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CONDOMÍNIO
ACTA DE ASSEMBLEIA
TÍTULO EXECUTIVO
FALTA DE DELIBERAÇÃO
Sumário
A acta da assembleia de condóminos da qual simplesmente consta a aprovação da lista de dívidas dos condóminos apresentada à assembleia pela administração do condomínio, desacompanhada da deliberação que fixou as quotas apresentadas como em dívida, não constitui título executivo nos termos e para efeitos do disposto no n.º 1 do art. 6.º do DL n.º 268/94, de 25 de Outubro.
Texto Integral
Acordam os juízes que compõem este colectivo do Tribunal da Relação de Lisboa:
I. Relatório
Condomínio do Centro Comercial …, nos autos m.id., veio instaurar execução contra N…, proprietário da loja n.º …, a que corresponde a fracção …, do prédio constituído em propriedade horizontal sito na Rua …; para pagamento da quantia de €10.869,52€, no requerimento executivo melhor discriminada quanto à sua composição.
Em síntese invocou no requerimento executivo que o “referido prédio tem um condomínio instituído; 4 - Compete à administração do condomínio a atribuição legal de cobrar as receitas comuns (…); 5 - Foram realizadas Assembleias de Condóminos/proprietários, no âmbito das quais foram aprovados os orçamentos anuais e as contas dos exercícios bem como o valor das contribuições mensais para as despesas comuns, conforme os Documentos n.º 1 e 2 que ora se juntam e se dão por integralmente reproduzidos; 6 - Foram, ainda, reconhecidas em acta as dívidas referentes à fracção supra referida em 1, com a respectiva indicação da origem e valor”.
Concretizando, invocou: “7 - O Executado não pagou as quotizações que, de seguida, se discriminam: - 954,00 € referentes aos meses de Janeiro a Dezembro do ano de 2002, à razão de 79,50 € por mês; - 954,00 € referentes aos meses de Janeiro a Dezembro do ano de 2003, à razão de 79,50 € por mês; - 954,00 € referentes aos meses de Janeiro a Dezembro do ano de 2004, à razão de 79,50 € por mês; - 954,00 € referentes aos meses de Janeiro a Dezembro do ano de 2005, à razão de 79,50 € por mês; - 954,00 € referentes aos meses de Janeiro a Dezembro do ano de 2006, à razão de 79,50 € por mês; - 954,00 € referentes aos meses de Janeiro a Dezembro do ano de 2007, à razão de 79,50 € por mês; - 954,00 € referentes aos meses de Janeiro a Dezembro do ano de 2008 também à razão de 79,50 € por mês. (…)”.
Com o requerimento executivo foi junta a Acta número vinte e quatro, de 24.6.2009.
Foi proferido despacho que mandou notificar “o exequente para, em 10 dias, juntar aos autos: - documento comprovativo da qualidade de condómino dos executados; - cópia certificada das actas relativas às assembleias onde foi aprovado o valor devido para os anos e meses de 2002 a 2004 e 2006 a 2009, a título de prestação de condomínio”.
O exequente veio a juntar a acta número vinte e um, de 8 de Março de 2004 (data em que não foi reunida a maioria necessária) para deliberações válidas da Assembleia de Condóminos) e a acta número vinte e dois, de 15 de Março de 2004.
Nesta lê-se, a dado passo: “Prestados os esclarecimentos devidos sobre as contas e sobre as dívidas acumuladas dos condóminos e dos lojistas, a Assembleia deliberou por unanimidade: - a) Aprovar as contas do exercício de dois mil e três, apresentadas pela Administração; b) Aprovar a relação de dívidas ao condomínio, apresentadas pela Administração, que seguidamente se transcreve, as quais deverão ser cobradas por via judicial (…)”.
Mais à frente lê-se: “€ 1908,00 (…) devidos por A…, inquilino da loja … – Fracção … – referentes aos meses de Janeiro a Dezembro de dois mil e dois e a Janeiro a Dezembro de dois mil e três, à razão de setenta e nove euros e cinquenta cêntimos por mês”.
Mais à frente lê-se: “Seguidamente o Presidente da Mesa pôs à discussão o ponto dois da ordem de trabalhos, tendo sido eleita a administração para o ano de dois mil e quatro, constituída pelos membros seguintes (…) Os Administradores eleitos foram investidos de imediato no exercício das suas funções. (…) Iniciada a discussão do orçamento para o ano de dois mil e quatro, os condóminos consideraram inoportuno alterar as quotizações em vigor. Assim, a Assembleia Geral deliberou por unanimidade manter no ano de dois mil e quatro o orçamento aprovado para os anos de dois mil e dois e dois mil e três, no montante mensal de €12.223,49 (…) e, em consequência, fixou quotizações mensais de condomínio de valor igual às aprovadas para o ano dois mil e dois, as quais constam da acta número catorze, de vinte e oito de Janeiro de dois mil e dois, a qual se dá por reproduzida para os legais efeitos”.
Foi ainda junta a acta número vinte e três de 10.3.2005, onde se volta a ler “Prestados os esclarecimentos devidos sobre as contas e sobre as dívidas acumuladas dos condóminos e dos lojistas, a Assembleia deliberou por unanimidade: - a) Aprovar as contas do exercício de dois mil e três, apresentadas pela Administração; b) Aprovar a relação de dívidas ao condomínio, apresentadas pela Administração, que seguidamente se transcreve, as quais deverão ser cobradas por via judicial tendo por título executivo a presente acta (…)”.
Nela consta ainda “N… proprietário da loja …, correspondente à fracção …, é devedor de 954,00€ referentes aos meses de Janeiro a Dezembro do ano de 2004, à razão de 79,50€. A este valor acresce 10% por cada mês de atraso, a título de sanção pecuniária compulsória, prevista nos artigos 11º n.1 e 27º n.6 do regulamento em vigor”.
