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CONTRATO PROMESSA DE COMPRA E VENDA
RESOLUÇÃO
SINAL
MORA
INCUMPRIMENTO DEFINITIVO
Sumário
I- O regime geral dos contratos – designadamente as regras atinentes à falta de cumprimento e mora imputáveis ao devedor, entre elas as dos arts. 798º, 801º, 804º e 808º do Cód. Civil – é aplicável ao contrato-promessa de compra e venda, tendo este, no entanto, um regime específico ao nível das sanções aplicáveis ao não cumprimento do contrato, quando tenha havido lugar à constituição de sinal. II- De acordo com o entendimento generalizado, na doutrina e na jurisprudência, salvo se da interpretação da vontade negocial resultar diversamente, o regime legal do sinal é inaplicável em caso de simples atraso no cumprimento. III- A mora apenas legitima a resolução quando convertida em incumprimento definitivo por uma das duas vias previstas no art. 808º, n.º 1, do CC: a) pela perda objetiva de interesse do credor na prestação ou b) pelo recurso à interpelação admonitória, com a fixação de prazo razoável, apenas dispensável se houver uma recusa antecipada do devedor em cumprir. IV- Essa interpelação admonitória – que pressupõe que o credor tenha ainda qualquer interesse no cumprimento – deve conter três elementos: a) a intimação para o cumprimento; b) a fixação de um termo perentório, e preciso, para o cumprimento; c) a admonição ou a cominação (declaração admonitória) de que a obrigação se terá por definitivamente não cumprida, caso não seja cumprida dentro daquele prazo suplementar.
Texto Integral
Acordam na 2ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães
I. Relatório
A. J. intentou no Juízo Central Cível de Vila Real – Juiz 2 – do Tribunal Judicial de Vila Real, a presente ação declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, contra X – Compra e Venda de Imóveis, Lda, NIPC ………, pedindo:
A – A declaração de incumprimento definitivo do contrato-promessa celebrado entre Autor e Ré, por atos culposos por parte da Ré, bem como a sua condenação no pagamento do valor global de € 39.600,00, ao Autor, acrescidos de juros até efetivo e integral pagamento, ou na eventualidade de não deferimento,
B – A condenação da Ré na devolução do sinal recebido, no montante de € 19.800,00, a título de enriquecimento sem causa, acrescidos de juros até o efetivo e integral pagamento.
Para tanto alegou, em resumo, que:
- em 2/11/2016, autor e ré celebraram um contrato promessa de compra e venda que tinha por objeto a fração autónoma que identifica, em fase final de construção, em que o autor prometeu comprar e a ré prometeu vender, nas circunstâncias que constam do respectivo contrato;
- o autor entregou à ré, a título de sinal e princípio de pagamento do preço acordado, a quantia de € 19.800,00, tendo ficado acordado que o restante seria pago na data da escritura, a qual seria celebrada no mês de janeiro de 2018;
- a ré não tinha a obra pronta na data designada para a escritura, tendo o autor aceitado que a mesma fosse realizada até ao final do mês de julho de 2018, data a partir da qual já não teria interesse no negócio;
- a ré não marcou a escritura até ao dia 31 de julho de 2018, pelo que o autor perdeu o interesse no negócio e resolveu o contrato promessa, por culpa imputável à ré.
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Citada, contestou a Ré, pugnando pela total improcedência da acção e deduzindo reconvenção, pedindo:
Que seja declarado que a ré faz sua a quantia de € 19.800,00 entregue pelo autor a título de sinal, uma vez que o autor incumpriu a obrigação de comparecer na escritura pública de compra e venda agendada para 9 de agosto de 2018, pelas 10.00 horas, na Casa ... na Conservatória do Registo Predial ..., por causa que só a ele lhe é imputável.
Defendeu-se por exceção, alegando que a culpa no atraso da celebração do contrato definitivo é imputável ao autor, por ter pedido alterações à fração, tendo sido informado pela ré que isso poderia causar o atraso da celebração da escritura, o que o autor aceitou, alegando, ainda, que o atraso resultou também de condições climatéricas adversas durante os anos de 2017 e 2018, bem como de atraso da Distribuidora de Energia ... na ligação à rede BT para o prédio.
Mais alegou que não houve incumprimento culposo da sua parte, e que foi, antes, o autor que faltou à sua obrigação de comparecer na escritura pública de compra e venda agendada.
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O autor apresentou réplica, contestando a reconvenção e concluindo pela absolvição do respetivo pedido.
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Realizou-se audiência prévia, no âmbito da qual foi elaborado despacho saneador, onde se afirmou a validade e regularidade da instância; foi fixado o objeto do litígio e enunciados os temas de prova, bem como foram admitidos os meios de prova.
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Procedeu-se a audiência de julgamento.
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Posteriormente, a Mm.ª Julgadora “a quo” proferiu sentença, nos termos da qual decidiu:
1º Julgar a presente ação procedente e, consequentemente declarou o incumprimento definitivo do contrato promessa celebrado entre Autor e Ré, por atos culposos por parte da Ré, e condenou a mesma no pagamento do valor global de € 39.600,00 (trinta e nove mil e seiscentos euros), ao Autor, acrescidos de juros até efetivo e integral pagamento.
2º Julgar totalmente improcedente a reconvenção, pelo que absolveu o autor reconvindo do pedido
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Inconformada, a Ré interpôs recurso da sentença e, a terminar as respectivas alegações, formulou as seguintes conclusões (que se transcrevem):
«1. A recorrente não se conforma com a decisão proferida, porquanto a mesma fez errada decisão da matéria de facto e menos correta interpretação e aplicação do direito ao caso concreto, como a seguir se vai demonstrar. 2. Deveria ter sido dado como não provados os seguintes factos 7º, 8º, 9º, 10º, 11º, 14º, 15º, 16º, 18º, 19º, 20º, 21º, 22º, 25º, 48º, 49º, 50º, 51º, 53º, 54º, 55º, 56º, 57º, 58º dos factos dados como provados, deveria ter sido dado como provados os seguintes factos j, l, m, n. o, p, q, r, s, t, u, v, x, z, aa, bb, cc, dd, ee, ff dos factos dados como não provados, e deveria ter sido julgada totalmente procedente a Reconvenção apresentada pela R. 3. Com base nas Declarações de Parte da Legal Representante da Ré T. R. as quais constam gravadas através do sistema integrado de gravação digital, disponível na aplicação informática em uso no Tribunal, em 29/01/2020, com relevo para este recurso de 00:37.0 a 12:31.8. 4. Com base nos Depoimentos das Testemunhas: M. G., o qual consta gravado através do sistema integrado de gravação digital, disponível na aplicação informática em uso no Tribunal, em 19/01/2020, com relevo para este recurso 00:00.2 a 08:52.2 e A. T., o qual consta gravado através do sistema integrado de gravação digital, disponível na aplicação informática em uso no Tribunal, em 19/01/2020, com relevo para este recurso 00:00.2 a 17:57.8. 5. Com base na Prova Documental composta pelos: Documento n.º 1 junto com a petição inicial, Documento nº. 1, 2 e 3 junto com a contestação, Documento nº. 4 junto com a contestação, Documento nº. 6 junto com a p.i., Documento nº 7 junto com a petição inicial, Documento n.º 8 junto com a petição inicial, Documento nº 5 junto com a contestação, Documento nº 6 junto com a contestação, Documento nº. 7 junto com a contestação, Documento nº. 8 junto com a contestação, Documentos nºs. 9, 10 e 11 juntos com a contestação, Documentos juntos pela Distribuidora de Energia ... ... Distribuição em 16 de Janeiro de 2020, CD junto pela Câmara Municipal .... 6. A R. é uma sociedade comercial que se dedica à compra e venda de imóveis e foi nessa sequencia que o A. se mostrou interessado na aquisição à R. da fração autónoma designada pela letra “X”, tipologia T2, com lugar de garagem e arrumos designados pela mesma letra, correspondente ao 1º piso, do prédio urbano a constituir em regime de propriedade horizontal, designado por Edifício ..., Entrada .., Lote .., sito na Quinta do ..., freguesia e concelho de Vila Real, inscrito na respetiva matriz predial urbana da União de Freguesias ..., sob o artigo ...º o qual proveio do artigo ...º da Freguesia de ... extinta, e descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o n.º .... 7. A edificação se encontrava na fase de construção da estrutura, e o A. pretendeu efetuar alterações à planta inicialmente projetada pela R. para aquela fração, que depois foram incluídas numa segunda planta, tendo ficado consolidadas na planta final que é a que consta anexa ao contrato-promessa junto pelo A. com a sua petição inicial, tendo a R. alertado que as alterações pretendidas iriam atrasar a entrega atempada da fração por a R. já ter pre-encomendado todos os materiais. 8. As partes celebraram o contrato promessa dos autos em 02 de Novembro de 2016 no qual a R. prometeu vender ao Segundo Outorgante, que àquela prometeu adquirir, o imóvel em causa nos presentes autos livre de quaisquer ónus ou encargos – Clausula Segunda, pelo preço de 132.000,00, a liquidar da seguinte forma: Como sinal e princípio de pagamento, o Segundo Outorgante entregou à Primeira Outorgante, na data da assinatura daquele Contrato-Promessa, a quantia de € 19.800,00 (dezanove mil e oitocentos euros), e o restante valor em dívida de € 112.200,00 (cento e doze mil e duzentos euros), será pago pelo Segundo Outorgante á Primeira Outorgante, no ato da escritura definitiva de compra e venda. 9. Quanto à Escritura de Compra e Venda ficou acordado que a mesma ficou de realizar-se em Janeiro de 2018, altura em que seria entregue ao Segundo Outorgante a respetiva fração com a entrega das respetivas chaves, tendo ficado da responsabilidade da Primeira Outorgante a marcação da escritura definitiva de compra e venda, da qual deverá notificar o Segundo Outorgante com a antecedência mínima de 15 dias. 10. Quanto ao incumprimento ficou acordado que, no caso de incumprimento do presente contrato por parte da Primeira Outorgante, designadamente na outorga do contrato prometido, tem o Segundo Outorgante a faculdade de exigir o dobro do que prestou a título de sinal, e ainda, no caso de incumprimento do presente contrato por parte do Segundo Outorgante, designadamente a não celebração da escritura pública de compra e venda no prazo convencionado, este perderá automaticamente as quantias entretanto entregues a título de sinal e princípio de pagamento. 11. A data fixada pelas partes para marcação da escritura de compra e venda - Janeiro de 2018 –foi acordada entre as parte, de comum acordo, com base numa previsão futura e incerta de realização dos trabalhos em curso, tendo a R. sempre alertado o A., que disso ficou ciente e concordou, para a possibilidade de a escritura de compra e venda não se realizar em Janeiro de 2018 e respetiva entrega das chaves. 12. Acresce que, após a celebração daquele contrato promessa, o A. pretendeu novas alterações, na casa de banho pertencente à suite o A. pretendeu: louças diferente das previstas no projeto original, móvel completo suspenso vida100, diferente do previsto no projeto inicial, saraná com espelho 100x60 e APL 30, diferente do previsto no projeto inicial, na casa de banho de serviço: louças diferente das previstas no projeto original, móvel completo suspenso VIDA 80, diferente do previsto no projeto inicial, Saraná com espelho 80 x60 e APL 30, diferente do previsto no projeto inicial. 13. Mediante as novas alterações a R. novamente alertou o A. que a escritura de compra e venda não iria ocorrer em Janeiro de 2018, o que este concordou, ficou ciente e não se opôs. 14. A R. nunca garantiu ao A., que disso ficou conhecedor, que nos 14 meses seguintes, a contar da data da assinatura do contrato-promessa, concluiria as obras e providenciaria todos os documentos necessários à outorga da competente escritura definitiva de compra e venda a favor do A., no referido mês de Janeiro de 2018. 15. O A. avançou com o referido negócio porque efetivamente gostou do imóvel, da construção, do preço/qualidade face à localização, e ainda, da possibilidade de poder fazer as alterações que pretendia, dado o estado bruto da construção, o que lhe possibilitava ter uma fração ao seu gosto pessoal, e não na garantia de que a escritura de compra e venda seria realizada e, Janeiro de 2018. 16. Após a celebração do contrato de promessa o A. por várias vezes falou com o encarregado da obra o Sr. F. R., não tendo em nenhuma ocasião manifestado qualquer desagrado. 17. Desde a celebração do contrato de promessa que a R. esteve sempre a trabalhar na obra, nunca tendo suspendido ou parado os trabalhos, sendo certo que, sempre que pretendeu visitar a obra foram-lhe abertas as portas da edificação, uma vez que, apenas por uma questão de segurança a R. fechava as portas da edificação. 18. O contrato celebrado entre o autor e a ré é um típico contrato-promessa de compra e venda, que se rege pelas normas do art. 410º do Código Civil e pelas regras do contrato de compra e venda (arts. 874º e seguintes do mesmo diploma legal). 19. Atualmente, o contrato é perspetivado como uma relação obrigacional complexa - em que o dever de prestação (e o correlativo direito) é apenas um dos seus elementos, quiçá o mais importante – integrando um conjunto ou sistema de vínculos de diversa natureza, emergentes do facto constitutivo da obrigação e unificados pela sua comum afetação à realização do mesmo fim contratual, sendo que, o conteúdo da relação obrigacional complexa analisa-se em direitos (e correlativos deveres) principais de prestação – elemento fundamental dirigido à consecução do fim determinante do surgimento da relação obrigacional – e deveres secundários. 20. Nos anos de 2017 e 2018 as chuvas prolongaram-se por mais tempo do que o que é esperado e normal, o que tais condições climatéricas adversas muitas vezes impediram a A. de poder levar a cabo alguns trabalhos na obra daquela edificação, uma vez que, as boas práticas na realização de certos trabalhos, não permite que alguns deles sejam realizados com chuva ou ventos fortes, sendo que, por este motivo totalmente alheio à R., esta viu-se impedida de realizar todos trabalhos nos tempos previstos, o que contribuiu para o atraso na conclusão da obra. 21. A R. deu conhecimento ao A., através e-mail remetido pelo seu mandatário em 18 de Abril de 2018, dos motivos que levaram ao atraso:“2º Segundo a N/Cliente, este atraso ficou a dever-se às condições climatéricas adversas;3º E também ao facto de os materiais escolhidos pelo promitente comprador não estarem disponíveis”, informado que a R. tencionava outorgar a escritura pública de compra e venda e entregar a fração autónoma em finais de Julho de 2018 (31 de Julho), o que o A. aceitou. 22. Em 16 de Julho de 2018 a R. deu conhecimento à A. de que se encontrava agendada escritura de compra e venda da fração objeto do contrato de promessa de compra e venda para o dia 09-08-2018, pelas 10:00 horas na Casa ... na Conservatória do Registo Predial ..., tendo tal alteração se ficado a dever-se a três fatores totalmente alheios à R, sendo eles o Alvará de Autorização de Utilização n.º 97/18 requerido junto da Câmara Municipal ..., que só foi obtido em 11 de Junho de 2018, a Distribuidora de Energia ... ... – Distribuição, Energia, S.A. na ativação da luz ao prédio/edificação, e ainda, o facto de, nas conservatórias, não existirem datas disponíveis para a realização da escritura de compra e venda. 23. A R. em 09-02-2018 requereu junto da Distribuidora de Energia ... – Distribuição Energia, S.A. a ligação à rede BT para o empreendimento em causa nos presentes autos, tendo esta remetido os orçamentos errados, e nesta sequência, a R. de imediato se apressou em requerer junto da Distribuidora de Energia ... ... – Distribuição por novos orçamentos, devidamente retificados. 24. Uma vez que aqueles orçamentos tardavam a chegar a R. insistiu pelo envio dos mesmos, junto da Distribuidora de Energia ... - Distribuição, mais concretamente através da página Web Distribuidora de Energia ... ... Reclamações e ainda através da Linha de Apoio, sendo que, dado o tempo decorrido e a urgência que se veio a sentir por via dessa demora da Distribuidora de Energia ... ... – Distribuição, a R. em 11-06-2018 apresentou a devida reclamação no livro de reclamações, e apenas em 15-06-2018 a Distribuidora de Energia ... ... – Distribuição remeteu os orçamentos retificativos à R., que na mesma data os liquidou. 25. Apenas a meio do mês de Julho de 2018 é que a Distribuidora de Energia ... ... – Distribuição, Energia, S.A. iniciou os trabalhos, sendo certo que, apenas na última semana daquele mês de Julho de 2018 é que aquela é que foi feita a ligação à rede BT da edificação aqui em causa, tendo a R. estado 5 meses a aguardar que aquela Distribuidora de Energia ... ... procedesse à ligação, sendo assim o atraso totalmente alheio à R., pois que, sem aquela ligação não era possível à R. realizar a escritura de compra e venda. 