IMPUGNAÇÃO DA DECISÃO DA MATÉRIA DE FACTO
ÓNUS DE ALEGAÇÃO
FORÇA DE CASO JULGADO
EMPREITADA
DEFEITOS DA OBRA
RECUSA DE CUMPRIMENTO
ABUSO DE DIREITO
Sumário

I - O dever de indicação exata das passagens da gravação em que se funda o recurso em matéria de facto é um ónus secundário relativamente aos ónus (primários) previstos no nº 1 do art.º 640º do Código de Processo Civil, tendente a facilitar a localização dos depoimentos relevantes no suporte técnico que contém a gravação da audiência, devendo ser avaliado de forma mais parcimoniosa e complacente, evitando que deficiências ou irregularidades puramente adjetivas impeçam a composição do litígio ou acabem por distorcer o conteúdo da sentença de mérito.
II - A força do caso julgado assenta na necessidade de assegurar a certeza das situações jurídicas apreciadas, nos termos em que o foram, que é inerente às decisões definitivamente julgadas, pressupondo a existência de uma conexão que impeça que a primeira decisão, transitada em julgado, seja contraditada pela segunda.
III - Os fundamentos de facto não adquirem, quando autonomizados da decisão de que são pressuposto, valor de caso julgado, de modo a poderem impor-se para além dessa mesma decisão. Porém, já relevam quando acoplados a uma decisão implícita de uma exceção invocada na defesa da ação condicionante e pressuposto lógico da concreta decisão final, transitada em julgado.
IV - Os vários direitos conferidos ao dono da obra, face ao incumprimento ou ao cumprimento defeituoso do empreiteiro, estão estabelecidos segundo uma regra de prioridade.
V - Na hipótese de se verificar um incumprimento definitivo da obrigação, imputável ao empreiteiro, não se revela necessário o recurso à via judicial para o dono da obra poder, ele próprio, ou através de terceiro, efetuar as obras de reparação ou reconstrução, sem que perca o direito de reclamar do empreiteiro o pagamento do custo dessas obras.
VI - Se o empreiteiro condiciona a sua intervenção reparadora das deficiências deixadas em obra à verificação de determinados pressupostos de facto, designadamente ao pagamento de um preço que o dono da obra recusa (legitimamente) pagar e à aceitação pelo mesmo de condições que excluem a responsabilidade do empreiteiro, pressupostos que alegou na ação, mas não provou, a sua atitude equivale a negação da reparação e de qualquer contribuição para a solução do problema a ele imputável, o que equivale a recusa de cumprimento e, consequentemente, incumprimento definitivo.
VII - Não age com abuso do direito o dono da obra que, face à recusa de cumprimento do empreiteiro na reparação de defeitos e qualquer contribuição para a solução do problema, solicita a intervenção de terceiro para obter essa solução ao mesmo tempo que envia ao incumpridor uma missiva pela qual vinca a confiança no seu profissionalismo e agradece “uma resposta no sentido de solucionar de vez esta situação”.
VIII - O tribunal ad quem não conhece de questões novas que não são do conhecimento oficioso.

Texto Integral

Proc. nº 4556/17.0T8MAI.P1 (apelação)
Comarca do Porto – Juízo Local Cível da Maia – J 2

Relator Filipe Caroço
Adj. Desemb. Judite Pires
Adj. Desemb. Aristides Rodrigues de Almeida

Acordam no Tribunal da Relação do Porto

I.
B…, LDA.[1], com sede na …, …, Fração E, em Coimbra, propôs ação declarativa, com forma de processo comum, contra C…, S.A.[2], com sede na Rua …, n.º …, …, …, Maia, alegando essencialmente que, no exercício da sua atividade, contratou com a R. serviços de colagem (soldadura/empalme) de um tapete/tela polidora que vendera e estava a aplicar nas instalações de uma empresa sua cliente, por não dispor de equipamento adequado ao empalme que estava obrigada a executar.
A R. aceitou e realizou aquele serviço no tapete da máquina de polimento de cerâmica instalado pela A., mediante um preço, mas fê-lo de modo imperfeito, deixando um desnível que iria afetar, como afetou, o normal funcionamento da máquina. Não obstante sucessivas reclamações da A., com advertência para a urgência da situação e risco de paragem da linha de produção da sua cliente, com avultados prejuízos, aquela acabou por “descartar” a sua responsabilidade, alegando designadamente que o defeito estava na tela e não no empalme que realizou, que não estava em condições de assegurar a reparação cabal e definitiva da colagem da tela, e recusou qualquer nova intervenção.
Viu-se obrigada a informar a R. que iria resolver ela própria a situação, considerando a sua resposta, aliada à sua reiterada recusa em proceder à reparação do serviço prestado, como recusa definitiva no cumprimento da execução cabal da obra. Como não restava outra solução que não a substituição integral do tapete por um outro tapete novo que, devidamente colocado e colado na máquina de polimento solucionaria definitivamente o problema, contratou uma outra empresa para o seu fornecimento e instalação, no que despendeu a quantia total de € 5.668,91, cuja responsabilidade pelo pagamento atribuiu à R. e que esta se recusa a pagar.
Terminou o articulado com o seguinte pedido:
«(…) deve a Ré ser condenada a pagar à A. a quantia global de 5.668,91 euros (cinco mil seiscentos e sessenta e oito euros e noventa e um cêntimos), acrescida de juros de mora às taxas legais em vigor desde a citação e até efectivo e integral pagamento o que se requer.»
Citada, a R. apresentou contestação pedindo a suspensão dos autos até ao julgamento de uma causa prejudicial que corre termos no proc. nº 67078/17.3YIPRT, também no Tribunal da Maia.
Por impugnação, opôs-se a grande parte da matéria de facto alegada pela A. e aos documentos por ela juntos com a petição inicial e alegou que, não sendo política sua prestar serviços de colagem em telas que por si não são vendidas, mais desconhecendo o tipo de tela em causa, só aceitou prestar o serviço por a A. se ter comprometido a fornecer todas as indicações necessárias e ter assumido a responsabilidade pelo resultado do serviço da R.
A tela sofreu um acidente (um corte causado pela cabeça de metal da máquina) quando estava a funcionar perfeitamente e, por novo contrato, a A. solicitou-lhe a sua reparação, tendo-se concluído que foi por causa deste acidente que o tapete ficou irreparável.
Deduziu reconvenção que viria a ser rejeitada e invocou a má fé da A. na litigância. Concluiu a R. pela sua absolvição do pedido da ação e condenação a A., como litigante de má fé, em indemnização a seu favor.
A A. respondeu à contestação, tendo concluído como na petição inicial.
Teve lugar audiência prévia e foi proferido despacho saneador, com prévia:
a) Rejeição da reconvenção, com fundamento em caso julgado;
b) Rejeição da ampliação do pedido formulada pela A., por inadmissibilidade; e
c) Fixação do valor da ação (€ 5.668,91).
Foi fixado também o objeto do processo, indicaram-se factos assentes e especificaram-se os temas de prova.
O tribunal pronunciou-se sobre os meios de prova indicados e marcou data par a audiência final.
Realizada aquela audiência, em três sessões de prova, foi proferida sentença que culminou com o seguinte dispositivo, ipsis verbis:
«Pelo exposto, decide-se julgar a presente acção procedente e, em consequência, condenar a ré “C…, S.A.” a pagar à autora “B…, Lda.” a quantia de Eur. 5.668,91 (cinco mil, seiscentos e sessenta e oito euros e noventa e um cêntimos), acrescida dos juros de mora vencidos e vincendos, contados desde 25/9/2017 até integral e efectivo pagamento, calculados à taxa legal.

Julga-se improcedente o pedido formulado pela ré de condenação da autora como litigante de má-fé, dele a absolvendo.
Custas pela ré, nos termos do artigo 527º n.º 1 do CPC.»

