JUNÇÃO DE DOCUMENTOS
PARECERES
EXAME CRÍTICO DAS PROVAS
Sumário


I - O dies ad quem para que as partes possam efectuar a junção de documentos e pareceres aos autos, é distinto, aferindo-se a (in)tempestividade de tal junção pelos momentos temporais previstos, respectivamente, nos artigos e 423.º a 425.º, e 426.º do CPC.
II - Em face do distinguo legal a respeito do limite temporal para a respectiva apresentação, ao julgador cumpre aquilatar a diferente natureza das peças escritas, distinguindo as que devem ser qualificadas como documentos enquanto meio de prova de um facto, daquelas que constituem pareceres técnicos, já que também estas dizem amiúde respeito a questões de facto.
III - Os pareceres de técnicos dizendo normalmente respeito a questões de facto, quando produzidos extrajudicialmente destinam-se exclusivamente a elucidar o tribunal sobre o significado e alcance de factos de natureza técnica cuja interpretação demanda conhecimentos especiais, não valendo como meio de prova, enquanto os documentos têm como função apenas servirem de prova dos factos a que se referem.
IV - A interpretação do artigo 426.º do CPC (conforme o Acórdão TC n.º 934/96, de 10.07.1996, decidiu a respeito do artigo 525.º então vigente) “à luz do artigo 20º, nº 1, da Lei Fundamental deve, pois, ser entendida como conferindo às partes o direito de juntar, nos tribunais de 1ª instância, pareceres de advogados, professores ou técnicos, cabendo-lhes a eles – e não ao juiz – a definição do critério do que deva ser considerado como parecer”.
V - Tendo por função o exame e interpretação de factos cuja apreciação, pela sua natureza técnica impõe a existência de conhecimentos especiais, da área da contabilidade, que o tribunal não possui, o escrito que as Rés pretenderam juntar com a designação de parecer contabilístico não podia, sem mais, ser rejeitado, independentemente da apreciação que o tribunal oportunamente venha a fazer sobre a sua valia na apreciação da matéria objecto do litígio (sumário da relatora)

Texto Integral

Tribunal Judicial da Comarca de Faro[1]

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Acordam na 1.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora[2]:

I – RELATÓRIO
1. C…, A… e N…, Rés nos autos acima identificados, notificadas do despacho proferido na audiência de julgamento de 07.11.2019, que indeferiu o requerimento que ali haviam formulado para que fosse “admitida a junção de documento, constituído por parecer contabilístico”, e não se conformando com o mesmo, apresentaram o presente recurso de apelação pedindo que o despacho recorrido seja revogado, admitindo-se o documento conforme foi requerido, finalizando com as seguintes conclusões:
«A) O Mmo juiz errou na aplicação da lei ao indeferir o requerimento das Rés para junção de um parecer subscrito pelo técnico Rui Pedro Pombinho, CC n.º 36787, invocando que não sabe quem subscreve e se tem a competência exigida para tal.
B) O técnico R… já se encontrava devidamente identificado nos autos, como TOC n.º …, (mesmo número de cédula profissional, mesmo domicílio profissional), conforme consta do ofício da OTOC (Ordem dos Técnicos Oficial de Contas) que foi junto ao processo em 08 de janeiro de 2015.
C) A OTOC (Ordem dos Técnicos Oficiais de Contas) foi substituída pela OCC (Ordem dos Contabilistas Certificados) com a entrada em vigor da lei n.º 139/2015, de 7 de setembro, pelo que os TOC (técnicos oficiais de contas) passaram a ser chamados CC (contabilistas certificados), cuja nova designação vigente há já quatro anos, parece ainda não ter sido recebida e assimilada pelas pessoas em geral.
D) O tribunal a quo aplica de forma incorreta a lei quando condiciona a entrega do parecer técnico à mediação do tribunal nos termos e condições do artigo 442.º, exigindo que o mesmo seja requisitado pelo tribunal, quando o direito de juntar ou não aos autos um parecer, seja de advogado, de professor ou de técnico é, em primeira instância, um direito que assiste às partes até ao momento em que o juiz recolhe aos seus aposentos para começar a elaborar a sentença.
E) O tribunal deveria ter aceite a junção do parecer aos autos, sem qualquer objeção, embora o subscritor se identifique como CC n.º … - o que salvo melhor opinião não basta para afastar o documento – até porque o técnico já era conhecido nos autos, onde já se encontrava devidamente identificado, como TOC.
F) O tribunal deveria ter aplicado a norma indicada, que é o artigo n.º 426 do CPC, que prevê a junção de pareceres pelas partes; não o fazendo, cerceou, limitou ou impediu o exercício do direito das Rés - constitucionalmente reconhecido no n.º 1 do artigo 20.º da CRP – em organizarem como bem entendem a sua defesa, porque infringiu o princípio de contraditório e da igualdade implícitos no direito do acesso ao direito e aos tribunais constitucionalmente reconhecidos no n.º1 do artigo 20.º da Constituição da República Portuguesa».

2. Não foram apresentadas contra-alegações.

3. Observados os vistos, cumpre decidir.
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II.1. – Factos relevantes
A tramitação processual relevante para a decisão do presente recurso será indicada na oportunidade, para evitar repetição inútil.
