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EMBARGOS DE TERCEIRO
SOLIDARIEDADE
RELAÇÕES INTERNAS
CONTAS DE DEPÓSITO
VALORES MOBILIÁRIOS ASSOCIADOS
Sumário
I- Na reapreciação da decisão da matéria de facto impõe-se à Relação, enquanto instância de recurso também quanto aos factos, observar o disposto no art.º 662.º do C.P.C., pelo que, não estando limitada pelos depoimentos e demais provas que lhe tenham sido indicados pelo recorrente, e/ou pelo recorrido, avalia livremente todas as provas carreadas para os autos, valorando-as e ponderando-as com recurso às regras da experiência, aos critérios da lógica, aos seus conhecimentos das pessoas e das coisas, no sentido de formar a sua própria convicção.
II- As provas têm por função a demonstração da realidade dos factos, não sendo, porém, de exigir que essa demonstração conduza a uma verdade absoluta (objectivo que seria impossível de atingir) mas tão-só a um elevado grau de probabilidade, suficiente para as necessidades práticas da vida.
III- Os co-titulares de uma conta bancária solidária, nas suas relações internas, presumem-se comparticipantes em partes iguais no saldo, valendo a presunção consagrada no art.º 616.º do C.C..
IV- Porém, uma vez que a propriedade da quantia depositada pode pertencer apenas a um deles, tem de se admitir que aquele a quem ela pertença faça prova do seu direito, com o que aquele que se arroga a posição de dono exclusivo do saldo tem de fazer a prova de que ele lhe pertence na totalidade, não sendo suficiente a simples contraprova.
V- Constituindo os Embargos de Terceiro o instrumento processual adequado para o co-titular de uma conta bancária, que não é parte na execução, reagir contra uma penhora que incide sobre a totalidade do saldo de um depósito bancário, mesmo não conseguindo ele provar que tem a propriedade exclusiva sobre o total do saldo, justifica-se o levantamento da penhora, como requereu, na parte em que excede a quota parte do executado.
Texto Integral
ACORDAM EM CONFERÊNCIA NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES
A) RELATÓRIO
I.- R. C., residente em …, Fafe, requereu os presentes Embargos de Terceiro contra a “Caixa ...”, com sede em Lisboa, e Outros, dentre os quais M. C., por apenso à execução comum, para pagamento de quantia certa, que aquela move a estes, pedindo que:
a) seja declarado e reconhecido o seu direito de propriedade exclusivo sobre a quantia de € 20.000, aplicada em títulos da Caixa …, constantes da conta penhorada; e
b) se ordene o levantamento da penhora que incide sobre a referida conta bancária e os títulos.
Fundamenta alegando, em síntese que a quantia penhorada na conta de depósitos à ordem da Caixa…, com a identificação nº ......., na quantia de € 20.000,00, aplicada em títulos, lhe pertence, sendo proveniente da conta nº 030002826...., do mesmo Banco, e representa as suas poupanças e a sua pensão de reforma, sendo que a executada M. C., sua filha, figura em tal conta bancária, mas nunca a utilizou, movimentou, nem depositou qualquer quantia própria na mesma, cujo saldo sempre pertenceu na totalidade à embargante.
A embargada “Caixa ... – Caixa...” contestou pronunciando-se pela total improcedência dos embargos ou, caso assim se não entenda, que os mesmos embargos sejam procedentes apenas na quota-parte do valor pertencente à Embargante, ordenando-se que esta venha aos autos indicar quem são os herdeiros do falecido J. A., para se apurar a quota-parte da Executada.
Procedeu-se ao julgamento que culminou com a prolação de douta sentença que julgando os embargos improcedentes, decidiu manter a penhora sobre os valores mobiliários na quantidade de 19.997.98, no valor de € 19.997,98, associado à conta PT ........
Inconformada, traz a Embargante o presente recurso, pedindo a revogação daquela decisão e a sua substituição por outra que julgue os embargos procedentes ou, se assim se não entender, os julgue parcialmente procedentes, atendendo à presunção legal constante do art.º 516.º do C.C., mantendo-se a penhora apenas e somente sobre a quota-parte da co-titular, nos termos do disposto no art.º 780.º, n.º 5, do C.P.C..
Não foram oferecidas contra-alegações.
O recurso foi recebido como de apelação, com efeito devolutivo.
Colhidos, que se mostram, os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.
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II.- A Apelante/Embargante formulou as seguintes conclusões:
i. Recurso da matéria de facto:
1- A apelante discorda do tratamento fáctico-jurídico dado pelo Tribunal a quo aos aspetos contidos nas alíneas a) e b) dos factos dados como não provados.
2- No seu entender, tais factos estão ali erradamente inseridos, pelo que deveriam passar a constar dos factos dados como provados.
3- Da análise do material probatório produzido, existe evidência testemunhal e prova documental clara e autêntica de que os valores mobiliários que foram penhorados no valor de € 19.997,98, associado à conta PT ......., e que se tratam de obrigações subscritas por M. C. (filha da embargante), trata-se de dinheiro pertencente exclusivamente à embargante.