*
É desta decisão final que recorre a R., tendo produzido alegações com as seguintes CONCLUSÕES:
………………………………
………………………………
………………………………
*
A A. respondeu em contra-alegações, onde defendeu, aqui em síntese:
………………………………
………………………………
………………………………
*
Foram colhidos os vistos legais.
*
II.
As questões a apreciar --- exceção feita para o que for do conhecimento oficioso --- estão delimitadas pelas conclusões da apelação da R. (art.ºs 608º, nº 2, 635º, nº 4 e 639º do Código de Processo Civil), cumprindo-nos decidir sobre:
1. Erro de julgamento na decisão em matéria de facto;
2. As consequências jurídicas ma modificação da decisão proferida em matéria de facto e o incumprimento definitivo;
3. Abuso de direito da A.;
4. Excessiva onerosidade da indemnização.
*
Nas contra-alegações, a A. suscita as seguintes questões prévias:
a) Violação do dever de sintetização nas conclusões da apelação;
b) A preterição do dever de indicação, com precisão, das passagens da gravação em que a apelante funda o seu recurso e a sua consequente rejeição imediata quanto aso pontos em que aquela apenas invoca prova testemunhal, ao abrigo do art.º 640º, nº 2, al. a), do Código de Processo Civil;
c) A autoridade do caso julgado relativamente aos factos julgados no processo nº 67078 173YIPRT que correu termos no mesmo Juízo Local Cível da Maia.
*
III.
É a seguinte a matéria de facto considerada provada na 1ª instância:
1 - A autora “B…, Lda.” dedica-se ao comércio e representação de produtos para a indústria cerâmica.
2 - A ré “C…, S.A.” dedica-se à produção e comércio por grosso e a retalho de elementos de transmissão por correias, correntes e afins, de telas transportadoras e outros produtos similares, bem como à prestação de serviços conexos com a produção e comercialização daqueles bens.
3 - No exercício da sua actividade comercial, no decurso do mês de Fevereiro de 2017, a autora forneceu à sociedade “D…, Lda.” um tapete/tela polidora (com cerca de 8 mm de espessura e 1200 mm de largura) para ser aplicado numa linha de produção (máquina de polimento) de componentes cerâmicos fabricados pela aludida sociedade, tendo também sido contratado o serviço de montagem/colagem através de soldadura da tela fornecida.
4 – Nos termos do acordo aludido em 3), o fornecimento e aplicação da tela vendida pela autora seria executado nas instalações da sociedade “D…, Lda.” sitas no … - … - Águeda.
5 – Em virtude de não possuir equipamentos que lhe permitissem prestar directamente o serviço de colagem/soldadura da tela fornecida na respectiva máquina de polimento, no dia 21 de Fevereiro de 2017, a autora contactou a ré no sentido de aquilatar se esta estava em condições de prestar o serviço requerido e se tinha condições técnicas e disponibilidade para o fazer, tendo sido solicitado ainda um orçamento referente aos custos desse serviço.
6 - Na sequência do contacto aludido em 5), a ré solicitou à autora que, previamente à apresentação de uma proposta para a realização desse serviço, lhe fossem disponibilizadas as informações sobre o “kit de empalme” e tipo de tapete/tela que seria objecto dos serviços, bem como as respectivas dimensões e características da tela.
7 – Em resposta à solicitação mencionada em 6), a autora remeteu à ré, que a recebeu, a mensagem de correio electrónico junta a fls. 17-v e 18 dos autos, datada de 21/2/2017, cujo teor se dá por reproduzido.
8 - Após a recepção da comunicação aludida em 7), a ré respondeu, afirmando que tinha condições técnicas e disponibilidade para prestar tal serviço, tendo para o efeito enviado à autora, nesse mesmo dia 21 de Fevereiro de 2017, a proposta n.º …/17 acompanhada do preço estimado para a realização do serviço, afirmando ter disponibilidade imediata para proceder à colagem da tela na máquina de polimento a que esta se destinava, solicitando ainda que fossem enviadas fotos do “kit” (referente ao tapete) para que o técnico da ré pudesse efectuar a intervenção adequadamente.
9 – No dia 22/2/2017, a autora comunicou à ré que lhe adjudicava a execução do serviço em causa, tendo ficado acordado que o serviço seria realizado no dia 1 de Março de 2017 nas instalações da sociedade “D…, Lda.”.
10 – Nessas circunstâncias, a autora disponibilizou-se para prestar qualquer outra informação que a ré entendesse ser necessária.
11 – Em momento prévio à execução do serviço, a autora enviou à ré imagens referentes ao tipo de empalme que seria executado na aplicação do tapete, tendo ficado acordado o horário e local de encontro do técnico da ré que iria prestar o serviço.
12 - No dia 1 de Março de 2017, o técnico da ré, E…, deslocou-se às instalações da sociedade “D…, Lda.”, tendo então procedido à aplicação e colagem da tela na respectiva máquina de polimento.
13 - Após a execução dos trabalhos aludidos em 12), verificou-se desde logo que na zona onde foi feita a selagem da tela por parte da ré (no local do empalme) existia um desnível que provocava um alto na tela do tapete.
14 – Nessas circunstâncias, a autora reclamou junto do técnico da ré quanto à existência desse desnível, chamando a atenção que aquela irregularidade iria afectar o normal funcionamento da máquina onde a tela havia sido instalada e tendo exigido que a existência do desnível ficasse a constar da folha de execução do serviço elaborada pela ré.
15 – Nessas mesmas circunstâncias, foi preenchido o documento junto a fls. 22 dos autos, cujo teor se dá por reproduzido.
16 – Então, a ré solicitou que se aguardasse pela entrada em funcionamento da máquina, pois só nesse momento se podia verificar se a existência daquele relevo no tapete por si aplicado afectaria o normal funcionamento da mencionada máquina.
17 - Após a execução dos trabalhos aludidos em 12), a ré emitiu a factura n.º ….., datada de 3/3/2017, no valor de Eur. 526,44, para pagamento dos serviços prestados.
18 – Quando a máquina mencionada em 16) foi colocada em funcionamento, verificou-se que o desnível existente no empalme do tapete colocado pela ré provocava a ruptura dos ladrilhos que apoiavam na zona do empalme onde havia sido feita a colagem por parte da ré.
19 – Nessas circunstâncias, em 6 de Março de 2017, a autora comunicou tal facto à ré, solicitando a resolução do problema, acompanhando essa reclamação das fotografias que atestavam a situação.
20 – Nessas mesmas circunstâncias, a ré alegou que o desnível existente no empalme se devia “ao facto de serem materiais de superfícies diferentes”, conforme documento junto a fls. 26 dos autos, cujo teor se dá por reproduzido.
21 – Então, a autora remeteu à ré, que a recebeu, a mensagem de correio electrónico junta a fls. 25-v dos autos, datada de 22 de Março de 2017, cujo teor se dá por reproduzido.
22 – Em resposta, a ré remeteu à autora, que a recebeu, a mensagem de correio electrónico junta a fls. 25-v dos autos, datada de 22 de Março de 2017, cujo teor se dá por reproduzido.
23 - Para possibilitar a intervenção do técnico da ré, a empresa onde a tela foi instalada procedeu, nesse dia, à imobilização da linha de produção, por um período de tempo não concretamente apurado.
24 – Na sequência da intervenção aludida em 23), a situação de existência de um desnível na zona do empalme manteve-se.
25 – Nessas circunstâncias, a autora informou a ré desse facto, solicitando a resolução definitiva da situação.
26 - No dia 20 de Abril de 2017, a sociedade “D…, Lda.” informou a autora que o estado da tela se estava a degradar, correndo o risco de “abrir completamente”, solicitando uma reparação urgente da situação.
27 – Nessas circunstâncias, a autora alertou a ré para a necessidade de resolver a situação com urgência.
28 - No dia 21 de Abril de 2017, a sociedade “D…, Lda.” informou a autora que a tela estava no limite de ruptura e que caso se verificasse a paragem da produção decorrente desse facto iria-lhe imputar a responsabilidade.
29 – Nessas circunstâncias, a autora comunicou à ré a urgência em resolver a situação, alertando para o facto de tela estar novamente a descolar na zona da colagem do empalme realizada por esta e alertando para o risco de ruptura total.
30 - No dia 28 de Abril de 2017, a ré enviou à autora a factura n.º ….., no valor de Eur. 372,69 euros, referente à deslocação do técnico ocorrida no dia 27 de Março de 2017 para tentar resolver o problema existente na colagem da tela.
31 - No dia 17 de Maio de 2017, a sociedade “D…, Lda.” informou a autora que a tela estava prestes a rebentar e que exigia a resolução cabal e definitiva da situação, alegando que teria de parar a produção o que lhe acarretaria custos avultados, os quais imputaria à autora.
32 – Nessas circunstâncias, a autora deu conhecimento à ré da posição da sociedade “D…, Lda.”, sendo que a ré voltou a afirmar que não estava em condições de assegurar a reparação cabal e definitiva da colagem da tela, alegando para o efeito que os materiais e equipamentos utilizados por si poderiam não ser compatíveis com tela em causa.
33 – A autora remeteu à ré que a recebeu, a mensagem de correio electrónico junta a fls. 34-v dos autos, datada de 18 de Maio de 2017, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
34 – Em resposta, a ré remeteu à autora, que a recebeu, a mensagem de correio electrónico junta a fls. 35 dos autos, datada de 19 de Maio de 2017, cujo teor se dá por reproduzido.
35 – A autora remeteu à ré que a recebeu, a mensagem de correio electrónico junta a fls. 35-v dos autos, datada de 23 de Maio de 2017, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
36 – Nessas mesmas circunstâncias, o desnível inicialmente existente, com o normal funcionamento na máquina de polimento, tinha provocado a ruptura parcial do tapete (decorrente da fricção provocada na zona onde se encontrava o desnível), sendo que a resolução da situação implicava a substituição integral do tapete por um outro tapete novo.
37 – Nessas mesmas circunstâncias, a autora encomendou e pagou um novo tapete, igual àquele que havia fornecido à sociedade “D…, Lda.”, tendo para o efeito procedido ao pagamento da quantia de Eur. 1.960,00.
38 – Para aplicação desse novo tapete, a autora teve de contratar e suportar os custos com o aluguer de uma prensa vulcanizada e demais equipamentos inerentes ao funcionamento da mesma nas instalações da sociedade “D…, Lda.”, para efectuar a nova colagem/soldadura da tela à máquina de polimento
39 – E teve de pagar a assistência do técnico especializado que se deslocou de Itália durante 3 dias para prestar este serviço, tudo no valor global de Eur. 2.800,00 euros.
40 – E teve de suportar as deslocações do referido técnico entre Bolonha e Lisboa (voo de vinda no dia 24 de Maio de 2017) e Lisboa – Bolonha (voo de regresso no dia 26 de Maio de 2017), no valor total de 425,38 euros
41 – E teve de pagar a estadia do técnico em Portugal durante os 3 dias (2 noites) em que esteve a prestar o serviço de assistência nas instalações da sociedade “D…, Lda.”, despendendo para o efeito a quantia de Eur. 68,00.
42 – E teve de pagar o transporte da prensa alugada e o novo tapete desde Itália até Portugal, despendendo para o efeito a quantia de Eur. 305,53.
43 – E teve de pagar as despesas de alimentação e de deslocação do técnico em Portugal, despendendo para o efeito a quantia global de Eur. 110,00.
44 - Aquando do funcionamento da máquina aludida em 16), já depois da execução dos serviços mencionados em 12), uma das cabeças de polimento atingiu a tela, provocando danos no revestimento da mesma,
*
A instância recorrida deu como não provada a seguinte matéria:[4]
45 - Nas circunstâncias aludidas em 16), a ré se tenha comprometido a reparar a tela.
46 – Em momento prévio à execução dos trabalhos aludidos em 12), a ré tenha comunicado à autora que não podia assegurar a qualidade da colagem da tela, alegando para o efeito que os materiais e equipamentos utilizados por si poderiam não ser compatíveis com tela em causa.
47 - Aquando da prestação dos serviços aludidos em 12), a autora tenha garantido que ela mesmo forneceria todas as indicações e daria todas as instruções necessárias para a aplicação da tela e que as mesmas seriam da sua responsabilidade.
48 - A ré só tenha acedido a prestar os serviços aludidos em 12) na condição de que não poderia assumir qualquer responsabilidade pelo resultado final da vulcanização, uma vez que desconhecia o tipo de artigo a vulcanizar e a compatibilidade desse material com as suas prensas.
49 - Apesar de tais alertas, a autora tenha insistido que a ré efectuasse tal serviço independentemente do resultado.
50 - Os trabalhos aludidos em 12) tenham sido cumpridos conforme as instruções da autora.
51 - A tela adquirida pela autora inicialmente não fosse adequada ao fim a que se destinava.
52 - Aquando do funcionamento da máquina aludida em 16), uma das cabeças de metal da máquina tenha caído sobre a tela, provocando um corte nessa mesma tela.
*
IV.
As questões prévias à apreciação do recurso.
a) Violação do dever de sintetização nas conclusões da apelação
Sob a epígrafe “ónus de alegar e formular conclusões”, dispõe o art.º 639º, nº 1, do Código de Processo Civil que “o recorrente deve apresentar a sua alegação, na qual conclui, de forma sintética, pela indicação dos fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão”.
De acordo com o nº 3 do mesmo artigo, “quando as conclusões sejam deficientes, obscuras, complexas (…), o relator deve convidar o recorrente a completá-las, esclarecê-las ou sintetiza-las, no prazo de cinco dias, sob pena de se não conhecer do recurso, na parte afetada”.
Assim, o recorrente tem o ónus de alegar e formular conclusões. Estas são parte daquelas, mas enquanto nas alegações propriamente ditas o recorrente expõe os fundamentos do recurso, as conclusões são o culminar daquelas por uma síntese do enunciado das questões que o alegante pretende que o tribunal ad quem aprecie. Nessa síntese, deve indicar também as normas jurídicas violadas, o sentido que deve ser atribuído às normas cuja aplicação e interpretação determinou o resultado que pretende impugnar. Perante eventual erro na determinação das normas aplicáveis, deve indicar as que deveriam ter sido aplicadas.
As conclusões são a indicação, de forma sintética, dos fundamentos porque se pede a alteração, revogação ou anulação da decisão e não se confundem com o “pedido”.[5] Cumprem importante missão de levantamento das questões controversas, procurando evitar a impugnação geral, vaga e indefinida, mas, também, a viabilização do exercício do contraditório, de modo a não criar dificuldades acrescidas à posição da outra parte, privando-a de elementos importantes para organizar a sua defesa, em sede de contra-alegações.
A complexidade das conclusões constitui uma das causas determinantes do convite do relator ao recorrente para que proceda à sua correção e impõe-se precisamente nos casos em que as alegações, embora contendo os fundamentos do recurso, não constituam uma verdadeira sínteses dos mesmos.
A propósito, diz-nos A. Abrantes Geraldes[6]: “As conclusões serão complexas quando não cumpram as exigências de sintetização a que se refere o nº 1 (prolixidade) ou quando, a par das verdadeiras questões que interferem na decisão do caso, surjam outras sem qualquer interesse (inocuidade) ou que constituem mera repetição de argumentos anteriormente apresentados. (…). Ou, ainda, quando se mostre desrespeitada a regra que aponta para a necessidade de a cada conclusão corresponder uma proposição, evitando amalgamar diversas questões. Nestes casos, trata-se fundamentalmente de eliminar aquilo que é excessivo, de forma a permitir que o tribunal de recurso apreenda com facilidade as verdadeiras razões nas quais o recorrente sustenta a sua pretensão de anulação ou de alteração do julgado”.
Não é inédita a apresentação de conclusões do recurso como uma perfeita cópia ou reprodução formal das alegações, apenas com a especificação prévia de “conclusões”, com evidente e absoluta inexistência de síntese. Por isso, também é conhecida jurisprudência que equipara essa repetição à falta de conclusões, não permitindo, por isso, o convite ao aperfeiçoamento.[7] Mais exigente, surge outra jurisprudência para a qual não valem como conclusões arrazoadas longas e confusas em que se não discriminam com facilidade as questões invocadas[8], ou ainda a falta de indicação concisa dos fundamentos explanados e desenvolvidos nas alegações, como equivalendo à falta de conclusões, pelo que, em conformidade, se defende nestes arestos que o recurso deve ser rejeitado. No essencial, defende esta jurisprudência que a repetição nas conclusões do que é dito na motivação se traduz em falta de conclusões. Alguma desta jurisprudência está acompanhada por Cardona Ferreira[9] que escreveu: “As conclusões são uma breve síntese do enunciado das questões que o alegante pretende que o Tribunal ad quem aprecie: por exemplo, legitimidade, validade contratual, cumprimento, etc., etc. Se as ‘conclusões” forem, praticamente, uma repetição do que já está no texto das alegações, não são, legalmente, conclusões.
Outra jurisprudência, mais compassiva e tolerante, sobretudo seguida no Supremo Tribunal de Justiça, tem defendido que a reprodução nas “conclusões” do recurso da respetiva motivação não equivale a uma situação de alegações com “falta de conclusões”, de modo que em lugar da imediata rejeição do recurso, nos termos do art.º 641º, nº 2, al. b), do Código de Processo Civil, é ajustada a prolação de despacho de convite ao aperfeiçoamento, com fundamento na apresentação de conclusões complexas ou prolixas, nos termos do art.º 639º, nº 3, do mesmo código.
No caso sob apreciação, as conclusões desenvolvem-se ao longo de extensas 28 páginas, com alguma repetição de ideias e prolixidade que, nem por isso, as tornam incompreensíveis ou complexas. Poderiam estar mais sintetizadas, mas também é verdade que a sua extensão não lhes retira clareza, antes facilita o exercício do direito de resposta e contraditório pela recorrida e uma melhor compreensão dos fundamentos dos recurso, também pelo tribunal, que, aliás, a apelante expões no corpo das alegações em 48 páginas, ou seja, quase o dobro do espaço dedicado às conclusões, o que desde logo revela sintetização destas últimas. Ou seja, a argumentação ali detalhada foi explicitada nas conclusões de forma evidentemente mais concisa. Em ambas as partes das alegações a exposição é clara, percetível, linear. Mais…, a avaliar pela motivação das contra-alegações e pela síntese conclusiva das mesmas, não fica dúvida alguma de que a recorrida compreendeu perfeitamente as questões e a argumentação da recorrente, face às quais produziu uma verdadeira resposta, com exercício do contraditório em alegações e conclusões, também estas últimas expostas em 18 páginas, o que também excede a síntese normalmente praticada em casos semelhantes.
A síntese que a recorrente apresentou não é exemplar enquanto tal, mantendo algum do desenvolvimento desnecessário e já expendido no corpo das alegações, mas está muito longe de traduzir um vício que comprometa as conclusões.
Com efeito, aceitam-se as conclusões das alegações tal como estão redigidas, sem necessidade de aperfeiçoamento por qualquer uma das causas em referência no citado art.º 639º, nº 3.
Temos, pois, como inconsequente a invocação, pela recorrida, da falta de sintetização das conclusões da apelação.
*
b) Preterição do dever de indicação, com precisão, das passagens da gravação em que a apelante funda o seu recurso e a sua consequente rejeição imediata quanto aos pontos em que aquela apenas invoca prova testemunhal, ao abrigo do art.º 640º, nº 2, al. a), do Código de Processo Civil
Passa depois a B1… a defender que o recurso em matéria de facto deve ser rejeitado no que se refere ao pedido de alteração dos pontos 14, 17 32, 36, 42 e 43 dados como provados na sentença recorrida, bem como quanto às alíneas a), b), c), d) e e) que a Recorrente indica que deveriam ser dadas como provadas, por a C1…, quanto aos mesmos, se basear apenas em prova testemunhal para lograr tal modificação e não ter cumprido o ónus previsto no art.º 640º, nº 2, al. a), do Código de Processo Civil, na sua determinação de que, quando os meios de prova invocados tenham sido gravados, incumbe ao recorrente indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sob pena de imediata rejeição do recurso.
Antes de mais importa dizer que a recorrente cumpriu os ónus primários previstos no nº 1, al. a), b) e c) do art.º 640º.
Quanto à al. a) do nº 2 daquele artigo, temos vindo a entender que a indicação das passagens da gravação com referência à hora, ao minuto e ao segundo, corresponde à forma mais exata e rigorosa possível em função dos meios de reprodução da gravação normalmente utilizados. Porém, não é a única legalmente admissível, não sendo de excluir outras formas de indicação, também elas suficientemente satisfatórias, já que, na teleologia da norma, não deixa de ser possível fazer o controlo da fundamentação do recurso em matéria de facto com recurso à prova gravada, com possibilidade, no limite, da sujeição do recorrente ao regime da litigância de má fé, cumprindo-se, mesmo numa exigência mais parcimoniosa, um mínimo de concretização dos meios de prova gravada.
Sobre esta problemática dos ónus do recorrente que impugna a decisão da matéria de facto, no dia 16 de fevereiro de 2017, foi inserido no blogue do IPPC o seguinte “post”, subscrito por Miguel Teixeira de Sousa: “Decisão sobre a matéria de facto; impugnação; "concretos meios probatórios"; ónus do recorrente 1. O sumário de STJ 3/11/2016 (342/14.8TTLSB.L1.S1):
Tendo a recorrente identificado no corpo alegatório os concretos meios de prova que impunham uma decisão de facto em sentido diverso, não tem que fazê-lo nas conclusões do recurso, desde que identifique os concretos pontos da matéria de facto que impugna e enuncie a decisão alternativa pretendida.
2. Na fundamentação do acórdão pode ler-se o seguinte:
"O acórdão recorrido reconhece que a recorrente indica os factos que considera terem sido mal julgados, especifica os meios de prova que, em seu entender, impunham decisão diversa da recorrida, e indica a decisão que pretende seja proferida sobre tais factos.
Mas como não indica, nem nas alegações, nem nas conclusões, as passagens da gravação dos depoimentos em que se funda o recurso, limitando-se, apenas, a indicar o início e o termo de cada um desses depoimentos, considera a Relação que tal omissão determina, nos termos do nº 2 al. a) do artigo 640º do CPC, a imediata rejeição do recurso nesta parte.
Não podemos, no entanto, e quanto a este ponto, concordar com esta posição. Efectivamente é inequívoco que a recorrente indica os factos que considera terem sido mal julgados e indica a decisão que pretende seja proferida sobre tais factos.
Por outro lado, especifica os meios de prova que, em seu entender, impõem decisão diversa da recorrida, embora não indique as passagens concretas da gravação que imporão uma resposta do tribunal consentânea com a sua pretensão, pois que se limita a indicar o início e o fim do depoimento.
Decorre do n.º 2, alínea a) do supracitado artigo 640º do CPC, que quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na parte respectiva, indicar com exactidão as passagens da gravação em que se funda o recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes - alínea a).
Quanto ao cumprimento deste ónus, a jurisprudência desta Secção Social tem decidido, com foros de unanimidade, que tendo o recorrente identificado no corpo alegatório os concretos meios de prova que impunham decisão diversa, não tem que fazê-lo nas conclusões do recurso, desde que identifique os concretos pontos da matéria de facto que impugna, vendo-se neste sentido os acórdãos de 1/10/2015, processo nº 824/11.3LRS.L1.S1 (Ana Luísa Geraldes); 14/1/2016, Processo nº 326/14.6TTCBR.C1.S1 (Belo Morgado); e de 11/2/2016, processo nº 157/12.8TUGMR.G1.S1 (Belo Morgado).
No caso presente a recorrente transcreveu nas suas alegações os depoimentos das testemunhas que, em seu entender, suportam a sua pretensão, conforme se colhe de fls. 631 a 640 dos autos. E indica o seu início e fim na gravação que lhe serve de suporte. Consideramos que, apesar disso, deu cumprimento ao ónus imposto pela alínea b), do nº 1 do artigo 640º e pela alínea a) do seu número 2. Efectivamente, e conforme doutrina do Acórdão deste Supremo Tribunal de 22.09.2015, P. 29/12.6TBFAF.G1.S1, 6ª Secção (Pinto de Almeida), quanto ao requisito previsto no n.º 2, al. a), justifica-se alguma maleabilidade, em função das especificidades do caso, da maior ou menor dificuldade que ofereça, com relevo, designadamente, para a extensão dos depoimentos e das matérias em discussão. E ainda que possa faltar a indicação exacta das passagens da gravação, continua o aresto citado, esta omissão não dificulta, de forma substancial e relevante, o exercício do contraditório, nem o exame pelo tribunal, pelo que a rejeição do recurso, com este fundamento, se afigura uma solução excessivamente formal, rigorosa e sem justificação razoável.
Na situação presente, embora a recorrente não tenha levado às conclusões a indicação dos concretos meios probatórios em que fundamenta a sua pretensão, fá-lo de forma clara na sua alegação, transcrevendo as passagens dos depoimentos que suportam a sua pretensão, e indicando ainda os números correspondentes ao seu início e fim na gravação.
Assim, justifica-se a aplicação da doutrina acima exposta, não se podendo, por isso, manter a posição da Relação que rejeitou a apelação na parte respeitante à reapreciação da matéria de facto, tanto mais que a recorrida exerceu cabalmente o seu direito ao contraditório, convocando para infirmar o entendimento da recorrente os depoimentos das testemunhas EE, CC e DD, cujas passagens da gravação indica e cujos excertos também transcreve."
3. [Comentário] O acórdão adopta a boa doutrina sobre a matéria. Regista-se com aplauso que a mesma é seguida, pelo menos na Secção Social do STJ, "com foros de unanimidade".