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II.2. – Objecto do recurso
Com base nas disposições conjugadas dos artigos 608.º, n.º 2, 609.º, 635.º, n.º 4, 639.º, e 663.º, n.º 2, todos do Código de Processo Civil[3], é pacífico que o objecto do recurso se limita pelas conclusões das respectivas alegações, evidentemente sem prejuízo daquelas questões cujo conhecimento oficioso se imponha, não estando o Tribunal obrigado a apreciar todos os argumentos produzidos nas conclusões do recurso, mas apenas as questões suscitadas, e não tendo que se pronunciar sobre as questões cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras.
Assim, vistos os autos, a única questão a apreciar no presente recurso é a de saber se deve ou não ser revogado o despacho recorrido, substituindo-o por outro que admita a junção aos autos do referido meio de prova apresentado em audiência.
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II.3. – O mérito do recurso
Alegam as Rés, ora Recorrentes, que o meio de prova por si indicado e rejeitado no despacho recorrido, deve ser admitido, começando a sua peça processual referindo que «[o] ponto essencial da questão recorrida diz respeito à não aplicação do artigo 426.º do CPC, tendo o Mmo juiz optado por aplicar o artigo 423.º CPC, cujo n.º 2 exige que os documentos sejam apresentados até 20 dias antes da data de realização da audiência final, na senda do alegado pela Ilustre mandatária da Autora, que não se coibiu de invocar a “má fé das Rés” ao tentarem juntar o parecer aos autos».
Aduziu então a Autora/Recorrida, em suma, «não dever o Tribunal admitir a junção aos autos do documento ora apresentado pelas rés, quer por manifesta inexistência de justificação do motivo da sua apresentação tardia, quer por extemporaneidade, e a sê-lo, a autora não prescinde, desde já, de prazo para análise do mesmo».
Expendeu-se no despacho recorrido: «Relativamente ao documento agora apresentado pelas rés, as mesmas qualificam o documento em apreço como um parecer.
Ora a lei processual contém normas específicas acerca da fase da formação dos pareceres, como seja o caso do disposto no artº 601.º, n.º 1, parte final, do Código de Processo Civil.
Sucede que, as rés, no seu momento próprio, não requereram (nos seus requerimentos probatórios) ao Tribunal que requisitasse qualquer parecer técnico.
O que foi requerido pelas partes foi a realização de perícia, essa foi levada a cabo, apresentado o respectivo relatório, e o mesmo consta do processo.
O documento que as rés apelidam agora de parecer, tinha assim um limite temporal para ser apresentado no processo pelas rés, e tal limite temporal é precisamente o limite temporal que a lei processual civil estabelece para que as partes possam apresentar prova documental.
É por isso mesmo que a junção de pareceres não requisitados pelo Tribunal, mas apresentados pelas partes, encontra-se expressamente prevista no capítulo que o Código de Processo Civil dedica à prova por documento, mais em concreto no art. 442.º, n.º 1 do NCPC.
Daí que, a nosso ver o documento agora apresentado pelas rés seja extemporâneo. Assim sucede porquanto se encontra ultrapassado o limite do prazo de 20 dias anterior à data da realização da audiência final (art. 423.º, n.º 2, do NCPC), e as rés nem alegaram que a apresentação deste documento não foi possível até esse momento, ou que a sua apresentação se tenha tornado necessária em virtude de ocorrência posterior.
Acrescente-se, ainda, que do documento agora apresentado pelas rés, e mediante a sua observação, não consta expressa a qualidade do seu subscritor como pessoa expressamente habilitada à emissão de um parecer, observando-se apenas que o seu subscritor se identifica como R…, sem concretizar afinal de contas o que é que significam as duas letras CC.
Entendemos assim que o documento em apreço, sem que o seu subscritor esteja nele claramente identificado como técnico especialmente habilitado para o efeito, não pode o documento em apreço valer como mero parecer de acordo com a noção que aos pareceres é dada pelo NCPC.
Pelo que também não poderá o mesmo ser admitido a coberto do art. 426.º do NCPC.
Fundamentos pelos quais, não se admite a junção do documento agora apresentado pelas rés».
O cerne da questão decidenda está, pois, circunscrito à qualificação do escrito oferecido pelas Rés em audiência de julgamento: trata-se de um documento, como considerou o julgador, cuja apresentação se encontra sujeita ao limite temporal estabelecido no artigo 423.º, n.º 2, do CPC, e, por tal, extemporâneo – tanto mais que não foi requisitado pelo Tribunal qualquer parecer e a qualidade do seu autor não está devidamente identificada –, ou constitui um parecer contabilístico subscrito por técnico especialmente habilitado para o efeito, como as Recorrentes sustentam, podendo ser junto em primeira instância, em qualquer estado do processo, nos termos previstos no artigo 426.º do CPC, e sem sujeição ao crivo do juiz?
Vejamos.
