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CONTRATO DE EMPREITADA
DEFESA POR EXCEPÇÃO
COMPENSAÇÃO
CLÁUSULA PENAL
ÓNUS DA PROVA
Sumário
I- A omissão ou deficiência da gravação configura uma nulidade processual que a parte interessada terá de arguir autonomamente, sem prejuízo da iniciativa oficiosa do juiz durante a audiência, ao qual compete tomar as providências necessárias para que a lei seja cumprida (cfr. artigos 195º, 197º e 199º, n.º 2 do Código de Processo Civil). II- Conforme decorre do artigo 155º n.ºs 3 e 4 do Código de Processo Civil a gravação deve ser disponibilizada às partes no prazo de dois dias após a realização do respetivo ato e as partes devem invocar no prazo de 10 dias a falta ou deficiência da gravação, a contar da disponibilização. III- Decorrido o referido prazo de dez dias a contar do momento em que a gravação é disponibilizada e não sendo arguida a falta ou deficiência da gravação, o vicio decorrente da mesma fica sanado, não podendo oficiosamente ser conhecido pela Relação, nem podendo tal nulidade processual ser arguida no prazo de interposição de recurso e apenas nas próprias alegações de recurso. IV- Não deve haver lugar à reapreciação da matéria de facto quando o facto objeto da impugnação não for suscetível de, ter relevância jurídica à luz das diversas soluções plausíveis da questão de direito, sob pena de se proceder à prática de um ato inútil, que a lei não permite (artigo 130º do Código de Processo Civil). V- O devedor pode livrar-se da sua obrigação através da compensação, por extinção simultânea do crédito equivalente que possua sobre o seu credor. VI- A compensação depende dos seguintes requisitos: existência de créditos recíprocos, fungibilidade das coisas objeto das prestações e identidade do seu género e exigibilidade do crédito que se pretende compensar. VII- Nos termos do artigo 810º n.º 1 do Código Civil permite-se às partes a estipulação, por acordo e antecipadamente, do montante da indemnização devida em caso de mora, a denominada cláusula penal. VIII- Compete ao réu, que invoca a existência de um contra crédito decorrente do acionamento da cláusula penal fixada no contrato de empreitada, o ónus de provar a verificação do atraso na conclusão dos trabalhos, competindo depois ao autor (devedor), para obstar à aplicação da cláusula penal, demonstrar a sua ausência de culpa.
Texto Integral
ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES
I. Relatório
X - Sociedade Unipessoal de Carpintari, Lda. intentou contra Y Construções Lda procedimento de injunção, alegando, para tanto, que no exercício da sua actividade foi contratada pela Ré para efectuar uma empreitada de colocação de cozinhas, portas, roupeiros, móveis de casa de banho, escadas, rodapés, entre outros produtos de mobiliário, num empreendimento imobiliário que consistiu numa obra de requalificação de um edifício sito em Viana do Castelo, tendo a Ré aceitado os dois orçamentos que apresentou para esse efeito, no valor de €19.386,00 e de €5.773,00, respectivamente.
Mais alega que iniciou os trabalhos no dia 18 de janeiro de 2019 nas várias fracções do prédio, tendo dado por concluídos os trabalhos no início do mês de abril do mesmo ano, mas que se encontra em dívida o valor total de €6.998,00, por referência às facturas n.ºs 2/415 e 2/454, vencidas, respectivamente, em 18/02/2019 e em 01/04/2019, e que apesar de diversas vezes interpelada para o efeito a Ré ainda não pagou tal montante.
Pede por isso a condenação da Ré a pagar-lhe a quantia de €6.998,00, acrescida dos juros de mora vencidos, contados à taxa legal desde 01/04/2019, e dos vincendos, estes contados desde a citação, em ambos os casos até integral pagamento.
A Ré deduziu oposição alegando que a Autora não executou a totalidade dos trabalhos que lhe foram contratados – e que, alguns deles, apresentam defeitos – e que abandonou a obra, pelo que calculou e aplicou as multas previstas no contrato, devidas pelos atrasos verificados.
Mais alega que, na sequência da instalação e operação de fixação da estrutura e móveis de cozinha do T0 do 2.º andar, por incúria e negligência na execução da furagem da parede para fixação, os funcionários da Autora causaram danos (um furo) no depósito da estrutura do depósito de água da sanita, do que resultou infiltração de água no edifício que penetrou no apartamento do piso inferior, causando danos diversos que obrigaram e obrigam a intervenção imediata e urgente de reparação, no que teve que despender a quantia de €6.200 + IVA, que por compensação reclama nos presentes autos.
Conclui pugnando pela improcedência da acção – e consequente absolvição do pedido – ou, sem prescindir, pela procedência da excepção de compensação invocada.
Notificada para o efeito, veio a Autora responder às excepções invocadas na oposição, contrapondo, por um lado, que não acordou a inclusão de qualquer cláusula penal no contrato celebrado com a Ré e, por outro, que executou a obra sem quaisquer defeitos.
Veio a efetivar-se a audiência de discussão e julgamento com a prolação de sentença nos seguintes termos, no que concerne à parte dispositiva:
“Pelo exposto, na procedência parcial da acção, o Tribunal decide condenar a R. Y Construções Lda. a pagar à A. X - Sociedade Unipessoal de Carpintari, Lda. a quantia de 6.998,00 € (seis mil novecentos e noventa e oito euros) contra a eliminação simultânea dos defeitos identificados no ponto 18 do elenco de factos provados por parte da A., absolvendo-se a R. do mais peticionado. Custas a cargo de A. e R., fixando-se as mesmas em partes iguais (artigos 527.º, n.ºs 1 e 2, 528.º, n.º 4, e 607.º, n.º 6, todos do CPC). Fixo o valor da causa em 7.225,89 € – cfr. artigos 297.º, n.º 1, 299.º, n.º 1 e 306.º, n.ºs 1 e 2, do CPC. Registe e notifique”.
Após a prolação da sentença a Ré, por requerimento apresentado em 01/07/2020, veio arguir a nulidade da gravação da audiência por, pretendendo recorrer da sentença proferida, e fazê-lo quanto à matéria de facto, ter requerido, presencialmente, no dia 25 de Junho de 2020, cópia da mesma, tendo constatado que dela não constava a acareação entre o legal representante da A. e a testemunha F. P., realizada no passado dia 12 de Fevereiro de 2020, durante a tarde.
Em 07/07/2020 foi proferido despacho considerando que “(…) Posto isto, a alegada falta da gravação ocorreu na sessão de audiência final realizada no dia 12.02.2020, pelo que o prazo previsto no n.º 3 do artigo 155.º do CPC terminou em 14.02.2020 e o do n.º 4 em 24.02.2020. Acontece que só no dia 1.07.2020 é que a A. veio arguir a falta da gravação nos termos acima descritos, ou seja, num momento em que o prazo previsto no n.º 4 do artigo 155.º do CPC já tinha decorrido, com a consequente sanação da eventual nulidade decorrente da falta da gravação. Em face do exposto, conclui-se que o requerimento apresentado pela A. é extemporâneo, o que tem como consequência o indeferimento da pretensão formulada”.
Inconformada, apelou a Ré da sentença, concluindo as suas alegações da seguinte forma:
“CONCLUSÕES
1. A recorrente não se conforma com a decisão do Tribunal a quo que condenou a 1.ª Ré e aqui Recorrente, no pagamento à recorrida da quantia de €6.998,00 contra e eliminação simultânea dos defeitos identificados no ponto 18 do elenco de factos provados por parte da A. mas que julgou improcedente a existência de Credito a favor da recorrente, resultante da aplicação da clausula penal objecto do contrato, e operando e julgando procedente a respectiva compensação de créditos.
2. O meritíssima Juiz a quo fez incorrecta apreciação e julgamento dos factos e aplicação do Direito aos mesmos.
Questão Previa, Da Nulidade falta gravação prova:
3. O recorrente arguiu os termos e para os efeitos previstos no arts 155.º, n.4 do CPC, conjugado com o disposto no art. 640.º e 195.ºdo CPC a nulidade da Gravação da Audiência de Julgamento nos termos e com os fundamentos seguintes:
A Ré, pretendendo recorrer da sentença proferida e fazê-lo quanto à matéria de facto, requereu, presencialmente, no dia 25 de Junho de 2020, ao tribunal copia da gravação dos depoimentos prestados em audiência de julgamento para poder cumprir o obus estatuído na alínea b) do n.º 1 do art. 640.º do CPC. Apos respectiva analise constatou que da gravação requerida não constava a acareação entre o Legal representante da A e a testemunha F. P. realizada no dia 12 de Fevereiro de 2020, na parte da tarde ada audiência de julgamento – cfr teor da acta de audiência de julgamento cujo conteúdo se da como integralmente reproduzido.
4. Na verdade, “(…) Finda a inquirição da testemunha (F. P.) , foi pedida a palavra pelo Dr. N. M. e, sendo-lhe concedida, no seu uso fez um REQUERIMENTO para a acta, no sentido de requerer a acareação da testemunha acabada de depor com o legal representante da autora, pelo que foi concedida apalavra ao Dr. P. V. que, no seu uso respondeu a tal REQUERIMENTO tendo no mais dito nada ter a opor à requerida acareação, requerimento que o Meritíssimo Juiz de Direito, por DESPACHO, deferiu, conforme se encontra gravado através do sistema integrado de gravação digital disponível na aplicação informática em uso neste tribunal, consignando-se que o seu início ocorreu pelas 16 horas 50 minutos e 32 segundos e o seu termo pelas 16 horas 54 minutos e 03 segundos. * Após, o Meritíssimo Juiz de Direito continuou com a produção da prova: ACAREAÇÃO ENTRE A TESTEMUNHA e o LEGAL REPRESENTANTE DA AUTORA (artigo 523.º, do Código de Processo Civil) F. P. e P. P., devidamente identificados nos presentes autos. Foram advertidos que continuam sob juramento, uma vez que já se encontram ajuramentadas. As suas declarações encontram-se gravadas através do sistema integrado de gravação digital disponível na aplicação informática em uso neste tribunal, consignando-se que o seu início ocorreu pelas 16 horas 55 minutos e 37 segundos e o seu termo pelas 17 horas 11 minutos e 29 segundos.”
5. Acontece que o depoimento/ declaração de parte daquelas duas testemunhas (se mostrou, afinal, de grande importância para a decisão da matéria de facto, como resulta expressamente da respectiva fundamentação na douta sentença proferida e acareação entre ambas decisiva para aferir a credibilidade das mesmas e sentido da decisão.
6. Por isso a Ré se dirigiu logo ao tribunal para verificar se havia lapso na gravação facultada tendo sido constatado que, na verdade, da gravação das sessões de audiência de julgamento, fora omitida e estava em falta a gravação da identificada acareação.
7. a impossibilidade de ouvir esses depoimentos, de inequívoco relevo no processo, conduz a que, por um lado, a parte que discorda da decisão proferida sobre a matéria de facto e recorre não possa indicar as passagens da gravação que alicerçam essa sua discordância, e leva, por outro, a que o Tribunal da Relação fique impedido de os sindicar e valorar convenientemente, não podendo cumprir a finalidade legal pretendida com o recurso relativamente à reapreciação da prova gravada.
8. A inexistência do registo magnético dos depoimentos, aqui em concreto do teor da acareação, produzidos na audiência de julgamento consubstancia omissão de acto que a lei prescreve e que tem óbvia influência no exame e decisão da causa, uma vez que impede ou condiciona o cumprimento do artigo 640.º do Código de Processo Civil, vindo, por isso, a constituir uma nulidade secundária, de harmonia com o estatuído no artigo 195.º do mesmo diploma legal.
9.Nulidade que expressamente se arguiu.
10.. Foi proferido despacho que indeferiu a nulidade arguida – cfr despacho proferido nos autos e transcrito nas alegações.
11. Esta decisão importa uma interpretação do preceito do art. 155.º n.º 4 que restringe os direitos das partes e lhes impõe um ónus de controlo dos actos materiais de competência do tribunal e da secretaria que não lhe deve competir.
12. É verdade que “a omissão ou deficiência das gravações é, após a entrada em vigor do Código de Processo Civil aprovado pela Lei n.º 41/2013, um problema que deve ficar definitivamente resolvido ao nível da primeira instância, quer pela intervenção oficiosa do juiz que preside ao ato, quer mediante arguição dos interessados”.
13. Porém e como se refere tal obrigação impende tanto sobre o juiz oficiosamente como sobre as partes. No entanto, deve ser entendido como permitindo às partes, como o fez a recorrente, arguir a respectiva nulidade aquando da audição das gravações para interposição de recurso. Tal não contende com a resolução a nível de primeira instância.
14. Devia, assim, o despacho – proferido ao nível da primeira instancia pois a arguição foi autónoma do presente recurso - ter reconhecido a nulidade invocada e ordenar a repetição da acareação em causa voltando ulteriormente a proferir sentença.
15. Outra interpretação poe em causa os direitos das partes e a logicado regime de pagamento de custas judiciais – se fossem as partes a ter o ónus de controlo da qualidade das gravações porque pagam taxas e custas.
16. Como alias se decidiu no Acórdão do Tribunal da Relação do Porto - Processo 1277/12.4TBFLG.P1, sessão de 15 de Março de 2015: I - A deficiente gravação da prova produzida em audiência de discussão e julgamento constitui nulidade que pode ser arguida nas alegações de recurso quando a gravação não foi disponibilizada nos termos do art.º 155.º, n.º 3, do CPC e não se prove que o reclamante teve conhecimento da deficiência dez dias antes do termo das alegações.
II - A mesma nulidade deve ser conhecida pelo tribunal onde foi cometida, mantendo-se no âmbito do recurso no caso de ser indeferida.
17. Afronta a razão de ser da lei o entendimento de que o início da contagem do prazo para a invocação de eventual deficiência da gravação dos depoimentos fica dependente da livre iniciativa da parte quanto ao momento da obtenção da gravação, sem qualquer limitação temporal (para além da que decorreria do prazo de apresentação do recurso da decisão final)
18. E está sujeita ao regime especial de arguição previsto no n.º 4 do seu artigo 155.º, que diz: “A falta ou deficiência da gravação deve ser invocada no prazo de 10 dias a contar do momento em que a gravação é disponibilizada”, pelo que a presente arguição foi em tempo.
19. Temos por inquestionável que, à semelhança do regime anterior ao NCPC, a deficiência da gravação da prova, em termos de tornar imperceptível algum depoimento, ou a sua omissão podem constituir nulidade processual secundária, nos termos do n.º 1, in fine, do art. 195.º do actual CPC, uma vez que se trata de irregularidade que pode influir no exame ou na decisão da causa, pelo menos no que diz respeito ao reexame das provas produzidas na 1.ª instância a efectuar pela Relação, já que também julga de facto e está sujeita aos mesmos princípios do julgador daquela instância, competindo-lhe proceder a um novo julgamento da matéria de facto impugnada, em busca da sua própria convicção, assim assegurando o duplo grau de jurisdição sobre essa mesma matéria (cfr., entre outros, os acórdãos do STJ de 13/01/2005, proc. 04B4251, de 17/1/2008, proc. 07B4233 e de 15/05/2008, proc. 08Bl099, e desta Relação de 29/11/2006, proc. 0625494 e de 20/05/2008, proc. 1808/08, todos acessíveis em www.dgsi.pt, proferidos ao abrigo do regime anterior, igual, neste aspecto, ao actual).
20.. Todavia, a sua verificação pressupõe, desde logo, que tenha sido arguida em tempo.
21. A questão da tempestividade da arguição daquela nulidade, face ao regime do anterior CPC, está longe de ser pacífica nos nossos tribunais, tal como noticia o acórdão do STJ de 14/1/2010, proferido no processo n.º 4323/05.4TBVIS.C1.S1, disponível em www.dgsi.pt.
22. Porem, a aludida nulidade pode ser arguida dentro do prazo da alegação de recurso, salvo se se demonstrar que o reclamante teve conhecimento do vício mais de dez dias antes do termo desse prazo, podendo tal arguição ter lugar nessa própria alegação, por não ser exigível à parte (ou ao seu mandatário) que proceda à audição dos registos magnéticos antes do início do prazo do recurso (relativo à reapreciação da decisão sobre a matéria de facto), sendo que é no decurso deste prazo que surge a necessidade de uma análise mais cuidada do conteúdo dos referidos registos e, com ele, o conhecimento de eventuais vícios da gravação que podem ser alegados na própria alegação de recurso entretanto interposto (v.g. acórdãos do STJ de 9/7/2002, na CJ - Acs. STJ - Ano X, tomo II,págs.153a 155, de 15/5/2008, de 1/7/2008, de 23/10/2008e de 13/1/2009, estes proferidos nos processos 08B1099, 08A1806, 08B2698 e 08A3741, respectivamente, disponíveis em www.dgsi.pt, para além do já citado acórdão de 14/1/2010, no processo n.º 4323/05.4TBVIS.C1.S1, e desta Relação do Porto de 27/03/2006, de 27/11/2008 e de 16/12/2009, nos processos n.ºs 0651069, 0836973 e 217/05.1TJVNF.P1, disponíveis no mesmo sítio).