4- Acontece que, como a embargante não tem qualificações, apenas sabe escrever o seu nome e mal sabe ler, pediu à sua única filha, M. C., que ficasse a constar como titular nas contas bancárias, delegando tais assuntos nesta, para que esta aplicasse e movimentasse o seu dinheiro.
5- Tanto assim é que, como resultou provado no número 2), tal quantia, antes de ser aplicada naqueles títulos encontrava-se depositada na conta nº 0300 02826…, possuindo três titulares, designadamente, J. A., marido da embargante e pai da embargada executada, já falecido, a embargante e a embargada M. C..
6- Pelo que a conta bancária e os valores ali depositados e aplicados em títulos, são propriedade exclusiva da Embargante, ora recorrente, que exerce sobre as mesmas uma posse real e efetiva.
7- Assim sendo, a recorrente não se conforma com o facto dado como não provado na alínea a), nomeadamente, que não tenha resultado provado que a quantia de 20.000,00€ (mais concretamente € 19.997,98), aplicada em títulos e a conta bancária penhorada, lhe pertencem exclusivamente, e que tal dinheiro tenha provindo de poupanças efetuadas pela própria e da sua pensão de reforma.
8- A este propósito, atente-se ao depoimento da testemunha V. C., que prestou um depoimento genuíno e esclarecedor da maior parte dos factos.
Explicou ao Tribunal a quo que, na referida conta bancária apenas estavam depositados montantes provenientes das poupanças da sua avó durante a vida, bem como de uma herança que havia recebido, no montante de 15.000,00€. (Extrato de depoimento [00:03:24 a 00:04:43]);
9- Dúvidas não subsistem, de que do saldo de € 19.997,98 existente na conta bancária, € 15.000,00 advieram à posse da embargante por via de uma herança que recebeu, sendo certo que, no que toca ao restante montante, muito embora a testemunha não tenha especificado a proveniência de tais poupanças, pela lógica e senso comum, facilmente se chega à conclusão que resultam da sua pensão de reforma, pois eram os únicos proventos que recebia.
10- Acresce que, o depoimento da referida testemunha, tem ainda relevância no esclarecimento dos factos, pois como clarificou ao Tribunal recorrido, a embargada M. C., só fazia parte da conta bancária como titular da mesma, devido à idade avançada da sua mãe, e pelo facto desta apenas saber escrever o seu nome e ler muito mal, pelo que, devido a tais limitações, era aquela que a acompanhava na sua vida diária, nomeadamente em todas as questões relativas ao banco, tais como gerir e movimentar o seu dinheiro. (Extrato de depoimento [00:06:30 a 00:07:04]);
11- É importante que se refira que a questão da propriedade do dinheiro depositado é distinta e independente do regime de movimentação dos depósitos.
12- A abertura de uma conta solidária confere a todos os titulares a faculdade de mobilizar os fundos depositados na conta, mas não pré-determina a propriedade dos ativos contidos nesta, que poderão ser da exclusiva propriedade de um ou de alguns titulares de conta, ou inclusive, de um terceiro.
13- Da análise do depoimento da testemunha, constata-se que no caso dos autos estamos perante uma conta bancária de uma pessoa muito idosa, que já não reúne condições físicas para tratar dos seus assuntos bancários e da gestão do seu dinheiro, que insere como contitular a única filha, e também em consonância com aquilo que é uma finalidade comum, que é facilitar e garantir o acesso aos valores em caso de urgência. Já em vida do seu marido, a filha havia sido incluída como contitular com esse propósito e não para os valores depositados passarem a ser, também, desta contitular. Foi dada continuidade a esse modo de proceder e não existe um único indício contrário que belisque a prova produzida.
14- Consequentemente, e por força do sobredito, o facto dado como não provado na alínea a), deve passar a constar da matéria de facto dada como provada.
15- De igual modo, não pode a recorrente concordar com o facto dado como não provado na alínea b), pois não decorre da prova produzida que a embargada M. C., tenha procedido a qualquer depósito de dinheiro nas referidas contas bancárias.
16- Mais uma vez, o depoimento da testemunha V. C., foi prestado de forma serena e humilde, revelando-se crucial para a apreciação da aludida factualidade, pois assegurou ao Tribunal que a sua mãe M. C. (embargada) e o seu pai não tinham quaisquer poupanças ou depósitos bancários, e que o dinheiro que tinham era apenas o que auferiam dos vencimentos, não possuindo outros bens.
17- Aliás, a dita testemunha explicou a situação económica precária dos seus progenitores, nomeadamente o facto de a mãe não possuir emprego fixo (anual), e que o seu pai era afinador de máquinas, mas que já tinha atravessado um processo de insolvência de uma empresa. (Extrato de depoimento [00:04:45 a 00:06:26] e [00:07:04 a 00:07:54]);
18- Ora, esta situação precária da embargada M. C. e do seu marido, foi corroborada pela testemunha I. R., que prestou um depoimento objetivo e coerente, confirmando ao Tribunal recorrido a situação de ambos.
