OPOSIÇÃO À EXECUÇÃO
TAXA DE JUSTIÇA
Sumário

I - Configurando-se a oposição à execução como uma verdadeira ação declarativa, a petição da oposição é equiparável à petição inicial em ação declarativa.
II - Sendo o requerimento de oposição à execução equiparável à petição inicial em ação declarativa, ser-lhe-ão aplicáveis as normas estatuídas no art. 552º, do CPCivil.
III – Porém, para efeitos tributários, designadamente no atinente ao prazo e oportunidade do pagamento da taxa de justiça, afasta-se do regime puro e simples da petição inicial, mas antes aproxima-se do da contestação, já que ambos estão sujeitos a prazos cominatórios que devem levar a uma igualdade de tratamento dos seus respetivos destinatários.
IV - Caso a executada/opoente não junte documento comprovativo do pagamento da taxa de justiça inicial no prazo de 10 dias a contar da notificação da decisão que indeferiu o pedido de apoio judiciário, deverá a secretaria notificar a mesma para, em 10 dias, efetuar o pagamento omitido, com acréscimo de multa de igual montante, mas não inferior a 1 UC nem superior a 5 UC.

Texto Integral

Acordam os juízes da 2ª secção (cível) do Tribunal da Relação de Lisboa:

1. RELATÓRIO
META DE EMOÇÕES UNIPESSOAL, LDA, deduziu oposição através de embargos de executado contra IL CAFFÉ DI ROMA – RESTAURAÇÃO, LDA, pedindo que os embargos fossem declarados procedentes por provados e, consequentemente, ser absolvida da instância executiva.
Foi proferido despacho que ordenou o desentranhamento do articulado de embargos de executado.
Inconformada, veio a embargante/executada apelar do despacho de desentranhamento, tendo extraído das alegações[1] que apresentou as seguintes
CONCLUSÕES[2]:
I.) A Apelante não recebeu qualquer ofício da Segurança Social.
II.) Aos Embargos de Executado em sede de pagamento de taxa de justiça, não se aplica o regime previsto para a petição inicial, mas antes o previsto para a contestação.
III.) Nos termos do disposto no nº 3 do artigo 570º do CPC a secretaria notifica a parte para que em 10 dias pagamento da taxa de justiça com um acréscimo de multa de igual montante, o que não fez.
IV.) Mas mesmo que assim não se entenda e se pretenda aplicar aos embargos de executado o regime da petição inicial deveria sempre ser cumprido o disposto no nº 3 do artigo 570º do CPC.
A exequente não contra-alegou.
Colhidos os vistos[3], cumpre decidir.
OBJETO DO RECURSO[4]
Emerge das conclusões de recurso apresentadas por META DE EMOÇÕES UNIPESSOAL, LDA, ora apelante, que o seu objeto está circunscrito à seguinte questão:
1.) Saber se para efeitos tributários a petição de oposição em embargos de executado é equiparável à petição inicial ou à contestação em ação declarativa.        
2. FUNDAMENTAÇÃO
2.1. FACTOS PROVADOS
1.) A apelante/executada deduziu embargos de executado, juntando o comprovativo do pedido de apoio judiciário.
2.) Em 23/02/2017, a apelante/executada requereu à Segurança Social proteção jurídica.
3.) Por despacho proferido em 21/07/2007, da Segurança Social, foi indeferido o pedido de proteção jurídica apresentado pela apelante/executada.
4.) Tendo a Segurança Social informado o tribunal de tal decisão em 31/07/2017.
5.) A secretaria judicial não notificou a apelante/executada para proceder ao pagamento da taxa de justiça acrescida de multa de igual montante.
6.) A apelante/executada não procedeu ao pagamento da taxa de justiça e multa de igual montante.
2.2. O DIREITO
Importa, pois, conhecer do objeto do recurso, circunscrito pelas respetivas conclusões, salvas as questões cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras, e as que sejam de conhecimento oficioso.           
