RECLAMAÇÃO DE CRÉDITOS
DIREITO DE RETENÇÃO
HIPOTECA
ÂMBITO SUBJECTIVO DO CASO JULGADO
Sumário

I - Não é oponível ao credor hipotecário a sentença que, embora com trânsito em julgado, haja declarado, em ação na qual este não foi parte, a existência de direito de retenção alheio sobre o imóvel hipotecado, neste caso a favor do respetivo promitente-comprador.
II - Com efeito, o credor hipotecário, com o reconhecimento de um crédito garantido por direito de retenção, não sofre só um prejuízo económico; sofre também um efetivo prejuízo jurídico, uma vez que a declaração de existência daquele direito de retenção coloca o credor que dele beneficia numa posição de preferência, na ordem de pagamento, relativamente ao credor hipotecário.
III - Por isso, sendo o credor hipotecário terceiro juridicamente interessado, e não tendo sido condenado na sentença em que foi reconhecido o direito de retenção, não pode considerar-se vinculado à sua observância.
IV - Este entendimento é hoje amplamente maioritário nos nossos tribunais superiores.

Texto Integral

Proc. nº 6903/13.5 TBVNG-B.P1
Comarca do Porto – Juízo de Execução do Porto – Juiz 5
Apelação
Recorrente: “B…, S.A. – Sociedade Aberta”
Recorrido: C…
Relator: Eduardo Rodrigues Pires
Adjuntos: Desembargadores Márcia Portela e José Igreja Matos

Acordam na secção cível do Tribunal da Relação do Porto:

RELATÓRIO
Por apenso aos autos de execução instaurados pela exequente “D…, SA” contra os executados E…, F…, G…, H… e I…, no âmbito dos quais foram penhorados os prédios descritos na Conservatória do Registo Predial de Matosinhos sob o nº 2140/19990805 (freguesia …) e na Conservatória do Registo Predial do Porto sob o nº 428/19901122 (freguesia …), vieram reclamar créditos:
a) J…, no valor de 50.000,00€, acrescido dos juros vencidos no montante de 6.000,00€ e dos vincendos até integral pagamento, nos termos documentados a fls. 6 a 10, cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido;
b) B…, SA, no valor de 95.455,68€, acrescido dos juros vencidos no montante de 8.115,64€ e dos vincendos até integral pagamento, nos termos documentados a fls. 16v a 66, cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido;
c) K…, SA, no valor de 436.129,10€, acrescido das despesas e juros vencidos no montante de 20.038,31€ e dos vincendos até integral pagamento, nos termos documentados a fls. 73 a 85, cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido;
d) C…, no valor de 134.000,00€, nos termos documentados a fls. 97 a 127, cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido;
e) D…, SA, no valor de 65.572,34€, acrescido dos juros vencidos no montante de 15.047,50€ e dos vincendos até integral pagamento, nos termos documentados a fls. 148 a 167, cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido.
Efetuadas as notificações previstas no art. 789º do Cód. de Proc. Civil foram apresentadas as seguintes impugnações:
a) O credor reclamante C… impugnou o crédito reclamado por J… nos termos constantes da Refª 29755635, sustentando, em síntese, que a hipoteca voluntária não foi constituída para garantir o pagamento de qualquer crédito e por o mesmo em 2012 ter apenas 19 anos de idade e ser estudante, não lhe sendo conhecida qualquer atividade profissional que lhe permitisse amealhar o montante de 50.000,00€, pelo que a hipoteca voluntária constituída a seu favor não teve por finalidade a garantia de pagamento de qualquer dívida, mas antes a de acautelar o património da executada sua mãe face aos vários processos executivos que, naquela data pendiam contra si; para além disso, nos termos do art. 1143º do Cód. Civil, o contrato de mútuo de valor superior a 25.000,00€ só é válido se for celebrado por escritura pública ou por documento particular autenticado.
A referida impugnação mereceu a resposta apresentada sob a Refª 29970060 em que se sustentou que, como consta da escritura de hipoteca, o mútuo de 50.000,00€ foi concedido para fazer face a compromissos pessoais no ano de 2012.
b) O credor reclamante B…, SA, impugnou o credito reclamado por C… nos termos constantes da Refª 29908013, sustentando, em síntese, que o contrato-promessa é nulo por não ter sido celebrado por escritura pública e as assinaturas não terem sido reconhecidas presencialmente e ainda pelo facto de o mesmo não ser titular do direito de retenção por falta de pagamento do sinal, inexistindo incumprimento definitivo e não ter feito prova cabal de que é efetivamente detentor do imóvel.
Esta última impugnação mereceu a resposta apresentada sob a Refª 30047325, em que se sustentou que o contrato-promessa é válido e plenamente eficaz entre as partes, pois as mesmas declararam expressamente prescindir mutuamente do reconhecimento presencial das assinaturas; existe suporte documental para comprovar a entrega dos pagamentos a título de sinal; o imóvel está na sua posse desde 4.11.2010 e é na qualidade de detentor que paga as despesas correntes da sua manutenção; a quantia de 134.000,00€ foi peticionada no pedido reconvencional apresentado em 5.2.2018, correspondente ao valor do sinal em dobro.
Em sede de despacho saneador, proferido em 29.4.2019, julgaram-se verificados os créditos reclamados pelo B…, S.A., pelo K…, S.A. e pela D…, S.A..
O crédito reclamado por C… foi julgado verificado pela quantia de 67.000,00€ e relativamente ao crédito reclamado por J…, por carecer de produção de prova, foi a sua verificação relegada para a sentença final.
Igualmente relegada para final se mostra a graduação de todos os créditos.
Foi ainda proferido despacho a identificar o objeto do litígio e a enunciar os temas da prova.
Inconformado com o decidido no tocante ao crédito reclamado por C…, interpôs recurso de apelação o credor reclamante B… que finalizou as suas alegações com as seguintes conclusões:
I. A douta decisão recorrida não deve manter-se pois não consagra a justa e correcta aplicação das normas legais e dos princípios jurídicos aplicáveis.
II. O crédito do Banco encontra-se garantido por hipotecas constituídas sobre o prédio urbano correspondente a casa de rés-do-chão, anexos e logradouro, destinado a habitação, sito na Rua …, …, freguesia …, concelho do Porto, descrito na 2.ª Conservatória do Registo Predial do Porto sob o n.º 428 e inscrito na respectiva matriz predial urbana sob o artigo 1553º (atual 3999º).
III. Nos presentes autos, veio C… reclamar o seu crédito, invocando a existência de um direito de retenção.
IV. O Banco impugnou tal crédito, invocando, em suma, que nenhuma prova foi feita relativamente ao direito de que o mesmo se arroga titular.
V. Posteriormente, o alegado credor C… procedeu à junção de uma certidão judicial de sentença transitada em julgado, sendo que no âmbito de tal processo é reconhecido um crédito no valor de 67.000,00€ e ainda o direito de retenção sobre o imóvel.
VI. O Banco impugna tal certidão, alegando que não foi chamado a tal acção apesar da sua qualidade de credor hipotecário, pelo que tal decisão em relação ao Banco não pode constituir caso julgado, sendo-lhe por isso inoponível.
VII. Sucede porém que o Tribunal “a quo” através da decisão de que ora se recorre, considera verificado o crédito do C… pela quantia de 67.000,00€, reconhecendo igualmente o direito de retenção.
VIII. Afigura-se ao Recorrente que a aliás douta decisão recorrida, ao reconhecer o direito de retenção, sem produção de qualquer prova, violou o disposto nos artigos 441º e 442º, nº 2 do Cód. Civil e nos artºs. 580.º, n.º 1, 581.º, n.º 1 e 619º Cód. Proc. Civil, igualmente desconsiderando os princípios fundamentais plasmados na Constituição da Republica Portuguesa da protecção da confiança e da segurança jurídica, vertidos nos artigos 2° e 18° CRP.
IX. A excepção do caso julgado pressupõe a repetição de uma causa já julgada, que se caracteriza por uma tríplice identidade: de sujeitos, de pedido e de causa de pedir.
X. Entre a acção declarativa instaurada pelo aqui credor contra os executados e a presente acção, não existe nem identidade de sujeitos, nem identidade de objecto (pedido e causa de pedir), sobretudo porque não intervieram na anterior acção, os credores reclamantes, designadamente o Banco.
XI. Ao Banco e aos demais credores não intervenientes nessa acção, sempre seria inoponível o efeito do caso julgado inerente a essa decisão, por serem terceiros titulares de direitos incompatíveis com o direito dos ora reclamantes apreciados naquela anterior acção.
XII. Caso a sentença que reconheceu o direito de retenção sobre o imóvel fosse oponível ao Banco, estaria a esvaziar-se o seu direito de crédito, mais concretamente o seu direito hipotecário, uma vez que estar-se-ia a colocar à sua frente um outro crédito, que, assim, gozava de prioridade de pagamento e sem qualquer hipótese de defesa.
XIII. A sentença não põe em causa a existência ou a validade do direito hipotecário do Banco, mas a verdade é que não se limita a afectar a sua consistência prática, face à restrição ou redução do património da executada, porquanto se confronta com o direito de um terceiro, juridicamente, interessado, de algum modo incompatível com o direito de retenção, afectando-lhe a sua consistência jurídica.
XIV. Se não existisse o direito de retenção, a hipoteca conferia ao Banco, o direito de ser pago pelo valor do imóvel, com preferência sobre os demais credores que não gozem de privilégio especial ou de prioridade de registo.
