ATA DE ASSEMBLEIA DE CONDOMÍNIO
TÍTULO EXECUTIVO
PENALIDADES
HONORÁRIOS DE ADVOGADO
Sumário


I- Preenchem os requisitos exigíveis pelo art. 6º, nº 1, do DL n.º 268/94, de 25 de outubro, quer as atas que integrem as deliberações das assembleias que decidem o valor das quotas periódicas que devem ser pagas pelos condóminos para suportar as despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns do edifício e dos serviços de interesse comum, bem como os encargos com inovações devidamente deliberadas, aludidas nos nº 1 dos artigo 1424º e 1426º do Código Civil, com fixação da sua data de vencimento, (prescindindo de ata que liquide o que for já devido), quer as atas que retratem a deliberação dos condóminos onde se procedeu à liquidação dos montantes em dívida por cada condómino;
II- Satisfaz os requisitos de título executivo a ata que apenas indique um valor global sem detalhar as parcelas que integram o montante aprovado, nem especificar a respetiva origem, desde que no requerimento executivo se proceda à discriminação das dívidas que compõem aquele valor globalmente aprovado pelo coletivo de condóminos, de modo a que o executado possa exercer plenamente o seu direito ao contraditório;
III- As atas certificativas da existência do que em determinado momento é devido ao condomínio por um determinado condómino pressupõem as pretéritas deliberações das assembleias em que resultou fixada a comparticipação de cada condómino nas despesas comuns, e a que título, bem como o prazo do respetivo pagamento, pelo que, no caso de, em razão dos elementos carreados para os autos, nomeadamente no âmbito dos embargos deduzidos, houver fundadas dúvidas sobre a existência daquelas deliberações, forçoso é que o julgador as esclareça, determinando a junção aos autos das atas comprovativas da sua existência a fim de, caso as mesmas efetivamente inexistam, declarar extinta a execução por falta de título executivo;
IV- “As actas da reunião assembleia de condomínio constituem título executivo, nos termos do art. 6º, nº 1 do DL 268/94, de 25/10, quanto: - às penalidades fixadas nos termos do art. 1434º do CC, por integrarem o conceito «contribuições devidas ao condomínio», e - aos honorários devidos ao mandatário que patrocine a demanda que tenha por fim exigir coercivamente do condómino a satisfação da sua quota-parte relativa às contribuições devidas, por constituir despesa necessária ao pagamento de serviço de interesse comum.”
V- Todavia, relativamente às penalizações, forçoso é haver uma deliberação que aplique a regra aprovada à concreta situação de mora verificada, só esta ata constituindo título executivo para a respetiva cobrança: “a aplicação de tal pena terá de ser objeto de uma decisão por parte do condomínio, na sequência de uma apreciação da situação em apreço que reconheça a ocorrência de uma violação de alguma disposição por parte do condómino, a sua gravidade e a oportunidade de aplicação da pena pecuniária prevista”;
VI- A ata também não preenche os pressupostos do nº 1 do art. 6º do DL 268/94, de 25/10, não podendo, pois, considerar-se como título executivo relativamente aos honorários “a pagar a advogado na acção a intentar, ou em pedidos formulados na acção executiva, mesmo que (esses pedidos) tenham sido aprovados em assembleia de condóminos e constem da respectiva acta, quando tais honorários (ali) não tenham sido previamente fixados”.

Texto Integral


Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães:

I. RELATÓRIO:

O Condomínio do Prédio sito na Rua ..., n.º .., em Braga, veio propor ação executiva, para pagamento de quantia certa, contra D. P. e M. F., para destes haver a quantia de €5.908,35, juntando como título executivo ata de condomínio, ao abrigo do art. 703º, d), do CPC.
Regularmente citados para deduzir oposição, vieram os Executados/Embargantes alegar, em síntese, a “inexequibilidade da dívida que fundamenta a execução” pois a Ata número 1, resultante da Assembleia de Condóminos de 5 de abril de 2017, por ser a única Ata referida no Requerimento Executivo, não é Titulo Executivo, porque a mesma não reúne os requisitos de exequibilidade exigidos pela lei para constituir Titulo Executivo e fundamentar a Execução, nunca foram notificados de nenhuma Ata nem lhes foi solicitado qualquer pagamento e não foram prestadas contas aos mesmos, desconhecendo a que parcelas ou itens a que se refere a dívida de € 2.818,50 que é imputada à fração de que são proprietários, deixando invocada a prescrição quanto a estes valores.
Mais defendem que da Ata exequenda não consta qualquer deliberação que fixe o montante das contribuições, especificando a que despesas respeitam, a quota-parte de cada condómino nessas despesas e um prazo para o pagamento, isto é, a Ata executada não explica a proveniência da quantia exequenda e as operações aritméticas que nela resultaram, nela não estando também determinados os sujeitos da relação executiva, pelo que os requisitos de exequibilidade da certeza, da exigibilidade e da liquidez da liquidação impostos pela lei estão ausentes do título usado nos Autos sendo ainda certo que a ata é posterior a grande partes das supostas dívidas cujo pagamento é reclamada no requerimento executivo, razão pela qual tal ata não poderá ser título executivo. Concluíram pela procedência dos embargos. Notificado do teor da dita oposição, veio o Exequente alegar, em síntese, que a ata que serve de título executivo aos autos executivos foi devidamente notificada aos Embargantes, conforme resulta do AR junto com o requerimento executivo, considerando-se sanados todos os eventuais vícios da mesma no caso de tais deliberações não terem sido tempestivamente impugnadas.
Mais alega que, mesmo que alguma razão tivessem os Embargantes – o que não se aceita – quanto a qualquer uma das questões que suscita, é patente a Má-Fé com que as invoca, agindo em claro abuso de direito.
Conclui dizendo que, face ao incumprimento reiterado dos Embargantes que sabiam e não podiam desconhecer que eram devidas contribuições ao condomínio, não cumpriram essas obrigações, em claro e manifesto “atropelo” pelos direitos dos outros condóminos, viram-se os demais condóminos forçados a suportar despesas superiores às que lhes caberiam para garantir o normal funcionamento do prédio e bem assim, o bem-estar do coletivo pelo que entende que deve a presente Oposição ser julgada improcedente por não provada, prosseguindo-se com a Execução.
Realizado o julgamento, foram os embargos de executado considerados procedentes tendo, em consequência, sido determinada a extinção dos autos principais de execução, por “falta de título executivo válido”.

Inconformado, o Exequente interpôs recurso, em cuja alegação formulou as seguintes conclusões:

