JUNÇÃO DE DOCUMENTOS EM FASE DE RECURSO
IMPUGNAÇÃO PAULIANA
MÁ FÉ
CONSCIÊNCIA DO PREJUÍZO
INDÍCIOS/PRESUNÇÕES
Sumário


I- Na impugnação pauliana muitas vezes está em causa apurar as intenções das partes na outorga dos negócios (actos impugnados) e a prova daquelas tem de ser feita com recurso a indícios/presunções, podendo a prova da consciência do prejuízo que o acto causa ao credor por parte dos intervenientes ser alcançada através da utilização de presunções judiciais.
II- São requisitos da impugnação pauliana: i) a existência de um crédito cuja defesa se intenta com a impugnação e que o crédito seja anterior ao acto impugnado; ii) o prejuízo que do acto resulta para o credor, entendido esse prejuízo como a impossibilidade de o credor obter a satisfação integral do seu crédito ou o agravamento dessa impossibilidade; iii) a existência de má-fé, sendo que quanto a este requisito a lei distingue conforme se trate de acto oneroso ou gratuito: o acto oneroso só está sujeito a impugnação pauliana se o devedor e o terceiro tiverem agido de má-fé, e o acto gratuito é impugnável ainda que um e outro hajam actuado de boa-fé.

Texto Integral


ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES

I. Relatório

Caixa ..., S.A, com sede na Av. …, em Lisboa, pessoal colectiva n.º ………, intentou a presente acção declarativa com processo comum contra F. R., residente na Rua de …, ..., M. A., residente na Rua …, ..., C. R., residente na Rua de …, ..., R. I., residente na Rua …, ..., X – Investimentos Imobiliários, S.A., com sede na Rua …, em ....

Pede a Autora que:

a) se julgue ineficaz, relativamente à Autora, a doação e a permuta objectos de impugnação, permitindo-se à Caixa ... executar o património objecto daquelas na esfera jurídico-patrimonial dos transmissários, livre de ónus, ainda que para garantia do pagamento dos créditos da autora sobre os transmitentes;
b) se julgue ineficaz, e de nenhum efeito, o direito de uso e habitação constituído a favor dos Réus F. R. e M. A., ordenando-se o cancelamento dos registos nos imóveis objecto da acção;

Subsidiariamente:
c) sejam declaradas nulas a doação e a permuta, por simulação absoluta, ordenando-se o cancelamento dos registos de aquisição e dos direitos de uso e habitação, nos termos do art. 240.º do Cód. Civil.
Para tal alega, em síntese, ser credora da sociedade “A. R. & Filhos, Lda.”, por força do incumprimento dos contratos de abertura de crédito em conta–corrente identificados nos arts. 3.º a 8.º da pi, contratados em 15/05/2007 e em 07/08/2009, para garantia dos quais aquela sociedade subscreveu duas livranças em branco avalizadas pelos respectivos sócios – M. N., M. C., F. R., A. R. e F. A., e ainda que quanto ao primeiro aquela ainda cedeu à Caixa ... o seu crédito sobre a Caixa …, S.A., relativo ao pagamento das facturas dos seus devedores.
Mais alega que iniciou a 27/10/2016 uma acção executiva para pagamento de quantia certa, com vista à restituição dos créditos não liquidados e titulados pelas aludidas livranças, contra os obrigados/avalistas (com excepção da sociedade mutuária porque já declarada insolvente no processo n.º 5210/15.3T8VNF), que corre termos sob o n.º 6748/16.0T8VNF do Juiz 1 do Juízo de execução de Vila Nova de Famalicão e que não logrou apurar bens susceptíveis de penhora, sendo que o executado M. C. faleceu e os demais executados foram sucessivamente declarados insolventes, o que determinou a suspensão dos autos, tendo a Autora reclamado os seus créditos nos processos de insolvência dos avalistas e no processo de insolvência da sociedade mutuária.
Que no processo n.º 5210/15.3T8VNF foram reconhecidos créditos no valor de mais de três milhões de euros, sendo seiscentos mil euros de créditos garantidos e privilegiados, e foram apreendidos bens no valor global de setecentos mil euros, não sendo previsível que a Caixa ... – credor comum - receba a totalidade do seu crédito, pois o remanescente será rateado.
Nos processos de insolvência dos demais avalistas foram reconhecidos créditos de valor muito superior aos bens apreendidos, sendo improvável que a Autora logre ali obter qualquer pagamento.
Alega ainda que a 09/08/2013 o Réu F. R., com o consentimento da mulher, M. A., fez uma doação a favor das filhas, aqui 3.ª e 4.ª Rés, dos dois prédios urbanos descritos no artigo 33º da petição, com reserva do direito de uso e habitação a seu favor e da sua esposa, sendo o 1.º Réu conhecedor da sua posição de devedor à Autora pois nessa data já a sociedade A. R. & Filhos, Lda, da qual era sócio-gerente, estava em dificuldades e apresentou um PER em outubro de 2013.
Que o 1.º Réu também se apresentou a PER em março de 2014, pelo que tinha consciência de que não tinha hipóteses de honrar os compromissos bancários assumidos com a Autora e sabia que, para além dos imóveis doados, não detinha património susceptível de constituir garantia de pagamento da dívida contraída.
Que os prédios doados já não estão em nome das filhas, pois por meio de escritura outorgada a 24/09/2013, os avalistas da A. R. & Filhos, Lda e ainda as aqui 3.ª e 4.ª Rés C. R. e R. I., e a sociedade X, aqui 5.ª Ré, declararam fazer a permuta daqueles prédios com as fracções “V” e “X”, destinadas a escritórios, sitas no “Edifício ...”, na Rua de ..., em ..., por €129.750,00.
Porém, em 28/12/2013 as mesmas 3.ª e 4.ª Rés doaram ao pai, F. R., as ditas fracções “V” e “X” pelo valor de €119.560,00:
Que a 5.ª Ré não podia desconhecer que a permuta celebrada em setembro de 2013 era prejudicial à posição da Autora, já que naquela escritura foi representada pelos seus administradores, que também eram avalistas da devedora A. R. & Filhos, Lda, não podendo ser considerada terceiro.
Que se tratou de uma verdadeira troca de património da esfera patrimonial do 1.º Réu de dois prédios urbanos para dois escritórios, de menor valor patrimonial, o que ocorreu de forma concertada por todos os gerentes e sócios da A. R. & Filhos, Lda, com vista à dissipação/preservação do património pessoal daquele, nomeadamente o de maior valor, para impedir a satisfação do crédito da Autora.
Alega por fim que a declaração de vontades constante da escritura pública de doação outorgada a 09/08/2013 não corresponde à real vontade dos ali declarantes, tanto mais que os Réus F. R. e M. A. mantiveram, como mantêm, morada num daqueles prédios urbanos, o qual sempre constitui a sua casa de morada de família.
E que também a permuta feita em 24/09/2013 não corresponde à vontade dos ali declarantes, pois nem a C. R. nem a R. I. quiseram permutar os prédios urbanos que lhes haviam sido doados pelo pai, nem a sociedade X quis ceder-lhes os escritórios à troca com aqueles prédios.
Os Réus contestaram dizendo, em suma, que o banco celebrou as operações de crédito datadas de 15 de Maio de 2007 e de 07 de Agosto de 2009 com a sociedade A. R. & Filhos, Lda, enquanto mutuária, crédito que se destinava ao apoio de tesouraria da referida sociedade, sendo que para assegurar o pagamento das responsabilidades decorrentes de tais empréstimos também foi a referida sociedade que entregou à Autora duas livranças em branco e que o Réu F. R. foi um dos avalistas das ditas livranças.
Mais alegam que a sociedade mutuária se apresentou a processo especial de revitalização a 21/10/2013 e que não conseguiu cumprir o Plano de Revitalização, por razões que se prenderam com a excessiva demora na sua homologação e contínua diminuição da sua carteira de encomendas, razão pela qual a 19/06/2015 a sociedade se apresentou à insolvência, declarada em 07/07/2015, encontrando-se o processo em fase de liquidação.
Pese embora estivesse em curso o PER alguns dos credores da sociedade accionaram os seus sócios, na qualidade de avalistas, nomeadamente o aqui Réu F. R., o qual, sem alternativa, bem como a sua mulher, M. A., a 26/03/2014, também se apresentaram a PER, cujo plano de revitalização foi homologado a 03/02/2015.
Alegam ainda que em Dezembro de 2016 os Réus F. R. e mulher apresentaram-se à insolvência e que o património dos insolventes, que foi apreendido, e neste estando compreendidos dois prédios urbanos e três rústicos cujo valor patrimonial total ascende a cento e vinte e dois mil duzentos e oitenta e um euros e quinze cêntimos, tem um valor comercial muito superior.
Que quando realizadas as doações advieram ao património dos ora Réus bens (os apreendidos, no processo de insolvência) cujo valor de mercado é o mesmo que os bens doados às suas filhas.
Que nunca o Réu F. R. teve qualquer intenção, com a doação às suas filhas, de prejudicar os seus credores, nem a Autora ficou impedida de obter a satisfação do seu crédito por causa da doação.
Que em Agosto de 2013 o Réu F. R. pretendeu realizar uma partilha em vida, dada a ligação afectiva que sempre uniu toda a família à casa que sempre foi de família de há muitos e longos anos, mas sem que o seu património se visse diminuído, estando o acto praticado condicionado ao facto do seu património não se ver diminuído, para além de que se procurava encontrar a forma de o concretizar através do menor encargo possível, em termos fiscais, para as filhas, daí que sendo estas acionistas da “X”, uma imobiliária acordaram a permuta de bens com o consentimento dos demais acionistas daquela.
Foi dispensada a realização da audiência prévia, sendo proferido despacho saneador e despacho destinado a identificar o objecto do litígio e a enunciar os temas da prova.

Veio a efectivar-se a audiência de discussão e julgamento com a prolação de sentença nos seguintes termos, no que concerne à parte dispositiva:
“Pelo exposto, o Tribunal julga a presente acção parcialmente procedente e, em consequência, decide:
a) declarar ineficaz, relativamente ao banco, a doação outorgada a 9.08.2013 e a permuta outorgada a 24.09.2013, permitindo-se à Caixa ... executar o património objecto daquelas na esfera jurídico-patrimonial dos transmissários, livre de ónus, para garantia do pagamento dos créditos que detém sobre os transmitentes F. R. e M. A.;
b) declarar ineficaz, e de nenhum efeito, o direito de uso e habitação constituído a favor dos réus F. R. e M. A.;
c) não ordenar o cancelamento dos registos nos imóveis objecto da acção.
Custas por autor e réus na proporção de 1/3 para 2/3, atento o decaimento.
Notifique e registe.”

