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EXECUÇÃO
TÍTULO EXECUTIVO
DOCUMENTO PARTICULAR
AUTENTICAÇÃO
Sumário
I – O procedimento tendente à autenticação de um documento particular por solicitador, pressupõe 3 etapas: i) outorga do documento pelas partes; ii) o documento particular assinado pelas partes é apresentado ao solicitador para autenticação, confirmando aquelas perante este o conteúdo do documento; iii) efectivação do registo informático em conformidade com a Portaria n.º 657-B/2006. II – O período temporal de 48 horas, referido n.º2 do art.º 4.º daquela Portaria respeita ao momento da elaboração do termo de autenticação do documento e do registo do mesmo, e não à celebração do contrato e respectiva autenticação.
Texto Integral
Processo n.º 7633/20.7T8PRT.P1
Acordam no Tribunal da Relação do Porto
I. RELATÓRIO
B…, SA instaurou a presente acção de execução para pagamento de quantia certa com forma ordinária contra C…, SA.
Para tanto, juntou documento de reconhecimento de dívida e acordo de pagamento com termo de autenticação lavrado por solicitador.
Em 13/05/2020, o Tribunal “a quo” proferiu a seguinte sentença: “B…, S.A. intentou a presente execução ordinária contra C…, S.A., apresentando como título executivo um documento que consubstancia um reconhecimento de dívida e acordo de pagamento, datado de 29.11.2020. Apreciando. A questão que desde logo se coloca prende-se em saber se o documento dado à execução possui força executória à luz do art. 703º do CPC, na redação atual, por ser este o diploma a aplicar. Como é sabido, com o novo Código de Processo Civil (cfr. art. 703º) os documentos particulares (com ressalva dos títulos de crédito) deixaram de poder suportar pretensão executória na justa medida em deixaram de constituir título executivo. Compulsados os autos verificamos que a exequente apresenta como título executivo, um documento particular, emitido já após a entrada em vigor do CPC de 2013. Assim sendo, e sem necessidade de maiores considerações, declara-se inexistir título executivo válido para suportar a execução, já que o documento dado à execução não se inclui na enumeração prevista no art.º 703º do CPC. Pelo exposto, indefere-se liminarmente a execução nos termos do art.º 726 do CPC, por falta de título (…)”.
Nesse mesmo dia, alegando que julgava ter-se tratado de lapso manifesto da Meritíssima Juiz “a quo a Exequente solicitou a retificação da sentença nos seguintes termos: “A sentença de fls_ agora notificada, refere estar perante uma execução baseada num documento particular. Salvo o devido respeito, tal pressuposto não corresponde à realidade já que o documento dado à execução se trata de DOCUMENTO AUTENTICADO, nos termos e para os efeitos do disposto na al. b) do art. 703º do CPC. Ora, por se omitir na análise da questão a especial qualidade do título dado à execução, considerando se tratar apenas de um “reconhecimento de dívida e acordo de pagamento” (não autenticado), a Exequente entende tratar-se de lapso manifesto. Por esse motivo pode ser por simples despacho retificada a sentença, o que se requer nos termos e para os efeitos do n.º 1 do artº. 614º do CPC, seguindo-se os demais trâmites legais”.
Sobre esse requerimento de rectificação pronunciou-se o tribunal de 1ª instância por despacho proferido a 19/05/2020, cujo teor se reproduz. “Indefere-se o requerido já que o documento dado à execução não se trata de um documento particular autenticado à luz da al. b) do nº1 do art. 703º do CPC, atento o facto de terem decorrido mais de 48 horas entre a celebração do contrato e a respetiva autenticação. Com efeito, na esteira do que vem sendo decidido pelos nossos Tribunais Superiores (cfr., inter alia, Acórdão da Relação do Porto de 23.01.2017 - proc. nº 4871/14.5T8LOUA.P1, disponível em WWW.DGSI.PT, e cujo sentido decisório seguimos de perto) para ser conferida exequibilidade extrínseca a um documento particular constitutivo ou recognitivo de uma obrigação, torna-se mister a sua autenticação por entidade dotada de competência para esse efeito, visando, desse modo, assegurar a compreensão do conteúdo do mesmo pelas partes. A validade dessa autenticação implica que seja efetuado o registo informático do respetivo termo dentro do prazo estabelecido no art. 4º da Portaria nº 657-B/2006, de 29 de junho, isto é, que o mesmo seja realizado no momento da prática do ato ou nas 48 horas seguintes se, em virtude de dificuldades de caráter técnico, não for possível aceder ao sistema nessa oportunidade temporal. E a inobservância do referido condicionalismo temporal, afetando a validade do termo de autenticação, implica que o documento particular não chega sequer a adquirir a natureza de documento particular autenticado, não podendo, nessa medida, servir de base à ação executiva, por não consubstanciar título passível de ser subsumido à fattispecie da al. b) do nº 1 do art. 703º do Cód. Processo Civil.”.
