1 - A revogação da suspensão da execução da pena de prisão, por violação ou incumprimento dos deveres ou regras de conduta impostos, nos termos previstos na al. a) do n.º 1 do artigo 56º do CP, exige que se trate de uma violação grosseira ou reiterada – tendo em conta a gravidade do incumprimento ou a repetição do mesmo –, pressupondo o comportamento culposo do condenado e que se conclua que as medidas previstas no artigo 55º do CP não se revelam suficientes ou adequadas para alcançar as finalidades que estiveram na base da suspensão da execução da pena de prisão.
2 - Nessa conformidade, quando está em causa o incumprimento do dever de entrega ou de pagamento, pelo condenado, de quantia(s) a que ficou subordinada a suspensão da execução da pena, para se poder afirmar que o condenado agiu com culpa, ao não entregar/pagar essa(s) quantia(s), é necessário, antes de mais, demonstrar que o condenado tinha condições económicas para o fazer, ou, então, que se colocou voluntariamente na situação de não poder satisfazer essa entrega/pagamento.
2. FUNDAMENTAÇÃO
2.1. Delimitação do objeto dos recursos
Como é sabido, as conclusões da motivação recursiva balizam ou delimitam o respetivo objeto do recurso (cf. artigos 402º, 403º e 412º, todos do C.P.P.), delas se devendo extrair as questões a decidir em cada caso.
Tal não impede o conhecimento, também oficioso, dos vícios enumerados nas alíneas a), b) e c), do nº. 2 do artigo 410º do C.P.P., mas tão somente quando os mesmos resultem do texto da decisão recorrida por si só ou em sua conjugação com as regras da experiência comum (cf. Ac. do STJ nº. 7/95 – in DR I-Série, de 28/12/1995, ainda hoje atual), bem como das nulidades principais, como tal tipificadas por lei.
No caso vertente, atentas as conclusões extraídas pelos recorrentes da motivação de recurso que respetivamente apresentaram, a única questão suscitada é a de saber se, ao invés do decidido no despacho recorrido, não deve ser revogada a suspensão da execução da pena de prisão em que a arguida foi condenada no processo referenciado, por não estarem reunidos os pressupostos que legitimam essa revogação e se antes deve ser prorrogado o período de suspensão da execução da pena.
2.2. Despacho recorrido
É o seguinte o teor do despacho recorrido:
«Por sentença transitada em julgado em 30-05-2016 (...) foi condenada pela prática de um crime de roubo, na pena de 3 anos e 6 meses de prisão, suspensa na sua execução por igual período e condicionada a regime de prova e á obrigação de pagar á ofendida, durante o período da suspensão, da quantia de € 455,00.
Decorrido o período da suspensão, veio a DGRSP juntar na ref.ª 4831321, onde pela negativa, ressalta que a condenada não pagou á ofendida a quantia que ficou obrigada a restituir e que apresenta uma postura de negação do ilícito.
Procedeu-se á audição da condenada, finda a qual, o Ministério Público promoveu a prorrogação do período de suspensão por mais um ano subordinada á condição da condenada entregar a uma IPSS a quantia que ficou obrigada a restituir uma vez que a ofendida já faleceu, facto que se mostra comprovado pela certidão de óbito cuja junção foi determinada.
Sucede que não podemos concordar com tal posição:
Com efeito, ressalta quer dos autos, quer da postura da condenada durante a sua audição (se o tribunal ainda quiser eu pago) que esta não interiorizou a condenação e ainda menos o desvalor do licito que praticou.
Resultando, pois das suas declarações que pese embora os seus problemas de saúde, ia fazendo “umas horas a dias” (as quais sabemos pelas regras da experiência que entram no campo da economia paralela e não declarada e tributada), igualmente sabemos pelo relatório da DGRSP que foi beneficiária do RSI, de onde resulta que a insuficiência económica não era de tal ordem que não pudesse ter restituído a quantia de € 455,00, durante o período da suspensão. Com efeito, tê-lo-ia feito mediante o pagamento de meros € 10,00 mensais.