26. A R. diligenciou, junto de todas as Conservatórias Casa ..., geograficamente próximas, por uma data para fins Julho de 2018, sem sucesso, tendo apenas logrado obter vaga para o dia 09 de Agosto de 2018 na Casa ... sita na Conservatória do Registo Predial ..., tendo a R. dado primazia ao A. sobre todas as demais escrituras que tinha de realizar. 27. No dia e hora agendados a R. compareceu naquela Casa ... da Conservatória do Registo Predial da …, não tendo o A. comparecido. 28. Os motivos que levaram a que apenas pudesse ser realizada escritura de compra e venda em 09-08-2018 foram totalmente alheios à R., sendo certo que os mesmos não se ficaram a dever à falta de conclusão das obras na edificação, uma vez que, as mesmas já se encontravam concluídas. 29. O A. procede à resolução, infundada diga-se, do contrato de promessa por não poder/querer aguardar por 9 dias (tempo que vai desde 31/07/2018 até 09/08/2018), sendo que o homem médio e comum não perderia o interesse na realização da escritura pública por 9 dias de diferença. 30. Inexistem danos não patrimoniais, uma vez que, o A., ou a sua família, nunca poderia ter ficado desiludido por algo que sempre soube poder não acontecer. 31. Da parte da R. não existe, como nunca existiu, qualquer incumprimento do contrato de promessa, nem do contrato prometido, muito menos em termos definitivos, nem a si imputáveis. 32. No que concerne ao contrato promessa, considera-se o mesmo cumprido quando, vencidas as obrigações, os obrigados à celebração do negócio prometido concluem este nos termos convencionalmente estabelecidos, o que supõe não apenas que celebrem tal negócio, como que este não sofra de qualquer vício ou disfunção suscetível de afetar a posição jurídico-patrimonial visada por cada um dos credores, relativamente à qual ele dispunha de uma expetativa jurídica. 33. O incumprimento definitivo enquadra-se numa situação de responsabilidade contratual do devedor e, como tal, baseia-se na culpa, apesar de presumida - art. 799º, nº 1, do Código Civil, sendo que, estar-se-á perante o incumprimento definitivo sempre que a prestação não tenha sido realizada e já não possa vir a sê-lo posteriormente. 34. De acordo com o disposto no art. 808º, n.º 1, do Código Civil, são duas as causas que podem estar na origem de tal situação: o credor perdeu objetivamente o interesse no cumprimento da prestação ou decorreu o prazo suplementar (admonitório) de cumprimento estabelecido pelo accipiens (acrescenta-se muitas vezes uma terceira causa: declaração expressa do devedor em não querer cumprir). 35. Estamos perante uma previsão de outorga da escritura em Janeiro de 2018, previsibilidade não se confunde com impreteribilidade, sendo manifesto que as partes com aquela cláusula não quiseram fixar uma data-limite e impreterível, uma vez que, ambas as partes (incluindo o A.) estavam cientes que a data como indicativa que era, podia não ser cumprida. 36. Apesar da previsão da conclusão da construção para Janeiro de 2018, e atendendo a que as partes convencionaram aquela data como meramente indicativa, não foi convencionado prazo final e essencial para a conclusão da construção nem para a outorga da escritura. 37. O comportamento do R. confirma o alegado pela A: de que o A. sabia que o prazo estipulado era meramente indicativo: Desde Janeiro de 2018 (data da alegada data) até Março de 2018 o A. nada disse ou questionou a R. sobre a realização da escritura; Apenas em Março de 2018 (mais de dois meses decorridos) é que o A. envia carta à R.; O R. aceitou a realização da escritura de compra e venda até ao final do mês de Julho de 2018. 38. O A. sabia, e tinha consciência, de que a data de Janeiro de 2018 era meramente indicativa, pois caso contrário, não demoraria dois meses para remeter carta à R., e não aceitava a realização da escritura para Julho de 2018. 39. Sobre a Ré impendia a obrigação de provar que a falta de cumprimento (a mora é um incumprimento temporário…) não procedia de culpa sua -art. 799º nº1 CC – o que logrou fazer com sucesso. 40. O Tribunal a quo entendeu, mal, que a data a considerar teria de ser Janeiro de 2018, no entanto, atendendo a todo o supra exposto quanto à data inicial (meramente indicativo), entende a R. que a data a considerar teria de ser a 31 de Julho de 2018 (por ter sido a data indicada pela R. para o efeito), e não qualquer outra, sendo certo que, atendendo àquela data de 31 de Julho de 2018, sempre se dirá que inexiste pelo R. qualquer interpelação admonitória, pois que, a comunicação anterior não está munida de tais efeitos conforme raciocínio supra explanado. 41. Prescreve o art. 808º nº1 CC que, se o credor, em consequência da mora, perder o interesse que tinha na prestação, ou esta for realizada dentro do prazo que razoavelmente for fixado pelo credor, considera-se para todos os efeitos não cumprida a obrigação. 42. Sustenta o A. haver perdido o interesse no contrato prometido, não bastando pois uma perda subjetiva de interesse na prestação, é necessário que essa perda de interesse transpareça numa apreciação objetiva da situação. 43. No caso dos autos, o A. visava com o contrato-promessa aquisição de uma fração, para a satisfação para futuro da necessidade de habitação familiar (prestação-resultado). 44. Apesar de no contrato – promessa constar a data de janeiro de 2018 para realização da escritura, apenas em Março de 2018 o A. enviou carta à R. a solicitar o agendamento de data, tendo a R. informado o A. que a escritura seria realizada até ao dia 31 de Julho de 2018, data com a qual o A. concordou., sendo que, devido à falta de vaga junto das conservatórias e Casas ..., a R. apenas logrou obter agendamento para o dia 09-08-2018, tendo dado conhecimento ao A., não só da data da escritura, como ainda, do motivo pelo qual não foi possível agendar para data anterior. 45. O A. foi indiferente ao impedimento de realização da escritura não ser por culpa a R., mas sim, pela falta de vaga nas conservatórias e Casa ..., e nessa sequência não compareceu na data agendada. 46. A intransigência do A. resultou de 9 dias, pois que, qualquer pessoa elementar e razoável bom senso (bonus pater familiae) que mantivesse o interesse na aquisição da fração em 31 de Julho de 2018 manteria o mesmo interesse 9 dias após aquela data. 47. O interesse do A. desapareceu, não por causa da mora, mas diretamente pela intransigibilidade do A. desprovida de razoabilidade quanto à diferença de 9 dias e os movidos a ela associados. 48. Sempre diremos que, se o interesse do A. era ter uma habitação alegadamente para si e para a sua família quando viessem a Portugal, a não realização da escritura por uma diferença de 9 dias, faz com que o mesmo tivesse ficado numa situação muito pior e mais prejudicial, pois que, teria de iniciar nova busca por habitação, aguardar a sua conclusão e realizar a escritura. 49. A necessidade de habitação - na qual radicam os motivos do A. que o determinou a celebrar o contrato-promessa e os fins por ele visado com o contrato de compra e venda prometido - continuava por satisfazer adequadamente, logo, presidindo à apreciação da perda de interesse na prestação uma perspetiva objetivista, forçoso é reconhecer que, não obstante a diferença de 9 dias desde a data aceite pelo A. (31 de julho) a daí decorrente razão de queixa do A. o interesse no cumprimento do contrato-promessa subsistia. 50. Celebrado o contrato-promessa de compra e venda de bem destinado a satisfazer necessidade permanente e duradoura – como é a de habitação - e incurso em mora o promitente vendedor, tal incumprimento temporário, só por si e independentemente da sua duração, não determina a perda objetiva de interesse no cumprimento daquele contrato. 51. Não se encontram verificados os requisitos de que depende a aplicação do disposto nos artigos 432º, n.º 1, 436, n.º 1, 442, n.º 2, 2ª parte e 808, n.º 1 todos do CC a favor do A, sendo a resolução do contrato promessa de compra e venda foi feita pelo A. de forma unilateral e sem justa causa, com expressa violação do disposto nas disposições conjugadas dos artigos 410º, 762º, 798º e 799º do CC. 52. O autor incumpriu definitivamente o contrato promessa celebrado, sendo que a não realização daquela escritura acarretou prejuízos para o A. que não viu receber o remanescente do valor acordado. 53. Em 02 de Agosto de 2018 o A. remeteu carta à R. a informar, ilicitamente e sem fundamento, da perda de interesse no imóvel em causa nos presentes autos, não tendo o A. comparecido, como devia, à escritura de compra e venda agendada para o dia 09 de Agosto de 2018. 54. Com o incumprimento do A. a R. se viu confrontada com o não recebimento do valor remanescente respeitante à venda da fração em causa nos presentes autos, sendo que, a mesma tinha encargos financeiros que não pode cumprir atempadamente por conta da não realização da escritura. 55. A R. teve de negociar a fração, mas por um valor consideravelmente inferior ao valor vendido ao A., uma vez que, as alterações que este último quis ver aplicadas diminuíram o seu valor. 56. Atendendo a que a R. já procedeu à venda da fração em causa, resta-lhe o direito a fazer sua a quantia entregue pelo A. a título de sinal e princípio de pagamento – artigo 442º, n.º 2 1ª parte do CC. 57. No contrato-promessa de compra e venda presume-se que tem carater de sinal toda a quantia entregue pelo promitente comprador ao promitente vendedor, ainda que a título de antecipação ou princípio de pagamento – artigo 441º do CC. 58. O A. já entregou à R. que recebeu e fez sua, a título de sinal, a quantia de € 19.800,00 (dezanove mil e oitocentos euros), pelo que, a R. tem o direito de fazer sua aquantia entregue pelo A. a título de sinal – artigo 442º, n.º 2, 1ª parte do CC, uma vez que, este A. incumpriu a obrigação de comparecer na escritura pública de compra e venda agendada para 09 de Agosto de 2018 pelas 10:00 horas na Casa ... na Conservatória do Registo Predial ..., por causa que só a ele lhe é imputável. 59. Verificou-se o incumprimento culposo por parte do Autor, e nessa sequência, deverá a sentença recorrida ser revogada e substituída por outra que julgue procedente a reconvenção. 60. A sentença deve ser revogada substituída por outra que absolva o R. do pedido e condene o A. no pedido da reconvenção. 61. O Tribunal recorrido violou, por erro de interpretação e aplicação o disposto nos artigos 410º, 762º, 798º e 799º, 432º, n.º 1, 436, n.º 1, 442, n.º 2, 2ª parte, 441º, 406º, 442º, 804º e 808, n.º 1 todos do Código Civil».
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O autor não apresentou contra-alegações.
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O recurso foi admitido como de apelação, a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito devolutivo.
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Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
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II. Delimitação do objeto do recurso
O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações do(s) recorrente(s), não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso e não tenham sido ainda conhecidas com trânsito em julgado [cfr. artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.ºs 1 e 2 do Código de Processo Civil (doravante, abreviadamente, designado por CPC), aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de junho].
No caso, apresentam-se as seguintes questões a decidir:
i) – Da impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto.
ii) – Do incumprimento definitivo do contrato-promessa imputável ao promitente vendedor; e, em caso de resposta negativa à questão antecedente,
iii) – Da resolução unilateral e sem justa causa do contrato-promessa por parte do promitente comprador.
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III. Fundamentos
IV. Fundamentação de facto.
A - A sentença recorrida deu como provados os seguintes factos:
1º O Autor decidiu adquirir um imóvel em Vila Real.
2º A Ré dedica-se à atividade de compra e venda de imóveis, sendo que no caso do imóvel em causa, também foi responsável pela construção.
3º Em 02 de novembro de 2016, através de documento escrito, o Autor e a Ré celebraram “Contrato-Promessa de Compra e Venda”.
4º O Autor prometeu comprar à Ré e esta prometeu vender o imóvel, em construção, constituído pela Fração Autónoma designada pela letra “X”, integrante do prédio urbano sob o regime de propriedade horizontal, sito na Quinta do ..., Edifício ..., Entrada .., Lote .., freguesia e concelho de Vila Real, descrito na conservatória do registo Predial ... sob o n° ..., inscrito na respetiva matriz predial urbana sob o n° ... da União das Freguesias ..., o qual proveio do artigo ... da freguesia da ..., extinta.
5º O preço de venda ajustado no referido contrato, foi no valor de € 132.000,00 (cento e trinta e dois mil euros), por conta do qual o Autor pagou à Ré, a título de sinal e princípio de pagamento, a quantia no valor de € 19.800,00 (dezanove mil e oitocentos euros), através de cheque.
6º Os restantes € 112.200,00 (cento e doze mil e duzentos euros), seriam pagos no ato da escritura definitiva de compra e venda, tendo sido previsto no referido contrato promessa que a sua outorga deveria realizar-se no mês de janeiro de 2018, contra a entrega das respetivas chaves da fração prometida vender.
7º Aquando do início das negociações que culminaram na celebração do referido contrato-promessa, as partes acordaram alterações no projeto inicial apresentado ao Autor, alterações essas que constam da planta anexa ao referido contrato promessa, e que foram tidas em conta pela Ré para fixação do prazo para outorga da escritura definitiva e entrega das chaves, constante do referido contrato-promessa, que foi elaborado pela própria Ré.
8º Era interesse do Autor, acompanhado de sua família, passar a Páscoa e o verão de 2018, já na referida fração.
9º Não foi possível realizar a escritura de compra e venda na data acordada no contrato-promessa, por a obra não estar terminada.
10º Apesar de frustrado com a não realização da escritura, o Autor deslocou-se a Portugal no mês de março de 2018 para saber do andamento da obra e para escolha de equipamentos e mobiliários para a fração, mantendo assim o interesse na outorga da escritura.
11º Quando foi visitar a obra deparou-se com o seu estado de aparente abandono.
12º Assim, em 23 de março de 2018, o Autor enviou uma carta registada à Ré a referir que a mesma se encontrava em mora quanto à entrega do imóvel nos termos do referido contrato-promessa (janeiro de 2018), bem como que tal mora seria convertida em incumprimento definitivo se até o dia 30 de Abril de 2018 não fosse outorgada a competente escritura pública, momento em que deixava, definitivamente, de ter interesse no negócio, bem como ficava a Ré notificada que deveria devolver o sinal recebido, em dobro, nos termos da Cláusula Oitava do referido contrato-promessa.
13º A Ré, através de e-mail datado de 18 de abril de 2018, informou ao Autor que a outorga da escritura de compra e venda estava prevista para o final do mês de julho de 2018.
14º O autor concordou com a prorrogação proposta pela Ré, sendo que essa seria a última.
15º O Autor aguardou pelo novo prazo dado pela Ré, sob a condição de que impreterivelmente o mesmo fosse cumprido, o que foi informado à Ré em 08 de Maio de 2018, pelo que se encontrava em Portugal na data indicada pela Ré, assumindo encargos com estadias.
16º O autor começou a suspeitar da boa fé da Ré e foi perdendo interesse na outorga da escritura de compra e venda, dado o adiamento e a nítida lentidão no avanço das obras.
17º Em 16 de julho de 2018, a Ré comunicou ao Autor que a escritura somente poderia ser outorgada no mês de agosto de 2018.
18º Perante tal informação, o Autor informou a Ré que ratificava e aceitava o prazo anteriormente por ela estabelecido, ou seja, fim do mês de julho de 2018, e que não aceitaria mais outra alteração.
19º A esposa do Autor encontrava-se internada em França, pelo que o prolongamento da sua estadia em Portugal estava a tornar-se insuportável.
20º O Autor não tinha mais condições de crer em mais uma promessa por parte da Ré a propor novas datas de entrega da fração e de outorga da escritura definitiva de compra e venda.
21º Devido aos atrasos, o autor teve que suportar pagamentos de estadias em hotéis e residenciais.
22º O Autor perdeu completamente o interesse na efetivação do contrato prometido, vendo a Ré como alguém sem credibilidade.
23º Em 02 de agosto de 2018, o autor remeteu carta registada com aviso de receção à Ré a relatar toda a situação, comunicando a resolução do contrato, sendo que ao deslocar-se à Câmara Municipal ... obteve a informação verbal de que a fração já tinha licença de utilização desde 11 de junho de 2018.
24º Ainda na referida missiva, nos termos da Cláusula Oitava do referido contrato promessa, o autor arguiu o incumprimento definitivo do contrato-promessa por parte da Ré e exigiu a devolução do sinal pago, em dobro, a totalizar a quantia no valor €39.600,00 (trinta e nove mil e seiscentos euros).
25º O Autor perdeu toda a confiança na competência, responsabilidade e idoneidade da Ré.