A Exequente juntou ainda certidão do registo predial, com menção da constituição em propriedade horizontal e enunciação das permilagens relativas às diversas fracções (sendo para a fracção … a permilagem de 1.22)
Em 8.10.2010 o tribunal, declarando verificar “que não foi dado integral cumprimento ao despacho que antecede” proferiu despacho que renovou o anterior, o que suscitou pedido de aclaração por parte da Exequente, para perceber exactamente o que estaria em falta.
O tribunal proferiu despacho do seguinte teor: “Verificando-se que apenas foram juntas as actas de 2004, 2005 e 2009, quando foram solicitadas as actas relativas às assembleias onde foi aprovado o valor devido para os anos e meses de 2002 a 2004 e 2006 a 2009, a título de prestação de condomínio, julga-se ter aclarado o despacho que antecede”.
A Exequente veio então esclarecer:
- a acta nº 22, aprovada no dia 8 de Março de 2004, (…) refere, na alínea b) da 3ª página, que a Assembleia deliberou por unanimidade “Aprovar a relação de dívidas ao condomínio (…) as quais deverão ser cobradas por via judicial (…) Por outro lado, na 3ª linha da 12º página da mesma acta, faz-se menção expressão ao valor em dívida, a título de prestação de condomínio quanto à loja nº … (…).
A Exequente fez idênticas demonstrações quanto à acta nº 23 e quanto à nº 24, alinhando ainda que nesta última nas páginas 24 e 25 se referia “que a Assembleia actualizou as quotizações de condomínio, e, ainda, que a loja nº … – fracção “…” teve a respectiva quotização actualizada para o valor de €63,60 (sendo este o valor de quotização devido para os anos subsequentes)”.
Foi então proferida, em 30.11.2010, a seguinte decisão:
“A exequente, Administração do Condomínio do Centro Comercial …, intentou acção comum executiva contra N…, por forma a obter o pagamento de €10.869,52, relativos a contribuições de condomínio não pagas relativas aos anos de 2002 a 2008, alegando que o executado é o proprietário da loja n.º … a que corresponde a fracção “…”, não pagando as quotas de condomínio. Notificado para juntar aos autos documento comprovativo da qualidade de condómino do executado e cópia certificada das actas relativas às assembleias onde foi aprovado o valor devido para os anos e meses em dívida a título de prestação de condomínio, o exequente juntou algumas actas, bem como certidão do registo. Cumpre apreciar. Preceitua o art. 45º do CPC que “toda a execução tem por base um título, pelo qual se determinam o fim e os limites da acção executiva”. Nos termos conjugados dos arts. 46º, al. d) do CPC e 6º do DL 268/94, de 25 de Outubro, “A acta da reunião da assembleia de condóminos que tiver deliberado o montante das contribuições devidas ao condomínio ou quaisquer despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns e ao pagamento de serviços de interesse comum, que não devam ser suportadas pelo condomínio, constitui título executivo contra o proprietário que deixar de pagar, no prazo estabelecido na sua quota-parte”. Donde, só é título executivo a acta da assembleia de condóminos que tiver deliberado o montante das contribuições, já não o sendo aquela que refira que se encontra em dívida determinada quantia, funcionando aquela como um pressuposto desta. Por outro lado, nos termos do art. 1424º do CC “as despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns do edifício e ao pagamento de serviços de interesse comum são pagas pelos condóminos em proporção do valor das suas fracções”, sendo, como decorre da lei, condóminos os proprietários. Cotejando aquilo que se vem de explanar com as actas constantes dos autos, constata-se que as actas apresentadas pela exequente como título executivo não reúnem as características referidas, já que não aprovam os montantes devidos a cada condómino, mas sim o montante que estará em dívida. Assim, apresentando a exequente a referida acta como título executivo, desacompanhada da acta onde se deliberou o montante das contribuições devidas ao condomínio ou qualquer despesa necessária à fruição das partes comuns do edifício, carece a mesma de título executivo quando interpõe os presentes autos de execução. Assim sendo, conclui-se pela verificação de uma situação de inexistência de título executivo, o que acarreta o indeferimento liminar do requerimento inicial, nos termos do art. 812º-E, nº 1, al. a) do CPC. Pelo exposto, ao abrigo do disposto no art. 812º-E, nº 1, al. a) do CPC, indefiro liminarmente o requerimento executivo. Custas pela exequente, nos termos do art. 446º do CPC”.
