I. Tendo em atenção a data da instauração em Juízo dos autos de inventário, ou seja, o ano de 2010, conquanto o processo de inventário tenha sido objecto de intervenção legislativa, concretamente, através da Lei n.º 23/2013 de 5 de Março, este novo regime jurídico do processo de inventário não se aplica, conforme decorre do respectivo art.º 7º, daí que, o regime aplicável é aqueloutro que resulta do anterior Código de Processo Civil.
II. O exequente que dispuser de título apenas quanto a um dos cônjuges, mas pretenda executar bens comuns do casal, deve, ao nomear tais bens à penhora, pedir a citação do cônjuge do executado, para requerer a separação de bens, de tal sorte que se for apresentado pedido de separação de bens, cujo requerimento é autuado por apenso á execução, ou junta certidão comprovativa da pendência de acção em que a separação já tenha sido requerida, a execução fica suspensa até à partilha.
III. O meio processual a usar com vista à separação judicial de bens é o processo de inventário com as especialidades dos artºs. 1404º a 1408º do anterior Código de Processo Civil, isto é, um processo especial de inventário, aberto só ao cônjuge do executado, para descrição e partilha apenas dos bens comuns, com o efeito de suspender a execução até à partilha.
IV. Sem prejuízo das particularidades do processo de inventário com vista à separação judicial de bens, e em tudo o mais que seja compatível, observar-se-ão, nos termos do n.º 3 do art.º 1404º do Código de Processo Civil, as disposições referentes ao processo dito comum de inventário.
V. O inventário para separação de meações destina-se à defesa dos interesses patrimoniais do cônjuge do executado, permitindo-lhe salvaguardar a sua meação nos bens comuns, correndo apenas entre os dois cônjuges, conquanto o credor exequente não possa deixar de ser equiparado a um “interessado”, relembrando-se que o inventário é caracterizado pelo princípio da universalidade, sendo o seu objetivo a partilha de todos os bens e direitos que integram essa comunhão, visando-se uma partilha igualitária, já que o inventário tem por finalidade distribuir fiel e equitativamente todo o apurado acervo.
VI. A lei adjectiva civil aplicável ao caso sub iudice, não fixa prazo temporal para a apresentação da reclamação à relação de bens apresentada, significando a expressão “posteriormente” referida no art.º 1348º n.º 6 do anterior Código de Processo Civil que pode ser apresentada a “qualquer altura”, daí que as reclamações contra a relação de bens podem sempre ter lugar até ao trânsito em julgado da sentença homologatória da partilha, em homenagem ao princípio da verdade material, que em processo de inventário chega ao extremo de conduzir à possibilidade de emenda ou de anulação da partilha mesmo depois do trânsito em julgado da respetiva sentença homologatória.
I – RELATÓRIO
1. AA instaurou processo de inventário para separação de meações, nos termos do art.º 825° do Código de Processo Civil, em vigor à data da propositura da demanda.
2. Entretanto, foi proferida sentença homologatória da partilha.
3. Inconformada com o decidido, a demandante, AA, interpôs apelação, tendo o Tribunal a quo conhecido do recurso, proferindo acórdão em cujo dispositivo enunciou: “Termos em que se julga o recurso improcedente e, consequentemente, se confirmam as decisões.”
4. É contra este acórdão, proferido no Tribunal da Relação de Coimbra que a demandante, AA se insurge, formulando as seguintes conclusões:
“A) O presente recurso é admissível, por a decisão nele proferida estar em contradição com a maioria dos acórdãos já proferidos no domínio da vigência do artº. 1348°., n°. 6 do Cod. Proc. Civil, na redacção que lhe foi dada pelo Dec. Lei n°. 180/96, de 25/9 e sobre a mesma questão fundamental de direito, pelo que, nos termos do art°. 672°., n°.1, al. c) do Cod. Proc. Civil, deve ser admitido o presente recurso de revista.
B) O acórdão proferido nos presentes autos, está em contradição com um acórdão da Relação de Évora de 3/12/2015, proferido no 1603/08.0TBSTR-B.E1 (relator: Des. Rui Machado e Moura), publicitado em http://www.dgsi.pt/jtre. reforçado pelo Ac. do STJ de 15/4/2004 (relator: Cons. Salvador da Costa), proferido no processo 04B1169, publicitado em http://www.dgsi.pt/jstj que já transitou em julgado pois foi proferido há mais de 3 anos.
C) Ambos os acórdãos foram proferidos no domínio da mesma legislação, ou seja, no domínio da vigência do artº. 1348°, n°. 6 do Cod. Proc. Civil, na redacção que lhe foi dada pelo Dec. Lei n°. 180/96, de 25/9 e incidiram os dois sobre a mesma questão fundamental de direito, qual seja, a da admissibilidade da reclamação contra a relação de bens para além do prazo inicialmente concedido aos interessados para tal reclamação, seja qual for a razão para tal reclamação.
D) Portanto, nos termos do art°. 672°., n°.1, al. c) do Cod. Proc. Civil, é admissível o presente recurso de revista a título excepcional para o Supremo Tribunal de Justiça.
E) Nos termos do n°. 2 do artº. 1396°. do Cod. Proc. Civil, na redacção que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n°. 303/2007, de 24 de Agosto, aplicável aos presentes autos, determina-se que “2 - Salvo nos casos previstos no n.º 2 do artigo 691.º as decisões interlocutórias proferidas no âmbito dos mesmos processos devem ser impugnadas no recurso que vier a ser interposto da sentença de partilha”.
F) Nos termos do art°. 1348°., n°. 6 do Cod. Proc. Civil, aplicável aos presentes autos, “6. - As reclamações contra a relação de bens podem ainda ser apresentadas posteriormente, mas o reclamante será condenado em multa, excepto se demonstrar que a não pode oferecer não pode oferecer no momento próprio, por facto que não lhe é imputável.”
G) Havendo um prazo geral para a reclamação da relação de bens, prazo fixado no n°. 1 desse artº. 1348°. do Cod. Proc. Civil, pode ainda qualquer interessado, desde 1994, reclamar da relação de bens posteriormente, naturalmente desde que ainda não tenha sido realizada a partilha, como é o presente caso, pelo que, mesmo 6 anos depois - o que não é verdade, pois a apresentação da relação de bens, ainda não ocorreu há 6 anos - ou até mais de 10 ou 20 anos depois, pode sempre ser apresentada a presente reclamação.
H) Aliás, sobre o limite temporal dessa reclamação tardia, veja-se JOÃO ANTÓNIO LOPES CARDOSO e AUGUSTO LOPES CARDOSO, PARTILHAS JUDICIAIS, volume I, 5ª. edição, pág. 562, onde estes autores referem que “Razoável é, pois, que, na senda do que já era entendido (na vigência do Código de 1939) a reclamação tardia há-de ter um limite processual, e esse só pode ser o do trânsito em julgado da sentença homologatória da partilha, ainda que isso se possa traduzir em refeitura do cálculo da partilha.”
I) Na jurisprudência que se seguiu à introdução daquele n°. 6, foram apontados como limites, quer o trânsito em julgado da sentença homologatória da partilha - Ae. do STJ de 16.10.2003, www.dgsi, proe. 04B1169 e Ac. da RP de 27.01.2005, www.dgsi, no proc. 0437302 - ,quer a prolação da referida sentença homologatória - Ac. da RP de 14.04.2005, www.dgsi.no proc. 0531824 -, quer a realização da conferência de interessados, em certas circunstâncias, como de só poderem ser “admitidas as que respeita a bens ainda não relacionados e valor destes” - Ac. da RC de 07.07.2004, www.dgsi, no proc. 2095/04-.
