PRESCRIÇÃO
EXCESSO DE PRONÚNCIA
RECONHECIMENTO
MEIO DE PROVA
Sumário

Extinto o procedimento criminal por prescrição, em relação a algum ou alguns dos diversos crimes que integram o objecto do processo, a manutenção dos factos integradores dos crimes prescritos dependerá da relevância que ainda tiverem para a decisão da causa.
Se se tratar de factos que integram uma fase do iter criminis quanto aos específicos modos de execução dos restantes crimes não prescritos, jamais poderão ser eliminados da decisão de facto, sem que a sua manutenção importe a nulidade da sentença por excesso de pronúncia, desde logo, porque factos não são questões e só as questões é que estão no âmbito da previsão contida no art. 379º nº1 al. c) do CPP.
Ponto é que deles não sejam extraídas consequências criminais, ou seja, não alicercem juízos de responsabilização penal autónomos. 
O reconhecimento de pessoas é, segundo as normas contidas no art. 147º do CPP, um meio de prova assente numa percepção sensorial que visa estabelecer a identidade do autor dos factos integradores de um crime e que é realizado pela própria vítima ou por pessoas que o tenham presenciado.
Ao reconhecimento fotográfico deve seguir-se o reconhecimento pessoal em banda, com observância das formalidades ali previstas, sob pena não ter valor como meio de prova, em qualquer fase do processo.
Não se confunde com a valoração de documentos que contenham fotografias, nem com a valoração de fotografias.
As fotografias também são documentos, na acepção, quer do art. 255º do CP, quer dos arts. 164º e 167º do CPP, sendo que esta última disposição legal, em sintonia com o princípio da livre apreciação da prova, consagrado nos arts. 125º e 127º do mesmo código, só faz depender a validade da prova produzida por reproduções mecânicas da inexistência de ilicitude na sua obtenção avaliada de acordo com o disposto na lei penal.

Texto Integral

Acordam os Juízes que integram a 3ª Secção, neste Tribunal da Relação de Lisboa:

I – RELATÓRIO
Por acórdão proferido em 4 de Setembro de 2020, no processo comum colectivo nº 653/16.8SILSB.L1 do Juízo Central Criminal de Sintra, Juiz 4, do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa Oeste, foi decidido, além do mais, o seguinte:
A) Julgar extinto, por prescrição, o procedimento criminal relativo a três crimes de falsificação de documento do artigo 256°, n° 1, als. c), d), e) e f) e n° 3, do CP praticados em 26.06.2008, 7.12.2007 e 17.06.2008;
B) Absolver o arguido PD_______da prática em autoria material e na forma consumada de um crime de falsificação de documento do artigo 256°, n° 1, als. c), d), e) e f) e n° 3, do CP.
C) Condenar o arguido PD_______pela prática em 17.04.2009, em autoria material e na forma consumada de um crime de falsificação de documento do artigo 256°, n° 1, als. c), d), e) e f) e n° 3, do CP, na pena de 2 (dois) anos de prisão.
D) Condenar o arguido PD_______pela prática em 17.04.2009, em autoria material e na forma consumada de um crime de burla qualificada dos artigos 217°, n° 1, 218°, n° 1 e 202°, al. a), do CP, na pena de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de prisão.
E) Condenar o arguido PD_______pela prática em 20 e 23.04.2009, em autoria material e na forma consumada de um crime de falsificação de documento do artigo 256°, n° 1, als. c), d), e) e f) e n° 3, do CP, na pena de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de prisão.
F) Condenar o arguido PD_______pela prática em 23.04.2009, em autoria material e na forma consumada de um crime de burla qualificada dos artigos 217°, n° 1, 218°, n° 2, al. a) e 202°, al. b), do CP, na pena de 3 (três) anos e 6 (seis) meses de prisão.
G) Em cúmulo jurídico das penas parcelares referidas de A) a D), nos termos do artigo 77°, n°s 1 e 2 do CP, condenar o arguido PD_____, na pena única de 5 (cinco) anos e 6 (seis) meses de prisão.
H) Julgar o pedido de indemnização civil deduzido pelo demandante V_________, parcialmente procedente, por parcialmente provado e em consequência condenar o demandado PD_______a pagar-lhe a quantia de € 15.000,00 (quinze mil euros) a título de danos não patrimoniais, acrescida de juros à taxa legal, desde a data da presente decisão, até pagamento.
I) Julgar o pedido de indemnização civil deduzido pela demandante Banco Credibom, SA, parcialmente procedente, por parcialmente provado e em consequência condenar o demandado PD_______a pagar-lhe a quantia de € 18.747,05 (dezoito mil, setecentos e quarenta e sete euros e cinco cêntimos), acrescida de juros à taxa legal, vencidos desde a data de notificação do pedido civil, até pagamento.
J) Julgar o pedido de indemnização civil deduzido pela demandante Hefesto Sociedade de Titularização de Créditos, SA, improcedente, por não provado, do mesmo absolvendo o demandado.
O arguido interpôs recurso desta decisão, tendo sintetizado as razões da sua discordância, nas seguintes conclusões:
1. Refere o douto acórdão recorrido, na sua "Questão Prévia", que "os factos descritos na acusação sob os art°s 1° a 9° que consubstanciariam a prática de três crimes de falsificação de documentos se mostravam prescritos, pelo decurso do prazo de 10 anos, desde a sua prática."
2. Porém e apesar disso, decidiu que "consequência, e sem prejuízo de se atender à dita matéria para melhor compreensão fáctica da sucessão de eventos e da sua interligação com os que se lhe seguiram, daqueles factos não se extrairá qualquer consequência penal, por o procedimento criminal por tais crimes se mostrar prescrito, e em consequência extinto, o que se decide."
3. Por sua vez, no douto acórdão recorrido, o Tribunal a quo, insistiu em apreciar e a dar por provada a matéria de facto coberta pela prescrição do procedimento criminal, isto é, deu como provados os exactos factos elencados nos art°s. 1° a 9° da acusação, os quais constam da alínea A) da "Fundamentação" com factos provados da apreciação e fundamentação da matéria de facto provada, nos seus art°s 1° a 9°.
4. A apreciação de tais factos imputados arguido e a sua manutenção entre os considerados provados e que serviram para a elaboração da decisão condenatória constitui uma absoluta contradição e negação da decisão que considerou prescrito o procedimento criminal quanto a tais factos.
5. Temos como comummente aceite pela doutrina e jurisprudência, que o instituto jurídico da prescrição do procedimento criminal previsto e regulado no art° 118° n° 1, do Código Penal, uma vez que seja decretado, impede a manutenção no objeto o processo criminal que visava exactamente realizar o apuramento dos factos imputados ao arguido que, uma vez provados, seriam suscetíveis de conduzir à sua responsabilidade criminal.
6. O processo, uma vez conhecida e decretada a prescrição, é arquivado quanto aos factos dele objecto, pois trata-se de uma questão prévia que obsta ao conhecimento do mérito (arts. 311°, n.° 1 e 368°, n.° 1 do CPP), ou seja, "a procedência da prescrição conduz à inutilidade e impossibilidade legal de verificação do mérito dos factos que constituem o objecto do processo."
8. Situação que, a nosso ver, constitui uma manifesta ilegalidade, a qual conduz à inexistência jurídica de tais factos no processo e à nulidade do douto acórdão recorrido, na medida em que o Tribunal a quo apreciou e julgou provados factos cuja apreciação de mérito lhe estava vedada (art° 379° n° 1, al. c) do C. P. Penal.
9. Atenta a prescrição do procedimento criminal relativa aos factos constantes dos artigos 1° a 9° dos "Factos provados" no douto acórdão recorrido, não só os mesmos devem ser considerados não provados, como devem ser retirados da sua "fundamentação da matéria de facto".
10. Por consequência, também por esta razão, devem ser considerados não provados todos os factos relativos á autoria material dos factos praticados imputados ao arguido - elaboração, preenchimento, assinatura e entrega de quaisquer documentos forjados ou falsificados - e, bem assim, todos os que deles decorram, sejam a eles subsequentes e que se refiram à sua identidade pessoal e ao contacto presencial e direto com o Serviço de Identificação Civil (obtenção do bilhete de identidade forjado), com o Serviço de Finanças (N. I. Fiscal), com instituições financeiras (Barclays Bank, Santander Totta e Credibom) e com o stand de automóveis Digital Car (art° 10°, dos factos provados), nomeadamente os que constam do elenco dos artigos 10° a 53°. "Factos Provados".
11. A consideração de tais factos imputados ao arguido nos referidos artigos 1 a 9 dos "Factos provados" conduz inevitavelmente à nulidade do douto acórdão e, em qualquer caso, aos vícios de insuficiência, contradição ou erro insanável na apreciação da prova, bem como (art° 379° n° 1, al. c) e art° 410° do C. P. Penal.
12. O Tribunal a quo na parte em que identifica o arguido como autor dos crimes que lhe foram imputados por recurso ao seu reconhecimento por comparação de fotografias existentes no documento falsificado (Bilhete de Identidade do assistente V_________ ) com os seus registos fotográficos pessoais remetidos aos autos pelo Instituto de Registos e Notariado e notificados ao seu mandatário, via Citius, no dia 10 de Julho de 2020, o qual não prescindiu de prazo de vista, nem de exercer sobre eles o direito ao contraditório, cujo prazo terminaria no dia 7 de Setembro de 2020 (art° 105°, do C. P. Penal).
13. Segundo consta da douta sentença recorrida, a identificação do arguido como autor dos crimes que foram imputados, foi feita e "resulta de forma inequívoca do confronto com os clichés da ficha biográfica da Polícia Judiciária de fls. 32 e 33, 138 a 139 e ainda das fotografias que instruíram os pedidos do bilhete de identidade em nome do arguido juntos a fls. 727 e ss. Destacando-se, pela sua qualidade as de fls 737v, de fls. 739, 740, 749 e por
14. Temos para nós que o único meio de prova usado para formar a convicção sobre a identificação do arguido como autor dos crimes que lhe são imputados, assenta nesse reconhecimento da pessoa e da identidade do arguido com base em tal comparação de fotografias feita pelos Srs. Juízes que integraram o colectivo que procedeu ao julgamento e à elaboração do douto acórdão.
15. O reconhecimento para estabelecimento da identidade de uma pessoa como autora de um crime, é um meio de prova que obedece a regras próprias e que vêm previstas no C. Processo Penal, que se traduz "em estabelecer a identidade entre uma percepção sensorial anterior e outra actual da pessoa que procede ao acto, servindo para confirmar um elemento de prova já admitido (Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal, Vol. II, 3- Edição, 2002, Editorial Verbo, pág. 194).
16. "O art. 147° do C. Processo Penal trata do reconhecimento de pessoas. Nele podemos distinguir três modalidades: o reconhecimento por descrição ou intelectual, o reconhecimento presencial e o reconhecimento por fotografia, filme ou gravação.
17. "O reconhecimento por fotografia, filme ou gravação, como a própria designação deixa intuir, é o que é feito através da exibição de fotografias ou filme ou a passagem da gravação, à pessoa que deve efectuar a identificação. Sendo positiva a identificação, este tipo de reconhecimento só pode valer como meio de prova quando for seguido de reconhecimento presencial (n° 5 do mesmo artigo) o que, na prática, lhe retira qualquer autonomia probatória, já que, sem aquele, não passará de mero indício."
18. " O reconhecimento de pessoas que não tenha sido efectuado nos termos que ficaram expostos, não vale como meio de prova, seja qual for a fase do processo em que ocorreu (n° 7 do mesmo artigo). Trata-se, portanto, de uma proibição de valoração de prova, isto é, o reconhecimento é inválido e não pode, por isso, ser usado no processo designadamente, para fundamentar a decisão."
19. Donde decorre, a nosso ver, que o Tribunal a quo, ao fazer, de moto próprio, esse "reconhecimento" actuou em desrespeito ao princípio do acusatório inerente ao nosso processo penal por determinação constitucional, não separando a produção de prova da função de julgar.
20. Sendo que, no caso do reconhecimento por fotografia, as exigências relativamente ao seu formalismo são ainda mais reforçadas, tornando a prova nula quando esse reconhecimento não for seguido de reconhecimento pessoal, sendo que o reconhecimento que não obedecer aos formalismos deste normativo legal, "não tem valor como meio de prova seja qual for a fase do processo em que ocorrer (art. 147°, n°s 5 e 7, do C. P. Penal).
21. Razão porque, ao fazer esse "reconhecimento" e verificação da identidade do arguido com base em tais fotografias e em sede de elaboração do douto acórdão ora recorrido, o Tribunal a quo esteve bem longe do que entendemos ser o respeito pelo princípio do acusatório, da igualdade de partes, da equidade e da lealdade processual ("due process of law").
22. Isto para além de se tratar um procedimento de obtenção e de apreciação da prova que resulta no aligeiramento dos requisitos legais e formalidades relativas à obtenção prova por reconhecimento, em violação material das garantias processuais relativas ao reconhecimento da identidade do suposto autor dos factos que constituem o ilícito criminal e o objecto do processo. Garantias essas que têm proteção constitucional (art°s. 32° e 207°, da C. R. Portuguesa)
23. Concluindo-se, assim, que o 'reconhecimento' da identidade do arguido ex ofício pelo Tribunal a quo, se reconduz ao uso de prova ou meio de prova proibida e sem qualquer valor legal nos termos do disposto no art° 147° do C. P. Penal e torna nulo o douto acórdão recorrido nos termos do 379°, n° 1, al. c), do mesmo diploma legal.
24. Todas as testemunhas que prestaram o seu depoimento em audiência negam ter conhecido o arguido e que tiveram qualquer contacto com ele ou que assistiram, de perto ou de longe e de modo directo ou indirecto, prática de qualquer desses factos.
25. A testemunha   (Registo audio: 20200309104_4307356_2871284.wma), depôs na qualidade de assistente;
26 A testemunha (Registo audio: 20200309111345_4307356_2871284,wma), depôs na qualidade de funcionário da financeira "Credibom";
27. E a testemunha  , depôs na qualidade de sócio-gerente da sociedade proprietária do Stand de Vendas RBMS (Registo audio: 20200623144204_4307358_2871284.wma).
28. As quais disseram o que se transcreveu parcialmente no corpo destas alegações e cujo depoimento completo, juntamente com o registo áudio integral da audiência se encontra transcrito em documento que se juntou a este requerimento de recurso, o que aqui se dá por integralmente reproduzido.
29. Assim face ao teor dos depoimentos das testemunhas acima considerados e transcritos, juntamente com a falta de prova documental, pericial ou outro tipo e meio de prova relevante, resulta ao contrário do decidido no douto acórdão recorrido e levado ao relatório dos "Factos provados" (art° 1° a 58°) deve ser alterado pelo facto de o depoimento de tais testemunhas lhe ser absolutamente contrário, pelo facto de a decisão que considerou  Marco de 2009 (arts 1º a 9°), devendo mesmo, ser eliminados do elenco dos "Factos Provados.
30° E, por consequência lógica devem ser, também, considerados não provados todos os factos subsequentes que deles decorram seja por inexistência de meio de prova válido, como sucede com o reconhecimento da identidade do arguido por mera comparação de fotografias sem verificação e reconhecimento presencial do mesmo com acima ficou estabelecido, quer por total ausência de prova bastante e válida, que submetida a imediação analítica do Tribunal a resista ao critério do exame ponderado e crítico da prova nos termos tratados no corpo destas alegações e serão tratadas nos pontos subsequentes destas alegações.
31. Neste sentido, não há nos autos qualquer outra prova documental, testemunhal, pericial ou outra, que permita comprovar a presença e o contacto pessoal e directo do arguido com qualquer Serviço de Identificação, Serviço de Finanças, instituição de crédito ou com o stand de automóveis referenciado nos autos (Digital Car), também não há qualquer prova que permita confirmar que foi o arguido quem elaborou, preencheu ou assinou quaisquer dos documentos.
32. Ou seja, também a prova testemunhal transcrita, contradiz em absoluto os factos constantes nos arts 1° a 59° dos "Factos Provados" que constam da fundamentação da matéria de facto do douto acórdão, em nosso entender, o que respeita aos factos 1° a 9° dos factos provados, devem ser eliminados do relatório da matéria de fato. Ou caso assim se não entenda devem os arts 1° a 9° dos Factos provados ser reconduzidos para o elenco dos factos não provados, o mesmo devendo suceder com os factos elencados nos art° 10° a 59° dos factos provados.
33. Assim sendo, salvo sempre o devido respeito por opinião diversa, entendemos que estão reunidos os requisitos para que se altere douto acórdão recorrido relativamente â decisão da matéria de facto considerada provada e não provada, nomeadamente porque:
33.1. Tal decorre da decisão de extinção do procedimento criminal dos factos elencados nos artigos 1° a 9° dos Factos Provados e de todos os factos subsequentes que com eles têm "interligação" e cuja "compreensão" é deles decorrentes;
33. 2. Face ao que antes se expôs quanto ilegalidade e à invalidade da identificação do arguido com autor dos factos objecto do processo feita pelo Tribunal a quo, de motu próprio, por "reconhecimento" (art° 147°, do C. Penal) por simples comparação de algumas das fotografias juntas pelos Serviços de Identificação e notificadas ao arguido em 10 de Julho de 2020 do autos, notificadas ao arguido, via citius, sem lhe ser dado e respeitado o "prazo de vista" (art. 105°), o que constitui nulidade não sanada;
33.3. E, finalmente, por os depoimentos de todas as testemunhas ouvidas nos presentes autos - objecto da prova gravada em registo áudio conforme transcrição foi feita parcialmente no corpo das presentes alegações, que aqui se dá por reproduzida e consta, na íntegra, em documento anexo - serem unânimes em referir que nunca viram, nunca contactaram e não conhecem o suposto autor dos factos de lado nenhum, tal como não conhecem nem nunca viram o arguido ora recorrente.
