O segmento do despacho saneador que absolva o autor da instância reconvencional pode ser objecto de recurso de apelação autónomo, dentro dos prazos gerais do art. 638.º, n.º 1, do Código de Processo Civil.
I. — RELATÓRIO
1. AA instaurou procedimento especial de despejo, seguindo os termos dos artigos 15.° ss. do Novo Regime do Arrendamento Urbano (NRAU), aprovado pela Lei n.° 6/2006, de 27 de Fevereiro, contra Courtesy Melody, Lda., alegando o não pagamento das rendas pela inquilina, desde Março 2016 até Novembro 2017 e a consequente a resolução contratual.
2. A Requerida Courtesy Melody, Lda, opôs-se ao despejo, defendendo-se por impugnação e por excepção.
3. Invocou, em particular, que o não pagamento das rendas era lícito; que o Requerente AA era parte ilegítima, desde que desacompanhado de sua mulher, como co-senhorio; e que existia uma relação de prejudicialidade entre a acção pendente no processo n° 12726/18.8…. era causa prejudicial e o presente procedimento especial de despejo.
4. Subsidiariamente, deduziu reconvenção, pedindo a condenação do Requerente no pagamento do valor remanescente do seu crédito.
5. O Requerente AA respondeu às excepções invocadas pela Requerida Courtesy Melody, Lda., e opôs-se à reconvenção.
6. Em despacho saneador, decidiu-se que a reconvenção não era admissível, que o Requerente AA era parte legítima e que não existia uma relação de prejudicialidade entre a acção pendente no processo n° 12726/18.8… e o presente procedimento especial de despejo.
7. O Tribunal de 1.ª instância julgou improcedente a oposição.
8. O dispositivo da sentença proferida pelo Tribunal de 1.º instância foi do seguinte teor:
Pelo exposto,
a) julgo improcedente a oposição, e declaro validamente resolvido pela notificação judicial avulsa de … .06.2017 (por requerimento de … .05.17- doc.2 req. Inicial, fls 24 vº/36), o contrato de arrendamento para comércio celebrado em … .05.2015 pelo Requerente AA e por BB, como senhorios, e Courtesy Melody, Lda como arrendatária —com o teor do doc. 1 junto ao requerimento inicial, fls 4/6 —da fracção autónoma designada pela letra “O”, correspondente ao Rés do Chão Loja 2 destinada a comércio, do prédio sito na Travessa …, nº... a ..., e Rua …, nº... a ..., …, espaço que condeno a Requerida a entregar de imediato ao Requerente, livre e devoluto de pessoas e coisas.
b) Julgo que a Requerida não litigou de má-fé.
c) Custas da acção pela Requerida, e custas do incidente de litigância de má-fé pelo Requerente, fixando-se a taxa de justiça deste em 1 U. C..
9. Inconformada, a Requerida Courtesy Melody, Lda., interpôs recurso de apelação.
10. Finalizou a sua alegação com as seguintes conclusões:
A) O presente recurso vem interposto da douta Sentença que julgou improcedente a oposição e julgou validamente resolvido o contrato de arrendamento dos autos e, nos termos do disposto no artigo 644.° n.° 3 do CPC, da decisão intercalar de 03-08-2018 que não admitiu o pedido reconvencional e da decisão intercalar que 18-10-2019 que indeferiu a reclamação ao relatório pericial;
B) Considerou o Tribunal a quo que por meras razões de forma, não foi admitido o pedido reconvencional onde a Ré pretendia efectuar a compensação do crédito pelas despesas com a realização da obra com a obrigação de pagamento da renda, nos termos do artigo 1074.° n.° 3 do CC ou o direito ao reembolso do art. 1036 do CC das despesas efectuadas e compensação com a obrigação de pagamento da renda nos termos do disposto no artigo 847 do CC;
C) Ora, tal posição defendida pelo Tribunal a quo, não é de aceitar, nomeadamente por existir um articulado de resposta à oposição/reconvenção;
D) A decisão que não admitiu o pedido reconvencional viola, por manifesto erro de interpretação, o n.° 7 do artigo 15.° da Lei n.° 31/2012 e a alínea c) do n.° 2 do artigo 266.° do C.P.C, devendo ser revogada com as legais consequências;
E) No seu douto despacho de …-10-2019 o Tribunal a quo indeferiu a reclamação ao relatório pericial porque “mostram-se fundamentadas, sendo que as questões ora equacionadas pela Requerida, vão para lá do visado pela perícia ordenada, enquanto esta tem limites no objecto das declarações constantes da cláusula 2a do escrito contrato doe. 1 r. i. e aquelas pressupõem a instalação de um especifico estabelecimento comercial, (de restauração), e desta forma haverá que que indeferir a reclamação em análise”;
F) A Ré considerou que o relatório pericial tinha algumas deficiências procurando que o perito que a elaborou a corrigisse ou completasse;
G) Ao contrário do que decidiu o Tribunal a quo questões equacionadas pela Requerida não iam para lá do visado pela perícia ordenada e eram de simples resposta pelo perito;
H) A decisão que não admitiu a reclamação ao relatório pericial viola, por manifesto erro de interpretação, o disposto nos números 2 e 3 do artigo 485.° do CPC, devendo ser revogada com as legais consequências;
I) Entende o ora recorrente, com o devido respeito pelo Tribunal a quo, que a matéria de facto não foi correctamente decidida;
J) No contrato de arrendamento em causa há apenas a referência a "alvará de licença de utilização n.° 4…3/UT/2012". Acontece que, estranhamente, o alvará de licença de utilização n.° 4…3/UT/2012 nunca foi junto aos autos pelo Autor;
K) As testemunhas CC e DD foram claras no seu depoimento ao afirmarem, conforme consta infra, que o locado não tinha quaisquer condições para uma actividade comercial, independentemente do ramo;
L) O que vem confirmar o disposto no número um da cláusula terceira do contrato de arrendamento onde se afirma "que os primeiros contraentes realizarão todos os actos que se mostrem necessários, atenta a sua qualidade de proprietários, para a obtenção da autorização camarária para a instalação no locado de um estabelecimento comercial”;
M) Conforme é confirmado pela prova testemunhal e documental junta aos autos, a Ré teve de realizar, por duas vezes, obras globais no locado para que o mesmo pudesse funcionar como um estabelecimento comercial;
N) Embora interpelado para o efeito, o Autor nunca quis resolver os problemas existentes no locado ou restituir à Ré os valores pagos por esta nas obras e reparações;
O) O valor de € 12.000,00 foi estipulado pelas partes antes de se ter acesso ao locado e no pressuposto que o mesmo tinha todas as infra-estruturas necessárias;
P) Quando o contrato foi celebrado as partes ainda não tinham tido acesso ao locado;
Q) Deve ser considerado provado: "Em … .03.15 o imóvel não tinha condições materiais para a sua utilização como espaço comercial" e que "em … .03.15 o imóvel não estava licenciado para a sua utilização como espaço comercial;
R) No considerando "E" do contrato promessa de compra e venda do imóvel, celebrado em … de Janeiro de 2015, junto aos autos pelo Autor como Doe. n.° 5 no seu requerimento de … de Julho de 2018, é expressamente referido que "o segundo contraente tem perfeito conhecimento que, na presente data, (i) a loja não se encontra devoluta, estando a ser ocupada pela sociedade …, Lda., ao abrigo de um contrato de arrendamento que se encontra em processo de resolução por falta de pagamento de rendas devidas; (ii) a …, Lda encontra-se em processo de insolvência, o qual está a ser acompanhado pela Primeira Contraente”;
S) As testemunhas CC e DD foram claras no seu depoimento ao confirmarem que a loja estava fechada e que as chaves da mesma estavam na posse do administrador de insolvência, não tendo sido possível aceder ao locado antes da celebração do contrato de arrendamento;
T) O próprio Autor afirmou em sede de declarações de parte (que não teve acesso ao imóvel;
U) Deve ser alterada a resposta aos factos em causa, e em consequência deve ser dado como provado que: i) "em … .03.2015 CC gerente de L..., Lda., não conhecia o estado de conservação do imóvel nessa data"; ii) "em … .05.2015 Courtesy Melody, Lda., não conhecia o estado de conservação do imóvel nessa data”;
V) Como resulta das mensagens de correio electrónico que foram juntas como Doc. n.° 8 e 9 pelo próprio Autor através do seu requerimento de … de Julho de 2018, antes da celebração do contrato de arrendamento, a Ré remeteu ao Autor o projecto do estabelecimento comercial que pretendiam instalar no futuro locado, referindo expressamente os desenhos "da cozinha/copa" e que o mesmo se chamava "… & …”;
W) A testemunha DD, que contactava directamente com o Autor, afirmou no seu testemunho que foi logo acordado com este que o locado seria para restauração;
X) As partes acordaram que o estabelecimento a instalar no locado era de restauração, e que o valor de € 12.000,00 entregue pelos senhorios à arrendatária, era um adiantamento dos primeiros à segunda, para custeio das obras necessárias à instalação daquele;
Y) As obras acordadas com os doze mil euros não eram referentes à "reconstrução" do imóvel como se veio a verificar necessário, mas apenas para custeio das obras necessárias à instalação daquele.