XV. Mal andou o Tribunal “a quo” ao reconhecer o direito de retenção ao credor C…, baseando-se unicamente numa sentença proferida num processo em que o Banco (e os restantes credores), não são parte e que claramente são terceiros juridicamente interessados.
XVI. Não foi produzida prova capaz de permitir aferir a existência do direito de retenção.
XVII. Só há direito de retenção quando existe reciprocidade de créditos entre o detentor da coisa e aquele a quem a sua entrega é devida, quer este seja ou não o proprietário.
XVIII. O contrato-promessa, só por si, não é susceptível de transferir a posse ao promitente-comprador.
XIX. A eventual posse do promitente-adquirente não emerge do contrato-promessa, alheia que é ao respectivo objecto, mas de um outro acordo negocial e da efectiva entrega do bem pelo promitente-alienante.
XX. Não é, assim, possível qualificar dogmaticamente como mera posse precária ou como verdadeira posse, a detenção exercida pelo promitente-comprador sobre a coisa objecto do contrato prometido em que é beneficiário de traditio, havendo de ser o acordo de tradição e as circunstâncias relativas ao elemento subjectivo a determinar a qualificação da detenção. Acordo esse que não existe nos presentes autos.
XXI. Nesta conformidade e atendendo a todo o exposto, seria forçoso concluir que deveria o Tribunal “a quo” ter remetido para o objeto do litígio a existência do direito de retenção, produzindo-se a prova em conformidade, pelo que mal andou o Tribunal “a quo” ao decidir em sentido contrário.
XXII. O douto despacho recorrido, ao reconhecer o direito de retenção, sem produção de qualquer prova, violou o disposto nos artºs. 441º e 442º, nº 2 do Cód. Civil e nos artºs. 580.º, n.º 1, 581.º, n.º 1 e 619º do Cód. Proc. Civil, igualmente desconsiderando os princípios fundamentais plasmados na Constituição da República Portuguesa da protecção da confiança e da segurança jurídica, vertidos nos artigos 2° e 18° CRP, motivo pelo qual deve ser revogado.
Pretende assim que o despacho recorrido seja revogado, sendo remetido para o objeto do litígio a existência do direito de retenção.
O recorrido - credor reclamante C… - apresentou contra-alegações, nas quais formulou as seguintes conclusões:
1. A ora recorrente apresenta recurso do despacho saneador proferido no passado dia 10 de maio de 2019, que decidiu, com relevância para os presentes autos, reconhecer o crédito de €67.000,00 do ora apelado, reconhecendo, ainda, o direito de retenção sobre o imóvel prometido vender ao abrigo celebração do contrato promessa de compra e venda outorgado entre o reclamante e a executada H….
2. No despacho proferido não há qualquer erro na apreciação da matéria de facto nem aplicação do direito, nem tampouco qualquer contradição ou desvalorização que impusesse uma solução inversa à decidida no despacho impugnado, competindo, assim, a este tribunal ad quem usar dos seus poderes/deveres (funcionais) de confirmação da decisão.
3. No processo n.º 13549/17.7T8PRT, que correu termos no Juízo Central Cível da Póvoa de Varzim – Juiz 5, o crédito do aqui apelado foi devidamente reconhecido, no valor de €67.000,00, bem como o direito de retenção que lhe assiste, em virtude do disposto no artigo 755.º, n.º 1, alínea f) do Código Civil e, por isso, tal direito de retenção prevalece sobre a hipoteca registada a favor da recorrente.
4. A recorrente confunde os institutos jurídicos de exceção de caso julgado, com a autoridade de caso julgado, pois, conforme dispõe o artigo 619.º, n.º 1 do Código de Processo Civil, transitada em julgado a sentença ou o despacho saneador que decida do mérito da causa, a decisão sobre a relação material controvertida fica a ter força obrigatória dentro do processo e fora dele.
5. A exceção de caso julgado destina-se a evitar uma nova decisão inútil, por razões de economia processual, o que implica uma não decisão sobre a nova ação, pressupondo a tríplice identidade de sujeitos, objeto e pedido, pelo que, por sua vez, a autoridade de caso julgado importa a aceitação de uma decisão proferida em ação anterior, que se insere, quanto ao seu objeto, no objeto da segunda, visando obstar a que a relação ou situação jurídica material definida por uma sentença possa ser validamente definida de modo diverso por outra sentença, não sendo exigível a coexistência da tríplice identidade prevista no artigo 498.º do Código de Processo Civil – cfr. Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação do Porto, de 11.10.2018.
6. Por força da autoridade de caso julgado, impõe-se aceitar a decisão proferida no primeiro processo, na medida em que o núcleo fulcral das questões de direito e de facto ali apreciadas e decididas são exatamente as mesmas que se pretende ver apreciadas e discutidas no âmbito de um segundo processo, pelo que, o objeto da primeira decisão constitui questão prejudicial na segunda ação, como pressuposto necessário da decisão de mérito que nesta há-de-ser proferida – acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 19.05.2016.
7. A tese da recorrente não pode merecer qualquer acolhimento, pois, como vimos, com relevância para os presentes autos, o que deve ser salientado, é a autoridade de caso julgado, e nunca a exceção de caso julgado, pelo que, nos presentes autos, verifica-se a autoridade de caso julgado.
8. A sentença que reconhece o direito de retenção do promitente-comprador sobre imóvel hipotecado não afeta a existência, a validade e/ou a consistência jurídica do direito do credor hipotecário; afeta apenas a consistência prática/económica deste direito, na medida em que o direito de retenção é graduado à frente da hipoteca – cfr. acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Guimarães, de 19.06.2016 e acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 21.10.2008.
9. A decisão proferida no âmbito do processo n.º 13549/17.7T8PRT na qual se reconheceu o direito de retenção do aqui apelado sobre o imóvel da qual se encontra registada a hipoteca a favor do apelante, não causa qualquer prejuízo à recorrente, uma vez que deixa íntegra a consistência jurídica do direito do credor hipotecário, pois, não lhe retira a sua garantia legal, causando, apenas, um prejuízo de facto ou económico, já que irá graduar em primeiro lugar o crédito do apelado, por beneficiar do direito de retenção e, por isso, o credor hipotecário é um terceiro juridicamente indiferente, razão pela qual aquela sentença de reconhecimento do direito de retenção faz caso julgado contra si, sendo-lhe oponível.
10. A decisão do tribunal “a quo” ao ter reconhecido o direito de retenção não violou qualquer princípio constitucional da proteção da confiança e segurança jurídica, porquanto, já o Supremo Tribunal de Justiça, no acórdão de fixação de jurisprudência n.º 4/2014, e com relevância para os presentes autos, entendeu que, em suma, o direito de retenção prevalece sobre a hipoteca registada.
11. O credor hipotecário não tinha de ter tido intervenção nos autos onde foi reconhecido o direito de retenção do aqui apelado, pois, apesar de manter interesse na impugnação do crédito invocado pelo recorrido, a verdade é que aquela, não teve, como não teria de ter, qualquer intervenção em sede declarativa, já que esta se desenvolveu apenas entre o recorrido e a executada H…, com vista, no que aqui interessa, à resolução do contrato promessa por culpa imputável à executada, ao pagamento do sinal e reconhecimento do direito de retenção do imóvel prometido vender a favor do recorrido.
12. Importa ainda referir que, o B…, S.A. – SOCIEDADE ABERTA, teve conhecimento a 20.06.2018 dos autos que correram termos no Juízo Central Cível do Porto – Juiz 2 sob o número 13549/17.7T8PRT, sem que o recorrente tenha decidido intervir nesses autos conforme o disposto nos artigos 311º e seguintes do Código de Processo Civil – documento nº 1
13. Muito se estranha que se reclame um direito que há muito foi prescindido pela recorrente.
14. A decisão proferida nos autos n.º 13549/17.7T8PRT pelo Juízo Central Cível da Póvoa de Varzim – Juiz 5, na qual se reconheceu o direito de retenção sobre o imóvel objeto do contrato a favor do apelado, é totalmente oponível à recorrente e, como tal, ao abrigo do disposto no artigo 759.º, n.º 1 e 2 do Código Civil, recaindo o direito de retenção sobre coisa imóvel, o respetivo titular, enquanto não entregar a coisa retida, tem a faculdade de a executar, nos mesmos termos em que o pode fazer o credor hipotecário, e de ser pago com preferência aos demais credores do devedor, sendo certo que, o direito de retenção prevalece neste caso sobre a hipoteca, ainda que esta tenha sido registada anteriormente.
15. O tribunal “a quo” detinha as condições essenciais e necessárias para a prolação do despacho saneador, sem produção de prova, pois, tendo em consideração que existe uma sentença na qual confere ao apelado o direito de crédito sobre a executada H…, no montante de €67.000,00, bem como o respetivo direito de retenção sobre o imóvel objeto do contrato promessa de compra e venda, dúvidas não restam que, por um lado, esse direito de retenção existe e, por outro lado, que o mesmo é oponível ao credor hipotecário, por força das disposições legais aplicáveis – artigo 759.º do Código Civil.
16. O direito de retenção previsto no artigo 755.º, n.º 1, alínea f) do Código Civil, estabelece que gozam ainda do direito de retenção o beneficiário da promessa de transmissão ou constituição de direito real que obteve a tradição da coisa a que se refere o contrato prometido, sobre essa coisa, pelo crédito resultante do não cumprimento imputável à outra parte, nos termos do artigo 442.º do Código Civil.
