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VIOLAÇÃO DE SIGILO PROFISSIONAL
CONSULTORIA JURÍDICA
CONTRATO DE CONCESSÃO COMERCIAL
POSIÇÃO DOMINANTE NO MERCADO
ADESÃO AO MERCADO COMUNITÁRIO
CLÁUSULAS CONTRATUAIS GERAIS
NULIDADE
ACORDO INTERNACIONAL
TAXA DE JUSTIÇA
DISPENSA DE PAGAMENTO
Sumário
I. Na tramitação do incidente de impugnação, se findo o interrogatório preliminar, a parte contra a qual a testemunha é oferecida, suscita que vai ocorrer violação do segredo profissional por parte dum advogado de empresa, o caminho a seguir, por via da conjugação dos artigos 514º e 515º, ambos do CPC, é o de ponderar se a impugnação deve ser admitida, isto é, se corresponde a fundamento legalmente previsto para se impedir alguém de depor – na perscrutação desta questão, no caso concreto, haveria que confirmar exactamente se a testemunha foi “advogado para a empresa”, designadamente porque para ela exerceu actos próprios da profissão de advogado – e não permitir a prestação do depoimento para, depois dele, aferir se foi violado o segredo profissional. II. A consultoria e assessoria jurídica prestada por um advogado de empresa, traduzindo-se na actividade de aconselhamento jurídico que consiste na interpretação e aplicação de normas jurídicas tendentes à alteração de negócios jurídicos, integram a actividade própria de advogado, o que não é prejudicado pelo facto do mesmo advogado, enquanto director de departamento jurídico, poder ter competências de gestão. Como tal, os conhecimentos obtidos no exercício dessa actividade estão sujeitos a segredo profissional. III. A compaginação da necessidade pública de manutenção do segredo com a autorização do beneficiário só se assegura na imprescindibilidade da revelação para a defesa do cliente. Não tendo esta imprescindibilidade sido alegada pela parte beneficiária e entidade empregadora do advogado, não pode considerar-se que este tenha ficado dispensada do segredo pelo seu mero oferecimento como testemunha, sendo aliás que, mesmo perante uma ponderação dessa necessidade de defesa do cliente, haveria de ter sido cumprido o procedimento próprio previsto no Regulamento de Dispensa do Segredo Profissional (Regulamento nº 94/2006 de 12 de Junho), de cujo artigo 4º resulta aliás a excepcionalidade da dispensa. IV. Na selecção da matéria de facto assente não é atacável a objectivação que qualquer das partes faça dos factos que alega, em função das possíveis soluções de direito. Não deve assim cindir-se um facto complexo – determinada cláusula contratual foi apresentada em contrário ao que resulta efectivamente da sua aplicação – levando aos factos provados a apresentação, sobretudo quando também não se leva à base instrutória a segunda parte do facto alegado. V. No âmbito da impugnação da decisão sobre a matéria de facto, a reapreciação da prova serve à aquisição de convicção própria da segunda instância – evidentemente com alguns limites resultantes da falta de imediação, evidentemente sem significar um segundo e novo julgamento independente do já realizado – em detrimento duma tese de mera sindicância dos erros notórios de apreciação da prova pela primeira instância. Tanto mais assim quanto o varrimento da totalidade da factualidade relevante para subsunção às muitas e possíveis soluções de direito, que no julgamento ocorreu e que na impugnação da decisão sobre a matéria de facto vêm também invocadas, bem como o apelo à generalidade dos inúmeros documentos constantes dos autos, e de muitos depoimentos prestados, se alinham para fornecer ao tribunal de recurso um conhecimento total da factualidade em que as partes foram intervenientes ao longo de várias décadas. VI. As respostas do tribunal em matéria de facto não têm de ser proferidas em função da obtenção duma verdade absoluta mas duma probabilidade razoável e segura segundo os padrões de normalidade. O quadro de fundo desta normalidade é o da inserção factual na realidade onde se inscreve. No caso concreto, esse quadro é o da realidade da prática comercial, da organização dum concreto negócio, da evolução desse negócio aliás em conjugação com a evolução política e económica geral. VII. Pode qualificar-se como contrato de concessão comercial a relação comercial, com duração de décadas, entre produtor/comercializador de cigarros e grossistas distribuidores, únicos clientes a quem aquele vende os seus produtos, em que o produtor se obrigou a vender e os grossistas se obrigaram a comprar para revenda ao retalho, em seu nome e por sua conta e risco, e igualmente assumiram obrigações pelas quais o produtor conseguiu a conformação concreta da rede de distribuição à sua política comercial, desde logo a obrigação de abastecimento regular e contínuo do mercado sem rupturas de stock, devidamente acoplada de mecanismo de expulsão contratual, e obrigações visando o conhecimento minucioso do mercado – em última análise operacionais para a manutenção do domínio de mercado – bem como obrigações relacionadas com a inalterabilidade do prestígio das marcas e da imagem do produtor, sujeição a regras de armazenagem, obrigações de sujeição a fiscalização, quer dos armazéns, quer da proveniência dos produtos, quer da própria informação fornecida. VIII – São igualmente relevantes para a qualificação os mecanismos formalmente livres mas na prática, pela dependência económica dos grossistas ao produtor, materialmente não livres, de adequação da actividade grossista às decisões comerciais em cada momento relevantemente tomadas pelo produtor, consistentes em recorrentes campanhas de incentivo, campanhas de Verão e similares, bem como as recomendações e instruções enquadradas em acções de formação promovidas pelo produtor e destinadas aos grossistas. IX. É a – comprovada nos autos – dependência do fumador em relação à marca, como chave do negócio, que permite mostrar como a produtos de prestígio, ainda que de valor unitário diminuto, sem particular necessidade de assistência pré e pós venda, e com publicidade crescentemente proibida, quadra bem a concessão comercial enquanto forma de operacionalização duma rede capilar muito extensa e fina de distribuição, com controlo firme das acções e das condições pelas quais tal dependência consegue ser mantida. X. Da adesão de Portugal às Comunidades Europeias e do processo de privatização onde o adquirente do produtor assumiu o compromisso de alienar a sua participação no negócio de distribuição, não resulta, de modo algum, que a relação comercial que se estabeleceu entre o produtor e os grossistas distribuidores – antes reconhecidamente titulada por contratos – não pudesse mais revestir qualquer forma contratual além de sucessivos contratos de compra e venda por ocasião de cada encomenda e fornecimento. XI. A liberdade de fixação de preço de venda pelo produtor não se confunde com uma liberdade de alteração unilateral irrestrita da percentagem de desconto acordada com o distribuidor no âmbito da concessão comercial. XII. A introdução de um adicional à factura onde o desconto acordado foi aplicado ao total da mesma, constituindo uma diminuição desse desconto, expressamente recusada pelos grossistas distribuidores, importa numa violação do pontual cumprimento dos contratos, tornando-se o produtor responsável pelos prejuízos causados pelo incumprimento. XIII. Em face duma recusa expressa de aceitação de tal adicional, o desvalor da cláusula que o introduziu não resulta do Regime Jurídico das Cláusulas Contratuais Gerais mas directamente da violação do princípio “pacta sunt servanda”. XIV. São nulas, nos termos do artigo 12º do RJCCG as cláusulas contratuais gerais aceites pelos seus destinatários que possibilitam ao predisponente a alteração total ou parcial do contrato, a todo o tempo e independentemente de fundamento, sobretudo quando permitem a alteração do equilíbrio económico das partes que é elemento essencial da sua vontade de vinculação recíproca. XV. Uma obrigação de pagamento por um único meio de pagamento no exacto montante da factura ou grupo de facturas, se resultante dum acordo internacional aprovado e ratificado pelo Estado Português, vincula por aplicação do nº 2 e subsequentemente do nº 1 do artigo 8º da Constituição da República Portuguesa, constituindo desse modo fonte normativa externa ao domínio da regulação privada dos contratos, e integrando uma limitação ao princípio da liberdade negocial constante do artigo 405º do Código Civil, deste modo insusceptível de, na sua adopção na pendência duma relação contratual privada na qual era anteriormente admitida a liberdade de meios de pagamento, constituir uma violação do contrato. XVI. Numa relação comercial em que o produtor tem uma posição dominante no mercado e o distribuidor se encontra na dependência económica daquele, decompondo-se o desconto fixo acordado em uma parte fixa e outra variável, em função de quatro factores diferentes, cujos máximos permitem a reconstituição do anterior desconto fixo único, o desconto por escalões de volume com uma diferença muito acentuada entre o 1º escalão e os demais, e ainda para mais diferenciado por distritos e sem prova de justificação económica para esta diferenciação, na medida em que incentivou os grossistas a comprarem mais produtos desse produtor em detrimento da sua concorrência horizontal, restringindo a escolha do consumidor final, e na medida em que se traduziu na prática de preços a serem tidos objectivamente como discriminatórios, e que conduziram à exclusão do mercado grossista de muitos grossistas e à concentração de muitas empresas grossistas, em coerência com o manifestado objectivo do produtor de diminuição do número de grossistas, tanto integrou o abuso de posição dominante como o abuso de dependência económica. XVII – Não se justifica a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça numa acção cujo valor foi fixado em €19.656.279,44, que conta com 39 volumes, 8907 folhas, que se iniciou com uma petição inicial de 612 artigos e uma contestação de 1462 artigos, em que foram invocadas várias fundamentações jurídicas para atacar várias cláusulas contratuais, em que foi junta abundantíssima prova documental, realizada uma perícia que demorou anos a ser concluída, em que até ao recurso da sentença final o processo já contava com cinco apensos decididos nesta Relação, e cujo julgamento demorou quase dois anos, resultando em 20 CD’s de prova gravada.
Texto Parcial
Acordam os juízes que compõem este colectivo do Tribunal da Relação de Lisboa:
I. Relatório
A…, Lda, B…, Lda, C…, Lda, D… Lda, E… Lda, F… Lda, G…, Lda, H... Lda, I… Lda, J…Lda, K… S.A., L… Lda, M…, Unipessoal, Lda, N…, Lda, O… Lda, P… Lda, Q… Lda, R…, Lda, S…Lda, T…, U…, V…, e X, S.A., todas e todos nos autos melhor identificados (e já não se mencionando as outras Autoras e Autores que entretanto desistiram dos respectivos pedidos) intentaram a presente acção declarativa, sob a forma ordinária, contra T…, S.A. e TT…, S.A., também nos autos melhor identificadas, pedindo;
- que se declarem ineficazes a Cláusula 2.3 das Condições Gerais de 2006 e de 2008 e as Cláusulas 10.1 das Condições de 2009 e 2010;
- subsidiariamente, que se anulem a Cláusula 2.3 das Condições Gerais de 2006 e de 2008 e as Cláusulas 10.1 das Condições de 2009 e 2010;
- que se declare a nulidade das disposições que constaram da Cláusula 2.2.2 das Condições de 2002, 2005, 2006 e 2008, da Cláusula 7 das Condições Gerais de 2002, da Cláusula 8 § 1 das de 2005, da Cláusula 8 § 1 das de 2008, da Cláusula 10.1 das Condições Gerais de 2009 e 2010, da Cláusula 2.3 das Condições Gerais de 2006 e 2008 e da alteração na forma de determinação da margem dos distribuidores (e a sua concreta redução para 7,11%), pelas Cláusulas 10.1 das Condições de 2009 e 2010 e Cláusula 11.4 constante das Condições Gerais de 2010;
- subsidiariamente, que se proceda à anulação das disposições que constaram da Cláusula 7 das Condições Gerais de 2002, da Cláusula 8 § 1 das de 2005, da Cláusula 8 § 1 das de 2008 e da Cláusula 10.1 das Condições Gerais de 2009 e 2010;
- que sejam as RR. condenadas a, solidariamente, entregarem à A. A… a quantia de € 1.181.155,04, à A. B… a quantia de € 1.532.328,82, à A. C… a quantia de € 936.907,59, à A. D… a quantia de € 581.992,83, à E… a quantia de € 458.477,63, à A. F…, a quantia de € 2.195.197,63, à A. G… a quantia de € 860.139,47, à A. H…, a quantia de 71.620,00, à A. I… a quantia de € 814.792,08, à A. J… a quantia de € 429.348,71, à A. K…. a quantia de € 582.523,45, à A. L… a quantia de € 982.683,86, à A. M… a quantia de € 298.318,52, à A. N…. a quantia de € 2.890.766,24, à A. O… a quantia de € 211.012,50, à A. N… a quantia de € 889.389,01, à A. P… a quantia de € 334.833,07, à A. Q… a quantia de € 306.321,33, à A. R… a quantia de € 943.549,92, ao A. S… a quantia de € 132.321,67, ao A. T… a quantia de € 779.437,39, ao A. U… a quantia de € 1.344.643,09 e ao A. V… a quantia de € 154.825,99;
- que sejam as RR. condenadas a pagar juros de mora sobre tais quantias, à taxa legal aplicável aos comerciantes, desde a data da citação;
- que sejam as RR. condenadas a entregarem aos AA. as quantias que faturarem com base nas mesmas cláusulas, desde a data das últimas faturas referidas na petição inicial até ao trânsito em julgado da presente ação, e os juros de mora sobre essas quantias, à taxa legal aplicável aos comerciantes, desde a data da citação;
- que sejam as RR. condenadas a executar no futuro os contratos de distribuição que mantêm com as AA., aplicando na sua faturação a margem de desconto das AA. que estava contratada, ao seu valor máximo - por força da nulidade da diferenciação por escalões -, a 31 de Dezembro de 2005;
- e que sejam as RR. condenadas a aceitar o pagamento das faturas por si emitidas por meio de mais do que um cheque sacado sobre várias instituições bancárias nacionais, se for conveniente às AA., aplicando-se as condições vigentes até 1 de Outubro de 2010 em matéria de forma de pagamento das faturas e que admitiam o pagamento de fatura ou conjunto de faturas por meio de mais de um cheque.
Em síntese e em apoio das suas pretensões, e servindo-se aqui este tribunal da introdução feita na petição inicial, alegaram que são sociedades comerciais ou empresas da titularidade de pessoas singulares que desenvolvem “a actividade de armazenagem e distribuição de produtos de tabaco, comprando por grosso às Rés, produtos de tabaco por estas produzidos e comercializados, e que estas Rés se comprometeram a vender, para depois serem revendidos a clientes retalhistas, em postos de venda variados, como cafés, tabacarias”, e similares, “como o faz qualquer concessionário ao abrigo de um contrato de concessão comercial”.
Na “produção e comercialização de produtos de tabaco (principalmente cigarros de produção fabril (…)”, as RR. “são titulares de uma quota de mercado de 79,4 %, tendo essa quota sido, nos anos de 2005 a 2009, sempre superior a 80%”.
(…)
Esta “actividade de distribuição das AA. é efectuada em condições de estrita dependência económica, ou seja, cerca de 3/4 dos produtos distribuídos pelas AA. são-lhes vendidos pelas Rés, pelo que a sua actividade económica terá de cessar e cessará se acaso as Rés deixarem de lhes vender, por qualquer causa, os produtos que distribuem, já que”, inexistindo “nas actuais condições de mercado — pela notoriedade das marcas produzidas e comercializadas pelas RR., entre as quais a M… e a S… a dependência dos consumidores que torna a procura pouco elástica e pela sua posição dominante — qualquer alternativa que possibilite às AA. substituírem a distribuição dos produtos das RR. por produtos de outros fornecedores”.
“A actividade de distribuição dos produtos das (…) Rés é desenvolvida há já longos anos e com base em contratos de concessão comercial celebrados com os grossistas, que eram, inicialmente, individualmente celebrados”.
Desde “1992 a … R. (antes da cisão) passou a pretender alterar as condições de exercício da actividade de distribuição por meio de cláusulas contratuais gerais que designa de “Condições Gerais”.
Desde “2002 que a … R. tem procurado fazer para tentar descaracterizar os contratos celebrados como contratos de concessão comercial não só para tentarem furtar-se às vinculações em matéria de cessação dos contratos (v.g. a necessidade de pagamento de indemnizações de clientela)”, como para “tentarem conseguir, unilateralmente, modificações contratuais ao abrigo de uma ficciosa tese de que os únicos contratos que celebra com os distribuidores são múltiplos contratos de compra e venda de produção sucessiva, e de que não existe qualquer contrato de distribuição celebrado”.
“Essas condições gerais, que desde 1992 surgiram, com versões em 1997, 2002, 2005 e 2006, passaram, após a cisão ocorrida na … (R), comunicada por carta de 9 de Novembro de 2007, com efeitos a partir de 1 de Janeiro de 2008, a ser parcialmente assumidas e comunicadas pela … ora 2ª R.”.
Na “perspectiva das RR. do que se tratou sempre, como se viu, foi da celebração de renovados contratos de compra e venda que estarão sujeitos às condições que o vendedor, em cada momento, esteja disposto a propor aos compradores, e não de contratos de concessão de duração indeterminada que, para sofrerem vicissitudes modificativas, naturalmente implicam o mútuo consenso dos contraentes”.
(…) “(…), as AA. recusaram sempre uma alteração às condições contratuais que a … (R – 1ª) impôs, para vigorar a partir de 1 de Janeiro de 2006, e que esteve relacionada com a introdução de um, assim denominado, “Factor de Correcção”. “Esse “Factor de Correcção”, (…), consistiu na imposição unilateral de uma redução à margem de lucro que os distribuidores percebiam na sequência da prossecução da sua actividade de distribuição, redução essa em benefício da … (R – 1ª), ou seja, impôs um custo acrescido (que resultava desse Factor de Correcção) para as AA. lhe adquirirem os mesmos produtos como até aí adquiriam”.
“Desconto esse, completamente arbitrário e não aceite, mas que implicou que a margem de lucro dos distribuidores, que era de 8,885% sobre o preço de venda ao público (PVP) dos produtos distribuídos em 31 de Dezembro de 2005, tivesse depreciado sistematicamente até atingir 7,373% em 5 de Janeiro de 2009”.
“Mais, as AA. recusaram expressamente ainda uma alteração contratual, que se destinava a vigorar a partir de 1 de Julho de 2009, e que implicaria que a margem de lucro dos distribuidores resultasse da diferença entre um preço fixo por caixa, na venda das T… aos distribuidores — preço esse que as … (RR) poderiam alterar quando o desejassem — e o preço de venda ao público que seja fixado em cada momento, também pelas …(Rés)”.
Essa “alteração implicou, no imediato, a redução da sua margem de lucro para 7,110% dos produtos distribuídos, margem essa que com a subida do PVP de Dezembro de 2010 passou a 7,135%”.
(…)
“Sendo essas alterações contratuais, pelas quais se reduziu a margem das AA., totalmente ineficazes por nunca terem merecido o acordo das AA., nulas por implicarem a violação do disposto na Lei 18/2003, de 11 de Junho (LDC), ou, finalmente, anuláveis porque realizadas sob coacção moral e usura, servirá a presente acção para que se proceda à reposição das condições contratuais vigentes em 31 de Dezembro de 2005, condenando-se as RR. a pagar às AA, as quantias a que elas têm direito à luz das condições vigentes em 2005 e que as … ora RR., fizeram suas”.
“Essas quantias, que as AA. teriam recebido não fora a ilícita e ineficaz alteração das condições contratuais impostas pelas RR. ascendem ao montante global de € 19.585.374,71”.
“Mas a presente acção diz ainda respeito a uma projectada alteração das “Condições Gerais” que foi comunicada às AA. por carta de 7 de Setembro de 2010, para entrar em vigor em 1 de Outubro de 2010”. “Através dessas novas “Condições Gerais”, as Rés querem impor aos armazenistas e grossistas o pagamento das facturas por meio de um único cheque, ou seja, com um cheque sacado sobre uma única instituição bancária, (…) alterando o que estava acordado entre as partes em matéria de forma de pagamento, já que os grossistas dos produtos de tabaco sempre, até ao momento, pagaram os produtos adquiridos com recurso a diversos cheques sacados sobre várias instituições bancárias nacionais quando disso necessitavam”.
Essa “alteração é extremamente prejudicial para as empresas distribuidoras, para as AA., na medida em que provoca às distribuidoras indisponibilidades financeiras decorrentes das regras de compensação de cheques, (…) as AA. declararam expressamente recusar essa imposição decorrente da alteração das “Condições Gerais”. Um variado conjunto de cláusulas das “Condições Gerais” das … (Rés), presentes e passadas, são legalmente inadmissíveis, e por isso nulas, requerendo-se a declaração da sua nulidade”.
“Já que, ou são disposições que configuram práticas restritivas da concorrência na sequência da posição de domínio no mercado nacional de cigarros de produção fabril e da exploração abusiva da dependência económica que as AA. têm para com as RR..,” “Ou são disposições que contrariam o regime vigente em matéria de cláusulas contratuais gerais, constante do DL n.º 446/85, de 25 de Outubro (RCCG)”.
Contestaram as Rés conjuntamente, concluindo a final que deve: “a) Ser julgada procedente, por provada, a excepção dilatória de ilegitimidade activa da 26.ª Autora; b) Ser julgada procedente, por provada, a excepção peremptória de caducidade do alegado direito dos Autores; c) Ser julgada procedente, por provada, a excepção peremptória de prescrição do alegado direito dos Autores; d) Ser julgada totalmente improcedente, por não provada, a acção instaurada pelos Autores, absolvendo-se consequentemente as Rés da totalidade dos pedidos por aqueles formulados”.
Em síntese, defenderam-se por excepção, desde logo invocando a ilegitimidade da 26ª Autora, a caducidade do direito de acção quanto à anulabilidade da cláusula 7 das CGF de 2002, da cláusula 9 das CGF de 2005, da cláusula 2.3 das CGF de 2006 e de 2008, da cláusula 8 § 1 das CGF DE 2008 e da cláusula 10.1 das CGF de 2009 e 2010, e a prescrição do direito à restituição por enriquecimento sem causa.
Por impugnação, e muito em síntese dos 1462 artigos da contestação, negaram a caracterização da relação contratual como concessão comercial ou distribuição, alinhando que (artigo 507º) “Na situação em análise, e numa síntese dos factos relevantes, temos que as partes, de forma reiterada no tempo, celebraram um (ou vários) contrato(s), e (i) não o fizeram por tempo indeterminado, (ii) as Rés não se obrigaram a fornecer aos Autores, (iii) nem estes tão-pouco se adstringiram a adquirir, (iv) uma determinada quota de bens, (v) de elevada tecnicidade, (vi) para revender a consumidores finais, (vii) em regime de exclusividade, (viii) numa área territorial identificada, (ix) com integração dos últimos na rede ou cadeia de distribuição das primeiras, e decorrente (x) sujeição à sua política comercial, controlo e fiscalização, (xi) designadamente submetendo-se a regras sobre a sua organização e métodos de venda, (xii) com assunção de obrigações, como as de informar, prestar assistência a clientes, angariar clientela ou promover os produtos” (artigo 508º) “Em face do que se impõe concluir que não estão aqui retratados os elementos constitutivos de um contrato de concessão comercial, antes pelo contrário)”.
No entendimento das Rés, as condições gerais devem ser qualificadas como “oferta (proposta contratual) ao público, isto é, “(proposta genérica, dirigida a todos os interessados), atentos (i) a indeterminação pessoal do declaratário, (ii) a fungibilidade da pessoa do futuro ou dos futuros contraentes e (iii) a utilização de um anúncio público como meio de difusão”.
“As condições, quando fixadas e comunicadas, não assumem, nesse momento, relevância jurídica per se, no tocante à posição dos grossistas – os quais devem, nessa altura, ser encarados como potenciais contraentes (sê-lo-iam, e foram-no efectivamente, se e quando se predispuseram a fazer encomendas, em observância das condições gerais)”[1].
Ao acto “de emissão de uma ordem de encomenda pelo grossista está inevitavelmente associada uma vontade – que se pode dizer tácita – de concordância com as condições gerais vigentes à altura (e previamente comunicadas)”.
A tese das Rés já foi sufragada pelos Tribunais, em “decisões judiciais transitadas em julgado proferidas especificamente quanto às relações comerciais das Rés com os seus revendedores grossistas”, como a sentença “proferida pelo Tribunal da Comarca de Santo Tirso de 20 de Junho de 2005, posteriormente confirmada pelo Acórdão de 12 de Outubro de 2006 do Tribunal da Relação do Porto (Proc. 0630320) (…) e, mais recentemente, a Sentença transitada em julgado proferida pelo 1.º Juízo do Tribunal Judicial de Benavente de 12 de Julho de 2010 (Proc. n.º 520/07.6TBBNV)”.
Em função desta natureza e da ausência do princípio da consensualidade, é impossível conceber as apontadas invalidades das cláusulas contratuais que alteram as condições gerais de fornecimento, que em rigor não alteram, mas são simples emissão de novas condições, autónomas umas das outras.
A admitir hipoteticamente a natureza consensual, ainda assim não se verificaria invalidade da cláusulas contratuais gerais por violação da boa-fé, pois que, como resulta da jurisprudência, “uma cláusula contratual geral será inválida, por contrária à boa-fé, se visar um objectivo injustificado, após ponderação dos interesses das partes em causa, no âmbito do concreto tipo contratual celebrado”, “Ou seja, a avaliação da conformidade da cláusula com a boa-fé é feita a priori, independentemente da execução que seja dada à mesma, pelo que nada importa o uso que as Rés podem fazer da mesma”.
Por outro lado, “o contrato de compra e venda é, por definição, um negócio comutativo em que as prestações das partes são correspectivas, pelo que a venda de um bem implica a integração no património do vendedor de uma contra-prestação de valor correspondente ao bem alienado”. “O preço de um bem é susceptível de variação com as oscilações de mercado, como sejam as decorrentes do aumento do preço das matérias-primas ou da carga fiscal que sob os produtos impende, de outros custos de factores de produção (mão-de-obra e capital),”; não “permitir actualizações de preço de venda em contratos com determinada duração, cuja regulação é estabelecida num primeiro momento, seria desvirtuar o conceito da compra e venda. (…) isso implicaria congelar um elemento essencial (o preço) que é susceptível de variar ao longo do tempo em conformidade com os anteriormente referidos factores, bem como a imposição da manutenção dos termos fixados nesse primeiro momento, retiraria o carácter correspectivo que caracteriza o contrato celebrado”.
Donde, “de acordo com os factores de concretização da boa-fé previstos no artigo 16.º do RCCG, a faculdade de alterar unilateralmente o preço permite manter os elementos essenciais do tipo de contrato utilizado e o objectivo que as partes visam atingir, pelo que não pode ser considerada como atentatória da boa-fé.
Relativamente à invocação da “proibição prevista no artigo 21.º, n.º 1 alínea a) do RCCG, já que com tal previsão legal teria o legislador pretendido proteger a parte com elevado nível de dependência económica em relação ao seu contratante (i.e. o consumidor na relação com os empresários), não corresponde à verdade que os Autores tenham um elevado nível de dependência económica em relação às Rés (…)”. De resto, “trata (se) de uma norma exclusivamente aplicável quando estiverem em causa contratos celebrados com consumidores finais”
Relativamente “à alegada violação pelas Rés do artigo 6.º do RCCG, nenhum fundamento tem a pretensão dos Autores, porquanto as cláusulas cuja invalidade é alegada – possibilidade de alteração unilateral do preço – referem-se a um elemento essencial do contrato. (…) ainda que as CGF das Rés consubstanciassem cláusulas contratuais gerais, o que não se concede, o dever de informação que, nesse caso, impenderia sobre as Rés não é um dever com a amplitude que os Autores a cada momento lhe queiram atribuir. (…) “A intensidade e o modo de executar esse dever dependem das particularidades do caso concreto, tendo em conta, nos termos gerais, as necessidades sentidas por um aderente normal, colocado na situação considerada” (…) “ é, no mínimo, estranho considerar que um comerciante, habituado a contratar – entenda-se em alguns casos dos Autores há mais de 15 anos – com capacidade e traquejo negocial, não tenha a efectiva percepção de uma cláusula que se refere a um elemento essencial do contrato que assina”. Mais, os “Autores nada disseram quanto ao facto de se clausular aquela possibilidade, pretendo agora – de forma inusitada – invocar a violação do dever de informação pelas Rés”.
Relativamente à invocação a título subsidiário da existência de negócio usurário, “porquanto as Rés teriam aproveitado o seu estado de alegada dependência económica para conseguir para si a obtenção de benefícios excessivos ou injustificados”, dependendo tal existência “da verificação de determinados requisitos, - que incumbia aos Autores alegar e provar – a saber (i) o benefício obtido pelas Rés ser excessivo ou injustificado, (ii) a exploração pelas Rés do estado de necessidade ou dependência das Autores para o obter e (iii) a consciência das Rés de tal estado de necessidade dos Autores”, requisitos que “são de verificação cumulativa”, os Autores não cumpriram o ónus de alegação dos respectivos factos constitutivos. “Assim, carece de fundamento a invalidade, por qualquer uma das formas tentadas pelas Autores, das cláusulas constantes das CGF de 2002 a 2008 que permitiam às Rés alterar unilateralmente as ofertas ao público, bem como as cláusulas 10.1 das CGF de 2009 e de 2010 que possibilitavam a alteração unilateral das tabelas de preços”.
Sobre a alteração relativa à introdução do factor de correcção e a mudança na forma de determinação da margem dos grossistas e das quantias indevidamente retidas aos Autores, assinalando que a tese destes assenta em pressupostos errados, as Rés invocam o aumento de impostos resultante do Programa de Estabilidade e Crescimento para 2005-2009, em percentagem muito acima do que era habitual – “aumentos do elemento específico do Imposto Especial sobre o Consumo de Tabaco (“IT”) na ordem dos 12,9%, 11,5% e 11%, em 2006, 2007 e 2008 respectivamente (para além dos aumentos entretanto verificados na taxa normal do IVA)” – o que “tornava inviável que fossem os fabricantes ou as entidades que introduzissem os produtos no consumo (ora Rés) a suportar tais aumentos, não repercutindo os mesmos nos referidos PVP, (…) razão “pela qual os PVP acabaram por inevitavelmente sofrer incrementos na ordem dos €0,30/0,40 durante o período em referência, isto é, aumentaram, no total, entre 40% a 50% ao longo do período de 2006 a 2009”. A “aplicação das regras anunciadas pelo Governo no PEC para 2005-2009 teria como consequência, e em potência, o aumento do tabaco em, pelo menos, 15% ao ano, sem que com isso as Rés beneficiassem de qualquer vantagem patrimonial. Aliás, se as Rés mantivessem os mesmos PVP, o aumento do imposto consubstanciaria, outrossim, um verdadeiro prejuízo”.
Ora, “a anterior fórmula de cálculo do preço a pagar pelos revendedores grossistas pela aquisição dos produtos comercializados pela 1.ª Ré – prévia à introdução do chamado Factor de Correcção – era calculada tendo por referência os PVP dos mesmos, ao qual eram aplicados descontos comerciais e descontos financeiros (…) Pelo que quanto mais elevado fosse o PVP, mais elevados seriam, à partida, os descontos comerciais de que os ora Autores (e demais revendedores grossistas) beneficiariam e, portanto, mais baixos seriam os seus preços de compra (…)”.
Tal “fórmula de cálculo do preço a pagar pelos grossistas distribuía de forma desigual a parte que não é receita do Estado decorrente dos aumentos dos PVP induzidos pelos aumentos da fiscalidade, atribuindo de forma totalmente iníqua e injustificada uma proporção crescente aos descontos comerciais, em claro prejuízo do fabricante”. (…) Já os “revendedores grossistas Clientes da 1.ª Ré veriam, mais uma vez, e aí sim, de forma artificial, aumentar exponencialmente o valor das suas receitas por cada maço de cigarros vendido”. Até “à entrada em vigor das CGF de 2006, e à inerente introdução do Factor de Correcção, o valor por cada maço vendido pelos revendedores grossistas Clientes da 1.ª Ré aumentava cada vez que aumentava o valor dos impostos incidentes sobre o tabaco, (…) Tendo essa circunstância sido sempre assumida pela 1.ª Ré até à divulgação do PEC para 2005-2009, perante o qual, e em face dos aumentos fiscais desmesurados que se avizinhavam, foi entendido ser desajustado que apenas a 1.ª Ré continuasse a suportar a inflação fiscal, traduzindo-se o Factor de Correcção na solução por si encontrada para o problema”.
As “Rés não obtiveram qualquer ganho com a aplicação do Factor de Correcção, já que a alteração do preço dos cigarros decorrente de aumento da carga fiscal torna esta variação nula, não apenas para as Rés como também para os revendedores grossistas seus Clientes, o que, salvo o devido respeito por melhor opinião, se afigura como a situação mais justa e equitativa”.
De resto, com “a entrada em vigor das CGF de 2009, terminou a aplicação do Factor de Correcção e foram introduzidos preços fixos de venda dos produtos comercializados pela 2.ª Ré aos revendedores grossistas”.
As Autoras conformaram-se com as CGF e respectivas cláusulas conforme lhes foram sendo apresentadas pelas Rés, por via da disciplina jurídica da declaração tácita, não tendo agora legitimidade para requerer a declaração da sua ineficácia, sob pena de abuso de direito na modalidade de “venire contra factum proprium”.
Por outro lado, não se verificou qualquer coacção moral, pois, ainda que se admitisse que o facto de as Rés terem informado que suspenderiam o fornecimento dos produtos por si comercializados caso os Autores persistissem no incumprimento das suas CGF (…) “Nunca estaria verificado o requisito indicado em (iii) – a ilicitude da ameaça –, resultando evidente que o exercício de um direito não poderá constituir ameaça relevante para efeitos de coação moral”.
Mesmo no que toca à passagem do factor de correcção para um valor fixo, as Rés salientam que “aquilo que efectivamente consubstancia a margem (bruta) dos grossistas há-de ser sempre a diferença entre o valor que pagam às Rés pela compra dos produtos comercializados por estas e a revenda dos mesmos aos respectivos clientes, retalhistas ou grossistas” e que “o preço de revenda aos retalhistas (ou outros grossistas) é livremente fixado pelos revendedores grossistas, não tendo as Rés qualquer intervenção a esse nível. Assim, não compreendem as Rés o motivo pelo qual pretendem os Autores imputar às Rés qualquer responsabilidade a este propósito, quando são livres de alterar a situação alegadamente criada, mediante o simples aumento do preço de revenda aos seus próprios clientes”.
Inexistem prejuízos – que sempre e apenas seriam concebíveis como lucros cessantes – e ainda assim a estes não teriam as Autoras direito sob pena do enriquecimento ilegítimo e injustificado que se pretendeu evitar com a introdução do factor de correcção. Mesmo na passagem ao valor fixo, “não existe qualquer exigência legal ou outra que determine a manutenção de quaisquer preços de venda ou descontos comerciais pelas Rés aos Autores ou aos demais revendedores grossistas, sendo estas livres de alterar a forma como calculam o preço dos produtos que comercializam”.
“Acresce que, ao contrário do que tentam os Autores demonstrar, se tiveram os alegados prejuízos que afirmam ter tido, tal verificou-se por motivos imputáveis aos próprios, já que dispunham da possibilidade de reflectir quaisquer aumentos dos preços a que compraram os produtos comercializados pelas Rés nos seus preços de revenda aos seus clientes e de eventualmente ajustar a sua própria actividade (v.g., através de ajustamentos ou reduções dos seus custos), mantendo ou aumentando, desse modo, a margem comercial bruta ou líquida por si auferida”.
Quanto à alteração relativa à forma de pagamento, sustentam as Rés que “existem outras modalidades de pagamento previstas nas CGF de 2010, que os revendedores grossistas podem optar, para além dos chamados “pagamentos a pronto” a que aludem, quando se referem aos pagamentos no prazo de 24 horas”. (…)
Por outro lado, o “Acordo CE instituiu um vasto e abrangente quadro legal para que os governos nacionais dos Estados-Membros da CE, a Comissão Europeia e a P… possam conjuntamente combater o comércio ilegal de cigarros. (…) Tal Acordo é juridicamente vinculativo para todas as Partes Signatárias, obrigando a … (Ré), enquanto empresa subsidiária da P…, a adoptar certos procedimentos e regras nas relações comerciais com os seus Clientes (…)”.
(…)
Relativamente à nulidade de disposições contratuais por violação do direito da concorrência,
(…)[2]
Replicaram as Autoras e Autores, desde logo sustentando a legitimidade da 26ª Autora, por a acção proposta estar dentro da sua capacidade, como pessoa colectiva cujo objecto é a defesa dos interesses dos associados, sendo que a acção interessa também a outros associados revendedores grossistas além dos que a interpuseram, e ainda por via do artigo 26º do Regime das Cláusulas Contratuais Gerais. Quanto à caducidade, alertam as Autoras e Autores para que é a qualificação jurídica que as Rés imprimem que lhes permite invocar a caducidade, mas que, procedendo ao correcto enquadramento legal, como contratos de execução continuada e duradoura, não se pode dizer que o prazo para a arguição de anulabilidade caducou, e ainda que assim não fosse, ele também apenas se iniciaria a partir da cessação dos vícios, que não ocorreu, e o mesmo sucede quanto à anulabilidade por usura. Quanto à prescrição, o enriquecimento sem causa é apenas uma das soluções jurídicas possíveis de enquadramento, podendo a restituição ocorrer por via da declaração de nulidade ou de anulação, e mesmo que assim não fosse, também o prazo de prescrição não teria corrido, porquanto se conta do conhecimento do direito que compete ao empobrecido, o qual deve considerar-se como tendo ocorrido quando os i. advogados das Autoras e Autores lhes comunicaram, em final de 2010, o entendimento jurídico de que não tinha justificação o depósito nas contas das Rés, durante a vigência do “factor de correcção”, de avultadas quantias relativas ao mesmo. De resto, mesmo que assim não fosse, a invocação da prescrição constitui abuso de direito, porquanto a errada convicção das Autoras quanto à obrigação de efectuar o pagamento das facturas em conformidade com o “factor de correcção”, foi criada dolosamente pelas Rés. Em todo o caso ainda, a actuação das Rés preenche a previsão do crime de burla, devendo aplicar-se o prazo acrescido de prescrição penal, e finalmente, mesmo a proceder a prescrição, então algumas das quantias estariam prescritas mas todas as quantias entregues há não mais de três anos antes da interposição da acção não estariam prescritas.
Por despacho de 27.9.2011 foi designada audiência preliminar, destinada aos fins previstos no art. 508º-A nº 1 als. b), c), d) e e) e nº 2 do C.P.C., em cuja primeira sessão foi pedida a suspensão da instância, sendo a continuação marcada para 12.1.2012, data em que foi facultada a discussão de facto e direito, e determinada a continuação da audiência para 19.1.2012. Nesta data foi facultada a discussão nos termos do art.º 508º-A, n.º 1, al. c) do C.P.C., “com base no projecto de selecção dos factos controvertidos alegados pelos AA., projecto esse apresentado por estes”, e determinada a continuação da audiência preliminar para 23.2.2012.
Sobreveio requerimento das Autoras e Autores requerendo que o tribunal proferisse convite ao aperfeiçoamento da petição inicial, indeferido por despacho de 22.2.2012, e com pronúncia contrária das Rés por requerimento do mesmo dia. Em 23.2.2012 as Autoras deram entrada de requerimento aperfeiçoando os artigos 92º, 80º, 85º, 94º, 106º, 170º, 459º e 536º da petição inicial, ao qual as Rés responderam por requerimento de 5.3.2012.
Com data de 29.3.2012 o tribunal entendeu proferir despacho saneador “antes da data designada para a continuação da audiência preliminar por forma a possibilitar a notificação electrónica bem como a preparação das partes para eventuais reclamações e para apresentação do requerimento probatório na audiência preliminar”, tendo fixado o valor da causa em €19.656.279,44, tendo julgado procedente a excepção de ilegitimidade da A. Associação …, e absolvido as Rés da instância quanto à mesma Autora, e tendo relegado para final a apreciação da excepção da caducidade do direito de acção quanto à anulabilidade de cláusulas das condições gerais de fornecimento e a excepção da prescrição do direito à restituição por enriquecimento sem causa.
Seguidamente, seleccionou a matéria de facto assente e organizou a base instrutória em 276 artigos.
Na continuação da audiência preliminar em 10.4.2012, foi requerida pelas Autoras e Autores a rectificação de lapsos de escrita e apresentada reclamação contra a matéria de facto assente (… e) contra a base instrutória, (…). Também as Rés apresentaram reclamação contra a selecção da matéria de facto, alinhando pedidos de rectificação, e reclamando por defeito.
As mesmas Rés pronunciaram-se sobre as reclamações apresentadas pelas Autoras, e estas pronunciaram-se sobre as reclamações apresentadas pelas Rés.
(…)
O tribunal proferiu então Despacho:
“Por se tratar de lapso manifesto e, portanto, rectificável, ordeno a rectificação dos pedidos formulados pelos Autores nas alíneas c) e d) por forma a que quando se lê “da cláusula 9, das de 2005” se passe a ler “cláusula 8 – 1º paragrafo, das de 2005”.
Notifique.
Oportunamente, anote no lugar próprio.
Autores e Rés vieram reclamar contra a Matéria Assente e a Base Instrutória.
Apreciando a reclamação apresentada pelos Autores, importa tecer as seguintes considerações:
1) A alínea GG) da Matéria Assente está conforme o projecto de Matéria Assente apresentado por ambas as partes. Estranha-se, pois, a reclamação dos Autores quanto à referida alínea.
(…)”.
O tribunal decidiu ainda as reclamações das Rés, tudo conforme consta da acta de 10.4.2012 (inserida em sistema Citius em 11.4.2012). As partes formularam extensos requerimentos probatórios que foram apreciados, após pronúncia das Rés, por despacho de 24.4.2012.
Precedendo duplos requerimentos das Rés e das Autores sobre a perícia requerida por estas, e intermediado por diversos requerimentos de instrução com prova documental e pela interposição de um recurso pela Autora …J, Ldª, contra considerarem-se não escritos os nomes das testemunhas excedentes a 20, que deu origem ao apenso B, e que foi julgado improcedente por acórdão desta Relação do qual foi interposta revista excepcional que o Supremo Tribunal de Justiça não admitiu, e após um despacho sobre os requerimentos de instrução datado de 15.6.2012 (que também admitiu o recurso que deu origem ao apenso B), foi elaborado auto de começo de diligência relativo a perícia colegial, em 5.9.2012, vindo o relatório de perícia a ser junto aos autos em 15.5.2014 (relatório cuja introdução no sistema Citius foi tentada sem sucesso, segundo resulta da cota elaborada em 17.7.2014).
Ambas as partes reclamaram do relatório pericial, pedindo esclarecimentos, que vieram a ser prestados em 17.7.2015.
Por despacho de 7.1.2016 foram sugeridas datas para a audiência final.
Por despacho de 9.9.2016, e por, além do mais que consta do despacho, terem dado entrada vinte e dois requerimentos, a data designada para a audiência foi dada sem efeito.
Por despacho de 26.10.2016 o tribunal indeferiu a junção de vários documentos requerida nos mencionados vinte e dois requerimentos - documentos 1 e 5 a 23 do requerimento de 7.9.2016 e documentos 1 a 3 e 14 a 17 do requerimento de 12.9.2016 - e determinou que todas as testemunhas substituídas pelas Autoras incluídas as que o foram por impossibilidade de notificação, fossem a apresentar. Desse despacho interpôs recurso a Autora C… Ldª, que foi julgado procedente por acórdão desta Relação de 4.4.2017, proferido no apenso C.
(…) Iniciou-se a audiência final em 6.3.2017.
(…)
Prosseguiu a audiência final na sessão de 2 de Maio de 2017 (…) com inquirição da testemunha das RR. VM, que disse ter sido funcionário da … Ré até 2001 e, posteriormente, advogado da Ré. … S.A.
Findo o interrogatório preliminar, o ilustre mandatário dos AA. deduziu incidente de impugnação e requereu a junção de documentos, e após pronúncia das RR., o tribunal proferiu despacho que não admitiu a impugnação e não admitiu a junção de documentos, tendo condenado os AA. nas custas do incidente, fixando a taxa de justiça em 1 UC. Prosseguiu então o depoimento da testemunha VM, (…) Seguidamente, as AA. arguiram a nulidade do depoimento prestado, sendo dada a palavra às RR. para se pronunciarem.
(…)
Em 16.5.2017 o tribunal proferiu o seguinte despacho:
“(…) Nos termos do art. 92º nº 1 do E.O.A., “o advogado é obrigado a guardar segredo profissional no que respeita a todos os factos cujo conhecimento lhe advenha do exercício das suas funções ou da prestação dos seus serviços, designadamente: (…) Conforme decorre do nº 2 do citado artigo, “a obrigação do segredo profissional existe quer o serviço solicitado ou cometido ao advogado envolva ou não representação judicial ou extrajudicial, quer deva ou não ser remunerado, quer o advogado haja ou não chegado a aceitar e a desempenhar a representação ou serviço, o mesmo acontecendo para todos os advogados que, direta ou indiretamente, tenham qualquer intervenção no serviço”. Por força do nº 5 do referido artigo, “os atos praticados pelo advogado com violação de segredo profissional não podem fazer prova em juízo”. Apesar de a testemunha VM ter reconhecido que, desde 1984, está inscrito na Ordem dos Advogados, o mesmo referiu que, desde a Páscoa de 1990 até finais de junho de 2001, foi funcionário da … R, exercendo as funções de diretor dos serviços jurídicos, não resultando do seu depoimento que, quanto aos factos em relação aos quais depôs, tenha exercido qualquer atividade própria das suas funções de advogado, sendo salientar que a testemunha referiu que foi um escritório de advogados que prestou à … R serviços de aconselhamento jurídico. Assim, não se pode considerar que o depoimento daquela testemunha está abrangido pelo segredo profissional (www.dgsi.pt Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa proferido a 10 de novembro de 2016, processo 782/14.2TVLSB-A.L1-6). Pelo exposto, indefiro a arguição da nulidade”.
(…)
(…) em 18.9.2018 (…) pelos ilustres mandatários foi requerido conjuntamente a apresentação das alegações por escrito, em simultâneo, sem réplica, no prazo de 60 dias, o que foi deferido. Em 21.11.2018 as Rés apresentaram as suas alegações finais, por requerimento com 239 páginas, e em 22.11.2018, as AA. apresentaram as suas alegações finais, por requerimento com 400 páginas.
Foi seguidamente proferida sentença de cuja parte dispositiva consta:
“Por todo o exposto, julgo a presente ação improcedente e, consequentemente, absolvo as RR. dos pedidos contra si deduzidos. Custas pelos AA. na proporção do respetivo decaimento”.
Inconformadas, as Autoras e Autores interpuseram o presente recurso, formulando, a final, as seguintes conclusões:
“Preliminarmente
A. No ponto I. destas alegações (que aqui damos por reproduzido e para onde remetemos) procedeu-se, a título de enquadramento preliminar, à síntese da causa de pedir e dos pedidos formulados pelos AA. e das razões de discordância com a Decisão Recorrida, entre as quais, a desconsideração de tudo o referido (em matéria de direito) nas alegações finais escritas apresentadas nos autos - cf. Requerimento de 21.11.2018, com a Ref. Citius 30772900 de fls. - incluindo o Parecer do Professor Pinto Monteiro de fls. 393 e segs. que incide especificamente sobre a natureza da relação existente entre AA. e RR..
Do objeto do recurso
B. O presente recurso tem por objeto a Sentença do Tribunal a quo de 13.02.2019 que julgou a ação totalmente improcedente e absolveu as RR. dos pedidos contra si deduzidos (adiante Decisão Recorrida) e incide sobre matéria de facto (incluindo a reapreciação da prova gravada) e de direito.
C. O presente recurso tem ainda como objeto, ao abrigo do disposto no n.º 3, do artigo 644.º do CPC:
(de apreciação condicionada em caso de procedência dos demais fundamentos)
a) As decisões do Tribunal a quo de 9.03.2017 e de 10.03.2017, nos termos das quais:
(i) foi indeferido requerimento dos AA. para que os Sr. Peritos prestassem esclarecimentos na audiência final, na sessão para a qual já estavam convocados e, bem assim,
(ii) foi indeferida a arguição de nulidade decorrente da decisão de dispensa dos Srs. Peritos sem o necessário contraditório dos AA.;
b) O despacho proferido na Audiência Preliminar de 10.04.2012 na parte que desatendeu as reclamações dos AA. quanto à seleção da matéria de facto;
c) O despacho de 24.05.2017 que indeferiu a nulidade do depoimento da Testemunha VE, arguida com fundamento no segredo profissional a que a referida testemunha se encontrava sujeito, enquanto advogado (nulidade em que incorre igualmente a Decisão Recorrida ao valorar tal depoimento).
Das questões a decidir
D. (…)
DAS RAZÕES DE DISCORDÂNCIA COM A DECISÃO RECORRIDA
D. Da nulidade por falta de fundamentação
(…)
J. Pelo exposto, a Decisão Recorrida infringiu de forma manifesta o disposto no n.º 1, do artigo 154.º do CPC, no n.º 1, do artigo 205.º da CRP e, bem assim, no n.º 4, do artigo 607.º do CPC, o que se reconduz à nulidade por falta de fundamentação a que refere a alínea a), do n.º 1, do artigo 615.º do CPC ou, no limite, a erro de julgamento (por desaplicação dos citados preceitos legais).
Da impugnação da decisão relativa à matéria de facto
Da infração do disposto nos n.ºs 4 e 5 do artigo 607.º do CPC e da consequente errada valoração global da prova
K. Na sua ponderação da resposta à matéria de facto o Tribunal a quo, pura e simplesmente, obliterou – sem qualquer justificação - o depoimento de 12 das 18 testemunhas arroladas pelos AA. e 8 das 14 Declarações de Parte prestadas pelos AA., bem como, muitos dos documentos juntos (não impugnados) - tudo prova que, como se demonstrou impunha uma decisão diversa da que foi proferida – cf. Pontos IV.B. d),e) e f) supra.
L. Os depoimentos “eleitos” pela Decisão Recorrida para fundamentar a resposta à matéria de facto revelaram, em boa parte, graves incoerências, inconsistências e até falta de razões de ciência, sendo desmentidos por ampla prova, desde logo testemunhal, mas também documental, o que torna difícil de compreender a opção por valorizar exclusivamente tais depoimentos em detrimento da prova produzida em sentido contrário.
M. (…)
N. Além de não ter ponderado todos os depoimentos prestados em audiência, o Tribunal a quo nem sequer ponderou os depoimentos que identifica na Decisão Recorrida na sua globalidade, mas apenas alguns excertos dos mesmos (invariavelmente aqueles donde se entendeu retirar alguma prova favorável às teses das RR.).
O. Em 18 anos de profissão nunca o ora 1.º signatário se deparou com uma apreciação da prova, salvo o devido respeito, tão parcial/fragmentária e tão contraditória com a prova global efetivamente produzida, quase como se o Tribunal a quo estivesse “em modo de suspensão” durante os depoimentos da maioria das testemunhas dos AA. (e durante as instâncias do signatário às testemunhas arroladas pelas RR.).
P. A Decisão Recorrida violou, assim, salvo o devido respeito, de forma grosseira, as regras da apreciação da prova estatuídas nos n.ºs 4 e 5 do artigo 607.º do CPC em infração destes preceitos legais, bem como o disposto no n.º 1, do artigo 376.º do CC, no que respeita à força probatória dos documentos não impugnados cuja autoria foi atribuída às RR. mas que, ainda assim, não foram valorados como prova plena.
Da valoração de meio de prova proibido em infração do disposto no artigo 92.º do EOA
Q. Ao valorar (até de modo decisivo - cf. pág. 124) o depoimento da testemunha VE…, prestado na sessão de 2.05.2017, a Decisão Recorrida reiterou a nulidade que já havia cometido quando permitiu a prestação do citado depoimento uma vez que aquela testemunha depôs sobre factos de que tomou conhecimento enquanto advogado (com as funções de Diretor Jurídico da … R), nulidade tempestivamente arguida e com manifesta influência na decisão da causa.
R. A Decisão Recorrida infringiu, assim, o disposto no n.º 5 do artigo 92.º do EOA e no n.º 3, do artigo 497.º do CPC, devendo ser revogada e substituída por outra que proceda à apreciação da prova produzida sem a valoração de tal prova materialmente ilícita – cf. demais fundamentos descritos no Ponto IV. B. b), supra.
Da impugnação do indeferimento da reclamação à seleção da matéria assente
S. Ao dar como assente que o ”Factor de Correcção foi apresentado aos AA” (cf. Alínea GG da Matéria Assente que originou o Facto Provado 30) sem levar à base instrutória um quesito que permitisse responder à questão concreta de saber “se as RR. prestaram ou não informações enganosas aos AA. sobre os objetivos e efeitos do fator de correção,” como foi requerido, o Tribunal a quo desvirtuou a alegação dos AA. realizada na p.i. e inverteu o seu sentido, impedindo-a, assim, de produzir os efeitos pretendidos e dificultando a procedência de uma das causas de pedir dos AA., ou seja, a infração dos deveres de informação e comunicação previstos nos RJCCG.
T. Nessa medida, o Despacho proferido na Audiência Preliminar de 10.12.2012 que indeferiu a Reclamação contra a seleção da matéria de facto apresentada pelas AA. infringiu o disposto no n.º 1, do artigo 511.º do CPC (então vigente), pois deixou de fora da base instrutória matéria relevante para decisão da causa ao mesmo tempo que fez incluir na matéria assente um facto que - desacompanhado de um quesito relativo ao demais alegado – pode, no limite, e sem a necessária contextualização, desvirtuar a alegação dos AA..
U. Pelo exposto, deve ser eliminado o Facto Provado 30, por excesso, devendo em sua substituição, passar a constar dos Factos Provados, (…) que: O Factor de Correcção […] foi apresentado às AA. – falsamente – como uma necessidade de anular o efeito que o aumento do PVP - exclusivamente decorrente de aumento de impostos - tinha na margem dos distribuidores (…)”.
V. Em face dos concretos meios de prova a seguir indicados, analisados com maior detalhe no Ponto IV.B.d) supra, que aqui se dá por integralmente reproduzido (incluindo os depoimentos gravados aí melhor identificados e transcritos), impunha-se ao Tribunal a quo ter proferido uma decisão relativa à matéria de facto diferente, e no sentido que passamos a indicar, dando como «provados» os seguintes factos (em alguns casos com alteração da redação do respetivo quesito)
(…)[3]
Da natureza da relação contratual entre AA. e RR.
W. Quanto à natureza das relações entre AA. e RR., discorda-se, em absoluto, do entendimento da Decisão Recorrida no sentido da sua natureza não contratual e, bem assim, do entendimento de que não resultou provado que, com a sua assinatura da minuta de contrato constante do anexo IV das CGF de 2001 a 2005, nasçam obrigações para qualquer das partes, que se afigura configurar erro de julgamento manifesto, desde logo, face ao texto das citadas CGF.
X. Prevendo-se nas CGF (até 2008) que os AA. devem “abastecer regular e continuamente” os respetivos clientes e zelar “pela inexistência de rupturas de stocks dos Produtos que adquira à … (R)” não se compreende, aliás, como se pode defender que daquelas não resultam a assunção de obrigações para os AA. típicas do contrato de concessão comercial,
Y. Com efeito - fora de uma relação contratual contínua – com que fundamento poderiam as RR. de exigir aos AA., relativamente a tabaco que já lhes foi pago (note-se) - que estes abastecessem regular e continuamente os seus clientes e zelassem pela inexistência de ruturas de stock das RR.!?
Z. De onde adviria às RR. o direito de impor aos AA. o pagamento de faturas que não resultavam de encomendas efetuadas pelos AA., mas da entrega, pelas próprias RR., diretamente aos Retalhistas, de produtos destinados a cobrir ruturas de stock, sem que os AA. pudessem recusar a respetiva fatura (alínea e) do Capítulo I das CGF de 2002? – cf. ponto 9 da matéria de facto provada.
AA. Como justificar neste caso que as obrigações dos AA. só surgem com as compras e vendas celebradas e não das próprias CGF se não existe sequer encomenda!
BB. Não se compreende também como se pode desvalorizar as inúmeras referências nas CGF à natureza contratual da relação estabelecida com base naquelas - incluindo a previsão expressa da necessidade de (i) assinar um contrato (de adesão às CGF), e (ii) da autorização escrita da … (R) para o distribuidor/grossista “ceder a sua posição contratual” e também; (iii) a obrigação dos AA. adotarem nas suas relações com os seus clientes “regras contratuais equivalentes àquelas estabelecidas nas presentes Condições Gerais”.
CC. Acresce que o “grande” argumento da Decisão Recorrida para sustentar tal tese – ou seja, a suposta inexistência de previsão expressa, nas CGF, de um direito de indemnização a favor da … (Ré) perante um eventual incumprimento dos grossistas – nem sequer corresponde à realidade, uma vez que aquelas efetivamente preveem que as RR. terão o direito de ser indemnizadas por eventuais incumprimentos dos grossistas incluindo nos termos gerais de direito - cf. Cláusulas 4.2 das CGF de 2005 (Facto Provado 10) e da Cláusula 8.7 das CGF de 2009 (Facto Provado 13).
DD. Por outro lado, é incompatível com a posição expressa na Decisão Recorrida, quanto ao significado da previsão de cláusulas que estabelecem quantidades mínimas, não só a sua diferenciação por distrito, mas também o estabelecimento, através de imposição de uma periodicidade obrigatória de encomendas, de uma obrigação contínua, sem interrupções, de aquisição de produtos das RR.
EE. A fixação de quantidades mínimas (diferentes por Distrito segundo critérios insondáveis da … (Ré)), nada tem que ver com a noção de cliente grossista, mas apenas com a política interna das RR. de controlo da quantidade de produto vendida em cada distrito, que se alcançava através da imposição aos AA. da referida obrigação de aquisição e de distribuição contínua.
FF. A obrigação de os AA. abastecerem de forma contínua o mercado com produtos da RR. e zelarem por inexistência de ruturas de stock, naturalmente só se entende por os mesmos fazerem parte da sua rede de distribuição, estando integrados na sua organização, como as RR. sempre lhes comunicaram e fizeram acreditar, além do mais, através da inúmera correspondência enviada ao longo dos anos, onde reiteradamente afirmam e reconhecem a essencialidade do seu trabalho e contributo para o sucesso das marcas da … (Ré).
GG. O que em nada se alterou apesar das sucessivas alterações às CGF que procuraram descaraterizar, mas apenas formalmente, a natureza da relação contratual existente entre as partes, não sendo seguramente coincidência que o maior empenho das RR. nesse sentido tenho ocorrido a partir das CGF de 2006 (que introduziu o fator de correção).
HH. Assim, não pode restar qualquer dúvida sobre a existência entre AA. e RR. de uma relação de natureza contratual contínua, estável e duradoura, cujos parâmetros são fornecidos, atualmente, pelas CGF, que funcionam como contrato-quadro, “que faz nascer a relação entre a … (R/RR) e o respetivo distribuidor a relação comercial e onde se estabelecem os termos e condições em que esta relação se há-de processar” e que “ultimamente se celebra através das “condições gerais” da … (R/RR).” - cf. Parecer do Professor Pinto Monteiro no Parecer de fls. 393 a 547
II. Quanto à natureza dessas relações contratuais damos por reproduzido o supra exposto no Ponto IV.C.a), concluindo, com o Professor Pinto Monteiro que: “os contratos a que se reporta a Consulta são contratos de distribuição, na modalidade dos contratos de concessão comercial. Em qualquer deles estão presentes todas as notas que identificam estes contratos, e que atrás apresentámos, designadamente e de modo sucinto: obrigação de compra para revenda; actuação dos distribuidores em seu nome e por conta própria; integração destes na rede ou cadeia de distribuição da …(R/RR).” entendimento que só sai reforçado pela vasta prova produzida nos autos e matéria de facto provada.
JJ. Ao entender de modo diverso, com influência na absolvição das RR., a Decisão Recorrida errou na determinação do direito aplicável incorrendo em erro de julgamento, devendo ser revogada e substituída por outra que aprecie os pedidos dos AA. à luz do regime do contrato de agência previsto no DL 178/86, aplicável ao contrato de concessão, conforme aceite unanimemente quer pela doutrina quer pela jurisprudência.
i) Da aplicação ilegal do fator de correção por constituir cláusula expressamente recusada pelos AA. e consequentemente excluída do contrato
KK. Tendo as AA. expressa e especificamente recusado, perante as RR., a introdução da cláusula que introduziu o “fator de correção” – cf. Factos Provados 18, 19, 22, 23 e 24 e 25 - impunha-se ao Tribunal a quo concluir que tal cláusula não integra as CGF aplicáveis aos AA., por força do disposto no artigo 4.º do RJCCG, até porque até esse momento foi sempre procedimento das RR. requerer a aceitação expressa dos AA., mediante a assinatura de um anexo IV às CGF.
LL. Com efeito, existindo recusa de uma cláusula especifica, ainda que com a aceitação do resto do clausulado, a mesma não integrará o contrato. Neste sentido, o Acórdão do STJ de 24.03.2011, de acordo com a transcrição supra.
MM. Tendo decidido de modo diverso, a Decisão Recorrida fez uma incorreta interpretação e aplicação aos Factos Provados do disposto no n.º 1, do artigo 406.º do CC e, bem assim, do artigo 4.º do RJCCG, infringindo consequentemente estes preceitos legais, devendo ser revogada e substituída por outra que julgue excluída do contrato tal cláusula.
Da infração do dever de comunicação e informação das CGF
NN. É patente, conforme se demonstrou no âmbito da impugnação ao facto “Não Provado” 32, que as RR. prestaram informações enganosas e manifestamente falsas sobre uma “condição de venda/fator de determinação do preço/desconto”, tendo alegado, de modo falacioso, que a aplicação do fator de correção se limitava a neutralizar os efeitos da subida dos impostos no aumento do PVP e também que a introdução do fator de correção não foi comunicada com a antecedência necessária e de modo adequado face à sua complexidade.
OO. Assim, ao ter decidido que explicar aos AA. a fórmula/cláusula do fator de correção não se justificava (ao mesmo tempo que reconhece a inexistência de tal explicação), a Decisão Recorrida, incorreu em erro manifesto de interpretação e aplicação do disposto nos artigos 5.º, 6.º e n.º 1, do artigo 9.º, todos do RJCCG, infringindo consequentemente estes preceitos legais.
PP. Devendo ser revogada e substituída por outra que, interpretando e aplicando corretamente os citados preceitos legais, julgue excluído do contrato celebrado a referida cláusula que introduziu o fator de correção.
Da nulidade de várias cláusulas das CGF por infração do artigo 19.º do RJCCG e do princípio geral da boa fé
QQ. Todas as cláusulas das CGF que se reportavam à possibilidade de alteração do seu conteúdo (cláusula 7 das CGF de 2001 e 2002, cláusula 8 das CGF de 2005, 2006, 2008 e cláusula 16.2 das CGF de 2009 e 2010), se interpretadas no sentido de permitir às RR. proceder à modificação, de forma ilimitada, de todos os elementos essenciais do contrato, incluindo o preço dos seus produtos, sem concordância da contraparte são nulas por violadoras do disposto na alínea h) do artigo 19.º do RJCCG e do princípio geral da boa fé.
RR. Neste sentido, Galvão Telles (em Revista dos Tribunais, Ano 71.º, 1953, página 140), Manuel Andrade (Revista dos Tribunais, Ano 71.º, 1953, página 131) e o Acórdão do STJ de 27.09.2009, de acordo com as citações supra nos pontos 633 a 635.
SS. Sendo nula a cláusula que confere à … (R/RR) o poder de alterar unilateralmente as CGF, também o são as cláusulas introduzidas em concretização desse poder arbitrário, ou seja, as cláusulas respeitantes ao fator de correção, aos descontos variáveis (distribuição direta ativa, escalões de volume, carteira de produtos e informações) e ao meio de pagamento único.
TT. Ao ter decidido de modo diverso, desaplicando ao caso concreto as normas supra aludidas, a Decisão Recorrida errou na interpretação e aplicação do direito, infringindo consequentemente o disposto na alínea h), do artigo 19.º, no artigo 15.º no artigo 12.º e no n.º 1, do artigo 13.º todos do RJCCG.
Da anulação por coação moral e usura
Subsidiariamente (e sem conceder)
UU. Caso, por ilógica conclusão se entenda que: (i) ocorreu aceitação esclarecida da cláusula relativa ao fator de correção e das cláusulas que preveem a alteração das CGF; (ii) que as RR. cumpriram os seus deveres de comunicação e informação (o que veementemente se recusa); (iii) que tais cláusulas não infringem o dever geral de boa-fé e alínea h), do artigo 19.º do RGCG e; (iv) que foram aplicadas em conformidade com os seus termos, ainda assim, sempre deveriam ter sido anuladas nos termos dos artigos 255.º e 256.º do CC.
VV. Decorre da prova referida no âmbito da impugnação do Facto “Não Provado” 31, a partir de 2006, que as RR. ameaçaram cortar o fornecimento de tabaco se as CFG não fossem seguidas.
WW. Ora, a imposição de uma cláusula contratual por via da ameaça de recusa em cumprir o contrato de distribuição, nomeadamente pela recusa em fornecer os distribuidores com produtos de tabaco da … (R/RR), implica que essa declaração de aceitação tenha sido emitida sob coação moral, in casu, na vertente de ameaça “à fazenda do declarante” (n.º 2).
XX. Provou-se, também, que os AA. se encontram numa situação de absoluta dependência económica face às RR., na medida em que, além do mais, estas são as fornecedoras exclusivas em Portugal das marcas de tabaco mais vendidas no mercado e em relação às quais inexistem produtos substitutivos e têm uma posição dominante no mercado, facto do qual as RR. têm total consciência – Cf. Factos Provados 50, 90 a 93, e 212 a 232.
YY. E que situação foi aproveitada pelas RR., que reduziram a margem dos AA. através da introdução do fator de correção (cf. Facto Provado 107) de forma a aumentar significativamente a sua margem e lucros, conforme resulta patente da prova supra identificada no âmbito da impugnação ao facto “Não Provado” 32, desde logo, e de forma bastante objetiva e indesmentível, do Relatório e Contas da … (R) de 2006, o que constitui um negócio usurário nos termos do disposto no n.º 1, do artigo 282.º do CC, anulável nos termos do artigo 287.º do CC.
ZZ. Assim, ao não determinar a anulabilidade das cláusulas 2.3 das CGF de 2006 e 2008 e 10.1 das CGF de 2009 e 2010 - e ao nem sequer apreciar esta causa de pedir oportunamente alegada na p.i. - a Decisão Recorrida incorreu em omissão de pronúncia e, em qualquer caso, em erro de julgamento, nomeadamente de subsunção dos Factos Provados ao direito aplicável, infringindo, deste modo e além do mais, os citados n.º 1, do artigo 282.º do CC e o n.º 2 do artigo 608.º do CPC
AAA. Devendo, em consequência, ser revogada e substituída por outra que, fazendo uma correta aplicação dos citados preceitos legais, declare a anulabilidade das compras e vendas realizadas com a aplicação do fator de correção e determine a sua redução ao negócio que teria sido concluído sem a parte viciada, nos termos do artigo 292.º do CC, determinando em consequência a condenação das RR. à restituição das quantias que se apuraram corresponderem à aplicação daquele.
Da aplicação do fator de correção em contradição com a cláusula que o prevê e com a informação transmitida
BBB. Da factualidade provada e da factualidade cuja alteração se requereu em sede de impugnação à matéria de facto, resulta que as RR., além do mais, aplicaram a cláusula relativa ao fator de correção em contravenção com os termos por si definidos nessa mesma cláusula.
CCC. Com efeito, ainda que julgasse válida e eficaz tal cláusula – o que sempre seria incorreto - impunha-se ao Tribunal a quo que, pelo menos, a tivesse interpretado no sentido que dela resulta que é o de permitir às RR. aplicar o fator de correção “apenas” ao montante do aumento do PVP do tabaco que decorre exclusivamente do aumento dos impostos, e já não aos aumentos que, em simultâneo, a (R) decidiu introduzir por exclusiva decisão comercial.
DDD. Ao decidir de modo diverso, a Decisão Recorrida interpretou incorretamente a citada cláusula das CGF e os “direitos” que dali decorrem para a (R) infringindo o disposto no n.º 1, do artigo 236.º, no artigo 237.º, no n.º 1, do artigo 238.º e no n.º 1 do artigo 406.º, todos do CC.
Da nulidade das cláusulas das CGF por abuso de posição dominante e de dependência económica
EEE. Dos Factos Provados, da análise realizada pela AdC no Estudo sobre o Mercado do Tabaco, da Decisão do PRC/04/08 (expurgada dos erros grosseiros que levaram ao seu arquivamento), da Sentença do Tribunal da Concorrência no referido Processo n.º 11/15.1YQSTR e, bem assim, ainda do Parecer do Professor Pinto Monteiro resulta, de forma patente, a posição dominante das RR. (no mercado do tabaco), a posição de dependência económica dos AA. em relação às mesmas e, ao contrário do decidido na Decisão Recorrida, que as condutas das RR. supra descritas configuram um abuso, quer da sua posição dominante, quer da posição de dependência económica dos AA.. o que deveria ter determinado o Tribunal a quo a declarar a nulidade de todas as cláusulas identificadas no petitório por todos os fundamentos supra descritos no ponto IV.C.g).
FFF. Com efeito, no que respeita às CGF relativas ao desconto comercial fixo (onde se inclui o fator de correção) a AdC consignou que a redução do desconto foi suscetível de induzir os grossistas à realização de comportamentos que lhes permitiam obter (em acréscimo) as componentes variáveis dos descontos com manutenção da sua margem - p. 66, da Decisão do PRC/04/08.
GGG. Quanto às cláusulas das CGF relativas ao desconto de escalões de volume, a AdC consignou que tal imposição gerava efeitos verticais (potencial discriminação entre grossistas com locais de entrega em diferentes distritos) e horizontais (potencial encerramento de atividade), distorcendo a concorrência, sendo potenciadores de um efeito de fidelização, de natureza retroativa, progressiva, incerta e de vigência prolongada (cf. pág. 316 e 317 Estudo sobre o Mercado do Tabaco), o que foi confirmado por AB…, no seu depoimento. No mesmo sentido, o Acórdão do Tribunal de Justiça, de 15 de Março de 2007,202 (§ 143) relativo ao caso British Airways vs Comissão (citado no Estudo de Mercado), conforme transcrição supra.
HHH. Sendo que se provou – cf. Factos Provados 228 a 230 – que o desconto por escalões de volume provocou uma efetiva discriminação de preços entre grossistas sem qualquer justificação económica favorecendo os “maiores” e levou ao afastamento de mercado de um elevado número deles, desde logo, por concentração.
III. No que diz respeito às cláusulas que permitem alterar unilateralmente condições comerciais (margem) e determinam obrigações de aquisição, resulta também do Estudo do Mercado do Tabaco que estas consubstanciam práticas anticoncorrenciais que têm por objeto impedir, falsear e restringir a concorrência, designadamente as cláusulas relativas a quantidades mínimas, desconto comercial fixo, desconto variável de informação de vendas, desconto variável por escalões de volume, desconto de carteira de produtos.
JJJ. Quer no Estudo sobre o mercado do Tabaco quer no PRC 04/08, a AdC concluiu, na respetiva apreciação jusconcorrencial, que as imposições de aquisição de quantidades mínimas, de descontos comerciais fixos, de descontos de informações e por escalão de volumes não dispunham de justificação económica atendível e que constituíam exploração abusiva da posição dominante da (R/RR), suscetíveis de distorcer a concorrência, sendo potenciadores de um efeito de fidelização, de natureza retroativa, progressiva, incerta e de vigência prolongada.
KKK. Ao que acresce a imposição de um único meio de pagamento - cf. cláusula 11.4 das CGF de 2010, de forma unilateral e da qual resultou um acréscimo de custos significativo de custos para os AA. – cf. Factos Provados 208 a 211 – relativamente aos quais inexiste qualquer justificação para que sejam estes a suportá-los.
LLL. Com efeito, ao contrário do entendido na Decisão Recorrida, o Acordo aludido no Facto Provado 47 (Acordo OLAF ou EC Agreement) não obrigava as RR. a impor aos distribuidores um único meio de pagamento, uma vez que ali se prevê a possibilidade de exceções ao procedimento do Acordo se existirem razões que o justifiquem – cf. parágrafo seguinte ao ponto v), pág. 89 da Decisão Recorrida.
MMM. De resto, constitui facto superveniente público que o citado Acordo cessou no dia 9 de julho de 2016 e não foi renovado, o que se constata, por exemplo, nos comunicados constantes no site da Comissão Europeia: https://ec.europa.eu/commission/commissioners/2014- 2019/georgieva/announcements/expiry-agreement-... -international_en e https://ec.europa.eu/antifraud/...-2004_en),.
NNN. Tendo a 2.ª R., ainda assim, continuado a impor aos AA. o pagamento através de um único meio de pagamento o que faz ainda hoje.
OOO. Sendo que, como considerado pelo Tribunal da Concorrência no Processo n.º 11/15.1YQSTR, apesar do arquivamento do PRC/04/08, nem sequer existe plena divergência entre os AA. e AdC, uma vez que, em concordância com as primeiras, “,…como vimos, a AdC deixou explícito que a (R/RR), quer ao abrigo das leis comunitárias, quer ao abrigo da lei portuguesa, praticou factos, objectiva e tipicamente, qualificados como infracções ao Direito da Concorrência então vigente, por abuso da sua posição dominante e por abuso da dependência económica dos distribuidores. (…)” - cf. Sentença de fls. 6705 a 6761, pág. 109 e 110.
PPP. Considerando ainda o Tribunal da Concorrência que: “- (1) No que diz respeito à pronúncia da AdC relativamente às cláusulas que permitem a alteração unilateral das CGF, temos por evidente que esse poder negocial da AdC foi abundantemente descrito e avaliado nos PRCs 04/08 e 07/10, por referência à definição do mercado relevante e da posição dominante da (R) na distribuição grossista, sendo identificada tal circunstância tanto como uma barreira à entrada como uma causa/efeito do abuso de posição dominante. (…) - (4) Em ambos os PRCs 04/08 e 07/10 ficou evidente e recorrentemente expresso que os distribuidores, clientes da (R), mercê da caracterização desta como parceiro comercial obrigatório e da caracterização do produto transaccionado (fidelização e diferenciação no mercado dos FMC), não dispõem de poder de estipulação das CGF, cujas cláusulas lhes são definidas e impostas unilateralmente. - (5) Em ambos os PRCs 04/08 e 07/10 ficou evidente e recorrentemente expresso que essa imposição unilateral, associada ao conteúdo comercial e financeiro das cláusulas, é susceptível de criar efeitos anti-concorrenciais integradores dos elementos objectivos dos tipos contraordenacionais de abuso de posição dominante e abuso de dependência económica previstos na LdC. - (6) No que diz respeito à pronúncia da AdC relativamente às cláusulas que alteram condições comerciais (margem) e determinam obrigações de aquisição, por aproveitamento do Estudo elaborado no Estudo sobre o mercado do Tabaco, registado com o número PRÉ-PRC 16/07, no PRC 04/08 ficou patente adesão da AdC à conclusão de que as cláusulas impostas pela (R) no âmbito das CGF e de outros contratos consubstanciam práticas anticoncorrenciais que têm por objecto impedir, falsear e restringir a concorrência, designadamente as cláusulas relativas a quantidades mínimas, desconto comercial fixo, desconto variável de informação de vendas, desconto variável por escalões de volume, desconto de carteira de produtos.
- (12) Em ambos os PRCs 04/08 e 07/10 ficou evidente e recorrentemente expresso que a subordinação económica dos distribuidores era acentuada pelos comportamentos negociais da (R), nas várias CGF em vigor, em função dos volumes de aquisição de produtos, designadamente quanto às obrigações de aquisições mínimas e aos incentivos para os distribuidores de adquirirem mais produtos para potenciarem poupanças.” - Destacados nossos – cf. Pág. 90
QQQ. Não podendo os AA. senão subscrever integralmente este entendimento, acrescentando apenas que a prova produzida na ação não só corroborou integralmente tais juízos de ilicitude das práticas das RR: como forneceu elementos de prova adicionais que nem sequer foram tidos pela AdC e pelo Tribunal da Concorrência e que reforçam a sua demonstração.
RRR. Pelo que, mostram-se preenchidos todos requisitos legalmente previstos para concluir que a conduta das RR. traduzida na implementação e aplicação das cláusulas em crise configura um abuso de posição dominante cominado com nulidade.
SSS. Assim não tendo decidido, a Decisão Recorrida incorreu em erro de julgamento, aplicando incorretamente o direito aos factos provados e infringindo, além do mais, o disposto nas alíneas a), b), c), e), e g) do n.º 1, e o n.º 2, artigo 4.º da Lei n.º 18/2003, de 11 de junho (Lei da Concorrência vigente à data dos factos),
TTT. Em virtude da posição dominante que detém no mercado, a (R/RR) tem uma responsabilidade acrescida em não permitir que a sua conduta distorça a normal concorrência do mercado – cf. Decisão da AdC no PRC/04/08, Estudo sobre o Mercado do Tabaco.
UUU. Porém, as práticas da (R/RR) e concretamente as várias cláusulas em crise, limitam a distribuição de produtos de tabaco da (R/RR) (entre grossistas) e dos seus concorrentes (efeitos de fidelização, concentração de vendas e fecho de mercado), traduzem-se na recusa direta e indireta de venda de bens e prestação de serviços aos distribuidores; e visam subordinar a celebração dos contratos de distribuição comercial à aceitação de obrigações suplementares que carecem de ligação com o objeto desses contratos, quer pela sua natureza quer segundo os usos comerciais (informação de vendas), pelo que constituem práticas restritivas da concorrência proibidas pelo artigo 4.º da Lei n.º 18/2003, de 11 de junho.
VVV. Com efeito, ao impor condições que provocam uma concentração do número de distribuidores, nomeadamente, as já acima referidas cláusulas das CGF que introduziram o desconto por escalões o fator de correção, o preço fixo (com incorporação do efeito do fator de correção) a (R/RR) acaba por reduzir as alternativas disponíveis para os, já fragilizados, concorrentes da (R/RR) poderem aceder aos mercados grossista e retalhista, sendo que os distribuidores que sobrevivem são necessariamente os mais fidelizados à (R/RR) e que, por consequência, menos compram à concorrência.
WWW. Este comportamento configura não só um abuso de dependência económica, mas também um abuso da posição dominante da (R/RR), na linha do decidido no acórdão Commercial Solvents (Processos apensos 6/73 e 7/73).
XXX. Em face de tudo o exposto e à luz da Jurisprudência acima citada, todas as cláusulas contratuais acima identificadas (designadamente, faculdade de alteração unilateral e arbitrária de todas as condições, descontos por escalões de volume, fator de correção, preço fixo com incorporação do efeito do fator de correção, imposição de pagamento único) constituem mecanismos através dos quais as RR. utilizaram e utilizam ilicitamente o “poder” e “ascendente” de que dispõem em relação às AA.” que se encontram em relação a elas num estado de dependência, por não disporem de alternativas equivalente para fornecimento dos bens em causa (…) que já produziram e são “suscetíveis de produzir efeitos no funcionamento do mercado ou a estrutura da concorrência.”.
YYY. Razão pela qual constituem práticas proibidas e consequente nulas nos termos do disposto nos artigos 7.º e 4.º da LdC, cuja violação gera a obrigação de as RR. indemnizarem os AA. relativamente às quantias em excesso indevidamente faturadas com base nas mesmas e, bem assim, cuja abstenção de uso para o futuro, deverá ser expressamente determinada.
ZZZ. Ao decidir de modo diverso, a Decisão Recorrida incorreu, também por este motivo, em erro de julgamento manifesto por infração e incorreta aplicação ao caso do disposto nos artigos 7.º e 4.º da Lei n.º 18/2003, devendo ser revogada e substituída por outra que, aplicando os citados preceitos aos Factos Provados e conjugando a demais prova produzida, declare a nulidade de todas as citadas cláusulas como peticionado.
Do abuso de direito
AAAA. Na hipótese, que apenas por dever de cautela e dever de patrocínio se refere, de se considerar que as RR. tinham efetivamente o direito de alterar unilateralmente as CGF, nos termos em que o fizeram, para introdução e a aplicação do fator de correção, do desconto por escalões de volume e do meio de pagamento único, sempre se terá que concluir que o exercício desse direito, nos termos em que foi feito, excedeu manifestamente os limites impostos pela boa fé, constituindo, por esse motivo, abuso de direito nos termos do disposto no artigo 334.º do CC., atento o contexto e consequências já explanadas.
BBBB. Como referido, através do fator de correção o que as RR. conseguiram foi alcançar a distribuição gratuita dos seus produtos (relativamente a uma parte relevante do preço) e colocar os AA. a suportar todos os custos e riscos acrescidos decorrentes desse aumento sem qualquer contrapartida, donde naturalmente obtiveram lucros de milhões apesar da quebra das vendas, como se demonstra pelas suas contas.
CCCC. Uma tal atuação, por parte de empresa em posição dominante no mercado do tabaco já condenada duas vezes por abuso de posição dominante e absolvida de uma terceira condenação “sem se saber bem como”, ainda que porventura não constituísse ilícito contratual e nova infracção às normas do direito da concorrência geradoras da pretensão indemnizatória peticionada (e constitui) sempre configura manifesto abuso de direito.
DDDD. Pelo que, ao não ter apreciado este fundamento de procedência da ação mesmo oficiosamente, como se impunha, a Decisão Recorrida infringiu também o disposto no citado artigo 334.º do CC.
Termos em que, com o douto suprimento de V. Exas., deve o presente recurso ser julgado integralmente procedente e, em consequência, deverá a Decisão Recorrida e as decisões interlocutórias impugnadas serem revogadas e substituídas por outra que:
a) Julgue procedentes as nulidades invocadas;
b) Julgue procedente a impugnação da decisão relativa à matéria de facto nos termos supra requeridos, dando como «provados» e «não provados» respetivamente,
os factos ali identificados (incluindo os factos instrumentais/ complementares); e; (em qualquer caso)
c) Julgue a ação totalmente procedente, por provada, decretando a nulidade e/ou a anulabilidade de todas as cláusulas identificadas na p.i.; e
d) Condene as RR. no pagamento aos AA. das quantias apuradas na perícia e daquelas que vieram a liquidar e em tudo o demais peticionado na p.i.
(Dispensa do remanescente da taxa de justiça.)
Mais requerem, por fim, nos termos do n.º 7 do artigo 6.º, do RCP, a dispensa do remanescente do pagamento da taxa de justiça, atendendo a que as questões a apreciar no recurso, ainda que múltiplas, são as mesmas para todos os AA. coligados e que os pedidos formulados são comuns e idênticos para todos eles, com exceção do pedido de condenação na restituição das quantias decorrentes da aplicação do fator de correção que difere apenas no quantitativo peticionado, pelo que a sua situação processual é materialmente equivalente a um litisconsórcio voluntário ativo pelo qual seria devida uma única taxa de justiça.
Assim, considerando que os AA. já pagaram, em conjunto, mais de € 17.000,00 de taxa de justiça pela interposição do recurso e que pautaram a sua conduta pela colaboração como o Tribunal (cf., por exemplo, alegações finais escritas) requer-se a dispensa integral do seu remanescente ou, caso assim, não se entenda, a dispensa parcial de modo a que o valor de taxa de justiça fixado seja adequado e proporcional, o que não sucederá se for estabelecido exclusivamente em função do valor dos pedidos deduzidos.
Valor do recurso de cada um dos AA., que expressamente se indica nos termos do disposto no n.º 2, do artigo 12.º do RCP:
(…)”
Contra-alegaram as Rés, pugnando pela integral confirmação da sentença recorrida, e formulando a final as seguintes conclusões:
Da Ausência de Quaisquer Vícios da Douta Sentença Recorrida e Da Correta Valoração Global da Prova Produzida, vertida na Douta Sentença Recorrida
A. (…)
Da Absoluta Legalidade do Depoimento da Testemunha VE… e, bem assim, dos Despachos de 02.05.2017 e 24.05.2017
M. (…)
N. O trabalhador VE… era, em bom rigor, um gestor, na medida em que era responsável por contratar e gerir os assuntos jurídicos da empresa junto dos advogados e jurisconsultos que, esses sim, prestavam serviços e funções próprios de advogado ao cliente … (R).
O. Numa palavra, a testemunha VE… não tinha qualquer mandato forense em seu nome, nos termos do artigo 67.º do EOA, nem prestou serviços de consulta jurídica, nos termos do artigo 68.º do EOA, porquanto tais funções estavam confiadas a advogados externos à empresa – ou seja, a testemunha não prestava serviços próprios de advogado.
P. Em qualquer caso e ainda que assim não se entendesse, o que não se concede para apenas por cautela de patrocínio se equaciona,
Q. Note-se que analisamos o depoimento de um advogado que foi arrolado pelo próprio “suposto” cliente – isto é, o principal beneficiário do segredo profissional, que as Recorrentes alegam como fundamento de nulidade.
R. Sobre esta temática, veja-se a tomada de posição de LUÍS FILIPA PIRES DE SOUSA, (…)
T. Com efeito, nos casos em que o cliente desvincula o advogado do sigilo, o condicionamento da quebra do sigilo profissional à autorização adicional da Ordem dos Advogados, como condição da licitude da quebra do sigilo, não esgota a análise da questão. Isto porque, por um lado (i) a posição da Ordem dos Advogados não vincula o tribunal, nos termos do artigo 135.º do Código de Processo Penal, aplicável ex vi artigo 417.º, n.º 4 do CPC e (ii) mesmo quando o presidente do conselho distrital não defira a quebra do sigilo, esta pode vir a ser imposta pelo tribunal de recurso (com fundamento no princípio da proibição do excesso) em sede de apreciação da justificação da escusa: ou seja, o último guardião da disponibilidade em concreto do sigilo profissional é o tribunal de recurso e não a Ordem dos Advogados.
U. (…)
Das Decisões que Indeferiram a Prestação de Esclarecimentos Orais pelos Srs. Peritos[4]
(…)
Da Natureza Jurídica da relação comercial entre as Autoras ora Recorrentes e as Rés ora Recorridas
HH. As CGF da Rés ora Recorridas constituíam meras propostas de venda de público, que se concretizavam, em caso de aceitação, em sucessivos contratos de compra e venda posteriormente celebrados.
II. Assim, tratando-se de meras propostas de venda ao público (rectius, a comerciantes grossistas) para a celebração de contratos de compra e venda, não poderá nunca ser tomada a aceitação das CGF por parte das 1.º a 25.º Autoras ora Recorrentes como equivalente à celebração de um contrato de distribuição, mas sim como o derradeiro passo para a perfeição de contratos de compra e venda.
JJ. Essa aceitação ocorria com os sucessivos pedidos de encomenda por parte de cada uma das 1.º a 25.º Autoras ora Recorrentes.
KK. As Autoras ora Recorrentes pretendem que a sua relação comercial com as ora Recorridas corresponde a um contrato de concessão comercial, uma das modalidades possíveis dos contratos de distribuição comercial.
LL. Os contratos de concessão comercial, tais como os demais contratos de distribuição, pressupõem uma concertação entre as partes contratantes que redunda numa verdadeira subordinação, tanto económica como jurídica, comummente intitulada por integração do concessionário perante o concedente.
MM. Esta subordinação que caracteriza os contratos de distribuição tem por fundamento um interesse económico do fornecedor, que é o de organizar a rede de distribuição e alinhar incentivos entre os vários membros dessa rede. Nesse sentido, as tarefas alocadas aos vários participantes da rede, que visam um escopo comum, terão de estar expressamente previstas e de ser escrupulosa e obrigatoriamente cumpridas.
NN. Ainda que haja graus distintos de integração na rede, há sempre um determinado nível de controlo sobre a atuação dos distribuidores exercido pelo fornecedor para assegurar esse alinhamento de incentivos.
OO. Na situação em apreço neste litígio nada disto se verifica. O que existe é uma pulverização de Grossistas, cada um com total liberdade de atuação comercial, com ausência de obrigações, designadamente no que respeita a áreas geográficas de atuação designadas, a clientes retalhistas designados, promoção dos produtos, etc., tudo elementos qualificadores dos contratos de distribuição comercial a nível grossista.
PP. Numa palavra, não havia uma política comercial de distribuição definida pelas Rés ora Recorridas que as 1.ª a 25.ª Autoras ora Recorrentes, enquanto Grossistas, tivessem obrigatoriamente de cumprir.
QQ. Na verdade, haveria quantas políticas quanto o número de Grossistas que comprassem bens às Rés ora Recorridas, sendo todas autonomamente definidas por aqueles, sem que as Rés ora Recorridas as pudessem coordenar, dirigir ou controlar.
RR. Claro está que não foi sempre assim, aceitando-se o vertido pelas Recorrentes quanto ao facto de que houve muito longinquamente verdadeiros contratos de distribuição (rectius, com uma verdadeira integração através da existência de um dever de promoção a que estariam todos os Grossistas obrigatoriamente adstritos e também obrigações de compra exclusiva).
SS. Contudo, os anos de 1996 e 1997 representaram uma alteração estrutural na comercialização de cigarros da … R.
TT. Porquanto em 1996 deu-se o processo de venda desta empresa à PMI.
UU. Bem vistas as coisas, (i) a liberalização do mercado que se deu com a entrada de Portugal na CEE e (ii) a aquisição da … R pela PM, que acarretou a reorganização do modo de interação do fornecedor com os Grossistas, são elementos históricos centrais e que definem o mercado do tabaco desde então.
VV. Não é, pois, por acaso que logo nas CGF de 1997 são omissas quaisquer das referências qualificadores de contratos de distribuição que existiam nos anteriores documentos.
WW. Efetivamente, a PM optou, em linha com o espírito dos compromissos assumidos aquando da aquisição da … R perante o Estado Português, por alterar a forma de relacionamento com os Grossistas, conferindo-lhes total independência na sua atuação comercial desde esse ano de 1997 até aos tempos mais hodiernos.
XX. No quadro das CGF vigentes no período a que se reporta o presente litígio, as Rés ora Recorridas não se obrigaram a vender, abastecer ou fornecer as 1.º a 25.º Autoras ora Recorrentes de cigarros, elemento caracterizador de contratos de distribuição.
YY. Demonstrou-se, outrossim, que as Rés ora Recorridas vendiam (e vendem) os seus produtos às 1.º a 25.º Autoras ora Recorrentes e a todos os demais Grossistas que o pretendessem, caso estes preenchessem os requisitos presentes nas CGF e emitissem uma declaração negocial de sentido convergente (rectius, a ordem de encomenda dos produtos).
ZZ. Se houvesse um qualquer dever de celebrar os contratos de compra e venda, seria lógico que a contraparte contratual tivesse o poder de “exigir” da outra o cumprimento (maxime, a celebração do contrato e o cumprimento dos deveres aí inseridos - por exemplo de receber os produtos ou o preço correspondente, respetivamente), podendo obter dos tribunais providências coercitivas aptas a satisfazer o seu interesse.
AAA. Trata-se, contudo, de uma questão – a da responsabilidade pelo cumprimento – que apenas surge depois da colocação da encomenda pelo Grossista.
BBB. Não se encontram nas CGF quaisquer indícios de uma relação obrigacional conducente a um dever de compra por parte das 1ª a 25.ª Autoras ora Recorrentes, elemento caracterizador de um contrato de distribuição.
CCC. Não há nas CGF um direito subjetivo de vender e não há uma previsão de uma garantia que permita a satisfação de uma hipotética obrigação de compra. E não se diga que a alusão à “aquisição de quantidades mínimas de produto” pode suscitar dúvidas sobre esta conclusão.
DDD. Como é evidente, esta fixação de valores mínimos de compra relacionava-se com os locais de entrega (aquisições mínimas em cada local de entrega), enquadrando-se nos critérios de admissão prévios à celebração de contratos de compra e venda. Impunha-se em razão dos mesmos imperativos de eficácia e eficiência económica que justificam outros requisitos de admissão.
EEE. De qualquer modo, caso houvesse algum dever de compra por parte das Recorrentes, a sanção não seria nunca a recusa da candidatura, mas a indemnização por incumprimento de um dever obrigacional – o que só demonstra a inexistência desse dever na relação económica ora em crise.
FFF. As ora recorrentes invocam uma exceção de não cumprimento, procurando reconduzir uma situação de não verificação dos requisitos de aquisição mínima presentes nas CGF a uma suposta faculdade de a … R não cumprir a sua obrigação de fornecer. Essa tese não se coaduna com a possibilidade de o mesmo Grossista não cumprir os requisitos relativos a quantidades mínimas num local de entrega dos produtos, mas já cumprir noutro, continuando, assim, a ser fornecido num outro local. O caráter compulsório deste instituto não se compadece com esta possibilidade.
GGG. À falta de melhor argumento, as Recorrentes neste ponto defendem que existiria um “teor leonino das cláusulas”, mencionando “disposições que se referem à transferência de risco para os grossistas e à forma de pagamento”. Todavia, trata-se de disposições que não revelam um qualquer dever de compra, antes regulam os termos subsequentes ao envio para a R… de uma ordem de encomenda e entrega do produto ao Cliente.
HHH. Não se invoque, como é ensaiado pelas Recorrentes, que o direito de indemnização não precisaria de estar expresso nas CGF para existir.
III. A propósito de “cláusulas leoninas”, a imaginação não precisa de se espraiar muito para conjurar a existência de cláusulas penais como um instrumento clássico e habitual que poderia ser inscrito nestas CGF se existisse uma obrigação de compra.
JJJ. As ora Recorrentes invocam ainda a possibilidade de os clientes grossistas terem celebrado um contrato, ao abrigo das CGF de 2002 e 2005, em que declaravam aceitar ser fornecidos de “cigarros produzidos e / ou comercializados pela … R, nos termos e condições previstos nas “Condições Gerais de Fornecimento de Cigarros pela … R., a Grossistas que Pratiquem Distribuição Direta”, em vigor em cada momento e que, presentemente são as que se encontram anexas ao presente contrato”.
KKK. Mas nada obsta a que seja celebrado um contrato prévio por referência ao qual se determinará o conteúdo dos contratos (de compra e venda) que poderão vir ou não a ser celebrados no futuro, em nada beliscando a liberdade de contratar, nem oferecendo qualquer possibilidade jurídica à contraparte de exigir a celebração dos contratos de compra e venda.
LLL. Do mesmo modo, nunca poderia ser considerado fundado o argumento de que a exigência de autorização da … R para uma cessão da posição contratual acarreta a demonstração da existência de um contrato de distribuição ou de concessão comercial.
MMM. Com efeito, faz todo o sentido que a … R exija que a posição contratual num acordo que permite fixar, ainda que precariamente, o conteúdo negocial das eventuais transacções futuras não possa ser cedida sem a sua autorização, tendo em linha de conta a importância da verificação dos requisitos subjetivos expressamente previstos nas CGF.
NNN. Já que, com a necessidade de existência de autorização pela … R, evitava-se que comportamentos fraudulentos ocorressem, como seria a cessão da posição contratual para um Grossista que não cumprisse com os requisitos.
OOO. A este propósito, importa também não olvidar as obrigações internacionais de prevenção da prática ilícita associada aos produtos de tabaco a que as Recorridas estão adstritas e que exigem que conheçam os seus clientes.
PPP. Ao contrário do que parece pretender as Recorrentes, não existe um dever das 1.ª a 25.ª Autoras ora Recorrentes de revenda de produtos da Rés ora Recorridas emergente de um eventual contrato.
QQQ. O texto constante nas CGF que prevê que os clientes procedam à revenda dos produtos é um mero requisito de venda, relativo à natureza da atividade dos Grossistas.
RRR. Com efeito, se um Grossista não revender os produtos, deixa de ter atividade económica de venda por grosso e, nessa medida, de cumprir um dos requisitos necessários para ser fornecido pelas Rés ora Recorridas.
SSS. Contudo, estas em nenhum momento podem exigir ao Grossista o cumprimento de um dever de revenda relativamente aos produtos que lhe tiverem vendido anteriormente, uma vez que este direito de crédito, que legitimaria a exigência de cumprimento, não está previsto em nenhuma cláusula das CGF.
TTT. Ao contrário do que parecem pretender as Recorrentes, a posição económica dos Grossistas na cadeia de comercialização do produto não faz prova de que põem em contacto a …R e o retalho; uma coisa é vender para o canal retalhista, outra totalmente distinta seria ser um representante das ora Recorridas junto dos retalhistas.
UUU. De acordo com a perspetiva económica, qualquer grossista ou retalhista é um distribuidor porque faz chegar, através da compra e subsequente revenda, produtos de um nível da cadeia de comercialização para outro; contrariamente, do ponto de vista jurídico, só há contratos de distribuição quando esta atividade comercial implica uma integração do comerciante numa rede de distribuição do fornecedor.
VVV. Por outro lado, ao contrário do que parecem julgar as ora Recorrentes, a previsão de obrigações laterais é também conatural à existência de contratos de compra e venda entre fornecedores e comerciantes, atendendo a que os comerciantes não compram os produtos para uso próprio, antes participam no circuito de comercialização desses produtos até à chegada ao consumidor, último e mais importante destinatário dos produtos.
WWW. A este propósito, note-se que o concedente, ao operar com vários concessionários e ao impor-lhes regras semelhantes, consegue não só integrar de modo mais forte e eficaz todos os concessionários na sua rede de distribuição, como também acompanhar e controlar de perto a política comercial que instituiu.
XXX. Ora, não encontramos tais diretrizes em matéria de política comercial nas várias CGF quanto ao método de revenda. As Rés ora Recorridas limitam-se, neste campo, a indicar aos Grossistas que deverão cumprir, nas suas relações com os seus clientes, a legislação em matéria fiscal, aduaneira e de combate ao branqueamento de vantagens de proveniência ilícita.
YYY. Estas indicações têm como fundamento os elementares princípios da boa fé e de prudência, e em respeito por um vincado interesse público.
ZZZ. De resto, ainda que se considerasse que o cumprimento da legislação em matéria fiscal, aduaneira e de branqueamento de vantagens de proveniência ilícita corresponderia a um verdadeiro dever obrigacional (estranhamente, supõe-se), tais relações obrigacionais nunca redundariam numa verdadeira definição de um método de revenda, pelo simples facto de que o cumprimento destes deveres legais não tem nada que ver com uma definição da política comercial por parte do produtor face ao grossista.
AAAA. O direito de indemnização por falta de cumprimento destes deveres legais, previsto nas CGF, que é invocado pelas Recorrentes, constitui um normalíssimo direito de regresso nas relações comerciais entre duas empresas que têm uma relação comercial vertical de compra e venda bens de consumo, quando o comerciante não cumpre os seus deveres legais e o fornecedor é demandado pelos que são lesados por esse incumprimento.
BBBB. Por outro lado, há que sublinhar que, no complexo obrigacional nascido do contrato de compra e venda, surgem deveres laterais de proteção da imagem e da perceção pública do alienante (rectius, das Rés ora Recorridas) que in casu se materializavam em manter inalteradas as embalagens dos produtos ou não alterar as características dos mesmos, aliás em decorrência das obrigações impostas pelo Acordo CE, uma convenção internacional.
CCCC. Ao contrário do que julgam as Recorrentes, fazer recomendações é diferente de dar instruções. São realidades distintas.
DDDD. As Recorridas faziam recomendações na medida em que comunicavam aos Grossistas o que consideravam ser as melhores práticas na venda de produtos de tabaco e estes aceitavam essa comunicação por considerarem que eram úteis ao seu negócio. Todavia tal comunicação não equivalia a instruções.
EEEE. Não se encontram nas CGF quaisquer diretrizes comerciais que permitissem afirmar que a liberdade de ação comercial dos clientes grossistas, no normal decurso da sua actividade económica, se encontrava constrangida.
FFFF. Não se pode confundir, desta feita, tal realidade com a celebração dos contratos que tinham por objeto as máquinas de vending, nos quais se estabeleciam deveres de parte a parte, que tinham um escopo e incidência diversos da relação entre a …R e os Grossistas ora em crise.
GGGG. As Recorrentes também parecem confundir controlo da política comercial desenvolvida pelos Grossistas com a possibilidade cometida às Rés ora Recorridas de vistoriarem os locais de armazenagem, por forma a aferirem a implementação pelos Grossistas das instruções básicas de acondicionamento, manuseamento e armazenagem dos produtos.
HHHH. A importância de separar o objetivo das vistorias em causa nos autos das que poderiam acontecer em casos de genuínos contratos de concessão – para controlo da execução da política comercial - é insofismável, se se pretender retirar conclusões juridicamente pertinentes.
IIII. As vistorias realizadas pelas Rés ora Recorridas tinham, pois, apenas como escopo a verificação do cumprimento das normas legais, do Acordo CE e dos deveres laterais de proteção da imagem das Rés ora Recorridas, evitando, dentro do possível, a violação desses mesmos standards e a consequente responsabilização dos Grossistas e das próprias Rés ora Recorridas.
JJJJ. É falso que nessas vistorias as ora Recorridas procedessem a uma verificação das
quantidades de produtos de marcas concorrentes, como decorre das próprias Alegações de Recurso.
KKKK. As Recorrentes invocam ainda a preocupação das ora Recorridas, expressa em determinadas CGF, com as ruturas de stock, como sendo um indicador da existência de uma relação de distribuição comercial, mas sem razão.
LLLL. Está em causa, como bem se percebe, o cumprimento da função básica de qualquer grossista que abasteça um ponto de venda do retalho, sendo compreensível a sua menção numas CGF, tanto mais que as ora Recorridas não podem, por imposição do Estado Português, ter atividade no comércio por grosso, estando dependentes dos Grossistas para assegurar a chegada dos produtos aos Retalhistas.
MMMM. Como se intui com facilidade, uma das ineficiências económicas mais danosas, para fornecedores e consumidores, associadas à comercialização de bens de consumo, é a rutura de stocks e ausência dos produtos nos pontos de venda retalhistas.
NNNN. Os promotores de vendas das Rés ora Recorridas contactavam diretamente os Retalhistas. Na eventualidade de, nesses contactos, se depararem com uma rutura de stock, os promotores de vendas da …R poderiam, mediante prévio conhecimento do Grossista, ceder produtos ao Retalhista, informando o Grossista da quantidade de produto cedida, para que o Grossista pudesse posteriormente cobrar os valores correspondentes à venda desses bens, ao mesmo tempo que as Rés ora Recorridas faturavam ao Grossista os produtos ora cedidos.
OOOO. Pretendia-se, assim, manter a integridade da cadeia e evitar ruturas de stocks, assim prevenindo situações em que determinados consumidores pretendessem comprar estes produtos num determinado ponto de venda, não o conseguindo fazer.
PPPP. A haver uma concessão comercial e uma obrigação de venda, as Rés ora Recorridas poderiam responsabilizar contratualmente, nestas situações, os Grossistas, mas não é isso que acontece; as Rés ora Recorridas limitam-se a suprir uma necessidade de produto momentânea do Retalhista e a dar conhecimento desse facto aos Grossistas.
QQQQ. Acresce que o facto de as Rés ora Recorridas solicitarem aos Grossistas a indicação dos locais de entrega dos produtos para cumprimento da sua obrigação de entrega resultante de encomendas não implicava qualquer exclusividade nessa “zona”, nem tão-pouco um direito exclusivo de revenda nessa “zona de entrega”, como parece inferir-se das Alegações de Recurso.
RRRR. Aliás, os Grossistas podiam sempre optar por ter mais do que um local de entrega em diferentes distritos ou, mediante comunicação prévia de dez dias, relocalizar para outro distrito o seu habitual local de entrega.
SSSS. Ademais, existe e existiu sempre a possibilidade, perfeitamente admitida, das 1.º a 25.º Autoras ora Recorrentes comprarem os Produtos num determinado Distrito e revendê-los noutro, ao contrário do que seria conatural num contrato de concessão comercial.
TTTT. Ao longo da relação económica ora em crise, as Rés ora Recorridas desenvolveram – de uma forma pontual, limitada e num esquema de participação voluntária – campanhas de incentivo. Tais campanhas de incentivo tinham obviamente o propósito de incrementar a compra destes produtos pelos clientes grossistas, o que é natural em todos os sectores económicos.
UUUU. Ao mesmo tempo, esses incentivos visavam fomentar o bom relacionamento comercial que se impõe num modelo de comercialização que, não só não confere ao fornecedor o controlo direto do abastecimento dos produtos até aos pontos de venda no retalho, como não assente numa rede de distribuidores integrados.
VVVV. O facto de a participação ser voluntária, i.e., nunca ter sido imposta pelas Rés ora Recorrentes, e de, consequentemente, a ausência de participação nunca ter gerado qualquer incumprimento ou penalização de qualquer espécie, sai em reforço do que aqui se diz.
WWWW. Estas iniciativas não podem, pois, nunca ser confundidas com a execução de um qualquer suposto “contrato de concessão comercial” ou de “distribuição”. É, aliás, precisamente a inexistência das bases de um “contrato de concessão comercial” ou de “distribuição” que dá (e deu) razão de ser às referidas campanhas.
XXXX. Noutra monta, não se pode acolher que a “previsão de descontos praticados pela …R em função da performance do distribuidor no passado”235 (235 Parágrafo 478, alínea e) das Alegações de Recurso). seja um argumento para contrariar a natureza do contrato de compra e venda.
YYYY. A realidade jurídico-económica demonstra precisamente esta correlação entre condições de compra e faturação anterior gerada por um determinado cliente, até com consumidores. São disto exemplos os cartões de fidelização, descontos associados ao volume de compras realizadas, etc.
ZZZZ. Ainda no âmbito das campanhas, as Recorrentes dão grande ênfase ao Programa Aliança, defendendo que não haveria “dúvidas de que a participação dos AA. nestas campanhas decorria e integrava a relação contratual existente”.
AAAAA. Ao contrário do que parece decorrer das alegações das Recorrentes o Programa Aliança estava especialmente direcionado para os Retalhistas, ficando os Grossistas numa posição limitada, eventual e lateral.
BBBBB. Os Grossistas poderiam participar neste Programa se (i) fossem nomeados pelos Retalhistas e (ii) se aceitassem essa participação; sendo a sua participação limitada e lateral, já que eram os Retalhistas que tinham o papel central de parceiro contratual neste Programa.
CCCCC. A participação dos Grossistas neste Programa que não pode, de forma alguma, qualificar-se como um elemento de uma integração jurídica na cadeia de distribuição da …R.
DDDDD. É verdade que as Rés ora Recorridas ofereceram a possibilidade de os Grossistas obterem material como cinzeiros, isqueiros e outros pequenos brindes –, tendo em vista, na medida do possível e admissível, apresentar novos produtos, marcas, formatos ou variantes de produtos, e fomentar o bom relacionamento profissional,
EEEEE. Houve, de facto, uma disponibilização deste merchandising pelas Rés ora Recorridas aos Grossistas, quando por eles solicitado, e porque era do interesse comercial destes últimos enquanto revendedores de produtos da …R, sendo que eles poderiam ou não usar tais materiais nas suas relações económicas com o retalho, como ficou claro com os depoimentos carreados pelas Recorridas.
FFFFF. Foi apenas a …R que planeou, criou e executou a política publicitária dos produtos do tabaco.
GGGGG. Uma vez que não existia qualquer vínculo obrigacional entre as Rés ora Recorridas e os clientes grossistas relativamente à publicidade ou ao merchandising, o que os Grossistas fizeram ou deixaram de fazer é manifestamente irrelevante para os autos e, em específico, para a qualificação da relação económica em causa, já que os Grossistas a nada estavam contratualmente obrigados pelas Rés ora Recorridas.
HHHHH. Ora, seria conatural, num contrato de concessão comercial, que o concedente e o concessionário partilhassem esforços e despesas em publicidade do produto e em organização comercial dos pontos de vendas.
IIIII. No tocante à promoção dos produtos junto do retalho, importa notar que, num contrato de distribuição, a integração do distribuidor prende-se, essencialmente, com este dever de promoção dos produtos que o adstringe, que aliás é comum aos contratos de concessão e aos contratos de agência. Trata-se de um elemento essencial deste tipo de contratos.
JJJJJ. Ora, os Grossistas não ficaram incumbidos de nenhuma obrigação de cooperação para com as Rés ora Recorridas a este nível, não empenhando aí nenhuma forma de capital.
KKKKK. A introdução de novas marcas no mercado retalhista surgia até, por vezes, apesar da relutância dos Grossistas em comercializar essas marcas. Como referido, por exemplo, pela testemunha HB… a propósito de um caso concreto: foram lá os promotores, incentivaram o retalho a comprar, e partir daí eu encomendei. E o …S foi um tabaco que ainda hoje é um sucesso,
LLLLL. Acresce que, no período a que se reporta o presente litígio, as CGF não previam uma obrigação de promoção dos produtos. Até 1995 esse dever estava previsto nas CGF, mas depois desapareceu das subsequentes CGF, como bem sabem as ora Recorrentes e resulta a contrario dos parágrafos 283 e 548 das Alegações de Recurso.
MMMMM. A prestação pelo concessionário de serviços de assistência pós-venda ao cliente é uma característica conatural aos contratos de concessão e, como tal, seu elemento qualificador.
NNNNN. No caso sub judice, esta função na cadeia do produto é assumida pelas Rés ora Recorridas, não tendo as 1.ª a 25.ª Autoras ora Recorrentes a obrigação contratual, nem a capacidade, de prestar esse serviço aos consumidores.
OOOOO. Com efeito, ainda que pontualmente os retalhistas reportassem problemas com os produtos aos Grossistas (afinal existia entre ambos uma relação fornecedor / cliente), não decorria das CGF qualquer obrigação que impendesse sobre os Grossistas de se responsabilizarem pelo serviço pós-venda. Essa era uma tarefa da …R.
PPPPP. As ora Recorrentes também pretendem reconduzir a prestação de informações sobre o mercado a putativos deveres obrigacionais adjacentes a um contrato de concessão comercial.
QQQQQ. Quanto a este ponto, o que é relevante para o presente litígio é que a prestação de informações era voluntária. O desconto de informação de vendas funcionava como remuneração de um serviço que - reitere-se - era opcional.
RRRRR. De resto, contrariando as referências feitas pelas Recorrentes de que este era um serviço que os Grossistas não poderiam deixar de prestar pela necessidade de obterem o desconto, há que notar que, como referido pela AdC, ele também implicava “aumento de custos e a necessidade de afetação de recursos humanos a esta tarefa”236 (236 Cf. Estudo da AdC p. 7, citado no parágrafo 359 das Alegações de Recurso). Significa isto que, se os Grossistas não prestassem este serviço, poupariam nos seus custos, o que relativiza a relevância deste desconto.
SSSSS. Por outro lado, também a distribuição ativa era meramente opcional, como a Sentença bem descortinou. A atribuição de um desconto adicional aos Grossistas que optassem pela distribuição ativa visava apenas remunerar os mesmos pela comercialização dos produtos com entrega nos pontos de venda retalhistas. Esta forma de comercialização é naturalmente mais onerosa do que a comercialização feita em estabelecimento do Grossista, contribuindo para tornar mais eficiente a comercialização dos produtos.
TTTTT. Não existia assim a imposição de uma modalidade de venda e só nesse caso é que se poderia dizer que “a atividade empresarial do distribuidor ser[ia] parcialmente heterodeterminada e heterocontrolada” (Cf. Ferreira Pinto), como é conatural a um contrato de distribuição.
UUUUU. Também as referências temporais vertidas nas CGF permitem esbater de forma significativa qualquer ideia de uma suposta estabilidade ou durabilidade das relações que se foram estabelecendo entre os diversos Grossistas e as Rés ora Recorridas.
VVVVV. Com efeito, a substituição in totum, tendencialmente anual, das CGF é bem demonstrativo do facto de se tratar simplesmente de um preçário acompanhado de condições de venda, adaptado a clientes grossistas.
WWWWW. Em corolário do pensamento carreado aos autos pelas ora Recorrentes, em que ou as Rés ora Recorridas não vendiam os seus produtos na cadeia comercial e não haveria um contrato de distribuição, ou vendiam os seus produtos na cadeia comercial a um Grossista e, de forma inelutável, tornar-se-iam concedentes, celebrando ope legis um contrato de distribuição, sem que tal quisessem e sem que o conteúdo obrigacional das relações jurídicas firmadas fosse consentâneo com tal qualificação.
XXXXX. Tal situação seria manifestamente iníqua, ficando as Rés ora Recorridas com o ónus de suportar os deveres e as imposições advenientes da concessão, sem beneficiar dos direitos respetivos, e, inversamente, as 1.ª a 25.ª Autoras ora Recorrentes com a possibilidade de beneficiar de uma lógica contratual, sem que estivessem adstritas às concomitantes obrigações que necessariamente se imporiam se de um contrato de distribuição efetivamente se tratasse.
YYYYY. Este entendimento é reforçado pelo facto de a jurisprudência vir apresentando um critério estrito para a qualificação de contratos como concessão comercial.
ZZZZZ. Na síntese do Tribunal da Relação do Porto: não existia vínculo jurídico que obrigasse o autor a comprar à R., que o obrigasse a só comprar tabaco do comércio da R, que o obrigasse, perante a R., a só vender em determinada zona geográfica ou só com clientes pré definidos pela R., ou que o obrigasse a negociar com os retalhistas em condições impostas, ou essencialmente determinadas, pela R., ou que controlasse a actividade do A. impondo-lhe condições de facturação, preços de venda, volume de facturação e marcas a distribuir e que o A. se encontrasse submetido às regras de actuação, de depósito de produtos e de relacionamento com o cliente, que a R. lhe exigia. Assim, afigura-se-nos que os factos provados integram o vulgarmente designado contrato de fornecimento que tem a natureza de contrato de compra e venda, com prolongamento no tempo. (…)(…) O vínculo jurídico que une as partes é cada um dos contratos de compra e venda que a ré e os grossistas celebram, com o conteúdo que as CGF estabelecem de forma geral e abstracta.(…)Ao alterar as CGF (…), a ré não alterou um contrato: alterou, isso sim, com eficácia geral e abstracta, os futuros contratos de compra e venda que iriam ser celebrados entre ela e o autor. (...)” (Cf. Processo n.º 0630320).
Da Aplicação do Regime das Cláusulas Contratuais Gerais
AAAAAA. As Recorrentes esforçam-se por demonstrar três fundamentos que levariam à invalidade / ineficácia de certas cláusulas das CGF, ao abrigo do Regime Jurídico das Cláusulas Contratuais Gerais (doravante também “RJCCG”), previsto no DL n.º 446/85, de 25 de outubro (já por várias vezes alterado), a saber: (i) falta de aceitação / recusa de cláusulas por parte dos Grossistas; (ii) violação dos deveres de comunicação e de informação e (iii) violação material de certas cláusulas das CGF. Mas, uma vez mais, sem razão.
BBBBBB. Tendo em conta que a relação económica em crise se desenrolou através de sucessivos contratos de compra e venda, a primeira face da celebração dos vários negócios que existiriam (ou não) é a de uma proposta ao público por parte da …R que poderia ser revogada, nos termos do artigo 230.º, n.º 3 do Código Civil.
CCCCCC. Esta disposição legal prevê uma exceção ao princípio da irrevogabilidade, ao admitir que estas propostas possam ser revogadas caso dêem lugar a outra “na forma da oferta ou em forma equivalente”.
DDDDDD. Como é bom de ver, este requisito cumpre-se por excelência porquanto, ao longo dos anos, a …R foi publicando as diversas CGF, que poder-se-ão considerar como equivalentes, tendo em conta o seu autor, o seu objeto imediato (produtos de tabaco) e os destinatários (todos os Grossistas).
EEEEEE. Se assim é, dificilmente se poderá subsumir tais CGF, tendo em consideração a sua natureza como propostas ao público, ao conceito de cláusulas contratuais gerais, por não terem em si qualquer sinal / característica de contrato.
FFFFFF. Mas ainda que se admitisse estarmos perante cláusulas contratuais gerais, o que não se concede e apenas por cautela de patrocínio se equaciona, sempre os argumentos das Recorrentes estariam condenados ao insucesso.
GGGGGG. Quanto à invocação de uma pretensa falta de aceitação / recusa de cláusulas por parte dos Grossistas, ela não colhe.
HHHHHH. Em primeira linha, todas as CGF tinham o caráter de propostas ao público, estando expressamente prevista na lei a possibilidade de o seu conteúdo, enquanto proposta, ser alterado e/ou substituído.
IIIIII. Em segundo lugar, as CGF de 2002, 2005, permitiam que a …R mudasse “total ou parcialmente” o conteúdo das CGF, tendo os respetivos Anexos IV sido assinados pelas 1.º a 25.º Autoras, o que coloca, desde já, fora de discussão toda a problemática da aceitação destas CGF.
JJJJJJ. Acresce que as 1.º a 25.º Autoras aceitaram, através deste Anexo IV, «ser fornecid[a]s de cigarros produzidos e/ou comercializados pela …R, nos termos e condições previstos nas “Condições Gerais de Fornecimento de Cigarros pela ..R., a Grossistas que Pratiquem Distribuição Direta”, em vigor em cada momento».
KKKKKK. Por último, ainda que se conjurasse uma natureza contratual - fosse ela qual fosse -, teria a …R a faculdade de denunciar ad nutum a relação contratual vigente, conquanto teria inadvertidamente celebrado um “contrato de duração ou por tempo indeterminado”.
A publicação pela …R das CGF respetivamente posteriores, consubstanciaria inelutavelmente a denúncia das CGF de 2002, 2005 e 2008, sendo este o único significado interpretativo possível da declaração negocial ínsita à comunicação das novas Condições Gerais.
LLLLLL. Não deve ainda perder-se de vista que os Grossistas fizeram pedidos de encomenda depois da entrada em vigor das CGF de 2006, por exemplo, o que só pode significar que as CGF de 2006 foram por eles aceites.
MMMMMM. Quanto à invocação pelas Recorrentes de uma pretensa violação dos deveres de comunicação e de informação, a propósito da introdução nas CGF do Fator de Correção, não pode a mesma ser acolhida, porquanto sempre a R… cumpriu com estes dois deveres.
NNNNNN. Em primeiro lugar, não pode passar despercebido que o Fator de Correção foi comunicado com a antecedência devida (de 18 de novembro de 2005 para a entrada em vigor das novas CGF em 1 de janeiro de 2006, estando as CGF de 2005 em vigor há dois meses e meio, desde dia 1 de agosto de 2005), tendo sido incluído nas novas CGF que foram enviadas aos Grossistas e que se aplicavam às compras e venda que viessem eventualmente a ocorrer no futuro.
OOOOOO. Em segundo lugar, houve lugar à realização de apresentações práticas da aplicação do Fator de Correção, no âmbito das quais a 1.ª Ré realizou uma apresentação explicativa em suporte “Power Point” e prestou todos os esclarecimentos que lhe foram solicitados pelos revendedores grossistas então seus clientes.
PPPPPP. Nessas apresentações, foram explicitadas todas as variáveis de conteúdo numérico desse instrumento, o qual, pelo seu caráter objetivo, de conteúdo matemático, contraria frontalmente a acusação das Recorrentes de que se trata de cláusula com conteúdo
obscuro ou ambíguo.
QQQQQQ. Por fim, é digna de nota a incoerência latente de se pretender, por um lado, que não existiu o cumprimento do dever de informação e de comunicação, ao mesmo tempo que se defende que, ao tempo da inclusão do Fator de Correção, logo foi este contestado porquanto lesivo dos interesses dos Grossistas (“apesar de tal cláusula [do Fator de Correção] ter sido expressa e inequivocamente recusada” na fórmula utilizada pelas Recorrentes).
RRRRRR. Também não pode proceder a pretensa violação material de certas cláusulas das CGF, designadamente da cláusula que permite a alteração unilateral das CGF.
SSSSSS. É através da análise do tipo contratual em causa, ou seja, dos sucessivos contratos de compra e venda, conquanto visem a aquisição pelo comprador (in casu as Recorrentes) ao vendedor (as ora Recorridas) de produtos mediante um preço, que poder-se-á avaliar a licitude ou ilicitude de cláusulas contratuais gerais, à luz das exigências normativas prevista nos artigos 15.º e 16.º do RJCCG.
TTTTTT. Assim, a Sentença cobriu na essencialidade todos estes tópicos de aproximação ao conceito de “quadro negocial padronizado”, porquanto confirma estar-se perante uma sucessão de compras e vendas que não são afetadas pelas alterações das CGF, na medida em que atingiram a sua perfeição num estádio anterior às eventuais mudanças nas condições negociais que viessem a existir.
UUUUUU. Nunca as compras para revenda (a existir) seriam afetadas por modificações nas CGF, porquanto tais compras e vendas já teriam sido celebradas e realizadas aquando das alterações nas CGF, não podendo as posteriores condições negociais afetar as compras para revenda já num estádio contratualmente perfeito.
VVVVVV. As Recorrentes pretenderam fazer crer que ficariam à mercê das condições draconianas que a …R poderia implementar, esquecendo que se as CGF estivessem sujeitas às regras das Cláusulas Contratuais Gerais (hipótese que as Recorridas tomam como académica), tais cláusulas draconianas apenas permaneceriam em vigor acaso não violassem os ditames da boa fé em sentido objetivo que, como vimos, censurariam “desequilíbrio[s] das prestações gravemente atentatório[s] da boa fé”.
WWWWWW. A propósito da aplicação desta regra em contratos de compra e venda, fará naturalmente pouco sentido que o vendedor esteja impossibilitado de aumentar o seu preço de venda, desde que não seja para níveis considerados desproporcionais ou desrazoáveis, o que não foi o caso com a introdução do Fator de Correção.
XXXXXX. Neste âmbito, é importante esclarecer que a argumentação trazida pelos Recorrentes baseada nos conceitos de margem é errónea, porquanto olvida que, com o aumento do PVP ocorrido na sequência do aumento de impostos (que ocorreu, sem sombra de dúvidas – como são os próprios Recorrentes a assumir na sua Petição Inicial no artigo 572.º), o valor absoluto arrecadado pelos Grossistas por cada maço de cigarros passou a ser maior do que era antes, ainda que a margem, enquanto percentagem, pudesse ser menor.
YYYYYY. É o próprio Perito indicado pelas Recorrentes que afirma contundentemente que o Fator de Correção não fez com que o valor absoluto que os Grossistas arrecadaram por maço diminuísse, mas que aumentasse, entre os anos de 2006 e 2009; sendo que as próprias Recorrentes afirmam que o volume de encomendas à …R se manteve estável depois da introdução do Fator de Correção, o que significa que a este ganho por cada maço vendido a um preço mais elevado, não foi anulado por uma qualquer perda materialmente relevante de vendas.
ZZZZZZ. Acresce que as margens comerciais (brutas) dos revendedores grossistas – nunca esquecendo o seu caráter, por vezes, enganador -, são obtidas pela diferença entre o preço pago pela aquisição dos produtos das Rés ora Recorridas e os preços que praticam na revenda dos mesmos aos seus clientes (Retalhistas ou outros Grossistas).
AAAAAAA. Ao contrário dos preços de venda (PVP) praticados pelas Rés ora Recorridas, que têm que ser homologados pela Direcção-Geral das Alfândegas, os preços de revenda são livremente fixados pelos Grossistas, não tendo as Rés ora Recorridas qualquer intervenção a esse nível.
BBBBBBB. Não foi celebrado qualquer contrato entre Recorridas e Grossistas pelo qual a “margem” (rectius, a diferença entre os preços de compra e venda dos produtos comercializados pelas Rés ora Recorridas) estivesse contratualmente garantida, sendo inclusivamente tal prática proibida pela Lei da Concorrência, na medida em que equivaleria à fixação de um preço de revenda pelos Grossistas aos retalhistas, preço esse que cabe exclusivamente aos Grossistas determinar.
CCCCCCC. Relativamente aos descontos variáveis, remete-se para a argumentação ora expendida relativamente ao Fator de Correção, mas acrescente-se que os seus valores estavam em linha com o passado histórico, não tendo as Recorrentes demonstrado por que razão tais descontos levariam a esse desequilíbrio ou uma desproporção entre as prestações, como se exigiria.
DDDDDDD. Por fim, a obrigação de meio de pagamento único foi introduzida nas CGF da …R por imposição do designado «Acordo CE», celebrado entre a PMI, a Comissão Europeia e dez Estados-membros, incluindo Portugal, o qual vinculou a …R, na qualidade de filial da PMI.
EEEEEEE. Sempre sem conceder, caso se considerasse que tais cláusulas seriam nulas ao abrigo do Regime das Cláusulas Contratuais Gerais, ter-se-ia de concluir que os contratos que pudessem ter sido inadvertidamente celebrados não poderiam subsistir, por nulidade, de acordo com o artigo 9.º, n.º 2 do DL n.º 446/85, de 25 de outubro, conquanto estas cláusulas das CGF acima nomeadas contendem com elementos essenciais, como são, definitivamente, o cumprimento de regras de fonte internacional ou o preço de venda aos Grossistas.
FFFFFFF. Com efeito, o Fator de Correção ou os descontos comerciais eram componentes centrais das CGF, uma vez que diziam respeito ao preço dos produtos vendidos pela …R.
GGGGGGG. Acresce que não faz qualquer sentido desintegrar estes elementos essenciais das CGF do que eram as circunstâncias existentes em 2005, desconsiderando todo o contexto económico e em especial as alterações fiscais que se verificaram naquela época e que estiveram na base da introdução do Fator de Correção.
HHHHHHH. Associado a isto, relembre-se que o Fator de Correção tinha como objetivo anular o (este sim) desproporcional ganho que os Grossistas conseguiriam obter com os aumentos dos PVP.
IIIIIII. Isto para significar que a sua ausência levaria a uma situação de “desequilíbrio nas prestações gravemente atentatório da boa fé”.
JJJJJJJ. O que levaria à nulidade de todos os contratos celebrados, com a restituição de tudo o que tivesse sido prestado (artigo 289.º, n.º 1 do Código Civil).
Da falta de fundamento das alegações de coação moral e usura
KKKKKKK. Em função da matéria de facto apurado nos autos e supra melhor enunciada, temos que é por demais evidente que nenhum dos requisitos da coação moral se verificam no caso sub judice.
LLLLLLL. Mais se evidencie que estas alegações de coação moral e usura são mais um sintoma da narrativa distorcida que as Recorrentes têm vindo a construir desde o primeiro momento e que tem pautado desde sempre a sua postura neste processo – quer em sede de articulados, quer em sede de prova testemunhal e de declarações de parte – no sentido de se apresentarem ao Tribunal como empresas especialmente fragilizadas e subjugadas à mercê da “toda poderosa” …R que domina e controla os destinos dos Grossistas a seu bel-prazer.
MMMMMMM. Ora, conforme foi possível desvendar ao longo da primeira instância, esta narrativa não passa de uma encenação das ora Recorrentes, na medida em que todas as sociedades comerciais que compõem o conjunto de Recorrentes coligadas são todas empresas com um volume de faturação muito significativo e com uma actividade desenvolvida, muitas vezes, ao longo de várias décadas com um grau elevado de sofisticação, contanto, na sua grande parte, com gerentes e administradores experientes e com grande desenvoltura negocial e conhecimento de mercado.
NNNNNNN. De facto, tal como referem PIRES DE LIMA e ANTUNES VARELA: “A ameaça, para que constitua coação, deve ser ilícita. A ameaça lícita, isto é, a ameaça do exercício de um direito não constitui coação. Não há coação, por exemplo, se se ameaça o devedor com uma execução ou uma falência, se ele não assinar o reconhecimento de dívida, se não entregar em pagamento um objecto de valor correspondente à dívida, se não prestar uma garantia, etc. Trata-se, como se diz no n.º 3, do exercício normal de um direito.”237 (237 PIRES DE LIMA e ANTUNES VARELA, Código Civil Anotado, Volume I, 4.ª edição revista e actualizada, Coimbra Editora, pág. 238 e 239)
OOOOOOO. Embora não se conceda que tenha existido, em algum momento, qualquer ameaça por parte das ora Recorrentes às ora Recorridas, o que é facto é que, em última instância e ainda que assim se considerasse, o que está em causa é um exercício normal de um direito das Recorridas,
PPPPPPP. Na medida em que, muito simplesmente, as Recorridas, enquanto produtoras que emitem ofertas ao público em geral, têm todo o direito de recusar fornecer quem não cumprir os requisitos e termos dessa oferta ao público.
QQQQQQQ. Razões pelas quais deverá improceder a alegação de coação moral e rejeitada liminarmente a possibilidade de anulação de tais declarações negociais com fundamento no disposto nos artigos 255.º e 256.º do CC.
RRRRRRR. Em função do que se alegou relativamente à inexistência evidente de qualquer coacção moral nas declarações negociais entre as partes, o mesmo se deverá concluir relativamente à qualificação dos negócios entre as partes como sendo usurários.
SSSSSSS. Assim, nos termos do artigo 282.º do CC “É anulável, por usura, o negócio jurídico, quando alguém, explorando a situação de necessidade, inexperiência, ligeireza, dependência, estado mental ou fraqueza de carácter de outrem, obtiver deste, para si ou para terceiro, a promessa ou a concessão de benefícios excessivos ou injustificados.”
TTTTTTT. Tal como é consabido, o conceito da usura assenta, em primeiro lugar, na situação de inferioridade do declarante – o que já vimos não se verificar de modo nenhum.
UUUUUUU. Conforme cabalmente demonstrado infra, não deverá proceder a alegação de dependência económica entre as partes – pelo que, consequentemente, também não deverá proceder a alegação de usura com base nessa suposta “dependência”.
VVVVVVV. Quanto ao elemento da excessividade ou injustificação do benefício, veja-se os escritos de LUÍS A. CARVALHO FERNANDES sobre esta matéria: “para se verificar este requisito do beneficiário da declaração haja um desequilíbrio objetivo que traduza uma desproporção excessiva, não justificada pelas circunstâncias particulares do negócio. Assim, não há negócio usurário, apesar de alguém exigir salários elevados por uma operação de salvamento, se, por exemplo, for muito grande o risco corrido pelo salvador ou muito elevado o valor dos bens em perigo”238 238 Teoria Geral do Direito Civil, II, Fontes, Conteúdo e Garantia da Relação Jurídica, 5.ª edição revista e actualizada, Universidade Católica, p. 246.
Da Absoluta Validade das Cláusulas das CGF, também à luz das normas de direito da concorrência
WWWWWWW. Os Autores ora Recorrentes, porventura cientes da dificuldade em fazerem prova de incumprimentos das Rés ora Recorridas na esfera do direito privado, decidiram, nesta ação, testar a via do direito da concorrência para imputar infrações legais às Rés.
XXXXXXX. Com esse propósito invocam, de forma desordenada, o direito da concorrência, com o objetivo de obterem declarações de nulidade de disposições das CGF, desconsiderando por completo os princípios jurídico-económicos subjacentes a este ramo do direito (a sua ratio juris).
YYYYYYY. Na PI, são essencialmente quatro os factos que os Autores reputam de violadores do direito da concorrência e que os terão lesado: a) escalões de volume e quantidades mínimas que durante alguns anos estiveram previstos nas CGF das Rés; b) a alteração unilateral pelas Rés das CGF; c) introdução do fator de correção, que durante alguns anos esteve previsto nas CGF e, aparentemente, também a introdução do preço fixo por caixa e d) introdução do meio de pagamento único por cada fatura, previsto desde 2010 nas CGF da 2.ª Ré.
ZZZZZZZ. Todavia, nas Alegações de Recurso, já são mencionadas outras hipotéticas infrações ao direito da concorrência: a) redução do desconto comercial fixo; b) desconto de Informação de venda e c) desconto de distribuição ativa direta.
AAAAAAAA. Ao mesmo tempo, a fundamentação apresentada nas Alegações de Recurso para a pretensa ilegalidade dos escalões de volume e quantidades mínimas e ainda do Fator de Correção é distinta da enunciada na PI.
BBBBBBBB. Esta variabilidade revela bem que os Recorrentes foram procurando ao longo do processo, sem grande critério, encontrar factos que lhes permitissem imputar infracções jusconcorrenciais às ora Recorridas.
CCCCCCCC. Os Recorrentes têm uma dificuldade adicional na exploração da via do direito da concorrência para obtenção dos seus intentos nesta ação: é que a AdC, a entidade
administrativa que em Portugal tem como missão a promoção e defesa das regras de concorrência, analisou e pronunciou-se exaustivamente, no âmbito de inquéritos contraordenacionais, sobre as CGF das Rés ora Recorridas, tendo decidido arquivar esses inquéritos, sem emissão de qualquer nota de ilicitude e, muito menos, identificação de qualquer infração.
DDDDDDDD. Ainda que determinadas passagens de uma dessas decisões possam ser interpretadas como preocupações relativas a aspetos delimitados da atuação da 2.ª Ré (sem que, contudo, se tenha concluído pela existência de qualquer conduta ilícita), elas em nada se relacionam com possíveis lesões provocadas aos 1.º a 25.º Autores.
EEEEEEEE. Mais recentemente, na sequência de uma denúncia dos ora Recorrentes contra as Recorridas respeitante a factos que constam da presente ação, a AdC abriu novo processo contraordenacional, o PRC 2017/9, que foi também arquivado.
FFFFFFFF. Ou seja, a AdC arquivou, em 2010, em 2011 e em 2018, três processos que tinham por objeto as CGF da 2.ª Ré que são também objeto da presente ação, não tendo acusado as Recorridas de qualquer comportamento ilícito. Não só não houve condenação, como nem sequer houve lugar à emissão de notas de ilicitude.
GGGGGGGG. Os Recorrentes reconduzem as suas acusações, essencialmente, a uma questão de perda de margem financeira, em resultado da introdução do Fator de Correção, e à imposição de uma obrigação de utilização do meio de pagamento único, que consideram ser, uma e outra, injustas.
HHHHHHHH. Contudo, como salienta a doutrina mais autorizada, “as regras de concorrência (e a AdC) não se encontram ao serviço da proteção de determinados concorrentes ou de sectores ou operadores económicos específicos, antes visam a defesa do processo competitivo entre agentes económicos enquanto tal, na medida em que este serve a maximização do bem-estar dos consumidores, traduzida na obtenção de preços mais baixos, qualidade, escolha e inovação. Tal entendimento está, de resto, de harmonia com a prática decisória da Comissão Europeia e a jurisprudência dos Tribunais da UE a este propósito” (J. L. Cruz Vilaça e M. J. Melícias).
IIIIIIII. No que respeita concretamente aos mercados de bens de consumo, isto é, bens destinados ao consumidor final, como é o da produção e comercialização de cigarros, a proteção da concorrência visa assegurar a manutenção de uma estrutura de mercado que permita aos consumidores beneficiarem de ofertas alternativas, preços competitivos e inovação, dentro dos limites impostos pela regulação a que está sujeito o setor.
JJJJJJJJ. No caso do comércio de cigarros, os preços ao consumidor são determinados, por razões fiscais, pelos próprios produtores e importadores, pelo que a preocupação que se coloca no âmbito do direito da concorrência, relativamente à atividade dos Grossistas não tem que ver com os preços ao consumidor. É, sim, a de que exista suficiente concorrência na atividade grossista para assegurar que os vários produtos alternativos presentes no mercado chegam ao retalho e, por essa via, aos consumidores.
KKKKKKKK. A propósito do hipotético abuso de dependência económica, note-se que a Lei da Concorrência reformulou em 2003 o tipo legal de abuso de dependência económica que constava do Decreto-Lei n.º 371/93, passando a prever que tal prática só é punível “na medida em que seja suscetível de afetar o funcionamento do mercado ou a estrutura da concorrência” (Cf. artigo 7.º, n.º 1 da Lei da Concorrência).
LLLLLLLL. Como refere MIGUEL MOURA E SILVA a propósito desta norma: Não podendo uma norma de concorrência proteger um equilíbrio contratual de forma a torná-lo imutável – criando uma espécie de regra de propriedade a favor da parte mais fraca, na terminologia da análise económica do direito, o sentido daquela proibição só pode então ser o de estabelecer um conjunto de regras que enquadrem essas modificações ou mesmo a cessação de relações, atendendo às repercussões que tais condutas poderão ter na concorrência. (realce nosso)
MMMMMMMM. Destarte, para que se verificasse, in casu, uma violação do direito da concorrência, teria não só de existir um abuso concretamente sobre os 1.º 25.º Autores, como seria também necessário que esse abuso tivesse repercussões no processo concorrencial e nos consumidores.
NNNNNNNN. Assim, para que o direito da concorrência fosse relevante nesta ação cível, seria necessário que os ora Recorrentes demonstrassem que a conduta das ora Recorridas tinha implicado uma restrição da capacidade de concorrerem com outros Grossistas que tivesse penalizado os consumidores e que tivesse provocado danos aos 1.º a 25.º Autores.
OOOOOOOO. Essa prova, que passaria designadamente por demonstrar quantos clientes retalhistas perderam os 1.º a 25.º Autores por causa da intervenção das Rés e para que Grossistas os perderam (para se poder comparar as condições oferecidas a uns e a outros e estabelecer o nexo causal), nunca é feita. Tudo o que vá para além disto, extravasa o âmbito do direito da concorrência.
PPPPPPPP. Para que possa existir um abuso de posição dominante ou de dependência económica, é desde logo necessário preencher-se um primeiro requisito legal, a saber, a existência de uma posição dominante ou de um estado de dependência económica. Ora, os Autores ora Recorrentes não lograram demonstrar a existência de uma posição dominante, nem tão-pouco de um estado de dependência económica, como se lhes exigia.
QQQQQQQQ. No que respeita aos pretensos abusos, os ora Recorrentes alegam que o facto de as Recorridas terem, por alguns anos, optado por introduzir descontos de quantidade, com escalões diferenciados, bem como quantidades mínimas, nas suas CGF constitui uma infração à concorrência que, presumivelmente, os terá lesado (Cf. parágrafos 730 e 736 a 740 das Alegações de Recurso).
RRRRRRRR. Este tipo de práticas em tese pode prejudicar, em primeira linha, os concorrentes da empresa que as aplica, por poder levar a uma concentração de compras dos clientes nos produtos dessa empresa, em prejuízo dos seus concorrentes.
SSSSSSSS. As Recorrentes, provavelmente cientes do facto de que não poderiam reclamar danos por uma potencial conduta que apenas prejudicaria os concorrentes das Rés e não os Grossistas, procuram associar os escalões de volume, combinados com as quantidades mínimas de aquisição, a uma prática de discriminação entre Grossistas que, segundo eles, seria ilegal.
TTTTTTTT. Na sua PI, os ora Recorrentes defendem que a mera existência destes escalões de volume seria discriminatória, mas essa acusação não faz sentido. Trata-se de uma prática generalizada no mercado (pense-se, p. ex., nos programas de descontos de volume das companhias aéreas dirigidas a consumidores), não podendo ser vista como lesiva dos clientes, nem discriminatória, se aplicada uniformemente, rectius, de forma estandardizada.
UUUUUUUU. Já a definição de quantidades mínimas de aquisição é uma prática comum na relação comercial entre fornecedores e grossistas, que se prende com requisitos óbvios de eficácia e eficiência económica.
VVVVVVVV. As Rés ora Recorridas tiveram, contudo, uma preocupação na definição destes escalões e dessas quantidades mínimas, que foi a de diferenciá-los por distrito, com base em critérios objetivos, favorecendo assim os Grossistas localizados nos distritos do país com menos consumidores.
WWWWWWWW. No que tange à previsão de uma quantidade mínima de aquisições, diferenciada por distrito, há que sublinhar que essa opção foi validada ao longo dos anos pelas entidades responsáveis pela tutela da concorrência.
XXXXXXXX. Na sua PI, as ora Recorrentes não esboçam qualquer preocupação com a diferenciação por distrito das quantidades mínimas ou dos descontos de escalões de volume,
seguramente porque tal prática não gerou qualquer dano às 1.ª a 25.ª Autoras. Contudo, agora, nas Alegações de Recurso, com base em determinadas considerações expendidas pela Autoridade da Concorrência (AdC), já contestam a diferenciação por distrito.
YYYYYYYY. Sucede que o objetivo das ora Recorridas foi, não o de favorecer o Grossista A em detrimento do Grossista B, mas sim o de proteger o interesse dos consumidores que vivem em zonas com menos consumo de cigarros, já que esses consumidores poderiam ver o acesso a cigarros na sua zona ser posto em causa pelo menor interesse comercial dos Grossistas em abastecer essa zona.
ZZZZZZZZ. Não houve assim qualquer discriminação, uma vez que todos os Grossistas localizados no mesmo distrito tinham acesso aos mesmos escalões de volume e que as diferenças em matéria de escalões de volume entre distritos tiveram por base uma justificação objetiva, tendo visado tratar de forma igual o que é igual e de forma desigual o que é desigual.
AAAAAAAAA. Deve notar-se que o que estaria aqui em causa seria uma discriminação pura de segunda linha, isto é, de uma empresa fornecedora face aos seus clientes, sem que esse fornecedor concorra com esses clientes, através de uma filial, na cadeia de comercialização. São muitos pouco os casos deste tipo de discriminação que foram identificados como ilegais pelas autoridades de concorrência nacionais ou europeias.
Aliás, a nível nacional, não se conhece nenhum caso.
BBBBBBBBB. O que se compreende: por que razão há de uma empresa que não está presente no circuito da distribuição e que pretende simplesmente que os seus produtos cheguem da forma mais eficiente possível aos seus clientes, discriminar determinadas clientes em detrimento de outros, a não ser por razões objetivas relacionadas com a melhoria da eficiência do processo de comercialização, em benefício dos consumidores?
CCCCCCCCC. De resto ainda recentemente o Tribunal de Justiça da União Europeia revelou o seu ceticismo em relação a casos de discriminação de segunda linha, num processo que envolveu a AdC, a empresa MEO e a GDA – Gestão dos Direitos dos Artistas (Processo Meo). Nesse processo, o Tribunal de Justiça declarou que, para que uma discriminação seja punida pelo direito da concorrência, mesmo quando não é justificada, não basta a demonstração de que um cliente foi discriminado face a outro, é ainda necessário demonstrar que houve um dano na concorrência.
DDDDDDDDD. O Tribunal de Justiça chama ainda a atenção para o facto de a existência de uma restrição da concorrência não se poder presumir. Há que proceder a um exame dos efeitos reais ou potenciais na concorrência à luz de todas as circunstâncias do caso em análise.
EEEEEEEEE. Os Recorrentes não conseguem indicar quaisquer danos para a concorrência resultantes desta prática, com exceção de uma referência vaga a uma redução do número de Grossistas.
FFFFFFFFF. Contudo, nenhuma prova é feita de um nexo causal entre essas situações vagamente enunciadas e as modalidades de descontos praticadas pelas Rés.
GGGGGGGGG. Há fatores exógenos às CGF, tais como, as condições económicas do país, o agravamento da carga fiscal sobre os produtos de tabaco, as regras legais mais restritivas para comercialização e publicidade dos produtos de tabaco, todas conducentes à redução da dimensão da procura de cigarros, que contribuem para este resultado. Já para não referir circunstâncias próprias dos negócios dos grossistas.
HHHHHHHHH. Contudo, o mais relevante é que a redução do número de Grossistas, em sim mesma, não tem impacto negativo na concorrência.
IIIIIIIII. Num mercado como o português, que tem vindo a decrescer ao longo dos anos, por força da diminuição do consumo de cigarros, parece evidente que a presença no mercado de mais de 150 grossistas assegura plenamente que os retalhistas têm fontes alternativas de abastecimento; efetivamente, nenhuma prova foi apresentada em sentido oposto.
JJJJJJJJJ. A redução do número de Grossistas pode até ter tornado mais eficiente a comercialização dos produtos, como refere e bem a Sentença Recorrida, sendo que o direito da concorrência favorece o incremento de eficiência no processo de comercialização, uma vez que os consumidores são beneficiados.
KKKKKKKKK. Com efeito, a continuação no mercado de Grossistas mais eficientes, com maior escala e maior capacidade de distribuição, e nessa medida com menos custos, pode ser benéfica para o consumidor, gerando eventualmente redução de preços para os retalhistas e prevenindo situações de rutura de stock, que são das mais danosas para o interesse dos consumidores.
LLLLLLLLL. A propósito dos escalões e das quantidades mínimas, a AdC, na Decisão PRC 04/08, manifestou preocupação, por um lado, com o risco de exclusão de concorrentes da 2.ª Ré e, por outro, com o facto de as quantidades mínimas e os escalões serem diferentes de distrito para distrito, admitindo que tal diferenciação por distrito era suscetível de ser discriminatória ou potencialmente discriminatória.
MMMMMMMMM. Em nenhum momento da sua extensa decisão, a AdC refere que a existência de escalões de volume ou de quantidades mínimas, em si mesma, é suscetível de ser discriminatória, pondo assim em causa a argumentação expendida pelas ora Recorrentes na sua PI.
NNNNNNNNN. De resto, a abordagem da AdC, especialmente quanto à questão da discriminação, revelou-se bastante formalista, sem qualquer incursão no apuramento dos impactos negativos no processo concorrencial dessa pretensa discriminação, ou sequer uma análise superficial quanto à suscetibilidade de verificação desse efeito negativo.
OOOOOOOOO. É assim uma abordagem muito distante da propugnada pelo Tribunal de Justiça no recente processo Meo. Caso a AdC tivesse pretendido emitir uma nota de ilicitude, teria necessariamente de ter feito essa análise quanto aos impactos potencialmente negativos dessa pretensa discriminação.
PPPPPPPPP. Quanto ao mais, cabe notar que a AdC não retirou qualquer ilação, quanto a um eventual dano para a concorrência, da redução do número de Grossistas, em si mesma.
QQQQQQQQQ. Decisivamente, os Recorrentes em nenhum momento da PI ou das suas Alegações de Recurso tentam sequer demonstrar que os 1.º a 25.º Autores sofreram um qualquer dano em resultado dos escalões de volume e quantidades mínimas diferenciadas por distrito que estiveram em vigor durante alguns anos nas CGF das Recorridas.
RRRRRRRRR. A redução do número de Grossistas até beneficiou os 1.º a 25.º Autores, na medida em que lhes abriu a possibilidade de chegarem a mais clientes retalhistas.
SSSSSSSSS. Referem as Autoras ora Recorrentes, na sua PI, que a faculdade das Recorridas de alterarem as CGF constitui uma infração “na medida em que possibilitam, por essa via, determinar unilateralmente a margem de lucro dos distribuidores. Nas Alegações de Recurso, desenvolvem a sua referência a “cláusulas que permitem alterar unilateralmente condições comerciais (margem)”.
TTTTTTTTT. As ora Recorridas determinam, como não poderia deixar de ser, os preços a que vendem os seus produtos aos Grossistas, mas os preços a que estes vendem os produtos aos retalhistas é da exclusiva responsabilidade dos Grossistas, sem qualquer interferência das Rés, sendo em função desse preço que se define a sua margem de lucro. Aliás, essa margem de lucro depende de vários outros fatores que as Recorridas não têm como controlar, como a qualidade da gestão das empresas, a eficiência da sua operação, etc.
UUUUUUUUU. Quanto à referência à possibilidade de alteração unilateral das CGF, há que notar que essa possibilidade é uma decorrência do facto de as CGF publicadas pelas Rés ora Recorridas ao longo do tempo corporizarem simplesmente propostas de venda aos Grossistas, ou seja, pressupostos gerais de contratação.
VVVVVVVVV. É evidente que as Rés, no exercício da sua liberdade de atuação, própria de uma economia de mercado, decidem os preços a que vendem os seus produtos aos seus clientes. O que aparentemente está a ser dito pelos Recorrente é que a possibilidade de as Rés fixarem os preços de venda dos seus produtos é em si mesma abusiva e violadora das regras de concorrência…
WWWWWWWWW. A introdução do Fator de Correção nas CGF é, juntamente com a introdução do meio de pagamento único, o ponto nuclear das acusações das ora Recorrentes às Recorridas em matéria de direito da concorrência.
XXXXXXXXX. O Fator de Correção esteve previsto, entre 2006 e 2009, nas CGF da … R/RR, tendo sido uma medida adotada para neutralizar, no nível do desconto comercial atribuído aos Grossistas, o impacto do aumento exponencial de impostos sobre produtos de tabaco ocorrido em 2005.
YYYYYYYYY. O Fator de Correção não implica a violação de qualquer regra prevista no direito da concorrência. O que está em causa é uma cláusula prevista nas condições de venda dos produtos das Recorrentes aos seus clientes, mais especificamente uma cláusula relativa ao preço, que em nada afetou a concorrência no mercado e em nada afetou os consumidores.
ZZZZZZZZZ. Aliás, a dificuldade dos Recorrentes em trazerem de forma credível o direito da concorrência para este litígio, no que respeita ao fator de correção, entrevê-se quando procuram concretizar, do ponto de vista normativo, os abusos em que as Rés estariam a incorrer.
AAAAAAAAAA. Note-se, desde logo, que as ora Recorrentes, na identificação das normas que teriam sido supostamente violadas pela introdução do Fator de Correção, identificam umas na PI (alíneas a) a c) do n.º 1 do artigo 4.º da Lei da Concorrência) e outras, distintas, nas Alegações de Recurso (alíneas e), f) e g) do n.º 1 do artigo 4.º da Lei da Concorrência).
BBBBBBBBBB. Esta diferente opção pode decorrer da conclusão retirada pelas ora Recorrentes de que as normas invocadas na PI não são, simplesmente, aplicáveis in casu; sucede que as normas invocadas nas Alegações de Recurso também não o são.
CCCCCCCCCC. No parágrafo 724 das suas Alegações de Recurso, as Recorrentes acusam as Recorridas, ainda a propósito do Fator de Correção, de “imposição de condições diferentes dos demais concorrentes [das Recorridas]”. Trata-se de uma acusação que é reveladora de um manifesto desconhecimento dos bens jurídicos que o direito da concorrência visa tutelar. O direito da concorrência visa promover a concorrência entre os operadores, sobretudo ao nível do preço; o direito da concorrência não pretende, antes procura prevenir, que haja um alinhamento dos preços entre empresas concorrentes, como são os vários produtores de cigarros.
DDDDDDDDDD. Se há concorrentes das Rés que oferecem melhores preços aos Grossistas, isso é apenas uma evidência de que há concorrência no mercado, podendo explicar em parte a perda constante de quota de mercado das Rés ao longo dos anos, por poder ser, eventualmente, mais apetecível para os Grossistas vender e promover vendas de produtos de concorrentes das Rés.
EEEEEEEEEE. Quanto aos hipotéticos efeitos negativos na concorrência gerados pelo Fator de Correção, à falta de melhor, os ora Recorrentes optam por sugerir que um efeito do Fator de Correção foi a concentração de grossistas.
FFFFFFFFFF. O argumento da redução do número de Grossistas, mesmo em tese, não faz sentido, do ponto de vista do direito da concorrência como se viu atrás. Em todo o caso, sublinhe-se que, segundo os dados constantes da própria Decisão PRC 04/08, o número de Grossistas entre 2006 e 2009 não sofreu oscilações significativas, tendo tido apenas uma ligeira quebra, mantendo-se em redor de 200.
GGGGGGGGGG. No que releva para a presente ação, não foi feita a prova pelos ora Recorrentes de que o Fator de Correção tenha causado uma qualquer redução do número de Grossistas; não foi feita a prova de que, ainda que tivesse havido tal redução, ela corresponderia a uma restrição da concorrência e não foi feita prova de qualquer impacto negativo dessa redução nos 1.º a 25.º Autores.
HHHHHHHHHH. A falta de sentido da invocação do Fator de Correção para tentar imputar violações do direito da concorrência às ora Recorridas é comprovada pelo facto de a AdC, no âmbito do PRC 04/08, ter tido conhecimento do Fator de Correção, ter analisado o Fator de Correção, e nada ter encontrado nessa cláusula das CGF que revelasse indícios de violação do direito da concorrência, como não poderia deixar de ser.
IIIIIIIIII. A AdC enumera na sua Decisão PRC 04/08 as cláusulas das CGF que lhe suscitam, preliminarmente, preocupações de natureza jusconcorrencial (cf. p. 62 e ss.), mas não inclui entre essas cláusulas o Fator de Correção (ou qualquer redução das margens.
JJJJJJJJJJ. O mesmo se diga relativamente ao Estudo sobre o Mercado de Tabaco, um estudo exaustivo, feito por técnicos da AdC e sem qualquer valor jurídico, mas que os Recorrentes referem com frequência nas suas Alegações de Recurso. Repare-se que esse estudo nunca elenca o Fator de Correção ou a redução das margens entre as preocupações jusconcorrenciais suscitadas pelas CGF.
KKKKKKKKKK. Em defesa da sua posição, as ora Recorrentes invocam uma alusão ao Factor de Correção feita numa carta enviada pelo Presidente da AdC a um deputado, alusão essa que só pode decorrer de lapso. Com efeito, se o Fator de Correção não surge identificado como uma preocupação numa Decisão que incidiu sobre as CGF da T... e que tem mais de 100 páginas; e não surge identificado como preocupação num Estudo que também incide sobre as CGF da T... e que tem mais de 300 páginas, como é que uma carta enviada a um parlamentar com uma referência vaga ao Fator de Correção, poderia ter maior valor probatório que uma Decisão da AdC ou mesmo que um Estudo feito por técnicos da AdC? Não faz qualquer sentido.
LLLLLLLLLL. É, por outro lado, falso que a …R/RR tenha retirado o Fator de Correção das suas CGF por força de preocupações manifestadas pela AdC. Basta aliás ler os artigos 222.º a 227.º e os artigos 321.º a 325.º da Decisão PRC 04/08, referentes às alterações implementadas pela 2.ª Ré nas suas CGF, para se verificar que não há qualquer referência à eliminação do Fator de Correção.
MMMMMMMMMM. Fica assim demonstrado que, no entendimento da AdC, não existe qualquer violação do direito da concorrência, não sendo possível, naturalmente, identificar um dano para os 1.º a 25.º Autores resultante de uma prática que nada tem de ilegal.
NNNNNNNNNN. Os Recorrentes reputam ainda de violadora do direito da concorrência a exigência prevista, desde 2010 nas CGF da 2.ª Ré, de os pagamentos de cada fatura pelos Grossistas serem feitos através de um meio de pagamento único, seja um cheque, seja uma transferência bancária.
OOOOOOOOOO. A referida cláusula foi introduzida nas CGF da 2.ª Ré por imposição do designado «Acordo CE», celebrado entre a PMI, a Comissão Europeia e dez Estados-membros, incluindo Portugal, o qual vinculou a 2.ª Ré, na qualidade de filial da PMI.
PPPPPPPPPP. Decorre do exposto que a 2.ª Ré estava vinculada ao cumprimento desta regra, decorrente de um acordo internacional que teve o Estado português como signatário, sendo que o cumprimento desse acordo afastava qualquer ilegalidade à luz do direito da concorrência.
QQQQQQQQQQ. Com efeito, resulta de forma clara do disposto no n.º 2 do artigo 1.º da Lei da Concorrência (e do n.º 2 do artigo 2.º da atual Lei da Concorrência) que a aplicação das normas de concorrência é feita “sob reserva das obrigações internacionais do Estado português”.
RRRRRRRRRR. De todo o modo, ainda que não tivesse sido imposta por força de um Acordo Internacional, dificilmente uma medida com este cariz poderia ser considerada restritiva da concorrência.
SSSSSSSSSS. O meio de pagamento único foi objeto de investigação num processo contra-ordenacional aberto pela AdC em 15 de outubro de 2010, o processo PRC 07/10.
TTTTTTTTTT. A AdC acabou por não desenvolver essa investigação por ter concluído, de forma perentória, que a obrigatoriedade do meio de pagamento único era imposta pelo «Acordo CE» (Cf., com informação completa sobre o Acordo, os artigos 22.º e seguintes da Decisão PRC 07/10).
UUUUUUUUUU. Importa notar que a AdC não concluiu que o meio único de pagamento fosse restritivo, como se a sua licitude estivesse apenas ancorada no Acordo CE. Em bom rigor, a análise não chegou a qualquer conclusão a esse nível porque a AdC, pragmaticamente, percebendo que as Recorridas estavam vinculadas a uma obrigação decorrente de um acordo internacional que também vinculava o Estado Português, decidiu encerrar o inquérito.
VVVVVVVVVV. Tivesse essa investigação continuado e teria ficado claro, em todo o caso, que essa obrigação não teve qualquer impacto na concorrência no comércio de cigarros, não tendo implicado qualquer dano para os concorrentes da 2.ª Ré.
WWWWWWWWWW. No parágrafo 746 das Alegações de Recurso, os Recorrentes invocam um alegado “facto superveniente”, a saber, que no dia 9 de julho de 2016 o Acordo CE cessou e não foi renovado.
XXXXXXXXXX. Não se percebe que efeito útil pretendem os Recorrentes retirar deste facto, atendendo ao âmbito temporal da presente ação.
YYYYYYYYYY. Sucede, contudo, que mesmo que se tivesse em atenção estes factos supervenientes, o que não se concede e apenas por cautela de patrocínio se equaciona, a justificação para a contínua aplicação do meio único de pagamento (passando já por cima da irrelevância deste facto do ponto de vista jusconcorrencial) continua a ser válida, mesmo após a cessação de vigência do Acordo CE.
ZZZZZZZZZZ. Isto porque, no dia 12 de novembro de 2012, foi adotado, no seio da Organização Mundial de Saúde, o Protocolo para a Eliminação do Comércio Ilícito de Produtos do Tabaco, que prevê que os fabricantes e os comerciantes de produtos de tabaco fiquem sujeitos ao mesmo tipo de exigências, incluindo a que respeita ao meio de pagamento único por fatura (Cf. artigo 10.º, números 2 e 4 do Protocolo).
AAAAAAAAAAA. Resulta da análise destas disposições que o contexto regulatório, imposto por regras de origem público-internacional, que obrigou a …R/RR a introduzir a cláusula relativa ao meio de pagamento único nas suas CGF, se mantém aos dias de hoje.
BBBBBBBBBBB. Por sua vez, a referência ao desconto comercial fixo, nas Alegações de Recurso, tem como finalidade, como logo se percebe, forçar mais uma via de inclusão do Fator de Correção nas preocupações manifestadas pela AdC a propósito das CGF das Recorridas.
Repare-se como é introduzida a questão nas Alegações de Recurso: “No que respeita às CGF relativas ao desconto comercial fixo (onde se inclui o fator de correção) (…)"
CCCCCCCCCCC. Contudo, as Recorrentes estão a tomar a nuvem por Juno. A preocupação da AdC, a propósito do desconto comercial fixo teve que ver com o peso relativo do desconto fixo face aos descontos condicionais.
DDDDDDDDDDD. A AdC manifestou-se preocupada com o facto de os descontos condicionais, incluindo o desconto de escalões de volume, desconto de informação de vendas e o desconto de distribuição ativa, enquanto descontos condicionais, terem demasiado peso face ao desconto comercial fixo.
EEEEEEEEEEE. Essa preocupação tinha por base a tese de que o peso dos descontos condicionais poderia induzir os Grossistas a ter um comportamento mais alinhados com os interesses das Recorridas, para obterem todos os descontos condicionais, o que poderia prejudicar os concorrentes da …R.
FFFFFFFFFFF. Nada disto se prende com o Fator de Correção, como é evidente. É aliás difícil perceber como podem os Recorrentes considerar que esta confusão de temas e de campos de análise pode conduzir a conclusão distinta.
GGGGGGGGGGG. Ao optar pela subida do desconto comercial fixo, eliminando descontos variáveis ou condicionais que premeiam a aquisição de maiores volumes, a 2.ª Ré afastou os riscos para o processo concorrencial preliminarmente identificados pela AdC, que se consubstanciariam numa concentração de compras pelos Grossistas nos produtos da …R.
HHHHHHHHHHH. A AdC, sem nunca ter concluído que esses descontos variáveis eram ilegais, validou esta solução por afastar as preocupações jusconcorrenciais preliminarmente identificadas (Cf. artigo 325.º da Decisão PRC 04/08).
IIIIIIIIIII. Curiosamente, as Recorrentes, nos parágrafos 723 e 724 das Alegações de Recurso, em linha com o que referido no artigo 573.º da PI, queixam-se que a solução que, segundo a AdC, eliminou os problemas jusconcorrenciais que tinham sido identificados, levou a uma “diminuição abusiva das margens dos grossistas distribuidores”, agravando os efeitos do Fator de Correção.
JJJJJJJJJJJ. Fica assim bem patente que a diferença de fundo entre a análise da AdC às CGF e a análise que delas é feita pelas ora Recorrentes é uma diferença de enfoque: enquanto que a AdC as apreciou à luz do direito da concorrência, as ora Recorrentes abordam-nas à luz dos seus interesses comerciais, procurando equivaler, de forma infundada, tais interesses a bens jurídicos protegidos pelo direito da concorrência.
KKKKKKKKKKK. As referências ao desconto de informação de vendas e desconto de distribuição direta ativa são igualmente irrelevantes para a presente ação, porquanto a preocupação a elas associado prendia-se, como já assinalado, com o seu carácter condicional e os riscos de prejuízos para os concorrentes da …R, é dizer, com o processo concorrencial entre fornecedores.
LLLLLLLLLLL. A AdC, a propósito já não do desconto propriamente dito, mas da informação solicitada aos Grossistas e da vistoria dos seus pontos de venda para comprovar a distribuição direta e ativa e consequente atribuição dos descontos, refere que tal “poderia constituir uma exploração abusiva dessa posição de domínio caso não estivesse objectivamente justificada” (cf. artigo 306.º da Decisão PRC 04/08).
MMMMMMMMMMM. Contudo, para se poder comprovar que essa venda estava a ser efetuada nos pontos de venda retalhistas, pressuposto da atribuição do desconto de distribuição direta ativa, era obviamente necessário proceder a essa monitorização, pelo que a mesma estava objetivamente justificada, o que não é contrariado pela Decisão PRC 04/08.
NNNNNNNNNNN. Ainda a propósito do desconto de informação, no parágrafo 789 das suas Alegações de Recurso, as ora Recorrentes procuram insinuar que as Recorridas subordinavam a venda de produtos à prestação da informação de vendas (a qual, em todo o caso, nunca incluía informações sobre concorrentes); mas não é verdade. Essa prestação era facultativa, sendo remunerada com um desconto adicional.
OOOOOOOOOOO. A propósito da relevância de certas preocupações manifestadas pela AdC em Decisões de arquivamento de processos contraordenacionais, há que sublinhar que a identificação de uma preocupação por parte da AdC em sede de inquérito de um processo contraordenacional não equivale à existência de indícios suficientes de infração para a emissão de nota de ilicitude e muito menos para uma condenação.
PPPPPPPPPPP. E mesmo quando a AdC emite uma nota de ilicitude, as empresas têm oportunidade de apresentar a sua defesa ainda na fase administrativa do processo contraordenacional, dando a conhecer os seus pontos de vista à AdC, que, só então, decide se condena a empresa ou se arquiva o processo.
QQQQQQQQQQQ. Note-se que, ainda recentemente, a AdC, depois de emitir uma nota de ilicitude num processo contra a empresa CTT por fortes indícios de abuso de posição dominante, decidiu arquivar o processo sem concluir pela existência de infrações, depois de confrontada com a defesa apresentada pela empresa e com uma proposta de compromissos para prevenir riscos jusconcorrenciais (cf. Processo PRC 04/15, Decisão de 5 de julho de 2018).
RRRRRRRRRRR. De igual modo, muito recentemente, a Comissão Europeia, depois de emitir uma nota de ilicitude contra as empresas TAP e Brussels Airlines por fortes indícios de concertação de preços ilegal entre concorrentes, o tipo de infração mais grave em direito da concorrência, decidiu arquivar o processo, sem compromissos, depois de confrontada com a defesa apresentada pelas empresas (cf. Processo 39860 Brussels Airlines/TAP Air Portugal, Decisão de 30 de outubro de 2018).
SSSSSSSSSSS. Recorde-se ainda que, como lembrado pelo Professor MS…, no seu depoimento no presente processo, as decisões de arquivamento no PRC 04/08 e PRC 07/10 foram deliberadas com o voto unânime dos membros do Conselho da AdC.
TTTTTTTTTTT. Importa salientar ainda que a recente decisão de arquivamento no PRC 2017/9 foi adotada por um Conselho de Administração da AdC distinto daquele que proferiu as decisões de arquivamento nos processos 04/08 e 07/10, tendo sido também distinta a equipa de instrutores. Contudo o desfecho foi o mesmo, o arquivamento.
UUUUUUUUUUU. Com relevo para a presente ação, saliente-se que, nesta sua decisão de 2017, a AdC inclui a seguinte observação: “Importa, a este respeito, deixar claro que a missão – de interesse público – desta Autoridade não consiste em dirimir litígios contratuais, nem em proteger agentes económicos específicos, mas sim em garantir a promoção e a defesa da concorrência no mercado.” (Cf. parágrafo 71 da Decisão de Arquivamento do PRC 2017/9). (Realce nosso)
VVVVVVVVVVV. Em suma, para que fique claro este ponto: em matéria de determinação de infrações e aplicação de sanções administrativas, é no âmbito de processos contraordenacionais ou judiciais que se faz ou não a prova de uma infração, devendo-se inclusivamente dar a possibilidade às visadas de exercer o direito de defesa; não se determina a existência de infrações no âmbito de quaisquer estudos técnicos ou relatórios preliminares: é assim que funciona um Estado de Direito.
WWWWWWWWWWW. Isto já para não mencionar os múltiplos casos em que os Tribunais, em sede de recurso, alteram decisões condenatórias da AdC (ou da Comissão Europeia), valendo naturalmente como decisão definitiva a que é proferida pelos Tribunais depois de transitada em julgado.
XXXXXXXXXXX. Note-se ainda que a Sentença do Tribunal da Concorrência mencionada nas Alegações de Recurso não tinha por objeto a revisitação da análise jusconcorrencial dos factos objeto do PRC 04/08, tendo o Tribunal pronunciado-se apenas a latere sobre a Decisão PRC 04/08. Essa Sentença errou manifestamente nas observações que fez a propósito da Decisão PRC 04/08, não só por ter desconsiderado totalmente a relevância da defesa num processo sancionatório, como por ter feito uma análise materialmente errada dos factos e das conclusões da AdC.
YYYYYYYYYYY. Contudo, para o que releva no presente litígio, importa retomar o fio à meada e relembrar que as acusações centrais que são feitas pelas Recorrentes, por serem as que verdadeiramente afetam a sua esfera jurídica, prendem-se com o Fator de Correção e o meio único de pagamento.
ZZZZZZZZZZZ. Ora, quanto ao Fator de Correção, não há uma única indicação, seja nas Decisões da AdC, seja no Estudo dos técnicos da AdC, seja na referida Sentença do Tribunal da Concorrência, de que o Fator de Correção alguma vez tenha sido uma preocupação jusconcorrencial.
AAAAAAAAAAAA. Quanto ao meio único de pagamento, que foi objeto do PRC 07/10, em nenhum momento a referida Sentença do Tribunal da Concorrência põe em causa o acerto a decisão de arquivamento do referido PRC.
BBBBBBBBBBBB. Quanto às demais práticas comerciais identificadas pelas ora Recorrentes, tendo sido as mesmas exaustivamente analisadas pela AdC no PRC 04/08, há que reiterar que as ora Recorridas não só não foram condenadas por essas práticas, como nem sequer foi emitida uma nota de ilicitude pela AdC.
CCCCCCCCCCCC. Acresce que, em matéria de efeitos verticais (relações entre fornecedores e clientes), a AdC apenas manifestou preocupações relativamente ao risco de uma eventual discriminação entre Grossistas por força das condições diferenciadas por distrito, em matéria de desconto de escalões de volume e de quantidades mínimas de aquisição, nunca tendo identificado como preocupação uma pretensa redução ou esmagamento de margens.
DDDDDDDDDDDD. Os Recorrentes, na tentativa vã de credibilizarem a sua tese relativamente ao enquadramento jusconcorrencial do Fator de Correção e mais latamente da redução das suas margens, procuraram, nas suas Alegações de Recurso, atribuir valor probatório aos depoimentos de duas instrutoras do processo, eventualmente até tentando sobrepô-lo ao valor probatório de detalhadas decisões da AdC e mesmo da análise constante do Estudo de Mercado.
EEEEEEEEEEEE. Contudo, esses depoimentos revelaram-se muito pouco relevantes para a produção de prova, já que, por força do lapso temporal que mediou entre a Decisão PRC 04/08 e a realização desses depoimentos (7 anos), a memória das testemunhas sobre os factos era, como se compreende, vaga e contraditória.
FFFFFFFFFFFF. Como exemplo desses lapsos de memória, note-se que a testemunha Dra. AB…, que aliás repetiu várias vezes que não se lembrava bem do conteúdo da Decisão PRC 04/08, referiu que o processo tinha tido origem numa denúncia de grossistas, o que não era verdade, e que o processo se prendia com esmagamento de margens, o que também não era verdade.
GGGGGGGGGGGG. De resto, a testemunha Dra. A..B, que teve um depoimento bastante mais articulado do que a testemunha Dra. AB…, foi muito categórica ao afirmar que o processo não dizia respeito a esmagamento de margens, até porque tal não faria sentido em face dos temas que foram discutidos no processo.
HHHHHHHHHHHH. Nenhuma destas duas testemunhas tinha recordação do que era o Fator de Correção, e muito menos de essa cláusula das CGF suscitar preocupações.
IIIIIIIIIIII. Perante a inevitável constatação de que as testemunham tinham recordações apenas vagas do processo – como fizeram questão de repetir várias vezes – o que deve verdadeiramente ser tido em conta, na apreciação dos temas jusconcorrenciais trazidos à presente ação, são as Decisões dos processos contraordenacionais, uma vez que esses documentos é que expressam, formalmente e de forma fundamentada, o entendimento da AdC sobre possíveis infrações ao direito da concorrência.
JJJJJJJJJJJJ. Em todo o caso, merecem menção particular certas indicações deixadas pelo anterior presidente da AdC, Professor MS…, sobre a dificuldade em fazer-se prova de um abuso de posição dominante e, mais ainda, de um abuso de dependência económica. Essas palavras são importantes pela sua pertinência para a presente ação, não só pela credibilidade da testemunha, como também por não implicarem um esforço de memória, nem reflexões impreparadas sobre temas jurídico-económicos complexos.
Trata-se, simplesmente, de uma constatação de facto, feita por alguém que presidiu durante 5 anos à AdC. Assim, e para além daquelas que foram já expressamente referidas, resultam improcedentes todas as demais Conclusões nas Alegações de Recurso ora sob resposta que se encontrem em contradição com as presentes Contra Alegações consideradas no seu conjunto.
Nestes termos e nos demais de Direito (…), deve o presente Recurso ser julgado totalmente improcedente e, em consequência, ser mantida integralmente a decisão vertida na douta Sentença Recorrida”.
O recurso foi admitido, como apelação, nos próprios autos e com efeito devolutivo, e o tribunal recorrido indeferiu a arguição de nulidade por falta de fundamentação, por não haver falta absoluta de fundamentação.
Corridos os vistos legais, cumpre decidir:
II. Direito
Delimitado o objecto do recurso pelas conclusões da alegação, as questões a decidir são, por uma questão de metodologia lógico-jurídica, e porque as questões que são submetidas ao tribunal não se confundem com os fundamentos dessas questões, as seguintes:
1ª questão - Se a sentença é nula por falta de fundamentação;
2ª questão - Se deve ser revogado o despacho que indeferiu a arguição de nulidade do depoimento da testemunha V…, por violação do segredo profissional, com a consequência da inutilização da contribuição do depoimento prestado para a formação da convicção do tribunal relativamente aos factos sobre que incidiu;
3ª questão - Se deve ser revogado o despacho proferido na audiência preliminar que desatendeu à reclamação das AA. quanto à selecção da matéria de facto então realizada pelo tribunal (no que toca porém, conforme artigo 92 das alegações de recurso, apenas à formulação da alínea GG da matéria assente, que conduziu ao facto provado 30);
4ª questão - Se deve ser alterada a decisão sobre a matéria de facto no sentido proposto pelas recorrentes.
5ª questão – Se devem proceder os pedidos formulados pelas Autoras e Autores porquanto:
a) O Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento ao ajuizar que entre os AA. e RR. inexiste qualquer relação de natureza contratual (nos termos das CG) e, bem assim, que inexiste qualquer contrato de distribuição (concessão) composto por um contrato quadro e vários contratos de execução daquele – cf. Ponto IV.C. a);
b) É ilícita /(in)eficaz a imposição e aplicação do fator de correção pelas RR. face à rejeição expressa pelos AA. desta cláusula contratual e atento o disposto no n.º 1, do artigo 406.º do CC e o RJCCG – cf. Ponto IV.C. b);
c) A cláusula que introduziu o fator de correção deve-se considerar excluída do contrato quadro e consequentemente, dos sucessivos contratos de compra e venda, por incumprimento do dever de comunicação e de informação previstos nos artigos 5.º e 6.º do RJCCG e ainda por as RR. terem prestado informações falsas aos AA. (e demais grossistas) sobre os seus efeitos e aplicação – cf. Ponto IV.C. c);
d) São lícitas, à luz do princípio geral da boa-fé e do RJCCG, nomeadamente do disposto na alínea h) do artigo 19.º, e da alínea c), do artigo 22.º, as cláusulas das CGF que conferem às RR. a faculdade de alterar todos os seus termos unilateralmente, em qualquer momento e sem qualquer limitação – cf. Ponto IV.C. d).
e) Além do mais, tais cláusulas devem ser anuladas por coação moral e usura – cf. Ponto IV.C. e).
f) É lícita a aplicação do fator de correção realizada pelas RR. face aos termos da própria cláusula que o prevê – cf. Ponto IV.C. d).
g) Todas as cláusulas das CGF identificadas no petitório são nulas por constituírem infração às Normas do Direito da Concorrência, concretamente por configurarem, atentos os seus objetivos e efeitos, abuso de posição dominante e/ou abuso de dependência económica por parte das RR. relativamente aos AA..
e se, na hipótese de improceder toda esta argumentação, ocorre abuso de direito por parte das RR. (conclusões AAAA a DDDD do recurso).
6ª questão - Se, nos termos do n.º 7 do artigo 6.º, do RCP, deve ser deferida integralmente a “dispensa do remanescente do pagamento da taxa de justiça, atendendo a que as questões a apreciar no recurso, ainda que múltiplas, são as mesmas para todos os AA. coligados e que os pedidos formulados são comuns e idênticos para todos eles, com exceção do pedido de condenação na restituição das quantias decorrentes da aplicação do fator de correção que difere apenas no quantitativo peticionado, pelo que a sua situação processual é materialmente equivalente a um litisconsórcio voluntário ativo pelo qual seria devida uma única taxa de justiça”, ou, no mínimo, se deve ser deferida a dispensa parcial do mesmo pagamento, “de modo a que o valor de taxa de justiça fixado seja adequado e proporcional, o que não sucederá se for estabelecido exclusivamente em função do valor dos pedidos deduzidos”.
7ª questão (condicional): Se devem ser revogados os despachos de 9.03.2017 e de 10.03.2017 (cfr. número 411 do corpo da alegação de recurso) nos termos dos quais (i) Foi dispensada a comparência dos Srs. Peritos sem a necessária anuência das AA.; (ii) foi indeferido requerimento dos AA. para que os Sr. Peritos prestassem esclarecimentos na audiência final, na sessão para a qual já estavam convocados e, bem assim, (iii) foi indeferida a arguição de nulidade decorrente da decisão de dispensa dos Srs. Peritos sem o necessário contraditório dos AA., e em consequência, se deve ser anulada a decisão sobre a matéria de facto e ordenada a sua ampliação, com a necessária anulação da sentença, devendo ser repetido o julgamento em ordem à prolação de nova decisão sobre a matéria de facto a ampliar e de seguida ser proferida nova sentença.
Algumas precisões quanto a esta questão:[5]
8ª questão (condicional) – Saber se, na procedência do recurso dos AA. se verificam as excepções de caducidade e prescrição invocadas pelas Rés na sua contestação (questões não conhecidas pelo tribunal recorrido por prejudicadas pela solução de absolvição total dos pedidos mas que, na inversa, incumbem decidir, nos termos do artigo 665º nº 2 do CPC) e neste caso conhecer também da arguição de abuso de direito na invocação da prescrição, formulada pelas AA. na réplica.
III. Matéria de facto
A decisão do tribunal de primeira instância sobre a matéria de facto é, citamos, a seguinte:
“Matéria de facto provada:
1 - Os AA. desenvolvem a atividade de armazenagem e distribuição de produtos de tabaco.
2 - A R. … (1ª) é uma sociedade de direito português, controlada, desde a sua privatização em 1997, indiretamente por via da P… S.A., pelo Grupo P…, que se dedica, a nível mundial, à produção e venda de produtos de tabaco, designadamente cigarros brancos, charutos, tabaco para cachimbo e tabaco de corte fino.
3 - A R. … (2ª) foi constituída por efeito de cisão ocorrida na … (1ª), comunicada às AA. por carta de 9 de novembro de 2007, com efeitos a partir de 1 de janeiro de 2008, com o objetivo de aumentar os níveis de eficiência da atividade, sendo indiretamente controlada, por via da P…S.A., pelo Grupo P….
4 - A atividade de comercialização de cigarros e produtos afins é desenvolvida pela R. … (2ª), prosseguindo a R. … (1ª) a atividade de produção industrial de cigarros e produtos afins.
5 - As Condições Gerais de Fornecimento passaram, após a cisão ocorrida na … (1ª Ré), a ser comunicadas pela R. …(2ª).
6 - Desde 1992, a R. (1ª) propôs aos grossistas que as condições contratuais que haviam sido inicialmente estipuladas por meio de acordos individualmente celebrados com cada grossista passassem a integrar as designadas “Condições Gerais”, aplicáveis a todos.
7 - Em 1997, a R. (1ª) introduziu novas condições gerais de fornecimento.
8 - As Condições Gerais de Fornecimento que estabeleciam a sua entrada em vigor no dia 1 de abril de 2001 são do seguinte teor:
CONDIÇÕES GERAIS DE FORNECIMENTO DE CIGARROS PELA …, S.A. A GROSSISTAS QUE PRATIQUEM DISTRIBUIÇÃO DIRECTA A …, S.A., adiante apenas designada por "T…", pelo presente documento estabelece e dá a conhecer aos grossistas que pratiquem distribuição directa, as suas Condições Gerais de Fornecimento de cigarros por si produzidos e/ou comercializados para venda no território de Portugal continental, com impostos especiais de consumo pagos (adiante apenas designados "Produtos"), as quais se regem de acordo com os seguintes termos e condições:
CAPÍTULO I
DEFINIÇÃO DE GROSSISTA DISTRIBUIDOR DIRECTO
Para efeitos das presentes Condições Gerais de Fornecimento de Produtos (de ora em diante designadas por "Condições Gerais"), o cliente grossista distribuidor directo (de ora em diante apenas designado por "Cliente Grossista"), deverá ser uma pessoa jurídica, singular ou colectiva, que cumulativamente preencha permanentemente os seguintes requisitos:
a) Compre Produtos por grosso, a título habitual e profissional, em seu próprio nome e por sua conta e risco e que os revenda a grandes utilizadores e/ou que os revenda a utilizadores profissionais que, por sua vez, os revendam directamente ao consumidor, em qualquer caso, sempre com impostos especiais de consumo pagos e somente no território de Portugal continental;
b) Esteja colectado na qualidade de comerciante por grosso perante a Administração Fiscal;
c) Possua contabilidade organizada;
d) Distribua directamente os Produtos aos seus respectivos clientes.
Considera-se existir distribuição directa quando o Cliente Grossista cumulativamente:
i) receba e prepare as encomendas para os seus respectivos clientes;
ii) efectue directamente a entrega física das encomendas a, pelo menos, 75% (setenta e cinco por cento) dos seus respectivos clientes através de meios próprios, utilizando veículos adequados ao transporte dos Produtos em boas condições de conservação e higiene;
e) Abasteça regular e continuamente os seus respectivos clientes e zele pela inexistência, nos estabelecimentos comerciais dos clientes por si abastecidos, de rupturas de stocks dos Produtos que adquira à T… ao abrigo das presentes Condições Gerais.
CAPÍTULO II
CANDIDATOS A CLIENTES GROSSISTAS
1. Os candidatos a Clientes Grossistas da T… deverão informar a T… que pretendem ser por esta fornecidos com Produtos da T… ao abrigo das presentes Condições Gerais, devendo para o efeito enviar à T… todos os seguintes elementos:
a) Nome completo/ Firma ou denominação social;
b) Actividade comercial/ Objecto social;
c) Número de Contribuinte Fiscal;
d) Residência/ sede social;
e) No caso de sociedades comerciais, declaração com identificação completa dos seus actuais sócios ou accionistas, acompanhada de Certidão do Registo Comercial emitida há menos de 1 (um) ano;
f) Localização do ou dos armazéns onde o Cliente Grossista pretende receber os fornecimentos e entregas a realizar pela T…, bem como autorização para que os mesmos sejam previamente vistoriados durante as horas de expediente por representantes da T… devidamente credenciados;
g) Demonstração de que possui capacidade financeira, pela apresentação dos seguintes elementos:
i) Referências bancárias favoráveis de, pelo menos, uma Instituição de Crédito;
ii) Balanço e Demonstração de Resultados dos últimos três anos ou daqueles em que tenha exercido a sua actividade, caso esta tenha sido iniciada há menos tempo;
iii) Declarações para efeitos de liquidação de IRC/ IRS relativas aos últimos três anos ou relativas àqueles em que tenha exercido a sua actividade, caso esta se tenha iniciado há menos tempo;
iv) Se o candidato a Cliente Grossista tiver iniciado a sua actividade no ano em que apresentar o seu pedido, deverá demonstrar que possui contabilidade organizada e que declarou o início de actividade como comerciante por grosso junto da Administração Fiscal;
h) Indicação da previsão das encomendas semanais para cada local de entrega e do modo de pagamento pretendido; o candidato a e/ ou o Cliente Grossista terá que apresentar a garantia bancária exigida no ponto 3.3.3. do Capítulo III destas Condições Gerais, caso:
i) pretenda pagar a prazo; ou
ii) pretendendo pagar a pronto, não o fizer nos termos previstos no ponto 3.3.1 e 3.3.2 do Capítulo III das presentes Condições Gerais, sem prejuízo da T… poder vir a exigir que o pagamento a pronto se faça por meio de cheque visado ou por transferência bancária provada e confirmada, e nos demais termos previstos nas presentes Condições Gerais. A exigência destes meios de pagamento a pronto ou de garantia manter-se-ão em vigor durante o período de tempo que a T… razoavelmente considere adequado para poder aferir da capacidade financeira do Cliente Grossista e/ ou da constância da pontualidade dos pagamentos dos fornecimentos que lhe efectuar.
2. Os Clientes Grossistas admitidos pela T… ao abrigo do disposto no anterior ponto 1. do presente Capítulo II terão que proceder à concretização das suas encomendas num prazo de 30 (trinta) dias a contar da data da informação da sua aceitação pela T…, a qual será dada desde que o candidato a Cliente Grossista preencha os requisitos previstos nestas Condições Gerais.
CAPÍTULO III
CONDIÇÕES GERAIS DE FORNECIMENTO
1. OBRIGAÇÕES DO CLIENTE GROSSISTA.
Para que o Cliente Grossista seja regularmente fornecido pela T… com Produtos das marcas por esta produzidas e/ ou comercializadas nos termos e condições estabelecidos nas presentes Condições Gerais, terá que preencher ainda cumulativamente os seguintes requisitos:
1.1. Encomendas. Locais de entrega.
O Cliente Grossista deverá encomendar e adquirir os Produtos à T… nos termos seguintes:
1.1.1. A T… só fornecerá e o Cliente Grossista só poderá encomendar os Produtos em caixas completas de cada marca produzida e/ ou comercializada pela T….
1.1.2. Cada Cliente Grossista será fornecido no ou nos locais de entrega que indicar à T…, devendo cumprir, em cada um dos locais de entrega pelo mesmo indicados, as quantidades mínimas previstas no Anexo II às presentes Condições Gerais, nos termos do disposto no ponto 1.1.4. deste Capitulo III. Os Distritos e áreas de Distrito estão identificados no Anexo I às presentes Condições Gerais. O Cliente Grossista deverá informar e indicar à T… o ou os locais em que deverão ser feitas as entregas dos Produtos, devendo tais locais ser de fácil acesso e parqueamento, tendo em conta os meios de transporte normalmente utilizados para a entrega dos Produtos. O Cliente Grossista não poderá interferir, directa ou indirectamente, no transporte dos Produtos para os locais de entrega que tenham sido pelo mesmo indicados.
1.1.3. Qualquer alteração relativamente ao local ou locais de entrega dos Produtos deverá ser previamente comunicada pelo Cliente Grossista à T…, por escrito e com uma antecedência mínima de 10 (dez) dias.
1.1.4. O Cliente Grossista adquirirá os Produtos de acordo com a média semanal de quantidades mínimas previstas no Anexo II, que estão estipuladas por Distrito ou área de Distrito. Cada Cliente Grossista deverá adquirir semanalmente em cada um dos locais por si indicados para entrega dos Produtos, em média, a quantidade mínima de Produtos estipulada para o Distrito ou área de Distrito onde estiver situado cada um dos seus locais de entrega.
Para este efeito, as aquisições de cada Cliente Grossista em cada local de entrega serão consideradas de forma individual e independente, devendo o Cliente Grossista cumprir em cada local de entrega situado em cada um dos Distritos ou áreas de Distritos as quantidades mínimas previstas no Anexo II, mesmo nos casos em que o Cliente Grossista disponha de mais do que um local de entrega num determinado Distrito ou área de Distrito.
1.1.5. No final de cada trimestre de cada ano civil, a T… fará uma análise das aquisições médias semanais efectuadas pelo Cliente Grossista em cada um dos seus respectivos locais de entrega durante o trimestre em causa, com vista a apurar o cumprimento ou incumprimento do disposto no ponto 1.1.4. deste Capítulo III no que respeita à aquisição de quantidades mínimas de Produtos. Para efeitos da determinação das aquisições médias semanais, tomar-se-á em conta a facturação emitida pela T… a cada Cliente Grossista durante o trimestre em causa. No que respeita aos Clientes Grossistas que tenham iniciado a sua actividade durante um trimestre já em curso, as suas respectivas aquisições só serão analisadas no final do trimestre seguinte.