Inconformados, apelaram os Réus, concluindo as suas alegações da seguinte forma:
“1. Os Apelantes discordam da sentença proferida e, por isso, dela recorrem, quer da decisão de direito, quer sobre a matéria de facto, mais concretamente por ter sido dado como provada nos termos em que deu a matéria constante dos pontos 38 e 39 dos factos provados, e ter dado como não provada a matéria constante do ponto 4 dos factos não provados.
2. Há flagrante desconformidade entre os elementos de prova produzidos e a decisão proferida no que aos pontos impugnados diz respeito, e por isso impõe-se corrigir o erro do julgador a quo; aliás, calcorreando a prova testemunhal e conjugando-a com os diversos elementos probatórios documentais, ocorreu evidente desvio, em termos de razoabilidade.
3. A intenção subjacente aos negócios em consideração – trocar património - ficou clara com os depoimentos das testemunhas arroladas pelas Rés, assim como pelas declarações de parte do Réu F. R., corroborados com os documentos juntos aos autos, designadamente, com a escritura de doação outorgada em 09/08/2013, a escritura de permuta outorgada em 24/09/2013 e a escritura de doação outorgada a 28/12/2013.
4. Não existiu qualquer intenção de dissipar bens, de fugir com património para se furtarem ao pagamento de responsabilidades assumidas para com os credores, que em 2013 ainda nem sequer haviam acionado os insolventes, nem mesmo se cogitava tal possibilidade, pois a AAR ainda se encontrava em atividade, com obras em curso, a trabalhar com a Banca
5. Em 2013 a AAR, muito menos os seus sócios se encontravam numa situação de eminente insolvência, nem tinham qualquer intenção de não ver a AAR revitalizada quando apresentaram o PER.
6. À data das operações a intenção era a de trocar bens, mas mantendo-se na esfera patrimonial dos insolventes bens com o mesmo valor a trocar, pois os sócios bem sabiam da necessidade de manter o seu património para garantia dos avais que obrigatoriamente se impõem a qualquer empresa em atividade.
7. Foi o que resultou com exatidão dos depoimentos das testemunhas M. N., cujo depoimento ficou registado em suporte digital através da aplicação “H@bilus Media Studio”, com início: das 10:30:00 horas e termo: às 11:33:00 horas, e do depoimento da testemunha C. F., cujo depoimento ficou registado em suporte digital através da aplicação “H@bilus Media Studio”, com início: das 11:34:00 horas, e termo: às 12:22:00 horas, cujos excertos que relevam para efeitos de alteração da matéria de fato que vai impugnada se encontram transcritos nas alegações, e que por economia processual se dispensa aqui a sua transcrição.
8. Para além das declarações de parte do Réu F. R., que cujo seu registo de prova ficado gravado em suporte digital através da aplicação “H@bilus Média Studio”: com início das 14:24:00 horas e termo às 14:49:00 horas, que corroborou a versão daquelas testemunhas, expressando a troca ocorrida espelhada nas operações realizadas de doação, permuta e doação.
9. Com as trocas operadas nunca houve intenção de prejudicar os credores, tanto que o valor do património do insolvente mante-se inalterado, aliás, se atentarmos no que as testemunhas referiram quanto aos valores de troca dos bens - foram trocados dois prédios urbanos, por outros dois prédios urbanos, mas vejamos, dos dois objeto da primeira doação, um deles trata-se de um barracão, destruído e sem qualquer valor comercial e o outro uma casa sita na aldeia, de construção muito antiga a necessitar de inúmeras obras, sendo que os dois outros prédios urbanos referentes á segunda doação, são localizados no centro de ... destinam-se a escritórios e possuem um valor de transação em muito, superior àqueles – conclui-se que o valor do património do insolvente F. R. após as operações ascendeu a valor superior àquele que já detinha.
10. Se o valor do património se manteve em 2013, e é neste ano que temos de nos fixar, por ser o ano da ocorrência dos atos impugnados, com a doação, permuta e subsequente doação, a Caixa ... não foi prejudicada, logo, não foi por causa da doação outorgada em 09/08/2020 que a Caixa ... ficou impossibilitada de receber o seu crédito.
11. Com base em tais depoimentos supra transcritos e escrituras supra identificadas juntas aos presentes autos, deve esse Venerando Tribunal alterar a matéria de facto assente nos seguintes termos:
38. Através da escritura pública outorgada a 9 de Agosto de 2013 o réu F. R., com o consentimento do cônjuge, M. A., pretendeu transmitir para as suas filhas, C. R. e R. I., e estas pretenderam receber a propriedade dos prédios referidos em 17.
39. Através da escritura pública feita em 24 de Setembro de 2013 a C. R. e a R. I. quiseram permutar os prédios urbanos que lhes haviam sido transmitidos pelo pai, aqui 1.º réu, e a sociedade “X”, aqui 5.ª ré, quis ceder-lhes os escritórios à troca com aqueles prédios urbanos.
40. Com a doação a Caixa ... não ficou impedida de obter a satisfação do seu crédito. 12. Não foi por culpa dos aqui recorrentes/insolventes, muito menos pelo fato de terem concretizado as operações supra mencionadas que a Caixa ... se viu impossibilitada de receber o seu crédito ou que viu a sua situação de impossibilidade de recebimento ser agravada, aliás, a Caixa ... para além de ter apresentado execução contra todos os ex sócios da AAR, também reclamou esse mesmo crédito no processo de insolvência da AAR e dos ex sócios desta, que como referiu uma das testemunhas ouvidas em audiência senão a totalidade, a maior parte do seu crédito irá receber.
13. Apuraram os insolventes, mediante informação verbal dos Srs. Administradores de Insolvência que em três dos processos em consideração, ou seja, no processo de insolvência da ex-sócia M. N. o valor a receber será de 27.800,00euros, existindo, no entanto, um valor condicional de 15.800,00euros; no processo do ex-sócio A. R. o valor que a Caixa ... irá receber será de 23.197,13euros, e no processo do F. A. o valor a receber após retificação será de 4.948,94euros, sendo que está retido na massa à ordem da Caixa ... a quantia de 9.388,80euros.
14. Sabem os recorrentes que a Caixa ... ainda só recebeu a quantia de 4.948,94euros, mais sabem ainda, que todos os processos já se encontram com as liquidações terminadas, aguardando pela elaboração das contas, uns por parte do Tribunal outros por parte dos Srs Administradores, e por isso não lhes é possível apresentar em concreto os valores que se pretendem ver definidos e indicados nos presentes autos referentes aos valores já recebidos pela Caixa ..., não lhes restando por isso outra alternativa senão:
15. Requerer, respeitosamente a Vªs Exªs, tendo em vista a prolação do justo Acórdão, se dignem oficiar a todos os processos de insolvência identificados em sede de alegações, segundo os mapas de rateio elaborados em cada um deles, os valores que caberão à Caixa ..., aguardando-se por tal informação para posteriormente ser proferido douto Acórdão, pois devem de fato ser atualizadas as informações (implicando um volte face no acórdão a proferir) o que não foi possível até à prolação da decisão em 1ª instância.
16. Alterando-se a decisão sobre a matéria de facto no sentido acima propugnado, conclui-se, que não se verificam todos os pressupostos e requisitos prescritos da ação pauliana.
17. Bem andou o Tribunal a quo reconduzindo o caso em discussão, à figura da ação de impugnação pauliana aplicando o regime decorrente dos artigos 610º e segs do CC; sendo condição necessária para o exercício de tal ação e consequente sucesso da mesma a verificação simultânea de todos os requisitos legalmente exigidos (artº 610º e 612º do Código Civil).
18. Os atos impugnados – doação de 09/08/2013 e permuta de 24/09/2013 - não envolveram diminuição da garantia patrimonial para a Caixa ...; não foram realizados dolosamente, com o fim de impedira satisfação do direito de crédito da aqui apelada; e mais, de tais atos não resultou um agravamento da impossibilidade, para a apelada obter a satisfação do seu crédito.
19. A Caixa ..., aqui apelada é titular de um direito de crédito sobre o Réu F. R. (e sobre os demais ex sócios da AAR), decorrente da qualidade de avalista da sociedade que lhe entregou duas livranças em branco, que aquela preencheu, no valor de 14.827,68euros, em 18/05/2007, e outra no valor de 102.901,55euros, emitida em 09/09/2009, ambas com vencimento a 29/02/2016.
20. Foram outorgadas a doação de 09/08/2013ea permuta de 24/09/2013,mas esquece propositadamente a apelada de mencionar a doação outorgada a 28/12/2013, pois, caso esta não ocorresse tinha de se concluir pela dissipação de património dos recorrentes/insolventes e consequentemente com o agravamento de verem o seu crédito satisfeito.
21. Tais operações foram outorgadas sem intuito de dissipar património muito menos prejudicar a Caixa ..., pois pese embora a doação de 09/08/2013 (outorgada pelo valor patrimonial de 128.946.50euros) e a permuta de 24/09/2013 (outorgada pelo valor patrimonial de 129.650,00euros) em 28/12/2013 regressou à esfera patrimonial dos recorrentes dois bens imóveis cuja escritura de doação pese embora também outorgada pelo valor patrimonial – 119.560,00euros – os valores de transação eram muito superiores aos bens doados em Agosto de 2013, até porque um deles tratava-se de um barracão completamente destruído, sem qualquer valor transacionável.
22. Um ato que à primeira vista poderia ser concebido como gratuito, acaba por ter de se considerar oneroso, pois na verdade ocorre uma troca, uma substituição de bens no património dos insolventes, e por isso mesmo se alguma intenção existisse em defraudar a expectativa de recebimento por parte dos eventuais credores do recorrente F. R., jamais teria sido outorgada a doação de 28/12/2013,
23. Para além dos demais bens que faziam parte da esfera patrimonial do aqui recorrente F. R., que sempre dela fizeram parte.
24. Veja-se que o valor total presumível de transação das frações recebidas era de 210.450.00euros e dos prédios rústicos de 65.017,44euros, ou seja, o valor total presumível de transação do património dos insolventes era de 275.467,44euros
25. E porque a data que deve ser tida em consideração para se aferir da impossibilidade de recebimento do crédito é a da data da prática do ato impugnado, neste caso, Agosto do ano de 2013, é claro que a apelada não estava impossibilitada de receber o seu crédito no valor total das livranças preenchidas no montante total de 117.729,23euros, tanto mais que por este também eram responsáveis os demais sócios da AAR.
26. Acresce que, em 2013 a AAR não se encontrava em situação de eminente insolvência, pois apresentou-se a PER a 21 de Outubro do ano de 2013, no âmbito do qual foi apresentado um Plano de Revitalização, com votação favorável de 87,468% - ao qual a Caixa ... votou favoravelmente – mas que só transitou em julgado a 07 de Abril de 2015 (quase dois anos depois!)
27. Por razões que se prenderam com a excessiva demora em ver o Plano de viabilização homologado, em 19 de Junho do ano de 2015 viu-se obrigada a apresentar-se à insolvência, que foi declarada em 07 de Julho, tendo encerrado a 03 de Setembro de 2015.
28. Pese embora o PER da AAR, e estando ainda o mesmo em curso e desconhecendo-se se seria ou não aprovado, a Caixa ..., aqui apelada, acionou os seus sócios, na qualidade de avalistas daquela sociedade, e, sem alternativa, o aqui recorrente F. R. e a sua mulher a 26 de Março de 2014, também se apresentaram a PER, (5 meses depois da apresentação do PER da AAR), cujo plano de revitalização foi homologado a 03 de Fevereiro do ano de 2015,e portanto em data anterior ao conhecimento do desfecho do processo de revitalização da AAR (que apenas vem a ser homologado em Abril de 2015)
29. Desconhecendo o desfecho do processo de revitalização da AAR a Caixa ..., aqui apelada, votou favoravelmente ao PER dos aqui recorrentes/insolventes, logo, também Ela tal como os seus sócios acreditavam na viabilização da AAR.
30. Acresce ainda, a expectativa quanto à liquidação do património da AAR, que em nada era despiciendo, e por isso mesmo só depois decorrido um ano e meio da prolação da sentença de declaração de insolvência da AAR, ou seja, só em Dezembro do ano de 2016 os recorrentes F. R. e mulher se apresentaram à insolvência.
31. O principal requisito para que pudesse ser procedente a ação de impugnação pauliana: é o de que dos atos outorgados resultasse a impossibilidade da Caixa ... obter a satisfação do seu crédito, e/ou da existência de tais atos resultar o agravamento dessa impossibilidade,
32. Os pressupostos a ter em consideração para a análise de tal requisito são: a data da outorga dos atos impugnados, Agosto e Setembro de 2013 e a existência ou não de bens nessa data, na esfera patrimonial do devedor, e o seu valor presumível de transação.
33. Ora, em 2013 os recorrentes/insolventes eram detentores de bens no valor total presumível de transação de 275.467,44euros, sendo o crédito da Caixa ... inferior; não foi por culpa sua que os recorrentes/insolventes se apresentaram à insolvência; nunca tiveram intenção de enganar os seus credores, os atos foram sendo realizados, e em Dezembro de 2013, já o PER da AAR já tinha dado entrada; havia que repor na esfera patrimonial dos aqui recorrentes valores equivalentes aos que haviam sido retirados.
34. Não ocorreu qualquer antecipação às insolvências, basta atender-se nas datas das doações e permutas, Agosto e Setembro de 2013 e ainda Dezembro de 2013,e na data da apresentação da insolvência dos aqui recorrentes/insolventes, Dezembro de 2016, e ainda da declaração de insolvência da AAR que data de Junho do ano de 2015.
35. Ocorreu uma total e plena transparência nos atos realizados entre todos os aqui recorridos, com grande preocupação do recorrente F. R. em não ver diminuído o seu património, sem qualquer dissipação do mesmo, aliás se assim o tivesse pretendido os prédios rústicos de que também era o dono e legitimo proprietário também teriam sido doados.
36. A sociedade X cujos acionistas são todos os filhos dos sócios e gerentes da AAR não agiu em conluio e com vista à dissipação do património dos recorrentes/insolventes, muito pelo contrário, pois não fosse o seu consentimento, aí sim teria ocorrido a dissipação do património daqueles.
37. Mas mais do que isso, não foi por causa da doação outorgada em Agosto de 2013, que a apelada ficou impedida de obter a satisfação do seu crédito, pois não fosse a situação a que os aqui recorrentes F. R. e mulher se viram obrigados – a apresentação da insolvência, mas qualificada como fortuita – o valor do seu património era mais do que suficiente para liquidar a parte da responsabilidade destes para com a Caixa ....”
Pugnam os Recorrentes pela integral procedência do recurso.
A Autora apresentou contra-alegações pugnando pela improcedência do recurso.
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

