ALIMENTOS A DESCENDENTE
MAIORIDADE
DESPESAS COM EDUCAÇÃO
PROPRINAS EM UNIVERSIDADE PRIVADA
Sumário

I – A solução trazida pela Lei nº 122/2015 deve ter-se como interpretativa do regime constante do art. 1880º do C Civil, pelo que, depois de atingida a maioridade do alimentando e ainda que em data anterior à do início de vigência daquela Lei (1/10/2015), se mantém a obrigação de prestação de alimentos anteriormente fixada.
II - O custo com propinas de uma universidade integra-se, salvo expressa solução em sentido diverso, no conceito de alimentos, como custo de educação, não constituindo uma despesa extraordinária equiparável a despesas não recorrentes expressamente previstas em acordo de exercício de responsabilidades parentais, tais como despesas de saúde com aparelhos dentários, próteses ou intervenções cirúrgicas.
III – A cessação ou alteração da obrigação alimentícia após a maioridade do alimentando, por termo ou interrupção do seu processo educativo, ou por irrazoabilidade, deverá ser declarada por iniciativa do devedor dos alimentos, através de expediente processual adequado, no âmbito do processo de responsabilidades parentais ou do expediente previsto no art. 936º do CPC e não no âmbito de embargos opostos à execução por alimentos.

Texto Integral

PROC. N. 9366/20.5T8PRT-A.P1
Tribunal Judicial da Comarca do Porto
Juízo de Família e Menores do Porto - Juiz 1

REL. N.º 589
Relator: Rui Moreira
Adjuntos: João Diogo Rodrigues
Anabela Tenreiro

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ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO:

1 – RELATÓRIO

Por apenso à execução por alimentos que B… e C… lhe movem, veio D…, pai do primeiro e ex-marido da segunda, deduzir oposição, pedindo a sua absolvição do pedido executivo.
Para o efeito, alegou que não existe título executivo válido que fundamente a acção executiva uma vez que a obrigação de alimentos cessou com a maioridade do filho, designadamente porque o acordo de pagamento de alimentos dado à execução só previa esse pagamento durante a menoridade do B…. Ora só estão a ser reclamadas quantias a partir de Abril de 2015, sendo que o exequente atingira a maioridade em 1/6/2014.
Mais alega que a dívida não é certa, nem líquida, nem exigível, designadamente por nunca ter sido consultado sobre o percurso escolar e opções de formação do exequente, que também jamais lhe deu conta de qualquer necessidade de alimentos. Para além disso, impugnou, a realidade das despesas alegadamente suportadas junto da Universidade E….
Os embargos foram liminarmente recebidos, tendo os embargados contestado, pronunciando-se pela sua improcedência. Alegaram que a obrigação de alimentos fixada durante a menoridade do filho se mantém para além da maioridade deste., bem como estarem documentadas as despesas cujo pagamento, na parte devida, reclamam.
O tribunal entendeu estar habilitado a decidir de mérito, e, dando por provado entre o mais, o pagamento das referidas propinas à Universidade, considerou, porém, que as mesmas não estavam incluídas no título executivo, julgando procedentes os embargos nessa parte. Mais considerou ser devido o valor correspondente aos alimentos vencidos desde 1 de Outubro de 2015 (data de entrada em vigor da redacção dada ao art. 1905º pela Lei nº 122/2015, de 1/09), até que o exequente complete 25 anos, o que ocorrerá a 1 de Junho de 2021, mas não o valor correspondente ao período que decorreu entre a maioridade do exequente (1/6/2014) e a data de entrada em vigor da referida lei.
É desta decisão que ambas as partes vêm interpor o presente recurso.
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Os exequentes/embargados reagem quanto à parte que julgou procedentes os embargos, quer a propósito da desconsideração das despesas com as propinas da universidade no âmbito da responsabilidade do devedor de alimentos, quer a propósito da sua exoneração em relação às prestações alimentícias referentes ao período entre a data da maioridade e a da entrada em vigor da Lei nº 122/2015.
Terminaram as suas alegações formulando as seguintes conclusões:
I - Mesmo antes da Lei nº 122/2015, já a Jurisprudência vinha entendendo que o facto do menor atingir a maioridade não era fundamento para a cessação automática do pagamento dos alimentos fixados durante a sua menoridade.
II - A Lei 122/2015, não é uma lei nova mas sim interpretativa do regime que estava vigente.
III - Pelo que são devidos ao Recorrente os alimentos entre 1/6/2014 a 1/10/2015.
IV - As despesas com a educação dos menores, estão contempladas no acordo de regulação do poder parental mesmo que não sejam especificadas.
V - As despesas com a educação no ensino superior, podem considerar-se normais nos tempos que correm, pois tem sido incentivado pelo Estado que todos tenham acesso ao ensino superior.
VI - Mesmo que seja extraordinária não foi excluída pelos progenitores quando existe uma cláusula para as despesas consideradas o "sustento" e outra para as extraordinárias.
VII - E quando se diz as despesas extraordinárias se refere "nomeadamente" umas tantas que especificaram, não quer dizer que tenham sido excluídas outras.
VIII - Por isso, as despesas extraordinárias como a educação profissional do filho em Universidade, estão imanentes nas "despesas extraordinárias".
IX - Pois cabe aos pais, dentro das suas possibilidades, assegurar a formação académica dos seus filhos.
