Não tendo o requerente, co-arguido, interposto recurso do acórdão levado na instância, não se verifica nulidade, por omissão de pronúncia, do acórdão proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça, que decidiu a redução de penas de co-arguidos recorrentes, por razões estritamente pessoais – artigos 379.º n.º 1, 402.º n.º 2 alínea a), e 403 n.os 2 alínea a) e 3, do Código de Processo Penal.
Recurso Penal
Acordam, em conferência, no Supremo Tribunal de Justiça:
I
1. O arguido AA vem arguir a nulidade do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça que precede, prolatado a 28 de Fevereiro de 2020.
Invoca o disposto no artigo 379.º alínea a), do Código de Processo Penal (CPP) e no artigo 615.º, do Código de Processo Civil (CPC).
Alega, em síntese:
a) O crime de tráfico de estupefacientes por que foi condenado reporta a factos levados, em co-autoria, designadamente com os co-arguidos BB e CC;
b) Estes co-arguidos viram reduzidas, por via do recurso que interpuseram para o Supremo Tribunal de Justiça (acórdão de 28 de Fevereiro de 2020), as penas de 10 anos de prisão e de 9 anos e 6 meses de prisão, para as penas de 8 anos de prisão e de 7 anos e 6 meses de prisão, respectivamente;
c) O fundamento de tal redução de penas não respeita a questões pessoais de cada um dos arguidos mas sim à ponderação da matéria de facto provada «fundamentada de forma genérica e uniforme relativamente a todos os co-arguidos»;
d) Devendo aproveitar ao requerente, nos termos do disposto no artigo 402.º n.º 2 alínea a), do CPP;
e) A omissão da reponderação da pena de 7 anos e 6 meses de prisão em que o requerente se encontra condenado no acórdão de 28 de Fevereiro de 2020, gera a respectiva nulidade;
f) Em suprimento, e ponderando, por um lado, que, na dinâmica delitiva, a intervenção dos co-arguidos se encontra «num patamar hierárquico superior», e, por outro lado, que o arguido confessou os factos, era primário aos 00 anos de idade e dispunha de boa inserção familiar, social e laboral, justifica-se a redução da pena em que se encontra condenado para medida próxima dos 5 anos de prisão.
2. O Ex.mo Procurador-Geral Adjunto no Supremo Tribunal de Justiça pronunciou-se, a respeito, no sentido do indeferimento do requerido.
Pondera, designadamente, que, como resulta dos §§ 29 a 48 do acórdão sindicado, a redução das penas dos co-arguidos BB e CC, reportou a motivos estritamente pessoais, não transmissíveis aos co-arguidos, designadamente ao requerente.
II
3. Resulta (incontestadamente) dos autos:
a) Precedendo audiência de julgamento de um grupo de seis arguidos, o arguido requerente, AA, foi condenado na pena de 7 anos e 10 meses pela prática de crime de tráfico de estupefacientes, do artigo 21.º n.º 1, do Decreto-Lei n.º 15/93, de 2 de Janeiro;
b) De par, foram condenados, por idêntico crime, os arguidos BB (na pena de 10 anos de prisão), CC (na pena de 9 anos e 6 meses de prisão), DD (na pena de 7 anos e 10 meses de prisão), e EE (na pena de 6 anos e 10 meses de prisão), tendo o sexto arguido sido absolvido;
c) Todos os condenados recorreram para o Tribunal da Relação …, mas, salvo a do arguido EE que logrou a redução da pena para 5 anos e 2 meses de prisão, todas as impugnações soçobraram, saindo confirmado o deliberado em 1ª instância;
d) Todos os condenados interpuseram recurso da Relação para o Supremo Tribunal de Justiça, mas apenas os recursos interpostos pelos arguidos BB e CC tiveram seguimento, tendo os demais sido rejeitados, por inadmissibilidade, no Tribunal da Relação;
e) No Supremo Tribunal de Justiça, por acórdão de 28 de Fevereiro de 2020, os recursos interpostos pelos arguidos BB e do CC lograram parcial provimento, sendo a pena do primeiro reduzida de 10 para 8 anos de prisão e a do segundo de 9 anos e 6 meses para 7 anos e 6 meses de prisão.