23. Defendemos sempre esta última tese, por se nos afigurar ser a mais correcta (cfr., entre outros, o acórdão de 1/4/2014, proferido no processo n.º 42/11.0TBCDR.P2).
24. E entendemos dever continuar a perfilhá-la, face ao regime do actual CPC, não obstante o disposto no n.º 4 do seu art.º 155.º, pelo menos, nos casos, como o presente, em que não foi disponibilizada a gravação nos termos do n.º 3 do mesmo artigo.
25. É que o citado DL n.º 39/95 não foi revogado pelo art.º 4.º da mencionada Lei n.º 41/2013, que aprovou o actual CPC. E também não se deve considerar tacitamente revogado, como defende alguma jurisprudência, visto o art.º 155.º não abarcar todos os aspectos regulados naquele diploma.
26. A disponibilização pressupõe, portanto, um acto expresso da secretaria com esse alcance. Só com essa disponibilização (que entendemos não ter de corresponder à entrega física do suporte sonoro, bastando a colocação ao dispor das partes do suporte já preparado), é que o mandatário da parte estará em condições de aceder aos elementos necessários para uma eventual reacção relativamente a falhas/incorrecções da gravação ou a despachos/decisões de que discorde.”
27. A falta de disponibilização da gravação impossibilita a contagem do prazo previsto no n.º 4 do referido art.º 155.º, por ser um pressuposto da sua aplicação.
28. O citado DL n.º 39/95 não contém qualquer preceito que fixe o prazo para arguição de omissões ou anomalias na gravação da prova.
29 A parte recorrente não esta sujeita a um especial dever de diligência, que lhe imponha a audição do registo áudio da prova nos dez dias imediatos ao recebimento do tribunal, quando ele se destina a servir de suporte a uma alegação de recurso para cuja elaboração dispõe de 40 dias (cfr. art.º 638.º, n.ºs 1 e 7 do NCPC[6]) e é suposto que a cópia recebida do tribunal não enferme de qualquer anomalia.
30. Como o vício se encontra oculto e o seu conhecimento, pela parte a quem pode prejudicar, depende de um acto desta (audição do registo) que é instrumental de um outro acto, este a praticar no processo (a apresentação da alegação de recurso), é razoável que o prazo para a parte invocar a irregularidade detectada e pedir que se desencadeiem as respectivas consequências (repetição da parte da prova omitida ou ininteligível) seja o mesmo em que pode apresentar a alegação de recurso, salvo se se demonstrar que o reclamante teve conhecimento do vício mais de dez dias antes do termo desse prazo.
31. Na verdade, se o recorrente dispõe de determinado prazo para minutar o recurso e se, nessa minuta, pode impugnar a matéria de facto dada como provada com base nos depoimentos gravados, é evidente que esse direito (de pedir a repetição da prova omitida ou imperceptível) pode ser exercido até ao último dia do prazo legal em curso, porque pode bem acontecer que só nesse prazo (incluindo o último dia) seja detectada a anomalia da gravação.
32.Daí que a arguição daquela irregularidade possa ter lugar na própria alegação do recurso de apelação.
33. Porém, a sua apreciação compete sempre, em primeira mão, ao juiz do tribunal onde se terá verificado a aludida irregularidade.
34. Embora esteja em causa uma nulidade processual que, à partida, não integra nulidade da sentença, certo é que, a existir tal nulidade, dela deriva nulidade da própria sentença, nos termos do n.º 2 do art.º 195.º do NCPC [7], visto que a sentença depende dos factos que forem considerados provados e estes, por sua vez, dos elementos de prova obtidos e que estejam em condições de ser analisados.
35. Por isso e apesar de não estarmos perante uma nulidade da sentença prevista no n.º 1 do art.º 615.º do NCPC, será de aplicar aos casos de arguição em sede de alegações, senão directamente pelo menos por analogia, visto tratar-se em qualquer caso de uma nulidade da sentença, o disposto no n.º 4 do mesmo artigo, cabendo assim ao juiz da 1.ª instância o suprimento dessa nulidade, se, como é óbvio, entender que ela existe.
36. Sendo indeferida essa arguição, mantém-se no âmbito do recurso para a Relação (cfr., neste sentido, o citado acórdão do STJ de 13/1/2009, proferido no processo n.º 08A3741, e os nossos acórdãos de 7/6/2012, proferido no processo n.º 2086/08.0TBVCD-A.P1, e o de 1/4/2014, no processo n.º 42/11.0TBCDR.P2, já citado e que aqui vimos seguindo).
37. No caso dos autos, constatamos que: Não foi disponibilizada às partes, no caso que importa considerar à Ré a gravação de cada uma das sessões da audiência de discussão e julgamento ocorridas.
38. Em nenhuma das actas consta tal partilha e mesmo constasse não significa que tivesse sido disponibilizado todo o seu conteúdo, depoimentos incluídos, tanto assim que a gravação da inspeção ao local foi feita em cassete áudio.
39. Não se mostra provado que a Ré/recorrente tivesse tido conhecimento da alegada deficiente gravação dez dias antes do termo das alegações, tendo arguido autonomamente a nulidade com fundamento naquela deficiência.
40. O que releva é o conhecimento efectivo da deficiência da gravação.
41. A recorrente não prescinde do direito de impugnar a matéria de facto com base nos depoimentos gravados que pretende exercer, mas que se viu impossibilitada de fazer, relativamente à matéria que indica que considera importantes para a boa decisão da causa.
42.Pelo que se requer seja declarada a mesma com as legais consequências designadamente com as consequências previstas no n.º 2 do art. 195.º do CPC, anulando-se a sentença proferida porquanto as declarações produzidas são essências na fundamentação da sentença e valoração da prova e ainda para fundamentação da discordância sobre decisão sobre a matéria de facto de que a Ré pretende recorrer.
43. Pelo que, no caso sub judicio, a arguição da nulidade foi tempestivamente feita pelo Autor/apelante e a consequência que dela advirá será a anulação dos depoimentos deficientemente gravados, que deverão ser repetidos e novamente gravados em audiência de julgamento.
44. A deficiente gravação da prova produzida em audiência de discussão e julgamento constitui nulidade que pode ser arguida nas alegações de recurso quando a gravação não foi disponibilizada nos termos do art.º 155.º, n.º 3, do CPC e não se prove que o reclamante teve conhecimento da deficiência dez dias antes do termo das alegações.
45.A mesma nulidade deve ser conhecida pelo tribunal onde foi cometida, mantendo-se no âmbito do recurso no caso de ser indeferida.
46. Pelo que, neste enquadramento fáctico e jurídico, face ao que se deixa exposto, deve-se declarar-se a nulidade invocada e em consequência revogar a sentença proferida e ordenar a repetição parcial da audiência de julgamento, com as consequências a tirar nos termos posteriores praticados no processo.
47. O despacho recorrido violou ou fez incorreta interpretação e aplicação do art 155 do CPC conjugado com o disposto no art. 640.º e 195.º do CPC
Sem Prescindir,
Do Recurso do julgamento da matéria de facto efectuada na sentença recorrida bem como da apreciação dos factos e aplicação do direito aos mesmos:
48. Na verdade, como supra se referiu, a aqui recorrente não se conforma com a decisão do Tribunal a quo que “Pelo exposto, na procedência parcial da acção, o Tribunal decide condenar a R. Y Construções Lda. a pagar à A. X - Sociedade Unipessoal de Carpintaria, Lda. a quantia de 6.998,00 € (seis mil novecentos e noventa e oito euros) contra a eliminação simultânea dos defeitos identificados no ponto 18 do elenco de factos provados por parte da A., absolvendo-se a R. do mais peticionado”, absolvendo ainda a A. do pedido deduzido, mesmo que considerado como compensação, de indemnização pela mora nos termos da cláusula penal acordada no contrato entre as partes ( e que o tribunal julgou provada ter sido fixada)
49. Como se disse e salvo o devido respeito, que é muito, o meritíssimo Juiz a quo fez incorrecta apreciação e julgamento dos factos e aplicação do Direito aos mesmos.
50 E em consequência, desde logo em primeira linha, face à prova testemunhal – cuja transcrição se anexa e cujas passagens dos depoimentos pertinentes se assinalara, supra nas alegações e se dão como reproduzidos – e documental produzida nos autos impõe-se a alteração da decisão e julgamento do ponto 8 do elenco dos factos provados.
51. O Meritíssimo Juiz efectuou um enquadramento jurídico errado da factualidade que vem dada como demonstrada e consequentemente falhou ao considerar ter resultado provado que A. e R. fixaram, tal como resultou provado relativamente ao orçamento de 11.12.2018 – cfr ponto 7 dos factos provados que se dão como integralmente reproduzidos - , uma clausula penal correspondente a 3.% do valor do orçamento por cada semana de atraso em relação às datas previstas para a conclusão dos trabalhos – respectivamente as dadas como provadas em 4., e 6 dos factos provados da sentença, e não ter retirado a respectiva consequência de atribuição de uma credito à Recorrente.
52. Ademais, no que tange o ponto 24 dos factos provados existe omissão por parte do tribunal porquanto, mesmo sem conceder, existissem os materiais referidos no dia 25 de Fevereiro de 2019, o tribunal deveria ter concretizado que tal “impossilitava a execução dos trabalhos contratados” apenas nesse dia ou em alternativa ter concretizado qual o período em que o alegado impedimento decorreu.
53. Só desta forma poderia, como fez, ulteriormente verificar e decidir pela existência ou inexistência de incumprimento do prazo, e se tal se deveu a atuação da A. ou a mora da Ré, quantificando num e noutro caso o período de tempo de molde a poder deduzir-se o mesmo ao prazo de execução de obras fixado pelas partes de acordo com o contrato – cfr. Ponto 4., e 6 e 8 dos factos provados.
54. Alias, o Tribunal deu claramente como provado que a Ré iniciou os trabalhos em janeiro de 2019 e os deu como concluídos no início do mês de abril do mesmo ano, ou seja claramente ultrapassado o prazo de execução de 2 semanas apos a entrada em obra – cfr ponto 6 dos factos provados.
55. Pese não se concorde com a tese de que o contrato de 22.12.2028 é um novo contrato e não se traduz – como de facto se verifica e defende - de uma alteração ao contrato inicial de 11.12.2018 uma vez que estando já os trabalhos de rés do chão incluídos no orçamento inicial se procedeu apenas a uma alteração do tipo dos mesmo decorrente da alteração do destino da fracção de comercio – como previsto inicialmente – cfr docs juntos aos autos que se dão como reproduzidos – para habitação, facto é que a valer a tese do tribunal – de que se tratam de contratos independentes entre si e que a cláusula penal apenas se aplica ao orçamento de 11.12.2018 - factos provados n.º 7, deveria, quanto a estes ter julgado existir mora na execução e aplicado e calculado a respectiva indemnização a favor da Recorrente.
56. Sublinhe-se que a matéria dada como provada no ponto 24 dos factos provados diz apenas respeito ao rés-do-chão, ou seja ao orçamento de 22.12.2018, e em nada influi no decurso dos trabalhos e cumprimento dos prazos pela Recorrida relativamente as demais fracções objecto do orçamento de 11.12.2028 – cfr ponto 4 dos factos provados que é claro sobre o objecto de cada orçamento e quais as fracções abrangidas por cada um.
57.Alias, em abono desta tese, nos factos não provados o tribunal é taxativo a julgar não provado que “o referido no ponto 24 do elenco de factos provados ocorria também nas fracções do primeiro e segundo pisos do edifício”.
Ou seja,
58. se como consta da Motivação da sentença “Em primeiro lugar há que destacar que, no caso dos autos, existem dois orçamentos elaborados pela A. que correspondem a dois pedidos distintos efectuados pela R. junto desta. O primeiro diz respeito à execução de serviços contratados à A. nos apartamentos do primeiro e segundo andares do edifício referido no ponto 3 do elenco de factos provados, enquanto que o segundo se reporta a serviços a executar na fracção autónoma inicialmente destinada a comércio, que só mais tarde a R. entendeu transformar em habitação (no rés-do-chão do mesmo edifício). Assim é que o primeiro orçamento data de 11.12.2018 (cfr. fls.28 e reverso) e o segundo de 22.12.2018 (cfr. fls. 30), sendo que o primeiro foi objecto de rectificação, conforme resulta e fls. 51 e 52, o que sucedeu na senda do e-mail que a R. enviou à A. em 12.12.2018 (fls. 49). Destaque-se que neste e-mail de 12.12.2018 a obra é adjudicada à A., sendo que existem diferenças nas condições de pagamento propostas por ambas as partes confrontando aquele e-mail com o orçamento rectificado (cfr. fls. 52). Quanto à cláusula penal, ela vem explicitada no referido e-mail, sendo certo que a A. nada opôs entre aquela data (12.12.2018) e a data em que refere que “o desconto de 3% também não estava combinado”, ou seja, no e-mail que enviou à R. em 29 de Janeiro de 2019, numa altura, note-se, em que a A. já estava a colocar os móveis no edifício em Viana do Castelo. De resto, a interpretação do dito e-mail, em bom rigor, leva a concluir que a posição do gerente da A. quanto à penalização diz respeito ao segundo e não ao primeiro orçamento, já que, como vimos, aquele imputa eventuais atrasos à R. “porque mesmo hoje ainda nos faltam planos do apartamento rés do chão (comercio)”, isto é, não faz qualquer referência às fracções autónomas objecto do primeiro orçamento.” existem dois orçamentos sendo que, pelo menos ao primeiro que se refere aos apartamentos do primeiro e segundo andares, se aplicam os prazos contratuais dados como provados em 6. Do elenco factos provados e a cláusula penal dada como provada em 7 dos mesmos factos.
59. Assim, tendo o tribunal dado como provado que a Ré iniciou os trabalhos em Janeiro de 2019 e deu os mesmos por concluídos em abril de 2019 – não fazendo qualquer destrinça entre uns e outros – deve concluir-se pela conclusão simultânea dos mesmos ( os das fracções do primeiro e segundo andares e os dos rés-do chão), pelo que a recorrida no que tange o contrato de 11.12.2018, com prazo de execução de duas semanas, e provado que foi que os iniciou em Janeiro e só terminou em Abril de 2019 estava em mora e incorria, como incorre, no pagamento de clausula penal de 3% do valor do orçamento por cada semana de atraso, in casu, sem conceder, tendo a Recorrida entrada em obra no dia 18 de Janeiro – cfr ponto 14 dos factos provados – teremos pelo menos ate inicio de abril (deduzidas as duas semanas previstas para a execução e conclusão dos trabalhos) 9 semanas de atraso. Tal implicava, por aplicação da clausula penal fixada o pagamento da Recorrida da quantia de € 19.712 x 9 semanas x3 % = € 5.322, 24 euros.
Assim,
60. Impõe-se desde logo uma alteração da matéria de facto julgada provada, existindo erro ou omissão na mesma, no sentido de concretizar, face ao exposto, o atraso que se verificou relativamente ao primeiro orçamento, devendo a mesma ser corrigida no ponto 8. No sentido de que a Recorrida iniciou os trabalhos em 18 de Janeiro de 2019 e os terminou um Abril de 2019.
61. Alias, na motivação o próprio tribunal refere que “no mail que enviou à R. em 29 de janeiro, numa altura em que a A. já estava a colocar os móveis no edifício em Viana do Castelo” ou seja tinha já iniciado os trabalhos.
62. Em apoio desta tese e concretização dispõe o tribunal da prova documental junta aos autos e ainda do conteúdo das declarações das testemunhas e depoimento de parte do legal representante da A, a saber e em concreto:
DECLARAÇÕES DE LEGAL REPRESENTANTE
Audiência 29-01-2020 | 10:04:11 – 11:45:32
Ficheiro: 20200129100418_1525217_3994078
00:00:00 – 01:41:19
P. P.
00:03:55 MERITÍSSIMO JUÍZ: E foi contratado para colocar, portanto fazer todos esses serviços, ou prestar, fazer estes serviços todos, na, na, em todas as frações desse prédio?
00:04:02 P. P.: Sim. Todas? Ou seja, foram… um, dois, três, e depois mais tarde um tempo, pediram-me para o local do fundo, para o comércio.
