I. Nos termos do art. 652.º, n.º 1, al. b) do CPC, deve admitir-se a revista regra na parte do acórdão recorrido em que se recusou parcialmente a apreciação da impugnação da decisão sobre a matéria de facto quer por não se encontrarem reunidos todos os requisitos previstos no art. 640.º do CPC, quer por se considerar que a alteração pretendida se afigura inútil à decisão da causa (art. 674.º, n.º 1, al. b) do CPC). Não se verifica, nesta parte, dupla conformidade decisória. O mesmo se diga a propósito da violação de disposições processuais, pela Relação, no exercício dos respetivos poderes de reapreciação da decisão de facto.
II. Em ordem a apurar se a fundamentação das decisões das Instâncias é ou não essencialmente diferente releva o conteúdo de cada uma dessas decisões e não o sumário do acórdão recorrido.
III. O conceito de fundamentação essencialmente diferente não se basta com qualquer modificação ou alteração da fundamentação no iter jurídico que suporta o acórdão da Relação em confronto com a sentença de 1.ª Instância.
IV. A Relação não se abstém de conhecer da impugnação da decisão de facto quando, a propósito de alguns pontos da matéria de facto, considerou que não foram cabalmente observados pelos recorrentes os ónus previstos no art. 640,º, n.º 1 do CPC e, quanto a outros pontos, reputou tratar-se de matéria irrelevante para a decisão final.
V. O dever de reapreciação da prova por parte da Relação apenas existe no caso de os recorrentes respeitarem todos os ónus previstos no art. 640.º, n.º 1 do CPC e de a matéria em causa se afigurar relevante para a decisão final.
VI. Na interpretação-aplicação do art. 640.º do CPC, o STJ tem observado, fundamentalmente, um critério de proporcionalidade e de razoabilidade.
VII. O art. 640.º, n.os 1, al. b), e 2 do CPC não exige que os recorrentes se pronunciem sobre a valoração alegadamente correta dos meios de prova por si indicados.
VIII. Segundo a jurisprudência do STJ, nada impede a Relação de apreciar se a factualidade indicada pelos recorrentes é ou não relevante para a decisão da causa, podendo, no caso de concluir pela sua irrelevância, deixar de apreciar, nessa parte, a impugnação da matéria de facto por se tratar de ato inútil.
I - Relatório
1. Arpador–Arquitectos & Associados, Lda. e AA, com sede e domicílio na Rua …, …, da cidade …, sob a forma de processo comum, contra Adriparte Gest, S.A., com sede com sede na Avenida …, …, …, da cidade … e BB, residente na Rua ….– Lote …– Quinta …., em …..
2. Os Autores fundamentaram a sua pretensão na responsabilidade pré-contratual, alegando que a 1ª Ré e/ou o 2º Réu frustraram de forma culposa e ilegítima as expectativas neles criadas de que iriam formalizar um contrato de prestação de serviço de arquitetura relativamente a dois imóveis, rompendo as negociações que vinham mantendo com vista a essa formalização, provocando-lhe prejuízos, designadamente, no valor de € 121.247,00 a título de honorários não auferidos, de € 100.000,00, a título de perda de negócios futuros e de € 270.000,00, a título de perda de oportunidade na participação em projeto.
3. Terminam pedindo a condenação dos Réus a pagar-lhes, solidária ou subsidiariamente, a quantia global de € 457.804,00, acrescida de juros de mora à taxa legal aplicável às transações comerciais, calculados desde a data da citação.
4. Citados, os Réus contestaram, impugnando de forma motivada os factos alegados, dizendo que apenas foi encomendado ao Autor um destes trabalhos, tendo sido liquidado o respetivo valor conforme recibo de quitação e, para o caso de assim não se entender, invocam ainda que os Autores agem com abuso do direito. Terminaram pugnando pela improcedência da ação.
5. No exercício do contraditório, os Autores pediram a condenação dos Réus como litigantes de má fé.
6. Foi realizada audiência prévia, no âmbito da qual foi proferido despacho saneador e foram fixados os temas de prova.
7. Procedeu-se, depois, ao julgamento.
8. A final foi proferida decisão que julgou a ação totalmente improcedente por não provado com a consequente absolvição dos Réus do pedido.
9. Não se conformando com a decisão, os Autores interpuseram recurso de apelação.
10. Os Réus apresentaram contra-alegações, preconizando o não provimento do recurso.
11. Conforme o acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 8 de setembro de 2020:
“Pelo exposto, acordam os juízes do Tribunal da Relação em julgar a apelação improcedente por não provado procedente e, consequentemente confirmar a decisão recorrida.
Custas da apelação a cargo dos recorrentes (artigo 527.º do CPCivil)”.
12. Não se conformando, os Autores interpuseram recurso de revista, apresentando as seguintes Conclusões:
“I. Integra violação de direito processual susceptível de constituir fundamento do recurso de revista, nos termos do art. 674.º, n.º 1, al. b), do NCPC, o acórdão em que a Relação se limita a tecer considerações de ordem genérica em torno das virtualidades de determinados princípios, como o da livre apreciação das provas, ou a enunciar as dificuldades inerentes à da tarefa de reapreciação dessas provas, para concluir pela manutenção da decisão da matéria de facto.
II. Não tendo sido efectivamente apreciada a impugnação da decisão da matéria de facto nem reapreciada a prova que foi indicada pelos recorrentes relativamente aos pontos de facto impugnados, deve o processo ser remetido à Relação para o efeito.
III. Os concretos pontos de facto contidos na previsão do art. 640.º, n.º 1, al. a), do CPC, podem ou não consistir na singularidade das proposições interrogativas isoladas que integram o «questionário» ou a base instrutória, mas devem, no entanto, traduzir-se em factos interligados, por um nexo espácio-temporal que lhes confira unidade, sobre os quais tenham sido admitidos e produzidos, essencialmente, os mesmos meios de prova, podendo corresponder ou não a um determinado tema de prova, quando os mesmos exprimam factos naqueles termos.
IV. A alínea a) do n.º 1 do art.º 640.º não limita a forma de referenciação dos “concretos pontos de facto”, não impondo que os mesmos sejam referidos por referência aos artigos da petição ou da contestação.
V. A insuficiência ou mediocridade da fundamentação probatória do recorrente não releva como requisito formal do ónus de impugnação, mas, quando muito, como parâmetro da reapreciação da decisão de facto, na valoração das provas, exigindo maior ou menor grau de fundamentação, por parte do tribunal de recurso, consoante a densidade ou consistência daquela fundamentação, matéria a apreciar em sede do mérito da decisão impugnada.
VI. A reapreciação da matéria de facto por parte da Relação tem de ter a mesma amplitude que o julgamento de primeira instância, pois só assim poderá ficar plenamente assegurado o duplo grau de jurisdição.
VII. O tribunal da Relação deve exercer um verdadeiro e efetivo 2.º grau de jurisdição da matéria de facto e não um simples controlo sobre a forma como a 1.ª instância respondeu à matéria factual, limitando-se a intervir nos casos de flagrante desconformidade entre os elementos de prova e a decisão, pois que só assim se assegurará o duplo grau de jurisdição, em matéria de facto, que a reforma processual de 1995 (DL n.º 329-A/95, de 12-12) visou assegurar e que o atual Código confirmou e reforçou
VIII. Na reponderação da decisão sobre a matéria de facto, para garantir um duplo grau de jurisdição em tal âmbito, a Relação deverá formar e fazer refletir na decisão a sua própria convicção, na plena aplicação e uso do princípio da livre apreciação da prova, nos mesmos termos em que o deve fazer a 1.ª instância, ainda que, quanto à prova gravada, com a consciência dos condicionamentos postos pela limitada ação do princípio da imediação.
IX. A Relação, no âmbito do seu poder-dever de sindicar a resposta dada à matéria de facto pela primeira instância, deve procurar formar a sua própria convicção sobre os factos que o recorrente lhe assinala, considerando, de novo, e de forma independente e autónoma da fundamentação da sentença, todos os meios pertinentes sobre tais factos.
X. Não pode, nesse exercício, aceitar como boas as conclusões e a respetiva fundamentação da sentença, apenas porque nelas não encontra incoerências intrínsecas, devendo antes fundamentar, por si própria, a formação da sua convicção factual, alinhando e sopesando a prova que considerou, em sede de recurso.
XI. Isto é, da fundamentação da resposta da Relação quanto à matéria de facto deve ser possível às partes retirar que a Relação efetivamente se debruçou sobre a prova, que a leu, ouviu ou visualizou, apenas depois contrapondo as suas próprias conclusões às expressas na sentença.
XII. Os factos instrumentais, mesmo que não constem da alegação das partes, podem ser tidos em consideração pelo julgador se resultarem da instrução da causa. Não se nos afigura rigorosa a afirmação de que os factos sindicados pelos Recorrentes – que foram por eles alegados na petição inicial e foram levados a debate em sede de instrução e julgamento – não devem ser objecto de julgamento em 2ª Instância, em sede de impugnação da matéria de facto, por serem instrumentais e o julgamento na 2ª Instância constituir um acto inútil.
XIII. A consideração da inutilidade da reapreciação do julgamento da matéria de facto, quando a parte que recorre cumpriu o ónus de que depende a apreciação da sua pretensão, só pode/deve ser recusada em casos de patente desnecessidade.
XIV. A fundamentação da matéria de facto provada e não provada, com a indicação dos meios de prova que levaram à decisão, assim como a fundamentação da convicção do julgador, devem ser feitas com clareza, objectividade e discriminadamente, de modo a que as partes, destinatárias imediatas da decisão, saibam o que o Tribunal considerou provado e não provado e qual a fundamentação dessa decisão reportada à prova fornecida pelas partes e adquirida pelo Tribunal.
XV. Uma deficiente ou obscura alusão aos factos provados ou não provados pode comprometer o direito ao recurso da matéria de facto e, nessa perspectiva, contender com o acesso à Justiça e à tutela efectiva, consagrada como direito fundamental no art. 20º da Constituição da República.
XVI. Tendo os recorrentes cumprido os apontados ónus sem que o tribunal a quo tenha conhecido de determinados pontos de facto que foram impugnados por aquele, ignorando essa impugnação, incorreu o mesmo em omissão de pronúncia, sendo o acórdão recorrido nulo, nessa parte, nos termos do art. 615.º, n.º 1, al. d), 1.ª parte, do CPC, aplicável por força do art. 666.º, n.º 1, do mesmo Código.
XVII. Devem ser objecto de julgamento em 2ª Instância, em sede de impugnação da matéria de facto, os factos instrumentais, não podendo a Relação presumir a sua irrelevância para qualquer solução possível (que pode não considerar corretamente), exceto quando ela seja manifesta (o que não é o caso).
XVIII. Pelo exposto, se conclui que o acórdão recorrido ilicitamente omite a pronúncia sobre todos os factos identificados na Conclusão I da Apelação, devendo assim ser ordenada a baixa dos autos para reformulação do acórdão, para cabal exercício do poder-dever da Relação de formar a sua própria convicção sobre tais factos, que deverá fundamentar tendo em consideração as alegações dos Apelantes e dos Apelados.
Sem prescindir,
XIX. A fundamentação do acórdão recorrido, fora dos casos previstos no n.º 5 e 6 do art.º 663.º do Código de Processo Civil, não pode traduzir-se na mera remissão para os fundamentos da sentença ou na sua reprodução sem contraposição com os inovadores argumentos formulados em apelação.
XX. Tendo o Recorrido, ao longo de dois anos e mantendo a conduta reiterada ao longo de mais de 25 anos, solicitado ao Recorrente e por seu intermédio à Recorrente Sociedade de que este é gerente, que realizasse trabalhos de arquitetura, que contactasse mediadores imobiliários relativamente a dois concretos imóveis e que encetasse negociações com o inquilino residente num deles tendentes ao seu conluio no exercício de direito de preferência financiado pela Recorrida Sociedade, criou legítimas expectativas aos Recorrentes de que o seu trabalho e esforços pessoais seriam remunerados pelo menos nos termos em que sempre o haviam sido no passado e que os Recorrentes acompanhariam os projetos enquanto os mesmos se mantivessem sob a alçada dos Recorridos.
XXI. Quer a sentença, quer o douto acórdão, porém, apenas conjugam o princípio da liberdade contratual na ótica dos Recorridos, mas não na ótica dos Recorrentes, assim não lhes reconhecendo, também, o direito e a liberdade de não contratar — e de não trabalhar — mediante condições que não considerassem satisfatórias.
XXII. Tendo o Recorrido, Presidente do Conselho de Administração da Recorrida e seu maior acionista, determinado ser esta quem adquiriria os imóveis e promoveria a sua valorização e revenda e já tendo no passado utilizado sociedades suas participadas para esses fins, relativamente a trabalhos realizados pelos Recorrentes, não se pode entender que desistiu de adquirir os imóveis, mas apenas que o decidiu fazer de forma indireta.
XXIII. Ao decidir, sem motivo objetivo claro e contrariando a sua própria prática em outras duas situações similares, abrir um concurso ao qual convidou mais três gabinetes de arquitetura, com os quais a Autora passou a ter de concorrer para conseguir manter-se no projeto, os Recorridos, a 1.ª diretamente e o 2.º por intermédio desta, cuja vontade como Presidente do Conselho de Administração determinava, frustrou as expectativas legítimas criadas nos Recorrentes;
XXIV. Atentas as circunstâncias da abertura do concurso, é objetivo concluir que o mesmo visou excluir a Recorrente Sociedade dos projetos ou, pelo menos, forçá-la a reduzir substancialmente os honorários que sempre praticara com o Recorrido BB, demonstrando assim intencionalidade e consciência dos Recorridos na frustração daquelas expectativas.
XXV. Por via da conduta dos Recorridos, descrita, os Recorrentes deixaram de auferir qualquer remuneração por trabalhos de arquitetura, bem como pelo tempo despendido em contactos e negociações, tendo além disso a oportunidade de participar em negócios alternativos sobre os mesmos prédios, que poderiam ter-lhe permitido participar nos lucros de tais projetos, o que havia já combinado quanto a um dos prédios, tendo também perdido a visibilidade que a concretização construtiva dos seus projetos de arquitetura lhe poderiam ter dado, conduzindo à angariação de novos clientes.
XXVI. Tendo a Recorrida Sociedade negociado com os Recorrentes apenas o valor da remuneração devida pelo Estudo Prévio, que pagou à Recorrente como pagou a todos os outros Gabinetes concorrentes, e tendo os Recorrentes declarado que com o montante acordado se consideravam ressarcidos dos valores devidos pela elaboração do Estudo Prévio, não se pode extrair de tal declaração que os Recorrentes deram quitação a ambos os Recorridos de todas e quaisquer quantias de que se pudessem considerar credoras;
XXVII. De tal declaração apenas se extrai que à Recorrida (e apenas a Recorrida) era dada quitação, exclusivamente quanto ao estudo prévio.
XXVIII. Assim os Recorridos não tinham motivo para crer que os Recorrentes nada mais deles reclamariam, não o tendo em especial o Recorrido BB, para o qual não foi expedida qualquer declaração de quitação, não constituindo por isso a presente ação qualquer abuso de direito (tanto mais que a Recorrida Sociedade apenas é demandada a título subsidiário).
XXIX. O valor do dano ou a forma de o determinar, não constituem pressuposto da imputação de responsabilidade civil — mas apenas a própria existência do dano.
XXX. Não se pode confundir a formação de um entendimento por parte da Relação que confirme a decisão da 1.ª instância, com a mera adesão, por outras palavras e com argumentos sujeitos apenas a diferente enquadramento jurídico, mas mantendo a essência da análise da sentença.
XXXI. A sentença recorrido viola assim o art.º 662.º e 663.º do Código de Processo Civil, e faz de forma manifesta uma errada aplicação do disposto no art.º 227.º, 483.º, 564.º e 566.º do Código Civil.
XXXII. Deve, assim, ser revogada a sentença, determinando-se a devolução dos presentes autos ao Tribunal da Relação, para que proceda à efetiva apreciação da matéria de facto impugnada.
Com o que se fará necessária e salutar JUSTIÇA.”