i) Visa o presente recurso questionar a douta decisão proferida pelo Tribunal a quo que, com recurso a uma errada interpretação da prova documental e testemunhal carreada ao processo, decidiu julgar procedente a oposição à execução apresentada nos autos,
ii)Fundamentando tal decisão no facto de a Acta que serviu de base ao Requerimento Executivo, não constituir título válido, por não reunir os requisitos da certeza, liquidez e exigibilidade,
iii) Decisão essa em clara contradição com anterior despacho proferido nos autos, ao arrepio de tudo o que se passou em audiência de discussão e julgamento, fazendo “tábua rasa” de todos os documentos apresentados e cujo conteúdo logrou provar-se e, por fim, de todos os depoimentos ali prestados. E ainda,
iv) Em manifesta contradição com Jurisprudência de Venerandos Tribunais Superiores que, em vários arestos (alguns deles citados nestas Alegações), decidiram que será de considerar como título Executivo uma acta de assembleia de condóminos onde se fixe a deliberação sobre o montante das contribuições ou despesas devidas ao condomínio, a fixação da quota- parte devida por cada condómino e o prazo de pagamento respectivo, podendo a referência ao montante em dívida ser referente ao valor global e, mesmo referente a anos anteriores.
v) Para ser Título a Acta deve fixar os montantes das contribuições devidas ao condomínio, o prazo de pagamento e a fixação da quota parte de cada condómino. Isto é,
vi) A Acta em que se fixa o montante a pagar será sempre Título Executivo, na medida em que fixa a sua contribuição, não se exigindo que contenha a dívida ou dívidas do condómino relapso, existentes apuradas ou conhecidas. Ora,
vii) A Acta dada à Execução fixava a contribuição dos Condóminos faltosos e ainda o prazo de cumprimento da dita prestação.
viii) No caso concreto, verifica-se que foram devidamente notificados aos agora Recorridos documentos em que se especificavam os valores em dívida, a sua distribuição no tempo e a que títulos eram devidos. Ora,
ix) Da análise de tais documentos, resultava, de forma clara, simples e facilmente perceptível o montante em dívida, a que contribuições se referiam e desde quando se encontra o condómino em dívida com tais contribuições. Acresce que,
x) A exequibilidade de uma Acta não exige, necessariamente, a menção, nessa mesma acta, do quantitativo exacto relativo à dívida de cada condómino. Necessário é sim que se aprove o montante ou montantes certos da contribuição ou despesa devida de modo global, para que, por aplicação das regras da permilagem ou de outro critério que venha a ser aprovado, se determine o “quantum” devido por cada condómino e, bem assim, o prazo de pagamento de tal contribuição. Ora,
xi) A acta dada à Execução cumpre todos os requisitos de que a lei faz depender a sua validade, devendo, por isso, ser admitida como título executivo.
xii) Da prova produzida em audiência de discussão e julgamento, nomeadamente, das declarações da testemunha M. G. (Advogada de profissão e filha dos Executados), resultou que durante vários anos as contribuições devidas ao condomínio não foram pagas.
xiii) Como acima se defendeu, e contrariamente ao decidido pelo Tribunal a quo, a acta dada à Execução, cumpre todos os requisitos para valer como título executivo.
xiv) Pelo que não deveria o Tribunal ter decidido como decidiu,
xv) Muito menos ao arrepio e sem considerar todas as outras questões que se levantavam nos autos e, bem assim, desconsiderando toda a prova produzida em audiência de discussão e julgamento que, foi no sentido de que as contribuições não foram pagas e são devidas.
xvi) Com todo o respeito, a decisão do Tribunal a quo veio premiar o incumprimento dos condóminos que, embora soubessem e não pudessem ignorar (tanto mais que têm uma filha Advogada), as suas obrigações enquanto proprietários de fracção, nomeadamente quanto ao pagamento de quotas e outras despesas comuns, vêm a sua actuação ser premiada com a absolvição,
xvii) Enquanto que todos os outros condóminos cumpriram com tais obrigações,
xviii)Criando desigualdades entre os cumpridores que não são de todo legítimas podendo até potenciar o futuro incumprimento dos outros condóminos.
xix) Deve a acta ser considerada título executivo válido, devendo ainda ser admitidas todas as quantias ali peticionadas (nunca é demais lembrar que a acta dada à execução foi devidamente notificada aos Executados e não foi por aqueles impugnada – e poderia tê-lo sido tanto mais que a filha de ambos é Advogada-), incluindo as pedidas a título de penalizações pelos atrasos e, bem assim, as peticionadas a título de compensação pelas despesas com a acção judicial, mormente as que visam compensar o Recorrente de despesas com honorários de Advogado.
xx) É da mais elementar Justiça, que os condóminos relapsos sejam penalizados pelo atraso no pagamento, tanto mais que os mencionados atrasos tiveram como consequência sobrecarregar os condóminos cumpridores com acréscimos de despesas e encargos que não teriam tido caso os ora Recorridos tivessem cumprido com as obrigações a que estavam adstritos e que sabiam, e não podiam ignorar, ser de sua responsabilidade.
xxi) A sentença ora em crise refere expressamente que os então Executados apresentaram Oposição à Execução mediante Embargos com fundamento na falta de validade do título dado à Execução (Acta) e, bem assim, a inexigibilidade da obrigação exequenda, sendo que do Despacho Saneador nada consta quanto à questão da validade do Título, constando, isso sim, não existirem quaisquer nulidades, excepções que obstem ao conhecimento do mérito da causa, pelo que a douta decisão proferida, fundamentada na inexistência de Título Executivo, consubstancia uma decisão surpresa.
xxii) Conforme se decidiu no Acórdão deste Venerando Tribunal da Relação de Guimarães, processo n.º 6017/10.0TBBRG-A.G1, Relator Helena Melo, disponível em dgsi.pt: “Em sede de saneador-sentença, o juiz deve, nos termos do n.º 1 do art. 608.º do CPC, começar por conhecer das exceções dilatórias de que lhe cumpra conhecer, designadamente da competência do tribunal em razão da matéria para, só depois – e apenas na hipótese de vir a concluir no sentido competência –, conhecer das demais questões, designadamente aquelas que apenas têm a ver com o mérito da causa, como é o caso da existência ou não de título executivo”.
xxiii) O tribunal a quo, ao invés da decisão agora proferida, deveria, em sede de Despacho Saneador, ter convidado a parte/recorrente a aperfeiçoar o requerimento executivo, suprindo alegadas irregularidades de que o requerimento executivo pudesse padecer, retificando o seu teor e/ou juntando documentação que lograsse suprir a alegada irregularidade.
xxiv)O Tribunal, na aplicação do direito, deve procurar sempre a decisão mais justa, adequada, proporcional e conforme com a verdade material, o que de todo sucedeu neste caso.
xxv) Ao decidir como decidiu, i.e., absolvendo os ora Recorridos da instância, por, alegada, falta de título válido, sem que em tempo algum do processo se tenha debruçado sobre essa questão formal, o Tribunal a quo veio a proferir uma decisão-surpresa por estar em manifesta contradição com despacho anteriormente proferido e, bem assim, por se encontrar em manifesta contradição com o que foi a audiência de discussão e julgamento. A este respeito importa referir o seguinte,
xxvi) Ocorre decisão surpresa quando a solução seguida pelo tribunal se desvincula totalmente da posição que esse mesmo Tribunal assumiu nos autos;
xxvii) Quando, embora se devesse ter debruçado sobre a questão formal da validade do título (não só porque os ora Recorridos suscitaram tal questão em sede de Oposição à Execução, mas também por ser esta uma questão de conhecimento oficioso e que lhe cumpria conhecer);
xxviii) Quando, ao arrepio de toda a prova produzida em audiência de discussão e julgamento em que a questão formal da validade do título não foi, de todo, o centro da discussão entre as partes,
xxix)O Tribunal veio a decidir precisamente fundamentando a sua decisão na questão formal da inexistência de título executivo. Com efeito,
xxx) Conforme defende a doutrina e a jurisprudência configura decisão surpresa a sentença proferida nos autos de oposição à execução, que julga procedente a exceção da inexequibilidade do título executivo dada à execução (ata de assembleia de condomínio), quando se verifica que apesar dessa exceção ser do conhecimento oficioso do tribunal, este não conheceu daquela aquando da prolação de despacho liminar na execução;
xxxi)Muito mal andou o Tribunal a quo ao não ter conhecido da exceção a que se alude, não só porque os então Embargantes lançaram mão dessa alegação em sede de Embargos, mas também porque a dita exceção é de conhecimento oficioso.
xxxii) Com a sua actuação, o Tribunal a quo criou nas partes a confiança de que a instância se considerava regular, e que a audiência de discussão e julgamento serviria para procurar e provar a verdade material dos factos e não a formal. Mais,
xxxiii) Realizada a audiência, essa verdade foi (activamente) procurada, tendo sido provados alguns factos mais do que relevantes para a decisão da causa. Ora,
xxxiv) Não se compreende como pode o Tribunal a quo, ao arrepio de tudo o que se verificou em sede de audiência, mormente quanto ao depoimento das testemunhas que, entre outros, confirmaram factos relevantes para a decisão da causa (mormente quanto à existência de dívidas ao condomínio),
xxxv) Proferir sentença que em nada plasma o que foi a discussão das partes,
xxxvi) Fundamentando tal decisão na questão da inexistência de título, em clara contradição com despacho anteriormente proferido. Em suma,
xxxvii) O tribunal a quo, não se tendo debruçado, em sede de despacho liminar, sobre questão de conhecimento oficioso nem tendo convidado a exequente/recorrente a suprir irregularidades, corrigindo o requerimento executivo e/ou juntando documentação violou, por errada interpretação e aplicação o disposto no n.º 1 do artigo 734º, o n.º 4 do artigo 726º e o n.º 2, do artigo 6º, do CPC, tendo cometido irregularidade relevante – 195º, n.º 1 do CPC.
xxxviii) Em audiência de discussão e julgamento, resultaram provados vários factos que permitiriam ao Tribunal a quo decidir diferentemente do que decidiu.
xxxix) Concretamente, das declarações da Testemunha M. G. (filha dos Executados e Advogada de profissão) que referiu expressamente que as quotas de condomínio não foram pagas, que a acta foi devidamente comunicada e não foi impugnada,
xl) da testemunha A. M. – anterior Administrador do Condomínio (cujo extrato de declarações foi transcrito nestas alegações), que de forma clara, isenta e com razão de ciência, confirmou a existência de dívidas por parte dos aqui Recorridos
xli) Por sua vez, a testemunha A. C. – Actual Administradora do Condomínio, tendo deposto de forma clara e credível confirmou igualmente a existência das dívidas peticionadas, os anos em que as quotas e outras despesas se encontram em incumprimento, que diligências foram levadas a cabo, antes da entrada da acção que deu origem a esta decisão, no sentido de que as partes resolvessem o diferendo de forma extrajudicial e, bem assim, como eram realizadas as comunicações com as partes no que toca à convocação para Assembleias e/ ou notificação das actas
xlii) Erradamente, e contra tudo o que ficou plasmado em audiência de discussão e julgamento, o Tribunal a quo não devia ter decidido por fundamentar a sua decisão na questão formal da validade da acta dada à execução, dado que, da audiência de discussão resultaram provados factos que, incidindo sobre as questões suscitadas, deveriam ter conduzido a uma decisão sobre esses mesmos factos e, em consequência, sobre a questão material a dirimir.
xliii) A douta sentença violou, por má interpretação e aplicação, o disposto pelos artigos 6º do DL n.º 268/94, de 25.10, 703º nº 1-d) do CPC, o disposto no n.º 1 do artigo 734º, o n.º 4 do artigo 726º e o n.º 2, do artigo 6º, do CPC, tendo cometido irregularidade relevante – 195º, n.º 1 do CPC, devendo como tal ser revogada.
Termina requerendo seja dado provimento ao recurso e alterada a decisão recorrida nos termos pugnados no presente recurso.
Foram apresentadas contra-alegações, em que os Recorridos pugnaram pela rejeição da impugnação da matéria de facto e pela improcedência do recurso.
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

