Ups... Isto não correu muito bem. Por favor experimente outra vez.
SANÇÃO PECUNIÁRIA COMPULSÓRIA
PRESCRIÇÃO
INTERRUPÇÃO DA PRESCRIÇÃO
Sumário
I - A sanção pecuniária compulsória prevista no n.º 4 do artigo 829.º-A do Código Civil opera de forma automática, quando for estipulado ou judicialmente determinado qualquer pagamento em dinheiro corrente, sendo devida desde o trânsito em julgado da sentença de condenação, não se exigindo que os respectivos juros compulsórios sejam peticionados na acção declarativa para serem considerados. II - Nos termos do n.º 1 do artigo 323.º do Código Civil, a prescrição interrompe-se pela citação ou notificação judicial de qualquer acto que exprima, directa ou indirectamente, a intenção de exercer o direito, seja qual for o processo a que o acto pertence e ainda que o tribunal seja incompetente. III - Se a citação ou notificação se não se fizer dentro de cinco dias depois de ter sido requerida, por causa não imputável ao requerente, tem-se por interrompida a prescrição logo que decorridos esses cinco dias. IV - A cláusula geral que consta no art.º 323.º, n.º 2, do Código Civil, «por causa não imputável ao requerente» tem sido densificada em diversos arestos do Supremo Tribunal de Justiça no sentido de que a conduta do requerente só exclui a interrupção da prescrição quando tenha infringido objetivamente a lei em qualquer termo processual e até à verificação da citação, devendo a referida expressão legal ser interpretada em termos de causalidade objetiva”.
Texto Integral
Processo n.º 13057/16.3T8PRT-A.P1
Tribunal Judicial da Comarca do Porto
Juízo de Execução do Porto – Juiz 4
Acordam no Tribunal da Relação do Porto:
I.RELATÓRIO
1. B… veio, por apenso à execução que o Banco C…, SA, intentou, entre outros, contra si, deduzir embargos de executado.
Invocou, para tanto:
- falta de válido título executivo/inexigibilidade, por falta de liquidação da obrigação no processo declarativo ou, a título subsidiário, por errada liquidação do capital, juros, imposto de selo e sanção pecuniária compulsória.
- prescrição quanto aos juros peticionados vencidos há mais de 5 anos.
Concluiu pela procedência dos embargos, com a extinção da execução ou, a título subsidiário, com a redução da quantia exequenda.
O exequente/embargado contestou, impugnando, essencialmente, os argumentos alegados pelo executado, concluindo pela improcedência dos embargos de executado deduzidos, excepto na parte dos juros e imposto de selo liquidados com referência ao lapso temporal de 09/02/2009 a 30/05/2011 – no valor de € 2.547,66.
Foram as partes notificadas para efeitos de dispensa da audiência prévia e conhecimento do mérito da causa, pronunciando-se apenas o exequente/embargado pela afirmativa, sem qualquer oposição pelo executado/embargante.
Na sequência disso, foi dispensa a realização de audiência prévia, proferindo-se despacho que fixou o valor dos embargos, julgou válida e regular a instância, e, conhecendo do mérito da causa, proferiu decisão com o seguinte dispositivo: “a)- considerando verificada a invocada falta de válido título executivo quanto aos juros compulsórios, julgo improcedente o pedido executivo quanto aos juros compulsórios (de 5%) pedidos pelo exequente, que apenas serão devidos após o trânsito da presente decisão, procedendo os embargos nesta parte. b)- considerando verificada a prescrição dos juros moratórios e do respetivo imposto de selo, vencidos entre 02/06/2009 e até 28/05/2011, julgo parcialmente procedentes os presentes embargos de executado, com a consequente e oportuna redução/extinção parcial da execução quanto ao aqui executado/embargante (nessa parte dos juros/imposto de selo prescritos), prosseguindo quanto ao capital de €5.569,89 e na parte restante como peticionado pelo exequente/embargado, nos termos acima fixados. Custas pelo aqui executado/embargante e pelo exequente/embargado na proporção do decaimento, sem prejuízo do apoio judiciário concedido. Como valor desta causa é mantido o da execução e já fixado. Registe e notifique”.