Conforme se extrai do saneamento dos autos, efectuado por despacho proferido em 17.06.2014 (ref.ª 1687319), o objecto do «litígio entre as partes circunscreve-se à verificação da obrigação de indemnizar por parte das Rés, com fundamento na violação dos deveres contratualmente estabelecidos, ao abrigo do contrato de prestação de serviços», constituindo temas da prova, nomeadamente saber se tal acordo foi celebrado entre a entre A. e a 1.ª Ré, obrigando-se esta, sozinha, a assumir a regularidade fiscal da A. e prestar-lhe a necessária consultadoria técnica e fiscal, além de elaborar toda a contabilidade da Empresa, responsabilizando-se pela mesma, assinando e/ou entregando informaticamente, para tanto as respectivas declarações fiscais e de Segurança Social da A., tendo a A. sabido apenas no Verão do ano de 2011 que a 1ª Ré não só não era Técnica Oficial de Contas como havia incumbido a 2ª e 3ª Ré de tais funções, tudo conforme alegação decorrente dos artigos 2.º, 6.º e 10.º da petição inicial, vertida nos temas da prova sob os números 1 a 4.
Alegou ainda a Autora na petição inicial da presente acção, em fundamento do pedido formulado, a existência de declarações de IVA que haviam sido submetidas incorrectamente pelas 1.ª e 3.ª, e cujo valor a pagar seria inferior ao suportado, o não pagamento do valor de IVA, que lhe havia sido entregue, dentro do prazo estipulado, tendo a Autora suportado coima e custas, a informação para a administração fiscal foi enviada com tais discrepâncias que a Autora foi notificada do projecto de decisão de cancelamento do seu alvará, tendo solicitado prazo para proceder à correcção dos erros detectados na contabilidade de 2008 e 2009, e pago ao TOC que identificou para proceder à respectiva recuperação e regularização, o que veio a constituir os temas da prova indicados nos números 5 a 20.
Mais invocou a Autora que apesar de pagar à 1.ª R. atempadamente as quantias por esta solicitadas a mesma não só não fazia a entrega das remunerações dos seus trabalhadores dentro do prazo para esse efeito, tendo suportado o pagamento de juros de mora, como procedeu a pagamento de quantia indevida, tendo a 2.ª e 3.ª R. assinado e validado as informações erradas constantes das declarações enviadas informaticamente para os Serviços de Administração Fiscal e Segurança Social, conforme temas da prova indicados nos números 21 a 24.
Por seu turno, em face da respectiva defesa motivada, constam ainda nos temas da prova, mormente nos números 35 a 60, um elenco de situações respeitantes a elementos contabilísticos, documentos de suporte e sua repercussão nas declarações que foram apresentadas, no confronto com os valores que deviam ter sido declarados e suas consequências nos valores a pagar ao Estado.
Nesse mesmo despacho foi liminarmente admitido o requerimento probatório que havia oportunamente sido formulado pela Autora (lapso corrigido no despacho de 24.10.2014), para realização de prova pericial, com o objecto que veio a ser definido no despacho de 11.04.2015, por referência aos pontos 1.º a 10.º do requerimento de fls. 353 e 354, a efectuar pela Senhora Técnica Oficial de Contas no mesmo nomeada, acolhendo o julgador a primeira das indicações constantes no ofício junto a 08.01.2015, subscrito pelo Senhor Bastonário da Ordem dos Técnicos Oficiais de Contas, que no seguimento da solicitação do Tribunal, indicou “os dados relativos a três Técnicos Oficiais de Contas, para realização da perícia contabilística”, que aparentemente seguem a ordem alfabética dos nomes respectivos, sendo a terceira indicação a do TOC n.º …, R….
Nos indicados pontos do requerimento impetrando a realização de prova pericial, apresentado pela Autora em 11.10.2013, para prova da matéria alegada sob os números 11.º a 20.º da petição inicial, constam as seguintes questões:
«1. A 2ª e 3ª Ré, verificavam, assinavam e validavam as declarações fiscais e de segurança sociais entregues pelas mesmas junto dos competentes serviços a saber: serviços de administração fiscal e de segurança social?
2. Em virtude de tal serviço foi a A. notificada pelos serviços de cobrança de IVA referente aos trimestres 2007.06T; 2007.12T; 2008.12T; para proceder à substituição das declarações periódicas de IVA?
3. Tais declarações foram submetidas incorrectamente?
4. No que respeita ao trimestre 2007.12T, ou seja, ultimo trimestre de 2007, a R. inscreveu incorrectamente os valores no campo 61 da Declaração de IVA?
5. A R. no campo 61, inscreveu valores, quando na verdade, tais valores não existiam?
6. No campo 11 (imposto a favor do estado) a dita Declaração contém valores que são incoerentes com a base tributável inscrita no campo 10?
7. A base tributável a declarar era de € 3.064,80 (três mil, sessenta e quatro euros e oitenta cêntimos), sendo que, aplicado a tal base a taxa de 21% de IVA, (percentagem de IVA em vigor à data da entrega da Declaração), o valor de Imposto a favor do estado seria de € 643,61 (seiscentos e quarenta e três euros e sessenta e um cêntimos)?
8. Em virtude de tal incorrecção a A. pagou em excesso ao estado a quantia de € 14.363,36 (catorze mil, trezentos e sessenta e três euros e trinta e seis cêntimos)?
9. A Declaração de IVA, supra referida, foi substituída por outra, sendo que, em virtude desta substituição a A. apenas teria de ter pago ao estado a quantia de € 1.102,50 (mil, cento e dois euros e cinquenta cêntimos)?