Inconformada, a Exequente interpôs o presente recurso, formulando, a final, as seguintes conclusões:
“1. A sentença recorrida logra em manifesto equívoco de facto e é absolutamente contrária à lei e à jurisprudência dos Tribunais Superiores nestas matérias. 2. A ora Recorrente intentou a presente acção executiva dando como títulos executivos as actas das Assembleias de Condóminos/proprietários número 21,22, 23 e 24, no âmbito das quais foram aprovados os orçamentos anuais e as contas dos exercícios bem como o valor das contribuições mensais para as despesas comuns. 3. Sendo que, nas referidas actas, foram, ainda, reconhecidas as dívidas referentes à loja n.º … – fracção “…”, propriedade do Executado, com a respectiva indicação da origem e valor. 4. Não obstante, foi o requerimento executivo indeferido liminarmente pelo tribunal a quo com a fundamentação de que “só é título executivo a acta da assembleia de condóminos que tiver deliberado o montante das contribuições, já não o sendo aquela que refira que se encontra em dívida determinada quantia, funcionando aquela como pressuposto desta.” 5. A questão que se coloca é a de saber se as actas dadas à execução constituem ou não títulos executivos que sirvam de base à presente execução. 6. Refere o n.º 1 do artigo 45.º do C.P.C. que “toda a execução tem por fim um título, pelo qual se determinam o fim e os limites da acção executiva.” 7. Por outro lado, o n.º 1 do artigo 6.º do DL 268/94 de 25 de Outubro dispõe que “A acta da reunião da assembleia de condóminos que tiver deliberado o montante das contribuições devidas ao condomínio ou quaisquer despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns e ao pagamento de serviços de interesse comum, que não devam ser suportadas pelo condomínio, constitui título executivo contra o proprietário que deixar de pagar, no prazo estabelecido, a sua quota-parte” (sublinhado nosso). 8. Cumpre analisar o que significa a expressão “contribuições devidas ao condomínio” e, especialmente, a palavra “devidas” ou, por outras palavras, se a mesma inclui as comparticipações a pagar por cada condómino que já estão vencidas e não pagas e, como tal, reconhecidas em deliberação de Assembleia de Condóminos. 9. Ora, refere o Acordão do Tribunal da Relação de Lisboa de 18 de Março de 2010 veio responder a essa questão ao explicar que “não faz sentido atribuir força executiva à acta em que se delibera o montante da quota parte das contribuições que cabe a cada condómino pagar e já não à acta em que, por um condómino não ter cumprido o deliberado, por não ter pago as contribuições que lhe respeitam, se delibera sobre o valor da sua dívida e se encarrega o administrador de proceder à sua cobrança judicial, como se fosse de desresponsabilizar aquele que efectivamente não cumpriu as suas obrigações, até porque, pela própria natureza das coisas, só quando o condómino não tenha pago, a assembleia está em condições de deliberar sobre o montante da respectiva dívida e se deve ou não o administrador instaurar a acção tendente à sua cobrança”. 10. Concluindo, ainda, o mesmo Acordão que “independentemente da leitura mais redutora que possa fazer-se do artigo 6.º, 1 do DL 268/94, defender-se que a acta da assembleia de condóminos em que se delibera que, em determinado momento, este ou aquele condómino deve determinada importância referente às contribuições do condomínio a que está obrigado, não é título executivo é interpretação normativa que a finalidade da lei não consente, pois equivale à frustração da eficácia e agilização do regime de propriedade horizontal nela visadas, nomeadamente no que ao inadimplemento de condóminos descuidados ou relapsos respeita.” 11. No caso em apreço, as actas reúnem os requisitos previstos no n.º 1 do artigo 6.º do DL 269/94 na medida em que pelas mesma se mostra que a assembleia aprovou as contribuições já em dívida ao condomínio por parte do Executado. 12. Portanto, as actas das reuniões da assembleia de condóminos contêm, não só, e contra o julgado, uma deliberação sobre a aprovação mas, também, sobre a cobrança de “contribuições devidas ao condomínio” já em dívida à data da deliberação sobre a cobrança, tratando-se, por isso, de uma obrigação certa, exigível e líquida, visto que está qualitativa e quantitativamente determinada quanto ao seu objecto e que se encontra vencida. 13. É, pois, de considerar títulos executivos as actas dadas à execução. 14. Não pode, por isso, o Tribunal a quo decidir como decidiu uma vez que conheceu e decidiu de questões que não estão em conformidade com a legislação, doutrina e jurisprudência nacional. Nestes termos (…) deve julgar-se procedente o presente recurso e, em consequência, revogar-se a sentença recorrida, substituindo-se a mesma por outra que defira o requerimento executivo. (…)”.
O recurso foi admitido por despacho 24.1.2011, despacho em que também foi ordenada a citação do executado “para os termos do recurso e para os termos da causa, nos termos e para os efeitos do art. 234º-A, nº 4 do CPC”.
Os autos documentam a dificuldade até à citação edital, também relacionada com agente de execução e substituição dele, em nada que para aqui releve excepto para aflorar a razão de quase 10 anos de demora na subida do recurso a esta Relação.
Não foram produzidas contra-alegaões.
Corridos os vistos legais, cumpre decidir:
II. Direito
Delimitado o objecto do recurso pelas conclusões da alegação - artigo 635.º, n.º 3, 639.º, nº 1 e 3, com as excepções do artigo 608.º, n.º 2, in fine, ambos do CPC - a única questão a decidir é a de saber se as actas apresentadas pela Exequente constituíam título executivo, devendo ter sido ordenado o prosseguimento da execução em vez do indeferimento liminar do requerimento executivo.
III. Matéria de facto
A constante do relatório que antecede.
IV. Apreciação
Primeira nota: - a inconformidade do Recorrente por não ter sido considerada a menção, na acta de 2009, da fixação do valor das prestações condominiais é irrelevante, pois que, segundo o requerimento executivo, estavam a ser cobradas prestações devidas até ao final de 2008.
Isto posto, basta ler todas as actas juntas aos autos para perceber que, na perspectiva do tribunal recorrido, e já adiante diremos qual é a nossa, a acta que está em falta é a acta nº 14: - é que não basta numa acta seguinte dar-se como reproduzida acta anterior onde se fixaram as quotas de cada condómino porque, para o tribunal, encarregue de, antes de dar andamento a diligências executivas, verificar se o direito exequendo existe, essa menção de reprodução de uma acta anterior deixa-o completamente sem possibilidade de fazer a referida verificação.
Mesmo que, eventualmente, se pudesse considerar que, perante uma acta que aprova o orçamento anual e perante o documento do registo predial com a menção das permilagens, se pudesse chegar ao valor da quota condominial para cada ano/mês, bem visto o recurso não é sobre uma errada desconsideração dos factos documentados no processo que o recurso versa, mas antes sobre uma questão teórica, a de saber quais são os requisitos que a acta da assembleia de condóminos deve ter para constituir título executivo.
A jurisprudência citada pelo recorrente tem, face às circunstâncias que envolveram a subida do recurso, uma antiguidade relevante, encontrando-se na mesma jurisprudência outras decisões em sentido contrário.
Mas, em palavras muito simples, a questão é esta: - a acta tem de ter a demonstração concreta da fonte da obrigação – a assembleia deliberou que a quota deste condómino é “x”, a pagar neste período “y” – ou basta ter a menção de que se deliberou no sentido de que a dívida (por quotas não pagas) deste condómino é “z”?