Z) Deve ser alterada a resposta ao facto em causa, e em consequência deve ser dado como provado que "em … .05.2015 as partes acordaram que o estabelecimento a instalar no locado era de restauração, e que o valor de € 12.000,00 entregue pelos senhorios à arrendatária, era um adiantamento dos primeiros à segunda, para custeio das obras necessárias à instalação daquele”;
AA) Resulta do testemunho de CC que o Autor terá aceite alterar o acordado no sentido de os senhorios se obrigarem ao suporte das respectivas despesas, ou em alternativa obrigados a vender o imóvel no final do contrato pelo preço de € 638.000,00 na disponibilidade da arrendatária, mas nunca pretendeu formalizar essa formalidade;
BB) Embora verbalmente tenha aceite alterar o contrato promessa, nunca foi formalizada a alteração porque o Autor arrastou a situação;
CC) Deve ser dado como provado que "em Junho de 2015 senhorios e arrendatária considerando que a instalação de um estabelecimento de restauração no locado carecia de obras em valor muito superior a € 12.000,00, alteraram o acordado no sentido de os senhorios se obrigarem ao suporte das respectivas despesas, ou em alternativa obrigados a vender o imóvel no final do contrato pelo preço de € 638.000,00 na disponibilidade da arrendatária”;
DD) Em consequência a alteração da matéria de facto, resulta que o locado foi arrendado e entregue à Ré num estado de degradação total e que não permitia a sua utilização para nenhuma actividade;
EE) Para além de estar totalmente degradado, o locado estava numa situação ilegal pois não tinha qualquer instalação sanitária e fazia uso do saguão do prédio (parte comum) onde foi instalada uma sanita;
FF) A utilização do locado implicava a realização de avultadas obras de reparação e legalização a cargo dos Proprietários e que estes ilicitamente recusaram;
GG) Os Proprietários não cumpriram enquanto locadores a sua obrigação primária e fundamental de assegurar ao locatário o gozo da coisa locada (art. 1031.°, ai. b), do CC);
HH) Nos termos do artigo 1074.° n.° 1 do CC cabe ao senhorio executar todas as obras de conservação, ordinárias ou extraordinárias, requeridas pelas leis vigentes ou pelo fim do contrato, salvo estipulação em contrário;
II) A posição dos Proprietários de não pretenderam realizar obras, para além de violar os referidos artigos art. 1031.°, ai. b), do CC) e 1074.° n.° 1 do CC violou o mais elementar princípio de justiça, caindo na previsão do abuso do direito constante do art. 334.° do CC;
JJ) As obras em causa eram urgentes, não consentindo qualquer dilação, pelo que em consequência da mora dos Proprietários, a Ré podia fazer as reparações ou despesas com direito a reembolso;
KK) O custo das obras, licenciamentos e projectos ascendeu, a valores muito superiores aos valores das rendas vencidas até à declaração de resolução do contrato de arrendamento;
LL) A Ré pode efectuar a compensação do crédito pelas despesas com a realização da obra com a obrigação de pagamento da renda, nos termos do artigo 1074.° n.° 3 do CC;
MM) A Ré sempre terá direito ao reembolso do art. 1036 do CC das despesas efectuadas, o qual pode ser compensável com a obrigação de pagamento da renda nos termos do disposto no artigo 847 do CC.
NN) A "resolução" que consta da notificação judicial avulsa efetuada pelos senhorios carece de fundamento legal e aos senhorios não assistia o direito de extinguir o contrato de arrendamento ou de exigir a entrega do imóvel, pelo que a mesma é ineficaz e de nenhum efeito.
11. O Requerente AA contra-alegou, pugnando pela improcedência do recurso.
12. Finalizou a sua contra-alegação com as seguintes conclusões:
A. As presentes contra-alegações visam responder às alegações da Recorrente que pretendem a reversão (i) da decisão intercalar de … .08.2018, que não admitiu o pedido re convencional deduzido pela Recorrente; (ii) da decisão intercalar de … .10.2019, que indeferiu a sua reclamação ao relatório pericial e (iii) da sentença proferida pelo Tribunal de Comarca de … - Juízo Local … - Juiz …, a qual veio determinar a desocupação imediata do locado propriedade do Recorrido.
B. A pretensão da Recorrente é, contudo, parca em fundamentação legal e factual, tendo o Tribunal a quo fundamentado correctamente todas as suas decisões.
C. Como questão prévia sempre será de analisar da admissibilidade das alegações de recurso da Recorrente por falta de pagamento da taxa de justiça devida.
D. A verdade é que a Recorrente não atendeu ao valor da causa, fixado em € 388.931,68, por Despacho de … .09.2018, tendo liquidado uma taxa de justiça no valor de € 510,00 e não de € 816,00, nos termos e para os efeitos da Tabela I-B da Portaria n.° 419-A/2009, de 17 de Abril, com as alterações introduzidas pela Portaria n.° 82/2012, de 29 de Março.
E. Acresce ainda que tendo submetido as suas alegações de recurso já em prazo de multa, sempre deveria ter atendido ao disposto no artigo 139.° do C.P.C., o que não logrou fazer.
F. Ou seja, o presente recurso, salvo respeito por opinião diversa, não pode ser admitido, devendo o Tribunal determinar o desentranhamento da alegação, nos termos e para os efeitos da segunda parte, do n.° 2 do artigo 642.° do C.P.C..
G. Caso assim se não entenda, dúvidas não restam da tempestividade da apresentação das contra-alegações do Recorrido,
H. Porquanto foi notificado das alegações oferecidas pela Recorrente no dia … .01.2020, por via telemática, considerando-se assim regularmente notificado a … .01.2020, por via do disposto no artigo 255.° C.P.C., de ora em diante C.P.C..
I. O prazo para contra-alegar é assim de 15 dias, nos termos e para os efeitos dos artigos 638.°, n.° 1 do C.P.C, e 15.°-S, n.os 5 e 8 da Lei 6/2006, de 27 de Fevereiro, prazo esse que termina no dia da submissão das presentes contra-alegações.