Continuemos…
Extrai-se do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 1.7.2014[10]:
«(…)
Vale dizer, que as normas devem, se cumpridas com um mínimo de arrimo sociojurídico e ser interpretadas não na sua literalidade lógico-positiva, mas moldando-lhe o sentido e conferindo-lhe poder significante casuisticamente considerado.
(…)
Ainda assim, pensamos, que o plano das exigências inscritas no preceito ordenador e que se prendem com o apertado formalismo imposto aos recorrentes – indicação dos concretos pontos de facto cuja decisão pretendem ver alterada, por estimarem estarem incorrectamente julgados; quais os concretos meios probatórios que impõem diverso julgamento (dos concretos pontos de facto indicados), e quando os meios probatórios tenham sido gravados, quais os depoimentos em que funda a discordância – tem de permitir a aceitação de um parâmetro de admissibilidade compaginável com a função e a finalidade do recurso da decisão de facto, qual seja a de que, desde que o apelante cumpra, no essencial com o ónus imposto na lei, o tribunal não pode deixar de proceder à reapreciação da decisão de facto.
(…)
Se é inquestionável que o julgamento a que o tribunal de recurso procede, na sua função de escrutinar e sindicar eventuais erros de julgamento – error in judicando –, praticados no tribunal recorrido, não pode redundar num novo e total julgamento da causa, não deixa de ser menos verdade que, tal como o legislador entendeu dever regular o recurso da decisão de facto, não pode o tribunal de recurso eximir-se a essa reapreciação escoltado e respaldado numa ausência de indicação, estreme, das passagens das gravações em que se encontrem gravados os depoimentos que, no juízo do recorrente, impõem decisão do impugnado enunciado fáctico. Não pode, o tribunal de recurso, em nosso aviso, deixar de conhecer do recurso da decisão de facto se, tendo o recorrente cumprido, ainda que, com alguma parcimónia, o dever injungido pelo comando legal.
(…).»
O acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 29.10.2015[11] distingue entre ónus de impugnação primário e secundário:
«(…)
Percorrendo, deste modo, os regimes processuais que têm vigorado quanto a este tema, é possível distinguir um ónus primário ou fundamental de delimitação do objecto e de fundamentação concludente da impugnação - que tem subsistido sem alterações relevantes; e um ónus secundário – tendente, não tanto a fundamentar e delimitar o recurso, mas a possibilitar um acesso mais ou menos facilitado aos meios de prova gravados relevantes para a apreciação da impugnação deduzida – que tem oscilado, no seu conteúdo prático, ao longo dos anos e das várias reformas – indo desde a transcrição obrigatória dos depoimentos até uma mera indicação e localização das passagens da gravação relevantes.
Ora, se é certo que – relativamente ao cumprimento de tais ónus, primário e secundário – não se permite a formulação de um sistemático convite ao aperfeiçoamento de eventuais deficiências, não poderá deixar de ser avaliada diferentemente a falha da parte consoante ocorra num ou noutro âmbito: como é óbvio, a ausência de objecto delimitado e de fundamentação minimamente concludente da impugnação deduzida deverá ditar, de forma inevitável e em termos proporcionais, a liminar rejeição do recurso quanto à matéria de facto.
Pelo contrário, o incumprimento do referido ónus secundário, tendente apenas a facilitar a localização dos depoimentos relevantes no suporte técnico que contem a gravação da audiência, deverá ser avaliado com muito maior cautela: é que, por um lado, o conceito usado pela lei de processo (exacta indicação das passagens da gravação) é, até certo ponto, equívoco, pressupondo a necessidade de distinguir entre a (insuficiente) mera indicação e a indicação exacta das passagens relevantes dos depoimentos gravados; por outro lado, por força do princípio da proporcionalidade, não parece justificável a imediata e liminar rejeição do recurso quando – apesar de a indicação do recorrente não ser, porventura, totalmente exacta e precisa - não exista dificuldade relevante na localização pelo Tribunal dos excertos da gravação em que a parte se haja fundado (como ocorrerá normalmente nos casos, como o dos autos, em que tal indicação do recorrente das passagens da gravação, é complementada com uma extensa transcrição, em escrito dactilografado, dos depoimentos relevantes para o julgamento do objecto do recurso).
Saliente-se que, na interpretação da norma que consagra este ónus de indicação exacta a cargo do recorrente que impugna prova gravada, não pode deixar de se ter em consideração a filosofia subjacente ao actual CPC, acentuando a prevalência do mérito e da substância sobre os requisitos ou exigências puramente formais, carecidos de uma interpretação funcionalmente adequada e compaginável com as exigências resultantes do princípio da proporcionalidade e da adequação - evitando que deficiências ou irregularidades puramente adjectivas impeçam a composição do litígio ou acabem por distorcer o conteúdo da sentença de mérito, condicionado pelo funcionamento de desproporcionadas cominações ou preclusões processuais.
(…)
Por outro lado, esta ideia base, segundo a qual não deve adoptar-se uma interpretação rígida e desproporcionadamente exigente de ónus ou cominações de natureza essencialmente formal ou secundária – devendo adoptar-se interpretação conciliável com as exigências de um princípio fundamental de proporcionalidade e adequação – vem encontrando acolhimento claro na jurisprudência recente deste Supremo, nomeadamente a propósito do grau de exigência e intensidade do ónus do recorrente que presentemente nos ocupa.
(…)».
No caso, a recorrente não se limita a indicar o início e o termo da gravação de todo e qualquer depoimento. Seleciona os depoimentos que considera relevantes e faz uma referência à data da sessão em que foram prestados. Quanto a estes, transcreve/concretiza, no corpo das alegações, as passagens da gravação que considera emblemáticas da sua oposição à versão factual que impugnou facto-a-facto e que ambiciona ver alterada para o texto que também propôs, ainda com base na prova documental que identifica com rigor maior.
A recorrida, nas suas contra-alegações, respondeu à impugnação da decisão em matéria de facto de forma bem reveladora de adequada compreensão dos fundamentos do recurso, com rebate significativo dos respetivos argumentos por referência a depoimentos testemunhais com indicação rigorosa do tempo das passagens da gravação que considera mais relevantes e também com transcrições.
Parece-nos também não poder excluir-se à partida que o recorrente possa considerar relevante a totalidade de depoimentos testemunhais par a alteração da decisão, pela mesma razão que o tribunal de recurso pode optar por ouvir a totalidade da prova produzida em audiência ao abrigo da al. b) do nº 2 do art.º 640º.
De tudo decorre, no seguimento da jurisprudência complacente do Supremo Tribunal de Justiça indicada[12], não vislumbrarmos motivos significativos de rejeição formal e parcial do recurso que, por isso, se admite.
Termos em que improcede esta questão prévia.
*
*
Apreciação dos fundamentos do recurso
1. Erro de julgamento na decisão em matéria de facto
Apreciamos aqui também, por razões de coerência lógica e interpenetração temática, a questão prévia da autoridade do caso julgado suscitada nas contra-alegações.

A Recorrente pretende a modificação dos seguintes factos, como também se segue:
Ponto 3: Discorda apenas do que se deu como provado quanto às dimensões da tela, pretendendo que se de como provado que são as seguintes: cerca de 8,9mm de espessura, 900mm de largura e 27500mm de comprimento.
Ponto 8: Não provado.
Ponto 14: Não provado.
Ponto 16: Não provado.
Ponto 17: Pretende a recorrente que seja dado como provado, além do que já está, que a fatura foi paga pela A., por meio de cheque.
Ponto 31: Não provado.
Ponto 32: Não provado na parte em que se afirma que a R. voltou a afirmar que não estava em condições de assegurar a reparação cabal e definitiva da colagem da tela, alegando para o efeito que os materiais e equipamentos utilizados por si poderiam não ser compatíveis com a tela em causa.
Ponto 36: Não provado.
Ponto 37: pretende a correção deste ponto com a afirmação de que o segundo tapete adquirido não é igual ao primeiro (o substituído).
Ponto 38. Não provado.
Ponto 39: Não provado.
Ponto 42: Não provado.
Ponto 43: Não provado.

