PROVA INDIRETA
LÓGICA
POR PRESUNÇÃO OU POR INDÍCIOS
Sumário

I. A prova indireta (lógica, por presunção ou por indícios) consiste em dar como provado um facto sem que sobre ele exista qualquer meio (direto) de prova, chegando-se ao factum probandum a partir da prova de outros factos que a ele se ligam com segurança, segundo as regras da lógica e da experiência comum.
II. A prova indireta de um facto tem de fundar-se num facto de partida que está indubitavelmente provado (não podendo fundar-se a inferência noutra inferência); e os indícios têm de ser contemporâneos do facto a provar, serem independentes e estarem interrelacionados; não podendo haver contraindícios (indícios que apontem noutra direção).

Texto Integral

Acordam, em conferência, os Juízes que constituem a Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora:
I – Relatório

1. No 1.º Juízo Central Cível e Criminal de Évora, do Tribunal Judicial da comarca de Évora, procedeu-se a julgamento em processo comum, com intervenção do tribunal coletivo, de cinco arguidos, dentre os quais, A… e R…, ambos com os sinais dos autos, aos quais a acusação imputava a autoria, na forma consumada, de dois crimes de dois crimes de roubo qualificado, previstos no artigo 210.º, § 1.º e 2.º, al. b), por referência às alíneas a) e f), do § 2.º do artigo 204.º do Código Penal (CP); e dois crimes de sequestro, previstos no 158.º, § 1.º CP. Mais se imputando a A… a autoria de um crime de detenção de arma proibida, previsto no artigo 2.º, § 1.º, al. a) e ar), § 3.º, artigo 3.º, § 2.º, als. f) e h), e artigo 86.º, § 1.º, al. d), todos da Lei n.º 5/2006, de 23 de fevereiro.

A final o tribunal a quo proferiu acórdão pelo qual decidiu condenar os referidos arguidos nas seguintes penas:

- A… pela prática, como coautor de dois crimes de roubo qualificado, previstos no artigo 210.º, § 1.º e 2.º, al. b), por referência às alíneas a) e f), do § 2.º do artigo 204.º do Código Penal (CP), nas penas de 6 anos de prisão por cada um deles; como coautor de dois crimes de sequestro, previstos no 158.º, § 1.º CP, nas penas de 2 anos de prisão por cada um deles; e como autor de um crime de detenção de arma proibida, previsto no artigo 86.º, § 1.º, al. d), com referência aos artigos 2.º n.º 1, alínea a), e 3.º n.º 2, alínea g), todos da Lei n.º 5/2006, de 23 de fevereiro (regime Jurídico das armas e suas munições – na redação vigente à data da prática dos factos), na pena de 2 anos de prisão. Operando o cúmulo jurídico das penas parcelares, foi este arguido condenado na pena única de 12 anos de prisão.

- R… pela prática, como coautor de dois crimes de roubo qualificado, previstos no artigo 210.º, § 1.º e 2.º, al. b), por referência às alíneas a) e f), do § 2.º do artigo 204.º do Código Penal (CP), nas penas de 6 anos de prisão por cada um deles; como coautor de dois crimes de sequestro, previstos no 158.º, § 1.º CP, nas penas de 2 anos de prisão por cada um deles. Operando o cúmulo jurídico das penas parcelares, foi este arguido condenado na pena única de 11 anos de prisão.

2. Inconformados com esta decisão, dela recorreram ambos os referidos arguidos, finalizando A… a respetiva motivação com as seguintes conclusões (transcrição (1)):

« I - O Arguido/Recorrente foi condenado:

a) Pela prática, em coautoria, de dois crimes de roubo agravado, p. e p. pelos artigos 210.º n.º 1 e 2, 204.º n.º 2, alíneas a) e f), do Código Penal, nas penas parcelares de seis (6) anos de prisão;

b) Pela prática, em coautoria, de dois crimes de sequestro, p. e p. pelo artigo 158.º n.º 1, do Código Penal, nas penas parcelares de dois (2) anos de prisão;

c) Pela prática, como autor material, de um crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelo artigo 86.º n.º 1, alínea d), do Regime Jurídico das Armas e suas Munições, na pena de dois (2) anos de prisão;

d) Em cúmulo jurídico das penas parcelares acima determinadas, na pena única de doze (12) anos de prisão.

II - O tribunal deu como provado:

Em data não concretamente apurada, mas anterior a 10/09/2013, o Arguido R… e os Arguidos A… e A…, conjuntamente com outras duas pessoas cuja identidade não se logrou apurar, delinearam um plano tendo em vista a subtração de cães pertencentes a A… e transportados por J… e J…, bem como de dinheiro e valores que estes transportassem consigo, a fim de tais proveitos serem distribuídos por todos os arguidos.

Após, munidos de um bastão de basebol e de um bastão extensível em aço, os Arguidos A…e A… desferiram várias pancadas nas pernas de J…, visando imobilizá-lo.

Os Arguidos A…, A… e R…, conjuntamente com duas pessoas cuja identidade não se logrou apurar, agiram em comunhão de esforços e intentos, e em execução de um plano previamente delineado, com intenção de subtrair e fazer seus os bens e quantias que encontrassem na posse dos queixosos, bem sabendo que ao fazer uso de força sobre o corpo dos mesmos e ao exibir-lhes armas de fogo e bastões, atuavam contra a sua integridade física e liberdade pessoal, e que não tinham autorização dos mesmos para fazerem seus os bens da sua propriedade, o que lograram conseguir.

III - Formou a sua convicção;

No que concerne à factualidade referente à intenção e representação inerentes às condutas do Arguidos A…, A… e R…, ou seja, vetores intelectuais das suas condutas, o Tribunal ponderou a matéria consignada por provada e conjugou-a com critérios de razoabilidade e com regras de experiência comum, daí extraindo, sem margem para dúvida, a intenção que presidiu à sua realização e exteriorização, bem assim a representação dos resultados das mesmas por parte dos Arguidos (cfr. pontos 27 a 30).

Saliente-se, quanto à detenção pelo Arguido A… de dois bastões com características idênticas aos que foram utilizados no dia 11/09/2013, a verdade é que não foi oferecida qualquer justificação lícita para sua detenção, designadamente que o Arguido se dedique àquela atividade desportiva, pelo que, mais uma vez, recorrendo às regras da experiência e da lógica, facilmente se infere que a sua detenção destinava-se utilizar tais bastões como arma de agressão.

IV – Salvo o devido respeito, o tribunal a quo julgou incorretamente os referidos factos, porquanto em relação aos mesmos não foi produzida a prova bastante.

V – Com efeito, com o depoimento do queixoso não resulta provado que o arguido/recorrente tivesse gizado um plano, conjuntamente com os demais arguidos e mais duas pessoas não identificadas, com vista subtração de cães pertencentes a A… e transportados por J… e J…, bem como de dinheiro e valores que estes transportassem consigo, a fim de tais proveitos serem distribuídos por todos os arguidos.

“(…) o R… foi ter com o depoente e perguntou-lhe se este não queria ir ao Alentejo buscar uns cães que ele tinha encomendado, pedido que o depoente não estranhou por saber que o R… negociava em cães.”

Conforme resulta do seu depoimento prestado no DIAP de Évora e não infirmado em sede de julgamento por prova em contrário.

VI - Não resulta provado que o arguido/recorrente tivesse desferido várias pancadas nas pernas de J…, na justa medida em que o queixoso não conseguiu identificar quem, alegadamente, praticou tais factos.

Depoimento do queixoso J…;

[00:27:55] Interprete (J…): Depois, quando tiveram essas armas apontadas à cabeça, apareceram mais 3 ou 4 pessoas já mais jovens e que lhes deram os tacos de basebol, e (um taco era de ferro?), e tinham a cara tapada com um lenço por baixo [impercetível].

[00:28:19] Procurador: Sim senhor. Se foi, se algum deles, ele ou o colega, foi batido por alguém.

[00:28:46] Interprete (J…): O colega não se lembra se foi batido, mas ele sabe que levou com um taco de basebol de ferro (aqui uma batida nas?) pernas.

VII – No tange à imputação do crime de detenção de arma proibida, consubstanciado na apreensão em sua casa de dois bastões de basebol, também aqui a decisão merece reparo, não só, porque a sua detenção não configura um crime, atenta a falta dos requisitos cumulativos e enformadores do preenchimento do tipo, conforme têm decidido os tribunais superiores e de onde se extrai; “taco de basebol: Não podendo este integrar o conceito de arma branca, também não se inclui entre as armas da classe E, ou qualquer uma das demais armas expressamente mencionadas na aludida alínea d) do n.º 1 do art. 86.º.

Por um lado, não se trata de um «engenho», ou de um «instrumento sem aplicação definida» - antes pelo contrário, tem uma aplicação bem definida, para a qual é construído e vendido ao público, que é a prática de um desporto -, ainda que tenha potencialidades para ser usado como arma de agressão. Estamos perante requisitos de verificação cumulativa. Para que a detenção de qualquer «engenho» ou «instrumento» possa ser considerada detenção ilícita de arma é necessário que aqueles não tenham «aplicação definida», que «possam ser usados como arma de agressão» e que o seu portador «não justifique a sua posse». Aqui, falha logo o primeiro pressuposto.” (Ac. TRL de 07.07.2015. Desembargador José Adriano).

Como foi prontamente referenciado pelo arguido/recorrente no seu depoimento na Secção de Montemor-o-Novo do DIAP, comarca de Évora, a existência de outro taco de basebol na posse do arguido A…;

“ (…) refere que o A… tinha também um bastão de basebol mas que não era nenhum dos que foram apreendidos durante o dia de hoje na casa do depoente.”

E quando as testemunhas C… e A…, inspetores da polícia judiciária que procederam às buscas em casa do arguido/recorrente não conseguiram individualizar e concretizar quais os tacos de basebol, que alegadamente, terão servido para desferir pancadas nas pernas do queixoso J….

Depoimento da testemunha C…;

[00:27:40] Procurador: Aqui no auto fala-se de bastões, um deles de metal e outro de madeira.

[00:27:45] C…: Sim. Creio que um de alumínio e o outro era de madeira, salvo erro.

[00:27:52] Procurador: Eram também essas as caraterísticas que eram transmitidas pelas vítimas?

[00:27:58] C…: Não me lembro exatamente qual era a descrição feita, mas, muitas vezes, a descrição que os Ofendidos que passam por uma situação destas, digamos que foi uma apreensão cautelar para eventualmente…

Depoimento da testemunha A…;

[00:11:00] Juiz Presidente: Lembra-se desses bastões? Há alguma característica ou alguma diferença entre os dois que o tenha, que se lembre que tenha sido referido pelos Ofendidos ou que os levaram… como é que chegaram?

[00:11:15] A…: Não. É assim: nós, por hábito, fazemos sempre antes das buscas, fazemos um briefing com as equipas que vão participar nas buscas, dizemos “o que se procura é isto, com estas características”, que é para nós sabermos exatamente o que é que vamos procurar. Eu na altura, a ideia que eu tenho é que nos terão dito que os bastões teriam esta ou aquela característica ou que seriam bastões similares a isto ou aquilo, por isso é que nós trouxemos os bastões que estavam no roupeiro, os dois. Agora, sinceramente não me consigo recordar. Lembro-me disto, agora, porque é que especificamente…

[00:11:53] Juiz Presidente: Eles têm cores diferentes? Lembra-se se algum dia lhe disseram que um teria uma cor Y e o outro uma…?

[00:11:58] A…: Eu, senhora doutora Juiz com todo o respeito, eu admito que sim, admito que me tenha sido transmitida a informação previamente às buscas, porque o que fazemos sempre. Eu sinceramente agora…

[00:12:07] Juiz Presidente: Não se lembra?

[00:12:08] A…: Não.

VIII - Tanto mais que é o próprio arguido A…, no seu depoimento na Secção de Montemor-o-Novo do DIAP, comarca de Évora, declarou que; “utilizou, como arma, um taco de basebol e que um outro co-autor tinha um pau”.

E acresce,

No mesmo dia, 26 de novembro de 2015, na residência do Arguido F…, sita na …, …, foram encontrados: (ii) 1 (um) pé de cabra em ferro, de cor preta, de 50 cm de comprimento, que se encontrava na gaveta da cómoda do quarto do arguido. Vide ponto 26/II. FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO/ Factos Provados.

IX - Caindo por fim o acórdão, numa contradição insanável, quando dá como provado no ponto 15/ II. FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO/Factos Provados, “Após, munidos de um bastão de basebol e de um bastão extensível em aço (…)”.

X - Por contraposição, ao dar como provado no ponto 25/ II. FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO/Factos Provados.

“No dia 26 de novembro de 2015, o Arguido A… tinha na sua posse, na sua residência sita na Rua …, …, foram encontrados dois bastões de basebol, sendo um de metal e outro de madeira, com cerca de 60 cm de comprimento cada.” Porquanto, o bastão extensível consubstanciar um objeto muito diferente dos bastões ora referenciados.

XI – Para além destes factos, o tribunal deu ainda como provado, “Em seguida, aqueles Arguidos, munidos de braçadeiras de serrilhas, manietaram os queixosos, atando-lhes os pulsos e os tornozelos, e amarraram-nos com uma corda, voltados de costas um para o outro, envolvendo os seus troncos e pernas, impedindo-os de se locomover.

Ato contínuo, os Arguidos A…, A… e R…, conjuntamente com duas pessoas cuja identidade não se logrou apurar, dirigiram-se ao veículo dos queixosos, de onde retiraram:

(i) 16 (dezasseis) cães, de diferentes raças, com o valor aproximado de €12.000,00 (doze mil euros);

(ii) a quantia monetária estimada entre de cerca de € 20.000,00 (vinte mil) euros em dinheiro, pertencente a A…;

(iii) um telemóvel SONY ERICSSON W910-i, no valor de € 50,00, pertencente a J…;

(iv) um telemóvel de marca Nokia, de valor e característica desconhecidas, pertencente a J…;

(v) um aparelho GPS, de marca TOM TOM, no valor de € 100,00.

Após, os referidos Arguidos e as duas pessoas cuja identidade não se logrou apurar abandonaram o barracão e dirigiram-se à viatura dos queixosos, tendo furado os quatro pneus, utilizando, para o efeito, um objeto de características desconhecidas, a fim de que aqueles não conseguissem deslocar-se naquela viatura.”

XII - Todavia o tribunal não individualizou os diversos tipos e grau de participação que cada dos arguidos teve na factualidade dada como provada nos pontos 16 a 18 do acórdão proferido pelo tribunal a quo, de modo a aferir a culpa do arguido.

XIII - Assim como, os autos não evidenciam a prova da existência do valor de €20.000,00 (valor estimado), quantia não desprezível, e não reclamada pelo lesado em sede do pedido de indemnização cível. Razão pela qual se impugna esta matéria facto dada como provada, pelo vício da insuficiência para a decisão da matéria de facto.

XIV - A participação do arguido A… nos presentes autos, reconduz-se ao carregamento dos cães para os carros dos demais arguidos, assim como ao recebimento da quantia de €500,00, a qual lhe foi entregue pelo arguido Ricardo em sua casa e que aquele reconheceu ter recebido.

XV – Motivo pelo qual, o arguido A… deverá ser absolvido da condenação solidária do pagamento da quantia reclamada em sede de pedido cível de indemnização.

XVI – Por outro do lado, o arguido/recorrente a ser condenado nos presentes autos, sê-lo-ia pela prática dos factos como cúmplice e não em coautoria, com a pena especialmente atenuada. Por não se mostrarem preenchidos os requisitos da autoria.

i) Assim, o arguido/recorrente não delineou, conjuntamente, com os demais arguidos qualquer plano que visassem subtrair cães e quantias monetárias ao lesado, nem isso resultou provado nos autos;

ii) Não tinha qualquer domínio sobre os fatos, porque desconhecia ao que ia, pois foi convidado pelo arguido R… para ir buscar cães ao Alentejo, ele comerciante de animais, nomeadamente cães. Facto que não foi infirmado em audiência de julgamento;

iii) A participação confessa do arguido/recorrente no evento, resumiu-se a auxiliar na colocação dos cães nas viaturas e,

iv) No recebimento da quantia de € 500,00 do arguido Ricardo.

XVII – São três, os requisitos da autoria, os quais se devem mostrar preenchidos cumulativamente;

i) Uma decisão conjunta, consubstanciada num plano previamente acordado, com vista a alcançar um determinado resultado, o facto típico ilícito e punível;

ii) A execução conjunta do plano, não se mostrando necessário que cada um dos comparticipantes cometa integralmente o facto punível ou que execute integralmente o facto punível, mas tem que tomar parte direta na execução do crime;

iii) Toma parte direta na execução do crime quando pratica um qualquer ato de execução por si só, ou, conjuntamente com os outro (s) agente (s);

iv) São atos de execução os que preencherem um elemento constitutivo de um tipo de crime; os que preencherem um elemento constitutivo de um tipo de crime; os que forem idóneos a produzir o resultado típico; imprevisíveis, forem de natureza a fazer esperar que se lhes sigam atos das espécies indicadas nas alíneas anteriores, (pelo mesmo agente);

v) E o terceiro requisito, emerge da Jurisprudência - tem o coautor deverá ter o domínio funcional do facto global.

XVIII – Por contraposição à cumplicidade, a qual pressupõe um mero auxílio material ou moral à prática por outrem do facto doloso, para que ao cúmplice falta o domínio do facto típico como elemento indispensável da coautoria.

IX - Mesmo a entender-se ter havido cumplicidade na prática do crime de roubo, nunca se poderia imputar ao arguido a prática dos dois crimes de sequestro, porquanto nenhuma prova se fez da sua intervenção nos mesmos, importando a sua absolvição.

XX – Concluindo, nos presentes autos, não só ficou cabalmente provado que o arguido/recorrente não praticou os crimes pelos quais vem acusado, nos precisos termos dados como provados no acórdão condenatório, como também falece o enquadramento jurídico da sua participação constante do acórdão sob recurso, devendo improceder o pedido de indemnização civil contra si deduzido.

XXI - Normativo violado: art.86º/1/d, Lei n.º 5/2006, de 23 de fevereiro; art.26ºCP e art.27º CP; art.410º/2/a/c, CPP.

Termos em que e nos demais de direito deve ser dado provimento ao presente recurso e, por via dele, ser revogado o acórdão recorrido, tudo com as legais consequências.»