X - Tanto mais que nunca o Embargante alegou que não tinha meios para suportar metade das despesas com as propinas do ensino superior.
XI - Não sendo necessário que o filho tivesse movido uma acção de alimentos entre maiores.
XII - A manutenção e a educação dos filhos é um direito natural dos pais e sobre eles incumbe o esforço e obrigação de lhes proporcionar uma educação que eles próprios até, não tenham atingido.
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Por sua vez, o embargante também ofereceu recurso, mas apresentando alegações tão prolixas quanto a própria alegação da petição de embargos que, ainda para mais, voltou a repetir quase integralmente nas conclusões (incluindo diversas citações de jurisprudência, absolutamente impertinentes em sede de conclusões de um recurso).
Assim, de útil, o que se retira dessas conclusões (99!) – e que constituirão leque de questões a que se reconduzirá o objecto do seu recurso, já que nada impõe que lhe seja dada nova oportunidade para aperfeiçoar o que fez de forma prolixa – resulta das seguintes afirmações:
XXXI – “no dito acordo (o Acordo de Regulação das Responsabilidades Parentais do menor B… foi alcançado e homologado em 26/03/2013) nada foi previsto no que concerne à prestação de alimentos em caso de filhos maiores ou emancipados, apenas e outrossim, ficando estabelecidas regras “relativamente à descendência menor comum “.
XXXII - Assim sendo, daí decorre que a manutenção da obrigação alimentar do pai em relação ao filho depois de atingir a maioridade ou emancipação depende, na falta de acordo, como é o caso dos presentes autos, da alegação e prova, a título de causa de pedir, dos factos relativos ao seu não completamento da formação profissional, assim como à razoabilidade dessa manutenção, o que jamais ocorreu e a decisão proferida pelo tribunal a quo não ponderou.
XXXIII. - Aliás, o acordo alcançado ou mesmo, caso existisse, a sentença condenatória do obrigado a prestar alimentos aos filhos enquanto menores é insusceptível de constituir título executivo para além da quantia exequenda devida até eles atingiram a maioridade.
LV. - Afigura-se absolutamente claro que ambos os exequentes, sem exceção, com os comportamentos assumidos durante os últimos 5 (cinco) anos e acima melhor descritos que configuram, entre outros, o abandono, o isolamento, o desprezo e o distanciamento voluntário e propositado para com a figura paterna, relegando-a à insignificância e à indiferença, violaram de forma grave e reiterada os seus deveres para com o obrigado, ali executado e ora recorrente, facto concreto que a decisão do Tribunal a quo teria forçosamente que ter relevado e ponderado criticamente, o que não sucedeu.
LVI. - Mormente os deveres assumidos no acordo alcançado e ora invocado no Requerimento Executivo de exercício em comum das responsabilidades parentais entre os progenitores ou do regime de visitas fixado.
LVII. - E esta violação grave e reiterada por parte do alimentado dos seus deveres para com o obrigado à prestação alimentícia merece, também, a tutela do Direito, conforme adiante se concluirá e o ali executado, ora recorrente, ao invocar todos os comportamentos dos ali exequentes neste âmbito e todos os factos que os rodeiam, atrás mais minuciosamente descriminados, está a invocar aqui, expressamente, como havia já feito em 11.º a 17.º e 28.º a 82.º, do seu articulado de oposição à execução, factos susceptíveis de determinarem a extinção do eventual direito à pensão de alimentos do seu filho maior e, principalmente, à inexistência de qualquer título executivo.
LXV. Ora, se há mais de 5 (cinco) anos a fio que os exequentes nada fazem, ou fizeram, para receber a pensão mensal de alimentos a prestar pelo executado, aqui apelante, ao seu filho maior e o estabelecimento de ensino superior seleccionado pelos exequentes foi a Universidade E…, no Porto, que é uma prestigiada instituição mas de ensino privado, e não público, instituição essa onde é consabido se paga mensalmente, nessa sequência, quantias bastante elevadas (muito acima da média de outra qualquer instituição pública de ensino) a título de propinas pela frequência dos cursos ali ministrados, tal significa objectivamente, segundo as mais básicas regras da experiência, que o filho maior jamais necessitou que seu pai lhe prestasse a qualquer pensão de alimentos.
LXVI. - Até porque no momento presente o exequente B… encontra-se a frequentar o Curso de Mestrado em Auditoria e Fiscalidade (cfr. ponto 5) do Requerimento Executivo) que é já o segundo ciclo de estudos do plano curricular académico do ensino superior.
LXVII. - E sempre, pelo menos até ao momento presente, sem qualquer necessidade da prestação mensal de alimentos por parte do aqui executado.
LXIX. - A verdade é que nos termos prescritos no Artigo 2013.º, do CC, a obrigação de prestar alimentos cessa quando aquele que os recebe deixe de precisar deles (alínea b), in fine), ou quando o credor viole gravemente os seus deveres para com o obrigado (alínea c), do citado preceito legal).
LXX. - E, em boa verdade, o executado fez com a sua oposição à execução prova suficiente do preenchimento de ambos os acima citados requisitos legais, por tudo quanto atrás invoca, mas a decisão do Tribunal a quo não ponderou a fundamentação alegada o que reflecte um erro na apreciação da prova.