É uma questão que nos remete para os próprios termos da planificação processual, digamos assim, do modo como o legislador processual pensou a adequação das realidades da vida carecidas de intervenção judicial a esta mesma intervenção, num conjugado estrutural de certeza e eficiência.
Antes de pensar nos problemas de gestão de interesses nem sempre coincidentes na contribuição monetária comum condominial, o legislador já tinha pensado que, perante múltiplos conflitos, se estamos numa fase em que se discute a própria existência dos direitos que são afirmados, temos de chamar para a resolução um determinado mecanismo – acção declarativa, para facilitar – mas se não é preciso, porque já está definida sem contestação entre as partes, a existência do direito, então o que precisamos é apenas convocar outro mecanismo, quando, apesar de pacífica também a existência da obrigação correspondente a esse direito, ela não foi voluntariamente cumprida e se trata de realizá-la coactivamente.
Este é o mecanismo básico da execução em contraponto à declaração, e a opção por um dos caminhos, ou noutra imagem, a chave de acesso a estas vias é o título executivo. Isto significa que o título executivo é, tem de apresentar-se como, o equivalente duma declaração de existência do direito.
Agora, quem diz, por referência ao título executivo, que os direitos existem, é o legislador, e não a parte. E é ainda que o sistema jurídico, salvo casos raros, não está pensado para declarações de autoridade de quem não a tem, ou seja, não compete ao particular declarar o seu próprio direito. E finalmente é ainda que declarar um direito e declarar a correspondente obrigação como não cumprida são coisas diferentes.
Ou dito de modo muito simples, declarar que alguém nos deve não é garantia que nos deva. Portanto, e indo assim às declarações constantes das actas, quando é apresentada a lista dos débitos e a assembleia a aprova, o que está a ser dito é que o condómino “w” não pagou, o que é coisa diferente de dizer que o condomínio tinha direito a esse pagamento.
E se conjugarmos isto com a tal pedra primeira da construção processual do corpo declarativo e do corpo executivo, já fica clara a nossa opção, que é coincidente com a posição defendida na decisão recorrida.
Esta posição é maioritária na jurisprudência.
Lê-se no sumário do recente acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 1.10.2019 proferido no processo nº 14706/14.3T8LSB.L1.S1:
“A ata da assembleia de condóminos da qual consta uma deliberação que se limita a reconhecer a existência de uma dívida dos condóminos/executados relativa à falta de pagamento de contribuições, referida como existente pela administração, não constitui título executivo nos termos e para efeitos do disposto no n.º 1 do art. 6.º do DL n.º 268/94, de 25-10”.
Para uma visão abrangente da diversidade de posições jurisprudenciais mas simultaneamente para se perceber a maior queda da jurisprudência recente para a posição consagrada na decisão recorrida, citamos, com a devida vénia, parte do texto do acórdão desta Relação proferido no processo nº 27228/10.2T2SNT-D.L1-2, em 24.4.2019:
“Nas palavras de José Lebre de Freitas [6] ”o acertamento é o ponto de partida da ação executiva, pois a realização coativa da prestação pressupõe a anterior definição dos elementos (subjectivos e objectivos) da relação jurídica de que ela é objecto. O título executivo contém esse acertamento; daí que se diga que constitui a base da execução, por ele se determinando «o fim e os limites da ação executiva» (art. 10-5), isto é, o tipo de ação (…) e o seu objecto, assim como a legitimidade, ativa e passiva, para ela (art. 53-1), e, sem prejuízo de poder ter que ser complementado (arts. 714 a 716), em face dele se verificando se a obrigação é certa, líquida e exigível (art. 713)”.
Ora, na configuração do título como causa de pedir na acção executiva, a causa de pedir deixaria “de ser o facto jurídico de que resulta a pretensão do exequente (art. 581-4) para passar a ser o próprio título executivo (que, como vimos, dela constitui prova ou acertamento)”.
Todavia, “não constituindo o título executivo um ato ou facto jurídico, esta construção não se harmoniza com o conceito de causa de pedir”, sendo que “a recusa da identificação do título com a causa de pedir é largamente dominante na jurisprudência” [7].
E, acrescenta o mesmo autor [8], “o título executivo ganha a relevância especial que a lei lhe atribui da circunstância de oferecer a segurança mínima reputada suficiente quanto à existência do direito de crédito que se pretende executar”.
Nas palavras de Antunes Varela [9], “o título executivo reside no documento e não no acto documentado, por ser na força probatória do escrito, atentas as formalidades para ele exigidas, que radica a eficácia executiva do título (quer o acto documentado subsista, quer não)”.
Exemplificativamente, refere-se no douto aresto do STJ de 02/12/2013 [10] que “a causa de pedir é o acto ou facto jurídico, simples ou complexo, mas sempre concreto – in casu uma sequência de negociações havidas entre o Autor e os Réus, com vista á aquisição de imóveis, que se frustraram no seu objectivo principal – de onde emerge o direito que aquele Autor, aqui Recorrido, pretende fazer valer nesta acção, traduzido do direito de crédito do Autor sobre os Réus, cfr Manuel de Andrade, Noções Fundamentais de Processo Civil, 1976, 111; Antunes Varela Miguel Bezerra, Sampaio e Nora, Manual de Processo Civil, 2ª edição, 244/246; Ac Stj de 3 de Junho de 2004 (Relator Salvador da Costa) e de 6 de Julho de 2004 (Relator Araújo de barros), in www.dgsi.pt”.
E, acrescenta-se, de forma concludente, em aresto do mesmo Alto Tribunal, datado de 10/12/2013 [11] que “na execução a causa de pedir não é o próprio título executivo, mas antes os factos constitutivos da obrigação exequenda reflectidos naquele: o título executivo terá de representar o acto jurídico pelo qual o executado reconhece uma obrigação para com o exequente” (sublinhado nosso) [12].