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II. QUESTÃO PRÉVIA:

Vieram os Recorrentes requerer (conclusão 15ª) que se oficiasse a todos os processos de insolvência que identificam nas suas alegações, para que informem os valores que caberão à Autora, aguardando-se que tais informações sejam prestadas.
Da análise das alegações de recurso apresentadas pelos Recorrentes constata-se que as mesmas são acompanhadas de dez documentos (sobre a sua admissibilidade adiante nos pronunciaremos) respeitantes aos processos de insolvência n.º 5210/15.3T8VNF, em que é insolvente A. R. & Filhos Lda, n.º 7971/16.3T8VNF em que é insolvente M. N., n.º 7972/16.1T8VNF em que é insolvente F. R., n.º 1562/17.9T8VNF em que são insolventes A. R. e A. F. e n.º 1625/17.0T8VNF em que são insolventes F. A. e M. R..
Não invocam os Recorrentes qualquer motivo justificativo da impossibilidade de juntarem aos autos informação prestada pelos referidos processos a seu pedido, que não seja o facto dos processos aguardarem ainda pela elaboração das contas não lhes permitindo apresentar em concreto os valores que pretendem ver definidos e indicados nos presentes autos e não foi possível actualizar as informações até à data da prolação da decisão em 1ª Instância, sendo certo que que alegam ter obtido informação verbal dos Administradores da Insolvência em três dos processos e que a Recorrida ainda só recebeu a quantia de €4.948,945 no processo n.º 1625/17.0T8VNF (o que a Recorrida aceita ter já sido paga).
Por outro lado, se com o seu pedido pretendem os Recorrentes fazer com que os autos aguardem até que a Recorrida receba todos os valores que lhe cabem por conta do crédito que lhe foi reconhecido nos referidos processos de insolvência, tal equivale a pretenderem suspender a instância.
Ora, em nosso entender tal não é motivo justificado para a suspensão da instância.
Decorre do n.º 1 do artigo 272º do Código de Processo Civil que o Tribunal pode ordenar a suspensão da instância quando a decisão da causa estiver dependente do julgamento de outra já proposta, ou quando ocorra motivo justificado.
Alberto dos Reis (Comentário ao Código de Processo Civil, Volume 3, página 279) referia a este propósito que o tribunal “pode ordenar a suspensão quando entender que ocorre outro motivo justificado, isto é, motivo diferente da pendência de causa prejudicial e que em seu juízo justifique a suspensão”.
No caso concreto, estando em causa a impugnação pauliana de atos praticados pelos Réus em agosto e setembro de 2013, não entendemos que deva determinar-se a suspensão da instância até que estejam definitivamente definidos ou que a Recorrida receba todos os valores que lhe cabem por conta do crédito que lhe foi reconhecido nos referidos processos de insolvência, sendo certo que, a manter-se a decisão recorrida a mesma permite apenas executar os bens objecto da doação e da permuta na esfera jurídico-patrimonial dos transmissários para pagamento dos créditos sobre os transmitentes F. R. e M. A., não se concebendo que vendo a Recorrida satisfeita a totalidade do seu crédito por força dos referidos processos de insolvência vá proceder a tal execução.
Indefere-se, por isso, à pretensão dos Recorrentes.
***
III. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO

O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente não podendo este tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, sem prejuízo das de conhecimento oficioso (artigo 639º do CPC).

As questões a decidir, tendo em conta o teor das conclusões formuladas pelos Recorrentes, são as seguintes:

1 – Da admissibilidade da junção de documentos com as alegações de recurso;
2 – Determinar se houve erro no julgamento da matéria de facto quanto aos pontos 38) e 39) dos factos provados e quanto ao ponto 4) dos factos não provados;
3 – Saber se houve erro na subsunção jurídica dos factos.
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III. FUNDAMENTAÇÃO