No que respeita ao teor das alegações propriamente ditas,
J. Sobre a impugnação da decisão intercalar de … .08.2018, sempre se refira que o Recorrido não sabe a que decisão intercalar se refere a Recorrente, pois nenhuma decisão foi tomada pelo Tribunal em … .08.2018, nomeadamente no que diz respeito ao indeferimento do se pedido reconvencional.
K. Mostra-se por isso, e de fornia inequívoca, prejudicado o direito do Recorrido em contra alegar especificamente este ponto por desconhecer uma qualquer decisão proferida em tal data.
L. Não obstante, conhecendo o Recorrido da decisão intercalar na qual o Tribunal a quo expressamente se pronuncia sobre este tema, a qual data de … .09.2018, sempre se pronunciará, por mera cautela de patrocínio, sobre esta, mas apenas na parte relativa à não admissão do pedido reconvencional.
M. A Recorrente defende nas suas alegações que a não admissão do seu pedido reconvencional se deveu a meras razões de forma, transcrevendo excertos de Acórdãos do Venerando Tribunal da Relação de Lisboa, para suportar a tese de que o Tribunal a quo deveria ter admitido tal pedido reconvencional.
N. Omite a Recorrente que o Tribunal a quo, aquando da análise da admissibilidade do pedido reconvencional da Recorrente, não se limitou a identificar problemas formais, mas também da própria formulação de tal pedido pela Recorrente.
O. Foi a própria Recorrente quem deu entrada de ação declarativa para ver o seu direito de crédito reconhecido - autuada como processo n.° 12726/18.8… - e que reconheceu que "(...) a natureza do presente procedimento não é a adequada à averiguação de todos os factos em causa, nomeadamente, pela sua extensão e necessidade de produção de vários meios de prova (…)",
P. Mais defendendo que a "procedência da ação processo 12726/18.8..., determinará a extinção desta lide”.
Q. Ou seja, a própria Recorrente defendeu que a ação especial de despejo que estava era curso não era a sede própria para conhecer do seu pedido reconvencional, consubstanciando a agora impugnação da decisão intercalar que não o admitiu um verdadeiro abuso de direito, na sua vertente de venire contra factum propriol
R. Cumpre assinalar que já os Venerandos Juízes do Tribunal ad quem analisaram e se pronunciaram recentemente sobre este mesmo tema, tendo sido proferido o acórdão datado de 26.09.2019, proferido no âmbito do processo com o n.° 427/19.4YLPRT-A.L1-2 (disponível em www.dgsi.pt) que: "[...] as especialidades do PED revelam-se não apenas nos prazos previstos para a prática dos atos pelos vários intervenientes processuais (...) mas também na forma dos atos que é simplificada (...). Todos estes elementos que levam-nos a concluir que estamos perante um processo especial caracterizado pela celeridade e simplificação do processado, sem prejuízo do direito de defesa do arrendatário e do contraditório. (...) Desde já adiantamos que propendemos para o entendimento de que não é admissível a reconvenção no âmbito do PED.
S. Para conclui, sem qualquer margem para dúvidas que: "Afigura-se que admitir a possibilidade do arrendatário deduzir pedido reconvencional neste processo especial será ir contra a intenção do legislador, ao permitir a introdução de fatores de complexidade e morosidade, no âmbito de um processo que se quis simples e expedito.”.
T. Também a doutrina nacional bebe desse entendimento, fazendo-se uso das palavras de Laurinda Gemas (in "Algumas questões controversas no novo regime processual de cessação do contrato de arrendamento", Revista do CEJ n.° 1, 2013, pág. 23 ss.): "... parece que dificilmente será admissível a defesa por reconvenção atento o disposto no art.° 266.° n.° 3 do CPC, já que ao pedido reconvencional corresponderá a forma de processo comum declarativo, manifestamente incompatível com o processo especial de uma acção no âmbito do PED, em particular face à urgência que os actos a praticar pelo juiz aqui assumem (art.° 15.°-S n.° 8) ao oferecimento de provas na audiência (art.° 15.°-I n.° 6) e à inexistência de audiência prévia.”
U. Ou seja, nenhuma dúvida resta de que andou bem o Tribunal a quo ao não admitir o pedido reconvencional, decisão essa que se deve manter inalterada.
V. No que diz respeito à impugnação da decisão intercalar de … .10.2019, nenhuma censura merece a decisão do tribunal a quo, porquanto a reclamação da Recorrente visava, de facto, a ampliação do objeto da perícia, sem qualquer fundamento legal,
W. Tendo disso tomado o tribunal efectiva percepção, deixando claro que "as questões ora equacionadas pela Requerida, vão para lá do visado pela perícia ordenada, enquanto esta tem limites no objecto das declarações constantes da cláusula 2a do escrito contrato doe. 1 r. i. e aquelas pressupõem a instalação de um especifico estabelecimento comercial, (de restauração), e desta forma haverá que que indeferir a reclamação em análise.”.
X. Relembre-se que a perícia foi requerida pela própria Recorrente, e as questões a ser analisadas pelo perito elaboradas por si, tendo estado presente, ou representada, na visita feita pelo perito ao local, tendo fornecido e relatado todos os factos relativos ao historial do locado.
Y. Na verdade, a suposta reclamação deduzida pela Recorrente foi mais uma tentativa de, por qualquer meio, fazer passar melhoramentos meramente voluptuários, por reparações necessárias, como por exemplo a substituição de janelas e portas, a adaptação do espaço para que reunisse as condições legalmente exigíveis para um espaço de restauração e não menos absurdo, a substituição do aparelho de ar condicionado,
Z. Quando a Recorrente bem sabia que o Recorrido já a havia compensado monetariamente para levar a cabo as obras estritamente necessárias à adaptação do espaço, para que este reunisse as condições mínimas necessárias a que fosse ali instalado um estabelecimento comercial “genérico".
AA. Contudo, o Tribunal a quo para indeferir da pressuposta reclamação, tomou em linha de conta um outro argumento, que a Recorrente não transcreve nas suas alegações.
BB. Referimo-nos à circunstância de que "Quanto à factualidade não provada, sobre a não indisponibilidade do arrendado para ser afecto a actividade comercial em Maio de 2015, tomámos em conta a referência ao Alvará de Utilização de 2012 (dois mil e doze) assumidos pelas partes no contrato,…".
CC. Em suma, as pretensões da Recorrente em ver revogada a decisão intercalar … .10.2019 carecem de fundamento, porquanto não logrou demonstrar - nem em sede própria, nem nas alegações de recurso a que ora se responde - que o relatório pericial tinha deficiências,
DD. Ou que tenha sido violado, por manifesto erro de interpretação, o disposto nos n.os 2 e 3 do artigo 485.° do C.P.C..
EE. É assim, e uma vez mais, de estranhar o comportamento da Recorrente, que apenas pode redundar na manutenção integral da decisão intercalar de … .10.2019.
FF. Já no que tange à sentença final proferida, a Recorrente alicerçou as suas alegações da matéria de facto dada como não provada pelo Tribunal a quo, defendendo que "o Tribunal a quo decidiu desconsiderar por completo os testemunhos de CC e DD e, pelo contrário, dar valor às declarações do Autor", o que não corresponde à verdade.
GG. O Tribunal, como se lhe impõe, valorou todos os depoimentos na mesma medida, tendo, na busca da verdade material, lançado mão dos poderes jurisdicionais de que dispõe e valorando globalmente todas as provas oferecidas pelas Partes, concluindo que "os referidos CC e DDdeclararam sobre a situação no interior do imóvel em Março e Maio de 2015, não os temos por credíveis, enquanto os mails de Fevereiro e princípio de Março de 2015, as tarefas ali referidas são economicamente incompatíveis com o desconhecimento referido (CC referiu prestação de serviços com despesas de milhares de euros), e porque nos documentos contratuais dessas datas nunca tal limitação foi referida.”.