Ora, in casu, a acta de reunião da assembleia de condóminos em que se encontram fixadas as contribuições a pagar ao condomínio constitui efectivo documento particular que se constitui em título executivo por disposição especial da lei – cf., a alínea d), do artº. 46º, do Cód. de Processo Civil, na redacção anterior às alterações introduzidas pela Lei nº. 41/2013, aplicável ao caso concreto, no que concerne à matéria respeitante aos títulos executivos, por força do prescrito no nº. 3, do artº. 6º deste diploma [13].
É o que resulta, nomeadamente, do prescrito no nº. 1, do artº. 6º, do DL nº. 268/94, de 25/10, ao estatuir que “a acta da reunião da assembleia de condóminos que tiver deliberado o montante das contribuições devidas ao condomínio ou quaisquer despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns e ao pagamento de serviços de interesse comum, que não devam ser suportadas pelo condomínio, constitui título executivo contra o proprietário que deixar de pagar, no prazo estabelecido, a sua quota-parte” (sublinhado nosso), acrescentando o nº. 2, do mesmo normativo incumbir ao administrador o dever de “instaurar acção judicial destinada a cobrar as quantias referidas no número anterior”.
Deste modo, a acta da reunião da assembleia de condóminos, como documento escrito representativo de uma declaração, impõe a conclusão “de que o título executivo extrajudicial ou judicial impróprio é um documento, que constitui prova plena para fins executivos, e que a declaração nele representada tem por objecto o facto constitutivo do direito de crédito ou é, ela própria, este mesmo facto”.
Pelo que, acrescenta-se, “o título executivo extrajudicial constitui documento probatório da declaração de vontade constitutiva de uma obrigação ou duma declaração directa ou indirectamente probatória do facto constitutivo duma obrigação e é este seu valor probatório que leva a atribuir-lhe exequibilidade” [14].
Ora, assim sendo, na situação em apreciação, o título é a própria acta, e esta não se confunde certamente com a causa de pedir que lhe subjaz, traduzida nos factos constitutivos da obrigação exequenda, de que faz parte o estatuto dos condóminos, as obrigações daí decorrentes de tal titularidade e a vinculação ao pagamento das contribuições e demais despesas deliberadas.
No que concerne à definição do que são os encargos do condomínio, urge atentar ao prescrito no nº. 1, do artº. 1424º, do Cód. Civil, aí se referenciando que “salvo disposição em contrário, as despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns do edifício e ao pagamento de serviços de interesse comum são pagas pelos condóminos em proporção do valor das suas fracções”. Despesas estas que, normalmente, são fixadas anualmente no orçamento do condomínio, e discutidas na Assembleia de Condóminos – cf., artº. 1431º, do Cód. Civil.
Deste modo, o referenciado quadro legal atribui força executiva à acta da assembleia de condóminos, sem que o condomínio, de forma a obter o reconhecimento do seu crédito e consequente pagamento deste, tenha que lançar previamente mão da acção declarativa, permitindo, assim, desde logo, a instauração de acção de natureza executiva contra o proprietário da fracção, condómino devedor, relativamente à contribuição deste, na proporção do valor da sua fracção, para as despesas elencadas naquele artº. 1424º, do Cód. Civil, ou seja, despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns e ao pagamento de serviços de interesse comum.
Finalidade subjacente a tal legal solução terá sido a de facilitar/agilizar a cobrança das dívidas do condomínio, sem que necessariamente este tenha que recorrer previamente ao processo declarativo, sempre mais demorado e sujeito a delongas várias.
Nas palavras do douto aresto da RP de 04/06/2009 [15], “sabendo-se das relações complexas que envolve a propriedade horizontal e das dificuldades (frequentes) criadas ao seu funcionamento, nomeadamente pela actuação relapsa e frequente de alguns condóminos, avessos a contribuir para as despesas comuns, sem que, não obstante, prescindam ou deixem de aproveitar dos benefícios da contribuição dos outros (revelador de, pelo menos, algum deficit de civismo), é criado um instrumento que facilite a cobrança dos valores devidos ao condomínio, legalmente previstos e regularmente aprovados”.
Todavia, quais os requisitos ou pressupostos que devem enformar tal(is) acta(s) da assembleia de condóminos para que se possa(m) constituir como título executivo, ou seja, para que se possam considerar documentos extrajudiciais aos quais é legalmente atribuída força executiva?
Uma breve análise do entendimento jurisprudencial acerca desta matéria, demonstra que inexiste unanimidade quanto aos requisitos/pressupostos em equação, nomeadamente no que concerne à amplitude exigida no seu preenchimento.
Refere o douto Acórdão desta Relação de 17/05/2018 [16] que “a expressão “contribuições devidas” pode significar contribuições fixadas e a cargo de cada condómino, a liquidar, periodicamente, em regra, mensalmente ou que se reportam às contribuições que estejam já vencidas e não pagas e, como tal, reconhecidas em assembleia de condóminos ou, então, abranger umas e outras”.
Assinala, então a divergência jurisprudencial existente acerca do preenchimento de tal conceito, enunciando que “alguns arestos defendem que só é título executivo a acta de assembleia de condóminos que documente deliberação onde sejam quantificados os valores em dívida pelo condómino a ser demandado - cfr. ac. RL de 7/7/2011, proc. 42780/06.9YYLSB.L1-2; outros, entendem que a lei atribui força executiva só à acta que contenha deliberação da assembleia de condóminos que aprove as despesas que serão suportadas pelo condomínio e a quota parte que será devida por cada condómino, com indicação do prazo do respectivo pagamento, entendendo ser meramente complementar/desnecessária, a acta que liquide o que for já devido – cfr. Ac. RL de 30/6/2011, proc. 13722/10.9YYLSB, de 22/6/2010, proc. 1155/05.3TCLRS.L1-7, de 11/10/2012, proc. 1515/09OTBSCR.L1-2 e de 14/6/2012, proc. 26879/11.2YYLSB-A.L1-6; e outros defendem que qualquer uma das duas modalidades de acta, quanto ao seu conteúdo, supra enunciadas, goza de força executiva (é título executivo) – cfr. Ac. RL de 18/372010, proc. 85181/05.OYYLSB-A.L1-6, de 7/7/2011, proc. 42780/06.9YYLSB.L1-2 e RP de 24/2/2011, proc. 3507/06.2TBAI-A.P1”.