17. Os pressupostos gerais explanados no artigo 754.º do Código Civil, não prevalecem sobre os requisitos especiais dos casos elencados no artigo 755.º do Código Civil, pois, atenta a letra da lei, este preceito legal refere precisamente que: “Gozam ainda do direito de retenção (…)” e, por isso, as situações elencadas no artigo 755.º do Código Civil consubstanciam-se em situações especiais e não aos pressupostos gerais de aplicação e reconhecimento do direito de retenção e, como tal, para o promitente comprador adquirir o direito de retenção a que vem sendo feita alusão, basta que seja beneficiário da promessa de transmissão que obteve a tradição da coisa a que se refere o contrato prometido, sobre essa coisa, pelo crédito resultante do não cumprimento imputável à outra parte.
18. Através da prolação da sentença nos autos do processo n.º 13549/17.7T8PRT do Juízo Central Cível da Póvoa de Varzim – Juiz 5, já se encontra definitivamente decidido que o incumprimento do contrato de promessa de compra e venda celebrado entre o apelado e a executada H…, foi por facto imputável a esta última, recaindo sobre esta a obrigação de entregar o sinal em singelo e, ainda, que o apelado obteve a tradição da coisa, pelo que, resta-nos concluir que os pressupostos do direito de retenção previstos no preceito especial plasmado no artigo 755.º, n.º 1, alínea f) do Código Civil se encontram verificados e preenchidos.
19. Apesar do recorrido ter a posse do imóvel, a verdade é que o direito de retenção a favor do promitente-comprador não exige a posse deste sobre o imóvel prometido vender, bastando-se a detenção material da coisa – acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 10.05.2018 – e, por isso, tendo em consideração que o disposto no artigo 755.º do Código Civil não releva a forma de tradição, temos de concluir que, quando a lei não distingue, não compete ao intérprete distinguir.
20. O direito de retenção tem prevalência sobre a hipoteca ainda que registada anteriormente e, além disso, que a decisão proferida pelo Juízo Central Cível da Póvoa de Varzim – Juiz 5 é oponível ao credor hipotecário, por força da autoridade do caso julgado, e, por estas razões, o tribunal “a quo” andou bem ao decidir pelo reconhecimento do direito de retenção do aqui apelado.
21. Atento o exposto, deverá este Tribunal Superior usar dos seus poderes de confirmação e, consequentemente, manter o despacho saneador proferido no passado dia 10 de maio, pelo Juízo de Execução do Porto – Juiz 5.
Tendo prosseguido os autos para julgamento quanto ao crédito reclamado por J… foi este realizado com observância do legal formalismo, sendo depois proferida sentença que considerou tal crédito verificado e procedeu à graduação pela seguinte forma:
A) Pelo valor da venda do imóvel descrito na Conservatória do Registo Predial de Matosinhos sob o nº 2140/19990805 (freguesia …), será dado pagamento:
1 - Em primeiro lugar, às custas em dívida;
2 – Em segundo lugar aos créditos reclamados pelo K…, SA, no valor de 436.129,10€, acrescido das despesas e juros vencidos no montante de 20.038,31€ e dos vincendos até integral pagamento;
3 – Em terceiro lugar, ao crédito da exequente D…, SA, no valor de 29.512,40€, acrescido dos juros vencidos no montante de 815,03€ e dos vincendos até integral pagamento;
4 - E, em quarto e último lugar, ao crédito reclamado pela D…, SA, no valor de 65.572,34€, acrescido dos juros vencidos no montante de 15.047,50€ e dos vincendos até integral pagamento.
B) Pelo valor da venda do imóvel descrito na Conservatória do Registo Predial do Porto sob o nº 428/19901122 (freguesia …), será dado pagamento:
1 - Em primeiro lugar, às custas em dívida;
2 – Em segundo lugar, ao crédito garantido por direito de retenção reclamado por C…, no valor de 67.000,00€, acrescido dos juros de mora civis, vencidos e vincendos, à taxa de 4%, a contar de 14.9.2012, até efetivo e integral pagamento;
3 – Em terceiro lugar, aos créditos hipotecários reclamados pelo B…, SA, no valor de 95.455,68€, acrescido dos juros vencidos no montante de 8.115,64€ e dos vincendos até integral pagamento;
4 – Em quarto lugar, ao crédito da exequente D…, SA, no valor de 29.512,40€, acrescido dos juros vencidos no montante de 815,03€ e dos vincendos até integral pagamento;
5 - E, em quinto e último lugar, ao crédito reclamado por J…, no valor de 50.000,00€, acrescido dos juros vencidos no montante de 6.000,00€ e dos vincendos até integral pagamento.
Novamente inconformado quanto ao decidido no tocante ao crédito reclamado por C…, o credor reclamante B…, SA interpôs recurso de apelação, tendo finalizado as suas alegações com as seguintes conclusões:
I. A douta decisão recorrida não deve manter-se pois não consagra a justa e correcta aplicação das normas legais e dos princípios jurídicos aplicáveis.
II. O crédito do Banco encontra-se garantido por hipotecas constituídas sobre o prédio urbano correspondente a casa de rés-do-chão, anexos e logradouro, destinado a habitação, sito na Rua …, …, freguesia …, concelho do Porto, descrito na 2.ª Conservatória do Registo Predial do Porto sob o n.º 428 e inscrito na respectiva matriz predial urbana sob o artigo 1553º (atual 3999º).
III. Nos presentes autos, veio C… reclamar o seu crédito, invocando a existência de um direito de retenção.
IV. O Banco impugnou tal crédito, invocando, em suma, que nenhuma prova foi feita relativamente ao direito de que o mesmo se arroga titular.
V. Posteriormente, o alegado credor C… procedeu à junção de uma certidão judicial de sentença transitada em julgado, sendo que no âmbito de tal processo é reconhecido um crédito no valor de 67.000,00€ e ainda o direito de retenção sobre o imóvel.
VI. O Banco impugnou tal certidão, alegando que não foi chamado a tal acção apesar da sua qualidade de credor hipotecário, pelo que tal decisão em relação ao Banco não pode constituir caso julgado, sendo-lhe por isso inoponível.
VII. O Tribunal “a quo” proferiu uma decisão, na qual considera verificado o crédito do C… pela quantia de 67.000,00€, reconhecendo igualmente o direito de retenção.
VIII. Face a tal decisão, o Banco interpôs recurso da mesma, não tendo até ao momento sido proferido qualquer despacho quanto à sua admissão e subida.
IX. Em virtude da decisão ali proferida e ignorando o facto de a mesma não ter transitado em julgado, o Tribunal “a quo” profere a sentença de graduação de créditos, de que ora se recorre.
X. Afigura-se ao Recorrente que a aliás douta decisão recorrida, ao graduar aqueles créditos da forma indicada, violou o disposto nos arts. 195º, n.º 1 e 2, 199º, n.º 1, 580.º, n.º 1, 581.º, n.º 1, 613º, n.º 2, 614º e 619º todos do CPC e artigos 441º e 442º, nº 2 do Cód. Civil, igualmente desconsiderando os princípios fundamentais plasmados na Constituição da Republica Portuguesa da protecção da confiança e da segurança jurídica, vertidos nos artigos 2° e 18° CRP.
XI. O Tribunal deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras.
XII. Quando o Banco interpõe recurso da decisão proferida em 13 de Maio, o Tribunal não se pronuncia e profere a sentença de que se recorre, temos que concluir que estamos perante uma omissão de pronúncia e consequentemente na nulidade da sentença proferida, nos termos do disposto no artigo 615º do Código do Processo Civil.
XIII. Para além da omissão de pronúncia, também estaremos perante um erro de julgamento.
XIV. Isto porque o Tribunal “a quo” assenta a sua sentença no despacho proferido a 13 de Maio, ignorando, conforme já referido, que tal despacho foi objeto de recurso.
XV. Ao suportar a sentença num despacho que será objeto de apreciação superior, está a viciar-se a decisão pois a mesma acaba por reconhecer um direito, que foi objeto de um recurso ainda não apreciado.
XVI. Apenas na sentença de verificação e de graduação de créditos, se individualiza definitivamente e se torna legítima a pretensão executiva do credor.
XVII. Mal andou o Tribunal “a quo” ao limitar-se a reconhecer o direito de retenção, não se tendo sequer preocupado em aferir da verdadeira existência de tal direito.
XVIII. A graduação de créditos, é tarefa que incumbe ao juiz, competindo igualmente assegurar a igualdade das partes em vista a que as decisões não assentem em formalidades ou subtilezas processuais que conduzem a desigualdade no plano da defesa e protecção dos direitos, sejam as partes economicamente poderosas ou débeis.
XIX. Ao suportar a sua decisão num despacho não transitado e que reconhece o direito de retenção, também ela própria é nula, nulidade essa que desde já se invoca.
XX. O Tribunal “a quo” para reconhecer o direito de retenção ao credor C…, entendeu que o Banco, na qualidade de credor hipotecário, é um terceiro juridicamente indiferente na ação declarativa instaurada pelo credor C…, contra os executados.
XXI. Tal entendimento é totalmente contrário à jurisprudência dos Tribunais Superiores, daí ter sido interposto recurso ao despacho proferido.
XXII. A excepção do caso julgado pressupõe a repetição de uma causa já julgada, que se caracteriza por uma tríplice identidade: de sujeitos, de pedido e de causa de pedir.
XXIII. Entre a acção declarativa instaurada pelo aqui credor contra os executados e a presente acção, não existe nem identidade de sujeitos, nem identidade de objecto (pedido e causa de pedir), sobretudo porque não intervieram na anterior acção, os credores reclamantes, designadamente o Banco.
XXIV. Ao Banco e aos demais credores não intervenientes nessa acção, sempre seria inoponível o efeito do caso julgado inerente a essa decisão, por serem terceiros titulares de direitos incompatíveis com o direito dos ora reclamantes apreciados naquela anterior acção.