4. Dispõe o artigo 402.º, do CPP (âmbito do recurso), designadamente, que (1) o recurso interposto da sentença abrange toda a decisão, que [2 a)] o recurso interposto por um dos arguidos, em caso de comparticipação, aproveita aos restantes – «salvo se for fundado em motivos estritamente pessoais» (n.º 2, proémio), impondo-se ademais, nos termos prevenidos no artigo 403.º n.os 2 alínea e) e 3, do CPP (limitação do recurso), o dever de retirar do recurso sobre uma parcela da decisão as consequências legalmente impostas relativamente a toda a decisão recorrida.
5. Dispõe, por sua vez, o artigo 379.º n.º 1, do CPP (nulidade da sentença), que é nula a sentença a) que não contenha a devida (artigo 374.º n.º 2, do CPP) fundamentação, e c) quando o tribunal deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar.
Vejamos.
6. O acórdão reclamado não padece da nulidade que vem arguida pelo arguido AA, seja a prevenida na alínea a), seja, designadamente, a prevista na alínea c) do n.º 1 do artigo 379.º, do CPP.
7. E assim, na medida em que resulta, à evidência, do acórdão revidendo, designadamente do teor dos §§ 29 a 48, que a comutação in mellius das penas aplicadas aos co-arguidos BB e do CC, resultou de razões que apenas aos mesmos respeitam, não cabendo estendê-las, designadamente, aos co-arguidos não recorrentes.
8. Caberá cotejar, designadamente, os §§ 44 a 48 do acórdão sindicado:
«44. Elementos de referência na determinação da pena são o grau de ilicitude do facto, o modo de execução e a gravidade das consequências.
45. No caso, a irrelevância da confissão e a pouca colaboração dos arguidos com as autoridades, e mesmo relevando, em abono atenuativo, seja a ausência de antecedentes criminais (no caso do arguido CC), seja o comportamento dos recorrentes em meio prisional, impõe-se a aplicação de penas detentivas, e com relevo punitivo.
46. Por outro lado, verificam-se factores de integração familiar e laboral que consentem, não a pretextada redução superlativa das penas concretizadas na instância, mas uma comutação in mellius que, respeitando as exigências de prevenção e a medida da culpa, não inviabilize, desproporcionadamente, um futuro ressocializado de conformação com as regras de convivência social, no respeito pelo Direito.
47. Figura-se assim que, na dita moldura abstracta de 4 a 12 anos de prisão, as penas podem ainda situar-se cerca do termo médio, distinguindo-se em função do pretérito delitivo do arguido BB.
48. Neste contexto – e sem qualquer desdouro para a sensibilidade expressa nas instâncias, designadamente em 1.ª instância, que beneficiou da imediação que não ampara os tribunais de recurso –, a pena de 10 anos de prisão aplicada ao arguido BB será de reduzir a 8 anos de prisão, enquanto a pena de 9 anos e 6 meses de prisão aplicada ao arguido CC será de reduzir a 7 anos e 6 meses de prisão.»
9. Por que assim, não cabia pronúncia, pelo Supremo Tribunal de Justiça, sobre a questão da extensão ao requerente, não recorrente, da mitigação da pena decidida, por razões só aos mesmos atinentes, quanto aos co-arguidos, recorrentes, não se figurando cometida qualquer, designadamente a nulidade arguida no requerimento sob apreciação.
10. Em conclusão e síntese:
Não tendo o requerente, co-arguido, interposto recurso do acórdão levado na instância, não se verifica nulidade, por omissão de pronúncia, do acórdão proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça, que decidiu a redução de penas de co-arguidos recorrentes, por razões estritamente pessoais – artigos 379.º n.º 1, 402.º n.º 2 alínea a), e 403 n.os 2 alínea a) e 3, do Código de Processo Penal.
III
11. Nestes termos e com tais fundamentos, decide-se:
a) indeferir o requerimento em referência, do arguido AA;
b) condenar o arguido na mínima taxa de justiça – ressalvado apoio judiciário.
Lisboa, 23 de Abril de 2020
António Clemente Lima – Relator
Margarida Blasco