Por seu turno, R… sintetizou as suas alegações de recurso com as seguintes conclusões (transcrição):

« A. Encerrada a audiência de audiência e julgamento, produzida a prova, foi proferido acórdão pelo Tribunal a quo, através do qual condena o Arguido R… da prática, em coautoria, de dois crimes de roubo agravado, p. e p. pelos artigos 210.º n.º 1 e 2, 204.º n.º 2, alíneas a) e f), do Código Penal, nas penas parcelares de seis (6) anos de prisão, e da prática, em coautoria, de dois crimes de sequestro, p. e p. pelo artigo 158.º n.º 1, do Código Penal, nas penas parcelares de dois (2) anos de prisão; em cúmulo jurídico das penas parcelares, na pena única de onze (11) anos de prisão, com o que o aqui Recorrente não se conforma, porquanto interpõe o presente recurso.

B. Não podia o Tribunal a quo ter dado como provado, como fez, os pontos 3, 4 e 5 da matéria de facto dada como provada.

C. Inexiste qualquer elemento probatório apto a colocar o Arguido no local da criação do email …, nas datas e horas dos respetivos acessos. O Tribunal a quo cria aquela convicção com base numa presunção proibida e errónea de que o Arguido R… é frequentador da “…”, sem qualquer elemento válido para o fazer.

D. O Tribunal a quo ignorou que os dados utilizados na criação do email são do domínio público, porquanto acessíveis a qualquer um. Ignorou que alguns dos emails são assinados por uma mulher e que foram estabelecidos contactos telefónicos, por uma mulher, através do número constante daqueles emails, com o lesado.

E. O Tribunal a quo sustenta e fundamenta a convicção criada para dar como provado os pontos 3, 4 e 5, em prova que não foi produzida.

F. Mal andou o Tribunal a quo, ao considerar provados os pontos 3, 4 e 5, o que fez com manifesta violação do art.º 127 do CPP e do princípio do in dubeo pro reo, porquanto deverão aqueles factos serem considerados como não provados.

G. Não podia igualmente, o Tribunal a quo, ter dado como provado o facto identificado com o nº 9. Por razões de coerência, se inexistem vidências bastantes para que o ponto 5 seja considerado provado também o ponto 9 deverá apresentar formulação distinta, retirando a imputação do facto ao arguido R….

H. O ponto 17 da matéria de facto dada como padece de sustento válido, por imbuído em obscuridade, ilógica e ABSOLUTA FALTA DE PROVA. A colocação “mágica” no local do arguido R… no segmento fático correspondente aos atos da subtração contraria toda a fundamentação e prova (válida) produzida, e encontra sustento único nas declarações prestadas em sede de inquérito pelos Arguidos A… e A…, cuja valoração nas vertentes incriminatórias não é valorável, nos termos do art.º 345º nº 4 do CPP.

I. Acresce ainda, no ponto dezassete, que, por impossibilidade aritmética, não foram nem podiam ter sido subtraídos 16 cães. Outrossim e no limite, apenas 9 foram subtraídos.

J. Já o valor atribuído pelo Tribunal a quo àqueles cães, é manifestamente infundado. Inexistem faturas, recibos, guias de transporte, faturas proforma, orçamentos ou outros escritos, sobre valores atribuídos/atribuíveis aos animais subtraídos.

K. Verifica-se um arrazoado sobre emails posteriormente ao envio, em encomendas anuladas com referência a preços. As declarações em sede de inquérito das Vítimas, avalia em 4555 €. As contas feitas sobre os cães alegadamente transportados assentes nos valores arrazoados estabelece um valor de 1000 €.

L. Por fim e quanto ao “subponto” (ii) deste ponto 17 da matéria de facto dada como provada, errou o Tribunal a quo ao dar como bom e bastante o teor do depoimento do lesado, fixando o valor subtraído em €20.000,00.

M. No entanto nada faz sentido, pois sendo valores alegadamente resultantes de transações comerciais, impunha-se pelo menos 1 documento. Esta exigência probatória cresce sabendo que daqui resultará eventual qualificação, ou meramente uma agravação da quantidade de ilicitude, consabido que o suposto lesado, beneficiará em termos fiscais tanto mais quanto maior for o valor que este Tribunal considera provado.

N. Já com recurso a elementos mais certos e desinteressados, das declarações dos Arguidos A… e A…, que foram acolhidos pelo Tribunal a quo como verdadeiros, resulta que aquele terá recebido subtraído 2.000,00 € e este 500,00 €, exigindo-se, in casu, mais que a simples alegação de um interessado direto para resultar da prova produzida com observância das regras processuais, que o valor subtraído supere os 2.500.00.

O. Ao dar como provado, como deu o facto descrito sob o nº 17, violou o Tribunal a quo, entre outras, as normas previstas nos nsº 127º e 345º nº 4, ambas do Código do Processo Penal, e o Princípio do In dubeo pro reo, impondo-se que aquele facto nº 17 da matéria de facto dada como provada, apresente a formulação seguinte:

17. Ato contínuo, os Arguidos A… e A…, conjuntamente com 3 pessoas cuja identidade não se logrou apurar, dirigiram-se ao veículo dos queixosos, de onde retiraram:

(i) 9 (nove) cães, de diferentes raças, com o valor aproximado de € 1.000,00 (mil euros);

(ii) a quantia monetária estimada entre de cerca de € 2.500,00 (dois mil e quinhentos) euros em dinheiro, pertencente a A…;

(iii) um telemóvel SONY ERICSSON W910-i, no valor de € 50,00, pertencente a J…;

(iv) um telemóvel de marca Nokia, de valor e característica desconhecidas, pertencente a J…;

P. Inexiste prova ou fundamento bastante para a cristalização do facto dado como provado identificado com o nº 23.

Q. Da prova produzida não resultou que os cães aprendidos na casa do Arguido R… FOSSEM AQUELES identificados nas publicações o OLX.

R. Por outro lado, a identificação daquelas publicações datam de 04/11/2013, porquanto não poderá estender-se para além do estritamente confirmado, decidindo assim, uma vez mais, o Tribunal a quo, em violação do art.º 127º do CPP e do Princípio do in dubeo pro reo, devendo aquele ponto, em consequência, apresentar a formulação que se propõe:

23. Em data não concretamente apurada, mas que se estima pelo menos a partir de …, e por forma a obter proveitos financeiros, o Arguido R… publicou online vários anúncios de venda de cães com a menção “Bulldog inglês bom preço” e “Boston terrier”.

S. Os pontos 1 e 27 da matéria de facto dada como provada, consubstanciam uma apreciação global e a convicção da intervenção do Arguido R… na factualidade, genericamente, mal e com violação das mais elementares regras processuais penais, dada como provada. São premissa e conclusão, da demais factualidade dada como provada.

T. Pelo menos no que respeita ao Arguido R…, aqueles pontos, que são factos dados como provados, assentam num embaralhado de inverdades formais e materiais, e resultam de um exercício presuntivo compulsivo e sequencial, desconsiderando elementos probatórios favoráveis ao aqui Recorrente, sendo manifestamente insuficiente a prova produzida para sustentar aquela factualidade, e com violação do artigo 127º, 129º, 345 º 4, todos do CPP, e bem assim do Princípio da Presunção da Inocência, no seu corolário máximo – in dubeo pro reo.

U. Conclui-se assim, quanto aos pontos 1 e 27 da matéria de facto dada como provada, que estes devem manter-se com a omissão da referência à intervenção do Arguido R….

V. Aqui chegados, avaliando a prova produzida, todos os elementos dos autos, é manifestamente impossível, ponto a ponto, ou globalmente, criar qualquer certeza de que o Arguido R… tenha intervindo em qualquer momento dos factos, razão pela qual, deverá o Arguido ser absolvido.

W. Sem prescindir da absolvição que se defende e, subsidiariamente, com ou sem prejuízo do acolhimento do todo até agora vertido, importará sempre, quanto ao Direito, aferir, desde logo quanto à qualificação jurídica dos factos, pelo menos em função da culpa do Arguido R…, aliás como dispõe o artigo 29º do Código do Processo Penal.

X. Atendendo a factualidade dada como provada, e aos demais elementos constantes dos autos, não cuidou o MP de demonstrar que o Arguido R… sabia, devia saber, ou tinha que antever a presença de 2 indivíduos como motoristas. Poderá, em tese, saber-se que haveria 1 fornecedor estrangeiro, 1 exportador de cães, 1 homem que em tempo terá negociado com R….

Y. Nestes moldes, sabendo que se tratou de uma universalidade de bens de um só titular, e não se verifica uma pluralidade, ao nível do dolo, de prática violentas sobre 2 indivíduos, conclui-se que apenas pode ser condenado por um crime de roubo., o que se defende e requer.

Z. Defende-se igual e paralelamente, que, no que diz respeito ao Arguido R…, resulta das declarações do Arguido A…, que aquele pretendida que a imobilização das vítimas fosse reduzida no tempo e de forma a que pudessem escapar. Declarações estas, nesta parte, por benéficas entre coarguidos, valoráveis por não sujeitas à proibição prevista no art. 345 nº 4 do CPP.

AA. Nesta vertente, impor-se-ia, nos termos do artigo 29º do CP, pelo no menos quanto ao Arguido R…, uma relação de consumpção entre o Crime de Roubo e o Crime de Sequestro, na medida em que, como visto, este (Sequestro) terá sido perspetivado pelo aqui Recorrente, em moldes estritamente necessários à consumação da subtração, passando a constituir-se como elemento típico do Crime de Roubo.

BB. Já numa outra perspetiva, não se deixará de reforçar que não se demonstrou que o Arguido R… haja participado na factualidade 14 a 16, isto é, nos atos “violentos” que agravam o crime de furto, passando a crime de roubo. Também não ficou demonstrado que quisesse a utilização de armas.

CC. O que, considerando que não havia 16 cães para subtrair e apenas (e no limite) 9 cães, como se defendeu na alteração ao ponto 17 da matéria de facto dada como provada; Acrescendo que aqueles 9 cães, com base nos elementos constantes nos autos, não valeriam mais de 1000 €; E atendendo que, como também supra defendido, que apenas se logrou prova de existir 2.500,00 € na carrinha das vítimas, deverá considerar-se, quanto ao Arguido R…, nos termos da sua culpa (art. 29 do CP), que este deverá ser condenado pela prática de 1 crime de roubo simples por não preenchidos os pressupostos dos artigo 210 nº 2 e nenhuma das alíneas dos nºs 1 ou 2 do artigo 204º, todos do Código Penal.

DD. Considerando a matéria de facto dada como provada pelo Tribunal a quo, dúvidas não restam que o quantum das penas aplicadas ao Arguido R…, quer aquelas parciais como o cúmulo jurídico aplicado, são manifestamente exageradas.

EE. Com efeito, sem prejuízo de tudo o que se teceu, é evidente que o Tribunal a quo desprezou ou menosprezou, ou ainda, melhor dito, violou os artigos 40º, 70º, 71º e 72º, todos do código penal.

FF. Em especial quanto às alíneas do nº 2 do art.º 71º, não foram de todo consideradas, quer de uma perspetiva fria e extra processual quer na comparação das penas aplicadas aos demais arguidos.

GG. Por fim, também não atendeu ao hiato temporal entre a prática dos factos e o presente, 7 anos, sem que se vislumbre qualquer comportamento contrário ao Direito (Penal ou não), porquanto se impunha a atenuação especial da pena, conforme dispõe o art. 72º nº 2 al. d) do Código Penal.

HH. Concluir-se-á, sempre na certeza da absolvição, mas no receio de uma condenação, mas esta sempre em pena inferior a 5 anos de prisão, a qual, por sobeja e distintamente preenchidos todos os respetivos requisitos ou pressupostos, deverá sempre ser suspensa na sua execução.»

3. Admitidos os recursos respondeu o Ministério Público, em mui doutas e precisas alegações, que se mostra relevante transcrever integralmente as respetivas conclusões:

«1. Da leitura das transcrições efetuadas no corpo do recurso, no confronto da argumentação explanada nos recursos e da apreciação desenvolvida no exame crítico da prova no Acórdão recorrido, nada resulta no sentido da demonstração de um erro de julgamento, quanto a qualquer dos factos indicados pelos arguidos.

3. E a avaliação que delas é feita na motivação revela-se perfeitamente compatível com a globalidade das provas produzidas em audiência.

4. Inexiste assim qualquer desconformidade entre as provas produzidas e as provas percebidas pelo Tribunal “a quo” ou violação de regra ou princípio de apreciação/valoração da prova, nomeadamente, dos princípios da livre apreciação e do in dubio pro reo.

5. O Tribunal coletivo, procedeu ao exame minucioso de todas as provas produzidas, relacionando-as entre si, destacando e apreciando todo o comportamento dos arguidos e das vítimas, avaliando-os ainda num quadro de normalidade e de racionalidade, a tudo procedendo de acordo com regras de lógica e de experiência comum.

6. O Tribunal Coletivo atendeu a todas essas declarações mas não as avaliou isoladamente. Articulou-as com as restantes provas produzidas, nos termos explanados no Acórdão, procedendo a um verdadeiro exame crítico da prova, como lhe impõem as normas e processuais penais, que se mostram integralmente cumpridos.

7. Não sendo detetáveis desconformidades entre a prova produzida e a perceção que dela foi feita, inexistindo provas proibidas ou produzidas fora dos procedimentos legais, e tendo o tribunal justificado suficientemente no Acórdão as opções que fez na valoração dos contributos probatórios, atribuindo-lhes valor positivo ou negativo de modo sempre racionalmente justificado, de acordo com regras de lógica e de experiência comum e com respeito pelo princípio do in dubio pro reo, inexistem motivos para impor à valoração da prova realizada pelo Tribunal Coletivo a valoração que dela fazem os arguidos, ora recorrentes.

8. Em complemento das considerações realizadas pelo Tribunal Colectivo a propósito referir-se-á o seguinte relativamente aos factos julgados provados, colocados em crise pelos Recorrentes:

9. No que tange à participação do arguido R… na prática dos factos, tal como foi julgado provado, nos termos explanados no Acórdão recorrido, a mesma sustenta-se na detenção por este arguido, no dia 14.11.2013, na sua residência de pelo menos quatro dos cães pertencentes a A…, como resulta do confronto do certificado intracomunitário de fls. 285 - em que são identificados através do nº do respetivo chip - os cães supostamente encomendados por G…, no total de 15 animais - com o relato de diligência externa e no auto de busca e apreensão de fls. 440 a 445, confirmado em audiência pelo Inspector C…, que participou nessa diligência e com o auto de exame direto aos cães encontrados em caso do arguido R…, de fls. 450.

10. Acresce que tendo sido colocados alguns desses cães em venda no OLX – cfr. fls. 429 e 430, quando os Inspetores da Polícia Judiciária efetuaram contacto telefónico com o vendedor foi com o arguido R… que falaram e com quem se encontraram no dia 14.11.2013, no café “…”, local indicado pelo arguido R…, conforme descreveu o Inspetor C… no deu depoimento aos 11’00 e segs. das suas declarações.

11. Sucede que importa aqui atender às declarações do coarguido É…, prestadas em julgamento e sujeitas a instâncias pelos Ilustres defensores dos arguidos, pelo que podem ser validamente valoradas, nos termos do disposto no artº 345º, nº 4, do Cód. Proc. Penal, a contrario sensu.

12. No caso dos autos verifica-se que o arguido É… respondeu a todas as questões que lhe foram colocadas sobre todo o objeto do processo, incluindo as efetuadas pelo Ilustre Defensor do Recorrente R….

13. O arguido É… foi claro ao indicar, nos termos apontados pelo Acórdão recorrido que nos meses de julho e agosto de 2013, os arguidos A…, seu irmão, A… e R… andavam a preparar o roubo dos cães, facto de que teve conhecimento por ter assistido a conversas nesse sentido e esclareceu ainda que o arguido R… convidou-o a integrar o grupo que iria realizar o assalto.

14. Mais afirmou a partir dos 05’.00” das suas declarações, que o seu irmão contou-lhe que tinham feito o assalto, que na repartição do dinheiro ele tinha conseguido roubar mais algum dinheiro ao R… (…) que tinham roubado cães, que tinham roubado dinheiro (…) que tinha ido ele, o A…, o R… e mais pessoas. Depois viu os animais no sótão do R…. Alguns morreram e ele enterrou-os.

15. Sabe que o assalto que o seu irmão lhe relatou é este que está em julgamento por causa dos cães.

16. Descreveu ainda as características dos cães que viu no sótão do arguido R…, como sendo cachorros pequenos, com poucos meses de idade e que se deslocou a esse local por ter sido o arguido R… que o levou ao sótão para lhe mostrar os cães.

17. Da conjugação dessas declarações com o testemunho e de J… resulta que foram mais de três os agentes dos factos.

18 O arguido É… esclareceu quem foi o terceiro interveniente para além dos coarguidos A… e A…, que assumiram a sua participação nos factos.

19. Acresce que a participação do arguido R… mostra-se ainda alicerçada no facto daquele já ter comprado cães anteriormente a Á… e de ter combinado encontrar-se com os inspetores da Polícia Judiciaria, a fim de negociar os cães que colocou em venda no OLX precisamente no café “…” cujo acesso à internet foi utilizado para enviar “emails” para Á…, com vista à realização do encomenda dos cães que vieram a ser roubados no dia 11.09.2013.

20. Por outro lado, verifica-se que os demais arguidos não possuíam qualquer relação com Á…, residente na Eslováquia.

21. Todas essas circunstâncias, entre si conjugadas e articuladas com o declarado pelo arguido É… permitem ao julgador de forma devidamente fundamentada julgar assentes os factos provados, em especial a participação do arguido R… e o acordo prévio entre todos os arguidos tendente ao planeamento e realização do assalto.

22. Note-se ainda que o arguido É… mencionou nas suas declarações que ao contactar a Polícia Judiciária para denunciar os factos fê-lo por se ter zangado com o seu irmão, o coarguido A… - que veio a admitir ter participado nos factos- mas no decurso do julgamento ou no decorrer do processo não revelou qualquer inimizade relativamente aos coarguidos A… - que também admitiu a sua participação nos factos - e R…, nem que tivesse qualquer motivo para o incriminar falsamente.

23. Pelo exposto, bem andou o tribunal coletivo ao julgar aqueles factos como provados.

24. Nos termos bem explicitados no Ac. da Relação do Porto de 24.10.2012, proferido no Proc. nº 872/09.3JAPRT.P1, «O número de crimes de roubo efetivamente praticados determina-se em função do número de pessoas, detentoras de um interesse legítimo em opor-se ao ato de subtração, sobre quem foi exercida ação violenta, intimidatória ou constrangedora como meio para atingir o crime-fim.»