2. 1. Inconformado com tal decisão, dela interpôs o exequente/embargado recurso de apelação para esta Relação, formulando com as suas alegações a seguinte conclusão:
………………………………
………………………………
………………………………
2.2. Também o executado/embargante não se conformou com a mesma sentença, pelo que dela interpôs recurso de apelação, formulando com as sua alegações as seguintes conclusões:
………………………………
………………………………
………………………………
O recorrido “Banco C…, S.A.” respondeu ao recurso interposto pelo executado B…, pugnando pela manutenção do decidido na sentença na parte por este impugnada.
Colhidos os vistos, cumpre apreciar.
II.OBJECTO DO RECURSO
A. Sendo o objecto do recurso definido pelas conclusões das alegações, impõe-se conhecer das questões colocadas pelos recorrentes e as que forem de conhecimento oficioso, sem prejuízo daquelas cuja decisão fique prejudicada pela solução dada a outras, importando destacar, todavia, que o tribunal não está obrigado a apreciar todos os argumentos apresentados pelas partes para sustentar os seus pontos de vista, sendo o julgador livre na interpretação e aplicação do direito.
B. Considerando, deste modo, a delimitação que decorre das conclusões formuladas pelos recorrentes, no caso dos autos cumprirá apreciar:
- Se devem ser considerados os juros compulsórios peticionados pela exequente no requerimento executivo;
- Se os juros anteriores a 28 de Abril de 2017 se acham prescritos.
III- FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
Foram os seguintes os factos julgados provados em primeira instância: 1.- O aqui exequente/embargado, antes denominado Banco D…, SA, e Banco E…, SA, deu à execução como título executivo:
- a sentença constante do processo executivo a que este está apenso, proferida no âmbito da ação sumária n.º 934/08.4TBMTS, com data de 23/12/2008, transitada em julgado em 01/06/2009, julgada parcialmente procedente, na qual, entre o mais, foi o ora embargante/executado condenado a pagar-lhe a seguinte quantia:
- a quantia pedida deduzida de todo o montante referente aos juros remuneratórios das prestações em dívida cujo período de tempo não decorreu, bem como a importância correspondente à capitalização desses valores (juros vencidos desde o incumprimento e vincendos sobre o capital em dívida) e nos termos e taxas de juros contratualizadas e quantia correspondente ao respetivo imposto de selo, tudo a liquidar em execução de sentença, com custas por ambas as partes, conforme tudo consta do documento junto e cujo teor aqui se dá por reproduzido. 2.- O pedido efectuado na acima referia acção sumária foi o seguinte:
- a condenação dos três RR., solidariamente, a pagarem ao A. a quantia de €6.819,07, acrescida de € 744,96 de juros vencidos até 04.02.2008 - e de € 29,80 de imposto de selo sobre estes juros e, ainda, os juros que, sobre a dita quantia de € 6.819,07 se vencerem, à taxa anual de 13,75% desde 05.02 de 2008 até integral pagamento, bem como o imposto de selo que, à referida taxa de 4%, sobre estes juros recair e, ainda, no pagamento das custas, procuradoria e mais legal, conforme tudo consta do documento junto e cujo teor aqui se dá por reproduzido. 3.- A exequente instaurou a presente execução em 23/05/2016, contra os três executados, através do requerimento executivo que se encontra junto, nele indicando como título executivo o acima indicado:
a)- fazendo constar, do local destinado a exposição dos Factos, o seguinte:
“IMPLEMENTAÇÃO DA CONDENAÇÃO CONSTANTE DE DECISÃO JUDICIAL QUANTIFICADA NO CAMPO LIQUIDAÇÃO DA OBRIGAÇÃO.”.