Pretende ainda a apelante que se acrescentem aos factos provados os seguintes factos (sendo simultaneamente retirados da matéria dada como não provada):
a) A Ré, antes da adjudicação do serviço informou a Autora que não se responsabilizava pelo resultado final da vulcanização da tela, uma vez que a tela não tinha sido por si fabricada e existiam diferenças de materiais.
b) A Ré aceitou fazer o serviço de 12), na condição não assumir qualquer responsabilidade pelo resultado final da colagem/vulcanização, uma vez que desconhecia o tipo de artigo a vulcanizar e a compatibilidade desse material com as suas prensas.
c) Nessas circunstâncias, em momento prévio à execução dos trabalhos em 12) a Ré comunicou à Autora que não podia assegurar a qualidade da colagem da tela, alegando para o efeito que os materiais e equipamentos utilizados por si poderiam não ser compatíveis com a tela em causa.
d) A primeira tela/tapete adquirida pela Autora, objecto dos trabalhos de 12) estava mal fabricada. Tais defeitos de fabrico, que poderiam implicar um mau funcionamento do tapete, foram comunicados pela Ré à Autora em momento prévio à realização dos trabalhos de 12). A Autora ordenou a realização dos trabalhos não obstante os defeitos da tela.
e) O acidente descrito em 44) e aquando do funcionamento da máquina aludida em 16) consistiu em que uma das cabeças de metal da máquina caiu sobre a tela, provocando-lhe um corte de 2/3 mm que condicionou o funcionamento da máquina.
Entende-se atualmente, de uma forma que se vinha já generalizando nos tribunais superiores, hoje largamente acolhida no art.º 662º do Código de Processo Civil, que no seu julgamento, a Relação, enquanto tribunal de instância, usa do princípio da livre apreciação da prova com a mesma amplitude de poderes que tem a 1ª instância (art.º 655º do anterior Código de Processo Civil e art.º 607º, nº 5, do código atual), em ordem ao controlo efetivo da decisão recorrida, devendo sindicar a formação da convicção do juiz, ou seja, o processo lógico da decisão, recorrendo com a mesma amplitude de poderes às regras de experiência e da lógica jurídica na análise das provas, como garantia efetiva de um segundo grau de jurisdição em matéria de facto; porém, sem prejuízo do reconhecimento da vantagem em que se encontra o julgador na 1ª instância em razão da imediação da prova e da observação de sinais diversos e comportamentos que só a imagem fornece.
Como refere A. Abrantes Geraldes[13], “a Relação deve alterar a decisão da matéria de facto sempre que, no seu juízo autónomo, os elementos de prova que se mostrem acessíveis determinem uma solução diversa, designadamente em resultado da reponderação dos documentos, depoimentos e relatórios periciais, complementados ou não pelas regras de experiência”… “afastando definitivamente o argumento de que a modificação da decisão da matéria de facto deveria ser reservada para casos de erro manifesto” ou de que “não é permitido à Relação contrariar o juízo formulado pela 1ª instância relativamente a meios de prova que foram objecto de livre apreciação”, acrescentando que este tribunal “deve assumir-se como verdadeiro tribunal de instância e, por isso, desde que, dentro dos seus poderes de livre apreciação dos meios de prova, encontre motivo para tal, deve introduzir as modificações que se justificarem”.
Importa, pois, por regra, reexaminar as provas indicadas pelo recorrente e, se necessário, outras provas, maxime as indicadas pelo recorrido nas contra-alegações e as referenciadas na fundamentação da decisão em matéria de facto e que, deste modo, serviram para formar a convicção do Ex.mo Julgador, em ordem a manter ou a alterar a referida materialidade, exercendo-se um controlo efetivo dessa decisão e evitando, na medida do possível, a anulação do julgamento, antes corrigindo, por substituição, a decisão em matéria de facto.
Refere Luís Filipe Pires de Sousa[14]: “Motivar os factos significa explicar, com a forma de uma argumentação justificativa, o raciocínio que permite atribuir uma eficácia determinada a cada meio de prova e que, sobre esta base, fundamenta a eleição a favor da hipótese sobre o facto que, de acordo com as provas disponíveis, tem um grau de confirmação lógica mais elevado. Este supõe que a motivação deve dar conta dos dados empíricos assumidos como elementos de prova, das inferências que a partir deles se formularam e dos critérios utilizados para extrair as suas conclusões probatórias; do mesmo modo, a motivação deve dar conta também dos critérios com os quais se justifica a valoração conjunta dos distintos elementos de prova, assim como das razões que fundamentam a eleição final para que a hipótese sobre o facto esteja justificada”.
Citando Antunes Varela, escreve Baltazar Coelho[15] que “a prova jurídica de determinado facto … não visa obter a certeza absoluta, irremovível da (sua) verificação, antes se reporta apenas a certeza subjectiva, a convicção positiva do julgador ou, o que vale por dizer, apenas aponta para a certeza relativa dos factos pretéritos da vida social e não para a certeza absoluta do fenómeno de carácter científico”.
Na mesma linha, ensina Vaz Serra[16] que “as provas não têm forçosamente que criar no espírito do juiz uma absoluta certeza acerca dos factos a provar, certeza essa que seria impossível ou geralmente impossível: o que elas devem é determinar um grau de probabilidade tão elevado que baste para as necessidades da vida”. É a afirmação da corrente probabilística, seguida pela maior parte da doutrina que, opondo-se à corrente dogmática, considera não exigível mais do que um elevado grau de probabilidade para que se considere provado o facto.
Terá que haver sempre um grau de convicção indispensável e suficiente que justifique a decisão, que não pode ser, de modo algum, arbitrária, funcionando aquela como base de compreensão do processo lógico e convincente da sua formação.
Vejamos então!
São algumas as situações em que a recorrente ataca a decisão alegando que não foi produzida qualquer prova sobre determinado facto concreto, o que nos leva necessariamente --- havendo fundamento para a sua concreta apreciação --- a tomar conhecimento da totalidade da prova ou, no mínimo, da prova que da motivação da decisão e dos fundamentos das contra-alegações resulte como fundamentadora do facto tido como provado. Acresce, à partida, que as caraterísticas próprias dos factos em causa e a evidente discussão de concretos pormenores que se prevê que sejam de grande relevância para a decisão justificam mesmo um amplo conhecimento da generalidade da prova produzida por documentos e por testemunhas, o que sempre nos vai reconduzir à utilização do mecanismo previsto na primeira parte da al. b) do nº 2 do art.º 640º, ou seja, a utilização dos poderes de investigação oficiosa na apreciação da matéria objeto de impugnação.
Previamente, porém, por motivos de coerência e lógica jurídica, havemos de ponderar a invocação, pela recorrida, da autoridade do caso julgado formado na sentença transitada em julgado, produzida no proc. nº 67078/17.3YIPRT, do mesmo Juízo Local Cível da Maia.
Diz-nos a B1… que, como consta daquela sentença, a forma e as circunstâncias em que a recorrente executou o serviço contratado, designadamente se o mesmo foi correta e cabalmente executado, já foi objeto de apreciação naquela decisão transitada em julgado; mais concretamente, alega que os termos e condições do acordo havido entre a aqui recorrente e a recorrida para aplicação da tela em questão, as circunstâncias e os termos em que foram prestados tais serviços, a deficiente e incorreta aplicação da tela nas instalações da D…, Lda., os contactos estabelecidos a este propósito pelas partes e a natureza das intervenções posteriores da recorrente na dita tela já foram objeto de decisão judicial transitada em julgado, estando cabalmente provados tais factos, impondo-se, por isso, relativamente aos mesmos a autoridade do caso julgado da citada decisão. Existe, na sua perspetiva, uma total coincidência e sobreposição entre o que ficou provado e decidido na referida sentença e os factos dados como provados sob os pontos 1 a 30 na sentença aqui impugnada, de tal modo que se impõe, nesta parte, a imodificabilidade da decisão proferida em matéria de facto.
A recorrida afirma ainda nas contra-alegações que aquela sentença transitada decidiu a seu favor em não ter efetuado o pagamento da fatura cujo valor era contra ela peticionado no proc. nº 67078/17.3YIPRT pela aqui demandada, uma vez que esta não logrou cumprir cabalmente o resultado a que se comprometeu e não pode vir exigir o pagamento do valor correspondente a uma fatura emitida na sequência de uma tentativa de reparação da execução da obra inicialmente realizada e que, mesmo assim, não produziu os efeitos pretendidos, ali se decidindo que é legítima a oposição ao pagamento das quantias alegadamente em dívida por se terem denunciado deficiências e se ter exigido a sua eliminação, não efetuada.
Vamos analisar aquela sentença, cujo trânsito em julgado não suscita dúvidas.
A aqui R. demandou a aqui A. naquela ação nº 67078/17.3YIPRT pedindo a sua condenação no pagamento da quantia de € 372,69 e respetivos juros, relativamente ao incumprimento, pela aqui A., dona da obra, da obrigação de pagar aquele preço de trabalhos prestados no âmbito de uma empreitada entre ambas as partes contratada, designadamente a reparação de uma tela.
A aqui A. defendeu-se ali alegando que recusou fazer aquele pagamento porque a aqui R. executou os trabalhos de modo deficiente, sem cabal satisfação do resultado a que se obrigou, não podendo, por isso, exigir o pagamento de uma fatura correspondente a um trabalho de reparação de defeitos resultantes do cumprimento deficiente da sua obrigação de prestar e que, mesmo assim, não surtiu efeito reparador.
A ali autora respondeu à exceção de não pagamento alegando que o serviço contratado foi prestado sem que que dele tivessem resultado deficiências ou qualquer outro vício, tendo a tela ficado a funcionar normalmente, de tal modo que a ali ré o pagou. Sucedeu --- acrescenta --- que a tela, em perfeito funcionamento, sofreu um acidente consistente na queda de uma cabeça de metal da máquina sobre a mesma, causando um corte no seu revestimento, sendo que foi nessa sequência e por causa desse acidente que a aqui R. prestou o serviço (novo) que a aqui A. então lhe solicitou e cujo pagamento ali requereu por via da dita ação.
Mais alegou ali a C1… que alertou a B1… de que não se responsabilizava pela reparação da tela, que o primeiro serviço foi realizado com sucesso, que desconhecia o comportamento da tela noutras situações, tendo sido estas limitações aceites pela aqui A. Concluiu que a tela não tinha reparação, devendo a B1… pagar-lhe o custo da deslocação do técnico que enviou ao local, conforme a fatura em causa no requerimento inicial.
Foi discutida a causa no proc. 67078//17.3YIPRT, em cuja sentença foram dados como provados os seguintes factos:[17]
l- A Requerente dedica-se ao fabrico e comercialização de telas e correias industriais.
2- No âmbito da sua atividade comercial, a Requerente foi contactada pela Requerida para tentar reparar uma tela que não tinha sido por si fornecida.
3- Foi efectuada a deslocação pelo técnico para tentar reparar a tela.
4- Foi emitida a factura n° 7 1714, de 28/04/2017, no valor de € 372,69 (trezentos e setenta e dois euros e sessenta e nove cêntimos).
5- A ré apesar de interpelado para o efeito, não procedeu ao pagamento da quantia constante na factura.
6- A Requerida é uma sociedade comerciai por quotas que se dedica ao comércio e representação de produtos para a indústria cerâmica. – Cfr. Certidão permanente da A. acessível através do código de acesso 6008-3261-4314.
7- Por sua vez a R. é uma sociedade comercial constituída sob a forma anónima, que se dedica à produção e comércio por grosso e a retalho de elementos de transmissão por correias, correntes e afins, de telas transportadoras e outros produtos similares, bem como a prestação de serviços conexos com a produção e comercialização daqueles bens.
8- No âmbito do exercício da sua atividade comercial, em Fevereiro de 2016, a Requerida vendeu a uma sua cliente, a sociedade “D…, Lda” um tapete/tela polidora (com cerca de 8 mm de espessura e 1200 mm de largura) para ser aplicado numa linha de produção (máquina de polimento) dos componentes cerâmicos fabricados pela sociedade acima identificada, tendo também sido contratado o serviço de montagem/colagem através de soldadura da tela fornecida. – Cfr. doc. n.° 2 que ora se junta e cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.
9- O fornecimento e aplicação da tela vendida pela Requerida seria executado nas instalações da sociedade “D…, LDA”, sitas no …, …, concelho de Águeda.
10- Tendo em conta que a Requerida não possui equipamentos que lhe permitam prestar, diretamente, o serviço de montagem/soldadura da tela de polimento fornecida na respetiva máquina de polimento, subcontratou a prestação desse serviço através da aqui Requerente.
11- A factura cujo valor peticiona resultou de uma reparação a um serviço por si anteriormente prestado, designadamente da aplicação/instalação da mesma na máquina de polimento a que se destinava e que havia sido executada pela própria Requerente.
12- Para efeitos de montagem/instalação da tela através de um processo de soldadura a aqui Requerida contactou a Requerente no dia 21 de Fevereiro de 2016, no sentido de aquilatar se estava em condições de prestar o serviço requerido e tinha condições técnicas e de disponibilidade para o fazer, tendo sido solicitado ainda um orçamento referente aos custos desse serviço.
13- Na sequência deste pedido por parte da Requerida, a Requerente solicitou, previamente à apresentação de uma proposta para a realização desse serviço, que lhe fossem disponibilizadas as informações sobre o “kit de empalme” e tipo de tapete/tela que seria objeto da mesma, bem como as respetivas dimensões características.
14- A esta solicitação respondeu imediatamente a Requerida, através de email datado desse mesmo dia 21 de Fevereiro de 2017 tendo enviado à Requerente todas as informações solicitadas acompanhadas das especificações técnicas e características do tapete/tela que seria objeto do serviço de colagem, fornecidas pelo próprio fabricando do equipamento. — Cfr. doc. n.° 3 que ora se junta e cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.
15- Após a receção dessa comunicação, onde constavam todas as características e especificidades do tapete que seria objeto do serviço a contratar, a Requerente respondeu afirmando expressamente que tinha condições técnicas e disponibilidade para prestar tal serviço, tendo para o efeito enviado à Requerida, nesse mesmo dia 21 de Fevereiro de 2017, a proposta n.° …/17 acompanhada do preço estimado para a sua realização e afirmando ter disponibilidade imediata para proceder à colagem da tela na máquina de polimento a que esta se destinava, solicitando ainda que fossem enviadas fotos do “kit” (referente ao tapete) para que o técnico da Requerente pudesse efectuar a intervenção adequadamente. – Cfr. doc. n.° 4 que ora se junta e cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.
16- Analisada a proposta e as condições da mesma apresentadas pela Requerente a Requerida comunicou no dia 22 de Fevereiro de 2016 que adjudicava a execução do serviço (instalação/colagem da tela através de soldadura) em causa à Requerente, tendo ficado acordado que o serviço seria realizado no dia 1 de Março de 2017 nas instalações da Cliente da Requerida acima identificada. - doc. n.° 5 que ora se junta e cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.
17- Previamente à execução do serviço, a Requerida enviou ainda à Requente, conforme esta havia solicitado, imagens referentes ao tipo de empalme que seria executado na aplicação do tapete, tendo ficado acordado o horário e local de encontro do técnico da R. que iria prestar o serviço contratado. – Cfr. doc. n.° 6 que ora se junta e cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.
18- No dia acordado, 1 de Março de 2017, o técnico da Requerente, Sr. E…, deslocou-se assim às instalações da Cliente da Requerida nos termos acordados para proceder à execução da obra contratada e que consistia na aplicação e colagem da tela na respetiva máquina de polimento.
19- Após a execução do serviço por parte da Requerente verificou-se desde logo que a execução da obra em questão apresentava deficiências, sendo que na zona onde foi feita a selagem da tela por parte da Requerente (no local do empalme) existia um desnível que provocava um alto na tela do tapete.
20- Imediatamente a Requerida reclamou junto do técnico da Requerente a existência desse desnível que atestava a deficiente execução da obra por parte da Requerente chamando a atenção que aquela irregularidade iria afectar o normal funcionamento da máquina onde a tela havia sido instalada, tendo exigido que tal facto (a existência do desnível) ficasse a constar a própria folha se execução do serviço elaborada pela própria Requerente. – Cfr. doc. n.° 7 que ora se junta e cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.
21- Desse documento consta expressamente, no campo correspondente a “notas” que a “tela ficou um pequeno alto na emenda, devido à gravação”.
22- Assim a Requerida imediatamente chamou a atenção da existência de um defeito na aplicação da tela e alertado que tal facto provaria o deficiente funcionamento da máquina em que a tela foi aplicada.
23- A Requerente, reconhecendo a existência de tal vício (tanto assim que o mesmo ficou logo a constar da folha de execução do serviço), solicitou à Requerida que se aguardasse pela entrada em funcionamento da máquina para verificar se efectivamente a existência daquele relevo no tapete por si aplicado afectava o normal funcionamento da máquina e a finalidade a que a mesma se destina.
24- Tendo-se comprometido a reparar a situação caso tal se verificasse.
25- Após a execução da obra a Requerente emitiu a factura n.° ….. datada de 03/03/2017 para pagamento do serviço prestado. – Cfr. doc. n.° 8 que ora se junta e cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.
26- Ocorre que passados poucos dias verificou-se que, efetivamente, o desnível existente no empalme do tapete colocado pela Requerente estava a afectar o normal funcionamento da máquina provocando a ruptura dos ladrilhos precisamente quando apoiavam na zona da colagem.
27- De imediato a Requerida comunicou tal facto à Requerente solicitando expressamente a resolução imediata do problema. – Cfr. doc. n.° 9 que ora se junta e cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.
28- Contrariamente àquilo a que se havia comprometido a Requerente começou então, e apenas nessa altura, nunca antes tendo aludido a tal situação, a “descartar” a sua responsabilidade na deficiente colocação da tela, alegando agora que a desconformidade detetada “se devia ao facto de serem materiais de superfícies diferentes”.
29- Através de comunicação escrita, enviada à Requerente via email no dia 22 de Março de 2017, a Requerida reiterou a urgência na reparação do empalme do tapete cuja colagem/soldadura foi realizada pela Requerente uma vez que o desnível verificado estava a provocar a rotura do material, tendo então ficado agendada uma deslocação de um técnico da Requerente ao local a fim de verificar e corrigir a situação no dia 27 de Março de 2017 (segunda-feira). — Cfr. doc. n.º 10 que ora se junta e cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.
30- Contudo, após a nova intervenção levada a cabo pela R. a situação manteve-se, não tendo a situação dos vícios detectados na aplicação da tela ficado corrigidos.
31- Tanto assim que nos dias 20 e 21 de Abril de 2017, a Cliente da Requerida onde a tela havia sido instalada comunicou-lhe que o problema ao desnível detectado na zona do empalme e cuja colagem/soldadura havia sido realizado e objecto de nova intervenção da Requerente continuava sem ser resolvido, estando a tela em risco de abrir completamente o que provaria a sua completa inutilização a que acresceriam todos os prejuízos relacionados com a paragem da linha de montagem e das peças que existiam na linha. – Cfr. docs. n.°s 11 e 12 que ora se juntam e cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.
32- Mais uma vez a Requerida deu nota à Requerente de que, quer o serviço inicial, quer a posterior tentativa de reparação levada a cabo pela Requerente não resolveram os vícios existentes estando a tela a descolar na zona onde a Requerente havia procedido à colagem através de metido de soldadura e que era urgência resolver definitivamente a situação. Cfr. doc. n.° 13 que ora se juntam e cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.
33- Em resposta às várias interpelações da Requerida, a Requerente respondeu no dia 28 de Abril de 2017 enviando a factura cujo valor é peticionado nos presentes autos, referente à deslocação do seu técnico, como se tudo tivesse ficado cabalmente resolvido e não continuassem a verificar-se os problemas no serviço prestado pela Requerente. – Cfr. doc. n.° 14 que ora se juntam e cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.
34- Já anteriormente e, por várias vezes, a Requerida havia demonstrado o seu descontentamento com o serviço prestado pela Requerente (tanto assim os vícios detetados e prontamente comunicados subsistiam) e que não estava disposta a efetuar qualquer pagamento relativamente à intervenção ocorrida na tentativa de a Requerente corrigir aquilo que antes havia mal executado (o que mesmo assim não conseguiu fazer). Cfr. doc. n.° 15 que ora se juntam e cujo conteúdo se da por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.
35- Só nesta altura e confrontada com a deficiente execução do serviço por si prestado e das consequências que o mesmo estava a provocar é que a Requerente começou a dizer que, afinal, não poderia garantir a reparação cabal e definitiva da colagem da tela uma vez que os materiais e equipamentos utilizados pela Requerente na realização daquele serviço poderiam não ser compatíveis com a tela em causa e que o material da tela era diferente do utilizado pela Requerente, sendo que conhecia, desde o início, todas as características do material uma vez que essa informação lhe foi disponibilizada previamente à apresentação da propostas pela Requerente para a realização daquele serviço. – Cfr. docs. n.s° 16, 17 e 18 que ora se juntam e cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.
36- Face a toda a conduta da Requerente e tendo em conta que não logrou prestar devidamente o serviço contratado, nem na sua intervenção inicial nem na tentativa de reparação do mesmo realizada posteriormente, a Requerida recusou e recusa efetuar qualquer pagamento relativamente a uma reparação que, na verdade, nada reparou.
37- Pelo que a Requerida devolveu à Requerente a factura n.º ….. por considerar não existir qualquer fundamento legal que justifique a emissão de tal factura atentos os fundamentos supra expostos. – Cfr. doc. n.° 19 que ora se junta e cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.
38- A Requerida tinha em seu poder uma tela transportadora, tendo contactado a Requerente, no início de fevereiro de 2017, a fim de solicitar os seus serviços para proceder à sua aplicação e colagem.
39- A tela em questão não foi produzida, nem fornecida pela Requerente.
40- A tela sofreu um acidente, tendo uma das cabeças de metal da máquina caído sobre a tela e efectuado um corte no seu revestimento, conforme email de 23 de março de 2017 que se dá por reproduzido.
*
Foi decidido julgar não provado naquele mesmo processo:
- Que a Requerente se negou proceder à prestação de serviços, uma vez que a tela não tinha sido por si fabricada e não conhecia as suas características, alegando não poder garantir o sucesso da reparação, informando que a tentativa de reparação e os custos de deslocação ao técnico estariam sempre sujeitas a cobrança, quer se obtivesse ou não sucesso na reparação.
- Que não obstante todas as advertências da Requerente, a Requerida insistiu na tentativa de reparação da tela, confirmando que queria que a reparação fosse tentada e que o técnico da requerente se deslocasse para o efeito, procedendo à indicação do local de reparação.
- Que a Requerente por não ser produto por si fabricado negou-se a prestar tal serviço, explicando que não era política da empresa efectuar serviços em telas que não eram a si adquiridas, nem por si fabricadas, por desconhecer os seus componentes e especificações.
- Que a Requerida, por querer cumprir os prazos com o seu cliente a tela iria ser aplicada, e por não dispor de alternativa, insistiu por variadíssimas vezes com a Requerente, no sentido de a mesma lhe prestar tal serviço, garantindo e assegurando que ela mesma forneceria todas indicações e daria todas instruções necessárias para a aplicação da tela, e que as mesmas seriam da sua inteira responsabilidade.
- Que só assim a Requerente acedeu, na condição de que não poderia assumir qualquer responsabilidade pelo resultado final da vulcanização por desconhecer o tipo de artigo a vulcanizar e a compatibilidade com as suas prensas.
- Que apesar de tais alertas, a Requerida insistiu que a Requerente efectuasse tal serviço, independentemente do resultado, assegurando que assumiria toda e qualquer responsabilidade.
- Que a requerente tenha realizado o serviço pretendido, que foi cumprido na íntegra e conforme as instruções da Requerida.
- Que ao contrário do que a Requerida quer fazer crer, tal serviço foi bem prestado, aceite como bom pela Requerida, tendo a tela ficado a trabalhar normalmente.
- Que a requerida solicitou à requerente a reparação da tela.
- Que mais uma vez a Requerente tenha alertado a requerida para o facto de não se poder responsabilizar pela reparação, porquanto apesar de o primeiro serviço ter sido realizado com sucesso, certo é que a Requerente desconhecia o comportamento da tela noutras situações, tais limitações foram aceites pela Requerida.
- Até à data do acidente a tela encontrava-se a funcionar normalmente.
*
Com base nestes factos, discutiu-se ali, na ação nº 67078/17.3YIPRT, o (in)cumprimento do que foi considerado ser um contrato de empreitada celebrado entre as mesmas partes desta ação, de colagem/soldadura/empalme de um tapete rolante em PVC numa máquina de polimento cerâmico instalada em espaço de um determinado cliente da aqui A., a D…, Lda. Tendo sido a C1… (empreiteira) que dirigiu todo aquele processo de empalme do tapete rolante, só a ela se imputou o comprovado insucesso do seu serviço.
Concluiu-se ali que a aqui R. não cumpriu devidamente a sua obrigação de prestação de serviços sem vícios ou defeitos, apesar de intervenção posterior com intenção reparadora. Integrando-se esta no mesmo contrato, por não ter sido mais do que uma tentativa de reparação do fracasso do empalme, entendeu-se naquela sentença que, face ao incumprimento contratual da ali Requerente C1…, não podia ela obter a condenação da aqui A. no pagamento daquele serviço, pelo valor pretendido por via da ação, sendo legítima a oposição da B1…. Com efeito, a sentença absolveu-a do pedido.
Aquela situação parece ser, em larga medida, a mesma que aqui se discute. Entramos, por isso, na questão do caso julgado e da autoridade do caso julgado, suscitada nas contra-alegações.
O art.º 619º, nº 1, do Código de Processo Civil[18], dispõe que “transitada julgado a sentença ou o despacho saneador que decida do mérito da causa, a decisão sobre a relação material controvertida fica a ter força obrigatória dentro do processo e fora dele nos limites fixados pelos artigos 580.° e 581.°, sem prejuízo do disposto nos artigos 696.° a 702.°.
Segundo o subsequente art.º 621º, “a sentença constitui caso julgado nos precisos limites e termos em que julga: se a parte decaiu por não estar verificada uma condição, por não ter decorrido um prazo ou por não ter sido praticado determinado facto, a sentença não obsta a que o pedido se renove quando a condição se verifique, o prazo se preencha ou o facto se pratique”.
O caso julgado confere à decisão caráter definitivo. Uma vez transitada em julgado, a decisão não pode, em princípio[19], ser alterada; antes adquire estabilidade, deixando de ser lícito a parte vencida provocar a sua alteração mediante o uso dos recursos ordinários. E sendo de caso julgado material, relativo ao mérito da causa, que falamos, a estabilidade ultrapassa as fronteiras do processo, e portanto, além da preclusão operada no processo, produz-se a impossibilidade de a decisão ser alterada mesmo noutro processo.
Assim, a exceção do caso julgado pressupõe a repetição de uma causa depois de a primeira causa ter sido decidida por sentença que já não admite recurso ordinário e tem por fim evitar que o tribunal seja colocado na alternativa de contradizer ou de reproduzir[20] uma decisão anterior (art.º 580º, nº 1, última parte, e nº 2). Implica uma não decisão sobre a nova ação e pressupõe uma total repetição entre as duas, constituindo, assim, um impedimento à decisão de idêntico objeto posterior.
Nos termos do art.º 581º, nº 1, entende-se que a causa se repete quando se propõe uma ação idêntica a outra quanto aos sujeitos, ao pedido e à causa de pedir.
Há identidade de sujeitos quando as partes são as mesmas sob o ponto de vista da sua qualidade jurídica (nº 2).
Há identidade de pedido quando numa e noutra causa se pretende obter o mesmo efeito jurídico (nº 3).
Há identidade de causa de pedir quando a pretensão deduzida nas duas ações procede do mesmo facto jurídico (nº 4, primeira parte).
A teoria da substanciação[21] está desde há muito consagrada no nosso processo civil: a afirmação da situação jurídica tem de ser fundada em factos que, ao mesmo tempo que integram, tal como os outros alegados pelas partes, a matéria fáctica da causa, exercem a função de individualizar a pretensão para o efeito da conformação do objeto do processo. Isso mesmo decorre dos art.ºs 186º, nº 2, al. a), 552º, nº 1, al. d) e 581º, nº 4, do Código de Processo Civil. Sem distinção da natureza do direito, todas as ações se configurarão por ambos os elementos: pedido e causa de pedir.
Sendo a causa de pedir o facto jurídico concreto ou específico invocado pelo autor como fundamento da sua pretensão e não a norma em que ele a estriba, deve entender-se que a identidade entre os objetos de uma e de outra ações não deve ser apreciada em abstrato. A doutrina mais recente tende a regressar à utilização do conceito de tatbstand, conjugado com a ideia de que o acontecimento da vida narrado pelo autor é suscetível de redução a um núcleo fáctico essencial, tipicamente previsto por uma ou mais normas materiais como causa do efeito pretendido.
Citando Chiovenda, já Alberto dos Reis defendia que a causa pretendi não é a norma de lei invocada pela parte, mas os elementos de facto que converteram em concreta a vontade legal, devendo atender-se aos factos que podem ter influência na formação da vontade concreta da lei (factos relevantes). E quando se muda o simples facto material ou motivo, mas para se deduzir dele o mesmo facto jurídico, não há diversidade de ação: a exceção de caso julgado subsiste.
Por regra, o caso julgado forma-se sobre a decisão, a decisão relativa ao objeto da ação, e não sobre os motivos ou fundamentos da decisão (teoria limitativa). Em princípio, estes não são mais do que elementos interpretativos e definidores do pensamento do julgador e do alcance da parte dispositiva da decisão. Para além disso, o problema do caso julgado sobre os motivos só se coloca quanto a pontos que poderiam ser objeto de processo autónomo, no qual sobre eles se formaria o caso julgado nos termos normais[22] e nas situações em que a motivação considera questões que constituem um antecedente lógico e indispensável da decisão.
Uma vez passada em julgado, a sentença define de modo irrefragável a relação jurídica sobre que recaiu. E se situações há em que pode ser difícil resolver o problema de identidade de ações, elas assim se devem considerar se a decisão da segunda fizer correr ao tribunal o risco de contradizer ou reproduzir a decisão proferida na primeira.
Algo diferente da exceção do caso julgado é a autoridade própria do caso julgado que se impõe mesmo onde não há identidade objetiva. Como defende Teixeira de Sousa, a autoridade de caso julgado implica uma aceitação de uma decisão proferida numa ação anterior, decisão esta que se insere, quanto ao seu objeto, no objeto da segunda ação, enquanto questão prejudicial, constituindo, assim, uma vinculação à decisão de distinto objeto posterior: “quando o objecto processual anterior é condição para a apreciação do objecto processual posterior, o caso julgado da decisão antecedente releva como autoridade de caso julgado material no processo subsequente; quando a apreciação do objecto processual antecedente é repetido no objecto processual subsequente, o caso julgado da decisão anterior releva como excepção do caso julgado”[23]. A autoridade do caso julgado realça a impossibilidade da discussão em nova ação de questão que se considera definitivamente resolvida naquela (art.ºs 580º, nº 2 e 621º).
Assim, a decisão de mérito produzida num determinado processo, confirmando ou constituindo uma situação jurídica, pode, em variados casos, ser vinculativa noutros processos onde se vise a apreciação ou constituição de outras situações jurídicas com ela conflituantes. Para isso, releva a existência de uma relação entre o objeto de uma e o objeto da outra que implique a possibilidade de confirmação ou de divergência ou contradição da decisão anterior com a decisão a proferir na ação posterior, seja ela de identidade (ocorre nas situações de exceção de caso julgado), seja ela de prejudicialidade ou de concurso (casos de autoridade do caso julgado).
É ainda importante salientar a tendência jurisprudencial na defesa de que uma questão essencial num primeiro processo vincula a decisão do outro tribunal que julga a segunda ação. Com a autoridade do caso julgado, os tribunais ficam vinculados às decisões uns dos outros, quanto a questões essenciais. Se a decisão em causa foi decisiva para a procedência ou improcedência da ação, impõe-se aquela autoridade, não podendo o tribunal da segunda ação julgá-la em contrário, mesmo que a causa de pedir seja diferente.[24]
As questões essenciais são as que respeitam aos factos judiciais, os factos concretos que são determinados e separados de todos os outros pela norma aplicável e foram tornados certos através da decisão que sobre eles recaiu após transitar em julgado e estando perante as mesmas partes.
Nesta perspetiva, só as questões essenciais poderão ter a autoridade de caso julgado, o que significa que só a terão as decisões sobre questões relativas à causa de pedir da ação transitada. Mas, mesmo que a sua causa de pedir seja diferente, aquela autoridade deve impor-se na segunda ação.
Quer na sua função positiva de autoridade, quer na função negativa que impede que a mesma causa seja novamente apreciada pelo tribunal[25], é a necessidade de certeza do direito e da segurança das relações jurídicas que se acautela. Como ensina ainda Alberto dos Reis[26], “desde que uma sentença, transitada em julgado, reconhece a alguém certo benefício, certo direito, certos bens, é absolutamente indispensável, para que haja confiança e segurança nas relações sociais, que esse benefício, esse direito, esses bens constituam aquisições definitivas, isto é, que não lhe possam ser tirados por uma sentença posterior. Se assim não fosse, se uma nova sentença pudesse negar o que a primeira concedeu, ninguém podia estar seguro e tranquilo; a vida social, em vez de assentar sobre uma base de segurança e de certeza, ofereceria o aspecto da insegurança, da inquietação, da anarquia. …A força e a autoridade derivam … da necessidade superior de certeza e segurança jurídica”. Vale este raciocínio também em sentido inverso: não pode uma sentença posterior reconhecer um direito que uma sentença anterior negou com trânsito em julgado.
A força do caso julgado assenta, pois, na necessidade de assegurar a certeza das situações jurídicas apreciadas, nos termos em que o foram, que é inerente às decisões definitivamente julgadas, pressupondo a existência de uma conexão que impeça que a primeira decisão, transitada em julgado, seja contraditada pela segunda.
Refere-se no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 14.2.2012[27], citando e traduzindo De la Oliva dos Santos, Andrés[28]: “Estas exigências necessitam de um vínculo que impeça: 1) que uma controvérsia se prolongue até ao infinito; 2) que se torne a instaurar uma segunda causa sobre uma matéria já decidida em via definitiva num órgão judicial; 3) que se produzam decisões e sentenças contraditórias ou se verifique uma injusta e irracional reiteração de sentença de conteúdo idêntico no confronto das mesmas partes”.
A propósito, o sumário do acórdão da Relação de Lisboa de 18.4.2013[29] é lapidar:
1. O princípio da eventualidade ou da preclusão consubstanciado no nº 1 do artigo 489º do Código de Processo Civil, que implica que toda a defesa deva ser deduzida na contestação, radica em razões de lealdade na condução da lide e razões de segurança e de certeza jurídica que impedem que os efeitos de uma sentença transitada em julgado sejam postergados, com base em novos argumentos que nessa acção poderiam ter sido invocados, e o não foram.
2. A autoridade de caso julgado de sentença transitada e a excepção de caso julgado constituem efeitos distintos da mesma realidade jurídica. Enquanto esta tem em vista obstar à repetição de causas e implica a tríplice identidade - de sujeitos, de pedido e de causa de pedir - aquela implica a proibição de novamente ser apreciada certa questão, podendo actuar independentemente da mencionada tríplice identidade.