3.1. Os factos
Factos considerados provados em Primeira Instância:

1. No exercício da sua actividade comercial a “Caixa ..., S.A” (de ora em diante só Caixa ...) celebrou com a sociedade “A. R. & Filhos, Lda.”, dois contratos de abertura de crédito em conta–corrente, nas datas e com as condições que a seguir se discriminam:
a) a 15.05.2007, o contrato n.º ………92, até ao montante de €800.000,00 (oitocentos mil euros), por 6 meses, prorrogável por períodos iguais e sucessivos, para apoio de tesouraria da sociedade mutuária, cujo plafond foi reduzido para € 500.000,00 (quinhentos mil euros) a 26.06.2012;
a.1) sendo que o capital em dívida vencia juros a uma taxa correspondente à EURIBOR a três meses, em vigor no dia útil imediatamente anterior ao do início de cada período de contagem de juros, acrescida de um spread de 0,50%, pelo que no momento da celebração do contrato, a taxa de juro nominal era de 4,566% e a taxa efectiva de 4,64478%;
a.2) em caso de mora, a Caixa ... poderia cobrar, sobre o capital exigível e juros correspondentes aos períodos mínimos legalmente previstos, comissões e outros encargos, juros calculados à taxa mais elevada de juros remuneratórios que, em cada um dos dias em que se verificar a mora, estiver em vigor para operações activas da mesma natureza, acrescida de sobretaxa até 4% ao ano a título de cláusula penal;
a.3) para titular e assegurar o pagamento de todas as responsabilidades decorrentes do empréstimo em apreço, a sociedade mutuária entregou à Caixa ... uma livrança com montante e vencimento em branco, subscrita pela sociedade mutuária e avalizada por M. N., M. C., F. R., A. R. e F. A.;
a.4) ainda para titular todas as responsabilidades emergentes do presente contrato de abertura de crédito, a sociedade mutuária declarou ceder à Caixa ... o seu crédito sobre a “Caixa …., …, S.A.”, relativo aos pagamentos das facturas dos seus devedores, cujos créditos venham a esta a ser cedidos, no âmbito do contrato de factoring com aquela celebrado;
b) a 7.08.2009, o contrato n.º ………92, até ao montante de €250.000,00 (duzentos e cinquenta mil euros), por 6 meses, prorrogável por períodos iguais e sucessivos, para apoio de tesouraria da sociedade mutuária;
b.1) o capital em dívida vencia juros a uma taxa correspondente à média aritmética simples das taxas EURIBOR a três meses, apurada com referência ao mês imediatamente anterior ao do início de cada período de contagem de juros, acrescida de um spread de 2,5%, pelo que no momento da celebração do contrato, a taxa de juro nominal era de 3,475% e a taxa efectiva era de 3,521%;
b.2) em caso de mora, a Caixa ... podia cobrar, sobre o capital exigível e juros correspondentes aos períodos mínimos legalmente previstos, comissões e outros encargos, juros calculados à taxa mais elevada de juros remuneratórios que, em cada um dos dias em que se verificar a mora, estiver em vigor para operações activas da mesma natureza, acrescida de uma sobretaxa até 4% ao ano a título de cláusula penal;
b.3) para titular e assegurar o pagamento de todas as responsabilidades decorrentes do empréstimo em apreço, a sociedade mutuária entregou à Caixa ... uma livrança com montante e vencimento em branco, subscrita pela sociedade mutuária e avalizada por M. N., M. C., F. R., A. R. e F. A. a 7.08.2009.
2. Verificado o incumprimento das obrigações assumidas nos contratos referidos, a Caixa ... procedeu ao preenchimento das livranças, nos termos dos respectivos pactos de preenchimento, mormente:
2.a) uma livrança, no valor de € 14.827,68 (catorze mil, oitocentos e vinte e sete euros e sessenta e oito cêntimos), emitida em ..., a 18.05.2007, com vencimento a 29.02.2016, subscrita pela sociedade “A. R. & Filhos, Lda.” e avalizada por M. N., M. C., F. R., A. R. e F. A.;
2.b) uma livrança, no valor de € 102.901,55 (cento e dois mil, novecentos e um euros e cinquenta e cinco cêntimos), emitida em ..., a 09.09.2009, com vencimento a 29.02.2016, subscrita pela sociedade “A. R. & Filhos, Lda.” e avalizada por M. N., M. C., F. R., A. R. e F. A..
3. A Caixa ... iniciou a 27.10.2016 uma acção executiva para pagamento de quantia certa no valor de € 122.354,54 (cento e vinte e dois mil, trezentos e cinquenta e quatro euros e cinquenta e quatro cêntimos), com vista à restituição dos créditos não liquidados e titulados pelas aludidas livranças, contra os obrigados/avalistas (com excepção da sociedade mutuária porque declarada insolvente), que corre termos sob o n.º 6748/16.0T8VNF no Juízo de Execução de Vila Nova de Famalicão – Juiz 1.
4. Naqueles autos de execução não logrou a Caixa ... apurar bens susceptíveis de penhora, sendo que o executado M. C. faleceu e os demais executados foram sucessivamente declarados insolventes, o que determinou a suspensão dos autos executivos, tendo a autora reclamado os seus créditos nos processos de insolvência dos avalistas e no processo de insolvência da sociedade mutuária.
5. A execução foi declarada suspensa quanto ao co-executado F. A. a 10.03.2017.
6. No processo n.º 5210/15.3T8VNF que corre termos no Juízo de Comércio de Vil Nova de Famalicão – Juiz 4, foi a sociedade “A. R. & Filhos, Lda.” declarada insolvente por sentença proferida a 7 de Julho de 2015, transitada em julgado a 28 de Julho de 2015, sendo reconhecidos créditos no valor de 3.276.068,22 Eur. (três milhões, duzentos e setenta e seis mil, sessenta e oito euros e vinte e dois cêntimos), sendo cerca de seiscentos mil euros de créditos garantidos e privilegiados, e foram apreendidos e liquidados bens no valor global de 647.262,88 Eur. (seiscentos e quarenta e sete mil, duzentos e sessenta e dois euros e oitenta e oito cêntimos).
7. Neste processo foi decidido o encerramento da sociedade, prosseguindo os autos para liquidação do activo apreendido, declarada extinta a 14.01.2020 e aguarda-se a elaboração do mapa de rateio.
8. M. N. foi declarada insolvente por sentença proferida a 27 de Dezembro de 2016, no âmbito do processo que corre termos com o n.º 7971/16.3T8VNF, no Juiz 2 do Juízo de Comércio de Vila Nova de Famalicão.
9. Nesses autos foram reconhecidos créditos no montante de 1.893.246,54 Eur. (um milhão, oitocentos e noventa e três mil e duzentos e quarenta e seis euros e cinquenta e quatro cêntimos) e apreendidos bens imóveis com um valor patrimonial global aproximado de 75.000,00 Eur. (setenta e cinco mil euros), mormente quatro prédios urbano (descritos com o n.º …/..., n.º …/..., n.º …/... e n.º …/...), sendo que o mesmo se mostra em fase de liquidação do activo sem quaisquer pagamentos já feitos.
10. F. R. e M. A. foram declarados insolventes por sentença proferida no dia 2 de Janeiro de 2017, transitada em julgado a 23 de Janeiro de 2017, no âmbito do processo que corre termos com o n.º 7972/16.1T8VNF, no Juiz 1 do Juízo de Comércio de Vila Nova de Famalicão.
11. Aí foram apreendidos bens imóveis com um valor patrimonial global de 122.278,76 Eur. (cento e vinte e dois mil, duzentos e setenta e oito euros e setenta e seis cêntimos), mormente cinco prédios rústicos (inscritos na matriz sob os arts. 5501, 3298, 3548, 2250 e 5669), duas fracções autónomas (letras “X” e “V” do prédio urbano descrito com o n.º 727), bem como um depósito bancário do montante de 6.762,96 Eur. (seis mil, setecentos e sessenta e dois euros e noventa e seis cêntimos), tendo sido reconhecidos créditos no montante de 1.727.782,15 Eur. (um milhão, setecentos e vinte e sete mil, setecentos e oitenta e dois euros e quinze cêntimos), sendo que o mesmo se mostra em fase de liquidação do activo sem quaisquer pagamentos já feitos.
12. A. R., foi declarado insolvente por sentença proferida no dia 9 de Março de 2017, no âmbito do processo que corre termos com o n.º 1562/17.9T8VNF, no Juiz 1 do Juízo de Comércio de Vila Nova de Famalicão.
13. Ali foram apreendidos bens imóveis com um valor patrimonial global de 71.911,80 Eur. (setenta e um mil, novecentos e onze euros e oitenta cêntimos), mormente cinco lotes de terreno (descritos na C.R.Predial de ... sob os n.ºs …., …., …., …. e …), tendo sido reconhecidos créditos no montante global de 1.305.127,71 Eur. (um milhão, trezentos e cinco mil, cento e vinte e sete euros e setenta e um cêntimos), mostrando-se encerrada a liquidação desde 21.10.2019 e aguarda-se a prestação de contas.
14. F. A., foi declarado insolvente por sentença proferida no dia 13 de Março de 2017, no âmbito do processo que corre termos com o n.º 1625/17.0T8VNF, no Juiz 1 do Juízo de Comércio de Vila Nova de Famalicão.
14. a) A 10 de Novembro de 2014 foi proferida sentença a homologar o plano de revitalização apresentado por F. A. e M. R., que correu termos sob o n.º 575/14.7TBEPS do J2 da 2.ª secção de Comércio de Vila Nova de Famalicão.
15. No processo referido em 14. foram reconhecidos créditos no valor global de 1.406.414,97 Eur. (um milhão, quatrocentos e seis mil, quatrocentos e catorze euros e noventa e sete cêntimos), e foram apreendidos bens imóveis que foram liquidados por 40.400,00 Eur. (quarenta mil e quatrocentos euros), havendo a ratear o valor de 31.927,17 Eur. (trinta e um mil, novecentos e vinte e sete euros e dezassete cêntimos), deduzidas as despesas e custas.
16. Neste processo já se encerrou a liquidação e segundo o mapa de rateio a Caixa ... vai receber 3.195,89 Eur. (três mil, cento e noventa e cinco euros e oitenta e nove cêntimos), do seu crédito comum reconhecido pelo valor global de 140.781,24 Eur. (cento e quarenta mil, setecentos e oitenta e um euros e vinte e quatro cêntimos), com base nas livranças executadas no processo referido em 3..
17. Por escritura pública outorgada a 9 de Agosto de 2013 o réu F. R., com o consentimento da mulher, M. A., declarou doar a favor das filhas, aqui 3.ª e 4.ª rés, C. R. e R. I., em comum e em partes iguais, os seguintes prédios:
- prédio urbano, composto de casa de cave, rés-do-chão, andar, terraço, dependência, piscina e logradouro, destinada a habitação, situado actualmente na Rua de ..., Sítio da …., Lugar do ..., freguesia de ..., concelho de ..., descrito na Conservatória de Registo Predial de ... sob o n.º .../... e inscrito na matriz predial urbana sob o art. ...º, com o valor patrimonial de € 142.030,00;
- prédio urbano, composto por casa de rés-do-chão, andar, dependências e logradouro, destinado a habitação, situado actualmente na Rua de ..., n.º .., Lugar do ..., da freguesia de ..., concelho de ..., descrito na Conservatória do Registo Predial de ..., sob o n.º …/... e inscrito na respectiva matriz predial urbana sob o art. ...º, com o valor patrimonial de €50.830,00.
18. Mais declarou reservar para si e para a sua mulher o direito de uso e habitação sobre o prédio n.º .../..., o qual se extinguirá à morte do último membro do casal e que atribuía à doação o valor de 128.946,50 Eur. (cento e vinte e oito mil, novecentos e quarenta e seis euros e cinquenta cêntimos).
19. O prédio urbano sobre o qual foi constituído o direito de uso e habitação a favor os réus F. R. e cônjuge, M. A., foi indicado como morada destes no processo de insolvência referido em 10. e à data da contratualização dos empréstimos referidos em 1. era já a sua casa de morada de família.
20. Tal acto de doação foi levado a registo, em cada uma das descrições prediais, através das Ap. 1198 de 2013/08/22 e Ap. 1199 de 2013/08/22.
21. A 21 de Outubro de 2013 a “A. R. & Filhos, Lda.”, da qual o réu F. R. era sócio-gerente, e o credor “X – Instalações Eléctricas …”, deram início a processo especial de revitalização, que veio a correr termos sob o n.º 1181/13.9TBEPS, 2.º Juízo do Tribunal de ..., no qual foi nomeado o AJ provisório a 30.10.2013 e actualmente distribuído no Juízo de Comércio de Vila Nova de Famalicão – J4.
22. Nesse processo foi apresentado um Plano de Revitalização que, pese embora a votação favorável de 87,468% dos credores - ao qual a Caixa ... votou favoravelmente - foi objeto de despacho de não homologação a 9 de Abril de 2014.
23. Não se conformando com tal despacho, a sociedade “A. R. & Filhos, Lda.”, interpôs recurso para o Tribunal da Relação de Guimarães que, a 11 de Setembro de 2014, homologou o plano para revitalização da devedora.
24. Dois credores interpuseram ainda recurso para o Supremo Tribunal de Justiça que, a 19 Março de 2015, decidiu julgar não admissível o recurso.
25. Vindo o plano de revitalização da sociedade a transitar em julgado no dia 7 de Abril de 2015.
26. Conforme estipulado em tal plano, o mesmo teria o seu início, desde logo, no que respeitava aos créditos privilegiados da AT e aos créditos laborais, 30 dias após o trânsito em julgado da sentença de homologação do plano, ou seja, em Maio de 2015, data em que a sociedade teria de efetuar o pagamento da primeira prestação à AT e aos trabalhadores.
27. A sociedade não cumpriu com o plano em face da contínua diminuição da carteira de encomendas e diminuição do volume de receitas.
28. E a 19 de Junho de 2015 apresentou-se à insolvência, que corre termos com o n.º de processo identificado em 6;
29. Os réus F. R. e cônjuge, M. A., também se apresentaram a PER em 26 de Março de 2014, que correu termos com o n.º 293/14.6TBEPS, no 2.º Juízo do Tribunal de ..., no qual foi nomeado o AJ provisório a 27 de Março de 2014, e que hoje corre termos no Juízo de Comércio de Vila Nova de Famalicão – Juiz 3.
30. O plano de revitalização destes foi homologado a 3 de Fevereiro de 2015.
31. Tal plano previa, e ao qual a Caixa ... votou favoravelmente, atendendo à circunstância específica, da totalidade dos créditos comuns e dos créditos sob condição afetados pelo mesmo resultarem de garantia dada, através de aval ou fiança, à sociedade AAR, condicionar o reembolso integral dos seus créditos, às suas disponibilidades, alterando a sua exigibilidade, nos seguintes termos:
· Os Requerentes continuam, enquanto avalistas/fiadores, responsáveis, como principais pagadores e solidários, pelo pagamento das dívidas da sociedade devedora, que se encontram também reclamadas neste processo, nos termos em que vierem a ser acordados e aprovados no Plano de viabilização da AAR, garantidas pelos Requerentes, em sede de processo de revitalização.
· Os credores acordam em não exigir, aos Requerentes, o pagamento dos créditos reclamados, em termos de prazo de amortização, taxa de juro e demais condições de pagamento, diferentes daquelas que venham a ser estipuladas, em acordo de credores, aprovado em sede de processo de revitalização da AAR, garantidas pelos Requerentes.
32. O processo referido em 10. e 11. foi iniciado através de apresentação dos réus F. R. e cônjuge, M. A., a 23 de Dezembro de 2016.
33. A obrigação dos réus se apresentarem à insolvência decorreu das responsabilidades por si assumidas enquanto avalistas da sociedade e o ressurgimento das execuções contra eles iniciadas.
34. Por meio de escritura outorgada a 24 de Setembro de 2013, M. N. e F. R., enquanto administradores e representantes da “X – Investimentos Imobiliários, S.A”, aqui 5.ª ré, e ainda as aqui 3.ª e 4.ª rés, C. R. e R. I., declararam fazer a permuta dos prédios urbanos referidos em 17. com as fracções autónomas designadas pelas letras “V” e “X”, destinadas a escritórios, sitas no “Edifício ...”, na Rua de ..., em ..., com o valor patrimonial atribuído de 57.490,00 Eur. e de 62.070,00 Eur., respectivamente, pelo valor global de 129.750,00 Eur. (cento e vinte e nove mil, setecentos e cinquenta euros).
35. E por meio de escritura pública outorgada a 28 de Dezembro de 2013 as mesmas 3.ª e 4.ª rés, C. R. e R. I., declararam doar ao seu pai, F. R., as ditas fracções “V” e “X” pelo valor de 119.560,00 Eur. (cento e dezanove mil, quinhentos e sessenta euros).
36. Também os outros sócios e avalistas da “A. R. & Filhos, Lda.” (também eles declarados insolventes), nomeadamente M. N. e F. A. doaram os seus bens aos seus descendentes a 9.08.2013 e a 18.03.2013.
37. Os rendimentos do F. R. provinham da actividade por si desenvolvida através da “A. R. & Filhos, Lda.”.
38. Através da escritura pública outorgada a 9 de Agosto de 2013 o réu F. R., com o consentimento do cônjuge, M. A., não pretendeu transmitir gratuitamente para as suas filhas, C. R. e R. I., nem estas alguma vez pretenderam receber em doação a propriedade dos prédios referidos em 17..
39. Através da escritura pública feita em 24 de Setembro de 2013 nem a C. R. nem a R. I. quiseram permutar os prédios urbanos que lhes haviam sido doados pelo pai, aqui 1.º réu, nem a sociedade “X”, aqui 5.ª ré, quis ceder-lhes os escritórios à troca com aqueles prédios urbanos.
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Factos considerados não provados em Primeira Instância:

1. O valor dos bens apreendidos no processo de insolvência referido em 10. 11. e 32. é superior ao atribuído/arbitrado nesses mesmos autos de insolvência;
2. O valor de mercado dos bens apreendidos naquele processo, e que advieram aos réus F. R. e cônjuge, M. A., por força da permuta e doação referidas em 34. e 35., têm o mesmo valor de mercado que os bens doados às rés C. R. e R. I. através da escritura referida em 17.;
3. No processo referido em 8. e 9. foi apreendido um quinhão hereditário;
4. Com a doação a Caixa ... não ficou impedida de obter a satisfação do seu crédito;
5. Com a doação o F. R. quis realizar uma partilha em vida, dada a ligação afectiva que o unia à casa que sempre pertenceu à família;
6. Por isso acordou com as filhas em fazer a doação dos imóveis referidos em 17. mas adquirir outros bens em substituição daqueles;
7. A doação referida em 17. foi condicionada ao facto do seu património não ser diminuído;
8. Como as filhas eram já accionistas da “X”, sociedade imobiliária, para que a doação tivesse menos encargos, em termos fiscais, acordaram em fazer a permuta referida em 34.;
9. A doação referida em 17. só foi possível dado o recebimento por parte de F. R. e mulher, M. A., de bens de igual valor aos doados;
10. Os réus F. R. e mulher, M. A., mantiveram o direito de uso e habitação do prédio descrito com o n.º ... referido em 17., porque as suas filhas/donatárias assim o exigiram.
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3.2. Da admissibilidade da junção de documentos com as alegações de recurso

