RECURSO PENAL
COMPETÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA
VÍCIOS DO ARTº 410.º DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL
INSUFICIÊNCIA DA MATÉRIA DE FACTO
ERRO NOTÓRIO NA APRECIAÇÃO DA PROVA
DUPLA CONFORME
CRIME CONTINUADO
QUESTÃO NOVA
ADMISSIBILIDADE DE RECURSO
REJEIÇÃO PARCIAL
FURTO
FURTO QUALIFICADO
RECETAÇÃO
VEÍCULO AUTOMÓVEL
PROVA INDICIÁRIA
CO-AUTORIA
APROPRIAÇÃO
MATÉRIA DE FACTO
MATÉRIA DE DIREITO
PENA ÚNICA
PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE
PENA DE PRISÃO
Sumário


I - É pacífica a jurisprudência deste Supremo Tribunal no sentido de que, no recurso para si interposto, o recorrente não pode invocar os vícios do n.º 2 do artigo 410.º do CPP, sem embargo de deles poder/dever conhecer oficiosamente o STJ sempre que constate, através da análise do texto da decisão recorrida, por si ou conjugada com as regras da experiência comum: (a) ocorrer insuficiência para a decisão da matéria de facto provada; (b) existir contradição insanável da fundamentação ou entre a fundamentação e a decisão; (c) ter havido erro notório na apreciação da prova – constituindo vícios da decisão, revelados no texto da decisão e a partir dele e não de erros de julgamento da matéria de facto, nomeadamente de apreciação das provas, cujo conhecimento se encontra subtraído ao STJ.
II - Perante as especificidades do caso sub judice, em que nos deparamos com a prática de sucessivas apropriações de veículos automóveis, encontra-se inteiramente justificado o recurso feito pelas instâncias à prova indiciária pois a prova nem sempre é directa, de percepção imediata, sendo muitas vezes baseada em indícios – circunstâncias conhecidas e provadas a partir das quais, mediante um raciocínio lógico, pelo método indutivo, se obtém a conclusão, firme, segura e sólida de outro facto. Apesar de ser prova indirecta, tem a mesma força que a testemunhal, documental ou outra.
III - Existe matéria de facto bastante para imputar à arguida, ora recorrente, a prática, em comparticipação, ao nível da co-autoria material, dos factos aí discriminados integradores dos crimes de furto assinalados.
IV – A verificação dos crimes de furto – integrados pela subtracção, expropriação de coisa móvel alheia com intenção de apropriação – apresenta-se como indiscutível. A arguida apropriou-se de bens – veículos automóveis – que não lhes pertencia.
VI - «Apropriação» que consta da factualidade provada e que, ao contrário do entendimento da recorrente, se configura verdadeiramente como elemento de facto e não como «conceito de direito», traduzindo um significado e uma precisa intencionalidade jurídico-penal do tipo objectivo do crime de furto previsto no artigo 203.ºdo Código Penal – a subtracção, ou seja, uma conduta que faz com que uma coisa saia do domínio de facto do precedente detentor ou possuidor que implica «a eliminação do domínio de facto que outrem detinha sobre a coisa».
VII – A comparticipação, em co-autoria material, não suscita quaisquer dúvidas atenta a matéria de facto provada pois, como consta da decisão, «flui da factualidade dada por assente que os arguidos M e C, tanto em conjunto, como conluiados com outros indivíduos […], agindo em comunhão de intentos e esforços, lançaram mão (i. é. subtraíram), e colocaram sob a sua disponibilidade fáctica (quebrando desse jeito, o poderio fáctico que os respectivos proprietários e/ou detentores sobre os mesmos detinham), os veículos melhor descritos nos parágrafos […], sendo que «os mesmos arguidos não eram titulares, sobre tais objectos, de qualquer posição juridicamente reconhecida e tutelada, que cabia, antes, a outrem, pelo que os mesmos eram, por isso, alheios em relação a si, na acepção do artigo 203.º, n.º 1, do Código Penal».
VIII - Constitui jurisprudência sedimentada e pacífica deste Supremo Tribunal que os vícios previstos nos n.os 2 e 3 do artigo 410.º do CPP não podem constituir objecto do recurso de revista a interpor para o STJ e que este tribunal deles somente conhece ex oficio, quando constatar que a decisão recorrida, devido aos vícios que denota ao nível da matéria de facto, inviabiliza a correcta aplicação do direito ao caso sub judice.
IX – Pelo que não é admissível um recurso interposto de um acórdão proferido pelo Tribunal da Relação para o STJ na parte em que convoca a reapreciação da decisão proferida sobre matéria de facto, quer em termos amplos, por erro de julgamento (erro na apreciação da prova), quer no quadro dos vícios do artigo 410.º do CPP (erro-vício).
X - A recorrente, reeditando os fundamentos que invocou no recurso que interpôs para o Tribunal da Relação suscita o vício da insuficiência para a decisão da matéria de facto provada e o vício do erro notório na apreciação da prova, contemplados no artigo 410.º, n.º 2, alíneas a) e c), do CPP, sendo que o que visa é impugnar a matéria de facto dado como assente pelo Tribunal da Relação, não aceitando a mesma e pretendendo a alteração da matéria de facto dada como provada.
XI - Na medida em que a reapreciação da matéria de facto, seja em termos amplos (erro-julgamento) seja no âmbito dos vícios do artigo 410.º do CPP (erro-vício), não pode servir de fundamento ao recurso interposto para o Supremo Tribunal de Justiça, impõe-se rejeitar, por inadmissível, nesta parte, o recurso interposto pela arguida, nos termos conjugados dos artigos 420.º, n.º 2, alínea b), 414.º, n.º 2 e 434.º, todos do CPP.
XII - O erro notório na apreciação da prova, previsto no artigo 410.º, n.º 2, alínea c), do CPP,é um vício que se observa quando se retira de um facto dado como provado uma conclusão ilógica, arbitrária ou visivelmente violadora do sentido da decisão e/ou das regras de experiência comum, vício que tem que resultar impreterivelmente do próprio teor da sentença.
XIII - A recorrente discorda com a forma como a prova foi considerada relativamente aos concretos pontos da matéria de facto (provada e não provada) que ficaram apurados, visando afinal pôr em causa o processo de valoração da prova efectuado pelas instâncias, pretendendo que a mesma prova seja valorada de acordo com a sua própria apreciação, esquecendo-se, contudo, que a prova é apreciada, salvo quando a lei dispuser diferentemente, segundo as regras da experiência e a livre convicção da entidade que julga, conforme artigo 127° do CPP, e não de acordo com a apreciação que dela fazem os destinatários da decisão.
XIV- A recorrente AA insurge-se contra a dimensão da pena única fixada, suscitando agora, ao mesmo tempo a questão relativa à «existência do crime continuado», pretendendo que a punição se efectue «pelas regras fixadas na lei para o crime continuado».
XV - O conhecimento desta última pretensão é, diga-se desde já, inadmissível porque configura uma verdadeira questão nova que não foi submetida à apreciação do Tribunal da Relação de que se recorre e que, por isso mesmo, não foi aí apreciada pelo que não poderá ser objecto de conhecimento no âmbito do presente recurso que, nesta parte, se rejeita por inadmissibilidade legal, nos termos dos artigos 420.º, n.º 1, alínea b), e 414.º, n.º 2, do CPP.
XVI - No caso presente, verifica-se que as penas parcelares aplicadas à recorrente pela prática de tais crimes e lastro fáctico-jurídico em que elas assentam, todas inferiores a 8 anos de prisão, foram integralmente confirmadas no acórdão da Relação de que se recorre – dupla conforme –, pelo que são insusceptíveis de recurso em conformidade com o disposto nos artigos 400.º, n.º 1, alínea f), a contrario, e 432.º, n.º 1, alínea b), ambos do CPP.
XVII - O Supremo Tribunal tem entendido, em abundante jurisprudência, que, com “a fixação da pena conjunta se pretende sancionar o agente, não só pelos factos individualmente considerados, mas também e especialmente pelo respectivo conjunto, não como mero somatório de factos criminosos, mas enquanto revelador da dimensão e gravidade global do comportamento delituoso do agente, visto que a lei manda se considere e pondere, em conjunto, (e não unitariamente) os factos e a personalidade do agente.
XVIII - Na determinação da pena conjunta, impõe-se atender aos “princípios da proporcionalidade, da adequação e proibição do excesso” , imbuídos da sua dimensão constitucional, pois que a decisão que efectua o cúmulo jurídico de penas, tem de demonstrar a relação de proporcionalidade que existe entre a pena conjunta a aplicar e a avaliação – conjunta - dos factos e da personalidade, importando, para tanto, saber se os crimes praticados são resultado de uma tendência criminosa ou têm qualquer outro motivo na sua génese, por exemplo se foram fruto de impulso momentâneo ou actuação irreflectida, ou se de um plano previamente elaborado pelo arguido.
XIX - A actividade delituosa da arguida M, concretizada na prática de 14 crimes de furto simples e de 13 crimes de furto qualificado, desenvolveu-se durante um período compreendido entre Abril de 2013 e Janeiro de 2014, lapso de tempo em que, de forma reiterada e pertinaz, se dedicou à subtracção de veículos automóveis que, depois, seriam objecto de desmantelamento, em cuja actividade o arguido C participava.
XX - Relativamente ao arguido C, a sua actividade delituosa no subtracção de veículos, traduzida na prática 3 crimes de furto simples, de 6 crimes de furto qualificado e de um crime de receptação, decorreu em período temporal mais curto ao qual acresce a muito censurável actividade desenvolvida no domínio da receptação.
XXI - Perscrutando o conjunto dos factos praticados pelos arguidos, ora recorrentes, não se considera que a sua actividade tenha sido meramente ocasional, de aproveitamento de circunstâncias que se lhes depararam, antes é reveladora de uma personalidade desvaliosa, próxima da tendência criminosa. 
XXII - A personalidade dos arguidos plasmada nos factos praticados tem uma eficácia agravante, posto que de claro alheamento da normatividade, indiferentes à situação dos ofendidos para alguns dos quais, pelo menos, os veículos constituíam seguramente o seu instrumento ou meio de trabalho.
XXIII - A ilicitude global do comportamento dos arguidos, revelada nos crimes cometidos, é muito elevada, revelando-se aqui intensas exigências de prevenção geral.
XXIV - Quanto a ambos os arguidos, agora recorrentes, o período de tempo já decorrido desde a prática dos factos, com o inerente efeito erosivo, assume particular relevo.
XXV - Tudo ponderado, valorando globalmente os factos e a personalidade dos arguidos, tendo presente que a pena conjunta há-de ser fixada nos limites das respectivas molduras abstractas, considera-se que se justifica uma intervenção correctiva das penas fixadas no acórdão recorrido, fixando-se à arguida M a pena única de 6 anos e 8 meses de prisão e ao arguido C a pena única de 5 anos e 3 meses de prisão.

Texto Integral


Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:




I - RELATÓRIO



     1. Por acórdão proferido em 6 de Setembro de 2017, proferido na … Secção do Juízo Central Criminal …, foram condenados os seguintes arguidos, agora recorrentes:


      a) AA, por:

- 14 crimes de furto simples, previstos no artigo 203.º n.º 1, do Código Penal, em 15 penas de 1 ano de prisão;

- 1 crime de furto qualificado, previsto nos artigos 203.º, n.º 1 e 204.º, n.º 2, alínea a), do Código Penal, na pena de 3 anos de prisão;

- 11 crimes de furto qualificado, previstos nos artigos 203.º n.º 1 e 204.º n.º 1, alínea a), do Código Penal, em 4 penas de 2 anos de prisão e 8 penas de 1 ano e 9 meses de prisão;

- em cúmulo, na pena única de 6 anos de prisão.

     b) BB, por:

- 3 crimes de furto simples, previstos no artigo 203.º n.º 1, do Código Penal, em 3 penas de 1 ano de prisão;

- 1 crime de furto qualificado, previsto nos artigos 203.º, n.º 1 e 204.º, n.º 2, alínea a), do Código Penal, na pena de 3 anos de prisão;

- 5 crimes de furto qualificado, previstos nos artigos 203.º n.º 1 e 204.º n.º 1, alínea a), do Código Penal, em 2 penas de 2 anos de prisão e 3 penas de 1 ano e 9 meses de prisão;

- 1 crime de receptação, previsto no artigo 231.º n.º 1, do Código Penal, na pena de 2 anos de prisão;

- em cúmulo, na pena única de 4 anos de prisão, com execução suspensa por igual período, com regime de prova.


      2. Na sequência dos recursos interpostos pelo Ministério Público e pela arguida AA, por acórdão proferido em 13 de Junho de 2018, deliberou o Tribunal da Relação do Porto:


- Julgar o recurso da arguida AA totalmente improcedente e confirmar nessa parte o acórdão recorrido;


- Julgar o recurso do Ministério Público parcialmente procedente e modificar o acórdão recorrido, mantendo todas as penas parcelares mas fixando a pena única da arguida AA em 9 anos de prisão e a do arguido BB em 6 anos de prisão.


       3. Inconformados, recorreram perante o Supremo Tribunal de Justiça os arguidos BB e AA.


      3.1. O recorrente BB rematou a respectiva motivação com as conclusões que se transcrevem:


      «Das conclusões:


     1.ª – BB, arguido devidamente identificado, vem recorrer para V/ Exas. por entender que a pena que lhe foi aplicada é manifestamente desproporcionada;


     2.ª – Salvo devido respeito, entende o recorrente que o Tribunal não teve em consideração e, em consequência, violou os normativos correspondentes à determinação da medida concreta da pena nos termos do disposto no artigo 71º do CP;


      3.ª – Apesar do grau de ilicitude ser elevado, assim como a culpa, a verdade é que o colectivo de Juízes do Tribunal da Relação do Porto não teve em consideração a conduta anterior e posterior ao facto;


      4.ª - Ora, o arguido não tem antecedentes criminais, tendo pautado a sua vida pela rectidão e respeito pelas normas jurídicas e sociais impostas;


     5.ª – O arguido cometeu, ao longo de cerca de um ano, nove (9) crimes – entre furto simples e qualificado e um (1) de receptação;


     6.ª – Não possuindo antecedentes criminais e não tendo prosseguido com qualquer actividade criminosa, após o julgamento, tal é demonstrativo de que o arguido não possui, assim, uma personalidade com inclinação para actividade criminosa, tendo-se tratado de delitos ocasionais, ocorridos numa fase menos boa da vida do Recorrente;


    7.ª – A pena aplicada pelo Tribunal de 1ª Instância teve forte expressão no arguido, fazendo-o reflectir sobre os actos que havia praticado, sendo que interiorizou o desvalor da sua conduta e a censurabilidade dos seus actos;


    8.ª – O Recorrente rejeitou totalmente o tipo de vida que estava a levar, encontrando-se, hoje em dia, a exercer uma actividade profissional remunerada, dedicando-se à sua família composta por duas filhas menores que de si dependem e demonstrando estar perfeitamente inserido na comunidade.


    9.ª – Desta forma, o Recorrente demonstrou sensibilidade à pena que lhe foi aplicada, uma vez que procurou alterar as suas atitudes, tendo identificado claramente os comportamentos e hábitos a alterar, demonstrando, assim, um esforço sério para dar continuidade ao processo de (re)integração na sociedade: objectivo fundamental do Direito Penal na recuperação do delinquente.


      10.ª – Nesta medida, e no que concerne ao quantum da pena única aplicada pelo Tribunal a quo ao arguido houve, salvo o devido respeito, violação do disposto no artigo 71º do CP.


     11.ª – É entendimento do Recorrente que o Tribunal deverá condená-lo numa pena mais harmoniosa, proporcional e justa face às circunstâncias acima expostas, de acordo como disposto no artigo 71º do CP, que não deverá ultrapassar os cinco (5) anos e suspensa na sua execução, por entender que assim se realiza de forma adequada e suficiente as finalidades da punição, a protecção dos bens jurídicos ofendidos e a reintegração do arguido na sociedade

           

    Termos em que, deverá ser revogado o douto Acórdão que condenou o ora Recorrente em 6 anos de prisão, por esta ser desproporcionada às finalidades da punição e ser aplicada ao Recorrente uma pena não superior a cinco (5) anos e suspensa na sua execução no tempo que V/ Exas. acharem ser conveniente.»


     3.2. A recorrente AA formulou, por sua vez, as seguintes conclusões (transcrição)[1]:

1. Por acórdão proferido, em 6 de Setembro de 2017, na 1ª Instância, foi a aqui arguida/recorrente condenada, pela prática dos seguintes crimes;

- 15 crimes de furto simples, previstos no artigo 203°, n°1 do CP, em 15 penas de 1 ano de prisão;

- 1 crime de furto qualificado, previsto nos artigos 203°, n° 1 e 204°, n° 2, al. a) do CP, na pena de 3 anos de prisão;

- 11 crimes de furto qualificado, previstos nos artigos 203°, nº 1 e 204° n° 1 al. a) do CP, em 4 penas de 2 anos de prisão e 7 penas de 1 ano e 9 meses de prisão;

       e em cúmulo jurídico, na pena única de 6 anos de prisão.

2. Inconformada com tal condenação, a arguida recorreu para o Venerando Tribunal da Relação do Porto (quer de facto, quer de direito), tendo sido, no dia 13 de Junho de 2018, proferido douto acórdão, que a condenou pela prática dos citados crimes, em cúmulo, na pena única de 9 anos de prisão.

3. Todavia, sucede que tal pena se mostra excessiva e desadequada, quer atenta a matéria de facto dada como provada, quer atenta a situação sócio-económica da arguida/recorrente AA, por dois motivos essenciais.

4. O primeiro motivo, salvo o devido respeito por opinião contrária, que é muito, consiste no entendimento da arguida/recorrente que não podia ser condenada, em concurso real e efectivo, pela prática de 27 crimes de furto e furto qualificado, na medida em que face à matéria dada como provada dúvidas não restam de que estamos na presença da prática de crimes continuados.

5. O segundo motivo, salvo o devido respeito por opinião contrária, que é muito, atenta a matéria de facto dada como provada e atenta toda a situação sócio-económica da arguida/recorrente AA, melhor plasmada no douto acórdão recorrido, mostra-se excessiva e desadequada a pena de 9 anos de prisão em que foi condenada, pelas razões que se irão expor infra.

6. Da existência do crime continuado.

O crime continuado mostra contemplado no n.º 2, do art.º 30.º, do Código Penal, onde se diz que “constitui um só crime continuado a realização plúrima do mesmo tipo de crime ou de vários tipos de crime que fundamentalmente protejam o mesmo bem jurídico, executada por forma essencialmente homogénea e no quadro da solicitação de uma mesma situação exterior que diminua consideravelmente a culpa do agente”. Ou seja, o crime continuado consiste numa unificação de um concurso efectivo de crimes, que protegem o mesmo bem jurídico, fundada numa culpa diminuída.

7.   São assim pressupostos do crime continuado:

- A plúrima violação do mesmo tipo legal de crime ou de vários tipos legais de crime que fundamentalmente protejam o mesmo bem jurídico;

- Que essa realização seja executada por forma essencialmente homogénea;

- Que haja proximidade temporal das respectivas condutas;

- A persistência de uma situação exterior que facilita a execução e que diminui sensivelmente a culpa do agente;

- Que cada uma das acções seja executada através de uma resolução e não com referência a um desígnio inicialmente formado de, através de actos sucessivos, defraudar o ofendido.

8. Tendo em conta, toda a matéria de facto dada como provada no douto acórdão recorrido e melhor expostas no ponto 1 da fundamentação do presente recurso, constata-se que estão preenchidos a totalidade dos requisitos estatuídos no n.º 2, do artigo 30º, do Código Penal, anteriormente referidos. Isto é verifica-se que a arguida cometeu 27 crimes de furto simples e qualificado; de forma essencialmente homogénea durante um curto período temporal (10 meses), no âmbito de uma situação exterior que lhe facilitou a execução dos crimes que lhe diminuiu a culpa, sendo certo que a decisão de exercer tal actividade criminosa foi tomada através de uma única resolução criminosa que levou à prática dos referidos actos criminosos sucessivos, melhor descritos nos autos.

9. Pelo que a arguida aqui recorrente terá de ser punida pelas regras fixadas na lei para o crime continuado, previstas no artigo 79º, n.º 1, do Código Penal.

10. Ora, atentas tais regras, a arguida/recorrente foi condenada pela prática de 27 crimes de furto, sendo que o mais grave de todos eles é o crime punido pelo n.º 2, do artigo 204º, do Código Penal, que estatui uma pena de prisão de 2 a 8 anos, enquanto que o crime de furto menos grave é o previsto no artigo 203º, n.º 1, do C. Penal, que estatui uma pena de prisão até 3 anos.

11. Assim sendo, e tendo em conta o estatuído no artigo 79º, n.º 1, do C. Penal, a pena mais grave de todos os crimes é de 8 anos de prisão.

12. Porém, a tal pena devemos aplicar as regras referentes à determinação das penas definidas nos artigos 40º, 70º e 71º, todos do C. Penal.

13. Ora, seguindo o raciocínio, nesta matéria, constante da fundamentação do douto acordão recorrido – não porque se concorde com o ali explanado, mas por uma questão de demonstrar mais facilmente o exagero no critério usado para o efeito - o qual consiste basicamente no seguinte;

“....visto cada crime na sua individualidade, penas parcelares fixadas entre 1/3 e 1/2 da medida útil é uma resposta adequada aos factos respectivos. Mas, vistas as condutas na sua globalidade, tendo em conta o grande desvalor de uma actividade criminosa que se assemelhava já a uma "indústria", as penas únicas não podem ser fixadas abaixo de 1/3, como foram”. Justifica-se, portanto, o aumento das penas únicas.................fixando-se 9 anos de prisão para a arguida AA, que correspondem a uma pena fixada abaixo de 1/2 mas acima de 1/3” - (sic), pelo que, dúvidas não restam de que a pena em que a arguida/recorrente deverá ser condenada situar-se-á no intervalo situado entre 1/2 e 1/3 da referida moldura penal.

14. Aplicando tal critério ao caso em análise, a pena máxima aplicável à arguida/recorrente é de 8 anos de prisão.

15.  Porém, tendo em conta que metade de 8 anos de prisão são 4 anos de prisão e que 1/3 de oito anos de prisão são 2 anos e oito meses de prisão, dúvidas não restam de que a pena adequada e justa, tendo em conta todos os critérios aplicáveis ao caso, quer pela doutrina, quer pela jurisprudência, já plasmados na douta decisão recorrida (que nos abstemos de repetir por brevidade e desnecessidade), a pena justa e adequada em que a arguida deveria ter sido condenada situar-se-ia no intervalo entre 2 anos e 8 meses de prisão até aos 4 anos de prisão.

16. Nesta conformidade, deverá a arguida/recorrente ser condenada na pena máxima de 4 anos de prisão, sendo certo que atenta a sua actual situação sócio-económica e familiar, a ausência de antecedentes criminais (não olvidando que a única condenação da arguida já tem 10 anos e o crime cometido (falsificação) não é igual aos descritos nos autos e ainda que o procedimento criminal por tal ilícito foi declarado extinto), bem como atento o parecer favorável constante do relatório social, nomeadamente no seu ponto n.º XXIV onde se diz;Face ao descrito, somos de parecer que AA apresenta condições para a execução de medida a cumprir na comunidade, devendo investir na obtenção de colocação laboral estável e fazer prova da convencionalidade do seu quotidiano” - (sic), dúvidas não restam de que a mesma reúne todos os requisitos para a suspensão da execução de tal pena de prisão, com regime de prova, estabelecidos nos artigos 50º, n.º 1, n.º 2, n.º 3 e n.º 5; 51º, 52º, 53º e 54º, todos do Código Penal, assim se satisfazendo da mesma forma as elevadas exigências de prevenção geral positiva e as de prevenção especial, que o caso em análise carece, tudo sem violar os princípios fundamentais e primordiais da ressocialização e reintegração do agente na sociedade que subjazem primordialmente à aplicação das penas na nossa lei penal.

17. Pelo exposto, deverá a pena de prisão de 9 anos em que foi condenada a arguida/recorrente, no douto acordão recorrido, ser revogada e em sua substituição deverá a mesma condenada numa pena de prisão nunca superior a cinco anos, suspensa na sua execução, com regime de prova, nos termos do disposto nos artigos 50º, n.º 1, n.º 2, n.º 3 e n.º 5; 51º, 52º, 53º e 54º, todos do Código Penal.

18. Do exagero da pena de 9 anos de prisão em que foi condenada a arguida/recorrente.

19. Como se alegou anteriormente existe um segundo motivo para se concluir que a pena de 9 anos de prisão, em que foi condenada a arguida/recorrente, pelo douto acórdão proferido pelo venerando Tribunal da Relação do Porto, é manifestamente exagerada e viola os princípios fundamentais de direito penal quanto à aplicação de penas, nomeadamente a prevalência da reintegração e ressocialização do arguido, sobre os demais requisitos.

20. Na verdade, a determinação da medida da pena, por via da medida da culpa, há-de encontrar-se, fundamentalmente, em função da maior ou menor gravidade do ilícito perpetrado, uma vez que o juízo de culpa é um juízo de desvalor sobre o agente em razão do seu comportamento num certo momento, qual seja o do cometimento do ilícito típico.

21. Por outro lado, atendendo a que, em caso algum, a pena pode ultrapassar a medida da culpa, certo é que as exigências de prevenção, quer geral, quer especial, podem entrar em conflito com a pena da culpa e a pena necessária para satisfazer aquelas exigências.

22. Com efeito, sempre que a realização das exigências de prevenção colocam maiores exigências de pena do que a culpa, há conflito entre a pena necessária à satisfação daquelas exigências e a pena da culpa. Neste conflito, é chamada a intervir, por força do preceito do n.º 2, do art.º 40º, do Código Penal, a medida da culpa, a qual desempenha o papel de limite inultrapassável de todas e quaisquer considerações preventivas.

23. Ora, no caso em análise, o douto acórdão decidiu dar preferência à pena privativa da liberdade, tendo fixado a pena de 9 anos de prisão, de acordo com os critérios definidos no art.º 71º, n.º 1, aplicável “ex vi” do art.º 47º, n.º 1, ambos do Código Penal, fundamentando para o efeito a elevada culpa do agente e as elevadas exigências de prevenção, quer geral, quer especial, atendendo ainda a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, constantes da matéria dada como provada depuseram contra o agente, nos termos do n.º 2 do citado art.º 71º.

24. Na nossa humilde opinião, nada mais errado – salvo o devido respeito por opinião contrária, que é muito – na medida em que a protecção dos bens jurídicos implica a utilização da pena como instrumento de prevenção geral, para manter e reforçar a confiança da comunidade na validade e na força de vigência das normas do Estado na tutela de bens jurídicos e, assim, no ordenamento jurídico-penal (prevenção geral positiva ou de integração). Sendo certo que a prevenção geral negativa ou de intimidação da generalidade, apenas pode surgir como um efeito lateral da necessidade de tutela dos bens jurídicos.

25. Já a reintegração do agente na sociedade está ligada á prevenção especial ou individual, isto é, à ideia de que a pena é um instrumento de actuação preventiva sobre a pessoa do agente, com o fim de evitar que no futuro, ele cometa novos crimes, que reincida. - (Cfr. no mesmo sentido; Ac. TRC de 17-12-2014; Ac. TRC de 4-03-2015 e Ac. do TRC de 05.04.2017, todos in www.dgsi.pt).

26. Aqui chegados, estamos em condições de averiguar se tal pena de 9 anos de prisão concretamente aplicada à arguida/recorrente se mostra efectivamente excessiva.

27. Ora, in casu, a culpa da arguida revestiu a forma grave – a de dolo directo – mas afirmou-se em todo o processo delitual no âmbito de uma circunstância exterior que lhe limitou a possibilidade de deixar de delinquir, pelo que tal factor deveria ter sido em conta pelo julgador e não o foi.

28. Assume particular relevância, também, a elevada ilicitude dos factos praticados pela arguida, face ao modo de execução e à gravidade das suas consequências.

29. Todavia, como já se disse antes, a arguida para todos os efeitos legais é primária, porquanto a única condenação que tem no registo criminal é de 2007, pela prática de um crime de falsificação, onde foi condenada numa pena de multa, pena esta já extinta pelo cumprimento. Acrescendo ainda que do teor dos autos resulta dado como provado, por força do vertido no relatório social, que a arguida/recorrente sofre de depressão sistemática, desde que teve as duas filhas, que sempre dependeu de terceiros para sobreviver, que tentou o suicídio quando se apercebeu da gravidade da sua actual situação, que depende de familiares para comer, dormir, vestir-se, pagar a água, a electricidade, o gás, etc,, recebendo o rendimento mínimo, situação que já existia durante a prática dos factos, e que basicamente esteve na origem da obtenção de rendimentos para a sua sobrevivência os quais provinham da actividade criminosa do seu companheiro, nas quais a arguida acabou por comparticipar devido à sua dependência de terceiros, como já se referiu.

30. Para além do facto de a arguida/recorrente ter duas filhas para “criar”, contar com o suporte dos familiares mais próximos, de estar consciente do mal que causou a terceiros e da gravidade dos factos cometidos, para além de estar disposta a aceitar quaisquer regras de conduta ou imposições que lhe venham a ser fixadas pelo tribunal para assim expiar a sua culpa e os seus crimes. 