*
II. DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO:

Como é sabido, as conclusões da alegação do recorrente delimitam o objeto do recurso, ressalvadas as questões que sejam do conhecimento oficioso do tribunal (artigos 635º, n.º 4 e 639º, n.º 1 do NCPC).

No caso vertente, face aos fundamentos invocados pelo Recorrente, a montante da aparentemente visada alteração da matéria de facto (e, portanto, da questão da rejeição da “impugnação” suscitada pelos Recorridos), colocam-se as seguintes questões:

- Saber quais as atas de condomínio que constituem título executivo à luz do disposto no artigo 6º, nº 1, do DL n.º 268/94, de 25 de outubro;
- Saber se, no caso da ata de onde resulta o reconhecimento de dívida do condómino, a força executiva da mesma depende necessariamente que da ata conste a “indicação suficiente dos seus elementos identificativos essenciais, que permita ao executado perceber o que se encontra em execução”;
- Na hipótese de se optar pela interpretação não restritiva do aludido preceito, saber se havendo dúvidas sobre a existência das pretéritas deliberações da assembleia geral pressupostas pela deliberação em que resultou fixada a dívida global do condómino, deve a execução prosseguir ou deve o julgador esclarecê-las, determinando a junção aos autos das atas comprovativas da sua existência e só ulteriormente, caso as mesmas inexistam, declarar extinta a execução por falta de título executivo;
- Saber se, face aos requisitos que se vierem a identificar e independentemente de qualquer aditamento à matéria de facto, a concreta ata dada à execução constitui título executivo relativamente a cada um dos valores cuja cobrança é visada nos autos, nomeadamente quanto às penalizações, bem como aos honorários e demais despesas associadas à cobrança judicial da dívida.

III – FUNDAMENTOS

Os factos
A primeira instância considerou provados os seguintes factos:
1) O Exequente, é o administrador do condomínio do prédio sito na Rua ..., n.º .., …, Braga, é representado pela sua Administradora eleita, conforme deliberação da Assembleia de Condóminos de 5 de Abril de 2017 ínsita no ponto 8(oito) da acta n.1
2) Os Demandados/Executados (casados entre si) são donos e legítimos proprietários da fração autónoma designada pelas letras AL, correspondente ao 5.º andar esquerdo, descrita na CRP de Braga (...), sob o n.º … e inscrita na matriz sob o artigo ....
3) Em 19 de Março de 2017, foram os ora Executados notificados, por carta registada com A/R, da convocatória para realização da assembleia de condóminos (e da respetiva ordem de trabalhos).
4) Os Executados, embora regular e devidamente notificados, não compareceram à mencionada reunião.
5) A 5 de Abril de 2019, foi realizada a aludida assembleia onde foi deliberado, entre outros, que a Administração agiria judicialmente contra os condóminos devedores.
6) A mencionada ata foi notificada aos ora Executados e não foi impugnada.
7) Pode ler-se na Ata n.º1 de 2017, para, além do mais, o seguinte:
Ponto 1 – Apresentação de contas dos anos 2010 a 2016, tendo sido explicados os valores verbalmente, passou a votação, tendo estas sido aprovadas por unanimidade. O mesmo relatório de contas dando-se por reproduzido (doc.4), apresenta os seguintes saldos: 1 – Dívida dos condóminos: € 5.933,00, sendo que € 1.836,00 respeitam à fração AH, e que desses, € 452,50 são devidos por D. P. (…), AL 2.818,50€; 2. Dívidas a fornecedores: 3.420,00€, sendo 2.900,00€ à ... elevadores e 520,00€ de limpeza;
Ponto 2: Realização de 2.900,00€ para pagamento à ... dado terem um processo judicial em curso contra o condomínio (…)” foi aprovado por unanimidade dos presentes “cada um fazer um empréstimo ao condomínio no montante de € 264,00….”.
Ponto 3. “(…) 1. Por unanimidade dos presentes, foi aprovado que o capital do seguro terá de ser no mínimo de 650,00€ m2 (…).
Ponto 4. Foi aprovado por unanimidade dos presentes, incumbir a administração adiante identificada no Ponto 8, para contratar os serviços de Advogado ou Solicitador, por forma intentar ações judiciais contra os condóminos que tenham dívidas ao condomínio (…).
Todas as despesas do processo (Advogado, Solicitador, Tribunal), (…), ficam a cargo do condómino devedor.
Ponto 6. Foi aprovado por unanimidade dos presentes, que o condomínio é liquidado até ao dia 08 (oito), sendo de 20,00€ mensais. Passado esse prazo, serão cobrados por cada dia de atraso 0,50€ a título de penalização até efetivo pagamento.
Ponto 7. (…) ”. Apresentadas três propostas para substituição do telhado, depois de analisadas e votadas, foi aprovada por unanimidade dos presentes, a proposta da empresa de L. B. (…). Não é possível ainda apresentar quanto cabe a cada um, por não estarmos na posse da permilagem de duas lojas (…).
2. Foi também aprovado por unanimidade, que independentemente da permilagem dos apartamentos não ser igual, mesmo assim pagarão todos o mesmo valor, o mesmo se passa com a prestação de condomínio.
Ponto 8. Foi eleita por unanimidade dos presentes para Administrador, A. C. (…), ficando isenta de pagar condomínio.
Ponto 9. Foi proposto, discutido e aprovado por unanimidade dos presentes, que as frações destinadas à habitação, terão de pagar 2,50€ mensais, desde Janeiro de 2017 para o FUNDO DE RESERVA e as lojas 5,00€ mensais desde Janeiro de 2012 também para o FUNDO DE RESERVA (…) Foi também aprovado por unanimidade dos presentes, que os condóminos que devem prestações, sejam elas de condomínio, obras ou outras, dispõem de 30 dias para procederem ao pagamento, findo esse prazo, serão esses débitos enviados para cobrança Judicial sem mais avisos.
8) Os ora executados foram interpelados, por carta registada datada e 19/07/2017, cujo aviso de receção foi assinado pelo Executado marido, para procederem ao pagamento da quantia em dívida, todavia, até à data, os ora Executados não procederam a qualquer pagamento.
9) No requerimento executivo que deu origem aos autos executivo pode ler-se na descrição dos factos, para além do mais, o seguinte:
“(…) 11) Apesar de bem saberem que são responsáveis pelo pagamento das quotas de condomínio e, bem assim, das despesas associadas às partes comuns do imóvel, os ora Demandados são devedores da quantia de € 4.408.35 (quatro mil quatrocentos e oito euros e trinta e cinco cêntimos), conforme Mapa de Conta Corrente que aqui se anexa (Cfr. Doc. n.º 5).
12) São ainda responsáveis pelo pagamento das despesas associadas à instauração da presente acção judicial, conforme o deliberado na já mencionada Assembleia (Cfr. ponto 4 da Acta). Ora,
13) O montante das despesas a que se aludiu foi estimado em quantia não inferior a € 1.500,00 (mil e quinhentos euros).
14) O que perfaz o montante global de € 5.908,35 (cinco mil novecentos e oito euros e trinta e cinco cêntimos).