Ademais, e nunca será demais sublinhar, que sendo uma suspensão de uma pena de prisão – ainda por cima pela prática de um crime de roubo – a mesma terá necessariamente de implicar algum sacrifício e empenho pessoal, pois mais não é que uma oportunidade de ressocialização em liberdade.
No caso vertente, o que ressalta dos autos, é que a condenada não interiorizou a condenação e como não o fez, não assumiu o desvalor do ilícito que praticou, indo ao ponto de negar a prática do mesmo perante a DGRSP, depois de o confessar de forma integral e sem reservas em julgamento, conforme ressalta da sentença condenatória.
Ora, decorrido o período da suspensão, o tribunal aquilata do cabal cumprimento da pena e, constatando a falta de cumprimento das condições da suspensão, se concluir que o incumprimento é culposo, pode nos termos do artigo 55º do Código Penal, fazer uma solene advertência, exigir garantias do cumprimento das obrigações que condicionam a suspensão, impor novos deveres e regras de conduta ou prorrogar o período de suspensão.
Se a infracção aos deveres e regras de conduta for grosseira, o tribunal revoga a suspensão da pena e determina o cumprimento da pena de prisão nos termos do artigo 56º do Código Penal.
No caso vertente, a infracção às condições impostas à condenada foi grosseira. A condenada não pagou porque não diligenciou para o efeito e porque não se dispôs a isso e não o fez porque não interiorizou o desvalor da sua conduta, indo ao ponto de a negar, após a confessar de forma integral e sem reservas. A sua postura em sede de audição foi displicente (se o tribunal quiser, eu ainda pago).
E é por se ter a sua conduta como grosseira e porque a vitima já faleceu estando a condenada impossibilitada de a ressarcir, que se entende ser de revogar a suspensão da pena de prisão, determinando-se que a condenada cumpra efectivamente a pena de prisão a que foi condenada.
Em face do exposto, concluindo-se que o incumprimento das condições a que ficou subordinada a suspensão da pena de prisão é grosseira, revoga-se a suspensão e, em consequência, determina-se o cumprimento da pena de prisão de 3 anos e 6 meses a que foi condenada.»
2.3. Apreciação dos recursos
Defendem os recorrentes, respetivamente, a arguida/condenada e o Ministério Público, que não deve ser revogada a suspensão da execução da pena de 3 (três) anos e 6 (seis) meses de prisão em que a arguida foi cominada nos autos em referência, pugnando pela prorrogação do período de suspensão por um ano, com sujeição a novos deveres, nos termos do disposto nos artigos 55º, al. c) e 50º, n.º 5, ambos do CP, pretendendo o Ministério Público que o seja ao dever de entrega, pela condenada, da quantia a que ficou subordinada a suspensão da execução da pena (€455,00), a uma IPSS, dado que a ofendida já faleceu.
Para fundamentar tal pretensão, os recorrentes sustentam não estarem verificados, no caso, os pressupostos previstos no artigo 56º, n.º 1, alíneas a) e b), do Código Penal, para que o Tribunal a quo pudesse decretar a revogação da suspensão da execução da pena de prisão em que a arguida foi condenada, por não ter havido violação culposa e grosseira dos deveres impostos à arguida, especificamente, do dever de entrega à ofendida (…) da quantia de €455,00.
Defendem os recorrentes que tendo a condenada, na audição que teve lugar, alegado que a não entrega daquela quantia se ficou a dever a problemas económico-financeiros – tendo padecido de problemas de saúde graves, que a impediram de trabalhar, até ter celebrado contrato de trabalho, auferindo como único rendimento o Rendimento de Inserção Social, residindo, a título gratuito, em casa de uma filha – e não constando dos autos qualquer elemento que permita infirmar a alegada insuficiência de rendimentos, não se pode imputar a culpa da arguida a falta de cumprimento da aludida obrigação de entrega da quantia em causa, não se estando, por isso, perante uma infração grosseira por parte da condenada, passível de legitimar a revogação da suspensão da execução da pena de prisão, nos termos previstos no artigo 56º, n.º 1, al. b), do CP.