A T… comunicará ao Cliente Grossista, no prazo de 30 (trinta) dias após o final de cada trimestre, o eventual não cumprimento pelo mesmo, num ou mais locais de entrega, das quantidades mínimas semanais estabelecidas nas Condições Gerais, que estiverem em vigor em cada momento para cada Distrito ou área de Distrito onde se encontrem situados o ou os locais de entrega dos Produtos. Nessa comunicação será concedido ao Cliente Grossista um prazo até ao final do trimestre que então estiver em curso para que este retome as encomendas médias semanais nos termos vigentes, sob pena de, não o fazendo, lhe ser de imediato comunicada a cessação dos fornecimentos no ou nos locais de entrega em que se verifique que o Cliente Grossista não atinge as quantidades mínimas semanais estabelecidas,
1.1.6. Por forma a acompanhar a evolução do mercado, a T… apurará, no início de cada ano civil, a média semanal de aquisições efectuadas no ano imediatamente anterior pelo Cliente Grossista que, tendo atingido as quantidades mínimas aplicáveis em determinado Distrito ou área de Distrito, adquiriu menos Produtos em cada local de entrega de cada Distrito ou área de Distrito. Para este efeito, nos casos em que o Cliente Grossista disponha de mais do que um local de entrega num determinado Distrito ou área de Distrito, a média de aquisições semanais do Cliente Grossista será determinada tendo em consideração, de forma independente, cada um dos locais de entrega do Cliente Grossista existentes nesse Distrito ou área de Distrito, sem prejuízo do disposto no ponto 1.1.7. seguinte.
A média de aquisições semanais do Cliente Grossista que, no ano civil precedente, tendo cumprido o disposto no ponto 1.1.4. acima, adquiriu menos Produtos em cada local de entrega situado em cada Distrito ou área de Distrito, constituirá a quantidade mínima de aquisições médias semanais do correspondente Distrito ou área de Distrito (sujeita ao disposto no ponto 1.1.7. seguinte). As novas quantidades mínimas serão aplicáveis a partir do início do segundo trimestre do ano civil em que for efectuada a análise. As quantidades mínimas serão comunicadas aos Clientes Grossistas com uma antecedência de 15 (quinze) dias relativamente à data da sua respectiva entrada em vigor.
1.1.7. Se o número de cigarros resultante do cálculo efectuado para apurar o cumprimento pelo Cliente Grossista das quantidades mínimas (ponto 1.1.5. acima) ou a evolução das quantidades mínimas aplicáveis num determinado Distrito ou área de Distrito (ponto 1.1.6. acima), não corresponder a uma unidade completa de dezena de milhar de cigarros, tal número de cigarros será arredondado, para cima ou para baixo, de modo a encontrar a dezena de milhar completa mais próxima (por exemplo: 0,105 milhões de cigarros = 0,110 milhões de ciganos; 0,104 milhões de cigarros = 0,100 milhões de cigarros).
1.2. Armazenagem
1.2.1. O Cliente Grossista deverá possuir instalações que assegurem a armazenagem dos Produtos em boas condições de segurança, temperatura, humidade e higiene. O(s) armazém(ns) do Cliente Grossista deverá(ão) ter capacidade para deter, em stock, quantidades de Produtos suficientes para o abastecimento regular e suficiente dos seus respectivos clientes retalhistas, devendo esse stock ser gerido de modo a assegurar que os Produtos cheguem a estes em boas condições. Para este efeito, o Cliente Grossista deverá cumprir e respeitar as condições de armazenagem que se encontram estabelecidas no Anexo III às presentes Condições Gerais.
1.2.2. O Cliente Grossista autoriza, desde já, os representantes da T… devidamente credenciados a vistoriar, durante as horas de expediente, todos os seus armazéns nos quais proceda à armazenagem de Produtos, por forma a verificar se são ou não cumpridas as condições de armazenagem constantes do Anexo III. Sempre que se verifique que as condições de armazenagem e/ ou de gestão de stocks dos Produtos não estão a ser cumpridas pelo Cliente Grossista, a T… notificá-lo-á dessa circunstância e conceder-lhe-á um prazo razoável para que o mesmo tome as medidas necessárias para o cumprimento do estipulado nas presentes Condições Gerais. Sempre que esteja em causa o não cumprimento de condições físicas, de higiene ou de segurança do próprio armazém, o prazo a conceder terá sempre em conta a duração previsível das obras de adaptação que para o efeito sejam necessárias e suficientes.
1.2.3. Qualquer alteração do ou dos armazéns utilizados pelo Cliente Grossista para armazenagem de Produtos deverá ser previamente comunicada à T…, por escrito e com uma antecedência mínima de 10 (dez) dias, ficando a T… desde logo autorizada a vistoriar o novo local de armazenagem, antes da sua utilização, para previamente verificar a conformidade do mesmo para efeitos de armazenagem dos Produtos.
1.3. Marcas. Embalagens.
O Cliente Grossista obriga-se a revender os Produtos apenas na sua apresentação original. O Cliente Grossista não poderá, de modo algum, introduzir qualquer alteração nas embalagens dos Produtos, nem remover ou eliminar quaisquer elementos nelas apostos, nem poderá alterar quaisquer características dos próprios Produtos. O Cliente Grossista não deverá praticar quaisquer actos ou omissões que possam prejudicar a reputação e imagem das marcas dos Produtos.
1.4. Relações dos Clientes Grossistas com os seus Clientes.
Os Clientes Grossistas da T… deverão adoptar, nas relações comerciais que estabeleçam com os seus respectivos clientes relativamente aos Produtos, regras contratuais equivalentes àquelas estabelecidas nas presentes Condições Gerais no que respeita ao cumprimento das leis fiscais e aduaneiras e zelar pela sua adequada aplicação.
1.5. Contrato.
O Cliente Grossista deverá celebrar com a T… um contrato cuja minutatipo se anexa e que constitui o Anexo IV às presentes Condições Gerais. O Cliente Grossista não poderá transmitir ou ceder a sua posição contratual no referido contrato sem o prévio consentimento expresso, prestado por escrito, da T….
1.6. Informações.
1.6.1. A T… poderá solicitar ao Cliente Grossista todas as informações que considere pertinentes para fins de apuramento do cumprimento, por aquele, dos requisitos estabelecidos nestas Condições Gerais, podendo, nomeadamente solicitar-lhe (atendendo ao elevado valor dos fornecimentos e à carga fiscal que incide sobre os Produtos) elementos demonstrativos de que possui permanente capacidade financeira para cumprir as suas obrigações para com a T…, nestes se incluindo designadamente os elementos referidos na alínea g) do ponto 1 do Capítulo II das presentes Condições Gerais.
1.6.2. O Cliente Grossista deverá notificar a T… logo que ocorra alguma alteração aos elementos referidos no ponto 1 do Capítulo II das presentes Condições Gerais, incluindo, nomeadamente, a cessação ou mudança de actividade, qualquer alteração no contrato de sociedade ou de titularidade do capital social, transmissão do direito e uso de firma ou denominação ou trespasse de estabelecimento comercial do Cliente Grossista.
1.6.3. Sem prejuízo do disposto nos pontos anteriores, o Cliente Grossista deverá enviar à T… até ao dia 30 (trinta) de Junho de cada ano (ou, se o ano social ou fiscal do Cliente Grossista não coincidir com o ano civil, até 30 (trinta) dias após apresentação de cada declaração para efeitos de IRC/ IRS):
a) Referências bancárias favoráveis actuais de, pelo menos, uma Instituição de Crédito;
b) Balanço e Demonstração de Resultados do ano imediatamente anterior;
c) Declaração para efeitos de liquidação de IRC/ IRS relativa ao ano imediatamente anterior.
1.6.4. A T… poderá proceder ao tratamento dos dados referidos no Anexo IX às presentes Condições Gerais, para as finalidades nele previstas e comunicar, nos termos da lei, quaisquer informações relativas ao fornecimento de Produtos ao Cliente Grossista, no seguimento de solicitação legítima de autoridades públicas, policiais ou judiciais.
2. CONDIÇÕES COMERCIAIS.
2.1. Condições Comerciais Gerais.
2.1.1. Os preços de venda ao público dos Produtos são os constantes da lista anexa que constitui o Anexo V às presentes Condições Gerais. A T… notificará o Cliente Grossista de qualquer alteração aos preços de venda ao público dos Produtos e, sempre que tal ocorra, enviar-Ihe-á o Anexo V devidamente alterado.
2.1.2. A T…, através do seu serviço telefónico de gestão de vendas, solicitará ao Cliente Grossista uma confirmação dos fornecimentos a efectuar ao abrigo das presentes Condições Gerais, até às 13 (treze) horas do dia útil anterior àquele em que o Cliente Grossista possa ser fornecido. O Cliente Grossista poderá igualmente efectuar e confirmar, nos mesmos termos, a efectivação de encomendas junto da sede social da T…, pelo número verde disponibilizado pela T…, ou para qualquer outro local ou contacto que a T… venha a indicar.
2.1.3. A T… fará as entregas, relativamente a cada um dos locais indicados pelo Cliente Grossista para o efeito, em dias úteis e de acordo com a seguinte Periodicidade:
a) Até 0,75 milhões de cigarros/ semana 1 x semana
b) De 0,76 a 1,50 milhões de cigarros/ semana 2 x semana
c) De 1,51 a 2,25 milhões de cigarros/ semana 3 x semana
d) De 2,26 a 3,0 milhões de cigarros/ semana 4 x semana
e) 3,01 milhões de cigarros ou mais/ semana 5 x semana
O Cliente Grossista deverá igualmente informar a T…, na data em que o Cliente Grossista indicar à T… os locais de entrega onde pretende ser fornecido nos termos previstos no ponto 1.1.2 do presente Capítulo III, da quantidade de Produtos a receber em cada um desses locais, por forma a que seja possível determinar a Periodicidade das entregas a vigorar para cada local de entrega nos termos acima expostos.
Sem prejuízo do disposto no ponto 1.1.5. do presente Capítulo III, no final de cada trimestre de cada ano civil, a T… fará uma análise das aquisições médias semanais efectuadas pelo Cliente Grossista em cada um dos seus respectivos locais de entrega durante o trimestre em causa, por forma a apurar, para o trimestre seguinte, a Periodicidade das entregas a realizar em cada um dos locais de entrega. Tal Periodicidade será comunicada ao Cliente Grossista no prazo de 30 (trinta) dias após o final de cada trimestre, sendo aplicável logo que a mesma seja comunicada ao Cliente Grossista.
Para efeito da determinação das aquisições médias semanais, tomar-se-á em conta a facturação emitida pela T… relativamente ao Cliente Grossista em causa durante o trimestre a que a mesma disser respeito. No que respeita às aquisições para locais de entrega que venham a ser indicados pelo Cliente Grossista durante um trimestre já em curso, as entregas em tais locais só serão consideradas e analisadas no final do trimestre seguinte.
2.1.4. O Cliente Grossista obriga-se a aceitar a entrega dos Produtos que encomendar à T…. Se o Cliente Grossista, após confirmação, não aceitar uma entrega ou não aceitar os Produtos que tenha encomendado à T…, esta terá direito de recusar efectuar quaisquer outros fornecimentos e/ ou satisfazer quaisquer outras encomendas efectuadas pelo Cliente Grossista, notificando-o por escrito de tal decisão.
2.1.5. O Cliente Grossista obriga-se a verificar e a assegurar a boa recepção dos Produtos, devendo verificar se os mesmos se encontram em boas condições e se correspondem à quantidade encomendada. Sob pena de se considerar perfeita a compra e venda e de se considerarem caducados quaisquer direitos de reclamação do Cliente Grossista:
a) as faltas notórias, como por exemplo falta de caixas, deverão ser denunciadas logo no momento da entrega dos Produtos ao Cliente Grossista;
b) quaisquer anomalias (sejam defeitos e/ ou faltas não notórias) nos Produtos, deverão ser comunicadas e comprovadas à T… no prazo máximo de 15 (quinze) dias a contar da data da entrega dos mesmos ao Cliente Grossista.
A T… obriga-se, após comprovação, a substituir os Produtos com anomalias e/ ou a suprir quaisquer faltas no prazo de 10 (dez) dias após a recepção da comprovação das referidas anomalias ou faltas.
2.1.6. O risco de perdas, de destruição e/ou de prejuízos relativamente aos Produtos será transferido para o Cliente Grossista no momento em que os Produtos forem entregues no local de entrega indicado pelo Cliente Grossista.
2.2. Condições Comerciais.
Serão concedidos ao Cliente Grossista que seja fornecido pela T. ao abrigo das presentes Condições Gerais os descontos comerciais constantes do Anexo VI, os quais serão efectuados em cada factura a emitir pela T….
3. CONDIÇÕES FINANCEIRAS GERAIS.
3.1. A T… concederá ainda os seguintes descontos financeiros:
3.1.1. será concedido um desconto de 0,8% (zero virgula oito por cento), sobre o valor da factura (excluindo os descontos comerciais), ao Cliente Grossista que efectue o pagamento a pronto da totalidade do valor da factura em causa nos termos e condições previstos nas presentes Condições Gerais;
3.1.2. será concedido um desconto de 0,4% (zero virgula quatro por cento), sobre o valor da factura (excluindo os descontos comerciais), ao Cliente Grossista que efectue o pagamento da totalidade do valor da factura em causa, nos termos e condições previstos nas presentes Condições Gerais, até ao 4º (quarto) dia útil seguinte ao da data da entrega dos Produtos. A utilização deste prazo de pagamento implica sempre a constituição de uma garantia bancária, nos termos e condições previstos no ponto 3.3.3. do presente Capítulo III.
3.2 Sem prejuízo dos descontos aplicáveis nos termos do disposto no ponto 3.1. do presente Capítulo III, o Cliente Grossista deverá efectuar todos os pagamentos à T… em seu próprio nome, na moeda e quantia exacta constantes da respectiva factura, não sendo admissíveis pagamentos por parte de terceiros e/ou pagamentos de quantias superiores às que constarem na respectiva factura.
3.3. O Cliente Grossista poderá efectuar os seus pagamentos a pronto ou a prazo. O Cliente Grossista deverá indicar, previamente, à T… qual é o meio e prazo de pagamento que, em cada momento, pretende utilizar na aquisição dos Produtos.
3.3.1. Sem prejuízo das excepções previstas nas presentes Condições Gerais, os pagamentos a efectuar, a pronto ou a prazo, pelo Cliente Grossista apenas poderão ser efectuados:
a) por transferência bancária, provada e confirmada, da conta do próprio Cliente Grossista para a conta da T… aberta junto do Banco …, com o NIB … ou para outra que esta venha a indicar por escrito;
b) por depósito directo, provado e confirmado, na conta bancária da T… referida na alínea a) anterior, de cheque cruzado emitido pelo próprio Cliente Grossista à ordem da T…, sob condição de que seja no próprio dia enviado à T…, após depósito, cópias do cheque depositado e do respectivo comprovativo de depósito.
c) por cheque cruzado entregue à T… e emitido pelo próprio Cliente Grossista à ordem da T….
3.3.2. Considera-se "pagamento a pronto":
a) O pagamento que seja efectuado por transferência bancária ou por depósito directo, nos termos referidos no ponto 3.2. e nas alíneas a) e b) do ponto 3.3.1. do presente Capítulo Ill sob condição de que a conta da T… seja creditada até ao 1º (primeiro) dia útil seguinte ao da entrega da encomenda;
b) O pagamento que é recebido pela T… no dia da entrega da encomenda, nos termos referidos no ponto 3.2. e na alínea c) do ponto 3,3.1. do presente Capítulo III.
3.3.3. Considera-se "pagamento a prazo" o pagamento que seja efectuado pelo Cliente Grossista, nos termos referidos no ponto 3.2. do presente Capítulo III e por qualquer dos meios referidos no ponto 3.3.1. do presente Capítulo III, no prazo máximo de 8 (oito) dias úteis contados a partir da data da entrega dos Produtos.
Para efeitos de pagamento a prazo, o Cliente Grossista deverá constituir e entregar à T… uma garantia bancária idónea à primeira interpelação, que seja aceitável pela T… de acordo com o seu livre critério, preferencialmente nos termos das minutas em anexo que constituem os Anexo VII e Anexo VIII às presentes Condições Gerais. O montante da garantia bancária deverá ser equivalente ao valor de, pelo menos, duas semanas de encomendas médias totais do Cliente Grossista.
3.4. A T… terá o direito de suspender imediatamente todas as entregas e/ ou anular as encomendas em curso e/ ou a exigir o pagamento de todas as facturas não pagas, ainda que não vencidas, cujo pagamento se tornará imediatamente exigível, sempre que a T… vier a considerar, justificadamente, que há risco de pagamento não pontual e/ ou se o Cliente Grossista:
a) Pagar, ainda que pontualmente, uma ou mais facturas vencidas emitidas pela T… em desrespeito do disposto nos pontos 3.2. e 3.3.1. do presente Capitulo III, ressalvando a T… o direito de considerar tal pagamento como não efectuado;
b) Não pagar pontualmente uma ou mais facturas vencidas ou emitir e entregar à T… um cheque sem provisão; ou
c) Entrar em liquidação, voluntária ou judicial, ou se o mesmo requerer ou se forem requeridos contra o Cliente Grossista medidas de protecção dos credores e/ ou de recuperação de empresa, ou se o mesmo for declarado falido ou insolvente e/ ou se, por qualquer motivo, suspender ou cessar a sua actividade.
3.5. Todo e qualquer pagamento não pontual constituirá o Cliente Grossista na obrigação de pagar, para além do montante do capital devido, todas as despesas (bancárias ou outras) incorridas pela T…, bem como os juros de mora calculados à taxa legal que estiver em vigor para dívidas comerciais, acrescida de 2% (dois por cento), contados desde o dia do vencimento até à data do efectivo pagamento.
3.6. A T… reserva-se o direito de imputar quaisquer pagamentos efectuados pelo Cliente Grossista, sucessivamente, (i) a todas e quaisquer despesas (bancárias ou outras) por si suportadas relacionadas com a mora nos pagamentos, (ii) aos juros de mora devidos e (iii) só depois ao capital em dívida. Os pagamentos de capital em dívida serão sempre imputados às facturas vencidas há mais tempo.
3.7. Caso ocorra qualquer das situações previstas no ponto 3.4. deste Capítulo III, e desde que sejam pagas pelo Cliente Grossista todas as quantias em dívida nos termos dos
pontos 3.5. e 3.6. do presente Capítulo III, a T…, de acordo com o seu livre critério, poderá aceitar efectuar novos fornecimentos de Produtos ao Cliente Grossista em causa, ressalvando-se desde já o direito de a T… poder exigir ao mesmo, previamente à realização de novas entregas de Produtos, o seguinte:
a) a entrega à T… de uma garantia bancária à primeira interpelação, nos termos precisos do Anexo VII; ou
b) o pagamento prévio dessas entregas por meio de cheque visado ou transferência bancária confirmada, nos termos e condições referidos no ponto 3.2. do presente Capítulo III.
4. RESPONSABILIDADE.
A T… não será responsável pelo não cumprimento pontual das suas obrigações prescritas nestas Condições Gerais, a não ser que tal incumprimento lhe seja imputável a título de negligência grave. Para este efeito, não se considera existir negligência grave, entre outros casos, sempre que a situação de incumprimento resulte, directa ou indirectamente, de qualquer greve, litígio ou conflito laboral (geral, sectorial ou na própria T…) ou de qualquer escassez de matérias primas ou de transporte, roubo, furto, acidente, distúrbio, tumulto, guerra, incêndio, tempestade ou inundação.
5. RECUSA DE ENCOMENDAS.
5.1. Sem prejuízo do previsto nas demais disposições das presentes Condições Gerais, a T… terá o direito de recusar quaisquer encomendas do Cliente Grossista, sem que tal constitua para este qualquer direito a indemnização, no caso de:
a) O Cliente Grossista entrar em liquidação voluntária ou judicial, ou se o mesmo requerer ou forem requeridas contra este quaisquer medidas de protecção dos credores e/ ou de recuperação de empresa, ou se o mesmo for declarado falido ou insolvente e/ ou se suspender ou cessar a sua actividade;
b) Parte substancial dos bens do Cliente Grossista for objecto de penhora, arresto ou qualquer outra providência cautelar ou medida decretada por tribunal ou autoridade que o impeça de dispor livremente dos seus bens, e tal situação se mantiver por mais de 30 (trinta) dias;
c) O Cliente Grossista incorrer em incumprimento das obrigações previstas nas presentes Condições Gerais, ou for indiciado ou demonstrado que o mesmo se encontra envolvido, directa ou indirectamente, na comercialização ilícita de Produtos;
d) As encomendas colocadas pelo Cliente Grossista se mostrarem manifestamente desproporcionadas face às quantidades normalmente encomendadas pelo Cliente Grossista, excepto no âmbito de campanhas de incentivos promovidas pela T...
5.2. A T… recusará fornecer o Cliente Grossista se este não preencher ou, em qualquer momento, deixar de preencher todos os requisitos referidos no Capítulo I.
Neste caso, a T… comunicará ao Cliente Grossista a falta verificada, concedendo-lhe um prazo de 30 (trinta) dias para repor a situação e preencher o requisito em falta, sob pena de, não o fazendo, a T… se reservar o direito de cessar de imediato os fornecimentos,
5.3. Para efeitos do previsto no ponto anterior, a T… analisará, anualmente, cada Cliente Grossista e as informações por estes prestadas nos termos do ponto 1.6.3. do Capítulo III, podendo ainda solicitar-lhe informações adicionais ao abrigo do ponto 1.6. do Capítulo III, nestas se incluindo, nomeadamente, informações sobre os clientes abastecidos pelo Cliente Grossista em causa. A falta de envio das informações referidas à T… constituirá justo fundamento de recusa de fornecimento de Produtos pela T… ao Cliente Grossista em causa, aplicando-se o previsto na segunda parte do ponto 5:2 anterior.
6. ÂMBITO DE APLICAÇÃO DAS PRESENTES CONDIÇÕES.
6.1. As presentes Condições Gerais aplicam-se apenas a todos os Clientes Grossistas da T… que pratiquem o comércio por grosso - actuais e futuros – que preencham os requisitos exigidos para que possam ser fornecidos ao abrigo do disposto nas presentes Condições Gerais.
6.2. O Cliente Grossista compromete-se a proceder à revenda dos Produtos em obediência às presentes Condições Gerais e à legislação aplicável, nomeadamente à legislação fiscal e aduaneira relativa aos Produtos, comprometendo-se ainda a não revender Produtos a quem se demonstre, ainda que indiciariamente, estar envolvido, directa ou indirectamente, na comercialização ilícita dos Produtos.
7. VIGÊNCIA. ALTERAÇÕES.
As presentes Condições Gerais entram em vigor no dia 1 (um) de Abril de 2001, podendo a T… alterar, em qualquer momento, total ou parcialmente, os termos das presentes Condições Gerais.
Sem prejuízo do disposto nas presentes Condições Gerais, quaisquer alterações das mesmas serão comunicadas por escrito aos Clientes Grossistas com uma antecedência de 30 (trinta) dias relativamente à data da sua entrada em vigor.
8. LEI APLICÁVEL.
As presentes Condições Gerais e os fornecimentos de Produtos realizados ao abrigo das mesmas serão regidos de acordo com a lei Portuguesa.
9 - As Condições Gerais de Fornecimento que estabeleciam a sua entrada em vigor no dia 1 de agosto de 2002, na parte em que alteram as condições referidas em 8, são do seguinte teor:
CAPÍTULO I
…
a) Compre Produtos por grosso, a título habitual e profissional, em seu próprio nome e por sua conta e risco e que os revenda a utilizadores profissionais (retalhistas) que, por
sua vez, os revendam directamente ao consumidor, em qualquer caso, sempre com impostos especiais de consumo pagos e somente no território de Portugal continental;
…
d) Distribua directamente os Produtos aos seus respectivos clientes retalhistas.
Considera-se existir distribuição directa quando o Cliente Grossista cumulativamente:
i) receba e prepare as encomendas para os seus respectivos clientes retalhistas;
ii) …
iii) facture em seu nome aos seus clientes retalhistas;
e) Abasteça regular e continuamente os seus respectivos clientes retalhistas e zele pela inexistência, nos estabelecimentos comerciais dos clientes retalhistas por si abastecidos, de rupturas de stock dos Produtos que adquira à T… ao abrigo das presentes Condições Gerais. No caso de os promotores de vendas da T… verificarem uma ruptura de stock num ponto de venda normalmente abastecido por um Cliente Grossista, os promotores de vendas da T… poderão, mediante aviso prévio ao Cliente Grossista fornecedor do ponto de venda em causa, deixar Produtos para cobrir a falta até à data prevista para a próxima entrega pelo Cliente Grossista, facturando posteriormente o valor dos Produtos assim colocados a este Cliente Grossista, sem que este possa vir a recusar a dita factura.
CAPÍTULO II
1. …
f) Localização do ou dos armazéns onde o candidato a Cliente Grossista pretende receber os fornecimentos e entregas a realizar pela T…, bem como autorização para que os mesmos armazéns sejam previamente vistoriados durante as horas de expediente por representantes da T… ou de empresas contratadas pela T…, devidamente credenciados;
…
h) Indicação da previsão das encomendas semanais e trimestrais para cada local de entrega e do modo de pagamento pretendido; o candidato a e/ou o Cliente Grossista terá que apresentar a garantia bancária exigida no ponto 3.1.3. do Capítulo III destas Condições Gerais, caso:
i) pretenda pagar a prazo; ou
ii) pretendendo pagar a pronto, não o fizer nos termos previstos no ponto 3.1. 1 e 3.1.2 do Capítulo III das presentes Condições Gerais, …
…
CAPÍTULO III
…
1.1.4. O Cliente Grossista adquirirá os Produtos de acordo com a média trimestral de quantidades mínimas previstas no Anexo II, que estão estipuladas por Distrito. Cada Cliente Grossista deverá adquirir trimestralmente em cada um dos locais por si indicados para entrega dos Produtos, em média, a quantidade mínima de Produtos estipulada para o Distrito onde estiver situado cada um dos seus locais de entrega.
Para este efeito, as aquisições de cada Cliente Grossista em cada local de entrega serão consideradas de forma individual e independente, devendo o Cliente Grossista cumprir em cada local de entrega situado em cada um dos Distritos as quantidades mínimas trimestrais previstas no Anexo II, mesmo nos casos em que o Cliente Grossista disponha de mais do que um local de entrega num determinado Distrito.
1.1.5. No final de cada trimestre de cada ano civil, a T… fará uma análise das aquisições médias trimestrais efectuadas por cada Cliente Grossista em cada um dos seus respectivos locais de entrega, durante o trimestre em causa, com vista a apurar o cumprimento ou incumprimento do disposto no ponto 1.1.4. deste Capítulo III no que respeita à média trimestral de quantidades mínimas de aquisição de Produtos. Para efeitos da determinação das aquisições médias trimestrais, tomar-se-á em conta a facturação emitida pela T… a cada Cliente Grossista durante o trimestre em causa. No que respeita aos Clientes Grossistas que tenham iniciado a sua actividade durante um trimestre já em curso, as suas respectivas aquisições só serão analisadas no final do trimestre seguinte.
A T… comunicará ao Cliente Grossista, no prazo de 30 (trinta) dias após o final de cada trimestre, o eventual não cumprimento pelo mesmo, num ou mais locais de entrega, das quantidades mínimas trimestrais estabelecidas nas Condições Gerais, que estiverem em vigor em cada momento para cada Distrito onde se encontrem situados o ou os locais de entrega dos Produtos. Nessa comunicação será concedido ao Cliente Grossista um prazo até ao final do trimestre que então estiver em curso para que este retome as encomendas médias trimestrais nos termos vigentes, sob pena de, não o fazendo, lhe ser comunicada no final do trimestre concedido, a cessação imediata dos fornecimentos no ou nos locais de entrega em que se verifique que o Cliente Grossista não atinge a média trimestral de quantidades mínimas estabelecidas.
1.1.6. Por forma a acompanhar a evolução do mercado, a T… apurará, no início de cada ano civil, a média trimestral de aquisições efectuadas no ano imediatamente anterior pelo Cliente Grossista que, tendo atingido as quantidades mínimas aplicáveis em determinado Distrito, adquiriu menos Produtos em cada local de entrega de cada Distrito.
Para este efeito, nos casos em que o Cliente Grossista disponha de mais do que um local de entrega num determinado Distrito, a média de aquisições trimestrais do Cliente Grossista será determinada tendo em consideração, de forma independente, cada um dos locais de entrega do Cliente Grossista existentes nesse Distrito, sem prejuízo do disposto no ponto 1.1.7. seguinte.
A média de aquisições trimestrais do Cliente Grossista que, no ano civil precedente, tendo cumprido o disposto no ponto 1.1.4. acima, adquiriu menos Produtos em cada local de entrega situado em cada Distrito, constituirá a média trimestral de quantidades mínimas do correspondente Distrito (sujeita ao disposto no ponto 1. 1.7. seguinte). As novas quantidades mínimas trimestrais serão aplicáveis a partir do início do segundo trimestre do ano civil em que for efectuada a análise. As quantidades mínimas serão comunicadas aos Clientes Grossistas com uma antecedência de 15 (quinze) dias relativamente à data da sua respectiva entrada em vigor.
1.1.7. Se o número de cigarros resultante do cálculo efectuado para apurar o cumprimento pelo Cliente Grossista das quantidades mínimas (ponto 1. 1.5. acima) ou a evolução das quantidades mínimas aplicáveis num determinado Distrito (ponto 1. 1.6. acima), …
1.2. Armazenagem.
1.2.1. O Cliente Grossista deverá possuir, em cada local de entrega de Produtos, instalações que assegurem a armazenagem dos Produtos em boas condições de segurança, temperatura, humidade e higiene. O(s) armazém(ns) do Cliente Grossista deverá(ão) ter capacidade para deter, em stock, quantidades de Produtos suficientes para o abastecimento regular e suficiente dos seus respectivos clientes, devendo esse stock ser gerido de modo a assegurar que os Produtos cheguem a estes em boas condições.
Para este efeito, o Cliente Grossista deverá cumprir e respeitar as condições de armazenagem que se encontram estabelecidas no Anexo III às presentes Condições Gerais.
1.2.2. O Cliente Grossista autoriza, desde já, os representantes da T… ou das empresas contratadas pela T… devidamente credenciados a vistoriar, …
…
1.6.3…
c) Prova de que efectuou a declaração para efeitos de liquidação de IRC/ IRS relativa ao ano imediatamente anterior.
Caso não seja possível a apresentação de qualquer dos documentos acima mencionados nas alíneas a), b) ou c), deverá ser entregue uma justificação indicando o motivo subjacente.
1.6.4. A T… poderá proceder ao tratamento dos dados referidos no Anexo IX às presentes Condições Gerais, para as finalidades nele previstas e comunicar, nos termos da lei, quaisquer informações relativas ao fornecimento de Produtos ao Cliente Grossista, no seguimento de solicitação legítima de autoridades públicas, policiais ou judiciais. O Cliente Grossista poderá sempre exercer o seu direito de oposição ao abrigo do artigo 12º da Lei 67/98.
O carácter obrigatório ou facultativo da prestação das informações em questão está identificado no Anexo IX.
…
2.1.3…
e)…
Na data em que o Cliente Grossista indicar à T… os locais de entrega onde pretende ser fornecido nos termos previstos no ponto 1.1.2 do presente Capítulo III, o Cliente Grossista deverá igualmente informar a T…, da quantidade de Produtos a receber em cada um desses locais, por forma a que seja possível determinar a periodicidade das entregas a vigorar para cada local de entrega nos termos acima expostos.
Sem prejuízo do disposto no ponto 1.1.5. do presente Capitulo III no final de cada trimestre de cada ano civil, e para efeitos de determinação da periodicidade de entregas dos Produto, a T… fará uma análise das aquisições médias semanais efectuadas pelo Cliente Grossista em cada um dos seus respectivos locais de entrega durante o trimestre em causa, por forma a apurar, para o trimestre seguinte, a periodicidade das entregas a realizar em cada um dos locais de entrega.
Tal periodicidade será comunicada ao Cliente Grossista no prazo de 30 (trinta) dias após o final de cada trimestre, sendo aplicável logo que a mesma seja comunicada ao Cliente Grossista.
Para efeito da determinação das aquisições médias semanais, tomar-se-á em conta a facturação emitida pela T… relativamente a cada local de entrega do Cliente Grossista em causa durante o trimestre a que a mesma disser respeito.
No que respeita às aquisições para locais de entrega que venham a ser indicados pelo Cliente Grossista durante um trimestre já em curso, as entregas em tais locais só serão consideradas e analisadas no final do trimestre seguinte.
…
2.2. Descontos Comerciais.
Serão concedidos pela T… ao seu Cliente Grossista um desconto comercial fixo e descontos comerciais variáveis.
2.2.1. Desconto Comercial Fixo
O desconto comercial fixo sobre o preço de venda ao público dos Produtos será o constante do Anexo VI(A), o qual será efectuado em cada factura a emitir pela T….
2.2.2. Descontos Variáveis
Os descontos comerciais variáveis serão descontos a praticar pela T… sobre o preço de venda ao público dos Produtos, em função dos factores – distribuição directa activa, escalões de volume, carteira de produtos e informações - e de acordo com as seguintes condições.
2.2.2.1. Distribuição Directa Activa
Considera-se distribuição directa e activa aquela que, para além do anteriormente definido no Capítulo I, implica, por parte do Cliente Grossista, a disponibilidade e utilização de meios humanos e transportes próprios ou subcontratados adequados para a distribuição dos Produtos encomendados através da pré-venda ou autovenda aos seus clientes retalhistas (com venda ao balcão ou através de máquinas automáticas), que por sua vez, revendam os Produtos directamente ao consumidor.
A distribuição directa e activa implica a facturação directa do Cliente Grossista, ou de empresas por si participadas em mais de 50%, ao seu cliente retalhista.
Ao Cliente Grossista que pratique uma distribuição directa e activa será atribuído um desconto comercial sobre o preço de venda ao público dos Produtos, adicional ao desconto fixo, que varia de acordo com a percentagem de distribuição directa e activa que o mesmo pratica relativamente aos seus clientes, conforme se ilustra no Anexo VI(B).
Para efeitos de determinação do desconto comercial a efectuar relativamente à distribuição directa e activa, no final de cada trimestre civil, a T… fará uma análise da informação enviada por cada Cliente Grossista de acordo com o previsto no ponto 2.2.2.4 relativamente aos respectivos clientes retalhistas que são fornecidos directa e activamente pelo Cliente Grossista em análise, aplicando a percentagem de desconto correspondente (Anexo VI-B), durante o trimestre seguinte.
A T… poderá efectuar auditorias ao Cliente Grossista, através dos seus representantes ou de empresas contratadas pela T… devidamente credenciadas, e sempre na presença do Cliente Grossista, dentro do horário normal de funcionamento do estabelecimento do Cliente Grossista e mediante aviso prévio, para efeitos de comprovar a prática da distribuição directa e activa.
2.2.2.2. Escalões de Volume
Por cada Distrito serão determinados três escalões de volume. Os escalões de volume serão determinados trimestralmente para o trimestre civil seguinte, com base nos seguintes factores:
- O 1º Escalão será determinado dividindo o total de compras anual de cada Distrito pelo número de Clientes Grossistas desse Distrito, sendo o resultado dividido pelo número de trimestres civis (4). Este resultado médio trimestral será utilizado para determinar os Clientes Grossistas com locais de entrega nesse Distrito cujas aquisições sejam iguais ou superiores ao resultado médio trimestral, os quais serão incluídos no 1º escalão de volume.
- O 2º Escalão de Volume será determinado dividindo o número de compras que resulta da subtracção das aquisições dos Clientes Grossistas que se situam no 1º escalão, ao total anual de compras do Distrito em causa pelo número de Clientes Grossistas desse Distrito (subtraindo aqueles que se situam no 1º escalão), sendo o resultado dividido pelo número de trimestres civis (4). Este resultado médio trimestral será utilizado para determinar os Clientes Grossistas com locais de entrega no dito Distrito cujas aquisições sejam iguais ou superiores ao resultado médio trimestral em questão mas inferiores ao resultado do 1º Escalão, sendo esses Clientes Grossistas incluídos no 2º escalão de volume.
- O 3º Escalão de Volume será o volume correspondente ao volume de Produtos abaixo do 2º escalão de volume, no qual serão incluídos os Clientes Grossistas com locais de entrega no Distrito em causa que não tiverem adquirido nem o volume previsto no 1º
escalão nem no 2º escalão de volume.
A cada escalão de volume corresponderá um desconto comercial sobre o preço de venda ao público dos Produtos, adicional ao desconto fixo, de acordo com o disposto no Anexo VI(C).
Com base na facturação emitida pela T…, a T… fará actualizações dos escalões de volume de cada Distrito no final de cada ano civil.
No final de cada trimestre civil, com base nas aquisições efectuadas durante esse trimestre civil, a T… analisará em que escalão se incluirá cada Cliente Grossista durante o trimestre então em vigor.
2.2.2.3. Carteira de Produtos
Serão concedidos diferentes descontos comerciais sobre o preço de venda ao público dos Produtos, adicional ao desconto fixo, conforme o Cliente Grossista adquira mais ou menos marcas de Produtos à T…, sendo que aquele que adquira pelo menos uma caixa (dez mil cigarros) das 21 marcas principais de Produtos, terá um desconto comercial, conforme indicado no Anexo VI(D).
Para efeitos de determinação do desconto comercial a efectuar a cada Cliente Grossista relativo à Carteira de Produtos, no final de cada semestre civil, a T… fará a análise das marcas de Produtos adquiridas por cada Cliente Grossista durante esse semestre civil e, com base nessa análise, aplicará a percentagem do desconto comercial (relativo à Carteira de Produtos) em que o Cliente Grossista se situar durante o semestre civil seguinte e assim sucessivamente.
2.2.2.4. Informações de Vendas
Cada Cliente Grossista poderá enviar, trimestralmente, informações de vendas, à T… sobre, por um lado, as vendas que o Cliente Grossista efectue de Produtos da T… e, por outro lado, as vendas totais de cigarros efectuadas pelo Cliente Grossista.
O Cliente Grossista não deverá enviar de modo discriminado, à T… as vendas que efectuar de cigarros que não sejam comercializados pela T…, mas apenas as vendas totais efectuadas pelo Cliente Grossista. Essas informações de vendas servirão, também para comprovar a prática de distribuição directa e activa do Cliente Grossista e sempre que possível deverão ser enviadas nos seguintes moldes:
a) a informação deve ser enviada através de suporte informático e ser confirmada pelo Cliente Grossista ou respectiva gerência e/ou administração;
b) a informação deve ser mensal e deverá ser entregue à T… trimestralmente, até ao quinto dia de cada trimestre civil;
c) A informação deve consistir na indicação do total de vendas das marcas de Produtos da T…, ou, opcionalmente, ordenada por marca de Produtos da T…, e, em qualquer caso, também por ponto de venda (cliente retalhista com venda ao balcão ou através de máquina automática) fornecido directa e activamente pelo Cliente Grossista ou por sociedades participadas pelo Cliente Grossista em mais de 50% do respectivo capital social. Os pontos de venda (cliente retalhista com venda ao balcão) fornecidos pelo Cliente Grossista activa e directamente deverão ser identificados através do respectivo número de contribuinte. Os pontos de venda (máquinas automáticas) fornecidos pelo Cliente Grossista activa e directamente deverão ser identificados através de um número de ordem de acordo com o livre critério do Cliente Grossista;
d) O volume total de Produtos objecto da informação trimestral deve representar, pelo menos, 95% das aquisições do Cliente Grossista.
Pela informação que a T… receber ao abrigo deste ponto 2.2.2.4 a T… concederá um desconto comercial sobre o preço de venda ao público dos Produtos, adicional ao desconto fixo conforme previsto no Anexo VI(E).
3. CONDIÇÕES FINANCEIRAS.
3.1. (anterior ponto 3.3)
3.2. O Cliente Grossista deverá efectuar todos os pagamentos à T… em seu próprio nome, na moeda e quantia exacta constantes da respectiva factura, não sendo admissíveis pagamentos por parte de terceiros e/ou pagamentos de quantias superiores às que constarem na respectiva factura.
3.3. A T… concederá o desconto financeiro 0.29% sobre o valor da factura (excluindo os descontos comerciais), ao Cliente Grossista que efectue o pagamento a pronto da totalidade do valor da factura em causa nos termos e condições previstos nas presentes Condições Gerais.
3.4. A T… terá o direito de suspender imediatamente todas as entregas e/ou anular as encomendas em curso e/ou a exigir o pagamento de todas as facturas não pagas, ainda que não vencidas, cujo pagamento se tornará imediatamente exigível, sempre que a T… vier a considerar, justificadamente, podendo tomar em consideração informações desabonatórias justificadas provenientes do mercado sobre a situação de solvabilidade do Cliente Grossista, que há risco de pagamento não pontual e/ou se o Cliente Grossista:
a) Pagar, ainda que pontualmente, uma ou mais facturas vencidas emitidas pela T… em desrespeito do disposto nos pontos 3.2. e 3.3.1. do presente Capítulo III, ressalvando a T… o direito de considerar tal pagamento como não efectuado;
…
5.3. Para efeitos do previsto no ponto anterior, a T… analisará, anualmente, cada Cliente Grossista e as informações por estes prestadas nos termos do ponto 1.6.3. do Capítulo III, podendo ainda solicitar-lhe informações adicionais ao abrigo do ponto 1.6. do Capítulo IlI.
A falta de envio à T…, sem justificação, das informações que sejam solicitadas ao abrigo do ponto 1.6 do Capitulo III constituirá justo fundamento de recusa de fornecimento de Produtos pela T… ao Cliente Grossista em causa, aplicando-se, o previsto na segunda parte do ponto 5.2 anterior.
…
7. VIGÊNCIA. ALTERAÇÕES.
As presentes Condições Gerais entram em vigor no dia 1 (um) de Agosto de 2002, podendo a T… alterar, em qualquer momento, total ou parcialmente, os termos das presentes Condições Gerais.
As presentes Condições Gerais substituem as anteriormente em vigor.
Sem prejuízo do disposto nas presentes Condições Gerais, quaisquer alterações das mesmas serão comunicadas por escrito aos Clientes Grossistas com uma antecedência de 30 (trinta) dias relativamente à data da sua entrada em vigor.
8. …
10 - As Condições Gerais de Fornecimento que estabeleciam a sua entrada em vigor no dia 1 de agosto de 2005, na parte em que alteram as condições referidas em 9, são do seguinte teor:
CAPÍTULO I
DEFINIÇÃO DE GROSSISTA COM DISTRIBUIÇÃO DIRECTA
Para efeitos das presentes Condições Gerais de Fornecimento de Produtos (de ora em diante designadas por “Condições Gerais”), o cliente grossista com distribuição directa (de ora em diante apenas designado por “Cliente Grossista”), deverá ser uma pessoa jurídica, singular ou colectiva, que, cumulativamente, preencha permanentemente os seguintes requisitos:
…
d) …
ii) efectue directamente a entrega física das encomendas aos seus respectivos clientes retalhistas nos estabelecimentos destes, através de meios próprios, utilizando veículos adequados ao transporte dos Produtos em boas condições de conservação e higiene;
iii) …
…
e) Abasteça regular e continuamente os seus respectivos clientes retalhistas e zele pela inexistência, nos estabelecimentos comerciais dos clientes retalhistas por si abastecidos, de rupturas de stock dos Produtos que adquira à T… ao abrigo das presentes Condições Gerais.
No caso de os promotores de vendas da T… verificarem uma ruptura de stock num ponto de venda normalmente abastecido por um Cliente Grossista, os promotores de vendas da T… poderão, mediante aviso prévio ao Cliente Grossista fornecedor do ponto de venda em causa e aceitação deste, deixar Produtos para cobrir a falta até à data prevista para a próxima entrega pelo Cliente Grossista, facturando posteriormente o valor dos Produtos assim colocados a este Cliente Grossista, sem que este possa vir a recusar a dita factura.
CAPÍTULO II
CANDIDATOS A CLIENTES GROSSISTAS
1. Os candidatos a Clientes Grossistas da T… (nestes se incluindo qualquer pessoa jurídica, singular ou colectiva, que pretenda comercializar ou já comercialize produtos nos termos identificados no Capítulo I) deverão informar a T… que pretendem ser por esta fornecidos com Produtos da T… ao abrigo das presentes Condições Gerais, devendo para o efeito enviar à T… todos os seguintes elementos:
a) Nome completo e cópia do documento de identificação/Firma ou denominação social;
…
e) No caso de sociedades comerciais, declaração com identificação completa dos seus actuais sócios, accionistas e representantes (gerentes, administradores, procuradores ou outros), acompanhada de Certidão do Registo Comercial (com teor integral e actualizado dos estatutos) emitida há menos de 1 (um) ano e de cópias dos documentos de identificação dos seus representantes e ainda identificação das pessoas colectivas em que detenham uma participação social;
f) Último mapa de contribuições para a Segurança Social;
g) Localização do(s) armazém(éns) onde o candidato a Cliente Grossista pretende receber os fornecimentos e entregas a realizar pela T…, bem como autorização para que os mesmos armazéns sejam previamente vistoriados durante as horas de expediente por representantes da T… ou de empresas contratadas pela T…, devidamente credenciados;
h) (anterior alínea g)
i) Indicação da previsão das encomendas semanais e trimestrais para cada local de entrega e do modo de pagamento pretendido; o candidato a Cliente Grossista i) pretendendo pagar a pronto, o pagamento terá que ser feito previamente à recepção das encomendas por meio de cheque visado ou transferência bancária confirmada, nos termos e condições referidos no ponto 3.1.1. do Capítulo III das presentes Condições Gerais, durante um prazo de seis meses a contar da data do primeiro fornecimento, período de tempo que a T… considera adequado para poder aferir da capacidade financeira do Cliente Grossista e/ou da constância da pontualidade dos pagamentos dos fornecimentos que lhe efectuar. Caso o candidato a Cliente Grossista assim decida, este pagamento prévio poderá ser substituído por pagamento a pronto nos termos do ponto 3.1.1. e 3.1.2 do Capítulo III, desde que apresente uma garantia bancária nos termos do ponto 3.1.3 do Capítulo III, ou
ii) pretendendo pagar a prazo, terá que apresentar uma garantia bancária nos termos do ponto 3.1.3 do Capítulo III.
2. …
CAPÍTULO III
...
1.1.2. Cada Cliente Grossista será fornecido no ou nos locais de entrega que indicar à T…, devendo cumprir, em cada um dos locais de entrega pelo mesmo indicados, as quantidades mínimas previstas no Anexo II às presentes Condições Gerais, nos termos do disposto no ponto 1.1.4. deste Capítulo III. Os Distritos estão identificados no Anexo I às presentes Condições Gerais. O Cliente Grossista deverá informar e indicar à T… o ou os locais em que deverão ser feitas as entregas dos Produtos, devendo tais locais ser da sua propriedade, por si arrendados ou explorados, ou local onde o grossista exerça a sua actividade, e de fácil acesso e parqueamento, tendo em conta os meios de transporte normalmente utilizados para a entrega dos Produtos. O Cliente Grossista não poderá interferir, directa ou indirectamente, no transporte dos Produtos para o(s) local(is) de entrega que tenha(m) sido pelo mesmo indicados.
1.1.3. Qualquer alteração relativamente ao local ou locais de entrega dos Produtos deverá ser previamente comunicada pelo Cliente Grossista à T…, por escrito e com uma antecedência mínima de 15 (quinze) dias, sem prejuízo do disposto no ponto 2.1.3. do Capítulo III.
…
1.3. Marcas. Embalagens.
1.3.1 (anterior 1.3.)
1.3.2 A T… irá implementar sistemas de identificação e rastreabilidade dos seus fornecimentos.
Tal implementação implicará para o Cliente Grossista a adopção de sistemas idênticos na revenda dos Produtos, bem como a identificação dos mesmos aquando da sua recepção e, ainda, aquando da entrega dos Produtos aos seus respectivos clientes.
Face ao exposto, o Cliente Grossista desde já se compromete em enveredar os melhores esforços em cooperar com a T… na implementação dos referidos sistemas de identificação e rastreabilidade.
1.4. Relações dos Clientes Grossistas com os seus Clientes.
1.4.1. Os Clientes Grossistas da T… deverão adoptar, nas relações comerciais que estabeleçam com os seus respectivos clientes relativamente aos Produtos, regras contratuais equivalentes àquelas estabelecidas nas presentes Condições Gerais no que respeita ao cumprimento da legislação aplicável, nomeadamente a legislação fiscal e aduaneira relativa aos Produtos e, ainda, a legislação sobre branqueamento de vantagens de proveniência ilícita (designadamente adoptando regras que permitam conhecer os seus respectivos clientes, incluindo a necessidade de obtenção dos elementos especificamente indicados no Capítulo II) e zelar pela sua adequada aplicação.
1.4.2. O Cliente Grossista compromete-se a proceder à revenda dos Produtos em obediência às presentes Condições Gerais e à legislação aplicável, nomeadamente à legislação fiscal e aduaneira relativa aos Produtos e à legislação sobre branqueamento de vantagens de proveniência ilícita, comprometendo-se ainda a não revender Produtos a quem se demonstre, ainda que indiciariamente, estar envolvido, directa ou indirectamente, na comercialização ilícita dos Produtos assim como a não revender os Produtos a quem faça encomendas em quantidades que razoavelmente excedam a normal e legítima procura dos Produtos. O Cliente Grossista compromete-se, ainda, a cooperar com as autoridades públicas em qualquer investigação conexa com comercialização ilícita de Produtos, devendo informar a T… de qualquer situação ilícita envolvendo os Produtos que chegue ao seu conhecimento.
…
1.6. Informações.
1.6.1. …, nestes se incluindo designadamente os elementos referidos na alínea h) do ponto 1. do Capítulo II das presentes Condições Gerais.
1.6.2. … transmissão do direito e uso de firma ou denominação ou trespasse de
estabelecimento comercial do Cliente Grossista, bem como no caso de pessoa colectiva, qualquer outro facto sujeito a registo.
…
1.6.4. Caso o entenda necessário, nomeadamente quando existam suspeitas ou indícios fortes do não cumprimento por parte do Cliente Grossista de alguma obrigação imposta por Lei, a T… poderá ainda solicitar o certificado de registo criminal do Cliente Grossista que exerça a sua actividade individualmente ou, se este for uma pessoa colectiva, dos respectivos sócios, accionistas ou representantes, obrigando-se o Cliente Grossista a fornecer prontamente tal informação à T….
1.6.5. (anterior 1.6.4.)
1.6.6. O Cliente Grossista concorda e aceita que a T… pretende cooperar com as autoridades competentes em quaisquer inquéritos ou investigações referentes a importação, transporte ou comércio ilegal dos Produtos
…
2.1.5. …
b) …
Desde que cumpridas as formalidades acima mencionadas, a T… obriga-se, após comprovação,
(i) a suprir quaisquer faltas no prazo de 10 (dez) dias após a recepção da comprovação das referidas faltas;
(ii) a emitir uma nota de crédito no valor e quantidade dos Produtos com anomalias.
…
2.2.2. Descontos Variáveis
Os descontos comerciais variáveis serão descontos a praticar pela T… sobre o preço de venda ao público dos Produtos, em função dos factores – distribuição directa activa, escalões de volume, carteira de produtos e informações.
Sempre que haja alteração frequente dos locais de entrega os descontos comerciais variáveis até então aplicados relativamente ao(s) locai(s) de entrega anteriormente existente(s) à data da mudança manter-se-ão, sendo efectuadas quaisquer eventuais necessárias actualizações apenas no 44º dia útil após o final do trimestre em que a mudança tiver lugar.
Sem prejuízo do disposto no ponto 1.6.2 do Capítulo III e do Capítulo II (à excepção da alínea i), do ponto 1), em caso de fusão ou de aquisição de participações sociais entre Clientes Grossistas, será tido em conta para efeitos de atribuição dos descontos comerciais variáveis a soma do registo histórico de vendas, distribuição directa e volume de vendas de cada um dos Clientes Grossistas que se fundam ou que se unam entre si através de aquisições de participações sociais, de modo a determinar quais os descontos que serão praticados a partir do momento em que tal situação seja comunicada à T…, ficando posteriormente sujeitos às análises previstas nos pontos 2.2.2.1 a 2.2.2.4 que vierem a ser efectuadas.
Os descontos variáveis serão efectuados de acordo com as seguintes condições.
2.2.2.1. Distribuição Directa Activa
Considera-se distribuição directa e activa aquela que, para além do anteriormente definido no Capítulo I, implica, por parte do Cliente Grossista, a disponibilidade e utilização de meios humanos e transportes próprios ou subcontratados adequados para a distribuição, dos Produtos encomendados através da pré-venda, autovenda, televenda, ou e-venda aos seus clientes retalhistas (com venda ao balcão ou através de máquinas automáticas), incluindo a entrega no estabelecimento dos respectivos clientes retalhistas, que por sua vez, revendam os Produtos a retalho directamente ao consumidor.
A distribuição directa e activa implica a facturação directa pelo Cliente Grossista, ou por sociedades por si participadas em mais de 50%, ao seu cliente retalhista.
Ao Cliente Grossista que pratique uma distribuição directa e activa será atribuído um desconto comercial sobre o preço de venda ao público dos Produtos, adicional ao desconto fixo, que varia de acordo com a percentagem de distribuição directa e activa que o mesmo pratica relativamente aos seus clientes em função dos Produtos adquiridos, conforme se ilustra no Anexo VI(B).
Para efeitos de determinação do desconto comercial a efectuar relativamente à distribuição directa e activa, após o final de cada trimestre civil, a T… fará uma análise da informação enviada por cada Cliente Grossista de acordo com o previsto no ponto 2.2.2.4 relativamente aos respectivos clientes retalhistas que são fornecidos directa e activamente pelo Cliente Grossista.
A actualização do desconto comercial variável previsto neste ponto 2.2.2.1. será comunicada ao Cliente Grossista no 39º dia útil e efectivada no 44º dia útil seguintes ao final do trimestre em análise.
Relativamente aos novos Clientes Grossistas e a novos locais de entrega (que não resultantes de alterações frequentes), os Clientes Grossistas deverão enviar a informação mencionada no ponto 2.2.2.4 para a T…, até ao 10º dia útil seguinte ao final do primeiro mês civil de compras seguinte ao início da respectiva actividade como Cliente Grossista, para determinar o desconto comercial variável devido pela distribuição directa.
A actualização deste desconto comercial variável será efectivada no 15º dia útil seguinte ao final desse mês civil de compras.
A T… poderá efectuar auditorias ao Cliente Grossista, através dos seus representantes ou de empresas contratadas pela T... devidamente credenciadas, e sempre na presença do Cliente Grossista, dentro do horário normal de funcionamento do estabelecimento do Cliente Grossista e mediante aviso prévio, para efeitos de comprovar a prática da distribuição directa e activa.
2.2.2.2. Escalões de Volume
Por cada Distrito serão determinados três escalões de volume com base nos seguintes factores:
- O 1º Escalão…
- O 2º Escalão de Volume…
- O 3º Escalão de Volume…
A cada escalão de volume…
Com base na facturação emitida pela T…, a T… fará actualizações dos escalões de volume de cada Distrito no final de cada ano civil, o qual será comunicado até ao 30º dia útil após o final do ano civil transacto, reportando os seus efeitos a 1 de Janeiro do ano civil em causa.
No final de cada trimestre civil, com base nas aquisições efectuadas durante esse trimestre civil, a T… analisará em que escalão se incluirá cada Cliente Grossista e, em caso de alteração de escalão, no 39º dia útil após o final de cada trimestre, comunicará ao Cliente Grossista qual o escalão em que se situa, sendo o desconto respectivo aplicável no 44º dia útil após o final de cada trimestre.
Relativamente aos novos Clientes Grossistas e a novos locais de entrega (que não resultantes de alterações frequentes), a média de encomendas previstas (ponto1, i) do Capítulo II) será utilizada para a determinação do escalão em que serão incluídos, sendo efectuada uma revisão da situação após decorrido um mês civil de compras e havendo lugar a alteração esta será efectivada no 15º dia útil seguinte ao final desse mês.
2.2.2.3. Carteira de Produtos
Serão concedidos diferentes descontos comerciais sobre o preço de venda ao público dos Produtos, adicional ao desconto fixo, conforme o Cliente Grossista adquira mais ou menos marcas de Produtos à T…, sendo que aquele que adquira pelo menos uma caixa (dez mil cigarros) das marcas principais de Produtos indicadas no Anexo VI(D), terá um desconto comercial, conforme também indicado no Anexo VI(D).
Para efeitos de determinação do desconto comercial a efectuar a cada Cliente Grossista relativo à Carteira de Produtos, no final de cada semestre civil, a T... fará a análise das marcas de Produtos adquiridas por cada Cliente Grossista durante esse semestre civil e, com base nessa análise, havendo lugar a alteração no desconto comercial variável, a actualização do desconto comercial variável será comunicada ao Cliente Grossista no 39º dia útil e efectivada no 44º dia útil seguintes ao final do semestre em análise.
2.2.2.4. Informações de Vendas
Cada Cliente Grossista poderá enviar informações de vendas à T… sobre, por um lado, as vendas que o Cliente Grossista efectue de Produtos da T… (apenas cigarros) e, por outro lado, as vendas totais de cigarros efectuadas pelo Cliente Grossista. O Cliente Grossista não deverá enviar de modo discriminado, à T… as vendas que efectuar de cigarros que não sejam comercializados pela T…, mas apenas as vendas totais efectuadas pelo Cliente Grossista a cada retalhista.
Essas informações de vendas servirão, também, para comprovar a prática de distribuição directa e activa do Cliente Grossista e sempre que possível deverão ser enviadas nos seguintes moldes:
a) a informação deve ser enviada através de suporte informático e ser confirmada pelo Cliente Grossista ou respectiva gerência e/ou administração;
b) a informação deve ser mensal e deverá ser entregue à T… trimestralmente, até ao 10º dia útil de cada trimestre civil;
c) a informação deve consistir na indicação do total de vendas das marcas de Produtos da T…, ou, opcionalmente, ordenada por marca de Produtos da T…, e, em qualquer caso, também por ponto de venda (cliente retalhista com venda ao balcão ou através de máquina automática) fornecido directa e activamente pelo Cliente Grossista ou por sociedades participadas pelo Cliente Grossista em mais de 50% do respectivo capital social. Os pontos de venda (cliente retalhista com venda ao balcão ou através de máquina automática exploradas pelo retalhista) fornecidos pelo Cliente Grossista activa e directamente deverão ser identificados através do respectivo número de contribuinte. Caso o retalhista fornecido pelo Cliente Grossista tenha mais do que um ponto de venda, o Cliente Grossista deverá identificar os vários pontos de venda com um número de ordem ao seu livre critério; As máquinas automáticas da propriedade ou exploradas directamente pelo Cliente Grossista e fornecidos pelo Cliente Grossista activa e directamente deverão ser identificados através de um número de ordem de acordo com o livre critério do Cliente Grossista.
d) A unidade de vendas deverá ser expressa em volumes (cada volume corresponde a dez maços de cigarros).
Pela informação que a T… receber ao abrigo deste ponto 2.2.2.4 a T… concederá um desconto comercial sobre o preço de venda ao público dos Produtos, adicional ao desconto fixo conforme previsto no Anexo VI(E).
A informação enviada pelo Cliente Grossista será analisada em cada trimestre e o desconto comercial variável, se aplicável, será comunicado ao Cliente Grossista no 39º dia útil e efectivado no 44º dia útil seguintes ao final do trimestre em análise.
A informação incorrecta ou incompleta constituirá a T… no direito de não efectuar o pagamento do desconto comercial previsto nos pontos 2.2.2.1 e 2.2.2.4 ou, de descontar eventuais pagamentos anteriormente efectuados com base em tal informação incorrecta ou incompleta em pagamentos seguintes.
A T… obriga-se a manter a informação que receber dos seus Clientes grossistas estritamente confidencial.
…
3.7. Caso ocorra qualquer uma das situações previstas no ponto 3.4. deste Capítulo III, e desde que sejam pagas pelo Cliente Grossista todas as quantias em dívida nos termos dos pontos 3.5. e 3.6. do presente Capítulo III, a T…, de acordo com o seu livre critério, poderá recusar ou aceitar efectuar novos fornecimentos de Produtos ao Cliente Grossista em causa, ressalvando-se desde já o direito de a T… poder exigir ao mesmo, previamente à realização de novas entregas de Produtos, o seguinte:
…
4. RESPONSABILIDADE.
4.1. (anterior 4.)
4.2. Na eventualidade da T… vir a ser responsabilizada pelo pagamento de quaisquer prejuízos, danos, custos ou indemnizações decorrentes do não cumprimento, negligente ou intencional, pelo Cliente Grossista, das obrigações previstas no ponto 1.4. do Capítulo III, o Cliente Grossista deverá indemnizar a T… nas quantias referidas, sem prejuízo do direito geral de indemnização pelos danos causados à T…, nos termos gerais de direito
5. RECUSA DE ENCOMENDAS.
5.1. …
c) O Cliente Grossista incorrer em incumprimento das obrigações previstas nas presentes Condições Gerais, ou for indiciado ou demonstrado que o mesmo se encontra envolvido, directa ou indirectamente, na comercialização ilícita de Produtos e, ainda, sempre que a T… receba instruções de autoridade pública competente nesse sentido;
d) …
…
6. FORNECIMENTO DE OUTROS PRODUTOS DE TABACO.
Para além de cigarros das marcas listadas no Anexo V, a T… fornece outro tipo de produtos de tabaco, conforme consta também do mesmo Anexo V. Estes produtos que não cigarros serão fornecidos aos preços e com os descontos indicados no Anexo X. As presentes Condições Gerais aplicam-se a estes produtos que não cigarros, excepto no que respeita aos pontos 1.1.4 a 1.1.7 do Capítulo III e ponto 2.2 (incluindo os pontos 2.2.2.1 a 2.2.2.4) do Capítulo III.
7. ÂMBITO DE APLICAÇÃO DAS PRESENTES CONDIÇÕES.
(anterior 6.1)
8. VIGÊNCIA. ALTERAÇÕES.
As presentes Condições Gerais entram em vigor no dia 1 de Agosto de 2005, podendo a T… alterar, em qualquer momento, total ou parcialmente, os termos das presentes Condições Gerais.
As presentes Condições Gerais substituem as anteriormente em vigor.
Sem prejuízo do disposto nas presentes Condições Gerais, quaisquer alterações das mesmas serão comunicadas por escrito aos Clientes Grossistas com uma antecedência de 30 (trinta) dias relativamente à data da sua entrada em vigor. Exceptua-se do disposto no período anterior os aumentos de preço, os quais entrarão em vigor na data que, em cada momento, for comunicada pela T….
9. LEI APLICÁVEL.
(anterior 8.)
11 - As Condições Gerais de Fornecimento que estabeleciam a sua entrada em vigor no dia 1 de janeiro de 2006, na parte em que alteram as condições referidas em 10, são do seguinte teor:
CAPÍTULO II
CANDIDATOS A CLIENTES GROSSISTAS
1. …
f) Declaração da situação contributiva devidamente regularizada perante a Segurança Social;
…
i) Indicação da previsão das encomendas semanais e semestrais para cada local de entrega e do modo de pagamento pretendido; o candidato a Cliente Grossista…
…
CAPÍTULO III
…
1.1.4. O Cliente Grossista adquirirá os Produtos de acordo com a média semestral de quantidades mínimas previstas no Anexo II, que estão estipuladas por Distrito. Cada Cliente Grossista deverá adquirir semestralmente em cada um dos locais por si indicados para entrega dos Produtos, em média, a quantidade mínima de Produtos estipulada para o Distrito onde estiver situado cada um dos seus locais de entrega.
Para este efeito, as aquisições de cada Cliente Grossista em cada local de entrega serão consideradas de forma individual e independente, devendo o Cliente Grossista cumprir em cada local de entrega situado em cada um dos Distritos as quantidades mínimas semestrais previstas no Anexo II, mesmo nos casos em que o Cliente Grossista disponha de mais do que um local de entrega num determinado Distrito.
1.1.5. No final de cada semestre de cada ano civil, a T… fará uma análise das aquisições médias semestrais efectuadas por cada Cliente Grossista em cada um dos seus respectivos locais de entrega, durante o semestre em causa, com vista a apurar o cumprimento ou incumprimento do disposto no ponto 1.1.4. deste Capítulo III no que respeita à média semestral de quantidades mínimas de aquisição de Produtos.
Para efeitos da determinação das aquisições médias semestrais, tomar-se-á em conta a faturação emitida pela T… a cada Cliente Grossista durante o semestre em causa. No que respeita aos Clientes Grossistas que tenham iniciado a sua actividade durante um semestre já em curso, as suas respectivas aquisições só serão analisadas no final do semestre seguinte.
A T… comunicará ao Cliente Grossista, no prazo de 30 (trinta) dias após o final de cada semestre, o eventual não cumprimento pelo mesmo, num ou mais locais de entrega, das quantidades mínimas semestrais estabelecidas nas Condições Gerais, que estiverem em vigor em cada momento para cada Distrito onde se encontrem situados o ou os locais de entrega dos Produtos. Nessa comunicação será concedido ao Cliente Grossista um prazo até ao final do semestre que então estiver em curso para que este retome as encomendas médias semestrais nos termos vigentes, sob pena de, não o fazendo, lhe ser comunicada no final do semestre concedido, a cessação imediata dos fornecimentos no ou nos locais de entrega em que se verifique que o Cliente Grossista não atinge a média semestral de quantidades mínimas estabelecidas.
1.1.6. Por forma a acompanhar a evolução do mercado, a T… apurará, no início de cada ano civil, a média semestral de aquisições efectuadas no ano imediatamente anterior pelo Cliente Grossista que, tendo atingido as quantidades mínimas aplicáveis em determinado Distrito, adquiriu menos Produtos em cada local de entrega de cada Distrito.
Para este efeito, nos casos em que o Cliente Grossista disponha de mais do que um local de entrega num determinado Distrito, a média de aquisições semestrais do Cliente Grossista será determinada tendo em consideração, de forma independente, cada um dos locais de entrega do Cliente Grossista existentes nesse Distrito, sem prejuízo do disposto no ponto 1.1.7. seguinte.
A média de aquisições semestrais do Cliente Grossista que, no ano civil precedente, tendo cumprido o disposto no ponto 1.1.4. acima, adquiriu menos Produtos em cada local de entrega situado em cada Distrito, constituirá a média semestral de quantidades mínimas do correspondente Distrito (sujeita ao disposto no ponto 1.1.7. seguinte).
As novas quantidades mínimas semestrais serão aplicáveis a partir do início do segundo semestre do ano civil em que for efectuada a análise.
As quantidades mínimas serão comunicadas aos Clientes Grossistas com uma antecedência de 15 (quinze) dias relativamente à data da sua respectiva entrada em vigor.
…
1.5. Fornecimento
O Cliente Grossista expressa e inequivocamente reconhece que o fornecimento de cigarros pela T… encontra-se sujeito às presentes Condições Gerais, as quais se aplicam por igual e de forma não discriminatória a todos os Clientes Grossistas que pretendam ser por aquela fornecidos.
O Cliente Grossista deverá enviar à T… declaração em como tomou conhecimento das presentes Condições Gerais, cuja minuta se anexa e que constitui o Anexo IV.
…
2.1.3. …
Na data em que…
Sem prejuízo do disposto no ponto 1.1.5. do presente Capítulo III, no final de cada semestre de cada ano civil, e para efeitos de determinação da periodicidade de entregas dos Produtos, a T… fará uma análise das aquisições médias semanais efectuadas pelo Cliente Grossista em cada um dos seus respectivos locais de entrega durante o semestre em causa, por forma a apurar, para o semestre seguinte, a periodicidade das entregas a realizar em cada um dos locais de entrega. Tal periodicidade será comunicada ao Cliente Grossista no prazo de 30 (trinta) dias após o final de cada semestre, sendo aplicável logo que a mesma seja comunicada ao Cliente Grossista.
Para efeitos da determinação das aquisições médias semanais, tomar-se-á em conta a facturação emitida pela T… relativamente a cada local de entrega do Cliente Grossista em causa durante o semestre a que a mesma disser respeito.
No que respeita às aquisições para locais de entrega que venham a ser indicados pelo Cliente Grossista durante um semestre já em curso, as entregas em tais locais só serão consideradas e analisadas no final do semestre seguinte.
…
2.2.2. Descontos Variáveis
…
Sempre que haja alteração frequente dos locais de entrega os descontos comerciais variáveis até então aplicados relativamente ao(s) locai(s) de entrega anteriormente existente(s) à data da mudança manter-se-ão, sendo efectuadas quaisquer eventuais necessárias actualizações apenas no 44º dia útil após o final do semestre em que a mudança tiver lugar.
Os descontos variáveis serão efectuados de acordo com as seguintes condições.
2.2.2.1. Distribuição Directa Activa
…
Para efeitos de determinação do desconto comercial a efectuar relativamente à distribuição directa e activa, após o final de cada semestre civil, a T… fará uma análise da informação enviada por cada Cliente Grossista de acordo com o previsto no ponto 2.2.2.3 relativamente aos respectivos clientes retalhistas que são fornecidos directa e activamente pelo Cliente Grossista. A actualização do desconto comercial variável previsto neste ponto 2.2.2.1. será comunicada ao Cliente Grossista no 39º dia útil e efectivada no 44º dia útil seguintes ao final do semestre em análise.
…
2.2.2.2. Escalões de Volume
Por cada Distrito serão determinados três escalões de volume com base nos seguintes factores:
- O 1º Escalão será determinado dividindo o total de compras anual de cada Distrito pelo número de Clientes Grossistas desse Distrito, sendo o resultado dividido pelo número de semestres civis (2). Este resultado médio semestral será utilizado para determinar os Clientes Grossistas com locais de entrega nesse Distrito cujas aquisições sejam iguais ou superiores ao resultado médio semestral, os quais serão incluídos no 1º escalão de volume.
- O 2º Escalão de Volume será determinado dividindo o número de compras que resulta da subtracção das aquisições dos Clientes Grossistas que se situam no 1º escalão, ao total anual de compras do Distrito em causa pelo número de Clientes Grossistas desse Distrito (subtraindo aqueles que se situam no 1º escalão), sendo o resultado dividido pelo número de semestres civis (2). Este resultado médio semestral será utilizado para determinar os Clientes Grossistas com locais de entrega no dito Distrito cujas aquisições sejam iguais ou superiores ao resultado médio semestral em questão mas inferiores ao resultado do 1º Escalão, sendo esses Clientes Grossistas incluídos no 2º escalão de volume.
- O 3º Escalão de Volume…
A cada escalão de volume…
Com base na facturação emitida pela T…, a T… fará actualizações dos escalões de volume de cada Distrito no final de cada ano civil, o qual será comunicado até ao 30º dia útil após o final do ano civil transacto, reportando os seus efeitos a 1 de Janeiro do ano civil em causa. No final de cada semestre civil, com base nas aquisições efectuadas durante esse semestre civil, a T… analisará em que escalão se incluirá cada Cliente Grossista e, em caso de alteração de escalão, no 39º dia útil após o final de cada semestre, comunicará ao Cliente Grossista qual o escalão em que se situa, sendo o desconto respectivo aplicável no 44º dia útil após o final de cada semestre.
Relativamente aos novos Clientes Grossistas e a novos locais de entrega (que não resultantes de alterações frequentes), a média de encomendas previstas (ponto 1, i) do Capítulo II) será utilizada para a determinação do escalão em que serão incluídos, sendo efectuada uma revisão da situação após decorrido um mês civil de compras e havendo lugar a alteração esta será efectivada no 15º dia útil seguinte ao final desse mês.
2.2.2.3. Informações de Vendas
Cada Cliente Grossista poderá enviar informações de vendas à T… sobre, por um lado, as vendas que o Cliente Grossista efectue de Produtos da T… (apenas cigarros) e, por outro lado, as vendas totais de cigarros efectuadas pelo Cliente Grossista. O Cliente Grossista não deverá enviar de modo discriminado, à T… as vendas que efectuar de cigarros que não sejam comercializados pela T…, mas apenas as vendas totais efectuadas pelo Cliente Grossista a cada retalhista.
Essas informações de vendas servirão, também, para comprovar a prática de distribuição directa e activa do Cliente Grossista e sempre que possível deverão ser enviadas nos seguintes moldes:
a) a informação deve ser enviada através de suporte informático e ser confirmada pelo Cliente Grossista ou respectiva gerência e/ou administração;
b) a informação deve ser mensal e deverá ser entregue à T… trimestralmente, até ao 10º dia útil de cada trimestre civil;
c) a informação deve consistir na indicação do total de vendas das marcas de Produtos da T…, ou, opcionalmente, ordenada por marca de Produtos da T…, e, em qualquer caso, também por ponto de venda (cliente retalhista com venda ao balcão ou através de máquina automática) fornecido directa e activamente pelo Cliente Grossista ou por sociedades participadas pelo Cliente Grossista em mais de 50% do respectivo capital social. Os pontos de venda (cliente retalhista com venda ao balcão ou através de máquina automática exploradas pelo retalhista) fornecidos pelo Cliente Grossista activa e directamente deverão ser identificados através do respectivo número de contribuinte.
Caso o retalhista fornecido pelo Cliente Grossista tenha mais do que um ponto de venda, o Cliente Grossista deverá identificar os vários pontos de venda com um número de ordem ao seu livre critério. As máquinas automáticas da propriedade ou exploradas directamente pelo Cliente Grossista e fornecidos pelo Cliente Grossista activa e directamente deverão ser identificados através de um número de ordem de acordo com o livre critério do Cliente Grossista;
d) A unidade de vendas deverá ser expressa em volumes (cada volume corresponde a dez maços de cigarros).
Pela informação que a T… receber ao abrigo deste ponto 2.2.2.3 a T… concederá um desconto comercial sobre o preço de venda ao público dos Produtos, adicional ao desconto fixo conforme previsto no Anexo VI(D). A informação enviada trimestralmente pelo Cliente Grossista será analisada em cada semestre e o desconto comercial variável, se aplicável, será comunicado ao Cliente Grossista no 39º dia útil e efectivado no 44º dia útil seguintes ao final do semestre em análise.
A informação incorrecta ou incompleta constituirá a T… no direito de não efectuar o pagamento do desconto comercial previsto nos pontos 2.2.2.1 e 2.2.2.3 ou, de descontar eventuais pagamentos anteriormente efectuados com base em tal informação incorrecta ou incompleta em pagamentos seguintes.
A T… obriga-se a manter a informação que receber dos seus Clientes Grossistas estritamente confidencial.
2.3. Factor de Correcção dos Descontos Comerciais.
Sempre que ocorrer um aumento de preços dos Produtos relacionado com alterações aos impostos aplicáveis aos Produtos, será aplicado um factor de correcção dos descontos comerciais concedidos pela T…, consistente num valor expresso em Euros, adicionado ao montante total de cada factura depois de deduzidos todos os descontos comerciais referidos no ponto 2.2.
A fórmula de cálculo do factor de correcção dos descontos comerciais para cada momento e categoria de preços é a constante do Anexo VI (E).
2. …
3.1.3. Considera-se “pagamento a prazo” o pagamento que seja efectuado pelo Cliente Grossista, nos termos referidos no ponto 3.2. do presente Capítulo III e por qualquer dos meios referidos no ponto 3.1.1. do presente Capítulo III:
a) no prazo máximo de 4 (quatro) dias úteis contados a partir da data da entrega dos Produtos;
b) no prazo máximo de 8 (oito) dias úteis contados a partir da data da entrega dos Produtos.
Para efeitos de pagamento a prazo, …
…
3.3. A T… concederá um desconto financeiro de 0,40% ou de 0,20% sobre o valor líquido da factura (ou seja, sobre o valor a pagar pelo Cliente Grossista após a subtracção dos descontos comerciais referidos no ponto 2.2. e adição do factor de correcção referido no ponto 2.3.), ao Cliente Grossista consoante este efectue o pagamento a pronto ou a prazo nos termos da alínea a) do anterior ponto 3.1.3 da totalidade do valor da factura em causa nos termos e condições previstos nas presentes Condições Gerais.
…
4. RESPONSABILIDADE.
4.1. A T… não será responsável pelo não cumprimento pontual das suas obrigações prescritas nestas Condições Gerais, a não ser que tal incumprimento lhe seja imputável a título de negligência grave.
Para este efeito, não se considera existir negligência grave, entre outros casos, sempre que a situação de incumprimento resulte, directa ou indirectamente, de qualquer greve, litígio ou conflito laboral (geral, sectorial ou na própria T…) ou de qualquer escassez de matérias primas ou de transporte, roubo, furto, acidente, distúrbio, tumulto, guerra, incêndio, tempestade ou inundação e ainda recusa das autoridades competentes, seja por que razão for, relativa à introdução no consumo das quantidades solicitadas pela T….
…
5.1. …
d) As encomendas colocadas pelo Cliente Grossista se mostrarem manifestamente desproporcionadas face às quantidades normalmente encomendadas pelo Cliente Grossista, sem qualquer justificação comprovada.
…
6. FORNECIMENTO DE OUTROS PRODUTOS DE TABACO.
Para além de cigarros das marcas listadas no Anexo V, a T… fornece outro tipo de produtos de tabaco, conforme consta também do mesmo Anexo V.
Estes produtos que não cigarros serão fornecidos aos preços e com os descontos indicados no Anexo X. As presentes Condições Gerais aplicam-se a estes produtos que não cigarros, excepto no que respeita aos pontos 1.1.4 a 1.1.7 do Capítulo III, ponto 2.2 (incluindo os pontos 2.2.2.1 a 2.2.2.3) e ponto 2.3 do Capítulo III.
…
8. VIGÊNCIA. ALTERAÇÕES.
As presentes Condições Gerais entram em vigor no dia 1 de Janeiro de 2006 e manter-se-ão em vigor até ao dia 31 de Dezembro de 2007. As presentes Condições Gerais substituem as anteriormente em vigor.
As actualizações resultantes de aumentos de preço entrarão em vigor na data que em cada momento for comunicada pela T….
A T… reserva-se, porém, o direito de efectuar quaisquer alterações às presentes Condições Gerais, no todo ou em parte, com fundamento em cumprimento de obrigação legal ou em caso de alteração de normas jurídicas, ou da sua interpretação, que possam eventualmente ser aplicáveis às presentes Condições Gerais e a situações por estas cobertas.
9…
12 - As Condições Gerais de Fornecimento que estabeleciam a sua entrada em vigor no dia 1 de julho de 2008, na parte em que alteram as condições referidas em 11, são do seguinte teor:
CAPÍTULO I
…
d) …
ii) …
Nestes termos, a prática de distribuição directa implica, por parte do Cliente Grossista, a disponibilidade e utilização de meios humanos e transportes próprios ou subcontratados adequados para a distribuição, dos Produtos encomendados através da pré-venda, auto-venda, tele-venda ou e-venda aos seus clientes retalhistas (com venda ao balcão ou através de máquinas automáticas), incluindo a entrega no estabelecimento dos respectivos clientes retalhistas, que, por sua vez, revendam os Produtos a retalho directamente ao consumidor. A distribuição directa implica, ainda, a facturação directa pelo Cliente Grossista, ou por sociedades por si participadas em mais de 50%, ao seu cliente retalhista.
ii) …
e) ...
f) A T… poderá efectuar auditorias ao Cliente Grossista, através dos seus representantes ou de empresas contratadas pela T… devidamente credenciadas, e sempre na presença do Cliente Grossista, dentro do horário normal de funcionamento do estabelecimento do Cliente Grossista e mediante pré-aviso, para efeitos de comprovar a prática de distribuição directa.
…
CAPÍTULO III
…
2.2.2. Descontos Variáveis
O desconto comercial variável será um desconto a praticar pela T… sobre o preço de venda ao público dos Produtos, em função de escalões de volume.
Sempre que haja alteração frequente dos locais de entrega o desconto comercial variável até então aplicado relativamente ao(s) locai(s) de entrega anteriormente existente(s) à data da mudança manter-se-ão, sendo efectuadas quaisquer eventuais necessárias actualizações apenas no 44º dia útil após o final do semestre em que a mudança tiver lugar.
O desconto variável será efectuado de acordo com as seguintes condições.
2.2.2.1. Escalões de Volume
(anterior 2.2.2.2.)
2.3. Factor de Correcção dos Descontos Comerciais.
…
3.1.1. …
a) por transferência bancária, provada e confirmada, da conta do próprio Cliente Grossista para a conta da T… aberta junto do Banco..., com o NIB …, ou para outra que esta venha a indicar por escrito;
…
3.3. A T… concederá um desconto financeiro de 0,29% ou de 0,10% sobre o valor líquido da factura (ou seja, sobre o valor a pagar pelo Cliente Grossista após a subtracção dos descontos comerciais referidos no ponto 2.2. e adição do factor de correcção referido no ponto 2.3.), ao Cliente Grossista consoante este efectue o pagamento a pronto ou a prazo nos termos da alínea a) do anterior ponto 3.1.3 da totalidade do valor da factura em causa nos termos e condições previstos nas presentes Condições Gerais.
…
6. FORNECIMENTO DE OUTROS PRODUTOS DE TABACO.
Para além de cigarros das marcas listadas no Anexo V, a T… fornece outro tipo de produtos de tabaco, conforme consta também do mesmo Anexo V. Estes produtos que não cigarros serão fornecidos aos preços e com os descontos indicados no Anexo X. As presentes Condições Gerais aplicam-se a estes produtos que não cigarros, excepto no que respeita aos pontos 1.1.4 a 1.1.7 do Capítulo III, ponto 2.2 e ponto 2.3 do Capítulo III.
…
8. VIGÊNCIA. ALTERAÇÕES.
As presentes Condições Gerais entram em vigor no dia 1 de Julho de 2008 podendo a T… alterar, em qualquer momento, total ou parcialmente, os termos das mesmas. Qualquer alteração será comunicada por escrito aos clientes grossistas com uma antecedência de 30 (trinta) dias relativamente à pretendida data de entrada em vigor.
Exceptua-se do disposto no parágrafo anterior, as actualizações resultantes de alterações de preço, que entrarão em vigor na data que em cada momento for comunicada pela T….
A T… reserva-se, porém, …
9. …
13 - As Condições Gerais de Fornecimento que estabeleciam a sua entrada em vigor no dia 1 de julho de 2009 são do seguinte teor:
CONDIÇÕES GERAIS DE FORNECIMENTO POR GROSSO DE PRODUTOS DE TABACO PELA T… (2ª Ré)
A (2ª Ré), adiante designada por “T…”, pelo presente documento estabelece e dá a conhecer aos seus Clientes (conforme abaixo definidos) as suas Condições Gerais de Fornecimento por Grosso de produtos de tabaco por si comercializados (adiante designadas por “Condições Gerais”) para venda no território de Portugal continental, com impostos especiais de consumo pagos.
1. Definições
1.1. “Cliente”: o Cliente deverá ser uma pessoa jurídica, singular ou colectiva, que, cumulativamente, preencha permanentemente os seguintes requisitos:
a) Compre produtos de tabaco por grosso, a título habitual e profissional, em seu próprio nome e por sua conta e risco e que os revenda, de forma activa ou passiva, maioritariamente a utilizadores profissionais, (sendo tais utilizadores adiante designados por “Clientes Retalhistas”), facturando a estes em seu próprio nome, que, por sua vez, os revendam directamente ao consumidor, sempre com impostos especiais de consumo pagos e somente no território de Portugal continental;
b) Esteja colectado na qualidade de comerciante por grosso perante a Administração Fiscal;
c) Abasteça regular e continuamente os seus respectivos Clientes Retalhistas que revendam os produtos de tabaco em Portugal continental apenas.
Para efeitos das presentes Condições Gerais, serão igualmente considerados Clientes as pessoas jurídicas, singulares ou colectivas, que explorem, a título habitual e profissional, em seu próprio nome e por sua conta e risco, máquinas de venda automática de Produtos para revenda directamente ao consumidor, em qualquer caso, sempre com impostos especiais de consumo pagos e somente no território de Portugal continental.
1.2. “Clientes com distribuição activa” e “Clientes com distribuição passiva”:
i) entender-se-á que um Cliente tem distribuição activa quando o mesmo venda directamente e entregue fisicamente as encomendas dos produtos de tabaco nos estabelecimentos dos seus respectivos Clientes Retalhistas, através de meios próprios ou sub-contratados.
ii) entender-se-á que um Cliente tem distribuição passiva quando o mesmo venda directamente os produtos de tabaco em instalações por si geridas ou exploradas aos seus respectivos Clientes Retalhistas.
1.3. “Produtos de tabaco” significa: todos os produtos de tabaco comercializados pela T… e com impostos especiais sobre o consumo pagos, sendo que de ora em diante se designará os cigarros apenas por “Produtos” e os restantes produtos de tabaco também comercializados pela T… por “Outros Produtos de Tabaco”.
1.4. “Locais de entrega” significa: os armazéns, cuja morada é fornecida pelo Cliente, em que deverão ser feitas as entregas dos Produtos, devendo tais locais ser da propriedade do Cliente, por si arrendados ou explorados, e de fácil acesso e parqueamento, tendo em conta os meios de transporte normalmente utilizados para a entrega dos Produtos.
1.5. “Locais de levantamento” significa: o local onde o Cliente procede ao levantamento dos Produtos e que se situam na Rua dos … e na Rua da … ou ainda noutras moradas que a T… venha a indicar por escrito.
1.6. “Pagamento a pronto” significa: o pagamento efectuado pelo Cliente sob condição de que a conta da T… seja creditada até ao 1.º (primeiro) dia útil seguinte ao da entrega ou do levantamento dos Produtos.
1.7. “Pagamento a prazo” significa:
a) O pagamento que seja efectuado pelo Cliente no prazo máximo de 4 (quatro) dias úteis contados a partir da data da entrega ou do levantamento dos Produtos; ou,
b) O pagamento que seja efectuado pelo Cliente no prazo máximo de 8 (oito) dias úteis contados a partir da data da entrega ou do levantamento dos Produtos.
1.8. “Caixas” de Produto significa: unidade mínima de venda de Produtos pela T… (actualmente existem Caixas contendo 10.000 (dez mil) cigarros, 5.000 (cinco mil) cigarros ou 6.000 (seis mil cigarros).
1.9. “Território” significa a zona geográfica correspondente a Portugal continental, ou seja, não abrangendo as regiões Autónomas da Madeira e dos Açores, na qual os produtos de tabaco se destinam a ser comercializados.
2. Formalização das candidaturas a Clientes
2.1. Os candidatos a Clientes que preencham os requisitos indicados no ponto 1.1 anterior deverão informar a T… que pretendem que esta lhes forneça os produtos de tabaco ao abrigo das presentes Condições Gerais, devendo para o efeito enviar à T… os seguintes elementos:
a) Nome completo ou Denominação social;
b) Actividade comercial ou Objecto social;
c) Número de Identificação Fiscal;
d) Morada ou sede social;
e) Cópia do documento de identificação (bilhete de identidade ou passaporte) e do cartão de contribuinte ou de Certidão do Registo Comercial (contendo em anexo o teor integral e actualizado dos estatutos) emitida há menos de 1 (um) ano e do cartão de pessoa colectiva;
f) No caso de o candidato a Cliente ser pessoa colectiva, declaração com identificação completa dos seus actuais sócios/accionistas e representantes (gerentes/administradores, procuradores ou outros), acompanhada de cópias dos documentos de identificação (bilhete de identidade ou passaporte);
g) Declaração indicando o número de trabalhadores do candidato a Cliente;
h) Cópia do comprovativo do número das contas bancárias e respectivos bancos (agência e respectiva morada) do candidato a Cliente que o mesmo tencione usar para efectuar pagamentos à T… ao abrigo das presentes Condições Gerais;
i) Morada completa dos Locais de entrega onde o candidato a Cliente pretende receber os fornecimentos ou indicação dos Locais de levantamento dos Produtos, sendo que neste último caso o Cliente deverá também indicar a morada completa dos armazéns por este utilizados para armazenar os Produtos;
j) Declaração a autorizar a visita ao(s) Local(ais) de entrega ou aos armazéns referidos na alínea anterior por parte de um representante da T…;
l) Demonstração de que possui capacidade financeira, pela apresentação dos seguintes elementos:
i) Referências bancárias favoráveis de, pelo menos, uma instituição de crédito;
ii) Cópia do Balanço e Demonstração de Resultados conforme submetido na “Informação Empresarial Simplificada” do último ano;
iii) Comprovativo da entrega das Declarações para efeitos de liquidação de IRC/IRS relativas ao último ano;
iv) Se o candidato a Cliente tiver iniciado a sua actividade no ano em que apresentar o seu pedido, deverá demonstrar que possui contabilidade organizada e que declarou o início de actividade como comerciante por grosso junto da Administração Fiscal.
m) Indicação se pratica Distribuição activa ou Distribuição passiva, ou qual aquela que pratica de forma principal;
n) Indicação da previsão das encomendas para um período de 3 (três) meses para cada Local de entrega ou Local de levantamento;
o) Indicação quanto à modalidade de pagamento dos Produtos de tabaco pretendida, ou seja, pagamento a pronto ou pagamento a prazo, conforme definidos nos pontos 1.6. e 1.7. das presentes Condições Gerais.
2.2. Após a recepção dos elementos referidos no número anterior e verificação da sua conformidade, a T… informará o candidato a Cliente da sua decisão.
Caso a candidatura seja aceite, o Cliente, no prazo máximo de 30 (trinta) dias a contar da comunicação enviada pela T…, deverá, sob pena de a candidatura se ter por recusada:
(i) Proceder à colocação das suas encomendas;
(ii) Caso o Cliente tenha optado pela modalidade de Pagamento a pronto este obriga-se, por um período inicial de 6 (seis) meses, a efectuar o pagamento de todas as facturas emitidas pela T… previamente à recepção das encomendas por meio de transferência bancária confirmada, nos termos referidos no ponto 11.3., correspondendo tal período ao prazo que a T… considera adequado para poder aferir da capacidade financeira do Cliente e/ou da constância da pontualidade dos pagamentos dos fornecimentos que este lhe efectuar.
(iii) Caso o Cliente tenha optado pela modalidade de Pagamento a prazo deverá entregar à T… uma garantia bancária (elaborada nos termos do Anexo I) emitida por uma entidade considerada aceitável pela T…, que garanta o pagamento do montante que seja por esta indicado.
3. Encomendas.
3.1. As presentes Condições Gerais considerar-se-ão integralmente aceites com a colocação da primeira encomenda de Produtos de tabaco.
3.2. O Cliente deverá adquirir por encomenda uma quantidade mínima de 10 (dez) Caixas completas de Produtos.
3.3. Por razões de eficiência cada Cliente deverá, no mínimo, encomendar 2 (duas) vezes por mês, por cada Local de entrega ou Local de levantamento.
Caso tal não aconteça em dois meses do mesmo trimestre civil, a T… poderá legitimamente recusar o fornecimento de quaisquer Produtos no Local de entrega ou Local de levantamento em causa, notificando o Cliente por escrito de tal decisão no prazo de 30 (trinta) dias após o final do trimestre civil em causa.
3.4. A T…, através do seu serviço telefónico de gestão de vendas, solicitará ao Cliente confirmação das encomendas, até às 13 (treze) horas do dia útil anterior àquele em que o Cliente possa ser fornecido de acordo com o estabelecido nos pontos 4.2. ou 5.
O Cliente poderá igualmente efectuar, nos mesmos termos, a confirmação de encomendas pelo número verde disponibilizado pela T…, junto da sede social da T…, ou em qualquer outro local ou através de qualquer outro contacto que a T… lhe venha a indicar.
3.5. O Cliente obriga-se a aceitar os Produtos de tabaco que encomendar à T…. Se o Cliente, após confirmação, não aceitar os Produtos que tenha encomendado à T…, esta terá direito de recusar quaisquer outros fornecimentos e/ou satisfazer quaisquer outras encomendas efectuadas pelo Cliente, notificando-o por escrito de tal decisão.
4. Transporte.
4.1 Sem prejuízo do disposto nos números seguintes, o Cliente deverá optar por uma das seguintes modalidades de fornecimento de Produtos: com transporte ou sem transporte por parte da T…, correspondendo a cada uma destas modalidades uma Lista de Preços de Venda dos Produtos conforme Anexo II.
4.2. Caso o Cliente tenha optado pela modalidade de fornecimento de Produtos sem transporte, deverá proceder ao levantamento dos Produtos nos Locais de levantamento por si seleccionados, no primeiro dia útil após a colocação das encomendas fazendo-se acompanhar dos respectivos números das notas de encomenda.
4.3. Caso o Cliente tenha optado pela modalidade de fornecimento de Produtos com transporte, o Cliente deverá assegurar que o tempo de espera para descarga dos Produtos no(s) Local(is) de entrega que tenha(m) sido pelo mesmo indicados não ultrapassa os 45 (quarenta e cinco) minutos. Ao fim de 45 (quarenta e cinco) minutos de espera, poderá a T… ou os seus representantes abandonar o local.
4.4. Qualquer alteração relativamente ao Local de entrega dos Produtos deverá ser previamente comunicada pelo Cliente à T…, por escrito e com uma antecedência mínima de 30 (trinta) dias relativamente à data em que pretende que tal alteração seja implementada.
Caso seja um novo Local de entrega, o Cliente deverá informar a T… da previsão das encomendas para um período de 3 (três) meses.
4.5. Caso o Cliente tenha mais do que 6 (seis) Locais de entrega no total, os custos de transporte dos Produtos pela T… para cada um dos Locais de entrega que exceda o número atrás referido ser-lhe-ão imputados, conforme a Lista de Preços de Transporte constante do Anexo III.
4.6. O Cliente poderá alterar a modalidade de fornecimento de Produtos escolhida (com ou sem transporte) no final de cada trimestre civil e desde que notifique a T… por escrito dessa sua intenção com, pelo menos, 30 (trinta) dias de antecedência.
5. Periodicidade de Entregas.
5.1. A periodicidade de entregas da T… por Local de entrega é determinada com base no número total de Caixas compradas nos três meses anteriores à data da entrada em vigor das presentes Condições Gerais, de acordo com a seguinte tabela:
a) Até 845 Caixas - 1 x semana
b) De 846 a 1690 Caixas - 2 x semana
c) De 1691 a 2535 Caixas - 3 x semana
d) De 2536 a 3380 Caixas - 4 x semana
e) De 3381 Caixas ou mais - 5 x semana
5.2. Relativamente a novos Locais de entrega, a frequência de entregas referida no ponto anterior será determinada de acordo com a previsão de encomendas indicada pelo Cliente para um período de 3 (três) meses.
5.3. Se o Cliente necessitar de uma entrega semanal adicional devido a um aumento da procura dos Produtos, informará a T…, por escrito, explicando de forma consubstanciada a razão de tal necessidade. Após análise do pedido a T…comunicará ao Cliente, no prazo de 10 dias após a recepção do pedido, a sua decisão.
6. Recepção dos Produtos.
6.1. O risco de perdas, de destruição e/ou de prejuízos relativamente aos Produtos será transferido para o Cliente no momento em que os Produtos forem entregues pela T… no Local de entrega indicado pelo Cliente ou no momento em que o Cliente proceda ao levantamento dos Produtos no Local de levantamento.
6.2. O Cliente obriga-se a conferir os Produtos no momento do seu levantamento ou entrega, consoante o caso, devendo verificar se os mesmos se encontram em boas condições e se correspondem às quantidades encomendadas, sob pena de se considerarem caducados quaisquer direitos de reclamação do Cliente relativamente aos produtos em causa.
Consequentemente:
a) As faltas notórias (como, por exemplo, a falta de Caixas) deverão ser denunciadas logo no momento do levantamento ou da entrega dos Produtos ao Cliente, consoante o caso;
b) Quaisquer anomalias (sejam defeitos e/ou faltas não notórias) nos Produtos,
deverão ser comunicadas à T… no prazo máximo de 15 (quinze) dias a contar da data da entrega ou do levantamento dos mesmos ao Cliente, acompanhadas dos elementos necessários para as comprovar.
Desde que cumpridas as formalidades acima mencionadas, a T… obriga-se, após comprovação, (i) a suprir quaisquer faltas no prazo de 15 (quinze) dias após a recepção dos elementos que as comprovem; e (ii) a emitir uma nota de crédito no valor e quantidade dos Produtos com anomalias.
7. Armazenagem.
Dada a natureza e as características dos Produtos, a T… recomenda ao Cliente que os mesmos sejam armazenados em instalações que assegurem capacidade suficiente, boas condições de segurança, temperatura, humidade e higiene, de acordo com as seguintes recomendações de armazenamento:
i) Os cigarros deverão ser manuseados cuidadosamente, de modo a evitar danos nas embalagens.
ii) Deverá ser aplicada a regra FIFO (first in first out), ou seja, os Produtos que entrem em primeiro lugar no armazém devem ser fornecidos aos respectivos clientes antes daqueles que forem recebidos posteriormente.
iii) Não é aconselhável empilhar mais de 10 Caixas.
iv) Os produtos de tabaco devem ser armazenados longe de produtos líquidos ou voláteis ou que libertem cheiros ou inflamáveis.
8. Acordo celebrado entre a Comissão Europeia e a PM….
O Acordo de Anti-Contrabando e Anti-Contrafacção celebrado entre a Comissão Europeia e a P…, o qual foi também assinado pelo Estado Português, representado pelo Ministro das Finanças, implica que a T… tenha que adoptar certos procedimentos e regras nas relações comerciais com os seus Clientes, sendo os seguintes parágrafos um reflexo destes.
8.1. O Cliente obriga-se a revender os Produtos apenas na sua apresentação original, não podendo de modo algum, introduzir qualquer alteração nas embalagens dos Produtos, remover ou eliminar quaisquer elementos nelas apostos, nem alterar quaisquer características dos próprios Produtos.
O Cliente não poderá, em geral, praticar quaisquer actos ou omissões prejudiciais às marcas dos Produtos.
8.2. O Cliente compromete-se a cumprir as presentes Condições Gerais e a legislação que lhe seja aplicável, nomeadamente a legislação fiscal e aduaneira relativa aos Produtos e a legislação sobre branqueamento de vantagens de proveniência ilícita, quando proceder à revenda dos Produtos e, bem assim,
(i) a não revender os Produtos a quaisquer pessoas ou entidades relativamente às quais se demonstre, ainda que de forma indiciária, estarem envolvidas, directa ou indirectamente, na comercialização ilícita dos Produtos e (ii) a não revender os Produtos a quem faça encomendas em quantidades que razoavelmente excedam a normal e legítima procura dos Produtos.
O Cliente compromete-se, ainda, a cooperar com as autoridades públicas em qualquer investigação conexa com comercialização ilícita de Produtos, devendo informar a T… de qualquer situação ilícita envolvendo os Produtos que chegue ao seu conhecimento.
8.3. O Cliente reconhece e aceita a intenção da T… no sentido de cooperar com as autoridades competentes em quaisquer inquéritos ou investigações referentes a importação, transporte ou comércio ilegal dos Produtos e expressamente autoriza a T… a divulgar os termos e condições de qualquer venda de Produtos ao Cliente se tal lhe for solicitado pelas autoridades competentes.
8.4. O Cliente reconhece e aceita que a T… tem o direito de suspender ou recusar quaisquer fornecimentos dos Produtos ao Cliente, se (i) este não cumprir o estabelecido nas presentes Condições Gerais, (ii) este demonstrar estar envolvido, directa ou indirectamente, na comercialização ilícita de Produtos e/ou em qualquer actividade de branqueamento de vantagens de proveniência ilícita, (iii) receber um pedido legítimo de uma autoridade governamental com esse objectivo, e no caso (iv) das encomendas colocadas pelo Cliente se mostrarem manifestamente desproporcionadas face às quantidades normalmente encomendadas pelo Cliente ou expectáveis tendo em consideração os seus Clientes Retalhistas, sem que qualquer justificação objectiva seja dada pelo Cliente quanto a tal acréscimo, sendo que o Cliente reconhece e aceita ainda que, caso alguma das situações acima referidas ocorra, este não terá direito a qualquer indemnização.
8.5. Para os efeitos do estabelecido na alínea (ii) do ponto anterior considera-se estar suficientemente demonstrado o envolvimento do Cliente nas actividades ali indicadas se for proferida sentença judicial que condene o Cliente pela prática de tais ilícitos ou que reconheça o envolvimento do Cliente em tais actividades.
8.6. Se o Cliente receber da T… um pedido para cessar o fornecimento de Produtos a um seu Cliente Retalhista devido a um envolvimento deste na comercialização ilegal de cigarros, atenderá a esse pedido em boa fé e agirá em conformidade, reconhecendo o direito e o interesse da T… em tomar medidas para assegurar que os seus produtos não sejam desviados para canais ilegais.
8.7. Na eventualidade de a T… vir a ser responsabilizada pelo pagamento de quaisquer prejuízos, danos, custos ou indemnizações decorrentes do incumprimento, atraso no cumprimento ou cumprimento defeituoso, negligente ou intencional, pelo Cliente, das obrigações relativas às relações deste com os seus Clientes Retalhistas, nomeadamente as previstas no ponto 8.2., o Cliente deverá indemnizar a T… nas quantias referidas, sem prejuízo do direito geral de indemnização pelos danos causados à T…, nos termos gerais de direito e, bem assim, do direito de a T… recusar, de imediato, quaisquer encomendas do Cliente.
8.8. A T… poderá, a todo o tempo, solicitar ao Cliente elementos demonstrativos de que possui capacidade financeira para cumprir as suas obrigações perante a T…, nestes se incluindo designadamente os elementos referidos no ponto 8.10.
8.9. O Cliente obriga-se ainda a enviar à T…, até à data limite de 31 de Janeiro, a sua previsão anual de vendas para o mesmo ano.
8.10. Sem prejuízo do disposto nos pontos anteriores, o Cliente deverá enviar à
T… até ao dia 30 (trinta) de Setembro (ou, se o ano social ou fiscal do Cliente não coincidir com o ano civil, até 60 (sessenta) dias após apresentação da declaração para efeitos de IRC/IRS):
a) Referências bancárias favoráveis actuais de, pelo menos, uma instituição de crédito;
b) Cópia do Balanço e Demonstração de Resultados conforme submetido na “Informação Empresarial Simplificada” do último ano;
c) Comprovativo da entrega da Declaração para efeitos de liquidação de IRC/IRS relativa ao último ano.
Caso não seja possível a apresentação de qualquer dos documentos acima mencionados nas anteriores alíneas a), b) ou c), o Cliente deverá entregar uma declaração à T… com indicação detalhada das razões que o impedem de o fazer.
8.11. O Cliente deverá notificar a T… logo que ocorra alguma alteração aos elementos referidos no ponto 2.1. da presentes Condições Gerais, incluindo, nomeadamente, a cessação ou mudança de actividade, o trespasse de qualquer estabelecimento comercial do Cliente ou qualquer alteração directa ou indirecta na titularidade do capital social ou nos respectivos representantes, bem como, no caso de pessoa colectiva, qualquer alteração no contrato de sociedade ou qualquer outro facto sujeito a registo. A referida documentação deverá ser acompanhada dos documentos necessários para evidenciar as alterações em causa.
8.12. Caso o entenda necessário, nomeadamente quando existam suspeitas ou indícios do não cumprimento por parte do Cliente de alguma obrigação imposta por lei, a T… poderá ainda solicitar o certificado de registo criminal do Cliente que exerça a sua actividade individualmente ou, se este for uma pessoa colectiva, dos respectivos sócios ou accionistas, membros dos órgãos sociais ou representantes, obrigando-se o Cliente a fornecer prontamente tal informação à T….
8.13. O Cliente autoriza, os representantes da T… (ou os representantes das empresas que sejam contratadas pela T… para o efeito e que se encontrem devidamente credenciados), a vistoriar, durante as horas de expediente, todos os seus armazéns nos quais proceda à armazenagem de Produtos, através de leituras electrónicas dos códigos apostos nas respectivas embalagens, tendo em vista a identificação e a rastreabilidade dos Produtos, por forma a permitir uma maior protecção dos seus Produtos do comércio ilegal.
8.14. A T… analisa anualmente as informações prestadas pelo Cliente ao abrigo das presentes Condições Gerais, sendo que a falta de envio à T…, sem justificação, das informações que sejam solicitadas ao abrigo das mesmas constituirá justo fundamento de recusa de fornecimento de Produtos pela T….
Neste caso, a T… comunicará ao Cliente a falta verificada, concedendo-lhe um prazo de 30 (trinta) dias para remediar essa situação e preencher o requisito em falta, sob pena de, não o fazendo, a T… poder cessar de imediato o fornecimento dos Produtos.
9. Tratamento de dados.
9.1. O Cliente expressa e inequivocamente autoriza a T… a, no âmbito das presentes Condições Gerais, recolher e proceder a outras formas de tratamento, automatizado ou não, parcial ou totalmente, dos dados pessoais relativos ao Cliente para fins relacionados com as presentes Condições Gerais ou para fins relativos às actividades compreendidas no objecto, social ou de facto, da T…, incluindo, nomeadamente, o fornecimento de produtos de tabaco comercializados pela T…, o processamento de pagamentos e a cobrança dos mesmos.
9.2. A T… poderá igualmente utilizar os dados pessoais que lhe sejam fornecidos nos termos das presentes Condições Gerais relativos ao Cliente e aos membros dos seus órgãos sociais, seus empregados e outros funcionários, com vista à realização de contactos comerciais correntes, envio de informação comercial ou promocional, realização de acções de formação ou outros eventos ou iniciativas destinados aos seus Clientes.
O Cliente poderá exercer a todo o tempo o seu direito de oposição em relação ao tratamento dos seus dados para as finalidades previstas no presente número.
9.3. O Cliente presta o seu consentimento expresso e inequívoco à transmissão, pela T…, dos dados pessoais referidos nos números anteriores para empresas que com ela se encontrem coligadas ou participem, directa ou indirectamente, no seu capital social.
Esta autorização inclui a transmissão de dados para empresas situadas nos Estados Unidos da América e na Suíça.
9.4. A T… compromete-se a facultar ao Cliente e aos membros dos seus órgãos sociais, seus empregados e outros funcionários, cujos dados sejam ou venham a ser sujeitos a tratamento nos termos do presente ponto 9., a possibilidade de, a todo o tempo, aceder aos dados que lhes respeitem e solicitar a sua correcção, nos termos legais, mediante solicitação escrita dirigida à T…, comprometendo-se ainda o Cliente em cumprir toda a legislação relativa ao tratamento e transmissão de dados pessoais constantes do presente ponto 9.
9.5. O não fornecimento dos dados para as finalidades previstas no ponto 9.1. acima poderá determinar a impossibilidade de realização dos fornecimentos.
9.6. O Cliente poderá sempre exercer o seu direito de oposição ao abrigo do artigo 12º da Lei n.º 67/98.
9.7. A T… poderá proceder ao tratamento dos dados referidos no presente ponto 9., para as finalidades nele previstas e comunicar, nos termos da lei, quaisquer informações relativas ao fornecimento de Produtos ao Cliente, no seguimento de solicitação legítima de autoridades públicas, fiscais, policiais ou judiciais.
10. Condições Comerciais.
10.1. As Tabelas de Preços de Venda dos Produtos da T… são as que constam no Anexo II às presentes Condições Gerais, podendo a T… alterar a qualquer momento as referidas Tabelas.
10.2. Caso o Cliente tenha optado pela modalidade de pagamento a prazo, nos termos das alíneas a) ou b) do ponto 1.7., irá acrescer ao preço total dos Produtos constante da factura um montante correspondente a 0,10 % (zero vírgula dez por cento) ou 0,29 % (zero vírgula vinte e nove por cento) do referido preço, respectivamente.
As percentagens ora referidas constam igualmente na Tabela de Preços de Venda dos Produtos contida no Anexo II.
10.3. Em caso de alteração das Tabelas de Preços de Venda dos Produtos constantes do Anexo II, a T… notificará o Cliente, com pelo menos 5 (cinco) dias úteis de antecedência relativamente à sua entrada em vigor, enviando-lhe o Anexo II devidamente alterado.
11. Condições Financeiras.
11.1. O Cliente poderá efectuar os seus pagamentos nas seguintes modalidades:
(i) Pagamento a pronto ou
(ii) Pagamento a prazo.
Caso pretenda alterar a modalidade de pagamento escolhida, o Cliente deverá informar a T… com pelo menos 5 (cinco) dias úteis de antecedência.
11.2. Caso opte pelo pagamento a prazo, o Cliente deverá entregar à T… uma garantia bancária idónea e à primeira interpelação (elaborada nos termos do Anexo I), a qual poderá ser aceite pela T… de acordo com o seu livre critério. O montante da garantia bancária será informado pela T… ao Cliente.
11.3. Os pagamentos poderão apenas ser efectuados por transferência bancária, provada e confirmada, de uma das contas do próprio Cliente já indicada nos termos da alínea h) do ponto 2.1. para a conta da T… aberta junto do Banco …, com o NIB …, ou para outra que esta venha a indicar por escrito sob condição de que, no próprio dia da transferência, seja enviada à T… cópia do processamento pelo banco da ordem de transferência.
11.4. O Cliente deverá efectuar todos os pagamentos à T… em seu próprio nome, através de uma das contas bancárias indicadas pelo Cliente, na moeda e quantia exacta constantes da respectiva factura, não sendo admissíveis pagamentos por parte de terceiros e/ou pagamentos de quantias superiores às que constarem na respectiva factura. O Cliente apenas poderá utilizar um único meio de pagamento relativamente a cada factura emitida pela T…., não sendo admitidos pagamentos múltiplos, ou seja, por cada factura apenas poderá ser efectuada uma única transferência bancária para a T….
11.5. A T… terá o direito de recusar encomendas e/ou suspender imediatamente todas as entregas e/ou anular as encomendas em curso e/ou a exigir o pagamento de todas as facturas não pagas, ainda que não vencidas, cujo pagamento se tornará imediatamente exigível, e/ou de exigir o pagamento antecipado ou a prestação de garantia bancária relativamente a encomendas futuras sempre que a T… vier a considerar, justificadamente, que há risco de pagamento não pontual e/ou se o Cliente:
a) Pagar, ainda que pontualmente, uma ou mais facturas vencidas emitidas pela T…. em desrespeito do estabelecido nos pontos 11.1 a 11.4., podendo a T… considerar tal pagamento como não efectuado; ou
b) Não pagar pontualmente uma ou mais facturas vencidas; ou
c) Entrar em liquidação, voluntária ou judicial, for declarado insolvente, for objecto de acordo de credores ou de transferência de património em benefício destes, lhe for instaurada acção de insolvência, voluntária ou não, lhe for nomeado administrador judicial do seu património, apresentar, ou seja apresentado por qualquer credor, requerimento para procedimento extrajudicial de conciliação para viabilização de empresas (previsto no Decreto-Lei n.º 316/98, de 20 de Outubro) e/ou se, por qualquer motivo, suspender ou cessar a sua actividade.
11.6. A falta de pagamento pontual de qualquer factura constituirá o Cliente na obrigação de pagar, para além do montante do capital devido, todas as despesas (bancárias ou outras) incorridas pela T…, bem como os juros de mora calculados à taxa legal que estiver em vigor para dívidas comerciais, contados desde o dia do vencimento até à data do efectivo pagamento.
11.7. A T… poderá imputar os pagamentos efectuados pelo Cliente, sucessivamente,
(i) a todas e quaisquer despesas (bancárias ou outras) por si suportadas
relacionadas com a mora nos pagamentos,
(ii) aos juros de mora devidos e, só depois,
(iii) ao capital em dívida.
Os pagamentos de capital em dívida serão sempre imputados às facturas vencidas há mais tempo.
11.8. Caso ocorra qualquer uma das situações previstas no ponto 11.5., e ainda que tenham sido pagas pelo Cliente todas as quantias em dívida nos termos dos pontos 11.6. e
11.7., a T…, de acordo com o seu livre critério, poderá recusar novos fornecimentos de Produtos ao Cliente, ou, previamente à realização de novas entregas de Produtos, exigir ao Cliente:
a) A entrega à T… de uma garantia bancária à primeira interpelação, elaborada nos termos precisos do Anexo I; ou
b) O pagamento prévio dessas entregas (ou seja, no dia da encomenda) por transferência bancária confirmada, nos termos e condições referidos no ponto 11.3.
12. Responsabilidade.
A T… não será responsável pelo incumprimento, pelo atraso no cumprimento ou pelo cumprimento defeituoso das obrigações que para si resultam das presentes Condições Gerais, salvo se lhe forem imputáveis a título de dolo ou de negligência grosseira. Para este efeito, não se considera existir dolo ou negligência grosseira, entre outros casos, se o incumprimento, o atraso no cumprimento ou o cumprimento defeituoso resultarem, directa ou indirectamente, de qualquer greve, litígio ou conflito laboral (geral, sectorial ou na própria T…) ou de qualquer escassez de matérias-primas ou de transporte, roubo, furto, acidente, distúrbio, tumulto, guerra, incêndio, tempestade ou inundação, ou, ainda, de recusa das autoridades competentes, seja por que razão for, relativa à introdução no consumo das quantidades solicitadas pela T….
13. Recusa de Encomendas.
13.1. Sem prejuízo do previsto nas demais disposições das presentes Condições Gerais, a T… terá o direito de recusar quaisquer encomendas do Cliente, sem que este tenha, por esse motivo, direito a qualquer indemnização, no caso de parte substancial dos bens do Cliente for objecto de penhora, arresto ou qualquer outra providência cautelar ou medida decretada por tribunal ou autoridade que o impeça de dispor livremente dos seus bens, e tal situação se mantiver por mais de 30 (trinta) dias.
13.2. A T… poderá recusar fornecer o Cliente se este não preencher ou se, em qualquer momento, deixar de preencher todos os requisitos referidos no ponto 1.1. das presentes Condições Gerais.
Neste caso, a T… comunicará ao Cliente a falta verificada, concedendo-lhe um prazo de 30 (trinta) dias para remediar essa situação e preencher o requisito em falta, sob pena de, não o fazendo, a T… poder cessar de imediato o fornecimento dos Produtos.
14. Fornecimentos de Outros Produtos de Tabaco.
Para além dos Produtos, a T… fornece Outros Produtos de Tabaco (que não cigarros), indicados no Anexo II, no qual consta a respectiva Tabela de Preços de Venda. As presentes Condições Gerais aplicam-se igualmente ao fornecimento de Outros Produtos de Tabaco pela T… sempre que a natureza das suas provisões não seja incompatível com o fornecimento deste tipo de produto de tabaco.
15. Âmbito de Aplicação das Presentes Condições Gerais.
As presentes Condições Gerais aplicam-se a todos os Clientes da T… que preencham os requisitos exigidos para que possam ser fornecidos de produtos de tabaco ao abrigo do disposto nas presentes Condições Gerais.
16. Vigência e Alterações.
16.1. As presentes Condições Gerais vigoram pelo prazo de 1 (um) ano, com início no dia 1 de Julho de 2009 e expressamente revogam quaisquer outras condições gerais de fornecimento de produtos de tabaco pela T… eventualmente existentes.
16.2. Sem prejuízo do estabelecido no ponto 10.1., a T… poderá efectuar unilateralmente alterações às presentes Condições Gerais, sempre que tal se revelar necessário ou conveniente ao cumprimento, pela T…, de qualquer obrigação legal e/ou administrativa a que esta se encontre ou venha a estar sujeita ou em caso de alteração ou publicação de quaisquer disposições legais e/ou administrativas, ou da sua interpretação, que possam ser aplicáveis às presentes Condições Gerais e/ou a quaisquer situações por estas reguladas.
Considera-se que tais alterações são aceites pelo Cliente a partir da data em que o mesmo coloque encomendas de Produtos de tabaco à T… após a recepção das alterações em causa.
17. Jurisdição
Qualquer questão ou litígio emergente da aplicação ou interpretação das presentes Condições Gerais será dirimido de acordo com a Lei Portuguesa e será submetido ao Tribunal Cível da Comarca de Lisboa, foro que o Cliente e a T… elegem com expressa renúncia a qualquer outro.”
14 - As Condições Gerais de Fornecimento que estabeleciam a sua entrada em vigor no dia 1 de outubro de 2010, na parte em que alteram as condições referidas no ponto 13, são do seguinte teor:
1.5. “Locais de levantamento” significa: o local onde o Cliente procede ao levantamento dos Produtos e que se situam na P… e na Rua da … ou ainda noutras moradas que a T… venha a indicar por escrito.
1.6. “Pré-pagamento” significa: o pagamento efectuado pelo Cliente sob condição de que, até ao último dia útil anterior ao da entrega ou do levantamento dos Produtos, seja enviada à T… cópia do comprovativo do processamento pelo Banco da ordem de transferência. A opção de Pré-pagamento apenas será admitida através de transferência bancária.
1.7 “Pagamento a pronto” significa: o pagamento efectuado pelo Cliente sob condição de que, até ao primeiro dia útil seguinte ao da entrega ou do levantamento dos Produtos seja enviada à T… cópia do comprovativo do processamento pelo Banco da ordem de transferência ou do comprovativo do depósito do cheque.
1.8. (anterior 1.7.)
1.9. (anterior 1.8.)
1.10. “Palete” Unidade de transporte de carga que permite eficiências ao nível de transporte, movimentação e armazenamento, compreendida por um determinado número de Caixas da mesma referência de Produtos de Tabaco, agrupadas numa plataforma, actualmente com as dimensões standard de 1000 mm por 1200 mm (ISO 6780). As paletes dos diversos Produtos de Tabaco encontram-se especificadas no Anexo III.
1.11 (anterior 1.9.)
…
2.1…
o) Indicação quanto à modalidade de pagamento dos Produtos de tabaco pretendida, ou seja, pré-pagamento, pagamento a pronto ou pagamento a prazo, conforme definidos nos pontos 1.6. e 1.7. e 1.8 das presentes Condições Gerais.
…
3.3. Cada Cliente deverá, no mínimo, encomendar 1 (uma) vez por semestre civil, por cada Local de entrega ou Local de levantamento.
Caso o Cliente não encomende pelo menos uma vez por semestre civil por cada Local de entrega ou Local de levantamento, a T… poderá legitimamente recusar o fornecimento de quaisquer Produtos no Local de entrega ou Local de levantamento em causa, notificando o Cliente por escrito de tal decisão no prazo de 30 (trinta) dias após o final do semestre civil em causa.
Decorrido o referido prazo, o Local de entrega ou Local de levantamento será bloqueado no sistema da T… e de forma a poder voltar a ser fornecido pela T…. no referido Local de entrega ou Local de levantamento, o Cliente deverá informar a T… em conformidade, nos termos do ponto 4.4 das presentes Condições Gerais.
Caso o Cliente não encomende em nenhum dos seus Locais de entrega ou Locais de levantamento, o Cliente será bloqueado no sistema e para ser novamente abastecido pela T…, este deverá voltar a formalizar a sua candidatura, nos termos do ponto 2 das presentes Condições Gerais.
…
4.5. (anterior 4.6.)
…
5.2. Relativamente a novos Locais de entrega, a frequência de entregas referida no ponto anterior será determinada de acordo com a previsão de encomendas indicada pelo Cliente para um período de 3 (três) meses.
Após o termo deste período, a frequência das entregas será determinada de acordo com o número total de Caixas efectivamente compradas nos referidos 3 (três) meses anteriores.
…
8.13. O Cliente autoriza, os representantes da T… (ou os representantes das empresas que sejam contratadas pela T… para o efeito e que se encontrem devidamente credenciados), a vistoriar, durante as horas de expediente, todos os seus armazéns nos quais proceda à armazenagem de Produtos, através de leituras electrónicas dos códigos apostos nas respectivas embalagens, tendo em vista exclusivamente a identificação e a rastreabilidade dos Produtos, por forma a permitir uma maior protecção dos seus Produtos do comércio ilegal.
…
10.2. Caso o Cliente tenha optado pela modalidade de pagamento a prazo, nos termos das alíneas a) ou b) do ponto 1.8., irá acrescer ao preço total dos Produtos constante da factura um montante correspondente a 0,10 % (zero vírgula dez por cento) ou 0,29 % (zero vírgula vinte e nove por cento) do referido preço, respectivamente. As percentagens ora referidas constam igualmente na Tabela de Preços de Venda dos Produtos contida no Anexo II.
10.3. No caso de o Cliente, numa mesma encomenda, optar pela aquisição de uma Palete completa da mesma referência de Produtos de Tabaco, terá direito a um desconto adicional, conforme referido no Anexo III.
10.4 (anterior 10.3.)
11. Condições Financeiras.
11.1. O Cliente poderá efectuar os seus pagamentos nas seguintes modalidades:
(i) Pré-pagamento,
(ii) Pagamento a pronto ou
(iii) Pagamento a prazo.
Caso pretenda alterar a modalidade de pagamento escolhida, o Cliente deverá informar a T… com pelo menos 5 (cinco) dias úteis de antecedência.
…
11.3. Os pagamentos poderão apenas ser efectuados:
a) (anterior 11.3.)
b) por depósito directo, provado e confirmado, na conta bancária da T… referida na alínea a) anterior, de cheque cruzado emitido pelo próprio Cliente à ordem da T…, sob condição de que seja no próprio dia enviado à T…, após depósito, cópia do cheque depositado e do respectivo comprovativo de depósito;
11.4. O Cliente deverá efectuar todos os pagamentos à T…em seu próprio nome, através de uma das contas bancárias indicadas pelo Cliente, na moeda e quantia exacta constantes da respectiva factura, não sendo admissíveis pagamentos por parte de terceiros e/ou pagamentos de quantias superiores às que constarem na respectiva factura. O Cliente apenas poderá utilizar um único meio de pagamento relativamente a cada factura emitida pela T…, não sendo admitidos pagamentos múltiplos, ou seja, por cada factura apenas poderá ser emitido um único cheque cruzado ou efectuada uma única transferência bancária. O Cliente poderá utilizar também um único meio de pagamento relativamente a um grupo de facturas que se vençam no mesmo de dia.
11.5. Sempre que o Cliente proceda a pagamentos através de transferência bancária (Pagamentos a pronto ou a prazo) terá direito a um desconto adicional correspondente a 0,05% (zero vírgula zero cinco por cento) do valor total da factura.
11.6 Caso o Cliente opte pela modalidade de Pré-pagamento, terá direito a um desconto adicional correspondente a 0,15% (zero vírgula quinze por cento) do valor total da factura.
11.7 (anterior 11.5.)
11.8. (anterior 11.6.)
11.9. (anterior 11.7.)
11.10. Caso ocorra qualquer uma das situações previstas no ponto 11.7., e ainda que tenham sido pagas pelo Cliente todas as quantias em dívida nos termos dos pontos 11.8. e 11.9., a T…, de acordo com o seu livre critério, poderá recusar novos fornecimentos de Produtos ao Cliente, ou, previamente à realização de novas entregas de Produtos, exigir ao Cliente:
…
16.1. As presentes Condições Gerais vigoram pelo prazo de 1 (um) ano, com início no dia 01 de Outubro de 2010 e expressamente revogam quaisquer outras condições gerais de fornecimento de produtos de tabaco pela T… eventualmente existentes.
…
15 - As AA. compram por grosso às … (RR) produtos de tabaco.
16 - Os AA. atuam por conta própria, assumindo o risco da comercialização.
17 - Desde 2000, os AA. e outros grossistas em condições semelhantes participaram em campanhas de incentivos promovidas pela …. R, e a seu pedido: a campanha de incentivos integrada; a campanha na crista da onda; o programa descobrir novos horizontes; o programa aliança … 2000 - ao encontro de Portugal, o programa Aliança 2001 - descobrir Portugal, a promoção Rotas V…., a promoção M… Team e a promoção … Duopack.
18 - Os AA. manifestaram à R. (1ª) a sua oposição à introdução do “Fator de Correção”, tendo recusado a assinar as Condições Gerais que lhes foram apresentadas pelas (RR) desde a introdução do “Fator de Correção”.
19 - Até esse momento a aceitação das Condições Gerais realizava-se pela assinatura de um documento que era enviado aos AA e que continha as Condições Gerais em anexo.
20 - Nas condições que iniciariam vigência em janeiro de 2006, a R. (1ª) solicitou aos AA. que assinassem o Anexo IV às Condições Gerais do qual consta o seguinte:
“Declara ter tomado conhecimento dos termos e condições constantes das Condições Gerais de Fornecimento de Cigarros pela T… a Grossistas que pratiquem Distribuição Directa”.
21 - A declaração referida no ponto 20 também existia no Anexo IV das condições referidas no ponto 12.
22 - Após a cisão na T…, a oposição à introdução do fator de correção foi apresentada pelos AA. aos responsáveis da (2ª) R….
23 - As RR. executaram as CGF referidas no ponto 13 como se elas tivessem sido aceites.
24 - Alguns AA., nas encomendas que efetuaram desde as CGF referidas no ponto 13, ressalvaram expressamente a sua não aceitação, tendo emitido e enviado à R. (2ª) notas de débito quantificadoras dos seus prejuízos.
25 - Os AA. afirmaram expressamente à T…, na pessoa do seu Diretor Comercial, por comunicações escritas e orais, que não estavam de acordo com a alteração de julho de 2009.
26 - Nas faturas emitidas no ano 2005, o desconto dos grossistas era calculado com uma percentagem máxima de 8,62%, resultante da adição de todos os descontos então em vigor, sobre o preço de venda ao público de todos os produtos cigarros da T…, à qual acrescia um desconto de pronto pagamento de 0,29% sobre o valor total da fatura.
27 - Nas faturas emitidas no ano 2006, o desconto era calculado com uma percentagem máxima de 8,62%, resultante da adição de todos os descontos então em vigor, sobre o preço de venda ao público de todos os produtos cigarros da T…, à qual acrescia um desconto de pronto pagamento de 0,40% ou de 0,20% sobre o valor total da fatura.
28 - A esse valor, e na fatura, a R. (1ª) passou a debitar, a partir de 1 de janeiro de 2006, por cada 1000 cigarros (cinco volumes), um valor, chamado “Fator de Correção”, que variava entre 1,08 euros e 1,12 euros, conforme a Tabela de Fatores de Correção de 2006 e a Tabela de Preços de 2006.
29 - Esse Fator de Correção consiste na aplicação de uma fórmula constante de um anexo às Condições referidas no ponto 11 do seguinte teor:
“O Factor de Correcção i+1 é um valor em Euros por mil cigarros e é calculado em duas etapas:
1. Determinar o aumento mínimo de preço (ΔPmin) necessário para cobrir o aumento de impostos e manter a Margem Bruta:
ΔPmin em €/maço =
2. A seguinte fórmula do Factor de Correcção será aplicada ao número mais baixo de entre o aumento efectivo de preço (ΔPef) e o aumento mínimo de preço (ΔPmin) necessário para cobrir o aumento de impostos:
• Se ΔPef<ΔPmin:
Factor Correcção i+1 em €/’000 cigarros =
• Se ΔPef>ΔPmin:
Factor Correcção i+1 em €/’000 cigarros =
Onde:
• PVP = Preço de Venda ao Público em €/maço
• IVA = Imposto sobre Valor Acrescentado, nominal, em %
• AdV = Imposto Ad Valorem em %
• Esp = Imposto Específico em €/’000 cigarros
• DC = Desconto Comercial individual em %
• como o cálculo do IVA efectivo em %
• como a variação do IVA efectivo em %
• como a variação do Ad Valorem em %
• como a variação do Específico em €/’000 cigarros
• i = 1,2,3,… como diferentes momentos no tempo
O primeiro cálculo do Factor de Correcção será baseado no momento i=1 que corresponde à situação de impostos e preços em vigor em Junho de 2005, nomeadamente:
• IVA nominal = 19%
• Ad Valorem = 23%
• Específico = 46.33€/’000 cigarros
• DC entre o mínimo de 5.45% e o máximo de 8.62%
O Factor de Correcção deverá ser aplicado, cumulativamente, sempre que ocorrerem alterações nos preços praticados pela T… relacionadas com aumento de impostos.
O valor mínimo do Factor de Correcção será sempre 0 (zero).
Será aplicado um Factor de Correcção por categoria de preços; no caso de lançamento de um novo Produto ou do reposicionamento de um Produto já existente, o Factor de Correcção será aquele aplicável à correspondente categoria de preços.
Poderão, no entanto, ocorrer as seguintes situações transitórias:
(a) Os preços não são alterados imediatamente após a entrada em vigor de um aumento de impostos. Neste caso não será calculado um novo Factor de Correcção até que ocorra uma alteração de preços;
(b) Os preços são alterados após um anúncio de aumento de impostos, mas antes da sua entrada em vigor. Neste caso não será calculado um novo Factor de Correcção até à entrada em vigor do aumento de impostos;
(c) Os preços são alterados faseadamente, em diversas ocasiões, antes ou após a entrada em vigor de um aumento de impostos. Neste caso, se a primeira alteração de preços for menor que o aumento mínimo de preços necessário para cobrir o aumento de impostos, o Factor de Correcção será considerado transitório até que se verifique uma nova alteração de preços suficiente para alcançar o aumento mínimo de preços.
Dado que o resultado da fórmula acima indicada depende do Desconto Comercial individual e dos diferentes PVP’s, poderão existir diferentes Factores de Correcção para cada grossista e categoria de preços.
O Factor de Correcção aplicável em resultado da fórmula descrita acima será indicado em cada factura da T…”.
30 - O Fator de Correção referido no ponto 28 foi apresentado aos AA.
31 - Por carta datada de 30 de novembro de 2007, a T… comunicou aos AA. que as condições referidas no ponto 11 continuariam em vigor até 30 de junho de 2008.
32 - Nas faturas emitidas no ano 2007, o desconto comercial era calculado com base numa percentagem de 8,62% sobre o PVP de todos os produtos cigarros e, sobre este valor, incidia um Fator de Correção que variava entre 1,95 euros e 2,00 euros por 1000 cigarros (cinco volumes), sendo o desconto de pronto pagamento de 0,40% sobre o valor total da fatura, depois de aplicado o Fator de Correção.
33 - Por carta datada de 29 de janeiro de 2008, a T… comunicou aos AA. a modificação do Fator de Correção, passando este a variar de 2,87 euros a 2,92 euros por 1000 cigarros (cinco volumes).
34 - Conforme Anexo VI das CGF referidas no ponto 12, o Desconto Comercial Fixo passou a ser de 7,97% sobre o preço de venda ao público, acrescido de 0,76% para os Grossistas do Primeiro Escalão.
35 - Por carta datada de 18 de fevereiro de 2009, a T… comunicou aos AA. a modificação do Fator de Correção, passando este a variar de 2,85 euros a 2,88 euros por 1000 cigarros (cinco volumes).
36 - Desde de 1 de julho de 2009, acabaram os descontos comerciais expressos em percentagem sobre o PVP, passando os grossistas a ter um desconto correspondente a uma quantia fixa por caixa.
37 - O desconto comercial passou a ser apurado pela diferença entre o PVP e o preço de venda que as T… em cada momento determinem para a venda desses produtos aos seus clientes grossistas, passando a ser de 7,13%.
38 - A 5 de junho de 2009, a Associação … enviou às RR. carta da qual consta o seguinte:
“Os vossos Distribuidores Grossistas consideram inaceitáveis as novas condições referentes ao pagamento através de transferência bancária, pois os custos são incomportáveis”.
39 - A 15 de setembro de 2009, e em resposta à carta referida no ponto 38, a R. (2ª)… enviou à A… (Associação) e aos seus associados carta da qual consta o seguinte:
“Serve a presente para informar V. Exas. que a (2ª Ré) decidiu suspender a implementação de pagamentos apenas por transferência bancária (Ponto 11.3 das Condições Gerais de Fornecimento), cuja entrada em vigor estava planeada para acontecer a partir do dia 1 de Outubro de 2009, até nova informação. Assim, a T… continuará a aceitar pagamentos como até agora e não apenas por transferência bancária”.
40 - A A… (Associação…) enviou às RR. carta datada de 22 de setembro de 2010 da qual consta o seguinte: “…vimos informar V. Ex.as que repudiamos estas novas Condições Gerais, como já tínhamos repudiado as anteriores, conforme nossa carta de 5 de Junho de 2009, que foi enviada registada com aviso de recepção à T… e T… (1ª e 2ª Rés). … Face ao exposto, V. Ex.as ficam cientes de que as modificações unilaterais das Condições Gerais de Fornecimento por Grosso de Produtos de Tabaco pretendidas pela T…, são chocantes e inaceitáveis pelo que os nossos associados vão continuar a efectuar os pagamentos das vossas facturas como fazem há muitos anos e sem que a T…, até hoje, tivesse tido algum motivo de preocupação.”
41 - A 27 de setembro de 2010, a R. (2ª) enviou aos associados da A… carta da qual consta o seguinte: “…na ausência do envio de informação atempada relativa à opção por si escolhida em matéria de… opções de pagamento, iremos considerar as condições vigentes e conhecidas para a sua empresa na data imediatamente anterior à implementação destas novas Condições Gerais”.
42 - Os pagamentos efetuados pela A. R… à R. (2ª), no período de 16 de setembro a 30 de setembro de 2010, eram quase sempre feitos por depósito de dois cheques na conta da T… junto do Banco …
43 - A partir de dia 1 de outubro de 2010, os AA. continuaram a fazer as suas encomendas de produtos de tabaco, como habitualmente, umas vezes telefonicamente outras vezes por fax, expressamente referindo não aceitar as alterações propostas às Condições Gerais e tendo continuado a fazer os pagamentos dessas faturas como também habitualmente faziam.
44 - Tendo a A. R… pago as suas encomendas dos dias 1 e 4 de outubro de 2010 por meio de vários cheques (cheque nº … sobre o Banco P…, no montante de € 73.252,73, cheque nº …, sobre o BP…, no montante de € 50.000,00, cheque nº …, sobre o M…, no valor de € 10.000,00, e cheque nº … sobre o BP, no montante de € 62.830,58), a R. (2ª), após a entrega dos produtos, tentou o cancelamento dos referidos cheques junto dos bancos sobre os quais foram sacados.
45 - Após os factos referidos no ponto 44, as RR. recusaram fornecer à A. R… produtos de tabaco, rejeitando os pedidos de encomenda nºs 175, 178, 180, 183 e 184, efetuados, respetivamente, nos dias 6, 8, 12, 14 e 15 de outubro de 2010.
46 - No dia 6 de outubro de 2010, a R. (2ª)… enviou para a A. R… comunicação da qual consta o seguinte:
“Constatamos que em desrespeito ao estabelecido nas Condições Gerais de Fornecimento por Grosso de Produtos de Tabaco pela T… (conforme Ponto 11.4) tentou liquidar a sua encomenda da passada sexta-feira recorrendo a um pagamento múltiplo. Agradecemos assim que proceda à regularização da situação, solicitando a devolução dos cheques e efetuando em substituição um único pagamento por cada fatura ou grupo de faturas, sem o que não poderemos concretizar a próxima entrega”.
47 - No dia 9 de julho de 2004, foi celebrado um acordo entre, por um lado, P… INC, PP INC, PD INC e PW SARL e, pelo outro, a Comunidade Europeia, representada pela Comissão Europeia, e vários estados membros, entre os quais Portugal, acordo esse denominado de “Acordo Anti-contrabando e Anti-contrafacção e Exoneração Geral” e do qual consta o seguinte:
- “Recepção de Pagamentos
Os criminosos negoceiam frequentemente com dinheiro derivado do crime ou com instrumentos negociáveis que são equivalentes a dinheiro (por exemplo, vales postais e cheques de viagem) e que tenham sido comprados com dinheiro proveniente do crime.
Os esquemas criminosos também podem implicar pagamentos por terceiros, que podem ser inexistentes ou pessoas “testa de ferro” ou pagamento em divida de um país diferente do país onde a transacção é realizada.
Em conformidade com as leis dos Estados Unidos e de outros países, em determinadas circunstâncias, efectuar transacções com receitas do crime pode, por si só, ser considerado conduta criminosa.
Em confirmação das nossas práticas de longa data nesta área, os Programas de Conformidade que as empresas de exploração implementam devem incluir os seguintes requisitos:
(i) as formas de pagamento aceitáveis são: (a) transferência bancária ou cheque, em ambos os casos a partir de uma conta bancária em nome do cliente, (b) cheque ao portador ou bancário ou equivalente, em ambos os casos, emitidos por um banco no país em que o cliente se encontra e (c) numerário, mas apenas quando a natureza e a escala da actividade do cliente (por exemplo, pequeno comércio a retalho) são de tal ordem que não é comercialmente viável segundo as condições locais que um cliente utilize as formas de pagamento previstas em (a) ou (b);
(ii) todos os pagamentos devem ser feitos na mesma divisa da factura;
(iii) os pagamentos realizados por terceiros são inaceitáveis;
(iv) quaisquer pagamentos indevidos devem ser cuidadosamente analisados, qualquer pedido para fazer um pagamento em excesso ou para que um reembolso seja feito em nome de terceiro deve ser aprovado pelo Director Financeiro e pelo Director Executivo da empresa de exploração ou pelos seus representantes; e
(v) os pagamentos para cada factura ou grupo de facturas devem ser feitos através de um único instrumento,
Os procedimentos de empresas de exploração individuais podem prever excepções a estes cinco requisitos a ser concedidas caso a caso, mas estas excepções devem ser aprovadas pelo Director Financeiro e pelo Director Executivo da empresa de exploração ou pelos seus representantes.
Caso sejam autorizadas excepções, os procedimentos devem prever que estas só sejam concedidas em circunstâncias excepcionais e exigir documentação sobre os motivos para a concessão de qualquer excepção.
Adicionalmente, cada Programa de Cumprimento deverá incluir procedimentos razoáveis para identificar pagamentos”
- “A P... International deverá aderir às suas políticas anti-branqueamento de capitais, que são concebidas para garantir que recebe o pagamento de cigarros P exclusivamente de fontes lícitas. As políticas desenvolvidas pela P... International para rastrear e acompanhar todos os pagamentos feitos por cigarros vendidos e/ou distribuídos pela P… International devem incluir medidas destinadas a evitar o uso das receitas de qualquer actividade ilícita, sob qualquer forma, como o pagamento de cigarros. Especificamente, como essas políticas se relacionam com as transacções com Prestadores Aprovados referentes à venda, armazenagem ou expedição de cigarros P…:
(i) as formas aceitáveis de pagamento serão limitadas a:
(A) transferências bancárias ou cheques, em ambos os casos de uma conta bancária em nome da Pessoa ou Afiliada dessa Pessoa com quem a P… International esteja envolvida numa transacção,
(B) cheques ao portador ou cheques bancários, em ambos os casos emitidos por um banco no país em que se localiza a Pessoa com quem a P… Internacional esteja envolvida numa transacção; e
(C) numerário, mas apenas quando a natureza e a escala da actividade da Pessoa com quem a P… International esteja envolvida numa transacção (por exemplo, pequeno comércio a retalho) são de tal ordem que não é comercialmente viável que essa Pessoa utilize as formas de pagamento previstas em (A) ou (B);
(ii) todos os pagamentos devem ser feitos na mesma divisa e no mesmo montante mencionados na factura;
(iii) todos os pagamentos por Cigarros P… devem ser realizados pelo cliente a quem foi emitida factura ou uma Afiliada desse cliente divulgada à P… International de acordo com o Protocolo 2.03(c)(vi);
(iv) os pagamentos por cada factura ou grupo de facturas devem ser feitos através de um único instrumento; e
(v) o pagamento deve ser feito de uma única conta designada pelo Prestador Aprovado durante o Processo de Diligência, no âmbito do Protocolo 2.03(c)(vi), supra.
(b) Podem ser concedidas excepções aos cinco requisitos estabelecidos acima no Protocolo 5.01(a) numa base caso a caso. Essas excepções devem ser aprovadas pelo Chief Financial Officer da P… International, e os motivos para a concessão de qualquer excepção devem ser registados.”
48 - Do despacho conjunto do Ministro das Finanças e do Ministro da Economia de 12 de dezembro de 1996, consta o seguinte:
“Nestes termos, os Ministros das Finanças e da Economia decidem estabelecer as seguintes obrigações a cumprir pela empresa P…, SA., no quadro do processo de reprivatização da T… SA.:
a) a P… SA. deverá alienar no mais curto espaço de tempo possível e no prazo máximo de doze meses após a concentração, os negócios grossistas directa ou indirectamente detidos pela T…, …, assim como abster-se de adquirir, constituir ou participar no futuro em empresas do circuito de distribuição;
b) a P…, SA. não deverá manter nem exigir a qualquer outro agente económico qualquer exclusividade de compra de produtos seus ou de qualquer sua comparticipada…
c) a P… SA. não deverá impor a qualquer outro agente económico a compra de quantidades mínimas de produtos seu…, salvo prévia concordância da Direcção Geral do Comércio e Concorrência e, nesse caso, quantidades mínimas que deverão corresponder a necessidades empresariais objectivas não tendo por efeito retirar a qualquer utilizador qualquer benefício resultante do estabelecido nas alíneas anteriores e deverão ser aplicadas com proporcionalidade, em igualdade e sem discriminação;
…
f) a P… SA., as suas participadas incluindo a T…, as sociedades naquelas participantes ou por estas dominada, deverão aceitar expressamente e por escrito as obrigações contratuais devidas, as quais vigorarão para todo o mercado nacional antes da concretização da operação de concentração notificada”.
49 - Alguns AA. realizam também a atividade de venda direta ao consumidor por intermédio de máquinas de venda automática de cigarros.
50 - Relativamente à marca M… as RR. detêm uma licença da sua empresa mãe, a P…, na qualidade de detentora exclusiva dos direitos sobre o fabrico e comercialização da mesma em Portugal.
51 - Nunca os AA. tiveram necessidade de repetir o processo de inscrição como grossista da T….
52 - As Condições Gerais de Fornecimento referidas no ponto 9 mantiveram-se em vigor até 2005.
53 - A T… procede periodicamente à vistoria dos armazéns dos AA.
54 - Nas vistorias, a T… verifica o grau de humidade, a temperatura, a localização e as condições de acesso e de estacionamento.
55 - Até 1985, inclusive, a R. (1ª) celebrou acordos com alguns grossistas de maneira a organizar o escoamento dos produtos de cigarros que produzia.
56 - As Condições Gerais passaram, após a cisão, a ser assumidos pela R. (2ª).
57 – A… R… iniciou a sua atividade de compra para revenda de produtos da T… em 1988.
58 - A partir de 2002, a A. T… A… R… assumiu a atividade inicialmente desenvolvida por A… R…, com o conhecimento e autorização da R. (1ª).
59 - A A. A.A.P… iniciou a atividade de grossista de produtos da T… em data não posterior a 1985.
60 - A atividade de compra para revenda de produtos da T… da A. A.S.F… remonta a 1982.
61 – J…V…P… iniciou a atividade de compra para revenda de produtos da T… em 2001.
62 - A partir de 2010, a A. J…assumiu a atividade inicialmente desenvolvida por J…V…P…, com o conhecimento e autorização da R. (2ª).
63 - A atividade de compra para revenda de produtos da T…da A. D…A… remonta a 1990.
64 - A A. D…L… iniciou a atividade de compra para revenda de produtos da T… em 2004.
65 - A A. H…P…M… iniciou a atividade de compra para revenda de produtos da T… em 1988.
66 - A atividade de compra para revenda de produtos da T… da A. R…C… remonta a 2002.
67 – D…S…e…, Lda, iniciou a atividade de compra para revenda de produtos da T… em 1982.
68 - A partir de 2003, a A. S…B…B… assumiu a atividade inicialmente desenvolvida por D…S…e…, Lda, com o conhecimento e autorização da T….
69 – C…A…C…, Lda iniciou a atividade de compra para revenda de produtos da T… em 1985.
70 - A partir de Fevereiro de 2003, a A. C.A… assumiu a atividade inicialmente desenvolvida por C…A…C…, Lda, com o conhecimento e autorização da T….
71 - A atividade de compra para revenda de produtos da T… da A. S…V… remonta a 2000.
72 - A A. D…T…S… iniciou a atividade de compra para revenda de produtos da T… em 2007.
73 – D...S…G…S… iniciou a atividade de compra para revenda de produtos da T… em 1992.
74 - A partir de 2008, a A. D… assumiu a atividade inicialmente desenvolvida por D…S…G…S…, com o conhecimento e autorização da T….
75 - A atividade de compra para revenda de produtos da T… da A. ET… remonta a 1998.
76 - A A. C…T… iniciou a atividade de compra para revenda de produtos da T… em 1989.
77 – A…R…. Lda iniciou a atividade de compra para revenda de produtos da T… em 1995.
78 - A partir de 2010, a A. T…R… assumiu a atividade inicialmente desenvolvida por A… R… Lda, com o conhecimento e autorização da T….
79 - A A. M…M…C… iniciou a atividade de compra para revenda de produtos da T… em 1996.
80 – J…M…R…L… iniciou a atividade de compra para revenda de produtos da T… em 1951.
81 - A partir de Novembro de 1986, a A. J…M…R…L… assumiu a atividade inicialmente desenvolvida por J…M…R…L…, com o conhecimento e autorização da T….
82 - A A. …D iniciou a atividade de compra para revenda de produtos da T… em 2003.
83 - A atividade de compra para revenda de produtos da T… do A. R… remonta a 2003.
84 - A atividade de compra para revenda de produtos da T… do A. A…remonta a 1990.
85 – CDF…. iniciou a atividade de compra para revenda de produtos da T… em 1926.
86 - A partir de 1994, o A. C… assumiu a atividade desenvolvida por F…, que anteriormente havia assumido a atividade desenvolvida por CDF…, com o conhecimento e autorização da T….
87 - A atividade de compra para revenda de produtos da T… do A. FJ remonta a 1994.
88 - A 18 de julho de 1944, DS… celebrou acordo com a T... pelo qual esta nomeava aquele seu depositário revendedor para o concelho de Gondomar, mediante, entre outras condições, a de aquele fazer propaganda intensa dos tabacos da T… e arranjar para esse fim e sob sua responsabilidade sub-depositários em todas as freguesias e aldeias do concelho de forma a que nessas freguesias e aldeias se vendam os tabacos da T….
89 - No início dos anos 90, a T… introduziu a distinção entre distribuidores passivos e distribuidores ativos, nestes se enquadrando os AA.
90 - Nos anos 80, era necessário, para se ser grossista da T…, ter contabilidade organizada.
91 - Conforme acordado no período anterior às CGF, os AA. que já eram grossistas da T… nesse período tinham de enviar anualmente a esta o balanço e demonstração de resultados e o certificado de idoneidade.
92 - Conforme acordado anteriormente às CGF, os AA. tinham de demonstrar trimestralmente à T… o cumprimento do requisito das quantidades mínimas.
93 - Caso algum dos AA. não cumprisse o requisito das quantidades mínimas, a T… cortava-lhe o fornecimento de tabaco.
94 - O preço pelo qual a T… vendia os produtos de tabaco aos grossistas foi determinado até julho de 2009 com base num desconto que era uma percentagem do Preço de Venda ao Público dos produtos.
95 - No acordo celebrado a 12 de julho de 1985 entre a T… e JMRL foi estipulada a obrigação do grossista de não comercialização de produtos concorrentes e de desenvolver atividades promocionais e publicitárias dos produtos da T.
96 - Antes de 2003, a T… promoveu cursos de técnicas de venda e cursos sobre rentabilidade das máquinas de venda de tabaco, fornecendo material para a ajuda na gestão de máquinas e clientes.
97 - A T… promoveu e organizou fóruns sobre o euro, a organização de empresas, o controlo de máquinas e as viagens
98 - O fórum sobre o euro realizou-se em 2001.
99 - Os AA. participaram em atividades referidas nos pontos 96 e 97.
100 - A T... oferecia um desconto extra aos AA. que participassem nas campanhas de incentivos promovidas por aquela.
101 - A T… promovia e custeava festas de Natal para os grossistas e ofereceu aos grossistas bilhetes para corridas de motos.
102 - Para os AA. ou os seus antecessores começarem a ser fornecidos pela T…, as instalações daqueles foram vistoriadas por esta de modo a confirmar se as mesmas reuniam as condições necessárias para manter o produto em bom estado.
103 - A mudança de instalações foi sujeita a vistoria e autorização por parte da T…
104 - Em 1985, os acordos celebrados entre grossistas e a T… eram expressamente designados de contratos de distribuição.
105 - Em 2005, a T… promoveu e custeou uma ação de formação sobre o comando de máquinas em que estiveram presentes alguns dos AA.
106 - Nos anos 80, o grossista era designado pela T… por “Distribuidor”.
107 - A introdução do fator de correção implicou a redução da margem dos grossistas sobre as vendas dos produtos da T…, entendendo-se por margem dos grossistas a percentagem calculada sobre o PVP que, abatida a esse mesmo PVP, originava o valor a pagar pelos grossistas à T…
108 - A aplicação dos preços fixos por caixa teve como consequência o aumento do valor a pagar pelos AA. por comparação com o valor que pagariam com base nas condições gerais de 2005 e deixar o valor a pagar pelos AA. de acompanhar a evolução do PVP dos produtos de tabaco.
109 - A aplicação do fator de correção no ano de 2006 implicou que a A. R… tivesse realizado menos € 110.242,29 do que realizaria se fossem aplicadas as condições gerais de fornecimento de 2005.
110 - A aplicação do fator de correção no ano de 2007 implicou que a A. R… tivesse realizado menos € 183.520,14 do que realizaria se fossem aplicadas as condições gerais de fornecimento de 2005.
111 - A aplicação do fator de correção no ano de 2008 implicou que a A. R… tivesse realizado menos € 207.040,32 do que realizaria se fossem aplicadas as condições gerais de fornecimento de 2005.
112 - A aplicação do fator de correção no 1º semestre de 2009 implicou que a A. R… tivesse realizado menos € 124.339,70 do que realizaria se fossem aplicadas as condições gerais de fornecimento de 2005.
113 - A aplicação das condições gerais de fornecimento em matéria de preço dos produtos em vigor desde 1 de julho de 2009 a setembro de 2010 implicou que a A. R… tivesse realizado, nesse período, menos € 355.321,68 do que realizaria se fossem aplicadas as condições gerais de fornecimento de 2005.
114 - A aplicação do fator de correção nos anos de 2006 e 2007 implicou que a A. AAP… tivesse realizado menos € 343.313,40 do que realizaria se fossem aplicadas as condições gerais de fornecimento de 2005.
115 - A aplicação do fator de correção no ano de 2008 implicou que a A. AAP… tivesse realizado menos € 310.437,45 do que realizaria se fossem aplicadas as condições gerais de fornecimento de 2005.
116 - A aplicação do fator de correção no 1º semestre de 2009 implicou que a A. AAP… tivesse realizado menos € 167.447,10 do que realizaria se fossem aplicadas as condições gerais de fornecimento de 2005.
117 - A aplicação das condições gerais de fornecimento em matéria de preço dos produtos em vigor desde 1 de julho de 2009 a 30 de novembro de 2010 implicou que a A. AAP… tivesse realizado, nesse período, menos € 499.768,63 do que realizaria se fossem aplicadas as condições gerais de fornecimento de 2005.
118 - A aplicação do fator de correção no ano de 2006 implicou que a A. ASF… tivesse realizado menos € 79.803,27 do que realizaria se fossem aplicadas as condições gerais de fornecimento de 2005.
119 - A aplicação do fator de correção no ano de 2007 implicou que a A. ASF tivesse realizado menos € 156.700,99 do que realizaria se fossem aplicadas as condições gerais de fornecimento de 2005.
120 - A aplicação do fator de correção no ano de 2008 implicou que a A. ASF… a tivesse realizado menos € 211.232,05 do que realizaria se fossem aplicadas as condições gerais de fornecimento de 2005.
121 - A aplicação do fator de correção no 1º semestre de 2009 implicou que a A. ASF… tivesse realizado menos € 100.343,67 do que realizaria se fossem aplicadas as condições gerais de fornecimento de 2005.
122 - A aplicação das condições gerais de fornecimento em matéria de preço dos produtos em vigor desde 1 de julho de 2009 a 30 de novembro de 2010 implicou que a A. ASF… tivesse realizado, nesse período, menos € 264.680,70.
123 - A aplicação do fator de correção no ano de 2006 implicou que a A. J… tivesse realizado menos € 59.391,30 do que realizaria se fossem aplicadas as condições gerais de fornecimento de 2005.
124 - A aplicação do fator de correção no ano de 2007 implicou que a A. J…. tivesse realizado menos € 99.157,38 do que realizaria se fossem aplicadas as condições gerais de fornecimento de 2005.
125 - A aplicação do fator de correção no ano de 2008 implicou que a A. J… tivesse realizado menos € 132.114,33 do que realizaria se fossem aplicadas as condições gerais de fornecimento de 2005.
126 - A aplicação do fator de correção no 1º semestre de 2009 implicou que a A. J… tivesse realizado menos € 61.483,99 do que realizaria se fossem aplicadas as condições gerais de fornecimento de 2005.
127 - A aplicação das condições gerais de fornecimento em matéria de preço dos produtos em vigor desde 1 de julho de 2009 a 30 de setembro de 2010 implicou que a A. J… tivesse realizado, nesse período, menos € 148.121,91 do que realizaria se fossem aplicadas as condições gerais de fornecimento de 2005.
128 - A aplicação do fator de correção desde 1 de janeiro de 2006 a 30 de junho de 2009 implicou que a A. DA… tivesse realizado menos € 264.759,56 do que realizaria se fossem aplicadas as condições gerais de fornecimento de 2005.
129 - A aplicação das condições gerais de fornecimento em matéria de preço dos produtos em vigor desde 1 de julho de 2009 a 30 de novembro de 2010 implicou que a A. DA… tivesse realizado, nesse período, menos € 151.444,97 do que realizaria se fossem aplicadas as condições gerais de fornecimento de 2005.
130 - A aplicação do fator de correção no ano de 2006 implicou que a A. DL… tivesse realizado menos € 203.525,43 do que realizaria se fossem aplicadas as condições gerais de fornecimento de 2005.
131 - A aplicação do fator de correção no ano de 2007 implicou que a A. DL… tivesse realizado menos € 346.271,78 do que realizaria se fossem aplicadas as condições gerais de fornecimento de 2005.
132 - A aplicação do fator de correção no ano de 2008 implicou que a A. DL… tivesse realizado menos € 486.810,93 do que realizaria se fossem aplicadas as condições gerais de fornecimento de 2005.
133 - A aplicação do fator de correção no 1º semestre de 2009 implicou que a A. DL… tivesse realizado menos € 255.131,94 do que realizaria se fossem aplicadas as condições gerais de fornecimento de 2005.
134 - A aplicação das condições gerais de fornecimento em matéria de preço dos produtos em vigor desde 1 de julho de 2009 a 30 de novembro de 2010 implicou que a A. DL… tivesse realizado, nesse período, menos € 619.985,54 do que realizaria se fossem aplicadas as condições gerais de fornecimento de 2005.
135 - A aplicação do fator de correção no ano de 2006 implicou que a A. HPM… tivesse realizado menos € 85.493,27 do que realizaria se fossem aplicadas as condições gerais de fornecimento de 2005.
136 - A aplicação do fator de correção no ano de 2007 implicou que a A. HPM…a tivesse realizado menos € 137.977,91 do que realizaria se fossem aplicadas as condições gerais de fornecimento de 2005.
137 - A aplicação do fator de correção no ano de 2008 implicou que a A. HPM… tivesse realizado menos € 192.339,10 do que realizaria se fossem aplicadas as condições gerais de fornecimento de 2005.
138 - A aplicação do fator de correção no 1º semestre de 2009 implicou que a A. HPM… tivesse realizado menos € 100.276,87 do que realizaria se fossem aplicadas as condições gerais de fornecimento de 2005.
139 - A aplicação das condições gerais de fornecimento em matéria de preço dos produtos em vigor desde 1 de julho de 2009 a 31 de dezembro de 2010 implicou que a A. HPM… tivesse realizado, nesse período, menos € 274.685,85 do que realizaria se fossem aplicadas as condições gerais de fornecimento de 2005.
140 - A aplicação do fator de correção no ano de 2006 implicou que a A. RC… tivesse realizado menos € 6.837,56 do que realizaria se fossem aplicadas as condições gerais de fornecimento de 2005.
141 - A aplicação do fator de correção no ano de 2007 implicou que a A. RC… tivesse realizado menos € 12.745,70 do que realizaria se fossem aplicadas as condições gerais de fornecimento de 2005.
142 - A aplicação do fator de correção no ano de 2008 implicou que a A. RC… tivesse realizado menos € 17.847,26 do que realizaria se fossem aplicadas as condições gerais de fornecimento de 2005.
143 - A aplicação do fator de correção no 1º semestre de 2009 implicou que a A. RC… tivesse realizado menos € 8.960,84 do que realizaria se fossem aplicadas as condições gerais de fornecimento de 2005.
144 - A aplicação das condições gerais de fornecimento em matéria de preço dos produtos em vigor desde 1 de julho de 2009 a 30 de setembro de 2010 implicou que a A. RC… tivesse realizado, nesse período, menos € 15.576,14 do que realizaria se fossem aplicadas as condições gerais de fornecimento de 2005.
145 - A aplicação do fator de correção no período de 1 de janeiro de 2006 a 30 de junho de 2009 implicou que a A. SBB tivesse realizado menos € 491.958,04 do que realizaria se fossem aplicadas as condições gerais de fornecimento de 2005.
146 - A aplicação das condições gerais de fornecimento em matéria de preço dos produtos em vigor desde 1 de julho de 2009 a 31 de dezembro de 2010 implicou que a A. SBB… tivesse realizado, nesse período, menos € 335.147,87 do que realizaria se fossem aplicadas as condições gerais de fornecimento de 2005.
147 - A aplicação do fator de correção no ano de 2006 implicou que a A. CA… tivesse realizado menos € 53.584,60 do que realizaria se fossem aplicadas as condições gerais de fornecimento de 2005.
148 - A aplicação do fator de correção no ano de 2007 implicou que a A. CA… tivesse realizado menos € 107.487,22 do que realizaria se fossem aplicadas as condições gerais de fornecimento de 2005.
149 - A aplicação do fator de correção no ano de 2008 implicou que a A. CA… tivesse realizado menos € 109.884,26 do que realizaria se fossem aplicadas as condições gerais de fornecimento de 2005.
150 - A aplicação das condições gerais de fornecimento em matéria de preço dos produtos em vigor desde 1 de janeiro de 2009 a 31 de outubro de 2010 implicou que a A. CA… tivesse realizado, nesse período, menos € 171.364,28 do que realizaria se fossem aplicadas as condições gerais de fornecimento de 2005.
151 - A aplicação do fator de correção no ano de 2006 implicou que a A. SV… tivesse realizado menos € 64.874,76 do que realizaria se fossem aplicadas as condições gerais de fornecimento de 2005.
152 - A aplicação do fator de correção entre janeiro de 2007 e junho de 2009 implicou que a A. SV… tivesse realizado menos € 302.382,34 do que realizaria se fossem aplicadas as condições gerais de fornecimento de 2005.
153 - A aplicação das condições contratuais em matéria de preço dos produtos em vigor desde 1 de julho de 2009 implicou que a A. SV… tivesse realizado menos € 136.911,07 do que realizaria se fossem aplicadas as condições gerais de fornecimento de 2005.
154 - A aplicação do fator de correção no ano de 2006 implicou que a A. DTSM… tivesse realizado menos € 91.186,80 do que realizaria se fossem aplicadas as condições gerais de fornecimento de 2005.
155 - A aplicação do fator de correção no ano de 2007 implicou que a A. DTSM… tivesse realizado menos € 158.370,11 do que realizaria se fossem aplicadas as condições gerais de fornecimento de 2005.
156 - A aplicação do fator de correção no ano de 2008 implicou que a A. DTSM… tivesse realizado menos € 186.567,28 do que realizaria se fossem aplicadas as condições gerais de fornecimento de 2005.
157 - Em resultado da aplicação das condições gerais de fornecimento em matéria de preço e descontos comerciais no ano de 2009, a A. DTSM… gastou mais € 209.254,74 do que gastaria se fossem aplicadas as condições gerais de fornecimento de 2005.
158 - A aplicação das condições gerais de fornecimento em matéria de preço dos produtos em vigor durante o ano de 2010 implicou que a A. DTSM… tivesse realizado, nesse período, menos € 198.310,41 do que realizaria se fossem aplicadas as condições gerais de fornecimento de 2005.
159 - A aplicação do fator de correção no período de 1 de janeiro de 2007 a 30 de junho de 2009 implicou que a A. D… tivesse realizado menos € 308.411,03 do que realizaria se fossem aplicadas as condições gerais de fornecimento de 2005.
160 - A aplicação das condições gerais de fornecimento em matéria de preço dos produtos em vigor desde 1 de julho de 2009 até 28 de outubro de 2010 implicou que a A. D… tivesse realizado, nesse período, menos € 105.674,39 do que realizaria se fossem aplicadas as condições gerais de fornecimento de 2005.
161 - A aplicação do fator de correção no ano de 2006 implicou que a A. ET... tivesse realizado menos € 173.201,42 do que realizaria se fossem aplicadas as condições gerais de fornecimento de 2005.
162 - A aplicação do fator de correção no ano de 2007 implicou que a A. ET... tivesse realizado menos € 332.776,97 do que realizaria se fossem aplicadas as condições gerais de fornecimento de 2005.
163 - A aplicação do fator de correção no ano de 2008 implicou que a A. ET... tivesse realizado menos € 462.418,76 do que realizaria se fossem aplicadas as condições gerais de fornecimento de 2005.
164 - A aplicação do fator de correção no 1º semestre de 2009 implicou que a A. ET... tivesse realizado menos € 265.644,36 do que realizaria se fossem aplicadas as condições gerais de fornecimento de 2005.
165 - A aplicação das condições gerais de fornecimento em matéria de preço dos produtos em vigor desde 1 de julho de 2009 até 15 de dezembro de 2010 implicou que a A. ET... tivesse realizado, nesse período, menos € 843.666,60 do que realizaria se fossem aplicadas as condições gerais de fornecimento de 2005.
166 - A aplicação do fator de correção no ano de 2006 implicou que a A. CT… tivesse realizado menos € 19.556,19 do que realizaria se fossem aplicadas as condições gerais de fornecimento de 2005.
167 - A aplicação do fator de correção no ano de 2007 implicou que a A. CT… tivesse realizado menos € 33.863,74 do que realizaria se fossem aplicadas as condições gerais de fornecimento de 2005.
168 - A aplicação do fator de correção no ano de 2008 implicou que a A. CT… tivesse realizado menos € 44.867,29 do que realizaria se fossem aplicadas as condições gerais de fornecimento de 2005?
169 - A aplicação do fator de correção no 1º semestre de 2009 implicou que a A. CT… tivesse realizado menos € 22.461,89 do que realizaria se fossem aplicadas as condições gerais de fornecimento de 2005.
170 - A aplicação das condições gerais de fornecimento em matéria de preço dos produtos em vigor desde 1 de julho de 2009 até finais de 2010 implicou que a A. CT… tivesse realizado, nesse período, menos € 45.532,00 do que realizaria se fossem aplicadas as condições gerais de fornecimento de 2005.
171 - A aplicação do fator de correção no ano de 2006 implicou que a A. TR... tivesse realizado menos € 73.032,22 do que realizaria se fossem aplicadas as condições gerais de fornecimento de 2005.
172 - A aplicação do fator de correção no ano de 2007 implicou que a A. TR… tivesse realizado menos € 128.144,86 do que realizaria se fossem aplicadas as condições gerais de fornecimento de 2005.
173 - A aplicação do fator de correção no ano de 2008 implicou que a A. TR… tivesse realizado menos € 178.284,20 do que realizaria se fossem aplicadas as condições gerais de fornecimento de 2005.
174 - A aplicação do fator de correção no 1º semestre de 2009 implicou que a A. TR… tivesse realizado menos € 99.393,39 do que realizaria se fossem aplicadas as condições gerais de fornecimento de 2005.
175 - A aplicação das condições gerais de fornecimento em matéria de preço dos produtos em vigor desde 1 de julho de 2009 até setembro de 2010 implicou que a A. TR… tivesse realizado, nesse período, menos € 240.328,56 do que realizaria se fossem aplicadas as condições gerais de fornecimento de 2005.
176 - A aplicação do fator de correção no ano de 2006 implicou que a A. MMC… tivesse realizado menos € 20.364,94 do que realizaria se fossem aplicadas as condições gerais de fornecimento de 2005.
177 - A aplicação do fator de correção no ano de 2007 implicou que a A. MMC… tivesse realizado menos € 33.378,31 do que realizaria se fossem aplicadas as condições gerais de fornecimento de 2005.
178 - A aplicação do fator de correção no ano de 2008 implicou que a A. MMC… tivesse realizado menos € 44.590,02 do que realizaria se fossem aplicadas as condições gerais de fornecimento de 2005.
179 - A aplicação do fator de correção no 1º semestre de 2009 implicou que a A. MMC… tivesse realizado menos € 24.735,40 do que realizaria se fossem aplicadas as condições gerais de fornecimento de 2005.
180 - A aplicação das condições gerais de fornecimento em matéria de preço dos produtos em vigor desde 1 de julho de 2009 implicou que a A. MMC… tivesse realizado menos € 47.221,48 do que realizaria se fossem aplicadas as condições gerais de fornecimento de 2005.
181 - A aplicação do fator de correção no ano de 2006 implicou que a A. JMRL… tivesse realizado menos € 58.050,29 do que realizaria se fossem aplicadas as condições gerais de fornecimento de 2005.
182 - A aplicação do fator de correção no ano de 2007 implicou que a A. JMRL… tivesse realizado menos € 91.095,59 do que realizaria se fossem aplicadas as condições gerais de fornecimento de 2005.
183 - A aplicação do fator de correção no ano de 2008 implicou que a A. JMRL… tivesse realizado menos € 126.217,90 do que realizaria se fossem aplicadas as condições gerais de fornecimento de 2005.
184 - A aplicação das condições contratuais em matéria de preço dos produtos durante o ano de 2009 implicou que a A. JMRL… tivesse realizado, nesse período, menos € 124.555,09 do que realizaria se fossem aplicadas as condições gerais de fornecimento de 2005.
185 - A aplicação das condições gerais de fornecimento em matéria de preço dos produtos durante o ano de 2010 implicou que a A. JMRL… tivesse realizado, nesse período, menos € 96.911,76 do que realizaria se fossem aplicadas as condições gerais de fornecimento de 2005.
186 - A aplicação do fator de correção no período de 1 de janeiro de 2006 a 30 de junho de 2009 implicou que a A. … D tivesse realizado menos € 1.272.414,19 do que realizaria se fossem aplicadas as condições gerais de fornecimento de 2005.
187 - A aplicação do fator de correção no ano de 2006 implicou que o A. R… tivesse realizado menos € 15.550,85 do que realizaria se fossem aplicadas as condições gerais de fornecimento de 2005.
188 - A aplicação do fator de correção no ano de 2007 implicou que o A. R… tivesse realizado menos € 26.698,81 do que realizaria se fossem aplicadas as condições gerais de fornecimento de 2005.
189 - A aplicação do fator de correção no ano de 2008 implicou que o A. R… tivesse realizado menos € 36.542,06 do que realizaria se fossem aplicadas as condições gerais de fornecimento de 2005.
190 - A aplicação do fator de correção no 1º semestre de 2009 implicou que o A. R… tivesse realizado menos € 20.975,79 do que realizaria se fossem aplicadas as condições gerais de fornecimento de 2005.
191 - A aplicação das condições gerais de fornecimento em matéria de preço dos produtos em vigor desde 1 de julho de 2009 até 13 de dezembro de 2010 implicou que o A. R… tivesse realizado, nesse período, menos € 35.767,58 do que realizaria se fossem aplicadas as condições gerais de fornecimento de 2005.
192 - A aplicação do fator de correção no ano de 2006 implicou que o A. A… tivesse realizado menos € 43.525,22 do que realizaria se fossem aplicadas as condições gerais de fornecimento de 2005.
193 - A aplicação do fator de correção no ano de 2007 implicou que o A. A… tivesse realizado menos € 84.424,61 do que realizaria se fossem aplicadas as condições
gerais de fornecimento de 2005.
194 - A aplicação do fator de correção no ano de 2008 implicou que o A. A... tivesse realizado menos € 147.212,40 do que realizaria se fossem aplicadas as condições gerais de fornecimento de 2005.
195 - A aplicação das condições gerais de fornecimento em matéria de preço dos produtos em vigor desde 1 de janeiro de 2009 até 14 de dezembro de 2010 implicou que o A. A… tivesse realizado, nesse período, menos € 361.809,00 do que realizaria se fossem aplicadas as condições gerais de fornecimento de 2005.
196 - A aplicação do fator de correção no ano de 2006 implicou que o A. CM… tivesse realizado menos € 112.748,78 do que realizaria se fossem aplicadas as condições gerais de fornecimento de 2005.
197 - A aplicação do fator de correção no ano de 2007 implicou que o A. CM… tivesse realizado menos € 204.586,67 do que realizaria se fossem aplicadas as condições gerais de fornecimento de 2005.
198 - A aplicação do fator de correção no ano de 2008 implicou que o A. CM… tivesse realizado menos € 258.593,64 do que realizaria se fossem aplicadas as condições gerais de fornecimento de 2005.
199 - A aplicação das condições contratuais em matéria de preço dos produtos em vigor no ano de 2009 implicou que o A. CM… tivesse realizado, nesse período, menos € 263.788,54 do que realizaria se fossem aplicadas as condições gerais de fornecimento de 2005.
200 - A aplicação das condições gerais de fornecimento em matéria de preço dos produtos em vigor no ano de 2010 implicou que o A. CM… tivesse realizado, nesse período, menos € 286.158,21 do que realizaria se fossem aplicadas as condições gerais de fornecimento de 2005.
201 - A aplicação do fator de correção no ano de 2006 implicou que o A. FJ… tivesse realizado menos € 15.224,80 do que realizaria se fossem aplicadas as condições gerais de fornecimento de 2005.
202 - A aplicação do fator de correção no ano de 2007 implicou que o A. FJ… Jorge tivesse realizado menos € 25.917,50 do que realizaria se fossem aplicadas as condições gerais de fornecimento de 2005.
203 - A aplicação do fator de correção no ano de 2008 implicou que o A. FJ… Jorge tivesse realizado menos € 35.367,41 do que realizaria se fossem aplicadas as condições gerais de fornecimento de 2005.
204 - A aplicação do fator de correção no 1º semestre de 2009 implicou que o A. FJ… tivesse realizado menos € 22.591,50 do que realizaria se fossem aplicadas as condições gerais de fornecimento de 2005.
205 - A aplicação das condições gerais de fornecimento em matéria de preço dos produtos em vigor durante o ano de 2010 implicou que o A. FJ… tivesse realizado, nesse período, menos € 26.523,35 do que realizaria se fossem aplicadas as condições gerais de fornecimento de 2005.
206 - O aumento do valor do Estado no PVP, entre 2006 e 2010, de cerca de 1,6 pontos percentuais foi suportado pela R. (1ª), de janeiro de 2006 a janeiro de 2008 e, depois desta data até 2010, inclusive, pela R. (2ª) com a diminuição do valor dos grossistas em cerca de 1,3 pontos percentuais e com a diminuição do valor da T… em cerca de 0,3 pontos percentuais.
207 - As AA. DL… e JMRL… recusaram a alteração prevista nas CGF de 2009 em matéria de forma de pagamento das faturas.
208 - Quando os AA. vendem os produtos de tabaco aos retalhistas, recebem muitas vezes destes diversos cheques sacados sobre diversas instituições bancárias.
209 - Para poderem obter a imediata disponibilidade das quantias inscritas nos cheques, os AA. têm contas abertas junto dessas diversas instituições bancárias.
210 - Com essa disponibilidade imediata, os AA. podiam, não fosse a imposição do pagamento por meio de um único cheque ou de uma única transferência bancária, utilizar as quantias recebidas para efetuar pagamentos à T… no dia imediatamente subsequente.
211 - Se os AA. depositassem os cheques dos retalhistas numa única conta bancária, demoraria um período não inferior a 48 horas para as quantias inscritas nos cheques sacados sobre instituição bancária diversa daquela junta da qual aquela conta foi aberta estarem disponíveis nessa conta bancária.
212 - Os AA. alteraram a forma de pagamento para um único cheque para evitar ficar sem produtos de tabaco da T… para distribuir pelos retalhistas.
213 - As principais marcas de cigarros de produção fabril comercializadas em Portugal pela T… são a S… e a M….
214 - As marcas S… e M… são as duas marcas líderes no mercado português, sendo a marca S… a que, em Portugal, tem maior implantação.
215 - No mercado de produção e comercialização de cigarros de produção fabril, em Portugal, a quota de mercado das T… foi de 87% em 2005, de 82% em 2006, de 79,9% em 2007, de 79,3% em 2008, de 80,2% em 2009 e de 77,1% em 2010.
216 - Em 1995, o segmento dos cigarros representava 99,1% do mercado nacional dos produtos manufaturados do tabaco.
217 - Os principais distribuidores de tabaco, em Portugal, distribuem uma gama
alargada de produtos de tabaco e não apenas um único tipo.
218 - O mercado de fornecimento de produtos de tabaco é um mercado onde existem importantes barreiras de facto à entrada como a fidelidade dos consumidores a uma marca resultante da dependência provocada pelo consumo.
219 - A marca de cigarros M… tem notoriedade internacional.
220 - Os retalhistas deixarão de procurar os produtos de tabaco de um determinado grossista se este deixar de oferecer os produtos da T….
221 - Os consumidores de tabaco procuram no mercado os agentes que lhes possam disponibilizar a marca que desejam.
222 - No mercado dos cigarros, verifica-se a dependência do consumidor relativamente à marca dos produtos que consome.
223 - Tal estado de dependência do consumidor faz com que o aumento de preços da marca dos produtos que consome que não ultrapasse o limite do incomportável não implique a mudança para outra marca.
224 - Entre 2005 e 2010, os produtos da T… representavam cerca de ¾ do volume de negócios total dos AA. ..D, ASF e SBB.
225 - Os retalhistas clientes dos AA., perante a impossibilidade de adquirir junto destas os produtos comercializados pelas T…, passariam a recorrer a um grossista que lhes permitisse simultaneamente adquirir as marcas comercializadas pelas T… e outras marcas.
226 - A grande maioria dos distribuidores fornece todas as marcas.
227 - Inexistem no mercado dos cigarros de produção fabril produtos pelos quais os AA. possam substituir os da T… no caso de esta cessar o fornecimento àqueles.
228 - Os descontos comerciais variáveis em função dos volumes de aquisição de produtos da T… incentivaram os grossistas a adquirir mais produtos da T… como forma de potenciar a margem de lucro a obter.
229 - Com os descontos por escalões, os mesmos produtos eram vendidos ou comprados por preços diferentes sem que esta diferença de preços fosse acompanhada por diferenças de custos.
230 - Muitas empresas distribuidoras concentraram-se para poderem atingir o escalão comercial mais vantajoso.
231 - Em Portugal, o número de grossistas era de 326 em 2002 e de 182 no 1º semestre de 2009.
232 - Os concorrentes da T… atribuem margens mais elevadas na distribuição dos seus produtos do que a T… atribui.
233 - As RR. vistoriam os locais de armazenagem dos grossistas para prevenir a responsabilização daquelas perante consumidores e perante autoridades fiscais ou de saúde.
234 - As RR. promovem encontros com os revendedores grossistas destinados a prestar esclarecimentos sobre a atividade em geral - em especial, sobre alterações legislativas.
235 - O preço de revenda aos retalhistas é fixado pelos revendedores grossistas.
236 - Desde 2008, quando identificavam a realização de um pagamento múltiplo, as RR. contactavam o cliente em causa como forma de evitar a repetição de tal ocorrência.
237 - A partir de outubro de 2010, a R. (2ª) passou a ser rigorosa quanto ao pagamento único.
238 - No ano de 2009, os AA. adquiriram à R. (2ª) produtos de tabaco no valor total de €294.501.564,45, correspondente ao valor a pagar de €273.658.455,02.
*
Matéria de facto não provada:
1 - As RR. comprometeram-se a vender produtos de tabaco aos AA. para que estes depois os revendessem a clientes seus que são retalhistas, em postos de venda variados, como cafés e tabacarias.
2 - As AA. põem em contacto as RR. e os retalhistas que, numa fase posterior, distribuem os produtos de tabaco pelos consumidores.
3 - Após a privatização, a R. (1ª) manteve acordos com grossistas de maneira a organizar o escoamento dos produtos de cigarros que produzia.
4 - A R. (2ª) surge, a partir da cisão, como intermediária na relação entre a R. (1ª) e os grossistas.
5 - Os factos referidos no ponto 4 da matéria de facto provada e no ponto 4 da matéria de facto não provada ocorrem por razões de conveniência das RR. às quais os AA são alheios.
6 - O fornecimento dos produtos de Tabaco aos AA. dependia da conduta das duas RR. no sentido de que, se a R. (1ª) não produzisse, a R. (2ª) não poderia fornecer.
7 - A intromissão da R. (2ª) na relação contratual com as AA. foi feita com o propósito de descaracterizar a relação contratual existente.
8 - Após a cisão na T… a R. (1ª), em benefício da R. (2ª), cedeu parcialmente a sua posição nos acordos existentes com os AA., para que esta, enquanto sociedade do grupo, organizasse a relação com os AA. quanto aos aspetos logísticos dessa relação.
9 - A A. DL… assumiu a atividade inicialmente desenvolvida por APSS, APS e MP S, com o conhecimento e autorização da T….
10 - A A. HPM assumiu a atividade inicialmente desenvolvida por HPM…, com o conhecimento e autorização da T….
11 - A A. DTSM… assumiu a atividade inicialmente desenvolvida por FPN, com o conhecimento e autorização da T….
12 - A A. CT… assumiu a atividade inicialmente desenvolvida por JST, com o conhecimento e autorização da T….
13 - A A. MMC assumiu a atividade inicialmente desenvolvida pelo sócio MAP…, com o conhecimento e autorização da T….
14 - A A. … D assumiu a atividade inicialmente desenvolvida por JAO, DRA, Lda, RT, Lda, DT, Lda, ENV, Lda e FR, com o conhecimento e autorização da T…
15 - No início da relação com a T…, AR… tinha que comprar 50 caixas por semana para cumprir as quantidades mínimas estabelecidas e, quando as quantidades mínimas passaram a ser fixadas por distrito, tinha de comprar 60 caixas para cumprir as quantidades mínimas estabelecidas para o distrito de Braga.
16 - Em 2001, as quantidades mínimas aplicáveis à A. ASF… eram de 20 caixas por semana.
17 - No início da relação com a T…, as quantidades mínimas que eram aplicáveis a J.A. eram de cerca de 50 caixas por semana.
18 - Em 1992, as quantidades mínimas que eram aplicáveis a DSGS eram de 17 caixas por semana.
19 - Os demais AA. que iniciaram, diretamente ou através de quem os antecedeu, a atividade de grossista da T… nos anos 40 celebraram com a T… acordos contendo quantidades mínimas de compra de caixas de tabaco.
20 - Conforme acordado anteriormente às CGF e relativamente a todos os AA. que já eram grossistas da T… nos anos 50 e 60, existia uma licença para que os mesmos pudessem vender tabaco que era paga pela T… em nome dos grossistas.
21 - A percentagem referida no ponto 94 da matéria de facto provada era acordada com os AA.
22 - Nos fóruns, a T… dava aos AA. instruções sobre a organização interna e a gestão dos estabelecimentos destes, recomendando aos AA. que se informatizassem, redefinissem rotas, reduzissem custos, rentabilizassem o negócio, se expandissem para outras áreas geográficas e aumentassem a rotatividade dos produtos da T….
23 - A T… dava instruções aos AA. no sentido de estes manterem sempre em stock a quantidade de produtos da T… suficiente para fazer face às vendas de pelo menos uma semana.
24 - Nas visitas que faziam aos armazéns dos AA., os promotores da T… manifestavam a sua pretensão de que os produtos da T… se encontrassem arrumados nos armazéns dos AA. segundo determinada ordem estipulada pela T…
25 - Para que os AA. desenvolvessem atividades promocionais e publicitárias dos produtos da T…, esta forneceu àqueles, para que fizessem chegar aos retalhistas, autocolantes, isqueiros, cinzeiros, baralhos de cartas, t-shirts, casacos, toalhas, bonés, brindes, reclames luminosos e expositores.
26 - A T… dava viagens aos AA. que fizessem publicidade dos produtos daquela junto do retalho.
27 - A T… dava aos AA. recomendações sobre os métodos de revenda dos seus produtos ao retalho.
28 - A T… exigia aos AA. que os produtos daquela fossem expostos em lugar de destaque em detrimento dos produtos da concorrência.
29 - Nas fiscalizações aos armazéns das AA., a T… verifica as quantidades de produtos de tabaco de marcas concorrentes que lá existem.
30 - Foi em execução dos acordos que mantinham com a T… que os AA participaram nas campanhas de incentivos mencionadas no ponto 17 da matéria de facto provada.
31 - A partir de 2006, as RR. ameaçaram cortar o fornecimento de tabaco se as condições gerais de fornecimento não fossem seguidas.
32 - As RR. reduziram a margem dos grossistas como referido no ponto 107 da matéria de facto provada de forma a aumentar significativamente a margem e os lucros daquelas.
33 - A A. …D recusou a alteração prevista nas CGF de 2009 em matéria de forma de pagamento das faturas.
34 - A redução da margem dos grossistas não implicou qualquer redução do peso do volume de venda dos produtos da T… no volume de vendas dos grossistas.
35 - Se um grossista vender produtos da T… a outro grossista passa a ser considerado um distribuidor passivo, o que implica a redução da sua margem.
36 - Muitos distribuidores mais pequenos tornaram-se insolventes por força de serem integrados num escalão com condições comerciais menos vantajosas.
37 - Se os concorrentes da T… baixassem as margens dos distribuidores dos seus produtos, a distribuição dos seus produtos seria afastada do leque de vendas dos distribuidores.
38 - O consumo de cigarros foi, em milhares de unidades, de 17.141.022 em 2005, de 18.971.802 em 2006, de 12.777.368 em 2007, de 12.915.815 em 2008 e de 10.864.621 em 2009.
39 - No dia 23 de Novembro de 2010, num encontro das T… com os grossistas, o administrador-delegado da R. (2ª) disse que o que as RR. esperavam da redução da margem era provocar a concentração entre distribuidores e que os mais pequenos deixassem a atividade de distribuição.
40 - Toda a assistência aos clientes dos revendedores grossistas é prestada pela R. (2ª).
41 - A introdução do fator de correção teve em vista eliminar ganhos dos revendedores grossistas provenientes do aumento mínimo dos PVP necessário para cobrir o aumento de impostos e, assim, manter a sua margem bruta.
42 - A existência e a forma de estabelecimento dos escalões têm por base a existência histórica de assimetrias distritais em matéria de vendas e consumo de cigarros.
43 - A inexistência de escalões e inerentes intervalos diferenciados por distrito levaria a que, nas zonas do país de menor procura e consumo, os revendedores grossistas tivessem pouco ou nenhum interesse na aquisição de produtos das RR., com os consequentes prejuízos para os consumidores dessas zonas.
44 - O total de clientes em Portugal adquiriu produtos de tabaco da T… no valor total de €1.639.789.195.
(…)[6]
IV. Apreciação 1ª questão: Da nulidade da sentença por falta de fundamentação:
Sustentam as recorrentes que a decisão recorrida conclui que as Rés não estavam obrigadas a explicar às Autoras o que era e como funcionava a cláusula relativa ao factor de correcção, fundamentando este entendimento apenas em que “não se justificava”, “sendo certo que havia Tabelas de fator de correção e que a T… comunicava aos AA. a modificação do fator de correção”. Ora, isto corresponde à inexistência de fundamentação relativamente ao segmento decisório da improcedência que se refere ao pedido relativo ao factor de correcção, originando a nulidade da sentença nos termos do artigo 615º, nº 1, al. b) do Código de Processo Civil.
As recorridas sustentam inversamente, defendendo que nem sequer existe fundamentação insuficiente pois que existe uma relação de prejudicialidade visto que o tribunal considerou “provado que o que existe é uma sucessão de contratos de compra e venda entre as partes”. O tribunal recorrido considerou também, no despacho de admissão do recurso, que não ocorria a mencionada nulidade.
Sem dúvida que as decisões judiciais têm de ser fundamentadas, o que desde logo resulta do artigo 205º, nº 1, da Constituição da República Portuguesa – enquanto demonstração de que o exercício da judicatura se conforma com a soberania popular mediante a utilização do critério definidor desta (a lei – vs. o arbítrio) e portanto enquanto constituinte da garantia mesma da autoridade judicial – preceito que se reverte na legislação ordinária no artigo 154º do Código de Processo Civil, ao estatuir este que as decisões sobre qualquer pedido controvertido devem ser fundamentadas e a fundamentação não pode consistir na simples adesão aos argumentos utilizados por alguma das partes.
Porém, constitui entendimento uniforme da jurisprudência que a violação de tal dever de fundamentação que origina a nulidade da sentença é apenas a falta absoluta de fundamentação, e não apenas a deficiência ou insuficiência da fundamentação, situação que é valorada, como aliás as recorrentes bem acabam a reconhecer, sob a perspectiva do erro de julgamento.
O deferimento de um pedido, neste caso relativo ao pagamento de diferenças ou reembolso de quantias alegadamente indevidamente pagas por efeito da introdução do factor de correcção, assenta sempre nos factos respectivos e por outro lado na valoração desses factos segundo o direito que é, bem ou mal, convocado.
Ora, o tribunal recorrido deu como provados determinados factos na sentença recorrida (note-se a referência ao facto provado 29, referência pela qual o tribunal parece muito sinteticamente explicar, na fundamentação jurídica, o que é o factor de correcção) e convocando, posteriormente, o universo dos institutos jurídicos a que fez submeter a qualificação da relação, e subsequentemente o regime jurídico das cláusulas contratuais gerais (referência ao artigo 6º) concluiu que “não se justificava explicar” porque o preceito só manda explicar quando “se justifique” o que só pode ser entendido como o tribunal recorrido entender assim, implicitamente, que não se justifica porque, sendo fornecidas as tabelas, elas são claras e não precisam de explicação.
Não ocorre no presente caso a inexistência total e absoluta de fundamentação, ainda que a fundamentação seja manifestamente parca.