26º Aquando do início das negociações que culminaram com a celebração do contrato promessa, a edificação em causa ainda se encontrava na fase de construção.
27º A ré ainda se encontrava a proceder aos trabalhos de construção, para só depois de concluída esta fase, poder iniciar a fase dos acabamentos.
28º O autor avançou com o negócio porque gostou do imóvel, da construção, do preço/qualidade face à localização, e ainda, da possibilidade de poder fazer as alterações que pretendia, dado o estado bruto da construção, o que lhe possibilitava ter uma fração ao seu gosto pessoal.
29º Em todas as deslocações que o autor fez à edificação, incluindo a alegada deslocação de 16 de julho de 2018, se encontravam funcionários da ré a trabalhar na obra.
30º A ré deu conhecimento ao autor, através de e-mail de 18 de abril de 2018, dos alegados motivos que levaram ao atraso, tendo referido que: “2º Segundo a N/Cliente, este atraso ficou a dever-se às condições climatéricas adversas; 3º E também ao facto de os materiais escolhidos pelo promitente comprador não estarem disponíveis”.
31º No mesmo e-mail, o autor é informado que a ré tencionava outorgar a escritura pública de compra e venda e entregar a fração autónoma em finais de julho de 2018 (31 de julho), o que o autor aceitou.
32º Em 16 de julho de 2018, a ré deu conhecimento ao autor de que se encontrava agendada escritura de compra e venda da fração objeto do contrato promessa de compra e venda, para o dia 09-08-2018, pelas 10.00 horas, na Casa ... na Conservatória do Registo Predial ....
33º O Alvará de Autorização de Utilização nº 97/18 requerido junto da Câmara Municipal ..., foi obtido em 11 de junho de 2018.
34º A ré requereu, em 09-02-2018, a ligação à rede BT para o empreendimento em causa, e procedeu ao pagamento das taxas devidas por conta de tal pedido.
35º Em 23-03-2018, a Distribuidora de Energia ... ... Distribuição procedeu ao envio dos respetivos orçamentos para os Lotes 8B e 8C, mas estes estavam errados.
36º A ré, de imediato, requereu junto da Distribuidora de Energia ... ... Distribuição, novos orçamentos, devidamente retificados, insistindo pelo envio dos mesmos, porque tardavam em chegar, tendo sempre sido informada que de facto, os orçamentos estavam errados, que iam ser enviados novos orçamentos e que aguardasse.
37º Com o decorrer do tempo, a ligação à BT veio a mostrar-se urgente, uma vez que sem aquela ligação à rede BT, as escrituras não se poderiam realizar.
38º Dado o tempo decorrido, em 11-06-2018, a ré apresentou reclamação no Livro de Reclamações.
39º Apenas em 15-06-2018, a Distribuidora de Energia ... ... remeteu os orçamentos retificados à ré que, na mesma data, os liquidou.
40º Em 28 de junho de 2018, a ré apresentou nova reclamação junto da Distribuidora de Energia ... ... Distribuição Energia, S.A.
41º Apenas a meio do mês de julho de 2018 é que a Distribuidora de Energia ... ... – Distribuição Energia, S.A. iniciou os trabalhos, e apenas na última semana do mês de julho de 2018 é que foi feita a ligação à rede BT da edificação em causa.
42º Sem a ligação da edificação à rede BT, não era possível à ré agendar nem realizar as escrituras de compra e venda.
43º Nas conservatórias não existiam datas disponíveis para a realização da escritura de compra e venda.
44º A ré diligenciou junto de todas as Conservatórias Casa ..., geograficamente próximas, por uma data para fins de julho de 2018, sem sucesso, tendo, apesar dos esforços, apenas logrado obter vaga para o dia 9 de agosto de 2018.
45º Apesar de a ré ter de diligenciar pela marcação de escrituras de outras frações, reservou essa primeira data que obteve, para a celebração da escritura com o autor.
46º No dia e hora agendados, a ré compareceu na Casa ..., não tendo o autor comparecido.
47º A não realização da escritura teve como consequência que a ré não recebeu do autor o remanescente do valor acordado.
48º O facto de a Distribuidora de Energia ... ... ter demorado cinco meses para a ligação à rede BT, não era impeditivo para a continuação da obra.
49º Em momento algum, a ré comunicou tal facto ao Autor, de modo a justificar o atraso.
50º Apenas em Fevereiro de 2018, a ré solicitou tal ligação à Distribuidora de Energia ....
51º O facto de “apenas ter obtido Alvará de Autorização de Utilização em 11 de junho de 2018”, era perfeitamente compatível com a data que a própria Ré acabou por indicar para a outorga do contrato prometido – 31 de Julho de 2018.
52º A Ré é proprietária do imóvel descrito sob o nº .../19990208 desde 26/10/2012 – data do registo da aquisição, e a propriedade horizontal já se encontrava averbada no registo desde 10/10/2017, por AP 2495, sendo que o modelo 1 de IMI foi entregue em 06/10/2017, conforme consta da Caderneta Predial Urbana, no campo “Dados de Avaliação”.
53º Em fins de Julho de 2018, a Ré estava em condições de fazer a escritura de compra e venda.
54º A Ré não procurou agendar a escritura em qualquer Notário.
55º O atraso da ré na marcação da escritura foi de sete (7) meses.
56º A Ré indicou para a celebração do contrato prometido, além de janeiro de 2018, o dia 31 de julho de 2018, sendo que incumpriu ambas as datas.
57º O autor aceitou a outorga da escritura definitiva no final do mês de julho de 2018, mas expressamente comunicando que era a última hipótese de cumprimento que era facultada à Ré, e informando, de forma categórica, que abandonaria o país no final desse mês, sobretudo devido ao facto de a sua esposa ter sido internada num hospital, em França, e precisar de a acompanhar, não podendo mais sujeitar-se ao arbítrio dos prazos, e sucessivas prorrogações ditadas pela Ré.
58º Perdendo assim, definitivamente, o interesse no negócio, como veio efectivamente a acontecer.
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- E deu como não provados os seguintes factos:
a- Aquando do início das negociações que culminaram na celebração do referido contrato-promessa, a Ré informou que a edificação supra referida estava em fase final de construção, nomeadamente na fase dos acabamentos, o que o Autor verificou e confirmou pessoalmente, e por esse motivo se interessou em adquiri-la.
b- O Autor somente avançou com o referido negócio pelo facto de a Ré ter garantido que no mês de janeiro de 2018 entregaria o dito imóvel pronto e acabado.
c- O Autor deslocou-se a Portugal várias vezes no ano de 2017 e, desde que celebrou o contrato-promessa, com frequência passava alguns dias em Vila Real, para saber do andamento das obras e para falar com o encarregado das mesmas, o Sr. F. R..
d- Quando o Autor se deslocava à obra, não via grande evolução da mesma, parecia que a construção sempre esteve do mesmo estado de quando da primeira vez que a visitou, antes de celebrar com a Ré o contrato-promessa, bem como não encontrava os trabalhadores em atividade.
e- Essa situação causou preocupação e estranheza ao Autor, pois estava a ver o tempo passar e pelo andamento das obras seria impossível a Ré cumprir com o prazo por ela própria estipulado no contrato-promessa para entrega da fração prometida vender e outorga da escritura de compra e venda definitiva, o que se confirmou com a
f- A seguir ao dia 16 de julho de 2018, o Autor deslocou-se à obra e verificou o seu andamento e confirmou pessoalmente do seu estado de total abandono.
g- Com deslocações a estabelecimentos comerciais localizados nos municípios do Porto e de Paços de Ferreira, para obter orçamentos para adquirir o mobiliário para a fração, o autor viajou mais de 700 km em viatura própria, arcando com portagens, combustível e consequente desgaste do automóvel, o que no total representa uma despesa que ascende a pelo menos € 250,00 (duzentos e cinquenta euros).
h- O autor fez inúmeras deslocações à edificação em construção para aferir da evolução da mesma, e na maioria das vezes não lhe foi permitido o acesso ao mesmo pelo facto de não haver ninguém a trabalhar na obra.
i- O autor suspeitou mesmo e fundadamente da qualidade da construção, sendo que na última deslocação à obra verificou que o piso de acesso às garagens subterrâneas se encontrava degradado, apesar de a Ré prometer o contrário, sendo que também lhe caiu mal a justificação para o atraso dada pelo construtor Sr. F. R. pelas alterações do projeto acordadas com o Autor antes mesmo da outorga do contrato-promessa de compra e venda.
j- A ré alertou o autor que, dadas as alterações pretendidas, as mesmas iriam atrasar a entrega atempada da fração em causa.
l- Porque a ré já havia pré-encomendado todos os materiais que haviam sido inicialmente projetados.
m- Para levar a cabo as alterações pretendidas pelo autor, a ré teria de recorrer aos fornecedores, ficando à mercê do stock destes.
n- A data fixada para a realização da escritura de compra e venda foi acordada entre as partes, de comum acordo, com base numa previsão futura e incerta de realização dos trabalhos em curso.
o- Não obstante a data acordada pelas partes, a ré sempre alertou o autor, que disso ficou ciente e concordou, para a possibilidade de a escritura de compra e venda não se realizar em janeiro de 2018 e respetiva entrega das chaves.
p- Tendo o autor disso ficado ciente, concordando e sem se opor.
q- Após a celebração do contrato promessa, o autor pretendeu novas alterações à fração.
r- Na casa de banho pertencente à suite, o autor pretendeu louças diferentes das previstas no projeto original; móvel completo suspenso VIDA 100, diferente do previsto do previsto no projeto inicial; saraná com espelho 100x60 e APL 30, diferente do previsto no projeto inicial.
s- Na casa de banho de serviço, o autor pretendeu: louças diferentes das previstas no projeto original; móvel completo suspenso VIDA 80, diferente do previsto do previsto no projeto inicial; saraná com espelho 80x60 e APL 30, diferente do previsto no projeto inicial.
t- Mediante estas novas alterações, a ré novamente alertou o autor de que a escritura de compra e venda não iria ocorrer em janeiro de 2018.
u- O que mais uma vez, o autor concordou, ficou ciente e não se opôs.
v- Após a celebração do contrato promessa, o autor, por várias, vezes, falou com o encarregado da obra, Sr. F. R., não tendo em nenhuma ocasião manifestado qualquer desagrado.
x- Desde a celebração do contrato promessa que a ré esteve sempre a trabalhar na obra, nunca tendo suspendido ou parado os trabalhos.
z- Sempre que o autor solicitou a visita, foram-lhe abertas as portas da edificação, que por questões de segurança e precaução, estavam fechadas.
aa- Só que os funcionários encontravam-se no interior da obra, a realizar trabalhos no interior da mesma.
bb- Nos anos de 2017 e 2018, as chuvas prolongaram-se por mais tempo do que é o esperado e normal, com chuvas fortes e ininterruptas durante vários dias, tempestades e até neve, condições climatéricas que muitas vezes impediram a ré de poder levar a cabo alguns trabalhos na obra.
cc- Por este motivo, a ré não pode realizar todos os trabalhos nos tempos previstos, o que contribuiu para o atraso na conclusão da obra.
dd- Até ao envio da comunicação datada de 23 de março de 2018, o autor nunca havia demonstrado qualquer desagrado.
ee- A alteração da data, de finais de julho de 2018 (31 de julho) para 09-08-2018, ficou a dever-se a três fatores, totalmente alheios à ré.
ff- A ré tinha encargos financeiros que não pode cumprir atempadamente por conta da não realização da escritura, pelo que sentiu necessidade de colocar no mercado a fracção em causa, por um valor consideravelmente inferior.
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V. Fundamentação de direito.
1. Da impugnação da matéria de facto.
1.1. Em sede de recurso, a apelante impugna a decisão sobre a matéria de facto proferida pelo tribunal de 1.ª instância.
Para que o conhecimento da matéria de facto se consuma, deve previamente o/a recorrente, que impugne a decisão relativa à matéria de facto, cumprir o (triplo) ónus de impugnação a seu cargo, previsto no artigo 640º do CPC, o qual dispõe que:
“1- Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição: a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados; b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida; c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas. 2- No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte: a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respectiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes; b) Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes. 3 - O disposto nos n.ºs 1 e 2 é aplicável ao caso de o recorrido pretender alargar o âmbito do recurso, nos termos do n.º 2 do artigo 636.º.».
Aplicando tais critérios ao caso, constata-se que a recorrente indica quais os factos que pretende que sejam decididos de modo diverso, inferindo-se por contraponto a redação que deve ser dada quanto à factualidade que entende estar mal julgada, como ainda o(s) meio(s) probatório(s) que na sua ótica o impõe(m), incluindo, no que se refere à prova gravada em que fazem assentar a sua discordância, a indicação dos elementos que permitem a sua identificação e localização, procedendo inclusivamente à respectiva transcrição de excertos dos depoimentos testemunhais e das declarações de parte da legal representante da ré que considera relevantes para o efeito, pelo que podemos concluir que cumpriu suficientemente o triplo ónus de impugnação estabelecido no citado art. 640º.
*
1.2. Sob a epígrafe “Modificabilidade da decisão de facto”, preceitua o art. 662.º, n.º 1, do CPC, que «a Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa».
Aí se abrangem, naturalmente, as situações em que a reapreciação da prova é suscitada por via da impugnação da decisão sobre a matéria de facto feita pelo recorrente.
O âmbito da apreciação do Tribunal da Relação, em sede de impugnação da matéria de facto, estabelece-se, resumidamente, de acordo com os seguintes parâmetros (1):
- só tem que se pronunciar sobre a matéria de facto impugnada pelo recorrente;
- sobre essa matéria de facto impugnada, tem que realizar um novo julgamento;
- nesse novo julgamento forma a sua convicção de uma forma autónoma, de acordo com o princípio da livre apreciação das provas, mediante a reapreciação de todos os elementos probatórios que se mostrem acessíveis (e não apenas os indicados pelas partes).
- a reapreciação da matéria de facto por parte da Relação tem que ter a mesma amplitude que o julgamento de primeira instância.
- a intervenção da Relação não se pode limitar à correção de erros manifestos de reapreciação da matéria de facto, sendo também insuficiente a menção a eventuais dificuldades decorrentes dos princípios da imediação, da oralidade e da livre apreciação das provas.
- ao reapreciar a prova, valorando-a de acordo com o princípio da livre convicção, a que está também sujeita, se conseguir formar, relativamente aos concretos pontos impugnados, uma convicção segura acerca da existência de erro de julgamento da matéria de facto, deve proceder à modificação da decisão.
- se a decisão factual do tribunal da 1ª instância se basear numa livre convicção objetivada numa fundamentação compreensível onde se optou por uma das soluções permitidas pela razão e pelas regras de experiência comum, a fonte de tal convicção - obtida com benefício da imediação e oralidade - apenas poderá ser afastada se ficar demonstrado ser inadmissível a sua utilização pelas mesmas regras da lógica e da experiência comum.
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1.3. Por referência às suas conclusões, extrai-se que a Ré/recorrente pretende (2):
i) - a alteração da resposta positiva para negativa dos pontos 7º, 8º, 9º, 10º, 11º, 14º, 15º, 16º, 18º, 19º, 20º, 21º, 22º, 25º, 48º, 49º, 50º, 51º, 53º, 54º, 55º, 56º, 57º, 58ºda matéria de facto provada da decisão recorrida;
ii) - a alteração da resposta negativa para positiva dos itensl, m, n, o, p, q, r, s, t, u, v, x, z, aa, bb, cc, dd, ee e ffda matéria de facto não provada da decisão recorrida (3).
Defende a recorrente que se impõe a modificação da matéria de facto em função das declarações de parte da legal representante da Ré, T. R., dos depoimentos das testemunhas M. G. e A. T., e da prova documental composta pelos documentos n.ºs 1, 6, 7 e 8 juntos com a petição inicial, documentos n.ºs. 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9, 10 e 11 juntos com a contestação, documentos juntos pela Distribuidora de Energia ... ... Distribuição em 16/01/2020 e CD junto pela Câmara Municipal ....
Cumpre, pois, analisar das razões de discordância invocadas pela apelante e se as mesmas se apresentam de molde a alterar a facticidade julgada como não provada, nos termos por si invocados.
Antes, porém, de iniciarmos essa análise importa deixar assinalado que, com vista a ficarmos habilitados a formar uma convicção autónoma, própria e justificada, procedemos à audição integral da gravação dos depoimentos (declarações de parte e testemunhais) invocados na apelação como justificadores da impugnação da matéria de facto, bem como aos que foram aduzidos na motivação da sentença recorrida, não nos tendo restringido aos trechos parcelares e/ou truncados (de tais depoimentos) assinalados pela apelante.
Para além disso, foram analisados todos os documentos produzidos nos autos.
