PAGAMENTO DO REMANESCENTE DA TAXA DE JUSTIÇA
EXPROPRIAÇÃO
Sumário


I- O regime emergente do disposto no art. 6º, n.º 7, do RCP, deve ser interpretado no sentido de que ao juiz cabe o poder-dever de, oficiosamente ou a requerimento das partes, dispensar o pagamento, quer da totalidade, quer de uma fração ou percentagem do remanescente da taxa de justiça devida a final, pelo facto de o valor da causa exceder o patamar dos € 275.000,00, consoante o resultado da ponderação das especificidades do caso concreto (utilidade económica dos interesses em litígio, comportamento processual das partes, complexidade da tramitação processual e das questões a decidir), em conjugação com os princípios da proporcionalidade e da igualdade.

Texto Integral


Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães:

I. RELATÓRIO

Nos autos de expropriação em que é expropriante Câmara Municipal de ... e expropriados D. M. e esposa M. A., vieram estes últimos apresentar requerimento, em 17.05.2019 (ref.ª citius 8659264), de acordo com o qual requereram, ao abrigo do disposto no n.º 7 do art. 6º do Regulamento das Custas Processuais, a dispensa do pagamento da taxa de justiça remanescente em todo o processo, incluindo a referente a todos os seus recursos ou, pelo menos, a sua redução a 25%, alegando que “nem sequer houve a realização de audiência final de discussão e julgamento; as questões da causa não tiveram excecional complexidade; as partes tiveram na causa conduta normal relativa às questões que suscitaram, e, ainda, porque o valor da taxa remanescente acaba por ferir princípios constitucionais da proporcionalidade, do acesso ao direito e à tutela efetiva dos direitos dos expropriados, e a processo equitativo pela expropriação das parcelas de terreno, de que deixaram de ser proprietários [cfr. n.º 2 do artigo 18º, e nºs 1 a 4 do artigo 20º, todos da Constituição].

O Ministério Público pronunciou-se sobre o referido requerimento apresentado pelos expropriados, tendo concluído pelo indeferimento do requerido (ref.ª citius 166301141).

Previamente à apreciação do requerimento mencionado, o tribunal solicitou à secção a indicação da “diferença entre o valor das custas devidas e com a pedida redução, a fim de avaliar a alegada desproporcionalidade das custas devidas.” (ref.ª citius 166363033).
A secção emitiu cálculo das custas a cargo dos expropriados e da expropriante (ref.ª citius 166975336).

Na sequência foi proferido, a 28.01.2020, o seguinte despacho:
Requerimento ref.ª 8659264:
Os expropriados nos presentes autos vieram requerer, ao abrigo do disposto no nº 7 do artigo 6º do Código das Custas Judiciais, a dispensa do pagamento da taxa de justiça remanescente em todo o processo, incluindo a referente a todos os seus recursos, ou pelo menos a sua redução a 25%, porque nem sequer houve a realização de audiência final de discussão e julgamento; as questões da causa não tiveram excecional complexidade; as partes tiveram na causa conduta normal relativa às questões que suscitaram, e, ainda, porque o valor da taxa remanescente acaba por ferir os princípios constitucionais da proporcionalidade, do acesso ao direito e à tutela efetiva dos direitos dos expropriados, e a processo equitativo pela expropriação das parcelas de terreno, de que deixaram de ser proprietários [cfr. nº 2 do artigo 18º, e nºs 1 e 4 do artigo 20º, todos da Constituição].
Notificado para tal, o Ministério Público promoveu o indeferimento do requerido, atendendo que, no caso concreto, a matéria e complexidade da causa, os valores em causa, sendo certo ainda que foram interpostos três recursos, não se justifica, a excecional dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça.
Cumpre decidir.
Nos presentes autos de expropriação, foi liquidada a taxa de justiça correspondente ao último escalão de valor das ações (€250.000,00 a €275.000,00), no regime geral (tabela I-A), o que significa que se aplica uma taxa de justiça de valor fixo de 16UC, correspondente a 1.632 €.
A este valor acrescerá, a final, por cada 25 000 € ou fração, 3 UC, no caso da referida coluna A. Este valor seria contabilizado na conta de custas.
O valor foi fixado o valor da ação em 2.141.348,73 € (dois milhões cento e quarenta e um trezentos e quarenta e oito euros e setenta e três cêntimos), pelo que o valor da taxa de justiça em dívida ascenderá a 22.950 €, de acordo com o cálculo provisório apresentado.
Por força do disposto no n.º 7 do artigo 6.º do Regulamento das Custas Processuais, nas causas de valor superior a 275.000,00€, o juiz pode dispensar o pagamento do remanescente da taxa de justiça, atendendo designadamente à complexidade da causa e à conduta processual das partes.
A questão que aqui se coloca é saber se os valores de tributação de taxa de justiça serão desproporcionados, em função da menor complexidade do processo ou mesmo da situação concreta, p. ex.º atendendo à indemnização fixada a final aos expropriados.
A dispensa do remanescente da taxa de justiça revestirá sempre natureza excecional e terá de ser justificada em cada caso.
Apesar de não se ter procedido à audição de testemunhas, não se pode afirmar que este processo não foi complexo. De resto, tratam-se efetivamente de 4 processos de expropriação, com realização de perícias, análise de documentos, articulados e alegações das partes, em que foram levantadas questões de facto de grande especificidade técnica e de direito relevantes e suscitadas outras questões, também sujeitas a recurso, não havendo qualquer simplificação da tramitação processual.
Por outro lado, a indemnização ascendeu a 930.687,27 € (novecentos e trinta mil seiscentos e oitenta e sete Euros e vinte e sete cêntimos), não se vislumbrando aqui qualquer desproporção entre o valor recebido e a taxa a pagar.
Assim, não se afigura desproporcionada em face do concreto serviço prestado a taxa sinalagmática correspondente, correspondendo a um processamento normal dos autos, pelo que, não se justificando a dispensa, indefiro o requerido.

