CONTUMÁCIA
MANDADOS DE DETENÇÃO
NOTIFICAÇÃO POR EDITAIS
COMPETÊNCIA
TRIBUNAL DE EXECUÇÃO DAS PENAS
TRIBUNAL DA CONDENAÇÃO
Sumário

I – Cabe ao Tribunal de Execução das Penas a emissão dos mandados de detenção previstos no artigo 337.º, n.º 1, do CPP, visando o cumprimento, pelo condenado, da pena de prisão que lhe foi imposta, excepto nos casos em que os ditos mandados já tenham sido emitidos, para o referido fim, por determinação do tribunal da condenação.
II – Quanto à realização das diligências prévias à declaração da contumácia – este acto é da competência do TEP, nos termos do disposto no artigo 138.º, n.º 4, al. x), do CEPMPL – importa distinguir duas situações: aquelas em que o condenado se eximiu ao cumprimento da pena após o seu ingresso no estabelecimento prisional, e aqueloutras em que o condenado ainda não iniciou o cumprimento da pena.
III – inscrevem-se no circunstancialismo apontado em primeiro lugar o caso de evasão ou ausência não autorizada do condenado do estabelecimento prisional, no qual a competência para a emissão dos editais referidos no artigo 335.º, n.º 1, do CPP, pertence ao TEP.
IV – Nas restantes situações, ou seja, nas quais ainda não ocorreu o início do cumprimento da pena, a prática da referida diligência processual inclui-se no círculo de competências do tribunal da condenação.

Texto Integral

Acórdão deliberado em conferência na 5ª seção criminal do Tribunal da Relação de Coimbra


1. Relatório
A. interpôs recurso da decisão proferida no processo sumário n.º 18/15.9GTVIS, da Instância de Competência Genérica de Sátão, Comarca de Viseu, que indeferiu a requerida declaração de prescrição da pena em que foi condenado.

1.1. Decisão recorrida (que se transcreve integralmente):

«Através do requerimento ora em apreço veio o arguido, por um lado, requerer que seja declarada a prescrição da pena de prisão de 18 meses de prisão em que foi condenado nos autos, nos termos do disposto na al. d) do n.º 1 do artigo 122.º do Código Penal, por não terem sido cumpridos os requisitos legais previstos no n.º 5 do artigo 337.º do Código de Processo Penal, em vigor à data contumácia.

Doutra banda, veio ainda arguir a nulidade insanável que resulta do disposto na alínea e) do artigo 119.º do Código de Processo Penal, em face da violação das regras de competência pelo Tribunal da Condenação, por serem, no seu entender, da competência do TEP, no que se refere quer à realização das diligências prévias à declaração de contumácia, nas quais se inclui a notificação edital, quer a emissão dos mandados de detenção.

A Digna Magistrada do Ministério Público pugnou pelo indeferimento do requerido, conforme fundamentos expendido na Douta promoção que antecede.

Cumpre apreciar e decidir.

Compulsados os autos verifico que no despacho proferido pelo Tribunal de Execução de Penas de Coimbra, datado de 3-10-2016, que declarou o ora condenado A. contumaz, resulta que foi dado cumprimento ao artigo 337.º, n.º 5 e 6 do Código de Processo Penal, tendo dele sido, portanto, dado conhecimento ao então defensor do arguido.

Pelo que, a decisão proferida de declaração de contumácia do arguido, proferida em 7-10-2016, tem a força de caso julgado formal com força obrigatória dentro do processo, ficando o Tribunal nele vinculado pelas decisões aí proferidas mesmo sobre aspetos de natureza processual.

Acresce que, sobre tal decisão não houve recurso por parte do arguido, tendo a mesma transitado em julgado, pelo que ficou esgotado o nosso poder jurisdicional sobre a matéria em causa.

Acresce que, preceitua o artigo 123.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, sob a epígrafe “irregularidades” que: “Qualquer irregularidade do processo só determina a invalidade do ato a que se refere e dos termos subsequentes que possa afetar quando tiver sido arguida pelos interessados no próprio ato ou, se a este não tiverem assistido, nos três dias seguintes a contar daquele em que tiverem sido notificados para qualquer termo do processo ou intervindo em algum ato nele praticado”.

In casu, àquele ato de declaração de contumácia, sucederam-lhe outros, para os quais foi o Ilustre defensor do condenado dos mesmos notificado (refira-se, a título de exemplo a notificação expedida a 4-06-2018), pelo que teria já o mesmo, necessariamente, pleno conhecimento daquela mesma decisão.

Pelo que, há muito se encontra precludido o prazo para invocar uma qualquer irregularidade, à luz do citado n.º 1 do artigo 123º do Código de Processo Penal, que, a concluir-se que existiu, sempre já se encontraria sanada, não invalidando, portanto, quer o ato a que se refere, quer todos os subsequentes.

Assim sendo, a declaração de contumácia é válida e eficaz, produziram-se os seus efeitos de suspensão e interrupção da prescrição, ínsitos nos artigos 125º, n.º 1, alínea b) e n.º 2 e 126º, n.º 1, alínea b), ambos do Código de Processo Penal, encontrando-se a prescrição da pena suspensa.