O Exm.º PGA, no parecer emitido pronuncia-se no sentido de o recurso interposto pela arguida dever merecer provimento.
Apreciando:
Sobre a revogação da suspensão da execução da pena de prisão, dispõe o artigo 56º, n.º 1, do Código Penal: «A suspensão da execução da pena de prisão é revogada sempre que, no seu decurso, o condenado:
a) Infringir grosseira ou repetidamente os deveres ou regras de conduta impostos ou o plano de reinserção social; ou
b) Cometer crime pelo qual venha a ser condenado, e revelar que as finalidades que estavam na base da suspensão não puderam, por meio dela, ser alcançadas.»
Decorre da citada disposição legal e no que releva para o caso dos autos que a revogação da suspensão da execução da pena de prisão, com fundamento no incumprimento de deveres inerentes ao regime de prova e a que ficou subordinada a suspensão, pressupõe a infração grosseira ou repetida desses deveres por parte do condenado.
E constitui entendimento reiteradamente afirmado pela jurisprudência dos nossos Tribunais Superiores o de que a violação grosseira dos deveres ou regras de conduta impostos, a que alude a alínea a), do n.º 1, do artigo 56º, do Código Penal, tem de constituir uma atuação indesculpável, em que o comum dos cidadãos não incorra e que não mereça ser tolerada nem desculpada e que não pressupõe, necessariamente, um comportamento doloso por parte do condenado, bastando que o condenado haja com culpa, ou seja, que a infração seja resultado de um comportamento censurável, de descuido ou leviandade[1].
Assim e como se refere no Acórdão da RC, de 9/09/2015[2] «A infracção grosseira é a que resulta de uma atitude particularmente censurável de descuido ou leviandade, aqui se incluindo a colocação intencional do condenado em situação de incapacidade de cumprir os deveres ou regras de conduta impostos ou o plano individual de reinserção. Já a infracção repetida dos deveres ou regras de conduta impostos ou do plano individual de reinserção é aquela que resulta de uma atitude de descuido e leviandade prolongada no tempo, revelando uma postura de desprezo pelas limitações resultantes da sentença condenatória.»
Para que haja lugar á revogação da suspensão da execução da pena por “infracção grosseira ou repetida dos deveres ou regras de conduta impostos” torna-se necessário que o comportamento assumido pelo condenado seja demonstrativo de que se frustraram, definitivamente, as expetativas que motivaram a suspensão da execução da pena, destruindo o condenado, por via do comportamento culposo assumido, a esperança nele depositada de que alcançaria a ressocialização, em liberdade[3].
E a revogação da suspensão só terá lugar como ultima ratio, isto é, quando estiverem esgotadas ou se revelarem de todo ineficazes as restantes medidas previstas no artigo 55º do Código Penal[4] e que são as seguintes: «a) Fazer uma solene advertência; b) Exigir garantias de cumprimento das obrigações que condicionam a suspensão; c) Impor novos deveres ou regras de conduta, ou introduzir exigências acrescidas no plano de reinserção; d) Prorrogar o período de suspensão até metade do prazo inicialmente fixado, mas não por menos de 1 ano nem por forma a exceder o prazo máximo de suspensão previsto no n.º 5 do artigo 50º».