10. A 1ª e 3ª R. ao proceder ao preenchimento e envio da Declaração periódica de IVA da A. e supra referida, preencheram a mesma incorrectamente?»
Apresentado o relatório pericial, as partes vieram requerer esclarecimentos nos termos dos requerimentos apresentados em 20 e 23.06.2016, informando a Senhora Perita nomeada (requerimento de 04.11.2016) que não respondeu às questões de forma completa, porque não constam do processo os elementos suficientes para o efeito, solicitando “para além dos elementos em falta, todos os documentos contabilísticos, todos os extratos de conta, todas as declarações fiscais, todas as declarações enviadas à Segurança Social, relativos aos anos de 2007 e 2008”.
O relatório pericial veio a ser junto aos autos em 10.05.2019, depois da junção pelas partes de vários documentos e da apresentação de um extenso rol de requerimentos, tendo nessa sequência A. e RR. requerido ainda a audição da Sr.ª Perita em audiência, para prestação de esclarecimentos orais, o que foi deferido por despacho proferido em 19.06.2019, acolhendo a posição das partes.
A Senhora Perita foi ouvida em esclarecimentos na primeira sessão da audiência de julgamento que ocorreu no dia 22.10.2019, na qual foram ouvidas as testemunhas arroladas pela autora, sendo uma Contabilista Certificada e outra Economista, e foi indeferida a pretendida junção pelas RR. de dois documentos, por extemporâneos, prosseguindo a audiência final no dia 29.10.2019, com inquirição das testemunhas arroladas pelas Rés, nenhuma das quais sendo profissional da área de conhecimento objecto do litígio, e sendo designado o dia 07.11.2019, para alegações finais, data em que as Rés formularam previamente àquele momento o requerimento para junção do escrito que foi pelas Recorrentes denominado “parecer contabilístico”, e que mereceu o despacho recorrido considerando-o inadmissível, por extemporâneo, enquanto documento, e por não poder valer como parecer, nos termos do artigo 426.º do CPC, desde logo por não estar devidamente identificada a qualidade do seu autor.
Fizemos o excurso que antecede sobre a tramitação processual que importa à decisão porquanto da mesma decorre cristalinamente que, aquando do requerimento apresentado na última sessão da audiência de julgamento, já não era legalmente possível a proposição de novos meios de prova pelas Rés, mormente a junção daquele escrito aos autos ao abrigo de qualquer um dos números do artigo 423.º, do CPC, considerando a data de elaboração no mesmo aposta, nem a inquirição como testemunha do seu autor, que como tal não foi oportunamente apresentado[4], havendo igualmente já expirado há muito o prazo para que as Rés, alegando fundadamente as razões da sua discordância relativamente ao relatório pericial apresentado, viessem requerer a realização de uma segunda perícia, tendo por objecto a averiguação dos mesmos factos sobre que incidiu a primeira e destinando-se a corrigir a eventual inexactidão daquela, conforme consentido pelo artigo 487.º do CPC.
Assim, a única forma de as ora Recorrentes lograrem que o seu requerimento fosse então admitido, era, como fizeram, impetrar a junção daquele escrito como parecer do seu autor, nos termos do disposto no artigo 426.º do CPC, preceito que, reproduzindo a previsão anteriormente constante do artigo 525.º do CPC de 1961, na redacção decorrente da revisão de 1967, estabelece que a junção de pareceres de advogados, professores ou técnicos podem ser juntos nos tribunais de primeira instância em qualquer estado do processo, não estando consequentemente sujeitos ao limite temporal estabelecido para apresentação dos meios de prova, podendo ser juntos mesmo após o encerramento da discussão em primeira instância, e quanto aos pareceres de jurisconsultos, mesmo com as alegações de recurso de apelação ou revista e inclusivamente até ao início do prazo para a elaboração do projecto de acórdão, conforme resulta dos artigos 651.º, n.º 2 e 680.º, n.º 2, do CPC, cujo aditamento veio «pôr fim a uma dúvida que o anterior regime suscitava, ficando clara a faculdade de junção até ao início do prazo para a elaboração do projecto de acórdão pelo relator»[5].
Deste modo, perante a distinção legal, não pode sufragar-se nem a necessidade de requisição pelo tribunal, nem a aparente equiparação efectuada pela primeira instância entre documentos e pareceres, quanto ao dies ad quem para que as partes possam efectuar a sua junção aos autos, com invocação do preceituado no artigo 442.º, n.º 1, do CPC, porquanto a (in)tempestividade de tal junção afere-se pelos momentos temporais previstos, respectivamente, nos artigos e 423.º a 425.º, e 426.º do CPC.
Mas, perante peças escritas, já que os pareceres não deixam de ser documentos stricto sensu considerados, como distinguir a sua diferente natureza?
É questão não dispicienda, desde logo em face do distinguo legal a respeito do limite temporal para a respectiva apresentação, pelo que importa avançar na determinação de como pode o julgador aquilatar quais as que devem ser qualificadas como documentos enquanto meio de prova de um facto, daquelas que constituem pareceres técnicos, já que também estas dizem amiúde respeito a questões de facto.
No Acórdão de 26.09.1996[6], o Supremo Tribunal de Justiça – reportando-se aos preceitos então vigentes que foram decalcados na actual redacção da codificação processual civil – afirmou que «Documentos e pareceres não têm a mesma natureza.