Por outro lado, nas conclusões do recurso que à arguição da nulidade se reportam, as recorrentes fazem também menção da violação do artigo 607º, nº 4 e 5, do Código de Processo Civil, preceito que organiza os meios ou elementos e a metodologia no seu tratamento que permite a fundamentação da decisão a prolatar. Mas esta violação não tem tratamento autónomo em matéria de nulidade da sentença face ao preceito taxativo que a consagra – artigo 615º do Código de Processo Civil – e no mais, o argumento consubstanciador utilizado – a ignorância que o tribunal fez à prova produzida pelas Autoras – tem tratamento em sede de impugnação da decisão sobre a matéria de facto – e a subsequente invocação de que tal ignorância nem sequer foi justificada tem tratamento sob a previsão do artigo 662º, nº 2, alínea d), do mesmo diploma, que tanto pode ocorrer oficiosamente como a pedido, pedido que no caso do presente recurso não foi formulado.
Em suma, concedendo-se na parca fundamentação do julgado, não se concede porém na invocada nulidade da sentença.
Uma última nota para dizer que embora na alínea ZZ das conclusões do recurso se aponte à sentença o não conhecimento da questão do negócio usurário, não foi arguida formalmente a nulidade da sentença com esse fundamento.
Improcede assim esta primeira questão do recurso. 2ª questão:Se deve ser revogado o despacho que indeferiu a arguição de nulidade do depoimento da testemunha VE, por violação do segredo profissional, com a consequência da inutilização da contribuição do depoimento prestado para a formação da convicção do tribunal relativamente aos factos sobre que incidiu.
Como consta do relatório supra, no prosseguimento da audiência final na sessão de 2 de Maio de 2017, procedeu-se à inquirição da testemunha das RR. VE... Ao interrogatório preliminar e perante o facto de ser advogado inscrito na Ordem respectiva desde 1984 e quanto ao depoimento, respondeu: “Relativamente ao período que eu estou disponível para prestar depoimento que acaba em junho de 2001, durante esse período, era pura e simplesmente trabalhador da T… e era o diretor dos serviços jurídicos da T…, não exercia de modo nenhum patrocínio judiciário, isso era com advogados externos. A partir de 2001 para a frente intervim, mas em processos, mas quanto a isso não me é dado prestar depoimento, está abrangido pelo segredo profissional”. Mais esclareceu que após 2001 interveio em três processos judiciais, num deles pelo menos em execução de mandato forense, pelo que quanto a este período posterior já não estava disponível para depor. Perguntado se havia requerido a dispensa de sigilo, respondeu que se informara (junto do site da Ordem) e que o sigilo não abrangia os advogados vinculados por contrato de trabalho, pelo que não havia pedido tal dispensa.
Concluído o interrogatório preliminar, o il. Mandatário das AA. pediu a palavra e ditou incidente de impugnação da testemunha, no essencial invocando que a testemunha é advogado e sócio de uma sociedade de advogados, que não corresponde à verdade que o sigilo não vincule os advogados contratados mediante contrato de trabalho, que a testemunha ao interrogatório preliminar não disse que interveio (patrocinou) um processo que envolveu as RR. e um grossista com questões idênticas às que se discutem nestes autos, razão pela qual não pode aqui intervir com conhecimentos que lhe resultaram desse processo, por via do artigo 92º, nº 1, al. a) e nº 2 do Estatuto da Ordem dos Advogados – sendo que o contrato que vincula o advogado à parte, qualquer que seja, não o exime do cumprimento dos seus deveres deontológicos – e não tendo pedido a dispensa, conforme devia por força do artigo 94º nº 5 do mesmo Estatuto, o seu depoimento não pode fazer prova em juízo. Mais declarou ter documentos para juntar.
A Mmª Juiz a quo de pronto referiu que não queria documentos, deu seguidamente a palavra ao il. Mandatário das RR, que se opôs à impugnação, esclareceu, à observação subsequente do il. Mandatário das AA. de que podia juntar documentos, que os documentos só seriam a juntar se a impugnação fosse admitida, e seguidamente proferiu despacho que não admitiu a impugnação e não admitiu a junção de documentos, tendo condenado as AA. nas custas do incidente, fixando a taxa de justiça em 1 UC.
Os termos fundamentadores deste despacho foram, como resulta da gravação: “(…) Nos termos do artigo 514 do Código do Processo Civil a parte contra a qual foi produzida a testemunha pode impugnar a sua admissão com os mesmos fundamentos, porque o Juiz deve obstar ao depoimento, decorre do disposto do artigo 497 número 3 do Código do Processo Civil, que devem escusar-se a depor, os que estejam adstritos ao segredo profissional, ao segredo dos funcionários públicos e ao segredo do Estado relativamente aos factos abrangidos pelo sigilo. Não se vislumbra que o sigilo profissional seja fundamento da impugnação, saber se há violação ou não do segredo profissional, dependerá das perguntas que forem feitas, da invocação ou não do segredo profissional pela testemunha face às perguntas feitas e, não havendo recusa a depor, se a resposta dada diz respeito a factos que advém do exercício da atividade de advogado. O facto de determinadas declarações constituírem violação do segredo profissional não obsta ao depoimento por parte da testemunha, mas apenas que as declarações da parte em que violam o segredo profissional, não podem fazer prova em juízo. Pelo exposto não admito a impugnação e não admito a junção do documento sendo certo que a junção do documento só era possível se a impugnação fosse admitida e a testemunha perguntada a matéria de facto, a não confessasse. Artigo 515, número 1, Código de Processo Civil”.
Seguidamente, porém, pediu a compreensão das partes para que o despacho dado não significava que tudo o que fosse deposto pudesse ser valorado.
A testemunha prestou o seu depoimento, e depois de inquirido pelo il. Mandatário das RR., passou a responder às perguntas do il. Mandatário das AA., tendo afirmado que quando iniciou funções mediante recibo verde, em 1988, a actividade que neles declarava era “consultoria”. Esclareceu: “O que eu fui fazer foi dar apoio à celebração de contratos da área comercial”. Perguntado se era assessoria jurídica, respondeu: “Sim, sim, sim”. Perguntado sobre as funções que desempenhou a partir da assinatura de contrato de trabalho, e concretamente se “Era também assessoria jurídica”, respondeu: “Oiça, um director jurídico é mais um administrador da área. Eu nessa altura discutia com os meus colegas os pareceres, nós dávamos opiniões sobre o que é que a empresa devia fazer, sobre a área laboral, sobre (…)”. Perguntado “Participou na elaboração das tabelas?”, respondeu: “Quando eu cheguei as tabelas já existiam. Todos os 6 meses participava na elaboração das condições gerais de fornecimento. Perdão, novas tabelas”. E de novo perguntado “Mas era assessoria jurídica?”, respondeu: “Oiça era assessoria jurídica, o meu colega de finanças era assessoria de finanças, o colega da comercial (…), juntávamos os três e púnhamos aquilo no mercado com a nossa assinatura”. Perguntado se “O Sr. Dr. focava-se na assessoria?” respondeu: “A minha função era gerir a área jurídica, não era elaborar pareceres”. Ouvindo-se relativamente mal o depoimento a partir daqui, ouve-se porém a referência a “nós somos advogados da empresa generalistas” como explicação para que, para as coisas mais complicadas, era pedido a advogados externos. Perguntado “Falou numa decisão de 86 (…)” (do Conselho da Concorrência), respondeu “Penso que apareceu o processo (em 86) e penso que a decisão terá sido tomada mais tarde, (em 88), a empresa recorreu, e a sentença, o caso julgado só em 93”. Perguntado: “Não acompanhou a evolução desse processo, dessa decisão, do recurso?” respondeu “Se eu acompanhei? Quem tinha de fazer o interface com o escritório dos advogados, é evidente que era eu”.
No final do depoimento o il. Mandatário das AA. arguiu a nulidade do depoimento, renovando os argumentos utilizados, e assinalando que as funções de assessoria jurídica são acto próprio da profissão de advogado, e portanto, mesmo que prestadas sob contrato de trabalho, não isentam o advogado do cumprimento do dever de sigilo. Pronunciaram-se as RR em sentido oposto.
O tribunal, por despacho escrito de 24.05.2017, indeferiu a arguição de nulidade, considerando, além do mais, que:
“Apesar de a testemunha V… ter reconhecido que, desde 1984, está inscrito na Ordem dos Advogados, o mesmo referiu que, desde a Páscoa de 1990 até finais de junho de 2001, foi funcionário da T…, exercendo as funções de diretor dos serviços jurídicos, não resultando do seu depoimento que, quanto aos factos em relação aos quais depôs, tenha exercido qualquer atividade própria das suas funções de advogado, sendo de salientar que a testemunha referiu que foi um escritório de advogados que prestou à T… serviços de aconselhamento jurídico. Assim, não se pode considerar que o depoimento daquela testemunha está abrangido pelo segredo profissional (www.dgsi.pt Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa proferido a 10 de novembro de 2016, processo 782/14.2TVLSB-A.L1-6)”.
É deste despacho que, como o identificam as AA. nas alegações, vem interposto recurso.
Comecemos pelo princípio, deixando algumas notas:
Na tramitação do incidente de impugnação, o raciocínio do tribunal recorrido foi o de que não resulta directamente do artigo 497º nº 3 do CPC que o simples facto de alguém ser advogado o impede de prestar depoimento, pois que o segredo só opera relativamente a determinado tipo de conhecimentos, desde logo os que lhe advêm pelo exercício da sua actividade profissional.
É certo que no caso em que o obrigado a sigilo profissional vem declarar que não vai violar tal sigilo, que o depoimento que pode fazer é apenas aquele que não viola o sigilo, o tribunal não tem, ab initio e sem mais, que o impedir de prestar depoimento.
Já porém, se findo o interrogatório preliminar, a parte contra a qual a testemunha é oferecida, suscita que tal violação vai ocorrer – porque, mesmo relativamente ao período indicado pela testemunha, não deixa de se impor o segredo sobre advogados de empresa – o caminho a seguir, por via da conjugação dos artigos 514º e 515º, ambos do CPC, é o de ponderar se a impugnação deve ser admitida, isto é, se corresponde a fundamento legalmente previsto para se impedir alguém de depor, ou seja, decidir se o facto de se ser advogado contratado exime o mesmo do segredo profissional ou não (fundamento invocado pela própria testemunha para cobrir a legalidade do depoimento que pretendia realizar, e desmentido pela parte contra a qual a testemunha foi oferecida, constituindo portanto matéria litigiosa a decidir após a ponderação da factualidade relevante), e na perscrutação desta questão, haverá que confirmar exactamente se a pessoa em questão foi “advogado para a empresa”, designadamente porque para ela exerceu actos próprios da profissão de advogado.
Seria assim mais correcto perguntar à testemunha exactamente que funções havia desempenhado, em que é que a função de director de serviços jurídicos se concretizava, para apurar se havia aí a prática de actos próprios da advocacia.
Na prática, a resposta a esta pergunta não feita, foi dada a final, depois do depoimento prestado e em função do depoimento prestado, e já em resposta dispositiva à arguição de nulidade do depoimento.
No fundo, é como se a decisão do incidente de impugnação tivesse sido postergada para após a prestação do depoimento, o que de todo não é conforme com a lógica da conjugação dos artigos 514º e 515º do CPC, inutilizando-a, e sobretudo impedindo que um cuidado do legislador pudesse ser efectivado, a saber, evitando o propósito que resulta do artigo 515º nº 2 do CPC quando determina o conhecimento imediato do incidente, concentrando toda a fundamentação pertinente à decisão no momento inicial, justamente para evitar que, já depois de ouvido o depoimento se venha dizer que ele ou parte dele não pode ser valorado, com o que já não se evita que tudo o que dele constou tenha sido ouvido pelo julgador.
Descrevendo a prática e teleologia da tramitação do incidente de impugnação, veja-se em apoio desta posição, na dgsi, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça sob o nº SJ200612190044467:
“Comecemos pela análise do objecto do incidente de impugnação.
Entre os inábeis para depor como testemunha contam-se os incapazes, os que possam depor como partes e os adstritos ao segredo profissional quanto aos factos por ele abrangidos (artigos 616º, 617º e 618º, nº 4, do Código de Processo Civil).
(…)
O juiz, depois do juramento da testemunha, deve perguntar-lhe se ela é parente, amigo ou inimigo de qualquer das partes, se está para com elas em alguma relação de dependência, se tem interesse directo ou indirecto na causa (artigo 635º, nº 1, do Código de Processo Civil).
E se verificar que o declarante é inábil para ser testemunha, não a admitirá a depor (artigo 635º, nº 2, do Código de Processo Civil).
A parte contra quem for indicada a testemunha pode impugnar a sua admissão com os mesmos fundamentos por que o juiz pode obstar ao seu depoimento (artigo 636º, nº 1, do Código de Processo Civil).
No caso vertente, não foi a testemunha CC que se escusou a depor, nem foi a Juíza, no fim do interrogatório preliminar, a não admitir o seu depoimento, porque foi a parte contrária contra quem ela foi oferecida que deduziu o incidente de impugnação. O incidente de impugnação em causa visa impedir que a testemunha seja admitida a depor.
A impugnação é deduzida após o interrogatório preliminar e, se for admitida, a testemunha é perguntada à matéria de facto e, se a não confessar, o impugnante pode comprová-la por documentos ou testemunhas, findo o que o juiz decide se a testemunha deverá ou não depor (artigo 637º, nºs 1 e 2, do Código de Processo Civil)”, (Sublinhado nosso).
Não incidindo o recurso directamente sobre esta questão, mas sobre o despacho que foi proferido sobre a arguição de nulidade (ainda que se acusando a persistência de nulidade desde a decisão do incidente de impugnação) passemos à argumentação do recurso e das contra-alegações, segundo os respectivos corpos:
Segundo as AA. e recorrentes, prescreve o “n.º 1, do artigo 92.º do Estatuto da Ordem dos Advogados, que “o Advogado é obrigado a guardar segredo profissional, no que respeita a todos os factos cujos conhecimento lhe advenha do exercício das suas funções ou da prestação dos seus serviços”, prevendo-se no n.º 2 do mesmo que “a obrigação do segredo profissional existe quer o serviço solicitado ou cometido ao Advogado envolva ou não representação profissional judicial ou extrajudicial, quer deva ou não ser remunerado, quer haja ou não chegado a aceitar e a desempenhar a representação ou serviço”; “A assessoria jurídica prestada pelo Dr. V… à T…, enquanto Diretor Jurídico, integrava, naturalmente, as funções próprias de um Advogado - cf. n.º 1, do artigo 1.º da Lei 49/2004 de 25 de agosto, e o facto de aquele ser advogado de empresa em nada invalida a obrigação de sigilo profissional”; “Não tendo, in casu, sido solicitada a dispensa de segredo, prevê-se como consequência, no n.º 5 do artigo 92.º do EOA que “Os atos praticados pelo advogado com violação de segredo profissional não podem fazer prova em juízo”.
Invocam as recorrentes que “Esta posição é entendimento consolidado nos nossos tribunais, conforme resulta da análise, entre outros, dos Acórdãos do Tribunal da Relação de Lisboa de 25.03.2014 e de 15.07.2014 e do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 23.01.2003”.
Por outro lado, “(…) é jurisprudência constante da OA (…) que o advogado de empresa também está sujeito a segredo profissional como, aliás, resulta expressamente do preceito do EOA supra citado e é inequivocamente reafirmado, por exemplo, nos seguintes Pareceres da OA: Parecer do Conselho Geral n.º 14/PP/2008-G e Parecer do Instituto dos Advogados de Empresa e do Conselho Geral n.º E-7/2007, de 6.07.2007, de acordo, a título de exemplo do seguinte excerto do 1.º: “11. Portanto, a regra é que todos os advogados são obrigados a guardar segredo profissional no que respeita a todos os factos cujo conhecimento lhes advenha do exercício das suas funções (insiram-se estas no âmbito de uma prestação de serviços ou no âmbito duma prestação laboral).”
Em conclusão, “A prova obtida com violação do dever de segredo profissional que vincula os advogados constitui uma prova materialmente proibida e, por isso ilícita” (cf. sumário do Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 20.06.2012)”.
Deste modo, a “nulidade cometida pelo Tribunal a quo, oportunamente arguida e, bem assim, a decisão do seu indeferimento, não foram sanadas e tiveram manifesta influência na decisão da causa - como resulta da citação do depoimento da referida Testemunha como fundamento de resposta a quesitos essenciais da base instrutória - cf. pág. 124 da Decisão Recorrida – e constitui, além do mais, violação de lei substantiva, é a mesma aqui expressamente reiterada como fundamento do recurso”.
Diversamente, para as Rés e recorridas, “(…) nos termos do artigo 92.º do Estatuto da Ordem dos Advogados (“EOA”): “o advogado é obrigado a guardar segredo profissional no que respeita a todos os factos cujo conhecimento lhe advenha do exercício das suas funções ou da prestação dos seus serviços” – isto é, das funções e dos serviços que preste na qualidade de advogado. 43. Porém, tal como indicado pela própria testemunha no interrogatório preliminar, a mesma mantinha com a, então, T…S.A., um vínculo laboral nos termos do qual exercia funções de “diretor de serviços jurídicos”, isto é, 44. O trabalhador VE… era, em bom rigor, um gestor, na medida em que era responsável por contratar e gerir os assuntos jurídicos da empresa juntos dos advogados e jurisconsultos que, esses sim, prestavam serviços e funções próprios de advogado ao cliente T…, SA. 45. Numa palavra, a testemunha VE… não tinha qualquer mandato forense em seu nome, nos termos do artigo 67.º do EOA, nem prestou serviços de consulta jurídica, nos termos do artigo 68.º do EOA, porquanto tais funções estavam confiadas a advogados externos à empresa – ou seja, a testemunha não prestava serviços próprios de advogado”.
Discorrendo sobre o depoimento prestado, afirmam as recorridas que “(…) o conteúdo do depoimento da testemunha em nada se prende com as suas funções de diretor jurídico: de facto, o contributo que a testemunha V… veio oferecer ao processo – e que, de resto, o Tribunal a quo valorou na página 124 da Sentença Recorrida – decorre, pura e simplesmente, da circunstância de ter sido trabalhador da T…, nessa qualidade, ter obtido conhecimento histórico da evolução da relação comercial entre as partes no processo, como qualquer outro colega seu poderia ter dito, sem que o acesso a essa informação estivesse de alguma forma relacionado com a qualidade de advogado da testemunha: isto é, a explicação quanto à substituição dos contratos pelas Tabelas de Condições realizada pela T… em 1986, tendo apresentado explicação satisfatória para a referência a “contrato”.
Caso assim se não entenda, afirmam ainda as recorridas que tendo o advogado sido oferecido pelo “próprio “suposto” cliente – isto é, o principal beneficiário do segredo profissional, (…)”, estamos, citando Luís Filipa Pires de Sousa, na “situação típica que pode dar azo à exclusão do dever de sigilo é a da pessoa em benefício de quem se estabelece o segredo profissional renunciar a tal benefício”, no mesmo sentido contribuindo Augusto Lopes Cardoso, que citam “(…) convém não esquecer que esta é a grande regra: é, porque o cliente desvincula o advogado do segredo para que esta possa invocar em juízo e provar os factos que lhe tinham sido revelados sob confidência. Nesse caso tal não é apenas lícito, mas indispensável.” Ora, “nenhum dos factos relatados (…) foram revelados “sob confidência” – antes pelo contrário, eram factos do conhecimento geral dos diretores gerais da empresa”.
Citam ainda as recorridas Carlos Campos, quando “realça que o cliente mantém o direito à melhor e mais conveniente defesa dos seus interesses pelo que, caso a caso, e perante a autorização do cliente, o advogado “deve definir e saber, com clareza, que factos pode revelar e que factos devem permanecer sob sigilo”.
Assim, “haverá que não confundir a natureza do segredo profissional (de ordem pública) com o interesse que se destina a proteger, qual seja o do cliente. (…) faz todo o sentido que o segredo profissional do advogado, apesar de revestir interesse de ordem pública, é relativamente disponível por vontade do cliente – no caso, as ora Recorridas”.
“61. Com efeito, nos casos em que o cliente desvincula o advogado do sigilo, o condicionamento da quebra do sigilo profissional à autorização adicional da Ordem dos Advogados, como condição da licitude da quebra do sigilo, não esgota a análise da questão. Isto porque, por um lado (i) a posição da Ordem dos Advogados não vincula o tribunal, nos termos do artigo 135.º do Código de Processo Penal, aplicável ex vi artigo 417.º, n.º 4 do CPC e (ii) mesmo quando o presidente do conselho distrital não defira a quebra do sigilo, esta pode vir a ser imposta pelo tribunal de recurso (com fundamento no princípio da proibição do excesso) em sede de apreciação da justificação da escusa: ou seja, o último guardião da disponibilidade em concreto do sigilo profissional é o tribunal de recurso e não a Ordem dos Advogados”.
Pode em síntese dizer-se então que, para as AA. “Q. Ao valorar (até de modo decisivo - cf. pág. 124) o depoimento da testemunha VE…, prestado na sessão de 2.05.2017, a Decisão Recorrida reiterou a nulidade que já havia cometido quando permitiu a prestação do citado depoimento uma vez que aquela testemunha depôs sobre factos de que tomou conhecimento enquanto advogado (com as funções de Diretor Jurídico da T…), nulidade tempestivamente arguida e com manifesta influência na decisão da causa. (…)” infringindo-se “o disposto no n.º 5 do artigo 92.º do EOA e no n.º 3, do artigo 497.º do CPC, devendo ser revogada e substituída por outra que proceda à apreciação da prova produzida sem a valoração de tal prova materialmente ilícita – cf. demais fundamentos descritos no Ponto IV. B. b), supra”. Já para as RR., e na mesma síntese, “não ocorreu qualquer violação das normas relativas ao segredo profissional, nomeadamente nos termos do artigo 92.º do EOA. N. O trabalhador VE… era, em bom rigor, um gestor, na medida em que era responsável por contratar e gerir os assuntos jurídicos da empresa junto dos advogados e jurisconsultos que, esses sim, prestavam serviços e funções próprios de advogado ao cliente T… (…) não tinha qualquer mandato forense em seu nome, nos termos do artigo 67.º do EOA, nem prestou serviços de consulta jurídica, nos termos do artigo 68.º do EOA, porquanto tais funções estavam confiadas a advogados externos à empresa – ou seja, a testemunha não prestava serviços próprios de advogado. P. Em qualquer caso e ainda que assim não se entendesse, (…) analisamos o depoimento de um advogado que foi arrolado pelo próprio “suposto” cliente – isto é, o principal beneficiário do segredo profissional, (…)”, sendo admissível como causa de exclusão do dever de sigilo a dispensa do segredo por parte do cliente, até porque “o condicionamento da quebra do sigilo profissional à autorização adicional da Ordem dos Advogados, como condição da licitude da quebra do sigilo, não esgota a análise da questão. Isto porque, por um lado (i) a posição da Ordem dos Advogados não vincula o tribunal, nos termos do artigo 135.º do Código de Processo Penal, aplicável ex vi artigo 417.º, n.º 4 do CPC e (ii) mesmo quando o presidente do conselho distrital não defira a quebra do sigilo, esta pode vir a ser imposta pelo tribunal de recurso (com fundamento no princípio da proibição do excesso) em sede de apreciação da justificação da escusa: ou seja, o último guardião da disponibilidade em concreto do sigilo profissional é o tribunal de recurso e não a Ordem dos Advogados”.
Em síntese, para as AA., a testemunha, sendo advogado inscrito na Ordem dos Advogados, contemporaneamente ao período sobre que depôs, e visto que prestou assessoria jurídica, estava obrigado a guardar segredo, o contrário não resultando do facto de ser trabalhador dependente da cliente T…, e para as Rés as funções desempenhadas não foram de mandato nem assessoria, e em qualquer caso as Rés, ao oferecerem-no como testemunha, dispensaram-no do segredo, sendo ainda irrelevante que a testemunha não haja requerido a dispensa, porque em última análise o poder de decisão é do tribunal de recurso.
Ora, a primeira constatação do confronto das teses é esta: as recorridas nada oferecem em contrário à argumentação de que o advogado subordinado está sujeito a sigilo profissional, o que defendem é que este advogado em concreto, apesar de se manter inscrito na Ordem, não exerceu mandato forense nem consulta jurídica, e que todo o conhecimento que revelou no seu depoimento o teve não em função de ser advogado, mas como qualquer outro colega (trabalhador) seu. Também não dizem, se assim por hipótese este tribunal o entender, que o facto do advogado em causa ter sido seu trabalhador o exime do sigilo, defendem antes que o seu oferecimento como testemunha o dispensa desse sigilo.
Donde, metodologicamente e de modo essencial, o caminho a percorrer passa por ouvir o depoimento da testemunha e dessa audição retirar se os conhecimentos revelados foram adquiridos no exercício de funções típicas de advogado, concretamente, na prática de actos próprios de advogado, e se assim se concluir, ponderar então a segunda parte da argumentação das recorridas.
Em todo o caso, sempre se deixa ainda a nota de que não se vê razão para distinguir entre advogados contratados e advogados independentes no que toca ao dever de segredo profissional.
Embora as AA. tenham invocado em seu apoio os Acórdãos desta Relação de 25.3.2014 e de 15.7.2014 e ainda o Acórdão do STJ de 2.10.2003, esse apoio só provém dos respectivos sumários, que genericamente reproduzem o teor do (actualmente) artigo 92º nº 2 do Estatuto da Ordem dos Advogados, que tornam irrelevante para o apuramento do dever de sigilo, o tipo e a consumação da relação que exista entre o advogado e o beneficiário da sua prática profissional.
Em rigor, mais apoio resulta de uma linha de pensamento simples ou prática: se o segredo profissional, concretamente dos advogados, constitui um pilar fundamental operacional da própria ideia de justiça (e consequentemente até da própria democracia), passando da órbitra da confiança do cliente para a órbitra da confiança do cidadão nos profissionais de justiça, como explicar que um advogado que exerce, com independência, actos próprios da sua profissão está sujeito a sigilo profissional mas o advogado que exerce os mesmos actos em regime de subordinação jurídica já não está? Bastaria então vestir uma qualquer roupagem jurídica de dependência para se conseguir o efeito contrário à própria ideia de justiça. A prova mais fundamental de que não pode haver diferença de tratamento reside na plena admissão do exercício da advocacia em regime subordinado mas com ressalva da independência do advogado.
Com efeito, decorre claramente da conjugação dos artigos 66º, nº 1 (Sem prejuízo do disposto no artigo 205.º, só os advogados com inscrição em vigor na Ordem dos Advogados podem, em todo o território nacional, praticar atos próprios da advocacia, nos termos definidos na Lei n.º 49/2004, de 24 de agosto) 73º, nºs 1 a 3, (1 - Cabe exclusivamente à Ordem dos Advogados a apreciação da conformidade com os princípios deontológicos das cláusulas de contrato celebrado com advogado, por via do qual o seu exercício profissional se encontre sujeito a subordinação jurídica. 2 - São nulas as cláusulas de contrato celebrado com advogado que violem aqueles princípios.
3 - São igualmente nulas quaisquer orientações ou instruções da entidade empregadora que restrinjam a isenção e independência do advogado ou que, de algum modo, violem os princípios deontológicos da profissão) 81º nºs 1 a 4 (1 - O advogado exercita a defesa dos direitos e interesses que lhe sejam confiados sempre com plena autonomia técnica e de forma isenta, independente e responsável. 2 - O exercício da advocacia é inconciliável com qualquer cargo, função ou atividade que possa afetar a isenção, a independência e a dignidade da profissão. 3 - Qualquer forma de provimento ou contrato, seja de natureza pública ou privada, designadamente o contrato de trabalho, ao abrigo do qual o advogado venha a exercer a sua atividade, deve respeitar os princípios definidos no n.º 1 e todas as demais regras deontológicas que constam do presente Estatuto. 4 - São nulas as estipulações contratuais, bem como quaisquer orientações ou instruções da entidade contratante, que restrinjam a isenção e a independência do advogado ou que, de algum modo, violem os princípios deontológicos da profissão) e 88º a 113º (Título III – Deontologia Profissional, onde se insere o artigo 92º) do actual Estatuto da Ordem dos Advogados, aprovado pela Lei nº 145/2015, de 09 de Setembro, que só os advogados inscritos podem exercer actos próprios da profissão de advogado, e que os advogados, mesmo que exerçam as suas funções em regime de subordinação ou dependência, por contrato de trabalho ou por outra modalidade contratual que determine alguma forma de dependência, gozam das mesmas garantias de independência que os advogados independentes dos beneficiários da sua prestação profissional, e em consequência estão sujeitos aos mesmos princípios deontológicos destes últimos.
Neste sentido, ainda que reportado ao Estatuto da Ordem dos Advogados aprovado pela Lei n.º 15/2005, de 26 de Janeiro de 2005, o Parecer da Ordem dos Advogados nº 14/PP/2008-G, de 28.7.2008 (João Loff Barreto), respondendo além do mais à pergunta “um advogado de empresa está ou não sujeito a sigilo profissional?”:
«c) Segredo profissional: um dever de toda a classe
24. Também não se pode deixar de sublinhar que as exigências e imperativos do segredo profissional são timbre da advocacia e condição sine qua non da sua dignidade. Com efeito, o segredo profissional não é só, em rigor, um dever do Advogado por pertencer a uma classe, mas é, e sobretudo, um dever de toda essa classe e, por isso, vinculativo e obrigatório para cada membro dela (cfr. Dr. Fernão Fernandes Thomaz, Parecer do Conselho Geral de 02/04/1981, In ROA, Ano 41, Setembro - Dezembro 1981, fls. 900 ss.).
B) ADVOGADOS DE EMPRESA
25. Feito o enquadramento geral da questão, ressalta com meridiana clareza que os chamados “advogados de empresa” não estão, nem devem estar, subtraídos ao dever de sigilo que impende sobre os demais. De outra forma todo o sistema do sigilo profissional enfermaria de manifesta incongruência.
26. Importa notar que todo o advogado que tem a sua inscrição em vigor na Ordem dos Advogados e que exerce actos típicos da profissão, nomeadamente de consulta jurídica, só pode ser considerado como agindo nessa mesma qualidade e está integralmente adstrito ao cumprimento dos deveres consignados no Estatuto da Ordem dos Advogados (EOA), aprovado pela Lei n.º 15/2005, de 26 de Janeiro, nomeadamente ao dever de sigilo profissional. É o que resulta do disposto nos arts. 61.º, 63.º, 83.º, 87.º, e n.º 1, do art. 109.º todos do EOA conjugado com o disposto na alínea b) do n.º 5, do art. 1.º e art. 3.º ambos da Lei n.º 49/2004, de 24 de Agosto.
27. A circunstância desse advogado exercer as suas funções para determinada “empresa”, à qual esteja ligado ao abrigo de um contrato de trabalho, “apenas” obriga a acautelar que os termos desse contrato estejam em conformidade com os princípios deontológicos da profissão, salvaguardando nomeadamente a sua isenção e a independência cf. art. 68.º do EOA, não tendo a virtualidade de o dispensar do cumprimento de qualquer um desses deveres.
28. Neste sentido o Parecer do Instituto dos Advogados de Empresa e do Conselho Geral n.º E-7/2007, de 6 de Julho de 2007: “(…) em lado nenhum encontramos qualquer discriminação legal negativa de qualquer Advogado (desde que com inscrição em vigor na Ordem dos Advogados), designadamente de qualquer Advogado que exerce a sua profissão no âmbito de uma relação jurídico-laboral.
Antes pelo contrário, o artigo 68º do EOA veio explicitamente consagrar, “urbi et orbe”, a plena compatibilidade de exercício da Advocacia com a subordinação jurídica. Mais do que isso, tal preceito veio mesmo salvaguardar e garantir o exercício da Advocacia nesse contexto de vínculo jurídico-laboral nos ditames da isenção, autonomia e independência técnicas do Advogado e dos princípios deontológicos da profissão.” IN Base de Dados de Jurisprudência da Ordem dos Advogados http://jurisprudencia.oa.pt/.
29. E o Bastonário Augusto Lopes Cardoso é igualmente claro: “O Advogado vinculado por contrato de trabalho não pode ter uma dupla veste, com deontologias diferentes, e antes deve opor-se tenazmente à aparente «vantagem» que daí lhe adviesse, e que, de facto, mais não seria do que uma capitis diminutio à sua inteireza profissional. Se é certo que a sua relação laboral, no dizer do EOA, «não pode afectar a sua plena isenção e independência técnica perante a entidade patronal, nem violar o presente Estatuto, não tem o direito nem se lhe pode exigir que tenha o dever de ter um regime diferente em matéria tão transcendente como a do segredo profissional” IN Augusto Lopes Cardoso, Do Segredo Profissional da Advocacia, pag. 45, Centro Editor Livreiro da Ordem dos Advogados,
(…)
Decidindo:
1. Responde-se à primeira questão posta – a única de âmbito geral – afirmando que os chamados “advogados de empresa” estão sujeitos ao sigilo profissional, tal como os demais». (fim de citação).
No mesmo sentido, a consulta nº 18/2014, de 13 de Agosto, relativa a um advogado que exercia funções ao abrigo dum contrato de prestação de serviços em regime de avença, onde se lê a dado passo: “Pelo que, relativamente aos factos (ainda que globalmente considerados) de que o Senhor Dr. A teve conhecimento por força dos serviços prestados à Junta de Freguesia de - , não nos suscita dúvidas a sujeição ao dever de sigilo profissional, por força do disposto no artigo 87º do Estatuto”. (fim de citação).
Não havendo tratamento diferenciado entre advogados independentes e advogados de empresa, do que se trata é mesmo de saber se este advogado em concreto, a testemunha em causa, exerceu ou não actos próprios de advogado durante a sua prestação laboral – e adiante-se, para-laboral – e se foi no seu exercício que tomou conhecimento dos factos que veio ao tribunal depor.
Ora, ouvido integralmente o depoimento, não temos, ao contrário do que a própria testemunha afirma na parte final do mesmo, que os conhecimentos que trouxe ao tribunal pudessem ser igualmente detidos por quaisquer outros colegas de outras áreas. Isso é evidente nas explicações especificamente jurídicas que a testemunha deu. A testemunha veio falar sobre a evolução histórica dos contratos (que ligaram os grossistas à T…) para a tabela de venda e posteriormente para as condições gerais de fornecimento. Indiscutivelmente, retira-se do depoimento, os grossistas faziam e fazem distribuição – a T… não poderia ela mesma alcançar cerca de setenta mil postos de venda ao consumidor final – e nos idos da década de 80 do século passado havia contratos. Em face da adesão de Portugal às então Comunidades Europeias e por isso à liberalização do mercado e à esperada entrada de concorrentes internacionais, as autoridades nacionais começaram a preocupar-se com cláusulas que existiam nesses contratos que se afiguravam como contrárias à livre concorrência. Tais cláusulas acabaram por ser eliminadas. Do mesmo modo, surgiu legalmente a necessidade de existência de tabelas de vendas. Depois da privatização, o adquirente maioritário quis implementar a sua própria política, que era de separação da produção e da distribuição. Em função destes acontecimentos, os contratos não podiam subsistir, mas existindo, havia que lhes pôr termo – daí que na aceitação das condições gerais que não são em si um contrato, na opinião da testemunha, se inclua, no escrito denominado contrato mas que não é um contrato, uma segunda cláusula que é sim um acordo de revogação dos contratos anteriores, ou seja, uma verdadeira cláusula contratual.
Não interessa particularmente prosseguir: - tudo o que a testemunha afirma em termos de opinião jurídica vale apenas como opinião que não vincula de modo algum o tribunal, ao qual compete interpretar e aplicar o direito, segundo o artigo 5º nº 3 do CPC. Já o encadeado histórico, das razões que levaram a T… a passar dos contratos para as tabelas de venda e para as condições gerais de fornecimento é factual, em concreto, o que é factual é a tomada de posição que a T… teve perante a actuação das autoridades de concorrência e as decisões que tomou relativamente aos títulos jurídicos atinentes ao relacionamento factual com os grossistas.
Aliás, diga-se em abono da verdade que a testemunha não veio trazer aos autos nada mais do que deles já constava em termos documentais: - há documentação sobre os contratos antigos e as cláusulas que deles constavam, há documentação sobre a queixa da P… às autoridades nacionais de concorrência (digamos assim abreviadamente sem especificação da personalidade jurídica concretamente envolvida, por mera facilidade expositiva) que sentia a ligação entre a T… e os grossistas como um entrave à sua expansão no mercado nacional, há documentação sobre a actividade das autoridades de concorrência, há documentação sobre as exigências governamentais do processo de privatização e sobre os compromissos assumidos pela adquirente P….
Mas a questão aqui é decidir se houve violação de segredo, e ela passa por saber se estes conhecimentos que a testemunha trouxe foram por ela obtidos no (e por causa do) exercício de actos próprios de advocacia integrantes do seu exercício funcional enquanto prestador de serviços e trabalhador subordinado.
Ora, embora oscile a dificuldade em perceber concretamente o que a testemunha fez, porque algumas vezes fala na primeira pessoa do singular pondo-se na posição da T…, temos pelo menos certo que enquanto prestador de serviços fez, nas suas palavras, consultoria jurídica relativamente a contratos da área comercial (o que não indica necessariamente que fossem contratos com grossistas, mas não os exclui) e que, não tendo elaborado as primeiras tabelas, no entanto participou semestralmente na revisão das tabelas, enquanto duraram, e que no seu tempo foram substituídas pelas condições gerais de fornecimento, participando na revisão destas também, contribuindo, naturalmente, com a sua área de formação profissional, para a emissão das mesmas, contribuição que, a final, respondeu ser assessoria jurídica. É desde logo evidente que quem tem conhecimento, quer das complexidades jurídicas anotadas como contrárias à livre concorrência pelas autoridades respectivas, quer das intenções e compromissos da adquirente na privatização, sabe que, independentemente da posição jurídica qualificativa que se possa ter quanto às tabelas e condições, nestas não podem constar cláusulas que contrariem as referidas complexidades, desde logo no que diz respeito a exclusividade mas também a escalões de desconto e quantidades mínimas discriminatórias entre grossistas, questões sobre as quais incidiu também a atenção das autoridades de concorrência justamente pela potencialidade fidelizante de tais cláusulas. Portanto, se dos colegas da área comercial e da área financeira viesse uma proposta de revisão das condições gerais de fornecimento que fosse susceptível de vir a provocar uma actuação das autoridades da concorrência, à testemunha em causa cumpriria impedir que isso sucedesse, impedimento a que chegaria por convocação do seu conhecimento jurídico e também do conhecimento factual da evolução histórica sobre que veio depor. Aliás, a testemunha foi clara: desde a decisão judicial de 1993 já se sabia que cláusulas dessas (sobretudo exclusividade) não podiam manter-se, e que os contratos não eram a solução, donde havia que pensar noutras soluções, tendo aliás a testemunha elaborado um parecer que levou à criação de uma sociedade (S…) através da qual a T… não violava a concorrência porque participava ela mesma na distribuição, solução que teve de ser abandonada por via da privatização. É por isso certa a resposta de que a testemunha em causa fazia assessoria jurídica a estas questões. Tal como também, ainda que não tivesse explicado quem decidia, dentro da T…, se os assuntos eram mais complexos e por isso tinham de ser decididos por advogados externos, a testemunha fazia a ligação com os referidos advogados externos, tendo por isso também conhecimentos, desde logo ao nível das questões que estavam para ser analisadas e da documentação pertinente a enviar ou satisfazer aos escritórios externos, sobre a referida evolução de tratamento formal da relação factual com os grossistas.
Em bom rigor até, repare-se que a testemunha não afirmou durante o seu depoimento que, primeiro, não fosse enquanto prestador de serviços e trabalhador subordinado simultaneamente advogado com inscrição em vigor na Ordem respectiva, e segundo, que as suas funções em concreto (tirando a menção ao director do departamento jurídico ser mais um gestor) não correspondessem à prática de actos próprios de advogado – daí que assumisse as respostas de que fez consultoria e assessoria jurídica e daí a menção a advogados de empresa generalistas – justamente porquanto desde logo se disponibilizou a prestar depoimento apenas na parte em que não violasse o sigilo profissional, e a razão que apresentou para essa não violação foi a de que os advogados de empresa não estavam sujeitos a segredo. Implicitamente, ao menos, expressou a testemunha que tinha sido advogado de empresa e que no fundo a sua actuação durante aquele período o fora nessa qualidade.
Ao tempo em que a testemunha exerceu as funções (1988 a 2001) estava em vigor o Estatuto da Ordem dos Advogados aprovado pelo Decreto-Lei nº 84/84 de 16 de Março, cujo artigo 81º nº 1 prescrevia: “1 - O advogado é obrigado a segredo profissional no que respeita: a) A factos referentes a assuntos profissionais que lhe tenham sido revelados pelo cliente ou por sua ordem ou conhecidos no exercício da profissão; (…)”. Já o nº 2 do mesmo preceito estabelecia: “2 - A obrigação do segredo profissional existe quer o serviço solicitado ou cometido ao advogado envolva ou não representação judicial ou extrajudicial, quer deva ou não ser remunerado, quer o advogado haja ou não chegado a aceitar e a desempenhar a representação ou serviço, o mesmo acontecendo para todos os advogados que, directa ou indirectamente, tenham qualquer intervenção no serviço”.
O artigo 53º do mesmo Estatuto prescrevia: “1 - Só os advogados e advogados estagiários com inscrição em vigor na Ordem dos Advogados podem, em todo o território nacional e perante qualquer jurisdição, instância, autoridade ou entidade pública ou privada, praticar actos próprios da profissão e, designadamente, exercer o mandato judicial ou funções de consulta jurídica em regime de profissão liberal remunerada. 2 - O exercício da consulta jurídica por licenciados em Direito que sejam funcionários públicos ou que a exerçam em regime de trabalho subordinado não obriga à inscrição na Ordem dos Advogados. (…)”.
No artigo 54º do mesmo Estatuto lia-se: “1 - O mandato judicial, a representação e a assistência por advogado são sempre admissíveis (…)”.
Não continha portanto o Estatuto, uma definição do que fossem actos próprios de advocacia, sendo certo que nas funções de um advogado estaria o mandato judicial, a representação e a assistência. Para a eventual discutibilidade do que seja a assistência, é certo ainda que a consulta jurídica estava também prevista no Estatuto, sendo aliás reservada a advogados e solicitadores e a escritórios exclusivamente constituídos por estes, tirando as excepções relativas a associações sindicais, patronais e outras, como resulta do artigo 56º.
Do nº 2 do artigo 53º não pode retirar-se nenhum argumento em defesa da isenção de sigilo aos advogados de empresa, já que a tanto se opõe o artigo 55º (O contrato de trabalho celebrado pelo advogado não pode afectar a sua plena isenção e independência técnica perante a entidade patronal, nem violar o presente Estatuto), sendo apenas certo desse nº 2 do artigo 53º que licenciados não inscritos podiam exercer consulta jurídica a favor dos seus empregadores. Já porém, estando esses mesmos licenciados inscritos como advogados na Ordem, então não é possível dissociar a qualidade de advogado inscrito do exercício da consulta jurídica sujeita à não violação do Estatuto, e portanto à observância do dever de sigilo constante do já transcrito artigo 81º.
Esta versão do Estatuto foi revogada e substituída pela aprovada pela Lei nº15/2005 de 26 de Janeiro, que, porque subsequente à publicação do Decreto-Lei nº 49/2004 de 24 de Agosto, já estabelece no artigo 61º que “1 - Sem prejuízo do disposto no artigo 198.º, só os licenciados em Direito com inscrição em vigor na Ordem dos Advogados podem, em todo o território nacional, praticar actos próprios da advocacia, nos termos definidos na Lei n.º 49/2004, de 24 de Agosto”.
A partir desta versão do Estatuto, podemos densificar ou concretizar o conteúdo funcional da advocacia: de acordo com o artigo 62º: “1 - Sem prejuízo do disposto na Lei n.º 49/2004, de 24 de Agosto, considera-se mandato forense: a) O mandato judicial para ser exercido em qualquer tribunal, incluindo os tribunais ou comissões arbitrais e os julgados de paz; b) O exercício do mandato com representação, com poderes para negociar a constituição, alteração ou extinção de relações jurídicas; c) O exercício de qualquer mandato com representação em procedimentos administrativos, incluindo tributários, perante quaisquer pessoas colectivas públicas ou respectivos órgãos ou serviços, ainda que se suscitem ou discutam apenas questões de facto” e de acordo com o artigo 63º: “Constitui acto próprio de advogado o exercício de consulta jurídica nos termos definidos na Lei n.º 49/2004, de 24 de Agosto”.
Estas definições, mantém-se na versão actual, aprovada pela Lei nº 145/2015 de 9 de Setembro, nos artigos 66º a 68º.
A Lei n.º 49/2004, de 24 de Agosto, não foi objecto de qualquer alteração, havendo numerosas vozes que por tal pugnam e tendo aliás um anterior Governo, na sequência do Memorando de Entendimento sobre as Condicionalidades de Política Económica, celebrado entre a República Portuguesa e o Banco Central Europeu, a União Europeia e o Fundo Monetário Internacional, e com vista ao aperfeiçoamento e melhoramento das profissões jurídicas reguladas, designadamente da advocacia e da solicitadoria, proposto alterações, lendo-se na exposição de motivos dessa proposta, além do mais, “Por fim, com vista a uma melhor clarificação dos atos próprios dos advogados e dos solicitadores e com o objetivo de efetivamente se poder combater as práticas ilícitas de procuradoria elimina-se a salvaguarda da prática de determinados atos próprios dos advogados e dos solicitadores por quem não seja advogado ou solicitador quando praticado pelo próprio e no seu interesse ou no interesse de terceiros, nomeadamente por representantes legais, empregados, funcionários ou agentes de pessoas singulares ou coletivas, públicas ou privadas, uma vez que tal salvaguarda tem sido usada para o fomento massivo da procuradoria ilícita”.
Dispõe a referida Lei nº 49/2004:
“1 – Apenas os licenciados em Direito com inscrição em vigor na Ordem dos Advogados (…) podem praticar os actos próprios dos advogados (…). 2 - Podem ainda exercer consulta jurídica juristas de reconhecido mérito e os mestres e doutores em Direito cujo grau seja reconhecido em Portugal, inscritos para o efeito na Ordem dos Advogados nos termos de um processo especial a definir no Estatuto da Ordem dos Advogados. 3 - Exceptua-se do disposto no n.º 1 a elaboração de pareceres escritos por docentes das faculdades de Direito. (…) 5 - Sem prejuízo do disposto nas leis de processo, são actos próprios dos advogados e dos solicitadores: a) O exercício do mandato forense; b) A consulta jurídica. 6 - São ainda actos próprios dos advogados e dos solicitadores os seguintes:
a) A elaboração de contratos e a prática dos actos preparatórios tendentes à constituição, alteração ou extinção de negócios jurídicos, designadamente os praticados junto de conservatórias e cartórios notariais; b) A negociação tendente à cobrança de créditos; c) O exercício do mandato no âmbito de reclamação ou impugnação de actos administrativos ou tributários. 7 - Consideram-se actos próprios dos advogados e dos solicitadores os actos que, nos termos dos números anteriores, forem exercidos no interesse de terceiros e no âmbito de actividade profissional, sem prejuízo das competências próprias atribuídas às demais profissões ou actividades cujo acesso ou exercício é regulado por lei. 8 - Para os efeitos do disposto no número anterior, não se consideram praticados no interesse de terceiros os actos praticados pelos representantes legais, empregados, funcionários ou agentes de pessoas singulares ou colectivas, públicas ou privadas, nessa qualidade, salvo se, no caso da cobrança de dívidas, esta constituir o objecto ou actividade principal destas pessoas. (…)”.
O artigo 3º da mesma Lei define a consulta jurídica: “Considera-se consulta jurídica a actividade de aconselhamento jurídico que consiste na interpretação e aplicação de normas jurídicas a solicitação de terceiro”.
Sabendo-se que o objectivo essencial deste diploma foi a definição das concretas actuações que integram o exercício da advocacia para delimitação do campo de actuação privativo, ou visto por outro prisma, para tipificação do campo da procuradoria ilícita, logo resulta que os nºs 7 e 8 do preceito incorporam a disciplina que já vinha do artigo 53º do Estatuto de 1984, ou seja, que licenciados em direito não inscritos podem exercer actos próprios de advocacia desde que para as suas entidades empregadores sem com essa actuação incorrerem em procuradoria ilícita – e portanto não é também por via do nº 8 que se chega à defesa da isenção de sigilo dos licenciados inscritos, em exercício subordinado.
Depois, em vista desse mesmo objectivo, não conseguimos retirar da novidade da Lei nº 49/2004 nenhum argumento contra a utilização da tipificação nela contida dos actos próprios de advocacia como critério interpretativo do que, anteriormente a ela, se deveria entender como exercício da advocacia. Podemos portanto entender que, apesar de não expressamente referido no Estatuto de 1984, vigente ao tempo em que a testemunha exerceu funções, a consulta jurídica também aí consistia na actividade de aconselhamento jurídico que consiste na interpretação e aplicação de normas jurídicas e que a elaboração de contratos e a prática dos actos preparatórios tendentes à constituição, alteração ou extinção de negócios jurídicos, situando-se entre aquela consulta e esta prática a actividade desenvolvida pela testemunha no que toca à revisão das tabelas de venda e das condições gerais de fornecimento, neste intermédio se resolvendo a eventual dificuldade qualificativa da natureza jurídica de tais tabelas e condições.
Podemos assim concluir que os conhecimentos que a testemunha revelou no seu depoimento foram obtidos no exercício de consultoria e assessoria jurídica, que integram sem dúvida a actividade própria do advogado, o que não é prejudicado nem deixa de valer pelo facto da testemunha, enquanto director de departamento jurídico, poder ter competências de gestão.
Por uma outra razão ainda estava a testemunha obrigada a segredo profissional. Na sua actuação como “interface” com os escritórios externos, estava vinculado pela disciplina do artigo 81º nº 2 parte final do Estatuto de 1984: - “(…) o mesmo acontecendo para todos os advogados que, directa ou indirectamente, tenham qualquer intervenção no serviço”. (sublinhado nosso).Tal resulta ainda mais claramente do dispositivo actualmente em vigor: artigo 92º nº 7 do EOA: “7 - O dever de guardar sigilo quanto aos factos descritos no n.º 1 é extensivo a todas as pessoas que colaborem com o advogado no exercício da sua atividade profissional, com a cominação prevista no n.º 5”.
Conclui-se pois que o depoimento em causa foi prestado, aliás na sua integralidade, com violação do segredo profissional. Considerando o diploma em vigor ao tempo da prestação do depoimento, o nº 5 do artigo 92º do EOA prevê: “5 - Os atos praticados pelo advogado com violação de segredo profissional não podem fazer prova em juízo”.
Mas, não deverá entender-se que o oferecimento da testemunha pelas RR. a dispensou do sigilo sobre os factos que conheceu ao abrigo da sua relação profissional com a antecessora de ambas?
Já vimos os argumentos que as recorridas oferecem.
Retomemos a consulta 18/2014, de 13 de Agosto já acima referida, pela clareza com que nos explica os valores em causa na definição e exigência do segredo profissional dos advogados:
“Nunca é de mais referir o carácter fundamental, para não dizer, verdadeiramente basilar, que a obrigação de segredo profissional reveste para o exercício da Advocacia. Mais do que uma condição para o seu desempenho é, sobretudo, um traço essencial da sua própria existência.
Sem o segredo profissional erigido em regra de ouro não existe, nem pode existir, Advocacia livre e independente, ficando abalado o direito de defesa dos cidadãos que recorrem ao Advogado para protecção dos seus direitos, liberdades e garantias.
No fim da linha, é o próprio Estado de Direito Democrático que é atingido no seu cerne, porquanto o sigilo profissional entre o Advogado e o seu Constituinte é estruturante e conditio sine qua non do direito de defesa dos cidadãos. Assim o tem entendido a lei e a própria jurisprudência da Ordem dos Advogados.
Com efeito, Advogado é acometido, por da lei ordinária e pela Constituição de uma verdadeira «missão de interesse público», competindo-lhe, designadamente:
- defender o Estado de direito e os direitos, liberdades e garantias dos cidadãos;
- pugnar pela boa aplicação das leis;
- colaborar na administração da justiça e pugnar pelo seu rápido funcionamento;
- assegurar o acesso ao direito nos termos da Constituição, como defensores e patronos;
- opinar sobre os projetos de diplomas legislativos que interessem ao exercício da advocacia e o patrocínio judiciário em geral;
- propor alterações legislativas relevantes para o sistema de justiça.
(v. art.ºs 3.º nas suas diversas alíneas e o 85.º, n.º 1 do EOA).
São, assim, os Advogados garantes de importantes funções do Estado com consagração constitucional como é o “acesso ao direito e aos tribunais” e o “patrocínio judiciário” previstos no art.º 20.º, n.ºs 1 e 2 da Lei Fundamental e que constituem “elemento essencial da administração da justiça” como resulta do art.º 208.º da mesma Lei, sendo-lhes com esse propósito conferidas garantias e imunidades no exercício do mandato forense (art.º 150.º, n.º 2 do Novo Código de Processo Civil), num claro e inequívoco reconhecimento da relevante função social de interesse público da profissão.
Atente-se, aliás, na redacção do art.º 13.º da Lei de Organização do Sistema Judiciário – Lei n.º 62/1013, de 26 de Agosto –, com a epígrafe “Imunidade do mandato conferido a advogados”:
(…)
Se ao Advogado não fosse reconhecido o direito de guardar para si, e só para si, o conhecimento de tudo quanto o seu Constituinte, directamente ou por via de terceiros, lhe confiou, ou não fosse obrigado a reservar a informação que obteve no exercício do mandato, então não haveria Advocacia livre e independente, transformando-se os Advogados em testemunhas de defesa e desse modo se desvirtuando a sua função na administração da Justiça e no acesso ao direito.
Existem, em suma, segundo entendimento há muito perfilhado por este Conselho Distrital de Lisboa da Ordem dos Advogados[2] três grandes ordens de razões que estão na origem da consagração estatutária do dever (que é ao mesmo tempo direito) do advogado guardar segredo profissional sobre factos e documentos dos quais tome conhecimento no exercício da profissão:
a. A indispensabilidade de tutelar e garantir a relação de confiança entre o advogado e o cliente.
b. O interesse público da função do advogado enquanto agente activo da administração da justiça.
c. A garantia do papel do advogado na composição extrajudicial de conflitos, contribuindo para a paz social”. (fim de citação).
E retomemos também o parecer Parecer da Ordem dos Advogados nº 14/PP/2008-G, de 28.7.2008, já acima mencionado:
“(…) 13. Conforme entendimento pacífico na Ordem, as normas que proíbem a revelação de factos abrangidos pelo segredo profissional estatutariamente imposto ao Advogado são de interesse e ordem pública, e não natureza contratual (cfr. Bastonário Coelho Ribeiro, Parecer do Conselho Geral de 13/01/1983 - in ROA, Ano 43, Ano 1983, fls. 211 ss.).
14. Efectivamente, o segredo profissional tem na sua génese a necessidade não só de garantir a relação de confiança entre o advogado e o cliente, mas também o interesse público da função do advogado enquanto agente activo da administração da justiça. Entendida esta “justiça” em sentido amplo, e não restrita à actividade judicial apenas. Tanto assim que a obrigação do Advogado guardar segredo profissional, com respeito a factos nele compreendidos, existe quer o serviço cometido envolva, ou não, representação judicial.
15. Portanto, é a própria administração da justiça que é posta em causa quando é violado o segredo profissional, o que exige do Estado a sua protecção, como decorre dos arts. 208º da CRP, 114º, nº 3 da LOFTJ e 87º do EOA. Donde resulta que os actos praticados pelos advogados com violação de segredo profissional não possam fazer prova em juízo (artigo 87º, nº 5, do EOA).
16. E não residindo a natureza jurídica do segredo profissional do advogado no foro contratual -- nem estando regulado, nem podendo estar, pelas mesmas regras do mandato puramente civil conferido a quem não seja Advogado – então não surpreende que a autorização do cliente não baste para a sua desvinculação (cfr. Dr. Luís Sáragga Leal, Parecer do Conselho Geral de 30/11/1984 , in ROA, ano 44, Dezembro 1984, fls. 735 ss.).
17. Não tem assim cabimento a tese que alguns defendem, segundo a qual a obrigação de guardar segredo profissional que impende sobre o advogado está na livre disponibilidade do cliente que dele beneficia.
18. Embora tal tese da “disponibilidade” conte efectivamente com jurisprudência e doutrina favorável, não se trata, de todo, de um entendimento unânime nem na Doutrina, nem na Jurisprudência. Em sentido contrário pronunciaram-se os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça, de 13-11-2003 e de 15-12-2004 (transcreve-se um excerto deste último acórdão que cremos bastante elucidativo): «…concedemos, até, que de jure constituendo uma tal concepção possa vir a implicar no futuro uma alteração do preceito, se for entendido (à semelhança do estatuído no Cod. Penal) que baste o consentimento daquele em benefício de quem o segredo tenha sido instituído, baseado numa relação de confiança inter-individual. Mas não é o que de iure constituto por ora está proclamado. Efectivamente, na ponderação dos interesses em presença a norma eleva o segredo profissional à categoria de dogma inerente ao interesse público dominante, que é o interesse da justiça na sua mais lata acepção. Isto é, enquanto operador judiciário, contribuindo o advogado para a realização da justiça, entende o legislador que o profissional deve respeitar e fazer cumprir o dever de reserva da intimidade da vida privada de cada cliente, mas também a relação de confiança estabelecida entre um e outro e, bem assim, a relação de confiança da generalidade dos cidadãos na classe profissional dos advogados e, em última análise, na própria justiça. Por isso, e uma vez que a Ordem dos Advogados tem por missão contribuir para a defesa do Estado de direito democrático e dos direitos e garantias dos indivíduos, colaborar na administração da justiça, zelar pela função social, dignidade e prestígio da profissão de advogado e promover o respeito pelos princípios deontológicos, viu o legislador a necessidade de lhe impor o dever de pronúncia decisiva em cada caso concreto de cessação do dever de sigilo. O que significa que o segredo profissional, além da dimensão pessoal inter-individual que encerra, contém igualmente uma dimensão institucional supra-individual. E assim, ao contrário do que o Cod. Penal estabelece, para este efeito não releva o eventual consentimento da pessoa protegida pelo segredo. Quer dizer, a falta de “consentimento” do titular do direito ao segredo servirá para preencher um dos elementos do tipo de ilícito (art. 195º). Mas, no que respeita ao segredo profissional, e para efeitos do art. 81º, nº4 citado, isto é, com vista à sua divulgação, apenas basta a “autorização” institucional do presidente do conselho distrital da O.A. Significa que a avaliação de «...tudo quanto seja absolutamente necessário para a defesa da dignidade, direitos e interesses legítimos do próprio advogado ou do cliente ou seus representantes...» é cometida tão somente à instituição, mediante prévia autorização. Por conseguinte, se o que está aqui em causa não é a demonstração de ausência de um ilícito criminal, não basta invocar o consentimento dos ex-clientes para, desde logo, o recorrente poder revelar os factos que lhe tenham sido transmitidos nas relações profissionais pretéritas. (…) Desta maneira, não se pode ter por acertada a conclusão que o recorrente retira de que o segredo profissional está na exclusiva dependência do recorrente e dos seus ex-clientes. A “autorização” da Ordem Profissional é condição normativa para a divulgação do segredo…” IN www.dgsi.pt.
19. O Dr. António Arnaut também se pronuncia negativamente contra a “disponibilidade” do sigilo pelo cliente que dele beneficia: “A autorização é necessária mesmo que o interessado desvincule o advogado, pois o segredo é de natureza social e deontológica e não contratual”. Estatuto da Ordem dos Advogados Anotado, anotação 2 ao art. 87.º, pag. 97, Coimbra Editora, 9.ª Edição, 2005.
20. O mesmo faz o Dr. Valério Bexiga: “A razão da existência do segredo profissional é de natureza social, como resulta do facto de a autorização para a sua quebra estar na disponibilidade, não do cliente, mas da Ordem dos Advogados.” Lições de Deontologia Forense, pag. 277 Edição do autor com o apoio do Conselho Distrital de Faro da Ordem dos Advogados, 2005.
21. Aliás, é esse o entendimento uniforme da jurisprudência da Ordem dos Advogados, cf. Acórdão do Conselho Superior de 15.02.1965, publicado na Revista da Ordem dos Advogados (ROA), 1965, (com referências de publicação de vários outros Acórdãos nesse mesmo sentido), o Parecer do Conselho Geral de 30 de Novembro de 1984, ROA, Ano 44 (1984), Vol. III, e o Parecer do Conselho Geral n.º 14/04, de 12 de Abril de 2002, entre outros (todos disponíveis em www.oa.pt, os dois primeiros em Publicações/Revista). 22. Na linha do expendido e face ao estatuído no EOA, também a nós se afigura incontornável a rejeição da tese da “suficiência do consentimento do cliente para desobrigar o advogado da obrigação do sigilo profissional”.
23. Na verdade, consagrando a Lei que o advogado só pode revelar factos sujeitos a sigilo profissional “desde que tal seja absolutamente necessário para a defesa da dignidade, direitos e interesses legítimos do próprio advogado ou do cliente ou seus representantes, mediante prévia autorização do presidente do conselho distrital respectivo, com recurso para o Bastonário, nos termos previstos no respectivo regulamento” (destacado nosso) - cf. art. 87.º do EOA, parece-nos de meridiana clareza que a prévia autorização da Ordem dos Advogados é condição necessária e indispensável para a revelação de factos sujeitos a sigilo, sendo insuficiente, para esse efeito, o mero aval do Cliente”. (fim de citação).
Vejam-se ainda os acórdãos da Relação do Porto:
- RP20110223552/06.1TAPGR.P1: “O segredo profissional de advogado é de interesse público, não sendo por isso suficiente para o afastar a vontade do cliente”.
- RP20181207430/14.0TAAMT.P1: “I – O segredo profissional traduz-se, em geral, na reserva que um profissional deve guardar dos factos conhecidos no desempenho das suas funções ou como consequência do seu exercício, factos que lhe incumbe ocultar, quer porque o segredo lhe é pedido, quer porque ele é inerente à própria natureza do serviço prestado ou à sua profissão. II – O fundamento ético-jurídico do dever de sigilo profissional do advogado não está confinado à relação contratual estabelecida entre este e o seu cliente, sendo o bem jurídico que ilumina a tutela desse segredo a necessidade social da confiança nos advogados em geral. III – Por esse motivo, não poderá ser o mandante/cliente a desvincular o mandatário/advogado desse dever de sigilo. (…)”.
Não havendo qualquer dúvida, nem para as recorridas, sobre a natureza pública do segredo dos advogados, pretendem aquelas porém que não há que confundi-la com o interesse que se destina a proteger, que é o interesse particular do beneficiário do sigilo.
Com o devido respeito, a natureza pública do segredo só pode corresponder a um interesse público nesse segredo. Seria um contra-senso e um excesso garantístico determinar que o segredo profissional tinha natureza pública para defesa dum interesse particular. A natureza pública do segredo resulta isso sim de ser um interesse público especialmente relevante aquele que o segredo pretende proteger, concretamente o da confiança no sistema de justiça e nas instituições do Estado de Direito democrático. Não é portanto defensável que esse interesse público seja satisfeito com uma concomitante revelação do segredo.
Portanto, admitir como regra que desde que o beneficiário houvesse dispensado o advogado do segredo, já estaria garantido o interesse maior, de natureza pública, essencial ao funcionamento do sistema de justiça, significava que bastava tal dispensa para que aquele interesse maior se devesse considerar não ofendido, abrindo-se a porta à permanente divulgação de factos conhecidos no âmbito da actividade profissional do cliente, bastando para tanto uma autorização do beneficiário.
Por isto, deve entender-se a compaginação da necessidade pública de manutenção do segredo com a autorização do beneficiário só se assegura na imprescindibilidade da revelação para a defesa do cliente. Ora, no caso concreto, nem sequer foi invocado em primeira instância como fundamento para a admissão do depoimento mas, mais ainda, como dissemos, existia abundante prova documental da qual se podia extrair o mesmo que a testemunha disse ou pelo menos inferir o comportamento da T… na formalização da relação factual com os grossistas. Significa isto que todo em todo o depoimento em causa se afigurava imprescindível para a defesa das RR.
Em todo o caso, mesmo perante uma ponderação dessa necessidade de defesa do cliente, haveria de ter sido cumprido o procedimento próprio previsto no Regulamento de Dispensa do Segredo Profissional (Regulamento nº 94/2006 de 12 de Junho), de cujo artigo 4º resulta aliás a excepcionalidade da dispensa: - “1 - A dispensa do segredo profissional tem carácter de excepcionalidade. 2 - A autorização para revelar factos abrangidos pelo segredo profissional apenas é permitida quando seja inequivocamente necessária para a defesa da dignidade, direitos e interesses legítimos do próprio advogado, cliente ou seus representantes”.
A argumentação de que, em última instância, o poder de decisão compete ao tribunal não permite concluir pela dispensabilidade deste procedimento, porquanto a decisão do tribunal – e mais concretamente do tribunal de recurso e não do tribunal de primeira instância – opera para os casos em que é invocada escusa pelo próprio advogado ou em que a Ordem não concede a dispensa pretendida – o que não foi o caso – e o tribunal, ponderando o conflito de interesses entre o interesse público do segredo e o interesse do apuramento da verdade, quer em processo penal quer em processo civil, por via do artigo 497º nº 3 e 417º nº 4, ambos do CPC, determina a quebra do sigilo.
Em última análise, a tese defendida corresponderia a dizer que o oferecimento da testemunha equivale à sua dispensa do sigilo e que o tribunal de primeira instância assegura que esta dispensa não ofende o interesse maior, de natureza pública, na manutenção do segredo, o que é francamente contrário quer aos fundamentos do segredo profissional quer à arquitectura normativa da operação de asseguramento da manutenção do segredo e do seu levantamento apenas em casos excepcionais.
Em conclusão, deveria ter sido deferida a arguição de nulidade do depoimento prestado, impondo-se a revogação do despacho recorrido e declarando-se agora a nulidade do depoimento integral da testemunha VE…, com a consequente impossibilidade do mesmo fazer prova em juízo.
Procede assim este recurso intercalar. 3ª questão - Se deve ser revogado o despacho proferido na audiência preliminar que desatendeu à reclamação das AA. quanto à selecção da matéria de facto então realizada pelo tribunal (no que toca porém, conforme artigo 92 das alegações de recurso, apenas à formulação da alínea GG da matéria assente, que conduziu ao facto provado 30).
Dele consta: ”O Factor de Correcção referido no ponto 28 foi apresentado aos AA”. Do ponto 28 consta: “28 - A esse valor, e na fatura, a R. T… passou a debitar, a partir de 1 de janeiro de 2006, por cada 1000 cigarros (cinco volumes), um valor, chamado “Fator de Correção”, que variava entre 1,08 euros e 1,12 euros, conforme a Tabela de Fatores de Correção de 2006 e a Tabela de Preços de 2006”.
Nas reclamações apresentadas à selecção da matéria de facto assente e da base instrutória, as AA. vieram reclamar por excesso quanto à matéria assente, afirmando:
“1. Os AA alegaram, no artigo 191.º da petição inicial, que “O Factor de Correcção […] foi apresentado às AA. – falsamente – como uma necessidade de anular o efeito que o aumento do PVP tinha na margem dos distribuidores, porque esse aumento do PVP era alegadamente exclusivamente decorrente de aumento de impostos.”.
2. Dessa alegação, foi incluído na alínea GG) da Matéria Assente, por aceite pelas RR., que “O Factor de Correcção referido em EE) foi apresentado aos AA.”, nada mais tendo sido seleccionado para integrar a matéria de facto dos presentes autos.
3. Ora, a alegação feita pelos AA. na petição inicial não é divisível: ela destina-se a integrar a causa de pedir dos pedidos de ineficácia, nulidade e, subsidiariamente, anulação da disposição contida nas cláusulas 2.3 das CGF de 2006 e de 2008 (que prevê o factor de correcção).
4. Tais nulidade e ineficácia sustentam-se, entre outros fundamentos, no facto de a disposição em causa não ter sido comunicada e informada aos AA. de modo a que se tornasse possível o conhecimento completo e efectivo da disposição e de todos os aspectos nela compreendidos, como mandam os artigos 5.º e 6.º do Regime Jurídico das Cláusulas Contratuais Gerais, o que tem por consequência que a disposição se deva considerar excluída dos contratos sendo, portanto, nula e de nenhum efeito.
5. O mesmo facto, assim alegado, é causa de pedir do pedido de anulação da referida disposição contratual com base em erro.
6. Todas estas soluções são soluções plausíveis desta questão de direito.
7. Fraccionar a alegação, dando como assente que o “Factor de Correcção foi apresentado aos AA.”, sem que se acrescente de que forma e com que conteúdo foi apresentado, é desvirtuar a alegação dos AA. e inverter o seu sentido, impedindo-a, assim, de produzir os efeitos pretendidos.
8. Isto porque o facto constante da alínea GG) sugere que o factor de correcção foi apresentado correctamente.
9. E porque, mesmo sendo incluído na Base Instrutória a outra parcela da alegação, sobre a forma como foi feita a apresentação do factor de correcção (o que adiante se requererá), sempre existiria o risco de tal quesito vir a ser dado como não provado, chegando-se assim ao resultado perverso de, através da decomposição de um facto uno, unitariamente alegado pelos AA., estes verem impedida a produção dos efeitos jurídicos pretendidos com tal alegação.
10. Requer-se, por isso, que seja eliminada da Matéria Assente a alínea GG), por excesso, devendo o facto alegado ser, por inteiro, integrado na Base Instrutória”.
Na procedência da reclamação as AA propunham:
27. Pelas razões acima expostas em II. a), (i), os AA. requerem seja incluído na Base Instrutória o seguinte quesito: “O Factor de Correcção foi apresentado às AA. como uma necessidade de anular o efeito que o aumento do PVP tinha na margem dos distribuidores, por esse aumento do PVP ser exclusivamente decorrente de aumento de impostos?” (alegado no artigo 191.º da petição inicial e impugnado no artigo 656.º da contestação);
28. Sendo este facto causa de pedir de vários dos pedidos formulados relativamente à disposição contida nas cláusulas 2.3 das CGF de 2006 e de 2008, segundo as várias soluções plausíveis de direito, enferma de deficiência a Base Instrutória se não for aditada nos termos aqui requeridos.
29. Subsidiariamente, e para o caso de improceder o requerimento de eliminação da alínea GG) da Matéria Assente, requer-se que o quesito a aditar tenha a seguinte redacção:
“Na apresentação do Factor de Correcção referida em GG), o Factor de Correcção foi apresentado às AA. como uma necessidade de anular o efeito que o aumento do PVP tinha na margem dos distribuidores, por esse aumento do PVP ser exclusivamente decorrente de aumento de impostos?”.
Mais referiram:
“30. Para demonstrar a desadequação do teor da informação transmitida pelas RR. aos AA. aquando da introdução do factor de correcção, bem como para sustentar o erro a que foram os AA. conduzidos, é relevante a alegação de que a margem das RR. subiu constantemente desde 2005 até 2010, quer em termos absolutos, quer em termos percentuais, e que os resultados da T… com a venda de tabaco se têm mantido apesar da acentuada redução na quantidade de produtos consumidos.
31. Requer-se, assim, a inclusão dos seguintes quesitos:
“A remuneração da T…, por volume de tabaco M… e S…., cresceu de € 3,745 em 2005 até € 6,439 em Dezembro de 2010?” (alegado no artigo 571.º da p.i. e impugnado nos artigos 1007.º e 1010.º da contestação);
32. “As margens, em termos percentuais, obtidas pela T… com a venda de tabaco M… e S… cresceram de 14,686% em 2005 até 16,945% em Dezembro de 2010?” (alegado no artigo 571.º da p.i. e impugnado nos artigos 1007.º e 1010.º da contestação);
33. “Desde Janeiro de 2006 que as RR. (a T… até 2008 e a T… após essa data) mantiveram os seus resultados com a venda de produtos de tabaco?” (alegado no artigo 583.º da p.i. e impugnado nos artigos 1007.º e 1010.º da contestação);
34. sendo também essencial demonstrar que as margens, em termos percentuais, dos AA. têm evoluído no sentido inverso, pelo que se requer a inclusão do seguinte quesito:
“As margens máximas, em termos percentuais, obtidas pelos AA. com a venda de tabaco M… e S… diminuíram de 8,620% em 2005 até 7,132% em Dezembro de 2010?” (alegado no artigo 571.º da p.i. e impugnado nos artigos 1007.º e 1010.º da contestação);”.
As Rés pronunciaram-se no sentido de que “a reclamação não tem razão de ser devendo manter-se a al. GG) da Matéria Assente na medida que este facto foi admitido pelas partes nos articulados e também nas anteriores sessões da presente audiência preliminar”. Mais afirmaram, na resposta à reclamação por defeito da base instrutória, formulada pelas AA. para o caso de se entender dever partir o facto em dois, mantendo-se a al. GG na matéria assente e quesitando-se a segunda parte, que poderia vir a haver sobreposição relativamente à al. GG.
O tribunal recorrido indeferiu a reclamação por excesso quanto à alínea GG considerando: “A alínea GG) da Matéria Assente está conforme o projecto de Matéria Assente apresentado por ambas as partes. Estranha-se, pois, a reclamação dos Autores quanto à referida alínea”.
O indeferimento é atacado no presente recurso pelas recorrentes pois que “S. Ao dar como assente que o ”Factor de Correcção foi apresentado aos AA” (cf. Alínea GG da Matéria Assente que originou o Facto Provado 30) sem levar à base instrutória um quesito que permitisse responder à questão concreta de saber “se as RR. prestaram ou não informações enganosas aos AA. sobre os objetivos e efeitos do fator de correção,” como foi requerido, o Tribunal a quo desvirtuou a alegação dos AA. realizada na p.i. e inverteu o seu sentido, impedindo-a, assim, de produzir os efeitos pretendidos e dificultando a procedência de uma das causas de pedir dos AA., ou seja, a infração dos deveres de informação e comunicação previstos nos RJCCG” e pois que “T. Nessa medida, o Despacho proferido na Audiência Preliminar de 10.12.2012 que indeferiu a Reclamação contra a seleção da matéria de facto apresentada pelas AA. infringiu o disposto no n.º 1, do artigo 511.º do CPC (então vigente), pois deixou de fora da base instrutória matéria relevante para decisão da causa ao mesmo tempo que fez incluir na matéria assente um facto que - desacompanhado de um quesito relativo ao demais alegado – pode, no limite, e sem a necessária contextualização, desvirtuar a alegação dos AA.”.
A tanto, as recorridas, no corpo e nas conclusões das contra-alegações do recurso, nada contrapuseram.
Note-se que, do histórico electrónico do processo nem da sua versão em formato papel não consta a junção dos projectos de selecção da matéria de facto apresentados pelas RR. e ou por estas e pelas AA., razão pela qual a fundamentação do despacho recorrido não pode ser verificada. Em todo o caso, estaríamos sempre perante um projecto não vinculativo, uma vez que a competência para seleccionar a matéria de facto pertencia, como aliás pertence mesmo em sede de fixação de temas de prova, ao tribunal de primeira instância, sem embargo das contribuições das partes na discussão dessa selecção ou da fixação desses temas.
Não é, salvo erro crasso, atacável a objectivação que qualquer das partes faça dos factos que alega. E no caso concreto, para a convocação do regime jurídico das cláusulas contratuais gerais, para a convocação eventual do regime do erro, mostra-se avisado alegar que determinada informação foi apresentada de modo contrário ao que dela efectivamente consta ou resulta ou veio a resultar.
Alegar que as RR. apresentaram falsamente o factor de correcção como uma “necessidade de anular o efeito que o aumento do PVP tinha na margem dos distribuidores, porque esse aumento do PVP era alegadamente exclusivamente decorrente de aumento de impostos” é obviamente conclusivo. A falsidade resulta da verificação da parte final: - se afinal o aumento do PVP não era exclusivamente decorrente do aumento de impostos, então a informação de que o factor de correcção era uma necessidade de anular a percentagem adicional que os grossistas iam receber por efeito do aumento do PVP (na medida em que o seu preço de compra às RR. era constituído por uma percentagem sobre o PVP) não era verdadeira, e terá sido esta informação não verdadeira que foi apresentada às AA. O falso é sempre uma conclusão que se extrai a partir da verdade do facto. Essa conclusão, na lógica de elaboração de uma sentença tal como preceituado pelo artigo 607º do CPC, actualmente, e mais claramente ainda pela restrição expressa do artigo 646º nº 4 da versão anterior[7], aplicável ao tempo da prolação do despacho ora recorrido (29.3.2012), que se aplicava por analogia às conclusões, ainda que de facto, desde que litigiosas, deve intervir no momento da apreciação dos factos provados, momento primeiro de ponderação prévio à convocação, interpretação e aplicação das normas jurídicas aplicáveis.
Mas isto significa apenas que a palavra “falsamente”, constante do artigo 191 da petição inicial, nunca poderia ser levada à matéria de facto.
Sem a menção “falsamente”, em nada ficava prejudicada a eficácia do facto alegado para a convocação das normas pertinentes segundo todas as soluções de direito plausíveis[8].
É neste sentido que a reclamação primeiramente se dirigiu: visto que as RR. apenas aceitaram a apresentação do factor de correcção mas não o demais constante do artigo 191º da petição inicial, então o facto não pode ser cindido sob pena de perder o seu sentido útil e de possibilitar soluções de direito contraditórias com o alegado. Mesmo, a entender-se diversamente, a manter-se o facto na matéria assente levando-se à base instrutória, a razão, no fundo, da qual resulta a falsidade, corre-se o risco duma resposta não provada produzir o mesmo resultado que a manutenção do facto.
Esse resultado é, segundo as AA. e recorrentes, o de que o facto constante da al. GG, tal como está, pode sugerir que a apresentação foi feita de modo correcto.
O Regime Jurídico das Cláusulas Contratuais Gerais aprovado pelo DL n.º 446/85, de 25 de Outubro, e alterações subsequentes, estabelece no seu artigo 5º:
“1 - As cláusulas contratuais gerais devem ser comunicadas na íntegra aos aderentes que se limitem a subscrevê-las ou a aceitá-las. 2 - A comunicação deve ser realizada de modo adequado e com a antecedência necessária para que, tendo em conta a importância do contrato e a extensão e complexidade das cláusulas, se torne possível o seu conhecimento completo e efectivo por quem use de comum diligência. 3 - O ónus da prova da comunicação adequada e efectiva cabe ao contratante que submeta a outrem as cláusulas contratuais gerais”.
Mais dispõe no seu artigo 6º: “1 - O contratante que recorra a cláusulas contratuais gerais deve informar, de acordo com as circunstâncias, a outra parte dos aspectos nelas compreendidos cuja aclaração se justifique. 2 - Devem ainda ser prestados todos os esclarecimentos razoáveis solicitados”.
Deste regime resulta notoriamente que, definindo a lei os termos em que a comunicação de cláusulas contratuais gerais deve ser realizada, o ónus de prova do cumprimento dos termos mencionados incumbe ao contratante que as submete a outrem. Assim, o mero facto da apresentação nada releva, ou dito de outro modo, é insusceptível, mesmo a não se provar, em sede de resposta ao quesito em que se integrassem as razões da falsidade alegada, de sugerir que a apresentação foi feita de modo correcto.
A apresentação será em si um facto: - as RR apresentaram, como parece resultar da comunicação das Condições Gerais de Fornecimento em que o factor foi introduzido. Em rigor, “apresentar” não é um termo absolutamente unívoco. Apresentar pode não ser comunicar. Que o factor de correcção foi comunicado resulta desde logo da referida introdução nas Condições Gerais de Fornecimento comunicadas. Mas apresentar pode indicar uma explicação mais detalhada, em eventos destinados a isso mesmo. E por esta possibilidade de pluralidade de sentidos, apresentar deveria ser densificada, melhor concretizada.
Admitamos porém que o quer está para decidir não invoca esta pluralidade, devendo pois tomar-se apresentação como sinónimo de comunicação.
Se alegado que a apresentação não foi feita de modo adequado, por insuficiente, dada a complexidade da fórmula de cálculo do factor de correcção, o ónus de prova cabe às RR., predisponentes. Saber como foi feita essa apresentação incumbe, de acordo com o mesmo ónus, às predisponentes. Saber se os termos da apresentação, quer os que constam das próprias Condições Gerais de Fornecimento, quer em sessões explicativas ou mediante conversas individuais com os grossistas, cumprem o desiderato de esclarecimento para livre aceitação, continua a caber às predisponentes.
Saber se os termos da apresentação ou explicação, correctamente produzidos, escondem os verdadeiros pressupostos e objectivos da introdução do factor de correcção, designadamente porque não é verdade que o factor tivesse servido apenas para anular o aumento do desconto de que os grossistas beneficiariam com um aumento de preço de venda ao público, visto que terá servido para, ao invés, transferir esse aumento para as Rés, pois que o aumento do preço de venda ao público excedeu o necessário para cobrir o aumento de impostos, já pode ser, na lógica contratual de alteração unilateral e não livre e esclarecidamente acordada, de diminuição da percentagem de desconto anteriormente acordada, mais discutível. Repare-se que, independentemente da qualificação da relação titulada pelas CGF como de concessão comercial, a invocação do regime das cláusulas contratuais gerais não prescinde da natureza contratual das mesmas. Ora, sem dúvida, até para a invocação de erro, a prova da violação contratual incumbe a quem a alega, nos termos do artigo 342º nº 1 do Código Civil.
Poderá pensar-se que quem invoca a falsidade de base – ou seja, em termos simples, o aumento do PVP excedeu o aumento para cobrir os impostos e portanto, na parte excedente, a operação do factor de correcção acabou por alterar as percentagens das RR. e das AA. na distribuição do rendimento disponível – teria de provar essa factualidade.
No que toca à questão concreta sob recurso, reportada ao modo de apresentação, há que distinguir entre a “falsidade de fundo”, digamos, e a “falsidade comunicada”.
Na primeira, mantém-se a regra do ónus de prova: - quem a invoca como fundamento de uma pretensão, tem de a provar.
Na segunda, pensemos: - é admissível uma comunicação profunda e adequadamente explicada, de uma cláusula que não seja verdadeira, ou melhor, cujo efeito não seja aquele que dessa explicação resulta, e com isto considerar-se cumprido o dever de comunicação adequada, competindo então àquele que recebeu a explicação provar que o efeito não era o explicado?
A resposta encontra-se na própria razão que levou a legislar sobre cláusulas contratuais gerais.
Lê-se no preâmbulo do DL n.º 446/85, de 25 de Outubro:
“1. Constitui a liberdade contratual um dos princípios básicos do direito privado. Na sua plena acepção, ela postula negociações preliminares íntegras, ao fim das quais as partes, tendo ponderado os respectivos interesses e os diversos meios de os prosseguir, assumem, com discernimento e liberdade, determinadas estipulações. A essa luz, uma boa medida do direito dos contratos possui natureza supletiva: as normas legais apenas se aplicam quando os intervenientes, no exercício legítimo da sua autonomia privada, as não tenham afastado. Por expressivo, recorde-se que o artigo 405.º, n.º 1, do Código Civil reconhece às partes a faculdade de fixar livremente o conteúdo dos contratos, celebrar contratos diferentes dos previstos na lei ou incluir nestes as cláusulas que lhes aprouver. 2. Dentro da visão clássica da autonomia contratual, os grandes obstáculos à sua efectivação residiam na ausência concreta de discernimento ou de liberdade, a respeito da celebração, ou, ainda, na presença de divergências entre a vontade real e a vontade declarada. Encararam-se tais aspectos com recurso aos institutos do erro, do dolo, da falta de consciência da declaração, da coacção, da incapacidade acidental, da simulação, da reserva mental ou da não seriedade da declaração. Uma experiência jurídica antiga também demonstrou que certas cláusulas, quando inseridas em contratos, se tornavam nocivas ou injustas. Deste modo, apareceram proibições relativas, entre outros, aos negócios usurários, aos pactos leoninos, aos pactos comissórios e, em termos mais genéricos, aos actos contrários à lei, à ordem pública ou aos bons costumes.
Assim acautelada, a liberdade contratual assumiu uma importância marcante, com dimensões jurídicas, económicas, sociais e culturais. Importância que se conserva nos nossos dias. 3. As sociedades técnicas e industrializadas da actualidade introduziram, contudo, alterações de vulto nos parâmetros tradicionais da liberdade contratual. A negociação privada, assente no postulado da igualdade formal das partes, não corresponde muitas vezes, ou mesmo via de regra, ao concreto da vida. Para além do seu nível atomístico, a contratação reveste-se de vectores colectivos que o direito deve tomar em conta. O comércio jurídico massificou-se: continuamente, as pessoas celebram contratos não precedidos de qualquer fase negociatória. A prática jurídico-económica racionalizou-se e especializou-se: as grandes empresas uniformizam os seus contratos, de modo a acelerar as operações necessárias à colocação dos produtos e a planificar, nos diferentes aspectos, as vantagens e as adscrições que lhes advêm do tráfico jurídico. O fenómeno das cláusulas contratuais gerais fez, em suma, a sua aparição, estendendo-se aos domínios mais diversos. São elaborados, com graus de minúcia variáveis, modelos negociais a que pessoas indeterminadas se limitam a aderir, sem possibilidade de discussão ou de introdução de modificações. Daí que a liberdade contratual se cinja, de facto, ao dilema da aceitação ou rejeição desses esquemas predispostos unilateralmente por entidades sem autoridade pública, mas que desempenham na vida dos particulares um papel do maior relevo. 4. As cláusulas contratuais gerais surgem como um instituto à sombra da liberdade contratual. Numa perspectiva jurídica, ninguém é obrigado a aderir a esquemas negociais de antemão fixados para uma série indefinida de relações concretas. E, fazendo-o, exerce uma autonomia que o direito reconhece e tutela. A realidade pode, todavia, ser diversa. Motivos de celeridade e de precisão, a existência de monopólios, oligopólios, e outras formas de concertação entre as empresas, aliados à mera impossibilidade, por parte dos destinatários, de um conhecimento rigoroso de todas as implicações dos textos a que adiram, ou as hipóteses alternativas que tal adesão comporte, tornam viáveis situações abusivas e inconvenientes. O problema da correcção das cláusulas contratuais gerais adquiriu, pois, uma flagrante premência. Convirá, no entanto, reconduzi-lo às suas autênticas dimensões. 5. Apresentam-se as cláusulas contratuais gerais como algo de necessário, que resulta das características e amplitude das sociedades modernas. Em última análise, as padronizações negociais favorecem o dinamismo do tráfico jurídico, conduzindo a uma racionalização ou normalização e a uma eficácia benéficas aos próprios consumidores. Mas não deve esquecer-se que o predisponente pode derivar do sistema certas vantagens que signifiquem restrições, despesas ou encargos menos razoáveis ou iníquos para os particulares. Ora, nesse quadro, as garantias clássicas da liberdade contratual mostram-se actuantes apenas em casos extremos: o postulado da igualdade formal dos contratantes não raro dificulta, ou até impede, uma verdadeira ponderação judicial do conteúdo do contrato, em ordem a restabelecer, sendo caso disso, a sua justiça e a sua idoneidade. A prática revela que a transposição da igualdade formal para a material unicamente se realiza quando se forneçam ao julgador referências exactas, que ele possa concretizar. 6. O Código Civil vigente consagra em múltiplas disposições o princípio da boa-fé. Deu-se um passo decisivo no sentido de estimular ou habilitar os tribunais a intervenções relativas ao conteúdo dos contratos, com vista à salvaguarda dos interesses da parte negocialmente mais fraca. Através da boa-fé, o intérprete dispõe de legitimidade para a efectivação de coordenadas fundamentais do direito. O apelo ao conceito de ordem pública é um outro alicerce. Sabe-se, contudo, que o problema das cláusulas contratuais gerais oferece aspectos peculiares. De tal maneira que sem normas expressas dificilmente se consegue uma sua fiscalização judicial eficaz. Logo, a criação de instrumentos legislativos apropriados à matéria reconduz-se à observância dos imperativos constitucionais de combate aos abusos do poder económico e de defesa do consumidor. Acresce a recomendação que, vai para nove anos, o Conselho da Europa fez, nesse sentido, aos Estados Membros. (…)”.
Resulta portanto claro que no quadro da negociação tradicional ocorrem contactos e ocasiões consideradas suficientes, pelo menos formalmente, para que as partes possam adquirir a plena consciência dos efeitos a que se vinculam. Os contraentes estão formalmente colocados em igualdade, igualdade que justifica que as situações que viciam a vontade se devam ter por excepcionais e que deva ser quem invoque tal vício o onerado com a prova respectiva. Na evolução da vida económica e do correspondente instrumental jurídico, que o preâmbulo olha com distância e sem preconceito, diagnostica-se a insuficiência desses contactos e ocasiões e a inoperância prática duma resistência servida por propostas e contrapropostas, e diagnostica-se portanto a falta de garantia de esclarecimento, necessária à formação de uma vontade livre. Os modelos tradicionais de defesa – designadamente a invocação dos vícios da vontade – não são suficientes. Por isso se optou por, reconhecendo a realidade económica e jurídica, não entravando a primeira, se legislarem mecanismos de garantia de formação da vontade livre e esclarecida na contratação massificada – os deveres de comunicação e informação adequada. Um segundo nível de garantia resulta do ónus de prova a cargo do predisponente.
Só pode formar-se uma vontade livre e esclarecida sobre a verdade.
Donde, é intolerável, mesmo na lógica de funcionamento do RJCCG que doutro modo quedaria completamente inutilizada, pensar que podem as exigências de comunicação e informação ser cumpridas com explicações que não revelam o verdadeiro efeito duma determinada cláusula. De resto, é isso mesmo que é fundamental para quem pretende contratar, saber quais os efeitos do que vai contratar.
Assim, tem de se concluir (na admissão abstracta da natureza contratual das CGF) que incumbia às RR. o ónus de prova da comunicação conforme às exigências do diploma em causa, incluída a veracidade da comunicação.
Terá sido este também um dos objectivos que justificam a alegação das RR., sempre mantida ao longo de todo o processo, de que o factor de correcção se limitou apenas a anular os efeitos de rentabilidade acrescida e injustificada dos grossistas resultantes dum aumento excepcional de impostos, que aliás não provaram (facto não provado nº 41, cuja decisão não puseram em causa).
Evidentemente, a não prova dum facto não corresponde à prova do seu contrário, mas para tanto outros factos foram levados à base instrutória e sobretudo, aqui e agora mais relevante, à impugnação da decisão sobre a matéria de facto. Para efeitos da aplicação do regime das cláusulas contratuais gerais, se as CGF a elas se pudessem reconduzir, teríamos então que as RR. não haviam feito a prova[9], que lhes incumbia nos termos do nº 3 do artigo 5º do regime jurídico respectivo, da comunicação completa, adequada e verdadeiramente explicativa do efeito da cláusula que introduziu o factor de correcção.
Ora, a ser assim, era indiferente que ficasse na al. GG da matéria de facto assente que o factor de correcção fora apresentado – pois que do simples facto da não apresentação nada se poderia extrair, muito menos que a apresentação havia cumprido as exigências dos já referidos artigos 5º e 6º – e era indiferente que a al. GG tivesse passado à matéria de facto provada na sentença final, e era também indiferente que não tivesse sido levado à base instrutória um quesito para saber se o factor de correcção fora “apresentado às AA. como uma necessidade de anular o efeito que o aumento do PVP tinha na margem dos distribuidores, por esse aumento do PVP ser exclusivamente decorrente de aumento de impostos?”.
A questão não se esgota aqui porém.
Dispondo o artigo 511º nº 1 do CPC na versão ao tempo aplicável que “O juiz, ao fixar a base instrutória, selecciona a matéria de facto relevante para a decisão da causa, segundo as várias soluções plausíveis da questão de direito, que deva considerar-se controvertida”, temos de percorrer as diversas questões de direito controvertidas. Sendo certo que os pedidos baseados em coacção moral e usura e bem assim por via do direito da concorrência, não exigem de modo algum a prova do erro, já a causa de pedir por incumprimento do RJCCG a integra na versão negativa – prova do não erro, a cargo das RR. – como acabámos de ver.
Se pensarmos na relação entre as partes como um sucessão de contratos de compra e venda, podemos admitir, como solução plausível de direito, que relativamente a cada um desses contratos, as AA. pudessem afirmar que pagaram a quantia calculada por via do factor de correcção por estarem em erro, convencidas de que, como lhes fora apresentado, esse pagamento servia apenas para anular aumentos injustificados, aceitando e concordando então que não havia razão económica justificativa para os mesmos.
Simplesmente, o que haveríamos de encontrar subsequentemente seria que então, por terem afinal percebido que não era essa a razão, invocassem o erro como causa de anulação de cada compra e venda.
Ora, salvo o devido respeito, percorrida a petição inicial e o aperfeiçoamento, não se encontra a alegação feita perante o tribunal recorrido em sede de reclamação de que o erro é causa de pedir das peticionadas anulações de quaisquer das cláusulas em causa.
Porém, percorridas todas as questões de direito controvertidas, ainda se encontra a defesa apresentada pelas AA. à excepção de prescrição do pedido fundado em enriquecimento sem causa – alegação de que as AA. pagaram as quantias calculadas pelo factor de correcção convencidas de que esse pagamento era devido, só lhes tendo sido revelado o erro pelos seus advogados, muito mais tarde – sendo com a prova desse erro onerada a parte que o invoca como fundamento que obsta à prescrição, nos termos do artigo 342º nº 2 do Código Civil. E para este efeito é indiferente saber se a relação factual entre as RR. e as AA. se cobre dum manto contratual duradouro ou se se resume a compras e vendas sucessivas que se esgotam e cumprem em si mesmas.
Significa isto afinal que, ao menos para a questão da apreciação do não decurso do prazo de prescrição, é relevante saber se o factor de correcção foi “apresentado às AA. como uma necessidade de anular o efeito que o aumento do PVP tinha na margem dos distribuidores, por esse aumento do PVP ser exclusivamente decorrente de aumento de impostos”, facto que terá de ser conjugado com a prova do “verdadeiro” efeito da introdução do factor de correcção, a partir desde logo da questão de saber se o factor de correcção incidia sobre um aumento estritamente correspondente ao aumento de impostos e manutenção de margem bruta.
Deste modo, considera-se que o tribunal recorrido haveria de ter atendido à reclamação das AA., por excesso quanto à matéria de facto assente, eliminando a al. GG e levando-a, com a restante parte do facto constante do artigo 191º da petição inicial, integralmente, à base instrutória. E em consequência, será de considerar que o facto provado sob o nº 30 não pode manter-se, eliminando-se o mesmo da decisão sobre a matéria de facto.
Repare-se outrossim que esta eliminação não prejudica a recondução do mesmo facto ao seu devido rigor, isto é, que continua a constar da decisão da matéria de facto que a introdução do factor de correcção nas CGF para 2006 e seu anexo explicativo foram comunicadas às AA., o que resulta desde logo do facto provado nº 5, não posto em causa, do qual resulta que as comunicações das CGF passaram a ser feitas pela 2ª Ré a partir da sua criação, depreendendo-se de “passaram”, que antes eram feitas pela 1ª Ré.
Por outro lado, como resulta da conclusão U do recurso, haverá que, em sede de reapreciação da decisão sobre a matéria de facto, apurar se “O Factor de Correcção […] foi apresentado às AA. como uma necessidade de anular o efeito que o aumento do PVP - exclusivamente decorrente de aumento de impostos - tinha na margem dos distribuidores”.
Na verdade, o desatendimento oportuno e injustificado da reclamação acaba a constituir uma necessidade de ampliação da decisão sobre a matéria de facto, que porém não convoca a necessidade de anulação da decisão proferida, nos termos do artigo 662º nº 2 al. c) do CPC, porquanto o tribunal de recurso está de posse de todos os elementos probatórios necessários, sendo aliás as recorrentes a fornecerem a indicação da prova que pretendem seja usada – “cf. depoimentos de P… e demais prova indicada a propósito da impugnação do Facto Não Provado 32”.
Em suma, procede o recurso, revogando-se o despacho recorrido na parte em que não atendeu à reclamação das AA. quanto à inclusão da al. GG na matéria de facto assente, eliminando-se o facto provado nº 30, relegando-se para a questão 4ª do presente recurso, a decisão sobre a prova do facto “O Factor de Correcção foi apresentado às AA. como uma necessidade de anular o efeito que o aumento do PVP - exclusivamente decorrente de aumento de impostos - tinha na margem dos distribuidores”. 4ª questão: - da impugnação da decisão sobre a matéria de facto.
Vem pedida a reapreciação da prova que conduziu à decisão sobre a matéria de facto nos termos que constam das alegações de recurso acima reproduzidas.
Mostram-se cumpridos os ónus de impugnação da decisão sobre a matéria constantes do artigo 640º do CPC, devendo aliás salientar-se que as RR. nada a este propósito invocaram, e devendo ainda salientar-se que, na parte em que se pronunciam sobre a reapreciação pedida, nada opõem dum ponto de vista formal à atendibilidade de factos instrumentais ou complementares formulada pelas AA.. De resto, convém recordar que tendo a acção sido autuada a 29.1.2012, é do mesmo ano a elaboração de despacho saneador e de selecção da matéria de facto assente e da base instrutória, e respectivas reclamações, sendo que, em grande parte por causa do relatório pericial, a primeira sessão da audiência de julgamento veio a ter lugar em 6.3.2017, e já agora, que a última sessão de produção de prova ocorreu em 18.9.2018. Deste modo, e por aplicação do artigo 5º nº 1 da Lei nº 41/2013 de 26 de Junho, entrada em vigor em 1 de Setembro de 2013, à presente acção passou a aplicar-se o chamado Novo Código de Processo Civil, sendo assim que, embora já tivesse sido formulada a selecção da matéria de facto assente e da base instrutória, e precisamente porque o pertinente despacho, quer no regime antigo (artigo 511º nº 3) quer no novo (artigo 596º nº 3), não transita, nada obsta a que se chame a disciplina nova da identificação do objecto do litígio e enunciação de temas de prova, com o seu propósito de permitir uma discussão probatória alargada e menos formalista, como cobertura para a possibilidade de atendimento de factos instrumentais que resultam da discussão da causa e dos factos complementares e ou concretizadores dos essenciais alegados, nos termos do artigo 5º nº 2 do CPC vigente.
Por outro lado, nas contra-alegações, ao invés duma específica resposta às pretensões das AA., optaram as RR. essencialmente por reproduzir as suas alegações de facto apresentadas por escrito ao tribunal recorrido encerrada que foi a produção de prova. Neste particular, há que explicar que não está de modo algum em causa no presente recurso, por falta de um pedido expresso e claro nesse sentido, uma ampliação do objecto do recurso de modo a serem dados como provados os factos que as RR. entendiam – em tais alegações primeiras referidas e levadas depois às contra-alegações – estarem provados. Portanto, deve entender-se que as RR. de modo algum impugnam a decisão do tribunal recorrido em matéria de facto, e o resultado de tal técnica contra-alegatória é que a oposição às pretensões das AA. apenas é formulada de modo indirecto e não concretamente incisivo.
Este tribunal de recurso procedeu à leitura integral do processo, de todos os articulados e requerimentos e de todos os documentos ao mesmo juntos, bem como à leitura de todos os recursos intercalares, leitura a que aliás procedeu antes de começar a ouvir a produção de prova em julgamento. A audição foi também integral, não obstante o longo rol de testemunhas e depoentes e declarantes invocado pelas AA recorrentes em apoio da sua pretensão impugnatória não abranger todos os depoimentos prestados.
Porque as alegações de recurso se iniciam com uma referência à condução do julgamento e por outro lado, porque uma apreciação global do julgamento é também relevante para a questão da dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça, algumas notas devem ser formuladas sobre o julgamento.
A primeira é a da sua extensão e duração temporal – e no relatório supra indicámos com precisão as sessões e os depoimentos e sua duração[10] – que não só justifica que as atitudes não se mantenham uniformes como naturalmente a vivacidade, a acutilância e a presença dos intervenientes não sejam constantes. Ao rigor de condução processual inicial, que justamente por ser inicial incidiu grandemente sobre a prova das AA., várias vezes originado em reparos das RR., seguiu-se um menor controlo, possivelmente justificado pela afirmação da facilidade do Tribunal da Relação em revogar decisões. A complexificação factual e jurídica do processo e o volume documental, conjugados com o volume de trabalho num tribunal de primeira instância justificam um conhecimento sobre o processo e sobre a prova documental em curso de aquisição ao longo do julgamento e não propriamente previamente adquirido, e por isso algumas intervenções limitadoras das instâncias podem não ter sido as mais adequadas. A duração excessiva de depoimentos e a justificação, formalmente correcta, de que as gravações não se destinam à primeira instância quando se suscitava a questão de saber o que determinada testemunha havia dito, aliada à menção a anotações essenciais do que interessava ao tribunal, deixa, num julgamento que demora um ano e meio, alguma incerteza sobre as recordações do tribunal recorrido na altura da decisão da matéria de facto. Acresce alguma estranheza com a menção à irrelevância da prova testemunhal mais especializada para estabelecer matéria mais técnica relacionada com o factor de correcção, justificada por as dúvidas que surgissem deverem ser resolvidas pelos peritos, quando finalmente o tribunal, perante uma perícia com divergências, entendeu não ser necessário ouvir os peritos.
A segunda nota é que nada, senão estratégias processuais, aliás recorrentemente desdobradas ao longo do processo, justificava um julgamento tão longo, depoimentos tão extensos com recorrentes questões reformuladamente repetidas, para demonstração de realidades factuais relativamente simples – tanto que diversas vezes se espantaram os inquiridos com as perguntas – porém impugnadas do ponto de vista da sua relevância jurídica ou mais especificamente da possibilidade da sua imputação a elemento definidor do atípico contrato de distribuição. A mesma simplicidade sobre o que era e como decorria a relação entre as AA e as RR, se revela afinal nas referências a contratos e relações contratuais feitas nos depoimentos favoráveis às RR., aliás num caso bem notado pela Mmª Juiz, e justificado de modo inteiramente desmerecedor de crédito, como lapso. Tivemos portanto, numa imagem, um julgamento com pinças, para evitar referências que se pudessem aproximar duma realidade jurídica, do que é exemplo evidente a questão das “recomendações” nos fóruns. Se de facto as partes tivessem querido ultrapassar, na discussão dos factos, a fragmentação jurídica da realidade, bem poderiam ter, como sugerido aliás pela Mmª Juiz, acordado em muita matéria.
Se as AA. repetiram tanto as perguntas ao ponto dos inquiridos pediram para não lhes voltarem a ser feitas, se na revisão das notas se aprestavam a resumir tudo o que havia sido dito – e aí pertinentemente travadas pela Mmª Juiz – e se fizeram perguntas extensíssimas, com trechos de leitura de documentos muitos, e essencialmente idênticos, levando a que os inquiridos se perdessem e se abrisse a oportunidade de reformular mais uma pergunta extensa, já não é porém compreensível que as RR tivessem, a dado passo, cronometrado as instâncias das AA. nem que insistentemente brandissem o Código de Processo Civil na invocação de que os esclarecimentos a que se destina a contra-instância tenham de ser de duração menor do que a instância. De todo, o esclarecimento é o que é – é para esclarecer, é para alcançar a verdade material que prevalece sobre qualquer tendência gestionária – e demora o tempo que a tanto for necessário. Já as RR foram mais comedidas e afinadas nas instâncias, e bem menos contidas na demonstração, em contra-instância, da inépcia das testemunhas, não podendo salvar-se senão a título de ironia as afirmações da simplicidade da teoria quântica aprendidas no 5º ano do liceu. Por outro lado, as interrupções da instância ou contra-instância da parte contrária que as não havia feito, não podem justificar-se com não interrompeu, tivesse interrompido.
Não dizendo mais, tratou-se dum julgamento muito penoso, e também, em vista duma reapreciação atenta, de audição muito penosa nesta segunda instância.
Isto posto, passemos à pretendida reapreciação da decisão sobre a matéria de facto.
Três considerações introdutórias e um ponto zero:
Ponto zero: ao longo do texto que segue usam-se por vezes expressões relacionadas com a denominação cliente/grossista/distribuidor, AA., apelantes, Ré, Rés, T…, T1 e T2, P…, entre muitas outras, por comodidade de expressão e rapidez de escrita, a partir duma habituação auditiva quase familiar aos termos longamente usados no próprio julgamento. Deve entender-se que se trata de mera facilidade expositiva, sem opção, juízo ou desrespeito, e de preferência situar-se a palavra em causa no contexto da sua contemporaneidade e do seu rigor, assim por exemplo, T… em regra referir-se-á à empresa existente antes da criação da 2ª Ré, na forma societária que em cada altura tenha assumido.
Primeira consideração:
As especificidades que já apontámos ao julgamento e por outro lado, de algum modo, o varrimento da totalidade da factualidade relevante para subsunção às diversas e possíveis soluções de direito, que no julgamento ocorreu e que na impugnação da decisão sobre a matéria de facto vêm também invocadas, bem como o apelo à generalidade dos documentos constantes dos autos, alinham-se no sentido, que de resto sempre tivemos, de que a reapreciação da prova serve à aquisição de convicção própria da segunda instância – evidentemente com alguns limites resultantes da falta de imediação, evidentemente sem significar um segundo e novo julgamento independente do já realizado – em detrimento duma tese de mera sindicância dos erros notórios de apreciação da prova pela primeira instância.
Neste sentido, veja-se aliás o acórdão do STJ de 8.1.2019, proferido no processo nº 3696/16.8T8VIS.C1.S1, no site da dgsi, onde, além do ponto V do respectivo sumário e no seu corpo se lê: “A reapreciação da matéria de facto por parte da Relação tem de ter a mesma amplitude que o julgamento de primeira instância pois só assim poderá ficar plenamente assegurado o duplo grau de jurisdição, cfr neste sentido inter alia o Ac STJ de 24 de Setembro de 2013 (Relator Azevedo Ramos), in www.dgsi.pt. Com efeito, embora não se tratando de um segundo julgamento, mas antes de uma reponderação, até porque as circunstâncias não são as mesmas, nas respectivas instâncias, não basta que não se concorde com a decisão dada, antes se exige da parte que pretende usar desta faculdade a demonstração da existência de incongruências na apreciação do valor probatório dos meios de prova que efectivamente, no caso, foram produzidos, mas não limita o segundo grau de sobre tais desconformidades previamente apontadas pelas partes, se pronuncie, enunciando a sua própria convicção, não estando, de todo em todo, limitada por aquela primeira abordagem pois não podemos ignorar que no processo civil impera o principio da livre apreciação da prova, cfr artigo 607º, nº5 do CPCivil (anterior artigo 655º, nº1), cfr Ac STJ de 28 de Maio de 2009 (Relator Santos Bernardino) e de 2 de Dezembro de 2013, da aqui Relatora, in www.dgsi.pt”. (fim de citação).
Dizer depois que, se a instrução da causa apenas deve ter por objecto os factos, positivos e concretos, necessitados de prova – cfr. artigos 5º, 410º e 607º, nºs 3 e 4, todos do CPC actual – estando por isso excluídos “juízos de valor, induções,conclusões,raciocínios e valorações de factos” por imporem uma actividade “estranha e superior à simples actividade instrutória” (Alberto dos Reis, in Código de Processo Civil, Vol. III, 3 ª Edição, 1981, pág. 212), disciplina que, apesar da não repetição, no actual CPC, duma norma idêntica à do artigo 646º nº 4 do anterior, se mantém vigente, já a questão da distinção entre matéria de facto e matéria de direito se revela particularmente complexa, porquanto “A linha divisória entre matéria de facto e matéria de direito não é fixa, dependendo em larga medida dos termos em que a lide se apresenta“, sendo que “A nível do julgamento da matéria de facto só são proibidos os juízos conclusivos que impliquem a apreciação e valorização de determinados acontecimentos à luz de uma norma jurídica” (cfr. Ac. STJ de 23/9/1997, Proc. nº 97B151, in www.dgsi.pt.). De facto, como ensina Castanheira Neves (cfr. “Matéria de Facto-Matéria de Direito”, RLJ, Ano 129, págs.162-167), existe um “ continuum entre matéria de facto e matéria de direito e não uma oposição absoluta entre ambos os conceitos, pois na concreta aplicação do direito acaba por verificar-se uma correlatividade entre ambos os elementos”, ou dito de outro modo“na matéria de facto concorrem não apenas dados empíricos, mas todos os pressupostos objectivos do problema colocado, por exemplo, elementos sócio-culturais e até jurídicos”.
Por isso, dependendo dos exactos termos de configuração da lide, “A natureza conclusiva do facto pode ter um sentido normativo quando contém em si a resposta a uma questão de direito ou pode consistir num juízo de valor sobre a matéria de facto enquanto ocorrência da vida real” - cfr. Ac. STJ de 9/9/2014, Proc. nº 5146/10.4TBCSC.L1.S1, in www.dgsi.pt.
Por isso, voltando a Alberto dos Reis (ob. e vol. cit, pp 206 e 207) “é questão de facto tudo o que tende a apurar quaisquer ocorrências da vida real quaisquer eventos materiais e concretos, quaisquer mudanças operadas no mundo exterior; e é questão de direito tudo o que respeita à interpretação e aplicação da lei”.
Mas, como advertemAntunes Varela e outros (Manual de Processo Civil, 1984, Coimbra editora, págs. 393/394), sendo certo que a área dos factos incide sobre os eventos reais, pode também abranger as ocorrências virtuais (os factos hipotéticos), que em rigor, não são factos, mas verdadeiros juízos de facto, integrando ainda a realidade de uma zona empírica – fáctica ou factual - que faz parte também do thema probandum, qual zona imediatamente contígua à dos juízos de valor e à dos juízos significativo-normativos, e integrando estes últimos, manifestamente, a esfera do direito.
Ora, nos juízos de facto, como ensina o Prof. Antunes Varela (In Anotação ao Acórdão do STJ, de 8 de Novembro de 1984, in “Revista de Legislação e de Jurisprudência”, Ano 122.º, n.º 3785, Novembro de 1989, pp. 219 a 222) “há que distinguir (…) entre aqueles cuja emissão ou formulação se há-de apoiar em simples critérios próprios do bom pai de família, do homo prudens, do homem comum e aqueles que, pelo contrário, na sua formulação apelam essencialmente para a sensibilidade ou intuição do jurista, para a formação especializada do julgador ”.
Em suma, quando as valorações jurídicas especializadas se inserem na análise jurídica do caso, quando, em termos muito simples, logo permitem a solução definitiva das questões de direito a resolver, estão as mesmas arredadas da possibilidade de resposta factual e terão de produzir-se na subsequente subsunção dos factos às normas.
Vertendo ao caso concreto, notar-se-á que nenhuma das partes questionou a inadmissibilidade, segundo a doutrina que acabamos de expor, da inclusão no âmbito da base instrutória de artigos sobre a obrigação dos clientes grossistas comprarem para revender e a obrigação das RR a venderem aos mesmos, mas já se produziu acesa controvérsia sobre a valoração jurídica contida na expressão “recomendação” (nos fóruns) e similares “instrução, formação”. De igual modo, grande parte do julgamento decorreu a propósito das obrigações dos clientes grossistas (de promoverem os produtos das RR) ou de aderirem a campanhas de incentivos, ou de prestarem a informação de vendas. O curioso desta contradição é que ela entronca precisamente na explicação teórica que demos: os eventos reais e a construção da realidade que se afirma para estes eventos segundo valorações diversas, de natureza sócio-cultural, manifestamente económica e até jurídica. Dito de outro modo, podemos perguntar se no mundo do que aconteceu – mundo factual em si e também valorado materialmente como comercial – concorreu uma pluralidade de fontes vinculantes.
As respostas – em matéria de facto e como se sabe – não traduzem a obtenção da verdade absoluta mas da probabilidade razoável e segura segundo os padrões de normalidade. Diz-nos isto que o primeiro patamar a que acedemos e onde nos vamos situar e até relativamente ao qual faremos o cotejo dos depoimentos prestados e das provas documentais, é o da realidade da prática comercial, da organização dum concreto negócio, da evolução desse negócio aliás em conjugação com a evolução política e económica geral, crivos que assim ao largo funcionarão como barreiras de enquadramento do plano da experiência normal.
Uma descrição mais elaborada do negócio melhor caberá, e para aí a relegamos, à abordagem da primeira questão de direito a resolver, qual seja a da qualificação da natureza jurídica da relação entre as partes.
Finalmente, numa terceira consideração, anotamos que cada parte produziu genericamente depoimentos em sintonia com as posições que assumiu, anotando também que as AA beneficiaram dum leque mais aberto de valências, ao apresentarem testemunhas que anteriormente haviam sido trabalhadoras das RR., ou seja, com o conhecimento de ambos os lados do negócio.
E, dum modo geral e em termos de razão de ciência, os intervenientes situaram-se entre funcionários das RR., muitos vindos da P…, que desempenharam diversas funções – alguns com esta diversidade mesmo na sua própria evolução profissional – em áreas de promoção de vendas, acompanhamento de clientes grossistas, financeiras, de vendas (departamento comercial “central”, digamos), de tesouraria, de elaboração de programas de formação e de elaboração e comunicação de estratégias, alguns dos quais alcançaram lugares de topo (depoimentos de parte e declarações de parte) e da banda das AA., testemunhas grossistas (não representantes ou já não representantes das empresas, ex-grossistas e novos grossistas, oriundos de anteriores funções nas RR), e seus empregados, ex- funcionários das RR., técnicos de contas, técnicos consultados em fase pré-litigiosa, grossistas representantes (declarações de parte inicialmente visadas à demonstração da antiguidade mas integralmente convertidas em depoimento sobre a totalidade da matéria de facto controvertida) e com independência das partes, as economistas técnicas que elaboraram o Estudo sobre o Mercado do Tabaco e o Presidente da Autoridade da Concorrência contemporâneo à decisão de um processo de concorrência.
Tirando este último, que, apesar dos esforços em responder, manifestamente de nada sabia, sequer porque tinha sido convocado, e as duas anteriores, com compreensíveis problemas de memória, o que é notório é que as demais depuseram sobre uma relação de facto, comercial, que longamente correu bem, correu como podia, segundo a evolução temporal, ter corrido, e com esse regular correr das coisas e a esse regular correr das coisas era indiferente a valoração jurídica. Digamos que, quer nas empresas familiares grossistas quer nos funcionários em execução duma dinâmica internacional dum dos mais fortes grupos mundiais de tabaco, cada um saía de manhã para o seu trabalho que lhe dava muito trabalho, colhendo ao final do dia um nível de frutos razoável. Por isso, percebe-se que os clientes grossistas assinassem as tabelas ou condições gerais sem as ler, após a comunicação postal e eventualmente verbal das alterações nas visitas dos key accounts, que achassem que as tabelas eram o contrato, que não se apercebessem que o contrato era afinal o anexo que tinham que assinar, que esse contrato não era um contrato mas uma remissão para o clausulado a que vinha anexo, eventualmente sendo contrato apenas na medida em que revogava “tudo o que estava para trás”, e percebe-se que não houvesse conhecimento por parte dos funcionários das RR sobre a existência não sua contemporânea de contratos antigos, em papel selado, com cláusulas de exclusividade, nem de documentos da década de 30 do século anterior, cujo lugar, como bem anotado, seria em museu, porque na verdade em termos comerciais e de negócio o que interessa é o presente e o futuro, e percebe-se também que nos seus depoimentos tenha espontaneamente surgido, por diversas vezes, a menção à relação contratual e às condições gerais de fornecimento como o contrato ou instrumento de vinculação jurídica. Esta espontaneidade é absolutamente coerente com um discurso sobre a realidade duma relação comercial, do que nela cada parte fazia e das condições estabelecidas e assumidas. Por isso, quando ouvimos depoimentos (ou mais rigorosamente, parte de depoimentos) pautados por valorações jurídicas puras – por exemplo, não há cessão dos acordos com grossistas de T1 para T2 porque não há acordos, há condições gerais de fornecimento, há compras e vendas sucessivas – o mínimo que se pode dizer é que lhes falta espontaneidade, para já não dizer que não compete, nem é devido nem útil, a produção de opinião jurídica por parte das testemunhas.
Feita esta introdução, prossigamos para os concretos pedidos de reapreciação formulados.
– saber se deve dar-se como provado que “O Factor de Correcção […] foi apresentado às AA. como uma necessidade de anular o efeito que o aumento do PVP - exclusivamente decorrente de aumento de impostos - tinha na margem dos distribuidores”.
Trata-se portanto de saber como é que foi apresentado às AA. o factor de correcção e não propriamente saber, neste momento, se o que foi apresentado correspondia ou não à verdade. Neste conspecto, tanto o factor de correcção foi comunicado por via do envio das condições gerais de fornecimento em que se incluía, quanto aconteceram explicações presenciais a algumas AA., em conjunto, num evento em Terras de Bouro, como ocorreram ainda explicações presenciais privadas, digamos assim, por intermédio de key accounts que visitaram algumas das AA. Da banda dos destinatários foi generalizado – e aqui podemos, parece, distinguir duas modalidades consoante o nível de maior ou menor preparação educacional para entender – o depoimento imediato no sentido de que “aquilo era um imposto”, foi apresentado como um imposto a incidir na factura e a suportar pelos compradores, que não se percebia nada, que ninguém soube explicar, que os key accounts não sabiam explicar, diziam que era um imposto, como se seguiram afirmações de que era para evitar que o aumento de impostos – o aumento do PVP na parte destinada a cobrir o aumento de impostos – produzisse o correspondente (por aplicação da percentagem sobre o PVP que era o desconto) aumento (de desconto), a beneficiar os grossistas. Seguramente que nem todos os que estiveram em Terras do Bouro, nem outros, ficaram com o mesmo grau de incompreensão, notando-se, não uma compreensão, mas nalguns uma suspeita, que depois comunicaram aos outros. Esta suspeita justificou que tivessem pedido a pessoas mais especializadas – fossem técnicos de conta, fosse a testemunha Professor …, fosse um professor de matemática – que estudassem a fórmula, suspeita que ainda mais se adensou quando perceberam que se era um imposto então a concorrência também o devia ter aplicado e não aplicou. Este historial vem a dizer que, se voltarmos a nossa atenção para o momento da apresentação, das apresentações para sermos mais correctos, com toda a probabilidade a ideia com que os explicandos ficaram foi essa mesma de que se tratava dum imposto que teriam de pagar para, ao fim ao cabo, anular ou evitar que, sem ele, se aplicasse a percentagem de desconto no preço de compra de que beneficiavam, que faria aumentar esse desconto.
Em bom rigor, as RR., embora de outro modo, foram claras quanto aos termos da apresentação: - o factor de correcção foi pensado para anular o aumento do desconto de que beneficiariam os clientes por via do aumento de impostos, e apenas nessa parte, que por ser anormalmente grande (o aumento de imposto), produziria um injustificado aumento do desconto dos clientes grossistas, injustificado porque sem correspondência em qualquer trabalho acrescido nas suas tarefas, e do mesmo modo, em tal excepcionalidade de aumento fiscal, não podiam mais, como anteriormente, serem as RR a acomodá-lo, à sua conta, quer porque ficassem a vender quase abaixo de custo quer por vissem a sua rentabilidade anormalmente diminuída. Mais ou menos explicado, admitindo-se que a fórmula não fosse acessível a qualquer leigo (mas confiando precisamente que empresas grossistas de maior volume teriam técnicos financeiros que poderiam elucidar), o que foi então apresentado não terá sido simplesmente “é um imposto novo”, mas um valor monetário a aplicar em cada factura (com diferentes incidências por marca ou família) que operava esse desiderato, de evitar que os clientes grossistas auferissem injustificadamente mais e que as RR perdessem injustificadamente – neste sentido, por imposição do Estado e por aplicação das percentagens de desconto aos clientes grossistas, sem elas mesmas RR também diminuírem a sua actividade e os seus custos. Segundo as RR., ao menos do que foi o discurso persistente em julgamento, nas diferentes incidências factuais, os clientes grossistas não perderiam e apenas não ganhariam mais sem contrapartida (quer deles para com as RR. quer deles em geral, por via dum aumento de custos limitado à inflação, abaixo do valor de aumento fiscal).
Sendo esta a posição das RR., em coerência, e na resposta ao facto ora sob apreciação, acaba por haver coincidência entre as posições das partes: - sim, o factor de correcção foi apresentado “como uma necessidade de anular o efeito que o aumento do PVP - exclusivamente decorrente de aumento de impostos - tinha na margem dos distribuidores”. No fundo, a tese que as AA. pretendem ver também provada – e que se concluía pela original inclusão da falsidade da alegação – é a de que “exclusivamente” não era verdade, quer porque o aumento do PVP não decorria exclusivamente da correspondência ao aumento fiscal, excedendo-o em parte, quer porque a incidência do factor de correcção afinal, e por isso que em excesso, acabava a transferir ganhos dos grossistas para as fornecedoras. Mas isto significa que o que há aqui a valorar, no preciso contexto deste ponto em apreciação, é que a apresentação, com toda a verosimilhança, há-de ter sido feita em termos coerentes com o que as RR. defendem ser o objectivo do factor de correcção, e portanto a resposta a dar tem de ser afirmativa.
Considerando que praticamente todas as testemunhas (excepto as ligadas à Autoridade da Concorrência), e todos os declarantes, quer produzidos por AA quer pelas RR, depuseram sobre o factor de correcção e a sua apresentação, dispensamo-nos de as identificar concretamente e de transcrever concretamente os excertos respectivos. Adita-se portanto aos factos provados, que:
- O Factor de Correcção foi apresentado às AA. como uma necessidade de anular o efeito que o aumento do PVP - exclusivamente decorrente de aumento de impostos - tinha na margem dos distribuidores.
- Pretendem seguidamente as apelantes que o facto não Provado 1 - “As RR. comprometeram-se a vender produtos de tabaco aos AA., que se comprometerem a comprá-los para depois os revenderem a clientes seus que são retalhistas, em postos de venda variados como cafés e tabacarias” seja dado como provado com base nos “Contratos de fls. 8128 a 8131, fls. 7683 a 7691, fls. 7367 a 7370, fls. 8133 a 8142, Declarações de Parte das RR. (M…M…), depoimentos de PO, SQ, AB conjugado com os Factos Provados 8 a 15, Estudo sobre o Mercado do Tabaco, de fls. 6464 a 6640, Decisão da AdC do PRC/04/08, fls. 6642-6704 e Sentença de fls. 6705-6761”.
O tribunal considerou: “Do documento de fls. 7683 a 7689, denominado “contrato de distribuição”, datado de 23 de julho de 1985 e que tem como outorgantes T… e LCT, consta que “a T… obriga-se às prestações seguintes: a) Abastecer o Distribuidor, na forma habitual e ressalvando impedimento legal ou caso fortuito ou de força maior, com os produtos objecto deste contrato; b) Não celebrar contrato análogo ao presente com contraente estabelecido na área principal do Distribuidor, com excepção dos estabelecimentos na área à data da assinatura do contrato.” Cláusulas idênticas constam dos documentos de fls. 7367 a 7370 frente e 8133 a 8142. Resulta do ponto 6 da matéria de facto provada que, desde 1992, a R. T…propôs aos grossistas que as condições contratuais que haviam sido inicialmente estipuladas por meio de acordos individualmente celebrados com cada grossista passassem a integrar as designadas “Condições Gerais”, aplicáveis a todos. Das condições gerais de 1992, juntas a 171 a 178 consta que “a presente tabela tem por objectivo definir e dar a conhecer aos agentes económicos, designadamente aos potenciais grossistas interessados na distribuição dos produtos da T…, as condições gerais e objectivas para o efeito exigidas”. Consta ainda que “as condições referidas são aplicáveis a todos os revendedores grossistas - actuais e futuros - podendo a T… conceder aos revendedores grossistas das zonas mais desfavorecidas, quando verifique que essas zonas correm o risco de ficar sem qualquer distribuição, um período transitório de adaptação”. As condições gerais são incompatíveis com a obrigação de “não celebrar contrato análogo… com contraente estabelecido na área principal do Distribuidor”. Do ponto 48 da matéria de facto provada resulta que do despacho conjunto do Ministro das Finanças e do Ministro da Economia de 12 de dezembro de 1996, consta, como uma das obrigações a cumprir pela P…., no quadro do processo de reprivatização da T…, que aquela “não deverá manter nem exigir a qualquer outro agente económico qualquer exclusividade de compra de produtos seus ou de qualquer sua comparticipada”. Do documento de fls. 7683 a 7689, atrás já mencionado, consta que “o Distribuidor obriga-se a… não comercialização de produtos concorrentes com os abrangidos pelo presente contrato, directamente ou por intermédio de terceiros, incluindo outras empresas”. Com a reprivatização, cláusulas deste tipo não podiam ser mantidas. É, pois, à luz das condições gerais que devem ser vistas as relações entre AA. e RR. Atender a contratos celebrados em 1985, como os atrás referidos, ou em 1944, como o junto a fls. 8129 a 8131, é esquecer factos como a adesão de Portugal à C.E.E. e a reprivatização da T… que implicaram alterações nas relações entre esta e os grossistas. Das condições gerais reproduzidas no ponto 8 da matéria de facto provada consta que “a T… recusará fornecer o Cliente Grossista se este não preencher ou, em qualquer momento, deixar de preencher todos os requisitos referidos no Capítulo I.” Daí o ponto 1 da matéria de facto não provada”.
Resumindo, o tribunal considera que as Condições Gerais de 1992 deixam para trás os contratos de distribuição, e que cláusulas de exclusividade como as que constavam desses contratos não se podiam manter, quer pela adesão de Portugal às Comunidades Europeias quer pelas exigências do processo de privatização. Louvando-se então nas Condições Gerais conclui que quem não preencher os requisitos delas constantes não será fornecido e passa portanto a desmentir que qualquer das partes se tenha comprometido a vender e a comprar – tanto que há a liberdade de recusar o fornecimento se o cliente deixar de preencher os requisitos. Talvez o que tenha estado na mente do tribunal recorrido seja que, porque a P…/T… não pode ter uma relação de exclusividade com os distribuidores, então estes não estarão comprometidos a comprar-lhe, em tanto que podem comprar onde quiserem, designadamente à sua concorrência. E se portanto os grossistas não estão comprometidos a comprar, também as Rés não estariam comprometidas a vender, cada um podendo ir à sua vida quando lhe aprouvesse. Pedimos a compreensão para algum engano de leitura, caso não seja esta a ideia, porque a motivação não é particularmente explicativa.
Retomando as nossas notas iniciais sobre as perspectivas de abordagem da realidade factual, um primeiro ponto de ordem à mesa se impõe: - não estamos a discutir a criação do Mundo, estamos no mundo já criado. Não estamos a falar da liberdade abstracta e formal de escolha de género de trabalho ou profissão, na qual sempre podemos afirmar que os grossistas têm a liberdade de se dedicarem a outros negócios, ou ao trabalho subordinado, tal qual as pessoas físicas que estão representadas pelos diferentes estratos de poder empresarial têm a mesma liberdade de abandonarem as competências funcionais desses estratos. Nem estamos a falar do plano civilístico da liberdade contratual privada. Quando abordamos esta realidade factual que temos de decidir, já descemos desses planos teóricos, formalmente válidos, ao plano do que já por força deles aconteceu, dos concretos relacionamentos que já se iniciaram entre pessoas e entidades concretas e dos modos que assumiram ou não assumiram para esses relacionamentos.
Também não caberá aqui fazer uma evolução do primeiro homem que descobriu que a folha do tabaco seca e triturada podia ser enrolada numa outra folha e seguidamente queimada e aspirada com notável deleite, passando pelas imagens de divas fumantes dos anos 30 até aos dias actuais da constatação médica generalizada dos malefícios do tabaco. O essencial a reter é o serviço privado (ou público, tanto importa) da fabricação do que começou puramente artesanal e local para consumo de milhões de fumadores em todo o mundo e portanto também o serviço de entrega tanto mais próxima possível desses milhões de fumadores. Na remota Sibéria não cresce o tabaco e a disponibilidade dum cigarro ao habitante local traduz uma muito diversificada e intensa actividade produtiva, que combina muitos meios de produção, cujos activistas têm de ser pagos em proporcionalidade dos meios que empregaram. Em suma, na passagem do artesanal e local à fabricação mecânica e global, temos negócio.
Podemos perspectivar este negócio, dum ponto de vista económico, a partir do fabricante (qualquer que seja) e percorrer apenas o primeiro passo até ao grossista. Mas trata-se duma abordagem menos valiosa, senão dum erro. Não nos podemos esquecer do siberiano. Em cada fumador, em qualquer local do mundo, está a chave de compreensão do negócio. E mais do que nele, está na sua dependência – e aqui sim podemos reverter ao fabricante e à dependência da marca.
Do que se trata portanto neste negócio é de como produzir milhões de cigarros que correspondem ao consumo de milhões de fumadores e de como os fazer chegar até estes milhões de fumadores espalhados pelo planeta, portanto, com milhões de quilómetros a percorrer, na impossibilidade de haver uma fábrica à porta de cada fumador. Também não é possível, pela enormidade de custo verso o valor insignificante do cigarro (valor que não só corresponde à insignificância da matéria prima e à divisão milionária, por cigarro, dos custos com meios de produção e ao preço de venda final que não pode deixar de ser muito baixo pois se destina literalmente a ser queimado pelo consumidor), que da fábrica saiam diariamente veículos – qualquer que seja o tipo – para se dirigirem à porta de todos e cada um dos fumadores. E portanto também não é possível ter meios humanos subordinados para fazer este transporte. E depois ainda, devemos ter estado num aliciamento expansionista, uma gradual conquista de muitos oestes, cujo efectivo gatilho é o consumo necessário à formação da dependência. Assim, a todos estes títulos, se há-de explicar a expansão da verdadeira rede capilar pela qual o cigarro sai da fábrica até aos milhões de fumadores. Uma rede em crescimento, de conquista confiante, mas com riscos.
Isto explica, outra a ciência comercial mais especializada, as condicionantes naturais do negócio, tanto porque é que, no caso português, as Rés são inteiramente dependentes dos grossistas como porque é que estes não se resumem à função de transporte e assumem também a compra definitiva dos produtos às Rés e a partir daí o risco do negócio – que aliás irão depois passar ao retalho, na sucessiva construção e expansão da rede capilar nacional, que se sustenta na disponibilidade permanente do produto aditivo ao dependente, sob pena de libertação deste.
Depois, não se nasce ensinado. Cada profissão convoca, senão apetência natural, pelo menos esforço, dedicação e trabalho. E no caso dos grossistas convoca ainda capital – da renda da “garagem” anexa à vivenda (HB, quando comprou a vivenda com armazém), às grandes instalações securitárias e às muitas carrinhas dos top 10 convidados para a viagem a Pequim (AF).
Vem isto a dizer da ainda maior dependência das Rés relativamente aos grossistas: - eles não são todo e qualquer cidadão singular ou colectivo que se apresta ao biscate, são aqueles que se esforçam, dedicam, trabalham e especializam neste trabalho da compra para revenda com distribuição ao retalho e que têm os recursos necessários para tanto. São também aqueles que têm a apetência da volta e da arte de revender. Não fossem os (ainda que “400 para 100”) grossistas, Albarraque exibiria uma montanha altamente inflamável. Não fossem estes mesmos grossistas, a V… C… não se preocuparia em queixar-se das cláusulas de exclusividade, nem a B… A… estaria preocupada porque, com as práticas da T…, qualquer delas não conseguia alcançar o seu desiderato essencial para o negócio – chegar à possibilidade de gerar dependência do fumador (do maior número de fumadores) relativamente aos seus produtos, via quem lhos leve lá.
Se pensarmos agora nos grossistas, sobretudo nos que se centram no negócio do tabaco, também não encontramos ingénuos. Eles encontram no negócio, cujo motor de funcionamento bem conhecem, uma oportunidade de vida. Apesar das muitas queixas sobre margens baixas, estamos no caso de várias AA. com sobrevivência no mercado desde há muitas décadas. É, numa sociedade organizada no dinheiro e na circulação deste, a maneira que encontraram para o obter. E estamos sempre a falar de maneiras lícitas para qualquer dos intervenientes, diga-se.
Nesse negócio que abraçaram, eles sabem que precisam de convocar ou reunir e afectar uma série de meios, e sabem-no tanto mais quanto a insignificância do preço de um cigarro e do lucro que podem obter com ele, exige uma afectação constante. Nenhum grossista, nenhuma das Autoras ou Autores – e quando estamos a analisar a motivação negocial, o que faz com que determinada pessoa enverede por uma profissão, não podemos atender ao que com base numa generalidade de pessoas que se dedicaram a ela, foi possível abstrair para definir legalmente essa profissão e eventualmente regulá-la para os mais variados efeitos – se mete ao negócio para vender dois maços de cigarros ou para estar nele durante dois meses, pois não ganharia nada, nem desenvolveria qualquer aptidão de venda, nenhum retalhista reteria o seu nome.
Convocados estes meios e esforços, também para o progresso ou subsistência do negócio grossista de tabaco, os grossistas se encontram na dependência dos seus fornecedores, na medida não duma atitude arbitrária ou independente dos fornecedores, mas da atitude destes – fabrico e comercialização – determinada pelos consumidores finais. Toda uma rede de implicações mútuas portanto, que carrega o peso da tradição – a dependência do consumidor relativamente à marca (facto provado) e o consumo de marcas nacionais, longamente mais ou menos monopolistas ou para-monopolistas do mercado proteccionista (edição histórica do S…). Daqui as quotas de mercado e a dificuldade – relativamente aos anos mais essenciais para este processo e eventualmente ainda hoje – de acesso, legalmente vedada a publicidade, via canal grossista e retalhista, ao consumidor final, pelas concorrentes das Rés, e daqui também a preponderância dos produtos das Rés para o negócio grossista e por isso a necessidade de os adquirir.
É a tradução ou o espelho de toda esta lógica que encontramos nas Condições Gerais. Elas plasmam a dependência das Rés relativamente a quem lhes leva o produto ao consumidor, o domínio da definição da estratégia comercial que visa atingir o fumador, organizando a passagem do produto até ele, e por isso a decisão sobre os termos melhores duma organização pensada e desejada. E dentro desta organização, encontram os grossistas também a sua estratégia, a sua oportunidade de inserção. Então, de um ponto de vista económico, os grossistas só convocam todos os meios que têm de aplicar se tiverem um compromisso de que o produto que vai ser processado com recurso a esses meios que convocam e disponibilizam, for efectivamente fornecido, e se assim for, comprometem-se também a desenvolver a sua actividade grossista. Asseguradas as Rés de que estes meios vão efectivamente ser convocados e que a actividade grossista vai ser desenvolvida, que o produto que for fornecido não fica no grossista e atinge, via retalho, o cliente final, as Rés, por sua dependência, não têm como recusar, elas estão, dum ponto de vista económico-naturalístico literalmente obrigadas a fornecer.
Outra coisa não foi dita, resumidamente, pela própria banda das Rés. Estas assumiram expressamente a sua dependência da distribuição. Por isso foram unânimes os depoimentos no sentido de que cumpridos os requisitos previstos nas Condições Gerais, elas fornecem. Como, mesmo em tabelas ou condições, quer expressa ou tacitamente, sempre houve previsão de aceitação de cumprimento dos requisitos, sempre houve aliás necessidade de demonstração desse cumprimento, com essa aceitação os grossistas comprometeram-se a desempenhar a sua função, e com essa demonstração as Rés ficaram asseguradas da seriedade desse compromisso. Para diante deixamos a perspectivação jurídica do alcance deste processo comunicativo e demonstrativo.
Quando ultrapassamos o limiar do processo de selecção, estamos no pleno quadro de operância das Condições Gerais e das obrigações nelas previstas – e deixaremos uma análise dos textos também para a discussão jurídica da causa. Aqui importa apenas reter que no quadro de funcionamento das Condições Gerais, perante estas Autoras e Autores que as cumpriram ao longo de anos, que como provado não tiveram, a cada nova publicação de condições, que iniciar um novo processo de candidatura em todos os seus muitos passos e aspectos, que como mencionado até pelo i. mandatário das Rés, não seria prático terem repetido o processo de demonstração a cada encomenda (noutro contexto poderíamos falar duma greve de zelo que pararia o negócio por completo), perante as Rés que também, relativamente a essas Autoras e Autores as cumpriram, efectivamente e de modo retrospectivo, global ou mesmo que visto só ano a ano, podemos verificar a assunção do compromisso de fornecer e do compromisso de comprar para revender.
Neste quadro de operação, podemos sempre apelar ao primeiro plano formal com que iniciámos esta análise: somos livres. As Condições Gerais, mesmo no seu quadro de operância, não obrigam ninguém, nem as Rés a fornecer nem as AA. a comprar. A resposta a isto, do ponto de vista económico, é que enquanto quisermos estar neste negócio e por via das dependências que assinalámos, por natureza do negócio, não somos livres. E isto nada tem a ver com a necessidade de adaptação por via da evolução do mercado livre nem às expulsões dele: - em última análise, as fabricantes de cigarros fecharão porta quando os grossistas saírem por inépcia ou incompetência, quando nenhum sobreviver ao mercado. Ou, as fabricantes de cigarros ficarão como os agricultores de aldeia, quando a sobrevivência no mercado obrigar os grossistas a uma mega concentração. Repete-se, argumentos de pura lógica jurídica abstracta, de liberdades formais, não servem para responder a uma realidade factual neste caso económica, em sede de decisão da matéria de facto.
Deixaremos para outra sede o argumento da inexistência previsional da obrigação de indemnizar em caso de incumprimento, leia-se, exercício da liberdade de não comprar nem vender.
Vindo mais concretamente aos meios probatórios invocados pelas apelantes, é claro, mas também deixaremos em mais minúcia para depois, que muitas das expressões usadas nos contratos de distribuição persistem, apesar de alterações ligeiras, até às mais recentes Condições Gerais. Porque a essência do negócio não mudou, mais proteccionismo, mais monopólio, mais comércio livre, mais concorrência, mais Europa e mais privatização, a essência é a mesma: - fabricar cigarros e levá-los ao fumador, sem ruptura de consumo. E as condições físicas do negócio também não mudaram: - Albarraque continua lá e os milhões de fumadores nacionais servidos por 70 mil postos de venda não se mudaram para a linha de Sintra. Claro portanto que as Rés tiveram de fornecer cigarros, tiveram de o fazer em economicamente eficientes entregas diárias ou semanais, e claro que os grossistas se comprometeram às encomendas e compras, e lutaram por crescer para poder ter mais rotação de entregas. Em M…M… encontramos a queda para a menção das Condições Gerais como contrato, que as apelantes aqui aproveitam para restabelecer a ligação entre os contratos e as Condições Gerais, e a admissão óbvia de que se o grossista cumprir (e desde logo com a primeiríssima obrigação de pagar) as Rés têm de fornecer, o que salta dos demais depoimentos invocados e acima referidos, mas de muitos outros ao longo dum extenso julgamento em que poucos intervenientes terão escapado à pergunta recorrente da obrigação de fornecimento das Rés.
Como se demonstrou, espera-se, por natureza económica, todos são atinados e credíveis.
Pensar na cláusula que possibilita a recusa de fornecimento, sem atender a tudo o mais que está escrito nas (várias versões das) Condições Gerais, para concluir que não há obrigação de fornecimento, é começar a casa pelo telhado, desde logo porque para recusar o fornecimento, este teve primeiro que tudo – estava no texto desconsiderado – que ser estabelecido, isto é, afirmado que iria ser feito.
Em suma, não podemos de modo algum secundar a motivação nem a decisão do tribunal recorrido.
Elimina-se, por todo o exposto, o facto não provado nº 1 e adita-se à matéria de facto provada que:
- As RR. comprometeram-se a vender produtos de tabaco aos AA., que se comprometerem a comprá-los para depois os revenderem a clientes seus que são retalhistas, em postos de venda variados como cafés e tabacarias.
- Prosseguem as apelantes para o facto não provado 2 – “As AA. põem em contacto as RR. e os retalhistas que, numa fase posterior, vendem os produtos de tabaco aos consumidores”, que pretendem passe a provado,invocando a “prova produzida a propósito do quesito 1.º da BI, correspondência de fls. 7279, 7314, 7316v, 7326v e segs., fls. 7346, fls. 7348, depoimento de parte da 2.ª R. (NJ) e ainda os depoimentos de AC (erradamente valorado pelo Tribunal a quo) e PO, conjugado também com os Factos Provados 8 a 15”.
O tribunal entendeu que “Várias foram as testemunhas que referiram que os promotores de venda da T... visitavam retalhistas acompanhados dos vendedores dos grossistas e que os promotores de venda deixavam por vezes produtos nos retalhistas. Isso não significa que os AA. põem em contacto as RR. e os retalhistas. Pôr em contacto tem implícita a intermediação. A testemunha R…, ex-promotor de vendas, afirmou que, nas visitas que fez aos retalhistas acompanhado dos vendedores dos grossitas, estes faziam o seu trabalho e a testemunha fazia o seu. A testemunha A…, ex-promotor de vendas, declarou que o vendedor do grossista “abre as portas” e que o promotor de vendas não precisa assim de perder tempo para estabelecer relação, conseguindo fazer mais visitas por dia. Os retalhistas são clientes dos grossistas e não da T… e tanto assim é que, quando os promotores de vendas deixavam produtos nos retalhistas, a T… faturava ao grossista, como foi mencionado por várias testemunhas, como por exemplo S…, ex-administradora de sociedade grossista”.
O problema começa com a alegação e persiste até à pretensão ora sob apreciação: - pôr em contacto é perfeitamente vago.
No corpo da alegação encontra-se concretizado o sentido: - os grossistas põem em contacto a T… e os retalhistas quando aqueles apresentam os promotores desta aos retalhistas, facilitando-lhes o trabalho de promoção, e, noutro sentido, os grossistas são um elo da cadeia pela qual o produto chega ao ponto de venda ao público.
Para este segundo sentido, não precisamos de dar o facto como provado, porque ele já resulta dos factos provados sub 1, 15, 49 “a contrario”, e ainda da alteração que acabamos de fazer ao facto não provado nº 1, de harmonia aliás com os textos quer dos contratos, quer da tabela quer das condições e ainda da lógica de funcionamento do negócio. É absolutamente manifesto que nenhum grossista, seja de que negócio for, compra para uso pessoal e é também manifesto que (no caso e salvo o caso específico das máquinas de vending próprias) o grossista não vende ao consumidor final.
Por isso, só pode salvar-se com utilidade para esta apreciação, o primeiro sentido de “pôr em contacto” – os grossistas apresentavam pessoalmente os promotores da T… aos retalhistas seus clientes. E sem dúvida que sim, inúmeros relatos além dos referidos A.., P. e NJ, quer dos grossistas (depoimentos e declarações) quer dos promotores (das testemunhas, depoentes ou declarante que eram ou foram funcionários T… e que em algum passo da sua carreira desempenharam essas funções) foram produzidos sobre as voltas em conjunto e sobre a sua utilidade, que é aliás também evidente: - acompanhar a volta do grossista aos seus clientes retalhistas ultrapassa a frieza e desconfiança dum primeiro contacto que o promotor realizasse sozinho, facilitando-lhe o trabalho (em simultâneo mas independente do trabalho do grossista na volta), e permite conhecer novos pontos de venda considerados relevantes e adicioná-los à base de dados, para posteriores visitas não acompanhadas. Sendo a função do promotor ligada à transmissão directa ao ponto de venda das opções estratégicas comercias em cada momento consideradas relevantes e oportunas, não vendendo a T… ao retalhista mas ao grossista, uma eficaz maneira de determinar o grossista à compra é convencer o retalhista a encomendar ao grossista a marca trabalhada. Aliás, no início, o programa A…, destinado aos retalhistas, tem precisamente este objectivo. Por isso que o grossista também é beneficiário da expertise T… veiculada pelo promotor, exercida sobre o seu cliente retalhista, os grossistas gostavam de colaborar e aceder aos pedidos da T… para os promotores os acompanharem na volta (expressiva HB…).
Donde, se restringirmos e concretizarmos a resposta, podemos afirmar que as AA., quando acompanhadas na sua volta pelos promotores das Rés, apresentavam-nos aos seus clientes retalhistas que, numa fase posterior, vendem os produtos de tabaco aos consumidores. Elimina-se assim o facto não provado nº 2, e adita-se à matéria de facto provada que:
- As AA., quando acompanhadas na sua volta pelos promotores das Rés, apresentavam-nos aos seus clientes retalhistas que, numa fase posterior, vendem os produtos de tabaco aos consumidores. - Quanto ao facto não provado 3 - “Após a privatização, a R. T… manteve os acordos com grossistas de maneira a organizar o escoamento dos produtos de cigarros que produzia.”, pretendem as apelantes que passe a provado, com base nos “factos provados 8 a 15, CGF de fls. 179 e seguintes, desconsideração (adequada valoração) do depoimento de VE…, e todos os demais meios de prova indicados a propósito da impugnação da resposta ao Facto Não provado 1”.
O tribunal recorrido entendeu que “O ponto 3 da matéria de facto não provada encontra a sua explicação nas considerações tecidas a propósito do ponto 1 da matéria de facto não provada, sendo de salientar que o depoimento da testemunha V… é esclarecedor quanto à substituição dos contratos pelas Tabelas de Condições realizada pela T… em 1986, tendo apresentado explicação satisfatória para a referência a “contrato” nas condições gerais”.
O sentido que resulta da alegação não é particularmente claro, pois poderia confundir-se com a subsistência da relação comercial com as AA. e demais grossistas, que, sendo clientes da T… antes da privatização, não deixaram de o ser após a privatização, não tendo a T… privatizada decidido entrar em relação com outros grossistas em vez dos existentes, e não tendo tido as AA. necessidade de reiniciar um processo de candidatura, tendo aliás mantido as condições comerciais de que beneficiavam. Não deixando este aspecto de ser tocado no corpo da alegação, quer pela referência final ao depoimento da testemunha V… quer pela referência ao Estudo sobre o mercado do tabaco, não é ele em rigor o sentido que as apelantes querem ver provado. Antes, do que se trata é de afirmar em sede de matéria de facto que os contratos que existiam com as AA., e que eram expressamente mencionados nas Condições Gerais continuaram a manter-se, que nada na privatização obrigou à cessação desses contratos e que até depois das RR. veicularem a tese da inexistência de contrato, ainda continuaram a ser celebrados contratos específicos para a venda automática.
Claro, a menção acordos lança alguma possibilidade de não estarmos em sede de direito, e claro, a menção à organização do escoamento serve para ilustrar a necessidade desses acordos e portanto da sua subsistência.
Quer o tribunal recorrido na sua motivação, quer agora as apelantes, incorrem na mesma valoração do facto como referência à subsistência dos contratos, o que não é admissível nesta sede.
Para uma conclusão semelhante ou dissemelhante a realizar em sede jurídica, já temos provado o teor das condições gerais antes e depois da privatização, que confrontado com os demais factos provados e com o direito aplicável, permitirá alcançá-la.
Se portanto temos uma alegação de direito e uma decisão de direito em sede de matéria de facto, o facto não provado nº 3 está a mais e deve ser eliminado.
Para a realidade factual da subsistência da relação comercial entre as partes (ou algumas das AA.) já temos provada (e iremos ainda acrescentar) a antiguidade dessa relação e já temos provado que não foi preciso um processo de recandidatura.
Em suma, mostra-se indevido e sem utilidade o aditamento do suposto facto aos factos provados. Assim, apenas, elimina-se o facto não provado nº 3.
- Quanto aos factos não provados 4, 5, 6 (“4 - A R. T… (2ª) surge, a partir da cisão, como intermediária na relação entre a R. (1ª) e os grossistas”, “5 - Os factos referidos no ponto 4 da matéria de facto provada e no ponto 4 da matéria de facto não provada ocorrem por razões de conveniência das RR. às quais os AA são alheios” e “6 - O fornecimento dos produtos de Tabaco aos AA. dependia da conduta das duas RR. no sentido de que, se a R. T (1) não produzisse, a R. (2) não poderia fornecer”) sustentam as apelantes que devem “ser dados como «provados» de acordo com o Facto Provado 4, depoimento de parte de P…S… e N…J… (RR.) e demais prova acima referida.
O tribunal motivou do seguinte modo: “Os pontos 4, 5, 6 e 7 da matéria de facto não provada encontram a sua explicação nos depoimentos das testemunhas PMCM e JMRL, testemunhas que entraram para a P… na década de 90 e que corroboraram o depoimento de parte prestado por PENS.
Resultou desses meios de prova que a cisão se ficou a dever a decisão da P… de separar fabrico da comercialização, não apenas em Portugal, mas em toda a comunidade europeia, e que a T (1) vende à P… e a T (2) compra à P…, podendo comprar produtos não fabricados em Portugal”.
Para as apelantes, segundo o corpo da alegação, não interessam formas societárias intermédias – o modo como a P… organiza as suas subsidiárias – nem que a P…M… tenha comprado à T… produtora e depois venda à T (2). E ficou claro que os cigarros produzidos pela T… que são consumidos em Portugal, passam, a partir da cisão, pela intermediária T (2).
Não explicam as apelantes porque é que forma societária não interessa, sendo que a única explicação que nos ocorre é a do sentido naturalístico que se acaba de referir: - os cigarros produzidos em Portugal, das marcas aqui consumidas, são produzidos pela T1 e vendidos pela T2 aos grossistas, aparecendo nessa medida a actividade de venda da T2 como um serviço intermédio necessário para que os cigarros (e outros produtos de tabaco) saiam da fábrica e entrem nos armazéns dos grossistas.
Inúmeras pessoas falaram sobre este assunto e da banda das AA. o interesse ou pensamento de base era demonstrar um deliberado afastamento da T… para com os grossistas, uma descaracterização deliberada da relação contratual de distribuição. Este pensamento não aflora a pretensão recursiva. Seguramente porque ficou evidente, pela credibilidade dos depoimentos produzidos pela banda das Rés, que estamos a falar de uma opção global (europeia, pelo menos) de organização societária da P…, pela qual foi separada a produção da comercialização, e mais que isso, no caso T1, foi explicado que a matéria-prima é propriedade da P… que a entrega à T1 e lhe encomenda a transformação em cigarros, pagando por esse serviço. Talvez não seja assim tão seguro que a T1 venda a quem lhe encomenda o fabrico, os cigarros fabricados. Foi afirmado que a T2 adquire os cigarros, mesmo os produzidos em Portugal e destinados ao consumo nacional, da P… e a proveniência dos cigarros será a possível e economicamente eficiente – se houver uma falha na produção nacional ou, por absurdo, um incremento não previsível da procura, os cigarros virão de outras fábricas que possam colmatar a falta ou falha, da Grécia como referido, ou da Polónia ou da Holanda.
Como é claro, por uma questão de economia, a regra maior é a de que os cigarros das marcas tradicionalmente fumadas em Portugal, produzidos em Albarraque, não vão às instalações da P… em Lausanne para de lá voltarem com destino aos armazéns dos grossistas nacionais.
Portanto, em sentido naturalístico, a T2 será, por regra e maioria, a intermediária. Isto – das não idas a Lausanne – é de tal modo evidente que não precisamos em rigor dum facto a dizê-lo, pois o que já está provado – “4 - A atividade de comercialização de cigarros e produtos afins é desenvolvida pela R. (2), prosseguindo a R. (1) a atividade de produção industrial de cigarros e produtos afins”, já nos permite concluir que os produtos fabricados pela T1 que chegam ao consumo nacional, foram comercializados pela T2, que neste caso intermediou essa passagem.
Quanto a uma intermediação em sentido jurídico, considerando que as apelantes pretendem dar como provado que foram alheias às decisões organizacionais da P…, no que têm inteiro acerto, essa pretensão já de algum modo abre a porta à credibilidade dos depoimentos da banda das RR. que com maior conhecimento de causa falam da decisão. Ora, o que resultou da globalidade desses depoimentos é que T2 não compra a T1 e portanto não há intermediação.
Consideramos assim que os meios de prova indicados no despacho motivador e vários outros, sustentam bem a decisão quanto ao facto não provado nº 4.
Pelo contrário, não se aproveitou da abundante prova produzida o que também foi referido: - a reorganização geral em cujo seio se deu também a decisão de cisão, foi completamente alheia aos grossistas. O facto não provado nº 5, reportado ao facto provado 4 (porque tecnicamente não faz sentido reportar a factos não provados), deve passar a provado.
Finalmente quanto ao nº 6 dos não provados, voltando a dar-se credibilidade aos mesmos depoimentos, apesar da regra apontar para que o produto, para chegar aos grossistas, seja primeiro fabricado pela 1ª Ré e depois vendido pela 2ª, a excepção – na falta de produto produzido pela 1ª Ré, o mesmo produto desejado pelo consumidor nacional pode ser feito noutras fábricas europeias e a P… o venderá à T2 – decisivamente afasta a possibilidade de dar como provado o facto não provado nº 6. Assim, mantêm-se os factos não provados 4 e 6, elimina-se o facto não provado 5, e adita-se à matéria de facto que:
- Os factos referidos no ponto 4 da matéria de facto provada ocorrem por razões de conveniência das RR. às quais os AA são alheios.
- Quanto ao facto não provado 8 – “Após a cisão na T… a R. (1), em benefício da R. (2), cedeu parcialmente a sua posição nos acordos existentes com os AA., para que esta, enquanto sociedade do grupo, organizasse a relação com os AA. quanto aos aspetos logísticos dessa relação”. Invocam em apoio as cartas de fls. 165, 281 e ss., 311 e 341 e o depoimento PNS, conjugados com o Facto Provado 56.
O tribunal recorrido entendeu que a prova não foi além do provado em 56 e convocou ainda a motivação para a sua resposta negativa a 1 e 3.
Dissecando o facto não provado 8, temos o mesmo aspecto naturalístico já assinalado na apreciação que acabámos de fazer: - se antes a T… produzia e comercializava, aqui incluindo tratar do transporte aos armazéns dos grossistas, depois de T2 passou a produzir só, e foi T2 quem passou a comercializar e tratar do transporte. Isto já temos no facto provado 4. Sobra do facto não provado 8 a afirmação de que havia acordos com os AA., e que tendo passado uma parte das obrigações que assumia para T2 então cedeu parcialmente a sua posição. Donde, cedeu parcialmente a posição é uma conclusão, e de direito, e em rigor o que pode contribuir para essa conclusão é saber se com a entrada em cena da T2, com o início da actividade da T2 nos aspectos “logísticos”, se alterou alguma coisa relativamente ao que vinha a acontecer. A isto pode responder o facto provado 56 mas é pouco expressivo. O que bem exprime o que, no imediato após a cisão aconteceu (e é esse momento imediato a que temos de atender para concluir por uma cedência) é a carta referida no facto provado nº 3, cujo teor ali não foi dado como reproduzido, mas que consta desde logo a fls. 165 dos autos. Nesta, além de se informar que a “partir do próximo dia 1.1.2008 as actividades de distribuição e comercialização de cigarros e produtos afins serão desenvolvidas por uma nova sociedade (…)”, escreveu a T…: “No que respeita às relações comerciais e/ou contratuais existente (s) com V.Exas e a T… (1)., estas manter-se-ão com a T…(2).”. E mais adiante-se lê-se, no seguimento da informação sobre identificação fiscal para efeitos de facturação: “Em tudo o mais, permanece inalterada a relação comercial com V.Exas (…)”. Assim, elimina-se o facto não provado 8 e adita-se aos factos provados que:
- Na carta referida no facto provado nº 3, a fls. 165 dos autos, a 1ª Ré escreveu, além do mais, que a “partir do próximo dia 1.1.2008 as actividades de distribuição e comercialização de cigarros e produtos afins serão desenvolvidas por uma nova sociedade” (…) “No que respeita às relações comerciais e/ou contratuais existente (s) com V.Exas e a T…., estas manter-se-ão com a T… (2)” (...) “Em tudo o mais, permanece inalterada a relação comercial com V.Exas (…)”.
– Pretendem as AA. relativamente aos factos não provados sob os números 9 a 14, que se dê como provada a genealogia, por assim dizer, das AA ali mencionadas, invocando documentação diversa, entre ela listas de distribuidores, e os depoimentos e declarações de parte de pessoas envolvidas com tais AA.
Percebe-se que o propósito é estabelecer a duração da relação comercial entre as AA e suas antecessoras e as RR, elemento tipificador duma determinada qualificação jurídica contratual e simultaneamente histórico-descritivo dos termos globais pelos quais o negócio se processou e evoluiu, o que é também, nesta generalidade, uma ajuda às teses defendidas pelas AA.
Lendo-se o despacho motivador da convicção do tribunal recorrido verifica-se que o tribunal atendeu apenas às datas no item “é cliente desde” constantes dos inquéritos anuais (documentos mencionados nesse despacho e constantes de fls. 4114 a 4117, 4228 a 4231, 4533 a 4535, 4743 a 4745, 4992 a 4996 e 5073 a 5078) denominados EC Agreement Site Visit and Sales Plan, elaborados pelas RR. e executados por funcionários seus junto dos clientes grossistas, tanto para estabelecer a antiguidade da relação com as AA em causa, como para dar como não provado todo o historial dos seus antecessores.
Tais inquéritos, ou melhor formulários de inquéritos foram produzidos, como do respectivo cabeçalho consta, para cumprimento do Acordo de Anti-Contrabando e Anti-Contrafacção também desdobrado, no essencial do que visava impedir e estabelecer garantias de impedimento, nas Condições Gerais de Fornecimento – 8ª – e que no fundo se pode resumir ao conhecimento do cliente, ou seja, que conhecendo o cliente, além do mais por visitas anuais, se garante que quaisquer práticas suspeitas de facilitação ou menor combate ao contrabando, contrafacção e branqueamento de capitais, sejam despistadas.
Este tipo de documento não corresponde, como é óbvio, ao único registo de cliente de que as RR. se poderiam servir. Trata-se de um documento específico, para um fim específico, sendo claro que dele não consta o histórico de compras e pagamentos que permitia aos serviços comerciais a imputação nas encomendas dos descontos a praticar em função desse histórico, seguramente até ao preço fixo por caixa, e outros ficheiros ou aplicações ou derivações deverão também existir ou ter existido para finalidades de informação financeira e de tesouraria. Por outro lado este tipo de documento é datado – data da visita – e evidentemente na data da visita quem é visitado e identificado é uma determinada pessoa, singular ou colectiva, e não as suas antecessoras – nem se revela a existência de inquéritos destes desde datas anteriores ao EC Agreement, que são por sinal todas aquelas a que as AA reportam as suas antecessoras. Acresce que foi muito discutida, em julgamento, a credibilidade da informação contida nestes inquéritos quanto à antiguidade, podendo admitir-se que os mesmos se encontravam pré-preenchidos e não que a data de início fosse declarada em cada ano pelo cliente, podendo em todo o caso tal data ter sido inserta em sistema por uma primeira menção do próprio cliente ou ter sido retirada, para pré-preenchimento, a partir do sistema informático. Mas em suma, o que resulta claro, da limitação funcional dos documentos e da sua posterioridade às alterações históricas ou genealógicas que as AA reclamavam nos factos que receberam resposta de não provado, ora sob análise, é que os mesmos são completamente inócuos para demonstrar que aquilo que as AA alegam quanto a essa genealogia não seja verdade.
Claro, remeter um facto para o rol dos não provados não diz que ele é falso, diz então apenas que o tribunal só deu credibilidade ao que constava destes documentos – note-se aliás que nos mesmos se encontra uma menção às alterações sociais desde a última visita, mas a realização dos inquéritos é posterior, como vimos, e portanto não há um campo próprio para explicar genealogias – não dando credibilidade alguma a outros documentos emanados das próprias RR (mais propriamente T1), a saber, listas de distribuidores, sem razão visível para tanto, nem às declarações das partes nem à conjugação ou cotejo destas com aqueles.
Ora, se depoimentos e declarações há em que a complexidade da genealogia já é dificilmente apreensível pelos depoentes e declarantes, se o começo do negócio remonta ao século XIX e ao rapé, e se portanto a segurança desses depoimentos não é muita, já saber que o negócio começou no avô, passou para o pai e quando este ficou doente para a mãe, e esta resolveu socorrer-se dos filhos, e histórias semelhantes, não têm qualquer razão para não serem verossímeis, e a tanto não basta sequer uma desconfiança de base ou de princípio no valor da prova por declarações de parte, que possa justificar que a simples declaração de parte, desacompanhada de outra confirmação probatória, não tem qualquer valor porque interessada. De resto, e renovando o que já disse, o que interessa ao tribunal é a probabilidade razoável e não a verdade absoluta, e portanto a declaração de parte há-de ser valorada por este prisma, tanto mais ainda quanto o facto que se destina a provar nem sequer é particularmente decisivo, ou melhor, quando é realmente indiferente se a antiguidade da relação comercial remonta aos anos 20, a 1940 ou 1970 ou a data próxima e anterior à da emissão das primeiras tabelas de condições gerais. Neste último caso poderíamos pensar nas implicações jurídicas dum contrato anterior às tabelas de condições, perante estas e suas sucessoras, mas mesmo se a relação comercial se estabelece já no tempo das condições gerais de fornecimento, a questão da duração (contra a efemeridade) já tem, ou pode ter, a relevância indiciária pretendida pelas AA.
Portanto, em termos gerais, não encontramos razão para secundar o pensamento motivador do tribunal recorrido.
Finalmente, diga-se, tirando muito pontuais intervenções, as RR. não tiveram qualquer empenho em contraditar os relatos de genealogia feitos, desde logo porque, atenta a sua posição, este tipo de factos não tem qualquer interesse, e mesmo a admitir a tese oposta, em rigor, como dissemos, o seu interesse é limitado.
Vejamos então em concreto:
- Quanto ao facto não provado 9 – “A A. …DL assumiu a actividade inicialmente desenvolvida por APSS, APS e MPS, com o conhecimento e autorização da T…”, relativamente ao qual as AA pretendem seja dado como provado que “APSS, APS e MPS iniciaram a actividade de compra para revenda de produtos da T… em 1949, e, em 1981, ASF constituiu com aqueles a S & C” e mais pretendem seja dado como provado que “A actividade actualmente desenvolvida pela DL é a mesma que inicialmente foi desenvolvida por APSS, AP e MPS, tendo-se mantido, com o decurso do tempo, as mesmas condições comerciais”.
AF… é justamente uma daquelas pessoas que nos conta uma história cheia de pormenores, um homem do norte que em novo arranjou uma namorada no Algarve, com quem veio a casar, cujo pai e cujos irmãos do pai tinham uma mercearia onde os pescadores que, conforme a hora da maré, vinham a terra e regressavam ao mar, nesse intervalo querendo comprar tabaco além de outros mantimentos, e por isso os três irmãos resolveram pedir directamente à T.. para serem seus agentes, para receberem eles mesmos dela o tabaco, para o que enviaram carta com cheque de duzentos contos, que não obteve resposta, e insistiram com nova carta recheada até que apareceu o inspector e foi então autorizado o negócio, isto situado em 1949. A partir do casamento, o depoente foi para “baixo”, passou o negócio que tinha no norte, e com o sogro e os tios por afinidade constitui a S & C, ao que, no desenvolvimento do negócio – e estamos a falar de Algarve e turistas – e no desenvolvimento das relações familiares, acabaram a constituir grupos de empresas que depois se dividiram, sendo também que a T… a dado passo criou ela mesma uma empresa de distribuição que se postou a fazer-lhes concorrência no dito Algarve e dado o grau de desenvolvimento alcançado, o referido A… e quem o acompanhava, vieram para Lisboa fazer concorrência à distribuidora da T…, instalando-se na margem sul. Pelo meio disto, a diversidade de empresas constituídas e que AF… explicou, quer inicialmente à Mmª Juiz e ao i. mandatário das AA. e finalmente de novo à Mmª Juiz, gera aqui algum ruído, de tal modo que a segunda parte da pretensão tem de ser parcialmente restringida, salvo se “A actividade actualmente desenvolvida pela DL é a mesma que inicialmente foi desenvolvida por …” fosse reportada ao comércio por grosso do Tabaco, com fornecimento preponderante pela T.. (R. ou RR.). A restrição é de impor-se para o sentido de que, tirando a DL, nenhuma outra empresa do mesmo grupo desenvolve já a actividade que o sogro e tios iniciaram em 1949. Entende-se que uma resposta esclarecedora permite evitar este último sentido e permite conservar o primeiro, se se substituir “é a mesma” por “continua ou dá continuação”. Por outro lado, a manutenção das mesmas condições comerciais ao longo do tempo, desde 1949 ao presente, não tem claro este sentido literal, que seria impossível, e amplamente demonstrado nos autos não ter sucedido com nenhuma das AA., e o resto do sentido possível – vinculações com a T… – acaba a ser conclusivo dos instrumentos contratuais ou não pelos quais tais condições se estabeleceram.
Repare-se outrossim que, dada a lateralidade ou relativa irrelevância destes factos, nem sequer é de pensar que a constituição duma sociedade comercial, por sujeita a registo comercial, só pudesse provar-se por certidão, até porque, procurando-se saber se uma determinada sociedade já antes, obviamente pelos seus sócios ou alguns deles, desenvolvia uma mesma actividade comercial, é indiferente saber se esse desenvolvimento ocorria por sociedade regularmente constituída ou por empresários em nome individual de algum modo coligados – o que é patente em face da não exigência de que os clientes sejam pessoas colectivas nas (todas as) condições gerais e portanto, por óbvia maioria de razão ou mais concretamente partindo da notória complexidade actual para a simplicidade antiga, também antes das tabelas de condições tal não faria qualquer sentido que acontecesse.
Não vemos qualquer razão para entender que a história familiar que acima sintetizámos, e que AF… veio contar, não fosse muito razoavelmente provável. Por outro lado, confrontadas a Lista de Distribuidores de 1987 a fls. 7533 verso (e não, como indicado pelas apelantes, 7538) e a carta de fls. 4150/51, vemos na primeira a menção a “S e C” e na segunda a menção à candidatura da DL, com armazém no Seixal, aliás referida como união de duas empresas, entre elas E…, o que se conjuga portanto bem com o relato de AF, que aliás também mencionou precisamente esta referência à E…, que havia formado com outro sócio. Assim, elimina-se o facto não provado nº 9 e adita-se à matéria de facto que:
- APSS, APS e MPS iniciaram a actividade de compra para revenda de produtos da T… em 1949, e, em 1981, ASF constituiu com aqueles a S & C;
- A actividade actualmente desenvolvida pela DL dá continuação à que inicialmente foi desenvolvida por APSS, AP e MPS.
- Quanto ao facto não provado 10 - “A A. HPM assumiu a actividade inicialmente desenvolvida por HPM, com o conhecimento e autorização da T…”, relativamente ao qual as AA. pretendem que seja dado como provado que “Pelo menos, à data de 1986, HPM desenvolvia a actividade de compra para revenda de produtos da T…” e que “A partir da sua constituição, a actividade inicialmente desenvolvida por HPM passou a ser desenvolvida pela sociedade HPM, Lda. com o conhecimento e autorização da T…”.
Neste caso, não foi prestada qualquer declaração de parte, a testemunha JL referiu ter-lhe sido dado saber que a empresa evoluiu familiarmente, referindo-se concretamente a que pode ter sido uma empresa individual que evoluiu para sociedade. Dos inquéritos ao abrigo do EC Agreement de fls. 4212 a 4234 vemos apenas a data de início de 1988, a morada em Esmoriz, e é facto que na lista de distribuidores T… 1987, por distrito (neste caso, de Aveiro – fls. 7529 verso - e com referência também ao ano de 1986), encontramos HPM.
Donde, com razoável probabilidade, pelo nome, por morada, por anos imediatamente subsequentes, e pelo afirmado pela referida testemunha, tudo indica que se pode dar como provado quanto as apelantes pretendem. Na verdade, também o conhecimento da T… é óbvio e resulta dos documentos mencionados. Já a autorização estará relacionada com a cessão da posição contratual, tantas vezes mencionada em julgamento, e as cláusulas pertinente quer dos contratos de distribuição de 1985 quer das tabelas e condições gerais posteriores, mas aqui a questão é enquadrar este tipo de passagem sob o rigor duma cessão ou na forma mais simples duma simples alteração do próprio cliente. O facto é que, se em 1987 temos HPM e se consta dos inquéritos que a antiguidade da sociedade HPM é 1988, parece manifesto que esta substituiu aquele como cliente, e que portanto, não terá havido qualquer oposição a isso. Como, em qualquer caso, e compreensivelmente, até para que a T… se certificasse da capacidade financeira e das condições de armazenamento e seus locais, questões relativamente às quais poderia ter razões de oposição, teria de haver uma tomada de posição, podemos equiparar a não oposição a uma autorização. Nada impede pois que se dê como integralmente procedente a alteração pretendida. Assim, elimina-se o facto não provado nº 10 e adita-se aos factos provados que:
- Pelo menos, à data de 1986, HPM desenvolvia a actividade de compra para revenda de produtos da T…;
- A partir da sua constituição, a actividade inicialmente desenvolvida por HPM passou a ser desenvolvida pela sociedade HPM Ldª, com o conhecimento e autorização da T….
- Quanto ao facto não provado 11 - “A A. DTSM assumiu a atividade inicialmente desenvolvida por FPN, com o conhecimento e autorização da T…”, pretendem as apelantes que se dê como provado que:
- “FPN iniciou a atividade de compra para revenda de produtos da t… na década de 30”;
- “A atividade desenvolvida pela A. DTSM a partir de 2007 [cf. Facto Provado 72] corresponde à atividade inicialmente desenvolvida por FPN e, no momento imediatamente anterior, por MELNA, Lda.”
- “A passagem da MENA, Lda. para a DTSM ocorreu com o conhecimento e a autorização da T…”.
Nas declarações de JNA, mesmo a final, a Mmª Juiz pergunta como é que o declarante sabe que o negócio começou com o seu bisavô FPN, nos anos 30, ao que o declarante responde “conversas de família”. Poderíamos ter aqui portanto “velharias” imprecisas, mas a explicação revela-se verosímil: - se o declarante cresceu com o avô MN, no sentido de sempre esteve ao lado dele, se o avô ficou velho e entretanto o pai do declarante, genro daquele, foi saneado da Guérin e começou então, e com ele, declarante, de bicicleta, a injectar sangue novo, se o negócio passou do avô para a filha ME, e se esta finalmente se socorreu dos dois filhos e com eles formou uma sociedade, cujas quotas o declarante comprou e com sua mulher formou a DSM, já se revela bem que toda a família, do avô ao declarante, se dedicou ao negócio da distribuição de tabaco (ou do comércio por grosso de tabaco) e que portanto é claro que as conversas em família andariam à volta do negócio/emprego/trabalho, como é completamente normal que suceda em família. Por isso, nada espanta que se soubesse que o negócio havia começado com o bisavô na década de 30, que tendo o bisavô vários filhos e vários negócios, tivesse deixado ao avô M… o negócio do tabaco, e que deste até ao declarante tivesse ocorrido a sucessão que mencionou. Isto posto, toda a explicação dada pelo declarante se revela perfeitamente credível, anota-se aliás a minúcia da explicação de que na passagem a DSM foram cumpridas as comunicações e que não foi exigido pagamento antecipado como se se tratasse dum novo cliente, tanto mais quanto conjugadas essas explicações com os documentos referidos pelas apelantes. Assim, temos nos documentos de fls. 4541, 4544, 4548, 4551, relativos a inquéritos e visitas, menção expressa a que DSM é o mesmo cliente que MELA Ldª e nos documentos de fls. 7286 verso (carta dirigida pelo avô MN à T…, invocando motivos de saúde e pedindo para transmitir a sua posição para a filha E…, com continuação das mesmas condições), fls. 7287 (resposta da T… para a filha E… comunicando a aceitação dessa pedida transmissão a título provisório), fls. 7287 verso (resposta da T… ao avô M… comunicando que aceitaram a transmissão pedida, sem menção a título provisório e portanto depreendendo-se que se trata da aceitação definitiva da transmissão pedida) e fls. 7301 a 7306, contrato de distribuição, assim intitulado e em papel selado, celebrado em 1985 com MELNA, vigente por 10 anos, e finalmente com a menção do cliente ME na Lista de Clientes Distribuidores, Porto Província, de 1987 e com menção a 1986, constante de fls. 7538. Em suma, a conjugação destes elementos probatórios permite, por sustento mútuo entre eles, afirmar a pretensão das apelantes. Assim, elimina-se o facto não provado nº 11 e adita-se à matéria de facto provada que:
- FPN iniciou a atividade de compra para revenda de produtos da t… na década de 30;
- A actividade desenvolvida pela A. DTSM a partir de 2007 [cf. Facto Provado 72] corresponde à actividade inicialmente desenvolvida por FPN e, no momento imediatamente anterior, por MELNA, Lda.;
- A passagem da MENA, Lda. para a DTSM ocorreu com o conhecimento e a autorização da T….
Por outro lado, não estando impugnado o contrato de distribuição da referida ME…, estando provado que “104 - Em 1985, os acordos celebrados entre grossistas e a T… eram expressamente designados de contratos de distribuição” e considerando a pluralidade de utilizações que foram feitas, longamente durante a audiência - designadamente as perguntas sobre cláusulas de exclusividade, obrigação de compra para revenda, obrigação de fornecimento, obrigação de promoção – e as suas diversas implicações com questões quer de Direito da Concorrência, quer com a definição concreta da relação havida entre as partes, entende-se pertinente aditar oficiosamente ao facto provado nº 104 que o contrato de fls. 7301 a 7306 é exemplo do que se descreve no facto provado nº 104, e dar-se também como reproduzido o seu teor integral. Mais se afigura também pertinente que contratos intitulados de distribuição e com teores quase integralmente idênticos, também celebrados em 1985, sejam dados como exemplos e dados os seus teores como integralmente reproduzidos, como é o caso dos contratos constantes dos documentos a fls. 7367 a 7370, celebrado com JGMF Ldª e de fls. 8133 a 8142 celebrado com JMRL. Assim, altera-se oficiosamente a redacção do facto provado nº 104 para:
- “Em 1985, os acordos celebrados entre grossistas e a T… eram expressamente designados de contratos de distribuição, de que é exemplo o contrato constante a fls. 7301 a 7306 dos autos, celebrado com MELNA, cujo teor integral aqui se dá por reproduzido, e de que são também exemplos os contratos constantes a fls. 7367 a 7370, celebrado com JGMF Ldª e a fls. 8133 a 8142, celebrado com JMRL, cujos teores integrais se dão também por reproduzidos”.
- Quanto ao facto não provado nº 12 – “A A. CT assumiu a atividade inicialmente desenvolvida por JST, com o conhecimento e autorização da T…”, vem invocado pelas apelantes que deveria o tribunal ter respondido provado que “JST iniciou a sua atividade de compra para revenda de produtos da T… em 1931” e que “A atividade desenvolvida pela A. CT a partir de 1989 (cf. Facto Provado 76) corresponde à atividade inicialmente desenvolvida por JST desde 1931 (pai e filho) e posteriormente por LTCC, sendo que a atividade de compra para revenda de produtos da T… foi sempre desenvolvida de modo contínuo, com a manutenção dos clientes e instalações originais”, a partir das declarações de PT e dos documentos de fls. 7312 (32º volume) (carta de 17.11.1931 de JST para a C… Ldª, propondo a sua nomeação como depositário dos produtos da representada T…) 7683 a 7691 (contrato de distribuição celebrado em 1985 com LCT e que mostra assinado no canto superior direito das suas folhas com o nome LCC) e Lista de Distribuidores de 1987 com referência a 1986 também, de fls. 7538, onde surge o nome LTCC.
Ora, se conjugarmos também com o documento de fls. 7313, carta de LTCC datada de 28.12.1988, em que é pedida a transferência do negócio em seu nome para a sociedade CT Ldª, de que faz parte com o seu filho R…, temos praticamente estabelecida a sucessão, que se completa com as declarações de PT, casada com este filho R…, e que afirma que o negócio começou a partir da carta de 1931, subscrita pelo avô do marido, que passou para o pai do marido que por sinal tinha o mesmo nome do avô, que do sogro passou para a sogra – tudo sendo um negócio familiar e sendo o meio de subsistência da família – e que da sogra passou para CT Ldª já com o marido, e que finalmente a quota da sogra passou para si.
Renovando o que já dissemos sobre a muito provável razoabilidade destas declarações, e conjugando-se todos os elementos probatórios aqui referidos, entende-se proceder a pretensão. Assim, elimina-se o facto não provado nº 12 e adita-se à matéria de facto provada que:
- JST iniciou a sua actividade de compra para revenda de produtos da T… em 1931;
- A actividade desenvolvida pela A. CT a partir de 1989 (cf. Facto Provado 76) corresponde à actividade inicialmente desenvolvida por JST desde 1931 (pai e subsequentemente por seu filho JST) e posteriormente por LTCC, sendo que a actividade de compra para revenda de produtos da T… foi sempre desenvolvida de modo contínuo, com a manutenção dos clientes e instalações originais.
Quanto ao facto não provado 13 – “ A A. MMC assumiu a atividade inicialmente desenvolvida pelo sócio MAPM, com o conhecimento e autorização da T…” sustentam as apelantes que deve ser dado como provado que “MAPM iniciou a sua atividade de compra para revenda de produtos da T… antes de 1987” e que “A atividade desenvolvida pela A. MMC, Lda. corresponde à actividade inicialmente desenvolvida por MAPM, passagem que foi autorizada pela T…”, o que fazem com base nos documentos de fls. 7360 e 7361 – cartas de MAPM, datada de 23.1.1991, comunicando à T… (Porto), em “suplemento”, relativa à localização e consumo de máquinas adquiridas (7360), carta da T… de 23.10.1991 sob o assunto “Fornecimentos” para “complemento do seu processo” (7360 verso) e resposta a esta carta por MM, enviando os documentos solicitados, (7361) e ainda no depoimento da testemunha MM prestado em audiência na sessão de 20.3.2017.
Ora, percorrendo o depoimento da testemunha, desde logo as suas respostas às perguntas iniciais feitas pelo tribunal e mais explicadas ao i. mandatário das AA, e que não mereceram, nesta parte, a cerrada contra-instância que recaiu sobre a demais matéria, o que vemos é porém que a actividade que MM desenvolvia a nível individual se iniciou em 82 ou 83, seis meses antes da grande greve (Fortuna)[11], mas como sub-agente, isto é, comprando a A e C Ldª, e só passou a ser cliente individual da T… em 90 ou 91 (possivelmente 91 pela conjugação com os documentos mencionados supra), e esta actividade individual vai dar origem, em 95, 97 ou 98, à MM Ldª, afirmando a testemunha que teve de dar conhecimento à T…, apresentado tudo o que exigiram, mas continuando tudo na mesma, mesmos clientes, tudo estável, sem problemas.
Portanto, quando se pretende dar como provado que MM iniciou a actividade de compra para revenda de produtos da T…, em 1987 ou antes, isso será verdade enquanto actividade, mas não enquanto compra directa à T…, e por isso, na lógica do interesse destes factos – caracterização de uma relação duradoura com a T… – não se afigura de qualquer utilidade o facto, salvo para demonstração de que os clientes grossistas sempre tiveram de adquirir determinadas quantidades mínimas, o que, não o conseguindo alcançar, antes ou depois, os remetia à condição de sub-agentes, o que todavia não é necessário explicitar em face do facto provado relativo à compra necessária de quantidades mínimas (factos provados nº 92 e nº 93).
Deste modo, considerando o conhecimento directo com que a testemunha depôs e que nada, neste aspecto, abala a sua credibilidade, restringe-se o deferimento da pretensão na parte relativa à data de início de actividade individual para 1991, procedendo no mais. Assim, elimina-se o facto provado nº 13 e adita-se aos factos provados que:
- MAPM iniciou a sua actividade de compra para revenda de produtos da T… em 1991;
- A actividade desenvolvida pela A. MM & C Ld.ª corresponde à actividade inicialmente desenvolvida por MAPM, passagem que foi autorizada pela T….
- Quanto ao facto não provado 14 – “A A. …D assumiu a atividade inicialmente desenvolvida por JAO, DRA, Lda, RT, Lda, D, Lda, ENF, Lda e FA, com o conhecimento e autorização da T…” sustentam as apelantes que deve dar-se como provado que “JAO, DRA, Lda., RT Lda., D, Lda., ENF, Lda. e FA iniciaram a sua atividade em data anterior a 1986”, que “A …D resulta da integração da RT, Lda., da JV, Lda., da DRA, Lda., da DT –, Lda., da D, Lda., da FA, Lda. e da ENF, Lda” e que “A atividade desenvolvida pela…D a partir da sua constituição corresponde à actividade desenvolvida até então pelas sociedades que a compõem com o conhecimento e autorização da T..”, para o que invocam as declarações de JO e diversa documentação.
Ora, está portanto em causa a data de início de actividade e o tipo de actividade das empresas mencionadas e que a Autora …D tenha resultado da integração dessas empresas, continuando a actividade delas (a sua actividade corresponde à que elas desenvolviam).
Como resulta da Certidão Permanente a fls. 3663 a 3668, vol. 18, e da escritura pública do contrato de sociedade a fls. 5116 a 5124 (23º vol.) a A. …D foi constituída em 2002 pelas outorgantes representadas RT, Ldª, JV, Ldª, DRA, Ldª, DT, Ldª., D –, Ldª, FA, Ldª e ENF, Ldª, apresentando-se à candidatura a cliente grossista conforme carta a fls 5102, ali mencionando, além do mais, como locais de entrega, os armazéns dos anteriores clientes JVO Ldª, RT Ldª e DRA, Ldª. Consultada a lista dedistribuidores relativa ao ano de 1987, com menção a 1986, a fls. 7535, frente e verso e 7536, porventura pela má impressão mas cremos diversamente, não encontramos as empresas RT Ldª, D, Ldª e DT, Ldª.
Nas suas declarações, JO explicou a razão de ser da decisão de constituição da ..D, reportando-a à perspectivação de uma situação difícil com a introdução dos escalões, e referiu-se à antiguidade das empresas outorgantes na actividade da distribuição ou comércio por grosso de tabaco, sendo algumas mais recentes, como o caso da DT, que situou nos anos 90 (e por isso, certamente, a não encontramos na lista de distribuidores de 1987). Se FA era a mais antiga, remontando aos finais do século XIX, já a do avô e pai do declarante era de 1935, a DRA dos anos 50 ou 60 e as restantes mais recentes, admitindo que ENF também fosse antiga.
Na contra-instância foi o declarante submetido a um intenso questionamento em que se pôs em causa a sua razão de ciência para afirmar práticas ancestrais de empresas que não a do seu avô, segundo o princípio, podemos depreender, de que só os netos podem falar sobre os avôs mas já não sobre os avôs de outros netos, cabalmente revertido pela explicação de que as empresas que se juntaram na …D eram antes concorrentes e como tal, antes de se juntarem, fizeram um estudo elaborado (precisa e compreensivelmente para perceberem os termos em que iriam participar que não haveriam de ser igualitários) mas sem que no fundo esteja em causa que as empresas mencionadas se dedicavam à distribuição de tabaco e que existiam antes de se juntarem, digamos assim, na 3D. De resto, a pretensão do i. mandatário das RR. de fazer ele mesmo a prova de que o inquérito EC Agreement à …D é o único histórico disponível na T… e que nada constando neste sobre as sociedades anteriores, nada poderia o declarante credivelmente estabelecer sobre elas, é obviamente indevida, por um excesso de entusiasmo, e como já antes escrevemos, sem sentido algum de plausibilidade.
Considerando que as declarações de JO se mostram confirmadas pela lista de distribuidores e pela candidatura da …D com menção de entrega nos armazéns, entre outros, da RT, nada obsta à procedência da primeira alteração pedida, nos termos pedidos (que excluem a DT), ressalvada a D, que também não encontramos na lista de distribuidores, salvo erro nosso. Quanto ao mais pedido, também nada obsta, desde logo por via da escritura pública que nos diz quem foram as empresas outorgantes, e quanto à continuação da actividade relevando-se a informação prestada por JO precisamente quanto à razão da criação da …D (o que exclui portanto que qualquer das empresas em causa se dedicasse a outra actividade). Assim, elimina-se o facto não provado nº 14 e adita-se aos factos provados que:
- JAO, DRA, Lda., RT, Lda., D, Lda., ENF, Lda, e FA iniciaram a sua actividade em data anterior a 1986;
- A …D resulta da integração da RT, Lda., da JV, Lda., da DRA, Lda., da DT, Lda., da D, da FA, Lda. e da ENF, Lda;
- A actividade desenvolvida pela …D a partir da sua constituição corresponde à actividade desenvolvida até então pelas sociedades que a compõem com o conhecimento e autorização da T….
- Quanto aos factos não provados 15 a 19 [15 - No início da relação com a T…, AR tinha que comprar 50 caixas por semana para cumprir as quantidades mínimas estabelecidas e, quando as quantidades mínimas passaram a ser fixadas por distrito, tinha de comprar 60 caixas para cumprir as quantidades mínimas estabelecidas para o distrito de Braga; 16 - Em 2001, as quantidades mínimas aplicáveis à A. ASF eram de 20 caixas por semana; 17 - No início da relação com a T…, as quantidades mínimas que eram aplicáveis a JA eram de cerca de 50 caixas por semana; 18 - Em 1992, as quantidades mínimas que eram aplicáveis a DSGS eram de 17 caixas por semana, 19 - Os demais AA. que iniciaram, diretamente ou através de quem os antecedeu, a atividade de grossista da T… nos anos 40 celebraram com a T… acordos contendo quantidades mínimas de compra de caixas de tabaco], sustentam as apelantes que deverá ser dado como provado que:
- “todos os AA., para serem aceites como Agentes/Distribuidores/Grossistas da T…, estavam obrigados a adquirir quantidades mínimas, definidas periodicamente (em regra, anualmente) pela T… e que variavam consoante o Distrito em que estes exerciam a sua atividade.”, invocando para tanto os seguintes meios de prova: - Tabela de Setembro de 1986, Anexo com quantidades por Distrito, fls. 7132-7135; Tabela de Janeiro de 1988, Anexo com quantidades por Distrito, fls. 7148-7150; Circular e tabela de 24.02.1988, Anexo com quantidades por Distrito, fls. 7155-7160; Carta de 14.01.1993, envia Tabela com anexo, quantidades por Distrito e Concelho, fls. 7176-7186; CGF de 2001 a fls. 200 a 225;
- Quando as quantidades mínimas semanais passaram a ser fixadas por distrito, AR tinha de comprar o número de caixas definido pela T… para cumprir as quantidades mínimas estabelecidas para o distrito de Braga que, em outubro de 1986, eram de 0,567 milhões de cigarros por semana” – invocando fls. 7132-7135;
- Em 2001, as quantidades mínimas aplicáveis à A. ASF eram de 0,16 milhões de cigarros por semanas, quantidade aplicável ao Porto II” – invocando as CG de 2001, a fls. 200 a 225.