b)- fazendo constar, do local destinado à liquidação da obrigação, cujo valor líquido indicado foi de €14.965,97, o seguinte:
“CAPITAL -------------- €5.569,89 (CORRESPONDENTE ÀS PRESTAÇÕES DE CAPITAL VENCIDAS E NÃO PAGAS COM EXCLUSÃO DOS JUROS REMUNERATÓRIOS – 54.ª A 96.ª) – VIDÉ PLANO FINANCEIRO JUROS VENCIDOS À TAXA DE 13,75% DESDE 20.04.2007 AO TRÂNSITO EM JULGADO DA SENTENÇA EM 09.02.2009----- €1.386,94 IMPOSTO DE SELO À TAXA DE 4% ATÉ 09.02.2009 ------------- €55,48 JUROS À TAXA DE 18,75% (13,75%+5%, ARTIGO 829.º-A, N.º 4 C.CIVIL) DESDE 10.02.2009 ATÉ 30.03.2016----€7.456,40 IMPOSTO DE SELO À TAXA DE 4% DESDE 10.02.2009 ATÉ 30.03.2016---€298,26 JUROS À TAXA DE 18,75% (13,75%+5%, ARTIGO 829.º-A, N.º 4 C.CIVIL) DESDE 31.03.2016 ATÉ AO PRESENTE 23.05.2016----€151,65 IMPOSTO DE SELO À TAXA DE 6% (VERBA 17.2.1 DA TABELA GERAL DO IMPOSTO DE SELO, ART.º 70.º A DO CÓDIGO DE IMPOSTO DE SELO ALTERADO PELO ART.º 155.º DA LEI 7-A/2016, DE 30 DE MARÇO) DESDE 31.03.2016 ATÉ 23.05.2016---€9,10 TAXA DE JUSTIÇA----€38,25 TOTAL (EXCLUÍDOS JUROS VINCENDOS E IMPOSTO DE SELO) DESDE 24.05.2016) ---€14.965,97 MAIS JUROS VINCENDOS À TAXA DE 18,75% SOBRE €5.569,89 DESDE 24.05.2016 ATÉ EFECTIVO E INTEGRAL PAGAMENTO E IMPOSTO DE SELO À TAXA DE 6% SOBRE ESSES JUROS.”.
c)- vindo depois a fazer uma retificação à liquidação da obrigação exequenda, por requerimento de 11/10/2019, cujo valor líquido indicado passou para €14.865,98, do modo seguinte: “CAPITAL -------------- €5.569,89 (CORRESPONDENTE ÀS PRESTAÇÕES DE CAPITAL VENCIDAS E NÃO PAGAS COM EXCLUSÃO DOS JUROS REMUNERATÓRIOS – 54.ª A 96.ª) – VIDÉ PLANO FINANCEIRO JUROS VENCIDOS À TAXA DE 13,75% DESDE 20.04.2007 AO TRÂNSITO EM JULGADO DA SENTENÇA EM 01/06/2009 ------ €1.619,85 IMPOSTO DE SELO À TAXA DE 4% ATÉ 01/06/2009 ---------- €64,79 JUROS À TAXA DE 18,75% (13,75%+5%, ARTIGO 829.º-A, N.º 4 C.CIVIL) DESDE 02/06/2009 ATÉ 30.03.2016 sobre €5.569,89 ---- €7.127,36 IMPOSTO DE SELO À TAXA DE 4% DESDE 10.02.2009 ATÉ 30.03.2016----€285,09 JUROS À TAXA DE 18,75% (13,75%+5%, ARTIGO 829.º-A, N.º4 C.CIVIL) DESDE 31.03.2016 ATÉ AO PRESENTE 23.05.2016 sobre €5.569,89 --€151,65 IMPOSTO DE SELO À TAXA DE 6% (VERBA 17.2.1 DA TABELA GERAL DO IMPOSTO DE SELO, ART.º 70.º A DO CÓDIGO DE IMPOSTO DE SELO ALTERADO PELO ART.º 155.º DA LEI 7-A/2016, DE 30 DE MARÇO) DESDE 31.03.2016 ATÉ 23.05.2016---€9,10 TAXA DE JUSTIÇA----€38,25 TOTAL (EXCLUÍDOS JUROS VINCENDOS E IMPOSTO DE SELO) DESDE 24.05.2016) ---€14.865,98 MAIS JUROS VINCENDOS À TAXA DE 18,75% SOBRE €5.569,89 DESDE 24.05.2016 ATÉ EFECTIVO E INTEGRAL PAGAMENTO E IMPOSTO DE SELO À TAXA DE 6% SOBRE ESSES JUROS.” 4.- Em 20/04/2007, o capital em dívida ao exequente era de €5.569,89, tal como se extrai da sentença exequenda e do documento junto aos autos de execução, cujo teor aqui se dá por reproduzido. 5.- Na sentença dada à execução provou-se, entre o mais, que:
- “Nos termos do contrato assim celebrado entre o A. e a referida R., aquele emprestou a este a dita importância de € 16.960,00, com juros à taxa nominal de 9,75% ao ano, devendo a importância do empréstimo e os juros referidos, bem como o prémio do seguro de vida, serem pagos, nos termos acordados, em 72 prestações mensais e sucessivas, com vencimento, a primeira, em 20 de Novembro de 2002 e as seguintes nos dias 20 dos meses subsequentes (vide doc. n.º 1)”.