34. Havendo, por isso, ausência de prova legal e válida que permita fundamentar e concluir com se concluí na decisão da matéria de "Facto Provada" no douto acórdão recorrido, devendo a mesma ser alterada e eliminados da mesma, os factos elencados nos seus artigos 1° a 9°, e, caso assim se não entenda, devem estes mesmos factos e os factos elencados nos seus artigos 10° a 57° da matéria de "Facto Provada" ( fls. 4 a 20, capítulo II, alínea A), do douto acórdão), e os mesmos considerados como não provados.
35. Assim sendo e pelas razões apontadas, devem os factos elencados nos artigos arts 1°, 2°, 4°, 5°, 6°, 7°, 8° 9°, 10°, 12°, 13°, 14°, 15°, 16°, 18°, 19°, 20°, 21°, 22°, 23°, 24°, 25°, 26°, 27°, 31°, 32°, 33°, 34°, 35°, 36°, 37°, 38°, 39°, 40°, 43°, 45°, 46°, 47°, 48°, 49°, 50°, 52°, 53°, 54°, 55°, 56°, 57° e 58° dos "Factos provados" ser julgados não provados e elencados nos "Factos não provados" ( Capitulo II, alínea B) do douto acórdão recorrido.
36. No seu capítulo C), relativo à "Motivação", muito sinteticamente, limita-se a afirmar que: "Formou o Tribunal a sua convicção através da análise conjugada do acervo documental constante dos autos com as informações bancárias e dos serviços centrais de identificação, que para tanto se oficiaram. Tal análise efectuada de forma crítica segundo a nossa livre apreciação, de acordo com as regras de experiência comum e segundo os juízos da lógica desta decorrentes, habilitaram o tribunal a inferir a matéria fáctica exposta."
37. Os únicos documentos apreciados e discutidos em sede audiência de julgamento foram os exibidos às testemunhas que prestaram depoimento e mais nenhum outro.
38. Ao que acresce que esta parte da fundamentação do douto acórdão recorrido corresponde a um mero enunciar genérico dos princípios e regras legais aplicáveis, com total ausência do concreto exame crítico da prova e de enunciação das proposições lógico- jurídicas de que resulte ser compreensível e verificável pelos demais intervenientes processuais - e até pelo "auditório universal".
39. Sem o Tribunal a quo ponderar que os pontos concretos da matéria de facto mais relevantes para o apuramento da responsabilidade criminal do arguido não são comprováveis e explicitáveis, no caso em apreço, por uma mera remissão para alguns documentos concretos do acervo documental junto aos autos, sem qualquer juízo crítico dos mesmos de que resulte compreensível a razão porque por via deles se provaram tais pontos da matéria de facto, ou a razão porque não se provaram outros pontos da matéria de facto, sendo certo que esses documentos, na sua generalidade não foram exibidos, discutidos e apreciados em audiência de julgamento - em razão, entre outros dos princípios da imediação e do contraditório (arts. 410° e 379°, do C. P. Penal e arts. 32°, n°s 1 e 5, da C. R. Portuguesa).
40. Assim, quanto aos factos constantes dos arts 1°, 2°, 4°, 5°, 6°, 7°, 8° 9°, 10°, 12°, 13°, 14°, 15°, 16°, 18°, 19°, 20°, 21°, 22°, 23°, 24°, 25°, 26°, 27°, 31°, 32°, 33°, 34°, 35°, 36°, 37°, 38°, 39°, 40°, 43°, 45°, 46°, 47°, 48°, 49°, 50°, 52°, 53°, 54°, 55°, 56°, 57° e 58° dos "Factos provados" do Factos Provados (Barclays Bank), não foi feita qualquer prova a comprovar a identidade de quem se apresentou perante o Serviço de Identificação, quem preencheu e requereu o Bilhete de Identidade em causa, nem a identidade de quem compareceu no Serviço de Finanças para obter o número de identificação fiscal, nem a comprovar quem compareceu perante as instituições de crédito e o stand de automóveis referenciados no douto acórdão, e a identidade de quem elaborou, preencheu, assinou e aí entregou esses documentos.
41. Nesta parte, nem sequer nem foi feita prova de quem os assinou e entregou, nem foi indicada qualquer testemunha que pudesse comprovar em que data os mesmos foram entregues, por quem foram entregues, como e quem os preencheu e assinou, bem como a comprovar como foi feita a recepção e a verificação da identidade e da assinatura aposta em todos esses documentos.
42. Os documentos em apreço, por si só, sem qualquer outra prova adicional ou complementar, não são aptos a permitir inferir e a provar quem os elaborou, quem os preencheu, quem os assinou, quem os entregou e a quem e em que datas.
43. As únicas testemunhas que prestaram depoimento, o assistente V_________; EM____, do departamento de cobranças da Credibom (depoimento acima transcrito), e a testemunha MN____ , na qualidade de sócio-gerente da sociedade proprietária do stand Digital Car (depoimento acima transcrito), foram unânimes em afirmar que nunca tiveram nenhum contacto directo e pessoal com o arguido e que o não conhecem de lado algum.
44. Também por isso, é manifesta - para a realização do exame crítico da prova e na motivação da decisão da matéria de facto provada - a necessidade levar em consideração o teor de tais depoimentos no seu confronto com o contexto e teor desse documentos fotocopiados.
45. Devendo esse juízo ser aferido em relação a qualquer ponto relevante da matéria de facto considerada provada e não provada, não bastando uma remissão e elencagem dessas fotocópias (Documentos), para se concluir, sem mais prova complementar válida, considerar provados os factos sobreditos.
46. O que fica ainda mais em crise essa decisão quando o próprio Tribunal a quo reconhece que a generalidade dos factos subsequentes aos elencados nos artigos 1° a 9° dos "Factos provados", isto é, que os factos enumerados sob os artigos 10° a 58°, são deles decorrente e têm com eles uma "interligação", dependendo a "compreensão" destes últimos do conhecimento e comprovação daqueles bem como da conexão e interligação entre uns e outros.
47. Ora, essa operação intelectual de elucidar e exteriorizar essa "compreensão" que decorre do encadeamento e "interligação" dos factos enumerados sob os art° 10° a 58° dos factos provados no douto acórdão recorrido com os actos que lhe são anteriores e elencados nos artigos 1° a 9° dos Factos Provados nessa alínea A) desse mesmo Capítulo II.
48. Factos esses que esses (artigos 1° a 9°) sobre os quais o Tribunal a quo se pronunciou pela prescrição e consequente extinção do procedimento criminal no que a eles respeita, deixando, por essa razão, de poderem continuar a fazer parte do objecto do processo e submetidos a produção de prova e a apreciação de mérito (art° 379° n° 1, al. c), do C. P. Penal.
49. Nesta medida, deveriam estes mesmos factos (1° a 9°) ter sido eliminados ou apagados do elenco dos factos observados na fundamentação da decisão da matéria de facto, tal como deveriam ter sido reconduzidos aos factos não provados todos aqueles factos subsequentes que tenham com eles tenham "interligação" e cuja "compreensão" seja deles decorrente e dependa do conhecimento daqueles.
50. Concluímos, pois, neste capítulo, que o Tribunal a quo deu como provados factos sobre os quais se não produziu prova testemunhal e documental bastante, nem qualquer outra prova legal e válida, para sem margem para dúvida razoável e legítima, se poderem imputar ao arguido, em autoria, os factos constitutivos dos ilícitos criminais de falsificação e de burla considerados no douto acórdão recorrido.
51. Não foram, a nosso ver, pelas razões antes invocadas, observados os requisitos legais e constitucionais relativos à fundamentação das decisões judiciais em respeito pelas garantias de defesa de modo a assegurar uma Justiça material efectiva (arts. 374°, 375°, 410°, do C. P. Penal e arts. 20°, 32° e 202°, da C. R. Portuguesa)
52. Não foi feita uma exposição concisa, mas completa dos motivos, de facto e de direito, que fundamentam a decisão dos diferentes pontos da matéria de facto provada e não provada, exteriorizando o modo como foram observado os procedimentos seguidos na análise das diferentes provas e meios de prova e como foi ponderado os seu exame crítico na sua concatenação e relação com os pontos concretos da matéria de facto a que respeitem.
53. Não tendo o Tribunal a quo observado tais preceitos quanto aos pontos da matéria relativa aos factos provados, como se disse antes, estamos no domínio da falta, da insuficiência, da contradição e do erro notório na apreciação da prova e da falta do seu exame crítico e ponderada motivação da decisão (arts. 410°, n°s 1 e 2, 374° n° 2 e 379°, do C. Penal).
54. Também no que respeita à matéria da alínea B) do douto acórdão, relativa aos "Factos não provados", verifica-se uma total ausência de fundamentação e de exame crítico da prova, o que também determina a nulidade do douto acórdão recorrido (art° 374° n° 2 e 379° do C. Penal)
55. Também aqui, a nosso ver, não esteve bem o Tribunal a quo em julgar procedente a acusação e em condenar o arguido ora recorrente em pena de prisão efectiva superior a 5 anos sem fosse usado do procedimento previsto no art° 374° do C. P. Penal, o que não fez.
56. Do que resultou carecerem os autos e a douta decisão recorrida de da falta de averiguação dos factos atinentes à "personalidade e às condições de vida do arguido." O que, poderia e seria "possível" ser superado, "ouvindo perito criminológico, técnico de reinserção social", conforme se determina no art° 371° n° 1 e 2 do C. P. Penal.
57. Mais do que isso, poderia e deveria ter sido elaborado o "Relatório Social" a que alude o art° 370° do C. P. Penal. Por isso, em nosso entender, o douto acórdão recorrido mostra efectiva omissão no que respeita à matéria de facto relativa à determinação da medida da pena, nomeadamente a atinente à conduta do arguido posterior aos factos que lhe são imputados e sobre os quais se passaram mais de 10 anos, e, bem assim, quanto à sua condição social e económica.
58. Caso tivesse procedido com esse cuidado e desse modo, não teria retirado a de que: "Na verdade, não se apuraram as circunstâncias anteriores, contemporâneas ou posteriores aos crimes que permitam concluir por uma acentuada diminuição da ilicitude, da culpa ou da necessidade da pena." (fls. 38, do douto acórdão)
59. Em razão dessa omissão, foi apurado, apenas, que o arguido vive em Londres onde tem a sua vida familiar e laboral organizada, com a sua companheira e três filhos de 20, 11 e 8 anos de idade (art° 60° dos Factos Provados).
60. Além de o arguido, devido essa omissão, ser mais penalizado por na "Dosimetria da pena", foi igualmente mais penalizado do por nela ser considerada factualidade que não consta da acusação e que não se provaram factos "que evidenciam que o arguido se vinha dedicando a um modo de vida assente num esquema algo organizado de falsificação de documentos (veja-se desde logo que as impressões digitais constantes do bilhete de identidade falsificado não são nem do arguido, nem do ofendido e já foram utilizados em vários países) apoderando-se da identificação de terceiros e fazendo-se passar por estes, em nome de quem celebrava negócios jurídicos onerosos, logrando proveitos financeiros avultados, sem o risco de assim vir a ser responsabilizado pelo seu cumprimento." (fls. 37 e 38 do acórdão).
61. Ou seja não fazia parte do objecto do processo o apuramento de qualquer facto relativo ao apuramento de que "o arguido se vinha dedicando a um modo de vida assente num esquema algo organizado de falsificação de documentos...", consequentemente, esta parte (IV. Dosimetria penal:), a fls. 36 a 39, do acórdão, padece, também de insuficiência e de erro notório na apreciação da prova (art° s. 410° e 379° do C. P. Penal).
62. Por outro lado, em nosso entender, o douto acórdão recorrido mostra, também, omissão no que respeita à matéria de facto relativa à determinação da medida da pena, nomeadamente a atinente à conduta do arguido anterior e posterior aos factos que lhe são imputados.
63. O douto acórdão omite, igualmente, factualidade relevante que deveria considerar e dar por provada por força do certificado do Registo Criminal do arguido (fls. ... e artigo 59° dos Factos provados), que desde o 23 de Julho de 2003, ano que foi instaurado o processo n°1297/03.TASNT, e depois da instauração dos presentes autos, não foi instaurado contra o arguido qualquer outro processo criminal, nem há notícia de que tenha praticado qualquer ilícito criminal.
64. Do que se concluí, que decorreram 17 anos desde então, e que, desde a suposta prática dos factos que são imputados ao arguido nos presentes autos e a data da prolação do douto acórdão recorrido decorreram mais de 11 anos sem haver notícia de que ele haja praticado qualquer outro ilícito criminal.
65. O apuramento do comportamento do arguido anterior e posterior aos factos que lhe são imputados no processo sub júdice não sendo relevante para a apreciação da ilicitude e da culpa no caso em apreço - ao contrário do que o relatório dos factos provados dá a entender - é muito relevante na escolha do tipo e da medida da pena.
66. Podendo significar, num caso como o aqui em apreço, a diferença entre aplicar uma pena igual ou inferior a cinco anos e uma pena de prisão efectiva superior a 5 anos e não suspensa na sua execução.
67. Por este motivo se verifica, também, uma situação de insuficiência ou falta, contradição insanável e de erro notório na apreciação da prova, o que resulta e se descortina directamente do texto do douto acórdão recorrido e por conjugação com as regras da experiência comum, o que determina a sua nulidade (arts 410° n°s 1 e 2 e 379° do C. P. Penal).
68. Ou, caso assim, se não entenda, tendo-se dado por provado "que o arguido vive em Londres onde tem a sua vida familiar e laboral organizada, com a sua companheira e três filhos de 20, 11 e 8 anos de idade (art° 60° dos "Factos Provados"), e não havendo notícia de que o arguido tenha cometido qualquer ilicito desta natureza, desde há mais de 11 anos a esta parte (Abril de 2009 a Setembro de 2020), conforme o evidencia o certificado do seu registo criminal (art° 59° dos Factos Provados), resulta evidenciado que o arguido neste período de tempo organizou a sua vida familiar e profissional no estrangeiro sem qual ligação ao mundo criminal e criminogénio.
69. Sendo que a sua condenação a uma pena de prisão efectiva significa colocar o arguido nesse meio criminal e criminogénio que é o ambiente prisional, afastando-o da sua vida profissional e familiar e de um já demorado e reiterado de período de real e efectiva reintegração social e profissional.
70. E no nosso entender, tanto as necessidades de prevenção especial, como as de prevenção geral, face ao período longo de um comportamento pessoal e social sem notícia de qualquer contacto com a actividade delinquente, são de modo a que se considere dar uma nova oportunidade ao arguido de continuar a levar este modo de vida afastado do mundo do crime, devendo ser aplicada ao arguido uma pena inferior a 5 anos de prisão e ser a mesma suspensa na sua execução.
71. Face ao exposto e contando com o douto suprimento deste Venerando Tribunal, somos de a concluir que deve ser revogada o douto acórdão e por via dessa revogação:
Ser o arguido absolvido dos factos que lhe são imputados;
71.1. Ou, ser julgado nulo o douto o douto acórdão recorrido, com todas as consequências legais dessa anulação;
71.2. Ou, ainda, caso assim se não entenda, ser aplicada ao arguido uma pena de prisão inferior a 5 anos de prisão, suspendendo a mesma na sua execução.
Admitido o recurso, o Mº. Pº. apresentou resposta, na qual concluiu:
- Inexiste qualquer dos vícios elencados no art. 410° n° 2, do Código de Processo Penal;
- Pode e deve o tribunal, ao abrigo do disposto no art° 127°, do Código de Processo Penal, apreciar a prova documental, designadamente visualizar e comparar as fotografias neles apostas, não constituindo qualquer reconhecimento;
- Nada impede que se dê como provados factos vertidos na acusação e que, no final, no acórdão se considerem parte desses factos prescritos, e que pela sua relação com os demais factos, de que são actos preparatórios, sendo uns, sequência dos outros, possam ser tidos em conta para contextualização dos últimos;
- Não foi violada qualquer disposição da Lei Fundamental;
- A decisão da matéria de facto não merece qualquer reparo;
- A medida concreta da pena mostra-se adequada à medida da culpa e às exigências de prevenção geral e especial.
- Mostra-se fielmente interpretado o disposto nos art°s. 40°, 70° e 71°, do Código Penal.
Pelo exposto, deve o acórdão recorrido ser confirmado.
Remetidos os autos a este Tribunal, na vista a que se refere o art. 416º do CPP, o Exmo. Sr. Procurador Geral da República Adjunto emitiu parecer, no sentido da improcedência do recurso, por concordar com os fundamentos de facto e de Direito contidos na resposta ao recurso apresentada pelo M° P° da 1ª instância.
Cumprido o disposto no art. 417º nº 2 do CPP, nem o arguido nem o assistente responderam, apenas o lesado Banco Credibom, S.A. que, aderindo ao parecer do Exmo. Sr. Procurador Geral Adjunto, se pronunciou pela improcedência do recurso.
 Colhidos os vistos legais e realizada a conferência prevista no art. 419º nº 3 al. c) do CPP, cumpre, então decidir.