J) Nos presentes autos, ainda não foi atingido nenhum daqueles limites, pelo que é manifestamente ilegal, por violar de forma flagrante o disposto no artº. 1348°., n°. 6 do Cod. Proc. Civil, na versão aplicável, o despacho que a não admitiu e o acórdão que confirmou tal decisão.
K) Acresce que, sem qualquer prova, o despacho recorrido até acrescenta que a ora recorrente vem “negar um facto pessoal; vive num prédio inscrito em seu nome e que pertence à comunhão conjugal, de modo a obstaculizar o direito à cobrança coerciva que os Exequentes pretendem exercer”, o que também não é verdade, pois a inscrição matricial, como é do conhecimento público, não dá, nem tira direitos e não está demonstrada a propriedade da ora recorrente e seu ex-marido sobre o prédio em causa e o facto de viver nesse prédio, não lhe confere mais quaisquer direitos que os que já tinha, pois não está demonstrado, o título com base no qual ali permanece.
L) O indeferimento tem um outro fundamento, ainda mais ilegal que o primeiro, qual seja, o de que existe caso julgado formal constituído pelo despacho que indeferiu a suspensão da instância executiva com o fundamento referido de que a acção declarativa proposta pelo pai da ora requerente não tem a virtualidade de suspender essa acção executiva.
M) O despacho de indeferimento da suspensão da instância foi proferido sobre um pedido concreto - a suspensão da instância - e a presente reclamação contra a relação de bens tem um pedido diverso, pelo que basta a diversidade de pedidos para impedir que se constitua qualquer caso julgado.
N) Porém, mais que isso essa decisão nunca podia constituir-se em caso julgado formal, pois, como resulta do artº. 1396°, n°. 2 do Cod. Proc. Civil, salvo nos casos previstos no n.º 2 do artigo 691.º as decisões interlocutórias proferidas no âmbito dos mesmos processos devem ser impugnadas no recurso que vier a ser interposto da sentença de partilha e a decisão que indeferiu a suspensão da instância não consta do elenco daquelas que admitem recurso imediato e referidas no n°. 2 do artº. 691°. do Cod. Proc. Civil vigente ao tempo, pois apenas deve ser imediatamente recorrida a “decisão que ordena a suspensão da instância” (al. f) e não aquela que indefira esse pedido de suspensão.
O) Àquela decisão de indeferimento da suspensão da instância aplica-se o regime regra consagrado pelo artº. l396°., n°. 2 referido para as decisões interlocutórias, ou seja, devem ser impugnadas no recurso da sentença final.
P) É que, a partir da entrada em vigor da reforma dos recursos - 1 de Janeiro de 2008 - introduzida pelo Decreto-Lei n°. 303/2007, de 24 de Agosto praticamente deixou de haver casos julgados formais, pois toda impugnação, mesmo das decisões interlocutórias, tem de ser feita com a decisão final e já assim era e continua a ser nos processos de inventário.
Q) Face ao exposto, mostra-se também violado por erro de interpretação e aplicação o disposto no 580°., n°. 1 e 581°., nºs. 1 e 3, ambos do actual Código de Processo Civil, pelo que tem de ser revogada a decisão recorrida, manifestamente carecida de fundamento legal.
R) O despacho recorrido considerou que a conduta da ora recorrente, ao exercer um direito que o artº. 1348° nº. 6 do Cod. Proc. Civil, aplicável aos presentes autos, lhe concede de forma expressa, era grave e censurável, no plano da ilicitude, mas já se demonstrou que a conduta da ora recorrente não é ilícita, tendo ela demonstrado que só agora reclamava face á acção que lhe foi movida a ela e a outros pelo seu pai, que nem é interessado no inventário e o acórdão que confirmou tal decisão também acolheu esta decisão, negando um direito ao interessado, com o argumento de que “combater a degradação dos padrões de atuação processual e impor uma litigância leal e de boa fé, com convencimento, por banda do litigante, de que a razão lhe assiste”, sendo evidente da argumentação da recorrente já nem sequer era uma dívida de fornecimentos ou qualquer outra actividade, mas uma nova dívida, com outra causa.
S) O tribunal pode aceitar ou não essa justificação, mas tal não releva para efeitos de condenação como litigante de má fé, pois a ora recorrente - repete-se ... - apenas exerceu um direito que o artº. 1348° nº. 6 do Cod. Proc. Civil, aplicável aos presentes autos lhe reconhece expressamente e se o tribunal entender que a justificação não colhe, aplica a multa legalmente permitida - e que já se prevê grande, face ao contexto ... - agora não tem qualquer base legal para condenar a ora recorrente como litigante de má fé.
T) Mostrando-se violado de forma flagrante, mesmo pelo acórdão recorrido, o que é determinado pelo art°. 542°. do actual Cod. Proc. Civil, deve ser revogada também a decisão manifestamente ilegal e injusta de condenação da ora recorrente como litigante de má fé, que consta do acórdão ora recorrido.
U) Mostrando-se violadas por erro de interpretação e aplicação as normas legais que se deixam indicadas, deve ser revogado na totalidade o despacho ora recorrido (Ref. 74367966) e, consequentemente, admitida a reclamação contra a relação de bens apresentada pela ora recorrente.
V) No que respeita à ilegalidade do despacho de 3/11/2017, que considerou dívida comum a dívida reclamada pela credora Judimonteiro, Ldª, (Ref. 75820784) e o acórdão que confirmou tal decisão, verifica-se que essa decisão é absolutamente precipitada e viola os mais elementares princípios de direito substantivo e processual, pelo que não pode subsistir na ordem jurídica, violações essas da lei civil e das regras de processo civil.
X) Conforme resulta dos presentes autos, a execução que conferiu título ao credor Judimonteiro, Ldª, foi a penhora realizada na execução que correu termos pelo Tribunal Judicial da Comarca de … - Juízo de Execução de …, com o n°. 381/10.8…D. - Cfr. requerimento junto aos presentes autos sob a refª. 1698437, de 4/12/2013.
Y) Conforme é referido nesse requerimento, “a reclamante instaurou contra o Interessado BB acção executiva para pagamento de quantia certa, através da qual reclamou o pagamento quantia de 72.628,94 € (setenta e dois mil seiscentos e vinte e oito euros e noventa e quatro cêntimos)”, tendo juntado para o efeito um documento comprovativo da instauração dessa execução e nesse documento que é o requerimento executivo do processo acima referido, invoca-se como título executivo “uma confissão de dívida e acordo de pagamento”, apenas subscrito pelo interessado BB.
Z) Verifica-se assim, que nesse momento da instauração do processo executivo, o referido credor não invocou a comunicabilidade da dívida dada à execução, pelo que fez prosseguir a mesma apenas contra o mencionado BB.
AA) Nesse processo foram nomeados à penhora e penhorados pela Agente de Execução os bens referidos no ponto 3 - quatro imóveis e não apenas 2 como erradamente se refere no ponto 2 da matéria de facto constante do despacho ora recorrido - do mencionado requerimento junto aos presentes autos sob a refª. 1698437, de 4/12/2013, sem que tenha sido ordenada a citação do cônjuge do executado, quer para efeitos de requerer a separação de meações, dado que, como se reconhece no despacho ora recorrido, a ora recorrente “está casada com o executado BB desde 17 de junho de 1978, no regime da comunhão geral de bens (v. /fs. 29 e 30, deste processo)”, quer para efeitos de se pronunciar sobre uma eventual comunicabilidade da dívida.