- “Em 1992, as quantidades mínimas que eram aplicáveis a DSGS eram as definidas para o Distrito Porto II, ou seja, de 0,200 milhões de cigarros por semana” – invocando a Carta 1/93-DV, de 14.01.1993, a Tabela com anexo, quantidades por Distrito e Concelho, fls. 7176-7186.
O tribunal recorrido entendeu que “ Os pontos 15, 16, 17, 18 e 19 da matéria de facto não provada encontram a sua explicação na ausência de prova de que os grossistas assumiram perante a T… a obrigação de comprar as quantidades mínimas fixadas por esta, sendo de referir que a testemunha PJAGSO, ex-funcionário da T… e atual funcionário da A. … D, declarou que os grossistas não eram obrigados a comprar, que não havia cláusula que estipulasse que, se o grossista não comprasse, tinha de indemnizar a T…”.
Está dado como provado que “92 - Conforme acordado anteriormente às CGF, os AA. tinham de demonstrar trimestralmente à T… o cumprimento do requisito das quantidades mínimas” e que “93 - Caso algum dos AA. não cumprisse o requisito das quantidades mínimas, a T… cortava-lhe o fornecimento de tabaco”, o que foi dado como provado por as RR. terem declarado expressamente na audiência de julgamento aceitarem esses factos.
Portanto, o que podemos concluir é que, para o tribunal recorrido, ele não se convence – pelas razões que explica – que a partir das Condições Gerais de Fornecimento houvesse obrigação de comprar, para sermos rigorosos, nem de quantidades mínimas e portanto nem de zero, ou seja, não havia obrigação de comprar, sendo que aceita – o que resulta implicitamente da aceitação por parte das Rés da obrigação de demonstração de cumprimento e da consequência estabelecida para essa não demonstração e portanto também para esse não cumprimento – que isso acontecesse anteriormente, do tempo dos contratos ao tempo da tabela. E mais, aparentemente e com o devido respeito, a questão até se resolve por via do entendimento jurídico fornecido ao tribunal por uma testemunha, de que não havendo previsão de indemnização, não há obrigação.
Portanto, a prova de que todos os grossistas, para serem aceites como clientes, estavam obrigados a adquirir quantidades mínimas, pretendida pelas apelantes e vistos os documentos que invocam, em parte está consagrada já, ainda que pela previsão da consequência, e a versão proposta permitirá apenas cobrir também o período que se inicia a partir da Condições Gerais de Fornecimento.
Note-se ainda que o tribunal não rejeita nem invoca a ausência de prova das quantidades mínimas aplicáveis a determinadas AA. nem que as mesmas fossem diferenciadas por distrito – coisa que, tal como os escalões, as Rés nunca puseram em causa.
Já o dissemos antes, mas vamos repetir: - na decisão da matéria de facto não usamos um crivo jurídico prévio, a realidade factual que temos que decidir não é a realidade jurídica que temos de decidir. Não se dá como não provado um facto que aconteceu mesmo, porque ele não tem a relevância jurídica pretendida.
Quer partamos da lógica estrutural do negócio que leva o produto fabricado ao seu consumidor, quer baixemos à análise dos componentes estruturais no exercício da definição de grossista, quer nos situemos apenas nos textos aplicáveis, quer contratados, quer aceites, expressa ou tacitamente, não tem qualquer sentido não dar como provado que a partir das Condições Gerais os grossistas estavam liberados da aquisição de quantidades mínimas, podendo então passar a comportar-se como retalhistas, ou comprarem para consumo pessoal, ou a não comprarem de todo: nas Condições Gerais, todas, a T… (1 ou 2) só vende por grosso, o que significa que quem compra, compra por grosso, e mais concretamente a T… (1 ou 2) só vende, em princípio, nas quantidades mínimas que segundo o seu melhor estudo de mercado e de acordo com a sua estratégia e política comercial, são as que permitem levar o número de cigarros necessários ao número de consumidores existentes. Não temos de nos situar fora ou para lá das Condições Gerais: - são as próprias Rés a defender que os grossistas têm de cumprir requisitos para serem fornecidos, e portanto para se manterem nesse cumprimento, têm de adoptar os comportamentos integrantes previstos. Por isso, é mais que evidente – lógica jurídica à parte – que os grossistas para serem aceites estavam obrigados a quantidades mínimas, pois que, se as não cumprissem, por aplicação de texto (mais pronta ou mais concedente de oportunidades de “arrependimento activo”, digamos), deixariam de ser aceites como clientes, sem embargo de poderem voltar a ser aceites, na condição de voltarem a cumprir.
Esta disciplina em nada de essencial mudou do período anterior às Condições Gerais que o tribunal reconheceu, para o período posterior. Basta ler, para exemplo, o que se definia nas Condições para 2006 e nas Condições para 2009: - facto provado 11 “(…) 1.1.4. O Cliente Grossista adquirirá os Produtos de acordo com a média semestral de quantidades mínimas previstas no Anexo II, que estão estipuladas por Distrito. Cada Cliente Grossista deverá adquirir semestralmente em cada um dos locais por si indicados para entrega dos Produtos, em média, a quantidade mínima de Produtos estipulada para o Distrito onde estiver situado cada um dos seus locais de entrega.
Para este efeito, as aquisições de cada Cliente Grossista em cada local de entrega serão consideradas de forma individual e independente, devendo o Cliente Grossista cumprir em cada local de entrega situado em cada um dos Distritos as quantidades mínimas semestrais previstas no Anexo II, mesmo nos casos em que o Cliente Grossista disponha de mais do que um local de entrega num determinado Distrito.
1.1.5. No final de cada semestre de cada ano civil, a T… fará uma análise das aquisições médias semestrais efectuadas por cada Cliente Grossista em cada um dos seus respectivos locais de entrega, durante o semestre em causa, com vista a apurar o cumprimento ou incumprimento do disposto no ponto 1.1.4. deste Capítulo III no que respeita à média semestral de quantidades mínimas de aquisição de Produtos. (…)”,
e facto provado 13 – “(…) 3.2. O Cliente deverá adquirir por encomenda uma quantidade mínima de 10 (dez) Caixas completas de Produtos.
3.3. Por razões de eficiência cada Cliente deverá, no mínimo, encomendar 2 (duas) vezes por mês, por cada Local de entrega ou Local de levantamento.
Caso tal não aconteça em dois meses do mesmo trimestre civil, a T… poderá legitimamente recusar o fornecimento de quaisquer Produtos no Local de entrega ou Local de levantamento em causa, notificando o Cliente por escrito de tal decisão no prazo de 30 (trinta) dias após o final do trimestre civil em causa. (…)”.
Percorridos os elementos documentais referidos pelas apelantes relativamente a cada Autora mais concretamente identificada na pretensão formulada, ali se comprovam os mínimos referidos. Deste modo, eliminam-se os factos não provados nº 15 a nº 19 e adita-se aos factos provados que:
- Todos os AA., para serem aceites como Agentes/Distribuidores/Grossistas da T…, estavam obrigados a adquirir quantidades mínimas, definidas periodicamente (em regra, anualmente) pela T… e que variavam consoante o Distrito em que estes exerciam a sua actividade;
- Quando as quantidades mínimas semanais passaram a ser fixadas por distrito, AR tinha de comprar o número de caixas definido pela T… para cumprir as quantidades mínimas estabelecidas para o distrito de Braga que, em Outubro de 1986, eram de 0,567 milhões de cigarros por semana;
- Em 2001, as quantidades mínimas aplicáveis à A. ASF eram de 0,16 milhões de cigarros por semanas, quantidade aplicável ao Porto II;
- Em 1992, as quantidades mínimas que eram aplicáveis a DSGS eram as definidas para o Distrito Porto II, ou seja, de 0,200 milhões de cigarros por semana.
Quanto ao facto não provado 20 – “Conforme acordado anteriormente às CGF e relativamente a todos os AA. que já eram grossistas da T… nos anos 50 e 60, existia uma licença para que os mesmos pudessem vender tabaco que era paga pela T… em nome dos grossistas”, pretendem as apelantes que se dê como provado que “Conforme acordado anteriormente às CGF e relativamente a todos os AA. que já eram grossistas da T… nos anos 50 e 60 ou aos seus antecessores, existia uma licença para que os mesmos pudessem vender tabaco que era paga pela T… em nome dos grossistas”, sustentando esta versão nas declarações deAF e de JA, e no contrato de fls. 8128 a 8131, relativo a DS em cuja cláusula 19ª se estipulava concretamente que a T… se comprometia a contribuir para o pagamento de uma licença para venda por grosso, em determinadas percentagens consoante o volume de vendas.
O tribunal entendeu que nenhuma das AA era grossista nos anos 50 e 60 do século passado, assim passando à resposta negativa.
Na versão que apresentam agora, introduzem as apelantes, na perspectiva de caracterização de uma relação duradoura, as antecessoras das AA., várias de facto já existentes e em relação com a T…, como se viu.
É certo que AF falou na referida licença, sem adiantar grandes pormenores de conhecimento pessoal, mas curiosamente referindo a licença de isqueiro (de porte de isqueiro, adiantamos, cujo fundamento nos anos 40, de apogeu do Estado Novo, está ligado à potencialidade subversiva de produção de incêndios) e JLA parecendo que falava do mesmo, acabou a dizer coisa diversa, pois se referiu a ir de bicicleta buscar as licenças aos clientes, ou seja, aos retalhistas.
É porém verdade que tal licença de venda por grosso existiu, como resulta do contrato de DS, de 1944, pelo que, admitindo a relevância indiciária para a caracterização da relação da T… com as antecessoras de algumas das AA. – relação aliás muito bem caracterizada nos referidos contratos, incluindo os de 1985 – entende-se nada se opor à eliminação do facto não provado nº 20 e ao aditamento pretendido, reportado porém apenas às antecessoras das AA., à década de 40 do século transacto e à proporcionalidade referida na mencionada cláusula 19ª do referido contrato com DS. Assim, elimina-se o facto não provado nº 20 e adita-se aos factos provados que:
- Conforme acordado anteriormente às CGF e relativamente aos antecessores das AA. que já eram grossistas da T… nos anos 40 do século XX, existia uma licença para que os mesmos pudessem vender tabaco que era paga, em proporções variáveis, pela T….
Quanto ao facto não provado 21 – “A percentagem referida no ponto 94 da matéria de facto provada (O preço pelo qual a T… vendia os produtos de tabaco aos grossistas foi determinado até julho de 2009 com base num desconto que era uma percentagem do Preço de Venda ao Público dos produtos) era acordada com os AA”, pretendem as apelantes que seja dado como provado na seguinte versão: “A percentagem referida no Ponto 94 da matéria de facto provada era unilateralmente decidida pela T… e, a partir da introdução das CG comunicada através destas sendo que, até às CG de 2006 que introduziram o fator de correção, a aceitação das CG realizava-se como descrito no Ponto 19 dos Factos Provados”.
O tribunal sustenta que não foi feita qualquer prova sobre o ponto 21 e as apelantes invocam em abono da versão que agora pretendem, a “Circular de 23.06.1978”, a fls. 7102-7103 e os “Contratos de Distribuição” de fls. 7367 a 7370 e de fls 8133 a 8142.
No primeiro caso, trata-se da comunicação, em 1978, de novos preços, com menção final de agradecimento às associações de distribuidores que negociaram nessa fixação, pelo que se poderia dizer que o documento mais serviria à prova do facto não provado 21 na sua versão primitiva do que na proposta. Aliás, é precisamente porque foi mais constante a tese de que não havia negociações senão formais, antes comunicações de decisões tomadas, que o documento seria relativamente pouco apto a provar a versão primitiva. Dos contratos de distribuição mencionados, salvo o devido respeito, também não se vê que sirvam para a prova da versão pretendida, dirigindo-se antes à prova da versão primitiva, sendo porém que ainda assim teríamos a dificuldade de neles se remeter, mais ou menos expressamente, para condições (de desconto) anexas (e que não acompanham os referidos documentos).
A pretensão agora formulada dá corpo, com o devido respeito, a uma visão mais próxima da realidade, desde logo da realidade económica da dimensão dos intervenientes e do peso da sua contribuição, propriedade e trabalho, para o negócio, do mesmo passo que evita a complicação metodológica da prévia (aos factos) definição da natureza contratual da relação. Simplesmente, se está provado no facto 19 que a aceitação das condições gerais se fazia como ali descrito, e se nos anexos às condições gerais, e antes delas nas tabelas de condições e antes delas nas comunicações relativas a preços e descontos acobertadas pelas cláusulas de pagamento e obrigação de pagamento constantes dos contratos de distribuição, se transmitia a decisão da T… relativamente aos preços e descontos a praticar, então em bom rigor não precisamos de dar este facto, na versão agora pretendida, que só serve como resultado escrito, completo, dum juízo a realizar em sede de discussão jurídica da decisão. É verdade que deixar nos factos não provados a menção a que a percentagem não era acordada, pode sempre levantar dúvidas sobre uma contradição entre a conclusão a chegar em sede de discussão e o facto não provado, mas tais dúvidas são infundadas, porque para todos os efeitos, dar um e esse facto como não provado não significa que não se possa afirmar, em termos de conclusão jurídica, que se formou acordo entre a comunicação da fixação de percentagem e a aceitação dessa comunicação ou mais exactamente da globalidade comunicativa em que se insere.
Assim sendo, por irrelevante, não se altera nem o facto não provado 21 nem se adita a versão alternativa pretendida pelas apelantes.
- Quanto aos factos não provados 22 – “Nos fóruns, a T… dava aos AA. instruções sobre a organização interna e a gestão dos estabelecimentos destes, recomendando aos AA. que se informatizassem, redefinissem rotas, reduzissem custos, rentabilizassem o negócio, se expandissem para outras áreas geográficas e aumentassem a rotatividade dos produtos da T…” – e 27 – “A T… dava aos AA. recomendações sobre os métodos de revenda dos seus produtos ao retalho”, pretendem as apelantes que os mesmos sejam dados como provados, ou, no mínimo, que seja dada como provada a seguinte versão: - “Nos fóruns, a T… organizava ações de formação sobre a organização interna e a gestão dos estabelecimentos destes, recomendando aos AA. que se informatizassem, redefinissem rotas, reduzissem custos, rentabilizassem o negócio, se expandissem para outras áreas geográficas e aumentassem a rotatividade dos produtos da T…”.
Invocam em seu apoio a correspondência de fls. 7169 a 7239v, os depoimentos dos legais representantes das RR. NJ e PS e os das testemunhas PO, AB, SQ, LS (antigo responsável das RR. pelos Key Accounts), HB, JL, LR, e as declarações de parte de AF, AR e CF, ao passo que o tribunal considerou que não ficou convencido “que a T… tivesse a ingerência na atividade dos grossistas que expressões como “dava instruções”, “dava recomendações” e “exigia” têm implícito”.
O tema foi um dos pontos quentes que atravessou praticamente todo o julgamento. Da banda mais especializada das RR veio a versão “partilha das melhores práticas do negócio”, da banda mais generalista das AA a versão mínima pretendida.
A motivação do tribunal liga-se a uma factualidade com pertinência para a apreciação das relações, desde logo no patamar da organização de uma rede de distribuição, e mais fundo ainda numa perspectiva possível de remontar a cadeia que é ver os grossistas a funcionarem em parte como trabalhadores da T… encarregados de parte das tarefas de transporte dos produtos, concretamente desde os seus armazéns até ao ponto de venda ao consumo. É bem certo uma perspectiva hipotética sem conexão real – nem objectiva por natureza, o que se demonstra historicamente, por exemplo, nos autos, pelo contrato de DS, nem subjectivamente interiorizada por nenhum dos participantes – mas com boas oportunidades de revisitação na restruturação produtiva global dos anos 90 do século passado, em que as empresas autonomizam as tarefas ditas não essenciais pelo chamado outsourcing na versão em que as empresas saídas da fonte são constituídas pelos anteriores trabalhadores subordinados da empresa mãe. No fundo, é a esta visão de que os grossistas seriam trabalhadores com a categoria de fiéis de armazém, transportadores e até cobradores, e em que os retalhistas poderiam surgir como empregados de balcão ou vendedores, da grande empresa mãe produtora de cigarros, que se revela como origem intuitiva da instância e contra-instância que associa a obrigatoriedade às palavras “instrução” e “recomendação”. Por momentos de abstracção, poderíamos julgar ter estado num julgamento na jurisdição laboral, discutindo a vexata quaestio da distinção entre o contrato de trabalho e o contrato de prestação de serviços. Mas com desacerto, porque nessa sede, “instrução” e “recomendação” estão precisamente associadas à liberdade de não seguimento, à não obrigatoriedade, à inexistência de poder de subordinação, portanto, contra as “ordens”. O crivo essencial é portanto saber se o que era passado nos fóruns ou outras acções, era para ser seguido obrigatoriamente ou não. Este é que é o ponto, as palavras usadas em si não têm nenhum “implícito”. Aliás, se voltássemos à jurisdição do trabalho, o “implícito” seria precisamente o da liberdade contratual que caracteriza a prestação de serviços, bem podendo aliás também pensar-se nos grossistas como prestadores de serviço para a produtora, prestadores de parte do serviço que é preciso fazer para levar os cigarros da fábrica ao consumidor. Ora, apesar da decisão final produzida, queremos acreditar que não esteve na mente do tribunal recorrido uma liberdade ainda mais ampla, como se os grossistas fossem afinal livres de fumarem eles mesmos os milhões de cigarros que compram à T....
O erro revela-se assim em não dar como provado um facto que é concretização da factualidade provada da organização de fóruns e da promoção de cursos (factos provados 96 a 99) por se atribuir um sentido implícito que não resulta de lado algum, nem da lei nem da psicologia geral e comercial, no máximo duma associação para-jurídica incorrecta formulada intermediariamente pelas testemunhas que se empenharam em afirmar a não obrigatoriedade através da palavra concreta a utilizar. Se a ideia era não veicular sentidos implícitos, haveria então no mínimo que encontrar uma resposta que o não fizesse e não simplesmente dar o facto como não provado.
Dir-se-á que já chega o que consta dos factos provados – se promoveu cursos sobre técnicas de venda, já se percebe que no curso foram, no mínimo, ministrados ensinamentos, e se promoveu assim o fez porque tinha nisso interesse – mas não é indiferente – em vista das possíveis soluções de direito – saber com maior precisão sobre o que é que concretamente foi ensinado.
Sem embargo de intervenções específicas de funcionários da T…, visto um certo maior acordo nas provas produzidas sobre a intervenção da T… se centrar mais à organização, com recurso a especialistas externos, é mais curial substituir “a T… dava” por “a T… organizava” com as apelantes bem intuem na formulação alternativa que propõem.
Esse mesmo acordo se revela, de um modo geral (tirando as queixas de não uniformidade de conhecimentos por parte dos formandos e alguma falta de interesse no ensino, a ressalvar portanto momentos de convívio em boa hospedagem), quanto aos efectivos interesses em jogo: a T… tinha interesse (além duma redução de custos de transporte) em que os grossistas se modernizassem e crescessem porque assim seriam mais eficientes no seu objectivo final – disponibilidade de cigarros seus para os fumadores – e os grossistas tinham interesse em modernizar-se para venderem mais e melhor, em menos tempo, e portanto ganharem mais. Isto aliás é claro quando ouvimos HB dizer que gostavam muito de ir aos cursos, quando ouvimos um “grossista de aldeia” declarar-se longe deste tipo de eventos e quando ouvimos a imputação duma estrutura demasiadamente modesta – familiar – aos grossistas e o gosto em isto alterar. E também percebemos que, no caso de várias AA., se o negócio começou no armazém contíguo à casa do patrão-trabalhador, na carrinha de dois lugares, também progrediu para movimentações de milhões de euros anuais com uma estrutura e logística muito mais profissionalizada.
Se o negócio dos grossistas cresce, se as quotas de mercado da T… são as que eram até 2003, é evidente o interesse da T… na organização destes fóruns e em que os grossistas deles aprendessem e pusessem em prática a aprendizagem, isso é claramente confirmado por PS e NJ. Aliás, em B… encontramos outra vertente deste interesse na aprendizagem, pela referência à percentagem de produtos da T… no negócio do grossista – claro que quem vende uma percentagem de 80% de produtos T… quer aproveitar as oportunidades que esta dá para perceber como ganhar ainda mais com produtos T…. O caso que HB relata é aliás paradigmático: - ensinaram-na, e ela muito gostou de aprender, que vender tabaco mais caro dá mais rentabilidade (esta nota aliás foi uma recorrência também usada a propósito do factor de correcção, para demonstrar que como o tabaco da T… é mais caro, o valor recebido, apesar do factor de correcção, não determinou prejuízo para os grossistas) e depois quiseram que ela vendesse um tabaco mais barato para combater directamente a concorrência, contrariando o que ela tinha aprendido (mas afinal, confessou, com grande sucesso). Se pensarmos especificamente num curso sobre gestão e rentabilidade de máquinas de vending, temos a benesse tecnológica a ser aproveitada quer em benefício dos grossistas proprietários de máquinas, quer da T… em vista dum maior e mais fácil acesso do consumidor final ao produto e ainda, é uma hipótese, na apreensão duma maior facilidade de gestão de PVP (não necessidade de tanto aumento) por redução da margem a conceder a um dos intervenientes na cadeia (aglutinação grossista-retalhista).
Portanto podemos pensar sem rebuço que se temos de estar no negócio com profissionalismo, devemos mesmo – quem mais sabe, porque o adquire até em outros mercados – empenhadamente aconselhar, recomendar, instruir, ensinar, esclarecer, com o propósito que alunos receptivos e interessados ponham em prática o que de melhor lhes damos. Portanto, deixemos os sentidos implícitos que demonstrámos que as palavras não têm de ter, para afirmar positivamente o que em rigor é uma realidade reconhecida por ambas as partes.
Neste sentido, a procedência da pretensão não contradiz, porque não exclui, que também houvesse eventos de esclarecimento de aspectos da evolução legal e outras matérias, constante do facto provado 234, procedente da alegação das Rés, e não impugnado pelas AA. Eliminam-se pois os factos não provados 22 e 27, e adita-se à matéria de facto que:
- Nos fóruns, a T… organizava acções de formação sobre a organização interna e a gestão dos estabelecimentos destes, recomendando aos AA. que se informatizassem, redefinissem rotas, reduzissem custos, rentabilizassem o negócio, se expandissem para outras áreas geográficas e aumentassem a rotatividade dos produtos da T….
- Quanto ao facto não provado 23 – “A T… dava instruções aos AA. no sentido de estes manterem sempre em stock a quantidade de produtos da T… suficiente para fazer face às vendas de pelo menos uma semana” pretendem as apelantes que o mesmo seja dado como provado, em atenção aos depoimentos dos legais representantes das RR., na mesma lógica da prova referida quanto aos factos não provados 22 e 27, e ainda com base nos depoimentos de AB e LS, bem como com referência às CG de 2008, a fls. 312 a 340 (Factos Provados 8 a 13); e à correspondência de fls. 7250-7250v, fls. 7343 v, e fls. 7346.
Mais pretendem que seja dado como “provado ou, pelo menos, considerado, com base na mesma prova, que: “a T… dava instruções aos AA. e tinha programas de incentivos específicos para que inexistissem ruturas de stock de produtos da T… no retalho e fez constar das CG, até 2008 inclusive, como obrigação do distribuidor/grossista, abastecer contínua e regularmente os clientes retalhistas e zelar pela inexistência de ruturas de stock”.
O tribunal recorrido valeu-se ainda do mesmo não convencimento de ingerência da T… nos negócios dos grossistas.
Tanto bastaria para renovar quanto já disse anteriormente, mas aqui vamos – além das eventuais repetições que possam resultar de se poder obter a mesma informação a partir dos textos das condições gerais, e anteriormente a elas dos contratos de distribuição que expressamente mencionavam a inexistência de rupturas de stock e além das menções de grossistas autores com maior dimensão e rotatividade de produtos, em que a questão não se punha – directamente ao “core business”.
A verdade profunda do negócio do tabaco assenta na dependência do consumidor. A ideia de que o tabaco é um produto natural, cuja complexidade conjugativa de materiais em sede de FMC (cigarros feitos em fábrica) deixa muito incerta, é o que faz, de banda com a legalização interessada, que não falemos numa toxicodependência. A condição primeira desta dependência é a sua manutenção, é a disponibilidade permanente do produto que a provoca. Sem ela, pese a perversidade da persistência na memória no recuperado por imensos anos, a dependência e o negócio que a alimenta, não têm condições de sobrevivência. Os lucros milionários desse negócio a nível global, a benefício dos Estados, das organizações supra estatais e de todos os participantes na cadeia de passagem do produto ao dependente, geram-se na dependência que o produto vendido provoca.
Não há portanto como considerar que possa ser indiferente a um produtor de cigarros que o cigarro que produz não esteja disponível para quem o fuma. Se há assunto onde, por lógica comercial, necessariamente se justifica existir ingerência do produtor aos que, em passos seguintes, oferecem ao mercado, é exactamente aqui. Qualquer que seja a forma da ingerência. Quem quer que seja o produtor.
Por isso os esforços da concorrência no acesso a quem realiza o trabalho essencial da passagem do produto.
Em concreto, e quanto à instrução, ela resulta quer dos textos sob a forma contratual ou não, quer das campanhas de incentivos – e aqui se abrindo também a polémica sobre inexistência de ruptura poder significar também ausência de marca nova no ponto de venda – por menção expressa, e muito concretamente pelo mecanismo chamado “transfer order”, que bem ilustra quanto a inexistência de ruptura é, foi, fundamental para a T…. No mesmo sentido, a campanha sobre o “bug” do ano 2000, esta indicando aliás como, para um cenário com um potencial de grande disrupção, um prazo mais alargado de disponibilidade de stock seria recomendável. Quando pensamos em circunstâncias disruptivas normais – greves, cortes de via por intempérie e similares – o apontamento do prazo de uma semana como previsivelmente necessário para superar o inconveniente parece bem ajustado. Quando pensamos no Verão, na maior afluência de consumidores a locais diversos dos seus habituais, renasce a mesma preocupação fundamental – não pode haver falta de produto nos pontos de venda do Estio.
Remetendo-se para a prova indicada pelas apelantes, sem necessidade de qualquer esmiuçamento, vista a valoração global de tudo quanto consta no processo e de toda a prova nele produzida, é com altíssima probabilidade que o facto teria de ser considerado provado, o que também sucede com as menções mais concretizadas que se pretendem com o facto adicional. Assim, elimina-se o facto não provado nº 23 e adita-se à matéria de facto provada que:
- A T… dava instruções aos AA. no sentido de estes manterem sempre em stock a quantidade de produtos da T… suficiente para fazer face às vendas de pelo menos uma semana;
- A T… dava instruções aos AA. e tinha programas de incentivos específicos para que inexistissem rupturas de stock de produtos da T… no retalho e fez constar das CG, até 2008 inclusive, como obrigação do cliente grossista, abastecer contínua e regularmente os retalhistas e zelar pela inexistência de rupturas de stock.
- Quanto ao facto não provado 24 – “Nas visitas que faziam aos armazéns dos AA., os promotores da T… manifestavam a sua pretensão de que os produtos da T… se encontrassem arrumados nos armazéns dos AA. segundo determinada ordem estipulada pela T…”, pretendem as apelantes que o mesmo seja dado como provado, invocando a “conjugação dos Factos Provados 8 (cf. Cláusula 1.2.1 e anexo III, das CG de 2001, a fls. 219) a 13 (cf. Cláusula 7.ª, ii, das CG de 2009) 53 e 54, na medida em que é complementar aos mesmos e Declarações dos legais representantes das RR.”.
A explicação para a resposta negativa dada pelo tribunal foi a de que “Os pontos 22, 23, 24, 27 e 28 da matéria de facto não provada encontram a sua explicação no facto de o tribunal não ter ficado convencido que a T… tivesse a ingerência na atividade dos grossistas que expressões como “dava instruções”, “dava recomendações” e “exigia” têm implícito”.
Se em 53 e 54 da matéria provada já se diz que “A T… procede periodicamente à vistoria dos armazéns dos AA” e “Nas vistorias, a T… verifica o grau de humidade, a temperatura, a localização e as condições de acesso e de estacionamento”, se nas condições gerais, e anexos, além da salubridade, também se passou a falar em “first in first out”, este tipo de arrumação que garante a salubridade e as boas condições de armazenamento, empilhamentos não excessivamente pesados, tabaco mais recente atrás do mais antigo, e a verificação que era feita nas vistorias, já diz exactamente – isto é, já está plenamente provado - o que as apelantes pretendem. Isso aliás parece ainda mais claro quando se lêem os excertos que, no corpo da alegação, transcreveram dos depoimentos de parte de PS e NJ.
Vem isto a dizer duas coisas: - primeiro, que o tribunal entendeu a matéria do facto não provado 24 como reportando-se a uma pergunta recorrente feita no julgamento e que mereceu refutação por praticamente todas as testemunhas e pelas próprias declarações de parte das AA., a saber, que os cigarros da T… tivessem de estar arrumados em armazém pela mesma ordem que a T… entendia deverem estar nos balcões dos retalhistas e nas máquinas de vending. Só assim se percebe a motivação da convicção. Segundo, que praticamente tudo o que é pretendido dar como provado, já o está. Falta apenas saber se as vistorias eram feitas pelos promotores e se eram feitas em cada visita de promotores a retalhistas. Ora, com o devido respeito, isso é completamente indiferente, porque nem da redacção pretendida resulta a regularidade das visitas, nem tem qualquer interesse saber se eram promotores ou inspectores ou key accounts ou promotores disponíveis a quem os serviços centrais tivessem pedido ajuda para fazer a vistoria inicial. Não se altera assim o facto não provado 24, que com o sentido entendido pelo tribunal recorrido se mostra perfeitamente consentâneo com a generalidade da prova produzida.
Quanto ao facto não provado 25 – “Para que os AA. desenvolvessem atividades promocionais e publicitárias dos produtos da T.., esta forneceu àqueles, para que fizessem chegar aos retalhistas, autocolantes, isqueiros, cinzeiros, baralhos de cartas, t-shirts, casacos, toalhas, bonés, brindes, reclames luminosos e expositores”, é pedida resposta afirmativa, invocando-se “cf. admissão das RR. no seu requerimento de 5.03.2012, Ref. Citius 9555543, Correspondência, por exemplo, a fls. 7221 v, 7249 (2001), 7222 a 7224v, fls. 7278 v (2005), fls. 7280 v (2005); fls. 7281 v (2005), fls. 7282 (2005), fls. 7318, fls. 7326 v – 7327 v, Declarações dos legais representantes das RR.; depoimentos de LS, LR, HB, PO, JL, PD (DP) e PT (DP) e instâncias a PM e JL (cujos depoimentos foram incorretamente valorados)”.
O tribunal firmou-se na afirmação de que as RR reservam para si o exclusivo da promoção, enquanto estratégia comercial que lhes permite situarem-se no mercado e que exercem por equipa própria, sendo que as obrigações de promoção constantes dos contratos antigos não subsistiriam por muita coisa ter mudado no mercado do tabaco – literalmente “Os pontos 25 e 26 da matéria de facto não provada encontram a sua explicação no facto de ter resultado dos depoimentos das testemunhas PMCM e JMRL que a promoção e a publicidade são da responsabilidade exclusiva da T…. Se é certo que resulta dos documentos de fls. 7367 a 7370, 7683 a 7689, 8129 a 8131 e 8133 a 8142 a obrigação do grossista de realizar atividades promocionais e publicitárias, certo é também que, entretanto, muita coisa mudou no mercado do tabaco”.
Nova questão abundantemente discutida em julgamento. Em PM encontra-se de facto uma menção clara à origem do problema: - a definição do que é promoção, não se considerando que exista na ou pelo simples facto da colocação do produto. As AA. transportam aos pontos de venda e vendem-lhes (e estes depois ao consumidor) e nesta actividade não há promoção, promoção não é colocação. Manifestamente há-de reconhecer-se à T… e ao grupo P… o afinco, a especialização e o empenho em se asseguraram permanentemente do estado do mercado, do seu bom desempenho ou do decréscimo dele, por si, pelos fumadores, pela luta anti-tabágica e pelas ameaças da concorrência, e da organização dos melhores meios para lhes responderem – e neste sentido é claro que a T… reserva para si o domínio da arquitectura dos correspondentes planos de resposta, ao nível da promoção e da publicidade, não permitindo inovações ou originalidades que não controla, da parte de todos quantos se encontram na cadeia de distribuição. Quando estamos a falar de produtos de notoriedade internacional, é impensável que o grossista ou o retalhista tenha uma ideia luminosa de revestir os maços com renda ou cortiça porque conhecendo o seu público habitual lhe parece que ficará muito atraído, e efectivamente a aplique. O mesmo se aplica a uma ideia mais puramente promocional, do tipo “compre um volume e oferecemos uma sombrinha de praia, por acaso feita ali na fábrica dum primo meu”. Mas, o que sempre esteve em causa, mesmo nos contratos de distribuição, não foi a autonomia e responsabilidade do grossista pela promoção, mas a sua colaboração na estratégia de promoção traçada pela T…. Por isso, em bom rigor, não tem sentido a distinção que a testemunha PM fez, porque definindo a T… a promoção, esta também não chega sozinha ao consumidor final. Não haja por outro lado dúvida que, será de boa prática agraciar os colaboradores grossistas e retalhistas com blusões Ferrari, mas eles francamente não precisam de acumular milhares de isqueiros, cinzeiros e menos ainda reclames luminosos nas suas residências pessoais. Estes brindes são uma ferramenta de negociação não essencialmente dirigida às fases intermédias de compras e vendas até à venda final ao consumidor, mas precisamente dirigida a este. É porque pode oferecer um isqueiro por cada dois maços, que a tabacaria de bairro fica mais sensibilizada a comprar a marca respectiva: - sabe que o cliente final aprecia muito os isqueiros e que portanto lhe vai comprar aquilo que ela vende: tabaco. Portanto, se podemos aceitar que uma parte do material promocional pode visar o grossista e o retalhista, em si (para si) mesmos, essa parte é residual. E portanto sim, porque a T… não desenvolve ela mesma estas actividades directamente ao consumidor final – no caso da publicidade sucessivas vagas de restrição legal foram acontecendo – estas ferramentas de negociação serviam para a colaboração dos grossistas (e subsequentemente e e/ou retalhistas) na realização de actividades promocionais e publicitárias.
Por outro lado, saber se a T… forneceu tais materiais para que os grossistas desenvolvessem essas actividades é facto e o facto que está a ser perguntado não é se os grossistas estavam obrigados a colaborar. Ora, as Rés, negando a obrigatoriedade – defendendo pelo contrário que os grossistas podiam guardar para si e para os amigos isqueiros aos centos – admitiram que essas entregas de material aconteciam. Em 37 do requerimento de 5.03.2012, Ref. Citius 9555543, as Rés afirmam que “Acresce que, os clientes grossistas, e os Autores em particular, não estavam obviamente vinculados a aceitar tal material e, muito menos, a distribui-lo junto dos seus clientes retalhistas, e, se o faziam, actuavam de forma voluntária, não sendo dadas quaisquer “instruções”/ordens nesse sentido pelas Rés”, na sequência de afirmarem em 36 que “Na verdade, as Rés, enquanto e na medida em que a legislação que rege o sector do tabaco o permita, disponibilizam aos Autores material adicional – cinzeiros, isqueiros e outros pequenos brindes –, tendo em vista, na medida do possível e admissível, apresentar novos produtos, marcas, formatos ou variantes de produtos, para fomentar o bom relacionamento profissional que se impõe num modelo de negócio que não permite o controlo directo do abastecimento dos produtos até aos pontos de venda, beneficiando, inclusivamente, os próprios grossistas”.
Se ouvimos diversos depoimentos em que promotores afirmaram guardar para si os brindes e a gestão deles, nos e para os contactos com os retalhistas, por exemplo na primeira testemunha das Rés, antiga promotora em Coimbra, e ao tempo do julgamento no departamento de vendas, também ouvimos e nisso houve coincidência, a menção ao interesse que os grossistas tinham em ter acesso a esses brindes para promover o seu próprio negócio. É o que as Rés também dizem em 36, os grossistas também saiam beneficiados com a actividade promocional e os brindes usados. HB foi absolutamente expressiva nesse interesse, revelando uma procura activa do acesso aos brindes e, até coerentemente com os depoimentos dos promotores reservantes, que também pedia para eles colocarem os brindes nos seus clientes.
Quem resolve finalmente a questão é PM: - 02:46:16 (sobre oferecimento de isqueiros aos grossistas no âmbito de uma promoção) – “(…) Aconteceu. Aliás, é prática da indústria e tem a ver e tem a ver com o suprimento de uma falta de cobertura geográfica da força de vendas da T…. Nós podíamos tê-lo feito, inclusive, através de uma outra empresa qualquer fora da cadeia de fornecimento. (…)”. Não podiam, como é claro, que haveria que transmitir a esta empresa fora da cadeia, a localização dos pontos de venda não cobertos pela força de vendas, e por isso é claro que para os atingir, até primeiro que tudo para saber quem eram e onde estavam, era preciso recorrer aos grosssitas. A chave da resolução é essa mesma – falta de cobertura geográfica de milhares de postos de venda, que muitos deles, pelo volume de negócios ou pela localização, não ofereceriam qualquer interesse nem justificavam o custo e o trabalho dos promotores da força de vendas da T….
Portanto, ao menos nesta parte em que os promotores não cobriam, os grossistas teriam todo o interesse e a T… teria todo o interesse em haver disponibilidade de ferramentas de negociação, de brindes, para motivar o retalho e para incentivar o consumidor final. Por isso, nessa parte pelo menos, seguramente aconteceu. Assim, elimina-se o facto não provado 25 e adita-se aos factos provados que:
- Para que os AA. desenvolvessem atividades promocionais e publicitárias dos produtos da T…, pelo menos na parte dos retalhistas não visitados pelos promotores da força de vendas da T…, esta forneceu àqueles, para que fizessem chegar aos retalhistas, autocolantes, isqueiros, cinzeiros, baralhos de cartas, t-shirts, casacos, toalhas, bonés, brindes, reclames luminosos e expositores.
Quanto ao facto não provado 26 – “A T.. dava viagens aos AA. que fizessem publicidade dos produtos daquela junto do retalho”, sustentam as apelantes que deve ser dado como provado na versão “A T… dava viagens aos AA. que obtinham melhores resultados na distribuição dos produtos daquela junto do retalho, nomeadamente no âmbito do Programa A…”, o que fazem com base nos documentos de “fls 7277 (apresentação do Programa A… 2005/2006, com oferta de viagem para os 7 melhores grossistas), 7235, 7335 e 7342 e depoimentos de AB, HB, JL, AF (DP) e JO (DP)”.
A motivação do tribunal recorrido é a mesma que para o facto não provado 25, ou seja, não fazendo as AA. publicidade, não recebiam viagens por isso.
Do que não haverá razão para duvidar, dados os muitos depoimentos de grossistas e até dum promotor que os acompanhou nalgumas dessas viagens (testemunha LS), é que alguns grossistas receberam da T… viagens e que essa oferta não era determinada por razões de estrita amizade pessoal, antes, alguma coisa teria a ver com o facto dos grossistas serem clientes da T….
E se portanto tinha a ver com o relacionamento profissional, interessaria saber da ocorrência dessas ofertas, em primeiro lugar, e das razões delas, depois, para se obter um retrato abrangente da relação em causa.
Qual a razão para duvidar que AF foi, com tudo pago, ao Brasil e à China, que HB foi às Canárias e até teria gostado de ir a Maranello, que JBO foi ao Dubai? Nenhuma. AB aliás adiantou a oferta de viagens no âmbito de programas específicos objectivados à inexistência de rupturas de stock, que visando essencialmente os retalhistas também premiava os grossistas seus fornecedores (de referência). De resto, consta a sua assinatura precisamente no documento de fls. 7277, de apresentação do Programa A…para a época 2005/2006, onde se refere que em “cada trimestre, os 7 grossistas com melhores resultados, em termos de marcas da T… disponíveis para o consumidor, irão ter o privilégio de viver uma experiência única e memorável ao visitar a mítica fábrica da Ferarri em Maranello, Itália. JL, ligou a oferta de viagens a programas desenvolvidos e ao atingir dos objectivos neles fixados. No primeiro depoimento de parte prestado por PS, ele confirmou que a T… fez viagens com muitos grossistas ao longo dos anos, prática que subsistia, afirmando mais tarde no seu depoimento que as viagens eram uma maneira de (mostrar) reconhecimento pelo esforço realizado pelos grossistas no trabalho do mercado, de novos lançamentos, e na instância do i. mandatário das RR. desligando a sua oferta da publicidade, por a reservar à T…. LS falou das viagens promovidas anualmente num período de quatro anos, no âmbito do programa A… esclarecendo que nelas (nas três que fez) não se falava de negócios.
Nestes termos, procede a pretensão impugnatória ora em apreço. Assim, elimina-se o facto não provado nº 26 e adita-se aos factos provados que: - A T… dava viagens aos AA. que obtinham melhores resultados na distribuição dos produtos daquela junto do retalho, nomeadamente no âmbito do Programa A….
Quanto ao facto não provado 28 – “A T… exigia aos AA. que os produtos daquela fossem expostos em lugar de destaque em detrimento dos produtos da concorrência”, pedem as apelantes que seja dado como provado ou “no limite, com a seguinte resposta restritiva: “A T… exigia aos AA. que os produtos daquela fossem expostos em lugar de destaque em detrimento dos produtos da concorrência nas máquinas de vending e dava indicações aos AA. para que essa exposição fosse também seguida nos seus clientes retalhistas.” - cf. Estudo de fls. 6464, Decisão da AdC no PRC/04/08, contratos de fls. 7318v a 7320v e fls. 7333v a 7334v., declarações das RR., depoimentos de AF (DP), JO (DP), JL, HB e PT (DP)”.
O tribunal considerou a não demonstração de instruções vinculativas e dentro outros depoimentos que citou para tanto, mencionou o de PO, especificamente afirmando que os promotores da T… nunca pediam que fosse observada qualquer ordem na arrumação dos produtos.
Em rigor, a resposta restritiva propugnada é uma resposta explicativa, dum quesito relativamente vago, pois há vários locais a que a exigência de exposição em destaque se poderia reportar. Dalgum modo, as respostas dadas pela generalidade dos inquiridos até saíram prejudicadas pela não especificação, assumindo-se imediatamente que não porque nos armazéns dos grossistas os produtos estão apenas armazenados e arrumados, tirando a questão do bom acondicionamento, sem exposição a ninguém, e seguindo a lógica de próprio funcionamento do armazém – facilitar a rapidez de carga de encomendas feitas pelos retalhistas. Neste aspecto, PT até dá uma ajuda porque indica que a própria ordem de encomenda que é usada pelos retalhistas tem uma ordem pela qual surgem as marcas que corresponde à ordem de exposição em destaque. Mas é fora de causa que não há ordem para destaque no armazém, ou melhor, que seria absolutamente indiferente à T… a ordem pela qual as marcas estariam no armazém (eventualmente apenas para facilitar o trabalho de pistolagem). Quando se fala numa exigência de exposição destacada, teremos portanto sempre de nos situar nos locais onde existe público para admirar essa exposição, ou seja, nos pontos de venda ou em máquinas automáticas de venda. Também é verdade que essa “melhor” ordem corresponde a um estudo sério sobre como melhor impressionar e captar a atenção do fumador, como melhor o orientar na diversidade de marcas disponíveis, e que portanto a observância desta ordem não é indiferente à T…, muito antes pelo contrário. Os autos demonstram a verdadeira exigência dessa ordem no caso dos contratos de máquinas de vending propriedade de grossistas, com remuneração específica condicionada à observância da ordem, a fls. 7318 verso e seguintes e 7333 verso e seguintes. Apesar de muita da discussão nos autos, em função dos pedidos formulados pelas AA., se centrar nas Condições Gerais de Fornecimento, não é irrelevante à caracterização da natureza jurídica da relação comercial havida, compreender o que nela era feito.
No que diz respeito especificamente à questão dos pontos de venda ao balcão, se é verdade que muitos eram visitados directamente pela força de vendas (promotores) da T…, que passariam as instruções ou tentariam convencer os retalhistas a observarem a ordem de destaque que a T… havia gizado e lhe interessava implementar, revisitamos a lógica que recentemente aplicámos: - não havendo cobertura geográfica nem de recursos humanos para a totalidade dos pontos de venda, por parte da T…, seria de todo o interesse que nos pontos não cobertos se observasse a mesma ordem de destaque expositivo. Por isso, com toda a probabilidade, aos grossistas haveria de ser sugerido (HB refere precisamente esta palavra) pelos funcionários da T… deles incumbidos, que transmitissem aos seus clientes retalhistas que não eram visitados por promotores, que implementassem a ordem de arrumação desejada.
Não é assim particularmente credível quem se preocupa com a não afirmação de quaisquer ordens, negando sugestões, quem segmenta a realidade por razões de princípio sobre o domínio da publicidade, independentemente de aos promotores serem cometidas essas funções de transmissão ao retalho da ordem expositiva, nesta última parte sendo até compreensível que quem fala da sua experiência profissional possa até estar mais centrado no seu mundo e de algum modo esquecer que existem outros mundos.
Estamos portanto com a valoração dos depoimentos indicados pelas apelantes, que parecem perfeitamente credíveis e adequados ao próprio interesse de base da T…, que é estender o seu estudo de eficácia sobre o consumidor final a todos quantos sejam o interlocutor deste, sendo natural a transmissão das instruções a este interlocutor por aqueles que com ele podem contactar, sejam promotores visitantes do retalho, sejam grossistas para a parte não visitada pelos promotores.
Procede assim a pretensão recursiva na versão explicativa, devendo ainda aditar-se a remessa para os termos dos contratos de máquinas, para acesso e compreensão do seu teor e apuramento da sua lateralidade ou relevância. Assim, elimina-se o facto não provado 28 e adita-se à matéria de facto que:
- A T… exigia aos AA. que os produtos daquela fossem expostos em lugar de destaque em detrimento dos produtos da concorrência nas máquinas de vending, através de contratos de que são exemplo os constantes de fls. 7318 verso e seguintes e 7333 verso e seguintes, cujos termos aqui se dão por reproduzidos, e dava indicações aos AA. para que essa exposição fosse também seguida nos seus clientes retalhistas, pelo menos nos clientes retalhistas não visitado pelos promotores da T….
Quanto ao facto não provado 29 – “Nas fiscalizações aos armazéns das AA., a T… verifica as quantidades de produtos de tabaco de marcas concorrentes que lá existem” pretendem as apelantes que passe a provado, com base nos seguintes meios de prova: “depoimentos de LR, JPG, HB, JL, AR (DP), JP (DP), PD (DP), AF (DP), CF (DP) e JMR (DP)”.
Já o tribunal considerou que o “ponto 29 da matéria de facto não provada ficou a dever-se ao facto de a prova produzida ter ficado aquém do facto vertido naquele ponto, sendo certo que uma coisa é poder ver que há produtos de marcas concorrentes e até ter a noção se é muito ou pouco e outra coisa é verificar as quantidades”.
De facto, tendo a generalidade dos intervenientes afirmando que não há armazéns separados para produtos T… e concorrência, na oportunidade das visitas dos key accounts estes poderiam ver as existências nos armazéns, tanto mais que, tratando-se de caixas e não propriamente volumes nem maços, seria relativamente simples, de olho, fazer o cálculo das quantidades de produto concorrência existentes. Estaremos então todos de acordo, tribunal recorrido incluído, que os funcionários T… visitantes veriam os produtos da concorrência. Parece duvidoso que anotassem (CF fala da anotação antes da existência de pistolas, e portanto estaria a referir-se à verificação de produtos T…). Com essa vista, conversavam com os grossistas procurando saber das razões das existências de produto concorrente, o que é perfeitamente enquadrável no âmbito duma visita comercial, em que há dois vectores importantes, a saber informação sobre o estado do negócio do tabaco em geral, em primeiro lugar, e depois imediato uso duma oportunidade de demonstrar ao cliente a vantagem ou as vantagens possíveis duma maior compra de produtos T…. Claro que, com a informação que se obtém – o cliente x tinha y (muitas) quantidades do produto z da concorrência porque explicou um maior desconto, que aproveitou uma campanha ou coisa parecida – podemos perguntar se quem a obtém fica com ela para si ou se a transmite. Diz-nos a experiência normal das coisas, a lógica do negócio (ainda que os promotores ou key accounts não ganhassem senão os seus salários) que estando inseridos numa estrutura empresarial negociante, com toda a probabilidade, se notassem algum facto relevante, algum comportamento mais agressivo da concorrência, o haveriam de comunicar superiormente a quem pudesse então pensar estratégias de oposição ou neutralização. Portanto, faz sentido que JL tenha afirmado que “víamos e reportávamos”, “à hierarquia”, ainda que o “Sim” com que inicia a resposta não seja completamente claro – dada a extensão da pergunta – sobre se o fazia em cumprimento de directrizes ou instruções específicas da T… nesse sentido, como se a verificação do produto da concorrência fosse uma das tarefas que todos os visitantes, em qualquer visita, teriam de fazer. Não há - talvez também não fosse razoável que existisse – qualquer documentação sobre isso.
Se entrarmos depois a conjugar, quando temos a possibilidade, nos grossistas que a prestam, de obter a informação de vendas em que se pode obter, pela dedução das compras T… ao volume total de vendas dos grossistas, o valor global das compras à concorrência, já os “olhos” dos funcionários permitem saber, ainda que de modo não completamente preciso, as compras dos grossistas a cada concorrente.
Evidentemente há depois estudos de mercado, e há o simples “andar na rua”, isto é, a possibilidade de ver em retalho ao balcão e máquinas, como singra cada concorrente. Podemos aperceber-nos de desenhos, variedades e formatos novos, mais apetecíveis. Em todo o caso, nesta apreciação de rua, objectiva, sem dependência dos grossistas nem mesmo de conversas com os retalhistas, não conseguimos captar todo o universo de razões possíveis pelas quais a concorrência, cada marca da concorrência, esteja a ter mais sucesso, porque nos escapa a parte justamente das promoções e campanhas. Esta consegue-se muito mais facilmente em conversa com os grossistas. E voltamos a não ter grossistas ingénuos, eles também sabem que comunicar informalmente à T… as campanhas da concorrência pode produzir uma reacção similar – campanhas de resposta, lançamentos de novos produtos – da qual eles serão também beneficiários.
Tudo isto portanto está na normalidade das estratégias do negócio, na normalidade duma prática comercial, sem infracção de nenhuma prática legalmente proibida.
Portanto, são perfeitamente credíveis os depoimentos, invocados pelas apelantes, que aventam o olhar dos funcionários ao produto concorrente existente nos armazéns dos grossistas e a tentativa de perceber as razões dessa existência, é credível o reporte, não há é evidência duma verificação formal directamente determinada pela T….
Entendemos pois que o máximo que se pode dar como provado é que nas fiscalizações aos armazéns das AA., os funcionários da T… vêem as quantidades de produtos de tabaco de marcas concorrentes que lá existem e tentam aperceber-se das razões dessas quantidades, nalguns casos reportando-as superiormente.
Pretendem ainda as apelantes no âmbito de impugnação do facto não provado em causa, que “Deverá ainda ser dado como provado, com base nos mesmos meios de prova que: “Nas fiscalizações que a T… faz aos armazéns dos AA., a mesma efetua o controlo das caixas de tabaco aí existentes, através da leitura dos códigos de barras (pistolagem) para saber se o tabaco provém da T… ou se foi adquirido a outro grossista.”. Concretamente apoiar-se-ão no depoimento de CF que mencionou com espontaneidade e vivacidade o episódio de uma caixa pistolada e identificada pelo funcionário como vendida pela T… a outro grossista.
Se pensarmos que é objectivo da pistolagem a verificação da origem do produto, na teleologia do combate à contrafacção, ao contrabando e ao branqueamento de capitais, aliás constante das Condições Gerais, podemos afirmar que é possível através da pistolagem determinar a origem do produto e o seu trajecto, mas já não resulta, aliás a partir do próprio relato do declarante, que a pistolagem permita identificar a compra dum grossista a outro, nem que o objectivo da pistolagem seja esse: - CF sobre se “eles” sabiam (se o tabaco era seu, ou emprestado, ou isso tudo) e se era para isso (que faziam a pistolagem) disse “Não, eu não sei para que era (…)”.
Não havendo qualquer facto provado sobre a pistolagem, e sendo certo que era feita, podemos apenas aditar que nas fiscalizações que a T… faz aos armazéns dos AA., a mesma efetua o controlo das caixas de tabaco aí existentes, através da leitura dos códigos de barras (pistolagem) para saber se o tabaco provém da T…, mas já não a parte final proposta. Assim, elimina-se o facto não provado 29 e adita-se à matéria de facto que: - Nas fiscalizações aos armazéns das AA., os funcionários da T… vêem as quantidades de produtos de tabaco de marcas concorrentes que lá existem e tentam aperceber-se das razões dessas quantidades, nalguns casos reportando-as superiormente;
- Nas mesmas fiscalizações, os funcionários da T… efectuam o controlo das caixas de tabaco aí existentes, através da leitura dos códigos de barras (pistolagem) para saber se o tabaco provém da T….
- Quanto ao facto não provado 30 – “Foi em execução dos acordos que mantinham com a T… que os AA participaram nas campanhas de incentivos mencionadas no ponto 17 da matéria de facto provada” sustentam as apelantes que deve ser dado como provado tal como quesitado, com base no “Estudo sobre o Mercado do Tabaco de fls. 6464, cf. CGF de 2001, fls. 200 a 225 até às CGF de 2008, a fls. 312 a 340; CGF de 1993, a fls. 7176 e 7189v. e segs. e CGF de 1995, a fls 7204-7209; Correspondência de fls. 7169 e segs. e descrição do Programa A…, a fls. 7277”. Para o tribunal recorrido, não se provando a obrigatoriedade da participação nas campanhas, não pode falar-se, nem prova foi feita, da execução correspondente a essa obrigação.
Recorde-se então que está provado: - 17 - Desde 2000, os AA. e outros grossistas em condições semelhantes participaram em campanhas de incentivos promovidas pela T…, e a seu pedido: a campanha de incentivos integrada; a campanha na crista da onda; o programa descobrir novos horizontes; o programa a… 2000 - ao encontro de Portugal, o programa A… 2001 - descobrir Portugal, a promoção Rotas V…, a promoção M… Adventure Team e a promoção … Duopack.
O problema nesta pretensão é a “execução de acordos”, porque ela encerra já o pré-juízo de que houve um acordo que vinculava a determinadas obrigações que foram cumpridas. Não está evidentemente em causa que, tendo aderido a campanhas cujos termos em si pode ser vistos como um acordo, os grossistas aderentes executaram as obrigações derivadas de tais acordos – do mesmo passo que a T… terá executado a obrigação de pagar ou conceder os incentivos (descontos e prazos de pagamento e similares). Não é a isso que se referem as apelantes, ou pelo menos não expressam a pretensão de que o teor ou o teor parcial relevante das comunicações relativas às campanhas passe aos factos provados. Quando se diz que foi “em execução dos acordos que mantinham…” as apelantes referem-se ao relacionamento comercial duradouro mas já enquadrado pela perspectiva jurídica (acordo). É certo que a utilização da palavra acordo vem para revestir uma certa neutralidade, mas a execução do acordo de todo já não pode ter esse sentido neutro. Poderíamos retomar um pouco as observações que fizemos no início desta questão para dizer que do ponto de vista do facto puro, a origem da obrigação é irrelevante e que o que interessa é saber da sua existência. Aliás, isto mesmo consta do corpo da alegação de recurso, as AA não discutem que não fossem obrigadas a participar, embora essa obrigatoriedade quase surgisse na prática na lógica de aproveitamento de toda e qualquer benesse que ajudasse a suprir a margem comprimida. E depois de afirmarem que não discutem, juridicamente, a obrigatoriedade de participação nas campanhas, afirmam que ela “decorria dos acordos (relações contratuais) existentes” – ponto 280. E que assim era em execução dessa relação o notava o Estudo do Mercado de Tabaco ao assinalar o papel de instrumento de fidelização com última vista ao assegurar duma óptima distribuição e visibilidade das suas marcas, desde logo pela ausência de rupturas de stock. Ora, esta óptima distribuição e visibilidade e inexistência de rupturas estiveram expressamente, de forma mais ou menos incisiva, plasmadas em todas as condições gerais de fornecimento, donde, em obediência a elas, se poderá dizer então que a participação das AA nas campanhas foi em execução dos acordos.
Embora dúvida alguma haja de que nos contratos de distribuição e saindo deles para as primeiras tabelas estivesse consagrada a obrigação de promoção e de zelar pela inexistência de stocks, embora nas condições posteriores se encontrem lastros das anteriores, embora, pelas antiguidades provadas, seja clara a persistência da relação, sendo portanto absolutamente natural que as AA. participassem nestas campanhas, sendo inegável que elas, mesmo as dirigidas a retalhistas, as tivessem de implicar, não saímos da fórmula do facto quesitado sem abordar a natureza do acordo.
Ora, quando as apelantes enunciam que não põem em causa que não eram obrigadas a participar, o facto que se aproveita é mesmo o que participavam – facto que já está provado – e da conjugação desta participação com os termos e objectivos das campanhas (note-se, desde logo porque não especificamente pedido, não necessitamos saber os contornos específicos de cada campanha, pois eles em geral se acobertam à fórmula “de incentivos” que só pode resolver-se em incentivos a comprar e a vender, e portanto com benefício mútuo) é que se pode chegar à pretensão das AA. Só que, esta chegada não é feita em sede de matéria de facto, mas antes na discussão jurídica da causa, que começa pela tarefa de interpretação dos factos provados.
Em suma, não é incorrecta a posição assumida pelo tribunal recorrido, que se mantém.
- Quanto ao facto não provado 31 – “A partir de 2006, as RR. ameaçaram cortar o fornecimento de tabaco se as condições gerais de fornecimento não fossem seguidas”- sustentam as apelantes que o mesmo deve merecer resposta positiva, a partir dos depoimentos dos legais representantes das RR e do depoimento da testemunha HB.
Já para o tribunal recorrido, não foi feita qualquer prova.
A prova da concretização de uma ameaça não é idónea à prova da ameaça em si. Estão provadas – sob 44 e 45 – recusas de fornecimento a propósito de pagamentos múltiplos. Significa isto que houve uma ameaça prévia? Não necessariamente. Para dizer a verdade, a ameaça, lícita ou ilícita, constrange, e o que a generalidade das pessoas que depuseram sobre incumprimento de condições gerais salientou não foi um puro exercício de ameaça mas uma prévia tentativa de perceber o incumprimento e um diálogo para correcção, o que aliás faz toda a lógica numa relação continuada e de necessidade e proveito mútuo. Assim por exemplo quanto a novos armazéns de acessibilidade complicada, em que se encontrava uma solução. Assim também, aqui já com um certo desrespeito, na pretensão de anulação dos cheques múltiplos junto dos bancos. Claro que se a determinado ponto persistir o incumprimento do estabelecido nas condições gerais, o fornecimento é cortado. Foi isso que, por mais ou menos razão que tivessem os reclamantes ou incumpridores, sucedeu. No exemplo dos contratos de distribuição, o inspector da T… era visto como uma figura detestável e arrogante, e com a entrada da P… as relações tornaram-se mais cordiais. Mais do que afirmar que ameaçavam – o que não fizeram – os representantes legais das RR. foram peremptórios em afirmar o corte de fornecimento se as condições não fossem cumpridas (ressalvando-se a essa peremptoriedade a solução de diálogo prévio afirmada por outras testemunhas).
A partir de 2006 porquê? Quando HB conta o episódio de, a propósito da informação de vendas, terem contactado um advogado que avisou para a ilegalidade da entrega dos dados, e de ter ela mesmo telefonado para a T…, e de a resposta ter sido, basicamente, é isto como estamos a dizer, dão informação ou se não derem não damos tabaco, a introdução do desconto por informação de vendas parece ser anterior a 2006 – de facto é 2002 – nada obstando claro que o contacto com o advogado fosse posterior. Mas HB não se referiu a 2006, não indicou data, aliás afirmou repetidamente que não era boa para datas. Depois com o devido respeito pela testemunha, que nos pareceu perfeitamente espontânea e geralmente credível, o resultado previsto para a não entrega da informação de vendas seria perder o desconto, e mais importante que esse, o desconto de distribuição directa e activa, e não propriamente deixar de ser fornecido (tanto melhor seria para a T… não dar estes descontos), e a isto se terá referido depois HB quando afirma que (ressalvamos alguma imprecisão nos apontamentos que tomámos de toda a audiência) “Depois veio uma carta, depois desta discussão, as condições são estas, se fizerem isto e aquilo e se derem os dados, o desconto era este. Senão não recebíamos, e por isso não íamos acreditar que nos estavam a impor uma coisa ilegal”.
Repare-se ainda que a pergunta começou por se reportar à introdução do factor de correcção, referindo uma altura em que “houve protestos e recusaram-se a assinar” e referindo “Mas a pergunta é, a T… ameaçou cortar o fornecimento de tabaco?” E a testemunha começa: “Houve uma altura na T… muito complicada, quando entrou (BE), e eramos ameaçados todos os dias”. É no desenvolvimento desta altura complicada e eventualmente, na sua mente, das ameaças, que a testemunha conta o episódio da informação de vendas. Ora, BE é posterior a 2006, é mesmo posterior à introdução do factor de correcção. Com o devido respeito, sendo claro que a introdução do factor de correcção, mais do que a abertura da passagem de desconto percentual fixo a desconto fixo e variáveis, abriu uma altura muito complicada, a ponto duma manifestação de grossistas à porta da T…, dessa complicação não resulta directamente uma crispação nem as ameaças todos os dias foram concretizadas.
Não vindo pedido que se dê o episódio que HB conta como provado, não temos prova suficiente da prolação de ameaças, mas só da concretização daquilo que supostamente era o objecto da ameaça, segundo os factos provados 44 e 45. Improcede nesta parte a pretensão impugnatória.
- Quanto ao facto não provado 32 – “As RR. reduziram a margem dos grossistas como referido no ponto 107 da matéria de facto provada de forma a aumentar significativamente a margem e os lucros daquelas”, pretendem as apelantes que o mesmo seja dado como integralmente provado, invocando a reapreciação dos seguintes meios probatórios: - “Relatório e Contas da T… de 2006, a fls. 6805, pág. 4 e 22, conjugação com os Factos Provados 107, 108 e 109 a 205, Relatório Pericial (fls. 5497 a 5546) e respetivos esclarecimentos (fls. 6279 a 6291), depoimentos de AB, JA, PC”.
Já o tribunal entendeu que: “Os factos vertidos nos pontos 107 a 206, 224 e 238 da matéria de facto provada e 32, 34 e 41 da matéria de facto não provada fundamentaram-se no relatório pericial de fls. 5497 a 5546, com os esclarecimentos prestados a fls. 6279 a 6291, sendo de salientar que, atento o conceito de margem dos grossistas empregue no ponto 107 da matéria de facto provada, ficou prejudicado o quesito 81º da Base Instrutória”. Recorda-se que este conceito de margem é: “107 - A introdução do fator de correção implicou a redução da margem dos grossistas sobre as vendas dos produtos da T…, entendendo-se por margem dos grossistas a percentagem calculada sobre o PVP que, abatida a esse mesmo PVP, originava o valor a pagar pelos grossistas à T…”.
Por seu lado, deve notar-se, as Rés, nas contra-alegações, nem no corpo nem nas conclusões, emitem qualquer pronúncia sobre a pretensão das AA. a dar como provado o facto não provado 32.
No confronto do facto provado 107 e do facto não provado 32, o que temos então que o tribunal não se convenceu foi que a introdução do factor de correcção tivesse sido deliberadamente feita para transferir a parte reduzida da margem para as RR., que o resultado dessa transferência – aumento da margem e lucros das RR – tivesse sido significativo, e ainda, até surge a dúvida, interpretando a redacção do facto 107 e do facto não provado 32 conjugadamente com a motivação e com as diversas perspectivas que se revelam no relatório pericial, que tivesse havido sequer essa transferência ou seja, se as Rés foram as destinatárias finais da redução da margem. Agora, acordo há que ocorreu redução da margem, no conceito desta que significa a percentagem (margem… a percentagem calculada sobre o PVP) de desconto (percentagem…abatida a esse mesmo PVP) e o preço a pagar (que originava o valor a pagar…).
A primeira observação a fazer é quanto ao (aumento) significativo, que como se sabe é uma conclusão e ainda para mais sem particular valor explicativo, ou seja, de algum modo inócua. Neste sentido, é muito mais útil a invocação de factos complementares como os resultados operacionais da T… segundo as suas contas do ano de 2006 e sobretudo o facto invocado quanto à transferência de 3.11 pontos percentuais no valor de mais de oito milhões de euros.
Assim, evidente se torna já que este tribunal, a dar procedência à impugnação do facto não provado 32, não irá verter no correspondente facto provado a menção “significativamente” que se segue a “aumentar”.
Saber se o factor de correcção implicou transferência será a primeira operação lógica para determinar seguidamente se, tendo havido, foi para a obter que as RR. pensaram e decidiram a introdução do factor de correcção. É certo que não se encontra a palavra “transferência” no facto não provado 32 mas reduzir a margem dos grossistas para aumentar a sua e os seus lucros tem implícita essa deslocalização, essa passagem de uns a outros.
Primeira pergunta então: - a introdução do factor de correcção implicou uma transferência da margem dos grossistas para a T…?
Quando pensamos em margem como a percentagem de desconto sobre o PVP de que beneficiavam as AA. até à introdução do factor de correcção e continuaram a beneficiar mesmo após esta introdução, até 2009 (em que o seu preço de compra foi definido por valor unitário) a aposição nas facturas de compra de um valor monetário a título de factor de correcção – corrigindo portanto o preço que desse desconto resultaria, implicou que o preço de compra aumentasse para os grossistas, o que resulta afinal numa percentagem de desconto menor. Se pensarmos num exemplo em que, para 2006, não houvesse qualquer aumento de PVP, a aposição do factor de correcção teria exactamente este resultado: o preço a pagar pelos grossistas era maior que em 2005. Por isso tanto se ouviu falar em “imposto”, que à factura (dizemos nós, quer normal, quer resultante do aumento de PVP) era aplicado, segundo quem assim depôs, um imposto, a ser pago pelos grossistas, donde, em última análise, o valor monetário a pagar era maior. O relatório pericial diz o mesmo tendo aliás ficado claro que “a aplicação do factor de correcção implicar que cada uma das AA. e dos Autores tivesse realizado menos os valores” quanto a eles referidos nos factos provados, significa exactamente o mesmo que dizer que cada um deles pagou esse valor a mais a título de factor de correcção.
A este raciocínio de aumento do preço a pagar, nada é alterado pelo facto do PVP ter efectivamente aumentado. Sobre o preço aumentado aplicar-se-ia a percentagem de desconto dos grossistas, obtendo-se assim o preço menor que o PVP a pagar pelos grossistas à T…, e que seria “x” (PVP - %). A este preço menor aplica-se o factor de correcção e de novo temos PVP - % + FC que dá um aumento desse preço menor, portanto um preço maior a pagar, o qual, levado à percentagem, volta a significar uma percentagem menor que a anterior.
Uma conclusão se pode tirar: quem paga o preço paga-o a alguém, este alguém recebe-o.
Isto não é, em rigor, uma transferência de margem – a redução da margem (percentagem aplicada sobre PVP) é só isso – mas sim uma transferência de dinheiro.
Para falarmos em transferência de margem, o conceito de margem não é o do facto provado 107, mas o da percentagem de participação em algo. Em termos simples, no PVP, ou melhor, do PVP pago pelo consumidor final, como é ele dividido entre T…, grossistas, retalhistas e Estado? Quando sabemos que os impostos são pagos pela T…, e que os retalhistas são “pagos” pelos grossistas, podemos então perguntar como é que a T… e os grossistas dividem as suas partes primordiais e se se quiser avançar, como é que a T…, depois de pagar os impostos (no suposto que o faz essencialmente a partir do preço recebido dos grossistas), e os grossistas depois de “pagarem” (i.é, concederem desconto) os retalhistas, dividem o PVP, e aqui encontramos, por exemplo “x e y” e após a aposição do factor de correcção vamos encontrar “x+ e y-“.
Neste momento cuidamos apenas das palavras constantes do facto não provado 32, cuidamos perceber se, no provimento, tais palavras poderiam ser mantidas.
Curiosamente, estas explicações mais minuciosas estão oferecidas ao juízo de reapreciação através dos factos complementares propostos “transferência de 3,11 pontos percentuais em benefício das Rés e em prejuízo dos Autores, no valor de 8.807.527 Euros” e explicação da origem concreta, da operação concreta desta transferência: - “fator de correção incidiu não só sobre a parcela do PVP que aumentou por força de aumento dos impostos, como também na parcela remanescente (…), permitindo às RR. apropriarem-se de aproximadamente 90% dos aumentos realizados extra impostos, quando, sem fator de correção teriam que partilhar esses aumentos com os AA. na proporção de 39% (AA) (61% RR)”.
Isto é, nestas explicações encontram-se os diversos níveis contidos nos conceitos do facto não provado 32: - a “margem e lucro” das RR. aumenta pelo preço maior pago pelos grossistas na medida em que não estamos a pensar na divisão de PVP total mas na divisão do rendimento disponível para o sector, já pagos os impostos, ou seja, resolve-se a questão de saber quem é o beneficiário final da redução da margem dos grossistas circunscrevendo-se o valor a partilhar, e é relativamente a este valor a partilhar que se conclui que, segundo invocam as AA., a anterior margem (percentagem de desconto) de que beneficiavam os grossistas já não se mantém, pelo contrário diminuiu por aplicação do factor de correcção, o que necessariamente implica que a margem (a percentagem de participação) das RR no mesmo valor tenha subido.
Ora, é sempre possível falarmos em valor e em percentagem: - se dividirmos por exemplo 5 euros por duas partes, sendo uma 3 euros e outra 2 euros, obtemos na atribuição da totalidade 100 a 5 euros, a percentagem de 60% para a parte constituída por 3 euros, e a percentagem de 40% para a parte constituída por 2 euros. Se subirmos de 5 para 6 euros, para obtermos as mesmas percentagens teremos de ter uma parte constituída por €3,60 e outra por €2,40. Se por introdução do factor de correcção as partes que se obtêm na divisão de 6 euros por duas pessoas são por exemplo €3,80 e €2,20, podemos de novo pensar nestes novos valores como representando, relativamente a 6 euros, as percentagens de 63,3333333333 e de 36,6666666667. Neste caso, ambas as pessoas recebem um valor em dinheiro maior do que anteriormente (quando o valor a partilhar era 5 euros) mas ocorre a descida da percentagem de uma pessoa e a correspondente subida da percentagem da outra.
Por isso, e para este efeito pelo menos, não nos interessa a dúvida tão recorrentemente lançada nas contra-instâncias das RR: - o valor em dinheiro que os grossistas receberam dos retalhistas foi, por via do aumento do PVP, maior ou igual ao que recebiam antes (no suposto evidente que não vão vender aos retalhistas abaixo do preço de compra à T…).
Repare-se agora que o facto não provado 32 não fala na redução dos lucros dos grossistas, mas no aumento dos lucros das Rés. Por isso, também para este efeito não nos interessa a mesma dúvida e menos ainda nos interessa a outra dúvida lançada sobre saber qual o rebate ou reprodução do factor de correcção que os grossistas fizeram sobre os retalhistas, de resto porque sempre estaríamos fora da operação do factor de correcção introduzido pela T… na relação que tem com o único cliente que tem, que é o grossista. O que a pergunta sobre o facto não provado 32 convoca é apenas saber se a redução da margem dos grossistas, operada pelo factor de correcção, gerou um aumento da margem das RR e um aumento dos seus lucros. Quanto aos lucros das Rés, evidentemente, há muitas maneiras de obter lucro – aliás isto mesmo se avisou na perícia – mas o que interessa é determinar que parte do lucro é obtido à custa da redução da margem dos grossistas, ou seja, pelo facto deles terem pago mais do que pagariam sem o factor de correcção.
Feitas estas precisões para saber do que falamos com as palavras que estão no facto não provado 32, prossigamos. Não sem antes dizer, como corolário do que ficou explicado, que muito provavelmente nos interessa abordar primeiro os factos complementares cuja prova é pedida, e só depois deles reverter ao facto não provado 32.
A partir da autoria do factor de correcção (cuja fórmula os próprios peritos assinalaram como complexa) – e da não intervenção dos grossistas na sua concepção e aliás da recusa de aceitação – é seguro que foram as RR. que implementaram o mecanismo cujo resultado foi a redução da margem tal como provado no facto 107, e em termos de segunda pergunta a fazer, o que interessará saber é se as RR. tinham ou lhes pode ser atribuída intenção diversa, que no fundo é que o sustentam: - apenas agiram (conceberam o factor de correcção) para compensar um desmesurado aumento de impostos que afectaria muito e só a elas (mais pagamento de imposto e aumento do custo da distribuição) a sua rentabilidade, compensação esta que não afectaria a margem bruta dos grossistas (não ganhariam injustificadamente mas também não perderiam). Só que isto já foi respondido pelo tribunal recorrido e não houve impugnação da decisão nessa parte: - facto não provado 41: - “A introdução do fator de correção teve em vista eliminar ganhos dos revendedores grossistas provenientes do aumento mínimo dos PVP necessário para cobrir o aumento de impostos e, assim, manter a sua margem bruta”. Com esta resposta, fica aberta a prova do contrário – foi (também) para aumentar a sua rentabilidade à custa da diminuição do custo da distribuição (aumento do preço a pagar pelos grossistas) que as Rés, rectius, a T… (antes de ser I) gizou o factor de correcção, podendo chegar-se ao resultado, no não provimento da impugnação do facto não provado 32, de não se saber para que foi, afinal, que foi concebido o factor de correcção.
Como é manifesto, só conseguimos saber para que foi concebido o factor de correcção depois de sabermos como ele operou, e por isso de novo é mais importante iniciar a abordagem pelos factos complementares, que, tal como este, implicam a análise dos meios de prova convocados.
Isto posto, e ainda antes de prosseguir, despachemos já um dos factos complementares que não tem relação directa com estas questões – a saber o aumento de custos operacionais para os grossistas derivado do simples (qualquer que seja) aumento de PVP. Recorda-se que não está em causa no facto não provado 32 a perda de lucros dos grossistas – e de todo por razões alheias ao factor de correcção – mas o aumento de custos operacionais não deixa de ter interesse para o enquadramento da relação entre RR. e AA.
Pretendem então as apelantes que se dê como provado que “O aumento do PVP do Tabaco implica para os autores um acréscimo de custos e riscos na sua atividade, derivado de comprarem o tabaco mais caro, do aumento das necessidades de fundo de maneio, aumento das necessidades e custos de financiamento, aumento dos custos de distribuição, a concessão de um maior volume de crédito ao retalho e maior risco deste, aumento do risco de assaltos e do aumento dos prémios de seguros.”, o que fazem invocando, entre outros, “os depoimentos de AB e LR, JR (DP)”.
Outra a observação de que estes aumentos não aumentaram tanto como o aumento exponencial de impostos anunciado no PEC em 2005, e outra a relativização destes custos – por exemplo, 200 mil euros de seguros para um volume de 104 milhões movimentado por um grossista (AA. ET- depoimento de JRJ) – em rigor as RR. nada opuseram ao que é uma evidência absoluta: - qualquer aumento de PVP, em singelo ou acompanhado do factor de correcção, dá esse simples resultado de que é preciso ter mais dinheiro para comprar o mesmo, que é preciso ter esse acrescido dinheiro disponível em fundo de maneio ou formas alternativas de o disponibilizar e que sendo os seguros calculados com base no valor seguro, se este aumenta, aumenta o prémio respectivo, até porque o mesmo produto, por ser mais caro, também se torna mais apetecível para assaltos. É também relativamente claro que, por falta de força negocial em razão da concorrência entre grossistas, cada grossista não pode exigir do seu retalhista o pagamento imediato, até porque o retalhista, que só reeembolsa o custo da compra ao grossista na venda ao consumidor, acaba a ser aquele que sofre o maior grau de incerteza no negócio. Depois, continua a ser evidente que quanto mais crédito se dá, maior é o risco de falta da sua cobrança.
Nos depoimentos invocado não ouvimos falar dum aumento do custo de distribuição do grossista (distribuição ao retalhista), mas duma diminuição do custo de distribuição para a T…, como motivação para introdução do factor de correcção em vista de alternativas mais difíceis derivadas da redução do consumo (AB). Por isso, quando se fala no facto complementar em “aumento dos custos da distribuição”, teremos de o ligar ao aumento dos seguros em vista do acrescido risco de assaltos, sendo que a ligação a um aumento de salários dos trabalhadores dos grossistas não se faz directamente ao aumento do PVP do tabaco, mas ao aumento do custo de vida, se é que se fez. Ou seja, o aumento do custo de distribuição não encontra autonomia face a outros aumentos invocados e constantes do mesmo facto pretendido aditar.
Nos depoimentos invocados assegura-se o que vem pedido dar como provado, que como dissemos é aliás evidente, e até notório, no que toca a assaltos e criminalidade organizada para o produto em causa, seja camiões seja máquinas de vending. Aliás, JRJ concretizou os assaltos a três carros da sua empresa e o rapto de trabalhadores, e referiu cerca de 70 máquinas furtadas.
LR assegura o aumento de capital necessário à compra e a existência de crédito aos retalhistas, com prazos alargados para os maiores clientes, e relaciona o aumento de custos derivado do aumento de PVP com a fixação tradicional da remuneração, digamos, dos grossistas em percentagem. Com efeito, além da regulação estatal que o sector teve, parece claro que cessada esta, a manutenção das percentagens assegurava automaticamente a compensação do aumento de custos derivado não só da inflação mas sobretudo do aumento do PVP do tabaco.
Também JPTG, trabalhador do grossista CF, explicou a necessidade de recurso à banca para suprir o aumento de valor investido na compra do tabaco até ao restauro duma cadência de tesouraria, o que ligou à circunstância específica da introdução do factor de correcção. Em todo o caso, pode retirar-se daqui a necessidade de aumento do fundo de maneio – sobre a qual falou também AB – e a necessidade, ao menos pontual, de financiamento externo. No seu depoimento, JPG também alinhou a demora de recuperação do dinheiro investido por via da venda em máquina automática, pela impossibilidade prática de visitar diariamente as muitas máquinas existentes, para fazer a recolha dos valores ali depositados pelos consumidores – o que é patentemente claro quando se pensa que se carrega a máquina e se terá de esperar algum tempo até que tenham sido comprados maços suficientes para justificar uma deslocação para recolha de dinheiro. Assim, adita-se aos factos provados que:
- O aumento do PVP do Tabaco implica para os autores um acréscimo de custos e riscos na sua atividade, derivado de comprarem o tabaco mais caro, do aumento das necessidades de fundo de maneio, aumento das necessidades e custos de financiamento, a concessão de um maior volume de crédito ao retalho e maior risco deste, aumento do risco de assaltos e do aumento dos prémios de seguros.
Por outro lado, podemos também adiantar a análise de outro facto pretendido aditar, a saber que “Nas contas do ano de 2006, a T… registou um crescimento dos seus resultados operacionais, relativamente a 2005, de 11,6%, para 116,796 milhares de euros e um crescimento dos resultados líquidos de 10,1%, para 85,172 milhares de euros, apesar de uma quebra no volume de vendas de 13,1%”, relativamente ao qual as apelantes se firmam no Relatório e Contas da T… de 2006, a fls. 6805, pág. 4 e 22.
Com efeito no Relatório e Contas 2006 da T…, a fls. 6805 e seguintes dos autos, as menções referidas são extraídas de quanto consta na página 22 – onde se lê, no ponto 3 “Situação Económico-Financeira”, ponto 3.1 “Situação Económica”, que “Os resultados operacionais atingiram o montante de 116,306 milhares de Euros, o que significa um aumento positivo de 11.6%, conforme se pode observar no quadro a seguir apresentado:” Neste quadro, intitulado “Evolução do Excedente Bruto de Exploração e dos Resultados” na rubrica “Volume de Negócios”, marcada com nota que em rodapé ao mesmo quadro refere “Volume de negócios deduzido das margens de comercialização, abatimentos em vendas e devoluções”, lemos o valor (em milhares de euros) de 1,650,416.1 para 2006, e o de 1,647,556.5 relativo a 2005. No mesmo quadro e mais abaixo, encontramos a menção aos Resultados operacionais no indicado valor de 116,306 milhares de Euros face ao valor do ano anterior, 2005, que foi de 104,197.9. Ainda no mesmo ponto 3 lê-se mais adiante: “Os resultados antes de impostos atingiram um montante de 116.796 milhares de Euros, verificando-se um acréscimo de 11% em relação a 2005. O resultado líquido do exercício cresceu 10.1% relativamente ao ano transacto, tendo atingido o montante de 85,172 milhares de Euros”.
Na página 4 do mesmo documento, ponto 2 – “Actividade da T…” ponto 2.2 “Mercado”, ponto 2.2.1 “Cigarros” lê-se depois do quadro intitulado Vendas Totais com referências à unidade em milhões de cigarros relativas aos anos 2002 a 2006, e da menção de obtenção duma “quota de mercado de 79,6%” (Continente e Regiões Autónomas) “registando vendas num total de 12.196 milhões de cigarros”, a seguinte afirmação: “Verificou-se assim uma quebra no volume de vendas num total de 1,838 milhões de cigarros (13.1%) e de 4.6 pontos percentuais na quota de mercado face ao ano anterior” (ou seja, 2005).
Resulta assim claro um aumento do volume de negócios deduzido das margens de comercialização, que aumenta face a 2005, concatenado com uma diminuição das vendas de cigarros, que resultou num aumento de 11.6% dos resultados operacionais. Estamos aqui no domínio da operação comercial em que vendendo-se menos cigarros, aos grossistas que os compram, todavia se ganha mais. Revela-se assim útil à explicação das consequências da introdução do factor de correcção o aditamento do pretendido. Assim, adita-se aos factos provados que:
- No Relatório e Contas do ano de 2006, a T… registou um crescimento dos seus resultados operacionais, relativamente a 2005, de 11.6%, para 116,796 milhares de euros e um crescimento dos resultados líquidos de 10.1%, para 85,172 milhares de euros, apesar de uma quebra no volume de vendas de 13.1%.
Prosseguindo, dir-se-á ainda que procedemos à leitura integral do relatório pericial e dos esclarecimentos, por duas vezes, antes e depois da audição da audiência de julgamento.
Pretendem as apelantes que se dê como provado, complementarmente, que “As alterações das condições gerais de fornecimento introduzidas pelas Rés aos Autores em 2006 tiveram como consequência uma transferência de 3,11 pontos percentuais em benefício das Rés e em prejuízo dos Autores, no valor de 8.807.527 Euros.”, invocando a “Análise e comentários do Sr. Perito indicado pelos AA. a fls. 5505 e 5531” e pretendem ainda que se dê como provado que “A redução das margens dos AA. operado pelo fator de correção incidiu não só sobre a parcela do PVP que aumentou por força de aumento dos impostos, como também na parcela remanescente (derivada de decisão comercial da T...), permitindo às RR. apropriarem-se de aproximadamente 90% dos aumentos realizados extra impostos, quando, sem fator de correção teriam que partilhar esses aumentos com os AA. na proporção de 39% (AA) (61% RR)”, invocando neste caso “toda a prova acima indicada, em especial o depoimento do Prof. JA e análise aos “esclarecimentos” do Sr. Perito indicado pelas RR”.
Já vimos que houve redução, no sentido dado como provado pelo tribunal, que é adiantado pelos peritos: margem como percentagem do PVP que aplicada ao PVP origina o preço a pagar pelo grossista, que foi reduzida, com o resultado depois identificado para cada AA. das consequências – isto é, do pagamento adicional – que tiveram de fazer nas facturas correspondentes às compras no período 2006-2009 (factor de correcção).
A metodologia usada pelo colégio de peritos foi a da divisão do PVP por três: Estado, T… e Grossistas – “Para cada produto (…), calculámos a repartição entre VALOR GROSSISTAS, VALOR T… E VALOR ESTADO (…)” (fls. 5500 – resposta ao quesito 107 da base instrutória). Tal divisão foi feita desde logo em termos percentuais, obviamente trabalhando os peritos sobre as 58.593 facturas que analisaram e as tabelas de condições gerais aplicáveis, e portanto a partir de valores nominais. Até 2005 as percentagens eram x, y e z, para simplificar, e por via do aumento excepcional de impostos a partir de 2006, a percentagem de x (Estado) aumentou bastante (em concreto “de 77,03% do PVP de 2005 para 77,45% do PVP de 2006, 78,48% do PVP de 2007, 79,28% do PVP de 2008 (…)”), com a consequência necessária da redução das percentagens dos demais visados, isto é, da T… (de 14,38% do PVP de 2005 para 14,64% do PVP de 2006 (…)”) e dos grossistas (de 8,59% do PVP de 2005 para 7,91% do PVP de 2006 (…)”). Não estamos a transcrever todos os números constantes da resposta ao quesito 107 da base instrutória, a fls. 5501 do relatório pericial, porque sem interesse concreto para a demonstração a fazer.
Pelo aumento da fatia de participação do Estado, nos termos que analisaram, (Em termos globais, o Valor do Estado passa de 77,03% do PVP de 2005 para 78,62% do PVP do período compreendido entre 2006 e 2010, ou seja ou peso percentual aumenta cerca de 1,6 pontos percentuais, a que corresponde um ganho de cerca de 20.659.910 euros – fls 5502) os peritos concluíram então, quanto aos demais intervenientes, que “no período em análise, verificou-se uma redução quer da margem das Autoras, quer da margem das Rés (…)”, o que vem a ser melhor explicado na resposta ao quesito 215 sobre a apropriação das Rés das quantias apuradas relativamente a cada Autora e Autor, tendo os peritos considerado apropriado referir que essas quantias foram pagas pelas AA às Rés e que as Rés entregaram ao Estado as quantias recebidas das AA., acrescidas de um adicional que resulta na redução da margem da T…, podendo então afirmar que “Em termos globais o Valor dos Grossistas passa de 8,59% do PVP de 2005 para 7,33% do PVP do período compreendido entre 2006 e 2010, ou seja o peso percentual diminui cerca de 1,3 pontos percentuais, a que corresponde uma perda de cerca de 16.170.565 Euros”, e que a perda percentual da T… foi de 0,3 pontos percentuais correspondentes a uma perda de cerca de 3.948.345 Euros – cf. fls 5530 dos autos.
Resumindo, o Estado aumentou a sua participação percentual no PVP em 1,6 e as percentagens da T… e Grossistas reflectem esse aumento pela correspondente redução de 1,6, sendo 1,3 para grossistas e 0,3 para a T…. Em suma, ganhou o Estado e perderam as aqui partes, as AA. 16.710.565 Euros e as RR. 3.948.345 Euros, e daqui os peritos não saem mesmo nas respostas aos esclarecimentos – resposta ao esclarecimento B pedido pelas AA, a fls. 6280 dos autos.
Somos tentados a uma observação e a uma pergunta: - com o devido respeito pelas orientações técnicas que ditaram a metodologia dos senhores peritos, quando o colégio responde afirmativamente à redução da margem dos grossistas – quesito 106º (A introdução do factor de correcção implicou a redução da margem dos grossistas sobre as vendas dos produtos da T…) – parece estranho que a análise subsequente da redução ter sido feita para aumentar (correspondentemente) significativamente a margem das Rés e os seus lucros (quesito 107º), prescinda dessa redução para chegar a conclusão que tanto as Rés como as AA. perderam a favor do Estado, não se pronunciando sobre a quantificação da redução afirmada na resposta ao quesito 106º na relação entre as partes e no seu desdobramento na contribuição de cada uma para o Estado, ou seja, perceber que medida de contribuição teria sido essa se não tivesse havido a redução afirmada no quesito 106º.
E a pergunta é: - numa acção em que se discute em primeiro lugar a possibilidade jurídica duma imposição unilateral de redução de margem ou aumento de preço como se queira chamar, feita pelas RR às AA., e se discute depois qual a consequência prática da efectivação dessas medidas, o que nos interessa aqui saber que foi o Estado que ganhou, quando ele não está nesta acção? Sobretudo quando, e agora já nesta fase de recurso, estão definitivamente fixados os valores apurados quanto a cada uma das Autoras e Autores? Interessa pouco para saber concretamente o que se passou em termos de alterações das condições comerciais praticadas entre as partes.
É neste sentido que se afigura perfeitamente aceitável a metodologia alternativa do perito das AA., que parte não da divisão do PVP por 3, mas da divisão da residual do PVP após pagamento da parte do Estado, por este valor representar efectivamente aquele que é repartível entre a indústria e o comércio, em qualquer caso, quaisquer que fossem os aumentos de impostos, que sempre teriam de ser pagos como condição de licitude e admissibilidade do próprio negócio em si. Analisando o rendimento disponível para o sector, a divisão é feita entre T… e grossistas, únicos clientes a quem ela vende. E aqui podemos ver – independentemente da bondade jurídica, dos direitos ou das injustiças – como é que se compara 2005 com os anos seguintes e se percebe a alteração de condições de repartição entre dois sectores fundamentais para a perfeição do negócio.
Não há nenhuma contradição entre a perspectiva do colégio de peritos e a perspectiva do perito indicado pelas AA, porque os pontos de partida metodológicos são diferentes. De resto, isto mesmo resulta da resposta afirmativa do colégio ao esclarecimento pedido à resposta ao quesito 215, a fls. 6283, quando perguntando-se se os grossistas, tendo contribuído para o ganho do Estado em cerca de vinte milhões de euros, com dezasseis deles, isso permitiu às RR contribuírem apenas com quase milhões, o que teria o sentido de que quanto mais uma das partes contribuísse a outra menos contribuiria.
Por outro lado, também volta a não haver qualquer contradição entre as perspectivas adicionais do perito indicado pelas AA. e do perito indicado pelas RR., porque este último parte da exclusão da variação de impostos (literalmente, do “aumento de impostos” – cf. fls. 5505) e seguidamente prossegue para a divisão do sobrante por 3, ou seja, pontos de partida metodológicos diversos e que assim nunca podem confrontar-se.
Dizer, em todo o caso, e com o devido respeito, que se bem interpretamos, o ponto de partida do perito indicado pelas RR. acaba a desconsiderar, na parte de aumento de impostos que exclui, a participação dos grossistas em termos percentuais sobre a totalidade do PVP, que é a situação que ocorria até 2005. A sua análise parte, com o devido respeito, do princípio que os grossistas não deveriam ter aumentos por mero arrasto do aumento do Estado, para chegar à conclusão que “Assim, as RR não reduziram a margem dos grossistas de forma a aumentar a margem e os lucros daquelas, uma vez que, não considerando o aumento dos impostos, a margem média de todos os autores e produtos, com base nas condições comerciais individuais, para qualquer dos períodos após 2005 são sempre superiores à verificada em 2005 (…)” – fls. 5506 dos autos (sublinhado nosso). Não parece inteiramente convincente que incidindo até 2005 a margem dos grossistas sobre a totalidade do PVP nele incluído a parte que servia a pagar impostos, e portanto também os aumentos desses impostos, e fixando-se a parte da T… por exclusão, possamos usar um termo diferente para comparar a situação das margens entre 2005 e 2006 (e seguintes).
Repare-se ainda que o perito indicado pelas AA. parte de premissas que foram amplamente corroboradas em audiência: - diz ele, no comentário adicional de fls. 5502 que tem por base “a forma de construção dos preços de venda do tabaco – processo de autorização administrativa – e do facto dos impostos neles contidos serem algo que é pago assim que o tabaco passa a estar disponível para entrada no sector” e “o aumento dos PVP’s é sempre superior ao aumento dos impostos”. É o que tem toda a lógica e pertinência, e foi, quanto ao segundo ponto, claramente assumido por MM já na recta final da sua contra-instância. Por ele também é assumido coisa clarividente, a saber, quem paga os impostos é o consumidor final. O único jogo de política comercial é saber até que ponto se pode esticar a contribuição do consumidor final antes dele fugir para a concorrência mais barata ou para a contrafacção e contrabando. É claro que esse ponto não era entendido como ultrapassável, nem pela T… nem de resto pelo Estado (cuja percentagem de aumento acaba a reduzir para o fim do período em causa) mas é também claro que a T… nunca entendeu que se aproximava perigosamente dele, pois, MM, os aumentos foram sempre acima do necessário para suprir o aumento de impostos.
Vem isto ainda a dizer duma acrescida pertinência dos comentários adicionais do perito das AA., porquanto é bem certo que é o consumidor final que paga, integralmente, os impostos, sob pena, aliás, do negócio tender a não fazer sentido nem ter qualquer utilidade lucrativa para nenhum dos envolvidos, e por isso ainda mais se justifica afastar o Estado da análise. Do que se trata afinal é de perceber a divisão do rendimento libertado para o sector após impostos.
O perito indicado pelas AA. chegou, a partir do quadro que elaborou, à conclusão de que “O Valor da T… para Produtos Cigarros, passa de 62,61% do PVP disponível para o sector de 2005 para 64,91% em 2006, 65,28% em 2007, 65,90% em 2008, 66,24% no 1º semestre de 2009 e 66,33% no período compreendido entre o 2º semestre de 2009 e 2010”. Em termos globais, o mesmo valor passa de 61,62% em 2005 para 65,72% no período compreendido entre 2006 e 2010 “ou seja, o peso percentual” (na divisão por 2 dizemos nós) “aumentou cerca de 3,11 pontos percentuais que correspondem a um ganho de cerca de 8.807.527 Euros”. Este mesmo percentual e valor foi correspondentemente perdido pelas AA., a partir da passagem de 37,39% do PVP disponível para o sector em 2005 para, em termos globais, 34,28% - cf. fls. 5505). Mais referiu, a fls. 5531, em resposta ao quesito 215 sobre a apropriação pelas RR. dos valores apurados quanto a cada AA., que segundo a sua metodologia se podia concluir que “por consequência directa das alterações das condições gerais de fornecimento de 2005, para os Produtos Cigarros, se registou uma efectiva transferência de valor no montante de 8.807.527 dos Grossistas (Autores) para as Rés, no período de 2006 a 2010, tendo por base o valor efectivamente disponível para o sector (PVP deduzido dos impostos)”. Em suma, a divisão do rendimento disponível entre T… e grossistas alterou-se e o que produziu essa alteração foi o factor de correcção.
Também nisto foi claro AB, relatando que, sendo ao tempo funcionário da T… e vestindo inteiramente a camisola, por assim dizer, a necessidade de abaixamento da margem dos grossistas que a T… sentia foi estudada com grande complexidade por modo a encontrar a melhor fórmula, sendo aliás que a que AB.. havia gizado – que se limitava a reduzir sem esclarecer – não passou muito para lá do papel. Diga-se aliás que isto é perfeitamente compreensível: não é particularmente avisado em termos de relações comerciais com clientes de há longa data, reduzir sem esclarecer, nem reduzir abertamente, em exercício puro do poder de mercado que AB.. adiantou para não haver réplica possível. Mais avisado é reduzir avisando de uma razão objectiva e pacífica, independentemente da operação da fórmula poder não ser inteiramente coerente. É que, não negando, se formos pela conclusão colegial, as quantias descontadas a título de factor de correcção foram entregues ao Estado, mas isso não obsta a que a medida de contribuição da T… e dos grossistas para esse pagamento se tenha alterado, do momento anterior em que os grossistas, não incumbidos de pagarem eles mesmos os impostos, obtinham os seus preços de compra por simples aplicação percentual ao PVP total.
Uma boa maneira de confirmar que alguma alteração efectivamente ocorreu na repartição do rendimento disponível para o sector é justamente a de que, apesar da redução do consumo, apesar do aumento de impostos que reduziu percentualmente o rendimento disponível, a T…, nominalmente, teve melhores resultados operacionais em 2006 que em 2005. Se fossem imputáveis exclusivamente ao aumento nominal dos preços, não só se demonstraria mais uma vez que o aumento de PVP permite compensar aumentos de impostos e ainda obter um rendimento extra para o sector, como se teria então de ver o rendimento dos grossistas aumentar nominalmente na percentagem de aumento anterior, o que, sendo que aumentou, não é verdade que tivesse aumentado na mesma percentagem que anteriormente, justamente por aplicação do factor de correcção e da provada redução da sua margem, isto é, aumento do preço pelo qual compraram acrescendo ao aumento de preço que resultaria nominalmente do aumento do PVP.
Revolteando em números e percentagens, é claro que podemos analisar a repartição do rendimento disponível para o sector em nova percentagem, mesmo a partir da divisão do PVP por 3 como o faz o colégio dos peritos. Se somarmos, dessa divisão por três, as percentagens das RR. e das AA. em 2005, teríamos um total de 22,97% do PVP, que levado a uma nova totalidade de 100% (rendimento disponível) e revisitado o nominal correspondente à totalidade, permitiria então dizer que a T… tinha 62,61% e as AA. 37,39% - cf. esclarecimentos, resposta adicional do perito indicado pelas AA., a fls. 6281.
O oferecimento duma perícia num processo não exclui, muito ao contrário do que disse a Mmª Juiz, a relevância de depoimentos testemunhais que possam incidir sobre a mesma factualidade e concretamente sobre os termos de análise da mesma. Podem de tais depoimentos retirar-se conhecimentos valiosos justamente para questionar a própria fundamentação de base dos peritos, a sua razão técnica, já que a perícia, mesmo a mais complexa, independentemente de segunda perícia, está sujeita à livre apreciação do tribunal – artigo 489º do CPC. A perícia não é em si mesma uma prova definitiva, nem as previsões de esclarecimento e segunda perícia a completam, tornando-a imune a qualquer reparo. Para exercer essa livre apreciação, o tribunal tem naturalmente de fundamentar-se, tanto mais quanto mais complexa for, e para essa fundamentação, para se munir de critérios de apreciação da própria perícia, é relevante a ponderação de outros meios de prova.
Foram produzidos dois depoimentos testemunhais – Prof. A.. e PC – de técnicos a quem foi pedida análise similar à que foi pedida aos peritos. O que deles resulta é – e de resto o colégio de peritos também não o põe em causa – a possibilidade metodológica da análise da divisão do rendimento disponível para o sector, já livre de impostos, a que procedeu o perito indicado pelas AA. Nas análises feitas pelas testemunhas apreciou-se justamente, ainda que por amostragem, relativamente a marcas de cigarros relevantes, a evolução da repartição do rendimento disponível extra impostos entre as partes, com referência a valores de preços por maço de tabaco. Em PC encontramos justamente duas referências à alteração da repartição do rendimento disponível de modo a que as percentagens imediatamente anteriores à introdução do factor de correcção não se mantiveram, pelo contrário, dos cêntimos sobrantes para o sector, a indústria passou a beneficiar de 86% e o sector grossistas de 14%.
Outra maneira de chegar à transferência do sector grossista para a indústria obtém-se a partir das afirmações do colégio que reportam, em termos globais, uma perda dos grossistas em 1.3 pontos percentuais e da T… em 0.3 pontos percentuais, no valor de 16.170.565 Euros para os primeiros e 3.948.345 Euros para a segunda, e perceber se, caso não tivesse sido introduzido o factor de correcção e se tivesse mantido a margem dos grossistas, qual teria sido a sua contribuição para o suprimento do incremento de vinte milhões para o Estado.
Neste sentido a resposta afirmativa do perito indicado pelas AA. ao esclarecimento por estas pedido sob F (fls. 6282) – “De acordo com os dados e números fornecidos pelo relatório, é possível concluir-se que, ao contribuírem para o ganho do Estado com a perda de 16.710.585€ referida em 2., da pág. 5, os grossistas perderam mais 8.968.195,55 € do que o que perderiam caso participassem proporcionalmente com a sua quota-parte de 7.724.366,45 € (correspondente a 37,39% da soma do Valor da T… com o Valor dos Grossistas em 2005)?” e bem assim a resposta, também afirmativa, ao esclarecimento G, sobre a correspondente não perda do mesmo valor de 8.968.195,55 € por parte das RR. Note-se aliás que não faz nenhum sentido a resposta que deram os demais peritos: “não se podem pronunciar sobre os valores apresentados, uma vez que os mesmos estão relacionados com comentário adicional feito pelo perito indicado pelas Autoras, no Relatório de Perícia”. Tendo o relatório sido assinado por todos, não se acredita que os demais peritos não tenham lido os comentários adicionais e que lhes fosse impossível ajudaram no esclarecimento, quer para o confirmar quer para o negar. Porque, em bom rigor, não estamos de facto em presença de nenhuma pronúncia contraditória entre o colégio pericial e os comentários adicionais dos peritos indicados pelas AA. e pelas RR.
Entende-se portanto que nem o relatório colegial dá um resultado unânime nem deixam de haver boas razões para considerar menos valiosa a sua metodologia e mais pertinente a metodologia indicada pelo perito oferecido pelas AA. E nada havendo a censurar aos números e às conclusões, e de resto relembrando que todo este assunto não mereceu das recorridas uma linha que fosse, boas razões há para aplicar os ensinamentos do referido perito, de resto coerentes com os depoimentos testemunhais já referidos. Adita-se assim aos factos provados que:
- As alterações das condições gerais de fornecimento introduzidas pelas Rés aos Autores em 2006 tiveram como consequência uma transferência de 3,11 pontos percentuais em benefício das Rés e em prejuízo dos Autores, no valor de 8.807.527 Euros;
- A redução das margens dos AA. operada pelo factor de correção incidiu não só sobre a parcela do PVP que aumentou por força de aumento dos impostos, como também na parcela remanescente (derivada de decisão comercial da T…), permitindo às RR. auferirem cerca de 85% dos aumentos realizados extra impostos, quando, sem factor de correcção a partilha desses aumentos com as AA. seria na proporção de 39% para as AA e 61% para as RR.
Passando então ao facto não provado 32, estabelecido que houve realmente uma redução da margem dos grossistas e correspondente aumento de margem das RR., quer o incremento patrimonial se situe ao nível do rendimento disponível para o sector ou ao nível da diminuição de encargo no pagamento ao Estado, posto que já decidimos que “aumentar significativamente” não tem lugar na decisão da matéria de facto, sendo outrossim elucidado a partir dos factos complementares que já aditámos, posto que, embora lucro se não confunda com resultado operacional líquido mas seguramente também se forme a partir deste, resta-nos então saber se a criação do factor de correcção foi deliberada no sentido de produzir o resultado referido no facto não provado 32 e nos factos a ele complementares. Neste conspecto, não só as testemunhas que desempenharam cargos elevados nas Rés nos dão conta da afiliação à política comercial talvez do maior grupo internacional de tabaco, sugerindo portanto que nada é feito ao acaso e pelo contrário são feitos aturados estudos sobre as mais diversas matérias, como AB foi impressivo nessa afirmação, relacionando a concepção do factor de correcção à atribuição de um prémio internacional importante do grupo. Sabemos por outro lado que na revisão das tabelas de condições participavam técnicos da área comercial, financeira e jurídica, e sabemos que o anunciado aumento de impostos do PEC 2005 suscitou a necessidade de revisão das tabelas. Sabemos finalmente que são os próprios peritos a afirmar a complexidade da fórmula do factor de correcção, complexidade que está no reverso duma explicação dos concretos efeitos do factor de correcção aos grossistas. Tudo temos pois para concluir com alta probabilidade, que o factor de correcção foi pensado, desenhado e implementado para possibilitar as consequências que teve para os grossistas. Assim, elimina-se o facto não provado 32 e adita-se aos factos provados que: - As RR. reduziram a margem dos grossistas como referido no ponto 107 da matéria de facto provada de forma a aumentar a margem e os lucros daquelas.
- Quanto ao facto não provado 33 - “A A. … D recusou a alteração prevista nas CGF de 2009 em matéria de forma de pagamento das faturas” sustentam as apelantes que deve ser dado como provado com base nas declarações de parte de JO alinhando que, não existindo prova em contrário, se deve atender à manifesta credibilidade do declarante.
Já o tribunal considerou que havendo documentos – cartas – relativas às recusas/reclamações apresentadas por outras AA., aqui falhava documento semelhante.
Sobre o assunto da obrigação de pagamento por um único meio, o declarante, perguntado se a …D recusou, afirmou que não achavam legítima a imposição, e que “Manifestámos, por escrito, julgo eu, até, mas, à semelhança de sempre, como era a T a exigir, tivemos que encontrar uma solução para o problema, com custos para nós, sempre, porque nesta actividade a disponibilidade num banco vai ter custos para nós, ou seja, se aquele valor está em contabilístico mas não está em disponível, tem custos e obriga-nos a ter contas caucionadas (…)”.
Voltamos à desconfiança relativamente às declarações de parte e à exigência da sua comprovação por outro meio de prova. Porém, esta exigência não é correcta nem sempre justificada. Não há nos autos documento de recusa/reclamação da …D e o declarante julga, acredita, que até foi escrito que foi manifestada a oposição. Se este credo não for correcto, isso não abala a afirmação de que manifestou oposição. Não deveríamos acreditar no declarante se ao longo de toda a sua declaração tivesse dado mostras de leviandade ou desconhecimento, o que não foi o caso, nem se aquilo que afirma fosse altamente improvável. Porém, sabemos, está provado, que outros grossistas se opuseram, e até ficámos a saber que foi apresentada uma queixa na Autoridade da Concorrência a propósito desta imposição de um único meio de pagamento. Sabemos também, e até foi dado como provado, que a imposição do meio de pagamento único acarretou dificuldades/custos aos grossistas. Donde, não se afigura nada desrazoável acreditar que tenham, que tenha a …D também, manifestado à 2ª Ré a sua oposição. Elimina-se pois o facto não provado nº 33 e adita-se aos factos provados que:
- A A. … D recusou a alteração prevista nas CGF de 2009 em matéria de forma de pagamento das faturas. - Quanto ao facto não provado 34 – “A redução da margem dos grossistas não implicou qualquer redução do peso do volume de venda dos produtos da T… no volume de vendas dos grossistas”, sustentam as apelantes que deve ser dado como provado que “Apesar da redução da margem dos grossistas, o peso dos produtos da T… continuou a ser preponderante no volume de vendas dos AA.”, firmando-se nos factos provados 50, 215 a 227, no depoimento de JPG, e no Relatório Pericial (pág. 39) e ainda nos seus esclarecimentos.
O tribunal produziu a sua resposta fundando-se apenas no relatório pericial e seus esclarecimentos, respectivamente a fls. 5497 a 5546, e a fls. 6279 a 6291, onde o colégio afirmou apenas ter dados para 3 AA. ao longo do período 2005-2010 e onde se aventou que várias razões poderiam explicar a redução, desde logo porque nem todas as AA. se dedicavam em exclusividade à distribuição de tabaco, podendo por ter reduzido as compras de tabaco e terem aumentado a distribuição de outros produtos.
A versão proposta resolve essa dificuldade, apelando a uma generalização probabilística directamente reportada ao percentual de compras às RR. para distribuição, qualquer que fosse.
Sumariando, se está dado como provado que a marca M…, que juntamente com S… é das mais vendidas, pertence, digamos, à T…, não podendo ser adquirida a outrem – e no ponto seguinte afastar-se-á uma possibilidade contrária – se está provado, pela dependência do fumador em relação às marcas e pelas quotas de mercado, a preponderância dos produtos da T… no negócio das AA. (pelo menos está assim provado quanto a uma delas e no comentário adicional do perito das AA. estendendo-se a todas) e justamente quando está provado que as AA. não têm maneira de substituir os produtos T… por outros, em caso de recusa de fornecimento – facto provado 227, parece então que, apesar da introdução do factor de correcção e das suas consequências e da não aceitação que as AA. demonstraram à sua introdução, não tiveram alternativa para deixar de encomendar, o que foi dito claramente pela testemunha JPG relativamente ao A. CF.
O que é que há a opor a este raciocínio? Que as AA. podiam ter optado por só comprar à concorrência, aceitando reduzir o seu volume de transacções para as quotas de mercado da concorrência nos anos em questão, o que seria insustentável sem a correspondente redução percentual de custos operacionais. Em suma, que as AA., para serem coerentes, teriam de ter emagrecido. O propósito de estar na actividade económica é justamente o contrário, qualquer que seja a dieta que o mercado venha a exigir. De resto, como as AA. continuaram – isto é, não se concentraram nem desapareceram do mercado por via da introdução do factor de correcção – para terem continuado hão-de ter continuado a comprar produtos da T… aproximadamente nos mesmos volumes em que o faziam anteriormente. De resto também, são os factos relativos às consequências do factor de correcção para cada uma das AA. e dos AA. que demonstram que não deixaram de comprar, isto é, que não substituíram totalmente a sua actividade grossista com outros produtos que não o tabaco.
Em suma, nada há, no plano dos factos que aconteceram, a sustentar a bondade duma resposta negativa. Assim, elimina-se o facto não provado 34 e adita-se aos factos provados que:
- Apesar da redução da margem dos grossistas, o peso dos produtos da T… continuou a ser preponderante no volume de vendas dos AA. - Quanto ao facto não provado 35 - “Se um grossista vender produtos da T… a outro grossista passa a ser considerado um distribuidor passivo, o que implica a redução da sua margem” pretendem as apelantes que seja dado como provado que “De acordo com as CGF de 2002 se um grossista vender produtos da T… a outros grossistas que representem, na sua faturação, pelo menos, 50% desse valor, passa a ser considerado um distribuidor passivo o que implica a redução da sua margem”, o que fazem com base na cláusula 2.2.2.1. “Distribuição Directa Activa”, CGF 2002 e no facto provado 9.
Mais pretendem que deve “ainda ser dado como provado ou, pelo menos, considerado, que”: - “O fornecimento da informação de vendas era condição de atribuição do desconto de distribuição direta e ativa, no máximo de 1,40%, sem o qual, os AA. não teriam condições para continuar no mercado, pelo que a entrega destas informações era, na realidade, imposta – cf. CGF de 2002, a fls. fls. 226 a 252 (Cláusula 2.2.2.4) e anexo de fls. 249 (Facto Provado 9), do Estudo de fls. 6464 e segs., documentos de fls. 7344 e de fls. 7284, e depoimento de AB”;
- “A T… comunicava expressamente aos AA. de que a falta de fornecimento da informação de vendas implicava não receber o desconto de distribuição direta e ativa – cf. fls. 7284”;
- “Através da informação de vendas prevista nas CG de 2002 até 2008, a T… tinha acesso aos dados das vendas dos AA., incluindo aos NIFs dos seus retalhistas e ao volume global das vendas de marcas da concorrência.” - cf. prova acima indicada”;
- “Tendo o desconto comercial fixo sido reduzido em 2002, momento em que foram introduzidos vários descontos condicionais, resulta que os grossistas são induzidos à realização dos comportamentos que lhes permitam a manutenção da margem anteriormente obtida; deste modo, os grossistas são 'obrigados' ao fornecimento da informação para efeito de desconto de informação de vendas, sob pena de perda de uma parte substancial do desconto” – cf. Estudo de fls. 6464”;
- “A T… realizava auditorias à informação de vendas entregue pelos AA.” – cf. fls. 7344 e 7344v”.
Já para o tribunal recorrido “O ponto 35 da matéria de facto não provada encontra a sua explicação no depoimento de parte de PENS. Para este, importante é respeitar o número mínimo de pontos de venda ao público. Acresce dizer que a testemunha HMLPB afirmou que a A. R… esteve 6 meses a ser fornecida de produtos da T… por grossistas”.
Ora, a primeira nota é que o depoimento de parte não serve para dar como provados factos favoráveis à parte que depõe e que não resulta alguém afirmar ter sido fornecido implique qualquer espécie de afirmação ou conhecimento sobre o que é que aconteceu a quem forneceu, nem se o fornecimento a esse alguém representava ou não 50% do valor de facturação total de quem fornecia.
A segunda é que parece que o facto – bem como outros que se pretendem aditar – já resulta provado da reprodução do facto provado 9 relativo às Condições Gerais de 2002.
Com efeito, no facto provado 9 estão reproduzidas as Condições Gerais “que estabeleciam a sua entrada em vigor no dia 1 de agosto de 2002, na parte em que alteram as condições referidas em 8” verificando-se no capítulo I a menção à necessidade de que o cliente grossista “a) Compre Produtos por grosso, a título habitual e profissional, em seu próprio nome e por sua conta e risco e que os revenda a utilizadores profissionais (retalhistas) que, por sua vez, os revendam directamente ao consumidor, em qualquer caso, sempre com impostos especiais de consumo pagos e somente no território de Portugal continental;” e a que “d) Distribua directamente os Produtos aos seus respectivos clientes retalhistas”. Mais concretizadamente, encontra-se “Considera-se existir distribuição directa quando o Cliente Grossista cumulativamente: i) receba e prepare as encomendas para os seus respectivos clientes retalhistas; ii) … iii) facture em seu nome aos seus clientes retalhistas; e) Abasteça regular e continuamente os seus respectivos clientes retalhistas e zele pela inexistência, nos estabelecimentos comerciais dos clientes retalhistas (…)”.
No capítulo II e sobre a matéria dos descontos, lê-se:
“2.2.2. Descontos Variáveis Os descontos comerciais variáveis serão descontos a praticar pela T… sobre o preço de venda ao público dos Produtos, em função dos factores – distribuição directa activa, escalões de volume, carteira de produtos e informações - e de acordo com as seguintes condições. 2.2.2.1. Distribuição Directa Activa Considera-se distribuição directa e activa aquela que, para além do anteriormente definido no Capítulo I, implica, por parte do Cliente Grossista, a disponibilidade e utilização de meios humanos e transportes próprios ou subcontratados adequados para a distribuição dos Produtos encomendados através da pré-venda ou autovenda aos seus clientes retalhistas (com venda ao balcão ou através de máquinas automáticas), que por sua vez, revendam os Produtos directamente ao consumidor. A distribuição directa e activa implica a facturação directa do Cliente Grossista, ou de empresas por si participadas em mais de 50%, ao seu cliente retalhista. Ao Cliente Grossista que pratique uma distribuição directa e activa será atribuído um desconto comercial sobre o preço de venda ao público dos Produtos, adicional ao desconto fixo, que varia de acordo com a percentagem de distribuição directa e activa que o mesmo pratica relativamente aos seus clientes, conforme se ilustra no Anexo VI(B). Para efeitos de determinação do desconto comercial a efectuar relativamente à distribuição directa e activa, no final de cada trimestre civil, a T… fará uma análise da informação enviada por cada Cliente Grossista de acordo com o previsto no ponto 2.2.2.4 relativamente aos respectivos clientes retalhistas que são fornecidos directa e activamente pelo Cliente Grossista em análise, aplicando a percentagem de desconto correspondente (Anexo VI-B), durante o trimestre seguinte. A T… poderá efectuar auditorias ao Cliente Grossista, através dos seus representantes ou de empresas contratadas pela T… devidamente credenciadas, e sempre na presença do Cliente Grossista, dentro do horário normal de funcionamento do estabelecimento do Cliente Grossista e mediante aviso prévio, para efeitos de comprovar a prática da distribuição directa e activa. (…) 2.2.2.4. Informações de Vendas Cada Cliente Grossista poderá enviar, trimestralmente, informações de vendas, à T… sobre, por um lado, as vendas que o Cliente Grossista efectue de Produtos da T… e, por outro lado, as vendas totais de cigarros efectuadas pelo Cliente Grossista. O Cliente Grossista não deverá enviar de modo discriminado, à T… as vendas que efectuar de cigarros que não sejam comercializados pela T…, mas apenas as vendas totais efectuadas pelo Cliente Grossista. Essas informações de vendas servirão, também para comprovar a prática de distribuição directa e activa do Cliente Grossista (…)”. (sublinhados e negritos nossos).
Portanto, é claro que a fórmula específica do facto não provado 35, não resultava que uma qualquer venda por um grossista que praticasse distribuição directa e activa, a outro, implicasse a perda do desconto de distribuição directa e activa.
Na fórmula agora proposta, ela reproduz de facto o que resulta das Condições Gerais correspondentes, e por isso a sua necessidade de consagração só tem pertinência para uma exclusão da dúvida de aplicação das Condições Gerais, que é aliás a que é suscitada pelo depoimento de parte prestado por PS.
Sendo verdade, coerentemente com a posição assumida pelas Rés da necessidade de preenchimento dos requisitos para se ser cliente, que haveria texto ao qual elas se poderiam arrimar para aplicar a consequência de redução de desconto a distribuidor directo e activo que passasse a vender a grossistas, não temos memória – e por isso possivelmente também não vem invocado pelas apelantes qualquer depoimento – que alguém tenha reportado algum caso concreto em que isso tenha acontecido. O depoimento de AB não menciona concretamente nenhum caso.
Foi muito frequente a afirmação da perda do desconto nesse caso. Foi até aventada uma lógica que terá estado na base deste desconto de distribuição directa e activa, outra a partição do desconto anterior fixo e a possibilidade de alguns grossistas não conseguirem cumprir todos os critérios dos descontos parcelares variáveis, a saber a tentativa de profissionalização, dizemos nós, que passava pelo afastamento dos sub-agentes (AB para as duas lógicas). Cremos que o que esteve na mente de quem depôs foi sempre o pairar das Condições Gerais, como texto definidor, sobre os comportamentos a adoptar, uma espécie de consciência da licitude, ao que se tem de somar o mecanismo de fiscalização instituído (as modalidades de comprovação da prática de distribuição directa e activa que sublinhámos), que não torna o texto (A distribuição directa e activa implica a facturação directa do Cliente Grossista, ou de empresas por si participadas em mais de 50%, ao seu cliente retalhista) uma declaração de princípio, mas um comando impositivo altamente provável. Em suma, uma não “letra morta” das Condições Gerais, sem embargo da possibilidade de diálogo prévio à imposição duma consequência.
Entendemos assim que tem ainda utilidade levá-lo aos factos provados, ainda que a menção redução da sua margem possa mais concretizadamente ser referida como perda do desconto de distribuição directa e activa. Assim, elimina-se o facto não provado 35 e adita-se à matéria de facto provada que:
- De acordo com as CGF de 2002 se um grossista vender produtos da T… a outros grossistas que representem, na sua facturação, pelo menos, 50% desse valor, passa a ser considerado um distribuidor passivo o que implica a perda do desconto de distribuição directa e activa.
Quanto ao demais:
Sobre o valor máximo do desconto de distribuição directa e activa previsto no anexo às Condições Gerais de 2002, não é ele indiferente à causa, quando, por tradição estatal as margens de retalhistas, face do negócio ao público, de longe vinham fixadas e não dispensaria afinada e prudente negociação a sua redução, quando a subtracção da margem dos retalhistas à dos grossistas implicava uns 2% remanescentes de margem bruta, quando estamos a falar dum desconto que podia atingir 1,40% - é o que resulta do documento de fls. 249, no caso do grossista ter 100% de distribuição directa e activa a clientes retalhistas.
Dizer depois que em face destas contas as AA. não poderiam sobreviver no mercado sem esse desconto e que por isso estavam obrigadas a fornecer a informação, que nas Condições Gerais aparece como facultativa – e associada a um desconto específico que remunera o custo de processamento (pelo grossistas, desonerando esse custo para a T…) da informação segundo o modelo ou formulário a fornecer – é concluir quase a partir duma evidência, que as Rés negam reportando-se ao livre funcionamento do mercado e à possibilidade de obtenção de ganhos de quantidade e à diminuição de custos operacionais enquanto modalidades de fuga por parte dos grossistas. Existe também uma dúvida, a partir das duas possibilidades de confirmação da informação – informação prestada pelos grossistas e auditorias da T… – que pode pôr em causa a afirmação do fornecimento de informação como condição de atribuição do desconto de distribuição directa e activa e levar por arrasto à não afirmação de uma imposição de prestação destas informações. O não fornecimento implicaria a perda do desconto de fornecimento mas não a do desconto de distribuição directa e activa, que poderia ser confirmado pelas auditorias. Não estamos portanto no puro domínio da conclusão, a realizar na sede de discussão jurídica.
Avançando, e por recurso à experiência normal das coisas, não se mostra economicamente eficiente que a T… deslocasse funcionários seus centrais para realizarem em centenas de lugares diferentes espalhados geograficamente pelo País demoradas auditorias para obtenção da informação de vendas dessas centenas de grossistas, em cada trimestre. E isto remete “auditoria” para o conceito duma verificação à informação prestada pelos grossistas – é o que resulta muito concretamente do documento de fls. 7344, onde se lê a realização de uma auditoria à informação de vendas prestada pelos grossistas. De resto, mesmo que, por comparação de texto, se concluísse que as auditorias previstas nas Condições Gerais (sublinhado acima) por serem a realizar nas instalações do cliente, não se confundissem com a auditoria mencionada neste documento de fls. 7344, voltaríamos a dizer que era inexequível no universo de todos os clientes grossistas e na frequência trimestral – aliás, o que consta do texto é que a T… poderá realizar auditorias, mas não que as fará necessariamente e sempre.
Podemos assim concluir com segurança razoável que a informação de vendas a prestar pelos grossistas era essencial à determinação do seu desconto de distribuição directa e activa, cujo valor para eles era essencial perceberem, e que por isso a referência à prestação facultativa contava com uma resposta que os grossistas se sentiriam obrigados a dar. Mais correcto será portanto dizer que a entrega das informações, na realidade, era obrigatória. Isto porém é conclusivo, e extrair-se-á da essencialidade da prestação de informação enquanto condição para continuar no mercado.
Claro que aqui estamos a adiantar a resposta a uma questão que acima dissemos não pacífica, que é a da essencialidade do desconto de distribuição directa e activa para a sobrevivência no mercado. É bem certo que a concorrência entre grossitas permite tentar tirar os clientes do concorrente, para o que se há-de convocar uma agressividade de meios logísticos e sobretudo de vendedores, sempre presentes, sempre visitantes (e todavia tendo o cuidado de não atrapalhar a tiragem de cafés pela senhora do café), o que é também certo que implica acrescido investimento e custo, é certo que a maneira mais simples de aumento do volume aponta a concentração de empresas, é sempre certo que se podem reduzir os custos com o pessoal e com equipamentos ou veículos, o que todavia tem o senão dum pessoal menos motivado e com menos meios de atingir os retalhistas com a agressividade necessária – e a este tipo de consideração não será alheia a própria intervenção da T... na atribuição de benefícios directamente aos vendedores dos grossistas. É ainda certo que se pode tentar repercutir a perda sobre o retalho, com o iminente risco de perda do retalho. Esta discussão situa-se nos patamares superiores e não naquilo que realmente aconteceu de acordo com as possibilidades, sendo notório que qualquer destas medidas de sobrevivência implicaria tempo e esforço de implementação, e sendo ainda notório que seria muito mais simples conseguir o mesmo resultado com a mera adjudicação dum funcionário a elaborar a resposta à informação de vendas. Repare-se outrossim que a realidade é o que é, e que veio mencionado como decisivo factor de perigo para a sobrevivência dum negócio familiar não foi o desconto de informação nem o desconto de informação directa e activa, mas o desconto por escalões. Para este terá havido a resposta de mudança para o distrito mais favorável e a resposta de início de concentração de empresas. Quando perguntamos se naquele tempo (de início de vigência de descontos variáveis subsequente a uma tradição de desconto fixo) foi essencial receber percentagens de desconto que poderiam ir até 1,40, num negócio que reservava cerca de 2% aos grossistas, a resposta é afirmativa. Adita-se portanto aos factos provados que:
- O fornecimento da informação de vendas era condição de atribuição do desconto de distribuição directa e activa, no máximo de 1,40%, sem o qual, os AA. não teriam condições para continuar no mercado.
Sobre “A T… comunicava expressamente aos AA. de que a falta de fornecimento da informação de vendas implicava não receber o desconto de distribuição direta e ativa” e invocando-se apenas o documento de fls. 7284, a verdade é que desse documento não consta essa comunicação expressa, mas apenas que “Com o final de mais um trimestre, eis chegado o momento de consolidar novamente a sua informação de de vendas que servirá de base de cálculo ao seu próximo desconto comercial (Desconto por Distribuição Directa e Activa por Informação de Vendas) (…) deverá enviar a sua informação de vendas até …”. Falta nesta comunicação portanto o resto da informação “sob pena de…”. Não há pois razão para aditar o facto.
Sobre “Através da informação de vendas prevista nas CG de 2002 até 2008, a T… tinha acesso aos dados das vendas dos AA., incluindo aos NIFs dos seus retalhistas e ao volume global das vendas de marcas da concorrência” a primeira parte é clara, resulta das Condições Gerais, e a segunda também, resulta do ponto 2.2.2.4 corpo e da alínea c) desse mesmo ponto. Portanto, já estando provado, torna-se dispensável a sua menção por aditamento.
Sobre “Tendo o desconto comercial fixo sido reduzido em 2002, momento em que foram introduzidos vários descontos condicionais, resulta que os grossistas são induzidos à realização dos comportamentos que lhes permitam a manutenção da margem anteriormente obtida; deste modo, os grossistas são 'obrigados' ao fornecimento da informação para efeito de desconto de informação de vendas, sob pena de perda de uma parte substancial do desconto”, a última parte é mais uma repetição desnecessária em face do que já aditámos, que o desconto fixo foi alterado para uma modalidade com parte de descontos condicionados resulta das Condições Gerais, e o único facto relevante é saber se por força desta alteração, os grossistas foram induzidos à realização dos comportamentos que lhes permitiriam a reconstituição do desconto fixo anterior, o que é absolutamente claro como já demonstrámos quando abordámos a essencialidade do desconto de 1,40 por distribuição directa e activa, ainda para mais quando foi unânime a afirmação da essencialidade de qualquer mínima percentagem de desconto e sobretudo quando o que preocupou a B…A e a Autoridade da Concorrência foi justamente os efeitos de fidelização da rede grossista obtidos com estes mecanismos, apesar das declarações formais e de princípio de não interferência e de lisura concorrencial. Deste modo, adita-se aos factos provados que: - Tendo o desconto comercial fixo sido reduzido em 2002, momento em que foram introduzidos vários descontos condicionais, os grossistas foram induzidos à realização dos comportamentos que lhes permitiam a manutenção do desconto comercial fixo anterior.
Sobre “A T… realizava auditorias à informação de vendas entregue pelos AA.”, estando a possibilidade prevista nas Condições Gerais, estamos em presença de saber se efectivou essa possibilidade, e isso resulta certo pelo menos no caso constante do documento de fls. 7344 e 7344 verso. Adita-se assim aos factos provados que:
- A T…, pelo menos no ano de 2005, realizou auditoria à informação de vendas entregue pelos AA.
- Quanto ao facto não provado 36 – “Muitos distribuidores mais pequenos tornaram-se insolventes por força de serem integrados num escalão com condições comerciais menos vantajosas”, pretendem as apelantes que se dê como provado apenas que “ocorreu a insolvência de grossistas por força da sua integração num escalão com condições comerciais menos vantajosas”, remetendo para as declarações de parte de JNA e PD e com o depoimento de LR.
Na comparação das versões vemos desaparecer a referência a “muitos distribuidores mais pequenos” e tirando isto, embora as redacções sejam diferentes, o facto pretendido é o mesmo.
Para o tribunal recorrido, “O ponto 36 da matéria de facto não provada encontra a sua explicação no facto de não ter sido junto qualquer documento comprovativo da declaração de insolvência de grossista, sendo de salientar que, para estabelecer o nexo de causalidade entre a declaração de insolvência e os descontos por escalões, importante seria saber quando se verificou o estado de insolvência”.
Note-se a lateralidade do facto para a decisão da causa. Trata-se de mais um dos muitos indícios duma caracterização da alegada dependência económica para efeitos da invocação do Direito da Concorrência. Não estamos numa acção em que o pedido nem a causa de pedir assentem na insolvência de alguém, e portanto seguindo a tese já muito em uso os tribunais, por exemplo para factos sujeitos a registo civil, não deve ser sem mais desconsiderado o facto se não for produzido o documento autêntico pertinente. Esta posição indica também que, apesar da pertinência da observação do nexo de causalidade na falta de documento, o mesmo nexo pode ser alcançado por outro tipo de prova. Se temos algum depoimento em que um grossista sabe que, viu, assistiu, à deterioração da situação económica dum seu concorrente vizinho cuja capacidade e volume de negócio conhecia, numa altura que coincide com a introdução do desconto por escalões, e que consegue radicar nele, e até pensou em comprar a respectiva carteira de clientes (e houve quem afirmasse que até comprou para evitar a insolvência) podemos dizer que estes depoimentos são completamente inócuos, para mais quando os situamos numa produção de prova em que noutros passos se aventa a solução da concentração de empresas e está efectivamente dada como provada a razão dessa concentração, a concentração e uma redução do número de grossistas ao longo dos anos (factos provados 229 a 231)? Cremos que se forma aqui um quadro de razões explicativas para a diminuição do número de grossistas, tanto sendo credível a solução ou saída da concentração, como a saída da insolvência. Portanto, repetimos, havendo um conhecimento de proximidade sobre uma situação destas, não há que desconsiderar o depoimento respectivo.
Não será o caso do depoimento de LR, porque não esclareceu se no seu próprio caso e pelas razões que explicou, o deixar de ser agente directo significou que foi declarado insolvente (ou simplesmente se vendeu a sua carteira de clientes ou pura e simplesmente passou a comprar a outro grossista) nem esclareceu quanto a outros à sua volta a quem aconteceu o mesmo (“uns fecharam, outros venderam”) se o fecho havia revestido a forma de insolvência, e JLA que tinha maiores condições por ter acolhido na sua empresa o filho de um concorrente vizinho acabou por esclarecer que o vizinho havia encerrado, e nem PD referiu a palavra insolvência, mas sim que muitos acabaram, os do 3º escalão venderam ou desapareceram.
Nem à insolvência chegamos pelo depoimento de ABR, como referido no corpo da alegação, porque ela não a mencionou, aliás, até ligou a redução do número de grossista a um aumento de concentração.
Assim, não é a falta de documento que nos impede de afirmar a solução possível da insolvência, mas a impertinência também dos meios probatórios invocados. Deles outrossim resulta, como as apelantes sugerem no corpo da alegação (362), que além das concentrações, alguns grossistas, por força da integração num escalão menos vantajoso, desapareceram do mercado, ou para usar uma expressão menos ambígua, venderam ou encerraram a sua actividade. Não se eliminando o facto não provado nº 36, adita-se porém aos factos provados que:
- Por força do desconto por escalões estabelecido pela T… e da sua integração num escalão com condições comerciais menos vantajosas, muitos grossistas de tabaco venderam ou encerraram a sua actividade.
-Quanto ao facto não provado 37 - “Se os concorrentes da T… baixassem as margens dos distribuidores dos seus produtos, a distribuição dos seus produtos seria afastada do leque de vendas dos distribuidores”, pretendem as apelantes que o mesmo seja dado integralmente como provado, baseando-se nos depoimentos de AB e MC, e nas declarações de PD e AF, bem como no Estudo sobre o mercado do tabaco de fls. 6464.
O tribunal recorrido consignou a sua resposta negativa por via da resposta provada em 225 e 226, segundo a qual os retalhistas clientes dos AA., perante a impossibilidade de adquirir junto destas os produtos comercializados pelas T.., passariam a recorrer a um grossista que lhes permitisse simultaneamente adquirir as marcas comercializadas pelas T… e outras marcas e a grande maioria dos distribuidores fornece todas as marcas, ouseja, por uma inversão destes: - se a generalidade dos distribuidores vende todas as marcas (T… e concorrência) e se os retalhistas querem comprar dum único (ou pelo menos não de muitos) grossista todas as marcas que o público procura, então as AA. não teriam liberdade prática para deixar de vender concorrência, sob pena de também os retalhistas não lhes procurarem os produtos da T…. Não será bem assim, mas é uma ideia aproximada à realidade: quem manda é o consumidor final, se este procura também, no seu posto de venda habitual, seja ao balcão ou em máquina, produto da concorrência, o retalhista (ao balcão ou dono de máquina) há-de querer ser fornecido também de concorrência, e terá preferência e vantagem em fazer todo ou quase todo o negócio com um único grossista, ora, havendo grossistas além das AA., fácil (aparentemente) será procurar outro além do que se recusa a vender concorrência.
Parece pacífico que são as quotas de mercado – em rigor e ao fim de contas medidas com acerto maior ou mais definitivo do que as estratégias dos intervenientes na cadeia, pelo consumo final – que explicam a actuação dos fabricantes/fornecedores relativamente aos demais intervenientes. Se a P…, ao estrear-se em Portugal e depois de trabalho árduo, conseguiu alcandorar-se a uns 15% e se em face disso lhe pareceu possível fazer o salto para adquirir a T… na privatização, e chegar aos 90% ou mais, também as outras concorrentes têm de jogar e trabalhar arduamente na medida da pequenez das suas quotas. Por isso, é também pacífico – tirando a minudência de distinção entre desconto comercial e financeiro e ignorando o prazo de pagamento – que as condições que a concorrência ofereceu aos grossistas eram mais favoráveis que as da T…, por si mesma ou já depois da privatização.
A medida da pequenez permite compreender o maior poder dos grossistas para com a concorrência, desde logo evitando que tais condições baixassem, porque como é claro a dependência do seu negócio dos produtos da concorrência se media pela quota de mercado da concorrência. Daí que nos depoimentos e declarações citados e em geral se percebesse que não eram aceites nem dadas confianças aos comerciais da concorrência, e que os grossistas poderiam prescindir de vender os seus produtos.
Mas, o que estamos a falar aqui é do reverso – duma afirmação pela marcação de uma barreira – do que as AA. pretendem demonstrar, a saber, a sua dependência da T…, o que desde logo, perante os factos provados relativamente às quotas de mercado da T… torna esta demonstração relativa à concorrência como supérflua ou desnecessária, e do mesmo modo convoca o universo da natureza conclusiva deste tipo de facto.
Não se escamoteando a convicção com que os depoimentos e declarações foram prestados, nem o que consta do Estudo, uma coisa é saber se, por via das quotas, as AA. não se sentiam dependentes da concorrência e por isso tinham mais força para lhes opor a pena capital de não compra, para por termo a veleidades, outra muito mais concreta é saber se o quereriam fazer, se o iriam fazer mais propriamente, e neste particular, não só pela razão prática que notou o tribunal recorrido mas convocando a generalizada afirmação (aliás não contestada sequer pelas testemunhas das Rés) de que qualquer décima de desconto mesmo conta, tudo no negócio importa, é muito relevante a questão do prazo de pagamento mais alargado, considerando que o negócio, de valores unitários irrisórios, é um negócio de milhões por via do volume de produto movimentado, e finalmente voltando a considerar as quotas de mercado da T… dadas como provadas para os anos mais pertinentes à acção, que se situam um pouco acima e gradualmente abaixo dos 80% (mas não inferior sequer a 70%), é um pouco difícil acreditar que, num negócio em que tudo conta, 20% de concorrência pudessem ser deitados a perder (ainda para mais para concorrentes grossistas que não tivessem a mesma disposição). Entendemos portanto que se deve manter a resposta não provada.
-Quanto ao facto não provado 39 – “No dia 23 de Novembro de 2010, num encontro das T… com os grossistas, o administrador-delegado da R. T (2)I disse que o que as RR. esperavam da redução da margem era provocar a concentração entre distribuidores e que os mais pequenos deixassem a atividade de distribuição” pretendem as apelantes que seja dado como provado com a redacção “No dia 23 de Novembro de 2010, num encontro das T… com os grossistas, o administrador-delegado da R. (2) disse que havia grossistas a mais na rede portuguesa, que estes deveriam ser menos e que deveriam ser maiores.” Sustentam-se aqui nos depoimentos de HB, JP, SQ e AB.
Pretendem também que se dê como provado, “por constituir facto complementar que responde objetivamente ao quesitado” que: “A T… manifestou, por diversas vezes, aos Grossistas, o objetivo de diminuir o seu número a nível nacional e as práticas comerciais por aquela implementadas, em especial a partir de 2002, levaram à diminuição do número de grossistas referida no Facto Provado 231” e a este propósito invocam os depoimentos de AF, LR e AB e o Estudo sobre o Mercado do Tabaco a fls. 6464, em conjugação com os Factos Provados 230 e 231.
Começando já pelo fim, se temos provada a diminuição do número de grossista a partir de 2002 (facto 231), se temos provada a concentração para obtenção do escalão comercial mais vantajoso, se temos as condições gerais que contemporaneamente introduziram os escalões e o fraccionamento da percentagem de desconto fixa em parte fixa e quatro variáveis para alcançar o anterior desconto fixo, temos na verdade tudo para concluir que “e as práticas comerciais por aquela implementadas, em especial a partir de 2002, levaram à diminuição do número de grossistas referida no Facto Provado 231”. Em bom rigor porque essas práticas, quaisquer que sejam que não estão melhor concretizadas no texto proposto, têm de reconduzir-se às condições gerais que as implementaram.Ou seja, é matéria de conclusão desnecessária em sede de decisão de facto.
Assim, estamos reduzidos a saber se BE disse o que disse, e se o que ele disse também já vinha a ser dito de modo mais particular pelos key accounts aos grossistas, na transmissão do que era um objectivo traçado pela T….
Ora, não há dúvida que BE era, na data em que participou no evento em causa, administrador delegado da 2ª Ré, e na versão ora pretendida, ultrapassa-se a dificuldade das afirmações de alguns que ressalvaram que quando fez as declarações em causa expressamente indicou que estava a falar em nome pessoal, contra a afirmação mais geral de que tal, se verdadeiro foi – e as versões em causa não apresentaram grande convicção, sendo certo que NJ não pode ser valorado para tanto – muito dificilmente foi apreendido pela audiência.
É absolutamente credível que BE tenha dito que “havia grossistas a mais na rede portuguesa, que estes deveriam ser menos e que deveriam ser maiores”. Isso alinha-se aliás bastante bem com a diminuição do número de grossistas dada como provada no facto 231. Eles já vinham a diminuir, e pelo menos parte desta diminuição resultava de concentrações. E dúvida alguma existe que a concentração de grossistas traduz grossistas maiores, e portanto mais profissionais, mais alinhados pelo lucro, mais agressivos, mais activos, quer na venda, quer na contenção de custos próprios, menos interessados na subsistência familiar e no comércio de aldeia. BE estaria portanto a aprovar o caminho já percorrido, à semelhança do que a sua experiência internacional lhe dava a conhecer. É um pouco inevitável, a partir da privatização para um grande grupo internacional, este obviamente recolhe a esse nível internacional as práticas que entende melhores – afinal já estamos em 2011 em globalização, também capitalista – e encarrega-se de as disseminar ou implementar em todas, para todas e por todas as suas afiliadas.
Com este pano de fundo, são absolutamente credíveis todos os depoimentos que se referiram às afirmações de BE, dos mais escandalizados aos que não precisando de tradução simultânea, afirmam que o senhor de quem até gostaram foi mal entendido (SQ), daqueles que colam BE ao conceito de agressividade, evidente talvez na sua carta simpática aos grossistas para agradecimento pela presença, e dos que, da banda das Rés, afirmam que fez uma constatação. Em rigor, tirando a questão de saber se BE agiu como administrador delegado expressando uma intenção da T… em produzir a diminuição dos grossistas ou se a entendia desejável apenas a título pessoal, o que ele disse não foi objecto de discordância entre as partes. Sem mais demoras, podemos portanto dar como provada a primeira parte da pretensão.
Quanto à segunda parte, as apelantes referem os depoimentos de AF e LR, reforçando-os com a explicação sobre o interesse da T… na diminuição do número de grossistas dada por AB. AF relata que, participando, com outros representantes da Associação … do Sul, numa reunião com o administrador delegado, representante máximo, L…, para apresentação de condições gerais, que situou em 1995, 1996 e depois corrigiu para depois da entrada da P…, que o dito senhor, belga, relatava o caso belga onde só havia 100 depositários contra os então 400 portugueses, e afirmava que o que ele queria e o que vinha fazer em Portugal era essa mesma redução, para evitar o custo de distribuição em que 300 depositários apenas vendiam 15% do seu produto. Rematou, AF, com a criação dos escalões que ocorreu depois.
LR, com alguma dificuldade inicial em se recordar dos nomes dos key accounts, afirmou que a T… tinha o objectivo de diminuir os grossistas e não o escondia, sendo os key accounts que assim diziam. Rematou também com o objectivo dos escalões ser prejudicar quem não conseguia cumprir, sem beneficiar ninguém.
Não sentimos nenhuma razão de descrédito quanto a estes depoimentos. L.. é menos preciso, até porque pedido para concretizar as afirmações dos key accounts não o fez, e AF é um homem experiente e bem-sucedido, movimentando muitos milhões (até na contra-instância se lhe afirmou a capacidade de fazer concorrência à T…), portanto naturalmente um dos que se pôs em aviso com a lição do administrador L…. Voltamos a dizer que estamos, estávamos também já em 97, ao longo de toda a década, no quadro da influência global no chamado processo de restruturação produtiva que se caracteriza pela concentração de empresas. A afirmação atribuída a L… é então perfeitamente razoável.
Se convocarmos quem afirma que com a entrada da P… todo o relacionamento se tornou mais cordial, se pensarmos no interesse mútuo nesse bom relacionamento, se pensarmos numa eficiente estratégia passando justamente por um tratamento mais paritário, não custa aceitar que no âmbito das visitas aos grossistas, no comentário sobre como vai o negócio, fossem comunicadas informalmente tendências ou previsões de futuro, fosse comunicado precisamente “olhe que”, “para seu bem terá de comprar mais” porque a vontade da T… é que os mais ineficientes de vós deixem de operar.
Se, finalmente, a T… tinha o objectivo de reduzir o número de grossistas, às afirmações de que a T… de todo não quer afectar qualquer disposição do Direito da Concorrência, de que lhe era indiferente a organização dos grossistas, que não se imiscuía no negócio, e sobretudo que não retiraria daí qualquer benefício, possivelmente porque estava privada legalmente de deter uma rede, há que contrapor a evidência de enquadramento geral que já fizemos, duma afiliada dum grande grupo internacional, senão o maior do tabaco, que necessariamente se move na sintonia da evolução comercial, se é que não é ele, com outros grandes grupos doutros mercados, que dita essa mesma evolução, há que contrapor que uma redução tão acentuada de grossistas não se explica por razões externas ao negócio, divórcios conturbados e outros desgostos pessoais dos senhores e senhoras grossistas, que em 2002 a redução do número de fumadores seria já relevante mas não se explicava pela ortodoxia da legislação anti-tabágica, que há um interesse objectivo de lucro por diminuição de custo com a diminuição dos grossistas, que além da diminuição não completamente certa dos custos de transporte até aos armazéns dos grossistas (depende do número de entregas semanais), há de facto que quem não alcança o 1º escalão tem um desconto menor, portanto paga mais pelo mesmo volume de compras, que não são os grossistas maiores que são beneficiados – porque sendo maiores o suficiente para o 1º escalão, com isso apenas conseguem reconstituir o desconto fixo que foi fragmentado em variáveis – e que é altamente provável que grossistas maiores possam suportar mais facilmente futuras reduções de desconto ou preços fixos menos favoráveis, vindo portanto a pagar mais, e vindo portanto quem recebe, a receber mais (explicação de AB).
Donde, nada afecta a credibilidade dos depoimentos produzidos, e deve também proceder a segunda parte da pretensão. Assim, elimina-se o facto não provado 39 e adita-se aos factos provados que: - No dia 23 de Novembro de 2010, num encontro das T… com os grossistas, o administrador-delegado da R. (2) disse que havia grossistas a mais na rede portuguesa, que estes deveriam ser menos e que deveriam ser maiores; - A T… manifestou, por diversas vezes, aos Grossistas, o objectivo de diminuir o seu número a nível nacional. - A propósito do facto provado 68 – “A partir de 2003, a A. SBB assumiu a atividade inicialmente desenvolvida por DSF, Lda, com o conhecimento e autorização da T…” e da menção ao facto provado 67 – “DSF, Lda, iniciou a atividade de compra para revenda de produtos da T… em 1982” – as apelantes afirmam que “Deverá também ser dado como provado: cf. Declarações de Parte de SNS e Contrato de nomeação de depositário de 1944 a fls. 8128 a 8131, em conjugação com o Facto Provado 67”.
Não declaram pois as apelantes expressamente que facto deve ser dado como provado, ao arrepio do artigo 640º do CPC, certamente por lapso, sendo que poderia parecer a partir do documento invocado que se estariam a referir à matéria do mesmo. Esta porém surge nos factos provados sob o nº 88 – “A 18 de julho de 1944, DS celebrou acordo com a T… pelo qual esta nomeava aquele seu depositário revendedor para o concelho de Gondomar, mediante, entre outras condições, a de aquele fazer propaganda intensa dos tabacos da T… e arranjar para esse fim e sob sua responsabilidade sub-depositários em todas as freguesias e aldeias do concelho de forma a que nessas freguesias e aldeias se vendam os tabacos da T….)”. Deste modo, a chave está nas declarações de SNS conjugadas com o sentido das alterações formuladas a propósito das AA. referidas nos factos não provados 9 a 14 acima referidos e apreciados, ou seja, a continuidade de prossecução da actividade, vista de frente para trás, desde SBB até DS, pessoa singular. E esta chave confirma-se numa visita ao corpo da alegação que não foi levado à conclusão – fls. 8679, 38º volume – “389. Impunha-se ao Tribunal a quo (…) considerar “Provado” que a actividade desenvolvida a partir de 1982 pela DSF, Ldª, corresponde à actividade inicialmente desenvolvida por DS em nome singular”. Mais adiante, depois de transcreverem passagens das declarações de SNS, referem as apelantes “392. Nesta sequência deverá este facto ser modificado, passando a adotar a seguinte redacção: “A partir de 2003, a A. SBB assumiu a actividade inicialmente desenvolvida por DS, como conhecimento e autorização da T…”. Não resultando portanto completamente omissa a vontade das apelantes na indicação do sentido da decisão a dar por este tribunal, entende-se poder prosseguir com esta apreciação.
Nas declarações que prestou, SNS explicou que DS era seu pai, que tinha exercido a actividade com um só empregado durante muitos anos e mais tarde formou uma sociedade com os filhos maiores sobrevivos a um que tinha falecido, na qual houve uma alteração de pacto social quanto os filhos do filho falecido atingiram a maioridade, passando a ser a DSF Ldª.
Nada havendo propriamente a opor à verosimilhança do histórico, dado o conhecimento directo do declarante, o que há a fazer não é o que as apelantes propuseram no nº 392, que seria a alteração do facto provado 68, mas sim aditar ao facto provado 67 que a DSF Ldª deu continuidade à actividade desenvolvida por DS, pessoa singular, conforme consta aliás do facto provado nº 88. Assim, altera-se a redacção do facto provado 67 para:
- DSF, Lda, iniciou a atividade de compra para revenda de produtos da T… em 1982, dando continuidade à actividade inicialmente desenvolvida por DS conforme facto provado nº 88.
- Em complemento, pretendem as apelantes que, por referência ao facto não provado “27 – A T… dava aos AA. recomendações sobre os métodos de revenda dos seus produtos ao retalho”, se como provado, por constituir facto complementar e responder objectivamente ao quesitado, que “Os AA. prestam assistência aos retalhistas nomeadamente na substituição do tabaco danificado que é devolvido às RR. de acordo com regras e procedimentos definidos por estas, na recolha de maços aquando da substituição de marcas e na configuração das teclas e assistência técnica às máquinas de vending dos próprios retalhistas.”, fundando-se nos depoimentos de JPG e LR e nos documentos a fls. 7252.
Sem embargo de não se alcançar a complementaridade referenciada ao facto não provado 27, e sem embargo do tribunal recorrido ter respondido negativamente a que toda a assistência aos clientes dos revendedores grossistas é prestada pela 2ª Ré, o que agora se pretende dar como provado tem relevância indiciária para a qualificação da relação, e foi também discutido na audiência.
A assistência, como se percebe pelo produto, é pouca, resumindo-se aos casos excepcionais de tabaco defeituoso, e em geral incidindo sobre as dificuldades técnicas das máquinas. Depois, o maior número de máquinas há-de pertencer aos grossistas e o menor aos próprios retalhistas. A experiência normal das coisas diz que quem, inadvertidamente, comprou um produto defeituoso, vai reclamar junto de quem lho vendeu. Portanto, a cadeia de reclamação e de resolução do problema opera para trás: - o consumidor final reclama com o retalhista, mesmo que se tenha comprado numa máquina nele instalada, o retalhista reclama ao grossista e este a quem lhe vendeu. Dando o retalhista conta – de volumes amachucados ou húmidos – reclamará com o grossista. Dando o grossista conta, assumirá o previsto nas Condições Gerais (veja-se 2.1.5 das Condições de 2001 – facto provado 8) verificando o produto encomendado no prazo ali referido sob pena de se considerar perfeita a compra. Nos estádios anteriores entrarão outras razões de bom relacionamento comercial: - o balconista não dirá ao fumador que nada pode fazer.
A lógica de racionalização de custos e actividades explica como não é complicado devolver pouco produto defeituoso a quem se encontra nas proximidades, quem faz voltas em veículos pequenos – vendedores dos grossistas – mas já não faz sentido um transporte específico realizado por ou a pedido da T…, desde Albarraque a Bragança, para recolha dum maço de cigarros. Por outro lado, as cargas não podem ser transportadas informalmente e é mais produtiva a concentração para o trabalho a desenvolver pelos funcionários que hajam de tratar do atendimento da reclamação, do exame do produto. Pelo exposto, faz todo o sentido a existência de um procedimento próprio que os grossistas deviam observar na acumulação de produto defeituoso e na sua remessa acumulada, acompanhada de formulário próprio e a ser realizada na data que fosse indicada pelas Rés. E faz todo o sentido que esta lógica não deva ser aplicada aos retalhistas nem ao consumidor final: - para estes a substituição tem de ser imediata ou muito rápida.
No que toca a máquinas, uma máquina que não funcione é um ponto de venda parado, parcialmente ou totalmente conforme a avaria. Em todo o caso, o potencial de perda de vendas é grande. Donde, a assistência tem de ser (relativamente) pronta. Afigura-se muito razoável pois que os vendedores ou técnicos dos grossistas, conhecedores dos problemas que surgem com as máquinas destes, viabilizem a assistência necessária sem desvio desnecessário para a assistência técnica dos fabricantes de máquinas que as venderam aos retalhistas.
Finalmente, é ainda um problema dos retalhistas – isto é, do ponto de venda final e decisivamente importante para a consecução do negócio integral que satisfaz os interesses de todos os participantes anteriores na cadeia até ao fabrico – o impedimento de venda por força da imposição de novas estampilhas, obrigando à substituição por tabaco devidamente estampilhado.
Diverso é substituir marcas e recolher maços quando tal procede duma decisão de política comercial das comercializadoras iniciais – marca lançada que não teve sucesso – pois aqui não estamos em rigor em sede de assistência, e ainda para mais se trata dum pedido específico e especialmente remunerado – é o caso do documento de fls. 7252.
A prova invocada pelas apelantes – depoimentos de JPG e LR – que se afigura inteiramente credível, refere especificamente as circunstâncias relativas a máquinas e tabaco danificado que resultam da descrição geral que fizemos. Assim, adita-se aos factos provados que:
- Os AA. prestam assistência aos retalhistas nomeadamente na substituição do tabaco danificado que é devolvido às RR. de acordo com regras e procedimentos definidos por estas e na configuração das teclas e assistência técnica às máquinas de vending dos próprios retalhistas.
Quanto ao facto provado 235 - “O preço de revenda aos retalhistas é fixado pelos revendedores grossistas”, defendem as AA. que passe a não provado, com base nos depoimentos de AB e JPG.
Estamos em presença de uma questão também recorrentemente discutida no julgamento, oscilando entre as claras negativas – de modo algum, a T… não interfere na fixação do preço que os grossistas façam aos retalhistas, os grossistas são livres nessa fixação – e as afirmativas explicadas, ou dito de outro modo, da afirmação de que a fixação do preço não é livre porque tem de se conter dentro do PVP, não pode ficar abaixo do custo de compra à T… (e custos de operação dos grossistas) e não pode ignorar a margem dos retalhistas, com os quais, embora sempre se tente, não é fácil, precisamente porque têm vários grossistas à disposição para se abastecerem, negociar em baixa essa margem.
Como é claro, que o preço de revenda aos retalhistas é fixado pelos grossistas, é. Não foi produzido um único documento nem depoimento ou declaração no sentido de que a T… (as), determina qual esse preço deva ser. O que já não é claro, ou é claro que parece não ser, é que a fixação desse preço seja livre, liberdade que nem sequer se afirma como em contexto de mercado (livre nas e de acordo com as condições do mercado em que interviessem apenas os fabricantes/fornecedores, grossistas e retalhistas e o consumidor final). Com efeito, o preço de venda ao público, homologado pelo Estado, sob proposta da T… (1 e depois 2), proposta afirmada como normalmente seguida (entre outros, declarações de parte das duas Rés por MPOGFM, à contra-instância), é o limite máximo de fixação de preço – por trás do qual está o Estado (confiante na prudência e ponderação do proponente) e o seu interesse em 80% dum negócio altamente rentável, interesse que pondera o poder de compra do fumador e a subsistência do fumador, concedendo mais ultimamente à luta-antitabágica uma ponderação sobre o custo de saúde pública – e o limite mínimo encontra-se no preço de compra do grossista à T…, seja para revenda a retalho ao balcão ou em máquinas de vending. Pelo meio, temos a remuneração, lato sensu, do interveniente principal, a “cara do negócio”, “as setenta, ou sessenta ou cinquenta mil caras do negócio”, aquele que conhece verdadeira e pessoalmente o consumidor, que deste está próximo, aquele que tem ainda alguma possibilidade de o influenciar em tempos de luta e legislação anti-tabágica apertada, cuja importância só não é total porque não paga a pronto pagamento, mas cujo papel relevante – altamente relevante por, mesmo com esse pagamento diferido, assumir o custo e o risco de ter cigarros que não se vendem – sempre foi reconhecido, desde os tempos da fixação estatal de percentagens. Esse reconhecimento traduziu-se em margens próximas de 6% do PVP. Aliás, louvores autónomos à tecnologia, o investimento em máquinas automáticas de venda sugere a acomodação ao mercado que os grossistas fizeram para justamente cortar as margens inevitáveis deste último interveniente tão importante (e ainda assim, claro, alguma “remuneração” há-de ser paga pela ocupação do espaço e pelo custo suportado pelo retalhista).
É verdade que muito do que se diz quase pode ser considerado matéria notória, desde logo quanto ao PVP, que é de conhecimento comum tratar-se dum preço tabelado que não pode ser ultrapassado, mas os termos da fixação do PVP no caso concreto já não são notórios. Deste modo, não sendo possível propriamente passar o facto a não provado, o que há-de fazer-se é consignar em esclarecimento que a fixação do preço de revenda aos retalhistas, pelos grossistas, tem como limite o PVP, proposto pelas T… e geralmente homologado, e a reserva duma margem para os retalhistas, que tradicionalmente, e para o período em referência nos autos, se situou próxima dos 6% sobre o PVP. Assim, altera-se a redacção do facto provado nº 235 para: - O preço de revenda aos retalhistas é fixado pelos revendedores grossistas tendo como limite o PVP, proposto pelas T… e geralmente homologado, e a reserva duma margem para os retalhistas, que tradicionalmente, e para o período em referência nos autos, se situou próxima dos 6% sobre o PVP.
Finalmente, por se revelar de interesse para a decisão da causa e constar de documentos que não mereceram impugnação, e de resto sendo mera concretização de factos já provados, aditam-se oficiosamente aos factos provados nº 6 e 7 as seguintes menções:
Facto provado nº 6 “Desde 1992, a R. T… propôs aos grossistas que as condições contratuais que haviam sido inicialmente estipuladas por meio de acordos individualmente celebrados com cada grossista passassem a integrar as designadas “Condições Gerais”, aplicáveis a todos” (aditamento): - “conforme documento de fls. 171 a 178, aqui dado por integralmente reproduzido, intitulado “Tabela de Condições – Operacionais, Comerciais e Financeiras – dos Revendedores Grossistas da T…”, do qual consta, além do mais que: “3. 3.1 As condições referidas são aplicáveis a todos os revendedores grossistas – actuais e futuros – podendo a T… conceder aos revendedores grossistas das zonas mais desfavorecidas, quando verifique que essas zonas correm o risco de ficar sem qualquer distribuição, um período transitório de adaptação. 3.2 O não cumprimento das condições e/ou obrigações estabelecidas nesta Tabela por parte dos revendedores grossistas determinará a imediata cessação de fornecimentos. (…) A presente tabela considera-se em vigor a 1 de Fevereiro de 1992 a 31 de Julho de 1992, sem prejuízo de modificações ditadas por alterações supervenientes das condições financeiras e económicas vigentes no país”.
Facto provado nº 7 – “Em 1997, a R. T… introduziu novas condições gerais de fornecimento” (aditamento): - “conforme documento de fls. 179 a 189, aqui dado por integralmente reproduzido, intitulado “Condições Gerais de Fornecimento de Cigarros pela T…, a Grossistas que pratiquem Distribuição Directa”, do qual consta, além do mais, que:
“6. Âmbito de aplicação As presentes condições gerais aplicam-se apenas a todos os clientes da T… que pratiquem o comércio por grosso – actuais e futuros – que preencham os requisitos exigidos para que possam ser fornecidos ao seu abrigo. 7. As presentes Condições Gerais entram em vigor no dia 15 de Novembro de 1997 e a T… poderá alterar, em qualquer momento, total ou parcialmente, os termos das presentes Condições Gerais. (…)”
Um último aditamento oficioso com relevância para a discussão das questões relativas às violações de normas concorrências:
- A 2ª Ré foi objecto de processo de contra-ordenação nº 04/08 da Autoridade da Concorrência, ao qual se mostra anexo “Estudo sobre o Mercado de Tabaco com o número de registo PRÉ-PRC 16/07” e no qual foi proferida decisão em 12.8.2010, dando-se aqui por reproduzidos o referido estudo, constante a fls. 6464- 6640 dos autos (volume 29º) e a referida decisão, que consta a fls 6642-6704 dos autos (volume 30º).
E o último de todos, por também se revelar de interesse para a decisão da causa, ao facto provado 88, no sentido de incluir a menção concreta ao teor do contrato ali referido, passando então a redacção a ser:
“88 - A 18 de julho de 1944, conforme contrato a fls. 8128 a 8131 dos autos que aqui se dá por reproduzido, DS celebrou acordo com a T… pelo qual esta nomeava aquele seu depositário revendedor para o concelho de Gondomar, mediante, entre outras condições, a de aquele fazer propaganda intensa dos tabacos da T… e arranjar para esse fim e sob sua responsabilidade sub-depositários em todas as freguesias e aldeias do concelho de forma a que nessas freguesias e aldeias se vendam os tabacos da T…”.
Em síntese, procede parcialmente a impugnação da decisão sobre a matéria de facto. Para melhor facilidade de leitura são as seguintes as alterações deliberadas:[12] Em consequência, fixa-se definitivamente a matéria de facto provada e não provada nos seguintes termos[13]: 5ª questão – Se devem proceder os pedidos formulados pelas Autoras e Autores porquanto:
a) O Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento ao ajuizar que entre os AA. e RR. inexiste qualquer relação de natureza contratual (nos termos das CG) e, bem assim, que inexiste qualquer contrato de distribuição (concessão) composto por um contrato quadro e vários contratos de execução daquele – cf. Ponto IV.C. a);
b) É ilícita /(in)eficaz a imposição e aplicação do fator de correção pelas RR. face à rejeição expressa pelos AA. desta cláusula contratual e atento o disposto no n.º 1, do artigo 406.º do CC e o RJCCG – cf. Ponto IV.C. b);
c) A cláusula que introduziu o fator de correção deve-se considerar excluída do contrato quadro e consequentemente, dos sucessivos contratos de compra e venda, por incumprimento do dever de comunicação e de informação previstos nos artigos 5.º e 6.º do RJCCG e ainda por as RR. terem prestado informações falsas aos AA. (e demais grossistas) sobre os seus efeitos e aplicação – cf. Ponto IV.C. c);
d) São lícitas, à luz do princípio geral da boa-fé e do RJCCG, nomeadamente do disposto na alínea h) do artigo 19.º, e da alínea c), do artigo 22.º, as cláusulas das CGF que conferem às RR. a faculdade de alterar todos os seus termos unilateralmente, em qualquer momento e sem qualquer limitação – cf. Ponto IV.C. d).
e) Além do mais, tais cláusulas devem ser anuladas por coação moral e usura – cf. Ponto IV.C. e).
f) É lícita a aplicação do fator de correção realizada pelas RR. face aos termos da própria cláusula que o prevê – cf. Ponto IV.C. d).
g) Todas as cláusulas das CGF identificadas no petitório são nulas por constituírem infração às Normas do Direito da Concorrência, concretamente por configurarem, atentos os seus objetivos e efeitos, abuso de posição dominante e/ou abuso de dependência económica por parte das RR. relativamente aos AA.. e se, na hipótese de improceder toda esta argumentação, ocorre abuso de direito por parte das RR. (conclusões AAAA a DDDD do recurso).
Analisemos: A - Primeira linha argumentativa: - se o tribunal incorreu em erro de julgamento ao ajuizar que entre os AA. e RR. inexiste qualquer relação de natureza contratual (nos termos das CG) e, bem assim, que inexiste qualquer contrato de distribuição (concessão) composto por um contrato quadro e vários contratos de execução daquele.
A sentença discorreu, e citamos:
“Nos termos do art. 405º do C.C., "dentro dos limites da lei, as partes têm a faculdade de fixar livremente o conteúdo dos contratos, celebrar contratos diferentes dos previstos neste código ou incluir nestes as cláusulas que lhes aprouver”; “as partes podem ainda reunir no mesmo contrato regras de dois ou mais negócios, total ou parcialmente regulados na lei”. “Os circuitos económicos de distribuição dos bens, desde o produtor e até ao consumidor final, são dobrados por esquemas jurídicos destinados a legitimá-los, fixando os direitos e os deveres das partes envolvidas. Trata-se, grosso modo, dos contratos de distribuição.” “A comercialização dos bens e a sua distribuição na sociedade pode ser feita de forma directa ou indirecta. A saber: - distribuição directa: o bem passa directamente do produtor ao consumidor, ainda que através de representantes, de comissários ou de mediadores; - distribuição indirecta: o bem atravessa ainda várias fases, passando do produtor ao grossista, do grossista ao retalhista e do retalhista ao consumidor final.” “Dos diversos esquemas de distribuição acima referidos, interessa reter a distribuição indirecta integrada. Esse tipo de distribuição pressupõe, em regra, a celebração, entre os interessados e, designadamente, entre o produtor e os distribuidores, de adequados instrumentos contratuais. A doutrina especializada aponta quatro tipos de situações jurídicas possíveis: - a agência; - a concessão; - a franquia; - a livre organização de cadeias. Nesta última hipótese, não há instrumentação contratual que estruture a articulação entre produtor, distribuidores e retalhistas” (António Menezes Cordeiro, Manual de Direito Comercial, Vol. I, 2001, pág. 490 a 492). Conforme decorre do disposto no art. 1º nº 1 do DL 178/86, de 3 de Julho, com as alterações introduzidas pelo DL 118/93, de 13 de Abril, “agência é o contrato pelo qual uma das partes se obriga a promover por conta da outra a celebração de contratos, de modo autónomo e estável e mediante retribuição, podendo ser-lhe atribuída certa zona ou determinado círculo de clientes”. São, pois, elementos essenciais do contrato de agência a obrigação de o agente promover a celebração de contratos por conta da outra parte; a autonomia; a estabilidade; e a retribuição. “A agência distingue-se, …, do contrato de concessão, fundamentalmente porque, apesar de manterem algumas afinidades (mormente no que concerne à relação de colaboração com a empresa e ao objectivo prosseguido…), o concessionário, ao contrário do agente, actua em seu nome e por conta própria, adquire a propriedade da mercadoria, comprando ao fabricante ou ao fornecedor mercadorias para revender a terceiros (estando muitas vezes obrigado a adquirir determinada quota mínima de bens) e assume os riscos da comercialização. É a concessão um contrato-quadro (…), que faz surgir entre as partes uma relação obrigacional complexa, por força da qual uma delas, o concedente, se obriga a vender à outra, o concessionário, e esta a comprar-lhe, para revenda, determinada quota de bens, aceitando certas obrigações (mormente no que diz respeito à sua organização, à política comercial e à assistência a prestar aos clientes) e sujeitando-se a um certo controlo e fiscalização do concedente. Como contrato-quadro, o contrato de concessão comercial funda uma relação de colaboração estável, de conteúdo múltiplo, cuja execução implica, designadamente, a celebração de futuros contratos entre as partes, pelos quais o concedente vende ao concessionário, para revenda, nos termos previamente fixados, os bens que este se obrigou a distribuir”. “A agência distingue-se, igualmente, do contrato de franquia… Trata-se do contrato pelo qual o produtor de bens e/ ou serviços concede a outrem, mediante contrapartidas, a comercialização dos seus bens, através da utilização da marca e demais sinais distintivos do primeiro e conforme o plano, método e directrizes prescritas por este, que lhe fornece conhecimentos tecnológicos e regular assistência”. “É nesta maior ingerência do franquiador na actividade do franquiado, bem como no facto de a comercialização dos bens ser necessariamente acompanhada de fornecimento de Know-how, de assistência, de métodos e planos de mercado, de conhecimentos tecnológicos, etc., que reside, no essencial, a diferença entre a franquia e a concessão” (António Pinto Monteiro, Contrato de Agência, anotação ao art. 2º do DL 178/86). Tal como o concessionário e ao contrário do agente, o franquiado age em seu nome e por conta própria. A concessão e a franquia são contratos atípicos. Os AA. qualificam a relação estabelecida entre as partes de contratos de concessão. Há “três notas essenciais que fornecem o recorte desta figura negocial: em primeiro lugar, o facto de a concessão ser «um contrato em que alguém assume a obrigação de compra para revenda, nele se estabelecendo desde logo os termos (ou os principais termos ou regras) em que esses futuros negócios serão feitos»; em segundo lugar, o facto de o concessionário agir «em seu nome e por conta própria, assumindo os riscos da comercialização»; e em terceiro lugar o facto de na concessão as partes se vincularem a «outro tipo de obrigações - além da obrigação de compra para revenda - sendo através delas que verdadeiramente se efectua a integração do concessionário na rede ou cadeia de distribuição do concedente»” (www.dgsi.pt Acórdão do STJ proferido a 17 de novembro de 2015, processo 4671/06.6TBMTS.P1.S1). A exclusividade do concessionário não é elemento essencial do contrato de concessão (www.dgsi.pt Acórdão do STJ proferido a 12-7-2018, processo 391/06.0TBBNV.E1.S1). Das condições gerais de fornecimento são estabelecidas quantidades mínimas, mas daí não se pode extrair que os AA. assumiram a obrigação de comprar. “A aquisição de quantidades mínimas é imperativo da condição de grossista, sendo o critério essencial e mais seguro para conceptualmente a separar da condição de retalhista ou de fumador. A ré não pode tratar como grossista quem tem a liberdade de comprar as quantidades que quiser, por mais pequenas que sejam, e não se pode considerar grossista, nas suas relações a jusante, quem vende as quantidades que quiser, por mais pequenas que sejam. A escala de compras e vendas é fundamental na definição dos operadores do mercado e a fixação de quantidades mínimas de aquisição, afinal, só serve para enquadrar os adquirentes no negócio dos tabacos, concretamente para enquadrar o comprador na única categoria de adquirentes com quem a ré aceita fazer negócios: os grossistas. Se não se comprarem as quantidades mínimas fixadas…, a ré cessa fornecimentos, …, pela simples razão de deixar de considerar esse adquirente como grossista” (www.dgsi.pt Acórdão do Tribunal da Relação do Porto proferido a 12 de outubro de 2006, processo 0630320). Não resultando da matéria de facto provada a obrigação dos AA. de comprar, não se pode qualificar a relação entre as partes de contrato de concessão”. (fim de citação).
Ainda que a propósito da modificabilidade dos contratos, a citação do passo seguinte da sentença não deixa de relevar para o enquadramento jurídico que o tribunal fez da relação entre as partes. Citamos:
“Nos termos do art. 406º nº 1 do C.C., “o contrato… só pode modificar-se… por mútuo consentimento dos contraentes”. Resulta da matéria de facto provada que, a 12 de julho de 1985, a T… e JMRL celebraram acordo no qual foi estipulada a obrigação do grossista de não comercialização de produtos concorrentes. Conforme resulta da matéria de facto provada, a partir de Novembro de 1986, a A. JMRL assumiu a atividade inicialmente desenvolvida por JMRL, com o conhecimento e autorização da T…. Do ponto 48 da matéria de facto provada resulta que do despacho conjunto do Ministro das Finanças e do Ministro da Economia de 12 de dezembro de 1996, consta, como uma das obrigações a cumprir pela P…, SA., no quadro do processo de reprivatização da T…S.A., que aquela “não deverá manter nem exigir a qualquer outro agente económico qualquer exclusividade de compra de produtos seus ou de qualquer sua comparticipada”. Com a reprivatização, cláusulas que estabeleciam a obrigação do grossista de não comercialização de produtos concorrentes não podiam ser mantidas. Resulta do ponto 6 da matéria de facto provada que, desde 1992, a R. T… propôs aos grossistas que as condições contratuais que haviam sido inicialmente estipuladas por meio de acordos individualmente celebrados com cada grossista passassem a integrar as designadas “Condições Gerais”, aplicáveis a todos. Assim, apesar do contrato celebrado em 1985, a relação do A. JMRL com as RR. é igual à relação dos demais AA. com as RR. Consta das condições gerais de fornecimento reproduzidas no ponto 8 da matéria de facto provada que “o Cliente Grossista deverá celebrar com a T… um contrato cuja minuta-tipo se anexa e que constitui o Anexo IV às presentes Condições Gerais”. Contudo, não resulta da matéria de facto provada que com a assinatura do referido anexo nascem obrigações para qualquer das partes. Resulta das condições gerais de fornecimento a preocupação da T… em zelar pela qualidade dos produtos revendidos sob a sua marca em termos de preservar a imagem da T… e a dos bens que produz. Mas tal preocupação não levou à assunção de obrigações por parte dos grossistas. Não temos obrigações que, uma vez incumpridas, dão lugar a indemnização, mas sim requisitos, que uma vez não preenchidos, dão lugar à recusa de fornecimento. “O vínculo jurídico que une as partes é cada um dos contratos de compra e venda que a ré e os grossistas celebram, com o conteúdo que as CGF estabelecem de forma geral e abstracta” (Acórdão citado). Não causa estranheza que não haja contrato subjacente aos contratos de compra e venda celebrados com os grossistas, uma vez que não há escolha de grossistas por parte da T… em razão da sua aptidão técnica e comercial. Para alterar as condições gerais de fornecimento não é, pois, necessário o consentimento dos grossistas”. (fim de citação).
Em suma, para o tribunal recorrido nem estamos perante um contrato de concessão comercial nem estamos sequer perante qualquer vinculação contratual resultante das Condições Gerais de Fornecimento, sendo que o único vínculo jurídico que ligou as partes foi cada contrato de compra e venda, numa longa sucessão destes – ou seja, sem tirar, a tese das Rés.
Revisitemos os argumentos de ambas as partes.
Da banda das apelantes, e sumariando aqui o que resulta das conclusões da alegação de recurso acima transcritas:
- erro face ao teor das Condições Gerais de Fornecimento,
- que expressamente prevêem a obrigação de abastecimento regular e contínuo dos clientes e zelar pela inexistência de rupturas de stock,
- sem que se encontre – “fora duma relação contratual contínua” – fundamento para essa exigência relativamente a um produto que já foi pago,
- mecanismo das “transfer orders” nas condições gerais de fornecimento de 2002, incompatível com a vinculação jurídica unicamente derivada de cada compra e venda sucessiva e inexplicável face à inexistência de encomenda,
- inúmeras referências nos textos das Condições Gerais de Fornecimento sobre contratos, a necessidade de assinar contrato, cedência da posição contratual e adoptar regras contratuais equivalentes para com os retalhistas,
- previsão do direito das Rés a serem indemnizadas por incumprimentos dos grossistas nos termos gerais de direito - “Cláusulas 4.2 das CGF de 2005 (Facto Provado 10) e da Cláusula 8.7 das CGF de 2009 (Facto Provado 13)”,
- incompatibilidade da tese da compra e venda sucessiva com o estabelecimento de quantidades mínimas, diferenciadas por Distrito, e da periodicidade de encomendas, numa obrigação contínua e sem interrupções de aquisição dos produtos das Rés,
- fixação de quantidades mínimas sem relação com a noção de grossista, “mas apenas com a política interna das RR. de controlo da quantidade de produto vendida em cada distrito, que se alcançava através da imposição aos AA. da referida obrigação de aquisição e de distribuição contínua”,
- similarmente, o abastecimento regular do mercado sem rupturas de stock só se explica por os grossistas fazerem parte da rede de distribuição, e serem parte essencial como sempre lhes foi comunicado,
- o que não é posto em causa por uma tentativa de descaracterização coincidente com a introdução do Factor de Correcção.
- Quanto a enquadramento jurídico e qualificação jurídica, remissão para os termos analisados no Parecer do Prof Pinto Monteiro junto aos autos.
Para as apeladas:
- a natureza jurídica das CGF era a de mera proposta de venda ao público, a aceitação das mesmas, desde logo pelas encomendas, não formava contrato, mas era simples condição de perfeição dos contratos de compra e venda que sucessivamente fossem sendo celebrados.
- A concessão comercial, como os demais contratos de distribuição, pressupõem uma concertação que “redunda numa verdadeira subordinação, tanto económica como jurídica, comummente intitulada por integração do concessionário perante o concedente”. Tal subordinação funda-se no interesse económico do fornecedor que é o de organizar a rede de distribuição, alinhando incentivos e alocando tarefas que visam um escopo comum, tudo e todas tendo “de estar expressamente previstas e de ser escrupulosa e obrigatoriamente cumpridas”. Distintos graus de integração na rede não dispensam que haja sempre um “determinado nível de controlo sobre a atuação dos distribuidores exercido pelo fornecedor para assegurar esse alinhamento de incentivos”.
- No caso, há uma “pulverização de Grossistas, cada um com total liberdade de atuação comercial, com ausência de obrigações, designadamente no que respeita a áreas geográficas de atuação designadas, a clientes retalhistas designados, promoção dos produtos, etc.”, ou, “não havia uma política comercial de distribuição definida pelas Rés” que tivesse de ser obrigatoriamente cumprida. Antes, cada grossista definiria a sua política, sem possibilidade de coordenação, direcção ou controlo por parte das Rés.
- foi a alteração estrutural dos anos 1996 e 1997 que determinou a mudança do paradigma anterior, no qual não se nega que “muito longinquamente” existiram verdadeiros contratos de distribuição, com verdadeira integração através da existência do dever de promoção e obrigações de exclusividade.
- em 1996 deu-se o processo de privatização e venda à P….
- Foram “(i) a liberalização do mercado que se deu com a entrada de Portugal na CEE e (ii) a aquisição da T… pela P…” que acarretaram a “reorganização do modo de interação do fornecedor com os Grossistas” como marcos históricos de definição do mercado de tabaco desde então, desde logo tendo desaparecido nas CGF dali em diante emitidas, as referências qualificadoras dos contratos de distribuição.
- “a P… optou, em linha com o espírito dos compromissos assumidos aquando da aquisição da T… perante o Estado Português, por alterar a forma de relacionamento com os Grossistas, conferindo-lhes total independência na sua atuação comercial desde esse ano de 1997 até aos tempos mais hodiernos”.
- passando à análise das CGF, nelas não se obrigaram as Rés a vender nem as AA. a comprar, apenas se provando que, se preencherem os requisitos previstos nas Condições, as AA. compram.
- se doutro modo fosse, seria lógico que “que a contraparte contratual tivesse o poder de “exigir” da outra o cumprimento (maxime, a celebração do contrato e o cumprimento dos deveres aí inseridos - por exemplo de receber os produtos ou o preço correspondente, respetivamente), podendo obter dos tribunais providências coercitivas aptas a satisfazer o seu interesse”, contudo, a questão da responsabilidade pelo cumprimento só surge depois da colocação de uma encomenda.
- nas CGF não há traço de obrigação de compra, nem a previsão de quantidades mínimas a revela, pois a “fixação de valores mínimos de compra relacionava-se com os locais de entrega (aquisições mínimas em cada local de entrega), enquadrando-se nos critérios de admissão prévios à celebração de contratos de compra e venda. Impunha-se em razão dos mesmos imperativos de eficácia e eficiência económica que justificam outros requisitos de admissão”.
- “De qualquer modo, caso houvesse algum dever de compra por parte das Recorrentes, a sanção não seria nunca a recusa da candidatura, mas a indemnização por incumprimento de um dever obrigacional – o que só demonstra a inexistência desse dever na relação económica ora em crise”.
- A invocação de uma “exceção de não cumprimento, procurando reconduzir uma situação de não verificação dos requisitos de aquisição mínima presentes nas CGF a uma suposta faculdade de a T… não cumprir a sua obrigação de fornecer” (…) “não se coaduna com a possibilidade de o mesmo Grossista não cumprir os requisitos relativos a quantidades mínimas num local de entrega dos produtos, mas já cumprir noutro, continuando, assim, a ser fornecido num outro local. O caráter compulsório deste instituto não se compadece com esta possibilidade”.
- A assunção de risco pelos grossistas e as formas de pagamento não reflectem qualquer obrigação de compra, pois “regulam os termos subsequentes ao envio para a T… de uma ordem de encomenda e entrega do produto ao Cliente”.
- “Não se invoque, como é ensaiado pelas Recorrentes, que o direito de indemnização não precisaria de estar expresso nas CGF para existir”, pois que, “a imaginação não precisa de se espraiar muito para conjurar a existência de cláusulas penais como um instrumento clássico e habitual que poderia ser inscrito nestas CGF se existisse uma obrigação de compra”.
- Acresce que “nada obsta a que seja celebrado um contrato prévio por referência ao qual se determinará o conteúdo dos contratos (de compra e venda) que poderão vir ou não a ser celebrados no futuro, em nada beliscando a liberdade de contratar, nem oferecendo qualquer possibilidade jurídica à contraparte de exigir a celebração dos contratos de compra e venda”.
- A existência de autorização para cedência de posição contratual não demonstra a existência de contrato, pois “faz todo o sentido que a T… exija que a posição contratual num acordo que permite fixar, ainda que precariamente, o conteúdo negocial das eventuais transacções futuras não possa ser cedida sem a sua autorização, tendo em linha de conta a importância da verificação dos requisitos subjetivos expressamente previstos nas CGF”, o que serve a impedir fraudes – “cessão da posição contratual para um Grossista que não cumprisse com os requisitos”.
- Aliás, estas previsões também decorrem das “obrigações internacionais de prevenção da prática ilícita associada aos produtos de tabaco a que as Recorridas estão adstritas e que exigem que conheçam os seus clientes”.
- Não existe um dever de revenda. A revenda é mero requisito da venda, relativo à natureza da actividade grossista – “se um Grossista não revender os produtos, deixa de ter atividade económica de venda por grosso e, nessa medida, de cumprir um dos requisitos necessários para ser fornecido pelas Rés ora Recorridas”.
- “Contudo, estas em nenhum momento podem exigir ao Grossista o cumprimento de um dever de revenda relativamente aos produtos que lhe tiverem vendido anteriormente, uma vez que este direito de crédito, que legitimaria a exigência de cumprimento, não está previsto em nenhuma cláusula das CGF”.
- “De acordo com a perspetiva económica, qualquer grossista ou retalhista é um distribuidor porque faz chegar, através da compra e subsequente revenda, produtos de um nível da cadeia de comercialização para outro; contrariamente, do ponto de vista jurídico, só há contratos de distribuição quando esta atividade comercial implica uma integração do comerciante numa rede de distribuição do fornecedor”.
- “a previsão de obrigações laterais é também conatural à existência de contratos de compra e venda entre fornecedores e comerciantes, atendendo a que os comerciantes não compram os produtos para uso próprio, antes participam no circuito de comercialização desses produtos até à chegada ao consumidor, último e mais importante destinatário dos produtos”.
- Não se encontram nas CGF (nem na realidade) directrizes em matéria de política comercial quanto ao método de revenda, antes meras indicações de legislação a cumprir em matéria fiscal, aduaneira e de combate ao branqueamento ditadas pela observância da boa-fé e em respeito ao interesse público, não havendo assim a possibilidade de imposição de regras ou directrizes de estrita política comercial ditada exclusivamente pelas Rés, imposição semelhante para todos os concessionários que integrem a rede de distribuição, de modo a acompanhar esta e a controlá-la.
- O direito de indemnização por falta de cumprimento destes deveres legais” (ditados pelas mesmas razões e com os mesmos objectivos de interesse público) “previsto nas CGF, que é invocado pelas Recorrentes, constitui um normalíssimo direito de regresso nas relações comerciais entre duas empresas que têm uma relação comercial vertical de compra e venda bens de consumo, quando o comerciante não cumpre os seus deveres legais e o fornecedor é demandado pelos que são lesados por esse incumprimento”.
- Mas, também, “no complexo obrigacional nascido do contrato de compra e venda, surgem deveres laterais de proteção da imagem e da perceção pública do alienante (rectius, das Rés ora Recorridas) que in casu se materializavam em manter inalteradas as embalagens dos produtos ou não alterar as características dos mesmos, aliás em decorrência das obrigações impostas pelo Acordo CE, uma convenção internacional”.
- recomendar é diferente de dar instruções, não se evidenciando também nas “CGF quaisquer diretrizes comerciais que permitissem afirmar que a liberdade de ação comercial dos clientes grossistas, no normal decurso da sua actividade económica, se encontrava constrangida”.
- “Não se pode confundir, desta feita, tal realidade com a celebração dos contratos que tinham por objeto as máquinas de vending, nos quais se estabeleciam deveres de parte a parte, que tinham um escopo e incidência diversos da relação entre a T… e os Grossistas ora em crise”.
- Não há controlo da política comercial na “possibilidade cometida às Rés ora Recorridas de vistoriarem os locais de armazenagem, por forma a aferirem a implementação pelos Grossistas das instruções básicas de acondicionamento, manuseamento e armazenagem dos produtos”, pois que “As vistorias realizadas pelas Rés ora Recorridas tinham, pois, apenas como escopo a verificação do cumprimento das normas legais, do Acordo CE e dos deveres laterais de proteção da imagem das Rés ora Recorridas, evitando, dentro do possível, a violação desses mesmos standards e a consequente responsabilização dos Grossistas e das próprias Rés ora Recorridas”, ou seja, o objectivo das vistorias não era para controlo da execução da política comercial nem muito menos para controlo da concorrência.
- Nas previsões sobre rupturas de stock não se indicia a existência de uma rede de distribuição, mas apenas “o cumprimento da função básica de qualquer grossista que abasteça um ponto de venda do retalho”, tanto mais que “as Recorridas não podem, por imposição do Estado Português, ter atividade no comércio por grosso, estando dependentes dos Grossistas para assegurar a chegada dos produtos aos Retalhistas”.
- “Como se intui com facilidade, uma das ineficiências económicas mais danosas, para fornecedores e consumidores, associadas à comercialização de bens de consumo, é a rutura de stocks e ausência dos produtos nos pontos de venda retalhistas”.
- Nesse suprimento, “Os promotores de vendas das Rés ora Recorridas contactavam diretamente os Retalhistas. Na eventualidade de, nesses contactos, se depararem com uma rutura de stock, os promotores de vendas da T… poderiam, mediante prévio conhecimento do Grossista, ceder produtos ao Retalhista, informando o Grossista da quantidade de produto cedida, para que o Grossista pudesse posteriormente cobrar os valores correspondentes à venda desses bens, ao mesmo tempo que as Rés ora Recorridas faturavam ao Grossista os produtos ora cedidos”.
- “Pretendia-se, assim, manter a integridade da cadeia e evitar ruturas de stocks, assim prevenindo situações em que determinados consumidores pretendessem comprar estes produtos num determinado ponto de venda, não o conseguindo fazer”.
- Numa verdadeira concessão comercial com obrigação de venda, “as Rés ora Recorridas poderiam responsabilizar contratualmente, nestas situações, os Grossistas, mas não é isso que acontece; as Rés ora Recorridas limitam-se a suprir uma necessidade de produto momentânea do Retalhista e a dar conhecimento desse facto aos Grossistas”.
- A solicitação da indicação dos locais de entrega “para cumprimento da sua obrigação de entrega resultante de encomendas não implicava qualquer exclusividade nessa “zona”, nem tão-pouco um direito exclusivo de revenda nessa “zona de entrega”
- Os grossistas podiam aliás ter mais do que um local de entrega, alterá-lo, e vender fora do distrito desse local de entrega, “ao contrário do que seria conatural num contrato de concessão comercial”.
- As campanhas de incentivo que foram desenvolvidas “de uma forma pontual, limitada e num esquema de participação voluntária”, “tinham obviamente o propósito de incrementar a compra destes produtos pelos clientes grossistas, o que é natural em todos os sectores económicos”, ao mesmo tempo que os “incentivos visavam fomentar o bom relacionamento comercial que se impõe num modelo de comercialização que, não só não confere ao fornecedor o controlo direto do abastecimento dos produtos até aos pontos de venda no retalho, como não assente numa rede de distribuidores integrados”. Aliás, esta não integração reforça-se com a voluntariedade e a inexistência de sanção para a não participação.
- “Estas iniciativas não podem, pois, nunca ser confundidas com a execução de um qualquer suposto “contrato de concessão comercial” ou de “distribuição”. É, aliás, precisamente a inexistência das bases de um “contrato de concessão comercial” ou de “distribuição” que dá (e deu) razão de ser às referidas campanhas”.
- Não contraria a tese da compra e venda sucessiva “previsão de descontos praticados pela T… em função da performance do distribuidor no passado”, pois a “realidade jurídico-económica demonstra precisamente esta correlação entre condições de compra e faturação anterior gerada por um determinado cliente, até com consumidores. São disto exemplos os cartões de fidelização, descontos associados ao volume de compras realizadas, etc”.