Inconformados com o assim decidido, vieram os expropriados interpor recurso de apelação, nele formulando as seguintes

CONCLUSÕES

1ª- A decisão recorrida não contém a especificação de fundamentos de facto, como lhe impunha o disposto no nº 1 do artigo 154º do Código de Processo Civil, e o disposto na primeira parte da alínea b) do nº 1 do artigo 615º do Código de Processo Civil, ex vi nº 3 do seu artigo 613º.
2ª- Em consequência, para evitar a sua nulidade, ou suprir a sua deficiência, impõe-se, pela sua relevância para a decisão deste recurso, que se tenham por assentes os factos dos pontos 1. a 30. de A) do corpo das alegações, e que aqui se dão por repetidos e reproduzidos.
3ª- Os argumentos do despacho da decisão recorrida: a) Apesar de não se ter procedido à audiência de testemunhas”; b) “ Tratam-se efectivamente de 4 processos de expropriação”;
c) “ com realização de perícias”; d) “ com análise de documentos, articulados e alegações das partes ”; e) “ em que foram levantadas questões de facto de grande especificidade técnica”; “
f) “e de direito relevantes e suscitadas outras questões”; g) “ Sujeitas a recurso “; e h) “ Por outro lado, a indemnização ascendeu a 930.687,27 €”, para além de terem natureza meramente conclusiva, são insubsistentes, por causa dos fundamentos, invocados desde a página 11 à página 17 do corpo das alegações, que aqui se dão por repetidos e reproduzidos.
4ª- O disposto no nº 7 do artigo 6º do Regulamento das Custas Processuais, para além de consentir ao juiz a dispensa do pagamento da taxa de justiça remanescente, também lhe consente reduzi-la.
5ª- A decisão recorrida, apenas, decidiu o pedido dos recorrentes de dispensa do pagamento da taxa de justiça remanescente, apesar dos recorrentes no mesmo requerimento com a referência 32464619 do dia 17 de Maio de 2019, subsidiariamente a esse pedido, terem pedido a sua redução a 25%.
6ª- Os factos dos pontos 1. a 24. de A) do corpo das alegações, e os fundamentos das alíneas a) a g) de B) do corpo das alegações demonstram que o processo teve normal tramitação de processo de expropriação litigiosa, e aos expropriados e à expropriante a decisão recorrida não imputa nenhuma conduta reprovável.
7ª- O valor de 57.273,00 € de taxa de justiça remanescente a pagar é desrazoável, desproporcional e desadequado face ao serviço de justiça prestado e face ao valor de 7.474,00 € de taxas de justiça já pago pelos recorrentes.
8ª- O disposto no nº 7 do artigo 6º do Regulamento das Custas Processuais deve ser interpretado no sentido do respeito pelos princípios da proporcionalidade, do acesso ao direito e à tutela jurisdicional efectiva, previstos, respectivamente, nº 2 do artigo 18º e no nº 1 do artigo 20º, ambos da Constituição.
9ª- A decisão recorrida, ao impor aos recorrentes o pagamento da taxa de justiça remanescente, violou esses princípios constitucionais e o disposto no nº 7 do artigo 6º do Regulamento das Custas Processuais, por errada interpretação e aplicação que fez desta disposição e daqueles princípios constitucionais.
10ª- Em consequência da procedência das anteriores conclusões, impõe-se que a decisão recorrida seja revogada e que se decida dispensar os recorrentes do pagamento da taxa de justiça remanescente, ou que, pelo menos, a reduza à percentagem de 25%.


Com relevo para a questão em análise, a pretexto de evitar-se a nulidade da decisão, por falta de fundamentação de facto, os apelantes descreveram, no corpo das alegações (cfr. Conclusão ), os seguintes factos emergentes dos autos, que consideram relevantes para a decisão em apreço:

1. No dia 31 de Julho de 2015, na 2ª Série do Diário da República, foi publicado o despacho de 16 de Julho de 2015 do Secretário de Estado da Administração Local que, a pedido da Câmara Municipal de ..., declarou a utilidade pública das parcelas A, B, D, E, todas situadas na União das freguesias de … e …, do concelho de …, com as áreas, respetivamente, de 7.600 m2, 9.500 m2, 43.474 m2 e 9.245 m2, todas destinadas à “ Cidade Desportiva de …”, e registadas a favor dos expropriados [cfr. factos dos pontos 1. e 2. da sentença com a referência 153813397 de 20 de Julho de 2017].
2. A expropriante avaliou essas parcelas expropriadas, respetivamente, nos valores de 87.400,00 €, 109.250.00 €, 499.951,00 € e 106.317,50 € [cfr. folhas 193 a 208 e 212].
3. No dia 12 de Janeiro de 2016, a expropriante apresentou em juízo quatro processos, um por cada uma daquelas parcelas expropriadas, que foram distribuídos na Secção Cível da Instância Local de Guimarães da comarca de Braga e com os números seguintes:
- 207/16.9T8GMR, Juiz 3, relativo à expropriação da parcela A; - 208/16.7T8GMR, Juiz 4, relativo à expropriação da parcela E; - 209/16.5T8GMR, Juiz 2, relativo à expropriação da parcela D; e - 210/16.9T8GMR, Juiz 1, relativo à expropriação da parcela B.
4. No dia 21 de Janeiro de 2016, neste processo n.º 209/16.5T8GMR, foi proferido o despacho 144723207, que determinou a sua apensação àquele processo n.º 207/16.9T8GMR.
5. No dia 29 de Janeiro de 2016, os expropriados/recorrentes, pelo seu requerimento com a referência 21701836, reclamaram deste despacho em que pediram que a este processo fossem apensados aqueles outros três processos, e pagaram a taxa de justiça de 25,50 €.
6. No dia 18 de Fevereiro de 2016, por decisão singular da Exma Vice – Presidente deste Tribunal da Relação de Guimarães, foi atendida essa reclamação e declarado que a este processo fossem apensos aqueles outros três processos.
7. No dia 10 de Março de 2016, foi proferido neste processo o despacho 145746281 que, em cumprimento do declarado por aquela decisão determinou que à expropriante fosse solicitado o original do processo de expropriação que nela correra, respeitante àquelas 4 parcelas para ser junto a este processo e que neste processo principal seguiu os seus termos.
8. No dia 24 de Março de 2016, foi proferido neste processo o despacho 146017757, que adjudicou à expropriante a propriedade daquelas quatro parcelas, e mandou notificar a expropriante e os expropriados da decisão arbitral e todos os elementos apresentados pelos árbitros, e, ainda, da faculdade de interposição de recurso, a que se refere o artigo 52º do Código das Expropriações.
9. No dia 19 de Abril de 2016, os expropriados interpuseram recurso dessa decisão arbitral, em que, como meios de prova, além da documental e da testemunhal indicadas, requereram que se fizesse a avaliação às parcelas expropriadas, prevista obrigatoriamente no n.º 2 do artigo 61º do Código das Expropriações, e pagaram a taxa de justiça de 1.632,00 € [cfr. folhas 587 e sgts ]; e a expropriante, no dia 23 de Maio de 2016, apresentou a sua resposta de folhas 611 vº e sgts..
10. Essa avaliação foi realizada [cfr. folhas 832 a 905], foram pedidos esclarecimentos aos peritos, e estes foram prestados [cfr. folhas 971 e sgts.].
11. No dia 30 de Março de 2017, foi proferido o despacho 152508549, em que as partes foram notificadas do entendimento de que o Tribunal dispunha de todos os elementos necessários para proferir a decisão, e de que se nada requeressem, no prazo de 10 dias, sobre a necessidade de ulterior produção de prova, seria proferida a sentença.
12. No dia 17 de Abril de 2017, os expropriados pelo seu requerimento com a referência 25470167, informaram o Tribunal que não prescindiam do direito de alegar, previsto no artigo 64º do Código das Expropriações.
13. No dia 5 de Maio de 2017, foi proferido o despacho 152997751, que mandou notificar as partes para alegarem, em 20 dias, nos termos do artigo 64º, nºs 1 e 2 do Código das Expropriações.
14. No dia 26 de Maio de 2017, os expropriados apresentaram as suas alegações, ao abrigo do disposto no nº 1 do artigo 64º do Código das Expropriações.
15. No dia 20 de Julho de 2017, foi proferida a respetiva sentença, que, na sua decisão, julgou improcedente o recurso interposto pelos expropriados e fixou em € 970.687,27 o valor da indemnização a pagar pela expropriante pelas parcelas expropriadas A, B, D e E, acrescido da quantia que resultasse da aplicação, a partir de 31 de Julho de 2015, do índice de preços no consumidor com exclusão de habitação, e que, ainda, fixou o valor da ação em 2.141.348,73 €.
16. No dia 6 de Outubro de 2017, os expropriados recorreram desta sentença, e pagaram a taxa de justiça de 816,00 €.
17. No dia 16 de Janeiro de 2018, por decisão singular da Exma Senhora Juíza Desembargadora Relatora deste Tribunal da Relação de Guimarães foi determinada a devolução do processo ao tribunal recorrido para que fundamentasse devidamente (ponto por ponto) a decisão que proferira sobre a matéria de facto, identificando os meios de prova em que alicerçara a sua convicção, que os analisasse criticamente, e que, ainda, mencionasse os factos que considerava não provados e a respetiva motivação.
18. No dia 16 de Fevereiro de 2018, foi proferido o despacho 156795473 para dar cumprimento àquela decisão.
19. No dia 10 de Maio de 2018, foi proferido por este Tribunal da Relação de Guimarães o respetivo acórdão, que julgou improcedente o recurso de apelação dos expropriados, e que confirmou a sentença recorrida.
20. Os expropriados arguiram a nulidade deste acórdão e este Tribunal da Relação de Guimarães, por seu acórdão do dia 10 de Julho de 2018, desatendeu a pretensão dos expropriados.
21. No dia 27 de Novembro de 2018, o Município de..., na qualidade de entidade expropriante, juntou aos autos a atualização, por si apurada, no valor de 39.307,68 € daquela indemnização de 930.687,27 €, relativa às parcelas expropriadas, que os expropriados impugnaram e pagaram a taxa de justiça de 51,00 €.
22. No dia 10 de Janeiro de 2019, foi proferida a decisão do despacho 161473796, que indeferiu essa impugnação dos expropriados.
23. No dia 21 de Janeiro de 2019, os expropriados interpuseram recurso dessa decisão, e pagaram a taxa de justiça de 816,00 €.
24. No dia 26 de Setembro de 2019, foi proferido o acórdão desta Relação, que julgou improcedente esse recurso dos expropriados, e que confirmou a decisão recorrida.
25. Entretanto, no dia 29 de Abril de 2016, tinha sido proferido o despacho 146698553, que arbitrou aos expropriados a quantia sobre a qual se verificava acordo, com retenção da quantia provável das custas do processo, cujo cálculo consta a folhas 744 dos autos, e aos expropriados do valor daquela indemnização de 930.687,27 €, apenas, lhes foi entregue a quantia de 901.064,27 € [cfr. folhas 824].
26. No dia 31 de Outubro de 2016, foi proferido o despacho 149836457 que, entre o mais, fixou os honorários de cada um dos Exmos Peritos em 16 UC [4UC/ parcela].
27. Os expropriados pagaram tudo o que era devido aos peritos, pela força da retenção, determinada naquele despacho do precedente ponto 25., no valor de 6.273,00 €, e, ainda, por força do decidido pelo despacho do antecedente ponto 26., no valor de 3.763,80 €, conforme consta da respetiva guia cível 70308006940351.
28. Os expropriados, também, em sede de reclamação de custas de parte por parte da expropriante, reembolsaram - lhe todas as taxas de justiça por ela pagas, e que perfizeram o valor total de 3.340,50 €, conforme consta do cálculo com a referência 166942260 do dia 20 de Janeiro de 2020, mandado efetuar pelo despacho 166363033 do dia 13 de Dezembro de 2019.
29. Verifica-se desse cálculo que os expropriados pagaram de taxas de justiça a quantia de 4.156,50 € [1.632,00 € + 816,00 € + 25,50 € + 51,00 € + 816,00 € + 816,00 €], e que, em consequência do reembolso do precedente ponto 28., pagaram de taxas de justiça o valor total de 7.497,00 € [4.156,50 € + 3.340,50 €].
30. Mais se verifica desse cálculo que a taxa de justiça remanescente em dívida ascende a 57.273,00 €, 35.037,00 € pelos expropriados, e 22.236,00 € pela expropriante.

