EMBARGOS DE TERCEIRO
CADUCIDADE DO DIREITO À ACÇÃO
ÓNUS DE ALEGAÇÃO E PROVA
Sumário

I - É ao embargado que compete o ónus de provar, e, bem assim, de excepcionar, a extemporaneidade dos embargos, como facto extintivo do direito de propor a acção.
II - Assim, não incumbe ao embargante o ónus de prova da tempestividade dos embargos de terceiro, em fase contraditória.
III - O instituto dos embargos de terceiro actua sempre que a penhora ou qualquer acto judicialmente ordenado de apreensão ou entrega de bens, ofenda a posse ou qualquer direito de que seja titular quem não é parte na causa.
IV - Ou seja, para o legislador é terceiro, para este feito, todo aquele que comprovadamente não seja parte na acção executiva.

Texto Integral

Apelação nº 1498/17.4T8MAI-C.P1
Tribunal recorrido: Tribunal Judicial da Comarca do Porto
Juízo de Execução do Porto
Relator: Carlos Portela
Adjuntos: Joaquim Correia Gomes
António Paulo Vasconcelos

Acordam na 3ª Secção do Tribunal da Relação do Porto

I.Relatório:
Por apenso aos autos de execução que B…, C… e D… deduziram contra E…, veio F…, Unipessoal Lda., deduzir os presentes embargos de terceiro, onde em síntese alegou não ser parte na acção executiva de que os mesmos embargos são apenso e ainda que a benfeitoria ali penhora não lhe pertence.
Procedeu-se produção das provas requeridas pela embargante, considerando-se ser considerar provável a existência do direito invocado, e nos termos do disposto no art.º 345º do CPC, acabando por receber os embargos deduzidos.
Notificadas as partes primitivas para contestar vieram estas arguir a caducidade da providência e a ilegitimidade da embargante, impugnando ainda parte dos factos alegados na petição inicial de embargos.
Os autos prosseguiram os seus termos sendo proferido despacho saneador-sentença no qual se julgou verificada a excepção da caducidade do direito da acção por parte dos exequentes e, em consequência, se julgaram improcedentes os presentes embargos.
Inconformada veio a exequente F…, Unipessoal Lda., interpor recurso desta decisão, apresentando desde logo e nos termos legalmente previstos as suas alegações.
Não foi apresentada resposta.
Foi proferido despacho onde e considerou o recurso tempestivo e legal e se admitiu o mesmo como sendo de apelação, com subida imediata, nos autos e efeito meramente devolutivo.
Recebido o processo nesta Relação emitiu-se despacho que teve o recurso por próprio, tempestivamente interposto e admitido com efeito e modo de subida adequados.
Colhidos os vistos legais cumpre decidir.

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II. Enquadramento de facto e de direito:
Ao presente recurso são aplicáveis as regras processuais da Lei nº 41/2013 de 26 de Junho.
É consabido que o objecto do presente recurso, sem prejuízo das questões que sejam de conhecimento oficioso obrigatório, está definido pelo conteúdo das conclusões vertidas pela apelante/embargante nas suas alegações (cf. artigos 608º, nº2, 635º, nº4 e 639º, nº1 do CPC).
E é o seguinte o teor das mesmas conclusões:
1.A recorrente discorda da douta decisão proferida quanto à interpretação que faz dos factos e, consequentemente, da aplicação do direito aos mesmos.
2.Nos termos do artigo 202º da Constituição da República Portuguesa os tribunais são os órgãos de soberania com competência para administrar a justiça em nome do povo.
3.A instância executiva de que estes embargos de terceiro são apenso, iniciou-se no dia 03/02/2017 contra dois executados: a aqui recorrente/embargante e E….
4.No dia 27/03/2017, a senhora agente de execução realiza a penhora de um “direito de crédito correspondente a uma benfeitoria realizada pelos executados E… e F…, Unipessoal, Lda., integrada na parcela de terreno para construção (...), que consiste numa moradia composta por rés-do-chão e 1.º andar (...)”.
5.Nesse mesmo dia a senhora agente de execução comunicou a realização da penhora a ambos os executados.
6.Em 01/05/2017 a senhora agente de execução comunicou à recorrente/embargante que a execução apenas prosseguia contra o executado E….