1.) SABER SE A PETIÇÃO DE OPOSIÇÃO EM EMBARGOS DE EXECUTADO PARA EFEITOS TRIBUTÁRIOS SERÁ EQUIPARÁVEL À PETIÇÃO INICIAL OU À CONTESTAÇÃO EM AÇÃO DECLARATIVA.
O tribunal a quo entendeu que para efeitos de pagamento de taxa de justiça a petição de embargos de executado era equiparável à petição inicial em ação declarativa.
Vejamos a questão.
Dado que os embargos de executado apresentam a figura quase perfeita duma ação dirigida contra o exequente, natural é estar tal ação acessória sujeita a despacho liminar semelhante ao instituído no artigo 474º (atual art. 558º), embora, vistas as suas condições peculiares, de mais restrito alcance[5].
No que concerne à tramitação, o processo de oposição à execução configura-se como uma verdadeira ação declarativa enxertada na executiva[6].
A propositura da demanda de oposição implica a constituição de uma nova relação processual autónoma, não reconduzível a uma fase da relação processual executiva, por poder apresentar pressupostos próprios e se delinear como uma relação processual de cognição, com a estrutura do processo normal de declaração, enquanto a relação executiva jamais conduz a um provimento decisório[7].
No caso de pluralidade de executados, se os respetivos prazos para a dedução da oposição terminarem em dias diferentes, e por a petição de oposição não constituir uma contestação, não se lhes aplica a norma excecional do nº 2 do art. 486º (atual,  art. 569º, nº 2), mas antes a norma geral do nº 3 do art. 145º, segundo a qual o decurso do prazo perentório faz extinguir o direito de praticar ao ato (art. 813º, nº 4) (atual, art. 728º, nº 3)[8].
Assim sendo, configurando-se a oposição à execução como uma verdadeira ação declarativa, a petição da oposição será equiparável à petição inicial em ação declarativa.
Sendo o requerimento de oposição à execução equiparável à petição inicial em ação declarativa, ser-lhe-ão aplicáveis as normas estatuídas no art. 552º, do CPCivil.
Como os embargos são uma ação dirigida contra o exequente, configurando-se esta oposição como uma oposição-ação e não como uma oposição-contestação, mesmo para efeitos tributários, será a oposição à execução equiparável à petição inicial em ação declarativa?
Pensamos que não, isto é, quanto ao pagamento da taxa de justiça tal correspondência não deverá ser feita com a petição inicial em ação declarativa, mas com a contestação.
O próprio regime da oposição prevê expressamente (art. 728.º, nº 3) que lhe não é aplicável o disposto no art. 469.º, nº 2, que, preceituando sobre o prazo para a contestação, diz que o mesmo se lhe não aplica. Produzindo-se, assim, limitadamente o efeito suspensivo da oposição (art. 733.º), apenas em relação ao executado que dele beneficie.
E, assim, neste específico caso é o próprio regime da oposição que, sem mais, remete para o da contestação. Sendo também certo que na oposição não é atribuído efeito cominatório à falta de contestação (art. 732.º, nº 3, do CPCivil).
A regra art. 552.º, nº 3, do CPCivil, é no sentido que o autor deve juntar à petição inicial o documento comprovativo do prévio pagamento da taxa de justiça inicial ou da concessão de apoio judiciário na modalidade de assistência judiciária.
Prevendo-se no art. 552.º, nº 5, do CPCivil, os casos em que seja requerida a citação urgente do réu, faltando, à data da apresentação em juízo, menos de cinco dias para o termo do prazo da caducidade ou ocorrendo outra razão de urgência, o autor deverá juntar documento comprovativo do pedido de apoio judiciário requerido, mas ainda não concedido.
Depois, no regime da petição inicial, a pena do seu desentranhamento, prescrita no art. 552.º, nº 5, do CPCivil, se o autor, alegando ter requerido o benefício do apoio judiciário e, indeferido o mesmo, não pagar a taxa de justiça no prazo de 10 dias a contar da notificação feita pela segurança social, não o inibe de apresentar nova petição no prazo de 10 dias, juntando, então, documento comprovativo do pagamento da taxa de justiça inicial, considerando-se a ação proposta na data em que a primeira petição inicial foi apresentada em juízo.   