13. Por seu turno, nas suas contra-alegações, os Réus apresentaram as seguintes Conclusões:
“a) O Douto Acórdão proferido não merece reparo, encontra-se devidamente fundamentado, sustentado, e com a devida aplicação das normas e do Direito, nomeadamente quanto à interpretação dos ónus constantes das disposições a), b) e c) do n.º 1 e alínea a) do n.º 2 do art. 640.º do CPC, pelo que deve ser julgado totalmente improcedente o recurso interposto.
b) De resto, o recurso nem deve ser aceite, por inadmissível. Os Recorrentes justificam o seu recurso invocando que os pontos I, II e III do sumário tratam de matéria diferente daquela que é tratada em 1.ª Instância, o que afastaria uma dupla conforme e possibilitaria a admissão do recurso.
c) Não têm razão nenhuma: como melhor explicado logo no início desta peça, aqueles pontos do sumário tratam do que são temas de prova, do que são factos provados e não provados, de como se impugna a matéria de facto constante da decisão de 1.ª Instância, e isso obviamente não é matéria que à 1.ª Instância coubesse apreciar, não funcionando como argumento para afastar a “dupla conforme” e permitir a admissibilidade do recurso. Não deve, portanto, ser admitido o recurso.
d) Ainda para tentar justificar a admissibilidade do recurso, em segunda linha os Recorrentes invocam que, no Acórdão, se verifica uma nova fundamentação diferente daquela que consta da 1.ª Instância, o que não é verdade: em qualquer dos casos, quer na Sentença quer no Acórdão, conclui-se que inexiste conduta dos Réus censurável e, nesse sentido, que inexiste responsabilidade pré-contratual imputável aos Réus, para mais não se tendo provado quaisquer danos (tudo melhor desenvolvido supra). Também por esta argumentação não deve ser admitido o recurso.
e) De seguida, os Recorrentes surpreendem-nos com as suas alegações (pontos 131 a 222) e conclusões (pontos XX a XXXI) pois enveredam por um conjunto de considerações, argumentações e alegações que não foram consideradas provadas querem 1.ª Instância quer na Relação, não têm qualquer suporte factual nos autos nem fundamento em qualquer disposição processual para serem agora invocadas em recurso ou apreciadas pelo Supremo Tribunal de Justiça.
f) Embora no final, aquando formulam o pedido, os Recorrentes não retirem qualquer consequência, a verdade é que o que ali vai não é admissível a todos os títulos: através de uma construção completamente fantasiosa, os Recorrentes tentam novamente imputar aos Recorridos uma conduta ilícita geradora de responsabilidade pré-contratual (que não resultou provada nos autos, quer em 1.ª quer em 2.ª Instância) e a responsabilidade pelo pagamento dos danos sofridos (que também não resultaram provados nos autos). Não faz sentido, não tem sustento factual ou processual, e por isso também não deve ser admitido o recurso nesta parte dos pontos XX a XXXI das conclusões.
g) Para além do mais, diz-se neste capítulo que o Acórdão teria violado os artigos 662.º e 663.º do CPC, sem se especificar qual ou quais as disposições que teriam sido violadas, e como, e que teria havido errada aplicação do disposto nos artigos 227.º, 483.º, 564.º e 566.º, todos do Código Civil, igualmente sem se especificar qual seria essa errada aplicação e qual seria a devida interpretação e aplicação (tudo em violação das alíneas a) e b) do n.º 2 do artigo 639.º do CPC), nem explicando por que motivo, face à prova efectivamente produzida, existiria qualquer erro.
h) Os Recorrentes invocam ainda recurso de revista excepcional por considerarem estar os pontos II e III do sumário “em contradição com o acórdão proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça, no domínio da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de direito, no âmbito da Revista n.º 299/05.6TBMGD.P2S1”, na tentativa de fazer caber o seu recurso no âmbito da previsão estabelecida na alínea c) do n.º 1 do art. 672.º do CPC (o acórdão será recorrível quando estiver “em contradição com outro, já transitado em julgado, proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça, no domínio da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de direito”), mas também aqui não têm razão.
i) Não só não estamos no âmbito da mesma legislação, pois aí tratava-se de uma acção instaurada em 2005 (pelo que àquele recurso não era aplicável a restrição de admissibilidade da “dupla conforme”, de acordo com o n.º 1 do art. 7.º da Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho; isto é, não lhe era aplicável o preceituado no n.º 3 do art. 671.º do CPC actual, com naturais consequências sobre a sua admissibilidade), como naquela Acórdão não trata da mesma questão jurídica.
j) Ali pretendia-se saber se se devem considerar preenchidos os requisitos formais relativos aos ónus de impugnação exigidos pelo art. 640.º, n.ºs 1 e 2, al. a), do CPC, quando só no corpo das alegações (e já não nas conclusões de recurso) o recorrente especifica os meios de prova concretos e indica as passagens concretas das gravações dos depoimentos que invoca e onde se sustenta para a alteração pretendida da matéria de facto, isto é, se é necessário o recorrente especificar nas conclusões os meios de prova concretos e indicar também nas conclusões as passagens concretas das gravações dos depoimentos que invocar e onde se pretenda sustentar para conseguir a apreciação da alteração da matéria de facto (e conclui-se que não é necessária a sua referência nas conclusões, pode constar da motivação).
k) Mas em algum sítio do recurso de impugnação da matéria de facto (alegações ou conclusões) terão de estar indicados os meios de prova concretos e as passagens concretas das gravações dos depoimentos que imponham decisão diferente da matéria de facto: se isso não estiver em lado nenhum (alegações ou conclusões), é evidente que não podem ser considerados cumpridos os ónus exigidos pelo art. 640.º, n.ºs 1 e 2, al. a), do CPC, e deve o recurso ser imediatamente rejeitado: é o que vem claramente expresso na disposição da alínea a) do n.º 2 do art. 640.º do CPC, tudo como melhor desenvolvido no corpo das alegações.
l) Neste ponto, que é o que importa, não há contradição nenhuma entre os Acórdãos: de forma que também não deve ser admitido o recurso excepcional de revista.
Posto isto:
m) Ainda que se admita o recurso, em todas as suas vertentes, ele deve ser julgado totalmente improcedente pelas razões deduzidas nas alegações (ver essencialmente capítulo II), mesmo na parte que os Recorrentes criticam a Relação na interpretação e aplicação das normas adjectivas (os ónus de impugnação da matéria de facto).
n) Na verdade, quando, para a maior parte das situações relativas à impugnação da matéria de facto, o Tribunal da Relação considera que os Recorrentes não cumpriram os ónus do art. 640.º do CPC, aquilo que se esperaria de recorrentes que quisessem invocar junto do STJ erro nessas decisões era que esclarecessem onde e como, nas suas alegações anteriores, teriam cumprido esses ónus, ao contrário do que determinou o Acórdão da Relação, e isso não acontece nas alegações a que agora se responde: não indicam de que forma, onde e como teriam cumprido os ónus da impugnação da matéria de facto no recurso apresentado à Relação e que, consequentemente, levaria aos erros no Acórdão que tentam colocar em crise.
o) E a verdade é que os Recorrentes não cumpriram os ónus constantes do art. 640.º, n.º 1, als. a), b) e c) e n.º 2, al. a).
p) Improcede, portanto, a sua pretensão, tal como mais abundantemente desenvolvido, explicado e ilustrado no corpo das alegações (ver capítulos II e III).
q) Como devem improceder todas as restantes invocações (pretenderem dar como provados temas de prova conclusivos, factos instrumentais irrelevantes, situações hipotéticas, situações alternativas, pelas razões sustentadas nas alegações supra).
r) E ainda improceder a arguição de nulidades, por inexistentes e infundamentadas.
s) Por fim, convirá recordar novamente que os Recorrentes não pagaram a taxa de justiça.
t) Assim, para concluir, o Acórdão proferido não padece de qualquer vício, por todos os motivos referidos, não merecendo qualquer reparo, devendo ser julgado totalmente improcedente o recurso interposto e o Acórdão mantido, com todas as consequências legais.
DESTE MODO, DEVERÁ:
SER JULGADO INADMISSÍVEL A INTERPOSIÇÃO DE RECURSO, POR INEXISTIR DISPOSIÇÃO PROCESSUAL QUE O PERMITA;
SENDO ADMITIDO, DEVE O MESMO SER JULGADO TOTALMENTE IMPROCEDENTE, EM TODAS AS SUAS VERTENTES, E COMO TAL INDEFERIDO, E MANTER-SE O DOUTO ACÓRDÃO RECORRIDO NOS SEUS PRECISOS TERMOS, FAZENDO ASSIM V. EXAS. SENHORES DESEMBARGADORES, INTEIRA JUSTIÇA!”
II – Questões a decidir
O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente, não podendo o Tribunal ad quem conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso (arts. 635.º, n.º 4, e 639.º, n.os 1 e 2 do CPC).
Estão, assim, em causa as questões de saber:
- se é ou não admissível o recurso de revista regra ou normal interposto pelos Autores;
- se o acórdão recorrido se encontra ou não ferido de nulidade por omissão de pronúncia, em virtude de o Tribunal da Relação …. não ter conhecido de determinados pontos de facto que foram impugnados pelos Autores/Apelantes, aqui Recorrentes (art. 615.º, n.º 1, al. d), 1.ª parte do CPC);
- se o Tribunal da Relação …. se limitou ou não a tecer considerações de ordem genérica em torno das virtualidades de determinados princípios, como o da livre apreciação das provas, ou a enunciar as dificuldades inerentes à tarefa de reapreciação dessas provas, para concluir pela manutenção da decisão da matéria de facto, sem formar a sua própria convicção sobre a matéria probatória objeto de impugnação pelos Autores/Apelantes, aqui Recorrentes;
- se o ónus de alegação previsto no art. 640.º, n.º 1, al. a) do CPC se cumpre com a indicação dos temas da prova ou se se impõe que os “concretos pontos de facto” sejam mencionados por referência aos artigos da petição ou da contestação;
- se os Autores/Apelantes, aqui Recorrentes, cumpriram ou não o ónus previsto no art. 640.º. n.º 1, al. b) do CPC;
- se, considerando a sua irrelevância para a decisão final, é ou não legítima a recusa do Tribunal da Relação …. em não conhecer da impugnação da matéria de facto contida na apelação relativamente a factos instrumentais.
III – Fundamentação
A) De Facto
O Tribunal de 1.ª Instância considerou como provada a seguinte factualidade:
“1. O 2º réu conheceu o 2º autor em Julho de 1989 por este ter projectado a sua casa.
2. Desde essa data, o 2º autor e o 2º réu foram estreitando relações, as quais evoluíram do campo estritamente profissional, para o da amizade, ao longo dos últimos 25 anos.
3. Ao longo desses anos, a autora foi, a pedido do 2º réu, realizando diversos trabalhos, nomeadamente, estudos prévios e/ou projectos de arquitectura, quer a título particular, para o 2º réu, quer para empresas em que trabalhava ou de que era sócio.
4. Em 2007, o 2º réu solicitou à autora a elaboração de um projecto de arquitectura para uma habitação, na zona da ….., na ….., a que se convencionou chamar “Casa P….” ou “P…..”, que se destinava a ser habitação do filho do 2º réu, CC, projecto esse que veio a ser concluído em 2011.
5. Todas as obras referidas foram realizadas a título oneroso pela autora, que sempre aplicou aos honorários os valores de referência resultantes das “Instruções para o Cálculo de Honorários Referentes aos Projectos de Obras Públicas”, resultantes da Portaria de 7 de Fevereiro de 1972.
6. O 2º réu sempre pagou os honorários pedidos pela autora, sem nunca os tendo questionado, embora a partir do ano de 2010 os qualificasse de “caros”.
7. O 2º autor, ao longo dos anos, sugeriu ao 2º réu por diversas vezes que este realizasse vários investimentos imobiliários.
8. Em todas estas sugestões estava presente o interesse do 2º autor em procurar captar eventuais trabalhos de arquitectura para a 1ª autora.
9. Em 15.06.2015, a D....., por intermédio de EE, propôs ao 2º réu a aquisição de um prédio sito na Rua ….., nº 80-82, no ….. através da comunicação electrónica constante de fls. 36 a 38 e cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
10. Tratava-se de um prédio pelo qual o 2º réu se interessara desde a altura em que foi realizada a intervenção no “P.....”.
11. Em resposta ao email aludido em 9., e com data de 16.06.2015, o 2º réu, utilizando o endereço de email BB@adriparte.pt, enviou ao aludido mediador imobiliário o seguinte email: “Boa tarde, Sr. EE, Reencaminhei este seu mail para o Sr. Arq. AA que será, no caso de prosseguimento deste negócio, quem irá desenvolver o projecto de reabilitação do edifício. Ele vai efectuar uma análise prévia e, muito provavelmente, rirá contactá-lo com o objectivo de obter informação complementar tendo em vista a elaboração de um análise de viabilidade do empreendimento, tendo por base o custo de aquisição de 440 mil euros que referiu na nossa conversa…”, conforme documento de fls. 36 e cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
12. Na sequência, o 2º réu incumbiu o 2º autor de obter informação complementar sobre o prédio e de elaborar uma análise de viabilidade do investimento.
13. Na sequência, o 2º autor solicitou ao aludido EE diversa informação e em 8 de Julho, comunicou ao 2º réu o agendamento de uma visita ao imóvel, conforme documento de fls. 38v e 39 e cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
14. Em 17 de Junho, o 2º réu remeteu ao 2º autor as suas contas sobre o investimento, analisando o formato de distribuição habitacional, tendo este último remetido em resposta a sua análise sobre a viabilidade das soluções aventadas, conforme documento de fls. 39v a 40 e cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
15. Em 18 de Junho, o 2º réu, planeando uma reunião para decidir da viabilidade do investimento no nº 80 da Rua …., pediu ao 2º autor que elaborasse um ou dois “esquiços” sobre as possibilidades de construção, conforme documento de fls. 40v a 41v e cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
16. Em 4.09.2015, o 2º réu enviou o seguinte email a FF, representante da G......, utilizando o endereço de email BB@adriparte.pt, com conhecimento do 2º autor: “Boa tarde Sr. FF, Relativamente ao prédio em assunto e na sequência do que temos vindo a conversar, sou a confirmar que o valor da minha proposta, incluindo a vossa comissão, é de 490 mil Euros. Este é o valor máximo que eu estou disponível para pagar pelo prédio, até porque, entretanto já adquiri outro na mesma zona. Por esse valor, estou em condições de fazer a escritura num prazo máximo de 30 dias. Como já anteriormente referi, mantenho este valor de proposta porque já anteriormente o tinha apresentado. Se o proprietário pedir um euro mais, retiro a proposta e desisto do negócio…”, conforme documento de fls. 42 a 43 e cujo teor se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos.
17. Em 24 de Setembro, o 2º autor enviou ao 2º réu informação sobre valores comparativos para estabelecimentos comerciais vizinhos, conforme documento de fls. 43v e cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
18. Em 25 de Setembro, o 2º autor enviou nova comunicação electrónica ao 2º réu, reencaminhando vários e-mails anteriormente trocados com este, correspondentes aos estudos de viabilidade económica anteriormente elaborados, conforme documento de fls. 44 a 46 e cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
19. A negociação sobre o prédio nº 80 foi perdurando, sendo que cerca de um ano depois entre o 2º réu e os vendedores do prédio ainda se discutiam valores entre os € 620.000,00 e os € 700.000,00, tendo em 13.09.2016 o 2º réu informado o 2º autor sobre o tema, conforme documento de fls. 46v a 48 e cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
20. E em 16 de Março de 2017, o 2º autor detectou que o Prédio nº 80 ia ser apresentado em regime de Open House, já com outra imobiliária, tendo recolhido informações sobre o preço proposto.
21. Em simultâneo, o 2º autor apresentou o projecto do “P…. 64” e acompanhando sozinho e como arquitecto autor uma visita ao edifício, que suscitou grande entusiasmo junto dos vendedores.
22. Sendo que na sequência dessas diligências, e perante eventual interesse na aquisição do dito imóvel, o 2º réu transmitiu ao 2º autor AA as suas condições de venda, para que sondasse o interesse dos potenciais compradores, o que fez.
23. Os vendedores do Prédio nº 80 dispunham de um estudo prévio desenvolvido relativamente aquele prédio, o qual foi disponibilizado gratuitamente pelos vendedores ao 2º réu.
24. Ao analisar os desenhos formulados pela autora para o Prédio 80 e comparando-o o estudo prévio fornecido pelos vendedores, constatou o 2º réu que o estudo da autora previa uma área útil consideravelmente superior, o que influenciaria o lucro da operação, conforme documento de fls. 54 e 54v e cujo teor se dá por reproduzido para todos os efeitos.
25. Na sequência das questões levantadas pelo 2º réu, a autora realizou diversos estudos adicionais, conforme documentos de fls. 57v a 61 e cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
26. Em 11 de Novembro, o mediador imobiliário remete um e-mail ao 2º autor, dando conta de que as ofertas concorrentes estariam já nos € 800.000,00, informação que este remeteu ao 2º réu, conforme documento de fls. 61v a 62 e cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
27. Em 15 de Junho, o 2º autor remeteu ao 2º réu um e-mail, sobre o prédio n.º 80, no qual dava conta de que continuava a elaborar desenhos que visavam maximizar a utilização de uma possível reconstrução, conforme documento de fls. 62v e cujo teor se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos.
28. As negociações para aquisição do aludido prédio acabaram por ser abandonadas pelo 2º réu que desistiu de comprar para si o referido prédio, dado o valor proposto para a compra ter aumentado significativamente.
29. A 1ª ré veio adquirir o referido prédio por € 1.250.000,00.
30. Em 17.02.2017, o 2º autor informou o 2º réu de que o prédio nº 74/76 da Rua ….., vizinho ao Prédio n.º 80, estava a ser colocado em venda e que o vendedor era ao Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, conforme documento de fls. 63 e cujo teor se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos.