- O Programa A… estava especialmente direccionado para os retalhistas, “ficando os Grossistas numa posição limitada, eventual e lateral”, pois que “poderiam participar neste Programa se (i) fossem nomeados pelos Retalhistas e (ii) se aceitassem essa participação”. Não pode pois tal participação “qualificar-se como um elemento de uma integração jurídica na cadeia de distribuição da T…”.
- Sendo verdade que as Rés “ofereceram a possibilidade de os Grossistas obterem material como cinzeiros, isqueiros e outros pequenos brindes –, tendo em vista, na medida do possível e admissível, apresentar novos produtos, marcas, formatos ou variantes de produtos, e fomentar o bom relacionamento profissional, (…) “porque era do interesse comercial destes últimos enquanto revendedores de produtos da T…”, todavia não eram eles obrigados a usá-los, sendo que “Foi apenas a T… que planeou, criou e executou a política publicitária dos produtos do tabaco”.
- “Uma vez que não existia qualquer vínculo obrigacional entre as Rés ora Recorridas e os clientes grossistas relativamente à publicidade ou ao merchandising, o que os Grossistas fizeram ou deixaram de fazer é manifestamente irrelevante para os autos e, em específico, para a qualificação da relação económica em causa, já que os Grossistas a nada estavam contratualmente obrigados pelas Rés ora Recorridas”.
- Já seria co-natural que num “contrato de concessão comercial, (…) o concedente e o concessionário partilhassem esforços e despesas em publicidade do produto e em organização comercial dos pontos de vendas.
- Os grossistas “não ficaram incumbidos de nenhuma obrigação de cooperação para com as Rés ora Recorridas (…), não empenhando aí nenhuma forma de capital” (…) no “tocante à promoção dos produtos junto do retalho”, sendo que “num contrato de distribuição, a integração do distribuidor prende-se, essencialmente, com este dever de promoção dos produtos que o adstringe, que aliás é comum aos contratos de concessão e aos contratos de agência. Trata-se de um elemento essencial deste tipo de contratos”.
- Aliás, “A introdução de novas marcas no mercado retalhista surgia até, por vezes, apesar da relutância dos Grossistas em comercializar essas marcas”.
- “no período a que se reporta o presente litígio, as CGF não previam uma obrigação de promoção dos produtos. Até 1995 esse dever estava previsto nas CGF, mas depois desapareceu das subsequentes CGF”
- “A prestação pelo concessionário de serviços de assistência pós-venda ao cliente é uma característica conatural aos contratos de concessão e, como tal, seu elemento qualificador” o que no caso é assumido pelas Rés e não pelas AA.
- “ainda que pontualmente os retalhistas reportassem problemas com os produtos aos Grossistas (afinal existia entre ambos uma relação fornecedor / cliente), não decorria das CGF qualquer obrigação que impendesse sobre os Grossistas de se responsabilizarem pelo serviço pós-venda. Essa era uma tarefa da T…”.
- A prestação de informações sobre o mercado era voluntária –e de resto, o custo que acarretava era remunerado especificamente – não relevando como dever obrigacional adjacente ao contrato de concessão comercial.
- A “distribuição ativa era meramente opcional” (…) “A atribuição de um desconto adicional aos Grossistas que optassem pela distribuição ativa visava apenas remunerar os mesmos pela comercialização dos produtos com entrega nos pontos de venda retalhistas. Esta forma de comercialização é naturalmente mais onerosa do que a comercialização feita em estabelecimento do Grossista, contribuindo para tornar mais eficiente a comercialização dos produtos”.
“Não existia assim a imposição de uma modalidade de venda e só nesse caso é que se poderia dizer que “a atividade empresarial do distribuidor ser[ia] parcialmente heterodeterminada e heterocontrolada” (Cf. Ferreira Pinto), como é conatural a um contrato de distribuição”.
“as referências temporais vertidas nas CGF permitem esbater de forma significativa qualquer ideia de uma suposta estabilidade ou durabilidade das relações que se foram estabelecendo entre os diversos Grossistas e as Rés ora Recorridas. (…) “a substituição in totum, tendencialmente anual, das CGF é bem demonstrativo do facto de se tratar simplesmente de um preçário acompanhado de condições de venda, adaptado a clientes grossistas”.
- Não seria justo, em “corolário do pensamento carreado aos autos pelas ora Recorrentes, em que ou as Rés ora Recorridas não vendiam os seus produtos na cadeia comercial e não haveria um contrato de distribuição, ou vendiam os seus produtos na cadeia comercial a um Grossista e, de forma inelutável, tornar-se-iam concedentes, celebrando ope legis um contrato de distribuição, sem que tal quisessem e sem que o conteúdo obrigacional das relações jurídicas firmadas fosse consentâneo com tal qualificação” quando “ficando as Rés ora Recorridas com o ónus de suportar os deveres e as imposições advenientes da concessão, sem beneficiar dos direitos respetivos, e, inversamente, as 1.ª a 25.ª Autoras ora Recorrentes com a possibilidade de beneficiar de uma lógica contratual, sem que estivessem adstritas às concomitantes obrigações que necessariamente se imporiam se de um contrato de distribuição efetivamente se tratasse”.
“Este entendimento é reforçado pelo facto de a jurisprudência vir apresentando um critério estrito para a qualificação de contratos como concessão comercial”. (…) “Na síntese do Tribunal da Relação do Porto: não existia vínculo jurídico que obrigasse o autor a comprar à R., que o obrigasse a só comprar tabaco do comércio da R, que o obrigasse, perante a R., a só vender em determinada zona geográfica ou só com clientes pré definidos pela R., ou que o obrigasse a negociar com os retalhistas em condições impostas, ou essencialmente determinadas, pela R., ou que controlasse a actividade do A. impondo-lhe condições de facturação, preços de venda, volume de facturação e marcas a distribuir e que o A. se encontrasse submetido às regras de actuação, de depósito de produtos e de relacionamento com o cliente, que a R. lhe exigia. Assim, afigura-se-nos que os factos provados integram o vulgarmente designado contrato de fornecimento que tem a natureza de contrato de compra e venda, com prolongamento no tempo. (…)(…) O vínculo jurídico que une as partes é cada um dos contratos de compra e venda que a ré e os grossistas celebram, com o conteúdo que as CGF estabelecem de forma geral e abstracta.(…)Ao alterar as CGF (…), a ré não alterou um contrato: alterou, isso sim, com eficácia geral e abstracta, os futuros contratos de compra e venda que iriam ser celebrados entre ela e o autor. (...)” (Cf. Processo n.º 0630320)”.
Impõe-se antes de mais um percurso sobre a conceptualização doutrinária e jurisprudencial do contrato e dos contratos de distribuição, mais concretamente da concessão comercial.
Para já notar dois pontos importantes:
Em primeiro lugar, por regra, desde as tábuas, não conhecemos que a lei tenha surgido para criar realidades de facto, antes para operar – e operacionalizar interesses e poderes em pretensão de efectivação – confirmando, regulamentando ou proibindo e punindo realidades de facto surgidas. Prevenindo a pluralidade dessas realidades, o Direito, que estuda a emanação de poder, convocou a técnica da abstracção. Isto porém não esgota a persistência da realidade de facto em construir-se e reconstruir-se, e em, bastas vezes, opor-se (e relegar para o sótão das inutilidades as leis em vigor) nem portanto a necessidade, o arrasto a uma concomitante evolução legislativa. É que, os quadros abstractos, as vastas molduras, se formam redes, mesmo as de malha fina, também não são suficientes, em termos de eficácia de poder, sem os conteúdos normativos. Vem isto a dizer que nunca podemos partir da lei para entender a realidade e que é nesta que temos de fundar a construção e aplicabilidade de quaisquer institutos, conceitos, formas e normas jurídicas. Seria de todo espúrio termos leis sobre a protecção de direitos pessoais quando nem um de nós já sobrevivesse neste mundo – e o Direito não é decorrência do prazer dum exercício intelectual, antes é funcional, tem uma função, tem necessariamente, enquanto subsiste válido, uma utilidade.
Quando por tudo isto visitamos a doutrina, que não é outra coisa que estudo do Direito, o que temos de entender é que ela partiu da realidade de facto que teve oportunidade de analisar, e relativamente a ela eliminou individualidades e partiu para a formulação de conceitos abstractos, susceptíveis de aplicação à recorrência das situações, mas não propriamente a novas realidades ou a variações significativas da realidade de que partiu. Não pode entender-se a doutrina como cristalização de uma verdade conceptual absoluta, mas apenas como melhor pensamento de época produzido sobre uma específica e concreta realidade.
Do mesmo modo, a jurisprudência é ainda mais limitada, pois não lhe cabendo usurpar o papel da doutrina, tem mesmo de se ater à realidade de facto concreta, tal como concretamente se provou, o que a maior parte das vezes não será um espelho límpido da realidade, ou serão apenas fragmentos do espelho. Também nela não podemos desejar o alcance da verdade absoluta, de resto porque se trata de “coisa” que todo em todo não existe.
A valia essencial destas considerações não tem qualquer pretensão de inovação, antes procura realçar um ponto que se encontra na doutrina: - a evolução da realidade e a modulação conforme dos instrumentos de atendimento a essa evolução.
Na tábua escrita, voltamos a encontrar o acolhimento desta necessidade, no liberal princípio da liberdade negocial, na liberdade de apelo à conjugação de formas já pensadas e até puramente inovatórias. Na excepção “Salvo disposição em contrário…” também se encontra uma parte desse acolhimento, justamente na vertente de conformação modulatória.
Em suma, um pequeno reparo para não ter a tentação de ditar a partir do pressuposto da suficiência total da doutrina e, menos ainda, da jurisprudência.
Do contrato: ou melhor, antes disso, das formas de determinação de outrem à adopção ou omissão de comportamentos.
No quadro constitucional assente na dignidade da pessoa humana, este pilar fundamental determina a emissão, ao menos programática, do direito à vida e à integridade física, ao amparo no crescimento, à educação e um pouco adiante, à liberdade de escolha de profissão ou género de trabalho, à liberdade de deter propriedade privada e à liberdade de iniciativa económica privada, em lado algum formal portanto se encontrando, salvo excepcionalidades crescentes de interesse público, uma constrição a qualquer tipo de comportamento, mormente de trabalho para outrem ou sequer de colaboração mútua. Ninguém é obrigado a fabricar cigarros nem a comercializá-los, ninguém é obrigado a distribuir cigarros, nem mesmo ninguém é formalmente obrigado a fumá-los.
Excluída a imposição coactiva legalizada, podemos então encontrar duas formas alternativas para explicar os comportamentos correspondentes (vamos excluir os fumadores): como primeira forma, a livre associação em sentido puro, afinidade electiva como em Goethe, ou cumprimento de obrigação natural que se assume para com o divino ou o ideal ou mais prosaicamente no ideário corporativo, mas não para com o beneficiário directo dessa obrigação. Como segunda forma, a divisão social do trabalho, na exacta medida em que especializando-se cada um naquilo para que está mais apto, não consegue dedicar tempo a tudo o mais que precisa para sobreviver, e tudo o mais que necessita para sobreviver lhe virá como contrapartida do oferecimento da sua especialidade.
É esta segunda forma que está na funda origem do contrato (tipo perfeito da bilateralidade sinalagmática). Claro que ele pressupõe uma atribuição merecida (isto é, correspondente ao ponto material a que se chegou imediatamente antes da emissão conducente à contratação) ou, no mínimo, formal, de subjectividade, enquanto condição de auto-vinculação, e portanto não esconde que por trás da subjectividade formal está a subjectividade material, a radicação do sujeito no seu contexto material que lhe dita como ajuizar e decidir emitir declaração de vinculação interessada. Digamos, traduzindo, para os fins do caso, dependência económica em sentido lato.
Estes pressupostos formais assegurados – e não é de outra coisa, ou para outra coisa, que trata a generalizada afirmação constitucional do século XVIII da liberdade e da igualdade – estamos portanto em ver que, na ordem jurídica, não encontramos outra forma de sujeitos livres se vincularem perante outros à adopção de quaisquer comportamentos. E já lá iremos à oferta ao público, notando porém que ela, como quaisquer formas imperfeitas de outras promessas, anseia pela perfeição contratual – e nem outra coisa dizem as Rés.
Ora, honrando a utilidade da Teoria do Direito e os menos séculos da codicística civil, apela-se aos pré-conceitos operativos da declaração negocial, da regra geral da liberdade da sua forma e da simplicidade duma união feliz entre a proposta e a aceitação, para chegar à conclusão do contrato. Ao mínimo descuido, um contrato.
Claro, e assim se tem lustrado a melhor teoria, há que acomodar a evolução, a rapidez, e bem mais as alterações na materialidade donde emerge a subjectividade contratante e ainda tentar proteger quem tem mais queda a submergir. Há portanto outras formas de evitar dar passos em falso e há multiplicações vinculativas e há ainda a convocatória de diversos corpos especiais, várias “salvo disposição em contrário”, todos úteis à regulação.
Digamos que, a um dado passo de análise da realidade material, poderemos ser confrontados com a incorporação de camadas oriundas precisamente do mundo jurídico, nada obstando a que no plano da decisão inserta na declaração negocial tenha entrado também, como elemento de facto, um conhecimento estabilizado do Direito enquanto realidade “a se”. É isto que explica a importância do “nomem juris” na qualificação dum contrato.
Digamos que, na análise material podemos encontrar não um, mas variados feixes de vontade reciprocamente vinculante, em forma perfeita e também em forma incipiente. Em teoria, portanto, não é difícil pensar que abstractamente as relações entre a(s) T… e os grossistas nos pudessem apresentar contratos ao lado de essências pré ou pára-contratuais ou até de realidades a-jurídicas, não juridicizadas ou mesmo avessas, voluntária ou naturalmente (aqui mais difícil, pela tendência à omnipresença do Direito), à juridicidade. Mas porque estamos em exercício de teorização abstracto, também é possível pensar na união de diversos contratos para regulação duma realidade global. Esta pluralidade de possibilidades teóricas lembra ainda uma cautela que convém assistir à análise: cada parte do contrato pode dar testemunho da sua contribuição, do pensamento que lhe assistiu na construção dos seus interesses e na defesa dos seus interesses. Não estará a faltar à verdade, mas só a falar por si, esquecendo-se do outro.
Portanto, como primeiro passo, que se dará posteriormente, identificar se na relação que está em causa nos autos os comportamentos assumidos o foram por via de vinculações contratuais ou de afinidades electivas (por exemplo, a afinidade ao lucro). No primeiro caso, tentar perceber se conseguimos forçar a tela à moldura, doutrinária ou legal, ou eventualmente se temos de mandar alargar a moldura.
É ponto assente que só se fez moldura legal para o contrato de agência. A doutrina e jurisprudência molduraram para aquilo que chamam de tipicidade social. Qual é esse tipo?
Voltando a uma nota que já mencionámos na questão anterior, quando a produção é excedentária à necessidade de auto-consumo e ultrapassamos a troca directa pela mediação do contado, inicia-se o problema de saber como levar o produzido a quem o há-de consumir (mais se incrementa o problema quando a técnica auxilia a produção para modos de abundante vulgaridade, quando a chave é a velocidade de circulação, e quando o dinheiro em si entra na lógica da mercadoria). Intervém aqui o espaço geográfico e a distância, na correspondência à possibilidade técnica de a percorrer e ao grau de apetência induzida (isso é básico, não se quer consumir o que de todo não se conhece nem se ouviu falar) do consumo. No nosso caso ainda, ao grau de fidelização do consumidor.
Trata-se portanto de como pensar e organizar a condução do produzido ao seu consumidor.
Já antes falámos da impossibilidade prática duma leva diária a cada consumidor realizada pelo produtor ele mesmo, nem por um batalhão de empregados motorizados. Depois, ressoando salteadores ao caminho do mercador pela floresta, ressoando que o próprio mercador se descaminhe com a mercadoria, bem podemos pensar em dividir os riscos do percurso, e mais concretamente em nos garantirmos mesmo que, aconteça o que acontecer na viagem, já recebemos a nossa parte à saída da fábrica ou à chegada à “Estação de Caminho-de-Ferro mais próxima do seu armazém”. Quando se fala aqui em “nossa parte”, já estamos mesmo a pensar que a “nossa parte” não pode ser o bolo, porque dependemos de outrem para dar viabilidade à nossa produção, e portanto haverá “uma parte” para o outrem. Esta cautela não implica necessariamente um alívio quando temos consciência que não podemos perder de vista o interessado final, porque ele é o complemento necessário da nossa capacidade de conjugar meios e conhecimentos, da nossa capacidade de produção, e por isso, e em última análise, a nossa razão de ser. É também certo que quanto mais seguros forem os caminhos, mais nos podemos teletransportar quase até à porta do destino.
Na organização do escoamento dos produtos desde o produtor ao consumidor, por isso, diferentes modos podem ser pensados consoante as circunstâncias, as possibilidades e as exigências concretas.
Ora, estes modos podem ser recorrentemente frequentados, dando origem à tipicidade social, e podem ter particularidades não significativas ou significativas, estas em desvio para a atipicidade, e o reconhecimento destas particularidades, em qualquer qualificação, pode mesmo determinar a vantagem da tipicidade permanecer social e escapar a uma rigidez normativa contraproducente.
Se descentrarmos a análise das pessoas para as actividades, abandonaremos Sherwood, e chamaremos à condução do produzido ao consumidor, distribuição. Nela centramos então o exercício de descortinar as suas formas recorrentes.
Muito do que vimos dizendo, ou quase tudo, encontra respaldo na doutrina e jurisprudência. Citamos a propósito, desde logo para a origem do problema, a referência feita no Ac. do STJ de 24.5.2018, proferido no processo 1212/12.0TBSTS.P1.S1, aliás profusamente justificado e de muito interesse:
“Ainda no campo dogmático, não nos podemos olvidar da magistral lição de Miguel Pupo Correia no seu conhecido manual «Direito Comercial (Direito da Empresa)» onde o ilustre professor universitário assim discorre:
«A massificação da produção, a cada vez maior dimensão e complexidade de funcionamento dos mercados e a necessidade de maior especialização dos agentes económicos, obrigaram ao aparecimento de novas formas de distribuição e ao aperfeiçoamento de outras já conhecidas.
Lançando mão de uma classificação clássica, encontramos situações em que o produtor se encarrega da colocação dos seus próprios produtos no mercado distribuição directa até modelos muito sofisticados de redes de distribuição, as quais são criadas e geridas por entidades que se especializaram nesse tipo de actividade distribuição indirecta.
É, assim, fundamental ter uma visão dos tipos contratuais mais comummente utilizados para a criação de redes de distribuição destinadas a colocar as mercadorias junto do consumidor final.
Como facilmente se compreende, o enorme dinamismo dos agentes económicos, faz com que, constantemente, sejam criadas novas figuras contratuais, as quais umas vezes constituem meras nuances dos contratos já conhecidos, ao passo que noutras são figuras totalmente inovadoras.
(…)
Como modelos contratuais especialmente vocacionados para regular as relações produtor-distribuidor, apontam-se, normalmente, o contrato de agência, o contrato de concessão comercial, o contrato de mediação, o contrato de comissão e o contrato de franquia» [M. Pupo Correia, «Direito Comercial (Direito da Empresa)», Ediforum, 2011, pg. 500 e segs.].
Num artigo publicado na imprensa dedicada à Economia e Negócios, da autoria de Fernando Ferreira Pinto, assim afirmava o ilustre autor: «a distribuição comercial é um vasto sector da actividade económica envolvendo esquemas de actuação económica muito diversificados, que implicam um continuum de formas jurídicas, cuja destrinça só é possível mediante segmentações da realidade muitas vezes reveladas artificiais. Trata-se, além disso, de uma realidade profundamente dinâmica, sujeita a uma contínua adaptação às circunstâncias que em cada momento se verificam, evoluindo em paralelo com os processos produtivos e sob a influência das inovações tecnológicas» (Fernando A. Ferreira Pinto, «Os contratos de distribuição e o direito da concorrência: crónica de uma relação conturbada», in Jornal de Negócios, artigo de 6-10-2005, disponível na Net/ https//www.jornaldenegócios.pt).
As citações transcritas visam demonstrar a fluidez e a versatilidade conceptual deste tipo contratual, cujo polimorfismo e adaptabilidade às circunstâncias não se deixam encerrar nos tradicionais esquemas rígidos ou pouco flexíveis dos clássicos negócios jurídicos civilísticos, por isso que a dinâmica e o ritmo da vida económica hodierna também já não assenta sobre os cristalizados esquemas jurídico-negociais clássicos.
É este dinamismo palpitante da vida célere do actual mundo dos negócios, com novas realidades consentâneas com as transformações contemporâneas, que não tem paralelo com os tradicionais modelos contratuais, entre os quais pontificam, no nosso ordenamento, o vetusto contrato jurídico-civil de compra e venda e o da empreitada, que ainda não permitiu a tipificação legal do contrato de distribuição numa fattispecie normativa própria que inexiste impondo, até ao seu surgimento, o recurso analógico às normas do contrato de agência para a interpretação do conteúdo convencionado e para a dirimência da conflitualidade conexa com tais convénios contratuais, sendo este um caso prototípico da supra-referida afirmação de Romano Martinez, «a tipificação legal é normalmente precedida de uma tipificação social; verificando-se que um determinado contrato está enraizado na prática jurídica (tipificação social), com alguma frequência ele vem, depois, a ser legalmente tipificado».
Enquanto tal não vier a acontecer, isto é, enquanto não se vazar em molde legal específico a massa normativa do contrato de distribuição, os tribunais não deixarão de lançar mão à analogia com o contrato de agência sempre que tal seja a forma tida por adequada aos factos provados, como in casu, para a decisão do pleito, na esteira inter alia de Menezes Cordeiro no seu autorizado ensinamento de que «nada impede as partes de confeccionar contratos atípicos de distribuição.
De todo o modo, havendo distribuição, encontraremos sempre um núcleo contratual bastante próximo da agência.
Esta pode ser considerada como a figura-matriz dos contratos de distribuição. As suas normas podem alargar-se aos contratos de distribuição acima referidos e, ainda, aos contratos de distribuição atípica. A esta luz compreende-se a relevância comunitária assumida pela agência» (uti supra, fls. 24, sendo nossos os sublinhados e negrito).” (fim de citação do Ac. STJ 24.5.2018).
Mas já estamos a falar de contratos e não vimos as afinidades. Nada obsta a que duas ou mais pessoas se unam, dividam tarefas, no ideal relevante para cada uma delas, que por acaso comungam, de o alcançar. Se este ideal for o lucro, a conquista de meios materiais de sobrevivência na sociedade organizada sobre a ideia do pagamento da sobrevivência por meio equivalente ao trabalho (o capital já é decorrência), podemos ter assim, no caso, que a T… queria ter lucro e que várias pessoas mais ou menos associadas, aos seus familiares ou a outros, também foram francamente seduzidos pelo lucro e se disponibilizaram para fazer a tarefa de transporte até ao retalhista e este, também interessadamente, se encarregou de atender ao balcão. E porque todos comungam do mesmo ideal e de livre vontade meteram mão a cada uma das tarefas necessárias, então é apenas natural que tenham trocado ideias, que os mais lúcidos tenham orientado os menos esclarecidos, que aquele que mais lucro visa obter possa comunicar ao balconista, físico ou mecânico, o conhecimento mais especializado que lhe resultou da sua diligência alargada em estudo e pesquisa de sedução do fumador, desde logo, que nada a este nunca falte. De resto, também será muito útil que as mãos sejam ágeis, que não se engatem os dedos na clave, razão pela qual bem podem todos afinar em sinergias e eficiências várias. Tudo, assim de modo geral, com o potencial de explicação de cada uma das muitas cláusulas das condições gerais. A afinidade porém, só assim se pode chamar, enquanto espelho da igualdade que consegue gerar a liberdade. Não se geminam almas numa relação de subalternidade. Por isso, o grande óbice à explicação por afinidade, ao apelo ao a-jurídico, é a conservação dum reduto, não mínimo, antes significativo, de liberdade, e desde logo da liberdade de se manter como tal. Voltamos à ideia dos patamares de raciocínio: - em teoria todos somos livres, e os grossistas seguramente são livres de deixar de o serem, mas esse não é o patamar a convocar, antes o de saber se, no contexto real, na materialidade onde se inserem, os grossistas, como tal, mantendo-se como tal, conservam a liberdade para se desafinar.
É na materialidade, mais do que no texto, prima emissão, mas não exclusiva, da soberania individual, que se procura a base na qual confrontar, desde logo, o texto soberano. A pergunta é então se é eficiente, do ponto de vista económico, a independência dos intervenientes na concreta cadeia que neste caso liga a produção ao consumo. Dizem logo as Rés: - não, de modo algum, é para isso mesmo que estabelecemos as condições que tem de ter quem nos quiser comprar, a primeira das quais é que tem de garantir que o cliente fumador não se veja na necessidade de recorrer à produção artesanal. Estabelecemo-las justamente porque estamos inteiramente nas mãos dos nossos clientes e por isso temos todo o interesse, nós que já vamos mais à frente, em garantir que essas mãos funcionem e de modo eficiente. Dizem logo as Autoras: - não, de modo algum, tivemos imenso trabalho e gastámos um imenso dinheiro para podermos deitar mão à tarefa, não temos interesse algum em que a T… se desafine para a produção de baralhos de cartas, até porque será difícil convencer o fumador a mudar para o vício do jogo. Dir-se-ia, para não recorrer a La Palisse, que é muito provável que levar milhões de cigarros a milhões de fumadores em milhares de sítios diferentes, e tudo isto só num País pequenino, tem sentença fatal garantida com a manutenção da liberdade de desafinação.
Uma análise mais detalhada ao texto, à prova e à argumentação das partes ficará para depois, mas impunha-se esta rectificação antes de passarmos a abordar largamente a temática contratual e os tipos sociais sobre que recai.
Dando mais enfâse a determinados aspectos da materialidade de facto que têm para analisar do que a outros, assim se varia a definição tipológica e a abstracção conceptual, mas o certo é que não encontramos na doutrina nem na jurisprudência uma clivagem fundamental, uma verdadeira controvérsia.
Não é este o lugar nem a competência para uma lição de direito, e de resto, em bom rigor, poderíamos até saltar para saber se a matéria de facto provada se inscreve num contrato de concessão comercial, como defendido pelas Autoras, ou não tem nada de juridicamente vinculante além dos sucessivos contratos de compra e venda como defendem as Rés.
Ainda assim convém fazer uma nota breve sobre a valoração jurídica – no fundo, sobre a vantagem de chamar o jurídico – a regular a distribuição.
Também Menezes Cordeiro (in “Do contrato de concessão comercial” – consultável em Portal.oa.pt) inicia lapidarmente com a seguinte menção: “Qualquer economia moderna assenta numa divisão de funções e de tarefas. Designadamente: o fabricante de bens terá, em princípio, aptidões industriais; mas não comerciais. Por seu turno, no próprio campo da comercialização, haverá agentes económicos grossistas e, separadaemtne, retalhistas: aqueles que têm contacto mais estreito com o público, designadmente os pequenos consumidores privados. Os circuitos económicos de distribuição dos bens, desde o produtor e até ao consumidor final são dobrados por esquemas jurídicos destinados a legitimá-los, fixando os direitos e os deveres das partes envolvidas. Trata-se, grosso modo, dos contratos de distribuição”.
Nas diferentes formas socialmente típicas de dobrar juridicamente a distribuição, assinala o mesmo Professor na mesma publicação: “Vários são, de todo o modo, os esquemas contratuais possíveis, típicos ou atípicos” e passando a distingui-los, opera desde logo uma divisão fundamental entre a distribuição directa e a indirecta, assinalando nesta a entrada do grossista: “o bem atravessa ainda várias fases, passando do produtor ao grossista, do grossista ao retalhista e do retalhista ao consumidor”. Prossegue distinguindo entre a distribuição integrada e a não integrada, no primeiro caso existindo coordenação entre a produção e a comercialização, de tal modo que “o distribuidor é integrado em circuitos próprios do produtor, sujeitando-se, eventualmente, às suas directrizes” (sublinhado nosso) e no segundo caso não existindo concertação entre as actuações do produtor e do distribuidor.
Para o mesmo autor “A distribuição indirecta integrada pressupõe, em regra, a celebração, entre os interessados e, designadamente, entre o produtor e os distribuidores, de adequados instrumentos contratuais. A doutrina especializada aponta quatro tipos de situações jurídicas possíveis (…): - a agência, a concessão, a franquia, a livre organização de cadeias. Nesta hipótese não há instrumentação contratual que estruture a articulação entrer produtor, distribuidores e retalhistas”.
Engrácia Antunes[14] ensina: “Por contratos de distribuição comercial entendemos aqui genericamente aqueles contratos, típicos ou atípicos, que disciplinam as relações jurídicas entre o produtor e o distribuidor “lato sensu” com vista à comercialização de bens e serviços do primeiro. A distribuição comercial pode assumir diferentes modalidades. Desde logo, a distribuição comercial pode ser directa ou indirecta. Ao passo que na primeira é o produtor que se encarrega da colocação dos seus próprios produtos ou serviços no mercado (usualmente recorrendo para tal a divisões orgânicas ou a pessoal dependente (…), na última o produtor concentra-se exclusivamente na função produtiva e renuncia à tarefa de comercialização, confiando esta a empresários ou intermediários autónomos especializados (v.g. transportadores, armazenistas, comissários, mediadores, agentes, concessionários, franquiados, etc.). Por seu turno, a própria distribuição indirecta pode ser simples ou integrada. Ao passo que na primeira, caracterizada pela ausência de coordenação entre a produção e a distribuição, o produtor concede uma grande autonomia aos seus distribuidores, no exercício da respectiva actividade empresarial distributiva, na última, onde tal coordenação está sempre presente, o distribuidor surge aos olhos do público como um empresário no âmbito da estratégia e rede de distribuição concebida pelo produtor, como tal sujeitando-se, em maior ou menor grau, às orientações e fiscalizações genéricas deste último (será o caso comum dos agentes, concessionários, franquiados ou distribuidores selectivos)”.
Prossegue o mesmo autor discorrendo sobre modalidades contratuais de distribuição e aportando ao contrato de agência, refere-se-lhe como aquele que “consiste no contrato pelo qual uma das partes – o agente – se obriga a promover por conta da outra – o principal – a celebração de contratos, de modo autónomo, estável e remunerado”.
Menciona igualmente a franquia “o contrato pelo qual um empresário – o franquiador – concede a outro empresário – o franquiado – o direito de exploração e fruição da sua imagem empresarial e respectivos bens imateriais de suporte (mormente, a marca), no âmbito da rede de distribuição integrada do primeiro, de forma estável e a troco de uma retribuição”; a mediação, “o contrato pelo qual uma parte – o mediador – se vincula para com a outra – o comitente ou solicitante – a, de modo independente e mediante retribuição, preparar e estabelecer uma relação de negociação entre este último e terceiros – os solicitados – com vista à eventual conclusão definitiva de negócio jurídico”, com relevância na distribuição de produtos ou serviços de natureza contratual, pense-se em contratos de seguro, por exemplo; a comissão – “contrato pelo qual uma das partes – o comissário – se obriga a praticar um ou mais actos comerciais em nome próprio e por conta da outra – o comitente”, assinalando a sua tendência decrescente em em função da “crescente importância da imagem da empresa e da marca dos produtos”. Refere ainda a distribuição selectiva e a distribuição autorizada, caracterizando esta como “o contrato através do qual um empresário vende os seus produtos a um conjunto de revendedores seleccionados que não usufrem de um exclusivo de venda”, mencionando como nota dissonante para a primeira modalidade a menor integração na rede, que faz o distribuidor autorizado aproximar-se dum revendedor independente.
Num estudo bem interessante, Sónia de Carvalho[15] refere: “O contrato de distribuição selectiva, a par dos contratos de agência, de concessão comercial e da franquia, também é um instrumento jurídico utilizado pelo produtor para a distribuição de bens”. Apesar de se referir essencialmente à relação entre produtor e retalhista, adverte, na 1ª nota de rodapé, que na intermediação, entre o produtor e o retalhista, de grossistas, também se impõe “a celebração deste contrato com estes intermediários de forma a que também recaia sobre estes a obrigação de não vender a retalhistas estranhos à rede”. Caracterizando-o como contrato-quadro “a partir do qual as partes se vinculam a um feixe de direitos e obrigações destinados a garantir a integração do revendedor na rede de distribuição selectiva e a sua sujeição à política comercial do produtor”, prossegue “Neste conjunto de direitos e obrigações, assume especial importância a obrigação assumida pelo produtor de fornecer, de forma regular e periódica, ao distribuidor, produtos e acessórios, e este de adquirir os produtos de acordo com as condições fixadas no contrato, onde se inclui o montante mínimo de compras, a fixação do preço e dos descontos em função do volume de negócios e as condições de entrega das mercadorias”. Prossegue ainda: “A par destas obrigações, o produtor obriga-se a não fornecer produtos aos comerciantes que estão fora da rede, recaindo sobre os distribuidores da rede a obrigação de não vender produtos aos distribuidores que estão fora da rede. Estas obrigações de prestação de facto negativo dão origem a uma rede de comercialização fechada, na qual a comercialização dos produtos está circunscrita aos pontos de venda da rede. A ausência destas obrigações conduziria à comercialização dos produtos para fora da rede, tornando inútil a selecção efectuada pelo produtor ou grossista e comprometendo a finalidade prosseguida pelo contrato”. Mais explica que a selecção dos comerciantes é necessária à comercialização do produto, de acordo com critérios técnicos e de qualidade que o produtor considera necessários, e que está normalmente associada a grandes marcas, produtos de luxo, cosmética, relojoaria, ourivesaria ou produtos de alta tecnicidade, na medida que a selecção dos revendedores permite defender o prestígio da marca, salvaguardando o acesso reservado ao produto, os investimentos em promoção e publicidade e permitindo também aumentar a notoriedade do produto. É também necessário assegurar “um serviço de assistência pré-venda e pós-venda eficaz, e para tudo isto serve a selecção dos comerciantes”.
Curiosamente, na nota de rodapé nº 6 dá conta, citando Didier Ferrier, “Droit de La Distribution”, e Paolo Cesarini, “Les systèmes de distribution selective en droit communautaire de la concurrance”, que também é usado este método de distribuição para a venda de cigarros, em obediência aliás a exigências de stock e de garantia de boa qualidade do produto na chegada ao consumidor.
Já concretamente quanto ao contrato de concessão comercial invocado pelas Autoras, e aproveitando sinergias (desde logo pela referência tanto à doutrina como à jurisprudência) e os ensinamentos mais recentes, citamos o Acórdão do STJ de 19.9.2019, proferido no processo 391/06.0TBBNV.E1.S1-A em recurso parra uniformização de jurisprudência (cuja nota inicial da citação que vamos fazer, sintetiza com mais probidade jurídica muito do que também já dissemos):
“3.1. Do contrato de concessão comercial
Nas relações negociais, os contraentes são inteiramente livres, tanto para contratar ou não contratar, como para fixar o conteúdo das relações contratuais que estabeleçam, desde que não haja lei imperativa, sustentada em normativos éticos e sociais, ou mesmo na segurança do comércio jurídico, ditame de ordem pública ou bons costumes que se oponham (neste sentido, Almeida Costa, in Direito das Obrigações, Almedina, 3.ª edição, página 184).
(…)
A concessão comercial constitui um método de organização das relações entre produtor e distribuidor, a par duma técnica de distribuição de produtos no mercado. A operação económica que subjaz a este contrato, intermediando a produção e o consumo, visa precisamente a comercialização de um produto ou gama de produtos.
Jurisprudência e Doutrina sufragam idêntico entendimento no que ao contrato de concessão comercial respeita, ao defenderem que este contrato se apresenta como um contrato juridicamente inominado que, em traços gerais, se pode descrever como aquele pelo qual um empresário - o concedente - se obriga a vender a outro - o concessionário - ficando este último, em contrapartida, obrigado a comprar ao primeiro, certos produtos para revenda, em nome e por conta própria, bem como a observar determinados deveres emergentes da sua integração na rede de distribuição do concedente, tendo por finalidade criar e disciplinar uma relação jurídica de colaboração estável e duradoura entre as partes, cuja execução se traduz na celebração futura entre as partes, de sucessivos contratos de compra e venda.
Nesta medida, o contrato de concessão comercial tem como elementos caracterizadores: o carácter duradouro; a actuação autónoma do concessionário, em nome próprio e por conta própria, assim se transferindo o risco de comercialização do produtor para o distribuidor; o objecto mediato é constituído por bens produzidos ou distribuídos pelo concedente; a obrigação do concedente celebrar, no futuro, sucessivos contratos de venda (dever de venda dos produtos a cargo do concedente); a obrigação do concessionário de celebrar - no futuro - sucessivos contratos de compra (dever de aquisição impendente sobre o concessionário); o dever de revenda por parte do concessionário dos produtos que constituem o objecto do contrato, não sendo necessária a delimitação de uma zona geográfica ou humana a que o mesmo se refere; a obrigação do concessionário orientar a sua actividade empresarial em função das finalidades do contrato e do concedente fornecer ao concessionário os meios necessários ao exercício da sua actividade - obrigação de promoção; a exclusividade (na maioria dos casos).
Na Doutrina, no sentido enunciado, divisamos, entre outros:
António Pinto Monteiro, in Contratos de Distribuição Comercial - Relatório, Livraria Almedina, Abril de 2009, páginas 110 e seguintes, Maria Helena Brito, in O Contrato de Concessão Comercial, páginas 54 e seguintes e 179 a 184; Menezes Cordeiro, in Manual de Direito Comercial, 2007, página 678; José Engrácia Antunes, in Direito dos Contratos Comerciais, Livraria Almedina, Setembro de 2009, páginas 446/447 e Os Contratos de Distribuição Comercial, páginas 19 a 24; João Calvão da Silva, in Concessão Comercial e direito da concorrência, Estudos Jurídicos (Pareceres), Almedina, páginas 192 a 196; José Alberto Vieira, in O Contrato de Concessão Comercial, AAFDL, 1991, página 15; e Abílio Neto, in Código Comercial e Contratos Comerciais Anotado - Setembro/2008, página 583.
Assim, a título de exemplo:
José Engrácia Antunes, in Direito dos Contratos Comerciais, Almedina, 2009, páginas 446 e 447, sustenta a propósito do contrato de concessão como aquele em que “um empresário, o concedente, se obriga a vender a outro, o concessionário, ficando este último obrigado a comprar ao primeiro certos produtos para revenda em nome e por conta próprios, numa determinada zona geográfica, bem assim como a observar determinados deveres emergentes da sua integração na rede de distribuição do concedente”, rematando, de seguida, “Antes do mais, o contrato de concessão comercial constitui um contrato-quadro (“Rahmenvertrag”, “contrat-quadre”) no sentido em que visa criar e disciplinar uma relação jurídica de colaboração estável e duradoura entre as partes, cuja execução se traduz na celebração futura entre estas de sucessivos contratos de compra e venda”;
De igual modo, Maria Helena Brito, in O Contrato de Concessão Comercial, Almedina, 1990, página 183, defende que “pelo contrato de concessão comercial é instituída uma relação contratual duradoura para a distribuição por uma das partes, o concessionário, de produtos adquiridos à outra parte, o concedente; as partes obrigam-se a celebrar entre si sucessivos contratos de compra e venda, sendo as condições de formação e o conteúdo desses contratos pré-determinados: o concedente obriga-se a vender, em determinada zona, ao concessionário e este obriga-se a comprar bens produzidos ou distribuídos pelo primeiro; o concessionário obriga-se a promover a respectiva revenda, em nome próprio, na zona e segundo as condições fixadas e deve orientar a sua actividade empresarial em função das finalidades do contrato; o concedente obriga-se a fornecer ao concessionário todos os meios necessários ao exercício da sua actividade”;
Pinto Monteiro, in Direito Comercial, Contratos de Distribuição Comercial, Almedina, 2002, página 110, reafirmado, in, Revista de Legislação e Jurisprudência, ano 144º, página 367 e 368, para quem a concessão comercial é um “contrato-quadro” que “faz surgir entre as partes uma relação obrigacional complexa, por força da qual uma delas, o concedente, se obriga a vender à outra, o concessionário, e este a comprar-lhe, para revenda, determinada quota de bens, aceitando certas obrigações - mormente no tocante à sua organização, à política comercial e à assistência a prestar aos clientes - e sujeitando-se a um certo controlo e fiscalização do concedente”, defendendo, de igual modo, que “como contrato-quadro, o contrato de concessão comercial funda uma relação de colaboração estável, duradoura, de conteúdo múltiplo, cuja execução implica, designadamente, a celebração de futuros contratos entre as partes, pelos quais o concedente vende ao concessionário, para revenda, nos termos previamente estabelecidos, os bens que este se obrigou a distribuir.
Na Jurisprudência, perfilhando a conceptualização consignada, podemos ver, entre outros, os seguintes Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça: de 31 de Março de 2004 (Processo nº 04B545); de 21 de Abril de 2005 (Processo nº. 04B3868) ; de 13 de Setembro de 2007 (Processo nº. 07B1958); de 15 de Novembro de 2007 (Processo nº. 07B3933); de 24 de Janeiro de 2012 (Processo n.º 39/2000.L1.S1) ; de 24 de Janeiro de 2012 (Processo n.º 2568/05.6TBCLD.L1.S1); de 20 de Março de 2014 (Processo n.º 28/08.2TBVNG.P1.S1); de 12 de Março de 2015 (Processo n.º 2199/11TVLSB.L1.S1); de 24 de Maio de 2018 (Processo n.º 1212/12.0TBSTS.P1.S1); e de 4 de Outubro de 2018 (Processo n.º 19656/15.3T8PRT.P1.S1).
Neles podemos encontrar os seguintes dizeres:
“A concessão comercial constitui, ao mesmo tempo, um método de organização das relações entre produtor e distribuidor e uma técnica de distribuição de produtos no mercado. A operação económica que subjaz a este contrato, intermediando a produção e o consumo, visa precisamente a comercialização de um produto ou gama de produtos. Entre o concedente e o concessionário estabelece-se uma relação jurídica duradoura, representando o dever de revenda o núcleo central do contrato, agindo o concessionário em seu nome e por sua conta. Ele é proprietário dos produtos que distribui e a sua contrapartida económica traduz-se na diferença entre o preço por que compra os produtos e o preço por que os revende.” - Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 13 de Setembro de 2007 (Processo n.º 07B1958), in, www.dgsi.pt.
“O contrato de concessão comercial envolve de uma relação contratual duradoura entre o concedente e o concessionário, em que este actua em nome e por conta própria, obrigando-se a promover a revenda dos produtos daquele na zona a que se reporta, e o último a celebrar com o primeiro sucessivos contratos de compra e venda e a fornecer-lhe alguns dos meios necessários ao exercício da sua actividade.” - Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 15 de Novembro de 2007 (Processo n.º 07B3933), in, www.dgsi.pt.
“Sendo o contrato de concessão comercial um contrato de cooperação comercial e de distribuição, pressupondo uma integração e conjugação de esforços organizativos com vista à implementação de bens no mercado, assumem especial relevo a estabilidade e permanência – o seu cariz continuado, duradouro – sem o qual a vertente de rentabilização económica dificilmente será alcançável.” - Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 24 de Janeiro de 2012 (Processo n.º 39/2000.L1.S1), in, www.dgsi.pt.
“O contrato de concessão comercial obriga à celebração de outros contratos de compra e venda entre as partes, beneficiando, em regra, mas não, necessariamente, de exclusivo, integrando-se na actividade comercial de duas empresas, para efeitos de distribuição no mercado, com carácter duradouro, como um dos seus elementos, essencialmente, individualizadores.” - Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 24 de Janeiro de 2012 (Processo n.º 2568/05.6TBCLD.L1.S1), in, www.dgsi.pt.
“O contrato de concessão comercial, contrato consensual (art. 219.º do CC) e assim assente na autonomia privada, oneroso, atípico e inominado, modalidade dos contractos de cooperação comercial, mormente na vertente de contratos de distribuição, pode ser entendido como um contrato-quadro, que faz surgir entre as partes uma relação obrigacional complexa, por força da qual uma delas, o concedente, se obriga a vender à outra, o concessionário, e esta a comprar-lhe, para revenda, determinada quota de bens, aceitando certas obrigações - mormente no tocante à sua organização, à política comercial e à assistência a prestar aos clientes - sujeitando-se, ainda, a um certo controlo e fiscalização do concedente. Sendo, pois, os seguintes os traços caracterizadores de tal contrato: (i) estabilidade do vínculo; (ii) dever de venda dos produtos a cargo do concedente; (iii) dever de aquisição impendente sobre o concessionário; (iv) dever de revenda; (v) actuação do concessionário, em nome e por conta própria; (vi) autonomia; (vii) exclusividade; (viii) zona de actuação. Tem cariz marcadamente continuado ou duradouro, pelo que a sua resolução ilícita implica, à partida, o dever de indemnizar em relação aos prejuízos causados.” - Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 20 de Março de 2014 (Processo n.º 28/08.2TBVNG.P2.S1), in, www.dgsi.pt.
“O contrato de concessão comercial é um contrato atípico, uma modalidade dos contratos de cooperação comercial, mormente na vertente dos contratos de distribuição, pelo qual um comerciante independente, o concessionário, se obriga a comprar a outro, o concedente, determinados bens de marca, para os revender em determinada área territorial, normalmente, mas nem sempre, com direito de exclusividade. Configura um contrato atípico de distribuição autorizada - sendo relativamente ténue a integração económica do distribuidor autorizado na rede comercial do fornecedor - o acordo pelo qual o produtor confere, sem obrigação de exclusividade, a um comerciante, escolhido em razão da sua aptidão técnica e comercial, a qualidade de distribuidor dos seus produtos, que fica com a obrigação de orientar a clientela para estes, mas não de exercer uma actividade de promoção da revenda dos mesmos.” - Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 9 de Julho de 2015 (Processo n.º 2368/07.9TBVCD.P1.S1), in, www.dgsi.pt.)
“O contrato de distribuição comercial é um negócio jurídico bilateral (contrato) mediante o qual uma das partes, o distribuidor, se vincula a adquirir à outra parte, o principal (produtor ou importador-fornecedor), uma quantidade de bens comerciais para posterior colocação no mercado numa certa área e por sua conta e risco. A concessão comercial é um dos contratos da distribuição comercial, ao lado da agência e do franchising, pelo qual o concessionário se obriga a comprar certa quantidade de produto e a revendê-lo durante certo período de tempo.” - Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 24 de Maio de 2018 (Processo n.º 1212/12.0TBSTS.P1.S1), in, www.dgsi.pt”. [16] (fim de citação do Acórdão STJ de 19.9.2019, processo 391/06.0TBBNV.E1.S1-A).
O Professor Pinto Monteiro, tanto referenciado nas citações, emitiu um parecer para o caso concreto dos autos. E nele refere, e para já apenas em termos genéricos quanto à concessão comercial:
“A distribuição comercial (…) efectua-se através de esquemas contratuais diversos. Um deles é o contrato de concessão (…)”. “Temos compreendido a concessão como um contrato-quadro (“Rahmenvertrag”/”contrat-cadre”) que faz surgir entre as partes uma relação obrigacional complexa por força da qual uma delas, o concedente, se obriga a vender à outra, o concessionário, e esta a comprar-lhe, para revenda, determinada quota de bens, aceitando certas obrigações – mormente no tocante à sua organização, à política comercial e à assistência a prestar aos clientes – e sujeitando-se a um certo controlo e fiscalização do concedente. (…) Como contrato-quadro, o contrato de concessão comercial funda uma relação de colaboração estável, duradoura, de conteúdo múltiplo, cuja execução implica, designadamente, a celebração de futuros contratos entre as partes, pelos quais o concedente vende ao concessionário, para revenda, nos termos previamente estabelecidos, os bens que este se obrigou a distribuir”.
Mais adiante: “Há, assim, três notas essenciais que convém destacar, as quais em nossa opinião, fornecem o recorte da figura. Em primeiro lugar, a concessão é um contrato em que alguém assume a obrigação de compra para revenda, nele se estabelecendo desde logo os termos (ou os principais termos ou regras) em que esses futuros negócios serão feitos. Daí que, ao celebrarem, periodicamente, os contratos de compra e venda pelos quais o concessionário adquire do concedente os bens para revenda, estão ambas as partes a cumprir a obrigação anteriormente assumida. A estes últimos podemos chamar contratos de execução, os quais se inserem no quadro definido pelo primeiro e o complementam. Em segundo lugar, o concessionário age em seu nome e por conta própria assumindo os riscos da comercialização. Finalmente, no contrato de concessão, vinculam-se as partes a outro tipo de obrigações – além da obrigação de compra para revenda - , sendo através delas que verdadeiramente se efectua a integração do concessionário na rede ou cadeia de distribuição do concedente. São obrigações de índole e intensidade diversas, com as quais se visa, no fundo, definir e executar determinada política comercial. Isso pode implicar, designadamente, o estabelecimento de regras sobre a organização e as instalações do concessionário, os métodos de venda, a publicidade, a assistência a prestar aos clientes, etc; consagra-se, além disso, um certo controlo do primeiro sobre a actividade do segundo. Numa palavra, trata-se definir regras de comportamento através das quais se estabelecem relações de colaboração entre as partes e se articula e coordena a actividade de todos no seio da rede de distribuição, regras essas que implicam obrigações várias e se fundam – justamente com a obrigação de compra para revenda – no contrato de concessão como contrato-quadro que é. (…) É a integração, ainda, que torna mais fácil ao concedente impor a sua política comercial e controlar a fase da distribuição, sendo certo, por outro lado, que o concessionário também retira daí benefícios, mormente pela posição de privilégio e a vantagem concorrencial que passa a ter. O que, tudo junto, evidencia a função económico-social deste contrato (a sua causa, “hoc sensu”) e explica a sua importância e frequente utilização prática (…)”[17].
Feito este percurso e procurando sintetizar, temos assim o entendimento homogéneo de que o contrato de concessão comercial, inserindo-se nos contratos de distribuição e por isso ligado à razão económica da actividade de distribuição, é o instrumento pelo qual as partes procuram organizar entre si as contribuições mútuas para a efectivação dessa actividade, a qual por natureza é tendencialmente duradoura, arrastando a durabilidade contratual enquanto referencial duradouro face ao qual se aferem e afinam as referidas contribuições, e face ao qual também é possível às partes, com estabilidade, organizarem os seus próprios meios para poderem realizar as suas previstas contribuições.
A primeira nota dominante é assim a de que estamos perante instrumento jurídico de agilização da colaboração pretendida e necessária à consecução do fim visado: - o consumo do produto.
A segunda, ou se calhar é mesmo uma nota prévia, uma evidência, é que o recurso a um instrumento jurídico visa garantir os comportamentos funcionais recíprocos necessários ao mesmo fim de levar o produto ao consumidor. Visa garanti-los na estabilidade exigida pelas afectações de recursos a fazer, visa o possível mas adequado funcionamento económico, o que se traduz mais abstractamente no campo jurídico por certeza e segurança.
A terceira, é a de que as notas essenciais características são as já mencionadas, enquadramento da venda/compra para revenda, por conta própria e risco próprio do revendedor/distribuidor por modo que as condições específicas ou concretamente necessárias sejam previamente estabelecidas para quaisquer vendas/compras para revenda que venham a acontecer, num período tendencialmente duradouro mas seguramente de ocorrência não isolada, e finalmente que as decisões do produtor relativas a como atingir o fim do consumo possam ser veiculadas através dum esquema normativo comprovável, ou seja, a integração do interveniente ou dos intervenientes subsequentes na cadeia de distribuição, na organização desejada pelo produtor.
Esta última deixa imediatamente de lado, no plano da realidade económica, todo o tipo de produto que não é dotado de qualquer especificidade, ou aqueles cuja generalidade e abundância “natural”, por assim dizer, são apenas cobertos por um véu extrínseco, relativamente banal, e falível, de imagem estudada. Tanto podemos falar de batatas como de ácido muriático.
Neste sentido Maria Helena Brito, e agora estamos a citar a partir da contestação, que depois de destacar “que a concessão comercial, sendo simultaneamente um método de organização racional das relações entre produtor e distribuidor e uma técnica de distribuição de produtos no mercado, não tem razão de ser na distribuição de bens de consumo corrente ou de simples tecnicidade (…) prossegue, dizendo que a comercialização de tais bens – como, por exemplo, drogaria –, não exige nem instalações técnicas na fase de venda nem organização de serviço pós-venda, pois que tais bens se destinam ao consumo imediato ou a uma utilização que conduz, naturalmente, à sua destruição (…)” Assim, prossegue a contestação “produtos daquela natureza são distribuídos numa série muito vasta de pontos de venda, o que não permite ao produtor intervir na comercialização no estádio do comércio a retalho. O produtor tem de limitar a sua acção ao estádio do comércio por grosso e, a este nível, a distribuição é feita por grossistas independentes. Assim se explicando que a concessão comercial não esteja difundida no sector nos produtos de consumo corrente, mesmo a nível do comércio grossista (…)”. Neste caso, o recurso à concessão só se justificaria quando o produtor pretendesse lançar no mercado um novo produto aperfeiçoado, procurando então reforçar a actuação publicitária que o produtor dirige ao público com a actuação do concessionário. Pelo contrário, a intervenção “do concessionário é frequente em relação a certos produtos de consumo corrente considerados de luxo, como bebidas de marca, certos produtos têxteis, vestuário de alta qualidade, perfumes, produtos de beleza, etc.”, porque estas qualidades exigem aptidão profissional e técnica à altura por parte dos distribuidores.
Já quanto a “alguns dos artigos de marca não se revela adequada a intermediação de concessionários, sendo esse o caso, por exemplo, “de certos artigos de marca produzidos em massa e standardizados, com valor reduzido e de utilização diária”, como “sabões, produtos de limpeza, cigarros” (…)” por, segundo a mesma Autora, “o êxito da comercialização de tais produtos pressupor que o comerciante disponha de quantidades tais que possa, em qualquer momento, satisfazer a procura dos seus clientes. O comerciante, que pretende manter a sua clientela, não aceita, portanto – conclui – qualquer limitação nos abastecimentos”.
Por outro lado, dizem ainda as Rés, quanto aos artigos de luxo, citando neste caso Pinto Monteiro, a concessão concede o privilégio de uma venda pré-garantida – Maria Helena Brito fala de produtos “pré-vendidos”, em consequência de uma forte acção publicitária – e daí o interesse dos candidatos a concessionários e a justificação para aceitação, por estes, de imposições estabelecidas pelo produtor.
Com o devido respeito e retomando muito do que já dissemos, a atipicidade e a liberdade negocial permitem ainda aceitar a vontade das partes na cobertura de produtos, produções e redes de distribuição ao consumo que não apontariam tradicionalmente à concessão comercial. Mas também a própria natureza dos produtos e a inovação ou recursos da produção permitirão apontar à concessão comercial como a mais eficaz cobertura, em casos aparentemente não nela enquadráveis. Assim, o recurso imaginativo que assistiu a produção do “tradicional pastel de bacalhau com queijo da serra”, pese a banalidade, já pode sensatamente convocar esse instrumental jurídico, justamente porque se tratará então de garantir que essa “inovação” se não perca por meio à imaginação convocada pela arte de vender na cadeia subsequente que levará o pastel aos quatro cantos do mundo, ou seja, porque terá conveniência controlar a rede de distribuição.
Para sermos coerentes com a atipicidade convivente com a tipicidade, ou seja, para acomodarmos a evolução do mercado e da tecnologia e bem outras valias do pensamento e da acção humanas, e ainda mais eficazmente a velocidade crescente do mundo que no seu suporte material teima em rodar ao ritmo tradicional, fomos deixando cair traços apontados como distintivos à concessão comercial, porque apontados por existentes in illo tempore, como a exclusividade, quer do produtor/fornecedor quer do grossista, como a restrição geográfica. Dito de outro modo, se, relativamente ao produto que produzo para vender, venho a descobrir que consigo atingir melhor o consumidor final mandando-lhe à porta três distribuidores em vez de um, não vou dar exclusivo a nenhum destes nem vou dar nem deixar que me peçam actuações privilegiadas em determinadas zonas geográficas. À uma, porque não será normal que quem vive no Algarve queira assumir as despesas de ir distribuir a Paços de Ferreira, e “à duas” porque há que por em prática os melhores ensinamentos da economia de mercado: - a concorrência, preferencialmente feroz, serve melhor o consumidor e por arrasto, a mim que produzo os produtos que ele vai consumir.
Repare-se outrossim que não existe irrelevância do grossista, sob o prisma de que uma política comercial inerente a um produto de alta qualidade teria o lugar natural de exercício junto do consumidor e do retalhista dele próximo, quando em termos práticos, da realidade concreta, nos é impossível atingir o consumidor (proibições de publicidade) e nos é também impossível atingir uma parte substancial do retalho. A circunstância natural concreta diz então que é preciso, o lugar onde é preciso garantir as opções de política comercial, é o do grossista.
Vem isto a dizer que, conquanto possamos encontrar os traços essenciais com que foi conceptualizada a concessão comercial, e mais concretamente enquanto consigamos encontrar venda para revenda, risco assumido pelo comprador, durabilidade e integração na organização desejada pelo vendedor, traços temporalmente válidos mas não vitaliciamente, e não equiparações formalistas, não servem para a descartar. Se a concessão foi tradicionalmente atribuída a bens de elevado valor, porque a esses, dados os investimentos feitos, dados os clientes finais que se pretendem atingir, se justifica ter garantias de idoneidade e aptidão financeira mas mais ainda técnica dos intervenientes na cadeia, e muito se justifica por isto mesmo que o produtor queira controlar esta cadeia, já o valor diminuto de bens, alguns de elevado prestígio, não pode servir para afastar a utilidade da concessão comercial, quando esses bens são de consumo diário e o que está em causa não é o seu consumo diário em pequenas doses mas a produção de milhões de unidades de pequeno valor, assim transformadas num interesse global de imenso valor. Quando falamos de cigarros de marcas com grande notoriedade não estamos, pese a destinação ao consumo e o preço unitário baixo, a falar de batatas e muito menos de drogarias. É também que o investimento em publicidade, em inovação e em aperfeiçoamento qualitativo, quando falamos em batatas e drogarias, é menos que nada, ou é pelo menos da já assinalada rotunda banalidade. Se era inerente à grande valia dos bens de luxo o serviço pré e pós venda, não é a inexistência dum serviço destes num negócio de venda de bens que normalmente não apresentam qualquer necessidade de assistência (até porque são, em consequência da notoriedade da marca e em consequência da vontade de fomentar a dependência do consumidor em relação à marca, de qualidade garantida à partida), também por via de consumo imediato, que torna indiferente ao produtor o controlo da rede. Não é porque o meu consumidor final não se situa nas camadas de fino gosto e refinado poder económico e portanto não preciso de ter um pára-par dele para o convencer, que vai ser desnecessário controlar o modo como o produto (cigarro da marca de que o consumidor depende) chega ao consumidor, quando os milhares de pessoas menos polidas que preciso para atingir milhões heterogéneos e grandemente rudes, podem render-me muito mais do que meia dúzia de engravatados, por assim dizer. A utilidade da concessão comercial não se define pelos dois lados da linha, mas pelo lado do produtor. O lado do consumidor final é um referente, a razão de ser da produção, mas não de modo fixo nem original. É um referente claramente maleável e manipulável, constitui-se nesse manuseamento, nesse tratamento que o leva a dar conta do produto, que o leva eventualmente a convencer-se da genuinidade e originalidade da sua procura. A construção do gosto é tarefa que essencialmente interessa e de que se encarrega o produtor que quer vender, e na qual se pode fazer interessar o distribuidor, justamente pela outra característica aliciante que explica a concessão comercial, como é o caso justamente da venda garantida, caso manifesto quanto a cigarros de marca relativamente aos consumidores dessa marca dependentes.
Estas linhas chamam ainda a atenção para um outro fenómeno da convocação do instrumental jurídico, a saber, a necessidade, a medida da necessidade. Para o que acontece natural e necessariamente, não preciso convocar o instrumental jurídico. É verdade que vivemos num mundo cada vez menos natural, mas subsistem coisas básicas: - se produzo sapatos, não preciso escrever no contrato que não é para o distribuidor perder tempo a colocá-los em clínicas veterinárias. Ele não o fará de qualquer maneira. Estamos outra vez a falar do mesmo grossista do Algarve, e de mais trezentos grossistas espalhados pelo País, que eu, produtor, sei que não vão, por natureza, de tempo e económica, ter a tendência de ir distribuir diariamente ao ponto que para cada um deles seja o mais longe possível do seu armazém.
Por isto, quando Engrácia Antunes nos diz que na concessão comercial o concessionário se obriga a comprar para revender por conta própria numa determinada zona geográfica, o mais importante do seu ensinamento não é isto, mas sim, além da compra para revenda, a observância duma série de deveres funcionais de integração. A determinada zona geográfica é, ou pode ser, uma referência mais ou menos alargada e sobretudo, porque por natureza há-de corresponder à realidade da possibilidade física do comprador/revendedor, um aspecto que não precisa encontrar menção textual.
Aliás, é o acórdão do STJ para uniformização de jurisprudência de 19 de Setembro de 2019 que expressamente o diz quando, versando sobre os elementos distintivos, refere “o dever de revenda por parte do concessionário dos produtos que constituem o objecto do contrato, não sendo necessária a delimitação de uma zona geográfica ou humana a que o mesmo se refere (…)”.
Assentemos portanto com a doutrina e a jurisprudência, que é decisiva a ocorrência de integração na rede. Engrácia Antunes considera essa característica relevantíssima[18] – enunciando-a como “sujeição do concessionário a certas obrigações destinadas a assegurar a sua integração na rede de distribuição do concedente, em matérias várias tais como a organização empresarial, a política promocional e comercial, e a assistência pós-venda a clientes”[19], o que é também asseverado uniformemente pelo STJ quando indica que “as partes vinculam-se a outro tipo de obrigações, sendo através delas que se efectua verdadeiramente a integração do concessionário na rede ou cadeia de distribuição do concedente, o que pode implicar, designadamente, o estabelecimento de regras sobre a organização e as instalações do concessionário, os métodos de venda, a publicidade, a assistência a prestar aos clientes, etc, consagrando-se um certo controlo do concedente sobre a actividade do concessionário”[20].
Mais uma vez, porém, deve notar-se que não se exige a totalidade destas menções acessórias tradicionais (como a assistência à venda) nem sobretudo uma subordinação jurídica plena, antes se admitem graus variados de integração, uma colaboração e dependência sim, em ordem a uma maior ou menor integração, mas que logre firmar essa colaboração. Neste sentido, Pinto Monteiro[21]. Se recuperarmos a linha da desnecessidade de instrumental jurídico, poderemos também dizer que, mesmo que o texto não revele a vontade das partes em consagrar essa maior ou menor integração, a sua existência de facto, as condições materiais que tornam visível e operacional essa existência, devem ser consideradas, quando razoavelmente não pudessem ser desconhecidas das partes, como convocadas à regulação da relação, isto é, podem e devem ser considerados pressupostos que também integram a volição das partes.
Antes de prosseguirmos, notar que a defesa das Rés em matéria de qualificação contratual como concessão comercial e até mesmo só como contrato, foi feita após a demonstração intentada da não verificação dos pressupostos teórico-conceptuais da concessão comercial, e portanto a caracterização das condições gerais de fornecimento e da relação económica que mantiveram com as Autoras como de “oferta (proposta contratual) ao público” foi feita, digamos assim, por exclusão de partes. Isso é válido mesmo quando as Rés sustentam essa concepção na “(i) a indeterminação pessoal do declaratário, (ii) a fungibilidade da pessoa do futuro ou dos futuros contraentes e (iii) a utilização de um anúncio público como meio de difusão”, pois a estas características chegaram desde logo negando justamente as inversas, que seriam típicas da concessão comercial.
O mínimo que se pode dizer, em termos práticos é que, quanto a grossistas que já mantivessem relação com as Rés antes da publicação das condições gerais, o “anúncio público” deixa de o ser quando é concretamente inscrito o destinatário postal desses grossistas, que assim não são absolutamente nada indeterminados pessoalmente, e que de todo em todo são “fungíveis” (o que em nada se confunde com a pluralidade concorrencial) na medida em que são alvo de um processo de candidatura e selecção prévio à colocação da primeira encomenda, praticamente insusceptível de ser realizado na ocasião concreta de cada venda sucessiva, e de resto nem sequer repetido pelos grossistas acreditados a cada nova emissão de condições gerais.
Retomando ainda mais alguns argumentos vertidos na contestação a propósito da caracterização das condições gerais como proposta contratual ao público, porventura livremente retratável nos termos do nº 3 do artigo 230º do Código Civil, deve explicar-se que o carácter tendencialmente duradouro do contrato de concessão comercial não exige qualquer celebração por tempo indeterminado, que não é decisiva a evolução quantitativa das quantidades mínimas e que as Condições Gerais, previamente às encomendas, pedem ao candidato que indique um volume de encomendas previsível, que a elevada tecnicidade ou o luxo não são os únicos casos possíveis de interesse do produtor na definição de regras de colaboração, como já vimos, que a restrição de área territorial de actuação, bem como a exclusividade, também já não são consideradas condição essencial da qualificação como concessão comercial. Quanto à integração na rede ou cadeia de distribuição, aspecto essencial, adiante a abordaremos.
Uma última menção a um argumento utilizado pelas Rés: a “unilateralidade da estipulação, perfeitamente justificável (inevitável, até)” que as Rés vão buscar à sua filiação à casa mãe: - não só ele nada determina sobre a contratualização (como se a casa mãe fosse dispensada de se submeter ao enquadramento jurídico em qualquer dos ordenamentos jurídicos em que opera e faz operar, como se tivesse dispensada da necessidade de um instrumental jurídico e da sombra da teoria geral do direito), como não reconhecemos, no nosso ordenamento jurídico, nem foi invocada, menoridade da personalidade e da capacidade jurídicas da casa filha.
Finalmente, e estamos ainda a falar em abstracto, ficcionar a vinculatividade de uma série de comportamentos que materialmente têm ocorrência necessariamente prévia e posterior, segundo as Condições Gerais de Fornecimento, ao momento de cada compra e venda de execução perfeita, imediata e logo cessada, e logo cessada portanto também a vinculatividade, é de um exercício de segmentação jurídica que só não é perfeito porque, como já vimos, o Direito tem de ter utilidade e para isso não pode desconectar-se completamente da realidade material sobre que se pronuncia.
Prosseguindo. Está fora de dúvida a autoridade do Professor Pinto Monteiro nestas questões. A junção pelas Autoras, a fls. 393 a 547 dos autos, de um parecer por elas pedido, não torna inidónea essa autoridade. Todavia, de facto, o referido parecer não mereceu qualquer nota por parte do tribunal recorrido, que não deixou de citar o referido Professor, de resto como as Rés o fizeram com abundância.
Nesse Parecer são referidos os seus pressupostos elaborativos, desde logo os textos analisados. O parecer, na parte em que foi realizado para resposta, entre outras, à questão de saber se “1. As presentes “Condições Gerais de Fornecimento de Tabaco pela T…., a Grossistas que pratiquem Distribuição Directa” consubstanciam ou não contratos comerciais vinculativos entre as partes? (…)”, tendo por base “informação sobre as relações comerciais dos Distribuidores Grossistas com a T…, designadamente sobre o modo de cumprimento dos contratos e a antiguidade de vários Distribuidores”, e tendo igualmente por base o “acesso a documentação variada, entre a qual figuram várias versões de “condições gerais” apresentadas pela T… ao longo dos anos (designadamente de 2008 e 2009), assim como cópia de contratos de distribuição anteriores (de 1944, de 1985 e de 1997) e de correspondência trocada entre as partes” (cf. fls 401-402), seguiu a metodologia de “perspectivar a relação comercial da T… com os grossistas e proceder ao respectivo enquadramento jurídico”, perspectiva que deixa de fora “preocupações de outra ordem – designadamente de ordem económica ou de gestão empresarial – excepto se e na medida em que revelem para a resposta a certas perguntas, como sucederá a respeito do abuso da posição dominante e da dependência económica”, alinhando-se, então, nele e em resumo, o seguinte:
- as relações comerciais com a T… “vêm já de muito longe, assim como permitem concluir facilmente que tal relacionamento se tem processado por via contratual”, o que resulta dos contratos DS 1944, JRL 1985, mas também dos contratos JVO Ldª, de 1997 e 2002, (entenda-se tabelas de e condições gerais com anexo intitulado contrato) e ultimamente da prática de prescindir da assinatura de um documento intitulado contrato, bastando-se com a comunicação das condições gerais e o reconhecimento pelos grossistas que tomaram conhecimento das mesmas: - ou seja, do universo textual. Na verdade, explica o parecer, o princípio da liberdade de forma (artigo 219º do Código Civil) já prescindiria dum texto formal, pois as declarações de vontade negocial tanto podem ser expressas como tácitas, bastando portanto para haver contrato “o mero consenso das partes”, mas “o problema nem se põe, pois os contratos (…) estão reduzidos a escrito”. Antes (1944-1985), os contratos incluíam no seu próprio texto todas as cláusulas que regulavam a relação comercial, depois (1997-2002) a T… “passou a utilizar “condições gerais”, servindo-se de uma “minuta-tipo” de contrato que anexava a essas condições gerais e que o cliente grossista devia subscrever (…)”, donde aqui “a relação comercial regia-se por esse contrato (assim formalmente designado em conformidade com a “minuta-tipo”), que remetia para as referidas “condições gerais” e que fariam assim parte desse contrato”. Finalmente, no desaparecimento da minuta-tipo e da subscrição do contrato, passando à declaração de tomada de conhecimento, aqui como imediatamente antes, os contratos negociados deram lugar a contratos de adesão, celebrados através das condições gerais, apresentando-se ainda a tomada de conhecimento, na última fase, como manifestação de adesão, ou seja, como manifestação da vontade negocial que permite o consenso. É o que resulta, se bem interpretamos, da conclusão de que “Trata-se, em qualquer dos casos, sempre e só, de contratos. O que mudou, ao longo dos tempos, foi a técnica contratual de celebração dos mesmos. Em vez de contratos individualizados, assentes em negociações prévias, a T… passou a celebrar contratos em série, através de “condições gerais” por si prévia e unilateralmente redigidas, a que os Grossistas se limitam a aderir” – cf. fls. 408-409.
- quanto ao tipo de contrato celebrado, encontra-se o contrato-base, que faz nascer a relação comercial entre as partes e no qual se “estabelecem os termos e condições em que esta relação se há-de processar”, “que ultimamente se celebra através das “condições gerais” (…)”, e as compras e vendas “que se vão periodicamente celebrando em ordem à distribuição dos produtos de tabaco abrangidos por aquele contrato”. O contrato base é, técnico-juridicamente mais adequadamente expresso, o “contrato-quadro”, que é executado em cada compra e venda sucessiva, assumindo cada uma desta a qualificação de contrato de execução.
- prosseguindo na qualificação, “Do ponto de vista da sua função, trata-se, parece-nos, de contratos de distribuição, mais concretamente, de contratos de concessão comercial” - fls. 412.
A primeira parte da justificação mais pormenorizada desta afirmação já antes, em sede de conceptualização jurídica do contrato de concessão comercial, foi citada.
A justificação por referência a textos (segmento de fls. 422 a 441 dos autos), correu do modo que passamos a descrever:
- no contrato de DS, a obrigação de compra para revenda e os termos em que os contratos de compra para revenda serão celebrados: – stock suficiente, compras em quantidade, pronto pagamento, concessão aos sub-depositários de desconto de modo a que o depositário não fique com mais de 2% para si mesmo, valor elevado para 3% no caso dos lojistas ou retalhistas, comprometimento da T… a conceder o desconto máximo de revenda que para cada qualidade de tabaco for fixado, transporte do tabaco até à Estação de Caminho-de-Ferro mais próxima do depositário, expedição rápida das encomendas, salvo casos de força maior ou estranhos à vontade da T…, e a contribuir para uma licença para venda por grosso; a menção expressa à assunção dos riscos de comercialização; e as obrigações pelas quais se efectua a integração do concessionário na cadeia de distribuição do concedente, se estabelecem laços de colaboração entre as partes e de promoção dos bens a distribuir, e se aceita o controlo do concedente – fazer propaganda intensa dos tabacos da T… para que o público os prefira a quaisquer outros, arranjar sub-depositários em todas as freguesias e aldeias do Concelho, para que nelas se vendam os produtos da T…, aceitar a fiscalização e as instruções da T… em todos os assuntos relativos à montagem do serviço de vendas no Concelho, colocar nos estabelecimentos, seu e dos sub-depositários, tabuletas, chapas, cartazes e qualquer forma de reclamo que forem fornecidas, informar confidencialmente a T… de tudo o que se referir à concorrência desta.
- nos contratos de 1985, expressamente intitulados “Contrato de Distribuição”, as cláusulas sobre o objecto do contrato e as obrigações assumidas: - A T… entrega ao Distribuidor e este aceita a distribuição dos produtos abrangidos, identificados na cláusula 3ª, e obriga-se a abastecer, na forma habitual, ressalvando impedimento legal ou caso fortuito ou de força maior, procedendo aos descontos fixados em anexo ao contrato, facultando acções de formação do pessoal do distribuidor nos domínios da comercialização, distribuição, organização e informática, o distribuidor comprará e revenderá em seu nome próprio, conta e risco, os produtos abrangidos, obrigando-se ainda à distribuição física dos produtos pelos pontos de venda.
Nos mesmos contratos, e no que toca à identificação das obrigações que revelam a integração na cadeia de distribuição, os pressupostos que constam:
- da primeira cláusula (“1. As partes têm em vista, no quadro contratual agora definido, estabelecer uma cooperação mútua no domínio das respectivas actividades e designadamente o seguinte: a) Satisfazer o mercado consumidor (…); b) Manter e melhorar a posição da T… no mercado do tabaco (…); c) Planificar a venda e o aprovisionamento dos produtos; d) Conferir maior rentabilidade ao distribuidor. 2. O DISTRIBUIDOR foi seleccionado pela T… atendendo designadamente às qualificações respectivas: a) Volume de vendas; b) cumprimento de normas de comercialização – promoção, pagamentos, informação de mercado, etc.; c) Idoneidade e prestígio na região; d) Disponibilidade de meios para a distribuição dos produtos abrangidos.”),
- da cláusula 4ª nº 1 al. c) e d) – “A T…obriga-se às prestações seguintes: (…) c) não celebrar contrato análogo ao presente com contraente estabelecido na área principal do DISTRIBUIDOR (…), d) Facultar, na medida do possível, acções de formação do pessoal do DISTRIBUIDOR, nos domínios da comercialização, distribuição, organização e informática);
- da cláusula 5ª nº 1 al.s b), c), d), e) e nº 2 e nº 3 – “O DISTRIBUIDOR obriga-se a todas as operações inerentes à comercialização e designadamente às seguintes: b) Possuir Armazéns adequados, bem como assegurar o “stock” de produto considerado bastante pela T…; c) Não comercialização de produtos concorrentes (…); d) Actividades promocionais ou publicitárias, em conformidade com directivas da T…; e) Informar periodicamente a T…, ou quando esta o solicitar, sobre a situação e as tendências do mercado, e a actividade da concorrência; (…) 2. A T… facultará ao DISTRIBUIDOR material publicitário e promocional, bem como as directivas tendentes à sua correcta utilização. 3. A T… poderá efectuar acções de inspecção e verificação das operações de distribuição, incluindo o controlo das existências do DISTRIBUIDOR”.
Prosseguindo para os contratos que a T… passou a celebrar através das suas “condições gerais”, e à pergunta sobre se ainda se estaria perante contratos de concessão comercial, refere-se no Parecer, depois de se notar que houve acesso a diversas condições gerais e que a T… tem modificado as suas condições gerais, pretendendo estendê-las, em cada momento, aos contratos anteriores, que isto nada contende, no essencial, com a qualificação, e que se deve manter o entendimento de que se está perante contratos de concessão comercial, já que, estando na mesma regulado o conteúdo e termos dos contratos que venham a ser celebrados com obrigação de compra para revenda, continua a estar em causa a organização do circuito da distribuição, sendo irrelevante aliás que a revenda não seja feita directamente ao consumidor final. Explicita-se então que “para lá do sentido e da razão de ser do contrato – organizar o circuito de distribuição – e das técnicas que utiliza – contrato-quadro e, por razões de uniformização da rede, “condições gerais” que previamente elabora para todos os Distribuidores Grossistas”, há cláusulas reveladoras da mesma natureza (concessão comercial), a saber, (e referindo-se às Condições Gerais em vigor a 1.7.2008), “as cláusulas 1.1.2, 1.1.4 e 1.1.5 do capítulo III, relativamente à obrigação de compra para revenda, pois nelas se consagra expressamente a obrigação, para “cada Cliente Grossista”, de que “adquirirá os Produtos de acordo com a média semestral de quantidades mínimas previstas no Anexo II”, em cada um dos locais por si indicado para entrega, compra que se destina a revenda como decorre de “todo o capítulo I e da cláusula 1.3.1. do capítulo III”. A “segunda nota típica dos contratos de concessão comercial – a de que o concessionário actua em seu nome e por conta própria (…) está expressamente consagrada logo na alínea a) do capítulo I, ao prescrever-se que o cliente grossista deve preencher permanentemente os seguintes requisitos: a) Compra Produtos por grosso, a título habitual e profissional, em seu próprio nome e por sua conta e risco e que os revenda a utilizadores profissionais (retalhistas) que, por sua vez, os revendam directamente ao consumidor”.
Quanto à terceira nota – integração dos grossistas na rede ou cadeia de distribuição da T… “e executar a política comercial desta”, refere-se no Parecer que “trata-se de definir regras de comportamento através das quais se estabelecem laços de colaboração entre as partes e se articula e coordena a actividade de todos no seio da rede de distribuição, regras essas que implicam obrigações várias e se fundam – juntamente com a obrigação de compra para revenda – no contrato de concessão como contrato-quadro que é. São obrigação de índole e intensidade diversa que servem a política comercial do concedente (…) e que os concessionários (…) devem acatar justamente em ordem à implementação dessa política. Isso pode implicar, designadamente, o estabelecimento de regras sobre a organização e as instalações do concessionário, os métodos de venda, a publicidade, a assistência a prestar aos clientes, etc, consagrando-se, além disso, um certo controlo do concedente sobre a actividade do concessionário. Ora, todas estas notas por que caracterizamos, em geral, a integração do concessionário na rede ou cadeia de distribuição do concedente, estão presentes – umas com maior intensidade do que outras – em concreto, nas condições gerais da T…. É o que sucede, de modo especial, designadamente: - com as cláusulas constantes da alínea f) do capítulo I” – (a T… poderá efectuar auditorias), “e dos pontos 1.2.2” (autorização para e vistorias dos armazéns), “1.2.3. do capítulo III” (comunicação de alteração de armazém e autorização para vistoria prévia ao novo local); “com as cláusulas constantes de todo o ponto 1.1. do capítulo III, sobre os termos em que o Grossista deverá proceder às encomendas e locais de entrega, às obrigações a cumprir “por forma a acompanhar a evolução do mercado” e aos requisitos que devem revestir as suas instalações, (…) com as cláusulas previstas nos pontos 1.3.1 e 1.3.2 do capítulo III, sobre métodos de revenda a observar pelos Grossistas; e com as obrigações de colaboração, de informação, de defesa da reputação e imagem das marcas dos produtos, etc, com que se depara ao longo de todo o texto das “condições gerais”,mormente na alínea e) do capítulo I e nos pontos 1.3.1, 1.3.2.1.4 e1.6 do capítulo III”.
Conclui-se então no referido Parecer que as condições gerais “não vieram alterar a índole dos contratos que, para o mesmo efeito, ela vinha já celebrando, de há muito, como seus distribuidores de produtos de tabaco”. Ampara-se ainda esta conclusão com os mecanismos de incremento da colaboração entre as partes e do estabelecimento de incentivos à distribuição dos produtos, designadamente das “campanhas de incentivos”, “traduzidas em importâncias creditadas aos distribuidores pelos resultados alcançados”, “Programas” que levam a prémios (“campanhas de promoção, várias acções promocionais”, estudos de mercado, “em suma, na estreita colaboração constantemente solicitada pela T… aos seus distribuidores”.
Finalmente, analisando se, as condições enviadas por carta de 25.5.2009, viriam alterar a qualificação, refere-se: “É claro que a T… deixou de se referir aos “Grossistas” passando a utilizar a expressão “fornecimento por grosso”, em vez de “fornecimento a grossistas”; e passou a falar, apenas, em “clientes”, onde antes falava de “clientes grossistas”. Mas a verdade é que, tal como antes, logo na alínea a) do ponto 1.1. destas “novas condições gerais” (...) estabelece como primeiro requisito para se ser seu cliente o de que este compre produtos de tabaco por grosso, a título habitual e profissional”; e acrescenta, na alínea b), que o cliente deve estar “colectado na qualidade de comerciante por grosso perante a Administração Fiscal”. O Parecer sustenta a persistência das cláusulas já analisadas e relevadas para a integração ao conceito de concessão comercial, afirmando que estas novas condições gerais continuam a desempenhar a mesma função económico-social das anteriores, portanto, a organizar o circuito da distribuição comercial.
Antes ainda de passarmos a uma análise mais fina dos factos provados, há em alguns dos argumentos usados pelas recorridas alguns aspectos que quedam desacertados por quanto já referimos até aqui em termos de conceptualização e que podemos assim decididamente afastar. Simultaneamente, noutros passos, ocorrem argumentos generalistas e contraditórios até, que também podemos descartar por desinteresse para a questão da qualificação contratual e da própria (in)existência de contrato.
Dizem as recorridas que a concessão comercial pressupõe uma concertação que redunda numa “verdadeira subordinação, tanto económica como jurídica, comummente intitulada por integração do concessionário perante o concedente”. Tal subordinação funda-se no interesse económico do fornecedor que é o de organizar a rede de distribuição, alinhando incentivos e alocando tarefas que visam um escopo comum, tudo e todas tendo “de estar expressamente previstas e de ser escrupulosa e obrigatoriamente cumpridas”. Já vimos que a doutrina admite intensidades diversas da integração, e não é por isso de todo o caso que se tenha de demonstrar uma verdadeira subordinação, nem económica nem jurídica. Está afastada a centralidade do elemento de exclusividade, o que significa que nem economicamente se exige a verdadeira subordinação. Essencial é apenas que exista a conformação possível da rede pelo interesse do produtor/fornecedor. Por outro lado, não é correcto afirmar-se que tem de haver expressa previsão nem escrupuloso cumprimento das condições pelas quais se opera o controlo da rede de acordo com os interesses do produtor/fornecedor, porquanto em presença de contratos legalmente atípicos sempre estaríamos perante contratos de forma livre, que nem escritos precisam ser, e que por isto também admitem a coexistência de elementos vinculativos passados a escrito com elementos vinculativos assumidos verbalmente e ainda com formas tácitas puramente comportamentais.
Para as recorridas, no caso concreto, existe uma “pulverização de Grossistas, cada um com total liberdade de atuação comercial” com ausência de obrigações, designadamente no que respeita a áreas geográficas de atuação designadas, a clientes retalhistas designados, promoção dos produtos, etc.”, ou, “não havia uma política comercial de distribuição definida pelas Rés” que tivesse de ser obrigatoriamente cumprida. Antes, cada grossista definiria a sua política, sem possibilidade de coordenação, direcção ou controlo por parte das Rés.
Independentemente do que analisaremos mais adiante e mais em concreto, deve atentar-se que a pulverização de grossistas corresponde à própria alma do negócio: uma estrutura capilar finíssima, que procura atingir milhões de consumidores o mais de perto possível. Modernas razões de eficiência económica, de concentração e economias de escala, não passam para trás dos montes até à mercearia da mais remota aldeia. Remotos aldeões por regra terão poucos meios de transporte e recursos económicos para correrem dezenas de quilómetros diários até ao aglomerado populacional maior mais próximo. E para a moderna e concentrada distribuição, o custo de atingir uma e todas as aldeias remotas não deixa de ser um custo acrescido, possivelmente demasiado para a moderna gestão. É por isso que continua a fazer todo o sentido que na distribuição existam grandes operadores e operadores mais pequenos, tão pequenos que consigam deslocar-se dentro dos capilares mais finos, onde já nem a força de vendas da T… consegue (quer, tem interesse em) penetrar. Esta diversidade explica naturalmente uma intensidade diferente da transmissão do comando, mas o comando é suficientemente simples (nem a prolixidade de campanhas o altera nessa simplicidade estrutural, nem o mesmo faz um combate à concorrência, no período em questão nos autos, vistas as quotas de mercado e as percentagens de negócio T… nos grossistas) para ser entendido por qualquer um, qualquer que seja o seu tamanho. Aliás, o comando é simples e foi ainda mais simplificado pela crescente legislação antitabágica, trata-se essencialmente de alimentar a dependência da marca sofrida pelos consumidores, ou seja, a nota que nenhum grossista, qualquer que seja o seu tamanho, pode descurar, é manter o abastecimento sem rupturas de stock. Não há portanto também grande margem de manobra inventiva em termos de política comercial por parte dos grossistas. Trata-se, para eles, de atingirem o maior número de postos de venda ao retalho, directamente por máquinas ou a retalhistas, e de permanentemente os incentivarem à abundância. Por outro lado, como já se viu, exclusividade e actuação geográfica restrita não são mais considerados elementos essenciais da concessão comercial, e de resto, como já dissemos, a exclusividade, no negócio concreto, pode até relevar-se contraproducente aos interesses das recorridas e a actuação geograficamente restrita como característica de controlo e organização da rede, acaba a ser uma decorrência natural da estrutura capilar da rede necessária ao tipo concreto de negócio.
Um grande argumento das Rés e recorridas, que o tribunal recorrido francamente acolheu quer na decisão da matéria de facto quer na decisão de direito, foi o de que:
- “foi a alteração estrutural dos anos 1996 e 1997 que determinou a mudança do paradigma anterior, no qual não se nega que “muito longinquamente” existiram verdadeiros contratos de distribuição, com verdadeira integração através da existência do dever de promoção e obrigações de exclusividade”;
- em 1996 deu-se o processo de privatização e venda à P….
- Foram “(i) a liberalização do mercado que se deu com a entrada de Portugal na CEE e (ii) a aquisição da T… pela P…” que acarretaram a “reorganização do modo de interação do fornecedor com os Grossistas” como marcos históricos de definição do mercado de tabaco desde então, desde logo tendo desaparecido nas CGF dali em diante emitidas, as referências qualificadoras dos contratos de distribuição.
- “a P… optou, em linha com o espírito dos compromissos assumidos aquando da aquisição da T… perante o Estado Português, por alterar a forma de relacionamento com os Grossistas, conferindo-lhes total independência na sua atuação comercial desde esse ano de 1997 até aos tempos mais hodiernos”.
Estamos em presença dum argumento que tem uma parte concreta, factual – saber se as condições gerais de 1997 alteram completamente o paradigma das condições anteriores praticadas pela T…, quer em termos de condições gerais e tabelas de condições anteriores, quer em termos, ainda mais para trás, de contratos de distribuição. Essa parte concreta reservamos para depois. Só que, o argumento tem também uma parte retórica que pode ser imediatamente debatida.
Repare-se então que é porque as Rés defendem que o elemento essencial de caracterização da concessão comercial é a exclusividade, que conseguem defender que houve concessão mas já não há, aqui porque interveio a adesão de Portugal a um mercado europeu dominado pela livre concorrência e porque simultaneamente, em correspondência temporal e ao mesmo princípio, a P… se comprometeu a respeitar esse valor, abdicando então de persistir na anterior detenção da rede de distribuição que a T… fazia. Deve dizer-se, de primeiro, que voltamos a abordar a realidade factual a partir do Direito, como se este a criasse. Em segundo lugar, que o raciocínio cai quando a doutrina e a jurisprudência já não detêm a exclusividade como elemento essencial e indispensável à concessão comercial. Em terceiro lugar, e mais grave, que o argumento nunca serviria a explicar porque é que, mesmo não havendo concessão comercial, não haveria contrato.
Portanto, assentemos com as Rés: havia contratos, havia até contratos de distribuição, era assim que era organizada a rede de distribuição. A T… não era proprietária dos grossistas com quem celebrava esses contratos.
O Direito Europeu não admite os contratos de concessão comercial, os contratos de distribuição, o Direito Europeu – ou os princípios da liberalização do mercado que o enformam – não admitem a celebração de contratos duradouros, pura e simplesmente? Ao aderirmos às Comunidades Europeias, ficou-nos vedado celebrar contratos? Serão apenas admissíveis outros tipos jurídicos pelos quais algum privado consegue conformar comportamentos de outro privado? Não tomámos nota dessa fundamental alteração no ordenamento jurídico, porventura deficiência nossa.
A adesão de Portugal ao mercado livre europeu ainda na década de 80, não tem nenhuma implicação com a possibilidade de celebrar contratos nem com estes serem a forma privilegiada de vinculação entre privados, o argumento é completamente errado e não é compreensível como é que o tribunal recorrido o acolheu. É que: - que não pudessem subsistir nos contratos de 1944 e 1985 cláusulas de exclusividade não tem nada a ver, mas absolutamente nada a ver, com a possibilidade de subsistência do restante clausulado, que aliás, como se verá, vai passar direitinho para as tabelas de condições e para as condições gerais, mesmo posteriores a 1997.
Também dos textos se verá que as referências a contratos não cessaram com o denominado marco histórico de 1997 – isso aliás foi uma recorrência questionatória no julgamento.
Para sermos absolutamente claros, o que marca a privatização é que o Estado, em sobreaviso para cumprir de facto um ideal de mercado livre, tomou consciência que a junção das quotas de mercado da T… e da P… conduzia ao domínio praticamente total do mercado, que isto afectaria sobremaneira a possibilidade de entrada de outros concorrentes delas, e que não tendo a possibilidade de se imiscuir através de ditames de política comercial concreta a adoptar, atacou um perigo evidente de aumento de detenção de rede grossista própria, proibindo então a detenção dessa rede própria.
Mas aqui entra outra confusão que sempre esteve latente neste processo: que só há rede de distribuição quando a rede de distribuição é própria. Mas não é verdade: - não é porque a P… se obrigou perante o Estado Português a não deter uma rede própria de distribuição que não existe rede de distribuição e que a ligação a essa rede não pode ser feita por via contratual. O acesso à rede de distribuição por via contratual pode levar a falar duma rede de distribuição – da rede de distribuição de que se serve determinado produtor/fornecedor, tal como outros produtores/fornecedores eventualmente se podem também servir – mas não leva a falar duma rede propriedade do produtor/fornecedor. Esta última modalidade é que foi alvo do compromisso. Aliás, isto é de uma evidência constrangedora: - se o Estado proibisse a T… - P… de ter uma rede de distribuição no sentido de lhe vedar o acesso possível, segundo a operação normal das fontes vinculativas admissíveis no ordenamento jurídico português, a qualquer rede de distribuição, o Estado literalmente rebentaria com o negócio do grupo em pouco mais duma semana (o suficiente para acabar o stock). E continua a ser de uma evidência constrangedora que a integração na rede, que é nota essencial da concessão comercial, serve justamente para suprir na medida possível, a ausência dos poderes directivos que resultariam da detenção em propriedade de uma rede de distribuição.
Portanto, o que é absolutamente impossível de se dizer é que foi a privatização e as condições impostas pelo Estado para essa privatização que determinaram a impossibilidade de manutenção ou de recurso futuro a contratos, quaisquer que sejam, incluído o de concessão comercial, com grossistas.
Mais uma vez, o máximo que resulta das imposições ao processo de privatização é a abolição das cláusulas de exclusividade, mas não a subsistência do restante clausulado contratual. Mais uma vez, subsistente bem para além de 1997.
Quanto às lógicas de que, para haver obrigação, a “contraparte contratual que tivesse o poder de “exigir” da outra o cumprimento teria de poder obter dos tribunais “providências coercitivas aptas a satisfazer o seu interesse”, o que no caso não existe porque a responsabilidade pelo cumprimento “só surge depois da colocação de uma encomenda”, volta este argumento a padecer de uma petição de princípio, ou seja, a de que não existe qualquer contrato prévio que enquadre cada compra e venda sucessiva, o que pode bem não ser o caso.
Quanto à irrelevância da previsão de quantidades mínimas, pois a “fixação de valores mínimos de compra relacionava-se com os locais de entrega (aquisições mínimas em cada local de entrega), enquadrando-se nos critérios de admissão prévios à celebração de contratos de compra e venda. Impunha-se em razão dos mesmos imperativos de eficácia e eficiência económica que justificam outros requisitos de admissão”, aqui vemos como as recorridas afinal e de algum modo vêm dar a mão à palmatória: - se são imperativos de eficácia e de eficiência (que justificam as quantidades mínimas e muitas outras previsões) isso demonstra claramente que são da eficácia e eficiência que as Rés procuraram garantir para si através das condições gerais (pelo menos). Ou seja, estamos na defesa dum interesse próprio – nem as Rés estão a dizer que se preocuparam com o bom sucesso económico dos grossistas – e de mecanismos de o assegurar. Muito em concreto aqui como ele vem posto, o interesse é de gestão do custo do transporte que as Rés suportavam até aos locais de entrega. Mas tudo isto não pode, por mais segmentações formalistas que se tentem, deixar de integrar o conceito de política comercial, ou pelo menos um conceito lato de política comercial, e é essa política comercial precisamente que se está a tentar veicular através do texto para ser observada pelas entidades primeiras que habitam a rede de distribuição.
Note-se ainda aliás que a tese, também repercutida na sentença, da irrelevância das quantidades mínimas em função da natureza grossista do grossista – só é grossista quem compra por grosso, porque isso aliás é uma definição legal (manifestamente para fins diversos da regulação das relações entre grossistas e produtores) – confunde compra por grosso com quantidades mínimas, que não são absolutamente nada sinónimas.
Quanto a “De qualquer modo, caso houvesse algum dever de compra por parte das Recorrentes, a sanção não seria nunca a recusa da candidatura, mas a indemnização por incumprimento de um dever obrigacional – o que só demonstra a inexistência desse dever na relação económica ora em crise”, insiste-se num argumento que também sensibilizou o tribunal recorrido: - não há obrigação sem sanção. Se pensarmos na definição de obrigação natural, nos termos do artigo 402º do Código Civil (“A obrigação diz-se natural, quando se funda num mero dever de ordem moral ou social, cujo cumprimento não é judicialmente exigível, mas corresponde a um dever de justiça”) até poderíamos dizer que sim, de resto faz parte da essência do Direito. Mas o verdadeiro fundamento da geração da obrigação jurídica é a vontade constituinte das partes, é ela que institui a juridicidade do vínculo (nos termos do artigo 397º do Código Civil – “Obrigação é o vínculo jurídico por virtude do qual uma pessoa fica adstrita para com outra à realização de uma prestação” (sublinhado nosso). Este facto gerador ocorrendo, o Direito, na conjugação do artigo 20º da Constituição da República, do Código Civil e do Código de Processo Civil, fará o serviço de fornecer toda uma regulamentação sobre os termos de exigência jurídica e judicial do cumprimento das obrigações assumidas.
De resto, as partes são livres de fixar o conteúdo dos seus contratos, salvo normas imperativas, mas isso não significa que essa liberdade acarrete a necessidade de fixarem todas as regulações possíveis, nem que o seu silêncio tenha a valor de recusa de aplicação das previsões legais. Portanto, na falta de expressa previsão de sanções, e de resto perante esmiuçada previsão legal geral para as consequências do incumprimento das obrigações no Código Civil, não pode falar-se da inexistência de sanção e por isso também não na inexistência de obrigação. De resto, diga-se, a suposta sanção não era, segundo as condições gerais, a recusa de candidatura mas a recusa de fornecimento, porque antes da candidatura nunca poderia haver dever de compra.
Aliás, isto mesmo vem rectificado logo no argumento seguinte, onde se diz que “A invocação de uma “exceção de não cumprimento, procurando reconduzir uma situação de não verificação dos requisitos de aquisição mínima presentes nas CGF a uma suposta faculdade de a T… não cumprir a sua obrigação de fornecer” (…) “não se coaduna com a possibilidade de o mesmo Grossista não cumprir os requisitos relativos a quantidades mínimas num local de entrega dos produtos, mas já cumprir noutro, continuando, assim, a ser fornecido num outro local. O caráter compulsório deste instituto não se compadece com esta possibilidade”. Também aqui cumpre dizer que as sanções não são todas iguais, que a ordem jurídica admite sanções de gravidade graduada e que não deixa de se afigurar sancionatório o não fornecimento para um local de entrega quando o grossista tem mais do que um, desde logo porque havia comunicação à T…, no próprio processo de candidatura, das previsões de encomendas, a determinar-lhe a possibilidade de, outro o interesse de combate ao contrabando, contrafacção e branqueamento já ditava, recusar vender para o local não atingido pela recusa de fornecimento quantidades superiores às que normalmente para ele eram encomendadas, justamente para prevenir a “esperteza saloia” do grossista recusado em trasfegar de um local para outro. Também não deixa de se afigura sancionatório não fornecer para um dos locais, quando consideramos que um grossista que tem mais do que um local necessariamente (até pelas condições gerais) afectou os meios humanos e materiais necessários a esses vários lugares, ou seja, dum ponto de vista económico, a recusa de fornecimento para um deles inviabiliza e consequentemente torna inútil e dispendioso a manutenção desses recursos afectados. E de resto, repare-se, o argumento não atentou à disciplina que foi instituída na tabela de condições gerais de 1992, a saber “Tabela de Condições – Operacionais, Comerciais e Financeiras – dos Revendedores Grossistas da T…”, a fls. 171 a 178, da qual consta, no parágrafo segundo do ponto 1, dito “Objectivo”, o seguinte: “Para efeitos da presente tabela, cada estabelecimento ou armazém dos revendedores grossistas abastecido pela T…, será considerado como uma entidade independente sujeita a todas as condições operacionais, comerciais e financeiras abaixo previstas”.
Repete-se o já antes dito quanto ao argumento do “encontro” da obrigação por via da sanção, relativamente à menção “Não se invoque, como é ensaiado pelas Recorrentes, que o direito de indemnização não precisaria de estar expresso nas CGF para existir”, pois que, “a imaginação não precisa de se espraiar muito para conjurar a existência de cláusulas penais como um instrumento clássico e habitual que poderia ser inscrito nestas CGF se existisse uma obrigação de compra”. O facto de haver uma sanção mais típica ou tradicional é irrelevante para afastar a aplicação do regime geral e a vontade das partes de todo não expressa também não tem o condão de significar que convencionaram a não aplicação de qualquer das sanções disponíveis no ordenamento jurídico. Recorda-se, de resto, o disposto no artigo 218º do Código Civil, na devida interpretação de que o silêncio só vale como declaração negocial quando esse valor lhe for atribuído por lei, uso ou convenção – neste sentido Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, vol. I, Coimbra, 1982, 3ª edição, p. 209.
A existência de cláusulas penais como instrumento clássico não constitui um uso, nem isso foi invocado, não foi invocada lei e a convenção prevista no preceito tem de ser uma convenção prévia expressamente declarada (não silenciosa, portanto).
Quando as recorridas vêm alegar que “nada obsta a que seja celebrado um contrato prévio por referência ao qual se determinará o conteúdo dos contratos (de compra e venda) que poderão vir ou não a ser celebrados no futuro, em nada beliscando a liberdade de contratar, nem oferecendo qualquer possibilidade jurídica à contraparte de exigir a celebração dos contratos de compra e venda”, ficamos com a dificuldade de conciliar esta admissão teórica dum contrato prévio, supostamente aplicável, por hipótese, ao caso dos autos, com a defesa intransigente de que nunca a vinculação jurídica entre as partes passou dos concretos e sucessivos contratos de compra e venda de execução perfeita e instantânea. Ou seja, se afinal se admite um contrato prévio, não é possível simultaneamente dizer que ele nada é, nada de contrato tem, e em nada vincula as partes. Esse contrato, assim configurado como mera definição das condições aplicáveis a eventuais futuros contratos em nada obrigatórios, seria uma preciosa inutilidade.
Quanto a “A existência de autorização para cedência de posição contratual não demonstra a existência de contrato, pois “faz todo o sentido que a T… exija que a posição contratual num acordo que permite fixar, ainda que precariamente, o conteúdo negocial das eventuais transacções futuras não possa ser cedida sem a sua autorização, tendo em linha de conta a importância da verificação dos requisitos subjetivos expressamente previstos nas CGF”, que serviria a impedir fraudes – “cessão da posição contratual para um Grossista que não cumprisse com os requisitos”, aliás na linha decorrente “obrigações internacionais de prevenção da prática ilícita associada aos produtos de tabaco a que as Recorridas estão adstritas e que exigem que conheçam os seus clientes”, oferece-se dizer o seguinte:
- faz todo o sentido, sim. O que só demonstra afinal que existe um verdadeiro processo prévio de selecção, que ele é necessário à viabilização eficaz da passagem do produto do produtor ao distribuidor para atingir diariamente o consumidor, e que não se pode, por esse processo de selecção e pela pretensão de controlo da cessão, deixar de considerar que também para as recorridas o vínculo ou não vínculo que tenham com as recorrentes era claramente “intuitus personae”. Esta característica é condição primeira de processamento do pensamento decisório que em cada momento o produtor queira imprimir à rede a que recorre para atingir o consumidor final, ou seja, é uma condição primeira da prossecução duma política comercial. E de resto tanto assim é que, muito antes das obrigações internacionais que obrigam ao conhecimento do cliente, já o mesmo processo de selecção era feito. Aliás, aqui, finamente, as recorridas reconhecem que este tipo de exigência “também” resulta das obrigações internacionais e não apenas que “só” resulta das obrigações internacionais. E em todo o caso, mesmo que só resultasse delas, também não deixaria de ser verdade que seria de interesse fundamental para a implementação da política comercial das recorridas, e lá está, estaríamos de novo no plano daquilo que não precisa de ser convencionado porque já resulta de outras fontes, neste caso normativas, que integram a realidade de facto.
Relativamente a “Não existe um dever de revenda. A revenda é mero requisito da venda, relativo à natureza da actividade grossista – “se um Grossista não revender os produtos, deixa de ter atividade económica de venda por grosso e, nessa medida, de cumprir um dos requisitos necessários para ser fornecido pelas Rés ora Recorridas” surge um argumento que também foi usado noutros lugares e que também impressionou o tribunal recorrido, e outros, e sobre o qual mais adiante mais abordaremos. O grossista é aquele que compra para revender. O produtor só vende a quem revende. O problema – relativamente à eficácia demonstrativa da não existência de dever de revenda – é que esta última afirmação não é verdadeira: - se o grossista por definição só compra para revender, já o produtor pode organizar o modo de atingir o cliente do seu produto das mais diversas maneiras, desde logo por distribuição directa. É justamente porque isso não é possível acontecer no negócio do tabaco que a condição de grossista vem plasmada nos requisitos para se ser cliente. Ou seja, é uma particularidade do caso, do negócio, que importa na interposição, entre o discurso abstracto/ordenação vinculante abstracta, e a solução, de um patamar de intervenção da regulação própria dum interesse particular. Abstractamente o grossista só compra para revender, portanto em quaisquer produtos que compre sempre os comprará para revender, isso não demonstra nada que esteja obrigado a comprá-los para revender – este é o discurso abstracto – mas no caso concreto, porque as Rés não conseguem proceder à distribuição directa, porque também estão impedidas de ser donas da sua própria distribuição, têm mesmo de recorrer a uma distribuição indirecta na qual, aliás, em teoria também poderiam recorrer apenas a pontos de venda, ao retalho, mas a especificidade concreta do negócio – a criação necessária da rede capilar extensa – exige que também recorram a grossistas. Este recurso pode ter várias formas de regulação, na demonstração de qual delas não pode entrar o discurso abstracto mais genérico, sobretudo quando apenas centrado no “outro” e não no “nós”. Entrará certamente, como mais adiante as recorridas repõem, a questão da integração do grossista na rede.
É talvez um pouco ousado afirmar que as Rés “em nenhum momento podem exigir ao Grossista o cumprimento de um dever de revenda relativamente aos produtos que lhe tiverem vendido anteriormente, uma vez que este direito de crédito, que legitimaria a exigência de cumprimento, não está previsto em nenhuma cláusula das CGF”, desde logo porque se os grossistas compram para revender, se as Condições Gerais colocam como requisito de selecção a qualidade de grossista e a compra para revenda, à admissão de colocação da primeira encomenda, se portanto pelas Condições Gerais fica claro que ninguém que se ofereça para comprar não por grosso consegue comprar, a suposta exigibilidade da revenda que teria de ser coberta por uma cláusula expressa nunca viria a ser discutida, nunca no plano prático circunscrito pelas Condições Gerais a questão se colocaria, tornando perfeitamente desnecessária uma tal cláusula. De resto, para a eventualidade dum grossista resolver fumar ele mesmo, num só dia, milhares de cigarros, não se cuida que o ordenamento jurídico geral não contenha a possibilidade de o responsabilizar, se acaso se mantiver vivo.
- Quanto ao argumento de que “a previsão de obrigações laterais é também conatural à existência de contratos de compra e venda entre fornecedores e comerciantes, atendendo a que os comerciantes não compram os produtos para uso próprio, antes participam no circuito de comercialização desses produtos até à chegada ao consumidor, último e mais importante destinatário dos produtos”, difícil será compaginar isto com a afirmação da execução imediata, da compleição perfeita de cada compra e venda. É claro que é natural haver obrigações laterais, mas se elas não estão previstas em cada compra e venda sucessiva, a sua previsão situa-se anteriormente, e já estamos então em presença de previsões obrigacionais. Aqui não podemos ficcionar que a anterioridade temporal não aconteceu, teremos de ficcionar que aconteceu mas não teve qualquer relevo, e vem apenas a emergir não declaradamente na ocorrência perfeita da compra e venda.
Quanto a “Não se encontram nas CGF (nem na realidade) directrizes em matéria de política comercial quanto ao método de revenda, antes meras indicações de legislação a cumprir em matéria fiscal, aduaneira e de combate ao branqueamento ditadas pela observância da boa-fé e em respeito ao interesse público, não havendo assim a possibilidade de imposição de regras ou directrizes de estrita política comercial ditada exclusivamente pelas Rés, imposição semelhante para todos os concessionários que integrem a rede de distribuição, de modo a acompanhar esta e a controlá-la” e quanto a “O direito de indemnização por falta de cumprimento destes deveres legais” (ditados pelas mesmas razões e com os mesmos objectivos de interesse público) “previsto nas CGF, que é invocado pelas Recorrentes, constitui um normalíssimo direito de regresso nas relações comerciais entre duas empresas que têm uma relação comercial vertical de compra e venda bens de consumo, quando o comerciante não cumpre os seus deveres legais e o fornecedor é demandado pelos que são lesados por esse incumprimento”, adiante melhor concluiremos a questão do método de revenda e do direito de indemnização, este, que expressamente consta dos textos numa sobrevivência dos primitivos instrumentos. Neste momento, apenas saudar em apoio do que vimos dizendo repetidamente, que aqui as recorridas já falam no texto das condições gerais e na realidade, dando pois razão a que não é apenas o texto das condições gerais que releva para a análise, e assinalar, como aliás é reconhecido, que não há uma origem externa normativa que não seja também relevante no âmbito da organização de interesses interna e que não possa dizer-se também querida. A questão não é exactamente simples, não é exactamente simples perceber se temos uma fonte autónoma que a todos vincula ou se apenas vincula na medida em que todos se dispõem a comportar-se num modo ao qual a fonte se dirige. Dito de outro modo, será que determinada restrição legal de comércio se aplica sem que alguém se pretenda dedicar-se a esse comércio especificamente restringido, ou é apenas na vontade de negociar nesse comércio que intervém a lei restritiva?
Agora, quanto a “no complexo obrigacional nascido do contrato de compra e venda, surgem deveres laterais de proteção da imagem e da perceção pública do alienante (rectius, das Rés ora Recorridas) que in casu se materializavam em manter inalteradas as embalagens dos produtos ou não alterar as características dos mesmos, aliás em decorrência das obrigações impostas pelo Acordo CE, uma convenção internacional”, pois que estamos a falar de contrato, não estamos a apelar à directa aplicação dos direitos de personalidade. Também é pensável que um contrato de compra e venda tradicionalíssimo seja condicionado à observância da imagem do vendedor e da imagem do produto. Se virmos as, importadas ao contrato de compra e venda, cláusulas das condições gerais, como condições, nem parece mal. Uma condição porém não é exactamente a mesma coisa que um dever. Na condição acolhida pelo Direito, há consequência: - ou o negócio, a compra e venda não se chega a concluir por falta de verificação da condição suspensiva, ou o negócio cumprido é resolvido por verificação da condição resolutiva. Supostamente, do contrato de compra e venda defendido nos autos (mera sucessão de contratos de compra e venda), não pode nascer nenhum complexo obrigacional, porque em coerência com a mesma teoria (só contratos sucessivos e nada mais vincula) então os contratos têm de se considerar perfeitos na sua execução e consumação instantânea. Quanto à decorrência do acordo internacional, é mais que evidente que, sim seja, mas não tem relevo de especial, porque ao lado disso está o interesse manifesto das Rés em que o seu produto não seja alterado, para o que seu prestígio e o prestígio do produto não seja alterado e para que em função de nenhuma alteração o consumidor se mantenha, interesse que muito antes do acordo invocado já existia e já estava plasmado nos textos.
Um ponto importante deve ser abordado quando as recorridas argumentam que “Não se pode confundir, desta feita, tal realidade com a celebração dos contratos que tinham por objeto as máquinas de vending, nos quais se estabeleciam deveres de parte a parte, que tinham um escopo e incidência diversos da relação entre a T… e os Grossistas ora em crise”. Acabámos de saudar as Rés quando aceitaram, ao menos em teoria, que não são só as condições gerais mas a realidade também que configuram a relação comercial entre as partes. Nesta realidade intervêm quer as condições gerais, como antes delas as tabelas e antes destas os contratos de distribuição, como todas as demais iniciativas que visam o mesmo fim – levar o tabaco desde o produtor ao consumidor – por recurso às mesmas pessoas/intervenientes. O vending grossista é um modo de levar o tabaco do produtor ao consumidor, que encurta a cadeia, dispensando o retalhista tradicional. Embora no processo os pedidos atinjam regulações por condições gerais, na caracterização da relação entre as partes não podemos deixar de atender também a outros modos que nessa relação foram usados. Neste sentido, e porque estamos a falar do mesmo objectivo final por recurso às mesmas pessoas, as campanhas de incentivos não alteram estruturalmente nada, são circunstanciais ou de conjuntura, e integram-se por isso na mesma estrutura de objectivo. Ora, não cremos que exista uma alteração estrutural na supressão de um interveniente na cadeia enquanto essa supressão decorre apenas duma acumulação funcional – o retalhista não desaparece, o grossista é que assume as funções de grossista e as acumula com as de retalhista. Aliás, muitos dos casos tradicionais em que a doutrina se fundou para estabelecer os elementos essenciais da concessão comercial – produtos de luxo na ourivesaria, cosmética ou vestuário e automóveis – não previam mais do que um intermediário até à venda ao consumidor. Do mesmo modo, se é evidente que a colocação da máquina de vending do grossista à disposição das Rés se equipara a uma espécie de arrendamento do espaço disponível nessa máquina (espaço esse maior aliás devida e especificamente pago pelo contrato de vending), essa comodidade não chega para integrar uma autonomia que deva ser expressamente contratada. Não havendo uma “remuneração do trabalho desenvolvido pelo retalhista” autónoma e paga pelas Rés aos retalhistas, antes saindo da mesma percentagem de desconto que é apenas “paga” aos grossistas, o contrato de vending não remunera esse “trabalho” nem o “trabalho acumulado” das funções de grossista e de retalhista. Remunera então especificamente o espaço/meio tecnológico locado. Mas o contrato de arrendamento de bens móveis, figura próxima que se poderia convocar, não precisa de ser celebrado de forma escrita. Ou seja, não há uma justificação jurídica específica que obrigasse à celebração de contratos de vending. Neste sentido, a remuneração adicional do espaço preferencial (facings e, de antanho, colocação de publicidade) não extrapola a cadeia de distribuição não sendo decisivamente independente na sua incidência e escopo, antes um mero “um dos” passos do mesmo escopo. Isto é aliás tão mais verdade quanto a tendência do negócio, como de tudo o mais nesta vida, será a incorporação tecnológica. No dia em que os grossistas apenas venderem por intermédio de máquinas, teremos a curiosidade daquilo que não era uma relação contratual – a distribuição dos produtos das Rés – passar a ser, ou até mais propriamente, voltar a ser contratual.
Quanto a não haver controlo e implementação da política comercial na “possibilidade cometida às Rés ora Recorridas de vistoriarem os locais de armazenagem, por forma a aferirem a implementação pelos Grossistas das instruções básicas de acondicionamento, manuseamento e armazenagem dos produtos”, pois que “As vistorias realizadas pelas Rés ora Recorridas tinham, pois, apenas como escopo a verificação do cumprimento das normas legais, do Acordo CE e dos deveres laterais de proteção da imagem das Rés ora Recorridas, evitando, dentro do possível, a violação desses mesmos standards e a consequente responsabilização dos Grossistas e das próprias Rés ora Recorridas”, alguma coisa nos escapa, quando as vistorias aos armazéns foram uma constante de há décadas e de muito antes do acordo CE, e quando o combate ao contrabando, contrafacção e branqueamento nada tem a ver com a chegada, ao consumidor, do produto em boas condições por via dum armazenamento salubre e não comprimido. As recorridas por certo estarão a referir-se a outras finalidades das vistorias que não a da verificação das condições de armazenamento. Estarão por certo a falar das vistorias para efeito de retraçamento do percurso realizado pelo produto encontrado no armazém até à sua origem.
Em “Nas previsões sobre rupturas de stock não se indicia a existência de uma rede de distribuição, mas apenas “o cumprimento da função básica de qualquer grossista que abasteça um ponto de venda do retalho”, tanto mais que “as Recorridas não podem, por imposição do Estado Português, ter atividade no comércio por grosso, estando dependentes dos Grossistas para assegurar a chegada dos produtos aos Retalhistas”, não só o grossista não tem uma função básica a cumprir no sentido de que se tenha comprometido com o Estado (talvez corporativo) a desempenhar essa função social, como o Estado não impôs aos grossistas, a grossistas concretamente determinados, que servissem o serviço de distribuição a que as Rés teriam de recorrer por estarem proibidas de ser proprietárias dum serviço próprio. Por outro lado, não é nada claro que a ruptura de stock, em termos gerais, desmereça o cumprimento da actividade grossista, antes manifestamente, a ruptura de stock serve um objectivo do produtor que não é uniforme para todo o tipo de produto produzido, bem podendo aliás perceber-se a utilidade da ruptura de stock como forma de reforço publicitário, quando se lança um modelo de alta tecnologia ou de luxo cujo imediato esgotamento no mercado aguça a vontade de o comprar por todos os que não correram suficientemente depressa a comprá-lo. A importância da ruptura de stock só pode ser avaliada negócio a negócio e no caso concreto, só é mesmo importante porque as Rés a definiram como o maior dos males a evitar, na medida em que potencia a desfidelização do fumador à sua marca, e até a sua libertação de dependência do tabaco em geral, pondo em perigo os interesses das Rés.
Relativamente ao suprimento da ruptura de stock e quanto a “Os promotores de vendas das Rés ora Recorridas contactavam diretamente os Retalhistas. Na eventualidade de, nesses contactos, se depararem com uma rutura de stock, os promotores de vendas da T… poderiam, mediante prévio conhecimento do Grossista, ceder produtos ao Retalhista, informando o Grossista da quantidade de produto cedida, para que o Grossista pudesse posteriormente cobrar os valores correspondentes à venda desses bens, ao mesmo tempo que as Rés ora Recorridas faturavam ao Grossista os produtos ora cedidos”, parece tratar-se dum ponto juridicamente relevante. Nos casos de prévio conhecimento do grossista, admitir-se-ia que a ordem de transferência pudesse ser vista como encomenda tácita intermediada, integrando temporalmente um dos contratos de compra e venda sucessivos.
Simplesmente, se compararmos as Condições Gerais de 2002 e as de 2005, percebemos que não é assim: - é que na versão de 2002, o aviso prévio é acompanhado da menção final “sem que este (cliente) possa vir a recusar a dita factura” ao passo que nas Condições de 2005 já se prevê “mediante aviso prévio ao Cliente Grossista fornecedor do ponto de venda em causa e aceitação deste” (sublinhado nosso). Ou seja, no primeiro caso estamos perante um verdadeiro direito de substituição da vontade negocial do grossista que se realiza mediante uma prévia comunicação da falha de cumprimento da obrigação de manter o posto de venda com suficiência de stock, algo portanto que se realiza no contexto global dos comportamentos instituídos pelas Condições Gerais, ao passo que no segundo caso esse direito não existe, antes é a própria vontade do grossista que então, após essa comunicação, é convocada a declarar-se.
Quando as recorridas referem “Pretendia-se, assim, manter a integridade da cadeia e evitar ruturas de stocks, assim prevenindo situações em que determinados consumidores pretendessem comprar estes produtos num determinado ponto de venda, não o conseguindo fazer”, acabam, se não estamos em erro, a admitir que pretendiam interferir na cadeia de distribuição e que portanto os membros dela não agiam necessariamente com estrita autonomia e liberdade. Na nossa visão talvez errada, o que as recorridas dizem é mesmo que o ponto mais importante da sua política comercial foi mesmo aquilo que pretenderam fazer aplicar ao longo da cadeia. A isto podemos fugir refugiando-nos numa definição rigorosa do que seja a política comercial, remetendo-a ao labor dos departamentos especializados e das administrações, mas dum ponto de vista económico geral, não haverá talvez fundamento de base, pressuposto, ponto de partida e ponto de chegada mais importante que este: - vender e como vender.
Sobre o argumento de que “Numa verdadeira concessão comercial com obrigação de venda, “as Rés ora Recorridas poderiam responsabilizar contratualmente, nestas situações, os Grossistas, mas não é isso que acontece; as Rés ora Recorridas limitam-se a suprir uma necessidade de produto momentânea do Retalhista e a dar conhecimento desse facto aos Grossistas”, teremos de repetir que poder poderiam, e nada obsta que apesar de não haver previsão expressa no texto das condições gerais, o não façam para além da prevista recusa de fornecimento. Por isso, a falta de previsão expressa não aponta para uma deficiência ou incompletude da “obrigação”, sendo aliás que encontra uma explicação absolutamente simples: - tal mecanismo não se compadece com a necessidade de fornecer diariamente o consumidor, donde o mecanismo das ordens de transferência é muito mais eficiente do que qualquer responsabilização contratual que visasse indemnização por parte do grossista às Rés.
Relativamente a que “Não contraria a tese da compra e venda sucessiva “previsão de descontos praticados pela T… em função da performance do distribuidor no passado”, pois a “realidade jurídico-económica demonstra precisamente esta correlação entre condições de compra e faturação anterior gerada por um determinado cliente, até com consumidores. São disto exemplos os cartões de fidelização, descontos associados ao volume de compras realizadas, etc”, é verdade que não contraria, mas supõe necessariamente que a relação fosse duradoura, indício usado para qualificação da concessão comercial, e foi precisamente para o seu preenchimento que as Autoras tanto insistiram neste tema.
- Quanto a “Uma vez que não existia qualquer vínculo obrigacional entre as Rés ora Recorridas e os clientes grossistas relativamente à publicidade ou ao merchandising, o que os Grossistas fizeram ou deixaram de fazer é manifestamente irrelevante para os autos e, em específico, para a qualificação da relação económica em causa, já que os Grossistas a nada estavam contratualmente obrigados pelas Rés ora Recorridas”, vamos simplificar: uma vez que não há obrigação é irrelevante o que fazem os grossistas para concluir se há contrato (de concessão). Ou seja, negamos a existência de contrato que gera a obrigação, depois dizemos que o que quer que tenha sido feito ao abrigo daquilo que pareceria decorrer dum contrato afinal não serve para dizer que há contrato. Digamos então que basicamente seja o que for, quando partimos do pressuposto de que não há contrato, não servirá para dizer que há contrato. Do que resulta claro que o argumento utilizado se resume a um jogo de palavras e não é realmente apto a produzir qualquer efeito útil. Sobretudo quando é manifestamente claro que não faria qualquer sentido que os grossistas não utilizassem o material promocional ou publicitário para conseguirem, para si mesmos, mais vendas.
Em “Já seria co-natural que num “contrato de concessão comercial, (…) o concedente e o concessionário partilhassem esforços e despesas em publicidade do produto e em organização comercial dos pontos de vendas”, deve dizer-se que isso não é um elemento imprescindível da qualificação da concessão comercial, qualquer que seja o ramo de negócio. Será co-natural conforme os intervenientes concretos e os produtos concretos. Quando sobretudo a publicidade do produto é legalmente restringida ou praticamente nula, não haverá grande esforço económico nela que não possa ser suportado apenas pelo produtor, e quando estamos a falar dum produtor que é dum ou do maior grupo internacional, e para se assim se conservar não abdica de modo algum da concepção da sua publicidade (basicamente imagem e formato do próprio produto já integradas antes da saída de fábrica, a que acresce uma mera ordem de exposição do produto), então já não faz grande sentido económico (despesas elevadas para colocação em determinada área) que haja partilha de despesas com publicidade definida de modo geral e não particularizado por área específica onde se situe o distribuidor que supostamente, pela especificidade da sua área e por uma especial e distinta necessidade de publicidade para ela, a devesse também comparticipar.
Que os grossistas “não ficaram incumbidos de nenhuma obrigação de cooperação para com as Rés ora Recorridas (…), não empenhando aí nenhuma forma de capital” (…) no “tocante à promoção dos produtos junto do retalho”, sendo que “num contrato de distribuição, a integração do distribuidor prende-se, essencialmente, com este dever de promoção dos produtos que o adstringe, que aliás é comum aos contratos de concessão e aos contratos de agência. Trata-se de um elemento essencial deste tipo de contratos” admitiremos que uma forma de cooperação é entregar capital para promover produtos, mas não é claramente a única e não é de todo a mais decisiva, porque empatado que fosse muito capital, ainda assim alguém teria de convencer o retalho a comprar. Quando se diz “nenhuma forma de capital” devemos portanto estar a incluir “capital sob a forma trabalho” e neste caso a questão resume-se a saber se os grossistas promoviam ou não, no exercício da sua actividade, um ditame de promoção junto do retalho, o que se verá mais adiante. Deve porém salientar-se que o que é essencial à qualificação duma relação contratual como de concessão comercial não é a promoção, mas a integração na rede, e esta integração revela-se por modos variados e não apenas pela promoção entendida em sentido estrito (concepção de promoções).
Quanto a “no período a que se reporta o presente litígio, as CGF não previam uma obrigação de promoção dos produtos. Até 1995 esse dever estava previsto nas CGF, mas depois desapareceu das subsequentes CGF”, cumprirá então perceber em que se traduzia a promoção contratualmente prevista e se após 1995 os actos concretos em que ela se traduzia deixaram de ser praticados pelos grossistas, e uma coisa é certa desde já, a promoção a que se referiam os contratos não teria de certeza o sentido restrito de concepção de promoções.
Quanto a “distribuição ativa era meramente opcional” (…) “A atribuição de um desconto adicional aos Grossistas que optassem pela distribuição ativa visava apenas remunerar os mesmos pela comercialização dos produtos com entrega nos pontos de venda retalhistas. Esta forma de comercialização é naturalmente mais onerosa do que a comercialização feita em estabelecimento do Grossista, contribuindo para tornar mais eficiente a comercialização dos produtos”, deve dizer-se que as condições gerais que vieram aos autos só foram estabelecidos para distribuidores activos. Portanto, perante condições que se referem a este tipo de distribuição é desajustado referir que ela é opcional. Se com isto pretendem as recorridas significar que os grossistas, perante as alterações das condições, perante o agravamento das condições, tinham a liberdade de mudar de distribuidores activos para passivos, sim teriam, como teriam muitas outras liberdades que não vêm ao caso, tanto que a observação é produzida a propósito da qualificação e não a propósito das questões de concorrência. Mas em rigor não era isso que as recorridas queriam dizer, antes que, a suposta obrigatoriedade das informações por dessa informação depender o desconto de distribuição directa e activa também não era obrigatória porque a distribuição directa e activa também era opcional. Seria, noutro contexto que não é o que liga as Rés às AA., em que elas praticavam esse tipo activo de distribuição. E portanto vamos dar ao mesmo: estas AA. teriam a liberdade de não dar informações porque teriam a liberdade de não querer agarrar-se à distribuição activa, visto que tinham uma alternativa. Ora, se a distribuição directa e activa implica a “remuneração” de um custo de trabalho e de custo de meios materiais exigidos e portanto é maior que a “remuneração” da distribuição passiva, só falta é dizer que a alternativa passiva não era de todo equivalente, e mais uma vez caímos na ideia veiculada ao longo do processo que somos livres e que a operação do mercado nos convida à liberdade de descer a escada. Simplesmente, não é por sermos livres nem é pelo degrau da escada, que não nos ligamos uns aos outros mediante contratos, aliás, é justamente por sermos livres que nos ligamos aos outros por contratos. Nas sociedades antigas era outra a forma de nos ligarmos, com a sua notória eficiência económica co-natural ao desenvolvimento dessas épocas, que a evolução tecnológica lato sensu tornou porém obsoletas. A mesma evolução já tornou os contratos individuais celebrados com um grande número de pessoas numa obsolescência, e por certo poderá vir a tornar quaisquer contratos, pura e simplesmente, obsoletos, substituindo-os, esperemos que não, de modo revivalista, mas verdadeira inovatório.
Esperamos ter demonstrado o desacerto do argumento conclusivo de que “Não existia assim a imposição de uma modalidade de venda e só nesse caso é que se poderia dizer que “a atividade empresarial do distribuidor ser[ia] parcialmente heterodeterminada e heterocontrolada” (Cf. Ferreira Pinto), como é conatural a um contrato de distribuição”. Repetimos, o caso que veio a tribunal é de grossistas que praticavam distribuição directa e activa e o centro da regulamentação dessa actividade pretendida discutir foram as condições gerais que se referem apenas e só à distribuição directa e activa. De resto, seria no mínimo estranho que a distribuição passiva fugisse ao controlo heterodeterminado do produtor, ou melhor dizendo, que num negócio em que corressem paralelamente distribuições activas e passivas (pense-se num cash and carry assumido por um grossista), nas segundas não houvesse por definição a possibilidade de uma heterodeterminação.
Relativamente a que as “referências temporais vertidas nas CGF permitem esbater de forma significativa qualquer ideia de uma suposta estabilidade ou durabilidade das relações que se foram estabelecendo entre os diversos Grossistas e as Rés ora Recorridas. (…) “a substituição in totum, tendencialmente anual, das CGF é bem demonstrativo do facto de se tratar simplesmente de um preçário acompanhado de condições de venda, adaptado a clientes grossistas”, vamos reservarmos para a análise dos textos mais adiante. Trata-se dum ponto relevante que também terá de ser apreciado para decisão de outros pedidos.
Sobre “Não seria justo, em “corolário do pensamento carreado aos autos pelas ora Recorrentes, em que ou as Rés ora Recorridas não vendiam os seus produtos na cadeia comercial e não haveria um contrato de distribuição, ou vendiam os seus produtos na cadeia comercial a um Grossista e, de forma inelutável, tornar-se-iam concedentes, celebrando ope legis um contrato de distribuição, sem que tal quisessem e sem que o conteúdo obrigacional das relações jurídicas firmadas fosse consentâneo com tal qualificação” quando “ficando as Rés ora Recorridas com o ónus de suportar os deveres e as imposições advenientes da concessão, sem beneficiar dos direitos respetivos, e, inversamente, as 1.ª a 25.ª Autoras ora Recorrentes com a possibilidade de beneficiar de uma lógica contratual, sem que estivessem adstritas às concomitantes obrigações que necessariamente se imporiam se de um contrato de distribuição efetivamente se tratasse”, dizer devido é que não se cuida neste processo de justiça mas de Direito. Não estão em causa direitos potestativos mas eventuais contratos sinalagmáticos, pelo que se trata apenas de apurar da existência das obrigações e direitos de ambas as partes.
Quanto a “Este entendimento é reforçado pelo facto de a jurisprudência vir apresentando um critério estrito para a qualificação de contratos como concessão comercial”. (…) “Na síntese do Tribunal da Relação do Porto: não existia vínculo jurídico que obrigasse o autor a comprar à R., que o obrigasse a só comprar tabaco do comércio da R, que o obrigasse, perante a R., a só vender em determinada zona geográfica ou só com clientes pré definidos pela R., ou que o obrigasse a negociar com os retalhistas em condições impostas, ou essencialmente determinadas, pela R., ou que controlasse a actividade do A. impondo-lhe condições de facturação, preços de venda, volume de facturação e marcas a distribuir e que o A. se encontrasse submetido às regras de actuação, de depósito de produtos e de relacionamento com o cliente, que a R. lhe exigia. Assim, afigura-se-nos que os factos provados integram o vulgarmente designado contrato de fornecimento que tem a natureza de contrato de compra e venda, com prolongamento no tempo. (…) (…)O vínculo jurídico que une as partes é cada um dos contratos de compra e venda que a ré e os grossistas celebram, com o conteúdo que as CGF estabelecem de forma geral e abstracta. (…)Ao alterar as CGF (…), a ré não alterou um contrato: alterou, isso sim, com eficácia geral e abstracta, os futuros contratos de compra e venda que iriam ser celebrados entre ela e o autor. (...)” (Cf. Processo n.º 0630320)”, estamos aqui em presença dum ponto que precisa mesmo ser abordado.
Ele impressionou muito o tribunal recorrido, que citou o referido acórdão em apoio da posição que tomou.
Como se sabe, tem sido desiderato da administração da justiça, até em arrasto à reclamação económica da ineficiência económica gerada pela justiça, a pretensão de uniformidade da jurisprudência enquanto garante da certeza e segurança do direito.
Como a sentença de primeira instância em que o acórdão citado se apoiou, nem o acórdão citado, fazem jurisprudência uniforme, não teríamos aqui de demonstrar as razões inovatórias de dissentimento da teoria que os impregna. Basta invocar as razões de não concordância – e em rigor nem a tanto estaríamos obrigados.
Com o maior respeito, até pessoal, pelo colectivo de tal acórdão, temos pontos de divergência fundamentais.
Acompanhemos o argumentário das recorridas acima transcrito:
- “Este entendimento é reforçado pelo facto de a jurisprudência vir apresentando um critério estrito para a qualificação de contratos como concessão comercial”. Tirando o acórdão em causa, e remetendo à lista que acima identificámos, não encontramos tão significativamente esse critério estrito.
- “Na síntese do Tribunal da Relação do Porto: não existia vínculo jurídico que obrigasse o autor a comprar à R” – a factualidade provada não é coincidente naquele processo e neste. - “que o obrigasse a só comprar tabaco do comércio da R, - o acórdão em causa terá considerado a exclusividade como elemento essencial da concessão comercial, o que não aceitamos como demonstrámos e com o respaldo doutrinário e jurisprudencial que já mencionámos, - “que o obrigasse, perante a R., a só vender em determinada zona geográfica ou só com clientes pré definidos pela R.” – mesma diferença, já demonstrado porque não aceitamos que seja um elemento essencial e já vimos também o respaldo doutrinário e jurisprudencial da nossa posição, - “ou que o obrigasse a negociar com os retalhistas em condições impostas,” - temos facto provado sobre a imposição de condições ao menos no que toca à determinação do preço de venda ao retalho, - “ou essencialmente determinadas, pela R.” – aqui mais nos aproximamos da ideia de que a liberdade negocial entre grossista e retalhista é determinada de base pelo que se apurou neste processo quanto à liberdade de fixação do preço, devendo dizer-se ainda quanto a estas duas afirmações que é obliterado tudo quanto nas condições gerais diz respeito à compra para revenda, às previsões de encomenda e às quantidades mínimas, que se têm de conjugar com a evidência de que não há compra para consumo próprio do grossista e que portanto nessa medida, há pelo menos uma determinação do volume a vender necessariamente ao retalho, - “ou que controlasse a actividade do A. impondo-lhe condições de facturação, preços de venda, volume de facturação e marcas a distribuir” – a diferença é justamente aquela que acabamos de mencionar no parágrafo anterior, - “e que o A. se encontrasse submetido às regras de actuação, de depósito de produtos e de relacionamento com o cliente, que a R. lhe exigia” – ora, tirando a vaguidade da menção “regras de actuação”, pelo menos no que diz respeito ao depósito de produtos a afirmação só pode ter sido feita por, com o maior respeito, uma desconsideração prévia da natureza vinculativa das regras, pois justamente nas condições gerais existem cláusulas relativas ao armazenamento e depósito acopladas da vistoria prévia dos armazéns, das vistorias subsequentes e da genérica recusa de fornecimento perante o incumprimento seja de que ponto for das condições gerais. - “Assim, afigura-se-nos que os factos provados integram o vulgarmente designado contrato de fornecimento que tem a natureza de contrato de compra e venda, com prolongamento no tempo” – portanto, na dependência dos factos ali provados. Mas mais relevante é notar que neste nosso processo nem isso – contrato de fornecimento – as Rés admitem que tenham celebrado com as AA. - “O vínculo jurídico que une as partes é cada um dos contratos de compra e venda que a ré e os grossistas celebram, com o conteúdo que as CGF estabelecem de forma geral e abstracta” – aqui, de novo com o maior respeito, não será possível afirmar a existência de um contrato de fornecimento para concluir que ele em nada vinculou as partes mas sim que os únicos vínculos foram os contratos de compra e venda sucessivos. Se havia contrato de fornecimento, então o único vínculo não seriam os contratos de compra e venda sucessiva, mas no mínimo, a conjugação do contrato de fornecimento com esses contratos de compra e venda sucessiva.
A mesma nossa inconformidade atinge o restante argumento de que “(…)Ao alterar as CGF (…), a ré não alterou um contrato: alterou, isso sim, com eficácia geral e abstracta, os futuros contratos de compra e venda que iriam ser celebrados entre ela e o autor. (...)” (Cf. Processo n.º 0630320)”.
Muito em concreto quanto a esta conclusão jurídica, de que havia contrato de fornecimento mas que o único vínculo era afinal a compra e venda sucessiva, não conseguimos mesmo aceitá-lo.
Nesta não aceitação apoiamo-nos também em “O Contrato de Fornecimento no Sector da Grande Distribuição a Retalho: Perspectivas Actuais”, consultável em www.rousseau.com.pt, no qual Carolina Cunha, Assistente da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, refere:
“1 - O contrato de fornecimento constitui, porventura, um dos instrumentos jurídicos mais antigos daquilo a que se convencionou chamar distribuição comercial1.
É, todavia, habitualmente descurado pela doutrina em prol de figuras mais recentes – com destaque para a agência, a concessão e a franquia –, que integram a moderna categoria dos contratos de distribuição2.
Este relativo alheamento doutrinal não traduz um declínio do recurso ao contrato de fornecimento na prática jurídica. Pelo contrário, em determinados sectores de actividade, aparece como instrumento de eleição na tarefa de estruturar as ligações económicas entre produtores e distribuidores.
É o que sucede no domínio das relações entre os produtores (em sentido amplo, incluindo, portanto, grossistas e importadores)3 e a denominada grande distribuição (de que surgem como expoentes máximos os hipermercados)4.
Com efeito, dando razão a quem profetiza que, no contexto da distribuição comercial, a figura do contrato em geral parece destinada a conservar a sua “poderosa vitalidade”5, o contrato de fornecimento não só continua bem vivo, como ainda apresenta uma saúde renovada.
Queremos com isto referir-nos à progressiva penetração, na base jurídica do fornecimento, de um conjunto de tendências que, de modo diverso, também se manifestam nos modernos contratos de distribuição.
O que não deve surpreender-nos: quaisquer que sejam as opções jurídiconegociais que concretamente acabem por ser tomadas, as necessidades sentidas pelos produtores na configuração do canal distributivo convergem no mesmo sentido: reduzir a distância que os separa do consumidor e possibilitar-lhes determinado acompanhamento do iter distributivo do produto comercializado6.
(…)
2 - A relação negocial entre os produtores e os grandes retalhistas tem vulgarmente por base um contrato de fornecimento. Trata-se, no caso, de um negócio de execução reiterada7, em que uma das partes (o fornecedor) se obriga, contra o pagamento de um preço, a realizar fornecimentos periódicos ao outro contraente (o fornecido).
O contrato de fornecimento qualifica-se como um contrato duradouro: a satisfação do interesse do fornecido exige que as prestações do fornecedor se realizem de forma repetida dentro de cada arco temporal. (…)
Já o objecto dos concretos fornecimentos tanto pode estar previamente fixado como corresponder à satisfação das necessidades normais do fornecido – o qual pode gozar da faculdade de determinar o “se”, o “quando” e o “quanto” de cada abastecimento.
O contrato de fornecimento não dispõe de disciplina própria no nosso ordenamento jurídico.
Todavia, a sua tipicidade social é indiscutível9, além de ser normativamente contemplado pelo art. 230º, 2º, do Código Comercial, o que lhe confere, em nosso entender, o estatuto de contrato (legalmente) nominado10.
Em termos de estrutura, o contrato de fornecimento celebrado entre os produtores (ou grossistas, ou importadores) e os retalhistas apresenta-se como um contrato-quadro.
Trata-se, pois, de um esquema negocial flexível, que oferece resposta adequada a situações contratuais complexas: “a sua originalidade deriva da circunstância de deixar a outros contratos [os contratos de execução] a tarefa de realizar concretamente o objectivo das partes”. 11
O contrato-quadro é fonte de uma relação obrigacional complexa cuja execução requer, designadamente, a celebração de múltiplos contratos, de acordo com os parâmetros inicialmente pactuados. Estes contratos de execução, isoladamente considerados, configuram compras e vendas mercantis12. Mas esta relação obrigacional complexa, ou seja, este “quadro, estrutura ou sistema de vínculos emergentes do contrato, numa posição recíproca de instrumentalidade e interdependência, coordenados pela sua procedência do mesmo contrato e pela sua colocação ao serviço do fim contratual amplamente entendido”13, não se esgota na periódica celebração de negócios de compra e venda.
A dinâmica sempre renovada das relações comerciais deu azo ao aparecimento, no seio do contrato de fornecimento, de um conjunto de vínculos jurídicos actualmente conhecidos por “cooperação comercial”. (fim de citação).
Em suma, tirando diferenças nos factos provados, as teses teóricas do referido acórdão da Relação do Porto, nem da sentença sobre que versou, nem de uma outra que as Rés também fizeram juntar aos autos, no mesmo sentido, não nos convencem. Vamos então a factos provados, e de entre eles, primeiramente ao teor dos textos.
No contrato de 1941, a fls. 8128 a 8131 dos autos, além do que já consta expressamente do facto provado 88, existem as menções de comprometimento do depositário:
“3. A aceitar a fiscalização e as instruções de A T… em todos os assuntos relativos à montagem dos serviços de vendas do Concelho. 4. A ter sempre em depósito, e a que os seus sub-depositários o tenham também, um stock suficiente de todas as marcas de que haja consumo no Concelho, de forma a que ninguém possa reclamar contra a falta de tabacos de A T…. 5. A efectuar as requisições tanto quanto possível semanalmente, e a aceitar os tipos de embalagem fornecidos por A T…, ou sejam: caixas, 1/2 caixas ou mínimo de 1/4 de caixa. (…) 8. A colocar no seu estabelecimento, e nos estabelecimentos dos seus sub-depositários, taboletas, chapas, cartazes ou quaisquer outras formas de reclamo que lhe forem fornecidas, ou que o acreditem como depositário revendedor de A T… podendo V. Sª, de sua conta, usar dos meios de propaganda que entender e com os quais A T… concorde. 9. A conceder aos sub-depositários um desconto mínimo de forma a que não fiquem reservados a V. Sª mais de 2% sobre os descontos que lhe forem concedidos. 10. A conceder a revendedores de tabacos, que não sejam sub-depositários, um desconto mínimo de forma a que não fiquem reservados a mais de V. Sª mais de 2 1/2 %. 11. A conceder aos lojistas ou retalhistas de tabaco um desconto mínimo de forma a que não fiquem reservados a V. Sª mais de 3% sobre os descontos que lhe forem concedidos. 12. A não vender fora da área que lhe é atribuída. 13. A informar confidencialmente A T.. de tudo o que se referir à concorrência dos nossos produtos. 14. A desistir de todo e qualquer direito a reclamação por demoras em entregas. (…)”
No mesmo contrato lê-se ainda:
“POR OUTRO LADO, A T… COMPROMETE-SE: 16. A conceder a V. S.ª o desconto máximo de revenda que para cada qualidade de tabaco for fixado. 17. A por todo o tabaco que V. S.ª requisitar, franco de embalagem e de sua conta na estação de Caminho de Ferro mais próxima da sede desse Concelho ou aquela que mais convier ao comprador. 18. A expedir rapidamente todas as encomendas de V. S.ª, salvo casos de força maior ou estranhos à vontade de A T…. (…) A T… reserva-se o direito de, se o julgar conveniente aos seus interesses, ou se reconhecer que V. S.ª não desenvolve a necessária actividade para a venda dos produtos de A T…, nomear mais depositários revendedores nesse Concelho, ou anular, com prévio aviso de 8 dias, este contrato de revenda. No caso de falência, concordata moratória ou convocação de credores para composição amigável ou ainda insolvência declarada por parte do depositário revendedor, este perde todo o direito a descontos ou bónus, ainda não liquidados, à data em que se dê qualquer dos casos acima explanados”.
Mais constam as seguintes menções acima das assinaturas das partes: “Reconhecendo que as condições de venda acima exaradas são formuladas com a melhor boa fé e em proveito de ambas as partes, declaro concordar com elas inteiramente (…)” e “Tendo DS assinado a declaração supra, e, portanto, concordado com todas as condições acima exaradas, outorgamos-lhe o direito de depositário revendedor dos nossos tabacos”.
Chegados à beira da adesão de Portugal às Comunidades Europeias, o texto passa a ser, e citamos a partir do contrato de fls. 8133 e seguintes, com RL, após o considerando inicial onde as partes declaram visar estabelecer uma cooperação mútua, designadamente satisfazer o mercado consumidor, manter e melhorar a posição da T…, planificar a venda e o aprovisionamento e ainda a mencionam a selecção do distribuidor por via das suas qualificações quanto a volume de vendas, cumprimento de normas de comercialização, informação do mercado, idoneidade e disponibilidade de meios:
2ª – “A T… entrega ao DISTRIBUIDOR, e este aceita a distribuição dos produtos abrangidos. O contrato tem como área principal de operação a definida no ANEXO I”.
(…)
4ª – epigrafada Obrigações da T… – “A T… obriga-se às prestações seguintes: 1. a) Abastecer o DISTRIBUIDOR, na forma habitual e ressalvando impedimento legal ou caso fortuito ou de força maior, com os produtos objecto deste contrato; b) Proceder aos descontos, a favor do DISTRIBUIDOR, fixados no anexo II; c) Não celebrar contrato análogo ao presente com contraente estabelecido na área principal do DISTRIBUIDOR, com excepção dos estabelecidos na área à data da assinatura do contrato; d) Facultar, na medida do possível, acções de formação do pessoal do DISTRIBUIDOR, nos domínios da comercialização, distribuição, organização e informática. 2 (…) 3 (…) 4. O presente contrato não colide com o abastecimento pela T… de outros grossistas estabelecidos na área, nem restringe a faculdade de a Empresa promover a distribuição directa dos sues produtos até 5% dos pontos de venda abastecidos pelo DISTRIBUIDORES. 5. A T… pode ainda, quando verificar a inexistência ou insuficiência de produtos nos pontos de venda, proceder à venda directa dos produtos em falta. 6. O DISTRIBUIDOR comprará à T…, e revenderá em seu próprio nome, conta e risco, os produtos abrangidos”.
5ª – epigrafada Obrigações do Distribuidor, a saber: “O DISTRIBUIDOR obriga-se a todas as operações inerentes à comercialização e designadamente as seguintes: 1 a) Distribuição física dos produtos pelos pontos de venda; b) Possuir armazéns adequados, bem como assegurar o “stock” de produtos considerado bastante pela T…; c) Não comercialização de produtos concorrentes (…) d) Actividades promocionais e publicitárias, em conformidade com directrizes da T…: e) Informar periodicamente a T…, ou quando esta o solicitar, sobre a situação e as tendências do mercado, e a actividade da concorrência. (…) 2. A T… fornecerá ao DISTRIBUIDOR material publicitário e promocional, bem como as directrizes tendentes à sua correcta utilização. 3. A T… poderá efectuar acções de inspecção e verificação das operações de distribuição, incluindo o controlo das existências do DISTRIBUIDOR. (…)
7ª – intitulada “Vigência”, onde se lê: “1. O presente contrato é válido pelo prazo de 10 anos, contados da data da sua assinatura, e renova-se por períodos sucessivos de cinco anos, no caso de nenhuma das partes comunicar à outra a vontade de o não renovar, com a antecedência mínima de 12 meses relativamente ao termo do prazo inicial ou de renovação em curso. (…) 3. O contrato poderá ser resolvido por qualquer das partes e com efeitos imediatos, no caso de incumprimento de obrigação essencial: a) Para a T… a recusa injustificada de fornecimento; b) Para o DISTRIBUIDOR o não pagamento das facturas nos prazos em vigor (…). 4. Considera-se justificada a recusa de fornecimento de tabaco no caso de ocorrência fora do controlo da T… – tais como incêndios, inundações, explosões, greves ou outras perturbações laborais, restrições legais -, as quais justificam o incumprimento ou diferem o cumprimento do contrato enquanto prevalecerem as referidas condições. (…)”
8ª:
“1 – A transmissão a terceiro da posição contratual emergente do presente contrato, sem autorização prévia por escrito da contraparte, confere a esta o direito de resolver com efeitos imediatos o contrato. 2 – No caso de o DISTRIBUIDOR ser uma sociedade, o ingresso de novos sócios na sociedade será comunicado à T…, que salvo no caso de sucessão por morte, terá o direito de opção entre continuar com o contrato ou resolvê-lo com efeitos imediatos”.
Concluída a adesão de Portugal às Comunidades Europeias, e em 16.1.1992, na vigência do prazo inicial dos contratos de 1985, celebrados por 10 anos, foram emitidas pela T… as primeiras tabelas de condições, a saber “Tabela de Condições – Operacionais, Comerciais e Financeiras – dos Revendedores Grossistas da T…”, a fls. 171 a 178. E dela consta:
“1. OBJECTIVO A presente tabela tem por objectivo definir e dar a conhecer aos agentes económicos, designadamente aos potenciais grossistas interessados na distribuição dos produtos da T…, as condições gerais e objectivas para o efeito exigidas. Para efeitos da presente tabela, cada estabelecimento ou armazém dos revendedores grossistas abastecido pela T…, será considerado como uma entidade independente sujeita a todas as condições operacionais, comerciais e financeiras abaixo previstas. 2. CONDIÇÕES 2.1 – OPERACIONAIS 2.1.1. – Quantidades Mínimas O revendedor grossista terá de adquirir à T… quantidades mínimas SEMANAIS, em montante equivalente à compra média semanal – em milhões de cigarros, cigarrilhas e charutos – dos 25% revendedores grossistas que menos compram no distrito ou área a que pertence, e referente ao semestre anterior. Este mínimo será apurado e posto semestralmente à disposição dos interessados até 10 dias antes da entrada em vigor das novas quantidades mínimas. (…) 2.1.2 – Distribuição O revendor grossista deverá, preferencialmente, praticar uma distribuição activa. Considera-se distribuição activa, a que implica a disponibilidade de meios humanos e de transporte adequados para a venda de cigarros e produtos afins nos pontos de venda ao público, fazendo a distribuição directa em percentagem igual ou superior a 75% da totalidade dos pontos de venda ao público por si abastecidos e em número não inferior a 25. Considera-se distribuição directa, a que resulta do contacto e entrega, sem suspensões ou interrupções, dos produtos e marcas nos pontos de venda ao público, e, no mínimo uma vez por semana. (…) (distribuição não activa) (…) (distribuição passiva) A T… poderá exigir elementos de informação comprovativos do enquadramento dos revendedores grossistas nas categorias de distribuição activa ou passiva. (…) 2.1.3 Armazém O revendedor grossista terá que possuir instalações que assegurem a armazenagem dos produtos em boas condições de salubridade, temperatura e humidade designadamente. A T… reserva-se ao direito de, a todo o tempo, verificar as condições de armazenagem dos produtos e marcas por si distribuídas ao revendedor grossista. 2.1.4 Stocks O revendedor grossista deverá possuir em armazém existências mínimas que assegurem o abastecimento aos pontos de venda durante o intervalo de tempo correspondente ao abastecimento regular que a T… estiver a efectuar, salvo por razões que lhe não sejam imputáveis. O revendedor grossista terá que distribuir de forma continuada todos os produtos e marcas produzidas ou comercializadas pela T…. A T… reserva-se o direito de, a todo o tempo, verificar o volume de stocks existentes, em armazém, das marcas por si fornecidas. 2.2 Comerciais 2.2.1 O revendedor grossista efectuará a promoção dos produtos abrangidos nas condições que são usuais na actividade, em conformidade com as instruções gerais da T…, muito em especial aquando do lançamento de novas marcas. 2.2.2 O revendedor grossista deverá comunicar à T…, logo que tal ocorra, a cessação ou mudança de actividade, bem como qualquer alteração de contrato de sociedade ou de titularidade de capital social, transmissão do direito ao uso da firma ou denominação, ou trespasse do estabelecimento comercial. 2.3 Financeiras O revendedor grossista terá direito a um desconto calculado sobre o preço de venda ao público de 8,5% ou de 7%, consoante efectuar a distribuição activa ou passiva, respectivamente. (…) 3. APLICAÇÃO 3.1 As condições referidas são aplicáveis a todos os revendedores grossistas – actuais e futuros – podendo a T… conceder aos revendedores grossistas das zonas mais desfavorecidas, quando verifique que essas zonas correm o risco de ficar sem qualquer distribuição, um período transitório de adaptação. 3.2 O não cumprimento das condições e/ou obrigações estabelecidas nesta Tabela por parte dos revendedores grossistas determinará a imediata cessação de fornecimentos. Durante o período de vigência da presente TABELA a T…poderá continuar a atribuir à “S…, S.A.” – empresa sua associada – o exercício de alguma ou algumas das tarefas e prerrogativas que, nos termos desta, lhe cabem. A presente tabela considera-se em vigor a 1 de Fevereiro de 1992 a 31 de Julho de 1992, sem prejuízo de modificações ditadas por alterações supervenientes das condições financeiras e económicas vigentes no país”.
Em 1997 deu-se a privatização e a 15 de Novembro desse ano, a R. T… (1) introduziu novas condições gerais de fornecimento, conforme documento de fls. 179 a 189, intitulado “Condições Gerais de Fornecimento de Cigarros pela T…, a Grossistas que pratiquem Distribuição Directa”.
Nelas se fez então consignar: “A T… –, S.A., adiante apenas designada por “T…” dá a conhecer aos grossistas que pratiquem distribuição directa, as condições gerais de fornecimento de cigarros por si produzidos e/ou comercializados, adiante apenas designados “Produtos”, estabelecidas de acordo com o seguinte: CAPÍTULO I DEFINIÇÃO DE GROSSISTA DISTRIBUIDOR DIRECTO Para efeitos das presentes condições gerais de fornecimento, o cliente grossista distribuidor directo – adiante apenas designado “cliente” – será uma pessoa jurídica, singular ou colectiva, que cumulativamente: a) A título habitual e profissional, compra Produtos por grosso, em seu próprio nome e por sua conta e risco e ou os revenda a grandes utilizadores ou os revenda a utilizadores profissionais que os revendam directamente ao consumidor; b) Esteja colectada nessa qualidade de comerciante por grosso perante a administração fiscal; c) possua contabilidade organizada; d) distribua directamente os Produtos aos seus clientes. Considera-se existir distribuição directa quanto o grossista cumulativamente: i) recebe e prepara as encomendas para os seus clientes, ii) efectua a entrega física e directa das encomendas a, pelo menos 75% dos seus clientes através de meios próprios e utilizando veículos adequados ao transporte dos produtos, em boas condições de conservação e higiene. e) abastece regular e continuamente os seus clientes e zela pela inexistência, nos estabelecimentos comerciais dos clientes por si abastecidos, de rupturas dos Produtos que adquire à T… ao abrigo destas condições. CAPITULO II CANDIDATOS A CLIENTES 1. Os candidatos a clientes da T… deverão informar esta empresa de que pretendem ser por esta fornecidos de Produtos ao abrigo destas Condições Gerais, devendo enviar-lhe todos os seguintes elementos: (…) e) Localização do ou dos armazéns onde pretende receber os fornecimentos, bem como autorização para que os mesmos sejam visitados durante as horas de expediente por representantes da T…, devidamente credenciados; (…) g) Indicação da previsão das encomendas semanais para cada local de entrega e do modo de pagamento pretendido; (…) 2. Os clientes admitidos pela T… ao abrigo do anterior ponto 1 deste Capítulo II terão que proceder à concretização das suas encomendas num prazo de 30 dias a contar da data da informação da sua aceitação, por esta, que será dada desde que o candidato preencha os requisitos previstos nestas Condições Gerais. CAPÍTULO III CONDIÇÕES GERAIS DE FORNECIMENTO 1 OBRIGAÇÕES DO CLIENTE Para que o cliente seja fornecido pela T… de Produtos das marcas por si produzidas e/ou comercializadas nas condições estabelecidas no presente documento terá que preencher todos os seguintes requisitos: 1.1 ENCOMENDAS. LOCAIS DE ENTREGA O cliente terá de encomendar e adquirir os Produtos à T… nos termos seguintes: 1.1.1 A T… só fornecerá e o cliente só poderá encomendar os Produtos em caixas completas de cada marca produzida e/ou comercializada pela T…. 1.1.2 Cada cliente será fornecido no ou nos locais de entrega que indicar à T…., mas não poderá, no entanto, indicar mais de um local em cada Distrito ou área de Distrito. Os Distritos e áreas de Distrito estão identificados no Anexo I. A T… deverá ser informada do ou dos locais de entrega que deverão ser de fácil acesso e parqueamento, tendo em conta os meios de transporte normalmente utilizados para a entrega dos Produtos. 1.1.3 Qualquer alteração quanto ao local ou locais de entrega deverá ser previamente comunicada à T…, por escrito e com um pré-aviso de dez dias, ficando esta autorizada, desde logo, a visitar o novo local de entrega previamente a qualquer fornecimento, para verificar as condições de armazenagem dos Produtos. 1.1.4 O cliente adquirirá os Produtos de acordo com a média semanal de quantidades mínimas previstas no Anexo II, que estão estipuladas por Distrito ou área de Distrito. Cada cliente deverá adquirir semanalmente, em média e relativamente a cada um dos locais por si indicados para entrega dos Produtos, a quantidade mínima de Produtos estipulada para o Distrito ou área de Distrito onde estiver situado cada um desses locais de entrega. 1.1.5 Com vista a apurar o cumprimento ou incumprimento do disposto no ponto 1.1.4 deste Capítulo III quanto à aquisição dos Produtos, no fim de cada trimestre do ano civil a T… fará uma análise das aquisições médias semanais de cada cliente, relativamente a cada um dos locais de entrega respectivos, durante o trimestre em análise. (…) O não cumprimento pelo cliente das quantidades mínimas semanais estabelecidas nas Condições Gerais, em vigor em cada momento para cada Distrito ou área de Distrito onde se encontrem situados o local ou os locais de entrega dos Produtos, ser-lhe-á comunicado pela T… no prazo de trinta dias após o final de cada trimestre. Nessa comunicação será concedido ao cliente um prazo até ao final do trimestre então em curso para retomar as encomendas médias semanais nos termos vigentes, sob pena de, não o fazendo, lhe ser de imediato comunicada a cessação dos fornecimentos no local ou locais de entrega em que se verifique que não atinge as quantidades estabelecidas. 1.1.6 Por forma a acompanhar a evolução do mercado, no início de cada ano civil a T… apurará a média semanal de aquisições efectuadas no ano imediatamente anterior pelo cliente que, tendo atingido as quantidades mínimas aplicáveis, adquiriu menos Produtos em cada Distrito ou área de Distrito. Para este efeito, as aquisições de cada cliente serão consideradas independentemente, ou seja, por cada um dos Distritos ou áreas de Distrito onde receba fornecimentos da T…. A média de aquisições semanais do cliente que, no ano civil precedente, tendo cumprido o disposto no ponto 1.1.4 acima, adquiriu menos Produtos em cada Distrito ou área de Distrito, constituirá a quantidade mínima de aquisições médias semanais do correspondente Distrito ou área de Distrito (sujeita ao disposto no ponto 1.1.7 seguinte). As quantidades mínimas serão comunicadas aos clientes até 15 dias antes da respectiva entrada em vigor. 1.1.7 (arredondamento do número de cigarros a computar, em caso de não corresponder a uma unidade completa de dezena de milhar) 1.2 ARMAZENAGEM 1.2.1 O cliente deverá possuir instalações que assegurem a armazenagem dos Produtos em boas condições de segurança, temperatura, humidade e higiene. O(s) Armazém (ns) do cliente deverá(ão) ter capacidade para deter, em stock, quantidades de Produtos suficientes para o abastecimento regular e suficiente dos respectivos clientes retalhistas, devendo esse stock ser gerido de modo a assegurar que os Produtos cheguem a estes em boas condições. As condições de armazenagem são as que constam do Anexo III. 1.2.3 O cliente autoriza, desde já, representantes da T… devidamente credenciados a visitar, durante as horas de expediente, todos os seus armazéns nos quais proceda à armazenagem de Produtos, por forma a verificar se são ou não cumpridas as condições constantes do Anexo III. Quando se verifique que as condições de armazenagem e/ou gestão de stocks dos Produtos não estão a ser cumpridas pelo cliente, a T… notificá-lo-à dessa circunstância e conceder-lhe-à[22] um prazo razoável para que se adapte ao cumprimento do estipulado nestas Condições Gerais. Quando se trate de não cumprimento de condições físicas, de higiene ou de segurança do próprio armazém, o prazo a conceder terá sempre em conta a duração previsível das obras de adaptação necessárias e suficientes. 1.2.3 Qualquer alteração quanto ao local de qualquer armazém onde o cliente proceda à armazenagem de Produtos, deverá ser previamente comunicada à T…, por escrito e com um pré-aviso de dez dias, que ficará autorizada, desde logo, a visitar o novo local previamente à sua utilização, para verificar as condições de armazenagem dos Produtos. 1.3 MARCAS. EMBALAGENS O cliente obriga-se a revender os Produtos apenas na sua apresentação original. Não poderá de modo algum, introduzir qualquer alteração nas embalagens dos Produtos, nem poderá alterar quaisquer características dos próprios Produtos. O cliente não prejudicará a reputação das marcas dos Produtos. 1.4 CONTRATO O cliente celebrará com a T… um contrato cuja minuta-tipo se anexa – Anexo IV. O cliente não poderá ceder a sua posição contratual no contrato sem o consentimento prévio e expresso da T…. 1.5 INFORMAÇÕES 1.5.1 A T… poderá solicitar ao cliente todas as informações que considere pertinentes para fins de apuramento do cumprimento, por aquele, dos requisitos estabelecidos nestas Condições Gerais podendo, inclusive – atendendo ao elevado valor dos fornecimento e à carga fiscal que incide sobre os Produtos – solicitar-lhe elementos demonstrativos de que possui permanente capacidade financeira para cumprir as suas obrigações para com a T…, designadamente os elementos referidos na alínea f) do ponto 1. do Capítulo II. 1.5.2 O cliente deverá notificar a T…, logo que ocorra, nomeadamente, a cessação ou mudança de actividade, qualquer alteração no contrato de sociedade ou de titularidade do capital social, transmissão do direito e uso de firma ou denominação, trespasse de estabelecimento comercial. 2. CONDIÇÕES COMERCIAIS 2.1 CONDIÇÕES COMERCIAIS GERAIS 2.1.1 Os preços de venda ao público dos Produtos são os constantes da lista anexa – Anexo V. A T… notificará ao cliente qualquer alteração aos preços de venda ao público dos Produtos e, sempre a tal haja lugar, enviar-lhe-à o anexo V devidamente alterado. 2.1.2 O cliente deverá fazer as suas encomendas à T… para a sua sede social ou para o armazém de Santa Maria da Feira ou para qualquer outro local que a T… venha a indicar, até às 13 horas do dia anterior àquele em que pretenda ser fornecido. 2.1.3 A T…, relativamente a cada um dos locais indicados pelo cliente, fará entregas em dias úteis e de acordo com a seguinte periodicidade: a) Até 75 caixas/semana --------------------------1 x semana b) De 76 a 150 caixas/semana -------------------2 x semana c) 151 caixas ou mais/semana ------------------ 3 x semana 2.1.4 O cliente obriga-se a aceitar a entrega dos Produtos que encomendar à T…. Se o cliente, após aviso, não aceitar uma entrega ou não aceitar os Produtos encomendados à T…, esta terá direito de recusar aceitar outras encomendas do cliente, notificando-o por escrito. 2.1.5 O cliente obriga-se a verificar e a assegurar a recepção dos Produtos, devendo verificar se os mesmos se encontram em boas condições e correspondem á quantidade encomendada. Sob pena de se considerar perfeita a compra e venda e caducados quaisquer direitos do cliente quanto a reclamações: a) as faltas notórias, como por exemplo falta de caixas, deverão ser denunciadas logo na altura da entrega; b) quaisquer anomalias – sejam defeitos e/ou faltas não notórias – nos Produtos, deverão ser comunicadas e comprovadas à T… no prazo máximo de 15 dias a contar da respectiva recepção no seu armazém. A T… obriga-se a substituir os produtos com anomalias ou a suprir quaisquer faltas dentro de 10 dias após a recepção da comprovação das referidas anomalias ou faltas. 2.1.6 O risco de perdas, de destruição e/ou de prejuízos relativamente aos Produtos é transferido para o cliente no momento da entrega dos Produtos no seu armazém. 2.2 CONDIÇÕES COMERCIAIS Ao cliente abastecido ao abrigo destas Condições Gerais serão concedidos os descontos comerciais conforme consta do Anexo VI, que serão efectuados em cada factura. 3. CONDIÇÕES FINANCEIRAS GERAIS. (…) 3.2.3 Sempre que a T… vier a considerar, justificadamente, que há risco de pagamento não pontual ou se o cliente: a) não pagar pontualmente uma ou várias facturas vencidas ou emitir e entregar à T… um cheque sem provisão; b) entrar em liquidação voluntária ou judicial, requerer ou forem requeridos em relação ao cliente medidas de protecção de credores e de recuperação de empresa, ou for declarado falido ou insolvente, suspender ou cessar a actividade, a T… terá o direito de suspender imediatamente todas as entregas e/ou anular as encomendas em curso e/ou a exigir o pagamento de todas as facturas não pagas, ainda que não vencidas, cujo pagamento se tornará imediatamente exigível. 3.2.4 Todo e qualquer pagamento não pontual constituirá o cliente na obrigação de pagar, para além do montante de capital devido, juros de mora à taxa legal que estiver em vigor para dívidas comerciais, acrescida de 2%, contados desde o dia do vencimento até à data do efectivo pagamento. (…) 4. RESPONSABILIDADE A T… não será responsável pelo não cumprimento pontual das suas obrigações prescritas nestas Condições Gerais, a não ser que tal incumprimento lhe seja imputável a título de culpa grave. Para estes efeitos, não se considera existir culpa grave, entre outros casos, quando o incumprimento for devido a qualquer greve, litígio ou conflito laboral ou a qualquer escassez de matérias primas ou de transporte, distúrbio, tumulto ou guerra, incêndio, tempestade ou inundação. 5. RECUSA DE ENCOMENDAS 5.1 Sem prejuízo de outras disposições destas Condições Gerais, a T… terá o direito de recusar encomendas do cliente sem que isso constitua para este qualquer direito a indemnização, se: a) o cliente entrar em liquidação voluntária ou judicial, requerer ou forem requeridas medidas de protecção dos credores e de recuperação de empresa, ou for declarado falido ou insolvente, suspender ou cessar a actividade; b) parte substancial dos bens do cliente for objecto de penhora, arresto, qualquer outra providência cautelar ou medida decretada por tribunal ou autoridade que o impeça de dispor livremente dos seus bens e tal situação se mantiver por mais de trinta dias. c) o cliente incorrer em incumprimento das obrigações previstas nas Condições Gerais. 5.2 A T… recusará fornecer o cliente se este não preencher, ou deixar de preencher, todos os requisitos referidos no Capítulo I. Caso se verifique o aqui previsto a T… comunicará ao cliente a falta verificada, concedendo-lhe um prazo de trinta dias para repor a situação sob pena de, não o fazendo, lhe ser de imediato notificada a cessação dos fornecimentos. 5.3 Para efeitos do previsto no ponto anterior, a T… analisará, anualmente, cada cliente, podendo solicitar-lhe informações ao abrigo do ponto 1.5 do Capítulo III, inclusive sobre os clientes abastecidos por cada um. 6. ÂMBITO DE APLICAÇÃO DAS PRESENTES CONDIÇÕES As presentes condições gerais aplicam-se apenas a todos os clientes da T… que pratiquem o comércio por grosso – actuais e futuros – que preencham os requisitos exigidos para que possam ser fornecidos ao seu abrigo. 7. As presentes Condições Gerais entram em vigor no dia 15 de Novembro de 1997 e a T… poderá alterar, em qualquer momento, total ou parcialmente, os termos das presentes Condições Gerais. (…)”
No documento a que nos vimos reportando falha o anexo IV. Porém, encontramos a mesma referência Anexo IV nas Condições Gerais de 2001, no ponto 1.5 das mesmas, sendo que o teor da respectiva minuta (anexo IV) era (fls. 219 dos autos):
“CONTRATO Entre: T… S.A., (…) E ___________ (…), adiante apenas designado por “Cliente”, Considerando que o Cliente pretende ser fornecido de cigarros pela T… É LIVREMENTE E DE BOA FÉ CELEBRADO O PRESENTE CONTRATO QUE SE REGE PELO DISPOSTO NAS CLÁUSULAS SEGUINTES: Cláusula 1ª O Cliente aceita ser fornecido de cigarros produzidos e/ou comercializados pela T… nos termos e condições previstos nas “Condições Gerais de Fornecimento de Cigarros pela T… S.A, a Grossistas que Pratiquem Distribuição Directa” em vigor em cada momento e que, presentemente, são as que se encontram anexas ao presente contrato, adiante apenas designadas por “Condições Gerais”. Sempre que, nos termos nelas previstos, as Condições Gerais vierem a ser, no futuro, alteradas, modificadas ou substituídas, total ou parcialmente, considerar-se-á o actual texto do Documento junto ao presente contrato substituído pelo das novas Condições Gerais, a partir do momento em que as mesmas passem a vigorar. Cláusula 2ª O presente Contrato revoga e substitui todos os anteriores contratos ou acordos comerciais que anteriormente possam ter vigorado entre as partes. Cláusula 3ª O presente Contrato entra em vigor no dia da sua assinatura e vigorará enquanto o Cliente for fornecido ao abrigo das Condições Gerais”.
Recordando o teor destas Condições Gerais de 2001 e das subsequentes, conforme factos provados 8 a 14:
(suprimida a reprodução dos factos provados 8 a 14, para efeitos de publicação, uma vez que podem ser consultados em local anterior do presente documento)
…”.
Cobertos os textos que se sucederam ao longo largo de mais de 60 anos, e notando-se a técnica na decisão dos factos provados 8 a 14, de ir consignando as alterações, servindo portanto as Condições de 2001 como base, o que se oferece dizer?
- Primeiro, que as linhas gerais de interpretação da lei formam um horizonte de referência para qualquer outra declaração humana que vise à produção de efeitos sérios, sendo que a primeira linha de todas é a de que, tendo alguém declarado alguma coisa, o que se há-de verificar primeiro, para apurar o que esse alguém quis mesmo dizer, é o teor literal da declaração, e portanto, tanto melhor quando a declaração é passada a escrito, o primeiro passo e o primeiro crivo é a leitura do texto, o apercebimento do sentido que decorre desse texto.
Já no plano concreto da declaração civil, a lei estabelece que a declaração negocial vale com o sentido que um declaratário normal, “colocado na posição do real declaratário, possa deduzir do comportamento do declarante, salvo se este não puder razoavelmente contar com ele” – artigo 236.º, n.º 1, do Código Civil, e que, quando a declaração tem natureza formal, a interpretação tem como limite a correspondência mínima com o texto escrito, ainda que imperfeitamente expresso – artigo 238.º, n.º 1, do mesmo diploma.
Assim, os elementos de interpretação serão assim aqueles de que um declaratário normal poderia dispor[23].
A propósito do artigo 684º do Código de Seabra, Carvalho Fernandes dá nota dos critérios interpretativos[24] que nesse preceito se indicavam, afirmando: - “(…) surgem aqui os elementos essenciais da interpretação: a letra do negócio, as circunstâncias de tempo, lugar, e outras, que precederam a sua celebração ou foram contemporâneas desta, bem como as negociações respectivas; a finalidade prática visada pelas partes; o próprio tipo negocial; a lei e os usos e costumes por ela recebidos”. E conclui: “deve entender-se que a todos continua a ser possível recorrer, com a ressalva de esta enumeração não ter carácter limitativo (…)[25].
Pires de Lima e Antunes Varela ensinam que “o sentido decisivo da declaração negocial é aquele que seria apreendido por um declaratário normal, ou seja, medianamente instruído e diligente, colocado na posição do declaratário real, em face do comportamento do declarante”[26]. Acrescentam ainda que “O objectivo da solução aceite na lei é o de proteger o declaratário, conferindo à declaração o sentido que seria razoável presumir em face do comportamento do declarante, e não o sentido que este lhe quis efectivamente atribuir” e ainda que “a normalidade do declaratário, que a lei toma como padrão, exprime-se (…) na capacidade para entender o texto ou conteúdo da declaração (…)”.
Segundo, e continuando nas declarações sérias (e portanto não reservadas, não poéticas, não artísticas, não lúdicas, não de princípio nem políticas, e não irónicas), uma sequela da impossibilidade de estender o braço da lei mais do que o seu efectivo comprimento em mistura com antigas fontes morais e religiosas ou mais modernamente numa microfísica de poder foucaultiana, vem trazer-nos outro elemento de decisiva importância
De modo que o sentido das expressões “direito”, “reserva-se o direito”, “não será responsável”, “deve”, “obrigações”, “contrato”, “livremente e de boa-fé celebrado” e assim sucessivamente num vasto leque de referências jurídicas que se mostram plasmadas nos sucessivos textos em vigor, deve, mais uma vez, segundo o elemento literal e a boa-fé, presumir-se que corresponde à vontade real do declarante, devendo ainda presumir-se que tais expressões não foram usadas fora do contexto que o normal declaratário, colocado na posição do declarante concreto, teria a possibilidade de lhes atribuir, ou seja, dum conhecimento mediano sobre o sentido de tais expressões, sentido vinculante com o propósito de defesa do declaratário. Digamos que quando a T… escreve um capítulo sobre as suas obrigações, podemos presumir que não estava a dizer que ia fazer o favor de prestar o conteúdo delas. O grossista, sobretudo aquele que já tinha celebrado contratos anteriormente com a T… e que esta não negava que eram contratos, pode com normalidade entender que as menções relativas a contratos e obrigações e direitos, apesar de já não constaram de um contrato individualizado, têm o sentido de que a T… continua a querer regular as relações com ele mediante contrato. Quando a T… se reserva o direito de não ser responsabilizada por atrasos de ou não fornecimentos devidos a incêndio, explosão ou tumulto, também laboral, podemos presumir que ela admite que fora desses casos pode ser responsabilizada, e ser responsabilizada não é receber palavras menos afectuosas dos senhores grossistas seus clientes, mas sim ser responsabilizada, porque nada indica sobre os termos desta responsabilidade, nos termos gerais de direito.
Sendo assim, como modestamente pensamos que é, é com bastante perplexidade que – em face da posição das Rés secundada pelo tribunal recorrido de que havia mesmo contratos até 85 mas as tabelas e condições posteriores à adesão às Comunidades e privatização já não são contratos – encontramos o uso das mesmas expressões que constavam nesses contratos aceites como verdadeiros. Desde logo porque a elaboração do contrato não é tarefa própria de quem nunca se deu ao trabalho de pensar sobre a lei e o direito, e de seguida porque efectivamente houve, ao longo de décadas, relações comerciais entre as partes, as expressões repetidas nos “não contratos” não podem ser aceites como mero exercício de liberdade romanesca e menos se enquadrarão na categoria do humor nem foram seguramente utilizadas por facilidade expositiva, como se quando se diz que uma das partes se obriga a, se quisesse dizer que “é quase como se se obrigasse a”.
Exemplificando:
No contrato de DS diz-se que este se compromete a:
“3. A aceitar a fiscalização e as instruções de A T… em todos os assuntos relativos à montagem dos serviços de vendas do Concelho. 4. A ter sempre em depósito, e a que os seus sub-depositários o tenham também, um stock suficiente de todas as marcas de que haja consumo no Concelho, de forma a que ninguém possa reclamar contra a falta de tabacos de A T…. 5. A efectuar as requisições tanto quanto possível semanalmente, e a aceitar os tipos de embalagem fornecidos por A T…, ou sejam: caixas, 1/2 caixas ou mínimo de 1/4 de caixa. (…) 14. A desistir de todo e qualquer direito a reclamação por demoras em entregas. (…)”, e quanto à T…, que esta se compromete 16. A conceder a V. S.ª o desconto máximo de revenda que para cada qualidade de tabaco for fixado. (…) 18. A expedir rapidamente todas as encomendas de V. S.ª, salvo casos de força maior ou estranhos à vontade de A T…. (…) A T… reserva-se o direito de, se o julgar conveniente aos seus interesses, ou se reconhecer que V. S.ª não desenvolve a necessária actividade para a venda dos produtos de A T…, nomear mais depositários revendedores nesse Concelho, ou anular, com prévio aviso de 8 dias, este contrato de revenda. No caso de falência, concordata moratória ou convocação de credores para composição amigável ou ainda insolvência declarada por parte do depositário revendedor, este perde todo o direito a descontos ou bónus, ainda não liquidados, à data em que se dê qualquer dos casos acima explanados”.
Temos portanto: - a) fiscalização e instruções da T… em tudo o que diga respeito à montagem do serviço de vendas; b) manutenção de stock suficiente para que ninguém possa reclamar da falta de produto T…, portanto obrigação de compra para revenda incidente pelo menos sobre stock suficiente; c) ritmo de encomendas nas quantidades resultantes dos tipos de embalagem; d) entrega rápida das encomendas – obrigação de fornecer; e) entrega rápida de encomendas salvo caso de força maior ou estranho à T… que justifica a desistência do direito a reclamar por atrasos nas entregas; f) concessão do desconto; g) anulação do contrato em caso de incumprimento da actividade julgada necessária à venda, ou seja, incumprimento da obrigação distributiva; h) protecção da T… contra consequências da perda de capacidade económica do grossista.
No contrato de 1985, a versão sobre estes mesmos assuntos é:
a) fiscalização e instruções da T… em tudo o que diga respeito à montagem do serviço de vendas - entre outras, “3. A T… poderá efectuar acções de inspecção e verificação das operações de distribuição, incluindo o controlo das existências do DISTRIBUIDOR”, “5. A T… pode ainda, quando verificar a inexistência ou insuficiência de produtos nos pontos de venda, proceder à venda directa dos produtos em falta”, (a T…) “d) Facultar, na medida do possível, acções de formação do pessoal do DISTRIBUIDOR, nos domínios da comercialização, distribuição, organização e informática”, (o Distribuidor) “e) Informar periodicamente a T…, ou quando esta o solicitar, sobre a situação e as tendências do mercado, e a actividade da concorrência”;
b) manutenção de stock suficiente e obrigação de compra – “O Distribuidor comprará à T… e revenderá em seu próprio nome, conta e risco, os produtos abrangidos”, “O Distribuidor obriga-se a todas as operações inerentes à comercialização (…)” entre elas “b) Possuir armazéns adequados, bem como assegurar o “stock” de produtos considerado bastante pela T…”;
c) ritmo de encomendas nas quantidades resultantes dos tipos de embalagem – não expresso, mas recondutível ao considerando inicial de objectivos constante da cláusula 1ª - “b) Manter ou melhorar a posição da T… no mercado do tabaco (…)” e “c) Planificar a venda e o aprovisionamento dos produtos”, conjugado com os factos provados 92, 93, 258 e 259.
d) entrega rápida das encomendas – obrigação de fornecer – clª. “4ª, 1 a) Abastecer o DISTRIBUIDOR, na forma habitual e ressalvando impedimento legal ou caso fortuito ou de força maior, com os produtos objecto deste contrato”;
e) entrega rápida de encomendas salvo caso de força maior ou estranho à T… que justifica a desistência do direito a reclamar por atrasos nas entregas – mesma cláusula, número e alínea e “4. Considera-se justificada a recusa de fornecimento de tabaco no caso de ocorrência fora do controlo da T… – tais como incêndios, inundações, explosões, greves ou outras perturbações laborais, restrições legais -, as quais justificam o incumprimento ou diferem o cumprimento do contrato enquanto prevalecerem as referidas condições”;
f) concessão do desconto – “b) Proceder aos descontos, a favor do DISTRIBUIDOR, fixados no anexo II”;
g) anulação do contrato em caso de incumprimento da actividade julgada necessária à venda, ou seja, incumprimento da obrigação distributiva – embora a previsão seja “3. O contrato poderá ser resolvido por qualquer das partes e com efeitos imediatos, no caso de incumprimento de obrigação essencial: (…) b) Para o DISTRIBUIDOR o não pagamento das facturas nos prazos em vigor (…) e a comercialização de produtos concorrentes”, o mecanismo instituído na cláusula 4ª nº 4 e 5 – o contrato não prejudica o abastecimento pela T… de outros grossistas estabelecidos na área nem restringe a faculdade de distribuição directa, e a T… pode, quando verificar a inexistência ou insuficiência de produto, proceder à venda dos produtos em falta – permite obstar a que seja necessária a resolução neste caso.
h) protecção da T… contra consequências da perda de capacidade económica do grossista - não expressamente previsto, mas ressalvável pela cláusula 1ª, selecção do distribuidor por disponibilidade de meios e pela cláusula 5ª f) – prestação de garantia de valor superior ao montante do crédito concedido pela T…, o qual servirá de limite ao valor dos fornecimentos.
De notar ainda as epígrafes expressas das cláusulas 4ª e 5ª “Obrigações da T…” e “Obrigações do Distribuidor”, e as menções “Contrato de Distribuição”, “livremente acordado e pelo presente reduzido a escrito o contrato constante das cláusulas seguintes”, “As partes tem em vista, no quadro contratual agora definido, estabelecer uma cooperação mútua (…)” e a introdução da consagração expressa da disciplina da cessão da posição contratual, que no contrato de DS só encontrava apoio na cláusula 15ª – “A, quando a V. S.ª deixar de convir ser depositário revendedor (…) da T…, avisá-la com 15 dias de antecedência, afim de a T… poder tratar da sua substituição (…)”, ou seja, embora não previsto o caso da cessão, a T… sempre se encarregaria de tratar ela mesma da substituição, quer o substituto fosse desconhecido e alheio ao depositário, quer fosse “indicado” pelo depositário cedente.
Mas é verdade que é pacífico que até aqui estamos perante contratos.
Passemos agora a ver como estas menções contratuais passam à tabela de Condições de 1992, já posterior à adesão de Portugal às Comunidades Europeias da qual se fez decorrer a insubsistência do modelo contratual.
Sendo o objectivo definir e dar a conhecer, designadamente aos potenciais grossistas interessados, e dentre estes se contando também (3.1 As condições referidas são aplicáveis a todos os revendedores grossistas – actuais e futuros”) os que já então eram revendedores grossistas da T…, cuja relação contratual com a T… até então subsistente passou, por acordo (ao menos tácito), a ser regida pela disciplina desta Tabela (facto provado 6 - a R. T… propôs aos grossistas que as condições contratuais que haviam sido inicialmente estipuladas por meio de acordos individualmente celebrados com cada grossista passassem a integrar as designadas “Condições Gerais” + facto não invocado de contemporânea oposição), o que se deu a conhecer foi:
- potenciais e já existentes grossistas que se dedicam à distribuição, ou seja, compram por grosso para revenda, que terão de “adquirir à T… quantidades mínimas SEMANAIS, em montante equivalente à compra média semanal – em milhões de cigarros, cigarrilhas e charutos – dos 25% revendedores grossistas que menos compram no distrito ou área a que pertence, e referente ao semestre anterior”, e praticar a distribuição nos moldes também dados a conhecer, sob pena de “3.2 O não cumprimento das condições e/ou obrigações estabelecidas nesta Tabela por parte dos revendedores grossistas determinará a imediata cessação de fornecimentos.
Já a T…, da sua parte, praticará “abastecimento regular”, aliás como única possibilidade dos grossistas terem de “distribuir de forma continuada todos os produtos e marcas produzidas ou comercializadas pela T… “, ou seja, terá de vender, e obriga-se a conceder um desconto determinado, ainda que o não diga, mas implicitamente pelo reconhecimento de que “O revendedor grossista terá direito a um desconto calculado sobre o preço de venda ao público de 8,5% ou de 7%, consoante efectuar a distribuição activa ou passiva, respectivamente”. Como, por outro lado, o abastecimento regular que corresponde à distribuição continuada, só conhece a excepção “salvo por razões que lhe não sejam imputáveis”, fica excluída qualquer hipótese de não abastecer por outras razões, discriminatórias ou discricionárias, e assim se constitui o mecanismo que, se não declara expressamente a obrigação de fornecer, a institui na prática, tornando dispensável a sua menção.
Não há menção expressa da actuação do grossista em nome e por conta e risco próprio, mas a ela se chega também por aplicação da previsão do desconto calculado sobre o preço de venda ao público, significando isso que com o pagamento do preço beneficiado de tal desconto, a propriedade dos bens adquiridos se transferia para o adquirente.
Por outro lado, continuamos a ver:
- a) fiscalização e instruções (da T… em tudo o que diga respeito à montagem do serviço de vendas, 1944, na versão de 85 sendo “3. A T… poderá efectuar acções de inspecção e verificação das operações de distribuição, incluindo o controlo das existências do DISTRIBUIDOR”, “5. A T… pode ainda, quando verificar a inexistência ou insuficiência de produtos nos pontos de venda, proceder à venda directa dos produtos em falta”, (a T…) “d) Facultar, na medida do possível, acções de formação do pessoal do DISTRIBUIDOR, nos domínios da comercialização, distribuição, organização e informática”, (o Distribuidor) “e) Informar periodicamente a T…, ou quando esta o solicitar, sobre a situação e as tendências do mercado, e a actividade da concorrência”) na versão de 1992 como ou em: - “A T… poderá exigir elementos de informação comprovativos do enquadramento dos revendedores grossistas nas categorias de distribuição activa ou passiva; A T… reserva-se ao direito de, a todo o tempo, verificar as condições de armazenagem dos produtos e marcas por si distribuídas ao revendedor grossista; A T… reserva-se o direito de, a todo o tempo, verificar o volume de stocks existentes, em armazém, das marcas por si fornecidas; 2.2.1 O revendedor grossista efectuará a promoção dos produtos abrangidos nas condições que são usuais na actividade, em conformidade com as instruções gerais da T…, muito em especial aquando do lançamento de novas marcas.
b) manutenção de stock suficiente: - passou a “Quantidades Mínimas - O revendedor grossista terá de adquirir à T… quantidades mínimas SEMANAIS (…); Stocks - O revendedor grossista deverá possuir em armazém existências mínimas que assegurem o abastecimento aos pontos de venda durante o intervalo de tempo correspondente ao abastecimento regular que a T… estiver a efectuar, (…); O revendedor grossista terá que distribuir de forma continuada todos os produtos e marcas produzidas ou comercializadas pela T…. Note-se com particular relevo para a questão da integração na rede, a restrição da liberdade de escolha de produtos por parte do grossista.
c) ritmo de encomendas nas quantidades resultantes dos tipos de embalagem – cláusula 2.1.1 – quantidades mínimas semanais.
d) entrega rápida das encomendas – obrigação de fornecer: abastecimento regular que a T… estiver a efectuar, salvo por razões que lhe não sejam imputáveis.
e)entrega rápida de encomendas salvo caso de força maior ou estranho à T… que justifica a desistência do direito a reclamar por atrasos nas entregas - abastecimento regular que a T… estiver a efectuar, salvo por razões que lhe não sejam imputáveis – sem menção concreta da consequência da quebra de fornecimento por razões não imputáveis, sendo relativamente claro, nos termos gerais de direito, que se não são imputáveis, também não se consegue estabelecer a totalidade dos pressupostos de uma indemnização contratual.
f) concessão do desconto – a versão de 1985 “b) Proceder aos descontos, a favor do DISTRIBUIDOR, fixados no anexo II”, passa a “O revendedor grossista terá direito a um desconto calculado sobre o preço de venda ao público de 8,5% ou de 7%, consoante efectuar a distribuição activa ou passiva, respectivamente”, suprimindo-se a ideia de obrigação da T… proceder a desconto mas mantendo-se a mesma implicação jurídica por decorrência da nova expressão de atribuição do direito correspondente a beneficiar do desconto.
g) anulação do contrato em caso de incumprimento: - 3.2 O não cumprimento das condições e/ou obrigações estabelecidas nesta Tabela por parte dos revendedores grossistas determinará a imediata cessação de fornecimentos. É verdade que não é exactamente a mesma coisa, mas como a tarefa fundamental da T… para a distribuição é a de vender/fornecer os produtos para que os distribuidores os distribuam, nunca subsistiria para o distribuidor em caso de cessação de fornecimentos nenhum direito ou efeito pendente, no máximo podendo pensar-se numa renegociação da retoma do fornecimento. Em todo o caso, note-se, o que estamos aqui a ver não é se as expressões se mantêm integralmente lineares, mas se os interesses pretendidos definir e regular se mantêm essencialmente regulados da mesma maneira ou com o mesmo efeito.
h) protecção da T… contra consequências da perda de capacidade económica do grossista – não previsto.