Os Recorrentes apresentam com as suas alegações dez documentos respeitantes aos processos de insolvência n.º 5210/15.3T8VNF, em que é insolvente A. R. & Filhos Lda, n.º 7971/16.3T8VNF em que é insolvente M. N., n.º 7972/16.1T8VNF em que é insolvente F. R., n.º 1562/17.9T8VNF em que são insolventes A. R. e A. F. e n.º 1625/17.0T8VNF em que são insolventes F. A. e M. R., e ainda que não requeiram expressamente a admissão aos autos de tais documentos referem-se aos mesmos e ao facto de serem posteriores à prolação da sentença nas suas alegações.
Vejamos então a admissibilidade da apresentação de documentos com as alegações de recurso.
Resulta do preceituado no artigo 651º nº 1 do Código de Processo Civil que “as partes apenas podem juntar documentos às alegações nas situações excepcionais a que se refere o artigo 425º ou no caso de a junção se ter tornado necessária em virtude do julgamento proferido na 1ª instância”.
Temos para nós como inquestionável que a junção de prova documental “deve ocorrer preferencialmente na 1ª instância, regime que se compreende na medida em que os documentos visam demonstrar certos factos, antes de o tribunal proceder à sua integração jurídica” (A. R. Santos Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, 2ª Edição, 2014, Almedina, p.191).
Quanto à junção de documentos prevê o artigo 425º do Código de Processo Civil que, depois “do encerramento da discussão só são admitidos, no caso de recurso, os documentos cuja apresentação não tenha sido possível até àquele momento”, resultando do artigo 423º do mesmo diploma que os documentos deverão “ser apresentados com o articulado em que se aleguem os factos correspondentes” (nº 1), ou “até 20 dias antes da data em que se realize a audiência final, mas a parte é condenada em multa, excepto se provar que os não pôde oferecer com o articulado” (nº 2), ou até ao encerramento da discussão, desse que a sua “apresentação não tenha sido possível ate aquele momento, bem como aqueles cuja apresentação se tenha tornado necessária em virtude de ocorrência posterior” (nº 3).
Assim, e havendo recurso, como acontece no nosso caso, em face do preceituado nos artigos 425º e 651º n.º 1 do Código de Processo Civil, a admissibilidade da junção de documentos com as alegações assume caracter excecional e ocorre apenas em duas situações: a) se a junção do documento não foi possível até àquele momento, isto é, nos casos de impossibilidade objetiva ou subjetiva de junção anterior do documento ou b) se a junção do documento se tornou necessária em virtude do julgamento proferido pela 1ª Instância.
A parte que pretenda juntar documentos, designadamente com as alegações de recurso, deve justificar o carácter superveniente da junção, seja ela de ordem objetiva seja ela de ordem subjetiva (cfr. Abrantes Geraldes, ob. cit, pág.191).
Quanto à impossibilidade objetiva a mesma decorre de o documento só ter sido produzido após o prazo-limite previsto no artigo 423º n.º 2 do Código de Processo Civil e a prova da impossibilidade da sua junção aos autos pela parte até àquele prazo limite decorre naturalmente da análise do teor do próprio documento.
No caso concreto, os Recorrentes alegam que os documentos são posteriores à prolação da sentença em 1ª Instância o que se confirma da sua análise e das datas dos mesmos, constatando-se que respeitam ao estado dos referidos processos de insolvência, em momento posterior à prolação da sentença recorrida.
Do exposto decorre ser de considerar justificado o carácter superveniente da junção dos documentos apresentado pelos Recorrentes admitindo-se a sua junção aos autos.
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3.3. Da modificabilidade da decisão de facto

Decorre do n.º 1 do artigo 662º do Código de Processo Civil que a Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa.
E a impugnação da decisão sobre a matéria de facto é expressamente admitida pelo artigo 640º, n.º 1 do Código de Processo Civil, segundo o qual o recorrente deve obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição, os pontos de facto que considera incorrectamente julgados, os concretos meios de prova, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão diversa e a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre essas questões de facto.
Sustentam os Recorrentes nas suas conclusões que houve erro no julgamento da matéria de facto quanto pontos 38) e 39) dos factos provados e quanto ao ponto 4) dos factos não provados.

Os pontos 38) e 39) da matéria de facto provada impugnados têm a seguinte redacção:
“38. Através da escritura pública outorgada a 9 de Agosto de 2013 o réu F. R., com o consentimento do cônjuge, M. A., não pretendeu transmitir gratuitamente para as suas filhas, C. R. e R. I., nem estas alguma vez pretenderam receber em doação a propriedade dos prédios referidos em 17..
39. Através da escritura pública feita em 24 de Setembro de 2013 nem a C. R. nem a R. I. quiseram permutar os prédios urbanos que lhes haviam sido doados pelo pai, aqui 1.º réu, nem a sociedade “X”, aqui 5.ª ré, quis ceder-lhes os escritórios à troca com aqueles prédios urbanos”.

O ponto 4) dos factos não provados tem a seguinte redacção:
“4. Com a doação a Caixa ... não ficou impedida de obter a satisfação do seu crédito”.

Entendem os Recorrentes que os pontos 38) e 39) devem passar a ter a seguinte redacção:
“38. Através da escritura pública outorgada a 9 de Agosto de 2013 o réu F. R., com o consentimento do cônjuge, M. A., pretendeu transmitir para as suas filhas, C. R. e R. I., e estas pretenderam receber a propriedade dos prédios referidos em 17.
39. Através da escritura pública feita em 24 de Setembro de 2013 a C. R. e a R. I. quiseram permutar os prédios urbanos que lhes haviam sido transmitidos pelo pai, aqui 1.º réu, e a sociedade “X”, aqui 5.ª ré, quis ceder-lhes os escritórios à troca com aqueles prédios urbanos”.

E que o ponto 4) dos factos não provados deve ser dado como provado, passando a constituir o ponto 40) dos factos provados com a seguinte redação:
“Com a doação a Caixa ... não ficou impedida de obter a satisfação do seu crédito.”
Analisemos então os argumentos expandidos pelos Recorrentes, que sustentam que as declarações das testemunhas por si indicadas e as declarações prestadas pelo Réu F. R., corroborados com os documentos juntos aos autos, designadamente a escritura de doação outorgada em 09/08/2013, a escritura de permuta outorgada em 24/09/2013 e a escritura de doação outorgada a 28/12/2013, determinam que se conclua que a intenção subjacente aos negócios de doação e permuta foi a de troca de património e não a de dissipação de bens ou de fuga do património para se furtarem ao pagamento das responsabilidades assumidas perante os credores.
Vejamos se lhe assiste razão começando por referir desde logo que os documentos (escrituras) a que se referem os Recorrentes, por si só, corroboram tão só o que os Réus declararam perante a Notária e já não a intenção subjacente a tais declarações e aos negócios celebrados; aliás, a não ser assim, nem seria possível a presente acção.
Quanto às testemunhas indicadas pelos Réus importa referir que a testemunha M. N. foi sócia gerente da sociedade “A. R. & Filhos Lda” juntamente com o Réu F. R., seu irmão e também administradora juntamente com seu irmão da sociedade Ré “X – Investimentos Imobiliários SA”, o que decorre da escritura de permuta de 24/09/2013 (cfr. fls. 42 e seguintes dos autos) onde outorgou nessa qualidade em representação desta sociedade; a testemunha C. F. é filha da testemunha M. N., sobrinha dos Réus F. R. e M. A. e prima das Rés R. I. e C. R., e, como decorre dos autos (cfr. documento de fls. 42 e seguintes dos autos) foi também outorgante na escritura de permuta.

O tribunal a quo consignou na motivação da sentença recorrida o seguinte:
“A convicção do Tribunal foi ainda sustentada nos depoimentos colhidos em audiência final, mormente quanto aos pontos 27. e 37. dos provados, bem ainda quanto aos pontos 38. e 39. em presunções, porque relativos à intenção subjacente aos negócios impugnados (que não sendo de prova directa porque atinente a factos do foro interno, corresponde a conclusão a extrair de factos que a patenteiam), já que a grande parte da matéria de facto alegada resultava já assente através de prova documental, e ainda por acordo das partes, atenta a posição tomada nos respectivos articulados.
Passando à análise sumária da prova testemunha colhida em audiência.
M. Z., funcionária da Caixa ... desde 1989, no gabinete de empresas e colocada no polo de Viana do Castelo desde 2012, começou por referir que conhece o réu F. R. como um dos sócios da empresa “A. R. & Filhos, Lda.”, bem como da “X”, que era a empresa imobiliária do grupo. Disse ainda conhecer os irmãos daquele, M. N., A. R. e F. A..