19- No que concerne ao marido da embargada (seu primo), a referida testemunha confirmou o facto de aquele ter sido declarado insolvente, há uns anos atrás.
20- Por sua vez, quanto à embargada M. C., demonstrou ter um conhecimento direto sobre a situação laboral desta, nomeadamente pelo facto de não possuir vínculo permanente, já que sendo membro da assembleia de freguesia, tem sido sua preocupação regularizar a situação laboral dos funcionários da Junta de Freguesia, tais como a embargada que se encontra numa situação ainda incerta. (Extrato de depoimento [00:05:04 a 00:06:24] e [00:06:34 a 00:07:48]);
21- Assim, forçosamente se tem de concluir, até pelas regras da experiência comum, que a embargada M. C. e o seu marido não entraram ou contribuíram, de alguma forma ou em momento algum, com valores ou dinheiro seu para a constituição do saldo da conta bancária em causa, até porque tal seria humanamente impossível, atenta a situação económica desta, que se revela manifestamente precária, vivendo de um trabalho de motorista na junta de freguesia de apenas 10 meses por ano, e o seu marido, exercendo a função de afinador de máquinas, tendo contudo, já sido declarado insolvente.
22- Portanto, o pouco que ganham e recebem é para os gastos diários, e muito provavelmente nem sequer chegará, tendo em consideração as já várias execuções que têm tido, por algumas das firmas que constam do presente processo.
23- No nosso modesto entendimento, foi feita prova minimamente convincente de que o saldo bancário resulta de poupanças da embargante e dos valores provenientes de eventos extraordinários (herança), também aí lançados.
24- Face ao exposto, o facto constante da alínea b) dos factos dados como não provados, deveria passar a figurar dos factos provados.
ii. Do recurso da matéria de direito:
25- Como dispõe o art. 342º, nº 1 do CPC, se qualquer ato, judicialmente ordenado, de apreensão ou entrega de bens ofender a posse ou qualquer direito incompatível com a realização ou o âmbito da diligência, de que seja titular quem não é parte da causa, pode o lesado fazê-lo valer, deduzindo embargos de terceiro.
26 - No caso a embargante/recorrente arroga-se titular dos valores e saldo bancário penhorados na execução, o que se mostra incompatível com a realização da diligência de penhora.
27- Para o efeito, sustenta o invocado direito no facto de tais valores terem sido resultado das suas poupanças e de uma herança, sendo que a co-titularidade da conta com a executada M. C. (sua única filha) apenas teve como objetivo assegurar o acesso às mesmas, atendendo à sua idade, e ao facto de saber escrever apenas o seu nome e saber ler mal.
28- O depósito pode ser singular, se apenas uma pessoa é a sua titular, ou plural, se a titularidade pertencer a mais que uma pessoa ou entidade.
29- Estes depósitos plurais, titulados por mais do que uma pessoa, podem ser conjuntos ou solidários, consoante qualquer dos titulares da conta tenha a faculdade de exigir, por si só, a prestação integral, ou seja, o reembolso de toda a quantia depositada (e juros se houver) e em que a prestação assim efetuada libera o devedor (banco depositário) para com todos eles.
30- Sendo a conta sujeita ao regime da solidariedade, serão aplicadas as regras constantes dos artºs 513º e 516º do C.C. No caso em apreço estamos face a uma conta co-titulada pela requerida, em que qualquer dos seus titulares, em princípio, a poderia movimentar e a que se aplicariam as regras dos artºs 513º e 516º do C.C.
31- Presume-se pois pelo regime de solidariedade, que aos seus titulares pertencem estes valores em partes iguais (artº 516º do C.C.).
32- Claro que tal presunção é ilidível, podendo qualquer dos seus titulares provar que os valores constantes desta conta lhe pertencem por inteiro, ou em diversa proporção.
33- Nos presentes autos, ficou demonstrado que a propriedade do bem depositado, o dinheiro, pertence por inteiro a um dos titulares (art. 350º, nº 2 do CC), neste caso, à embargante, e que a co-titular da conta bancária, M. C., não é co-proprietária dos depósitos bancários penhorados, mas antes mera auxiliar na sua gestão e movimentação, fica ilidida a presunção legal do art. 516º do CC.
34- Com efeito, no caso em apreço, a embargada M. C., apenas participava na respetiva conta solidária como contitular, ou seja, movimentava isoladamente o dinheiro existente na referida conta bancária, uma vez que a embargante/recorrente não sabia ler nem escrever ou pelo menos tinha muitas dificuldades, sem contudo, tal dinheiro ser pertença sua.
35- Deste modo, a embargante arroga-se titular do direito de propriedade sobre os saldos penhorados, o que logrou demonstrar, e se mostra incompatível com a realização da diligência, pelo que os presentes embargos devem proceder.
36- Pelo que a penhora não pode incidir sobre os saldos desta conta e das que lhe estão associadas, por ofenderem o direito de propriedade de terceiro não executado.