BB) No referido processo foi deduzida oposição apenas pelo interessado BB e, na sequência da mesma foi feito um termo de transacção entre este interessado e aquele credor, o qual, depois de devidamente homologado, transitou em julgado. - Cfr. pontos 5 e 6 do requerimento junto aos presentes autos sob a refª. 1698437, de 4/12/2013.
CC) Com esta transacção, o credor Judimonteiro, Ldª, e o interessado BB procederam à novação da dívida inicial numa nova dívida de valor inferior, pois agora a dívida é apenas de € 66.900 e anteriormente era de € 72.628,94. - Cfr. pontos 1, 4 e 6 do requerimento junto aos presentes autos sob a refª. 1698437, de 4/12/2013.
DD) Verifica-se assim que, no âmbito do processo executivo em que o credor fez valer o seu direito, nunca o mesmo suscitou a questão da comunicabilidade da dívida, sendo certo que era nesse processo executivo que a questão devia ter sido suscitada e não o foi, atento o disposto no artº. 825°., n°. 2 do Cod. Proc. Civil vigente ao tempo da instauração da execução, pois eram dadas ao exequente diversas possibilidades de obter a declaração de comunicabilidade da dívida, mas sempre dentro do processo executivo e sempre permitindo ao cônjuge o exercício do contraditório, quer a comunicabilidade tenha sido alegada pelo exequente, quer pelo executado.
EE) Por sua vez, o art°. 1691°. do Cod. Civil determina que são da responsabilidade de ambos os cônjuges as dívidas aí referidas, estabelecendo-se presunções de comunicabilidade, mas o tribunal só leu a alínea d) do n°. 1 até metade, não tendo lido a parte onde se refere que “salvo se se provar que não foram contraídas em proveito comum do casal”.
FF) A presunção consagrada na al. d) é uma presunção juris tantum, ou seja, é uma presunção que admite prova em contrário, sendo certo que isso resulta de forma clara e explícita do texto da lei, pelo que, ao admitir sem mais a presunção daquele art°. 1691°. do Cod. Civil, o tribunal violou de forma grosseira o princípio do contraditório previsto no artº. 3°., n°. 3 do Cod. Proc. Civil, apesar da advertência expressa do legislador neste normativo de que “o juiz deve observar e fazer cumprir, ao longo de todo o processo, o princípio do contraditório” .
GG) Porém, já a dívida exequenda nem sequer era uma dívida de fornecimentos ou qualquer outra actividade, mas uma nova dívida, com outra causa, resultante da transacção efectuada em tribunal, apenas pelo então executado BB.
HH) Aliás, também violou o disposto no art°. 1355°. do Cod. Proc. Civil, pois nesta norma é referido que “Se todos os interessados forem contrários à aprovação da dívida, o juiz conhecerá da sua existência quando a questão puder ser resolvida com segurança pelo exame dos documentos apresentados” e, além de não poder o Juiz decidir com segurança, pois que ainda não havia sido concedida à ora recorrente a possibilidade de poder alegar e provar a inexistência do proveito comum, falta o outro pressuposto para a decisão, qual seja, o de que “se todos os interessados forem contrários à aprovação da dívida”, o que não sucede no presente caso, pois como consta da acta da conferência de interessados “mais informaram que no tocante ao passivo o cabeça de casal reconhece integralmente as duas dívidas (Seg. Social e Judimonteiro), tendo a requerente declarado que não reconhece porque não teve nada a ver com a origem das mesmas”.
II) Acresce que, essa comunicabilidade só pode resultar de sentença ou pode ser obtida em sede, única e exclusivamente, de processo de execução, como se escreve doutamente no Caderno III dos trabalhos elaborados pelos Auditores de Justiça do 30.º curso de formação de Magistrados do Centro de Estudos Judiciários sobre o NOVO PROCESSO CIVIL, a págs. 43/44, sobre as novas regras relativamente à comunicabilidade das dívidas entre cônjuges.
JJ) Deste modo, ao contrário do que sucedeu nos presentes autos, o tribunal deve preocupar-se em conceder ao cônjuge do executado a oportunidade de ilidir a presunção legalmente estabelecida, pois as presunções são em regra ilidíveis e esta é-o claramente como resulta dos termos da própria lei. - Cfr., neste sentido, VASCO DA GAMA LOBO XAVIER, Responsabilidade dos bens do casal pelas dívidas comerciais de um dos cônjuges, Separata da Revista de Direito e Estudos Sociais, ano XXIV, n°. 4, pág. 7.
KK) Mostram-se violados, pelo acórdão recorrido e ora impugnado, de forma flagrante os artigos 3°, n°. 3 e 1355°., ambos do Cod. Proc. Civil e o art°. 1691°., n°. al. d) do Cod. Civil.
LL) Face às ilegalidades cometidas em lª. instância e que foram confirmadas pelo acórdão recorrido e que ora se denunciam, a ora recorrente acabou por ser prejudicada na partilha, pois viu um bem que não responde pelas dívidas nem pertence ao casal, ser incluído na partilha e, sobretudo, viu-se responsabilizada por uma dívida, sem ser ouvida e pela qual não tem qualquer responsabilidade.
MM) Porque baseada em decisões anteriores ilegais, o acórdão que confirmou a sentença recorrida que homologou essa partilha deficiente e tem de ser revogado.
Justiça!”
5. Remetidos os autos à Formação para a verificação do arrogado pressuposto que justifique, ou não, a pretendida revista excepcional, foi a mesma rejeitada.
6. Recorreu a Requerente/AA para o Tribunal Constitucional, tendo obtido provimento, considerando o Tribunal Constitucional que a interpretação do n.º 3 do art.º 672° do Código de Processo Civil, no sentido da rejeição da revista, sem dar à parte a possibilidade de suprir a falta, não é conforme às normas constitucionais atinentes.
7. Em conformidade com a decisão proferida pelo Tribunal Constitucional, a Formação procedeu à reforma da decisão que rejeitou a interposta revista excepcional, tendo sido proferido acórdão que concluiu pela admissibilidade da revista excepcional.
8. Foram dispensados os vistos.
9. Cumpre decidir.
II. FUNDAMENTAÇÃO
II. 1. As questões a resolver, recortadas das alegações apresentadas pela Recorrente/Requerente/AA, consistem em saber se:
(1) Cotejado o acórdão recorrido divisamos errada subsunção jurídica, na medida em que, contrariamente ao decidido, que confirmou a sentença homologatória da partilha proferida em 1ª Instância, impõe-se reconhecer a tempestividade da reclamação apresentada contra a relação de bens, donde, o seu prévio conhecimento determinará a revogação da sentença homologatória da partilha, outrossim, importa revogar a declarada condenação da Recorrente/Requerente/AA como litigante de má-fé, e ainda reconhecer a violação do direito ao contraditório da Recorrente/Requerente/AA quanto à questão de provar a incomunicabilidade da dívida, tida por comunicável ao abrigo do art.º 1691° n.º 1 alínea d) do Código Civil?