Os factos, só por si, não estão abrangidos pelo caso julgado nem pela autoridade do caso julgado. Ou seja, os fundamentos de facto não adquirem, quando autonomizados da decisão de que são pressuposto, valor de caso julgado, de modo a poderem impor-se para além dessa mesma decisão. A decisão de facto integra-se no plano da fundamentação da sentença, como decorre do disposto no n.º 4 do art.º 607º, correspondente ao anterior art.º 659º do Código de Processo Civil, pelo que sobre ela não opera, de forma autónoma, o alcance do caso julgado material.
O caso julgado material, nos termos definidos nos art.ºs 619º, n.º 1, e 621º do Código de Processo Civil, só se forma sobre a decisão ainda que tendo por limite objetivo a respetiva fundamentação, não recaindo, pois, os seus efeitos, de forma isolada ou autónoma, sobre os fundamentos daquela.[30]
Como se expõe no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 2.3.2010[31], «a problemática do respeito pelo caso julgado coloca-se, sobretudo, a nível da decisão, da sentença propriamente dita e, quando muito, dos fundamentos que a determinaram, quando acoplados àquela», pelo que «os fundamentos de facto, nunca por nunca, formam, por si só, caso julgado, de molde a poderem impor-se extraprocessualmente»[32].
«Não pode é confundir-se o valor extraprocessual das provas produzidas (que podem ser sempre objecto de apreciação noutro processo) com os factos que no primeiro foram tidos como assentes, já que estes fundamentos de facto não adquirem valor de caso julgado quando são autonomizados da respectiva decisão judicial. Transpor os factos provados numa acção para a outra constituiria, pura e simplesmente, conferir à decisão acerca da matéria de facto um valor de caso julgado que não tem, ou conceder ao princípio da eficácia extraprocessual das provas uma amplitude que manifestamente não possui»[33].
Acontece, no caso sub judice, que os factos atinentes ao incumprimento do contrato havido entre a A. e da R. foram discutidos na primeira ação, discussão essa essencial à apreciação da causa de pedir e decisão do respetivo pedido. E foi por se ter concluído que a ali Requerente cumpriu a sua obrigação contratual principal de forma deficiente (empalme sem vícios e com resultado satisfatório), que a ali Requerida foi absolvida do pedido de pagamento efetuado pela C1….
Esta questão do incumprimento da empreiteira foi inseria naquela ação a título de exceção ali invocada na defesa da B1…; passou a fazer parte do seu objeto e determinou uma decisão implícita que funcionou como pressuposto da decisão de absolvição da B1… do pagamento do serviço. Foi uma questão discutida e decidida, e um pressuposto lógico da decisão final relativa ao pedido da ação.
Decorre do exposto que não se trata de uma discussão de efeitos de caso julgado ou de autoridade do caso julgado relativamente a uma decisão em matéria de facto, por determinados factos isolados já dados como provado noutra ação, mas de caso julgado, ou melhor, de autoridade do caso julgado relativa a uma decisão sobre (in)cumprimento contratual a que está associado o conjunto de factos que a fundamenta e que, no seu todo, impede a reabertura da discussão do cumprimento contratual defeituoso da C1… nesta segunda ação. Um caso nítido em que a discussão daqueles factos já efetuada na primeira ação --- ou de outros factos que ali devessem ter sido alegados pelas partes relativos ao mesmo (in)cumprimento --- poderia conduzir a uma absurda, desprestigiante e evitável contradição de decisões proferidas entre as mesmas partes, relativamente a uma mesma questão de direito, no âmbito de uma mesma relação contratual, através de uma segunda discussão dos mesmos factos atinentes ao mesmo incumprimento ou cumprimento defeituoso.
Por conseguinte, a autoridade do caso julgado formado na primeira ação impõe-nos o dever de não voltar a discutir os termos do contrato e os factos relativos ao cumprimento defeituoso pela R. da sua prestação contratual principal de efetuar a colagem/soldadura/empalme do tapete rolante, conforme contratou com a A.
Não devia o tribunal a quo ter reapreciado tais factos na presente ação. No entanto, discutiu-os de novo, proferindo nova decisão de facto, quer quanto aos termos do contrato, quer ainda quanto ao seu cumprimento, tendo concluído pelo incumprimento defeituoso da R; não obstante, referiu-se na sentença: “(…) no caso concreto, o sentido da prova produzida nos dois processo é similar, sendo que este tribunal sempre teria de se pronunciar quanto aos factos de forma a aquilatar as consequências do incumprimento contratual que aqui também resultou comprovado da prova produzida.
Em suma, constatando-se que em ambos os processos a prova produzida permite concluir pela existência de uma situação de incumprimento contratual imputável à ré, não se suscita qualquer violação do princípio da autoridade do caso julgado, sendo que a questão das consequências resultantes do incumprimento contratual não foram abordadas e decididas no processo que correu termo no J4, motivo pelo qual sempre teriam de ser aqui dirimidas, o que infra se fará.
(…)”.
Façamos nós a conferência dos factos apreciados e decididos na primeira ação relativos ao contrato e ao cumprimento defeituoso, de modo a distinguir aqueles que tendo, ou não, ficado decididos na 1ª instância, não relevando naquela questão, tenham interesse para a decisão da questão que cumpre aqui reapreciar e decidir: a responsabilidade resultante do cumprimento defeituoso da R. e a obrigação de indemnizar.
De entre os factos impugnados, os pontos 3, 8, 14, 16, 17, 31 e 32 dos factos dados como provados estão abrangidos na matéria do contrato e do seu incumprimento, já apreciada e decidida, com autoridade de caso julgado, no proc. 67078/17.3YIPRT. Estão igualmente abrangidos pela matéria do contrato e do seu incumprimento todas as alíneas de factos que a recorrente pretende que sejam dados como provados (al.s a), b), c), d) e e)). São estes, igualmente, factos e circunstâncias que foram ou deveriam ter sido discutidas no âmbito da exceção do incumprimento invocado pela aqui A. naquela ação, por se integrarem cabalmente nessa questão. Aliás, quase toda essa matéria foi alegada naquela ação e mereceu ali resposta negativa.
Efetuada esta exclusão, restam-nos para reexame da decisão em matéria de facto a apreciação dos pontos 36, 37, 38, 39, 42 e 43 da sentença:

36 – Nessas mesmas circunstâncias, o desnível inicialmente existente, com o normal funcionamento na máquina de polimento, tinha provocado a ruptura parcial do tapete (decorrente da fricção provocada na zona onde se encontrava o desnível), sendo que a resolução da situação implicava a substituição integral do tapete por um outro tapete novo.
37 – Nessas mesmas circunstâncias, a autora encomendou e pagou um novo tapete, igual àquele que havia fornecido à sociedade “D…, Lda.”, tendo para o efeito procedido ao pagamento da quantia de Eur. 1.960,00.
38 – Para aplicação desse novo tapete, a autora teve de contratar e suportar os custos com o aluguer de uma prensa vulcanizada e demais equipamentos inerentes ao funcionamento da mesma nas instalações da sociedade “D…, Lda.”, para efectuar a nova colagem/soldadura da tela à máquina de polimento
39 – E teve de pagar a assistência do técnico especializado que se deslocou de Itália durante 3 dias para prestar este serviço, tudo no valor global de Eur. 2.800,00 euros.
(…)
42 – E teve de pagar o transporte da prensa alugada e o novo tapete desde Itália até Portugal, despendendo para o efeito a quantia de Eur. 305,53.
43 – E teve de pagar as despesas de alimentação e de deslocação do técnico em Portugal, despendendo para o efeito a quantia global de Eur. 110,00.

No essencial, quanto aos pontos 36 e 37, a apelante alega que a reparação era possível, sendo desnecessária a substituição do tapete rolante e que o segundo tapete não é igual ao primeiro.
Quanto aos pontos 38, 39, 42 e 43, pretende a recorrente que sejam dados como não provados.
Para os pontos 36 e 37, indica a R. o confronto de faturas, emails de 28 de abril (doc. 13 e doc. 14/1 da petição inicial) de 17 e 18 de maio de 2017 (doc. 16/1), o doc. 20/1 junto com a petição inicial os depoimentos de E… e de F….
O tribunal, na motivação da sentença, faz relevar para a sua prova os depoimentos de G…, H…, I…, J…, F…, L… e E….
Em abono da versão sufraga na sentença, a recorrida destaca as prestações de G…, J…, F…, E… (ponto 36) e ainda H… e L… (ponto 37).

Relativamente aos pontos 38 e 39, invoca a recorrente os documentos 21/1 e 21/2 juntos pela A.
O tribunal motiva a decisão no depoimento de I….
A recorrida pretende o reexame dos depoimentos de H…, I… e L….

Quanto aos factos dos pontos 42 e 43, a R. refere que o doc. nº 24 junto com a petição inicial não está completo e invoca o depoimento de H….
O tribunal motiva a decisão nos depoimentos de I….
A recorrida pretende o reexame dos depoimentos de H….