LXXI. - Todos esses factos acima descritos foram pelo executado invocados na sua posição à execução e consubstanciavam matéria de excepção, sendo factos que determinariam a extinção do direito à pensão de alimentos do filho maior, de acordo com o plasmado no n.º 2, do Artigo 342.º, do CC.
LXXVIII. - O ora recorrente ao especificar nos termos do prescrito no Artigo 640.º, do Código de Processo Civil (CPC) este concreto segmento da douta decisão proferida, ora sindicada, está a impugnar, expressamente, todo o conteúdo dos pontos e), g), i), j), e k) dos Factos Provados:
e) – “sendo que o executado obrigou-se a pagar à exequente, mãe do menor, a título de alimentos, a quantia de 200 € (duzentos euros) até ao dia 8 de cada mês e, anualmente, atualizada em Janeiro de cada ano em função dos índices de preços do consumidor, publicados pelo INE, reportando ao ano anterior, a iniciar-se no mês de Janeiro de 2014. – item 3 do Acordo”
g) – “O jovem encontra-se a estudar, frequentando a Universidade E… do Porto, no Curso de Mestrado em Auditoria e Fiscalidade.”
i) – “Entre Abril de 2015 e Maio de 2020 encontram-se por pagar a quantia global de 12.667,08 €.”
j) – “ Ao que acrescem juros no montante global de 1.051,13 €.”
k) – “Em propinas na Universidade E…, na sua formação superior no Curso de Mestrado de Auditoria e Fiscalidade, o Exequente B…, suportou a quantia global a título de propinas, o valor global de 22.730,86.”
LXXIX. - Sendo certo que a decisão alternativa sustentada na prova documental junta aos autos,deveria ter sido a seguinte:
Factos Provados:
• O descendente menor B… fica a residir habitualmente com a mãe na Rua …, n.º .. – 1.º direito sul, …, Matosinhos, até Janeiro de 2014, cabendo o exercício das responsabilidades parentais aos progenitores – item 1 do Acordo;
• O pai pode estar com o descendente menor sempre que queira sem prejuízo das obrigações escolares e períodos de descanso, avisando quem tem o seu cargo com antecedência de 48 horas, podendo tê-lo consigo nos fins-de-semana, alternadamente, entre as 10h de Sábado e as 21h de Domingo – item 2 do Acordo;
• D… ficará obrigado a entregar à mãe a título de alimentos devidos ao descendente menor, a quantia de 200 €, até ao dia 8 de cada mês e será anualmente atualizada em Janeiro em função dos índices de preços do consumidor, publicados pelo INE, reportando ao ano anterior, e na mesma proporção, a iniciar-se no mês de Janeiro de 2014. – item 3 do Acordo;
• Ficarão a cargo de ambos os progenitores, em partes iguais, as despesas extraordinárias que o menor venha a necessitar, nomeadamente as referentes a livros escolares no início de cada ano letivo, aparelhos dentários, próteses e calçado ortopédico, consultas não comparticipadas, intervenções cirúrgicas,internamentos hospitalares e meios complementares de diagnóstico (análises, tac, rem, etc…) – item 4 do Acordo;
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Não foi apresentada qualquer resposta a qualquer dos recursos.
Os recursos foram admitidos como apelações, com subida nos próprios autos e efeito devolutivo. Cumpre decidi-los.
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2- FUNDAMENTAÇÃO

O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação da recorrente, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso - arts. 635º, nº 4 e 639º, nºs 1 e 3 do CPC.
Assim, no primeiro dos recursos interpostos (dos exequentes/embargados) sobressaem as seguintes questões:
a) se são devidos os alimentos entre 1/6/2014 a 1/10/2015;
b) se é devida a parte proporcional à responsabilidade do executado, das despesas com a Universidade, por estas estarem incluídas no acordo de regulação do poder parental mesmo que não especificadas ou, sendo extraordinárias, por ainda caberem nas cláusulas desse mesmo acordo.
Do segundo desses recursos, extraem-se as seguintes questões:
c) se a obrigação resultante do acordo quanto a alimentos ao filho se extinguiu com a sua maioridade, dados os termos do próprio acordo, apenas assinalados para a respectiva menoridade;
d) se a obrigação poderia ter-se por inexigível em função do comportamento dos exequentes para com o embargante, alegado na petição e que não mereceu indagação do tribunal;
e) se a obrigação se poderia ter por extinta em função de caracteres de desnecessidade, conforme alegado na petição de embargos;
f) se não poderiam ter-se por provados os factos descritos nos pontos e), g), i), j), e k) dos Factos Provados;
g) se deveriam dar-se por provados os factos alternativamente descritos pelo embargante.
h) Se essa alteração justificava a procedência dos embargos e a extinção da execução.