31. Deste modo, mal andou o Tribunal a quo ao aplicar à arguida/recorrente a pena de 9 anos de prisão.

32. Pois atentos todos os critérios legais anteriormente referidos, conjugados com a personalidade da arguida, as suas condições de vida, à sua conduta anterior e posterior à prática dos factos, às circunstâncias em que os mesmos foram cometidos, bem como ao teor do relatório social onde é emitido parecer no sentido de a sujeição da arguida a regras de conduta e/ou regime de prova é suficiente para a sua reintegração na sociedade, não se mostra adequada e proporcional a pena de 9 anos de prisão.

33. Assim sendo, a pena de 5 anos de prisão mostra-se a mais adequada e proporcional aos crimes cometidos pela arguida, na medida em que tal pena satisfaz de forma segura as elevadas exigências de prevenção geral, mas também as elevadas exigências de reintegração da arguida na sociedade – sendo certo que a lei, toda a doutrina e a maioria da nossa jurisprudência dá prevalência a este aspecto da reintegração do agente – atento o disposto nos artigos 40º, 70º e 71º, do Código Penal, com referência aos artigos 50º a 54º, do mesmo diploma legal.

34. Daí que face a todo o supra alegado, a situação socioeconómica e social da arguida/recorrente, o grau da sua culpa e ilicitude, conjugados com os princípios fundamentais da aplicação das penas, supra explanados, a mesma apenas deveria ser condenada na pena de prisão de 5 anos de prisão, suspensa na sua execução, com sujeição a regras de conduta e/ou regime de prova.


        Pelo exposto, requer-se que a pena de 9 anos de prisão, em que foi condenada a arguida/recorrente, no douto acórdão recorrido, seja revogada e em sua substituição seja a mesma condenada na pena única de 5 anos de prisão, suspensa na sua execução, sujeita a regras de conduta e/ou ao regime de prova (…)».


 4. Por acórdão de 10 de Abril de 2019, este Supremo Tribunal deliberou anular, por falta de fundamentação, o referido acórdão do Tribunal da Relação do Porto.


5. Por acórdão de 11 de Setembro de 2019, o Tribunal da Relação deliberou suprir a nulidade da falta de fundamentação do primeiro acórdão proferido (de 13 de Junho de 2018), julgar o recurso interposto pela arguida AA totalmente improcedente e julgar parcialmente procedente o recurso interposto pelo Ministério Público, mantendo todas as penas parcelares mas fixando a pena única da arguida AA em 9 anos de prisão e a do arguido BB em 6 anos de prisão.


6. Inconformada, a arguida AA recorre para este Supremo Tribunal, formulando as seguintes conclusões (transcrição)[2]:


1. Por acórdão proferido, em 6 de Setembro de 2017, na 1ª Instância, foi a aqui arguida/recorrente condenada, pela prática dos seguintes crimes;

a. - 15 crimes de furto simples, previstos no artigo 203°, n°1 do CP, em 15 penas de 1 ano de prisão;

b. - 1 crime de furto qualificado, previsto nos artigos 203°, n° 1 e 204°, n° 2, al. a) do CP, na pena de 3 anos de prisão;

c. - 11 crimes de furto qualificado, previstos nos artigos 203°, nº 1 e 204° n° 1 al. a) do CP, em 4 penas de 2 anos de prisão e 7 penas de 1 ano e 9 meses de prisão; e em cúmulo jurídico, na pena única de 6 anos de prisão.

2. Inconformada com tal condenação, a arguida recorreu para o Venerando Tribunal da Relação do Porto (quer de facto, quer de direito), tendo sido proferido douto acórdão, que a condenou pela prática dos citados crimes, em cúmulo, na pena única de 9 anos de prisão.

3. Tal decisão padece de nulidade, por falta de fundamentação nos termos do art. 374º, nº 2 e 379º, nº 1, al. a) do CPP, o que deve ser declarado.

4. Conforme vertido na precedente motivação, o tribunal limitou-se em cada ponto do probatório a afirmar que a recorrente e um ou outros indivíduos, ora de identidade apurada, ora não apurada, se apropriaram de veículos contra a vontade de seus donos, agindo em conjugação de esforços e de intenções, sem autorização e contra a vontade dos seus legítimos proprietários, tendo agido de forma livre, voluntária e consciente, com o propósito de se apropriarem de tais veículos e de os venderem a troco de quantia monetária, como fizeram integrando tal quantia nos seus patrimónios.

5. S.d.r. e s.m.o. não se vislumbram na decisão recorrida quaisquer factos integrantes do crime de furto, nem distintivos do grau de participação de cada um dos visados em cada um dos momentos identificados na decisão – como se impõe.

6. Considerando que a exigência de indicação precisa dos factos imputados ao arguido é, antes de mais, uma emanação clara das garantias constitucionais de defesa, nomeadamente do princípio do acusatório consagrado no art.º 32.º da CRP – que, no caso presente, foram violadas, pelas razoes que aqui se invocam, fica arguida tal violação.

7. Com efeito, a simples utilização (repetida ao longo de todo o probatório) da expressão “apropriaram-se” consubstancia um conceito jurídico que, para ter relevância numa solução decisória teria de estar – e não está - concretizado por factos, acontecimentos. Ou seja, o conceito “apropriação” teria de ser materializado factualmente para poder, porventura, sustentar uma condenação.

8. A sentença padece da nulidade prevista no art.º 379º/1, a) do CPP porquanto não contém as menções obrigatórias referidas no n.º 2 do art.º 374º do mesmo código, designadamente por não conter os factos provados, nem não provados que permitam apreender e compreender a concreta actuação de cada agente em cada episódio criminoso, daí determinando se cometeram ou não o crime, bem como compreender a participação de cada um, designadamente para os poder condenar a título de co-autoria ou cumplicidade.

9. E a solução jurídica parece também apontar num único sentido, o da absolvição da recorrente – por errada interpretação do art. 203º, nº 1 e 204º, nº 1, al. a) todos do C.P, violação da aludida garantia constitucional, por efeito da não concretização evidenciada no parágrafo anterior.

10. Como evidenciado na presente motivação, e atento o vindo de expor, parece manifesto que os factos dados como provados integram o vício de insuficiência para a decisão, da matéria de facto provada, consignado no art.º 410º/2 do CPP.

11. Ora, este vício é patente da decisão recorrida e resulta do vindo de dizer supra quanto à falta de concretização da actuação de cada agente, impossibilitadora da subsunção das respectivas condutas, seja ao tipo criminal, seja a uma forma específica de comparticipação, pelo que,

12. Verificada tal insuficiência da matéria de facto para a decisão, deve julgar-se violado o art.º 410/2 do CPP e a recorrente ser absolvida.

13. Está a recorrente em crer que o douto acórdão recorrido viola ainda al. c) do n.º 2 do art.º 410 do CPP por padecer de erro notório na apreciação da prova.

14. não resultando a considerada conjugação de esforços e intenções de quaisquer factos concretizadores, não se percebe como foi a recorrente condenada a título de co-autora.

15. De acordo com o art.º 26º CP é punível como autor, quem executar o facto por si ou por intermédio de outro, ou tomar parte directa na sua execução por acordo ou juntamento com outro ou outros, e ainda quem, dolosamente, determinar outra pessoa à prática do facto desde que haja execução ou começo de execução.

16. Atenta a manifesta carência desses factos concretizadores, verifica-se que o tribunal violou o citado art.º 26º do CP, impondo-se a absolvição da recorrente.

17. O art.º 311º CPP confere ao tribunal a possibilidade de saneamento do processo.

18. Concretamente a al. b) do n.º 3 configura como manifestamente infundada e de rejeitar, a acusação que não contenha a narração dos factos.

19. Já vinha da própria acusação, essa carência de factos evidenciada em todos e cada um dos pontos supra.

20. Se uma acusação sem factos deve ser rejeitada (entenda-se factos integradores do crime e não conclusões), por maioria de razão, o acórdão condenatório não pode condenar sem factos.

21. Indirectamente mostra-se violado o art.º 311º/3 al. b) por referência à al. a) do nrº 2 do mesmo, pelo que se impõe à absolvição d a recorrente por não se encontrar materializada a prova da comissão dos crimes por que vem condenada.

22. Como decorrência do imperativo constitucional consagrado no art. 205º n.º 1, o art. 374º, do CPP, relativamente à fundamentação, dispõe no seu n.º 2 que deve constar da “enumeração dos factos provados e não provados, bem como de uma exposição tanto quanto possível completa, ainda que concisa, dos motivos, de facto e de direito, que fundamentam a decisão, com indicação e exame crítico das provas que serviram para formar a convicção do tribunal.”

23. Mais uma vez, questões que ficaram por esclarecer – e que não encontram resposta nos autos.

24. Não existem elementos que relacionem a recorrente com os factos dados por provados a seu respeito designadamente com a maior parte deles para além de um episódio identificado que além das escutas foi objecto de observação e seguimento policial.

25. As escutas são um mero meio de prova e não permitem afirmar, senão que determinada conversa ocorreu.

26. E o próprio tribunal reconhece grande dificuldade de análise e interpretação das escutas telefónicas e transcrições pois os intervenientes não são totalmente claros acerca de objectos, lugares ou concretas actividades.

27. E uma vez mais, a única conclusão que parece possível é a da sua absolvição em todos aqueles episódios não sustentados para além das transcrições telefónicas.

28. como decorrência do imperativo constitucional consagrado no art. 205º n.º 1, o art. 374º, do CPP, relativamente à fundamentação, e em concretização do nr.º 5 do art.º 97 do CPP, verifica-se que o tribunal não logrou fundamentar suficientemente nem os factos provados nem a condenação, violando aquelas normas, impondo-se a absolvição da recorrente

29. Existe no douto acórdão uma efectiva falha de fundamentação que redunda na nulidade do decidido, nos termos do art. 379º, nº 1, al. a) do CPP ex vi art. 374º, nº 2 do mesmo diploma.

30. Mais, o Tribunal limitou-se a fundamentar a sua convicção quanto à prática de todos os crimes remetendo para a sua convicção quanto ao primeiro deles (sem levar a cabo uma verdadeira analise critica da prova).

31. Ademais, as próprias escutas, na sua forma de transcrições telefónicas, no dizer do próprio tribunal, suscitam um problema suplementar, qual seja o da análise (e, onde necessário interpretação de um conjunto vasto de intercepções telefónicas, que se espraiam por várias centenas de páginas de transcrições, com todas as dificuldades inerentes à apreensão do sentido de conversações em que os intervenientes, consciente ou inconscientemente, não são totalmente claras acerca dos objectos a que aludem, dos lugares a que referem ou das concretas actividades que realizam ou pretendem realizar (ou ver realizadas pelos destinatários das comunicações em causa)

32. Através das mesmas como flui do probatório, nem sequer foi possível apurar a identidade de outros supostos envolvidos nos crimes imputados à recorrente. É demasiado pouco para a condenação.

33. Como decorrência do imperativo constitucional consagrado no art. 205º n.º 1, o art. 374º, do CPP, relativamente à fundamentação, e em concretização do nr.º 5 do art.º 97 do CPP, verifica-se que o tribunal não logrou fundamentar suficientemente nem os factos provados nem a condenação, violando aquelas normas, impondo-se a absolvição da recorrente.

34. Quando assim se não entenda, a pena concretamente aplicada mostra-se excessiva e desadequada, quer atenta a matéria de facto dada como provada, quer atenta a situação socio-económica da arguida/recorrente AA, por dois motivos essenciais.

35. O primeiro motivo, salvo o devido respeito por opinião contrária, que é muito, consiste no entendimento da arguida/recorrente que não podia ser condenada, em concurso real e efectivo, pela prática de 27 crimes de furto e furto qualificado, na medida em que face à matéria dada como provada dúvidas não restam de que estamos na presença da prática de crimes continuados.

36. O segundo motivo, salvo o devido respeito por opinião contrária, que é muito, atenta a matéria de facto dada como provada e atenta toda a situação sócio-económica da arguida/recorrente AA, melhor plasmada no douto acórdão recorrido, mostra-se excessiva e desadequada a pena de 9 anos de prisão em que foi condenada, pelas razões que se irão expor infra.

37. Da existência do crime continuado.

a. O crime continuado mostra contemplado no n.º 2, do art.º 30.º, do Código Penal, onde se diz que “constitui um só crime continuado a realização plúrima do mesmo tipo de crime ou de vários tipos de crime que fundamentalmente protejam o mesmo bem jurídico, executada por forma essencialmente homogénea e no quadro da solicitação de uma mesma situação exterior que diminua consideravelmente a culpa do agente”. Ou seja, o crime continuado consiste numa unificação de um concurso efectivo de crimes, que protegem o mesmo bem jurídico, fundada numa culpa diminuída.

38. Tendo em conta, toda a matéria de facto dada como provada no douto acórdão recorrido e melhor expostas no ponto 1 da fundamentação do presente recurso, constata-se que estão preenchidos a totalidade dos requisitos estatuídos no n.º 2, do artigo 30º, do Código Penal. Isto é verifica-se que a arguida cometeu 27 crimes de furto simples e qualificado; de forma essencialmente homogénea durante um curto período temporal (10 meses), no âmbito de uma situação exterior que lhe facilitou a execução dos crimes que lhe diminuiu a culpa, sendo certo que a decisão de exercer tal actividade criminosa foi tomada através de uma única resolução criminosa que levou à prática dos referidos actos criminosos sucessivos, melhor descritos nos autos.

39. Pelo que a arguida aqui recorrente terá de ser punida pelas regras fixadas na lei para o crime continuado, previstas no artigo 79º, n.º 1, do Código Penal.

40. Ora, atentas tais regras, a arguida/recorrente foi condenada pela prática de 27 crimes de furto, sendo que o mais grave de todos eles é o crime punido pelo n.º 2, do artigo 204º, do Código Penal, que estatui uma pena de prisão de 2 a 8 anos, enquanto que o crime de furto menos grave é o previsto no artigo 203º, n.º 1, do C. Penal, que estatui uma pena de prisão até 3 anos.

41. Assim sendo, e tendo em conta o estatuído no artigo 79º, n.º 1, do C. Penal, a pena mais grave de todos os crimes é de 8 anos de prisão.

42. Porém, a tal pena devemos aplicar as regras referentes à determinação das penas definidas nos artigos 40º, 70º e 71º, todos do C. Penal.

43. Ora, seguindo o raciocínio, nesta matéria, constante da fundamentação do douto acórdão recorrido – não porque se concorde com o ali explanado, mas por uma questão de demonstrar mais facilmente o exagero no critério usado para o efeito - o qual consiste basicamente no seguinte;

i.“....visto cada crime na sua individualidade, penas parcelares fixadas entre 1/3 e 1/2 da medida útil é uma resposta adequada aos factos respectivos. Mas, vistas as condutas na sua globalidade, tendo em conta o grande desvalor de uma actividade criminosa que se assemelhava já a uma "indústria", as penas únicas não podem ser fixadas abaixo de 1/3, como foram”. Justifica-se, portanto, o aumento das penas únicas................. fixando-se 9 anos de prisão para a arguida AA, que correspondem a uma pena fixada abaixo de 1/2 mas acima de 1/3” - (sic), pelo que, dúvidas não restam de que a pena em que a arguida/recorrente deverá ser condenada situar-se-á no intervalo situado entre 1/2 e 1/3 da referida moldura penal.

44. Aplicando tal critério ao caso em análise, a pena máxima aplicável à arguida/recorrente é de 8 anos de prisão.

45. Porém, tendo em conta que metade de 8 anos de prisão são 4 anos de prisão e que 1/3 de oito anos de prisão são 2 anos e oito meses de prisão, dúvidas não restam de que a pena adequada e justa, tendo em conta todos os critérios aplicáveis ao caso, quer pela doutrina, quer pela jurisprudência, já plasmados na douta decisão recorrida (que nos abstemos de repetir por brevidade e desnecessidade), a pena justa e adequada em que a arguida deveria ter sido condenada situar-se-ia no intervalo entre 2 anos e 8 meses de prisão até aos 4 anos de prisão.

46. Nesta conformidade, deverá a arguida/recorrente ser condenada na pena máxima de 4 anos de prisão, sendo certo que atenta a sua actual situação sócio-económica e familiar, a ausência de antecedentes criminais (não olvidando que a única condenação da arguida já tem 10 anos e o crime cometido (falsificação) não é igual aos descritos nos autos e ainda que o procedimento criminal por tal ilícito foi declarado extinto), bem como atento o parecer favorável constante do relatório social, nomeadamente no seu ponto n.º XXIV onde se diz; “Face ao descrito, somos de parecer que AA apresenta condições para a execução de medida a cumprir na comunidade, devendo investir na obtenção de colocação laboral estável e fazer prova da convencionalidade do seu quotidiano” - (sic), dúvidas não restam de que a mesma reúne todos os requisitos para a suspensão da execução de tal pena de prisão, com regime de prova, estabelecidos nos artigos 50º, n.º 1, n.º 2, n.º 3 e n.º 5; 51º, 52º, 53º e 54º, todos do Código Penal, assim se satisfazendo da mesma forma as elevadas exigências de prevenção geral positiva e as de prevenção especial, que o caso em análise carece, tudo sem violar os princípios fundamentais e primordiais da ressocialização e reintegração do agente na sociedade que subjazem primordialmente à aplicação das penas na nossa lei penal.

47. Pelo exposto, deverá a pena de prisão de 9 anos em que foi condenada a arguida/recorrente, no douto acórdão recorrido, ser revogada e em sua substituição deverá a mesma condenada numa pena de prisão nunca superior a cinco anos, suspensa na sua execução, com regime de prova, nos termos do disposto nos artigos 50º, n.º 1, n.º 2, n.º 3 e n.º 5; 51º, 52º, 53º e 54º, todos do Código Penal.

Do exagero da pena de 9 anos de prisão em que foi condenada a arguida/recorrente.

48. Como se alegou anteriormente existe um segundo motivo para se concluir que a pena de 9 anos de prisão, em que foi condenada a arguida/recorrente, pelo douto acórdão proferido pelo venerando Tribunal da Relação do Porto, é manifestamente exagerada e viola os princípios fundamentais de direito penal quanto à aplicação de penas, nomeadamente a prevalência da reintegração e ressocialização do arguido, sobre os demais requisitos.

49. Na verdade, a determinação da medida da pena, por via da medida da culpa, há-de encontrar-se, fundamentalmente, em função da maior ou menor gravidade do ilícito perpetrado, uma vez que o juízo de culpa é um juízo de desvalor sobre o agente em razão do seu comportamento num certo momento, qual seja o do cometimento do ilícito típico.

50. Por outro lado, atendendo a que, em caso algum, a pena pode ultrapassar a medida da culpa, certo é que as exigências de prevenção, quer geral, quer especial, podem entrar em conflito com a pena da culpa e a pena necessária para satisfazer aquelas exigências.

51. Com efeito, sempre que a realização das exigências de prevenção colocam maiores exigências de pena do que a culpa, há conflito entre a pena necessária à satisfação daquelas exigências e a pena da culpa. Neste conflito, é chamada a intervir, por força do preceito do n.º 2, do art.º 40º, do Código Penal, a medida da culpa, a qual desempenha o papel de limite inultrapassável de todas e quaisquer considerações preventivas.

52. Ora, no caso em análise, o douto acórdão decidiu dar preferência à pena privativa da liberdade, tendo fixado a pena de 9 anos de prisão, de acordo com os critérios definidos no art.º 71º, n.º 1, aplicável “ex vi” do art.º 47º, n.º 1, ambos do Código Penal, fundamentando para o efeito a elevada culpa do agente e as elevadas exigências de prevenção, quer geral, quer especial, atendendo ainda a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, constantes da matéria dada como provada depuseram contra o agente, nos termos do n.º 2 do citado art.º 71º.

53. Na nossa humilde opinião, nada mais errado – salvo o devido respeito por opinião contrária, que é muito – na medida em que a protecção dos bens jurídicos implica a utilização da pena como instrumento de prevenção geral, para manter e reforçar a confiança da comunidade na validade e na força de vigência das normas do Estado

na tutela de bens jurídicos e, assim, no ordenamento jurídico-penal (prevenção geral positiva ou de integração). Sendo certo que a prevenção geral negativa ou de intimidação da generalidade, apenas pode surgir como um efeito lateral da necessidade de tutela dos bens jurídicos.

54. Já a reintegração do agente na sociedade está ligada á prevenção especial ou individual, isto é, à ideia de que a pena é um instrumento de actuação preventiva sobre a pessoa do agente, com o fim de evitar que no futuro, ele cometa novos crimes, que reincida.

55. Aqui chegados, estamos em condições de averiguar se tal pena de 9 anos de prisão concretamente aplicada à arguida/recorrente se mostra efectivamente excessiva.

56. Ora, in casu, a culpa da arguida revestiu a forma grave – a de dolo directo – mas afirmou-se em todo o processo delitual no âmbito de uma circunstância exterior que lhe limitou a possibilidade de deixar de delinquir, pelo que tal factor deveria ter sido em conta pelo julgador e não o foi.

57. Assume particular relevância, também, a elevada ilicitude dos factos praticados pela arguida, face ao modo de execução e à gravidade das suas consequências.

58. Todavia, como já se disse antes, a arguida para todos os efeitos legais é primária, porquanto a única condenação que tem no registo criminal é de 2007, pela prática de um crime de falsificação, onde foi condenada numa pena de multa, pena esta já extinta pelo cumprimento. Acrescendo ainda que do teor dos autos resulta dado como provado, por força do vertido no relatório social, que a arguida/recorrente sofre de depressão sistemática, desde que teve as duas filhas, que sempre dependeu de terceiros para sobreviver, que tentou o suicídio quando se apercebeu da gravidade da sua actual situação, que depende de familiares para comer, dormir, vestir-se, pagar a água, a electricidade, o gás, etc,, recebendo o rendimento mínimo, situação que já existia durante a prática dos factos, e que basicamente esteve na origem da obtenção de rendimentos para a sua sobrevivência os quais provinham da actividade criminosa do seu companheiro, nas quais a arguida acabou por comparticipar devido à sua dependência de terceiros, como já se referiu.

59. Para além do facto de a arguida/recorrente ter duas filhas para “criar”, contar com o suporte dos familiares mais próximos, de estar consciente do mal que causou a terceiros e da gravidade dos factos cometidos, para além de estar disposta a aceitar quaisquer regras de conduta ou imposições que lhe venham a ser fixadas pelo tribunal para assim expiar a sua culpa e os seus crimes.

60. Deste modo, mal andou o Tribunal a quo ao aplicar à arguida/recorrente a pena de 9 anos de prisão.

61. Pois atentos todos os critérios legais anteriormente referidos, conjugados com a personalidade da arguida, as suas condições de vida, à sua conduta anterior e posterior à prática dos factos, às circunstâncias em que os mesmos foram cometidos, bem como ao teor do relatório social onde é emitido parecer no sentido de a sujeição da arguida a regras de conduta e/ou regime de prova é suficiente para a sua reintegração na sociedade, não se mostra adequada e proporcional a pena de 9 anos de prisão.

62. Assim sendo, a pena de 5 anos de prisão mostra-se a mais adequada e proporcional aos crimes cometidos pela arguida, na medida em que tal pena satisfaz de forma segura as elevadas exigências de prevenção geral, mas também as elevadas exigências de reintegração da arguida na sociedade – sendo certo que a lei, toda a doutrina e a maioria da nossa jurisprudência dá prevalência a este aspecto da reintegração do agente – atento o disposto nos artigos 40º, 70º e 71º, do Código Penal, com referência aos artigos 50º a 54º, do mesmo diploma legal.

63. Daí que face a todo o supra alegado, a situação sócio-economica e social da arguida/recorrente, o grau da sua culpa e ilicitude, conjugados com os princípios fundamentais da aplicação das penas, supra explanados, a mesma apenas deveria ser condenada na pena de prisão de 5 anos de prisão, suspensa na sua execução, com sujeição a regras de conduta e/ou regime de prova.

Termos em que, Vossas Excelências, Venerandos Conselheiros, acolhendo a motivação e conclusões que antecedem, sempre com o douto suprimento de V.Exas., revogando a decisão recorrida e absolvendo a recorrente, ou, assim não entendendo decidindo pela condenação da mesma em pena única nunca superior a 5 anos de prisão, suspensa na sua execução, ainda que sujeita a regras de conduta e/ou ao regime de prova, farão inteira e sã

JUSTIÇA


7. Respondeu o Ministério Público, dizendo:


«A arguida AA interpõe recurso do acórdão proferido em 11/09/2019 que, concedendo parcial provimento ao recurso interposto pelo Ministério Público, alterou a decisão do Tribunal Colectivo da … Secção do Juízo Central Criminal da comarca …, decidindo “modificar o acórdão recorrido, mantendo todas as penas parcelares mas fixando a pena única da arguida AA […] em nove anos de prisão”

Renovando os fundamentos do recurso interposto da decisão de primeira instância, pretende a recorrente a reapreciação de facto e de direito da decisão do Tribunal da Relação invocando que esta padece de

- Erro notório na apreciação da prova

- Insuficiência para a decisão da matéria de facto provada

- Nulidade do acórdão por falta de fundamentação

- Excesso da pena única imposta porquanto a sua conduta reveste a forma de crime continuado, pugnando pela sua redução e suspensão de execução

Não lhe assiste, porém, qualquer razão. Com efeito

O âmbito do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação (salvo os casos de conhecimento oficioso), transitando em julgado as questões nelas não contidas, e, por outro lado, os tribunais de recurso só podem apreciar as questões suscitadas pelas partes e decididas pelos tribunais inferiores.

Não obstante não poder ignorar, por constar do texto do Ac STJ de 10/04/2019, proferido neste mesmo processo, que

O certo é que invoca todos os vícios decisórios elencados no artº 410º, nº 2 do Código de Processo Penal, se bem que no rigor dos termos os não referencia à decisão ora sob recurso mas à decisão proferida em primeira instância.

Ora, o presente recurso tem por objecto o acórdão que reaprecia a decisão de 1ª instância e não esta directamente.

E é avaliando a bondade dessa reapreciação que, no âmbito dos poderes de cognição delimitados no artº 425º do Código de Processo Penal, o supra referido aresto do STJ de 10/04/2019, detectou a existência uma nulidade - insuficiência de fundamentação - no Acórdão desta Relação proferido em 13/06/2018

E mostra-se suprida tal nulidade por falta de fundamentação quanto à reapreciação dos motivos pelos quais se decidiu dar como provados os factos respeitantes à recorrente, nulidade prevista nos arts 379º, nº 1-) e 425º, nº 4 do Código de Processo Penal e declarada pelo Ac STJ de 10/04/2019, por mais minuciosa explicitação, efectuada ao longo de 13 páginas e concluída nos termos seguintes:

O texto do douto acórdão recorrido é absolutamente claro e demonstrativo do processo lógico que conduziu à decisão, inexistindo, pois, qualquer vício, insuficiência ou obscuridade.

Demonstrando a fundamentação decisória o processo de raciocínio que conduziu o juiz a proferir a decisão, isto é, para além da enumeração das razões de facto e de direito, contendo o exame crítico das provas, que consiste na sua descrição e no respectivo juízo de valor que elas oferecem em termos de suporte decisório, à luz do artº 127º do Código de Processo Penal, inexiste vício ou insuficiência.

O acórdão recorrido reapreciou a condenação da recorrente - cuja pena única agravou - nos seguintes termos (transcrição):

Invoca a arguida AA que o Tribunal a quo efectuou incorrecta qualificação jurídico-penal dos factos provados que, em seu entender, relevariam de uma única resolução criminosa ou constituiriam crime continuado, na acepção do artº 30º do Código Penal.

Contudo, esta é questão nova, não suscitada para apreciação do Tribunal recorrido, pelo que não poderá ser, agora, conhecida.

É esse o uniforme entendimento jurisprudencial, de que é exemplo o Ac TJ de 24/10/2012, proferido no Proc 2965/06.0TBLLE.E1, disponível em www.dgsi.pt

(…) IV -O recurso interposto de uma determinada decisão não pode abranger questões que não constam dessa mesma decisão. Assim, reafirma-se a jurisprudência do STJ no sentido de que os recursos se destinam a reexaminar decisões proferidas por jurisdição inferior e não obter decisões sobre questões novas, não colocadas perante aquelas jurisdições.(…)

De todo o modo, sempre se dirá que dos factos provados não emergem elementos que indiquem a existência, na conduta dos recorrentes, de uma única resolução criminosa ou de qualquer “solicitação exterior que diminua consideravelmente a culpa”.

A menos que se entendesse que a prática do mesmo tipo legal de crime, repetida ao longo do tempo, sempre relevaria da mesma originária intenção de delinquir.

É interpretação que a literalidade do artº 30º do Código Penal não comporta.

Nesse sentido, o Ac. TRE de 18-09-2012, disponível em www.dgsi.pt:

I. A regra constante no n.º 1 do artigo 30.º do Código Penal sofre as restrições resultantes do concurso legal, aparente ou impuro de crimes e do crime continuado.

II. O roubo pode definir-se como crime de furto qualificado em função do emprego de violência, física ou moral, contra a pessoa, ou a redução desta, por qualquer meio, à incapacidade de resistir. Trata-se de crime complexo, protegendo simultaneamente a liberdade individual e a propriedade.

III. Da factualidade assente no acórdão recorrido não resulta qualquer circunstância exógena ao Recorrente, enquanto agente de crimes de roubo, que permita concluir por uma diminuição considerável da culpa. A toxicodependência (quando ocorre) é situação endógena e evitável.

E porque o crime de roubo tutela bens jurídicos relativos à pessoa 'eminentemente pessoais', ocorre a previsão do n.º 3 do artigo 30.º do Código Penal. Ou seja, não é possível afirmar o crime continuado relativamente à prática de crimes de roubo.