25. Tal jurisprudência é aplicável, por inteiro, à situação sub judice. Porquanto as testemunhas J… e J… foram encarregues pelo seu patrão, o demandante Á… de transportar os cães desde a Eslováquia até Portugal e de aqui os entregarem ao comprador, sendo eles os responsáveis pela guarda dos animais até que procedessem à sua entrega efetiva.

26. Também neste caso, a violência exercida sobre qualquer deles constituía uma crime-meio em relação ao crime-fim, pelo que também na situação dos autos os arguidos incorreram na prática de dois crimes de roubo em concurso real.

27. Deve também ser mantida a condenação dos arguidos pelo cometimento de dois crimes de sequestro, em concurso real com os crimes de roubo, como realizado pelo Tribunal Colectivo porquanto, se num primeiro momento os arguidos limitaram a liberdade de locomoção das testemunhas J… e J… para se apoderarem do dinheiro, dos cães e demais bens existentes na carrinha uma vez alcançado objetivo, num segundo momento, colocaram essas pessoas dentro de um barracão, atados pelos pulsos e tornozelos e amarrados com uma corda, envolvendo os troncos e as pernas, de costas voltadas um para o outro, impedidos de se locomover.

28. Assim permaneceram cerca de uma hora até que foram descobertos pelo pastor A… que ali passou e ouviu os gritos de socorro.

29. Quando os arguidos ali deixaram as testemunhas os crimes de roubo já estavam consumados, pelo que os crimes e sequestro não foram instrumentais dos roubos, ocorrendo uma situação de concurso real entre esses ilícitos penais.

30. Na dosimetria das penas parcelares e única o Tribunal Coletivo atendeu aos critérios legais expressos nos artºs. 71º e 77º do Cód. Penal.

31. O Acórdão atendeu a todas as circunstâncias agravantes e atenuantes apuradas em julgamento e realizou uma ponderação acertada das mesmas, fixando as penas parcelares em medida que não ultrapassa a da culpa e atendendo às fortíssimas exigências de prevenção geral e especial que no caso ocorrem.

32. De igual modo, em sede de fixação da pena única, justificou cabalmente a ordem de grandeza das penas aplicadas, face aos critérios previstos no artº 77º, do Cód. Penal.

33. Por tudo o exposto, afigura-se que o Acórdão recorrido não ofende qualquer dos princípios e normas invocados pelos arguidos pelo que deve ser mantidos os seus precisos termos.»

4. Subidos os autos a este Tribunal da Relação, o Ministério Público junto desta instância de recurso, na vista prevista no artigo 416.° do CPP, secundando a posição já assumida na 1.ª instância, pronunciou-se também doutamente no sentido da improcedência do recurso.

5. No exercício do contraditório o recorrente A… reafirmou a sua posição, nos termos já constantes das alegações de recurso.

6. Efetuado exame preliminar e colhidos os vistos, foram os autos à conferência.

II – Fundamentação

1. O âmbito dos recursos é delimitado pelas conclusões dos recorrentes, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso (artigo 412.º, § 1.º CPP) (2) .

No caso vertente, atentas as conclusões apresentadas pelos recorrentes apura-se serem as seguintes as questões a apreciar:

i - erro de julgamento da questão de facto;

ii - vícios da decisão recorrida (apenas suscitados por A…);

iii – in dubio pro reo;

iv - erros de julgamento de direito relativamente a:

a) qualificação jurídica dos factos;

b) comparticipação criminosa;

c) medida das penas.

2. No acórdão recorrido o tribunal a quo deu como provado o seguinte acervo factual, que motivou nos termos seguintes (transcrição):

«II. FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

Factos Provados

Da discussão da causa resultaram provados, com interesse para a decisão, os seguintes factos:

1. Em data não concretamente apurada, mas anterior a 10/09/2013, o Arguido R… e os Arguidos A… e A…, conjuntamente com outras duas pessoas cuja identidade não se logrou apurar, delinearam um plano tendo em vista a subtração de cães pertencentes a A… e transportados por J… e J…, bem como de dinheiro e valores que estes transportassem consigo, a fim de tais proveitos serem distribuídos por todos os arguidos.

2. O Arguido R… sabia que A…se dedicava à venda de cães, provenientes da Eslováquia, uma vez que, em data prévia, não concretamente apurada, havia realizado outros negócios com o mesmo, igualmente, de compra e venda de cães.

3. Aproveitando o conhecimento que tinha desse negócio, o Arguido R… criou o endereço de e-mail …, através do qual efetuou uma encomenda de vários cães à empresa de A…, sem, contudo, revelar a este a sua verdadeira identidade.

4. Através do referido endereço de e-mail, o Arguido R… informou A… de que a encomenda se destinava a ser entregue a G…, tendo fornecido àquele os elementos referentes à identificação de G… e solicitando que a entrega dos cães viesse a ocorrer em ….

5. Na sequência do plano engendrado, em 10/09/2013, o Arguido R… enviou novamente um e-mail a A…, informando-o de que, afinal, o local do encontro não seria a morada indicada anteriormente, mas sim na …, em …, ao que A… acedeu.

6. Nessa ocasião, e conforme previamente acordado entre todos os sobreditos Arguidos, conjuntamente com duas pessoas cuja identidade não se logrou apurar, estes iriam esperar os queixosos, naquele local, e conduzi-los a um local ermo e isolado, a fim de lhes retirarem os bens e valores que detivessem.

7. Para o efeito, dois dos intervenientes no plano seguiram numa viatura e foram esperar os queixosos à …, em … e, por seu turno, os restantes aguardavam a chegada dos queixosos no local combinado, um monte isolado e inabitado na ….

8. Assim, no dia 11 de setembro de 2013, no período da manhã, os queixosos J… e J… entraram em território nacional, conduzindo o veículo ligeiro de mercadorias, de marca …, modelo …, com a matrícula …, a fim de entregaram cães ao referido cliente G….

9. Na sequência da informação transmitida pelo Arguido R…, conforme referido no ponto 5, A… comunicou aos queixosos, via telemóvel, de que o encontro com o cliente seria, afinal, no …, em …, cerca das 12h e que os mesmos se deviam dirigir a esse local, com o intuito de aí se encontrarem com o comprador dos cães.

10. Pouco tempo depois de aí chegarem os queixosos, surgiram dois dos intervenientes no plano, cuja identidade concreta não se logrou apurar, sendo que um deles lhes fez sinal para que os seguissem, ao que estes acederam, seguindo a sua marcha, no sentido … – ….

11. Os queixosos seguiram-nos até um monte inabitado, na …, sita entre a Estrada Nacional n.º … e o lugar de …, na zona desta localidade de ….

12. Nesse local, e conforme previamente definido, encontravam-se os Arguidos A… e A… a aguardar a chegada de J… e de J….

13. Quando chegaram ao local, os Arguidos estacionaram a viatura em frente ao monte, seguida da viatura dos queixosos, os quais começaram a retirar os cães da sua viatura para entregar ao suposto cliente.

14. Nessa ocasião, e sem que nada o previsse, dois dos intervenientes no plano, cuja identidade concreta não se logrou apurar, munidos de luvas e duas armas de fogo, tipo pistolas, apontaram as mesmas à cabeça dos queixosos, obrigando-os a entrarem no interior de um barracão e a sentarem-se.

15. Após, munidos de um bastão de basebol e de um bastão extensível em aço, os Arguidos A… e A… desferiram várias pancadas nas pernas de J…, visando imobilizá-lo.

16. Em seguida, aqueles Arguidos, munidos de braçadeiras de serrilhas, manietaram os queixosos, atando-lhes os pulsos e os tornozelos, e amarraram-nos com uma corda, voltados de costas um para o outro, envolvendo os seus troncos e pernas, impedindo-os de se locomover.

17. Ato contínuo, os Arguidos A…, A… e R…, conjuntamente com duas pessoas cuja identidade não se logrou apurar, dirigiram-se ao veículo dos queixosos, de onde retiraram:

(i) 16 (dezasseis) cães, de diferentes raças, com o valor aproximado de € 12.000,00 (doze mil euros);

(ii) a quantia monetária estimada entre de cerca de € 20.000,00 (vinte mil) euros em dinheiro, pertencente a A…;

(iii) um telemóvel SONY ERICSSON W910-i, no valor de € 50,00, pertencente a J…;

(iv) um telemóvel de marca Nokia, de valor e característica desconhecidas, pertencente a J…; (v) um aparelho GPS, de marca TOM TOM, no valor de € 100,00.

18. Após, os referidos Arguidos e as duas pessoas cuja identidade não se logrou apurar abandonaram o barracão e dirigiram-se à viatura dos queixosos, tendo furado os quatro pneus, utilizando, para o efeito, um objeto de características desconhecidas, a fim de que aqueles não conseguissem deslocar-se naquela viatura.

19. Os Arguidos e as duas pessoas cuja identidade não se logrou apurar ausentaram-se daquele local, deixando J… e J… amarrados no interior do barracão, onde ali permaneceram cerca de uma hora, isolados de pessoas e qualquer outra forma de comunicação, e sem conseguirem fugir.

20. J… e J… foram encontrados por A…, pastor que ali passava e ouviu os gritos de socorro dos queixosos, tendo, nessa ocasião, chamado os Militares da G.N.R., que ali compareceram e procederam à sua libertação.

21. J… e J… sofreram dores e lesões nos pulsos e tornozelos, sendo que o segundo sofreu “escoriações circulares nos punhos e tornozelos, mais exuberantes à direita”.

22. Os bens e valores acima descritos, pertencentes aos queixosos, foram divididos por todos os arguidos, tendo o Arguido R… ficado, pelo menos, com os quatro cães que vieram a ser apreendidos, na sua residência, nos termos e circunstâncias referidas abaixo.

23. Em data não concretamente apurada, mas posterior a 11/09/2013, e por forma a obter proveitos financeiros, o Arguido R… publicou online vários anúncios de venda dos aludidos cães com a menção “Bulldog inglês bom preço” e “Boston terrier”, através do site …, colocando fotografias dos mesmos e o contacto telefónico ….

24. Posteriormente, em 14 de novembro de 2013, o Arguido R… tinha na sua posse, na residência daquele Arguido, sita na …, em …, quatro dos cães referidos no ponto 17, de raça PUG e Bulldog Inglês, com os seguintes chips: …, …, … e ….

25. No dia 26 de novembro de 2015, o Arguido A… tinha na sua posse, na sua residência sita na Rua …, …, foram encontrados dois bastões de basebol, sendo um de metal e outro de madeira, com cerca de 60 cm de comprimento cada.

26. No mesmo dia, 26 de novembro de 2015, na residência do Arguido F…, sita na …, …, foram encontrados:

(i) 1 (um) aerossol de defesa, de marca CS-REIZGAS 77000”, carregado com gás “CS”, com 40 ml, que aquele detinha na sua posse e que se encontrava em cima da cómoda do seu quarto;

(ii) 1 (um) pé de cabra em ferro, de cor preta, de 50 cm de comprimento, que se encontrava na gaveta da cómoda do quarto do arguido;

(iii) 1 (uma) espingarda caçadeira, de dois canos basculantes e paralelos, de marca “Manufacture Liégeoise D’Armes a Feu”, com o n.º …, e 110 cm de comprimento, fechada e municiada com um cartucho de calibre 16 no cano esquerdo;

(iv) 15 (quinze) cartuchos de calibre 16, da marca “GB”, um que se encontrava no interior da espingarda e os restantes no interior de uma caixa.

27. Os Arguidos A…, A… e R…, conjuntamente com duas pessoas cuja identidade não se logrou apurar, agiram em comunhão de esforços e intentos, e em execução de um plano previamente delineado, com intenção de subtrair e fazer seus os bens e quantias que encontrassem na posse dos queixosos, bem sabendo que ao fazer uso de força sobre o corpo dos mesmos e ao exibir-lhes armas de fogo e bastões, atuavam contra a sua integridade física e liberdade pessoal, e que não tinham autorização dos mesmos para fazerem seus os bens da sua propriedade, o que lograram conseguir.

28. Na concretização de tal plano conjunto, quiseram ainda aqueles Arguidos deter os queixosos, no período e circunstâncias acima descritas e impedi-los de usar a sua liberdade de locomoção, mantendo-os presos no barracão, contra a sua vontade, com o uso de braçadeiras e cordas, de que se muniram previamente, o que lograram conseguir.

29. Mais sabiam os arguidos A… e F… que detinham, respetivamente, os dois bastões e o aerossol, acima descritos, nas circunstâncias em que os mesmos lhes foram encontradas, o que lhes era vedado, por constituírem objetos utilizados como armas de agressões, cuja detenção os mesmos não justificaram, o que os mesmos previram e quiseram, logrando assim proceder.

30. Mais sabiam os sobreditos Arguidos que as suas condutas eram proibidas e punidas pela lei penal.

(…)

Mais se provou quanto às condições pessoais, económicas e respetiva inserção social dos Arguidos:

(…)

Arguido A…

66. Natural de …, a infância do Arguido ocorreu, até aos 9 anos de idade, no agregado de origem, junto dos pais e de três irmãos, numa família de condição socioeconómica muito baixa, com privações ao nível das necessidades básicas, tendo o arguido sido ainda sujeito a uma dinâmica familiar pobre de afetos, negligente e como elevados níveis de agressividade, que marcou negativamente o seu desenvolvimento e formação pessoal.

67. Para o agravamento da já parca situação económica, concorriam os gastos elevados em bebidas alcoólicas pelo pai que inviabilizavam a aquisição de bens de subsistência para a família, obrigando assim o arguido e o irmão mais velho à mendicidade.

68. O arguido esteve sujeito a situação de grande violência física e emocional, dos 5 anos aos 9 anos de idade, que só cessou após denúncia da escola, depois de verificados os motivos do absentismo escolar das duas crianças (arguido e irmão mais velho).

69. Neste contexto o Arguido, e o seu irmão foram colocados na Casa Pia de Lisboa, onde permaneceu até aos 20 anos de idade.

70. A recusa e rejeição pelo sistema institucional e escolar inviabilizaram a sua escolaridade, situação que só foi superada quando em adulto voltou a estudar e habilitou-se com o 2.º ciclo do Ensino Básico.

71. Foi na Casa Pia que iniciou e desenvolveu a atividade laboral de jardineiro e de canalizador, tendo, após institucionalização, cumprido serviço militar obrigatório dos 20 aos 22 anos.

72. Regressou depois à família de origem, onde foi bem acolhido pela mãe, mas não pelo pai, o que levou o Arguido a ir viver com a avó materna numa aldeia em …, onde se dedicou à pastorícia e a pequenos trabalhos na construção civil, normalmente a troco de géneros alimentares.

73. Posteriormente, organizou a sua vida no …, onde trabalhou na construção civil e estabeleceu uma união marital que manteve durante vários anos, da qual nasceram as suas duas filhas.

74. Esta companheira nunca desenvolveu atividade laboral, sendo o arguido o sustento económico do agregado.

75. No decorrer de 2008, o arguido iniciou cumprimento de uma pena de prisão efetiva, em cúmulo jurídico de 3 anos e 8 meses de prisão e durante esse período frequentou escola, o que lhe permitiu obter o 6.º ano de escolaridade, tendo sido colocado em liberdade condicional em abril de 2012.

76. Durante a sua prisão, a companheira terá mantido comportamento social desajustado, tendo-lhe sido retiradas a guarda das duas filhas, que foram então institucionalizadas.

77. Após ter sido colocado em liberdade condicional (que o mesmo cumpriu sem anomalias), o Arguido passou a residir na antiga casa de morada de família, então abandonada, em ….

78. É considerado um pai interessado e diligente, ficou com a guarda das duas filhas, que desde então até outubro de 2015 estiveram entregues aos seus cuidados e a quem procurou oferecer melhores condições de vida e de educação, dentro das suas possibilidades.

79. Para a concretização deste projeto, o arguido beneficiou do apoio possível, mas próximo da CPCJ local, que tem procurado manter este agregado sob supervisão, tendo em conta a precariedade económica do mesmo, que tem sido colmatado com colocações laborais temporárias e sem vínculo laboral por parte do arguido e trabalhos ocasionais na construção civil até há cerca de um ano.

80. Atualmente, o Arguido trabalha com regularidade para a autarquia, o que lhe tem trazido estabilidade laboral e económica.

81. Há cerca de quatro anos A… voltou a assumir a guarda das filhas, porém deparou-se com dificuldades em lidar com os comportamentos menos adequado da filha mais velha (B…, então com 13 anos) que foi colocada numa instituição de infância e juventude e a qual se distanciou da família paterna.

82. Presentemente, o agregado é constituído pelo arguido, pela companheira (41 anos, reformada por invalidez) e filha mais nova (M…, 14 anos).

83. Recentemente, o casal separou-se.

84. O Arguido habita numa casa que pertence ao seu pai, que está emigrado na ….

85. As relações do arguido com a família de origem são caracterizadas por litígios entre as partes, nomeadamente entre o arguido e o irmão mais velho, alegadamente devido a divisão de bens.

86. O Arguido aufere o salário mensal de € 535,00.

87. Nos tempos livres não se dedica a atividades estruturadas, dedicando-se ao cultivo de uma horta e de criação de animais para autoconsumo.

88. No plano individual, o Arguido apresenta uma atitude educada, colaborante e revelou capacidade para avaliar as suas ações, agindo, por vezes, por impulso sem antecipar os resultados e as respetivas consequências.

89. Em termos sociais, embora seja aceite na comunidade por ser uma pessoa normalmente pacífica, o Arguido é referenciado na GNR local, sendo sobretudo relacionado com processos anteriores de pequenos furtos, mas recentemente não há expediente sobre si.