- “Mais foi acordado entre o A. e a referido R. - vide doc. n.o 1 - que em caso de mora sobre o montante em débito, a título de cláusula penal, acrescia uma indemnização correspondente à taxa de juro contratual ajustada – 9,75% - acrescida de 4 pontos percentuais, ou seja, um juro à taxa anual de 13,75%”.
- “A referida R., das prestações referidas, não pagou a 1a e as seguintes, ou seja, nenhuma, vencida, a primeira, em 20 de Maio de 2007, vencendo-se então todas, tendo ainda em dívida o valor de € 322,93, correspondente à prestação com vencimento em 20.04.2007”.
- “Por documento escrito, assinado pelo R B… e datado de 1.10.2002 e intitulado “termo de fiança” lê-se: “B… ... constitui-se perante e para com o banco E…, com sede..., ao diante designada por Banco E…, fiador de todas e quaisquer obrigações que para F…, resultem do contrato de mutuo com fiança no 629703 (...)”.
IV. FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO.
A. Recurso da apelante Banco C…, SA.
1. Dos juros compulsórios reclamados nos termos do artigo 829.º-A, n.º 4 do Código Civil.
É sabido que toda a acção executiva tem necessariamente de se fundar num título, do qual depende a exequibilidade da obrigação exequenda. Di-lo expressamente o n.º 5 do artigo 10.º do Código de Processo Civil quando prescreve que “toda a execução tem por base um título, pelo qual se determina o fim e os limites da acção executiva”.
Como esclarece Lebre de Freitas[1], “para que possa ter lugar a realização coactiva duma prestação devida (ou do seu equivalente), há que satisfazer dois tipos de condição, dos quais depende a exequibilidade do direito à prestação:
a) O dever de prestar deve constar dum título: o título executivo. Trata-se dum pressuposto de carácter formal, que extrinsecamente condiciona a exequibilidade do direito (…), na medida em que lhe confere o grau de certeza que o sistema reputa suficiente para a admissibilidade da acção executiva.
b) A prestação deve mostrar-se certa, exigível e líquida (…). Certeza, exigibilidade e liquidez são pressupostos de carácter material que intrinsecamente condicionam a exequibilidade do direito, na medida em que sem eles não é admissível a satisfação coactiva da pretensão”.
O artigo 703.º do Código de Processo Civil elenca, de forma taxativa, os títulos executivos que podem servir de base à execução, neles se incluindo - alínea a) do nº 1 - “as sentenças condenatórias”.
Das decisões judiciais, só a condenatória constitui título executivo[2]. Questão distinta é a de saber se toda a sentença de condenação constitui título executivo.
A força executória da sentença radica na força de caso julgado que a ela é associado, pelo que a oposição à execução nela fundada só poderá ter por fundamento qualquer das circunstâncias taxativamente tipificadas na lei, não podendo, consolidado esse trânsito em julgado, ser a mesma objecto de impugnação.
Como esclarece Fernando Amâncio Ferreira[3], “o encerramento da discussão no processo de declaração marca os limites temporais do caso julgado da decisão executada. Com efeito, é até esse encerramento que as partes podem invocar os factos supervenientes [art. 506.º, n.ºs 1 e 3, alínea c)] e o tribunal pode considerar os factos constitutivos, modificativos ou extintivos do direito invocado (art. 663.º, n.º1)”.