E o mais recente Ac STJ de 24/09/2014, proferido no Proc 53/12.9JBLSB.L1.S1, disponível em “Sumários de Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça – Secções Criminais – Nº 201 – Setembro de 2014”, pronunciou-se igualmente nesse sentido:

Inexiste, pois, fundamento para a qualificação da actividade delituosa da arguida como crime continuado.

Sobre as finalidades da punição consignadas no artigo 40º, do Código Penal e sobre os critérios concretos a observar no doseamento da pena - artigo 71°, do mesmo Código -, como ensina o Professor Figueiredo Dias, em “Direito Penal”, Parte Geral, Tomo 1, Coimbra Editora, Y ed., pág. 84, “a pena concreta é limitada no seu máximo inultrapassável pela medida da culpa; dentro desse limite máximo ela é determinada no interior de uma moldura de prevenção geral de integração, cujo limite superior é oferecido pelo ponto óptimo de tutela dos bens jurídicos e cujo limite inferior é constituído pelas exigências mínimas de defesa do ordenamento jurídico; dentro desta moldura de prevenção geral de integração a medida da pena é encontrada em função das exigências de prevenção especial, em regra positiva ou de socialização, excepcionalmente negativa, de intimidação ou de segurança individuais”

Identicamente, Claus Roxin, sufragando a teoria da “margem de liberdade”, afirma que a pena concreta deve ser fixada entre um limite mínimo e um limite máximo, aquele já adequado à culpa, este ainda adequado à mesma culpa, intervindo, depois, dentro dos referidos limites, os demais fins das penas, isto é, os da prevenção geral e especial. ( “Culpabilidad y Prevencion en Derecho Penal”, Editorial Reus, Madrid 1981)

Porque assim é, face aos factos provados e à relativa responsabilidade da arguida/recorrente, tendo em conta os seus antecedentes criminais; a gravidade da sua actuação, em que releva a prolongada reiteração e a necessidade de sofrer um juízo forte de censura ético-retributiva que tenha em consideração a necessidade de actuar ao nível da prevenção especial

A ponderação das penas a ela aplicadas teve em consideração a culpa concreta e elas mostram-se adequadas à gravidade da sua actuação - isto é, ao número de crimes cometidos, às suas circunstâncias pessoais e à satisfação das necessidades de prevenção geral e especial que ilícitos desta natureza requerem.

A gravidade, objectiva e subjectiva, dos ilícitos praticados é elevada, acrescendo a relação de concurso entre eles.

Nos termos do art. 77º do Código Penal, se o agente tiver praticado vários crimes é condenado numa única pena, na determinação da qual são considerados os factos e a personalidade do agente, tendo como limite mínimo corresponde a mais elevada das penas parcelares concretamente aplicadas e como limite máximo a soma das mesmas.

Assim:

- a arguida AA, numa moldura penal de 3 anos a 39 anos, foi condenada na pena única de 9 anos de prisão, englobando as seguintes penas

parcelares:

• - 15 crimes de furto simples, previstos no artigo 203° nº 1 do CP, em 15 penas de 1 ano

de prisão;

• - 1 crime de furto qualificado, previsto nos artigos 203° n° 1 e 204° n2 2 al. a) do CP,

na pena de 3 anos de prisão;

• - 11 crimes de furto qualificado, previstos nos artigos 203°, n° 1 e 204° n° 1 al. a) do

CP, em 4 penas de 2 anos de prisão e 7 penas de 1 ano e 9 meses de prisão

A pena unitária de prisão imposta à arguida AA mostra-se graduada muito abaixo do ponto intermédio da moldura aplicável. E espelham terem sido adequadamente ponderados “em conjunto, os factos e a personalidade do agente”, ajustando-se à medida da sua culpa e reflectindo a sua concreta responsabilidade

O fenómeno criminal do furto e receptação de veículos automóveis, pela sua frequência, cria especial insegurança e alarme social, tornando ingentes acrescidas necessidades de prevenção, geral e especial.

É, por isso, adequado que a pena unitária satisfaça tais necessidades - tendo em atenção o grau de ilicitude da actuação, sua extensão em alargado período temporal, elevado número de furtos e avultadas vantagens com eles obtidas, intensidade do dolo, antecedentes criminais (ou sua ausência) de cada um dos intervenientes, confissão e arrependimento (ou sua ausência), as exigências de prevenção geral e especial

Neste sentido, a pena ora imposta é equilibrada, isto é, corresponde à concreta responsabilidade da arguida AA, justificando-se que a pena única imposta haja sido elevada por forma a reflectir a sua distinta culpa.

Nesse sentido, veja-se o Ac. STJ de 21/11/2012, in Proc 86/08.OGBOVR.P1.S1, disponível em www.dgsi.pt:

“Assim, com a fixação da pena conjunta se pretende sancionar o agente, não só pelos factos individualmente considerados, mas também e especialmente pelo respectivo conjunto, não como mero somatório de factos criminosos, mas enquanto revelador da dimensão e gravidade global do comportamento delituoso do agente, visto que a lei manda se considere e pondere, em conjunto, (e não unitariamente), os factos e a personalidade do agente.”

A reapreciação, efectuada pelo Tribunal da Relação no douto acórdão recorrido, da decisão condenatória em 1ª Instância não enferma de qualquer insuficiência, contradição ou erro na apreciação da prova ou na aplicação do direito.

Em suma, o acórdão recorrido não nos merece qualquer censura quanto à apreciação dos factos e aplicação do direito que redundaram nas penas impostas à arguida AA, com cuja dosimetria concordamos.


EM CONCLUSÃO:


I. A gravidade, objectiva e subjectiva, dos ilícitos praticados é elevada, acrescendo a relação de concurso entre eles, pelo que a pena é ajustada à culpa da arguida AA, ora recorrente, e satisfaz as necessidades de prevenção que o caso requer

II. O acórdão recorrido, agravando a pena unitária imposta à arguida AA, não enferma de qualquer insuficiência, contradição ou erro na apreciação da prova e fez correcta apreciação dos factos e interpretação do direito.»


8. Neste Supremo Tribunal, a Ex.ma Procuradora-Geral Adjunta emitiu o seguinte parecer:

1.     Do acórdão do TRP proferido em 11.09.2019, reformulado em função da nulidade apontada pelo acórdão do STJ de 10.04.2019, foi decidido julgar improcedente o recurso interposto pela arguida AA, e na procedência do recurso interposto pelo MºPº em sede de 1ª instância, foi decidido aumentar a medida da pena única aplicada à arguida AA de 6 Anos para 9 Anos de prisão.

2.      De tal acórdão interpõe a arguida AA recurso para o STJ, em 16.10.2019, com as conclusões de fls. 9980v, que aqui se dão por reproduzidas.

A recorrente pugna por decisão de absolvição e, em alternativa, pela aplicação de pena única não superior a 5 anos de prisão, suspensa na sua execução com regime de prova.

3.      A tal recurso respondeu com rigor o Magistrado do MºPº junto do TRP, equacionando e rebatendo com justeza as questões suscitadas pela recorrente, pronunciando-se pela improcedência global do recurso em causa.

4.      Nada obstando ao conhecimento do recurso, deverá o mesmo ser apreciado em sede de conferência, uma vez que não foi requerida a realização de audiência.

5.       Cumpre dizer que se acompanham os fundamentos aduzidos na citada resposta do MºPº, excepto quanto à medida da pena única fixada em 9 anos de prisão.

Assim, consideramos igualmente encontrar-se o acórdão do TRP de 11.09.2019, reformulado em função da nulidade apontada pelo acórdão do STJ de 10.04.2019, fundamentado com objectividade, particularmente de fls. 9929 a 9992 dos autos, que aqui se dá por reproduzido, em conformidade com o disposto no nº 2 do art. 374º do CPP, com a síntese conclusiva de fls. 9991 /9992, igualmente salientada na aludida Resposta do MºPº.  E considera-se igualmente não ocorrer no citado acórdão do TRP qualquer vício de decisão, mormente os alegados vícios previstos nas alíneas b) e c) do nº 2 do art. 410º do CPP.

Acompanham-se igualmente os fundamentos aduzidos na citada resposta, de fls. 9995v a 9996v, relativamente à questão nova, apenas suscitada em sede de recurso, de os factos ilícitos se subsumirem à previsão de prática de um crime de furto, na forma continuada.

Já no que concerne à medida da pena, aplicada pelo acórdão do TRP, recorde-se ter sido a arguida condenada, em sede de acórdão de 1ª instância, pela prática de:

- 15 crimes de furto simples, pp pelo art. 203 nº1 do CP, na pena parcelar de 1 anos de prisão, por cada um;

- 1 crime de furto qualificado, pp pelo art. 204 nº2-a) do CP, na pena parcelar de 3 anos de prisão;

- 11 crimes de furto qualificado, pp pelo art. 204º nº2-a), na pena parcelar de 2 anos de prisão, por quatro desses crimes; na pena parcelar de 1 ano e 9 meses, por cada sete de tais crimes.

Em cúmulo jurídico foi condenada na pena de 6 anos de prisão.

O acórdão do TRP, pelos fundamentos aduzidos a fls. 9993/9997, considerou justificar-se o aumento da pena única para 9 anos de prisão, “atenta a globalidade da conduta criminosa, o grande desvalor de uma actividade criminosa que se assemelhava já a uma “indústria”, às fortes exigências de prevenção geral e não despiciendas necessidades de prevenção especial”.  Considerou ainda o TRP  “ser muito elevada a culpa os arguidos, e muito censurável uma conduta desenvolvida ao longo de meses, revelando premeditação e planeamento, completo desinteresse pela situação das vítimas, número de crimes muito significativo, objectos de valor considerável, internacionalização da actividade, actuação maioritariamente à noite e em grupo”.

Ressalvado o respeito por opinião divergente, afigura-se ser de realçar averbar a arguida apenas uma condenação criminal, em 2007 (ou seja, há 13 anos), pela prática de um crime de falsificação, tendo sido condenada em pena de multa, já extinta pelo cumprimento.

E, atenta a imagem “global do facto”, estando em causa valores de ordem patrimonial, tendo a actividade delituosa decorrido entre os meses de Maio de 2013 a Janeiro de 2014, e atenta a personalidade da recorrente (de que o relatório social dá conta), não referindo o acórdão estar-se perante uma tendência criminosa relativamente à recorrente, antes se afigurando tratar-se de situação de pluriocasionalidade, considera-se estar contida nos limites da culpa e das necessidades de prevenção geral e especial, a aplicação de medida de pena única não superior a 7 anos e 6 meses de prisão.


9. Foi cumprido o disposto no artigo 417.º, n.º 2, do Código de Processo Penal, doravante CPP, nada mais tendo sido dito.


10. Com dispensa de vistos e realizada a conferência, cumpre decidir.



II – FUNDAMENTAÇÃO


1. Matéria de facto relativa aos dois arguidos recorrentes:


    «Factos provados


Outros factos relevantes para apreciação da matéria constante dos parágrafos 10.27) a 10.55):


10.56) Pelo menos os veículos mencionados nos antecedentes parágrafos 10.27), 10.32), 10.35), 10.40), 10.43), 10.45), 10.51) e 10.54) foram adquiridos, em circunstâncias e sob condições não concretamente apuradas, pelo arguido CC, sempre por valores inferiores aos do mercado, tendo sido levados para o aludido armazém sito na Rua …., em …, …, de que o arguido BB era arrendatário com vista ao seu desmantelamento por parte deste (que para o efeito solicitou a ajuda dos arguidos DD, EE e FF) mediante contrapartida económica não concretamente determinada;

10.57) Os arguidos CC e BB bem sabiam da proveniência ilícita de tais veículos, tendo agido com vista à posterior revenda dos componentes resultantes do desmantelamento dos veículos em apreço por montantes superiores aos despendidos na aquisição e desmantelamento dos mesmos, assim obtendo a correspondente vantagem pecuniária;

10.58) Os arguidos CC e BB agiram, pelo menos relativamente aos veículos mencionados nos parágrafos 10.27), 10.32), 10.35), 10.40), 10.43), 10.45), 10.51) e 10.54), de forma livre, voluntária e conscientemente, em conjugação de esforços e de intenções, visando obter as aludidas vantagens patrimoniais, não obstante bem saberem tais condutas são proibidas e punidas por lei;

10.59) Aquando da sua intercepção pelas autoridades policiais no dia 07/02/2014, o arguido CC tinha na sua posse € 4 720 (quatro mil setecentos e vinte euros) em numerário, composto por quarenta e uma notas de € 20, sessenta notas de € 50, cinco notas de € 100 e duas notas de € 200, do Banco Central Europeu, proveniente da actividade atrás descrita, quantia que lhe foi apreendida (cfr. o auto de apreensão de fls. 72 do aludido inquérito apenso n.º 160/14.3TAPRD).

(…)

5. Quanto aos factos constantes dos artigos 191.º a 385.º da acusação pública:

28 – Inquérito n.º 431/13.6… (veículo com a matrícula ...-...-DJ), apensado sob o n.º 39/11.0…-T:

Pelas 23 horas do dia 27/05/2013, na Rua …, …, a arguida AA e outros dois indivíduos cuja identidade não foi possível apurar, agindo em conjugação de esforços e de intenções, sem autorização e contra a vontade do seu legítimo proprietário, apropriaram-se do veículo ligeiro de mercadorias, da marca «Toyota», modelo «Hilux», com a matrícula ...-...-DJ, de valor não concretamente apurado mas sempre superior a uma unidade de conta (cento e dois euros), pertencente a GG;

No dia 29/05/2013, o veículo em referência foi recuperado por militares da Guarda Nacional Republicana junto a uma fábrica sita na Rua …, em …, …, …, com o canhão da fechadura forçado, sem a blindagem plástica que protege a coluna da direcção, que ficou aos pés do lugar do acompanhante do condutor, e ainda sem o dispositivo da «Via Verde» com que se encontrava equipado, tendo sido entregue ao seu legítimo proprietário (cfr. o aditamento e termo de entrega de fls. 6-7 e 8 do inquérito apenso n.º 39/11.0…-T; cfr., ainda, o relatório de inspecção de fls. 14-17 do mesmo apenso);

A arguida AA agiu livre, voluntária e conscientemente, em conjugação de esforços e de intenções com os indivíduos atrás aludidos, com o propósito de se apropriarem do referido veículo e posteriormente o venderem a troco de uma quantia monetária, o que não chegaram, contudo, a fazer, por razões alheias à sua vontade;

A arguida não ignorava que tais factos são proibidos e punidos por lei;

29 – Inquérito n.º 496/13.0… (veículo com a matrícula ...-...-JR), apensado sob o n.º 39/11.0…-P:

Pelas 21 horas e 30 minutos do dia 12/06/2013, na Rua …, em …, …, a arguida AA e outro indivíduo cuja identidade não se apurou, agindo em conjugação de esforços e de intenções, sem autorização e contra a vontade do seu legítimo proprietário, apropriaram-se do veículo ligeiro de mercadorias da marca «Toyota», modelo «Hilux», com a matrícula ...-...-JR, de valor não concretamente apurado, mas nunca inferior a € 1 500 (mil e quinhentos euros), pertencente a HH, bem como os documentos pessoais deste queixoso, tais como bilhete de identidade, carta de condução, caderneta de cheques do «Banco Santander Totta», cartão de contribuinte, pasta de apontamentos, agenda, documento único automóvel do veículo, chaves de várias casas onde o queixoso estava a efectuar obras e uma carteira contendo a quantia monetária de dez euros;

A arguida AA agiu livre, voluntária e conscientemente, em conjugação de esforços e de intenções com o indivíduo aludido, com o propósito de se apropriarem do referido veículo e posteriormente o venderem a troco de uma quantia monetária, o que fizeram, obtendo o correspondente proveito económico, que integraram nos seus patrimónios;

A arguida não ignorava que tais factos são proibidos e punidos por lei;

30 – Inquérito n.º 472/13.3… (veículo com a matrícula ...-...-MC), apensado sob o n.º 39/11.0…-O:

Pelas 03 horas e 55 minutos do dia 15/07/2013, na Rua …, em …, …, a arguida AA e outros três indivíduos cuja identidade não se apurou, actuando em conjugação de esforços e de intenções entre si, sem autorização e contra a vontade do seu legítimo proprietário, apropriaram-se do veículo da marca «Volkswagen», modelo «Golf TDi», com a matrícula ...-...-MC, de valor não concretamente apurado mas nunca inferior a € 3 000 (três mil euros), pertencente a II;

A arguida AA, bem como os indivíduos que a acompanhavam, agiram livre, voluntária e conscientemente, em conjugação de esforços e de intenções, com o propósito de se apropriarem do referido veículo para posteriormente o venderem, a troco de uma quantia monetária, o que fizeram, obtendo o correspondente proveito económico, que integraram nos seus patrimónios;

A arguida não ignorava que tais factos são proibidos e punidos por lei;

31 – Inquérito n.º 471/13.5… (veículo com a matrícula QX-...-...), apensado sob o n.º 39/11.0…-U:

Pelas 03 horas e 45 minutos do dia 15/07/2013, junto ao n.º … da Rua do …, em …, …, a arguida AA e outros três indivíduos cuja identidade não se apurou, actuando em conjugação de esforços e de intenções, sem autorização e contra a vontade do seu legítimo proprietário, apropriaram-se do veículo ligeiro de mercadorias, da marca «Bedford», modelo «TFR B4 HBY», com a matrícula QX-...-..., de valor não concretamente apurado, mas nunca inferior a € 1 500 (mil e quinhentos euros), pertencente a JJ, bem como de diversas ferramentas que se encontravam no interior da mesma viatura;

A arguida AA e os indivíduos já aludidos agiram livre, voluntária e conscientemente, em conjugação de esforços e de intenções, com o propósito de se apropriarem do referido veículo para posteriormente o venderem a troco de uma quantia monetária, como fizeram, obtendo o correspondente proveito económico, que integraram no seu património;

A arguida não ignorava que tais factos são proibidos e punidos por lei;

32 – Inquérito n.º 632/13.7… (veículo com a matrícula ...-...-HT), apensado sob o n.º 39/11.0…-Z:

Pelas 05 horas e 30 minutos do dia 20/07/2013, na Rua das …, junto ao n.º …, em …, …, a arguida AA e outros dois indivíduos cuja identidade não se apurou, actuando em conjugação de esforços e de intenções, sem autorização e contra a vontade do seu legítimo proprietário, apropriaram-se do veículo ligeiro de mercadorias, da marca «Opel», modelo «Campo», com a matrícula ...-...-HT, de valor não concretamente apurado mas nunca inferior a € 1 500 (mil e quinhentos euros), pertencente à sociedade «Ducatel, Produtos Químicos Têxteis, Lda.», aqui representada nos autos por KK;

O veículo em apreço acabou por ser encontrado no dia 24/07/2013, na Travessa …, em …, …, e entregue à queixosa acima identificada, após exame directo (cfr. o «aditamento» e o termo de entrega de fls. 6 e 9 do inquérito n.º 632/13.7…, apenso n.º 39/11.0…-Z);

A arguida AA e os dois aludidos indivíduos agiram livre, voluntária e conscientemente, em conjugação de esforços e de intenções, com o propósito de se apropriarem do referido veículo, como fizeram, com intenção de o venderem e embolsarem o respectivo preço, o que, porém, não chegaram a concretizar por razões alheias à sua vontade;

A arguida não ignorava que tais factos são proibidos e punidos por lei;

33 – Inquérito n.º 379/13.4… (veículo com a matrícula XO-...-...), apensado sob o n.º 39/11.0…-Q:

Pela 01 hora e 15 minutos do dia 14/08/2013, na Travessa …, em …, a arguida AA e dois outros indivíduos cuja identidade não se apurou, actuando em conjugação de esforços e de intenções, sem autorização e contra a vontade do seu legítimo proprietário, apropriaram-se do veículo ligeiro de mercadorias, da marca «Bedford», modelo «TFR 54 HSY», com a matrícula XO-...-..., de valor não concretamente apurado mas nunca inferior a € 4 000 (quatro mil euros), pertencente a LL, bem como de várias ferramentas eléctricas e manuais, nomeadamente três rebarbadoras, no valor de € 600 (seiscentos euros);

Posteriormente, a arguida e seus comparsas acabaram por entregar o veículo em apreço ao arguido MM, que sabia da origem do mesmo, a troco de uma quantia monetária não concretamente apurada mas manifestamente inferior ao respectivo valor de mercado, que integraram no seu património;

O arguido MM procedeu, então, ao desmantelamento do veículo em referência e à venda dos respectivos componentes, em circunstâncias não apuradas, obtendo o correspondente proveito económico, que integrou no seu património;

A arguida AA e os aludidos indivíduos agiram livre, voluntária e conscientemente, em conjugação de esforços e de intenções, com o propósito de se apropriarem do referido veículo e demais objectos que se encontravam no seu interior, para posteriormente o venderem a troco de uma quantia monetária, como fizeram, obtendo o correspondente proveito económico, que integraram no seu património;

O arguido MM agiu livre, voluntária e conscientemente, com intenção de obter vantagem patrimonial resultante da venda dos componentes do veículo ora em causa, que tinha adquirido nas condições aludidas;

Os referidos arguidos não ignoravam que as suas condutas são proibidas e punidas por lei;

34 – Inquérito n.º 441/13.3… (veículo com a matrícula ...-...-NM), apensado sob o n.º 39/11.0…-AI:

Pelas 03 horas do dia 14/08/2013, na Rua da …, em …, a arguida AA e dois outros indivíduos cuja identidade não se apurou, actuando em conjugação de esforços e de intenções, sem autorização e contra a vontade do seu legítimo proprietário, apropriaram-se do veículo da marca «Opel», modelo «Campo», com a matrícula …-…-NM, de valor não concretamente apurado, mas sempre superior a € 102 (cento e dois euros), pertencente a NN;

Posteriormente, a arguida e seus comparsas acabaram por entregar o veículo em apreço ao arguido MM, que sabia da origem do mesmo, a troco de uma quantia monetária não concretamente apurada mas manifestamente inferior ao respectivo valor de mercado, que integraram no seu património;

O arguido MM procedeu, então, ao desmantelamento do veículo em referência e à venda dos respectivos componentes, em circunstâncias não apuradas, obtendo o correspondente proveito económico, que integrou no seu património;

A arguida AA e os indivíduos aludidos agiram livre, voluntária e conscientemente, em conjugação de esforços e de intenções, com o propósito de se apropriarem do referido veículo para posteriormente o venderem a troco de uma quantia monetária, como fizeram, obtendo o correspondente proveito económico, que integraram no seu património;

O arguido MM agiu livre, voluntária e conscientemente, com intenção de obter vantagem patrimonial resultante da venda dos componentes do veículo ora em causa, que tinha adquirido nas condições aludidas;

Os referidos arguidos não ignoravam que as suas condutas são proibidas e punidas por lei;

35 – Inquérito n.º 353/13.0… (veículo com a matrícula ...-...-ZL), apensado sob o n.º 39/11.0…-BM:

Entre as 22 horas e as 22 horas e 15 minutos do dia 30/09/2013, na Rua …, em …, …, a arguida AA e outro indivíduo cuja identidade não se apurou, actuando em conjugação de esforços e de intenções, sem autorização e contra a vontade do seu legítimo proprietário, apropriaram-se do veículo ligeiro de mercadorias, da marca «Toyota», modelo «Hilux», com a matrícula ...-...-ZL, de valor não concretamente apurado mas nunca inferior a € 10 000 (dez mil euros), pertencente a OO, bem como dos documentos respeitantes ao veículo que se encontravam no seu interior, uma caderneta do «Montepio Geral» e um livro de cheques do «BPI», em nome do queixoso;

A arguida AA e o seu aludido comparsa agiram livre, voluntária e conscientemente, em conjugação de esforços e de intenções, com o propósito de se apropriarem do referido veículo para posteriormente o venderem a troco de uma quantia monetária, como fizeram, obtendo o correspondente proveito económico, que integraram no seu património;

A arguida não ignorava que tais factos são proibidos e punidos por lei;

36 – Inquérito n.º 878/13.8… (veículo com a matrícula ...-...-JP), apensado sob o n.º 39/11.0…-AF:

Pelas 18 horas e 30 minutos do dia 04/10/2013, na Avenida …, em …, …, a arguida AA e outro indivíduo cuja identidade se não apurou, actuando em conjugação de esforços e de intenções, sem autorização e contra a vontade do seu legítimo proprietário, apropriaram-se do veículo ligeiro de mercadorias da marca «Opel», modelo «Combo», com a matrícula ...-...-JP, de valor não concretamente apurado, mas nunca inferior a € 3 500 (três mil e quinhentos euros, pertencente a PP;

Posteriormente, a arguida e seu comparsa entregaram o veículo em apreço aos arguidos CC e BB, que sabiam da origem do mesmo, a troco de uma quantia monetária não concretamente apurada mas manifestamente inferior ao respectivo valor de mercado, que integraram no seu património;

Os arguidos CC e BB procederam então o desmantelamento do veículo em referência e à venda dos respectivos componentes, em circunstâncias não apuradas, obtendo o correspondente proveito económico, que integraram no seu património;

A arguida AA e o seu aludido comparsa agiram livre, voluntária e conscientemente, em conjugação de esforços e de intenções, com o propósito de se apropriarem do referido veículo para posteriormente o venderem a troco de uma quantia monetária, como fizeram, obtendo o correspondente proveito económico, que integraram no seu património;

Os arguidos CC e BB agiram livre, voluntária e conscientemente, com intenção de obter vantagem patrimonial resultante da venda dos componentes do veículo em referência, o que fizeram;

Todos os referidos arguidos não ignoravam que tais factos são proibidos e punidos por lei;

37 – Inquérito n.º 500/13.2… (veículo com a matrícula ...-...-TA), apensado sob o n.º 39/11.0…-K:

Pelas 14 horas do dia 10/10/2013, no Lugar …, …, …, a arguida AA e um indivíduo cuja identidade não se apurou, actuando em conjugação de esforços e de intenções, sem autorização e contra a vontade do seu legítimo proprietário, apropriaram-se do veículo ligeiro de mercadorias da marca «Toyota», modelo «Hilux», com a matrícula ...-...-TA, pertencente a QQ, bem como de documentos e um telemóvel da marca «Nokia», tudo de valor não concretamente apurado mas sempre superior a uma unidade de conta (cento e dois euros);

Posteriormente, a arguida e seu comparsa entregaram o veículo em apreço aos arguidos CC e BB, que sabiam da origem do mesmo, a troco de uma quantia monetária não concretamente apurada mas manifestamente inferior ao respectivo valor de mercado, que integraram no seu património;

Os arguidos CC e BB procederam então o desmantelamento do veículo em referência e à venda dos respectivos componentes, em circunstâncias não apuradas, obtendo o correspondente proveito económico, que integraram no seu património;

A arguida AA e o seu aludido comparsa agiram livre, voluntária e conscientemente, em conjugação de esforços e de intenções, com o propósito de se apropriarem do referido veículo para posteriormente o venderem a troco de uma quantia monetária, como fizeram, obtendo o correspondente proveito económico, que integraram no seu património;

Os arguidos CC e BB agiram livre, voluntária e conscientemente, com intenção de obter vantagem patrimonial resultante da venda dos componentes do veículo em referência, o que fizeram;

Todos os referidos arguidos não ignoravam que tais factos são proibidos e punidos por lei;

38 – Inquérito n.º 759/13.5… (veículo com a matrícula ...-...-LL), apensado sob o n.º 39/11.0…-N:

Pelas 16 horas do dia 14/10/2013, na Rua …, em …, …, a arguida AA e um indivíduo cuja identidade não se apurou, actuando em conjugação de esforços e de intenções, sem autorização e contra a vontade do seu legítimo proprietário, apropriaram-se do veículo da marca «Toyota», modelo «Hilux», com a matrícula ...-...-LL, de valor não concretamente apurado mas nunca inferior a € 6 000 (seis mil euros), pertencente à sociedade «Distribuidora de Gás Lousadense, Lda.», aqui representada por RR, e ainda várias máquinas relacionadas com a actividade da referida empresa, tudo no valor de € 3 500 (três mil e quinhentos euros), que se encontravam no interior da mesma viatura;

Posteriormente, a arguida e seu comparsa entregaram o veículo em apreço aos arguidos CC e BB, que sabiam da origem do mesmo, a troco de uma quantia monetária não concretamente apurada mas manifestamente inferior ao respectivo valor de mercado, que integraram no seu património;

Os arguidos CC e BB procederam então o desmantelamento do veículo em referência e à venda dos respectivos componentes, em circunstâncias não apuradas, obtendo o correspondente proveito económico, que integraram no seu património;

A arguida AA e o seu aludido comparsa agiram livre, voluntária e conscientemente, em conjugação de esforços e de intenções, com o propósito de se apropriarem do referido veículo para posteriormente o venderem a troco de uma quantia monetária, como fizeram, obtendo o correspondente proveito económico, que integraram no seu património;

Os arguidos CC e BB agiram livre, voluntária e conscientemente, com intenção de obter vantagem patrimonial resultante da venda dos componentes do veículo em referência, o que fizeram;

Todos os referidos arguidos não ignoravam que tais factos são proibidos e punidos por lei;

39 – Inquérito n.º 514/13.2… (veículo com a matrícula ...-...-EF), apensado sob o n.º 39/11.0…-I:

Pelas 12 horas e 45 minutos do dia 21/10/2013, na Rua …, em …, …, a arguida AA e outro indivíduo cuja identidade não se apurou, actuando em conjugação de esforços e de intenções, sem autorização e contra a vontade do seu legítimo proprietário, apropriaram-se do veículo da marca «Opel», modelo «Campo», com a matrícula ...-...-EF, de valor não concretamente apurado, mas nunca inferior a € 1 500 (mil e quinhentos euros), pertencente a SS;

Posteriormente, a arguida e seu comparsa entregaram o veículo em apreço aos arguidos CC e BB, que sabiam da origem do mesmo, a troco de uma quantia monetária não concretamente apurada mas manifestamente inferior ao respectivo valor de mercado, que integraram no seu património;

Os arguidos CC e BB procederam então o desmantelamento do veículo em referência e à venda dos respectivos componentes, em circunstâncias não apuradas, obtendo o correspondente proveito económico, que integraram no seu património;

A arguida AA e o seu aludido comparsa agiram livre, voluntária e conscientemente, em conjugação de esforços e de intenções, com o propósito de se apropriarem do referido veículo para posteriormente o venderem a troco de uma quantia monetária, como fizeram, obtendo o correspondente proveito económico, que integraram no seu património;

Os arguidos CC e BB agiram livre, voluntária e conscientemente, com intenção de obter vantagem patrimonial resultante da venda dos componentes do veículo em referência, o que fizeram;

Todos os referidos arguidos não ignoravam que tais factos são proibidos e punidos por lei;

40 – Inquérito n.º 1015/13.4… (veículo com a matrícula ...-...-SE), apensado sob o n.º 39/11.0…-X:

Pelas 12 horas e 40 minutos do dia 04/11/2013, na Rua …, em …, …, a arguida AA e outro indivíduo cuja identidade se não apurou, actuando em conjugação de esforços e de intenções, sem autorização e contra a vontade do seu legítimo proprietário, apropriaram-se do veículo da marca «Toyota», modelo «Hilux», com a matrícula ...-...-SE, de valor não concretamente apurado mas nunca inferior a € 3 000 (três mil euros), pertencente a TT;

Posteriormente, a arguida e seu comparsa entregaram o veículo em apreço aos arguidos CC e BB, que sabiam da origem do mesmo, a troco de uma quantia monetária não concretamente apurada mas manifestamente inferior ao respectivo valor de mercado, que integraram no seu património;

Os arguidos CC e BB procederam então o desmantelamento do veículo em referência e à venda dos respectivos componentes, em circunstâncias não apuradas, obtendo o correspondente proveito económico, que integraram no seu património;

A arguida AA e o seu aludido comparsa agiram livre, voluntária e conscientemente, em conjugação de esforços e de intenções, com o propósito de se apropriarem do referido veículo para posteriormente o venderem a troco de uma quantia monetária, como fizeram, obtendo o correspondente proveito económico, que integraram no seu património;

Os arguidos CC e BB agiram livre, voluntária e conscientemente, com intenção de obter vantagem patrimonial resultante da venda dos componentes do veículo em referência, o que fizeram;

Todos os referidos arguidos não ignoravam que tais factos são proibidos e punidos por lei;

41 – Inquérito n.º 803/13.6… (veículo com a matrícula ...-...-GH), apensado sob o n.º 39/11.0…-R:

Pelas 13 horas e 20 minutos do dia 04/11/2013, na Avenida …, em …, …, a arguida AA e outro indivíduo cuja identidade se não apurou, actuando em conjugação de esforços e de intenções, sem autorização e contra a vontade do seu legítimo proprietário, apropriaram-se do veículo da marca «Opel», modelo «Campo», com a matrícula ...-...-GH, de valor não concretamente apurado mas nunca inferior a € 6 000 (seis mil euros), pertencente a UU, aqui representado pela sua mãe, VV, mas que era habitualmente usado pelo pai deste, XX;

Posteriormente, a arguida e seu comparsa entregaram o veículo em apreço aos arguidos CC e BB, que sabiam da origem do mesmo, a troco de uma quantia monetária não concretamente apurada mas manifestamente inferior ao respectivo valor de mercado, que integraram no seu património;

Os arguidos CC e BB procederam então o desmantelamento do veículo em referência e à venda dos respectivos componentes, em circunstâncias não apuradas, obtendo o correspondente proveito económico, que integraram no seu património;

A arguida AA e o seu aludido comparsa agiram livre, voluntária e conscientemente, em conjugação de esforços e de intenções, com o propósito de se apropriarem do referido veículo para posteriormente o venderem a troco de uma quantia monetária, como fizeram, obtendo o correspondente proveito económico, que integraram no seu património;

Os arguidos CC e BB agiram livre, voluntária e conscientemente, com intenção de obter vantagem patrimonial resultante da venda dos componentes do veículo em referência, o que fizeram;

Todos os referidos arguidos não ignoravam que tais factos são proibidos e punidos por lei;

42 – Inquérito n.º 565/13.7… (veículo com a matrícula ...-...-UE), apensado sob o n.º 39/11.0…-AA:

Pelas 20 horas do dia 05/11/2013, na Rua …, em …, a arguida AA e pelo menos um outro indivíduo cuja identidade se não apurou, actuando em conjugação de esforços e de intenções, sem autorização e contra a vontade do seu legítimo proprietário, apropriaram-se do veículo da marca «Toyota», modelo «Hilux», com a matrícula ...-...-UE, de valor não concretamente apurado mas nunca inferior a € 10 000 (dez mil euros), pertencente à empresa «Sistavac, S. A.», aqui representada por ZZ;

Posteriormente, a arguida e seu aludido comparsa entregaram o veículo em apreço aos arguidos CC e BB, que sabiam da origem do mesmo, a troco de uma quantia monetária não concretamente apurada mas manifestamente inferior ao respectivo valor de mercado, que integraram no seu património;

Os arguidos CC e BB procederam então o desmantelamento do veículo em referência e à venda dos respectivos componentes, em circunstâncias não apuradas, obtendo o correspondente proveito económico, que integraram no seu património;

A arguida AA e o seu aludido comparsa agiram livre, voluntária e conscientemente, em conjugação de esforços e de intenções, com o propósito de se apropriarem do referido veículo para posteriormente o venderem a troco de uma quantia monetária, como fizeram, obtendo o correspondente proveito económico, que integraram no seu património;

Os arguidos CC e BB agiram livre, voluntária e conscientemente, com intenção de obter vantagem patrimonial resultante da venda dos componentes do veículo em referência, o que fizeram;

Todos os referidos arguidos não ignoravam que tais factos são proibidos e punidos por lei;

(…)

44 – Inquérito n.º 874/13.5… (veículo com a matrícula ...-...-HU), apensado sob o n.º 39/11.0…-S:

Pelas 22 horas e 10 minutos do dia 24/10/2013, na Avenida …, em …, a arguida AA e pelo menos um outro indivíduo cuja identidade se não apurou, actuando em conjugação de esforços e de intenções, sem autorização e contra a vontade do seu legítimo proprietário, apropriaram-se do veículo da marca «Opel», modelo «Campo», com a matrícula ...-...-HU, de valor não concretamente apurado, mas nunca inferior a € 5 000 (cinco mil euros), assim como dos documentos do veículo, pertencente a AAA;

Posteriormente, a arguida e seu aludido comparsa entregaram o veículo em apreço aos arguidos CC e BB, que sabiam da origem do mesmo, a troco de uma quantia monetária não concretamente apurada mas manifestamente inferior ao respectivo valor de mercado, que integraram no seu património;

Os arguidos CC e BB procederam então o desmantelamento do veículo em referência e à venda dos respectivos componentes, em circunstâncias não apuradas, obtendo o correspondente proveito económico, que integraram no seu património;

A arguida AA e o seu aludido comparsa agiram livre, voluntária e conscientemente, em conjugação de esforços e de intenções, com o propósito de se apropriarem do referido veículo para posteriormente o venderem a troco de uma quantia monetária, como fizeram, obtendo o correspondente proveito económico, que integraram no seu património;

Os arguidos CC e BB agiram livre, voluntária e conscientemente, com intenção de obter vantagem patrimonial resultante da venda dos componentes do veículo em referência, o que fizeram;

Todos os referidos arguidos não ignoravam que tais factos são proibidos e punidos por lei;

45 – Inquérito n.º 888/13…. (veículo com a matrícula ...-...-SQ), apensado sob o n.º 39/11.0…-AB:

Pelas 18 horas e 50 minutos do dia 29/10/2013, junto ao n.º … da Rua …, em …, …, a arguida AA e pelo menos um outro indivíduo cuja identidade se não apurou, actuando em conjugação de esforços e de intenções, sem autorização e contra a vontade do seu legítimo proprietário, apropriaram-se do veículo da marca «Toyota», modelo «Hilux», com a matrícula …-…-SQ, de valor não concretamente apurado mas não inferior a € 7 500 (sete mil e quinhentos euros), pertencente a AAA, assim como uma carteira que estava no interior do veículo contendo o seu bilhete de identidade, carta de condução e documentos do veículo;

Posteriormente, a arguida e seu aludido comparsa entregaram o veículo em apreço aos arguidos CC e BB, que sabiam da origem do mesmo, a troco de uma quantia monetária não concretamente apurada mas manifestamente inferior ao respectivo valor de mercado, que integraram no seu património;

Os arguidos CC e BB procederam então o desmantelamento do veículo em referência e à venda dos respectivos componentes, em circunstâncias não apuradas, obtendo o correspondente proveito económico, que integraram no seu património;

A arguida AA e o seu aludido comparsa agiram livre, voluntária e conscientemente, em conjugação de esforços e de intenções, com o propósito de se apropriarem do referido veículo para posteriormente o venderem a troco de uma quantia monetária, como fizeram, obtendo o correspondente proveito económico, que integraram no seu património;

Os arguidos CC e BB agiram livre, voluntária e conscientemente, com intenção de obter vantagem patrimonial resultante da venda dos componentes do veículo em referência, o que fizeram;

Todos os referidos arguidos não ignoravam que tais factos são proibidos e punidos por lei;

46 – Inquérito n.º 789/13.7… (veículo com a matrícula ...-...-MR), apensado sob o n.º 39/11.0…-M:

Pelas 16 horas e 20 minutos do dia 30/10/2013, num parque de estacionamento existente na Avenida …, em …, …, a arguida AA e pelo menos um outro indivíduo cuja identidade se não apurou, actuando em conjugação de esforços e de intenções, sem autorização e contra a vontade do seu legítimo proprietário, apropriaram-se do veículo da marca «Mitsubishi», modelo «L200», de valor não concretamente apurado mas nunca inferior a € 5 000 (cinco mil euros), com a matrícula ...-...-MR, bem como os documentos do veículo, pertencentes a CCC;

Posteriormente, a arguida e seu aludido comparsa entregaram o veículo em apreço aos arguidos CC e BB, que sabiam da origem do mesmo, a troco de uma quantia monetária não concretamente apurada mas manifestamente inferior ao respectivo valor de mercado, que integraram no seu património;

Os arguidos CC e BB procederam então o desmantelamento do veículo em referência e à venda dos respectivos componentes, em circunstâncias não apuradas, obtendo o correspondente proveito económico, que integraram no seu património;

A arguida AA e o seu aludido comparsa agiram livre, voluntária e conscientemente, em conjugação de esforços e de intenções, com o propósito de se apropriarem do referido veículo para posteriormente o venderem a troco de uma quantia monetária, como fizeram, obtendo o correspondente proveito económico, que integraram no seu património;

Os arguidos CC e BB agiram livre, voluntária e conscientemente, com intenção de obter vantagem patrimonial resultante da venda dos componentes do veículo em referência, o que fizeram;

Todos os referidos arguidos não ignoravam que tais factos são proibidos e punidos por lei;

47 – Inquérito n.º 369/13.7… (veículo com a matrícula ...-...-AD), apensado sob o n.º 39/11.0…-AD:

Pelas 16 horas e 45 minutos do dia 31/10/2013, na Rua …, em …, …, a arguida AA e pelo menos um outro indivíduo cuja identidade se não apurou, actuando em conjugação de esforços e de intenções, sem autorização e contra a vontade do seu legítimo proprietário, apropriaram-se do veículo da marca «Bedford», modelo «TFR 54 HSY», com a matrícula ...-...-AD, de valor não concretamente apurado mas nunca inferior a € 2 500 (dois mil e quinhentos euros), pertencente a DDD, assim como todos os documentos do mesmo, bilhete de identidade, carta de condução, cartão de utente, chaves da sua residência, comando do portão e um telemóvel com o n.º 96…63, no valor de € 60 (sessenta euros);

Posteriormente, a arguida e seu aludido comparsa entregaram o veículo em apreço aos arguidos CC e BB, que sabiam da origem do mesmo, a troco de uma quantia monetária não concretamente apurada mas manifestamente inferior ao respectivo valor de mercado, que integraram no seu património;

Os arguidos CC e BB procederam então o desmantelamento do veículo em referência e à venda dos respectivos componentes, em circunstâncias não apuradas, obtendo o correspondente proveito económico, que integraram no seu património;

A arguida AA e o seu aludido comparsa agiram livre, voluntária e conscientemente, em conjugação de esforços e de intenções, com o propósito de se apropriarem do referido veículo para posteriormente o venderem a troco de uma quantia monetária, como fizeram, obtendo o correspondente proveito económico, que integraram no seu património;

Os arguidos CC e BB agiram livre, voluntária e conscientemente, com intenção de obter vantagem patrimonial resultante da venda dos componentes do veículo em referência, o que fizeram;

Todos os referidos arguidos não ignoravam que tais factos são proibidos e punidos por lei;

48 – Inquérito n.º 537/13.1… (veículo com a matrícula ...-...-NA), apensado sob o n.º 39/11.0…-J:

Pelas 18 horas e 20 minutos do dia 06/11/2013, na Rua …, em …, …, quando EEE se deslocou a um estabelecimento, deixando a chave na respectiva ignição, a arguida AA e pelo menos um outro indivíduo cuja identidade se não apurou, actuando em conjugação de esforços e de intenções, sem autorização e contra a vontade do seu legítimo proprietário, apropriaram-se do veículo da marca «Opel», modelo «Campo», com a matrícula ...-...-NA, propriedade do referido queixoso, de valor não concretamente apurado mas sempre superior a uma unidade de conta (cento e dois euros), assim como dos seus documentos pessoais, tais como um cartão de crédito, um cartão de cidadão, a carta de condução, o certificado com a matrícula da viatura, sessenta euros e um projecto completo de uma obra, que se encontravam no interior do veículo;

Posteriormente, a arguida e seu aludido comparsa entregaram o veículo em apreço aos arguidos CC e BB, que sabiam da origem do mesmo, a troco de uma quantia monetária não concretamente apurada mas manifestamente inferior ao respectivo valor de mercado, que integraram no seu património;

Os arguidos CC e BB procederam então o desmantelamento do veículo em referência e à venda dos respectivos componentes, em circunstâncias não apuradas, obtendo o correspondente proveito económico, que integraram no seu património;

A arguida AA e o seu aludido comparsa agiram livre, voluntária e conscientemente, em conjugação de esforços e de intenções, com o propósito de se apropriarem do referido veículo para posteriormente o venderem a troco de uma quantia monetária, como fizeram, obtendo o correspondente proveito económico, que integraram no seu património;

Os arguidos CC e BB agiram livre, voluntária e conscientemente, com intenção de obter vantagem patrimonial resultante da venda dos componentes do veículo em referência, o que fizeram;

Todos os referidos arguidos não ignoravam que tais factos são proibidos e punidos por lei;

49 – Inquérito n.º 1252/13.1… (veículo com a matrícula ...-...-PG), apensado sob o n.º 39/11.0…-V:

Pelas 23 horas e 30 minutos do dia 11/11/2013, no Parque de estacionamento do restaurante «Leitão Assado J..P…», sito na Rua …, em …, …, a arguida AA e pelo menos um outro indivíduo cuja identidade se não apurou, actuando em conjugação de esforços e de intenções, sem autorização e contra a vontade do seu legítimo proprietário, apropriaram-se do veículo da marca «Toyota», modelo «Hilux», com a matrícula ...-...-PG, de valor não concretamente apurado mas nunca inferior a € 8 000 (oito mil euros), propriedade da sociedade «José Gadelho de Castro & Filhos, Lda.», com sede na Rua …, n.º …, em …, aqui representada por FFF, bem como doze leitões assados, no valor de € 1 200 (mil e duzentos euros), bem como todos os documentos do veículo, que se encontravam no seu interior;

Posteriormente, a arguida e seu aludido comparsa entregaram o veículo em apreço aos arguidos CC e BB, que sabiam da origem do mesmo, a troco de uma quantia monetária não concretamente apurada mas manifestamente inferior ao respectivo valor de mercado, que integraram no seu património;

Os arguidos CC e BB procederam então o desmantelamento do veículo em referência e à venda dos respectivos componentes, em circunstâncias não apuradas, obtendo o correspondente proveito económico, que integraram no seu património;

A arguida AA e o seu aludido comparsa agiram livre, voluntária e conscientemente, em conjugação de esforços e de intenções, com o propósito de se apropriarem do referido veículo para posteriormente o venderem a troco de uma quantia monetária, como fizeram, obtendo o correspondente proveito económico, que integraram no seu património;

Os arguidos CC e BB agiram livre, voluntária e conscientemente, com intenção de obter vantagem patrimonial resultante da venda dos componentes do veículo em referência, o que fizeram;

Todos os referidos arguidos não ignoravam que tais factos são proibidos e punidos por lei;

50 – Inquérito n.º 1258/13.0… (veículo com a matrícula XD-...-...), apensado sob o n.º 39/11.0…-W:

Pelas 21 horas e 50 minutos do dia 13/11/2013, na Travessa …, n.º …, em …, …, os arguidos AA e BB, acompanhados por um indivíduo cuja identidade não se apurou, actuando em conjugação de esforços e de intenções, sem autorização e contra a vontade do seu legítimo proprietário, apropriaram-se do veículo ligeiro de mercadorias, da marca «Bedford», modelo «TFR 52 HSY», com a matrícula XD-...-..., de valor não concretamente apurado mas não inferior a € 2 000 (dois mil euros), pertencente ao queixoso GGG;

Os aludidos arguidos agiram livre, voluntária e conscientemente, em conjugação de esforços e de intenções com o indivíduo aludido, com o propósito de se apropriarem do referido veículo e posteriormente o venderem a troco de uma quantia monetária, o que fizeram, obtendo o correspondente proveito económico, que integraram nos seus patrimónios;

Os arguidos não ignoravam que tais factos são proibidos e punidos por lei;

51 – Inquérito n.º 566/13.5… (veículo com a matrícula ...-...-EB), apensado sob o n.º 39/11.0…-AH:

Pelas 15 horas e 45 minutos do dia 19/11/2013, na Rua …, em …, a arguida AA e pelo menos um outro indivíduo cuja identidade se não apurou, actuando em conjugação de esforços e de intenções, sem autorização e contra a vontade do seu legítimo proprietário, apropriaram-se do veículo da marca «Opel», modelo «Campo», com a matrícula ...-...-EB, de valor não concretamente apurado mas superior a € 102 (cento e dois euros) e nunca mais do que € 5 000 (cinco mil euros) pertencente a HHH, contendo no seu interior os documentos do veículo e vários documentos pessoais, bem como uma espingarda de caça, de ar comprimido, classe D, livrete n.º 2…8, emitido em 19/09/2006 e o n.º de série AA1…12/AB13…6, que se encontrava no interior de um estojo, no valor de € 1 200 (mil e duzentos euros);

Posteriormente, a arguida e seu aludido comparsa entregaram o veículo em apreço aos arguidos CC e BB, que sabiam da origem do mesmo, a troco de uma quantia monetária não concretamente apurada mas manifestamente inferior ao respectivo valor de mercado, que integraram no seu património;

Os arguidos CC e BB procederam então o desmantelamento do veículo em referência e à venda dos respectivos componentes, em circunstâncias não apuradas, obtendo o correspondente proveito económico, que integraram no seu património;

A arguida AA e o seu aludido comparsa agiram livre, voluntária e conscientemente, em conjugação de esforços e de intenções, com o propósito de se apropriarem do referido veículo para posteriormente o venderem a troco de uma quantia monetária, como fizeram, obtendo o correspondente proveito económico, que integraram no seu património;

Os arguidos CC e BB agiram livre, voluntária e conscientemente, com intenção de obter vantagem patrimonial resultante da venda dos componentes do veículo em referência, o que fizeram;

Todos os referidos arguidos não ignoravam que tais factos são proibidos e punidos por lei;

52 – Inquérito n.º 967/13.9… (veículo com a matrícula ...-...-GH), apensado sob o n.º 39/11.0…-AK:

Pelas 21 horas e 40 minutos do dia 21/11/2013, na Avenida …, em …, os arguidos AA e BB, acompanhados por um indivíduo cuja identidade não se apurou, actuando em conjugação de esforços e de intenções, sem autorização e contra a vontade do seu legítimo proprietário, apropriaram-se do veículo ligeiro de mercadorias, da marca «Opel», modelo «Campo», com a matrícula ...-...-GH, de valor não concretamente apurado mas nunca inferior a € 5 000 (cinco mil euros), bem como dos documentos do veículo, pertencente a III;

Os aludidos arguidos agiram livre, voluntária e conscientemente, em conjugação de esforços e de intenções com o indivíduo aludido, com o propósito de se apropriarem do referido veículo e posteriormente o venderem a troco de uma quantia monetária, o que fizeram, obtendo o correspondente proveito económico, que integraram nos seus patrimónios;

Os arguidos não ignoravam que tais factos são proibidos e punidos por lei;

53 – Inquérito n.º 1147/13.9… (veículo com a matrícula ...-...-LH), apensado sob o n.º 39/11.0…F-BJ:

Pelas 17 horas e 48 minutos do dia 25/11/2013, na Avenida …, em …, …, o arguido BB, acompanhado por um indivíduo cuja identidade não se apurou, actuando em conjugação de esforços e de intenções, sem autorização e contra a vontade do seu legítimo proprietário, apropriaram-se do veículo ligeiro de mercadorias, da marca «Opel», modelo «Campo», com a matrícula ...-...-LH, de valor não concretamente apurado mas nunca inferior a € 4 000 (quatro mil euros), pertencente a JJJ;

O aludido arguido agiu livre, voluntária e conscientemente, em conjugação de esforços e de intenções com o indivíduo aludido, com o propósito de se apropriarem do referido veículo e posteriormente o venderem a troco de uma quantia monetária, o que fizeram, obtendo o correspondente proveito económico, que integraram nos seus patrimónios;

O arguido não ignorava que tais factos são proibidos e punidos por lei;

54 – Inquérito n.º 1190/13.8… (veículo com a matrícula ...-...-LN), apensado sob o n.º 39/11.0…-AZ:

Pelas 21 horas e 10 minutos do dia 25/11/2013, na Avenida …, em …, …, os arguidos AA e BB, acompanhados por um indivíduo cuja identidade não se apurou, actuando em conjugação de esforços e de intenções, sem autorização e contra a vontade do seu legítimo proprietário, apropriaram-se do veículo ligeiro de mercadorias, da marca «Mitsubishi», modelo «Canter», com a matrícula ...-...-LN, de valor não concretamente apurado mas nunca inferior a € 14 000 (catorze mil euros), propriedade de KKK, bem como dos documentos do veículo (documento único automóvel e carta verde) e uma máquina de planar madeira da marca «Rioby», de cor azul, no valor de € 250 (duzentos e cinquenta euros), e várias facturas;

Os aludidos arguidos agiram livre, voluntária e conscientemente, em conjugação de esforços e de intenções com o indivíduo aludido, com o propósito de se apropriarem do referido veículo e posteriormente o venderem a troco de uma quantia monetária, o que fizeram, obtendo o correspondente proveito económico, que integraram nos seus patrimónios;

Os arguidos não ignoravam que tais factos são proibidos e punidos por lei;

55 – Inquérito n.º 976/13.8… (veículo com a matrícula ...-...-NO), apensado sob o n.º 39/11.0…-AR:

Pelas 23 horas e 10 minutos do dia 25/11/2013, na Rua …, em …, …, os arguidos AA e BB, acompanhados por um indivíduo cuja identidade não se apurou, actuando em conjugação de esforços e de intenções, sem autorização e contra a vontade do seu legítimo proprietário, apropriaram-se do veículo ligeiro de mercadorias, da marca «Mitsubishi», modelo «L200», com a matrícula ...-...-NO, de valor não inferior a € 5 000 (cinco mil euros), propriedade de LLL;

Os aludidos arguidos agiram livre, voluntária e conscientemente, em conjugação de esforços e de intenções com o indivíduo aludido, com o propósito de se apropriarem do referido veículo e posteriormente o venderem a troco de uma quantia monetária, o que fizeram, obtendo o correspondente proveito económico, que integraram nos seus patrimónios;

Os arguidos não ignoravam que tais factos são proibidos e punidos por lei;

56 – Inquérito n.º 977/13.6… (veículo com a matrícula ...-...-NU), apensado sob o n.º 39/11.0…-BA:

Pelas 00 horas e 30 minutos do dia 26/11/2013, na Rua …, em …, …, os arguidos AA e BB, acompanhados por um indivíduo cuja identidade não se apurou, actuando em conjugação de esforços e de intenções, sem autorização e contra a vontade do seu legítimo proprietário, apropriaram-se do veículo ligeiro de mercadorias, da marca «Mitsubishi», modelo «Canter», com a matrícula ...-...-NU, de valor não concretamente apurado mas nunca inferior a € 5 000 (cinco mil euros), propriedade da sociedade «Divercol – Indústrias Químicas, Lda.», com sede na Rua …, n.º …, em …, aqui representada por MMM, bem como dos documentos do veículo e ainda da carga, composta pelas seguintes quantidades de tinta:


QuantidadeProdutoTotal
220 l «Diverfundo» APC Pre€ 67,40
120 l «Diverdur»» 548€ 40,30
220 l «Diverpur» Branco Mate€ 102,20
120 l «Divermovel» 580 Mate€ 41,30
120 l «Diverdur» 580€ 29,80
1201 kg Tela líquida tijolo RSS€ 211,20
305 kg Tela líquida branca RSS€ 241,50
601 kg Tela líquida branca€ 111,60
220 l «Cerapur» Alto Brilho Afinação€ 123,60
210 l «Diverdur» 690€ 33,88
120 l «Diverfundo» F450€ 34,90
110l «Diverdur» 450€ 35,30
120 l «Divermovel» 45580€ 38,30
120 l Velatura «Uni Wengue» escuro€ 34,50
10,75 l «Divercel» MIX€ 2,45
45 l Decapante tintas líquido€ 30,20
121 l «Decoplast» base TR€ 10, 68
60,25 l «Diverlux» 309€ 5,58
31 l esmalte acrílico 2135 € 7,95
1815 l Primária aquoso branco€ 244,80
5200 l Verniz preto p/ferro€ 908,10
620 l Diluente diluretano€ 123,00
120 l Velatura «UNI Wengue»€ 28,70
25 l Velatura «UNI Wengue»€ 14,70
25 l «Diverpur» TOP Mix € 26, 80
15 l «Diverpur» Mix€ 23,40
15 l Cola «Veta» KD 501€ 15,65
Total………….€ 2 631,74

Os aludidos arguidos agiram livre, voluntária e conscientemente, em conjugação de esforços e de intenções com o indivíduo aludido, com o propósito de se apropriarem do referido veículo e posteriormente o venderem a troco de uma quantia monetária, o que fizeram, obtendo o correspondente proveito económico, que integraram nos seus patrimónios;

Os arguidos não ignoravam que tais factos são proibidos e punidos por lei;

57 – Inquérito n.º 616/13.5 … (veículo com a matrícula ...-...-HV), apensado sob o n.º 39/11.0…-BE:

No dia 05/12/2013, pelas 09 horas, NNN apresentou, na Esquadra de … da Polícia de Segurança Pública, queixa contra desconhecidos pela alegada subtracção do veículo ligeiro de mercadorias da marca «Opel», modelo «Campo», com a matrícula ...-...-HV, que deu origem ao inquérito n.º 616/13.5…, que correu os seus termos pelos Serviços do Ministério Público de Valongo e foi oportunamente apensado aos presentes autos sob o n.º 39/11.0GAPNF-BE;

58 – Inquérito n.º 438/13.3… (veículo com a matrícula ...-...-QX), apensado sob o n.º 39/11.0….-BS:

Pelas 20 horas e 15 minutos do dia 09/12/2013, na Rua da …, em …, …, os arguidos AA e BB, acompanhados por um indivíduo cuja identidade não se apurou, actuando em conjugação de esforços e de intenções, sem autorização e contra a vontade do seu legítimo proprietário, apropriaram-se do veículo ligeiro de mercadorias, da marca «Mitsubishi», modelo «Canter», com a matrícula ...-...-QX, de valor não concretamente apurado mas nunca inferior a € 9 000 (nove mil euros), propriedade da sociedade «Eduardo Rocha Monteiro, C.ª, Lda.», aqui representada por OOO, bem como de todos os documentos do veículo e diverso material que estava no seu interior, designadamente um «GPS» da marca «Tomtom», de valor não concretamente apurado mas nunca inferior a € 150 euros, um porta-paletes de ferro no valor de € 250 (duzentos e cinquenta euros), diversa mercadoria, de valor não concretamente apurado mas não inferior a € 5 000 (cinco mil euros), e uma caixa de discos para introdução no tacógrafo do veículo, no valor de € 12 euros (doze euros);