HH. Ou seja, neste ponto em específico, e atendendo aos factos que a própria Recorrente alegou, e o não arrolamento do dito Administrador de Insolvência como testemunha, não se ofereceu ao Tribunal a quo, e bem, outra conclusão que não a de não ser crível o total desconhecimento de algo, e o investimento de largas centenas de euros
II. Na verdade, a descredibilização do testemunho dos senhores CC e DD, resultou das suas próprias declarações, que não raras vezes se contradisseram a si próprios, tendo inclusivamente respondido de forma contrária ao teor de documentos oficiais constantes no próprio processo, com certidões permanentes e documentos por si enviados.
JJ. A título de exemplo veja-se a negação de CC em saber quem é a senhora EE, quando esta era, de acordo com a certidão comercial da sociedade Â…, sua sócia, tendo exercido simultaneamente o cargo da gerência da mesma.
KK. Esclarecido que vai este ponto, cumpre assinalar que bem andou o Tribunal a quo ao determinar como não provado i) Em 15.03.15 o imóvel não estava licenciado para a sua utilização como espaço comercial.
LL. Foi pela Recorrente defendido que o espaço adquirido pelo Recorrido nunca poderia abrir e ser um qualquer espaço comercial, porquanto não estava licenciado, não tendo logrado demonstrar que assim era de facto.
MM. A este propósito, o senhor CC referiu ao minuto 52.04, da gravação de 16.12.2019 que:
Adv. Recorrido: ... o local onde se encontra instalado o restaurante, não tinha licença de utilização, e, portanto, vocês tiveram que fazer o projecto.
CC: Sim, o projecto de licenciamento.
Adv. Recorrido: Projecto de licenciamento do quê?
CC: Do estabelecimento comercial.
Adv. Recorrido: De qualquer estabelecimento comercial?
CC: No caso seria um restaurante…
NN. Ao minuto 01.03.36, da gravação de … .12.2019, referiu ainda que:
Juiz: ... mas o senhor afinal o que é que o senhor nos vem dizer? Que aquilo não estava licenciado para restaurante?
CC: Não, não disse isso. [...] Portanto, pode ser passada, pode haver uma licença de utilização, a licença pode estar válida, pode estar válida... […]
Juiz: ... a licença foi emitida em 2012, não foi emitida em 1955, que era a hipótese que eu estava a dizer, ... a licença que foi emitida em 2012, pressupôs uma vistoria ao local ... mas naturalmente que é diferente uma licença de utilização do exemplo que eu dei, dum imóvel de habitação, na Avenida de Roma, de 1955, que nunca ninguém foi lá, nunca ninguém pediu à Câmara projecto nenhum... esta licença de 2012, se nós a víssemos, eu também estou a estranhar que uma licença de 2012 não tivesse detectado os sagões. De facto, é muito estranho, ... para mais, quando aqui já foi referido que aquilo estaria fechado, pelo menos foi as informações que lhe passaram a si, e que o senhor ou a testemunha anterior ... que aquilo já estaria fechado há 15 anos. Ora, fechado há 15 anos com uma licença de 2012, deixa-nos na dúvida.
OO. Pelo que bem andou o Tribunal a quo, devendo manter-se como facto não provado o ponto i).
PP. Sobre os pontos ii) e iii) da matéria de facto dada como não provada, referentes ao (des)conhecimento do estado de conservação imóvel dado em arrendamento, pelo senhor CC gerente de L..., Lda. e pela Courtesy Melody, Lda. cumpre dizer que nenhum indício foi dado ao tribunal para decidir diferentemente.
QQ. Quer o senhor CC quer o senhor DD, admitiram ter interesse no prédio onde se localiza o imóvel do Recorrido desde muito tempo antes do contrato de arrendamento ter sido celebrado,
RR. Sabendo que o mesmo tinha sido TODO remodelado, tendo isso sido referido pelo senhor DD, ao minuto 09.15, da gravação de … .12.2019, quando referiu "O prédio estava totalmente remodelado ... nós conhecíamos a loja pela localização e pelo desenho da planta…"
SS. Quando questionado o senhor CC sobre a obtenção da chave do imóvel na semana seguinte ao envio do email em … .02.2015, (documento 12 junto pelo Recorrido com o requerimento oferecido em 12.07.2018) respondeu este que não.
TT. Contudo, quando confrontado com a pergunta feita pela mandatária do Recorrido sobre se tinham ou não informado da não recepção da chave, gerou em tornou de uma simples pergunta uma enorme confusão,
UU. Afirmando, inclusivamente que a entrega das chaves havia sido feita pelo Tribunal e estaria devidamente documentada, algo que é totalmente desconhecida pelo Recorrido, ou do Tribunal a quo, na medida em que nenhum meio de prova foi produzido nesse sentido.
VV. As declarações constantes a partir do minuto 01.33.24, da gravação de … .12.2019 e acima transcritas (vide ponto 101.) são clarificadoras de toda esta situação,
WW. Motivo pelo qual bem andou o Tribunal a quo a dar como não provados os pontos identificados ii) e iii), que assim se devem manter, não assistindo razão à Recorrente.
XX. Finalmente, e na medida em que os pontos iv) e v) da matéria de facto dada como não provada se encontram intrinsecamente relacionados, sempre se refira que, também nestes pontos, foram óbvias as contradições entre os documentos existentes e as declarações das testemunhas da Recorrente.
YY. À Recorrente cabia demonstrar que a realidade vertida no contrato de arrendamento foi de facto objecto de alteração e acordo entre as Partes,
ZZ. Não só no que que respeita à afectação do espaço à actividade da restauração, mas também sobre a efectiva assunção dos custos inerentes a tal afectação e posterior formalização desse "novo" acordo.
AAA. Foi nesse aspecto peremptório o senhor DD, que ao minuto 44.05, da gravação de … .12.2019, afirmou:
DD: ... isso já é a nossa responsabilidade de querer um restaurante.
Juiz: ... Já aqui se propõe, a promessa unilateral de aquisição da fração. [...] em … de maio de 2015
DD: Só que a nós só nos faria sentido…
Juiz: [...] Há um outro acordo onde isto muda?
DD: Há um acordo posterior a esse... só que não está escrito.
BBB. Tendo por sua vez o senhor CC referido a partir do minuto 01.26.06, da gravação de … .12.2019 que:
Adv. Recorrido: .... E a minha pergunta é: onde é que está a comunicação ao senhor AA em Agosto, Setembro, Outubro de 2015 a dizer: AA, nós gastámos 120 mil euros até agora lá. A minha pergunta foi esta.
CC: Oiça, eu não sei se foi comunicado por escrito, se foi comunicado por we chat, mas também devido ao acordo que ele tinha dito, o compromisso que tinha dito que fazia connosco de nos vender a loja por nossa opção, era pouco relevante para mim.
Juiz: Tá bem, podia ser para si, mas estamos a falar de evidências... estamos antes das segundas obras, aquelas que são provocadas não por indeferimento, não pela necessidade de licenciamento... quando os senhores vão para as segundas obras, fiquei eu com a ideia, que os senhores já estão convencidos que o senhor AA não vai cumprir.
CC: Sim, já. Claramente.
Juiz: ... é que repare, dizer que o senhor AA depois não cumpre, não cumpre o quê?