Deve ainda considerar-se que:

- É o seguinte o teor integral do ponto 7 da referida ata:
- Com o Requerimento Executivo foi junto um documento denominado “Mapa de Conta Corrente”, numerado como “5”, cujo teor a seguir se reproduz por imagem.













O Direito

Está em causa saber se o documento apresentado à execução constitui ou não título executivo.
Como se sabe, o título executivo é um pressuposto processual específico da ação executiva, requisito de admissibilidade desta, sem o qual não têm lugar as providências executivas que o tribunal deverá realizar com vista à satisfação da pretensão do exequente e que são, no processo executivo, o equivalente à decisão de mérito favorável no processo declarativo (José Lebre de Freitas, in A Acção Executiva - À Luz do Código de Processo Civil de 2013, 7ª edição, páginas 39 a 44).
Como questão que poderia ter determinado, se apreciada nos termos do art. 726º, nº 2, a), do CPC, o indeferimento liminar (ainda que parcial – nº 3 do citado artigo) ou o aperfeiçoamento do requerimento executivo, o juiz pode conhecer oficiosamente da falta ou insuficiência do título executivo até ao primeiro ato de transmissão dos bens penhorados – art. 734º, nº 1, do CPC.
O juiz deve, pois, rejeitar a execução “logo que se aperceba da ocorrência de alguma das situações susceptíveis de fundar o indeferimento, quer ela fosse já manifesta à data do despacho liminar, quer só posteriormente se tenha revelado no processo executivo ou mesmo no processo declarativo de embargos de executado” (Marco Carvalho Gonçalves, in Lições de Processo Civil Executivo, pág. 225, citando Acórdão desta Relação de 12.10.2005, com indicação de múltiplos acórdãos no mesmo sentido).
Por outro lado, caso tal não suceda, prevê a lei a possibilidade de o executado invocar a inexistência de título executivo em sede de embargos à execução – art. 729º, alínea a), ex vi art. 731, ambos do CPC.

No caso, apesar de terem denominado a primeira parte da sua oposição como “inexequibilidade do título que fundamenta a execução”, à falta de título executivo se reconduz o invocado pelos ora Recorridos nos embargos deduzidos.
No caso sub judice está em causa uma ata de reunião da assembleia de condóminos.
O artigo 6º, nº 1, do DL n.º 268/94, de 25 de outubro, determina que “a ata da reunião da assembleia de condóminos que tiver deliberado o montante das contribuições devidas ao condomínio ou quaisquer despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns e ao pagamento de serviços de interesse comum, que não devam ser suportadas pelo condomínio, constitui título executivo contra o proprietário que deixar de pagar, no prazo estabelecido, a sua quota-parte”.
A respeito da discussão jurisprudencial sobre os requisitos das atas de condomínio para valerem como títulos executivos, é esclarecedor o Acórdão desta Relação de 2020-09-10 (Relatora - Sandra Melo), que começa por sublinhar que “esta norma tem tido as mais variadas interpretações e aplicações, encontrando-se ainda hoje uma miríade de entendimentos sobre os requisitos exigíveis às atas para servirem de título executivo, que muitas vezes se excluem, o que, além do mais, dificulta o recurso ao processo executivo pelos condomínios”, sendo, contudo, “largamente aceite que as deliberações das assembleias que decidem o valor das quotas periódicas que devem ser pagas pelos condóminos para suportar as despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns do edifício e dos serviços de interesse comum, bem como os encargos com inovações devidamente deliberadas, aludidas nos nº 1 dos artigo 1424º e 1426º do Código Civil, com fixação da sua data de vencimento, preenchem os requisitos exigíveis por esta norma (prescindindo de ata que liquide o que for já devido).”
Para apreciação do caso concreto é, porém, também necessário recordar que “a corrente que faz uma interpretação restrita da norma, com muitos seguidores, afasta a força executiva de ata de assembleia em que se delibera descrever os montantes em dívida, face as deliberações anteriores, por determinado condómino, respeitante a tais contribuições, considerando que, no fundo, não corresponde exatamente ao descrito na norma especial que criou este título executivo, por não conter a deliberação nela descrita”.

Isto na medida em que na sentença recorrida se entendeu inexistir título executivo com, no essencial, o seguinte fundamento:
A nosso ver, o que nos interessava era a ata que onde foi deliberado qual o montante das quotas que cabia a cada condómino e fixado o montante da contribuição de cada um dos condóminos para o fundo de reserva, bem como a(s) ata(s) que aprovou(aram) a quota em vigor para cada um dos anos em causa (que também não se descortina quais sejam da ata junta aos autos). Por conseguinte, entende-se que a ata dada à execução não consubstancia um título executivo válido, pois que na mesma apenas se deliberou sobre os montantes em dívida.
Que dizer?
Desde já, que, tal como se defende no citado acórdão desta Relação, “uma leitura muito exigente desta norma, escapando ao seu espírito, afasta-se da realidade portuguesa e dos objetivos que com ela se quis criar: permitir aos condóminos não relapsos, com a maior brevidade possível, alcançar forma de satisfazer as despesas de conservação e fruição das partes comuns, bem como as despesas com serviços de interesse comum”. Ao que acresce que, sendo inegável que “a diversidade de entendimentos quanto a este aspeto formal dificulta de tal forma o acesso ao direito por parte dos condomínios”, também nos “parece sensato conceder força executiva às atas das quais resulte, de forma clara e indubitável, quer a constituição da obrigação, quer o seu reconhecimento (…)”.
Com efeito, não temos dúvidas em afirmar que, “(…) tendo em conta a letra do artigo 6º, nº 1, do decreto-lei nº 268/94, que alude ao montante das contribuições devidas e não à fixação dessas contribuições, tendo em conta a teleologia dessa previsão expressa no preâmbulo do citado decreto-lei e tendo ainda em conta que a detenção de um título executivo em que o devedor não teve intervenção não altera as regras gerais de distribuição do ónus da prova, cabendo por isso ao Administrador do Condomínio demonstrar os factos constitutivos do crédito exequendo, quando os mesmos sejam impugnados pelo devedor, afigura-se-nos que deve ser seguida a posição jurisprudencial de que é também exequível a acta que retrate a deliberação dos condóminos onde se procedeu à liquidação dos montantes em dívida por cada condómino” (Acórdão da Relação de Coimbra de 20/6/2012, pº 157/10.2TBCVL-A.C1, Relator - Carlos Gil).
Por outro lado, temos por certo que “é manifesto que actas (…) em que a assembleia de condóminos delibera, enquanto expressão da vontade colectiva do condomínio, que, em determinado momento, este ou aquele condómino tem em dívida determinado montante, referente a um ou vários anos, explicitando a origem das diversas parcelas que compõem esse montante – abrangem, por definição, porque as pressupõem - as pretéritas deliberações das assembleias em que resultou fixada a comparticipação de cada condómino nas despesas comuns, e a que título, bem como o prazo do respectivo pagamento”. – cfr. Acórdãos da Relação de Lisboa, de 07.072011 (Relatora - Maria Teresa Albuquerque) e de 29.06.2006 (Relator - Pereira Rodrigues). Esta opinião é reafirmada pelo Relator do último, in Elucidário de Temas de Direito (Civil e Processual, pág.´s 105 e 106).
Na verdade, por definição, o título executivo constitui base da presunção da existência (e titularidade) da obrigação exequenda mas, antes disso, integra a base da presunção da existência do facto que a constituiu (Lebre da Freitas, A Ação Executiva à luz do CPC de 2013, pág. 93, nota 89).
Questão é, porém, saber se, no caso da ata de onde resulta o reconhecimento de dívida do condómino, a força executiva da mesma depende necessariamente que da ata conste a “indicação suficiente dos seus elementos identificativos essenciais, que permita ao executado perceber o que se encontra em execução”, como se defende no acórdão desta Relação acima citado, sem possibilidade, portanto, de indicação desses elementos no requerimento executivo que a dá à execução.
No sentido de ser de admitir a possibilidade da execução da deliberação que liquide o montante em dívida, mas somente “desde que correctamente discriminado pelos prazos e valores parciais em causa”, posiciona-se também o Acórdão da Relação de Coimbra de 20/6/2012, pº 157/10.2TBCVL-A.C1 (Relator - Carlos Gil), com o argumento de que “sendo tal acta integrada pela descrição dos factos constitutivos do crédito exequendo, nos termos previstos no artigo 810º, nº 1, alínea e), do Código de Processo Civil, o executado está em condições de exercer eficazmente o contraditório.”
Cremos, porém, que satisfará os requisitos de título executivo a ata que apenas indique um valor global sem detalhar as parcelas que integram o montante aprovado, nem especificar a respetiva origem, na condição de, claro está, no requerimento executivo se proceder à discriminação das dívidas que compõem aquele valor globalmente aprovado pelo coletivo de condóminos, de modo a que o executado possa exercer plenamente o seu direito ao contraditório.
Neste sentido também, Virgínio da Costa Ribeiro e Sérgio Rebelo, in A Ação Executiva Anotada e Comentada, 2015, pág. 146, ao afirmarem que não vêm razão para afastar a possibilidade da ata em que tenha sido aprovado o concreto débito constituir título executivo, “desde que, em qualquer dos casos, conste da ata ou seja consignado no requerimento executivo, o período ou períodos a que se refere o alegado débito para que ao demandado seja assegurado o adequado contraditório”.