A revogação da suspensão da execução da pena de prisão, atento o disposto no artigo 55º do CP, fica dependente de um juízo sobre a inadequação das medidas menos gravosas previstas naquela disposição legal, em respeito pelos princípios da proporcionalidade e da necessidade da pena que presidem a «todo o processo aplicativo e subsistem até à extinção da sanção imposta.[5]»
Em suma e em conformidade com todo o exposto, a revogação da suspensão da execução da pena de prisão, por violação ou incumprimento dos deveres ou regras de conduta impostos, nos termos previstos na al. a) do n.º 1 do artigo 56º do CP, exige que se trate de uma violação grosseira ou reiterada – tendo em conta a gravidade do incumprimento ou a repetição do mesmo –, pressupondo o comportamento culposo do condenado e que se conclua que as medidas previstas no artigo 55º do CP, não se revelam suficientes ou adequadas para alcançar as finalidades que estiveram na base da suspensão da execução da pena de prisão, ou seja, como se refere no Acórdão deste TRE de 05/03/2013[6], que «a infracção (ou infracções) detectada(s) sejam de molde a infirmar irremediavelmente o juízo de prognose favorável que conduziu à aplicação de uma pena de prisão suspensa e que a revogação desta se apresente como a única forma possível de virem a ser alcançadas as finalidades da punição.»
Neste quadro e baixando ao caso dos autos, o que aqui está em causa é a revogação da suspensão da execução da pena de 3 (três) anos e 6 (seis) meses de prisão em que a arguida, ora recorrente, foi condenada, pela prática de um crime de roubo, p. e p. pelo artigo 210º, n.ºs 1 e 2, com referência ao artigo 204º, n.º 1, al. d), ambos do Código Penal, decretada pela Senhora Juiz a quo, por incumprimento, pela condenada, do dever de entrega à ofendida, (…), da quantia de €455,00, a que ficou subordinada a suspensão da execução daquela pena de prisão.
Concluiu o Tribunal a quo, no despacho recorrido, existir uma infração grosseira por parte da condenada das condições a que ficou subordinada a suspensão da execução da pena de prisão, porquanto «A condenada não pagou porque não diligenciou para o efeito e por que não se dispôs a isso, não o fez porque não interiorizou o desvalor da sua conduta, indo ao ponto de negar, após a confessar de forma integral e sem reservas. A sua postura em sede de audição displicente (se o tribunal quiser eu ainda pago).
E é por se ter essa conduta como grosseira e porque a vítima já faleceu estando a condenada impossibilitada de a ressarcir, que se entende ser de revogar a suspensão da pena de prisão …»
Os recorrentes, Ministério Público e arguida/condenada, sustentam que não está perante um incumprimento que integre infração grosseira dos deveres a que ficou subordinada a suspensão da execução da pena de prisão, ante a alegação por parte da condenada de que não satisfez o dever que lhe foi imposto, por não dispor de meios económicos para o fazer - tendo estado desempregada, padecendo de graves problemas de saúde, que a impediram de trabalhar, tendo subsistido com o rendimento social de inserção, a ajuda de uma filha, em casa de quem vive e os rendimentos de trabalho precários como empregada doméstica - e inexistindo nos autos qualquer elemento que refute a alegada insuficiência económica da condenada para satisfazer o dever de entrega/pagamento à ofendida da referenciada quantia, não estão reunidos os pressupostos previstos no artigo 56º, n.º 1, do CP, para que fosse decretada a revogação da suspensão da execução da pena.
Que dizer?
Não explicitando a lei o que deve entender-se como infração grosseira dos deveres ou regras de conduta impostos, a que alude a al. a) do n.º 1 do artigo 56º do CP, cabe ao julgador a definição e o preenchimento de tal conceito, sendo que, conforme supra se referiu, vem sendo reiteradamente afirmado pela jurisprudência dos nossos Tribunais Superiores que para que possa ser qualificada como grosseira, a violação dos deveres ou regras de conduta, tem de constituir uma atuação indesculpável, em que o comum dos cidadãos não incorra e que não mereça ser tolerada nem desculpada e que não pressupõe, necessariamente, um comportamento doloso por parte do condenado, bastando que atue com culpa, ou seja, que a infração seja resultado de um comportamento censurável, de descuido ou leviandade.