Se a tivessem não se justificava a distinção feita nos artigos 706 e 542 do Código do Processo Civil.
Os pareceres são peças que contribuem ou podem contribuir para esclarecer o espírito do julgador. São peças escritas que se juntam ao processo para serem tomadas pelo tribunal na consideração que merecerem.
Os pareceres de técnicos dizem respeito, normalmente a questões de facto. Destinam-se a elucidar o tribunal sobre o significado e alcance de factos de natureza técnica cuja interpretação demanda conhecimentos especiais. Se as opiniões dos técnicos forem expressas em diligência judicial valem como meio de prova se forem expressas por via extra judicial valem como pareceres. Os documentos têm como função apenas servirem de meio de prova de determinados factos.
Fruto da investigação e do trabalho dos técnicos, os pareceres técnicos expressos por via extra judicial representam apenas uma opinião sobre a solução a dar a determinado problema. Têm, apenas, a autoridade que o seu autor lhe dá.
Daí que não devam ser considerados documentos.
E não sendo considerados documentos podem os pareceres de técnicos ser juntos aos autos, nos tribunais de primeira instância em qualquer estado do processo e nos tribunais superiores até se iniciarem os vistos aos juízes (artigos 525, 706 n. 2 e 726 do Código de Processo Civil).
Não têm nem carecem de ter força probatória plena para que a sua junção ao processo seja admitida. Também não podem ser rejeitados com o fundamento de que são desnecessários ou impertinentes, como acontece com os documentos. Os documentos servem, como se disse, de meio de prova. Os pareceres servem apenas para ajudar o julgador a encontrar uma solução justa para o caso que tem para decidir».
Em suma, podemos assentar que os pareceres de técnicos dizendo normalmente respeito a questões de facto, quando produzidos extrajudicialmente destinam-se exclusivamente a elucidar o tribunal sobre o significado e alcance de factos de natureza técnica cuja interpretação demanda conhecimentos especiais, não valendo como meio de prova, enquanto os documentos têm como função apenas servirem de prova dos factos a que se referem.
Tendo então presente este enquadramento e olhando o escrito apresentado pelas Rés para junção aos autos, previamente às alegações orais, podemos afirmar que o mesmo foi produzido extrajudicialmente e se reporta a questões de natureza técnica, já que identifica que se reporta às Declarações do IVA 12T2007 e IES 2008, pelo que, tendo presente a distinção proposta pelo Supremo Tribunal de Justiça, não deverá ser qualificado como documento. Ainda assim, subsiste a questão: pode o mesmo ser qualificado como parecer?
Vejamos, pois, o que pretenderam as Recorrentes que fosse admitido nos autos.
Trata-se de um escrito elaborado em papel sem qualquer timbre, no qual, começando por identificar o n.º do processo, e sem sequer fazer a referência a que qualifica o que assina como um parecer, o subscritor do escrito, datado de 18.10.2018 – ou seja, elaborado antes de nos autos ter sido apresentado o relatório pericial, em 10.05.2019 –, que não se mostra dirigido a ninguém, não identifica quem lhe solicitou a opinião nem o que lhe foi pedido, identifica-se nos seguintes termos «R…, NIF …, CC…, estabelecido na R…», prossegue referindo que «em consulta ao processo supramencionado, relativamente à documentação que teve o cuidado de consultar, vem destacar 2 pontos que se afiguram de elevada importância», continuando com a menção a pontos das declarações de IVA de 2007 e IES de 2008, afirmando que naquela declaração o Estado foi lesado porque o valor que haveria a pagar (€15.344,94) seria superior ao que foi pago (€13.260,86), e quanto a este que “deveria ser apreciado o conteúdo da Acta da referida Assembleia Geral, por forma a verificar em que moldes e por quem foram os mesmos resultados aprovados. No mesmo sentido seria de todo conveniente verificar o relatório de gestão de 2008, por forma a verificar o desempenho da gestão, e os pressupostos relativos aos principais factos empresariais registados nesse exercício fiscal”, e que “relativamente à rubrica de Produtos e trabalhos em curso deveria ser observado o respectivo documento de suporte e verificar se o mesmo teve a colaboração do Engenheiro responsável pelo Alvará, nomeadamente autos de obras”, concluindo que “a empresa apresentava já alguns sinais de debilidade estrutural, com o montante relativo dos Capitais próprios a descer de 80.00€ em 2007, para 55.34€ em 2008, fruto do prejuízo declarado em 2008, no montante de €12.929,02, sendo este facto corroborado com o parecer negativo do IMPCI à revalidação do Alvará».
Considerou a primeira instância, na parte que releva em face das conclusões do recurso, que «do documento agora apresentado pelas rés, e mediante a sua observação, não consta expressa a qualidade do seu subscritor como pessoa expressamente habilitada à emissão de um parecer, observando-se apenas que o seu subscritor se identifica como R… (CC 36787), sem concretizar afinal de contas o que é que significam as duas letras CC.
Entendemos assim que o documento em apreço, sem que o seu subscritor esteja nele claramente identificado como técnico especialmente habilitado para o efeito, não pode o documento em apreço valer como mero parecer de acordo com a noção que aos pareceres é dada pelo NCPC».