31. E iniciou contactos com o vendedor, com vista à visita do imóvel, conforme documentos de fls. 64 a 65v e cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
32. Em 22 de Fevereiro, o 2º autor remeteu um email ao 2º réu no qual refere: “se conseguires comprar o P74 (mas provavelmente acharás muito caro…) E se quiseres que eu te faça um projecto de recuperação mais ou menos… considera então nas tuas contas de aquisição/proveitos os meus honorários afectados de um coeficiente de mais 70% que os baratuchos! E depois faz a tua putticall. Enfim, é a vida.”, conforme documento de fls. 66 e cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
33. A 1ª ré tinha interessa na aquisição do prédio nº 74/76.
34. Nesse prédio existia um locatário idoso, cuja saída era relevante para a formação da proposta a apresentar.
35. Tendo o 2º autor, a solicitação da 1ª ré, contactado o referido locatário com vista a serem entabular conversações com o referido, no sentido da eventual desocupação, caso conseguisse adquirir o imóvel em concurso público da Segurança Social, conforme documento de fls. 66v e cujo teor se dá por reproduzido para todos os efeitos.
36. O 2º autor começou a efectuar medições e a fazer estudos sobre a possível reconstrução do prédio n.º 74/76, com conhecimento dos réus, conforme documento de fls. 67 e cujo teor se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos.
37. Em 10 de Março, aquando da abertura das propostas, constatou-se que o valor proposta pela ré por intermédio de uma outra sociedade, fora insuficiente, tendo o prédio sido adjudicado a outro proponente.
38. O 2º autor, porém, manteve os contactos com a familiar do locatário no sentido do exercício por este do seu direito de preferência de modo a ultrapassar o facto de o imóvel não ter sido adjudicado à ré no âmbito do Concurso Público realizado, tendo sido agendadas reuniões com a filha do locatário do imóvel.
39. Tendo a ré alcançado um entendimento com o locatário, que passou pelo pagamento a este de uma indemnização de € 80.000,00 para a desocupação do locado, e em contrapartida este iria preferir na compra realizada.
40. Em simultâneo, a autora foi elaborando novos estudos, a fim de determinar a rentabilidade económica da aquisição do Prédio n.º 76, com conhecimento dos réus.
41. Em 29.05.2017, através de email, e referindo-se a uma nota de honorários apresentada pela autora, relativa a um projecto de arquitectura elaborado para a designada “Quinta.…..”, um projecto pessoal do 2º réu, este questionou o montante dos valores de honorários praticados por esta, conforme documento de fls. 90 a 92 e cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
42. Ao que o 2º autor respondeu por email, e, conforme documento de fls. 90 a 92 e cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
43. Em Julho de 2017, o 2º réu remeteu ao 2º autor um e-mail, no qual se referia aos prédios nºs 76 e 80, solicitando que à 1ª ré ou a outras empresas do grupo fosse apresentada “uma proposta de honorários para a elaboração do projecto de execução e, também, para a chamada fase de ‘estudo prévio’, isto é, para aquela fase em que ainda não sabemos se iremos comprar, ou até se conseguiremos comprar, mas precisamos de ter uma ideia do que lá é possível construir para podermos formatar uma proposta. Pelo que me dizem por aqui e para tua orientação, normalmente quando se trabalha sistematicamente com um determinado Arquitecto, essa primeira parte do trabalho, na fase de negociação do terreno ou de “casa em ruínas”, é a custo zero, na expectativa de que o negócio se venha a fechar e, aí sim, esse arquitecto tenha mais esse projecto na sua ‘carteira’ de trabalho. Como subsiste alguma falta de sintonia neste entendimento, então será importante separarmos as coisas e apresentares propostas para as duas fazes e, já agora, dizeres, no teu entendimento, quanto te devemos pelo trabalho que, entretanto, já efectuaste no P….. 76 e no P…. 80 e até que ponto é que o esse valor será deduzido no custo final do projecto de execução no caso de te virmos a adjudicar o projecto, isto ainda, no caso de virmos a comprar um, ou dois, desses imóveis…”, conforme documento de fls. 90 e cujo teor se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos.
44. A autora respondeu conforme consta do email constante de fls. 92v e cujo teor se dá por reproduzido para todos os efeitos.
45. E em 27.07.2017, solicitou a realização de um levantamento arquitectónico à N......, que para o efeito apresentou uma proposta, que foi adjudicada pela ré, que instruiu a N...... a obter a chave do imóvel junto do 2º autor.
46. O 2º autor propôs a um outro seu cliente, o Sr. Dr. II uma parceria de investimento no Prédio nº 76.
47. Tendo este visitado o n.º 76 em 03.03.2017, tendo em vista a elaboração de uma proposta de compra no âmbito do Concurso da Bolsa de Imóveis da Segurança Social.
48. Nas conversações mantidas com o Dr. II, o 2º autor e aquele estabeleceram a possibilidade de apresentação por aquele de uma proposta de 600.000 € para a compra do dito prédio, tendo então acordado na participação da Autora, como parceira ou associada da proposta, entre 10% a 20%, na compra e no resultado do investimento.
49. Porém, o 2º autor acabou por comunicar aquele que não pretendia avançar com a proposta dado o interesse do 2º réu no negócio.
50. Em 06.09.2017, o 2º réu remeteu ao 2º autor um e-mail, no qual, juntando os levantamentos topográficos, convida a autora “a apresentar, até ao final do corrente mês de Setembro, uma proposta de preço para a execução dos respectivos projectos, decomposta nas seguintes fases: 1) Estudo Prévio: Elaboração de um estudo inicial de projecto, de acordo com as normas e regulamentos determinados pelas distintas entidades licenciadoras, com uma proposta de distribuição de áreas e tipologias de apartamentos, que incluirá peças desenhadas à escala de 1:100, imagens virtuais, quadro de estimativa de áreas e definição de solução construtiva. 2) Projecto de Licenciamento. Preparação do processo de licenciamento para apresentação à Câmara Municipal …… e demais Entidades intervenientes. 3) Projecto de Execução. Elaboração do Projecto de Execução e Projectos de todas as Especialidades, Mapas de Quantidades de Trabalho tendo em vista a orçamentação da obra, Peças Desenhadas de Pormenor, Mapa de Acabamentos, Condições Técnicas Gerais e Especiais, Caderno de Encargos e custo de acompanhamento da fase de construção da obra. Tendo em vista a orçamentação da vossa proposta, informamos que, para efeitos de adjudicação, reservamo-nos no direito de contratar, numa primeira fase, apenas o Estudo Prévio, sendo que a contratação da Fase 2 e 3 ficará dependente do resultado comparativo das várias soluções apresentadas para a Fase 1, garantindo a ADRIPART Gest que, caso de não adjudicação à Arpador das fases subsequentes, a vossa solução arquitectónica, preterida, será definitivamente abandonada.”, conforme documento de fls. 110 e cujo teor se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos.
51. Perante esta comunicação, a autora remeteu à 1ª ré, em 30.09.2017, uma Proposta para a Reabilitação de 2 prédios na Rua ……., nº 76 e 80, a qual continha não só uma proposta de honorários, mas já um Estudo Prévio, que corporizava o trabalho que a autora já realizara ao longo dos dois anos anteriores, conforme documentos de fls. 111v a 116v e cujo teor se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos.
52. Foram enviadas pela 1ª ré, no mesmo dia 6.09.2017, comunicações com uma formulação exactamente igual e sem qualquer tratamento diferenciado a outros três gabinetes de arquitectura, igualmente os convidando a apresentar proposta para a elaboração dos projectos de arquitectura, conforme documentos de fls. 174 a 177 e que se dão por integralmente reproduzidos para todos os efeitos.
53. Na sequência dos convites dirigidos pela 1ª ré, foram apresentadas propostas de honorários por todos os gabinetes convidados, conforme documentos de fls. 178 a 204v cujo teor se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos.
54. A proposta apresentada pela 1ª autora previa para a fase de estudo prévio honorários no valor de 42.436,55 € mais IVA (35% dos honorários totais da proposta de arquitectura), e para o conjunto dos projectos um valor global de 159.905,79 € mais IVA, que resultava da aplicação de um desconto de 20% (previsto na proposta da 1ª autora como contrapartida da adjudicação das 3 fases do projecto) a um valor total sem desconto de € 199.882,24.
55. A proposta da L......Arquitectos previa para a fase de estudo prévio honorários no valor de 4.325,14 € mais IVA, num total de 5.319,93 €, e para o conjunto dos projectos um valor global de 43.251,45 € mais IVA, num total de 53.199,28€.
56. Por sua vez, a proposta apresentada por A….. + P….. previa para a fase de estudo prévio honorários no valor de 5.351,16 € mais IVA para o P…. 80 e 4.762,66 € mais IVA para o P… 76 (num total de 10.113,82 €), sendo que para o conjunto dos projectos previa um valor global de 44.593,34 € mais IVA para o P…. 80 e de 39.688,72 € para o P….. 76, o que perfaz um valor total de 84.282,06 €.
57. E a proposta apresentada por N…… Arquitectura e Planeamento, Lda., previa para o conjunto dos projectos de arquitectura um valor global de 37.700,00 € mais IVA para o P… 80 e também de 37.700,00 € para o P…. 76, o que perfaz um valor total de 75.400,00 €.
58. Tendo presente os valores das outras propostas, em 03.10.2017, a 1º ré convocou o 2º autor AA para uma reunião na sede da ré, na qual o Dr. NN, consultor da ré, levantou diversas dúvidas sobre a proposta apresentada.
59. Na dita reunião o réu transmitiu ao 2º autor que, atenta a especial relação de amizade e os anos de trabalho que os uniam, a proposta da autora apresentava valores muito acima das restantes propostas e que, apenas por via de tal amizade, aceitaria que a autora corrigisse a proposta.
60. A autora entregou então uma proposta revista em 06.10.2017, alterando os critérios definidos pela ré e a medição das áreas brutas, o que fez baixar o valor da obra em cerca de 30% e a proposta de honorários em cerca de 20%, conforme documento de fls. 117 e 117v e cujo teor se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos.
61. Em 08.10.2017, em face de novas dúvidas suscitadas pelo Dr. NN, a autora remeteu esclarecimentos adicionais, conforme documento de fls. 118 a 121v e cujo teor se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos.
62. Em 09.10.2017, porém, o Réu remeteu um e-mail ao Arq. AA, no qual, para além de outras considerações, refere que: “Depois, de posse de todos os Estudos Prévios, que adjudicamos e pagamos, optaremos, para adjudicação da fase seguinte, pela proposta que melhor satisfaça o tal trinómio que referi de Qualidade/Área/Preço do Produto Final, sendo certo que, para propostas de áreas semelhantes e perspectiva de prática de preço do produto final semelhantes, optaremos, como é óbvio, pelo projectista que apresente o melhor preço para elaborar o respectivo projecto. É este o método que utilizaremos e quele que me parece que é mais ‘fair’. Aquilo que te posso dizer, por enquanto, é que, apesar de ainda não saber o que cada concorrente vai apresentar de Estudo Prévio, o que sei é que o teu preço para elaborar o Estudo Prévio é 7 vezes o preço de um dos teus concorrentes, quatro vezes o de outro e três vezes o de outro. Em condições normais, e se eu não te tivesse pedido, no passado, em termos pessoais, a realização de um estudo para tentar ver até onde poderia ir na proposta de compra do imóvel, à Arpador nem seria adjudicado, sequer, a elaboração do estudo Prévio.”, conforme documento de fls. 122 a 122v e cujo teor se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos.
63. O 2º autor respondeu a este e-mail, em 03.11.2017, aludindo à sua intervenção no desenvolvimento de todo o projecto e a prática mantida quanto aos honorários, conforme documento de fls. 125v a 126 e cujo teor se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos.
64. No dia 13.10.2017, o 2º autor recebeu um novo e-mail do Dr. NN, no qual refere:“… agora apresento ao Sr. Arquitecto a proposta seguinte, que agora submeto à sua consideração: para liquidação integral dos trabalhos realizados até à presente data pelo Sr. Arquitecto AA relativamente aos imóveis sitos nos nºs 76 e 80 da Rua ……, nesta cidade ….., pagaremos, com vencimento imediato, o valor correspondente a 20% do total dos honorários indicados para execução integral e completa do projecto na sua Proposta de 08.10.2017; Deixamos ainda ao melhor critério do Sr. Arquitecto a opção por: “a) manter a Proposta de 08.10.2017 para prestação de serviços de Arquitectura aplicando-se, com as necessárias adaptações, os termos do convite formulado pela Adriparte; ou b) Declarar o desinteresse na participação do convite formulado pela Adriparte e, em consequência, extinguir qualquer relação comercial ou contratual entre as Partes, nada mais havendo, mutuamente, a reclamar.”, conforme documento de fls. 128 e cujo teor se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos.
65. A autora manifestou a disponibilidade para receber os referidos 20% do valor descontado, mantendo a proposta de 08.10.2017 e aguardando a decisão sobre a sua adequação, bem como instruções para conclusão da fase de Estudo Prévio, conforme documento de fls. 127v e 128 e cujo teor se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos.
66. A solicitação do Dr. NN, o 2º autor esclareceu em e-mail de 16.10.2017, que aceitava que os referidos 20% englobam a elaboração completa do Estudo Prévio, nada mais tendo a ré a liquidar (para além dos 20% aprovados) pela elaboração do referido estudo prévio, conforme documento de fls. 126 e 127 e cujo teor se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos.
67. E em consequência, a ré adjudicou à Autora os serviços de arquitectura (sem especialidades) para elaboração do Estudo Prévio, nos dois imóveis, salientando novamente que a ré se reservava o direito de não adjudicar as demais Fases por e-mail de 17.10.2017, cujo teor se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos.
68. A autora veio a enviar factura em 18.10.2017, a qual porém mereceu ainda discussão por parte do Dr. NN, conforme documentos de fls. 129 a 130 e cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
69. A referida factura veio a ser paga no dia 20.10.2017.
70. Entre 31.10.2017 e 02.11.2017, a ré remeteu comunicação ao 2º autor, exigindo a entrega do Estudo Prévio adjudicado em formatos editáveis, tendo a autora se recusado a fornecer, conforme documentos de fls. 131 a 132 e cujo teor se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos.
71. O prédio nº 76 foi vendido em 25.06.2019 por € 1.335.000,00, conforme certidão constante de fls. 372 a 384 e cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
72. E o prédio correspondente ao n.º 80 encontra-se anunciado para venda por € 1.900.000,00”.
O Tribunal de 1.ª Instância considerou como não provados os seguintes factos:
“a. que a ré não conseguiria adquirir o imóvel sito no na Rua ….. nº 76 se o 2º autor não tivesse intervindo nas negociações;
b. que o 2º autor levou a cabo os contactos e as conversações com o locatário do imóvel mediante a contrapartida de lhe ser adjudicado o projecto pelo preço referido no artigo 100º, da petição inicial;
c. que os réus encomendaram aos autores os projectos de execução das obras desse imóvel; e. que os autores foram coagidos a aceitar o valor aludido no ponto 65. do elenco dos factos provados;
e. que os autores foram coagidos a aceitar o valor aludido no ponto 65. do elenco dos factos provados;
f. que devido à conduta dos réus os autores deixaram de poder ganhar prémios, publicitar a sua obra e angariar novos clientes;
g. que devido à conduta dos réus a autora deixou de ganhar a quantia de € 121.247,00 a título de honorários;
h. que apenas com um outro negócio de idênticas características lhe tivesse proporcionado a sua obra, devidamente concluída, os autores poderiam vir a receber, pelo menos, mais € 100.000,00; e
i. caso tivesse levado a cabo a parceria com o Dr. II, os autores poderiam contar com um lucro na venda do n.º 76 da ordem dos € 120.000,00;
j. que, não fosse a conduta dos réus, a autora poderia ter logrado negociar com outros investidores o negócio do n.º 80 e obtido uma participação directa no lucro do negócio obtido, que facilmente poderia corresponder a 10% ou 15% do mesmo, isto é, de até € 150.000,00; e
l. os autores não teriam feito o investimento no desenvolvimento dos projectos se não tivessem sido incentivados pelos réus”.
B) De Direito
1. Está em causa o recurso de revista interposto pelos Autores do acórdão do Tribunal da Relação … que julgou a apelação totalmente improcedente e confirmou a sentença do Tribunal de 1.ª Instância, que havia julgado improcedente a ação e, consequentemente, absolvido os Réus do pedido.
2. Os Autores interpõem recurso de revista regra ou normal, ao abrigo do art. 671.º, n.º 1 do CPC, invocando a inexistência de dupla conformidade decisória e, a título subsidiário, para o caso de improcedência da sua argumentação, recurso de revista excecional, à luz do art. 672.º, n.º 1, al. c) do CPC.