E, no caso vertente, após a audição integral de tais depoimentos prestados e análise de toda a prova documental produzida, desde já podemos adiantar ser de sufragar, na sua essencialidade, a valoração/apreciação explicitada pelo Tribunal recorrido, o qual – contrariamente ao propugnado pela recorrente –, em obediência ao estatuído no art. 607º, n.º 4 do CPC, fez uma análise crítica objetiva, articulada e racional da globalidade da prova produzida, que se mostra condizente com as regras da experiência comum e da normalidade da vida, logrando alcançar nos termos do n.º 5 do citado normativo uma convicção quanto aos factos em discussão que se nos afigura adequada, lógica e plausível, em termos que (como melhor explicitaremos) nos merece adesão praticamente total.
Vejamos.
Iniciando a nossa análise pelas declarações de parte da legal representante da ré, T. R., confirmou esta o interesse do autor na aquisição da fracção em causa, a celebração do contrato promessa e o recebimento, pela ré, do sinal. Declarou que, na altura o edifício estava “em esqueleto” (“no tosco, tinha a estrutura e as paredes”) e que o autor pretendeu algumas alterações à arquitectura do apartamento (por ex., demolição e construção de paredes, construção de armário, aumento da casa de banho, redução da dimensão do quarto), admitindo que tal foi antes da celebração do contrato promessa. Afirmou, porém, que posteriormente à outorga do contrato promessa o autor quis escolher louças sanitárias, móveis de casa de banho, bancadas e os próprios resguardos do duche, já na fase de acabamentos, tendo-se sido dito que tais alterações poderiam implicar o atraso na execução da obra, porque os materiais não estavam disponíveis no mercado.
Mais declarou a legal representante da ré que o autor nunca referiu que o prazo inicial previsto, janeiro de 2018, fosse questão essencial para a celebração do negócio, até porque ambos sabiam que poderia haver um ajuste. O autor sempre foi recebido, quando queria ver a obra, a qual nunca esteve parada, e que nunca houve qualquer tipo de atrito com este cliente. Referiu, sim, alguns contratempos devidos ao mau tempo no inverno (o que perturbou os trabalhos no exterior) e disse que a obra foi atrasando também por causa da Distribuidora de Energia ..., que, além de ter remetido orçamentos errados, que tiveram de ser corrigidos, atrasou a conclusão da baixada tendente a instalar luz no prédio, o que impedia a empresa de pôr o prédio com luz definitiva (sem a baixada não conseguiam ter o elevador a funcionar, os portões da garagem e não tinham condições de pôr lá ninguém a morar). Disse que o autor começou a pressionar (há uma carta em março – a de fls. 17 v.º e 18), que a ré insistiu com a Distribuidora de Energia ... ..., que na Câmara estava tudo tratado já em junho, e que comunicou ao autor que fariam a escritura até final do mês de julho, o que não foi possível por falta de agenda das Conservatórias. Tendo inicialmente dito que essa falta de disponibilidade do agendamento se verificou também nos Cartórios, posteriormente esclareceu que apenas tentou marcações nas Conservatórias e não em qualquer Cartório Notarial (por ser prática da empresa marcar apenas nas Conservatórias, através do instrumento da Casa Segura).
Confirmou que a escritura ficou agendada para o dia 9 de agosto de 2018, o que foi comunicado ao autor no dia 16 ou 17 de julho, mas este, que se mostrou sem margem de manobra, pois queria a celebração da escritura até ao dia 31 de julho e que declarou que não esperava nem mais um dia, enviou uma carta a indicar que perdeu o interesse no negócio e que não iria à escritura, não tendo, de facto, comparecido na Conservatória da … no dia agendado. Posteriormente, por o negócio se ter gorado, a empresa colocou o apartamento à venda e acabou por vendê-lo, em dezembro de 2018, a um preço inferior, no caso por € 117.500,00, porque as alterações pedidas pelo autor não agradavam à generalidade dos clientes.
Confirmou que a ré requereu a ligação da baixada à Distribuidora de Energia ... em fevereiro de 2018 e que o último apartamento daquele prédio (num total de 25 fracções autónomas) a ser vendido ocorreu em janeiro de 2019.
O autor, A. J., inquirido em sede de declarações de parte, declarou, entre o mais, que a razão da escolha daquele apartamento radicou no facto de estar ainda em construção – não queria um prédio já construído –, para poder fazer modificações antes de ser ultimado.
Celebrou o contrato com base na análise do projecto.
À data, na fachada do prédio estavam já montados os andaimes, assim como o tijolo e as varandas. Não tinha janelas, nem portas e estava tudo fechado, sendo que o F. R. não lhe quis mostrar o apartamento (por ser perigoso e ter de observar certas regras de segurança, o que o declarante disse compreender, por ter trabalhado em França no sector da construção civil).
Antes de assinar o contrato promessa pediu alterações (muro e portas), o que foi aceite.
Afirmou que não pediu quaisquer outras alterações para além dessas, apenas tendo ido escolher os materiais para as casas de banho, mas isso ficou logo acordado. Negou que alguma vez a ré tivesse dito que os materiais escolhidos podiam atrasar a obra.
O F. R., encarregado da obra,disse-lhe para ao fim de um ano vir cá para irem escolher os materiais a Viseu, à Porcela…, com quem a empresa trabalhava.
Esteve em Portugal de 4 a 9 de setembro de 2017, juntamente com a mulher, para escolher os materiais. Marcaram entrevista com o F. R. junto do prédio, mantendo-se os andaimes montados e nada tendo sido feito na frente do prédio. Declarou ter ficado chateado com a evolução da obra, porque nem daqui a dois anos estaria acabado. O F. R., enervado, disse ao declarante que o máximo que a obra podia estar atrasada era um mês, mais lhe dizendo que não podia ir com ele a Viseu, porque estava atarefado e recomendando-lhe uma empresa sita em Vila Real (a Y) onde podia escolher os mosaicos da cozinha, à qual o declarante se dirigiu.
Deslocou-se também à empresa R. M. onde escolheu os móveis (levando as respectivas referências).
Nas lojas não lhe disseram que a disponibilização de tais materiais iria demorar muito tempo, nem o F. R. (ou alguém da Ré) alguma vez lhe disse isso.
Como a escritura era para ser assinada em janeiro de 2018 e uma vez que a ré não enviou – como estava obrigada – carta a comunicar-lhe a data do agendamento da escritura, em face do atraso o declarante decidiu vir a Portugal em abril de 2018, a fim de se inteirar da situação do andamento da obra.
Quando regressou, o prédio estava praticamente no mesmo estado como estava em setembro de 2017, ainda com os andaimes montados.
A filha e os netos tinham intenção de vir cá passar uns dias no mês de junho ao apartamento.
Ao chegar a Portugal tentou contactar por diversas vezes o empreiteiro F. R. por telefone, sem êxito. Foi inclusivamente ao escritório da empresa, não tendo conseguido falar com ele, mas tão só com a secretária, que uma vez lhe disse que foram as intempéries que impediram a conclusão do prédio (nunca lhe foi referido que o atraso tinha sido por causa da Distribuidora de Energia ... ...).
Esteve em Portugal de abril a julho, onde andou a ver casas de móveis, para mobilar a casa depois de adquirida.
Em abril de 2018, deu até ao mês de maio para a celebração da escritura (por o F. R. lhe ter dito que a obra só estava atrasada um mês). Este referiu que o prazo concedido era um bocado justo e o A. disse-lhe que esperava até ao fim de julho, mas nem mais um dia.
Permaneceu em Portugal de abril a julho de 2018, tendo ficado hospedado na residencial M. C..
Nesse período, não obstante todos os dias passar junto da obra, nunca se apercebeu da entrada e/ou saída de funcionários, nem viu ser efectivado o descarregamento de material, estando tudo fechado.
Disse que decidiu não aceitar fazer a escritura para lá do dia 31 de julho, já que perdeu a confiança na ré e deixou de querer o apartamento, tendo ficado desiludido.
Tendo 76 anos de idade, contava vir passar a reforma naquele apartamento a Portugal.
A mulher estava hospitalizada em França e isso também o desanimou um bocado, por não poder permanecer cá mais tempo, uma vez que reside distanciado das filhas cerca de 200 km. Aguardou até ao fim de julho como estava previsto e teve de se ir embora a fim de dar assistência à mulher.
A testemunha E. G., reformado, residente em Vila Pouca de Aguiar, que foi colega de trabalho do autor em França, limitou-se a referir que este contava comprar um apartamento e Portugal e estava contente com isso.
O Autor tinha duas filhas que casaram com franceses, as quais contavam vir cá passar uns dias de férias.
Tem conhecimento que, em 2018, em maio/junho, o autor esteve em Portugal para fazer a escritura, referindo que a Ré não cumpria as datas.
Ele foi embora porque a mulher estava hospitalizada e ele perdeu interesse naquilo.
A testemunha M. G. - funcionária de escritório do grupo do qual a ré faz parte, tendo como função tratar com os clientes e fornecedores, e encomendas de matérias, parte de contabilidade, recebimentos - assistiu à aposição da assinatura do contrato promessa objecto dos autos, por ter sido realizada no escritório da Ré.
Declarou que a sede da Ré está, como sempre esteve, de porta aberta e que atendeu alguns telefonemas do autor, tendo-se este deslocado à sede da R. algumas vezes. Admitiu que, em março de 2018, ou seja, já depois da data acordada para a realização da escritura, a obra estaria um “bocadinho atrasada”, por causa do mau tempo nesse ano “e que talvez eles estivessem um bocadinho preocupados com a realização da escritura”, pelo que, depois de se entrar em contacto com o advogado do A., a escritura foi agendada para o fim de julho de 2018.
Afirmou que os atrasos na conclusão da obra também foram por causa da Câmara (no tocante a licenças de utilização), dos materiais escolhidos pelo autor, mas, sobretudo, da Distribuidora de Energia ... ....
A escritura foi marcada para 9 de agosto de 2018, na Casa ... (Conservatória) de …, porque não conseguiu marcação em data anterior (que lhe permitisse cumprir a data de 31 de julho), em nenhuma das cinco Casas ... (Conservatórias) onde tentou marcar.
Reconheceu não ter contactado Cartórios Notariais para agendar a escritura definitiva de modo a poder cumprir o prazo de celebração da escritura até 31/07.
Disse, ainda, que o autor, quando avisado da data, disse logo que não ia comparecer, mais referindo que o apartamento em causa naquela data estava pronto e foi vendido em dezembro de 2018, mas por preço mais baixo, devido aos materiais (“antiquados”) escolhidos pelo autor.
Reconheceu que o atraso na disponibilidade para vender foi de sete meses, sendo que cerca de 3 (três) meses de atraso seriam da responsabilidade do A. por causa da escolha dos móveis e o restante da responsabilidade da Distribuidora de Energia ... (“mais de meio ano”) e da licença de utilização.
Por fim, a testemunha A. T., engenheira civil, que presta serviços à ré, tendo sido a responsável técnica da obra por parte da construtora pelo Edifício ... desde que foi retomada a obra (cuja licença data de 3/11/2016).
Declarou nada saber quanto à venda dos apartamentos.
Disse saber qual é a fração em causa, que sofreu alterações a pedido do autor (de que tem conhecimento, por ter sido ela quem desenhou as alterações que o A. pediu), o que a tornou menos interessante para venda ao consumidor médio (depreciou o prédio).
Adiantou que a obra nunca parou, só acontecendo pontualmente por motivos de força maior quando as condições climatéricas não permitiam o avançar da mesma (por exemplo, quando era para colocar a cobertura e choveu).
Disse que andavam sempre vários trabalhadores na obra e os andaimes só foram retirados após a parte exterior estar toda concluída.
Afirmou que a obra ficou pronta em junho de 2018, mas faltavam as ligações para o lote da eletricidade, água e gás, sendo certo que contavam que as infraestruturas estivessem feitas até ao prédio, mas não estavam.
Esclareceu que a licença de utilização é de 11 de junho de 2018, pelo que a obra estava pronta antes. Reportou a demora da Distribuidora de Energia ... ..., à qual a ré foi alheia, já que demorou muito, quando costuma demorar apenas cerca de um mês, tendo sido pedida a ligação, em fevereiro.
Confirmou que o apartamento foi já vendido, embora por preço inferior (não sabendo, porém, o concreto valor por que foi vendido).
Disse que, segundo as “legis artis”, de novembro de 2016 a janeiro de 2018 era uma data razoável para ter a obra pronta, mas que os sete meses a mais não foram da responsabilidade da ré.
Referiu que só depois de a obra estar pronta é que pode pedir as ligações à rede de gás, abastecimento de água, ligação de esgotos e à rede das águas pluviais.
As referidas ligações estavam prontas antes do fim de julho; quanto à electricidade o processo ficou resolvido em junho, mas a execução do ramal demorou mais tempo.
Da prova documental:
- Documento n.º 1 junto com a petição inicial (cfr. fls. 8 v.º e 9), intitulado “Contrato Promessa de Compra e Venda”:
Do referido documento destacam-se, com relevância para o caso dos presentes autos, os seguintes elementos:
i) A Primeira Outorgante (ora apelante), pelo presente contrato, prometeu vender ao Segundo Outorgante (ora apelado), que àquela prometeu adquirir, o imóvel em causa nos presentes autos livre de quaisquer ónus ou encargos, pelo preço global de € 132.000,00 – Cl.ª 2ª.
ii) O preço será a liquidar da seguinte forma (Cl.ª 3ª):
a) Como sinal e princípio de pagamento, o Segundo Outorgante entregou à Primeira Outorgante, na data da assinatura daquele Contrato-Promessa, a quantia de € 19.800,00.
b) O restante valor em dívida de € 112.200,00, será pago pelo Segundo Outorgante á Primeira Outorgante, no ato da escritura definitiva de compra e venda.
iii) A escritura pública de compra e venda ficou de realizar-se em janeiro de 2018, altura em que seria entregue ao Segundo Outorgante a respetiva fração com a entrega das respetivas chaves – Cl.ª 5ª.
iv) Era da responsabilidade da Primeira Outorgante a marcação da escritura definitiva de compra e venda, da qual deveria notificar o Segundo Outorgante com a antecedência mínima de 15 dias – Cl.ª 6ª.
v) No caso de incumprimento do contrato por parte da Primeira Outorgante, designadamente na outorga do contrato prometido, tinha o Segundo Outorgante a faculdade de exigir o dobro do que prestou a título de sinal. – Cl.ª 8ª.
vi) No caso de incumprimento do contrato por parte do Segundo Outorgante, designadamente a não celebração da escritura pública de compra e venda no prazo convencionado, este perderia automaticamente as quantias entretanto entregues a título de sinal e princípio de pagamento. – Cl.ª 9ª.
- Planta anexa ao contrato promessa (cfr. fls. 10), que contém já as alterações pedidas pelo autor, antes da assinatura do contrato promessa.
- A certidão do registo predial e a caderneta predial relativas ao prédio, juntas a fls. 11 a 16.
- A cópia do cheque entregue pelo autor para pagamento do sinal, no valor de 19.800,00, datado de 29/10/2016 (cfr. fls. 17).
- A correspondência trocada entre as partes, junta a fls. 17 verso a 24, donde se destaca (segundo a ordem cronológica):
i) - em 23 de março de 2018, o Autor enviou uma carta registada à Ré referindo que a mesma se encontrava em mora quanto à entrega do imóvel nos termos do referido contrato-promessa (janeiro de 2018), bem como que tal mora seria convertida em incumprimento definitivo se, até o dia 30 de abril de 2018, não fosse outorgada a competente escritura pública, momento em que deixava, definitivamente, de ter interesse no negócio, bem como lhe seria exigida a devolução do sinal recebido, em dobro, sem prejuízo de poder solicitar o ressarcimento por danos patrimoniais e não patrimoniais pela não concretização do negocio, nos termos da Cl.ª 8ª do referido contrato-promessa.
ii) - Tendo a referida carta registada sido devolvida, foi a mesma reencaminhada, em 12/04/2018, por email do mandatário do autor ao mandatário da Ré (cfr. fls. 19 v.º).
iii) - O mandatário da Ré, através de e-mail datado de 18 de abril de 2018, informou o mandatário do autor que a Ré tencionava outorgar a escritura de compra e venda e entregar a fracção autónoma em causa em finais de julho de 2018.
iv) Mais referiu que:
“2º Segundo a N/Cliente, este atraso ficou a dever-se às condições climatéricas adversas; 3º E também ao facto de os materiais escolhidos pelo promitente comprador não estarem disponíveis”.
v) - Por e-mail remetido pelo mandatário do A. ao mandatário do R. de 8/05/2018, aquele informa que o A. aceita a prorrogação do prazo inicialmente previsto no contrato-promessa para a outorga da escritura de compra e venda até ao dia 31 de julho de 2018 (fls. 20 v.º).
vi) - Mais informa que o autor deixará de ter interesse no negócio caso o prazo de outorga da escritura não se cumpra até 31 de julho de 2018, ficando a promitente-vendedora em incumprimento definitivo.
vii) - O e-mail enviado pelo mandatário da R. ao mandatário do A., em 16 de Julho de 2018, no qual a R. deu conhecimento à A. de que se encontrava agendada escritura de compra e venda da fração objeto do contrato de promessa de compra e venda para o dia 09-08-2018, pelas 10:00 horas, na Casa ..., na Conservatória do Registo Predial ....
viii) - Em resposta ao email antecedente, por enviado pelo o mandatário do A. dirigiu ao mandatário da R. um e-mail em 16 de julho de 2018, no qual informa que o autor não aceitava a celebração da escritura após a data limite estipulada (31/07/2018); que, pela sua observação, o prédio ainda não se encontrava terminado; que recebeu informação de que a sua esposa foi internada de urgência, em França, pelo que estava a preparar o seu regresso; reafirmou a disponibilidade para outorgar a escritura até ao final do prazo estipulado.
ix) - Em 2 de agosto de 2018, o autor remeteu à Ré carta registada com aviso de receção, arguindo o incumprimento do contrato promessa por parte da ré e solicitando o pagamento do sinal em dobro (fls. 22 v.º a 24).