II. 2. Da Matéria de Facto
Com relevância para o conhecimento da presente revista ter-se-á em consideração a seguinte facticidade:
“1. Por requerimento apresentado em Juízo em 29 de Abril de 2011, AA, casada, comerciante, residente na Rua Fonte da Costa, n°. .., S… C…, 3…0-5…2 …, nos termos do artº. 825º nº. 5 do Código de Processo Civil, e por apenso à execução comum - Processo 3860/10.3T… - em que são exequentes CC e outros, requereu Inventário para separação de meações pedindo, não só a separação de bens comuns do casal, ordenando-se uma vez admitida a suspensão da execução até efectivação da partilha, mas também, para que os autos possam prosseguir os seus termos até final, se proceda à nomeação do cabeça de casal, a fim de o mesmo prestar juramento e declarações de cabeça de casal.
“2. Em 6 de Junho de 2018 foi proferida sentença nestes autos de Inventário para separação de meações, em cujo dispositivo se consignou:
“Nos presentes autos de Inventário para separação de meações, em que é requerente AA e requerido BB, e nos quais desempenha as funções de cabeça de casal o referido requerido, nos termos do artº 1382, aplicável por via do disposto nos artºs. 1406 e 1404, nº. 3, todos do CPC, homologo a partilha constante do mapa de fls. 626 (electronicamente pode ser consultado em 09-05-2018), adjudicando aos dois interessados os respectivos quinhões, bem como deve ainda, cada um deles, efectuar o pagamento do passivo nos moldes já consignados antecedentemente, ou seja, em partes iguais.
Custas pela Requerente e pelo Requerido (nos termos do artº. 1405, 2ª. parte, do CPC).
Notifique e registe.”
3. O Tribunal de 1ª Instância proferiu decisão em 18 de Abril de 2017, cujos termos se enuncia:
“Consigna-se que a estes autos de Inventário para separação de meações é aplicável o CPC anterior ao actual CPC.
Nestes termos, vista a norma do artº. 32, nº. 3, do antigo CPC, uma vez que o cabeça de casal e requerido/executado BB não constituiu mandatário, o presente processo prosseguirá os seus termos, aproveitando-se os actos anteriormente praticados pelo seu advogado, Sr. Dr. José Joaquim Sampaio e Nora.
Notifique.
**
O Sr. Dr. José Joaquim Sampaio e Nora mantém-se mandatário da Requerente AA.
Em 02-02-2017, a Requerente AA veio reclamar contra a relação de bens, de acordo com o disposto no artº. 1348, nº. 6, do CPC, alegando que a verba nº. 10, da relação de bens, deverá ser excluída por não pertencer ao património do casal: Requerente e Requerido/cabeça de casal.
Alega novamente que foi instaurada uma acção cível na Comarca de …, instaurada pelo pai da Requerente, através da qual pede a declaração de reconhecimento de que é proprietário exclusivo desse imóvel descrito sob a verba nº. 10, da relação de bens.
Juntou prova testemunhal e documental.
1. O processo executivo, de que estes autos são apenso, foi instaurado contra o executado BB.
2. Nesse processo executivo foram penhorados dois imóveis que correspondem às verbas nºs. 6 e 10, relacionadas aqui em 01-09-2011.
3. O presente inventário para separação de meações foi instaurado pela Requerente, cônjuge do executado, AA.
4. A referida AA está casada com o executado BB desde 17.06.1978, no regime da comunhão geral de bens (v. fls. 29 e 30, deste processo).
5. Ambos residem na Rua da Fonte da Costa, nº. …., S…. C…, V…, que corresponde ao imóvel descrito sob a verba nº. 10, da relação de bens.
6. O executado, aqui cabeça de casal, apresentou relação dos bens comuns do casal em 01-09-2011, descrevendo ainda como bem comum o imóvel sob a verba nº. 10 (cfr. fls. 35 a 38, deste processo).
7. A Requerente AA, devidamente notificada para esse efeito, não apresentou qualquer reclamação à relação de bens.
8. Em 24 de Maio de 2016, a Requerente AA apresentou requerimento a solicitar a suspensão deste processo de acordo com o artº. 272, nº. 1, do CPC, visto que o seu pai, DD, instaurou no Juízo Central Cível de A… uma acção comum, a solicitar que seja declarado ser ele o exclusivo proprietário da verba aqui relacionada sob o nº. 10, devendo ser cancelada a penhora concretizada no processo executivo principal.
9. Por decisão de 4-07-2016, foi decidido indeferir o pedido de causa prejudicial por carecer de fundamento legal, despacho esse que não foi objecto de recurso.
10. A citada verba nº. 10 encontra-se matricialmente inscrita a favor da Requerente AA (cfr. fls. 49, deste processo).
Isto é, esse despacho, ora citado, que indeferiu a suspensão da instância por causa prejudicial, tem um valor intraprocessual, ou seja, é vinculativo no próprio processo em que a decisão foi proferida.
Deste modo, indefere-se “in totum” a reclamação contra a relação de bens, antes apresentada pela Requerente, condenando-se a mesma na multa de 1 UC.
A condenação de uma parte como litigante de má fé está dependente da verificação de elementos objectivos e subjectivos.
Os elementos objectivos reconduzem-se a uma das alíneas consagradas no art. 542, nº. 2, do Código de Processo Civil, designadamente: a) tiver deduzido pretensão ou oposição cuja falta de fundamento não devia ignorar, não se incluindo aqui as lides temerárias; b) tiver alterado a verdade dos factos ou omitido factos relevantes para a decisão da causa; c) tiver praticado omissão grave do dever de cooperação; d) tiver feito do processo ou dos meios processuais um uso manifestamente reprovável, com o fim de conseguir um objectivo ilegal, impedir a descoberta da verdade, entorpecer a acção da justiça ou protelar, sem fundamento sério, o trânsito em julgado da decisão.
Os elementos subjectivos consubstanciam-se no dolo ou negligência grave.
A negligência grave é entendida como “imprudência grosseira, sem aquele mínimo de diligência que lhe teria permitido facilmente dar-se conta da desrazão do seu comportamento, que é manifesta aos olhos de qualquer um” 1 (In acórdão do STJ de 06-12-2001, 01A3692, apud António Menezes Cordeiro, in Litigância de Má Fé Abuso do Direito de Acção e Culpa “In Agendo”, 2006, Almedina, Pág. 26.)
É importante sublinhar que “a lei processual castiga a litigância de má fé,
independentemente do resultado. Apenas releva o próprio comportamento, mesmo que, pelo prisma do prevaricador, ele não tenha conduzido a nada. O dano não é pressuposto da litigância de má fé.” 2 (V. António Menezes Cordeiro, ob. cit., pág. 26).
São duas as possíveis consequências da litigância de má fé: uma opera oficiosamente, designadamente a condenação em multa; outra, demanda um pedido do beneficiário, a indemnização - cfr. art. 543º, nº. 1, do CPC.
A multa pode ser fixada entre 0,5 e 10 unidades de conta, nos termos do art. 27º/1 e 2, do Regulamento das Custas Processuais (RCP), estando reservas as últimas cinco unidades de conta aos casos especialmente graves.
A opção é da competência do juiz, em função da conduta do litigante de má fé – cfr. art. 543, nº. 2, do CPC.