Estabelece o artigo 729.º do Código de Processo Civil, sob a epígrafe “fundamentos de oposição à execução baseada em sentença”:
“Fundando-se a execução em sentença, a oposição só pode ter algum dos fundamentos seguintes:
a) Inexistência ou inexequibilidade do título;
b) Falsidade do processo ou do traslado ou infidelidade deste, quando uma ou outra influa nos termos da execução;
c) Falta de qualquer pressuposto processual de que dependa a regularidade da instância executiva, sem prejuízo do seu suprimento;
d) Falta ou nulidade da citação para a acção declarativa quando o réu não tenha intervindo no processo;
e) Incerteza, inexigibilidade ou iliquidez da obrigação exequenda, não supridas na fase introdutória da execução;
f) Caso julgado anterior à sentença que se executa.
g) Qualquer facto extintivo ou modificativo da obrigação, desde que seja posterior ao encerramento da discussão no processo de declaração e se prove por documento. A prescrição do direito ou da obrigação pode ser provada por qualquer meio;
h) Contracrédito sobre o exequente, com vista a obter a compensação de créditos;
i) Tratando-se de sentença homologatória de confissão ou transacção, qualquer causa de nulidade ou anulabilidade desses actos”.
Com base na decisão condenatória proferida na acção sumária n.º 934/08.4TBMTS, com data de 23.12.2008, transitada em julgado em 01.06.2009, o exequente reclamou dos executados o pagamento das quantias peticionadas no requerimento executivo, nos termos que constam do ponto 3) dos factos provados.
Nas quantias peticionadas inclui juros à taxa de 5%, de acordo com o disposto no artigo 829.º - A, n.º 4 do Código Civil, “desde 02/06/2009 até 30.03.2016 [...]” e “desde 31.03.2016 até ao presente 23.05.2016 sobre €5.569,89 [...]”.
Dispõe o artigo 829.º-A, aditado ao Código Civil pelo Decreto-Lei n.º 262/83, de 16 de Junho: 1. Nas obrigações de prestação de facto infungível, positivo ou negativo, salvo nas que exigem especiais qualidades científicas ou artísticas do obrigado, o tribunal deve, a requerimento do credor, condenar o devedor ao pagamento de uma quantia pecuniária por cada dia de atraso no cumprimento ou por cada infracção, conforme for mais conveniente às circunstâncias do caso. 2. A sanção pecuniária compulsória prevista no número anterior será fixada segundo critérios de razoabilidade, sem prejuízo da indemnização a que houver lugar. 3. O montante da sanção pecuniária compulsória destina-se, em partes iguais, ao credor e ao Estado. 4. Quando for estipulado ou judicialmente determinado qualquer pagamento em dinheiro corrente, são automaticamente devidos juros à taxa de 5% ao ano, desde a data em que a sentença de condenação transitar em julgado, os quais acrescerão aos juros de mora, se estes forem também devidos, ou à indemnização a que houver lugar.”.
Retira-se do preâmbulo do mencionado Decreto-Lei n.º 262/83, de 16 de Junho: “Autêntica inovação, entre nós, constituem as sanções compulsórias reguladas no artigo 829.º-A. Inspira-se a do n.º 1 desse preceito no modelo francês das astreintes, sem todavia menosprezar alguns contributos de outras ordens jurídicas; ficando-se pela coerção patrimonial, evitou-se contudo atribuir-se-lhe um carácter de coerção pessoal (prisão) que poderia ser discutível face às garantias constitucionais.
A sanção pecuniária compulsória visa, em suma, uma dupla finalidade de moralidade e de eficácia, pois com ela se reforça a soberania dos tribunais, o respeito pelas suas decisões e o prestígio da justiça, enquanto por outro lado se favorece a execução específica das obrigações de prestação de facto ou de abstenção infungíveis.
Quando se trate de obrigações ou de simples pagamentos a efectuar em dinheiro corrente, a sanção compulsória- no pressuposto de que possa versar sobre quantia certa e determinada e, também, a partir de uma data exacta (a do trânsito em julgado) - poderá funcionar automaticamente. Adopta-se, pois, um modelo diverso para esses casos, muito similar à presunção adoptada já pelo legislador em matéria de juros, inclusive moratórios, das obrigações pecuniárias, com vantagens de segurança e certeza para o comércio jurídico.”.
Como explica Calvão da Silva[4], “a sanção pecuniária compulsória é a condenação pecuniária decretada pelo juiz para constranger e determinar o devedor recalcitrante a cumprir a sua obrigação. É, pois, um meio de constrangimento judicial que exerce pressão sobre a vontade lassa do devedor, apto para triunfar da sua resistência e para determiná-lo a acatar a decisão do juiz e a cumprir a sua obrigação, sob a ameaça ou compulsão de uma adequada sanção pecuniária, distinta e independente da indemnização, susceptível de acarretar-lhe elevados prejuízos”.