00:04:11 MERITÍSSIMO JUÍZ: Portanto, para a zona habitacional inicialmente, foi isso?
00:04:14 P. P.: A zona habitacional foi logo os primeiro orçamento que era um orçamento dezanove mil e tal euros e depois dali a um tempo, pouco, três quatro semanas, ou assim, encomendaram-me para um local que ia ser de comércio, loja, e eles transformaram aquilo também para outro apartamento.
00:04:32 P. P.: No mesmo prédio.
00:04:39 MERITÍSSIMO JUÍZ: …então ao fim e ao cabo, quantas frações, em quantas frações é que a sua empresa trabalhou, por assim dizer?
00:04:43 P. P.: Sei lá trabalhámos…olhe uma, duas, três, quatro…
00:04:55 MERITÍSSIMO JUÍZ: …portanto, três mais uma, pode-se dizer assim…
(…)
00:16:09 MERITÍSSIMO JUÍZ: …e…então o senhor conseguiu ou não fazer os trabalhos?
00:16:11 P. P.: Consegui fazer o trabalho.
00:16:12 MERITÍSSIMO JUÍZ: O que é que isso obrigou a fazer?
00:16:14 P. P.: Eu consegui fazê-los todos. Não dentro do que estaria previsto de nossas datas, que nós era dentro de quatro a seis semanas entrávamos em obra e tínhamos duas semanas para fazer a colocação…
00:16:24 MERITÍSSIMO JUÍZ: …sim...
00:16:25 P. P.: …mas depois a colocação lá...uh! uh!
00:16:26 MERITÍSSIMO JUÍZ: …portanto o prazo que foi acordado entre as duas empresas, foi de duas semanas, é isso?
00:16:31 P. P.: A colocação…
00:16:32 MERITÍSSIMO JUÍZ: …a colocação, portanto…
00:16:33 P. P.: …de todo o material…
(…)
00:19:28 MERITÍSSIMO JUÍZ: … em que data é que a obra ficou acabada?
00:19:30 P. P.: Só foi terminada depois, em … por volta de abril, porque temos emails a, a tentar saber quando podíamos colocar as coisas, mas também já foi coisinhas mínimas, o abril, foi coisinhas mínimas e até ainda foi relacionado com extras. Quadros elétricos, frentes de quadros elétricos, já foram pedidos extras que não se podiam colocar, que andavam lá, e nós, eles mandaram um email a dizer, qualquer coisa…
(…)
00:54:02 MERITÍSSIMO JUÍZ: Pronto e depois para colocar a?...
00:54:03 P. P.: …para colocar, tínhamos duas semanas para colocar…
00:54:07 MERITÍSSIMO JUÍZ:…hum…
00:54:08 P. P.:… mas já não conseguíamos colocar, havia coisas que já não conseguíamos colocar…mas também tinha que estar o pagamento feito mas não o fizeram, além de não estar o pagamento feito também não se conseguia colocar.
(…)
00:57:02 MERITÍSSIMO JUÍZ: E recebeu alguma comunicação a propósito da tal cláusula penal que o senhor diz que não foi convencionada?
00:57:09 P. P.: Recebi uma?
00:57:10 MERITÍSSIMO JUÍZ: Uma comunicação, portanto com o cálculo, com montante devido a título da referida cláusula penal que o senhor diz que não foi combinada entre as partes…
00:57:18 P. P.: …isso já foi mais lá para a frente é que recebi….
00:57:20 MERITÍSSIMO JUÍZ: …pois, recebeu então algum…
00:57:22 P. P.: …eles lá faziam umas contas, mas eu…como já estava neste caminho…
00:57:26 MERITÍSSIMO JUÍZ: …que diziam que a sua empresa era devedora?
00:57:29 P. P.: Hamm?
00:57:30 MERITÍSSIMO JUÍZ: …Que diziam que a sua empresa seria devedora? É isso?
00:57:32 P. P.: Sim, mas eu não liguei áquilo, não podia ligar áquilo, que aquilo, há uma já era depois de nós estarmos já com o assunto para caminhar aqui para tribunal, já foi muito tarde que eu vi isso…
(…)
01:38:30 P. P.: estamos aqui, olhe, sejam as datas, a vinte e nove de janeiro? A vinte e nove de janeiro já estavam as cozinhas todas colocadas, roupeiros todos colocados, e os cinquenta por cento ainda não tinham vindo, nem primeira, nem segunda, nem quarta, nem quinta semana, ….então …
01:38:41 MANDATÁRIO DA A.: Mesmo, mesmo… mesmo após…
01:38:44 P. P.: …então explique-me isto também agora…
01:38:46 MANDATÁRIO DA A.: …imaginemos, você se começa, está aqui assente dezoito de janeiro o início, é isto? A entrada em obra…
01:38:53 MANDATÁRIO DA R: Acho que não…., acho que sim talvez…
63. Das declarações resulta claro que o legal representante da A. confessa ter iniciado obra referente ao 1.º orçamento em 18 de Janeiro de 2019 e só a ter concluído em Abril desse ano. Note-se que as demais considerações e imputação de culpa à Ré pela mora não foram dadas como provadas (e bem) pelo tribunal – alias a contrario o ponto 24 dos factos provados permite tal conclusão somado ao expendido na motivação da sentença pelo Tribunal.
64. Mas atente-se ainda no seguinte depoimento:
DECLARAÇÕES DE TESTEMUNHA
Audiência 29-01-2020 | 15:50:42 – 17:00:39
Ficheiro: 20200129155049_1525217_3994078
00:00:00 – 01:09:55
S. C.
00:07:28 S. C.: No meio de novembro, por aí ..porque eles, nós adjudicámos em dezembro, e eles entraram em obra…
00:07:31 MANDATÁRIO DA R.: Ah, adjudicaram em dezembro, pronto, terá chegado primeiro…
00:07:34 S. C.: E eles entraram em janeiro.
(…)
00:09:39 MANDATÁRIO DA R.: …vocês fizeram o pagamento antes ou depois do senhor P.….
00:09:42 S. C.: …antes…nós fizemos o pagamento em dezembro
00:09:43 MANDATÁRIO DA R.: …em dezembro…
00:09:44 S. C.: …e o senhor P. entrou em janeiro.
00:09:45 MANDATÁRIO DA R.: …e ele recebeu o dinheiro…
00:09:46 S. C.: …sim…
(..)
00:09:46 MANDATÁRIO DA R.: …e ele entrou em janeiro. Foi só esta negociação que houve com a X ou houve também já um segundo orçamento?
00:09:52 S. C.: Houve um segundo orçamento.
00:09:54 MANDATÁRIO DA R.: Porque é que houve outro?
00:09:55 S. C.: Porque, o edifício em causa tem, tinha quatro apartamentos e um comércio, no qual, nós em janeiro, resolvemos alterar o comércio para apartamento e fazer um T1. Então eu contactei o senhor P. e disse-lhe: olhe, afinal nós aqui vamos fazer um apartamento, portanto eu preciso de um orçamento para a cozinha, para a porta, para a casa de banho, para os móveis de casa de banho, roupeiros, rodapé, tudo o que envolve um apartamento...
00:10:18 MANDATÁRIO DA R.: …transformação…
00:10:19 S. C.: …e ele deu-me um orçamento, nós finalizámos e eu voltei a formalizar…
00:10:22 MANDATÁRIO DA R.: …isso deve ser quê? Ainda em dezembro? janeiro?
00:10:25 S. C.: Eu penso que foi em janeiro já…
00:10:26 MANDATÁRIO DA R.: …janeiro…
00:10:26 S. C.: …janeiro já ele tinha entrado em obra, aliás ele já estava a executar…
00:10:30 MANDATÁRIO DA R.: …já estava a executar?…
00:10:30 S. C.: …os outros apartamentos, sim.. Ele deu-me o valor desse apartamento, não é? E desse aditamento ao orçamento, e eu formalizei a adjudicação.
(…)
00:50:24 MANDATÁRIO DA R.: Quanto aos atrasos…(impercetível) …quadros elétricos, eles, a X alega que houve atrasos, que não puderam colocar os quadros elétricos , porque vocês não tinham uma parte preparada…
00:50:35 S. C.:…os quadros elétricos não faziam parte do orçamento.
00:50:37 MANDATÁRIO DA R.: Ai não faziam parte deste…
00:50:38 S. C.:…eu não adjudiquei e na altura não formalizámos…
00:50:39 MANDATÁRIO DA R.: Ai portanto, não está no âmbito desta empreitada?
00:50:42 S. C.: Não está no âmbito... exatamente. Na altura em que eles estavam em obra, eu na altura não pedi os quadros elétricos…
00:50:48 MANDATÁRIO DA R.: (impercetível)…portanto não está aqui neste processo, (impercetível) não está nem no pedido de indemnização?...nem está...
00:50:51 S. C.:
(impercetível)…exatamente…eu nem considerei que ele atrasou na situação dos quadros elétricos…
00:50:56 MANDATÁRIO DA R.: …não está nos orçamentos…
00:50:56 S. C.: …não fazia parte…nem sequer do orçamento inicial, nem do aditamento.
00:50:58 MANDATÁRIO DA R.: …muito bem…
00:50:59 S. C.: …surgiu no decorrer da obra, e eu pedi-lhe se faziam os quadros elétricos, ele disse que sim, eles mediram e nós…
00:51:07 MANDATÁRIO DA R.: …um bocado, na tal boa relação…
00:51:08 S. C.: …exatamente…
00:51:08 MANDATÁRIO DA R.: …de vocês esquecerem a porta (impercetível) …
00:51:10 S. C.: …sim ele disse que fazia e eu acabei por nem formalizar na altura…
00:51:13 MANDATÁRIO DA R.: …pois…
00:51:14 S. C.: …foi um funcionário que tirou as medidas do que era para fazer…
00:51:15 MANDATÁRIO DA R.: …mas pagaram? Ou foi quase…no…vocês perdoaram entre aspas a porta com menos sete centímetros?...
00:51:21 S. C.: Não. Foi faturado.
00:51:22 MANDATÁRIO DA R.: Foi faturado?
00:51:23 S. C.: Foi.
00:51:24 MANDATÁRIO DA R.: … mesmo assim pagaram… ah…
00:51:25 S. C.: …faz parte da última fatura. Faz parte de um extra.
00:51:28 MANDATÁRIO DA R.: Está no extra. Portanto está no extra.
00:51:29 S. C.: Como esse houve também por exemplo, estou-me a recordar agora de uma garrafeira na cozinha que foi como extra na fatura…
00:51:34 MANDATÁRIO DA R.: E foi pago?
00:51:35 S. C.: E está faturado.
00:51:36 MANDATÁRIO DA R.: Muito bem.
00:51:37 S. C.: Nós nesse tipo de coisas assim…
00:51:38 MANDATÁRIO DA R.: …são extras… não estava neste orçamento…
00:51:40 S. C.: … não fazem parte do orçamento inicial e nem…
00:51:42 MANDATÁRIO DA R.: …nem foram considerados para efeitos de atraso na execução desta, desta, desta subempreitada …
00:51:47 S. C.: …não foram...
00:51:48 MANDATÁRIO DA R.: …não?…não se coloca…já agora também…(impercetível) eles terão deixado a obra, mais ou menos quando? Em março? Eu vejo aqui…
00:51:58 S. C.: …talvez vinte e cinco de fevereiro eu estava a alertá-lo para isso… ele não tinha concluído , portanto devemos estar a falar de março…
00:52:02 MANDATÁRIO DA R.: …março…depois já vamos ver o cálculo de indemnizações, que eu penso que foi a senhora engenheira que fez…mas, eu perguntava-lhe: outra das, das justificações para os atrasos, que a X dá, em parte, é o facto de, a obra estar com lixo, com areias, eles não poderem trabalhar, não poderem…
00:52:25 S. C.: …o que aconteceu, foi que no apartamento do rés do chão…o tal…
00:52:28 MANDATÁRIO DA R.: …do rés do chão?...
00:52:29 S. C.: O que nós alterámos para comércio, realmente nós alterámos na fase final, ou seja, já estava a X em obra, nós adjudicámos mais tarde…
00:52:36 MANDATÁRIO DA R.: …em obra nas outras frações…
00:52:37 S. C.: …nas outras frações...
00:52:38 MANDATÁRIO DA R.: …mas estava a trabalhar? Nas cozinhas, portas?...
00:52:39 S. C.: sim…as outras frações, foram concluídas, até segundo me recordo, já tinham o piso colocado, o pavimento vinílico já estava colocado. Neste apartamento, naturalmente foi uma decisão tomada em janeiro foi daí que nós mudámos para apartamento e a obra estava nesse apartamento mais atrasada que nas outras. De qualquer das formas nunca foi impeditivo para a X de entrar em obra. A única coisa que a X não poderia colocar seriam os rodapés, mas enquanto não tem cozinhas, roupeiros e portas interiores, o chão colocado, há várias especialidades em obra ao mesmo tempo…portanto…
00:53:11 MANDATÁRIO DA R.: …portanto não é estanque. Há uma articulação entre as especialidades e concluem muitas vezes…
00:53:16 S. C.: …ou seja, a X não estava só naquele apartamento a trabalhar, estava sim, num conjunto de mais quatro, portanto enquanto eles iam trabalhando…nós fazíamos o pavimento não é?….E não é impeditivo de eles trabalharem. A única coisa que a X não conseguia fazer é…
00:53:30 MANDATÁRIO DA R.: …é os rodapés…
00:53:31 S. C.: …é rodapé …(impercetível)…
00:53:35 MANDATÁRIO DA R.: …e é normal, neste tipo de obras…
00:53:37 S. C.: …até porque o pavimento…
00:53:38 MANDATÁRIO DA R.: …haver a coincidência de especialidades ao mesmo tempo na obra, não é ? …Senão… eram intermináveis..
00:53:42 S. C.: …até porque o pavimento é um material de acabamento que nós deixamos sempre mais tarde possível para colocar, porque é, facilmente cai uma ferramenta, cai alguma coisa e danifica o piso…
00:53:50 MANDATÁRIO DA R.: …isso é normal?
00:53:52 S. C.: …é…é…comum…
00:53:54 MANDATÁRIO DA R.: …(impercetível) uma prática habitual…
00:53:55 S. C.: ...arranjar uma amostra de piso para eles verem (impercetível) e trabalhar…
00:53:59 MANDATÁRIO DA R.: … fazem isso?
00:54:00 S. C.: …exatamente…ou seja, ele não tem…
00:54:01 MANDATÁRIO DA R.: … foi o que fizeram isso neste caso?
00:54:02 S. C.: …sim ele sabia, ia ser o mesmo tipo de material dos apartamentos, que eles estavam a trabalhar…
00:54:06 MANDATÁRIO DA R.: … e isso só se pôs já na parte digamos da empreitada, aditada. Ou seja no rés do chão, na parte de cima estava tudo…
00:54:12 S. C.: …no resto estava tudo, até já tinham piso colocado…
00:54:14 MANDATÁRIO DA R.: … quando ele refere a sujidade, os lixos e a impossibilidade é quanto à fração do rés do chão, só. E, com essa nuance de saber que é possível trabalhar e executar…
00:54:22 S. C.: …sim…
00:54:23 MANDATÁRIO DA R.: … só não podia pôr o rodapé…eu perguntava-lhe: há aqui uma carta que foi, (impercetível) de folhas oitenta e sete, com um cálculo de penalizações, se conhece? Se a senhora engenheira participou na elaboração dela?
00:54:58 S. C.: …sim…esta foi a carta que nós…fizemos para o cálculo da…das multas não é? E que respondemos a algumas questões também dentro da carta que eles nos responderam…nós demos resposta…
00:55:12 MANDATÁRIO DA R.: … todas as cartas foram enviadas sempre, para a mesma morada da X?
00:55:15 S. C.: …sim…para a sede deles..
00:55:16 MANDATÁRIO DA R.: … e umas foram recebidas e outras foram devolvidas?
00:55:20 S. C.: …sim…a maioria delas foram devolvidas..
00:55:23 MANDATÁRIO DA R.: …mas a morada estava sempre correta? Era
sempre a mesma?...
00:55:25 S. C.: …sim…era a sede da…
00:55:27 MANDATÁRIO DA R.: …X…(impercetível)
00:55:29 S. C.: …sim era..(impercetível)
00:55:32 MANDATÁRIO DA R.: …pois…foram lá recebidas umas e outras não…
00:55:33 S. C.: …e outras não…exatamente…
00:55:35 MANDATÁRIO DA R.: …e portanto, estas são as datas?...