Note-se ainda que “2.2.1 O revendedor grossista efectuará a promoção dos produtos abrangidos nas condições que são usuais na actividade, em conformidade com as instruções gerais da T…, muito em especial aquando do lançamento de novas marcas”, retoma “2. A T… fornecerá ao DISTRIBUIDOR material publicitário e promocional, bem como as directrizes tendentes à sua correcta utilização” do contrato de 1985, e tem a sua origem do dever de empenhada promoção que já onerava o depositário no contrato de 1944.
Portanto, no essencial, a Tabela de 1992 continuou a prever o abastecimento regular e continuado da T… nas proporções pelo menos de quantidades mínimas semanais que o grossista teria de adquirir, que este, beneficiando do desconto e pagando o preço, adquiria a propriedade e passava às restantes tarefas da distribuição por sua conta e risco, e em seu nome, que nessas tarefas estava justamente incumbir-se que os produtos T… não faltassem no retalho para compra pelo consumidor, que a disponibilidade dos produtos teria de ser assegurada em boas condições (armazenagem em boas condições), que a T… podia continuar a dar instruções, e que podia fiscalizar quer os armazéns, quer as existências de stock, e que o incumprimento das tarefas do distribuidor determinaria a cessação dos fornecimentos. Tudo isto acompanhado das menções de significado jurídico indicativo de vinculação e não de liberdade ou autonomia, que fizemos questão de sublinhar.
Mas, se dúvidas houvesse a partir da parcimónia textual da tabela de 1992, o certo é que encontramos nas Condições Gerais de 1997, supostamente o grande marco histórico onde definitivamente se abandonaram as reminiscências das imposições estatais, corporativas e revolucionárias, para entrar a implementação de uma política internacional muito mais dinâmica como o “free market” exige, um rol de reposições textuais e de menções de sabor jurídico particularmente acentuado, que aliás vamos anotar sublinhando e parcialmente realçando a negrito.
É assim que, e agora vamos analisar passo a passo, alterando aliás o tamanho de letra das Condições em apreço para que se evidenciem melhor os nossos comentários: “A T…, adiante apenas designada por “T…” dá a conhecer aos grossistas que pratiquem distribuição directa – é retirada a menção define, mas se dá a conhecer é porque define, e os grossistas que pratiquem distribuição directa destinatários são “todos os clientes da T… que pratiquem o comércio por grosso – actuais e futuros”, ou seja, novas condições também para clientes já existentes.
Estas condições são “as condições gerais de fornecimento de cigarros por si produzidos e/ou comercializados, adiante apenas designados “Produtos”, estabelecidas de acordo com o seguinte: CAPÍTULO I DEFINIÇÃO DE GROSSISTA DISTRIBUIDOR DIRECTO Para efeitos das presentes condições gerais de fornecimento, o cliente grossista distribuidor directo – adiante apenas designado “cliente” – será uma pessoa jurídica, singular ou colectiva, que cumulativamente: a) A título habitual e profissional, compra Produtos por grosso, em seu próprio nome e por sua conta e risco e ou os revenda a grandes utilizadores ou os revenda a utilizadores profissionais que os revendam directamente ao consumidor; Pelo menos, pode dizer-se que os clientes, se o quiserem ser ou continuar a ser, como se neste caso já o não tivessem de, terão de comprar para revender, por conta própria, risco próprio e em seu nome, ou seja, não serão consideráveis agentes ou representantes da T…. b) Esteja colectada nessa qualidade de comerciante por grosso perante a administração fiscal; c) possua contabilidade organizada; d) distribua directamente os Produtos aos seus clientes. Considera-se existir distribuição directa quanto o grossista cumulativamente: i) recebe e prepara as encomendas para os seus clientes, ii) efectua a entrega física e directa das encomendas a, pelo menos 75% dos seus clientes através de meios próprios e utilizando veículos adequados ao transporte dos produtos, em boas condições de conservação e higiene. É o que se pretende, que os produtos cheguem aos pontos de venda, em bom estado, e não é indiferente o modo como chegam, antes, para o produtor é preciso que o cliente organize meios próprios, humanos e materiais (neste se incluindo os veículos), dos quais será responsável, naturalmente, e que use apenas veículos adequados. Repare-se que estamos antes do acordo CE, mas já na importância do conhecimento do cliente, não por razões de interesse público ou não só por elas, mas sim porque conhecendo o cliente também podemos fiscalizar os meios que usa e até veicular por eles os modelos de melhor serviço do nosso interesse, desde logo, vistorias a armazéns, acompanhamento de grossistas e seus trabalhadores pela força de vendas da T…. e) abastece regular e continuamente os seus clientes e zela pela inexistência, nos estabelecimentos comerciais dos clientes por si abastecidos, de rupturas dos Produtos que adquire à T… ao abrigo destas condições. Se abastece regular e continuamente os seus clientes, tem necessariamente que comprar regular e continuadamente os produtos T…, que é desses que aqui se trata, e tem de o fazer de modo que não haja rupturas de stock, não exactamente nele mesmo, nos seus armazéns, que isto é meramente instrumental, mas junto do consumidor, ou seja, junto primeiro do retalho seu cliente.
A tudo isto ainda se poderia dizer “tem se quiser ser ou continuar a ser cliente”. CAPITULO II CANDIDATOS A CLIENTES 1. Os candidatos a clientes da T… deverão informar esta empresa de que pretendem ser por esta fornecidos de Produtos ao abrigo destas Condições Gerais, devendo enviar-lhe todos os seguintes elementos: (…) e) Localização do ou dos armazéns onde pretende receber os fornecimentos, bem como autorização para que os mesmos sejam visitados durante as horas de expediente por representantes da T…, devidamente credenciados; (…) g) Indicação da previsão das encomendas semanais para cada local de entrega e do modo de pagamento pretendido; (…) 2. Os clientes admitidos pela T… ao abrigo do anterior ponto 1 deste Capítulo II terão que proceder à concretização das suas encomendas num prazo de 30 dias a contar da data da informação da sua aceitação, por esta, que será dada desde que o candidato preencha os requisitos previstos nestas Condições Gerais.
Se quiser ser cliente tem de informar que o quer ser, e tem de enviar elementos comprovativos dos seus requisitos, e fazendo-o, desde que preencha os requisitos, sucede então que é admitido. E sendo-o tem imediatamente de proceder à concretização da primeira das regulares e continuadas encomendas com as quais abastecerá os seus clientes, pois é requisito para ser cliente que faça esse abastecimento regular e continuado.
Portanto, há um processo de selecção, o candidato é admitido e tem logo de fazer alguma coisa – dar início às encomendas. Portanto, antes de dar início às encomendas, já existe aqui a previsão dum necessariamente prévio “ter que” que na verdade é um “ter de”. Não está expresso, mas seleccionado, o candidato assume uma primeira obrigação. CAPÍTULO III CONDIÇÕES GERAIS DE FORNECIMENTO 1 OBRIGAÇÕES DO CLIENTE Para que o cliente seja fornecido pela T… de Produtos das marcas por si produzidas e/ou comercializadas nas condições estabelecidas no presente documento terá que preencher todos os seguintes requisitos: 1.1 ENCOMENDAS. LOCAIS DE ENTREGA O cliente terá de encomendar e adquirir os Produtos à T… nos termos seguintes: 1.1.1 A T… só fornecerá e o cliente só poderá encomendar os Produtos em caixas completas de cada marca produzida e/ou comercializada pela T….. Portanto, é claro que o cliente terá de adquirir produtos da T…, para o abastecimento regular e contínuo dos seus clientes retalhistas, a que se declarou em sede de processo de selecção, e parece que voltamos a 1944, à menção das caixas, meias caixas e quarto de caixas mínimos da nomeação de DS como depositário. 1.1.2 Cada cliente será fornecido no ou nos locais de entrega que indicar à T…, mas não poderá, no entanto, indicar mais de um local em cada Distrito ou área de Distrito. Os Distritos e áreas de Distrito estão identificados no Anexo I. A T… deverá ser informada do ou dos locais de entrega que deverão ser de fácil acesso e parqueamento, tendo em conta os meios de transporte normalmente utilizados para a entrega dos Produtos. Note-se aqui como, de algum modo, não havendo limitação de área de actuação, não deixa de haver uma limitação quantitativa da capacidade de revenda do grossista distribuidor. Esta limitação porém desaparecerá nas Condições Gerais de 2001 (ponto 1.1.4). 1.1.3 Qualquer alteração quanto ao local ou locais de entrega deverá ser previamente comunicada à T…, por escrito e com um pré-aviso de dez dias, ficando esta autorizada, desde logo, a visitar o novo local de entrega previamente a qualquer fornecimento, para verificar as condições de armazenagem dos Produtos. 1.1.4 O cliente adquirirá(futuro, não condicional) os Produtos de acordo com a média semanal de quantidades mínimas previstas no Anexo II, que estão estipuladas por Distrito ou área de Distrito. Cada cliente deverá adquirir semanalmente, em média e relativamente a cada um dos locais por si indicados para entrega dos Produtos, a quantidade mínima de Produtos estipulada para o Distrito ou área de Distrito onde estiver situado cada um desses locais de entrega. 1.1.5 Com vista a apurar o cumprimento ou incumprimento do disposto no ponto 1.1.4 deste Capítulo III quanto à aquisição dos Produtos, no fim de cada trimestre do ano civil a T… fará uma análise das aquisições médias semanais de cada cliente, relativamente a cada um dos locais de entrega respectivos, durante o trimestre em análise. (…) O não cumprimento pelo cliente das quantidades mínimas semanais estabelecidas nas Condições Gerais, em vigor em cada momento para cada Distrito ou área de Distrito onde se encontrem situados o local ou os locais de entrega dos Produtos, ser-lhe-á comunicado pela T… no prazo de trinta dias após o final de cada trimestre. Nessa comunicação será concedido ao cliente um prazo até ao final do trimestre então em curso para retomar as encomendas médias semanais nos termos vigentes, sob pena de, não o fazendo, lhe ser de imediato comunicada a cessação dos fornecimentos no local ou locais de entrega em que se verifique que não atinge as quantidades estabelecidas.
Como é manifesto, do que estamos aqui a falar não é duma obrigação que se assume encomenda a encomenda, mas duma obrigação que se assume semanalmente para um trimestre de referência, e que portanto se assume previamente a cada encomenda concreta e independentemente de cada encomenda concreta. O texto só pode ser entendido como obrigação, na lógica que é de cumprimento fiscalizado e está prevista a consequência do incumprimento. Trata-se manifestamente dum interesse básico, central e essencial para o produtor, que é a definição dum número de produtos com que pretende atingir o consumidor em determinada zona (em que existem os armazéns dos grossistas e em que estes actuam, ainda que possam actuar noutras mais longínquas), número que lhe surge ou por aposta agressiva, ou por estudo de consumo na zona, e em qualquer caso que é correspondente à expectativa mínima de alimentação da dependência dos fumadores assim localizáveis. Por tudo isto, a consequência é tão forte – corresponde ao fim da própria actividade do distribuidor relativamente a produtos de que depende em percentagem muito elevada, face ao insucesso ou às dificuldades de penetração da concorrência. Voltamos a dizer que o uso destas palavras, destas expressões, não é ingénuo, aliás porque, embora o documento em questão não se mostre assinado, a anterior tabela de 1992 estava subscrita, além do mais, pela Direcção de Serviços Jurídicos, (cfr. fls.116) não sendo verosímil que isso não tivesse ocorrido na elaboração da tabela seguinte. 1.1.6 Por forma a acompanhar a evolução do mercado, no início de cada ano civil a T… apurará a média semanal de aquisições efectuadas no ano imediatamente anterior pelo cliente que, tendo atingido as quantidades mínimas aplicáveis, adquiriu menos Produtos em cada Distrito ou área de Distrito. Para este efeito, as aquisições de cada cliente serão consideradas independentemente, ou seja, por cada um dos Distritos ou áreas de Distrito onde receba fornecimentos da T…. A média de aquisições semanais do cliente que, no ano civil precedente, tendo cumprido o disposto no ponto 1.1.4 acima, adquiriu menos Produtos em cada Distrito ou área de Distrito, constituirá a quantidade mínima de aquisições médias semanais do correspondente Distrito ou área de Distrito (sujeita ao disposto no ponto 1.1.7 seguinte). As quantidades mínimas serão comunicadas aos clientes até 15 dias antes da respectiva entrada em vigor.
Se a média é calculada pelo cliente que cumprindo o patamar anterior, adquiriu menos no ano civil anterior, o resultado só pode ser a manutenção das quantidades mínimas fixadas ou o seu aumento, portanto uma indicação de cumprimento obrigatório para o ano seguinte, de estabilidade e preferencialmente aumento de negócio. 1.1.7 (arredondamento do número de cigarros a computar, em caso de não corresponder a uma unidade completa de dezena de milhar) 1.2 ARMAZENAGEM 1.2.1 O cliente deverá possuir instalações que assegurem a armazenagem dos Produtos em boas condições de segurança, temperatura, humidade e higiene. O(s) Armazém (ns) do cliente deverá(ão) ter capacidade para deter, em stock, quantidades de Produtos suficientes para o abastecimento regular e suficiente dos respectivos clientes retalhistas, devendo esse stock ser gerido de modo a assegurar que os Produtos cheguem a estes em boas condições. As condições de armazenagem são as que constam do Anexo III. 1.2.3 O cliente autoriza, desde já, representantes da T… devidamente credenciados a visitar, durante as horas de expediente, todos os seus armazéns nos quais proceda à armazenagem de Produtos, por forma a verificar se são ou não cumpridas as condições constantes do Anexo III. Quando se verifique que as condições de armazenagem e/ou gestão de stocks dos Produtos não estão a ser cumpridas pelo cliente, a T… notificá-lo-à dessa circunstância e conceder-lhe-à[27] um prazo razoável para que se adapte ao cumprimento do estipulado nestas Condições Gerais. Quando se trate de não cumprimento de condições físicas, de higiene ou de segurança do próprio armazém, o prazo a conceder terá sempre em conta a duração previsível das obras de adaptação necessárias e suficientes. 1.2.3 Qualquer alteração quanto ao local de qualquer armazém onde o cliente proceda à armazenagem de Produtos, deverá ser previamente comunicada à T…, por escrito e com um pré-aviso de dez dias, que ficará autorizada, desde logo, a visitar o novo local previamente à sua utilização, para verificar as condições de armazenagem dos Produtos.
A autorização aqui prevista é uma versão polida da anterior reserva do direito de verificar, a todo o tempo, o volume de stocks existentes e da fiscalização do armazém. 1.3 MARCAS. EMBALAGENS O cliente obriga-se a revender os Produtos apenas na sua apresentação original. Não poderá de modo algum, introduzir qualquer alteração nas embalagens dos Produtos, nem poderá alterar quaisquer características dos próprios Produtos. O cliente não prejudicará a reputação das marcas dos Produtos.
Temos pois menção expressa da “obrigação” e temos de notar que a protecção da imagem das Rés e dos seus produtos resulta da última parte, sendo portanto que, em tempos pré-acordo CE, pré combate à contrafacção, o interesse servido quer por esta obrigação de não prejudicar quer pela obrigação de não alteração nem nas embalagens nem nos produtos em si, está relacionado com o domínio da concepção do produto, da imagem e da publicidade, características consideradas essenciais para fomentar o interesse do consumidor e para garantir a genuinidade da sua dependência, ou dito de outro modo, que a pior coisa que pode acontecer é não se manter as características do produto pelas quais essa dependência é criada. Estamos, independentemente de considerações de natureza pública, em pleno campo do que absolutamente essencial para o produtor e que ele impõe à rede de distribuição a que recorre. 1.4 CONTRATO O cliente celebrará com a T… um contrato cuja minuta-tipo se anexa – Anexo IV. O cliente não poderá ceder a sua posição contratual no contrato sem o consentimento prévio e expresso da T….
Portanto, privatizada a T…, afiliada ao grupo P…, este, porventura porque também no país da sua sede parece ser legítimo o recurso a contratos, admite que na expansão da sua política à privatizada, a T... celebrará um contrato com o cliente distribuidor grossista. Que saibamos, admitindo erro, contrato é uma palavra que só tem um sentido jurídico, é uma palavra de origem jurídica e que só é usada numa acepção jurídica. Mais adiante prosseguiremos neste contrato. 1.5 INFORMAÇÕES 1.5.1 A T… poderá solicitar ao cliente todas as informações que considere pertinentes para fins de apuramento do cumprimento, por aquele, dos requisitos estabelecidos nestas Condições Gerais podendo, inclusive – atendendo ao elevado valor dos fornecimento e à carga fiscal que incide sobre os Produtos – solicitar-lhe elementos demonstrativos de que possui permanente capacidade financeira para cumprir as suas obrigações para com a T…, designadamente os elementos referidos na alínea f) do ponto 1. do Capítulo II. 1.5.2 O cliente deverá notificar a T…, logo que ocorra, nomeadamente, a cessação ou mudança de actividade, qualquer alteração no contrato de sociedade ou de titularidade do capital social, transmissão do direito e uso de firma ou denominação, trespasse de estabelecimento comercial.
Revisitamos os contratos de 1944 e sobretudo os de 1985, e a tabela de 1992. 2. CONDIÇÕES COMERCIAIS 2.1 CONDIÇÕES COMERCIAIS GERAIS 2.1.1 Os preços de venda ao público dos Produtos são os constantes da lista anexa – Anexo V. A T… notificará ao cliente qualquer alteração aos preços de venda ao público dos Produtos e, sempre a tal haja lugar, enviar-lhe-à o anexo V devidamente alterado. 2.1.2 O cliente deverá fazer as suas encomendas à T… para a sua sede social ou para o armazém de Santa Maria da Feira ou para qualquer outro local que a T… venha a indicar, até às 13 horas do dia anterior àquele em que pretenda ser fornecido. 2.1.3 A T…, relativamente a cada um dos locais indicados pelo cliente, fará entregas em dias úteis e de acordo com a seguinte periodicidade: a) Até 75 caixas/semana --------------------------1 x semana b) De 76 a 150 caixas/semana -------------------2 x semana c) 151 caixas ou mais/semana ------------------ 3 x semana 2.1.4 O cliente obriga-se a aceitar a entrega dos Produtos que encomendar à T…. Se o cliente, após aviso, não aceitar uma entrega ou não aceitar os Produtos encomendados à T…, esta terá direito de recusar aceitar outras encomendas do cliente, notificando-o por escrito.
Portanto, à obrigação do cliente corresponde o direito da T…. 2.1.5 O cliente obriga-se a verificar e a assegurar a recepção dos Produtos, devendo verificar se os mesmos se encontram em boas condições e correspondem á quantidade encomendada. Sob pena de se considerar perfeita a compra e venda e caducados quaisquer direitos do cliente quanto a reclamações: a) as faltas notórias, como por exemplo falta de caixas, deverão ser denunciadas logo na altura da entrega; b) quaisquer anomalias – sejam defeitos e/ou faltas não notórias – nos Produtos, deverão ser comunicadas e comprovadas à T... no prazo máximo de 15 dias a contar da respectiva recepção no seu armazém. A T… obriga-se a substituir os produtos com anomalias ou a suprir quaisquer faltas dentro de 10 dias após a recepção da comprovação das referidas anomalias ou faltas. 2.1.6 O risco de perdas, de destruição e/ou de prejuízos relativamente aos Produtos é transferido para o cliente no momento da entrega dos Produtos no seu armazém. 2.2 CONDIÇÕES COMERCIAIS Ao cliente abastecido ao abrigo destas Condições Gerais serão concedidos os descontos comerciais conforme consta do Anexo VI, que serão efectuados em cada factura.
Suprimiu-se a expressão “tem direito a”, por um futuro imperativo equivalente “serão concedidos”. 3. CONDIÇÕES FINANCEIRAS GERAIS. (…) 3.2.3 Sempre que a T… vier a considerar, justificadamente, que há risco de pagamento não pontual ou se o cliente: a) não pagar pontualmente uma ou várias facturas vencidas ou emitir e entregar à T… um cheque sem provisão; b) entrar em liquidação voluntária ou judicial, requerer ou forem requeridos em relação ao cliente medidas de protecção de credores e de recuperação de empresa, ou for declarado falido ou insolvente, suspender ou cessar a actividade, a T… terá o direito de suspender imediatamente todas as entregas e/ou anular as encomendas em curso e/ou a exigir o pagamento de todas as facturas não pagas, ainda que não vencidas, cujo pagamento se tornará imediatamente exigível.
Retomamos a disciplina do contrato de 1944. 3.2.4 Todo e qualquer pagamento não pontual constituirá o cliente na obrigação de pagar, para além do montante de capital devido, juros de mora à taxa legal que estiver em vigor para dívidas comerciais, acrescida de 2%, contados desde o dia do vencimento até à data do efectivo pagamento. (…) 4. RESPONSABILIDADE A T… não será responsável pelo não cumprimento pontual das suas obrigações prescritas nestas Condições Gerais, a não ser que tal incumprimento lhe seja imputável a título de culpa grave. Para estes efeitos, não se considera existir culpa grave, entre outros casos, quando o incumprimento for devido a qualquer greve, litígio ou conflito laboral ou a qualquer escassez de matérias primas ou de transporte, distúrbio, tumulto ou guerra, incêndio, tempestade ou inundação.
A T… será responsável pelo não cumprimento pontual das suas obrigações prescritas nestas Condições Gerais, no que parece ser uma clara assunção de que destas Condições Gerais lhe resultam obrigações, quando o incumprimento lhe for imputável a título de culpa, mas apenas grave, que não se dá nos casos mencionados. 5. RECUSA DE ENCOMENDAS 5.1 Sem prejuízo de outras disposições destas Condições Gerais, a T… terá o direito de recusar encomendas do cliente sem que isso constitua para este qualquer direito a indemnização, se: a) o cliente entrar em liquidação voluntária ou judicial, requerer ou forem requeridas medidas de protecção dos credores e de recuperação de empresa, ou for declarado falido ou insolvente, suspender ou cessar a actividade; b) parte substancial dos bens do cliente for objecto de penhora, arresto, qualquer outra providência cautelar ou medida decretada por tribunal ou autoridade que o impeça de dispor livremente dos seus bens e tal situação se mantiver por mais de trinta dias.
Voltamos às protecções contratuais da T… face aos infortúnios dos grossistas, mencionamos expressamente o direito a recusar encomendas e portanto a ficar em situação complicada quanto a recebimento do preço, e admitimos que o cliente até terá direito a ser indemnizado se o motivo da nossa recusa de servir encomendas não for um destes e, como resulta da alínea seguinte, se não for também imputável ao incumprimento do titular do admitido direito à indemnização. c) o cliente incorrer em incumprimento das obrigações previstas nas Condições Gerais. 5.2 A T… recusará fornecer o cliente se este não preencher, ou deixar de preencher, todos os requisitos referidos no Capítulo I. Caso se verifique o aqui previsto a T… comunicará ao cliente a falta verificada, concedendo-lhe um prazo de trinta dias para repor a situação sob pena de, não o fazendo, lhe ser de imediato notificada a cessação dos fornecimentos. 5.3 Para efeitos do previsto no ponto anterior, a T… analisará, anualmente, cada cliente, podendo solicitar-lhe informações ao abrigo do ponto 1.5 do Capítulo III, inclusive sobre os clientes abastecidos por cada um.
Ora, para efeitos do ponto 5.2 e 5.3, e na comparação com o ponto 5.1, não nos ajuda a tese de que tudo se limita à verificação constante do preenchimento dos requisitos, como se nenhuma obrigação ou direito autónomos resultassem das Condições Gerais e apenas se incorporassem, quais espíritos, em cada uma das compras e vendas sucessivas. Pelo contrário, no texto destas Condições Gerais de 1997, a T… cuidou mesmo de distinguir as duas situações. Conclui-se da leitura que para a T… existem verdadeiras obrigações prescritas nas Condições Gerais, que são, elas, instrumento autónomo de vinculação acordada, em tanto quanto a T… nunca virá a prescindir, até 2010, duma aceitação ao menos tácita das Condições Gerais. 6. ÂMBITO DE APLICAÇÃO DAS PRESENTES CONDIÇÕES As presentes condições gerais aplicam-se apenas a todos os clientes da T… que pratiquem o comércio por grosso – actuais e futuros – que preencham os requisitos exigidos para que possam ser fornecidos ao seu abrigo.
Desde que preencham os requisitos, serão seleccionados e a partir daí, as obrigações constantes das Condições aplicam-se. Portanto, de novo, os requisitos e as obrigações são pensadas como diferentes. 7. As presentes Condições Gerais entram em vigor no dia 15 de Novembro de 1997 e a T… poderá alterar, em qualquer momento, total ou parcialmente, os termos das presentes Condições Gerais. (…)”
Na sua linearidade textual, o ponto acabado de transcrever não significa que, porque a T… se reserva a possibilidade de alterar as Condições a todo o tempo e total ou parcialmente, que as condições, se aceites, não cheguem a ser um contrato, na exacta medida em que enquanto não as alterar, elas regerão a relação estabelecida com o cliente.
No documento a que nos vimos reportando falha o anexo IV (cfr. fls. 194-195 dos autos) mencionado no ponto 1.4. Porém, encontramos a mesma referência “Anexo IV” nas Condições Gerais de 2001, no ponto 1.5 das mesmas, sendo que o teor da respectiva minuta (anexo IV) era (fls. 219 dos autos):
“CONTRATO Entre: T...., (…) E ___________ (…), adiante apenas designado por “Cliente”, Considerando que o Cliente pretende ser fornecido de cigarros pela T… É LIVREMENTE E DE BOA FÉ CELEBRADO O PRESENTE CONTRATO QUE SE REGE PELO DISPOSTO NAS CLÁUSULAS SEGUINTES: Cláusula 1ª O Cliente aceita ser fornecido de cigarros produzidos e/ou comercializados pela T… nos termos e condições previstos nas “Condições Gerais de Fornecimento de Cigarros pela T…, a Grossistas que Pratiquem Distribuição Directa” em vigor em cada momento e que, presentemente, são as que se encontram anexas ao presente contrato, adiante apenas designadas por “Condições Gerais”. Sempre que, nos termos nelas previstos, as Condições Gerais vierem a ser, no futuro, alteradas, modificadas ou substituídas, total ou parcialmente, considerar-se-á o actual texto do Documento junto ao presente contrato substituído pelo das novas Condições Gerais, a partir do momento em que as mesmas passem a vigorar. Cláusula 2ª O presente Contrato revoga e substitui todos os anteriores contratos ou acordos comerciais que anteriormente possam ter vigorado entre as partes. Cláusula 3ª O presente Contrato entra em vigor no dia da sua assinatura e vigorará enquanto o Cliente for fornecido ao abrigo das Condições Gerais”.
Dizer então que, contrato tem o significado jurídico inequívoco que já referimos. Esse significado é reforçado pela menção da boa-fé com que é celebrado, ou seja, parece, contrato não poderá ser outra coisa que contrato. Da cláusula 1ª pode ficar a ideia de que este contrato não é nada, porque o seu conteúdo é uma simples aceitação das condições gerais. Então, se é assim, neste contrato encontram-se as declarações de vontade das partes que não se encontram nas Condições Gerais justamente em função da sua destinação ao público interessado – grossistas actuais e futuros. Quer dizer, estaremos em presença dum documento complementar ao conteúdo contratual acordado, documento contratual em que se plasma apenas o acordo em tornar vigentes, para a relação contratual que com base na aceitação se inicia, as cláusulas expressamente concretizadas nas Condições Gerais. Mas esta ideia é logo desmentida pela menção “anexas ao presente contrato”. Tão anexas que se forem substituídas, alteradas, se considerará que as novas passarão a estar no mesmo lugar anexo. Significa isto afinal que o documento principal é o contrato e que as Condições Gerais são um simples, porém precioso porque pleno de conteúdo, anexo do contrato.
Quanto a “O presente Contrato revoga e substitui todos os anteriores contratos ou acordos comerciais que anteriormente possam ter vigorado entre as partes”, estamos num ponto de muito arrimo e valia para as Rés, no tocante à demonstração de que após a adesão às Comunidades e privatização a relação deixou de ser contratual e ainda no tocante à durabilidade da relação como indício da concessão comercial.
Uma coisa na fórmula porém é certa: não vale para demonstrar que não há contrato, porque “o presente contrato” – que outra coisa não pode ser senão um contrato – revoga os anteriores, pois sim, mas fica este em seu lugar, ou seja, a relação antes regulada por contratos continua a ser regulada por “mais um” contrato.
Da simples análise do texto, portanto, nos resulta que não é correcta a asserção de que as Condições de 97 foram, na sucessão das de 92, o marco histórico da ultrapassagem da regulação contratual da relação comercial de distribuição, muito menos que esse desligamento, que os textos não revelam, tivesse alguma coisa que ver com a adesão de Portugal às Comunidades e com a privatização, esta especificamente na determinação do Estado em privar a privatizada da sua rede de distribuição, onerando-a com a proibição de celebrar contratos com distribuidores e portanto com a dificuldade duma rede de distribuidores completamente livre de a todo o momento a não servir.
Quanto à durabilidade: - está fora de causa, não só pela sucessão das Condições Gerais entre si, como por esta incorporação de anexos substituídos que a cláusula 1ª menciona, que não houve hiatos temporais entre as Condições Gerais, ou dito de outro modo, que não houve períodos em que nenhuma estipulação se aplicasse à regulação da relação comercial entre as partes. Deste modo, o caso é o de que várias cláusulas mudaram e outras subsistiram integralmente ou com mínimas mudanças de lugar no texto global ou com mínimas mudanças literárias sem qualquer oportunidade de diversa interpretação sobre o efeito plasmado e querido. Quanto às primeiras, naturalmente e em decorrência desta cláusula revogatória, na medida em que tenha havido acordo nesta revogação, foram revogadas. Quanto às segundas, manifestamente não o foram. Ao não o terem sido, a única leitura possível de “O presente Contrato revoga e substitui todos os anteriores contratos ou acordos comerciais que anteriormente possam ter vigorado entre as partes” é a dum acordo que fazem as partes em declarar formalmente algo que materialmente não aconteceu. Para os devidos efeitos declaramos que a nossa obrigação de fornecer e a nossa obrigação de comprar para revender que existiu até ontem, cessou ontem, e que hoje recomeçou. Para os devidos efeitos declaramos que nos divorciámos e que voltámos a casar, no mesmo dia. A menos que se interprete a menção presente contrato revogando todo o anterior na sua acepção física: este bilhete de identidade já não está válido, agora o que está válido é o seu cartão de cidadão – sendo claro que a sua identidade não mudou.
Admite-se até que nalgum tipo de contratos aquela declaração formal pudesse ter interesse. Por exemplo, constituiu prática corrente na celebração de contratos de trabalho a prazo – no tempo em que ainda eram assim legalmente nominados – a cessação do contrato no fim do prazo e a imediata celebração de outro idêntico no dia seguinte. A assim evidente, intentada e conseguida fuga ao limite legal de duração do contrato a prazo veio a determinar, na reforma de 1989, a reacção do legislador na expressa determinação da contagem do tempo dos contratos sucessivamente celebrados para o mesmo posto de trabalho. Curiosamente, semelhante intento fraudatório não se dá no caso dos autos, porque onde se pretendesse agravar a posição dos grossistas tanto bastaria clausulá-lo e submete-lo à aceitação destes do novo clausulado, porque, cumpridos que fossem os requisitos, a relação seria tendencialmente duradoura (enquanto houvesse fumantes e não fossem inventados meios tecnológicos automatizados de distribuição), porque seria do interesse do produtor/comercializador apontar ao passado para definir novas quantidades mínimas para o presente, porque seria do interesse do cliente que as suas percentagens de desconto, quer comerciais, quer financeiras, se firmassem no seu bom histórico anterior, interesse que a T… aliás honrou.
E portanto, ou estamos em presença duma fórmula apontada à existência física do documento onde o contrato está impresso, o que é perfeitamente desinteressante para efeitos da relação entre as partes, ou estamos em presença duma inutilidade do ponto de vista da produção de efeitos jurídicos, em tanto quanto o presente contrato não deixa de ser o presente contrato com tudo o que nele se faz inscrever, com todas as cláusulas que o integram. Não há diferença que possa produzir efeito jurídico entre contrato e clausulado do mesmo contrato.
O essencial da demonstração da valia dos textos para apurar o fim da relação contratual entre as partes e o início da fase de relacionamento livre, está feito, porque, a tese das Rés se apoiava no referido marco histórico do final de 80 até ao final de 90 do século passado. Não vamos portanto ser tão exaustivos na análise dos textos das Condições Gerais subsequentes, passando então apenas a referir as notas essenciais da evolução que apresentaram.
Nas “Condições Gerais de Fornecimento que estabeleciam a sua entrada em vigor no dia 1 de Abril de 2001, cujo texto consta do facto provado nº 8, a estrutura é idêntica às de 1997, iniciando-se com a T… estabelece, em vez de define, e dá a conhecer aos grossistas que pratiquem distribuição directa, actuais e futuros (6.1) (os actuais compreendendo, na lógica do facto provado nº 6, aqueles que já fossem clientes da T… antes da entrada em vigor de cada uma das novas Condições Gerais) as novas condições, que se iniciam por um capítulo I de “Definição de grossista distribuidor directo”, de novo definido como aquele que profissionalmente compra por grosso para revenda, actuando em nome próprio e por conta e risco próprios, recebendo e preparando as encomendas dos seus clientes, e entregando-as directamente a estes, por meios seus, continuando a ser nota essencial da definição que abasteça “regular e continuamente os seus respectivos clientes e zele pela inexistência, nos estabelecimentos comerciais dos clientes por si abastecidos, de rupturas de stocks dos Produtos que adquira à T… (…)”.
Deve aqui notar-se portanto que não estamos perante uma verdadeira definição abstracta de Grossista Distribuidor Directo, mas de Cliente Grossista Distribuidor Directo, ou seja, do perfil do grossista que a T… pretende ter como seu cliente.
Repete-se o passo estrutural do processo de selecção dos clientes, no capítulo II, agora mais desenvolvido no que toca ao conhecimento concreto da pessoa do cliente e a um asseguramento da respectiva capacidade económica (alíneas “e) No caso de sociedades comerciais, declaração com identificação completa dos seus actuais sócios ou accionistas, acompanhada de Certidão do Registo Comercial emitida há menos de 1 (um) ano”, e “g) Demonstração de que possui capacidade financeira, pela apresentação dos seguintes elementos: (…)”, mantendo-se a necessidade de indicar a previsão semanal de encomendas por local, e mantendo-se que “Os Clientes Grossistas admitidos pela T… ao abrigo do disposto no anterior ponto 1. do presente Capítulo II terão que proceder à concretização das suas encomendas num prazo de 30 (trinta) dias a contar da data da informação da sua aceitação pela T…, a qual será dada desde que o candidato a Cliente Grossista preencha os requisitos previstos nestas Condições Gerais”.
Voltamos a encontrar o capítulo de “CONDIÇÕES GERAIS DE FORNECIMENTO” que se iniciam pelas “1. OBRIGAÇÕES DO CLIENTE GROSSISTA”, cujo texto praticamente repete o anterior: “Para que o Cliente Grossista seja regularmente fornecido pela T… com Produtos das marcas por esta produzidas e/ ou comercializadas nos termos e condições estabelecidos nas presentes Condições Gerais, terá que preencher ainda cumulativamente os seguintes requisitos”: - deverá encomendar e adquirir os Produtos à T… em caixas completas; será fornecido no ou nos locais de entrega que indicar (…); devendo cumprir, em cada um dos locais de entrega (…) indicados, as quantidades mínimas previstas no Anexo II às presentes Condições Gerais, nos termos do disposto no ponto 1.1.4. deste Capitulo III. (…); os locais deverão (…) ser de fácil acesso e parqueamento, tendo em conta os meios de transporte normalmente utilizados para a entrega dos Produtos. Inova-se que: “O Cliente Grossista não poderá interferir, directa ou indirectamente, no transporte dos Produtos para os locais de entrega que tenham sido pelo mesmo indicados”. Porém, mantém-se o dever de comunicar previamente a alteração do local de entrega. Mantêm-se as disposições relativas ao dever adquirir semanalmente, em média, a quantidade mínima correspondente, para cada local, sendo a aquisição por local tratada individualmente, inovando-se na admissão de que o cliente pode ter mais de um local de entrega por distrito ou área de distrito. Continua a prever-se a análise trimestral do cumprimento das quantidades mínimas semanais, e a notificação para reposição em caso de incumprimento e a cessação imediata dos fornecimentos caso não ocorra tal reposição. Mantêm-se os deveres quanto a armazenagem, em que se continua a prever a capacidade para detenção em stock para o abastecimento regular e suficiente dos retalhistas, e onde se mantém as autorizações para as agora chamadas vistorias, em vez de visitas, aos armazéns existentes e aos novos ou alterados, comunicados também previamente. Mantém-se a obrigação de “revender os Produtos apenas na sua apresentação original. O Cliente Grossista não poderá, de modo algum, introduzir qualquer alteração nas embalagens dos Produtos”, adicionando-se que não poderá também “remover ou eliminar quaisquer elementos nelas apostos”, nem prejudicar “a imagem”, além da reputação dos produtos, esclarecendo-se que “O Cliente Grossista não deverá praticar quaisquer actos ou omissões que possam” prejudicá-las. A abrangência da forma à omissão parece vir em reforço dos deveres de abastecimento regular sem ruptura de stock – e relembra-se 1944 “para que ninguém se possa queixar da falta de produtos da T…” – eventualmente abrindo a porta a um dever de promoção e publicidade, senão mesmo a um dever de promoção preferencial dos produtos da T…. Não há nos autos qualquer notícia disto, estamos apenas a pensar sobre o alcance da alteração do texto.
Nestas Condições de 2001 inovou-se no estabelecimento das “1.4. Relações dos Clientes Grossistas com os seus Clientes. Os Clientes Grossistas da T… deverão adoptar, nas relações comerciais que estabeleçam com os seus respectivos clientes relativamente aos Produtos, regras contratuais equivalentes àquelas estabelecidas nas presentes Condições Gerais no que respeita ao cumprimento das leis fiscais e aduaneiras e zelar pela sua adequada aplicação”. As Rés explicam a preocupação de que interessa a todos o cumprimento destas leis, no reverso do qual se encontra o mercado ilegal de tabaco, e aventam a hipótese de serem responsabilizadas por acção dos “seus” grossistas. Não será decisiva esta inovação para estabelecer uma directriz obrigatória de autoria própria do produtor sobre o método de revenda na medida em que também nunca poderiam os grossistas almejar ao incumprimento ou à liberdade de não cumprir tais leis (é uma generalidade, mas também está expressamente previsto no ponto 6.2. “compromete-se a proceder à revenda dos Produtos em obediência às presentes Condições Gerais e à legislação aplicável, nomeadamente à legislação fiscal e aduaneira relativa aos Produtos, comprometendo-se ainda a não revender Produtos a quem se demonstre, ainda que indiciariamente, estar envolvido, directa ou indirectamente, na comercialização ilícita dos Produtos”), nem os retalhistas poderiam almejar o mesmo nas suas relações com eles. Tudo se passa então como uma espécie escalonada de alerta ou lembrete por parte dos mais cientes.
É certo que as obrigações do cliente grossista previstas no capítulo de “CONDIÇÕES GERAIS DE FORNECIMENTO”, enquanto apresentadas como requisitos ainda a preencher cumulativamente pelo cliente, além dos que resultavam do passo de selecção, podem dar a ideia de uma imperícia conceptual: para se ser cliente, para ser fornecido tem de cumprir as indicações e também as obrigações do passo de selecção e tem ainda que cumprir mais estas obrigações do capítulo “Condições Gerais de Fornecimento”. Já explicámos a propósito das Condições de 1997 que assim não o entendemos, pela anterioridade do passo selectivo que se inicia com uma obrigação de iniciar encomendas. Mas mesmo que estejamos errados, a verdade é que nestas Condições de 2001, vamos continuar a ver a exigência do contrato, nos termos que já analisámos também anteriormente e que de todo podem significar outra coisa que não um relacionamento contratual.
É assim que estas Condições de 2001 prosseguem exigindo “1.5. Contrato. O Cliente Grossista deverá celebrar com a T… um contrato cuja minuta tipo se anexa e que constitui o Anexo IV às presentes Condições Gerais. O Cliente Grossista não poderá transmitir ou ceder a sua posição contratual no referido contrato sem o prévio consentimento expresso, prestado por escrito, da T….
Mantém-se essencialmente o estabelecido sobre informações, acrescentando-se à possibilidade de pedido de informações por parte da T… em matéria de capacidade financeira, o dever do Cliente de enviar anualmente “a) Referências bancárias favoráveis actuais de, pelo menos, uma Instituição de Crédito; b) Balanço e Demonstração de Resultados do ano imediatamente anterior; c) Declaração para efeitos de liquidação de IRC/ IRS relativa ao ano imediatamente anterior”.
Em matéria de condições comerciais gerais, mantém-se a comunicação dos preços de venda ao público em anexo e inova-se – certamente por facilidade e para agilizar, e seguramente porque pressupostamente existe, logo no processo de selecção, o dever de indicar a previsão de encomendas semanais – estabelecendo que “2.1.2. A T…, através do seu serviço telefónico de gestão de vendas, solicitará ao Cliente Grossista uma confirmação dos fornecimentos a efectuar ao abrigo das presentes Condições Gerais, até às 13 (treze) horas do dia útil anterior àquele em que o Cliente Grossista possa ser fornecido”.
Mantém-se previsões relacionadas com a periodicidade de entregas que a T… “fará”, mantém-se que o cliente “obriga-se a aceitar a entrega dos Produtos que encomendar” e o direito da T… recusar fornecimentos no caso de incumprimento desta obrigação, e mantêm-se as obrigações de verificação da boa recepção dos Produtos, condicionando agora a T… a sua obrigação de substituição de produto anómalo e suprimento de falhas à sua comprovação.
Continua a disciplina de transferência do risco de perdas, destruição ou prejuízos relativamente aos produtos, no momento da entrega.
Continua a previsão de que “Serão concedidos ao Cliente Grossista que seja fornecido pela T… ao abrigo das presentes Condições Gerais os descontos comerciais constantes do Anexo VI, os quais serão efectuados em cada factura a emitir pela T…”.
Relativamente a pagamentos estabelecem-se agora apenas três meios, dos quais não consta a entrega ou depósito de numerário,
Há previsões (3.4) do direito de “suspender imediatamente todas as entregas e/ou anular as encomendas em curso e/ ou a exigir o pagamento de todas as facturas não pagas, ainda que não vencidas, cujo pagamento se tornará imediatamente exigível, sempre que a T… vier a considerar, justificadamente, que há risco de pagamento não pontual e/ ou se o Cliente Grossista:
a) Pagar, ainda que pontualmente, uma ou mais facturas vencidas emitidas pela T… em desrespeito do disposto nos pontos 3.2. e 3.3.1. do presente Capitulo III, ressalvando a T… o direito de considerar tal pagamento como não efectuado;
b) Não pagar pontualmente uma ou mais facturas vencidas ou emitir e entregar à T… um cheque sem provisão; ou
c) Entrar em liquidação, voluntária ou judicial, ou se o mesmo requerer ou se forem requeridos contra o Cliente Grossista medidas de protecção dos credores e/ ou de recuperação de empresa, ou se o mesmo for declarado falido ou insolvente e/ ou se, por qualquer motivo, suspender ou cessar a sua actividade”.
Estas vêm acompanhadas do ponto “3.7. Caso ocorra qualquer das situações previstas no ponto 3.4. deste Capítulo III, e desde que sejam pagas pelo Cliente Grossista todas as quantias em dívida nos termos dos pontos 3.5. e 3.6. do presente Capítulo III, a T…, de acordo com o seu livre critério, poderá aceitar efectuar novos fornecimentos de Produtos ao Cliente Grossista em causa, ressalvando-se desde já o direito de a T… poder exigir ao mesmo, previamente à realização de novas entregas de Produtos, o seguinte:
a) a entrega à T… de uma garantia bancária à primeira interpelação, nos termos precisos do Anexo VII; ou
b) o pagamento prévio dessas entregas por meio de cheque visado ou transferência bancária confirmada, nos termos e condições referidos no ponto 3.2. do presente Capítulo III”.
Ora, apesar do direito de pedir garantias, a retoma de fornecimentos é “a livre critério” da T…, o que permite pensar no livre critério de não admitir um candidato a cliente grossista que reúna todos os requisitos exigidos nas Condições Gerais, entre eles ter enviado “g) Demonstração de que possui capacidade financeira, pela apresentação dos seguintes elementos: i) Referências bancárias favoráveis de, pelo menos, uma Instituição de Crédito; ii) Balanço e Demonstração de Resultados dos últimos três anos ou daqueles em que tenha exercido a sua actividade, caso esta tenha sido iniciada há menos tempo; iii) Declarações para efeitos de liquidação de IRC/ IRS relativas aos últimos três anos ou relativas àqueles em que tenha exercido a sua actividade, caso esta se tenha iniciado há menos tempo” que já tenha anteriormente sido cliente grossista e que a dado passo tenha tido um histórico negativo em termos de pagamento e capacidade de honrar compromissos, mesmo que depois se tenha recuperado financeiramente. Digamos que é improvável o seu não regresso, mas a menção “a livre critério” admite mesmo essa possibilidade de apuramento mais personalizado do “intuitus personae”.
Mantêm-se as estipulações de responsabilidade, “A T… não será responsável pelo não cumprimento pontual das suas obrigações prescritas nestas Condições Gerais, a não ser que tal incumprimento lhe seja imputável a título de negligência grave” e “o direito de recusar quaisquer encomendas do Cliente Grossista, sem que tal constitua para este qualquer direito a indemnização”, no caso de periclitante situação financeira do cliente ou de comprometimento do seu património, mas também no caso do “Cliente Grossista incorrer em incumprimento das obrigações previstas nas presentes Condições Gerais”, inovando-se ainda quanto a encomendas desproporcionais, “excepto no âmbito de campanhas de incentivos promovidas pela T…”, aqui claramente em vista do combate ao branqueamento de capitais.
Curiosamente, apesar da ideia de que as campanhas de incentivos, por terem remuneração própria, se apresentarem como verdadeiros acordos e se situarem fora do âmbito de análise dos indícios relevantes para a concessão comercial (ou na menção das recorridas em contra-alegação “Estas iniciativas não podem, pois, nunca ser confundidas com a execução de um qualquer suposto “contrato de concessão comercial” ou de “distribuição”) elas acabam a ser reguladas, neste particular efeito negativo – não contam para a desproporcionalidade suspeita - nas Condições Gerais, relevando doutro modo que é claro que a T… conta com elas para dinamizar a actividade de distribuição directa regulada pelas Condições Gerais.
E de novo se mantém a dicotomia entre as obrigações antes previstas e a falta de preenchimento, a qualquer momento, de todos os requisitos referidos no capítulo I (5.2).
É idêntica a previsão da possibilidade da T… “alterar, em qualquer momento, total ou parcialmente, os termos das presentes Condições Gerais”.
Sobre a minuta tipo do contrato referido no ponto 1.5, já nos pronunciámos antes.
Em suma, alguns aperfeiçoamentos e especificações, inovações relacionadas com uma preocupação de combate ao mercado ilegal, mas a manutenção da mesma estrutura, do mesmo tipo de menções juridicamente relevantes.
Nas Condições Gerais a que se refere o facto provado nº 9 – 2002, a entrar em vigor em Agosto, subsiste na cláusula 1.5 a referência ao contrato que deve ser celebrado entre as partes, com remissão para minuta-tipo, mas, ao contrário das tabelas de 92, 97 e 2001 no capítulo III deixou de aparecer a epígrafe “Obrigações do Cliente Grossista, passando apenas a constar o texto “Para que o Cliente (…) seja regularmente fornecido (…) terá que preencher ainda cumulativamente os seguintes requisitos (…). Em coerência, na generalidade do texto vemos o uso recorrente das expressões “terá que”, mas subsistem vários “deverá”, e algumas “obriga-se a”.
De resto, em matéria de alterações e inovações:
- adita-se à definição de grossista distribuidor directo, relativamente ao abastecimento regular e contínuo dos seus clientes retalhistas e ao zelo pela inexistência de rupturas de stock nos pontos de venda destes, que “No caso de os promotores de vendas da T… verificarem uma ruptura de stock num ponto de venda normalmente abastecido por um Cliente Grossista, os promotores de vendas da T… poderão, mediante aviso prévio ao Cliente Grossista fornecedor do ponto de venda em causa, deixar Produtos para cobrir a falta até à data prevista para a próxima entrega pelo Cliente Grossista, facturando posteriormente o valor dos Produtos assim colocados a este Cliente Grossista, sem que este possa vir a recusar a dita factura”.
Já mencionámos que esta possibilidade de “uma compra imposta” substitui a vontade negocial do grossista que poderia ser levada à conta ou a uma imputação de encomenda tácita indirecta no encadeado de compras e vendas sucessivas (o que se verificará a partir de 2005). É claro que com este mecanismo se assegura o cumprimento do abastecimento contínuo e regular – é clara a cobertura até à próxima entrega do grossista ao retalhista – não apenas nas quantidades mínimas exigíveis mas na medida correspondente à previsão de encomendas que tiver sido inicialmente comunicada pelo cliente, e que nunca poderá ser inferior às quantidades mínimas, sob pena de não selecção do cliente. E daqui resulta na instituição deste mecanismo de garantia de efectivo cumprimento dos, chamemos, requisitos para ser cliente grossista, que afinal, após a selecção, não há autonomia do cliente para optar entre cumprir ou não cumprir, ou dito de outro modo, que o cumprimento é obrigatório, verdadeiramente obrigatório. Temos pois, para o que as Rés chamam um requisito previsto nas Condições Gerais que em si não são nada, só vêm à tona quando e por ocasião de cada compra e venda sucessiva, o mecanismo das “compras impostas” ainda que apenas para eventualidades residuais e em pequenas quantidades demonstra a existência de uma verdadeira obrigação de abastecimento regular e continuado, sem rupturas de stock, por parte do grossista aos seus clientes retalhistas, obrigação externa e omnipresente sobre as compras e vendas sucessivas que sejam feitas, e obrigação portanto que foi estipulada (e de resto aceite pelos grossistas que assinaram o contrato, na respectiva forma de minuta-tipo) directamente nas Condições Gerais, revelando-se assim como manifestação clara do carácter contratual das próprias Condições Gerais em si e que a T… definiu como instrumento de regulação do seu acesso a uma rede grossista – e de resto, do controlo que, por meio das Condições Gerais, veiculou para e sobre essa rede. Nem de outro modo (não contratual) poderia ser: a possibilidade de suprir uma declaração de vontade negocial de alguém só poderia resultar da lei ou de contrato. Não tendo sido indicada a lei que permitiria à T… operar uma compra de produto seu por alguém que a não poderia recusar (e não poder recusar a factura é o mesmo que ter de a pagar mesmo que não quisesse comprar), não tendo sido indicada a prerrogativa especial da T… fundada em razões de interesse público, tal imposição, a não ter fonte contratual, violaria o princípio constitucional da igualdade e em última análise a dignidade da pessoa humana que é o pilar primeiro do ordenamento constitucional nacional, e evidentemente o princípio da liberdade negocial constante do artigo 405º do Código Civil.
- completa-se o dever de indicar a previsão das encomendas semanais com um indicação de previsão também trimestral (Cap. II, ponto 1. al. h));
- o cumprimento das quantidades mínimas passa a ter uma referência trimestral – (Cap. III, 1.1.4 – “Cada Cliente Grossista deverá adquirir trimestralmente em cada um dos locais por si indicados para entrega dos Produtos, em média, a quantidade mínima de Produtos estipulada para o Distrito onde estiver situado cada um dos seus locais de entrega”);
- continua a prever-se a independência de cada local de entrega pertencente ao mesmo grossista para efeito do apuramento das quantidades mínimas, e o procedimento de recondução ao cumprimento e de cessação imediata de fornecimento se o grossista, no local em causa, não retomasse as encomendas das quantidades mínimas aplicáveis.
Mais uma vez, sendo o apuramento das quantidades mínimas trimestral e a confirmação da previsão de encomendas também trimestral, a indicação da previsão das encomendas e seguramente a compra das quantidades mínimas – para mais acopladas deste mecanismo contemporizador de recondução e em última análise do mecanismo de cessação de fornecimentos – essa trimestralidade está muito longe de se poder reconduzir à emergência à tona por ocasião de cada compra e venda sucessiva, antes revelando claramente outras obrigações – e não meros requisitos, além do mais porque necessariamente aceites – que resultam autonomamente das Condições Gerais.
- A inovação maior nas Condições em apreço foi introduzida no que diz respeito aos descontos, que se fraccionaram em duas modalidades, uma fixa e quatro variáveis: - “2.2. Descontos Comerciais. Serão concedidos pela T… ao seu Cliente Grossista um desconto comercial fixo e descontos comerciais variáveis. 2.2.1. Desconto Comercial Fixo - O desconto comercial fixo sobre o preço de venda ao público dos Produtos será o constante do Anexo VI(A), o qual será efectuado em cada factura a emitir pela T…. 2.2.2. Descontos Variáveis - Os descontos comerciais variáveis serão descontos a praticar pela T… sobre o preço de venda ao público dos Produtos, em função dos factores – distribuição directa activa, escalões de volume, carteira de produtos e informações - e de acordo com as seguintes condições. (…)”.
A matéria de facto provada ilustra as consequências deste fraccionamento, as quais serão abordadas para resolução das questões ligadas ao Direito da Concorrência. Não deixa porém de ser relevante, não para a questão de saber se estamos em presença dum contrato mas sim para saber se o contrato é de concessão comercial, perceber a potencialidade de fidelização e domínio da rede a que a T… recorria, enquanto características facilitadoras duma veiculação ou propagação mais fluida das definições de interesse da T… para essa rede.
Foram definidos os seguintes descontos variáveis (e os sublinhados destinam-se a revelar a potencialidade referida):
“2.2.2.1. Distribuição Directa Activa
Considera-se distribuição directa e activa aquela que, para além do anteriormente definido no Capítulo I, implica, por parte do Cliente Grossista, a disponibilidade e utilização de meios humanos e transportes próprios ou subcontratados adequados para a distribuição dos Produtos encomendados através da pré-venda ou autovenda aos seus clientes retalhistas (com venda ao balcão ou através de máquinas automáticas), que por sua vez, revendam os Produtos directamente ao consumidor. A distribuição directa e activa implica a facturação directa do Cliente Grossista, ou de empresas por si participadas em mais de 50%, ao seu cliente retalhista. Ao Cliente Grossista que pratique uma distribuição directa e activa será atribuído um desconto comercial sobre o preço de venda ao público dos Produtos, adicional ao desconto fixo, que varia de acordo com a percentagem de distribuição directa e activa que o mesmo pratica relativamente aos seus clientes, conforme se ilustra no Anexo VI(B)”. Para efeitos de determinação do desconto comercial a efectuar relativamente à distribuição directa e activa, no final de cada trimestre civil, a T… fará uma análise da informação enviada por cada Cliente Grossista de acordo com o previsto no ponto 2.2.2.4 relativamente aos respectivos clientes retalhistas que são fornecidos directa e activamente pelo Cliente Grossista em análise, aplicando a percentagem de desconto correspondente (Anexo VI-B), durante o trimestre seguinte.
A T… poderá efectuar auditorias ao Cliente Grossista, através dos seus representantes ou de empresas contratadas pela T… devidamente credenciadas, e sempre na presença do Cliente Grossista, dentro do horário normal de funcionamento do estabelecimento do Cliente Grossista e mediante aviso prévio, para efeitos de comprovar a prática da distribuição directa e activa.
2.2.2.2. Escalões de Volume
Por cada Distrito serão determinados três escalões de volume. Os escalões de volume serão determinados trimestralmente para o trimestre civil seguinte, com base nos seguintes factores:
- O 1º Escalão será determinado dividindo o total de compras anual de cada Distrito pelo número de Clientes Grossistas desse Distrito, sendo o resultado dividido pelo número de trimestres civis (4). Este resultado médio trimestral será utilizado para determinar os Clientes Grossistas com locais de entrega nesse Distrito cujas aquisições sejam iguais ou superiores ao resultado médio trimestral, os quais serão incluídos no 1º escalão de volume.
- O 2º Escalão de Volume será determinado dividindo o número de compras que resulta da subtracção das aquisições dos Clientes Grossistas que se situam no 1º escalão, ao total anual de compras do Distrito em causa pelo número de Clientes Grossistas desse Distrito (subtraindo aqueles que se situam no 1º escalão), sendo o resultado dividido pelo número de trimestres civis (4). Este resultado médio trimestral será utilizado para determinar os Clientes Grossistas com locais de entrega no dito Distrito cujas aquisições sejam iguais ou superiores ao resultado médio trimestral em questão mas inferiores ao resultado do 1º Escalão, sendo esses Clientes Grossistas incluídos no 2º escalão de volume.
- O 3º Escalão de Volume será o volume correspondente ao volume de Produtos abaixo do 2º escalão de volume, no qual serão incluídos os Clientes Grossistas com locais de entrega no Distrito em causa que não tiverem adquirido nem o volume previsto no 1º escalão nem no 2º escalão de volume. A cada escalão de volume corresponderá um desconto comercial sobre o preço de venda ao público dos Produtos, adicional ao desconto fixo, de acordo com o disposto no Anexo VI(C).
Com base na facturação emitida pela T…, a TA… fará actualizações dos escalões de volume de cada Distrito no final de cada ano civil. No final de cada trimestre civil, com base nas aquisições efectuadas durante esse trimestre civil, a T… analisará em que escalão se incluirá cada Cliente Grossista durante o trimestre então em vigor.
2.2.2.3. Carteira de Produtos Serão concedidos diferentes descontos comerciais sobre o preço de venda ao público dos Produtos, adicional ao desconto fixo, conforme o Cliente Grossista adquira mais ou menos marcas de Produtos à T…, sendo que aquele que adquira pelo menos uma caixa (dez mil cigarros) das 21 marcas principais de Produtos, terá um desconto comercial, conforme indicado no Anexo VI(D).
Para efeitos de determinação do desconto comercial a efectuar a cada Cliente Grossista relativo à Carteira de Produtos, no final de cada semestre civil, a T… fará a análise das marcas de Produtos adquiridas por cada Cliente Grossista durante esse semestre civil e, com base nessa análise, aplicará a percentagem do desconto comercial (relativo à Carteira de Produtos) em que o Cliente Grossista se situar durante o semestre civil seguinte e assim sucessivamente.
2.2.2.4. Informações de Vendas Cada Cliente Grossista poderá enviar, trimestralmente, informações de vendas, à T… sobre, por um lado, as vendas que o Cliente Grossista efectue de Produtos da T… e, por outro lado, as vendas totais de cigarros efectuadas pelo Cliente Grossista.
O Cliente Grossista não deverá enviar de modo discriminado, à T… as vendas que efectuar de cigarros que não sejam comercializados pela T…, mas apenas as vendas totais efectuadas pelo Cliente Grossista. Essas informações de vendas servirão, também para comprovar a prática de distribuição directa e activa do Cliente Grossista e sempre que possível deverão ser enviadas nos seguintes moldes:
a) a informação deve ser enviada através de suporte informático e ser confirmada pelo Cliente Grossista ou respectiva gerência e/ou administração;
b) a informação deve ser mensal e deverá ser entregue à T… trimestralmente, até ao quinto dia de cada trimestre civil;
c) A informação deve consistir na indicação do total de vendas das marcas de Produtos da T…, ou, opcionalmente, ordenada por marca de Produtos da T…, e, em qualquer caso, também por ponto de venda (cliente retalhista com venda ao balcão ou através de máquina automática) fornecido directa e activamente pelo Cliente Grossista ou por sociedades participadas pelo Cliente Grossista em mais de 50% do respectivo capital social. Os pontos de venda (cliente retalhista com venda ao balcão) fornecidos pelo Cliente Grossista activa e directamente deverão ser identificados através do respectivo número de contribuinte. Os pontos de venda (máquinas automáticas) fornecidos pelo Cliente Grossista activa e directamente deverão ser identificados através de um número de ordem de acordo com o livre critério do Cliente Grossista;
d) O volume total de Produtos objecto da informação trimestral deve representar, pelo menos, 95% das aquisições do Cliente Grossista.
Pela informação que a T… receber ao abrigo deste ponto 2.2.2.4 a T… concederá um desconto comercial sobre o preço de venda ao público dos Produtos, adicional ao desconto fixo conforme previsto no Anexo VI(E)”.
Através das imposições de 50% de facturação directa ao cliente retalhista e de variação do desconto em função da percentagem e distribuição directa e activa, reduz-se, para os grossistas que queiram beneficiar do desconto que é parte do desconto fixo anterior, garantido sem mais, o expediente ou a oportunidade de negócio de venda a clientes não retalhistas, a saber, vendas entre grossistas.
O apuramento do percentual de distribuição directa e activa para efeito de obtenção do desconto é feito por via da variável da informação, acoplando-as na necessidade de obtenção dos respectivos descontos, como já se viu na análise da matéria de facto.
A introdução de 3 escalões para desconto por escalão necessariamente onera quem, por distrito, compra menos, ou dito de outro modo, pelo mecanismo definidor dos escalões, resulta que os grossistas dum mesmo distrito não poderão necessariamente ficar todos colocados no mesmo escalão, o que indica que a busca de uma variável de desconto que é parte do que antes era fixo e garantido, incentiva claramente os grossistas a um maior volume de compras de produtos da T…, sem sequer lhes dar antecipadamente a certeza do escalão em que serão inseridos – ponto 2.2.2.2 in fine. Este maior volume de compras aumenta, evidentemente, a percentagem de produto T… no seu negócio grossista, pelo que mais facilmente serão receptivos às indicações que a T… a cada momento resolver passar-lhes.
Uma parte da reconstituição do anterior desconto único fixo, passa agora pela aquisição do maior número de marcas da T… – desconto de carteira, cujo mínimo de concessão é a compra de uma marca (em unidade de 10.000 cigarros) das 21 marcas principais identificadas no anexo VI e aí mencionadas, não como principais, mas como “marcas comercializadas”, notando-se que até 8 marcas o desconto é zero, e de 9 a 21 tem três modalidades de desconto crescente (anexo VI fls. 249 dos autos). Com este desconto variável e também ele escalonado, a possibilidade da decisão comercial da T…, da política comercial da T… – relativamente à adequação das marcas à procura do consumidor, à persistência nas suas marcas mais fortes e principais, mas também em outras menos apetecíveis ao público ou menos conhecidas do público, concretamente as que possam representar reacção da T… às marcas concorrentes, criando formatos ou características de cigarros equiparados – mais facilmente se opera pelo sector grossista da rede de distribuição.
Quanto à informação de vendas, devendo ela indicar a totalidade das vendas do grossista e a totalidade das vendas de produtos T… pelo grossista, esta totalidade discriminada com indicação do cliente retalhista, não só é claro que se consegue acesso a um conhecimento relevante sobre o mercado, principalmente sobre a posição própria da T… no mercado, como, da alínea d), supra, resulta que, para se beneficiar do desconto específico de informação, o grossista tem não só de enviar os elementos nos formatos pedidos, como tem de restringir as suas compras da concorrência a 5%. É que, as informações podem ser auditadas e naturalmente não podem ser falseadas; sendo exigível a menção das vendas totais, incluídas as da concorrência, quando se refere o volume total de “Produtos” que deve representar 95% das aquisições do grossista, estes Produtos devem ser entendidos de acordo com a menção inicial inserta nas Condições Gerais: “A T… (…) dá a conhecer (…) as suas Condições Gerais de Fornecimento de cigarros por si produzidos e/ou comercializados peara venda no território de Portugal continental, com impostos especiais de consumo pagos (adiante apenas designados “Produtos”) (…)”.
Portanto, através duma variável que reconstitui um desconto fixo anterior resultante das Condições Gerais anteriores, em 2002 vem tentar garantir-se o domínio da rede de grossistas a que se recorre, numa quase renovação das antigas cláusulas de exclusividade, que apenas o não são, porque o não poderiam ser formalmente em face das obrigações assumidas perante o Estado no processo de privatização e porque se introduziu a menção de informação voluntária, sobre a qual, recorda-se, em matéria de facto decidimos “279 - O fornecimento da informação de vendas era condição de atribuição do desconto de distribuição directa e activa, no máximo de 1,40%, sem o qual, os AA. não teriam condições para continuar no mercado”. É verdade que 95% não é 100%, mas é uma quase exclusividade. Aliás, e para tudo o que vimos dizendo sobre estes escalões variáveis, recorda-se que resultou da prova feita em juízo que “280 - Tendo o desconto comercial fixo sido reduzido em 2002, momento em que foram introduzidos vários descontos condicionais, os grossistas foram induzidos à realização dos comportamentos que lhes permitiam a manutenção do desconto comercial fixo anterior”.
Nas Condições ora em apreço introduz-se o pagamento “em seu próprio nome, na moeda e quantia exacta constantes da respectiva factura, não sendo admissíveis pagamentos por parte de terceiros e/ou pagamentos de quantias superiores às que constarem na respectiva factura”.
Por outro lado, consignou-se que: “ 3.4. A T… terá o direito de suspender imediatamente todas as entregas e/ou anular as encomendas em curso e/ou a exigir o pagamento de todas as facturas não pagas, ainda que não vencidas, cujo pagamento se tornará imediatamente exigível, sempre que a T… vier a considerar, justificadamente, podendo tomar em consideração informações desabonatórias justificadas provenientes do mercado sobre a situação de solvabilidade do Cliente Grossista, que há risco de pagamento não pontual e/ou se o Cliente Grossista:
a) Pagar, ainda que pontualmente, uma ou mais facturas vencidas emitidas pela T… em desrespeito do disposto nos pontos 3.2. e 3.3.1. do presente Capítulo III, ressalvando a T… o direito de considerar tal pagamento como não efectuado;”.
A vaguidade de “informações desabonatórias justificadas provenientes do mercado”, ainda que temperada pela condição “justificadas”, a importar uma flexibilidade no juízo de suspensão e anulação de encomendas (e neste caso, note-se, alguém estabelece o poder de anular uma declaração negocial de compra emitida por outrem) deve ter-se por adequada em face da necessidade de aceitação das Condições Gerais por via dum contrato.
Previu-se ainda que: “A falta de envio à T…, sem justificação, das informações que sejam solicitadas ao abrigo do ponto 1.6 do Capitulo III constituirá justo fundamento de recusa de fornecimento de Produtos pela T… ao Cliente Grossista em causa, aplicando-se, o previsto na segunda parte do ponto 5.2 anterior”. Como, além da concessão de descontos, a tarefa essencial da T… é o fornecimento/venda que é pressuposto de toda a subsequente actividade a desenvolver pelo cliente grossista, o mecanismo assim instituído lembra, até pelo uso da expressão justo fundamento, não exactamente uma excepção de cumprimento, mas a regulação pelas partes (T… mais celebração do contrato mencionado na cláusula 1.5) dum fundamento de resolução contratual.
Finalmente, a T… continua a poder alterar, em qualquer momento, total ou parcialmente, os termos das Condições Gerais, acrescentando-se que “As presentes Condições Gerais substituem as anteriormente em vigor”. A expressão replica o que consta aliás da minuta de contrato – este contrato revoga o anterior. Remete-se para o que já se disse a propósito. Poderá também aqui dizer-se que, com maior propriedade de leitura, a interpretação possível será a de que “as presentes” condições substituem tudo quanto consta das anteriores na medida em que não seja mantido nestas exactamente como já constava daquelas. Aliás, por isso o tribunal recorrido optou por não transcrever nos factos provados 9 a 14, o teor integral das sucessivas Condições Gerais.
Relativamente às “Condições Gerais de Fornecimento que estabeleciam a sua entrada em vigor no dia 1 de agosto de 2005, na parte em que alteram as condições referidas em 9” (facto provado 10), notando-se a manutenção da exigência de celebração de contrato conforme minuta tipo – cláusula 1.5 e anexo IV, do mesmo teor daquele que já foi transcrito e analisado, as alterações mais relevantes procedem duma importação de preocupações de combate às infracções fiscais e aduaneiras e contra o branqueamento de capitais, um maior e mais finamente concretizado controlo do grossista, que já explicaremos, em parte relacionado com as referidas preocupações, em parte relacionado com protecção da T… face ao próprio grossista, uma reacção, aliás perfeitamente coerente com a sucessão cronológica de Condições Gerais, à evolução dos acontecimentos relacionais, como se verá quanto à disciplina dos descontos, e uma dilação na aplicação de descontos actualizados.
Nestas condições gerais, as alterações começam na definição de grossista logo ao especificar-se que a distribuição directa implica a entrega física nos próprios estabelecimentos dos retalhistas, prossegue-se para acautelar a imposição contratual no caso da “transfer order”, reconduzindo-a à contratualidade pela menção “mediante aviso prévio ao Cliente Grossista fornecedor do ponto de venda em causa e aceitação deste”, Segue-se o esclarecimento no Cap. II de qualquer coisa que já resultava de todas as tabelas de condições anteriores, mas que não estava adequadamente expressa nem inserida no lugar próprio: - a menção de que “Os candidatos a Clientes Grossistas da T… (nestes se incluindo qualquer pessoa jurídica, singular ou colectiva, que pretenda comercializar ou já comercialize produtos nos termos identificados no Capítulo I)” devem informar do seu interesse em serem fornecidos. Neste particular, a matéria de facto já definitivamente provada em 1ª instância sobre o facto de não haver repetição do processo de inscrição para os clientes existentes à data de publicação das novas Condições, aqui aplicada, vem a significar que, se a intenção de inclusão desta especificação – “que já comercialize” – era a da repetição do processo de candidatura, essa intenção não foi concretizada, e vem a explicar que sem dúvida os anteriormente mencionados “actuais” dos “actuais e futuros”, eram os que já comercializavam produtos da T….
Os elementos a enviar no processo de candidatura tornaram-se mais exigentes ou melhor, procuraram a obtenção de informação mais fina e detalhada, em decorrência das referidas preocupações contra o mercado ilegal que levam à política “conheça o seu cliente” e assegure-se de que ele se move dentro da legalidade: - estão neste caso as inovações relativas ao envio de “e) No caso de sociedades comerciais, declaração com identificação completa dos seus actuais sócios, accionistas e representantes (gerentes, administradores, procuradores ou outros), acompanhada de Certidão do Registo Comercial (com teor integral e actualizado dos estatutos) emitida há menos de 1 (um) ano e de cópias dos documentos de identificação dos seus representantes e ainda identificação das pessoas colectivas em que detenham uma participação social” e do “f) Último mapa de contribuições para a Segurança Social”. Por outro lado, este bom conhecimento do cliente estende-se à sua situação financeira a benefício de cautela da T… em negociar com ele, como resulta da exigência de pagamento prévio à recepção das encomendas, por um período de seis meses considerado adequado para aferir a capacidade financeira e/ou a constância da pontualidade dos pagamentos (al. i) ponto i).
Porventura ditada por razões do mesmo conhecimento do cliente, é de notar o agravamento, em termos de afectação de recursos dos grossistas à actividade grossista, que resulta da novel exigência (Cap. III. 1.1.2) de que os locais de entrega dos produtos aos grossistas devem “ser da sua propriedade, por si arrendados ou explorados”
Em matéria de Marcas e Embalagens, foi introduzido o anúncio de que “1.3.2 A T… irá implementar sistemas de identificação e rastreabilidade dos seus fornecimentos.
Tal implementação implicará para o Cliente Grossista a adopção de sistemas idênticos na revenda dos Produtos, bem como a identificação dos mesmos aquando da sua recepção e, ainda, aquando da entrega dos Produtos aos seus respectivos clientes.
Face ao exposto, o Cliente Grossista desde já se compromete em enveredar os melhores esforços em cooperar com a T… na implementação dos referidos sistemas de identificação e rastreabilidade”.
No campo das relações dos grossistas com os seus clientes, especificou-se, além da adopção de regras semelhantes ao relacionamento T…-grossistas em matéria de cumprimento da legislação fiscal e aduaneira, a “a legislação sobre branqueamento de vantagens de proveniência ilícita (designadamente adoptando regras que permitam conhecer os seus respectivos clientes, incluindo a necessidade de obtenção dos elementos especificamente indicados no Capítulo II) e zelar pela sua adequada aplicação”. Em conformidade exigiu-se do grossista o comprometimento de não revenda em quantidades que excedam a procura normal, por suspeita de branqueamento, e o comprometimento de colaboração com as autoridades e de informação à T… de “qualquer situação ilícita envolvendo os Produtos que chegue ao seu conhecimento”.
As mesmas preocupações de combate à ilegalidade justificam a inovação do pedido de certificado de registo criminal do grossista e o compromisso de pronto fornecimento do mesmo, finalizando-se com uma declaração de que “1.6.6. O Cliente Grossista concorda e aceita que a T… pretende cooperar com as autoridades competentes em quaisquer inquéritos ou investigações referentes a importação, transporte ou comércio ilegal dos Produtos”, que se explicará pela lógica de desonerar a T…, agilizando a indemnização do grossista à T… em caso de condenação desta por acto daquele, que se vem a estabelecer mais adiante nas mesmas Condições.
Subsiste uma menção a uma obrigação da T… relativamente ao suprimento de falhas de entrega de produtos encomendados, e à emissão de nota de crédito relativa a produtos com anomalias, esta em lugar da sua substituição.
Em matéria de descontos comerciais variáveis, estamos em crer, as Condições respondem à evolução do relacionamento a partir da introdução destes descontos variáveis (2002). Prevê-se que “Sempre que haja alteração frequente dos locais de entrega os descontos comerciais variáveis até então aplicados relativamente ao(s) locai(s) de entrega anteriormente existente(s) à data da mudança manter-se-ão, sendo efectuadas quaisquer eventuais necessárias actualizações apenas no 44º dia útil após o final do trimestre em que a mudança tiver lugar”. Relaciona-se isto com o facto apurado da mudança de armazém para distritos com condições de desconto por escalão mais favorável, que não podendo ser impedida, é recebida com um “delay”, um atraso na actualização do desconto.
O mesmo sucede com a constatação de que, além da tendência concentracionária que se iniciou na década anterior, os grossistas já clientes, perante o agravamento das condições por via da decomposição do desconto fixo em desconto com componente fixa e quatro variáveis, se concentraram, estipulando a aglutinação parcial do seu histórico para efeito de cálculo em vez duma contagem a zero para a entidade concentrada, dalgum modo em coerência com o acolhimento duma distribuição mais profissionalizada, mas ainda assim com alguma demora no pagamento do desconto encontrado para a nova entidade - “Sem prejuízo do disposto no ponto 1.6.2 do Capítulo III e do Capítulo II (à excepção da alínea i), do ponto 1), em caso de fusão ou de aquisição de participações sociais entre Clientes Grossistas, será tido em conta para efeitos de atribuição dos descontos comerciais variáveis a soma do registo histórico de vendas, distribuição directa e volume de vendas de cada um dos Clientes Grossistas que se fundam ou que se unam entre si através de aquisições de participações sociais, de modo a determinar quais os descontos que serão praticados a partir do momento em que tal situação seja comunicada à T…, ficando posteriormente sujeitos às análises previstas nos pontos 2.2.2.1 a 2.2.2.4 que vierem a ser efectuadas”.
A mesma demora se verifica no caso da alteração de escalão dum cliente grossista em função da análise das suas compras efectuadas no trimestre anterior, até 39 dias para comunicar a alteração e depois destes, mais 44 dias úteis depois de terminar o trimestre em curso, até ser aplicado o novo escalão. Uma demora que beneficia o grossista que desce de escalão, ajudando-o talvez na procura de voltar a subir, mas desfavorece aquele que sobe, e que terá que continuar a pagar mais do que resultaria do seu desconto. Nas anteriores Condições a aplicação do novo escalão dava-se no trimestre em vigor, isto é, em curso.
Relativamente ao desconto por (2.2.2.3) Carteira de Produtos, deve notar-se que, tal como na versão anterior, as marcas principais que vinham definidas nos anexos VI nestes são referidas como marcas comercializadas e não principais. Na versão anterior as marcas comercializadas eram 21 e nesta versão passam a ser 24. Comprando pelo menos uma caixa de 10.000 cigarros de cada uma das 24 consegue-se um desconto de 0,81%, comprando-se a mesma quantidade mas apenas de 8 marcas, não se consegue qualquer desconto. (entre 9 e 14 obtém-se 0,30% e entre 15 e 23, 0,60%) (fls. 275). Alterações a estes descontos obedecem também a aplicações diferidas nos mesmos termos que para os descontos por escalão.
Mantendo-se a disciplina da informação de vendas, explica-se agora que estas informações “servirão, também” para comprovar a distribuição directa e activa, no que se pressupõe um uso mais literal da mesma informação, ou seja, como informação de mercado “a se”.
Note-se que se inovou ao estabelecer que “A informação incorrecta ou incompleta constituirá a T… no direito de não efectuar o pagamento do desconto comercial previsto nos pontos 2.2.2.1 e 2.2.2.4 ou, de descontar eventuais pagamentos anteriormente efectuados com base em tal informação incorrecta ou incompleta em pagamentos seguintes”. Sendo a informação auditada esta preocupação deveria ser excessiva, mas porventura a prática demonstrou o contrário e terá sido preciso lembrá-lo aos grossistas.
Mais se consignou, dissipando quaisquer dúvidas, que a T… “obriga-se a manter a informação que receber dos seus Clientes grossistas estritamente confidencial”.
Mais curiosa é a menção inovatória que se encontra no ponto 3.7: “Caso ocorra qualquer uma das situações previstas no ponto 3.4. deste Capítulo III, e desde que sejam pagas pelo Cliente Grossista todas as quantias em dívida nos termos dos pontos 3.5. e 3.6. do presente Capítulo III, a T…, de acordo com o seu livre critério, poderá recusar ou aceitar efectuar novos fornecimentos de Produtos ao Cliente Grossista em causa, ressalvando-se desde já o direito de a T… poder exigir ao mesmo, previamente à realização de novas entregas de Produtos, o seguinte (…)”. Pareceria que “desde que sejam pagas todas as quantias em dívida”, e mediante garantias adicionais, o livre critério da T… se inclinaria, por lógica económica, para aceitar o grossista de volta. Não esperasse porém o grossista que o simples pagamento das dívidas e mesmo a prestação de garantias adicionais lhe garantia o regresso, porque a T… decidiria de acordo com o seu livre critério - isto resultava da versão anterior. Posso, de acordo com o meu livre critério, recusar, na versão nova, parece ser simples expressão daquilo que antes era a intuir “se calhar, mesmo pagando, não me aceita de volta”, mas não deixa de ter o efeito de reforço do livre critério enquanto possibilidade arbitrária: - “mesmo que pagues tudo e até prestes garantias, mesmo que assim fazendo até possas voltar a estar dentro dos requisitos para ser admitido como cliente grossista, reservo-me desconfiar de ti para sempre”, ou seja, introduzo uma avaliação subjectiva de re-selecção. Repare-se que esta possibilidade é perfeitamente normal e comercialmente avisada, e nada a ela obsta posto que aceite, que é aliás o caso porque há contrato em anexo. O que ela não é, é compatível com o discurso das Rés de que as Condições Gerais nada vinculam sendo meras indicações objectivas aplicáveis a todos os potenciais interessados sem discriminação objectivamente justificada.
No que toca à “4. RESPONSABILIDADE”, prevê-se que “4.2. Na eventualidade da T… vir a ser responsabilizada pelo pagamento de quaisquer prejuízos, danos, custos ou indemnizações decorrentes do não cumprimento, negligente ou intencional, pelo Cliente Grossista, das obrigações previstas no ponto 1.4. do Capítulo III, o Cliente Grossista deverá indemnizar a T… nas quantias referidas, sem prejuízo do direito geral de indemnização pelos danos causados à T…, nos termos gerais de direito”.
Daqui partiram as AA. para indicar uma indemnização para o incumprimento de um comportamento prescrito, e portanto para encontrar nas prescrições das Condições Gerais “obrigações” suas, ao passo que as Rés se defendem com um normalíssimo direito de regresso nas relações verticais.
Não indicam as Rés donde, de que norma legal ou de que circunstância concreta, lhes resulte esse direito de regresso, nem de resto na cláusula em questão se fala de direito de regresso, e por isso o material que temos é o da convenção dum chamado direito de regresso. Ou seja, se usamos o argumento de que o direito de regresso explica que a previsão de indemnização não revela uma obrigação, quando esta previsão está inserta no clausulado das Condições Gerais que é anexo ao contrato, a sua previsão não deixa de ser coberta pelo contrato, fonte ao qual podemos ir buscar a natureza obrigacional da totalidade das prescrições. Por outro lado, alguma ligação mais sólida terá de existir na relação vertical para explicar que a condenação prevista na primeira parte não possa ser incluída nos danos a indemnizar nos termos gerais de direito referidos na última parte. Tal ligação mais sólida poderia estar na responsabilidade do comitente, nos termos do artigo 500º do Código Civil, mas aqui as Rés teriam de admitir que os grossistas exerciam para si uma função e que no exercício dela haviam contrariado as instruções recebidas das Rés, coisa que as Rés não quiseram admitir imaginando que dessa admissão resultasse o reconhecimento dum relacionamento contratual duradouro e autónomo em relação às compras e vendas sucessivas. Aliás, precisamente porque como se viu em sede de conceptualização dos contratos de distribuição, também o contrato de comissão havia sido uma das formas de organizar a distribuição.
Surgem então “11 - As Condições Gerais de Fornecimento que estabeleciam a sua entrada em vigor no dia 1 de janeiro de 2006, na parte em que alteram as condições referidas em 10” nas quais se vai introduzir o factor de correcção.
Notas essenciais das alterações introduzidas:
- Reforço do conhecimento do cliente e da sua situação de legalidade – Cap. II 1 f) – “Declaração da situação contributiva devidamente regularizada perante a Segurança Social”;
- períodos de referência passam a semestrais: - assim o candidato tem de indicar também a previsão de encomendas semestrais, assim as quantidades mínimas são apuradas por referência semestral, assim também para determinação da periodicidade de entregas, assim para as alterações de desconto que passam a ser efectivadas após o semestre em curso.
- substituição na cláusula 1.5 relativa à celebração de contrato mediante minuta anexa, pela supressão da epígrafe “Contrato” e pela introdução da epígrafe “Fornecimento”, sendo o texto novo o de que: “O Cliente Grossista expressa e inequivocamente reconhece que o fornecimento de cigarros pela T… encontra-se sujeito às presentes Condições Gerais, as quais se aplicam por igual e de forma não discriminatória a todos os Clientes Grossistas que pretendam ser por aquela fornecidos. O Cliente Grossista deverá enviar à T… declaração em como tomou conhecimento das presentes Condições Gerais, cuja minuta se anexa e que constitui o Anexo IV”. O teor literal da declaração, constante do anexo IV, é, depois da identificação do declarante, o seguinte: “Declara ter tomado conhecimento dos termos e condições constantes das “Condições Gerais de Fornecimento de Cigarros pela T… S.A. a Grossistas que pratiquem Distribuição Directa” (fls. 302 dos autos).
- introdução duma justificação restritiva na possibilidade de alteração unilateral das Condições Gerais pela T…. É suprimida a menção da possibilidade de alteração unilateral a todo o tempo e em seu lugar encontramos: “A T…reserva-se, porém, o direito de efectuar quaisquer alterações às presentes Condições Gerais, no todo ou em parte, com fundamento em cumprimento de obrigação legal ou em caso de alteração de normas jurídicas, ou da sua interpretação, que possam eventualmente ser aplicáveis às presentes Condições Gerais e a situações por estas cobertas”.
- introdução do factor de correcção “Sempre que ocorrer um aumento de preços dos Produtos relacionado com alterações aos impostos aplicáveis aos Produtos, será aplicado um factor de correcção dos descontos comerciais concedidos pela T..., consistente num valor expresso em Euros, adicionado ao montante total de cada factura depois de deduzidos todos os descontos comerciais referidos no ponto 2.2. A fórmula de cálculo do factor de correcção dos descontos comerciais para cada momento e categoria de preços é a constante do Anexo VI (E)”.
Note-se a subsistência de menções como o cliente “adquirirá” as quantidades mínimas, que devem ser “cumpridas” por local de entrega, sendo apurado no final do semestre “o cumprimento ou incumprimento” delas, mantendo-se a oportunidade de retoma após comunicação de eventual “incumprimento” com a previsão de “sob pena de, não o fazendo, lhe ser comunicada no final do semestre concedido, a cessação imediata dos fornecimentos (…)”, e a manutenção da disciplina de sancionamento da informação incorrecta ou incompleta que “constituirá a T…no direito de não efectuar o pagamento do desconto comercial”. Subsiste ainda a menção à, a contrario, responsabilidade da T… em caso de negligência grave no “não cumprimento pontual das suas obrigações prescritas nestas Condições Gerais”.
Quanto ao alargamento da trimestralidade para a semestralidade, repete-se o já dito. Não pode inferir-se deste alargamento uma diminuição da intensidade do comprometimento de distribuir, que a tanto se opõe a manutenção dos requisitos relacionados com quantidades mínimas e claro, o requisito essencial do abastecimento regular e contínuo. Estamos portanto apenas perante um compreensível facilitamento das tarefas de análise de informação por parte da T…, com as consequências já assinaladas da eventualidade parcial de dilação de concessão dos descontos merecidos pelos melhores grossistas.
Mais relevante parece ser a supressão do “Contrato” e a sua substituição, inclusive mantendo-se a remissão para um mesmo anexo IV, pelo texto da cláusula 1.5.
Este passa para o primeiro parágrafo o que já constava da minuta do contrato, ou seja, que se aceita ser fornecido nos termos das novas Condições Gerais comunicadas, retirando-se porém a menção “aceita” e colocando-se no seu lugar “reconhece que o fornecimento obedece às condições comunicadas”. Depois, seja por preocupação com eventuais notas de infracção às regras do Direito da Concorrência, seja para afastar qualquer ideia de personalização na escolha do cliente, importa-se a menção relativa ao reconhecimento também de que as Condições não são discriminatórias e se aplicam por igual a todos os clientes grossistas. Finalmente, os termos da declaração anexa e o teor da nova cláusula 1.5 evitam a possibilidade de se entender a posição secundária das Condições Gerais face ao contrato, de que eram anexo, alçando-se agora à posição principal.
Mas isto significa, face à substituição integral das Condições anteriores, que não estamos agora mais, em termos textuais, em presença dum contrato, ou melhor dizendo, que estamos em presença duma mera tabela de condições de venda, sem nenhum efeito vinculativo por si, e que apenas se importa tacitamente para cada contrato de compra e venda sucessivamente celebrado, na ocasião da celebração?
Note-se que nesta época, 2006, não nos assiste nenhum fenómeno histórico de ruptura definitiva com a organização da distribuição por contrato. Depois, quando chegarmos a 2009, no ponto 3.1 das Condições Gerais desse ano, vamos voltar a ver expressamente a menção à aceitação das Condições Gerais por modo tácito, com a realização da primeira encomenda. Neste sentido, a concreta expressão empregue em 2006 não é decisivamente indicativa do desligamento da realidade contratual, antes estaremos perante uma mera alteração literária, uma mera alteração de texto. Depois ainda, não temos aqui – 2006 – uma cláusula ou menção equivalente à que se encontrava nas Condições anteriores: - aceitamos que estas novas Condições revogam as anteriores, aceitamos que este novo contrato revoga o anterior. Então, não conseguimos afirmar que o mero reconhecimento da aplicação das Condições de 2006 tem o efeito de revogar qualquer realidade contratual que existisse antes.
Em última análise, o que determina a contratualidade, mesmo em termos de puro texto, são os comportamentos prescritos pela integralidade das novas Condições de 2006 para fornecedor e grossistas distribuidores. E neste aspecto, as inovações ou alterações que acima sintetizámos não alteram o essencial dessas prescrições, e como dissemos, mantêm-se diversas expressões jurídicas e cláusulas (responsabilidade, direito de recusa de fornecimento) que continuam indiciando um contrato.
Nem mesmo conclusão diversa se obtém na ideia de que a T… estaria a colocar-se na posição dum ofertante que na sua oferta procura acima de tudo cumprir a legalidade, a que se chega pela retirada da possibilidade de livre alteração a todo o tempo pela T… e pela restrição à alteração determinada por decorrência legal.
É que também a possibilidade primitiva não fosse propriamente compatível com o modelo contratual, ou seja, não obtemos conclusão diversa porque a conclusão que obtínhamos da versão anterior não era relevante em termos de caracterização da natureza contratual das prescrições das Condições Gerais.
Quanto à introdução do factor de correcção, para efeitos de apuramento da existência de um contrato e da sua qualificação, não tem relevância nem merece por isso, neste lugar do acórdão, maior consideração.
No ano de 2008 a T… (2) vem emitir novas Condições Gerais de Fornecimento, com entrada em vigor a 1 de Julho (facto provado 12) não se notando nas alterações nesse facto transcritas nada de particularmente útil para a questão que nos ocupa.
Dizer apenas que na cláusula 8 a T… voltou a introduzir no corpo do primeiro parágrafo a liberdade de alteração a todo o tempo das condições gerais, mantendo a menção à liberdade reservada de alteração por via da necessidade de adequação legal. Mais uma vez uma certa liberdade de composição literária a significar que a supressão da menção nas Condições de 2006 afinal não tinha o sentido de alterar mesmo a possibilidade que a T… se reservou perante os seus clientes de alterar a todo o tempo as Condições Gerais.
No ano de 2009 e para entrar em vigor a 1 de Julho (facto provado 13), surgem novas Condições Gerais, com alterações mais relevantes.
A definição de quem são os clientes a quem as Condições Gerais são endereçadas abrange, além dos habituais clientes que compram tabaco por grosso, a título habitual e profissional, em seu nome e por sua conta e risco e os revendam (compra para revenda) a quem depois os revenda ao consumidor final, os que também explorem, a título habitual e profissional, em seu próprio nome e por sua conta e risco, máquinas de venda automática de Produtos para revenda directamente ao consumidor.
Reconhece-se assim por certo a evolução tecnológica que ocorre no próprio mercado, a realidade da utilização cada vez mais frequente de máquinas automáticas de venda. Com este reconhecimento, também fica claro que não estamos realmente em presença de duas relações diferentes, a compra para revenda ao retalho e compra para revenda automática directa, e vamos encontrar por isso a inserção dos contratos de vending nas prescrições regulamentares das Condições Gerais, ou seja, vamos perceber que na realidade da relação entre AA. e RR. se incluem tanto a tradicional compra para revenda a retalho como a compra para revenda automática ao consumidor, e que a razão invocada para a contratualidade desta última modalidade não é suficiente para implicar a rejeição da contratualidade da primeira.
Repare-se que do ponto 1.2, na comparação entre i) e ii) resulta que o exercício da revenda automática directa não se encaixa na distribuição passiva, mas na activa. A passiva vem definida como “um Cliente tem distribuição passiva quando o mesmo venda directamente os produtos de tabaco em instalações por si geridas ou exploradas aos seus respectivos Clientes Retalhistas”. Em rigor falta uma vírgula após “exploradas”, e de qualquer modo, as máquinas também não são “instalações”.
Voltamos a 1944 (voltamos no sentido de que já vimos isto antes na regulação das relações com distribuidores) para encontrar modalidades mais suaves da quantidade mínima, no ponto 1.8, onde as caixas deixam de ser apenas as de 10.000 cigarros, e aparecem também caixas com 5.000 e 6.000 cigarros. Estamos evidentemente numa mais fina adequação às tentativas e possibilidades de escoamento de produtos cada vez mais diversificados, segundo a procura do consumidor.
Um cada vez maior “conhecimento do seu cliente”, mas não necessariamente apenas para fins de controlo de suspeitas, podendo também servir para um conhecimento da estrutura operacional da distribuição, o que não deixa de interessar às opções comerciais da T… (2), encontra-se na nova exigência de informação em processo de candidatura do número de trabalhadores do candidato a cliente – ponto 2, 2.1, al. g).
Na alínea n) do mesmo ponto e subponto deixamos a indicação semestral das encomendas e voltamos à indicação trimestral.
No ponto 2.2. voltamos a ter a definição clara que há um processo de candidatura e uma decisão a proferir nesse processo pela T…, ou seja, uma aceitação ou uma recusa: - “2.2. Após a recepção dos elementos referidos no número anterior e verificação da sua conformidade, a T… informará o candidato a Cliente da sua decisão. Caso a candidatura seja aceite, (…)”.
Curiosamente, no seguimento deste ponto, já não vemos que os comportamentos imediatamente a seguir exigidos sejam tratados como violação do compromisso assumido, mas vemo-los tratados por meio duma extensão da pendência da candidatura, ou mais concretamente, como uma imposição de uma condição suspensiva: - a não colocação das (primeiras) encomendas (conforme indicadas pelo clientes à T…) “no prazo máximo de 30 (trinta) dias a contar da comunicação enviada pela T…” tem a consequência “sob pena de a candidatura se ter por recusada”, já depois de ter sido aceite, digamos então, provisoriamente.
Avança-se depois prescindindo da assinatura da declaração “tomei conhecimento” pois se passa a definir que “3.1. As presentes Condições Gerais considerar-se-ão integralmente aceites com a colocação da primeira encomenda de Produtos de tabaco”.
Claramente pois, se apela à declaração tácita, sendo a colocação da primeira encomenda o comportamento do qual, com toda a probabilidade, se revela a aceitação do cliente. Isto porém não deixa de fazer lembrar o mecanismo de formação dos contratos, proposta e aceitação, que não tendo exigência legal de forma, podem perfeitamente ser produzidas por via tácita. Quer isto dizer, como já dissemos, que a T… (2), nem em 2009, se descola da imanência do pensamento jurídico contratual no seio dos comportamentos estabelecidos para organizar a distribuição. Aliás, como vimos, nem em audiência de julgamento deixou de escapar às testemunhas das Rés a menção contrato com que se referiram às Condições Gerais. É na verdade qualquer coisa que integra o nível de entendimento humano, uma concepção jurídica generalizada, a de que quando alguém pretende que outrem adopte determinado comportamento, na proibição da acção directa e da auto justiça, ou tem uma lei que obriga esse outrem a esse comportamento, ou tem de chegar a um entendimento vinculativo com ele, um acordo, não de cavalheiros ou por razão exógena ao encontro puro de vontades, mas concretamente de favor trocado.
Mantém-se a previsão de encomendas mínimas “deverá adquirir por encomenda uma quantidade mínima de 10 (dez) Caixas completas de Produtos” que como vimos pode não ser 100.000 cigarros mas só 50.000 ou 60.000 (na regra geral de 20 cigarros por maço, estamos em 3.000 neste último caso, o que dá bem ideia do volume global deste negócio, dos lucros dele em quantidade, e da quantidade de consumidores dependentes) tanto mais que se estabelece também que “3.3. Por razões de eficiência cada Cliente deverá, no mínimo, encomendar 2 (duas) vezes por mês, por cada Local de entrega ou Local de levantamento”. Ora, neste caso temos claro que, sendo a T… a predisponente destes mínimos, as razões de eficácia de que fala são as razões de eficácia para si, e não propriamente para os clientes (isso será uma decorrência secundária), ou seja, com razoável probabilidade, estamos perante a veiculação à rede, obrigatória (sob pena de recusa de fornecimentos posteriores), das decisões comerciais com a que a fornecedora pretende atingir o consumidor final e que precisa que sejam implementadas na rede de distribuição a que recorre.
O carácter vinculativo resulta ainda do parágrafo que imediatamente se segue: “Caso tal não aconteça em dois meses do mesmo trimestre civil, a T… poderá legitimamenterecusar o fornecimento de quaisquer Produtos (…)”. A inserção, nova, da palavra “legitimamente”, importa para o campo da relação pretendida regular a lei, sendo pois difícil perceber a defesa de que nada há de juridicamente vinculativo nas Condições Gerais.
Persistem aliás as referências de inequívoco significado jurídico obrigacional em “3.5. O Cliente obriga-se a aceitar os Produtos de tabaco que encomendar à T…. Se o Cliente, após confirmação, não aceitar os Produtos que tenha encomendado à T…, esta terá direito de recusar quaisquer outros fornecimentos (…)”.
Uma inovação é a previsão da modalidade de fornecimento poder ser com transporte ou sem transporte por parte da T…, com o resultado duma diferente lista de preços de venda ao grossista (ponto 4.). A disciplina instituída neste ponto indica uma gestão racional de custos, na modalidade de poupança para a T…: - “4.5. Caso o Cliente tenha mais do que 6 (seis) Locais de entrega no total, os custos de transporte dos Produtos pela T… para cada um dos Locais de entrega que exceda o número atrás referido ser-lhe-ão imputados, conforme a Lista de Preços de Transporte constante do Anexo III” e o mesmo sucede com “5.3. Se o Cliente necessitar de uma entrega semanal adicional devido a um aumento da procura dos Produtos (…)”.
Se ainda se lê que o cliente se obriga a conferir os produtos e que a T…se obriga a suprir as faltas (ponto 6.2) já na armazenagem (ponto 7) vemos agora uma recomendação: “Dada a natureza e as características dos Produtos, a T… recomenda ao Cliente que os mesmos sejam armazenados em instalações que assegurem capacidade suficiente, boas condições de segurança, temperatura, humidade e higiene, de acordo com as seguintes recomendações de armazenamento: i) Os cigarros deverão ser manuseados cuidadosamente, de modo a evitar danos nas embalagens; ii) Deverá ser aplicada a regra FIFO (first in first out), (…); iii) Não é aconselhável empilhar mais de 10 Caixas; iv) Os produtos de tabaco devem ser armazenados longe de produtos líquidos ou voláteis ou que libertem cheiros ou inflamáveis”.
Grande alteração sistemática encontramos no ponto 8 “O Acordo de Anti-Contrabando e Anti-Contrafacção celebrado entre a Comissão Europeia e a P…, o qual foi também assinado pelo Estado Português, representado pelo Ministro das Finanças, implica que a T… tenha que adoptar certos procedimentos e regras nas relações comerciais com os seus Clientes, sendo os seguintes parágrafos um reflexo destes”.
Dizemos grande alteração porque muito do que era antes uma evidência de serviço do puro interesse comercial da T… passa agora a ser justificado pelo referido acordo. Assim, já não é a protecção da imagem da produtora e das suas marcas, e do prestígio destas, mas o Acordo CE que justifica que o cliente se obrigue a revender os produtos (8.1) “apenas na sua apresentação original, não podendo de modo algum, introduzir qualquer alteração nas embalagens dos Produtos, remover ou eliminar quaisquer elementos nelas apostos, nem alterar quaisquer características dos próprios Produtos”.
O mesmo parece ter acontecido à prerrogativa de recusa ou suspensão de fornecimento em caso de incumprimento das obrigações assumidas pelo grossista, de manifesto interesse para o serviço comercial da T…, que também passou a ser consignado como reflexo das exigências do Acordo referido: - “8.4. O Cliente reconhece e aceita que a T… tem o direito de suspender ou recusar quaisquer fornecimentos dos Produtos ao Cliente, se (i) este não cumprir o estabelecido nas presentes Condições Gerais, (ii) este demonstrar estar envolvido, directa ou indirectamente, na comercialização ilícita de Produtos e/ou em qualquer actividade de branqueamento de vantagens de proveniência ilícita, (iii) receber um pedido legítimo de uma autoridade governamental com esse objectivo, e no caso (iv) das encomendas colocadas pelo Cliente se mostrarem manifestamente desproporcionadas face às quantidades normalmente encomendadas pelo Cliente ou expectáveis tendo em consideração os seus Clientes Retalhistas, sem que qualquer justificação objectiva seja dada pelo Cliente quanto a tal acréscimo, sendo que o Cliente reconhece e aceita ainda que, caso alguma das situações acima referidas ocorra, este não terá direito a qualquer indemnização” (sublinhados nossos). Justamente porque se subsumiu “o não cumprimento do estabelecido nas presentes Condições Gerais” – ponto i (e que é completamente diferente das situações constantes dos pontos ii a iv) ao reflexo das exigências do Acordo, é que se consegue agora estabelecer que não há qualquer direito a indemnização se a T… recusar fornecer por incumprimento do cliente ao abrigo do ponto i, ou seja, qualquer incumprimento. Significa isto que não há qualquer hipótese de discussão concreta sobre valoração de comportamentos de incumprimento e de subsequente recusa de fornecimento, concretamente a adequação da recusa ao incumprimento, qualquer que seja. Não há discussões possíveis de culpa ou de proporcionalidade. A “sanção” “recusa de fornecimento” torna-se imperial, sendo claro que interessa privadamente ao sancionante, que porém remete a fonte do seu poder ao império maior dum acordo internacional. Na parte em que continua a tratar-se aqui do interesse privado da T… em implementar a sua política comercial à rede de distribuição a que recorre, a indiscutibilidade mencionada diz bastante sobre a liberdade de cumprimento ou incumprimento por parte do grossista e ainda mais sobre o controlo da rede de distribuição. Tanto mais que haverá que conjugá-lo com a dependência do consumidor em relação à marca e quanto ao volume de Produto T… no negócio do grossista e bem assim com as quotas de mercado da T… nos anos em causa. Agora repare-se, não é todo e qualquer incumprimento das prescrições das Condições Gerais que é de interesse público: - como é manifesto, e só para dar um exemplo, o interesse público não se preocupa minimamente com as quantidades mínimas que a T… entende serem as necessárias para atingir os consumidores dos seus produtos, e é-lhe completamente indiferente que haja rupturas de stock, porque delas não decorre necessariamente que a única possibilidade dos consumidores satisfazerem a sua dependência – aqui sim, é verdade, meia, por debaixo da dependência da marca provada e não impugnada, há uma dependência do fumo – os consumidores procurem cigarros contrafeitos ou feitos mas advindos por via criminal, porque de facto também podem optar por cigarros da concorrência legítima da T… – que em geral serão mais fáceis de encontrar no quiosque habitual.
Encontra-se ainda a novidade da cláusula 9, sobre tratamento de dados, vendo-se no ponto 9.2 que “A T… poderá igualmente utilizar os dados pessoais que lhe sejam fornecidos nos termos das presentes Condições Gerais relativos ao Cliente e aos membros dos seus órgãos sociais, seus empregados e outros funcionários, com vista à realização de contactos comerciais correntes, envio de informação comercial ou promocional, realização de acções de formação ou outros eventos ou iniciativas destinados aos seus Clientes”(sublinhados nossos). As sessões de partilha de conhecimento sobre as melhoras práticas do negócio estão na verdade previstas como acção de formação, e destinam-se não só aos clientes, mas ao respectivo corpo de recursos humanos. Evidentemente, é uma possibilidade, facultada pela autorização de acesso aos dados, mas revela que para a T… é importante formar os elementos humanos principais – e portanto não apenas os clientes mas muito relevantemente os seus empregados vendedores – da rede de distribuição que usa. Se não fosse importante, se não fosse um instrumento importante à disposição da T…, não faria sentido incluir a referência às acções de formação neste ponto.
Nas Condições em apreço surge – cláusula 10 – a substituição das percentagens de desconto sobre o PVP atribuídas aos clientes grossistas pelas tabelas de preço de venda que são anexadas, o chamado preço por caixa na venda ao grossista, que correspondeu a uma diminuição das percentagens iniciais, acima de 8%, para pouco mais de 7%, conforme está dado como provado. Esta inovação não é relevante na questão da qualificação da natureza contratual, porque, recorda-se, dela extraem as Rés um argumento de que mesmo que estivéssemos perante contratos, sempre teriam a liberdade de fixar os preços a que vendem, argumento que terá de ser analisado a propósito do pedido relativo à reposição das percentagens de desconto de 2005.
Nestas Condições também foi introduzida a regra de pagamento apenas por transferência bancária – 11.3 – e a menção de que “O Cliente apenas poderá utilizar um único meio de pagamento relativamente a cada factura emitida pela T…, não sendo admitidos pagamentos múltiplos, ou seja, por cada factura apenas poderá ser efectuada uma única transferência bancária para a T…” sob pena de recusa de encomendas e/ou suspensão de entregas e/ou anulação de encomendas em curso, voltando a ver-se uma alteração às consequências na possibilidade não já de posteriormente a T…, a seu livre critério, aceitar ou recusar novos fornecimentos, mas agora apenas, a seu livre critério, recusar novos fornecimentos. Tal como dissemos antes, torna-se agora mais claro que o livre critério é mesmo um livre critério, uma autorização ao direito de sentir ofendida, uma introdução, como dissemos, de uma avaliação subjectiva de re-selecção.
Mantém-se a disciplina da responsabilidade exclusiva da T… pelo “incumprimento, pelo atraso no cumprimento ou pelo cumprimento defeituoso das obrigações que para si resultam das presentes Condições Gerais”, no caso de dolo ou negligência não excepcionados pelas situações tradicionalmente previstas, e acrescidas agora da “recusa das autoridades competentes, seja por que razão for, relativa à introdução no consumo das quantidades solicitadas pela T…”.
À T… assiste (13.1) “o direito de recusar quaisquer encomendas do Cliente, sem que este tenha, por esse motivo, direito a qualquer indemnização, no caso de parte substancial dos bens do Cliente for objecto de penhora, arresto ou qualquer outra providência cautelar ou medida decretada por tribunal ou autoridade que o impeça de dispor livremente dos seus bens, e tal situação se mantiver por mais de 30 (trinta) dias”.
Já no âmbito de aplicação das Condições Gerais em apreço (15) estabelece-se que visam “todos os Clientes da T… que preencham os requisitos exigidos para que possam ser fornecidos de produtos de tabaco ao abrigo do disposto nas presentes Condições Gerais”, o que poderia levar a pensar na exigência de um renovado processo de candidatura dos já clientes, que a matéria de facto provada desmente.
Estabeleceu-se ainda que “16.1. As presentes Condições Gerais vigoram pelo prazo de 1 (um) ano, com início no dia 1 de Julho de 2009 e expressamente revogam quaisquer outras condições gerais de fornecimento de produtos de tabaco pela T… eventualmente existentes” e preferiu-se voltar à fórmula de 2006 de supressão da menção de livre alterabilidade das Condições que tinha sido reposta em 2008, para “16.2. (…) a T… poderá efectuar unilateralmente alterações às presentes Condições Gerais, sempre que tal se revelar necessário ou conveniente ao cumprimento, pela T…, de qualquer obrigação legal e/ou administrativa a que esta se encontre ou venha a estar sujeita ou em caso de alteração ou publicação de quaisquer disposições legais e/ou administrativas, ou da sua interpretação, que possam ser aplicáveis às presentes Condições Gerais e/ou a quaisquer situações por estas reguladas”.
Mais se estabeleceu que também para as alterações (que não importam revogação global das Condições) a colocação de encomenda posterior por parte do cliente vale como aceitação dessas alterações.
Finalmente, para entrar em vigor em 1.10.2010 (facto provado 14) foram publicadas novas Condições Gerais de Fornecimento, relativamente a cujas alterações não se vê praticamente nada com qualquer relevância para a questão em apreço. Notar apenas que se prevê a possibilidade de comprar “paletes”, (1.10) “Unidade de transporte de carga que permite eficiências ao nível de transporte, movimentação e armazenamento”, e que a respectiva compra dá direito a um desconto adicional “conforme referido no Anexo III” (10.3), o que repõe, embora muito limitadamente, em matéria de condições comerciais (nas financeiras sempre se mantiveram descontos vários) a técnica do desconto, agora ao lado do preço fixo por caixa.
Lidos os textos e posto que não está em causa que eles se aplicaram, podemos então concluir:
- desde 1944 a 2010 aquilo que a T… (em qualquer das suas formas) fez foi fornecer cigarros, numa cadência pré-estabelecida em função de mínimos de venda que ela própria definiu, acompanhada da previsão do excesso de encomendas sobre esse volume mínimo que pediu aos grossistas que lhe comunicassem, previsões que também serviram a definir a periodicidade das entregas que fez aos grossistas, só recentemente admitindo que além das suas entregas, também os grossistas pudessem ir eles mesmos buscar aos armazéns da T….
Da parte dos grossistas, e concretamente das AA., aquilo que fizeram ao longo de todos os textos regulamentares respectiva e contemporaneamente aplicáveis, foi comprar em nome próprio para revenda a retalho (e mais recentemente em máquinas automáticas de venda, de propriedade sua e directamente ao consumidor), revenda a que procederam por sua conta e risco. Esta compra foi instrumentalizada ao serviço do abastecimento regular e contínuo do consumidor, implicando pois uma revenda regular e contínua, regularidade e continuidade que implicaram um cuidado para evitar rupturas de stock.
A relação comercial que se estabeleceu entre a T… e as AA. teve a duração que a matéria de facto provada revela, ao longo da qual se sucederam as diversas alterações da personalidade jurídica das AA que os mesmos factos provados documentam, e se sucederam os diversos textos emitidos pela T…, formalmente nesta sucessão se revogando os textos anteriores por inteiro, mas vendo-se a passagem incólume de grandes partes dos textos revogados para os textos postos seguidamente em vigor, sem qualquer hiato entre eles. Vendo-se concretamente a passagem inalterada dos elementos essenciais estruturantes da relação comercial, a saber, do fornecimento segundo previsão de mínimos, volume de encomendas e periodicidade de entregas, e da compra para revenda regular e continua e sem ruptura de stock, em nome e por conta e risco próprios dos grossistas. Vendo-se também a passagem de mecanismos de asseguramento da funcionalidade (consecutiva do fim visado de alcance do consumidor) – ou dito de outro modo, da organização de uma rede de distribuição – montada: garantias de fiabilidade financeira dos grossistas, previsão de consequências para o incumprimento ou cumprimento defeituoso por ambas as partes, condições de armazenagem, manuseamento e inalterabilidade das marcas, suas imagens e características dos produtos e finalmente definição da “participação” no negócio dos intervenientes directos na rede de distribuição. Se o processo de selecção esteve pressuposto na celebração dos contratos de 1944 e 1985, ele passou a estar expresso nas tabelas de 1992 em diante. Deste processo selectivo e em virtude da localização geográfica dos grossistas, também se evidencia ao longo dos textos a construção – manutenção e crescimento – de uma rede capilar de distribuição. Foi isso que os textos visaram.
O que é notório nos sucessivos textos é a correspondência dos comportamentos numa relação de reciprocidade, ou sinalagmática, que é instrumental do fim visado. Ao fornecimento da T… correspondeu, na exacta medida das previsões, a compra para revenda por parte dos grossistas, e a instituição de mecanismos de garantia para que as previsões se cumprissem. Às compras dos grossistas correspondeu o fornecimento periódico da T…. Dito de outro modo, se a T… não fornecesse, os grossistas não teriam procedido à compra para revenda nem afectado a esta sua actividade grossista especificamente dirigida ao produto cigarro, os meios que afectaram.
Em abstracto até se poderia pensar que independentemente do que os grossistas fizeram a T… poderia ter continuado a produzir e a vender cigarros. Isso até seria pensável quando restringíssemos o universo grossista às AA. Mas a realidade não é nem foi essa. Já vimos como seria impossível atingir o fim de vender cigarros diariamente a milhões de consumidores espalhados pelo País, sem recurso a uma rede de distribuição. A T… precisou concretamente de recorrer a uma rede de distribuição, na qual as AA. se integraram, assumindo a posição grossista em igualdade com outros grossistas que deixaram de ser autores no processo e em igualdade com todos os outros grossistas que serviram a T….
Daqui resulta também que a posição dominante, quase exclusiva e em decrescimento, da T…, não permite concluir pela independência desta face a uma rede de distribuição. Não é pelo facto de em Portugal se terem consumido praticamente só cigarros produzidos pela T… que ela se podia arrogar uma posição de força face à rede grossista, como se não precisasse duma rede grossista. Evidentemente, até à privatização, era opcional que a rede recorrida fosse independente ou de propriedade própria, mas a opção sempre foi maioritariamente a de recurso a uma rede não própria, obviamente mais compatível com a gestão de risco do negócio e com a própria construção da rede capilar com chamamento das competências de proximidade que os grossistas tinham nas suas diversas regiões (esta construção da rede e chamamento de competência personalizada é claríssima nos termos do contrato de 1944).
Da não opção por uma rede de distribuição de propriedade da T… resultou então que, na preservação formal da liberdade dos grossistas, o seu chamamento a assumirem os comportamentos descritos nos textos tinha, além do “devido pagamento”, de ser coberto por um instrumental de compromisso cuja fonte só podia encontrar-se na vontade livre e esclarecida das partes. Disso mesmo se deu conta a T… nos contratos até 1985, nos autos assumidos como verdadeiros contratos, e disso mesmo se continuou a dar conta nos termos jurídicos recorrentemente usados relativamente a direitos e obrigações e sobretudo à necessidade de celebração de um contrato que mesmo a considerar-se apenas uma declaração de aceitação, finalmente tácita, não deixa de ser uma aceitação, ou seja, nunca deixou de haver a previsão de um mecanismo de convocação da vontade dos grossistas para selar os compromissos assim assumidos. E como vimos, não tem qualquer sentido nem é verdade que tenha sido a adesão de Portugal às Comunidades Europeias e a privatização da T… que tenha determinado a impossibilidade de celebração de contratos com os grossistas, sendo a sua relevância limitada à eliminação de cláusulas de exclusividade e restrição ou privilégio geográfico e à eliminação de práticas que pudessem ter o mesmo significado.
Liga-se aliás esta eliminação a outra característica que ressalta dos textos: - a adaptação a novas realidades legislativas. Outra a evidente adaptação à evolução do mercado, incluído o mercado ilegal, muito possivelmente até se consegue perceber a afirmação de desconhecimento que a Autoridade da Concorrência usou para não prosseguir no processo 4/2008, pela operação normal da T… enquanto agente comercial: trata-se de pensar como fazer o melhor para o negócio próprio, pensamento que é essencialmente comercial, e que posto em forma de decisão deve ser seguido, competindo então aos juristas a redacção que formalmente não conflitue com a evolução legislativa. É até isto que se revela das alterações sobre a livre alterabilidade das Condições Gerais, ao mencionarem que serão justificáveis desde que nesse sentido. Por exemplo, na introdução de descontos variáveis num mercado pautado pela dependência do consumidor em relação à marca, com a T… a deter quotas muito elevadas de mercado, consegue-se obter uma adesão à compra pelos grossistas que tenta aproximar-se da exclusividade anterior. Como vimos, num passo (desconto por informação) criou-se uma previsão de pagamento de desconto no caso do grossista apenas deixar uma margem de 5% para as compras da concorrência. No mesmo sentido funcionaram as campanhas de incentivos que como vimos vieram a ser mencionadas nos textos. Até porque há aqui uma evidência: o número de fumadores não está em crescimento, mas em redução. Assim, determinar os grossistas a um maior número de compras de produto T… fará com que no destino final – fumador – se mantenha a dependência da marca T…, afastando assim a concorrência. O mercado consumidor não é elástico e o grossista que compra mais T… terá de vender mais T…, não podendo correr o risco de ficar com armazéns cheios de produto T… que não se vende.
Em suma, e quanto à natureza contratual resultante directamente dos textos, parece-nos que mesmo apesar das menções de revogação integral, mesmo apesar da proposta, evidentemente aceite, de substituição dos contratos de 1985 pelas tabelas, nunca deixaram de se prever comportamentos recíprocos vinculativos, acoplados de previsões de reforço de carácter também vinculativo, nem nunca se deixou de apelar à aceitação dos grossistas às propostas da T… – propostas primeiramente de integração dum corpo de distribuidores capaz de servir os interesses da T…, propostas de regulação dos deveres e compromissos assumidos após a integração no corpo distribuidor, com caracter prévio à efectiva realização dos contratos de compra e venda sucessiva – mecanismo suficiente para formar o acordo de vontades, um acordo de vontades autónomo em relação às compras e vendas sucessivamente ocorridas em decorrência dos compromissos assumidos. Nas compras e vendas sucessivas não houve uma independência de uma vontade encontrada anteriormente e reportada aos termos em que a sucessão deveria correr, porque esta independência de facto e em concreto não existia para nenhuma das partes, não só pela realidade material como pela realidade constituída pelas manifestações ou declarações insertas pela T… nas tabelas de condições que a T… só logrou implementar na condição de obtenção do acordo dos grossistas.
Parece-nos inequívoco que a relação comercial entre as RR e as AA. foi regulada, quer nos contratos individuais, quer após a introdução das tabelas e Condições Gerais, por contratos. Secundamos assim inteiramente o Prof. Pinto Monteiro na afirmação que fez no seu Parecer junto aos autos, de que o que mudou foi a forma de celebração, mas não a realidade celebrada. Dos contratos individuais passou-se a contratos de adesão, mas não deixaram nunca de ser usados contratos para estabelecer a organização da rede de distribuição, por via dos compromissos dos diversos intervenientes que nela se integraram.
Também dos textos sucessivos resultam claros os elementos essenciais que permitem a qualificação do contrato como de distribuição e mais especificamente na modalidade de contrato de concessão comercial.
De distribuição é evidente, tratou-se de regular como levar o produto produzido e posto à venda pela T… até ao seu consumidor final. De concessão comercial – na admissão de que cláusulas de exclusividade e de restrição ou favor geográfico não são elementos imprescindíveis para a qualificação, na admissão da indiferença da posição grossista ou retalhista (e isto nem se põe no caso das máquinas de venda automática) – também parece claro, pelos elementos básicos da obrigação de fornecimento e da correspondente obrigação de compra para revenda em nome e por conta e risco próprio, e pela manutenção duradoura destas obrigações não afectada por uma declaração formal sem correspondência real sobre a revogação de textos não alterados e sobrevigentes. Mas, como nota a doutrina e a jurisprudência, o elemento específico decisivo da concessão comercial está na integração na rede enquanto meio de veiculação por esta dos interesses do produtor/fornecedor, e portanto nas obrigações ditas laterais pelas quais tal integração se faz, levando não necessariamente a uma subordinação jurídica em sentido estrito nem a uma dependência absoluta, mas a um grau suficiente de perda de autonomia, a uma adstrição funcional à prossecução da política comercial do produtor/fornecedor.
A subsistência de cláusulas de quantidades mínimas (em nada decorrentes da condição de grossista), a obrigação de abastecimento regular e contínuo sem rupturas de stock, os mecanismos de suprimento de rupturas, quer impositivos quer acordados, as imposições de inalterabilidade do produto e da sua imagem, num mercado de publicidade crescentemente proibida, a fiscalização de armazéns, as obrigações de informação financeira, as informações de mercado acopladas de incentivo reconstituinte de anteriores percentagens fixas de desconto, constituem um já considerável número de obrigações laterais pelas quais se consegue o controlo da rede grossista e a sua adesão aos fins comerciais, à política comercial em cada momento delineada pela T…. A isto nada tira o facto de mais recentemente algumas das obrigações poderem ter sido assumidas pelo império público como relevantes para controlar o mercado ilegal e o crime de branqueamento de capitais. É uma dupla valoração das obrigações, que não afasta o serviço de interesse privado legítimo da T…. Voltamos portanto a concordar, e de resto também para lá remetemos, com a análise feita, cláusula a cláusula, nos diversos momentos históricos, pelo Prof. Pinto Monteiro. E voltamos a dizer que, sendo a sua autoridade doutrinária amplamente reconhecida e elogiada, podemos com confiança aceitá-la nos termos em que se desdobrou na análise concreta que fez.
Confirmemos então estas conclusões em termos da restante matéria de facto provada – eminentemente não textual portanto.
Primeiro aspecto: - contratos anteriores e passagem à tabela de 1992 e às Condições Gerais que se lhe seguiram – factos provados 6 – “Desde 1992, a R. T… propôs aos grossistas que as condições contratuais que haviam sido inicialmente estipuladas por meio de acordos individualmente celebrados com cada grossista passassem a integrar as designadas “Condições Gerais”, (…) e 51 “Nunca os AA. tiveram necessidade de repetir o processo de inscrição como grossista da T…”. Interessa também perceber que até à introdução do factor de correcção (facto 18) está provado que “19 - Até esse momento a aceitação das Condições Gerais realizava-se pela assinatura de um documento que era enviado aos AA e que continha as Condições Gerais em anexo” e que “20 - Nas condições que iniciariam vigência em janeiro de 2006, a R. T… solicitou aos AA. que assinassem o Anexo IV às Condições Gerais do qual consta o seguinte: “Declara ter tomado conhecimento dos termos e condições constantes das Condições Gerais de Fornecimento de Cigarros pela T… S.A. a Grossistas que pratiquem Distribuição Directa”, sendo depois seguida a fórmula que já vimos no facto provado 13 – ponto 3.1 das Condições Gerais de 2009: “As presentes Condições Gerais considerar-se-ão integralmente aceites com a colocação da primeira encomenda de Produtos de tabaco”.
Em suma, inequívocos contratos cujas cláusulas passam à tabela de condições de 1992 e se mantêm como vimos, ou melhor, nos termos que vimos, nas Condições Gerais subsequentes, nunca prescindindo de uma declaração por parte dos grossistas.
Segundo aspecto: - sujeitos/partes e objecto.
Os factos provados relevantes são: 1 - Os AA. desenvolvem a atividade de armazenagem e distribuição de produtos de tabaco; 2 – A R. (1) é uma sociedade de direito português, controlada, desde a sua privatização em 1997, indiretamente por via da P…, pelo Grupo P…, que se dedica, a nível mundial, à produção e venda de produtos de tabaco, designadamente cigarros brancos, charutos, tabaco para cachimbo e tabaco de corte fino; 4 - A atividade de comercialização de cigarros e produtos afins é desenvolvida pela R. T…(2), prosseguindo a R. T… (1) a atividade de produção industrial de cigarros e produtos afins.
Mais concretamente, os factos provados “15 - As AA. compram por grosso às T… produtos de tabaco”, “16 - Os AA. atuam por conta própria, assumindo o risco da comercialização”, “49 - Alguns AA. realizam também a atividade de venda direta ao consumidor por intermédio de máquinas de venda automática de cigarros”.
Terceiro aspecto: - obrigações principais assumidas: - facto provado 240 “As RR. comprometeram-se a vender produtos de tabaco aos AA., que se comprometerem a comprá-los para depois os revenderem a clientes seus que são retalhistas, em postos de venda variados como cafés e tabacarias”; adicionalmente à venda de produtos de tabaco, compromisso de concessão de descontos na compra: - factos provados “94 - O preço pelo qual a T… vendia os produtos de tabaco aos grossistas foi determinado até julho de 2009 com base num desconto que era uma percentagem do Preço de Venda ao Público dos produtos”, e para 2007 temos provado que “32 - Nas faturas emitidas no ano 2007, o desconto comercial era calculado com base numa percentagem de 8,62% sobre o PVP de todos os produtos cigarros (…)” (primeira parte do facto), sendo que “36 - Desde 1 de julho de 2009, acabaram os descontos comerciais expressos em percentagem sobre o PVP, passando os grossistas a ter um desconto correspondente a uma quantia fixa por caixa”, e que “37 - O desconto comercial passou a ser apurado pela diferença entre o PVP e o preço de venda que as T… em cada momento determinem para a venda desses produtos aos seus clientes grossistas, passando a ser de 7,13%”.
Quarto aspecto: durabilidade da relação: factos provados “57 – A… iniciou a sua atividade de compra para revenda de produtos da T… em 1988”, “58 - A partir de 2002, a A. T…. assumiu a atividade inicialmente desenvolvida por A…, com o conhecimento e autorização da R. T…”, “59 - A A. AAP iniciou a atividade de grossista de produtos da T… em data não posterior a 1985”, “60 - A atividade de compra para revenda de produtos da T… da A. ASF remonta a 1982”, “61 - JVP iniciou a atividade de compra para revenda de produtos da T…em 2001”, 62 - A partir de 2010, a A. J… assumiu a atividade inicialmente desenvolvida por JVP, com o conhecimento e autorização da R. T….”, 63 - A atividade de compra para revenda de produtos da T… da A. DA remonta a 1990”, 64 - A A. DL iniciou a atividade de compra para revenda de produtos da T… em 2004”, “65 - A A. HPM iniciou a atividade de compra para revenda de produtos da T… em 1988”, “66 - A atividade de compra para revenda de produtos da T… da A. RC remonta a 2002”, “67 - DSF & Filhos, Lda, iniciou a atividade de compra para revenda de produtos da T…em 1982, dando continuidade à actividade inicialmente desenvolvida por DS conforme facto provado nº 88”, “68 - A partir de 2003, a A. SBB assumiu a atividade inicialmente desenvolvida por DSF, Lda, com o conhecimento e autorização da T…”, “69 - CACT, Lda iniciou a atividade de compra para revenda de produtos da T… em 1985”, “70 - A partir de Fevereiro de 2003, a A. CAI assumiu a atividade inicialmente desenvolvida por CACT Lda, com o conhecimento e autorização da T…”, “71 - A atividade de compra para revenda de produtos da T… da A. SV remonta a 2000”, “72 - A A. DTSM iniciou a atividade de compra para revenda de produtos da T… em 2007”, “73 - DSGS iniciou a atividade de compra para revenda de produtos da T…em 1992”, “74 - A partir de 2008, a A. D… assumiu a atividade inicialmente desenvolvida por DSGS, com o conhecimento e autorização da T…”, 75 - A atividade de compra para revenda de produtos da T…da A. ES remonta a 1998”, 76 - A A. CT iniciou a atividade de compra para revenda de produtos da T… em 1989”, “77 - AR, Lda iniciou a atividade de compra para revenda de produtos da T…em 1995”, “78 - A partir de 2010, a A. TR assumiu a atividade inicialmente desenvolvida por AR, Lda, com o conhecimento e autorização da T…”, “79 - A A. MMC iniciou a atividade de compra para revenda de produtos da T… em 1996”, “80 - JMRL iniciou a atividade de compra para revenda de produtos da T… em 1951”, “81 - A partir de Novembro de 1986, a A. JMRL assumiu a atividade inicialmente desenvolvida por JMRL, com o conhecimento e autorização da T…”, “82 - A A. … D iniciou a atividade de compra para revenda de produtos da T… em 2003”, “83 - A atividade de compra para revenda de produtos da T… do A. R… remonta a 2003”, “84 - A atividade de compra para revenda de produtos da T… do A. A… remonta a 1990”, “85 – CDF iniciou a atividade de compra para revenda de produtos da T… em 1926”, “86 - A partir de 1994, o A. CM assumiu a atividade desenvolvida por FDF, que anteriormente havia assumido a atividade desenvolvida por CDF, com o conhecimento e autorização da T…”, “87 - A atividade de compra para revenda de produtos da T… do A. FJ remonta a 1994”, “88 - A 18 de julho de 1944, DS celebrou acordo com a T… pelo qual esta nomeava aquele seu depositário revendedor para o concelho de Gondomar, mediante, entre outras condições, a de aquele fazer propaganda intensa dos tabacos da T… e arranjar para esse fim e sob sua responsabilidade sub-depositários em todas as freguesias e aldeias do concelho de forma a que nessas freguesias e aldeias se vendam os tabacos da T…”, “244 - APSS, APS e MPS iniciaram a actividade de compra para revenda de produtos da T… em 1949, e, em 1981, ASF constituiu com aqueles a S & C”, “245 - A actividade actualmente desenvolvida pela DL dá continuação à que inicialmente foi desenvolvida por APSS; AP E MPS”, “246 - Pelo menos, à data de 1986, HPM desenvolvia a actividade de compra para revenda de produtos da T…”, “247 - A partir da sua constituição, a actividade inicialmente desenvolvida por HPM passou a ser desenvolvida pela sociedade HPM, Ldª, com o conhecimento e autorização da T…”, “248 – FPN iniciou a atividade de compra para revenda de produtos da t…na década de 30”, “249 - A actividade desenvolvida pela A. DTSM a partir de 2007 [cf. Facto Provado 72] corresponde à actividade inicialmente desenvolvida por FPN e, no momento imediatamente anterior, por MELNA, Lda.”, “250 - A passagem da MENA, Lda. para a DTSM ocorreu com o conhecimento e a autorização da T…”, “251 – JST iniciou a sua actividade de compra para revenda de produtos da T…em 1931”, “252 - A actividade desenvolvida pela A. CT a partir de 1989 (cf. Facto Provado 76) corresponde à actividade inicialmente desenvolvida por JST desde 1931 (pai e subsequentemente por seu filho JST) e posteriormente por LTCC, sendo que a actividade de compra para revenda de produtos da T… foi sempre desenvolvida de modo contínuo, com a manutenção dos clientes e instalações originais”, “253 – MAPM iniciou a sua actividade de compra para revenda de produtos da T… em 1991”, “254 - A actividade desenvolvida pela A. MMC, Ld.ª corresponde à actividade inicialmente desenvolvida por MAPM, passagem que foi autorizada pela T…”, “255 – JAO, DRA, , Lda., RT, Lda., DT, Lda., ENF, Lda, e FA iniciaram a sua actividade em data anterior a 1986”, “256 - A …D resulta da integração da RT, Lda., da JV, Lda., da DRA, Lda., da MD…, Lda., da DL …, Lda., da FA…, Lda. e da ENF, Lda”, “257 - A actividade desenvolvida pela …D a partir da sua constituição corresponde à actividade desenvolvida até então pelas sociedades que a compõem com o conhecimento e autorização da T…”, “285 - DSF, Lda, iniciou a atividade de compra para revenda de produtos da T… em 1982, dando continuidade à actividade inicialmente desenvolvida por DS conforme facto provado nº 88”.
Deste elenco se retira também, pelas menções de conhecimento e autorização da T…, um não descuido da selecção personalizada dos grossistas.
Quinto aspecto: - da posição de base material, no contexto do mercado de tabaco, das RR. e das AA. e das características dos produtos vendidos e distribuídos: - factos provados “50 - Relativamente à marca M…, as RR. detêm uma licença da sua empresa mãe, a P…, na qualidade de detentora exclusiva dos direitos sobre o fabrico e comercialização da mesma em Portugal”, “213 - As principais marcas de cigarros de produção fabril comercializadas em Portugal pela T…. são a S… e a M…”, “214 - As marcas S… e M…. são as duas marcas líderes no mercado português, sendo a marca S… a que, em Portugal, tem maior implantação”, “215 - No mercado de produção e comercialização de cigarros de produção fabril, em Portugal, a quota de mercado das T… foi de 87% em 2005, de 82% em 2006, de 79,9% em 2007, de 79,3% em 2008, de 80,2% em 2009 e de 77,1% em 2010”, “216 - Em 1995, o segmento dos cigarros representava 99,1% do mercado nacional dos produtos manufaturados do tabaco”, “219 - A marca de cigarros M… tem notoriedade internacional” – banda das Rés.
Por outro lado e para que se situem então face às RR as Autoras e Autores, são relevantes os factos provados “218 - O mercado de fornecimento de produtos de tabaco é um mercado onde existem importantes barreiras de facto à entrada como a fidelidade dos consumidores a uma marca resultante da dependência provocada pelo consumo”, “222 - No mercado dos cigarros, verifica-se a dependência do consumidor relativamente à marca dos produtos que consome”, “223 - Tal estado de dependência do consumidor faz com que o aumento de preços da marca dos produtos que consome que não ultrapasse o limite do incomportável não implique a mudança para outra marca”, “221 - Os consumidores de tabaco procuram no mercado os agentes que lhes possam disponibilizar a marca que desejam” – sendo que estes factos também são relevantes para caracterizar a posição de força das RR.
Para se continuar a perceber a posição material das AA, são relevantes os factos provados “217 - Os principais distribuidores de tabaco, em Portugal, distribuem uma gama alargada de produtos de tabaco e não apenas um único tipo”, “220 - Os retalhistas deixarão de procurar os produtos de tabaco de um determinado grossista se este deixar de oferecer os produtos da T…”, “225 - Os retalhistas clientes dos AA., perante a impossibilidade de adquirir junto destas os produtos comercializados pelas T…, passariam a recorrer a um grossista que lhes permitisse simultaneamente adquirir as marcas comercializadas pelas T… e outras marcas”, “226 - A grande maioria dos distribuidores fornece todas as marcas”.
No fundo, e em operação de todas estas condicionantes, das RR., dos produtos que fabricam e vendem e do mercado distribuidor e consumidor, resultou, conforme factos provados que se seguem: “277 - Apesar da redução da margem dos grossistas, o peso dos produtos da T… continuou a ser preponderante no volume de vendas dos AA” e se portanto continuou é porque o já era antes, sendo disso exemplo em termos gerais e para um universo de cerca de vinte grossistas, o facto provado “238 - No ano de 2009, os AA. adquiriram à R. T… produtos de tabaco no valor total de € 294.501.564,45, correspondente ao valor a pagar de € 273.658.455,02, e em termos concretos o exemplo constante do facto provado “224 - Entre 2005 e 2010, os produtos da T…representavam cerca de ¾ do volume de negócios total dos AA. …D, ASF… e SBB…”. Isto porque “227 - Inexistem no mercado dos cigarros de produção fabril produtos pelos quais os AA. possam substituir os da T… no caso de esta cessar o fornecimento àqueles”.
Finalmente, para perceber a margem de manobra das AA. é ainda relevante saber que “235 - O preço de revenda aos retalhistas é fixado pelos revendedores grossistas tendo como limite o PVP, proposto pelas T…e geralmente homologado, e a reserva duma margem para os retalhistas, que tradicionalmente, e para o período em referência nos autos, se situou próxima dos 6% sobre o PVP”.
Sexto aspecto:
Entrando então naquilo que a doutrina chama obrigações laterais (integração), temos como provado, e desde logo quanto ao chamamento aos objectivos de política comercial em cada momento decididos pelas RR, que “228 - Os descontos comerciais variáveis em função dos volumes de aquisição de produtos da T… incentivaram os grossistas a adquirir mais produtos da T… como forma de potenciar a margem de lucro a obter”, o que até permitiu um menor número de interlocutores/clientes: - “230 - Muitas empresas distribuidoras concentraram-se para poderem atingir o escalão comercial mais vantajoso” e “231 - Em Portugal, o número de grossistas era de 326 em 2002 e de 182 no 1º semestre de 2009”, traduzindo pois um mecanismo de conformação da própria rede. Neste sentido, os factos provados “283 - No dia 23 de Novembro de 2010, num encontro das T… com os grossistas, o administrador-delegado da R. T… disse que havia grossistas a mais na rede portuguesa, que estes deveriam ser menos e que deveriam ser maiores” e “284 - A T… manifestou, por diversas vezes, aos Grossistas, o objectivo de diminuir o seu número a nível nacional”.
Depois temos:
“92 - Conforme acordado anteriormente às CGF, os AA. tinham de demonstrar trimestralmente à T… o cumprimento do requisito das quantidades mínimas”, “93 - Caso algum dos AA. não cumprisse o requisito das quantidades mínimas, a T…cortava-lhe o fornecimento de tabaco”, “258 - Todos os AA., para serem aceites como Agentes/Distribuidores/Grossistas da T…, estavam obrigados a adquirir quantidades mínimas, definidas periodicamente (em regra, anualmente) pela T… e que variavam consoante o Distrito em que estes exerciam a sua actividade”, e os exemplos “259 - Quando as quantidades mínimas semanais passaram a ser fixadas por distrito, AR… tinha de comprar o número de caixas definido pela T… para cumprir as quantidades mínimas estabelecidas para o distrito de Braga que, em Outubro de 1986, eram de 0,567 milhões de cigarros por semana”, “260 - Em 2001, as quantidades mínimas aplicáveis à A. ASF… eram de 0,16 milhões de cigarros por semanas, quantidade aplicável ao Porto II”, “261 - Em 1992, as quantidades mínimas que eram aplicáveis a DSGS … eram as definidas para o Distrito Porto II, ou seja, de 0,200 milhões de cigarros por semana”.
Coerentemente temos: “264 - A T… dava instruções aos AA. no sentido de estes manterem sempre em stock a quantidade de produtos da T… suficiente para fazer face às vendas de pelo menos uma semana”, “265 - A T… dava instruções aos AA. e tinha programas de incentivos específicos para que inexistissem rupturas de stock de produtos da T… no retalho e fez constar das CG, até 2008 inclusive, como obrigação do cliente grossista, abastecer contínua e regularmente os retalhistas e zelar pela inexistência de rupturas de stock”.
Em bom rigor portanto nem se trata de uma obrigação lateral, mas do complemento da obrigação principal de revenda.
E em complemento e adequação à política comercial promocional em cada momento definida pela T…, temos que “17 - Desde 2000, os AA. e outros grossistas em condições semelhantes participaram em campanhas de incentivos promovidas pela T…, e a seu pedido: a campanha de incentivos integrada; a campanha na crista da onda; o programa descobrir novos horizontes; o programa a… t… 2000 - ao encontro de Portugal, o programa A… 2001 - descobrir Portugal, a promoção Rotas V…l, a promoção M… Adventure Team e a promoção … Duopack” e “267 - A T… dava viagens aos AA. que obtinham melhores resultados na distribuição dos produtos daquela junto do retalho, nomeadamente no âmbito do Programa A…”. Não se evidencia, contrariamente ao que defendem as RR., que se tratasse de episódios pontuais e pouco frequentes, e o respectivo carácter voluntário é contrariado pela comprovada necessidade prática de trabalhar numa margem limitada pela concessão de margem ao retalho e pela definição/indicação pela T… do PVP, e pelo menos a partir de 2002, de realizar qualquer forma de compensação do abaixamento de margem originado na decomposição do anterior desconto fixo em desconto parcialmente fixo e com quatro variáveis.
E temos ainda que para um fino apercebimento do mercado e para um fino controlo da actividade dos grossistas, AA., as RR – “269 - Nas fiscalizações aos armazéns das AA., os funcionários da T… vêem as quantidades de produtos de tabaco de marcas concorrentes que lá existem e tentam aperceber-se das razões dessas quantidades, nalguns casos reportando-as superiormente”, “279 - O fornecimento da informação de vendas era condição de atribuição do desconto de distribuição directa e activa, no máximo de 1,40%, sem o qual, os AA. não teriam condições para continuar no mercado”, “280 - Tendo o desconto comercial fixo sido reduzido em 2002, momento em que foram introduzidos vários descontos condicionais, os grossistas foram induzidos à realização dos comportamentos que lhes permitiam a manutenção do desconto comercial fixo anterior”, “281- A T…, pelo menos no ano de 2005, realizou auditoria à informação de vendas entregue pelos AA”, ou seja, deveres de informação e faculdades de comprovação da informação, que como vimos na análise dos textos, eram acopladas pela previsão final de corte de fornecimento. Previsão esta que, face ao que se deu como provado no quinto aspecto, sobre a posição de base material das AA., se revelava particularmente incisivo.
Mas prossigamos nas obrigações laterais:
“53 - A T…procede periodicamente à vistoria dos armazéns dos AA.”, “54 - Nas vistorias, a T… verifica o grau de humidade, a temperatura, a localização e as condições de acesso e de estacionamento”, “102 - Para os AA. ou os seus antecessores começarem a ser fornecidos pela T…, as instalações daqueles foram vistoriadas por esta de modo a confirmar se as mesmas reuniam as condições necessárias para manter o produto em bom estado”, “103 - A mudança de instalações foi sujeita a vistoria e autorização por parte da T…”, “233 - As RR. vistoriam os locais de armazenagem dos grossistas para prevenir a responsabilização daquelas perante consumidores e perante autoridades fiscais ou de saúde” – o que não deixa de ser um interesse próprio das RR, por elas definido, de não serem responsabilizadas – é o que resulta literalmente do facto, que aliás foi pelas Rés alegado – e não um empenho das RR. no cumprimento de prescrições fiscais e de saúde pública.
Continuando: - “234 - As RR. promovem encontros com os revendedores grossistas destinados a prestar esclarecimentos sobre a atividade em geral - em especial, sobre alterações legislativas” e continuando “96 - Antes de 2003, a T… promoveu cursos de técnicas de venda e cursos sobre rentabilidade das máquinas de venda de tabaco, fornecendo material para a ajuda na gestão de máquinas e clientes”, “97 - A T…promoveu e organizou fóruns sobre o euro, a organização de empresas, o controlo de máquinas e as viagens”, “98 - O fórum sobre o euro realizou-se em 2001”, “99 - Os AA. participaram em atividades referidas nos pontos 96 e 97”, sendo que “100 - A T… oferecia um desconto extra aos AA. que participassem nas campanhas de incentivos promovidas por aquela”, e “105 - Em 2005, a T… promoveu e custeou uma ação de formação sobre o comando de máquinas em que estiveram presentes alguns dos AA” e finalmente que “263 - Nos fóruns, a T… organizava acções de formação sobre a organização interna e a gestão dos estabelecimentos destes, recomendando aos AA. que se informatizassem, redefinissem rotas, reduzissem custos, rentabilizassem o negócio, se expandissem para outras áreas geográficas e aumentassem a rotatividade dos produtos da T…”.
Mais obrigações laterais: - “268 - A T…. exigia aos AA. que os produtos daquela fossem expostos em lugar de destaque em detrimento dos produtos da concorrência nas máquinas de vending, através de contratos de que são exemplo os constantes de fls. 7318 verso e seguintes e 7333 verso e seguintes, cujos termos aqui se dão por reproduzidos, e dava indicações aos AA. para que essa exposição fosse também seguida nos seus clientes retalhistas, pelo menos nos clientes retalhistas não visitado pelos promotores da T…”, “266 - Para que os AA. desenvolvessem actividades promocionais e publicitárias dos produtos da T…, pelo menos na parte dos retalhistas não visitados pelos promotores da força de vendas da T…, esta forneceu àqueles, para que fizessem chegar aos retalhistas, autocolantes, isqueiros, cinzeiros, baralhos de cartas, t-shirts, casacos, toalhas, bonés, brindes, reclames luminosos e expositores”. Não sendo uma obrigação mas uma forma de colaboração, deve ainda mencionar-se que “241 - As AA., quando acompanhadas na sua volta pelos promotores das Rés, apresentavam-nos aos seus clientes retalhistas que, numa fase posterior, vendem os produtos de tabaco aos consumidores”.
Finalmente, com uma valia caracterizadora residual, dizer que “286 - Os AA. prestam assistência aos retalhistas nomeadamente na substituição do tabaco danificado que é devolvido às RR. de acordo com regras e procedimentos definidos por estas (…)”.
Em conclusão:
Também ao nível dos factos provados não textuais se evidencia a presença de contrato, correspondente à necessidade de tornar firme o modo pelo qual as RR. conseguem chegar com os seus produtos aos consumidores e de tornar também firmes os pressupostos de adesão das AA. ao propósito das RR., desde logo os termos em que afectaram à possibilidade de exercício da sua função concreta tal como definida pelas RR. os recursos necessários a tanto.
Na situação concreta que a longa relação comercial que se desenvolveu entre AA e RR revela, e não no plano dos princípios jurídicos abstractos, não se encontra qualquer domínio relevante de liberdade ou autonomia que permitisse a estas concretas AA. optarem por não cumprirem, por não satisfazerem as exigências de quantidades mínimas, de periocididade das encomendas, as exigências de demonstração do cumprimento e de demonstração da sua própria fiabilidade. Igualmente resultou provado que mesmo sob a aparência de faculdade, os mecanismos de variabilidade das percentagens a conceder, sempre residuais em função da necessidade de conceder também percentagens mais elevadas ao retalho, acabaram por, conjugados com a quota de mercado e a dependência dos negócios destas AA. dos produtos das RR., ambas originadas na dependência do fumador em relação à marca, determinar as AA. à adesão a esses mecanismos aparentemente facultativos, tal como a participação em campanhas e o fornecimento de informação de mercado. Está aliás demonstrado que a alternativa ao cumprimento se resolveu em encerramento de actividade e venda a outros grossistas mais fortes, ou em concentração de grossistas. Portanto, e agora repare-se, mesmo no mecanismo do contrato de adesão, só há unicidade do ponto de vista do predisponente, mas continua a manter-se a individualidade dos aderentes, não pode falar-se dum grau de autonomia ou liberdade de cada um dos grossistas, de cada uma das Autoras e dos Autores, que permita conceber nem a oferta ao público indiferenciado de que falam as RR., nem mesmo a tese dum contrato prévio de modulação do conteúdo de futuros contratos a celebrar, que em si, sendo contrato, afinal nenhum subjectivo direito ou obrigação criasse.
Assentemos portanto, repetindo aliás, com Pinto Monteiro, que estamos na presença de contratos, cuja forma de celebração mudou dos contratos individuais para o contrato-quadro de adesão, instrumentos jurídicos que modularam e regeram a relação comercial ao longo das apontadas e comprovadas durações da mesma com cada uma das Autoras e dos Autores.
Tal relação comercial, pelo seu objecto, visou a distribuição dos produtos produzidos e comercializados pelas RR., e o instrumental contratual pode assim caracterizar-se como contrato de distribuição. Repare-se ainda que este instrumental contratual face à globalidade da relação comercial foi complexo, no sentido de que paralelamente aos textos dos contratos e subsequentemente aos textos contratuais da tabela e das Condições de Fornecimento – sequência não afastada pela alegação do marco histórico da adesão de Portugal às Comunidades e da privatização – correram outros instrumentos contratuais como os contratos de vending, e as campanhas de incentivos que as Rés assumiram serem contratuais. Esta posição paralela integradora duma mesma realidade regulamentar conformativa, só reforça a falta de verosimilhança da tese da não relevância jurídica das tabelas e Condições.
Relativamente à modalidade deste contrato de distribuição, estamos perante um contrato de concessão comercial. Os elementos essenciais deste tipo social, naturalmente variáveis em termos de intensidade na adaptação às necessidades concretas e às circunstâncias da realidade do negócio (desde logo portanto àquilo que por ser uma evidência de facto, não precisa sequer ser regulado, porque sempre irá ocorrer mesmo sem essa regulação[28]) ficaram provados: - obrigação de fornecimento, compra para revenda em nome, por conta e risco próprio, durabilidade das obrigações assumidas, ou para ser mais correcto, longa duração das obrigações assumidas – não prejudicada pelo argumento formal da revogação total de condições que não passaram, na sua sucessão, da alteração de aspectos específicos que em nada beliscaram as obrigações principais nem as obrigações laterais, nem mesmo no seu posterior enquadramento ao abrigo do Acordo CE, que não esconde a sua previsão anterior nem elimina o interesse privado próprio das RR. no cumprimento dessas obrigações – e obrigações pelas quais se realizou a conformação concreta da rede de distribuição à política comercial das RR., desde logo o mais fundamental interesse e objectivo de manter a dependência do fumador em relação à marca, por via dum abastecimento regular e contínuo sem rupturas de stock, devidamente acoplado de mecanismo de expulsão contratual, mas também obrigações visando o conhecimento minucioso do mercado, em última análise operacionais para a manutenção do domínio de mercado, a inalterabilidade do prestígio das marcas e da imagem das Rés, a sujeição a regras de armazenagem, as obrigações de sujeição a fiscalização, quer dos armazéns, quer da proveniência dos produtos, quer da própria informação fornecida, e finalmente os mecanismos formalmente livres mas materialmente não livres, de adequação da actividade grossista às decisões comerciais em cada momento relevantemente tomadas pelas Rés, nas campanhas de incentivo, campanhas de Verão e outras similares – sendo aliás irrelevante que os primeiros destinatários do Programa A… fossem os retalhistas, porque a conformação da actividade grossista tanto se faz directamente como por “pressão” sobre o cliente do grossista que, bem sucedida, só pode resultar em compras ao grossista, visto o impedimento da T… em vender ao retalho directamente – e bem assim as recomendações e instruções enquadradas em acções de formação.
É à dependência do fumador em relação à marca, como chave de todo o negócio, desde logo das RR., que permite mostrar como a produtos de prestígio, ainda que de valor unitário diminuto, sem particular necessidade de assistência pré e pós venda, e com publicidade crescentemente proibida, quadra bem a concessão comercial enquanto forma de operacionalização dum rede capilar muito extensa e fina de distribuição, com controlo firme das acções e das condições pelas quais tal dependência consegue ser mantida.
Concluímos assim que a relação comercial entre AA. e RR. foi regulada por um contrato de concessão comercial.
Em todo o caso, independentemente da qualificação, sempre teríamos um contrato de distribuição, no que se abre a porta à apreciação da segunda linha argumentativa: - a “ilicitude/ineficácia da imposição de aplicação do factor de correcção em face do artigo 406º nº 1 do Código Civil”, além da mesma consequência perspectivada por via do Regime Jurídico das Cláusulas Contratuais Gerais. B - Segunda linha argumentativa:
Dispõe o artigo 406º nº 1 do Código Civil que “1. O contrato deve ser pontualmente cumprido, e só pode modificar-se ou extinguir-se por mútuo consentimento dos contraentes ou nos casos admitidos na lei”.
Trata-se do chamado princípio “pacta sunt servanda”. Ele é um pilar, ou talvez o pilar fundamental de todo o ordenamento jurídico. Para os efeitos da nossa apreciação, não interessando discutir se a sociedade civil surge antes ou depois do Estado, questão filosófica onde ressoam reconfigurações em recorrências múltiplas de Platão e Aristóteles, o certo é que o “cachimbo da paz” tanto põe fim à guerra privada quanto à pública, tanto coroa composições pacíficas de interesses públicos e internacionais quanto de interesses privados. Por isso encontramos o princípio “pacta sunt servanda” no artigo 26º da Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados, de 23 de Maio de 1969, aprovada para adesão pela Resolução da Assembleia da República nº 67/2003, segundo o qual “Todo o tratado em vigor vincula as Partes e deve ser por elas cumprido de boa-fé”, como o encontramos como princípio fundamental de regulamentação de conflitos privados de qualquer ordem jurídica[29], constituindo um princípio geral de Direito da União aplicável aos contratos[30], como o vemos integrar o conceito de ordem pública internacional do Estado Português[31].
Em rigor, não se trata apenas de uma questão de honra, de paz nem de tabaco para cachimbo, mas dum elemento estruturante da própria sociedade moderna, isto é, de oitocentos para cá, intimamente conectado com a fragilidade humana, com o tempo humano e com a luta pela sobrevivência, cada uma por si reclamando mínimos de estabilidade conseguidos por via da certeza e da segurança, ou seja, o princípio é absolutamente operacional do princípio da certeza e da segurança jurídica, se é que não estávamos a falar do mesmo (nos idos antes da progressão extraordinária do Direito Público). Voltando a falar dum tema ao de longe paralelo, a vantagem dum contrato de trabalho para o empregador é exigir ao trabalhador o cumprimento da sua obrigação principal, que é a prestação de trabalho, coisa que, teoricamente, se não pode fazer quando se contrata o mesmo como prestador de serviços. Estamos no básico de como organizar uma sociedade. Como acima dissemos, organizar a distribuição do tabaco por via duma associação livre, sem controlo da cadeia de distribuição, levaria rapidamente ao fim do negócio. Subsistindo a dependência de base do fumador, ele teria de recorrer rapidamente à concorrência, ao mercado ilegal ou à produção artesanal. Considerando os investimentos feitos pelos produtores e pelos distribuidores, é absolutamente fundamental que um mínimo de certeza e de segurança jurídica os assista. Obtêm-no com o contrato mas sobretudo com o princípio jurídico “pacta sunt servanda” que a ele se aplica.
Dizem-nos Pires de Lima e Antunes Varela[32] que “Afirmando que o contrato deve ser pontualmente cumprido, a lei quer dizer que todas as cláusulas contratuais devem ser observadas, que o contrato deve ser cumprido ponto por ponto, e não apenas que ele deve ser executado no prazo fixado (…)”. E dizem-nos ainda os mesmos Autores, na nota primeira a este preceito na mesma obra, que “Só com carácter excepcional se admite, pois, a extinção ou modificação da relação contratual por vontade exclusiva de uma das partes. É o que acontece, por ex., no (…) ou, em relação a qualquer contrato, quando haja alteração das circunstâncias em que as partes fundaram a decisão de contratar (…)”.
Ainda dos mesmos Autores, uma citação muito relevante, em anotação ao artigo 405º do Código Civil: “1. O princípio da liberdade contratual é uma aplicação da regra da liberdade negocial, sendo ambos um corolário do princípio da autonomia privada, só limitado, em termos gerais, nas disposições dos artigos 280º e seguintes (cr. Art. 398º), e, em termos especiais, na regulamentação de alguns contratos. Em virtude do princípio da liberdade contratual, ninguém pode ser compelido à realização dum contrato. (…)”. O reverso da inexistência de compulsão é o asseguramento da vontade soberana das partes pelo princípio do cumprimento pontual dos contratos.
O artigo 437º nº 1 do Código Civil vem então dizer que “Se as circunstâncias em que as partes fundaram a decisão de contratar tiverem sofrido uma alteração anormal tem a parte lesada direito à resolução do contrato, ou à modificação dele segundo juízos de equidade, desde que a exigências das obrigações por ela assumida afecte gravemente os princípios da boa-fé e não esteja coberta pelos riscos próprios do negócio”. Sabendo-se que a introdução do factor de correcção foi apresentada como uma necessidade de controlar o efeito do aumento de impostos, sendo notório que, independentemente de não se ter provado que era só o aumento de impostos que justificava a introdução, os impostos aumentaram grandemente pelas decisões políticas da época, o que seria uma repartição muito tradicional dos lucros do negócio, (ou numa outra perspectiva, a remuneração de cada interveniente em função do investimento feito) entre os participantes que funcionava como fundamento da decisão de contratar, teria assim possivelmente o condão de se subsumir a uma tal alteração anormal, podendo mesmo pensar-se que não estivesse coberta pelos riscos próprios do negócio, e assim justificar um apelo a uma modificação contratual por alteração anormal das circunstâncias, o que porém não foi o caminho escolhido, e de resto nunca foi invocado formalmente pelas RR.
Pergunta-se então se a introdução e aplicação do factor de correcção foi uma alteração unilateral do contrato em violação do artigo 406º do Código Civil.
Em primeiro lugar, os factos demonstram claramente que se tratou duma alteração unilateral – não foram os grossistas que predispuseram as Condições Gerais e o mecanismo da revogação total claramente não opera quando, como provado, as Autoras e Autores expressamente se opuseram à introdução e aplicação do factor correcção. Apesar dessa oposição expressa – factos provados 18 e 22 – o factor de correcção foi mesmo aplicado – factos provados 27/28/29 e 31 a 33 e 35 – e teve as consequências descritas no facto provado 107 (A introdução do fator de correção implicou a redução da margem dos grossistas sobre as vendas dos produtos da T…, entendendo-se por margem dos grossistas a percentagem calculada sobre o PVP que, abatida a esse mesmo PVP, originava o valor a pagar pelos grossistas à T…) e concretizadas para cada Autora e Autor nos subsequentes factos provados 109 a 205 (nos quais se inclui também a consequência da passagem ao preço fixo por caixa com as Condições Gerais de 2009 – facto provado 108 e concretizações do resultado concreta para cada Autora e Autor mencionadas também no último facto relativo à sequência das consequências da alteração para cada um deles).
Muito curiosamente temos no facto provado “157 - Em resultado da aplicação das condições gerais de fornecimento em matéria de preço e descontos comerciais no ano de 2009, a A. DTSM… gastou mais € 209.254,74 do que gastaria se fossem aplicadas as condições gerais de fornecimento de 2005”, que nunca foi posto em causa neste recurso, e que é o único que contém esta menção, uma outra forma de dizer aquilo que consta de todos os outros (109 a 205), a saber “realizou menos”. Na verdade, trata-se exactamente da mesma coisa, pois que, tal como já resultava “a contrario” do facto 107 e tal como similarmente se descreve para o preço fixo por caixa a partir de 2009 no facto provado 108, resulta do facto provado 28 (e dos que ilustram os anos subsequentes) que na factura a pagar passou a ser debitado, sobre o preço apurado depois da aplicação de todos os descontos em cada caso e em concreto devidos (variáveis introduzidas em 2002), um adicional, ou seja, este adicional teve também que ser pago pelos grossistas.
Portanto, o que se significa com “realizou menos x” é o valor que, tivesse sido mantida a percentagem de desconto sobre o PVP à data de 2005, não teria sido pago, como efectivamente foi.
O que resulta evidente de quanto dizemos e do facto provado 107 (e no elenco concreto que se lhe seguiu) é que o preço pago nos anos 2006 a 2009 pelas Autoras e Autores é a concretização monetária da diminuição da sua percentagem, percentagem que, por aplicação unilateral do factor de correcção, e depois do preço fixo por caixa, efectivamente foi diminuída.
Não têm assim razão as Rés quando defendem, a partir da sua liberdade negocial e mais atrás dos princípios constitucionais da propriedade privada e da iniciativa económica privada, a possibilidade de fixarem livremente o preço pelo qual decidem vender os seus produtos. É que essa liberdade não é tocada, não é afectada, como se comprova pelo aumento do PVP, e pelo aumento do preço pago nessa medida, nessa exacta correspondência, pelos grossistas. O que não é livre, por virtude do princípio “pacta sunt servanda” – relevantíssimo, como base securitária da liberdade negocial e da livre iniciativa económica privada – é a alteração da percentagem de desconto acordada com as Autoras e Autores, porque ela é, em sentido lato, a remuneração do investimento em capital e trabalho que as Autoras e Autores puseram ao serviço da distribuição dos produtos das Rés, o objectivo deste investimento e portanto a, ou uma das, base fundamental da decisão de contratar das Autoras e Autores. Afirmar o direito livre de fixar o preço de venda dos produtos por um produtor que não consegue levá-los ao mercado consumidor, é o mesmo que ignorar a necessidade de pagamento do trabalho de quem leva os produtos ao mercado consumidor, sem o qual seria totalmente irrelevante essa liberdade de fixação de preço porque ninguém compraria.
Voltam as Rés a não ter razão quando referem que, pela postulação de encomendas após a introdução do factor de correcção, só pode entender-se que as AA e os AA aceitaram a introdução e alteração do factor de correcção (e o mesmo de resto para a introdução do preço fixo por caixa), pois que é linear que a relevância da declaração tácita se restringe à revelação com “toda a probabilidade” – parte final do artigo 217º nº 1 do Código Civil. É com toda a probabilidade que não deduzimos do comportamento de encomendar que ele revela aceitação integral das Condições Gerais quando temos como provado que relativamente à alteração que consistiu na introdução do factor de correcção (e depois no preço fixo por caixa) as AA e os AA manifestaram expressamente a sua oposição. A probabilidade total a que se refere o preceito mencionado exige evidentemente que não haja dúvida sobre o sentido da declaração tácita, e essa dúvida existe no caso concreto, e mais do que dúvida, existe a prova do contrário.
Também não lhes assiste razão quando remetem para os termos dos contratos assinados como anexo IV, segundo os quais as AA e AA aceitaram ser fornecidas “nos termos e condições previstos nas “Condições Gerais de Fornecimento de Cigarros pela T…., a Grossistas que Pratiquem Distribuição Direta”, em vigor em cada momento”, porque como é claro, com a oposição expressa manifestada, essa aceitação não foi total.
Quanto ao argumento de que, desde 2002, já era permitido, isto é, aceite pelas AA e AA, que a T… mudasse total ou parcialmente o conteúdo das Condições Gerais de Fornecimento, e que portanto a introdução do factor de correcção estaria coberta por esta aceitação prévia, de nada valendo a oposição posterior, sem embargo da apreciação das cláusulas respectivas que vem pedida pelas AA e AA mais à frente, a verdade é que a aceitação duma tal cláusula em 2002 e em 2005 será um facto histórico, ao qual, em 2006, se sucederá outro facto histórico – isto é, concretamente situado e ocorrido depois daquele primeiro – com relevância jurídica. Ou seja, a partir duma aceitação antiga de toda e qualquer alteração unilateral, não podemos fazer de conta nem podemos juridicamente concluir que qualquer manifestação de vontade posterior está ferida de inexistência jurídica. Os factos são concretos, as coisas passaram-se concretamente. O que há que saber é qual o valor jurídico a dar esses factos que concretamente se passaram. É manifesto que a declaração posterior de recusa duma alteração só pode entender-se como uma revogação parcial da declaração anterior de aceitação de toda e qualquer alteração unilateral. Poderemos dizer que não é lícita por violação de “pacta sunt servanda” ou que constitui abuso de direito na modalidade de “venire contra factum proprium”, mas não podemos dizer que não existiu.
E adiante-se desde já, não integra nenhuma destas situações.
Quanto ao argumento de que revelassem as Condições Gerais um contrato, a T… teria a faculdade de denunciar “ad nutum a relação contratual vigente, conquanto teria inadvertidamente celebrado um “contrato de duração ou por tempo indeterminado” e que “A publicação pela T… das CGF respetivamente posteriores, consubstanciaria inelutavelmente a denúncia das CGF de 2002, 2005 e 2008, sendo este o único significado interpretativo possível da declaração negocial ínsita à comunicação das novas Condições Gerais”, já explicámos suficientemente antes porque é que a T… esteve absolutamente consciente da necessidade de recorrer a uma rede de distribuição – ela o confessou – e porque é que esse recurso tinha de ser assegurado por um contrato, e portanto “inadvertidamente” foi exactamente o que não se passou. Depois, esta inadvertência afinal ter-se-ia repetido quase de ano para ano, apercebendo-se a T…, ao final do prazo estipulado para a vigência de cada Condição Geral de Fornecimento (o que já suficiente para dizer que não havia sequer “um contrato por tempo indeterminado”), que não podia ficar manietada pelos termos desse instrumento. Não é compatível com a tese da “inadvertência” a sua repetição anual. Tendo-se apercebido de que inadvertidamente tinha celebrado um contrato de duração, haveria então de ter mudado o modo de relacionamento com os grossistas, e não simplesmente tê-lo repetido com a simples alteração do que em cada momento lhe interessava alterar. O significado único possível da declaração ínsita à comunicação das novas CGF – aliás, o contrato – não pode ser o de “aceitem que eu por distracção nas CGF em vigor coloquei lá um prazo de vigência”. De resto, falemos da duração anual ou da duração indeterminada, o facto é exactamente o mesmo: - não houve materialmente nenhuma denúncia da relação contratual por inteiro, houve apenas alterações sobre o modo de cálculo dos descontos acordados e das percentagens de desconto, e por isso não podemos também falar numa denúncia formal sem simultaneamente convocarmos o abuso de direito.
É que, se secundamos quanto se lê no Acórdão desta Relação proferido no processo nº 94104/17.3YIPRT.L1-7 em 08-10-2019 (disponível na dgsi) e passamos a citar:
“Acompanhando de perto PEDRO ROMANO MARTINEZ, diremos que denúncia é a comunicação ou participação da vontade de uma das partes, feita à contraparte, manifestando a intenção de fazer cessar o vínculo obrigacional. Trata-se, regra geral, de um exercício discricionário relativamente ao qual não é necessário invocar qualquer motivo. A denúncia pode corresponder a uma declaração negocial através da qual um dos contraentes obsta à renovação automática do vínculo contratual que o liga ao outro contraente. Assim, tendo esse vínculo um prazo de duração limitado, renovável automaticamente, qualquer das partes pode inviabilizar a renovação por um novo período, recorrendo à denúncia. Neste caso, a denúncia constitui o meio específico de fazer cessar um contrato de duração indeterminada. A denúncia serve, pois: - para pôr termo a contratos com um período de vigência indeterminado; ou, - para evitar a renovação em negócios jurídicos de duração limitada,
donde, não poderem fazer-se cessar através denúncia, contratos que tenham um prazo de vigência limitado, antes do seu decurso. Apesar de a denúncia ser em princípio livre, à luz do princípio da boa-fé que deve nortear as partes na vigência e execução dos contratos, o exercício do direito potestativo de denúncia[2] deverá ser precedido de um aviso prévio, o que significa que tem de ser comunicada com alguma antecedência relativamente à data em que a cessação produzirá efeitos. A antecedência exigida para a denúncia serve para que a parte destinatária dessa declaração se possa precaver quanto ao facto de o vínculo contratual se extinguir em breve[3]. (…) A denúncia é, em conclusão, uma declaração unilateral recetícia, que se identifica como um ato jurídico unilateral (art. 295.º), que tem por finalidade pôr termo a um vínculo contratual, consistindo numa declaração universal que é emitida por uma das partes num contrato, tendo como destinatário o outro contraente, e que só se torna eficaz depois de chegar ao poder ou ser conhecida deste, nos termos do art. 224º, n.º 1, 1.ª parte[4]. O seu fundamento reside no pressuposto da liberdade de desvinculação, podendo, por isso, ser invocada sem menção de qualquer motivo; é exercida ad nutum, de modo discricionário, mas sem abuso de direito[5]” (fim de citação)[33],
já nos resulta evidente que a denúncia que visa a liberdade, a desvinculação, não existe nos casos em que não há desvinculação nenhuma, antes a relação contratual subsiste por vontade do denunciante. Já nos resulta também evidente que a técnica utilizada – enquanto expediente para contornar o princípio “pacta sunt servanda” – se revela manifestamente contrária à boa-fé, mas também ao fim económico do direito, como adiante teremos oportunidade de melhor concretizar.
Em conclusão, a introdução unilateral do factor de correcção violou o princípio contido no artigo 406º do Código Civil. Essa unilateralidade – por via da não aceitação das AA e dos AA – estendeu-se ao longo dos anos de aplicação do factor de correcção, sendo suficiente a oposição inicial, pois que em rigor nada mudou na fórmula ao longo dos anos em que foi aplicada.
Como resulta do facto provado 108 e dos factos provados 36 e 37, e 25, também quanto ao preço fixo por caixa e ao correspondente abaixamento do desconto obtenível em 2005 para 7,13, essa unilateralidade de alteração persistiu.
Quando lemos nas conclusões da alegação de recurso que “KK. Tendo as AA. expressa e especificamente recusado, perante as RR., a introdução da cláusula que introduziu o “fator de correção” – cf. Factos Provados 18, 19, 22, 23 e 24 e 25 – (…)” a referência a estes factos, que tanto se referem a factor de correcção como preço fixo por caixa, significa que para as AA e AA a passagem do preço fixo à caixa cristaliza o factor de correcção, e que portanto o que se invoca quanto à sua ilegalidade de inclusão e aplicação (embora a al. KK prossiga directamente para a violação do Regime Jurídico das Cláusulas Contratuais Gerais) se fundamenta desde logo na oposição expressa dos grossistas, isto é, na não aceitação que converte a introdução em alteração unilateral em violação do artigo 406º nº 1 do Código Civil.
A reversão dessa invocada ilegalidade é prevenida nos pedidos formulados pelas AA e AA. Embora não coincidentes com os valores indicados à inicial, se somarmos as verbas constantes dos factos 109 a 205, sempre poderíamos concluir que abrangem também as quantias que as AA e AA deixaram de receber por virtude da alteração correspondente à introdução do preço fixo por caixa, como de resto isso também resultaria do pedido seguinte, de que as RR. sejam condenadas “a entregarem aos AA. as quantias que faturarem com base nas mesmas cláusulas, desde a data das últimas faturas referidas na petição inicial até ao trânsito em julgado da presente ação”, ou seja, estamos aqui nas consequências da cláusula 10.1 das Condições Gerais de 2009 e de 2010, para as quais o primeiro fundamento de base é a unilateralidade não acolhida por uma aceitação que se resolve na referida violação do artigo 406º nº 1 do Código Civil.
E neste aspecto, tudo o que se escreveu acima sobre o factor de correcção propriamente dito, se estende também à fixação do preço fixo por caixa nas tabelas de 2009 e 2010. Aliás, até com maior força desestabilizadora dos fundamentos da decisão de contratar por banda dos grossistas, justamente porque concretizou a soma dos agravamentos das suas condições comerciais que lhes resultaram pela aplicação ano a ano do factor de correcção propriamente dito.
E em conclusão também, tendo-se repetido o processo de oposição à passagem ao preço fixo por caixa, também neste conspecto ocorreu violação do princípio contido no artigo 406º nº 1 do Código Civil.
É ainda certo que nesta segunda linha argumentativa as Recorrentes também enquadram a ilicitude destas alterações sob o regime jurídico das cláusulas contratuais gerais, mas como também o fazem por via de outros argumentos que retiram do mesmo regime jurídico, deixaremos a apreciação para a terceira linha argumentativa.
Finalmente, e sobre as consequências da ilicitude das alterações, concluiremos a final desta 5ª questão. C - Terceira linha argumentativa – (“b) É ilícita /(in)eficaz a imposição e aplicação do fator de correção pelas RR. face à rejeição expressa pelos AA. desta cláusula contratual e atento o disposto (…) no RJCCG – cf. Ponto IV.C. b)) e “c) A cláusula que introduziu o fator de correção deve-se considerar excluída do contrato quadro e consequentemente, dos sucessivos contratos de compra e venda, por incumprimento do dever de comunicação e de informação previstos nos artigos 5.º e 6.º do RJCCG e ainda por as RR. terem prestado informações falsas aos AA. (e demais grossistas) sobre os seus efeitos e aplicação – cf. Ponto IV.C. c)”.
Na petição inicial as Autoras e Autores invocaram, no artigo 137º, depois de afirmarem que são várias as causas de invalidade das cláusulas que unilateralmente oneram a margem dos distribuidores, que essa invalidade “(…) decorre, antes de mais, de serem cláusulas contrárias à boa-fé, nos termos do artigo 15º do RJCCG, pois possibilitam a uma das partes a desarticulação do equilíbrio económico estabelecido, e da sua materialidade subjacente, aquando da celebração do contrato, num elemento que é central em qualquer contrato de distribuição: a margem do distribuidor, a sua vantagem económica pela distribuição dos produtos do produtor”. Invocaram ainda que dado o “elevadíssimo” nível de dependência económica, pese o regime das cláusulas contratuais gerais não contemple uma proibição absoluta de cláusulas que alterem, por qualquer modo, as obrigações assumidas por quem as predisponha, como sucede pelo artigo 21º nº 1 al. a) nas relações entre empresários e consumidores finais, este mesmo preceito deve ser aplicado por analogia, determinado ex-vi do artigo 12º a nulidade das cláusulas.
Além disto, as mesmas cláusulas devem considerar-se excluídas por violação do dever de informação, nos termos dos artigos 6º e 8º al. a) do RCCG – artigos 146º e 147º da petição inicial, fls. 40 dos autos.
Nas alegações de recurso e sobre a aplicação ilegal do factor de correcção, vem indicado como primeiro motivo a não aceitação, e portanto a não previsão do artigo 4º do mesmo regime, citando ainda as Recorrentes em seu apoio o Acórdão do STJ proferido no processo n.º 1582/07.1TBAMT-B.P1.S1, em 24.03.2011, e caso se entendesse que tinha havido aceitação tácita, então ainda assim se mostravam violados os deveres de comunicação e de informação, previstos nos artigos 5º e 6º do mesmo regime, e excluídas pois as referidas cláusulas por aplicação do artigo 8º alíneas a) e b).
Não há propriamente diferenças de monta entre o alegado na primeira instância e na segunda, e em todo o caso, os factos pertinentes foram oferecidos logo em primeira instância.
Retomando o que vínhamos dizendo quase a final da questão anterior, devemos lembrar-nos que está provado (nº 6) que foi proposto – e aceite – que, desde 1992, “as condições contratuais que haviam sido inicialmente estipuladas por meio de acordos individualmente celebrados com cada grossista passassem a integrar as designadas “Condições Gerais”, aplicáveis a todos”. Sendo facto que dessa data em diante não foram mais celebrados contratos individuais, designadamente com nenhuma das AA e dos AA, a perspectiva mais correcta não é a de considerar que os contratos antigos, das AA e AA que os houvessem celebrado antes de 1992, tenham subsistido com o seu conteúdo integrado depois dessa data pelas cláusulas constantes das Condições Gerais em cada momento e sucessivamente predispostas pelas RR., mas sim a de que, a partir de 1992, passou a ser usado, para a regência das alterações da relação contratual, o mecanismo da adesão – isto para os AA e AA que já então eram clientes da T…. Para os que se tornaram clientes depois, o que temos é um contrato de concessão comercial celebrado por adesão, cujas alterações posteriores são processadas também por adesão.
Em todo o caso e em virtude do processo de selecção e da expressa decisão das RR. ao final dele, e de resto por via da aplicação específica de condições relacionadas com a localização geográfica das AA, designadamente descontos por escalões e quantidades mínimas definidas distritalmente, a forma de celebração não deixa de levar à celebração de contratos distintos para cada AA. e AA., isto é, contratos singulares.
O artigo 406º nº 1 do Código Civil regia para o contrato tradicional, celebrado individualmente ou singularmente e continua a reger para todos os contratos, mesmo para os celebrados por adesão, embora, quanto a estes, como enquadramento de fundo, porquanto a virtude da regulamentação legal das cláusulas contratuais gerais foi precisamente a de indicar mais finamente os critérios fundamentais que nunca poderão deixar de ser observados.
O preâmbulo do DL nº 446/85 de 25.10 (1ª versão, a que se seguiram as resultantes do DL n.º 220/95, de 31.08, da Rect. n.º 114-B/95, de 31.08, do DL n.º 249/99, de 07.07 e a actual versão do DL n.º 323/2001, de 17.12 – e esta portanto anterior à emissão das Condições Gerais de 2002, primeiras relativamente às quais as AA. e AA pedem condenação) que estabeleceu o Regime Jurídico das Cláusulas Contratuais Gerais é mais sintético e expressivo. Nele lê-se:
“1. Constitui a liberdade contratual um dos princípios básicos do direito privado. Na sua plena acepção, ela postula negociações preliminares íntegras, ao fim das quais as partes, tendo ponderado os respectivos interesses e os diversos meios de os prosseguir, assumem, com discernimento e liberdade, determinadas estipulações.
A essa luz, uma boa medida do direito dos contratos possui natureza supletiva: as normas legais apenas se aplicam quando os intervenientes, no exercício legítimo da sua autonomia privada, as não tenham afastado. Por expressivo, recorde-se que o artigo 405.º, n.º 1, do Código Civil reconhece às partes a faculdade de fixar livremente o conteúdo dos contratos, celebrar contratos diferentes dos previstos na lei ou incluir nestes as cláusulas que lhes aprouver.
2. Dentro da visão clássica da autonomia contratual, os grandes obstáculos à sua efectivação residiam na ausência concreta de discernimento ou de liberdade, a respeito da celebração, ou, ainda, na presença de divergências entre a vontade real e a vontade declarada. Encararam-se tais aspectos com recurso aos institutos do erro, do dolo, da falta de consciência da declaração, da coacção, da incapacidade acidental, da simulação, da reserva mental ou da não seriedade da declaração.
Uma experiência jurídica antiga também demonstrou que certas cláusulas, quando inseridas em contratos, se tornavam nocivas ou injustas. Deste modo, apareceram proibições relativas, entre outros, aos negócios usurários, aos pactos leoninos, aos pactos comissórios e, em termos mais genéricos, aos actos contrários à lei, à ordem pública ou aos bons costumes.
Assim acautelada, a liberdade contratual assumiu uma importância marcante, com dimensões jurídicas, económicas, sociais e culturais. Importância que se conserva nos nossos dias.
3. As sociedades técnicas e industrializadas da actualidade introduziram, contudo, alterações de vulto nos parâmetros tradicionais da liberdade contratual. A negociação privada, assente no postulado da igualdade formal das partes, não corresponde muitas vezes, ou mesmo via de regra, ao concreto da vida. Para além do seu nível atomístico, a contratação reveste-se de vectores colectivos que o direito deve tomar em conta. O comércio jurídico massificou-se: continuamente, as pessoas celebram contratos não precedidos de qualquer fase negociatória. A prática jurídico-económica racionalizou-se e especializou-se: as grandes empresas uniformizam os seus contratos, de modo a acelerar as operações necessárias à colocação dos produtos e a planificar, nos diferentes aspectos, as vantagens e as adscrições que lhes advêm do tráfico jurídico.
O fenómeno das cláusulas contratuais gerais fez, em suma, a sua aparição, estendendo-se aos domínios mais diversos. São elaborados, com graus de minúcia variáveis, modelos negociais a que pessoas indeterminadas se limitam a aderir, sem possibilidade de discussão ou de introdução de modificações. Daí que a liberdade contratual se cinja, de facto, ao dilema da aceitação ou rejeição desses esquemas predispostos unilateralmente por entidades sem autoridade pública, mas que desempenham na vida dos particulares um papel do maior relevo.
4. As cláusulas contratuais gerais surgem como um instituto à sombra da liberdade contratual. Numa perspectiva jurídica, ninguém é obrigado a aderir a esquemas negociais de antemão fixados para uma série indefinida de relações concretas. E, fazendo-o, exerce uma autonomia que o direito reconhece e tutela.
A realidade pode, todavia, ser diversa. Motivos de celeridade e de precisão, a existência de monopólios, oligopólios, e outras formas de concertação entre as empresas, aliados à mera impossibilidade, por parte dos destinatários, de um conhecimento rigoroso de todas as implicações dos textos a que adiram, ou as hipóteses alternativas que tal adesão comporte, tornam viáveis situações abusivas e inconvenientes. O problema da correcção das cláusulas contratuais gerais adquiriu, pois, uma flagrante premência. Convirá, no entanto, reconduzi-lo às suas autênticas dimensões.
5. Apresentam-se as cláusulas contratuais gerais como algo de necessário, que resulta das características e amplitude das sociedades modernas. Em última análise, as padronizações negociais favorecem o dinamismo do tráfico jurídico, conduzindo a uma racionalização ou normalização e a uma eficácia benéficas aos próprios consumidores. Mas não deve esquecer-se que o predisponente pode derivar do sistema certas vantagens que signifiquem restrições, despesas ou encargos menos razoáveis ou iníquos para os particulares.
Ora, nesse quadro, as garantias clássicas da liberdade contratual mostram-se actuantes apenas em casos extremos: o postulado da igualdade formal dos contratantes não raro dificulta, ou até impede, uma verdadeira ponderação judicial do conteúdo do contrato, em ordem a restabelecer, sendo caso disso, a sua justiça e a sua idoneidade. A prática revela que a transposição da igualdade formal para a material unicamente se realiza quando se forneçam ao julgador referências exactas, que ele possa concretizar.
6. O Código Civil vigente consagra em múltiplas disposições o princípio da boa-fé. Deu-se um passo decisivo no sentido de estimular ou habilitar os tribunais a intervenções relativas ao conteúdo dos contratos, com vista à salvaguarda dos interesses da parte negocialmente mais fraca. Através da boa-fé, o intérprete dispõe de legitimidade para a efectivação de coordenadas fundamentais do direito. O apelo ao conceito de ordem pública é um outro alicerce.
Sabe-se, contudo, que o problema das cláusulas contratuais gerais oferece aspectos peculiares. De tal maneira que sem normas expressas dificilmente se consegue uma sua fiscalização judicial eficaz. Logo, a criação de instrumentos legislativos apropriados à matéria reconduz-se à observância dos imperativos constitucionais de combate aos abusos do poder económico e de defesa do consumidor. Acresce a recomendação que, vai para nove anos, o Conselho da Europa fez, nesse sentido, aos Estados Membros.
7. Na elaboração deste diploma atendeu-se aos precedentes estrangeiros, que se multiplicam, assim como aos ensinamentos colhidos da aplicação e da crítica de tais experiências. Também se ponderaram as directrizes dimanadas do Conselho da Europa. Mas houve a preocupação de evitar um reformismo abstracto, quer dizer, que desconhecesse as facetas da realidade portuguesa.
É certo que o problema não tem, entre nós, tradições assinaláveis. Apenas se detectam alguns raros preceitos, mais ou menos vagos e dispersos, mormente voltados para uma fiscalização prévia de índole administrativa. Os arestos dos tribunais, quanto se apurou, são escassos e pouco expressivos. A prática dos contratos nada revela de específico.
Entretanto, a nossa doutrina mais recente põe em destaque inequívoco a acuidade do tema. Aí se encontrou estímulo para um articulado desenvolto, inclusive, abrangendo situações que ultrapassam os meros consumidores ou utentes finais de bens e serviços. Encarou-se a questão das cláusulas contratuais gerais com abertura. À jurisprudência e à dogmática jurídica pertence extrair todas as virtualidades dos dispositivos legais agora sancionados. Aquelas não ficam, de resto, como se impõe, encerradas num sistema rígido que tolha a consideração de novas situações e valorações de interesses, resultantes da natural evolução da vida. (…)”.
Portanto, o sistema tradicional assegurava ao princípio da liberdade negocial formal os remédios práticos fornecidos pelos “institutos do erro, do dolo, da falta de consciência da declaração, da coacção, da incapacidade acidental, da simulação, da reserva mental ou da não seriedade da declaração” e pelas “proibições relativas, entre outros, aos negócios usurários, aos pactos leoninos, aos pactos comissórios e, em termos mais genéricos, aos actos contrários à lei, à ordem pública ou aos bons costumes”. O reconhecimento da evolução ocorrida nas “sociedades técnicas e industrializadas da actualidade”, a saber a massificação do comércio jurídico, com celebração de contratos “não precedidos de qualquer fase negociatória” nem poder de alteração ou negocial, em contraponto à racionalização e especialização da “prática jurídico-económica”, na qual “as grandes empresas uniformizam os seus contratos, de modo a acelerar as operações necessárias à colocação dos produtos e a planificar, nos diferentes aspectos, as vantagens e as adscrições que lhes advêm do tráfico jurídico”, reconhecimento que não é em si censurado pois “as padronizações negociais favorecem o dinamismo do tráfico jurídico, conduzindo a uma racionalização ou normalização e a uma eficácia benéficas aos próprios consumidores”, apenas é acompanhado da preocupação de que “a liberdade contratual se cinja, de facto, ao dilema da aceitação ou rejeição desses esquemas predispostos unilateralmente por entidades sem autoridade pública, mas que desempenham na vida dos particulares um papel do maior relevo”, desde logo porque se apresentam como “monopólios, oligopólios, e outras formas de concertação entre as empresas”, sendo que a complexidade e minúcia das cláusulas pode impedir os destinatários de compreender o seu verdadeiro alcance e a totalidade das suas implicações.
Em suma, perante este fenómeno massificado, pode estar em causa a liberdade contratual, reconhecendo-se a duplicidade da sua consagração formal – ninguém é obrigado a contratar, e se contrata aderindo a um esquema pré-definido, a sua adesão tem um significado jurídico preciso, que é o de ter sido exercida a sua autonomia negocial – e da sua realidade material – o fenómeno da adesão a texto complexo pré-elaborado por entidades poderosas e sem possibilidade de discussão pode viabilizar “situações abusivas e inconvenientes”, como vantagens para o predisponente “que signifiquem restrições, despesas ou encargos menos razoáveis ou iníquos para os particulares”.
A intenção foi pois a de prevenir que “o postulado da igualdade formal dos contratantes não raro dificulta, ou até impede, uma verdadeira ponderação judicial do conteúdo do contrato, em ordem a restabelecer, sendo caso disso, a sua justiça e a sua idoneidade” e a de fornecer ao julgador “referências exactas” habilitando-o a “intervenções relativas ao conteúdo dos contratos, com vista à salvaguarda dos interesses da parte negocialmente mais fraca. Através da boa-fé, o intérprete dispõe de legitimidade para a efectivação de coordenadas fundamentais do direito. O apelo ao conceito de ordem pública é um outro alicerce”.
Na verdade, o fornecimento de densificações da boa-fé, assegurando que num esquema de contratação complexa e massificada ainda assim prevaleça uma verdadeira liberdade negocial, que só existe perante vontades livres e esclarecidas, e onde o mínimo ético de equilíbrio entre as partes se mantenha. Densificações, em forma de norma expressa, para uma eficaz fiscalização judicial, criando “instrumentos legislativos apropriados” para a “observância dos imperativos constitucionais de combate aos abusos do poder económico e de defesa do consumidor”. “À jurisprudência e à dogmática jurídica pertence extrair todas as virtualidades dos dispositivos legais agora sancionados. Aquelas não ficam, de resto, como se impõe, encerradas num sistema rígido que tolha a consideração de novas situações e valorações de interesses, resultantes da natural evolução da vida”.
Note-se que se a lógica básica do diploma visa o consumidor final, naturalmente considerado como a parte mais fraca, em tudo, isto é, em termos económicos e da capacidade de esclarecimento face a documentos altamente complexos e tecnicamente preparados, a mesma lógica continua a aplicar-se, pelo simples facto da pré-elaboração para adesão sem capacidade de alteração de conteúdo, também nas relações entre empresários, devendo ali pensar-se nos casos evidentes de termos, dum lado, “monopólios, oligopólios” e outras formas empresarias concentradas, e do outro, vamos simplificar, pequenas e médias empresas, o que calça perfeitamente ao caso dos autos, quando em 1997 nos aparece o reforço da posição dominante da T… com a quota de mercado da P…, a chegar quase ao domínio total do mercado (e em qualquer caso e dali para a frente, com as quotas de mercado provadas no facto 215, e do lado das Autoras e Autores conseguimos alcançar, por via da manifestação do objectivo da T… de reduzir o número de grossistas (facto provado 284) que a sua estrutura não era nem grande nem profissional.
Dispõe então o artigo 1º do referido diploma que “1 - As cláusulas contratuais gerais elaboradas sem prévia negociação individual, que proponentes ou destinatários indeterminados se limitem, respectivamente, a subscrever ou aceitar, regem-se pelo presente diploma. 2 - O presente diploma aplica-se igualmente às cláusulas inseridas em contratos individualizados, mas cujo conteúdo previamente elaborado o destinatário não pode influenciar. 3 - O ónus da prova de que uma cláusula contratual resultou de negociação prévia entre as partes recai sobre quem pretenda prevalecer-se do seu conteúdo”.
Sob o Capítulo II intitulado “Inclusão de cláusulas contratuais gerais em contratos singulares”, dispõe à cabeça o artigo 4º do Regime estatuindo que “As cláusulas contratuais gerais inseridas em propostas de contratos singulares incluem-se nos mesmos, para todos os efeitos, pela aceitação, com observância do disposto neste capítulo”. Ora, neste capítulo vemos que (artigo 5º) “1 - As cláusulas contratuais gerais devem ser comunicadas na íntegra aos aderentes que se limitem a subscrevê-las ou a aceitá-las. 2 - A comunicação deve ser realizada de modo adequado e com a antecedência necessária para que, tendo em conta a importância do contrato e a extensão e complexidade das cláusulas, se torne possível o seu conhecimento completo e efectivo por quem use de comum diligência”. Muito relevantemente, “3 - O ónus da prova da comunicação adequada e efectiva cabe ao contratante que submeta a outrem as cláusulas contratuais gerais”.
Este dever de informação é completado nos termos do artigo 6º: “1 - O contratante que recorra a cláusulas contratuais gerais deve informar, de acordo com as circunstâncias, a outra parte dos aspectos nelas compreendidos cuja aclaração se justifique.