- A planta da fração em causa, junta a fls. 42 a 43.
Diz respeito às alterações (na casa de banho pertencente à suite, na casa de banho de serviço, no hall de entrada, na cozinha e nos quartos) que o A. pretendeu fazer à planta inicialmente projetada pela R. para aquela fracção, as quais se mostram consolidadas na planta final, que é a que consta anexa ao contrato-promessa constante de fls. 8 v.º a 10, alterações essas indicadas antes da assinatura do referido contrato.
- O orçamento de fls. 43 verso, relativo aos móveis das casas de banho, datado de 4 de setembro de 2017, embora prove que, após a celebração do contrato-promessa em causa nos presentes autos, o A. pretendeu novas alterações à fracção – concretamente, móvel completo suspenso VIDA 100, saraná com espelho 100x60 e APL 30, móvel completo suspenso VIDA 80; saraná com espelho 80 x60 e APL 30 –, nada prova quanto a um eventual atraso por causa desses mesmos móveis na conclusão da fracção.
Aliás, aquando da elaboração desse orçamento faltavam ainda cerca de quatro meses para a verificação do prazo inicial para a celebração do contrato prometido.
- O Alvará de Autorização de Utilização n.º 97/18 requerido junto da Câmara Municipal ..., obtido em 11 de Junho de 2018, data em que o prédio estava pronto.
- A correspondência trocada entre a ré e a Distribuidora de Energia ... ..., junta a fls. 45 a 59 e a informação da Distribuidora de Energia ... ..., junta a fls. 111, à qual se mostra anexada a correspondência trocada com a ré junta de fls. 112 vº a 122 vº (que corroboram os pontos 34 a 41 dos factos provados).
- A declaração da Conservatória do Registo Predial de … de fls. 60, que atesta a não comparência do autor na data designada para a escritura (9 de agosto de 2018, pelas 10 h).
- A informação meteorológica de fls. 72, da qual resulta que não ocorreu nenhuma precipitação anormal durante o ano de 2017.
- A informação médica de fls. 79, que refere um internamento da esposa do autor, em França, de 9/07/2018 a 13/08/2018.
- O processo de licenciamento da obra remetido pela Câmara Municipal ..., junto a fls. 108/109 (CD).
- Certidões permanentes constantes de fls. 60 v.º a 62 vº, donde resulta:
i) Em 21-08-2018 foi realizada escritura de compra e venda da Fração “Z” na Conservatória do Registo Predial ... .../199990208.
ii) Em 19-10-2018 foi realizada escritura de compra e venda da Fração “AA” na Conservatória do Registo Predial ... .../199990208, conforme certidão que se junta.
iii) Em 29-11-2018 foi realizada escritura de compra e venda da Fração “AB” na Conservatória do Registo Predial ... .../199990208.
- O processo de licenciamento da obra remetido pela Câmara Municipal ..., junto a fls. 108/109 (CD).
Delineados e explicitados os meios de prova produzidos, este Coletivo, à semelhança da convicção formada na motivação da sentença recorrida, também formou a convicção que o autor, ainda que em sede de declarações de parte, prestou declarações que se mostram condizentes com a generalidade dos demais meios de prova carreados aos autos (mormente a prova documental), sendo que quer o teor das negociações tendentes à outorga do contrato-promessa, quer os atrasos verificados na celebração da escritura pública de compra e venda e os timings fixados para a prorrogação ou ultimação do prazo final mostram-se estribados nos documentos juntos aos autos. Reconhece-se que o depoimento do autor mostrou-se titubeante e menos seguro quando se pronunciou sobre os factos e vicissitudes contratuais ocorridos a partir de abril de 2018. Julgamos, porém, que essa menor segurança e clarividência patenteada nas suas declarações se ficaram a dever ao facto de, a partir de março de 2018, e face ao atraso da ré na conclusão da construção do prédio objecto do contrato promessa e na celebração do contrato definitivo, o autor ter-se socorrido de acompanhamento jurídico, mediante advogado, posto que a partir dessa data os contactos entre os contraentes (autor e a ré) passaram primordialmente a ser feitos através dos respetivos mandatários, como se alcança da correspondência trocada e junta aos autos.
No tocante às declarações da legal representante da ré, T. R., foi notório o cariz justificativo e desculpante que a mesma tentou apresentar para o atraso, pela Ré, na marcação da escritura definitiva e na entrega da fracção prometida vender, designadamente fazendo alusão ao facto de, já na fase de acabamentos, o autor ter pretendido escolher louças e móveis de casa de banho diferentes das previstas no projecto inicial, o que atrasou a conclusão da obra, porque os materiais não estavam disponíveis no mercado. Pois bem, essa afirmação não se mostra verosímil, porquanto o único documento junto aos autos comprovativo de alterações (após a outorga do contrato promessa) diz respeito a um orçamento relativo aos móveis datado de 04-09-2017 (cfr. fls. 43 v.º), «portanto, bem anterior à data em que a mesma acabou por marcar a escritura, não resultando de toda a prova produzida que qualquer alteração pedida pelo autor tivesse sido motivo de qualquer atraso na conclusão da obra».
A testemunha E. G., arrolada pelo autor, apresentou um depoimento irrelevante, na medida em que pouco ou não sabia sobre os factos em apreço.
Relativamente à testemunha M. G., ressalta igualmente do seu depoimento o propósito de enfatizar razões justificativas para o atraso na conclusão da obra, designadamente quanto às adversas condições climatéricas (quando é certo não ter sido feito prova cabal do afirmado, sendo que da informação meteorológica de fls. 72 resulta não ter ocorrido nenhuma precipitação anormal durante o ano de 2017), à concessão da licença de utilização por parte da Câmara Municipal (quando é certo que a ré não alegou nenhum atraso por parte dessa entidade, admitindo inclusivamente que estava tudo resolvido em junho de 2018), nos materiais escolhidos pelo autor (reitera-se aqui as considerações tecidas a propósito da legal representante da ré) e da Distribuidora de Energia ... ... (neste ponto há que reconhecer que o tempo para a concessão da baixada terá excedido o que é comummente praticável, sendo certo que é a própria Ré a reconhecer que a situação estava já resolvida em julho, pois só assim se compreende que em 16 de julho de 208 tenha comunicado ao autor que a escritura estava agendada para agosto de desse ano).
Por fim, o depoimento prestado pela testemunha A. T. denota que esta não logrou libertar-se da ligação profissional que mantém com a ré.
Permitimo-nos para o efeito destacar dois aspectos particulares:
i) Tendo reconhecido que o lapso de tempo existente entre a data da celebração do contrato-promessa (2/11/2016) e a data estipulada para a escritura pública de compra e venda (janeiro/2018) era razoável para a obra estar terminada/pronta, não explicou cabalmente as razões por que nesse prazo a Ré não cumpriu o acordado (por serem também aqui plenamente validas, remete-se para as objecções feitas quanto ao depoimento da testemunha M. G.).
E, relativamente aos sete meses a mais (de janeiro a julho/2018), afora o atraso provocado pela Distribuidora de Energia ... ..., não indicou outras razões justificativas do atraso na conclusão da obra.
ii) Instada se a Ré não podia ter antecipado a outorga do contrato definitivo em 10 dias a fim de respeitar o prazo prorrogado (31 de julho de 2018), limitou-se a responder negativamente, sem qualquer justificação, quando o certo é que o prédio já estava ultimado em julho, tanto mais que em 16 de julho de 2018 a R. deu conhecimento à A. de que se encontrava agendada escritura de compra e venda da fração objeto do contrato de promessa de compra e venda para o dia 09-08-2018, pelas 10:00 horas na Casa ... na Conservatória do Registo Predial ..., não tendo providenciado sequer pela sua marcação em Cartório Notarial a fim de respeitar a data agendada para a celebração da escritura.
Na sua generalidade, o depoimento da referida testemunha não colocou em causa as declarações de parte do autor.
Importa, por último, salientar que as testemunhas M. G. e A. T. são colaboradoras da ré (a primeira mediante um vínculo de subordinação jurídica e a segunda, ao que se depreende, de prestação de serviços), sendo que os seus depoimentos não se afiguraram inteiramente desinteressados e descomprometidos quanto ao litígio em apreço, tendo apresentado – na parte atinente às descritas reservas, ressalve-se –, uma versão dos factos favorável à posição propugnada pela ré, de modo a não fazer perigar o direto interesse que esta entidade tem no resultado da lide, o que lhes retira credibilidade.
Pelo exposto, em face das considerações anteriores, por referência à matéria impugnada impõe-se a rectificação do ponto 10 dos factos provados, pois onde consta março deverá ler-se abril (com suporte nas declarações de parte do autor).
Por outro lado, o facto vertido no ponto 11 dos factos provados ocorreu não em março de 2018, mas sim em setembro de 2017, sendo inverosímil que naquela data a obra aparentasse um estado de abandono, até porque apenas cerca de cinco meses depois a ré começou a outorgar as escrituras de compra e venda relativas às frações autónomas integrantes daquele imóvel.
Por fim, no tocante à matéria das als. q), r) e s) dos factos não provados, por referência ao documento de fls. 43 vº e à prova testemunhal produzida, impõe-se a desmonstração de que, após a celebração do contrato promessa, em setembro de 20187, o autor pretendeu as alterações à fracção descritas no referido documento, como seja:
- móvel completo suspenso VIDA 100, saraná com espelho 100x60 e APL 30.
- móvel completo suspenso VIDA 80, saraná com espelho 80x60 e APL 30.
Já a demais matéria fáctica impugnada é de julgar improcedente.
Assim, em conformidade com a prova produzida, os pontos 10 e 11 passarão a valer com a seguinte redacção:
10º. Apesar de frustrado com a não realização da escritura, o Autor deslocou-se a Portugal no mês de abril de 2018 para saber do andamento da obra e para escolha de equipamentos e mobiliários para a fração, mantendo assim o interesse na outorga da escritura.
11º. Em setembro de 2017, quando foi visitar a obra o autor deparou-se com o seu estado de aparente abandono.
Adita-se aos factos provados um ponto fáctico (com a consequente eliminação das als. q), r) e s) dos factos não provados), que passará a valer com a seguinte redacção e numeração:
59. Após a celebração do contrato promessa, em setembro de 2017, o autor pretendeu as seguintes alterações à fracção:
- móvel completo suspenso VIDA 100, saraná com espelho 100x60 e APL 30.
- móvel completo suspenso VIDA 80, saraná com espelho 80x60 e APL 30.
*
Em suma, procede parcialmente a impugnação da matéria de facto nos termos supra explicitados (4).
*
2. - Da reapreciação da matéria de direito.
2.1. Do incumprimento definitivo do contrato-promessa imputável à promitente vendedora (apelante).
Não vem posto em causa como decidido que as partes celebraram entre si um contrato-promessa bilateral de compra e venda de um imóvel, porquanto reciprocamente se obrigaram a comprar e a vender uma fração autónoma, sendo o Autor promitente-comprador e a Ré promitente vendedora (5).
Tendo em conta as pretensões do autor e da ré (reconvenção), cumpre, sim, indagar se foi a ré, ou antes o autor, quem incumpriu as obrigações que para si resultavam do contrato promessa de compra e venda celebrado, e, consequentemente, se (tal como decidido na sentença recorrida) o autor tem direito a receber em dobro o sinal que pagou, ou, ao invés, a ré tem direito a fazer seu o montante recebido a título de sinal.
Dispõe o art. 410º, n.º 1 do Código Civil (doravante, abreviadamente, CC) que o contrato promessa consiste na “convenção pela qual alguém se obriga a celebrar certo contrato”, sendo-lhe aplicáveis as disposições legais que regulam o contrato prometido, excetuadas as que, pela sua própria razão de ser, não se devam considerar extensivas ao contrato promessa
Como ensina o Prof. Antunes Varela (6), o contrato promessa é“a convenção pela qual ambas as partes, ou apenas umas delas, se obrigam, dentro de certo prazo ou verificados certos pressupostos, a celebrar determinado contrato” (v.g., compra e venda, locação, mandato, etc.), isto é, o chamado contrato prometido.
É bilateral se ambas as partes se obrigam a celebrar o contrato definitivo; unilateral se apenas uma das partes se vincula (art. 411º do CC).
O contrato promessa tem como objeto um negócio jurídico (unilateral ou bilateral e de eficácia obrigacional ou real) e gera, necessariamente, uma ou duas obrigações de contratar, ou, por outras palavras, uma ou duas obrigações de emitir a declaração de vontade correspondente ao negócio prometido (7).
O objeto destas obrigações é uma prestação de facto jurídico positivo (uma prestação de facere jurídico), que consiste na "emissão de uma declaração negocial destinada a celebrar o contrato prometido” (8), a que corresponde o direito de crédito da contraparte de exigir o seu cumprimento.
Assim, na promessa bilateral de compra e venda, a obrigação a que os contraentes se obrigam é a de outorgarem, respetivamente, como comprador e como vendedor, num futuro contrato de compra e venda (contrato prometido ou definitivo).
O contrato promessa assume-se, pois, como um contrato preliminar ou preparatório do negócio definitivo, um contrato de segurança ou de garantia do negócio prometido” (9).
*
O contrato deve ser pontualmente cumprido e só pode modificar-se ou extinguir-se por mútuo consentimento dos contraentes ou nos casos admitidos na lei (art. 406º, n.º 1, do CC), designadamente, mediante a sua resolução fundada na lei ou em convenção (art. 432°, n.º 1, do CC).
Trata-se, no fundo, da consagração do velho princípio “pacta sunt servanda”, o qual deve ser entendido como significando que o contrato deve ser cumprido não apenas no aspecto temporal, mas em toda a linha, em todos os sentidos, “ponto por ponto” (10).
O devedor cumpre a obrigação quando realiza a prestação a que está vinculado (art. 762º, n.º 1 do CC).
Salvo convenção, disposição legal ou uso em contrário, a prestação deverá ser efetuada integralmente e não por partes (art. 763º do CC).
Assim sendo, sempre que o devedor não cumpra a prestação a que está vinculado ou a tenha realizado em desrespeito de qualquer dos princípios referidos, estar-se-á perante uma situação de não cumprimento do dever obrigacional.
O devedor que falte culposamente ao cumprimento da obrigação torna-se responsável pelo prejuízo que cause ao credor (art. 798º do CC).
Incumbe ao devedor provar que a falta de cumprimento da obrigação não procede de culpa sua (art. 799º, n.º 1 do CC).
*
A resolução do contrato é, como se disse, um dos casos admitidos na lei para a modificação ou extinção do direito (arts. 432º e 437º do CC).
A resolução é a destruição da relação contratual, validamente constituída, por um dos contraentes, com base em facto posterior à celebração do contrato (11).
Como estrutura negocial, a resolução surge como uma faculdade, integrando, normalmente, uma declaração extrajudicial não sujeita a qualquer formalidade (arts. 436.º e 224.º do CC).
A resolução de um vínculo contratual pode ocorrer por convenção ou vontade das partes e/ou fundada na lei – cfr. art. 432.º, n.º 1 do CC.