37- Mesmo que assim não se entenda, o que não se concebe nem concede, deverá adotar-se o entendimento segundo o qual, estando perante contas bancárias de movimentação solidária, significa que estas podem ser livremente movimentadas, quer a crédito, quer a débito, por qualquer dos titulares, presumindo-se assim, que os saldos bancários existentes estão divididos em quotas-partes.
38- Em suma, na ausência de prova em contrário, deverá concluir-se que metade do saldo da dita conta pertence à embargante.
39- Por conseguinte, a entender-se que tal presunção legal não foi ilidida, a penhora dos saldos bancários deve incidir apenas e somente sobre a quota-parte do cotitular, na esteira do consignado no artigo 780.º, n.º 5, do CPC.
40- Como tal, a diligência de penhora, padece de ilegalidade, porquanto ficou cabalmente demonstrado que os depósitos bancários penhorados consubstanciam bens próprios da embargante/recorrente, sendo ilegítima a penhora da quota-parte que lhe pertence.
41- A douta sentença recorrida, decidindo como decidiu, violou, frontalmente, o disposto nos arts. 342º, nº 1 e 780º, nº 5 ambos do CPC e arts. 350º, nº 2, 513º e 516º todos do CC.
42- Pelo que, deve ser proferido douto acórdão que revogando a sentença recorrida, julgue os embargos totalmente procedentes por provados, ou se assim não se entender, julgue os embargos parcialmente procedentes, atendendo à presunção legal do art. 516º do CC, incidindo a penhora dos saldos bancários apenas e somente sobre a quota-parte do cotitular, na esteira do consignado no artigo 780.º, n.º 5, do CPC, com as legais consequências.
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III.- Como resulta do disposto nos art.os 608.º, n.º 2, ex vi do art.º 663.º, n.º 2; 635.º, n.º 4; 639.º, n.os 1 a 3; 641.º, n.º 2, alínea b), todos do C.P.C., sem prejuízo do conhecimento das questões de que deva conhecer-se ex officio, este Tribunal só poderá conhecer das que constem nas conclusões que, assim, definem e delimitam o objecto do recurso.
Consideradas, pois, as conclusões acima transcritas, cumpre:
- reapreciar a decisão de facto quanto aos segmentos impugnados; e
- reapreciar a decisão de mérito, se vier a resultar alteração da decisão de facto.
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B) FUNDAMENTAÇÃO
IV.- Como acima se referiu, a Apelante impugna a decisão de facto, indicando os pontos de facto que visa com a impugnação – alíneas a) e b) dos factos “não provados”; formula a sua proposta de decisão – que sejam julgados provados os factos vertidos naquelas alíneas; indica os meios de prova que, a seu ver, sustentam a proposta de decisão que formula. Fundando-se em depoimentos pessoais, situa no tempo da gravação os trechos dos depoimentos em que se baseia, destarte cumprindo com os ónus estabelecidos nos n.os 1 e 2, alínea a) do art.º 640.º do C.P.C..
Não há, pois, obstáculo legal à pretendida reapreciação da decisão de facto.
ii) Na reapreciação da decisão da matéria de facto impõe-se à Relação, enquanto instância de recurso também quanto aos factos, observar o disposto no art.º 662.º do C.P.C., pelo que, não estando limitada pelos depoimentos e demais provas que lhe tenham sido indicados pelo recorrente, e/ou pelo recorrido, avalia livremente todas as provas carreadas para os autos, valorando-as e ponderando-as com recurso às regras da experiência, aos critérios da lógica, aos seus conhecimentos das pessoas e das coisas, no sentido de formar a sua própria convicção.
De acordo com o art.º 341.º do Código Civil (C.C.) as provas têm por função a demonstração da realidade dos factos, não sendo, porém, de exigir que essa demonstração conduza a uma verdade absoluta (objectivo que seria impossível de atingir) mas tão-só a um elevado grau de probabilidade, suficiente para as necessidades práticas da vida.
As regras sobre o ónus da prova constam dos art.os 342º. a 346.º do C.C., sendo que o princípio basilar é o que vem estabelecido no primeiro daqueles preceitos legais: quem invoca um direito tem de fazer a prova dos factos que o constituem. Já os factos impeditivos, modificativos ou extintivos têm de ser provados por aquele contra quem o direito é invocado.
Complementarmente àquelas regras e princípios de direito material, cumpre ainda ter presente o princípio de direito adjectivo consagrado no art.º 414.º do C.P.C., que rege sobre a interpretação da dúvida acerca da realidade de um facto ou da repartição do ónus da prova, que se resolve contra a parte à qual o facto aproveita. De resto, o art.º 346.º do C.C. reporta-se, precisamente, à contraprova que pode oferecer a parte contrária à onerada com o ónus probatório, destinada a tornar os factos duvidosos.
A importância destas regras e princípios radica na proibição, consagrada no n.º 1 do art.º 8.º do C.C., de o tribunal deixar de julgar alegando dúvida insanável acerca dos factos em litígio.