Os aludidos arguidos agiram livre, voluntária e conscientemente, em conjugação de esforços e de intenções com o indivíduo aludido, com o propósito de se apropriarem do referido veículo e posteriormente o venderem a troco de uma quantia monetária, o que fizeram, obtendo o correspondente proveito económico, que integraram nos seus patrimónios;

Os arguidos não ignoravam que tais factos são proibidos e punidos por lei;

59 – Inquérito n.º 626/13.2… (veículo com a matrícula ...-...-QN), apensado sob o n.º 39/11.0…-BD:

Pelas 23 horas e 55 minutos do dia 10/12/2013, na Rua …, n.º …, em …, os arguidos AA e BB, acompanhados por um indivíduo cuja identidade não se apurou, actuando em conjugação de esforços e de intenções, sem autorização e contra a vontade do seu legítimo proprietário, apropriaram-se do veículo ligeiro de mercadorias, da marca «Mitsubishi», modelo «Canter», com a matrícula ...-...-QN, de valor não concretamente apurado mas nunca inferior a € 30 000 (trinta mil euros), propriedade de PPP, bem como de diversas peças de mobiliário no valor de € 21 000 (vinte e um mil euros), com que o mesmo veículo se encontrava carregado;

Os aludidos arguidos agiram livre, voluntária e conscientemente, em conjugação de esforços e de intenções com o indivíduo aludido, com o propósito de se apropriarem do referido veículo e posteriormente o venderem a troco de uma quantia monetária, o que fizeram, obtendo o correspondente proveito económico, que integraram nos seus patrimónios;

Os arguidos não ignoravam que tais factos são proibidos e punidos por lei;

60 – Inquérito n.º 879/13.6… (veículo com a matrícula ...-...-NA), apensado sob o n.º 39/11.0…-AQ:

Pelas 20 horas do dia 14/12/2013, na Rua …, …, o arguido BB, acompanhado por um indivíduo cuja identidade não se apurou, actuando em conjugação de esforços e de intenções, sem autorização e contra a vontade do seu legítimo proprietário, apropriaram-se do veículo ligeiro de mercadorias, da marca «Opel», modelo «Campo», com a matrícula …-…-NA, de valor não concretamente apurado mas nunca inferior a € 5 000 (cinco mil euros), pertencente a QQQ;

O aludido arguido agiu livre, voluntária e conscientemente, em conjugação de esforços e de intenções com o indivíduo aludido, com o propósito de se apropriarem do referido veículo e posteriormente o venderem a troco de uma quantia monetária, o que fizeram, obtendo o correspondente proveito económico, que integraram nos seus patrimónios;

O arguido não ignorava que tais factos são proibidos e punidos por lei;

61 – Inquérito n.º 633/13.5… (veículo com a matrícula ...-...-OJ), apensado sob o n.º 39/11.0…-BN:

Pelas 21 horas e 40 minutos do dia 14/12/2013, na Rua …, em …, o arguido BB, acompanhado por um indivíduo cuja identidade não se apurou, actuando em conjugação de esforços e de intenções, sem autorização e contra a vontade do seu legítimo proprietário, apropriaram-se do veículo ligeiro de mercadorias, da marca «Mitsubishi», modelo «L200», com a matrícula ...-...-OJ, no valor de € 7 500 (sete mil e quinhentos euros), pertencente a RRR;

O aludido arguido agiu livre, voluntária e conscientemente, em conjugação de esforços e de intenções com o indivíduo aludido, com o propósito de se apropriarem do referido veículo e posteriormente o venderem a troco de uma quantia monetária, o que fizeram, obtendo o correspondente proveito económico, que integraram nos seus patrimónios;

O arguido não ignorava que tais factos são proibidos e punidos por lei;

62 – Inquérito n.º 1/14.1… (veículo com a matrícula ...-...-PR), apensado sob o n.º 39/11.0…-BR:

Pelas 20 horas e 15 minutos do dia 03/01/2014, na Rua …, em …, …, os arguidos AA e BB, acompanhados por um indivíduo cuja identidade não se apurou, agindo em conjugação de esforços e de intenções, sem autorização e contra a vontade do seu legítimo proprietário, apropriaram-se do veículo ligeiro de mercadorias, da marca «Toyota», modelo «Hilux», com a matrícula ...-...-PR, de valor não concretamente apurado mas nunca inferior a € 4 000 (quatro mil euros), pertencente a SSS;

Os aludidos arguidos agiram livre, voluntária e conscientemente, em conjugação de esforços e de intenções com o indivíduo aludido, com o propósito de se apropriarem do referido veículo e posteriormente o venderem a troco de uma quantia monetária, o que fizeram, obtendo o correspondente proveito económico, que integraram nos seus patrimónios;

Os arguidos não ignoravam que tais factos são proibidos e punidos por lei;

63 – Inquérito n.º 5/14.4… (veículo com a matrícula ...-...-JC), apensado sob o n.º 39/11.0…-AY:

Pelas 22 horas e 20 minutos do dia 03/01/2014, na Rua …, em …, …, os arguidos AA e BB, acompanhados por um indivíduo cuja identidade não se apurou, actuando em conjugação de esforços e de intenções, sem autorização e contra a vontade do seu legítimo proprietário, apropriaram-se do veículo ligeiro de mercadorias, da marca «Mitsubishi», modelo «Canter», com a matrícula ...-...-JC, de valor não concretamente apurado mas nunca inferior a € 7 500 (sete mil e quinhentos euros), bem como dos seguintes artigos que se encontravam no interior de tal viatura:

i) Uma máquina de pipocas, no valor de € 2 000 (dois mil euros);

ii) Uma máquina de algodão doce, de valor não concretamente apurado mas nunca inferior a € 2 000 (dois mil euros);

iii) Dois geradores, no valor global de € 1 500 (mil e quinhentos euros);

iv) Uma arca frigorífica, no valor de € 300 (trezentos euros);

v) Um «pack» de guarda-sóis;

vi) Trezentas salsichas, dez quilos de batatas, uma caixa de cebolas e um garrafão de «ketchup» e outro de maionese, no valor global de € 300 (trezentos euros);

vii) Oito botijas de gás, no valor global de € 200 (duzentos euros);

viii) Uma botija de gás para criar pressão para extracção de cervejas, no valor de € 40 (quarenta euros);

ix) Quatro barris de cerveja da marca «Superbock», no valor global de € 200 (duzentos euros);

x) Uma televisão da marca desconhecida, no valor de € 100 (cem euros);

xi) Um forno da marca desconhecida, no valor de € 1 000 (mil euros);

xii) Dois carrinhos de mão, no valor global de € 300 (trezentos euros);

xiii) Um «pack» de balões, no valor de € 100 (cem euros);

xiv) Três embalagens de cerveja da marca «Superbock mini», no valor global de € 30 (trinta euros);

xv) Duas embalagens de garrafas de água «Penacova», no valor global de € 6 (seis euros);

xvi) Quarenta e sete garrafas de champanhe, da marca desconhecida, no valor global de € 100 (cem euros),

tudo propriedade de TTT;

Os aludidos arguidos agiram livre, voluntária e conscientemente, em conjugação de esforços e de intenções com o indivíduo aludido, com o propósito de se apropriarem do referido veículo e posteriormente o venderem a troco de uma quantia monetária, o que fizeram, obtendo o correspondente proveito económico, que integraram nos seus patrimónios;

Os arguidos não ignoravam que tais factos são proibidos e punidos por lei;

(…)

66 – Inquérito n.º 303/13.4… (veículo com a matrícula ...-...-JN), apensado sob o n.º 39/11.0…-AN:

Pelas 20 horas e 25 minutos do dia 08/04/2013, na Rua de …, em …, …, a arguida AA e um indivíduo cuja identidade não se apurou, agindo em conjugação de esforços e de intenções, sem autorização e contra a vontade do seu legítimo proprietário, apropriaram-se do veículo ligeiro de mercadorias da marca «Mitsubishi», modelo «L200», com a matrícula ...-...-JN, de valor não concretamente apurado mas nunca inferior a € 4 000 (quatro mil euros), propriedade de UUU, bem como dos documentos do (documento único do veículo e ficha de inspecção) e de várias máquinas utilizadas na construção civil, de valor não concretamente apurado mas nunca inferior a € 2 500 (dois mil e quinhentos euros), que se encontravam no interior da viatura;

A arguida agiu livre, voluntária e conscientemente, em conjugação de esforços e de intenções com o indivíduo aludido, com o propósito de se apropriarem do referido veículo e posteriormente o venderem a troco de uma quantia monetária, o que fizeram, obtendo o correspondente proveito económico, que integraram nos seus patrimónios;

A arguida não ignorava que tais factos são proibidos e punidos por lei;

67 – Inquérito n.º 362/13.0… (veículo com a matrícula ...-...-JC), apensado sob o n.º 39/11.0…-AL:

Pelas 22 horas e 45 minutos do dia 17/05/2013, na Rua da …, n.º …, em …, …, …, a arguida AA e pelo menos um outro indivíduo cuja identidade não se apurou, agindo em conjugação de esforços e de intenções, sem autorização e contra a vontade do seu legítimo proprietário, apropriaram-se do veículo ligeiro de mercadorias da marca «Mitsubishi», modelo «L200», com a matrícula …-…-JC, de valor não concretamente apurado mas nunca inferior a € 4 000 (quatro mil euros), bem como dos documentos do veículo que se encontravam no seu interior, pertencente a VVV;

A arguida agiu livre, voluntária e conscientemente, em conjugação de esforços e de intenções com o indivíduo aludido, com o propósito de se apropriarem do referido veículo e posteriormente o venderem a troco de uma quantia monetária, o que fizeram, obtendo o correspondente proveito económico, que integraram nos seus patrimónios;

A arguida não ignorava que tais factos são proibidos e punidos por lei;

68 – Inquérito n.º 3968/13.3… (veículo com a matrícula ...-...-TG), apensado sob o n.º 39/11.0…-BF:

Pelas 22 horas e 55 minutos do dia 16/05/2013, na Rua …, em …, …, a arguida AA e dois outros indivíduos cuja identidade não se apurou, agindo em conjugação de esforços e de intenções, sem autorização e contra a vontade do seu legítimo proprietário, apropriaram-se do veículo ligeiro de mercadorias da marca «Toyota», modelo «Hilux», com a matrícula ...-...-TG, de valor não concretamente apurado mas nunca inferior a € 5 000 (cinco mil euros), pertencente à sociedade «Orbitroad – Rent a Car, Lda.», aqui representada por XXX;

A arguida agiu livre, voluntária e conscientemente, em conjugação de esforços e de intenções com os indivíduos aludidos, com o propósito de se apropriarem do referido veículo e posteriormente o venderem a troco de uma quantia monetária, o que fizeram, obtendo o correspondente proveito económico, que integraram nos seus patrimónios;

A arguida não ignorava que tais factos são proibidos e punidos por lei;

69 – Inquérito n.º 748/13.0… (veículo com a matrícula ...-...-JO), apensado sob o n.º 39/11.0…-AG:

Pelas 03 horas dia 30/08/2013, na Rua …, em …, …, a arguida AA e dois outros indivíduos cuja identidade não se apurou, agindo em conjugação de esforços e de intenções, sem autorização e contra a vontade do seu legítimo proprietário, apropriaram-se do veículo ligeiro de mercadorias da marca «Opel», modelo «Campo», com a matrícula ...-...-JO, de valor não concretamente apurado mas nunca inferior a € 4 000 (quatro mil euros), pertencente a ZZZ;

A arguida agiu livre, voluntária e conscientemente, em conjugação de esforços e de intenções com os indivíduos aludidos, com o propósito de se apropriarem do referido veículo e posteriormente o venderem a troco de uma quantia monetária, o que fizeram, obtendo o correspondente proveito económico, que integraram nos seus patrimónios;

A arguida não ignorava que tais factos são proibidos e punidos por lei;

70 – Inquérito n.º 339/13.5… (veículo com a matrícula ...-...-NV), apensado sob o n.º 39/11.0…-AC:

Pelas 00 horas e 40 minutos do dia 24/09/2013, na Rua de …, em …, a arguida AA e dois outros indivíduos cuja identidade não se apurou, agindo em conjugação de esforços e de intenções, sem autorização e contra a vontade do seu legítimo proprietário, apropriaram-se do veículo ligeiro de mercadorias da marca «Toyota», modelo «Hilux», com a matrícula ...-...-NV, de valor não concretamente apurado mas nunca inferior a € 5 200 (cinco mil e duzentos euros), pertencente à sociedade «Fernando Alpoim Martins, Unipessoal, Lda.», com sede na Rua …, n.º …, …, em …, aqui representada por AAAA;

A arguida agiu livre, voluntária e conscientemente, em conjugação de esforços e de intenções com os indivíduos aludidos, com o propósito de se apropriarem do referido veículo e posteriormente o venderem a troco de uma quantia monetária, o que fizeram, obtendo o correspondente proveito económico, que integraram nos seus patrimónios;

A arguida não ignorava que tais factos são proibidos e punidos por lei;

(…)

Do relatório social relativo à arguida AA, elaborado pelos serviços de reinserção social por solicitação do Tribunal, que se encontra junto a fls. 5964/XIX e segs., refere-se, no que aqui interessa:

AA reside em …, …, com duas filhas, respectivamente com dezanove e catorze anos de idade, ambas estudantes, nascidas da relação matrimonial que terminou quando a arguida contava trinta e um anos de idade;

Habitam um apartamento de tipologia 3, arrendado, que lhes oferece adequadas condições de habitabilidade, sendo a dinâmica relacional do agregado descrita pela arguida como harmoniosa;

AA concluiu em idade escolar o 6.º ano de escolaridade e posteriormente em idade adulta o 9.º ano, tendo desenvolvido ao logo do tempo algumas actividades laborais, às quais não atribui grande significado;

Actualmente, encontra-se incapacitada para o trabalho, segundo a médica de família que a acompanha, na sequência do quadro depressivo que apresenta e que se tem vindo a agravar, desde o seu confronto com o presente processo, tendo, segundo a própria, efectuado uma tentativa de suicídio, encontrando-se a efectuar tratamento psiquiátrico;

A arguida refere que na sequência do nascimento das filhas sofreu de depressão pós-parto, denotando desde então alguma vulnerabilidade, em termos psico-afetivos, apresentando em períodos que avalia de maior pressão, sintomatologia depressiva;

Em termos de situação económica, refere que a manutenção do agregado, é assegurada através do valor que recebe no âmbito do programa do rendimento social de inserção (€ 323,18), de que beneficia desde Maio de 2015, abono de família das filhas (€ 89) e pensão de alimentos paga pelo progenitor da filha mais nova (€ 75);

Beneficia ainda mensalmente, de um cabaz de alimentos atribuído pelo banco alimentar;

Como despesa fixa de maior significado refere o valor de € 380 relativos ao arrendamento da casa, que, segundo a própria, paga com a ajuda da mãe, sendo a situação económica avaliada, face aos recursos disponíveis, como deficitária, não obstante, a própria referir que está assegurada a satisfação das necessidades básicas do agregado, devido ao apoio prestado pela progenitora;

O quotidiano da arguida é habitualmente passado em casa, onde se ocupa com a organização doméstica, ou em casa dos progenitores;

No período a que se reportam os factos de que se encontra acusada, subjacentes ao presente processo, AA, residia com o companheiro, BBBB, seu co-arguido, inicialmente numa casa que era propriedade deste em …, … e a partir de Novembro de 2012 na actual residência;

Segundo a própria, iniciaram relacionamento afectivo no final de 2011, por volta da passagem de ano, e em Março/Abril seguinte, passaram a viver em união de facto;

Na época nem ela nem o companheiro desenvolviam qualquer actividade profissional, sendo sua convicção que o companheiro fazia trabalhos esporádicos, uma vez que saía às vezes, dizendo que ia trabalhar;

A arguida referiu desconhecer concretamente em que sector, referindo, ser através do rendimento obtido desta forma, que assegurava a manutenção do agregado;

Após a mudança para a actual residência o companheiro, passou a explorar uma oficina, embora, segundo a arguida, fosse escasso o seu movimento, encontrando-se por vezes fechada;

A própria continuava a não desenvolver actividade laboral, ocupando-se com a organização doméstica;

O relacionamento do casal durou até Abril de 2014, altura em que ela tomou conhecimento que ele mantinha um relacionamento paralelo, não tendo desde então estabelecido qualquer contacto com ele, referindo desconhecer o seu paradeiro;

Quer em …, quer na actual área de residência, a arguida não tinha/tem qualquer rede social de convívio, encontrando-se as suas relações praticamente restritas à família nuclear e de origem, mantendo com a vizinhança apenas relações de cordialidade;

AA avalia como muito significativo o impacto que a instauração dos presentes autos teve para si, mostrando-se muito angustiada e receosa com o desfecho da sua actual situação jurídica;

A família desconhece os contornos da situação jurídico-penal em que se encontra envolvida, mostrando-se contudo atentos e colaborantes, por associarem o seu mal-estar ao quadro depressivo que apresenta, fundamentado na sintomatologia que apresenta e diagnóstico do médico particular, e que refere não saber no momento identificar, a quem recorreu, também com a ajuda da progenitora;

AA não se revê na prática dos factos de que se encontra acusada;

Não obstante, reconhece, em abstracto, a ilicitude dos factos de que se encontra acusada nos presentes autos, revelando capacidade para reconhecer a sua gravidade e o dano causado, mostrando-se disponível para o cumprimento de uma medida na comunidade, caso venha a sofrer uma condenação;

AA vem apresentando um estilo de vida centrado nas relações familiares e organização doméstica, sem enquadramento laboral, o que a coloca numa posição de dependência de terceiros, quer a nível familiar quer do sistema de apoio social;

Actualmente apresenta um quadro clinico, traduzido em forte instabilidade psico-afetiva, que vem tentando controlar através de acompanhamento clínico, contando com o apoio da família;

Apesar de não se rever na prática dos factos de que se encontra acusada no presente processo, apresenta raciocínio/sentido crítico e de valorização deste processo, assumindo uma atitude de total colaboração com o sistema de justiça penal no caso de eventual cumprimento de uma medida na comunidade;

Face ao descrito, somos de parecer que AA apresenta condições para a execução de medida a cumprir na comunidade, devendo investir na obtenção de colocação laboral estável e fazer prova da convencionalidade do seu quotidiano;

Do certificado de registo criminal relativo à arguida AA, junto a fls. 6127/XIX, consta ter ela sido condenada, no âmbito do processo comum (tribunal singular) com o n.º 369/07.6…, do extinto Tribunal Judicial da Comarca de …, por decisão proferida em 17/02/2011, transitada em julgado em 18/11/2011, e pela prática, em 01/06/2007, de um crime de falsificação de documentos, p. e p. pelo artigo 199.º da Lei Orgânica n.º 1/2001, de 14 de agosto, na pena de 150 dias de multa, à taxa diária de € 5, entretanto extinta pelo respectivo cumprimento;

(…)


Pese embora os esforços desenvolvidos pelos serviços de reinserção social, não foi possível elaborar relatório social relativo ao arguido BB;

Do certificado de registo criminal relativo ao arguido BB, junto a fls. 6145/XIX, nada consta;


2. Âmbito dos recursos


O âmbito do recurso delimita-se pelas conclusões da motivação do(s) recorrente(s) (artigos 402.º, 403.º e 412.º, do CPP), sem prejuízo dos poderes de conhecimento oficioso do tribunal ad quem quanto a vícios da decisão recorrida e a nulidades não sanadas, nos termos do artigo 410.º, n.os 2 e 3, do CPP (cf. AFJ 7/95, DR 298/1995, Série I-A, 28-12-1995).

           

    O arguido BB, vem recorrer por entender que a pena única que lhe foi aplicada é desproporcionada, não devendo ultrapassar os cinco (5) anos e suspensa na sua execução.

           

   A arguida AA, reeditando as conclusões formuladas no primeiro recurso que interpôs:

     - Alega que a decisão proferida padece da nulidade prevista nos artigos 374.º, n.º 2 e 379.º, n.º 1, alínea a), do CPP porque, na sínteses efectuada no acórdão recorrido, não contém factos provados que possam integrar os tipos de crime, mas apenas conclusões e conceitos jurídicos, não permitindo apreender a concreta actuação nem o grau de comparticipação e ainda porque a motivação dos factos é insuficiente, uma vez que o tribunal fundamentou o primeiro crime apenas com base em indícios e todos os outros por extrapolação;

       - Verifica-se o vício de insuficiência para a decisão da matéria de facto provada - artigo 410º, nº 2, alínea a), do CPP;

        - Verifica-se também o vício de erro notório na apreciação da prova - artigo 410º, nº 2, alínea c), do CPP;

        - A acusação é manifestamente infundada e deveria ter sito rejeitada nos termos do artigo 311º nº 3, alínea b), do CPP;

        - As penas parcelares e única são exageradas e injustas, dado que o tribunal não valorou o tempo decorrido desde os crimes nem a boa conduta – a pena única não deve ser superior a 3 anos de prisão, com execução suspensa.


      Como se afirmou no acórdão deste Supremo Tribunal proferido nestes autos, nos termos do artigo 434.º, do CPP, o recurso interposto para o Supremo Tribunal de Justiça visa exclusivamente o reexame de matéria de direito, sem prejuízo do disposto nos n.os 2 e 3 do artigo 410.º.

      A limitação do recurso para o Supremo Tribunal de Justiça ao reexame da matéria de direito não impede, assim, este Tribunal de conhecer oficiosamente dos vícios da decisão recorrida a que se refere o n.º 2 do artigo 410.º do CPP, se eles resultarem do texto da decisão recorrida, por si só ou em conjugação com as regras da experiência, se a sua sanação se revelar necessária à boa aplicação do direito.

       É pacífica, hoje em dia, a jurisprudência deste Supremo Tribunal no sentido de que, no recurso para si interposto, o recorrente não pode invocar os vícios do n.º 2 do artigo 410.º do CPP, sem embargo de deles poder/dever conhecer oficiosamente o STJ sempre que constate, através da análise do texto da decisão recorrida, por si ou conjugada com as regras da experiência comum: (a) ocorrer insuficiência para a decisão da matéria de facto provada; (b) existir contradição insanável da fundamentação ou entre a fundamentação e a decisão; (c) ter havido erro notório na apreciação da prova (nesse sentido (cf., entre outros, o acórdão do STJ de 27-02-2013 proferido no processo n.º 36/06.8YRLSB.S1 - 3.ª Secção[3], e de 14-02-2013, proferido no processo n.º 350/00.6JACHV.P1.S1 - 5.ª Secção[4]. Trata-se de vícios da decisão, revelados no texto da decisão e a partir dele e não de erros de julgamento da matéria de facto, nomeadamente de apreciação das provas, cujo conhecimento se encontra subtraído ao Supremo Tribunal de Justiça.


    Acresce que o conhecimento do recurso implica que, no âmbito da sua competência, este Supremo Tribunal aprecie e decida, oficiosamente ou a pedido do recorrente, todas as questões de direito relacionadas com o objecto e âmbito do recurso, com vista à boa decisão deste, incluindo as nulidades da decisão recorrida, as quais, sendo admissível recurso, nele devem ser arguidas, sem prejuízo daqueles poderes de conhecimento oficioso, nos termos do artigo 379.º, n.º 2, do CPP, aplicável ex vi artigo 425.º, n.º 4, do mesmo Diploma.

           

      Sendo que, de acordo com o disposto no artigo o 608.º do Código de Processo Civil (CPC), aplicável ex vi artigo 4.º, do CPP, dever-se-á começar pela apreciação das questões suscitadas pelos sujeitos processuais, bem como das que o tribunal deva oficiosamente conhecer, susceptíveis de obstar ao conhecimento de mérito


3. Apreciação


Iniciando o conhecimento das questões suscitadas, e perante o acórdão proferido pela Relação do Porto na sequência da prolação do acórdão deste Supremo Tribunal, supra referido, vejamos se se verifica a nulidade da falta de fundamentação invocada pela recorrente AA.


3.1. Da nulidade da decisão


No acórdão deste Supremo Tribunal de 10 de Abril de 2019 foi deliberado, «nos termos do artigo 379.º, n.º 1, alínea a), correspondentemente aplicável ex vi artigo 425.º, n.º 4, do CPP, julgar verificada a nulidade de fundamentação do acórdão recorrido, devendo em consequência ser proferido novo acórdão pelo Tribunal da Relação para suprimento da mesma».

Considerou-se então que quanto à questão suscitada pela recorrente da eventual existência de nulidade por falta de fundamentação:

«[…] respondeu o acórdão recorrido [do Tribunal da Relação do Porto] descrevendo o regime legal aplicável, mencionando e transcrevendo um conjunto de indicações doutrinárias e jurisprudenciais e concluindo que o acórdão de 1.ª instância não enferma de qualquer nulidade por falta de fundamentação».

     O certo é que, não obstante tal conclusão, o Tribunal da Relação não rebate todos os argumentos invocados pela recorrente, no recurso que esta apresentou e que constam das conclusões aí apresentadas, designadamente o de que o tribunal de 1.ª instância se limitou «a fundamentar a sua convicção quanto à prática de todos os crimes (cfr. 81) da motivação) remetendo para a sua convicção quanto ao primeiro deles (o do parágrafo 28-, 10.79)», bem como o de que o tribunal de 1.ª instância se limitou «a extrair uma convicção generalista partindo de dois episódios que tiveram escutas e seguimento policial».

     Resulta, assim, que o Tribunal da Relação, apreciando a nulidade invocada, não se pronunciou fundamentadamente sobre a concreta questão colocada pela recorrente, o que, para além do mais, se lhe impunha oficiosamente.

      O acórdão recorrido adoptou a fundamentação do acórdão da 1.ª instância mas não explica os motivos pelos quais decide dar como provados os factos respeitantes à recorrente [excepção feita à factualidade constante do ponto facto 10.79)], sendo que o mero elenco dos meios probatórios, sem qualquer leitura articulada dos mesmos que reflicta o raciocínio lógico seguido e que permita entender os motivos que levaram a considerar provados tais factos, não é claramente suficiente para que se mostre cumprido o dever de fundamentação.

      Quer o acórdão da 1.ª instância, quer o acórdão recorrido apenas cumpriram tal dever quanto à factualidade constante do ponto 10.79), sendo a análise crítica da prova quanto aos restantes factos provados manifestamente insuficiente/deficiente, não estando demonstradas as razões pelas quais as instâncias consideraram provados a quase totalidade dos factos provados (excepção feita aos referidos no ponto 10.79), de modo a poder considerar-se cumprido o dever de fundamentação, entendido nos termos acima expostos.

      Assim sendo, forçoso se impõe concluir que, nesta parte, o acórdão recorrido se mostra ferido de nulidade por falta de fundamentação, nos termos do artigo 379.º, n.º 1, alínea a), do CPP, correspondentemente aplicável ex vi artigo 425.º, n.º 4, do mesmo Código, a qual, devendo ser declarada, não pode ser suprida por este Tribunal, por respeitar a matéria de facto subtraída à sua competência.


       Em consequência, deverá ser proferido novo acórdão pelo tribunal recorrido tendo em vista o suprimento desta nulidade […]».


       Reeditando a recorrente AA, como já se disse, a arguição da nulidade que invocara no recurso primeiramente interposto, cumpre apurar se o Tribunal da Relação, no seu acórdão de 11 de Setembro de 2019, proferido na sequência da anulação da anterior decisão, supriu eficazmente a nulidade que fora declarada.


Neste âmbito, afirma-se no acórdão sob recurso:

«[…]

A recorrente AA tinha invocado no recurso que a decisão de primeira instância é nula por falta de fundamentação e no nosso anterior acórdão julgámos essa arguição improcedente. No entanto, o Supremo Tribunal de Justiça decidiu que não foram rebatidos todos os argumentos invocados pela recorrente, “designadamente o de que o tribunal de 1ª instância se limitou a «fundamentar a sua convicção quanto à prática de todos os crimes (cfr. 81) da motivação) remetendo para a sua convicção quanto ao primeiro deles (o do parágrafo 28-, 10.79)», bem como o de que o tribunal de 1ª instância se limitou «a extrair uma convicção generalista partindo de dois episódios que tiveram escutas e seguimento policial»”.

É pois esta nulidade que passamos a suprir, explicitando, agora de forma mais completa, as razões porque consideramos que a fundamentação da matéria de facto do acórdão de primeira instância não é nula e porque, em consequência, não sufragamos os argumentos do recurso, segundo os quais, em suma, o tribunal se limitou a remeter para a convicção que tinha formado quanto ao primeiro crime e extraiu uma convicção generalista partindo de dois episódios que tiveram escutas e seguimento policial.