Para além das diversas situações em que a lei consagrou especialmente a possibilidade de uma das partes resolver o contrato – a título de exemplo, os arts. 437.º; 891.º; 966.º; 1140.º; 1150.º; 2248.º –, a resolução pode ser acionada quando um contraente deixe, definitiva e culposamente, de cumprir a prestação a que estava adstrito. É o que resulta dos arts. 798.º e 801.º, n.º 2 do CC: o devedor que falta culposamente ao cumprimento da obrigação toma-se responsável pelo prejuízo que causa ao credor, sendo certo que (tendo a obrigação por fonte um contrato bilateral) o credor, face à impossibilidade do cumprimento pode, independentemente do direito à indemnização, resolver o contrato (12).
O direito de resolução (por incumprimento da obrigação) é um direito potestativo extintivo e depende de um fundamento – o que significa que precisa de se verificar um facto que crie esse direito, ou melhor, um facto ou situação a que a lei liga como consequência a constituição (o surgimento) desse direito potestativo. Tal facto ou fundamento é, no que aqui releva, o facto de incumprimento ou situação de inadimplência (13).
A simples mora não confere ao contraente fiel o direito (potestativo) de pedir a resolução do contrato, mas tão só o direito de pedir a reparação dos prejuízos que o retardamento causou ao credor – cfr. art. 804.º, n.º 1 do CC (14).
Assim, o direito de resolução está sempre condicionado a uma situação de inadimplência (no caso de impossibilidade culposa – art. 801º) e, à semelhança do que sucede com a generalidade dos contratos, também a resolução legal do contrato-promessa pressupõe uma situação de incumprimento definitivo que resultará normalmente da conversão de uma situação de mora através de uma das vias previstas no art.º 808° do CC (seja pela interpelação admonitória, seja pela perda, objetivamente considerada, do interesse do credor) (15).
*
O regime geral dos contratos – designadamente as regras atinentes à falta de cumprimento e mora imputáveis ao devedor, entre elas as dos arts. 798º, 801º, 804º e 808º do CC – é aplicável ao contrato-promessa de compra e venda, tal como resulta do disposto genericamente no art. 410º, n.º 1, do CC, tendo este, no entanto, um regime específico (constante dos arts. 442º e 830º do CC) ao nível das sanções aplicáveis ao não cumprimento do contrato, quando tenha havido lugar à constituição de sinal (convencionado ou presumido – arts. 440º e 441º do CC) (16).
Assim, toda a quantia entregue pelo promitente-comprador ao promitente vendedor a título de antecipação do preço presume-se ter o carácter de sinal (art. 441º do CC).
Quando haja sinal, presumido (art. 441º) ou convencionado (art. 440º), a coisa entregue deve ser imputada na prestação devida ou restituída, quando a imputação não for possível (art. 442º, n.º 1 do CC).
No caso de não cumprimento imputável a qualquer dos contraentes os efeitos do sinal são os regulados no art. 442º, n.º 2 do CC (17).
Segundo este normativo, no caso de não cumprimento imputável a quem constituiu o sinal (tradens), o outro promitente (accipiens) tem direito a reter o sinal; se, ao invés, o não cumprimento for devido a este último, o promitente não faltoso tem o direito a exigir o dobro do que prestou ou, no caso de ter havido tradição da coisa objeto do contrato prometido para o autor do sinal, este pode optar pelo valor que a coisa, ou o do direito a transmitir ou a constituir sobre ela, tiver, à data do não cumprimento da promessa, com dedução do preço convencionado, mas devendo ser-lhe restituído o sinal e a parte do preço que tenha pago.
Na ausência de convenção contrária, não há lugar, pelo não cumprimento do contrato, a qualquer outra indemnização, no caso de perda do sinal ou de pagamento do dobro deste, ou do aumento do valor da coisa ou do direito à data do não cumprimento (art. 442º, n.º 4 do CC).
De acordo com o entendimento generalizado, na doutrina (18) e na jurisprudência (19), salvo se da interpretação da vontade negocial resultar diversamente, o regime legal do sinal é inaplicável em caso de simples atraso no cumprimento. De facto, só o incumprimento definitivo e culposo do contrato-promessa (e o consequente pedido resolutivo) dá lugar às cominações previstas no art. 442°, n. ° 2, do CC, não bastando, para o efeito, a simples mora [que é necessário transformar em incumprimento definitivo, nos termos gerais do art. 808° do CC], porquanto nada justifica que se excecione o contrato-promessa do regime geral aplicável à generalidade dos contratos (20).
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O conceito de não cumprimento abrange várias modalidades de não realização da prestação enquanto devida.
Adotando o critério proposto por Menezes Leitão (21), definiríamos “o não cumprimento como a não realização da prestação devida, por causa imputável ao devedor, sem que se verifique qualquer causa de extinção da obrigação”.
Ficam, assim, excluídas as causas de incumprimento que não são imputáveis a conduta do devedor, v.g. impossibilidade objetiva da prestação que constitui causa de extinção – art. 790º, n.º 1, do CC.
A violação do dever de prestar, por causa imputável ao devedor, pode revestir uma dupla forma (consoante a prestação se torna definitivamente impossível ou se atrasa): o não cumprimento definitivo ou falta de cumprimento (inadimplemento ou inadimplência) e a mora (22).
Esta segunda hipótese – mora do devedor (que é um simples incumprimento temporário) – verifica-se quando, por causa que lhe seja imputável (i. é, que provenha de culpa sua), a prestação, ainda possível, não foi efetuada no tempo devido (art. 804º, n.º 2, do CC). O devedor não executou a obrigação quando ela se vence, mas poderá vir a executá-la mais tarde, dado que a prestação na sua forma originária continua a ser materialmente possível e o credor continua a ter interesse nela. Dá-se, então, um simples retardamento, demora ou dilação no cumprimento da obrigação, e não uma falta definitiva de realização da prestação debitória.
A simples mora apenas constitui o devedor na obrigação de reparar os danos causados ao credor (n.º 1 do art. 804º do CC) e não lhe confere, em princípio, o direito à resolução do contrato.
Na referida primeira hipótese, a prestação impossibilita-se e de vez, torna-se em definitivo irrealizável – aqui ocorre a não realização definitiva da prestação debitória.
O incumprimento é uma categoria mais vasta onde cabem:
a) O incumprimento definitivo, propriamente dito (arts. 798º e 799º do CC);
b) A impossibilidade de cumprimento (arts. 790º a 795 e 801º a 803º do CC);
c) A conversão da mora em incumprimento definitivo – art. 808º, nº 1, do CC;
d) A declaração antecipada de não cumprimento e a recusa categórica de cumprimento, antecipada ou não;
e) E o cumprimento defeituoso (art. 799º do CC).
No caso de incumprimento do contrato promessa de compra e venda, a nossa lei abre dois caminhos ao contraente não faltoso (23):
a) - a execução específica regulada no art. 830.º do C.C., havendo simples mora;
b) - a resolução do contrato, havendo incumprimento definitivo, sendo que apenas este dá origem ao direito previsto no art. 442º, n.º 2 do C.Civil (24).
O incumprimento definitivo, na previsão do art. 808º do C.Civil, verifica-se quando o credor, em consequência da mora, perder o interesse que tinha na prestação, ou esta não for realizada dentro do prazo que razoavelmente for fixado pelo credor, considerando-se para todos os efeitos não cumprida a obrigação.
A mora apenas legitima a resolução quando convertida em incumprimento definitivo (arts. 801º, n.º 2 e 802º, n.º 2 “ex vi” do art. 808º, todos do CC), quer pela perda objetiva de interesse do credor ou, então, pelo recurso à interpelação admonitória, com a fixação de prazo razoável, apenas dispensável se houver uma recusa antecipada do devedor em cumprir.
Como se explicita no Ac. RG de 4/06/2009 (relatora Rosa Ching), in www.dgsi.pt., a lei considera definitivamente não cumprida a obrigação nos seguintes casos de:
1º- estipulação de cláusula resolutiva ou termo inicial;
2º- impossibilidade culposa da prestação por parte do devedor (art. 801, n.º 1º do CC);
3º- mora, se ocorrer perda do interesse do credor na prestação (art. 808º, n.º 1 do CC), apreciada objetivamente (n.º 2 do mesmo artigo), ou seja, em função da utilidade que a prestação teria para o credor, justificada segundo o critério da razoabilidade própria do comum das pessoas.
4º- mora, se a realização da prestação não ocorrer dentro do prazo que razoavelmente for fixado pelo credor (art. 808º, n.º 1 do CC).
Mas, para além destes casos, a doutrina aponta um outro caso que pode constituir incumprimento definitivo por parte do devedor.
5º- Trata-se do caso em que o devedor (antecipada e inequivocamente) declara que não quer cumprir a prestação.
O n.º 1 do art. 808º do CC, enuncia claramente duas possibilidades de a mora se converter em incumprimento definitivo: a) em consequência da perda objetiva de interesse do credor na prestação; b) em consequência da ultrapassagem do novo prazo razoável fixado pelo credor para o devedor cumprir finalmente a prestação em falta.
Não se trata, porém, de situações cumulativas ou que devam funcionar em conjunto.
Pelo contrário, estes dois modos de conversão da mora em incumprimento definitivo são alternativos e independentes entre si, ainda que possam ocorrer em simultâneo, tendo um pressuposto comum necessário (25): que o devedor esteja em mora, que a sua obrigação esteja vencida.
No tocante ao primeiro dos invocados fundamentos, a perda do interesse do credor na prestação acordada decorrente da mora do outro contraente é legalmente equiparada ao não cumprimento da obrigação (art. 808º, nº 1, do CC) e é apreciada objetivamente (n.º 2 do mesmo artigo).
Resultando do n.º 2 do art. 808º do CC a exigência de que a perda de interesse do credor seja apreciada objetivamente, configura-se como insuficiente o juízo valorativo arbitrário do próprio credor (26).
A perda de interesse pode resultar da própria natureza ou finalidade da prestação assumida (caso típico do vestido e/ou do bolo de noiva, não havendo interesse em recebê-los no dia imediato ao do casamento), podendo também a perda de interesse advir do estabelecimento de um termo essencial absoluto, ajustando-se no contrato que o prazo é absolutamente fixo (a mercadoria tinha de ser impreterivelmente entregue em certa data, sob pena de não ser recebida posteriormente).
Ainda que objetivada, a perda de interesse do credor verificada antes de ele poder exigir do devedor a realização da sua prestação não é juridicamente relevante, só podendo valer, nos termos legais, se o devedor já se encontrar em mora, consistindo então numa espécie de inversão do risco de perda do interesse no negócio - antes da mora corria por conta do credor, depois da mora passa a correr por conta do devedor relapso.
Como se explicita nos Acs. do STJ de 8/05/2007 (relator Sebastião Póvoas) e de 28/06/2011 (relator Sebastião Póvoas), in www.dgsi.pt., “a perda de interesse que tem de ser real e efectiva não se bastando com uma mera diminuição de interesse em contratar. (…) Exige-se “uma perda subjectiva do interesse com verificação objectiva”. A demonstração tem de ser concreta – objectiva – não sendo suficiente a mera alegação do credor nesse sentido. É que o direito de resolução terá de ser aferido em termos de razoável normalidade negocial, com apego aos princípios de honestidade no trato contratual não dependendo de meros caprichos ou impulsos de ocasião. A perda do interesse não é um mero “não quero” mas tem de se fundar numa causa objectiva que o cidadão comum possa apreender e compreender”.
No mesmo sentido, refere Antunes Varela que “[n]ão basta, porém, uma perda subjectiva de interesse na prestação. É necessário, diz o n.º 2 do art 808º, que essa perda de interesse transpareça numa apreciação objectiva da situação” (27), salientado que “a perda do interesse na prestação não pode assentar numa simples mudança de vontade do credor, desacompanhada de qualquer circunstância além da mora – ou seja, não pode o credor alegar como fundamento da resolução o facto de, não tendo o devedor cumprido a obrigação na altura própria, o negócio não ser já do seu agrado, exigindo a apreciação objectiva da situação algo mais do que esse puro elemento subjectivo que é a alteração de vontade do credor, apoiada na mora da outra parte – e a de que também não basta, para fundamentar a resolução, qualquer circunstância que justifique a extinção do contrato aos olhos do credor. A perda do interesse há-de ser justificada segundo o critério de razoabilidade, próprio do comum das pessoas” (28). Pretende-se “evitar que o devedor fique sujeito aos caprichos daquele (credor) ou à perda infundada do interesse na prestação. Atende-se, por conseguinte, ao valor objectivo da prestação, não ao valor da prestação determinado pelo credor, mas à valia da prestação medida (objectivamente) em função do sujeito” (29).
É ao credor que incumbe a prova da perda do interesse (art. 342º, n.º 1 do CC) (30).
Para além dos casos em que a mora, em conjugação ou não com outras causas, fez desaparecer o interesse do credor na prestação, há que ter em conta todos os outros em que tal não acontece (31), mas nos quais não seria legítimo obrigar o credor a esperar indefinidamente pelo cumprimento por parte do devedor, continuando aquele adstrito ao cumprimento da sua contraprestação e à aceitação da realização extemporânea da obrigação omitida. Com efeito, o credor tem legítimo interesse em libertar-se do vínculo contratual que se encontra na base da obrigação omitida pelo vendedor, e, tendo em conta que apenas o incumprimento definitivo legitima a resolução, as consequências decorrentes da mora mostram-se redutoras para, em determinados casos, acautelar convenientemente o seu interesse, porquanto limitadas ao ressarcimento dos danos moratórios (32).
Por isso, a lei prevê a possibilidade de o credor (parte não inadimplente), uma vez incurso em mora o devedor, fixar a este um prazo suplementar razoável – mas perentório – dentro do qual se deverá verificar o cumprimento, sob pena de resolução automática do negócio, que pode conduzir às consequências do art. 801º do CC, se a obrigação não for cumprida dentro desse prazo fixado na mesma interpelação ou intimação.
A situação está prevista na 2ª parte do n.º 1 do art.º 808º do CC, na parte em que se prescreve que, se a prestação “não for realizada dentro do prazo que razoavelmente for fixado pelo credor, considera-se para todos os efeitos não cumprida a obrigação”.
Nas elucidativas palavras de Antunes Varela (33), a interpelação admonitória consagrada no art. 808.º constitui «uma ponte essencial de passagem do atravessadouro (lamacento e escorregadio) da mora para o terreno (seco e limpo) do não cumprimento definitivo da obrigação».
Trata-se de uma intimação formal dirigida ao devedor moroso para que cumpra a sua obrigação dentro de certo prazo, sob pena de se considerar o seu não cumprimento como definitivo – através da fixação de um prazo perentório, obtém-se uma clarificação definitiva de posições. Trata-se, na generalidade dos casos, de um ónus imposto ao credor que pretenda converter a mora em não cumprimento (34).
Essa interpelação admonitória – que pressupõe que o credor tenha ainda qualquer interesse no cumprimento – deve conter três elementos: a) a intimação para o cumprimento; b) a fixação de um termo perentório, e preciso, para o cumprimento; c) a admonição ou a cominação (declaração admonitória) de que a obrigação se terá por definitivamente não cumprida, caso não seja cumprida dentro daquele prazo suplementar (35).
Diz a lei que o prazo fixado pelo credor deve ser um prazo razoável, atenta a natureza da prestação – o prazo razoável será aquele que o for para o aprestamento da prestação, embora também não deva ser tal que prejudique ou faça desaparecer o interesse do credor.
Tem-se entendido que o prazo razoável fixado pelo credor para a dita conversão, se o devedor não cumprir, tanto se aplica às obrigações sem prazo (inicial) estabelecido, como às obrigações com prazo inicialmente fixado (36).
Para que possa validar-se a interpelação admonitória impõe-se que o prazo fixado “ab initio” não tenha sido clausulado, expressa e inequivocamente, como prazo fatal e que tenha havido um retardamento da prestação.
Todavia, enquanto o interesse do credor na prestação se mantiver e se quiser que a mora do devedor se converta em falta de cumprimento, terá ele que dar nova oportunidade ao devedor em mora para que cumpra a sua obrigação. A interpelação admonitória do devedor em mora, sob a cominação apontada no n.º 1 do art. 808.º do CC, como explicita Antunes Varela (37), não constitui apenas um poder conferido ao credor, porque representa ao mesmo tempo um ónus que a lei lhe impõe (porque querendo converter a mora do devedor em não cumprimento definitivo da obrigação, o credor tem necessidade de recorrer a ela). E, para o devedor interpelado, ela representa, não só uma notificação (que o constitui no dever de prestar dentro do prazo fixado pelo interpelante, sob pena de ficar sujeito às sanções próprias da inadimplência da obrigação), mas também uma exceção (através da qual ele pode afastar, invocando a falta da interpelação prévia, a aplicação de qualquer das sanções correspondentes ao não cumprimento definitivo, apesar de inequivocamente ter faltado ao cumprimento da obrigação, quando incorreu em mora) (38).