Em primeiro lugar a formalização do acordo, porque se ele cumprisse a formalização do acordo depois isto tudo se ia compondo. Ele não cumpre, mas o senhor para o convencer a cumprir, não evidencia que já gastei 120 mil, ... isto é, eu estou num litígio com ele, vou ter necessidade, para aproveitar os 120 mil que lã gastei, ... então não era argumento para o convencer …
Já sobre o valor entregue pelo Recorrido para fazer face às reparações necessários no Imóvel para abertura ao público, são ainda mais esclarecedoras as declarações do senhor DD, que ao minuto 20.27, da gravação de … .12.2019 mencionou:
Adv. Recorrente: [...] Aquilo que tinha ficado acordado com o proprietário era que esses 12 mil euros eram para reparar uma situação como essa, ou seja, um local como referiu, destruído, e que era necessário refazer, ou era um montante que era, pelo contrário, para reparar talvez pequenas coisas ... Ou seja, já estava prevista uma situação dessas ou por oposição os 12 mil euros era para uma situação não…
DD: Não, nada previa aquilo que se encontrou dentro da loja. Os 12 mil euros era para montar pladur e comprar mesas e cadeiras e fazer uma minicozinha.
CCC. Ou seja, até o valor inicial entregue pelo Recorrido iria ser canalizado para outras despesas que não as acordadas, na medida em que iria servir para comprar mesas e cadeiras e fazer uma mini-cozinha.
Ainda sobre este tema, o perito não teve dúvidas em reflectir no seu relatório que 3.3 - Dada a proximidade de valores e não deixando de admitir surpresas ou "derrapagens" em alguma tarefa, tem-se presente que é "fácil" acertar momentos, quantidades e ajustar soluções e meios, pelo que parece aceitável considerar que o valor de 12 (doze) mil euros referido no contrato, em 2015, seja suficiente para a realização razoável de obras gerais de preparação mínima, genérica para actividade comercial não especificadamente dedicada e exigente e, sem dúvida, não incluindo mobiliário, decorações e equipamentos ou reforço de instalações ou serviços." [sublinhado e negrito nossos].
DDD. Pelo que ao Tribunal a quo restou a palavra das testemunhas da Recorrente contra a do Recorrido, sendo certo, e como resulta acima demonstrado, as contradições nas declarações das testemunhas da Recorrente são imensas,
EEE. Sendo de manter na íntegra e como matéria de facto não provada a constante dos pontos iv) e v).
13. O Tribunal da Relação de Lisboa julgou improcedente a apelação, confirmando o acórdão recorrido.
14. Inconformada, a Requerida Courtesy Melody, Lda, interpôs recurso de revista.
15. Finalizou a sua alegação com as seguintes conclusões:
A) Consideram os recorrentes que existe fundamento para, nos presentes autos, ser admitida a revista excecional para o Supremo Tribunal de Justiça ao abrigo do disposto na alínea c) do artigo 721.º-A do código de Processo Civil;
B) O acórdão recorrido defende que a “cabia recurso de apelação autónoma contra decisão que não admitiu liminarmente o pedido reconvencional, nos termos do artigo 644.º n.º 1, alínea b) do Código de Processo Civil, não se aplicando o regime consignado no artigo 644.º, n.º 3, do Código de Processo Civil”;
C) Tal jurisprudência é contrária à estabelecida em dois acórdãos de Tribunais da Relação, já transitados em julgado, no domínio da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de direito.
D) O Tribunal da Relação de Lisboa, processo n.º 224298/08.4YIPRT-B.L1-8, 16-10-2009, em www.dgsi.pt, decidiu, numa situação semelhante, que a Reforma de 2007 optou pela regra inversa. Toda e qualquer decisão da 1ª instância é impugnável por meio de recurso de apelação, mas só são susceptíveis de recurso autónomo imediato as decisões que ponham termo ao processo ou as demais expressamente indicadas na lei: todas as outras decisões só são impugnáveis no recurso da decisão que tenha posto termo ao processo;
E) O Tribunal da Relação de Guimarães, processo n.º 3476/11.7TBBRG.G1, 27-02-2012, em www.dgsi.pt, decidiu, também numa situação semelhante, decidiu que a não admissão da reconvenção não é uma decisão que produza um resultado irreversível quanto ao recurso e, como tal, só pode ser impugnada no recurso que venha a ser interposto da decisão final.
F) Existe, assim, uma clara contradição entre estes dois acórdãos e o acórdão recorrido, porquanto aqueles defendem que da decisão de não admissão da reconvenção não cabe apelação autónoma e, por isso, tal decisão não transitou ainda em julgado.
G) A recorrente considera que a decisão que não admitiu liminarmente o pedido reconvencional não deve ser objeto de decisão autónoma e deve apenas ser impugnada com o recurso da decisão final;
H) Deve ser aplicado o regime consignado no artigo 644.º, n.º 3, do Código de Processo Civil, não sendo aplicado o disposto no artigo 644.º n.º 1, alínea b) do Código de Processo Civil;
I) Sendo admitido o recurso da decisão que não admitiu liminarmente o pedido reconvencional, considera a recorrente que deve a mesma ser revogada.
J) Considerou o Tribunal da 1ª instância que por meras razões de forma, não foi admitido o pedido reconvencional onde a Ré pretendia efetuar a compensação do crédito pelas despesas com a realização da obra com a obrigação de pagamento da renda, nos termos do artigo 1074.º n.º 3 do CC ou o direito ao reembolso do art. 1036 do CC das despesas efetuadas e compensação com a obrigação de pagamento da renda nos termos do disposto no artigo 847 do CC;
K) Tal posição defendida pelo Tribunal da 1ª instância, não é de aceitar, nomeadamente por existir um articulado de resposta à oposição/reconvenção;
L) A decisão do Tribunal da 1ª instância constitui, por erro de interpretação, uma violação da tutela jurisdicional efetiva.
M) A decisão que não admitiu o pedido reconvencional viola, por manifesto erro de interpretação, o n.º 7 do artigo 15.º da Lei n.º 31/2012 e a alínea c) do n.º 2 do artigo 266.º do C.P.C, devendo ser revogada com as legais consequências;
Nestes termos, e nos melhores de Direito que V. Exa suprirão, deve o presente recurso ser julgado procedente, com as legais consequências, assim se fazendo a acostumada JUSTIÇA.
17. Em … de Junho de 2020, Exmo. Senhor Juiz Desembargador relator proferiu despacho com o seguinte teor:
O procedimento especial de despejo é um processo de natureza urgente, pelo que o prazo de interposição de recurso é de quinze dias, nos termos conjugados dos arts. 15º-S, n.ºs 5 e 8, da Lei n.º 6/2006 de 27.02, e 638.º, n.º 1, 2.ª parte, do C.P.C.
A recorrente foi notificada do acórdão proferido nesta Relação, datado de 2 de junho de 2020, e ora sob recurso, no âmbito de um procedimento especial de despejo, através de transmissão eletrónica de dados, no dia 3 de junho de 2020, pelo que, nos termos do art. 248.º do C.P.C., do mesmo se consideram notificados no dia.
Assim, o prazo de 15 dias de que dispunha para recorrer daquele acórdão para o S.T.J., terminou no dia 23 de junho de 2020.
Sucede que o recurso, identificado como de revista excecional, interposto daquele acórdão, apenas foi apresentado no dia 14 de julho de 2020, sendo, por isso, extemporâneo.
Por conseguinte, nos termos do art. 641.º, n.º 2, al. a), do C.P.C., indefiro o requerimento de interposição do recurso de revista excecional.
18. Inconformada com o despacho, a Recorrente apresentou reclamação, ao abrigo do art. 643.º do Código de Processo Civil.