II - FUNDAMENTAÇÃO 
2.1. Delimitação do Objecto do Recurso e Identificação das Questões a Decidir:
De acordo com o preceituado nos arts. 402º; 403º e 412º nº 1 do CPP, o poder de cognição do tribunal de recurso é delimitado pelas conclusões do recorrente, já que é nelas que sintetiza as razões da sua discordância com a decisão recorrida, expostas na motivação.
Além destas, o tribunal está obrigado a decidir todas as questões de conhecimento oficioso, como é o caso das nulidades insanáveis que afectem o recorrente, nos termos dos arts. 379º nº 2 e 410º nº 3 do CPP e dos vícios previstos no art. 410º nº 2 do CPP, que obstam à apreciação do mérito do recurso, mesmo que este se encontre limitado à matéria de direito (Acórdão do Plenário das Secções do STJ nº 7/95 de 19.10.1995, in Diário da República, I.ª Série-A, de 28.12.1995 e o AUJ nº 10/2005, de 20.10.2005, DR, Série I-A, de 07.12.2005).
Umas e outras definem, pois, o objecto do recurso e os limites dos poderes de  apreciação e decisão do Tribunal Superior (Germano Marques da Silva, Direito Processual Penal Português, vol. 3, Universidade Católica Editora, 2015, pág. 335; Simas Santos e Leal-Henriques, Recursos Penais, 8.ª ed., Rei dos Livros, 2011, pág.113; Paulo Pinto de Albuquerque, Comentário do CPP, à luz da Constituição da República Portuguesa e da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, 4ª edição actualizada, Universidade Católica Editora, 2011, págs. 1059-1061).
Das disposições conjugadas dos arts. 368º e 369º por remissão do art. 424º nº 2, todos do Código do Processo Penal, o Tribunal da Relação deve conhecer das questões que constituem objecto do recurso pela seguinte ordem:
Em primeiro lugar das que obstem ao conhecimento do mérito da decisão;
Em segundo lugar, das questões referentes ao mérito da decisão, desde logo, as que se referem à matéria de facto, começando pela impugnação alargada, se deduzida, nos termos do art. 412º do CPP, a que se seguem os vícios enumerados no art. 410º nº 2 do mesmo diploma;
Finalmente, as questões relativas à matéria de Direito.
De acordo com este iter sequencial, no confronto com as conclusões, as questões a apreciar, no presente recurso, são as seguintes:
Se o acórdão é nulo, por excesso de pronúncia, nos termos do art. 379º nº 1 al. c) do CPP, por:
a)  O Tribunal do julgamento ter apreciado e julgado provados factos cuja apreciação de mérito lhe estava vedada, concretamente, os descritos sob os pontos 1 a 9 dos factos provados, mesmo depois de ter declarado o procedimento criminal extinto por prescrição quanto aos três crimes de falsificação de documento que aqueles factos seriam susceptíveis de integrar e;
b) Por ter recorrido ao reconhecimento fotográfico para identificar o arguido, pr comparação entre o documento falsificado (Bilhete de Identidade do assistente V_________ ) com os registos fotográficos do arguido remetidos aos autos pelo Instituto de Registos e Notariado, sem que tenha sido dado cumprimento ao disposto no art. 147º nº 5 do CPP;  
Se o acórdão recorrido é nulo, por falta de exame crítico da prova, nos termos do art. 379° n° 1 al. a) do CPP;
Se houve erro de julgamento, na consideração como provados dos factos descritos em 1º a 58º, devendo, os descritos em 1º a 9º ser retirados da decisão recorrida e os restantes considerados não provados.
Se o acórdão recorrido padece dos vícios de insuficiência, contradição ou erro notório na apreciação da prova, previstos no art. 410º nº2 do CPP.
Se a pena aplicada deverá ser reduzida e aplicado o instituto da suspensão de execução da mesma.
2.2. Fundamentação de Facto
Antes da apreciação do mérito do recurso, importa considerar a seguinte factualidade exarada na sentença impugnada, assim como a motivação da decisão de facto e que são as seguintes (transcrição):

Em data não concretamente apurada, mas situada em data próxima anterior a 26.06.2008, o arguido dirigiu-se às entidades administrativas portuguesas competentes e, fazendo-se passar por V_________, entregando uma fotografia sua e associando as impressões digitais de indivíduo desconhecido, logrou obter um bilhete de identidade autêntico, n.° 00000000 emitido em 26.06.2008, com o nome V_________.

Em 07.12.2007, o arguido ou alguém a seu mando dirigiu-se ao Serviço de Finanças Amadora 1 e, fazendo-se passar por V_________, logrou alterar a morada associada ao NIF daquele 111111111 e conseguiu obter para si um cartão de contribuinte autêntico, porquanto foi remetido para a sua morada.

Assim, o arguido, na posse dos referidos Bilhete de identidade e cartão de contribuinte do ofendido V______, decidiu utilizá-la em proveito próprio, assumindo a identidade do ofendido, perante variadas entidades.

No dia 17 de Junho de 2008, o arguido, dirigiu-se ao balcão do Banco Barclays, a fim de constituir uma conta bancária em nome de V______, o que conseguiu, apresentando para tal, documentos em nome de V_______, designadamente o Bilhete de identidade n.° 00000000, emitido em 17.11.1999, forjado, o cartão de contribuinte, e demais documentação forjada em nome daquele.

Nessa ocasião de tempo e lugar o arguido assinou a documentação solicitada, apondo o nome V______, no local do contratante/ subscritor.

Além do mais, logrou associar a tal conta bancária o seu email hanwdamba@hotmail.com.
 7°
Convencido que a pessoa que se lhe apresentava era V______, o funcionário bancário, diligenciou pela a constituição de conta solicitada à qual foi atribuído o n.° de conta 0033 ....

O arguido sabia que não poderia exibir documentos que não lhe pertenciam como se fossem seus, nem assinar os referidos documentos utilizando a assinatura de outra pessoa.

Ao exibir e fazer uso dos documentos autênticos em nome de V_______, com base em factos desconformes com a realidade, de que tinha conhecimento, estava ciente de que, com a sua actuação, punha em causa a confiança e segurança que os documentos merecem à generalidade das pessoas.
10°
No dia 17 de Abril de 2009, o arguido dirigiu-se ao stand de automóveis Digital Car, na Amadora, com o intuito de adquirir uma viatura automóvel para si, sem proceder ao seu pagamento.
11°
Decidiu então adquirir o veículo de marca Volkswagen, modelo Golf IV Diesel, de matrícula , pelo preço de 17.900,00€.
12°
Para tal, tendo em seu poder o Bilhete de identidade e o cartão de contribuinte do ofendido V_________ (referidos em 1° e 2°) e fazendo-se passar por este, solicitou crédito para obtenção daquela viatura.
13°
Convencido que a pessoa que se lhe apresentava era V_________, o funcionário, diligenciou pelo solicitado.
14°
Assim, foi-lhe entregue no referido Stand:
- Um contrato de crédito com o n° 8 116118, com o timbre da sociedade Banco Credibom SA (fls. 21 e ss.), com sede social em Lagoas Park, Ed. 14, 2° piso, em Porto Salvo, no valor de 29.847,36€ (correspondente ao valor total das prestações).
15°
O arguido, tendo em seu poder o Bilhete de identidade e o cartão de contribuinte do ofendido V_________, desde logo os apresentou para fotocópia que entregou no referido “Stand”.
16°
Obtidos de forma não concretamente apurada, fazendo uso dos documentos forjados de fls. 24 a 26, que consubstanciam declaração de entidade patronal e recibos de vencimento, em nome do ofendido V_________, desde logo, os entregou no referido “Stand”.
17°
Sendo certo que V_________ nunca trabalhou naquela entidade patronal nem, consequentemente, recebeu da mesma qualquer remuneração a que título fosse.
18°
Preencheu o contrato da seguinte forma:
- No local destinado à subscrição do contrato de crédito automóvel n° 80003116118, apôs o nome V_________;
19°
No local destinado ao “NIB conta DO a debitar” o arguido forneceu o n.° de conta 002 ... daquele Banco Barclays (acima referido).
20°
O arguido sabia que não poderia exibir documentos que não lhe pertenciam como se fossem seus, nem assinar os referidos documentos utilizando a assinatura de outra pessoa.
21°
O arguido nunca pretendeu pagar o valor da viatura, e que por isso mesmo, o contrato foi denunciado por incumprimento do devedor e deu origem em 15.06.2020, à acção executiva n° 4291/19.0TBOER do juízo de execução de oeiras proposta contra V_________  .
22°
Ao exibir e fazer uso dos documentos referidos, em nome de V_________, com base em factos desconformes com a realidade, de que tinha conhecimento, estava ciente de que, com a sua actuação, punha em causa a confiança e segurança que os documentos merecem à generalidade das pessoas.
23°
Ao apor pelo seu próprio punho o nome de V_________ no contrato atrás referido, no local destinado às respectivas assinaturas, o arguido quis pôr em causa a fé pública que os documentos merecem à generalidade das pessoas.
24°
O arguido apresentou-se perante o vendedor do “Stand” fazendo-lhe crer que os documentos haviam sido emitidos e assinados pelas pessoas que neles constavam como obrigados e, como tal, válidos para garantir o cumprimento de obrigações deles constantes.
25°
Logrou assim, conseguir para si uma viatura automóvel, obtendo, portanto, um benefício patrimonial ilegítimo, em prejuízo de terceiros.
26°
Por via desta realidade alterada que criou o arguido, fez crer, a quem consigo contratou, na genuinidade dos documentos e na sua seriedade, e obtendo, desse modo, um benefício ilegítimo, a que bem sabia não ter direito.
27°
Beneficio esse que prejudicava quer o ofendido V_________, quer a lesada Credibom, esta que se viu prejudicada no montante correspondente ao benefício.
28°
Do pedido civil da demandante Credibom, provou-se ainda que:
O valor do financiamento concedido ao arguido pela demandante ascendeu a € 18.873,25.
29°
Para além do pagamento da primeira prestação acordada (no valor de € 310,91), a demandante nada mais recebeu em execução daquele contrato.
30°
Nem através da acção executiva, extinta em 11.12.2015, por falta de bens penhoráveis, com a qual ainda suportou a quantia de € 38,25 a título de taxa de justiça e € 146,46, a título de provisões pagas ao agente de execução, num total de € 184,71.
31°
Da conta bancária no Santander Totta:
No dia 20 de Abril de 2009, o arguido, dirigiu-se ao balcão de Amadora, do Banco Santander Totta, a fim de constituir uma conta bancária em nome de V_________  , o que conseguiu, apresentando para tal, documentos em nome de V_________, designadamente o Bilhete de identidade nº 00000000, emitido em 26.06.2008, mas onde se encontrava aposta a sua fotografia, o cartão de contribuinte, e demais documentação forjada em nome daquele.
32°
Nessa ocasião de tempo e lugar o arguido assinou a documentação solicitada, apondo o nome V_________  , no local do contratante/ subscritor.
33°
Além do mais, logrou associar a tal conta bancária o seu email hanwdamba@hotmail.com.
34°
Convencido que a pessoa que se lhe apresentava era V_________, o funcionário bancário, diligenciou pela a constituição de conta solicitada, à qual foi atribuída o n° de conta 0003 ....
35°
O arguido sabia que não poderia exibir documentos que não lhe pertenciam como se fossem seus, nem assinar os referidos documentos utilizando a assinatura de outra pessoa.
36°
Ao exibir e fazer uso dos documentos autênticos em nome de V_________, com base em factos desconformes com a realidade, de que tinha conhecimento, estava ciente de que, com a sua actuação, punha em causa a confiança e segurança que os documentos merecem à generalidade das pessoas.
37°
Do contrato com o Banco Santander Totta:
No dia 23 de Abril de 2009, o arguido dirigiu-se ao Banco Santander Totta, agência de Amadora E. Garcia, com o intuito de contratar um contrato de crédito ao consumo, recebendo o respectivo dinheiro, sem proceder ao seu pagamento.
36°
O arguido, tendo em seu poder o Bilhete de identidade e o cartão de contribuinte do ofendido V_________ (mencionados em 31°), fazendo-se passar por este, solicitou a subscrição de um contrato de crédito ao consumo no valor de 20.552,54€.
37°
Convencido que a pessoa que se lhe apresentava era V_________, o funcionário bancário, diligenciou pelo solicitado.
38°
Nesta ocasião, foram-lhe entregues os seguintes documentos que o arguido preencheu da seguinte forma:
- No local destinado à subscrição do contrato de crédito ao consumo n° 7918042, apôs o nome V_________;
- Na livrança, no local destinado à subscrição, inscreveu o nome V_________;
- Repetiu o mesmo procedimento imitando a assinatura do ofendido, colocando-a no documento intitulado de “Carta de Renúncia ao exercício do direito de revogação”.
39°
Para instruir o contrato, e fazendo crer que era V_________, o arguido exibiu os referidos documentos pessoais em nome do ofendido.
40°
Acreditando na seriedade do arguido e da documentação junta, o Banco entregou-lhe o respectivo montante contratado, creditando a quantia mutuada na conta n.° 0003 ..., quantia com a qual se locupletou.
41°
Assim, o contrato de crédito ao consumo bem como a livrança, ficaram registados em nome de V_________.
42°
O arguido não procedeu ao pagamento da quantia referida.
43°
O arguido sabia que não poderia exibir documentos que não lhe pertenciam como se fossem seus, nem assinar os referidos documentos utilizando a assinatura de outra pessoa.
44°
O arguido nunca pretendeu pagar o valor inscrito no contrato.
45°
Ao apor pelo seu próprio punho o nome de V_________ nos documentos atrás referidos, no local destinado às respectivas assinaturas, o arguido quis pôr em causa a fé pública de que aquele título de crédito, como meio de pagamento, deve merecer.
46°
Ao apor pelo seu próprio punho o nome de V_________ no contrato atrás referido, no local destinado às respectivas assinaturas, o arguido quis pôr em causa a fé pública que os documentos merecem à generalidade das pessoas.
47°
O arguido sabia que não poderia exibir documentos que não lhe pertenciam como se fossem seus, nem assinar os referidos documentos utilizando a assinatura de outra pessoa.
48°
Ao exibir e fazer uso dos documentos autênticos em nome de V_________, com base em factos desconformes com a realidade, de que tinha conhecimento, estava ciente de que, com a sua actuação, punha em causa a confiança e segurança que os documentos merecem à generalidade das pessoas.
49°
O arguido apresentou-se perante a entidade bancária fazendo-lhe crer que os documentos, bem como o título de crédito haviam sido emitidos e assinados pelas pessoas que neles constavam como obrigados e, como tal, válidos para garantir o cumprimento de obrigações deles constantes.
50°
Logrou assim, conseguir para si um crédito no valor de 20.552,54€, obtendo, portanto, um benefício patrimonial ilegítimo, em prejuízo de terceiros.
51°
Por via desta realidade alterada que criou o arguido fez crer a quem consigo contratou na genuinidade dos documentos e na sua seriedade, e obtendo, desse modo, um benefício ilegítimo, a que bem sabia não ter direito.
52°
Beneficio esse que prejudicava quer o ofendido V_________, quer a sociedade lesada, esta que se viu prejudicada no montante correspondente ao benefício.
53°
Mais se provou, do pedido de indemnização civil deduzido pela Hefesto STC, SA, que:
Através do denominado contrato de cessão de créditos celebrado em junho de 2011, o Santander Totta SA, vendeu à LB UK RE Holding Limited (em processo de insolvência) o crédito ao consumo que concedera ao arguido, mas contraído em nome de V_________  , referido em 38°.
54°
No dia 6 de Maio de 2009, no âmbito do Inquérito 228/08.5JBSLB foram apreendidos ao arguido, além do mais, os seguintes documentos que o mesmo tinha na sua posse:
Em nome de V_________  :
- Uma carta de condução (provisória) a que corresponde o n.° DOSSA 709088VG9KW01, emitida pelo Reino Unido;
- Um cartão do Barclays (electron) n.°4909850061127868;
- Um cartão do Santander Totta com o n.° 5545060610549698;
- Um cartão do Banif com o NIB 003802340634590077162;
- Um cartão Barclayscard com o n.°4064740081284701”.
55°
Por causa da conduta do arguido o ofendido V_________ ficou impedido de aceder a crédito em Portugal, tendo sido nesta altura, em março de 2016, que descobriu os factos sub judice.
56°
O arguido em todas as suas condutas agiu de forma livre, voluntária e consciente, bem sabendo que as mesmas lhe estavam vedadas e eram punidas por lei penal.
57°
Do pedido de indemnização civil deduzido por V_________  , provou-se ainda que:
Em consequência da conduta do arguido, o demandante viu-lhe negada a concessão de empréstimo bancário para aquisição de habitação própria, com prejuízo para a sua vida pessoal e familiar, o que lhe causou tristeza e angústia.
58°
E viu a sua vida escamoteada quando soube que o arguido tinha celebrado negócios e contraído empréstimos em seu nome pessoal, encapotado pela identificação do demandante, sentindo-se humilhado e frustrado pela utilização abusiva do seu nome e demais dados pessoais para a prática de tais actos.
59°
Do certificado de registo criminal do arguido, consta que o mesmo sofreu as seguintes condenações:
Por sentença de 15.03.2001, transitada em julgado, proferida no processo n° 15514/97.OTDISB, do Tribunal Criminal de Lisboa, foi condenado pela prática em 16.02.1997, de um crime de emissão de cheque sem provisão na pena de cinco meses de prisão.