Confirmou tratar-se da gestora de contas da 1ª sociedade referida e que a Caixa ... celebrou com a mesma duas operações de crédito, mormente os dois contratos de abertura de crédito referidos nos pontos 1. a) e 1. b) dos factos provados, mormente:
a) uma conta corrente caucionada em 2007, renovável de 6 em 6 meses, com plafond disponível para a empresa fazer face às necessidades de tesouraria/fundo de maneio, que se manteve até 2013, data em que o banco informou que só manteria o plafond se fossem prestadas garantias ou fosse feito um plano de redução de responsabilidades; esta iniciou-se com um plafond de 800.000,00 Eur., reduzido em 2012 para 500.000,00 Eur. (o que contra eco na comunicação de fls. 17 verso – doc. 2 da pi);
b) uma conta corrente caucionada em 2009, com plafond de 250.000,00 Eur., renovável de 6 em 6 meses; em 2012 o banco transmitiu à empresa não ser possível renovar a mesma a não ser que amortizassem parte do valor em dívida ou reforçassem as garantias – com constituição de hipoteca por exemplo, o que foi comunicado por email de 13.02.2012.
Mais referiu que, em face das condições impostas pelo banco, a M. N. negociou um novo plano para liquidar parte dos compromissos assumidos, solicitando que o valor que o Município de … estava a pagar não fosse levado à conta-corrente mas sim à conta de depósitos à ordem.
A opção foi amortizar o valor em dívida em função dos pagamentos que a “A. R. & Filhos, Lda.” recebia de clientes, acertando-se um plano de liquidação, sendo que em cerca de 6 meses foram pagos cerca de cem mil euros, tendo depois a empresa suspendido os pagamentos (após email subscrito pela M. N. pedir isso mesmo).
Os dois contratos referidos estavam garantidos pessoalmente pelos sócios da empresa, através de aval prestado em livranças em branco, que foram preenchidas pelo banco e deram origem a uma execução (v. ponto 3 dos provados).
Confirmou que a Caixa ... e outros credores votaram favoravelmente o PER iniciado em Outubro de 2013, porque acreditavam na viabilização da empresa, porém, com o despacho de não homologação, recurso e subsequente oposição de outros credores, o processo arrastou-se e a empresa acabou por ir à insolvência.
M. N., confirmou que foi sócia-gerente da empresa “A. R. & Filhos, Lda.”, juntamente com o réu F. R., seu irmão, e que da mesma sociedade foram também sócios M. C. (seu falecido marido), F. A. e A. R., seus outros irmãos.
Quanto à X, da qual foi igualmente gerente com o réu F. R., disse que passaram todas acções aos respectivos filhos/sobrinhos.
Relativamente ao negócio outorgado por escritura pública a 9.08.2013 afirmou que apesar de denominado de “doação” se tratou de uma troca, já que o F. R. e a mulher doaram dois prédios urbanos às duas filhas – C. R. e R.I., mas estas deram-lhes, em compensação, dois escritórios da “X”, de quem eram sócias, sendo o valor deles o mesmo, sem intenção de defraudar credores.
Porém, de forma incongruente afirmou também que a “doação” consubstanciou uma “partilha em vida” porque o irmão F. R. e a esposa, assim como ela e os outros irmãos, F. A. e A. R., quiseram dar aos respectivos filhos o património que haviam adquirido ao longo da sua actividade empresarial assim como os pais deles fizeram consigo.
Assim como afirmou que a reserva do direito de habitação foi consignada para que o F. R. e a esposa tivessem um tecto para morar, e que a permuta daqueles prédios urbanos doados com os escritórios de ... da “X” feita em 24.09.2013 e a subsequente doação dos escritórios ao F. R. e esposa pelas filhas em 28.12.2013, teve por fim garantir a possibilidade de se obter financiamento bancário para a “A. R. & Filhos, Lda.”, já que esta empresa na época continuava a laborar.
C. F., sobrinha dos co-réus F. R. e M. A. e filha de M. N., licenciada em economia, referiu que sempre acompanhou a vida da “A. R. & Filhos, Lda.”, nomeadamente prestando apoio à gerência (da sua mãe e tio F. R.), na parte financeira, dada a sua formação.
Quanto à doação feita a 9.8.2013 limitou-se a referir que os tios assim procederam assim como a sua mãe (M. N.) e demais tios (A. R. e F. A.) por forma a salvaguardar o património da família, mormente as casas de habitação, e que já pensavam fazer as permutas com a “X” depois, por forma a pagar menos impostos.
Quanto à doação feita dos escritórios permutados com a “X” aos tios F. R. e M. A. pelas primas em 28.12.2013, afirmou que procuraram dessa forma assegurar a cada um dos sócios da “A. R. & Filhos, Lda.” património que pudesse servir de garantia para pedidos de financiamento bancário, para que a actividade da empresa pudesse continuar.
Por fim, foram colhidas as declarações de parte a F. R..
Este começou por referir que foi gerente da “A. R. & Filhos, Lda.” e da “X”, sendo que aquela foi declarada insolvente em 2015, e esta se mostra ainda em actividade, sendo gerida pelas filhas e pelos sobrinhos, a quem ele e os irmãos doaram as acções que ali possuíam.
Quanto à doação feita às filhas em 9.08.2013 disse que o seu objecto foram dois prédios herdados por ele dos pais e que quis preservar estes prédios urbanos na família, sem pretender fugir com património aos credores já que em troca recebeu os escritórios de ..., de idêntico valor, embora mais tarde (em Dezembro).
Nesta altura a “A. R. & Filhos, Lda.” ainda exercia actividade, e ele próprio tinha outros bens, sendo feita a reserva do direito de uso e habitação somente para garantir que ele e a esposa ali continuariam a viver até ao seu óbito, sendo que nunca deixou de habitar na casa com a esposa e as filhas/donatárias.
Reconheceu que quando foi feita a troca dos escritórios da “X” com os prédios doados às filhas em 24.09.2013, ele e a irmã M. N. eram os administradores da “X”, como resulta da escritura pública de permuta, mas sem que tivessem a intenção de fugir com património aos credores.
Ora, da conjugação da prova testemunhal com as declarações do co-réu F. R., não pode retirar-se, de qualquer forma, a conclusão de que a doação feita a 9.08.2013 dos prédios urbanos onde aquele habitava à data com a mulher e as filhas, situação que ainda se mantém (segundo declarou), apenas visou salvaguardar que tal património se manteria na esfera da família, já que escasso mês e meio após, mormente a 24.09.2013, um dos doadores, o F. R., juntamente com a sua irmã, M. N., ambos na qualidade de administradores e representantes da “X”, aqui 5.ª ré, e as aqui 3.ª e 4.ª rés, donatárias, declararam fazer a permuta daqueles mesmos prédios urbanos com as fracções autónomas designadas pelas letras “V” e “X”, destinadas a escritórios, sitas no “Edifício ...”, na Rua de …, em ....
Além do mais, já a 28.12.2013, e estando já pendente o processo de revitalização “A. R. & Filhos, Lda.”, iniciado a 21.10.2103 (v. ponto 21. dos provados), as aludidas donatárias e permutantes vieram a doar aos pais os mesmos escritórios.
As permutas feitas são naturalmente incompatíveis com qualquer espírito de liberalidade como a doação, e muito menos são compagináveis com a salvaguarda de qualquer património na esfera familiar dos réus, sendo evidente que as sucessivas transmissões operadas dos prédios urbanos dos réus F. R. e M. A., 1.º às filhas e depois por estas à “X” apenas visou tornar mais difícil aos credores penhorar/apreender esses bens, como dificultar que os mesmos fossem atingidos por outras medidas de garantia patrimonial, pois passaram os prédios urbanos da esfera dos réus particulares para a esfera de ume empresa do ramo imobiliário.
Aliás, os depoimentos a este propósito prestados por M. N. e C. F., não convenceram minimamente o Tribunal, pois que apesar de ambas se escusarem a reconhecer que este esquema se tratou de uma manobra para tentar imiscuir aos credores aqueles prédios urbanos, não deixaram de reconhecer que o objectivo era salvaguardar património familiar e assegurar ao F. R. e à esposa um tecto para morar, o que é bem elucidativo da consciência que todos já tinham da hipótese desse mesmo património vir a ser accionado como garantia de dívidas de que os co-réus F. R. e esposa, e bem assim M. N. e os outros irmãos de ambos, F. A. e A. R., enquanto sócios da “A. R. & Filhos, Lda.”, que vieram a usar de idêntico esquema (v. ponto 36. dos provados), haviam garantido pessoalmente, através da prestação de aval.
Da conjugação da prova enunciada resultou a convicção positiva e negativa do Tribunal, sendo que em relação aos pontos 1. a 10. dos não provados não foi possível retirar-se resposta afirmativa à sua ocorrência, pois que na sequência dos princípios da imediação, da oralidade e da concentração, o tribunal apreciou livremente as provas, segundo a sua prudente convicção – cfr. art. 607.º, n.º 5 do C.P.Civil (princípio da livre apreciação da prova), sem que fosse possível retirar as mesmas conclusões que os réus verteram a esse propósito na contestação – quanto ao valor dos bens apreendidos no processo de insolvência dos co-réus F. R. e esposa, pois como já se mencionou não se justifica desvalorizar o relatório pericial obtido nos nossos autos em relação ao junto os autos de insolvência; quanto à intenção subjacente à doação e permutas analisadas e à alegada condição imposta pelas filhas do casal, donatárias e permutantes, em face do conjunto da prova recolhida nos autos.
De acordo com as regras de raciocínio lógico e as máximas da experiência comum, é possível afirmar a existência da intenção dos co-réus, no sentido de fazer retirar o património mais valioso do F. R. e da M. A. da sua esfera, com vista a retirá-lo da esfera de acção do credor/banco-autor, através da doação dos prédios urbanos que lhes pertenciam às suas filhas, seguida, cerca de mês e meio após, da permuta desses mesmos prédios urbanos (sendo um a casa de habitação dos pais e das filhas e cujo direito de uso e habitação ficou reservado aos 1.ºs), com dois escritórios da “X”, imobiliária detida também pela família.
Por um lado, não resultou comprovado nos autos que o valor declarado na doação e permutas corresponda sequer ao valor de mercado dos bens objecto desses negócios, além de que, estando em causa um primeiro negócio de carácter gratuito não é sequer relevante o valor atribuído aos imóveis na escritura de doação.
A doação e as subsequentes permutas impediram ou no mínimo diminuíram as possibilidades de o credor, o aqui banco autor, a Caixa ..., pudesse ser paga e/ou cobrado coercivamente o seu crédito, quer através da execução n.º 6748/16.0T8VNF (cujos títulos foram as livranças avalizadas em 18.05.2007 e em 9.09.2009), onde nenhum bem foi penhorado, e se mostra suspensa, quer nos processos de insolvência da empresa e dos co-réus F. R. e M. A., sendo assim a mesma doação e direito de uso e habitação inoponíveis ao exequente banco.
De facto, não obstante reconhecidos os créditos da Caixa ... nos processos de insolvência n.º 5210/15.3T8VNF e n.º 7972/16.1T8VNF, considerando o valor global dos créditos ali reconhecidos e graduados, o valor do activo já liquidado (no 1.º caso) e em liquidação (no 2.º caso), e neste último caso tomando-se ainda em consideração o valor da avaliação ali operada, é evidente que a Caixa ... não tem qualquer hipótese, em rateio, e operadas as operações de proporção habituais, de vir a obter a liquidação total ou parcial dos créditos ali reconhecidos, posto que o valor que receberá é ínfimo e reduzido como já ocorreu no processo de insolvência n.º 1625/17.0T8VNF (v. pontos 14 a 16 dos provados), relativo a um outro sócio e avalista do banco, irmão do co-réu F. R.”.
Analisando a motivação exposta pelo tribunal a quo, e desde já antecipando a nossa decisão, entendemos não assistir razão aos apelantes sendo que as razões invocadas por estes radicam no essencial na sua discordância relativamente à convicção do Tribunal a quo, transcrevendo parte dos depoimentos prestados pelas testemunhas em causa e pelo Réu em declarações de parte.
Ora, para se poder concluir pela verificação de um facto não basta proceder à indicação ou transcrição de parte das declarações prestadas por algumas testemunhas sobre o mesmo, ou outros meios de prova; a prova tem de ser analisada na sua globalidade e de forma crítica, designadamente com recurso às regras de experiência comum.
E o tribunal a quo na análise da prova produzida em audiência equacionou toda a prova testemunhal produzida, designadamente as testemunhas indicadas pelos Recorrentes e as declarações prestadas pelo Réu, bem como a prova documental constante dos autos e a prova pericial, e fê-lo de forma crítica, fundamentada e exaustiva, esclarecendo através de raciocínio lógico a forma como formou a sua convicção, especificando os fundamentos decisivos para a formação da mesma e justificando os motivos da sua decisão, designadamente porque deu como provada a intenção subjacente aos negócios efectuados; e esclareceu também de forma fundamentada os motivos da opção tomada perante a prova produzida nos autos, analisando não só as declarações que foram proferidas pelas testemunhas ouvidas em audiência, mas também as declarações proferidas pelo Réu, tudo no confronto com a demais prova constante dos autos e segundo as regras da experiencia comum.
Acresce dizer que, relativamente à prova, a questão que se coloca, seja na 1.ª Instância, seja na Relação, é sempre a da valoração das provas produzidas em audiência ou em documentos de livre apreciação, pois que, em ambos os casos, vigoram para o julgador as mesmas normas e os mesmos princípios, em particular o da livre apreciação da prova consagrado no artigo 607º n.º 5 do Código de Processo Civil.
Prevê este preceito que o “juiz aprecia livremente as provas segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto”; tal resulta também do disposto nos artigos 389º, 391º e 396º do Código Civil, respectivamente para a prova pericial, para a prova por inspecção e para a prova testemunhal, sendo que desta livre apreciação do juiz o legislador exclui os factos para cuja prova a lei exija formalidade especial, aqueles que só possam ser provados por documentos ou aqueles que estejam plenamente provados, quer por documentos, quer por acordo ou confissão das partes (2ª parte do referido nº 5 do artigo 607º).
Conforme o ensinamento de Manuel de Andrade (Noções Elementares de Processo Civil, Reimpressão, 1993, página 384) “segundo o princípio da livre apreciação da prova o que torna provado um facto é a íntima convicção do juiz, gerada em face do material probatório trazido ao processo (bem como da conduta processual das partes) e de acordo com a sua experiência de vida e conhecimento dos homens; não a pura e simples observância de certas formas legalmente prescritas”.
A prova idónea a alcançar um tal resultado, é assim a prova suficiente, que é aquela que conduz a um juízo de certeza; a prova “não é uma operação lógica visando a certeza absoluta (a irrefragável exclusão da possibilidade de o facto não ter ocorrido ou ter ocorrido de modo diferente) (…) a demonstração da realidade de factos desta natureza, com a finalidade do seu tratamento jurídico, não pode visar um estado de certeza lógica, absoluta, (…) A prova visa apenas, de acordo com os critérios de razoabilidade essenciais à aplicação prática do Direito, criar no espírito do julgador um estado de convicção, assente na certeza relativa do facto” (Antunes Varela, J. Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, Manual de Processo Civil, Manual de Processo Civil, 2ª Edição, Revista e Actualizada, página 435 a 436). Está por isso em causa uma certeza jurídica e não uma certeza material, absoluta.
Cumpre realçar ainda que a “livre apreciação da prova” não se traduz obviamente numa “arbitrária apreciação da prova”, pelo que se impõe ao juiz que identifique os concretos meios probatórios que serviram para formar a sua convicção, bem como a “menção das razões justificativas da opção pelo Julgador entre os meios de prova de sinal oposto relativos ao mesmo facto” (cfr. Antunes Varela, J. Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, Obra Cit. página 655).
Por isso, o “juiz [de 1ª Instância] explicará por que motivo deu mais crédito a uma testemunha do que a outra, por que motivo deu prevalência a um laudo pericial em detrimento de outro, por que motivo o depoimento de certa testemunha tecnicamente qualificada levou à desconsideração de um relatório pericial ou por que motivo não deu como provado certo facto apesar de o mesmo ser referido em vários depoimentos. E é ainda assim por referência a certo depoimento e a propósito do crédito que merece (ou não), o juiz aludirá ao modo como o depoente se comportou em audiência, como reagiu às questões colocadas, às hesitações que não teve (teve), a naturalidade e tranquilidade que teve (ou não)” (Paulo Pimenta, Processo Civil Declarativo, Almedina, 2014, p. 325).
E é o juiz da 1ª Instância, perante o qual a prova é produzida que está em posição privilegiada para proceder à sua avaliação, e, designadamente, surpreender no comportamento das testemunhas elementos relevantes para aferir da espontaneidade e credibilidade dos depoimentos que frequentemente não transparecem da gravação.
Assim, a alteração da matéria de facto só deve pois ser efectuada pelo Tribunal da Relação quando este conclua, com a necessária segurança, que a prova produzida aponta em sentido diverso e impõe uma decisão diferente da que foi proferida em 1ª instância.
Como como já referimos, o tribunal a quo esclareceu de forma exaustiva, crítica e fundamentada, e através de raciocínio lógico, a forma como formou a sua convicção, e indicou especificada e justificadamente os fundamentos decisivos para a formação da mesma.
E, ouvida a prova produzida em audiência, designadamente os depoimentos prestados pelas testemunhas indicadas pelo Recorrente e as declarações do Réu, conjugados os mesmos com a prova documental constante dos autos e analisados à luz das regras da experiência comum, não vemos que se possa afirmar a existência de erro de julgamento e nem concluir que a prova produzida aponta em sentido diverso ou impõe uma decisão diferente da que foi proferida em 1ª Instância.
Tanto bastaria, segundo entendemos, para que se não procedesse à alteração da matéria de facto fixada em 1ª Instância no sentido pretendido pelos Recorrentes, mas na verdade, ouvidas as declarações prestadas em audiência, conjugadas com a prova documental e com o relatório pericial (respeitante à avaliação dos sete imóveis que fazem parte da massa insolvente do Réu F. R.) e analisadas as mesmas à luz das regras da experiência comum, a nossa convicção coincide efectivamente com a do tribunal a quo.
Desde logo resulta das próprias declarações das testemunhas de forma clara que a intenção era de retirar do património dos Réus F. R. e M. A. os prédios urbanos, em particular o prédio urbano que constitui a casa de habitação daqueles e de os colocar a salvo de qualquer acção por parte dos credores; aliás, das próprias declarações da testemunha C. F. transcritas pelos Recorrentes resulta que “sempre foi objectivo preservar essas casas de habitação (…) e na altura decidimos fazer estas operações, digamos, assim para salvaguardar este património pelo valor estimativo que tinha (…)”.
Também a testemunha M. N. afirmou que o intuito de terem feito a doação foi a do irmão ter um lugar para viver, para se “as coisas corressem mal, como infelizmente aconteceu, ter um telhado. Senão hoje o meu irmão estava de baixo da ponte”, era para o Réu F. R. ter um lugar para viver, ter um “telhado para os filhos”; acrescentando ainda que ao serem transmitidos os prédios urbanos para a sociedade, em particular o que constitui a casa de habitação, a intenção era a sociedade ficar com eles “parqueados” no seu património, sem os vender. E, na verdade, não se perceberia que fosse outro o interesse que não o de “salvar” a sua casa a transmissão para uma sociedade imobiliária e nem o interesse desta nessa transmissão uma vez que sobre o imóvel descrito na Conservatória do registo Predial de ... sob o número .../... foi reservado para os Réus F. R. e M. A. o direito de habitação a extinguir apenas à morte do último.
E também o Réu F. R. foi afirmativo ao esclarecer que “quis ficar com aqueles bens”, “saber que ficava com eles até ao fim da vida”, em particular a casa de habitação, até porque os outros bens que tinha não tinham significado para ele.
De salientar ainda que, quer as testemunhas quer o Réu F. R., são os primeiros a insistir que não havia intenção de doar; referem a intenção de fazer uma troca desde o inicio, não se percebendo contudo, se não fosse também outra a intenção, que procedessem aos negócios de doação/permuta/doação, não convencendo a explicação adiantada de ter sido uma questão técnica e de custos, tanto mais que referem a equivalência de valores e incorreram em custos acrescidos com a realização de diversas escrituras e respectivos registos.
Assim, e a este propósito mostra-se absolutamente clara e fundada a motivação do tribunal a quo que concluiu que “os depoimentos a este propósito prestados por M. N. e C. F., não convenceram minimamente o Tribunal, pois que apesar de ambas se escusarem a reconhecer que este esquema se tratou de uma manobra para tentar imiscuir aos credores aqueles prédios urbanos, não deixaram de reconhecer que o objectivo era salvaguardar património familiar e assegurar ao F. R. e à esposa um tecto para morar, o que é bem elucidativo da consciência que todos já tinham da hipótese desse mesmo património vir a ser accionado como garantia de dívidas de que os co-réus F. R. e esposa, e bem assim M. N. e os outros irmãos de ambos, F. A. e A. R., enquanto sócios da “A. R. & Filhos, Lda.”, que vieram a usar de idêntico esquema (v. ponto 36. dos provados), haviam garantido pessoalmente, através da prestação de aval; considerando que de acordo com as regras da experiência comum e de raciocínio lógico era “possível afirmar a existência da intenção dos co-réus, no sentido de fazer retirar o património mais valioso do F. R. e da M. A. da sua esfera, com vista a retirá-lo da esfera de acção do credor/banco-autor, através da doação dos prédios urbanos que lhes pertenciam às suas filhas, seguida, cerca de mês e meio após, da permuta desses mesmos prédios urbanos (sendo um a casa de habitação dos pais e das filhas e cujo direito de uso e habitação ficou reservado aos 1.ºs), com dois escritórios da “X”, imobiliária detida também pela família” e que os negócios em causa de doação e subsequente permuta impediram ou no mínimo diminuíram as possibilidades da Autora, credora, ser paga e/ou cobrado coercivamente o seu crédito, tanto mais que não resultou demonstrado que o valor declarado na doação e permutas corresponda ao valor de mercado dos bens objecto desses negócios (veja-se o ponto 2) dos factos não provados, matéria não impugnada pelos Recorrentes).
Não entendemos, por isso, que deva ser alterada a redacção dos pontos 38) e 39) da matéria de facto provada e nem que deva julgar-se provada a matéria constante do ponto 4) dos factos não provados.
Pelo exposto, por nenhuma censura merecer a decisão a esse respeito proferida pela 1ª Instância, conforme com a prova constante dos autos, mantêm-se inalterada a redação dos pontos 38) e 39) da matéria de facto provada e do ponto 4) dos factos não provados.