90. Segundo parecer da DGRSP, o arguido reúne condições para aplicação de uma sanção penal de execução da comunidade.

91. O Arguido conta com os seguintes antecedentes criminais:

* No âmbito do Processo comum (coletivo) n.º 262/94.0GBBNV, que correu termos no Tribunal Judicial de Benavente, por acórdão transitado em julgado em 21/09/2000, foi condenado na pena de dois anos de prisão suspensa na sua execução pelo período de três anos, pela prática de um crime de furto qualificado, em 3/10/1994, declarada extinta, em 5/02/2003;

* No âmbito do Processo sumário n.º 80/01.1PACTX, que correu termos no Tribunal Judicial do Cartaxo, por sentença transitada em julgado em 9/04/2001, foi condenado na pena de 90 dias de multa à taxa diária de mil escudos, pela prática de um crime de condução sem habilitação legal, em 23/02/2001, declarada extinta, em 28/05/2003;

* No âmbito do Processo comum (singular) n.º 298/99.5GBBNV, que correu termos no Tribunal Judicial de Benavente, por sentença transitada em julgado em 28/04/2009, foi condenado na pena de dois meses de prisão substituída por multa, pela prática de um crime de furto qualificado, em 19/12/1999, declarada extinta, em 19/03/2009;

* No âmbito do Processo singular n.º 49/01.6PACTX, que correu termos no Tribunal Judicial do Cartaxo, por sentença transitada em julgado em 5/06/2003, foi condenado na pena de 70 dias de multa à taxa diária de € 4,50, pela prática de um crime de condução sem habilitação legal, em 9/02/2001, declarada extinta, em 6/07/2004;

* No âmbito do Processo singular n.º 152/00.0GACTX, que correu termos no Tribunal Judicial do Cartaxo, por sentença transitada em julgado em 6/11/2003, foi condenado na pena de 120 dias de multa à taxa diária de € 3,00, pela prática de um crime de furto qualificado, em 24/07/2000, declarada extinta, em 22/10/2003;

* No âmbito do Processo sumário n.º 230/06.1GABNV, que correu termos no Tribunal Judicial de Benavente, por sentença transitada em julgado em 22/06/2006, foi condenado na em pena de prisão substituída por 290 horas de trabalho a favor da comunidade, pela prática de um crime de condução sem habilitação legal, em 17/05/2006;

* No âmbito do Processo sumário n.º 388/07.2GTSTR, que correu termos no Tribunal Judicial de Benavente, por sentença transitada em julgado em 13/02/2008, foi condenado na pena de 14 meses de prisão suspensa na sua execução condicionada a pegamento, pela prática de um crime de condução sem habilitação legal, em 21/12/2007, declarada extinta, em 28/06/2011;

* No âmbito do Processo comum (singular) n.º 360/04.4GEBNV, que correu termos no Tribunal Judicial de Benavente, por sentença transitada em julgado em 21/02/2008, foi condenado na pena única de 18 meses de prisão suspensa por igual período, pela prática de um crime de condenação de veículo sem habilitação legal e falsidade de testemunho, em 2004 e 2006, declarada extinta, em 4/11/2011;

* No âmbito do Processo comum (coletivo) n.º 579/05.0GBTMR, que correu termos no Tribunal Judicial de Tomar, por acórdão transitado em julgado em 28/10/2008, foi condenado na pena de 3 anos de prisão, pela prática de um crime de furto qualificado, em 12/12/2005, declarada extinta, em 5/01/2012;

* No âmbito do Processo comum (coletivo) n.º 321/04.3GEBNV, que correu termos no Tribunal Judicial de Benavente, por acórdão transitado em julgado em 17/11/2009, foi condenado na pena de 6 meses de prisão suspensa por um ano, pela prática de um crime de condução sem habilitação legal, em 14/06/2006, declarada extinta, em 14/01/2011;

* No âmbito do Processo comum (singular) n.º 523/06.8GARMR, que correu termos no Tribunal Judicial de Rio Maior, por sentença transitada em julgado em 7/06/20010, foi condenado na pena única de 18 meses de prisão, pela prática de um crime de detenção de arma proibida, de condução sem habilitação legal, de um furto simples e de ofensa à integridade física simples, em 10/06/2006, declarada extinta, em 4/11/2011;

* Em cúmulo jurídico das penas dos Processos n.º 579/05.0GBTMR e 523/06.8GARMR, foi condenado por sentença cumulatório transitada em julgado em 7/12/2011, na pena única de 3 anos e 8 meses de prisão;

* No âmbito do Processo comum (coletivo) n.º 243/08.9GBBNV, que correu termos no Tribunal Judicial de Benavente, por acórdão transitado em julgado em 30/05/2011, foi condenado na pena de 3 meses de prisão, pela prática de um crime relativo à caça e à pesca, em 23/10/2008, declarada extinta, em 17/12/2012;

* No âmbito do Processo sumário n.º 59/14.3GBCCH, que correu termos no Juízo de Competência Genérica de Coruche, por sentença transitada em julgado em 19/05/2014, foi condenado na pena de 8 meses de prisão suspensa na sua execução por um ano, sujeita a regime de prova, pela prática de um crime de furto simples, em 17/02/2014, declarada extinta, em 9/11/2015;

* No âmbito do Processo comum (singular) n.º 1673/15.5T9STR, que correu termos Juízo Local Criminal de Benavente, por sentença transitada em julgado em 18/01/20017, foi condenado na pena de 100 dias de multa à taxa diária de € 5,50, pela prática de um crime de ofensa à integridade física simples, em 28/10/2015, a qual foi substituída por prestação de trabalho a favor da comunidade e declarada extinta, em 23/01/2018.

(…)

Arguido R…

108.R… evidencia uma situação familiar e social com muita mobilidade.

109.À data dos factos, o Arguido tinha a sua vida centrada num ramo de negócios de criação e comercialização de animais, que desenvolveu ao longo de 12 anos, primeiro no …, com loja em …, depois em …, atividade que deixou em 2015. 110.No presente tem novamente a sua vida organizada no … – concelho de …, dedicando-se ao transporte particular de passageiros e transferes.

111.À data dos factos, como no presente, tem como principal referência afetiva-relacional a companheira, P…, de 53 anos, que muitas vezes colabora nas suas atividades.

112.Presentemente, o casal vive sozinho na morada indicada, mas já integrou uma filha de P…, de 23 anos e o respetivo namorado, que é um dos coarguidos no presente processo (A…).

113.O arguido reside numa pequena moradia com logradouro, arrendada em meio rural.

114.R… nasceu em …, foi um filho tardio, mais novo de quatro irmãos, com uma diferença de 11 anos do seguinte.

115. Aos 7 anos a família sofreu as mudanças inerentes ao processo sociopolítico da descolonização e viveram alguns anos no … e vieram a fixar-se na região de ….

116.Por opção, associado à morte do pai, o Arguido deixou os estudos após terminar o 6º ano e ingressou no mundo do trabalho.

117.Começou por temporadas de verão em restaurantes, bares e discotecas no …, complementado com a venda de livros porta-a-porta.

118.Nos anos 90, ao longo de 8 anos, ingressou como comercial da …, no …, onde foi progredindo, com um período, entre 1996 – 97, que desenvolveu a atividade no ….

119.Em 2007, optou por se mudar de vez para esta região, mudando a sua atividade exclusiva para a criação e comercialização de animais.

120.Com vista a ampliar o negócio, ter-se-á mudado em 2011 para …, onde arrendou casa e um terreno maior.

121.Depois de um ano na …, em 2018, o Arguido criou a empresa de transportes de passageiros “…”.

122.O Arguido tem um filho de 28 anos, o qual não foi criado consigo, uma vez que o casal se divorciou, ao fim de 3 anos de relação.

123.Aos 34 anos, encetou o relacionamento com a atual companheira, cujas origens familiares se encontram no …, razão por que acaba por retornar a esta região.

124.Desta relação nasceu o seu segundo filho, que faleceu vítima de acidente com apenas 3 anos, em 2009, ocorrência ainda causadora de notório sofrimento por parte do casal.

125.Embora os seus contextos sociais, laborais e recursos económicos se afigurem pouco claros, não são conhecidos problemas de relacionamento interpessoal tido como ofensivo.

126.Segundo parecer da DGRSP, o Arguido reúne condições para cumprimento de medida probatória em meio livre, caso a situação jurídica o permita.

127.O Arguido não conta com antecedentes criminais.

(…)

Motivação da Decisão de Facto

A decisão respeitante à factualidade considerada por provada radicou na análise crítica e ponderada da prova produzida em julgamento, apreciada segundo as regras da experiência comum e o princípio da livre convicção do julgador.

Por sua vez, no que toca à factualidade considerada por não provada, a decisão estriba-se na circunstância de os elementos probatórios produzidos a esse respeito não terem logrado atingir um valor persuasivo e razoável que permitisse sustentar a convicção do Tribunal quanto à certeza da sua verificação, além da dúvida razoável.

*

Na decisão sobre a factualidade consignada por provada, o Tribunal tomou em consideração, em primeiro lugar, a prova pericial e documental produzida nestes autos, a saber:

• Relatório pericial às braçadeiras com serrilhas e cordas encontradas nos locais dos factos (cfr. fls. 329-332), da qual resulta um vestígio do dedo médio da mão esquerda do queixoso J…;

• Relatório pericial a vestígio tridimensional de calçado encontrado no local dos factos (cfr. fls. 387-389);

• Relatório pericial (cfr. fls. 398-408) de exame, observações e recolha de vestígios com interesse forense, no “…”, em 11 de setembro de 2013, local dos factos, e respetivo acervo fotográfico, do qual decorre a localização da propriedade, a existência da carrinha identificada nos factos provados com pneus furados, onde seguiram os queixosos, cordas e braçadeiras encontradas no local, divisão onde estiveram os queixosos (cfr. fls. 401 a 405);

• Relatório pericial às armas apreendidas, em particular, à caçadeira e munições apreendidas no interior da residência do Arguido F… (cfr. fls. 805-808 e 905), ao aerossol apreendido na residência do referido Arguido (cfr. fls. 816 a 817);

• Auto de Notícia, no tocante às circunstâncias de tempo e lugar descritas na acusação (cfr. fls. 3ª 5);

• E-mails recebidos e trocados por A… (cfr. fls. 69-70, 73-78 e 284);

• Certificado de transporte de animais com indicação dos chips dos cães transportados pelos queixosos (cfr. fls. 285);

• Fotogramas da câmara de vigilância da bomba de combustível indicada na acusação e nos factos provados (cfr. fls. 287-290);

• Relatório do episódio de urgência do queixoso J… (cfr. fls. 391-394), do qual resultam as lesões apresentadas por este em 11/09/2013;

• Informação da PT a fls. 354-355 sobre o endereço eletrónico … e respetivo IP;

• Informação da Via verde, a fls. 361-364;

• Registo de comunicação da operadora Optimus, a fls. 247-254;

• Informação da operadora Optimus, a fls. 422 sobre o funcionamento do IMEI associado ao número …;

• Anúncios do OLX sobre venda de cães da raça Bulldog Inglês e Boston Terrier (cfr. fls. 429-430);

• Relato de diligência externa, a fls. 440;

• Fotografias, de fls. 445-447;

• Auto de exame direto aos cães apreendidos na residência do Arguido R… (cfr. fls. 450);

• Auto de busca e apreensão à residência do Arguido A… (cfr. fls. 649-652);

• Auto de busca e apreensão à residência do Arguido F… (cfr. fls. 661-667);

• Auto de exame direto (cfr. fls. 668-671);

• Auto de reconstituição do facto em que intervieram os Arguidos A… e A… (cfr. fls. 701-711);

• Auto de exame direto à caçadeira e cartuchos (cfr. fls. 979-982).

• Documentação oferecida com o pedido de indemnização civil (cfr. fls. 1484 a 1496);

• Certificados de Registo Criminal dos Arguidos (cfr. fls. 2013 a 2056);

• Relatórios sociais dos Arguidos (cfr. fls. 1871; 1837, 1655, 1662 e 1638).

Os elementos periciais e documentais supra elencados foram devidamente conjugados com as declarações prestadas pelos Arguidos A… e A… a fls. 772 a 779, em sede de inquérito, perante Ministério Público, uma vez que foram cumpridas todas as formalidades legais (3) , com as declarações prestadas pelo Arguido É…, em audiência de julgamento, e com os depoimentos das testemunhas arroladas pela acusação, a saber, J…, queixoso/vítima; A…, proprietário dos animais e da quantia monetária subtraída; G…, engenheiro e empresário que teve uma empresa com a designação “…”; A…, pastor que encontrou os queixosos; A… e M…, Militares da GNR que estiveram no local, na data dos factos e tomaram conta da ocorrência; G…, D…, A…, P…, N… e D…, inspetores da Polícia Judiciária; e P…, vendedor de animais que conhece o Arguido R… negociou animais com A….

No que concerne às circunstâncias de tempo e lugar descritas na acusação, o desenrolar dos factos nos termos ali mencionados (cfr. pontos 8 a 21 e 31 a 32), o Tribunal teve em consideração, primordialmente, o depoimento da testemunha J…, queixoso/vítima, que apresentou um depoimento claro, objetivo e lógico e que narrou de modo crível os eventos ocorridos em 11/09/2013. Em particular, o local onde se dirigiu juntamente com J…, que seguia consigo na carrinha, primeiro ponto de encontro comunicado pelo seu patrão da altura A…, que seguiu a carrinha tripulada por duas pessoas até a uma herdade em … (grande propriedade rural) e a abordagem/ataque que a testemunha e o seu colega foram vítimas, referindo que, quando se preparavam para entregar os quinze cães, para além das duas pessoas que circulavam na carrinha que os guiou até ao local, foi surpreendido por mais três a quatro pessoas.

Num primeiro momento, duas pessoas apontaram duas armas (6,35m com carregador segundo as suas palavras) à sua cabeça e de J… e, posteriormente, duas ou três pessoas desferiram-lhes pancadas nas pernas com dois tacos de basebol, sendo um deles de metal.

Após esta investida, já no interior do casebre, ataram-lhes as pernas e os pulsos, tendo ali permanecido até que foram encontrados por um pastor.

A testemunha confirmou os bens e valores existentes no interior da carrinha em que circulava, mormente, o número de cães que era suposto entregar e os bens que lhe pertenciam que foram objetos de subtração.

Corroborou, ainda, as lesões sofridas que decorrem da documentação clínica acima referenciada – episódio de urgência da testemunha que foi levado de ambulância para o Hospital de … – e documentação clínica oferecida com o pedido de indemnização cível da qual decorre que, em virtude das lesões sofridas no pulso, o queixoso/vítima teve que ser sujeito a operação e realizou sessões de fisioterapia.

O depoimento do queixoso/vítima reputou-se de crível e verosímil, apesar da emoção demonstrada pelo mesmo em virtude da violência do ataque de que foi vítima.

A testemunha A…, pastor, descreveu em Tribunal, todo o circunstancialismo que o levou a socorrer os dois queixosos, confirmando o local onde os encontrou com os pulsos e pernas amarrados.

Foi a testemunha quem chamou a GNR.

As testemunhas A… e M…, Militares da GNR, corroboraram o teor do auto de notícia a fls. 3 a 5, confirmaram o local exato (barracão/casebre) onde se encontravam os queixosos e que a carrinha que estava no Herdade tinha os pneus furados (cfr. fotografias a fls. 400 a 404 com as quais foram confrontados).

Por seu turno, a testemunha A…, proprietário dos cães que os queixosos vinham entregar ao Alentejo e da quantia monetária que se encontrava na carrinha em que aqueles se faziam deslocar, descreveu ao Tribunal, igualmente de modo lógico, objetivo e coerente, os contactos mantidos com o pretenso cliente/comprador dos referidos animais, por email, utilizando o endereço de email …, o preço dos animais de € 12 000,00, quais os procedimentos a adotados, o percurso realizado pelos seus empregados, aqui queixosos.

Corroborou o teor dos emails juntos aos autos (acima identificados), trocados com o pretenso vendedor, referiu não conhecer pessoalmente o indivíduo de nome G…, pretenso autor dos emails, asseverou as indicações que lhe foram dadas para o ponto de encontro, que inicialmente estava para ser … e passou a ser nas … em …, o que transmitiu aos queixosos.

Referiu, ainda, esta testemunha que aquela seria a última entrega de animais, antes de os queixosos iniciaram o trajeto de regresso até à República Checa.

A testemunha G… apresentou, igualmente, um depoimento crível e coeso, reforçando dois pontos essenciais: o primeiro que não conhece o proprietário dos animais subtraídos – a testemunha A… – que até 2006 foi sócio e gerente da sociedade …, Lda., conjuntamente com outro sócio, que se dedicava à produção de aves, mas que está tal sociedade ligada à criação e utilização do endereço de email … (aliás resulta das informações prestadas pela PT e pela Optimus que esse endereço foi criado em agosto de 2013, tendo terminado a sua utilização no dia dos factos, em 11/09/2013, sendo que o IP é de um estabelecimento de restauração sito em … – fls. 354).

Atualmente, a testemunha dedica-se à criação de cães da raça “pastor belga” para utilização pela GNR.

Os elementos de identificação da antiga empresa poderiam estar disponíveis e publicados na DGAV, segundo a testemunha, e bem assim a sua morada.

É com esse fundamento que a testemunha afirma que terá sido elaborado o certificado intracomunitário a fls. 285, com elementos que lhe dizem respeito, porquanto nunca teve qualquer intervenção num negócio de compra de cães com A….

Por fim, a testemunha P…, vendedor de animais, referiu que, no dia dos factos, A… lhe ligou preocupado com o facto de os empregados, queixosos, se encontrarem incontactáveis e ainda não terem chegado a Espanha, onde eram esperados por um cliente.

Ora, se estas testemunhas, cujos depoimentos foram devidamente concatenados com o restante acervo probatório, foram essenciais para dar como por provado o desenrolar dos factos nos termos vertidos nos factos provados, em face da impossibilidade de valoração do reconhecimento fotográfico realizado em inquérito (cfr. fls. 615 e seguintes), uma vez que não foi respeitado o formalismo processual vertido no n.º 5 do artigo 147.º, do C.P.P., e de a testemunha J… realizar uma descrição dos intervenientes, em juízo, o Tribunal lançou mão de outros elementos de prova para colocar os Arguidos A…, A… e R…, no cenário dos acontecimentos, e assim formar convicção segura quanto à sua intervenção nos mesmos.

Vejamos.

Os Arguidos A… e A… admitiram, em declarações prestadas em sede de inquérito, a sua intervenção nos factos, tendo participado na reconstituição dos factos realizada nessa fase (cfr. fls. 702 a 711).

Descreveram a sua atuação e intervenção, confirmando grande parte da descrição tecida pelo queixoso J…, e ainda que receberam uma quota-parte do dinheiro que foi subtraído do interior da carrinha dos queixosos.

Por seu turno, o Arguido É… negou ter tido qualquer intervenção nos factos, referindo, em declarações, no que pode ser validade valorado, que o seu irmão, o Arguido A… lhe confessou ter tido participação e intervenção nos factos e que recebeu quantia monetária.

Contudo, acrescentou um dado objetivo e de perceção direta ao declarar que foi convidado pelo Arguido R… a participar nos factos, tempos antes, exatamente no mesmo café sito em …, onde se encontra registado do IP do endereço eletrónico.