Por acórdão transitado em julgado em 27.01.2003, proferido no processo n° 1/00.9ZFFAR do Juízo Criminal de Faro, foi condenado pela prática em 1.11.1997, de um crime de uso de documento de identificação alheio, de um crime de falsificação de documento e de um crime de auxílio à imigração ilegal, na pena única de 6 anos e 6 meses de prisão.
No processo n° 700/97.0SLLSB do Tribunal Criminal de Lisboa, por sentença transitada em julgado em 14.05.2003, foi condenado pela prática em 15.02.1997,      de um crime de emissão de cheque sem provisão na pena de 6 meses de prisão.
 Por acórdão transitado em julgado em 11.02.2004, proferido no processo n° 625/99.5SSLSB das Varas Criminais de Lisboa, foi condenado pela prática em 1.1.1999, de dois crimes de falsificação de documentos na pena única de 7 anos e 6 meses de prisão.
Por decisão de 12.05.2006 proferida pelo TEP de Lisboa, foi ao arguido concedida liberdade condicional até 16.06.2008.
No processo n° 1297/03.0TASNT do Juízo Local Criminal de Sintra, foi condenado por sentença transitada e julgado em 15.09.2014 pela prática em 23.07.2003, de um crime de ofensa à integridade física simples dos artigos 143°, 146°, n°s 1 e 2 e 132°, n° 2, al. j), do CP, na pena de 12 meses de prisão, suspensa na sua execução pelo mesmo período.
60°
Da condição social do arguido, provou-se que:
O arguido reside em Londres, onde tem a sua vida familiar e laboral organizada, com a sua companheira e três filhos de 20, 11 e 8 anos de idade.
A) Factos não provados:
Não se provou que:
A livrança mencionada em 34° dos factos provados deu origem a uma acção executiva, contra o “avalista” V_________.
 A demandante Hefesto adquiriu o crédito referido em 36° e 38° dos factos provados e intentou acção executiva para cobrança do seu crédito contra V_________  , que corre termos com o n° 2757/13.0T2SNT do Juízo de execução de Sintra.
B) Motivação:
Formou o Tribunal a sua convicção através da análise conjugada do acervo documental constante dos autos com as informações bancárias e dos serviços centrais de identificação, que para tanto, se oficiaram. Tal análise, efectuada de forma crítica, segundo a nossa livre apreciação, de acordo com as regras da experiência comum e segundo os juízos da lógica desta decorrentes, habilitaram o tribunal a inferir pela verificação fáctica exposta.
Concretizando:
Relativamente ao contrato de crédito para aquisição de veículo automóvel celebrado com a Credibom e efectuado em nome de V_________, valeu-se o tribunal dos documentos juntos a fls. 22 (condições particulares do mútuo outorgado em 14.07.2009, declarando-se ali a residência sita no Largo ..., 9°, 2° D, em Queluz e conta a debitar - n° 0033 ... do então Barclays Bank) bem como dos documentos que foram apresentados pelo beneficiário do crédito e que instruíram o referido processo - juntos a fls. 23 e ss (bilhete de identidade em nome de V_________, emitido em 26.06.2008, n° 00000000, cartão de contribuinte em nome de V_________, n° 000000000, (vide fls. 204 e ss com domicílio na Alameda ..., n  em Agualva) declaração de vínculo laboral, onde se atesta que o referido V_________ era trabalhador da empresa L ..., construção civil e limpezas, Lda, dois recibos de vencimento desta empresa e um extracto bancário de janeiro de 2009 da referida conta do Barclays).
Ora,
A fotografia aposta no referido bilhete de identidade não é a do cidadão V_________  , mas a do arguido, apesar daquele número de bilhete de identidade e demais dados de identificação (com excepção da assinatura) pertencerem efectivamente a Valdemir  - cfr. fls.106 a 129 e 134.
Tal resulta de forma inequívoca do confronto com os clichés da ficha biográfica da Polícia Judiciária de fls. 32 e 33, 138 a 139 e ainda das fotografias que instruíram os pedidos de bilhete de identidade em nome do arguido juntos a fls. 727 e ss, destacando-se, pela sua qualidade identificativa as de fls. 737v, de fls. 739, 740, 747, 749 e por último a do cartão de cidadão junto pelo próprio arguido a fls. 658.
Aliás, as impressões digitais apostas no bilhete de identidade utilizado não são nem do arguido, nem de V_________ (vide relatório de fls. 185, daqui se extraindo que tais impressões dactiloscópicas foram “plantadas” naquele documento de modo não apurado e que terão sido utilizadas noutros documentos de identificação na Alemanha, na República Checa e em Espanha).
Dúvidas não existem de que somente ao arguido interessaria a utilização de um bilhete de identidade com a sua fotografia mas com a identidade de terceiros para desta forma conseguir:
- Primeiramente a abertura de uma conta bancária no Barclays - acto esse que sobretudo à data era presencial e requeria a exibição e conferência de documentação do titular que o arguido apresentou.
A abertura de conta ocorreu em 17.06.2008 (fls. 255 e ss) e para a sua instrução foram apresentados os documentos de fls. 262 (factura de água em nome de V_________   e com a residência sita no Largo ...,  , em Queluz, bilhete de identidade em nome do referido cidadão com o n° 00000000, mas emitido em 17.11.1999 (cuja fotografia coincide com a do arguido) e cartão de contribuinte também em nome de V_________ - fls. 263 a 265.
- E através desta conta bancária, novamente mediante a utilização de documentos em nome de V_________, lograr o financiamento para a aquisição do veículo que lhe foi entregue mas que conforme a demandante reconhece apenas liquidou uma prestação mensal (fixada contratualmente em € 310,91) por débito directo na referida conta do Barclays, não tendo as demais sido liquidadas por insuficiência de saldo bancário como nos referiu , o qual, enquanto funcionário da demandante na área da recuperação de activos diligenciou pela descoberta do paradeiro daquele devedor, não tendo o mesmo sido localizado, nem tendo sido possível executar com êxito a livrança preenchida aquando da celebração do contrato - execução essa que conforme resulta dos documentos juntos ao pedido civil foi movida logicamente contra a pessoa de V_________  , cidadão que nunca trabalhou na dita L ..., construção civil e limpezas, Lda, nem nunca teve domicílio na morada fiscal que passou a constar do seu cartão de contribuinte - Alameda ..., n° Dto, no Cacém e que no acto de abertura da conta do Barclays foi indicada como sendo o domicílio fiscal daquele proponente (fls. 265).
Aliás, este demandante, para além de ter corroborado o exposto, salientou que apenas quando veio de férias a Portugal, já que residia em Angola, pretendendo renovar o seu bilhete de identidade, foi confrontado com o facto de já alguém o ter feito em seu nome, tendo sido ainda surpreendido com a existência de dívidas contraídas também em seu nome às quais nunca deu azo.
Relativamente à situação ocorrida junto do Santander Totta, atendeu o tribunal ao contrato de crédito pessoal de fls. 49 e ss celebrado em 23.04.2009, em nome de V_________, titular do mesmo número de cartão de contribuinte referido supra e do mesmo bilhete de identidade aludido, mas residente na R. ..., 63SC, na Amadora.
Este contrato foi associado à conta de depósitos à ordem, aberta poucos dias antes, em 20.04.2009, no balcão da Amadora com o n° 0003 ... - fls. 246 e ss.
Tal crédito, foi imediatamente disponibilizado àquele proponente, mas a primeira prestação (com vencimento em 5.06.2009), assim como as demais, nunca foi paga.
Mas não deu origem à execução da livrança dada como garantia do cumprimento daquele contrato (cfr. original da livrança junto a fls. 572, apenas assinada pelo subscritor).
Também nesta situação e pelos fundamentos já expostos somente o arguido, que utilizava um documento de identificação com a sua fotografia, mas com os demais dados de terceiros, poderia celebrar tais negócios.
Tal crédito, decorrente do não pagamento do mútuo no valor de € 20.552,54 foi objecto de cessão à LB UK RE Holdings Limited em junho de 2011 (vide fls. 59 e contrato de fls. 706 e ss), sem que daqui decorra que a demandante Hefesto o tenha adquirido posteriormente.
Acresce que, no cumprimento dos mandados de busca domiciliária emitidos no processo n° 228/08.5JBLSB dos Juízos Criminais de Sintra, em 6.05.2009 (vide certidão do auto de busca de fls. 295 e ss), no então domicílio do arguido e na sua posse, estando o mesmo presente aquando da realização de tal diligência foi apreendida diversa documentação fiscal e de identificação, incluindo passaportes, de vários cidadãos, bem como uma declaração emitida pela empresa “L ...” atestando a existência de um vínculo laboral e recibos de vencimento, a favor de um cidadão (a mesma empresa que também foi utilizada para atestar o vínculo laboral no contrato de mútuo com a Credibom), cartões bancários em nome de vários cidadãos e cartas de condução, sendo que em nome de V_________   o arguido detinha uma carta de condução emitida pelo Reino Unido (fls. 311v) e quatro cartões bancários (dois do BarclaysBank, um do Santander Totta e outro do Banif).
Ademais, a fotografia aposta naquela carta de condução corresponde à do bilhete de identidade utilizado para a abertura de conta bancária no Barclays (fls. 263).
Apurou-se ainda que o cartão do Barclays com o n° 4909 ... (fls. 311v) esteve associado justamente à conta bancária n° 0033 ... (informação de fls. 715) e que o cartão bancário do Santander Totta (fls. 311v) esteve associado à conta bancária n° 00032 ... (informação de fls. 686).
A posse de todos os referidos documentos e cartões bancários não só compromete de forma inequívoca o arguido na prática dos factos, como evidencia uma actividade fraudulenta associada à adulteração de documentos de identificação de terceiros.
 Quanto ao pedido de indemnização civil deduzido por V_________, analisou-se ainda o teor de fls. 85, do qual se infere que efectivamente o ofendido solicitou a concessão de crédito para aquisição de habitação que lhe foi negada em 1 de março de 2016, atentas as informações que relativamente ao mesmo constavam na central de responsabilidades de crédito do banco de Portugal (fls. 85 e fls. 5), o que motivou a que o mesmo, tomando conhecimento de dívidas em seu nome mas que não tinha contraído, apresentasse a participação criminal que deu origem aos presentes autos. Naturalmente, que qualquer cidadão cumpridor, colocado nas circunstâncias com as quais o ofendido foi confrontado, vendo o seu bom nome manchado na praça, porquanto passou a constar da lista de devedores relapsos a nível nacional, difundida pela entidade reguladora do sector bancário - o Banco de Portugal, se sente vilipendiado, ofendido na sua honra. Além disso, o ofendido, para além de ter tido de contestar as dívidas que em seu nome foram contraídas, algo que angustia qualquer pessoa, ainda ficou prejudicado na economia da sua vida pessoal e familiar já que por causa das dívidas contraídas pelo arguido em nome pessoal do ofendido, ficou impossibilitado de recorrer à banca, como pretendia, para adquirir habitação própria.
No mais, estribou-se o tribunal, quanto à matéria atinente à condição pessoal do arguido que foi possível apurar, no teor do requerimento e documentos juntos pelo próprio a fls. 693 ss.
Analisou-se o certificado de registo criminal do arguido constante de fls. 660 e ss do mesmo se extraindo as suas condenações penais.
Quanto ao pedido de indemnização civil deduzido pela Hefesto nenhuma prova logrou a mesma efectuar, como lhe incumbia, desde logo quanto à origem do crédito invocado, fundado num contrato de cessão de créditos que, apesar de convidada a juntar aos autos, não veio a efectuar.
2.3. Apreciação do Mérito do Recurso
Quanto à nulidade prevista no art. 379º nº1 al. a) do CPP.
 Nas conclusões 36 a 39 e 54 do recurso, o recorrente acusou o acórdão de «muito sinteticamente» se ter limitado a efectuar afirmações genéricas de «princípios e regras legais aplicáveis, com total ausência do concreto exame crítico da prova e de enunciação das proposições lógico-jurídicas de que resulte ser compreensível e verificável pelos demais intervenientes processuais».
Nos termos do art. 379º nº 1 al. a) em conjugação com o art. 374º nº2 do CPP, a sentença que omita o exame crítico das provas em que fundamentou a sua convicção na consideração como provados e como não provados, dos factos objecto do processo, é nula.
A exigência de que o texto da sentença contenha o exame crítico das provas é uma decorrência das exigências constitucionais da fundamentação das decisões judiciais como mecanismos de concretização das garantias de independência e imparcialidade dos Tribunais e de sindicância do acerto da decisão, através do recurso e está, ainda, conexionada com o princípio da livre apreciação da prova, contido no art. 127º do CPP.
Nesta medida, a exigência legal do exame crítico das provas, além das garantias de imparcialidade e sindicabilidade da decisão em instância de recurso, previne que estados puramente subjectivos, assentes em meras intuições, crenças ou emoções determinem a fixação da matéria de facto e obsta à violação do princípio da inadmissibilidade das proibições de prova.
Como a própria expressão «exame crítico» refere, se, por um lado, a exigência de fundamentação da convicção do Tribunal quanto aos factos provados e não provados não se basta com a mera enumeração dos meios de prova produzidos na audiência de discussão e julgamento, (sendo inconstitucional a norma do n.º 2 do artigo 374º do Código de Processo Penal, na interpretação segundo a qual a fundamentação das decisões em matéria de facto se basta com a simples enumeração dos meios de prova utilizados em 1.ª instância – cfr. Acs. do Tribunal Constitucional n.º 172/94, Diário da República, 2.ª série, de 19 de Julho de 1994 e n.º 573/98, Diário da República, 2.ª série, de 13 de Novembro de 1998), por outro lado, também não deve redundar numa «espécie de assentada, em que o tribunal reproduza os depoimentos de todas as pessoas ouvidas, ainda que de forma sintética» (Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 258/2001, com texto integral disponível em www.tribunalconstitucional.pt), sob pena de violação do princípio da oralidade e de também não materializar qualquer análise objectiva da prova produzida, da qual seja possível retirar qual o processo de raciocínio do tribunal na formação da sua convicção quanto aos factos, qual o escrutínio efectuado acerca do conteúdo e do valor de todos e cada um dos meios de prova disponíveis.
O que importa para satisfazer a exigência legal do exame crítico das provas é que a fundamentação da decisão de facto expresse quais as provas cujo valor probatório se encontra pré-estabelecido na lei (v.g., a confissão do arguido, a prova pericial e a prova documental autêntica e autenticada) que foram produzidas e quais os factos que demonstram, bem como, que dessa fundamentação resulte, com clareza, quais as regras de experiência comum, os critérios de razoabilidade e de lógica, ou os conhecimentos técnicos e científicos utilizados para conferir credibilidade a determinados meios de prova e não a outros e em que medida os meios de prova produzidos oferecem informação esclarecedora e convincente que permite considerar provados os factos ou, pelo contrário, não oferecem segurança para alicerçar uma conclusão positiva acerca da verificação de determinados factos e, por isso, se justifica a sua inclusão, nos factos não provados, «em ordem a que os destinatários (e um homem médio suposto pelo ordem jurídica, exterior ao processo, com a experiência razoável da vida e das coisas) fiquem cientes da lógica do raciocínio seguido pelo tribunal e das razões da sua convicção (cfr., v. g., acórdão do Supremo Tribunal de 30.01.2002, proc. 3063/01, in http://www.dgsi.pt. No mesmo sentido Acs. do STJ de 3.10.2007, proc. 07P1779; de 19.05.2010, proc. 459/05.0GAFLG.G1.S1, de 17.09.2014, proc. 1015/07.3PULSB.L4.S1; de 14.12.2016, proc. 303/14.7JELSB.E1.S1; de 13.12.2018, proc. 308/10.7JELSB-L3.S1 e de 11.07.2019, proc. 22/13.1PFVIS.C1.S1, in http://www.dgsi.pt e Marques Ferreira, Jornadas de Direito Processual Penal - O Novo Código de Processo Penal, Livraria Almedina, 1988, pág. 228, Sérgio Poças, Da sentença penal – Fundamentação de facto, Revista “Julgar”, n.º 3, p. 21 e segs.).
O raciocínio lógico, motivado e objectivado na análise das provas não tem, forçosamente, de implicar uma fundamentação específica e autonomizada, facto a facto, diversamente do que pretende o recorrente, sob pena de se converter numa tarefa impossível, ou, pelo menos, repetitiva e inútil, com eventual grave prejuízo para a sua inteligibilidade e clareza e, portanto, os valores de transparência e rigor, controlo da legalidade e legitimação democrática das decisões judiciais, que a exigência de fundamentação visa assegurar, acabarem por resultar postos em crise por essa mesma fundamentação, se exacerbada a um nível de pormenorização que reproduza por escrito tudo ou quase tudo quanto oralmente se passou no decurso da discussão da causa.
É certo que o exame crítico das provas tem geometria variável, tanto quanto o dever geral de fundamentação de todas as demais decisões judiciais, mas, o que é igualmente certo e resulta expresso do próprio texto do art. 379º nº 1 al. a) do CPP, é que só a total falta de análise valorativa dos meios de prova disponíveis integra a nulidade ali prevista e que, aparte esta causa de invalidade da sentença, a exigência legal de motivação da convicção do Tribunal quanto aos factos considerados provados e não provados, basta-se com uma apreciação sintética, desde que abrangente e esclarecedora sobre o processo lógico-dedutivo de apreciação da prova e de fixação da matéria de facto, que permita compreender as opções do julgador e aferir da sua correcção ou conformidade com o conteúdo da prova e a valoração que dela se deve fazer, por referência aos critérios de decisão contidos nos arts. 125º a 127º do CPP.