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O Ministério Público apresentou contra-alegações, tendo terminado com as seguintes
CONCLUSÕES

1 – O douto despacho recorrido, ao contrário do que defendem os recorrentes, não enferma de qualquer falta de fundamentação; bem pelo contrário, encontra – se devidamente concretizado e fundamentado;
2 – Não se verifica, atenta a especificidade da situação, nomeadamente, a complexidade da causa, com questões de facto e de direito de grande densidade e dificuldade técnico – jurídica, o comportamento das partes com vários recursos interpostos em que a maioria deles, foram julgados improcedentes; a utilidade económica do processo para as partes, o montante indemnizatório que foi arbitrado aos recorrentes e a taxa de justiça remanescente a pagar, a exceção a que alude a 2ª parte do nº 7, do artigo 6º, do Regulamento das Custas Processuais:
3 – A decisão proferida julgou de acordo com a regra estabelecida no artigo 6º, nº7, do Regulamento das Custas Processuais, fazendo adequada aplicação dos princípios da proporcionalidade e de igualdade imanentes a tal preceito;
4 – A decisão recorrida mostra-se, assim, conforme à Lei e ao Direito, não sendo, por isso, violadora de qualquer preceito legal, nomeadamente, do artigo 6º, nº7, do Regulamento das Custas Processuais.
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Após os vistos legais, cumpre decidir.
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II. DO OBJETO DO RECURSO:

O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente (arts. 635º, n.º 4, 637º, n.º 2 e 639º, nºs 1 e 2, do C. P. Civil), não podendo o Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso (art. 608º, n.º 2, in fine, aplicável ex vi do art. 663º, n.º 2, in fine, ambos do C. P. Civil).

No seguimento desta orientação, cumpre fixar o objeto do presente recurso.

Neste âmbito, as questões decidendas traduzem-se nas seguintes:

- Saber se o despacho recorrido é nulo por falta de fundamentação de facto que justifique a decisão.
- Saber se o despacho recorrido ocorreu em erro de direito e/ou violador de princípios constitucionais ao indeferir a pretensão dos recorrentes de dispensa ou redução do pagamento do remanescente da taxa de justiça.
*
III. FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

Factos Provados

Os constantes do Relatório supra.

Fazendo uso do disposto no art. 607º, n.º 4 (ex vi do art. 663º, n.º 2) e 662º, n.º 1, do C. P. Civil, considerar-se-ão igualmente como provados, para efeitos do objeto do recurso em presença, os factos que resultam da prova objetiva, constante do processo principal, que infra salientaremos, nos quais se incluirão, no essencial, os aludidos factos elencados pelos recorrentes sob os nºs 1 a 30, da al. A), do corpo das alegações, acima mencionados, corrigindo-se apenas o lapso manifesto da quantia indicada no ponto 15., de modo que, onde se lê “€ 970.687,27”, se passe a ler “€ 930.687,27”.
*

IV) FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

A) Da nulidade da decisão recorrida por falta de fundamentação de facto que a justifique.

A primeira questão que importa dirimir, em função das conclusões do recurso, refere-se à alegada nulidade do despacho recorrido por falta de fundamentação de facto.
Resulta do disposto no art. 607º, n.º 3, do C. P. Civil que, na elaboração da sentença, e após a identificação das partes e do tema do litígio, deve o juiz deduzir a fundamentação do julgado, explicitando “os factos que considera provados e indicar, interpretar e aplicar as normas jurídicas correspondentes, concluindo pela decisão final.”
Por seu turno, sancionando o incumprimento desta injunção, prescreve o art. 615º, n.º 1, al. b), do C. P. Civil que é nula a sentença que “não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão” – este normativo aplicável aos despachos, por força do disposto no art. 613º, n.º 3, do C. P. Civil.
Na realidade, não basta que o juiz decida a questão posta; é indispensável, do ponto de vista do convencimento das partes, do exercício fundado do seu direito ao recurso sobre a mesma decisão (de facto e de direito) e do ponto de vista do tribunal superior a quem compete a reapreciação da decisão proferida e do seu mérito, conhecerem-se das razões de facto e de direito que apoiam o veredicto do juiz. (1)
Neste sentido, a fundamentação da decisão deve ser expressa, clara, suficiente e congruente, permitindo, por um lado, que o destinatário perceba as razões de facto e de direito que lhe subjazem, em função de critérios lógicos, objetivos e racionais, proscrevendo, pois, a resolução arbitrária ou caprichosa, e por outro, que seja possível o seu controle pelos Tribunais que a têm de apreciar, em função do recurso interposto. (2)
Todavia, ao nível da fundamentação de facto e de direito da sentença, como é lição da doutrina e da jurisprudência, para que ocorra esta nulidade “não basta que a justificação da decisão seja deficiente, incompleta, não convincente; é preciso que haja falta absoluta, embora esta se possa referir só aos fundamentos de facto ou só aos fundamentos de direito” (nosso sublinhado). (3)
Neste sentido, que é o tradicionalmente perfilhado, referia J. Alberto dos Reis (4), a propósito da especificação dos fundamentos de facto e de direito na decisão, que importa proceder-se à distinção cuidadosa entre a “falta absoluta de motivação, da motivação deficiente, medíocre ou errada. O que a lei considera nulidade é a falta absoluta de motivação; a insuficiência ou mediocridade da motivação é espécie diferente, afecta o valor doutrinal da sentença, sujeita-a ao risco de ser revogada ou alterada em recurso, mas não produz nulidade.” (sublinhado nosso). (5)
Todavia, a nosso ver, no atual quadro constitucional (art. 205º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa), em que é imposto um dever geral de fundamentação das decisões judiciais, ainda que a densificar em concretas previsões legislativas (cfr. art. 154º do C. P. Civil), parece que também a fundamentação de facto ou de direito gravemente insuficiente, isto é, em termos tais que não permitam ao respetivo destinatário a perceção das razões de facto e de direito da decisão judicial, deve ser equiparada à falta absoluta de especificação dos fundamentos de facto e de direito e, consequentemente, determinar a nulidade do ato decisório. (6)
Feitas estas considerações, de todo o modo, no caso em apreço, é nosso entendimento que não ocorre manifestamente a invocada nulidade por falta de fundamentação de facto.
De facto, resulta, assim, da decisão recorrida que o tribunal a quo ponderou os argumentos explanados pelos expropriados, designadamente quanto ao facto de não se ter realizado a audiência de discussão e julgamento e de não se ter procedido à inquirição de testemunhas.
Descreveu aquilo que, no seu entendimento, constituiu a complexidade da presente ação, enumerando diversos fatores, designadamente, invocando que: “tratam-se efetivamente de 4 processos de expropriação, com realização de perícias, análise de documentos, articulados e alegações das partes, em que foram levantadas questões de facto de grande especificidade técnica e de direito relevantes e suscitadas outras questões, também sujeitas a recurso, não havendo qualquer simplificação da tramitação processual.
Apreciou igualmente a questão da desproporcionalidade invocada pelos expropriados, com relevância na alegada violação dos descritos princípios constitucionais, salientando que: “Por outro lado, a indemnização ascendeu a 930.687,27 € (novecentos e trinta mil seiscentos e oitenta e sete Euros e vinte e sete cêntimos), não se vislumbrando aqui qualquer desproporção entre o valor recebido e a taxa a pagar.
Assim, não se afigura desproporcionada em face do concreto serviço prestado a taxa sinalagmática correspondente, correspondendo a um processamento normal dos autos (…)