Tais declarações, devidamente conjugadas com os restantes elementos de prova, em particular com a reconstituição dos factos em que os Arguidos A… e A… intervieram, separadamente - como foi relatado pelas testemunhas N… e P…, Inspetores da Polícia Judiciária, que descreveram a diligência com rigor, em juízo - são suficientes para colocar estes dois Arguidos no cenário dos factos e para formar convicção segura de que os mesmos intervieram no ataque perpetrado, detendo, igualmente, a par dos restantes intervenientes, o domínio sobre a execução dos mesmos.

Sucede, porém, que não podendo tais declarações dos Arguidos ser validamente valoradas contra os restantes coarguidos, por não terem sido contraditadas, o Tribunal não tem dúvidas de que, segundo o depoimento do queixoso J…, intervieram nos factos pelo menos cinco pessoas, duas das quais os Arguidos A… e A…, sendo certo que da demais prova produzida não há elementos que sustentem e comprovem a presença dos Arguidos É… e F… no local dos factos.

Tal conclusão não é, contudo, extensível ao Arguido R…, uma vez que toda a prova produzida, conjugada com as regras da lógica e da experiência, é suficiente para o colocar, igualmente, no local dos factos.

Em primeiro lugar, importa reter que estamos claramente perante uma transação “forjada” ou em nome de um pretenso comprador falso.

Tal ilação resultou evidente do depoimento da testemunha G…, que negou ter contactado A… e de ter celebrado qualquer negócio com o mesmo.

Acresce a isto que o endereço de e-mail utilizado para os contactos mantidos com A… foi criado e utilizado, entre 26/08/2013 a 11/09/2013 (data dos factos), como decorre das informações prestadas pela Optimus e pela PT, sendo certo que o IP associado a tal endereço corresponde a um café sito em …, frequentado pelo Arguido R….

Em segundo lugar, em 14 de novembro de 2013, na sequência das investigações realizadas em sede de inquérito, foram apreendidos, na residência dos Arguido R…, quatro cães da raça PUG e Bulldog Inglês com chips idênticos aos dos animais que se encontravam na carrinha, no dia dos factos, objeto de entrega pelos queixosos, em nome de A…, como resulta do confronto do auto de apreensão a fls. 444 a 447 e com o certificado europeu a fls. 285, que titulava a transação forjada.

A apreensão destes animais na posse do Arguido constitui um elemento indiciário fortíssimo, uma vez que inexiste qualquer elemento ou demonstração de uma causa alternativa que justifique tal detenção.

Veja-se, ainda, que essa apreensão ocorreu na sequência de os Inspetores da Polícia Judiciária – C… e A… que o relataram aos Tribunal – terem respondido a anúncios publicados na página OLX (cfr. fls. 429 e 430) de venda de uma cadela Bulldog Inglês e de um cão Boston terrier, com o mesmo número de contacto, com localização no concelho de …. Em virtude de o anunciante não ter qualquer identificação, os Inspetores da Polícia Judiciária ligaram para o número de telemóvel publicitado e foi combinado um encontro no café “…”, sito em …, mesmo local onde se encontra registado o IP do endereço de e-mail utilizado, como acima se referiu, onde compareceu o Arguido R…, o qual acedeu a conduzir os dois Inspetores à sua residência onde se encontravam os quatros canídeos.

Tais diligências, que precederam a apreensão e conduziram à constituição de R… como Arguido, no processo, não se insere no n.º 7 do artigo 356.º, do C.P.P., denominada “conversas informais”, porquanto se tratam de factos objetivos recolhidos pelos Inspetores da Polícia Judiciária, voluntariamente cedidas pelo Arguido, quando ainda não existiam elementos suficientes para o constituir arguido, o que só veio a suceder quando aqueles confirmaram que quatro cães apreendidos tinham chips dos cães subtraídos nos dias dos factos.

Por outro lado, o Tribunal não valorou quaisquer declarações prestadas pelo Arguido, antes da sua constituição como tal, mas sim o relato tecido pelas duas testemunhas Inspetores da Polícia Judiciária das diligências realizadas e conducentes à apreensão dos animais.

Na verdade, as forças policiais não estão proibidas de falar com os cidadãos que podem vir a ser constituídos arguidos ou com os suspeitos, ou com quem se encontra numa “cena de crime”, desde que não houver culpa sua no atrasar da formalização daquela constituição. (…) Face ao ordenamento português, o simples cidadão ou cidadão suspeito não goza do direito ao silêncio e, como tal, a prova produzida pelas suas declarações, melhor, depoimento, é válido. Se ainda não havia obrigação de constituição como arguido e as entidades policiais agiam dentro dos poderes concedidos pelas normas reguladoras da aquisição e notícia do crime (artigos 241º e 242º) e de medidas cautelares e de policia (artigos 248º e segs., designadamente o artigo 250º do C.P.P.) e, sem má fé ou atraso propositado na constituição de arguido, ouvem do cidadão ou suspeito a informação da prática de um crime, isso não constitui violação de lei ou fraude à lei, nem obtenção de prova proibida. Por isso a proibição de “conversas informais” só deve abranger afirmações posteriores à constituição de arguido e nunca antes da sua constituição pois ai nem existem propriamente “conversas informais”, mas sim afirmações de um cidadão, que pode ser suspeito ou nem isso. E este é, no ordenamento processual penal português, uma testemunha (cfr. Acórdão do TRL de 22/06/2017, Processo n.º320/14.7GCMTJ.L1-9, disponível para consulta em www.dgis.pt).

Todos estes elementos associados às declarações prestadas pelo Arguido É… (sobre o convite formulado pelo Arguido R… para participar no ataque aos queixosos) e ao facto de o Arguido se ter dedicado à compra e venda de cães, tendo inclusivamente tido negócios com A…, que não correram bem, e com P…, como reportado por ambos em juízo, fortalecem todos os indícios recolhidos e são suficientes para que o Tribunal tenha formado convicção segura quanto à intervenção do Arguido R… nos factos, mormente, em ter sido responsável na negociação com A…, por já o conhecer e ter experiência neste ramo comercial.

Pelo exposto, da conjugação de todos os elementos acima escrutinados, a que acresce a circunstância de, à data dos factos, o Arguido A… residir com o Arguido R…, por manter relação amorosa com a enteada deste último (como resulta do relatório social do primeiro e das suas declarações em inquérito), é possível formar convicção segura e afirmar que o Arguido R… interveio nos factos, fez parte do plano e foi responsável pela negociação da venda dos cães e da entrega dos mesmos no local dos factos.

O Tribunal considera, ainda, que não se logrando apurar a identidade dos restantes dois intervenientes, ficou demonstrados que os Arguidos A…, A… e R… atuaram juntamente com dois indivíduos, segundo um plano prévio, nos termos vertidos nos factos provados.

Uma vez que decorreu das suas declarações, o Tribunal logrou precisar que os atos de bater com bastões nas pernas dos queixosos, como reportado por J…, foram cometidos pelos Arguidos A… e A….

No tocante à factualidade referente às apreensões realizadas às residências dos Arguidos A… e F… (cfr. ponto 26), o Tribunal tomou em consideração o teor dos autos de apreensão e exames diretos acima elencados, bem como os depoimentos das testemunhas D…, P… e D…, que intervieram nessas diligências e que relataram os locais onde se encontravam os objetos e armas apreendidos.

*

No que concerne à factualidade referente à intenção e representação inerentes às condutas do Arguidos A…, A… e R…, ou seja, vetores intelectuais das suas condutas, o Tribunal ponderou a matéria consignada por provada e conjugou-a com critérios de razoabilidade e com regras de experiência comum, daí extraindo, sem margem para dúvida, a intenção que presidiu à sua realização e exteriorização, bem assim a representação dos resultados das mesmas por parte dos Arguidos (cfr. pontos 27 a 30).

Saliente-se, quanto à detenção pelo Arguido A… de dois bastões com características idênticas aos que foram utilizados no dia 11/09/2013, a verdade é que não foi oferecida qualquer justificação lícita para sua detenção, designadamente que o Arguido se dedique àquela atividade desportiva, pelo que, mais uma vez, recorrendo às regras da experiência e da lógica, facilmente se infere que a sua detenção destinava-se utilizar tais bastões como arma de agressão.

*

Para efeitos da consignação dos factos relativos à situação económica e pessoal dos Arguidos, o Tribunal teve em conta o teor dos relatórios sociais (cfr. fls. 1871; 1837, 1655, 1662 e 1638) e os depoimentos das testemunhas de defesa arroladas pelo Arguido É… (A…, V…, P… e P…), pelo Arguido A… (S…, sua irmã de acolhimento que relatou a situação pessoal do Arguido, no presente), pelo Arguido R… (L…, colega de trabalho do Arguido) e pelo Arguido A… (T…, sua irmã).

Os antecedestes criminais dos Arguidos decorrem dos respetivos certificados de registo criminal (cfr. fls. 2013 a 2056).»

3. Apreciando

3. 1. Do erro de julgamento da matéria de facto

Importa começar por recordar que o recurso da matéria de facto perante a Relação não se confunde com um novo julgamento, em que a 2.ª instância aprecia toda a prova produzida e documentada em 1.ª instância, como se o julgamento anterior não existisse. O que ele deveras pretende ser é um remédio jurídico que permita colmatar erros de julgamento, despistando ou corrigindo, cirurgicamente, eventuais erros in judicando (por violação de normas de direito substantivo) ou in procedendo (por violação de normas de direito processual).

Para tanto não é suficiente a alegação e demonstração de uma mera divergência de convicção face à formada pelo julgador (pretendendo com isso o recorrente sobrepor a sua convicção à que foi formada por um julgador imparcial).

A Constituição e a lei atribuem ao tribunal – e só a este - não apenas o poder de apreciar livre e imparcialmente as provas, como também o dever de motivar a sua convicção segundo parâmetros racionais controláveis (artigo 127.º CPP), impondo-se-lhe, para garantia de direitos fundamentais, o limite imposto pelo princípio in dubio pro reo (por força do qual só poderá julgar provado facto desfavorável ao acusado quando tal demonstração se evidencie para além de toda a dúvida razoável).

Talqualmente se prevê no artigo 412.º, § 3.º CPP, o erro de julgamento, nos termos que se deixaram caracterizados, ocorre quando o Tribunal considere provado um determinado facto, sem que dele tivesse sido feita prova, pelo que deveria ter sido considerado não provado; ou quando dá como não provado um facto que, face à prova que foi produzida, deveria ter sido considerado provado.

Nestas situações o recurso pretende que o tribunal ad quem reaprecie a prova produzida e documentada na primeira instância, caso em que a apreciação pelo tribunal de recurso não se atém ao texto da decisão recorrida, antes procede a uma análise da prova efetivamente produzida na audiência.

Em consonância com o que se vem sendo referido a lei exige ao recorrente que fixe o objeto da reapreciação a efetuar pelo tribunal ad quem, especificando os concretos pontos da matéria de facto que considera incorretamente julgados; e as concretas provas que impõem decisão diversa relativamente a cada um deles (§ 3.º do artigo 412.º CPP).

Neste caso os recorrentes apresentam-se a impugnar o julgamento de facto feito na primeira instância, considerando que não foi produzida prova bastante que demonstre uma parte significativa na matéria de facto assente (A… refere-se aos pontos 1, 15 a 18 e 29 e R… aos pontos 1 a 27, na parte que pessoalmente lhe respeita).

O recorrente A… firma a impugnação factológica dos pontos aludidos, essencialmente, na pretensa ausência de prova demonstrativa do seu envolvimento pessoal na dimensão firmada no acórdão recorrido, nomeadamente que tenha previamente, explícita ou implicitamente, concertado com os demais arguidos um plano para realizar os factos ilícitos pelos quais foi condenado. Sustenta que se limitou a estar no local e prestar auxílio no carregamento dos cães subtraídos para os carros e ter por isso recebido 500€.

Por seu turno o recorrente R… considera, em síntese, que a prova produzida em audiência não permite formular um juízo seguro («de certeza») de que ele praticou qualquer dos factos que o acórdão considerou provados. Entende não haver qualquer prova demonstrativa de ter sido ele a criar o endereço de correio eletrónico ..., nem prova válida de que teve alguma intervenção na demais factualidade.

Para tanto enumera uma série de elementos probatórios que entende terem sido desconsiderados «por serem favoráveis ao recorrente», sobre os quais ele próprio afirma deles se não retirar nenhuma prova do seu envolvimento nos factos julgados provados! Acrescentando, por outro lado, não poder dar-se nenhuma espécie de crédito às declarações do coarguido É…, por este se ter limitado a dar conta do que ouviu dizer. Não podendo também ser valoradas contra ele as declarações prestadas pelos arguidos A… e A…, por não ter tido oportunidade de sobre elas exercer contraditório (artigo 345.º, § 4.º CPP). E ainda que as conversas que teve com os inspetores da Polícia Judiciária, antes de ser constituído arguido, também não podem ser valoradas.

Concluindo, pois, inexistir prova válida demonstrativa do seu envolvimento nos factos contidos nos pontos 1.º a 27.º.

3. 1.a) Do recurso de A…

A tese trazida no recurso pelo arguido A… não tem sustentação em nenhuma prova. Só seria conjeturável arredar o seu envolvimento nos acontecimentos de 11 de setembro de 2013, se sobre a globalidade da prova validamente produzida se procedesse a uma seleção que necessariamente teria de excluir provas de sentido inequívoco.

Certo é que a conjugação e valoração de todos os elementos probatórios, como se impõe e vem feito no acórdão recorrido, evidencia não apenas a sua participação nos acontecimentos daquele dia e, no essencial, talqualmente vêm descritos, incluindo a sua efetiva integração no plano que naquele dia se executou.

O que a prova produzida demonstra é deveras absolutamente incompatível com a tese de que se teria limitado a acompanhar o amigo R… ao Alentejo para ir buscar uns cães que este tinha encomendado! A mais disso a tese que sustenta falha na plausibilidade e sobretudo na lógica que sempre subjaz às atuações humanas.

Com efeito, a versão de que a sua participação nos acontecimentos teria sido como que acidental, acessória e angelical é desmentida não apenas pelo modo como os factos decorreram, como o que consta e se infere das suas próprias declarações e da reconstituição dos factos em que participou. Por que razão R… precisaria dele como «ajudante» para ir buscar uns cães aos Alentejo se, como se provou, ele levava consigo outras duas pessoas?!

A motivação constante do acórdão recorrido não se limita a identificar as provas (todas) que sustentam a factualidade assente, pois contém uma extensa e proficiente explicitação da lógica subjacente à valoração dos meios de prova e dos raciocínios efetuados relativamente à participação do recorrente na subtração dos bens e valores e à sua concreta atuação de agressão da integridade física dos assaltados, visando manietá-los, imobilizá-los e sequestrá-los.

Nessa motivação precisam-se os instrumentos utilizados na agressão e faz-se a conexão desses factos com a apreensão dos tacos de basebol na casa do recorrente e a este pertencentes. Também nesta parte o recorrente se mostra seletivo na escolha das provas que pretensamente lhe seriam favoráveis, como sucede com o depoimento do inspetor da PJ a propósito dos instrumentos utilizados na agressão. Na verdade isso é não apenas desinteressante como absolutamente irrelevante. Perguntar a tal testemunha qual terá sido o taco utilizado na agressão é pedir-lhe que faça um exercício de prestidigitação, pois ela não esteve presente no dia e local onde decorreu a agressão e por isso não viu o que ali sucedeu (e por força as características dos instrumentos de agressão física utilizados), não tendo, pois, conhecimento direto do facto relevante (artigo 128.º, § 1.º CPP). Relevante é, antes, o que a mesma testemunha referiu sobre a apreensão dos tacos de basebol ao recorrente, dali não restando dúvida que os tacos apreendidos eram mesmo dele (e não de outra qualquer pessoa – como agora também se pretende!).

Da mesma sorte a declaração isolada do arguido A… de que teria usado um taco de basebol e a «outra pessoa» um pau de madeira é, só por si, irrelevante. Tão irrelevante como dizer-se agora que tal afirmação até poderia significar que ele usou um taco de basebol metálico e «a outra pessoa» um taco de madeira (um pau).

O acórdão contém, porém, um erro de escrita, que importa corrigir. No ponto 15.º dos factos provados diz-se que os arguidos A… e A… estavam munidos de «um bastão de basebol e de um bastão extensível em aço», quando o que se provou (depoimentos testemunhais), foi que estavam munidos de dois tacos de basebol, sendo um deles de metal. É o que consta da motivação de facto e está alinhado com a apreensão feita na casa de A…. Trata-se de um lapsus calami, compreensível quando se trabalha em cima de outros textos (neste caso a redação acolhida no acórdão recorrido vem do ponto 15.º da acusação), mas que importa corrigir. E, como assim, o ponto 15. dos factos provados da decisão recorrida passará a ter a seguinte redação:

«Após, munidos de dois tacos de basebol, os arguidos A… e A… desferiram várias pancadas nas pernas de J…, visando imobilizá-lo.»

Para além desta correção, imposta pela deteção de um notório erro involuntário de escrita, não existe qualquer fundamento probatório que sustente e, muito menos, que imponha (conforme exige 412.º, §3.º, al. b) CPP) qualquer outra alteração à matéria de facto julgada provada pelo tribunal a quo.

Importa ainda referir que a dado passo do seu recurso A… alude às expressões «insuficiência para a decisão de facto» (quando indica inexistir prova sustentadora do valor de 20 000€); e «contradição insanável da fundamentação» (a propósito da referência ao «bastão extensível» do ponto 15.º da matéria de facto provada). Tais referências surgem no âmbito da impugnação ampla da matéria de facto, se bem que as expressões usadas tenham um enquadramento distinto como vícios da decisão, em conformidade com o disposto no § 2.º do artigo 410.º CPP.

Seguro é que o valor de 20 000€ foi subtraído da carrinha assaltada, pois tanto foi confirmado em audiência pela testemunha J… (que era uma das pessoas que foi surpreendida, agredida e manietada pelos arguidos) e por A… (que era o dono daquele valor), em depoimentos que o tribunal recorrido considerou credíveis. Igualmente seguro é que o ponto 15.º da matéria de facto provada continha um erro de escrita, mas já corrigido.

Não obstante sempre se dirá que de acordo com o que dispõe o artigo 410.º CPP existirá vício da decisão recorrida quando, de acordo com um raciocínio lógico na base do seu texto, por si ou conjugado com as regras da experiência comum, seja de concluir que a fundamentação justifica decisão oposta ou não justifica a decisão; ou torna-a fundamentalmente insuficiente, por contradição insanável entre factos provados, entre factos provados e não provados, entre uns e outros e a indicação e a análise dos meios de prova fundamentos da convicção do Tribunal.