XXV. Caso a sentença que reconheceu o direito de retenção sobre o imóvel fosse oponível ao Banco, estaria a esvaziar-se o seu direito de crédito, mais concretamente o seu direito hipotecário, uma vez que estar-se-ia a colocar à sua frente um outro crédito, que, assim, gozava de prioridade de pagamento e sem qualquer hipótese de defesa.
XXVI. A sentença não põe em causa a existência ou a validade do direito hipotecário do Banco, mas a verdade é que não se limita a afectar a sua consistência prática, face à restrição ou redução do património da executada, porquanto se confronta com o direito de um terceiro, juridicamente, interessado, de algum modo incompatível com o direito de retenção, afectando-lhe a sua consistência jurídica.
XXVII. Se não existisse o direito de retenção, a hipoteca conferia ao Banco, o direito de ser pago pelo valor do imóvel, com preferência sobre os demais credores que não gozem de privilégio especial ou de prioridade de registo.
XXVIII. Mal andou o Tribunal “a quo” ao reconhecer o direito de retenção ao credor C…, baseando-se unicamente numa sentença proferida num processo em que o Banco (e os restantes credores), não são parte e que claramente são terceiros juridicamente interessados.
XXIX. Não foi produzida prova capaz de permitir aferir a existência do direito de retenção.
XXX. Só há direito de retenção quando existe reciprocidade de créditos entre o detentor da coisa e aquele a quem a sua entrega é devida, quer este seja ou não o proprietário.
XXXI. O contrato-promessa, só por si, não é susceptível de transferir a posse ao promitente comprador.
XXXII. A eventual posse do promitente-adquirente não emerge do contrato-promessa, alheia que é ao respectivo objecto, mas de um outro acordo negocial e da efectiva entrega do bem pelo promitente-alienante.
XXXIII. Não é, assim, possível qualificar dogmaticamente como mera posse precária ou como verdadeira posse, a detenção exercida pelo promitente-comprador sobre a coisa objecto do contrato prometido em que é beneficiário de traditio, havendo de ser o acordo de tradição e as circunstâncias relativas ao elemento subjectivo a determinar a qualificação da detenção. Acordo esse que não existe nos presentes autos.
XXXIV. Nesta conformidade e atendendo a todo o exposto, seria forçoso concluir que deveria o Tribunal “a quo” ter remetido para o objeto do litígio a existência do direito de retenção, produzindo-se a prova em conformidade, pelo que mal andou o Tribunal “a quo” ao decidir em sentido contrário.
XXXV. A douta decisão recorrida, ao graduar aqueles créditos da forma indicada, violou o disposto nos arts. 195º, n.º 1 e 2, 199º, n.º 1, 580.º, n.º 1, 581.º, n.º 1, 613º, n.º 2, 614º e 619º todos do CPC e artigos 441º e 442º, nº 2 do Cód. Civil, igualmente desconsiderando os princípios fundamentais plasmados na Constituição da República Portuguesa da protecção da confiança e da segurança jurídica, vertidos nos artigos 2° e 18° CRP, motivo pelo qual deve ser revogada.
O credor reclamante C…, aqui recorrido, apresentou contra-alegações, cujas alegações finalizou com as seguintes conclusões:
1. A sentença de graduação de créditos proferida no passado dia 17 de julho de 2019, pelo tribunal “a quo”, no âmbito do processo executivo movido contra H… e outros, decidiu, e bem, graduar o crédito do recorrido em primeiro lugar.
2. Na referida decisão não foi cometido qualquer erro na aplicação da matéria de direito, nem tampouco qualquer violação dos princípios fundamentais, que impusesse uma solução diversa à decidida na aludida sentença, competindo, assim, a este tribunal “ad quem” usar dos seus poderes/deveres (funcionais) de confirmação.
3. A apelação da decisão que considerou verificado o crédito do recorrido, bem como o seu direito de retenção, não tem efeito suspensivo nos termos do artigo 647.º, n.º 3 do Código de Processo Civil, sendo ainda certo que a recorrente não se ofereceu para prestar caução, pelo que, o tribunal “a quo”, ao ter proferido a presente sentença de graduação de créditos, não violou qualquer princípio ou norma jurídica e, por isso, deverá o presente recurso ser julgado totalmente improcedente.
4. O recorrido não vislumbra qualquer nulidade de sentença, nem tampouco qualquer omissão de pronúncia sobre questões que foram colocadas à apreciação daquele tribunal, uma vez que o recorrido desconhece que pronúncia é que o tribunal “a quo” deveria ter emanado, pois, a recorrente apresentou recurso daquela decisão que verificou o crédito do recorrido, pelo que tal decisão ainda se encontra em apreciação junto do tribunal superior, esgotando-se, assim, o poder jurisdicional do tribunal “a quo”, nos termos do disposto no artigo 613.º, n.º 1 do Código Civil.
5. A inexistência de despacho de admissão do recurso, não se consubstancia em nenhuma omissão de pronúncia, nem tampouco, em nenhuma omissão que seja censurada através da nulidade, porquanto, o artigo 615.º, n.º 1 do Código Civil não discrimina essas situações, pelo que deverá o recurso improceder.
6. A recorrente confunde ou desconhece o instituto do erro de julgamento, pois, conforme é consabido, o erro de julgamento (error in judicando) resulta de uma distorção da realidade factual (error facti) ou na aplicação do direito (error juris), de forma a que o decidido não corresponda à realidade ontológica ou à normativa – cfr. acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 30.09.2010, no processo n.º 341/08.9TCGMR.G1.S2.
7. Não existe qualquer distorção da realidade factual ou da aplicação da matéria de direito, mas somente uma decisão que a recorrente não aceita, por entender que deveria ter sido proferida uma decisão em sentido contrário, o que, por si só, não significa que exista erro de julgamento, pois, caso contrário, existiria sempre erro de julgamento em relação à parte vencida, na medida em que é esta quem não aceita ou não se conforma com tal decisão.
8. A recorrente não prestou caução para poder atribuir efeito suspensivo àquele recurso de apelação e, assim, não pode agora tentar invocar que o tribunal “a quo” cometeu uma nulidade ou um erro de julgamento, quando, na realidade, proferiu a respetiva sentença conforme estava obrigado, devido à ausência de efeito suspensivo.
9. O tribunal “a quo” no despacho proferido em 29 de abril de 2019, fundamentou, e bem, a razão pela qual considerava o direito de retenção a favor do recorrido devidamente reconhecido.
10. O tribunal “a quo” fundamentou bem a sua decisão de considerar verificado o crédito do recorrido, bem como o seu direito de retenção, uma vez que aferiu de todos os documentos constantes nos autos e proferiu uma decisão totalmente conforme com a realidade creditória, pois, teve em consideração, e bem, a sentença proferida, e transitada em julgado, no âmbito do processo n.º 13549/17.7T8PRT, que correu os seus termos pelo Juízo Central Cível da Póvoa de Varzim, Juiz 5, no qual se discutiu e se verificou que a executada H… incumpriu definitivamente o contrato promessa de compra e venda sobre o imóvel descrito na Conservatória do Registo Predial do Porto sob o n.º 428/19901122 celebrado com o recorrido, pelo que impendia sobre ela a obrigação de proceder à entrega ao recorrido do sinal pago por aquele, razão pela qual, até efetivo e integral pagamento, ao ora recorrido assistia-lhe o direito de retenção sobre tal imóvel prometido vender.
11. A existência e validade do direito de retenção foi discutida, apreciada e considerada no âmbito daquele processo que, conforme é consabido, ao abrigo do disposto no artigo 619.º, n.º 1 do Código de Processo Civil, a decisão sobre a relação material controvertida fica a ter força obrigatória dentro do processo e fora dele e, por essa razão, tendo em consideração que o crédito do recorrido se encontra manifestamente alegado, justificado e suportado documentalmente, dúvidas não restam que o mesmo tinha de ser graduado da forma que o foi.
12. Na ação declarativa instaurada pelo recorrido contra os executados, após a apresentação dos respectivos articulados, o Senhor Doutor Juiz daquele processo decidiu, e bem, julgar a ação totalmente improcedente e, por sua vez, considerar totalmente procedente a reconvenção deduzida pelo promitente comprador, aqui recorrido, reconhecendo, assim, o crédito no valor do sinal pago e, consequentemente, o direito de retenção sobre o imóvel prometido vender, até a promitente vendedora proceder ao pagamento daquela quantia.
13. Naqueles referidos autos, o Senhor Juiz não teve dúvidas de que o ora recorrido beneficiava do direito de retenção sobre o imóvel aqui em apreço, uma vez que a promitente vendedora ainda não havia pago a quantia correspondente ao sinal, pelo que, o tribunal “a quo” também não teve dúvidas de que o recorrido beneficia de tal direito de retenção, devidamente reconhecido judicialmente, por sentença transitada em julgado e, por isso, graduou o seu crédito em primeiro lugar.
14. A matéria invocada neste recurso, já foi alegada pela recorrente em sede de recurso de apelação aquando da prolação da decisão que verificou o crédito do recorrido e, que reconheceu o seu direito de retenção, pelo que, a reapreciação desta matéria, em sede do presente recurso, consubstancia-se claramente numa repetição, pelo que deverá este Tribunal abster-se de reapreciar tal questão, pois, transitada em julgado a sentença ou o despacho saneador que decida do mérito da causa, a decisão sobre a relação material controvertida fica a ter força obrigatória dentro do processo e fora dele – artigo 619.º, n.º 1 do Código de Processo Civil.