Salientando o carácter subsidiário da sanção em relação à obrigação principal, acrescenta o mesmo autor que “em caso de impossibilidade de observância da condenação principal, a sanção pecuniária compulsória não produz efeitos”.
Por sua vez, o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 12.04.2012[5], citando o acórdão do mesmo Tribunal de 23.01.2003[6], refere: “A sanção pecuniária compulsória visa, [...] uma dupla finalidade de moralidade e de eficácia, pois com ela se reforça a soberania dos tribunais, o respeito pelas suas decisões e o prestígio da justiça, enquanto por outro lado se favorece a execução específica das obrigações de prestação de facto ou de abstenção infungíveis. Quando se trate de obrigações ou de simples pagamentos a efectuar em dinheiro corrente, a sanção compulsória - no pressuposto de que possa versar sobre quantia certa e determinada e, também, a partir de uma data exacta (a do trânsito em julgado) - poderá funcionar automaticamente.
Parece, por conseguinte, que a sanção pecuniária compulsória, cujo “fim não é (nem, atenta a sua natureza de astreinte” (…), o poderia ser), o de indemnizar o credor pelos danos sofridos com a mora, mas o de forçar o devedor a cumprir, vencendo a resistência da sua oposição ou do seu desleixo, indiferença ou negligência” (…), constitui “um meio intimidativo, de pressão sobre o devedor, em ordem a provocar o cumprimento da obrigação, assegurando-se, ao mesmo tempo, o respeito e o acatamento das decisões judiciais e reforçando-se, assim, o prestígio da justiça” (…).
A qual se analisa, “quanto à sua natureza jurídica, numa medida coercitiva, de carácter patrimonial, seguida de sanção pecuniária na hipótese de não ser eficaz na consecução das finalidades que prossegue” (…)”.
Rematando o referido acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 12.04.2012: “Assim, de harmonia com o entendimento transcrito, a que se adere (…) a sanção pecuniária compulsória prevista no n.º 4 do citado artigo 829.º-A opera de forma automática, quando for estipulado ou judicialmente determinado qualquer pagamento em dinheiro corrente, sendo devida desde o trânsito em julgado da sentença de condenação.”.
No mesmo sentido, defende o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 12.09.2006[7] que “Os juros compulsórios, sendo impostos pelo legislador e devidos automaticamente, verificada que seja a situação prevista na lei, não necessitam ser pedidos na acção declarativa, para serem considerados, embora devam ser requeridos na acção executiva, se o exequente pretender que lá sejam atendidos”.
E no sumário do acórdão da Relação do Porto de 10.12.2019[8] pode ler-se:
“I - O mecanismo da sanção pecuniária compulsória consagrado no artigo 829º-A, do Cód. Civil, em qualquer das suas modalidades, visa o interesse público inerente à efectivação, em geral, das decisões judiciais que condenem o devedor no cumprimento das obrigações tidas em vista, ainda que também em benefício do interesse do credor.
II - O artigo 829º-A, n.º 1 do Cód. Civil prevê a denominada sanção pecuniária compulsória judicial, sanção que depende, para a sua aplicação casuística à luz de critérios de razoabilidade e conveniência, de requerimento do credor.
III - O artigo 829º-A, n.º 4, por seu turno, prevê uma outra modalidade de sanção pecuniária compulsória, denominada de sanção pecuniária compulsória legal, sanção que opera automaticamente e cujo conteúdo se mostra previamente fixado por lei (5% ao ano, sobre o valor pecuniário estipulado judicialmente e a contar desde o trânsito em julgado da sentença condenatória), sem demandar, portanto, ulterior intermediação judicial e requerimento do credor para esse fim”.
Sustenta o acórdão em causa que “...a aplicação desta sanção pecuniária compulsória legal não depende [...] de requerimento do credor/exequente, sendo sempre devida e, como tal, deve ser oportunamente liquidada pelo agente de execução”.
Idêntica posição foi acolhida no acórdão desta Relação e Secção, de 6.02.2020, – com voto de vencido -, quando sustenta: “O mecanismo da sanção pecuniária compulsória consagrado no artigo 829.º-A do CC, em qualquer das suas modalidades, é pois dominado pelo interesse público inerente à efectivação das decisões judiciais que condenem o devedor no cumprimento das obrigações de prestação tidas em vista, ainda que também em benefício do interesse de cada credor em particular.