Os factos provados que estão em causa são os seguintes (correspondendo cada grupo à apropriação de um veículo automóvel, no local e data indicados nos respectivos factos):

28) 10.79-10.82: ...-...-DJ, 27mai13;

29) 10.83-10.85: ...-...-JR, 12jun13;

30) 10-86-10.88: ...-...-MC, 15jul13;

31) 10.89-10.91: QX-...-..., 15jul13;

32) 10.92-10.95: …-…-H/, 20jul13;

33) 10.96-10.101: XO-...-..., 14ago13;

34) 10.102-10.107: ...-...-NM, 14ago13;

35) 10.108-10.110: ...-...-ZL, 30set13;

36) 10.111-10.116: ...-...-JP, 4out13;

37) 10.117-10.122: ...-...-TA, 10out13;

38) 10.123-10.128: ...-...-LL, 14out13;

39) 10.129-10.134: ...-...-EF, 21out13;

40) 10.135-10.140: ...-...-SE, 4nov13;

41) 10.141-10.146: ...-...-GH, 4nov13;

42) 10.147-10.152: ...-...-UE, 5nov13;

44) 10.154-10.159: ...-...-HU, 24out13;

45) 10.160-10.165: ...-...-SQ, 29out13;

46) 10.166-10.171: ...-...-MR, 30out13;

47) 10.172-10.177: ...-...-AD, 31out13;

48) 10.178-10.183: ...-...-NA, 6nov13;

49) 10.184-10.189: ...-...-PG, 11nov13;

50) 10.190-10.192: XD-...-..., 13nov13;

51) 10.193-10.198: ...-...-EB, 19nov13;

52) 10.199-10.201: ...-...-GH, 21nov13;

54) 10.205-10.207: ...-...-LN, 25nov13;

55) 10.208-10.210: ...-...-NO, 25nov13;

56) 10.211-10.213: ...-...-NU, 26nov13;

58) 10.215-10.217: ...-...-QX, 9dez13;

59) 10.218-10.220: ...-...-QN, 10dez13;

62) 10.227-10.229: ...-...-PR, 3jan14;

63) 10.230-10.232: ...-...-JC, 3jan14;

66) 10.237-10.239: ...-...-JN, 8ab13;

67) 10.240-10.242: …-…-JC, 17mai13;

68) 10.243-10-245: ...-...-TG, 16mai13;

69) 10.246-10.248: …-…-JE, 30ago13;

70) 10.249-10.251: ...-...-NV, 24set13.

Como fundamentou o tribunal de primeira instância a sua convicção para julgar estes factos provados?

No que respeita às características e valor dos veículos subtraídos e dos objectos existentes no seu interior, posterior recuperação, estado em que se encontravam e entrega aos proprietários (quando houve), como decorre expressamente dos parágrafos 33, 33.5 e 33.6 da fundamentação da matéria de facto, o tribunal teve em conta os depoimentos das testemunhas indicadas naqueles factos, a saber: GG (10.79), HH (10.83), II (10.86), JJ (10.89), KK (10.92), LL (10.96), NN (10.102), OO (10.108), PP (10.111), QQ (10.117), RR (10.123), SS (10.129), TT (10.135), VV e XX (10.141), ZZ (10.147), AA (10.154), AAA (10.160), CCC (10.166), DDD (10.172), EEE (10.178), FFF (10.184), GGG (10.190), HHH (10.193), III (10.199), JJJ (10.202), KKK (10.205), LLL (10.208), MMM (10.211), OOO (10.215), PPP (10.218), SSS (10.227), TTT (10.230), UUU (10.237), VVV (10.240), XXX (10.243), ZZZ (10.246) e AAAA (10.249).

As razões que levaram o tribunal a dar credibilidade aos depoimentos dessas testemunhas, sem necessidade de, a propósito de cada um, fazer um resumo fastidioso do que disseram, são as que constam expressamente nos parágrafos 15 a 18 da fundamentação da matéria de facto.

No que respeita ao valor dos objectos elencados nos parágrafos 10.147 e 10.211, para além dos depoimentos das testemunhas ZZ e MMM, o tribunal valorou ainda os documentos de fls. 4677-4678/XVI e 4703 a 4710/XVI, como expressamente referido nos parágrafos 50 e 51 da fundamentação da matéria de facto.

No nosso anterior acórdão anulado já tínhamos feito referência à indicação pelo tribunal recorrido destes meios de prova, remetendo para os parágrafos respectivos onde por uma simples operação de leitura é possível identificar as testemunhas. Só não transcrevemos os nomes – como agora fizemos – por o termos considerado desnecessário. De todo o modo, com o objectivo de sanar a nulidade, fica agora isento de qualquer dúvida que em nosso entendimento o acórdão do tribunal recorrido motiva de forma suficiente, expressa e individualizada em relação a cada veículo, a convicção relativamente à prova das características e valor dos veículos e objectos existentes no seu interior, recuperação dos mesmos, estado em que se encontravam e entrega aos proprietários (quando houve).

No que respeita à identificação da recorrente AA como autora dos factos e à finalidade das apropriações, o tribunal fundou a sua convicção nas seguintes provas, que elencou de forma precisa nos parágrafos 75 a 93 da fundamentação da matéria de facto):

- 28) 10.79-10.82: transcrição das conversas telefónicas (sessão 169 do alvo 56970IE e seguintes), das quais decorre, pelas razões que o tribunal explicou detalhadamente nos parágrafos 75 a 80, inclusivamente transcrevendo os segmentos mais relevantes (que por inutilidade e redundância não se repetem aqui), que a arguida participou nos factos com o arguido BBBB e outro indivíduo não identificado; localização celular do telemóvel do arguido BBBB, que permitiu identificar o veículo em questão pela proximidade do local; coincidência da circunstância de ter havido um acidente após a subtracção do veículo e de o respectivo proprietário ter sido contactado pelo outro interveniente; aditamento e termo de entrega de fls. 6, 7 e 8, relatório de inspecção de fls. 14 a 17 (do inquérito 431/13.6…), dos quais se dá conta da descoberta do veículo. O tribunal explicou ainda as razões porque, tratando-se embora de prova indirecta, a mesma permitiu dar os factos como provados.

- 29) 10.83-10.85: transcrição das conversas telefónicas (sessões 327 a 329 do alvo 56970IE);

- 30) 10-86-10.88 e 31) 10.89-10.91: transcrição das conversas telefónicas (sessões 327 a 329 do alvo 56970IE);

- 32) 10.92-10.95: transcrição das conversas telefónicas (sessões 4657 e 4659 do alvo 56970IE) e aditamento de fls. 6 e termo de entrega de fls. 9 (do inquérito 632/13.7…), onde se dá conta da descoberta do veículo; sessões 3845, 3850, 3859 e 3867, das quais resulta que o arguido BBBB não tinha intenção de oferecer o veículo ao arguido MM e sessões 4679, 4680, 4683 e 4690, que demonstram que as “sapatilhas boas” se destinariam a outra pessoa que não os arguidos CC e MM;

- 33) e 34) 10.96-10.101 e 10.102-10.107: transcrição das conversas telefónicas (sessões 52 e 54 e 56, 58 e 66, respectivamente, do alvo 5937005) e sessões 6676 a 7505 do alvo 58558M, algumas das quais respeitam ao momento em que a recorrente AA e os co-arguidos e acompanhantes se apropriaram do veículo mencionado no parágrafo 10.96; acresce que dos contactos entre os arguidos MM e BBBB resulta a referência a um par de alguma coisa, que se quadra com o número de veículos de que se tinham apropriado na madrugada de 14ago13; no que respeita ao desmantelamento do veículo, o tribunal considerou a uniformidade do procedimento, resultante da sua interpretação das conversas telefónicas, e as regras da experiência comum, das quais resulta que a finalidade era o posterior desmantelamento para venda de peças ou dos próprios veículos depois de falsificados os elementos identificativos;

- 35) 10.108-10.110: transcrição das conversas telefónicas (sessões 149 e 150 do alvo 60336050);

- 36) 10.111-10.116: transcrição das conversas telefónicas (sessões 219 e 224 do alvo 60336050); no que respeita ao desmantelamento do veículo, o tribunal considerou a uniformidade do procedimento, resultante da sua interpretação das conversas telefónicas, e as regras da experiência comum, das quais resulta que a finalidade era o posterior desmantelamento para venda de peças ou dos próprios veículos depois de falsificados os elementos identificativos, destacando aqui as sessões 1037, 1039, 1041 e 1042 do alvo 593720040 e 224 e 224 do alvo 60336050;

- 37) 10.117-10.122: transcrição das conversas telefónicas (sessões 386 e 389 do alvo 60336050); no que respeita ao desmantelamento do veículo, o tribunal considerou a uniformidade do procedimento, resultante da sua interpretação das conversas telefónicas, e as regras da experiência comum, das quais resulta que a finalidade era o posterior desmantelamento para venda de peças ou dos próprios veículos depois de falsificados os elementos identificativos, destacando aqui as sessões 224 e 226 do alvo 60336050;

- 38) 10.123-10.128: transcrição das conversas telefónicas (sessão 444 do alvo 60336050); no que respeita ao desmantelamento do veículo, o tribunal considerou a uniformidade do procedimento, resultante da sua interpretação das conversas telefónicas, e as regras da experiência comum, das quais resulta que a finalidade era o posterior desmantelamento para venda de peças ou dos próprios veículos depois de falsificados os elementos identificativos, destacando aqui as sessões 445 a 484 do alvo 60336050;

- 39) 10.129-10.134: transcrição das conversas telefónicas (sessão 583 do alvo 60336050); no que respeita ao desmantelamento do veículo, o tribunal considerou a uniformidade do procedimento, resultante da sua interpretação das conversas telefónicas, e as regras da experiência comum, das quais resulta que a finalidade era o posterior desmantelamento para venda de peças ou dos próprios veículos depois de falsificados os elementos identificativos, destacando aqui as sessões 584, 585, 603 e 607 do alvo 60336050, esta última demonstrando a colaboração entre os referidos arguidos;

- 40) 10.135-10.140: transcrição das conversas telefónicas (sessões 852 e 858 do alvo 60336050); no que respeita ao desmantelamento do veículo, o tribunal considerou a uniformidade do procedimento, resultante da sua interpretação das conversas telefónicas, e as regras da experiência comum, das quais resulta que a finalidade era o posterior desmantelamento para venda de peças ou dos próprios veículos depois de falsificados os elementos identificativos, destacando aqui as sessões 855 e 861 do alvo 60336050, bem como o relatório de fls. 1053 a 1057/V, conjugado com os depoimentos dos elementos policiais nele referidos;

- 41) 10.141-10.146: transcrição das conversas telefónicas (sessão 886 do alvo 60336050), relatório de fls. 1053 a 1057/V, fotografias de fls. 1064 a 1068/V e depoimentos das testemunhas CCCC, DDDD e EEEE, que acompanhavam os arguidos em simultâneo com as intercepções telefónicas; no que respeita ao desmantelamento do veículo, o tribunal considerou a uniformidade do procedimento, resultante da sua interpretação das conversas telefónicas, e as regras da experiência comum, das quais resulta que a finalidade era o posterior desmantelamento para venda de peças ou dos próprios veículos depois de falsificados os elementos identificativos, destacando aqui a sessão 866 do alvo 60336050, bem como o relatório de fls. 1053 a 1057/V, conjugado com os depoimentos dos elementos policiais nele referidos;

- 42) 10.147-10.152: transcrição das conversas telefónicas (sessão 866 do alvo 60336050) e depoimentos das testemunhas DDDD e EEEE, conjugados com o auto de fls. 1069ª 1071/V; no que respeita ao desmantelamento do veículo, o tribunal considerou a uniformidade do procedimento, resultante da sua interpretação das conversas telefónicas, e as regras da experiência comum, das quais resulta que a finalidade era o posterior desmantelamento para venda de peças ou dos próprios veículos depois de falsificados os elementos identificativos, destacando aqui as sessões 909, 928 e 932 do alvo 60336050, sendo que nesta o arguido BBBB disse que tinha acabado de trazer “umas sapatilhas”, o que se conjuga com as outras “sapatilhas” do mesmo dia, que envolviam o arguido BB, conforme resulta do relatório de fs. 1069 a 1071/V e dos depoimentos das testemunhas que tomaram parte na diligência aí referida;

- 44) 10.154-10.159: transcrição das conversas telefónicas (sessão 617 do alvo 60336050); no que respeita ao desmantelamento do veículo, o tribunal considerou a uniformidade do procedimento, resultante da sua interpretação das conversas telefónicas, e as regras da experiência comum, das quais resulta que a finalidade era o posterior desmantelamento para venda de peças ou dos próprios veículos depois de falsificados os elementos identificativos, destacando aqui as sessões 687 e 691 do alvo 60336050;

- 45) 10.160-10.165: transcrição das conversas telefónicas (sessão 770 do alvo 60336050); no que respeita ao desmantelamento do veículo, o tribunal considerou a uniformidade do procedimento, resultante da sua interpretação das conversas telefónicas, e as regras da experiência comum, das quais resulta que a finalidade era o posterior desmantelamento para venda de peças ou dos próprios veículos depois de falsificados os elementos identificativos, destacando aqui as sessões 771, 779 e 785 do alvo 60336050;

- 46) 10.166-10.171: transcrição das conversas telefónicas (sessão 794 do alvo 60336050); no que respeita ao desmantelamento do veículo, o tribunal considerou a uniformidade do procedimento, resultante da sua interpretação das conversas telefónicas, e as regras da experiência comum, das quais resulta que a finalidade era o posterior desmantelamento para venda de peças ou dos próprios veículos depois de falsificados os elementos identificativos, destacando aqui a sessão 796 do alvo 60336050;

- 47) 10.172-10.177: transcrição das conversas telefónicas (sessão 817 do alvo 60336050); no que respeita ao desmantelamento do veículo, o tribunal considerou a uniformidade do procedimento, resultante da sua interpretação das conversas telefónicas, e as regras da experiência comum, das quais resulta que a finalidade era o posterior desmantelamento para venda de peças ou dos próprios veículos depois de falsificados os elementos identificativos, destacando aqui as sessões 818, 826 e 830 do alvo 60336050;

- 48) 10.178-10.183: transcrição das conversas telefónicas (sessão 938 do alvo 60336050); no que respeita ao desmantelamento do veículo, o tribunal considerou a uniformidade do procedimento, resultante da sua interpretação das conversas telefónicas, e as regras da experiência comum, das quais resulta que a finalidade era o posterior desmantelamento para venda de peças ou dos próprios veículos depois de falsificados os elementos identificativos, destacando aqui a sessão 940 do alvo 60336050;

- 49) 10.184-10.189: transcrição das conversas telefónicas (sessão 1030 do alvo 60336050); no que respeita ao desmantelamento do veículo, o tribunal considerou a uniformidade do procedimento, resultante da sua interpretação das conversas telefónicas, e as regras da experiência comum, das quais resulta que a finalidade era o posterior desmantelamento para venda de peças ou dos próprios veículos depois de falsificados os elementos identificativos, destacando aqui as sessões 1031, 1036 e 1045 do alvo 60336050;

- 50) 10.190-10.192: transcrição das conversas telefónicas (sessão 1100 do alvo 60336050);

- 51) 10.193-10.198: transcrição das conversas telefónicas (sessão 1168 do alvo 60336050); no que respeita ao desmantelamento do veículo, o tribunal considerou a uniformidade do procedimento, resultante da sua interpretação das conversas telefónicas, e as regras da experiência comum, das quais resulta que a finalidade era o posterior desmantelamento para venda de peças ou dos próprios veículos depois de falsificados os elementos identificativos, destacando aqui as sessões 1169, 1187 e 1193 do alvo 60336050;

- 52) 10.199-10.201: transcrição das conversas telefónicas (sessões 1231 e 1239 do alvo 60336050), cuja relevância resulta do facto de o arguido BB ter dito que qua buscar “outra sapatilha”, o que coincide com a indicação decorrente da primeira sessão, relativa à subtracção de outro veículo;

- 54) 10.205-10.207: transcrição das conversas telefónicas (sessões 1304 e 1307 do alvo 60336050);

- 55) 10.208-10.210: transcrição das conversas telefónicas (sessões 1311 e 1314 do alvo 60336050);

- 56) 10.211-10.213: transcrição das conversas telefónicas (sessões 1317 a 1319 do alvo 60336050);

- 58) 10.215-10.217: transcrição das conversas telefónicas (sessões 1534, 1539 e 1560 do alvo 60336050);

- 59) 10.218-10.220: transcrição das conversas telefónicas (sessões 1541 a 1543, 1557, 1559 e 1560 do alvo 60336050), que se quadram com o depoimento do proprietário do veículo;

- 62) 10.227-10.229: transcrição das conversas telefónicas (sessão 99 do alvo 62390040);

- 63) 10.230-10.232: transcrição das conversas telefónicas (sessão 120 do alvo 62390040);

- 66) 10.237-10.239: transcrição das conversas telefónicas (sessões 8, 13 e 19 do alvo 56620M);

- 67) 10.240-10.242: transcrição das conversas telefónicas (sessão 109 do alvo 56970IE);

68) 10.243-10-245: transcrição das conversas telefónicas (sessões 79, 81 e 83 do alvo 593701050);

- 69) 10.246-10.248: transcrição das conversas telefónicas (sessões 2202 e 2203 do alvo 56970IE);

- 70) 10.249-10.251: transcrição das conversas telefónicas (sessões 3414 e 3415 do alvo 59371050); transcrição das conversas telefónicas (sessão 99 do alvo 62390040);

O tribunal não se limitou a indicar os meios de prova, nomeadamente as intercepções telefónicas, em que se baseou para dar os respectivos factos como provados. Motivou a sua convicção explicando porquê e como é que tais provas foram valoradas.

Disse, a propósito da convicção em relação a todos os factos acabados de referir, resultar das escutas mencionadas que o arguido BBBB nada fazia sem a colaboração da arguida AA, convicção que se confirma, também, nas vigilâncias realizadas e descritas pela testemunha FFFF, como consta nos autos de fls. 1045 a 1050/V e 1152 a 1155/V, nos videogramas de fls. 1485 a 1511/VI e 1512 a 1553/VI, no relatórios de fls. 1053 a 1057/V, 1064 a 1068/V, 1069 a 1070/V e na operação policial do dia 7fev2014 (no inquérito 160/14.3…), em que o arguido BB foi surpreendido a desmantelar vários veículos.

Disse também, que todas as remissões para autos e documentos se referem ao seu conteúdo útil para a matéria em apreço, nomeadamente, a apreensão de objectos, a entrega de objectos e ao resultado do exame pericial aos objectos (parágrafo 19 da fundamentação da matéria de facto).

Disse, do mesmo modo, com validade para todos os casos acima referidos, que as transcrições de intercepções telefónicas foram objecto de interpretação conjugada, que permitiu apreender o modo de execução uniforme e reconstituir os espaços frequentados pelos arguidos, autorizando a retirada de ilações probatórias, mesmo nos casos de conversações telefónicas que vistas isoladamente poderiam ter pouco significado. No que respeita à identificação dos intervenientes nas conversações – que, de resto, a arguida, ora recorrente, não disputa no recurso – o tribunal apontou que se baseou nos depoimentos dos elementos policiais, que chegaram a essa identificação, ora pela utilização dos nomes, ora pelo conhecimento dos aspectos da sua vida privada que foram apreendendo ao longo da investigação, ora pelo acompanhamento das escutas com diligências policiais no terreno (parágrafos 20 a 28 da fundamentação da matéria de facto).

No que respeita à prova dos elementos subjectivos dados como provados, nomeadamente às finalidades visadas pelos arguidos – incluindo, naturalmente, a arguida recorrente – o tribunal explicou que os seus comportamentos não admitem outra interpretação, pois não seria normal que pessoas se dessem ao trabalho de percorrer quase diariamente diversas áreas geográficas em busca de veículos automóveis de certas características e posterior retirada dos respectivos locais. Daí resulta que os arguidos não poderiam ter actuado com outra intenção que não fosse fazer seus tais veículos e dar-lhes o destino que se provou, em troca de contrapartidas monetárias. A convicção que os arguidos conheciam a proveniência dos veículos também resultou da avaliação global dos seus comportamentos e das conversas que mantiveram ao telefone. Concretamente, no que se refere ao acordo entre a arguida recorrente AA e o arguido BB, o tribunal fundou a sua convicção nas conversas telefónicas acima identificadas, das quais resulta que existiu esse acordo de actuação concertada e o empenho de todos os participantes com vista ao mesmo objectivo. Por fim, quanto à actuação com consciência da ilicitude, afirmou o tribunal que, em face do contexto social e cultural dos arguidos, eles não podiam deixar de conhecer que as suas actividades eram ilegais (parágrafos 109 a 114 da motivação da matéria de facto).

Portanto, como acabámos de apontar, agora mais detalhadamente, não é verdade que o tribunal não tivesse explicado, em relação a cada facto, como é que se convenceu da autoria imputada à arguida recorrente, da sua participação nos crimes e das intenções como actuou. O tribunal disse em que testemunhas se baseou e porquê, quais foram as escutas telefónicas que ponderou como relevantes, que autos teve em consideração e qual foi o raciocínio probatório para dar os factos como provados. Isso foi feito em relação a cada facto individualizado e não por extrapolação, como se invoca no recurso.

Tendo o tribunal optado por uma forma de motivação da convicção em que explicou primeiro, em termos gerais, como interpretou cada meio de prova, e depois, já quanto a cada facto, que meios de prova teve em consideração, não era necessário repetir trinta e seis vezes as mesmas razões a propósito de cada facto. Por outro lado, estando em causa prova indirecta, o tribunal não deixou de explicitar as ilações probatórias que lhe permitiram chegar a uma convicção segura, por oposição a certos factos que deu como não provados, precisamente por não se adequarem ao critério de certeza que utilizou. A arguida recorrente – como qualquer pessoa – ao ler o acórdão da primeira instância tem plenas condições para perceber em que depoimentos, autos, escutas telefónicas e documentos o tribunal se baseou para dar como provado que praticou os factos, nos termos descritos nos factos provados.

Nesta fase não estamos a avaliar se o tribunal julgou em ou mal a matéria de facto, isto é, se interpretou bem os depoimentos, documentos e autos em que se baseou. E, não nos parecendo caso para sindicar a decisão a luz dos vícios do artigo 410º do CPP, também não nos compete agora ver se o raciocínio probatório do tribunal aplica as regras da formação da convicção e da proibição de violação do princípio in dubio pro reo nos mesmos termos em que a arguida as aplicaria. Isso seria matéria para analisar se tivesse impugnado o julgamento da matéria de facto nos termos previstos no artigo 412º nºs 3 e 4 do CPP, o que a arguida optou por não fazer.

Do que se trata, face ao objecto do recuso e aos poderes de cognição no recurso em segunda instância, também não é de motivarmos a decisão da matéria de facto. Essa função pertence ao tribunal de primeira instância. O tribunal de recurso, não havendo, como não há, impugnação da matéria de facto, apenas tem de verificar se a decisão cumpre os requisitos formais e substanciais do artigo 374º do CPP e se não ocorrem os vícios do artigo 410º do CPP. Não nos compete substituir a primeira instância na fundamentação da decisão, complementando-a ou refazendo-a.

Por fim, face às conclusões do recurso, o que está agora em causa é apenas de saber se o tribunal fundamentou suficientemente os factos provados, de acordo com os critérios legais que já tínhamos referido no nosso anterior acórdão anulado. Sobre isso, não temos dúvidas que o acórdão recorrido cumpre de forma adequada os requisitos de fundamentação.

Consideramos, portanto, improcedente a arguição de nulidade por falta de fundamentação do acórdão de primeira instância.»


Do trecho que vem de se transcrever, consideramos que, efectivamente, a nulidade que se observou e declarou está devidamente suprida.

Perante as especificidades do caso sub judice, em que nos deparamos com a prática de sucessivas apropriações de veículos automóveis, há que reconhecer que se encontra inteiramente justificado o recurso feito pelas instâncias à prova indiciária pois, como se afirma no acórdão deste Supremo Tribunal de 11-07-2007 (Proc. n.º 07P1416)[5], a prova nem sempre é directa, de percepção imediata. Muitas vezes é baseada em indícios – circunstâncias conhecidas e provadas a partir das quais, mediante um raciocínio lógico, pelo método indutivo, se obtém a conclusão, firme, segura e sólida de outro facto. A indução parte do particular para o geral e, apesar de ser prova indirecta, tem a mesma força que a testemunhal, documental ou outra.


O acórdão sindicado oferece-nos agora um quadro fáctico e um acervo probatório esclarecedor e revelador de que ocorreu um verdadeiro exame das provas (e reflexão sobre elas) valoradas pelo Tribunal Colectivo, nomeadamente quanto às intercepções telefónicas.

Assim sendo, resta-nos concluir que, examinadas as provas, as instâncias cumpriram suficientemente o dever de fundamentar.

A discordância da recorrente quanto aos factos apurados não justifica agora a afirmação de não ter sido (ou não ter sido suficientemente) efectuado o exame crítico das provas pelas instâncias. Diga-se, a este propósito, que no primeiro recurso que interpôs para este Supremo Tribunal, a recorrente não arguiu as nulidades agora invocadas. Nesse recurso, sustentou a recorrente a «existência do crime continuado», pugnado ainda pela redução da pena única de 9 anos de prisão.


A insuficiência da motivação da decisão de facto, não assumindo uma gravidade que possa ser equiparável a uma autêntica falta de fundamentação, o que sucederia se a motivação da decisão de facto fosse puramente genérica e abstracta, sem qualquer referência concreta aos meios de prova, nem produzindo sobre eles qualquer exame crítico concreto, só poderá, em princípio, ser atacada por via da impugnação da decisão proferida sobre matéria de facto, nos termos do artigo 412.º, n.os 3, 4 e 6 do CPP.


Com a explicitação feita no acórdão sob recurso, consideramos suprida a deficiência – nulidade detectada no primeiro acórdão que se proferiu. Através dos elementos probatórios, onde se incluem os elementos indiciários, elencados na decisão recorrida, reafirmamos que a motivação da decisão proferida pelas instâncias sobre os factos deles emergentes, nomeadamente a comparticipação dos arguidos na apropriação dos veículos identificados, cumpre, com suficiência e objectividade, o dever de fundamentação.

Os destinatários da decisão, designadamente a agora recorrente AA, ficam a saber que o Tribunal Colectivo e o Tribunal da Relação apreciaram as provas que podiam e deviam apreciar e que tal apreciação foi realizada objectivamente, de acordo com os ditames legais e das regras da lógica e da experiência.


Improcede, pois, a arguição das nulidades previstas nos artigos 374.º, n.º2 e 379.º, n.º 1, alínea a) do CPP.


3.2. Da falta de concretização da participação de cada agente em cada episódio criminoso. Da nulidade da acusação


Alega ainda recorrente que a decisão «padece da nulidade prevista no art.º 379º/1, a) do CPP porquanto não contém as menções obrigatórias referidas no n.º 2 do art.º 374º do mesmo código, designadamente por não conter os factos provados, nem não provados que permitam apreender e compreender a concreta actuação de cada agente em cada episódio criminoso, daí determinando se cometeram ou não o crime, bem como compreender a participação de cada um, designadamente para os poder condenar a título de co-autoria ou cumplicidade». Não resultando – afirma-se – «a considerada conjugação de esforços e intenções de quaisquer factos concretizadores, não se percebe como foi a recorrente condenada a título de co-autora»

Que, enfim, a alínea b) do n.º 3 do artigo 311.º do CPP «configura como manifestamente infundada e de rejeitar, a acusação que não contenha a narração dos factos», sendo que «[j]á vinha da própria acusação, essa carência de factos [integradores do crime]», mostrando-se «indirectamente […] violado o art.º 311º/3 al. b) por referência à al. a) do nrº 2 do mesmo, pelo que se impõe à absolvição d a recorrente por não se encontrar materializada a prova da comissão dos crimes por que vem condenada».


Como judiciosamente se observa no acórdão recorrido em considerações que merecem a nossa integral concordância:


«Todos os argumentos do recurso da arguida AA giram à volta da mesma questão: a imputação feita na acusação e dada como provada no acórdão tem ou não conteúdo factual? Devemos, pois, começar por resolver esta dúvida.

Segundo a arguida, as afirmações provadas no acórdão para sustentar a sua condenação não têm suficiente conteúdo factual, limitando-se a reproduzir os conceitos legais e a formular conclusões, que não permitem saber exactamente que actos praticou e qual foi o seu grau de participação nos crimes.

O Ministério Público é da opinião contrária. Diz que se trata de factos e que são suficientes para a subsunção no tipo legal de furto.

Esta questão é nuclear porque se prende directamente com a possibilidade de um exercício efectivo dos direitos de defesa.

Resulta claro do 283º nº 3 al. b) do CPP que a narração dos acontecimentos que o Ministério Público considera relevantes para imputar um crime tem de ser feita com factos e não com conclusões ou conceitos jurídicos. Uma acusação em que a indicação da sequência de acontecimentos do evento histórico que constitui o crime é substituída por afirmações conclusivas, que não permitem ao acusado contrariar de forma efectiva a imputação não respeita aquela exigência. A consequência de não se observar aquele requisito legal é a nulidade da acusação, como resulta expressamente do nº 3 da norma referida.

E estrutura acusatória do nosso processo penal, imposta pelo artigo 32º nº 5 da Constituição, determina que o juiz penal se encontra colocado numa posição de total independência em relação às partes e estas, na fase do julgamento, têm entre si uma posição equivalente no processo. A iniciativa do processo é do Ministério Público, que define o seu objecto. A defesa pode ampliar esse objecto com a alegação de factos na contestação. A sua posterior modificação pelo juiz, seja nos factos seja na qualificação jurídica, está sujeita aos rígidos mecanismos de contraditório e até à aceitação do arguido, sob pena de nulidade da decisão (artigos 358º, 359º e 379º nº 1 al. b) do CPP). Só excepcionalmente são concedidos ao juiz poderes de tipo inquisitório e o seu campo de aplicação privilegiado em julgamento encontra-se na fase da produção de prova, com expressão máxima no artigo 340º do CPP.

Estas observações são de extrema importância para o nosso caso, pois se chegarmos à conclusão de que a acusação era nula, a consequência será a absolvição da arguida. O tribunal não podia aditar factos para corrigir uma acusação inviável.