Outra não pode ser a interpretação a retirar das expressões «tanto quanto possível completa, ainda que concisa», contida no art. 374º nº 2 do CPP e «é nula a sentença que não contiver as menções referidas no nº 2 (…) do art. 374º» inserta no art. 379º nº 1 al. a) do mesmo diploma, referidas à fundamentação da decisão de facto.
Ora, no caso vertente, o texto da decisão é totalmente explícito e esclarecedor acerca dos motivos da convicção, tanto da consideração dos factos provados, como dos não provados.
Do texto do acórdão, no excerto em que são expostos os motivos da convicção resulta evidente que os factos não provados, foram assim considerados porque nenhuma prova foi produzida sobre eles, pelo que, se não há qualquer dado de informação disponível sobre esses factos, também nada mais é necessário explicar sobre as razões de não terem resultado demonstrados, perante a incerteza sobre a sua verificação que, naturalmente, decorre da ausência de prova.
Já no que se refere aos que foram considerados provados, o Tribunal disse muito mais do que o excerto que o recorrente transcreveu na conclusão 36.
E o que disse para explicar como e porquê concluiu que os factos aconteceram como descritos em 1º a 59º, é tudo menos genérico, vago ou ininteligível.
Como se pode concluir da simples leitura do texto da motivação, o Tribunal  analisou com detalhe, quer a prova documental, quer a testemunhal e por declarações, quer a pericial (relatório de fls.185 e seguintes) indicando qual a razão de ciência das testemunhas, indicando de que espécies de documentos se socorreu e o que é que os mesmos atestam, estabelecendo correlações entre os conteúdos dos diversos documentos e entre estes e os outros meios de prova, fazendo alusão por súmula ao teor dos documentos que valorou, comparando-os com os excertos mais impressivos das declarações do lesado e dos depoimentos das testemunhas, explicando como e porquê chegou à conclusão de que foram aquelas as circunstâncias de tempo, modo e lugar em que foram fabricados os documentos civil e fiscal com os elementos de identificação do lesado V_________, mas com a fotografia do arguido, em que foram abertas duas contas bancárias depósito à ordem com o Banco Barclays e com o Santander Totta, foram celebrados o contrato de compra e venda do veículo Volkswagen Golf de matrícula  e os contratos de abertura de crédito com o Banco Credibom, S.A., no valor de € 29.847,36 para financiamento da compra do veículo e de crédito ao consumo com o Banco Santander Totta, no valor de € 20.552,54.
Que o recorrente não concorde com essa motivação, tem o presente recurso para impugnar a decisão. Mas não é pelo facto de discordar dela, que se pode afirmar que a motivação da decisão de facto foi omitida.
Ela encontra-se expressa no texto da motivação de forma clara e evidente, de resto, como o próprio recorrente também a compreendeu perfeitamente, ou não teria elaborado o presente recurso, sobretudo, na parte em que invocou o erro de julgamento e os vícios decisórios, como elaborou.
Não existe, pois, a nulidade apontada.
Quanto à nulidade prevista no art. 379º nº1 al. c) do CPP, por excesso de pronúncia.
Esta sanção da nulidade, exclusivamente prevista para as sentenças (atento o princípio da legalidade em matéria de nulidades, ínsito no art. 118º nºs 1 e 2 do CPP), visa garantir a completude ou exaustividade da decisão, de acordo com o qual, uma sentença deve conter, de forma esgotante, a apreciação dos factos e o respectivo enquadramento jurídico, mas sempre em estreita coerência com o que foi alegado pelos sujeitos processuais; com a prova produzida e com o direito aplicável, segundo as várias soluções jurídicas possíveis e segundo os seus poderes de cognição, resultantes das regras do processo ou dos temas pertinentes à decisão de mérito sobre o objecto do processo ou sobre a tramitação do mesmo, que tenham sido colocadas à apreciação do tribunal, pelos sujeitos processuais.
Trata-se de assegurar a coincidência significativa entre o que é pedido e o que é julgado.
De acordo com o preceituado no nº 2 do artigo 608º do Código Processo Civil, aplicável, ex vi do art. 4º do CPP, o «juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras. Não pode ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras».
A expressão questões que devesse apreciar «deve ser entendida em sentido amplo: envolverá tudo quanto diga respeito à concludência ou inconcludência das exceções e da causa de pedir (melhor, à fundabilidade ou infundabilidade dumas e doutras) e às controvérsias que as partes sobre elas suscitem. Esta causa de nulidade completa e integra, assim, de certo modo, a da nulidade por falta de fundamentação. Não basta à regularidade da sentença a fundamentação própria que contiver; importa que trate e aprecie a fundamentação jurídica dada pelas partes. Quer-se que o contraditório propiciado às partes sob os aspetos jurídicos da causa não deixe de encontrar a devida expressão e resposta na decisão» (Anselmo de Castro, Direito Processual Civil Declaratório, vol. III, Coimbra, Almedina, 1982, pág. 142).
«O  juiz conhecer de todas as questões que lhe são submetidas, isto é, de todos os pedidos deduzidos, todas as causas de pedir e exceções invocadas e todas as exceções de que oficiosamente lhe cabe conhecer (art. 660º/2), o não conhecimento de pedido, causa de pedir ou exceção cujo conhecimento não esteja prejudicado pelo anterior conhecimento de outra questão constitui nulidade, já não a constituindo a omissão de considerar linhas de fundamentação jurídica, diferentes da da sentença, que as partes hajam invocado» (Lebre de Freitas, A. Montalvão Machado e Rui Pinto, Código de Processo Civil Anotado, Vol. II, 2ª edição, Coimbra, Coimbra Editora, 2008, pág. 704).
E também «não significa considerar todos os argumentos que, segundo as várias vias, à partida plausíveis, de solução do pleito ( art. 511º/1 ), as partes tenham deduzido ou o próprio juiz possa inicialmente ter admitido: por um lado, através da prova, foi feita a triagem entre as soluções que deixaram de poder ser consideradas e aquelas a que a discussão jurídica ficou reduzida; por outro lado, o juiz não está sujeito às alegações das partes quanto à indagação, interpretação e aplicação das normas jurídicas ( art. 664º ) e, uma vez motivadamente tomada determinada orientação, as restantes que as partes hajam defendido, nomeadamente nas suas alegações de direito, não têm de ser separadamente analisadas» (Alberto dos Reis, Código de Processo Civil Anotado, vol. V, Coimbra, Coimbra Editora reimp, 1984, pág. 143).
É, pois, neste sentido, que deve ser interpretada a palavra «questões» incluída na previsão do art. 379º nº 1 al. c) do CPP, sentido este, que não se confunde com os simples argumentos, teses doutrinárias ou jurisprudenciais, razões, ou opiniões invocados pelos sujeitos processuais para sustentar a sua pretensão, reconduzindo-se antes a problemas concretos com incidência e influência directa no desfecho do processo, esteja em causa uma decisão de mérito sobre o seu objecto, ou apenas a aplicação de normas de direito adjectivo que obstem ao conhecimento do fundo da causa.
Para efeitos da nulidade prevista na al. c) do nº 1 do art. 379º do CPP, o conhecimento proibido é o que resulte de decisão não compreendida pelo objecto do processo. Assim, há excesso de pronúncia, quando o tribunal decide uma questão que não havia sido chamado a resolver e que não é de conhecimento oficioso.
O recorrente enfoca o excesso de pronúncia na manutenção dos factos provados em 1º a 9º, apesar de o Tribunal ter declarado o procedimento criminal extinto por prescrição, quanto aos crimes de falsificação de documentos que esses factos seriam susceptíveis de integrar, tal como alegou nas conclusões 1 a 9 e 11.
 Em primeiro lugar, cumpre esclarecer que factos não são questões e só as questões, com o significado e alcance acima exposto, é que estão no âmbito da previsão contida no art. 379º nº1 al. c) do CPP.
Em segundo lugar, o que foi declarado extinto por prescrição foi o procedimento criminal, não foram os factos.
A prescrição tem um efeito extintivo do processo porque lhe subjaz a ideia de que decorrido certo tempo sobre a prática de factos que constituem crimes já não se justifica a sua punição, porque já não há fins das penas a prosseguir e o efeito da manutenção do direito de punir do Estado seria contraproducente, convertendo-se num foco de insegurança jurídica e premiando, de forma intolerável, a inércia do Estado em administrar a justiça penal contra os princípios da segurança e paz jurídicas, do Estado de direito democrático e da necessidade das penas, que se extraem dos arts. 2º, 18º, nº 2, 29º e 32º, nº 2, da Constituição e dos quais emerge a necessidade de regras prescricionais.  
«É inútil manter a possibilidade de punição por tempo ilimitado para reafirmar a validade das normas violadas (prevenção geral). O decurso do tempo faz diminuir ou mesmo desaparecer as exigências de reintegração social do agente do crime, não está jurídico-constitucionalmente fundamentada a necessidade da aplicação de uma pena quando esta não seja necessária do ponto de vista da prevenção, geral e/ou especial. A reabilitação do arguido não impõe – não exige – sempre uma pena. (…) A aplicação de uma sanção apenas provocaria nova intranquilidade social e não contribuiria em nada para a estabilização da paz jurídica». (Pedro Filipe Gama da Silva, A prescrição como causa de extinção da responsabilidade criminal. Um estudo de direito penal português Tese de Mestrado em Direito, na área de especialização de Ciências Jurídico-Criminais, orientada pela Prof. Doutora Cristina Líbano Monteiro e apresentada à Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, 2015, p. 81 a 83. No mesmo sentido, Mariana Canotilho e Ana Luísa Pinto, “As medidas de clemência na ordem jurídica portuguesa”, Separata de Estudos em Memória do Conselheiro Luís Nunes de Almeida, Coimbra Editora, 2007, p. 372 e Acs. do TC n.º 205/99, de 7.04.1999; Ac. n.º 483/2002, de 20.11.2002, in http://www.tribunalconstitucional.pt).
Esse efeito extintivo terá repercussão sobre os factos integradores dos crimes prescritos, mas apenas na medida em que já não serão sujeitos a qualquer juízo técnico jurídico quanto ao seu enquadramento penal. A prescrição extingue a responsabilidade criminal e só por isso é que extingue o processo. Se a prescrição atingir todos os crimes objecto do processo, ficará prejudicada qualquer decisão de mérito sobre todos eles. Não porque se tenham extinguido os factos que os integram, mas porque esses factos perderam a tutela penal que tinham até então.
Do mesmo modo, mesmo que a prescrição não abranja todos os crimes que integram o objecto do processo e este tiver de prosseguir para o julgamento de outros crimes, se os factos forem autónomos, naturalmente, que aqueles que integram os crimes prescritos perdem relevância, logo, porque o Tribunal, não pode retirar deles qualquer consequência jurídica, pode e deve eliminá-los da decisão de facto, mantendo apenas os que são pertinentes ao juízo sobre se os ainda não prescritos foram ou não foram cometidos e podem ou não podem ser imputados a quem está acusado da sua prática. Não porque se tenham extinto por prescrição que só incide sobre a responsabilidade criminal e sobre o correspondente processo, mas tão-só porque deixaram de ser necessários ao exame e decisão da causa.
Mas não é que o sucede, no caso vertente.
Os factos 1º a 9º referem-se ao fabrico e obtenção dos documentos de identificação civil e fiscal contendo os elementos de identificação do lesado V_________   mas, no caso do primeiro com a fotografia do arguido e, no caso do segundo para ele remetido, como se aquele NIF fosse o que lhe está realmente atribuído pela AT e, ainda, à abertura de uma conta bancária junto do Barclays Bank titulada na realidade pelo arguido, mas fazendo-se passar pelo mesmo V_________   porque constituída através da exibição daqueles documentos forjados, conta bancária essa, com o nº 0033 ....
Acontece que aqueles documentos de identificação civil e fiscal a que se referem os pontos 1º e 2º dos factos provados foram utilizados em todos os sucessivos contratos de compra e venda do veículo automóvel celebrado com o Stand Digital Car, de crédito pedido junto do Banco Credibom, S.A, de abertura de conta depósito, junto do Banco Santander Totta e subsequente contrato de crédito ao consumo, tal como referido nos pontos 12, 15, 18, 23, 31, 36, 36 (repetido), 38 e 39, do mesmo modo que, como descrito no ponto 19º, o NIB que foi usado no contrato celebrado com o Banco Credibom SA foi o que estava associado à conta bancária do Barclays Bank, a que se referem os pontos 4º a 9º.
Portanto, o arguido celebrou todos estes contratos usando documentos falsos, construindo uma falsa identidade, fazendo-se passar por outra pessoa, o lesado V_________  , como se fosse o próprio. Esses documentos foram usados na redacção e elaboração de outros documentos, eles próprios também, por isso mesmo, falsificados e contribuíram para criar a aparência de negócios lícitos, mas que apenas serviram os propósitos do arguido de obter o veículo e as quantias monetárias dos contratos de crédito, à custa de disposições patrimoniais feitas pela empresa e pelas instituições bancárias que com ele contrataram e em execução das suas obrigações contratuais.
Esta a interligação dos factos 1 a 9 com os restantes, na medida em que é neles que vem descrito como é que os documentos forjados e adulterados como se fossem genuínos documentos de identificação do lesado V_________  , foram fabricados e obtidos pelo arguido.
Os factos 1 a 9 são, por conseguinte, instrumentais dos enumerados e descritos em 10 a 58, facilitam a compreensão da matéria de facto provada e mais do que isso, integram uma fase do iter criminis quanto aos específicos modos de execução dos restantes crimes de falsificação de documentos e de burla imputados ao arguido, pelo que nunca poderiam ter sido eliminados da decisão de facto, porque estes últimos crimes não estão prescritos e porque se trata de factos que integram o modo de execução destes últimos, logo, relevantes, para a decisão da causa.
Os factos provados nos pontos 1 a 9, são antecedentes lógicos e cronológicos de todos os restantes e é por isso que o Tribunal depois de declarar a prescrição, fez a ressalva, e muito bem, de que os iria manter, no elenco dos factos provados, dada a sua importância «(…) para melhor compreensão fáctica, em face da sucessão de eventos e da sua interligação com os que se lhe seguiram».
E, na medida em que, por efeito da prescrição, o processo foi extinto em relação aos crimes que tais factos eram susceptíveis de integrar, tal como exarado na alínea A) do dispositivo do acórdão, não foi cometida qualquer nulidade, porque, efectivamente, tal como anunciado no acórdão, daqueles factos não foi extraída qualquer consequência penal.
Erro de julgamento e vícios decisórios.
A matéria de facto pode ser sindicada em recurso através de duas formas: uma, de âmbito mais estrito, a que se convencionou designar de «revista alargada», implica a apreciação dos vícios enumerados nas als. a) a c) do art. 410º nº 2 do CPP; outra, denominada de impugnação ampla da matéria de facto, que se encontra prevista e regulada no art. 412º nºs 3, 4 e 6 do mesmo diploma.
Assim, se no primeiro caso, o recurso visa uma sindicância centrada exclusivamente no texto da sentença, dirigida a aferir da capacidade do juiz em expressar de forma adequada e suficiente as razões pelas quais se convenceu e o sentido da decisão que tomou, já no segundo, o que o recurso visa é o reexame da matéria de facto, através da fiscalização das provas e da forma como o Tribunal recorrido formou a sua convicção, a partir delas.
O erro do julgamento verifica-se sempre que o Tribunal tenha dado como provado um facto acerca do qual não foi produzida prova e, portanto, deveria ter sido considerado não provado, ou inversamente, quando o Tribunal considerou não provado um facto e a prova é clara e inequívoca, no sentido da sua comprovação.
O mecanismo por via do qual deverá ser invocado - impugnação ampla da matéria de facto – encontra-se previsto e regulado no art. 412º nºs 3, 4 e 6 do CPP e envolve a reapreciação da actividade probatória realizada pelo Tribunal, na primeira instância e da prova dela resultante.
No entanto, essa reapreciação não é livre, nem abrangente, antes tem vários limites, porque está condicionada ao cumprimento de deveres muito específicos de motivação e formulação de conclusões do recurso.
 Assim, nos termos do nº 3 do art. 412º do CPP, quando impugne a decisão proferida sobre matéria de facto, o recorrente deve especificar: a) os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados; b) as concretas provas que impõem decisão diversa da recorrida e c) as provas que devem ser renovadas».
O nº 4 do mesmo artigo acrescenta que, tratando-se de prova gravada, as indicações a que se referem as alíneas b) e c) do nº 3 se fazem por referência ao consignado na acta, nos termos do disposto no n.º 2 do artigo 364º, devendo o recorrente indicar concretamente as passagens em que se funda a impugnação, sendo que, neste caso, o tribunal procederá à audição ou visualização das passagens indicadas e de outras que considere relevantes para a descoberta da verdade e a boa decisão da causa, segundo o estabelecido no nº 6.
Assim:
Para cumprir o ónus previsto no nº 3, o recorrente terá de indicar, com toda a clareza e precisão, o que é que, na matéria de facto, concretamente, quer ver modificado.
