RECURSO DE REVISTA
PLANO DE INSOLVÊNCIA
HOMOLOGAÇÃO
PRAZO DE INTERPOSIÇÃO DO RECURSO
PROCESSO URGENTE
OPOSIÇÃO DE JULGADOS
ÓNUS DE ALEGAÇÃO
INSOLVÊNCIA
Sumário


I - A decisão de recusa de homologação do plano de insolvência apresentado pelo insolvente, que determinou o prosseguimento dos autos para liquidação, consubstancia decisão proferida nos autos de insolvência; não, em apenso destes.
II - Estando em causa processo de natureza urgente, é de 15 dias o prazo de interposição de recurso, designadamente para a revista do acórdão da Relação que confirmou tal decisão de não homologação do plano de insolvência apresentada pelo insolvente.
III - Constitui ónus do recorrente a indicação do pressuposto específico de admissibilidade da revista – oposição de acórdãos – previsto no art. 14.º, n.º 1, do CIRE.

Texto Integral



Acordam em conferência na 6ª Secção Cível do Supremo Tribunal de Justiça,

I -

1. AA, declarado insolvente por sentença proferida a 30-05-2018, vem reclamar para a conferência da decisão da relatora de não conhecimento do objecto do recurso de revista que interpôs do acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Coimbra, que julgou improcedente a apelação e confirmou a decisão de 1ª instância que recusou a homologação do plano de insolvência apresentado pelo Insolvente e determinou o prosseguimento dos autos para liquidação.

Considera o Requerente que a decisão reclamada se apresenta desconforme ao Direito porquanto entende que, no caso, o prazo de interposição de recurso a ter em conta é o geral (30 dias); não o aplicável aos processos urgentes (15 dias). Reitera assim a tempestividade da revista, aduzindo a seguinte argumentação:

- mostrar-se duvidoso que o artigo 17.º, do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas (CIRE) preveja que os apensos à insolvência sejam considerados processos urgentes.

- estar-se perante acção com “tramitação processual do processo comum, inerente”, cabendo-lhe, por isso, o regime geral de recurso quanto ao prazo;

- encontrar-se preenchido o requisito específico de oposição de acórdãos sendo que, caso assim não fosse, ao abrigo dos “Princípios da Materialidade Subjacente e ao Primado da Substância sob a Forma e da Cooperação Inter Partes”, deveria ter sido notificado para, querendo, “promover o suprimento da alegada insuficiência processual”.

2. A decisão reclamada tem o seguinte teor:

1. Em causa está recurso do acórdão da Relação que confirmou a decisão de 1ª instância que recusou a homologação do plano de insolvência apresentado pelo Insolvente e, em consequência, determinou o prosseguimento dos autos para liquidação.

Trata-se pois de recurso de decisão que se insere no âmbito da tramitação do processo de insolvência, sendo aplicável o regime previsto nos artigos 9.º e 14.º, ambos do CIRE.

Assim, por força do citado artigo 9.º, n.º1, do CIRE, há que considerar que o processo em causa e respectivo recurso da decisão nele proferida assumem natureza urgente e, nessa medida, cabe-lhe a aplicação do regime geral das disposições da lei processual civil, nos termos previstos pelo artigo 17.º, do CPC. Consequentemente, na determinação do regime processual civil a aplicar ao recurso, particularmente no que se reporta ao prazo de interposição de recurso, atenta a natureza urgente do processo, de acordo com o artigo 677.º, do CPC, o prazo para a interposição de recurso de revista é de 15 dias.

2. Na sequência do consignado no despacho que antecede, estando em causa processo com natureza urgente e sendo-lhe aplicável o regime previsto no artigo 677.º, n.º1, do CPC, impunha-se que o Requerente tivesse interposto recurso no prazo de quinze dias.

Tal, porém, não aconteceu.

Na verdade, conforme evidenciam os autos, a notificação do acórdão ao Recorrente foi levada a cabo em 18-09-2019, presumindo-se, assim, a notificação ao mesmo em 23-09-2019 (cfr. artigo 248.º, do CPC), tendo interposto recurso em 15-10-2019.