Nessa conformidade, quando está em causa o incumprimento do dever de entrega ou de pagamento, pelo condenado, de quantia(s) a que ficou subordinada a suspensão da execução da pena, para se poder afirmar que o condenado agiu com culpa, ao não entregar/pagar essa(s) quantia(s), é necessário, antes de mais, demonstrar que o condenado tinha condições económicas para o fazer, ou, então, que se colocou voluntariamente na situação de não poder satisfazer essa entrega/pagamento[7].
Por outro lado, tendo em conta que «só a inconciliabilidade do incumprimento com a teleologia da suspensão da pena é que deve conduzir à revogação da suspensão da pena[8]», a revogação por incumprimento do dever de entrega ou de pagamento, nos termos sobreditos, «não prescinde de prova fáctica que justifique, de forma bastante, a convicção de que um tal incumprimento infirmou definitivamente o juízo de prognose favorável que esteve subjacente à decisão da suspensão[9].»
Neste quadro e perante os elementos em presença, em função da alegada insuficiência económica da condenada, ora recorrente, para satisfazer o dever de entrega à ofendida – entretanto, falecida – da quantia de €455,00, a que ficou subordinada a suspensão da execução da pena e não se mostrando comprovado que a arguida/condenada dispusesse de condições económicas que lhe permitissem, com maior ou menor sacrifício, cumprir aquele dever de entrega, não pode afirmar-se que o incumprimento desse dever constitui uma violação grosseira.
Acresce que, como bem refere o Exm.º PGA, no seu parecer, a afirmação contida no despacho recorrido, de que a arguida não revelou interiorização da pena, é uma asserção conclusiva, sem sustentação em base factual e «sem conteúdo que, concretamente, milite contra ela e seja suscetível de, só por si, conduzir irremediavelmente à revogação da suspensão».
Assim sendo, inexistindo elementos factuais de que resulte demonstrado que o incumprimento pela arguida/condenada, ora recorrente, do dever de entrega à ofendida da quantia a que ficou subordinada a suspensão da execução da pena, ocorreu dispondo a condenada meios económicos para o poder cumprir, não se pode concluir pela existência de infração grosseira desse dever, passível de poder fundamentar a revogação da suspensão da execução da pena de prisão, nos termos previsto na al. a) do n.º 1 do artigo 56º do Código Penal.
Não pode, pois, manter-se o despacho recorrido, que revogou a suspensão da execução da pena de prisão em que a ora recorrente foi condenada nos autos, impondo-se a sua revogação.
Pretende o Ministério Público recorrente que se decrete a prorrogação do período da suspensão da execução da pena, pelo período de um ano, com a imposição de um novo dever, qual seja, o de entrega da quantia a que ficou subordinada a suspensão da execução da pena (€455,00), a uma IPSS, dado que a ofendida já faleceu, nos termos do disposto nos artigos 55º, al. c) e 50º, n.º 5, ambos do CP.
Vejamos:
O período de suspensão da execução da pena de prisão, que foi fixado em 3 anos e 6 meses, na sentença condenatória, a qual transitou em julgado em 30/05/2016, já se mostra decorrido, tendo sido atingido em 30/11/2019.
Nos termos do disposto no artigo 55º, al. d), do Código Penal «Se, durante o período de suspensão, o condenado, culposamente, deixar de cumprir qualquer dos deveres ou regras de conduta impostos, ou não corresponder ao plano de reinserção social, pode o tribunal: Prorrogar o período de suspensão até metade do prazo inicialmente fixado, mas não por menos de um ano nem por forma a exceder o prazo máximo de suspensão previsto no nº 5 do artigo 50.º»
Ora, para além de não, resultar demonstrado que o incumprimento, por parte da condenada, do dever de entrega da quantia em causa seja culposo, não é legalmente admissível a prorrogação do período de suspensão da execução da pena, no caso concreto, por a prorrogação não poder ser determinada por menos de um ano e nem por forma a exceder o prazo máximo da suspensão a que se alude na al. d) do artigo 55º, que, por força da remissão feita para o n.º 5 do artigo 50º, é de cinco anos, a contar do trânsito em julgado da decisão condenatória[10], o qual será atingido em 30/05/2021, tendo o despacho recorrido sido proferido em 22/06/2020.