Neste conspecto, cumpre assinalar que, na medida em que o recurso está concebido como um remédio jurídico e não como um novo julgamento, ele não implica a formulação de uma nova convicção por parte do tribunal de recurso, em substituição integral da formada pelo tribunal da primeira instância, nem equivale a um sistema de duplo julgamento, antes se cingindo a pontos concretos e determinados da matéria de facto já fixada e que, de acordo com a prova já produzida ou a renovar, devem necessariamente ser julgados noutro sentido, de harmonia com os princípios da imediação e da oralidade da audiência de discussão e julgamento, da livre apreciação da prova e da segurança jurídica e partindo da constatação de que o contacto que o Tribunal de recurso tem com as provas é, por regra e quase exclusivamente, feito através da gravação, sem a força da imediação e do exercício sistemático do contraditório que são característicos da prova produzida no julgamento, princípios e constatação estes, que postulam a excepcionalidade das alterações ao julgamento da matéria de facto, feito na primeira instância (Ac. STJ n.º 3/2012, publicado no Diário da República, 1.ª série, de 18-4-2012. No mesmo sentido, Acs. do Tribunal Constitucional nºs 124/90; 322/93; 59/2006 e 312/2012, in www.tribunalconstitucional.pt e AUJ nº 10/2005, de 20.10.2005, DR, Série I-A, de 07-12-2005. Prof. Germano Marques da Silva, Registo da Prova em Processo Penal, Tribunal Colectivo e Recurso, in Estudos em Homenagem a Cunha Rodrigues, vol. I, Coimbra, 2001, Ana Maria Brito, Revista do C.E.J., Jornadas Sobre a Revisão do C.P.P., pág. 390; Cunha Rodrigues, «Recursos», in O Novo Código de Processo Penal, p. 393).
O ónus de indicação das provas que impõem decisão diversa da recorrida, apresenta uma configuração alternativa, conforme a acta da audiência de julgamento contenha ou não a referência do início e do termo de cada uma das declarações e depoimentos gravados: se a acta contiver essa referência, a indicação dos excertos em que se funda a impugnação faz-se por referência ao consignado na acta, nos termos do disposto no nº 2 do artigo 364º e do nº 4 do artigo 412º do CPP); se a acta não contiver essa referência, basta a identificação e transcrição, nas motivações de recurso, das ditas “passagens/excertos” dos meios de prova oral gravados (Ac. do STJ nº 3/2012, de fixação de jurisprudência de 08.03.2012, in D.R. 1.ª série,  nº 77 de 18 de abril de 2012; Acs. da Relação de Évora, de 28.05.2013, proc. 94/08.0GGODM.E1 e da Relação de Lisboa de 22.09.2020, proc. 3773/12.4TDLSB.L1-5, in http://www.dgsi.pt).
Do mesmo modo que se os meios de prova invocados forem de outra natureza, a indicação da totalidade de um documento ou de uma perícia, ou de uma escuta telefónica, por reporte a um determinado período, na sua globalidade, não cumpre o ónus previsto no art. 412º nº 4 do CPP, nem viabiliza a possibilidade de reapreciação da matéria de facto pelo Tribunal de recurso – é necessário que o recorrente explicite qual o trecho do documento, do relatório pericial ou das transcrição das comunicações telefónicas que contém a informação apta a infirmar a afirmação do facto como provado ou como não provado feita pelo Tribunal recorrido.
Por fim, é preciso que dessa indicação resulte comprovada a insustentabilidade lógica ou a arbitrariedade da decisão recorrida e que a versão probatória e factual alternativa proposta no recurso é que a correcta.
Trata-se, em suma, de colocar à apreciação do tribunal de recurso a aferição da conformidade ou desconformidade da decisão da primeira instância sobre os precisos factos impugnados com a prova efectivamente produzida no processo, de acordo com as regras da experiência e da lógica, com os conhecimentos científicos, bem como com as regras específicas e princípios vigentes em matéria probatória, designadamente, com os princípios da prova proibida, da livre apreciação da prova e do in dubio pro reo, assim como, com as normas que regem sobre a validade da prova e sobre a eficácia probatória especial de certos meios de prova, como é o caso da confissão, da prova pericial ou da que emerge de certo tipo de documentos.
Se dessa comparação resultar que o Tribunal não podia ter concluído, como concluiu na consideração daqueles factos como provados ou como não provados, haverá erro de julgamento e, consequentemente, modificação da matéria de facto, em conformidade com o desacerto detectado. 
Porém, se a convicção ainda puder ser objectivável de acordo com essas mesmas regras e a versão que o recorrente apresentar for meramente alternativa e igualmente possível, então, deverá manter-se a opção do julgador, porquanto tem o respaldo dos princípios da oralidade e da imediação da prova, da qual já não beneficia o Tribunal de recurso. Neste caso, já não haverá, nem erro de julgamento, nem possibilidade de alteração factual.
Assim, a convicção do julgador, no tribunal do julgamento, só poderá ser modificada se, depois de cabal e eficazmente cumprido o triplo ónus de impugnação previsto no citado art. 412º nºs 3, 4 e 6 do CPP, se constatar que decisão da primeira instância sobre os precisos factos impugnados quando comparada com a prova efetivamente produzida no processo, deveria necessariamente ter sido a oposta, seja porque aquela convicção se encontra alicerçada em provas ilegais ou proibidas, seja porque se mostram violadas as regras da experiência comum e da lógica, ou, ainda, porque foram ignorados os conhecimentos científicos, ou inobservadas as regras específicas e princípios vigentes em matéria probatória, designadamente, os princípios da livre apreciação da prova e in dubio pro reo, assim como, as normas que regem sobre a validade da prova e sobre a eficácia probatória especial de certos meios de prova, como é o caso da confissão, da prova pericial ou da que emerge de certo tipo de documentos (autênticos e autenticados).
«A censura dirigida à decisão de facto proferida deverá assentar “na violação de qualquer dos passos para a formação de tal convicção, designadamente porque não existem os dados objectivos que se apontam na convicção ou porque se violaram os princípios para a aquisição desses dados objectivos ou porque não houve liberdade na formação da convicção(…)”.
«A reapreciação da prova, dentro daqueles parâmetros, só determinará uma alteração da matéria de facto quando do respectivo reexame se concluir que as provas impõem uma decisão diversa, excluindo-se a hipótese de tal alteração ter lugar quando aquela reapreciação apenas permita uma decisão diferente da proferida, porquanto, se a decisão de facto impugnada se mostrar devidamente fundamentada e se apresenta como uma das possíveis soluções face às regras da experiência comum, deve a mesma prevalecer, não ocorrendo, nesse caso, violação das regras e princípios de direito probatório» (Ac. da Relação de Lisboa de 10.09.2019 proc. 150/18.7PCRGR.L1-5. No mesmo sentido, Ac. STJ n.º 3/2012, publicado no Diário da República, 1.ª série, de 18-4-2012; Acs. do Tribunal Constitucional nºs 124/90; 322/93; 59/2006 e 312/2012, in www.tribunalconstitucional.pt e AUJ nº 10/2005, de 20.10.2005, DR, Série I-A, de 07-12-2005 Paulo Saragoça da Mata, in A Livre Apreciação da Prova e o Dever de Fundamentação da Sentença em Jornadas de Direito Processual Penal e Direitos Fundamentais, Almedina, Coimbra 2004, pág. 253, Ana Maria Brito, Revista do C.E.J., Jornadas Sobre a Revisão do C.P.P., pág. 390; Cunha Rodrigues, «Recursos», in O Novo Código de Processo Penal, p. 393 e ainda, os Acs. do STJ de 12.09.2013, proc. 150/09.8PBSXL.L1.S1 e de 11.06.2014, proc. 14/07.0TRLSB.S1; Acs. da Relação de Coimbra de 16.11.2016, proc. 208/14.1JACBR.C1; de 13.06.2018, proc. 771/15.0PAMGR.C1 e de 08.05.2019, proc. 62/17.1GBCNF.C1; Acs. da Relação do Porto de 15.11.2018, proc. 291/17.8JAAVR.P1, de 25.09.2019, processo 1146/16.9PBMTS.P1 e de 29.04.2020, proc. 1164/18.2T9OVR.P1; da Relação de Lisboa de 24.10.2018, proc. 6744/16.8L1T9LSB-3; de 13.11.2019, proc. 103/15.7PHSNT.L1, de 09.07.2020, proc. 135/16.8GELSB.L1-9, da Relação de Guimarães de 08.06.2020, proc. 729/17.4GBVVD.G1 in http://www.dgsi.pt).
A primeira observação que se impõe fazer, quanto a esta parte do recurso, é da que o recorrente acusou o acórdão recorrido de insuficiência dos factos para a decisão, de contradição entre os fundamentos e a decisão e de erro notório na apreciação da prova, mas não extraiu do texto da decisão que impugnou, por si só ou conjugado com regras de experiência comum, qualquer obscuridade, ambiguidade, incongruência ou arbitrariedade que permita ilustrar algum daqueles vícios decisórios.
Diversamente, insurge-se contra o raciocínio seguido pelo Tribunal, acusando o Colectivo de Juízes de ter usado um método proibido de prova, sob a aparência de prova documental, porque efectuou um reconhecimento fotográfico do arguido, sem que tenha  dado cumprimento aos formalismos previstos no art. 147º do CPP, concretamente, ao disposto no nº 5 e por ter alicerçado a sua convicção em documentos que, na sua generalidade, não foram exibidos, discutidos nem apreciados em audiência de julgamento - em razão, entre outros dos princípios da imediação e do contraditório (conclusões 12 a 23 do recurso) e ainda, porque decidiu contra a prova testemunhal produzida e sem quaisquer provas aptas à demonstração dos factos (conclusões 24 a 53).
A segunda observação a fazer é a de que os concretos pontos de facto que o recorrente pretende ver alterados são, afinal, todos os factos, em frontal inobservância do carácter excepcional, circunscrito a factos precisos e pontual do reexame que o duplo grau de jurisdição em matéria de facto permite, no sistema jurídico-penal português.
Trata-se da utilização do presente recurso para uma finalidade que ele não pode servir, qual seja, a de obter um novo julgamento e uma diferente convicção em substituição integral da do Tribunal do julgamento.
Com efeito, a sua insurgência dirige-se aos factos exarados sob os pontos 1 a 58 que são todos os que integram todos os crimes por que foi condenado.
Desta observação, por si só, já resultaria a improcedência do presente recurso, quanto à matéria de facto, mas tendo em atenção, toda a argumentação aduzida pelo recorrente quanto ao desacerto do exame crítico das provas, cumpre ainda esclarecer o seguinte:
Não é correcta, nem verdadeira a afirmação de que o Tribunal efectuou um reconhecimento pessoal sob a aparência da análise de documentos, recorrendo exclusivamente a fotografias, sem que tenha dado cumprimento aos formalismos previstos no art. 147º do CPP, especialmente ao disposto no nº 5.
O reconhecimento de pessoas é, segundo as normas contidas no art. 147º do CPP, um meio de prova assente numa percepção sensorial que visa estabelecer a identidade do autor dos factos integradores de um crime.
O princípio da livre apreciação da prova genericamente consagrado no artigo 127º do CPP, assenta, entre outras regras, na admissibilidade de todos os meios de prova, em geral, desde que não incluídos nas proibições contidas no art. 126º do CPP, em sintonia com o princípio consagrado no art. 32º nº 8 da Constituição.
Do texto do art. 147º do CPP, resulta evidente que no reconhecimento, enquanto meio autónomo de prova, se podem distinguir três modalidades: o reconhecimento por descrição (n.º 1), o reconhecimento presencial (n.º 2) e o reconhecimento com resguardo (n.º 3). Esta última modalidade apenas se autonomiza da anterior pela presença de um resguardo ou proteção visual ao reconhecedor, por razões que apenas se prendem com a sua segurança.
Ao reconhecimento fotográfico deve seguir-se o reconhecimento pessoal em banda, com observância das formalidades ali previstas, sob pena não ter valor como meio de prova, em qualquer fase do processo.
Do mesmo modo que o reconhecimento por fotografia, filme ou gravação realizado no âmbito da investigação criminal só pode valer como meio de prova quando for seguido de reconhecimento efectuado nos termos do nº 2, como imposto pelo nº 5 e que, se não este formalismo não for cumprido, o reconhecimento não poderá ser valorado.
Acontece que não é o Tribunal que faz reconhecimentos pessoais.
O Tribunal sindica a legalidade desses reconhecimentos e pondera-os, ou não, no exame crítico da prova, conforme for a sua livre convicção, para decidir os factos.
Este meio de prova pressupõe, desde logo, que exista uma incerteza acerca da identidade do agente do crime, pois é para a apurar que o reconhecimento está previsto e regulado.
«O pressuposto específico - que autonomiza o reconhecimento e o erige como meio de prova - traduzido num inequívoco juízo de necessidade, direccionado, como se disse, ao esclarecimento de uma situação de incerteza subjectiva, em termos de a ele se recorrer apenas "quando houver necessidade de proceder ao reconhecimento de qualquer pessoa« (Alberto Medina de Seiça, "Legalidade da prova e reconhecimentos 'atípicos' em processo penal: notas à margem de jurisprudência (quase) constante", in AA. VV. - organização de Manuel da Costa Andrade et alii - Liber Disciplinorum para Jorge de Figueiredo Dias, Coimbra, 2003, p. 1413 e Ac. do Tribunal Constitucional nº 425/2005 de 25 de Agosto de2005, in Diário da República n.º 195/2005, Série II de 11.10.2005).
Pressupõe também uma ou várias pessoas, vítimas ou testemunhas da prática de um crime, que são quem vai realizar o reconhecimento. Estas pessoas irão estabelecer uma interligação das suas percepções sensoriais acerca das características físicas e, a partir delas, da identidade do autor dos factos objecto do processo, reportadas a dois momentos temporais distintos – o da prática do crime e o da realização dos procedimentos que envolvem a diligência do reconhecimento, designadamente, nos momentos da descrição verbal e, de seguida, de observação das pessoas com as características físicas correspondentes a essa descrição.
«O reconhecimento é um meio de prova que consiste na confirmação de uma percepção sensorial anterior, ou seja, consiste em estabelecer a identidade entre uma percepção sensorial anterior e outra actual da pessoa que procede ao acto» (Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal, vol. II, Lisboa, 1999, p. 174. No mesmo sentido, C. Taormina, Diritto Processuale Penale, vol. II, Turim, p. 543).
No caso vertente, nem sequer havia como realizar esse reconhecimento pela simples razão de que nenhuma das testemunhas inquiridas na audiência, alguma vez viu o arguido.
Simplesmente o que aconteceu, foi que o Tribunal se socorreu das fotografias com as quais o arguido havia instruído os seus anteriores pedidos de renovação do seu próprio bilhete de identidade e que foram remetidas aos autos pelos Serviços de Identificação Civil e Criminal e comparou-as com a existente no cartão de identificação no qual foram apostos os dados pessoais de identificação da testemunha V_________  , o que fez para aferir da falta de autenticidade de tal documento, do mesmo modo que para a mesma finalidade, também foram feitas comparações ao nível das impressões digitais. 
As fotografias também são documentos, na acepção, quer do art. 255º do CP, quer dos arts. 164º e 167º do CPP, sendo que esta última disposição legal, em sintonia com o princípio da livre apreciação da prova, consagrado nos arts. 125º e 127º do mesmo código, só faz depender a validade da prova produzida por reproduções mecânicas da inexistência de ilicitude na sua obtenção avaliada de acordo com o disposto na lei penal.
Por conseguinte, a admissibilidade da prova por fotografias ou outras reproduções mecânicas só fica dependente da sua configuração como um acto ilícito à luz das normas incriminadoras que tutelam os direitos de personalidade associados à imagem e ao direito à intimidade, pelo que carece de tutela penal, sendo criminalmente atípica a obtenção de fotografias ou de filmagens, mesmo sem consentimento do visado, sempre que exista justa causa nesse procedimento, «designadamente quando as mesmas estejam enquadradas em lugares públicos, visem a realização de interesses públicos ou hajam ocorrido publicamente, constituindo único limite a esta justa causa a inadmissibilidade de atentados intoleráveis à liberdade, dignidade e integridade moral do visado» (Ac. do STJ de 28.09.2011, proc. 22/09.6YGLSB.S2,in http://www.dgsi.pt).
Ora, aquilo que o recorrente apelida erradamente de prova por reconhecimento, mais não foi do que análise e ponderação de parte da prova documental, que só por mera coincidência, coincidiu com fotografias tiradas para finalidades de ordem pública e arquivadas por uma entidade pública, no uso legítimo das atribuições e competências que lhe estão atribuídas por lei e que remeteu aos autos, em cumprimento do seu dever de colaboração com a Justiça.
Atribuir a esta actividade probatória o significado de um reconhecimento pessoal, além de destituído de qualquer fundamento legal, redundaria na impossibilidade, contra legem, de valorar prova documental quando a mesma coincidisse com fotografias do arguido obtidas de forma absolutamente lícita, criminalmente atípica e, ainda para mais, relevante para a descoberta da verdade.
Do mesmo modo, tratando-se, como se trata, de prova documental, todos os documentos invocados na motivação da decisão de facto, já se encontravam juntos aos autos, são prova pré-constituída e não carecem de ser reproduzidos em audiência de discussão e julgamento, para assegurar as garantias de defesa do arguido e pleno exercício do princípio do contraditório, se, como sucedeu no caso vertente, umas a maior parte, já constavam do elenco da prova indicada pela acusação e as restantes, as tais fotografias remetidas pelos serviços de identificação civil e criminal foram em tempo oportuno notificados ao recorrente, como ele próprio afirmou, no recurso.
Em concretização dos princípios da imediação, da oralidade, do contraditório e da concentração e publicidade da audiência, o art. 355º nº 1 do CPP proíbe que o tribunal forme a sua convicção com fundamento em provas que não tenham sido produzidas ou examinadas durante o julgamento, excepcionando o nº 2 as provas contidas em actos processuais cuja leitura, visualização ou audição em audiência sejam permitidas.