Não se conformando com a decisão proferida, veio a exequente interpor o presente recurso de apelação, em cujas alegações conclui da seguinte forma:
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Não foram apresentadas contra-alegações.
Colhidos os Vistos legais, cumpre decidir:
I.DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO.
O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação da recorrente, não podendo este tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso - cfr. arts. 635º, nº 4, 637º, nº 2, 1ª parte e 639º, nºs 1 e 2, todos do Cód. Processo Civil.
Porque assim, atendendo às conclusões das alegações apresentadas pela apelante, são as seguintes as questões solvendas:
. apreciar e decidir qual é o ato a que se refere o nº2 do artigo 4º da Portaria 657-B/2006 de 29 de Junho(1), designadamente decidir se esse prazo de 48 horas previsto no nº2 do artº 4º da Portaria nº 657-B/2006, de 29 de junho respeita à elaboração do termo de autenticação e do registo do mesmo, ou, à outorga do próprio documento particular
. de seguida, apreciar e decidir se a exequente dispõe de título dotado de força executiva que legitime a instauração da ação executiva, concretamente, apurar se no caso em apreço, o registo do termo de autenticação foi feito no prazo de 48 horas previsto no artº 4º da Portaria nº 657-B/2006, de 29 de junho .
III. FUNDAMENTAÇÃO.
3.1.São ocorrências materiais, com interesse para a decisão da causa as que constam do relatório elaborado, destacando, em particular, que:
1.A exequente instaurou a presente acção executiva, com fundamento em "ACORDO" de pagamento e reconhecimento de Dívida autenticado.
2.Na parte dos "FACTOS", do seu requerimento executivo, a exequente refere: “Finalidade da Execução: Pagamento de Quantia Certa - Dívida comercial [Execuções] Título Executivo: Outro documento autenticado Factos: 1. No exercício normal da sua atividade, a Exequente forneceu à Executada, a pedido desta, os serviços melhor descritos nas faturas nºs VFT19/005107 e VFT19/008504 no valor, respetivamente, de € 14.169,13 e € 5.430,94. A fatura nº VFT19/005107 foi emitida em 18/02/2019, com vencimento em 20/03/2019 e a fatura nº FT19/008504 foi emitida em 20/05/2019, com vencimento em 19/06/2019. 2. As faturas não foram pagas na data do seu vencimento. Em consequência, em 29 de novembro de 2019, Exequente e Executada outorgaram um documento que designaram de reconhecimento de dívida e acordo de pagamento, sujeito a termo de autenticação, no qual, em síntese: - a Executada confirma a existência, validade e exigibilidade dos valores em dívida à Exequente, referente às faturas supra aludidas. - a Executada confessa-se devedora à Exequente da quantia global de € 20.509,88 (vinte mil, quinhentos e nove euros e oitenta e oito cêntimos). - a Executada se compromete a pagar a quantia global de € 20.509,88 (€ 19.600,07 a título de capital e € 909,81 a título de juros) em 5 prestações mensais: uma primeira prestação no valor de € 5.430,93 a liquidar até ao dia 30 de novembro de 2019 e quatro prestações, iguais e sucessivas, no valor de € 3.769,74 a liquidar por transferência bancária até ao último dia dos meses imediatamente seguintes. - a falta de pagamento, total ou parcial, de uma das prestações nos prazos acordados implica o vencimento das restantes e a exigibilidade por parte da Exequente da totalidade da dívida acrescida dos juros de mora, vencidos e vincendos, desde a data de vencimento de cada uma das faturas até efetivo e integral pagamento. 3. A Executada apenas procedeu ao pagamento da primeira prestação, no valor de € 5.430,94, não tendo liquidado qualquer uma das restantes prestações a que se obrigou, apesar de instada para o efeito várias vezes. 4. O não pagamento de uma das prestações acordadas importa o vencimento das restantes e a exigibilidade por parte da Exequente da totalidade do valor em dívida. 5. Encontra-se, assim, em dívida a quantia de € 15.078,94. 6. A esta quantia acrescem os juros desde 30 de dezembro de 2019 até à presente data, que ascendem a € 440,71, bem como os vincendos até efetivo e integral pagamento.”