Quanto à violação das regras de competência pelo Tribunal da condenação também não assiste razão ao arguido.

Lançando mão dos argumentos aduzidos na Douta promoção que antecede, com a qual concordamos e a cujos fundamentos aderimos, temos que “a questão suscitada tem a sua génese no sentido interpretativo atribuído às regras que delimitam a competência material do TEP, consagradas no Código de Execução das Penas e Medidas Privativas de Liberdade, aprovado pela Lei n.º 115/2009, de 12 de Outubro, particularmente quando lidas à luz do critério que o legislador enunciou na Exposição de Motivos da Proposta de Lei n.º 252/X, que esteve na base da redação daquele diploma. Ora, o teor do ponto 15 da Exposição de Motivos da Proposta de Lei 252/X, que está na génese da aprovação do CEPMPL tem o seguinte teor: “No plano processual e no que se refere à delimitação de competências entre o tribunal que aplicou a medida de efetiva privação da liberdade e o Tribunal de Execução das Penas, a presente proposta de lei atribui exclusivamente ao Tribunal de Execução das Penas a competência para acompanhar e fiscalizar a execução de medidas privativas da liberdade, após o trânsito em julgado da sentença que as aplicou. Consequentemente, a intervenção do tribunal da condenação cessa com o trânsito em julgado da sentença que decretou o ingresso do agente do crime num estabelecimento prisional, a fim de cumprir medida privativa da liberdade. Este um critério simples, inequívoco e operativo de delimitação de competências, que põe termo ao panorama, atualmente existente, de incerteza quanto à repartição de funções entre os dois tribunais e, até, de sobreposição prática das mesmas. Incerteza e sobreposição que em nada favorecem a eficácia do sistema”. Parece daí resultar o propósito do legislador em estabelecer a linha de fronteira de atuação entre os dois tribunais, no trânsito em julgado da sentença condenatória que aplicou a pena privativa ou a medida privativa da liberdade. Nesta aceção, a partir do trânsito da sentença, toda a atividade de execução da pena competiria ao TEP. Aliás, é o artigo 138º, nº 2 do CEPMPL que dispõe que, após o trânsito em julgado da sentença que determinou a aplicação de pena ou medida privativa da liberdade, compete ao tribunal de execução das penas acompanhar e fiscalizar a respetiva execução e decidir da sua modificação, substituição e extinção, sem prejuízo do disposto no artigo 371.º-A do Código de Processo Penal.

Não obstante, tal interpretação é posta em causa na própria fundamentação da Exposição de Motivos, literalmente entendida, quando nela, a dita linha de fronteira é referida ao trânsito em julgado da sentença que decretou o ingresso do agente do crime num estabelecimento prisional, a fim de cumprir medida privativa da liberdade.

Assim é que, na verdade, a sentença condenatória decreta uma pena de prisão, mas não decreta o ingresso do agente num estabelecimento prisional pois, como se sabe, é por intermédio de um mandado, vulgo, mandado de condução ao estabelecimento prisional para cumprimento de pena, necessariamente posterior ao trânsito da sentença, que este procedimento se desenrola. Posto isto, e na senda das mais recentes decisões da Relação de Coimbra, somos do entendimento que, tendo em consideração que a pena de prisão decretada por sentença transitada só inicia a sua execução quando o condenado ingressa no estabelecimento prisional, competindo ao TEP, como vimos, “acompanhar e fiscalizar a respetiva execução” dir-se-á que tal competência só se ‘inicia’ após o ingresso do condenado na instituição prisional – vide, neste sentido o Acórdão da Relação de Coimbra, datado de 21-02-2018, proferido no processo n.º 685/13.8TACLD-B.C1, cuja argumentação aqui seguimos de muito perto.”

Considerando o exposto, conclui-se que as diligências prévias à declaração de contumácia e a emissão do mandado de condução ao estabelecimento prisional para execução da pena de prisão não são, ainda, um momento do acompanhamento e fiscalização da execução da pena, mas um procedimento prévio, ficando, portanto, de fora das competências atribuídas ao TEP.

Decorre do disposto na alínea x) do n.º 4 do artigo 138º do CEPMPL que é da competência material do TEP: “Proferir a declaração de contumácia e decretar o arresto de bens, quanto a condenado que dolosamente se tiver eximido, total ou parcialmente, à execução de pena de prisão ou de medida de internamento”.

Do preceito legal transcrito resulta balizada a competência do TEP em matéria de contumácia, a qual se limita à sua declaração.

Ou seja, da norma não decorre que é da competência do TEP todas as diligências prévias a tal decisão, que são do Tribunal da Condenação, como, de resto, tem sido a prática judiciária, até ao momento.

Doutra banda, determina ainda aquele dispositivo legal, na alínea t) que compete, em razão da matéria, ao TEP “Emitir mandados de detenção, de captura e de libertação”.