2 - Devem ainda ser prestados todos os esclarecimentos razoáveis solicitados”.
O dever é reforçado pela consequência da sua inobservância (artigo 8º) “Consideram-se excluídas dos contratos singulares: a) As cláusulas que não tenham sido comunicadas nos termos do artigo 5.º; (…)”. O resultado é então que (artigo 9º) “1 - Nos casos previstos no artigo anterior os contratos singulares mantêm-se, vigorando na parte afectada as normas supletivas aplicáveis, com recurso, se necessário, às regras de integração dos negócios jurídicos. 2 - Os referidos contratos são, todavia, nulos quando, não obstante a utilização dos elementos indicados no número anterior, ocorra uma indeterminação insuprível de aspectos essenciais ou um desequilíbrio nas prestações gravemente atentatório da boa fé”.
Densificando os critérios, como acima vimos, o Regime institui a proibição, absoluta ou relativa, de diversas cláusulas contratuais gerais, determinando, nos termos do artigo 12º, a sua nulidade. Em função dela, voltamos a ver repetida (artigo 13º) uma parte do já estabelecido no artigo 9º, ou seja, a manutenção dos contratos, neste caso por opção do aderente, na parte não afectada, recorrendo-se às normas supletivas para a parte afectada. Se a opção não for exercida ou sendo-o, conduzir “conduzir a um desequilíbrio de prestações gravemente atentatório da boa fé, vigora o regime da redução dos negócios jurídicos”.
No Capítulo V, “Cláusulas contratuais gerais proibidas”, começamos pela Secção I onde se estabelece:
(Disposições comuns por natureza)
Artigo 15º - “São proibidas as cláusulas contratuais gerais contrárias à boa fé”.
Artigo 16º - “Na aplicação da norma anterior devem ponderar-se os valores fundamentais do direito, relevantes em face da situação considerada, e, especialmente:
a) A confiança suscitada, nas partes, pelo sentido global das cláusulas contratuais em causa, pelo processo de formação do contrato singular celebrado, pelo teor deste e ainda por quaisquer outros elementos atendíveis;
b) O objectivo que as partes visam atingir negocialmente, procurando-se a sua efectivação à luz do tipo de contrato utilizado”.
Sob a Secção II expressamente intitulada “Relações entre empresários ou entidades equiparadas”, dispõe-se quanto a estas a aplicabilidade das proibições desta secção e da secção anterior (artigo 17º) e elencam-se as cláusulas absoluta e relativamente proibidas, do seguinte modo:
Artigo 18º: “São em absoluto proibidas, designadamente, as cláusulas contratuais gerais que:
a) Excluam ou limitem, de modo directo ou indirecto, a responsabilidade por danos causados à vida, à integridade moral ou física ou à saúde das pessoas;
b) Excluam ou limitem, de modo directo ou indirecto, a responsabilidade por danos patrimoniais extracontratuais, causados na esfera da contraparte ou de terceiros;
c) Excluam ou limitem, de modo directo ou indirecto, a responsabilidade por não cumprimento definitivo, mora ou cumprimento defeituoso, em caso de dolo ou de culpa grave;
d) Excluam ou limitem, de modo directo ou indirecto, a responsabilidade por actos de representantes ou auxiliares, em caso de dolo ou de culpa grave;
e) Confiram, de modo directo ou indirecto, a quem as predisponha, a faculdade exclusiva de interpretar qualquer cláusula do contrato;
f) Excluam a excepção de não cumprimento do contrato ou a resolução por incumprimento;
g) Excluam ou limitem o direito de retenção;
h) Excluam a faculdade de compensação, quando admitida na lei;
i) Limitem, a qualquer título, a faculdade de consignação em depósito, nos casos e condições legalmente previstos;
j) Estabeleçam obrigações duradouras perpétuas ou cujo tempo de vigência dependa apenas da vontade de quem as predisponha;
l) Consagrem, a favor de quem as predisponha, a possibilidade de cessão da posição contratual, de transmissão de dívidas ou de subcontratar, sem o acordo da contraparte, salvo se a identidade do terceiro constar do contrato inicial”.
Artigo 19º: “São proibidas, consoante o quadro negocial padronizado, designadamente, as cláusulas contratuais gerais que:
a) Estabeleçam, a favor de quem as predisponha, prazos excessivos para a aceitação ou rejeição de propostas;
b) Estabeleçam, a favor de quem as predisponha, prazos excessivos para o cumprimento, sem mora, das obrigações assumidas;
c) Consagrem cláusulas penais desproporcionadas aos danos a ressarcir;
d) Imponham ficções de recepção, de aceitação ou de outras manifestações de vontade com base em factos para tal insuficientes;
e) Façam depender a garantia das qualidades da coisa cedida ou dos serviços prestados, injustificadamente, do não recurso a terceiros;
f) Coloquem na disponibilidade de uma das partes a possibilidade de denúncia, imediata ou com pré-aviso insuficiente, sem compensação adequada, do contrato, quando este tenha exigido à contraparte investimentos ou outros dispêndios consideráveis;
g) Estabeleçam um foro competente que envolva graves inconvenientes para uma das partes, sem que os interesses da outra o justifiquem;
h) Consagrem, a favor de quem as predisponha, a faculdade de modificar as prestações, sem compensação correspondente às alterações de valor verificadas;
i) Limitem, sem justificação, a faculdade de interpelar”.
Finalmente, e ainda com algum relevo para os autos, em virtude da alegação de recurso, dispõe-se na Secção III sobre as relações com os consumidores finais, além da aplicabilidade das proibições das secções anteriores e em específico, como cláusulas absolutamente proibidas e relativamente proibidas:
Artigo 21º: “São em absoluto proibidas, designadamente, as cláusulas contratuais gerais que:
a) Limitem ou de qualquer modo alterem obrigações assumidas, na contratação, directamente por quem as predisponha ou pelo seu representante;
b) Confiram, de modo directo ou indirecto, a quem as predisponha, a faculdade exclusiva de verificar e estabelecer a qualidade das coisas ou serviços fornecidos;
c) Permitam a não correspondência entre as prestações a efectuar e as indicações, especificações ou amostras feitas ou exibidas na contratação;
d) Excluam os deveres que recaem sobre o predisponente, em resultado de vícios da prestação, ou estabeleçam, nesse âmbito, reparações ou indemnizações pecuniárias predeterminadas;
e) Atestem conhecimentos das partes relativos ao contrato, quer em aspectos jurídicos, quer em questões materiais;
f) Alterem as regras respeitantes à distribuição do risco;
g) Modifiquem os critérios de repartição do ónus da prova ou restrinjam a utilização de meios probatórios legalmente admitidos;
h) Excluam ou limitem de antemão a possibilidade de requerer tutela judicial para situações litigiosas que surjam entre os contratantes ou prevejam modalidades de arbitragem que não assegurem as garantias de procedimento estabelecidas na lei.
Artigo 22º: “1 - São proibidas, consoante o quadro negocial padronizado, designadamente, as cláusulas contratuais gerais que:
a) Prevejam prazos excessivos para a vigência do contrato ou para a sua denúncia;
b) Permitam, a quem as predisponha, denunciar livremente o contrato, sem pré-aviso adequado, ou resolvê-lo sem motivo justificativo, fundado na lei ou em convenção;
c) Atribuam a quem as predisponha o direito de alterar unilateralmente os termos do contrato, excepto se existir razão atendível que as partes tenham convencionado;
d) Estipulem a fixação do preço de bens na data da entrega, sem que se dê à contraparte o direito de resolver o contrato, se o preço final for excessivamente elevado em relação ao valor subjacente às negociações;
e) Permitam elevações de preços, em contratos de prestações sucessivas, dentro de prazos manifestamente curtos, ou, para além desse limite, elevações exageradas, sem prejuízo do que dispõe o artigo 437.º do Código Civil;
f) Impeçam a denúncia imediata do contrato quando as elevações dos preços a justifiquem;
g) Afastem, injustificadamente, as regras relativas ao cumprimento defeituoso ou aos prazos para o exercício de direitos emergentes dos vícios da prestação;
h) Imponham a renovação automática de contratos através do silêncio da contraparte, sempre que a data limite fixada para a manifestação de vontade contrária a essa renovação se encontre excessivamente distante do termo do contrato;
i) Confiram a uma das partes o direito de pôr termo a um contrato de duração indeterminada, sem pré-aviso razoável, excepto nos casos em que estejam presentes razões sérias capazes de justificar semelhante atitude;
j) Impeçam, injustificadamente, reparações ou fornecimentos por terceiros;
l) Imponham antecipações de cumprimento exageradas;
m) Estabeleçam garantias demasiado elevadas ou excessivamente onerosas em face do valor a assegurar;
n) Fixem locais, horários ou modos de cumprimento despropositados ou inconvenientes;
o) Exijam, para a prática de actos na vigência do contrato, formalidades que a lei não prevê ou vinculem as partes a comportamentos supérfluos, para o exercício dos seus direitos contratuais.
2 - O disposto na alínea c) do número anterior não determina a proibição de cláusulas contratuais gerais que:
a) Concedam ao fornecedor de serviços financeiros o direito de alterar a taxa de juro ou o montante de quaisquer outros encargos aplicáveis, desde que correspondam a variações do mercado e sejam comunicadas de imediato, por escrito, à contraparte, podendo esta resolver o contrato com fundamento na mencionada alteração;
b) Atribuam a quem as predisponha o direito de alterar unilateralmente o conteúdo de um contrato de duração indeterminada, contanto que se preveja o dever de informar a contraparte com pré-aviso razoável e se lhe dê a faculdade de resolver o contrato.
3 - As proibições constantes das alíneas c) e d) do n.º 1 não se aplicam:
a) Às transacções referentes a valores mobiliários ou a produtos e serviços cujo preço dependa da flutuação de taxas formadas no mercado financeiro;
b) Aos contratos de compra e venda de divisas, de cheques de viagem ou de vales postais internacionais expressos em divisas.
4 - As alíneas c) e d) do n.º 1 não implicam a proibição das cláusulas de indexação, quando o seu emprego se mostre compatível com o tipo contratual onde se encontram inseridas e o mecanismo de variação do preço esteja explicitamente descrito”.
Resulta do artigo 4º do Regime, acima transcrito, que a regra é a da aceitação, que para que esta se dê livre e esclarecidamente se devem cumprir os deveres de informação, e em todo o caso, as previsões de nulidade para as cláusulas genericamente reconduzíveis à violação da boa fé e para as cláusulas concretamente nominadas nas diversas proibições absolutas e relativas, são aplicáveis no caso de terem sido aceites ou estar em discussão a sua aceitabilidade – (acções inibitórias). Não resulta de todo do diploma que no caso de oposição expressa à introdução/alteração de uma cláusula num contrato de adesão devamos prosseguir para perceber a integração dessa cláusula numa das categorias de proibição, para fazer um juízo de legalidade, como se ao tribunal fosse dado o poder de suprimento da vontade negocial do contratante – quando isso não lhe foi pedido – obrigando-o a contratar simplesmente porque a cláusula que recusa é lícita. Esse resultado seria manifestamente atentatório da liberdade negocial. Lícita a realidade a negociar, a autonomia da vontade que é decorrência da própria dignidade da pessoa humana, autoriza ao seu titular que se recuse a contratar, qualquer que seja a razão que o determina a tanto, ou mesmo a total falta de razão, o mero capricho.
Neste sentido, lê-se no citado pelas recorrentes Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, proc. n.º 1582/07.1TBAMT-B.P1.S1, de 24.03.2011 e além do sumário, que “Porém, a limitação, jurídica ou meramente de facto, da liberdade do aderente não constitui óbice ao triunfo da tese contratual, pois não é a liberdade de estipulação que caracteriza o negócio jurídico e portanto o contrato, mas a autonomia de vontade, ou seja, a faculdade de regular por si os próprios interesses, ainda que dentro de esquemas legais preestabelecidos (7)”. (sendo a nota de rodapé referência a Inocêncio Galvão Telles, Manual dos Contratos em Geral, página 313).
É por isto que, para efeitos do factor de correcção e do preço fixo por caixa, expressamente recusados pelas AA e AA, a questão não se põe em termos da legalidade dessas cláusulas contratuais gerais nem da aplicação do regime jurídico destas, mas sim em termos da recusa de contratar/alterar. O artigo 8º e 9º do RJCCG não se aplica a uma cláusula à partida não aceite. Eles previnem aliás as consequências em caso de uma cláusula que, nos termos do artigo 4º, foi aceite, mas sem observância do disposto no capitulo II do Regime – cfr. parte final do artigo 4º.
Por esta razão, a questão não é a da ilegalidade face ao RJCCG e consequente nulidade das cláusulas que introduziram tais factor e preço, mas se situa num plano anterior, conjugado do artigo 405º com o artigo 406º do Código Civil, e do apuramento do seu desvalor jurídico.
Posto que essas cláusulas foram introduzidas na pendência da relação contratual e posto que, apesar de recusadas, as mesmas cláusulas foram aplicadas, o desvalor jurídico é analisável apenas no plano do incumprimento do contrato.
Disto têm as Recorrentes noção, porquanto a apreciação recursiva das cláusulas sobre o factor de correcção e o preço fixo por caixa à luz do Regime Jurídico das Cláusulas Contratuais Gerais apresentam como subsidiárias da sua apreciação à luz do artigo 406º, ou melhor, vêm como subsidiárias para a hipótese de não se entender que entre AA e RR se tinha celebrado um contrato de concessão comercial, mas apenas compras e vendas sucessivas.
Paramos por aqui, considerando prejudicada a apreciação do factor de correcção à luz das normas do RJCCG, tal como as Recorrentes invocam.
Em todo o caso, para a hipótese de não estarmos a pensar correctamente, e quanto a esta linha argumentativa na parte em que se refere ao incumprimento dos deveres de informação, sempre se dirá:
- Partindo do princípio já afirmado que o essencial da recusa foi o factor de correcção na parte em que determinou uma redução das percentagens de desconto tradicionalmente auferidas pelas AA, que acabou a cristalizar-se no preço fixo por caixa, e quanto à violação do dever de informação, que, mesmo a considerar que o factor de correcção foi apresentado, com antecedência e com esclarecimento, a destinatários capazes de o entender – o que manifestamente não era o caso, quando, quanto à fórmula apresentada, os próprios peritos asseguram que era complexa – a verdade é que ficou provado que “239 - O Factor de Correcção foi apresentado às AA. como uma necessidade de anular o efeito que o aumento do PVP - exclusivamente decorrente de aumento de impostos - tinha na margem dos distribuidores” mas “274 - A redução das margens dos AA. operada pelo factor de correção incidiu não só sobre a parcela do PVP que aumentou por força de aumento dos impostos, como também na parcela remanescente(…)”, ou seja, a apresentação e esclarecimentos não cumpriram o desiderato essencial do dever de informação, que é permitir o esclarecimento necessário a uma formação da vontade negocial, pois omitiram que o factor de correcção também incidia sobre a parte de aumento não resultante de aumento de impostos, levando à consequência do abaixamento da margem dos grossistas para além da simples amputação do aumento correspondente ao aumento de impostos no PVP. A prestação de informação, senão falsa, pelo menos incompleta, parcialmente falsa portanto, não pode então afirmar-se como um correcto cumprimento do dever de informação.
Não pode extrapolar-se do facto das AA e AA terem recusado o factor de correcção que tivessem um perfeito conhecimento das suas implicações, isto é, que se apresentassem como destinatários qualificados que de imediato e perante a introdução do factor de correcção e a sua fórmula, tivessem logrado alcançar toda a verdade. Diversa é uma suspeita forte que leva à recusa, dum conhecimento pleno, completo e esclarecido sobre uma fórmula manifestamente complexa.
Em suma, a considerar-se que as cláusulas que introduziram e mantiveram o factor de correcção e o preço fixo por caixa tinham sido aceites, dir-se-ia então que teriam de considerar-se excluídas do contrato por força do incumprimento do dever de informação, nos termos do artigo 8º do RJCCG o que conduziria à aplicação do regime previsto no artigo 9º do mesmo Regime. D - Quarta linha argumentativa: - “d) São (i)lícitas, à luz do princípio geral da boa-fé e do RJCCG, nomeadamente do disposto na alínea h) do artigo 19.º, e da alínea c), do artigo 22.º, as cláusulas das CGF que conferem às RR. a faculdade de alterar todos os seus termos unilateralmente, em qualquer momento e sem qualquer limitação – cf. Ponto IV.C. d)”
Repare-se então agora que parte desta linha se apresenta como subsidiária, ou como enquadramento de fundo, relativamente ao factor de correcção/preço fixo por caixa – é porque não pode admitir-se uma cláusula, a partir de 2002, que dá à T… o poder de alterar o que quiser, no todo ou em parte, a todo o tempo, que também a introdução do factor de correcção/preço fixo é arrastada pela proibição – e se apresenta de apreciação autónoma relativamente às próprias cláusulas que conferem às RR. o poder de alteração a todo o tempo e no todo ou em parte, quer em si, quer nas suas decorrências para as cláusulas de introdução dos descontos variáveis e do meio único de pagamento.
Sustentam as Recorrentes que as cláusulas insertas nas Condições Gerais (7ª de 2001 e 2002, 8ª de 2005, 2006 e 2008, e 16.2 de 2009 e 2010), que possibilitam a alteração unilateral pela T…, total ou parcial, do conteúdo das Condições Gerais, são nulas por violação do artigo 19º alínea h) do RJCCG e (mesmo que assim não se entenda) do princípio geral da boa-fé. Trata-se duma relação entre empresários, ao abrigo do artigo 17º do mesmo Regime e duma proibição relativa, a ser apreciada à luz do quadro negocial padronizado. As cláusulas relacionadas com o preço não podem ser deixadas ao puro arbítrio do predisponente. Neste sentido, apoiam-se as Recorrentes em Inocêncio Galvão Telles (Revista dos Tribunais, Ano 71º, 1953, p. 140) quando escreve que “(…) tem de se excluir o arbítrio tanto do devedor como do credor, e não pode confiar-se a nenhum deles a necessária determinação, pois isso seria deixar na mão de uma das partes a medida da retribuição contratual. A justiça do contrato, o equilíbrio económico das prestações não pode ser obra unilateral de um dos contraentes, deve resultar do concurso de ambos”. Também apelam a Manuel de Andrade, na mesma revista e número, p. 131, quando refere que o preço “não seja relegado ao mero capricho de uma das partes”. No mesmo sentido, o Ac. STJ de 27.9.2009 onde se refere “Afigura-se ainda que o princípio essencial da autonomia privada exige que a liberdade reconhecida às partes de livre estipulação não se projecte num clausulado em que avulta um proveito tão excessivo de uma das partes face à outra que revele um exercício abusivo da própria liberdade contratual”. Finalmente, invocam ainda as Recorrentes o Parecer do Prof. Pinto Monteiro, constante dos autos, em que é mencionado que “tratando-se de relações entre empresários (…), a proibição das cláusulas que atribuem o direito de alterar unilateralmente os termos do contrato não resulta directamente do artigo 22º, mas, antes, do artº 15º, se e na medida (…) em que devam considerar-se proibidas pelo princípio da boa fé (artº 15º), tendo em conta (…) o carácter irrestrito, sem critérios e sem limites, com que tal possibilidade de alteração unilateral é conferida à” T…. A nulidade da cláusula encontra-se estatuída pelo artigo 12º do RJCCG.
Já para as Recorridas, nas conclusões RRRRRR a JJJJJJJ, e tirando já aqui a parte em que apreciam a questão à luz da tese dos contratos de compra e venda sucessivos, que lhes permitia pensá-la enquanto quadro negocial padronizado onde se aferia o seu direito a fixar, em cada momento, o preço pelo qual decidiam vender os seus produtos, e tirando também a parte onde insistem no conceito de margem dos grossistas e de livre fixação por estes dos preços a praticar ao retalho, tudo também já analisado, sobra uma menção aos descontos variáveis, em concreto “mas acrescente-se que os seus valores estavam em linha com o passado histórico, não tendo as Recorrentes demonstrado por que razão tais descontos levariam a esse desequilíbrio ou uma desproporção entre as prestações, como se exigiria”, ao que desde já se responde pelos factos provados relativos ao decréscimo do número de grossistas, aos não provados quanto à razão de distinção de assimetrias regionais nos volumes por distrito, e com a simples leitura das cláusulas que introduziram tais descontos, donde resulta que efectivamente sendo possível manter o patamar histórico do desconto fixo, as condicionantes variáveis introduziram impedimentos para que todos os clientes anteriores conseguissem alcançar esse patamar. Sobra ainda outra menção quanto à “obrigação de meio de pagamento único (que) foi introduzida nas CGF da T… por imposição do designado «Acordo CE», celebrado entre a P…, a Comissão Europeia e dez Estados-membros, incluindo Portugal, o qual vinculou a T…, na qualidade de filial da P…”, que convoca análise específica, a realizar adiante.
Tal como refere o Prof. Pinto Monteiro, a questão é “se e na medida”. É claro que podemos pedir a um tribunal e pode o tribunal ponderar da legalidade duma cláusula que permite a alteração total do contrato a todo o tempo por decisão unilateral duma das partes, em qualquer matéria. Este pedido e esta ponderação realizam-se, se favoráveis, de algum modo de forma inibitória. Como a fórmula é absolutamente total, mas vaga, a aferição da boa fé ou o juízo de boa fé a fazer apresenta-se necessariamente total e vago. Diverso é pedir e ponderar que cláusulas que introduziram alterações concretas ofendem ou não a boa fé.
É assim que em termos totais somos transportados ao plano dos princípios básicos da liberdade negocial e da autonomia da vontade e podemos dizer que uma cláusula de alteração unilateral total se resolve numa abdicação da própria liberdade negocial da parte que a aceita a favor da outra, digamos que não sendo sequer caso de a valorar à luz da boa-fé, mas de a rejeitar por pura e simples submissão de uma parte à outra, contrária à lei. A ordem jurídica não aceita expressamente, para o funcionamento dos seus pilares básicos, que alguém escravize outrem, pelo que não pode aceitar que alguém se declare escravo de outrem ou se comprometa à possibilidade de vir a ser declarado escravo de outrem. Estamos a usar um argumento limite por mera facilidade expositiva.
Assim, e em termos de boa-fé, quando nos situamos no plano total, já vamos ter de começar a concretizar. Das duas uma: ou o padrão do negócio é de tal modo que tudo aquilo que pode ser alterado é previsível, e então a aceitação prévia duma cláusula de alteração total a favor da outra parte ainda se situa nos limites da vontade esclarecida e livre – pensemos por exemplo numa remuneração fixada em função do número de alunos que em cada ano lectivo se inscrevam numa determinada escola, com uma ficção dum número mínimo anual para cálculo dessa remuneração – e duma agilização do tratamento da variabilidade de circunstâncias normais do negócio, ou o mesmo padrão de negócio convoca possibilidades de alteração de todo em todo não previsíveis, e em última análise patentemente inaceitáveis por destruição do equilíbrio negocial, por uma espécie de destituição de qualquer fundamento económico ou social para o comprometimento assumido.
Significa isto que perante uma cláusula de alteração unilateral livre e a todo tempo e parte, posto que aceite, afirmar a violação da boa fé exige no mínimo que a cláusula seja entendida no seio do contrato em que se insere.
Entra então aqui uma distinção entre cláusulas não essenciais e cláusulas essenciais. Agora repare-se: tudo, aparentemente tudo, nas Condições Gerais, pode ter uma implicação em termos de valor económico, por exemplo, prazos de pagamento a pronto, a prazo, modo de encomendar, propriedade ou arrendamento dos armazéns, devolução de produto avariado, e assim por diante. Isto porém não nos pode levar a pensar que qualquer destas situações tenha como implicação a alteração do equilíbrio económico entre as partes, ao menos dum modo intolerável.
Assim, quando procuramos definir o que sejam as cláusulas essenciais e não essenciais do contrato, isto é, aquelas em que assenta e não assenta tanto o equilíbrio das posições contratuais como a razão fundamental que levou a vontade a declarar-se, o pensamento tem de se centrar mais na correspondência de funcionalidades prestacionais. É essencial o que diz respeito ao fornecimento, mas não já se uma entrega semanal a mais deve implicar o pagamento do custo específico do transporte. É essencial o que diz respeito à compra para revenda, e concretamente o preço a que se compra, mas já não é essencial quando se paga ou como se paga.
Aliás, um bom crivo da razão fundamental de contratar encontra-se no facto de que esta cláusula genérica só veio a ser contestada como forma de atacar as cláusulas concretas decorrentes, na sua concretização. Não contestam as AA. a possibilidade de alterar livremente que se concretizou no aumento da periodicidade de entregas, ou na possibilidade de entrega à boca de armazém, sem transporte.
Em todo o caso, quer por ataque concreto às cláusulas que não se querem, quer por moldagem da cláusula abstracta a estas cláusulas indesejadas, o que está em causa é a possibilidade da livre alteração a todo o tempo incidir sobre a, vamos usar o termo mais lato, onerosidade.
Como é manifesto, ao convocarem capital e trabalho, ao investirem para o cumprimento da sua obrigação de compra para revenda, as AA e AA pretendem vê-los frutificar, e a medida dessa frutificação é essencial, isto é, não só estabelece um equilíbrio essencial entre as posições das partes (correspondente, já o dissemos, ao capital e trabalho investido por cada uma no negócio) como é fonte de permanente vontade de vinculação, ou seja, fundamento essencial da decisão de contratar. É verdade que isto vale para uma e outra parte: - a decisão de selecção dos grossistas pela T… também assenta na aceitação por estes do nível de “retribuição” fixado (com mais ou menos maleabilidade) pela T…. Fossem comunicadas Condições Gerais e nenhum grossista comparecesse a interessar-se pelo nível de retribuição delas decorrente, antes todos declarassem que só aceitariam realizar o negócio ganhando o triplo, e a T… procuraria outra forma de distribuir os seus produtos.
Portanto, assentemos que o preço, ou melhor dizendo, a retribuição das AA (a sua margem de rentabilidade do capital e trabalho investido em função do desconto máximo fixado pela T… relativamente ao PVP), é para elas um elemento essencial da sua decisão de contratar, tal como para as RR é essencial não conceder mais desconto do que o desconto fixo máximo em vigor até 2005. Para ambas será essencial mecanizar um modo de acomodação da evolução normal do mercado e desde logo atender ao aumento da inflação.
E se, para ambas as partes a matéria de retribuição e acomodação é essencial, na cristalização inicial se encontrando o equilíbrio concretamente aceite por ambas as partes e considerado por elas adequado, é já claro que é inconcebível que uma das partes possa ter o direito, ainda que de fonte contratual, de alterar quando e quanto de modo unilateral e livre. O risco é evidentemente o da possibilidade de uma das partes eliminar a contrapartida da outra, sem compensação.
De resto, isto acontece em matéria de contratos duradouros. Num exemplo, se o mercado dita o valor de renda dum imóvel num determinado sítio, se senhorio e arrendatário acordam na renda, que é clara remuneração para o senhorio e que cujo correlato gozo da casa também funciona como compensação para o arrendatário, seria inconcebível – e isto mesmo sem a intervenção legal que o direito à habitação determina e que conduz à fixação dos aumentos possíveis, suponhamos que ela não existia – uma cláusula no contrato de arrendamento segundo a qual o senhorio poderia, a todo o tempo, aumentar a renda no montante que quisesse. O fundamento económico e social da decisão de contratar do inquilino – pago por um apartamento médio porque é para isso que tenho dinheiro e é o que me basta – seria destituível – fiquei a pagar como se estivesse numa moradia grande duma zona luxuosa, sem que o senhorio me tenha sequer instalado uma pequena piscina na varanda.
E agora note-se, até em matéria de compensação: embarcámos todas (AA e RR) no mesmo negócio, firmámos uma expectativa de ganho recíproco, a partir das contribuições de cada uma, que constituiu o fundamento pelo qual decidimos embarcar, e, numa imagem, nas ondas maiores uma de nós passa por cima e as outras passam por baixo, e a que passa por cima diz às outras que não há problema nenhum porque mesmo assim sobreviveram. Quando as RR. referem que o aumento de PVP, do preço monetário unitário, permitiu às AA ganhar mais, estão a esconder que as AA embarcaram para passarem ao lado das RR por cima das ondas (aproveitando o negócio de cuja concretização são parte essencial), negando-lhes essa pretensão e fundamento da sua decisão de embarcar e colocando-as numa posição inferior em que sobrevivem, mas encharcadas. Quer isto dizer que, para o abaixamento retributivo resultante da introdução do factor de correcção, do preço fixo por caixa e mesmo dos descontos variáveis, não está demonstrada a existência de qualquer compensação.
Portanto, no que diz respeito à essência do elemento essencial que é a retribuição enquanto forma básica e primeiro passo necessário de operacionalização do (final) lucro quer das AA quer das RR, uma cláusula que permite a estas a todo o tempo alterá-la, sem uma mínima fundamentação sequer, tem, no quadro padronizado dum contrato de concessão comercial, de considerar-se subsumível à proibição relativa do artigo 19º alínea h) do RJCCG, do mesmo modo que é também genericamente subsumível a uma violação de boa-fé, para os efeitos e nos termos do artigo 15º do mesmo preceito, à luz do artigo 16º, notoriamente da sua alínea b), ambos do mesmo Regime.
Seria este o regime aplicável se as cláusulas que introduziram o factor de correcção e o preço fixo por caixa tivessem sido aceites. Neste caso apelaríamos de facto à conjugação da claúsula de alteração unilateral livre e irrestrita e às clausulas sobre o factor de correcção e o preço fixo, e diríamos que, tendo as AA. melhor pensado, poderiam vir invocar a sua nulidade nos termos acima referidos.
Como é claro, nunca poderíamos nem podemos então falar numa violação do pontual cumprimento dos contratos por banda das AA, quando não aceitam as cláusulas cobertas pela autorização irrestrita de alteração que consta da aceitação das Condições Gerais, porque o contrário seria a aceitação da nulidade, o que contrariaria o regime de arguição e mais do que ele a pretensão da ordem jurídica de que as cláusulas proibidas não produzam o seu efeito principal. Do mesmo modo, não conseguimos falar de abuso de direito na modalidade de “venire contra factum proprium”, porque as Rés nunca poderiam ter gerado a confiança de que as AA não invocariam a nulidade e mais do que ela, essa possibilidade extrema de anulação da vontade das AA. e de desconsideração de todo e qualquer interesse destas. De resto e nos termos do artigo 334º do Código Civil, o abuso de direito surge apenas em situações de manifesto excesso relativamente à boa-fé e ao fim social e económico do direito, sendo que essa característica “manifesto” de todo não se encontra presente. Repare-se que nem mesmo para o caso da questão da nulidade da cláusula de alteração unilateral irrestrita nunca ter sido levantada se excluiria utilidade económica e social coerente, determinada por um qualquer factor externo contemporâneo à arguição que justificasse então a necessidade de invocar a nulidade. E o mesmo vale para qualquer pretensão de um contínuo comportamental de silêncio, que a dado passo, seja por conduta da outra parte seja por factor externo às partes, se não possa manter.
Quando finalmente aplicamos esta solução, vemos porém que estamos limitados pelo pedido, e que o pedido foi a declaração de nulidade (além do mais) “das disposições que constaram da (…) Cláusula 7 das Condições Gerais de 2002, da Cláusula 8 § 1 das de 2005, da Cláusula 8 § 1 das de 2008, da Cláusula 10.1 das Condições Gerais de 2009 e 2010, (…)”, ou seja, apesar da referência exemplificativa à Cláusula 7ª de 2001 – parágrafo 614 do corpo da alegação de recurso (fls. 8716 verso) – e levada às conclusões do recurso sob a al. QQ, vemos que não podemos declarar a nulidade da Cláusula 7ª das Condições Gerais de 2001 nem da Cláusula 8ª das Condições Gerais de 2006 (porque não foi pedida inicialmente e só agora referida no recurso). Por outro lado, para as Cláusulas 16.2 das Condições Gerais de 2009 e 2010, o que sucede é o mesmo que para a Cláusula 8ª das Condições Gerais de 2006 – a previsão de alteração está subordinada à necessidade de cumprimento legal, ou seja, não é uma alteração livre, de puro arbítrio. E se nos concentrarmos na Cláusula 10.1 das mesmas Condições de 2009 e 2010 a que a primeira parte de 16.2 faz referência, esta diz uma coisa diferente: - é a possibilidade de alterar a todo o tempo, mediante comunicação, as Tabelas de Preço de Venda constantes de anexo a essas Condições Gerais, sendo pois que a questão da nulidade destas Cláusulas 10.1 se reconduz, como já analisado, à violação do princípio “pacta sunt servanda”, e por isso e em face do decidido acima, não tem aplicação. Devem assim considerar-se nulas, por força do artigo 12º do mesmo Regime, as cláusulas 7 das Condições Gerais de 2002, da Cláusula 8 § 1 das de 2005, da Cláusula 8 § 1 das de 2008, nulidade que se declara.
Agora repare-se: - para declararmos a nulidade decorrente nas cláusulas que, nas Condições Gerais de 2002, introduziram os descontos variáveis, precisaríamos de ter tido um pedido para a declaração de nulidade da cláusula 7ª das Condições Gerais anteriores (isto é, 2001). Repare-se ainda que não foi invocado quanto à cláusula que introduziu os descontos variáveis a violação do princípio “pacta sunt servanda” – e que, se tínhamos pedido inicial – “que se declare a nulidade das disposições que constaram da Cláusula 2.2.2 das Condições de 2002, 2005, 2006 e 2008, (…)” – no recurso a apreciação (e portanto o pedido) é limitada a “SS. Sendo nula a cláusula que confere à T… o poder de alterar unilateralmente as CGF, também o são as cláusulas introduzidas em concretização desse poder arbitrário, ou seja, as cláusulas respeitantes ao fator de correção, aos descontos variáveis (distribuição direta ativa, escalões de volume, carteira de produtos e informações) e ao meio de pagamento único”.
Deste modo, limitados pelo princípio dispositivo (cuja repercussão em instância de recurso se desdobra também no princípio da delimitação do objecto do recurso), vemos que a eventual nulidade das Cláusulas 2.2.2 relativas a descontos variáveis só poderá ser conseguida na apreciação da violação do Direito da Concorrência. Quanto ao pagamento por um único meio de pagamento:
Vejamos um pouco mais em pormenor:
Temos provado que: “47 - No dia 9 de julho de 2004, foi celebrado um acordo entre, por um lado, P… INC, PPM… INC, PMDF…INC e PMWT… SARL e, pelo outro, a Comunidade Europeia, representada pela Comissão Europeia, e vários estados membros, entre os quais Portugal, acordo esse denominado de “Acordo Anti-contrabando e Anti-contrafacção e Exoneração Geral” e do qual consta o seguinte:
- “Recepção de Pagamentos
Os criminosos negoceiam frequentemente com dinheiro derivado do crime ou com instrumentos negociáveis que são equivalentes a dinheiro (por exemplo, vales postais e cheques de viagem) e que tenham sido comprados com dinheiro proveniente do crime.
Os esquemas criminosos também podem implicar pagamentos por terceiros, que podem ser inexistentes ou pessoas “testa de ferro” ou pagamento em divida de um país diferente do país onde a transacção é realizada.
Em conformidade com as leis dos Estados Unidos e de outros países, em determinadas circunstâncias, efectuar transacções com receitas do crime pode, por si só, ser considerado conduta criminosa.
Em confirmação das nossas práticas de longa data nesta área, os Programas de Conformidade que as empresas de exploração implementam devem incluir os seguintes requisitos:
(i) as formas de pagamento aceitáveis são: (a) transferência bancária ou cheque, em ambos os casos a partir de uma conta bancária em nome do cliente, (b) cheque ao portador ou bancário ou equivalente, em ambos os casos, emitidos por um banco no país em que o cliente se encontra e (c) numerário, mas apenas quando a natureza e a escala da actividade do cliente (por exemplo, pequeno comércio a retalho) são de tal ordem que não é comercialmente viável segundo as condições locais que um cliente utilize as formas de pagamento previstas em (a) ou (b);
(ii) todos os pagamentos devem ser feitos na mesma divisa da factura;
(iii) os pagamentos realizados por terceiros são inaceitáveis;
(iv) quaisquer pagamentos indevidos devem ser cuidadosamente analisados, qualquer pedido para fazer um pagamento em excesso ou para que um reembolso seja feito em nome de terceiro deve ser aprovado pelo Director Financeiro e pelo Director Executivo da empresa de exploração ou pelos seus representantes; e
(v) os pagamentos para cada factura ou grupo de facturas devem ser feitos através de um único instrumento,
Os procedimentos de empresas de exploração individuais podem prever excepções a estes cinco requisitos a ser concedidas caso a caso, mas estas excepções devem ser aprovadas pelo Director Financeiro e pelo Director Executivo da empresa de exploração ou pelos seus representantes.
Caso sejam autorizadas excepções, os procedimentos devem prever que estas só sejam concedidas em circunstâncias excepcionais e exigir documentação sobre os motivos para a concessão de qualquer excepção.
Adicionalmente, cada Programa de Cumprimento deverá incluir procedimentos razoáveis para identificar pagamentos”
- “A P… deverá aderir às suas políticas anti-branqueamento de capitais, que são concebidas para garantir que recebe o pagamento de cigarros P…. exclusivamente de fontes lícitas. As políticas desenvolvidas pela P… para rastrear e acompanhar todos os pagamentos feitos por cigarros vendidos e/ou distribuídos pela P… devem incluir medidas destinadas a evitar o uso das receitas de qualquer actividade ilícita, sob qualquer forma, como o pagamento de cigarros. Especificamente, como essas políticas se relacionam com as transacções com Prestadores Aprovados referentes à venda, armazenagem ou expedição de cigarros P…:
(i) as formas aceitáveis de pagamento serão limitadas a:
(A) transferências bancárias ou cheques, em ambos os casos de uma conta bancária em nome da Pessoa ou Afiliada dessa Pessoa com quem a P… esteja envolvida numa transacção,
(B) cheques ao portador ou cheques bancários, em ambos os casos emitidos por um banco no país em que se localiza a Pessoa com quem a P… esteja envolvida numa transacção; e
(C) numerário, mas apenas quando a natureza e a escala da actividade da Pessoa com quem a P… esteja envolvida numa transacção (por exemplo, pequeno comércio a retalho) são de tal ordem que não é comercialmente viável que essa Pessoa utilize as formas de pagamento previstas em (A) ou (B);
(ii) todos os pagamentos devem ser feitos na mesma divisa e no mesmo montante mencionados na factura;
(iii) todos os pagamentos por Cigarros P… devem ser realizados pelo cliente a quem foi emitida factura ou uma Afiliada desse cliente divulgada à P… de acordo com o Protocolo 2.03(c)(vi);
(iv) os pagamentos por cada factura ou grupo de facturas devem ser feitos através de um único instrumento; e
(v) o pagamento deve ser feito de uma única conta designada pelo Prestador Aprovado durante o Processo de Diligência, no âmbito do Protocolo 2.03(c)(vi), supra.
(b) Podem ser concedidas excepções aos cinco requisitos estabelecidos acima no Protocolo 5.01(a) numa base caso a caso. Essas excepções devem ser aprovadas pelo Chief Financial Officer da P…, e os motivos para a concessão de qualquer excepção devem ser registados.”
236 - Desde 2008, quando identificavam a realização de um pagamento múltiplo, as RR. contactavam o cliente em causa como forma de evitar a repetição de tal ocorrência.
237 - A partir de outubro de 2010, a R. T… passou a ser rigorosa quanto ao pagamento único.
Por outro lado, temos provado que:
208 - Quando os AA. vendem os produtos de tabaco aos retalhistas, recebem muitas vezes destes diversos cheques sacados sobre diversas instituições bancárias.
209 - Para poderem obter a imediata disponibilidade das quantias inscritas nos cheques, os AA. têm contas abertas junto dessas diversas instituições bancárias.
210 - Com essa disponibilidade imediata, os AA. podiam, não fosse a imposição do pagamento por meio de um único cheque ou de uma única transferência bancária, utilizar as quantias recebidas para efetuar pagamentos à T… no dia imediatamente subsequente.
211 - Se os AA. depositassem os cheques dos retalhistas numa única conta bancária, demoraria um período não inferior a 48 horas para as quantias inscritas nos cheques sacados sobre instituição bancária diversa daquela junta da qual aquela conta foi aberta estarem disponíveis nessa conta bancária.
Depois, temos ainda que nas Condições Gerais de 2010, se considera pagamento a pronto (ponto 1.7) “o pagamento efectuado pelo Ciente sob condição de que, até ao primeiro dia útil seguinte ao da entrega ou do levantamento dos Produtos seja enviada à T… cópia do comprovativo do processamento pelo Banco da ordem de transferência ou do comprovativo do depósito do cheque” e que no ponto 11.4 das mesmas Condições Gerais consta: “11.4. O Cliente deverá efectuar todos os pagamentos à T… em seu próprio nome, através de uma das contas bancárias indicadas pelo Cliente, na moeda e quantia exacta constantes da respectiva factura, não sendo admissíveis pagamentos por parte de terceiros e/ou pagamentos de quantias superiores às que constarem na respectiva factura. O Cliente apenas poderá utilizar um único meio de pagamento relativamente a cada factura emitida pela T…, não sendo admitidos pagamentos múltiplos, ou seja, por cada factura apenas poderá ser emitido um único cheque cruzado ou efectuada uma única transferência bancária. O Cliente poderá utilizar também um único meio de pagamento relativamente a um grupo de facturas que se vençam no mesmo de dia”.
Temos provado ainda provado que “40 - A A… enviou às RR. carta datada de 22 de setembro de 2010 da qual consta o seguinte: “…vimos informar V. Ex.as que repudiamos estas novas Condições Gerais, como já tínhamos repudiado as anteriores, conforme nossa carta de 5 de Junho de 2009, que foi enviada registada com aviso de recepção à T… e T… S.A. … Face ao exposto, V. Ex.as ficam cientes de que as modificações unilaterais das Condições Gerais de Fornecimento por Grosso de Produtos de Tabaco pretendidas pela T…, são chocantes e inaceitáveis pelo que os nossos associados vão continuar a efectuar os pagamentos das vossas facturas como fazem há muitos anos e sem que a T…, até hoje, tivesse tido algum motivo de preocupação.”
41 - A 27 de setembro de 2010, a R. T… enviou aos associados da A… carta da qual consta o seguinte: “…na ausência do envio de informação atempada relativa à opção por si escolhida em matéria de… opções de pagamento, iremos considerar as condições vigentes e conhecidas para a sua empresa na data imediatamente anterior à implementação destas novas Condições Gerais”.
42 - Os pagamentos efetuados pela A. R… à R. T…, no período de 16 de setembro a 30 de setembro de 2010, eram quase sempre feitos por depósito de dois cheques na conta da T… junto do Banco ….
43 - A partir de dia 1 de outubro de 2010, os AA. continuaram a fazer as suas encomendas de produtos de tabaco, como habitualmente, umas vezes telefonicamente outras vezes por fax, expressamente referindo não aceitar as alterações propostas às Condições Gerais e tendo continuado a fazer os pagamentos dessas faturas como também habitualmente faziam.
44 - Tendo a A. R… pago as suas encomendas dos dias 1 e 4 de outubro de 2010 por meio de vários cheques (cheque nº 3…4, sobre o Banco P…, no montante de € 73.252,73, cheque nº 1…5, sobre o B…, no montante de € 50.000,00, cheque nº 8…5, sobre o M…, no valor de € 10.000,00, e cheque nº 9…7, sobre o B…, no montante de € 62.830,58), a R. T…, após a entrega dos produtos, tentou o cancelamento dos referidos cheques junto dos bancos sobre os quais foram sacados.
45 - Após os factos referidos no ponto 44, as RR. recusaram fornecer à A. R…produtos de tabaco, rejeitando os pedidos de encomenda nºs 175, 178, 180, 183 e 184, efetuados, respetivamente, nos dias 6, 8, 12, 14 e 15 de outubro de 2010.
46 - No dia 6 de outubro de 2010, a R. T… enviou para a A. R… comunicação da qual consta o seguinte:
“Constatamos que em desrespeito ao estabelecido nas Condições Gerais de Fornecimento por Grosso de Produtos de Tabaco pela T…. (conforme Ponto 11.4) tentou liquidar a sua encomenda da passada sexta-feira recorrendo a um pagamento múltiplo. Agradecemos assim que proceda à regularização da situação, solicitando a devolução dos cheques e efetuando em substituição um único pagamento por cada fatura ou grupo de faturas, sem o que não poderemos concretizar a próxima entrega”.
Finalmente temos que “207 - As AA. DL e JMRL recusaram a alteração prevista nas CGF de 2009 em matéria de forma de pagamento das faturas” e que “212 - Os AA. alteraram a forma de pagamento para um único cheque para evitar ficar sem produtos de tabaco da T… para distribuir pelos retalhistas”.
Vamo-nos centrar em 2010, não porque em 2009 a 2ª Ré tenha invertido a exigência de meio de pagamento único – isso não resulta do facto provado 41 – mas porque em 2010 é que temos nas Condições Gerais a formulação mais rigorosa do meio de pagamento único.
Repare-se agora que o que foi muito discutido em audiência não tem amparo nos factos provados nem foi pedida a sua reapreciação: - a questão do custo exigido pelo Banco de Portugal nas transferências acima de cem mil euros.
Assim, a questão do desequilíbrio económico neste particular do meio único de pagamento só pode centrar-se na questão do prazo de pagamento (e do dinheiro que existe para o cumprir), ou seja, só pode centrar-se no “atraso de 48h” da operação de transferência para uma única conta do grossista das transferências, cheques ou depósitos feitos pelos retalhistas nas diversas contas em diferentes bancos que os grossistas mantêm para receberem dos retalhistas.
Ora, se considerarmos a definição de pagamento a pronto em 2010, vemos que ela exige que o meio de pagamento tenha sido emitido, pelo grossista à T…, no próprio dia da entrega ou no máximo no primeiro dia útil subsequente à entrega. Portanto, no limite, teríamos como possível que um grossista, tendo recebido da T… cigarros num dia, tivesse nesse mesmo dia vendido os mesmos cigarros ao retalho e deste, nesse mesmo dia, tivesse recebido o pagamento.
Até sabemos, embora isso não esteja nos factos provados, mas porque foi bastante referido em julgamento, que os grossistas dão um prazo de pagamento aos retalhistas, maior do que o que a T… lhes dá. Mas nem precisamos desse facto. Se pensarmos na primeira compra dum grossista à T…, ele naturalmente terá de ter dinheiro para pagar, e esse dinheiro não virá do retalho – é o tão falado fundo de maneio que, não sendo próprio, chama custos bancários com contas caucionadas e descobertos em conta. No máximo, se para essa primeira compra e entrega já houvesse cliente retalhista certo, com a boa vontade ou a necessidade de obediência suficientes para que ele de imediato pagasse ao grossista, então o que teríamos, por efeito do meio de pagamento único e do referido atraso de 48h, seria que o grossista haveria de precisar de recorrer a dinheiro próprio ou bancário para pagar a primeira compra a pronto, sem a penalização da compra a prazo. Portanto, em termos de custos, no máximo estaríamos a falar de custos relacionados com um atraso de 48h.
Quer isto dizer, como já intuíamos, que a importância económica desta questão não afecta essencialmente o equilíbrio económico das partes. Até mais grave que isto poderão ter sido, ao longo das décadas, os encurtamentos dos prazos de pronto pagamento, e não há menção de oposição. Não concedemos portanto que o modo de pagamento integre a essencialidade do equilíbrio económico das partes, que fundou a sua decisão de contratar, pelo que quanto a esse aspecto não concedemos que o poder de alteração unilateral irrestrita e a sua aplicação prática na alteração quanto ao meio único de pagamento se integre na previsão do artigo 19º alínea h) nem do artigo 15º, ambos do RJCCG.
E ainda sobre o meio de pagamento único, e porque “207 - As AA. … e … recusaram a alteração prevista nas CGF de 2009 em matéria de forma de pagamento das faturas” (podendo então discutir-se a legalidade da inclusão da cláusula relativamente a estas AA na perspectiva do artigo 406º do Código Civil), deve dizer-se ainda o seguinte:
Para as Rés, trata-se duma imposição “legal” (e como se sabe, o artigo 406º do Código Civil não tem aplicação quando na sua base está o artigo 405º do Código Civil que se inicia precisamente pela excepção “salvo disposição em contrário”), radicada na força conferida ao mencionado Acordo CE. Já as Recorrentes advertem que o mesmo Acordo já não está em vigor, e já as Recorridas oferecem um outro, também aplicável.
O objectivo que se extrai do facto provado 47 tem essencial relação com a questão do branqueamento de capitais. Impedir que os capitais provenientes de actividades criminosas possam ser trocados por um produto facilmente transaccionável como cigarros, passa, nos termos do Acordo CE pela identificação da origem do produto e do seu trajecto até ao destino, e pela identificação de que compra e vende. Não está em causa que os pagamentos dos grossistas tenham de provir de contas bancárias identificadas e associadas a eles – é o modo de conhecer quem comprou. Também para este conhecimento é relevante perceber o volume habitual de compras que igualmente dá a medida do volume habitual de revendas, percebendo-se portanto que um volume anormal de compra pode indiciar uma revenda a quem compre com capitais provindos da actividade criminosa. Muito especificamente, o que está em causa é uma medida mais minuciosa ou detalhada desta actividade de vigilância, saber se o pagamento de uma factura, por um grossista identificado e conhecido, a partir duma conta bancária sua (excluindo portanto que esteja a comprar ele mesmo com dinheiro fornecido por quem se dedique ao crime) pode ser feito mediante vários instrumentos (por exemplo, por uma parte em transferência bancária e outra em cheque) ou por mais do que uma forma do mesmo instrumento (várias transferências bancárias, vários cheques).
Então, estabelecia o Acordo CE que:
“(ii) todos os pagamentos devem ser feitos na mesma divisa e no mesmo montante mencionados na factura;
(…)
(iv) os pagamentos por cada factura ou grupo de facturas devem ser feitos através de um único instrumento;”.
Quando analisamos estas duas alíneas, vemos que tem de haver um mesmo instrumento (iv) e que esse instrumento usado deve pagar “o mesmo montante” mencionado na factura: - um único cheque no valor exacto da factura, uma única transferência no valor exacto da factura – ou seja, um único meio de pagamento.
Seriamos tentados a dizer que a T… “exagerou” quando nas suas Condições Gerais e com maior rigor, passou a exigir um único meio de pagamento no sentido acima definido, porquanto se um grupo de facturas pode ser pago por um único instrumento, então já se vê que neste caso o fino objectivo de controlar/conhecer quem compra e quanto compra e detectar eventuais indícios ou suspeitas de actividade ilícita de terceiros, a partir da correspondência de valores entre o meio de pagamento e a factura, não resultará directamente do cotejo entre o meio de pagamento e a factura, antes implicará uma operação adicional de análise das facturas do dia relativas a um mesmo grossista.
Quando porém as Condições Gerais se limitam a transcrever os termos do Acordo, a análise passa para o nível do Acordo, e então aqui sim entra a sua qualificação como fonte legal impositiva dum determinado comportamento ao nível das obrigações assumidas em certo contrato privado.
Dizer antes que sendo reconhecido que o Acordo CE cessou[34], isso não alivia o problema para efeitos do pedido deduzido pelas AA e AA de que o tribunal declare que não têm de pagar doravante por um meio de pagamento único, porquanto como assinalam as Recorridas, em 12 de Novembro de 2012, em Seul, foi adoptado, no seio da Organização Mundial de Saúde, o Protocolo para a Eliminação do Comércio Ilícito de Produtos do Tabaco, aprovado entre nós pela Resolução da Assembleia da República nº 66/2015, de 15 de Maio, e ratificado pelo Decreto do Presidente da República n.º 42/2015 de 22 de Junho, cujo artigo 45.º prevê que “1 — O presente Protocolo entrará em vigor no nonagésimo dia após a data do depósito junto do Depositário do quadragésimo instrumento de ratificação, aceitação, aprovação, confirmação formal ou adesão” e “2 — Para cada Parte na Convenção Quadro da Organização Mundial de Saúde para o Controlo do Tabaco que ratifique, aceite, aprove, confirme formalmente o presente Protocolo ou adira ao mesmo após o cumprimento das condições fixadas no n.º 1 para a entrada em vigor, o presente Protocolo entrará em vigor no nonagésimo dia após a data do depósito do seu instrumento de ratificação, aceitação, aprovação, adesão ou confirmação formal”, donde, por aplicação do nº 2 do preceito, como resulta do Aviso nº 13/2016 publicado no Diário da República n.º 69/2016, Série I de 2016-04-08, o Protocolo encontra-se em vigor entre nós.
Ora, do artigo 10º nº 2 do referido Protocolo consta precisamente a correspondência entre o meio de pagamento e o valor da factura.
Deste modo, por aplicação do nº 2 e subsequentemente do nº 1 do artigo 8º da Constituição da República Portuguesa, teremos de concluir que a imposição do meio de pagamento único não só vincula o Estado Português como constitui fonte normativa externa ao domínio da regulação privada dos contratos, integrando uma limitação ao princípio da liberdade negocial constante do artigo 405º do Código Civil, e deste modo insusceptível de, na sua adopção, nas Condições Gerais, em alteração à liberdade de meios de pagamento anteriormente vigente entre as partes, constituir uma violação do princípio “pacta sunt servanda”. Não releva assim a recusa de aceitação da cláusula feita pelas AA. … e ….
Adiante se verá a relevância jus-concorrencial e portanto outra eventual fonte de ilícito, mas para já pode adiantar-se que, nem por violação do princípio do pontual cumprimento dos contratos nem por aplicação do RJCCG, procede a pretensão das AA de que o tribunal declare a nulidade das pertinentes cláusulas e que condene a 2ª Ré a aceitar doravante pagamentos por mais do que um meio de pagamento. E – Quinta linha argumentativa: - “e) Além do mais, tais cláusulas devem ser anuladas por coação moral e usura – cf. Ponto IV.C. e)”.
Quando corremos o Ponto IV. C. e) do corpo da alegação de recurso, encontramos que “tais cláusulas” são apenas as relativas ao factor de correcção e ao preço fixo por caixa – 2.3 de 2006 e 2008 e 10.1 de 2009 e 2010 – veja-se o parágrafo 664, a fls. 8721 verso.
Não está portanto em causa que as cláusulas que introduziram descontos variáveis e a que exige o pagamento por um único meio de pagamento, tenham sido enquadradas também sob esta argumentação de coacção moral e usura.
Continuando nesse Ponto do corpo da alegação, percebemos que a questão é levantada a título subsidiário para o caso de se entender que ocorreu aceitação livre e esclarecida das cláusulas que a todo o tempo a T… se arrogou o direito de alterar, e que quanto a essas cláusulas foram cumpridos os deveres de informação – parágrafo 650. Portanto, a sua apreciação seria em rigor desnecessária porque prejudicada pela solução dada na segunda linha argumentativa (violação do artigo 406º do Código Civil).
Ademais, os termos em que tais coacção moral e usura vêm colocadas apontam para noções de dependência económica que só na apreciação jus-concorrencial ficarão mais bem definidas. Em todo o caso, sempre se dirá o seguinte:
Dispõe o artigo 255º do Código Civil: “1. Diz-se feita sob coacção moral a declaração negocial determinada pelo receio de um mal de que o declarante foi ilicitamente ameaçado com o fim de obter dele a declaração. 2. A ameaça tanto pode respeitar à pessoa como à honra ou fazenda do declarante ou de terceiro. 3. Não constitui coacção a ameaça do exercício normal de um direito nem o simples temor reverencial”.
Dispõe o artigo 282º nº 1 do Código Civil que “É anulável, por usura, o negócio jurídico, quando alguém, explorando a situação de necessidade, inexperiência, ligeireza, dependência, estado mental ou fraqueza de carácter de outrem, obtiver deste, para si ou para terceiro, a promessa ou a concessão de benefícios excessivos ou injustificados”.
Para o primeiro caso, esgrimem as Recorrentes com a recusa de fornecimento que levaria ao seu desaparecimento económico. Para este primeiro caso, a nossa tentativa de dizer alguma coisa útil depois do que se concluiu na segunda linha argumentativa esbarra numa impossibilidade teórica: - o que se previne com o instituto da coacção moral é a liberdade da declaração negocial conforme (à vontade do declarante e não à vontade daquele que pratica a coacção). Aliás, estamos na parte do Código Civil onde se definem ou asseguram os termos da declaração negocial validamente prestada. Por isto, quando temos provado desde sempre que as AA e os AA recusaram expressamente a introdução e aplicação do factor de correcção (o que se estende também ao preço fixo por caixa), temos que não produziram elas e eles a declaração negocial que o coactor pretendia que produzissem, apenas se passando que as RR passaram por cima, digamos assim, da declaração negocial concretamente emitida pelas AA e AA. Ou seja, é impossível considerar que as AA e AA emitiram declaração de aceitação sob coacção, quando a declaração que emitiram foi a contrária à de aceitação. Se porém entendermos que há uma declaração de vontade implícita no pagamento de factura que inclua o factor de correcção, já desconsiderando que é “sim, pago, mas é a contragosto”, então a alegação teria viabilidade porque, como se verá na análise concorrencial, de facto as AA e os AA estavam na dependência económica das RR., significando uma recusa de fornecimento uma ameaça ao seu potencial de sobrevivência no mercado, tanto quanto nenhuma delas conseguiria sobreviver apenas revendendo cigarros da concorrência. Por outro lado, em decorrência do que se disse na primeira e segunda linhas argumentativas, a recusa de fornecimento não seria então o normal exercício de um direito, antes a efectiva solidificação dum primeiro ilícito. Todavia, a questão da coaçao moral foi levantada a título subsidiário e como dissemos deve considerar-se prejudicada.
No segundo caso, já não estamos propriamente no plano dos vícios da declaração de vontade em si, mas do conteúdo ou objecto sobre que a declaração incide. O negócio usurário supõe a exploração consciente, por uma parte, das situações de “menoridade”, por assim dizer, em que se encontra a outra, com o propósito de, além do mais, obter benefícios excessivos ou injustificados.
Curioso é que, quando nos centramos na situação de “menoridade” que é a dependência, o que diz o artigo 282º diz também o artigo 12º da Lei da Concorrência (actualmente Lei 19/2012 de 8.5): - “1 - É proibida, na medida em que seja suscetível de afetar o funcionamento do mercado ou a estrutura da concorrência, a exploração abusiva, por uma ou mais empresas, do estado de dependência económica em que se encontre relativamente a elas qualquer empresa fornecedora ou cliente, por não dispor de alternativa equivalente. 2 - Podem ser considerados como abuso, entre outros, os seguintes casos: (…)” 3 - Para efeitos do n.º 1, entende-se que uma empresa não dispõe de alternativa equivalente quando: a) O fornecimento do bem ou serviço em causa, nomeadamente o serviço de distribuição, for assegurado por um número restrito de empresas; e b) A empresa não puder obter idênticas condições por parte de outros parceiros comerciais num prazo razoável.”[35]. Quando por via do nº 2 se consegue a remissão para o artigo 11º nº 2 “a) Impor, de forma direta ou indireta, preços de compra ou de venda ou outras condições de transação não equitativas”, temos totalmente preenchido, nos sublinhados que fizemos, a situação material a que se reporta o artigo 282º do Código Civil. A falta de alternativa caracteriza todas as situações de menoridade previstas neste artigo 282º, a exploração abusiva traduz-se pela exploração consciente da situação de menoridade com vista ao aproveitamento de benefício, a não equidade importa num benefício, neste caso simultaneamente injustificado e excessivo.
O problema não se poria se as AA apenas tivessem invocado o negócio usurário e não este e o abuso da posição dominante. A dúvida é saber se na invocação dupla não estamos perante uma consumpção do negócio usurário pelo abuso da posição dominante, em termos tais que só pudéssemos concluir pelo negócio usurário no preenchimento do crivo mais pormenorizado do artigo 12º da Lei da Concorrência. A resposta, ao menos formal, é esta: - em última análise o objectivo final do Direito da Concorrência não coincide com os interesses particulares dos concorrentes.
Simplesmente, tal como as Recorrentes colocam a questão, elas estão numa situação de “absoluta dependência económica face às RR”, pois que estas são as fornecedoras exclusivas das marcas de tabaco mais vendidas e em relação às quais inexistem produtos que as possam substituir, sendo que as RR. têm uma posição dominante no mercado, do que têm total consciência. E disto se aproveitam para reduzir a margem das AA por via do factor de correcção, de forma a aumentar a sua margem e lucros de modo muito significativo, concretamente apropriando-se de cerca de 90% do aumento do PVP acima do aumento para cobrir impostos, quando antes da introdução do factor de correcção teriam de repartir este rendimento residual na proporção de cerca de 61% para si e 39% para as AA. – parágrafos 660 a 662 do corpo da alegação de recurso.
Significa isto que mesmo como as Recorrentes colocam a questão (primeira parte) é difícil analisar o negócio usurário com independência dos conceitos aportados pelo Direito da Concorrência. Em todo o caso, vamos admitir, porque no âmbito de análise do negócio usurário nos situamos na esfera privada e não numa perspectivação funcional ao interesse público na livre concorrência, que podemos realizar essa análise com independência e vamos admitir que “temos negócio” não na sua celebração original, nem na recusa de alteração, mas no prosseguimento de facto do negócio com desconsideração da recusa das AA., como efectivamente aconteceu, continuando elas a comprar e pagando o adicional do factor de correcção (que mais tarde se cristaliza no preço fixo).
Então, estando provada a dependência do consumidor em relação à marca, estando provada a amplitude desta dependência por reporte às quotas de mercado da T…, obtendo-se destas o residual de quota de que beneficiaria a concorrência da T… no seu conjunto, resultando também a quota T… no volume correspondente de negócio grossista, é defensável que a T… não ignorasse nada disto, e é defensável que tenha sido esta a situação de facto, o condicionalismo factual que lhe permitiu impor o factor de correcção mesmo contra a vontade das AA e AA. Falta portanto apurar se o benefício que a T… assim conseguiu foi injustificado ou excessivo. Se partirmos dum desconto máximo acima dos 8% para 2005 para a cristalização dos efeitos da aplicação do factor de correcção no preço fixo por caixa levando a um desconto na ordem dos 7%, e se simultaneamente pensarmos no tradicional desconto que tem de ser concedido ao retalho – voltemos a 1944 e ao contrato D..S… para encontrar originalmente a medida deste desconto – percebemos que estamos a falar dum corte, digamos, de quase 50% do desconto. De notar que não chegamos a tanto porque o que as Recorrentes referem é a apropriação do rendimento resultante do aumento extra-impostos, que é menor. Quando pensamos se isto é excessivo, à primeira vista parece que sim, mas, já que estamos a falar em termos gerais e não de Direito da Concorrência, não podemos esquecer-nos que, apesar de estarem provadas as condicionantes da fixação de preço ao retalho, além delas têm os grossistas a alternativa tecnológica da exploração de máquinas automáticas de venda de cigarros, onde conseguem contornar a margem tradicional do retalho. Deste modo, estamos perante um excesso não aniquilador ou mais correctamente dum excesso que é menos excessivo do que parece. Mais relevante do que o excesso é a falta de justificação. O benefício trazido às RR. pelo factor de correcção e pelo preço fixo não tem uma justificação, no sentido de que não radica, não se fundamenta, num decréscimo do volume de investimento (em trabalho humano, em aceleração deste, em tecnologia, em capital) das AA e num aumento do mesmo volume por parte das RR. Digamos que nem as AA. deixaram de trabalhar/investir (pelo contrário, devem ter trabalhado mais) nem as RR desenvolveram mais trabalho/investimento que merecesse a alteração do equilíbrio económico até então existente e reconhecido[36]. Dizemos isto em função do que temos provado, admitindo perfeitamente que as RR. tenham realizado mais investimentos em função da redução global do número de fumadores e dos avanços da sua concorrência, isto bem para lá dum aumento inflacionário que possa ter atingido RR, AA e todos – e em função do ónus de prova da existência de justificação pertencer às RR. nos termos do artigo 342º nº 2 do Código Civil.
Portanto, a ter de conhecer desta questão se tivéssemos negado razão às Recorrentes na primeira e segunda linha argumentativas, tenderíamos a concluir pela natureza usurária das cláusulas que introduziram o factor de correcção e o preço fixo por caixa. F - Sexta linha argumentativa: “f) É (i)lícita a aplicação do fator de correção realizada pelas RR. face aos termos da própria cláusula que o prevê – cf. Ponto IV.C. d)”. Nos termos em que vem formulada esta linha, que o factor de correcção incidiu, ao contrário do que previa, sobre o aumento extra impostos, ela não apresenta autonomia de consequências em relação à questão da prestação de informação falsa e de incumprimento do dever de informação. G – Sétima linha argumentativa: - “g) Todas as cláusulas das CGF identificadas no petitório são nulas por constituírem infração às Normas do Direito da Concorrência, concretamente por configurarem, atentos os seus objetivos e efeitos, abuso de posição dominante e/ou abuso de dependência económica por parte das RR. relativamente aos AA.”. Todas as cláusulas identificadas no petitório são:
- a Cláusula 2.3 das Condições Gerais de 2006, relativa ao Factor de Correcção dos Descontos Comerciais, e a sua sucessora Cláusula 2.3 das Condições Gerais de 2008;
- as Cláusulas 10.1 das Condições de 2009 e de 2010, relativas à possibilidade da T... poder alterar a todo o momento as tabelas de preços de venda (preço fixo por caixa);
- a Cláusula 2.2.2 das Condições de 2002, relativa a descontos variáveis, (e as suas componentes 2.2.2.1 a 2.2.2.4, e as suas sucessoras Cláusulas 2.2.2 nas Condições Gerais de 2005, 2006 e 2008;
- a Cláusula 7ª das Condições Gerais de 2002, a Cláusula 8 § 1 das de 2005 e de 2008, e as Cláusulas 10.1 das Condições Gerais de 2009 e 2010, relativas à possibilidade de alteração unilateral irrestrita do todo ou de parte das Condições Gerais pelas Rés.
Como bem observam as Recorridas, é por via deste último grupo de cláusulas que as Recorrentes pretendem também que se analise e decrete a nulidade por violação da Lei da Concorrência da imposição de um único meio de pagamento.
Na lógica de construção da decisão judicial, a declaração de nulidade das cláusulas acima identificadas que permitiam a alteração unilateral irrestrita, já tendo sido concedida, está prejudicada, isto é, não se justifica abordar uma outra perspectiva pela qual se chega ao mesmo resultado, mas em todo o caso isto não implica necessariamente o arrasto de todas e quaisquer alterações que concretamente tenham sido introduzidas em função dessa possibilidade de alteração unilateral, como aliás já explicámos. Quanto ao meio de pagamento único impõe-se uma análise adicional e quanto aos descontos variáveis, aqui sim, eles terão de ser abordados com autonomia em relação às cláusulas de alteração unilateral irrestrita e incondicionada. Quanto ao factor de correcção e preço fixo por caixa, parecendo desnecessário abordar a perspectiva concorrencial, a questão possível é que a consequência da perspectiva de violação contratual pode ser diferente da violação de normas concorrenciais, assim fazendo sentido abordar também esta última perspectiva.
Comecemos pelo meio único de pagamento, retomando o que já foi dito, para encontrar lapidarmente no artigo 1º nº 2 da Lei da Concorrência, neste caso, na versão em vigor ao tempo dos factos, a da Lei 18/2003 de 11.6, segundo o qual “Sob reserva das obrigações internacionais do Estado Português, a presente lei é aplicável às práticas restritivas da concorrência e às operações de concentração de empresas que ocorram em território nacional ou que neste tenham ou possam ter efeitos” justamente a retoma daquilo que havíamos dito, ou seja, que “por aplicação do nº 2 e subsequentemente do nº 1 do artigo 8º da Constituição da República Portuguesa, teremos de concluir que a imposição do meio de pagamento único (…) vincula o Estado Português”, donde, de facto, nenhum sentido faria que o Estado Português, tendo assumido uma obrigação internacional, permitisse que um outro seu mecanismo, neste caso, a sua lei da concorrência, viesse por em causa a obrigação assumida. Em suma, é a qualificação normativa internacional vinculante do Estado Português que impede a análise da imposição do meio único de pagamento enquanto prática restritiva da concorrência à luz da Lei da Concorrência nacional, nada mais se oferecendo dizer, excepto naturalmente a improcedência da pretensão das Recorrentes nesta parte.
Na dilucidação da linha argumentativa ora em apreço, comecemos por dizer que embora a Autoridade da Concorrência fosse/seja a encarregada de assegurar o respeito pelas regras da concorrência (artigo 14º da Lei 18/2003), aos tribunais comuns assistia/assiste a competência para conhecer directamente das causas em que a violação das normas de concorrência tenha sido invocada de modo não exclusivo, o que resulta “a contrario” dos números 3 e 4 do artigo 112º da Lei 62/2013 de 26 de Agosto e do artigo 80º nº 1 da mesma Lei.
Neste sentido, as menções feitas por ambas as partes, aliás contraditórias entre si na apreciação que fazem da actuação da Autoridade da Concorrência, e a actuação desta entidade, não são vinculantes para este tribunal. Ou dito de modo mais directo: - não é porque, nos processos de contra-ordenação que a mesma entidade levantou à T..., não se chegou a qualquer condenação, que este tribunal está impedido de declarar a nulidade de cláusulas das Condições Gerais de Fornecimento por violação das regras da concorrência. Aliás, é público, pois consta da base de dados da dgsi, que no processo 11/15.1YQSTR.S1 foi proferido acórdão pelo Supremo Tribunal de Justiça em 19-01-2017 de cuja parte decisória consta: “Nos termos expostos, acordam em conferência na secção criminal do Supremo Tribunal de Justiça em julgar procedente o recurso interposto pela AA e a BB Lda. e, em resultado disso, considerar ilegal o ato administrativo de arquivamento de denúncia, de 03.09.2015, condenando a Autoridade da Concorrência a praticar o ato devido de abertura de inquérito por abuso de posição dominante e abuso de dependência económica”[37].
Isto posto, vamos considerar corrente pacífica, apesar da controvérsia, a que alinha ao objectivo do Direito da Concorrência não a protecção de agentes económicos específicos mas sim a da concorrência no mercado em tanto quanto práticas restritivas dela prejudicam o consumidor. Neste sentido, e como se nota no parágrafo 708 do corpo das contra-alegações de recurso, a citação de que “as regras de concorrência (e a AdC) não se encontram ao serviço da protecção de determinados concorrentes ou de sectores ou operadores económicos específicos, antes visam a defesa do processo competitivo entre agentes económicos enquanto tal, na medida em que este serve a maximização do bem-estar dos consumidores, traduzida na obtenção de preços mais baixos, qualidade, escolha e inovação. Tal entendimento está, de resto, de harmonia com a prática decisória da Comissão Europeia e a jurisprudência dos Tribunais da UE a este propósito”, sendo a citação retirada José Luís da Cruz Vilaça e de Maria João Melícias, in Lei da Concorrência – Comentário Conimbricense, Almedina, 2ª edição, 2017, pp 152 e 153.
De resto, também um reforço desta posição, desde logo quanto ao direito nacional, se obtém pelas referências do artigo 81º, alínea f), da Constituição da República Portuguesa, segundo o qual constitui incumbência prioritária do Estado “Assegurar o funcionamento eficiente dos mercados, de modo a garantir a equilibrada concorrência entre as empresas, a contrariar as formas de organização monopolistas e a reprimir os abusos de posição dominante e outras práticas lesivas do interesse geral”, e do artigo 99º, alínea a) da mesma Constituição, segundo o qual constitui objectivo da política comercial “a concorrência salutar dos agentes mercantis”.
No mesmo sentido, de que o que está em causa, no Direito da Concorrência, é o interesse geral na organização do mercado, não sendo o mesmo ramo instrumento adequado para a defesa concreta de operadores económicos específicos, o facto de existirem outros instrumentos para esta última defesa. Contemporâneo dos factos, veja-se o DL 370/93 de 29.10, alterado pelo DL 140/98 de 16.5 e pelo DL 10/2003 de 18.1, e finalmente revogado pelo DL 166/2013 de 27.12. No seu preâmbulo lê-se concretamente: “O Decreto-Lei n.º 422/83, de 3 de Dezembro, ocupou-se não só dos efeitos económicos danosos decorrentes de acordos e práticas concertados entre empresas, de decisões de associações de empresas e de abusos de posição dominante, como ainda da proibição de certas práticas individuais restritivas da concorrência.
A inclusão das práticas individuais no diploma funcionou como instrumento pedagógico do comportamento dos agentes económicos e simultaneamente contribuiu para a transparência do mercado.
Ao proceder à revisão do Decreto-Lei n.º 422/83, houve que ponderar entre a manutenção deste conjunto de práticas na lei nacional de defesa da concorrência ou - seguindo as tendências e soluções de outros países - o seu deslocamento para sede legislativa mais adequada à realidade.
Adoptando esta última solução, evita-se que o Conselho da Concorrência se pronuncie sobre práticas que já no actual quadro legislativo não eram ponderadas à luz dos critérios enunciados no artigo 15.º do Decreto-Lei n.º 422/83 (balanço económico) mas que de per se constituem comportamentos menos transparentes embora sem efeitos graves a nível de concorrência.
Não obstante, porque não raro certas práticas individuais são consequência de acordos restritivos da concorrência, ou de abusos de poder económico, que, enquanto tal, devem ser apreciados em sede de legislação de defesa da concorrência, quer para efeitos de condenação, quer de isenção, houve o cuidado de distinguir claramente o âmbito de aplicação de ambas as disciplinas”.
Nestas práticas individuais o diploma elencava precisamente no artigo 1º, nº 1, “É proibido a um agente económico praticar em relação a outro agente económico preços ou condições de venda discriminatórios relativamente a prestações equivalentes, (…)”, e no artigo 4º estabelecia:
“1 - É proibido a um agente económico recusar a venda de bens ou a prestação de serviços a outro agente económico, segundo os usos normais da respectiva actividade ou de acordo com as disposições legais ou regulamentares aplicáveis, ainda que se trate de bens ou de serviços não essenciais e que da recusa não resulte prejuízo para o regular abastecimento do mercado.
2 - É equiparada à recusa de venda a subordinação da venda de um bem ou da prestação de um serviço à aquisição de outro bem ou serviço.
3 - São consideradas causas justificativas de recusa:
a) A satisfação das exigências normais da exploração industrial ou comercial do vendedor, designadamente a manutenção dos seus stocks de segurança ou das necessidades de consumo próprio;
b) A satisfação de compromissos anteriormente assumidos pelo vendedor;
c) A desproporção manifesta da encomenda face às quantidades normais de consumo do adquirente ou aos volumes habituais das entregas do vendedor;
d) A falta de capacidade do adquirente para, face às características do bem ou serviço, assegurar a sua revenda em condições técnicas satisfatórias ou manter um adequado serviço de pós-venda;
e) A fundada falta de confiança do vendedor quanto à pontualidade do pagamento pelo adquirente, tratando-se de vendas a crédito;
f) A existência de débitos vencidos e não liquidados referentes a fornecimentos anteriores;
g) A ocorrência de qualquer outra circunstância inerente às condições concretas da transacção que, segundo os usos normais da respectiva actividade, tornaria a venda do bem ou a prestação do serviço anormalmente prejudicial para o vendedor.
4 - Incumbe ao vendedor a prova das causas justificativas a que se refere o número anterior”.
No mesmo DL estabelecia-se no artigo 2º a obrigatoriedade das tabelas de venda:
“1 - Os produtores, fabricantes, importadores, distribuidores, embaladores e grossistas de bens e os prestadores de serviços são obrigados a possuir tabelas de preços com as correspondentes condições de venda e facultá-las, quando solicitados, a qualquer revendedor ou utilizador.
2 - As condições de venda devem referenciar, nomeadamente, os prazos de pagamento, as diferentes modalidades de descontos praticados e respectivos escalões.
3 - As condições em que um agente económico obtenha uma remuneração financeira ou de outra natureza dos seus fornecedores, como contrapartida da prestação de serviços específicos, devem ser reduzidas a escrito”.
Não é caso de voltar atrás, mas como é claro há um intuito de transparência na exigência das tabelas que em nada impossibilita a celebração de contratos de distribuição. E quando vemos as justificações da recusa de fornecimento no artigo 4º, estamos a reler quase integralmente as Condições Gerais de Fornecimento.
O certo é que as AA. não invocaram estes instrumentos legislativos específicos para fundamento das suas pretensões, antes preferiram enquadrá-los ao abrigo do Direito da Concorrência.
Vamos ainda considerar pacífico, apesar dos comentários ao excessivo formalismo das responsáveis pelo Estudo do Mercado do Tabaco e à sua ligeireza na definição do mercado relevante, que o mercado relevante para análise das práticas restritivas nos autos imputadas às Rés, é o da comercialização e distribuição de FMC (factory made cigarettes) em Portugal, e mais concretamente o da distribuição grossista de tais produtos.
Como nota Miguel Sousa Ferro, in “Práticas Restritivas da Concorrência: Súmula orientada para a prática judicial” (Curso de Formação para Juízes Nacionais em Direito da Concorrência, Instituto de Direito Económico, Financeiro e Fiscal da Faculdade de Direito de Lisboa, 2010), quanto à aplicabilidade do direito nacional e do direito europeu, “A Lei n.º 18/2003 (Lei da Concorrência, ou LC) aplica-se a práticas restritivas da concorrência “que ocorram em território nacional ou que neste tenham ou possam ter efeitos”, “[s]ob reserva das obrigações internacionais do Estado” (Art.º 1.º(2) LC). Os Art.ºs 101.º e 102.º TFUE aplicam-se às práticas que sejam “susceptíveis de afectar o comércio entre os Estados Membros”. Discorrendo sobre a afectação do comércio entre Estados Membros, prossegue: “O critério da afectação do comércio entre EMs recebeu uma interpretação muito ampla pelo TJUE. Atenta a importância crucial desta determinação, foi adoptada uma Comunicação que lhe é exclusivamente dedicada16”.[38] Prosseguindo na dilucidação do critério de afectação do comércio entre Estados Membros, indica o mesmo autor: “(ii) A prática deve ser susceptível de afectar o comércio entre EMs: “deve ser possível determinar com um grau suficiente de probabilidade, baseando-se num conjunto de elementos de direito e de facto, se [a prática em questão] pode vir a exercer uma influência directa ou indirecta, actual ou potencial, nas correntes de trocas entre os Estados Membros, de uma forma susceptível de prejudicar a realização dos objectivos de um mercado único entre os Estados Membros”17. O critério é neutro (pode ser um efeito benéfico ou prejudicial)18 e refere-se tanto ao lado da oferta como da procura19. Nos termos da jurisprudência do TJUE, presume-se que há afectação do comércio entre EMs sempre que esteja em causa um mercado que cubra a totalidade do território dum EM, i.e. um mercado nacional20”.[39] (…)”
Deste modo, e relativamente a qual direito aplicar, refere ainda o mesmo autor: “Sempre que o critério da afectação do comércio entre EMs esteja preenchido, os tribunais nacionais são obrigados a aplicar o Direito Europeu da Concorrência, em paralelo com o Direito nacional, por força do efeito directo dos Art.ºs 101.º e 102.º TFUE26 e do Art.º 3.º(1) do Regulamento (CE) n.º 1/2003”.
Ora, devendo afirmar-se o primado do direito europeu, o referido autor afirma: “Na esmagadora maioria dos casos, a aplicação conjunta do Direito nacional e do Direito Europeu da Concorrência não suscitará dificuldades, atenta a profunda convergência verificada entre ambos”.
É que o artigo 101.º, nº 1 do TFUE corresponde ao artigo 4º nº 1 da Lei 18/2003, o artigo 102º do TFUE corresponde ao artigo 6º da Lei 18/2003 e o artigo da dependência económica previsto no artigo 7º desta mesma lei não tem paralelo no direito europeu, o que porém não é excluído pelo primado deste último. Miguel Sousa Ferro, na mesma obra, e sobre os termos de conciliação entre o direito europeu e nacional, refere: “Nos termos do Art.º 3.º(2) e (3) do Regulamento (CE) n.º 1/2003, sempre que ambos os ordenamentos sejam aplicáveis às mesmas práticas:
(…)
b) Os Art.ºs 6.º e 7.º LC podem resultar na proibição práticas permitidas pelo Art.º 102.º TFUE (note-se que o ordenamento comunitário não proíbe o abuso de dependência económica)”.
Deste modo e como se verá, e de resto nenhuma das partes de resto suscita qualquer divergência digna de nota entre os dois ordenamentos no que toca às imputações que as AA. e Recorrentes fazem, as soluções que decorrem de ambos são idênticas.
Onde se instala a controvérsia entre as partes é ao nível da posição dominante e da dependência económica e mais ainda ao nível do abuso destas, porque é a este que se reportam as Recorrentes nas cláusulas que indicam.
O artigo 101º do TFUE (que corresponde ao artigo 86º do TCE) estabelece:
“1. São incompatíveis com o mercado interno e proibidos todos os acordos entre empresas, todas as decisões de associações de empresas e todas as práticas concertadas que sejam suscetíveis de afetar o comércio entre os Estados-Membros e que tenham por objetivo ou efeito impedir, restringir ou falsear a concorrência no mercado interno, designadamente as que consistam em: a) Fixar, de forma direta ou indireta, os preços de compra ou de venda, ou quaisquer outras condições de transação; b) Limitar ou controlar a produção, a distribuição, o desenvolvimento técnico ou os investimentos; c) Repartir os mercados ou as fontes de abastecimento; d) Aplicar, relativamente a parceiros comerciais, condições desiguais no caso de prestações equivalentes colocando-os, por esse facto, em desvantagem na concorrência; e) Subordinar a celebração de contratos à aceitação, por parte dos outros contraentes, de prestações suplementares que, pela sua natureza ou de acordo com os usos comerciais, não têm ligação com o objeto desses contratos. 2. São nulos os acordos ou decisões proibidos pelo presente artigo. 3. As disposições no n.º 1 podem, todavia, ser declaradas inaplicáveis:— a qualquer acordo, ou categoria de acordos, entre empresas,— a qualquer decisão, ou categoria de decisões, de associações de empresas, e— a qualquer prática concertada, ou categoria de práticas concertadas, que contribuam para melhorar a produção ou a distribuição dos produtos ou para promover o progresso técnico ou económico, contanto que aos utilizadores se reserve uma parte equitativa do lucro daí resultante, e que: a) Não imponham às empresas em causa quaisquer restrições que não sejam indispensáveis à consecução desses objetivos; b) Nem dêem a essas empresas a possibilidade de eliminar a concorrência relativamente a uma parte substancial dos produtos em causa”.
Por sua vez e quanto ao abuso de posição dominante, o artigo 102º do mesmo Tratado (correspondente ao artigo 82º do TCE), estabelece:
“É incompatível com o mercado interno e proibido, na medida em que tal seja suscetível de afetar o comércio entre os Estados-Membros, o facto de uma ou mais empresas explorarem de forma abusiva uma posição dominante no mercado interno ou numa parte substancial deste. Estas práticas abusivas podem, nomeadamente, consistir em: a) Impor, de forma direta ou indireta, preços de compra ou de venda ou outras condições de transação não equitativas; b) Limitar a produção, a distribuição ou o desenvolvimento técnico em prejuízo dos consumidores; c) Aplicar, relativamente a parceiros comerciais, condições desiguais no caso de prestações equivalentes colocando-os, por esse facto, em desvantagem na concorrência; d) Subordinar a celebração de contratos à aceitação, por parte dos outros contraentes, de prestações suplementares que, pela sua natureza ou de acordo com os usos comerciais, não têm ligação com o objeto desses contratos”.
No direito nacional, estabelecia o artigo 6º da Lei 18/2003 que: “1 - É proibida a exploração abusiva, por uma ou mais empresas, de uma posição dominante no mercado nacional ou numa parte substancial deste, tendo por objecto ou como efeito impedir, falsear ou restringir a concorrência. 2 - Entende-se que dispõem de posição dominante relativamente ao mercado de determinado bem ou serviço: a) A empresa que actua num mercado no qual não sofre concorrência significativa ou assume preponderância relativamente aos seus concorrentes;
b) Duas ou mais empresas que actuam concertadamente num mercado, no qual não sofrem concorrência significativa ou assumem preponderância relativamente a terceiros.
3 - Pode ser considerada abusiva, designadamente: a) A adopção de qualquer dos comportamentos referidos no n.º 1 do artigo 4.º; b) A recusa de facultar, contra remuneração adequada, a qualquer outra empresa o acesso a uma rede ou a outras infra-estruturas essenciais que a primeira controla, desde que, sem esse acesso, esta última empresa não consiga, por razões factuais ou legais, operar como concorrente da empresa em posição dominante no mercado a montante ou a jusante, a menos que a empresa dominante demonstre que, por motivos operacionais ou outros, tal acesso é impossível em condições de razoabilidade”.
Estabelecia o artigo 7º da mesma Lei que: “1 - É proibida, na medida em que seja susceptível de afectar o funcionamento do mercado ou a estrutura da concorrência, a exploração abusiva, por uma ou mais empresas, do estado de dependência económica em que se encontre relativamente a elas qualquer empresa fornecedora ou cliente, por não dispor de alternativa equivalente. 2 - Pode ser considerada abusiva, designadamente: a) A adopção de qualquer dos comportamentos previstos no n.º 1 do artigo 4.º; b) A ruptura injustificada, total ou parcial, de uma relação comercial estabelecida, tendo em consideração as relações comerciais anteriores, os usos reconhecidos no ramo da actividade económica e as condições contratuais estabelecidas.
3 - Para efeitos da aplicação do n.º 1, entende-se que uma empresa não dispõe de alternativa equivalente quando: a) O fornecimento do bem ou serviço em causa, nomeadamente o de distribuição, for assegurado por um número restrito de empresas; e b) A empresa não puder obter idênticas condições por parte de outros parceiros comerciais num prazo razoável.
Por seu lado, o artigo 4º da mesma Lei estabelecia que: “1 - São proibidos os acordos entre empresas, as decisões de associações de empresas e as práticas concertadas entre empresas, qualquer que seja a forma que revistam, que tenham por objecto ou como efeito impedir, falsear ou restringir de forma sensível a concorrência no todo ou em parte do mercado nacional, nomeadamente os que se traduzam em: a) Fixar, de forma directa ou indirecta, os preços de compra ou de venda ou interferir na sua determinação pelo livre jogo do mercado, induzindo, artificialmente, quer a sua alta quer a sua baixa; b) Fixar, de forma directa ou indirecta, outras condições de transacção efectuadas no mesmo ou em diferentes estádios do processo económico; c) Limitar ou controlar a produção, a distribuição, o desenvolvimento técnico ou os investimentos; d) Repartir os mercados ou as fontes de abastecimento; e) Aplicar, de forma sistemática ou ocasional, condições discriminatórias de preço ou outras relativamente a prestações equivalentes; f) Recusar, directa ou indirectamente, a compra ou venda de bens e a prestação de serviços; g) Subordinar a celebração de contratos à aceitação de obrigações suplementares que, pela sua natureza ou segundo os usos comerciais, não tenham ligação com o objecto desses contratos. 2 - Excepto nos casos em que se considerem justificadas, nos termos do artigo 5.º, as práticas proibidas pelo n.º 1 são nulas”.
E quanto a justificação, estabelecia o artigo 5º da mesma Lei o seguinte: “1 - Podem ser consideradas justificadas as práticas referidas no artigo anterior que contribuam para melhorar a produção ou a distribuição de bens e serviços ou para promover o desenvolvimento técnico ou económico desde que, cumulativamente: a) Reservem aos utilizadores desses bens ou serviços uma parte equitativa do benefício daí resultante; b) Não imponham às empresas em causa quaisquer restrições que não sejam indispensáveis para atingir esses objectivos; c) Não dêem a essas empresas a possibilidade de eliminar a concorrência numa parte substancial do mercado dos bens ou serviços em causa. 2 - As práticas previstas no artigo 4.º podem ser objecto de avaliação prévia por parte da Autoridade da Concorrência, adiante designada por Autoridade, segundo procedimento a estabelecer por regulamento a aprovar pela Autoridade nos termos dos respectivos estatutos. 3 - São consideradas justificadas as práticas proibidas pelo artigo 4.º que, embora não afectando o comércio entre os Estados membros, preencham os restantes requisitos de aplicação de um regulamento comunitário adoptado ao abrigo do disposto no n.º 3 do artigo 81.º do Tratado que institui a Comunidade Europeia. 4 - A Autoridade pode retirar o benefício referido no número anterior se verificar que, em determinado caso, uma prática por ele abrangida produz efeitos incompatíveis com o disposto no n.º 1”.
É também interessante notar, visto que as invocações das recorrentes já se estendem até 2002, o enquadramento das práticas restritivas ao abrigo do DL 371/93 de 29 de Outubro, anterior Lei da Concorrência expressamente revogada pelo artigo 59º nº 1 da Lei 18/2003. Nesse tempo, estabelecia o artigo 3º desse DL 371/93 que:
“1 - É proibida a exploração abusiva, por uma ou mais empresas, de uma posição dominante no mercado nacional ou numa parte substancial deste, tendo por objecto ou como efeito impedir, falsear ou restringir a concorrência. 2 - Entende-se que dispõem de posição dominante relativamente ao mercado de determinado bem ou serviço: 1. A empresa que actua num mercado no qual não sofre concorrência significativa ou assume preponderância relativamente aos seus concorrentes; 2. Duas ou mais empresas que actuam concertadamente num mercado, no qual não sofrem concorrência significativa ou assumem preponderância relativamente a terceiros. 3 - Sem prejuízo da ponderação, em cada caso concreto, de outros factores relativos às empresas e ao mercado, presume-se que: 1. Se encontra na situação prevista na alínea a) do número anterior uma empresa que detenha no mercado nacional de determinado bem ou serviço uma participação igual ou superior a 30%; 2. Se encontram na situação prevista na alínea b) do número anterior as empresas que detenham no conjunto do mercado nacional de determinado bem ou serviço: i- Uma participação igual ou superior a 50%, tratando-se de três ou menos empresas; ii- Uma participação igual ou superior a 65%, tratando-se de cinco ou menos empresas. 4 - Poderá ser considerada abusiva, designadamente, a adopção de qualquer dos comportamentos referidos no n.º 1 do artigo 2.º”.
Por outro lado dispunha o artigo 4º do mesmo Decreto-Lei que:
“É também proibida a exploração abusiva, por uma ou mais empresas, do estado de dependência económica em que se encontre relativamente a elas qualquer empresa fornecedora ou cliente, por não dispor de alternativa equivalente, nomeadamente quando se traduza na adopção de qualquer dos comportamentos previstos no n.º 1 do artigo 2.º”.
O artigo 2º identificava como práticas proibidas:
“1 - São proibidos os acordos e práticas concertadas entre empresas e as decisões de associações de empresas, qualquer que seja a forma que revistam, que tenham por objecto ou como efeito impedir, falsear ou restringir a concorrência no todo ou em parte do mercado nacional, nomeadamente os que se traduzam em: 1. Fixar, de forma directa ou indirecta, os preços de compra ou de venda ou interferir na sua determinação pelo livre jogo do mercado, induzindo, artificialmente, quer a sua alta quer a sua baixa; 2. Fixar, de forma directa ou indirecta, outras condições de transacção efectuadas no mesmo ou em diferentes estádios do processo económico; 3. Limitar ou controlar a produção, a distribuição, o desenvolvimento técnico ou os investimentos; 4. Repartir os mercados ou as fontes de abastecimento; 5. Aplicar, de forma sistemática ou ocasional, condições discriminatórias de preço ou outras relativamente a prestações equivalentes; 6. Recusar, directa ou indirectamente, a compra ou venda de bens e a prestação de serviços; 7. Subordinar a celebração de contratos à aceitação de obrigações suplementares que, pela sua natureza ou segundo os usos comerciais, não tenham ligação com o objecto desses contratos. 2 - Excepto nos casos em que se considerem justificados, nos termos do artigo 5.º, os acordos ou decisões proibidos pelo presente artigo serão nulos”.
E a justificação era estabelecida pelo artigo 5º nos seguintes termos:
“1 - Poderão ser consideradas justificadas as práticas restritivas da concorrência que contribuam para melhorar a produção ou a distribuição de bens e serviços ou para promover o desenvolvimento técnico ou económico desde que, cumulativamente: 1. Reservem aos utilizadores desses bens ou serviços uma parte equitativa do benefício daí resultante; 2. Não imponham às empresas em causa quaisquer restrições que não sejam indispensáveis para atingir esses objectivos; 3. Não dêem a essas empresas a possibilidade de eliminar a concorrência numa parte substancial do mercado dos bens ou serviços em causa”.
O artigo 12º do Código Civil dispõe: “1. A lei só dispõe para o futuro; ainda que lhe seja atribuída eficácia retroactiva, presume-se que ficam ressalvados os efeitos já produzidos pelos factos que a lei se destina a regular.
2. Quando a lei dispõe sobre as condições de validade substancial ou formal de quaisquer factos ou sobre os seus efeitos, entende-se, em caso de dúvida, que só visa os factos novos; mas, quando dispuser directamente sobre o conteúdo de certas relações jurídicas, abstraindo dos factos que lhes deram origem, entender-se-á que a lei abrange as próprias relações já constituídas, que subsistam à data da sua entrada em vigor”.
Deste modo, por aplicação do artigo 12º, em tudo o que se reporta às alterações introduzidas pelas Condições Gerais de Fornecimento de 2002, rege o DL 371/93, podendo apenas defender-se, a partir da segunda parte do nº 2 do preceito, que nas alterações de 2005 e seguintes em matéria de descontos variáveis, e por referência à funcionalização da dependência económica aos fins últimos da concorrência, a aplicação da Lei 18/2003 poderia tornar lícita uma prática idêntica anteriormente considerada como ilícita face à lei anterior. Já nos explicaremos melhor, mas em todo o caso não nos parece que a situação possa ser considerada diversa face às duas leis apesar das diferenças de redacção.
Afirmam as Recorridas que as Recorrentes não provaram que as primeiras têm posição dominante no mercado de referência e menos ainda que se encontram na dependência económica das primeiras.
É interessante perceber como as Recorridas constroem a sua tese (que não chega a ser uma expressa afirmação de que não estão, rectius, estavam, em posição dominante). Vejamos o corpo da sua contra-alegação:
“723. No âmbito do direito da União Europeia e do direito português, uma empresa tem posição dominante quando detém uma posição de mercado que lhe permite impedir a manutenção da concorrência efetiva no mercado relevante, por ter o poder de adotar comportamentos em grande medida independentes dos seus concorrentes, dos seus clientes e, em última análise, dos consumidores (cf. artigo 6.º n.º 2, da Lei da Concorrência). 724. Os ora Recorrentes justificam a sua conclusão de que as Rés têm posição dominante invocando quotas de mercado e a existência de barreiras à entrada no mercado relevante, designadamente a dependência dos consumidores relativamente a determinadas marcas de cigarros. 725. Relativamente às quotas de mercado (…) o que se verificava, já na data de entrada da presente ação, segundo dados apresentados pelos próprios Recorrentes, é que essas quotas de mercado estavam a decrescer. 726. De resto, essa tendência de decrescimento manteve-se nos anos seguintes, estando hoje em dia a quota de mercado das ora Recorridas bastante abaixo dos valores apontados pelos Recorrentes na sua petição inicial, em níveis inferiores a 60%. 727. Ora, esse decrescimento constante das quotas de mercado das Recorridas revela que a sua posição no mercado é claramente contestável, contrariando assim a tese de que a empresa pode comportar-se com independência face aos seus concorrentes, clientes e consumidores. 728. Acresce que o Tribunal de Justiça da União Europeia nunca considerou que a verificação de determinado nível de quota de mercado constitui prova irrefutável de existência de uma posição dominante. 729. Por outro lado, a tese da existência de barreiras à entrada é posta em causa pelo surgimento de vários novos produtos de cigarros e novos operadores nos anos a que se reportam os factos identificados pelos Recorrentes na sua PI; isto apesar da redução acentuada do consumo de cigarros. 730. Finalmente, a tese da dependência dos fumadores relativamente a determinadas marcas, que constituiria uma barreira à entrada e à expansão, é também contrariada pelo facto de as Recorridas terem perdido, ao longo dos últimos dez anos, quota de mercado, num quadro em que o mercado total, isto é, o número total de consumidores em Portugal, está também a reduzir-se. 731. Se há menos consumidores e se as Recorridas perdem quota de mercado, a única justificação possível para essa perda de quota está na opção de muitos consumidores de deixarem de comprar produtos das Rés para passarem a consumir cigarros de produtores concorrentes. 732. Esta realidade decorre do facto de provavelmente não existir, ao contrário do que alegam os Recorrentes uma forte dependência relativamente a determinadas marcas de cigarros, mas sim uma dependência relativamente ao consumo de cigarros, que faz com que os consumidores tenham dificuldade em deixar de fumar, mas mudem de marca de cigarros com relativa facilidade. 733. De resto, as crescentes restrições à utilização de sinais distintivos de cigarros, associada ao agravamento do contexto económico nos anos a que se reportam os factos e ao agravamento da carga fiscal, conduziram a uma maior indiferenciação dos produtos, que facilitou ainda mais esse processo de troca de marca. 734. Por outro lado, o forte agravamento da carga fiscal e o seu impacto no preço, explica também esse processo e a opção dos consumidores por produtos baratos, independentemente da marca. 735. Decorre do exposto, que não só os Recorrentes não demonstraram a existência de uma posição dominante, como existem vários indicadores de mercado que apontam para que seja altamente duvidoso que as Recorridas tenham efetivamente uma posição dominante nos mercados de tabaco”.
Sendo certo que o artigo 102º do TFUE não densifica o que é uma posição dominante, o Tribunal de Justiça tem afirmado que se trata de “uma posição de força económica de uma empresa que lhe permite impedir a manutenção de concorrência efectiva no mercado relevante, por ter o poder de se comportar, em larga medida, de modo independente dos seus concorrentes, clientes e, em última linha, dos seus consumidores” - Acórdão do TJUE de 14 de Fevereiro de 1978, United Brands (27/76), C.J. (1978) 207, para. 65.
Outra não é a definição que oferecem as próprias Recorridas nem nisso divergem as Recorrentes.
Quando cotejamos esta definição com o artigo 6º nº 2 al. a) da Lei 18/2003, vemos que a menção “não sofre concorrência significativa” se rebate na possibilidade de adoptar comportamentos “em grande medida” independentes – dito de outro modo, a posição dominante não se define em termos absolutos.
É certo que na passagem da lei antiga (DL 371/93) para a nova (Lei 18/2003) se perderam as presunções de posição dominante a partir, para empresa isolada, da participação igual ou superior a 30% do mercado, sem dúvida para tornar mais fluida a aplicação que já resultava da ressalva “Sem prejuízo da ponderação, em cada caso concreto, de outros factores relativos às empresas e ao mercado (…)”.
Porém, como é manifesto, a quota de mercado não deixa de ter uma relevância indiciária particularmente forte. Neste sentido – como se confirma também no processo T-219/99 – British Airways plc contra a Comissão (ECLI:EU:T:2003:343)[40] – o acórdão do TJUE no processo 85/76 Hoffmann-La Roche & Co./Comissão, Col. 1979, p. 461.
Em última análise, quando exista uma quota a 100%, não há sequer concorrência com a qual a empresa tenha de se preocupar, e na falta de alternativa, pode ela tomar as decisões que bem entender com independência também dos consumidores. Da meia concorrência aos 50% já não estamos perante esse poder ou essa liberdade se temos um concorrente com os outros 50%, mas se temos concorrentes vários que dividem estes outros 50% já a situação é mais favorável à empresa que detém 50%. A dado passo começa a ser aritmético: - se a quota se situa nos 80%, independentemente dos restantes 20% serem detidos por um ou mais concorrentes, a liberdade de quem detém 80% situa-se num nível bastante cómodo.
Se portanto temos como provado que “215 - No mercado de produção e comercialização de cigarros de produção fabril, em Portugal, a quota de mercado das T.. foi de 87% em 2005, de 82% em 2006, de 79,9% em 2007, de 79,3% em 2008, de 80,2% em 2009 e de 77,1% em 2010”, o apuramento da diferença que cabia, em cada ano dos elencados, aos concorrentes, é relativamente inócuo à liberdade de disposição independente das RR.
É certo que assistimos, segundo o mesmo facto, a uma diminuição de quase 10% em 5 anos. Voltemos à construção da tese.
“726. De resto, essa tendência de decrescimento manteve-se nos anos seguintes, estando hoje em dia a quota de mercado das ora Recorridas bastante abaixo dos valores apontados pelos Recorrentes na sua petição inicial, em níveis inferiores a 60%. 727. Ora, esse decrescimento constante das quotas de mercado das Recorridas revela que a sua posição no mercado é claramente contestável, contrariando assim a tese de que a empresa pode comportar-se com independência face aos seus concorrentes, clientes e consumidores”.
Primeiro então voltar a uma afirmação de metodologia histórica: não se explica o passado pelo presente. E em termos jurídicos ou melhor dizendo judiciais, para o efeito dum processo em que estão em causa anos determinados, até 2010, não nos interessa – porque simplesmente não pode interessar e de resto nem está provado – saber qual foi a diminuição de quota depois de 2010.
O decrescimento das quotas de mercado, salvo o devido respeito, não releva nada para os autos enquanto demonstração de que a posição das RR é contestável, não é isso que nos importa, antes é saber se a posição foi contestada. Não se trata de fazer afirmações abstractas, mas de saber, em termos de factos provados, se para as condutas em causa nos autos, reportadas ao relacionamento da T… (lato sensu) com os grossistas, ela conseguiu agir de modo independente deles, do mesmo modo que conseguiu agir de modo independente ao que faziam as suas concorrentes, e independentemente também dos seus consumidores.
De resto, como alinhámos, não se trata também de saber se as Rés agiram com independência total mas com significativa independência, o que é manifestamente compatível com o abaixamento das quotas. O abaixamento das quotas não revela assim – e pelo menos tendo em conta as quotas provadas no facto 215, situadas medianamente nos 80% - uma possibilidade de contrariar a relevância da quota de mercado como indício de posição dominante, porque esta se verifica em concreto e porque é compatível com a existência de quotas menores dos concorrentes, na medida em que mantendo-se este confronto maior contra menor, sempre ao maior se terá de atribuir independência significativa em relação ao menor[41].
Não sendo a quota de mercado o único indício, respondem as Recorridas às Recorrentes na invocação por estas da existência de barreiras à entrada no mercado relevante desvalorizando o elemento da dependência dos fumadores em relação às marcas: 730. Finalmente, a tese da dependência dos fumadores relativamente a determinadas marcas, que constituiria uma barreira à entrada e à expansão, é também contrariada pelo facto de as Recorridas terem perdido, ao longo dos últimos dez anos, quota de mercado, num quadro em que o mercado total, isto é, o número total de consumidores em Portugal, está também a reduzir-se. 731. Se há menos consumidores e se as Recorridas perdem quota de mercado, a única justificação possível para essa perda de quota está na opção de muitos consumidores de deixarem de comprar produtos das Rés para passarem a consumir cigarros de produtores concorrentes. 732. Esta realidade decorre do facto de provavelmente não existir, ao contrário do que alegam os Recorrentes uma forte dependência relativamente a determinadas marcas de cigarros, mas sim uma dependência relativamente ao consumo de cigarros, que faz com que os consumidores tenham dificuldade em deixar de fumar, mas mudem de marca de cigarros com relativa facilidade.
Deve então notar-se que as Rés não impugnaram a decisão sobre a matéria de facto proferida em 1ª instância, donde resultava que: “218 - O mercado de fornecimento de produtos de tabaco é um mercado onde existem importantes barreiras de facto à entrada como a fidelidade dos consumidores a uma marca resultante da dependência provocada pelo consumo”, “222 - No mercado dos cigarros, verifica-se a dependência do consumidor relativamente à marca dos produtos que consome”, “223 - Tal estado de dependência do consumidor faz com que o aumento de preços da marca dos produtos que consome que não ultrapasse o limite do incomportável não implique a mudança para outra marca”.
Para que pudéssemos considerar a agora subtilmente introduzida distinção entre forte dependência e dependência da marca – e diga-se, não relativamente a determinadas marcas, mas relativamente às marcas fumadas efectivamente pelos fumadores e para o caso que nos interessa, justamente às marcas mais vendidas em Portugal, que são provadamente M… e S…, marcas das Rés – necessário seria que essa distinção tivesse sido levada à decisão sobre a matéria de facto.
O facto puro é portanto que há dependência do consumidor em relação à marca que fuma, e que é tal que “o aumento de preços da marca dos produtos que consome que não ultrapasse o limite do incomportável”, sendo ainda certo que eram as Rés que comunicam os PVP que eram depois oficialmente aceites, ou seja, no limite, também com intervenção do Estado na ponderação do limite do incomportável (cfr. artigo 96º do Código dos Impostos Especiais de Consumo, na versão introduzida pelo artigo 2º do Decreto Lei 307-A/2007 de 31 de Agosto. Note-se aliás o desaparecimento desta intervenção – artigo 112º do CIEC aprovado pelo Decreto Lei 73/2010 de 21 de Junho e alterações subsequentes – na alteração introduzida pela Lei nº 42/2016 de 28 de Dezembro).
Note-se, de resto, que no parágrafo 731 as Recorridas pressupõem – sem qualquer apoio em matéria de facto – que a redução de consumo não atingiu os fumadores que eram fumadores de marcas das RR, por isso que a perda de quota significa então que esses fumadores mantiveram-se a fumar mas trocaram os produtos das Rés pelos da concorrência. Não há disso qualquer evidência nos autos.
Por outro lado, temos provado todo o rol de alterações que foram feitas nas Condições Gerais de Fornecimento – consignação da possibilidade de alteração unilateral irrestrita e não condicionada, redução do desconto fixo e possibilidade de reconstituição por modalidades de desconto variável, entre elas o desconto por informação com informação sobre a globalidade das compras de produtos concorrentes, e informação detalhada sobre os clientes retalhistas, o desconto por escalões de venda diferenciado por distrito, a introdução do factor de correcção e do preço fixo por caixa, entre outros aspectos já examinados – e temos como provado que “232 - Os concorrentes da T… atribuem margens mais elevadas na distribuição dos seus produtos do que a T… atribui” e bem assim que “277 - Apesar da redução da margem dos grossistas, o peso dos produtos da T.. continuou a ser preponderante no volume de vendas dos AA”. Significa isto que a T… com as quotas de mercado que apresentou nos anos já referidos, com a dependência do consumidor das suas marcas relativamente a elas, ao ponto de apenas aumentos ultrapassando o limite do incomportável os fazerem (ou deixar de fumar ou) procurar produtos mais baratos da concorrência, com a prática de condições mais favoráveis à distribuição pelos seus concorrentes e com as imposições – e no caso do factor de correcção é patente que se tratou duma imposição, com desconsideração da oposição expressa dos grossistas – significa tudo isto, dizíamos, que as RR agiram com significativa independência da conduta das suas concorrentes, das posições dos grossistas e até dos consumidores. Até se poderia dizer, como as recorrentes também depois esboçam, que quanto aos consumidores as RR de facto não foram independentes, porque sempre se preocuparam em assegurar a inexistência de rupturas de stock, mas o argumento é deslocado: por um lado, não há posição dominante nem dominada, pura e simplesmente não há posição se não se vender, e por outro, assegurar a inexistência de ruptura de stock significa assegurar a manutenção da dependência, que é a única coisa que importa para controlar o consumidor. Quando, na venda dum produto que gera dependência do consumidor, perguntamos pela posição dominante e pela independência significativa do produtor face ao consumidor, esta independência só pode aferir-se em relação a outro comportamento que não passa pela manutenção da dependência, e desde logo como é claro, à liberdade de aumento de preço do produto.
Note-se ainda que no Estudo do Mercado do Tabaco são apontadas outras barreiras à entrada no mercado, desde logo a estrutura fiscal[42], os condicionamentos à introdução de cigarros e a necessidade de autorização para introdução de novas marcas no mercado[43]. Também muito relevante, enquanto barreira, ainda que para o tempo dos autos se mostrasse em crescendo, a legislação dominada pela luta contra o tabagismo – Lei 37/2007 de 14 de Agosto[44], e alterações subsequentes dadas pela Lei 109/2015 de 26.8 e pela Lei 63/2017 de 3.8 – com forte restrição à publicidade, proibição de venda a menores, proibições de fumar em variados lugares, e exigências em termos de ingredientes e emissões.
É claro que estas barreiras afectaram e afectam também as Rés, mas no alcance do mercado as Rés já iam muito à frente, para usar uma imagem, em explicação da razão pela qual as concorrentes tinham muito mais dificuldade em fazer crescer as suas quotas de mercado, o que correspondentemente fortalecia a posição da T…, permitindo-lhe independência significativa. É que também do ponto de vista da distribuição grossista, está provado que “227 - Inexistem no mercado dos cigarros de produção fabril produtos pelos quais os AA. possam substituir os da T… no caso de esta cessar o fornecimento àqueles”, sendo que “225 - Os retalhistas clientes dos AA., perante a impossibilidade de adquirir junto destas os produtos comercializados pelas T…, passariam a recorrer a um grossista que lhes permitisse simultaneamente adquirir as marcas comercializadas pelas T… e outras marcas” porque “226 - A grande maioria dos distribuidores fornece todas as marcas”. Donde, digamos assim, a posição das Rés no mercado dava-lhes uma margem de liberdade de actuação comercial muito confortável. Notório é também que as Rés não se acomodaram, antes foram instituindo diversos mecanismos de asseguramento da sua posição – “228 - Os descontos comerciais variáveis em função dos volumes de aquisição de produtos da T… incentivaram os grossistas a adquirir mais produtos da T… como forma de potenciar a margem de lucro a obter”, além de muitos outros, que no Estudo do Mercado do Tabaco são apresentadas como indícios comportamentais da posição dominante (e que resultariam inexplicados se não fosse essa posição dominante)[45], mas que, já integrando a eventual qualificação como abuso, preferimos abordar posteriormente.
Uma última menção ao leque de marcas disponíveis – anexos das CGF sobre desconto por carteira de produtos – onde se incluem as marcas mais prestigiadas e mais fumadas em Portugal, para confortar ainda mais a posição da T….
Concluamos portanto que as Rés detinham uma posição dominante no mercado relevante.
Passemos então à dependência económica das AA. e AA.
Não havendo previsão da figura no direito europeu, aplicamos apenas o direito nacional.
Já vimos que legalmente e ao tempo de 2002, o DL 371/93 apontava para uma caracterização do estado de dependência económica no caso da empresa dependente “não dispor de alternativa equivalente, nomeadamente quando se traduza na adopção de qualquer dos comportamentos previstos no n.º 1 do artigo 2.º”, ou seja “1. Fixar, de forma directa ou indirecta, os preços de compra ou de venda ou interferir na sua determinação pelo livre jogo do mercado, induzindo, artificialmente, quer a sua alta quer a sua baixa; 2. Fixar, de forma directa ou indirecta, outras condições de transacção efectuadas no mesmo ou em diferentes estádios do processo económico; 3. Limitar ou controlar a produção, a distribuição, o desenvolvimento técnico ou os investimentos; 4. Repartir os mercados ou as fontes de abastecimento; 5. Aplicar, de forma sistemática ou ocasional, condições discriminatórias de preço ou outras relativamente a prestações equivalentes; 6. Recusar, directa ou indirectamente, a compra ou venda de bens e a prestação de serviços; 7. Subordinar a celebração de contratos à aceitação de obrigações suplementares que, pela sua natureza ou segundo os usos comerciais, não tenham ligação com o objecto desses contratos”.
Já vimos também que nos termos da Lei 18/2003, concretizando melhor a falta de alternativa, se estabelecia, no artigo 7º, que “3 - Para efeitos da aplicação do n.º 1, entende-se que uma empresa não dispõe de alternativa equivalente quando: a) O fornecimento do bem ou serviço em causa, nomeadamente o de distribuição, for assegurado por um número restrito de empresas; e b) A empresa não puder obter idênticas condições por parte de outros parceiros comerciais num prazo razoável”.
Repare-se então que a questão da dependência se põe quer a empresa de qual se depende tenha ou não uma posição dominante no mercado (a dificuldade de obter alternativas com idênticas condições não depende da posição dominante, se houver, por exemplo, 5 empresas com 20% cada uma, nenhuma é dominante e ainda assim estamos num número restrito de fornecedores ou clientes) e quer esta empresa de que se depende seja uma fornecedora ou uma cliente (são manifestamente pensáveis casos de dependência económica do produtor face ao seu distribuidor). O crivo da dependência é portanto não se dispor de alternativa equivalente em consequência do que se fica sujeito ao mando, por assim dizer, da empresa da qual se depende.
Dir-se-á que o estado de dependência é um estado de facto puro, a obter a partir das circunstâncias fácticas do mercado relevante, e que sobre estado assim apurado se irá depois operar a perspectivação concorrencial, cuja afectação leva à proibição. Isto é, em termos rigorosos, a primeira tarefa é apurar o estado de dependência, e a segunda é apurar da sua relevância jus-concorrencial.
Voltemos às teses das Recorridas:
“751. Os Recorrentes não conseguiram demonstrar o preenchimento destes dois requisitos, o que seria necessário para provar um estado de dependência económica face às Rés.
Os Recorrentes não demonstraram que fornecimento de cigarros em Portugal é assegurado apenas por um número restrito de operadores 752. Deve começar-se por notar que, para efeito de aplicação do requisito previsto na al. a) do n.º 3 do artigo 7.º da Lei da Concorrência, “o bem em causa” compreende todos os bens que estão no mesmo mercado relevante em que se integra o produto relativamente ao qual se alega a dependência, ou seja, compreende todos os produtos que são substituíveis e que, no caso vertente, são os cigarros fabris, como referem as Autoras ora Recorrentes (cf. artigo 408.º da PI). 753. Ora, em Portugal, não há um número restrito de empresas às quais os Grossistas podem comprar cigarros. 754. Na verdade, entre produtores, importadores e outros Grossistas, há muitas opções às quais as Recorrentes podem recorrer para adquirir cigarros. 755. Recorde-se que, além das marcas já estabelecidas há muitos anos em Portugal, vêm aparecendo vários marcas novas no mercado português, sendo alargado o leque de oferta de cigarros em Portugal. Aliás, há Grossistas que são importadores e detêm marcas de cigarros em Portugal. 756. Está assim perfeitamente ao alcance das Recorrentes recorrer a concorrentes das Rés para se abastecerem de produtos de outras marcas, sendo que várias delas têm qualidade e notoriedade equiparáveis aos produtos comercializados pela 2.ª Ré. 757. O facto de não ser imposta aos Grossistas qualquer obrigação de compra exclusiva de produtos das Recorridas, nem existir qualquer identificação dos Grossistas com as Recorridas, em termos de obrigações de imagem (fardamento, etc.), facilita a comercialização de produtos concorrentes pelos Grossistas que, de resto, existe há já vários anos. 758. Com efeito, as Recorrentes, assim como outros Grossistas, dispõem de outros parceiros comerciais na comercialização de cigarros para além da 2.ª Ré, como já dispunham quando a presente ação foi iniciada, sendo porventura essa uma das razões que explicam a perda de quota de mercado das Rés que se vem verificando ao longo dos anos. 759. Como também têm a possibilidade de aquisição de cigarros comercializados pelas Rés a outros Grossistas, atendendo ao universo de mais de 150 grossistas existentes em Portugal continental. 760. Conclui-se assim que os ora Recorrentes não lograram demonstrar que o fornecimento de cigarros em Portugal é assegurado apenas por um número restrito de operadores.
Os Recorrentes não demonstraram que não podem obter idênticas condições por parte de outros parceiros comerciais num prazo razoável 761. A ausência de qualquer exclusividade nas relações comerciais com as Recorridas permite aos Grossistas não concentrarem a sua atividade num ou mais dos produtos e/ou marcas comercializadas pela 2.ª Ré. 762. As Recorrentes já têm acesso a produtos alternativos, o que vem acontecendo em paralelo com a redução de quota de mercado das Recorridas. 763. E, como acima se deixou dito, existem soluções alternativas, em particular no que respeita à compra de cigarros tecnicamente semelhantes, de outras marcas, que as Recorrentes poderão rapidamente, e sem custos adicionais, passar a comercializar ou cuja comercialização (se já existe) podem incrementar. 764. Aliás, os Recorrentes até referem que conseguem obter melhores condições comerciais dos fornecedores concorrentes das Rés (cf. artigo 575.º da PI). 765. Parece, assim, evidente que a conclusão de que não existem alternativas equivalentes é, no mínimo, precipitada, senão mesmo infundada, sem se aferir previamente se as Recorrentes se empenharam ou ponderaram tal empenhamento, em que medida o fizeram e durante quanto tempo, na busca de soluções alternativas. 766. Na verdade, o ritmo a que a 2ª Ré tem perdido quota de mercado ao longo dos anos dá a entender que os Grossistas tinham mesmo alternativas, que terão começado a explorar quando nisso viram interesse. 767. Como refere MIGUEL MOURA E SILVA, “(…) é necessário que o estado de dependência resulte de fatores objetivos e não de uma estratégia da empresa que se coloca deliberadamente nas mãos de um ou dois fornecedores ou clientes, quando existe a possibilidade de diversificar as suas fontes de abastecimento (…). A ligação deste estado a um potencial impacto na concorrência exige que a intervenção se fundamente em razões objetivas que impedem a obtenção de alternativas (…)”193. 768. Como lembra ainda MIGUEL MOURA E SILVA, “na aferição da inexistência de uma alternativa equivalente, a jurisprudência francesa tem sublinhado que não basta ter em conta o peso das vendas ou das compras, uma vez que esse indicador não é determinante quanto à questão da possibilidade de encontrar outros fornecedores”194. 769. Está assim por provar que exista uma impossibilidade de substituir produtos ora comercializados pela 2.ª Ré por outros equivalentes, não tendo ficado, assim, demonstrada a existência de um estado de dependência económica das Recorrentes, relativamente às Recorridas. 770. Acresce que a “alternativa equivalente” pode estar noutros bens de consumo que possam ser comercializados aos mesmos clientes retalhistas que as Recorrentes têm no seu comércio de produtos de cigarros. 771. Com efeito, com os seus meios de transporte, logística, armazenagem, serviços administrativos e de vendas e rede de clientes, as Recorrentes podem, com relativa facilidade e sem custos adicionais significativos, redirecionar-se para o desempenho de atividades similares à compra e revenda de produtos de tabaco. 772. Em face do exposto, é evidente que os meios que as Recorrentes têm à sua disposição sempre lhes permitiriam, perante uma hipotética ausência de fornecimento dos produtos comercializados atualmente pela 2.ª Ré, encontrar uma “alternativa equivalente”, no sentido indicado”.
Dizer então, quanto ao número restrito de empresas que fornecem cigarros de produção fabril, que embora não haja um facto provado a dizer propriamente quais são as outras empresas que em Portugal se dedicam a essa produção/comercialização, acabamos por ter uma indicação relevante, mais propriamente equivalente, nas quotas de mercado constantes do facto provado 215. É que, se podem haver muitas outras empresas fornecedoras, elas em todo o caso e no seu conjunto, para os anos em causa nesse facto, não conseguiam fornecer mais do que o remanescente das quotas das Rés, desde logo porque provada está a dependência do consumidor em relação à marca, e por isso que, quisessem os grossistas uma alternativa a não tinham (está também provado que 227 - Inexistem no mercado dos cigarros de produção fabril produtos pelos quais os AA. possam substituir os da T… no caso de esta cessar o fornecimento àqueles) junto dos concorrentes das Rés, ou tendo-a, ainda assim o seu mercado ficaria reduzido ao valor das quotas da concorrência, o que no mínimo é bastante claro para dizer que não seria equivalente ao mercado que obteriam com a venda dos produtos da T...
Por isto, em rigor, o único modo de contornar seria a compra a outros grossistas, sobretudo aos que comprassem com mais desconto e que pudessem revender a um preço inferior ao que os grossistas “dependentes” pudessem directamente comprar às Rés, o que porém as Rés se encarregaram de barrar em termos práticos logo em 2002, quando “278 - De acordo com as CGF de 2002 se um grossista vender produtos da T… a outros grossistas que representem, na sua facturação, pelo menos, 50% desse valor, passa a ser considerado um distribuidor passivo o que implica a perda do desconto de distribuição directa e activa”, ou seja, desincentivando os grossistas maiores e com melhores condições de compra a revender a outros grossistas.
Tanto basta para demonstrar que não é correcto pensar que as AA. e AA não demonstraram o número restrito de empresas fornecedoras. Insiste-se: - as definições em causa são formuladas de modo abstracto para todos e quaisquer produtos, mas no caso dos produtos que causam dependência da marca, há que fazer um afunilamento: qual o número de empresas às quais seria possível recorrer para ser fornecido de produtos dessa marca, é o ponto que releva. Em todo o caso e mesmo que assim não seja, também as conclusões que retirámos a partir das quotas de mercado permite a mesma conclusão dum número de fornecedores equivalente a restrito.
Quanto à obtenção de idênticas condições comerciais, e notando já que temos de nos situar historicamente nos anos que estão em causa nos autos e não no que aconteceu nos agora quase 10 anos depois, volta a explicar-se que a dependência do fumador em relação à marca impede que se afirme o acesso a produtos equivalentes, mas, ainda que assim não seja, deve ainda dizer-se que a não exclusividade formal foi substancialmente atenuada pelos mecanismos de incentivos instituídos pelas Rés, das campanhas de incentivos aos descontos variáveis – o que aliás, como consta do Estudo do Mercado do Tabaco, motivou a queixa da B… por entender constituírem esses mecanismos de fidelização da rede distribuidora que a impediam a ela, como concorrente da T…, de aceder à mesma rede – ou seja, que apesar de não haver formalmente uma exclusividade de compra dos grossistas às Rés, aliás em decorrência do livre mercado europeu e das exigências da privatização, na prática não se perdeu significativamente essa exclusividade. Quanto ao empenhamento dos grossistas na procura de alternativas o problema – da aplicação da tese que o Direito da Concorrência visa precisamente salvaguardar a concorrência e por natureza impedir o acomodamento dos agentes, com que se concorda – é o “prazo razoável” da alínea b) do nº 3 do artigo 7º da Lei 18/2003. Para facilitar a compreensão, expõe-se o argumento em pergunta: - quanto tempo demorariam os grossistas a acabar com a dependência de 80% dos fumadores nacionais às marcas da T…, notoriamente ao M… e ao S…? Quanto tempo teria o mercado T… de ser boicotado, literalmente, com induzidas rupturas de stock, até que a dependência dos consumidores se acomodasse a marcas equivalentes – porém sempre com características distintas – da concorrência? Quando são as próprias Recorridas a afirmar que para os dias das suas contra-alegações a descida da quota as situou em 60%, parece que o prazo razoável – e aqui note-se que em teoria o Direito e a Lei, quando regulam, pressupõem que o que regulam se conforma com a legalidade, e portanto a previsão não é a do prazo razoável se apurar em face de atitudes desconformes ao Direito, como boicotes e sabotagens – é um prazo de vários anos, o que é pouco razoável, pois o que está em causa é a condescendência com, ou a irrelevância dos, prejuízos sofridos durante pouco tempo.
Finalmente, ainda que se pudesse admitir que para a alternativa equivalente se pudessem convocar produtos de fora do mercado relevante, e que as Recorrentes tivessem os meios humanos, técnicos e logísticos para essa reconversão, sempre se perguntaria qual é o alternativo produto de consumo diário, de baixo preço, do qual estão dependentes milhões de consumidores, que não podendo legalmente ser o estupefaciente puro e simples, também não é o álcool (que dificilmente apresenta dependência da marca), de todo se justificando convocar os mesmos meios humanos, técnicos e logísticos para a venda de jogo. A dizer portanto que temos muitas dúvidas que fosse possível aos grossistas de cigarros de produção fabril encontrarem uma alternativa equivalente fora do mercado relevante.
Se portanto temos provado que “50 - Relativamente à marca M…, as RR. detêm uma licença da sua empresa mãe, a P…, na qualidade de detentora exclusiva dos direitos sobre o fabrico e comercialização da mesma em Portugal; 219 - A marca de cigarros M… tem notoriedade internacional; 213 - As principais marcas de cigarros de produção fabril comercializadas em Portugal pela T…são a S… e a M…; 214 - As marcas S… e M… são as duas marcas líderes no mercado português, sendo a marca S… a que, em Portugal, tem maior implantação; 238 - No ano de 2009, os AA. adquiriram à R. T… produtos de tabaco no valor total de € 294.501.564,45, correspondente ao valor a pagar de € 273.658.455,02; 221 - Os consumidores de tabaco procuram no mercado os agentes que lhes possam disponibilizar a marca que desejam; 222 - No mercado dos cigarros, verifica-se a dependência do consumidor relativamente à marca dos produtos que consome; 223 - Tal estado de dependência do consumidor faz com que o aumento de preços da marca dos produtos que consome que não ultrapasse o limite do incomportável não implique a mudança para outra marca; 227 - Inexistem no mercado dos cigarros de produção fabril produtos pelos quais os AA. possam substituir os da T…no caso de esta cessar o fornecimento àqueles; 225 - Os retalhistas clientes dos AA., perante a impossibilidade de adquirir junto destas os produtos comercializados pelas T…, passariam a recorrer a um grossista que lhes permitisse simultaneamente adquirir as marcas comercializadas pelas T… e outras marcas; 217 - Os principais distribuidores de tabaco, em Portugal, distribuem uma gama alargada de produtos de tabaco e não apenas um único tipo; 226 - A grande maioria dos distribuidores fornece todas as marcas; 220 - Os retalhistas deixarão de procurar os produtos de tabaco de um determinado grossista se este deixar de oferecer os produtos da T…” logo percebemos que não é o facto de “232 - Os concorrentes da T… atribuem margens mais elevadas na distribuição dos seus produtos do que a T… atribui” que serve como paliativo nem porta de emergência para a dependência concreta dos grossistas de cigarros de produção fabril em Portugal, e nomeadamente das AA. e AA., em relação às Rés.
Repare-se finalmente que tal como está pensada legalmente, a alternativa equivalente não é equiparável à redução de negócio, à introdução de novas técnicas de gestão de recursos técnicos ou tecnológicos ou de recursos humanos, a despedimentos, outsourcings e abaixamento de salários, ou à possibilidade de repercussão de prejuízos sobre os clientes retalhistas, nem à possibilidade de aumento de preço de revenda ou de venda final, neste último caso aliás impossível em absoluto. Não estando firmada a propriedade do mais fraco a ser mais fraco, a questão da adaptabilidade ao mercado, para efeitos da definição do estado de dependência económica, não passa além do encontro dum número não restrito de outros fornecedores ou clientes e da possibilidade de encontrar alternativas de produtoem idênticas condições por parte de outros parceiros comerciais num prazo razoável.
Concluímos assim que as AA. e AA. se encontravam num estado de dependência económica das Rés ao longo do período em causa. Dos abusos da posição dominante e da dependência económica:
Antes de mais, a precisão que fazem as Recorridas quanto ao abuso de dependência económica e com a qual se tem de concordar. Chamam aquelas a atenção para que “(…) importa clarificar o sentido e alcance da figura legal do abuso de dependência económica.
738. Esta clarificação parece-nos importante uma vez que esta modalidade de abuso, prevista na Lei da Concorrência, pode gerar alguma perplexidade quanto à sua inserção no direito da concorrência.
739. Com efeito, trata-se de uma disposição legal que, por parecer que remete para uma noção de equilíbrio nas relações comercias, faria aparentemente mais sentido no âmbito do direito privado, a considerar-se que haveria necessidade de tal disposição.
740. Mas esta norma não tem como propósito o equilíbrio nas relações comerciais.
741. É que o abuso de dependência económica só é punível “na medida em que seja suscetível de afetar o funcionamento do mercado ou a estrutura da concorrência”, como prevê o artigo 7.º, n.º 1 da Lei da Concorrência.
742. Nem poderia ser de outra forma, sob pena de – precisamente - a norma extravasar o âmbito do direito da concorrência para se transformar numa norma de direito privado.
743. A este propósito, deve assinalar-se que a Lei da Concorrência reformulou em 2003 o tipo legal de abuso de dependência económica que constava do Decreto-Lei n.º 371/93, para incluir, cirurgicamente, o segmento transcrito acima, que remete para a necessidade de afetação do funcionamento do mercado ou da estrutura da concorrência.
744. Sobre este ponto, é particularmente útil atentar no seguinte excerto da Exposição de Motivos da Proposta de Lei n.º40/IX (Aprova o Regime Jurídico da Concorrência), de 2003, que esteve na base da Lei da Concorrência: «Enfim, altera-se significativamente, no artigo 7.º desta proposta de lei, o regime da figura do abuso de dependência económica, prevista no artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 371/93. Entende-se, com efeito, que, a manter-se na legislação portuguesa da concorrência a referência a uma tal figura (desconhecida na maior parte das legislações comunitárias), se impõe a modificação dos seus pressupostos, de modo a que possa actuar apenas se e na medida em que seja susceptível de afectar o funcionamento do mercado ou a estrutura da concorrência.»190 (realce nosso)
745. Neste sentido, note-se o que refere MIGUEL MOURA E SILVA a propósito desta norma:
«Não podendo uma norma de concorrência proteger um equilíbrio contratual de forma a torná-lo imutável – criando uma espécie de regra de propriedade a favor da parte mais fraca, na terminologia da análise económica do direito, o sentido daquela proibição só pode então ser o de estabelecer um conjunto de regras que enquadrem essas modificações ou mesmo a cessação de relações, atendendo às repercussões que tais condutas poderão ter na concorrência (…).»191 (ênfase nosso)
746. Seguindo o mesmo autor, o que está aqui em causa é “o recurso a meios que acabam por prejudicar não apenas os interesses dos parceiros comerciais dependentes como também implicam o risco de ter implicações ao nível da redução de escolhas dos consumidores”192. (realce nosso)”.
Se o que as Recorridas dizem encontra apoio claro na letra do artigo 7º da Lei 18/2003, e mais na exposição de motivos que citaram, a questão é saber se já ao abrigo da lei antiga se não deveria entender do mesmo modo. Com efeito, apesar de na exposição de motivos da proposta se referir a alteração dos pressupostos, não exclui isso que no regime antigo não devesse também entender-se que a protecção do equilíbrio contratual em última análise não visava contraentes ou operadores económicos específicos, antes o facto desse equilíbrio satisfazer os próprios fins da concorrência, é dizer o interesse dos consumidores em que duma concorrência “salutar” resultasse abaixamento de preço, mais qualidade, mais escolha, melhores produtos disponíveis a um preço acessível.
Digamos que, para o equilíbrio contratual, já o Direito Privado servia instrumentos vários, da boa-fé, sobretudo, ao pontual cumprimento dos contratos e ao regime das cláusulas contratuais gerais. Portanto, não faria sentido a repetição dum instrumento de protecção cuja novidade se centraria na especial qualidade de agente económico dos intervenientes e num elenco de comportamentos integrantes do que afrontaria a boa-fé.
Depois, é no próprio preâmbulo do DL 371/93 que se encontra um sinal da funcionalização do abuso de dependência económica aos fins da concorrência. Com efeito lê-se nesse preâmbulo:
“Após nove anos de vigência, o Decreto-Lei n.º 422/83, de 3 de Dezembro, embora tenha correspondido de uma maneira geral aos objectivos que presidiram à sua publicação, carece de ajustamentos que permitam uma melhor adaptação do seu conteúdo à nova ordem nacional e internacional e uma maior eficácia na prossecução dos seus objectivos, dando assim adequado cumprimento ao imperativo constitucional constante da alínea f) do artigo 81.º da Constituição. De facto, ocorreram profundas alterações na estrutura e funcionamento da economia portuguesa ditadas pela liberalização, desregulamentação e privatização de importantes áreas da actividade económica, pelo avanço do processo de integração europeia e pelo aparecimento de novos protagonistas que introduziram importantes mudanças no tecido empresarial e modificaram a relação de forças no mercado. A crescente interpenetração das economias e integração dos mercados nacionais torna imprescindível uma correcta articulação das diferentes políticas nacionais de concorrência como condição indispensável para a promoção da competitividade das estruturas económicas.
O presente diploma visa integrar numa autêntica lei quadro da política de concorrência os desenvolvimentos próprios de uma economia aberta, em crescente processo de internacionalização e de dinamismo concorrencial, contribuindo para a liberdade de formação da oferta e da procura e de acesso ao mercado, para o equilíbrio das relações entre agentes económicos, para o favorecimento dos objectivos gerais de desenvolvimento económico e social, para o reforço da competitividade dos agentes económicos e para a salvaguarda dos interesses dos consumidores. Nele estão presentes, pois, aspectos inovadores, de entre os quais assume relevância o seu carácter universal e sistemático, que lhe garante a indispensável coerência.
Assim, para além das práticas restritivas da concorrência, o presente diploma contempla as concentrações de empresas e aflora os auxílios de Estado, completando o quadro dos principais instrumentos da política comunitária de defesa da concorrência.
No campo das práticas restritivas da concorrência importa realçar a introdução da figura do abuso do estado de dependência económica. A exploração abusiva do estado de dependência económica só era considerada restritiva da concorrência se praticada por empresas que detivessem uma posição dominante no mercado de determinado bem ou serviço, o que impedia o seu sancionamento quando praticada por empresas com elevado poderio económico mas sem posição dominante nesse mercado. Releve-se, todavia, que o que se pretende com a criação desta figura é sancionar o abuso e não comportamentos ditados por uma efectiva concorrência, como sejam os resultantes de opções por melhores condições negociais”.
O objectivo específico foi o de clarificar que não apenas empresas em posição dominante eram susceptíveis de serem aquelas de que outras podiam ser economicamente dependentes. Mas, se um cenário de “profundas alterações na estrutura e funcionamento da economia portuguesa ditadas pela liberalização, desregulamentação e privatização de importantes áreas da actividade económica, pelo avanço do processo de integração europeia e pelo aparecimento de novos protagonistas que introduziram importantes mudanças no tecido empresarial e modificaram a relação de forças no mercado”, se apresenta com um potencial relevante de abuso, o certo é que exigências maiores de regulamentação de concorrência claramente indicam que a preocupação não era de carácter privado mas público, ou seja, não se tratava apenas de proteger um equilíbrio privado de interesses, eventualmente se apresentando em contraciclo, mas a medida em que ele se revelasse pertinente para a defesa duma concorrência actualizada e eficaz. Até poderíamos por a hipótese de que o contraciclo se apresentasse então como um resquício proteccionista sub-repticiamente introduzido para salvaguarda dum tempo de adaptação das empresas nacionais ao novo cenário, mas o caso dos autos de alguma maneira até revela que mais pertinente seria a preocupação consistir em, no domínio das relações verticais, assegurar aos novos intervenientes o acesso às cadeias de distribuição (vitalizando por choque adaptativo as empresas nacionais) e conseguir então fornecer ao público novos e melhores e mais baratos produtos, em última análise porque, isto acontecendo, é toda a economia que sai dinamizada, com repercussões favoráveis ao nível do emprego, dos salários e do poder de compra (em teoria) e ao nível fiscal.
Afigura-se portanto menor credibilidade nessa ideia de proteccionismo sub-reptício e conclui-se pois que, mesmo não constando da versão do DL 371/93, em vigor ao tempo da emissão das Condições Gerais de Fornecimento de 2002, também aí o abuso da dependência económica só relevaria se fosse susceptível de afectar o funcionamento do mercado ou a estrutura da concorrência.
E por esta razão, no enquadramento que mais adiante vamos fazer dos eventuais ilícitos vamos por economia referir os preceitos da Lei de 2003, devendo entender-se que quanto aos factos que se situam antes da sua entrada em vigor que as normas aplicáveis são as antigas mas que nos estamos a dispensar de as mencionar e de reproduzir o seu conteúdo porque o seu conteúdo material se encontra por inteiro na Lei de 2003.
Antes de prosseguir, importa ainda tentar perceber os campos de aplicação do abuso da posição dominante e do abuso da dependência económica.
Quando, no artigo 6º epigrafado “abuso da posição dominante” temos a proibição da “exploração abusiva, por uma ou mais empresas, de uma posição dominante no mercado nacional ou numa parte substancial deste, tendo por objecto ou como efeito impedir, falsear ou restringir a concorrência” e quando vemos como exemplificativas do abuso as práticas restritivas mencionadas no artigo 4º, também subordinadas ao mesmo fito de impedimento, falseamento ou restrição da concorrência – e nas quais se encerra um pré-juízo legal de ilicitude – obtemos a indicação de que a proibição se afina aqui pela qualidade dominante do sujeito que se dedica às práticas restritivas, sendo irrelevante que existam ou não acordos ou práticas concertadas entre empresas no sentido dessas práticas restritivas. No fundo, quando uma empresa, porque é dominante, consegue por força da sua independência dos outros operadores do mercado e mesmo dos consumidores, não limitar-se a fruir, digamos, observando para si mesma um comedimento especial porque a sua posição de domínio já lhe dá vantagem suficiente, mas unilateralmente adoptar práticas restritivas que falseiam ou impedem a concorrência em detrimento do mercado, ou seja, quando usa da sua vantagem para ainda se reforçar mais e impedir o acesso ou a sobrevivência da pouca concorrência que tem, o Direito da Concorrência sanciona este uso com uma proibição[46]. Mas também resulta do preceito que, quando a empresa explora a posição dominante que tem num determinado mercado, o campo de afectação da prática abusiva se circunscreve ao mercado onde o abusador é dominante, no nosso caso, ao mercado da produção/comercialização/fornecimento de cigarros de produção fabril, e os atingidos serão os seus concorrentes nesse mesmo mercado, ou seja, a concorrência horizontal.
Quando depois vemos o abuso da dependência económica no artigo 7º, o que encontramos é um tipo diferente, apenas diferenciado, como sugeriria a exposição de motivos, pela natureza não dominante da empresa que abusa da dependência de outras?
Esse foi certamente o intuito: impedir que mesmo uma empresa em posição não dominante possa, neste caso operando nas relações verticais, introduzir práticas restritivas. Porém, quando coincide, no sujeito que pratica, a qualidade de detentor de posição dominante com a qualidade de superioridade face à qual se afirma a dependência económica de outras empresas, a prática é proibida tanto por via do artigo 6º como do artigo 7º? Quem tem posição dominante e comete uma prática restritiva tanto abusa da sua posição dominante como da dependência económica? A única valia do artigo 7º é punir o abuso da dependência praticado por uma empresa não dominante? Ou, a definição do tipo do abuso de dependência faz-se então por outra via, qual seja o domínio onde a prática restritiva se exerce? No sentido de que constitui abuso da dependência económica a prática restritiva, cometida tanto por uma empresa dominante como não dominante, que apenas tem reflexo no interior da relação vertical, ao nível portanto das empresas secundarizadas nessa relação?
A resposta está no nº 1 do artigo 7º - é proibida a exploração abusiva do estado de dependência, exploração essa que no carácter abusivo pode consistir nas práticas previstas no artigo 4º. Significa isto que o tipo se completa pelo meio utilizado, ou seja, o que tem de existir é a operância prática na relação vertical. Porém, já não podemos concluir que seja ainda necessário ao tipo que, além disso, os efeitos da prática se produzam unicamente ao nível vertical secundarizado ou dependente, posto que a parte inicial do artigo 7º não restringe o mercado afectado pela prática restritiva. Quando o legislador não distingue, não deve o intérprete fazê-lo, tanto mais que afinal o que está em causa é proteger a livre concorrência no mercado, qualquer que seja o modo como possa ser prejudicada e onde quer que o prejuízo se dê. Quer os efeitos se dêem, neste caso, no mercado distribuidor – afectação da concorrência entre distribuidores – quer no mercado produtor/fornecedor de tabaco (concorrência horizontal) verificar-se-á igualmente abuso da dependência económica, se o meio utilizado para a prática tiver sido a exploração abusiva da dependência.
Metodologicamente portanto, vamos analisar primeiro o abuso da posição dominante, com estritos efeitos ao nível do mercado horizontal neste caso de produção/fornecimento de cigarros, e depois o abuso da dependência económica, com efeitos quer ao nível da concorrência horizontal que no mercado vertical dependente.
Claro, poderão dizer, as práticas que vêm imputadas às Recorridas são práticas, todas elas, que se processam através das Condições Gerais que impõem às empresas grossistas, portanto no âmbito da relação vertical, e por isso não se justificaria sequer uma abordagem autónoma do abuso da posição dominante. Mas não é assim que a questão nos vem formulada e vamos seguir a fórmula oferecida. O que sucederá é que muito do que vamos dizer sobre o abuso da posição dominante e dos reflexos no mercado horizontal da produção/comercialização de cigarros será aproveitado para integrar uma eventual proibição, mas enquadrada mais correctamente por via do meio utilizado, como abuso da dependência económica. Do abuso da posição dominante:
Antes de prosseguir (e de resto isto também vale para o abuso da dependência económica) uma pequena correcção relacionada com o artigo 130º do Código de Processo Civil: - apesar de cada parte ter seguido de perto – e as Recorridas de modo exaustivo – o Estudo do Mercado do Tabaco, de tal modo que no corpo da alegação de recurso vemos no parágrafo 720 e seguintes a menção às cláusulas de “quantidades mínimas, desconto comercial fixo e (factor de correcção que o reduziu), desconto variável de informação de vendas, desconto variável de distribuição directa e activa, desconto variável por escalões de volume, desconto de carteira (extinto em 2006), prémios de fidelização no âmbito do programa de Parceria de Qualidade, exclusividade nas máquinas de vending, posicionamento das marcas T… nas máquinas de vending, mudança de localização das máquinas de vending sem aprovação da T…”, o certo é que que a nulidade cuja declaração é pedida ao tribunal só vem reportada às cláusulas 2.3 das Condições Gerais de 2006, relativa ao Factor de Correcção dos Descontos Comerciais, e à sua sucessora Cláusula 2.3 das Condições Gerais de 2008, das Cláusulas 10.1 das Condições de 2009 e de 2010, relativas à possibilidade da T… poder alterar a todo o momento as tabelas de preços de venda (preço fixo por caixa), da Cláusula 2.2.2 das Condições de 2002, relativa a descontos variáveis, (e as suas componentes 2.2.2.1 a 2.2.2.4, e as suas sucessoras Cláusulas 2.2.2 nas Condições Gerais de 2006 e de 2008, das Cláusulas 7ª das Condições Gerais de 2002, 8 § 1 das de 2005 e de 2008, e 10.1 das Condições Gerais de 2009 e 2010, todas relativas à possibilidade de alteração unilateral irrestrita do todo ou de parte das Condições Gerais pelas Rés.
Não vem pois pedida a nulidade de cláusulas relativas a quantidades mínimas nem quaisquer outras com eventual relação com programas de fidelização ou vending.
Compreende-se que uma referência às quantidades mínimas e a estes prémios ou programas de fidelização e às especiais exigências no âmbito de contratos de venda de tabaco em máquina automática possa ser usada como enquadramento, mas não será ela alvo de análise mais pormenorizada por se tratar então de acto inútil.
Em que consiste um abuso da posição dominante?
O artigo 102.º do TFUE também não o explica, antes exemplificando:
- (i) “Impor, de forma directa ou indirecta, preços de compra ou de venda ou outras condições de transacção não equitativas”; (ii) “Limitar a produção, a distribuição ou o desenvolvimento técnico em prejuízo dos consumidores”; (iii) “Aplicar, relativamente a parceiros comerciais, condições desiguais no caso de prestações equivalentes, colocando-os, por esse facto, em desvantagem na concorrência”; (iv) “Subordinar a celebração de contratos à aceitação, por parte dos outros concorrentes, de prestações suplementares que, pela sua natureza ou de acordo com os usos comerciais, não têm ligação com o objecto desses contratos”.
No direito nacional, como vimos, e para 2002, estabelecia o artigo 3º do DL 371/93, no seu nº 1, uma caracterização ou afunilamento teleológico do abuso ao ter “por objecto ou como efeito impedir, falsear ou restringir a concorrência”, e exemplificava-se – a enunciação não era taxativa – pelo nº 4 e sua remissão para o artigo 2º, as práticas que o legislador entendia como abusivas, ou seja, o abuso da posição dominante consistiria, ou na expressão legal, traduzir-se-ia, por exemplo, em a empresa em posição dominante “1. Fixar, de forma directa ou indirecta, os preços de compra ou de venda ou interferir na sua determinação pelo livre jogo do mercado, induzindo, artificialmente, quer a sua alta quer a sua baixa; 2. Fixar, de forma directa ou indirecta, outras condições de transacção efectuadas no mesmo ou em diferentes estádios do processo económico; 3. Limitar ou controlar a produção, a distribuição, o desenvolvimento técnico ou os investimentos; 4. Repartir os mercados ou as fontes de abastecimento; 5. Aplicar, de forma sistemática ou ocasional, condições discriminatórias de preço ou outras relativamente a prestações equivalentes; 6. Recusar, directa ou indirectamente, a compra ou venda de bens e a prestação de serviços; 7. Subordinar a celebração de contratos à aceitação de obrigações suplementares que, pela sua natureza ou segundo os usos comerciais, não tenham ligação com o objecto desses contratos”, se nenhuma destas condutas se justificasse por contribuir para “melhorar a produção ou a distribuição de bens e serviços ou para promover o desenvolvimento técnico ou económico desde que, cumulativamente: 1. Reservem aos utilizadores desses bens ou serviços uma parte equitativa do benefício daí resultante; 2. Não imponham às empresas em causa quaisquer restrições que não sejam indispensáveis para atingir esses objectivos; 3. Não dêem a essas empresas a possibilidade de eliminar a concorrência numa parte substancial do mercado dos bens ou serviços em causa”.
Já na versão da Lei 18/2003, mantendo-se a objectivação “tendo por objecto ou como efeito impedir, falsear ou restringir a concorrência”, adicionou o legislador um novo caso de exemplificação de abuso – “A recusa de facultar, contra remuneração adequada, a qualquer outra empresa o acesso a uma rede ou a outras infra-estruturas essenciais que a primeira controla, desde que, sem esse acesso, esta última empresa não consiga, por razões factuais ou legais, operar como concorrente da empresa em posição dominante no mercado a montante ou a jusante, a menos que a empresa dominante demonstre que, por motivos operacionais ou outros, tal acesso é impossível em condições de razoabilidade” – mantendo-se a mesma lista “a) Fixar, de forma directa ou indirecta, os preços de compra ou de venda ou interferir na sua determinação pelo livre jogo do mercado, induzindo, artificialmente, quer a sua alta quer a sua baixa; b) Fixar, de forma directa ou indirecta, outras condições de transacção efectuadas no mesmo ou em diferentes estádios do processo económico; c) Limitar ou controlar a produção, a distribuição, o desenvolvimento técnico ou os investimentos; d) Repartir os mercados ou as fontes de abastecimento; e) Aplicar, de forma sistemática ou ocasional, condições discriminatórias de preço ou outras relativamente a prestações equivalentes; f) Recusar, directa ou indirectamente, a compra ou venda de bens e a prestação de serviços; g) Subordinar a celebração de contratos à aceitação de obrigações suplementares que, pela sua natureza ou segundo os usos comerciais, não tenham ligação com o objecto desses contratos” e mantendo-se os mesmos motivos de justificação, esclarecendo-se porém que “2 - As práticas previstas no artigo 4.º podem ser objecto de avaliação prévia por parte da Autoridade da Concorrência, adiante designada por Autoridade, segundo procedimento a estabelecer por regulamento a aprovar pela Autoridade nos termos dos respectivos estatutos” e aditando-se ainda que “3 - São consideradas justificadas as práticas proibidas pelo artigo 4.º que, embora não afectando o comércio entre os Estados membros, preencham os restantes requisitos de aplicação de um regulamento comunitário adoptado ao abrigo do disposto no n.º 3 do artigo 81.º do Tratado que institui a Comunidade Europeia”.
As AA invocaram na petição inicial “O comportamento abusivo diz respeito às cláusulas contratuais que têm imposto unilateralmente aos grossistas (…) forçando a sua execução, e que os distribuidores manifestamente declararam não aceitar” – artº 545º. Prosseguiram (artº 547º) “Para efeito de determinação de afectação da concorrência devem ser atendidas aquelas cláusulas que, apesar de não constituírem uma obrigação para o distribuidor de adquirir um determinado tipo de produtos exclusivamente a um fornecedor, constituem, no entanto, incentivos a tal, sendo equivalentes a cláusulas de exclusividade”. Assim, 548º, as cláusulas de descontos comerciais variáveis, que acentuaram a subordinação económica por incentivarem os distribuidores a adquirir mais produtos do mesmo fornecedor, como forma de potenciar a margem de lucro a obter, “em violação da alínea c) do nº 1 do artigo 4º da LDC (limitação ou controlo da distribuição)”. O efeito do regime de escalões é acentuado pelas quantidades mínimas. Esses descontos constituem também uma discriminação de preços, com o objectivo de fomentar a concentração da distribuição, em prejuízo dos concorrentes da T… na produção e comercialização de FMC. O objectivo da existência de escalões é a fidelização dos distribuidores, o que (552º) “constitui uma prática proibida pela alínea e) do nº 1 do artigo 4º da LDC (aplicação de condições discriminatórias de preço)”. De resto, (554º) não apenas no mercado da produção/comercialização de FMC “a existência de descontos por escalão teve efeitos anticoncorrenciais: também no mercado da distribuição esse regime teve importantes consequências”, a saber, a insolvência de distribuidores mais pequenos e a concentração de empresas. Donde, as T…utilizaram artificialmente a margem dos distribuidores para provocar uma concentração de empresas no mercado da distribuição, “prática proibida pela al. c) do artigo 4º nº 1 da LDC (controlo da distribuição)”. Em conclusão (559º) “(…) deverá ser declarada a nulidade das disposições que constaram da Cláusula 2.2.2 das Condições de 2002, 2005, 2006 e 2008, tendo as AA interesse nessa declaração de nulidade na medida em que pedirão compensação financeira nos termos contratuais pelo escalão máximo aplicável decorrente da ilicitude da diferenciação por escalões”.
Mais, na perspectiva das AA, as cláusulas de alteração unilateral irrestrita permitiam “que se altere o contrato no sentido da violação das alíneas a) a e) do artigo 4º da LDC, deixando os distribuidores (a acrescer à dependência económica em que se encontram) perante a impossibilidade jurídica de obstar à execução de práticas anticoncorrenciais” (artigo 564º), pelo que também requerem a sua declaração de nulidade[47].
Acresce que a introdução do Factor de Correcção e a alteração da forma de determinação da margem dos distribuidores (e a sua concreta redução para 7,13%) “provocou, de facto, importantes efeitos anticoncorrenciais” (artigo 566º com referência às Cláusulas 2.3 de 2006 e 2008 e 10.1 de 2009 e 2010). É que, se de 1.1.2006 a 30.6.2009 o contratado desconto comercial percentual sobre o PVP que se situou entre 8,62% + 0,40%/Pronto Pagamento e 8,73% + 0,29% Pronto Pagamento (que aliás permaneceu em vigor até 2005 (estamos a reportar-nos ao artigo 568º da PI), pela introdução do Factor de Correcção as T… fizeram baixar, unilateral e artificialmente, durante três anos e meio e gradualmente, a remuneração dos grossistas, que (573º) desde 1.7.2009, “com a remuneração fixa por caixa, a margem máxima diminuiu ainda mais, chegando a corresponder a 7.11%, situando-se actualmente nos 7,13% sobre o PVP”. Ora, nesta “diminuição artificial abusiva da margem dos grossistas (artificial em relação ao que estava contratado e em relação à margem que era uniformemente praticada no mercado por todos os concorrentes)” – resultante duma subida artificial do preço que tem por objectivo o aumento da margem das T…e assim o reforço da sua posição perante os seus concorrentes no mercado FMC, concorrentes que não estão em condições de baixar as margens dos distribuidores, sob pena de, por não terem posição dominante, a distribuição dos seus produtos ser afastada do leque de vendas dos distribuidores – as Rés violaram a al. a) do artigo 4º nº 1 da LDC que proíbe “práticas que se traduzam em fixar, de forma directa ou indirecta, os preços de compra ou de venda, ou de interferir na sua determinação pelo livre jogo do mercado, induzindo artificialmente, quer a sua alta quer a sua baixa (…)” (artigo 577º da PI).
Do mesmo passo e visto pelo prisma do abuso da dependência económica, (584º) “Conseguiram ainda as T… fixar (…) de forma directa, condições de transacção diferentes das dos seus concorrentes no mesmo estádio do processo económico, bem sabendo que os seus concorrentes não as podem acompanhar (pois não detêm posição dominante no mercado), o que é proibido à luz do artigo 4º nº 1, al. b) da LDC”.
Em conclusão, os comportamentos adoptados pelas RR com a introdução dos escalões entre distribuidores entre 2002 e 2009, na utilização que fizeram da dependência económica das AA., tanto lhes serviram para “intervir directamente no mercado de comercialização de FMC (obtendo um ganho a que não se podem candidatar os concorrentes” como “no mercado de distribuição de produtos de tabaco (provocando a concentração e o desaparecimento de agentes económicos)”. (595º) “Pelo que se vem requerer a declaração de nulidade das Cláusulas” 2.3 e 10.1[48].
Já em recurso e como notam as Recorridas, as Recorrentes mencionam outras infracções (redução do desconto comercial fixo, desconto de informação de venda e desconto de distribuição directa e activa), e a fundamentação para a ilegalidade dos escalões de volume, quantidades mínimas e factor de correcção não coincide inteiramente, enquanto práticas de fidelização equivalente a exclusividade, passa a ser perspectivada como violação das alíneas e), f) e g) do artigo 4º da LdC (parágrafo 727 do corpo da alegação), mas isto porque seguramente se seguiu de mais perto o guião do Estudo do Mercado do Tabaco.
Impõe-se dizer, relativamente à conclusão feita no artigo 559º da PI, que não é exactamente correcto o que ali é dito: - as AA. têm legitimidade para pedir a declaração de nulidade das cláusulas que introduziram, a partir de 2002, os descontos variáveis, não porque “pedirão compensação financeira nos termos contratuais pelo escalão máximo aplicável decorrente da ilicitude da diferenciação por escalões”, que o não pediram, mas porque pedem, a partir dessa nulidade, que a facturação futura seja feita à taxa máxima de 2005, para todas elas, independentemente, em concreto e só, do escalão de volume em que cada uma delas estava colocada nessa data.
Como se sabe, a nulidade aponta-se a um vício que a ordem jurídica não pode tolerar, alargando-se por isso o seu regime de arguição a todos os interessados que, no campo privado, são “os titulares de qualquer relação cuja consistência, tanto jurídica como prática, seja afectada pelo negócio” – cfr. Pires de Lima, Antunes Varela, Código Civil Anotado, 3ª Edição, Coimbra Editora, p. 261.
Quer isto dizer que mesmo que não se consiga perspectivar a nulidade concorrencial do desconto por escalões à luz da discriminação injustificada entre grossistas de diferentes distritos, no âmbito das relações verticais e como prática enquadrada no abuso da dependência económica, a potencialidade de nos encontrarmos perante uma prática caracterizável apenas como de fidelização, cujo lesado directo seria o concorrente na produção e comercialização de cigarros de produção fabril, por não ter acesso à rede de distribuição, em primeiro lugar passa pela relação em que os distribuidores eram titulares e em segundo lugar interessa-lhes sobremaneira, mesmo que não para pedir compensação, mas pelo menos para pedir a sua não aplicação futura.
Repare-se outrossim que para o mesmo resultado desejado – facturação futura ao desconto máximo abstractamente praticado em 2005 – interessa enquadrar a passagem do desconto fixo ao desconto composto entre fixo e variáveis, como prática restritiva da concorrência, bastando que o seja em prejuízo dos concorrentes directos da T…, ou seja, na modalidade de fidelização substitutiva ou reparadora da perda da exclusividade. E se nos voltarmos a situar em 2005, ou de resto já muito antes disso, vemos que para esta questão se torna irrelevante a apreciação da polémica relativa às quantidades mínimas.
Mas avancemos então para perceber se as práticas das T…, constantes quer dos textos das suas Condições quer da sua aplicação, efectivamente se podem considerar anti-concorrenciais, em termos de abuso da posição dominante. Dá-se de barato que a posição dominante não é em si censurada e que as empresas têm o direito de a tentar manter ou mesmo fortalecer, conquanto não recorram a práticas proibidas.
Quantidades mínimas:
No Estudo do Mercado do Tabaco e tal como referido pelas Recorrentes, não se encontra uma censura à fixação de quantidades mínimas em si, mas apenas à sua fixação diversa em termos distritais, que as autoras do Estudo consideraram não ter justificação económica, não se baseando numa estimativa do número de fumadores por distrito, sendo por isso susceptíveis de criar barreiras artificiais à entrada no mercado grossista.
Repare-se que com esta justificação – e que aliás não está acompanhada por factos provados nestes autos – o que está em causa se situa no domínio das relações verticais, não podendo perspectivar-se como abuso de posição dominante em prejuízo da concorrência da T…, que terá sido o motivo de queixas anteriores da concorrência, justamente na versão de apoderamento da rede grossista: - ao exigir quantidades mínimas, a T… desviaria a disponibilidade dos recursos financeiros correspondentes, da liberdade dos grossistas os afectaram à compra de produtos concorrentes. As Recorridas indirectamente o referem: “(…) a imposição de quantidades mínimas prende-se com requisitos óbvios de eficácia e eficiência económica, conforme foi reconhecido pela Direção-Geral do Comércio e da Concorrência em 1997 e em 2002. 798. No que tange à previsão de uma quantidade mínima de aquisições diferenciada por distrito, há que sublinhar que essa opção foi validada ao longo dos anos pelas entidades responsáveis pela tutela da concorrência. 799. Recorde-se, a este propósito, que a Direção-Geral do Comércio e da Concorrência (doravante, “DGCC”) declarou que as quantidades mínimas previstas nas CGF de 1 de julho de 2002 e que previam uma diferenciação por distrito “não contrariam os objetivos que se pretendem salvaguardar, por corresponderem a necessidades empresariais objetivas e serem aplicadas com proporcionalidade e sem discriminação”. Esta submissão das quantidades mínimas à apreciação das autoridades de Concorrência existiu em função dos problemas que antes surgiram a esse respeito, e que eram na perspectiva da concorrência e não na perspectiva duma discriminação entre grossistas no acesso ao mercado grossista. Vale porém dizer que se analisarmos todas as Cláusulas de quantidades mínimas, sempre vemos um mecanismo de potencial crescimento de ano para ano[49] só eventualmente justificável porque as quantidades mínimas se situam abaixo da expectativa normal de venda mesmo num mercado consumidor final em decréscimo, ou em todo o caso porque, desde os textos que substituíram os contratos, ficou claro que não havia protecções de exclusividade de exploração regional para os grossistas, e portanto o serviço do mercado consumidor seria tendencialmente feito por vários grossistas a cumprirem cada um deles as quantidades mínimas.
Repare-se ainda que não temos um facto não provado sobre a não justificação distrital das quantidades mínimas, e tirando as quotas de mercado e a dificuldade da concorrência aumentar as suas, não temos como estabelecer, relativamente a quantidades mínimas, um efeito concreto de fidelização em prejuízo da concorrência, ficando apenas a pairar a potencialidade desse efeito em termos abstractos. E mais uma vez, note-se, para o efeito dos pedidos formulados nestes autos pelas AA., a questão das quantidades mínimas como prática restritiva da concorrência é irrelevante.
Passemos então ao desconto fixo na passagem a composto, antes de mais em termos genéricos, e depois concretamente ao desconto por escalões de volume.
Na passagem do desconto fixo – cfr. Condições Gerais de 2001 ponto “2.1.1. Os preços de venda ao público dos Produtos são os constantes da lista anexa que constitui o Anexo V às presentes Condições Gerais. A T… notificará o Cliente Grossista de qualquer alteração aos preços de venda ao público dos Produtos e, sempre que tal ocorra, enviar-Ihe-á o Anexo V devidamente alterado” – a composto (Condições Gerais de 2002, ponto 2.2 “Serão concedidos pela T… ao seu Cliente Grossista um desconto comercial fixo e descontos comerciais variáveis” sendo “2.2.1. (…) O desconto comercial fixo sobre o preço de venda ao público dos Produtos será o constante do Anexo VI(A), o qual será efectuado em cada factura a emitir pela T…”, no percentual de 5,35% conforme documento 8 junto com a PI, anexo VI, a fls. 249 dos autos (Condições Gerais de 2002, facto provado nº 9) foram previstos descontos variáveis a somar ao desconto fixo reportados a quatro factores - “distribuição directa activa, escalões de volume, carteira de produtos e informações” - cujas condições eram:
“2.2.2.1. Distribuição Directa Activa
(…) aquela que, para além do anteriormente definido no Capítulo I, implica, por parte do Cliente Grossista, a disponibilidade e utilização de meios humanos e transportes próprios ou subcontratados adequados para a distribuição dos Produtos encomendados através da pré-venda ou autovenda aos seus clientes retalhistas (com venda ao balcão ou através de máquinas automáticas), que por sua vez, revendam os Produtos directamente ao consumidor.
A distribuição directa e activa implica a facturação directa do Cliente Grossista, ou de empresas por si participadas em mais de 50%, ao seu cliente retalhista.
Ao Cliente Grossista que pratique uma distribuição directa e activa será atribuído um
desconto comercial sobre o preço de venda ao público (…) que varia de acordo com a percentagem de distribuição directa e activa que o mesmo pratica relativamente aos seus clientes, conforme se ilustra no Anexo VI(B)”. Concretamente 49% (distribuição activa) - 0,35% (de desconto sobre o PVP), 50% a 74% - 0,70%; 75% a 99% - 1,05% e 100% - 1,40% - fls. 249 dos autos.
Repare-se portanto que estamos a falar de 0,35% de desconto a menos na revenda a um único grossista, e de 0,70% na revenda a grossistas que ultrapassassem 25% dos clientes totais do grossista. Como já foi dito, o mercado grossista fica assim na prática fortemente limitado na revenda ao retalho, o que é duplamente garantido pela pura e simples não atribuição de desconto de distribuição directa e activa se não for simultaneamente cumprido o necessário para obter o desconto de informação, ou seja, se não forem prestadas as informações. Aliás, está provado que “279 - O fornecimento da informação de vendas era condição de atribuição do desconto de distribuição directa e activa, no máximo de 1,40%, sem o qual, os AA. não teriam condições para continuar no mercado”. Isto sem prejuízo da T… poder fazer auditorias para comprovar presencialmente a prática da distribuição directa e activa.
As Recorridas, de resto, em concreto sobre o desconto de distribuição directa e activa nada de específico oferecem, e as Recorrentes remetem para o Estudo do Mercado do Tabaco onde se lê, conforme escrevem as Recorrentes: “732.Neste aspeto, refere-se no Estudo sobre o Mercado do Tabaco (pág. 313): “A análise dos efeitos do desconto comercial fixo deve ser enquadrada no contexto dos restantes descontos praticados pela T…. De facto, após as alterações nas CGP introduzidas pela T… em 2002, o desconto comercial fixo de 8,15% até à data em vigor foi reduzido para 5,35%, ficando a parte variável condicionada à realização de um conjunto de comportamentos por parte do Grossista, nomeadamente, a prestação de informação de vendas, a aquisição de determinadas quantidades, a distribuição directa activa e a aquisição de toda a gama de produtos da T... A partir de 2006 o desconto comercial fixo foi aumentado para 6,16%, após a abolição do desconto de carteira de produtos. Do exposto, resulta que o valor reduzido do desconto comercial fixo induz os grossistas da T… à realização dos comportamentos que lhe permitam obter as componentes variáveis dos descontos, e assim lhes permitir a manutenção da sua margem”.
Dada a independência destes autos relativamente ao processo 04/08 da AdC, com o devido respeito não nos interessa particularmente as razões pelas quais a AdC resolveu não prosseguir. Isto para dizer apenas que, se conjugarmos os percentuais destes descontos com o desconto que os grossistas por necessidade têm de dar aos retalhistas (independentemente do recurso parcial a venda em máquina automática sempre subsiste uma parte importante de retalho na modalidade de venda directa ao público ao balcão), é patente que esses percentuais de desconto variável são muito importantes, ainda que pequenos, e é patente que a asserção das autoras do Estudo do Mercado do Tabaco se revela perfeitamente compatível com a experiência normal das coisas: - portanto sim, na passagem do desconto fixo ao desconto composto, os grossistas foram induzidos à realização dos comportamentos necessários à recuperação do percentual de desconto que tinham ao abrigo do único desconto fixo anterior. E portanto também é patente que os grossistas tenderiam fortemente a não revender a outros grossistas, gerando-se um fenómeno curioso de centralização nas RR da resposta a necessidades conjunturais específicas do retalho. Num caso em que, por qualquer razão, imaginemos um festival de Verão numa determinada zona do País, falhassem cigarros por haver uma procura anormalmente alta, o grossista que servisse o retalhista respectivo não teria o poder de lhe valer de imediato recorrendo a um seu colega grossista, antes teria de pedir às RR. o fornecimento da quantidade adicional em falta. O resultado seria então que este grossista compraria mais às RR. e que o grossista do lado teria de continuar a escoar o seu produto para os seus clientes retalhistas, mesmo que estes não estivessem pela mesma razão (isto é, porque os seus clientes habituais se tivessem deslocado para o festival) carecidos de produto. Neste caso existiria uma introdução adicional forçada de produto T… no mercado, aqui sim em prejuízo da possibilidade da concorrência da T… fazer introduzir as suas marcas.
Temos provado que “280 - Tendo o desconto comercial fixo sido reduzido em 2002, momento em que foram introduzidos vários descontos condicionais, os grossistas foram induzidos à realização dos comportamentos que lhes permitiam a manutenção do desconto comercial fixo anterior” . Todavia, isto não nos diz em concreto e por grosso se a simples indução à reconstituição do desconto comercial fixo implicou um aumento do número de compras em detrimento da concorrência horizontal das T….
Onde a passagem do desconto fixo ao desconto composto assume mais relevância e os factos provados já nos assistem melhor, é na questão dos descontos por escalão de volume.
Com efeito, tendo sido introduzido nas Condições Gerais de 2002, previa-se:
“2.2.2.2. Escalões de Volume
Por cada Distrito serão determinados três escalões de volume. Os escalões de volume serão determinados trimestralmente para o trimestre civil seguinte, com base nos seguintes factores:
- O 1º Escalão será determinado dividindo o total de compras anual de cada Distrito pelo número de Clientes Grossistas desse Distrito, sendo o resultado dividido pelo número de trimestres civis (4). Este resultado médio trimestral será utilizado para determinar os Clientes Grossistas com locais de entrega nesse Distrito cujas aquisições sejam iguais ou superiores ao resultado médio trimestral, os quais serão incluídos no 1º escalão de volume.
- O 2º Escalão de Volume será determinado dividindo o número de compras que resulta da subtracção das aquisições dos Clientes Grossistas que se situam no 1º escalão, ao total anual de compras do Distrito em causa pelo número de Clientes Grossistas desse Distrito (subtraindo aqueles que se situam no 1º escalão), sendo o resultado dividido pelo número de trimestres civis (4). Este resultado médio trimestral será utilizado para determinar os Clientes Grossistas com locais de entrega no dito Distrito cujas aquisições sejam iguais ou superiores ao resultado médio trimestral em questão mas inferiores ao resultado do 1º Escalão, sendo esses Clientes Grossistas incluídos no 2º escalão de volume.
- O 3º Escalão de Volume será o volume correspondente ao volume de Produtos abaixo do 2º escalão de volume, no qual serão incluídos os Clientes Grossistas com locais de entrega no Distrito em causa que não tiverem adquirido nem o volume previsto no 1º
escalão nem no 2º escalão de volume.
A cada escalão de volume corresponderá um desconto comercial sobre o preço de venda ao público dos Produtos, adicional ao desconto fixo, de acordo com o disposto no Anexo VI(C).
Com base na facturação emitida pela T…, a T… fará actualizações dos escalões de volume de cada Distrito no final de cada ano civil.
No final de cada trimestre civil, com base nas aquisições efectuadas durante esse trimestre civil, a T… analisará em que escalão se incluirá cada Cliente Grossista durante o trimestre então em vigor”.
Ora, dizem-nos os factos não provados, desde logo que: “42 - A existência e a forma de estabelecimento dos escalões têm por base a existência histórica de assimetrias distritais em matéria de vendas e consumo de cigarros” e que “43 - A inexistência de escalões e inerentes intervalos diferenciados por distrito levaria a que, nas zonas do país de menor procura e consumo, os revendedores grossistas tivessem pouco ou nenhum interesse na aquisição de produtos das RR., com os consequentes prejuízos para os consumidores dessas zonas”, ou seja, que as RR. não provaram a justificação que aventaram para a existência de escalões diversificados por distrito, com o resultado de termos provado que “229 - Com os descontos por escalões, os mesmos produtos eram vendidos ou comprados por preços diferentes sem que esta diferença de preços fosse acompanhada por diferenças de custos”.
Resulta dos factos provados que: “228 - Os descontos comerciais variáveis em função dos volumes de aquisição de produtos da T… incentivaram os grossistas a adquirir mais produtos da T… como forma de potenciar a margem de lucro a obter. 230 - Muitas empresas distribuidoras concentraram-se para poderem atingir o escalão comercial mais vantajoso. 231 - Em Portugal, o número de grossistas era de 326 em 2002 e de 182 no 1º semestre de 2009. 282 - Por força do desconto por escalões estabelecido pela T… e da sua integração num escalão com condições comerciais menos vantajosas, muitos grossistas de tabaco venderam ou encerraram a sua actividade”.
E ainda que “283 - No dia 23 de Novembro de 2010, num encontro das T… com os grossistas, o administrador-delegado da R. T… disse que havia grossistas a mais na rede portuguesa, que estes deveriam ser menos e que deveriam ser maiores”; e que “284 - A T… manifestou, por diversas vezes, aos Grossistas, o objectivo de diminuir o seu número a nível nacional”.
Em suma, preços a serem tidos objectivamente como discriminatórios, falhando-lhes justificação económica da sua diferença distrital, que por via desta discriminação e por outro lado por via da própria grande distância do desconto de primeiro escalão para os demais, como resulta do facto provado 282, conduziram à exclusão do mercado grossista de muitos grossistas e à concentração de muitas empresas grossistas, em coerência com o manifestado objectivo das RR. da diminuição dos grossistas. Note-se que o facto provado “229 - Com os descontos por escalões, os mesmos produtos eram vendidos ou comprados por preços diferentes sem que esta diferença de preços fosse acompanhada por diferenças de custos” embora mais directamente relacionado com a falta de justificação distrital, também pode ser usado na perspectiva intra-distrital.
Mas não só: - para os resistentes, há dois fenómenos.
Por um lado, a reconstituição da percentagem de desconto anterior – note-se que o desconto máximo por escalão de volume é de 0,76% sobre o PVP para o primeiro escalão (anexo VI às Condições Gerais de 2002, fls. 249 dos autos, o que somado aos descontos máximos da distribuição directa e activa e carteira de vendas e ao desconto de informação leva a 8,62%) e se não temos um facto provado directo sobre a percentagem de desconto fixo aplicada até à entrada das Condições de 2002, pois apenas temos tabelas numérico-monetárias de desconto por marca no anexo às Condições de 2001, já no Estudo do Mercado do Tabaco temos a menção de que esse desconto fixo era de 8,15%, mas na tabela de 1992 temos a menção a 8,5%, donde em qualquer caso não andaremos muito longe duma reconstituição de percentagem. A reconstituição em si, se agrava as condições dos grossistas, não explica que haja compra de mais quantidade. No fundo, para muitos grossistas, ficou mais caro comprar a mesma quantidade.
Por outro lado, e adicionalmente, se temos provado que “Os descontos comerciais variáveis em função dos volumes de aquisição de produtos da T… incentivaram os grossistas a adquirir mais produtos da T… como forma de potenciar a margem de lucro a obter” e se conjugarmos o reduzido preço unitário com as quantidades mínimas com base para um entendimento prático de que o negócio, tanto para as produtoras quanto para os grossistas, é um negócio de quantidade, então aqui sim já temos que a passagem do desconto fixo ao desconto composto e concretamente na modalidade do desconto por escalões de volume, gerou o efeito de compras acrescidas. De resto, se ligarmos isto ao empoderamento que se obtém pela concentração de grossistas, o que aqui se percebe é um natural maior volume de compras e uma acrescida profissionalização, ou dito de outro modo, agressividade, no escoamento dos mais produtos comprados para o retalho. Neste sentido, basta olhar para as quotas de mercado do facto provado 215 (que apesar da sua redução em 10% não deixam de se situar acima de 70% e próximo dos 80%) para concluir pela dificuldade de penetração no mercado grossista que a concorrência horizontal das RR. teve, apesar de comprovadamente oferecer aos grossistas condições melhores do que as oferecidas pelas RR.
Ora, se há um incentivo ao grossista a comprar mais T…, há um desincentivo a comprar concorrência. Digamos assim que a distribuição se move mais pela dependência dos fumadores em relação às marcas da T…, enquanto selo de garantia do negócio, acomodando-se a condições mais agravadas, porque as consegue contornar por investimentos acrescidos na compra das marcas tradicionais, segundo os mecanismos instituídos pelas Rés para tanto. Num cenário abstracto (ou de livre jogo do mercado) em que dois fornecedores oferecessem condições diferentes, o cliente (neste caso grossista), no exercício da sua liberdade comercial, tenderia a escolher o que lhe oferecesse melhores condições. No cenário abstracto das RR manterem o desconto fixo (sem parcelas de decomposição variável) haveria a comparação, pelo cliente grossista, desse desconto com o desconto fixo oferecido pela concorrência das RR. Simplesmente, em termos concretos, a dependência dos fumadores às marcas prestigiadas e notórias da T… reveladas pela quota de mercado, vem dizer aos grossistas, que aliás não estão sozinhos no serviço de abastecimento do mercado consumidor (pelo contrário, estão acompanhados ou parcialmente sequenciados pelo retalho relativamente ao qual sabemos que “225 - Os retalhistas clientes dos AA., perante a impossibilidade de adquirir junto destas os produtos comercializados pelas T…, passariam a recorrer a um grossista que lhes permitisse simultaneamente adquirir as marcas comercializadas pelas T… e outras marcas”, o que conseguiriam porque “226 - A grande maioria dos distribuidores fornece todas as marcas”) que a resposta favorável às melhores condições da concorrência os levaria no imediato a um mergulho quase fatal, e que a pura e simples não resposta favorável aos incentivos das RR levaria os grossistas a perdas acentuadas (ou seja, a não conseguirem contornar o agravamento das condições praticadas pelas Rés). Por outro lado, os recursos disponíveis para a compra de produtos T… e concorrência são disponibilizados na exacta medida em que vêm a ser retribuídos ou recompensados, ou melhor dizendo, pelo menos, repostos. Isto porque, além do mais, estamos num mercado legalmente restringido e em decréscimo de consumo, ou seja, não pode um grossista apostar comprar por igual T… e concorrência, com o fito de sucesso na revenda e posteriormente revenda ao mercado consumidor, na esperança dum aumento significativo do mercado consumidor.
É isto também que faz com que os descontos por volume de compras, geralmente considerados inócuos (obviamente inócuos no que dizem respeito ao consumidor final) quando aplicados a um grossista, deixem de ser inócuos. Poderiam sê-lo por representar simples prémio e potenciação de economias de escala, e neste caso serem uma condição de abaixamento do preço a praticar para o consumidor final, mas não é isso que se passa no caso concreto, em que o preço de venda final vem antecipadamente fixado pelo fornecedor, sem qualquer possibilidade de alteração. Por isto, o único efeito que têm aqui, no grossista, é aumentar a sua apetência para a compra do produto T… (apetência ainda maior quanto a integração no escalão só se faz posteriormente às compras). E este dirige-se a um mercado consumidor final marcado pela dependência da marca, que a exige ao retalho e este a exige ao grossista, e a um mercado consumidor final que se encontra sob o fogo do combate ao tabagismo e em redução, ou seja, com pouca apetência de mudança e pouca elasticidade. Com estas condicionantes, o inócuo desconto por volume de compras passa a ter um efeito de fidelização, em detrimento da concorrência na produção de cigarros fabris.
Acresce que, se nos situarmos então do ponto de vista do consumidor, o que não existe, no mercado dos cigarros de produção fabril à sua disposição é diversificação, escolha, alternativa, inovação e eventualmente um apuramento concorrencial da qualidade. É que se temos porventura um número maior de consumidores já fumadores dependentes (e ainda assim nestes, por razões diversas, pode acontecer necessitarem mudar para cigarros mais fracos, mais suaves ou mais elegantes, ou o oposto), também temos, apesar do esforço da luta contra o tabagismo, um acorrer anual de novos consumidores ainda não viciados. Aliás, neste acorrer e no seu volume, não existe inicialmente a barreira da dependência como entrave à entrada no mercado dos produtos concorrentes.
Quando um jovem influenciado por outros jovens que já são fumadores, se pretende iniciar no fumo, experimentará os cigarros que os seus conhecidos fumam, ou na eventualidade de se querer afirmar pela diferença – consequência notória do pós-modernismo publicitariamente induzido – dirigir-se-á ao quiosque ou à máquina automática onde verá (veria, digamos, para ser mais precisos, entre 2002 e 2009) mais de 80% do espaço ocupado pelas marcas da T… e 20% de marcas da concorrência expostas em lugares menores – o que desde logo dá uma boa impressão de que tais marcas são, perdoe-se agora a expressão “refugo” desprestigiado. É claro que a imagem dum belo camelo tem tanto poder de atracção quanto a de um vaqueiro rebelde, mas estamos a falar de dois casos limite de marcas muito prestigiadas da T… e da concorrência. As marcas que não beneficiam desta tradição não se fazem valer aos olhos dum candidato a fumador pelas imagens que ostentam. E há mais, é que quando vemos uma marca num pequeno escaparate lateral junto à operadora de caixa na bomba de gasolina, que tem atrás de si toda uma parede de alinhadas marcas de cigarros, também ficamos com a ideia de que a marca lateralizada não é muito abundante no mercado e que por isso pode não estar sempre disponível.
Parece que será contrário à própria ideia de mercado livre, que na sua liberdade acolhe o maior esforço de cada qual, portanto também ao nível da comunicação de mercado, exigir, para o melhor serviço do cliente final, uma exposição igualitária de todos os produtos disponíveis. Ninguém se lembrará de expor todos os serviços de cutelaria por igual, vedando um lugar de destaque aos mais bonitos. Mas num mercado de produto cuja publicidade é altamente restringida, em que o produtor ou comerciante de cutelaria barata não inunda páginas de revistas de decoração e utilidades, no mercado de cigarros em que a publicidade se resume à imagem no ponto de venda, o percentual quantitativo tem um efeito publicitário forte.
Para concluir, em suma, que chegando os cigarros às mãos do consumidor por via dos grossistas e retalhistas, os mecanismos de indução dos comportamentos destes, e mais concretamente dos grossistas visto que as RR. não vendem ao retalho, têm um impacto decisivo no consumidor final, reduzindo-lhe o leque de escolha e remetendo-o para as marcas tradicionalmente mais vendidas e mais abundantes no mercado.
Se é que não resulta já do que vimos dizendo, que não se acolhe a tese das Recorridas de que o desconto por escalões de volume era de pequena monta e por isso insusceptível de afectar a concorrência horizontal.
O desconto por escalões não era de todo desprezível, posto que enquadrado desde logo pelo abaixamento do desconto fixo na sua decomposição em fixo e variável. Se estivéssemos a falar dum “mais”, dum “pouco mais” a acrescer ao desconto unicamente fixo antes da decomposição, até poderíamos considerar a tese das Recorridas da irrelevância para o volume de compras acrescidas, mas esse pouco mais também deve ser visto como o necessário para ser “um pouco menos mau” (reconstituição) e nesse sentido não há como desconsidera-lo como gerador de compras acrescidas. É facto que não temos volumes comparativos de compras grossistas às T… e suas concorrentes, ano a ano, mas a ideia pode ser aproximada pela comparação de quotas de mercado. Como já dissemos antes, o decréscimo das quotas de mercado não é um facto absoluto – bastante decrescer já não se poderia pensar num efeito de fidelização grossista em detrimento da concorrência – mas relativo: apesar do decréscimo, as quotas das Rés mantiveram-se sempre em valores muito elevados.
Por outro lado, ainda que se possa conceder que não se possa presumir prejuízo para a concorrência, deve notar-se que mesmo a jurisprudência citada pelas Recorridas e as referências às Conclusões do Advogado-Geral do Tribunal de Justiça, Nihls Wahl, no âmbito do processo C-525/16 (MEO c. Autoridade da Concorrência) e concretamente do trecho do parágrafo “70. Impôs-se progressivamente, tanto na prática decisória das autoridades responsáveis pela concorrência como na jurisprudência mais recente do Tribunal de Justiça, que, quando se deve analisar um comportamento empresarial na perspectiva do artigo 102.° TFUE [artigo do Tratado que proíbe abusos de posição dominante], a existência de uma restrição da concorrência não se pode presumir. Para concluir que tal restrição existe, há que proceder, em todos os casos, a um exame dos efeitos reais ou potenciais da medida contestada à luz de todas as circunstâncias do caso em análise.» não exige um facto provado sobre essa restrição, mas um elenco de factos provados (todas as circunstâncias do caso) dos quais ela se possa concluir, e no fundo é o que temos estado a fazer com base nos factos provados nestes autos.
Assim, e em conclusão quanto ao desconto por escalão de volume, na medida em que incentivou os grossistas a comprarem mais em detrimento da concorrência, restringindo a escolha do consumidor final, é manifesto que estamos em presença duma prática que teve por objecto e efeito restringir a concorrência e que operou por controlo da distribuição – em concreto condicionando os distribuidores dependentes das RR - sendo subsumível à previsão da alínea c) do artigo 4º nº 1 da LdC e mesmo que assim não se entenda, igualmente proibida por via da enunciação exemplificativa constante dos artigos 6º e 7º da mesma Lei, que tanto pode ser vista, em atenção ao agente e ao campo de produção de efeitos, como abuso de posição dominante (uma empresa produtora interfere na distribuição que está disponível para o serviço de distribuição de todas as empresas produtoras), como em relação ao meio de prática, e em face do campo onde produz também efeitos (mercado distribuidor, com determinação deste a comportamentos que eventualmente poderia não ter se conservasse a sua inteira liberdade negocial) como abuso de dependência económica.
E por outro lado, quando consideramos o efeito específico no mercado distribuidor em si, isto é, como já dissemos, que o desconto por escalão de volume resultou na prática de preços a serem tidos objectivamente como discriminatórios, falhando-lhes justificação económica da sua diferença (na dimensão distrital mas também intra-distrital), que conduziram à exclusão do mercado grossista de muitos grossistas e à concentração de muitas empresas grossistas, em coerência com o manifestado objectivo das RR. da diminuição dos grossistas, voltamos à mesma proibição da alínea c) do artigo 4º n º 1 – controlo da distribuição – e encontramos nova proibição na alínea e) do mesmo preceito e número, com afectação do funcionamento do mercado, e claramente integrante neste caso dum abuso de dependência económica.
Deste modo, visto o disposto no artigo 4º nº 2 da Lei 18/2003, aplicável também quando as práticas nele mencionadas forem cometidas quer como abuso de posição dominante quer como abuso de dependência económica, as cláusulas relativas ao desconto por escalão de volume, nas Condições Gerais de 2002 e nas suas sucessoras até 2009, devem ser declaradas nulas, solução a que se chegaria também mesmo sem disposição expressa, por via dos artigos 280º e 294º, ambos do Código Civil.
No seio dos descontos variáveis, foi também introduzido, ainda que suprimido mais cedo que os restantes descontos variáveis, o desconto por carteira de produtos. Visava ele em última análise, aliás porque os grossistas eram induzidos aos comportamentos de reconstituição do desconto fixo anterior, a que os grossistas disponibilizassem ao mercado todas as marcas, ou a maior variedade possível de marcas T…, sendo claro que, quanto às marcas notórias e mais consumidas não havia nenhuma dificuldade, mas quanto a muitas outras, que obviamente eram uma resposta às inovações concorrenciais em termos de teores e formatos, do que se tratava era de combater a iniciativa da concorrência, aproveitando a dependência dos grossistas e levando a uma introdução forçada no mercado. Em circunstâncias normais – isto é, se o desconto fixo não tivesse sido decomposto e reduzido – os grossistas atenderiam aos pedidos dos retalhistas que atendiam aos pedidos dos consumidores, e portanto comprariam as marcas mais vendáveis, e a concorrência da T… poderia então aceder ao mercado consumidor oferecendo produtos que a T… não produzia, servindo mercados de fumadores de cigarros mais fracos, ou mais elegantes, ou mais mentolados, ou seja o que for mais de inovador. Nada de censurável há na resposta à iniciativa ou inovação da concorrência, centrando-se porém a censura no mecanismo impositivo aos grossistas. Estaríamos assim perante um controlo da distribuição, proibido pela alínea c) do artigo 4º nº 1 da LdC, que impediria de forma sensível o livre jogo do mercado, ao qual saudavelmente se pretende a convocação de inovação, e se pretende convocar concorrentes que apresentam soluções inovatórias em benefício do consumidor final. Estaríamos em presença dum abuso da dependência económica praticado por um dominante, que assim poderia também ser enquadrado como abuso da posição dominante.
Simplesmente, estamos a usar os verbos na forma condicional porque na lógica dos recursos, não basta repetir os pedidos, é necessário adiantar as razões para que o tribunal de recurso defira a pedidos antes indeferidos. E o que vemos, nas conclusões e no corpo da alegação, é que a menção ao desconto de carteira é mera consequência do facto de se descreverem quais eram os tipos de descontos variáveis, repetindo-se o pedido de declaração de nulidade, sem porém existir qualquer menção a qualquer razão pela qual o desconto de carteira especificamente deveria ser considerado como proibido pela LdC – em violação do artigo 639º nº 1 do Código de Processo Civil – ao contrário do que sucede quanto ao demais descontos integrantes da componente variável. Assim, quanto ao desconto de carteira, vamos entender que pese o seu potencial de ilegalidade face às normas do Direito da Concorrência, não podemos dele conhecer.