Nestes termos, bem se compreende que a aplicação do nº4, não necessite de qualquer tipo de pedido processual. Se a sua aplicação é automática a mesma decorre oficiosamente da instauração do pedido exequendo (é uma consequência acessória do mesmo), já que constituiu não uma obrigação contratual mas uma consequência legal do incumprimento, em termos análogos aos dos juros legais. Deste modo, a sua aplicação em nada afecta o princípio do dispositivo [...]”.
Tendo o exequente, no caso dos autos, reclamado no requerimento executivo juros compulsórios devidos nos termos do n.º 4 do artigo 829.º-A do Código Civil, a controvérsia sobre a necessidade ou não de formular tal pretensão não exige aqui concreta solução.
É, assim, de concluir que a sanção pecuniária compulsória prevista no n.º 4 do citado artigo 829.º-A do Código Civil, operando de forma automática, quando for estipulado ou judicialmente determinado qualquer pagamento em dinheiro corrente, é, na situação em debate, devida desde o trânsito em julgado da sentença de condenação que constitui o título executivo.
Merece, consequentemente, procedência o recurso do apelante Banco C…, SA. sendo de revogar a sentença na parte por ele impugnada.
B. Recurso do apelante B….
A sentença recorrida considerou verificada “a prescrição dos juros moratórios e do respetivo imposto de selo, vencidos entre 02/06/2009 e até 28/05/2011, julgo parcialmente procedentes os presentes embargos de executado, com a consequente e oportuna redução/extinção parcial da execução quanto ao aqui executado/embargante (nessa parte dos juros/imposto de selo prescritos), prosseguindo quanto ao capital de €5.569,89 e na parte restante como peticionado pelo exequente/embargado, nos termos acima fixados”.
Alega o recorrente que não pode aplicar-se, no caso, o regime do n.º 2 do artigo 323.º do Código Civil, não tendo o exequente/embargado em momento algum alegado facto tendente a demonstrar que não foi por culpa sua que a citação não ocorreu no prazo de cinco dias.
Tendo o executado/embargado sido efectivamente citado a 28 de Abril de 2017, defende que é esta a data a que se deve atender para efeitos de interrupção da prescrição.
Nos autos resulta demonstrado que:
- a sentença que constitui título executivo transitou em julgado a 1.06.2009 – ponto 1.º dos factos provados;
- a execução, com base na referida sentença, foi instaurada a 23.05.2016 – ponto 3.º dos factos provados.
Nos termos do n.º 1 do artigo 323.º do Código Civil, a prescrição interrompe-se pela citação ou notificação judicial de qualquer acto que exprima, directa ou indirectamente, a intenção de exercer o direito, seja qual for o processo a que o acto pertence e ainda que o tribunal seja incompetente. Não se exige que a citação ou notificação tenham lugar no processo em que se procura exercer o direito, podendo ter lugar em procedimento preparatório, designadamente, em procedimento cautelar, bastando que o acto do titular do direito exprima, directa ou indirectamente, através da citação ou notificação, propósito de exercer o direito[9].
De acordo com o n.º 2 do aludido normativo, se a citação ou notificação se não se fizer dentro de cinco dias depois de ter sido requerida, por causa não imputável ao requerente, tem-se por interrompida a prescrição logo que decorridos esses cinco dias.
Como explica o citado acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 12.09.2018, “A cláusula geral que consta no art.º 323.º, n.º 2, do Código Civil, «por causa não imputável ao requerente» tem sido densificada em diversos arestos do Supremo Tribunal de Justiça no sentido de que a conduta do requerente só exclui a interrupção da prescrição quando tenha infringido objetivamente a lei em qualquer termo processual e até à verificação da citação, devendo a referida expressão legal ser interpretada em termos de causalidade objetiva”.
Segundo Pires de Lima/Antunes Varela[10], “se a citação ou notificação é feita dentro dos cinco dias seguintes ao requerimento, não há retroactividade quanto à interrupção da prescrição. Atende-se, neste caso, ao momento da citação ou notificação. Se é feita posteriormente, por causa não imputável ao requerente, considera-se interrompida passados cinco dias (…). Se a culpa da demora é do requerente, atende-se ao momento da citação ou notificação”.