Considerando, contudo, o teor dos documentos juntos com as alegações de recurso de que resulta a junção de novo mapa de rateio no processo n.º 1625/17.0T8VNF, a substituir o anteriormente junto em 13/12/2019, e o despacho a determinar o inicio dos pagamentos datado de 26/05/2020, e aceitando a Autora ter recebido efetivamente a quantia de €4.948,94 na sequência do rateio efetuado naquele processo entendemos ser de acrescentar à matéria de facto provada um novo ponto que passará a ser 40) e terá a seguinte redação:
“40. No processo referido em 14. veio a ser junto aos autos pelo Administrador da Insolvência novo mapa de rateio em substituição do indicado em 16. e a Autora recebeu já a quantia de €4.948,94 na sequência do rateio efetuado”.
***
3.3. Reapreciação da decisão de mérito da acção

No que se refere à decisão jurídica propriamente dita, e em face da manutenção da decisão da matéria de facto, terá a mesma também que se manter, tanto mais que a alteração da decisão jurídica, na própria perspectiva dos Recorrentes, teria como pressuposto a alteração da decisão de facto nos termos por si pretendidos, concluindo que com a alteração da decisão sobre a matéria de facto não se verificariam os pressupostos da acção pauliana.
Vejamos então.
Não vem questionado nos autos que está em causa uma acção de impugnação pauliana e que deve ser aplicado o regime decorrente dos artigos 610º e seguintes do Código Civil, tal como configurado pelo tribunal a quo.

Dispõe o artigo 610º do Código Civil que os actos que envolvam diminuição da garantia patrimonial do crédito e não sejam de natureza pessoal podem ser impugnados pelo credor, se concorrerem as circunstâncias seguintes:

a) Ser o crédito anterior ao acto ou, sendo posterior, ter sido o acto realizado dolosamente com o fim de impedir a satisfação do direito do futuro credor;
b) Resultar do acto a impossibilidade, para o credor, de obter a satisfação integral do seu crédito, ou agravamento dessa impossibilidade.