3. Os Réus, na sua resposta, pugnam pela inadmissibilidade do recurso de revista regra ou normal, por se verificar dupla conformidade decisória, sustentando igualmente não se encontrarem preenchidos os pressupostos do recurso de revista excecional.
(In)admissibilidade do recurso
1. Nos termos do art. 652.º, n.º 1, al. b) do CPC, assiste razão aos Autores/Recorrentes quando afirmam que, relativamente à parte do acórdão recorrido em que se recusou parcialmente a apreciação da impugnação da decisão sobre a matéria de facto - quer por não se encontrarem reunidos todos os requisitos previstos no art. 640.º do CPC, quer por se considerar que a alteração pretendida se afigura inútil à decisão da causa -, o recurso de revista regra ou normal deverá ser admitido.
2. Admite-se assim, a este respeito, o recurso de revista regra ou normal.
3. Com efeito, a jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça tem admitido o recurso de revista quanto à sindicância do modo como o Tribunal da Relação ….. interpretou os ónus de impugnação da matéria de facto, precisamente por se tratar de matéria que não conheceu decisão idêntica no Tribunal de 1.ª Instância. Considera-se estar em causa uma situação de violação de lei processual justificativa da admissibilidade do recurso interposto pelos Autores, nos termos do art. 674.º, n.º 1, al. b) do CPC[1].
4. Os Autores/Recorrentes invocam igualmente a violação de disposições processuais no exercício dos poderes de reapreciação da decisão de facto, alegando que o Tribunal da Relação …. inobservou o dever de formar e manifestar na decisão a sua própria convicção, nos mesmos termos em que o deve fazer o Tribunal de 1.ª Instância, não garantindo, por isso, um duplo grau de jurisdição.
5. Em geral, a jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça defende que a dupla conformidade das decisões das instâncias não se verifica quando se pretende reagir contra a violação de disposições processuais no exercício dos poderes de reapreciação da decisão de facto por parte do Tribunal da Relação[2].
6. Quanto ao restante objeto do recurso respeitante às questões de direito, não se admite o recurso de revista regra ou normal em virtude da verificação de dupla conformidade decisória.
7. De acordo com o art. 671.º, n.º 3 do CPC, não é admissível recurso de revista regra ou normal do acórdão que confirme, sem voto de vencido e sem fundamentação essencialmente diferente, a decisão proferida pelo Tribunal de 1.ª Instância, sem prejuízo dos casos em que o recurso é sempre admissível.
8. No caso dos autos, o acórdão recorrido confirmou a sentença de 1.ª Instância sem qualquer voto de vencido, alterando parcialmente a matéria de facto não provada, mas sem que tal tivesse repercussão na decisão de direito.
9. Poder-se-ia considerar que, apesar de ter confirmado a decisão do Tribunal de 1.ª instância, o Tribunal da Relação ….. o fez com “fundamentação essencialmente diferente”.
10. Os Autores/Recorrentes alegam que “no que tange a configuração jurídica, a que se referem os parágrafos IV e V do referido sumário do douto acórdão recorrido, conclui-se que os mesmos correspondem também a uma nova fundamentação que não constava da decisão da 1.ª Instância, com especial incidência quanto ao Parágrafo V, dado que a 1.ª instância não faz qualquer alusão ao interesse contratual negativo ou positivo como medida determinante do direito dos Autores. Mais, e no que tange ainda à própria ponderação das condutas dos Réus, a que se refere o Ponto IV do sumário, o acórdão recorrido afirma que fazer assentar as expectativas dos Autores no relacionamento negocial passado com os Réus constituiria uma contradição com o princípio da liberdade contratual, questão que a 1.ª Instância tão-pouco aborda”.
11. Sustentam ainda os Autores/Recorrentes que, no que respeita à licitude da rutura de negociações, “embora o douto acórdão recorrido faz uma cópia ipsis verbis da fundamentação narrativa factual da sentença, esta assenta a sua decisão de considerar legítimo o abandono das negociações no cumprimento do dever de informação e esclarecimento; enquanto que o acórdão recorrido assenta a sua análise na aplicação, genérica, das regras do art.º 483.º do Código Civil, o que depois verte no referido ponto IV do sumário”.
12. Em ordem a apurar se a fundamentação das decisões das Instâncias é ou não essencialmente diferente releva, desde logo, o conteúdo de cada uma dessas decisões e não o sumário do acórdão recorrido.
13. Depois, de acordo com a jurisprudência consolidada do Supremo Tribunal de Justiça, o conceito de fundamentação essencialmente diferente não se basta com qualquer modificação ou alteração da fundamentação no iter jurídico que suporta o acórdão da Relação em confronto com a sentença de 1.ª Instância. Afigura-se antes indispensável que, naquele aresto, ocorra uma diversidade estrutural e diametralmente diferente no plano da subsunção do enquadramento normativo da mesma matéria litigiosa. Deste modo, “só pode considerar-se estarmos perante uma fundamentação essencialmente diferente quando ambas as instâncias divergirem, de modo substancial, no enquadramento jurídico da questão, mostrando-se o mesmo decisivo para a solução final: ou seja, se o acórdão da Relação assentar num enquadramento normativo absolutamente distinto daquele que foi ponderado na sentença de 1.ª instância. Ou, dito ainda de outro modo: quando o acórdão se estribe definitivamente num enquadramento jurídico perfeitamente diverso e radicalmente diferenciado do perfilhado na 1.ª instância” [3].
14. Pode dizer-se que, no caso em apreço, a fundamentação utilizada pelas Instâncias não é diferente, sendo mesmo essencialmente coincidente.
15. Na verdade, o Tribunal da Relação …. manteve a decisão sobre a matéria de facto proferida pelo Tribunal de 1.ª Instância, com exceção da eliminação da al. e) do elenco dos factos não provados, por considerar que se tratava de matéria conclusiva, algo que não teve qualquer repercussão na decisão final. Assentou, no mais, a sua fundamentação na apreciação dos pressupostos da alegada responsabilidade pré-contratual dos Réus pela não celebração do contrato de prestação de serviço, tendo em vista a elaboração dos projetos de arquitetura referentes aos P…. 76 e P… 80, concluindo de forma inteiramente coincidente com a 1.ª Instância na falta de verificação desses requisitos.
16. Ambas as decisões referem o princípio da autonomia privada, ou da liberdade contratual, no sentido de nada apontar para uma vinculação dos Réus a celebrar os contratos pretendidos pelos Autores, negando que tenha havido uma qualquer rutura injustificada nas negociações por parte dos Réus, tanto mais que, antes dessa rutura, o Réu já vinha advertindo os Autores de que os honorários por eles cobrados não se mostravam em sintonia com aqueles habitualmente arrecadados.
17. As Instâncias coincidiram, assim, na inexistência “de ilegitimidade da ruptura das negociações por parte dos réus, já que a mesma estava perfeitamente justificada em função do valor elevado dos honorários cobrados em comparação com os demais apresentados, sendo perfeitamente razoável que os réus não quisessem que a autora (ou os autores) procedessem à elaboração do projecto de arquitectura, quando o preço cobrado não revestia uma decisão de gestão racional”.
18. Fortalecendo essa argumentação, utilizam-se, no acórdão recorrido, argumentos laterais adicionais, mencionados no ponto V do respetivo sumário indicado pelos Autores/Recorrentes, que visaram apenas reforçar a decisão que já estava tomada, algo que é evidenciado pelo texto do acórdão recorrido na seguinte passagem: “Mas, mesmo que assim não se entendesse e, portanto, os Réus tivessem incorrido em responsabilidade pré-contratual e com isso os Autores tivessem sofrido os danos alegados (não provados) ainda assim a acção, na nossa perspectiva e salvo melhor entendimento, não teria melhor sorte”.
19. Nesse sentido, o Tribunal da Relação …. considerou que os Autores/Recorrentes pretendiam obter uma indemnização pelo interesse contratual positivo, mas para que assim fosse era necessário que tivessem alegado e provado – o que não fizeram – a existência de um acordo sobre todas as questões essenciais do negócio ao qual apenas faltava a devida concretização mediante a respetiva redução a escrito, ou não.
20. Porém, apesar deste reforço argumentativo levado a cabo pelo Tribunal da Relação …., o cerne da respetiva decisão assentou no não preenchimento dos pressupostos da alegada responsabilidade pré-contratual dos Réus, algo em que as Instâncias coincidiram totalmente.
21. “A fundamentação essencialmente diferente deve ser aferida em relação aos motivos essenciais da decisão e não a meras questões secundárias ou laterais”[4].
22. Ou seja, no caso dos autos, no que respeita ao acórdão recorrido, não se vislumbra que o “âmago fundamental do respectivo enquadramento jurídico, seja diverso daqueloutro assumido e plasmado pela 1.ª instância”, ou seja, “a solução jurídica do pleito prevalecente na Relação não foi inovatória, nem ancorada em preceitos, interpretações normativas ou institutos jurídicos diversos e autónomos daqueloutros que fundamentaram a decisão proferida na sentença apelada, sendo irrelevantes discordâncias que não encerrem um enquadramento jurídico alternativo, ou, pura e simplesmente, seja o reforço argumentativo aduzido pela Relação para sustentar a solução alcançada”[5].
23. Em suma, uma vez que se entende que as Instâncias se “moveram” no âmbito dos mesmos institutos jurídicos e que o iter prosseguido por cada uma não é suficiente para considerar que existiu a este respeito fundamentação essencialmente diferente, entende-se que se verifica o obstáculo da dupla conforme à admissão do recurso de revista regra ou normal, nos termos do art. 671.º, n.º 3 do CPC.
24. Pelo exposto, o recurso de revista regra ou normal apenas é admissível quanto à parte do acórdão recorrido em que se apreciou a impugnação da decisão sobre a matéria de facto. Quanto ao restante objeto do recurso, no caso de a respetiva apreciação não ficar prejudicada pela procedência da argumentação dos Recorrentes, os autos deverão ser remetidos à Formação do Supremo Tribunal de Justiça em ordem ao apuramento da (in)verificação dos requisitos da revista excecional interposta pelos Autores/Recorrentes Arpador–Arquitectos & Associados, Lda. e AA a título subsidiário.
Nulidade do acórdão recorrido por omissão de pronúncia
1. Os Autores/Recorrentes invocam a nulidade do acórdão recorrido por omissão de pronúncia em virtude de o Tribunal da Relação …. não ter conhecido de determinados pontos de facto por si impugnados no recurso de apelação (art. 615.º, n.º 1, al. d), 1.ª parte do CPC).
2. De acordo com este preceito, “é nula a sentença quando: (…) d) o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar”. Esta nulidade decorre do art. 608.º, n.º 2 do CPC, segundo o qual “o juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras; não pode ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras.”
3. Ora, ”a violação do dever de reapreciação da matéria de facto não integra nenhum dos vícios de nulidade de decisão, que se encontram taxativamente previstos nas als. a) a e) do n.º 1 do art. 615.º do CPC” [6].
4. Pode dizer-se que o Tribunal da Relação ….. não se absteve de conhecer da questão da impugnação da decisão sobre a matéria de facto suscitada pelos Autores no recurso de apelação, pois que a conheceu e tomou posição no sentido de recusar parcialmente a respetiva apreciação. Com efeito, entendeu, a propósito de alguns pontos da matéria de facto, não terem sido cabalmente observados pelos Autores/Apelantes os ónus de alegação previstos no art. 640,º, n.º 1 do CPC e, no que respeita a outros pontos, considerou que a matéria de facto em causa se afigura destituída de relevância para a decisão final. O Tribunal da Relação …. tomou, assim, posição sobre a referida questão, fundamentando a sua decisão, pelo que é evidente inexistir qualquer omissão de pronúncia[7].
5. Improcede, pois, nesta parte, o recurso interposto pelos Autores/Recorrentes Arpador–Arquitectos & Associados, Lda. e AA.
Reapreciação da matéria de facto pelo Tribunal da Relação …
1. Os Autores/Recorrentes alegam que o Tribunal da Relação ….. se limitou a tecer considerações de ordem genérica em torno das virtualidades de determinados princípios, como o da livre apreciação das provas, ou a enunciar as dificuldades inerentes à tarefa de reapreciação dessas provas, para concluir pela manutenção da decisão da matéria de facto, sem formar a sua própria convicção sobre a matéria probatória objeto de impugnação pelos Autores/Apelantes, aqui Recorrentes, como legalmente lhe era exigido.
2. No seu recurso de apelação, os Autores/Recorrentes impugnaram a decisão sobre a matéria de facto sustentando que:
a) “deverá ser julgado provado o tema de prova n.º 5, relacionado em sede de despacho saneador;
b) deverá o facto não provado referido sob a alínea e) ser eliminado, ou assim não se entendendo, deverá ser julgado provado, por força do que resulta do facto provado § 64, o teor do artigo 80.º da petição inicial;
a) deverá ser julgado provado o facto referido na alínea a) do art.º 129.º da petição, ou assim não se entendendo, pelo menos deveria ter julgado provado o facto vertido no art.º 125.º da petição;
b) deverá ser julgado provado que “com grande probabilidade, caso tivessem levado a cabo a parceria com o Dr. II, os autores poderiam contar com um lucro na venda do 76 da ordem dos € 120.000,00”, questão inserida no tema de prova n.º 10;
c) deverá ser julgado provado que “com alguma probabilidade, a notoriedade da realização do projeto para o P76 e para o P80 poderia ter possibilitado a angariação de algum novo cliente, com ganhos de nunca menos de € 100.000,00”, questão inserida no tema de prova n.º 10;
d) deverá ser julgado provado que “com alguma probabilidade, os Autores poderiam ter-se associado a outros promotores para a aquisição e renovação do P80, obtendo um ganho efetivo da ordem dos 10% a 15% do lucro correspondente.”, questão inserida no tema de prova n.º 10;
e) deverá ser julgado provado o teor dos artigos 121.º a 123.º da petição, nos seguintes termos: “os Autores não se teriam emprenhado pessoalmente na realização de estudos prévios, medições, cálculos e estimativas várias, contactos com interessados, negociações com vendedores, arrendatário e agentes imobiliários, com enorme dispêndio de tempo e desgaste pessoal, da imagem pessoal e reputação, se tal não lhes tivesse sido pedido pelo 2.º Réu”;
f) deverão ser julgados provados os factos alegados nos artigos 6.º, 7.º, 8.º, 9.º, 10.º, 18.º, 46.º, 50.º e 60.º da petição, bem como todo o teor do art.º 38.º da petição inicial e não apenas o que foi transcrito sob o facto provado § 31;
g) o facto provado 33 deverá ser redigido nos termos do art.º 40.º, isto é, “Os Réus tinham interesse na aquisição do prédio n.º 74/76.”
h) O facto julgado provado sob o § 28 deverá ser julgado não provado”.
3. O Tribunal da Relação ….. rejeitou a apreciação desta impugnação relativamente ao tema de prova n.º 5, por entender que os Autores/Apelantes não cumpriram o ónus imposto pelo art. 640.º, n.º 1, al. a) do CPC, já que não indicam que facto concreto é que devia ter sido dado como provado, e não o fazem quer por referência à fundamentação de facto constante da sentença, quer a qualquer outra peça (petição, contestação) integrante dos autos.
4. Rejeitou também a apreciação da impugnação da decisão da matéria de facto realizada pelos Autores/Apelantes relativamente aos arts. 60.º, 121.º a 123.º, e à al. a) do art. 129º da petição inicial (cujos factos os Apelantes entendem que deveriam ter sido dados como provados), ao conteúdo das als. i), h), j) e l) do elenco dos factos não provados (que os Apelantes entendem que deveriam ser dados como provados), e ao teor dos pontos 28 e 33 do elenco dos factos reputados como provados pelo Tribunal de 1.ª Instância (entendendo os Apelantes que o primeiro devia ser considerado como não provado e o segundo alterado nos moldes por si requeridos).
5. Com efeito, o Tribunal da Relação …… entendeu que, nesta parte, os Autores/Apelantes não cumpriram o ónus previsto no art. 640.º, n.º 1, al. b) do CPC, uma vez que não indicaram os concretos meios de prova que fundamentariam a alteração pretendida. Em alguns casos, sustentou que tal ónus não se pode ter por satisfeito com pouco mais do que simples transcrições do depoimento de testemunhas, sem fazer qualquer análise crítica de tais meios de prova.
6. O Tribunal da Relação … rejeitou ainda a apreciação da impugnação da decisão da matéria de facto relativamente aos factos alegados nos arts. 6.º, 7.º, 8.º, 9.º, 10.º e 46.º da petição inicial (que os Autores/Apelantes consideraram que deveriam ter sido dados como provados), atendendo a que se trata de factos instrumentais que se afiguram irrelevantes para a decisão final. Por esse motivo se absteve de reapreciar, nessa parte, a decisão da matéria de facto.