00:55:37 S. C.: …exatamente…
00:55:38 MANDATÁRIO DA R.: …data de conclusão, está aqui vinte e dois de fevereiro?...
00:55:39 S. C.: …era quando ele devia ter acabado…eu não devo, vimos há pouco a data de vinte e cinco…
00:55:44 MANDATÁRIO DA R.: …duas semanas?...(impercetível)…faz o cálculo do valor?...
00:55:47 S. C.: …exatamente
00:55:48 MANDATÁRIO DA R.: … e das tais penalizações…
00:55:48 S. C.: …e aliás outro cálculo para o segundo orçamento que começou noutra data, não é?…
00:55:52 MANDATÁRIO DA R.: …claro...portanto considera a partir da adjudicação…
00:55:55 S. C.: …dia vinte e cinco do um. A partir do dia vinte e cinco do um, eu considero as quatro semanas… que eles se mantiveram em obra…mais duas para concluir a obra…
00:56:01 MANDATÁRIO DA R.: ...e portanto dá este valor contratual...e entendem também que em causa própria… (impercetível)
00:56:07 S. C.: …sim…
00:56:10 MANDATÁRIO DA R.: ...esta assinatura é do…
00:56:12 S. C.: …do gerente, do doutor F. C..
00:56:13 MANDATÁRIO DA R.: ...do doutor F. C.. Sim senhora. Podemos dizer que foi a senhora engenheira que fez o cálculo das penalizações?
00:56:16 S. C.: …sim, sim. (impercetível)
65. Como se verifica, o depoimento da testemunha supra, que elaborou o calculo das indemnizações referidas no ponto 14 dos factos provados, vai ao encontro da tese que se defende e permitia ao tribunal concretizar a data de inicio dos trabalhos referentes ao primeiro orçamento no dia 18 de janeiro de 2019.
Tal permite fazer os cálculos supra referidos para obter o número de semanas até ao início de abril – data dada como provada para o término dos trabalhos - e calcular o quantum indemnizatório.
66. Assim deve a matéria de facto dada como provada ser alterada no sentido exposto, ou seja, no sentido de concretizar, face ao exposto, o atraso que se verificou relativamente ao primeiro orçamento, devendo a mesma ser corrigida no ponto 8. no sentido de que a Recorrida iniciou os trabalhos em 18 de Janeiro de 2019 e os terminou um Abril de 2019.
67. O ónus da prova de que existiram atrasos imputáveis a Ré Recorrente competia à A.
68. Porem, como se vê da matéria de facto provada nenhuma prova foi feita quanto a esta matéria, nem nenhum facto julgado provado nesse sentido.
69. Na motivação o próprio tribunal reconhece que “E a verdade é que, em bom rigor, a produção de prova sobre os alegados atrasos se centrou fundamentalmente no apartamento do rés-do-chão e não nos apartamentos dos pisos superiores. P. P. negou que tenha incumprido os prazos de execução das obras, mas referiu-se, neste particular, essencialmente a dificuldades que encontrou no piso do rés-do-chão do edifício, onde nemas escadas estavam feitas – e portanto, não podiam ser alvo de intervenção, pois os seus degraus seriam cobertos com placas de madeira – nem o chão colocado (o que impediu, segundo o representante legal da A., a colocação de rodapés) e onde estavam amontoados diversos materiais de construção civil que impediram a A. de executar os trabalhos para que fora contratada, o que só foi possível em finais do mês de Fevereiro de 2019 quando a R. retirou do local todos esses materiais, sendo certo que referiu que em Abril de 2019 ainda estava em obra mas apenas por causa de trabalhos extra que a R. entretanto lhe contratara. E, na verdade, as comunicações de 26 de Fevereiro de 2019 (fls. 31) e de3 e 6 de Abril de 2019 (fls. 37, reverso) respeitam à colocação dos armários dos quadros eléctricos que, como a depoente S. C. referiu, não estava prevista em nenhum dos dois orçamentos elaborados pela A., pois que se reporta à execução de trabalhos extra posteriormente acordados, e é por esse motivo que a A. alega que deu a obra como finda durante o mês de Abril.”
70. Ademais, na própria resposta à oposição a Recorrida confessou expressamente, em 67.º do articulado que se da como reproduzido, “Contrariamente ao contra producentemente alegado no artigo 45, assevera aqui a autora que entregou a obra, concluindo-a, no decurso da primeira semana de Abril de 2019.”
71. Pelo que, por confissão deve ser dado como provado ser esta a data de entrega da obra, sendo certo que a Requerida, que não fez qualquer distinção entre os contratos/ orçamentos, confessa a conclusão simultânea dos trabalhos na referida data, pelo que deve ser julgado como provado esse facto e a data referida.
72. Nunca a Requerida fez em qualquer articulado menção a trabalhos a mais, ou outros contratos designadamente os que o tribunal refere na motivação de colocação de armários dos quadros elétricos, pelo que estava ao tribunal vedado conhecer de tal questão que as partes não trouxeram ao processo.
73. Refira-se neste particular que o tribunal apenas se podia pronunciar sobre o objecto da causa: os dois contratos dados como provados em 4. e é obviamente a eles se refere quanto à data de termino no ponto 8 dos factos provados onde nenhuma referencia é feita a ”extras” sendo certo que os mesmos foram executados e colocados em simultâneo com e execução dos trabalhos dos dois orçamentos.
74. O Meritíssimo Juiz ultrapassa aquilo de que podia conhecer e profere decisão com base em factos que não foram dados como provados.
Acresce
75 Existe, pois, também na sentença excesso de pronúncia pois o tribunal conhece de questões que não tendo sido colocadas pelas partes, o que constitui nulidade que expressamente se argui, e constitui contradição entre a matéria de facto provada e a decisão.
Ademais,
76. Verifica-se pelo exposto a existência de vício da contradição insanável da fundamentação ou entre a fundamentação e a decisão traduzido na sentença recorrida tanto na contradição entre a matéria de facto dada como provada ou como provada e não provada, como também entre a fundamentação probatória da matéria de facto, ou até mesmo entre a fundamentação e a decisão. Ou seja, existe uma situação em que, seguindo o fio condutor do raciocínio lógico do julgador, os factos julgados como provados ou como não provados colidem inconciliavelmente entre si ou uns com os outros ou, ainda, com a fundamentação da decisão.
77. Existe assim vício formal da sentença suscetível de determinar a sua nulidade pela verificação das circunstâncias previstas nas várias alíneas do art.º 615.º n.º 1 do C.P.C. ou sem conceder erro de julgamento de facto art.º 662.º do C.P.C. que determina nulidade que se invoca.
78. Acresce que, sem conceder nas nulidades invocadas, mas considerando-se quer a actual matéria de facto julgada provada e a não provada e ainda quela que, como se crê, venha a ser alterada no sentido apontado pela Recorrente, à Recorrida assiste o direito a indemnização contratual pela mora.
79. Como bem escreveu o tribunal na decisão de direito: “Dizemos que foram celebrados dois contratos porque se afigura inequívoco que a A. apresentou à R. um primeiro orçamento respeitante a trabalhos a executar no primeiro e segundo andares do edifício mencionado no ponto 1 do elenco de factos provados e, um pouco mais tarde, um segundo orçamento que teve como objecto o rés-do-chão do dito prédio. Não se pode considerar que este segundo orçamento consubstancia um mero aditamento ao primeiro porque, como já tivemos oportunidade de referir, tanto apenas se poderia alvitrar se, porventura, tivessem sido contratados trabalhos extra no primeiro e segundo andares objecto do primeiro orçamento, o que não foi o caso, já que o objecto daquele segundo orçamento foi o rés-do-chão do edifício que inicialmente estava destinado a “comércio” e que, só mais tarde, por vontade e decisão da R., foi destinado a “habitação”. É aliás o que resultou de forma abundante da prova produzida. Tal questão não constitui mera “bizantinice” ou preciosismo dado que contende com o aquilo que, num caso e noutro, se deve considerar ter sido convencionado entre as partes, designadamente no que tange com a fixação de indemnizações em caso de atraso na execução dos trabalhos contratados entre as partes. Assim é que, quanto ao primeiro contrato, parece claro que as partes fixaram entre si uma cláusula desse jaez, conforme resulta do teor do ponto 7 do elenco de factos provados, o mesmo já não tendo sucedido com o segundo contrato, pelo que a haver algum contra-crédito da R. relativamente à A. ele só será devido, neste conspecto, por atraso na execução dos trabalhos referentes ao primeiro orçamento, de 11.12.2018.”
80.Tal como refere o Meretissimo juiz a quo tal tem como consequência que “Em suma, entendemos que nas formas de processo em que não é admissível a reconvenção deve ser permitido ao réu invocar a compensação como mera excepção até ao limite do crédito do autor, apenas para impedir o efeito jurídico deste crédito.”
81. O que se verifica nos autos.
82. Seguindo ainda a sentença: “Deu-se como provado que A. e R. fixaram uma cláusula penal correspondente a 3% do valor do orçamento de 11.12.2018 por cada semana de atraso em relação às datas previstas para a conclusão dos trabalhos (ponto 7 do elenco de factos provados). Trata-se inequivocamente de uma estipulação negocial acessória que fixa uma cláusula penal (artigos 810.º a 812.º do Código Civil), sendo que esta consiste na convenção através da qual o devedor promete ao seu credor uma prestação para o caso de não cumprir, ou de não cumprir perfeitamente, a obrigação. Consubstanciando a cláusula penal uma obrigação de indemnização, há que concluir que estamos perante uma dívida de valor, pelo que não lhe é aplicável o princípio nominalista. Nessa medida, é admissível a fixação do seu montante em momento posterior ao da constituição da respectiva obrigação nos termos do artigo 550.º do Código Civil: a dívida de indemnização não é, em sentido estrito, uma dívida pecuniária e, assim sendo, poderíamos ser levados a concluir que não tem assento no tipo de acção processual em curso. Sucede que, como de resto bem se explica no Ac. do TRC de 26.06.2012 (processo n.º 365/09.9TBCNT-A.C1, acessível em www.dgsi.pt.), “Quando se convenciona uma cláusula penal pecuniária que defina ne varietur o valor da indemnização devida ao credor em caso de não cumprimento, a convenção não se limita a estabelecer, por acordo prévio, o valor dessa reparação, mas antes produz estoutro efeito fundamental: opera a conversão da dívida de valor em débito em dinheiro, fixa o montante em dinheiro do débito de valor e, a partir desse momento, a dívida fica deve ser tratada como uma obrigação pecuniária, tout court. Como quer que seja,… a dívida de indemnização que decorra de uma cláusula penal de feição indemnizatória deve ser considerada uma dívida pecuniária. Só assim não será, evidentemente, a prestação prometida pelo devedor através dessa cláusula, não tiver carácter pecuniário”.
83.Porém, a sentença decorrida na aplicação do direito e na decisão fez errada interpretação dos factos e aplicação da lei ao considerar que “Posto isto, a verdade é que não foi feita prova de que houve retardamento da prestação a cargo da A. Com efeito, a factualidade alegada pela R. a esse propósito, como já tivemos ensejo de mencionar, é muito parca, senão mesmo inexistente. Na carta que a R. enviou à A. em 26.04.2019 (cfr. ponto 14 do elenco de factos provados) limita-se aquela a contabilizar o valor das indemnizações devidas mas não refere os trabalhos que, àquela data – ou a outra posterior à data convencionada para o termo dos mesmos –, supostamente se encontravam por executar. Diz ali a R. que “existem múltiplos incumprimentos da vossa parte que justificam não aceitemos a factura dos trabalhos porquanto os trabalhos a que esta alegadamente se refere ou não estão terminados, ou estão executados de forma incorreta e em desacordo com o contratado ou ainda desajustados dos prazos e valores de pagamento contratados”, mas, reiteramos, não discrimina os trabalhos contratados e não terminados, sendo que a restante factualidade ali mencionada – o erro de execução das portas, a questão da dupla lacagem das mesmas – se deu como não provada por não se ter apurado que tinha sido objecto dos contratos celebrados entre as partes. Portanto, parece-nos que o accionamento da cláusula penal estipulada entre as partes nos termos supra descritos dependia do apuramento dos trabalhos que não se encontravam executados no termo do prazo que as partes fixaram para a entrega da obra por banda da A., o que não foi alegado pela R. E, assim sendo, neste conspecto impõe-se concluir pela inexistência de contra-crédito inscrito na esfera jurídica da R. que possa ser objecto de compensação com o crédito de que a A. é titular perante aquela”.
84. Porem, por tudo o que já expôs que esta feita prova da data inicio e termino dos trabalhos (inicio de abril de 2019) sendo que tendo o tribunal dado estes factos e datas como provadas – mesmo que não se altere a matéria de facto no sentido defendido pela recorrente, no que não se concede -, devia julgar que estavam reunidas as condições de accionamento da clausula. Pois se da como provada uma data de inicio e termo dos trabalhos o raciocínio logico é de que a A.m recorrida, não completou a sua obrigação contratual no prazo a que se obrigou.
85 Inexistindo nos autos qualquer facto que justifique o atraso e o impute à Recorrente o efeito que se retira é que a A. entregou só trabalhos objecto do contrato (na sua totalidade) apenas no final de abril.
86. Escrever, como se escreve que impendia à Re o “apuramento dos trabalhos que não se encontravam realizados não faz qualquer sentido quando o próprio tribunal julgou provado que os trabalhos apenas foram concluídos no início de Abril de 2019. Ou seja a A. apenas completou os mesmos naquelas data e esse é o facto que permite despoletar a clausula penal considerando a data de inicio dos mesmos e o prazo fixado contratualmente para o seu termino.
87. Com estas balizas – início e termino (da totalidade do objecto do contrato) – podia e devia o tribunal, ao invés do que fez, julgar procedente o pedido de indemnização deduzido pela Re quanto à clausula penal e julgar o mesmo procedente e em consequência atribuir à Re um credito a ser objecto de compensação com o reclamado pela A.
88. Devia assim o tribunal ter julgado, ao invés do que fez, igualmente procedentes a exceptio non adimpleti contractus invocada pela R., e o reconhecimento do credito da R. sobre a A. decorrente da aplicação da clausula pena e procedente a respectiva compensação de créditos.
89. Sentido em que, na procedência do presente recurso, deve ser alterada a sentença Recorrida, revogada a mesma a substituída por outra que julgue procedente a obrigação de indemnização da Recorrida à Recorrente pela mora verificada e faça operar a respectiva compensação de créditos.
90. A sentença recorrida violou, alem do mais, o disposto nos artigos 1207.º, 847 e ss, 395,º e 342.º. n.º 2 todos do Cód. Civil e 5871.º do CPC e incorreu na nulidade prevista nos arts. arts 155.º, n.4 do CPC, conjugados com o disposto no art. 640.º e 195.º do CPC e na nulidade prevista pela verificação das circunstâncias previstas nas várias alíneas do art.º 615.º n.º 1 do C.P.C. ou sem conceder em erro de julgamento de facto art.º 662.º do C.P.C. que determina nulidade que se invoca”.
Não foram apresentadas contra-alegações.
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
***
II. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO
O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente não podendo este tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, sem prejuízo das de conhecimento oficioso (artigo 639º do CPC).
As questões a decidir, tendo em conta o teor das conclusões formuladas pelos recorrentes, são as seguintes:
1 - Da nulidade por falta de gravação da acareação entre o legal representante da Autora e a testemunha F. P.;
2 – Da nulidade da sentença por verificação das circunstâncias no artigo 615º do Código de Processo Civil;
3 - Do erro no julgamento da matéria de facto, designadamente quanto aos pontos 8) e 24) dos factos provados;
4 - Do erro na subsunção jurídica dos factos.
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II. FUNDAMENTAÇÃO
3.1. Os factos Factos considerados provados em Primeira Instância:
1. A A. é uma sociedade comercial que desenvolve a actividade de carpintaria e pintura de edifícios.
2. A R. é uma sociedade comercial que tem por objecto a actividade de construção civil e obras públicas, serviços de engenharia e arquitectura.
3. No âmbito do desenvolvimento das acima referidas actividades, em Dezembro de 2018, a R. contratou a A. para esta efectuar uma empreitada de colocação de cozinhas, portas, roupeiros, móveis de casa de banho, escadas, rodapés, entre outros produtos de mobiliário, num empreendimento imobiliário que consistiu numa obra de requalificação de um edifício composto por rés-do-chão, primeiro e segundo andar, convertido em propriedade horizontal, sito na Rua ..., União das Freguesias de Viana do Castelo (... e ...) e ....