3.Ao requerimento executivo foi junto um documento particular denominado “Reconhecimento de Dívida e Acordo de Pagamento”, no qual está aposta a data de 29.11.2019, no qual, outorgaram a exequente e a executada, nele constando os carimbos de ambas as sociedades, tendo sido aposta uma assinatura por baixo do nome B… e duas assinaturas por baixo do nome “C…”.
4. E ainda cópia de um termo de autenticação, nos termos do artigo 38º do DL 76-A/2006 de 29-03 e Portaria 657/-b/2006, de 29.06.
5. Esse termo de autenticação foi emitido por D…, solicitador, que declarou:
“No dia 6.12.2019, perante mim, no meu escritório, …, compareceram a outorgar:
E…, (…) e F…, 8…) na qualidade de sócios gerentes com poderes para o ato da sociedade C…, o que verifiquei pela exibição da respectiva certidão permanente e a identidade dos outorgantes pela exibição dos seus cartões de cidadão.
Os signatários apresentaram o documento em anexo que é um reconhecimento de dívida e acordo de pagamento, tendo declarado que já o leram e assinaram e que o conteúdo do mesmo exprime a sua vontade.
O presente termo de autenticação, tal como o documento que o antecede, foi lido e explicado ao signatário, tudo em voz alta e na sua presença.
6. Esse termo foi assinado pelos intervenientes no mesmo.
7. O registo do termo de autenticação foi feito no dia 6.12.2019.
3.2.DO MÉRITO DA DECISÃO RECORRIDA. Da exequibilidade extrínseca do documento que os exequentes apresentaram para legitimar a propositura da ação executiva
Como é consabido, a ação executiva carateriza-se pela necessidade de uma base documental, isto é, a ação executiva não pode ser instaurada sem o exequente se encontrar munido de um título executivo. Isso mesmo decorre do nº 5 do art. 10º do Cód. de Processo Civil[1], onde se preceitua que “toda a execução tem por base um título, pelo qual se determinam o fim e os limites da ação executiva”.
O título executivo define, portanto, os limites subjetivos e objetivos da ação executiva, constituindo a sua base, discutindo-se, a este propósito, qual a efetiva causa de pedir neste concreto tipo de ação. Assim, enquanto uns entendem que a causa de pedir é o título executivo de per se, outros consideram que a causa de pedir é constituída apenas pelos factos alegados no âmbito da obrigação subjacente e, ainda, outros defendem que a causa de pedir é a conjunção do título e da alegação dos factos da obrigação subjacente.(2)
Tem vindo a entender-se maioritariamente, que a causa de pedir na execução não é o título executivo, ainda que baseado numa declaração de reconhecimento de dívida, mas os factos constitutivos da obrigação exequenda nele reflectidos (relação fundamental)
Todavia, à luz da lei adjetiva, o título executivo apresenta-se como requisito essencial (rectius, como pressuposto processual específico) da ação executiva e há de constituir instrumento probatório suficiente da obrigação exequenda.
Ora, o Novo Código de Processo Civil, no artº. 703, restringiu a espécie de títulos executivos, eliminando os documentos particulares que importem o reconhecimento ou a constituição de uma obrigação pecuniária, cujo montante seja determinável por simples cálculo aritmético, ou obrigação de entrega de coisa ou de prestação de facto seu elenco, a não ser, conforme expressamente é referido na alínea b) do nº1 daquela disposição legal que os mesmos tenham sido exarados ou autenticados por notário ou outras entidades ou profissionais com competência para tal.
O art. 703º apresente uma enumeração taxativa dos títulos executivos que podem servir de fundamento a uma ação executiva,
Como resulta do disposto na al. b) do nº 1 do citado art. 703º do CPC o documento particular somente valerá como título executivo quando importe a constituição ou reconhecimento de qualquer obrigação (isto é, quando nele se formaliza a constituição de uma obrigação ou então o devedor nele reconhece uma dívida pré-existente) e seja devidamente autenticado por notário ou por outras entidades ou profissionais com competência para tal.