7. Pode dizer-se que o Tribunal da Relação …. reapreciou a decisão da matéria de facto relativamente à al. e) dos factos não provados (dando procedência, nesta parte, à impugnação dos Autores/Apelantes, eliminando essa al. do elenco dos factos não provados) e quanto aos factos vertidos nos arts. 18.º, parte do art. 38.º e 50.º da petição inicial (considerando, nesta parte, improcedente a argumentação dos Autores/Apelantes, mantendo tais factos como não provados).
8. Conforme a jurisprudência consolidada do Supremo Tribunal de Justiça, a reapreciação da decisão da matéria de facto pelo Tribunal da Relação “não se limita à verificação da existência de erro notório por parte do tribunal a quo, antes implicando uma reapreciação do julgado sobre os pontos impugnados, em termos de formação, por parte do tribunal de recurso, da sua própria convicção, em resultado do exame das provas produzidas e das que lhe for lícito ainda renovar ou produzir, para, só em face dessa convicção, decidir sobre a verificação ou não do invocando erro, mantendo ou alterando os juízos probatórios que tenham sido feitos (art. 662.º, n.º 1, do CPC)”[8].
9. ”A reapreciação da prova pela Relação tem a mesma amplitude da apreciação da prova pela 1.ª instância, por se encontrar na posse dos mesmos elementos de prova de que se serviu este tribunal, no âmbito do princípio da livre apreciação ou do sistema da prova livre, baseada sempre numa nova, diferente e própria convicção formada pelos seus juízes, e não, simplesmente, na sua aquisição pelo modo exteriorizado pelo tribunal de hierarquia inferior, em termos considerados razoáveis e lógicos, ainda que venha a ter lugar a confirmação do decidido pela 1.ª instância, sob pena de violação de um verdadeiro e efetivo duplo grau de jurisdição, em matéria de facto[9].
10. No entanto, este dever de reapreciação da prova por parte do Tribunal da Relação …., nos moldes referidos supra, apenas existe no caso de o recorrente respeitar todos os ónus previstos no art. 640.º, n.º 1 do CPC e de a matéria em causa se afigurar relevante para a decisão final. No caso sub judice, conforme mencionado supra, o Tribunal a quo rejeitou em grande medida apreciar a impugnação da decisão sobre a matéria de facto por considerar que os Autores/Apelantes não cumpriram integralmente aqueles ónus e também por, em parte, reputar que a matéria factual em causa era irrelevante e, por isso, não havia qualquer necessidade de reapreciar a prova.
11. No que respeita aos pontos da impugnação da decisão da matéria de facto que foram apreciados pelo Tribunal da Relação ….. com exceção da al. e) dos factos não provados - que foi eliminada pela Relação nos termos requeridos pelos Autores/Apelantes - , os Autores/Apelantes fundamentaram a impugnação em prova documental. O Tribunal recorrido reapreciou os documentos em causa, formulou livremente a sua convicção e concluiu que o respetivo teor não permitia a prova dos factos alegados pelos Autores/Apelantes. Negou, por isso, provimento à sua pretensão. Não se descortina, deste modo, que o Tribunal recorrido tenha de alguma forma incumprido o seu dever de reapreciar a prova, nos termos referidos supra, na parte em que admitiu apreciar a impugnação da decisão da matéria de facto.
12. Improcede, assim, nesta parte, o recurso de revista interposto por Arpador–Arquitectos & Associados, Lda. e AA.
(In)observância do ónus de alegação previsto no art. 640.º, n.º 1, al. a) do CPC
1. De acordo com os Autores/Recorrentes, “os concretos pontos de facto contidos na previsão do art. 640.º, n.º 1, al. a), do CPC, podem ou não consistir na singularidade das proposições interrogativas isoladas que integram o «questionário» ou a base instrutória, mas devem, no entanto, traduzir-se em factos interligados, por um nexo espácio-temporal que lhes confira unidade, sobre os quais tenham sido admitidos e produzidos, essencialmente, os mesmos meios de prova, podendo corresponder ou não a um determinado tema de prova, quando os mesmos exprimam factos naqueles termos”. Concluem que a regra do art. 640.º, n.º 1, al. a) do CPC não limita o modo de indicação dos “concretos pontos de facto”, não impondo que estes sejam assinalados por referência aos artigos da petição ou da contestação.
2. O Tribunal da Relação ….. rejeitou a apreciação da impugnação deduzida pelos Autores/Apelantes relativamente ao tema de prova n.º 5, por entender que estes não cumpriram o ónus previsto no art. 640.º, n.º 1, al. a) do CPC, já que não indicam que facto concreto é que devia ter sido dado como provado, e não o fazem quer por referência à fundamentação de facto constante da sentença, quer a qualquer outra peça (petição, contestação) incluída nos autos.
3. No seu recurso de apelação, os Autores/Apelantes defenderam que deverá ser julgado provado o tema de prova n.º 5, relacionado em sede de despacho saneador, e que tem a seguinte redação:
“Apurar se o 2º autor teve um papel determinante da aquisição do imóvel sito na rua nova de alfândega 74 e 76 e se ficou incumbido de entabular conversações com o locatário desse imóvel”.
4. Entendeu o Tribunal da Relação ……., quanto ao teor deste tema da prova, que “na sua primeira parte encerra uma simples conclusão e não qualquer facto, sendo que, a segunda parte, embora possa conter um facto, ainda assim é facto genérico e eivado de vaguidade”.
5. Segundo o art. 640.º, n.º 1 do CPC:
1 - Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas”.
6. Na jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça, tem-se decidido que “no caso em que não foi elaborada base instrutória, antes se enunciou os temas da prova, deve o recorrente indicar os concretos pontos de facto impugnados, com referência aos artigos dos articulados onde os mesmos foram alegados ou a outras circunstâncias de onde os mesmos resultassem”[10]. Assim, “sem essa referência, o recorrente não fundamenta de forma concludente as razões por que discorda da decisão recorrida, devendo, sem prévio convite ao aperfeiçoamento, ser rejeitado o recurso, por falta de especificação dos pontos de facto que considera incorrectamente julgados (art. 640.º, n.º 1, al. a), do CPC)”[11].
7. No caso concreto dos autos, os Autores/Recorrentes limitaram-se a enunciar o tema de prova n.º 5, sem indicar os factos concretos que pretendem ver provados, nem identificaram tão pouco qualquer artigo de articulado em que tais factos tivessem sido alegados.
8. Por conseguinte, assiste razão ao Tribunal da Relação …. quando sustenta, quanto ao teor de tema da prova n.º 5, que “na sua primeira parte encerra uma simples conclusão e não qualquer facto, sendo que, a segunda parte, embora possa conter um facto, ainda assim é facto genérico e eivado de vaguidade.” Com efeito, “apurar se o 2º autor teve um papel determinante da aquisição do imóvel sito na rua nova de alfândega 74 e 76” é manifestamente conclusivo. É que os factos concretos traduzem-se nos atos materiais praticados pelo 2.º Autor AA que permitam concluir por esse “papel determinante”. Por seu turno, a 2.º parte do tema da prova, embora contenha o facto a apurar se o 2.º Autor AA ficou incumbido de encetar conversações com o locatário do imóvel, e ainda que se infira que o resultado pretendido com essas negociações era a aquisição do imóvel, não inclui o objeto concreto dessas negociações: i.d., a identificação do meio para atingir aquele fim, porquanto um locatário não tem, evidentemente, o poder de disposição do imóvel locado.
9. Os Autores/Recorrentes limitaram-se, pois, a indicar de forma puramente genérica e vaga um tema da prova que não contém factos concretos que possam ser objeto de prova. Não merece, por isso, reparo o acórdão recorrido quando considerou não estar cumprido o ónus de alegação previsto no art. 640.º, n.º 1, al. a) do CPC, rejeitando nesta parte a apreciação da impugnação da decisão da matéria de facto.
10. Improcede, nesta parte, o recurso de revista interposto por Arpador–Arquitectos & Associados, Lda. e AA.
(In)observância do ónus de alegação previsto no art. 640.º, n.º 1, al. b) do CPC
1. O Tribunal da Relação ….. rejeitou a apreciação da impugnação da decisão da matéria de facto apresentada pelos Autores/Apelantes relativamente aos arts. 60.º, 121.º-123.º, e à al. a) do art. 129º da petição inicial, ao conteúdo das als. i), h), j) e l) do elenco dos factos não provados e ao teor dos pontos 28 e 33 do elenco dos factos dados como provados pelo Tribunal de 1.ª Instância. De acordo com o Tribunal a quo, os Autores/Recorrentes não cumpriram, nesta parte, o ónus previsto no art. 640.º, n.º 1, al. b) do CPC, porquanto não indicaram os concretos meios de prova que fundamentariam a alteração pretendida e, em alguns casos, esse ónus não se pode ter por observado com pouco mais do que simples transcrições do depoimento de testemunhas, desacompanhadas de qualquer análise crítica desses meios de prova.
2. Segundo os Autores/Recorrentes, “a insuficiência ou mediocridade da fundamentação probatória do recorrente não releva como requisito formal do ónus de impugnação, mas, quando muito, como parâmetro da reapreciação da decisão de facto, na valoração das provas, exigindo maior ou menor grau de fundamentação, por parte do tribunal de recurso, consoante a densidade ou consistência daquela fundamentação, matéria a apreciar em sede do mérito da decisão impugnada”.
3. O Tribunal a quo lançou mão da seguinte argumentação relativamente a cada um dos pontos de facto referidos supra:
“No que aos honorários respeita -al. a) do artigo 129º da petição – os recorrentes a pouco mais se limitam do que a transcrever excertos de depoimentos das testemunhas OO, PP.
Acontece que isso não basta.
A lei impõe aos recorrentes que indiquem o porquê da discordância, isto é, em que é que os referidos meios probatórios contrariam a conclusão factual do Tribunal recorrido, por outras palavras, importa apontar a divergência concreta entre o decido e o que consta dos citados meios probatórios.
É exactamente esse o sentido da expressão legal “quais os concretos meios probatórios constantes do processo ou de registo ou gravação… que imponham decisão, sobre os pontos da matéria de facto impugnados, diversa da recorrida” (destaque e sublinhado nossos).
Repare-se na letra da lei: “Imponham decisão (não basta que sugiram) diversa da recorrida”!
Trata-se, aliás, da imposição de um ónus perfeitamente lógico e necessário, em primeiro lugar, porque ninguém está em melhor posição do que o recorrente para indicar os concretos pontos da sua discordância relativamente ao apuramento da matéria de facto, indicando os concretos meios de prova constantes do registo sonoro que, em seu entendimento, fundamentam tal discordância e qual a concreta divergência detectada.
Em segundo lugar, para permitir que a parte contrária conheça os argumentos concretos e devidamente delimitados do impugnante, para os poder contrariar cabalmente, assim se garantindo o devido cumprimento do princípio do contraditório.
Na verdade, o que se exige é que se analisem esses meios de prova, cotejando-os mesmo com a prova em sentido contrário, relativizando o sentido dessa prova e dizendo porquê, mas também relativizando as provas que convoca para sustentar o seu ponto de vista e de tudo isso extraindo o sentido que lhe merecer acolhimento.
O que se pretende que a parte faça?
Certamente que apresente um discurso argumentativo onde, em primeiro lugar, alinhe as provas, identificando-as, ou seja, dizendo onde se encontram no processo e, tratando-se de depoimentos, identifique a passagem ou passagens pertinentes, e, em segundo lugar, produza uma análise crítica dessas provas, pelo menos elementar.
A razão pela qual se afirma que a parte deve produzir uma análise crítica mínima é esta: indicar apenas os meios probatórios, isto é, o depoimento da testemunha A ou B, ou o documento C ou D, é reproduzir apenas o que consta do processo, pelo que nada se acrescenta ao que já existe nos autos, nem se mostra a razão por que a resposta a uma dada matéria de facto deve ser diversa da que foi dada pelo juiz.
Para desencadear a reapreciação pelo Tribunal da Relação, a parte tem de colocar uma questão a este tribunal.
Ora, só coloca uma questão se elaborar uma argumentação que se oponha à argumentação produzida pelo juiz em 1.ª instância, colocando então o tribunal de recurso perante uma questão a resolver.
Não basta, pois, identificar meios de prova e dizer-se que os mesmos deviam ter sido valorados em certo sentido e em detrimento daqueles que o tribunal valorou.
Com efeito, o depoimento das testemunhas, que os ora apelantes pretendem que sejam agora valorados diversamente do que o foram pelo tribunal recorrido, de molde a levar à alteração da matéria de facto, são, consabidamente, como acima se deu nota elementos de prova a apreciar livremente pelo tribunal (cfr. artigos 396.º do Cód. Civil e 607.º, nº 5 do CPCivil.
Portanto, se o tribunal recorrido entendeu valorar diferentemente da ora recorrente tais depoimentos, não pode esta Relação pôr em causa, a convicção daquele, livremente formada, tanto mais que dispôs de outros mecanismos de ponderação da prova global que este tribunal ad quem não detém aqui, pois que, se a Relação deve formar a sua própria e autónoma convicção, a verdade é que, como acima se referiu, se mantêm vigorantes os princípios da imediação, da oralidade, da concentração e da livre apreciação da prova e guiando-se o julgamento humano por padrões de probabilidade e nunca de certeza absoluta.
De modo simples, impunha-se que os recorrentes como condição da reapreciação da prova, fizesse evidenciação da existência de um erro grosseiro, material ou formal, na apreciação da prova para, partindo dessa circunstância, abrir-se a porta da renovação da prova a que apela, coisa que manifestamente não fez.
Portanto, o referido ónus não se pode ter por satisfeito com pouco mais que simples transcrições do depoimento de testemunhas.
(…)
Alegam depois os recorrentes que em relação às alíneas i) h) e j) do elenco dos factos provados deviam, na mesma correspondência, ter sido dados como provados os seguintes factos:
- “com grande probabilidade, caso tivessem levado a cabo a parceria com o Dr. II, os autores poderiam contar com um lucro na venda do 76 da ordem dos € 120.000,00”;
- “com alguma probabilidade, a notoriedade da realização do projecto para o P76 e para o P80 poderia ter possibilitado a angariação de algum novo cliente, com ganhos de nunca menos de € 100.000,00”.
“com alguma probabilidade, os Autores poderiam ter-se associado a outros promotores para a aquisição e renovação do P80, obtendo um ganho efectivo da ordem dos 10% a 15% do lucro correspondente”.
(…)
No que tange à prova dos supra indicados factos mais uma vez os recorrentes não cumprem os ónus imposto pelo artigo 640.º, nº 1 al. c) do CPCivil, não indicando os concretos meios de prova que poderiam servir de lastro a tal alteração.
Acresce que ainda que assim não fosse, torna-se evidente que tais alterações, nos moldes propostos pelos recorrentes, acabariam por ser meras conclusões e não factos, sendo que o tribunal não julga com base em conclusões e mas sim em factos.
Quanto aos artigos 121.º a 123º da petição inicial e al. l) dos factos não provados mais uma vez não cumprem os ónus impostos pelo artigo 640.º nº 1 al. c) do CPCivil não indicando os concretos meios de prova que fundamentariam a pretendida alteração e, se é verdade que o tribunal se pode socorrer das regras da experiência no seu iter decisório, elas apenas servem para completar em sentido positivo (corroborante) ou negativo (infirmante) o resultado de outra prova.
(…)
Pretendem também os recorrentes que deveria ter sido dado como provado o conteúdo do artigo 60º da petição inicial, convocando para o efeito o depoimento da testemunha QQ.
Todavia, também aqui, se limitaram a transcrever um excerto desse depoimento e sem fazer qualquer análise crítica do mesmo, ou seja, porque razão devia ser valorado.
Alegam por último os recorrentes que o ponto 28. Da fundamentação não devia ter sido dado como provado e que devia ser alterada a redacção do ponto 33. Da mesma fundamentação e nos moldes propostos.
No que se refere ao ponto 28. Referem que não vislumbram de que prova resulta tal julgamento.
O citado ponto factual corresponde a alegação que foi vertida na contestação e que resulta do alegado nos artigos 89º a 94 da contestação e que, obviamente, assentará a nível de fundamentação factual na genérica formulação (uma vez que não se adoptou a via de fundamentação ponto por ponto) plasmada na decisão quando aí se refere:
“Assim, e para além dos factos que estão assentes por documento autêntico e acordo das partes, nos termos do art.º 574º, nº 2, do NCPC, teve ainda o tribunal em consideração a demais prova produzida, nomeadamente, os depoimentos de parte dos legais representantes das partes e os depoimentos das testemunhas, tudo devidamente concatenado com a vasta prova documental oferecida nos presentes autos, sendo que esta não mereceu qualquer impugnação, nomeadamente, quanto à sua genuinidade ou veracidade”.
E assim sendo, teriam os recorrentes de rebater tal argumentação com a respectiva análise crítica da prova para depois chegarem à conclusão de que sobre tal facto não foi produzida qualquer prova.
Acresce que está dado como provado que, quem a final adquiriu o P…80 foi a primeira ré (cfr. ponto 29. Da fundamentação factual) e que não está impugnado.