4. A. e R. começaram a encetar negociações em Dezembro de 2018, no âmbito das quais a primeira apresentou à segunda dois orçamentos, por esta aceites, a saber: o orçamento n.º 2/8.24, de 11.12.2018, no valor de 19.386,00 €, referente às fracções autónomas do primeiro e segundo andares do edifício acima identificado; e, mais tarde, o orçamento 2/8.59, de 22.12.2018, no valor de 5.773,00 €, referente ao rés-do-chão do referido edifício.
5. Foi acordado pelas partes que o pagamento dos preços referidos em 4 seria efectuado da seguinte forma: 30% no acto de adjudicação da obra; 50% após o termo da construção do material/móveis pela A.; e 20% do preço no final da colocação dos móveis em obra.
6. Ademais, as partes fixaram os prazos de entrada em obra em quatro semanas após a adjudicação e a data de conclusão dos trabalhos em duas semanas após a entrada em obra pela A.
7. E fixaram uma cláusula penal correspondente a 3% do valor do orçamento de 11.12.2018 por cada semana de atraso em relação às datas previstas para a conclusão dos trabalhos.
8. Após aceitação, por banda da R., dos valores previstos em orçamento, a A. iniciou os trabalhos em Janeiro de 2019 nas várias fracções do prédio, tendo dado os mesmos por concluídos no início do mês de Abril do mesmo ano.
9. Por conta da sobredita empreitada, encontra-se em dívida o valor total de 6.998,00 €, traduzido no somatório de valores não pagos por referência às facturas n.ºs 2/454 e 2/415.
10. As facturas n.ºs 2/454 e 2/415, venceram-se, respectivamente, nos dias 1.04.2019 e 18.02.2019.
11. Em 12.04.2019, a R. devolveu à A. a factura n.º 2/454, invocando que se verificaram atrasos na execução da obra e por se terem encontrado defeitos, designadamente nas portas.
12. A R. pagou à A. apenas parte da factura n.º 2/415 pelos mesmos motivos referidos em 11.
13. Após a devolução da referida factura, a A. enviou uma carta à R. em 11 de Abril de 2019, declarando que reenviava a factura.
14. Em 26.04.2019, a R. remeteu à A. uma carta com o seguinte teor:
“Acusamos, pelo presente, a recepção da vossa carta datada de 11 de abril de 2019 relativa à obra empreitada, a realizar na Rua ..., Viana do Castelo, adjudicada à vossa empresa em 28/12/2018, conforme vosso orçamento n.º 278.24 de 11.12.2018 e ainda da ulterior adjudicação, em 12.12.2018, pela nossa empresa, de aditamento ao orçamento.
Recordamos que nos dois atos, foram fixadas as condições de pagamento e os respectivos prazos, bem como as cláusulas penais no caso de mora da vossa responsabilidade.
Certamente, por terem recorrido a tão profusa e eloquente linguagem esqueceram o essencial da questão: os factos.
Desde logo, referem que reenviam a factura que nós antes devolvemos. Porem não o fazem, sendo que a carta vem desacompanhada de qualquer documento.
Acresce que, caso tal sucedesse, nos veríamos, mais uma vez, pelas mesmas razões, obrigados a devolver a mesma, pois reiteramos, não a aceitamos.
Na verdade, e como bem sabem, apos a referida adjudicação efetuamos pagamento no 28/12/2018 sendo que a vossa empresa apenas entrou em obra no dia 18/01/2019. Ulteriormente, por comunicação escrita foi realizada a adjudicação de aditamento ao orçamento inicial em 25/01/2019, e reiteradas as condições de pagamento e prazos e clausulas penais por mora.
Estranhamente, ou não - porque depois de lida a vossa carta já nada nos parece estranho -, só no dia 29 de janeiro de 2019 – quando, como se disse, as condições de pagamento foram previamente enviadas por e-mail no dia 12/12/2018, (sendo que, ate aquela data não tivemos qualquer sinal de desacordo da vossa parte), vem V. Exas. manifestar alegada discordância com as condições de pagamento.
Obviamente, para não qualificar este comportamento, nem dizer mais, diremos apenas que não nos parece correto nem aceitamos que, após efetuarmos os pagamentos, queiram alterar essas condições, ou seja alterarem unilateralmente e de forma superveniente as condições iniciais ajustadas pelas partes e mencionadas no e-mail de adjudicação.
Assim, dito isto, obviamente para nós contratos e a palavra mantem-se.
Ademais, como bem sabem, pese o hábil exercício de retorica expresso na vossa carta, existem múltiplos incumprimentos da vossa parte que justificam não aceitemos a factura dos trabalhos porquanto os trabalhos a que esta alegadamente se refere ou não estão terminados, ou estão executados de forma incorreta e em desacordo com o contratado ou ainda desajustados dos prazos e valores de pagamento contratados. Alem do mais, permitimo-nos recordar que as portas interiores da obra não foram executadas pela vossa empresa conforme nós solicitamos, discutimos uma nova solução para eliminar o erro da vossa responsabilidade com V. Exas. em consequência do qual estas tiveram que ser aumentadas, para que fosse possível executar o aro oculto conforme pretendido e também não foi possível colocar os puxadores que nós escolhemos inicialmente de acordo com o projecto.
Acresce que, as portas dos roupeiros apenas estão lacadas numa das faces quando solicitamos lacagem em ambas as faces.
Em relação ao apartamento sem pavimento, era apenas o do R/chão que assim se encontrava (e este corresponde ao apartamento que adjudicamos posteriormente no dia 25/01/2019), sendo que além disso não é necessário pavimento para a montagem da carpintaria…
Ao contrário do que afirmam, o corte da chapa não impediu a continuidade dos trabalhos, pois o material para a montagem das escadas não se encontrava em obra. Assim, rejeitamos em absoluto as acusações e imputações que realizam na vossa missiva, as ameaças veladas que realizam no termino da mesma – sendo que esta empresa tem também um departamento jurídico que, se necessário, a manter-se a vossa atuação, dará resposta a V. Exas. intentando a competente acção judicial – e reiteramos tudo o que deixamos expresso nesta e noutras comunicações quanto a execução do contrato adjudicado.
Aproveitamos para apresentar o cálculo dos valores de penalizações devidos por V. Exas. A nossa empresa pelo incumprimento contratual que se verifica:
- Data de adjudicação 1º orçamento: 28/12/2018
- Data de conclusão obra 1º Orçamento:22/02/2019 - Semanas de atraso: 9 semanas
- Data de adjudicação 2º orçamento: 25/01/2019
- Data de conclusão obra 1º Orçamento:22/02/2019 - Semanas de atraso: 5 semanas 1º Orçamento= 19.712€x9semanasx3% 2º Orçamento= 5773€x5semanasx3% Total Penalizações = 6188.19€
Oportunamente apresentaremos a respectiva nota sem prejuízo da interpelação que se segue.
Ficamos, assim, a aguardar terminem os trabalhos no prazo de oito dias e retifiquem a factura devolvida sob pena de considerarmos haver, da vossa parte abandono da obra, e nos reservarmos o direito de concluirmos os trabalhos, eliminando defeitos e de ulteriormente reclamarmos o pagamento junto de V. Exas.”
15. A A. recebeu a carta referida em 14 e não se apresentou em obra nem deu qualquer resposta ou procedeu a qualquer pagamento ou emissão de nota de crédito relativos às facturas que emitira.
16. Em 28 de Maio de 2019 a R. enviou nova comunicação escrita à A., com o seguinte teor: “…na qualidade de donos da obra de empreitada identificada em epigrafe, conforme vosso orçamento n.º 278.24 de 11.12.2018 e ainda da ulterior adjudicação, em 12.12.2018, pela nossa empresa, de aditamento ao orçamento, denunciar junto de V. Exa. a existência dos defeitos abaixo identificados conhecidos no decurso da presente semana, sem prejuízo dos já previamente denunciados na nossa anterior comunicação escrita, requerendo, desde já, que nos termos do disposto no art. 1221.º do CC. procedam urgentemente à sua eliminação”.
17. E informou a A. do seguinte:
1. Os aros das portas apresentam defeitos na execução da colocação e fixação; surgiram fissuras no material de colagem de união à parede e afastamento dos aros da estrutura.
2. A lacagem das portas foi mal executada apresentando, nesta data, o surgimento de fissuras e quebras na superfície lacada, defeitos que se vem acentuando diariamente e tornando mais visíveis.
3. Na sequência da instalação e operação de fixação da estrutura e móveis de cozinha do T0 do 2.º andar, por incúria e negligência na execução da furagem da parede para fixação causaram danos (furo) no depósito da estrutura do depósito de água da sanita.
18. A lacagem de algumas das portas colocadas na obra referida em 1. foi mal executada, apresentando fissuras na superfície lacada.
19. Do furo referido em 3. do antecedente ponto 17, resultou infiltração de água no edifício, que penetrou no apartamento do piso inferior, causando danos diversos que obrigaram a intervenção imediata e urgente de reparação, inclusive com levantamento de pavimentos e outros trabalhos.
20. Os trabalhos necessários para reparar os danos referidos em 19 ascende a 6.200,00 + IVA e encontram-se descritos no orçamento junto a fls. 151, reverso, e 152, cujo teor aqui damos por reproduzido.
21. Na carta referida em 16 a R. declarou: “Ficamos, assim, a aguardar que, no prazo máximo de 3 dias contados da recepção da presente comunicação, eliminem os defeitos mencionados, e informamos que caso tal não ocorra nos reservarmos o direito de concluirmos os trabalhos, eliminando defeitos e de ulteriormente reclamarmos o pagamento junto de V. Exas”.
22. Decorrido o prazo concedido na carta datada de 28 de Maio de 2019, em 6 de Junho de 2019 a R. enviou nova carta à A. na qual reclamou que realizasse “…os trabalhos de eliminação de defeitos na obra de empreitada identificada em epigrafe, e sendo certo que, como comunicamos a eventual demora na sua eliminação resulta em graves prejuízos para a Requerida e dono da obra, iremos fazer uso do direito de concluirmos os trabalhos, eliminando defeitos existentes, atento ao vosso reiterado incumprimento das obrigações de garantia de obra.
Apos a execução dos trabalhos enviaremos a respetiva fatura para o pagamento junto de V. Exas.”
23. A R. teve de contratar terceiros para reparar os danos causados pela fuga e infiltração de água supra referida, suportando os respectivos custos.
24. À data de 25 de Fevereiro de 2019 encontrava-se depositado no chão do apartamento do rés-do-chão do edifício referido em 1 areias, sacos de cimento e ferramentas, o que impossibilitava a execução de parte dos trabalhos contratados pela R. à A.
*** Factos considerados não provados em Primeira Instância:
- Para além do referido no ponto 5 do elenco de factos provados, o pagamento dos 50% do preço acordado previsto no orçamento ocorreria no termo da primeira semana de trabalhos de montagem dos móveis pela A.
- A. e R. fixaram uma cláusula penal correspondente a 3% do valor do orçamento de 22.12.2018 por cada semana de atraso em relação às datas previstas para a conclusão dos trabalhos.
- No decurso da execução dos trabalhos contratualizados, a R. sempre manifestou dificuldades de tesouraria para proceder ao pagamento integral de cada factura emitida pela A., de modo que a factura mais recente emitida por esta nunca era paga na totalidade, atentos os valores remanescentes em dívida, das anteriores já entretanto emitidas.
- A obra executada pela A. apresenta o seguinte defeito: fissuras no material de colagem de união à parede e afastamento dos aros da estrutura.
- Entre A. e R. foi acordado que as portas interiores da obra seriam executadas com o aro oculto e que as portas dos roupeiros seriam lacadas em ambas as faces.
- Não foi possível colocar os puxadores nas portas de acordo com o projecto de obra.
- Foram os funcionários da A. que efectuaram o furo no depósito de água da sanita referido no ponto 17, 3, do elenco de factos provados.
- A R. teve de contratar terceiros para concluir os trabalhos em falta e rectificar todo o trabalho efectuado pela A.
- A R. terá de despender quantia nunca inferior a 12.000,00 € para concluir e eliminar os defeitos verificados nos trabalhos adjudicados à A., bem como para reparar os danos referidos no ponto 20 do elenco de factos provados.
- A R., em vez de ter procedido ao pagamento do valor de 30% do preço do primeiro orçamento no momento da adjudicação, apenas veio a pagar tal maquia no dia de entrada em obra por parte da A.
- O referido no ponto 24 do elenco de factos provados ocorria também nas fracções do primeiro e segundo pisos do edifício.
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3.2. Da nulidade por falta de gravação
A Recorrente veio arguir a nulidade decorrente da falta de gravação (da acareação entre o legal representante da Autora e a testemunha F. P.).
Sustenta que está em causa uma nulidade processual, que arguiu atempadamente por requerimento apresentado em 01/07/2020, já após a prolação da sentença recorrida, e sobre o qual recaiu em 07/07/2020 o seguinte despacho:
“Ref.ª 2805990: a R. veio arguir a nulidade da gravação da audiência final porquanto, pretendendo recorrer da sentença proferida, e fazê-lo quanto à matéria de facto, requereu, presencialmente, no dia 25 de Junho de 2020, cópia da mesma, tendo constatado que dela não constava a acareação entre o legal representante da A. e a testemunha F. P., realizada no passado dia 12 de Fevereiro de 2020, durante a tarde.
Decidindo. O n.º 3 do artigo 155.º do CPC estabelece que a gravação da audiência final de acções, incidentes e procedimentos cautelares, obrigatória nos termos do n.º 1, deve ser disponibilizada às partes no prazo de dois dias a contar do respectivo acto. Dispõe o n.º 4 do mesmo artigo que a falta ou deficiência da gravação deve ser invocada no prazo de 10 dias a contar do momento em que a gravação é disponibilizada. A disponibilização, às partes, da gravação da audiência final de acções, incidentes e procedimentos cautelares, nos termos do artigo 155.º, n.º 3, do CPC, consiste na simples colocação, pela secretaria judicial, da referida gravação à disposição das partes para que estas possam obter cópia da mesma (sendo que “disponibilizar” também não é entregar o suporte digital da gravação às partes). A lei não prevê, por exemplo, a notificação das partes de que a gravação se encontra disponível na secretaria judicial porque, como se refere no Ac. do TRE de 12.10.2017 (processo 1382/14.2TBLLE-A.E1, acessível em www.dgsi.pt), “foi intenção do legislador que o procedimento tendente à obtenção de cópia da gravação pelas partes seja o mais simples possível, sem necessidade de realização de qualquer notificação pela secretaria e tendo em vista garantir que algum problema que se verifique com a gravação seja resolvido com rapidez, no tribunal de primeira instância. Se fosse intenção do legislador que a secretaria notificasse as partes de que a gravação está disponível, certamente o teria estabelecido expressamente. Todavia, não é, manifestamente, isso que o n.º 3 do artigo 151.º faz”. Refira-se ainda que o início da contagem do prazo para a invocação de eventual falta ou deficiência da gravação da prova não pode ficar dependente do livre alvedrio da parte quanto ao momento da obtenção da gravação, ou seja, sem qualquer limitação temporal para além da que decorreria do prazo de interposição do recurso da decisão. O entendimento acima explanado vem sendo perfilhado pelos Tribunais superiores, sendo disso exemplo os Acórdãos do TRL de 05.02.2015 (processo n.º 8/13.6TCFUN.L1-2); do TRC de 25.09.2018 (processo 7839/15.0TBLSB-A.C1); e do TRG de 16.05.2019 (processo 57308/18.0YIPRT.G1), todos disponíveis em www.dgsi.pt. Posto isto, a alegada falta da gravação ocorreu na sessão de audiência final realizada no dia 12.02.2020, pelo que o prazo previsto no n.º 3 do artigo 155.º do CPC terminou em 14.02.2020 e o do n.º 4 em 24.02.2020. Acontece que só no dia 1.07.2020 é que a A. veio arguir a falta da gravação nos termos acima descritos, ou seja, num momento em que o prazo previsto no n.º 4 do artigo 155.º do CPC já tinha decorrido, com a consequente sanação da eventual nulidade decorrente da falta da gravação. Em face do exposto, conclui-se que o requerimento apresentado pela A. é extemporâneo, o que tem como consequência o indeferimento da pretensão formulada. Notifique”.
Sustenta a Recorrente que o tribunal a quo fez uma incorreta interpretação e aplicação do artigo 155º do Código de Processo Civil, conjugado com o disposto nos artigos 640º e 195º do mesmo diploma.
Mais alega que embora esteja em causa uma nulidade processual que, à partida, não integra nulidade da sentença, da sua verificação decorre a nulidade da própria sentença.
Vejamos se lhe assiste razão.