Ainda no seio dos descontos variáveis, e portanto na impugnação da cláusula 2.2.2 nas versões que estiveram em vigor desde 2002 a 2009, encontramos a obrigação de informação. Já tivemos oportunidade de nos pronunciar sobre ela em termos de reapreciação da decisão sobre a matéria de facto.
Temos então (factos provados 9 a 12) que em 2002 foi estipulado o desconto de informação de vendas nos seguintes termos:
“2.2.2.4. Informações de Vendas Cada Cliente Grossista poderá enviar, trimestralmente, informações de vendas, à T… sobre, por um lado, as vendas que o Cliente Grossista efectue de Produtos da T… e, por outro lado, as vendas totais de cigarros efectuadas pelo Cliente Grossista. O Cliente Grossista não deverá enviar de modo discriminado, à T… as vendas que efectuar de cigarros que não sejam comercializados pela T…, mas apenas as vendas totais efectuadas pelo Cliente Grossista. Essas informações de vendas servirão, também para comprovar a prática de distribuição directa e activa do Cliente Grossista e sempre que possível deverão ser enviadas nos seguintes moldes: a) a informação deve ser enviada através de suporte informático e ser confirmada pelo Cliente Grossista ou respectiva gerência e/ou administração; b) a informação deve ser mensal e deverá ser entregue à T… trimestralmente, até ao quinto dia de cada trimestre civil; c) A informação deve consistir na indicação do total de vendas das marcas de Produtos da T…, ou, opcionalmente, ordenada por marca de Produtos da T…, e, em qualquer caso, também por ponto de venda (cliente retalhista com venda ao balcão ou através de máquina automática) fornecido directa e activamente pelo Cliente Grossista ou por sociedades participadas pelo Cliente Grossista em mais de 50% do respectivo capital social. Os pontos de venda (cliente retalhista com venda ao balcão) fornecidos pelo Cliente Grossista activa e directamente deverão ser identificados através do respectivo número de contribuinte. Os pontos de venda (máquinas automáticas) fornecidos pelo Cliente Grossista activa e directamente deverão ser identificados através de um número de ordem de acordo com o livre critério do Cliente Grossista; d) O volume total de Produtos objecto da informação trimestral deve representar, pelo menos, 95% das aquisições do Cliente Grossista. Pela informação que a T… receber ao abrigo deste ponto 2.2.2.4 a T… concederá um desconto comercial sobre o preço de venda ao público dos Produtos, adicional ao desconto fixo conforme previsto no Anexo VI(E)”.
Na versão de 2005, no ponto 2.2.2.4, o essencial da alteração passou pelo aditamento de três parágrafos:
“2.2.2.4. Informações de Vendas (…) A informação enviada pelo Cliente Grossista será analisada em cada trimestre e o desconto comercial variável, se aplicável, será comunicado ao Cliente Grossista no 39º dia útil e efectivado no 44º dia útil seguintes ao final do trimestre em análise. A informação incorrecta ou incompleta constituirá a T… no direito de não efectuar o pagamento do desconto comercial previsto nos pontos 2.2.2.1 e 2.2.2.4 ou, de descontar eventuais pagamentos anteriormente efectuados com base em tal informação incorrecta ou incompleta em pagamentos seguintes. A T… obriga-se a manter a informação que receber dos seus Clientes grossistas estritamente confidencial”.
Na versão de 2006, o ponto passou a 2.2.2.3 e estipulava:
“2.2.2.3. Informações de Vendas Cada Cliente Grossista poderá enviar informações de vendas à T… sobre, por um lado, as vendas que o Cliente Grossista efectue de Produtos da T… (apenas cigarros) e, por outro lado, as vendas totais de cigarros efectuadas pelo Cliente Grossista. O Cliente Grossista não deverá enviar de modo discriminado, à T… as vendas que efectuar de cigarros que não sejam comercializados pela T…, mas apenas as vendas totais efectuadas pelo Cliente Grossista a cada retalhista. Essas informações de vendas servirão, também, para comprovar a prática de distribuição directa e activa do Cliente Grossista e sempre que possível deverão ser enviadas nos seguintes moldes: a) a informação deve ser enviada através de suporte informático e ser confirmada pelo Cliente Grossista ou respectiva gerência e/ou administração; b) a informação deve ser mensal e deverá ser entregue à T… trimestralmente, até ao 10º dia útil de cada trimestre civil; c) a informação deve consistir na indicação do total de vendas das marcas de Produtos da T…, ou, opcionalmente, ordenada por marca de Produtos da T…, e, em qualquer caso, também por ponto de venda (cliente retalhista com venda ao balcão ou através de máquina automática) fornecido directa e activamente pelo Cliente Grossista ou por sociedades participadas pelo Cliente Grossista em mais de 50% do respectivo capital social. Os pontos de venda (cliente retalhista com venda ao balcão ou através de máquina automática exploradas pelo retalhista) fornecidos pelo Cliente Grossista activa e directamente deverão ser identificados através do respectivo número de contribuinte. Caso o retalhista fornecido pelo Cliente Grossista tenha mais do que um ponto de venda, o Cliente Grossista deverá identificar os vários pontos de venda com um número de ordem ao seu livre critério. As máquinas automáticas da propriedade ou exploradas directamente pelo Cliente Grossista e fornecidos pelo Cliente Grossista activa e directamente deverão ser identificados através de um número de ordem de acordo com o livre critério do Cliente Grossista; d) A unidade de vendas deverá ser expressa em volumes (cada volume corresponde a dez maços de cigarros). Pela informação que a T… receber ao abrigo deste ponto 2.2.2.3 a T…concederá um desconto comercial sobre o preço de venda ao público dos Produtos, adicional ao desconto fixo conforme previsto no Anexo VI(D). A informação enviada trimestralmente pelo Cliente Grossista será analisada em cada semestre e o desconto comercial variável, se aplicável, será comunicado ao Cliente Grossista no 39º dia útil e efectivado no 44º dia útil seguintes ao final do semestre em análise. A informação incorrecta ou incompleta constituirá a T… no direito de não efectuar o pagamento do desconto comercial previsto nos pontos 2.2.2.1 e 2.2.2.3 ou, de descontar eventuais pagamentos anteriormente efectuados com base em tal informação incorrecta ou incompleta em pagamentos seguintes. A T… obriga-se a manter a informação que receber dos seus Clientes Grossistas estritamente confidencial”.
Nas Condições Gerais de 2008 o desconto em causa foi suprimido, sendo que em matéria de desconto variável apenas se previa o desconto por escalões de volume – cláusula 2.2.2 e 2.2.2.1.
Provou-se além destes teores textuais que:
“279 - O fornecimento da informação de vendas era condição de atribuição do desconto de distribuição directa e activa, no máximo de 1,40%, sem o qual, os AA. não teriam condições para continuar no mercado. 278 - De acordo com as CGF de 2002 se um grossista vender produtos da T… a outros grossistas que representem, na sua facturação, pelo menos, 50% desse valor, passa a ser considerado um distribuidor passivo o que implica a perda do desconto de distribuição directa e activa. 280 - Tendo o desconto comercial fixo sido reduzido em 2002, momento em que foram introduzidos vários descontos condicionais, os grossistas foram induzidos à realização dos comportamentos que lhes permitiam a manutenção do desconto comercial fixo anterior. 281- A T…, pelo menos no ano de 2005, realizou auditoria à informação de vendas entregue pelos AA”.
Notar portanto que o desconto de informação, ao contrário do seu teor textual de mera possibilidade, se constituía, face ao provado em 280 mas sobretudo face a 279, como uma possibilidade irrecusável, ou seja, na prática, uma obrigação.
Notar que na medida em que permitia o controlo – e era a fonte principal de controlo – da prática da distribuição directa e activa, tinha o potencial de solidificar a quase proibição de revenda a outros grossistas. Digamos que a mera instrumentalização de controlo da prática da distribuição directa e activa não representava qualquer prejuízo para a concorrência horizontal, ficando-se pelo quadro dum mecanismo de verificação do cumprimento contratual. Se o objecto do contrato era a compra para revenda por quem revendia em modo de distribuição directa e activa, a obrigação de informação, enquanto obrigação suplementar, estava plenamente sintonizada com o objecto do contrato.
Porém, a informação prestada tem uma dimensão adicional ou digamos, essencial: - é o conhecimento do mercado, em diversas vertentes dele.
Pela informação prestada conseguiam as RR. ter acesso ao seu próprio mercado finalizado, conhecendo do mesmo modo o mercado grossista e o mercado retalhista (quer este depois também viesse a ser assumido pelos grossistas proprietários das máquinas de venda automática).
Conseguiam conhecer todos estes mercados em detalhe, por marca, verificando a prestação, ou dito à inglesa, a “performance”, de cada marca. Repare-se que não estamos perante uma informação de compras à T…, mas das vendas dos grossistas e portanto acedemos a um conhecimento profundo do modo como se comporta o retalho, cada ponto de venda, que é decorrente do modo como se comporta o consumidor. E repare-se que podemos, além do mais, pelo NIF do retalhista, comunica-lo à nossa força de vendas – isto manifestamente não viola o tratamento confidencial da informação – para que quando visite o retalho e junto dele obtenha o seu NIF, possa ter antecipadamente acesso à sua situação. Do mesmo modo, com a informação sobre o retalho, podemos sempre saber que grossista conquistou retalhista antes pertencente a outro.
É duvidoso que se justifique tanta informação e tão detalhada que excede o nosso parceiro comercial e atinge os clientes dele, o mercado retalhista, mas ainda assim e até aqui parece que continuamos a poder dizer que esta obrigação suplementar está relacionada com o objecto principal do contrato, visto que a compra dos grossistas é feita para revenda ao retalho.
Onde seguramente se extrapola completamente duma conexão com o objecto do contrato é na pretensão obrigatória de conhecer o volume total de vendas do grossista, em tanto quanto ela assim traz a informação sobre as compras que os grossistas fazem aos concorrentes horizontais das T…, vistas aliás pelo prisma do seu já conquistado sucesso – vendas de produtos concorrentes ao retalho. Ficamos assim a saber da repercussão da concorrência sobre o mercado grossista, retalhista e consumidor.
Ora aqui, de nada vale dizer que esta informação é incompleta, porque expressamente prevista como não individualizada para cada concorrente horizontal. Ser incompleto não é o mesmo que ser irrelevante. Se fosse irrelevante não era pedido. É certo que o conhecimento da prestação de cada concorrente seria ainda mais relevante por permitir uma contra actuação directa à medida inovatória que uma concorrente específica tivesse tomado para romper a barreira combinada das quotas de mercado das T… com os demais entraves à entrada no mercado, mas como a soma de todas as concorrentes é pequena, mais pequena será a unidade, menor perigo existe, o que significa que ao tomar o conjunto temos um primeiro alerta do nível de perigo. Naturalmente que quem está em posição dominante não está impedido de a defender nem de se manter para tanto em estado de vigilância constante sobre os avanços da concorrência, o que não pode é instituir um mecanismo no seio da relação vertical que obriga os grossistas a darem informações sobre a concorrência, às quais, por lisura e são equilíbrio de todas as concorrentes no mercado, se deveria ter acesso apenas por fontes independentes e igualmente acessíveis por todos os operadores no mercado produtor/fornecedor em causa. E aqui sim, é absolutamente claro que a informação sobre as vendas dos grossistas de produtos concorrentes não tem rigorosamente nada que ver com o objecto do seu contrato com as T…, constituindo uma obrigação suplementar à época proibida nos termos do artigo 4º nº 1 al. g) da Lei 18/2003, na medida também em que era susceptível de restringir de forma sensível a concorrência, sendo aliás praticada por uma empresa em posição dominante actuando sobre, isto é, em exploração da dependência económica dos grossistas em relação a ela.
Mais do que um abuso da posição dominante estamos perante um dominante que abusa do seu dependente, afectando o funcionamento do mercado, com uma prática legalmente exemplificada como abusiva, à qual não assiste qualquer justificação nos termos do artigo 5º do mesmo diploma, e que, em função da proibição legal, se deve declarar nula – artigo 4º nº 2 da Lei 18/2003 e artigos 280º e 294º, ambos do Código Civil, como referido a propósito do desconto por escalão de volume.
Sobre o factor de correcção e preço fixo por caixa, apesar das esparsas referências que a AdC lhe fez, é inegável que as respectivas cláusulas se situam no âmbito das relações verticais. Todavia, isso não impede a sua consideração também para efeitos de abuso de posição dominante.
As Recorrentes colam o factor de correcção e o preço fixo por caixa ao abaixamento da sua margem resultante da passagem do desconto fixo ao desconto composto, que, conjugado com a dependência do seu volume de negócios e com a dependência dum mercado dependente das marcas T… nas quotas de mercado da época, as obrigava, para poderem subsistir como tal no mercado grossista, a obedecer a tudo quanto as RR. determinassem e concretamente a aproveitar todas as possibilidades de reconstituição da sua margem anterior, no que isto traz de incentivo conseguido de maiores compras. Seguem assim a posição da AdC, que não tendo detalhado particularmente a questão do factor de correcção, no entanto apreciou todos os comportamentos que resultavam das Condições Gerais que lhe foram submetidas com a perspectivação das mesmas segundo a queixa da concorrente B…, que acusava tais condições de gerarem a fidelização da rede grossistas e portanto de a impedirem, e a outras concorrentes, de aceder eficazmente à mesma rede.
Dizem as Recorridas lapidarmente que o factor de correcção em nada afectou a concorrência no mercado nem os consumidores, o que tentam demonstrar pela dificuldade de subsunção aos normativos exemplificativos do abuso (tanto da posição dominante, quanto da dependência económica) a que as AA. e Recorrentes apelaram.
Concretamente sustentam as Recorridas que o factor de correcção e o preço fixo por caixa (e por economia, daqui para a frente, quando falarmos no primeiro deve entender-se que estamos também a falar no segundo) não se subsume ao artigo 4º nº 1 al. a) da LdC, pois a norma não impede as empresas de fixarem os seus preços de venda nem as obriga a fixar preços de venda iguais aos das suas concorrentes. O que é punido é a fixação artificial da alta ou da baixa do preço, devendo por esta entender-se “acordos de preços entre concorrentes (…) que levem ao aumento ou baixa de preços de forma artificial, ao arrepio do livre jogo do mercado, e por outro, acordos verticais entre fornecedores e comerciantes (sejam grossistas ou retalhistas), mas quanto ao preço a que o comerciante deve revender os seus produtos, que levem a uma limitação da liberdade do comerciante de determinação do preço a que pretende revender os produtos aos clientes. 926. A proibição de imposições pelo fornecedor dos preços de revenda dos comerciantes é, de resto, considerada no direito da concorrência português e da União Europeia uma infracção grave, na medida em que, ao reduzir a concorrência pelo preço entre comerciantes, implica preços mais elevados (não concorrenciais) para os consumidores”.
É verdade que a questão não muda se, em vez de falarmos de fixação de preço superior, falarmos de fixação (alteração em baixa) da margem remuneratória lato sensu dos grossistas. Na subida do preço do tabaco para os grossistas estamos numa fixação artificial do preço? Apenas porque, contrariamente ao afirmado, o factor de correcção não tinha como justificação apenas o aumento de impostos? O preço superior tem, ainda assim, uma justificação – é aumentar a rentabilidade das T…. Quando o preceito fala de fixação artificial fala duma falta de correspondência do preço ao livre jogo do mercado, que tem por efeito seguidamente influenciar o mercado de modo restritivo. No fundo, o que é proibido é a subida ou descida de preço enquanto mero artifício orientado à restrição, impedimento ou falseamento da concorrência. Não parece ser o caso com o factor de correcção.
O caso mais notório duma fixação artificial é a fixação de preço abaixo do custo de produção, onde se vê a completa falta de correspondência do preço fixado a qualquer justificação económica. Pelo contrário, na subida artificial do preço, por regra, o efeito pensado seria impedir ou dificultar a compra subsequente ou final. Quanto a esta, ou seja, em matéria de repercussão para o consumidor final, o aumento do preço de venda ao grossista não tem qualquer efeito, estando o preço de venda ao público fixado pela produtora. De facto, para o consumidor é absolutamente indiferente se as margens dos grossistas ou dos retalhistas baixam ou sobem, porque o preço que paga é o mesmo. Sendo o factor de correcção aplicado uniformemente a todos os grossistas, a questão, diferentemente do que sucedia com o desconto por escalões de volume, não é a subida artificial dum preço que impede a compra subsequente (isto é, por grossistas) a quem não pode pagar esse preço aumentado, assim tendo de se afastar do mercado.
Quanto a uma pura afectação da concorrência horizontal pelo factor de correcção, na medida que a entender-se o factor de correcção como uma subida artificial de preço, dele resultasse um reforço do poder económico das T…, não cremos que a LdC esteja preocupada com isso e que essa preocupação tenha sido a fonte da norma em questão, da proibição da fixação artificial do aumento de preço. É que aqui, voltamos a dizer, não estamos perante um artifício, mas perante uma justificação económica aceitável (“quero ganhar mais”) e a preocupação da liberdade concorrencial enquanto medida de saúde não implica um modelo de igualdade de poder entre todos os operadores. Como é claro, há-de admitir-se, para benefício do consumidor, que as empresas possam ter poderios económicos diversificados e que seja verdadeiramente desejado que algumas tenham um poderio suficiente para que possam realizar investimentos avultados em inovação – o caso claro e manifesto é o da indústria farmacêutica. A preocupação concorrencial nesta matéria atinge apenas os casos limite em que o poderio económico no mercado relevante pode chegar às formas de monopólio ou excessiva concentração, mas para acudir a essa preocupação a LdC tem outros remédios, designadamente a fiscalização das operações de concentração.
Não têm pois razão as AA. quando sustentam que as RR abusaram da sua posição dominante nos termos da al. a) do nº 1 do artigo 4º da LdC com a prática da introdução do factor de correcção.
Já para a aventada subsunção do factor de correcção à norma prevista na alínea b) do referido artigo 4º nº 1, “São proibidos os acordos entre empresas…que se traduzam em fixar, de forma directa ou indirecta, outras condições de transacção [para além do preço] efectuadas no mesmo ou em diferentes estádios do processo económico”, que sancionaria a prática pelas Recorridas de condições de transacção diferentes dos seus concorrentes – por exemplo, o facto das concorrentes das T… não terem aplicado o factor de correcção – as Recorridas sustentam a sua inaplicabilidade e dizemos nós que é manifesto que a norma não tem por objectivo que outras condições de transacção além do preço sejam idênticas entre concorrentes em qualquer fase do estádio do processo económico, pelo contrário, é precisamente porque, além do preço, outras condições de transacção são diferentes, por exemplo, prazos de pagamento ou facilidades de entrega, que se fortifica a concorrência salutar no mercado. E quanto ao factor de correcção, quer se veja como preço ou margem, ele não seria outra condição além do preço.
Já para a subsunção do factor de correcção à alínea c) do referido artigo 4º nº 1, que proíbe os acordos (…) que se traduzam em limitar ou controlar a (…) distribuição, sustentam as Recorridas que o preceito se afina às práticas de limitação efectiva e deliberada das fontes de distribuição, fechando, por exemplo, a entrada de novos revendedores ou proibindo os existentes de revenderem fora duma determinada zona geográfica, o que não é o caso do factor de correcção que foi aplicado uniformemente, sem associação a qualquer zona geográfica.
As AA., como vimos, invocaram a violação da alínea c) em associação à possibilidade de alteração unilateral que subsequentemente se concretizou nas “cláusulas que, apesar de não constituírem uma obrigação para o distribuidor de adquirir um determinado tipo de produtos exclusivamente a um fornecedor, constituem, no entanto, incentivos a tal, sendo equivalentes a cláusulas de exclusividade”, designadamente as relativas “a descontos comerciais variáveis, que acentuaram a subordinação económica por incentivarem os distribuidores a adquirir mais produtos do mesmo fornecedor, como forma de potenciar a margem de lucro a obter, “em violação da alínea c) do nº 1 do artigo 4º da LDC (limitação ou controlo da distribuição)”, e é pela colagem ou enquadramento do factor de correcção na acentuação da subordinação económica que se pode então afirmar uma limitação ou controlo da distribuição.
Parece curial que o legislador, quando se refere a uma limitação ou controlo da produção ou da distribuição esteja a falar duma limitação ou controlo efectivo delas. A lógica da proibição é evidentemente reportada a impedir, falsear ou restringir a concorrência o que atinge não apenas o consumidor final, que terá menos escolha (porque são produzidos ou distribuídos menos produtos por exemplo na sua zona) e perante bens mais escassos pagará, por regra, preço maior, mas também indirectamente os concorrentes que se dispusessem à produção ou distribuição do suplemento de produtos que acorreriam ao mercado se não fosse a limitação ou o controlo da produção ou distribuição.
Mas não deixa de ser verdade que há tantas maneiras de limitar ou controlar a distribuição quanto a inventiva económica que é afinal apanágio, ao menos instrumental, do próprio “direito” prático a manter-se no mercado.
Não resulta da comparação com as duas alíneas anteriores do artigo 4º nº 1 que contêm a menção “directa ou indirectamente” que no caso da alínea c) a limitação ou controlo da distribuição ou produção devam ser directas. Note-se que o que interessa é controlar a limitação da produção ou distribuição enquanto limitadoras da concorrência salutar e seria incoerente com isto estar a restringir a actuação proibitiva a casos de expressa menção de limitação ou controlo. O objectivo final manda aqui mesmo que nos dispensemos de seccionamentos formalistas: - posto que uma determinada prática resulte na limitação ou controlo da distribuição ou da produção, deve entender-se subordinada à proibição.
Falando de factor de correcção, em que medida é que ele limita ou restringe a concorrência? No mercado distribuidor, por aplicação idêntica do factor, em nada. No mercado em que se situa o abusador?
Temos de estabelecer primeiro qual é a consequência do factor de correcção. E aqui o problema é que não temos na matéria de facto provada grande apoio: - sabemos que genericamente a T… tinha a intenção de reduzir os distribuidores – factos provados 283 e 284 – mas daqui não resulta imediatamente a limitação da distribuição (o que é claramente diferente), porque nada nos diz e nem faria sentido, sobretudo neste tipo de negócio, que a T… quisesse que houvesse menos distribuição dos seus produtos ao retalho. Note-se que limitar a distribuição é bem diverso de a controlar e por isso a observação que agora fazemos especificamente quanto ao factor de correcção não invalida o que já dissemos quanto ao desconto por escalões de volume. A diminuição dos distribuidores resolve-se, com toda a probabilidade, numa concentração da distribuição em menos distribuidores, mas não numa limitação da própria distribuição. Sabemos que “238 - No ano de 2009, os AA. adquiriram à R. T… II produtos de tabaco no valor total de € 294.501.564,45, correspondente ao valor a pagar de € 273.658.455,02” mas não sabemos quanto compraram nos anos anteriores. Daqui não chegamos a uma limitação da distribuição. Por outro lado, o mesmo facto, desacompanhado dos anos anteriores, também não nos serve para dizer que este grande volume de compras representa um aumento nas compras T…, aqui sim em detrimento das compras da concorrência. Depois, sabemos apenas que “277 - Apesar da redução da margem dos grossistas, o peso dos produtos da T… continuou a ser preponderante no volume de vendas dos AA.”, o que também não nos diz que tenha aumentado o volume de compras. Parece até que estando provado que “271 - O aumento do PVP do Tabaco implica para os autores um acréscimo de custos e riscos na sua atividade, derivado de comprarem o tabaco mais caro, do aumento das necessidades de fundo de maneio, aumento das necessidades e custos de financiamento, a concessão de um maior volume de crédito ao retalho e maior risco deste, aumento do risco de assaltos e do aumento dos prémios de seguros” o mais provável é mesmo que tenha havido um enorme esforço (facilitado nas concentrações) para manter o mesmo volume de compras.
Digamos portanto que não resulta directamente do factor de correcção que para compensar o agravamento dele resultante, tenha sido feito um esforço para aumentar significativamente as compras em detrimento da concorrência. Não temos factos provados suficientes para o afirmar.
Poderia ainda pensar-se, mas as AA e Recorrentes não o dizem, que o investimento ou custo adicional derivado do factor de correcção privou os grossistas de afectarem esse adicional à compra de produtos concorrentes, mas para este pensamento precisaríamos dum facto provado que nos dissesse que esse valor seria em qualquer caso aplicado na compra de tabaco, porque não é de todo garantido que o fosse, havendo em abstracto inúmeras aplicações ou gastos possíveis.
Não chegamos assim à prática restritiva prevista na al. c) do nº 1 do artigo 4º da LdC.
Sobre a possibilidade de subsumir o factor de correcção à prática restritiva da alínea e) do n.º 1 do artigo 4.º da LdC, “aplicação sistemática ou ocasional de condições discriminatórias de preço ou outras relativamente a prestações equivalentes”, deve notar-se que o factor de correcção e o preço fixo por caixa se aplicam, segundo as Condições Gerais de Fornecimento, a todos os clientes grossistas das RR., donde a possibilidade de falarmos de condições discriminatórias é reduzida.
Eventualmente, se colarmos o factor de correcção ao desconto por escalões de volume, poderíamos chegar a essa conclusão. É que, como se nota mesmo a final na fórmula do mesmo factor de correcção, “Dado que o resultado da fórmula acima indicada depende do Desconto Comercial individual e dos diferentes PVP’s, poderão existir diferentes Factores de Correcção para cada grossista e categoria de preços”. Porém, não nos parece que consigamos demonstrar – e lá está a complexidade da fórmula – que o factor de correcção concretamente aplicado a cada desconto comercial individual tenha por si próprio e apenas a virtualidade de encerrar uma discriminação, como que agravando a discriminação da própria parte do desconto comercial individual reportada ao desconto por escalão de volume. Não sabemos se o factor de correcção aplicado a um desconto mais baixo correspondente por exemplo ao 2º ou 3º escalão, correspondia exactamente a estes, ou se era maior ou menor, agravando ou compensando.
Volta-se a dizer que é indiferente ao preenchimento da prática restritiva o facto dos concorrentes das RR não aplicarem o factor de correcção. De algum modo, visto pelo prisma do distribuidor discriminado, isto suporia um direito a ser tratado por igual por todos os fornecedores, o que não é uma necessidade concorrencial lógica nem sequer se afirma como salutar.
Quanto à subsunção à alínea f) do artigo 4º nº 1 – recusa de venda/fornecimento, como resulta do seu afunilamento funcional – com o objectivo de restringir a concorrência – não é toda e qualquer recusa de venda que integra esta alínea. Se a recusa se dá em função do não pagamento do preço, nada há a censurar.
O mecanismo do factor de correcção implicou uma subida de preço (por diminuição do desconto) acontecendo o mesmo no preço fixo por caixa. Portanto, quando pensamos no factor de correcção como uma recusa de venda, não é a ele que nos reportamos directamente (cláusula 2.3 e cláusula 10.1) nem às cláusulas que nas Condições Gerais estabeleceram, a propósito de variadíssimas situações, a possibilidade da recusa de fornecimento, porque não foram postas em causa, isto é, não vem pedida a respectiva declaração de nulidade. Só conseguimos assim indirectamente chegar à recusa por uma aplicação de direito privado – “se não me pagas, não te vendo” – conjugada com vontade contrária dos grossistas – “não queremos pagar este mais” – e a sua derrogação – “não nos interessa que não queiram pagar este adicional, ou o pagam ou não consideramos paga a totalidade do preço e portanto não vendemos”. Ora, donde não conseguimos sair é que há sempre uma dissensão de natureza jurídico-privada que subtrai a recusa de venda ao domínio do Direito da Concorrência: não é uma recusa arbitrária objectivada a uma restrição concorrencial, uma recusa de vender a quem quer comprar e pagar o preço pedido. Mesmo se depois afirmamos que esse preço adicional não era devido, isto não transforma a prática ocorrida anteriormente numa prática restritiva, porque no tempo em que foi cometida a questão não estava decidida. Percebe-se que o preço adicional constituiu um recurso financeiro que podia ter sido usado pelos grossistas para comprarem produtos das marcas concorrentes, pode admitir-se que fosse intenção da(s) T…(s) obrigar os grossistas seus clientes a pagarem mais para os impedir de comprarem à concorrência, mas note-se que isto é este tribunal de recurso a dar largas à imaginação, porque esta intenção não foi sequer alegada pelas AA., que antes se quedaram por uma intenção das RR de aumentarem os seus lucros e se assim se tornarem mais poderosas economicamente que os seus concorrentes, desse poderio resultando então a afectação da concorrência – o que já vimos que também não é censurável do ponto de vista da concorrência. Para não darmos largas à imaginação, precisaríamos de ter algum apoio nos factos provados sobre esta funcionalização da subida de preço por via da introdução do factor de correcção, apoio que não temos. Portanto, assim como a questão nos vem posta, não nos parece que o factor de correcção (e o preço fixo por caixa) revelem recusa sistemática ou ocasional de venda enquanto prática restritiva da concorrência no domínio do abuso da posição dominante.
Finalmente, quanto à subsunção dos comportamentos das Rés à alínea g) do nº 1 do artigo 4º da LdC, subordinar a celebração de contratos à aceitação de obrigações suplementares que, pela sua natureza ou segundo os usos comerciais, não tenham ligação com o objecto desses contratos, quando nos centramos no factor de correcção, temos a dificuldade de não conseguir considerar um aumento de preço como uma obrigação suplementar, antes é uma obrigação principal e essencial, e nem mesmo quando pensamos no adicional que representou o factor de correcção, ou quando o perspectivamos como diminuição de margem, não conseguimos ver que uma sua eventual natureza suplementar não tenha, pela sua natureza ou segundo os usos comerciais, ligação com o objecto do contrato – o objecto do contrato é vender/comprar para revender, tudo o que diga respeito a preço ou margem de desconto está directamente relacionado com este objecto.
Em conclusão, e segundo as imputações feitas pelas Recorrentes para a subsunção do factor de correcção/preço fixo às práticas restritivas previstas no artigo 4º nº 1 da LdC, em termos de abuso da posição dominante, não conseguimos secundar as Recorrentes. Abuso da dependência económica:
Revisitemos então as invocações na perspectiva dum abuso de dependência económica.
Já vimos que não é inerente ao tipo do abuso da dependência económica que o efeito da prática se limite ao mercado dependente, mas em todo o caso em havendo esse efeito ele deve ser analisado.
Já concluímos, sobre os descontos variáveis que sucederam na decomposição do anterior desconto fixo, que o desconto de informação se integra na proibição da alínea g) do nº 1 do artigo 4º, podendo até mais correctamente e em função do seu modo de prática, ser enquadrado como abuso da dependência económica.
Na dimensão adicional em que a informação ao abrigo deste desconto, porque destinada a comprovar o desconto de distribuição directa e activa, solidificou os termos deste desconto e mais concretamente uma quase proibição de revenda a outros grossistas, podemos voltar a pensar num controlo da distribuição, ao abrigo da alínea c) do mesmo preceito e número, na medida em que interfere com a liberdade negocial de revenda dos grossistas, só que, tal como resulta da definição de cliente distribuidor nas Condições Gerais que entraram em vigor em Agosto de 2002 (facto provado 9) – “a) Compre Produtos por grosso, a título habitual e profissional, em seu próprio nome e por sua conta e risco e que os revenda a utilizadores profissionais (retalhistas) que, por sua vez, os revendam directamente ao consumidor” – não tendo esta definição sido posta em causa na presente acção, isto é, não tendo sido a mesma apodada de violadora da leal e sã concorrência, parece claro que não está em causa que o objecto do contrato definia a revenda como revenda ao retalho, ou essencialmente como revenda ao retalho, em coerência lógica com o fito de recorrer a uma rede de distribuição, que é afinal levar o produto produzido até quem o consome. Por outro lado, também não temos factos provados que nos densifiquem a medida de prejuízo da impossibilidade de revender a outros grossistas. Finalmente, se pensarmos numa outra face desta mesma impossibilidade, ela liga-se ao impedimento que teriam os distribuidores que não alcançassem o 1º escalão no desconto por escalões, a abastecerem-se junto de grossistas que o tivessem alcançado e que conseguissem então vender-lhes por um preço acima do preço que resultaria da aplicação directa pelas T… dum escalão inferior. Também para aqui não temos grandes factos e o máximo que podemos convocar é o que já resulta da análise do desconto por escalões que acima fizemos.
Resta dizer que em si, o desconto por distribuição directa e activa não apresenta autonomamente nenhum vício concorrencial: - também resulta das Condições Gerais cujas cláusulas são impugnadas, que as mesmas Condições se referem aos clientes grossistas que pratiquem distribuição directa e activa. O seu potencial de ilicitude só eventualmente pode ser encontrado mais atrás, na redução do desconto fixo por via da sua decomposição.
Relativamente ao desconto por escalões, volta-se a repetir o que se disse, na perspectiva dum abuso de dependência económica, pela integração nas previsões das alíneas c) e e) do nº 1 do artigo 4º, em prejuízo da concorrência horizontal e em prejuízo do próprio mercado distribuidor, e em função do primeiro, também em prejuízo das escolhas disponíveis ao consumidor.
Assim sendo, e porque excluímos ab initio a análise do meio único de pagamento e tendo excluído o conhecimento do desconto por carteira, parece apenas restar analisar o factor de correcção enquanto estrito abuso de dependência económica.
Ora, se pensarmos no abuso de dependência económica na remissão enunciativa legal para o elenco de práticas restritivas que o legislador considera à partida, salvo justificação, proibidas, e posto que já apreciamos cada uma das imputações feitas pelas Recorrentes – como se viu, às alíneas a), b), c), e), f) e g) do nº 1 do artigo 4º da Lei 18/2003 – teremos de repetir aqui a conclusão de que especificamente quanto ao factor de correcção e ao preço fixo por caixa não se consegue fazer a subsunção às referidas alíneas.
Passemos então ao nível não expressamente nomeado pelo legislador: o factor de correcção e o preço fixo por caixa, independentemente de não se subsumirem a nenhuma das alíneas do artigo 4º nº 1, ainda assim afectaram o funcionamento do mercado (horizontal ou vertical – distribuidor) ou a estrutura da concorrência, ou no seu equivalente, tiveram por objecto ou efeito impedir, restringir ou falsear a concorrência, afectando esta de modo sensível?
Aqui voltamos às grandes linhas das AA. e Recorrentes, às quais também chamamos a decomposição do desconto fixo em descontos variáveis: - o objecto e efeito de todas as alterações introduzidas a partir de 2002, e depois em 2006, foi reduzir a margem dos distribuidores para que estes se fidelizassem ainda mais às RR, em prejuízo da concorrência e do consumidor final, ou dito de outro modo, uma quase reposição da exclusividade que antes do final dos anos 80 podia constar dos contratos individuais celebrados com os grossistas. Essa redução da margem foi de tal forma violenta que muitos distribuidores cessaram actividade – nesta cessação os sobreviventes engrandeceram-se – e muitos concentraram-se, todos os sobreviventes isolados ou concentrados ganhando novo poder, construído sobre a dependência do consumidor às marcas T… e portanto abrindo a porta a notáveis economias de escala – e daqui também, um caminho livre para a fidelização.
E no fundo chegamos às conclusões das autoras do Estudo do Mercado do Tabaco, de que todas e cada uma das alterações, por si ou em conjunto, fidelizaram os distribuidores às T…, em prejuízo da concorrência e do consumidor.
Ora bem, com o devido respeito, parece que estamos pouco assistidos de factos provados para secundar esta afirmação e as linhas gerais das AA. e Recorrentes.
Uma das afirmações das Recorrentes que é de afastar liminarmente é a de que a redução do número de grossistas operou em prejuízo do consumidor final, por diminuir a distribuição. Concluímos que houve controlo da distribuição, se quiserem, melhor ainda, controlo dos distribuidores, mas não que tenha havido limitação da distribuição – já dissemos que seria um contra-senso ao próprio coração do negócio (e neste negócio e neste coração também estão plenamente mergulhadas as concorrentes horizontais das T…).
Outra é do reforço do poderio económico das T… – além do mais obtido pelo factor de correcção e preço fixo – em detrimento das suas concorrentes horizontais. Não vamos repetir o que dissemos já sobre isto.
Quanto à redução da margem – que operou para todos os que, antes titulados a um desconto fixo uniforme, não conseguiram reconstitui-lo na adopção dos comportamentos exigidos pela componente variável de descontos – redução onde combinamos os eventuais insucessos comportamentais variáveis com o factor de correcção e o preço fixo por caixa, não temos, salvo o que se dirá a seguir, que o aumento de preço (é no que se resolve a redução da margem) tivesse necessariamente sido um desvio dessa parcela da afectação que, com toda a segurança, os distribuidores dela teriam feito na compra de produtos concorrentes das T….
Apenas temos que os grossitas, na decomposição do desconto fixo e composto com variáveis, foram induzidos aos comportamentos exigidos pelos descontos variáveis, mas, tirando o desconto por escalões de volume, não temos evidência senão duma maior afectação de dinheiro à compra, sem conseguirmos passar ao nível de evidência de que todos os comportamentos que as componentes variáveis reclamavam determinavam um maior número de compras às RR. Só no desconto por escalão de volume isto se tornou evidente. Na realidade, a fórmula do facto provado 280 “Tendo o desconto comercial fixo sido reduzido em 2002, momento em que foram introduzidos vários descontos condicionais, os grossistas foram induzidos à realização dos comportamentos que lhes permitiam a manutenção do desconto comercial fixo anterior” não pode deixar de ser combinada com os mecanismos concretos de cada desconto variável, não resultando que do desconto de distribuição directa e activa e do desconto de informação sobreviesse um aumento do número de compras. Isso só aconteceria com o desconto de carteira e o desconto por escalão de volume.
Neste mesmo desconto, temos prova de que ele provocou a diminuição do número de grossistas, por cessação e concentração, afectando assim a estrutura e o funcionamento do mercado, restringindo a concorrência no mercado distribuidor, de modo censurável além disso porque se tratou duma afectação artificial (por discriminação injustificada num mercado marcado pela dependência do consumidor em relação à marca e limitado pela fixação antecipada do preço final e pelo condicionamento do preço de revenda) do livre jogo concorrencial no mercado distribuidor.
Repare-se agora que com a introdução do desconto por escalão, num mercado distribuidor em que não há fuga relevante – quer dizer, mecanismo de reconstituição, concretamente pela dificuldade de aumentar o preço de venda ao retalho, este mesmo condicionado pelo PVP, e quer dizer, a dependência do consumidor em relação à marca condiciona também a escolha do retalhista e deste modo a fuga do grossista para as marcas da concorrência, perante concorrentes seus que disponibilizam todas as marcas e que seriam preferidos pelo retalhista – se alcança o desiderato de profissionalização da rede distribuidora, com exclusão dos menos aptos a essa profissionalização, conseguindo-se profissionais de maior dimensão geradores de economias de escala, que porém também conscientes da dependência do fumador em relação à marca, preferem apostar no negócio seguro de venda de marca T…, e deste modo se gera igualmente um potencial muito importante de maiores compras T… que concorrência desta. Poderíamos até falar dum dolo necessário – independentemente de ser irrelevante a volição – de afectação do mercado distribuidor por redução dos seus membros, enquanto instrumento de combate à concorrência horizontal. Quanto maiores os distribuidores mais apetência terão para comprar mais do que a simples soma das compras dos membros anteriores do mercado distribuidor, e no limite, denodadamente combatida a dependência do fumador em relação à marca, a lealdade pode ceder às margens maiores oferecidas pela concorrência.
Finalmente, quanto ao factor de correcção/preço fixo, enquanto agente de agravamento das condições dos grossistas, na tentativa de subsunção a um ilícito inominado por desvio de fidelização em prejuízo da concorrência horizontal, pensando por exemplo que para compensarem a baixa, os grossistas comprassem mais, colidimos com o facto provado de que as compras se mantiveram (portanto, compraram o mesmo mais caro, apenas), e pensando por exemplo que os sobreviventes compraram o mais que os não sobreviventes deixaram de comprar, neste aspecto não se chega aritmeticamente senão à compra da mesma quantidade. Pensando ainda em alteração da estrutura do mercado distribuidor ou afectação do seu funcionamento por exclusão dos que não conseguiram sobreviver ao aumento de custo de compra introduzido pelo factor de correcção, temos números da diminuição de grossistas mas já começados em 2002 (e não apenas em 2006 quando o factor é introduzido) e temos um facto provado relacionando a cessação de actividade dos grossistas em consequência do desconto por escalão, mas não em consequência do factor de correcção. Por outro lado, tentando lançar-nos numa abordagem mais geral ou de potencial, contornar-se-ia a aplicação uniforme do factor de correcção pelo objectivo de diminuição dos grossistas diversas vezes manifestado pelas T… – e assim o agravamento do preço visaria deliberadamente afastar do mercado distribuidor os menos profissionalizados – mas o que temos em concreto sobre isso e na verdade isso foi a alegação essencial das AA., é o que o factor de correcção foi instituído pelas Rés com o objectivo de aumentarem a sua própria margem e lucros à conta do correspondente prejuízo dos grossistas, ou seja, não temos uma ligação específica entre o factor de correcção e a alteração da estrutura e funcionamento do mercado distribuidor.
Assim, e em conclusão, em termos de abuso da dependência económica, apenas o encontramos como já vimos, no desconto por escalões de volume e no desconto por informação introduzidos em 2002. Por isso, declaramos nulas as cláusulas 2.2.2 das Condições de 2002, 2005, 2006 e 2008, mas apenas no que toca especificamente às subcláusulas 2.2.2.2 e 2.2.2.4 das Condições Gerais de 2002 e das Condições Gerais de 2005, às subcláusulas 2.2.2.2 e 2.2.2.3 das Condições Gerais de 2006 e às subcláusulas 2.2.2.1 e 2.2.2.1 das Condições Gerais de 2008. H - Oitava linha argumentativa: - do abuso de direito.
Como se indicou, as Recorrentes invocam o abuso de direito para a improcedência de todas as linhas argumentativas anteriores. Não sendo o caso quanto a cláusulas de alteração irrestrita, factor de correcção e preço fixo, descontos variáveis por escalão e informação, não haverá que o analisar enquanto linha autónoma. Todavia, ainda assim, dizer que nos termos em que a invocação vem feita, não se conseguiria autonomiza-la da violação das normas de concorrência, posto que se parte do aproveitamento da dependência económica por uma empresa detentora de posição dominante, ou seja, na verdade, a invocação feita não era subsidiária da hipótese de se conceder que não havia abuso de posição dominante e de dependência económica.
Uma última nota para dizer que nem pela via do abuso de direito se consegue a eliminação da cláusula que impôs o meio de pagamento único.
O abuso de direito não vem oferecido pela ordem jurídica no âmbito do artigo 334º do Código Civil como um remédio contra uma lei injusta. Como vimos, e por isso não satisfizemos as pretensões das Recorrentes quanto ao meio de pagamento único, estamos em presença duma decorrência do respeito por uma obrigação assumida internacionalmente, além do mais, pelo Estado Português, que faz extrapolar a obrigação de pagamento único do seio da disciplina privada dos conflitos, isto é, que opera no seio privado pela ressalva contida na parte inicial do artigo 405º do Código Civil.
Nem se virmos esta obrigação como um direito que o compromisso internacional daria à 2ª Ré de exigir o pagamento por um único meio – e em bom rigor não é nada disso, antes uma imposição teleologicamente dirigida a um interesse público no combate ao mercado ilegal de tabaco e mais especificamente ao branqueamento das vantagens do crime em geral, portanto, uma imposição colaborativa à 2ª Ré e não um direito seu – lhe conseguimos opor o abuso de direito, pois este se apresenta como um remédio de última linha ao chamamento duma realidade aos princípios básicos fundamentadores e legitimantes da própria emanação jurídica – isto é, uma certa e mais ou menos acordada ou imposta ideia de repartição de riqueza e poder na pólis, ou dito de outro modo, uma ideia de justiça – não podendo um comportamento (prática criminosa e suas vantagens, isto é, uma prática que sustém um poder paralelo ao do poder instituído ou aceite na cidade) que contraria tais princípios nunca ser tolerado, sob pena de derrocada do próprio poder instituído.
Para que se entenda e apelando a um campo mais geral, se o modo de repartição da riqueza e do poder é injusto, o poder criminoso ou se afirma como revolucionário e derruba o poder instituído, ou se não tem essa pretensão e se afirma meramente como alternativa de repartição da riqueza, nunca consegue, em termos de funcionamento de princípios, ser bem acolhido pela ordem instituída e pelo seu instrumental jurídico.
Mas em rigor, não entendemos sequer que a cláusula que impõe o pagamento único corresponda a um direito da 2ª Ré, e por isso não poderíamos concluir nunca que haveria abuso desse direito.
Terminadas as linhas argumentativas desta 5ª questão, impõe-se agora concluir sobre as consequências jurídicas dos ilícitos encontrados, na conjugação destas com os pedidos formulados pelas AA. e AA na petição inicial. Consequências:
I - Por economia, excluamos já o pedido de condenação das RR “a aceitar o pagamento das faturas por si emitidas por meio de mais do que um cheque sacado sobre várias instituições bancárias nacionais, se for conveniente às AA., aplicando-se as condições vigentes até 1 de Outubro de 2010 em matéria de forma de pagamento das faturas e que admitiam o pagamento de fatura ou conjunto de faturas por meio de mais de um cheque”.
Não conseguimos encontrar a ilegalidade da correspondente cláusula nem ao abrigo do RJCCG, nem como violação contratual “a se” no caso das recusas expressas de aceitação da sua imposição, nem ao abrigo das normas do Direito da Concorrência.
II – Excluamos também, porque subsidiária e considerada prejudicada, a subsunção do aplicação do factor de correcção e do preço fixo por caixa à coacção moral e à usura, e portanto a consideração dos efeitos do negócio usurário para os quais, na apreciação sumária, tendemos.
III – Excluamos ainda a nulidade das cláusulas que introduziram e mantiveram o factor de correcção e o preço fixo por caixa por violação das normas do Direito da Concorrência.
Sobra então:
IV – Da qualificação da relação entre as partes como contrato de concessão comercial, que a introdução do factor de correcção e do preço fixo por caixa, porque expressamente não aceites pelas AA. e Recorrentes e porque apesar dessa recusa foram aplicadas, se situa no domínio da violação contratual.
Na verdade, a não ter ocorrido recusa de aceitação das cláusulas que introduziram estas modificações essenciais, reportadas ao equilíbrio económico entre as partes, as mesmas seriam nulas nos termos do RJCCG, além do mais pela contaminação ou arrasto que lhes determinaria a nulidade, por violação do artigo 15º do mesmo regime, da cláusula que permitia alterações unilaterais irrestritas. Porém, porque as AA. e AA. efectivamente recusaram a aplicação das mencionadas cláusulas relativas a factor de correcção e preço fixo por caixa, o respectivo Regime só se aplicando a cláusulas aceites (artigo 4º), não é aplicável.
Quedando-nos então pela violação contratual, qual é a consequência?
Antes de mais, recordar que na presença dum contrato de concessão comercial, a percentagem de desconto que estava acordada até antes da introdução do factor de correcção, era um elemento essencial acordado, cuja concessão, pelas Rés às AA. representava o cumprimento de uma sua obrigação. Traduzindo-se o factor de correcção num abaixamento dessa percentagem, ele só poderia ser aplicado se as AA. e AA tivessem dado o seu acordo a esse abaixamento. Alternativamente, poderiam as RR. ter recorrido ao mecanismo jurídico do artigo 437º do Código Civil, o que não fizeram. Não tendo as AA. aceite e não tendo as RR. recorrido à modificação contratual por alteração de circunstâncias, o contrato obtido por livre vontade das partes, nos termos do artigo 405º do Código Civil, tinha de ser pontualmente cumprido nos termos do artigo 406º do Código Civil, concretamente o ponto sobre o desconto a conceder tinha de continuar a ser observado. Não o tendo feito, antes activamente tendo imposto a sua vontade às AA. e AA., as Rés violaram o artigo 406º do Código Civil, incumprindo o que tinham acordado.
As AA. e os AA., na petição inicial, alinham a consequência para uma conduta que não aceitaram como sendo a ineficácia (a não produção de qualquer efeito jurídico – cfr. artigo 183º da PI), em função da qual o que pagaram a mais foi indevido, ou visto doutro modo, o que tinham direito a receber e deixaram de receber lhes foi retido, reclamando a sua repetição ou devolução. Alegam as AA. no artigo 352º da petição inicial que “Essas quantias devem ser restituídas às AA. pela RR., para cada uma delas nos termos e montantes referidos anteriormente, por aplicação dos artigos 476º, nº 1, 479º nº 1 e 480º, al. b), do CC, por não ter havido para a retenção base contratual que a legitimasse, seja nos termos do artigo 289º nº 1 do CC, em razão da invalidade das disposições contratuais que as determinaram”. A parte final da alegação não coloca verdadeiramente uma alternativa, devendo entender-se que se reporta à alegação subsidiária contida nos artigos 184 e seguintes da PI, onde se alinhou que, a entender-se ter havido aceitação tácita das cláusulas relativas a factor de correcção e preço fixo, sempre as mesmas seriam anuláveis por terem sido obtidas por coacção moral a partir da ameaça de recusa de fornecimento.
Pese embora na petição inicial o Autor haja de indicar as razões de direito que fundamentam o seu pedido, na medida em que também assim delimita o campo ao qual há-de a outra parte poder oferecer defesa, a não subsunção da factualidade oferecida a essas razões não determina o insucesso da pretensão, pois, como se sabe, o tribunal não está sujeito às alegações das partes no tocante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito – artigo 5º nº 3 do CPC (na versão actualmente em vigor). Esta regra também se increve no domínio do conhecimento obrigatório da contraparte. Ora, esta liberdade do tribunal é tanto mais assim perante um consenso de impossibilidade teórica subsuntiva e por outro lado, no caso concreto, também tendo sido invocadas outras razões de direito para a ilicitude das cláusulas em apreço, se não pode afirmar nenhum condicionamento da defesa das RR.
Quando falamos em evidência de impossibilidade teórica estamos a pensar numa espécie de conhecimento básico sobre o enriquecimento sem causa, qual seja, o da sua natureza subsidiária.
Diz-nos então Menezes Leitão[50], logo a iniciar a segunda parte da sua tese (Parte II – Estudo de Direito Positivo) que “por força da consagração expressa da subsidiariedade do enriquecimento sem causa no art. 474º do Código Civil (…), torna-se necessário proceder à delimitação entre o enriquecimento por prestação e outras hipóteses jurídicas de restituição de prestações, cmo sejam a invaliade do negócio jurídico (arts 286º e ss.) (…)”.
Pronunciando-se sobre a invalidade do negócio jurídico, prossegue o mesmo autor: “A invalidade do negócio jurídico constitui, por isso, uma hipótese de restituição de prestações, à semelhança do que ocorre no âmbito do enriquecimento por prestação. Nesta medida, a sua aplicação impede a aplicação do regime do enriquecimento sem causa, na media me que constitui “outro meio de o empobrecido ser restituído” nos termos do art. 474º do Código Civil. A restituição da prestação só poderá ser pedida com fundamento no enriquecimento sem causa (arts. 473º e ss.), em caso de inexistência do próprio negócio 1327, por este nunca se ter chegado a constituir ou já se ter extinto, uma vez que a invalidade do negócio atribui às partes um fundamento distinto para exigir a restituição das prestações”[51].
Mais adiante[52] e depois de abordar os distintos regimes consequenciais do enriquecimento e da invalidade, refere: “Esta distinção de regimes entre a invalidade do negócio jurídico e o enriquecimento sem causa é justificada com base na diferença de fundamento dos dois institutos. Enquanto no enriquecimento sem causa a restituição deriva de se ter realizado uma atribuição patrimonial sem causa, produtora desse enriquecimento, no âmbito da invalidade do negócio está em causa um vício inerente ao acto, em virtude do qual este não pode produzir os seus efeitos, tendo a obrigação de restituição das prestações por fundamento essa ineficácia negocial 1331”.
Quando pensamos nas prestações realizadas em pagamento do adicional à factura que representou o factor de correcção e quando pensamos nas prestações pagas pelo valor duma factura que incorporou a redução do desconto ao longo dos anos de aplicação do factor de correcção para o preço fixo por caixa, não dizemos que essas prestações não têm causa, como sucede no âmbito das prestações no enriquecimento sem causa por prestação. Não estamos em presença de prestações feitas com animo solvendi quando a obrigação que se visa cumprir não existe – ela existe, foi plasmada nas Condições Gerais e de novo nas facturas emitidas, o que sucede é que não podia ter sido plasmada nem incluída porque em violação do artigo 406º do Código Civil – não estamos em presença dum indevido objectivo (a obrigação não existia no momento em que foi realizada a prestação), a obrigação assim cumprida não é uma obrigação natural, nem estamos em presença do cumprimento feito a terceiro ou feito por erro desculpável antes do vencimento da obrigação, nem finalmente do cumprimento de uma obrigação alheia na convicção de que é própria. Também não estamos no domínio do cumprimento duma obrigação que tendo tido causa deixou, no momento de realização da prestação, de a ter, nem do cumprimento para verificação de um efeito que afinal não se verificou.
No caso, a causa da obrigação que se cumpre, é muito clara: - é a imposição do adicional de preço em que se resolveu o factor de correcção e o preço fixo por caixa, contra a vontade expressa das AA. e dos AA.
Assim sendo, quando pensamos na consequência “restituição” da prestação adicional paga – e em rigor é mesmo isto que se trata, porque as AA. e os AA. só deixaram de auferir determinado desconto na medida em que tiveram de o pagar – não é ao enriquecimento sem causa que devemos ir buscar o regime jurídico aplicável.
Qual é então este regime? É o do incumprimento contratual.
Quando pensamos na obrigação de vender/fornecer contra a obrigação de comprar para revenda, inserida num contrato em que também estão plasmados, directamente e por referência a anexos, os descontos a conceder e as condições desses descontos, tudo isso, ainda que variável para cada grossista e ainda que variável de Condições Gerais para Condições Gerais, está abrangido pelo acordo das partes que se foi dando sucessivamente por diversas vias de aceitação das Condições Gerais. Digamos com meridiana clareza que acaso um grossista aceite como cliente tivesse cumprido todas as suas obrigações e porém reclamasse um desconto superior ao que resultava das tabelas em cada momento aplicáveis, a T… naturalmente lho recusaria invocando o cumprimento do contrato – “foi a isto, com estas condições, que disseste que sim, não podes querer mais”. Com a mesma clareza podemos reverter este argumento: - quando a T… concede menos desconto, podem as AA. dizer “estás a faltar ao compromisso que assumiste”, “compromisso em função do qual nos organizámos”. Quando as RR. concedem menos desconto do que aquele a que se tinham obrigado, concessão que é ilícita porque as AA. não aceitaram esse desconto menor – na verdade, não há base legal nem contratual que lhes permita impor esse desconto às AA. quando elas não o aceitam – essa concessão é feita em violação do contratado e representa o incumprimento da obrigação de concessão de desconto maior, pois que, de acordo com o artigo 762º nº 1 do Código Civil, “O devedor cumpre a obrigação quando realiza a prestação a que está vinculado”. Em consequência, rege o artigo 798º do mesmo Código “O devedor que falta culposamente ao cumprimento da obrigação torna-se responsável pelo prejuízo que causa ao credor”. E mais: “Incumbe ao devedor provar que a falta de cumprimento ou o cumprimento defeituoso da obrigação não procede de culpa sua” – artigo 799º do Código Civil.
No caso concreto não só as RR não provaram que tinham o direito de baixar a margem de desconto das AA, como é manifesto que nem sequer procederam de boa-fé perante os grossistas que expressamente recusaram a aplicação do factor de correcção e do preço fixo por caixa, pois optaram pela via da defesa da inexistência de qualquer vinculação contratual, fosse de que espécie fosse, ao arrepio de toda a tradição de contratos mantidos ao longo de décadas, e reconhecidos como contratos, através duma tese de que era a adesão de Portugal às Comunidades Europeias e a privatização da T… que impedia que celebrassem contratos com os distribuidores, a qual era patentemente descabida. Mais, ficou demonstrado que nem sequer prestaram informação completamente verdadeira sobre o factor de correcção, omitindo que de facto através dele visaram, em parte, alterar o equilíbrio económico das partes, que é condição essencial da mútua vinculação.
Dizer assim que é evidente o comportamento voluntário destas RR. devedoras e que é firme o ilícito contratual e a culpa das mesmas RR.
No apuramento da obrigação de indemnizar somos então remetidos para a necessidade de verificação de dano e de nexo causal, segundo os termos do artigo 562º e seguintes do Código Civil. O que pareceria ser uma tarefa complicada em face dos factos provados de que as AA. “realizaram menos x do que teriam se tivessem sido cumpridas as Condições de 2005” é muito facilitado quando temos provado que o factor de correcção consistiu num adicional de preço aplicado às facturas e que simultaneamente pode ser calculado como um abaixamento de percentagem de desconto, abaixamento esse quantificado no caso do preço fixo por caixa que passou a ser aplicado a partir da segunda metade de 2009. É que na verdade o dano consiste precisamente nas quantias pagas a mais do que teria acontecido se tivesse sido aplicada a percentagem de desconto resultante das Condições de 2005, e não há sequer nenhuma outra explicação para esse dano que não seja a aplicação que as RR. fizeram do factor de correcção e do preço fixo por caixa contra a vontade expressa das AA e dos AA. De resto, o que resulta dos factos provados 107 e 108 e 109 a 205 é o apuramento do “pago a mais” em função das compras concretamente feitas por cada AA ao longo dos anos, sendo portanto indiferentes quaisquer considerações sobre adaptações dos grossistas à evolução do mercado e sobre o facto de por aplicação do PVP aumentado terem ganho mais do que ganharam em 2005.
Torna-se assim claro que as RR. devem reconstituir a situação que existiria (artigo 562º do Código Civil) restituindo a cada Autora e Autor os valores apurados em tais factos provados, com as especificações que faremos a final. Porque ilicitamente privados desses valores, e desde a data de constituição de cada parcela desses valores, haveriam as AA e AA de receber os correspondentes juros de mora, senão como benefícios que deixaram de obter pela lesão, concretamente pela privação da disponibilidade dos respectivos montantes pagos a mais, nos termos do artigo 564º do Código Civil, pelo menos nos termos do artigo 804º do Código Civil, porém a contagem inicial de tais juros mostra-se limitada, em face do pedido, aos juros devidos a partir da citação das RR.
Tais juros devem ser contados à taxa de juros comercial em cada momento aplicável, nos termos do artigo 102º § 3 do Código Comercial, uma vez que independentemente da obrigação sobre a qual incidem proceder da aplicação de disposições civis comuns, ela se insere no âmbito da actividade comercial que unia ambas as partes.
Neste sentido, veja-se na dgsi o acórdão do STJ de 8.9.2016 proferido no processo 1665/06.5TBOVR.P2.S1, em cujo sumário se lê: “(…) IX - A obrigação de pagamento de juros comerciais respeita à natureza do acto: acto comercial ou não. A circunstância de o pedido ou da causa de pedir assentar em normas do CC não se mostra decisiva para a qualificação da natureza da dívida destinada a reparar os danos causados pela mora (art. 804.º do CC), não sendo esse o critério para qualificar uma obrigação de pagamento de juros como civil ou comercial” (…). Como se adverte no texto do mesmo acórdão: “É que a razão de ser da existência de juros moratórios comerciais não se relaciona com o devedor mas antes com o credor, sendo aqui válido o que se escreveu no Acórdão deste STJ de 09-07-2014 (Proc. 433682/09): “a razão continua a ser a mesma e radica na necessidade de compensar especialmente as empresas pela imobilização de capitais, pois que, para elas o dinheiro tem um custo mais elevado do que em geral, na medida em que deixam de o poder aplicar na sua actividade, da qual extraem lucros, ou têm mesmo de recorrer ao crédito bancário”.
Pedem ainda as AA. e os AA que sejam as RR. condenadas a entregarem aos AA. as quantias que facturarem com base nas mesmas cláusulas, desde a data das últimas faturas referidas na petição inicial até ao trânsito em julgado da presente acção, e os juros de mora sobre essas quantias, à taxa legal aplicável aos comerciantes, desde a data da citação.
O fundamento de procedência – incumprimento culposo – é o mesmo que para as quantias apuradas concretamente nos autos por referência aos factos provados 107 a 205, e mais especificamente está relacionado com a aplicação da cláusula de preço fixo tabelado às compras que as AA e AA tenham feito e que tenham sido facturadas já depois das últimas juntas aos autos, na pendência processual, até ao trânsito em julgado da decisão que finalmente der razão às AA e AA. Mas por outro lado, note-se, pedindo as AA. “que sejam as RR. condenadas a entregarem aos AA. as quantias que faturarem com base nas mesmas cláusulas, desde a data das últimas faturas referidas na petição inicial até ao trânsito em julgado da presente ação”, haverá que considerar ainda a relevância para a determinação do desconto a considerar – e por isso também para a determinação do que foi pago a mais – da nulidade do desconto por escalão.
Estamos em presença de um pedido genérico formulado nos termos do artigo 556º nº 1 al. b) do Código de Processo Civil, e cuja solução passa, nos termos do nº 2 do mesmo artigo, pelo envio para o incidente de liquidação. Porém, assim sendo, parece evidente que a privação do montante a mais dispendido no pagamento de cada factura que se tenha vencido na pendência da causa será sempre individualizada e sempre posterior à citação, nenhum sentido fazendo reclamar juros desde a citação, antes sendo devidos desde a data de cada factura.
Pedem as AA e os AA a condenação solidária de ambas as Rés na restituição dos montantes. Será assim?
Sabemos que a diferente participação na dívida não exclui a solidariedade, apenas a circunscreve à parte participada - artigo 512º nº 2 do Código Civil, aliás em coerência com o que depois se dispõe no artigo 516º do mesmo diploma. O problema está antes disso: - de acordo com o artigo 513º do Código Civil “A solidariedade de devedores ou de credores só existe quando resulte da lei ou da vontade das partes”.
É manifesto que não há qualquer solidariedade resultante de vontade das partes, mas também não se encontra disposição legal que a estabeleça no caso, pois a responsabilidade contratual, ainda que encontre no seu fundamento também um ilícito – a violação dos termos acordados – não é equiparável, nesse ilícito, aos casos em que a lei estabelece a responsabilidade solidária dos causadores de danos responsáveis por facto ilícito ou pelo risco.
Nestes termos, e estando provado que “2 - A R. (1) é uma sociedade de direito português, controlada, desde a sua privatização em 1997, indiretamente por via da P…, S.A., pelo Grupo P…, que se dedica, a nível mundial, à produção e venda de produtos de tabaco, designadamente cigarros brancos, charutos, tabaco para cachimbo e tabaco de corte fino” e que “3 - A R. (2) foi constituída por efeito de cisão ocorrida na T…, comunicada às AA. por carta de 9 de novembro de 2007, com efeitos a partir de 1 de janeiro de 2008 (…)”, sendo que “4 - A atividade de comercialização de cigarros e produtos afins é desenvolvida pela R. (2), prosseguindo a R. (1) a atividade de produção industrial de cigarros e produtos afins” e que “5 - As Condições Gerais de Fornecimento passaram, após a cisão ocorrida na T…, a ser comunicadas pela R. (2)”, resulta que antes da cisão a actividade de comercialização de cigarros era prosseguida pela 1ª Ré, e que depois da cisão e concretamente a partir de 1.1.2008, passou a ser prosseguida pela 2ª Ré, donde, para os valores devidos restituir e respectivos juros moratórios comerciais são responsáveis cada uma das Rés, a 1ª relativamente às quantias que em aplicação do factor de correcção recebeu de cada Autora e de cada Autor até 31.12.2007 e respectivos juros a contar da citação, e a 2ª Ré relativamente às quantias recebidas de cada Autora e Autor pelo mesmo título (factor de correcção) e ainda a título de maior pagamento correspondente à redução do desconto vigente em 31.12.2005 através do preço fixo por caixa, a partir de 1.1.2008. Quanto às quantias a apurar em liquidação do acórdão e correspondentes à facturação ocorrida na pendência processual, apenas será responsável a 2ª Ré.
Finalmente, devem ser declaradas nulas, no dispositivo do presente acórdão, as Cláusulas 7 das Condições Gerais de 2002, da Cláusula 8 § 1 das de 2005, da Cláusula 8 § 1 das de 2008, e as subcláusulas 2.2.2.2 e 2.2.2.4 das Condições Gerais de 2002 e das Condições Gerais de 2005, a subcláusulas 2.2.2.2 e 2.2.2.3 das Condições Gerais de 2006 e as subcláusulas 2.2.2.1 e 2.2.2.1 das Condições Gerais de 2008.
Desta declaração porém, em termos de pedidos condenatórios formulados pelas AA., apenas temos que considerar as cláusulas relativas aos descontos de escalão, por infracção às normas da Lei da Concorrência, e ponderar o pedido formulado à inicial de que “sejam as RR. condenadas a executar no futuro os contratos de distribuição que mantêm com as AA., aplicando na sua faturação a margem de desconto das AA. que estava contratada, ao seu valor máximo - por força da nulidade da diferenciação por escalões -, a 31 de Dezembro de 2005”.
Dizer então que tendo-se apurado um incumprimento contratual, a sua declaração implicará também a sua insubsistência, ou dito de outro modo, os contratos que a 2ª Ré mantém com as AA e os AA devem ser cumpridos tal como acordado antes da ocorrência do incumprimento. No fundo, na presente acção, assistimos a um pedido de correcção da aplicação do factor de correcção e preço fixo por caixa na redução que fizeram do desconto de 8,62% em vigor em 2005 para 7,13% em 2009, tendo-se apurado as quantias pagas a mais até à introdução do feito em juízo, prevenindo-se os vencimentos na pendência processual mediante um pedido específico e representando este último pedido a prevenção da aplicação do desconto minimizado para futuro, pedindo-se concretamente que se aplique o desconto de 2005.
Menos simples é perceber se o desconto que deve ser aplicado nas facturas de compras que as AA e os AA venham a fazer depois do trânsito em julgado deste acórdão é o desconto que estava contratado ao seu valor máximo, por força da nulidade da diferenciação por escalões.
Poderia esta fórmula ser latamente entendida como desconto acordado antes da introdução dos descontos variáveis, ou seja, o desconto vigente em 2001, mas não é esse o sentido literal. No sentido literal, o que se diz é: “queremos que cada uma de nós seja doravante facturada como se em 2005 não houvesse qualquer discriminação entre nós por força do desconto de escalão de volume”. Quer isto dizer que, apesar de se declarar, como pedido, a nulidade das cláusulas relativas a desconto de volume, aliás desde a sua introdução nas Condições Gerais de 2002, pretendem as AA que se salve dessas cláusulas o valor máximo de desconto - 1º escalão – à data de 2005.
Pensemos em termos práticos, ou seja, tentemos reconstituir o pensamento das AA. Se o desconto de informação era condição de comprovação do desconto de distribuição directa e activa e se deste elas não podiam prescindir, já resulta claro que todas elas terão, com muita probabilidade, beneficiado do desconto de distribuição directa e activa (ainda que com diferenças entre elas em função da percentagem de distribuição directa e activa) e do desconto de informação. Quando pensamos então no desconto máximo de 2005 acordado - 8,62% - a diferença entre as AA estará em eventuais diferenças no desconto por distribuição directa e activa, mas que não serão de grande monta) e no desconto por carteira, eventualmente, mas sobretudo no desconto por escalão. Donde, para as AA., o interesse será eliminar, por nulo, o desconto por escalão na medida em que as discriminou. Daí a referência a “nulidade por diferenciação de escalões” e não exactamente a referência a nulidade do desconto por escalão de volume. “Dêem-nos portanto o máximo do desconto por escalão para cada uma de nós”.
O que foi pedido ao tribunal não foi que declarasse a nulidade dos descontos de 2º e 3º grau que tivessem sido aplicados a algumas das AA. em concreto. Foi antes pedido que se declarasse a nulidade da cláusula relativa a descontos por escalão, pura e simplesmente e pura e integralmente, em todas as Condições Gerais em que foi plasmada. E se o tribunal declara a nulidade, ainda que por violação da Lei da Concorrência na medida em que constituiu abuso de posição dominante/abuso de dependência económica, porque a partir da discriminação introduzida controlou a distribuição, em prejuízo quer da concorrência horizontal quer por alteração do funcionamento estrutural do mercado verticalmente secundarizado, o resultado é que a cláusula em si não pode mais produzir nenhum efeito (e já se dá de barato que também não podia ter produzido nenhum efeito, do que porém as AA não extraíram qualquer consequência condenatória).
Pareceria assim que, de algum modo limitados pelo princípio dispositivo e de resto pela obediência legal ao próprio intuito que preside ao instituto da nulidade – que algo que contraria a ordem jurídica não produza efeitos – seria impossível que pensássemos no desconto máximo por escalão – 1º escalão – para obrigar a 2ª Ré doravante a aplica-lo para todas as AA e AA.
Isto porém não nos impederia de dizer que na taxa de desconto a aplicar na facturação que viesse a ser feita após o trânsito em julgado deste acórdão, na medida em que a situação se mantivesse - isto é, que continuasse a não haver acordo em alterar a percentagem de desconto a observar no preço fixo por caixa, ou em que não haja recurso a uma modificação contratual por alteração das circunstâncias – o incumprimento contratual não poderia persistir, e portanto em tal facturação deveria ser observado – ainda que por reflexo na fixação do preço fixo por caixa, de venda a cada AA e AA, se este fosse ainda o modelo praticado – que o valor de desconto não podia incluir a diminuição percentual ao desconto que especificamente resultou da aplicação integral do factor de correcção desde 2006 a 2009 na medida em que foi levada à fixação do preço fixo por caixa em 2009. É que esta consequência cabe no dispositivo do pedido de aplicação da “margem de desconto das AA. que estava contratada” em 31.12.2005.
Neste conspecto, o percurso que estaríamos a fazer seria afinal o da reconstituição do desconto máximo resultante da soma de todos os descontos, entre fixo e variáveis, na medida em que o mesmo tinha sido diminuído pela aplicação do factor de correcção e posteriormente pelo preço fixo por caixa. Dito de outro modo, eliminar o dano, reconstituindo a situação que existia antes dele.
Podemos fazer o mesmo para o desconto por escalão. Se lhe declaramos a nulidade, a partir da sua introdução em 2002, o que acontece é que tudo se terá de passar como se o mesmo não tivesse sido introduzido, o que nos leva ao modo de cálculo do desconto a atribuir aos grossistas em 2001 – isto é, ao desconto fixo sem componentes variáveis. Aqui sim é que qualquer um dos valores de desconto por escalões, e portanto também o valor do 1º escalão, retorna à composição do desconto fixo de 2001, neste caso com irrelevância dos descontos menores e consideração apenas do desconto maior (porque engloba os menores). Por outro lado, quando consideramos as Condições Gerais de 2009, que introduziram o preço fixo por caixa, o que acontece é que elas suprimiram também os descontos variáveis (na altura, desde 2008, só sobrando o desconto por escalão de volume). E portanto, também nas Condições Gerais de 2009 vemos o mesmo movimento: elas “chamaram” ou melhor dizendo, integaram no preço fixo por caixa o valor de quaisquer descontos variáveis, e em concreto o valor do desconto por escalão que era o único que subsistia – e isto é uma afirmação sobre o significado do preço fixo por caixa enquanto modo de aplicação de desconto, que é independente do mesmo, em concreto, nos seus 7,13% poder ser menor do que o seria a soma da não aplicação do factor de correcção com a aplicação do desconto máximo de escalão.
Portanto, quer para trás, quer como aconteceu em 2009, o desconto por escalão é chamado a reintegrar-se num desconto único e fixo, não dependente de quaisquer variáveis específicas adicionais de comportamento das grossistas, e nesse chamamento acorre pelo valor máximo (repete-se, porque engloba os valores menores que ele).
Se esta consequência - “reingresso donde nunca devia ter saído” - é compatível com a eliminação do acto nulo, como então conseguimos apontar para a taxa de desconto de 2005 que era de 8,62%?
Em primeiro lugar, porque o potencial ou o que se quer realmente prevenir com o pedido ora em apreciação é aquilo que já dissemos: - na facturação doravante deve ser observado não o desconto de 7,13% incorporado no preço fixo por caixa, mas este desconto acrescido do percentual que resultaria da não aplicação do factor de correcção, no seu abaixamento ao longo dos anos e até ao valor 7,13% do preço fixo, situando-se então o ilícito contratual em 2006 (primeiro ano de aplicação do factor de correcção) e portanto devendo o desconto ser reconstituído à data imediatamente anterior à do ilícito, para que tudo se passe como se nada se tivesse passado, ou seja, retornando-se então a 2005.
Em 2005 tinhamos 8,62% de desconto comercial máximo, só que correspondente à soma do desconto fixo com os quatro descontos variáveis.
Na procedência do pedido ora em apreciação não conseguimos dizer portanto que para cada uma das AA deve a 2ª Ré doravante facturar com o desconto de 8,62%. Mas isto de resto nem as Recorrentes o dizem, isto é, pedem. O que conseguimos dizer é que 8,62% não pode ser diminuído no percentual de desconto a menos que representou o factor de correcção e na medida em que a sua evolução foi levada aos 7,13% do preço fixo por caixa, e que no desconto a conceder deve ainda estar incluído o valor que correspondia ao 1º escalão de volume.
Em suma, e atendendo aos termos limitados do pedido - sejam as RR. condenadas a executar no futuro os contratos de distribuição que mantêm com as AA., aplicando na sua faturação a margem de desconto das AA. que estava contratada, ao seu valor máximo - por força da nulidade da diferenciação por escalões -, a 31 de Dezembro de 2005 – e mostrado como é queo desconto do 1º escalão pode ser levado ao cálculo da margem de desconto que estava contratada nessa data, o pedido procede, segundo o que pensamos ser a interpretação correcta do pedido, na seguinte versão: “condena-se a 2ª Ré a executar no futuro os contratos de concessão comercial que mantém com as AA. e os AA, aplicando na sua facturação a margem de desconto que, relativamente a tais Autoras e Autores estava contratada a 31.12.2005, considerando a inclusão nessa margem do desconto máximo correspondente ao 1º escalão do desconto por escalões de volume e sendo vedada a dedução a essa margem do percentual que correspondeu à aplicação do factor de correcção que veio a integrar o desconto único e fixo de 7,13% no preço fixo por caixa estabelecido nas Condições Gerais de 2009”. Esta margem de desconto assim definida será a que deve também ser usada para a liquidação do pedido relativo às facturas emitidas na pendência do processo. 6ª questão – da dispensa do remanescente da taxa de justiça.
A final do seu recurso, pedem as AA e os AA: “(…)
Não é claro, em face do requerido, se as AA. e AA estão a pedir a dispensa do remanescente da taxa de justiça relativamente ao processado em 1ª instância ou apenas quanto ao processado em sede de recurso.
Para a primeira hipótese, temos entendido que não tendo sido pedida a dispensa em 1ª instância, fica precludida essa possibilidade. Veja-se na dgsi o nosso processo nº 1712/11.9TVLSB-B.L1-6, julgado em 28.2.2019, com voto de vencido e declaração de voto vencido do Exmº Desembargador ora 2º Adjunto, de cujo sumário e para cuja fundamentação do acórdão remetemos. Diz o sumário que:
“I - Nas acções de valor superior a €275.000,00 e relativamente ao pagamento do remanescente da taxa de justiça, a parte que, não sendo evidente a simplicidade da actividade desenvolvida pelo sistema de justiça na sua acção, queira pedir a dispensa desse pagamento, deverá fazê-lo antes da decisão que põe termo ao processo ou quando notificada da mesma, se a decisão não tiver oficiosamente dispensado o pagamento, mas já não, por extemporaneidade, quando notificada da conta de custas e mediante reclamação desta.
II - A interpretação que considera extemporâneo o pedido de dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça ao abrigo do artigo 6º nº 7 do Regulamento das Custas Processuais, quando deduzido após a notificação da conta de custas e em reclamação desta, não é inconstitucional por violação do princípio da proporcionalidade e do acesso à justiça”.
Para a segunda hipótese, o artigo 6º, nº 7, do Regulamento das Custas Processuais admite essa dispensa. Neste sentido, e quanto a um recurso de revista, veja-se o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 27 de Abril de 2017, proferido no processo 4154/15.3TBLSB.L1.S1.
Enquadrando a questão da dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça, o acórdão proferido nesta Relação no processo 10313/15.1T8LSB.L2-2, julgado em 21.11.2019, apresenta uma fundamentação muito compreensiva e extensa, com a qual se concorda e que vamos citar para fazer esse mesmo enquadramento:
“Dispõe o artigo 527.º, n.º 1 do Código de Processo Civil (abreviadamente, CPC) que: “A decisão que julgue a acção ou algum dos seus incidentes ou recursos condena em custas a parte que a elas houver dado causa ou, não havendo vencimento da acção, quem do processo tirou proveito.”
As custas assumem a natureza de contrapartida ou taxa paga pelo utilizador do aparelho judiciário, reduzindo os custos do seu funcionamento no âmbito do Orçamento Geral do Estado (assim, José Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, Código de Processo Civil Anotado, volume 2º, 3ª edição, pág. 418; Parecer do Conselho Consultivo da Procuradoria Geral da República de 19-04-2012).
As custas em sentido amplo abrangem a taxa de justiça, os encargos e as custas de parte - cf. art. 529º, n.º 1 do CPC.
A taxa de justiça corresponde ao montante devido pelo impulso processual de cada interveniente e é fixado em função do valor e complexidade da causa (cf. n.º 2 do art. 529º), ou seja, nos termos do Regulamento das Custas Processuais (abreviadamente, RCP), conforme o disposto nos seus artigos 5.º a 7.º, 11.º, 13.º a 15.º e das tabelas I e II anexas.
Daqui se retira que o impulso processual do interessado o elemento que implica o pagamento da taxa de justiça e corresponde à prática do acto de processo que dá origem a “núcleos relevantes de dinâmicas processuais” como a acção, a execução, o incidente, o procedimento cautelar e o recurso (assim, Salvador da Costa, As Custas Processuais - Análise e Comentário, 7ª edição, pág. 15).
Nos termos do artigo 529.º, n.º 3, do CPC, os encargos são as despesas resultantes da condução do processo correspondentes às diligências requeridas pelas partes ou ordenadas pelo juiz, cujo regime consta essencialmente dos artigos 16.º a 20.º, 23.º e 24.º do RCP.
De acordo com o disposto no art.º 530.º, n.º 4 do CPC, as custas de parte compreendem ao que cada parte haja despendido com o processo e tenha direito a ser compensada em virtude da condenação da parte contrária nos termos do Regulamento – cfr. artigos 25.º, 26.º e 30.º a 33.º do RCP e Portaria n.º 419-A/2009, de 17 de Abril. Envolvem, por exemplo, as quantias que a parte vencedora, na respectiva proporção, despendeu a título de encargos, de taxa de justiça e de patrocínio a advogados.
A taxa de justiça deve ser paga no momento do respectivo impulso processual, em uma ou duas prestações (cf. art.ºs 13º e 14º do RCP), por meio de autoliquidação da parte, para o que esta deverá socorrer-se das tabelas anexas ao diploma e, no caso de processo cuja taxa seja variável, a parte liquidará a taxa pelo seu valor mínimo, pagando o excedente, se o houver, a final (cf. art.º 6º, n.º 6 do RCP).
A conjugação do disposto no art.º 527.º, n.ºs 1 e 2 com o n.º 6 do art.º 607.º e no n.º 2 do artigo 663.º do CPC permite concluir que a responsabilidade pelo pagamento dos encargos e das custas de parte assenta no critério do vencimento ou decaimento na causa, ou, não havendo vencimento, no critério do proveito, mas tal não sucede quanto à taxa de justiça.
Na verdade, em conformidade com o acima referido, a responsabilidade pelo pagamento da taxa de justiça decorre automaticamente do respectivo impulso processual, por via, por exemplo, de petição inicial, contestação, requerimento de interposição de recurso, contra-alegação, requerimento de incidente ou de oposição, portanto, independentemente do decaimento ou do vencimento na causa.
Assim, nos termos do n.º 1 do art.º 530.º do CPC, a taxa de justiça só é devida, incluindo a remanescente, em função do impulso processual da parte que demande na qualidade de autor ou de réu, de exequente ou de executado, de requerente ou requerido, de recorrente ou recorrido.
E dada a natureza da taxa de justiça, relativamente ao seu remanescente, contrapartida do serviço prestado pela Justiça e da actividade judicial desenvolvida, causada pelas partes, concorda-se com o assinalado pelo Tribunal da Relação de Lisboa, no acórdão de 15-02-2018 (Processo: 428/12.3TCFUN-A.L1-8, Relator ANTÓNIO VALENTE), no sentido de que “a notificação da parte que obteve ganho de causa, nos termos do nº 9 do art. 14º do RCP para efectuar o pagamento do remanescente da taxa de justiça, não pressupõe qualquer violação dos princípios constitucionais de proporcionalidade e adequação”.
É que, “correspondendo o impulso processual, grosso modo, à prática do acto de processo que dá origem a núcleos relevantes de dinâmicas processuais, acaba o nº2, do artº 529º, do CPC, por inserir no sistema de custas a mais significativa alteração, correspondendo a mesma à “autonomização da responsabilidade pelo pagamento da taxa de justiça em relação à responsabilidade pelo pagamento de encargos e de custas de parte”. Ou seja, o responsável pelo pagamento de taxa de justiça é sempre a parte ou o sujeito processual autor do impulso processual, independentemente de a final ser vencedor ou vencido, podendo acontecer que o vencedor, por virtude da dinâmica da evolução do valor da causa para efeito de custas ou da sua complexidade, tenha de proceder a final ao pagamento do remanescente da taxa de justiça devida” (assim, o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 05-07-2018, Processo: 28852/15.2T8LSB-A.L1-6, Relator ANTÓNIO SANTOS).
(…)
Vejamos: “O direito de acesso aos tribunais não compreende um direito à gratuitidade do serviço de justiça, sendo, pois, legítima a exigência do pagamento do serviço de justiça. Todos os processos, salvo se beneficiarem de isenção legal, estão sujeitos a custas (que em rigor são a única fonte de financiamento do sistema judicial que se encontra directamente relacionada com os seus utilizadores). Embora não em termos não absolutos, deve existir correspectividade entre os serviços prestados e as taxa de justiça cobrada aos cidadãos que recorrem aos tribunais” (assim, o acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 21/05/2013, processo: 412/11.4TCGMR.G1, relatora MARIA DA PURIFICAÇÃO CARVALHO).
De facto, o direito de acesso aos tribunais não compreende um direito a litigar de forma gratuita (cfr. Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 227/2007), nem tem que existir rigorosa equivalência entre o custo do serviço e o montante da quantia a prestar pelo utente desse serviço (cfr. Ac. TC n.º 349/02). “Todavia, ainda que assim se entenda, é preciso que o critério adoptado não seja desproporcionado (Acs. N.ºs. 495/96 e 247/99 (…)). Concretamente, se é certo que nada impede que o montante das custas seja variável – e possa tomar em consideração o valor dos interesses globais solucionados no processo ou a utilidade económica final da acção (Ac. n.º 708/05) - , a verdade é que um sistema de custas cujo montante aumente directamente e sem limite na proporção do valor da acção coloca dois tipos de problemas. Por um lado, não está excluído que, rompida a proporcionalidade entre as custas cobradas e o serviço de administração da justiça prestado, se deixe de estar perante verdadeiras taxas e se entre, pelo contrário, no domínio dos impostos.
Por outro lado, no plano estritamente material, a solução em causa pode, na prática, consubstanciar-se na imposição de um sistema de custas excessivas, inaceitável em face do artigo 20.º (…)” (assim, Jorge Miranda e Rui Medeiros; Constituição da República Portuguesa, anotada, Tomo I, 2.ª ed., Wolters Kluwer/Coimbra Editora, 2010, p. 431).
Ou seja: O custo do recurso ao sistema de Justiça deverá ser proporcionado ao dispêndio de meios exigidos a este mesmo sistema.
Se o n.º 1 do artigo 6.º do RCP consagra o primeiro princípio, o n.º 7 do mesmo normativo permite adequá-lo ao caso concreto.
De facto, prescreve o artigo 6.º, n.º 1, do Regulamento das Custas Processuais que “a taxa de justiça corresponde ao montante devido pelo impulso processual do interessado e é fixada em função do valor e complexidade da causa de acordo com o presente Regulamento, aplicando-se, na falta de disposição especial, os valores constantes da tabela I-A, que faz parte integrante do presente Regulamento”.
Por seu turno, o artigo 6.º, n.º 7, do Regulamento das Custas Processuais prescreve que “nas causas de valor superior a € 275.000,00, o remanescente da taxa de justiça é considerado na conta a final, salvo se a especificidade da situação o justificar e o juiz de forma fundamentada, atendendo designadamente à complexidade da causa e à conduta processual das partes, dispensar o pagamento”.
Trata-se de uma faculdade que, aliás, pode ser apreciada oficiosamente em sede de recurso (assim, o Acórdão do S.T.J. de 19/09/2013, processo n.º 738/08.4TVLSB.L1.S1, relatado por ABRANTES GERALDES).
Os n.ºs. 1 e 7 do artigo 6.º do RCP mostram a preocupação do legislador em procurar alcançar algum equilíbrio entre a natureza e características do pleito e a actividade jurisdicional a que dá lugar, por um lado, e o montante a que estará sujeita a parte, a título de taxa de justiça, por outro lado.
Uma adequação perfeita é impossível, naturalmente, e daí que a lei confira ao juiz a faculdade de, criteriosa e fundadamente, procurar evitar discrepâncias gritantes entre os serviços de justiça prestados no pleito e por causa deste e a taxa de justiça.
Taxa de justiça que pode, por vezes, alcançar valores extraordinariamente elevados.
Como se referiu no Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 421/2013 (publicado no D.R., 2.ª Série, n.º 200, de 16 de Outubro de 2013, p. 31098), citando diversa jurisprudência sobre a matéria, “a taxa de justiça assume, como todas as taxas, natureza bilateral ou correspetiva, constituindo contrapartida devida pela utilização do serviço público da justiça por parte do respetivo sujeito passivo. Por isso que, não estando nela implicada a exigência de uma equivalência rigorosa de valor económico entre o custo e o serviço, dispondo o legislador de uma «larga margem de liberdade de conformação em matéria de definição do montante das taxas», é, porém, necessário que «a causa e justificação do tributo possa ainda encontrar -se, materialmente, no serviço recebido pelo utente, pelo que uma desproporção manifesta ou flagrante com o custo do serviço e com a sua utilidade para tal utente afeta claramente uma tal relação sinalagmática que a taxa pressupõe» (citado Acórdão n.º 227/2007). Os critérios de cálculo da taxa de justiça, integrando normação que condiciona o exercício do direito fundamental de acesso à justiça (artigo 20.º da Constituição), constituem, pois, a essa luz, zona constitucionalmente sensível, sujeita, por isso, a parâmetros de conformação material que garantam um mínimo de proporcionalidade entre o valor cobrado ao cidadão que recorre ao sistema público de administração da justiça e o custo/utilidade do serviço que efetivamente lhe foi prestado (artigos 2.º e 18.º, n.º 2, da mesma Lei Fundamental), de modo a impedir a adoção de soluções de tal modo onerosas que se convertam em obstáculos práticos ao efetivo exercício de um tal direito”.---
A decisão judicial que se pronuncia sobre a dispensa do remanescente atenderá, designadamente, à complexidade da causa e à conduta processual das partes.
A complexidade da causa encontra-se prevista no artigo 530.º, n.º 7 do CPC, segundo o qual: “7. Para efeitos de condenação no pagamento de taxa de justiça, consideram-se de especial complexidade as ações e os procedimentos cautelares que: a) Contenham articulados ou alegações prolixas; b) Digam respeito a questões de elevada especialização jurídica, especificidade técnica ou importem a análise combinada de questões jurídicas de âmbito muito diverso; ou c) Impliquem a audição de um elevado número de testemunhas, a análise de meios de prova complexos ou a realização de várias diligências de produção de prova morosas”.
“Os articulados (art. 147º CPC) ou alegações (art. 637º, nº 2 CPC) prolixas são aqueles que excedem a média razoável, considerando a complexidade dos factos, os institutos jurídicos envolvidos, a quantidade de documentos juntos e o número de partes. Tal acontece, por exemplo, quando os articulados ou alegações têm dezenas de páginas, existem inúmeros “copy paste” de Acórdãos ou Doutrina ou ocorre uma significativa repetição de argumentos” (assim, João Alves; “O Ministério Público na área cível: taxa de justiça – casos de especial complexidade”, in Verbo Jurídico, pp. 4-5, disponível em https://www.verbojuridico.net/ficheiros/doutrina/pcivil/joaoalves_taxajustica_especialcomplexidade.pdf).
A título comparativo, relativamente à extensão dos articulados em ações e recursos diretos, as disposições práticas de execução do regulamento de processo do Tribunal Geral da União Europeia determinam nos seus artigos 114.º e 115.º (JO 2015, L 152, p. 1 e JO 2016, L 217, p. 78) o “número máximo de páginas dos articulados” (“- 50 páginas, para a petição e para a contestação; - 25 páginas, para a réplica e para a tréplica; - 20 páginas, para um requerimento de exceção de inadmissibilidade e para as observações sobre esta; - 20 páginas, para um articulado de intervenção, e 15 páginas, para as observações sobre este) e que tais limites “só podem ser ultrapassados em casos particularmente complexos do ponto de vista jurídico ou factual”, prevendo-se normas de inserção de texto e de caracteres.
Por seu turno, as questões de elevada especialização jurídica ou especificidade técnica serão as que envolvem intensa especificidade no âmbito da ciência jurídica e grande exigência de formação jurídica de quem tem que decidir. Já as questões jurídicas de âmbito muito diverso são as que suscitam a aplicação aos factos de normas jurídicas de institutos particularmente diferenciados (cfr. Salvador da Costa; Regulamento das Custas Processuais, Anotado e Comentado, Almedina, 4.ª ed., 2012, p. 85).
Já no que respeita à conduta processual das partes estarão em questão na previsão normativa, condutas em que não tenham sido observados os deveres inerentes à da participação processual, como sejam: “- Cooperação com o magistrado judicial ou com a parte contrária, para a obtenção, com brevidade e eficácia, da justa composição do litígio (…); - Prestarem os esclarecimentos que lhe foram pedidos (…); - Agir com boa-fé (…); - Correcção, e de urbanidade (…); - Não usar, nos seus escritos ou alegações orais, expressões desnecessárias ou injustificadamente ofensivas à honra ou o bom nome da outra parte, ou do respeito devido às instituições (…)” (assim, José António Coelho Carreira; Regulamento das Custas Processuais; 2.ª Ed., Almedina, Coimbra, 2018, p. 146).
(…)” (fim de citação).
Como é sabido, o “estilo nacional” está muito longe da síntese europeia. Num outro caso em que se analisou a dispensa do remanescente, sobre o qual versou o acórdão desta Relação proferido em 73.2018 no processo 344/09.6TTLSB.L4-4, vemos no respectivo sumário que: “(…) II– Não é de dispensar o pagamento da taxa de justiça remanescente numa acção com o valor de 1.049.647€, que implicou um labor judicial de cerca de 10 anos, mediante a análise de vários e complexos articulados, pedindo o trabalhador, director-geral da Ré, a condenação desta a pagar-lhe todas as retribuições que se viessem a vencer até ao trânsito em julgado da sentença, a reintegrá-lo ou a pagar-lhe a indemnização legal devida, a pagar-lhe a quantia de 150.000€ a título de danos não patrimoniais, e ainda os danos materiais que se vierem a verificar, bem como juros. Tudo a exigir que o Tribunal apreciasse as funções concretas do Autor e a implementação no seio da Ré do programa informático Sistema Integrado de Gestão de Direitos de Autor (SIGDA), para decidir acerca da alegada violação pelo Autor dos seus deveres funcionais, análise esta que se revelou de assinalável complexidade, não só para a compreensão da natureza de um tal programa, e forma de instalação, mas também face ao número de pessoas ouvidas, parte delas técnicos, para além ainda de avaliar e decidir acerca dos demais factos que compõem a complexa causa que determinou o despedimento do Autor e dos demais pedidos formulados. Acresce que a acção subiu várias vezes em recurso e as próprias decisões proferidas e transitadas em julgado geraram controvérsia que foi apreciada. (…)”
E no seu texto escreveu-se: “No presente caso, a acção deu entrada em juízo em 2009 (2008 a providência cautelar), pedindo o trabalhador, director-geral da Ré, a condenação desta a pagar-lhe todas as retribuições que se viessem a vencer até ao trânsito em julgado da sentença, a reintegrá-lo ou a pagar-lhe a indemnização legal devida, a pagar-lhe a quantia de 150.000€ a título de danos não patrimoniais, e ainda os danos materiais que se vierem a verificar, bem como juros. O processo sofreu as vicissitudes descritas no relatório supra e a decisão ainda não transitou em julgado. O valor da causa é de 1.049.647€. (…) A actividade do Tribunal passou, não só pela apreciação das matérias que enformam o objecto da acção, como também pelo número de articulados apresentados e sua complexidade (a título exemplificativo, no recurso de apelação, foram apresentadas 67 conclusões e as contra-alegações apresentam 52 conclusões, sendo que no que respeita às conclusões, algumas com vários parágrafos, e nas alegações do recurso de revista a Ré apresenta 79 conclusões, as quais, como se sabe, traduzem o objecto do recurso), num processo que ainda não está findo, e que conta com uma duração de 10 anos, com todo o labor judicial daí resultante, o que não permite concluir pela aplicabilidade ao caso do disposto no nº7 do artigo 6º, por forma a ser dispensado o pagamento do remanescente da taxa de justiça, apresentando-se o acréscimo previsto na Tabela I proporcional a essa complexidade e utilidade económica”. (fim de citação).
Estamos perante uma acção cujo valor foi fixado em €19.656.279,44, que conta com 39 volumes, 8907 folhas até ao termo de remessa dos autos a este tribunal de recurso, tendo sido também remetidos 22 CD’s sendo 2 relativos à audiência preliminar e 20 relativos à prova produzida em julgamento. No relatório supra fizemos questão de indicar o número de sessões de julgamento, o número de testemunhas e de partes ouvidas, estas quer em depoimento de parte quer em declarações de parte, a duração dos respectivos depoimentos. Indicámos também a extensão dos articulados (612 artigos da PI que mereceram 1462 artigos de contestação logo para começo de discussão), e a extensão da prova documental. Sendo verdade que os autos foram autuados em 29.1.2012 e o processo foi remetido, no recurso da decisão final, a este tribunal, cerca de sete anos e meio depois, parte muito considerável da demora deveu-se à conclusão da perícia. Mas é facto que só o julgamento em primeira instância demorou quase dois anos.
Por outro lado, se o essencial do processo era atacar o factor de correcção introduzido em 2006, a verdade é que foram impugnadas muito mais cláusulas das Condições Gerais de Fornecimento, e cada cláusula impugnada o foi a diversos títulos, quer em termos de direito civil, quer em termos do regime das cláusulas contratuais gerais, quer em termos de coacção e usura, quer finalmente em termos de violação da Lei da Concorrência. O juízo dobrou-se, é certo, na também plúrrima defesa das Rés. Acresce que à data da remessa dos autos a este tribunal, já o processo contava com cinco apensos entre recursos intercalares e reclamações, decididos em diversos colectivos desta Relação. Também com o recurso da sentença final houve ainda que apreciar mais dois recursos intercalares.
Como decorre do que dissemos a propósito da impugnação da decisão sobre a matéria de facto, não pode exactamente dizer-se que o julgamento tenha decorrido com correcção exemplar nem, no que toca especificamente às AA e AA, com um esforço sério de abreviar. A tarefa das AA e AA não foi fácil, mas era realmente escusado repetir tantas formulações das mesmas perguntas, e em rigor ter transformado as declarações de parte sobre a antiguidade das AA em verdadeiros depoimentos sobre toda a matéria dos autos, também não se afigura como contribuindo para a celeridade processual.
Como transparece, esperamos, do presente acórdão, a tarefa do tribunal de recurso não foi propriamente simples. O nível de complexidade e de complexificação exigiu repetidas leituras, quer dos articulados, quer da perícia, quer do Estudo do Mercado do Tabaco, quer do teor integral de todos os documentos juntos, como tarefa prévia a podermos ouvir o julgamento sem estarmos nem ficarmos perdidos. A audição integral do julgamento foi bastante dura. A reapreciação da decisão sobre a matéria de facto, que aparentemente era até limitada a poucas alterações pretendidas, acabou por revelar como todas elas tinham implicação com todos os aspectos em discussão nos autos. As questões de direito resolvidas foram diversas, e se não eram particularmente complexas, eram porém interligadas e prejudicadas pela pluralidade e complexidade alegatória.
Estamos assim em dizer que se não afigura de todo que o presente processo possa ser considerado simples em termos de justificar a dispensa do remanescente da taxa de justiça.
Invocam porém as Recorrentes que a multiplicidade das questões é a mesma para cada uma delas, e que “a sua situação processual é materialmente equivalente a um litisconsórcio voluntário ativo pelo qual seria devida uma única taxa de justiça”.
Com o devido respeito, o artigo 35º do Código de Processo Civil afirma que no litisconsórcio voluntário não há uma única acção mas “uma simples acumulação de ações”, o que conjugado com o artigo 1º, nº 2 do Regulamento das Custas Processuais não indica que fosse devida apenas uma taxa de justiça. Em todo o caso, a sê-lo, seria então calculada essa taxa pelo valor da acção – artigo 6º nº 1 do Regulamento das Custas Processuais. Por outro lado, cada uma das AA. e dos AA. é titular duma relação contratual que limita a si a relação material controvertida, desde logo no que toca à duração da relação e aos volumes de afectação pelas condutas das Rés que originam e fundamentam os pedidos de cada Autora e Autor. A situação das AA. e dos AA. quadra antes a uma coligação de autores por pedidos diferentes, nos termos do artigo 36º do Código de Processo Civil, a qual tem como consequência a nível de custas a aplicação da tabela I-B, como resulta do artigo 13º nº 7 al. a) do Regulamento das Custas Processuais. É certo que esta consequência também resultaria para a taxa de justiça devida pela interposição do recurso (artigo 7º nº 2) mas em qualquer caso e comparando a tabela I-A a que se refere o artigo 6º nº 1 e a tabela I-B ex-vi do artigo 13º nº 7 al. a), ambos do Regulamento, já resulta uma redução substancial da taxa.
Não cremos portanto que a argumentação usada aponte decisivamente para uma desproporcionalidade manifesta, sendo certo que o juízo de desproporcionalidade não prescinde de, isto é, não pode deixar de partir da, consideração da simplicidade do processo, ou mesmo a entender-se que poderia afirmar-se para um processo nem simples nem complexo, em todo o caso quando se afirma que o presente processo é complexo, foi de resolução complexa, mesmo em recurso, dificilmente poderíamos chegar à desproporcionalidade que justificasse a dispensa total ou sequer parcial do pagamento do remanescente.
Improcede assim esta questão. 7ª questão: - do recurso dos despachos (já restringido, em sede de enunciação das questões objecto do recurso) proferidos na Audiência Final do dia 10.03.2017 por via dos quais o tribunal a) Indeferiu por extemporâneo o requerimento apresentado pelas Autoras em 09.03.2017, no sentido da realização da referida diligência de prestação de esclarecimentos orais por parte dos peritos e indeferiu o requerimento apresentado pelas Autoras em 10.03.2017 invocando a nulidade do despacho proferido em 09.03.2017 com base em violação do princípio do contraditório.
Como delimitamos, o fundamento destes dois recursos prendia-se com a inconformidade com a resposta dada ao facto não provado nº 32, densificado pela matéria complementar que se pretendia ver também provada, para se obter a prova de que “à diminuição das margens brutas das AA. de 3,11 pontos percentuais que corresponde à quantia de € 8.807.527,00 correspondeu um ganho e aumento das margens das RR. na mesma proporção e no mesmo exato valor.”
Tendo este tribunal de recurso dado provimento à impugnação de facto realizada pelas AA. torna-se então claro que não há que conhecer dos recursos em causa.
Repare-se ainda que apesar da sua formulação subsidiária - “422. Sendo o presente recurso apreciado apenas com a decisão final (por não ter sido admitido anteriormente apesar de reclamação para este Venerando Tribunal) e por uma questão de economia processual, deverá a respetiva apreciação ficar condicionada à modificação da matéria de facto nos termos supra requeridos quanto ao “Facto Não Provado 32” e respetivos factos complementares (ali indicados) e/ou à procedência do recurso por outros fundamentos, porquanto se tornará desnecessária nesses casos”. (sublinhado nosso) – o insucesso das Recorrentes quanto à questão da declaração de ilicitude da imposição de pagamento por um único meio de pagamento em nada poderia ser evitado por declarações complementares dos senhores perito.
Isto é, não há qualquer razão de improcedência que justifique que se apreciem os recursos intercalares referidos nesta questão. 8ª questão – da caducidade e da prescrição.
Relativamente ao pedido subsidiário de anulabilidade, em primeiro lugar, da Cláusula 2.3 das CGF de 2006 e de 2008 e a Cláusula 10.1 das CGF de 2009 e 2010, por aceites na sequência de coacção moral e quanto, em segundo lugar e nos mesmos termos, à anulação da Cláusula 7 das CGF de 2002, da Cláusula 9, das CGF de 2005, da Cláusula 8, § 1, das CGF de 2008 e da Cláusula 10.1 das CGF de 2009 e 2010, defenderam-se as RR invocando a caducidade o direito dos Autores quanto à por via da aplicação do artigo 287.º do Código Civil e do decurso do prazo de um ano para a arguição do vício de anulabilidade, que deverá ser computado desde a cessação do vício que lhe serve de fundamento. Como vimos, não declarámos a anulabilidade de nenhuma das referidas cláusulas, tendo antes e apenas declarado a nulidade das cláusulas Cláusulas 7 das Condições Gerais de 2002, da Cláusula 8 § 1 das de 2005, da Cláusula 8 § 1 das de 2008 nos termos do artigo 12º do RJCCG.
Deste modo, fica prejudicado o conhecimento da invocada excepção de caducidade.
Invocaram também as Rés a excepção de prescrição do direito à restituição por enriquecimento sem causa. Como vimos na análise das consequências da 5ª questão, não secundamos a invocação de aplicação do enriquecimento sem causa como consequência da violação do disposto no artigo 406º nº 1 do Código Civil, remetendo-se aqui para o que ali dissemos sobre a aplicação exclusivamente subsidiária do enriquecimento sem causa e sobre a sua não aplicação no caso dos autos. Deste modo, também fica prejudicada a apreciação da excepção de prescrição invocada pelas Rés. Identicamente, fica prejudicado o conhecimento do abuso de direito invocado pelas AA. em resposta à prescrição. Conclusões finais:
Terminada a análise de todas as questões que nos cumpria conhecer no presente recurso, somos então a concluir:
1 – Julgámos procedente o recurso interposto do despacho que indeferiu a arguição de nulidade do depoimento da testemunha V…, por violação do segredo profissional, com a consequência da inutilização da contribuição do depoimento prestado para a formação da convicção do tribunal relativamente aos factos sobre que incidiu;
2 – Julgámos procedente o recurso do despacho proferido na audiência preliminar que desatendeu à reclamação das AA. quanto à selecção da matéria de facto então realizada pelo tribunal no que toca à formulação da alínea GG da matéria assente, que conduziu ao facto provado 30, em consequência do que se eliminou o facto provado nº 30, e se relegou para a questão 4ª do recurso da sentença final, a decisão sobre a prova do facto “O Factor de Correcção foi apresentado às AA. como uma necessidade de anular o efeito que o aumento do PVP - exclusivamente decorrente de aumento de impostos - tinha na margem dos distribuidores”;
3 – Alterámos a decisão sobre a matéria de facto nos termos constantes da 4ª questão do recurso, dando procedência parcial às pretensões das recorrentes nesse âmbito;
4 – Relativamente às subquestões em que se desdobrou a 5ª questão do recurso, considerámos que a relação comercial havida entre as partes consubstanciou um contrato de concessão comercial; que a alteração da percentagem de desconto acordada pela introdução e aplicação do factor de correcção e do preço fixo por caixa violou o artigo 406º nº 1 do Código Civil, e que cada Ré, na medida dos recebimentos feitos por esses títulos, e comprovados nos autos, devia indemnizar as AA e AA dos danos correspondentes a esses valores, acrescida dos correspondentes juros moratórios à taxa comercial.
Importa agora concretizar estes valores:
Assim, vemos que relativamente ao pedido principal formulado, e para cada Autora e Autor, temos os seguintes resultados:
- A A. R… pediu €1.181.155,04 e provou na globalidade €980.464,13, sendo da responsabilidade da 1ª Ré (factos provados 109 e 110) a quantia de €293.762,43 (duzentos e noventa e três mil e setecentos e sessenta e dois euros e quarenta e três cêntimos) e da responsabilidade da 2ª Ré (factos provados 111 a 113) a quantia de €686.701,70 (seiscentos e oitenta e seis mil e setecentos e um euros e setenta cêntimos).
- A A. AAP pediu € 1.532.328,82 e apenas provou €1.320 966,58, sendo da responsabilidade da 1ª Ré a quantia de €343.313,40 (trezentos e quarenta e três mil trezentos e treze euros e quarenta cêntimos) (facto provado 114), e da responsabilidade da 2ª Ré a quantia de €977.653,18 (novecentos e setenta e sete mil e seiscentos e cinquenta e três euros e dezoito cêntimos) (factos provados 115 a 117).
- A A. ASF pediu €936.907,59 e provou €812.760,68 sendo da responsabilidade da 1ª Ré a quantia de €236.504,26 (duzentos e trinta e seis mil e quinhentos e quatro euros e vinte e seis cêntimos) (factos provados 118 e 119), e da responsabilidade da 2ª Ré a quantia de €576.256,42 (quinhentos e setenta e seis mil e duzentos e cinquenta e seis euros e quarenta e dois cêntimos) (factos provados 120 a 122).
- A A. J… pediu €581.992,83 e provou €500.223,91 sendo da responsabilidade da 1ª Ré a quantia de €158.548,68 (centos e cinquenta e oito mil quinhentos e quarenta e oito euros e sessenta e oito cêntimos) (factos provados 123 e 124), e da responsabilidade da 2ª Ré a quantia de €341.675,23 (trezentos e quarenta e um mil e seiscentos e setenta e cinco euros e vinte e três cêntimos) (factos provados 125 a 127).
- A A. DA… pediu €458.477,63 e provou €416.204,53 sendo da responsabilidade da 2ª Ré como resulta do facto provado 129 a quantia de €151.444,97 (cento e cinquenta e um mil e quatrocentos e quarenta e quatro euros e noventa e sete cêntimos) acrescida daquele que, dentro o valor de €264.759,56 (duzentos e sessenta e quatro mil e setecentos e cinquenta e nove euros e cinquenta e seis cêntimos) (facto provado 128) se vier a apurar ser correspondente à facturação realizada desde 1.1.2008, e sendo o remanescente dessa quantia e correspondente à facturação de 1.1.2006 a 31.12.2007, da responsabilidade da 1ª Ré.
- A A. DL… pediu €2.195.197,63 e provou €1.911.725,62 sendo da responsabilidade da 1ª Ré a quantia de €549.797,21 (quinhentos e quarenta e nove mil e setecentos e noventa e sete euros e vinte e um cêntimos) (factos provados 130 e 131), e da responsabilidade da 2ª Ré a quantia de €1.361.928,41 (um milhão e trezentos e sessenta e um mil e novecentos e vinte e oito euros e quarenta e um cêntimos) (factos provados 132 a 134).
- A A. HPM… pediu €860.139,47 e provou €790.773,00 sendo da responsabilidade da 1ª Ré a quantia de €223.471,18 (duzentos e vinte e três mil e quatrocentos e setenta e um euros e dezoito cêntimos) (factos provados 135 e 136), e da responsabilidade da 2ª Ré a quantia de €567.301,82 (quinhentos e sessenta e sete mil e trezentos e um euros e oitenta e dois cêntimos) (factos provados 137 a 139).
- A A. RCC… pediu a quantia de €71.620,00 e provou €61.967,50 sendo da responsabilidade da 1ª Ré a quantia de €19.583,26 (dezanove mil e quinhentos e oitenta e três euros e vinte e seis cêntimos) (factos provados 140 e 141), e da responsabilidade da 2ª Ré a quantia de €42.384,24 (quarenta e dois mil e trezentos e oitenta e quatro euros e vinte e quatro cêntimos) (factos provados 142 a 144).
- A A. SBB … pediu a quantia de €814.792,08 e provou €827.105,91 sendo da responsabilidade da 2ª Ré pelo menos a quantia de €335.147,87 (trezentos e trinta e cinco mil e cento e quarenta e sete euros e oitenta e sete cêntimos) (facto provado 146) acrescida da que, dentro o valor de €491.958,04 (quatrocentos e noventa e um mil e novecentos e cinquenta e oito euros e quatro cêntimos) (facto provado 145) se vier a apurar corresponder à facturação desde 1.1.2008, e sendo da responsabilidade da 1ª Ré o remanescente dessa quantia correspondente à facturação de 1.1.2006 a 31.12.2007.
- A A. CA… pediu €429.348,71 e provou €442.320,36 sendo da responsabilidade da 1ª Ré a quantia de €161.071,82 (cento e sessenta e um mil e setenta e um euros e oitenta e dois cêntimos) (factos provados 147 e 148), e da responsabilidade da 2ª Ré a quantia de €281.248,54 (duzentos e oitenta e um mil e duzentos e quarenta e oito euros e cinquenta e quatro cêntimos) (factos provados 149 e 150).
- A A. SV… pediu €582.523,45 e provou €504.168,17, sendo da responsabilidade da 1ª Ré pelo menos a quantia de €64.874,76 (sessenta e quatro mil e oitocentos e setenta e quatro euros e setenta e seis cêntimos) (facto provado 151), e da responsabilidade da 2ª Ré pelo menos a quantia de €136.911,07 (cento e trinta e seis mil e novecentos e onze euros e sete cêntimos) (facto provado 153). A 1ª Ré é adicionalmente responsável pela parte do valor de €302.382,34 (trezentos e dois mil e trezentos e oitenta e dois euros e trinta e quatro cêntimos) (facto provado 152) que corresponder à facturação ocorrida entre 1.1.2007 e 31.12.2007, e a 2ª Ré é adicionalmente responsável pela parte desse valor que corresponder à facturação ocorrida entre 1.1.2008 a 30.6.2009 (2ª Ré).
- A A. DTSM pediu a quantia de € 982.683,86 e provou €843.689,34 sendo da responsabilidade da 1ª Ré a quantia de €249.556,91 (duzentos e quarenta e nove mil e quinhentos e cinquenta e seis euros e noventa e um cêntimos) (factos provados 154 e 155), e da responsabilidade da 2ª Ré a quantia de €594.132,43 (quinhentos e noventa e quatro mil cento e trinta e dois euros e quarenta e três cêntimos) (factos provados 156 a 158). - A A. D… pediu a quantia de €298.318,52 e provou €414.085,42 (factos provados 159 e 160). Quando revistamos a PI vemos que (artigo 282º) temos a alegação de €197.525,73 relativa a factor de correcção aplicado de 1.1.2006 a 30.6.2009, e vemos no artigo 283º a alegação de €100.792,79 relativa a preço fixo por caixa desde 1.7.2009 a 28.10.2010. Limitados pelo princípio dispositivo, apenas podemos então condenar a 2ª Ré pelo artigo 283º no valor pedido de €100.792,79 e relativamente ao valor pedido de €197.525,73 estamos também limitados por ele, e deste valor a 1ª Ré será responsável pela parte dele que corresponder à facturação entre 1.1.2007 (cfr. facto provado 159) a 31.12.2007 e a 2ª Ré será responsável pela parte desse mesmo valor de €197.525,73 que corresponder à facturação desde 1.1.2008 a 30.6.2009.
- A A. ET… pediu a quantia de €2.890.766,24 e provou €2.077.708,11, sendo da responsabilidade da 1ª Ré a quantia de €505.978,39 (quinhentos e cinco mil e novecentos e setenta e oito euros e trinta e nove cêntimos) (factos provados 161 e 162), e da responsabilidade da 2ª Ré a quantia de €1.571.729,72 (um milhão e quinhentos e setenta e um mil e setecentos e vinte e nove euros e setenta e dois cêntimos) (factos provados 163 a 165).
- A A. CT… pediu a quantia de €211.012,50 e provou €191.592,21 sendo da responsabilidade da 1ª Ré a quantia de €78.731,03 (setenta e oito mil e setecentos e trinta e um euros e três cêntimos) (factos provados 166 e 167), e da responsabilidade da 2ª Ré a quantia de €112.861,18 (cento e doze mil e oitocentos e sessenta e um euros e dezoito cêntimos) (factos provados 168 a 170).
- A A. TR… pediu a quantia de €889.389,01 e provou €719.183,23 sendo da responsabilidade da 1ª Ré a quantia de €201.177,08 (duzentos e um mil e cento e setenta e sete euros e oito cêntimos) (factos provados 171 e 172), e da responsabilidade da 2ª Ré a quantia de €518.006,15 (quinhentos e dezoito mil e seis euros e quinze cêntimos) (factos provados 173 a 175).
- A A. MMC… pediu a quantia de €334.833,07 e provou €170290,15, sendo da responsabilidade da 1ª Ré a quantia de €53.743,25 (cinquenta e três mil e setecentos e quarenta e três euros e vinte e cinco cêntimos) (factos provados 176 e 177), e da responsabilidade da 2ª Ré a quantia de €116.546,90 (cento e dezasseis mil e quinhentos e quarenta e seis euros e noventa cêntimos) (factos provados 178 a 180).
*
- A A. JMRL … pediu a quantia de €306.321,33 e provou €496.830,63. Quando somamos os montantes descritos nos artigos 318º a 322º da PI, logo concluímos que o valor referido e indicado no artigo 323º corresponde a um mero lapso de cálculo, porquanto o valor correcto seria €441.252,21. Ora, o mesmo valor de €306.321,33 foi levado ao petitório final. Percorridos os autos e se não estamos em erro, as AA e os AA apenas pediram a rectificação de vários lapsos de escrita referentes à indicação do número de uma cláusula, não encontrando nós que tenha sido pedida a rectificação do erro de cálculo constante do artigo 323º da P.I. Como assim, acabamos por também neste caso estar limitados pelo princípio dispositivo, não podendo condenar além do pedido. Quando somamos as quantias apuradas nos factos provados 181 e 182 obtemos €149.145,88 que corresponderia à responsabilidade da 1ª Ré (anos 2006 e 2007), e quando somamos as quantias referidas nos factos provados 183 a 185 chegamos ao montante de €347.684,75 que seria a responsabilidade da 2ª Ré.
Como então proceder?
Revisitemos os factos provados em cotejo com a alegação:
“181 – A aplicação do fator de correcção no ano de 2006 implicou que a A. JMRL tivesse realizado menos €58.050,29” (dos quais foram pedidos no artigo 318º da PI €55.357,51, ou seja, apurou-se mais do que o que foi pedido e por isso estamos limitados pelo pedido;
“182 – A aplicação do fator de correcção no ano de 2007 implicou que a A. JMRL… tivesse realizado menos €91.095,59” (dos quais foram pedidos no artigo 319º da PI €94.492,90) ou seja apurou-se menos do que o que foi alegado, e por isso o valor a considerar é o apurado.
“183 – A aplicação do fator de correcção no ano de 2008 implicou que a A. JMRL… tivesse realizado menos €126.217,90” (dos quais foram pedidos no artigo 320º da PI €153.906,00) ou seja, menos do que o pedido, e portanto o valor a considerar é o apurado.
“184 – A aplicação das condições contratuais em matéria de preço dos produtos durante o ano de 2009 implicou que a A. JMRL… tivesse realizado, nesse período, menos €124.555,09” (dos quais no artigo 321º da PI foram pedidos €137.376,00) ou seja menos do que o pedido, e portanto o valor a considerar é o apurado.
“185 – A aplicação das condições gerais de fornecimento em matéria de preço dos produtos durante o ano de 2010 implicou que a A. JMRL… tivesse realizado, nesse período, menos €96.911,76” (foram pedidos no artigo 322º da PI €119.040,00) ou seja foi reconhecido menos do que o pedido, e portanto o valor a considerar é o apurado.
Tendo este tribunal considerado que não há lugar a condenação solidária das Rés (o que remeteria o problema da repartição de condenação pelo valor total pedido para a esfera destas Rés) a petição inicial não nos dá nenhuma pista de onde o erro de soma ocorreu (isto é, se as AA se esqueceram de somar as parcelas dos anos 2006 e 2007 ou se se esqueceram de somar parcelas dos anos de 2008 e seguintes).
Quando somamos os valores a considerar relativamente aos anos 2006 e 2007, chegamos a €146.453,10 que, diminuídos a €306.321,33, nos dão a sobra de €159.868,23. Se ao contrário somarmos todos os valores a considerar dos anos 2008 e seguintes, chegaremos a €347.684,75, ultrapassando já o limite do pedido total. Não temos como descobrir. A única solução é portanto ir computando desde o início da factualidade alegada e apurada, e parar a contagem quando se chegar ao limite do valor global pedido.
Assim, a 1ª Ré será responsável por €146.453,10 (cento e quarenta e seis mil e quatrocentos e cinquenta e três euros e dez cêntimos), soma dos valores a considerar reportados aos factos provados 181º e 182º e aos artigos 318º e 319º da P.I., e a 2ª Ré é responsável nos termos dos factos apurados 183º a 185º (€347.684,75) mas apenas até ao limite da diferença da condenação da 1ª Ré para o valor do pedido de €306.321,33, ou seja, apenas, €159.868,23 (cento e cinquenta e nove mil e oitocentos e sessenta e oito euros e vinte e três cêntimos).
*
- A A. … D pediu a quantia de €943.549,92 e provou €1.272.414,19 (facto provado 186). Voltamos a estar limitados pelo princípio dispositivo. A 1ª Ré será responsável pela parte do valor de €943.549,92 (novecentos e quarenta e três mil e quinhentos e quarenta e nove euros e noventa e dois cêntimos) que corresponder à facturação ocorrida de 1.1.2006 a 31.12.2007 e a 2ª Ré será responsável pela parte desse valor que corresponde à facturação ocorrida de 1.1.2008 a 30.6.2009.
*
- O A. ROA… pediu a quantia de €132.321,67 e provou €135.535,09. Voltamos a ter um excesso e voltamos a estar limitados pelo princípio dispositivo. No caso concreto, vamos comparar os valores indicados na PI (artigos 326º a 330º com os factos provados 187 a 191. Dessa comparação vai resultar que estaremos limitados pelo valor de cada parcela de pedido sempre que os factos apurados revelem valores superiores.
“187 - A aplicação do fator de correção no ano de 2006 implicou que o A. R… tivesse realizado menos €15.550,85” e foram pedidos “€15.573.43”, portanto foi apurado menos que o pedido, e deve considerar-se a responsabilidade da 1ª Ré pelo valor apurado.
“188 - A aplicação do fator de correção no ano de 2007 implicou que o A. R… tivesse realizado menos €26.698,81” e foram pedidos €28.180,59, tendo por isso sido apurado menos que o pedido e devendo limitar-se a responsabilidade da 1ª Ré ao apurado, a qual, somada à resultante do facto anterior, dará portanto o montante de €42.249,66.
“189 - A aplicação do fator de correção no ano de 2008 implicou que o A. R… tivesse realizado menos €36.542,06” quando foi pedido €40.385,43, donde menos que o pedido e portanto a responsabilidade da 2ª Ré limitada ao apurado.
“190 - A aplicação do fator de correção no 1º semestre de 2009 implicou que o A. R… tivesse realizado menos €20.975,79” e foi pedido €22.051,76, donde também foi apurado menos que o pedido e a responsabilidade da 2ª Ré fica limitada ao apurado.
“191 - A aplicação das condições gerais de fornecimento em matéria de preço dos produtos em vigor desde 1 de julho de 2009 até 13 de dezembro de 2010 implicou que o A. R… tivesse realizado, nesse período, menos € 35.767,58” tendo sido pedido €26.130,46, donde neste caso, a responsabilidade da 2ª Ré fica limitada ao pedido.
Contas feitas, temos para a 1ª Ré €42.249,66 (quarenta e dois mil e duzentos e quarenta e nove euros e sessenta e seis cêntimos) e para a 2ª Ré €83.648,31 (oitenta e três mil e seiscentos e quarenta e oito euros e trinta e um cêntimos).
*
- O A. AAA… pediu a quantia de €779.437,39 e provou €636.971,23, sendo da responsabilidade da 1ª Ré a quantia de €127.949,83 (cento e vinte e sete mil e novecentos e quarenta e nove euros e oitenta e três cêntimos) (factos provados 192 e 193), e da responsabilidade da 2ª Ré a quantia de €509.021,40 (quinhentos e nove mil e vinte e um euros e quarenta cêntimos) (factos provados 194 e 195).
- O A. CMPF pediu €1.344.643,09 e provou €1.125.875,84, sendo da responsabilidade da 1ª Ré a quantia de €317.335,45 (trezentos e dezassete mil e trezentos e trinta e cinco euros e quarenta e cinco cêntimos) (factos provados 196 e 197), e da responsabilidade da 2ª Ré a quantia de €808.540,39 (oitocentos e oito mil e quinhentos e quarenta euros e trinta e nove cêntimos) (factos provados 198 a 200).
- A A. FJPF pediu a quantia de €154.825,99 e provou €125.624,56, sendo da responsabilidade da 1ª Ré a quantia de €41.142,30 (quarenta e um mil e cento e quarenta e dois euros e trinta cêntimos) (factos provados 201 e 202), e da responsabilidade da 2ª Ré a quantia de €84.482,26 (oitenta e quatro mil e quatrocentos e oitenta e dois euros e vinte e seis cêntimos) (factos provados 203 a 205).
Às quantias apuradas acrescem juros de mora às sucessivas taxas comerciais em cada momento em vigor. Quanto às Autoras cujos valores - totalmente no caso da A. …D e parcialmente no caso das Autoras DA…, SBB…, SV… e D… – não nos permitiram, pelo seu modo de apuramento, encontrar a repartição total entre a 1ª e a 2ª Rés, impõe-se ainda remeter para liquidação do presente acórdão este apuramento. Sobre os valores que vierem a ser apurados serão devidos juros de mora às taxas comerciais sucessivamente em vigor, contados desde a citação, pois que os pagamentos não devidos foram realizados antes dela, e não estamos em presença de uma iliquidez objectiva, tanto que o valor está liquidado apenas não se sabendo que parte corresponde a cada Ré, havendo assim apenas que verificar, das facturas pertinentes, quais as emitidas até 31.12.2007 e quais as emitidas a partir de 1.1.2008.
Prosseguindo nas consequências das subquestões da 5ª questão:
Considerámos que devem ser apurados em liquidação do presente acórdão os valores correspondentes à diminuição da percentagem acordada relativamente à percentagem de desconto que se compreende no preço fixo por caixa, referentes às facturas emitidas na pendência dos presentes autos, acrescidos de juros de mora à taxa comercial a partir da liquidação.
Mais considerámos declarar a nulidade das cláusulas que permitiam a alteração irrestrita e unilteral das Condições Gerais nos termos do artigo 12º do RJCCG, porque tinham sido aceites pelas AA. e AA, mas analisámos especificamente as alterações concretas introduzidas ao nível do equilíbrio económico das partes em sede de violação contratual.
Mais considerámos nulas por violação da Lei da Concorrência, as cláusulas relativas a descontos variáveis por escalão de volume e relativas a desconto por informação. Em consequência da nulidade das cláusulas relativas a desconto por escalão de volume, conjugadas com o princípio do pontual cumprimento dos contratos, deferimos ao pedido de que a 2ª Ré, doravante, passe a facturar às AA. à percentagem de desconto acordada em 2005, sem consideração da redução de desconto operada pelo factor de correcção e levada ao preço fixo por caixa e com inclusão do valor de desconto correspondente ao 1º escalão de volume, dado o seu reingresso no desconto fixo anterior à decomposição deste em parte fixa e componentes variáveis.
Considerámos outrossim que às cláusulas expressamente não aceites pelas Autoras e Autores não era aplicável o RJCCG, não concedendo por isso na invocada exclusão contratual das mesmas nem por incumprimento do dever de informação, que reconhecemos ter existido. Considerámos prejudicado o conhecimento da coacção moral e da usura, porque levantado a título subsidiário. Tirando as cláusulas já acima referidas, não concedemos na violação da Lei da Concorrência relativamente a todas as outras invocadas e concretamente quanto ao factor de correcção e ao preço fixo por caixa. Finalmente considerámos prejudicada a apreciação do abuso de direito.
5 – Julgámos improcedente o pedido de dispensa total ou mesmo parcial do pagamento do remanescente da taxa de justiça.
6 – Julgámos prejudicado o conhecimento dos recursos intercalares relativos aos peritos.
7 – Julgámos prejudicado o conhecimento das excepções de caducidade e de prescrição e de abuso de direito.
Ora, assim sendo, na procedência total dos recursos intercalares conhecidos e na procedência parcial do recurso da sentença final, e tendo presente o disposto no artigo 527º nº 1 e 2 do CPC, impõe-se agora determinar a condenação em custas de ambas as partes e as suas percentagens.
Tendo os recursos intercalares sido apresentados nos termos do artigo 644º nº 3 do CPC, não são objecto de tributação autónoma.
Considerando então que, apesar de não se ter concedido na violação do RJCCG quanto ao factor de correcção e preço fixo, nem relativamente a estes, se ter concedido na violação da Lei da Concorrência, esta não concessão não prejudicou o sucesso das AA. e dos AA. relativamente aos pedidos relacionados com o factor de correcção e o preço fixo por caixa, em si, e no seu desdobramento para o apuramento na pendência do processo e para futuro.
Considerando face a todos os pedidos principais – cuja procedência determinou a irrelevância dos pedidos subsidiários – que as AA e os AA decaíram no pedido de condenação das Rés a aceitarem doravante pagamentos múltiplos, decaíram, mas apenas algumas delas, em diferenças entre os valores alegados na petição inicial e os valores obtidos por perícia e constantes dos factos 107 a 205, e finalmente decaíram no pedido de condenação das Rés a pagar juros de mora contados desde a citação no que respeita aos valores imputados na facturação durante a pendência processual;
Considerando que não é quantificável à partida a utilidade económica dos pedidos relativos a juros de facturação excessiva na pendência do processo, que também não temos qualquer ideia sobre qual terá sido esse excesso, e que também não é quantificável a utilidade económica da admissão de meios de pagamento não únicos, que igualmente se reportaria também apenas a futuro, estamos em não conseguir determinar com rigor em termos monetários uma percentagem de perda, o que nos leva então a ponderar o número de pedidos feitos julgados procedentes e julgados improcedentes. Donde, dois recursos intercalares procedentes, parcialmente procedente o pedido principal, e o pedido de juros, procedente o pedido relacionado com a pendência processual e parcialmente procedente o pedido de juros com ele relacionado, e procedente o pedido de execução futura dos contratos, e finalmente improcedente o pedido de pagamento por mais do que um cheque, ou seja, um pedido improcedente e dois parcialmente procedentes, podemos então dizer grosso modo (ficcionando que duas improcedências parciais somam uma improcedência total) que em oito pedidos as AA. e os AA. decaíram em dois, ou seja num quarto, o que nos dá 25% para as AA. e os AA. e 75% para as Rés.
Assim, condenaremos as AA. e os AA. e as Rés em custas, nas percentagens ora apuradas. V. Decisão
Nos termos supra expostos, acordam os juízes que compõem este colectivo da 6ª Secção deste Tribunal da Relação, em:
I - Conceder provimento ao recurso intercalar interposto do despacho que indeferiu a arguição de nulidade do depoimento da testemunha VE…, por violação do segredo profissional, e consequentemente inutilizar a contribuição do depoimento prestado para a formação da convicção do tribunal relativamente aos factos sobre que incidiu;
II - Conceder provimento ao recurso intercalar interposto do despacho proferido na audiência preliminar que desatendeu à reclamação das AA. quanto à selecção da matéria de facto realizada pelo tribunal no que toca à formulação da alínea GG da matéria assente, e consequentemente eliminar o facto provado nº 30, relegando para a impugnação da decisão sobre a matéria de facto a prova sobre o facto “O Factor de Correcção foi apresentado às AA. como uma necessidade de anular o efeito que o aumento do PVP - exclusivamente decorrente de aumento de impostos - tinha na margem dos distribuidores”;
Relativamente ao recurso da sentença final, acordam ainda em:
III - Alterar a decisão da matéria de facto provada e não provada nos termos supra expostos;
IV – Julgar prejudicado o conhecimento dos recursos intercalares relativos aos peritos e julgar prejudicado o conhecimento das excepções de caducidade e de prescrição e de abuso de direito.
V – Julgar parcialmente procedente o recurso, e em consequência, revogar parcialmente a sentença recorrida e substitui-la pelo presente acórdão que delibera:
V.1 - Declarar nulas as Cláusulas 7 das Condições Gerais de 2002, da Cláusula 8 § 1 das de 2005, da Cláusula 8 § 1 das de 2008, e as subcláusulas 2.2.2.2 e 2.2.2.4 das Condições Gerais de 2002 e das Condições Gerais de 2005, a subcláusulas 2.2.2.2 e 2.2.2.3 das Condições Gerais de 2006 e as subcláusulas 2.2.2.1 e 2.2.2.1 das Condições Gerais de 2008.
V.2
a) Condenar a 1ª Ré a pagar à A. R… a quantia de €293.762,43 (duzentos e noventa e três mil e setecentos e sessenta e dois euros e quarenta e três cêntimos);
b) Condenar a 1ª Ré a pagar à A. A… a quantia de €343.313,40 (trezentos e quarenta e três mil trezentos e treze euros e quarenta cêntimos);
c) Condenar a 1ª Ré a pagar à A. AS… a quantia de €236.504,26 (duzentos e trinta e seis mil e quinhentos e quatro euros e vinte e seis cêntimos);
d) Condenar a 1ª Ré a pagar à A. J… a quantia de €158.548,68 (cento e cinquenta e oito mil quinhentos e quarenta e oito euros e sessenta e oito cêntimos);
e) Condenar a 1ª Ré a pagar à A D.. a parte do valor de €264.759,56 (duzentos e sessenta e quatro mil e setecentos e cinquenta e nove euros e cinquenta e seis cêntimos) (facto provado 128) que se vier a apurar em liquidação do presente acórdão ser correspondente à facturação realizada de 1.1.2006 a 31.12.2007;
f) Condenar a 1ª Ré a pagar à A. DL… a quantia de €549.797,21 (quinhentos e quarenta e nove mil e setecentos e noventa e sete euros e vinte e um cêntimos);
g) Condenar a 1ª Ré a pagar à A. H…P…M… a quantia de €223.471,18 (duzentos e vinte e três mil e quatrocentos e setenta e um euros e dezoito cêntimos);
h) Condenar a 1ª Ré a pagar à A. R…C… a quantia de €19.583,26 (dezanove mil e quinhentos e oitenta e três euros e vinte e seis cêntimos);
i) Condenar a 1ª Ré a pagar à A. S…B… a parte da quantia de €491.958,04 (quatrocentos e noventa e um mil e novecentos e cinquenta e oito euros e quatro cêntimos) (facto provado 145) que se vier a apurar em liquidação do presente acórdão corresponder à facturação de 1.1.2006 a 31.12.2007;
j) Condenar a 1ª Ré a pagar à A. C…A… a quantia de €161.071,82 (cento e sessenta e um mil e setenta e um euros e oitenta e dois cêntimos);
k) Condenar a 1ª Ré a pagar à A. S…V… a quantia de €64.874,76 (sessenta e quatro mil e oitocentos e setenta e quatro euros e setenta e seis cêntimos) e condená-la ainda a pagar à mesma Autora a parte do valor de €302.382,34 (trezentos e dois mil e trezentos e oitenta e dois euros e trinta e quatro cêntimos) que se vier a apurar em liquidação do presente acórdão e que corresponder à facturação ocorrida entre 1.1.2007 e 31.12.2007 ;
l) Condenar a 1ª Ré a pagar à A. D…T…S… a quantia de €249.556,91 (duzentos e quarenta e nove mil e quinhentos e cinquenta e seis euros e noventa e um cêntimos);
m) Condenar a 1ª Ré a pagar à A. Do… a parte da quantia de €197.525,73 que se vier a apurar em liquidação do presente acórdão corresponder à facturação desde 1.1.2007 até 31.12.2007;
n) Condenar a 1ª Ré a pagar à A. ET… a quantia de €505.978,39 (quinhentos e cinco mil e novecentos e setenta e oito euros e trinta e nove cêntimos);
o) Condenar a 1ª Ré a pagar à A. C...T… a quantia de €78.731,03 (setenta e oito mil e setecentos e trinta e um euros e três cêntimos);
p) Condenar a 1ª Ré a pagar à A. T…R… quantia de €201.177,08 (duzentos e um mil e cento e setenta e sete euros e oito cêntimos);
q) Condenar a 1ª Ré a pagar à A. M…MC… a quantia de €53.743,25 (cinquenta e três mil e setecentos e quarenta e três euros e vinte e cinco cêntimos);
r) Condenar a 1ª Ré a pagar à A. J…RL… a quantia de €146.453,10 (cento e quarenta e seis mil e quatrocentos e cinquenta e três euros e dez cêntimos);
s) Condenar a 1ª Ré a pagar à A. …D a parte do valor de €943.549,92 (novecentos e quarenta e três mil e quinhentos e quarenta e nove euros e noventa e dois cêntimos) que se vier a apurar em liquidação do presente acórdão corresponder à facturação ocorrida de 1.1.2006 a 31.12.2007;
t) Condenar a 1ª Ré a pagar ao A. R…AO… a quantia de €42.249,66 (quarenta e dois mil e duzentos e quarenta e nove euros e sessenta e seis cêntimos);
u) Condenar a 1ª Ré a pagar ao A. AA…A… a quantia de €127.949,83 (cento e vinte e sete mil e novecentos e quarenta e nove euros e oitenta e três cêntimos);
v) Condenar a 1ª Ré a pagar ao A. C…M..P… a quantia de €317.335,45 (trezentos e dezassete mil e trezentos e trinta e cinco euros e quarenta e cinco cêntimos);
x) Condenar a 1ª Ré a pagar ao A. F…J…F… a quantia de €41.142,30 (quarenta e um mil e cento e quarenta e dois euros e trinta cêntimos).
V.3
- Condenar a 1ª Ré a pagar a cada uma das Autoras e dos Autores, relativamente às quantias identificadas no ponto precedente, juros de mora às sucessivas taxas comercial legalmente em vigor desde a citação até integral pagamento.
V.4
y) Condenar a 2ª Ré a pagar à A. R… a quantia de €686.701,70 (seiscentos e oitenta e seis mil e setecentos e um euros e setenta cêntimos);
w) Condenar a 2ª Ré a pagar à - A A. A…A… a quantia de €977.653,18 (novecentos e setenta e sete mil e seiscentos e cinquenta e três euros e dezoito cêntimos);
z) Condenar a 2ª Ré a pagar à - A A. A…S… a quantia de €576.256,42 (quinhentos e setenta e seis mil e duzentos e cinquenta e seis euros e quarenta e dois cêntimos);
aa) Condenar a 2ª Ré a pagar à - A A. Jo…a quantia de €341.675,23 (trezentos e quarenta e um mil e seiscentos e setenta e cinco euros e vinte e três cêntimos);
bb) Condenar a 2ª Ré a pagar à A. D…A…a quantia de €151.444,97 (cento e cinquenta e um mil e quatrocentos e quarenta e quatro euros e noventa e sete cêntimos) acrescida daquele que, dentro o valor de €264.759,56 (duzentos e sessenta e quatro mil e setecentos e cinquenta e nove euros e cinquenta e seis cêntimos) (facto provado 128) se vier a apurar em liquidação do presente acórdão ser correspondente à facturação realizada desde 1.1.2008;
cc) Condenar a 2ª Ré a pagar à A. DL… a quantia de €1.361.928,41 (um milhão e trezentos e sessenta e um mil e novecentos e vinte e oito euros e quarenta e um cêntimos);
dd) Condenar a 2ª Ré a pagar à A. H…P…M… a quantia de €567.301,82 (quinhentos e sessenta e sete mil e trezentos e um euros e oitenta e dois cêntimos);
ee) Condenar a 2ª Ré a pagar à A. R…C… a quantia de €42.384,24 (quarenta e dois mil e trezentos e oitenta e quatro euros e vinte e quatro cêntimos);
ff) Condenar a 2ª Ré a pagar à A. SBB… a quantia de €335.147,87 (trezentos e trinta e cinco mil e cento e quarenta e sete euros e oitenta e sete cêntimos) acrescida daquela que, dentro o valor de €491.958,04 (quatrocentos e noventa e um mil e novecentos e cinquenta e oito euros e quatro cêntimos) (facto provado 145) se vier a apurar em liquidação do presente acórdão corresponder à facturação desde 1.1.2008;
gg) Condenar a 2ª Ré a pagar à A. C…A… a quantia de €281.248,54 (duzentos e oitenta e um mil e duzentos e quarenta e oito euros e cinquenta e quatro cêntimos);
hh) Condenar a 2ª Ré a pagar à A. S…V… a quantia de €136.911,07 (cento e trinta e seis mil e novecentos e onze euros e sete cêntimos) acrescida daquela que, dentro o valor de €302.382,34 (trezentos e dois mil e trezentos e oitenta e dois euros e trinta e quatro cêntimos) se vier a apurar em liquidação do presente acórdão corresponder à facturação ocorrida entre 1.1.2008 a 30.6.2009;
ii) Condenar a 2ª Ré a pagar à A. D..T..S… a quantia de €594.132,43 (quinhentos e noventa e quatro mil cento e trinta e dois euros e quarenta e três cêntimos);
jj) Condenar a 2ª Ré a pagar à A. Do…. a quantia de €100.792,79 (cem mil e setecentos e noventa e dois euros e setenta e nove cêntimos) acrescida daquela que relativamente ao valor pedido de €197.525,73 (cento e noventa e sete mil e quinhentos e vinte e cinco euros e setenta e três cêntimos), se vier a apurar em liquidação do presente acórdão corresponder à facturação desde 1.1.2008 a 30.6.2009;
kk) Condenar a 2ª Ré a pagar à A. ES... a quantia de €1.571.729,72 (um milhão e quinhentos e setenta e um mil e setecentos e vinte e nove euros e setenta e dois cêntimos);
ll) Condenar a 2ª Ré a pagar à A. C…T…. a quantia de €112.861,18 (cento e doze mil e oitocentos e sessenta e um euros e dezoito cêntimos);
mm) Condenar a 2ª Ré a pagar à A. T…R… a quantia de €518.006,15 (quinhentos e dezoito mil e seis euros e quinze cêntimos);
nn) Condenar a 2ª Ré a pagar à A. MMC… a quantia de €116.546,90 (cento e dezasseis mil e quinhentos e quarenta e seis euros e noventa cêntimos);
oo) Condenar a 2ª Ré a pagar à A. JMR… a quantia de €159.868,23 (cento e cinquenta e nove mil e oitocentos e sessenta e oito euros e vinte e três cêntimos);
pp) Condenar a 2ª Ré a pagar à A. ….D a quantia que, relativamente ao valor de €943.549,92 (novecentos e quarenta e três mil e quinhentos e quarenta e nove euros e noventa e dois cêntimos) se vier a apurar em liquidação do presente acórdão corresponder à facturação ocorrida de 1.1.2008 a 30.6.2009;
qq) Condenar a 2ª Ré a pagar ao A. R…O…A a quantia de €83.648,31 (oitenta e três mil e seiscentos e quarenta e oito euros e trinta e um cêntimos);
rr) Condenar a 2ª Ré a pagar ao A. AA…A… a quantia de €509.021,40 (quinhentos e nove mil e vinte e um euros e quarenta cêntimos);
ss) Condenar a 2ª Ré a pagar ao A. C…M…P… a quantia de €808.540,39 (oitocentos e oito mil e quinhentos e quarenta euros e trinta e nove cêntimos);
tt) Condenar a 2ª Ré a pagar ao A. F…J…P… a quantia de €84.482,26 (oitenta e quatro mil e quatrocentos e oitenta e dois euros e vinte e seis cêntimos).
V.5
- Condenar a 2ª Ré a pagar a cada uma das Autoras e dos Autores, relativamente às quantias identificadas no ponto precedente, juros de mora às sucessivas taxas comercial legalmente em vigor desde a citação até integral pagamento.
V.6
- Condenar a 2ª Ré a pagar a cada uma das Autoras e dos Autores, as quantias que se vierem a apurar em liquidação do presente acórdão corresponderem, na facturação ocorrida desde a data das últimas faturas referidas na petição inicial até ao trânsito em julgado da presente acção, à diferença, para mais, entre a margem de desconto que, relativamente a tais Autoras e Autores estava contratada a 31.12.2005 – margem que se define pela inclusão do desconto máximo correspondente ao 1º escalão do desconto por escalões de volume e pela exclusão do percentual que correspondeu à aplicação do factor de correcção e que veio a integrar o desconto único e fixo de 7,13% no preço fixo por caixa estabelecido nas Condições Gerais de 2009 – e a margem de desconto que tiver sido concretamente aplicada.
V.7
- Condenar a 2ª Ré, relativamente às quantias que vierem a ser apuradas nos termos do ponto anterior (V.6) a pagar a cada Autora e Autor juros de mora às sucessivas taxas comerciais legalmente em vigor, desde a data de cada factura.
V.8
- Condenar a 2ª Ré a executar no futuro os contratos de concessão comercial que mantém com as AA. e os AA, aplicando na sua facturação a margem de desconto que, relativamente a tais Autoras e Autores estava contratada a 31.12.2005, considerando a inclusão nessa margem do desconto máximo correspondente ao 1º escalão do desconto por escalões de volume e sendo vedada a dedução a essa margem do percentual que correspondeu à aplicação do factor de correcção que veio a integrar o desconto único e fixo de 7,13% no preço fixo por caixa estabelecido nas Condições Gerais de 2009.
VI. Mais acordam julgar improcedente o pedido de dispensa total ou mesmo parcial do pagamento do remanescente da taxa de justiça.
VII. Quanto ao pedido de que “sejam as RR. condenadas a aceitar o pagamento das faturas por si emitidas por meio de mais do que um cheque sacado sobre várias instituições bancárias nacionais, se for conveniente às AA., aplicando-se as condições vigentes até 1 de Outubro de 2010 em matéria de forma de pagamento das faturas e que admitiam o pagamento de fatura ou conjunto de faturas por meio de mais de um cheque”, mantém-se a absolvição das Rés já decretada na sentença recorrida.
VIII. Mais acordam condenar Autoras(es) e Rés em custas, tanto em primeira instância quanto em segunda instância, na percentagem de 25% para as primeiras e 75% para as segundas.
Registe e notifique.
Lisboa, 08 de Outubro de 2020
Eduardo Petersen Silva
Cristina Neves
Manuel Rodrigues
_______________________________________________________ [1] Na continuação do relatório sintético da contestação, não nos referiremos por isso aos variados momentos de defesa que procedem da qualificação jurídica que as Rés fazem da relação comercial com as Autoras. [2] Para efeitos de publicação no site da dgsi, entendeu-se suprimir as referências feitas, no acórdão, em síntese da tese das RR., consignando-se aqui que as RR. se opuseram, a diversos títulos, à admissão de que tivessem incorrido em qualquer violação do Direito da Concorrência. [3] Suprimiu-se neste documento a indicação concreta feita dos factos, seu teor e alterações propostas e provas fundamentadoras dessa proposição, porque todas estas referências constam na reapreciação da decisão sobre a matéria de facto, mais adiante. [4] Uma vez que a final se considerou prejudicado o conhecimento dos recursos relativos a esta questão, optou-se na revisão do acórdão para publicação na dgsi por suprimir as partes relativas a estes recursos. [5] Nova supressão de texto por não se revelar útil, uma vez que os pertinentes recursos não foram conhecidos. [6] Suprimimos a reprodução do despacho motivador da convicção do tribunal de primeira instância, uma vez que na reapreciação da decisão sobre a matéria de facto mais adiante, quando necessário, ele será reproduzido. [7] DL 329-A/95, de 12 de Dezembro, com as alterações introduzidas pelos seguintes diplomas: DL 180/96, de 25-9; DL 125/98, de 12-5; L 59/98, de 25-8; DL 269/98, de 1-9; DL 315/98, de 20-10; L 3/99, de 13-1; DL 375-A/99, de 20-9; DL 183/2000, de 10-8; L 30-D/2000, de 20-12; DL 272/2001, de 13-10; DL 323/2001, de 17-12; L 13/2000, de19-2; DL 38/2003, de 8-3; DL 199/2003, de 10-9; DL 324/2003, de 27-12; DL 53/2004, de 18-3; L 6/2006, de 27-2; DL 76-A/2006, de 29-3; L 14/2006, de 26-4; L 53-A/2006, de 29-12; DL 8/2007, de 17-1; DL 303/2007, de 24-8; DL 34/2008, de 26-2; DL 116/2008, de 4-7; L 52/2008, de 28-8; L 61/2008, de 31-10; DL 226/2008, de 20-11; L 29/2009, de 29-6; DL 35/2010, de 15-4; L 43/2010, de 3-9; L 52/2011, de 13-4; L 63/2011, de 14-12; L 31/2012, de 14-8; L 60/2012, de 9/11 e L 23/2013, de 5/3. [8] De resto, diga-se, na formulação que as AA. reclamaram ao tribunal recorrido, a palavra “falsamente” foi retirada. [9] Não considerando por ora a contribuição que se pudesse extrair da atitude de recusa, por todas e cada uma das AA., da introdução do factor de correcção. [10] Para efeitos de publicação, essa parte do relatório foi suprimida. [11] Greve de produção de tabaco nacional que levou à importação da marca espanhola Fortuna em substituição e para serviço dos fumadores nacionais. [12] Suprimida a reprodução desta parte, para efeitos de publicação no site da dgsi. [13] Idêntica supressão. [14] ANTUNES, José Engrácia - Os contratos de distribuição comercial. Revista de Ciências Empresariais e Jurídicas. ISSN 1646-1029. Nº 16 (2010), p. 9-38. [15] “Algumas notas sobre o contrato de distribuição selectiva”, in “Estudos de Homenagem a Fernando de Araújo Barros”, 2017, consultável em Repositório.uporto.pt, pag. 440 e seguintes. [16] Dentre esta jurisprudência, salientamos (e por questões de economia não vamos manter todos os espaços entre parágrafos):
- Ac. STJ de 21 de Abril de 2005 (Processo nº. 04B3868) em cujo texto se lê:
“Ao contrário da agência, o contrato de concessão dispõe, apenas, de tipicidade social, apresentando, dentro dos contratos de distribuição, um perfil característico; à partida, ele opera em áreas que exigem investimentos significativos e que o produtor dos bens ou serviços a distribuir não queira ou não possa, ele próprio, efectuar; corresponde, pois, pelo menos tendencialmente, a esquemas destinados a distribuir produtos de elevado valor, com exemplo clássico nos veículos automóveis (4). Na concessão, o produtor fixa, com o distribuidor - o concessionário - um quadro de distribuição que se norteia pelos seguintes parâmetros: um comerciante (o concessionário) insere-se na rede de distribuição dum produtor; adquire o produto em jogo, junto do produtor e obriga-se a vendê-lo, em seu próprio nome, na área do contrato. A concessão, contrato que estabelece relações duradouras, pode ser enriquecida com numerosas outras cláusulas; designadamente, o concessionário pode ficar adstrito a determinadas metas, à efectivação de certos investimentos ou à utilização de marcas ou de insígnias que identifiquem o produto em jogo. (Prof. Menezes Cordeiro, Manual de Direito Comercial, I vol., págs. 509 e 510) (5).
2.1. Por sua vez, o contrato de franquia surge numa linha de evolução em que sobressai a crescente ingerência na actividade de distribuição; neste sentido, ele constitui um desenvolvimento do contrato de concessão e representa a mais estreita forma de cooperação entre empresas independentes e o mais elevado grau de integração do distribuidor (o franquiado) na rede da outra parte (o franqueador), em termos de gerar no público a convicção de ser o próprio fabricante, ou uma sua filial, a encarregar-se da distribuição (Prof. Pinto Monteiro, Contratos de Distribuição Comercial, pág. 117). Inicialmente, a franquia era, antes do mais, um meio de permitir o uso de marcas, patentes e outros benefícios de que o franqueador tinha o exclusivo; mais tarde, ela veio implicar elementos próprios da agência e da concessão: angariar clientes e distribuir bens e serviços (Prof. Menezes Cordeiro, ob. Citada, pág. 516). A ingerência do franqueador na actividade do franquiado - na sua organização, nos planos de fabrico e métodos de venda, na política de "marketing", etc. - é muito mais acentuada e extensa do que na concessão. Por outro lado, o franquiado comercializa os bens mediante a utilização obrigatória da marca e demais sinais distintivos de comércio pertencentes ao franqueador; a licença de utilização destes sinais é necessariamente acompanhada do fornecimento de "know-how", de assistência, de métodos e planos de mercado, de conhecimentos tecnológicos, de directrizes sobra a política de "marketing" e dos meios publicitários a utilizar, etc. Finalmente, é habitual, nos contratos de franquia, o pagamento, pelo franquiado, de contrapartidas, pelos benefícios que resultam da utilização da marca e dos conhecimentos e assistência que recebe: essas contrapartidas traduzem-se, em regra, no pagamento inicial de certa importância - direito de entrada -, acrescida do pagamento de outras quantias periódicas - "royalties" (Prof. Pinto Monteiro, Contratos de Distribuição Comercial, págs. 122 e 123) (6)
- Ac. STJ de 13 de Setembro de 2007 (Processo nº. 07B1958), em cujo texto se lê:
“A concessão comercial constitui, ao mesmo tempo, um método de organização das relações entre produtor e distribuidor e uma técnica de distribuição de produtos no mercado. A operação económica que subjaz a este contrato, intermediando a produção e o consumo, visa precisamente a comercialização de um produto ou gama de produtos. Segundo o douto ac. S.T.J, de 2001/02/01 (1), o contrato de concessão comercial é um contrato juridicamente inominado que, em traços gerais, se pode descrever como aquele em que um comerciante independente (o concessionário) se obriga a comprar a outro (o concedente) determinada quota de bens de marca, para os revender ao público em determinada área territorial, e, normalmente (mas nem sempre), com direito de exclusividade.
O concessionário obriga-se, em regra, a comprar uma quantidade de produtos durante certo período, pelos quais paga um preço, e a revendê-los à sua clientela. Por vezes, estabelecem-se obrigações acessórias, como a obrigação de adquirir e/ou vender uma quantidade mínima de produtos e ainda a não adquirir os mesmos produtos a empresas diferentes e de publicitar esses mesmos produtos.
Entre o concedente e o concessionário estabelece-se uma relação jurídica duradoura, representando o dever de revenda o núcleo central do contrato, agindo o concessionário em seu nome e por sua conta. Ele é proprietário dos produtos que distribui e a sua contrapartida económica traduz-se na diferença entre o preço por que compra os produtos e o preço por que os revende (2). (…)
Efectivamente, esta integração na rede de distribuição do concedente é um dos traços característicos da concessão e que a distingue de outros contratos do sector distributivo, designadamente do contrato de distribuição autorizada, podendo este definir-se, segundo Helena Brito (3), como o efeito de um acordo pelo qual um produtor confere a um comerciante, escolhido em razão da sua aptidão técnica e comercial, a qualidade de distribuidor dos seus produtos. Mas esta integração na rede de distribuição traduz-se em promover a revenda dos produtos adquiridos ao concedente geralmente através de estruturas criadas para o efeito, muitas das vezes com a comparticipação do próprio concedente, devendo este fornecer os meios necessários ao exercício da actividade do concessionário e cumprir as obrigações que se relacionam com a organização e promoção de vendas. (…)
- Ac. STJ de 15 de Novembro de 2007 (Processo nº. 07B3933), em cujo texto se lê:
“Trata-se de duas espécies do contrato de distribuição comercial, comungando do escopo de promoção autónoma, estável e onerosa por uma parte de negócios de outra, sem regulamentação específica no nosso ordenamento jurídico. Com efeito, o concessionário e o franquiado revendem produtos ou bens do concedente e do fraquiador, respectivamente, integrados na rede de distribuição dos últimos, com assistência destes, mas por sua conta e risco, em regra em determinada zona geográfica. Neste quadro, o contrato de concessão comercial tem sido caracterizado como envolvente de uma relação contratual duradoura entre o concedente e o concessionário, em que este actua em nome e por conta própria, obrigando-se a promover a revenda dos produtos do concedente na zona a que se reporta, e o último a celebrar com o primeiro sucessivos contratos de compra e venda e a fornecer-lhe alguns dos meios necessários ao exercício da sua actividade. O contrato de franquia, por seu turno, caracteriza-se como sendo aquele pelo qual o franquiador concede ao franquiado, mediante determinada contrapartida monetária inicial e subsequente, a utilização, em certa zona geográfica, sob o seu controlo de fiscalização, de marcas, nomes, insígnias, processos de fabrico ou técnicas comerciais que acompanham a negociação pelo último de bens adquiridos ao primeiro. A doutrina tem, porém, apontado a diferenciação estrutural dos mencionados contratos por via de determinados vectores negociais, designadamente o maior ou menor grau ou intensidade da ingerência do concedente ou do franquiador na actividade da contra-parte, isto é, na sua organização e ou planos e métodos de venda, a especificidade do objecto mediato e a particularidade da remuneração. E, a propósito do contrato de franquia, tem salientado a vertente essencial do aproveitamento pelo franquiado de vantagens decorrentes de exploração de ideias e de conhecimentos advindos do franquiador, o mais intenso controlo deste último no confronto do primeiro e a efectiva integração deste na rede de distribuição daquele, o pagamento de determinadas quantias, inicialmente, e posteriormente de forma periódica (ANTÓNIO PINTO MONTEIRO, “Contratos de Distribuição Comercial”, Coimbra, 2001, páginas 118 a 123). Um dos elementos relevantes da distinção entre o contrato de concessão comercial e o contrato de franquia consubstancia-se, na prática da negociação, na circunstância de o franquiado, ao invés do concessionário, assumir perante o franquiador a obrigação de utilização no seu âmbito de actividade, dos sinais do comércio ou da indústria do último, designadamente, marcas, insígnias ou nomes do estabelecimento. (…)”
- Ac. STJ de 24 de Janeiro de 2012 (Processo n.º 39/2000.L1.S1), em cujo texto se lê:
“O contrato de concessão comercial é um contrato consensual, art. 219º do Código Civil, oneroso, as mais das vezes com cariz intuitu personae, podendo assumir as características de contrato de adesão (que não ocorrem no caso dos autos). (…)
Engrácia Antunes, in “Direito dos Contratos Comerciais” – Almedina-Setembro de 2009 – define-o – pág. 446 – como o “Contrato pelo qual um empresário – o concedente – se obriga a vender a outro – o concessionário —, ficando este último, em contrapartida, obrigado a comprar ao primeiro, certos produtos, para revenda em nome e por conta próprios numa determinada zona geográfica, bem assim como a observar determinados deveres emergentes da sua integração na rede de distribuição do concedente”. E mais adiante – pág. 447 – “Antes do mais, o contrato de concessão comercial constitui um contrato-quadro (“Rahmenvertrag”, “contrat-quadre”) no sentido em que visa criar e disciplinar uma relação jurídica de colaboração estável e duradoura entre as partes, cuja execução se traduz na celebração futura entre estas de sucessivos contratos de compra e venda”.
Definição semelhante é a dada por António Pinto Monteiro – “Contrato de Agência, 4ª edição, 2000, pág. 49: “É a concessão um contrato-quadro (“Rahmenvertrag”/”contrat cadre”), que faz surgir entre as partes uma relação obrigacional complexa, por força do qual uma delas, o concedente, se obriga a vender à outra, o concessionário, e esta a comprar-lhe, para revenda, determinada quota de bens, aceitando certas obrigações (mormente no que concerne à sua organização, à política comercial e à assistência a prestar aos clientes) e sujeitando-se a um certo controlo fiscalização do concedente. Como contrato-quadro, o contrato de concessão comercial funda uma relação de entre as partes, pelos quais o concedente vende ao concessionário, para revenda, nos termos previamente fixados, os bens que este se obrigou a distribuir”. Sendo como é um contrato de cooperação comercial e de distribuição, pressupondo uma integração e conjugação de esforços organizativos com vista à implementação de bens no mercado, assumem especial relevo a estabilidade e permanência – o seu cariz continuado, duradouro[2] – sem o qual a vertente de rentabilização económica dificilmente será alcançável.
Abílio Neto, in “Código Comercial e Contratos Comerciais Anotado” – Setembro /2008, pág.583, escreve: “O Contrato de concessão comercial tem como elementos caracterizadores: (a) o carácter duradouro do contrato (a estabilidade do vínculo); (b) actuação autónoma do concessionário, em nome próprio e por conta própria (transferindo-se o risco do produtor para o distribuidor); (c) objecto mediato: bens produzidos ou distribuídos pelo concedente; (d) obrigação do concedente celebrar, no futuro, sucessivos contratos de venda (o dever de venda dos produtos a cargo do concedente); (e) obrigação do concessionário de celebrar — no futuro — sucessivos contratos de compra (o dever de aquisição impendente sobre o concessionário); (f) o dever de revenda por parte do concessionário dos produtos que constituem o objecto do contrato, na zona geográfica ou humana a que o mesmo se refere; (g) obrigação do concessionário orientar a sua actividade empresarial em função das finalidades do contrato e do concedente fornecer ao concessionário os meios necessários ao exercício da sua actividade; (h) exclusividade (na maioria dos casos) (Maria Helena Brito, “O Contrato de Concessão…”, págs. 179 a 184; José Alberto Coelho Vieira, “O Contrato de Concessão Comercial”, AAFDL, 1991, pág. 15).
A vertente duradoura do contrato de concessão comercial é deveras relevante, não só para protecção económica dos contraentes forçados a fazer investimentos em bens e numa estrutura que, normalmente, tem como fito apenas o particular objecto da concessão, como também a incutir no público consumidor – sobretudo em caso de exclusividade – maior confiança, precisamente porque entre concedente e concessionário existe uma organização que dará resposta não só ao aspecto primordial da aquisição dos bens, como à assistência de que careçam. Assim acontece, sobremaneira, do domínio da concessão de veículos automóveis.
- Ac. STJ de 29 de Setembro de 2015 (Processo n.º 1552/07.0TBPTM.E2.S1), em cujo texto se lê:
“Neste segundo tipo de contrato, o único que aqui nos importa pelas razões que adiante se evidenciarão, modalidade dos contratos de distribuição comercial, estabelece-se entre o concedente e o concessionário uma relação contratual duradoura, que não é definitiva e unitária, antes obriga à celebração de outros contratos através dos quais o concessionário adquire os produtos ao concedente, representando o dever de revenda o núcleo central do contrato, agindo o concessionário em seu nome e por sua conta. O concessionário obriga-se, em regra, a comprar uma quantidade mínima de produtos durante certo período, pelos quais paga um preço, e a revendê-los à sua clientela. Ele é proprietário dos produtos que distribui e a sua contrapartida económica traduz-se na diferença entre o preço por que compra os produtos e o preço por que os revende. Por vezes, estabelecem-se obrigações acessórias, como a de não adquirir os mesmos produtos a empresas diferentes, de os vender só em determinada área territorial, de os publicitar, e, normalmente, mas nem sempre, com direito de exclusividade[3].
O contrato de comissão constitui, as mais das vezes, um contrato de “cooperação associativa”, por nele os interesses das partes serem convergentes e ambas participarem nos resultados obtidos[4].
Ainda, nas palavras de Pinto Monteiro, “aconcessão é um contrato-quadro («Rahmenvertrag»/«contrat-cadre») que faz surgir entre as partes uma relação obrigacionalcomplexa por força da qual uma delas, o concedente, se obriga a vender à outra, o concessionário, e esta a comprar-lhe, para revenda, determinada quota de bens, aceitando certas obrigações – mormente no que concerne à sua organização, à política comercial e à assistência a prestar aos clientes – e sujeitando-se a um certo controlo e fiscalização do concedente. Como contrato-quadro, o contrato de concessão comercial funda uma relação de colaboração estável, duradoura, de conteúdo múltiplo, cuja execução implica, designadamente, a celebração de futuros contratos entre as partes, pelos quais o concedente vende ao concessionário, para revenda, nos termos previamente estabelecidos, os bens que este se obrigou a distribuir”[5].
O contrato de concessão comercial é uma emanação das relações comerciais existentes e do princípio da liberdade contratual estabelecido no artigo 405.º do Código Civil (doravante CC), e como contrato atípico que é não possui disciplina legal própria. A sua regulamentação jurídica tem de se encontrar nas cláusulas contratuais adoptadas pelas partes, nas disposições legais dos contratos típicos que não tenham carácter excepcional e em relação aos quais apresente analogia, nas regras gerais do direito dos contratos, e ainda no regime estabelecido para as cláusulas contratuais gerais/contratos de adesão por muitas vezes ser esse o modo negocial típico seguido na formação desse contrato.
- Ac. STJ de 24 de Maio de 2018 (Processo n.º 1212/12.0TBSTS.P1.S1), que em parte já citámos no nosso texto anteriormente, e em cujo texto se lê:
“ Ensina o Prof. Romano Martinez que a própria concessão comercial é um dos contratos da distribuição comercial ao lado da agência e do franchising já que a concessão surge como modo de distribuição comercial, pelo que o concessionário se obriga a comprar certa quantidade de produto e a revendê-los durante certo período e, quanto à publicidade, acrescenta que «normalmente são produtos comercializados com certa marca, pelo que a respectiva publicidade não cabe ao concessionário» [Pedro Romano Martinez, «Contratos Comerciais (Apontamentos)» Princípia, 2ª edição, 2003 pg. 9]. Quanto à exclusividade, o mesmo Professor da Universidade de Lisboa afirma que é discutível que a exclusividade do concessionário seja elemento do tipo (artº 85º do Tratado de Roma, DL 371/93, de 29 de Outubro, Lei da Defesa da Concorrência), apontando, como notas essenciais do regime jurídico da concessão comercial, em cujo conceito amplo, se insere o contrato de distribuição, as seguintes notas: «Frequentemente, o concessionário tem de revender os bens numa zona e em determinadas condições. O concessionário tem de orientar a actividade empresarial em função da finalidade do contrato de concessão, ou seja segundo o interesse do concedente. O concedente tem de fornecer ao concessionário os meios necessários para o exercício da actividade. Contrato-quadro. Contrato de cooperação. Aplicação das regras da agência, nomeadamente no que respeita à cessação do contrato» (Romano Martinez, op. cit, pg. 10).
Ainda nas palavras do ilustre jurisconsulto e docente universitário que vimos de citar, trata-se de um contrato juridicamente atípico, mas socialmente típico, assim explicando tal fenómeno do seguinte modo: «De entre os contratos previstos em outros códigos é, a título exemplificativo, de mencionar alguns dos constantes do Código Comercial - como o transporte (arts. 366º ss. C.Com.) ou o seguro (arts. 425.° ss. C.Com. - ou do Código do Direito de Autor e Direitos Conexos - como o contrato de edição (artºs. 83 ss. do Código do Direito de Autor). Ao lado destes contratos típicos têm as partes liberdade de ajustar negócios jurídicos atípicos de índole variada[1]. Normalmente, o legislador tipifica aqueles contratos a que as partes recorrem com maior frequência; são exemplo disto o leasing e a agência. Dizendo de outro modo, a tipificação legal é normalmente precedida de uma tipificação social; verificando-se que um determinado contrato está enraizado na prática jurídica (tipificação social), com alguma frequência ele vem, depois, a ser legalmente tipificado. Mas subsistem como atípicos contratos que são usados há bastante tempo, como a hospedagem ou a concessão comercial. Nas últimas décadas, muitas vezes por influência norte-americana, surgiram na prática contratual portuguesa diversos contratos, como o factoring e o franchising» .
No plano doutrinal mais relevante, pode consultar-se, na vasta obra do Prof. Menezes Cordeiro, o seu Manual de Direito Comercial, onde se lê a seguinte passagem cujo relevo para a questão ora decidenda é incontestável: «Nada impede as partes de confeccionar contratos atípicos de distribuição. De todo o modo, havendo distribuição, encontraremos sempre um núcleo contratual bastante próximo da agência. Esta pode ser considerada como a figura-matriz dos contratos de distribuição. As suas normas podem alargar-se aos contratos de distribuição acima referidos e, ainda, aos contratos de distribuição atípica. A esta luz compreende-se a relevância comunitária assumida pela agência» (Menezes Cordeiro, Manual de Direito Comercial I, 2001, Almedina, pg. 494)
(…)
Já atrás tivemos ensejo de esboçar, ainda que a traço necessariamente grosso, os contornos da figura do denominado contrato de distribuição comercial – enquadrando-o no genus proximum de contrato de concessão comercial – como sendo um negócio jurídico bilateral (contrato) mediante o qual uma das partes, o distribuidor, se vincula a adquirir à outra parte, o principal (produtor ou importador-fornecedor), uma quantidade de bens comerciais para posterior colocação no mercado numa certa área e por sua conta e risco.
A este respeito, como bem afirma o Prof. J. Engrácia Antunes «não está excluído, aliás, que as próprias espécies referidas se possam combinar entre si para dar lugar a contratos de distribuição híbridos» (Direito dos Contratos Comerciais, nota de rodapé, nº 804) indicando como referência jurisprudencial o Acórdão da Relação de Lisboa de 2-12-99 in Col. Jur (1999), V, 112-114.
É esta possibilidade quase mimética deste tipo de contratos de concessão comercial que permite não só variações intrínsecas, como combinações com outras espécies, gerando os tais contratos híbridos a que se refere o Ilustre Professor citado.
Sendo assim, conforme a extensão e profundidade da dependência do distribuidor do principal, assim a distribuição contratada pode assumir diferentes tonalidades ou graus pois, como bem refere o Prof. José Alberto Vieira, «a variedade terminológica apontada para um mesmo contrato assenta, a meu ver, sobre dois vectores: quer numa errada concepção da natureza do contrato, quer no erigir de um dos eventuais elementos do tipo contratual em elemento designativo do mesmo. Por outro lado, a ausência de regulamentação legal e a imprecisão e variedade em que os esquemas contratuais da distribuição aparecem na prática social, dificultam e baralham, por vezes, a tarefa do intérprete. Não é assim de espantar a pluralidade de nomen juris propostos até hoje para este contrato» (J.Alberto Vieira, O Contrato de Concessão Comercial (reimpressão), Coimbra Editora, 2006, pg.17).
De notar, ainda, como afirma o Prof. António Pinto Monteiro que à análise desta temática tem dedicado alguns estudos de referência, que dentro da categoria de contratos de distribuição comercial há ainda que distinguir tonalidades ou graus respeitantes à integração do distribuidor na rede de distribuição do principal, é dizer, à sua dependência económico-social deste, como se colhe das seguintes palavras deste autor, escritas a propósito de um caso de denúncia de um contrato de concessão comercial, em que além dos requisitos de compra para revenda e actuação em nome e por conta própria do distribuidor, se exige também o requisito de integração do distribuidor na rede de distribuição do concedente, assim se comprovando a dependência do distribuidor da política comercial do principal: «Importa não esquecer que no amplo leque das formas negociais ao serviço da distribuição comercial há outros contratos, além da concessão, mas próximos deste, como os distribuição autorizada em que a integração do distribuidor, a existir, é mais ténue» (A. Pinto Monteiro, Denúncia de um Contrato de Concessão Comercial, Coimbra Editora, pg. 46).
De inegável relevância é também a dissertação de Pós-Graduação em Ciências Jurídicas na Universidade de Lisboa, da ilustre Professora Doutora Maria Helena Brito, defendida em 1985, mas publicada em 1990, onde a autora assim discorre sobre o conceito de distribuição autorizada:
«O sistema de venda através de uma rede de agentes ou de comissários apenas proporciona à empresa produtora uma redução nos custos. Na verdade, esta modalidade de distribuição não evita à empresa o risco que a venda directa implica. Tanto o agente como o comissário agem por conta da empresa produtora, o que significa que e esta a suportar grande parte dos riscos respectivos. Desejando afastar de si própria o risco da venda directa a empresa produtora procura outros sistemas de integração no sector distributivo, recorrendo a comerciantes que adquiram os produtos e os revendam por conta própria. Esses comerciantes adquirentes-revendedores ficam ligados por contratos substancialmente uniformes à empresa produtora que deste modo, pode contar com centros autónomos de distribuição O risco da distribuição é transferido para o distribuidor, a cargo do qual fica a organização da venda e respectivas despesas. Por sua vez, o distribuidor, seja qual for o contrato que o liga à empresa produtora, obtém uma posição privilegiada no mercado porque pode adquirir os produtos de certa empresa preferencialmente a outros comerciantes não abrangidos por aquela relação. Os distribuidores que adquirem por conta própria, nos termos de uma relação preferencial com o produtor, e que revendem também por conta própria aos seus clientes só aparentemente se aproximam do revendedores independentes. É que, se eles o são, de um ponto de vista estritamente jurídico, pois compram e revendem, sob o ponto de vista económico encontram-se sempre, embora em graus diferentes, integrados numa rede de distribuição da empresa produtora. O equilíbrio entre a produção e o consumo que normalmente resulta da actividade dos distribuidores é neste caso reduzido, atendendo a uma série de obrigações que, em geral, lhes são impostas: obrigação de comprar uma quantidade mínima de produtos durante um certo período de tempo, obrigação de observar um preço de revenda fixado pelo produtor. A distribuição autorizada pode definir-se como efeito de um acordo pelo qual um produtor confere a um comerciante, escolhido em razão da sua aptidão técnica e comercial, a qualidade de distribuidor dos seus produtos» (Maria Helena Brito, O Contrato de Concessão Comercial, Almedina, 1990, pg. 13).
Mais adiante, a ilustre autora citada acrescenta o que se considera do maior interesse para a decisão do presente recurso: «Esta modalidade de distribuição não comporta obrigação de exclusividade de venda a cargo do produtor, nem atribuição ao distribuidor de exclusividade de revenda dos produtos, em sectores determinados. O produtor tem a faculdade de fornecer outros comerciantes e o distribuidor autorizado pode continuar a abastecer- -se junto de fabricantes concorrentes. Na prática, porém, o produtor trata, antes de mais, com os seus distribuidores autorizados; da mesma maneira, o distribuidor permanece, em regra, fiel aos produtos de que é distribuidor autorizado. O distribuidor autorizado tem a obrigação de orientar a clientela para os produtos que distribui; não lhe incumbe propriamente a obrigação de exercer uma actividade de promoção da revenda dos produtos. Além disso, o distribuidor autorizado não tem de orientar a sua actividade em função das finalidades do contrato» (Op. cit, pg. 14). [17] Os não itálicos no texto que colocamos em itálico correspondem aos itálicos originais. [18]In “Direito dos Contratos Comerciais”, Livraria Almedina, Coimbra, 2009, pág. 449. [19] No mesmo sentido vide também Fernando Ferreira Pinto, in “Contratos de Distribuição, Da Tutela do distribuidor integrado em face da cessação do vínculo”, Universidade Católica Editora, 2013, pág. 61 e Pinto Monteiro, in “Contratos de Distribuição Comercial”, Almedina, 2004, págs. 109/110. [20] Cfr. Ac. STJ de 20.6.2013, Proc. 178/07.2TVPRT.P1.S1S1, (Serra Baptista) e, no mesmo sentido os Acórdãos STJ de 13.4.2010, Proc. 673/2002.E1.S1, (Fonseca Ramos), de 11.4.2019, Proc. 622/08.1TVPRT.P2.S1, (António Joaquim Piçarra), de 15.4.2004, Proc. 04B1023 (Salvador da Costa) e de 11.11.2010, Proc. 4749/03.8TVPRT.P1.S1 (Maria dos Prazeres Pizarro Beleza), todos acessíveis in www.dgsi.pt.. [21]In “Do Regime Jurídico dos Contratos de Distribuição Comercial", Estudos em Homenagem ao Prof. Inocêncio Galvão Telles, vol I, pág. 565/577. [22] Respeitamos a pontuação original. [23] Carvalho Fernandes, “Teoria Geral do Direito Civil”, vol. II, Universidade Católica Portuguesa, 5.ª edição, p. 447 e segs. [24] Sobre os critérios interpretativos na pré-codificação e no Código de Seabra, veja-se Menezes Cordeiro “Tratado de Direito Civil”, vol. II, Almedina, 2017, 4.ª edição, p. 707 e ss. [25] Carvalho Fernandes, ob. cit. p 450. [26]In Código Civil Anotado, vol. I, Coimbra Editora, 1985, 3.ª edição, p. 222-223. [27] Respeitamos a pontuação original. [28] Repare-se como, entre muitas outras coisas, num negócio que é vender tabaco, em que estão estabelecidos quantitativos mínimos, em que está estabelecida a compra para revenda, o grossista não tem qualquer interesse em não vender e com toda a naturalidade tentará que o retalho, na totalidade dos seus clientes retalhistas, lhe comprem as mesmas quantidades que ele próprio comprou, para o que usará os mesmos bons argumentos com que em cada momento a produtora/fornecedora o convenceu a comprar: - por exemplo, comprar mais porque é Verão e há mais emigrantes e turistas. Para isto não é preciso ter uma indicação formal e formalmente consagrada como obrigatória de usar os mesmos argumentos. Eles serão de certeza usados. [29] Acórdão de 16 de junho de 1998, Racke, C‑162/96, EU:C:1998:293, n.o 49. [30] Ver, neste sentido, Conclusões da advogada‑geral V. Trstenjak no processo Dominguez, C‑282/10, EU:C:2011:559, n.o 96, Conclusões da advogada‑geral J. Kokott no processo Pujante Rivera, C‑422/14, EU:C:2015:544, n.o 55. [31] V. Ac. TRL de 13.7.2017, processo 1358/16.5YRLSB-7. [32] Ob. cit, p. 354-355. [33] Sendo a obra de Pedro Romano Martinez seguida “Da Cessação do Contrato, 2.ª Edição, Almedina, 2006, pp. 58-66 e 116-125”. [34] Conforme assinalam as Recorrentes nas notícias extraídas dos sites https://ec.europa.eu/commission/commissioners/2014- 2019/georgieva/announcements/expiry-agreement-p..._en e https://ec.europa.eu/antifraud/...-2004_en). [35] É idêntica, para os efeitos que aqui nos interessa realçar, a fórmula do artigo 7º da Lei 18/2003, vigente ao tempo dos factos: “1 - É proibida, na medida em que seja susceptível de afectar o funcionamento do mercado ou a estrutura da concorrência, a exploração abusiva, por uma ou mais empresas, do estado de dependência económica em que se encontre relativamente a elas qualquer empresa fornecedora ou cliente, por não dispor de alternativa equivalente. 2 - Pode ser considerada abusiva, designadamente: (…) . 3 - Para efeitos da aplicação do n.º 1, entende-se que uma empresa não dispõe de alternativa equivalente quando: a) O fornecimento do bem ou serviço em causa, nomeadamente o de distribuição, for assegurado por um número restrito de empresas; e b) A empresa não puder obter idênticas condições por parte de outros parceiros comerciais num prazo razoável”. [36] Citamos a propósito parte do texto do corpo do Acórdão TRL proferido no processo 3309/07.9TVLSB.L1-8 em 15-04-2010: “No nosso antigo direito admitia-se a rescisão dos contratos comutativos por lesão enorme. E escreveu Coelho Rocha: Diz-se haver lesão nos contratos comutativos todas as vezes que uma das partes não recebe o equivalente daquilo que dá. (…) A controvérsia que, através dos séculos, tem suscitado a admissibilidade desta causa de anulação do negócio jurídico, mergulha as suas raízes na contrariedade de razões igualmente válidas: para a não admissibilidade, o princípio da estabilidade do contrato, o da segurança jurídica, o reconhecimento das exigências do comércio; para a solução oposta, o princípio da protecção dos mais fracos e outros de humanidade e caridade – Das Relações Jurídicas, do Cons. Rodrigues Bastos, pag 200 e seg. E continua… O texto legal vigente é de aplaudir, integrando-se harmonicamente na economia do diploma, que em boa hora tão larga aplicação manda fazer dos princípios da equidade e boa fé negocial. No mesmo sentido Mota Pinto, na Teoria Geral do Direito Civil, pag 534 seg.- O DL 262/83, de 16 de Junho, alterou a redacção do art. 282/1 deixando de fazer referência a «benefícios manifestamente excessivos ou injustificados». [37] Vejam-se os seguintes números da matéria de facto considerada provada no referido processo:
“45. O PRC 04/08 foi objecto de decisão de arquivamento do Conselho da AdC datada de 12 de Agosto de 2010, na sequência de alterações introduzidas (Compromissos), pela T…, nas CGF, em resultado das quais a AdC considerou terem sido eliminadas as preocupações de cariz jusconcorrencial que deram origem à abertura do processo contraordenacional. 46. O PRC 07/10 foi arquivado por decisão do Conselho da AdC datada de 18 de Agosto de 2011, nos termos da qual se concluiu pela não verificação de um abuso de posição dominante e/ou de um abuso de dependência económica por parte da T… relativamente aos seus clientes grossistas no que se refere à alegada recusa de fornecimento, por parte desta, face ao incumprimento da imposição de um meio de pagamento único para cada factura emitida pelo fornecimento de tabaco a clientes grossistas, nos termos do disposto das CGF em vigor”. [38] A nota de rodapé 16 identifica: “ Comunicação da Comissão com orientações sobre o conceito de afectação do comércio entre os Estados Membros, previsto nos artigos 81.º e 82.º do Tratado, JO C 101/81, de 27/04/2004)”. [39] A nota de rodapé 20 refere: “Acórdão do TJUE de 17 de Outubro de 1972, Cementhandelaren (8/72), C.J. (1972) 977, para. 29”. [40] Do qual se cita o parágrafo 210, onde se lê: “A este propósito, deve tomar‑se em consideração o indício altamente significativo que representa a detenção, pela empresa em causa, de partes de mercado de uma grande dimensão, bem como a relação entre as partes de mercado detidas por essa empresa e pelos seus concorrentes imediatos (acórdão Hoffmann‑La Roche/Comissão, referido no n.° 182 supra,n.os 39 e 48), e isto tanto mais quanto os concorrentes imediatos apenas detêm partes de mercado marginais (v., neste sentido, acórdão do Tribunal de Justiça de 14 de Fevereiro de 1978, United Brands/Comissão, 27/76, Colect., p. 77, n.° 111)”. [41] Embora não tenhamos provados os dados que permitiram no Estudo sobre o Mercado do Tabaco afirmar a detenção pela T… de quotas de mercado superiores a 82% nos últimos 10 anos, relativamente à data de elaboração do Estudo, argumento que lhe permitiu invocar Bellamy & Child, European Community Law of Competition, Sweet & Maxwell, 2001, p. 706, para firmar que “Quando uma empresa detém uma quota de mercado muito elevada de forma estabilizada e sustentada ao longo de um período razoável de tempo a empresa é considerada dominante no mercado”, a verdade é que em função do critério de independência significativa o mais relevante é o nível da quota, no sentido de que a manutenção de níveis altos ainda que decrescentes, deve considerar-se como mantendo um nível de independência significativo. [42] Citamos a partir do Estudo (fls.6492 dos autos): “De acordo com o disposto no artigo 83º, nºs 2 e 3 do Código dos Impostos Especiais sobre o Consumo, o imposto específico traduz-se num montante fixo por cada mil cigarros, enquanto que o imposto ad valorem se traduz numa percentagem de imposto já incluído no PVP. A taxa do elemento específico situa-se em €64,75, enquanto que o imposto ad valorem era de 23%. O elemento específico sobre o consumo tem carácter regressivo, na medida me que os cigarros menos caros estão sujeitos a um imposto mais alto (todos os impostos pagam o mesmo imposto especial sobre o consumo, independentemente do seu preço de venda ao público)”. Deve ler-se (todos os cigarros pagam o mesmo imposto…)”. [43] De acordo com o artigo 86º-A do Código dos Impostos Especiais de Consumo (CIEC), aprovado pelo DL 566/99 de 22.12, artigo aditado pelo artigo 1º do DL 307-A/2007 de 31.8, epigrafado “Regras especiais de introdução no consumo”, “1 - A introdução no consumo de cigarros está sujeita a regras de condicionamento aplicáveis no período que medeia entre o dia 1 de Setembro e o dia 31 de Dezembro de cada ano civil. 2 - Durante o período referido no número anterior, as introduções no consumo de cigarros, efectuadas mensalmente, por cada operador económico, não podem exceder os limites quantitativos, decorrentes da aplicação de um factor de majoração à quantidade média mensal de cigarros introduzidos no consumo ao longo dos 12 meses imediatamente anteriores. (…)”. O mesmo condicionalismo passou ao CIEC aprovado pelo DL 73/2010 de 21 de Junho, nos termos do artigo 106º.
Por outro lado, de acordo com o artigo 108.º do mesmo diploma, que retoma o artigo 88º do CIEC aprovado pelo DL 566/99, “1 - É proibida a comercialização no mercado nacional de produtos de tabaco que não satisfaçam as condições legalmente exigidas para o efeito ou que não correspondam aos elementos declarados nos termos dos números seguintes. 2 - A comercialização de novas marcas de tabaco manufacturado, ou quaisquer alterações dos elementos de marcas já existentes, devem ser previamente comunicadas à autoridade aduaneira, com a antecedência mínima de 30 dias.(…)”. [44] Nos termos do artigo 1º da versão original: “A presente lei dá execução ao disposto na Convenção Quadro da Organização Mundial de Saúde para o Controlo do Tabaco, aprovada pelo Decreto n.º 25-A/2005, de 8 de Novembro, estabelecendo normas tendentes à prevenção do tabagismo, em particular no que se refere à protecção da exposição involuntária ao fumo do tabaco, à regulamentação da composição dos produtos do tabaco, à regulamentação das informações a prestar sobre estes produtos, à embalagem e etiquetagem, à sensibilização e educação para a saúde, à proibição da publicidade a favor do tabaco, promoção e patrocínio, às medidas de redução da procura relacionadas com a dependência e a cessação do consumo, à venda a menores e através de meios automáticos, de modo a contribuir para a diminuição dos riscos ou efeitos negativos que o uso do tabaco acarreta para a saúde dos indivíduos”. [45] Tal como vem referido pelas Recorridas, e também correctamente por remissão para as correspondentes páginas e parágrafos do Estudo do Mercado do Tabaco e do Processo 04/08, e entre outras: - informação quase completa sobre o mercado (nomeadamente sobre as vendas de cada uma das marcas e do total das vendas das empresas concorrentes por ponto de venda no retalho e por máquina de vending, informações estas obtidas através do desconto de informação de vendas. - critérios para o início da atividade grossista, nomeadamente a necessidade de pagamento antecipado do tabaco; - prazos de pagamento; - auditorias nas instalações dos grossistas para verificar o cumprimento da distribuição direta ativa; - definição de quantidades mínimas de aquisições por distrito (…); - definição de descontos de escalões de volume, (…); - prática de condições comerciais menos favoráveis relativamente aos concorrentes. [46] Miguel Sousa Ferro, na obra que acima referimos e citámos, e sobre o conceito de abuso da posição dominante ao nível do direito europeu, alerta: “O Direito da Concorrência não proíbe a detenção de posições dominantes, ou sequer de monopólios. Um concorrente pode ser tão eficiente que os restantes acabem por sair do mercado ou verem as suas quotas tornarem-se ínfimas. O Direito da Concorrência só se preocupa com essa situação a partir do momento em que a empresa com posição dominante use o seu poder de mercado para adoptar práticas abusivas. Desde que a concorrência se faça puramente com base no ―mérito, o seu resultado será, em princípio, benéfico para os consumidores.
Segundo a jurisprudência: “uma empresa em posição dominante tem uma responsabilidade especial de não prejudicar, através do seu comportamento, uma concorrência efectiva e não falseada no mercado comum (...). Uma empresa em posição dominante não pode, assim, recorrer a outros meios que não os que resultem de uma concorrência pelo mérito”146”. [47] Além do prejuízo de apreciação que já referimos, também resulta da formulação neste parágrafo que afinal as cláusulas de alteração irrestrita têm como condição da sua ilegalidade concorrencial o facto dos AA não se poderem opor a elas, o que com o devido respeito, é um problema de direito privado e não de direito da concorrência. Bem visto o parágrafo, torna-se claro que o que interessa às Recorrentes é o ataque às alterações concretas que em consequência dessas cláusulas de alteração irrestrita foram introduzidas. Isto resulta ainda mais evidente quando, sendo mencionada a possibilidade de ofensa às alíneas a) a e) do nº 1 do artigo 4º, na realidade as Recorrentes nada oferecem quanto a uma eventual violação da alínea d). [48] Prosseguiram as AA. com a invocação da nulidade por violação das normas do Direito da Concorrência no que diz respeito à introdução do meio de pagamento único. [49] O mecanismo pelo qual as quantidades mínimas ou se mantêm ou sobem, mas nunca descem, extrai-se por conjugação da obrigação de cumprimento das quantidades mínimas em vigor com, por exemplo, nas Condições Gerais de 2001, o ponto 1.1.6.: “Por forma a acompanhar a evolução do mercado, a T… apurará, no início de cada ano civil, a média semanal de aquisições efectuadas no ano imediatamente anterior pelo Cliente Grossista que, tendo atingido as quantidades mínimas aplicáveis em determinado Distrito ou área de Distrito, adquiriu menos Produtos em cada local de entrega de cada Distrito ou área de Distrito. (…) A média de aquisições semanais do Cliente Grossista que, no ano civil precedente, tendo cumprido o disposto no ponto 1.1.4. acima, adquiriu menos Produtos em cada local de entrega situado em cada Distrito ou área de Distrito, constituirá a quantidade mínima de aquisições médias semanais do correspondente Distrito ou área de Distrito (sujeita ao disposto no ponto 1.1.7. seguinte). (…)”. [50] Luís Manuel Teles de Menezes Leitão in “O Enriquecimento Sem Causa no Direito Civil”, Almedina, Coimbra, 2005, pp. 441 e segs. [51] Menezes Leitão, ob. cit. p. 445-446. Na nota 1327, o Autor dá conta da discussão doutrinária sobre a categoria da inexistência jurídica. [52] Idem, p 448.