A Relação analisou os documentos juntos ao processo, designadamente os emails, faturas e fotografias, algumas de difícil perceção. Foram também ouvidos, de modo completo, os depoimentos relevantes, nomeadamente das testemunhas atrás indicadas, sendo desde já de realçar que vertem, em quase toda a linha, sobre os factos mais diretamente relacionados com a execução dos trabalhos contratados entre a A. e a R., serviço esse de colagem das extremidades do tapete de uma máquina instalada na cliente da demandante, por onde transitavam as peças por esta fabricadas, designadamente para polimento, já na fase final do fabrico. De facto, não ficaram dúvidas de que a oscilação provocada pelo desequilíbrio das peças que se encontrassem sobre o que chamaram de um “alto” ou “elevação” no tapete, deixado pelo técnico da R. na respetiva zona de empalme (a união das duas extremidade dessa tela/tapete) provocava danos nessas peças, chegando mesmo a quebrar-se com relativa facilidade, não podendo manter-se tal deficiência, sob pena de grave e longo prejuízo para o funcionamento da linha de produção da empresa da D…, Lda. A esta situação acresceu o facto de a deficiência do empalme se ter revelado também na descolagem da tela iniciada logo no dia da conclusão daquele trabalho, executado pela testemunha E…, ao serviço da R., e que motivou que, imediatamente, tivesse sido aceite com as reservas assinaladas no documento/folha de serviço relativo à sua conclusão, junto aos autos, tendo-se o chefe de equipa da D…, Lda. recusado a assinar, por isso, aquele documento. Tal serviço foi pago de imediato, mas com reserva manifestada quanto à sua qualidade e salvaguarda de rápida reparação. O funcionamento correto e imediato do tapete era uma condição sem a qual a fábrica parava a laboração, por se tratar de uma produção em linha.
A situação foi-se agravando, ao menos na descolagem do empalme, tendo sido referido que se deu o rebentamento do tapete, chegando a impedir o funcionamento da máquina durante alguns dias (três o quatro, dito pela testemunha J…), mesmo depois de uma segunda intervenção da R., pela mão do mesmo técnico especializado, que reconheceu então que não tinha solução para o problema sem que fosse substituído o tapete rolante da máquina (de polir). Referiu-se a estes factos, em sentido semelhante e de modo muito seguro, também a testemunha F…, chefe de equipa na D…, Lda., que acompanhou todo o processo de colagem e tentativa de reparação posterior, e L…, funcionário da A. que também acompanhou a situação. Mesmo E…, o técnico da R. que executou o empalme, apesar de não ter assumido qualquer erro no seu trabalho, reconheceu que depois da sua intervenção o problema já não poderia ser solucionado sem a substituição do tapete/tela. O mesmo foi referido pela testemunha G…, técnico comercial da A. que diligenciou pela aquisição em Itália e aplicação do novo tapete no mês de maio de 2017.
Não surpreende, pois, que as demais testemunhas que se pronunciaram sobre a questão, também elas, considerando que o referido desnível (“o alto” ou “a elevação”, como foi referindo a generalidade das testemunhas), tal como a descolagem/rutura transversal na zona do empalme, não tinham solução sem substituição do tapete. Qualquer remendo redundaria numa variação da espessura da tela determinante da oscilação das peças em polimento que seriam quebradas pelas cabeças polidoras da máquina. Aquele tapete já não tinha solução. Fizeram estas referências de modo coerente e explicado as testemunhas G…, L…, F… e o eng.º J…, profissionais ligados à atividade da A. e da D…, Lda. que se relacionaram diretamente com os factos.
Em qualquer caso, o que se extrai das prestações testemunhais mais relevantes, por lidarem com a máquina na cliente da A. (a D…, Lda.) é que o desnível (a “elevação” ou irregularidade) existente no tapete constitui um vício diferente do vício da rutura progressiva da colagem, apesar de ambos estarem situados na zona do empalme e resultarem da deficiência do mesmo. O eng.º J… e F… --- aquele à data dos factos, um dos gerentes e atualmente seu diretor industrial, e o segundo chefe de equipa --- referiram que o tapete acabou por abrir ou rebentar em razão da deficiência da colagem na zona do empalme.
A coincidência temporal da encomenda do novo tapete à empresa italiana com uma alegadamente nova solicitação da reparação feita pela A. à R., --- que, na verdade não resulta do email de 18.5.2017, nem de outra prova produzida e indicada pela recorrente --- em conjugação com o teor da fatura que constitui o doc. nº 20/1, ambos os documentos juntos com a petição inicial, não são mais do que o reforço da ideia deixada pela prova testemunhal mais bem colocada de que era absolutamente urgente a resolução do problema, sob pena da produção da fábrica parar por tempo indeterminado, com prejuízo na ordem de dezenas de milhar de euros (v.g. depoimentos dos funcionários da D…, Lda.). Aquela insistência pela colaboração da R. foi utilizada como uma forma de reforçar a sua responsabilidade e alcançar, tão breve quanto possível, uma solução conjunta na solução do problema (que poderia passar por uma comparticipação de ambas as partes nos custos de aquisição de um novo tapete).
Esta e a demais prova produzida, no seu conjunto apreciada com ponderação dos conhecimentos revelados por cada uma das testemunhas, a razão do conhecimento de cada uma delas e a sua posição relativamente aos interesses de cada uma das partes, conduzem-nos à modificação do factos relativo ao ponto 36 que passa a ter o seguinte texto:
36. Nessas mesmas circunstâncias, a descolagem verificada na zona do empalme desde a sua instalação e soldadura já tinha aumentado e continuou a aumentar com o normal funcionamento da máquina de polimento, provocando progressiva rutura parcial do tapete (decorrente da fricção provocada naquela zona, onde também se encontrava o desnível), sendo que a resolução da situação implicava a substituição integral do tapete rolante por um tapete novo.

Com base naqueles mesmos depoimentos e das testemunhas H… e I…, funcionárias administrativas da A. que, no serviço de escritório, sobretudo a primeira, intervieram no desenrolar dos acontecimentos --- envio e receção de emails, emissão e recebimento de encomendas, pagamentos e cobranças ---, é seguro afirmar que o novo tapete, adquirido pela A. à empresa italiana, foi aplicado na dita máquina em substituição do anterior, tendo eles caraterísticas muito semelhantes, sem o que não serviriam para a mesma máquina. O eng.º J… referiu que não pode afirmar que um e outro tapetes sejam exatamente iguais, mas um e outro têm caraterísticas essencialmente idênticas e servem o mesmo fim, funcionando o último perfeitamente. L… referiu mesmo que se trata de tapetes iguais, sendo que acompanhou a instalação do novo tapete.
É certo que da respetiva faturação resulta uma divergência de comprimento, entre um e outro, de cerca de 60 cm (doc.s 2, 20/1, e 20/2 juntos com a petição inicial) que ficou por explicar, mas isso não afasta a aplicação do segundo no lugar do primeiro, onde ainda se encontra em perfeita laboração, como foi afirmado pelas testemunhas que conhecem a sua instalação e o seu funcionamento, incluindo as que trabalham na respetiva fábrica. Fora as pequenas divergências resultantes da comparação daqueles documentos, não existe nada, nem na prova testemunhal, que indicie a não aplicação da segunda tela, adquirida em Itália, no lugar da primeira. Esse tapete foi pago pela A., ninguém o negou (foi confirmado pelas testemunhas, especialmente as funcionárias de escritório), e está documentado nos autos (doc. 20/3 junto com a petição inicial).
O ponto 37 passa a ter o seguinte texto:
37- Nessas mesmas circunstâncias, a A. encomendou um novo tapete, com caraterísticas essenciais semelhantes às daquele que havia fornecido à D…, Lda., tendo, para o efeito, efetuado o pagamento da quantia de € 1.960,00.