As causas de nulidade de sentença encontram-se taxativamente enumeradas no artigo 615º do Código de Processo Civil, que dispõe no n.º 1 que:
“1- É nula a sentença quando: a) Não contenha a assinatura do juiz; b) Não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão; c) Os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível; d) O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento; e) O juiz condene em quantidade superior ou em objecto diverso do pedido”.
As nulidades da sentença, elencadas neste preceito, distinguem-se das nulidades processuais previstas nos artigos 186º e seguintes do Código de Processo Civil e que se consubstanciam em “quaisquer desvios do formalismo processual seguido, em relação ao formalismo processual prescrito na lei, a que esta faça corresponder – embora não de modo expresso – uma invalidação mais ou menos extensa dos actos processuais” (Cfr. Manuel A. Domingues de Andrade, Noções Elementares de Processo Civil, Reimpressão, Coimbra Editora, Limitada, 1993, página 176).
Nas nulidades processuais distinguem-se ainda as designadas nulidades principais, nominadas ou típicas, que se encontram taxativamente previstas nos artigos 186º, 187º, 191º, 193º e 194º do Código de Processo Civil, das nulidades secundárias, inominadas ou atípicas, que a lei regula no artigo 195º do Código de Processo Civil, sob a epigrafe “Regras gerais sobre a nulidade dos atos”, e que poderão ter na sua base a prática de um ato proibido, omissão de um ato prescrito na lei ou prática de um ato imposto ou admitido por lei, mas sem observação das formalidades previstas; estão em causa irregularidades verificadas na tramitação processual as quais só constituirão nulidade se a lei o determinar ou quando o vício cometido possa influir no exame ou na decisão da causa (quando se repercutam na sua instrução, discussão ou julgamento, ou em processo executivo na realização da penhora, venda ou pagamento – cfr. Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, Código de Processo Civil Anotado, Vol. 1.º, 3.ª Edição, página 381).
Esta distinção assume particular relevo uma vez que o regime das nulidades principais e das nulidades secundárias é distinto quer quanto à sua invocação, quer quanto aos seus efeitos.
Assim, quanto à arguição das nulidades principais a regra geral consta do artigo 196º do Código de Processo Civil e é a da oficiosidade do seu conhecimento, podendo as nulidades previstas nos artigos 187º e 194º ser arguidas em qualquer estado do processo, enquanto não devam considerar-se sanadas, enquanto as nulidades previstas nos artigos 186º e no n.º 1 do artigo 193º apenas podem ser arguidas até à contestação (cfr. artigo 198º n.ºs 1 e 2).
Fora dos casos a que se refere o artigo 196º a nulidade só pode ser invocada pelo interessado na observância da formalidade ou na repetição ou eliminação do ato, não podendo ser arguida pela parte que lhe deu causa ou que, expressa ou tacitamente, renunciou à arguição (cfr. artigo 197º).
Quanto às nulidades secundárias a regra é a da sua inoficiosidade, podendo o juiz delas conhecer oficiosamente de ocorrerem no decurso de ato a que presida conforme decorre do artigo 199º n.º 2 do Código de Processo Civil); estabelece o n.º 1 deste preceito que se a parte estiver presente, por si ou por mandatário, no momento em que forem cometidas, podem ser arguidas enquanto o ato não terminar, isto é, até ao termo desse acto; se não estiver presente ou representada, o prazo de 10 dias para a arguição (v. artigo 149º n.º 1) conta-se do dia em que, depois de cometida a nulidade, a parte intervier em algum ato praticado no processo ou for notificada para qualquer termo dele, mas, neste último caso, só quando deva presumir-se que então tomou conhecimento da nulidade ou quando dela pudesse conhecer, agindo com a devida diligência.
No caso sub judice a Recorrente aceita estar em causa uma nulidade processual mas sustenta que da sua verificação decorre a nulidade da própria sentença.
Importa então apurar se foi tempestivamente arguida a nulidade da gravação perante o tribunal a quo e se este fez uma incorreta interpretação e aplicação do artigo 155º do Código de Processo Civil, e ainda se, a verificar-se a invocada nulidade, a mesma determina a nulidade da sentença recorrida.
Conforme preceitua o artigo 155º do Código de Processo Civil, na parte que aqui releva, “1 - A audiência final de ações, incidentes e procedimentos cautelares é sempre gravada, devendo apenas ser assinalados na ata o início e o termo de cada depoimento, informação, esclarecimento, requerimento e respetiva resposta, despacho, decisão e alegações orais. 2 - A gravação é efetuada em sistema sonoro, sem prejuízo de outros meios audiovisuais ou de outros processos técnicos semelhantes de que o tribunal possa dispor. 3 - A gravação deve ser disponibilizada às partes, no prazo de dois dias a contar do respetivo ato. 4 - A falta ou deficiência da gravação deve ser invocada, no prazo de 10 dias a contar do momento em que a gravação é disponibilizada (…)”.
O regime da gravação da audiência e documentação de atos presididos pelo juiz sofreu alterações com a entrada em vigor do Código de Processo Civil de 2013 passando a gravação a ter “um outro significado e uma maior amplitude: abarca a gravação da audiência final e não apenas da prova oralmente produzida; e reporta «-se a todas as audiências finais, ou seja, de acções, de incidentes e de procedimentos cautelares. Ademais ocorre por imposição legal, sem necessidade de requerimento e independentemente da questão do recurso” (cfr. António Santos Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Pires de Sousa, Código de Processo Civil Anotado, Vol. I - Parte Geral e Processo de Declaração, Almedina, 2018, página 189).
O n.º 4 do referido artigo 155º veio fixar expressamente o prazo de arguição do vício da falta ou deficiência da gravação estabelecendo que deve ser invocado no prazo de dez dias a contar do momento em que a gravação é disponibilizada, sendo que esta deve ser disponibilizada às partes no prazo de dois dias a contar do respectivo ato (cfr. n.º 3 do mesmo preceito).
Deste preceito decorre que a gravação deve ser disponibilizada às partes no prazo de dois dias após a realização do ato e que as partes devem invocar a falta ou deficiência da gravação no prazo de 10 dias, contados da sua disponibilização pelo que “é de concluir que o prazo de arguição da deficiência conta-se a partir do termo do prazo de disponibilização da gravação imposto ao tribunal (dois dias), ou antes, se a gravação for entregue à parte antes desse prazo, devendo descontar-se eventual atraso do tribunal na disponibilização efetiva da gravação à parte (ou na prestação da informação acerca da sua inexistência) que a tenha solicitado ainda dentro do aludido prazo global de 12 dias” (Cfr. Acórdãos desta Relação de 16/05/2019, Processo n.º 57308/18.0YIPRT.G1, Relator Desembargador Alcides Rodrigues, e de 12 março 2020, Processo n.º 5253/18.5T8BRG.G1, Relatora Desembargadora Purificação Carvalho, ambos disponíveis em www.dgsi.pt).
As partes (sem prejuízo da iniciativa oficiosa do juiz durante a audiência – artigo 199º n.º 2 do Código de Processo Civil) passam a ter o ónus de ouvir a gravação e verificar se a mesma não padece de qualquer deficiência, por forma a poder invocar a sua falta ou deficiência, uma vez que se não for tempestivamente arguida a nulidade “pode a parte ficar limitada, ou, na maior parte dos casos, mesmo efetivamente impedida de preencher o ónus de alegação e motivação no recurso de apelação (bem como dos ónus impostos no exercício do contraditório a que o recorrido tem direito, nesta sede) quando a impugnação assente, de modo exclusivo ou não, na necessidade de alteração por erro de julgamento da matéria de facto que foi decidida pela primeira instância” (Elisabeth Fernández, Um Novo Código de Processo Civil? Em busca das Diferenças, Vida Económica, 2014, página 36).
Tal como reconhece a Recorrente a omissão ou deficiência da gravação configura uma nulidade processual: está em causa a omissão duma formalidade prescrita por lei que a parte interessada deve arguir autonomamente (artigos 195º e 197º, ambos do Código de Processo Civil).
Como se afirma nos Acórdãos desta Relação já citados, que aqui acompanhamos, “decorrido aquele prazo global de 12 dias (= 2 + 10) sem que seja arguido o vício em causa, fica o mesmo sanado, não podendo oficiosamente ser conhecido pela Relação, nem podendo tal nulidade processual ser arguida pela parte interessada no prazo de interposição de recurso (30 ou 40 dias) e apenas nas próprias alegações de recurso” (v. também António Santos Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Pires de Sousa, obra citada, página 190); daí afirmar-se “que a omissão ou deficiência das gravações é, após a entrada em vigor do Código de Processo Civil aprovado pela Lei n.º 41/2013, um problema que deve ficar definitivamente resolvido ao nível da primeira instância, quer pela intervenção oficiosa do juiz que preside ao acto, quer mediante arguição dos interessados. Tal regime tem o mérito de permitir que a questão seja colocada de imediato ao tribunal de 1.ª instância e este possa de imediato desencadear todas as diligências necessárias ao suprimento das falhas que afectem a gravação, evitando a subida de recursos “condenados” a gerarem anulações e repetições de actos evitáveis, constituindo, além do mais, expressão do princípio da autorresponsabilização das partes”.
No caso concreto constata-se que a Recorrente arguiu, como lhe competia, a deficiência da gravação na parte respeitante à acareação entre o legal representante da Autora e a testemunha F. P., no tribunal a quo, no entanto não o fez tempestivamente.
De facto, quando a audiência decorre por mais do que uma sessão o prazo de dois dias de disponibilização da gravação deve considerar-se por referência a cada concreta sessão (v. António Santos Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Pires de Sousa, obra citada, página 190).
Ora, tendo a sessão em causa ocorrido no dia 12 de fevereiro de 2020 (cfr. ata junta a fls. 180 dos autos) quando em 01/07/2020 a Recorrente veio arguir a falta de gravação havia já decorrido o referido prazo previsto na lei para esse efeito.
Ter-se-á, assim, de concluir, tal como concluiu o tribunal a quo no despacho proferido em 07/07/2020, que a arguição foi intempestiva e que o vício se acha sanado por não ter sido conhecido oficiosamente no decurso da sessão da audiência e nem arguido em tempo, estando vedado agora a esta Relação o seu conhecimento.
E, mostrando-se sanada a irregularidade impõe-se ainda concluir estar precludido o direito de arguir esse vício no prazo de interposição de recurso, nas próprias alegações de recurso, e não ocorrer, por essa via, qualquer nulidade da sentença recorrida.
Improcede, por isso, e nesta parte, o recurso.
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3.3. Da nulidade da sentença por verificação das circunstâncias previstas no artigo 615º do Código de Processo Civil
As causas de nulidade de sentença (ou de outra decisão), taxativamente enumeradas no referido artigo 615º do Código de Processo Civil, conforme se escreve no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 17/10/2017 (Relator Conselheiro Alexandre Reis, Processo n.º 1204/12.9TVLSB.L1.S1, disponível em www.dgsi.pt) “visam o erro na construção do silogismo judiciário e não o chamado erro de julgamento, a injustiça da decisão, ou a não conformidade dela com o direito aplicável, nada tendo a ver com qualquer de tais vícios a adequação aos princípios jurídicos aplicáveis da fundamentação utilizada para julgar a pretensão formulada: não são razões de fundo as que subjazem aos vícios imputados, sendo coisas distintas a nulidade da sentença e o erro de julgamento, que se traduz numa apreciação da questão em desconformidade com a lei”.
As decisões judiciais podem encontrar-se viciadas por causas distintas, sendo a respectiva consequência também diversa: se existe erro no julgamento dos factos e do direito, a respectiva consequência é a revogação, se foram violadas regras próprias da sua elaboração e estruturação, ou que respeitam ao conteúdo e limites do poder à sombra do qual são decretadas, são nulas nos termos do referido artigo 615º.
As nulidades da sentença não se confundem, por isso, com o chamado erro de julgamento e, sobretudo, não deve confundir-seo inconformismo quanto ao teor da decisão com os vícios que determinam as nulidades em causa.
Como vem sendo reconhecido é “impressionante a frequência com que, em sede de recurso, são invocadas nulidades da sentença ou de acórdãos, denotando um número significativo de situações em que o verdadeiro interesse da parte não é verdadeiramente obter uma correta apreciação do mérito da causa, mas de “anular” a toda a força a sentença com que foi confrontada (…) seria bom que se interiorizasse que, atento o disposto no art. 655º, n.º 1, que regula os poderes da Relação no âmbito do recurso de apelação, a sua verificação não determina necessariamente a remessa dos autos ao tribunal de 1ª instância, antes implica a substituição imediata por parte da relação (…) Acresce ainda uma frequente confusão entre nulidade da decisão e discordância quanto ao resultado, entre a falta de fundamentação e uma fundamentação insuficiente ou divergente da pretendida ou mesmo entre a omissão de pronuncia (relativamente a alguma questão ou pretensão) e a falta de resposta a algum argumento dos muitos que florescem nas alegações de recurso” (António Santos Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, Código de Processo Civil Anotado, Vol. I, página 736 a 737).
No caso dos autos cremos ser patente a confusão da Recorrente entre as nulidades da sentença e o erro de julgamento, a discordância quanto ao decidido (vide em particular as conclusões 76 e 77).
Aliás, a Recorrente invoca no presente recurso de forma absolutamente genérica a “verificação das circunstâncias previstas nas várias alíneas do art.º 615.º n.º 1 do C.P.C.”.
E tais circunstâncias relativas à sentença são as seguintes:
a) Não contenha a assinatura do juiz;
b) Não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão;
c) Os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível;
d) O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento;
e) O juiz condene em quantidade superior ou em objecto diverso do pedido.
Ora, analisada a sentença recorrida é por demais evidente que a mesma contém a assinatura do juiz, específica os fundamentos de facto e de direitos que justificam a decisão, não consta qualquer ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível, dela constam apreciadas todas as questões submetidas à apreciação do tribunal (não mencionando aliás a Recorrente que assim não seja) e nem existe condenação em quantidade superior ou em objecto diverso do pedido (o que também não é indicado pela Recorrente). E quanto à alegada oposição entre os fundamentos e a decisão também nada se vislumbra.
A Recorrente invoca ainda o excesso de pronúncia alegando que nunca foi feita menção a trabalhos a mais ou outros contratos, designadamente os que o tribunal a quo refere na motivação e que estava vedado ao tribunal conhecer de tal questão.
Porém, o tribunal a quo não conheceu de qualquer questão relacionada com trabalhos a mais e nem qualquer outro contrato senão os que foram invocados pela Autora e a que respeitam os dois orçamentos mencionados no ponto 4) dos factos provados; na motivação o tribunal a quo limita-se a fazer uma análise da prova que foi produzida, designadamente do que foi declarado pelo legal representante da Autora e pelas testemunhas e o que consta da prova documental.
Como já referimos, o que está em causa é o facto de a Recorrente entender existir erro de julgamento e discordar do decidido em 1ª Instância; tal não se confunde, contudo, com a nulidade da sentença.
Assim, analisada a sentença proferida em 1ª Instância é manifesto não se verificar qualquer nulidade, improcedendo também nesta parte o recurso.
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3.4. Da modificabilidade da decisão de facto
Sustenta a Recorrente que houve erro no julgamento da matéria de facto quanto aos pontos 8) e 24) dos factos provados, entendendo que deve ser alterada a sua redacção de forma a que do ponto 8) conste que o inicio dos trabalhos ocorreu no dia 18 de janeiro de 2019, que obra foi entregue no decurso da primeira semana de abril e a conclusão simultânea de todos os trabalhos nessa data, e do ponto 24) conste que “tal impossibilitava a execução dos trabalhos contratados apenas nesse dia” ou, pelo menos, concretizar qual o período em que o impedimento ocorreu.
Decorre do n.º 1 do artigo 662º do Código de Processo Civil que a Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa.
E a impugnação da decisão sobre a matéria de facto é expressamente admitida pelo artigo 640º, n.º 1 do Código de Processo Civil, segundo o qual o recorrente deve obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição, os pontos de facto que considera incorretamente julgados, os concretos meios de prova, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão diversa e a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre essas questões de facto.
Analisemos então os motivos da discordância da Recorrente quanto aos pontos impugnados, os quais têm a seguinte redacção:
“8. Após aceitação, por banda da R., dos valores previstos em orçamento, a A. iniciou os trabalhos em Janeiro de 2019 nas várias fracções do prédio, tendo dado os mesmos por concluídos no início do mês de Abril do mesmo ano. 24. À data de 25 de Fevereiro de 2019 encontrava-se depositado no chão do apartamento do rés-do-chão do edifício referido em 1 areias, sacos de cimento e ferramentas, o que impossibilitava a execução de parte dos trabalhos contratados pela R. à A.”.