Por sua vez, nos arts. 356º e 357º do CPP, encontram-se identificados os autos, cuja leitura ou reprodução é permitida, em audiência de discussão e julgamento.
Acontece que, estando em causa, a valoração de documentos, os princípios do contraditório e da imediação têm sido conjugados e equilibrados com os princípios da economia e da celeridade processuais, no sentido da desnecessidade da leitura da prova documental, para que esta possa ser valorada pelo Tribunal, desde que os documentos tenham sido juntos, o mais tardar, até ao final da audiência de discussão e julgamento, como imposto pelo art. 165º do CPP, sejam notificados aos sujeitos processuais e lhes tenham sido dadas todas as possibilidades de impugnação, quer da respectiva admissão, quer da sua força probatória, na medida em que a leitura redundaria num mero ritual, que, além de poder eternizar desnecessariamente a audiência de discussão e julgamento, por si só, nada acrescentaria à descoberta da verdade material, nem às garantias de defesa do arguido ou a um processo justo e equitativo.
A exigência de um processo equitativo, consagrada no artigo 20º nº 4 da Constituição, concretiza-se entre outras regras, na proibição da indefesa e no direito ao contraditório, traduzido fundamentalmente na possibilidade de cada uma das partes invocar as razões de facto e direito, oferecer provas, controlar a admissibilidade e a produção das provas da outra parte e pronunciar-se sobre o valor e resultado de umas e outras, antes de ser tomada qualquer decisão judicial que as afecte (Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, pág. 415 e 416, do vol. I, da 4.ª edição, da Coimbra Editora e Ac. do TC nº 90/2013 processo 357/2012 de 7 de fevereiro de 2013 Diário da República n.º 85/2013, Série II de 03.05.2013).
Por isso é que, mais do que a mera reprodução, visualização ou audição em audiência do documento, o que importa é que o arguido, o assistente e o Mº. Pº. tenham amplas oportunidades de o examinar, de questionar o respectivo conteúdo, de provocar a sua reapreciação pelo Tribunal e participar activamente na confirmação ou infirmação do seu valor probatório, porque assim é que se cumprem, quer o contraditório e as garantias de defesa do arguido, quer a imediação.
Estas finalidades podem perfeitamente ser alcançadas, sem necessidade dessa leitura, visualização ou audição, uma vez que, estando os documentos no processo, por regra, todos os intervenientes têm acesso aos mesmos e, a partir da sua consulta, podem delinear as suas estratégias de defesa e de produção de prova a realizar em audiência, em função do conteúdo de tais documentos e dos factos que pretendam demonstrar.
«Tratando-se de documentos que foram juntos com a acusação, o arguido teve todas as possibilidades de os questionar, podendo ainda, na própria audiência, provocar a sua reapreciação individualizada para esclarecer qualquer ponto da sua defesa relativamente à qual entenda que isso seria necessário. Não é, porém, indispensável à satisfação da exigência de que processo assegure todas as garantias de defesa a leitura de toda a prova documental pré-constituída e junta ao processo. Quanto a este tipo de prova, o princípio do contraditório há-de traduzir-se em ter necessariamente de facultar-se à parte não apresentante a impugnação, quer da respectiva admissão, quer da sua força probatória.
«Acresce que é a audiência de julgamento no seu conjunto e os actos instrutórios que a lei determinar que a Constituição submete ao princípio do contraditório e não a prova testemunhal ou por declarações. O conteúdo essencial deste princípio está em que nenhuma prova deve ser aceite em audiência nem nenhuma decisão deve aí ser tomada pelo juiz sem que previamente tenha sido dada uma ampla e efectiva possibilidade ao sujeito processual contra o qual ela é dirigida de a discutir, de a contestar e de a valorar» (Ac. do TC n.º 87/99, processo n.º 444/98, 1.ª Secção de 9 de Fevereiro in www.tribunalconstitucional.pt).
«Ora, relativamente a documentos que constem do processo e que tiverem sido indicados na acusação como meio de prova, a respectiva leitura ou exibição pública ritualística, embora se reconheça que poderia servir para realizar de modo mais intenso os objectivos do princípio da publicidade da audiência, nada acrescentaria no capítulo das oportunidades de defesa do arguido. Seria, “um verdadeiro “simulacro” de “constituição” no decurso daquele acto processual de uma prova que, afinal, já existia, de modo anterior e autónomo relativamente ao processo penal em questão» (Ac. do TC nº 110/2011, de 2 de Março in www.tribunalconstitucional.pt. No mesmo sentido, entre muitos outros, os Acs. do STJ de 10.11.1993, CJ/STJ, tomo 3, 233; Ac. STJ de 25.02.1993, BMJ 424, p. 535; Ac. STJ de 23.05.1994, p. 46218/3ª; Ac. STJ de 10.07.1996, CJ/STJ, tomo 2, 229; Ac. STJ de 27.01.1999, SASTJ, nº 27, p 83; de 19.11.1997 (processo 97P290); de 21.01.1998 (processo 97P1095), de 10.11.2010 (processo 347/06.2GBVLG-A.S1) e de 28.09.2016 (processo 2/14.0GACLD.C1.S1), http://www.dgsi.pt. Ainda, no mesmo sentido, Maia , Código de Processo Penal – Anotado e Legislação Complementar, Almedina, 2009, 17ª Edição, p. 804. No mesmo sentido, Paulo Pinto de Albuquerque, Comentário do Código de Processo Penal à luz da Constituição da República e da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, Lisboa, Universidade Católica, 2011, pp. 890-891; Oliveira Mendes Código de Processo Penal Comentado, p. 1071).
Mesmo no que se refere ao princípio da publicidade da audiência, cujo objectivo essencial é «dissipar quaisquer desconfianças que se possam suscitar sobre a independência e a imparcialidade com que é exercida a justiça penal e são tomadas as decisões» (Figueiredo Dias, Direito Processual Penal, 1.ª ed. (reimpressão), Coimbra Editora, 2004, pág., pp. 222-223), a sua concretização garante-se primacialmente com a leitura da sentença (art. 87º nº 5 do CPP) e com a disponibilização pública das razões da decisão (Mouraz Lopes, A fundamentação da sentença no sistema penal português - Legitimar, diferenciar e simplificar, Almedina, Coimbra, 2011, p. 101), pois são a publicação da sentença e a respectiva fundamentação os principais instrumentos de controlo pelo público da actividade jurisdicional, ao nível da formação das suas convicções e do sentido das suas decisões (cfr. Acs. do TC nºs 27/2007 e 367/2014, em www.tribunalconstitucional.pt).
Não foram, pois, violados quaisquer direitos fundamentais do arguido, nem postergados quaisquer princípios constitucionais em matéria de garantias de defesa do arguido, de processo justo e equitativo, ou do acusatório, nem usados métodos proibidos de prova.  
Por fim, no que se refere aos depoimentos das testemunhas, o recurso não cumpre com o tríplice ónus da impugnação imposto pelo art. 412º nºs 3,4, e 6 do CPP, pela simples razão de que os excertos dos depoimentos e declarações invocados nas conclusões 24 e seguintes do recurso, também assim foram percebidas e interpretadas pelo Tribunal, como se extraí da simples leitura da motivação da decisão de facto exarada no acórdão recorrido.
O recorrente argumentou que o Tribunal decidiu ao contrário da prova testemunhal produzida porque nenhuma das testemunhas inquiridas viu o arguido.   
Acontece que dizerem que nunca viram o arguido, não é o mesmo que dizerem que não foi o arguido quem praticou os factos.
Portanto, o recorrente não tem razão, porquanto, em bom rigor, desses depoimentos resultam amplamente demonstrados os factos impugnados no recurso, pois que, apesar de não terem logrado identificar o arguido como autor das negociações que antecederam a sucessão de negócios jurídicos descritos em 1º a 58º dos factos provados e como parte contratante nesses negócios, o que, de resto, só reforça a sua credibilidade e a fidedignidade dos seus relatos quanto aos factos de que tinham conhecimento, essa sua razão de ciência, no fundo, resume-se, à confirmação de que aqueles documentos e contratos têm aquele conteúdo e foram celebrados com uma pessoa que se apresentava como sendo o lesado V_________ e usava documentos oficiais com essa identidade.
E foi assim com este significado e alcance que o Tribunal interpretou e valorou estes depoimentos e declarações, portanto, em total sincronia com o seu conteúdo e não contra ele.
O que se passou foi que o Tribunal valorou os meios de prova que tinha disponíveis, retirando deles as informações que os mesmos eram aptos a dar e conjugou-os com presunções judiciais.
A apreciação da prova é livre, mas não arbitrária. Tem de alicerçar-se num processo lógico-racional, de que resultem objectivados, à luz das máximas de experiência, do senso comum, de razoabilidade e dos conhecimentos técnicos e científicos, os motivos pelos quais o Tribunal valorou as provas naquele sentido e lhes atribuiu aquele significado global e não outro qualquer.
Em contrapartida, a prova indirecta é aceitável e usada como alicerce da convicção em plano de igualdade com a prova directa, desde que verificados determinados pressupostos.
Exigir a prova directa implicaria o fracasso na luta contra o crime, ou para essa consequência se evitar, o recurso à confissão, o que significaria o levar ao máximo expoente o valor da prova vinculada, taxada, e a tortura enquanto efeito à vista se a confissão redundasse em insucesso (cfr. Carlos Clement Durán, La Prueba Penal, 1999, págs. 575 e 696 , J.M. Ascensio Mellado, in Presunção de Inocência e Prueba Indiciária, 1992, citado por Clement Durán a págs. 583).
O juízo de inferência converter-se-á em verdade convincente se a base indiciária, plenamente reconhecida mediante prova directa, foi integrada por uma pluralidade de indícios (embora excepcionalmente possa admitir-se um só se o seu significado for determinante), que no confronto outros possíveis contraindícios, estes não neutralizem a  eficácia probatória dos factos indiciantes e que a associação de uma regra da ciência, uma máxima da experiência ou uma regra de sentido comum  sustente uma conclusão inteiramente razoável face a critérios lógicos do discernimento  humano ( neste sentido, Euclides Dâmaso Simões, em «Prova indiciária», na Revista Julgar, n.º 2, 2007, pág. 203 e ss., José Santos Cabral, «Prova indiciária e as novas formas de criminalidade», na Revista Julgar, n.º 17, 2012, pág. 13, Marta Sofia Neto Morais Pinto, em «A prova indiciária no processo penal, na Revista do Ministério Público, n.º 128, out.-dez. 2011, pp. 185-222; Paulo de Sousa Mendes, A prova penal e as Regras da experiência, Estudos em Homenagem ao prof. Figueiredo Dias, III, p.1002).
O artigo 127º do Código de Processo Penal permite o recurso a presunções judiciais, é compatível com a presunção de inocência, consagrada no artigo 32º nº 2 da Constituição, e ainda com o dever de fundamentar as decisões judiciais, imposto pelo artigo 205º nº 1 da Constituição (Ac. Tribunal Constitucional nº 391/2015, em DR nº 224, II Série, de 16/11/2015, e Ac. do TC nº 521/2018 de 17 Out. 2018, Processo 321/2018 http://www.tribunalconstitucional.pt/tc//tc/acordaos/20180521.html).
Tal como as presunções judiciais são meios de prova, também o princípio in dúbio pro reo, corolário do princípio constitucional da presunção de inocência do arguido, contemplado no art. 32º nº 2 da Constituição, é um princípio de prova.
Ambos são mecanismos de resolução dos estados de incerteza, na convicção do julgador, quanto à verificação dos factos integradores de um crime.
O primeiro pressupõe que a dúvida se mantenha insanável, depois de esgotado todo o iter probatório e feito o exame crítico de todas as provas e resolve a dúvida cominando-lhe como consequência a consideração dos factos como não provados e a consequente absolvição do arguido.
A segunda, através da inferência lógico-dedutiva, a partir de indícios ou factos circunstanciais ou colaterais ao objecto do processo resolve essa dúvida contra o arguido, superando a aplicação do in dúbio pro reo, pois permite afirmar um facto desconhecido a partir de um facto conhecido, para além de qualquer dúvida razoável.
Assim, a concatenação entre os princípios da presunção de inocência e in dubio pro reo e o da admissibilidade da prova indirecta, através de presunções judiciais em Direito Penal, implica que as dúvidas acerca da demonstração de determinados factos, sejam resolvidas em benefício do arguido, conduzindo à sua absolvição, mas a questão da existência da dúvida e consequente aplicação deste princípio só pode colocar-se depois de esgotado todo o iter probatório, ou seja, quando o non liquet persiste, mesmo depois de analisadas todas as provas directas e de concluído todo o esforço lógico-dedutivo inerente ao apuramento dos factos através de presunções judiciais.
Com efeito, o Tribunal partiu da constatação objectiva de que os documentos de identificação civil e fiscal mencionados em 1º e 2º foram fabricados e adulterados, só em parte contendo dados de identificação de V_________, mas no caso do bilhete de identidade contendo a fotografia do arguido e umas impressões digitais usadas em outros documentos forjados em outros países, por pessoa ou pessoas desconhecidas, das circunstâncias de esses documentos terem sido usados na contratação da compra do automóvel, na abertura das contas bancárias e dos créditos bancários descritos em 10º a 58º, assim como de que em 6 de Maio de 2009, o arguido ter sido encontrado na posse de vários documentos contendo diferentes identidades e, além disso, cartões bancários associados às contas bancárias abertas no Barclays Bank e no Banco Santander Totta, que serviram para o crédito de veículo automóvel junto do Banco Credibom, S.A e para o crédito ao consumo contraído junto do banco Santander Totta, todos em nome do lesado V_________   e de que este não teve qualquer intervenção, seja na emissão dos documentos de identificação civil e fiscal mencionados em 1º e 2º da matéria de facto provada, seja na celebração dos contratos descritos em 10º a 58º para concluir que o autor desses factos foi o arguido.
E, realmente, de acordo com aquilo que é de esperar, seguindo critérios de dedução lógica e de senso comum, cumpre perguntar que outro significado poderia retirar-se destas circunstâncias, que não seja o de que foi o arguido quem praticou todos os factos descritos em 10º a 58º ?
A esta pergunta, só as conclusões retiradas na motivação da matéria de facto dão uma resposta esclarecedora: era o arguido quem tinha o interesse em adulterar os documentos referidos em 1º e 2º para os poder usar como descrito em 3º a 57º e foi ele quem os usou para obter um veículo automóvel e as duas quantias monetárias mencionadas em 10º a 58º da matéria de facto provada.
Só por uma de todo em todo inverosímil e extraordinária coincidência é que, em 6 de Maio de 2009, tinha na sua posse todos os referidos documentos e cartões bancários que lhe possibilitavam movimentar as contas bancárias, sem ter sido ele o autor desses factos.
A decisão da matéria de facto, dado o seu acerto, a sua coerência com a prova produzida e o estrito cumprimento dos princípios da livre convicção do julgador e que regem a valoração e o exame crítico da prova, não merece, pois, qualquer censura, porque é a única plausível, de acordo com esses princípios e, por isso mesmo, não será alterada.  
Quanto ao texto da decisão recorrida, facilmente se observa da sua simples leitura que não se surpreende nela qualquer insuficiência da matéria de facto provada, qualquer falta de fundamentação, contradição de fundamentação ou entre esta e a decisão ou, ainda, qualquer asserção contrária às regras da experiência comum ou qualquer juízo ilógico, arbitrário ou contraditório, pelo que também é manifesta a inexistência de qualquer dos vícios decisórios previstos no art. 410º nº2 als. a) a c) do CPP.
O recurso também não terá provimento, nesta parte.
Quanto ao excesso da pena e pressupostos de aplicação do instituto da suspensão.
Resta, por último, apreciar a questão do excesso da pena e da verificação dos pressupostos da suspensão da execução da pena.
De acordo com os princípios gerais, consagrados nos art. 18º nº 2 da CRP, da necessidade da pena e da proporcionalidade ou da proibição do excesso, a que o art. 40º do CP deu concretização, as penas servem finalidades exclusivas de prevenção geral e especial, sendo que a pena concreta tem como limite máximo inultrapassável, a medida da culpa e esta constituí o fundamento ético da pena e dentro de uma moldura de prevenção geral positiva ou de integração, cujos limites mínimo e máximo são, respectivamente, o ponto óptimo de tutela dos bens jurídicos e as exigências mínimas de defesa da ordem jurídica penal, correspondendo às exigências básicas e irrenunciáveis de restabelecimento dos níveis de confiança por parte da sociedade, na validade da norma incriminadora violada. (Figueiredo Dias, in Temas Básicos da Doutrina Penal, Coimbra Editora, 2001, págs. 65-111 e na Revista Portuguesa de Ciência Criminal, Ano 3, Abril - Dezembro 1993, páginas 186 e 187. No mesmo sentido, Anabela Miranda Rodrigues, O Modelo de Prevenção na Determinação da Medida Concreta da Pena, in Revista Portuguesa de Ciência Criminal, ano 12, nº 2, Abril/Junho de 2002, pág. 147 e ss., Claus Roxin, Culpabilidad y Prevención en Derecho Penal, p. 113; Eduardo Correia, BMJ nº 149, p. 72 e Taipa de Carvalho, Condicionalidade Sócio-Cultural do Direito Penal, p. 96 e ss.).
É função da pena salvaguardar a reposição e a integridade dos bens jurídicos violados com a prática dos crimes, introduzir um efeito de confiança, no seio da comunidade, acerca da validade e eficácia das correspondentes normas jurídicas incriminadoras e produzir um efeito dissuasor da criminalidade, nos cidadãos em geral, induzindo-lhes a aprendizagem da fidelidade ao direito.