Porque tal ocorre, e nesta perspetiva, a fundamentação constante da decisão recorrida é a bastante para a decisão que ali era suposto ser proferida, sendo certo que é perfeitamente claro o enquadramento factual considerado relevante pelo tribunal de 1ª instância, permitindo, pois, aos respetivos destinatários exercer, de forma efetiva e cabal, a sua análise e a sua crítica, suscitando a sua reapreciação, como ora sucede nesta instância; sendo, aliás, bem visível das alegações de recurso dos apelantes, que os mesmos interpretaram convenientemente os fundamentos de facto explanados na mesma.

Não pode, pois, sustentar-se que a decisão em crise seja nula por falta de fundamentação de facto, pois que, no essencial, os pressupostos de facto que conduziram ao sentido decisório acolhido na mesma decisão se mostram nele evidenciados de forma objetiva, lógica e racional, podendo, quando muito, se considerar que a justificação factual apresentada se revela algo parca e/ou genérica, o que de modo algum não constitui motivo para a verificação da dita nulidade, improcedendo neste segmento a apelação em presença.

De qualquer modo, sempre se dirá que a descrita factualidade com que os recorrentes pretendem que seja suprida, nesta instância, a alegada nulidade, consta dos factos provados, porque emergentes objetivamente do processo principal, conforme acima salientámos, pelo que esta nulidade sempre seria irrelevante para efeitos de conhecimento da principal questão decidenda em que se traduz o objeto do presente recurso.
*

B) Da dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça

Pelo presente recurso, vieram os apelantes pugnar que se dispense ou, pelo menos, se reduza o remanescente da taxa de justiça a liquidar, invocando, em suma, que os argumentos utilizados pelo tribunal recorrido para indeferir a pretensão dos expropriados, para além de assumirem natureza conclusiva, são insubsistentes, tanto quanto é certo que o processo em causa teve uma normal tramitação de processo de expropriação litigiosa, sendo que a decisão recorrida não imputa a nenhuma das partes nenhuma conduta reprovável.
Mais invocam que a decisão recorrida, ao impor aos recorrentes o pagamento da taxa de justiça remanescente, sem admitir sequer a sua redução pedida subsidiariamente, violou os princípios constitucionais de proporcionalidade, do acesso ao direito e à tutela jurisdicional efetiva.

Analisemos então.

Prescreve o disposto no aditado (pela Lei n.º 7/2012, de 13.02) n.º 7 do art. 6º do D.L. n.º 34/2008, de 26.02 (Regulamento das Custas Processuais ou RCP) que: “Nas causas de valor superior a (euro) 275 000, o remanescente da taxa de justiça é considerado na conta a final, salvo se a especificidade da situação o justificar e o juiz, de forma fundamentada, atendendo designadamente à complexidade da causa e à conduta processual das partes, dispensar o pagamento.”
Tal regime é aplicável independentemente da fase em que o processo termine, sendo que o remanescente da taxa de justiça, considerando a parte final da tabela I (anexa ao RCP), é por cada € 25.000,00 ou fração, equivalente a 3 UC, no caso da coluna A, a 1,5 UC no caso da coluna B, e 4,5 UC no caso da coluna C.
Não obstante, conferiu-se o poder-dever ao juiz de, oficiosamente ou a requerimento das partes, por despacho fundamentado, dispensar o pagamento dessa taxa de justiça remanescente, quando a especificidade da situação o justifique, atendendo, designadamente, à complexidade da causa e à conduta processual das partes.
Com efeito, estando em causa a salvaguarda do direito constitucionalmente consagrado de acesso aos tribunais, na sua vertente da igualdade dos utentes na utilização do sistema de justiça e no suporte dos custos de funcionamento do mesmo e, bem assim, os princípios da proporcionalidade, da justeza e da adequação dos valores das taxas de justiça devidas pelas partes em cada ação ou procedimento, o comando previsto no n.º 7 do art. 6º, do RCP, carece de ser entendido como um poder-dever imposto ao juiz de, nas causas de valor superior a € 275.000,00, ponderar da proporcionalidade, justeza e adequação do pagamento do remanescente da taxa de justiça, devendo dispensar, total ou parcialmente, esse pagamento sempre que o mesmo coloque em crise aqueles direitos e princípios constitucionais, tudo sem prejuízo de o juiz, nada dizendo, serem as próprias partes interessadas a requerer essa dispensa.
Enfatize-se que o Código das Custas Judiciais de 2004 já previa, no seu art. 27º, igual possibilidade para as causas de valor superior a € 250.000,00 (n.º 3); não havendo mesmo lugar ao pagamento do remanescente da taxa de justiça quando a ação terminasse antes de concluída a fase de discussão e julgamento (n.º 4).
Podemos assim dizer que, mediante a introdução do n.º 7 do art. 6º do RCP, “recupera-se a possibilidade do juiz, ou do relator nos tribunais superiores, dispensar o remanescente da taxa de justiça devida acima de um determinado valor, por decisão fundamentada, e em função da complexidade da causa e à conduta processual das partes.” (7)
No fundo, com o aditamento daquele n.º 7 do art. 6º, o legislador introduziu no RCP um “sistema misto”, assente, por um lado, no valor da causa até determinado limite (€ 275.000,00), e por outro, em mecanismos de graduação prudencial do montante das custas devidas a partir desse limite. (8)

Por seu turno, conforme esclarece Salvador da Costa (9), “a referência à complexidade da causa e à conduta processual das partes significa, por um lado, a sua menor complexidade ou maior simplicidade, e, por outro, a atitude das partes na prática dos atos processuais necessários à adequada decisão da causa, isto é, à margem de afirmações ou alegações de índole dilatória.