Assim, dispondo o artigo 470º, n.º 1 do Código de Processo Penal que, a execução corre nos próprios autos perante o presidente do tribunal de 1ª instância em que o processo tiver corrido, sem prejuízo do disposto no artigo 138.º do Código da Execução das Penas e das Medidas Privativas da Liberdade, entende-se que a emissão do mandado de detenção para cumprimento de pena é da competência do Tribunal da Condenação.

E, de acordo com a jurisprudência dominante do Tribunal da Relação de Coimbra, compete ao TEP, nos termos do disposto no artigo 138º, nº 4, t) do CEPMPL, emitir mandados de detenção, captura ou libertação que visem a execução das suas próprias decisões, sendo, por isso, competente para emitir o mandado de detenção destinado ao início da execução de uma pena de prisão fixada em sentença transitada o Tribunal da Condenação (vejam-se, neste sentido, a título de exemplo, os Acórdãos de 29-03-2017, proferido no processo nº 92/15.8PTLRA-A.C, de 29-11-2017, processo nº 536/15.9GCLRA-B.C2, de 18-10-2017, processo nº 3466/11.0TALRA-A.C1 e de 11-102017, processo nº 16/11.1PELRA-B.C1, todos in www.dgsi.pt).

Nestes termos, este Tribunal tinha competência para determinar a emissão dos mandados de detenção para cumprimento da pena de prisão em que o arguido foi condenado por decisão datada de 8-02-2016 e, bem assim, para determinar a sua notificação por editais, dando cumprimento ao artigo 335º, n.º1 e 2 do Código de Processo Penal, por decisão proferida em 27-06-2016.

Em face do exposto, e atentos os fundamentos supra invocados, este Tribunal é competente, quer para a realização das diligências prévias à declaração de contumácia, quer para a emissão de mandado de detenção destinado ao início da execução de pena de prisão fixada no Acórdão já transitado em julgado, não tendo sido violadas as regras de competência material e, portanto, não havendo lugar à nulidade insanável arguida, a que se refere o artigo 119º, alínea e), do Código de Processo Penal.

Pelo que, por falta de fundamento legal par a tanto, indefiro o requerido.»

1.2. Recurso do arguido (conclusões que se transcrevem integralmente):

1 – Nos presentes autos foi o Arguido condenado a uma pena de prisão efetiva de 18 meses transitada em julgado a 18 de novembro de 2015.

2 – Não se tendo o mesmo apresentado para cumprimento da referida pena, foram efetuadas diligências para a declaração de contumácia.

3 – Acontece que, não só foram violadas as regras de competência do tribunal,

4 – Assim como, considerando que aquelas não haviam sido violadas, o que se coloca por mera hipótese académica, havia de se declarar a contumácia irregular e, portanto, ineficaz, em face da falta de cumprimento dos pressupostos legais.

5 – Não restando outra alternativa senão declarar a prescrição da pena aplicada em face do disposto na al. d) do n.º 1 do artigo 122.º do CP. Assim,

6 – Em despacho de declaração de contumácia, proferido pelo Tribunal de Execução de Penas de Coimbra, datado de 3 de outubro de 2016, foi ordenado o cumprimento do n.º 5 e 6 do artigo 337.º do CPP, pressuposto legal para a referida declaração de contumácia. Acontece que,

7 – Tal notificação não foi cumprida.

8 – Entende o Arguido condenado que tal violação constitui nulidade insanável. Contudo,

9 – Admitindo-se, o que por mera hipótese se coloca, tratar-se de irregularidade, conforme o entendimento do tribunal “a quo”, a mesma não pode considerar-se sanada, sob pena de,

10 – Violar-se o disposto no artigo 123.º do CPP. Assim,

11 – Do conteúdo da única notificação efetuada ao defensor ao Arguido, a 04.06.2018, não pode presumir-se que o mesmo teve conhecimento da nulidade/irregularidade. E mais,

12 – Não teve o defensor intervenção em mais nenhum ato do processo que, também esse, fizesse presumir o conhecimento da irregularidade. Ora,

13 – A irregularidade indicada determina, necessariamente, a invalidade do ato a que se refere (a contumácia) e dos termos subsequentes que possa afetar, restando a,

14 – Declaração da prescrição da pena de prisão a que foi condenado nos termos do disposto na al. d) do n.º 1 do artigo 122.º do CP. Assim não tendo determinado,

15 – Violou o tribunal “a quo” tal disposição legal. Ainda,

16 – Só se pode considerar que alguém se está a eximir dolosamente, conforme o disposto no artigo 138.º, n.º 4, al. x) do CEPMPL que veremos à frente, à execução da medida privativa da liberdade e que se encontra, portanto, contumaz, se tiver efetivo conhecimento dessa condição, o que, claramente, não é o caso do Arguido.

17 – Arguiu, ainda, o Arguido a nulidade insanável nos termos do disposto na al. e) do artigo 119.º do CPP. Assim,

18 – Foram violadas as regras atributivas da competência material invocando, o Arguido, a incompetência do Tribunal da Condenação para proceder às diligências prévias à declaração de contumácia, nas quais se inclui a notificação edital e, bem assim, os mandados de detenção. Vejamos,

19 – Foi violado o disposto no artigo 138.º n.º 4 x) do CEPMPL segundo o qual cabe ao tribunal de execução das penas a competência material para “Proferir a declaração de contumácia e decretar o arresto de bens, quanto a condenado que dolosamente se tiver eximido, total ou parcialmente, à execução de pena de prisão ou de medida de internamento.”, uma vez que foi o tribunal da condenação a proceder às diligências prévias necessárias a proferir a eventual declaração de contumácia.