É, de resto, em função destas questões, que o recorrente afirma genericamente que a obrigação exequenda não é certa, liquida e exigível, pelo que será nesse contexto que se ponderarão
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Para a apreciação da questão, cumpre atentar nos factos dados por provados na sentença recorrida. Afirmou o tribunal em 1ª instância:
a) A Exequente C… e o embargante divorciaram, conforme decisão proferida na acção de divórcio por mútuo consentimento que ocorreu os seus termos sob o nº 2361/2013 da Conservatória de Registo Civil de Matosinhos, decretado em 26/3/2013, que transitou de imediato, porquanto os intervenientes disseram que renunciavam ao recurso;
b) O Exequente, B…, nasceu a 1/6/1996;
c) Tendo sido homologado, no âmbito do referido processo, o acordo quanto ao exercício das Responsabilidades Parentais;
d) Tendo ficado a residir com a mãe, com quem ainda reside;
e) Sendo que o Executado obrigou-se a entregar à Exequente, mãe do menor, a título de alimentos, a quantia de 200 € (duzentos Euros) até ao dia 8 de cada mês e, anualmente actualizada em Janeiro de cada ano em função dos índices de preços ao consumidor, publicados pelo INE, reportado ao ano anterior, a iniciar-se no mês de Janeiro de 2014 – item 3 do Acordo.
f) Mais ficou estabelecido que as despesas extraordinárias com o jovem, nomeadamente as referentes a livros, aparelhos dentários, próteses, consultas e intervenções cirúrgicas seriam divididas entre os pais, em partes iguais.
g) O jovem encontra-se a estudar, frequentando a Universidade E… do Porto, no Curso de Mestrado em Auditoria e Fiscalidade;
h) O embargante não tem pago a pensão de alimentos, como não tem suportado as despesas com a formação profissional do Exequente B… na Universidade E… do Porto.
i) Entre Abril de 2015 e Maio de 2020 encontra-se por pagar a quantia global de 12.667,08 €;
j) Ao que acrescem juros no montante global de 1.051,13 €;
k) Em propinas na Universidade E…, na sua formação superior no curso de Mestrado de Auditoria e Fiscalidade, o Exequente B…, suportou a quantia global, a título de propinas, o valor global de 22.730,86 € Resta, em conclusão, afirmar a improcedência da presente apelação, na total confirmação da decisão recorrida.
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A primeira questão a resolver respeita ao segmento da decisão que concluiu não ser devido pelo embargante o valor das prestações de alimentos vencidas no período decorrido entre a aquisição da maioridade do B… (1/6/2014) e a data de entrada em vigor da Lei nº 122/2015, por via da alteração do art. 1905º, nº 2 do C. Civil.
Entendeu o tribunal recorrido que a referida Lei nº 122/2015 definiu uma solução nova – a da continuidade automática das prestações de alimentos educacionais (assim normalmente designados) para além da maioridade- pelo que não poderia ser aplicada a período anterior à data da sua entrada em vigor.
As razões para a defesa desta solução, além das referidas na própria decisão recorrida, constam exemplarmente do Ac. do TRC, de 7/3/2017, (proc. nº 6782/16.0T8CBR-A.C1, em dgsi.pt), dispensando-se aqui a sua repetição, tanto mais que aí se alcança solução precisamente igual à que é objecto deste recurso.
No entanto, é conhecida a divisão da jurisprudência sobre a matéria, de resto já anterior à própria Lei nº 122/2015.
Se é certo que a jurisprudência ainda maioritária fazia prevalecer o entendimento de que, atingida a maioridade, logo caducava o direito a alimentos (para que a obrigação pudesse permanecer, ao abrigo do disposto no artigo 1880.º do Código Civil, tinha o filho, agora maior de idade, de requerer a fixação de alimentos, para o que haveria de recorrer ao processo previsto no artigo 1412.º do Código de Processo Civil), já diversa jurisprudência e a doutrina mais inovadora vinham afirmando que essa caducidade não operava, à luz de razões de justiça e humanidade, na consciência da realidade sociológica que demonstrava que, até por via do aumento do grau de escolaridade obrigatória, a maior parte dos jovens não terminava os seus estudos aos 18 anos, antes os prosseguia. Mais se acrescentava, para sustentar esta tese, o argumento de que o art. 2013º do Código Civil não previa a maioridade como uma das causas de cessação da obrigação alimentar, do que decorria a impossibilidade de se aditar essa hipótese como mais uma causa de cessação da obrigação alimentar, sob pena de se ultrapassar a própria lei (cfr. Daniela Pinheiro da Silva, Alimentos a Filho Maior, pgs. 25-27).
Foi neste contexto que surgiu a Lei nº 122/2015, que aditou um nº 2 à regra do 1905º do C.Civil, que, resolvendo a controvérsia, veio afirmar a continuidade automática da obrigação alimentar a favor do jovem, salvo se o respectivo processo de educação ou formação profissional estiver concluído antes da sua maioridade, se tiver sido livremente interrompido ou ainda se, em qualquer caso, o obrigado à prestação de alimentos fizer prova da irrazoabilidade da sua exigência.
Logo se discutiu o significado desta norma, para ela se reivindicando uma natureza interpretativada regra do art. 1880º do C. Civil.
A corrente que o defendeu rapidamente se afirmou dominante, favorecendo assim uma solução que permitia abranger sob o regime de protecção da norma as situações em que, não tendo sido intentada, pelo filho já maior, acção própria para o reconhecimento do seu direito a alimentos, havia deixado de receber as correspondentes prestações. À luz desta tese, devia ser-lhe facultada, mesmo assim, a possibilidade de repristinar a obrigação alimentícia anteriormente fixada, que não deveria ter-se por caducada.