Precise-se que, não obstante o referido art. 6º, n.º 7, do RCP, apenas preveja a dispensa do remanescente da taxa de justiça, é pacífico que os princípios da razoabilidade, da proporcionalidade e da adequação, que estão subjacentes a esta norma flexibilizadora só são plenamente alcançados se ao juiz for possível moldar ou modular o valor pecuniário correspondente ao remanescente da taxa de justiça devida nas causas de valor especialmente elevado, ponderando integralmente as especificidades do caso concreto e evitando uma lógica binária de tudo ou nada, segundo a qual apenas seria devido o montante da taxa de justiça já pago ou teria de ser liquidada a totalidade das custas correspondentes ao valor da causa – devendo antes poder dispensar o pagamento, conforme seja mais adequado, da totalidade ou apenas de uma parcela ou fração daquele valor remanescente”. É que a assim não se entender, criar-se-ia situações de intolerável desproporção de resultados e violadoras do princípio da igualdade entre os litigantes, “ao impossibilitar uma plena consideração e balanceamento das especificidades próprias do caso ou situação processual, obrigando, de forma rígida e injustificada, a parificá-las artificiosamente, apesar das substanciais diferenças que entre elas pudessem verificar-se”. (10)
Outrossim, cumpre dizer que, como resulta da expressão “designadamente” utilizada pelo legislador no apontado n.º 7 do art. 6º do RCP, no exercício desse poder-dever, a enumeração que nele se faz dos critérios a utilizar nessa apreciação – complexidade da causa e conduta processual das partes -, é meramente exemplificativa, “devendo o julgador convocar todos os fatores modeladores e individualizadores do caso concreto e que se mostrem relevantes para aferir do montante das custas a pagar ao Estado pelo serviço de justiça recebido em função dos acima referidos direitos e princípios constitucionais.
Trata-se, a final de apreciar as especificidades próprias do caso concreto e verificar se se justifica ou não dispensar, total ou parcialmente, o remanescente da taxa de justiça atendendo aos comandos constitucionais segundo os quais o montante da taxa de justiça a pagar pelas partes não deve ser de molde a colocar em crise o direito constitucionalmente consagrado de acesso aos tribunais, sequer pode colocar em crise os princípios constitucionais da proibição do excesso (proporcionalidade) e da igualdade, princípio este do qual decorre que dos cidadãos deve ser solicitado idêntico grau de taxa de esforço no financiamento do sistema de justiça que utilizam.” (11)

No mesmo sentido, sumariou-se no Ac. do STJ de 08.11.2018 (12) que, “em conformidade com o princípio da proporcionalidade, constitucionalmente consagrado, a apreciação do requerimento de dispensa do pagamento da taxa de justiça, para além do valor de € 275.000,00, nos termos do art. 6º, n.º 7, do RCP, deve ser feita em função dos diversos factores enunciados pela lei e pela jurisprudência deste Supremo Tribunal, a saber, a utilidade económica dos interesses em litígio, o comportamento processual das partes, a complexidade da tramitação processual e a complexidade das questões jurídicas apreciadas.

Por último, no que se refere à complexidade da tramitação processual, impõe-se chamar à colação o disposto no n.º 7 do art. 530º do C. P. Civil, de acordo com o qual: “Para efeitos de condenação no pagamento de taxa de justiça, consideram-se de especial complexidade as ações e os procedimentos cautelares que:

a) contenham articulados ou alegações prolixas;
b) digam respeito a questões de elevada especialização jurídica, especificidade técnica ou importem a análise combinada de questões jurídicas de âmbito muito diverso; ou
c) impliquem a audição de um elevado número de testemunhas, a análise de meios de prova complexos ou a realização de várias diligências de produção morosas.

Aqui chegados, cumpre desde já dizer que à presente ação, por decisão transitada em julgado, foi atribuído o valor de € 2.141.348,73.
Considerando tal valor, por determinação do tribunal, a secção efetuou cálculo do remanescente da taxa de justiça ainda a pagar pelas partes, a qual ascende ao montante global de € 57.273,00, mais concretamente no valor de € 35.037,00 a cargo dos expropriados, e no valor de € 22.236,00 da responsabilidade da expropriante.
Mais se apurou que os expropriados já pagaram de taxa de justiça a quantia de € 4.156,50 e por reembolso de custas de parte devido à expropriante o valor de € 3.340,50, tudo no montante global de € 7.497,00.

Na presente ação, estamos em presença de quatro parcelas a expropriar, o que deu origem à instauração pela expropriante de quatro processos de expropriação litigiosa (processos nºs 207/16.9T8GMR, 208/16.7T8GMR, 209/16.5T8GMR e 210/16.9T8GMR).
No dia 21.01.2016, no processo n.º 209/16.5T8GMR, foi proferido o despacho, que determinou a sua apensação ao processo n.º 207/16.9T8GMR.
Não obstante, os expropriados/recorrentes vieram reclamar de tal despacho, pedindo que a este processo fossem apensados aqueles outros três processos.
Tal reclamação importou que a Exma. Vice-Presidente deste Tribunal da Relação de Guimarães proferisse, a 18.02.2016, decisão singular, determinando que ao processo n.º 209/16.5T8GMR fosse apensos aqueles outros três processos.
A questão jurídica apreciada nesta reclamação não se apresentou de especial complexidade, na medida em que estava unicamente em causa a interpretação a retirar do disposto nos arts. 39º e 51º do Código das Expropriações (CE).