Sucede que o acórdão de que se recorre não contém nenhuma contradição lógica entre os factos provados nem entre estes e os não provados, mostrando-se a motivação compreensível e convincente. E a conexão entre a factualidade que o tribunal recorrido julgou provada, os meios de prova em que se baseou e a criteriosa valoração que fez, de harmonia com o princípio da livre apreciação da prova, não se apresenta como logicamente inaceitável, manifestamente errada, impossível de ter acontecido ou violadora das regras da experiência comum.

Com exceção da ressalva já feita, forçoso é concluir pela improcedência destes fundamentos.

3. 1.b) Do recurso de R…

Antes de fazermos a incursão, que naturalmente se impõe, sobre as provas concretas e os detalhes mais relevantes para o juízo sobre a factualidade que vem colocada em crise no recurso de R…, importará precisar, ainda que perfunctoriamente, em que consiste o princípio da livre apreciação da prova, plasmado no artigo 127.º CPP, a que o recorrente amiúde se reporta na crítica à ponderação feira pelo tribunal recorrido e à fundamentação do acórdão.

O referido princípio vem explicitado no direito positivo do seguinte modo: «a prova é apreciada segundo as regras da experiência e a livre convicção da entidade competente».

Esta liberdade de apreciação da prova não se confunde com o arbítrio que parece subjacente à argumentação do recorrente, porquanto assenta em pressupostos valorativos e obedece a critérios de experiência comum e da lógica da pessoa média suposta pela ordem jurídica, estando ainda vinculada aos princípios em que se consubstancia todo o direito probatório.

A liberdade a que o princípio se reporta transcende a pura subjetividade, estando funcionalmente ao serviço da objetividade, em ordem a lograr justamente a verdade (a verdade validamente adquirida). Esta exigência de objetividade é ela própria um princípio de direito, que implica que a formação da convicção só é válida se for fundamentada e, desse modo, ser capaz de se impor aos outros, através da demonstração do processo intelectual e lógico seguido para a afirmação da verdade dos factos, para além de dúvida razoável.

Essa verdade afirmada e deste modo lograda não se confunde, claro está, com uma certeza absoluta, física ou matemática, sendo antes a verdade adquirida em resultado de uma atividade intelectual, humana, assente nas regras da experiência comum, que valoriza os diversos aspetos da vida no seu contexto empírico, moral e histórico.

Neste contexto importa afirmar que o juiz não é um colecionador de declarações de testemunhas, de arguidos, de exames, perícias, documentos, relatórios ou de outros quaisquer meios de prova ou de obtenção de prova, que acriticamente verte na decisão... O que dele se exige é que, para formação da sua convicção, aprecie, racional e criticamente todas as provas, de acordo com as regras comuns da lógica, da razão, da experiência e dos conhecimentos científicos disponíveis.

A factualidade que se julga assente adquire-se no âmbito de um procedimento leal, justo e garantístico para os intervenientes, para isso também integrado pelo estatuto de independência e imparcialidade do órgão que julga, que é o tribunal, único interveniente que não está comprometido com a procedência ou a improcedência das pretensões das «partes», garantindo aos envolvidos e à comunidade um juízo imparcial e distante dos interesses em conflito.

A dado passo o recorrente R… refere que o tribunal a quo considerou provados os factos que o responsabilizam através de um «exercício presuntivo compulsivo e sequencial», desconsiderando elementos probatórios que lhe são favoráveis!

Não tem razão.

O seu envolvimento nos factos em referência é insofismável. Na verdade, sem os atos que praticou na preparação do assalto que veio a ocorrer no dia 11/9/2013 os crimes nunca teriam acontecido.

A descoberta do seu envolvimento nos acontecimentos surge na sequência de ter colocado à venda no OLX cães das mesmas raças dos que haviam sido subtraídos no assalto em referência (fls. 429 e 430).

Os inspetores da Polícia Judiciária contactaram o vendedor (que era ele) e combinaram um encontro, o qual veio a decorrer no dia 14/11/2013, no local indicado pelo arguido: no café … (decl. inspetor C…).

Segundo resulta das informações prestadas pela PT e pela Optimus o e-mail … foi criado em agosto de 2013, tendo terminado a sua utilização no dia do assalto, em 11/9/2013, sendo que o IP (Internet Service Provider ) é de um estabelecimento de restauração sito em … (fls. 354), onde se situa o café «…», sendo que a caixa de correio eletrónico … foi acedido através do IP do café «…», portanto, no próprio café ou nas suas imediações.

Com isto conjuga-se o que foi dito em audiência pelo coarguido É…. É certo que uma parte das declarações deste, por serem efetivamente de ouvir dizer (ao seu irmão, coarguido A…), não podem ser atendidas. E não o podem porque sendo o conhecimento direto de tais factos de A… e tendo este recusado o contraditório em audiência (artigos 129.º e 345.º, § 4.º CPP), está vedada a sua valoração. Mas outra parte das declarações de É… reporta-se ao seu conhecimento direto (que se detalhará), sendo que ao contrário daquele (A…) este respondeu em audiência a todas as perguntas que lhe quiseram fazer.

É… negou a sua participação nos factos, mas declarou ter sido para isso convidado por R…, que o aliciou a juntar-se ao grupo que iria realizar a subtração dos cães. E também disse, em declarações que podem ser validamente valoradas, que posteriormente à realização do assalto, R… lhe mostrou os animais, que se encontravam no sótão da casa dele, onde viu alguns dos cães subtraídos, descrevendo-os como sendo cachorros pequenos, com poucos meses de idade. Ora estas declarações conjugam-se, sem contradição, com as demais provas que ligam o arguido R… aos factos lícitos.

R… já anteriormente tinha comprado cães a A…, sendo que nenhum dos demais arguidos tivera qualquer tipo de relação com esse eslovaco.

E no dia 14/11/2013 foram aprendidos na sua residência pelo menos quatro dos cães pertencentes a A… (cf. certificado intracomunitário de fls. 285 - em que surgem identificados através do n.º do respetivo chip e auto de exame direto aos animais apreendidos em casa do arguido R… - fls. 450).

O recorrente sustenta que não foi produzida nenhuma prova demonstrativa da sua ligação ao endereço de correio eletrónico …, firmando o tribunal a quo a sua convicção afirmativa na presunção, não demonstrada, de que ele é frequentador da «…», não atentando e valorando que houve uma mulher que telefonou para o lesado a partir de um número indicado numa mensagem eletrónica trocada naquele «e-mail»!

Pode o recorrente esgrimir tanto quanto queira que o tribunal fez um exercício presuntivo compulsivo e sequencial, mas o que foi feito, e legitimamente, foi apenas «ligar os pontos» e ver como eles apontam para R…. Convenhamos que o manancial de coincidências» é não só insofismável como tem uma lógica que permite, legitimamente, as inferências feitas (a chamada prova indireta ou por presunção).

Com efeito, pese embora o CPP não contenha normas próprias relativas à prova por presunção, isso não significa que este não seja um meio legítimo de chegar ao facto probando a partir da prova de outros factos que a ele se ligam com segurança, segundo as regras da lógica e da experiência comum.

O Tribunal Constitucional (4) tem-no aceite e reconhecido como meio lícito e não vulnerador dos princípios fundamentais; o mesmo sucedendo com o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, que entende fazerem tais presunções parte do próprio sistema jurídico-penal, não vulnerando o arrigo 6.º da Convenção (5). Não obstante doutrina qualificada alerta que o indício, sem mais, é insuficiente para se considerar provada a autoria do facto criminoso (6).

Destacamos na doutrina a posição recentemente expressa, entre nós, por Susana Aires de Sousa (7), sobre o tema, assinalando justamente que «a prova indireta de um facto consiste em dar esse facto como provado sem que sobre ele exista qualquer meio (direto) de prova. O factum probandum presume-se e dá-se como provado.

Sendo o facto presumido contrário ao arguido, é dever do juiz objetivar o juízo de inferência por si realizado, superando, por essa via, a presunção de inocência de que é titular um arguido em processo penal (…) Na medida em que o facto conhecido (base da presunção) não prova mas antes indicia o facto presumido, a convicção probatória do julgador, admitida pelo artigo 127.º está sujeita ao dever acrescido de fundamentação nos termos do artigo 374.º, n.º 2.»

A prova indireta de um facto tem de fundar-se num facto de partida que está indubitavelmente provado (não pode fundar-se a inferência noutra inferência); os indícios têm de ser contemporâneos do facto a provar, serem independentes e estarem interrelacionados; não podendo haver contraindícios (indícios que apontem noutra direção).

Sendo através da motivação que o julgador torna clara a razão pela qual se convenceu da verificação do factum probandum através do juízo de inferência realizado, para além de qualquer dúvida razoável, só desse modo legitimando a sua decisão (artigo 295.º da Constituição). E foi isso mesmo que fez o tribunal a quo no acórdão recorrido.

O recorrente R… acrescenta que o tribunal a quo o coloca no local dos factos, no dia 11 de setembro de 2013 firmando-se nas declarações de A… e de A…, o que não poderia licitamente fazer, por tal lhe estar vedado pela lei, em razão de não lhe ter sido possível contraditar tais declarações (artigo 345.º, § 4.º CPP). Considera também ser arbitrário o valor fixado relativamente aos cães subtraídos. E que o valor de 20 000€ está sustentado apenas nas declarações do ofendido, sem que haja qualquer documento a corroborar tais declarações. E ainda que não há qualquer prova dos anúncios por si publicados para venda de cães, ou que os cães apreendidos sejam os que foram subtraídos aos ofendidos.

Não tem razão. A todas estas questões a fundamentação da decisão de facto, constante do acórdão recorrido, dá resposta cabal, lógica, convincente e alinhada as regras da experiência comum, sem atropelo de quaisquer regras procedimentais, nomeadamente proibições de valoração de provas, como já se deixou dito supra.

Naturalmente que a explicação constante do acórdão recorrido se não mostra do agrado do recorrente.

Sucede que contrariamente ao que este deixa implícito nas suas alegações, a vida real está cheia de coisas para as quais não há «certificados», nem «documentos», havendo apenas comportamentos humanos, coisas inexplicadas e outras mal explicadas. É um pouco sobre tudo isso que se debruça esclarecidamente a motivação do acórdão recorrido, arrimando-se na segurança da prova produzida e prudentemente conjugada, ponderada, dela retirando as inferências impostas pela lógica que as coisas sempre têm, com o auxílio dos ditames da experiência comum. Explicando com detalhe o processo e os raciocínios empreendidos, incluindo as razões pelas quais se alcançaram os valores que fixou, seja os relativos aos cães, seja o montante de 20 000€ (de modo claro e irrepreensível).

E tudo isso se mostra feito sem vulneração das garantias de defesa do recorrente, pois o tribunal só se serviu da prova validamente produzida. Ressalvando expressamente, e muito bem, as declarações dos arguidos A… e A… relativamente à atuação do recorrente R…

O tribunal também explicou a razão pela qual valorou a posição que o recorrente assumiu e exteriorizou perante os inspetores da Polícia Judiciária numa fase anterior à sua constituição como arguido.

Esclareça-se neste conspecto que de acordo com o que dispõe o § 1.º, al. b) do artigo 356.º CPP só podem ser lidas em audiência declarações prestadas na fase de inquérito ou de instrução que não contenham declarações do arguido. Tal regra alinha coerentemente com a que consta do § 1.º do artigo 357.º do mesmo código, as quais são aplicáveis às declarações dos órgãos de polícia criminal em audiência (por força do disposto no artigo 356.º, § 7.º - ex vi § 3.º do artigo 357.º CPP).

Daí decorre que só nos casos em que as declarações tenham sido reduzidas a escrito, conforme preceituam os artigos 275.º, § 1.º e 99.º CPP, depois da constituição de arguido (artigos 57.º e 58.º CPP), vigora a referida proibição, i. e, só nessa situação os órgãos de polícia criminal que as receberam estão impedidos de testemunhar.

Porém o que sucedeu no presente caso foi que no âmbito das diligências de investigação, a Polícia Judiciária contactou o recorrente – que estava no OLX a oferecer para venda cães com as mesmas características dos que haviam sido subtraídos no assalto em referência - para recolher informações, visando acautelar prova que habilitasse no prosseguimento das investigações.

Isso ocorreu em momento anterior à constituição de arguido. Mas não apenas isso. Tal sucedeu num momento em que não havia razões para crer que ele o viria a ser. Enquadrando-se, por isso mesmo, tais diligências, no âmbito permitido pelos artigos 249.º e 250.º, § 8.º CPP.

Nestes casos não estamos perante verdadeiras declarações processuais, mas antes face a diligência de colheita de informações pelos órgãos de polícia criminal, com vista à aquisição, proteção e conservação da prova, não havendo razão para ser vedado ao tribunal o que então foi percecionado pelos órgãos de polícia criminal, mesmo tratando-se de declarações de alguém que posteriormente veio a ser constituído arguido (8).

As provas não revelam apenas o envolvimento de R… nos factos, evidenciam que ele não foi um participante essencial, o planeador e «convidante» dos demais, que aderiram ao plano por ele gizado e que se tornou comum.

Todas as considerações tecidas pelo tribunal a quo sobre a prova demonstrativa do envolvimento de R… estão corretas, sendo aqui reafirmadas.

Para encerrar este segmento relativo à factualidade impugnada pelo recorrente R… importa ainda esclarecer o preciso significado e operacionalidade do mui verberado (nas alegações de recurso) princípio in dubio pro reo.

Incorre o recorrente num erro muito comum da praxis forense, ao confundir o dito princípio com uma regra de apreciação de meios de prova, no âmbito do artigo 127.º do CPP.

Na verdade o princípio in dubio pro reo está em estreita conexão com a livre apreciação da prova (artigo 127.º CPP) e com a garantia fundamental da presunção de inocência (artigo 32.º, § 2.º Constituição), de que é uma das suas dimensões.

Mas ele não serve para aferir as dúvidas que o recorrente tenha - ou possa ter tido - sobre a matéria de facto, constituindo, antes, uma «regra de decisão na falta de uma convicção para além da dúvida razoável sobre os factos» (9) . Isto é, constitui um princípio geral de incidência probatória, enquanto emanação do princípio da presunção de inocência (10).

O seu âmbito reconduz-se, assim, à valoração pelo julgador de toda a prova produzida. Se o resultado desse processo for uma dúvida - uma dúvida razoável e insuperável sobre a realidade dos factos (objetivos ou subjetivos) -, o juiz decide a favor do arguido, dando como não provado o facto que lhe é desfavorável.

Acompanha-se nesta parte o preclaro segmento de aresto deste mesmo Tribunal da Relação de Évora, para ilustrar o que se vem referindo (11).

Quando no processo racional de decisão sobre a matéria de facto o juiz se depara com uma dúvida resultante de inultrapassável impasse probatório pode ver-se confrontado com três situações:

«- ou tem dúvidas sobre como ocorreram os factos e usa o princípio in dubio pro reo e dá-os como não provados;

- ou constrói um juízo de mera probabilidade de que os factos ocorreram de determinada forma e deve dar os factos incriminatórios como não provados;

- ou, finalmente, tem uma certeza judicial de que os factos ocorreram de determinada forma e dá os factos como provados.»

No caso em apreço neste recurso, pelas razões bastamente descritas na motivação da decisão recorrida e nas considerações que se deixaram supra, não sobra dúvida, não apenas sobre o envolvimento do recorrente R…, como da sua posição de liderança em todos os acontecimentos. Não surgindo, pois, o substrato – a dúvida - que por efeito do princípio in dubio pro reo determinaria que os respetivos factos tivessem/devessem ser julgados não provados.

No respeitante ao número de assaltantes releva o depoimento da testemunha J…, que estava presente e não teve dúvidas em referir terem sido «mais de 3».

4. Erros de julgamento de direito

4.1. Da qualificação jurídica dos factos

Cada um de sua maneira, ambos os recorrentes discordam que dos factos provados resulte a prática dos crimes pelos quais foram condenados; discordando também da qualificação jurídica (no roubo); do concurso efetivo com o crime de sequestro; e a consideração de os bastões apreendidos a A… serem arma proibida.

Vejamos então, começando pelo crime central que é o crime de roubo.

Neste ilícito os elementos objetivos reconduzem-se a uma ação de subtração ou de constrangimento à entrega de coisa móvel; que tem de ser alheia; e com valor venal; por meio de violência, de ameaça ou colocação da vítima na impossibilidade de resistir.

O tipo subjetivo de ilícito é doloso e consiste na ilegítima intenção de apropriação.

Trata-se de ilícito complexo, em que são ofendidos bens jurídicos patrimoniais (como o direito de propriedade e de detenção de coisas móveis), bem assim como bens jurídicos pessoais (como a liberdade individual de decisão e de ação e a integridade física (em certos casos a vida).

Importará para o caso concreto considerar que o conceito de violência a que se refere o tipo legal se mostra concretamente integrado pela exibição de armas de fogo e consequente ameaça (o que consiste numa forma de violência psíquica com a especificidade de constranger através do medo, gerando inquietação e insegurança, afetando a liberdade de decisão e ação das vítimas), mas também pelas agressões físicas perpetradas com os tacos de basebol.

A exibição das armas de fogo e o valor subtraído remetem para a agravação prevista no § 2.º (al. b) do artigo 210.º CP, com referência às als. a) e f) do § 2.º do artigo 204.º e 202.º, al. b), todas do mesmo código.

Pese embora os arguidos tenham exercido violência sobre as duas pessoas que se transportavam na carrinha assaltada e se tenham apoderado dos bens que transportavam e que estavam à sua guarda, não pode, ainda assim, sustentar-se o juízo feito na 1.ª instância de se estar perante dois crimes de roubo, mas apenas de um (12), pois apesar de, como referido, este ilícito tutelar de modo instrumental ou reflexo bens jurídicos de natureza pessoal, o seu núcleo essencial, capaz de atuar como padrão crítico da incriminação, é a propriedade.

Atente-se ainda que o plano traçado pelos arguidos começa a revelar-se logo com a criação do endereço de correio eletrónico, com dados idóneos a dar uma aparência de credibilidade (como se depreende do depoimento de G…), a que se seguiu o contacto estabelecido com o vendedor dos cães.

O plano era, pois, o de se apoderarem dos cães encomendados, sem terem de pagar por eles, isto é, de subtraírem os cães ao seu legítimo dono.

Os acontecimentos seguiram o curso traçado na sequência da troca de mensagens por e-mail com o vendedor dos canídeos (através do endereço eletrónico forjado) e depois, no próprio dia concertado para a conclusão do «negócio», via telefónica.