Portanto, para se conferir exequibilidade a um documento particular constitutivo ou recognitivo de uma obrigação, torna-se mister a sua autenticação, visando, desse modo, assegurar a compreensão do conteúdo do mesmo pelas partes, não sendo, pois, suficiente o simples reconhecimento de assinaturas.
Acresce ainda que como é sabido a competência para essa autenticação deixou de ser da competência exclusiva dos notários (cfr.art 363º, nº3 do Cód. Civil e art 4º, nº2 al.c) do Cód do Notariado), passando a ser atribuída a outras entidades, mormente, no que ao caso importa, aos solicitadores.
Assim, na sequência da publicação do DL nº 76-A72006, de 29.03, o qual, entre o mais, adoptou medidas de simplificação e eliminação de atos e procedimentos notariais e registrais, resulta que o Artigo 38.º, sob a epígrafe “ Competência para os reconhecimentos de assinaturas, autenticação e tradução de documentos e conferência de cópias” estabelece: 1 - Sem prejuízo da competência atribuída a outras entidades, as câmaras de comércio e indústria, reconhecidas nos termos do Decreto-Lei n.º 244/92, de 29 de Outubro, os conservadores, os oficiais de registo, os advogados e os solicitadores podem fazer reconhecimentos simples e com menções especiais, presenciais e por semelhança, autenticar documentos particulares, certificar, ou fazer e certificar, traduções de documentos, nos termos previstos na lei notarial, bem como certificar a conformidade das fotocópias com os documentos originais e tirar fotocópias dos originais que lhes sejam presentes para certificação, nos termos do Decreto-Lei n.º 28/2000, de 13 de Março. 2 - Os reconhecimentos, as autenticações e as certificações efectuados pelas entidades previstas nos números anteriores conferem ao documento a mesma força probatória que teria se tais actos tivessem sido realizados com intervenção notarial. 3 - Os actos referidos no n.º 1 apenas podem ser validamente praticados pelas câmaras de comércio e indústria, advogados e solicitadores mediante registo em sistema informático, cujo funcionamento, respectivos termos e custos associados são definidos por portaria do Ministro da Justiça. 4 - Enquanto o sistema informático não estiver disponível, a obrigação de registo referida no número anterior não se aplica à prática dos actos previstos nos Decretos-Leis n.os 237/2001, de 30 de Agosto, e 28/2000, de 13 de Março. 5 - O montante a cobrar, pelas entidades mencionadas no n.º 3, pela prestação dos serviços referidos no n.º 1, não pode exceder o valor resultante da tabela de honorários e encargos aplicável à actividade notarial exercida ao abrigo do Estatuto do Notariado, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 26/2004, de 4 de Fevereiro. 6 - As entidades referidas no n.º 1, bem como os notários, podem certificar a conformidade de documentos electrónicos com os documentos originais, em suporte de papel, em termos a regulamentar por portaria do membro do Governo responsável pela área da justiça. 7 - As entidades mencionadas no número anterior podem proceder à digitalização dos originais que lhes sejam apresentados para certificação”
No caso dos autos, a exequente invoca como título executivo um documento particular autenticado por solicitador, denominado “Reconhecimento de Dívida e Acordo de Pagamento”, no qual está aposta a data de 29.11.2019.
E a questão que é trazida a este Tribunal de recurso traduz-se, na essência, em dilucidar se o conjunto de documentos que a exequente apresentou, aos quais nos referimos, consubstanciam título executivo à luz do disposto na al. b) do nº 1 do citado art. 703º, nos termos da qual “[à] execução apenas podem servir de base os documentos exarados ou autenticados, por notário ou por outras entidades ou profissionais com competência para tal, que importem constituição ou reconhecimento de qualquer obrigação”.
O tribunal a quo sufragou o entendimento de que no caso em apreço o documento dado à execução não se trata de um documento particular autenticado à luz da al. b) do nº1 do art. 703º do CPC, atento o facto de terem decorrido mais de 48 horas entre a celebração do contrato e a respetiva autenticação.
É exatamente neste ponto que se situa o âmago do objeto do presente recurso, já que, na perspetiva da apelante, o termo de autenticação junto à execução reúne as condições necessárias para desencadear a démarche processual executiva, por se estar em presença de documento particular que foi devidamente autenticado por solicitador, alegando que aquele registo informático da autentificação foi realizada com observância do disposto no artigo 4º, nº2 da referida Portaria n.º 657-B/2006, de 29 de junho.