A jurisprudência tem entendido que a nulidade da acusação, quando detectada em julgamento (ou em recurso da sentença, logicamente), conduz à absolvição e não à restituição do processo à fase de inquérito para que o Ministério Público a possa corrigir. Nessa linha de entendimento, a possibilidade de sanação da nulidade da acusação está restrita à fase do inquérito, se arguida perante o Ministério Público, cabendo dessa decisão recurso hierárquico. Se tal não ocorrer e a acusação transitar para a fase do julgamento com o vício da falta de narração dos factos incriminadores, a consequência inevitável será a sua rejeição, por aplicação do disposto no artigo 311º nº 3 al. b) do CPP.

No acórdão de fixação de jurisprudência do STJ nº 7/2005, de 12MAI2005, publicado no DR 212, Série I-A, de 14NOV2005 [[6]], decidiu-se o seguinte: “Não há lugar a convite ao assistente para aperfeiçoar o requerimento de abertura de instrução, apresentado nos termos do artigo 287º nº 2, do Código de Processo Penal, quando for omisso relativamente à narração sintética dos factos que fundamentam a aplicação de uma pena ao arguido”.

Esta jurisprudência deve aplicar-se por maioria de razão à situação em que a acusação que padece do mesmo vício é apresentada pelo Ministério Público. Não se compreenderia que o tribunal, em vez de actuar a consequência própria de uma acusação nula por falta dos factos incriminadores, que é a sua rejeição no momento do artigo 311º do CPP ou a absolvição em julgamento, em benefício do arguido sujeito a uma imputação criminal inviável, determinasse a correcção do vício para que o arguido fosse “melhor acusado”, de molde a viabilizar uma condenação.

No acórdão TRL, de 30-1-2007 [[7]]considerou-se que, quando o processo é remetido para julgamento sem que a omissão dos factos para preenchimento do tipo legal de crime imputado tenha sido detectada a tempo de levar à rejeição da acusação, o juiz julgador, perante a insuficiência dos factos, tem de proferir decisão absolutória. Esta solução merece a nossa concordância.

Temos agora de ver se as afirmações constantes no capítulo dos factos provados – decalcadas do texto da acusação – têm conteúdo factual.

O que se deu como provado em todos os casos foi, no essencial, o seguinte: às tantas horas do dia tal, em determinado local, a arguida, juntamente com um co-arguido ou com outra ou outras pessoas não identificadas, agindo em conjugação de esforços e de intenções, sem autorização e contra a vontade do dono, apropriaram-se de certo veículo automóvel, para posteriormente o venderem.

É certo que não se referem as circunstâncias em que se preparou a apropriação (quem teve a ideia, qual foi o plano e que acção cabia a cada um dos elementos) nem como a mesma se efectivou (como se abriu o veículo, quem o conduziu, quem o guardou). Mas a nosso ver é manifesto que a imputação tem conteúdo factual. Ao contrário do que se diz no recurso, não são afirmações conclusivas que não permitam um exercício efectivo dos direitos de defesa.

Em primeiro lugar, indicam-se com toda a precisão o dia, a hora e o local e o veículo subtraído ao dono. É totalmente identificável o acontecimento da vida real a que se reporta a acusação. Não se suscita qualquer dúvida que impeça ou dificulte a defesa da pessoa acusada do facto.

Em segundo lugar, no que respeita à actuação conjunta, afirma-se que a arguida e as pessoas que a acompanhavam agiram em conjugação de esforços e de intenções. Isso tem um significado inequívoco. Quer dizer que a actuação decorreu em conjunto, com o sentido de todos os intervenientes terem tomado parte na sua execução. O conhecimento dos actos concretos que cada um dos intervenientes praticou podia ser relevante, se tivesse sido apurado, mas não é essencial para o preenchimento do tipo. O princípio de que cada um dos comparticipantes responde de acordo com a sua culpa e responsabilidade não é afectado, porque ele só tem aplicação quando se provam actuações com diferentes graus de culpa e/ou ilicitude, o que não foi o caso.

Finalmente, afirma-se que a arguida e os acompanhantes se apropriaram do veículo, sem autorização e contra a vontade do dono, para o venderem mais tarde. De novo não se suscita aqui qualquer dúvida sobre a imputação em causa. A arguida sabia que estava acusada de se apoderar de veículos automóveis estacionados na via pública para ficar com eles e os vender mais tarde. Não se vê como não pudesse defender-se dessa acusação.

O facto de nem sempre se ter apurado a identidade das pessoas que acompanhavam a arguida é irrelevante. O que interessa para a comparticipação criminosa é a actuação de uma pluralidade de pessoas e não a sua identidade civil.

Também é inócuo não se ter apurado o método exacto de apropriação. O que releva para o furto é a subtracção do objecto ao seu dono. Tratando-se de automóveis estacionados na via pública que foram levados para outro lugar, é claro que a imputação tem o significado de a arguida e os seus acompanhantes terem recorrido a formas impróprias para aceder ao interior e colocar os motores em funcionamento.

O facto de a descrição dos crimes ser feita sempre da mesma forma também não tem qualquer relevância. Trata-se de actuações idênticas e subordinadas ao mesmo modo de actuação, com repetição de todos os factos essenciais.

Concluímos, portanto, que a imputação dos crimes à arguida se baseou em factos e não em meras conclusões ou conceitos jurídicos sem conteúdo factual. Não há a mínima hipótese de a defesa da arguida ter sido prejudicada, por desconhecimento dos factos que lhe estavam imputados.

A acusação não é portanto nula nem importa a absolvição da arguida por falta de factos.»


Secundando as considerações tecidas no acórdão recorrido, também nós entendemos que existe matéria de facto bastante para imputar à arguida, ora recorrente, a prática, em comparticipação, ao nível da co-autoria material, dos factos aí discriminados integradores dos crimes de furto assinalados.


Antes de mais, a verificação dos crimes de furto – integrados pela subtracção, expropriação de coisa móvel alheia com intenção de apropriação – que se nos apresenta como indiscutível. A arguida apropriou-se de bens – veículos automóveis – que não lhes pertencia. «Apropriação» que consta da factualidade provada e que, ao contrário do entendimento da recorrente, se configura verdadeiramente como elemento de facto e não como «conceito de direito», traduzindo um significado e uma precisa intencionalidade jurídico-penal do tipo objectivo do crime de furto previsto no artigo 203.ºdo Código Penal – a subtracção, ou seja, uma conduta que faz com que uma coisa [8]saia do domínio de facto do precedente detentor ou possuidor. O que implica, segundo JOSÉ DE FARIA E COSTA, «a eliminação do domínio de facto que outrem detinha sobre a coisa».


E a comparticipação, em co-autoria material, não suscita quaisquer dúvidas atenta a matéria de facto provada.

Como bem se consigna no acórdão do Tribunal Colectivo, «flui da factualidade dada por assente que os arguidos AA e BB, tanto em conjunto, como conluiados com outros indivíduos […], agindo em comunhão de intentos e esforços, lançaram mão (i. é. subtraíram), e colocaram sob a sua disponibilidade fáctica (quebrando desse jeito, o poderio fáctico que os respectivos proprietários e/ou detentores sobre os mesmos detinham), os veículos melhor descritos nos parágrafos […] que constituem indubitavelmente entidades do mundo externo, espacialmente delimitadas e com existência física autónoma, apropriáveis pelo ser humano e dotadas de valor, susceptíveis de tal apreensão material e de deslocação sem perda da sua respectiva substância (o mesmo é dizer, coisas, de natureza móvel» (sublinhados no original). Por outro lado, acrescenta-se, «os mesmos arguidos não eram titulares, sobre tais objectos, de qualquer posição juridicamente reconhecida e tutelada, que cabia, antes, a outrem, pelo que os mesmos eram, por isso, alheios em relação a si, na acepção do artigo 203.º, n.º 1, do Código Penal».


Improcede, pois, a invocada nulidade no contexto enunciado.


3.3. Impugnação da matéria de facto provada. Insuficiência para a decisão da matéria de facto provada e erro notório na apreciação da prova

Impugna o recorrente impugna perante o Supremo Tribunal de Justiça a decisão de facto da 2.ª instância, apontando-lhe o vício de insuficiência para a decisão da matéria de facto provada e erro notório na apreciação da prova, vícios contemplados no artigo 410.º, n.º 2, alíneas a) e c), do CPP.


3.3.1. Como já se referiu, o Supremo Tribunal de Justiça tem os seus poderes de cognição estrita e pontualmente fixados no artigo 434.º do CPP, limitados ao exclusivo reexame da matéria de direito, sendo-lhe defeso intrometer-se no reexame da matéria de facto, sem prejuízo do disposto no artigo 410.º n.os 2 e 3, do CPP, ou seja, sempre que, além do mais, ocorram os vícios previstos no n.º 2.

Daí resulta que, acompanhando o acórdão deste Supremo Tribunal de 04-07-2013, proferido no processo n.º 1243/10.4PAALM.L1.S1 – 3.ª Secção, à recorrente é vedado erigir a divergência factual com o decidido, a convicção adquirida nesse domínio, em fundamento de recurso para este Supremo Tribunal, porque não teve contacto à vista com as provas, do qual deriva, após a sua produção, reexame e análise crítica, a convicção probatória do Tribunal, que não tem que coincidir com a da parte, modelada, como bem se entende, à luz do seu interesse, a fixação do acervo factual.

Tal papel incumbe às instâncias às quais é viabilizado aquele contacto, numa relação apelidada já de proximal, pela aproximação aos meios de prova, particularmente ao testemunhal, cuja especificidade, pela forma multifacetada de prestação, é essencialmente apreensível, mais na 1.ª instância do que na 2.ª instância, esta podendo conhecer de facto e de direito, nos termos do art.º 428.º, do CPP, contudo o seu julgamento se cinge aos pontos de facto indicados no condicionalismo do artigo 412.º, n.º3, do CPP

E a Relação fecha, em definitivo, como regra, o ciclo do conhecimento da matéria de facto, seja por aquele conhecimento limitado, seja ainda pelos poderes de modificabilidade que lhe são outorgados no artigo 432.º, alíneas a), e c), seja pelo conhecimento oficioso dos vícios previstos no artigo 410.º, n.º 2, do CPP.

«E neste último âmbito, lê-se ainda no acórdão que se vem seguindo, parificadamente com o reconhecido para este STJ, na observância do AFJ, de 19.10.95, in DR, Série A, de 28.12.95, atenta a natureza de tais vícios, de gravidade, comprometendo a lógica do decidido, a credibilidade das decisões judiciais ante os seus destinatários próximos e a comunidade mais ampla de cidadãos, que aguarda dos tribunais, decisões acertadas e justas, só assim se lhes impondo na sua missão de julgar

Essas anomalias situam-se ao nível da matéria de facto, da lógica jurídica, são impeditivas de bem se decidir, viciando o silogismo judiciário, criando disfuncionalidades, incoerência interna nos termos da decisão, como se decidiu nos Acs. deste STJ, de 7.12.2005, CJ, Acs. STJ, XIII; T III, 224 e de 29.3.2006, in P.º n.º 651/06 -3.ª Sec.

O STJ quando conhece oficiosamente, dessas anomalias, em revista alargada, mantém-se, ainda, portanto na sua esfera de competência específica, enquanto definindo o direito em última instância, porque seria incompaginável com essa função proferir decisão de direito sobre uma base factual afectada por esses vícios, desde que resultem do texto da decisão recorrida por si só, sem recurso a elementos exteriores, ou em conjugação com as regras da experiência comum, aquilo que é usual acontecer, com probabilidade forte de ser evento normal.

[…]

Só, pois, por razões excepcionais, o STJ conhece de tais vícios, sendo, até, jurisprudência sua, com foros de pacificidade, a de que o recorrente, tendo-se a Relação pronunciado sobre tais vícios, está impedido de os reapreciar a pedido expresso no recurso intentado (cfr., entre muitos outros, os Acs. de 24.3.2003, CJ, STJ, XXVIII, T1, 166, pág. 236 e de 25.1.2006, P.º n.º 2981/05, 3.ª Sec.), Lourenço Martins, O Instituto dos Recursos, RMP, 94, 2003, págs. 81. e 82.»

Esta jurisprudência tem sido seguida reiteradamente afirmada.

Convocando o acórdão deste Supremo Tribunal de 12-07-2018, proferido no processo n.º 172/17.5S7LSB.L1.S1 – 3.ª Secção, relatado pelo ora relator:

«O Supremo Tribunal de Justiça, enquanto tribunal de revista, conforme dispõe o artigo 434.º do CPP, somente reaprecia matéria de direito, sem prejuízo do conhecimento (oficioso) dos vícios previstos no artigo 410.º, n.os 2, als. a) a c), e 3, do CPP.

Desta feita, ao STJ está-lhe vedado proceder à análise crítica da prova testemunhal ou documental produzida nos autos, substituindo-se às instâncias na valoração dos meios de prova e na fixação da matéria de facto provada e não provada. Veja-se neste sentido acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 14-12-2006, Proc. n.º 4356/06 - 5.ª Secção:

“I. Tendo os recorrentes ao seu dispor a Relação para discutir a decisão de facto do tribunal colectivo, vedado lhes ficará pedir ao Supremo Tribunal a reapreciação da decisão de facto tomada pela Relação. II. E isso porque a competência das Relações, quanto ao conhecimento de facto, esgota os poderes de cognição dos tribunais sobre tal matéria, não podendo pretender-se colmatar o eventual mau uso do poder de fazer actuar aquela competência, reeditando-se no STJ pretensões pertinentes à decisão de facto que lhe são estranhas, pois se hão-de haver como precludidas todas as razões quanto a tal decisão invocadas perante a Relação, bem como as que o poderiam ter sido”.

Como repetidamente este Supremo Tribunal tem entendido, e aqui se reitera, decidido o recurso pela Relação, ficam esgotados os poderes de apreciação da matéria de facto, tornando-se esta definitivamente adquirida, salvo se ocorrer algum dos vícios previstos no artigo 410.º, n.º 2, do CPP, de que o Supremo Tribunal de Justiça deva conhecer oficiosamente.

Constituindo jurisprudência sedimentada e pacífica deste Supremo Tribunal que os vícios previstos nos n.os 2 e 3 do artigo 410.º do CPP não podem constituir objecto do recurso de revista a interpor para o Supremo Tribunal de Justiça e que este tribunal deles somente conhece ex oficio, quando constatar que a decisão recorrida, devido aos vícios que denota ao nível da matéria de facto, inviabiliza a correcta aplicação do direito ao caso sub judice [[9]].

Posto isto, não é admissível um recurso interposto de um acórdão proferido pelo Tribunal da Relação para este tribunal, na parte em que convoca a reapreciação da decisão proferida sobre matéria de facto, quer em termos amplos, por erro de julgamento (erro na apreciação da prova), quer no quadro dos vícios do artigo 410.º do CPP (erro-vício).

Assim quanto à impugnação da matéria de facto, estando em causa erro-vício há-de cingir-se ao texto da decisão recorrida, eventualmente em conjugação com as regras de experiência comum, por sua vez o erro-julgamento é quanto há erro na apreciação da prova com base em elementos externos ao texto da decisão, como é o caso de confronto da prova testemunhal ouvida em audiência de julgamento.»

A recorrente, reeditando os fundamentos que invocou no recurso que interpôs para o Tribunal da Relação suscita o vício da insuficiência para a decisão da matéria de facto provada e o vício do erro notório na apreciação da prova, contemplados no artigo 410.º, n.º 2, alíneas a) e c), do CPP.

Ora, neste segmento do recurso que interpõe perante este Supremo Tribunal, o que o recorrente visa é impugnar a matéria de facto dado como assente pelo Tribunal da Relação, não aceitando a mesma e pretendendo a alteração da matéria de facto dada como provada.

Na medida em que a reapreciação da matéria de facto, seja em termos amplos (erro-julgamento) seja no âmbito dos vícios do artigo 410.º do CPP (erro-vício), não pode servir de fundamento ao recurso interposto para o Supremo Tribunal de Justiça, impõe-se rejeitar, por inadmissível, nesta parte, o recurso interposto pelo arguido, nos termos conjugados dos artigos 420.º, n.º 2, alínea b), 414.º, n.º 2 e 434.º, todos do CPP.


3.3.2. Poderia ponderar-se apenas conhecer oficiosamente dos vícios do artigo 410.º, n.os 2 e 3, do CPP, porque o conhecimento destes vícios não constitui mais do que uma válvula de segurança a utilizar naquelas situações em que não seja possível tomar uma decisão (ou uma decisão correcta e rigorosa) sobre a questão de direito, por a matéria de facto se revelar ostensivamente insuficiente, por se fundar em manifesto erro de apreciação ou ainda por assentar em premissas que se mostram contraditórias e por fim quanto se verifiquem nulidades que não se devam considerar sanadas.

Ora, o Tribunal da Relação examinou a questão da verificação dos referidos vícios suscitada pela recorrente em termos que, pela sua correcção técnico-jurídica não podem deixar de merecer a nossa concordância.

E assim, pode ler-se no acórdão recorrido:

«Apontam-se ao acórdão os vícios previstos nas alíneas a) e c) do nº 2 do artigo 410º do CPP. De novo, o que está em causa é aquela objecção relacionada com a alegada insuficiência da descrição dos factos feita no acórdão.

Começa a arguida por alegar que o acórdão não contém os factos necessários para a decisão de direito – vício da alínea a) – e depois que, se não foram provados factos mas apenas conclusões, a condenação enferma de erro lógico no raciocínio – vício da al. c).

Tendo em conta o que dissemos atrás, é manifesta a improcedência deste fundamento do recurso.

Os vícios do artigo 410º nº 2 ocorrem nas situações em que se verifica, pela simples leitura de decisão, por si só ou conjugada com as regras da experiência comum, que o julgador incorreu num vício lógico do raciocínio, ou porque analisou a questão jurídica sem factos de suporte ou porque retirou da prova uma ilação manifestamente errada, insusceptível de levar ao convencimento de qualquer pessoa.

No caso em análise, é evidente que isso não sucedeu. O acórdão contém todos os factos necessários para a decisão condenatória. E, como vimos também, o tribunal teve-os como provados com base num raciocínio provatório que explicou de forma clara e racionalmente motivada.

Improcede também este fundamento do recurso.»

Resulta da matéria de facto provada descrita no acórdão recorrido que foram apurados todos os elementos de facto necessários para integrar o tipo objectivo e subjectivo dos ilícitos pelos quais foram condenados os arguidos e, concretamente, a arguida AA.

Não tendo qualquer sentido, no caso presente, pretender imputar à decisão decorrida, a existência do vício da insuficiência para a decisão da matéria de facto provada previsto no artº 410º/2/a) do C.P.P, porquanto não se vê em concreto qualquer omissão da matéria de facto, que pudesse impedir a decisão jurídica, tal como ela foi proferida.

Sendo que, tal como decorre da letra da lei, qualquer um dos vícios a que alude o n.º 2 do artigo 410° do CPP tem de dimanar da própria decisão recorrida, por si só ou conjugada com as regras da experiência comum, sem recurso, portanto, a quaisquer elementos externos à decisão.

O erro notório na apreciação da prova, previsto na alínea c) daquele preceito, é um vício que se observa quando se retira de um facto dado como provado uma conclusão ilógica, arbitrária ou visivelmente violadora do sentido da decisão e/ou das regras de experiência comum.

O erro notório na apreciação da prova tem pois que resultar impreterivelmente do próprio teor da sentença. Existe este erro, quando considerado o texto da decisão recorrida por si só ou conjugado com as regras de experiência comum se evidencia um erro de tal modo patente que não escapa à observação do cidadão comum ou do jurista com preparação normal.

Ocorre o vício, quando se dão por provados factos que, face às regras da experiência comum e à lógica normal, traduzam uma apreciação manifestamente ilógica, arbitrária, de todo insustentável e por isso incorrecta.

Ora, numa averiguação oficiosa, não vislumbramos na decisão sob recurso qualquer falha ou deficiência que determine a existência deste vício de erro notório, limitada à sua letra.

A recorrente discorda com a forma como a prova foi considerada relativamente aos concretos pontos da matéria de facto (provada e não provada) que ficaram apurados, visando afinal pôr em causa o processo de valoração da prova efectuado pelas instâncias, pretendendo que a mesma prova seja valorada de acordo com a sua própria apreciação, esquecendo-se, contudo, que a prova é apreciada, salvo quando a lei dispuser diferentemente, segundo as regras da experiência e a livre convicção da entidade que julga, conforme artigo 127° do CPP, e não de acordo com a apreciação que dela fazem os destinatários da decisão.

A fundamentação que consta do acórdão do Tribunal Colectivo, na parte relativa à motivação da decisão proferida sobre a matéria de facto, suprida que se encontra a nulidade que fora observada no primeiro acórdão deste Supremo Tribunal, contém a indicação expressa dos meios de prova tomados em consideração e da relevância que se lhes atribuiu, mostrando-se coerente, lógica e feita de acordo com as normas legais e as regras da experiência comum.

Podemos, pois, concluir que se mostram bem julgados todos os factos objecto da acusação imputados aos arguidos e, em particular, à ora recorrente, de acordo com as provas produzidas e analisadas, conjugadamente, com as regras da experiência comum, não se vislumbrando qualquer fundamento que imponha uma alteração da matéria de facto assente, nem se se colocando qualquer dúvida sobre o acerto da decisão, em função de toda a prova produzida e examinada pelas instâncias para formar a sua convicção.

Em conclusão, não padece, pois, a decisão recorrida do vício previsto no artigo 410.º, n.º 2, alínea c), do CPP, pelo que também terá que improceder a impugnação da matéria de facto assente nesta base, suscitada pela arguida AA.

 O recurso é, pois, de rejeitar nesta parte.


3.4. Inadmissibilidade parcial dos recursos – dupla conforme relativamente às penas parcelares

Estabilizada a base factual relevante:

O recorrente BB foi condenado em 1.ª instância pela prática de:

- 3 crimes de furto simples, previstos no artigo 203.º n.º 1, do Código Penal, em 3 penas de 1 ano de prisão;

- 1 crime de furto qualificado, previsto nos artigos 203.º, n.º 1 e 204.º, n.º 2, alínea a), do Código Penal, na pena de 3 anos de prisão;

- 5 crimes de furto qualificado, previstos nos artigos 203.º n.º 1 e 204.º n.º 1, alínea a), do Código Penal, em 2 penas de 2 anos de prisão e 3 penas de 1 ano e 9 meses de prisão;

- 1 crime de receptação, previsto no artigo 231.º n.º 1, do Código Penal, na pena de 2 anos de prisão;

- em cúmulo jurídico destas penas, foi condenado na pena única de 4 anos de prisão, com execução suspensa por igual período, com regime de prova.

A recorrente AA foi condenada em 1.ªinstância pela prática de:

- 14 crimes de furto simples, previstos no artigo 203.º n.º 1, do Código Penal, em 15 penas de 1 ano de prisão;

- 1 crime de furto qualificado, previsto nos artigos 203.º, n.º 1 e 204.º, n.º 2, alínea a), do Código Penal, na pena de 3 anos de prisão;

- 11 crimes de furto qualificado, previstos nos artigos 203.º n.º 1 e 204.º n.º 1, alínea a), do Código Penal, em 4 penas de 2 anos de prisão e 8 penas de 1 ano e 9 meses de prisão;

Em cúmulo jurídico destas penas foi fixada a pena única de 6 anos de prisão.

Na sequência do recurso interposto pelo Ministério Público, o Tribunal da Relação do Porto deliberou:

- Julgar tal recurso parcialmente procedente e modificar o acórdão recorrido, mantendo todas as penas parcelares mas fixando a pena única da arguida AA em 9 anos de prisão e a do arguido BB em 6 anos de prisão.

O recorrente BB no recurso que interpõe do acórdão da Relação do Porto entende que a pena única «é manifestamente desproporcionada», devendo ser aplicada uma pena não superior a 5 anos de prisão suspensa na sua execução.

Por seu lado, a recorrente AA entende que

«34. […] a pena concretamente aplicada mostra-se excessiva e desadequada, quer atenta a matéria de facto dada como provada, quer atenta a situação socio-económica da arguida/recorrente AA, por dois motivos essenciais.

35. O primeiro motivo, salvo o devido respeito por opinião contrária, que é muito, consiste no entendimento da arguida/recorrente que não podia ser condenada, em concurso real e efectivo, pela prática de 27 crimes de furto e furto qualificado, na medida em que face à matéria dada como provada dúvidas não restam de que estamos na presença da prática de crimes continuados.

36. O segundo motivo, salvo o devido respeito por opinião contrária, que é muito, atenta a matéria de facto dada como provada e atenta toda a situação sócio-económica da arguida/recorrente AA, melhor plasmada no douto acórdão recorrido, mostra-se excessiva e desadequada a pena de 9 anos de prisão em que foi condenada […]»

Perante as conclusões formuladas pelos recorrentes, verifica-se que o arguido BB impugna a pena única que lhe foi fixada.

A recorrente AA insurge-se igualmente contra a dimensão da pena única fixada, suscitando agora, ao mesmo tempo a questão relativa à «existência do crime continuado», pretendendo que a punição se efectue «pelas regras fixadas na lei para o crime continuado».

O conhecimento desta última pretensão é, diga-se desde já, inadmissível.

Primeiro porque configura uma verdadeira questão nova que não foi submetida à apreciação do Tribunal da Relação de que se recorre e que, por isso mesmo, não foi aí apreciada. Consequentemente, tal questão não poderá ser objecto de conhecimento no âmbito do presente recurso que, nesta parte, se rejeita por inadmissibilidade legal, nos termos dos artigos 420.º, n.º 1, alínea b), e 414.º, n.º 2, do CPP.

Convocando considerações tecidas sobre este tópico no acórdão deste Supremo Tribunal de 10-10-2018, proferido no processo n.º 1082/13.0GAFAF.G1.S1 – 3.ª Secção, relatado pelo agora relator, a questão do crime continuado, agora trazida a debate, não foi presente ao tribunal de recurso, ao Tribunal da Relação, pelo que estamos perante a formulação de uma questão nova.

Como se considera no acórdão deste Supremo Tribunal, de 09-03-2017, proferido no processo n.º 582/05.0TASTR.E1.S1 – 3.ª Secção:

       

«Os recursos destinam-se ao reexame das questões submetidas ao julgamento do tribunal recorrido. O tribunal de recurso aprecia e conhece de questões já conhecidas pelo tribunal recorrido e não de questões que antes não tenham sido submetidas à apreciação deste tribunal – o tribunal de recurso reaprecia o concretamente já decidido, não profere decisões novas.

Assim sendo, não é lícito invocar no recurso questões que não tenham sido suscitadas nem resolvidas na decisão de que se recorre.


Destinam-se os recursos a reapreciar as decisões tomadas pelos tribunais de inferior hierarquia e não a decidir questões novas que perante eles não foram equacionadas.

 A preclusão do conhecimento pelo Supremo Tribunal de Justiça de questões não suscitadas perante a Relação, apenas sofre as restrições advindas da natureza da questão levantada quando a sua apreciação deva ou possa fazer-se ex officio (v.g., nulidade de actos jurídicos; questões de inconstitucionalidade normativa; caducidade em matéria de direitos indisponíveis).


Os recursos ordinários não servem para conhecer de novo da causa, mas antes para controlo da decisão recorrida».

 

Citando-se MIGUEL TEIXEIRA DE SOUSA, «[no] direito português, os recursos ordinários visam a reapreciação da decisão proferida dentro dos mesmos condicionalismos em que se encontrava o tribunal recorrido no momento do seu proferimento. Isto significa que, em regra, o tribunal de recurso não pode ser chamado a pronunciar-se sobre matéria que não foi alegada pelas partes na instância recorrida ou sobre pedidos que nela não foram formulados»[10].


No mesmo sentido ANTÓNIO ABRANTES GERALDES, «[os] recursos ordinários destinam-se a permitir que um tribunal hierarquicamente superior proceda à reponderação da decisão recorrida, objectivo que se reflecte na delimitação das pretensões que lhe podem ser dirigidas e no leque de competências susceptíveis de serem assumidas. Na fase de recurso, as partes e o tribunal superior devem partir do pressuposto de que a questão já foi objecto de decisão, tratando-se apenas de apreciar a sua manutenção, alteração ou revogação. Por outro lado, a demanda do tribunal superior está circunscrita a questões que já tenham sido submetidas ao tribunal de categoria inferior, sem prejuízo da possibilidade de suscitar ou de apreciar questões de conhecimento oficioso»[11].


O acórdão citado dá nota do «entendimento constante do STJ, sobre a natureza e função processual do recurso, de que este não pode ter como objecto a decisão de questões novas, constituindo apenas um remédio processual que permite a reapreciação, em outra instância, de decisões expressas sobre matérias e questões já submetidas e objecto de decisão do tribunal de que se recorre. Em fórmula impressiva: no recurso não se decide, com rigor, uma causa, mas apenas questões específicas e delimitadas, que tenham já sido objecto de decisão anterior pelo tribunal a quo e que um interessado pretende ver reapreciadas», referenciando vasta jurisprudência, já consolidada, sobre este tópico.


Perante o exposto, rejeita-se o recurso, por inadmissibilidade legal, nos termos dos artigos 420.º, n.º 1, alínea b), e 414.º, n.º 2, do CPP, quanto à questão referente ao crime continuado.