Salvo o devido respeito, em face da matéria de facto em causa nos presentes autos, e do requerimento das Rés para junção de um parecer contabilístico, atenta a identificação do seu subscritor como CC n.º 36787, se dúvidas tivesse, sobre o significado daquelas letras, deveria o julgador ter solicitado o respectivo esclarecimento ao abrigo do disposto no artigo 7.º, n.º 2, do CPC, e não meramente afirmar que não sabe se quem o subscreve tem a competência exigida para tal, indeferindo a respectiva junção com tal fundamento.
Na realidade, conforme decorre da tramitação processual acima descrita, constava já nos autos o ofício da Ordem dos Técnicos Oficial de Contas, junto em 8 de Janeiro de 2015, indicando para a realização da perícia, R…, TOC n.º …, ou seja, com o mesmo número de cédula profissional, e com o mesmo domicílio profissional, do subscritor do escrito que as Rés pretenderam juntar em audiência.
Deste modo, e tendo presente que a Ordem dos Técnicos Oficiais de Contas, era abreviadamente identificada com a sigla OTOC e que a mesma foi substituída pela Ordem dos Contabilistas Certificados, com a entrada em vigor da Lei n.º 139/2015, de 7 de Setembro, que passou a ser abreviadamente designada pela sigla OCC, natural seria que os Técnicos Oficiais de Contas, antes abreviadamente identificados com a sigla TOC, que passaram a ser denominados Contabilistas Certificados, fossem abreviadamente identificados com a sigla CC. Aliás, bastaria atentar que no relatório pericial de 07.05.2019, a Senhora Perita se identificou com o seu nome seguido precisamente daquela sigla CC...
Assim sendo, concordamos com o entendimento expresso pelas Recorrentes de que o facto de o respectivo subscritor se identificar como CC n.º 36787 não basta para afastar o documento que pretenderam juntar como parecer, tanto mais que nos autos se mostrava já junto o identificado ofício, pelo que, urge concluir que a sua apresentação foi tempestiva.
Resta, pois, apreciar se, como pretendem as Rés, o tribunal deveria ter aceitado a junção do por elas denominado parecer aos autos, sem qualquer objecção, adiantando-se que a resposta não pode deixar de ser afirmativa.
Efectivamente, defendem as Apelantes que o direito de juntar ou não aos autos um parecer, seja de advogado, de professor ou de técnico é, em primeira instância, um direito que assiste às partes até ao momento em que o juiz recolhe aos seus aposentos para começar a elaborar a sentença, sendo que, o tribunal deveria ter aplicado a norma indicada, que é o artigo n.º 426 do CPC, (…) não o fazendo, cerceou, limitou ou impediu o exercício do direito das Rés – constitucionalmente reconhecido no n.º 1 do artigo 20.º da CRP – em organizarem como bem entendem a sua defesa, porque infringiu o princípio de contraditório e da igualdade implícitos no direito do acesso ao direito e aos tribunais constitucionalmente reconhecidos no n.º 1 do artigo 20.º da Constituição da República Portuguesa.
Ora, a questão que as Recorrentes colocam prende-se com a conformidade constitucional da interpretação do artigo 426.º do CPC, e já foi objecto de decisão pelo Tribunal Constitucional a respeito do artigo 525.º CPC, cuja redacção era exactamente igual à presente, tendo aquele alto Tribunal, por acórdão proferido em 10.07.1996[7], decidido «Julgar inconstitucional a norma do artigo 525º do Código de Processo Civil, na interpretação que lhe foi dada pelo acórdão recorrido, ou seja, de que cabe ao juiz a definição do critério do que deva considerar-se parecer e, consequentemente, o poder de avaliar e decidir sobre a junção dos pareceres que as partes pretendem juntar aos autos, ao abrigo de tal disposição, por violação do artigo 20º, nº 1, da Constituição».
As interpretações do preceito que então se apresentavam ao Tribunal Constitucional eram a defendida pelos ali recorrentes no sentido de que «cabe ao interessado a decisão sobre a junção, ou não, de pareceres, nos tribunais de 1ª instância, e há-de ser ele o dono do critério da definição do que constitui parecer», e a manifestada no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça – e defendida nas declarações de voto de vencido formuladas quanto àquela decisão de inconstitucionalidade – «de que cabe aos tribunais o critério de aplicação do disposto no artigo 525º, como de outras disposições que regulam os poderes de intervenção das partes. Caberia, assim, ao juiz, e não ao interessado, o poder de avaliar e decidir sobre a junção de pareceres ao processo, quer nas instâncias de recurso, quer na primeira instância», tendo de imediato sido afirmado que «aquela norma, interpretada com o sentido de que a junção de pareceres pode ser recusada pelo juiz do processo, é inconstitucional, por violação do artigo 20º, nº 1, da Constituição».
Remetendo-se maiores desenvolvimentos para a fundamentação do aresto, não podemos deixar de respigar a seguinte passagem, por impressiva: «sob pena, justamente, de se atingir o direito constitucionalmente tutelado do acesso ao direito e aos tribunais, não podem estes, salvo em casos pontuais – e decerto excepcionais – em que seja patente ou manifesto que o documento que se pretende juntar ao processo não constitui parecer algum e não se oferecem quaisquer dúvidas de que a parte apenas pretendeu com aquela junção utilizar um instrumento de chicana, sobrepor a sua valoração à valoração da parte no momento da sua junção ao processo».