É no enquadramento destes princípios que se vai proceder à reapreciação da decisão sobre a matéria de facto.
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V.- O Tribunal a quo proferiu a seguinte decisão de facto:
i) julgou provados os seguintes factos:
1) No dia 20-12-2018, no âmbito dos autos de execução com o nº 1413/06.0TBFAF, a que os presentes autos se encontram apensos, em que é exequente Caixa ..., Crl, tendo sido habilitada X, SA, e executada M. C., entre outros, foram penhorados valores mobiliários na quantidade de 19.997.98, no valor de € 19.997,98, associado à conta PT ......., tendo tais obrigações sido subscritas por M. C., que é a titular das mesmas.
2) A conta de depósitos à ordem nº 030002826...., que também está associada à conta de activos financeiros possuía três titulares: J. A., marido da embargante e pai da embargada executada, já falecido, a embargante e a embargada M. C..
ii) julgou NÃO provados:
Os restantes factos alegados na petição inicial, nomeadamente:
a) A quantia de € 20.000,00 aplicada em títulos e a conta bancária penhorada pertencem exclusivamente à embargante, sendo proveniente de poupanças efectuadas pela embargante e da sua pensão de reforma.
b) Em momento algum a embargada M. C. procedeu a quaisquer depósitos nas contas bancárias.
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VI.- É, pois, a facticidade imediatamente antecedente que a Apelante pretende seja reapreciada.
1.- Os factos em reapreciação admitem a prova testemunhal, cujo valor probatório está sujeito à livre (pressuposto que conscienciosa) apreciação do julgador – cfr. art.º 396.º do C.C. -, o que significa que na apreciação desta prova o tribunal não está sujeito a regras legais preestabelecidas, julgando apenas segundo a convicção que formou através da influência que exerceram as provas produzidas no seu espírito, avaliadas segundo o seu juízo e a sua experiência.
Sendo admissível a prova testemunhal é-o igualmente o recurso às presunções naturais, de acordo com o disposto no art.º 351.º, do C.C., que são ilações que o julgador tira de um facto conhecido para firmar um facto desconhecido – cfr. art.º 349.º, ainda do C.C..
Como refere o Acórdão do S.T.J., de 07/01/2004, “a presunção permite … que perante factos (ou um facto preciso) conhecidos, se adquira ou se admita a realidade de um facto não demonstrado, na convicção, determinada pelas regras da experiência, de que normal e tipicamente (id quod plerumque accidit) certos factos são a consequência de outros. No valor da credibilidade do id quod, e na força da conexão causal entre dois acontecimentos, está o fundamento racional da presunção, e na medida desse valor está o rigor da presunção”.
Na presunção - diz ainda o mesmo Aresto - “deve existir e ser revelado um percurso intelectual, lógico, sem soluções de continuidade, e sem uma relação demasiado longínqua entre o facto conhecido e o facto adquirido” [ut Procº. 03P3213, (Cons. Henriques Gaspar), in www.dgsi.pt/jstj].
As presunções legais podem ser ilididas (salvo as presunções juris et de jure), assim como admitem prova em contrário, sendo que esta prova do contrário e a contraprova, como referem ANTUNES VARELA et AL., “dirige-se contra o facto presumido, visando convencer o juiz de que, não obstante a realidade do facto que serve de base à presunção, o facto presumido não se verificou ou o direito presumido não existe” (in “Manual de Processo Civil”, Coimbra Editora, 1984, pág. 488).
2.- O Tribunal a quo fundamentou a sua decisão quanto à parte impugnada nos seguintes termos:
“A matéria de facto dada por não provada resultou da existência de dúvida sobre a realidade dos factos, resolvida contra a parte a quem os factos aproveitavam. Efectivamente, as testemunhas inquiridas não tinham qualquer conhecimento sustentado da factualidade em causa nos autos. Com efeito, a testemunha I. R., primo do marido da embargante, nada sabia quanto a tal factualidade, limitando-se a reproduzir o que a executada lhe tinha dito há “uns dias”. Por seu turno, a testemunha V. C., neto da embargante e filho da executada, nada sabia sobre a vida financeira da avó, afirmando não saber “se os pais têm dinheiro”, apenas assegurando que o avô faleceu em 2012, ou seja, após a subscrição das obrigações, que ocorreu em 2009. Deste modo, a conjugação de tais elementos de prova suscita ao tribunal a dúvida sobre a realidade desses factos, ou seja, se as obrigações penhoradas pertencem à embargante, a qual foi resolvida contra a parte a quem os factos aproveitavam, dando-se como não provados os factos alegados pela embargante.”. 3.- Dos dois depoimentos testemunhais, que se revisitaram através das gravações: V. C. (neto da Apelante/Embargante, e filho da Embargada/Executada M. C.) e I. R. (que não tem relação familiar com a Embargante, sendo primo do marido da Embargada/Executada), resultam, inequivocamente, os seguintes factos:
- A ora Apelante não sabe escrever se não o seu nome.