Conclui, então, sufragando o entendimento de que “constitui título executivo – contra o proprietário que deixar de pagar -, à luz do art. 6 DL 268/94 de 25/10, a acta da assembleia de condóminos que documente deliberação onde nasce a obrigação de pagamento de contribuição por parte do condómino (fixa a quota-parte de comparticipação de cada condómino nas despesas comuns), estipule o prazo e o modo de pagamento e não já a que declare, tão só, o montante da dívida.
Uma acta com este conteúdo comprova a constituição de uma obrigação, bem como a data do seu vencimento pelo que, decorrido o prazo de pagamento, documentará uma obrigação que é certa, e exigível e que poderá ser liquidada através do requerimento executivo, indicando-se as prestações não pagas/em falta e que estão em dívida, em consonância com o preceituado nos arts. 713 e 716/1 CPC”.
Pelo que, só uma acta com estas características tem força executiva, pois contém e traduz a fonte da obrigação em causa, ou seja, o facto com contornos jurídicos que lhe subjaz.
Donde se conclui que “a acta que reconhece tão só o valor da dívida - deliberação no sentido de que o condómino deve determinado montante ao condomínio (não pagamento da sua quota-parte deliberada em assembleia) -, não constitui título executivo porquanto, não cria qualquer obrigação e não fixa qualquer prazo para o seu pagamento, ignorando-se como foram calculados os montantes em dívida, onde e quando foram fixados, bem como o respectivo prazo de pagamento.
Assim, entende-se que “as contribuições devidas ao condomínio” abrange o valor das contribuições, a cargo de cada um dos condóminos, fixada e aprovada em assembleia de condóminos, na proporção do valor da sua fracção (permilagem), a liquidar, periodicamente e não pagas e não já a acta que se limite a declarar, tout court, o valor das contribuições que estejam vencidas e não pagas, ainda que reconhecidas em assembleia de condóminos” (sublinhado nosso).
Em sentido diferenciado, pronunciou-se douto Acórdão desta Relação de 07/04/2016 [17], reconhecendo o carácter não unívoco de tal posição jurisprudencial.
Referenciou, em concordância, que “toda a acta da assembleia de condóminos em que se delibere que, em determinado momento, este ou aquele condómino tem em dívida determinados montantes resultantes de contribuições ao condomínio ou quaisquer despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns e ao pagamento de serviços de interesse comum, pode servir como título executivo para o administrador instaurar a competente execução contra o condómino relapso” – v. Ac. R.P. de 02.06.1998, CJ, Tomo III, 190 e segs., Acs. R.C. de 20.06.2012 (Pº 157/10.2TBCVL-A. C1) e de 14.12.2010 (Pº 78/10.9TBMGR.C1); e Acs. R.L. de 18.03.2010 (Pº 85181/05.0YYLSB-A.L1-6) e de 07.07.2011 (Pº 42780/06.9YYLSB.L1-2)”.
Acrescenta que “as deliberações constantes das actas que servem de título executivo são susceptíveis de anulação a requerimento de qualquer condómino que não a tenha aprovado, no prazo de 10 dias contados da deliberação para os condóminos presentes ou contado da sua comunicação para os condóminos ausentes (nº 2 do artº 1433º do CC).
O direito de propor a acção de anulação caduca no prazo de 60 dias sobre a data da deliberação (nº 4 do artº 1435º 4 do CC)”.
Pelo que, o condómino que não impugnou a acta nos termos legalmente consignados, “não pode disso prevalecer-se tendo em conta o instituto do abuso de direito previsto no artigo 334º do Código Civil, porque a ela deu causa ou aceitou a forma como a mesma foi elaborada”.
Donde, “conferindo-se eficácia executiva às actas nas quais, designadamente, foi fixado o montante da obrigação a pagar, competirá ao devedor/executado demonstrar que a dívida não é devida, nomeadamente porque efectuou o seu pagamento, mediante a respectiva oposição à execução (…)”.
Vejamos, ainda que em súmula e de forma exemplificativa, o ponderável quadro jurisprudencial (todos in www.dgsi.pt) :
- Acórdão desta Relação de 22/01/2019 – Relator: Diogo Ravara, Processo nº. 3450/11.3TBVFX.L1-7 , no qual se referenciou que “do citado art. 6º, nº 1 do DL 268/94 também resultam requisitos de clareza e precisão no que diz respeito à definição dos elementos que devem constar na ata para que a mesma possa constituir título executivo.
Na verdade, tal ata terá que permitir quantificar, de forma clara, os montantes e os prazos de vencimento das obrigações em mora. Daí que a jurisprudência saliente que para que constitua título executivo a mesma tem que documentar a aprovação de uma deliberação da qual resulte uma obrigação pecuniária para o condómino e o respetivo montante, não bastando que dela resulte uma mera relação de dívidas ao condomínio”.