No caso vertente, considera-se verificada a hipótese prevista no art. 542º, nº. 2, als. a), b) e d), do CPC, pois a Requerente, que não apresentou qualquer reclamação contra a relação de bens feita pelo seu cônjuge em 01-09-2011, com o intuito de obstaculizar o pagamento da dívida aos exequentes, até porque é precisamente o imóvel que quer ver excluído deste processo que se encontra penhorado no processo executivo principal, vem agora, sob a forma de “venire contra factum proprium”, reclamar de forma extemporânea que o referido prédio não lhe pertence, mas antes ao seu pai, o que se encontra em CLARA CONTRADIÇÃO com a inscrição matricial do prédio em seu nome e pelo facto de ser esse a sua casa de morada de família e NADA ter DITO no Momento em que foi notificada para reclamar da relação de bens ainda em 2011.
A Requerente não pode agora - decorridos seis anos da apresentação da relação de bens neste processo - pretender a exclusão de um imóvel deste inventário, negando um facto pessoal: vive num prédio inscrito em seu nome e que pertence à comunhão conjugal, de modo a obstaculizar o direito à cobrança coerciva que os Exequentes pretendem exercer sobre o seu cônjuge, que é executado no processo executivo principal.
A conduta da Requerente é particularmente grave e censurável, quer no plano da ilicitude, quer no plano da culpa.
Assim, conjugando os elementos expostos, considera-se adequada uma multa correspondente a 3 unidades de conta.
Pelo exposto, decido:
- nos termos e ao abrigo do disposto nos artºs 542 e 543, ambos do Código de Processo Civil, e como litigante de má fé, condena-se a REQUERENTE AA a pagar uma multa igual à soma de 3 (três) UC´s.
Notifique.”
4. O Tribunal de 1ª Instância proferiu decisão em 4 de Julho de 2016, cujos termos se enuncia:
“Quanto ao requerimento, apresentado antes, pela Requerente AA:
A requerente, depois de notificada do nosso último despacho, veio reafirmar a escolha já antes efectuada. Alega ainda que o seu pai, DD, instaurou uma acção comum (nº. 1712/16.2T….), a correr termos na Instância Central de …, através da qual pede que ele seja declarado exclusivo proprietário e possuidor do prédio penhorado no processo principal, condenando-se os Réus a tal reconhecer.
Conclui, a final, que a instância deve ser suspensa de acordo com o disposto no artº. 272, nº. 1, do NCPC, até que seja proferida sentença com trânsito em julgado nesses autos.
Apreciando.
De acordo com o disposto no artº. 272, do CPC, sob a epígrafe “Suspensão por determinação do juiz ou por acordo das partes”:
“1 O tribunal pode ordenar a suspensão quando a decisão da causa estiver dependente do julgamento de outra já proposta ou quando ocorrer outro motivo justificado.
2 Não obstante a pendência de causa prejudicial, não deve ser ordenada a suspensão se houver fundadas razões para crer que aquela foi intentada unicamente para se obter a suspensão ou se a causa dependente estiver tão adiantada que os prejuízos da suspensão superem as vantagens.
3 Quando a suspensão não tenha por fundamento a pendência de causa prejudicial, fixa-se no despacho o prazo durante o qual estará suspensa a instância.”.
Não esquecemos que uma parte da jurisprudência entende que o Assento do STJ, de 24/05/1960 - onde se defende que a acção executiva nunca é passível de suspensão por prejudicialidade, mesmo que esteja em causa a decisão crime sobre a obtenção do título - ainda se mantém em vigor.
No entanto, a mais recente jurisprudência (entre outros, Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 06/05/2003, CJ, III, in www.colectaneajurisprudencia.com) tem vindo a considerar que a prejudicialidade não é exclusiva das acções declarativas.
Porém, independentemente da questão da prejudicialidade, o tribunal pode determinar a suspensão da instância quando ocorrer motivo justificado.
No caso em apreço, porém, não há qualquer causa dependente, pois o processo comum deve continuar a correr e é independente da acção executiva principal e deste inventário. Veja-se, aliás, o disposto nos artºs. 840 e 841, do NCPC, ou seja, mesmo a venda de imóvel que foi REIVINDICADO não fica suspensa, pois concretiza-se. Mas os bens não são entregues ou o produto da venda não é levantado sem se prestar caução.
Acresce que o pai da Requerente apenas se lembrou de instaurar acção comum de reivindicação em 2016 e a Requerente ou o Requerido/executado, ao longo destes anos (desde o relacionamento desse imóvel em Setembro de 2011), nunca afirmaram que esse prédio pertencia a um terceiro, designadamente, o pai da Requerente.
Estamos, pois, convictos que a instauração da acção comum pelo pai da Requerente se trata de um expediente dilatório, porquanto foi intentada unicamente para se obter a suspensão deste inventário. Ademais, o estado adiantado destes autos de inventário, caso existisse causa prejudicial (que não existe, como acima já enunciámos), desaconselhavam vivamente uma suspensão deste processo, o que implicaria, naturalmente, a continuidade da suspensão da execução.
Pelo exposto, decido:
- por carecer de fundamento legal, indeferir o peticionado pela Requerente AA.
Valor deste incidente: € 6.000,00 euros.
Após o termo do prazo de 10 dias, abra conclusão.”
II. 3. Do Direito
O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da Recorrente, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que sejam de conhecimento oficioso, conforme prevenido no direito adjectivo civil - artºs. 635º n.º 4 e 639º n.º 1, ex vi, art.º 679º, todos do Código de Processo Civil.
II. 3.1. Cotejado o acórdão recorrido divisamos errada subsunção jurídica, na medida em que, contrariamente ao decidido, que confirmou a sentença homologatória da partilha proferida em 1ª Instância, impõe-se reconhecer a tempestividade da reclamação apresentada contra a relação de bens, donde, o seu prévio conhecimento determinará a revogação da sentença homologatória da partilha, outrossim, importa revogar a declarada condenação da Recorrente/Requerente/AA como litigante de má-fé, e ainda reconhecer a violação do direito ao contraditório da Recorrente/Requerente/AA quanto à questão de provar a incomunicabilidade da dívida, tida por comunicável ao abrigo do art.º 1691° n.º 1 alínea d) do Código Civil? (1)
Considerando o objecto do recurso, e tendo em atenção a data da instauração em Juízo dos presentes autos de inventário, devemos destacar, como resulta do acórdão recorrido, que ao conhecimento da presente revista, apesar do processo de inventário já ter sido objecto de intervenção legislativa, concretamente, através da Lei n.º 23/2013, de 5 de Março, este novo regime jurídico do processo de inventário não se aplica ao caso sub iudice, conforme decorre do seu art.º 7º que textua “O disposto na presente lei não se aplica aos processos de inventário que, à data da sua entrada em vigor, se encontrem pendentes” donde, o regime aplicável é aqueloutro que resulta do anterior Código de Processo Civil.
Conforme decorre do n.º 1 do art.º 825º do anterior Código de Processo Civil, o exequente que dispuser de título apenas quanto a um dos cônjuges, mas pretender executar bens comuns do casal, deve, ao nomear tais bens à penhora, pedir a citação do cônjuge do executado, para requerer a separação de bens, de tal sorte que se for apresentado pedido de separação de bens, cujo requerimento é autuado por apenso á execução, ou junta certidão comprovativa da pendência de acção em que a separação já tenha sido requerida, a execução fica suspensa até à partilha - nºs. 2 e 3 do art.º 825º do anterior Código de Processo Civil - .