Quanto à alteração do ponto 33. Da fundamentação factual mais uma vez os recorrentes não cumprem os ónus impostos pelo artigo 640.º, nº al. al. b) não indicando os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão diversa da recorrida”.
4. Pode dizer-se que, em geral, a jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça tem observado, fundamentalmente, um critério de proporcionalidade e de razoabilidade, entendendo que os ónus previstos no art. 640.º do CPC têm em vista garantir uma adequada inteligibilidade do fim e do objeto do recurso. Deste modo, “a apreciação da satisfação das exigências estabelecidas no art. 640.º do CPC deve consistir na aferição se da leitura concertada da alegação e das conclusões, segundo critérios de proporcionalidade e razoabilidade, resulta que a impugnação da decisão sobre a matéria de facto se encontra formulada num adequado nível de precisão e seriedade, independentemente do seu mérito intrínseco” [12].
5. Importa, porém, apreciar separadamente cada um dos pontos impugnados pelos Autores/Apelantes, aqui Recorrentes.
6. No que respeita às als. h), i) e j) do elenco dos factos não provados (no acórdão recorrido refere-se, certamente por lapso de escrita, que tais als. correspondem ao leque dos factos provados), os Autores/Recorrentes indicam os factos que entendem que deveriam ser considerados como provados. Contudo, conforme o acórdão recorrido, as alterações pretendidas não configuram factos concretos, mas antes meras conclusões.
Com efeito, os Autores/Recorrentes pretendem que resulte provado que:
- “com grande probabilidade, caso tivessem levado a cabo a parceria com o Dr. II, os autores poderiam contar com um lucro na venda do 76 da ordem dos € 120.000,00”;
- “com alguma probabilidade, a notoriedade da realização do projecto para o P76 e para o P80 poderia ter possibilitado a angariação de algum novo cliente, com ganhos de nunca menos de € 100.000,00”.
- “com alguma probabilidade, os Autores poderiam ter-se associado a outros promotores para a aquisição e renovação do P80, obtendo um ganho efectivo da ordem dos 10% a 15% do lucro correspondente”.
7. Ora, o uso de expressões vagas e imprecisas como “com alguma probabilidade”, assim como a quantificação de lucros ou acréscimos patrimoniais, na ausência de indicação dos factos concretos que permitam concluir pela forma de cálculo dos valores referidos, não se coadunam com a exigência legal imposta aos recorrentes de indicar os factos concretos passíveis de prova.
8. As alterações pretendidas pelos Autores/Recorrentes traduzem-se, por isso, em meras conclusões, sem que sejam acompanhadas dos factos concretos que permitam explicar como se alcançaram essas mesmas conclusões.
9. Deste modo, independentemente da (in)observância do ónus de alegação previsto no art. 640.º, n.º 1, al. b) do CPC, não se mostra cumprido o ónus consagrado na al. a) do mesmo preceito, na medida em que os Autores/Recorrentes não indicaram factos concretos que considerassem incorretamente julgados. Na verdade, assinalaram tão somente meras conclusões.
10. Nesta parte, improcede a argumentação dos Autores/Recorrentes Arpador–Arquitectos & Associados, Lda. e AA.
11. Quanto aos arts. 121.º a 123º da petição inicial e à al. l) dos factos não provados, compulsado o teor das alegações do recurso de apelação, verifica-se que os Autores/Apelantes, aqui Recorrentes, se limitaram a invocar as regras da experiência para a prova dos factos constantes dos arts. 121.º a 123.º da petição inicial, sem contudo indicaram quaisquer outros meios probatórios incluídos no processo que impusessem a prova desses factos.
Estão em causa os seguintes factos:
“121.º E entendendo-se não ser de atender à expetativa de ganho perdida, a verdade é que os Autores se empenharam pessoalmente na realização de estudos prévios, medições, cálculos e estimativas várias, contactos com interessados, negociações com vendedores, arrendatário e agentes imobiliários, com enorme dispêndio de tempo e desgaste pessoal,
122.º Tendo o Autor empenhado a sua imagem pessoal e a sua reputação, granjeada ao longo de anos, no sucesso das pretensões dos Réus.
123.º Esse investimento pessoal — que os Autores não teriam feito se não tivessem sido incentivados pelos Réus — pode ser quantificado da seguinte forma:”
12. Atendendo à natureza dos factos em causa, é evidente que as regras de experiência comum não se afiguram suficientes para a respetiva prova. Tem, por isso, razão o Tribunal da Relação …… quando afirma que “se é verdade que o tribunal se pode socorrer das regras da experiência no seu iter decisório, elas apenas servem para completar em sentido positivo (corroborante) ou negativo (infirmante) o resultado de outra prova”.
13. Improcede, assim, nesta parte, o alegado pelos Autores/Recorrentes Arpador–Arquitectos & Associados, Lda. e AA.
14. Por seu turno, no que respeita à falta de inclusão nos factos provados dos arts. 129.º, al. a) e 60.º da petição inicial, o Tribunal da Relação … entendeu que o ónus previsto no art. 640.º, n.º 1, al. b) do CPC não é suscetível de ser considerado como cumprido com pouco mais do que simples transcrições do depoimento de testemunhas, desacompanhadas de qualquer análise crítica de tais meios de prova.
15. Quanto ao ponto 28 da matéria de facto dada como provada pelo Tribunal de 1.ª Instância, que os Autores/Apelantes, aqui Recorrentes, entendem que não deve ser dado como provado, depois de considerar que a prova desses factos se encontra fundamentada na sentença, o Tribunal da Relação …. sustentou que “teriam os recorrentes de rebater tal argumentação com a respectiva análise crítica da prova para depois chegarem à conclusão de que sobre tal facto não foi produzida qualquer prova”.
16. Também quanto à alteração do ponto 33 da matéria de facto dada como provada pelo Tribunal de 1.ª Instância, defendeu-se no acórdão recorrido que “mais uma vez os recorrentes não cumprem os ónus impostos pelo artigo 640.º, nº al. al. b) não indicando os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão diversa da recorrida”.
17. Compulsadas as alegações dos Autores/Apelantes, aqui Recorrentes, verifica-se que a falta de prova dos factos constantes do ponto 28 da matéria de facto dada como provada pelo Tribunal de 1.ª Instância e a alteração ao ponto 33 da mesma matéria estão interligados, fundamentando os Apelantes a sua argumentação no teor de prova documental, identificando os documentos em causa e o texto relevante de cada um deles, assim como uma passagem do depoimento do 2.º Réu BB. Estes meios probatórios não foram apreciados pelo Tribunal da Relação ….. com o argumento de que os Autores/Apelantes não efetuaram uma análise crítica da prova.
18. Em sede de observância do ónus de alegação previsto no art. 640.º, n.º 1, al. b) do CPC, num caso similar ao dos presentes autos, o Supremo Tribunal de Justiça entendeu que:
“O argumento expressamente avançado pelo acórdão recorrido para rejeitar conhecer parte da impugnação da matéria de facto não foi o incumprimento do ónus de alegação, dito primário, de especificação dos “concretos pontos de facto” considerados “incorrectamente julgados” (alínea a) do nº 1), nem dos “concretos meios probatórios” determinantes de decisão diversa (alínea b) do nº 1), nem ainda da “decisão que deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas” (alínea c) do nº 1), nem até mesmo do ónus, dito secundário, da indicação exacta das passagens da gravação em que se funda o recurso (alínea b) do n.º 2).
(…) Antes enuncia o acórdão recorrido, como sendo relevante, a omissão das “razões pelas quais aqueles meios de prova conduzem à alteração pretendida”, sem, contudo, identificar, de entre os previstos nas supra reproduzidas três alíneas do nº 1 do art. 640º do CPC, o segmento normativo que a apelante incumpriu.
Procurando interpretar o sentido da fundamentação do acórdão recorrido, dando-lhe um sentido útil, afigura-se ter a Relação entendido que o legislador – ao impor, na referida alínea b) do nº 1 do art. 640º do CPC, que o recorrente especifique “os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida” – exigiria também que o mesmo recorrente se pronunciasse sobre a valoração alegadamente correcta desses mesmos meios de prova, ou seja, sobre as razões pelas quais cada um deles deverá conduzir a decisão diversa da impugnada.
Na interpretação da referida norma legal, não se vislumbra que tal sentido interpretativo, de acrescida exigência, encontre suporte nos elementos literal, sistemático ou teleológico da interpretação.
Senão vejamos.
Não encontra suporte no elemento literal da interpretação normativa porque a especificação dos concretos meios probatórios mais não é do que a identificação individualizada de cada um deles.
Não encontra suporte no elemento sistemático da interpretação porque, por um lado, a lei estipulou, na alínea a) do nº 2, a especificação dos meios probatórios gravados e aí se bastou com a obrigação de o apelante indicar com exactidão as passagens da gravação e não também de indicar aquelas razões, depreendendo-se vontade deliberada em não incluir esta outra indicação no referido ónus; e porque, por outro lado, em lugares paralelos de consagração e disciplina de outros ónus de alegação recursórios, quando entendeu existir necessidade de exigir ao recorrente a exposição das razões concretas de certa alegação, o legislador o consagrou expressamente (ver maxime quanto ao ónus de alegação dos pressupostos previstos nas alíneas a) e b) do nº 1 do art. 672º do CPC, a respeito da admissibilidade do recurso de revista por via excepcional)
Tampouco a sobredita interpretação normativa encontra suporte no elemento teleológico da interpretação, uma vez que, exigindo-se ao tribunal da Relação que, na reapreciação da matéria de facto, proceda ao exame crítico e autónomo das provas formando a sua própria convicção (cfr. arts. 662º, nº 1, 663º, nº 2 e 607º, nº 4, todos do CPC) – não dependente portanto da convicção formada em 1ª instância nem da convicção apresentada pelo apelante – bastará para esse efeito a indicação dos meios de prova que, no entender do apelante, serão relevantes para a pretensão de ver proferida decisão de facto diversa, sendo inútil a enunciação das razões concretas conducentes a tal decisão.
Esclareça-se ainda que não se afigura que a falta da indicação dessas razões conduza à afectação do princípio do contraditório, na medida em que o apelado, conhecendo os meios de prova em que o apelante sustenta a pretendida alteração da decisão relativa à matéria de facto, dispõe das condições para contraditar tal pretensão”[13].
19. Assim, no que respeita à falta de inclusão no elenco dos factos provados dos arts. 129.º, al. a) e 60.º da petição inicial, compulsado o recurso de apelação por si interposto, verifica-se que os Autores/Apelantes, ora Recorrentes, indicaram os depoimentos de testemunhas relevantes para a prova desses factos, assim como as passagens da gravação em que fundam a sua argumentação, e procederam ainda à transcrição das passagens pertinentes.
20. Também quanto à impugnação do ponto 28 da matéria de facto considerada como provada pelo Tribunal de 1.ª Instância e à alteração pretendida do ponto 33 da mesma matéria de facto, segundo a alegação dos Autores/Apelantes, ora Recorrentes, essas questões encontram-se interligadas. Fundamentam a sua argumentação no teor de prova documental, identificando os documentos em causa e o texto relevante em cada um deles, assim como uma passagem do depoimento do 2.º Réu BB. Estes meios probatórios não foram apreciados pelo Tribunal da Relação ….. com o argumento de que os Autores/Apelantes não efetuaram uma análise crítica da prova.
21. Na senda da orientação da jurisprudência consolidada do Supremo Tribunal de Justiça, referida supra, o legislador não exige, no art. 640.º, n.os 1, al. b), e 2 do CPC, que os Autores/Recorrentes se pronunciem sobre a valoração alegadamente correta dos meios de prova por si indicados, ou seja, sobre as razões pelas quais cada um deles deverá conduzir a decisão diversa da impugnada.
22. Por conseguinte, o Tribunal da Relação …., ao recusar essa parte da impugnação da decisão sobre a matéria de facto, ostenta um formalismo excessivo no cumprimento dos ónus consagrados no art. 640.º do CPC. No caso em apreço, o teor do recurso de apelação permite identificar o objeto da impugnação da matéria de facto e proceder à sua apreciação sem qualquer esforço desmesurado.
23. Impõe-se por isso, nesta parte, concluir pela verificação de ofensa às normas processuais, pelo Tribunal da Relação …., ao ter rejeitado parcialmente a impugnação da matéria de facto com fundamento no não cumprimento do ónus estabelecido no art. 640.º, n.os 1, al, b), e 2 do CPC.
24. Procede, nesta parte, o recurso de revista interposto por Arpador–Arquitectos & Associados, Lda. e AA.
Não apreciação da impugnação da decisão sobre a matéria de facto por irrelevância dessa matéria para a decisão final
1. Por último, o Tribunal da Relação …. rejeitou ainda a apreciação da impugnação da decisão da matéria de facto relativamente aos factos alegados nos arts. 6.º, 7.º, 8.º, 9.º, 10.º e 46.º da petição inicial (que os Autores/Apelantes reputaram que deveriam ter sido dados como provados) considerando que se trata de factos instrumentais, irrelevantes para a decisão final.
2. Segundo os Autores/Recorrentes, “os factos instrumentais, mesmo que não constem da alegação das partes, podem ser tidos em consideração pelo julgador se resultarem da instrução da causa.” Não se lhes afigura “rigorosa a afirmação de que os factos sindicados pelos Recorrentes – que foram por eles alegados na petição inicial e foram levados a debate em sede de instrução e julgamento – não devem ser objecto de julgamento em 2ª Instância, em sede de impugnação da matéria de facto, por serem instrumentais e o julgamento na 2ª Instância constituir um acto inútil”.
3. A jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça tem considerado que nada impede o Tribunal da Relação de apreciar se a factualidade indicada pelos recorrentes é ou não relevante para a decisão da causa, podendo, no caso de concluir pela sua irrelevância, deixar de apreciar, nessa parte, a impugnação da matéria de facto por se tratar de ato inútil. Assim, “Não viola o dever de reapreciação da matéria de facto a decisão do Tribunal da Relação que não conheceu a matéria fáctica que o Apelante pretendia que fosse aditada ao factualismo provado (factos complementares e concretizadores de factos essenciais) tendo subjacente a sua irrelevância para o conhecimento do mérito da causa (por a mesma, por si só, na ausência de demonstração de factualidade essencial para o efeito, não poder alterar o sentido da decisão, ou seja, afastar a qualificação da insolvência como culposa)”[14]. Na verdade, “se os factos cujo julgamento é impugnado não forem susceptíveis de influenciar decisivamente a decisão da causa, segundo as diferentes soluções plausíveis de direito que a mesma comporte, é inútil e contrário aos princípios da economia e da celeridade a reponderação pela Relação da decisão proferida pela 1.ª instância”[15].
25. No caso sub judice, os factos em causa, alegados na petição inicial, são os seguintes:
“6.º - Entre 1995 e 2001, a Autora projetou e acompanhou a remodelação da sede da R......, S.A., no …., dividida em três fases.
7.º - Entre 2001 e 2002, a Autora projetou e acompanhou a construção do edifício destinado a albergar o arquivo da mesma R......, S.A., em …, ….
8.º - Entre 2004 e 2005, a Autora projetou uma habitação para o 2.º Réu, em …, …, …., a qual não veio a ser executado.
9.º - Entre 2005 e 2007, a Autora projetou três casas em …., e uma em …., a pedido do 2.º Réu, as quais não vieram a ser executadas.
10.º - Em 2005, o 2.º Réu solicitou ao Arq. AA, a ampliação da sua casa pessoal, na Quinta ….., em ….., projeto que foi elaborado e acompanhado pela Autora, vindo a ser concluído em 2011.
(…)
46.º - Sendo que o 2.º Réu refere, em comunicação a um seu sócio, que “Não porque eu seja melhor do que qualquer um de vocês a negociar, mas porque a ‘empatia’ que foi criada com o Sr SS está muito personalizada em mim e no AA” e “o que eu proponho é que se fale com o Senhor SS, talvez o AA, e se lhe explique que eu estou no …. e que só volto no dia 10 de abril, mas que ficará ao seu critério uma das duas opções: a) Fazer já uma reunião com a sua filha e a sua advogada, o AA e o TT (dizendo que é meu sócio na empresa) para o primeiro acerto de modelo de atuação e, depois, quando eu regressar, fazermos uma nova reunião para ‘fechar’ o negócio.” (DOC. 40 a 45).
26. Discute-se, in casu, a alegada responsabilidade pré-contratual dos Réus pela não celebração do contrato de prestação de serviço, que tinha por objeto a elaboração dos projetos de arquitetura referentes ao P…. 76 e 80. Assim, no que toca aos arts. 6.º a 10.º da petição inicial, os trabalhos anteriormente desenvolvidos pelos Autores a pedido do 2.º Réu BB permitem apenas concluir que existiram negócios entre as partes antes da ocorrência dos factos que são objeto desta ação – o que se encontra provado sob os n.os 1 a 3.