- A embargada M. C. é a única filha da ora Apelante, R. C., e de J. A., e acompanhou sempre os seus pais, continuando desde a morte do progenitor a assistir a sua mãe, transportando-a sempre que ela precisava de se deslocar, designadamente nas idas ao médico.
No print relativo aos titulares da conta n.º 030002826...., constante de fls. 17 (assim como no requerimento de protecção jurídica, constante de fls. 19), consta que a ora Apelante, 2.ª titular da conta, nasceu em -/03/1942, pelo que à data em que foi feito a aquisição das obrigações, em 2009, tinha já 67 anos de idade.
Mais consta do referido print que o marido da Apelante, J. A., que é o 1.º titular daquela conta, tendo nascido em 02/10/1938, quando foi feita a aquisição, nos inícios de 2009, estava muito perto dos 71 anos.
Estamos, pois, perante duas pessoas já de idade, que se pode dizer avançada mesmo para os padrões de hoje, com limitações, que, tendo uma única filha, a qual lhes presta assistência e os acompanha, a associam ao que têm, nomeadamente à conta bancária.
Por ser uma situação tão igual a tantas que se conhecem nas zonas do interior do País, com gente idosa e pouco letrada, permite, sem hesitação, presumir que o dinheiro movimentado por aquela conta era pertença do casal, figurando a Executada M. C., sua filha, como co-titular (em 3.º) se não apenas, pelo menos sobretudo, para ter maior liberdade de gerir/movimentar a conta.
A realidade que a Apelante trouxe para os autos, e pretende ver ratificada, não é, porém, integralmente coincidente com a acima descrita.
O que ela pretende é que se julgue demonstrado nos autos que “a quantia de € 20.000 aplicada em títulos e a conta bancária penhorada” lhe pertencem em exclusivo, sendo proveniente “de poupanças” por si efectuadas, e “da sua pensão de reforma”.
Sobre a “origem” daquele dinheiro, apenas o seu neto, referido V. C., afirmou «ter ouvido falar», quando «era novo» que “o dinheiro provinha de uma herança que a avó herdou”. Não referiu, tampouco por aproximação, uma data em que tal terá ocorrido. Perguntado pelo valor dessa herança respondeu «herdou € 15.000», o que, tudo, é demasiado vago para se lhe dar credibilidade.
E outra prova não foi oferecida apesar da veracidade de tal facto nem ser de difícil demonstração, quer através do testemunho de um co-herdeiro, quer pela simples junção de cópia da partilha.
Os extractos da referida conta D/O n.º 030002826...., ainda poderiam, eventualmente, fornecer algum indício se confirmassem um depósito daquela importância.
Não pode olvidar-se, porém, que, à data, o marido da Apelante, 1.º titular da conta, J. A., ainda era vivo – posto que não tenha sido junto aos autos qualquer documento ou deles conste informação mais fidedigna, a referida testemunha V. C., seu neto, disse que ele faleceu em 2012 – e, por isso, para que a importância da dita “herança” pudesse ser considerada bem próprio da Apelante, teria esta de demonstrar estar casada no regime de bens matrimonial da comunhão de adquiridos, já que a alínea b) do n.º 1 do art.º 1722.º do C.C. refere como bens próprios dos cônjuges os que “lhes advierem depois do casamento por sucessão ou doação”, ou então que vigorava o regime da separação de bens.
Ainda que, por presunção, (por saber-se que as pessoas da sua geração estão habituadas a viver com um mínimo, tirando o proveito máximo das hortas e dos animais domésticos e de capoeira para se alimentarem, tendo arreigado o hábito da poupança) se pudesse aceitar que a quantia referida em a) era proveniente das poupanças da Apelante e do seu marido J. A., já se não pode ter por minimamente demonstrada a realidade por si alegada, e que consta da referida alínea a).
Relativamente à alínea b), para além do seu conteúdo ser conclusivo, o texto ser demasiado genérico, o que o torna de sentido dúbio, também as afirmações produzidas pelas testemunhas sobre a actual ou mais recente situação económico-profissional da “embargada M. C.” (não resulta claro de nenhum dos dois depoimentos a data a partir da qual esta começou a trabalhar como motorista, com contrato de trabalho a termo certo, para a Junta de freguesia local), não constituem base indiciária suficientente consistente para se ter por demonstrado que ela “em momento algum” procedeu “a qualquer depósito” “nas contas bancárias” - contas que se não identificam, nem mesmo a testemunha V. C., seu neto, identificou. De resto, quando a inquirição versou sobre esta matéria “fraquejou” completamente, começando por responder de modo titubeante, hesitando notoriamente antes de cada resposta, até acabar por responder não ter conhecimento algum dos movimentos das contas referidas nos autos.