Quid juris?
Dispõe o artº. 46, do Código do Notariado, sobre as formalidades comuns aos instrumentos notariais, especificando o artº. 151, do mesmo diploma legal, os requisitos comuns para a autenticação dos documentos particulares nos seguintes termos, a saber: “1 – O termo de autenticação, além de satisfazer, na parte aplicável e com as necessárias adaptações, o disposto nas alíneas a) a n) do nº1 do artigo 46, deve conter ainda os seguintes elementos: - a declaração das partes de que já leram o documento ou estão perfeitamente inteiradas do seu conteúdo e que este exprime a sua vontade; - a ressalva das emendas, entrelinhas, rasuras ou traços contidos no documento e que não estejam devidamente ressalvados. 2 – É aplicável à verificação da identidade das partes, bem como a intervenção de abonadores, intérpretes, peritos, litores ou testemunhas, o disposto para os instrumentos públicos.”
Por sua vez, o artº. 70, do Código de Notariado, prevê os casos de nulidade do acto notarial por vício de forma, prescrevendo o seu nº 1 o seguinte: “O ato notarial é nulo, por vício de forma, apenas quando falta algum dos seguintes requisitos: a menção do dia, mês e ano ou do lugar em que foi lavrado; a declaração do cumprimento das formalidades previstas no artigo 65 e 66; a observância do disposto na primeira parte do nº2 do artigo 41; a assinatura de qualquer intérprete, perito, leitor, abonador ou testemunha;- a assinatura de qualquer dos outorgantes que saiba e possa assinar;- a assinatura do notário; a observância do disposto na alínea g) do nº1 do artigo 46.”.
Eo n.º 1 do artigo 38.º do Decreto-Lei n.º 76-A/2006, de 29 de Março, estabelece a competência das câmaras de comércio e indústria, dos advogados e dos solicitadores para a prática de reconhecimentos simples e com menções especiais, presenciais e por semelhança, autenticar documentos particulares e certificar, ou fazer e certificar, traduções de documentos.
Todavia, o n.º 3 daquele artigo 38º do citado Decreto- lei condiciona a validade desses actos a registo em sistema informático, cujo funcionamento, respectivos termos e custos associados foram definidos por portaria do Ministro da Justiça, concretamente, a referida Portaria nº 657-B/2006, de 29 de junho.
Importa pois atentar que o artigo 1º desta Portaria, o qual, sob a epígrafe “Registo informático” dispõe: “A validade dos reconhecimentos simples e com menções especiais, presenciais e por semelhança, das autenticações de documentos particulares e da certificação, ou realização e certificação, de traduções de documentos nos termos previstos na lei notarial, efectuados por câmaras de comércio e indústria, reconhecidas nos termos do Decreto-Lei n.º 244/92, de 29 de Outubro, advogados e solicitadores, depende de registo em sistema informático.”
E nos artigos 3º e 4º dessa Portaria.Assim, estabelece o artigo 3º sob a epígrafe “ Dados recolhidos”: “Relativamente a cada um dos actos referidos no artigo 1.º, devem ser registados no sistema informático os seguintes elementos: a) Identificação da natureza e espécie dos actos; b) Identificação dos interessados, com menção do nome completo e do número do documento de identificação; c) Identificação da pessoa que pratica o acto; d) Data e hora de execução do acto; e) Número de identificação do acto.”
E o artigo 4.º, sob a epígrafe “Execução do registo” dispõe: “1 - O registo informático é efectuado no momento da prática do acto, devendo o sistema informático gerar um número de identificação que é aposto no documento que formaliza o acto. 2 - Se, em virtude de dificuldades de carácter técnico, não for possível aceder ao sistema no momento da realização do acto, esse facto deve ser expressamente referido no documento que o formaliza, devendo o registo informático ser realizado nas quarenta e oito horas seguintes.”