15. A exceção de caso julgado destina-se a evitar uma nova decisão inútil, por razões de economia processual, o que implica uma não decisão sobre a nova ação, pressupondo a tríplice identidade de sujeitos, objeto e pedido e, por sua vez, a autoridade de caso julgado importa a aceitação de uma decisão proferida em acção anterior, que se insere, quanto ao seu objeto, no objeto da segunda, visando obstar a que a relação ou situação jurídica material definida por uma sentença possa ser validamente definida de modo diverso por outra sentença, não sendo exigível a coexistência da tríplice identidade prevista no artigo 498.º do Código de Processo Civil – cfr. Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação do Porto, de 11.10.2018.
16. Por força da autoridade de caso julgado, impõe-se aceitar a decisão proferida no primeiro processo, na medida em que o núcleo fulcral das questões de direito e de facto ali apreciadas e decididas são exatamente as mesmas que se pretende ver apreciadas e discutidas no âmbito de um segundo processo, razão pela qual, o que tem relevância para o presente caso é a autoridade de caso julgado, e nunca a exceção de caso julgado.
17. A sentença que reconhece o direito de retenção do promitente-comprador sobre imóvel hipotecado não afeta a existência, a validade e/ou a consistência jurídica do direito do credor hipotecário; afeta apenas a consistência prática/económica deste direito, na medida em que o direito de retenção é graduado à frente da hipoteca – cfr. acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Guimarães, de 19.06.2016 e Tribunal da Relação do Porto, no acórdão de 21.10.2008 – e, por isso, o credor hipotecário é um terceiro juridicamente indiferente, razão pela qual aquela sentença de reconhecimento do direito de retenção faz caso julgado contra si, sendo-lhe, por essa razão, oponível.
18. Entende Oliveira Ascensão, in Lições de Direitos Reais, página 77 que, sendo o direito de retenção um direito real de garantia, é oponível a todos, gozando de eficácia tendencialmente absoluta, e fazendo impender sobre todos um dever genérico de nada fazer que perturbe o gozo do seu titular, pelo que, a decisão proferida no âmbito do processo n.º 13549/17.7T8PRT na qual se reconheceu o direito de retenção do aqui apelado sobre o imóvel da qual se encontra registada a hipoteca a favor do apelante, não causa qualquer prejuízo à recorrente, uma vez que deixa íntegra a consistência jurídica do direito do credor hipotecário, pois não lhe retira a sua garantia legal, causando, apenas, um prejuízo de facto ou económico, já que irá graduar em primeiro lugar o crédito do apelado, por beneficiar do direito de retenção.
19. Inexistindo o prejuízo jurídico, mas apenas um prejuízo económico, a sentença que reconhece ao promitente-comprador um direito de crédito sobre o promitente-vendedor e, consequentemente, o direito de retenção sobre o imóvel prometido, pode ser invocada sobre o credor hipotecário – cfr. acórdão proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça, em 16.03.1999.
20. A decisão do tribunal “a quo” ao ter reconhecido o direito de retenção não violou qualquer princípio constitucional da proteção da confiança e segurança jurídica, porquanto, já o Supremo Tribunal de Justiça, no acórdão de fixação de jurisprudência n.º 4/2014, veio referir que essa solução jurídica não afeta qualquer princípio constitucional.
21. O credor hipotecário não tinha de ter intervenção naqueles autos onde foi reconhecido o direito de retenção do aqui apelado, pois, apesar de manter interesse na impugnação do crédito invocado pelo recorrido, a verdade é que aquela, não teve, como não teria de ter, qualquer intervenção em sede declarativa, já que esta se desenvolveu apenas entre o recorrido e a executada H…, com vista, no que aqui interessa, à resolução do contrato-promessa por culpa imputável à executada, ao pagamento do sinal e reconhecimento do direito de retenção do imóvel prometido vender a favor do recorrido.
22. A decisão proferida nos autos n.º 13549/17.7T8PRT pelo Juízo Central Cível da Póvoa de Varzim – Juiz 5, na qual se reconheceu o direito de retenção sobre o imóvel objeto do contrato a favor do apelado, é-lhe totalmente oponível à recorrente e, por isso, ao abrigo do disposto no artigo 759.º, n.º 1 e 2 do Código Civil, recaindo o direito de retenção sobre coisa imóvel, o respetivo titular, enquanto não entregar a coisa retida, tem a faculdade de a executar, nos mesmos termos em que o pode fazer o credor hipotecário, e de ser pago com preferência aos demais credores do devedor, sendo certo que, o direito de retenção prevalece neste caso sobre a hipoteca, ainda que esta tenha sido registada anteriormente.
23. O tribunal “a quo” detinha as condições essenciais e necessárias para a prolação da presente decisão, pois, tendo em consideração que existe uma sentença na qual confere ao apelado o direito de crédito sobre a executada H…, no montante de €67.000,00, bem como o respetivo direito de retenção sobre o imóvel objeto do contrato-promessa de compra e venda, dúvidas não restam que, por um lado, esse direito de retenção existe e, por outro lado, que o mesmo é oponível ao credor hipotecário, por força das disposições legais aplicáveis – artigo 759.º do Código Civil.
24. O direito de retenção está previsto no artigo 755.º, n.º 1, alínea f) do Código Civil, o qual estabelece que gozam ainda do direito de retenção o beneficiário da promessa de transmissão ou constituição de direito real que obteve a tradição da coisa a que se refere o contrato prometido, sobre essa coisa, pelo crédito resultante do não cumprimento imputável à outra parte, nos termos do artigo 442.º do Código Civil, e, assim sendo, os pressupostos gerais, explanados no artigo 754.º do Código Civil, não podem prevalecer sobre os requisitos especiais dos casos elencados no artigo 755.º do Código Civil, pois, estes referem-se a situações especiais e não aos pressupostos gerais de aplicação e reconhecimento do direito de retenção e, como tal, para o promitente comprador gozar do direito de retenção a que vem sendo feita alusão, basta que seja beneficiário da promessa de transmissão que obteve a tradição da coisa a que se refere o contrato prometido, sobre essa coisa, pelo crédito resultante do não cumprimento imputável à outra parte.
25. Na sentença proferida nos autos do processo n.º 13549/17.7T8PRT do Juízo Central Cível da Póvoa de Varzim – Juiz 5, já se encontra definitivamente decidido que o incumprimento do contrato de promessa de compra e venda celebrado entre o apelado e a executada H…, foi por facto imputável a esta última, recaindo sobre esta a obrigação de entregar o sinal em singelo e, ainda, que o apelado obteve a tradição da coisa, resta-nos concluir que os pressupostos do direito de retenção previstos no preceito especial plasmado no artigo 755.º, n.º 1, alínea f) do Código Civil se encontram verificados e preenchidos.
26. O direito de retenção a favor do promitente-comprador não exige a posse deste sobre o imóvel prometido vender, bastando-se a detenção material da coisa – acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 10.05.2018.
27. Para efeitos do disposto no artigo 755.º do Código Civil não releva a forma de tradição, pois, quando a lei não distingue, não compete ao intérprete distinguir, pelo que, temos de concluir que o direito de retenção tem prevalência sobre a hipoteca ainda que registada anteriormente e, além disso, que a decisão proferida pelo Juízo Central Cível da Póvoa de Varzim – Juiz 5 é oponível ao credor hipotecário, por força da autoridade do caso julgado, e, por estas razões, o tribunal “a quo” andou bem ao decidir pelo reconhecimento do direito de retenção do aqui apelado.
28. Este tribunal deverá, assim, usar dos seus poderes de confirmação e, consequentemente, manter a decisão proferida no passado dia 17 de julho de 2019.
Ambos os recursos foram admitidos, por despacho proferido em 8.1.2020, como apelação, a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo.
Entretanto, o Mmº Juiz “a quo” consignou o seguinte para os efeitos do art. 617º, nº 1 do Cód. de Proc. Civil:
“Salvo o devido respeito por diferente opinião, afigura-se-nos não terem sido praticadas as nulidades mencionadas nas alegações de recurso, designadamente as de omissão de pronúncia e de erro de julgamento, pelo que se decide julgar as mesmas improcedentes."
Cumpre então apreciar e decidir.

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FUNDAMENTAÇÃO
O âmbito dos recursos, sempre ressalvadas as questões de conhecimento oficioso, encontra-se delimitado pelas conclusões que neles foram apresentadas e que atrás se transcreveram – cfr. arts. 635º, nº 4 e 639º, nº 1 do Cód. do Proc. Civil.
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As questões a decidir são as seguintes:
- Apurar se a sentença em que foi reconhecido o direito de retenção do credor C… faz – ou não – caso julgado relativamente ao credor hipotecário B… que não foi parte na ação respetiva;
- Apurar se a sentença proferida em 17.7.2019 enferma de nulidade.
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Os elementos factuais e processuais relevantes para o conhecimento do presente recurso constam do antecedente relatório.
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Passemos à apreciação jurídica.
I. 1. No despacho proferido em 29.4.2019, para os efeitos do art. 791º do Cód. de Proc. Civil, o crédito reclamado por C… foi julgado verificado pela quantia de 67.000,00€, acrescida de juros de mora civis, vencidos e vincendos, reconhecendo-se ainda ao reclamante direito de retenção sobre o imóvel objeto do contrato promessa.
Posteriormente, na sentença de graduação de créditos proferida em 17.7.2019, este crédito, garantido por direito de retenção, viria a ser graduado com preferência sobre os créditos hipotecários reclamados pelo B…, SA.