20 – Em tais diligências inclui-se a notificação edital prevista no artigo 335.º do CPP, ora, foi o tribunal da condenação que procedeu a tal notificação em violação do disposto no artigo 97.º n.º 2, als. a) e b), do CEPMPL.

21 - Há que atender, também, ao princípio da aplicação retractiva de lei penal mais favorável ao arguido, conforme o disposto no n.º 4 do artigo 29.º da CRP, aplicando por analogia ao entendimento da doutrina e jurisprudência e decidir-se mediante o entendimento vigente no momento da declaração de contumácia relativamente à competência material para a realização das diligências referidas.

22 – Assim, foi violado o princípio da igualdade dos cidadãos perante a lei consagrado no artigo 13.º da CRP. Mais,

23 – Pertence ao tribunal de execução de penas a competência para a emissão dos mandados de detenção, nos termos do disposto nos artigos vistos anteriormente. Ora,

24 – Foi o tribunal da condenação a emitir tais mandados o que resulta, claramente, de novo, em violação dos normativos e do entendimento jurisprudencial e doutrinal vigentes à data, violando-se, bem assim, o disposto no artigo 114.º da Lei n.º 62/2013, de 13 de agosto (Lei da Organização do Sistema Judiciário – LOSJ. Assim,

25 – Violou-se o princípio do juiz natural ou do juiz legal consagrado no n.º 9, do artigo 32.º da CRP, no artigo 10.º da Declaração Universal dos Direitos do Homem e no artigo 6.º, n.º 1, da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, no artigo 14.º, n.º 1, do Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos, e no artigo 47.º da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia.

26 – É forçoso concluir que, atentas as nulidades insanáveis, são inválidos não só os atos praticados mas também tudo o que for processado posteriormente e que deles dependa, nos termos do disposto no artigo 122.º do CPP. Assim,

27 – Os atos praticados devem considerar-se nulos e, em consequência, também a contumácia declarada, não restando, senão, declarar prescrita a pena de prisão aplicada nos termos do disposto no artigo 122.º, n.º 1, al. d) do CP.”

1.3.Resposta do Ministério Público (conclusões):
2. No que se refere à invocada prescrição da pena de prisão em que o arguido foi condenado, cumpre apontar, ao contrário do que alega o Recorrente que, do teor do despacho proferido pelo TEP de Coimbra, datado de 3-10-2016, que declarou o ora condenado A. contumaz, resulta que foi dado cumprimento ao artigo 337º, n.º 5 e 6 do Código de Processo Penal, tendo disso sido, portanto, dado conhecimento efetivo ao então defensor do arguido.
3. Assim, a decisão proferida de declaração de contumácia do arguido, proferida em 7-10-2016, transitada em julgado, é inalterável, dado que ficou esgotado o poder jurisdicional do juiz sobre a matéria em causa, ficando precludida a possibilidade de, em momento ulterior, ser apreciada a mesma questão.
4. Contudo, mesmo que assim não se entendesse, importará referir que, em face do teor do n.º 1 do artigo 123.º do Código de Processo Penal, sempre se mostraria precludido o prazo para invocar uma qualquer irregularidade que, a concluir-se que existiu, se encontra já sanada, por o, à data, Ilustre defensor do condenado ter sido notificado para ulteriores termos do processo (v.g., a notificação expedida a 4-06-2018), contando-se o prazo ínsito na referida norma legal a partir daquela data.
5. Por tudo, e na medida em que a declaração de contumácia é perfeitamente válida e eficaz, produziram-se os seus efeitos de suspensão e interrupção da prescrição, ínsitos nos artigos 125º, n.º 1, alínea b) e n.º2 e 126º, n.º1, alínea b), ambos do Código de Processo Penal, encontrando-se a prescrição da pena aqui irrogada ao arguido suspensa sine die.
6. No que à nulidade insanável arguida em face da alegada violação das regras de competência deste Tribunal concerne, não assiste igualmente razão ao Recorrente, uma vez que, quer as diligências prévias à declaração de contumácia, quer a emissão do mandado de condução ao estabelecimento prisional para execução da pena de prisão são da competência material do Tribunal da Condenação, ficando de fora das competências atribuídas ao TEP, ao contrário do aventado pelo Recorrente.
7. Na verdade, resulta da norma inserta na alínea x) do n.º 4 do artigo 138º do CEPMPL que é da competência material do TEP: “Proferir a declaração de contumácia (…), quanto a condenado que dolosamente se tiver eximido, total ou parcialmente, à execução de pena de prisão ou de medida de internamento”.
8. Do teor literal da norma, é fácil de ver que se encontra inequivocamente delineada a competência do TEP em matéria de contumácia, reconduzindo-a, apenas, à sua declaração, não podendo daí extrapolar-se para a respetiva competência para todas as diligências prévias a tal decisão, que permanecem “nas mãos” do Tribunal da Condenação, como, de resto, tem sido a prática judiciária, até ao momento.
9. De outra parte, prescreve ainda aquele dispositivo legal, na inerente alínea t) que compete, em razão da matéria, ao TEP “Emitir mandados de detenção, de captura e de libertação”.
10. São realidades distintas os mandados de detenção para cumprimento de pena e os mandados de detenção destinados a conferir completude à declaração de contumácia, estes sim da competência do TEP, o que resulta inequívoco do teor das disposições conjugadas do artigo 17.º e 138.º, nº 4, alínea t) do CEPMPL, que apenas atribui competência material ao TEP para a emissão de mandados de detenção, de captura e de libertação, mas já não, para a emissão de mandados que determinem a execução da pena ou medida privativa da liberdade.
11. Assim, com a jurisprudência dominante e mais recente da Relação de Coimbra, quanto a nós, compete ao TEP, nos termos do disposto no artigo 138º, nº 4, alínea t) do CEPMPL, emitir mandados de detenção, captura ou libertação que visem a execução das suas próprias decisões, sendo, em consequência, competente para emitir o mandado de detenção destinado ao início da execução de uma pena de prisão fixada em sentença transitada o Tribunal da Condenação.
12. Nestes termos, este Tribunal é competente para determinar a emissão dos mandados de detenção para cumprimento da pena de prisão em que o arguido foi condenado, o que fez por decisão datada de 8-02-2016.
13. Conclui-se, assim, que este Tribunal é competente, quer para a realização das diligências prévias à declaração de contumácia, quer para a emissão de mandado de detenção destinado ao início da execução de pena de prisão fixada no Acórdão já transitado em julgado, não tendo sido violadas as regras de competência material e, portanto, não havendo lugar à nulidade insanável arguida, a que se refere o artigo 119º, alínea e), do Código de Processo Penal.
Daqui resulta, em suma, que a pena de prisão em que Recorrente foi condenado não se mostra afetada pelos vícios processuais invocados, não se encontrando, nessa medida, decorrido o respetivo prazo prescricional.