E, como bem refere o ac. do Tribunal da Relação do Porto de 23.01.2017 : “Em consonância com o que se dispõe nos arts. 35º, nº 3, 150º e 151º, todos do Cód. do Notariado, esse procedimento de autenticação do documento particular consiste, essencialmente, na confirmação do seu teor perante entidade dotada de fé pública, declarando as partes estarem perfeitamente inteiradas do seu conteúdo e que este traduz a sua vontade(3), após o que aquela entidade, mediante a aposição do termo de autenticação(4)[8], atesta que os seus autores confirmaram, perante ela, que o respetivo conteúdo correspondia à sua vontade. Na sequência desse procedimento, em conformidade com o disposto no art. 377º do Cód. Civil, o documento passa, então, a ter “a força probatória dos documentos autênticos, ainda que não os substituam quando a lei exija documento desta natureza para a validade do ato”
E como aí se anota na nota de rodapé: “Ressalvada a situação contemplada no segundo segmento dessa norma, o documento particular autenticado, substancialmente, difere pouco dos documentos autênticos notariais, razão pela qual se lhes equiparam em força probatória e executiva. Com efeito, o referido termo de autenticação é em si, um ato autêntico, valendo portanto como tal”.
De resto, como assinalou o citado acórdão: “Existem três momentos no procedimento tendente à autenticação de um documento particular por entidade competente para o efeito, sendo que no primeiro momento, o notário, advogado ou solicitador, como foi o caso dos autos, não outorga nem subscreve o documento, sendo que apenas no segundo momento, o da autenticação, é que esse mesmo documento lhe é apresentado para autenticação e, posteriormente, num terceiro momento, deve ser efetuado o registo informático.
Por conseguinte, como deflui do descrito quadro normativo, o procedimento tendente à autenticação de um documento particular por solicitador pressupõe três momentos ou etapas. Assim, num primeiro momento esse documento é outorgado e assinado pelas respetivas partes, sendo que o solicitador - enquanto entidade autenticadora - não outorga nem subscreve o documento. Poderá, quando muito, não como entidade autenticadora mas enquanto profissional habilitado auxiliar as partes na redação do documento ou redigir ele próprio o documento que depois será assumido e assinado apenas pelas partes.
Num segundo momento, o documento particular assinado pelas partes é apresentado ao solicitador para autenticação, sendo que no exercício dessa função exige-se, como se notou, que as partes confirmem perante ele o conteúdo do documento particular, devendo subsequentemente o termo de autenticação ser lavrado com observância dos requisitos estabelecidos nos citados arts. 150º e 151º do Cód. do Notariado, contendo, nomeadamente, a declaração das partes de que procederam à leitura do documento ou estão inteiradas do seu conteúdo e que o mesmo exprime a vontade nele declarada.
Num terceiro momento, deve ser efetuado o registo informático em conformidade com o que se mostra estabelecido na citada Portaria nº 657-B/2006, de 29.06, sendo que no concernente à oportunidade temporal da sua execução rege o seu art. 4º, que no nº 1 estipula que “o registo informático é efetuado no momento da prática do ato, devendo o sistema informático gerar um número de identificação que é aposto no documento que formaliza o ato”, acrescentando o nº 2 do mesmo normativo que “se, em virtude de dificuldades de caráter técnico, não for possível aceder ao sistema no momento da realização do ato, esse facto deve ser expressamente referido no documento que o formaliza, devendo o registo informático ser realizado nas quarenta e oito horas seguintes”.
A mesma orientação foi seguida no acórdão desta Relação do Porto, proferido a 09.03.3030, in proc nº9446/19.0T8PRT-A.P1, cujo sumário se reproduz: “Sumário: Nos documentos particulares submetidos a autenticação perante as câmaras de comércio e indústria (às quais seja reconhecida legalmente competência para tal), advogados e solicitadores, o que tem de ser efetuado de imediato, ou nas 48 horas subsequentes, para assegurar a validade da autenticação, é o registo desta última e não a realização da autenticação em si mesma, tendo por referência a data de elaboração de tais documentos.
Exposto, deste modo o regime legalmente instituído para a autenticação de documentos particulares, cumpre agora avançar para a resolução da questão central que consubstancia o objeto do presente recurso, a saber: qual o ato a se refere o período temporal de 48 horas referido no nº2 do art.4º da citada Portaria.
Assim.
Da análise conjugada do artigo 38º nº3 do citado DL nº 76-A/ 2006 (3- Os actos referidos no n.º 1 apenas podem ser validamente praticados pelas câmaras de comércio e indústria, advogados e solicitadores mediante registo em sistema informático, cujo funcionamento, respectivos termos e custos associados são definidos por portaria do Ministro da Justiça), com o texto dos nºs 1 e 2 do citado artigo 4º da Portaria nº 657-B/2006, de 29.06, resulta que o ato a que a Portaria 657-B/2006 de 29 de junho se refere é o da autenticação do documento particular e não o da outorga do próprio documento particular e que o prazo de 48 horas previsto no artº 4º da Portaria nº 657-B/2006, de 29 de junho respeita à elaboração do termo de autenticação e do registo do mesmo e não à celebração do contrato e respetiva autenticação.