Igual orientação se seguiu no Acórdão da Relação de Évora, de 12.09.2019 (Relator – José Manuel Lopes Barata) com a seguinte argumentação:
“É certo que a celeridade e a eficácia não são os únicos objetivos de qualquer norma legal, uma vez que os princípios da segurança e certeza no tráfico jurídico são igualmente valores a considerar e que se lhes podem sobrepor.
Mas se esta segurança e certeza se mostrarem asseguradas é a interpretação extensiva que deve prevalecer.
Não pode argumentar-se que estes princípios são arredados se o administrador, no requerimento executivo, expõe sucintamente os factos que fundamentam o pedido, quando não constem do título executivo, tal como obriga a alínea e) do nº 1 do artº 724º do CPC.
Factos que poderão ser sempre impugnados pelo executado mediante embargos.
E com o que se fecha o circuito de segurança e certeza jurídicas de todos os visados pela norma: os condóminos que cumprem regularmente as sua obrigações, os relapsos que as não cumprem e se transformam num encargo insuportável para os que cumprem e para os condóminos que injustamente forem apontados pelo administrador como relapsos.”
Na verdade, admitindo-se, como a generalidade da jurisprudência admite, constituir título executivo a ata que decide o valor das quotas periódicas que devem ser pagas pelos condóminos para suportar as despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns do edifício e dos serviços de interesse comum – da qual, obviamente, não constam os concretos valores que após essa deliberação vieram a ficar em dívida –, o que implica aceitar que a liquidação complementar necessária para efeitos da execução do montante em dívida seja efetuada no requerimento executivo (art. 724º, nº 1, h), do CPC), não nos parece dever colocar-se obstáculos a que, dando-se à execução uma ata que certifique a dívida global de um condómino sem especificação dos valores que a integram, a decomposição do valor global aprovado seja, também ela, feita no requerimento executivo (por semelhança com o que sucede na primeira hipótese), em tal requerimento (ou em documento complementar para o qual aquele remete) se indicando a origem de cada uma das parcelas, o valor em falta da comparticipação nas despesas comuns e o valor mensal de cada uma das quotas em dívida, dando-se, desse modo a conhecer ao executado, sem qualquer prejuízo para o exercício do seu direito ao contraditório, os cálculos feitos para se alcançar a liquidação no montante aprovado pelo coletivo de condóminos que consta da ata.
Isto dito, importa, agora, reconhecer que, precisamente porque, como já dissemos, as atas certificativas da existência do que em determinado momento é devido ao condomínio por um determinado condómino “abrangem, por definição, porque as pressupõem”, “as pretéritas deliberações das assembleias em que resultou fixada a comparticipação de cada condómino nas despesas comuns, e a que título, bem como o prazo do respectivo pagamento”, no caso de decorrer da própria ata certificativa da dívida do condómino que essas prévias deliberações inexistem se impõe reconhecer que a certificação em causa não assenta no pressuposto legal, não podendo, pois, valer como título executivo. E assim sendo, se tal inexistência não decorrer da própria ata mas, em razão dos elementos carreados para os autos, nomeadamente no âmbito dos embargos deduzidos, houver fundadas dúvidas sobre a existência das pretéritas deliberações, forçoso é também que o julgador as esclareça, determinando a junção aos autos das atas comprovativas da sua existência a fim de, caso as mesmas efetivamente inexistam, declarar extinta a execução por falta de título executivo.

No caso concreto, há, desde logo, que assinalar que a ata dada à execução inclui quer a certificação de uma dívida global de diversos condóminos, quer a aprovação da comparticipação de cada condómino em despesas comuns ali também aprovadas, com fixação de prazo para o respetivo pagamento.

Com efeito, consta na dita ata:
Assim, desde logo, mesmo para quem, como a juíza a quo não aceite o valor de título executivo das atas que certifiquem dívidas dos condóminos, forçoso será reconhecer neste segmento da ata dada à execução a aprovação de despesas comuns e a definição da comparticipação que nelas caberia a cada um dos condóminos – diretamente indicada no que toca à comparticipação das campainhas e iluminação do interior do prédio (sendo, como se vê do “Mapa de Conta Corrente” junto com o requerimento executivo e para o qual este remete, o valor de 64,23 €, isto é, o menor dos indicados, aquele que o Exequente visa cobrar) e indiretamente alcançável através da aplicação dos critérios ali definidos às despesas com o telhado, resultando da mera interpretação da ata que a comparticipação das lojas nesta despesa seria feita em função da respetiva permilagem, sendo a comparticipação dos apartamentos igual para todos independentemente da permilagem –, com fixação do prazo de pagamento respetivo, assistindo razão ao Recorrente quando diz que a exequibilidade de uma Acta não exige, necessariamente, a menção, nessa mesma acta, do quantitativo exacto relativo à dívida de cada condómino. Necessário é sim que se aprove o montante ou montantes certos da contribuição ou despesa devida de modo global, para que, por aplicação das regras da permilagem ou de outro critério que venha a ser aprovado, se determine o “quantum” devido por cada condómino e, bem assim, o prazo de pagamento de tal contribuição.
De igual modo, no que toca à aprovação das comparticipações periódicas no montante de 20 € devidas por cada condómino, tanto bastando para considerar que a ata dada à execução vale como título executivo relativamente a todas essas comparticipações devidas a partir de maio de 2017 (inclusive) – tendo em conta que a deliberação é de abril desse mesmo ano –, com exclusão das comparticipações estipuladas a favor do Fundo de Reserva, uma vez que o valor a cobrar visado é relativo ao primeiro semestre de 2017, sendo a deliberação efetivamente retroativa quando estipula o pagamento das referidas comparticipações desde janeiro de 2017.
Resta acrescentar que, tendo em conta que, como resulta do “Mapa de Conta Corrente” que decompõe em parcelas a quantia exequenda, esta apenas engloba montantes relativos à fração .. (não integrando o montante de € 452,50 referido em ata e respeitante à fração AH) e, ainda, que, como resulta do respetivo registo junto com o Requerimento Executivo, os Demandados/Executados (casados entre si) são donos e legítimos proprietários da fração autónoma designada pelas letras AL, correspondente ao 5.º andar esquerdo, descrita na CRP de Braga (...), sob o n.º .. e inscrita na matriz sob o artigo ..., determinados estão os sujeitos da relação executiva.
“Com efeito, o artigo 6º do DL nº 268/94, de 25 de Outubro ao estabelecer que “A acta da reunião da assembleia de condóminos que tiver deliberado o montante das contribuições devidas ao condomínio ou quaisquer despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns (…), constitui título executivo contra o proprietário que deixar de pagar, no prazo estabelecido, a sua quota-parte”.
Neste caso a lei atribui, expressamente, legitimidade passiva para ser demandado como executado ao proprietário de fracção autónoma que deixe de pagar pontualmente a sua quota-parte nos encargos com contribuições e despesas devidos ao condomínio, afastando-se também aqui da regra geral inserta no citado artigo 55º do Código de Processo Civil.” (Ac. da Relação de Lisboa, de 08.11.2012, proc. 46628/04.0YYLSB-A.L1-6)
Por outro lado, como consta dos “Factos provados” sem qualquer impugnação a esse respeito, a mencionada ata foi notificada aos ora Executados e não foi impugnada, o que efetivamente torna não invocável qualquer eventual irregularidade suscetível de servir de fundamento à respetiva impugnação.
Procede, pois, nesta parte, a apelação, devendo revogar-se, no que aos itens supra referenciados concerne, a decisão recorrida, substituindo-a por outra que, quanto aos mesmos, julgue improcedentes os deduzidos embargos, com o consequente prosseguimento da execução relativamente aos correspondentes valores.