13.1.  No parecer do Exmo. Procurador Geral Adjunto nesta Relação, conclui-se pela manutenção da decisão recorrida.


14. Conhecimento do recurso

Encontra-se o objeto do recurso limitado pelas conclusões apresentadas pelo recorrente. São as conclusões da motivação que delimitam o âmbito do recurso, pelo que se ficam aquém, a parte da motivação que não consta das conclusões não é considerada, e se forem além também não são consideradas, porque a motivação das mesmas é inexistente (v. Germano Marques da Silva, Direito Processual Penal Português, vol. 3, 2015, págs. 335-336).

O objeto do presente recurso resume-se às seguintes questões:
a) Nulidade da declaração de contumácia do arguido; e
b) Prescrição da pena.


Conhecendo,

Com relevo para a decisão, temos o seguinte historial de atos processuais:
1. Por sentença proferida a 12.3.2015, transitada em julgado a 18.11.2015, o arguido foi condenado na pena única de 18 (dezoito) meses de prisão, pela prática de um crime de condução sem habilitação legal, p. e p. pelo art. 3º, n.ºs 1 e 2, do DL 2/98, de 3.1. (8 meses de prisão), de um crime de desobediência, p. e p. pelo art. 348º, n.º 2, do Código Penal, por referência ao art. 14º, n.º 2, da Lei n.º 63/2007, de 6.11 (6 meses de prisão), e de um crime de corrupção ativa, p. e p. pelo art. 374º, n.º 1, do Código Penal (12 meses de prisão).
2. Foi emitido pelo tribunal da condenação mandado de detenção do arguido para cumprimento da pena, em 8 de fevereiro de 2016.
3. O arguido ausentou-se para parte incerta, razão pela qual não foi cumprido o mandado de detenção.
4. Em 27.6.2016, foi proferido pelo tribunal da condenação o seguinte despacho: “… Apesar das múltiplas diligências realizadas até à presente data, desconhece-se o atual paradeiro do arguido.
Estatui a alínea a) do n.º 2 do art. 97º da Lei n.º 115/2009, de 12 de outubro, que “ao condenado que dolosamente se tiver eximido, total ou parcialmente, à execução de pena de prisão ou de medida de internamento é correspondentemente aplicável o disposto nos artigos 335º, 336º e 227º do Código de Processo Penal, relativos à declaração de contumácia, com as modificações seguintes: os editais e anúncios contêm, em lugar da indicação do crime e das disposições legais que o punem, a indicação da sentença condenatória e da pena ou medida de segurança a executar”.
Destarte, determino a notificação do arguido por editais, com as especificidades constantes da norma mencionada, para se apresentar em juízo, num prazo de 20 dias, sob pena de ser declarado contumaz (artigo 335º, n.º 1, do Código de Processo Penal)”.
5. Os editais foram afixados, nos termos legais, em 13.7.2016.
6. Em 27.9.2016, pelo tribunal da condenação foi proferido o seguinte despacho “Atento o disposto nos artigos 138º/4/x) e 137º/3 do CEPMPL, solicite ao TEP de Coimbra a prolação de decisão de declaração de contumácia do condenado A., extraindo e enviando, para o efeito, certidão, com nota de trânsito em julgado, das decisões proferidas nos presentes autos, dos mandados de detenção emitidos e devolvidos, do despacho de fls. 61 e da cópia de edital de fls. 264”.
7. Por despacho de 3.10.2016, proferido pela Juiz do TEP de Coimbra, o arguido foi declarado contumaz, constando, da parte final do mesmo despacho: “Por força da declaração agora decidida, ficarão suspensos dos ulteriores termos dos autos da condenação, nos termos infra consignados (art. 335.º, n.º 1 do CPP), bem como vigorará o estatuído nos arts. 125.º, n.º 1 b) e 126.º, n.