Do exposto se conclui que a realidade trazida aos autos pela Apelante e na qual insiste em sede de recurso, plasmada nas alíneas a) e b), não tem o respaldo na prova por ela própria oferecida, não permitindo extrair, sequer por presunção, a realidade dos factos aí descritos. Mantém-se, pois, a decisão de facto quanto a esta parte. 4.- Sem embargo, os documentos bancários juntos aos autos, que não foram impugnados, demonstram que a importância de € 20.000 aplicada na aquisição das obrigações saiu da conta de depósitos à ordem com o n.º 0300 028261 …, a qual tem como 1.º titular o marido da Apelante, J. A.; como 2.º titular a Apelante, e como 3.º titular a filha de ambos, embargada M. C. – cfr. os documentos de fls. 17 e verso -, conta que, por instrução desta mesma Embargada/Executada, ficou associada à Conta de Activos Financeiros, aberta por esta aquando da subscrição das obrigações, sendo naquela conta que se depositavam os rendimentos e se cobravam as despesas, tudo como consta dos documentos de fls. 7 e 8 que, por brevidade, aqui se dão por reproduzidos.
Esta realidade fáctica deve, pois, ser levada à decisão, atento o manifesto interesse que terá na apreciação da pretensão subsidiária formulada pela Apelante.
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VII.- Deste modo, tem-se por demonstrado nos autos que:
1) No dia 20/12/2018, no âmbito dos autos de execução com o nº 1413/06.0TBFAF, a que os presentes autos se encontram apensos, em que é exequente a “Caixa ... – Caixa ..., ” tendo sido habilitada como adquirente “X, S.A.” e executada M. C., entre outros, foram penhorados valores mobiliários na quantidade de 19.997.98, no valor de € 19.997,98, associados à conta da Caixa ... n.º PT ......., tendo tais obrigações sido subscritas por M. C., que é a titular das mesmas.
2) Nos termos do n.º 1 da cláusula 4.ª das Condições Gerais do Contrato de Intermediação Financeira, assinado pela referida M. C., “o registo e o depósito dos instrumentos financeiros, à excepção dos depósitos estruturados, consta de conta a constituir na Caixa, designada de conta de activos financeiros”, conta que é a acima referida em 1).
3) De acordo com o que dispõe a cláusula 5.ª, as contas acima referidas “são abertas por associação a uma conta de depósito à ordem existente na Caixa, a qual deve ser indicada pelo Cliente no momento de abertura de conta de activos financeiros” – n.º 1; “A identificação completa do titular da conta de activos financeiros, incluindo todos os elementos exigidos por lei para o efeito, é feita por remissão para a identificação que consta da conta de depósito à ordem associada” – n.º 2; “A associação da conta de activos financeiros pode ser feita a uma conta de depósito à ordem individual ou colectiva, sendo iguais as condições de movimentação” – n.º 3; “Salvo convenção em contrário, as importâncias correspondentes a comissões, impostos, portes e outros encargos que sejam devidos pelo Cliente, bem como os demais débitos e créditos pecuniários decorrentes de operações sobre instrumentos financeiros, são lançados na conta de depósito à ordem associada à conta de activos financeiros” – n.º 4; “O Cliente deverá assegurar-se, previamente à emissão de uma ordem de compra de instrumentos financeiros, da suficiência de provisão na conta de depósito à ordem associada, para satisfazer todos os custos, encargos e responsabilidades decorrentes dessa ordem no momento em que é ordenada” – n.º 5. - cfr. documento de fls. 7 que, por brevidade, se dá aqui por reproduzido.
4) A Embargada/Executada M. C. aquando da abertura da conta de activos financeiros referida em 1), indicou como conta de depósitos à ordem associada a conta n.º 030002826...., que tem como 1.º titular J. A., marido da Apelante/Embargante e pai daquela; como 2.º titular a Apelante/Embargante, R. C.; e como 3.º titular a supramencionada Embargada/Executada - cfr. documentos de fls. 8 e 17, que por brevidade se dão aqui por reproduzidos.
5) A importância de € 20.000 aplicada na subscrição de obrigações referidas em 1) saiu da conta à ordem referida em 3) – cfr. documento de fls. 6v.º e 17v.º, que por brevidade se dão aqui por reproduzidos.
6) A aplicação acima referida ocorreu em Abril/Maio de 2009.
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VIII.- Os embargos de terceiro, como já vinha sucedendo no Código anterior, vêm regulados no actual C.P.C. como um dos incidentes de oposição, sendo o instrumento processual adequado à defesa não só da posse, nos termos previstos no art.º 1285.º do C.C., mas também “de qualquer direito incompatível com a realização ou âmbito da diligência”, como o direito de propriedade ou qualquer dos outros direitos reais de gozo menores, de que seja titular quem não é parte na causa – cfr. art.os 342.º a 350.º.
Terceiro é, assim, pessoa que não é parte na causa.
As obrigações são valores mobiliários nominativos, constando do registo a identificação do respectivo titular.
As contas bancárias colectivas, que são aquelas que têm mais do que um titular, podem ser solidárias ou conjuntas.
A movimentação das contas conjuntas exige a intervenção simultânea de todos os seus titulares, sendo de presumir que os direitos de crédito dos titulares da conta sejam quantitativamente iguais, nos termos dos art.os 1403.º e 1404.º do C.C...