Quanto à parte respeitante à certificação da dívida global dos titulares da fração .. (2.818,50 €), a sua decomposição é, no caso, feita através do já referido “Mapa Conta Corrente” junto com o Requerimento executivo e para o qual este expressamente remete, complementado estando, desse modo, tal requerimento, com a descrição integral dos itens (até ao ano de 2016, inclusive) cuja soma ascende ao montante a que alude a ata dada à execução, pelo que, em princípio e face ao mero teor da mesma, nenhum obstáculo existiria a considerar tal ata título executivo quanto à certificada dívida dos Executados.
Sucede, porém, que, relativamente à dívida global assim fixada, afirmou a julgadora da primeira instância que o Exequente, através unicamente dessa ata, peticiona valores relativamente a um período temporal (2010 (?) a 2016) em que ainda não tinha havido qualquer deliberação que aprovasse e fixasse o valor a pagar por cada condómino, correspondente à sua quota-parte para as despesas comuns.
Todavia, não se vê como é que a eventual falta das pretéritas deliberações possa decorrer diretamente da ata em questão, nem a juíza a quo determinou a notificação do Exequente para proceder à junção de quaisquer atas, pelo que vedado lhe estava concluir, sem mais, da forma como concluiu, pela inexistência de qualquer deliberação.
Não deixa, porém, de ser certo que da instrução dos embargos resulta claramente que terá havido um período de tempo que se prolongou durante vários anos em que nenhuma ata terá sido elaborada (como assumido pelo próprio ex-administrador do condomínio), o que suscita fundadas dúvidas sobre a existência das pretéritas deliberações pressupostas pela ata dada à execução no que tange à concreta dívida certificada e, assim sendo, como se disse, forçoso é esclarecê-las, mediante notificação do Exequente para juntar aos autos os elementos necessários para esse efeito, quais sejam: a ata onde foi fixada a comparticipação para o condomínio de 15 €, a ata que alterou essa comparticipação para 20 € e a ata que aprovou a reparação do elevador, fixou a comparticipação dos proprietários da fração .. – ora Executados –, quanto a essa despesa, em 358,50 € e determinou o prazo para o respetivo pagamento.
Após tal esclarecimento, caso as atas contendo as aludidas deliberações inexistam, poderá, então, o julgador da primeira instância declarar extinta a execução por falta de título executivo e dizer com propriedade que o Exequente, se pretendia exigir e cobrar tais valores fixados, discutidos e aprovados em 2017, teria de socorrer-se de uma ação declarativa, não podendo recorrer, de imediato à ação executiva; em alternativa, caso as mesmas sejam juntas aos autos eliminando as dúvidas suscitadas, deverá o mesmo julgador apreciar, relativamente aos itens a tais atas concernentes, os restantes fundamentos dos embargos deduzidos.
Para tal efeito, deve, pois, ao abrigo do disposto no art. 662º, nº 2, c), do CPC, anular-se, no que toca à quantia exequenda no montante de 2.818,50 € - que corresponde à dívida certificada na ata e cujas parcelas componentes se mostram discriminadas no “Mapa de Conta Corrente” a que alude o Requerimento Executivo e que com este foi junto –, bem como às comparticipações periódicas no montante de 20€ relativas aos meses de janeiro a abril de 2017, a decisão proferida na 1ª instância, para apuramento da existência das aludidas atas e subsequente apreciação, em função da posição assumida por esta Relação, da questão da existência de título executivo quanto a cada um dos distintos valores que integram a referida dívida e, na hipótese de prosseguimento dos autos, apreciação das restantes questões suscitadas pelos Embargados.

Deve, aliás, sublinhar-se que, mesmo aqueles que, como a julgadora da primeira instância defendem a interpretação restritiva do preceito em questão, reconhecem que “em casos em que a falta (inexistência) de título não seja manifesta, o juiz deve, ao abrigo do disposto no n.º 2 do art.º 812.º-E do CPC (“fora dos casos previstos no n.º 1, o juiz convida o exequente a suprir as irregularidades do requerimento executivo, bem como a sanar a falta de pressupostos, aplicando-se, com as necessárias adaptações, o disposto no n.º 2 do art.º 265.º”) convidar o exequente a suprir a irregularidade, apresentando o título em falta e, se for o caso, corrigindo o requerimento inicial (neste sentido, Lebre de Freitas, Acção executiva, obra citada, pág. 77). Tal tem sido propugnado por parte da jurisprudência, em casos idênticos ao destes autos (cfr. acórdãos da Relação de Lisboa, 30.6.2011, 13722/10.9YYLSB e 22.6.2010, 1155/05.3TCLRS.L1-7, já supra citados). O não acionamento desse poder-dever é omissão que constitui irregularidade relevante (art.º 201.º n.º 1 do CPC) que, tendo sido arguida pelo exequente no recurso da decisão que a acobertou deve ser conhecida por esta Relação (cfr. Manuel Domingues de Andrade, Noções elementares de processo civil, Coimbra Editora, 1979, pág. 183)”. – Acórdão da Relação de Lisboa, de 19.05.2020 (Relatora – Ana Rodrigues da Silva).

No mesmo sentido, se decidiu no Acórdão da Relação de Lisboa de 17/2/2009 (Relatora – Maria do Rosário Morgado), que, não obstante opção pelo entendimento sufragado na decisão recorrida, revogou despacho de indeferimento liminar proferido e determinou a sua substituição por outro que convidasse “a exequente a juntar aos autos a acta da assembleia de condóminos em que (relativamente ao período em causa) se fixa a quota-parte de comparticipação de cada condómino nas despesas comuns, bem como o prazo e modo de pagamento”.

Por último:
Entendeu-se na sentença recorrida que as sanções pecuniárias aplicadas em consequência do atraso no pagamento das contribuições devidas, na medida em que estas não correspondem a encargos de condomínio respeitantes à conservação e fruição das partes comuns do edifício, bem como não respeitam aos serviços de interesse comum não se enquadrem na aludida disposição legal.
E, quanto aos honorários e despesas com a presente ação, nela se considerou: tal quantia poderá e, a nosso ver, deverá ser peticionada a título de custas de parte pelo que, também nesta parte, não possui o Exequente título executivo para peticionar a dita quantia de 1.500,00€.
Desde já se dirá que, exceto no que toca às taxas de justiças pagas – que, integrando o conceito de custas de parte (art. 529º, nº 4 do CPC e 26º, nº 3, a) do Regulamento das Custas Processuais), terão de ser exigidas ao exequente nos termos previstos nos artigos 25º e seguintes do Regulamento das Custas Processuais, não constituindo quantia exequenda –, não concordamos com estas asserções porquanto estamos em sintonia com o Acórdão desta Relação 06.02.2020 (Relator – Ramos Lopes), quando defende que “as actas da reunião assembleia de condomínio constituem título executivo, nos termos do art. 6º, nº 1 do DL 268/94, de 25/10, quanto: - às penalidades fixadas nos termos do art. 1434º do CC, por integrarem o conceito «contribuições devidas ao condomínio», e - aos honorários devidos ao mandatário que patrocine a demanda que tenha por fim exigir coercivamente do condómino a satisfação da sua quota-parte relativa às contribuições devidas, por constituir despesa necessária ao pagamento de serviço de interesse comum.”