Assim, é irrelevante que tenham decorrido mais de 48 horas entre a celebração do contrato e a respetiva autenticação, resultando da Portaria 657-B/2006 de 29 de junho, que não podem é ter decorrido mais de 48 horas entre a autenticação e o registo informático previsto naquele artigo 4º.
In casu, analisando os suportes documentais juntos ao requerimento executivo, resulta que a Executada outorgou um documento de reconhecimento de dívida e acordo de pagamento em 29/11/2019 e que a autenticação desse documento foi feita em 06/12/2019, tendo o registo dessa mesma autenticação sido efetuado nesse mesmo dia 06/12/2019, inexistindo qualquer discrepância ou irregularidade.
Concluímos assim, com relação ao termo de autenticação dos autos que foi efetuado o registo informático em conformidade com o que se mostra estabelecido na Portaria nº 657-B/2006, de 29.06, nomeadamente no momento temporal previsto art. 4º, nº 1 (o termo de autenticação foi lavrado no dia 06/12/2019 e o registo informático foi efetuado no mesmo dia 06/12/2019).
Pelo que, tendo como fundamento a conformidade do registo informático com o que se mostra estabelecido na Portaria nº 657-B/2006, de 29.06, o documento de reconhecimento de dívida e acordo de pagamento em apreço adquiriu indubitavelmente natureza de documento autenticado, sendo válido e podendo servir de base à ação executiva.
A implicar que se impõe a revogação da decisão recorrida, e, sua substituição por outra que pressuponha que o documento de reconhecimento de dívida e acordo de pagamento em apreço adquiriu indubitavelmente natureza de documento autenticado, sendo válido e podendo servir de base à ação executiva.
Assim.
Da análise conjugada do artigo 38º nº3 do citado DL nº 76-A/ 2006 (3- Os actos referidos no n.º 1 apenas podem ser validamente praticados pelas câmaras de comércio e indústria, advogados e solicitadores mediante registo em sistema informático, cujo funcionamento, respectivos termos e custos associados são definidos por portaria do Ministro da Justiça), com o texto dos nºs 1 e 2 do citado artigo 4º da Portaria nº 657-B/2006, de 29.06, resulta que o ato a que a Portaria 657-B/2006 de 29 de junho se refere é o da autenticação do documento particular e não o da outorga do próprio documento particular e que o prazo de 48 horas previsto no artº 4º da Portaria nº 657-B/2006, de 29 de junho respeita à elaboração do termo de autenticação e do registo do mesmo e não à celebração do contrato e respetiva autenticação.
IV. DISPOSITIVO:
Nestes termos, os juízes deste Tribunal da Relação do Porto, acordam em julgar procedente o recurso de apelação e, assim, determinam que a mesma seja substituída por outra que pressuponha que o documento de reconhecimento de dívida e acordo de pagamento em apreço adquiriu indubitavelmente natureza de documento autenticado, sendo válido e podendo servir de base à ação executiva.
Custas a cargo da exequente, por ser a parte que tirou proveito do recurso.
Porto, 22.10.2020
Francisca Mota Vieira
Paulo Dias da Silva
João Venade
___________ [1] Cujo teor se reproduz. 22 - Se, em virtude de dificuldades de carácter técnico, não for possível aceder ao sistema no momento da realização do acto, esse facto deve ser expressamente referido no documento que o formaliza, devendo o registo informático ser realizado nas quarenta e oito horas seguintes.” [2] Cfr, sobre a questão, inter alia, LEBRE DE FREITAS, A acção executiva: à luz do Código revisto, 2.ª edição¸ pág. 64 e seguinte. [3] A propósito, registe-se que declaração cuja autenticação se impõe e, naturalmente, a da pessoa que se obrigou (a pagar, a entregar certa coisa ou a prestar determinado fato) ou seja, a do devedor. [4] Termo esse que, de acordo com o estabelecido no nº4 do art. 36º do Cód de Notariado, é lavrado no próprio o documento a que respeita ou em folha anexa.