Assim, tratando-se de divida incomunicável, o credor apenas terá que aguardar que nos autos de inventário seja feita a partilha, para ficar a saber quais os bens que efectivamente ficaram a pertencer ao executado e depois executá-los, sem qualquer tipo de constrangimentos, semelhantes àquele que motivaram a suspensão da sua execução.
No que respeita ao meio processual a usar, com vista à separação judicial de bens, distinguimos estar em causa o processo de inventário, com as especialidades dos artºs. 1404º a 1408º do anterior Código de Processo Civil, neste sentido, Lopes Cardoso, in, Manual da Acção Executiva, páginas 344 e seguintes e 354, e Partilhas Judiciais, I volume, 3º edição, página 376, isto é, um processo especial de inventário, aberto só ao cônjuge do executado, para descrição e partilha apenas dos bens comuns, com o efeito de suspender a execução até à partilha.
Resulta dos enunciados preceitos adjectivos civis as especialidades do processo de inventário cujo objectivo é a separação judicial de bens, quais sejam:
a) O credor exequente tem o direito de promover o andamento do inventário (alínea a) do n.º 1 do art.º 1406º do anterior Código de Processo Civil);
b) Não podem ser aprovadas dívidas que não estejam devidamente documentadas (alínea b) do n.º 1 do art.º 1406º do anterior Código de Processo Civil);
c) O cônjuge do executado tem o direito de escolher os bens com que há-de ser formada a sua meação (alínea c), 1ª parte, do n.º 1 do art.º 1406º do anterior Código de Processo Civil);
d) Se o cônjuge do executado não fizer uso do direito de escolha, ou desistir dela após a segunda avaliação, as meações são adjudicadas por meio de sorteio (n.º 3 do art.º 1406º do anterior Código de Processo Civil);
e) Se o cônjuge do executado fizer uso do direito de escolha o credor exequente pode reclamar contra a escolha e o juiz se a julgar atendível ordenará segunda avaliação dos bens que lhe pareçam mal avaliados (alínea c), 2ª parte, do n.º 1 e n.º 2 do art.º 1406º do anterior Código de Processo Civil).
Sem prejuízo das enunciadas particularidades do processo de inventário com vista à separação judicial de bens, e em tudo o mais que seja compatível, observar-se-ão, nos termos do n.º 3 do art.º 1404º do anterior Código de Processo Civil atinente ao processo de inventário cujo objectivo é a separação judicial de bens, as disposições referentes ao processo dito comum de inventário.
O inventário para separação de meações, previsto no consignado art.º 825º do anterior Código de Processo Civil, destina-se à defesa dos interesses patrimoniais do cônjuge do executado, permitindo-lhe salvaguardar a sua meação nos bens comuns, decorrendo entre os dois cônjuges, embora o credor não possa deixar de ser equiparado a um “interessado”, relembrando-se que o inventário é caracterizado pelo princípio da universalidade, sendo o seu objetivo a partilha de todos os bens e direitos que integram essa comunhão, visando-se uma partilha igualitária, já que o inventário tem por finalidade distribuir, fiel e equitativamente, todo o património do referido acervo, e nele interessa, sobretudo, apurar toda a verdade para que a partilha seja efetuada com igualdade e justiça.
É na partilha que os ex-cônjuges recebem a sua meação nos bens comuns, que cada um deles confere o que deve ao património comum - art.º 1689° n.º 1 do Código Civil - e é também no momento da partilha que o crédito de um deles sobre o outro, ou do património comum sobre um deles, e ainda o dos credores do património comum, se tornam exigíveis - artºs. 1697° e 1695° n.º l do Código Civil - importando, assim, que a relação de bens discrimine o património comum, dos ex-cônjuges, assim como as suas responsabilidades e créditos.
O processo de inventário é, pois, um caminho que se deseja em direcção a uma partilha justa e equilibrada de um património, caminho este constituído por variadas decisões, de natureza processual ou substantiva, que vão sendo tomadas e se vão consolidando, à medida que transitam os despachos que as assumem, tudo para que as questões suscitadas pelos interessados sejam enfrentadas e decididas, e o caminho aplanado para uma decisão final que se quer, como adiantamos, justa e equilibrada.
As decisões que vão sendo tomadas constituem, no dizer de Lopes Cardoso, in, Partilhas Judiciais, volume II, 1970, página 251 “verdadeiros julgamentos contenciosos que não podem deixar de impor-se às partes”.
Enunciados, em termos breves, os termos do processo de inventário para separação de meações, importa conhecer da bondade do acórdão recorrido que confirmou a sentença homologatória da partilha proferida em 1ª Instância, tendo indeferido previamente a reclamação da Recorrente/Requerente/AA à relação de bens apresentada, o que foi determinante para a prolação da sentença homologatória da partilha, decisão com a qual a Requerente/AA não se conforma, tendo interposto recurso, reclamando, por isso, a revogação da sentença homologatória da partilha, uma vez que, em sua opinião, a alcançada e homologada partilha do património do casal não é justa, na medida em que integra património que não pertence ao casal, e que, de resto, a reclamação da Requerente/AA à relação de bens apresentada, pretendia demonstrar.
Vejamos.
No aresto em escrutínio, e no que a esta particular questão respeita, divisamos que o Tribunal a quo, entendeu que: “Estatuía o artº. 1348º nº. 6 do CPCivil, na sua redacção pretérita ainda aplicável aos presentes autos: “6. - As reclamações contra a relação de bens podem ainda ser apresentadas posteriormente, mas o reclamante será condenado em multa, excepto se demonstrar que a não pode oferecer no momento próprio, por facto que não lhe é imputável.”
Tal como alega a insurgente, e constituem doutrina e jurisprudência pacíficas, deste preceito emerge que a reclamação contra a relação de bens em inventário poderia ser apresentada até ao trânsito em julgado da sentença homologatória da partilha.
A ratio deste preceito prende-se, naturalmente, com o fito do legislador em querer consecutir uma partilha materialmente justa e que corresponda à realidade do acervo dos bens e dívidas existentes.
Porém, este direito não pode ser exercido arbitrária e incondicionadamente, a bel prazer dos interessados, se e quando eles assim o entenderem.
Antes a interpretação de tal segmento normativo devendo ser efectivada cum granno sallis, i.e., sensata, cautelosa e comedidamente.
É que conflituantes com aquele desiderato, existem outros princípios e valores a defender.
Desde logo, os autos de inventário, como “processo”, exigem, por definição e exigência desta qualidade, que os atos nele praticados o sejam de um modo ordenado, sequencial e atempado, rectius nos prazos normais nele prescritos.
Os princípios do dispositivo, da autoresponsabilidade das partes/interessados, da estabilidade da instância, da lealdade na atuação, tudo com vista à obtenção da decisão justa no mais breve lapso de tempo possível - pois que, como é consabido, a decisão, algumas vezes, por demasiado tardia, já não assume, total ou parcialmente, tal justeza -, assim o exigem.
Acresce que a reclamação contra a relação de bens se consubstancia, jurídico-processualmente, como um incidente da instância do inventário, a qual, assim, de algum modo, vai bulir e afetar/prejudicar as aludidas e pretendidas estabilidade e celeridade; por conseguinte, urge operar uma interpretação que, tendencialmente, possa limitá-la ou restringi-la.