Pelo que, nas situações em que o exequente não apresente á execução a acta da assembleia de condóminos que fixou o valor da contribuição relativa á fracção em causa (mensal ou anual), limitando-se a constatar que está em dívida um valor global relativo a um determinado período, no que a este crédito concerne verifica-se a falta de título executivo ;
- Decisão Individual desta Relação de 01/03/2019 – Relator: Carlos Marinho, Processo nº. 1094/13.4YYLSB.L1-6 -, onde se defende ser título executivo “qualquer «acta da reunião da assembleia de condóminos que tiver deliberado o montante das contribuições devidas ao condomínio ou quaisquer despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns e ao pagamento de serviços de interesse comum, que não devam ser suportadas pelo condomínio». E esse título é utilizável desde que o proprietário tenha deixado de pagar (como é manifesto, inclui-se, aqui – porque ubi lex non distinguit nec nos distinguere debemus – a falta de pagamento integral ou meramente parcial, sendo que se trata, quer num caso quer no outro, de elemento circunstancial que não se espera encontrar nos títulos porque ulterior à sua formação)”.
Donde decorre deverem ser admitidos “como títulos executivos todas as actas de assembleias gerais de condóminos que imponham à Executada prestações inseríveis na previsão do art. 6.º acima referido, ou seja, com incidência sobre: a) contribuições devidas ao condomínio b) despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns ou c) despesas relativas ao pagamento de serviços de interesse comum”;
- Acórdão desta Relação de 29/11/2018 – Relatora: Teresa Prazeres Pais, Processo nº. 6642/17.8T8FNC.L1-8 -, no qual se defende que “atento o teor do citado artº 6º, nº 1, a força executiva da acta não depende de nela se fazer necessariamente constar o montante determinado, concreto, certo, da dívida de cada condómino, mas deve conter critério que permita que esse valor se determine. A acta pode conter o valor global devido ao condomínio (seja por contribuições correntes, seja para realização de despesas de conservação ou fruição das partes comuns, ou para pagamento de serviços de interesse comum), mas deve permitir que a cada condómino, pela simples aplicação da permilagem da sua fracção ao valor global, saber qual o montante que lhe toca (se outro critério não for expressamente deliberado). Quem tem de aprovar a despesa e a imputação é a assembleia e não outrem, nomeadamente o administrador, para quem aquela não deve remeter o encargo dessa determinação. A acta só constitui título executivo, enquanto contém a deliberação da assembleia que fixa a obrigação exequenda”.
Efectivamente, aduz-se, “sendo o título o instrumento documental da demonstração da obrigação exequenda, fundamento substantivo da execução, ou o correspondente à causa de pedir no processo declarativo, a prestação exigida terá de ser a prestação substantiva acertada no título ou, por outras palavras, o objecto da execução deve corresponder ao objecto da obrigação definida no título, ou seja, a acta da assembleia de condóminos terá que documentar a deliberação onde nasce a obrigação de pagamento de contribuição por parte do condómino (fixa a quota-parte de comparticipação de cada condómino nas despesas comuns), estipule o prazo e o modo de pagamento e não já a que declare, tão só, o montante da dívida” (parcial sublinhado nosso) ;
- Acórdão desta Relação de 12/04/2018 – Relatora: Maria Teresa Pardal, Processo nº. 2712/14.2TBOER-A.L1-6 -, onde se sumariou preencherem “os requisitos de exequibilidade previstos no artigo 6º do DL 268/94 de 25/10 as duas actas da reunião de condomínio de 2013 e de 2014 apresentadas à execução pelo exequente, uma vez que, na primeira, se delibera intentar acção de cobrança das quantias em dívida pelo condómino ora executado, com a discriminação do valor em dívida por cada ano até 2012, a proveniência da dívida e as fracções a que se referem e, na segunda, se torna a discriminar ainda mais detalhadamente o valor, a sua proveniência e a sua relação com as fracções em causa, acrescentando-se o valor devido no ano de 2013, entretanto vencido e se remete para a deliberação de intentar a respectiva acção tomada na acta anterior” (sublinhado nosso) ;
- Acórdão desta Relação de 22/03/2018 – Relator: Luís Correia Mendonça, Processo nº. 7606/16.4T8ALM.A.L1 – 8 -, o qual sufraga o entendimento exposto no douto aresto do STJ de 14/10/2014, no sentido de que a acta da assembleia de condóminos para valer como título executivo “apenas impõe que seja aprovado o montante certo da contribuição de modo que, pela simples aplicação da permilagem relativa a cada fracção da propriedade (ou de outro critério que haja sido aprovado) se determine o quantum devido por cada condómino”.
Deste modo, preenche-se o requisito da exequibilidade na situação em que o exequente junta “4 actas que aprovam o orçamento anual do condomínio para os anos de 2013 a 2016 e comparticipações mensais para o condomínio e respectivos valores com referência a permilagens que é possível claramente individualizar a partir do documento junto com o n.º 6”;
- Acórdão desta Relação de 26/01/2017 – Relator: Ilídio Sacarrão Martins, Processo nº. 1410/14.1YYLSB-A.L1-8 -, que define os seguintes requisitos de exequibilidade da acta da assembleia de condóminos:
-Deliberação sobre o montante das contribuições ou despesas devidas ao condomínio;
-Fixação da quota-parte devida por cada condómino;
-Fixação do prazo de pagamento respectivo.
Para as actas assumirem força executiva é necessário, desde logo, que fixem os montantes das contribuições devidas ao condomínio, o prazo de pagamento e a fixação da quota parte de cada condómino”.
Pois, de outro modo, não são idóneas a constituírem-se como título executivo, dado não reunirem “todos os requisitos da certeza, liquidez e exigibilidade”;
- Acórdão do STJ de 14/10/2014 – Relator: Fernandes do Vale, Processo nº. 4852/08.8YYLSB-A.L1.S1 -, onde se referencia, citando-se aresto da RP de 09/06/2010, que “para as actas da assembleia de condóminos assumirem força executiva é necessário, desde logo, que fixem os montantes das contribuições devidas ao condomínio, o prazo de pagamento e a fixação da quota-parte de cada condómino.