No despacho datado de 29.4.2019, como fundamento da sua decisão, foi a seguinte a argumentação do Mmº Juiz “a quo” que aqui se passa a transcrever:
“O crédito reclamado por C…, foi parcialmente reconhecido por sentença transitada em julgado proferida no processo nº 13549/17.7 T8PRT, que correu os seus termos pelo Juízo Central Cível da Póvoa de Varzim, Juiz 5, tendo a executada H… sido condenada a pagar ao referido C… a quantia de €67.000,00, acrescida dos juros de mora civis, vencidos e vincendos, à taxa de 4%, a contar de 14/09/2012, até efetivo e integral pagamento, sendo ainda reconhecido ao mesmo o direito de retenção sobre o imóvel objeto da promessa até que seja efetuado o referido pagamento.
A nosso ver, com a prolação da referida sentença, ficaram prejudicadas todas as questões constantes da impugnação apresentada pelo B…, SA, salvo no que respeita ao valor do crédito que deverá considerar-se reduzido ao montante ali reconhecido.
Relativamente ao direito de retenção, com todo o respeito por diferente opinião, entendemos que o mesmo deverá ser considerado no âmbito dos presentes autos, sendo oponível aos demais credores, apesar de os mesmos não terem intervindo no processo onde esse direito foi reconhecido.
Com efeito, estabelece-se no artigo 759º, nº 1, do Código Civil, que recaindo o direito de retenção sobre coisa imóvel, o respetivo titular, enquanto não entregar a coisa retida, tem a faculdade de a executar, nos mesmos termos em que o pode fazer o credor hipotecário, e de ser pago com preferência aos demais credores do devedor, estipulando-se no seu nº 2 que o direito de retenção prevalece neste caso sobre a hipoteca, ainda que esta tenha sido registada anteriormente.
Prosseguindo a sua argumentação, o Mmº Juiz “a quo” respalda-se no Acórdão da Relação do Porto de 21.10.2008, no qual consta o seguinte: “a sentença que reconhece a existência do direito de retenção sobre coisa hipotecada não causa prejuízo jurídico ao credor hipotecário, uma vez que não afecta a existência, a validade ou a consistência jurídica do seu direito, apesar de lhe causar prejuízo económico. Por isso, essa sentença faz caso julgado quanto ao credor hipotecário não interveniente na acção respectiva, pois este é de qualificar como terceiro juridicamente indiferente e não como terceiro juridicamente interessado. A prevalência do direito de retenção sobre a hipoteca, mesmo que esta tenha sido registada anteriormente, não ofende qualquer dos princípios e valores constitucionais, como sejam o da proporcionalidade, o da igualdade e o da confiança, motivo pelo qual o art. 759º nº 2 do Cód. Civil não é de declarar inconstitucional.”[1]
Como consequência do decidido neste despacho, o Mmº Juiz “a quo” na sentença depois proferida em 17.7.2019 graduou o crédito reclamado por C… com anterioridade relativamente ao reclamado pelo B…, SA.
Ambas as decisões foram objeto de impugnação por parte do credor B…, SA, tendo este considerado, em sede recursiva, que o efeito do caso julgado formado pela sentença proferida no processo com o nº 13549/17.7 T8PRT que correu termos no Juízo Central Cível da Póvoa de Varzim não é oponível aos credores reclamantes não intervenientes nessa acção, uma vez que estes, relativamente a esta sentença, são terceiros juridicamente interessados.
2. Vejamos então.
A decisão dos recursos interpostos pelo credor hipotecário passa pela análise da questão da extensão do caso julgado a terceiros.
O princípio geral é o da eficácia relativa do caso julgado, ou seja, o da sentença só ter força de caso julgado entre as partes – cfr. art. 581º, nº 2 do Cód. de Proc. Civil.
Porém, conforme escreve Manuel de Andrade (in “Noções Elementares de Processo Civil”, 1979, pág. 312), “os terceiros têm de acatar a sentença proferida entre as partes e a correspondente definição judicial da relação litigada, quando a sentença não lhes causa qualquer prejuízo jurídico, porque deixa íntegra a consistência jurídica do seu direito, embora lhes cause um prejuízo de facto ou económico.”
A sentença, transitada em julgado, impõe-se assim àqueles que Manuel de Andrade (in ob. cit., págs. 312/3) designa como terceiros juridicamente indiferentes, mas já não se impõe aos terceiros juridicamente interessados, isto é àqueles a quem a sentença pode causar um prejuízo jurídico, invalidando a própria existência ou reduzindo o conteúdo do seu direito, e não apenas destruindo ou abalando a sua consistência prática ou económica.
No mesmo sentido, Antunes Varela[2] (in “Manual de Processo Civil”, 1984, Coimbra Editora pág. 708) refere que os terceiros juridicamente indiferentes “são as pessoas a quem a sentença não causa nenhum prejuízo jurídico, por não bulir com a existência ou validade do seu direito, embora possa afectar a sua consistência prática ou económica.”
Por seu turno, Jacinto Rodrigues Bastos (in “Notas ao Código de Processo Civil”, vol. III, 3ª ed., pág. 201) escreve que “todos estão obrigados a reconhecer o caso julgado entre as partes; o que não podem, em regra, é ser prejudicados por ele, entendendo-se tal prejuízo como um prejuízo de natureza jurídica e não um mero prejuízo de facto.”[3]
Como exemplo de terceiros juridicamente indiferentes, Manuel de Andrade aponta o caso dos credores relativamente às sentenças proferidas nos pleitos em que seja parte o seu devedor. Tais sentenças, escreve (in ob. e loc. cit.), “não invalidam o seu direito nem lhe cerceiam a entidade jurídica. Apenas podem afectar-lhe a consistência prática, enquanto reduzam o património do devedor e, por consequência, a sua solvabilidade.”
3. Uma vez feitas estas considerações, há então que apurar se em relação à sentença proferida no processo com o nº 13549/17.7 T8PRT do Juízo Central Cível de Póvoa de Varzim, em que foi reconhecido direito de retenção ao credor reclamante C…, o credor hipotecário B…, S.A. deve ser encarado como terceiro juridicamente indiferente ou terceiro juridicamente interessado.
Tal como se referiu no dito acórdão da Relação do Porto de 21.10.2008 (proc. 0822499, disponível in www.dgsi.pt), que foi relatado pelo presente relator, trata-se de questão de difícil resposta e que tem conduzido a posições jurisprudenciais divergentes.
Ora, seguindo-se a orientação adotada nesse acórdão, seria de considerar que, relativamente à sentença proferida no dito processo nº 13549/17.7T8PRT que condenou a aqui executada H… a pagar a C… a importância de 67.000,00€, acrescida de juros de mora vencidos e vincendos e reconheceu a este direito de retenção sobre o imóvel em causa nos autos, o “B…, S.A.” se configurará como terceiro juridicamente indiferente, sendo-lhe, por isso, oponível tal sentença.
Com efeito, entendeu-se aí que o reconhecimento do direito de retenção ao crédito reclamado por C… e a correspondente baixa de lugar na graduação de créditos do reclamado pelo “B…, S.A.” não afeta juridicamente o direito deste, uma vez que este continua o mesmo, com o mesmo conteúdo e a mesma garantia hipotecária.
É que a circunstância de o direito do “B…, S.A.” ter sido afetado na ordem da graduação de créditos, passando a situar-se abaixo do reclamado por C…, não representa para aquela um prejuízo de natureza jurídica, mas tão só um prejuízo meramente fáctico, de ordem apenas económica.
Na verdade, o que sucederá é que antes do crédito do “B…, S.A.”, que ascende a 95.455,68€, acrescido de juros, se colocará o crédito de C…, no valor de 67.000,00€, o que, no caso “sub judice”, significará uma maior vulnerabilização económica, que não jurídica, do direito do “B…, S.A.”.
Ou seja, o crédito deste relativamente à executada H… mantém-se nos seus precisos termos, tal como se mantém a respetiva garantia hipotecária, mas a sua consistência económica surge agora como mais vulnerável face ao direito de retenção de que beneficia o crédito de C….
4. Nesse acórdão da Relação do Porto de 21.10.2008, relatado por este mesmo relator como já se mencionou, referenciaram-se em apoio da solução aí adotada os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 24.3.1992 (in BMJ, nº 415, págs. 622/632), de 12.1.1993 (in BMJ nº 423, págs. 463/473) e de 16.3.1999 (in BMJ nº 485, págs. 356/360)[4].
Porém, para além destes, existiam ainda outros arestos do nosso mais alto tribunal em sentido semelhante como sejam os Acórdãos de 3.6.2003 (proc. 03A1432) e de 2.7.1998 (proc. 99B084), disponíveis in www.dgsi.pt.[5]
Posteriormente, em sentido idêntico, referenciamos também os Acórdãos da Relação do Porto de 26.5.2011 (proc. 395/09.0TBSJM-B.P1) e de 13.1.2015 (proc. 5729/09.5YIPRT-C.P1), da Relação de Évora de 14.6.2012 (proc. 3052/10.1TBSTR-C.E1) e da Relação de Guimarães de 19.5.2016 (proc. 734/10.1TBPRG-A.G1), todos disponíveis in www.dgsi.pt.
5. Contudo, mais de dez anos volvidos sobre o Acórdão da Relação do Porto de 21.10.2008, constata-se que a orientação do Supremo Tribunal de Justiça é hoje diferente da antes maioritária, como resulta desde logo do Acórdão proferido em 20.5.2010 (proc. 13465/06.8YYPRT-A.P1.S1, disponível in www.dgsi.pt), onde a propósito de situação idêntica à dos presentes autos, e da consequente qualificação como terceiro juridicamente interessado ou indiferente do credor hipotecário em relação à sentença que reconheceu a um outro credor direito de retenção sobre o imóvel penhorado, se entendeu que esta sentença afeta aquele direito hipotecário, na medida em que vê colocar-se-lhe à sua frente um outro crédito, que, assim, goza de prioridade de pagamento, tendo, igualmente, reduzido o património da executada.