º 1 b) do CP. Nos mesmos termos, a presente declaração implica para o(a) supra mencionado(a) condenado(a) a anulabilidade dos negócios jurídicos doravante celebrados; proibição de obtenção, a seu requerimento ou de outrem a seu rogo, de quaisquer documentos, certidão a emitir por autoridade/entidade administrativa, nomeadamente e a título exemplificativo cartão de cidadão, bilhete de identidade, carta de condução, certificado do registo criminal, passaporte, certidões dos registos, licença de uso e porte de arma, licença de caça e carta de caçador, licença de pesca, atestado de residência e outros atestados administrativos, cartão de contribuinte, caderneta militar e outros documentos emitidos por entidades militares, cartão de identificação de empresário em nome individual, certificados da Administração Fiscal e das Conservatórias do Registo Civil, Comercial ou Predial e documentos juntos das Repartições de Finanças.
Fica-lhe igualmente vedado efetuar quaisquer registos junto de autoridades públicas, nomeadamente e a título exemplificativo conservatórias do Registo Civil, Comercial ou Predial, ANSR e IMTT, Governos Civis, Câmaras Municipais e Juntas de Freguesia;
Ao tribunal da condenação, por ser o para tal competente, caberá extrair os legais efeitos da supra declarada contumácia (cfr. arts. 337º, n.º 1k, do CPP, 17º a) do CEP e 3º do RGEP). Notifique.”
8. O despacho proferido foi notificado ao Exmo. Defensor Oficioso do arguido.
9. O arguido juntou aos autos procuração forense no dia 6.12.2019.
10. O arguido arguiu a prescrição da pena de prisão por requerimento de 23.1.2020, sobre o qual incidiu o despacho ora recorrido, de 3 de fevereiro de 2020.
11. O presente recurso foi interposto a 9 de março de 2020.


A) Nulidade da declaração de contumácia do arguido

Invoca o recorrente diversas nulidades dos atos praticados no âmbito da declaração de contumácia, que pretende ver declaradas.

O sistema processual português consagrou o princípio da legalidade em matéria de invalidades formais, que significa que a inobservância das leis de processo só determina a nulidade do ato quando esta for expressamente cominada na lei; se a lei não determinar de forma expressa a nulidade, o ato ilegal é irregular – cf. art. 118º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Penal.

Por outro lado, as nulidades encontram-se classificadas em insanáveis, que podem ser conhecidas e declaradas em qualquer fase do processo – art. 119º -, e em nulidades dependentes de arguição, que são todas as restantes. Estas, que se encontram previstas no art. 120º do Código de Processo Penal, e devem ser arguidas pelos interessados nos prazos estabelecidos na lei, sob pena de se considerarem sanadas.

Por último, a irregularidade é o efeito do vício formal que não produz nulidade, tendo uma natureza residual (arts. 118º, n.º 2, e 123º do Código de Processo Penal), estabelecendo igualmente a lei prazo para a sua arguição, sob pena de se considerar sanada. Tratando-se de um vício menos grave que o gerador de nulidade, a lei prevê uma sua mais fácil sanação.

Vejamos quais os vícios invocados em concreto pelo recorrente:
a) Não ter sido cumprido o art. 337º, n.º 5, do Código de Processo Penal, na notificação ao defensor do arguido:

Estabelece a norma em causa que “O despacho que declarar a contumácia é anunciado nos termos da parte final do n.º 13 do artigo 113º e notificado, com indicação dos efeitos previstos no n.º 1, ao defensor e a parente ou pessoa da confiança do arguido”.

No caso, o TEP notificou o Exmo. Defensor Oficioso do arguido do despacho proferido, que inclui todos os efeitos da declaração de contumácia, nomeadamente os referidos no n.º 1 do art. 337º.

A notificação foi, assim, regularmente efetuada.

Acresce que, contrariamente ao pretendido, a pretensa notificação “irregular” do defensor nunca origina uma nulidade insanável, não existindo norma no Código de Processo Penal que comine tal vício com essa consequência, ou sequer a nulidade dependente de arguição – cf. arts. 119 e 120º, n.º 2, do Código de Processo Penal, “a contrario”.