Assim, uma vez que o Recorrente interpôs revista excedendo o prazo de 15 dias que se lhe impunha legalmente, mostra-se o recurso intempestivo, obstando por isso ao conhecimento do respectivo objecto.

3. Importa ainda sublinhar que o Recorrente fundamenta o recurso no disposto no artigo 672.º, n.º1, do CPC (revista excepcional), sendo que, conforme acima referido, é-lhe aplicável o regime especial de recursos ínsito no artigo 14.º, n.º1, do CIRE (norma que estabelece um regime especial de aplicação directa e autónoma), ou seja, independentemente da dupla conformidade das decisões das instâncias, mas

sujeita ao requisito da oposição de acórdãos.

Como resulta das alegações de recurso, o Recorrente não invoca a oposição de acórdãos que constituía ainda o requisito necessário para a admissibilidade da revista, caso a mesma se mostrasse tempestiva.”

II - Apreciando

1. O entendimento da decisão proferida não pode deixar de ser reiterado.

1.1 Contrariamente ao entendimento defendido pelo Recorrente (estar-se perante processo apenso aos autos de insolvência), em causa está a admissibilidade de recurso de decisão proferida no âmbito do próprio processo de insolvência (ainda que enquanto incidente do mesmo), porquanto o Requerente interpôs recurso do acórdão da Relação que confirmou a decisão de 1ª instância que recusou a homologação do plano de insolvência apresentado pelo Insolvente e determinou o prosseguimento dos autos para liquidação.

Assim sendo, a questão da natureza urgente do processo encontra-se expressamente prevista no artigo 9.º, do CIRE, e a determinação do regime de recursos, no artigo 14.º, do mesmo Código.

Consequentemente, a aplicação subsidiária do Código de Processo Civil (CPC), por efeito do artigo 17.º, do CIRE, reporta-se apenas ao prazo de interposição de recurso para os processos urgentes (artigo 677.º, do CPC) pois que o CIRE, nessa parte, não contempla norma específica, remetendo para o que nesse sentido se mostra estipulado no CPC.

Como salientado na decisão reclamada, o Recorrente não interpôs a revista no prazo de 15 dias que legalmente se lhe impunha (evidenciam os autos, que a notificação do acórdão ao Recorrente foi levada a cabo em 18-09-2019, presumindo-se, assim, a notificação ao mesmo em 23-09-2019, tendo apresentado requerimento de interposição de recurso em 15-10-2019) pelo que a extemporaneidade do recurso impeditiva da sua admissibilidade, obsta ao conhecimento do respectivo objecto.

2. Quanto à falta de alegação de oposição de acórdão enquanto requisito do recurso a interpor ao abrigo do artigo 14.º, do CIRE, importa sublinhar que a indagação/verificação do pressuposto específico do regime de recurso a aplicar não dispensa a verificação prévia das condições gerais de admissibilidade, designadamente a tempestividade do recurso. Acresce que, a oposição de acórdãos enquanto requisito específico de admissibilidade da revista nos termos do artigo 14.º, do CIRE, constitui ónus do Recorrente, que como tal não pode ser passível de ser colmatado por iniciativa do tribunal.

Improcede, pois, a reclamação.

II - Decisão

Nestes termos, acordam os juízes neste Supremo Tribunal de Justiça em julgar improcedente a presente reclamação do despacho que não conheceu do objecto do recurso.

Custas pelo Recorrente, fixando-se em 2 Uc´s a taxa de justiça.


Lisboa, 7 de Setembro de 2020

Graça Amaral - Relatora

Henrique Araújo

Maria Olinda Garcia

Tem voto de conformidade dos Senhores Conselheiros Adjuntos (artigo 15ºA, aditado ao DL 10-A/2020, de 13/3, pelo DL 20/2020, de 1/5).

Sumário (art. 663º, nº 7, do CPC).