Por aderirmos inteiramente à argumentação produzida no referido acórdão, nada de relevante tendo a acrescentar, passamos a transcrever, com a devida vénia, o que a respeito das penalidades ali se escreveu:
“Como decorre do art. 1434º, nº 1 do CC, a assembleia de condóminos pode fixar penas pecuniárias para a inobservância quer das disposições que, no Código Civil, regulam o instituto da propriedade horizontal, quer das deliberações da assembleia, quer das decisões do administrador.
Destinadas a sancionar a mora relativa à satisfação das comparticipações devidas ao condomínio (abrangendo também as comparticipações para o fundo comum de reserva previsto no art. 4º do DL 268/94 (11)), tais penalizações assumem a natureza de cláusula penal moratória (art. 811º, nº 1 do CC).
Tendo tal pena génese (e aí radica o direito do condomínio a exigi-la judicialmente) na mora do condómino em satisfazer a quota-parte nas despesas comuns, justifica-se que o seu cumprimento coercivo observe o procedimento processual aplicável a estas despesas, pois que se trata também de conferir maior ‘eficácia à administração do condomínio, nomeadamente à cobrança oportuna da quota-parte dos condóminos, dissuadindo comportamentos faltosos e prevenindo dificuldades de gestão do condomínio, que podem provir do atraso no pagamento da quota-parte das despesas do condomínio’ (12).
Efectivamente, valendo as actas da assembleia de condomínio como título executivo quanto às despesas comuns, não se encontra justificação para não valerem também relativamente ao montante das penas pecuniárias regular e validamente deliberadas para sancionar (e prevenir, instando ao seu cumprimento tempestivo) o condómino que aquelas não satisfaz pontualmente – seria incoerente ‘que para a cobrança das contribuições e despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns e ao pagamento de serviços de interesse comum se pudesse avançar para a fase executiva e para a cobrança do montante resultante das penas pecuniárias legalmente estabelecidas o condomínio estivesse impedido de instaurar execução, tendo previamente que instaurar uma acção declarativa condenatória’; um tal ‘entendimento seria contraditório com a proclamada intenção de tornar mais eficaz o regime de propriedade horizontal’ (13).
(…)
Na verdade, não pode deixar de reconhecer-se que a questão é de interpretação da lei, valendo também aqui os comandos prescritos no art. 9º do CC – e mais do que buscar através de tal actividade hermenêutica a ratio legis, importará encontrar a ratio iuris, a solução mais conforme às exigências do justo e à realização do direito, conformes à consciência jurídica geral e expectativas jurídico-sociais de validade e justiça, pois que é sempre o Direito, em conjunto, que se aplica, buscando na Justiça o fundamento da interpretação, pois que a solução injusta do resultado não pode ser entendida como vontade da lei (art. 9º, nº 3 do CC) (18).” (fim de citação)
Importa, porém, realçar que, como no próprio acórdão acabado de citar se diz, a questão que ali se tratou foi a de saber se a força executiva atribuída às atas engloba “os valores de penalidades deliberadas para sancionar o condómino que não satisfaz, tempestivamente, a sua quota-parte”.
Na verdade, como resulta da leitura do respetivo relatório, em causa estava uma penalidade concretamente aplicada para sancionar uma concreta situação de mora, penalidade essa aprovada por deliberação do condomínio.
De modo diverso, no caso em apreço, a ata dada à execução não contém qualquer deliberação que aprove a aplicação das penalidades que, de acordo com o “Mapa de Conta Corrente” a que alude o requerimento executivo, foram incluídas pelo Exequente na quantia exequenda.
Ora, assim sendo, os presentes autos colocam-nos uma questão acrescida.
Na verdade, ao contrário das situações em que pela Assembleia de Condóminos é definido o valor mensal da prestação devida por cada condómino, ou do valor da despesa global com determinada obra de manutenção, cujos valores podem ser liquidados através de mero cálculo aritmético, em que é de entender ser desnecessária qualquer deliberação ulterior que fixe o montante em dívida, bastando que a liquidação desse valor seja feita no requerimento executivo, para efeito da execução dos valores relativos a penalizações importa indagar se tal aplicação é automática, dispensando a existência de uma deliberação da assembleia de condóminos no sentido da sua concreta aplicação a determinada situação de mora.
Colocada a questão nestes termos, cremos que, desde já se avança, relativamente às penalizações, forçoso é haver uma deliberação que aplique a regra aprovada à concreta situação de mora verificada, só esta ata constituindo título executivo para a respetiva cobrança.
Com efeito, a aplicação de uma pena não pode ser automática: a mera previsão genérica e abstrata de penalizações “não dispensará (…) uma deliberação da assembleia para a imposição de uma pena em concreto: trata-se de uma pena que terá necessariamente que ser imposta pelo órgão deliberativo do condomínio”; ainda que exista uma deliberação em que se “preveja a aplicação de determinada sanção para o atraso no pagamento das quotizações do condomínio e demais despesas a cargo dos condóminos, a aplicação em concreto de tal sanção terá necessariamente que passar por uma deliberação da assembleia de condomínio, quer quanto à oportunidade de aplicação da mesma, quer quanto ao momento a partir do qual a mesma é liquidada, quer quanto à determinação do respetivo montante”; “a aplicação de tal pena terá de ser objeto de uma decisão por parte do condomínio, na sequência de uma apreciação da situação em apreço que reconheça a ocorrência de uma violação de alguma disposição por parte do condómino, a sua gravidade e a oportunidade de aplicação da pena pecuniária prevista” (Acórdão da Relação do Porto de 24.09.2013, Relatora - Maria João Fontinha Areias Cardoso).
Ora, a ata dada à execução nestes autos não contém qualquer deliberação no sentido da aplicação das penalidades a que alude a “Conta Corrente” junta com o requerimento executivo.
E é por essa razão – e não pela invocada na sentença recorrida – que se deve acabar por dizer que a dita ata não constitui, quanto às penalidades cuja cobrança é visada nos autos, título executivo.
Passando, agora, à questão dos honorários, como acima já dissemos, propendemos a considerar que, também relativamente aos honorários de advogado valem as atas da reunião da assembleia de condóminos como título executivo.

De novo recorrendo à explanação do citado Acórdão desta Relação:

“Na verdade, implicando o incumprimento do condómino relapso o recurso a juízo para dele se obter coercivamente a satisfação das contribuições devidas (da sua quota-parte concernente a assegurar o funcionamento das partes comuns, conservação e fruição destas), o pagamento dos honorários devidos ao mandatário que patrocine a causa constituirá uma despesa necessária ao pagamento de serviço de interesse comum (20).
Não se argumente que sendo a cobrança das contribuições do interesse do condomínio, o serviço prestado pelo mandatário em vista da sua cobrança coerciva não se inclui no âmbito dos serviços de interesse comum, postos à disposição dos condóminos, por o serviço do mandatário não ser serviço que qualquer dos condóminos possa usar (não estar na disposição de cada um deles), não sendo eles, executados, beneficiários dos serviços prestados pelo advogado – serviços de interesse comum seriam, assim, tão só os aludidos no art. 1424º do CC: serviços postos à disposição de todos os condóminos, que eles poderão usar ou não usar, como, por exemplo, os serviços relacionados com equipamentos comuns, tais como ascensores, caldeiras de aquecimento, jardins colectivos, piscinas, antenas colectivas, serviços de segurança e vigilância do imóvel (21).
Não cremos que essa seja a solução mais conforme à hermenêutica do preceito.
O que releva, estamos em crer, para determinar se o serviço é de interesse comum (para efeitos do nº 1 do art. 6º do DL 268/94, de 25/10) não é estar o serviço na disposição directa de cada um dos condóminos (na possibilidade de o utilizar ou não), antes tratar-se de serviço prestado para alcançar o interesse comum. Atente-se no serviço de limpeza dos espaços comuns: tal serviço não está na disponibilidade directa de fruição por qualquer condómino (nenhum condómino os poderá usar na sua fracção); é serviço de que frui (e beneficia) na medida em que goza (ou pode gozar/fruir) das partes comuns, onde o mesmo é prestado. Do mesmo modo, os serviços prestados pelo mandatário ao condomínio em causa executiva destinada a haver coercivamente de qualquer condómino a quota-parte das contribuições devidas ou das despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns, serão fruídos/gozados pelos condóminos (todos) na utilização/fruição/gozo das partes comuns, já que os valores cobrados na execução se destinam a suportar os encargos com aquelas.
Conclui-se, face ao exposto, que o pagamento dos honorários devidos ao mandatário pela demanda em juízo dos condóminos relapsos, com vista a cobrar coercivamente destes a sua quota-parte nas contribuições e despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns, constitui despesa necessária ao pagamento de serviços de interesse comum, compreendida na previsão normativa no nº 1 do art. 6º do DL 268/94, de 25/10 – e por isso que as actas da assembleia de condóminos que deliberem sobre o montante respectivo gozam de executoriedade.”
Todavia, como o acórdão desta Relação que se tem vindo a citar desde logo alerta, isto é assim “desde que, claro está, no título se determine desde logo o montante em causa”.
Com efeito, não obstante a concordância que acabamos de manifestar com o exarado no citado acórdão, certo é que a ata não preenche os pressupostos do nº 1 do art. 6º do DL 268/94, de 25/10, não podendo, pois, considerar-se a mesma como título executivo relativamente aos honorários “a pagar a advogado na acção a intentar, ou em pedidos formulados na acção executiva, mesmo que (esses pedidos) tenham sido aprovados em assembleia de condóminos e constem da respectiva acta, quando tais honorários não tenham sido previamente fixados na acta” (Ac. da Relação de Lisboa, de 08.07.2008, Relator – Arnaldo Silva).