As contas solidárias caracterizam-se por poderem ser movimentadas livremente por um só dos titulares, ficando o banqueiro desonerado pela entrega da totalidade do saldo a quem lho pedir.
Como refere o Acórdão da Relação do Porto de 17/09/2009, citando jurisprudência do S.T.J., “a natureza solidária da conta releva apenas nas relações externas entre os seus titulares e o banco, quanto à legitimidade da sua movimentação a débito e pode nada ter a ver com o direito de propriedade das quantias depositadas”, sendo distintos “o direito de crédito de que é titular cada um dos depositantes solidários e que se traduz num poder de mobilização do saldo, e o direito real que recai sobre o dinheiro (de que podem apenas algum ou alguns dos depositantes ser titulares, em função das partes respectivas), direito real que, por efeito do contrato de depósito celebrado com o banco, se transferira para este no momento da entrega do numerário” (in “Colectânea de Jurisprudência” (C.J.), ano XXXIV, Tomo IV/2009, págs. 183-184).
Nas relações internas, presume-se que os titulares (credores solidários) comparticipam em partes iguais no saldo, valendo a presunção consagrada no art.º 616.º do C.C..
Porém, uma vez que a propriedade da quantia depositada pode pertencer apenas a um deles, tem de se admitir que aquele a quem ela pertença faça prova do seu direito.
As presunções legais invertem o ónus da prova, nos termos do disposto no art.º 350.º do C.C., pelo que quem se arroga a posição de dono exclusivo do saldo tem de fazer a prova de que ele lhe pertence na totalidade, não sendo suficiente a simples contraprova.
Como refere o Acórdão do S.T.J. de 27/01/98, “Aquela presunção justifica-se pela normal dificuldade de prova da quota de cada um dos credores e, como é próprio das diversas presunções, assenta num pressuposto de probabilidade ou normalidade”, pelo que “o meio mais directo e frontal de se ilidir a presunção” é “a prova da exclusão do seu pressuposto, ou seja, de o depósito não ter sido feito com dinheiro, em partes iguais, dos titulares da conta, independentemente do motivo do regime da conta” (in C.J., Acórdãos do S.T.J., ano VI, Tomo I – 1998, págs. 43/44).
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IX.- Na situação sub judicio, de acordo com o que se apurou, nos autos de Execução n.º 1413/06.0TBFAF, movidos, dentre outros, contra M. C., foram penhorados os valores mobiliários – obrigações – que se encontravam registados numa conta aberta para o efeito na Caixa .., apenas em nome daquela.
Porém, está associada à referida conta (de registo e depósito das obrigações – conta de activos financeiros) uma conta solidária, da qual, para além da referida M. C., são também co-titulares os seus pais, J. A. e R. C..
O dinheiro para a subscrição dos activos financeiros (obrigações) saiu integralmente desta conta.
Atenta a relação pessoal dos titulares da conta é de presumir que o valor de substituição, representado pelo valor dos activos financeiros, embora estes estejam registados apenas no nome da Embargada/Executada M. C., seja pertença comum dos co-titulares da conta de depósitos à ordem.
Tendo a Apelante sucumbido na prova de que tal importância lhe pertencia exclusivamente a si (atenta a via por que optou), fica de pé a presunção de pertencer em partes iguais a cada um dos três titulares da conta.
Ora, nos termos do disposto nos art.º 817.º do C.C. e 735.º, n.º 1 do C.P.C., só os bens do devedor é que estão sujeitos à execução.
Os bens de terceiro só podem ser executados, de acordo com o disposto no art.º 818.º do C.C., quando estejam vinculados à garantia do crédito, ou quando sejam objecto de acto praticado em prejuízo do credor, que este haja procedentemente impugnado, não se podendo incluir nesta situação as duas terças partes pertencentes aos pais da referida Embargada/Excutada – a Apelante e J. A. (nesta sede considerado pela inexistência nos autos de comprovativo documental do seu decesso).
Acresce que a execução não foi movida contra estes, pelo que se não verifica o pressuposto referido no n.º 2 do mencionado art.º 735.º do C.P.C..
Impõe-se, pois, ao abrigo do disposto no art.º 780.º do C.P.C., reduzir o âmbito da penhora à quota parte (um terço) da Embargada/Executada M. C., ordenando-se o levantamento da penhora quanto aos outros dois terços.
Merece, assim provimento a pretensão recursiva subsidiária formulada pela Apelante.
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C) DECISÃO
Nos termos que se deixam expostos, acordam os Juízes desta Relação em julgar parcialmente procedente o presente recurso de apelação, pelo que, revogando a decisão impugnada, decidem julgar parcialmente procedentes os Embargos de Terceiro, ordenando-se o levantamento da penhora relativamente a duas terças partes dos valores depositados.
Custas dos Embargos e da Apelação na proporção de 2/3 para os Embargados/Apelados, e 1/3 para a Embargante/Apelante.
Guimarães, 13/02/2020
Fernando Fernandes Freitas Alexandra Rolim Mendes Maria Purificação Carvalho