Assim, a ocorrer uma “deficiência” no conteúdo da notificação ao defensor, tratar-se-ia de mera irregularidade, que teria de ser arguida no prazo de 3 dias a contar da notificação que foi efetuada ao defensor – porque existiu, de facto, e foi regulamente cumprida a notificação. Não tendo sido arguido qualquer irregularidade, encontra-se sanada.

Tendo o defensor sido notificado do despacho que declarou o arguido contumaz, descrevendo os efeitos do mesmo, nenhuma garantia do processo criminal foi colocada em causa, designadamente as previstas no art. 32º da Constituição da República Portuguesa – que o recorrente invoca sem esclarecer qual o princípio constitucional que em concreto entende ter sido violado, ou os seus fundamentos.

Nem se diga, como parece pretender o recorrente, que o ato em análise feriu os seus direitos de defesa: o recorrente ausentou-se para parte incerta logo após a condenação, e a notificação do despacho que o declarou contumaz foi efetuada na pessoa do seu defensor, cumprindo assim o estatuído no art. 113º, n.º 10, do Código de Processo Penal. Desta feita, a existir alguma irregularidade essa foi conhecida nessa data, a partir da qual decorreu o prazo de arguição a que se refere o art. 123º do mesmo diploma legal.

Se o defensor não praticou qualquer ato processual na decorrência de tal notificação, é porque entendeu que não havia qualquer ato a praticar.

Em consequência, e tal como referido no despacho recorrido, qualquer irregularidade na declaração de contumácia proferida, designadamente o preenchimento do requisito legal do dolo do condenado (que não é cominado pela lei processual com a nulidade), encontra-se definitivamente sanada.

Tendo sido conferida oportunidade de defesa ao arguido, quer através da sua notificação edital, quer através da notificação na pessoa do seu defensor (art. 63º, n.º 1, do Código de Processo Penal), não foram violadas as garantias de defesa estabelecidas no art. 32º da Constituição da República Portuguesa.

 
b) Nulidade insanável por violação das regras de competência

Invoca o recorrente que o tribunal da condenação não era competente para proceder às diligências prévias à declaração de contumácia, incluindo a notificação edital e a emissão de mandados de detenção.

A competência para a emissão dos mandados de detenção posteriores à declaração da contumácia, nos termos do art. 337º, n.º 1, do Código de Processo Penal, tem sido discutida nas relações, tendo anteriormente esta Relação de Coimbra conferido a competência para a emissão dos mandados de detenção posteriores à declaração de contumácia proferida pelo Tribunal de Execução de Penas a este tribunal (cf. Acórdãos da Relação de Coimbra de 15.3.2017, no proc. 247/11.4GACCB-A.C1,, em www.dgsi.pt).

No entanto, nos autos haviam já sido emitidos mandados de detenção do arguido para cumprimento da pena em que foi condenado anteriormente à declaração de contumácia, naturalmente que pelo tribunal da condenação. Foram estes mandados que continuaram pendentes e válidos para cumprimento.

Na verdade, e conforme se decidiu no Acórdão da Relação de Lisboa de 14.6.2019 (proc. 312/14.6PHSNT-A.L1-9, em www.dgsi.pt), “Tendo já sido emitidos mandados para detenção do condenado, com a finalidade de cumprir a respetiva pena, seria incongruente e supérfluo a emissão de novos mandados de detenção por parte do TEP para ser presente a juízo, quando aquilo que se impõe é o cumprimento dos mandados já anteriormente emitidos pelo tribunal da condenação”.

Ou seja, ao TEP caberá eventualmente emitir os mandados de detenção a que se refere o n.º 1 do art. 335º do Código de Processo Penal exclusivamente se não tiverem anteriormente sido emitidos mandados de detenção para cumprimento pelo condenado da pena.

Quanto à realização das diligências prévias à declaração da contumácia – cuja competência sem dúvida compete ao Tribunal de Execução de Penas, nos termos do art. 138º, n.º 4, al. x), do CEPMPL, importa distinguir duas situações: aquelas em que o condenado se eximiu ao cumprimento da pena após o seu ingresso no estabelecimento prisional, ou seja, após o início do cumprimento da pena, e aquelas situações em que o condenado não iniciou ainda o cumprimento da pena.

Na verdade, o Tribunal de Execução de Penas tem competência para acompanhar e fiscalizar a execução das penas, decidir a sua modificação, substituição e extinção, conforme estatuído no art. 138º do CEPMPL. Em consonância, essa competência inicia-se com o cumprimento do condenado da pena privativa da liberdade, excetuando os atos referidos de forma taxativa no art. 138º, n.º 4, do CEPMPL – entre os quais a declaração de contumácia prevista na sua alínea x).

Ora, o art. 97º, n.º 2, als. a) e b), do CEPMPL, na parte em que defere ao TEP a competência para as diligências inerentes à declaração de contumácia, pressuposto o que a própria epígrafe anuncia: a evasão ou ausência não autorizada do condenado. Só no caso de evasão ou ausência não autorizada do condenado, em cumprimento de pena, a competência para a emissão dos editais a que se refere o art. 335º, n.º 1, do Código de Processo Penal será do TEP.