Esta tese – que desde já afirmamos acolher, até por já ter sido defendida pelos membros deste colectivo em diversas circunstâncias e decisões - mostra-se exposta no acórdão do TRE de 09-03-2017 (proc. nº 26/12.1TBPTG-D.E1, em dgsi.pt), de onde resulta que, mesmo para as situações em que a maioridade foi adquirida antes da entrada em vigor da Lei nº 122/2015, haverá de entender-se que a pensão fixada em benefício do filho menor se mantém automaticamente até que ele complete os 25 anos, cabendo ao progenitor obrigado aos alimentos fixados durante a menoridade o ónus de cessar essa obrigação demonstrando que ocorre uma das três situações elencadas pelo legislador no segundo segmento do preceito em questão: que o filho completou o respectivo processo de educação ou formação profissional; que o interrompeu livremente; que a exigência de alimentos é irrazoável.
E isso precisamente em razão da natureza interpretativa da Lei nº 122/2015, que cumpre reconhecer, como ali se explica nos seguintes termos:
Considerando a referida divergência de entendimentos, e o teor do segmento inicial da alteração introduzida, sublinhando o legislador que, para efeitos do disposto no artigo 1880.º, entende-se que se mantém para depois da maioridade, deve concluir-se que estamos perante lei que é interpretativa do artigo 1880.º do CC, quanto à extensão da obrigação de alimentos a cargo dos progenitores durante a menoridade, e até que o filho complete 25 anos.
Efectivamente, lei interpretativa “[é] aquela que intervém para decidir uma questão de direito cuja solução é controvertida ou incerta, consagrando um entendimento a que a jurisprudência, pelos seus próprios meios, poderia ter chegado”, o que, como ficou suficientemente demonstrado supra chegou a ocorrer, decidindo alguma jurisprudência no sentido ora consagrado.
Na verdade, “[p]ara que a lei nova possa ser interpretativa são necessários dois requisitos: que a solução do direito anterior seja controvertida ou pelo menos incerta; que a solução definida pela nova lei se situe dentro dos quadros da controvérsia e seja tal que o julgador ou o intérprete a ela poderiam chegar sem ultrapassar os limites normalmente impostos à interpretação e aplicação da lei.
Se o julgador ou o intérprete em face de textos antigos não podiam sentir-se autorizados a adoptar a solução que a lei nova veio a consagrar, então a lei é inovadora”.
Como vimos, na situação vertente a nova lei veio claramente consagrar um regime que a própria jurisprudência já tinha entendido como sendo possível e adequado em face da lei antiga, pelo que devemos considerar que a nova lei é interpretativa por acolher uma das soluções objecto da querela jurisprudencial.
Ora, «o que está na base do normativo do art. 1880º do Código Civil é a incapacidade económica do filho maior para prover ao seu sustento e educação, quando as circunstâncias impõem aos pais, não obstante a maioridade do filho, a obrigação de, em nome do bem-estar e do futuro deste, continuar a suportar tais despesas. (…)
A obrigação excepcional prevista neste normativo tem um carácter temporário, balizado pelo “tempo necessário” a completar da formação profissional do filho, e obedece a um critério de razoabilidade – é necessário que, nas concretas circunstâncias do caso, seja justo e sensato, exigir dos pais a continuação da contribuição a favor do filho agora de maioridade.(…)
Por isso, a lei impõe o dever de contribuição “pelo tempo normalmente requerido para que a formação se complete”».
Idêntica solução foi afirmada, entre outros, no Ac. deste TRP, de 6/3/2017 (proc. nº 632/14.0T8VNG.P1, em dgsi.pt), para uma situação com semelhanças com a dos autos, nos seguintes termos: “Questão conexa com esta (mas que com ela se não confunde) é a de saber se a norma ora editada é tão-somente aplicável às situações que ocorrerem depois da respectiva entrada em vigor ou, ao invés, também se aplicará às relações jurídicas constituídas e subsistentes a essa data, o que se volve pois em determinar se estaremos (ou não) em presença de uma lei interpretativa.
(…)
A importância de tomada de posição relativamente a essa questão assume, na economia do presente recurso, importância primordial porquanto o apelante impetra a condenação da requerida no pagamento de todas as prestações alimentares que esta deixou de liquidar a partir do momento em que aquele atingiu a maioridade.
A propósito da determinação da natureza da aludida norma, será útil trazer à colação os ensinamentos de BATISTA MACHADO, o qual assinala que, neste domínio, “poderemos (…) dizer que são de sua natureza interpretativas aquelas leis que, sobre pontos ou questões em que as regras jurídicas aplicáveis são incertas ou o seu sentido controvertido, vem consagrar uma solução que os tribunais poderiam ter adotado (…).
Para que uma lei nova possa ser realmente interpretativa são necessários, portanto, dois requisitos: que a solução de direito anterior seja controvertida ou incerta; e que a solução definida pela nova lei se situe dentro dos quadros da controvérsia e seja tal que o legislador ou intérprete a ela poderiam chegar sem ultrapassar os limites normalmente impostos à interpretação e aplicação da lei (…)”.
Tendo presentes tais ensinamentos, afigura-se-nos que o nº 2 do art. 1905º do Cód. Civil veio clarificar o sentido normativo do art. 1880º do mesmo diploma legal, como indelevelmente o revela o primeiro segmento daquela norma quando dispõe “entende-se que se mantém para depois da maioridade, e até que o filho complete 25 anos de idade, a pensão fixada em seu benefício durante a menoridade” (sublinhado nosso).
Portanto, a citada Lei nº 122/2015 não alterou a fattispecie do art. 1880º do Cód. Civil, nem outrossim estabeleceu qualquer norma de direito transitório no sentido de regular a sua aplicação, limitando-se, na nossa perspectiva, a tornar claro o sentido e alcance do referido preceito legal adoptando uma das interpretações possíveis (por sinal a minoritária) que no domínio do direito anterior à sua entrada em vigor vinha sendo jurisprudencialmente acolhida.