Os expropriados apresentaram recurso da decisão arbitral nos termos do disposto nos arts. 52º e 58º do CE. As suas alegações de facto e de direito constam de 80 artigos, suscitando questões jurídicas a apreciar, designadamente quanto à classificação dos solos em questão; tendo ainda requerido avaliação dos imóveis (com a formulação de dois quesitos), juntando documentos e arrolando testemunhas (cfr. ref.ª citius 3580295).
A expropriante respondeu ao recurso interposto pelos expropriados, As suas alegações de facto e de direito constam de 231 artigos, contrapondo as questões jurídicas suscitadas. Requereram igualmente a avaliação dos imóveis em questão com a sua ampliação em 18 quesitos; juntando documentos e arrolando testemunhas (cfr. ref.ª citius 3783002).

A expropriante e os expropriados reclamaram dos relatórios de peritagem apresentados, dando origem à prolação de despacho a 31.10.2016, determinando o desentranhamento dos relatórios periciais apresentados pelo perito dos expropriados, com a realização de um único relatório, prestando os esclarecimentos solicitados pelas partes (cfr. ref.ª citius 149836457).
Uma vez apresentados relatórios de peritagem, vieram os expropriados apresentar nova reclamação suscitando diversos esclarecimentos (cfr. ref.ª citius 4960145), o que mereceu a resposta dos Srs. Peritos de 23.02.2017 (cfr. ref.ª citius 5174052).
Mais uma vez, os expropriados vieram solicitar esclarecimentos, o que foi indeferido por despacho de 30.03.2017 (cfr. ref.ª citius 152508549).
Expropriante e expropriados alegaram nos termos do disposto no art. 65º do CE, com vasta argumentação fáctica e jurídica (cfr. ref.ª citius 5593370 e 5693759).
Na sequência, foi proferida sentença, a 20.07.2017, analisando as questões jurídicas suscitadas pelas partes, fixando-se em € 930.687,27 o valor da indemnização a pagar pela expropriante aos expropriados pela expropriação das parcelas em causa, acrescido da quantia que resultar da aplicação, a partir de 31.07.2015, do índice de preços no consumidor com exclusão de habitação (cfr. ref.ª citius 153813397).
Mais se decidiu pela condenação dos expropriados nas custas processuais.

Os expropriados interpuseram recurso de apelação desta sentença, impugnando a decisão recorrida que incidiu quer sobre a matéria de facto (com vasta factualidade impugnada) quer sobre a matéria de direito (cfr. ref.ª citius 6096963).
A expropriante contra-alegou.
Por decisão singular da Exma. Senhora Juíza Desembargadora Relatora deste Tribunal da Relação de Guimarães foi determinada a devolução do processo ao tribunal recorrido para que fundamentasse devidamente (ponto por ponto) a decisão que proferira sobre a matéria de facto, identificando os meios de prova em que alicerçara a sua convicção, que os analisasse criticamente, e que, ainda, mencionasse os factos que considerava não provados e a respetiva motivação.
No dia 16.02.2018, foi proferido despacho para dar cumprimento àquela decisão singular.
No dia 10.05.2018, foi proferido por este Tribunal da Relação de Guimarães o respetivo acórdão, que julgou improcedente o recurso de apelação dos expropriados, e que confirmou a sentença recorrida.

Em tal acórdão (constituído por mais de 50 páginas) foram apreciadas quer a impugnação da decisão sobre a matéria de facto, quer a impugnação da decisão que incidiu sobre a matéria de direito, designadamente quanto à classificação dos solos em questão, cujas questões fácticas e jurídicas apreciadas (designadamente com recurso a interpretações jurídicas retiradas da jurisprudência) revelaram uma complexidade acrescida, tendo em atenção o tipo de processo em causa (cfr. ref.ª citius 5727505).

Os expropriados arguiram a nulidade deste acórdão e este Tribunal da Relação de Guimarães, por seu acórdão de 10.07.2018, desatendeu a pretensão dos expropriados.

No dia 27.11.2018, o Município de..., na qualidade de entidade expropriante, juntou aos autos a atualização, por si apurada, no valor de € 39.307,68 daquela indemnização de € 930.687,27, relativa às parcelas expropriadas, que os expropriados impugnaram.
No dia 10.01.2019, foi proferido despacho que indeferiu essa impugnação dos expropriados.
Os expropriados interpuseram recurso dessa decisão.
No dia 26.09.2019, foi proferido o acórdão desta Relação, que julgou improcedente esse recurso dos expropriados, e que confirmou a decisão recorrida.

Em conformidade com as alegações de recurso dos apelantes, neste mesmo acórdão foi analisada a questão de aplicação dos princípios do processo civil ao incidente suscitado. Mais, se analisou o critério a atender para efeitos de atualização da indemnização fixada, percorrendo uma análise jurídica (incluindo jurisprudencial), mormente quanto aos respetivos cálculos aritméticos aplicáveis, de relevante complexidade (cfr. ref.ª citius 6595291).

Por conseguinte, não nos restam dúvidas que a utilidade do presente processo, medida em função do valor económico dos interesses em litígio envolvidos, é elevada.

A tramitação processual revelou-se significativa (considerando a espécie de ação especial em questão), na medida em que envolveu a produção de prova pericial tecnicamente bastante apurada, em face dos quesitos apresentados e esclarecimentos solicitados, a sindicar pormenorizadamente pela 1ª e 2ª instâncias, bem como a apreciação de múltiplos requerimentos/incidentes dos expropriados e conhecimento de diversos recursos de apelação que os mesmos interpuseram, sendo que um deles envolveu mesmo a apreciação da decisão sobre a matéria de facto proferida em 1ª instância.

De igual modo, as questões jurídicas apreciadas ao longo do processo revelaram-se de alguma complexidade, obrigando quer a 1ª instancia quer a 2ª instância a debruçar-se sobre temas de específico relevo, designadamente sobre a classificação dos solos em questão e cálculo da atualização da indemnização fixada, havendo necessidade de sedimentar as decisões proferidas com recurso a relevante esforço de análise e alcance da solução juridicamente adequada.

Ponderados estes fatores, afigura-se-nos que o conjunto do processado em causa implicou para os tribunais de 1ª instância e de 2ª instância significativo volume de trabalho e de complexidade relevante, pelo que, contrariamente ao defendido pelos apelantes, se entende não existir fundamento para dispensar (totalmente) as partes do pagamento da taxa de justiça remanescente.