19. Finalizou a sua reclamação com as seguintes conclusões.
A) No âmbito do presente processo, previamente à decisão reclamada, já foi decidido duas vezes que não estamos perante um processo urgente e que o prazo para apresentação do recurso é de 30 dias;
B) Por despacho de … de fevereiro de 2020 do Tribunal da primeira instância e por despacho de … de março de 2020 do Tribunal da Relação de Lisboa foi decidido que o prazo para apresentação de recurso no presente processo é de 30 (trinta) dias;
C) Tal entendimento é igualmente sufragado pelo Autor/recorrido que nas suas contra- alegações de recurso de apelação defendeu que o prazo paraa interposição do recurso é de 30 dias;
D) As referidas decisões constituem, nos termos do disposto no artigo 620.º n.º 1 do CPC, caso julgado formal;
E) Não poderia agora o tribunal, no mesmo processo e perante idêntico quadro factual e jurídico, decidir em sentido contrário às referidas decisões;
G) Esmos perante a violação do disposto do artigo 620.º n.º 1 do CPC.
H) A decisão reclamada viola, por erro de interpretação, o princípio de acesso ao direito e tutela jurisdicional efectiva - artigo 20º da CRP.
I) A decisão reclamada também violou o disposto no 638º.1 1ª parte C.P. Civil ex-vi artigo 15º-Q do NRAU, porquanto o prazo de recurso a considerar é de 30 dias e não de 15 dias.
Nestes termos, e nos melhores de Direito que V. Exa suprirão, deve a presente reclamação ser julgada procedente, com as legais consequências, assim se fazendo a acostumada JUSTIÇA.
18. Em … de Outubro de 2020, foi proferido despacho em que se deferiu a reclamação, admitindo o recurso interposto pela Requerida Courtesy Melody, Lda.
19. Como objecto do recurso é delimitado pelas conclusões dos Recorrentes (cf. arts. 635.º, n.º 4, e 639.º, n.º 1, do Código de Processo Civil), sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso (cf. art. 608.º, n.º 2, por remissão do art. 663.º, n.º 2, do Código de Processo Civil), as questões a apreciar são as seguintes:
I. — se o segmento do despacho saneador em que não se admitiu a reconvenção deduzida pela Requerida Courtesy Melody, Lda., transitou em julgado; — II. — em caso de resposta negativa, se a reconvenção deduzida pela Requerida Courtesy Melody, Lda., deve ser admitida.
II. — FUNDAMENTAÇÃO
OS FACTOS
20. O acórdão recorrido deu como provados os factos seguintes:
A) O Requerente AA e sua mulher BB, são de nacionalidade chinesa e residentes em …, China.
B) Em 2014, no âmbito de campanha de promoção de empresa chinesa, com a colaboração de senhora também de nacionalidade chinesa de nome EE (residente na Alemanha), AA e BB foram interessados na aquisição de imóveis em Portugal, aproveitando o regime de "vistos golden", de concessão de vistos de residência.
C) Em Setembro de 2014, AA e BB deslocaram-se para o efeito a Portugal, e foram recebidos pela dita EE, que os motivou na aquisição da fracção autónoma designada pela letra "O", correspondente ao Rés-do-Chão Loja 2 destinada a comércio, do prédio sito na Travessa …, n° ... a ..., e Rua …, n°... a ..., …, que estava devoluto.
D) Então AA e BB deslocaram-se ao imóvel, sendo recebidos pela Sra. EE que estava acompanhada por CC e por DD, estes pai e filho, os quais dois se diziam donos do imóvel, embora dizendo estar ele em nome de terceiro, um Fundo Imobiliário.
E) Então, não foi disponibilizado a AA e a BB o acesso ao interior do imóvel, com fundamento em estar em obras.
F) Ao longo do período de Setembro 2014 a Março 2015, CC deslocava-se com frequência a …, quando aproveitava para continuar junto de AA e BB a promoção e negociação da venda do imóvel do R/Chão da Travessa … e Rua …, ..., encarando-se operação que envolvesse também, posteriormente àquela, o arrendamento para comércio a empresa em que CC e DD tinham interesses, assegurado um rendimento remunerador do capital valor de aquisição.
G) E, designadamente, em 9 de Fevereiro de 2015, 13 de Fevereiro de 2015 e em 18 de Fevereiro de 2015 CC remeteu a AA com conhecimento a DD, os mails com o teor dos does. 7, 8 e 12 resposta, fls 116 e 123 v°, em que lhe expunha o seu objectivo de "(...) concluir o projecto e a lista de equipamentos e materiais que serão orçamentados até ao dia 15 do próximo mês (...), na expectativa de terem as chaves do imóvel na última semana de Fevereiro de 2015.
H) E, em 26 de Fevereiro de 2015 com o teor do doe. 9 resposta, fls. 118, CC remeteu a AA com conhecimento a DD, novo mail em que expunha o planeamento da intervenção no imóvel Rés do Chão Loja 2 destinado a comércio, do prédio sito na Travessa …, n°... a ...., e Rua …, n°... a ..., …, prevendo o fecho do design até 8 de Março, o final da engenharia até 15 de Março, até ao final de Março o fecho do orçamento e negociação da construção, em Abril a produção de equipamentos, móveis, decoração e preparação para a construção, "na primeira semana de Maio a escritura e as chaves entregam-lhe a si e a nós", em Maio e primeira semana de Junho as obras de construção e treinamento de pessoal, e em 8 de Junho a abertura (do estabelecimento), data importante porque é a época alta de … .
I) Em 2 de Março de 2015 e 3 de Março de 2015 CC e AA trocaram mails com o conteúdo dos does 14 e 15 resposta, fls. 128/132, em que nenhuma referência é feita à não disponibilização de chave do imóvel, informada na alínea G).
J) No período de Outubro 2014 a Outubro 2015, a sociedade L... - Consultores em Turismo, Lda, tinha o capital de € 1.000,00, das respectivas quotas eram titulares CC (€ 50,00) e DD(€ 950,00), sendo o primeiro o respectivo gerente (certidão doe. 10 resposta, fls 120v° / 121 v°)
K) No período de Abril 2015 a Julho 2015, a sociedade Courtesy Melody, Lda., tinha o capital de € 1.000,00, das respectivas quotas eram titulares CC (€ 650,00) e outros (€ 350,00), não sendo o CC o gerente (certidão doe. 11 resposta, fls 122)
L) E, em 15 de Março de 2015 L..., Lda, representada pelo seu gerente CC, e AA e BB representados por procuradora advogada, acordaram com o teor do doe. 6 resposta, fls 109/111, o contrato promessa de arrendamento do imóvel sito na Travessa …, n°... a ..., e Rua …, n°... a ..., …, em que a L..., Lda., ou quem esta indicasse, assumia a qualidade de arrendatária, sendo o arrendamento pelo período de 10 anos, pela renda da ordem de € 2500,00 por mês, calculada como rendimento bruto anual de 5,5 % do preço de futura aquisição de € 580.000,00, e tinha por fim a instalação no locado e posterior exploração de um estabelecimento comercial.
M) Mais acordando, que a promessa de arrendamento tinha como pressuposto, que os promitentes senhorios (AA e BB) viessem a adquirir a propriedade do imóvel, e sendo que aquela passaria a contrato de arrendamento a partir da data da escritura pública daquela aquisição, situação em que no fim do prazo contratual a Requerida se obrigava a adquirir o imóvel pelo preço de € 638.000,00, caso os promitentes senhorios não o conseguissem vender a terceiros.
N) E, acordando-se ainda a promessa de arrendamento do imóvel, com previsão de realização de obras pela Requerida, para cujo custo a Requerente compensaria com o montante de € 12.000,00.