Note-se que, subjacente à discussão esteve a ponderação, sublinhada no voto de vencido do Exm.º Senhor Conselheiro Messias Bento de que «Um processo leal há-de permitir o máximo de participação dos interessados na realização da 'obra da justiça'. Estes hão-de, porém, adoptar um comportamento processual que não prejudique o fim tido em vista no processo – fazer justiça –, nem seja causa de demoras indevidas. Ora, para fazer justiça, necessário é que o juiz possa intervir de modo a que o processo se oriente sempre – e sem dilações desnecessárias – na busca da verdade material.
No processo, o critério do juiz há-de ser, pois, o decisivo.
Não pode, por isso, deixar de ser compatível com a Constituição uma norma que confira ao juiz um poder de direcção que se traduza na possibilidade de ele recusar tudo o que for impertinente, porque desnecessário».
Como visto, a maioria que fez vencimento – apesar de afirmar claramente que «a decisão sobre a relevância dos pareceres constitui seguramente uma prerrogativa irredutível dos tribunais» –, considerou que «o princípio da legalidade processual exige, pelo menos, que os poderes discricionários se não sobreponham aos critérios normativos: por isso, em primeira instância, não pode o juiz recusar a junção de um parecer que a lei admite seja junto em qualquer estado do processo, sem previsão de formulação de um juízo de oportunidade ou relevância, como admite para a junção que ocorra em instância de recurso.
A norma do artigo 525º do Código de Processo Civil, interpretada à luz do artigo 20º, nº 1, da Lei Fundamental deve, pois, ser entendida como conferindo às partes o direito de juntar, nos tribunais de 1ª instância, pareceres de advogados, professores ou técnicos, cabendo-lhes a eles – e não ao juiz – a definição do critério do que deva ser considerado como parecer».
Este aresto do Tribunal Constitucional, veio a ser objecto de anotação concordante por SÉRVULO CORREIA e BACELAR GOUVEIA[8], e as objecções colocadas nas declarações de voto, vieram a ser aprofundadamente analisadas pelos os Autores, que sufragaram o entendimento preconizado pela maioria dos Conselheiros quanto à inconstitucionalidade da interpretação que havia sido efectuada pelos tribunais comuns, concluindo que o artigo 525.º do CPC «não concede qualquer discricionariedade ao juiz quanto ao momento limite da junção de pareceres em 1.ª instância (…). E que a apreciação liminar sobre a dificuldade técnica das questões para efeito de merecerem ou não o esclarecimento de um especialista e sobre o grau de objectividade científica do parecer para efeito do seu poder persuasivo cabe às partes para efeito da junção e não ao juiz para efeito de rejeição liminar também parece desde logo uma evidência à luz da letra do artigo 525.º. Esta reza que os parecereres «podem ser juntos» e não que o juiz poderá admitir a junção. (…) O nosso entendimento é o de que o princípio da legalidade processual seria violado por qualquer norma jurídica processual que fundasse em juízos de valor científico e de oportunidade processual (quanto à necessidade de esclarecimento e quanto ao momento apropriado) uma livre decisão pelo juiz dos requerimentos de junção de pareceres pelas partes.
(…) A condução do processo não pode ser confundida com o exercício do poder de cognição. No âmbito deste último cabe ao julgador apreciar livremente a relevância do parecer para o esclarecimento da situação jurídica controvertida. Em contrapartida, não pode competir ao juiz, para efeito de recusar a respectiva junção, nem a livre apreciação da necessidade ou desnecessidade do parecer em face do grau de complexidade do caso, nem a livre apreciação do grau de objectividade científica do parecer, nem ainda a livre apreciação de um momento da marcha do processo na 1.ª instância em que, hipoteticamente, o parecer se tornaria inútil. (…)
De acordo com esta orientação, também na condução do processo o juiz está submetido a critérios legais: não lhe cabe determinar os termos da marcha do processo nem substituir-se aí (mesmo que sob a forma de actos negativos) ao impulso processual das partes. Se assim não fosse, desprezar-se-iam garantias de imparcialidade e objectividade visadas pelo princípio constitucional da legalidade processual».
Revertendo a ponderação efectuada ao caso em presença, importa ainda sublinhar que as Rés, requereram a junção do parecer contabilístico aos autos, não indicando sequer que o mesmo se destinava a provar alguma da matéria de facto controvertida, num sentido que pudesse depreender-se que, sob a capa de parecer, pretendiam juntar aos autos intempestivamente um documento.
Ademais, visto o seu teor constatamos que o mesmo se refere a matéria ínsita no objecto do processo, pelo que igualmente não poderia recusar-se a sua junção com o fundamento de que se trataria de um qualquer exercício de chicana processual, tanto mais que o seu subscritor realça alguns aspectos que entende deverem ser ponderados, donde se conclui estarmos perante um parecer que expressa a opinião emitida por um técnico sobre pontos concretos de análise das declarações contabilísticas em causa, e não em presença de um documento, já que o escrito em presença fornece apreciações técnicas do seu autor, relativamente às indicadas declarações de IVA e IES.