Nos termos da denominada interpelação admonitória – qualificada por Pinto Oliveira (39) como princípio das duas oportunidades –, o devedor que não cumpre à primeira (a tempo) deve ter a oportunidade de cumprir à segunda – dentro de um prazo razoável depois do tempo (devido). Ou bem que aproveita, cumprindo – e indemnizando o credor pelos danos ou prejuízos causados pelo seu atraso –, ou bem que não a aproveita, não cumprindo.
O direito potestativo previsto, por ex., nos arts. 801º, n.º 2, e 802º do CC, só pode em princípio ser exercido desde que o devedor desaproveite duas oportunidades para cumprir e desde que se passe o segundo degrau.
Sendo certo que pode acontecer que a simples mora inviabilize logo a realização do contrato, como genericamente o admite o art. 808º do CC, no seu n.º 1, ao preconizar que a obrigação se tem como não cumprida quando a mora faça desaparecer o interesse do credor na prestação. Nestes casos já não haverá necessidade da interpelação admonitória para resolução do contrato, embora essa perda de interesse tenha de ser apreciada objetivamente, tal como se dispõe no n.º 2 do art.º 808.º do CC, isto é, que se revele através de dados factuais, de comportamentos, ações ou omissões, que indubitavelmente demonstrem que a perda de interesse se equipara ao não cumprimento definitivo da obrigação.
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Da fixação de um prazo para a celebração de um contrato não decorrem sempre os mesmos efeitos, como salienta o Prof. Vaz Serra:
“A estipulação de um prazo para a execução de um contrato não tem sempre o mesmo significado. Pode querer dizer que, decorrido o prazo, a finalidade da obrigação não pode já ser obtida com prestação ulterior, caducando por isso o contrato; mas pode também ser apenas uma determinação do termo que não obste à possibilidade de uma prestação ulterior, que satisfará ainda a finalidade da obrigação, caso em que o termo do prazo não importa a caducidade do contrato, mas tão somente a atribuição ao credor do direito de resolve-lo. Na primeira hipótese estamos perante um negócio fixo absoluto. No segundo estamos perante um negócio fixo, usual, relativo ou simples” (40).
Tal entendimento é aplicável ao contrato-promessa, podendo o prazo nele fixado para a celebração do contrato prometido ser havido como absoluto ou como relativo. Sendo absoluto (o que sucederá quando as partes fixarem um prazo para o cumprimento de determinada obrigação de modo a que a prestação seja efetuada dentro dele, sob pena de o negócio já não ter interesse para o credor), decorrido o prazo para a celebração do contrato prometido sem que este seja realizado, caduca o contrato-promessa. Sendo relativo, determina a simples constituição em mora, conferindo ao credor o simples direito a pedir o cumprimento, a sua resolução (verificados os demais pressupostos legais) ou a indemnização legal moratória (41).
Como decorrência do regime da transformação da mora em incumprimento definitivo (art. 808º do CC), no direito civil português o princípio geral é o de que o prazo de cumprimento de uma obrigação não constitui termo essencial (42). A falta de respeito pelo prazo de cumprimento da obrigação, que se presume estabelecido a favor do devedor (art. 779º do CC), origina uma situação de mora (art. 805º, nº 1, al. a), do CC) que apenas se transforma em incumprimento definitivo por uma das duas supra enunciadas vias previstas no art. 808º.
A regra é, aliás, a de que havendo dúvidas sobre como dever ser entendido o prazo fixado pelas partes, seja o mesmo considerado como um termo subjetivo relativo (43).
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Particularizando o caso concreto, constata-se que, na sentença recorrida, face à materialidade fáctica apurada, considerou a Mmª Juíza “a quo” estarem demonstrados os dois requisitos previstos no art. 808º, n.º 1 do CC, que servem de fundamento de conversão da mora em incumprimento definitivo.
Aí se exarou para o efeito que:
«Perante esta factualidade, (…) temos de concluir que no caso a perda de interesse invocada pelo autor é legítima, sendo também certo que se verificou a segunda causa referida, ou seja, o decurso do “prazo admonitório” de cumprimento estabelecido pelo autor».
Discorda a recorrente, sustentando ter havido errada interpretação do disposto no art. 808.º, n.º 1 do CC.
Vejamos a situação ajuizada.
Perante o elenco dos factos provados, verifica-se que, em 02/11/2016, o Autor e a Ré celebraram um intitulado “Contrato-Promessa de Compra e Venda”, por via do qual aquele prometeu comprar à Ré e esta prometeu vender o imóvel identificado nos autos, em construção, pelo preço de € 132.000,00, por conta do qual o Autor pagou à Ré, a título de sinal e princípio de pagamento, a quantia no valor de € 19.800,00, sendo os restantes a pagar no ato da escritura definitiva de compra e venda, tendo sido previsto no referido contrato promessa que a sua outorga deveria realizar-se no mês de janeiro de 2018, contra a entrega das respetivas chaves da fração prometida vender.
Não foi possível realizar a escritura de compra e venda na data acordada no contrato-promessa (janeiro de 2018), por a obra não estar terminada.
Apesar de frustrado com a não realização da escritura, o Autor deslocou-se a Portugal no mês de abril de 2018 para saber do andamento da obra e para escolha de equipamentos e mobiliários para a fração, mantendo, assim, o interesse na outorga da escritura.
Abra-se aqui um breve parêntesis na enunciação dos factos provados para referir que a não celebração do contrato prometido na data ajustada no contrato, por a construção não estar concluída, traduz uma situação de mora (culposa), visto que a Ré não logrou ilidir a presunção de culpa que sobre si impendia no que respeita ao incumprimento contratual – art. 799º, n.º 1, do CC –, posto não se ter provado que atuou com a diligência devida (numa perspectiva de atuação diligente que a boa-fé contratual supõe), com vista à ultimação do prédio prometido vender. Em concreto, não se provou que a não conclusão da obra no prazo inicialmente acordado se ficou a dever às condições climatéricas adversas que se fizeram sentir, nem ao facto de as alterações pretendidas pelo autor ao projeto inicial terem atrasado a entrega atempada da fração em causa, facto este de que aquele estava ciente e que mereceu a sua concordância.
Mais resulta dos autos que, em 23/03/2018, o Autor dirigiu uma carta registada à Ré, referindo que a mesma se encontrava em mora quanto à entrega do imóvel nos termos do referido contrato-promessa (janeiro de 2018), bem como que tal mora seria convertida em incumprimento definitivo se, até o dia 30 de Abril de 2018, não fosse outorgada a competente escritura pública, momento em que deixava, definitivamente, de ter interesse no negócio, bem como ficava a Ré notificada que deveria devolver o sinal recebido, em dobro, nos termos da Cláusula Oitava do referido contrato-promessa.
Em resposta, através de e-mail datado de 18/04/2018, a Ré informou o Autor que a outorga da escritura de compra e venda estava prevista para o final do mês de julho de 2018 [entenda-se até 31-07 (art. 279º, als. a) e c) do CC)], data esta com a qual o autor concordou, sob a condição de que impreterivelmente a mesma fosse cumprida, o que foi informado à Ré em 08 de Maio de 2018.
Acontece que, em 16/07/2018, a Ré comunicou ao Autor de que se encontrava agendada escritura de compra e venda da fração objeto do contrato promessa de compra e venda, para o dia 09-08-2018, pelas 10.00 horas, na Casa ... na Conservatória do Registo Predial ....
Contudo, perante tal informação, o Autor informou a Ré de que ratificava e aceitava o prazo anteriormente por ela estabelecido, ou seja, fim do mês de julho de 2018, e que não aceitaria mais outra alteração, aduzindo para o efeito que a sua esposa encontrava-se internada em França, pelo que o prolongamento da sua estadia em Portugal estava a tornar-se insuportável, além de que não tinha mais condições de crer em mais uma promessa por parte da Ré a propor novas datas de entrega da fração e de outorga da escritura definitiva de compra e venda, sendo que, devido aos atrasos, teve de suportar pagamentos de estadias em hotéis e residenciais e perdeu completamente o interesse na efetivação do contrato prometido, perdendo toda a confiança na competência, responsabilidade e idoneidade da Ré e vendo esta como alguém sem credibilidade.
Daí que, em 02/08/2018, o autor tenha remetido à Ré carta registada com aviso de receção a relatar toda a situação, comunicando a resolução do contrato, bem como arguiu o incumprimento definitivo do contrato-promessa por parte da Ré e exigiu a devolução do sinal pago, em dobro, a totalizar a quantia no valor €39.600,00.
No dia e hora agendados, a ré compareceu na Casa ... (Conservatória), não tendo o autor comparecido.
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Da (verificação da) transformação da mora em incumprimento definitivo por via da perda de interesse do credor na prestação.
Divergindo da sentença recorrida, consideramos que a facticidade apurada supra enunciada não é suficiente para dar como preenchido o referido fundamento legal.
Com efeito, afora considerações de índole estritamente subjetivas ou de simples conjeturas e/ou convicções pessoais (tais como a perda da confiança na competência, responsabilidade e idoneidade da Ré), dos factos apurados não se vislumbra uma conduta da ré que possa indicar que o autor tinha razões válidas para ter perdido, em termos objetivos, o interesse na prestação em mora, qual seja a aquisição da fração em causa, por ter desaparecido o interesse que com aquele contrato pretendia satisfazer.
Relembre-se que, não obstante a ré se ter comprometido a celebrar o contrato prometido em janeiro de 2018, na sequência da mora verificada e, tendo sido admonitoriamente interpelada, ficou estipulado que a escritura seria outorgada até finais do mês de julho de 2018, sendo que, em 16/07/2018, a Ré comunicou ao Autor de que a escritura se encontrava agendada para o dia 09-08-2018, mais indicando os demais elementos (hora e local da escritura).
Ainda que se admita que, na sua perceção subjetiva, o autor tenha perdido a confiança na ré, nomeadamente por esta não ter honrado o prazo inicialmente acordado (janeiro de 2018), nem tão pouco o novo prazo fixado (final de julho de 2018), não é lícito concluir que a estipulação da data certa fixada como limite para a realização da escritura pública tenha como característica uma essencialidade absoluta impeditiva da existência do interesse na realização do negócio em momento ulterior [mormente quando está em causa uma dilação ou um retardamento de (apenas) 9 dias em relação à última data prevista].
Na verdade, as vicissitudes que sempre podem surgir na construção de um prédio e na formalização de um negócio prometido que tem por objeto um imóvel e a circunstância de não ter sido fixada qualquer consequência para o decurso do prazo inicial – já quanto ao segundo prazo ter-se-á ulteriormente de tomar em consideração as implicações decorrentes de se tratar, ou não, de uma interpelação admonitória –, inculcam a ideia de que o mero decurso do prazo não implicaria, só por si, uma inderrogabilidade absoluta do prazo, nem a perda do interesse do credor.
O normal, quando se trata da compra e venda de um imóvel, em que as partes nada disseram expressamente quanto às consequências do decurso do prazo, será que o interesse se mantenha para além da data indicada para a realização da escritura, e não o seu contrário, devendo aqui ser aplicada a regra do in dubio sufragada por Calvão da Silva, por ser aquela que preferencialmente corresponderá à vontade das partes (44).
A situação de mora ocorrida pelo facto de a escritura ter sido agendada para o dia 9/08/2018, ao invés do final do mês de julho de 2018 (traduzindo uma dilação ou retardamento no máximo, de 9 dias), por si só, não justifica a resolução do contrato, pois que não significa que a prestação deixou de ser suscetível de proporcionar ao autor a utilidade e vantagens que com o negócio normalmente visou obter.
Aliás, o autor concordou que o prazo da celebração do contrato prometido ocorresse até final do mês de julho precisamente por manter interesse na realização do contrato definitivo, pelo que, por reporte a um (exíguo/parco) atraso de 9 dias na marcação da escritura, e não obstante a situação de mora, não é possível concluir que aquele tenha perdido (em termos objetivos) o interesse na realização do contrato prometido.
Sendo propósito do promitente comprador destinar o imóvel objeto do contrato promessa ao seu uso pessoal e estadia (bem como dos seus familiares) aquando das frequentes vindas a Portugal, e tendo inclusivamente providenciado pela introdução de alterações ao projeto inicial de modo a que a fração em apreço ficasse ao seu gosto pessoal, da factualidade apurada não resultam factos positivos, concretos e objetivos reveladores, por exemplo, que o rumo da sua vida privada/familiar, por vicissitudes várias, sofreu uma inflexão ao ponto de ter desistido do propósito de vir passar umas temporadas a Portugal e de ter aqui uma habitação para se instalar.
Acresce que o facto da mulher do autor ter sido internada em França, carecendo o autor de regressar àquele país para lhe prestar assistência, tão pouco é apto a dar como demonstrada essa perda (objectiva) do interesse do credor na prestação em mora, até porque sempre aquele poderia outorgar procuração a quem o representasse no acto de outorga da (já agendada) escritura de compra e venda.
Termos em que se conclui pela inverificação do primeiro fundamento enunciado no n.º 1 do art. 808º do CC (perda objetiva do interesse do credor na prestação, em consequência de mora).
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Da (verificação da) transformação da mora em incumprimento definitivo por via da interpelação admonitória.
Já no que concerne ao referido fundamento, entendemos ser de subscrever o juízo formulado na sentença recorrida no sentido da sua demonstração.
Vimos já que no contrato promessa em apreço foi fixado um prazo certo (janeiro de 2018) para a celebração da escritura pública de compra e venda [da fração autónoma prometida vender] e que era a Ré que estava obrigada a marcar a escritura, tendo esta incumprido aquele prazo, uma vez que na data acordada no contrato-promessa a obra não estava terminada, incorrendo numa situação de mora nos termos supra explicitados.
Não decorre da facticidade provada que o prazo contratualmente estabelecido para o efeito revestisse a natureza de prazo fixo, essencial e absoluto, pelo que o seu esgotamento apenas implicou a constituição do devedor em mora, situação essa que para poder ser convertida em incumprimento definitivo carecia da fixação de um novo prazo admonitório [ou da perda objetiva de interesse do credor na prestação analisado no ponto anterior].
Nesse particular importa ter presente que, em 23/03/2018, o Autor enviou carta registada à Ré a referir que a mesma se encontrava em mora quanto à entrega do imóvel nos termos do referido contrato-promessa (janeiro de 2018), bem como que tal mora seria convertida em incumprimento definitivo se, até o dia 30 de abril de 2018, não fosse outorgada a competente escritura pública, momento em que deixava, definitivamente, de ter interesse no negócio, bem como ficava a Ré notificada que deveria devolver o sinal recebido, em dobro, nos termos da Cláusula Oitava do referido contrato-promessa.
Em resposta, através de e-mail datado de 18/04/2018, a Ré informou o Autor que a outorga da escritura de compra e venda estava prevista para o final do mês de julho de 2018, data esta com a qual o autor concordou, sob a condição de que impreterivelmente a mesma fosse cumprida, o que foi informado à Ré em 08 de Maio de 2018.
Aquela notificação expedida em 23/03/2018, complementada com a aceitação do prazo proposto pela ré para a outorga do contrato prometido, vale como notificação admonitória ou interpelação cominatória, sendo que, a verificar-se a mesma sem cumprimento do contrato, a mora seria convertida em incumprimento definitivo, nos termos da 2ª parte n.º 1 do art. 808º do CC.
Na verdade, daquela notificação constam os três requisitos constitutivos daquela intimação ou interpelação, quais sejam:
- i) a intimação para o cumprimento; ii) a fixação de um termo perentório para o cumprimento (que, no caso, foi proposto pela própria ré na sequência do prazo mais curto indicado pelo autor, acabando aquele por ser ratificado pelo contraente não faltoso) e iii) a declaração admonitória ou cominatória de que a mora seria convertida em incumprimento definitivo e o promitente comprador deixava, definitivamente, de ter interesse no negócio, com a consequente devolução do sinal recebido, em dobro, se não se verificasse o cumprimento dentro daquele fixado.
No caso, nem sequer se poderá equacionar a irrazoabilidade do prazo (suplementar) para permitir ao devedor cumprir o seu dever de prestar, até porque o mesmo foi contraproposto pela ré e aceite pelo autor. Foi, pois, a própria promitente vendedora a estabelecer o referido prazo que, uma vez verificado, determinaria que a obrigação se tivesse para todos os efeitos por não cumprida (a título definitivo), conferindo ao autor a faculdade potestativa de resolver o contrato dos autos.
Tendo a Ré comunicado ao Autor, em 16/07/2018, de que se encontrava agendada escritura de compra e venda da fração objeto do contrato promessa, para o dia 09-08-2018, pelas 10.00 horas, na Casa ... na Conservatória do Registo Predial ..., o autor de imediato respondeu, informando que ratificava e aceitava o prazo anteriormente por ela estabelecido, ou seja, final do mês de julho de 2018, e que não aceitaria mais outra alteração, subentendendo-se, pois, que se mantinha plenamente válida a aludida interpelação admonitória.