A procedência da impugnação (cfr. artigo 616º n.º 1 do Código Civil) dá ao credor o direito à restituição dos bens na medida do seu interesse, podendo executá-los no património do obrigado à reparação e praticar os actos de conservação da garantia patrimonial autorizados por lei.
Ao credor incumbe a prova do montante das dívidas e ao devedor ou a terceiro interessado na manutenção do acto a prova de que o obrigado possui bens penhoráveis de igual ou maior valor (artigo 611º do Código Civil), preceituando o artigo 612º, nº 1 que o acto oneroso só está sujeito à impugnação se o devedor e o terceiro tiverem agido de má-fé, considerando-se má-fé a consciência do prejuízo que o acto causa ao credor (artigo 612º, nº 2).
Se o acto for oneroso, a impugnação procede havendo má-fé, valendo como tal a consciência do prejuízo que o acto causa ao credor conforme resulta do artigo 612.º, mas se o acto for gratuito a impugnação procede ainda que o terceiro tenha procedido de boa-fé.
São assim requisitos da impugnação pauliana: i) a existência de um crédito cuja defesa se intenta com a impugnação e que o crédito seja anterior ao acto impugnado; ii) o prejuízo que do acto resulta para o credor, entendido esse prejuízo como a impossibilidade de o credor obter a satisfação integral do seu crédito ou o agravamento dessa impossibilidade; iii) a existência de má-fé, sendo que quanto a este requisito a lei distingue conforme se trate de acto oneroso ou gratuito: o acto oneroso só está sujeito a impugnação pauliana se o devedor e o terceiro tiverem agido de má-fé, e o acto gratuito é impugnável ainda que um e outro hajam actuado de boa-fé.
Esta distinção em conformidade com a natureza gratuita ou onerosa do acto tem subjacente que sendo o interesse no cumprimento das obrigações “mais valioso que o interesse na protecção e conservação de actos de liberalidade, quando se verifica a alienação de um bem, sem recebimento de qualquer contrapartida, não se justifica que os interesses de quem deu e de quem recebeu se sobreponham, em qualquer situação, aos interesses de quem deixa de ter garantido o cumprimento do seu crédito sobre o benemérito” (Cura Mariano, Impugnação Pauliana, Almedina, 2004, página 183).
No caso concreto não há dúvida sobre a existência do crédito da Autora e que é anterior à escritura de doação e à subsequente escritura de permuta.
O que os Recorrente sustentam é que os actos impugnados de doação de 09/08/2013 e de permuta de 24/09/2013 não envolveram diminuição da garantia patrimonial para a Autora, credora e que dos mesmos não resultou um agravamento da impossibilidade de obter a satisfação do crédito, e que não foram realizados dolosamente, com o fim de impedir a satisfação do seu direito de crédito.
Está, por isso, em causa a verificação dos requisitos da impossibilidade de o credor obter a satisfação integral do seu crédito ou o agravamento dessa impossibilidade e da existência de má-fé.
Cumpre referir desde logo que, ao contrário do que alegam os Recorrentes, a Recorrida não esqueceu de mencionar a doação posterior à permuta, datada de 28/12/2013, pois na petição inicial refere expressamente a doação efectuada pelas Rés a seu pai (cfr. artigo 57º da petição inicial).
E quanto à má-fé, tal como já referido, há que distinguir conforme se trate de acto oneroso ou gratuito, pois o acto gratuito é impugnável ainda que o devedor e o terceiro hajam actuado de boa-fé.
Assim, e relativamente à doação de 09/08/2013, sendo um ato gratuito (cfr. artigo 940º do Código Civil que define no seu n.º 1 a doação como o contrato pelo qual uma pessoa, por espírito de liberalidade e à custa do seu património, dispõe gratuitamente de uma coisa ou de um direito, ou assume uma obrigação, em benefício do outro contraente) é indiferente a existência de má-fé.
Ao contrário do que sustentam os Recorrentes não entendemos que a posterior doação efectuada pelas Rés C. R. e R. I. a seu pai em 28/12/2013 altere por qualquer forma a natureza gratuita do ato de doação de 09/08/2013, tanto mais que não decorre sequer dos autos que os bens em causa em ambas as doações tivessem valor equivalente (não só não tinham o mesmo valor patrimonial, como ficou a constar do ponto 2) dos factos não provados, matéria que os Recorrentes não impugnaram, que o valor de mercado seja o mesmo).
Por isso, e relativamente ao ato de doação não é de exigir a verificação da má-fé.

Quanto à permuta, e estando em causa um ato oneroso, importa apelar também ao preceituado no artigo 613º do Código Civil que impõe como requisito no caso de transmissões posteriores que, relativamente à primeira transmissão, se verifiquem os requisitos da impugnabilidade (n.º 1 alínea a) e que haja má-fé tanto do alienante como do posterior adquirente, no caso de a nova transmissão ser a título oneroso (n.º 1 alínea b).
Como se refere na decisão recorrida a verificação da “consciência do prejuízo que o ato causa ao credor” é conclusão a extrair dos factos que a patenteiam, pois que é atinente a factos do foro interno, assumindo particular relevo o uso de presunções judiciais (na definição legal, decorrente do artigo 349º do Código Civil as presunções são as ilações que a lei ou o julgador tira de um facto conhecido para firmar um facto desconhecido, sendo que as presunções judiciais, só são admitidas nos casos e termos em que é admitida a prova testemunhal – cfr. artigo 351º do Código Civil).
Ora, não temos dúvidas de que, na impugnação pauliana, a prova da consciência do prejuízo que o acto causa ao credor por parte dos intervenientes é muitas vezes alcançado através da utilização de presunções judiciais.
Aliás, a consciência do prejuízo nem será em regra susceptível de prova directa mas normalmente da denominada prova indirecta.
Na impugnação pauliana está muitas vezes em causa apurar as intenções das partes na outorga dos negócios e a prova destas tem de ser feita na maior parte das vezes através de indícios/presunções.
Luís Filipe Pires de Sousa (ob. citada página 250 e seguintes quanto à impugnação pauliana e página 231 e seguintes quanto à simulação, entendendo que as considerações expandidas a propósito dos indícios da simulação se aplicam, mutatis mutandis, quanto aos indícios da impugnação pauliana) enuncia a este propósito diversos indícios que poderão revelar a simulação ou a consciência do prejuízo na impugnação pauliana (má fé): affectio, habitus, subfortuna, movimento bancário, pretium confessus, pretium vilis, preço diferido, retentio possessionis, tempus, sigilum, preconstitutio, previssio, disparitesis, incúria, inertia, nescientia e domínio.
No caso concreto é inequívoco que as partes envolvidas nos atos impugnados são familiares, mesmo relativamente aos representantes da sociedade Ré (indicio affectio) e que o prédio urbano é a casa de habitação dos Réus F. R. e M. A. (indicio retentio possessionis), aliás a doação foi feita com reserva do direito de habitação a seu favor e a extinguir-se apenas à morte do último, tendo a sociedade Ré, imobiliária, representada no ato da permuta pelo Réu F. R. e pela testemunha M. N., na qualidade de seus Administradores, permutado duas fracções autónomas destinadas a escritórios pelos prédios urbanos, um dos quais onerado com o referido direito de habitação e, por isso, dificilmente comercializável.
Por outro lado, decorre dos factos provados o Réu F. R., com o consentimento do cônjuge, M. A., não pretendeu transmitir gratuitamente para as suas filhas, C. R. e R. I., nem estas alguma vez pretenderam receber em doação a propriedade dos prédios em questão e nem estas quiseram permutar os prédios urbanos, nem a sociedade Ré quis ceder-lhes os escritórios à troca com aqueles prédios urbanos.
Tal como se salienta na sentença recorrida as circunstâncias apuradas acerca da motivação da doação e subsequente permuta são a revelação de que o acto foi realizado para impedir a satisfação do direito do credor, ressaltando a má-fé das alienantes e da adquirente de não desconhecerem que os Réus eram devedores da Recorrida, não podendo desconhecer a situação difícil que a sociedade “A. R. & Filhos, Lda” já então atravessava pois que o processo de revitalização se iniciou em 21/10/2013 (ponto 21 dos factos provados), menos de um mês após a escritura de permuta, não sendo de considerar para este efeito apenas as datas das declarações de insolvência, conforme pretendem os Recorrentes; é que o crédito da Autora que está em causa tem origem no incumprimento de obrigações assumidas por aquela sociedade e subsequente preenchimento de livranças subscritas pela mesma e avalizada pelo Réu F. R..
Sustentam os Recorrentes que em agosto de 2013, data que entendem deve ser a considerada, a Autora/Credora não estava impossibilitada de receber o seu crédito pois o valor do património dos Réus/devedores era de €275.467, 44, correspondente à soma do valor das fracções de €210.450,00 e dos demais prédios rústicos de €65.017,44. Contudo, tal afirmação assenta em dois pressupostos que se não mostram totalmente corretos: por um lado, os valores que referem são os que constam do relatório pericial e que se reportam à data em que o mesmo foi elaborado (2018) e não a 2013 e, por outro lado, naquela data (agosto de 2013) os Réus não eram proprietários das referidas fracções.
Não resulta, por isso, dos autos que os Réus F. R. e M. A. tivessem nessa data outros bens que permitissem satisfazer integralmente o crédito da Recorrida. E não resulta também demonstrado que o valor de mercado dos bens que advieram aos Réus F. R. e M. A., por força da permuta e doação de 28/12/2013 tinham, e têm, o mesmo valor de mercado que os bens doados às rés C. R. e R. I. através da doação de 09/08/2013
Aliás, atentando-se na factualidade não provada decorre não ter ficado demonstrado que com a doação a Autora não ficou impedida de obter a satisfação do seu crédito (ponto 4), que foi acordado entre o Réu F. R. e as filhas fazer a doação dos imóveis mas adquirir outros bens em substituição daqueles e nem que a doação foi condicionada ao facto do seu património não ser diminuído e que só foi possível dado o recebimento por parte de F. R. e mulher, M. A., de bens de igual valor aos doados (pontos 6, 7 e 9, factualidade não provada que os Recorrentes não impugnaram).
Por outro lado, se é verdade que estão também pendentes os processos de insolvência da sociedade “A. R. & Filhos, Lda” e dos seus sócios M. N., F. R., A. R. e F. A., e cônjuges, nos quais a aqui Autora reclamou os créditos decorrentes do não pagamento das livranças em causa, e que foram reconhecidos reconhecimento, tal não significa que venha a obter a satisfação integral do seu crédito no âmbito desses processos.
Neste momento sabemos que a Autora, tal como ela própria reconhece, já recebeu no âmbito do processo n.º 1625/17.0T8VNF, em que em que são insolventes F. A. e M. R., a quantia de €4.948,94; alegam ainda os Recorrentes terem sido informados que a Autora irá receber a quantia de €27.800,00 no âmbito do processo de insolvência n.º 7971/16.3T8VNF, em que é insolvente M. N., existindo contudo um valor condicional de €15.800,00, e a quantia €23.197,13 no processo n.º 1562/17.9T8VNF em que são insolventes A. R. e A. F.. Do mapa de rateio que juntaram com as suas alegações, referente ao processo n.º 5210/15.3T8VNF, em que é insolvente A. R. & Filhos Lda consta que a Autora irá receber a quantia de €5.253,43. E no processo de insolvência dos aqui Réus, processo n.º 7972/16.1T8VNF, foram apreendidos bens imóveis com um valor patrimonial global de €122.278,76 e um depósito bancário do montante de €6.762,96 tendo sido reconhecidos créditos no montante de €1.727.782,15.
Atentando no valor global dos créditos reclamados e reconhecidos e o valor do ativo apreendido e /ou liquidado não é provável poder afirmar-se que a Autora aí vai ver integralmente satisfeito o crédito aqui em causa, tal como consta da sentença recorrida.
Não merece, por isso, censura a sentença recorrida que concluiu pela procedência da impugnação pauliana relativamente à doação outorgada em 09/08/2013 e à permuta outorgada em 24/09/2013.
Em face de todo o exposto, improcede pois a apelação, sendo de confirmar a decisão recorrida.
As custas são da responsabilidade dos Recorrentes em face do seu integral decaimento (artigo 527º do Código de Processo Civil).
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SUMÁRIO (artigo 663º n.º 7 do Código do Processo Civil):

I - Na impugnação pauliana muitas vezes está em causa apurar as intenções das partes na outorga dos negócios (actos impugnados) e a prova daquelas tem de ser feita com recurso a indícios/presunções, podendo a prova da consciência do prejuízo que o acto causa ao credor por parte dos intervenientes ser alcançada através da utilização de presunções judiciais.
II - São requisitos da impugnação pauliana: i) a existência de um crédito cuja defesa se intenta com a impugnação e que o crédito seja anterior ao acto impugnado; ii) o prejuízo que do acto resulta para o credor, entendido esse prejuízo como a impossibilidade de o credor obter a satisfação integral do seu crédito ou o agravamento dessa impossibilidade; iii) a existência de má-fé, sendo que quanto a este requisito a lei distingue conforme se trate de acto oneroso ou gratuito: o acto oneroso só está sujeito a impugnação pauliana se o devedor e o terceiro tiverem agido de má-fé, e o acto gratuito é impugnável ainda que um e outro hajam actuado de boa-fé.
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IV. Decisão

Pelo exposto, acordam os juízes desta Relação em:

a) Indeferir o pedido formulado pelos Recorrentes de solicitação de informações e de que os autos aguardem pelas mesmas;
b) Admitir a junção aos autos dos documentos apresentados pelos Recorrentes com as alegações de recurso;
c) Julgar improcedente a apelação, confirmando-se a sentença recorrida.
Custas pelo Recorrente.
Guimarães, 17 de dezembro de 2020
Texto elaborado em computador e integralmente revisto pela signatária

Raquel Baptista Tavares (Relatora)
Margarida Almeida Fernandes (1ª Adjunta)
Margarida Sousa (2ª Adjunta)