Também é função da pena assegurar, no âmbito da prevenção especial, em regra, positiva ou de socialização, a reintegração do agente na sociedade, excepcionalmente negativa ou de intimidação, prevenindo a reincidência.
Se uma pena insuficiente para satisfazer os fins da prevenção redunda na neutralização da própria eficácia do sistema jurídico, porque cria na comunidade o sentimento de uma sociedade onde o crime não é punido e onde vale a pena praticar crimes, contrariando as mais elementares necessidades de prevenção geral positiva (a que se refere à expectativa de vigência, validade e eficácia do Direito Penal), também é verdade que uma pena de medida superior à culpa é injusta, do mesmo modo, que será desproporcionado e excessivo impor o cumprimento efectivo de penas de prisão, quando ainda é possível assegurar os fins das penas com a simples censura do facto e a ameaças da pena que subjazem ao instituto da suspensão da execução.
O recorrente não põe em causa o doseamento das penas parcelares aplicadas e elas afiguram-se ajustadas à gravidade dos crimes, quer ao nível do desvalor da acção em face da eficácia, determinação e sofisticação de meios utilizados pelo arguido, com recurso ao fabrico e adulteração de diversos documentos de diversas espécies, a reiteração das condutas e o período de tempo em que foram praticadas, quer do desvalor do resultado, em face das consequências patrimoniais desvantajosas para terceiros da prática do crime e do montante expressivo do enriquecimento ilegítimo, o que agrava a ilicitude, do grau de culpa, tendo o arguido agido com dolo directo em todos os momentos e sendo essa a modalidade mais grave, entre as previstas no art. 14º do CP e também das necessidades de prevenção geral, em face da proliferação deste tipo de crimes e da quebra de confiança que induzem no tráfego jurídico.
A moldura pena abstracta tem, pois, como limite mínimo a pena mais grave, de 3 anos e 6 meses e um limite máximo de 10 anos e 6 meses de prisão, resultante da soma de todas as penas aplicadas.       
No que se refere à pena única, é que a pena aplicada de cinco anos e seis meses já se afigura excessiva.
A pena única deve ser encontrada a partir do conjunto dos factos, o qual indica gravidade do ilícito global perpetrado, a existência ou não de uma conexão e qual o tipo de conexão que se verifica entre os diversos factos concorrentes.
E também dever ser encontrada a partir da personalidade do agente, tendo-se em atenção, em primeira linha, se os crimes praticados são expressão de uma inclinação criminosa, de uma tendência de personalidade para a prática de determinado ou determinados crimes, ou apenas constituem delitos ocasionais sem relação entre si, sem esquecer a dimensão da ilicitude do conjunto dos factos e a conexão entre eles existente, sendo que só no primeiro caso se justificará atribuir à pluralidade de crimes um efeito agravante dentro da moldura penal conjunta.
«Todo este trabalho de análise global se justifica tendo em vista descortinar e aferir se o conjunto de factos praticados pelo(a) condenado(a) é a expressão de uma tendência criminosa, isto é, se significará já a expressão de algum pendor para uma “carreira”, ou se, diversamente, a (…) repetição comportamental dos valores estabelecidos emergirá antes e apenas de factores meramente ocasionais» (Ac. do STJ de 22.11.2017, proc. 731/15.0JABRG.G1.S1. No mesmo sentido, Acs. do STJ de 18.09.2018, proc. 964/15.0PPPRT-A.S1, de 12.12.2018, proc. 734/14.2PCLRS.S1, de 9.01.2019, proc. 142/12.0GCSCD-A.S1, de 22.04.2020, proc. 87/17.7SWLSB.1.L1.S1, in http://www.dgsi.pt; Jescheck, Tratado de Derecho Penal, Parte Geral, 4ª edição, pág. 668 e segs; Figueiredo Dias, As Consequências Jurídicas do Crime, (1993), p. 291).
Nesta operação de determinação da pena única impõe-se, ainda, com relevo especial, o juízo sobre o efeito previsível da pena no comportamento futuro do agente.
Ora, sendo embora certo que o arguido actuou sempre com recurso ao mesmo esquema enganoso junto de várias instituições, a verdade é que o fez num período circunscrito de seis dias entre 17 e 23 de Abril de 2009. Também é certo que tem condenações anteriores, duas delas por crime de falsificação de documentos, mas a verdade é que se mostram decorridos onze anos sem que haja notícia de que o arguido tenha cometido outros crimes, tendo-se provado que desfruta de inserção familiar e que se dedica ao trabalho.
Não pode, por conseguinte, afirmar-se que os factos objecto deste processo sejam expressão de uma especialização, ou modo de vida ou tendência de personalidade do arguido, sendo que a gravidade global dos factos, face ao longo período decorrido após a prática dos mesmos, se mostra substancialmente mitigada.
Afigura-se, pois, mais adequada a pena de cinco anos de prisão.
No que concerne à suspensão da execução da pena de prisão pretendida com o presente recurso, importa considerar que de acordo com os princípios gerais, consagrados nos art. 18º nº 2 da CRP, da necessidade da pena e da proporcionalidade ou da proibição do excesso, a que o art. 40º do CP deu concretização, constitui princípio fundamental do sistema punitivo do Código Penal, o da preferência fundamentada pela aplicação das penas não privativas da liberdade, consideradas mais eficazes para promover a integração do delinquente na sociedade e dar resposta às necessidades de prevenção geral e especial.
Em diversos preceitos se encontram afloramentos de tal princípio, designadamente, no instituto da suspensão da execução da pena de prisão, previsto no art. 50º.
A suspensão da execução da pena constituí uma dessas medidas de conteúdo pedagógico e ressocializante que exige, para além da moldura concreta não superior a cinco anos de prisão, que o Tribunal formule um juízo favorável ao arguido, no sentido de considerar provável que a simples censura da sua conduta e a ameaça da pena são suficientes para que ele não volte a cometer crimes e para satisfazer as exigências de prevenção da criminalidade.
E a ponderação das condições pessoais do arguido, da sua personalidade e conduta anterior e posterior aos factos, bem como as circunstâncias em que estes foram praticados, estão directamente associadas a finalidades de prevenção especial e não quaisquer factores relacionados com o grau de culpa do agente, cuja sede própria de apreciação é a escolha e determinação concreta da pena, constituindo o limite máximo e inultrapassável desta.
A suspensão da execução da pena que, embora efectivamente pronunciada pelo tribunal, não chega a ser cumprida, por se entender que a simples censura do facto e a ameaça da pena bastarão para realizar as finalidades da punição, deverá ter na sua base uma prognose social favorável ao réu, a esperança de que o réu sentirá a sua condenação como uma advertência e que não cometerá no futuro nenhum crime.
«O tribunal deverá correr um risco prudente, uma vez que esperança não é seguramente certeza, mas se tem sérias dúvidas sobre a capacidade do réu para compreender a oportunidade de ressocialização que lhe é oferecida, a prognose deve ser negativa» (Leal-Henriques e Simas Santos, Código Penal Anotado, em anotação ao art. 50.º).
Do que se trata é de saber, se mantendo o autor do crime em liberdade, sujeito ou não a injunções e regras de conduta, como condições do não cumprimento efectivo da pena de prisão, destinadas, respectivamente, a reparar o mal do crime e a assegurar a inserção social do condenado, se mostra, em cada caso, adequado e suficiente para que interiorize o carácter ética e juridicamente reprovável da sua conduta e obste a que volte a praticar outros crimes.
«Na base da decisão de suspensão da execução da pena deverá estar uma prognose social favorável ao agente, baseada num risco prudencial. A suspensão da pena funciona como um instituto em que se une o juízo de desvalor ético - social contido na sentença penal com o apelo, fortalecido pela ameaça de executar no futuro a pena, à vontade do condenado em se reintegrar na sociedade» (Jescheck, Tratado, Parte Geral, versão espanhola, volume II, págs. 1152 e 1153).
«Também importa acrescentar que esse juízo de prognose não corresponde a uma certeza, antes a uma esperança fundada de que a socialização em liberdade se consiga realizar. Trata-se pois de uma convicção subjectiva do julgador que não pode deixar de envolver um risco, derivado, para além do mais, dos elementos de facto mais ou menos limitados a que se tem acesso» (Ac. do STJ de 18.06.2015, proc. 270/09.9GBVVD. S1, in http://www.dgsi.pt; no mesmo sentido, Acs. do STJ de 5.07.2012, proc. 373/11.0JELSB.S1-5; de 24.02.2016 proc. 60/13.4PBVLG.P1.S1, na mesma base de dados; Figueiredo Dias, in “Direito Penal Português – As Consequências Jurídicas do Crime”, pág. 344; André Lamas Leite, A suspensão da execução da pena privativa de liberdade sob pretexto da revisão de 2007 do Código Penal, in Stvdia Jurídica, 99, Ad Honorem-5, BFDC, Coimbra Editora, 2009, pág. 629).
Mas são, sobretudo, razões atinentes à prevenção geral que fundamentam, seja a aplicação, seja a não aplicação deste instituto.
Com efeito, são as razões de prevenção geral, traduzidas nas exigências mínimas e irrenunciáveis de salvaguarda da crença da sociedade, na manutenção e no reforço da validade da norma incriminadora violada, que determinam a possibilidade de reinserção social em liberdade que inspira o instituto da suspensão da execução da pena.
Mesmo que aconselhada à luz das exigências de socialização do condenado, a suspensão da execução da pena não poderá ter lugar, se a tal se opuserem a tutela dos bens jurídicos violados e as expectativas comunitárias, quanto à capacidade dos mecanismos e das instituições previstos na ordem jurídica para repor a validade e a eficácia das normas que a integram e de as fazerem respeitar.
«Uma tal medida (de suspensão de execução da pena de prisão) em nada pode ser influenciada por considerações, seja de culpa, seja de prevenção especial.
«Decisivo só pode ser o quantum da pena indispensável para que se não ponham irremediavelmente em causa a crença da comunidade na validade de uma norma e, por essa via, os sentimentos de confiança e de segurança dos cidadãos nas instituições jurídico-penais» (Figueiredo Dias, Direito Penal Português – As Consequências Jurídicas do Crime, Aequitas, Editorial de Notícias, págs. 330/331 e Robalo Cordeiro, A Determinação da Pena, Jornadas de Direito Criminal – Revisão do Código Penal, CEJ, vol. 2.º, pág. 48).
As exigências de prevenção geral que se colocam em relação aos crimes de burla e de falsificação, com índices de gravidade como os deste processo – sem carácter organizado e agindo o arguido isoladamente – ainda não comprometem a possibilidade de suspender a pena, pois que, pese embora a natureza dos bens jurídicos tutelados pelas normas incriminadoras que se refere à fé pública dos documentos, à confiança indispensável à celebração de negócios jurídicos e ao respeito devido pelo património alheio, continua a ser possível restabelecer esses valores e a confiança da comunidade na validade e eficácia das normas jurídicas violadas, através de medidas não privativas da liberdade, ainda que condicionadas a injunções e regras de conduta ou a um regime de prova adequado a reparar os prejuízos causados pelo crime e que implique, por parte do arguido, comportamentos nesse sentido.   
Portanto, o que determinará a possibilidade de suspender a pena de cinco anos de prisão agora aplicada serão apenas as razões de prevenção especial.
Numa análise globalizante dos factos, mostra-se que os mesmos se inserem num contexto de vida pessoal do arguido, que já não existe.
É certo que os factos objecto deste processo, pelo número de crimes cometidos, assim como pela utilização do mesmo modo de actuação, associados à circunstância de que o arguido já havia sofrido condenações por crimes com algumas similitudes com os que constituem o objecto deste processo, como é o caso da emissão de cheques sem provisão e onde também avultam crimes idênticos como é o caso das duas condenações por crimes de falsificação de documento, a última das quais em sete anos e seis meses de prisão no processo 625/99.5SSLSB, em cujo âmbito lhe havia sido concedida liberdade condicional, cerca de três anos antes da prática dos crimes a que se referem os presentes autos e, bem assim, ao curto período de tempo que decorreu entre o termo final dessa pena de prisão de sete anos e seis meses, em 16 de Junho de 2008 e os factos descritos em 10º a 58º da matéria de facto provada.
De resto, cumpre assinalar que tivessem estes crimes sido julgados em data mais próxima da sua prática e não teria este Tribunal qualquer hesitação em impor ao arguido uma pena de prisão efectiva, em face da total impossibilidade de formulação de um juízo de prognose favorável quanto ao comportamento futuro do arguido.
Mas não se pode ignorar que decorreram onze anos, o arguido vive e trabalha em vive em Londres onde tem a sua vida familiar e laboral organizada, com a sua companheira e três filhos de 20, 11 e 8 anos de idade, o que associado à ausência de antecedentes criminais, desde 2009 até ao presente, permite concluir por um lado, que ao contrário do que afirma o acórdão recorrido, face ao seu actual contexto de vida laboral, social e familiar, estes crimes já não podem ser vistos como expressão de um modo de ser, ou uma escolha assumida de determinado trajecto de vida, que radiquem na personalidade do agente, antes se apresentando como resultado de uma multiplicidade de circunstâncias casuais, ou de uma particular conjuntura da vida do recorrente, um contexto que embora longo, de cerca de oito anos, entre a prática dos factos que deram origem à primeira condenação e os que integram os crimes deste processo, já ultrapassado e superado e substituído por um modo de vida socialmente inserido e conforme ao Direito.
Tal como a propósito da prescrição se referiu, à medida que o tempo vai passando, mais atenuadas ficam as necessidades de prevenção geral e especial e menor vai sendo a justificação para a intervenção do sistema de Justiça Penal.
O período de onze anos decorrido sem notícia da prática de novos crimes e a circunstância de o arguido trabalhar e viver com a sua família, apesar de nada mais se ter apurado sobre as suas condições de vida, permitem, ainda assim, concluir que a imposição do cumprimento efectivo desta pena sem antes lhe dar uma oportunidade de, em liberdade, mas sob a ameaça da pena e com a censura dos crimes, reparar os males dos crimes que praticou, seria desproporcionado e injusto, porque aquilo que a aplicação da pena de prisão visa prosseguir ao nível da reintegração social do agente e da dissuasão da reincidência, converter-se-ia, afinal, num factor de criação dessa mesma reincidência.
As tarefas de escolha e determinação concreta das penas vivem nesta tensão constante entre a necessidade de assegurar a paz social e transmitir à comunidade e ao infractor que o crime não compensa e o perigo de aplicar penas injustas ou excessivas que, em lugar de assegurarem as finalidades de prevenção geral e especial, com adequação e proporcionalidade, ao invés de assegurarem a disrupção na carreira criminosa e de assegurarem ao arguido a adopção futura de comportamentos conformes às regras de convívio social em liberdade, acabam por produzir o efeito oposto, induzindo nele a tendência para voltar a delinquir.
É o que aconteceria, no caso vertente, se o arguido tivesse de ser sujeito ao cumprimento efectivo desta pena de cinco anos de prisão, por crimes cometidos já há mais de onze anos e quando a sua vida se estabilizou e se mostra socialmente reinserido, dedicando-se ao trabalho e vivendo com a sua família.
No entanto, porque não se pode ignorar a gravidade dos crimes cometidos e os prejuízos causados, também se afigura inadequada a mesma suspensão da pena de prisão, desacompanhada de um esforço sério do arguido realmente demonstrativo de que interiorizou o carácter ilícito e censurável das suas condutas e de que é capaz de forma absolutamente consistente e inequívoca, de reparar os males dos crimes que praticou e de adoptar um modo de ser e de viver consonante com a ordem jurídica, razões pelas quais, a suspensão da pena terá de ser acompanhada de regime de prova em cujo plano individual de reinserção social terão de estar necessariamente contempladas formas de pagamento total, ou parcial, conforme as condições socioeconómicas que vierem a apurar-se, dos montantes fixados na decisão recorrida, a título de indemnização.
Assim sendo, o recurso procede quanto aos pedidos de diminuição da pena e suspensão na respectiva execução, pelo mesmo período de duração da pena a qual será, no entanto, acompanhada de regime de prova, nos termos dos arts. 50º e 53º do CP.   
III – DISPOSITIVO
Termos em que decidem, neste Tribunal da Relação de Lisboa:
Em conceder provimento parcial ao recurso, reduzindo a pena única aplicada ao arguido PD_________, para cinco anos de prisão, suspensa na respectiva execução, pelo mesmo período de cinco anos, com regime de prova, nos termos dos arts. 50º e 53º do CP, devendo o plano individual de reinserção social contemplar, entre outras,  a obrigação de pagamento das quantias fixadas, neste processo, a título de indemnização, nas decisões dos pedidos cíveis deduzidos, o qual será total ou parcial, escalonado ou não, conforme o que se vier a apurar acerca das condições económicas do arguido e conforme o que vier a ser sugerido pela DGRSP ou pela sua congénere inglesa e vier a ser decidido pelo Mmº. Juiz Titular do processo.
No mais, confirmam, na íntegra, o acórdão recorrido.
Sem custas  – art. 513º do CPP.
Notifique.
*
Acórdão elaborado pela primeira signatária em processador de texto que o reviu integralmente (art. 94º nº 2 do CPP), sendo assinado pela própria e pela Mma. Juíza Adjunta.

Tribunal da Relação de Lisboa, 10 de Fevereiro de 2021
Cristina Almeida e Sousa
Sebastião e Silva