Concede-se, pois, que o documento rejeitado se destina essencialmente a elucidar o tribunal sobre o significado e alcance de factos de natureza técnica, cuja valoração e interpretação demanda conhecimentos especiais, tanto assim que os autos penderam vários anos até que fosse produzido o relatório pericial.
Assim, tendo por função o exame e interpretação de factos cuja apreciação, pela sua natureza técnica impõe a existência de conhecimentos especiais, da área da contabilidade, que o tribunal não possui, o escrito que as Rés pretenderam juntar com a designação de parecer contabilístico não podia, sem mais, ser rejeitado, independentemente da apreciação que o tribunal oportunamente venha a fazer sobre a sua valia na apreciação da matéria objecto do litígio.
Na realidade, conforme se referiu no citado aresto do Supremo Tribunal de Justiça, louvando-se no que já salientava ALBERTO DOS REIS «"os pareceres de jurisconsultos, professores e técnicos podem fornecer elementos preciosos de informação. Um parecer bem deduzido e escrupulosamente fundamentado, que aprecie conscienciosamente a questão sobre todos os seus aspectos pode contribuir em larga medida para a justa solução do pleito, porque pode chamar a atenção do julgador para considerações, fundamentos e razões de decidir que lhe passariam despercebidos" (vid. Código do Processo Civil Anotado, Volume IV, página 20). (…) De todo o exposto resulta que o parecer podia ter sido junto aos autos e nele devia manter-se. Tem influência na decisão da causa na medida em que pode contribuir para a justa solução da mesma. Conforme diz Alberto dos Reis "quanto mais bem informado estiver o julgador, maior é a probabilidade de que a sua decisão seja acertada" (Vid. Código do Processo Civil Anotado, volume IV, página 26)».
Consequentemente, não pode manter-se a decisão recorrida que indeferiu a junção aos autos do parecer tempestivamente apresentado pelas Rés, impondo-se a revogação do despacho recorrido e determinando-se, em sua substituição, que o parecer se mantenha nos autos, devendo ser tomado em conta na sentença a proferir, na consideração que vier a merecer ao julgador.
Nestes termos, e sem necessidade de maiores considerações, a apelação procede.
Vencida, a Autora/Recorrida, suporta as custas, na vertente das custas de parte, nos termos conjugados dos artigos 527.º, n.ºs 1 e 2, 529.º, n.ºs 1 e 4, e 533.º, todos do CPC[9].
*****
III - Decisão
Pelo exposto, acordam os juízes deste Tribunal da Relação em julgar procedente o presente recurso, revogando o despacho recorrido, e determinando que o parecer se mantenha nos autos.
Custas pela Recorrida.
Évora, 25 de Junho de 202
Albertina Pedroso [10]
Tomé Ramião
Francisco Xavier
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[1] Juízo de Competência Genérica de Tavira.
[2] Relatora: Albertina Pedroso; 1.º Adjunto: Tomé Ramião; 2.º Adjunto: Francisco Xavier.
[3] Doravante abreviadamente designado CPC, aplicável na redacção aprovada pela Lei nº 41/2013, de 26 de Junho, por estar em causa decisão recorrida posterior a 1 de Setembro de 2013 – cfr. artigos 5.º, 7.º, n.º 1 e 8.º deste diploma.
[4] Ressalvadas as situações particulares previstas no n.º 2 do artigo 517.º e nos artigos 518.º e 526.º do CPC, que não se aplicam ao caso.
[5] Cfr. ABRANTES GERALDES, in Recursos no Novo Código de Processo Civil, 4.ª edição, ALMEDINA, 2017, pág. 427. O Ilustre Autor reporta-se à discussão suscitada após as alterações introduzidas no Código de Processo Civil com a entrada em vigor do novo regime legal de recursos consagrado pelo Decreto-Lei n.º 303/2007, de 24 de Agosto, sobre a questão de saber se os pareceres só podiam ser juntos com as alegações do recurso, a apresentar em primeira instância, ou ainda podiam sê-lo em momento posterior.
[6] Proferido no processo n.º 96B174, disponível em www.dgsi.pt.

[7] Acórdão TC n.º 934/96, proferido no Processo n.º 489/93, publicado no DR II Série, de 10.12.1996, e disponível em http://www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/
[8] In PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DO ACESSO À JUSTIÇA. DA LEGALIDADE PROCESSUAL E DO CONTRADITÓRIO; JUNÇÃO DE PARECERES EM PROCESSO CIVIL; INTERPRETAÇÃO CONFORME À CONSTITUIÇÃO DO ARTIGO 525.º DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL, disponível em https://portal.oa.pt/upl/%7B1cb04d37-50e1-4655-b53b-826bc51f3edc%7D.pdf.
[9] Cfr. neste sentido SALVADOR DA COSTA, no recente Post de 18.06.2020, intitulado “Responsabilidade pelas custas no recurso julgado procedente sem contra-alegação do recorrido”, e publicado no BLOG do IPPC, em 23.06.2020, no qual conclui que «A circunstância de o recorrido não ter contra-alegado no recurso interposto pela parte contrária, que foi julgado procedente, não exclui a sua responsabilidade pelo pagamento das custas respetivas».
[10] Texto elaborado e revisto pela Relatora, e assinado electronicamente pelos três desembargadores desta conferência.