II – Porém, a exequibilidade desse título não demanda, necessariamente, a menção, na acta, do quantitativo exacto relativo à dívida de cada condómino, nomeadamente do condómino contra quem o administrador venha a instaurar a execução: necessário é que haja sido aprovado o montante certo da contribuição ou da despesa global de modo que, pela simples aplicação da permilagem relativa a cada fracção da propriedade (ou de outro critério que haja sido aprovado), se determine o «quantum» devido por cada condómino”.
Acrescenta-se, então, “não poder ser defendida diferente interpretação do correspondente regime legal, pelas seguintes e essenciais razões:
--- Desde logo, em homenagem ao elemento literal da interpretação da lei, já que a expressão empregue pelo legislador foi a de “deixar de pagar”, o que consente uma projecção “in futurum”, quando teria sido muito mais apropriada a expressão “tenha deixado de pagar”, caso tivesse em mente a omissão de pagamento de prestações já vencidas, com possibilidade da respectiva quantificação exacta, desde logo, na própria acta que constitui a fonte da obrigação exequenda;
--- Depois, e muito mais decisivamente, porque só a propugnada interpretação se compatibiliza com o propósito legislativo subjacente à criação deste novo título executivo – elemento teleológico da interpretação (art. 9º, nº1, do CC) –, dotando o condomínio dum instrumento célere e eficaz para a prossecução e realização das atribuições a seu cargo, dispensando-o do recurso a fastidiosas, longas e desgastantes acções declarativas, em ordem ao cumprimento coercivo das obrigações impendentes sobre condóminos recalcitrantes, oportunistas e relapsos;
--- Ainda porque para uma acta de assembleia de condóminos constituir título executivo não é necessário que, na mesma, se encontre já liquidada a dívida do condómino executado, já que é impossível fazer constar, desde logo, do documento que cria a obrigação de efectuar pagamentos futuros o valor daqueles que, nesse mesmo futuro, virão a ser incumpridos;
--- Caso o condomínio tenha incorrido em lapso, instaurando execução indevida, sempre o condómino perseguido poderá deduzir oposição à execução, nesta fazendo prevalecer a regularidade da sua situação perante o exequente, com as inerentes consequências legais;
--- A interpretação perfilhada é a única que permite considerar que, no caso, o legislador consagrou a solução mais acertada e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados (art. 9º, nº3, do CC), uma vez que a adversa, como, de resto, os presentes autos evidenciam, teria o condão de estimular a tendencial eternização de conflitos surgidos no seio do condomínio por não serem, atempadamente, pagas as prestações a cargo dos respectivos condóminos”;
- Acórdão da RP de 15/01/2019 – Relatora: Maria Cecília Agante, Processo nº. 13190/18.7T8PRT-A.P1 -, no qual se consignou que o “artigo 6º/1 do decreto-lei 268/94 não faz depender a força executiva da ata da assembleia de condóminos da liquidação do montante concreto, certo, da dívida de cada condómino, bastando que os dados da ata e dos demais documentos que a completam permitam determinar esse valor. Cremos até bastar a menção do valor global devido ao condomínio por contribuições correntes, pela realização de despesas de conservação ou fruição das partes comuns ou para pagamento de serviços de interesse comum, se os demais dados permitirem que cada condómino, pela aplicação da permilagem da sua fração ao valor global, conheça o montante que lhe diz respeito” (sublinhado nosso);
- Acórdão da RP de 27/05/2014 – Relator: Vieira e Cunha, Processo nº. 4393/11.6TBVLG-A.P1 -, onde se menciona que “uma acta que se limita a descrever um débito, não acompanhado das actas que o prevêem, contém um elemento acessório - a menção da dívida concreta, mas falta-lhe, de acordo com o artº6º nº1 D-L nº 268/94, o elemento principal, que é a deliberação da assembleia de condóminos quanto à fixação do montante das contribuições e respectivo prazo de pagamento.
Desta forma, como adequadamente se doutrinou no Ac.R.P. 13/9/2012, pº 4222/10.8TBGDM-A.P1, da base de dados oficial, relatado pelo Desemb. Amaral Ferreira, só por si, essa acta não pode servir de base à presente execução.
Na verdade, extrai-se do teor do citado artº6º nº1 que “a força executiva da acta não depende de nela se fazer necessariamente constar o montante determinado, concreto, certo, da dívida de cada condómino”, mas tal força executiva extrai-se antes do critério que permita que esse valor se determine, a achar pelo confronto da acta que o preveja.
Desta forma, se a acta pode conter o valor global devido ao condomínio (seja por contribuições correntes, seja para realização de despesas de conservação ou fruição das partes comuns, ou para pagamento de serviços de interesse comum), ela deve permitir que a cada condómino, pela aplicação da permilagem da sua fracção ao valor global, saber qual o montante que lhe toca (se outro critério não for expressamente deliberado)”.
Donde, conclui, “a acta constitui título executivo apenas se se mostrar acompanhada da deliberação da assembleia que fixa a obrigação exequenda, como o impõe a lei que criou este concreto título executivo” (fim de citação).
Concluímos assim que, também para nós, a acta da assembleia de condóminos da qual simplesmente consta a aprovação da lista de dívidas dos condóminos apresentada pela administração do condomínio, desacompanhada da deliberação que fixou as quotas apresentadas como não pagas, não constitui título executivo nos termos e para efeitos do disposto no n.º 1 do art. 6.º do DL n.º 268/94, de 25 de Outubro.
Considerando as actas com as quais foi instruído o requerimento executivo e respondidos subsequentemente os pedidos do tribunal, nelas não vemos a demonstração da existência do direito dado à execução, pelo que se confirma a decisão recorrida, improcedendo o recurso.
Tendo nele decaído, é o recorrente responsável pelas custas – artigo 527º nº 1 e 2 do CPC.
V. Decisão
Nos termos supra expostos, acordam negar provimento ao recurso e em consequência confirmam a decisão recorrida.
Custas pelo recorrente.
Registe e notifique.
Lisboa, 25 de Março de 2021
Eduardo Petersen Silva
Cristina Neves
Manuel Rodrigues