Contra o entendimento que preconiza a natureza interpretativa da lei vem-se esgrimindo o argumento de que esse resultado interpretativo pode conduzir à frustração das expectativas do progenitor que aguardava a maioridade do filho para deixar de pagar alimentos, sem prejuízo deste poder requerer a manutenção dessa prestação mediante procedimento a instaurar nos termos da al. a) do art. 5º do DL nº 272/2001, de 13.10.
Trata-se, contudo, de argumentação que não colhe, porquanto tais (eventuais) expectativas derivavam não directamente da lei, mas antes da controvérsia interpretativa que gravitava em torno da mesma, parecendo-nos que tão legítimas e fundadas eram as expectativas do progenitor que esperava deixar de suportar os encargos com a maioridade do filho, como as deste que contava com a manutenção da pensão, estabelecida na sua menoridade, até que completasse a sua formação profissional.
De facto, como bem enfatizava BATISTA MACHADO[20], a razão pela qual a lei interpretativa se aplica a factos e situações anteriores reside fundamentalmente em que ela, vindo a consagrar e fixar uma das interpretações possíveis da lei antiga com que os interessados podiam contar, não é susceptível de violar expectativas seguras e legitimamente fundadas.
Sufragamos, assim, o entendimento de que a citada lei assume natureza interpretativa, pelo que, na expressão do art. 13º do Cód. Civil, integra-se na lei interpretada, o que significa que esta passa a aplicar-se com o sentido que aquela lhe imputa, abrangendo ab origine todas as situações nela passíveis de serem subsumidas desde que a lei interpretada surgiu, gozando pois de retroactividade nesse sentido (escapando, contudo, a essa retroactividade os efeitos já produzidos por sentença transitada em julgado, bem como os já produzidos pelo cumprimento da obrigação, por transacção, ainda que não homologada, ou por actos de análoga natureza, entendendo-se por actos de análoga natureza os que importem o reconhecimento do direito).
(…)
Como assim, na esteira desse entendimento, nas situações em que haja pensão de alimentos fixada, na menoridade, por decisão judicial (…) o progenitor não convivente fica obrigado, até que o filho complete os 25 anos de idade, a suportar a pensão de alimentos estabelecida no mencionado ato decisório, salvo se lograr demonstrar que o processo de educação ou formação profissional foi concluído antes daquela data, foi livremente interrompido ou deixou de ser razoável a sua exigência.
Tal significa que, in casu, malgrado o requerente tenha atingido a maioridade em 25 de junho de 2013, a requerida continuaria obrigada a pagar a pensão alimentar que havia sido judicialmente fixada.”
Acolhendo na íntegra os argumentos que acabam de se expor, absolutamente válidos para a situação subjudice, concluímos que, não obstante o B… ter atingido a maioridade em 1/6/2014, ou seja, antes da data da entrada em vigor da Lei nº 122/2015 e da nova redacção do art. 1905º do C.Civil que ela acarretou, nem por isso caducou então o seu direito a alimentos a receber do pai, aqui embargante e nesta parte apelado, pois que já então o art. 1880º do C. Civil, conforme esclarecido pela referida Lei interpretativa nº 122/2015, estabelecia a continuidade dessa obrigação, até aos 25 anos de idade, de forma a propiciar a conclusão do processo formativo, sem prejuízo de excepções que, no caso, se não verificam, pois que é incontroverso que nem se completou ou foi interrompido o respectivo percurso escolar, nem se mostra invocada a chamada cláusula de irrazoabilidade.
Por todo o exposto, ao contrário do decidido pelo tribunal a quo, entendemos ser devido pelo embargante também o valor previsto a título de alimentos (200,00€ por mês, devidamente actualizados) correspondente ao período entre 1/6/2014 e 1/10/2015, pelo que, em relação a tal montante, não podem os embargos proceder.
Revogar-se-á, consequentemente, a decisão recorrida que o tinha resolvido em sentido contrário, procedendo nesta parte a apelação dos exequentes/embargados.
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A segunda questão a decidir refere-se ao segmento da decisão que julgou procedentes os embargos em relação a metade do valor gasto em propinas, junto da Universidade E…, pela frequência do curso e mestrado em Gestão.
Com efeito, o tribunal deu por provado (em termos que o embargante ainda impugna, ao que nos referiremos infra) que “Em propinas na Universidade E…, na sua formação superior no curso de Mestrado de Auditoria e Fiscalidade, o Exequente B…, suportou a quantia global, a título de propinas, o valor global de 22.730,86 €”. Mas considerou que o embargante não era devedor de metade desse valor (11.365, 43 €) por esta despesa não ter sido prevista no regime de exercício das responsabilidades parentais em vigor, o que equivale a dizer-se que não estava abrangida no título dado à execução.
O teor daquele regime, nos termos dos factos dados por provados, consta das als. e) e f), nos seguintes termos: “o Executado obrigou-se a entregar à Exequente, mãe do menor, a título de alimentos, a quantia de 200 € (duzentos Euros) até ao dia 8 de cada mês e, anualmente actualizada em Janeiro de cada ano em função dos índices de preços ao consumidor (…). Mais ficou estabelecido que as despesas extraordinárias com o jovem, nomeadamente as referentes a livros, aparelhos dentários, próteses, consultas e intervenções cirúrgicas seriam divididas entre os pais, em partes iguais.”