Como planeado os arguidos lograram que os empregados do vendedor, encarregados por este de proceder à entrega dos canídeos e recebimento do preço acordado, levassem a viatura onde transportavam os animais até ao local por eles escolhido para a consumação da subtração.

No local ermo escolhido, após paragem dos veículos e encontro dos arguidos com os empregados do vendedor dos animais, aqueles logo trataram de manietar estes e de os encerrar no barracão ali existente.

Logo após os arguidos dirigiram-se à carrinha para dela retirarem os canídeos. E, como a ocasião faz o ladrão, o plano inicial estendeu-se ao deitar de mão a todos os bens de valor nela existentes.

Isso, porém, não altera o plano de ação de subtração, mantendo-se este sujeito a uma única resolução, relevando do ponto de vista penal, a circunstância de haver um único lesado, pois o objeto da ação é a realidade lesada com a prática da conduta típica, daí resultando a comissão de um único crime de roubo.

Com efeito, no quadro da causalidade adequada, relevam apenas as condições que segundo as máximas da experiência ou da normalidade do acontecer são idóneos a produzir o resultado (artigo 10.º, § 1.º CP) (13). Isto é, quaisquer consequências imprevisíveis ou anómalas (como sucedeu neste caso com a circunstâncias de os telemóveis de que se apoderaram serem, afinal, dos empregados do lesado A… e não deste) mostram-se juridicamente irrelevantes para a imputação objetiva do facto ao agente.

Em linha com o juízo efetuado no acórdão recorrido, também consideramos que o aludido crime de roubo está em concurso efetivo com dois crimes de sequestro, previstos no artigo 158.º, § 1.º CP.

O crime de sequestro tutela justamente a liberdade ambulatória ou de locomoção, isto é, a capacidade de cada um se fixar ou movimentar livremente no espaço físico contra a ilícita restrição por qualquer forma ou medida temporal desse direito (com ressalva das que de tão diminuta relevância, possam ser consideradas bagatelas, fora do âmbito de proteção da norma).

O lugar do confinamento tanto pode ser um imóvel (urbano, rústico, uma parte de um deles, um quarto, etc.) como um móvel com viabilidade de confinamento (como um automóvel, um barco, uma caravana de campismo, etc.). Não sendo necessário que a impossibilidade de a pessoa se libertar seja absoluta ou invencível, basta que o meio utilizado constitua um impedimento sério (14).

Trata-se de um crime duradouro na medida em que se consuma com a efetiva privação da liberdade e só termina com a libertação da vítima. E no respeitante ao elemento subjetivo exige-se o dolo, isto é, o conhecimento da ilicitude da conduta e a vontade de a praticar, bastando-se a lei com o dolo genérico em qualquer das suas formas (artigo 14.º CP).

Nas circunstância do caso este ilícito mostra-se autónomo relativamente ao crime de roubo, em razão de a privação da liberdade dos dois ofendidos ter ultrapassado a medida necessária è efetivação da subtração, isto é por se ter estendido (muito) para além da que seria necessário à apropriação dos bens e valores subtraídos (15).

O acórdão recorrido condenou o recorrente A… como autor de um crime de detenção de arma proibida, previsto na al. d) do § 1.º do artigo 86.º do Regime Jurídico das Armas e suas Munições (Lei n.º 5/2006, de 23 de fevereiro), onde se dispõe:

«1. Quem, sem se encontrar autorizado, fora das condições legais ou em contrário das prescrições da autoridade competente, detiver, transportar, importar, transferir, guardar, comprar, adquirir a qualquer título ou por qualquer meio ou obtiver por fabrico, transformação, importação, transferência ou exportação, usar ou trouxer consigo: (…)

d) (…) ou engenhos ou instrumentos sem aplicação definida que possam ser usados como arma de agressão e o seu portador não justifique a sua posse (…)»

O crime de detenção de arma proibida consiste, simultaneamente, num crime de perigo comum e de perigo abstrato. De perigo comum, na medida em que é suscetível de provocar um dano não controlável, difuso, com potência expansiva, que pode ofender vários bens jurídicos e várias vítimas; e de perigo abstrato, porquanto, para a sua consumação não é necessária a lesão do bem jurídico tutelado, bastando-se com a mera colocação em perigo do mesmo, sendo certo que a produção ou verificação do perigo não é elemento do tipo, pelo que a conduta do agente é punida independentemente da efetiva criação de perigo (ao contrário do que sucede nos crimes de perigo concreto).

O bem jurídico protegido por esta incriminação consiste na ordem, segurança e tranquilidade públicas, mas igualmente, ainda que de modo indireto, a vida, a integridade física dos membros da comunidade, «face aos riscos sérios que derivam da livre circulação e detenção, porte e uso de armas» (16).

Para a comissão deste ilícito é indispensável que inexista autorização para a conduta do agente ou que este haja sobre o objeto fora das condições legais ou que contrarie as prescrições de autoridade competente, que consiste no elemento negativo do tipo (17).

Nesta parte não podemos acompanhar o entendimento seguido no acórdão recorrido, pois que, contrariamente ao que nele se decidiu consideramos que a lei (concretamente o normativo extratado) não abrange os tacos de basebol.

Está claro que os tacos de basebol podem ser (indevidamente) utilizados como arma, mas não é seguramente essa a sua finalidade, não é para isso que são fabricados e comercializados. É ademais bastamente conhecida a sua função lícita. Idêntica situação ocorre com as facas de cozinha, que têm uma função lícita, que é conhecida, e que estão à venda em qualquer parte e acessíveis a toda a gente. Mas nada garante que o seu dono ou simples detentor as utilizem como armas de agressão.

Acompanhamos nesta parte a interpretação feita neste mesmo sentido p. ex. no acórdão o Tribunal da Relação de Lisboa, de 7/7/2015, no proc. 596/13.7PZLSB.L1-5, em que foi relator o Des. José Adriano, e concluímos que não integrando os tacos de basebol qualquer outra das definições contidas na norma incriminadora, a guarda pelo arguido, em sua casa, de dois tacos de basebol (um metálico e outro de madeira), não integra os elementos objetivos do crime de detenção de arma proibida, ainda que, como é aqui o caso, o seu detentor não seja praticante da modalidade desportiva que lhes está associada.

Termos em que o arguido A… deverá ser absolvido da prática deste ilícito.

4.2. Da comparticipação criminosa

Ambos os recorrentes suscitam questões relativamente à imputada autoria dos crimes de roubo e sequestro.

A… alega não lhe poder ser imputada a prática de tais crimes porquanto a sua atuação se circunscreveu ao carregamento dos cães para o carro e ao recebimento (das mãos do arguido R…) de 500€, pelo que terá sido cúmplice no crime de roubo e não coautor.

R…, por seu turno, para além de alegar a consunção do sequestro no crime de roubo qualificado (questão já resolvida), suscitou a questão de não lhe poder ser oponível a agravante do crime de roubo, quer porque o valor dos bens subtraídos ter sido inferior a 50€ (!), quer porque não utilizou nenhuma arma, nem pretendia que as mesmas fossem utilizadas. Mais sustentando que como também não foi ele quem praticou os atos materiais do confinamento dos ofendidos, não poderá ser considerado autor dos crimes de sequestro.

Algumas destas questões estão já resolvidas na fixação dos factos provados, onde ficou definida a atuação de cada um dos recorrentes, aí se incluindo o modo de participação dos arguidos nos factos e a questão do valor dos bens subtraídos.

O tribunal a quo considerou os arguidos/recorrentes como sendo coautores do crime de roubo agravado e dos crimes de sequestro. E considerou bem.

A comparticipação criminosa no direito português pode assumir duas formas: a coautoria, prevista no artigo 26.º do Código Penal («… tomar parte direta na sua execução, por acordo ou juntamente com outro ou outros…») e a cumplicidade, prevista no artigo 27.º do mesmo código («… prestar auxílio (…) à prática por outrem de facto doloso»).

Resulta da primeira das disposições legais citadas que várias pessoas podem ser coautores, tomando parte direta na execução, por acordo ou juntamente com outro ou outros. Enquanto o autor singular executa o facto por si mesmo; o coautor toma parte direta na sua execução – e fá-lo por acordo ou juntamente com outro ou outros - sem que seja necessário que cada um dos agentes intervenha em todos os atos correspondentes à norma penal violada, podendo executá-lo só parcialmente. Indispensável é que essa atuação se integre no todo com vista à produção do resultado.

O que verdadeiramente releva é que cada comparticipante desempenhe uma função essencial na execução do plano, ainda que na sua execução a intervenção de algum dos intervenientes seja apenas parcial. Tanto é o bastante para que o ilícito lhe seja integralmente imputado (18).

A componente subjetiva da coautoria reside na decisão conjunta; e a objetiva na execução também conjunta. «Tudo acaba por recair, em suma, no significado externo de que a realização acordada se reveste, nomeadamente nas características do papel ou da função que a cada autor é distribuído na execução total do facto. Este deve surgir por forma que o contributo de cada um para o facto apareça não como mero favorecimento de um facto alheio, mas como uma parte da atividade total. E, correspondentemente, as ações dos outros se revelem como um complemento da sua participação própria. Nesta medida não ficará a priori excluído que o referido acordo possa ser apenas “implícito” – sempre que a situação externo-objetiva só possa ser interpretada como ajuste espontâneo num comportamento comum (…) Essencial é a ideia segundo a qual o princípio do domínio do facto se combina aqui com a exigência de uma repartição de tarefas, que assinala a cada comparticipante contributos para o facto que, podendo situar-se fora do tipo legal de crime, tornam a execução do facto dependente daquela mesma repartição.» (19)

Por sua vez, a cumplicidade é a forma de participação que favorece (o cúmplice auxilia, presta auxílio material ou moral) a prática pelo autor do facto ilícito doloso.

O auxílio material «consiste na entrega de meios ou instrumentos ao autor que favoreçam a realização do facto.» (20) E o auxílio moral reporta-se ao aconselhamento quanto ao modo da prática do facto ou de um qualquer dos seus segmentos ou ao fortalecimento do plano já idealizado pelo autor.

«A cumplicidade liga-se sempre a uma concreta conduta de outrem, ou, quanto muito, a um facto doloso que outrem já começou a realizar e ainda está cometendo. É neste sentido que dizemos que ligada à responsabilização do cúmplice existe uma acessoriedade que também é de ordem "lógica" (…) Os cúmplices são meros auxiliares que não executam o facto, não realizam o tipo de ilícito, a sua intervenção nele é acessória, depende da existência de um outro personagem na execução dum facto doloso.» (21)

Revertendo ao caso concreto, com referência à factualidade provada, temos que os recorrentes, conhecedores do caráter ilícito da sua conduta, praticaram ambos atos que consideraram necessários para o sucesso da atividade ilícita que resolveram empreender, realizando cada um a parte que neles lhe competia, sendo-lhes imputáveis todos os factos que integraram a ação criminosa como coautores.

4.3. Da medida das penas

Ambos os recorrentes consideram que as penas aplicadas na 1.º instância são excessivas.

Recordemos as que lhes foram aplicadas, importando agora, apenas, as penas parcelares relativas aos crimes efetivamente cometidos, nos termos que foram fixados supra, uma vez que a pena única resultante do concurso de crimes haverá necessariamente de ser fixada ex novo, em sequência da redução dos ilícitos criminais pelos quais cada um dos recorrentes é responsável.

A… é coautor de um crime de roubo qualificado, previsto no artigo 210.º, § 1.º e 2.º, al. b), por referência às alíneas a) e f), do § 2.º do artigo 204.º CP; e coautor de dois crimes de sequestro, previstos no 158.º, § 1.º CP. No acórdão recorrido foi-lhe aplicada uma pena de 6 anos de prisão pelo crime de roubo e duas penas de 2 anos de prisão por cada um dos crimes de sequestro.

R… é coautor dos mesmos crimes de roubo e de sequestro, tendo-lhe sido aplicadas as mesmas penas que a A….

Sobre a graduação das penas dos arguidos o tribunal recorrido ponderou as seguintes circunstâncias:

«As necessidades de prevenção geral afiguram-se muitíssimo acentuadas, atentos os bens jurídicos violados pelos crimes cometidos pelos arguidos, os quais tutelam, quer bens patrimoniais, quer bens pessoais.

Como tal, a prática reiterada deste tipo de crimes coloca em causa a vida em comunidade e a confiança dos indivíduos nas relações interpessoais, contribuindo para um clima de instabilidade e insegurança social e pública, a que urge pôr cobro.

O grau de ilicitude das condutas praticadas pelos arguidos é elevadíssimo atenta a violência plasmada pela sua conduta e que a factualidade prova[da] ilustra.

Acresce a isto as lesões sofridas pelo queixoso J… que foi sujeito a intervenção médica e tratamento.

A culpa dos arguidos é intensa, já que deliberadamente quiseram praticar os factos, agindo com dolo direto.

No que tange às necessidades de prevenção especial e conduta posterior à prática dos factos de cada um dos Arguidos, importa reter o seguinte:

(…)

- O arguido A… encontra-se profissionalmente inserido, há pelo menos um ano, mas conta com um vasto rol de condenações anteriores pela prática de crime de diversa natureza, que vão desde furtos simples e qualificados, a ofensa à integridade física simples até detenção de arma proibida. Chegou, inclusivamente, a cumprir pena de prisão efetiva, reincidindo na prática de crimes, o que significa que as finalidades subjacentes às punições anteriores não foram alcançadas. Milita, contudo, a favor deste arguido o facto de ter reconhecido a sua conduta e a sua intervenção nos factos e ter colaborado para a descoberta da verdade material através da sua participação na prova por reconstituição.

- No tocante ao arguido R…, este encontra-se social e familiarmente inserido e é primário. Contudo, não houve qualquer reconhecimento dos factos, nem colaboração com a descoberta da verdade material, ao contrário dos demais arguidos.»

Vejamos, então.

Do que verdadeiramente se trata em sede de recurso no concernente à escolha e medida das penas, é da reapreciação pelo tribunal ad quem do respeito e consideração pelo tribunal a quo dos princípios constitucionais e legais, regras e vetores relevantes para a determinação da medida da pena.

Como refere e sublinha a doutrina de referência, esta reapreciação não abrange «a determinação, dentro daqueles parâmetros, do quantum exato de pena, exceto se tiverem sido violadas regras da experiência ou se a quantificação se revelar de todo desproporcionada» (22).

Isto é, «o tribunal ad quem não julga de novo, não determina a pena como se inexistisse uma decisão de primeira instância, e a sindicância dessa decisão (de primeira instância) pelo tribunal superior não abrange a fiscalização do quantum exato de pena que, decorrendo duma correta aplicação das regras legais e dos princípios legais e constitucionais, ainda se revele proporcionada. E não inclui ainda a compressão da margem de apreciação livre reconhecida ao tribunal de primeira instância enquanto componente individual do ato de julgar, sendo que a margem de liberdade do juiz de julgamento nos limites expostos, abrange todo o processo prático de decisão sobre a pena.» (23)

Os princípios e regras que norteiam esta matéria são essencialmente os seguintes:

- A finalidade das penas é a de proteger bens jurídicos e reintegrar o agente na sociedade, não podendo a pena exceder a medida da culpa do infrator (artigo 40.º CP). Ensina Figueiredo Dias (24), que «toda a pena serve finalidades exclusivas de prevenção, geral e especial; a pena concreta é limitada no seu máximo inultrapassável pela medida da culpa; dentro desse limite máximo ela é determinada no interior de uma moldura de prevenção geral de integração, cujo limite superior é oferecido pelo ponto ótimo de tutela dos bens jurídicos e cujo limite inferior é constituído pelas exigências mínimas de defesa do ordenamento jurídico; dentro desta moldura de prevenção geral de integração a medida da pena é encontrada em função das exigências de prevenção especial, em regra positiva ou de socialização, excecionalmente negativa, de intimidação ou de segurança individuais.»

- A determinação da medida da pena, dentro dos limites definidos na lei, é feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção (artigo 71.º do CP). A culpa aqui em referência reporta-se à censura dirigida ao agente por referência à prática do facto ilícito, que consiste na desaprovação da sua atitude interna face às exigências do dever ser sociocomunitário. E as exigências de prevenção reportam-se à prevenção geral e à prevenção especial: aquela traduzida pela necessidade de tutela da confiança e das expectativas da comunidade na manutenção da vigência da norma violada (sendo por isso uma razoável forma de expressão afirmar como finalidade primária da pena o restabelecimento da paz jurídica comunitária abalada pelo crime); e esta, numa vertente positiva ou de socialização, que se traduz na oferta ao arguido das condições para prevenir a reincidência (25). A doutrina vem consistentemente densificando estes conceitos e o modo como eles operam conjugadamente, referindo que: «dentro da moldura ou dos limites consentidos pela prevenção geral positiva ou de integração – entre o ponto ótimo e o ponto ainda comunitariamente suportável de medida da tutela dos bens jurídicos (ou de “defesa do ordenamento jurídico”) – devem atuar, em toda a medida possível, os pontos de vista de prevenção especial, sendo sim eles que vão determinar, em última instância, a medida da pena. Isto significa que releva neste contexto qualquer uma das funções que o pensamento da prevenção especial realiza: seja a função positiva de socialização, seja qualquer uma das funções negativas subordinadas de advertência individual ou de segurança ou inocuização. A medida de necessidade de socialização do agente é no entanto, em princípio, critério decisivo das exigências de prevenção especial, constituindo hoje – e devendo continuar a constituir no futuro – o vetor mais importante daquele pensamento (26).»

Temos, pois, que a medida da culpa fixa o máximo que a pena concreta pode comportar; a prevenção geral impõe o limite mínimo da pena em medida ainda suportada pelas expectativas comunitárias face à norma de proteção de bens jurídicos que foi violada; fixando-se depois a medida concreta da pena de acordo com as necessidades de prevenção especial, por referência à ressocialização do infrator e à prevenção de futuros crimes (pelo próprio). Breve: dentre os limites fixados pela medida da culpa (máximo de pena) e pela prevenção geral (mínimo da pena) a prevenção especial virá a determinar o quantum concreto da pena.

Depois destas considerações sobre os referentes normativos, vistos já os parâmetros em que o tribunal a quo balizou a sua avaliação e o resultado a que chegou no processo de determinação da pena concreta, vemos que valorizou as exigências de prevenção geral, o elevado grau da ilicitude (atento o elevado grau de violência envolvido, desnecessária para a concretização da subtração dos bens e valores) e da culpa. Verificamos que considerou quanto a A… a circunstância de ele estar profissionalmente inserido e ter assumido uma atitude colaborante durante todo o processo, mas registando um extenso rol de antecedentes criminais. E que relativamente a R… considerou a circunstância de este ser primário.