7.Em momento algum dos autos executivos a senhora agente de execução proferiu o despacho de extinção da instância executiva a favor da recorrente/embargante.
8.A recorrente/embargante foi notificada em 08/03/2018, na qualidade de executada, para contestar a reclamação de créditos apresentada pelo Instituto da Segurança Social IP.
9.Só por sentença de 28/11/2019, no apenso B relativo à reclamação de créditos, esta instância foi julgada extinta quanto à recorrente/embargante.
10.O executado E… intentou embargos de executado e de oposição à penhora, dando origem ao apenso A.
11.A sentença proferida em 27/11/2018, nesse apenso A, declara parte ilegítima a executada F…, Lda., absolvendo-a da instância executiva.
12.Este segmento da sentença não foi considerado na sentença a quo, o que acaba por desvirtuar toda a interpretação dos factos e conduz a uma errónea aplicação da lei.
13.Assim, a recorrente/embargante continuou a ser executada até ao trânsito em julgado da sentença atrás referida que a declarou parte ilegítima, absolvendo-a da instância executiva.
14.Esta sentença é de 27/11/2018 e só após o seu trânsito em julgado é que efectivamente a recorrente/embargante passou a ter a qualidade de terceira.
15.Só o juiz, com as suas garantias de independência, imparcialidade e isenção face às partes, no processo de execução, pode decidir aquilo que é da essência da sua função e que consiste, no fundo, no declarar o direito naquele caso concreto – o que aconteceu apenas em 27/11/2018.
16.E, assim sendo, só a partir do trânsito em julgado desta sentença se inicia a contagem do prazo de caducidade para serem requeridos os presentes embargos, porquanto só então a recorrente/embargante era terceira para este efeito.
17.O instituto dos embargos de terceiro opera sempre que a penhora ou qualquer acto judicialmente ordenado de apreensão ou entrega de bens, ofenda a posse ou qualquer direito de que seja titular quem não é parte na causa; e este é UM requisito cumulativo conjuntamente com os demais.
18.Tal significa que a lei considera como terceiro, para este feito, todo aquele que não seja parte na acção executiva.
19.Ora, como já se disse a recorrente/embargante foi inicialmente parte nos autos executivos, pelo que, e apesar de a penhora ofender ostensivamente o seu direito, não tinha legitimidade processual para lançar mão dos embargos de terceiro.
20.Mas também não se podia opor à execução ou à penhora porque, apesar de a execução não ter sido declarada extinta quanto a si, a senhora agente de execução comunicou que a mesma só prosseguia contra o E….
21.Sem prejuízo de a referida sentença transitar em julgado em Janeiro de 2019, a aqui recorrente/embargante requereu de imediato o apoio judiciário com nomeação de patrono para intentar os presentes embargos.
22.Tal pedido de protecção jurídica na segurança social ocorreu no dia 13/12/2018, interrompendo o prazo em curso.
23.A nomeação ocorreu no dia 14 de Janeiro de 2019, conferindo 30 dias ao patrono nomeado para intentar a respectiva acção de embargos de terceiro.
24.A qual deu entrada no dia 13/02/2019.
25.Pelo que e, salvo melhor opinião, não se verifica a caducidade do direito da recorrente/embargante em intentar os presentes embargos de terceiro.
26.Aliás, em sede de audiência prévia o tribunal a quo apenas cuidou de tentar perceber se os exequentes estavam devidamente representados e se a penhora teria sido devida e correctamente realizada, não tendo sido dada oportunidade de ser rebatida quaisquer outras questões, nomeadamente a caducidade, as quais ficaram relegadas para uma posterior diligência, a qual nunca veio a acontecer.
27.Encontra-se sobejamente demonstrado documentalmente nos autos com facturas, recibos, licenças de construção e licenças de habitação que todas as construções/benfeitorias realizadas nos lotes foram única e exclusivamente pagas a expensas da recorrente/embargante, inclusivamente as licenças de construção e licenças de habitação estão registadas no nome da F…, Lda., pelo que o direito de crédito penhorado correspondente às benfeitorias é pertença exclusiva desta, que não é parte na acção executiva.