E, em 02/08/2018, remeteu à Ré carta registada com aviso de receção, comunicando a resolução do contrato, bem como arguindo o incumprimento definitivo do contrato-promessa por parte da Ré e exigindo a devolução do sinal pago, em dobro, a totalizar a quantia no valor € 39.600,00.
É inequívoca, portanto, a demonstração de que o agendamento da escritura não observou o prazo suplementar fixado na interpelação admonitória com vista ao cumprimento pelo devedor da prestação.
Por conseguinte, tendo o credor realizado efetivamente a interpelação admonitória, fixando um prazo razoável e definitivo para o cumprimento da obrigação (final de julho de 2018), com a advertência de que a não realização da escritura nesse prazo final ditaria uma situação de irremediável incumprimento definitivo, facto esse que se tem como consolidado no processo – visto que a escritura (apenas) foi agendada para o dia 9/08 –, aquela interpelação feita à ré, através da carta de 23/03/2018, em princípio, converteu a mora em que incorrera em incumprimento definitivo (arts. 801º e 808º, n.º 1 do Código Civil).
Com vista a ilidir a presunção de culpa que sobre si impende (art. 799º, n.º 1, do CPC), invocou a ré que a alteração da data, de finais de julho de 2018 (31 de julho) para 09-08-2018, ficou a dever-se a três fatores:
1º - Só ter sido obtido em 11 de Junho de 2018 o Alvará de Autorização de Utilização n.º 97/18, requerido junto da Câmara Municipal ....
2º Atraso da Distribuidora de Energia ... ... – Distribuição, Energia, S.A. na ativação da luz ao prédio/edificação.
3º - Não existirem, nas conservatórias, datas disponíveis para fins julho de 2018 para a realização da escritura de compra e venda.
Todavia, não logrou demonstrar a respetiva facticidade.
Seguindo de perto a fundamentação explanada na sentença recorrida, diremos, em traços gerais e esquemáticos, o seguinte:
- No caso era sobre a ré que impendia a obrigação da marcação da escritura de compra e venda (cl.ª 6ª), sendo certo que, geralmente, é sobre o vendedor que recai a obrigação de disponibilizar toda a documentação necessária à transmissão, e que inclui a licença de utilização, bem como tratar de todas as ligações à rede pública de gás, água, eletricidade e outras que existam (com relevo a cl.ª 10ª).
- No que diz respeito à licença de utilização requerida junto da Câmara Municipal ..., nem sequer constitui qualquer fundamento para atraso, pelo menos em relação à data de 31 de julho, já que ficou disponível em junho de 2018.
- Quanto ao agendamento da escritura, não obstante se mostrar provado que a ré diligenciou junto de todas as Conservatórias Casa ..., geograficamente próximas, por uma data para fins de julho de 2018, sem sucesso, tendo, apesar dos esforços, apenas logrado obter vaga para o dia 9/08/2018, a verdade é que não esgotou todas as vias possíveis e razoáveis ao seu alcance de modo a respeitar o prazo suplementar perentório, na medida em que nem sequer procurou agendar a escritura em qualquer Cartório notarial, além de que sempre podia ter tentado o agendamento mais cedo, por forma a poder obter uma data que lhe permitisse cumprir aquele prazo.
- Por fim, quanto ao atraso da Distribuidora de Energia ... ..., «ainda que se considerasse que a ré fez o que podia perante a situação descrita nos factos provados, é a própria ré que alega que tudo estava pronto antes do final de julho, pelo que se tivesse tentado agendar a escritura em data anterior, como referido, tal atraso não teria tido influência no cumprimento».
De resto, quem se assume como promitente-vendedor de fração a construir, recebendo do promitente-comprador um sinal, terá de prever toda uma série de diligências de natureza burocrática e eventuais obstáculos administrativos e, em relação a eles, precaver-se atempadamente (45).
Salvo, pois, melhor opinião, não logrou a Ré, face aos factos provados, afastar a presunção de culpa que sobre ela recaía, não resultando demonstrada, designadamente a ocorrência de acto de terceiro que não fosse previsível ou de caso fortuito ou de força maior.
Nesta conformidade e repristinando o que anteriormente se assinalou, uma vez verificada a mora do promitente vendedor (que não providenciou pela marcação da escritura no mês de janeiro de 2018), o promitente comprador, mantendo interesse na outorga do negócio definitivo, recorreu à interpelação admonitória prevista no art. 808º, n.º 1, do CC. Para o efeito, notificou a promitente vendedora, intimando-a a cumprir o contrato definitivo, até finais do mês de julho de 2018 – sendo que a dilação se tem como razoável até porque foi indicada pelo próprio devedor e aceite pelo credor –, sob a cominação de, no caso de não cumprimento, se ter o contrato promessa por não cumprido (definitivamente não cumprido).
Considerando, pois, que a notificada (promitente vendedora) voltou a não cumprir, dentro do prazo suplementar que para o efeito lhe foi concedido, a obrigação tem-se para todos os efeitos por não cumprida (incumprimento definitivo) e é inquestionável que o promitente comprador tem o direito de resolver o contrato promessa (arts. 808º e 801º, n.º 2 do CC) e exigir – como exigiu – a aplicação da sanção prevista no n.º 2 do art. 442º do CC (no caso, a restituição do sinal em dobro).
Improcede, por conseguinte, este fundamento de apelação.
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2.2. – Da resolução unilateral e sem justa causa do contrato-promessa por parte do promitente comprador.
Considerando que a (eventual) procedência da questão em apreço dependia, na sua totalidade, do prévio sucesso da questão antecedente [quanto à não demonstração do preenchimento dos pressupostos do invocado direito de resolução do contrato promessa por parte do promitente comprador], o que não sucedeu, fica necessariamente prejudicado o seu conhecimento, o que aqui se declara, nos termos do art. 608º, n.º 2 do C.P.C. “ex vi” do art. 663º, n.º 2, in fine, do mesmo diploma.
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As custas do recurso, mercê do princípio da causalidade, são integralmente da responsabilidade da recorrente, atento o seu integral decaimento (art. 527º do CPC).
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Sumário (ao abrigo do disposto no art. 663º, n.º 7, do CPC):
I - O regime geral dos contratos – designadamente as regras atinentes à falta de cumprimento e mora imputáveis ao devedor, entre elas as dos arts. 798º, 801º, 804º e 808º do Cód. Civil – é aplicável ao contrato-promessa de compra e venda, tendo este, no entanto, um regime específico ao nível das sanções aplicáveis ao não cumprimento do contrato, quando tenha havido lugar à constituição de sinal.
II - De acordo com o entendimento generalizado, na doutrina e na jurisprudência, salvo se da interpretação da vontade negocial resultar diversamente, o regime legal do sinal é inaplicável em caso de simples atraso no cumprimento.
III - A mora apenas legitima a resolução quando convertida em incumprimento definitivo por uma das duas vias previstas no art. 808º, n.º 1, do CC: a) pela perda objetiva de interesse do credor na prestação ou b) pelo recurso à interpelação admonitória, com a fixação de prazo razoável, apenas dispensável se houver uma recusa antecipada do devedor em cumprir.
IV - Essa interpelação admonitória – que pressupõe que o credor tenha ainda qualquer interesse no cumprimento – deve conter três elementos: a) a intimação para o cumprimento; b) a fixação de um termo perentório, e preciso, para o cumprimento; c) a admonição ou a cominação (declaração admonitória) de que a obrigação se terá por definitivamente não cumprida, caso não seja cumprida dentro daquele prazo suplementar.
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VI. Decisão
Perante o exposto, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar improcedente o recurso de apelação, confirmando a sentença recorrida.
Custas do recurso a cargo da apelante/ré (art. 527.º do CPC).
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Guimarães, 15 de outubro de 2020
Alcides Rodrigues (relator)
Joaquim Boavida (1º adjunto)
Paulo Reis (2º adjunto)
1. Cfr., na doutrina, Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, 2017 – 4ª ed., Almedina, pp. 271/300, Luís Filipe Pires de Sousa, Prova testemunhal, 2017 – reimpressão, Almedina, pp. 384 a 396; Miguel Teixeira de Sousa, em anotação ao Ac. do STJ de 24/09/2013, Cadernos de Direito Privado, n.º 44, Outubro/dezembro 2013, p. 33 e Francisco Manuel Lucas Ferreira de Almeida, Direito Processual Civil, Vol. II, 2015, Almedina, pp. 462 a 469; na jurisprudência, Acs. do STJ de 7/09/2017 (relator Tomé Gomes), de 24/09/2013 (relator Azevedo Ramos), de 03/11/2009 (relator Moreira Alves) e de 01/07/2010 (relator Bettencourt de Faria); Acs. da RG de 11/07/2017 (relatora Maria João Matos), de 14/06/2017 (relator Pedro Damião e Cunha) e de 02/11/2017 (relator António Barroca Penha), todos consultáveis em www.dgsi.pt.
2. Conclusão 2ª.
3. Conclusão 17ª.
4. Por se tratar de uma alteração muito limitada, dispensamo-nos de transcrever de novo toda a factualidade provada e não provada, devendo considerar-se aqueles pontos objeto de alteração incluídos nos factos provados e não provados nos termos supra explanados.
5. Cfr. pontos 3 a 6 dos factos provados e documento de fls. 8 v.º e 9.
6. Cfr. Das Obrigações em Geral, Vol. I, 10ª ed., Almedina, p. 308.
7. Cfr. Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, Vol. I, p. 309, Ana Prata, O Contrato-Promessa e o seu Regime Civil, Almedina, 2001, 1993, p. 573 e Calvão da Silva, Sinal e Contrato-Promessa, 14ª ed./2017, Almedina, p. 13.
8. Cfr. Almeida Costa, Contrato Promessa, Uma síntese do Regime Actual, separata da Revista da Ordem dos Advogados, Ano 50, I, 1990, pág. 41.
9. Cfr. Calvão da Silva, obra citada, p. 15.
10. Cfr. Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, Vol. I, 4ª ed. Coimbra Editora, p. 373.
11. Cfr. Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, II, 4ª ed., Almedina, p. 265.
12. Cfr. Acs. do STJ de 11/02/2015 (relator Gabriel Catarino) e de 22-03-2011 (relator Moreira Alves), disponíveis in www.dgsi.pt.
13. Cfr. João Baptista Machado, “Pressupostos da Resolução por Incumprimento”, in Obra Dispersa, Vol. I, Scientia Ivridica, Braga, 1991, p. 130 e ss..
14. Cfr. Acs. do STJ de 12/01/2010 (relator Paulo Sá) e de 11/02/2015 (relator Gabriel Catarino), disponíveis in www.dgsi.pt.
15. Cfr., entre outros, Ac. do STJ de 22/06/2010 (relator Fonseca Ramos) e Ac. da RC de 21/09/2010 (relator Fonte Ramos), in www.dgsi.pt.
16. Cfr., neste sentido, entre outros, os acórdãos do STJ de 10/09/2009 (relator Santos Bernardino), de 20.10.2009 (relator Fonseca Ramos) e de 12/01/2010 (relator Paulo Sá), disponíveis in www.dgsi.pt.
17. Não existindo sinal, o contraente não faltoso terá direito a uma indemnização calculada de acordo com as regras gerais da responsabilidade civil (arts. 562º e ss. do CC).
18. Cfr., neste sentido, entre outros, Calvão da Silva, Sinal e Contrato-Promessa, (…), p. 98/103 e Cumprimento e Sanção Pecuniária Compulsória, 1987, p. 297; Antunes Varela, Sobre o Contrato-Promessa, p. 70, nota 1; Antunes Varela, RLJ, ano 119, p. 216, Almeida Costa, Contrato-Promessa, Uma síntese do Regime Actual, separata da ROA, ano 50, I, p. 54; Januário Gomes, Tema de Contrato-Promessa, 1990, AAFDL, pp. 55/60; Brandão Proença, Do incumprimento do contrato-promessa bilateral, 1996, pp. 119/126, Ana Prata, O contrato-promessa e o seu regime civil, p. 780/782 e Ana Prata, Código Civil Anotado (Ana Prata Coord.), volume I, 2017, Almedina, p. 567.
19. Cfr., neste sentido, entre outros, os acórdãos do STJ de 22/06/2010 (relator Fonseca Ramos), de 11/02/2015 (relator Gabriel Catarino), de 19/05/2016 (relator Lopes do Rego), de 16/06/2016 (relator Pires da Rosa), de 13/10/2016 (relatora Maria da Graça Trigo), 2/02/2017 (relatora Maria da Graça Trigo) e de 30/11/2017 (relatora Fernanda Isabel Pereira), todos disponíveis in www.dgsi.pt.
20. O que significa que a resolução do contrato-promessa e as sanções da perda do sinal ou da sua restituição em dobro só têm lugar no caso de inadimplemento definitivo da promessa.
21. Cfr. Direito das Obrigações, vol. II, Almedina, p. 223 e segs..
22. Cfr. Antunes Varela, Das Obrigações (…), Vol. II., p. 119.
23. Cfr. Ac. do STJ de 10/12/1007, CJSTJ, Ano V, T. III-1997, p. 164, Ac. da RG de 11.07.2013 (relatora Purificação Carvalho) e Ac. RP de 28/04/2014 (relator Manuel Domingos Fernandes), ambos consultáveis in www.dgsi.pt.
24. Remete-se para as referências doutrinárias e da jurisprudenciais explicitadas nas notas 18 e 19.
25. Cfr. Ac. do STJ de 6/02/2007 (relator Sebastião Póvoas), in www.dgsi.pt.
26. Como se refere no Ac. do STJ de 8/05/2007 (relator Sebastião Póvoas), in www.dgsi.pt., o único elemento comum é a mora, pois é este atraso que provoca ou o desinteresse ou a fixação de prazo suplementar fatal para cumprir.
27. Cfr. Antunes Varela, Das Obrigações (…), Vol. II., p. 119.
28. Cfr. Rev. Leg. Jur., ano 118º, p. 55, nota (1).
29. Cfr. Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, vol. II, 3.ª ed., Coimbra Editora, Coimbra, 1986, p. 72.
30. Cfr. Pedro Romano Martinez, Da cessação do contrato, 3ª ed./2017, Almedina, p. 136.
31. Dá-se como exemplo os casos em que não tenha sido estipulada uma cláusula resolutiva ou um termo essencial absoluto, nem o credor possa alegar, de modo objetivamente fundado, perda do interesse na prestação por efeito da mora. - cfr. João Baptista Machado, Pressupostos da resolução por incumprimento (…), p. 164/165 e Ac. STJ de 10/07/2008 (Relator Alberto Sobrinho), in www.dgsi.pt.
32. Cfr. Comentário ao Código Civil - Direito das Obrigações – Das Obrigações em Geral, anotação de Maria da Graça Trigo/Mariana Nunes Martins ao artigo 808º, Universidade Católica Editora, p. 1143.
33. Cfr. RLJ, ano 128.º, p. 119.
34. Cfr. Antunes Varela, Das Obrigações (…), Vol. II., p. 125 e ss.
35. Cfr. Baptista Machado, Pressupostos da Resolução (…), p. 164; Brandão Proença, A resolução do contrato no direito civil. Do enquadramento e do regime, Coimbra Editora, 1996, pp. 119/121; na jurisprudência, Acs. do STJ de 10/07/2008 (Relator Alberto Sobrinho), de 02/02/2017 (relatora Graça Trigo), de 19-12-2018 (relator Olindo Geraldes) e de 10/12/2019 (relatora Raimundo Queirós), in www.dgsi.pt.
36. Cfr. Antunes Varela, RLJ, ano 128, p. 136.
37. Cfr. Das Obrigações em Geral, vol. I, (…), p. 346 e Das Obrigações em Geral, vol. II, (…), pp. 119 e 120.
38. Cfr. Antunes Varela, RLJ, ano 128, p. 139.
39. Cfr. Princípios de Direito dos Contratos, 2011, Coimbra Editora, p. 807 e segs.
40. Cfr. RLJ, ano 110.º, pp. 326-327.
41. Cfr. neste sentido, Vaz Serra, obra e local citado.
42. Cfr. Ac. do STJ de 13/10/2016 (relatora Maria da Graça Trigo), in www.dgsi.pt..
43. Cfr. Calvão da Silva, Sinal e Contrato-Promessa, (…), p. 130.
44. Cfr. Ac. do STJ de 16/06/2016 (relator Pires da Rosa), in www.dgsi.pt.
45. Cfr. Ac. do STJ de 12/01/2010 (relator Paulo Sá), in www.dgsi.pt.