Entendem os exequentes que o valor das propinas deve subsumir-se ao conceito de despesas extraordinárias a serem divididas pelos pais, em partes iguais.
No entanto, e em concordância com o tribunal a quo, devemos afirmar que não têm razão.
Os alimentos, tal como definidos no art. 2003º, nº 2 do Código Civil compreendem a instrução e a educação. Isso acontece na hipótese de o alimentando ser menor, mas é necessariamente extensível ao caso em que o direito a alimentos se prolonga para além da maioridade do alimentando, exactamente pela razão de estar em continuação o processo de formação do jovem. É, de resto, por isso mesmo que se apelidam esses alimentos de “educacionais”.
Ora, no regime de prestação de alimentos ao exequente B…, foram previstos dois tipos de responsabilidades: a responsabilidade por alimentos, a abranger as despesas com instrução e educação, onde necessariamente haverão de se compreender as despesas com propinas e quaisquer outros custos com formação escolar; a responsabilidade por despesas extraordinárias, que serão aquelas não recorrentes e para as quais foram apontados como exemplo os custos com aparelhos dentários, próteses, consultas e intervenções cirúrgicas.
Para as primeiras, foi acordado um valor mensal de 200,00€, a actualizar anualmente segundo critério pré-estabelecido; as segundas, conforme surgissem, seriam suportadas a meias, entre os progenitores. É certo que nas segundas as partes incluíram despesas com livros, o que tenderá a referir-se a livros escolares, também eles, então, qualificados como “despesas extraordinária”, por não ser repetida mensalmente. Isso não está, no entanto, em questão, sendo certo que, enquanto despesa de educação, a mesma se deveria classificar, por definição, como “alimentos” e ser previsto o seu pagamento nesse âmbito. Sem prejuízo, o próprio embargante admite, no seu próprio recurso, que essa menção se referia a livros escolares, o que exclui qualquer controvérsia sobre a matéria, a qual se tem, pelo contrário, como expressamente prevista no acordo sobre as responsabilidades parentais relativas a B….
O que é certo, porém, é que, neste enquadramento legal e segundo o regime acordado e homologado, as despesas com propinas de um estabelecimento de ensino privado não podem considerar-se como subsumíveis ao conceito de despesas extraordinárias, como se retira, também, do facto de esse acordo, que como tais classificou despesas com livros escolares, não ter admitido a existência de outras despesas escolares, além dessas.
No mesmo contexto, a responsabilidade pelos encargos com a formação escolar do B…, perante a hipótese do seu crescimento significativo com o pagamento das referidas propinas, teria de ter sido definida por via da alteração do valor dos alimentos devidos pelo ora embargante. Nessa sede, com o necessário contraditório, se teriam definido as novas necessidades de alimentos a prestar, informadas por esse custo com propinas, e se teria obtido o acordo do devedor, ou lhe teria sido imposta essa obrigação. E, em caso de incumprimento, não faltaria título para se concretizar o seu cumprimento coercivo.
Porém, como é óbvio, isso não foi feito. E a situação assim criada não se pode remediar por via da obliteração dos conceitos de alimentos e de despesas extraordinárias, como agora pretendem os exequentes, para se impor ao devedor dos alimentos, como caso consumado, uma obrigação que nunca teve oportunidade de discutir.
Conclui-se, pois, que tal como decidido na sentença em crise, em razão do título dado à execução e das obrigações que nele se compreendem, não pode a presente execução prosseguir para a cobrança do valor pretendido a título de propinas.
A apelação dos exequentes/embargados improcederá, pois, nesta parte.
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Importa, agora, passar à apreciação das questões emanadas do recurso do embargante D….
A primeira refere-se à caducidade da obrigação alimentar de que resulta o crédito exequendo, por o alimentando ter atingido a maioridade e o acordo quanto à prestação de alimentos apenas ter previsto uma tal obrigação enquanto ele fosse menor.
Já acima discutimos a questão e concluímos que a obrigação alimentar estabelecida, por acordo ou por sentença, para a menoridade do alimentando não caduca com a respectiva maioridade, antes se mantendo automaticamente, cabendo ao devedor de alimentos o ónus de demonstrar a verificação de uma das três hipóteses previstas no nº 2 do art. 1905º: a conclusão do processo formativo do alimentando, a sua interrupção voluntária ou a irrazoabilidade da exigência de alimentos.
No caso, jamais veio o ora embargante alegar, para efeitos de cessação ou alteração da sua obrigação de prestação de alimentos ao seu filho B…, no processo respectivo, qualquer das referidas circunstâncias. Designadamente não veio requerer que se declarasse cessada a sua obrigação por ter sido adquirida a maioridade do seu filho e ter ele cessado o seu processo de formação escolar. Por isso, segundo o regime legal com o sentido que supra se explicou, conclui-se que se mantém intacta a sua obrigação, tal como ela resulta do acordo sobre o regime de exercício das responsabilidades parentais celebrado e homologado. Não procedem, pois, os argumentos do apelante a este propósito.