A inadmissibilidade do recurso neste segmento sempre se verificaria por via da dupla conforme decorrente da confirmação integral pela Relação das penas parcelares impostas aos arguidos-recorrentes, todas elas não superiores a 8 anos, em conformidade com o disposto no artigo 400.º, n.º 1, alínea f), do CPP.

Revisitando considerações expendidas nos acórdãos deste Supremo Tribunal, de 21-06-2017 (Proc. n.º 585/15.7PALGS.E1.S1 – 3.ª Secção), de 27-09-2017 (Proc. n.º 52/14.6TACBT.G1.S1 – 3.ª Secção)[12], De 07-02-2018, proferido no processo n.º 66/12.0PAETZ.E2.S2 – 3.ª Secção[13], de 02-05-2018 (Proc. n.º 51/15.0PJCSC.L1.S1 – 3.ª Secção) e de 21-11-2018, proferido no processo n.º 179/15.7JAPDL.L1.S1 – 3.ª Secção, e convocadas também no acórdão de 04-07-2019, proferido no processo n.º 1872/16.2JABRG.G2.S1 – 3.ª Secção[14], relatados pelo agora relator, as penas singulares aplicadas aos recorrentes e, concretamente à recorrente AA, pela prática dos crimes de furto simples e qualificados são todas elas inferiores a 8 anos de prisão.


O artigo 400.º do CPP, regendo sobre as «Decisões que não admitem recurso», na redacção actual, conferida pela Lei n.º 20/2013, dispõe no seu n.º 1, alínea f), que não admitem recurso as decisões «de acórdãos condenatórios proferidos, em recurso, pelas relações, que confirmem decisão de 1.ª instância e apliquem pena de prisão não superior a 8 anos».


No caso presente, verifica-se que as penas parcelares aplicadas à recorrente pela prática de tais crimes e lastro fáctico-jurídico em que elas assentam, todas inferiores a 8 anos de prisão, foram integralmente confirmadas no acórdão da Relação de que se recorre – dupla conforme –, pelo que são insusceptíveis de recurso em conformidade com o disposto nos artigos 400.º, n.º 1, alínea f), a contrario, e 432.º, n.º 1, alínea b), ambos do CPP.


O instituto da «dupla conforme» radica, como se sabe, na constatação de que a concordância de duas instâncias quanto ao mérito da causa é factor indiciador do acerto da decisão, o que, em casos de absolvição ou de condenação em pena de prisão de pequena ou média gravidade, prévia e rigorosamente estabelecidos pelo legislador, justifica a limitação daquele direito.


Cumprindo dizer que esta solução da irrecorribilidade de decisões proferidas, em recurso, pelo Tribunal da Relação, enquanto confirmativas da deliberação da 1.ª instância, não ofende qualquer garantia do arguido, nomeadamente, o direito ao recurso, consagrado no artigo 32.º, n.º 1, da Constituição da República.


O direito ao recurso foi expressamente incluído pela Lei Constitucional n.º 1/97 como uma das garantias de defesa em processo criminal. Assim, como notam J. J. GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA, explicita-se que «em matéria penal, o direito de defesa pressupões a existência de um duplo grau de jurisdição, na medida em que o direito ao recurso integra o núcleo essencial das garantias de defesa constitucionalmente asseguradas. Na falta de especificação, o direito ao recurso traduz-se na reapreciação da questão por um tribunal superior, quer quanto à matéria de direito quer quanto à matéria de facto»[15].


Por via de regra, o direito ao recurso não exige o seu exercício em mais de um grau, e é decidido por um tribunal superior àquele de que se recorre, constituindo jurisprudência firme e reiterado do Tribunal Constitucional não considerar inconstitucional a circunstância de haver dupla conforme depois de ter havido redução da pena num acórdão da relação, nos termos do art. 400.° n.º 1, alínea f), do CPP e, por isso, não poder haver recurso para o Supremo Tribunal de Justiça em terceiro grau de jurisdição em matéria penal - Acórdãos do Tribunal Constitucional n.º 2/06, de 13.1.2001, n.º 20/2007, de 17.01.2007, e n.º 645/2009 de 15.12.2009.


Como se considera no acórdão do STJ de 11-04-2012, proferido no processo n.º 3989/07.5TDLSB.L1.S1 – 3.ª Secção, «estando o Supremo Tribunal impedido de sindicar o acórdão recorrido no que tange à condenação pelos crimes em concurso, obviamente que está impedido, também, de exercer qualquer censura sobre a actividade decisória prévia que subjaz e conduziu à condenação do recorrente por cada um desses crimes. A verdade é que relativamente aos crimes em concurso o acórdão recorrido transitou em julgado, razão pela qual no que a eles se refere se formou caso julgado material, tornando definitiva e intangível a respectiva decisão em toda a sua dimensão, estando pois a coberto do caso julgado todas as decisões que antecederam e conduziram à condenação pelos crimes em concurso, ou seja, que a montante da condenação se situam» (sublinhado agora).


No mesmo sentido, referência também para o acórdão de 13-01-2016, proferido no processo n.º 174/11.5GDGDM.L1.S1 – 3.ª Secção BASES), que o ora relator subscreveu como adjunto, em que, perante o pedido de reapreciação de prova alegadamente proibida, deixou expresso ser «jurisprudência pacífica que «[n]ão é possível ao STJ conhecer da medida das penas parcelares aplicadas quando se está perante penas de prisão inferiores a 8 anos e foram confirmadas, em recurso, pelo Tribunal da Relação, (…)», atendendo a que, «com a entrada em vigor, em 15-09-2007, da Lei 48/2007, foi modificada a competência do STJ em matéria de recursos de decisões proferidas, em recurso, pelas Relações, restringindo-se a impugnação daquelas decisões para este Supremo Tribunal, no caso de dupla conforme, a situações em que tenha sido aplicada pena de prisão superior a 8 anos [[16]]».


Como também se decidiu no já citado acórdão de 02-05-2018 (Proc. n.º 51/15.0PJCSC.L1.S1 – 3.ª Secção): «I - sendo as penas parcelares todas inferiores a 8 anos de prisão, e tendo sido integralmente confirmadas no acórdão da Relação de que se recorre, verifica-se a existência de dupla conforme, pelo que as mesmas são insusceptíveis de recurso em conformidade com o disposto nos arts. 400.º, n.º 1, al. f), a contrario e art. 432.º, n.º 1, al, b), ambos do CPP. II - Abrangidos pelo caso julgado firmado e inerente irrecorribilidade, estão igualmente as questões que se prendem com a decisão de perdimento a favor do Estado dos valores e dos veículos automóveis referidos. Abrangido pela irrecorribilidade, igualmente fica prejudicado o conhecimento das alegadas nulidade das escutas telefónicas, da nulidade do acórdão recorrido por insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, por erro notório na apreciação da prova ou por omissão de pronúncia e da alegada violação do princípio in dubio pro reo. III - A restrição assinalada quanto à impossibilidade de o STJ conhecer da medida das penas parcelares aplicadas quando se está perante penas de prisão inferiores a 8 anos e foram confirmadas em recurso pelo tribunal da relação vale igualmente para as situações em que são arguidos vícios como os alegados pelo recorrente, consubstanciados no erro de julgamento da matéria de facto provada, relativos à insuficiência para a decisão da matéria de facto provada ou ao erro notório na apreciação da prova, previstos no art. 410.º, n.º 2, als. a) e c), do CPP.» (do sumário).


A admissibilidade ou não de determinado recurso é questão prévia ao conhecimento do mesmo já que só pode conhecer-se de qualquer recurso depois de ser admitido no tribunal a quo e o tribunal ad quem considerar que essa admissão é válida.


Na verdade, como se dá conta no acórdão do STJ, de 27-04-2011, proferido no processo n.º 712/00.9JFLSB.L1.S1 – 3.ª Secção, «sendo o recurso inadmissível, tudo se passa como se não tivesse sido admitido, apesar de ter sido admitido na 1.ª instância e nessa medida, se o acórdão se prefigura irrecorrível na parte criminal, óbvio é, que das questões que lhe subjazem, sejam elas de constitucionalidade, processuais e substantivas, sejam interlocutórias, ou finais, referentes às razões de facto e direito da condenação em termos penais, não poderá o STJ conhecer, por não se situarem no círculo jurídico-penal legal do conhecimento processualmente admissível, delimitado pelos poderes de cognição do Supremo Tribunal»[17].


Como também se decidiu no acórdão de 25-06-2015, proferido no processo n.º 814/12.9JACBR.S1 - 5.ª Secção[18]:


«Tem sido jurisprudência constante deste STJ, de que se comunga, que a inadmissibilidade de recurso decorrente da dupla conforme impede este tribunal de conhecer de todas as questões conexas com os respectivos crimes, tais como os vícios da decisão sobre a matéria de facto, a violação dos princípios do in dubio pro reo e da livre apreciação da prova, da qualificação jurídica dos factos, da medida concreta da pena singular aplicada ou a violação do princípio do ne bis in idem ou de quaisquer nulidades, como as do art. 379.° do CPP».


Bem como o acórdão de 16-06-2016, proferido no processo n.º 200/08.5PAESP-A.P1.S1 – 3.ª Secção, nos termos do qual, «[t]endo o tribunal de 1.ª instância condenado o recorrente em quatro penas parcelares não superiores a 8 anos, penas estas inteiramente confirmadas pelo tribunal da relação, é patente a inadmissibilidade do recurso relativamente às mesmas e questões subjacentes a elas. Sendo o acórdão recorrido, irrecorrível na parte criminal, óbvio é que das questões que lhe subjazem, sejam elas de constitucionalidade, processuais e substantivas, sejam interlocutórias, ou finais, enfim das questões referentes às razões de facto e de direito da condenação em termos penais, não poderá o STJ conhecer, por não se situarem no círculo jurídico-penal legal do conhecimento processualmente admissível, delimitado pelos poderes de cognição do STJ».


Resulta do exposto, constituindo este o entendimento sedimentado no Supremo Tribunal de Justiça, que estão subtraídas ao conhecimento deste Tribunal, nos termos dos artigos 400.º, n.º 1, alínea f), e 432.º, n.º 1, alínea b), ambos do CPP, as questões relativas aos crimes de furto por cuja prática foi a arguida AA condenada, e respectivas penas aplicadas, todas não superiores a 8 anos, sendo que se verifica, quanto a elas, uma situação de «dupla conforme» condenatória.


Rejeita-se, pois, o recurso interposto pela arguida AA, rejeitando-se o recurso, por irrecorribilidade, nos termos dos artigos 420.º, n.º 1, alínea b) e 414.º, n.os 2 e 3, e 400.º, n.º 1, alínea f),do CPP quanto à matéria respeitante aos crimes de furto praticados.


Em resultado da rejeição do recurso na parte referida, a sua apreciação é confinada às penas conjuntas aplicadas aos recorrentes em cúmulo jurídico das penas parcelares, porque relativamente àquelas não se verifica a dupla conforme e são superiores a 5 anos de prisão, sendo admissível o recurso de acordo com disposto nos artigos 432.º, n.º 1, alínea b), e 400.º, n.º 1, alínea e), do CPP.


   3.5. Medida das penas únicas


    Recordando:

     A arguida AA foi condenada em 1.ª instância pela pática de:

- 14 crimes de furto simples, previstos no artigo 203.º n.º 1, do Código Penal, em 15 penas de 1 ano de prisão;

- 1 crime de furto qualificado, previsto nos artigos 203.º, n.º 1 e 204.º, n.º 2, alínea a), do Código Penal, na pena de 3 anos de prisão;

- 11 crimes de furto qualificado, previstos nos artigos 203.º n.º 1 e 204.º n.º 1, alínea a), do Código Penal, em 4 penas de 2 anos de prisão e 8 penas de 1 ano e 9 meses de prisão;

- em cúmulo jurídico foi-lhe fixada a pena única de 6 anos de prisão.


      O arguido BB foi condenada em 1.ª instância pela pática de:

- 3 crimes de furto simples, previstos no artigo 203.º n.º 1, do Código Penal, em 3 penas de 1 ano de prisão;

- 1 crime de furto qualificado, previsto nos artigos 203.º, n.º 1 e 204.º, n.º 2, alínea a), do Código Penal, na pena de 3 anos de prisão;

- 5 crimes de furto qualificado, previstos nos artigos 203.º n.º 1 e 204.º n.º 1, alínea a), do Código Penal, em 2 penas de 2 anos de prisão e 3 penas de 1 ano e 9 meses de prisão;

- 1 crime de receptação, previsto no artigo 231.º n.º 1, do Código Penal, na pena de 2 anos de prisão;

- em cúmulo jurídico, foi-lhe fixada a pena única de 4 anos de prisão, com execução suspensa por igual período, com regime de prova.


      O Tribunal da Relação, na sequência do recurso interposto pelo Ministério Público, confirmou todas as penas singulares destes arguidos, agravando, no entanto, as respectivas penas únicas.

        Assim, fixou à arguida AA a pena única de 9 anos de prisão e ao arguido BB a pena única de 6 anos de prisão.


     Os arguidos insurgem-se contra a medida dessas penas pugnando pela sua diminuição para medida não superior a 5 anos de prisão com suspensão da respectiva execução.


O artigo 77.º do Código Penal estabelece as regras da punição do concurso de crimes, dispondo no n.º 1 que «[q]uando alguém tiver praticado vários crimes antes de transitar em julgado a condenação por qualquer deles é condenado numa única pena», em cuja medida «são considerados, em conjunto, os factos e a personalidade do agente».

O n.º 2 do mesmo preceito estabelece «[a] pena aplicável tem como limite máximo a soma das penas concretamente aplicadas, não podendo ultrapassar 25 anos, tratando-se de pena de prisão (…), e como limite mínimo, a mais elevada daquelas penas concretamente aplicadas aos vários crimes».


Sobre a pena única e para os casos em que aos crimes correspondem penas parcelares da mesma espécie, considera MARIA JOÃO ANTUNES que «o direito português adopta um sistema de pena conjunta, obtida mediante um princípio de cúmulo jurídico»[19].

A pena única do concurso, formada nesse sistema de pena conjunta e que parte das várias penas parcelares aplicadas pelos vários crimes, deve ser, pois, fixada, dentro da moldura do cúmulo, tendo em conta os factos e a personalidade do agente, considerados em conjunto, o que garante, segundo MARIA JOÃO ANTUNES, «a observância do princípio da proibição da dupla valoração»[20].


     Como se refere no acórdão deste Supremo Tribunal, de 20-12-2006 (Proc. n.º 06P3379), «na consideração dos factos (do conjunto dos factos que integram os crimes em concurso) está ínsita a avaliação da gravidade da ilicitude global, que deve ter em conta as conexões e o tipo de conexão entre os factos em concurso».

     Por seu lado, lê-se no mesmo acórdão, «na consideração da personalidade (da personalidade, dir-se-ia estrutural, que se manifesta e tal como se manifesta na totalidade dos factos) devem ser avaliados e determinados os termos em que a personalidade se projecta nos factos e é por estes revelada, ou seja, aferir se os factos traduzem uma tendência desvaliosa, ou antes se se reconduzem apenas a uma pluriocasionalidade que não tem raízes na personalidade do agente».


Neste domínio, dá-se nota no acórdão deste Supremo Tribunal, de 27-05-2015, proferido no processo n.º 220/13.8TAMGR.C1.S1-3ª Secção, «o Supremo Tribunal tem entendido, em abundante jurisprudência, que, com “a fixação da pena conjunta se pretende sancionar o agente, não só pelos factos individualmente considerados, mas também e especialmente pelo respectivo conjunto, não como mero somatório de factos criminosos, mas enquanto revelador da dimensão e gravidade global do comportamento delituoso do agente, visto que a lei manda se considere e pondere, em conjunto, (e não unitariamente) os factos e a personalidade do agente. Como doutamente diz Figueiredo Dias, como se o conjunto dos factos fornecesse a gravidade do ilícito global perpetrado”, e, assim, [i]mportante na determinação concreta da pena conjunta será, pois, a averiguação sobre se ocorre ou não ligação ou conexão entre os factos em concurso, bem como a indagação da natureza ou tipo de relação entre os factos, sem esquecer o número, a natureza e gravidade dos crimes praticados e das penas aplicadas, tudo ponderando em conjunto com a personalidade do agente referenciada aos factos (-), tendo em vista a obtenção de uma visão unitária do conjunto dos factos, que permita aferir se o ilícito global é ou não produto de tendência criminosa do agente, bem como fixar a medida concreta da pena dentro da moldura penal do concurso, tendo presente o efeito dissuasor e ressocializador que essa pena irá exercer sobre aquele (-)»[21].


  Na determinação da pena conjunta, impõe-se atender aos “princípios da proporcionalidade, da adequação e proibição do excesso”[22], imbuídos da sua dimensão constitucional, pois que “[a] decisão que efectua o cúmulo jurídico de penas, tem de demonstrar a relação de proporcionalidade que existe entre a pena conjunta a aplicar e a avaliação – conjunta - dos factos e da personalidade, importando, para tanto, saber – como já se aludiu - se os crimes praticados são resultado de uma tendência criminosa ou têm qualquer outro motivo na sua génese, por exemplo se foram fruto de impulso momentâneo ou actuação irreflectida, ou se de um plano previamente elaborado pelo arguido”, sem esquecer, que “[a] medida da pena única, respondendo num segundo momento também a exigências de prevenção geral, não pode deixar de ser perspectivada nos efeitos que possa ter no comportamento futuro do agente: a razão de proporcionalidade entre finalidades deve estar presente para não eliminar, pela duração, as possibilidades de ressocialização (embora de difícil prognóstico pelos antecedentes)”»[23].


A decisão que determine a medida concreta da pena do cúmulo deverá correlacionar conjuntamente os factos e a personalidade do condenado no domínio do ilícito cometido por forma a caracterizar a dimensão e gravidade global do comportamento delituoso do agente, na valoração do ilícito global perpetrado.


A decisão que fixe a medida concreta da pena do cúmulo não pode, designadamente, deixar de se pronunciar sobre se a natureza e a gravidade dos factos reflecte a personalidade do respectivo autor ou a influenciou, «para que se possa obter, como se considera no acórdão que vem de se citar, uma visão unitária do conjunto dos factos, que permita aferir se o ilícito global é produto de tendência criminosa do agente, ou revela pluriocasionalidade (…), bem como ainda a análise do efeito previsível da pena sobre o comportamento futuro do agente (exigências de prevenção especial de socialização).


Na fundamentação da pena conjunta, o acórdão proferido pelo Tribunal Colectivo (1.ª instância) fornece elementos que, pela sua pertinência, se entende convocar.


Depois de se consignar as molduras abstractas das penas conjuntas para cada um dos arguidos, lê-se ali:


«[…] Ponderando o que nestes autos efectivamente se apurou quanto ao comportamento dos indicados arguidos, afigura-se que uma pena que se mantenha no terço inferior da moldura “útil” do concurso responde ainda adequadamente ao grau de censura que as suas condutas complexivamente concitam.

[…] Com efeito, se a conduta da arguida teve uma dimensão assinalável, a do arguido, dedicando-se, quer à subtracção, quer ao desmantelamento dos veículos, acaba por não ficar muito aquém daquela; por outro lado, estamos no domínio de uma criminalidade patrimonial que causa grande alarme social, tendo consequências económicas para a maior parte dos ofendidos que foi muito para além da mera perda do veículo que lhes foi subtraído.

[…] No entanto, é importante também manter as penas únicas a aplicar dentro de limites suportáveis do ponto de vista especial-preventivo, em especial no caso da arguida, considerando a amplitude (ou seja, o severo limite superior) da moldura “única” encontrada, de forma a que, respondendo embora de forma eficaz do ponto de vista geral-preventivo aos factos aqui em apreço, não se prejudiquem as possibilidades de ressocialização futura dos arguidos».


Tendo em conta o preceituado no artigo 77.º, n.º 2, do Código Penal, a moldura penal do concurso relativa à arguida AA tem uma grande amplitude, pois está compreendida entre o limite mínimo de 3 anos de prisão (pena parcelar mais baixa) e 25 anos (limite máximo legal já que a soma material das penas parcelares atinge o valor de 39 anos de prisão).

A moldura penal do concurso referente ao arguido BB compreende-se entre 3 anos e 18 anos e 3 meses de prisão.


Será nessas molduras que se deverá ter em conta os factos e a personalidade dos agentes, ou, como refere FIGUEIREDO DIAS, «a gravidade do ilícito global perpetrado», apontando este autor como critério avaliativo a seguir o da «conexão e o tipo de conexão que entre os factos concorrentes se verifique», para além de uma «avaliação da personalidade unitária» reconduzível ou não a uma tendência criminosa[24].


Como se afirma no já citado acórdão de 28-11-2018, «[n]a expressão dos acórdãos deste Supremo Tribunal de Justiça, de 20-02-2008, proferido no processo n.º 4733/07 e de 8-10-2008, no processo n.º 2858/08, desta 3.ª Secção, na formulação do cúmulo jurídico, o conjunto dos factos fornece a imagem global do facto, o grau de contrariedade à lei, a grandeza da sua ilicitude; já a personalidade revela-nos se o facto global exprime uma tendência, ou mesmo uma “carreira”, criminosa ou uma simples pluriocasionalidade».


A actividade delituosa da arguida AA desenvolveu-se durante um período compreendido entre Abril de 2013 e Janeiro de 2014. Neste lapso de tempo, a arguida, de forma reiterada e pertinaz, dedicou-se à subtracção de veículos automóveis que, depois, seriam objecto de desmantelamento, em cuja actividade o arguido BB participava.


Relativamente ao arguido BB, a sua actividade na subtracção de veículos decorreu em período temporal mais curto ao qual acresce, porém, a muito censurável actividade desenvolvida no domínio da receptação.


Perscrutando o conjunto dos factos praticados pelos arguidos, ora recorrentes, não consideramos que a sua actividade tenha sido meramente ocasional, de aproveitamento de circunstâncias que se lhes depararam, antes é reveladora de uma personalidade desvaliosa, próxima da tendência criminosa.

 

A personalidade dos arguidos plasmada nos factos praticados tem uma eficácia agravante, posto que de claro alheamento da normatividade, indiferentes à situação dos ofendidos para alguns dos quais, pelo menos, os veículos constituíam seguramente o seu instrumento ou meio de trabalho.

A ilicitude global do comportamento dos arguidos, revelada nos crimes cometidos, é muito elevada, revelando-se aqui intensas exigências de prevenção geral.

A função de prevenção geral que deve acentuar perante a comunidade o respeito e a confiança na validade das normas que protegem tanto os bens pessoais como o património das pessoas tem de ser eminentemente assegurada, sobrelevando, decisivamente, as restantes finalidades da punição.

                         

A inserção familiar da arguida reveste moderada eficácia atenuante pois que se mostrou insuficiente para a conter na normatividade.

Relativamente ao arguido BB, como factor atenuante, a ausência de antecedentes criminais,

Quanto a ambos os arguidos, agora recorrentes, o período de tempo já decorrido desde a prática dos factos, com o inerente efeito erosivo, assume particular relevo.


Tudo ponderado, valorando globalmente os factos e a personalidade do arguido, tendo presente que a pena conjunta há-de ser fixada nos limites das molduras abstractas apontadas consideramos justificar-se uma intervenção correctiva das penas fixadas no acórdão recorrido.

Pelo que entendemos adequadas e ajustadas, por satisfazerem os interesses da prevenção:


- fixar à arguida AA a pena única de 6 anos e 8 meses de prisão; e

- fixar ao arguido BB a pena de 5 anos e 3 meses de prisão.


Assim, procedendo parcialmente os recursos interpostos.

           


  III – DECISÃO


  Em face do exposto, acordam na 3.ª Secção do Supremo Tribunal de Justiça em:

1. Julgar improcedente a arguição das nulidades formulada pela recorrente AA;

2. Rejeitar o recurso, por inadmissibilidade legal, recurso interposto pela arguida AA, nos termos dos artigos 420.º, n.º 1, alínea b), e 414.º, n.º 2, do CPP, quanto à questão nova suscitada referente ao crime continuado e quanto à reapreciação da matéria de facto, nos termos conjugados dos artigos 420.º, n.º 2, alínea b), 414.º, n.º 2 e 434.º, todos do CPP;

3. Rejeitar, por irrecorribilidade, o recurso interposto pela arguida AA, nos termos dos artigos 420.º, n.º 1, alínea b) e 414.º, n.os 2 e 3, e 400.º, n.º 1, alínea f),do CPP, quanto à matéria respeitante aos crimes de furto praticados e respectivas penas em que foi condenada, todas não superiores a 8 anos;

4. Conceder parcial provimento aos recurso interpostos pelos arguidos, condenando-se:

a) O arguido BB na pena única de 5 (cinco) anos e 3 (três) meses de prisão; e

b) A arguida AA na pena única de 6 (seis) anos e 8 (oito) meses de prisão.

           

       Sem custas – artigo 513.º, n.º 1, do CPP


  Texto processado e revisto pelo relator que assina digitalmente que atesta, nos termos e para os efeitos do artigo 15.º-A do Decreto-Lei n.º 20/2020, de 1 de Maio, o voto de conformidade da Ex.ma Juíza Adjunta, Conselheira Conceição Gomes.

           

SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA, 1 de Julho de 2020


Manuel Augusto de Matos (Relator)

Conceição Gomes

__________

[1] Com os trechos destacados no original.
[2] Destaques e sublinhados no original.
[3] Disponível, como dos demais que se citarem sem outra menção, nas Bases Jurídico-Documentais do IGFEJ, em www.dgsi.pt.
[4] Sumários de Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça - Secções Criminais, 2013, em www.stj.pt/jurisprudência/sumários de acórdãos/Criminal.
[5] Disponível, como os demais acórdãos que se citarem sem outra menção, nas Bases Jurídico-Documentais do IGFEJ.
[6] https://dre.pt/application/dir/pdf1sdip/2005/11/212A00/63406346.pdf
[7]http://www.dgsi.pt/jtrl.nsf/33182fc732316039802565fa00497eec/ef9cd5bb55f6c46380257287003c0cf5?OpenDocument&Highlight=0,10221%2F2006-5
[8] Comentário Conimbricence do Código Penal - Parte Especial, dirigido por JORGE DE FIGUEIREDO DIAS, Tomo II, Coimbra Editora, 1999, p. 43.
[9] Neste sentido, vide, entre muitos outros, os acórdãos do STJ de 13-11-2014, Proc. N.º 249/11.0PECBR.C1.S1; de 07-05-2014, Proc. N.º 250/12.7JABRG.G1.S1; de 18-06-2014, Proc. n.º 659/06.5GACSC.L1.S1; de 02-10-2014, Proc. n.º 87/12.3SGLSB.L1.S1; bem como os acórdãos, acessíveis in www.stj./jurisprudencia/sumários de acórdãos/Criminal - Ano de 2014, de 13-02-2014, Proc. n.º 160/13.0TCLSB.L1.S1; de 27-02-2014, Proc. n.º 1572/11.0JAPRT.P1.S2; de 10-04-2014, Proc. n.º 431/10.8GAPRD.P1.S1; de 14-05-2014, Proc. n.º 42/11.0JALRA.C1.S1; de 18-09-2014, Proc. n.º 1299/09.2PBLRA.C1.S1; de 25-09-2014, Proc. n.º 384/12.8TATVD.L1.S1.
[10] Estudos Sobre o Novo Processo Civil, Lisboa, Lex, 1997, p. 395,
[11] Recursos em Processo Civil, Novo Regime (DL 303/2007, de 24-08), Almedina, 2008, p. 23, e Recursos no Novo Código de Processo Civil, 2014 – 2.ª Edição, Almedina, pp. 92-93.:
[12] Sumários de Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça - Secções Criminais, Setembro de 2017.
[13] Sumários de Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça - Secções Criminais, Fevereiro de 2018.
[14] Sumários de Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça - Secções Criminais, Julho de 2019.
[15] Constituição da República Portuguesa Anotada, volume I, 4.ª Edição Revista, Coimbra Editora, p. 516.
[16] Acórdãos de 4 de Fevereiro de 2010, processo n.º 1244/06.7PBVIS.C1.S129, e de Março de 2012, processo n.º 18/10.5GBTNV.C1.S1. No mesmo sentido, entre outros acórdãos neles citados, os de 8 de Janeiro de 2014, processo n.º 104/07.9JBLSB.C1.S1, de 6 de Fevereiro de 2014, processo n.º 417/11.5BBLLE.E1.S1, e de 27 de maio de 2015, processo n.º 352/13.2PBOER.S1.
[17] No mesmo sentido, v. os acórdãos de 26-06-2014, proferido no processo n.º 160/11.5JAPRT.C1.S1 - 5.ª Secção, de 04-05-2016, proferido no processo n.º 1101/12.8TDPRT. P1. S1 – 3.ª Secção, e de 28-11-2018, proferido no processo n.º 115/17.6JDLSB.L1.S1 – 3.ª Secção.
[18] Sumários de Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça – Secções Criminais, Boletim Anual – 2015, Assessoria Criminal.
[19] Consequências Jurídicas do Crime, Coimbra Editora, p. 56.
[20] Penas e Medidas de Segurança, Almedina,2017, p. 59.
[21] Acórdão de 12-09-2012 (Proc. n.º 605/09.4PBMTA.L1.S1 – 3.ª Secção).
[22] Acórdão de 10-12-2014 (Proc. n.º 659/12.6JDLSB.L1.S1 – 3.ª Secção).
[23] Acórdão de 27-06-2012 (Proc. n.º 70/07.0JBLSB-D.S1 – 3.ª Secção).
[24] Direito Penal Português - As Consequências Jurídicas do Crime, pag.421.