Ora, no caso concreto, o que consta do Requerimento Executivo é o seguinte:

São ainda responsáveis pelo pagamento das despesas associadas à instauração da presente acção judicial, conforme o deliberado na já mencionada Assembleia
O montante das despesas a que se aludiu foi estimado em quantia não inferior a € 1.500,00 (mil e quinhentos euros).

E o que consta da ata é:
Foi aprovado por unanimidade dos presentes, incumbir a administração adiante identificada no Ponto 8, para contratar os serviços de Advogado ou Solicitador, por forma intentar ações judiciais contra os condóminos que tenham dívidas ao condomínio (…).
Todas as despesas do processo (Advogado, Solicitador, Tribunal), (…), ficam a cargo do condómino devedor.
Deste modo, como a sentença recorrida também sublinha, na ata dada à execução, relativamente ao valor relativo aos honorários cuja cobrança se visa, nenhum montante se mostra aprovado pela Assembleia de Condóminos, somente no Requerimento Executivo constando uma referência ao valor global estimado das despesas associadas à instauração da presente acção judicial.
Assim sendo, por esta razão, no caso concreto, não constitui a dita ata título executivo no que aos honorários em causa concerne.
Face ao supra decidido, fica prejudicado o conhecimento de qualquer outra questão no que tange à impugnação da matéria de facto (e à requerida rejeição da mesma).

Em conclusão e sintetizando, decide-se:
- anular, no que toca à quantia exequenda no montante de 2.818,50 € - que corresponde à dívida certificada na ata e cujas parcelas componentes se mostram discriminadas no “Mapa de Conta Corrente” a que alude o Requerimento Executivo e que com este foi junto –, bem como às comparticipações periódicas no montante de 20€ relativas aos meses de janeiro a abril de 2017 (também identificadas no referido “Mapa de Conta Corrente), a decisão proferida na 1ª instância, para apuramento da existência das aludidas atas (a ata onde foi fixada a comparticipação para o condomínio de 15 €, a ata que alterou essa comparticipação para 20 € e a ata que aprovou a reparação do elevador, fixou a comparticipação dos proprietários da fração .. – ora Executados –, quanto a essa despesa, em 358,50 € e determinou o prazo para o respetivo pagamento), mediante notificação ao Exequente para proceder à sua junção aos autos, e subsequente apreciação, em função da posição assumida por esta Relação, da questão da existência de título executivo quanto a cada um dos distintos valores que integram a referida dívida e, na hipótese de prosseguimento dos autos, apreciação das restantes questões suscitadas pelos Embargados;
- julgar parcialmente procedente a apelação, revogando a decisão recorrida e julgando improcedentes os embargos no que toca às quantias relativas às obras no telhado, campainhas e iluminação interior e comparticipações periódicas de 20 € devidas desde maio de 2017;
- confirmar a decisão recorrida no que tange à inexistência de título executivo relativamente às penalizações, honorários e despesas associadas à propositura da presente ação, bem como ao valor de 15 € relativo ao Fundo de Reserva, com a consequente extinção da execução no que ao montante de 1.810,50 € respeita.
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Sumário

I – Preenchem os requisitos exigíveis pelo art. 6º, nº 1, do DL n.º 268/94, de 25 de outubro, quer as atas que integrem as deliberações das assembleias que decidem o valor das quotas periódicas que devem ser pagas pelos condóminos para suportar as despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns do edifício e dos serviços de interesse comum, bem como os encargos com inovações devidamente deliberadas, aludidas nos nº 1 dos artigo 1424º e 1426º do Código Civil, com fixação da sua data de vencimento, (prescindindo de ata que liquide o que for já devido), quer as atas que retratem a deliberação dos condóminos onde se procedeu à liquidação dos montantes em dívida por cada condómino;
II - Satisfaz os requisitos de título executivo a ata que apenas indique um valor global sem detalhar as parcelas que integram o montante aprovado, nem especificar a respetiva origem, desde que no requerimento executivo se proceda à discriminação das dívidas que compõem aquele valor globalmente aprovado pelo coletivo de condóminos, de modo a que o executado possa exercer plenamente o seu direito ao contraditório;
III – As atas certificativas da existência do que em determinado momento é devido ao condomínio por um determinado condómino pressupõem as pretéritas deliberações das assembleias em que resultou fixada a comparticipação de cada condómino nas despesas comuns, e a que título, bem como o prazo do respetivo pagamento, pelo que, no caso de, em razão dos elementos carreados para os autos, nomeadamente no âmbito dos embargos deduzidos, houver fundadas dúvidas sobre a existência daquelas deliberações, forçoso é que o julgador as esclareça, determinando a junção aos autos das atas comprovativas da sua existência a fim de, caso as mesmas efetivamente inexistam, declarar extinta a execução por falta de título executivo;
IV – “As actas da reunião assembleia de condomínio constituem título executivo, nos termos do art. 6º, nº 1 do DL 268/94, de 25/10, quanto: - às penalidades fixadas nos termos do art. 1434º do CC, por integrarem o conceito «contribuições devidas ao condomínio», e - aos honorários devidos ao mandatário que patrocine a demanda que tenha por fim exigir coercivamente do condómino a satisfação da sua quota-parte relativa às contribuições devidas, por constituir despesa necessária ao pagamento de serviço de interesse comum.”
V – Todavia, relativamente às penalizações, forçoso é haver uma deliberação que aplique a regra aprovada à concreta situação de mora verificada, só esta ata constituindo título executivo para a respetiva cobrança: “a aplicação de tal pena terá de ser objeto de uma decisão por parte do condomínio, na sequência de uma apreciação da situação em apreço que reconheça a ocorrência de uma violação de alguma disposição por parte do condómino, a sua gravidade e a oportunidade de aplicação da pena pecuniária prevista”;
VI – A ata também não preenche os pressupostos do nº 1 do art. 6º do DL 268/94, de 25/10, não podendo, pois, considerar-se como título executivo relativamente aos honorários “a pagar a advogado na acção a intentar, ou em pedidos formulados na acção executiva, mesmo que (esses pedidos) tenham sido aprovados em assembleia de condóminos e constem da respectiva acta, quando tais honorários (ali) não tenham sido previamente fixados”.

IV. DECISÃO:

Pelo exposto, acordam os juízes desta Relação em:

- anular, no que toca à quantia exequenda no montante de 2.818,50 €, bem como às comparticipações periódicas no montante de 20€ relativas aos meses de janeiro a abril de 2017, a decisão proferida na 1ª instância, para apuramento da existência das supra aludidas atas, mediante notificação ao Exequente para proceder à sua junção aos autos, e subsequente apreciação, em função da posição assumida por esta Relação, da questão da existência de título executivo quanto a cada um dos distintos valores que integram a referida dívida e, na hipótese de prosseguimento dos autos, apreciação das restantes questões suscitadas pelos Embargados;
- julgar parcialmente procedente a apelação, revogando a decisão recorrida e julgando improcedentes os embargos no que toca às quantias relativas às obras no telhado, campainhas e iluminação interior e comparticipações periódicas de 20€ devidas desde maio de 2017;
- confirmar a decisão recorrida no que tange à inexistência de título executivo relativamente às penalizações, honorários e despesas associadas à propositura da presente ação, bem como ao valor de 15 € relativo ao Fundo de Reserva, com a consequente extinção da execução no que ao montante de 1.810,50 € respeita.
Custas dos embargos e da execução por Embargantes e Embargado, na proporção a fixar pela primeira instância após decisão sobre a parte anulada.
Custas do recurso pelo Recorrente e pelos Recorridos, na proporção de, respetivamente, 69,4% e 30,6%.
Guimarães, 17.12.2020

Margarida Sousa
Afonso Cabral de Andrade
Alcides Rodrigues