O que vem de referir-se é aplicável, nos seus precisos termos, às questões que ressumam do seu recurso e que supra se identificaram sob as al.s d) ee): (se a obrigação poderia ter-se por inexigível em função do comportamento dos exequentes para com o embargante, alegado na petição e que não mereceu indagação do tribunal; e) se a obrigação se poderia ter por extinta em função de caracteres de desnecessidade, conforme alegado na petição de embargos).
Com efeito, a obrigação exequenda resulta do título executivo e este traduz-se numa decisão homologatória de um acordo de exercício de responsabilidades em vigor e que, em sede própria, não foi alterado.
Assim, o imerecimento ou a eventual desnecessidade de alimentos, tendo-se presente que falamos já dos alimentos educacionais devidos a partir da maioridade do alimentando, que o embargante alega, a ocorrerem, haveriam de relevar no âmbito da cláusula de irrazoabilidade, prevista como possível causa de cessação da obrigação fixada por decisão judicial homologatória de acordo sobre responsabilidades parentais.
A discussão dessa matéria, porém, só poderia ocorrer ou no âmbito do próprio processo de regulação das responsabilidades parentais, em incidente a correr por apenso (art. 989º, nº 2 do CPC) ou eventualmente através do expediente previsto no art. 936º do CPC, no âmbito do processo executivo especial por alimentos.
Tal discussão, pelo contrário, já não pode ocorrer no âmbito de um expediente de embargos, sob pena de se poderem criar decisões judiciais contraditórias: aquela de que resulta a fixação da obrigação de prestação de alimentos, que sempre se manteria, pois não poderia ter-se por extinta por efeito da eventual procedência dos embargos de executado, a par de um outra que a iria contradizer, ao desonerar o obrigado daquela sua obrigação, por efeito dessa procedência.
Conclui-se, assim, pela irrelevância, nesta sede, das referidas questões suscitadas pelo embargante, bem como pela eventual instrução e demonstração da factualidade que lhe é inerente.
E é nesta medida que não pode deixar de declarar-se prejudicada a discussão e decisão da impugnação que o apelante oferece em relação à decisão sobre a matéria de facto, designadamente a propósito da decisão positiva proferida sobre a factualidade descrita nas als. e), g), i), j), e k) dos factos provados.
De resto, o constante da al. e) reduz-se a uma súmula do constante do acordo homologado quanto às responsabilidades parentais relativas ao jovem B…, sendo irrelevante a superior precisão da mesma matéria, tal como constava da redacção alternativa proposta pelo apelante; a matéria das alíneas g) e i) resulta irrelevante em face da permanência da obrigação de alimentos, cuja cessação ou alteração não foi proposta pelo apelante, em observância do ónus que, para esse efeito, se lhe impunha; a matéria da al. j) refere-se apenas ao cálculo de juros; e a matéria da al. k) seria indiferente para a decisão a proferir, já que em relação à correspondente obrigação (propinas da Universidade E…) foi decidida a ausência de responsabilidade do apelante.
Nestes termos, por todo o exposto, resta concluir pela improcedência do recurso do embargante D….
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Em resumo, e quanto a ambos os recursos:
a) Procederá parcialmente a apelação dos exequentes/embargados, no respeitante ao valor correspondente às quantias devidas a título de alimentos referentes aos meses decorridos entre 1/6/2014 e 1/10/2015, à razão de 200,00€ por mês, actualizados segundo o prescrito no acordo relativo às responsabilidades parentais em discussão, e inerentes juros, a contabilizar tal como decidido na sentença recorrida em relação aos valores vencidos ulteriormente a essa data. Revoga-se, por isso, a sentença recorrida na parte em que julgou procedentes os embargos e declarou extinta a execução pelos valores correspondentes.
b) Improcederá, no mais, a apelação dos exequentes/embargados, no respeitante ao valor correspondente a metade das quantias despendidas a título de propinas entregues à Universidade E…, a propósito do que a decisão recorrida julgou procedentes os embargos, em termos que se confirmam.
c) Improcederá in totum o recurso de apelação do embargante, confirmando-se, quanto a todas as questões suscitadas, a decisão recorrida.
Sumariando:
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3 - DECISÃO
Pelo exposto, acordam os juízes que constituem este Tribunal em julgar parcialmente procedente a apelação dos embargados B… e C…, revogando, por isso, a sentença recorrida na parte em que julgou procedentes os embargos e declarou extinta a execução no respeitante ao valor correspondente às quantias vencidas a título de alimentos referentes aos meses decorridos entre 1/6/2014 e 1/10/2015, à razão de 200,00€ por mês, actualizadas segundo o prescrito no acordo relativo às responsabilidades parentais em discussão, e inerentes juros, a contabilizar em termos idênticos ao decidido na sentença recorrida em relação aos valores vencidos ulteriormente a essa data. Consequentemente, a execução prosseguirá também para cobrança do valor correspondente.
Improcederá, no mais, a apelação dos embargados, designadamente quanto ao valor correspondente a metade das quantias despendidas a título de propinas, entregues à Universidade E…, a propósito do que a decisão recorrida julgara procedentes os embargos, em termos que se confirmam.
Mais acordam em julgar improcedente in totum o recurso do embargante D…, confirmando-se, quanto a todas as questões suscitadas, a decisão recorrida.
Custas por apelantes e apelado na proporção do decaimento, em relação ao recurso dos embargados, e apenas pelo embargante em relação ao recurso por si oferecido.
Registe e notifique.

Porto, 15/12/2020
Rui Moreira
João Diogo Rodrigues
Anabela Tenreiro