Sobre tal imputabilidade é entendimento pacífico na jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça[11] que a conduta do autor/requerente só não exclui a interrupção da prescrição quando tenha infringido objectivamente a lei em qualquer termo processual até à verificação da citação, sendo que a expressão causa não imputável ao requerente, acolhida no artigo 323.º, n.º 2 do Código Civil, deve ser interpretada em termos de causalidade objectiva, só excluindo a interrupção da prescrição quando aquela parte tenha infringido objectivamente a lei em qualquer termo processual até à verificação da citação.
De acordo com o citado acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 29.11.2016, “deve, por outro lado, afastar-se o entendimento de que, em razão de o autor não se ter socorrido de actos ou diligências aceleratórias que, porventura, a terem sido adoptadas, poderiam permitir um curso mais célere do processo na sua fase liminar, não poder beneficiar do dito regime (consagrado no nº 2 do art. 323º), já que essas diligências constituem uma faculdade e não um dever ou ónus do autor. Neste sentido referiu-se no acórdão do STJ de 20-06-2012 que “… a resposta à questão colocada é negativa: não se perscrutando nos autos a imputação objectiva à conduta das autoras de violação de preceito processual, a simples omissão de um acto facultativo que tanto pode justificar como não a recusa do acto de citação, não pode ter o efeito obstativo da interrupção da prescrição, conforme pretende a ré e decidiu o acórdão recorrido. Não é essa a linha de interpretação do disposto no art. 323.º, n.º 2, do CC”.
No caso aqui em análise não é possível apontar ao exequente qualquer conduta excludente da interrupção da prescrição na interpretação pela qual alinha maioritariamente a jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça.
Assim, acertadamente considerou a sentença impugnada interrompida a prescrição a 28.05.2016, de acordo com o disposto no n.º 2 do artigo 323.º, n.º 2 do Código Civil, pelo que, nessa parte, não merece reparo, improcedendo o recurso do apelante B….
Pelo exposto, acordam os juízes desta Relação, em:
A. Julgar procedente o recurso interposto pela apelante Banco C…, SA., revogando, em consequência, a sentença na parte em que considerou verificada a falta de válido título executivo quanto aos juros compulsórios, julgando improcedente o pedido executivo quanto aos juros compulsórios (de 5%) pedidos pelo exequente – alínea a) do dispositivo.
B. Julgar improcedente o recurso interposto pelo apelante B…, confirmando a sentença na parte por ele impugnada.
Custas:
- apelação da recorrente Banco C…, SA.: as custas do recurso serão suportadas pela recorrente, por tirar proveito da decisão, não havendo lugar à sua condenação em custas de parte ou procuradoria por não ter sido apresentada resposta às suas alegações;
- apelação do recorrente B…: decaindo no recurso interposto, as respectivas custas são da sua responsabilidade.
Acórdão processado informaticamente e revisto pela primeira signatária.
Porto, 25 de Março de 2021
Judite Pires
Aristides Rodrigues Almeida
Paulo Dias da Silva
_____________ [1] “A Acção Executiva Depois da Reforma da Reforma”, 5ª ed., pág. 29. [2] Lebre de Freitas, “A Acção Executiva à Luz do Código de Processo Civil de 2013”, 7.ª ed., Gestlegal, pág. 51. [3] Curso de Processo de Execução”, 2010, 13ª ed., Almedina, pág. 178. [4] Cumprimento e Sanção Pecuniária Compulsória, pág. 355. [5] Processo 176/1998.L1.S1, www.dgsi.pt. [6] Processo 02B4173, www.dgsi.pt. [7] Processo 06A2302, www.dgsi.pt. [8] Processo 6460/08.4YYPRT-A.P1, www.dgsi.pt [9] Acórdão do STJ de 12.09.2018, processo n.º 5282/07.4TTLSB.L1.S1, www.dgsi.pt. [10] Código Civil Anotado, vol. I, 4ª edição revista e actualizada, Coimbra Editora, págs. 290/291. [11] Entre outros, cfr. acórdãos de 29.11.2016, processo nº 448/11.5TBSSB-A.E1.S1, de 3.02.2011, processo nº 1228/07.8TBAGH.L1S1 e de 14.05.2002, processo nº 02A1159, todos em www.dgsi.pt.