Quanto aos pontos 38, 39, 42 e 43, as situações foram especialmente descritas pela testemunha I…, que interveio diretamente nas diligências de compra da segunda tela, em Itália, fazendo a encomenda e o pagamento ao fornecedor, assim como tendo diligenciado pelo pagamento dos serviços necessárias à execução do trabalho de instalação, como seja o transporte, alojamento, alimentação e viagens do técnico italiano da empresa fornecedora e o aluguer da prensa que também veio de Itália. Os pagamentos de tais serviços estão documentados com a petição inicial, tendo as testemunhas confirmado o desempenho do técnico italiano na montagem que foi presenciada por algumas delas e que ninguém negou. O tempo despendido pelo técnico na montagem e empalme do tapete vai também ao encontro da duração e custo da sua estadia, acrescido do tempo das viagens de vinda e regresso a Itália.
A fatura que constitui o documento nº 21/2 não se refere a aluguer da prensa, é certo, mas a uma “venda”. Porém, também respeita ao valor do serviço de assistência prestado pelo técnico italiano e nem por isso deixa de se referir apenas “venda” no seu cabeçalho. A fatura da vendedora italiana (doc. nº 21/1) também não é esclarecedora, mas as testemunhas referiram que não ficou nem existe qualquer prensa nas instalações da A., que é um instrumento com que não trabalha diretamente, não tendo interesse na sua aquisição e que foi simplesmente utilizado pelo técnico na colagem da tela, não tendo sido comprado. De resto, este assunto não teve desenvolvimento significativo na discussão da causa. Não passou designadamente por uma possível controvérsia comparativa do valor de aquisição de uma prensa daquelas com o valor do seu aluguer, para justificar um ato de compra ou um ato de aluguer em função do preço praticado.
Quanto ao mais, tais factos, à luz das regras da experiência da vida, correspondem aquilo que é razoavelmente necessário para a execução de um trabalho por um técnico especialista que tem de se deslocar do estrangeiro para Portugal e daqui para o país de origem, em três dias (não obstante o trabalho ter ficado concluído num dia, há que contabilizar os dias de viagem), com as presumíveis despesas de viagem, alojamento e alimentação.
Mantêm-se os factos dados como provados sob os pontos 38, 39, 42 e 43.
Valem aqui também os factos considerados provados na ação nº 67078/17.3YIPRT, tendo-os como indiscutíveis, assim como a decisão implícita na sentença daquela ação que assentou nos mesmos, de que ocorreu cumprimento defeituoso pela R. na execução do empalme.
*
2. As consequências jurídicas ma modificação da decisão proferida em matéria de facto
Para apurar responsabilidades é, antes de mais, necessário qualificar as relações jurídicas em causa e determinar a fonte das obrigações da R., alegadamente violadas.
A apelante tem vindo a defender que entre ela e a A. foram celebrados dois contratos. Num primeiro momento, no dia 1 de março de 2017, um acordo pelo qual se obrigou perante a B1… a efetuar um serviço de empalme das extremidades de um tapete rolante nas instalações fabris da cliente da A., D…, Lda., com a qual a demandante celebrara um contrato de fornecimento e instalação do mesmo. Num segundo momento, em 24 de março de 2017, um segundo contrato pelo qual, pressupondo o integral cumprimento do primeiro, mais uma vez se obrigou perante a A., desta feita a reparar um dano causado no mesmo tapete rolante pela queda de uma cabeça de polimento da mesma máquina, sendo que, ao contrário do que se passou com o primeiro contrato, este novo serviço não foi pago, nem a deslocação do técnico ao local, tendo-se concluído que só com a substituição do tapete a máquina voltaria a cumprir a sua função.
Ora, não é esta a realidade demonstrada desde logo pela autoridade do caso julgado imposta pela sentença transitada em julgado, proferida na ação 67078/17.3YIPRT, complementada pelos demais factos dados como assentes na sentença recorrida, com a modificação atrás introduzida.
O que a recorrente apelida de um novo contrato não é mais do que uma tentativa frustrada de reparação, após reclamação, de um trabalho contratado entre as partes (em 22 de fevereiro de 2017), executado (em 1 de março seguinte) com deficiência pela R. em momento anterior e pago, como se extrai facilmente da leitura dos factos provados na referida ação, em especial nos respetivos pontos 9, 10, 11, 12, 16, 18, 19, 20, 21, 22, 23, 24, 36 e 37. Também resultou não provado naquela ação que tal serviço foi bem prestado e aceite como bom pela aqui A., que a tela ficou a funcionar normalmente e que foi na sequência do acidente que a máquina sofreu (e por causa dele) que a R. foi chamada a fazer uma (nova) reparação.
Os factos são precisos na expressão de apenas um encontro de vontades entre a A. e R. no sentido desta prestar um serviço para aquela, de empalme de um tapete rolante que a primeira forneceu a uma sua cliente (a D…, Lda.) com a obrigação de o instalar na máquina de polimento das peças de cerâmica que esta última fabrica. O empalme ou colagem das duas extremidades do tapete rolante fazia parte do processo da sua montagem na máquina existente na linha de produção da cliente a que a A. se obrigou.
A contrapartida do serviço a prestar nos termos do contrato e efetivamente prestado pela R. era o preço que foi pago pela A.
Temos por preenchidos os elementos típicos de um contrato de empreitada celebrado entre a A. e a sua cliente D…, Lda. e, no que aqui interessa, de um contrato de subempreitada havido entre a A. e a R., ao qual é de aplicar o regime próprio do contrato de empreitada, como se a A. fosse a dona da obra e a R. a empreiteira (art.ºs 1207º e seg.s, com destaque para o art.º 1213º, nº 1, do Código Civil), como vamos ver.
O contrato de empreitada tem como matriz a realização de uma obra. É um contrato sinalagmático, oneroso, comutativo e consensual, porque dele emergem, por um lado, obrigações recíprocas e interdependentes; a obrigação de realizar a obra tem como contrapartida direta o dever de pagar o preço. O esforço económico é suportado pelas duas partes e há vantagens correlativas para ambas. Essas vantagens são delas conhecidas no momento do ajuste e a validade das concernentes declarações negociais depende do seu mero consenso.
Adota-se na lei o conceito comum e amplo de obra, equivalente à obtenção de um resultado material que abrange a criação ou construção, reparação, modificação ou demolição de coisas móveis ou imóveis[34].
Se, à semelhança da generalidade dos contratos, há flexibilidade na contratação da empreitada, há rigidez no cumprimento, pois que estes existem para serem cumpridos com respeito pelos interesses da contraparte, legal e contratualmente protegidos (art.ºs 398º, nº 1 e 406º, º 1, do Código Civil). Existe uma eficácia comum a todos os contratos que se consubstancia no princípio da força vinculativa ou da obrigatoriedade; significa que, uma vez celebrado, o contrato plenamente válido e eficaz, constitui lei imperativa entre as partes.
Almeida Costa[35] define ainda a regra da eficácia vinculativa através dos seguintes princípios:
- O da pontualidade, utilizando a lei o termo “pontualmente” com o alcance de que o contrato deve ser executado ponto por ponto, quer dizer, em todas as suas cláusulas e não apenas no prazo estipulado[36]; e
- Os da irretratabilidade ou da irrevogabilidade dos vínculos contratuais e da intangibilidade do seu conteúdo, fundindo-se estes no que também se designa por princípio da estabilidade dos contratos.
Como refere Enzo Roppo, cada um “é absolutamente livre de comprometer-se ou não, mas, uma vez que se comprometa, fica ligado de modo irrevogável à palavra dada: pacta sunt servanda”[37], sendo certo que, é “nesta estrutura de confiança que se intercala o laço social instituído pelos contratos e pelos pactos de todos os tipos que conferem uma estrutura jurídica à troca das palavras dadas”, e que, o “facto de os pactos deverem ser observados é um princípio que constitui uma regra de reconhecimento que ultrapassa o face a face da promessa de pessoa a pessoa”[38].
Ainda assim, ocorrem situações que, excecionalmente, por motivos supervenientes, justificam um desvio àquela regra, permitindo que uma relação contratual validamente constituída se extinga, sendo uma delas a resolução contratual. Pode ser fundada na lei ou em convenção das partes (art.º 432º, nº 1, do Código Civil).
A obrigação do empreiteiro é uma obrigação de resultado, obrigando-o não só a efetuar os trabalhos e a fornecer os materiais, como a obter um resultado final: que a obra fique concluída em conformidade com o convencionado e sem vícios que a desvalorizem ou prejudiquem a realização do fim a que se destina.
Ao contrato de empreitada, além das normas específicas do respetivo regime legal, são também aplicáveis regras gerais relativas ao cumprimento e incumprimento das obrigações, designadamente os art.ºs 762º e seg.s, ainda do Código Civil, na medida em que não contrariem as ditas disposições especiais.
Tanto o empreiteiro como o dono da obra estão adstritos ao princípio da boa fé (art.º 762º, nº 2, do Código Civil). Este princípio, em sentido objetivo, acompanha a relação contratual desde o seu início, permanece durante toda a sua vida e subsiste mesmo após se ter extinguido. Está presente, além do mais, na formação do contrato e na sua execução e cumprimento. Como ensina Mota Pinto[39], “do contrato fazem parte não só as obrigações que expressa ou tacitamente decorrem do acordo das partes, mas também, designadamente, todos os deveres que se fundam no princípio da boa fé …Nesta linha, importa sublinhar o papel decisivo da boa fé no enriquecimento do conteúdo do contrato, mormente por constituir a matriz dos denominados deveres laterais, como os deveres de cuidado para com a pessoa e o património da contraparte, os deveres de informação e esclarecimento, etc.”.
Por várias razões de ordem social, laboral ou económica, entre elas a falta de preparação técnica adequada do empreiteiro, a necessidade de conhecimento especializado para a realização eficiente de determinados trabalhos da obra e a redução de custos, este prefere delegar em terceiro a realização de uma parte ou mesmo da totalidade da obra objeto da empreitada.
O empreiteiro celebra então com terceiro um contrato pelo qual este se obriga para com aquele a realizar a obra a que este se encontra vinculado ou uma parte dela: o contrato de subempreitada. É o que, no essencial, resulta do art.º 1213º, nº 1, do Código Civil.
A subempreitada tem, pois, como pressuposto, a preexistência de um contrato de empreitada na sequência do qual o empreiteiro, atuando nas vestes de dono da obra, contrata com um terceiro a realização de todos, ou de parte, dos trabalhos que se vinculou a realizar. É um subcontrato, um contrato subordinado ou contrato derivado, e é, fundamentalmente, uma empreitada em segundo grau. Mantém a sua distinção ou individualidade em relação à empreitada.
Não se trata de uma cessão de posição contratual, pois a posição jurídica do empreiteiro mantém-se no contrato de empreitada, e, por força da subempreitada, criam-se novas relações obrigacionais, entre o empreiteiro e o subempreiteiro.
Sem prejuízo da chamada ação oblíqua ou de sub-rogação indireta, do credor ao devedor, em caso de necessidade, e a que se refere o art.º 606º do Código Civil, na subempreitada não existe relação direta entre o dono da obra e o subempreiteiro: se a obra apresentar defeitos, por culpa do subempreiteiro, nem por isso o dono da obra lhe poderá exigir a reparação ou a eliminação desses defeitos, apenas o podendo reclamar do empreiteiro. Este é que poderá exigir do subempreiteiro a reparação ou a eliminação dos defeitos da obra.
Na subempreitada, como na empreitada, coexistem direitos contratuais de crédito e obrigações cuja eficácia é relativa (e não absoluta, como acontece nos direitos reais). Operam apenas inter partes, vinculam pessoas determinadas (ou determináveis) que são os sujeitos da relação; valem, em princípio, somente a favor do credor e contra o devedor. A obrigação é essencialmente o poder de exigir uma prestação, que apenas recai sobre o devedor e, por isso, se considera um direito relativo. Só excecionalmente se admite a eficácia externa das obrigações.[40]
Os factos indicam e o tribunal concluiu já no proc. nº 67078/17.3YIPRT da Maia, por decisão transitada em julgado, que a R. cumpriu defeituosamente o contrato ao permitir, na sequência do seu serviço, que o empalme que estava obrigada a executar com perfeição, de modo a que o tapete cumprisse a sua função adequadamente e sem vícios, se descolasse e tivesse ficado com uma elevação ou desnível que prejudicava o polimento das peças cerâmicas que nele transitam durante o processo produtivo ali desenvolvido. O seu esforço de reparação não surtiu qualquer efeito.
A R. executou a prestação violando o princípio da pontualidade, por ter sido defeituosa, que foi aceite e paga com reserva, sendo os defeitos relevantes. Dela resulta prejuízo para a A. que teve de adquirir um tapete novo e proceder à sua instalação, em necessária substituição do anterior.
O cumprimento defeituoso é aqui inquestionável, sendo também evidente que a R. não logrou demonstrar que agiu sem culpa, como impõe o art.º 799º, nº 1, do Código Civil, para excluir a sua responsabilidade contratual e se libertar dos efeitos do cumprimento defeituoso (no caso, negligente). À R. cumpria provar que executou a obra com observância das leges artis e que os vícios não lhe são imputáveis. Não efetuou essa prova.
Numa situação de cumprimento defeituoso não se verifica a liberação do devedor, podendo ocorrer as seguintes situações: ou o devedor se constitui em mora (artigo 804º do Código Civil) ou se verifica o incumprimento definitivo da obrigação (artigo 808º do Código Civil). Ocorrendo mora, o credor conserva interesse na prestação, pelo que caberá ao devedor reparar o defeito, ou substituir a prestação defeituosa por outra em condições.
Os vários direitos conferidos ao dono da obra, face ao incumprimento ou ao cumprimento defeituoso do empreiteiro, estão estabelecidos segundo uma regra de prioridade.
Tem sido entendido que só se o empreiteiro não eliminar os defeitos da obra, conforme a sua denúncia e verificação, nem a obra for construída de novo (na impossibilidade de eliminação), assiste ao dono da obra o direito à redução do preço ou a resolução do contrato se os defeitos tornarem a obra inadequada ao fim a que se destina. O desrespeito pela referida prioridade implica a não existência do direito dependente, e, consequentemente, a impossibilidade do seu exercício pela via judicial (art.ºs 1221º e 1222º do Código Civil).
O direito à indemnização, nos termos gerais, é um complemento de qualquer um dos referidos direitos (art.º 1223º do Código Civil).
O primeiro direito que assistia à A. era a eliminação dos defeitos.
Só se o empreiteiro recusar definitivamente a sua eliminação, esta se tronar impossível, ou não for realizada em prazo razoável fixado pelo dono da obra, é que podemos falar em incumprimento definitivo do dever de eliminação dos vícios verificados na obra. Como refere Pedro Romano Martinez[41], “o devedor, porém, só se constitui em mora depois de transcorrido um prazo razoável, tendo em conta a natureza dos defeitos a reparar (arte. 777°, n° 2 e 805°, n° 1). Prevendo a eventualidade de (…) o empreiteiro não eliminar os defeitos, a contraparte pode, concomitantemente com a interpelação ou em momento posterior, estabelecer um prazo equitativo, findo o qual rejeita a reparação (art.º 808º). Não se justifica o estabelecimento deste prazo se o devedor recusou perentoriamente a eliminação do defeito, ou se o credor, entretanto, tiver perdido o interesse nessa prestação”[42].
Assim, uma vez provada a existência de defeitos que tornam a obra inadequada para os fins pretendidos pelo seu dono, cabe-lhe a obrigação de notificar o empreiteiro para que este, dentro de um prazo razoável, os elimine (art.ºs 777º, 804º, 805º e 808º do Código Civil). Se nesse prazo razoável os defeitos não forem eliminados ou não tiver sido construída nova obra, é que então o dono da obra poderá exigir a redução do preço ou resolver o contrato se os defeitos tornarem inadequada a obra ao fim a que se destina e, ao mesmo tempo, poderá pedir a intervenção de terceiros para eliminar os defeitos. Só em caso de manifesta e provada urgência é que ele pode diretamente, e sem intervenção do tribunal, proceder à eliminação dos defeitos, exigindo depois o pagamento das respetivas despesas por parte do empreiteiro.[43] É opinião dominante na doutrina e na jurisprudência que a não eliminação dos defeitos ou a não repetição da prestação pelo empreiteiro não confere ao dono da obra o direito de por si, ou por intermédio de terceiro, num ato autotutelar, eliminar os defeitos ou reconstruir a obra, reclamando, posteriormente, daquele o pagamento das despesas efetuadas com esses trabalhos, ou exigindo-lhe antecipadamente o adiantamento dessa quantia. O dono da obra só poderia obter esse resultado através da via judicial, percorrendo toda a via sacra processual acima descrita.[44]
Além dos casos de impossibilidade técnica ou jurídica de eliminação dos defeitos, o dono da obra só poderá opor-se a essa iniciativa do empreiteiro, se já tiver perdido o interesse no cumprimento perfeito da obrigação de realizar a obra, sendo essa perda apreciada objetivamente. Encontrando-se o empreiteiro em mora no cumprimento daquelas obrigações, continua o dono da obra a não poder efetuar por ele ou através de terceiro as obras de reparação, a não ser no momento previsto no art.° 871° do Código de Processo Civil, no caso de ter recorrido à via judicial para exercer o seu direito. Mas, na hipótese de se verificar um incumprimento definitivo daquelas obrigações, imputável ao empreiteiro, já não se revela necessário o recurso à via judicial para o dono da obra poder, ele próprio, ou através de terceiro, efetuar as obras de reparação ou reconstrução, sem que perca o direito de reclamar do empreiteiro o pagamento do custo dessas obras.[45] O dono da obra, tendo-se verificado um incumprimento definitivo das obrigações de eliminação dos defeitos ou de reconstrução por parte do empreiteiro que se recusou a realizá-las, não correspondeu a uma interpelação admonitória para o fazer, falhou no seu cumprimento, ou deixou que a realização da sua prestação perdesse interesse, deve poder optar entre o direito à redução do preço ou à resolução do contrato, nos termos do art.° 1222° do Código Civil, ou a efetuar a reparação ou reconstrução da obra pelos seus meios, ou com recurso a terceiros, sendo o empreiteiro responsável pelo custo desses trabalhos. Na verdade, o incumprimento definitivo de uma obrigação confere ao credor o direito a ser indemnizado pelos prejuízos causados por esse incumprimento (art.° 798°, do Código Civil), o que, neste caso, corresponde ao custo das obras de eliminação dos defeitos ou de reconstrução, entretanto efetuadas ou a realizar pelo dono da obra, ou por terceiro contratado por este.
Além dos casos de incumprimento definitivo da obrigação de eliminação dos defeitos, imputável ao empreiteiro, também a urgência na realização desses trabalhos pode justificar que eles sejam efetuadas pelo dono da obra, ou por terceiro por ele contratado, sem intervenção judicial, para evitar maiores prejuízos, assistindo àquele um direito de indemnização em dinheiro, correspondente ao custo dessas reparações, a satisfazer pelo empreiteiro, prévia ou posteriormente à realização das obras de reparação. [46] Esta ilação tem por base o princípio do estado de necessidade (art.º 339° Código Civil), em que, excecionalmente, se admite a via da justiça privada.
Volvendo ao caso concreto, a R. obrigou-se a reparar o desnível no tapete, que estava a afetar o normal funcionamento da máquina, provocando a rutura dos ladrilhos precisamente quando apoiados na zona da colagem. Mas ainda que não se tivesse obrigado após a execução do seu trabalho, essa sua obrigação de corrigir aqueles vícios resulta, como vimos, diretamente da lei.
A R. foi alertada no início de março para a necessidade de proceder à reparação imediata dos defeitos.
Em vez de fazer a reparação imediata, a R. começou a “descartar” a sua responsabilidade na deficiente colocação da tela, tendo passado a alegar que a desconformidade detetada “se devia ao facto de serem materiais de superfícies diferentes”. No entanto, após insistência da A. na urgência da reparação, a R. enviou o técnico ao local no final do mês de março, mas os vícios existentes mantiveram-se, sem qualquer correção. Em razão dessa intervenção, a linha de produção esteve imobilizada.
A A. insistiu pela resolução definitiva da situação, designadamente em abril, ao solicitar mais uma vez a reparação, informando a R. que, quer o serviço inicial, quer a posterior tentativa de reparação que ela levou a cabo não resolveram os vícios existentes, estando a tela a descolar na zona onde a Requerente havia procedido à colagem através de metido de soldadura e que era urgente resolver definitivamente a situação. A tela estava em risco de abrir completamente, o que provocaria a sua total inutilização, a que acresceriam todos os prejuízos relacionados com a paragem da linha de montagem e das peças que existiam na linha.
Nessa sequência, a 28 de abril, R. enviou à A. uma fatura referente à deslocação do seu técnico para a reparação de 27 de março.
Já anteriormente e, por várias vezes, a A. havia demonstrado o seu descontentamento com o serviço prestado pela R. (tanto assim os vícios detetados e prontamente comunicados subsistiam) e que não estava disposta a efetuar qualquer pagamento relativamente à intervenção ocorrida na tentativa de a R. corrigir aquilo que antes havia mal executado (o que mesmo assim não conseguiu fazer).
Nessa altura, confrontada com a deficiente execução do serviço por si prestado, e das consequências que o mesmo estava a provocar, a R. começou a dizer que não poderia garantir a reparação cabal e definitiva da colagem da tela, porém invocando motivos que não ficaram provados.
No dia 17 de maio, a sociedade D…, Lda. informou a A. de que a tela estava prestes a rebentar e que exigia a resolução cabal e definitiva da situação, alegando que teria de parar a produção o que lhe acarretaria custos avultados, os quais imputaria à aqui demandante.
Nessas circunstâncias, a A. deu conhecimento à R. da posição daquela sua cliente, sendo que a demandada voltou a afirmar que não estava em condições de assegurar a reparação cabal e definitiva da colagem da tela, alegando para o efeito fundamento que não provou.
Nessas mesmas circunstâncias, a descolagem verificada na zona do empalme desde a sua instalação e colagem já tinha aumentado e continuou a aumentar com o normal funcionamento da máquina de polimento, provocando progressiva rutura parcial do tapete (decorrente da fricção provocada naquela zona, onde também se encontrava o desnível), sendo que a resolução da situação implicava a substituição integral do tapete rolante por um tapete novo que a A. encomendou e pagou.
No email de 19.5.2017, a R. voltou a condicionar a sua colaboração com a A. na solução dos defeitos da tela ao pagamento da fatura relativa à deslocação do seu técnico para reparação da tela, no valor de € 372,69 que a A. recusou pagar por considerar não ser devido, e ainda ao reconhecimento pela A. de determinados pressupostos da sua intervenção inicial excludentes da sua culpa no surgimento dos vícios na tapete rolante que, no entanto, não logrou demonstrar.
Esta posição da R. criou um impasse absoluto na resolução dos referidos defeitos que, naquela situação real de urgência, não podia deixar de conduzir a A. à aquisição de um tapete novo, sendo essa, aliás, a única forma de ultrapassar o problema (ponto 36 da sentença).
Compreende-se, pois, o teor do email subsequente enviado pela B1… à C1… com o seguinte teor:
Em Virtude da v/ Resposta, em que descartam qualquer responsabilidade no serviço prestado, não vai ser possível chegar a qualquer tipo de entendimento justo para ambas as partes, e visto que o nosso cliente já retirou o tapete e nos está a exigir responsabilidades. Vamos ter que tomar decisões internas e entregar todo este processo á nossa parte jurídica.

Também se compreende a ausência de qualquer resposta a esta mensagem cujo significado vai ao encontro da manutenção da posição já assumida pela R. no citado email de 19 de maio, de que sem o pagamento da dita fatura e a aceitação pela A. de determinados condicionalismos da intervenção originária da C1…, esta em nada mais colaboraria.
Ora, tendo-se concluído pelo cumprimento defeituoso e culposo da R. da sua obrigação principal --- na ausência de prova dos factos atinentes referidos condicionalismos invocado a título de exceção --- estando, por isso, ela também adstrita à reparação dos vícios detetados no tapete, a sua posição traduz uma recusa de cumprimento da sua obrigação, pela negação injustificada da reparação do tapete que, dada a situação de urgência que bem conhecia e independentemente da data em que a A. encomendou o novo tapete, corresponde a um incumprimento definitivo e culposo da sua obrigação, sem que houvesse necessidade de ser notificada em termos admonitórios para cumprir dentro de qualquer prazo, pois que, pela posição já assumida, só seria de esperar que continuasse a recusar o cumprimento e a assumir, por qualquer forma, a responsabilidade pelo sucedido.
Com efeito, a R. é responsável pelos prejuízos que a situação causou à A., correspondentes aos custos inerentes à aquisição e instalação de um novo tapete, a única forma de superar os vícios ligados ao funcionamento do tapete anterior, como ficou demonstrado.
*
3. Abuso de direito da A.
Diz-nos a apelante na conclusão W):
«Mas mesmo que assim não se entenda, o que se admite por mera hipótese académica, mesmo que se entenda que o contrato seria o mesmo e que havia incumprimento, nunca poderia a Recorrente ser condenada.
Com efeito, a Recorrida em 18 de maio de 2017 estava junto da Recorrente a pedir a reparação da tela e junto do fabricante a encomendar uma tela nova, que afirma ser exatamente igual à anterior e supostamente para a mesma máquina.
Ora, se na perspectiva da Recorrida, no dia de 18 de maio de 2017, a tela tinha reparação, uma vez que a solicitou à Recorrente, não se compreende como, nesse mesmo dia, não solicita tal reparação ao fabricante e opta por lhe comprar uma tela nova.
Se era reparável para a Recorrente, decerto era reparável para o seu fabricante.
Tal conduta é reprovável por parte da Recorrida, age esta em manifesto abuso de direito sob a forma de venire contra factum proprium, nos termos do previsto no artº 334 do código civil.».
A exceção do abuso de direito pode ser apreciada pela Relação, sendo até do conhecimento oficioso.
Não consta como provado o facto agora invocado pela R., mas apenas que a A. remeteu à R., que a recebeu, a mensagem de correio eletrónico junta a fl.s 34.v dos autos, datada de 18 de maio de 2017, dando por reproduzido o respetivo teor (ponto 33), que é o seguinte:
Boa tarde,
No seguimento do v/ email somos a responder o seguinte:
Quando a n/ empresa vos contatou para realizar o serviço, foram-nos solicitadas as fichas técnicas, as quais vos foram devidamente entregues.
Foi com base nessa informação que realizaram o v/ trabalho, portanto, deveremos partir do princípio que fizeram o trabalho com conhecimento suficiente para tal. Pois de outra forma e tendo em conta as consequências que acarretaria um trabalho mal executado nesse caso, nunca o deveriam ter feito.
Tendo em conta que qualquer serviço têm obrigatoriamente que ter garantia, quando solicitados para realizarem uma segunda intervenção, pelo motivo de o trabalho inicial não ter ficado bem feito, não deveria ter sido cobrado qualquer valor extra por essa intervenção.
Tendo em conta a gravidade da situação e os constrangimentos que esta situação está a causar ao nosso cliente que têm a tela num estado limite, podendo rebentar a qualquer momento, obrigação com isso a parar a máquina com consequências graves para a produção da empresa, não é de todo correto da v/ parte não atender os telefonemas do nosso comercial e quando respondem, argumentar que não fazem qualquer intervenção sem receber os valores indevidamente cobrados por vós aquando da 2.ª intervenção.
Mantendo fé no v/ profissionalismo agradecemos uma resposta no sentido de solucionar de vez esta situação.