Analisada a posição da Autora temos de concluir que assiste razão à Recorrente relativamente ao inicio dos trabalhos pois a própria Autora veio alegar a data concreta em que iniciou os trabalhos: 18 de janeiro de 2019 (cfr. ponto 8º do articulado que apresentou de resposta às exceções invocadas na oposição); aliás, no próprio requerimento de injunção a Autora indicou como período “18/01/2019 a 01/04/2019”, não obstante no ponto 5), que é reproduzido no ponto 8) dos factos provados, fazer apenas referência ao início dos trabalhos em janeiro de 2019.
Quanto a dar-se como provado que a obra foi entregue no decurso da primeira semana de abril, alterando-se nesse sentido a parte final do ponto 8) entendemos que tendo sido julgado provado que os trabalhos foram dados por concluídos no início do mês de Abril, não releva introduzir qualquer alteração; da mesma forma que não deve passar a constar a conclusão simultânea de todos os trabalhos nessa data por não ser essa a conclusão a retirar do alegado no artigo 67º do articulado da Autora. Neste artigo a Autora alega ter concluído e entregue a obra naquela data em resposta à posição da Recorrente que alegara ter aquela abandonado a obra sem concluir os trabalhos (cfr. artigo 45º da oposição apresentada), e fá-lo no pressuposto de ter sido celebrado apenas um contrato de empreitada (e daí referir-se à entrega da obra), quando, tal como foi reconhecido pelo tribunal a quo, foram celebrados dois contratos de empreitada (e apenas num fixada a clausula penal), o que também consideramos e não é colocado em causa pela Recorrente (cfr. conclusão 79º). Daí que a afirmação de que os trabalhos foram dados por concluídos no início do mês de abril não tenha subjacente, por si só, a ideia da conclusão simultânea de todos os trabalhos na referida data.
Assim, e em face do exposto, altera-se a redacção do referido ponto 8) dos factos provados para do mesmo passe a constar:
“8. Após aceitação, por banda da R., dos valores previstos em orçamento, a A. iniciou os trabalhos em 18 de janeiro de 2019 nas várias fracções do prédio, tendo dado os mesmos por concluídos no início do mês de Abril do mesmo ano”.
Relativamente ao ponto 24) dos factos provados e tal como refere a Recorrente o mesmo respeita apenas ao rés-do-chão, ou seja ao orçamento de 22/12/2019 e não influi nos trabalhos e cumprimento do prazo relativamente às demais fracções a que se reporta o primeiro orçamento datado de 11/12/2019; tal resulta evidente se conjugado com o facto de ter sido julgado não provado que o referido em 24) ocorria também nas fracções do primeiro e segundo pisos.
Ou seja, o ponto 24) apenas assume relevo relativamente ao segundo contrato de empreitada celebrado entre as partes que teve por objecto os trabalhos na fracção do rés-do-chão, sendo que quanto a este não resulta dos autos ter sido acordada a fixação de qualquer cláusula penal tal como decidido em primeira instância e não questionado no presente recurso (veja-se o ponto 5) dos factos provados e os factos julgados não provados, matéria não impugnada pela Recorrente).
Ora, a Recorrente pretende com o presente recurso que se reconheça a existência de um crédito sobre a Recorrida decorrente da aplicação da cláusula penal e procedente a compensação de créditos, pois que na sentença o tribunal a quo julgou procedente a exceptio non adimpleti contractus invocada pela Recorrente mas entendeu não haver lugar a qualquer compensação de créditos, designadamente por força do accionamento da cláusula penal.
O crédito que a Recorrente pretende ver reconhecido respeita tão só ao primeiro contrato de empreitada celebrado, ao primeiro orçamento datado de 11/12/2019 que, como vimos, tem a ver com as fracções do primeiro e segundo pisos e já não com a do rés-do-chão.
Temos pois de concluir que ainda que fosse alterada a redacção do ponto 24) da matéria provada, como pretende a Recorrente, tal nunca seria susceptível de alterar a decisão jurídica da causa relativamente ao crédito que a Recorrente pretende seja reconhecido e nem à compensação que entende dever ser operada, sendo nesta parte que pretende ver revogada a decisão proferida.
Assim, apreciar a pretendida alteração à redacção do ponto 24) da matéria de facto provada traduzir-se-ia na prática de um ato absolutamente inútil, que a lei não permite por força do disposto no artigo 130º do Código de Processo Civil (v. neste sentido, entre vários outros, os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 17/05/2017, Processo n.º 4111/13.4TBBRG.G1.S1 , Relatora Conselheira Fernanda Isabel Pereira, desta Relação de 08/02/2018, Processo n.º 96/14.8TBAMR.G1, Relatora Desembargadora Maria Amália Santos e de 22/10/2020, Processo n.º 5397/18.3T8BRG.G1, Relatora Desembargadora Maria João Matos e do Tribunal da Relação do Porto de 14/07/2020, Processo n.º 1429/18.3T8VLG.P1, Relatora Desembargadora Rita Romeira, todos em www.dgsi.pt.).
Não se deverá pois proceder à reapreciação da matéria de facto quando a formulação de tal matéria nos termos pretendidos pelo recorrente não tenha qualquer relevância jurídica, sob pena de, assim não sendo, se estarem a praticar actos inúteis, que a lei não permite.
Improcede, por isso, nesta parte a pretensão da Recorrente, alterando-se apenas a redacção do ponto 8) dos factos provados nos termos expostos.
Assim, mantendo-se a matéria de facto não provada tal como julgada em 1ª Instância, passa a matéria de facto a ter a seguinte formulação:
“I. Factos Provados
1. A A. é uma sociedade comercial que desenvolve a actividade de carpintaria e pintura de edifícios.
2. A R. é uma sociedade comercial que tem por objecto a actividade de construção civil e obras públicas, serviços de engenharia e arquitectura.
3. No âmbito do desenvolvimento das acima referidas actividades, em Dezembro de 2018, a R. contratou a A. para esta efectuar uma empreitada de colocação de cozinhas, portas, roupeiros, móveis de casa de banho, escadas, rodapés, entre outros produtos de mobiliário, num empreendimento imobiliário que consistiu numa obra de requalificação de um edifício composto por rés-do-chão, primeiro e segundo andar, convertido em propriedade horizontal, sito na Rua ..., União das Freguesias de Viana do Castelo (... e ...) e ....
4. A. e R. começaram a encetar negociações em Dezembro de 2018, no âmbito das quais a primeira apresentou à segunda dois orçamentos, por esta aceites, a saber: o orçamento n.º 2/8.24, de 11.12.2018, no valor de 19.386,00 €, referente às fracções autónomas do primeiro e segundo andares do edifício acima identificado; e, mais tarde, o orçamento 2/8.59, de 22.12.2018, no valor de 5.773,00 €, referente ao rés-do-chão do referido edifício.
5. Foi acordado pelas partes que o pagamento dos preços referidos em 4 seria efectuado da seguinte forma: 30% no acto de adjudicação da obra; 50% após o termo da construção do material/móveis pela A.; e 20% do preço no final da colocação dos móveis em obra.
6. Ademais, as partes fixaram os prazos de entrada em obra em quatro semanas após a adjudicação e a data de conclusão dos trabalhos em duas semanas após a entrada em obra pela A.
7. E fixaram uma cláusula penal correspondente a 3% do valor do orçamento de 11.12.2018 por cada semana de atraso em relação às datas previstas para a conclusão dos trabalhos. 8. Após aceitação, por banda da R., dos valores previstos em orçamento, a A. iniciou os trabalhos em 18 de janeiro de 2019 nas várias fracções do prédio, tendo dado os mesmos por concluídos no início do mês de Abril do mesmo ano.
9. Por conta da sobredita empreitada, encontra-se em dívida o valor total de 6.998,00 €, traduzido no somatório de valores não pagos por referência às facturas n.ºs 2/454 e 2/415.
10. As facturas n.ºs 2/454 e 2/415, venceram-se, respectivamente, nos dias 1.04.2019 e 18.02.2019.
11. Em 12.04.2019, a R. devolveu à A. a factura n.º 2/454, invocando que se verificaram atrasos na execução da obra e por se terem encontrado defeitos, designadamente nas portas.
12. A R. pagou à A. apenas parte da factura n.º 2/415 pelos mesmos motivos referidos em 11.
13. Após a devolução da referida factura, a A. enviou uma carta à R. em 11 de Abril de 2019, declarando que reenviava a factura.
14. Em 26.04.2019, a R. remeteu à A. uma carta com o seguinte teor:
“Acusamos, pelo presente, a recepção da vossa carta datada de 11 de abril de 2019 relativa à obra empreitada, a realizar na Rua ..., Viana do Castelo, adjudicada à vossa empresa em 28/12/2018, conforme vosso orçamento n.º 278.24 de 11.12.2018 e ainda da ulterior adjudicação, em 12.12.2018, pela nossa empresa, de aditamento ao orçamento.
Recordamos que nos dois atos, foram fixadas as condições de pagamento e os respectivos prazos, bem como as cláusulas penais no caso de mora da vossa responsabilidade.
Certamente, por terem recorrido a tão profusa e eloquente linguagem esqueceram o essencial da questão: os factos.
Desde logo, referem que reenviam a factura que nós antes devolvemos. Porem não o fazem, sendo que a carta vem desacompanhada de qualquer documento.
Acresce que, caso tal sucedesse, nos veríamos, mais uma vez, pelas mesmas razões, obrigados a devolver a mesma, pois reiteramos, não a aceitamos.
Na verdade, e como bem sabem, apos a referida adjudicação efetuamos pagamento no 28/12/2018 sendo que a vossa empresa apenas entrou em obra no dia 18/01/2019. Ulteriormente, por comunicação escrita foi realizada a adjudicação de aditamento ao orçamento inicial em 25/01/2019, e reiteradas as condições de pagamento e prazos e clausulas penais por mora.
Estranhamente, ou não - porque depois de lida a vossa carta já nada nos parece estranho -, só no dia 29 de janeiro de 2019 – quando, como se disse, as condições de pagamento foram previamente enviadas por e-mail no dia 12/12/2018, (sendo que, ate aquela data não tivemos qualquer sinal de desacordo da vossa parte), vem V. Exas. manifestar alegada discordância com as condições de pagamento.
Obviamente, para não qualificar este comportamento, nem dizer mais, diremos apenas que não nos parece correto nem aceitamos que, após efetuarmos os pagamentos, queiram alterar essas condições, ou seja alterarem unilateralmente e de forma superveniente as condições iniciais ajustadas pelas partes e mencionadas no e-mail de adjudicação.
Assim, dito isto, obviamente para nós contratos e a palavra mantem-se.
Ademais, como bem sabem, pese o hábil exercício de retorica expresso na vossa carta, existem múltiplos incumprimentos da vossa parte que justificam não aceitemos a factura dos trabalhos porquanto os trabalhos a que esta alegadamente se refere ou não estão terminados, ou estão executados de forma incorreta e em desacordo com o contratado ou ainda desajustados dos prazos e valores de pagamento contratados. Alem do mais, permitimo-nos recordar que as portas interiores da obra não foram executadas pela vossa empresa conforme nós solicitamos, discutimos uma nova solução para eliminar o erro da vossa responsabilidade com V. Exas. em consequência do qual estas tiveram que ser aumentadas, para que fosse possível executar o aro oculto conforme pretendido e também não foi possível colocar os puxadores que nós escolhemos inicialmente de acordo com o projecto.
Acresce que, as portas dos roupeiros apenas estão lacadas numa das faces quando solicitamos lacagem em ambas as faces.
Em relação ao apartamento sem pavimento, era apenas o do R/chão que assim se encontrava (e este corresponde ao apartamento que adjudicamos posteriormente no dia 25/01/2019), sendo que além disso não é necessário pavimento para a montagem da carpintaria…
Ao contrário do que afirmam, o corte da chapa não impediu a continuidade dos trabalhos, pois o material para a montagem das escadas não se encontrava em obra. Assim, rejeitamos em absoluto as acusações e imputações que realizam na vossa missiva, as ameaças veladas que realizam no termino da mesma – sendo que esta empresa tem também um departamento jurídico que, se necessário, a manter-se a vossa atuação, dará resposta a V. Exas. intentando a competente acção judicial – e reiteramos tudo o que deixamos expresso nesta e noutras comunicações quanto a execução do contrato adjudicado.
Aproveitamos para apresentar o cálculo dos valores de penalizações devidos por V. Exas. A nossa empresa pelo incumprimento contratual que se verifica:
- Data de adjudicação 1º orçamento: 28/12/2018
- Data de conclusão obra 1º Orçamento:22/02/2019 - Semanas de atraso: 9 semanas
- Data de adjudicação 2º orçamento: 25/01/2019
- Data de conclusão obra 1º Orçamento:22/02/2019 - Semanas de atraso: 5 semanas 1º Orçamento= 19.712€x9semanasx3% 2º Orçamento= 5773€x5semanasx3% Total Penalizações = 6188.19€
Oportunamente apresentaremos a respectiva nota sem prejuízo da interpelação que se segue.
Ficamos, assim, a aguardar terminem os trabalhos no prazo de oito dias e retifiquem a factura devolvida sob pena de considerarmos haver, da vossa parte abandono da obra, e nos reservarmos o direito de concluirmos os trabalhos, eliminando defeitos e de ulteriormente reclamarmos o pagamento junto de V. Exas.”
15. A A. recebeu a carta referida em 14 e não se apresentou em obra nem deu qualquer resposta ou procedeu a qualquer pagamento ou emissão de nota de crédito relativos às facturas que emitira.
16. Em 28 de Maio de 2019 a R. enviou nova comunicação escrita à A., com o seguinte teor: “…na qualidade de donos da obra de empreitada identificada em epigrafe, conforme vosso orçamento n.º 278.24 de 11.12.2018 e ainda da ulterior adjudicação, em 12.12.2018, pela nossa empresa, de aditamento ao orçamento, denunciar junto de V. Exa. a existência dos defeitos abaixo identificados conhecidos no decurso da presente semana, sem prejuízo dos já previamente denunciados na nossa anterior comunicação escrita, requerendo, desde já, que nos termos do disposto no art. 1221.º do CC. procedam urgentemente à sua eliminação”.
17. E informou a A. do seguinte:
1. Os aros das portas apresentam defeitos na execução da colocação e fixação; surgiram fissuras no material de colagem de união à parede e afastamento dos aros da estrutura.
2. A lacagem das portas foi mal executada apresentando, nesta data, o surgimento de fissuras e quebras na superfície lacada, defeitos que se vem acentuando diariamente e tornando mais visíveis.
3. Na sequência da instalação e operação de fixação da estrutura e móveis de cozinha do T0 do 2.º andar, por incúria e negligência na execução da furagem da parede para fixação causaram danos (furo) no depósito da estrutura do depósito de água da sanita.
18. A lacagem de algumas das portas colocadas na obra referida em 1. foi mal executada, apresentando fissuras na superfície lacada.
19. Do furo referido em 3. do antecedente ponto 17, resultou infiltração de água no edifício, que penetrou no apartamento do piso inferior, causando danos diversos que obrigaram a intervenção imediata e urgente de reparação, inclusive com levantamento de pavimentos e outros trabalhos.
20. Os trabalhos necessários para reparar os danos referidos em 19 ascende a 6.200,00 + IVA e encontram-se descritos no orçamento junto a fls. 151, reverso, e 152, cujo teor aqui damos por reproduzido.
21. Na carta referida em 16 a R. declarou: “Ficamos, assim, a aguardar que, no prazo máximo de 3 dias contados da recepção da presente comunicação, eliminem os defeitos mencionados, e informamos que caso tal não ocorra nos reservarmos o direito de concluirmos os trabalhos, eliminando defeitos e de ulteriormente reclamarmos o pagamento junto de V. Exas”.
22. Decorrido o prazo concedido na carta datada de 28 de Maio de 2019, em 6 de Junho de 2019 a R. enviou nova carta à A. na qual reclamou que realizasse “…os trabalhos de eliminação de defeitos na obra de empreitada identificada em epigrafe, e sendo certo que, como comunicamos a eventual demora na sua eliminação resulta em graves prejuízos para a Requerida e dono da obra, iremos fazer uso do direito de concluirmos os trabalhos, eliminando defeitos existentes, atento ao vosso reiterado incumprimento das obrigações de garantia de obra.
Apos a execução dos trabalhos enviaremos a respetiva fatura para o pagamento junto de V. Exas.”
23. A R. teve de contratar terceiros para reparar os danos causados pela fuga e infiltração de água supra referida, suportando os respectivos custos.