27. Por sua vez, o teor do art. 46.º da petição inicial revela apenas a presença de uma relação próxima entre o 2.º Autor AA e o 2.º Réu BB, mas sem que daí decorra qualquer facto essencial para a matéria em discussão nos autos. Na verdade, revestindo-se de natureza meramente instrumental, como aliás não é posto em causa pelos Autores/Recorrentes, todos os factos ora em apreço apenas seriam relevantes se permitissem a prova de outros factos de natureza essencial, que os Autores/Recorrentes pretendessem julgar provados, ou, ao invés, consentissem a contraprova de factos julgados provados pelo Tribunal de 1.ª Instância. Todavia, os Autores/Recorrentes não identificaram os factos essenciais que aqueles factos instrumentais visavam provar, que não integrem já a decisão da matéria de facto.
28. Não se descortinando, por conseguinte, qualquer utilidade na prova dos factos vertidos nos arts. da petição inicial indicados supra, não merece censura a decisão do Tribunal da Relação ….. em recusar apreciar a impugnação deduzida quanto aos mesmos.
29. Improcede, assim, nesta parte, o recurso de revista interposto por Arpador–Arquitectos & Associados, Lda. e AA.
Em suma:
Admite-se o recurso de revista regra ou normal apenas quanto à parte do acórdão recorrido que se pronunciou sobre a impugnação da decisão sobre a matéria de facto, não se admitindo na parte restante em virtude da verificação de dupla conformidade decisória;
Julga-se parcialmente procedente o recurso de revista, revogando-se o acórdão recorrido na parte em que recusou apreciar a impugnação da decisão da matéria de facto relativamente (i) à falta de inclusão nos factos provados dos arts. 129.º, al. a) e 60.º da petição inicial, (ii) à impugnação do ponto 28 da matéria de facto considerada como provada pelo Tribunal de 1.ª Instância e (iii) à alteração pretendida do ponto 33 da mesma matéria de facto dada como provada pelo Tribunal de 1.ª Instância.
Determina-se a baixa dos autos ao Tribunal da Relação …. para, se possível pelos mesmos Senhores Juízes Desembargadores, ser apreciada a impugnação da matéria de facto quanto aos pontos indicados supra, cujo conhecimento foi rejeitado.
Com a procedência parcial do recurso de revista regra ou normal e a baixa dos autos ao Tribunal da Relação …. fica prejudicada a remessa dos autos à Formação em ordem ao apuramento da (in)verificação dos requisitos do recurso de revista excecional, interposto pelos Autores Arpador–Arquitectos & Associados, Lda. e AA a título subsidiário.
IV – Decisão
Nos termos expostos, acorda-se:
- em admitir o recurso de revista regra ou normal, interposto por Arpador–Arquitectos & Associados, Lda. e AA, apenas quanto à parte do acórdão recorrido que se pronunciou sobre a impugnação da decisão sobre a matéria de facto, não sendo admissível na parte restante por existência de dupla conformidade decisória;
- em julgar parcialmente procedente o recurso de revista interposto por Arpador–Arquitectos & Associados, Lda. e AA, revogando-se o acórdão recorrido na parte em que recusou apreciar a impugnação da decisão da matéria de facto relativamente (i) à falta de inclusão nos factos provados dos arts. 129.º, al. a) e 60.º da petição inicial, (ii) à impugnação do ponto 28 da matéria de facto considerada como provada pelo Tribunal de 1.ª Instância e (iii) à alteração pretendida do ponto 33 da mesma matéria de facto dada como provada pelo Tribunal de 1.ª Instância;
- em determinar a baixa dos autos ao Tribunal da Relação ….. para, se possível pelos mesmos Senhores Juízes Desembargadores, ser apreciada a impugnação da matéria de facto quanto aos pontos indicados supra, cujo conhecimento foi rejeitado.
Custas na proporção do decaimento.
Lisboa, 9 de fevereiro de 2021.
Sumário: 1. Nos termos do art. 652.º, n.º 1, al. b) do CPC, deve admitir-se a revista regra na parte do acórdão recorrido em que se recusou parcialmente a apreciação da impugnação da decisão sobre a matéria de facto quer por não se encontrarem reunidos todos os requisitos previstos no art. 640.º do CPC, quer por se considerar que a alteração pretendida se afigura inútil à decisão da causa (art. 674.º, n.º 1, al. b) do CPC). Não se verifica, nesta parte, dupla conformidade decisória. O mesmo se diga a propósito da violação de disposições processuais, pela Relação, no exercício dos respetivos poderes de reapreciação da decisão de facto. 2. Em ordem a apurar se a fundamentação das decisões das Instâncias é ou não essencialmente diferente releva o conteúdo de cada uma dessas decisões e não o sumário do acórdão recorrido. 3. O conceito de fundamentação essencialmente diferente não se basta com qualquer modificação ou alteração da fundamentação no iter jurídico que suporta o acórdão da Relação em confronto com a sentença de 1.ª Instância. 4. A Relação não se abstém de conhecer da impugnação da decisão de facto quando, a propósito de alguns pontos da matéria de facto, considerou que não foram cabalmente observados pelos recorrentes os ónus previstos no art. 640,º, n.º 1 do CPC e, quanto a outros pontos, reputou tratar-se de matéria irrelevante para a decisão final. 5. O dever de reapreciação da prova por parte da Relação apenas existe no caso de os recorrentes respeitarem todos os ónus previstos no art. 640.º, n.º 1 do CPC e de a matéria em causa se afigurar relevante para a decisão final. 6. Na interpretação-aplicação do art. 640.º do CPC, o STJ tem observado, fundamentalmente, um critério de proporcionalidade e de razoabilidade. 7. O art. 640.º, n.os 1, al. b), e 2 do CPC não exige que os recorrentes se pronunciem sobre a valoração alegadamente correta dos meios de prova por si indicados. 8. Segundo a jurisprudência do STJ, nada impede a Relação de apreciar se a factualidade indicada pelos recorrentes é ou não relevante para a decisão da causa, podendo, no caso de concluir pela sua irrelevância, deixar de apreciar, nessa parte, a impugnação da matéria de facto por se tratar de ato inútil.
Este acórdão obteve o voto de conformidade dos Excelentíssimos Senhores Conselheiros Adjuntos António Magalhães e Fernando Dias, a quem o respetivo projeto já havia sido apresentado, e que não o assinam por, em virtude das atuais circunstâncias de pandemia de covid-19, provocada pelo coronavírus Sars-Cov-2, não se encontrarem presentes (art. 15.º-A do DL n.º 10-A/2020, de 13 de março, que lhe foi aditado pelo DL n.º 20/2020, de 1 de maio).
Maria João Vaz Tomé (Relatora)
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[1] Vide, neste sentido, António Santos Abrantes Geraldes, Recursos em Processo Civil, Coimbra, Almedina, 2020, pp.415-418; Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 19 de março de 2019 (Acácio das Neves), proc. n.º 3505/15.5T8OER.L1.S1; de 19 de junho de 2019 (Rosa Tching), proc. n.º 5065/16.0T8CBR.C1-A.S1; de 7 de novembro de 2019 (Oliveira Abreu), proc. n.º 8141/15.3T8GMR.L1.S1; de 11 de julho de 2019 (Bernardo Domingos), proc. n.º 2128/16.6T8VIS.C1.S1; de 17 de outubro de 2019 (Rosa Ribeiro Coelho), proc. n.º 617/14.6YIPRT.L1.S1; de 17 de dezembro de 2019 (Maria da Graça Trigo), proc. n.º 363/07.7TVPRT-D.P2.S1. – encontrando-se os três últimos acórdãos disponíveis para consulta in www.dgsi.pt.
[2] Cf. Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 4 de junho de 2020 (Rijo Ferreira), proc. n.º 1519/18.2T8FAR.E1.S1 – disponível para consulta in https://jurisprudencia.csm.org.pt/ecli/ECLI:PT:STJ:2020:1519.18.2T8FAR.E1.S1/; de 7 de novembro de 2019 (Oliveira Abreu), proc. n.º 8141/15.3T8GMR.L1.S1.
[3] Cf. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 20 de fevereiro de 2020 (Ilídio Sacarrão Martins), proc. n.º 1003/13.0T2AVR.P1.S1 - disponível para consulta in https://jurisprudencia.csm.org.pt/ecli/ECLI:PT:STJ:2020:1003.13.0T2AVR.P1.S1/. A propósito da jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça sobre o tema da dupla conforme, vide o caderno de jurisprudência temática disponível in https://www.stj.pt/wp-content/uploads/2020/11/dupla_conforme.pdf.
[4] Cf. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 12 de março de 2019 (Fonseca Ramos), proc. n.º 1747/17.8T8LRA.C1.S1 – não se encontra disponível para consulta in www.dgsi.pt.
[5] Cf. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 28 de fevereiro de 2019 (Oliveira Abreu), proc. n.º 424/13.3T2AVR.P1.S1 – não se encontra disponível para consulta in www.dgsi.pt..
[6] Cf. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 27 de outubro de 2020 (Graça Amaral), proc. n.º 25/11.0TBVRL.G1.S2 – não se encontra disponível para consulta in www.dgsi.pt.
[7] Cf. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 11 de julho de 2019 (Acácio das Neves), proc. n.º 9696/15.8T8VNG.P1.S1 - não se encontra disponível para consulta in www.dgsi.pt.
[8] Cf. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 9 de fevereiro de 2017 (Tomé Gomes), proc. n.º 8228/03.5TVLSB.L1.S2 – não se encontra disponível para consulta in www.dgsi.pt.
[9] Cf. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 5 de dezembro de 2017 (Helder Roque), proc. n.º 968/14.0T8LSB.L1.S1 – não se encontra disponível para consulta in www.dgsi.pt; vide, no mesmo sentido, Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 27 de abril de 2017 (António Joaquim Piçarra), proc. n.º 481/09.7TBMNC.G1.S1 – não se encontra disponível para consulta in www.dgsi.pt.
[10] Cf. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 8 de março de 2018 (Roque Nogueira), proc. n.º 3034/12.9YIPRT.L1.S1 – não se encontra disponível para consulta in www.dgsi.pt.
[11] Cf. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 8 de março de 2018 (Roque Nogueira), proc. n.º 3034/12.9YIPRT.L1.S1. No mesmo sentido, vide Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 19 de dezembro de 2018 (Roque Nogueira), proc. n.º 292/08.7TBVLP.G1.S1; de 13 de setembro de 2016 (Helder Roque), proc. n.º 166472/13.7YIPRT.P1.S1 – não se encontram disponíveis para consulta in www.dgsi.pt.
[12] Cf. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 4 de junho de 2020 (Rijo Ferreira), proc. n.º 1519/18.2T8FAR.E1.S1 – disponível para consulta in https://jurisprudencia.csm.org.pt/ecli/ECLI:PT:STJ:2020:1519.18.2T8FAR.E1.S1/.
Vide, no mesmo sentido, os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 8 de julho de 2020 (Nuno Pinto Oliveira), proc. n.º 4081/17.0T8VIS.C1-A.S1, – disponível para consulta in https://jurisprudencia.csm.org.pt/ecli/ECLI:PT:STJ:2020:4081.17.0T8VIS.C1.A.S1/; de 16 de junho de 2020 (Henrique Araújo), proc. n.º 8670/14.6T8LSB.L2.S1 – disponível para consulta in https://jurisprudencia.csm.org.pt/ecli/ECLI:PT:STJ:2020:8670.14.6TB8LSB.L2.S1/; de 5 de fevereiro de 2020 (Nuno Pinto Oliveira), proc. n.º 3920/14.1TCLRS.S1 – disponível para consulta in https://jurisprudencia.csm.org.pt/ecli/ECLI:PT:STJ:2020:3920.14.1TCLRS.S1/. Para acesso a mais jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça sobre o tema do ónus de impugnação da matéria de facto, pode consultar-se o caderno de jurisprudência temática disponível in ttps://www.stj.pt/wp-content/uploads/2020/11/onus_-impugnacao_materia_facto-.pdf.
[13] Cf. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 17 de fevereiro de 2019 (Maria da Graça Trigo), proc. n.º 363/07.7TVPRT-D.P2.S1 – disponível para consulta in http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/5228ba24fbe54a7d802584d3005a57f5?OpenDocument.