Pois o efeito de tal desentranhamento há de ser interpretado como equivalendo à recusa da petição inicial, nos termos do art. 558.º, nº 1, al. f), do CPCivil, permitindo, assim, a subsequente aplicação do art. 560.º, do mesmo código.
O prazo para a conclusão do procedimento administrativo e decisão sobre o pedido de proteção jurídica é de 30 dias, é contínuo, não se suspende durante as férias judiciais e, se terminar em dia em que os serviços da segurança social estejam encerrados, transfere-se o seu termo para o 1.º dia útil seguinte - art. 25º, nº 1, do citado regime de acesso ao direito e aos tribunais.
O executado pode opor-se à execução por embargos no prazo de 20 dias a contar da citação - art. 728º, nº 1, do CPCivil.
Decorre destes preceitos legais, que a lei, tendo em vista, sobretudo, a harmonia do sistema jurídico, não pode ter querido um sistema mais gravoso para o executado, ao deduzir a sua oposição, do que para o autor de uma petição inicial[9].
Isto porque tendo o executado um prazo de 20 dias para deduzir a oposição a contar da citação, nos termos do art. 728º, nº 1, do CPCivil e, esgotado que seja este, não pode vir intentar, fora dele, outra oposição à execução.
É que sendo de 20 dias o prazo para a oposição à execução, o mesmo não é conciliável com o prazo de 30 dias previsto no regime de acesso ao direito para a conclusão do respetivo processo administrativo e decisão sobre o pedido de proteção jurídica.
Na verdade, se é compreensível que nas ações declarativas em geral se ordene o desentranhamento da petição inicial, quando a parte não junte o documento comprovativo do prévio pagamento da taxa de justiça ou do pedido de apoio judiciário, porque o autor sempre terá possibilidade de apresentar nova petição, podendo, inclusive, valer-se do benefício que lhe é facultado pelo art. 560º do CPCivil, de modo a que a ação se possa considerar proposta na data em que a primeira petição foi apresentada em juízo, já o mesmo não sucede no que concerne aos embargos de executado[10].
Assim, embora o requerimento inicial de oposição dê início a uma contra-acção movida pelo executado contra o exequente deve, para alem das especificidades que ao seu regime são próprias, afasta-se, para efeitos tributários do regime puro e simples da petição inicial, mas antes se aproximar do da contestação, já que ambos estão sujeitos a prazos cominatórios que devem levar a uma igualdade de tratamento dos seus respetivos destinatários[11].
É que embora a dedução de embargos de executado se inicie com uma petição inicial, a verdade é que se se considerassem aplicáveis as regras gerais processuais atinentes a essa peça processual, a solução que se encontraria seria bem diferente, atenta a inexistência de identidade de situações que aqui sempre seria de exigir[12].
Com efeito, fácil é de ver que não se pode transpor este regime da petição inicial para o campo dos embargos de executado (da sua petição inicial), pois tal solução colidiria, de forma manifesta, com o prazo perentório de 20 dias previsto no art. 728º, do CPCivil, para a sua dedução[13].
É que o caso da petição inicial das ações declarativas em geral, sendo o primeiro articulado, com o qual se inicia a instância, justifica-se que mereça um tratamento diferenciado, o que já não ocorre com a petição inicial dos embargos de executado, que deverá, para a questão que é aqui colocada, ser encarada antes como uma contestação em ação declarativa, e isto porque tanto uma como outra estão sujeitas a prazos perentórios para a sua dedução[14].
Se ao opoente fossem aplicadas as disposições da petição inicial, atendendo a que é de 30 dias o prazo para a conclusão do processo administrativo e decisão sobre o pedido de proteção jurídica, e tendo um prazo perentório de 20 dias para contestar, pois, como tal prazo é inferior ao da conclusão do processo administrativo, poderia ficar impedido de deduzir oposição, por não poder comprovar a concessão do beneficio de apoio judiciário.