28.E, deste modo, a penhora sobre tal direito viola de forma grosseira o seu direito de propriedade, que é constitucionalmente protegido, bem como o nº 1 do artigo 735º do CPC, porquanto só podem estar sujeitos à execução os bens do devedor.
29.A sentença em crise fez uma incorrecta interpretação da conjugação dos artigos 342º, 344º, 576º e da alínea e) do 577º do C.P.C.
30.Pelo que acaba por violar o estipulado nº 1 do artigo 735º do CPC e que decorre do artigo 62.º da CRP.
Termos em que, e nos mais de Direito deve ser dado provimento ao presente recurso e, por via dele revogar-se a sentença recorrida e, em consequência, julgar-se procedentes os embargos de terceiro, decretando-se ainda o cancelamento da penhora, sendo que só assim farão os Venerandos Desembargadores a devida Justiça.
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Perante o antes exposto, resulta claro que é a seguinte a questão suscitada no presente recurso:
A não verificação da excepção peremptória da caducidade do direito de acção da embargante.
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Como ficou já visto neste recurso não se questiona a decisão de facto que foi proferida na decisão recorrida.
Importa, pois e antes do mais, recordar aqui o que a esse propósito foi feito constar na mesma.
Assim:
Factos assentes, resultantes exclusivamente da tramitação dos autos:
1.A execução de que estes autos dependem deu entrada em juízo em 03 de Fevereiro de 2017, tendo sido proposta por B…, C… e D… contra o ainda executado E…, mas também contra a ora embargante, F…, Unipessoal, Lda.
2.No requerimento executivo, pretendiam os exequentes executar a sentença proferida na acção declarativa e, nos termos que constam do requerimento executivo, exigir o pagamento da nota de custas de parte que apresentaram nos autos principais.
3.Por despachos de 15-02-2017 e 14-03-2017 foi julgada ilegal essa cumulação de pedidos, tendo sido reduzido o pedido exequendo apenas à quantia relativa às obrigações resultantes da sentença declarativa.
4.Em 2017 / 03 / 27 foi penhorado «Direito de crédito correspondente a uma benfeitoria realizada pelos executados E… e F…, Unipessoal, Lda., integrada na parcela de terreno para construção, descrito na Conservatória do Registo Predial de Santo Tirso sob o n.º 599, freguesia …, com inscrição a favor de G… e inscrito na matriz respectiva sob o n.º 2761 da União de Freguesias …, que consiste numa moradia composta por rés-do-chão e 1.º andar localizada a poente da construção em banda implantada neste imóvel, no valor de 17.000,00 euros.»
5.A sociedade F…, Unipessoal, Lda foi notificada da penhora referida em 4º em 27-03-2017 «Nos termos do disposto nos artigos 626º e 856º do Código Processo Civil (CPC), fica pela presente citado para os termos do presente processo executivo, tendo o prazo de 20 (vinte dias) para: a) Pagar a quantia em dívida, juros e custas; ou querendo, b) Deduzir oposição à execução através de embargos de executado; e/ou c) Deduzir oposição à penhora; (…)».
6.Em 27 de Abril de 2017 a ora embargante F…, Unipessoal, Lda. dirigiu à Sr.ª Agente de Execução um requerimento (ora junto a fls. 120, com o seguinte teor:
7.Em 01-05-2017 a Sr.ª Agente de Execução proferiu a seguinte decisão: «A presente acção executiva foi instaurada contra E… e F…, Unipessoal, Lda. Em resposta ao despacho do M.º Juiz de Execução de 15.02.2017, os exequentes requereram o prosseguimento dos autos relativamente á sentença, tendo por despacho de 14.03.2017 sido reduzido o pedido exequendo apenas à quantia relativa ás obrigações resultantes da sentença declarativa, em que foi condenado o executado E…, pelo que a execução apenas prosseguirá contra este.».
8.A decisão referida em 7º foi notificada à embargante F…, Unipessoal, Lda. em 01-05-2017.
9.Em 08/03/2018 a ora embargante F…, Unipessoal, Lda. foi notificada da reclamação de créditos apresentada pelo Instituto de Segurança Social, IP.