24. À data de 25 de Fevereiro de 2019 encontrava-se depositado no chão do apartamento do rés-do-chão do edifício referido em 1 areias, sacos de cimento e ferramentas, o que impossibilitava a execução de parte dos trabalhos contratados pela R. à A.”
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3.5. Reapreciação da decisão de mérito da acção
No que se refere especificamente à decisão jurídica da causa, e não obstante a alteração no quadro factual julgado provado, ter-se-á de manter a mesma, a qual em nosso entender se mostra adequada e correcta face à factualidade apurada e aos normativos aplicáveis.
Vejamos.
A decisão recorrida, julgando a acção parcialmente procedente, condenou a Recorrente Y Construções Lda. a pagar à Autora X - Sociedade Unipessoal de Carpintari, Lda. a quantia de €6.998,00 contra a eliminação simultânea dos defeitos identificados no ponto 18) do elenco de factos provados por parte da Autora e absolveu a Ré do mais peticionado, julgando dessa forma procedente a exceptio non adimpleti contractus invocada pela Recorrente mas improcedente a pretensão desta de ver reconhecidos dois créditos, um decorrente do accionamento da cláusula penal e outro de danos alegadamente sofridos em virtude de infiltrações de água que decorreram de comportamento ilícito da Autora, e consequentemente, da compensação de créditos.
A Recorrente pretende no presente recurso ver reconhecido apenas o seu alegado crédito decorrente do accionamento da cláusula penal e operada a compensação deste com o crédito da Autora.
Sustenta que lhe assiste o direito a indemnização 9pela mora por força da cláusula penal contratualmente prevista uma vez que a Autora iniciou os trabalhos nas várias fracções do prédio em 18 de janeiro de 2019 e devia conclui-los em duas semanas após a entrada em obra (cfr. ponto 6 dos factos provados), tendo dado os mesmos por concluídos no início do mês de abril.
Vejamos se lhe assiste razão.
Sobre a compensação de créditos dispõe o artigo 847º do Código Civil que “1. Quando duas pessoas sejam reciprocamente credor e devedor, qualquer delas pode livrar-se da sua obrigação por meio de compensação com a obrigação do seu credor, verificados os seguintes requisitos:
a) Ser o seu crédito exigível judicialmente e não proceder contra ele excepção, peremptória ou dilatória, de direito material; b) Terem as duas obrigações por objecto coisas fungíveis da mesma espécie e qualidade. 2. Se as duas dívidas não forem de igual montante, pode dar-se a compensação na parte correspondente. 3. A iliquidez da dívida não impede a compensação”.
A compensação traduz-se fundamentalmente na extinção de duas obrigações, “sendo o credor de uma delas devedor na outra, e o credor desta última devedor na primeira” e “representa um encontro de contas, que se justifica pela conveniência de evitar pagamentos recíprocos” (v. Mário Júlio de Almeida Costa, Direito das Obrigações, 12ª Edição Revista e Atualizada, 2014, página 1099).
A compensação é, por isso, um meio de o devedor se livrar da sua obrigação, por extinção simultânea do crédito equivalente de que disponha sobre o seu credor (cfr. Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, Vol. II, Reimpressão da 7ª Edição, página 196 e Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 11/07/2019, Processo n.º 1664/16.9T8OER-A.L1.S1, Relator Conselheiro Bernardo Domingos, disponível em www.dgsi.pt).
Segundo Antunes Varela (ob. cit. página 204) “Para que o devedor se possa livrar da obrigação por compensação, é preciso que ele possa impor nesse momento ao notificado a realização coativa do crédito (contra crédito) que se arroga contra este”, dai que o crédito do compensante tenha de ser exigível judicialmente e não estar sujeito a nenhuma excepção, peremptória ou dilatória, de direito material, sendo “judicialmente exigível a obrigação que, não sendo voluntariamente cumprida, dá direito à ação de cumprimento e à execução do património do devedor (art. 817º) (…).”
Menezes Cordeiro (Da Compensação no Direito Civil e no Direito Bancário, página 115 e 116) considera que a exigibilidade, como requisito da compensação, traduz a necessidade de que os créditos em presença possam ser cumpridos “[Q]uanto ao crédito activo, isso implica: - que seja válido e eficaz; que não seja produto de obrigação natural; que não esteja pendente de prazo ou de condição; que não seja detido por nenhuma excepção; que possa ser judicialmente actuado; que se possa extinguir por vontade do próprio […]. No tocante ao crédito passivo, podemos dispensar, dos apontados requisitos, o não ser obrigação natural, a pendência do prazo, quando estabelecido a favor do compensante, numa asserção extensiva à compensação, por analogia e o problema das excepções: estando tudo isso na disponibilidade do compensante, ele prescindirá, necessária e automaticamente, das inerentes posições, quando pretenda compensar”.
No caso em apreço o que está em causa é a própria existência de um crédito da Recorrente sobre a Recorrida, posto que o tribunal a quo entendeu não ser a Recorrente titular de qualquer crédito que possa ser compensado com o da Recorrida.
O crédito invocado pela Recorrente funda-se no contrato de empreitada celebrado e no accionamento da cláusula penal aí fixada por alegadamente não ter a Autora cumprido os prazos acordados.
Nos termos do artigo 810º n.º 1 do Código Civil as partes podem fixar por acordo o montante da indemnização exigível: é o que se chama cláusula penal.
Segundo Pinto Monteiro (v. Cláusula Penal e Indemnização, Almedina,1990, página 259) este preceito estabelece uma modalidade de cláusula penal, de cláusula de liquidação prévia do dano ou de fixação antecipada da indemnização: o objetivo das partes é, neste caso, calcular o montante do dano previsível, aceitando ambas que a indemnização a pagar será a que tiver sido previamente acordada entre si, independentemente da extensão concreta do dano efectivo.
O principal objectivo da cláusula penal “é evitar dúvidas futuras e litígios entre as partes quanto à determinação do montante da indemnização. Muitas vezes, porém, ela é fixada com o carácter de verdadeira penalidade, ou, ao contrário, com o intuito de por um limite à responsabilidade, nos casos em que os danos possam atingir proporções exageradas em relação às previsões normais dos contraentes. Também pode servir para atribuir carácter patrimonial a prestações que o não têm” (Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, Volume II, 3ª Edição Revista e Atualizada, página 74).
Conforme decorre do preceituado no n.º 1 do referido artigo 810º a cláusula penal é fixada por acordo das partes, o que ocorre segundo o princípio da liberdade contratual (cfr. artigo 405º do Código Civil), estando contudo sujeita às formalidades exigidas para a obrigação principal, sendo nula se for nula esta obrigação (n.º 2 do artigo 810º) e podendo ser reduzida pelo tribunal, de acordo com a equidade (artigo 812º).
In casu, conforme consta dos factos provados (ponto 7) foi fixada uma cláusula penal correspondente a 3% do valor do orçamento de 11/12/2018 por cada semana de atraso em relação às datas previstas para a conclusão dos trabalhos.
As partes fixaram os prazos de entrada em obra em quatro semanas após a adjudicação e a data de conclusão dos trabalhos em duas semanas após a entrada em obra pela Autora.
Não está aqui em causa o início da obra mas sim a conclusão dos trabalhos; resulta da matéria de facto provada que a Autora iniciou os trabalhos no dia 18 de janeiro de 2019 nas várias fracções do prédio e deu os trabalhos por concluídos no início do mês de abril do mesmo ano (cfr. ponto 8) dos factos provados).
Entende a Recorrente que tendo sido concluídos os trabalhos apenas no início do mês de abril a Autora incorreu em nove semanas de atraso, o que implica, por aplicação da cláusula penal contratualmente fixada, um crédito sobre a mesma de €5.322,24.
À primeira vista, atento o teor do referido ponto 8) dos factos provados, poderíamos ser levados a considerar que assiste razão à Recorrente; não cremos, contudo, que assim seja.
Vejamos.
Conforme já referimos, não é pelo facto de a Autora ter dado os trabalhos por concluídos no início do mês de abril do mesmo ano (cfr. ponto 8) dos factos provados) que podemos concluir pela conclusão simultânea de todos os trabalhos nessa data.
De facto, a Autora alegou ter iniciado os trabalhos no dia 18 de janeiro de 2019 nas várias fracções e ter dado os trabalhos por concluídos, a obra por concluída, procedido à sua entrega no início de abril do mesmo ano; veja-se que a Ré/Recorrente alegara na sua oposição o abandono da obra e a não conclusão dos trabalhos.
Porém, não sabemos ao certo quando foram concluídos os trabalhos em cada uma das fracções, em particular no rés-do-chão e nas fracções autónomas do primeiro e segundo andares, sendo que o primeiro contrato de empreitada apenas respeita a estas e só neste foi fixada a cláusula penal que a Recorrente pretende ver acionada.
Era sobre a Recorrente que recaia o ónus de provar a existência dos atrasos por si invocados e para o efeito incumbia-lhe demonstrar em que data foram os trabalhos concretizados em cada fracção autónoma ou, pelo menos, em que data o foram nas fracções autónomas do primeiro e segundo andares, factos que nem sequer alegou.
Tal como consta da sentença recorrida “(…) a verdade é que não foi feita prova de que houve retardamento da prestação a cargo da A. Com efeito, a factualidade alegada pela R. a esse propósito, como já tivemos ensejo de mencionar, é muito parca, senão mesmo inexistente. Na carta que a R. enviou à A. em 26.04.2019 (cfr. ponto 14 do elenco de factos provados) limita-se aquela a contabilizar o valor das indemnizações devidas mas não refere os trabalhos que, àquela data – ou a outra posterior à data convencionada para o termo dos mesmos –, supostamente se encontravam por executar. (…) Portanto, parece-nos que o accionamento da cláusula penal estipulada entre as partes nos termos supra descritos dependia do apuramento dos trabalhos que não se encontravam executados no termo do prazo que as partes fixaram para a entrega da obra por banda da A., o que não foi alegado pela R. (..)”.
Na conclusão 67ª sustenta a Recorrente que o ónus da prova de que existiram atrasos imputáveis à Ré Recorrente competia à Autora; cremos que o que a Recorrente pretende afirmar é que competiria à Autora demonstrar a ausência de culpa nos atrasos verificados designadamente demonstrando a existência de atrasos da parte da Recorrente (ou qualquer outra atuação) que tivessem comprometido o cumprimento da sua obrigação. É neste contexto que resulta provado que em 25 de fevereiro de 2019 se encontravam depositados no chão do apartamento do rés-do-chão areias, sacos de cimento e ferramentas, o que impossibilitava a execução de parte dos trabalhos contratados pela Ré à Autora, resultando, contudo, não provado que tal ocorresse também nas fracções do primeiro e segundo pisos do edifício.
De facto, conforme decorre do preceituado no artigo 798º do Código Civil, em sede de responsabilidade contratual é necessário que a mora ou a falta de cumprimento resulte de culpa do devedor, sendo que a culpa é presumida (cfr. artigo 799º n.º 1 do mesmo diploma) competindo ao devedor demonstrar a ausência de culpa.
Julgamos que também no âmbito da cláusula penal é necessário que o incumprimento da prestação seja consequência de uma atuação ou omissão do devedor passível de um juízo de censura normativa, e ainda que competirá ao devedor demonstrar a ausência de culpa (v. entre outros os Acórdãos desta Relação de 16/03/2017, Processo n.º 896/09.0TBVVD.G1, Relatora desembargadora ISABEL SILVA e da Relação do Porto de 07/11/2013, Processo n.º 91046/11.0YIPRT.P1, Relator Desembargador ARISTIDES RODRIGUES DE ALMEIDA, ambos disponíveis em www.dgsi.pt), não havendo que distinguir entre os casos em que a compensação é invocada como excepção ou em reconvenção.
Não desconhecemos, contudo, a existência de jurisprudência que considera que nos casos em que é invocada como exceção não tem aplicação a regra da presunção de culpa do devedor prevista no referido n.º 1 do artigo 799º; assim, foi considerado no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 14/04/2011, relatado pelo Conselheiro Lopes do Rego (Processo n.º 3830/06.6TBBRG.G1.S1, também disponível em www.dgsi.pt) que “a presunção de culpa do devedor, afirmada pelo art. 799º do CC, é privativa das acções (ou pedidos reconvencionais) de incumprimento, desencadeadas pelo credor contra o devedor inadimplente, - não funcionando nos casos em que o devedor pretenda opor ao credor, por via de exceção perentória, um contra crédito, suscetível de determinar a extinção da obrigação que lhe era exigida, cabendo-lhe, neste caso, provar inteiramente os elementos constitutivos da excepção peremptória que deduz (incluindo a culpa do A. no despoletar da cláusula penal que está na base daquele contra crédito)(…)”.
De todo o modo, seja qual for o entendimento perfilhado relativamente à aplicação no caso concreto, em que a compensação é invocada por via de exceção, da culpa presumida prevista no referido n.º 1 do artigo 799º, a verdade é que sempre incumbiria à Ré/Recorrente, enquanto facto constitutivo do contra crédito que invoca por via de exceção (cfr. n.º 2 do artigo 342º do Código Civil) tendo em vista a extinção do crédito da Autora, a demonstração do facto determinante do accionamento da cláusula penal, in casu, do atraso da Autora na conclusão dos trabalhos nas fracções do primeiro e segundo pisos do edifício; e, segundo o entendimento que perfilhamos, competiria então à Autora demonstrar a ausência de culpa nesse atraso, ficando ainda a Ré liberada, por força do funcionamento da cláusula penal, de alegar e provar que sofreu danos decorrentes desse atraso e o respetivo montante.
Ora, analisados os factos provados julgamos não resultar concretamente demonstrado pela Ré o atraso verificado na conclusão dos trabalhos nas fracções do primeiro e segundo pisos do edifício, por desconhecermos em que datas foram estes concluídos, o que nem sequer foi alegado pela mesma que, aliás, invocou o abandono da obra pela Autora sem concluir os trabalhos, não sendo também de presumir a sua conclusão simultânea.
Temos, por isso, de concluir que não merece censura a decisão contida na sentença recorrida, improcedendo, dessa forma o recurso.
As custas são da responsabilidade da Recorrente em face do seu integral decaimento (artigo 527º do Código de Processo Civil).
***
SUMÁRIO (artigo 663º n.º 7 do Código do Processo Civil):
I – A omissão ou deficiência da gravação configura uma nulidade processual que a parte interessada terá de arguir autonomamente, sem prejuízo da iniciativa oficiosa do juiz durante a audiência, ao qual compete tomar as providências necessárias para que a lei seja cumprida (cfr. artigos 195º, 197º e 199º, n.º 2 do Código de Processo Civil). II – Conforme decorre do artigo 155º n.ºs 3 e 4 do Código de Processo Civil a gravação deve ser disponibilizada às partes no prazo de dois dias após a realização do respectivo ato e as partes devem invocar no prazo de 10 dias a falta ou deficiência da gravação, a contar da disponibilização. III – Decorrido o referido prazo de dez dias a contar do momento em que a gravação é disponibilizada e não sendo arguida a falta ou deficiência da gravação, o vicio decorrente da mesma fica sanado, não podendo oficiosamente ser conhecido pela Relação, nem podendo tal nulidade processual ser arguida no prazo de interposição de recurso e apenas nas próprias alegações de recurso. IV – Não deve haver lugar à reapreciação da matéria de facto quando o facto objecto da impugnação não for susceptível de, ter relevância jurídica à luz das diversas soluções plausíveis da questão de direito, sob pena de se proceder à prática de um acto inútil, que a lei não permite (artigo 130º do Código de Processo Civil). V – O devedor pode livrar-se da sua obrigação através da compensação, por extinção simultânea do crédito equivalente que possua sobre o seu credor. VI – A compensação depende dos seguintes requisitos: existência de créditos recíprocos, fungibilidade das coisas objecto das prestações e identidade do seu género e exigibilidade do crédito que se pretende compensar. VI – Nos termos do artigo 810º n.º 1 do Código Civil permite-se às partes a estipulação, por acordo e antecipadamente, do montante da indemnização devida em caso de mora, a denominada cláusula penal. VII – Compete ao réu que invoca a existência de um contra crédito decorrente do acionamento da cláusula penal fixada no contrato de empreitada o ónus de provar a verificação do atraso na conclusão dos trabalhos, competindo depois ao autor (devedor), para obstar à aplicação da cláusula penal, demonstrar a sua ausência de culpa.
***
III. Decisão
Pelo exposto, acordam os juízes desta Relação em julgar improcedente a apelação, confirmando-se a sentença recorrida.
Custas pela Recorrente.
Guimarães, 25 de fevereiro de 2021 Texto elaborado em computador e integralmente revisto pela signatária