Neste sentido, vide Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 18 de fevereiro de 2020 (Jorge Dias), proc. n.º 968/15.2T8PNF.P1.S1 (“(…) III – Os concretos meios probatórios enunciados na al. b) do n.º 1 do art. 640.º do CPC hão-de respeitar a concretos pontos de facto, enunciados na al. a) e que a apelante entende terem sido incorretamente julgados. IV – Quando a recorrente “cumpre os mínimos”, isto é, concretiza, minimamente, quais os meios probatórios que, em seu entender, impunham decisão diversa da recorrida, relativamente aos pontos da matéria de facto impugnados, não deve ser rejeitado o recurso de impugnação da matéria de facto. V – A insuficiência da fundamentação probatória do recorrente da matéria de facto não releva como requisito formal do ónus de impugnação. VI – Ao indagar da suficiência da alegação deverá tomar-se em linha de conta o princípio da proporcionalidade.”) – disponível para consulta in https://jurisprudencia.csm.org.pt/ecli/ECLI:PT:STJ:2020:968.15.2T8PNF.P1.S1/; de 21 de março de 2019 (Rosa Tching), proc. n.º 3683/16.6T8CBR.C1.S2 (“I – Para efeitos do disposto nos arts. 640.º e 662.º, n.º 1, ambos do CPC, impõe-se distinguir, de um lado, a exigência da concretização dos pontos de facto incorretamente julgados, da especificação dos concretos meios probatórios convocados e da indicação da decisão a proferir, previstas nas als. a), b) e c) do n.º 1 do citado art. 640.º, que integram um ónus primário, na medida em que têm por função delimitar o objeto do recurso e fundamentar a impugnação da decisão da matéria de facto. E, por outro lado, a exigência da indicação exata das passagens da gravação dos depoimentos que se pretendem ver analisados, contemplada na al. a) do n.º 2 do mesmo art. 640.º, que integra um ónus secundário, tendente a possibilitar um acesso mais ou menos facilitado aos meios de prova gravados relevantes para a apreciação da impugnação deduzida. II – Na verificação do cumprimento dos ónus de impugnação previstos no citado art. 640.º, os aspetos de ordem formal devem ser modelados em função dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade. III – Nesta conformidade, enquanto a falta de especificação dos requisitos enunciados no n.º 1, als. a), b) e c) do referido art. 640.º implica a imediata rejeição do recurso na parte infirmada, já, quanto à falta ou imprecisão da indicação das passagens da gravação dos depoimentos a que alude o n.º 2, al. a) do mesmo artigo, tal sanção só se justifica nos casos em que essa omissão ou inexatidão dificulte, gravemente, o exercício do contraditório pela parte contrária e/ou o exame pelo tribunal de recurso. IV -Tendo o recorrente, indicado, nas conclusões das alegações de recurso, o início e o termo de cada um dos depoimentos das testemunhas ou indicado o ficheiro em que os mesmos se encontram gravados no suporte técnico e complementado estas indicações com a transcrição, no corpo das alegações, dos excertos dos depoimentos relevantes para o julgamento do objeto do recurso, tanto basta para se concluir que o recorrente cumpriu o núcleo essencial do ónus de indicação das passagens da gravação tidas por relevantes, nos termos prescritos no art. 640.º, n.º 2, al. a), do CPC, nada obstando a que o tribunal da Relação tome conhecimento dos fundamentos do recurso de impugnação da decisão sobre a matéria de facto.”) – disponível para consulta in http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/5ecc2fde50f04bd5802583c50038e5c7?OpenDocument; de 24 de abril de 2018 (João Camilo), proc. n.º 3438/13.0TBPRD.P1.S1 (“I – É jurisprudência pacífica do STJ que os tribunais da Relação, em matéria de cumprimento do ónus de especificação a que se refere o art. 640.º, n.º 1, do CPC, não devem ser excessivamente formais e rigorosos, sob pena de violação dos princípios da prevalência da substância sobre a forma, e da agilidade e celeridade processual. II – Decidiu bem a Relação ao conhecer da impugnação da matéria de facto deduzida pelos apelantes, se, pese embora a reconhecida incorreção formal, compreendeu o seu sentido e o alcance relativamente aos factos com os quais não se conformaram. III – A correção de lapso detetado no articulado da petição inicial não traduz condenação em objeto diverso do pedido, pelo que inexiste fundamento de nulidade do acórdão, nos termos do art. 615.º, n.º 1, al. e), do CPC. IV – Ao STJ não compete sindicar a atividade da Relação que alterou a decisão da matéria de facto baseada em provas de livre apreciação (testemunhal, pericial, documental e por presunção judicial) – arts. 389.º, 351.º e 396.º do CC.”) – não se encontra disponível para consulta in www.dgsi.pt; de 17 de abril de 2018 (Maria Olinda Garcia), proc. n.º 1676/10.6TBSTR.E2.S1 (“(…) II – Cumpre o ónus de alegação previsto no art. 640.º do CPC, o recorrente que (i) identifica o concreto ponto de facto que pretende ver reapreciado e (ii) o sentido com que deve ser julgado, (ii) sustentando-o no depoimento de uma testemunha com identidade e registo temporal reveladas”) – não se encontra disponível para consulta in www.dgsi.pt; de 15 de fevereiro de 2018 (Tomé Gomes), proc. n.º 134116/13.2YIPRT.E1.S1 (“I – A razão de ser do requisito de impugnação estabelecido na al. a) do n.º 2 do art. 640.º do CPC tem em vista o delineamento, por parte do recorrente, do campo de análise probatória sobre o teor dos depoimentos convocados de modo a proporcionar, em primeira linha, o exercício esclarecido do contraditório, por banda do recorrido, e a servir de base ao empreendimento analítico do tribunal de recurso, sem prejuízo da indagação oficiosa que a este tribunal é legalmente conferida, em conformidade com o disposto nos arts. 5.º, n.º 2, al. a), 640.º, n.º 2, al. b), 1.ª parte, e 662.º, n.º 1, do mesmo Código. II – Complementarmente, tal exigência constitui um fator de concentração da argumentação probatória do recorrente, numa base substancial, sobre a caracterização do erro de facto invocado, refreando, por outro lado, eventuais tendências para meras considerações de natureza generalizante e especulativa. III – Todavia, o nível de exigência na exatidão das passagens das gravações não se pode alhear da metodologia ou do modo concreto como os depoimentos foram prestados e colhidos em audiência. IV – Assim, à luz dessas coordenadas, impõe-se aferir a medida de proporcionalidade adequada à exatidão das passagens das gravações a que se refere o normativo em foco. V – Nessa conformidade, a decisão de rejeição do recurso com tal fundamento não se deve cingir a considerações teoréticas ou conceituais, de mera exegética do texto legal e dos seus princípios informadores, mas contemplar também uma ponderação do critério legal nas circunstâncias e modo como os depoimentos foram prestados e colhidos, bem como face ao grau de dificuldade que a indicação das passagens da gravação efetuada acarrete para o exercício do contraditório e para a própria análise crítica por parte do tribunal de recurso. VI – No caso em que vem impugnado apenas um juízo probatório negativo, convocando-se diversos depoimentos prestados nessa sede com argumentação crítica sobre a valoração feita pela 1.ª instância e questionamento da credibilidade dada às testemunhas da autora em detrimento das da ré, complementada ainda pela transcrição desses depoimentos com indicação do dia da sessão de julgamento em que foram prestados, do ficheiro de que consta a respetiva gravação e das horas e tempo de duração, tal como ficou consignado em ata, tem-se por observado o nível de exatidão suficiente do teor dessas gravações suscetíveis de relevar para a apreciação do caso, à luz do preceituado no art. 640.º, n.º 2, al. a), do CPC. VII – De resto, a forma como os depoimentos foram prestados e colhidos naquelas gravações, bem como a latitude da impugnação deduzida, versando nomeadamente sobre a credibilidade desses depoimentos, não se afigura de molde a exigir um minucioso parcelamento das respetivas passagens como foi entendido no acórdão recorrido, tanto mais que nem sequer tal forma de impugnação constituiu óbice ao exercício do contraditório por parte da apelada”) - disponível para consulta in http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/4078cfe87a09c3f480258236005e295b?OpenDocument; e 8 de fevereiro de 2018 (Maria da Graça Trigo), proc. n.º 8440/14.1T8PRT.P1.S1 (“(…) III – De acordo com a orientação reiterada do STJ, a verificação do cumprimento do ónus de alegação do art. 640.º do CPC tem de ser realizada com respeito pelos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, dando-se prevalência à dimensão substancial sobre a estritamente formal. IV – Tendo a recorrente identificado, no corpo das alegações e nas conclusões, o ponto da matéria de facto que considera incorrectamente julgado, identificando e transcrevendo o depoimento testemunhal que, no seu entender, impõe decisão diversa e retirando-se da leitura das alegações, ainda que de forma menos clara, qual a decisão que deve ser proferida a esse propósito, mostra-se cumprido, à luz da orientação referida em III, o ónus de impugnação previsto no art. 640.º do CPC”) – disponível para consulta in
http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/05a1fa11c236ad648025822e005e14c8?OpenDocument; de 14 de novembro de 2017 (Sebastião Póvoas), proc. n.º 543/15.1T8GMR.G1.S2 (“(…) V – A falta da indicação exacta e precisa do segmento da gravação em que se funda o recurso, nos termos da alínea a) do n.º 2 do art. 640.º do CPC não implica, só por si a rejeição do pedido de impugnação sobre a decisão da matéria de facto, desde que o recorrente se reporte à fixação electrónica/digital e transcreva os excertos que entenda relevantes de forma a permitir a reanálise dos factos e o contraditório. VI – A assim não se entender, cair-se-ia num excesso de formalismo e rigor que a dogmática processual, hoje mais agilizada e célere, pretende evitar. VII – Embora, e numa primeira fase se tivesse mostrado reticente quanto à bondade formal da impugnação o aresto acabou por aceitá-la e proceder à reapreciação”) – não se encontra disponível para consulta in www.dgsi.pt; de 6 de outubro de 2016 (Silva Gonçalves), proc. n.º 1752/10.5TBGMR-A.G1.S1 (“I – Atualmente, por força do que está proposto no n.º 1 do art. 662.º do CPC, a Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa. II – Incumbe, porém, ao recorrente que impugne a decisão relativa à matéria de facto o ónus de, obrigatoriamente, especificar, os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados, os concretos meios probatórios constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão diversa da recorrida e indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o recurso – art. 640.º do CPC – sob pena de rejeição se assim o não fizer. III – A expressão “incumbe ao recorrente (…) indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso”, há-de ser compreendida no particularizado contexto em que é denunciado o erro de julgamento da matéria de facto e tendo sempre na devida conta o pormenorizado envolvimento do modo como é especificadamente tratada e densificada a sua impugnação, isto é, relevando muito para esta exegese o modo como é proposta a alteração preconizada pelo recorrente. IV – Como tal, a recusa da reapreciação do julgamento da matéria de facto, fundamentada na omissão da indicação referida em III, só será de materializar no caso de essa denotada anotação se tornar indispensável, ou seja, quando, da envolvência circunstancial conferida ao julgador, se patentear que só com um labor comportamental acrescido e desmedido é que o juiz haverá de proceder ao exame da prova que lhe é deferido; e tal estorvo não ocorrerá sempre que esse peculiar e rogado discernimento jurisdicional, por parte do tribunal de recurso, seja suscetível de se concretizar sem o recurso a essa formal exigência normativa. V – Tendo a recorrente nas suas alegações de recurso: (i) identificado corretamente as testemunhas cujos depoimentos considerou infirmarem a decisão proferida pelo tribunal de 1.ª instância quanto a determinados pontos da matéria de facto; (ii) indicado expressamente as passagens desses depoimentos em que fundamentou o seu recurso, tendo inclusivamente procedido à sua transcrição; e (iii) apontado o início e o fim da gravação de cada um dos depoimentos, preencheu a mesma o ónus legal de impugnação da matéria de facto previsto no art. 640.º, n.º 2, al. a), do CPC.”) – não se encontra disponível para consulta in www.dgsi.pt; de 5 de julho de 2016 (Pires da Rosa), proc. n.º 178/11.8T2AVR.P1.S1 (“I – Como vem sendo repetido pelo STJ, a impugnação da decisão sobre a matéria de facto, feita perante a Relação, não se destina a que este tribunal reaprecie, global e genericamente, a prova valorada em 1.ª instância, impondo-se, consequentemente, ao recorrente um especial ónus de alegação no que respeita à delimitação do objecto do recurso e à respectiva fundamentação. II – Ao impugnar tal decisão, deve o recorrente especificar a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas, bem como – quando os meios probatórios tenham sido gravados – indicar, com exactidão, as passagens da gravação em que se funda a impugnação, sob pena de imediata rejeição do recurso – art. 640.º do NCPC (2013). III – Não esclarecendo a lei de que forma deve ser feita essa indicação e podendo a expressão indicar, com exactidão, essas passagens prestar-se a várias interpretações e sentidos, a citada norma tem vindo a ser interpretada pelo STJ à luz do princípio da proporcionalidade e da adequação, concluindo-se não ser justificável a imediata rejeição do recurso quando – apesar de a indicação do recorrente não ser, porventura, totalmente exacta e precisa – não exista dificuldade relevante na localização pelo tribunal dos excertos da gravação em que a parte se haja fundado, como sucede nos casos em que o recorrente completa a sua impugnação com a transcrição, em escrito dactilografado, das partes dos depoimentos relevantes para o julgamento do recurso. IV – Tendo a parte indicado o depoimento, identificado a pessoa que o prestou e assinalado os pontos de facto que pretende ver apreciados, complementando tal indicação com os excertos dos depoimentos gravados que conduzem ao sentido da decisão por si defendido, deve ter-se por cumprida a exigência legal contida no art. 640.º, n.º 2, al. a), do NCPC, tanto mais que da acta da audiência de julgamento não consta o início e termo de cada um dos depoimentos prestados, mas apenas a sua duração total – art. 157.º, n.º 6, do NCPC.”) – não se encontra disponível para consulta in www.dgsi.pt; de 10 de dezembro de 2015 (Fernanda Isabel Pereira), proc. n.º 352/12.0TBVPA.G1.S1 (“I – A impugnação da decisão sobre a matéria de facto está dependente da observância, pelo recorrente, dos requisitos impugnatórios constantes do artigo 640.º do NCPC (2013), sob pena de rejeição do recurso. II – Porém, o ónus de indicação exacta das passagens da gravação em que se funda o recurso, previsto no n.º 2 do citado normativo – sendo um ónus secundário – destina-se, não tanto a fundamentar e delimitar o recurso, mas a possibilitar um acesso mais ou menos facilitado aos meios de prova gravados relevantes para a apreciação da impugnação deduzida. III – A indicação, feita pelo recorrente, dos pontos de facto que considera incorrectamente julgados, dos meios probatórios que impunham decisão diversa, bem como do sentido da decisão que, no seu entender, deveria ter sido proferida – acompanhada da menção do início e do termo da gravação de cada um dos depoimentos invocados como suporte da impugnação e da transcrição, na alegação, das suas passagens relevantes – satisfaz a referida exigência da lei adjectiva.”) – não se encontra disponível para consulta in www.dgsi.pt.
[14] Cf. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 30 de junho de 2020 (Graça Amaral), proc. n.º 4420/18.6T8GMR-B.G2.S1 (“I - É sindicável em sede de revista a recusa da Relação em conhecer do recurso da matéria de facto com fundamento no incumprimento de ónus processual previsto no art. 640.º do CPC, por se tratar de uma situação de violação da lei processual reconduzida à questão da legalidade da interpretação feita pelo tribunal da Relação quanto ao poder/dever que a lei lhe confere para reapreciar a prova gravada. II - A exigência legal imposta ao recorrente de especificar os pontos de facto que pretende impugnar constitui corolário do princípio do dispositivo no que respeita à identificação e delimitação do objecto do recurso, pelo que não pode deixar de ser avaliada sob um critério de rigor tendo em conta o espírito do sistema radicado na necessidade de preservar o uso sério do regime do recurso da matéria de facto por forma a impedir a utilização abusiva de instrumentos processuais com efeitos dilatórios. III - Incumpre o ónus de especificação dos concretos pontos de facto incorrectamente julgados o recorrente que nas alegações (corpo e respectivas conclusões) não só não fez referência específica à circunstância de se encontrar a impugnar factualidade não provada, como não indicou nem destacou qualquer matéria que permitisse identificar/delimitar a efectiva factualidade que entendia mal julgada pelo tribunal de 1.a instância. IV - Não viola o dever de reapreciação da matéria de facto a decisão do tribunal da Relação que não conheceu a matéria fáctica que o apelante pretendia que fosse aditada ao factualismo provado (factos complementares e concretizadores de factos essenciais) tendo subjacente a sua irrelevância para o conhecimento do mérito da causa (por a mesma, por si só, na ausência de demonstração de factualidade essencial para o efeito, não poder alterar o sentido da decisão, ou seja, afastar a qualificação da insolvência como culposa)”) – disponível para consulta in https://jurisprudencia.csm.org.pt/ecli/ECLI:PT:STJ:2020:4420.18.6T8GMR.B.G2/.
[15] Cf. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 14 de março de 2019 (Maria do Rosário Morgado), proc. n.º 8765/16.1T8LSB.L1.S2 – disponível para consulta in www.dgsi.pt.
Vide ainda, a este propósito, Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 5 de fevereiro de 2020 (Nuno Pinto Oliveira), proc. n.º 4821/16.4T8LSB.L1.S2 - (“I - O princípio de que o juiz deve examinar toda a matéria de facto alegada pelas partes, analisando todos os pedidos formulados, está sujeito a uma restrição, e a restrição reporta-se às matérias e aos pedidos que forem juridicamente irrelevantes. II - Estando em causa factos irrelevantes, não faz qualquer sentido ponderar sequer a sua inserção na matéria de facto provada. III - O acórdão da Relação que altera os valores individuais da indemnização por danos não patrimoniais fixados na 1.ª instância e não impugnados por nenhuma das partes incorre em ofensa de caso julgado”) – disponível para consulta in https://jurisprudencia.csm.org.pt/ecli/ECLI:PT:STJ:2020:4821.16.4T8LSB.L1.S2/; de 28 de janeiro de 2020 (Pinto de Almeida), proc. n.º 287/11.3TYVNG-G.P1.S1 (“(…) IV - Decorre do princípio da limitação dos actos (art. 130.º do CPC), que, no processo, apenas devem ser praticados os actos que se revelem úteis para a resolução do litígio. Este princípio, previsto para os actos processuais em geral, deve ser também observado no âmbito da apreciação da impugnação da decisão de facto, se se verificar que daí não advirá qualquer elemento com relevo para a decisão de mérito”) – disponível para consulta in https://jurisprudencia.csm.org.pt/ecli/ECLI:PT:STJ:2020:287.11.3TYVNG.G.P1.S1/; de 14 de janeiro de 2020 (Jorge Dias), proc. n.º 154/17.7T8VRL.G1.S2 - (“I - Se existem factos que “não chegaram a ser valorados”, verificar-se-á, eventualmente, erro na apreciação da matéria de facto, ou falta a aplicação do direito aos factos, o que constituirá omissão de pronúncia, mas não violação de caso julgado. II - O conceito de passagem com “normalidade” é um conceito apreendido pela generalidade das pessoas. As pessoas que conhecem o caminho sabem responder se quem por lá transita, pessoas, animais ou, carros, incluindo tratores, o faz de uma maneira normal, “com normalidade”. III - É irrelevante julgar, como provados, factos tidos como inócuos, (não sendo lícito realizar no processo actos inúteis, como determina o art. 130.º do CPC). IV - Não se verificando ofensa de uma disposição expressa de lei que exija certa espécie de prova para a existência do facto, nem havendo lei que, no caso, fixe a força de determinado meio de prova, não há lugar a recurso de revista incidindo sobre a matéria de facto.”) - não se encontra disponível para consulta na www.dgsi.pt; de 13 de julho de 2017 (Fonseca Ramos), proc. n.º 442/15.7T8PVZ.P1.S1 (“I - Nos termos do art. 5.º, n.º 1, do CPC, às partes cabe alegar os factos essenciais que constituem a causa de pedir e aqueles em que se baseiam as excepções invocadas. II - Factos não alegados pelas partes podem, no entanto, ser considerados pelo juiz. Esses factos, são os factos instrumentais que resultarem da instrução da causa (n.º 2 al. a) do art. 5.º), e os que sejam complementares ou concretizadores dos que as partes alegaram, quando resultarem da instrução da causa, desde que sobre eles as partes tenham tido a possibilidade de se pronunciar – al. b). III - Os factos que resultam da discussão da causa, como decorre da formulação do n.º 2 do art. 5.º do CPC – “Além dos factos articulados pelas partes, são ainda considerados pelo juiz” – são factos, passe a expressão, que só foram descobertos, que só chegaram ao conhecimento do tribunal na fase instrutória da causa. IV - Os factos instrumentais, mesmo que não constem da alegação das partes, podem ser tidos em consideração pelo julgador se resultarem da instrução da causa. Não se nos afigura rigorosa a afirmação de que os factos sindicados pelos recorrentes – que foram por eles alegados na petição inicial e foram levados a debate em sede de instrução e julgamento - não devem ser objecto de julgamento em 2.ª instância, em sede de impugnação da matéria de facto, por serem instrumentais e o julgamento na 2.ª instância constituir um acto inútil. V - A consideração da inutilidade da reapreciação do julgamento da matéria de facto, quando a parte que recorre cumpriu o ónus de que depende a apreciação da sua pretensão, só pode/deve ser recusada em casos de patente desnecessidade.”) – disponível para consulta in http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/4bf735390cc090ee8025815c004762af?OpenDocument.