10.Em 23 de Março de 2018 a ora embargante F…, Unipessoal, Lda. veio deduzir oposição a essa reclamação de créditos, dizendo, para além do mais que «Como a Reclamante bem sabe e não pode ignorar, a F…, Unipessoal, Lda. deixou de figurar como exequente nos presentes autos executivos por decisão judicial com a Referência 378644524 a 15/02/2017, que consta nos autos executivos principais e ora se junta – doc. 01 e se dá por reproduzida com as devidas consequências legais. 5º Bem como, a Reclamada apenas ocupava a posição de exequente como devedora solidária relativamente às custas processuais, pedido o qual, caiu relativamente à mesma, tendo prosseguido apenas a execução contra o executado E…, conforme consta da Decisão da Agente de execução (presente nos autos executivos) que ora se junta e se dá por reproduzida com as devidas consequências legais (…)».
11.Em 06/09/2017 o executado E… veio deduzir embargos de executado em que, para além do mais, veio, em cumulação com os embargos de executado, deduzir oposição a penhora alegando que o direito penhorado – benfeitoria realizada na parcela de terreno para construção (…) com inscrição a favor de G… (…) que consiste numa moradia composta por rés-do-chão e 1º. andar… - não é sua pertença mas sim da sociedade F…, Unipessoal, Lda..
12.Tal oposição foi julgada improcedente, por sentença proferida em 27 de Novembro de 2018, confirmada por acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 8 de Outubro de 2019.
13.Os presentes embargos de terceiro deram entrada em juízo em 13/02/2019.
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Vejamos:
Nos termos do art.º 342º - nº1 do CPC: “Se a penhora, ou qualquer ato judicialmente ordenado de apreensão ou entrega de bens, ofender a posse ou qualquer direito incompatível com a realização ou o âmbito da diligência, de que seja titular quem não é parte na causa, pode o lesado fazê-lo valer, deduzindo embargos de terceiro”, dispondo o artigo 344º do citado diploma legal: nº 1 – “Os embargos são processados por apenso à causa em que haja sido ordenado o acto ofensivo do direito do embargante. 2 - O embargante deduz a sua pretensão, mediante petição, nos 30 dias subsequentes àquele em que a diligência foi efectuada ou em que o embargante teve conhecimento da ofensa, mas nunca depois de os respectivos bens terem sido judicialmente vendidos ou adjudicados, oferecendo logo as provas”.
Por outro lado e segundo o disposto no art.º 345º, sob a epígrafe “ Fase introdutória dos embargos”: “Sendo apresentada em tempo e não havendo outras razões para o imediato indeferimento da petição de embargos, realizam-se as diligências probatórias necessárias, sendo os embargos recebidos ou rejeitados conforme haja ou não probabilidade séria da existência do direito invocado pela embargante”.
Ora tendo esta fase natureza liminar e cautelar, a mesma apenas assegura a possibilidade de prosseguimento da acção, razão pela qual e no que toca á mesma, alguns autores e alguma jurisprudência defendem o conhecimento oficioso da intempestividade, e o ónus de alegação e de oferecimento de prova sumária pelo embargante da tempestividade dos embargos (neste sentido cf. Lebre de Freitas, “A Acção Executiva, À luz do CPC de 2013, 6ª edição, pág.337 e o Acórdão da Relação de Lisboa de 14.05.2015, processo 8365/10.4YYLSB-B.L1-2, www.dgsi.pt).
No caso e tendo sido já proferida decisão liminar de prosseguimento por despacho judicial de 24.05.2019, a fls.64 dos autos, não está, manifestamente, em causa a apreciação e aplicação da referida norma do art.º 345º do CPC.

Mais, admitidos os embargos segue-se, como refere o indicado autor, obra citada, pg.338 a “fase contraditória” “que tem início com a notificação dos embargados para contestar” nos termos do nº1 do art.º 348º do CPC, seguindo-se os termos do processo comum.
No caso e tendo a embargante F…, Lda. vindo contestar invocando a intempestividade dos embargos, tal invocação traduz-se em defesa por excepção peremptória, estando em causa por isso em causa o prazo de caducidade para a dedução dos mesmos.
Como todos já vimos, na decisão recorrida foi decidido no sentido da verificação de tal excepção.