Nesta conformidade, a postura exegética incidente sobre o segmento normativo em dilucidação que temos por mais conforme e adequada à compatibilização/harmonização entre os desideratos, por um lado, da obtenção da decisão materialmente justa e, por outro lado, o da preservação da estabilidade processual e da atuação escorreita e leal, com vista a uma decisão célere, é a de que a reclamação contra a relação de bens apenas pode(ria) ser efectuada, posteriormente ao prazo normal de dez dias, se existi(r)(sse) um motivo, mínimo que seja, que tenha impedido ou dificultado a reclamação dentro deste prazo.
Se assim não fosse, e sendo certo que, como se disse, se entendia que a reclamação poderia ser feita até à sentença final, estar-se-ia a abrir a “caixa de pandora” que permitiria, muitas vezes de um modo intoleravelmente negligente, e, algumas vezes, até de um modo doloso, protelar a decisão por largos meses ou até anos, com as possíveis nocivas consequências supra aludidas.
A simples condenação em multa não pode justificar ou branquear uma atuação processual nesta matéria que pode ter apenas intuitos meramente dilatórios.
Ou, pior ainda, propósitos atentatórios da própria descoberta da verdade pelos meios legal e processualmente admissíveis, vg. através da obtenção de prova no largo lapso de tempo que pode decorrer até à efetivação da reclamação e pela sua apresentação após o decurso do prazo legal para o efeito.
E esta preocupação e a pretensão de evitar tais nefastas decorrências parece tê-la tido o legislador que posteriormente interveio nesta matéria.
Pois que nos termos do artº 32º nº 5 da Lei n.º 23/2013, de 05 de Março que aprovou o REGIME JURÍDICO DO PROCESSO DE INVENTÁRIO:
“5 - As reclamações contra a relação de bens podem ainda ser apresentadas até ao início da audiência preparatória, sendo o reclamante condenado em multa, exceto se demonstrar que a não pôde oferecer no momento próprio, por facto que não lhe é imputável.”
Por aqui se vê que, presentemente, o prazo para a reclamação tardia está fortemente restringido, devendo ela ser, impreterível e preclusivamente, efectuada até ao momento da realização de diligência que se situa a montante da própria conferência de interessados.
O caso vertente é paradigmático no sentido da inadmissibilidade da reclamação, pelos motivos supra aduzidos.
Vistos os autos verifica-se que:
Foi apresentada a relação de bens pelo cabeça de casal, em 2011 na qual estava incluída a casa em questão como bem comum do casal.
A requerente não reclamou da relação quanto à natureza de bem comum da casa.
Inclusivé, optou por escolher tal casa para preencher a sua meação, nos termos do artº 1406º nº1. al.c) do CPC pretérito.
E apenas em 2017, cerca de seis anos depois da sua apresentação, vem invocar que, afinal, o imóvel não pertence ao casal, mas ao seu pai.
Com o argumento de que a casa foi paga pelo seu pai, o qual, devido às dívidas do ex marido, sobrestou na sua doação à filha, ora recorrente, relativamente ao que antes tinha planeado.
É evidente que estes argumentos já eram do seu conhecimento à data da apresentação da relação de bens.
Se estes fossem verídicos e consistentes poderia/deveria antes tê-los logo aduzido, e, com eles, impugnado a comunicabilidade da casa.
Assim não atuou, nem, sequer, justificou tal inacção.
Destarte, não se compreende, e é de todo inadmissível, que decorridos que foram cerca de seis longos anos, venha por em crise o jaez de bem comum da casa.
E, ademais, em claro venire contra factum proprium, desdizer aquilo que, senão expressa, pelo menos tacitamente - pela prática de atos inequivocamente reveladores - aceitou: que a casa era bem comum do casal.
Ademais, invocou que o pai instaurou acção tendente à declaração da propriedade da casa a seu - do pai - favor.
Ora a sentença atinente a tal acção e pedido consta nestes nossos autos, e dela decorre que não apenas não concedeu tal propriedade ao progenitor, como deu como provados factos que clamam a conclusão que, o imóvel é propriedade do casal, via usucapião, consabidamente o modo originário mais forte de aquisição do domínio.
A insurgente diz que tal nada vale, pois que a usucapião não foi invocada no aludido processo.
Pode não valer em tais autos, mas vale no presente inventário.
Perante os factos ali dados como provados, os quais a recorrente não põe em crise, tem de concluir-se, na economia das pretensões dos interessados do presente inventário, que é o que releva, que não apenas a recorrente não provou que a casa não é do casal, como está provado - via documento autêntico - que ela a este pertence.
Certo é que o argumento “expressis verbis” plasmado na decisão de indeferimento da reclamação - caso julgado por despacho anterior que indeferiu a suspensão da instância por invocação de causa prejudicial - não procede.
Efetivamente, e como aduz a recorrente, tal despacho e o despacho recorrido versaram sobre pedidos diversos.
Porém, improcedente que é o argumento pela recorrente colocado no recurso, de cariz estritamente jurídico, e revelando-se, perante tal improcedência, a sua pretensão insubsistente, a falência do fundamento adrede invocado na decisão não obsta ao fenecimento desta sua pretensão.”
Cremos, no entanto, e desde já o afirmamos, que o Tribunal a quo andou mal ao decidir nos termos enunciados.
Sendo o prazo de dez dias - art.º 1348º n.º 1 do anterior Código de Processo Civil - o prazo normal para deduzir reclamação contra a relação de bens, daí não decorre que fique precludido o direito de os interessados apresentarem reclamação em momento ulterior.
Na verdade, textua o n.º 6 do art.º 1348º do anterior Código de Processo Civil que as reclamações contra a relação de bens podem ainda ser apresentadas posteriormente ao prazo previsto no seu n.º 1, mas o reclamante será condenado em multa, excepto se demonstrar que a não pôde oferecer no momento próprio, por facto que não lhe é imputável, como, aliás, entende a jurisprudência ao reconhecer que, pese embora a reclamação contra a relação de bens tenha como prazo específico, o do exame do processo, ela pode sempre ter lugar até ao trânsito em julgado da sentença homologatória da partilha.
O reconhecimento de que a reclamação pode ser apresentada até ao trânsito em julgado da decisão homologatória da partilha - art.º 1348º n.º 6 do anterior Código de Processo Civil - poderá importar, necessariamente, perturbações no andamento normal do processo, contudo, sempre prevalecerá evitar partilhas que não sejam conformes à realidade, quer por se terem relacionado bens em excesso, quer por não se haverem relacionado todos os bens a partilhar, e/ou ainda para corrigir qualquer inexactidão na descrição dos bens relacionados que possa influenciar a partilha.
A lei adjectiva civil aplicável ao caso sub iudice não fixa prazo temporal para a apresentação da reclamação à relação de bens apresentada, significando a expressão “posteriormente” referida no seu art.º 1348º n.º 6, do anterior Código de Processo Civil que pode ser apresentada a “qualquer altura”, sustentando a propósito, Lopes Cardoso, in, Partilhas Judiciais, Volume I, página 525, “o significado do advérbio empregado não consente entendimento diverso”.