Compreende-se bem a razão pela qual foram graduadas as penas dos dois arguidos em medida idêntica, pois que se por um lado um deles teve atitude colaborante (que mais que um indício é já uma evidência de se ter encetado o processo de reinserção), mas regista extensos antecedentes criminais; o outro, sendo primário, não assumiu minimamente a sua responsabilidade, evidenciando com isso uma maior necessidade da pena.

Efetivamente as exigências de prevenção geral mostram-se elevadas, sobretudo em razão dos antecedentes criminais de um (A…) por as anteriores condenações não se terem mostrado suficientes para o arredar da prática de novos crimes; sendo a primariedade criminal de outro (R…) pouco relevante, na medida da sua liderança, evidente, na preparação do assalto, tendo sido também o maior beneficiado dos ilícitos. Estas diferenças como que equilibram as necessidades de pena, como bem considerou o tribunal a quo.

O crime de roubo agravado é punível com pena de prisão de 3 a 15 anos; e o crime de sequestro com pena de prisão até 3 anos ou com pena de multa (de 10 a 360 dias – artigo 47.º, § 1.º CP).

As circunstâncias referidas relativas aos antecedentes criminais de A… e a atitude assumida por R… evidenciam que a pena de multa é desajustada para a punição dos crimes de sequestro.

A ponderação feita na 1.ª instância sobre a medida das penas de prisão fixada relativamente a cada um dos ilícitos e a cada um dos arguidos (6 anos de prisão pelo crime de roubo agravado e 2 anos de prisão por cada um dos crimes de sequestro cometidos) mostra-se conforme aos princípios supra enunciados, pelo que não há nenhuma razão para as alterar.

Impõe o artigo 77.º, § 1.º CP no âmbito do princípio da unidade da pena que quando alguém tiver praticado vários crimes antes de transitar em julgado a condenação por qualquer deles é condenado numa pena única, seno o que importa agora realizar.

Ao contrário de outros o nosso sistema penal não optou pelo somatório de penas em concurso; antes entendeu dever ficcionar-se uma conduta global a punir com uma pena única.

Importa, pois, fixar a pena única relativa ao concurso dos três crimes cometidos por cada um dos arguidos/recorrentes, a qual se forma através da avaliação do conjunto dos factos e da personalidade do agente.

Tudo deverá passar-se «como se o conjunto dos factos fornecesse a gravidade do ilícito global perpetrado, sendo decisivo para a sua avaliação a conexão e o tipo de conexão que entre os factos concorrentes se verifique. Na avaliação da personalidade – unitária – do agente relevará, sobretudo, a questão de saber se o conjunto dos factos é reconduzível a uma tendência (ou eventualmente mesmo a uma “carreira”) criminosa, ou tão só a uma pluriocasionalidade que não radica na personalidade: só no primeiro caso, não já no segundo, será cabido atribuir à pluralidade de crimes um efeito agravante dentro da moldura penal conjunta. De grande relevo será também a análise do efeito previsível da pena sobre o comportamento futuro do agente (exigências especiais de socialização).» (27)

Considerando as penas parcelares relativas a cada um dos crimes integrados no concurso, a moldura abstrata deste, nos termos do artigo 77.º, § 2.º CP, é relativamente a cada um dos arguidos, de 6 anos de prisão (a medida da pena concreta parcelar mais elevada) a 10 anos (a soma das penas a cumular).

Tem-se em consideração a gravidade do conjunto dos factos praticados por cada um dos arguidos, nos termos já supra expostos, extraindo-se desse conjunto a gravidade do ilícito global perpetrado. Neste conspecto verifica-se que ambos os arguidos praticaram os crimes em referência, no mesmo dia e no mesmo contexto. Assim, atendendo à gravidade e às circunstâncias atinentes à globalidade dos factos praticados, à natureza dos crimes praticados e à personalidade evidenciada nos mesmos por cada um deles e no mais que evidencia o percurso de vida de cada um, a pena única deverá fixar-se para cada um dos arguidos em 7 anos e 6 meses de prisão.

Termos em que o recurso procederá parcialmente.

III – Decisão

Destarte e por todo o exposto:

a) Alteramos a redação do ponto 15.º da matéria e facto provada nos seguintes termos: «Após, munidos de dois tacos de basebol, os arguidos A… e A… desferiram várias pancadas nas pernas de J…, visando imobilizá-lo.»

b) Absolvemos ambos os recorrentes (A… e R…) da prática de um crime de roubo agravado, previsto no artigo 210.º, § 1.º e 2.º, al. b) do Código Penal, com referência às alíneas a) e f) do § 2.º do artigo 204.º do mesmo código, por referência ainda ao artigo 202.º, al. b) CP.

c) Absolvemos o arguido/recorrente A… da prática do crime de detenção de arma proibida, previsto na al. d) do § 1.º do artigo 86.º da Lei n.º 5/2006, de 23 de fevereiro (Regime Jurídico das Armas e suas Munições).

d) Mantemos a condenação de cada um dos arguidos/recorrentes (A… e R…), como coautores de um crime de roubo, previsto no artigo 210.º, § 1.º e 2.º, al. b), por referência às alíneas a) e f), do § 2.º do artigo 204.º do Código Penal, na pena de 6 anos de prisão; e como coautores de dois crimes de sequestro, previstos no 158.º, § 1.º CP, nas penas de 2 anos de prisão por cada um desses crimes.

e) Em cúmulo jurídico condenamos o arguido/recorrente A… na pena única de 7 anos e 6 meses de prisão.

f) Em cúmulo jurídico condenamos o arguido/recorrente R… na pena única de 7 anos e 6 meses de prisão.

g) Mantemos no mais o douto acórdão recorrido.

h) Sem custas (artigo 513.º, a contrario sensu)

Évora, 12 de janeiro de 2021

J. F. Moreira das Neves (relator)

José Proença da Costa

Assinado eletronicamente

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1 Os «saltos» na ordenação numérica provêm do original»!

2 Cf. acórdão do STJ n.º 7/95, de 19/10/1995 (Fixação de Jurisprudência), publicado no DR, I-A, de 28/12/1995.

3 Artigos 357.º n.º 1, alínea b), 141.º n.º 1, alínea b), 144.º n.º 1, todos do C.P.P.

4 Acórdãos n.ºs 391/2015, de 12 de agosto e 521/2018, de 17 de outubro: www.tribunalconstitucional.pt

5 Guide on Article 6 of the European Convention on Human Roghts (2018), em: www.echr.coe.int/Documents/Guide_Art_6_criminal_ENG.pdf

6 Roxin/Schünmann, cit. por Susana Aires de Sousa, Prova Indireta e Dever Acrescido de Fundamentação da Sentença Penal, Estudos de Homenagem ao Professor Doutor Germano Marques da Silva, Universidade Católica Editora, Vol. IV, pp. 2753 ss.

7 Ob. cit. pp. 2272.

8 Neste sentido cf. (acervo indicado por Ana Margarida de Andrade Guerreiro Lima, EBook CEJ, «Declarações informais, prova testemunhal e o regime dos artigos 355.º e 356.º CPP», pp. 191/192).

Na Doutrina:

António Pires Henriques da Graça, «Processo Penal Português – Questões de Prova», apresentação decorrida no âmbito da ação de formação «Produção, apreciação e valoração da prova em julgamento no processo penal», no Auditório do Edifício-Sede da Polícia Judiciária (Lisboa), a 13 de março de 2015, acessível em

http://www.cej.mj.pt/cej/recursos/ebooks/penal/eb_DireitoProcessoPenal.pdf, págs. 53-55.

Na Jurisprudência:

o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 22-04-2004, relatado pelo Conselheiro António Pereira Madeira, no processo com o n.º 902/04, in Coletânea de Jurisprudência, n.º 176, Tomo II/2004, Ref.ª 2159/2004;

o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 15-02-2007, relatado pelo Conselheiro Maia Costa, no processo com o n.º 06P4593, acessível em

http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/e37981209a994f61802572de0048308e?OpenDocument ;

o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 03-03-2010, relatado pelo Conselheiro Santos Cabral, no processo com o n.º 886/07.8PSLSB.L1.S1, acessível em

http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/25061d49157a048c8025770a002ed7d7?OpenDocument;

o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 27-06-2012, relatado pelo Conselheiro Santos Cabral, no processo com o n.º 127/10.0JABRG.G2.S1, acessível em

http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/318098074779316080257aa100366960?OpenDocument;

o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 12-12-2013, relatado pelo Conselheiro Santos Cabral, no processo com o n.º 292/11.0JAFAR.E1.S1, acessível em

http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/2210e8876cb60c2580257c6200337ff3?OpenDocument;

o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 13-12-2012, relatado pelo Desembargador João Carrola, no processo com o n.º 7/11.2GBSNT-A.L1, in Coletânea de Jurisprudência, n.º 241, Tomo V/2012, Ref.º 8385/2012;

o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 08-03-2017, relatado pela Desembargadora Maria Graça Santos Silva, no processo com o n.º 716/15.7PCAMD.L1-3, acessível em

http://www.dgsi.pt/jtrl.nsf/33182fc732316039802565fa00497eec/1527d84b4e8f85ef802580fb002ec2e6?OpenDocument;

o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 22-06-2017, relatado pela Desembargadora Filipa Costa Lourenço, no processo com o n.º 320/14.7GCMTJ.L1-9, acessível em

http://www.dgsi.pt/jtrl.nsf/33182fc732316039802565fa00497eec/874635a6242dfe2d8025814800742c29?OpenDocument;

o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 08-05-2018, relatado pelo Desembargador João Carrola, no processo com o n.º 74/16.2SRLSB.L1-5, acessível em

http://www.dgsi.pt/jtrl.nsf/33182fc732316039802565fa00497eec/b90fa2e6535ed106802582b000545825?OpenDocument;

o Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, de 06-02-2017, relatado pela Desembargadora Ausenda Gonçalves, no processo com o n.º 564/14.1PBCHV.G1, acessível em

http://www.dgsi.pt/jtrg.nsf/86c25a698e4e7cb7802579ec004d3832/2c1e25fbe8482b3c802580c70050c195?OpenDocument;

o Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, de 10-09-2018, relatado pela Desembargadora Clarisse Gonçalves, no processo com o n.º 1221/16.0JABRG.G1, acessível em

http://www.dgsi.pt/jtrg.nsf/86c25a698e4e7cb7802579ec004d3832/51123f8b7ab8de6180258314002fc9d3?OpenDocument;

o Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 18-06-2003, relatado pelo Desembargador António Jorge Fernandes de Oliveira Mendes, no processo com o n.º 1674/03, in Coletânea de Jurisprudência, n.º 167, Tomo III/2003, Ref.ª 8402/2003;

o Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 30-03-2011, relatado pelo Desembargador Alberto Mira, no processo com o n.º 370/08.2TACVL.C1, acessível em

http://www.dgsi.pt/jtrc.nsf/c3fb530030ea1c61802568d9005cd5bb/f06044e3470f33bf8025786c0049d2ce?OpenDocument;

o Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 09-05-2012, relatado pelo Desembargador Jorge Dias, no processo com o n.º 12/11.9PECTB.C1, acessível em

http://www.dgsi.pt/jtrc.nsf/8fe0e606d8f56b22802576c0005637dc/120fb32215852a9980257a0f004f9bfa?OpenDocument;

o Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 26-06-2013, relatado pelo Desembargador Correia Pinto, no processo com o n.º 220/11.2GBTND.C1, acessível em

http://www.dgsi.pt/jtrc.nsf/c3fb530030ea1c61802568d9005cd5bb/25e0b70f975bfaad80257b9b003b15a8?OpenDocument;

o Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 11-09-2013, relatado pelo Desembargador José Eduardo Martins, no processo com o n.º 71/11.4GCALD.C1, acessível em

http://www.dgsi.pt/jtrc.nsf/8fe0e606d8f56b22802576c0005637dc/7283d711cb27b0ac80257be50046626f?OpenDocument;

o Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 18-06-2014, relatado pelo Desembargador Jorge Dias, no processo com o n.º 356/12.2SAGRD.C1, acessível em

http://www.dgsi.pt/jtrc.nsf/c3fb530030ea1c61802568d9005cd5bb/94115938033f251980257d0000389cab?OpenDocument;

o Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 16-06-2015, relatado pela Desembargadora Cacilda Sena, no processo com o n.º 360/10.5EACBR.C1, acessível em

http://www.dgsi.pt/jtrc.nsf/8fe0e606d8f56b22802576c0005637dc/82a46d691c727cdf80257e690047bfbb?OpenDocument;

o Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 07-10-2015, relatado pela Desembargadora Maria José Nogueira, no processo com o n.º 174/13.0GAVZL.C1, acessível em

http://www.dgsi.pt/jtrc.nsf/8fe0e606d8f56b22802576c0005637dc/9c82a23d055d5ca280257ed900336b17?OpenDocument;

o Acórdão do Tribunal da Relação de Évora, de 07-04-2015, relatado pelo Desembargador Clemente Lima, no processo com o n.º 79/14.8PFSTB.E1, acessível em

http://www.dgsi.pt/jtre.nsf/134973db04f39bf2802579bf005f080b/776295135ee43bde80257e2e003edcf3?OpenDocument;

o Acórdão do Tribunal da Relação de Évora, de 07-04-2015, relatado pelo Desembargador João Gomes de Sousa, no processo com o n.º 1161/11.9PBFAR, acessível em

http://www.dgsi.pt/jtre.nsf/134973db04f39bf2802579bf005f080b/52a78f1bfffd93f380257e2e00356d38?OpenDocument;

o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 17-06-2015, relatado pelo Desembargador Artur Oliveira, no processo com o n.º 543/12.3PDPRT.P1, acessível em

http://www.dgsi.pt/jtrp.nsf/56a6e7121657f91e80257cda00381fdf/6897eb5e972d450f80257e75004b4f62?OpenDocument ;

o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 30-09-2015, relatado pelo Desembargador Jorge Langweg, no processo com o n.º 17135/08.4TDPRT.P1, acessível em

http://www.dgsi.pt/jtrp.nsf/56a6e7121657f91e80257cda00381fdf/bf58702eedc24f2b80257ede0046dfa8?OpenDocument .

9 Jorge de Figueiredo Dias, Direito Processual Penal, pp. 215. Tb. Cristina Líbano Monteiro, Perigosidade de Inimputáveis e In Dubio Pro Reo, Almedida, 2019, pp..

10 Cavaleiro Ferreira, Curso de Processo Penal, tomo II, pp. 316.

11 Cf. Acórdão deste Tribunal da Relação de Évora de 3/8/2018, no proc. 1360/14.IT9STB.E1, Des. Gomes de Sousa.

12 Neste sentido cf. Conceição Ferreira da Cunha, Comentário Coninbricense do Código Penal, 1999, Coimbra Editora, pp. 180 (§ 63.º); e Paulo Pinto de Albuquerque, Comentário do Código Penal, 2008, Universidade Católica Editora, pp. 581 (anotação 26.ª).

13 Jorge de Figueiredo Dias, Direito Penal, parte geral, tomo I, 3.ª Edição, Gestlegal, 2019, pp. 382 ss.; Manuel Cavaleiro de Ferreira, Lições de Direito Penal, Parte Geral. I, Editorial Verbo, 1988, pp. 81 ss.

14 Américo Taipa de Carvalho, Comentário Coninbricence do Código Penal, parte especial, Tomo I, 2.ª Ed., 2012, pp. 641 ss.

15 Neste sentido cf. Conceição Ferreira da Cunha, Comentário Coninbricense do Código Penal, parte especial, tomo II, 1999, Coimbra Editora, pp. 177 (§ 54º); e Paulo Pinto de Albuquerque, Comentário do Código Penal, 2008, Universidade Católica Editora, pp. 427 (anotação 24.ª).

16 Cf. Paulo Pinto de Albuquerque e outros, Comentário das Leis Penais Extravagantes, vol. I, 1.ª ed., 2010, Universidade Católica Portuguesa, pp. 240.

17 Idem.

18 Neste exato sentido cf. Ac. TRÉvora, de 9/10/2012, proc. 449/10.0JAFAR.E1 (Des. Proença da Costa). No mesmo sentido cf. Jescheck, Tratado de Derecho Penal, 5.ª Edición, Comares Editorial, 2003, pp. 731.

19 Jorge de Figueiredo Dias, Direito Penal, parte geral, tomo I, 3.ª Edição, Gestlegal, 2019, pp. 924/925 e 927.

20 Paulo Pinto de Albuquerque, Comentário do Código Penal, 2008, Universidade Católica Editora, pp. 127 (anotação 1.ª).

21 M. Miguez Garcia, O risco de comer uma sopa e outros casos de Direito Penal, Elementos da Parte Geral (§ 19º Autoria e comparticipação), 2007. No mesmo sentido Jorge de Figueiredo Dias, Direito Penal, parte geral, tomo I, 3.ª Edição, Gestlegal, 2019, pp. 960 ss.

22 Jorge de Figueiredo Dias, Direito Penal Português – As Consequências Jurídicas do Crime, pp. 197, Aequitas – Editorial Notícias, 1993.

23 DSum. TRE, 20/2/2019, Ana Brito, proc. 1862/17.8PAPTM.E1 e também Ac. TRÉvora, de 16jun2015, proc. 25/14.9GAAVS.E1. Des. Clemente Lima; e Ac. TRCoimbra, de 5abr2017, proc. 47/5.2IDLRA (estes dois indicados no parecer do Ministério Público junto deste Tribunal de recurso).

24 Jorge de Figueiredo Dias, Direito Penal, Parte Geral, Tomo I, Coimbra Editora, 3.ª ed., 2019, pp. 96.

25 «Por reforço dos standards de comportamento e de interação na vida comunitária (condução da vida “de forma socialmente responsável”)» - Jorge de Figueiredo Dias, Direito Penal Português – As Consequências Jurídicas do Crime, pp. 74, 110 e 238 ss., Aequitas – Editorial Notícias, 1993. Também Maria João Antunes, Consequências Jurídicas do Crime, Lições aos alunos de Direito Penal III, da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, 2010-2011, pp. 31 e ss

26 Jorge de Figueiredo Dias, Direito Penal, Parte Geral, tomo I, Gestlegal, 3.ª ed., pp. 93. No mesmo sentido Maria Fernanda Palma, Direito Penal – Conceito Material de Crime, Princípios e Fundamentos, 2019, AAFDL, pp. 53 e ss.

27 Jorge de Figueiredo Dias, Direito Penal Português – As Consequências Jurídicas do Crime, Aequitas – Editorial Notícias, 1993, pp. 291.