Por isso, esta sentença não é oponível ao credor hipotecário.
É certo que a sentença não põe em causa a existência ou a validade do direito hipotecário do credor “B…, S.A.”, mas não afeta só a sua consistência prática, face à restrição ou à redução do património da executada. Afeta também a sua consistência jurídica, porquanto o confronta com o direito de um terceiro, juridicamente interessado, de algum modo incompatível com o direito de retenção reconhecido ao exequente.
Com efeito, se não existisse o direito de retenção, a hipoteca conferia ao reclamante “B…, S.A.” o direito de ser pago pelo valor de certas coisas imóveis, ou equiparadas, pertencentes ao devedor ou a terceiro, com preferência sobre os demais credores que não gozem de privilégio especial ou de prioridade de registo, atento o disposto pelo artigo 686º, nº 1 do Cód. Civil, sendo que o direito de retenção em análise prevalece sobre a hipoteca, ainda que esta tenha sido registada, anteriormente, como decorre do preceituado pelo artigo 759º, nº 2 do mesmo diploma.
“É que a concorrência de um crédito hipotecário com um crédito garantido pelo direito de retenção não se situa no mesmo plano do crédito comum que vê reconhecido outro crédito comum, hipótese esta em que a concorrência entre ambos se efectua, em igualdade de circunstâncias, e em que o único prejuízo do primeiro se traduz em poder não ser, totalmente, pago, tendo de ratear com o outro crédito o produto da garantia patrimonial do devedor, ao passo que, naquela primeira situação, se verifica uma graduação entre tais créditos, com prevalência do segundo, podendo, inclusivamente, acontecer que, pago este crédito, nada reste já para satisfazer o crédito hipotecário.
Aliás, mesmo antes deste possível prejuízo económico, já existia um efectivo prejuízo jurídico, na medida em que o valor potencial da hipoteca foi, desde logo, diminuído, com a declaração da existência do direito de retenção, que ficou situado numa ordem de pagamento preferente, em relação ao crédito hipotecário.”
Concluiu-se, assim, no referido Acórdão do STJ de 20.5.2010, cuja argumentação temos vindo a seguir, que a sentença que reconheceu o direito de retenção sobre o imóvel penhorado não formou caso julgado quanto ao credor hipotecário, sendo-lhe inoponível, uma vez que tal equivaleria a criar um direito, em desfavor deste credor, sem que o mesmo tivesse tido a possibilidade de defender a prioridade do seu crédito, até contra eventuais e hipotéticos conluios existentes entre as partes naquela acção.
Neste mesmo sentido, surgem os Acórdãos do STJ de 7.10.2010 (proc. 9333/07.4TBVNG-A.P1.S1), de 24.11.2015 (proc. 7368/10.9TBVNG-C.P2.S1), de 12.4.2018 (proc. 622/08.1TBPFR-A.P1.S1) e de 24.10.2019 (proc. 6906/11.4YYLSB-A.L1.S2), da Relação do Porto de 23.3.2017 (proc. 103/09.6TBALB-A.P1), de 27.11.2017 (proc. 909/15.7T8AMT-A.P1) e de 11.7.2018 (proc. 128/15.2T8VNG-B.P1), da Relação de Lisboa de 3.4.2014 (proc. 1149/13.5TJLSB-A.L1-2) e de 15.3.2018 (proc. 11159/14.0T2SNT-A.L1-8), da Relação de Guimarães de 21.9.2017 (proc. 954/13.7TJVNF-A.G1) e de 10.7.2019 (proc. 503/14.0T8CHV-A.G1) e da Relação de Évora de 12.4.2018 (proc. 57/09.9T2 STC-C.E1), todos disponíveis in www.dgsi.pt.
6. Confrontado então com aquela que é hoje a orientação jurisprudencial claramente maioritária dos nossos tribunais superiores e com a argumentação que tem vindo a ser adotada por estes, entende o presente relator ser de alterar a sua posição sobre a questão colocada nestes recursos.
Sobre ela haverá que aludir ainda ao que foi escrito por José Lebre de Freitas (In R.O.A., Ano 66-2006 – Vol. II – Setembro 2006, Doutrina, “Sobre a prevalência, no apenso de reclamação de créditos, do direito de retenção reconhecido por sentença”, “Extensão subjectiva da eficácia da sentença sobre o direito de retenção” e “Legitimidade para impugnar o direito de retenção na acção de verificação e graduação de créditos”), que se passa a citar[6]:
“7.1. No âmbito da extensão subjectiva da sua eficácia, a sentença só pode ser posta em causa mediante recurso de revisão, destinado a obter a sua revogação (art. 771 CPC), sem prejuízo, se ocorrerem os respectivos pressupostos, do recurso de oposição de terceiro (art. 778 CPC)[7].
Mas o recurso a estes meios processuais só é necessário e adequado na medida em que quem deles queira lançar mão seja abrangido pela eficácia do caso julgado.
Não é o caso do credor hipotecário cujo direito de garantia se tenha constituído antes do direito de retenção, autor da acção declarativa.
A consagração constitucional do direito de defesa tem como corolário que o caso julgado não possa produzir-se contra quem não tenha tido oportunidade de intervir no processo em que a sentença é proferida, pelo que a sujeição de terceiros ao regime definido na sentença não é uma sujeição à autoridade do caso julgado, mas tão-só à eficácia da sentença, e circunscreve-se no plano dos efeitos práticos ou de facto, não podendo um terceiro ver afectada a existência ou o conteúdo dum seu direito. Independentemente da possibilidade de invocação do caso julgado favorável em certos casos de contitularidade ou dependência de situações jurídicas em que a lei o alarga a terceiros secundum eventum litis e da produção do caso julgado perante terceiros que, citados para intervir na causa, não o quiserem fazer, a limitação subjectiva do âmbito do caso julgado faz-se em termos paralelos aos da circunscrição da eficácia do negócio jurídico pelas regras da legitimidade ou, segundo a doutrina tradicional, pela regra res inter allios acta aliis nec nocere nec prodesse potest, pelo que a sentença acerta as situações jurídicas das partes entre si com a mesma eficácia com que elas próprias o poderiam fazer celebrando um negócio jurídico à data em que ela é proferida e a produção dos seus efeitos perante terceiros limita-se aos casos em que estes estão sujeitos pelo direito substantivo às consequências do exercício dos poderes dispositivos da parte.
Assim se explica que terceiros juridicamente indiferentes, mas titulares de direitos cuja consistência prática pode ser afectada pela decisão, sejam abrangidos pela eficácia da sentença. É o caso do credor comum da parte na acção de reivindicação, que, não podendo impedir o acto (extrajudicial) de alienação dum bem do seu devedor, não obstante a consequente diminuição da garantia patrimonial do seu crédito, tão-pouco pode pôr em causa a sentença que reconheça o direito da outra parte sobre o bem reivindicado ou que lho atribua com base no exercício dum seu direito potestativo (execução específica, preferência, partilha ou divisão de coisa comum).
Assim se explica também que terceiros (juridicamente interessados) titulares de situações jurídicas dependentes, já não apenas na sua consistência prática mas na sua própria existência ou conteúdo, da situação jurídica da parte, não possam discutir a questão coberta pelo caso julgado, quando a subsistência ou o conteúdo dessa sua situação jurídica também extrajudicialmente podia ser afectado por via da manifestação de vontade negocial da parte na relação jurídica de que a sua situação depende. É o caso do subcontratante, tal como o sublocatário ou o subempreiteiro, cuja posição contratual se extingue com a extinção da locação ou da empreitada, inclusivamente por acto de vontade do locatário (resolução, nos termos do art. 1050 CC; denúncia, nos termos dos arts. 1054-1 CC e 1055 CC; revogação por acordo com o locador), do dono da obra (desistência, nos termos do art. 1229 CC; resolução, nos termos gerais dos arts. 432 CC e 801-2 CC) ou do empreiteiro (resolução, nos termos gerais; revogação por acordo com o dono da obra), e que, por isso, resultará também extinta por via de sentença que anule ou declare a nulidade da locação ou da empreitada ou verifique a sua extinção.
Mas já quando o terceiro é titular duma situação jurídica dependente da da parte principal, mas sem que esta a possa negativamente afectar por via negocial, ou duma situação jurídica paralela, concorrente ou independente e incompatível com a da parte principal, por isso nunca afectável negativamente por uma actuação negocial desta, o caso julgado não pode ser contra ele invocado.
Facilmente se vê, em face destes princípios, que não é oponível ao credor hipotecário a sentença que, em acção que tenha corrido entre o promitente comprador e o promitente vendedor, ou entre o empreiteiro e o dono da obra feita no prédio hipotecado, reconheça o direito de retenção do primeiro.
7.2. O direito real de garantia, uma vez validamente constituído, não está, na sua existência ou conteúdo, sujeito às vicissitudes da actuação negocial do devedor ou do proprietário do bem (ou titular de direito real menor sobre ele) que negativamente o possam afectar.