No entanto, não podemos deixar de aludir que, de um modo geral, nada resulta dos autos quanto a um comportamento processual inadequado das partes, designadamente violador dos deveres processuais de boa fé, cooperação, razoabilidade ou prudência.

Por sua vez, como é pacífico, a significativa utilidade económica da lide não pode ser tida como obstáculo à dispensa parcial do remanescente da taxa de justiça devida a final. (13)

De igual modo, é certo o alegado pelos apelantes no que se refere à ausência de realização da audiência de discussão e julgamento, o que, a ocorrer, envolveria necessariamente um acréscimo de volume de trabalho pelo tribunal da 1ª instância, designadamente mediante a inquirição das diversas testemunhas arroladas pelas partes, previsivelmente em mais de uma sessão de julgamento.
Mais se demonstrou que o valor do remanescente das taxas de justiças devidas pelas partes ascende ao montante global de € 57.273,00, sendo certo que os expropriados já pagaram de taxa de justiça (incluindo reembolso de custas de parte) a quantia global de € 7.497,00.

Sendo assim, em face do que acima aludimos sobre a tramitação do presente processo, impõe-se, pois, reconhecer que o valor resultante da tabela legal da taxa de justiça remanescente a cargo das partes e a suportar, em última instância, unicamente pelos apelantes, se revela manifestamente excessivo, atento o serviço de justiça que, no seu conjunto, foi prestado às partes no âmbito dos presentes autos.

De facto, sob pena de violação dos referidos princípios constitucionais do direito de acesso aos tribunais, da proporcionalidade, justiça e adequação e do princípio da igualdade de tratamento dos apelantes comparativamente aos demais utentes do sistema de justiça, há que reduzir o remanescente da taxa de justiça, por comparação às característica dos presentes autos em relação aos demais processos de trâmite processual, análise factual e apreciação jurídica bem mais elevada.

Por conseguinte, tendo presente tudo o que acima se expôs a propósito da utilidade económica dos interesses envolvidos pelas partes nos presentes autos, a complexidade da tramitação processual e das questões jurídicas analisadas no presente litígio e, bem assim, o comportamento processual das partes, entende-se adequado, justo e proporcional dispensar as partes do pagamento do remanescente das taxas de justiça ainda devidas na proporção de 60%, que assim ficará reduzido a 40% (na parcela excedente a € 275.000,00), valor este que se mostra consentâneo à salvaguarda dos direitos constitucionalmente tutelados das partes de aceder aos tribunais e de nele beneficiarem de igualdade de tratamento em relação as demais utentes do sistema de justiça e, bem assim, à salvaguarda do princípio da proibição do excesso, em respeito do princípio da proporcionalidade. (14)
*
V. DECISÃO

Pelos fundamentos acima expostos, acordam os Juízes desta Relação em julgar parcialmente procedente o recurso de apelação em presença, revogando-se a decisão recorrida, substituindo-a pelo presente acórdão em que se decide:

- Dispensar as partes do pagamento de 60% do remanescente das respetivas taxas de justiças ainda devidas.

Custas da apelação pelos apelantes, na proporção do respetivo decaimento, que se fixa em 40% (art. 527º, n.ºs 1 e 2 do C. P. Civil).
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*
Guimarães, 18.06.2020
Este acórdão contem a assinatura digital eletrónica dos Desembargadores:

Relator: António Barroca Penha.
1º Adjunto: José Manuel Flores.
2º Adjunto: Sandra Melo.


1. Vide, neste sentido, J. Alberto dos Reis, Código de Processo Civil Anotado, Volume V, 3ª edição, Coimbra Editora, pág. 139.
2. Sobre a fundamentação das decisões judiciais, vide, por todos, Ac. do STJ de 24.11.2015, Processo n.º 125/14.5FYLSB, relator Souto Moura, acessível em www.dgsi.pt. (além da demais jurisprudência citada neste aresto).
3. Vide, neste sentido, por todos, Antunes Varela, Manual de Processo Civil, Coimbra Editora, 2ª edição, pág. 687.
4. Ob. citada, Vol. V, pág. 140.
5. Vide, ainda, no mesmo sentido, Lebre de Freitas, Montalvão Machado e Rui Pinto, Código de Processo Civil Anotado, Vol. 2º, Coimbra Editora, 2001, pág. 609; e Miguel Teixeira de Sousa, Estudos Sobre o Novo Processo Civil, Lex, 1997, págs. 221-222.
6. Vide, neste sentido, Ac. do STJ de 02.03.2011, proc. n.º 161/05.2TBPRD.P1.S1, relator Sérgio Poças; e Ac. da Relação do Porto de 16.06.2014, proc. n.º 722/11.0TVPRT.P1, relator Carlos Gil, ambos disponíveis em www.dgsi.pt.
7. Cfr. José António Coelho Carreira, Regulamento das Custas Processuais Anotado, Almedina, 2013, pág. 67.
8. Neste sentido, cfr. Ac. RG de 05.04.2018, proc. n.º 899/08.2TBFAF-A.G1, relator José Alberto Moreira Dias (cujo o ora relator aqui foi 1º adjunto), acessível em www.dgsi.pt.
9. As Custas Processuais, Análise e Comentário, Almedina, 7ª edição, pág. 141.
10. Cfr. Ac. STJ. de 12.12.2013, proc. n.º 1319/12.3TVLSB-B.L1.S1, relator Lopes do Rego, disponível em www.dgsi.pt.
11. Cfr. Ac. RG de 05.04.2018, já citado.
12. Proc. n.º 567/11.8TVLSB.L1.S2, relatora Maria da Graça Trigo, acessível em www.dgsi.pt.
13. Por todos, cfr. Ac RG de 11.01.2018, proc. n.º 501/07.0TBVPA-G.G1, relatora Margarida Sousa, disponível em ww.dgsi.pt. 14. Neste sentido, cfr., por todos, Ac. STJ de 22.01.2016, proc. n.º 200/14.6T8LRA-A.C1.S1, relator Alexandre Reis; Ac. STJ de 24.05.2018, proc. n.º 1194/14.3TVLSB.L1.S2, relatora Rosa Tching; e Ac. STJ de 31.01.2019, proc. n.º 478/08.4TBASL.E1.S1, relator Tomé Gomes, disponíveis em www.dgsi.pt.