Por conseguinte, não pode ser atendida a pretensão do Ministério Público recorrente, de prorrogação do período de suspensão, com a imposição do dever de entrega da quantia de €455,00, a uma IPSS.
Nos termos do disposto no artigo 57º, n.º 1, do Código Penal a pena é declarada extinta se, decorrido o período da sua suspensão, não houver motivos que possam conduzir à sua revogação.
Assim, pese embora o incumprimento, por parte da condenada, do dever de entrega à ofendida, da quantia de €455,00, não podendo afirmar-se que esse incumprimento constitua uma infração grosseira do respetivo dever, nos termos previstos na al. a) do n.º 1 do artigo 56º do CP e não ocorrendo outra(s) causa(s) conducentes à revogação da suspensão, ao abrigo do disposto na al. b) do n.º 1, do CP, há que declarar extinta a pena em que a arguida, ora recorrente, foi condenada nos autos em referência, o que se decide, ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 57º do Código Penal.
Destarte, ainda que as consequências jurídico-processuais decorrentes da revogação do despacho recorrido por que pugnavam não sejam inteiramente coincidentes com aquelas que preconizam, procedem os recursos interpostos pelo Ministério Público e pela arguida/condenada.
3. DISPOSITIVO
Nestes termos, em face do exposto, acordam os Juízes que compõem a Secção Criminal deste Tribunal da Relação de Évora em conceder provimento aos recursos interpostos pelo Ministério Público e pela arguida/condenada (...), revogando-se, em consequência, o despacho recorrido, julgando-se extinta a pena em que foi condenada a arguida/recorrente no âmbito do processo n.º 15/15.4GBDGDL.
Sem tributação.
Évora, 12 de janeiro de 2021
Fátima Bernardes
Fernando Pina
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[1] Neste sentido, cfr., entre outros, Ac. da RC de 17/10/2012, processo 91/07.3IDCBR.C1, acessíveis em www.dgsi.pt
[2] Proferido no proc. n.º 83/10.5PAVNO.E1.C1, disponível em www.dgsi.pt
[3] Vide Cons. Simas Santos e Leal Henriques, in Código Penal Anotado, 1º volume, 4ª edição, 2014, Editora Reis dos Livros, páginas 823 e 824 e Prof. Figueiredo Dias, in Direito Penal Português - As Consequências Jurídicas do Crime, 1993, Aequitas – Editoral Notícias, páginas 355 a 357.
[4] Cf., entre outros, na doutrina, Prof. Figueiredo Dias, in ob. e loc. cit. e, na jurisprudência, Ac da RC de 9/09/2015, proc. n.º 83/10.5PAVNO.E1.C1, acessível em www.dgsi.pt
[5] Ac. deste TRE, de 05/03/2013, proferido no proc. 1144/05.8TASTB.E1 e acessível no endereço www.dgsi.pt.
[6] Idem.
[7] Neste sentido, vide, entre outros, Ac. da RP de 12/01/2011, proc. 5376/97.2JAPRT-B.P1 e Ac da RE de 10/03/2020, proc. 65/06.1IDFAR.E2, acessíveis em www.dgsi.pt
[8] Cfr. Ac. RL de 19/02/1997, in CJ, 1007, tomo 1, pág. 166.
[9] Cf. Ac da RP de 14/3/2012, proc. 35/08.5IDAVR.P1, in www.dgsi.pt
[10] Neste sentido, cfr., entre outros, Ac. da RC de 15/10/2014, proc. 826/10.7JACBR-A.C1, Ac. da RP de 18/3/2015, proc. 9/13.4PFMTS e Ac. da RG de 22/01/2018, proc. 97/10.5GCVRL-B.G1, acessíveis em www.dgsi.pt.