Neste mesmo sentido, seguindo idêntica orientação, distinguimos do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 21 de Janeiro de 2003 (Processo n.º 02A931), disponível em www.dgsi.pt: “Finalmente, do disposto no art.º 1348º, n.º 6, do Cód. Proc. Civil, resulta que as reclamações contra a relação de bens podem sempre ter lugar até ao trânsito em julgado da sentença homologatória da partilha, em homenagem ao princípio da verdade material, que em processo de inventário chega ao extremo de conduzir à possibilidade de emenda ou de anulação da partilha mesmo depois do trânsito em julgado da respetiva sentença homologatória nos termos dos art.ºs 1386º, 1387º e 1388º do mesmo Código. Ora, tal sentença ainda não transitou em julgado, pelo que os ora recorridos ainda estavam e estão em tempo de suscitar essa questão, não se encontrando sequer sujeitos, para o efeito, a qualquer fórmula sacramental”.
Outrossim, no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 15 de Abril de 2004 (Processo n.º 04B1169), disponível em www.dgsi.pt, onde se sustentou:
“Apresentada a relação de bens, são os interessados notificados de que podem reclamar contra ela, no prazo de 10 dias, acusando a falta de bens que devam ser relacionados, ou reclamando a exclusão de bens indevidamente relacionados, por não fazerem parte do acervo a dividir, ou arguindo qualquer inexactidão na descrição dos bens, que releve na partilha (artigo 1340º, nº. 3, do Código de Processo Civil).
As reclamações contra a relação de bens ainda podem ser apresentadas posteriormente, mas o reclamante será condenado em multa se não demonstrar que a não pôde oferecer no momento próprio por facto que lhe não seja imputável (artigo 1348º, nº. 6, do Código de Processo Civil).
Assim, verificando-se a falta de relacionação de bens antes do trânsito em julgado da sentença homologatória do acto de partilha, caso em que os bens omitidos são sujeitos à tramitação que é própria do processo de inventário, isto é, de correcção do seu valor, de licitação, conforme os casos, e objecto de partilha juntamente com os restantes.
Para o efeito, conforme a situação envolvente, se necessário, suspender-se-ão os actos típicos do processo de inventário, designadamente a conferência de interessados ou o acto de licitação ou os termos posteriores do processo, para que se atinja o referido desiderato.
Diversa é a solução legal, como é natural, no caso de a omissão de relacionação de bens ser verificada depois do trânsito em julgado da sentença homologatória da partilha, caso em que se deve proceder no mesmo processo à partilha adicional, com observância, na parte aplicável, do disposto na secção sétima e anteriores do capítulo décimo-sexto do Código (art.º 1395º nº. 1, do CP Civil). (…) Conforme acima se referiu, quando a falta de relacionação de bens é detectada antes do trânsito em julgado da sentença homologatória da partilha, ela pode ser objecto de reclamação até ao referido trânsito. Todavia, como é natural, a reclamação tem de ser apresentada na 1ª instância, onde foi proferida a sentença homologatória da partilha, e nunca em recurso daquela sentença.”
No caso trazido a Juízo impunha-se que o Tribunal recorrido revogasse a sentença homologatória de partilha, em obediência ao princípio da verdade material, que em processo de inventário chega ao limite de permitir a emenda ou anulação da partilha mesmo depois do trânsito em julgado da respetiva sentença homologatória, uma vez que a reclamação à relação de bens ocorreu antes do trânsito em julgado da respectiva sentença homologatória da partilha.
O critério legal decorrente da lei adjectiva civil, aplicável ao caso em apreço, vai no sentido de que no processo de inventário devem ser decididas definitivamente todas as questões de facto de que a partilha dependa, excepto se a decisão a proferir determine ampla discussão no quadro do processo comum, que, de todo, não se ajuste à sumária apreciação do processo de inventário.
Assim, sendo consabido que no inventário resolvem-se, em princípio, além de todas as questões de direito, aquelas questões de facto de que dependa a partilha, importará que a resolução da apresentada reclamação à relação de bens seja apreciada, se possível, dentro do processo de inventário, ou remetida para os meios comuns, na medida em que esse conhecimento, mesmo condicionado à possibilidade de se poder produzir prova sumária, poderá, ou não, influir na determinação da partilha.
Sustenta a Recorrente/Requerente/AA, por outro lado, que o indeferimento da reclamação da relação de bens tem um outro fundamento, qual seja, o de que existe caso julgado formal constituído pelo despacho que indeferiu a suspensão da instância executiva com o fundamento referido de que a acção declarativa proposta pelo pai da ora requerente não tem a virtualidade de suspender essa acção executiva.
Ora, a este propósito, bastará atentar ao consignado no enquadramento jurídico que sustenta o acórdão recorrido para se concluir que o Tribunal a quo (ao enunciar que “Certo é que o argumento “expressis verbis” plasmado na decisão de indeferimento da reclamação - caso julgado por despacho anterior que indeferiu a suspensão da instância por invocação de causa prejudicial - não procede. Efetivamente, e como aduz a recorrente, tal despacho e o despacho recorrido versaram sobre pedidos diversos.”), não deixou de acolher a argumentação aduzida pela Recorrente/Requerente/AA, sendo, por isso, despiciendo, qualquer referência à inexistência de caso julgado, reconhecido em 1ª Instância, mas, inequivocamente, arredado pelo Tribunal recorrido.
Censurado o acórdão recorrido, com consequente revogação da sentença homologatória da partilha, uma vez que se impõe a apreciação prévia da reclamação à relação de bens (julgada extemporânea pelo Tribunal recorrido, declarando que a Requerente/AA não pode agora - decorridos seis anos da apresentação da relação de bens neste processo - pretender a exclusão de um imóvel deste inventário), torna-se, necessariamente, prejudicada o conhecimento das restantes questões, objecto desta revista, quais sejam, a declarada condenação da Requerente/AA como litigante de má-fé, que deixa de ter qualquer sentido, sendo, por isso, revogada, outrossim, prejudicada se torna o conhecimento da invocada violação do direito ao contraditório da Requerente/AA quanto à questão de provar a incomunicabilidade da dívida.
Tudo visto, concluímos, sem reservas, que o Tribunal a quo não apreciou os problemas fundamentais e necessários à justa decisão da lide, donde, a decisão merece reprovação, na medida em que este Tribunal ad quem reconhece ter havido nítida precipitação na confirmação da sentença homologatória da partilha quando se impunha apreciar, previamente, da reclamação da relação de bens, entretanto indeferida sem justificação legal que suportasse a declarada extemporaneidade, tanto mais que tal decisão poderá influir na determinação da partilha.
Na procedência das conclusões aduzidas, reconhecemos às mesmas, virtualidade bastante para alterar o destino da presente demanda, revogando-se o acórdão recorrido.
III. DECISÃO
Pelo exposto, os Juízes que constituem este Tribunal, concedem a revista, julgando-a procedente, revogando o acórdão recorrido, impondo-se, por isso, apreciar a deduzida reclamação à relação de bens, após o que, deverão os autos prosseguir seus termos.
Custas pelos Recorridos/BB e outros
Notifique.
Lisboa, Supremo Tribunal de Justiça, 24 de Setembro de 2020
Oliveira Abreu (Relator)
Ilídio Sacarrão Martins
Nuno Pinto Oliveira
Nos termos e para os efeitos do art.º 15º-A do Decreto-Lei n.º 20/2020, verificada a falta da assinatura dos Senhores Juízes Conselheiros adjuntos no acórdão proferido, atesto o respectivo voto de conformidade dos Senhores Juízes Conselheiros adjuntos, Ilídio Sacarrão Martins e Nuno Pinto Oliveira.
(a redacção deste acórdão não obedeceu ao novo acordo ortográfico)