Agora cumpre, pois, saber se tal decisão merece ou não ser acolhida.
Dispõe assim o art.º 342º do Código Civil, referente ás regras de repartição do “Ónus da prova”: - nº2 “A prova dos factos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito invocado compete àquele contra quem a invocação é feita”, mais dispondo o nº2 do art.º 343º, do citado diploma legal, reportado ao “Ónus da prova em casos especiais” que – nº 2 “Nas acções que devam ser propostas dentro de certo prazo a contar da data em que o autor teve conhecimento de determinado facto, cabe ao Réu a prova de o facto já ter decorrido, salvo se outra for a solução especialmente consignada na lei”.
Nestes termos, e ao abrigo das citadas disposições legais, impõe-se concluir ser ao embargado que compete o ónus de provar, e, bem assim, de excepcionar, a extemporaneidade dos embargos, como facto extintivo do direito de propor a acção.
Mais, não incumbe ao embargante o ónus de prova da tempestividade dos embargos de terceiro, em fase contraditória, nos termos acima expostos (neste sentido e entre outros o Acórdão do STJ de 1.04.2008, processo 08A046, www.dgsi.pt. onde se afirma: “Nada tendo sido provado relativamente ao momento do conhecimento pelo embargante do facto (penhora) lesivo do seu direito deverão os embargos de terceiro, (...) considerar-se tempestivamente propostos, exactamente porque recai sobre o embargado o ónus da prova sobre a extemporaneidade.”
No mesmo sentido vão os seguintes acórdãos:
Da Relação de Guimarães de 13.02.2012, processo 3592/03, da Relação de Coimbra de 1.04.2008, processo 5166/06.3TBLRA-B.C1 e da Relação de Lisboa de 14.05.2015, processo 18365/10.4YYLSB-B.L1-2, todos em www.dgsi.pt.
Subscrevendo tal posição ver ainda Lopes do Rego, Comentários ao CPC, 2004, pág.327.
Perante ao antes exposto e recaindo sobre a embargante F…, Lda. o ónus da prova sobre a extemporaneidade dos presentes embargos, é para nós evidente que os mesmos se devem considerar como tempestivamente propostos.
Se não vejamos:
Já sabemos que a decisão recorrida julgou procedente a excepção de caducidade baseando-se nas seguintes circunstâncias de facto:
- No facto de a recorrente/embargante ter tido conhecimento da penhora em 27/03/2017.
- No facto de a senhora Agente de Execução ter procedido à notificação da apelante/embargante e em 01.05.2017 de que a execução apenas prosseguiria contra o executado E….
- No facto de em 06.09.2017 o executado E… ter deduzido embargos de executado e oposição à penhora, processo esse que foi julgado parcialmente procedente por decisão proferida em 27.11.2018 e confirmada por acórdão do Tribunal da Relação do Porto datado de 8.10.2019.
- No facto da apelante/embargante ter em 28.03.2018 deduzido oposição a uma reclamação de créditos apresentada pelo Instituto da Segurança Social IP e da qual teve conhecimento em 8.03.2018.
- No facto de os presentes embargos de terceiro terem dado entrada em 13.02.2019.
E foi tendo em conta tais circunstâncias que acabou por vir a entender que, pelo menos desde 01.05.2017 a apelante/embargante tinha conhecimento da penhora e da sua qualidade de terceira.
É pois tal conclusão que em nosso entender não pode deixar de ser questionada.
Assim os elementos constantes dos autos permitem (e impõem) que se conclua que apesar da referida notificação ter ocorrido em 01.05.2017, o certo é que a apelante/embargante não deixou, em 08.03.2018, de ser notificada na qualidade de executada, para contestar a reclamação de créditos apresentada pelo Instituto da Segurança Social IP.
Perante tal realidade tem razão a embargante ora apelante quando defende ser legítimo considerar que se questione se à data de Março 2018 era terceira ou executada.
Tudo porque apesar da decisão da Sr.ª Agente de Execução antes melhor referida, o certo é que continuava a ser notificada na qualidade de executada.
E são igualmente válidos os argumentos que logo a seguir e em sede de alegações de recurso traz ao processo e que são os seguintes:
O facto da Sr.ª Agente de Execução e quanto a si não ter declarado a extinção da instância executiva;
No facto da Sr.ª Agente de Execução ter continuado a considerá-la como executada nas diferentes e diversas notificações que foi fazendo às restantes partes processuais.