O) Em 27 de Abril de 2015 a fracção autónoma designada pela letra "O", correspondente ao Rés-do-Chão Loja 2 destinada a comércio, do prédio sito na Travessa …, n° ... a ..., e Rua …, n°... a ..., …, era pertença da sociedade F… -Sociedade Imobiliária, Lda., e nessa data esta como vendedora e AA e BB (como compradores) acordaram — com o teor do doc. 13 resposta, fls 125/127 — a compra e venda do imóvel pelo preço de € 580.000,00, que aqueles pagaram.
P) Em cuja formalização de escritura notarial, os outorgantes apresentaram para arquivo, fotocópia do alvará de licença de utilização n°4…3/UT/2012 (total) emitido por Câmara Municipal de … em … de Abril de 2012, e declaração emitida em … de Outubro de 2014 pelo perito qualificado FF, PQ0…36, de que a fracção "O" se encontrava isenta da emissão de certificado energético, por se tratar de um espaço comercial com funcionamento de porta aberta.
Q) Em 1 de Maio de 2015 AA e BB representados por procuradora advogada, como senhorios, e Courtesy Melody, Lda., como arrendatária, acordaram —- com o teor do doei junto ao requerimento inicial, fls 4/6 — o arrendamento da fracção autónoma designada pela letra "O", correspondente ao Rés-do-Chão Loja 2 destinada a comércio, do prédio sito na Travessa …, n° ... a ..., e Rua …, n°... a ..., …, tendo por fim a instalação no locado e posterior exploração de um estabelecimento comercial, com expressa referência ao alvará de licença de utilização e ã declaração de dispensa de certificado energético referidos em P).
R) O arrendamento iniciou-se em 1 de Maio de 2019 por um prazo de 10 anos, podendo ser denunciado pelo senhorio decorridos 6 anos de vigência, sendo a renda mensal no valor de € 2.658,00 actualizada anualmente segundo a taxa de inflação portuguesa, e com vencimento até ao dia oito do mês anterior àquele a que respeita.
S) Mais se acordando, que aquando do final do contrato, a arrendatária se obriga a devolver o locado aos senhorios, em perfeitas condições de funcionamento, conservação, segurança e limpeza, precedida de vistoria pelos senhorios ou representante.
T) Dizendo as partes em considerandos:
ti) que Courtesy Melody se obrigava a comprar o imóvel caso não seja vendido a terceiros no prazo de 6 anos, pelo preço de € 638.000,00, ficando a decisão de venda na disponibilidade dos senhorios.
t2) que os senhorios pagaram à arrendatária, "(...) a título de compensação pelas obras a efectuar na fracção o valor de € 12.000,00 (doze mil euros) (…)";
t3) que, decorrido o prazo de 6 anos de vigência do contrato de arrendamento, no caso de o imóvel ser vendido a terceiros e o contrato de arrendamento se mantiver em vigor por mais 4 anos, a arrendatária obriga-se a devolver aos senhorios, no prazo de 7 dias, o valor de € 12.000,00 entregue por aqueles, nada mais tendo a receber no final do contrato, pelas obras realizadas no locado, as quais ficarão a pertencer ao imóvel, não podendo alegar retenção e renunciando ao direito a qualquer indemnização.
U) A Courtesy Melody, Lda., recebeu o imóvel e logo iniciou a realização de obras para instalação de um restaurante.
V) A Requerida pagou as rendas vencidas de Maio de 2015 a Dezembro de 2015.
W) Em princípios de 2016, Courtesy Melody, Lda., dirigiu a AA e BB, comunicação de que tinha tido problemas relativamente a um esgoto, que determinou o não licenciamento da sua actividade, vindo posteriormente a ser realizadas pela Requerida obras, que permitiram a utilização do locado como restaurante.
X) A Requerida pagou as rendas vencidas de Janeiro a Março de 2016, e desde então deixou de o fazer.
Y) Em … de Junho de 2017 (por requerimento de … de Maio de 2017) os senhorios notificaram judicialmente a Requerida (doe.2 req. Inicial, fls 24 v°/36), de que face ao não pagamento das rendas vencidas nos meses de Março 2016 a Abril 2017, valor de € 2416,00 X 14 = € 33.824,00, consideravam resolvido o contrato de arrendamento ajuizado.
Z) Em … de Junho de 2018, com a oposição a Requerida depositou a título de caução o valor de € 14.496,00, correspondente a seis meses de renda (€ 2.416,00 X 6).
O DIREITO
21. O recurso de revista excepcional pressupõe o preenchimento dos requisitos gerais de admissibilidade do recurso de revista, designadamente dos requisitos relacionados com o conteúdo da decisão recorrida — art. 671.º, n.º 1 —, com a alçada e com a sucumbência — art. 629.º, n.º 1 —, com a legitimidade dos recorrentes — art. 631.º — e com a tempestividade do recurso — art. 638.º do Código de Processo Civil [1]. Em consequência, “para se determinar se é, no caso, de admitir a revista excepcional, deve começar por se apurar se, no caso concreto, estão preenchidos os requisitos gerais de admissibilidade da revista, rejeitando logo o recurso, sem necessidade de apreciação dos requisitos específicos, se se concluir que não se mostram verificados tais requisitos” [2].
22. O art. 671.º, n.º 1, do Código de Processo Civil dispõe que “[cabe revista para o Supremo Tribunal de Justiça do acórdão da Relação, proferido sobre decisão da 1.ª instância, que conheça do mérito da causa ou que ponha termo ao processo, absolvendo da instância o réu ou algum dos réus quanto a pedido ou reconvenção deduzidos”.
23. Estando preenchidos os requisitos da alçada e da sucumbência, da legitimidade e da tempestividade, a admissibilidade do recurso só poderia ser impedida pela dupla conforme.
24. O art. 671.º, n.º 3, do Código de Processo Civil é do seguinte teor:
“Sem prejuízo dos casos em que o recurso é sempre admissível, não é admitida revista do acórdão da Relação que confirme, sem voto de vencido e sem fundamentação essencialmente diferente, a decisão proferida na 1.ª instância, salvo nos casos previstos no artigo seguinte”.
25. O acórdão da Relação confirmou, sem voto de vencido, a decisão proferida na 1.ª instância, pelo que o problema do preenchimento dos pressupostos do art. 671.º, n.º 3, está, tão-só, em averiguar se o confirmou com ou sem fundamentação essencialmente diferente.
26. Entre a fundamentação da sentença da 1.ª instância e a fundamentação acórdão da Relação há em todo o caso uma diferença fundamental: a sentença proferido pelo Tribunal de 1.º instância não se pronunciou sobre a questão do trânsito em julgado do segmento do despacho do despacho saneador que não admitiu a reconvenção; o acórdão proferido pelo Tribunal da Relação pronunciou-se sobre a questão, para sustentar que sim.
27. Encontrando-se em causa uma questão nova, não estão preenchidos os pressupostos do art. 671.º, n.º 3, do Código de Processo Civil — ainda que o acórdão da Relação confirme a decisão proferida na 1.ª instância, confirma-a com uma fundamentação essencialmente diferente.
28. A revista deve ser admitida como revista normal — não sendo necessária a remessa dos autos à Formação prevista no n.º 3 do art. 672.º para decidir se está, ou não, preenchido o pressuposto da alínea a) do n.º 1 do art. 672.º do Código de Processo Civil.
29. A primeira questão suscitada pela Requerida Courtesy Melody, Lda., consiste em determinar se o segmento despacho saneador em que não se admitiu a reconvenção transitou em julgado.
30. O art. 644.º do Código de Processo Civil é do seguinte teor:
1. — Cabe recurso de apelação:
a) Da decisão, proferida em 1.ª instância, que ponha termo à causa ou a procedimento cautelar ou incidente processado autonomamente;
b) Do despacho saneador que, sem pôr termo ao processo, decida do mérito da causa ou absolva da instância o réu ou algum dos réus quanto a algum ou alguns dos pedidos.