(…)
Ora ao conteúdo do direito real de garantia, que implica a afectação especial duma coisa ao pagamento duma dívida, com preferência do credor sobre os demais credores que, por lei, não lhe devam preferir, é inerente a posição do credor na graduação de créditos. (…) Uma das características do direito real, inerente à sua natureza de direito absoluto, é, precisamente, a preferência ou prevalência de que é dotado em face dos outros direitos; ela surge também como característica do direito real de garantia, mas desta vez como factor de resolução do fenómeno da sua concorrência com outros direitos da mesma natureza incidentes sobre a mesma coisa; em especial, o grau hipotecário de tal modo faz parte do conteúdo do direito de hipoteca que pode ser objecto de cessão autónoma a outro credor hipotecário (art. 729 CC). Portanto, a sentença de que resulte que outro direito real deve sobre ele prevalecer afecta-o no seu conteúdo e consistência jurídica. Do titular do direito real de garantia nunca se pode dizer que é um terceiro juridicamente indiferente a uma sentença que afecte o grau da sua garantia. Na realidade, a relação jurídica de garantia real é, ao mesmo tempo que dependente da relação de crédito que garante (como resulta do art. 717-2 CC), independente e incompatível em face de outras relações de garantia que tenham por objecto o mesmo bem.
Em contrário, não se pode vir dizer que não há incompatibilidade porque, reconhecido, por exemplo, o direito de retenção, o direito de hipoteca continua a existir, embora graduado depois dele. Do mesmo modo, dir-se-ia então que não há incompatibilidade entre o direito de propriedade e o direito de usufruto ou de servidão, visto que a existência deste não extingue a propriedade, que permanece não obstante a existência de usufruto ou servidão alheia sobre o bem próprio; ou entre o direito de propriedade e o direito de hipoteca, visto que o proprietário conserva o seu direito sobre o bem hipotecado; ou ainda entre o direito de usufruto e o direito de servidão ou de superfície. Na realidade, são entre si incompatíveis todos os direitos reais incidentes sobre a mesma coisa, sejam eles de gozo ou de garantia, pois, ainda que possam coexistir, esta coexistência diminui a utilidade que cada um dos titulares pode tirar da coisa, por afectar quer a extensão do uso e fruição da coisa (pelo titular do direito real de gozo), quer o valor que, através de um acto de alienação, dela pode ser extraído (pelo titular do direito real de gozo ou pelo titular do direito real de garantia).
(…)
Por fim, o art. 869-5 CPC[8], ao impor o litisconsórcio necessário passivo de exequente, executado e restantes credores reclamantes na acção autónoma que o credor com garantia real que não tenha título executivo deve propor para ser admitido a reclamar, mostra bem que o credor com garantia real não é nunca um terceiro juridicamente indiferente.
Não é, pois, invocável perante o credor hipotecário a sentença que, com trânsito em julgado, tenha declarado, em acção em que o credor hipotecário não foi parte, a existência de direito de retenção alheio sobre o imóvel hipotecado, inclusivamente a favor do promitente comprador do imóvel ou fracção ou do empreiteiro que nele construiu um prédio urbano.”
E “8.1. Não sendo contra ele invocável a sentença que declare a existência de direito de retenção sobre a coisa hipotecada em acção movida pelo respectivo titular contra o promitente vendedor ou o dono de obra, não carece o credor hipotecário de dela recorrer extraordinariamente, nem de mover acção declarativa própria. Todas as questões contra a verificação do direito de retenção podem ser levantadas na acção de verificação e graduação de créditos. (…). O credor hipotecário pode assim pôr directamente em causa o direito de retenção nos termos gerais, isto é, mediante impugnação dos factos alegados pelo empreiteiro, na petição da acção executiva por ele proposta ou na petição da acção de verificação e graduação de créditos, em que reclame, ou mediante sustentação da respectiva inconcludência; e, constituindo a existência do crédito garantido pressuposto do direito de retenção, ela mesma pode ser impugnada pelo credor hipotecário, embora com as limitações adiante referidas.”
7. Deste modo, alterando o presente relator a sua posição por força da jurisprudência e doutrina acabadas de referenciar, adere-se pois ao entendimento, hoje maioritário, segundo o qual não é oponível ao credor hipotecário a sentença que, embora com trânsito em julgado, haja declarado, em ação na qual este não foi parte, a existência de direito de retenção alheio sobre o imóvel hipotecado, neste caso a favor do respetivo promitente-comprador.
Por isso, todas as questões que contendam com a verificação deste direito de retenção podem ser levantadas na ação de verificação e graduação de créditos, como o foram, no presente caso, pelo credor hipotecário B…, S.A. em sede de impugnação ao crédito reclamado por C….
Como tal, o credor hipotecário tem assim a possibilidade de pôr diretamente em causa o direito de retenção invocado pelo credor reclamante mediante impugnação dos factos alegados na respetiva reclamação de créditos ou sustentando a sua inconcludência.[9]
Consequentemente, como a sentença proferida no processo com o nº 13549/17.7T8PRT do Juízo Central Cível de Póvoa de Varzim, Juiz 5, embora transitada em julgado, não é oponível ao credor hipotecário B…, S.A., impõe-se a revogação do despacho proferido em 10.5.2019 na parte em que julgou verificado o crédito reclamado por C… pelo montante de 67.000,00€ e reconheceu a este direito de retenção sobre o imóvel objeto do contrato-promessa, com base apenas naquela sentença.
Os autos terão pois que seguir os seus termos, mas apenas no segmento destinado a apurar da existência do direito de retenção invocado pelo credor reclamante C…, sendo também revogada a posterior sentença de graduação de créditos, datada de 17.7.2019 na parte relativa ao imóvel descrito na Conservatória do Registo Predial do Porto sob o nº 428/19900122 (freguesia …).
O recurso interposto pelo credor hipotecário B…, S.A. em 31.5.2019, com a referência 32602911, obterá assim procedência, o mesmo sucedendo com o posterior recurso de 4.10.2019, com a referência 33602898.
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Quanto à questão relacionada com o eventual cometimento de nulidades na sentença proferida em 17.7.2019, há a referir que a mesma se encontra prejudicada pelo modo como foi solucionada a questão essencial colocada nos dois recursos interpostos pelo credor hipotecário “B…, S.A.” – cfr. art. 608, nº 2 do Cód. de Proc. Civil.
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Sumário (da responsabilidade do relator – art. 663º, nº 7 do Cód. de Proc. Civil):
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DECISÃO
Nos termos expostos, acordam os juízes que constituem este tribunal em julgar procedentes os recursos de apelação interpostos pelo credor hipotecário “B…, S.A.”, com as referências 32602911 e 33602898, e em consequência:
- Revoga-se o despacho proferido em 10.5.2019 na parte em que julgou verificado o crédito reclamado pelo credor C… pelo montante de 67.000,00€ e reconheceu a este direito de retenção sobre o imóvel objeto do contrato-promessa, com base apenas na sentença proferida no processo com o nº 13549/17.7 T8PRT do Juízo Central Cível de Póvoa de Varzim – Juiz 5;
- Revoga-se a sentença de graduação de créditos proferida em 17.7.2019 na parte relativa ao imóvel descrito na Conservatória do Registo Predial do Porto sob o nº 428/19900122 (freguesia …);
- Determina-se que os autos sigam os seus termos apenas no segmento destinado a apurar da existência do direito de retenção invocado pelo credor reclamante C….
As custas do recurso com a referência 32602911 serão suportadas pelo recorrido.
As custas do recurso com a referência 33602898 serão suportadas conforme vencimento a final.

Porto, 19.5.2020
Rodrigues Pires
Márcia Portela
José Igreja Matos
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[1] Esta citação corresponde ao respectivo sumário.
[2] Com Miguel Bezerra e Sampaio e Nora.
[3] No mesmo sentido cfr. ainda Anselmo de Castro, “Direito Processual Civil Declaratório”, vol. III, pág. 386.
[4] Escreveu-se o seguinte no sumário deste último acórdão: “I – A sentença que reconhece o direito de retenção sobre coisa hipotecada não causa prejuízo jurídico ao credor hipotecário, pois que a sentença não afecta a existência, a validade ou consistência jurídica do seu direito, embora lhe causa um prejuízo de facto ou económico. II – A sentença é, por isso, oponível ao credor hipotecário não interveniente na acção, o qual é de qualificar como terceiro juridicamente indiferente e não como terceiro juridicamente interessado. III – Na execução da sentença, o crédito que goza do direito de retenção é graduado com preferência sobre o direito garantido pela hipoteca, nos termos do artigo 759º, nº 2, do Código Civil (…)”.
[5] Cfr., em sentido contrário, Ac. Rel. Coimbra de 2.3.2004, CJ, XXIX, II, págs. 8/11 e Ac. STJ de 10.10.1989, BMJ nº 390, págs. 363 e segs.
[6] Apud Ac. Rel. Lisboa de 3.4.2014, proc. 1149/13.5 TJLSB-A.L1-2, disponível in www.dgsi.pt.
[7] Reporta-se ao anterior Cód. de Proc. Civil.
[8] Que corresponde ao art. 792º, nºs 4 e 5 do atual Cód. de Proc. Civil, onde se estatui o seguinte: «4. Quando o executado negue a existência do crédito, o credor obtém na ação própria sentença exequível, reclamando seguidamente o crédito na execução. 5. O exequente e os credores interessados são réus na ação, provocando o requerente a sua intervenção principal, nos termos dos artigos 316º e seguintes, quando a ação esteja pendente à data do requerimento.»
[9] Porém, se o credor hipotecário, mesmo que não abrangido pela eficácia do caso julgado formado na acção declarativa anterior, não tivesse impugnado o crédito garantido pelo direito real de retenção, este sempre se deveria ter como reconhecido, nos termos do disposto pelo artigo 791º, nºs 2 e 4 do Cód. de Proc. Civil – cfr. Ac. STJ de 20.5.2010, proc. 13465/06.8YYPRT-A.P1.S1, disponível in www.dgsi.pt.