No caso dos autos, não tendo ainda o recorrente iniciado o cumprimento da pena, a intervenção do TEP encontra-se limitada à prática dos atos concretamente previstos no art. 138º, n.º 4, do CEPMPL. O que foi rigorosamente cumprido.

No entanto, não podemos deixar de referir que o cumprimento das diligências previas à declaração de contumácia, e a emissão de mandados de detenção do condenado não é suscetível de integrar a nulidade insanável a que se refere o art. 119º, al. e), do Código de Processo Penal.

Com efeito, a lei processual comina com a mais grave forma de invalidade a violação de regras de competência por tendo por base a garantia do respeito pelo princípio do juiz natural – “determinação anterior do tribunal competente, de acordo com critérios gerais prefixados, para prevenir a manipulação da competência ou a determinação da competência ex post facto (art. 32º, n.º 9, da Constituição da República Portuguesa)” -, reportando-se à competência material (cf. Henriques Gaspar, Código de Processo Penal Comentado, 2ª ed., p. 351). Por esta razão, a arguição da violação das regras de competência em razão do território encontra-se temporalmente limitada, tendo como consequência não a declaração automática da nulidade dos atos praticados, mas a remessa para o tribunal territorialmente competente [arts. 119º, al. e), 32º, n.º 2, e 33º do Código de Processo Penal].

Um qualquer ato ou diligência processual que não interfira com o princípio constitucional do juiz natural ou legal, ou seja, com as garantias da independência e da imparcialidade dos tribunais, não é suscetível de gerar a nulidade insanável prevista no art. 119º, al. e), do Código de Processo Penal.

É o que sucede com a afixação de editais, ato da competência da secretaria do tribunal, e outras diligências prévias à declaração de contumácia (as que visam encontrar o paradeiro do arguido).

O ato jurisdicional em causa, cuja competência é suscetível de gerar a nulidade prevista na norma vinda de referir, é a própria declaração de contumácia – que é o despacho judicial que limita os direitos das pessoas. E este despacho foi proferido pelo tribunal e juiz competente, conforme o recorrente reconhece.

Conclui-se pela não verificação de qualquer das invocadas nulidades.


B) Prescrição da pena

 

Vejamos as disposições legais aplicáveis:

1. A prescrição da pena e da medida de segurança suspende-se, para além dos casos especialmente previstos na lei, durante o tempo em que:
a) Por força da lei, a execução não puder começar ou continuar a ter lugar;
b) Vigorar a declaração de contumácia;
c) O condenado estiver a cumprir outra pena ou medida de segurança privativas da liberdade; ou
d) Perdurar a dilação do pagamento da multa.
2.A prescrição volta a correr a partir do dia em que cessar a causa de suspensão”.

O art. 126º, por sua vez, sobre a interrupção da prescrição, determina:
1.A prescrição da pena e da medida de segurança interrompe-se:
a) Com a sua execução; ou
b) Com a declaração de contumácia.
2.Depois de cada interrupção começa a correr novo prazo de prescrição.
3.A prescrição da pena e da medida de segurança tem sempre lugar quando, desde o seu início e ressalvado o tempo de suspensão, tiver decorrido o prazo normal da prescrição acrescido de metade”.

O recorrente tem consciência que a declaração de prescrição da pena de prisão em que foi condenado se encontrava dependente da declaração de nulidade da contumácia declarada. Tendo o recorrente sido declarado contumaz, ocorre a causa de suspensão prevista no art. 125º, n.º 1, al. b), do Código Penal, permanecendo a pena indefinidamente suspensa até cessar o facto suspensivo, não funcionando no caso o limite estabelecido no art. 126º, n.º 3, transcrito (cf. o Acórdão desta Relação de 15.6.2016, proc. 452/05.2GTLRA, em www.dgsi.pt).
Como se viu, a contumácia declarada nos autos é válida e mantém-se plenamente eficaz, produzindo efeitos ao nível da suspensão e interrupção do prazo de prescrição da pena.

O prazo de prescrição da pena de 18 meses de prisão aplicada ao recorrente é de 4 anos – art. 122º, n.º 1, al. d), do Código Penal. Este prazo começou a correr em 18.11.2015, data do trânsito em julgado da decisão condenatória.

O recorrente foi declarado contumaz em 3.10.2016.

A declaração de contumácia interrompeu a prescrição da pena, nos termos do art. 126º, n.º 1, al. b), do Código Penal, inutilizando o prazo que estava em curso.

Como a contumácia constitui concomitantemente causa de suspensão da prescrição, o decurso deste prazo continua suspenso até que cesse a declaração de contumácia.

Conclui-se, pelo exposto, que a pena aplicada ao recorrente não se encontra prescrita.


*
15. Decisão

Nos termos expostos, julga-se o recurso interposto totalmente improcedente, confirmando-se a decisão recorrida.

Custas pelo recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 4 UC’s.

Coimbra, 24 de junho de 2020

Ana Carolina Veloso Gomes Cardoso (relatora)

João Bernardo Peral Novais (adjunto)