2 — Cabe ainda recurso de apelação das seguintes decisões do tribunal de 1.ª instância:
a) Da decisão que aprecie o impedimento do juiz;
b) Da decisão que aprecie a competência absoluta do tribunal;
c) Da decisão que decrete a suspensão da instância;
d) Do despacho de admissão ou rejeição de algum articulado ou meio de prova;
e) Da decisão que condene em multa ou comine outra sanção processual;
f) Da decisão que ordene o cancelamento de qualquer registo;
g) De decisão proferida depois da decisão final;
h) Das decisões cuja impugnação com o recurso da decisão final seria absolutamente inútil;
i) Nos demais casos especialmente previstos na lei.
3. — As restantes decisões proferidas pelo tribunal de 1.a instância podem ser impugnadas no recurso que venha a ser interposto das decisões previstas no n.º 1.
4. — Se não houver recurso da decisão final, as decisões interlocutórias que tenham interesse para o apelante independentemente daquela decisão podem ser impugnadas num recurso único, a interpor após o trânsito da referida decisão.
31. As decisões previstas na alínea a) do n.º 1 do art. 644.º do Código de Processo Civil podem designar-se como decisões formalmente finais, ou como decisões finais em sentido formal, e as decisões previstas na alínea b) podem designar-se como decisões materialmente finais, ou como decisões finais em sentido material [3].
32. Ora o regime das decisões materialmente finais do art. 644.º, n.º 1, alínea b), do Código de Processo Civil deve aplicar-se “ao segmento do despacho saneador que absolva o autor ou os autores da instância reconvencional (ou que por qualquer motivo formal julgue extinta a instância nessa parte)” [4]. O autor, ou o requerente, “assume a posição de sujeito passivo” [5], de réu ou de requerido — daí que do segmento do despacho saneador que absolva o requerente da instância reconvencional caiba recurso de apelação imediata nos prazos gerais do art. 638.º, n.º 1, do Código de Processo Civil [6].
33. O facto de a Requerida, agora Recorrente, Courtesy Melody, Lda., não ter interposto recurso de apelação do segmento do despacho saneador que absolveu o Requerente, agora Recorrido, da instância reconvencional dentro dos prazos gerais do art. 638.º, n.º 1, do Código de Processo Civil determina o trânsito em julgado da decisão.
34. Como se diz no acórdão recorrido:
“Por despacho datado de 4 de Dezembro de 2018, o juiz a quo decidiu que se encontrava prejudicada a reconvenção por não ser processualmente compatível com a finalidade do presente processo especial de despejo.
Notificado, o reconvinte não impugnou tal decisão, contra ela não apresentando apelação autónoma.
Veio a fazê-lo no âmbito da apelação interposta a final contra a sentença que lhe foi desfavorável, seguindo o regime consignado no artigo 644°, n° 3, do Código de Processo Civil.
Acontece que cabia recurso de apelação autónoma contra a decisão que não admitiu liminarmente o pedido reconvencional, nos termos do artigo 644°, n° 1, alínea b), do Código de Processo Civil, não se aplicando por isso o regime geral consignado no artigo 644°, n° 3, do Código de Processo Civil. […]
Ora, não havendo o reconvinte apresentado recurso de apelação autónoma contra tal decisão, que lhe foi desfavorável, impedindo o conhecimento nestes autos do mérito da reconvenção que formulou, como a lei lhe permitia, essa mesma decisão de indeferimento veio a transitar em julgado.
Logo, não é agora possível, em sede de apreciação do recurso interposto contra a decisão final, conhecer do mérito desse despacho transitado em julgado, sendo necessariamente intempestivo o recurso intentado relativamente à citada decisão.
Assim e nesta parte, o recurso apresentado a final não é admissível e, desse modo, tendo em conta o trânsito em julgado entretanto constituído em relação à decisão de não admissão liminar da reconvenção, a apelação em apreço não poderia em circunstância alguma vir a ser julgada procedente (ou sequer conhecida).
Não há assim, com este fundamento, lugar ao conhecimento da apelação neste particular”.
35. A Requerida, agora Recorrente, alega que a decisão proferida no acórdão recorrido contradiz as decisões proferidas no acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 16 de Outubro de 2009 — processo n.º 224298/08.4YIPRT-B.L1-8 — e no acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 27 de Fevereiro de 2012 — processo n.º 3476/11.7TBBRG.G1.
36. Ora os dois acórdãos foram proferidos no quadro de diferente legislação — do art. 691.º do antigo Código de Processo Civil, na redacção do Decreto-Lei n.º 303/2007, de 24 de Agosto. Em ambos os acórdãos invocados se interpretou disposição correspondente à alínea h) do art. 644.º, n.º 2, do actual Código de Processo — decisões cuja impugnação com o recurso da decisão final seria absolutamente inútil —; em nenhum dos dois acórdãos invocados se interpretou disposição correspondente ou sequer semelhante à alínea b) do art. 644.º, n.º 1. do actual Código de Processo Civil — despacho saneador que… absolva da instância o réu ou algum dos réus quanto a algum ou alguns dos pedidos. Entre o acórdão recorrido e as duas decisões invocadas não há, por consequência, contradição nenhuma.
37. Face à resposta dada à primeira questão, fica prejudicada a segunda — não há que apreciar se a reconvenção deduzida pela Requerida Courtesy Melody, Lda., deve ser admitida.
38. O trânsito em julgado do segmento do despacho saneador por que não se admitiu a reconvenção determina que o Supremo Tribunal de Justiça não possa pronunciar-se sobre a interpretação das disposições legais aplicadas pelo Tribunal de 1.ª instância, ou sobre a compatibilidade da interpretação das disposições legais aplicadas com a tutela jurisdicional efectiva.
III. — DECISÃO
Face ao exposto, nega-se provimento ao recurso e confirma-se o acórdão recorrido.
Custas pela Recorrente Courtesy Melody, Lda.
Lisboa, 10 de Dezembro de 2020
Nuno Manuel Pinto Oliveira (Relator)
José Maria Ferreira Lopes
Manuel Pires Capelo
Nos termos do art. 15.º-A do Decreto-Lei n.º 10-A/2020, de 13 de Março, aditado pelo Decreto-Lei n.º 20/2020, de 1 de Maio, declaro que o presente acórdão tem o voto de conformidade dos Exmos. Senhores Conselheiros José Maria Ferreira Lopes e Manuel Pires Capelo.
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[1] Cf. designadamente os acórdãos do STJ de 22 de Fevereiro de 2018 — processo n.º 2219/13.5T2SVR.P1.S1 — e de 26 de Novembro de 2019 — processo n.º 1320/17.0T8CBR.C1-A.S1.
[2] Cf. acórdão do STJ de 22 de Fevereiro de 2018 — processo n.º 2219/13.5T2SVR.P1.S1.
[3] Expressões de Rui Pinto, anotação ao art. 644.º, in: Código de Processo Civil anotado, vol. II — Artigos 546.º a 1085.º, Livraria Almedina, Coimbra, 2018, págs. 296-306.
[4] Cf. António Santos Abrantes Geraldes, anotação ao art. 644.º, in: Recursos no novo Código de Processo Civil, 5.`ed., Livraria Almedina, Coimbra, 2018, págs. 199-224 (207).
[5] Expressão de António Santos Abrantes Geraldes, anotação ao art. 644.º, in: Recursos no novo Código de Processo Civil, cit., pág. 207.
[6] Rui Pinto, anotação ao art. 644.º, in: Código de Processo Civil anotado, vol. II — Artigos 546.º a 1085.º, cit., pág. 301.