Através desta missiva, a A. não está a insistir pela reparação da tela, até porque já se sabia, nessas circunstâncias --- e, disso, estava também perfeitamente ciente o técnico especializado da R. que executou a obra --- que a solução do problema teria de passar pela substituição integral do tapete (ponto 36). O que a A. ali manifestou à R. foi confiança no seu profissionalismo e vontade de obter uma resposta que relevasse no sentido de solucionar definitivamente a situação. Obviamente, essa resposta poderia passar pelo pagamento total ou parcial, pela R., do novo tapete. O que a A. fez foi fazer notar que não descartava a responsabilidade da R., vincando-a junto dela, apesar de ter encomendado um tapete novo e se encontrar a diligenciar, sem a sua colaboração, pela solução do problema.
Vamos admitir que a A. encomendou o novo tapete para a sua aplicação na máquina na data que consta da fatura que constitui o doc. nº 20/1 junto com a petição inicial, ou seja, o dia 18 de maio de 2017, a data do referido email.
Dispõe o art.º 334º do Código Civil que “é ilegítimo o exercício de um direito, quando o titular exceda manifestamente os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico desse direito”.
O instituto do abuso do direito aplica-se a situações em que a invocação ou o exercício de um direito que, na normalidade das situações seria justo, na concreta situação da relação jurídica se revela iníquo e fere o sentido de justiça da comunidade. «Visa obtemperar a situações em que a concreta aplicação de um preceito legal que, na normalidade das situações seria ajustada, numa concreta situação da relação jurídica, se revela injusta e fere o sentido de justiça dominante. (...) A parte que abusa do direito, actua a coberto de um poder legal, formal, visando resultados que, clamorosamente, violam os limites impostos pela boa-fé, pelos bons costumes, ou pelo fim económico ou social do direito. (…)”»[47].
Enquanto princípio geral moderador dominante na globalidade do sistema jurídico, apresenta-se como verdadeira «válvula de segurança» vocacionada para impedir ou paralisar situações de grave injustiça que o próprio legislador preveniria se as tivesse previsto, de tal forma que se reveste, ele mesmo, de uma forma de antijuridicidade cujas consequências devem ser as mesmas de qualquer ato ilícito.
Quando tal sucede, isto é, quando o direito que se exerce não passa de uma aparência de direito, desligado da satisfação dos interesses de que é instrumento, e se traduz «na negação de interesses sensíveis de outrem», haverá á que afastar as normas que formalmente concedem ou legitimam o poder exercido.[48]
Como consequência de um eventual abuso do direito, o ordenamento põe uma regra geral no sentido de recusar a tutela aos poderes, direitos e interesses exercitados em violação das corretas regras do exercício, posto serem comportamentos contrários à boa fé.
Manuel de Andrade qualificava a figura de abuso de direito como o exercício incorreto e desviado do sentido que a lei e o Direito pretenderam fixar o direito subjetivo que o respetivo titular pode exercitar sem ofensa às regras de boa-fé, confiança jurídica e relacional que queda estabelecida entre os protagonistas de um contrato ou de uma relação jurídica tutelada pela ordem jurídica. Tem de haver, no exercício do direito, uma clamorosa ofensa do sentimento jurídico dominante, devendo então o seu titular ser tratado como se não tivesse tal direito ou a de contra ele se admitir um direito de indemnização baseado em facto ilícito extracontratual.[49]
Face à recusa da R. em cumprir pontualmente o contrato (fora de um quadro circunstancial que alegou, desde logo na ação nº 67078/17.3YIPRT, mas não demonstrou) e à urgência da reparação, a A. exerceu legitimamente o seu direito, dentro do quadro legal, através da aquisição e instalação do tapete para a máquina de polir, cumprindo, pela prática dos mesmos atos, uma obrigação de prestar (sem vícios ou defeitos) que assumira perante a sua cliente D…, Lda. no contrato de empreitada que com ela celebrara.
A conduta da recorrida não só não excede os limites impostos pela boa fé contratual, nem é clamorosamente ofensiva dos bons costumes, do fim social e económico do seu direito, como, na realidade, é absolutamente consentânea com o correto e devido exercício desse direito de eliminar o vício e exigir da R. empreiteira uma indemnização correspondente ao prejuízo que suportou com a sua ação reparadora, ao mesmo tempo que demonstra ainda boa fé no cumprimento do contrato que celebrada com a D…, Lda., prevenindo a paragem da máquina ou mesmo da produção da sua fábrica e, assim, maiores prejuízos.
De resto, dadas as circunstâncias demonstradas, não há, como observámos, qualquer conduta contraditória, própria do venire contra factum proprium, entre a encomenda de um serviço a terceiro quando o empreiteiro já se recusou a prestá-lo e a notificação simultânea deste pelo dono da obra de que mantém interesse em responsabilizá-lo pelo problema que o mesmo não solucionou.
A recorrida não agiu com abuso do direito.
*
4. Excessiva onerosidade da condenação
Passa depois a recorrente a defender que a A. não tinha necessidade de adquirir a tela de substituição em Itália com despesas de deslocação do técnico daquele pais para Portugal a fim de a montar, podendo tê-la adquirido em Portugal por um preço próximo de metade daquele valor. Faz uma comparação entre o custo da primeira tela e o custo da segunda tela e respetivos serviços e afirma que, se a recorrida tivesse optado por qualquer fornecedor nacional, os custos seriam muito menos elevados.
Esta é uma questão nova que não foi e deveria ter sido suscitada na contestação, onde toda a defesa deve ser deduzida, excetuados os incidente que a lei mande deduzir em separado. Depois da contestação só podem ser deduzidas as exceções, incidentes e meios de defesa que sejam supervenientes, ou que a lei expressamente admita passado esse momento, ou de que se deva conhecer oficiosamente (art.º 573º, nº 1 e 2, do Código de Processo Civil).
Não podia a apelante estrear esta questão apenas nesta sede de recurso.
Sobre o conceito de “recurso”, escreveu Alberto dos Reis[50] que “são meios de obter a reforma de sentença injusta, de sentença inquinada de vício substancial ou do erro de julgamento. O mecanismo através do qual opera o recurso define-se nestes termos: pretende-se um novo exame da causa, por parte de órgão jurisdicional hierarquicamente superior”.
Castro Mendes e Armindo Ribeiro Mendes definem o recurso como um “pedido de reponderação sobre certa decisão judicial, apresentada a um órgão judiciariamente superior ou por razões especiais que a lei permite fazer valer”[51].
A existência de decisão recorrível é fator sine qua non do nascimento do direito ao recurso, conforme o regime normativo aplicável. Na medida em que um recurso se destina a fazer reponderar uma decisão, seguramente tal repudia a consideração de questões novas, salvo aquilo que é de conhecimento oficioso. Vale dizer de poder-dever de conhecimento oficioso, inserível no thema decidendum.[52]
O objeto do recurso não se confunde com o objeto do litígio, tendo o recurso acentuada autonomia. Aquele é constituído por um pedido que tem por objeto a decisão recorrida e visa a sua revogação total ou parcial. A questão ou litígio sobre que recaiu a decisão impugnada não é, ao menos de forma imediata, objeto do recurso, no modelo de revisão ou de reponderação acolhido no nosso Direito.[53] Daí que, proibindo a lei a reformatio in pejus, e sendo possível restringir o objeto inicial do recurso, os efeitos do julgado, na parte não recorrida da decisão, não possam ser prejudicados pela decisão do recurso nem pela anulação do processo (art.º 635º, nºs 4 e 5).
O tribunal ad quem apenas pode conhecer, em princípio, das questões que, tendo sido apreciadas na decisão recorrida, constituam objeto do recurso, delimitado este pelas conclusões da alegação (art.ºs 627°, nº 1 e 635º). O objeto do recurso é a decisão proferida pelo tribunal recorrido, as questões postas à sua apreciação que ele efetivamente decidiu ou omitiu (devendo decidir) nesse mesmo despacho ou sentença. Pelo recurso, a parte vencida nessa decisão visa obter a sua reapreciação ou reexame e a respetiva modificação, tendo em vista a realização do seu interesse.
Decorre do exposto que não vamos conhecer desta questão do excesso de onerosidade.
*
Nada mais havendo a apreciar e a decidir, resta-nos confirmar a sentença recorrida, julgando improcedente a apelação da R.
*
SUMÁRIO (art.º 663º, nº 7, do Código de Processo Civil)[54]:
………………………………
………………………………
………………………………
*
*
V.
Pelo exposto, acorda-se nesta Relação em julgar a apelação improcedente e, em consequência, confirma-se a sentença recorrida.

Custas da apelação pela recorrente, dado seu total decaimento, devendo a tender-se à taxa de justiça paga pela interposição do recurso (art.º 527º, nº 1, do Código de Processo Civil).
*
*
Porto, 14 de julho de 2020
Filipe Caroço
Judite Pires
Aristides Rodrigues de Almeida
_______________
[1] Adiante B1….
[2] Adiante C1….
[3] Por transcrição.
[4] Por transcrição.
[5] Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 24.1.2012, proc. 2384/10.3YXLSB.L1-7, in www.dgsi.pt.
[6] Recursos no Novo Código de Processo Civil, Almedina 2013, pág. 117.
[7] Acórdão da Relação de Coimbra de 10.11.2015, proc. 158/11.3TBSJP.C1, in www.dgsi.pt, citando outra jurisprudência.
[8] Acórdão da Relação de Guimarães de 20.11.2014, proc. 1016/10.4TBVVD.G1, in www.dgsi.pt.
[9] Guia de Recurso em Processo Civil, Coimbra Editora, 4ª edição, pág. 125.
[10] Proc. 1825/09.7TBSTS.P1.S1, in www.dgsi.pt.
[11] Proc. 233/09.4TBVNC.G1.S1, in www.dgsi.pt.
[12] Não é, no entanto, pacífica esta jurisprudência. Em sentido divergente, veja-se, por exemplo, o acórdão da Relação de Coimbra de 16.2.2017, proc. 52/12.0TBMBR.C1, in www.dgsi.pt, do qual destacamos a pertinente observação de que as posições menos rígidas, mais maleáveis, na admissão do recurso em matéria de facto, designadamente com utilização de critérios casuísticos de proporcionalidade, introduzem fatores de insegurança e instabilidade indesejáveis numa matéria processual que se deseja segura e praticamente indiscutível, sem transtornos nem divergências.
[13] Recursos no Novo Código de Processo Civil, 2013, Almedina, pág. 224 e 225.
[14] Prova por Presunção no Direito Civil, Almedina, 2ª edição, 2013, pág. 129, citando Michele Taruffo, La Prueba de los Hechos, Editorial Trotta, Madrid, 2002, pág. 436.
[15] Sob o título “Os Ónus da Alegação e da Prova, em Geral …”, Colectânea de Jurisprudência, Ano VII, T I, pág. 19.
[16] “Provas – Direito Probatório Material”, BMJ 110/82 e 171.
[17] Por transcrição.
[18] Diploma a que pertencem todas as disposições legais que se citarem sem menção de origem.
[19] Poderá ser modificada através de recurso extraordinário, mas dele não temos que cuidar aqui.
[20] Dever que incumbe ao órgão jurisdicional que conhece de um novo processo de se abster de ditar uma nova resolução sobre o fundo da questão litigiosa, quando esta seja idêntica à que foi já foi decidida na resolução em que se produzia o caso julgado (efeito negativo ou excludente); ou, no dever de ater-se ao que resulte desta ou tomá-la como pressuposto da sua decisão, quando se apresente como condicionante ou prejudicial da questão que constituí o objeto do novo processo (efeito positivo ou prejudicial). [21] Por oposição à teoria da individualização.
[22] Anselmo de Castro, Direito Processual Civil Declaratório, Almedina, 1982, vol. III, pág.s 392 e 398.
[23] O Objecto da Sentença e o Caso Julgado Material, BMJ nº 325, pág. 171.
[24] Silva Carvalho, O CASO JULGADO Na Jurisdição Contenciosa (como excepção e como autoridade
– limites objectivos) e na Jurisdição Voluntária (haverá caso julgado?)”, in http://www.search.ask.com/web?l=dis&q=Silva+Carvalho%2C+O+CASO+JULGADO+Na+Jurisdi%C3%A7%C3%A3o+Contenciosa+%28como+excep%C3%A7%C3%A3o+e+como+autoridade+%E2%80%93+limites+objectivos%29+e+na+Jurisdi%C3%A7%C3%A3o+Volunt%C3%A1ria+%28haver%C3%A1+caso+julgado%3F%29&o=APN10644A&apn_dtid=^BND101^YY^PT&shad=s_0047&gct=hp&apn_ptnrs=AG5&lang=pt&atb=sysid%3D101%3Auid%3D01d1d3bfb415bb15%3Auc%3D1364843619%3Asrc%3Dhmp%3Ao%3DAPN10644A.
[25] A que aqui nos interessa.
[26] Código de Processo Civil anotado, vol. III, pág.s 94 e 95.
[27] Proc. 5182/06.5TBMTS-B.P1.S1, in www.dgsi.pt.
[28] Oggetto del Processo Civile e Cosa Giudicata”, Giuffrè Editore, Milão, 2009,116-118.
[29] Proc. 2204/10.9TBTVD.L1-2, in www.dgsi.pt.
[30] Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 19.2.2015, proc. 299/05.6TBMGD.P2.S1, in www.dgsi.pt.
[31] Revista nº 690/09.9YFLSB.
[32] Neste sentido, cf. ainda Antunes Varela, J. Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, Manual de Processo Civil, 1984, pág. 697, e Teixeira de Sousa, Estudos sobre o Novo Processo Civil, pág. 577, para quem “os fundamentos de facto não adquirem, quando autonomizados da decisão de que são pressuposto, valor de caso julgado”.
[33] Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 5.5.2005, proc. nº 05B691, in www.dgsi.pt.
[34] Cf. P. Lima e A. Varela, in “Código Civil anot”, Coimbra Ed., 2ª edição, volume II, pág.s 702 e 703 e acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 9/11/2006, in www.dgsi.pt.
[35] Direito das Obrigações, Almedina 1979, pág. 232.
[36] Cf. também Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, 2ª edição, 2.° vol., pág. 13.
[37] O Contrato, 1989, pág. 34.
[38] Paul Ricoeur, O Justo ou a Essência da Justiça, Instituto Piaget, 1997, pág. 32.
[39] Teoria Geral do Direito Civil, 4ª edição, Coimbra Editora, pág. 126.
[40] J. Antunes Varela, Das Obrigações em geral, Almedina, 5ª edição, pág.s 162 e 167.
[41] Cumprimento Defeituoso…, Almedina, pág. 344.
[42] Citando doutrina estrangeira.
[43] Cf., entre outros, os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 30.10.97, proc. 98B900, de 8.6.2006, proc. 06A1338, de 2.11.2006, proc. 06B3822, de 16.3.2010, proc. 6817/06, e acórdão da Relação do Porto de 28.3.2011, 444/08, in www.dgsi.pt, citados por Luís Filipe Pires de Sousa, ob. cit., pág. 257 e 258.
[44] Cura Mariano, Responsabilidade Contratual do Empreiteiro pelos Defeitos da Obra, Almedina, 3ª edição revista e aumentada, pág.s 147 a 149.
[45] Cura Mariano, ob. cit., pág. 153, referindo doutrina estrangeira. [46] Cura Mariano, idem, pág. 157, Pedro romano Martinez, Cumprimento Defeituoso, em Especial na Compra e Venda e na Empreitada, Almedina, Teses, pág.s 346 e 347, e Menezes Leitão, Direito das Obrigações, vol. III, pág. 552. Assim se tem entendido também na jurisprudência, de que são exemplo, os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 23.11.2004 e de 25.11.2004, e desta Relação do Porto de 18-11-2004 e de 13-11-2005, todos in www.dgsi.pt.
[47] Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 9.9.2008, proc. nº 08A2123, in www.dgsi.pt, e de 5.3.2013, Colectânea de Jurisprudência do Supremo, T. I, pág. 134.
[48] Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 16.12.2010, proc. 1584/06.5TBPRD.P1.S1, in www.dgsi.pt, citando Coutinho de Abreu, Do Abuso de Direito, pág. 43.
[49] Teoria Geral das Obrigações, pág. 63.
[50] Código de Processo Civil anotado, vol. V, pág. 212.
[51] Armindo Ribeiro Mendes, Direito Processual Civil III, AAFDL, 1982, pág. 158.
[52] J. Cardona ferreira, Guia de Recursos em Processo Civil, 4ª edição, Coimbra Editora, pág.s 42, 43 e 87; A. Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, Almedina 2013, pág. 25, Teixeira de sousa, estudos Sobre o Novo Processo Civil, 2ª ed., pág. 395, Lebre de Freitas e Ribeiro Mendes, Código de Processo Civil anot., vol. III, tomo I, 2ª ed., pág. 8 e, bem assim, a jurisprudência portuguesa em geral, de que são exemplo os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 25.111998, BMJ 481/430 e de 12.7.2007, in www.dgsi.pt.
[53] Armindo Ribeiro Mendes, Recursos em Processo Civil, Reforma de 2007, Coimbra Editora, pág. s 74 e 81.
[54] O sumário é da exclusiva responsabilidade do relator.