No próprio facto dos exequentes em sede de contestação aos embargos de terceiro – e também na contestação aos embargos de executado – terem continuado a defender a qualidade de executada da embargante ora apelante.
A ser assim, resulta também para nós evidente que se devia considerar que a embargante/apelante continuou a ser executada até ao trânsito em julgado da sentença que a declarou parte ilegítima e que, consequentemente, a absolveu da instância executiva.
Está comprovado que tal sentença foi proferida em 27.11.2018.
Por isso só após o trânsito em julgado da mesma é que a embargante ora apelante passou a ter a qualidade de terceiro.
E mais, só a partir daí se iniciou o prazo para deduzir embargos de terceiro.
Em suma, todos sabemos porque decorre da nossa lei adjectiva, que o instituto dos embargos de terceiro actua sempre que a penhora ou qualquer acto judicialmente ordenado de apreensão ou entrega de bens, ofenda a posse ou qualquer direito de que seja titular quem não é parte na causa.
Ou seja, o legislador considera como terceiro, para este feito, todo aquele que não seja parte na acção executiva.
Sendo certo que a embargante/apelante foi inicialmente parte nos presentes autos executivos, a verdade é que apesar de a penhora ofender ostensivamente o seu direito, não tinha então legitimidade processual para lançar mão dos embargos de terceiro.
Por outro lado também já vimos que apesar disso, nessa altura não se podia opor à execução ou à penhora porque, apesar de a execução não ter sido declarada extinta quanto a si, o certo é que a Sr.ª Agente de Execução não deixou de lhe dar a saber que a mesma execução só prosseguia contra o executado E….
Perante tal circunstancialismo pergunta, e bem, a apelante/embargante nas suas alegações de recurso como poderia acautelar, então o seu direito?
E a correcta resposta a tal pergunta, é também para nós a de que tal só seria possível através dos embargos de terceiro, o que só aconteceria a partir do momento em que tivesse sido definitivamente declarado que a embargante/apelante não fazia parte dos autos executivos.
E esse momento só acontece, manifestamente, com a sentença proferida em 27.11.2018, no apenso A., na qual o Tribunal declara parte ilegítima a executada F…, Lda., absolvendo-a então da instância executiva.
Ora tal circunstância de facto está comprovada nos autos mas não foi tida em conta, como deveria aliás ter sido, na decisão recorrida.
A ser deste modo, só a partir do trânsito em julgado desta sentença se inicia a contagem do prazo de caducidade para serem requeridos os presentes embargos, porque só a partir daí a embargante/apelante era terceira para este efeito.
Verifica-se que não obstante a referida sentença só transitar em julgado em Janeiro de 2019, a verdade é que a embargante/requerente não deixou de vir, de imediato, requerer o apoio judiciário com nomeação de patrono para intentar os presentes embargos.
E tal pedido foi formulado no dia 13.12.2018, interrompendo-se desde então o prazo em curso.
Mais se comprova que a nomeação de patrono ocorreu no dia 14.01.2019.
Por isso e sendo a partir concedido o prazo de 30 dias ao patrono nomeado para intentar a respectiva acção de embargos de terceiro, a mesma foi tempestivamente interposta já que deu entrada no dia 13.02.2019.
Ou seja, contrariamente ao que foi decidido, não se verifica a caducidade do direito da embargante F…, Unipessoal Lda. intentar os presentes embargos de terceiro.
Merece assim provimento o recurso aqui interposto.
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Sumário (cf. art.º 663º, nº7 do CPC):
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III. Decisão:
Pelo exposto, julga-se procedente o presente recurso de apelação e, em consequência revoga-se a decisão recorrida, determinando-se que a mesma seja substituída por despacho que se outra razão não obstar, mande prosseguir os autos nos termos e para os efeitos do disposto no nº1, parte final, do art.º 348º do CPC.
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Custas pela parte vencida a final.
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Notifique.

Porto, 8 de Outubro de 2020
Carlos Portela
Joaquim Correia Gomes
António Paulo Vasconcelos