Assim, tendo em atenção a unidade do sistema jurídica e a sua harmonia, bem como os fins por ela prosseguidos, e consagrando a melhor solução de modo a que o opoente possa deduzir oposição no caso de ainda não estar decidido o pedido de apoio judiciário, é serem aplicáveis à oposição à execução, no que concerne ao pagamento da taxa de justiça, as disposições respeitantes à contestação em ação declarativa, e não as relativas à petição inicial em ação declarativa.
Concluindo, se fossem aplicáveis as disposições respeitantes à petição inicial em ação declarativa, e se ainda não tivesse sido decidido o benefício do apoio judiciário, o opoente poderia não poder deduzir oposição à execução.
Tem, pois, razão a apelante quando entende que aos embargos de executado, em sede de pagamento da taxa de justiça, se aplica o regime previsto para a contestação (art. 570º, do CPCivil), e não o regime previsto para a petição (art. 552º, nº 6, do CPCivil).
O réu deve comprovar o prévio pagamento da taxa de justiça ou juntar ao processo o respetivo documento comprovativo no prazo de 10 dias a contar da notificação da decisão que indefira o pedido de apoio judiciário – art. 570º, nº 2, do CPCivil.
Na falta de junção do documento comprovativo do pagamento da taxa de justiça devida ou de comprovação desse pagamento, no prazo de 10 dias a contar da apresentação da contestação, a secretaria notifica o interessado para, em 10 dias, efetuar o pagamento omitido com acréscimo de multa de igual montante, mas não inferior a 1 UC nem superior a 5 UC – art. 570º, nº 3, do CPCivil.
Após a verificação, por qualquer meio, do decurso do prazo referido no n.º 2, sem que o réu tenha comprovado o prévio pagamento da taxa de justiça, a secretaria notifica-o para os efeitos previstos no número anterior – art. 570º, nº 4, do CPCivil.
Está provado que “a apelante/executada deduziu embargos de executado, juntando o comprovativo do pedido de apoio judiciário”, que “a secretaria judicial não notificou a apelante/executada para proceder ao pagamento da taxa de justiça acrescida de multa de igual montante”, e que “não procedeu ao pagamento da taxa de justiça e multa de igual montante” – factos provados nºs 1, 5 e 6.
Ora, não estando junto o documento comprovativo do pagamento da taxa de justiça inicial no prazo de 10 dias a contar da notificação da decisão que indeferiu o pedido de apoio judiciário, deveria a secretaria notificar a apelante/opoente para, em 10 dias, efetuar o pagamento omitido, com acréscimo de multa de igual montante, mas não inferior a 1 UC nem superior a 5 UC (dando assim a secretaria cumprimento ao disposto no art. 570º, nº 4, do CPCivil).
Destarte, procedendo o recurso de apelação, há que revogar o despacho de desentranhamento proferido pelo tribunal a quo.
3. DISPOSITIVO
3.1. DECISÃO
Pelo exposto, acordam os juízes desta secção cível (2ª) do Tribunal da Relação de Lisboa em julgar procedente o recurso de apelação e, consequentemente, revoga-se a decisão recorrida, a
qual deverá ser substituída por outra que ordene a notificação da apelante para, em 10 dias, efetuar o pagamento omitido, com acréscimo de multa de igual montante, mas não inferior a 1 UC nem superior a 5 UC.
3.2. REGIME DE CUSTAS
Sem custas, por elas não serem devidas.

Lisboa, 2020-01-09
Nelson Borges Carneiro
Pedro Martins
Inês Moura
_______________________________________________________
[1] Para além do dever de apresentar a sua alegação, impende sobre o recorrente o ónus de nela concluir, de forma sintética, pela indicação dos fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão – ónus de formular conclusões (art. 639º, nº 1) – FRANCISCO FERREIRA DE ALMEIDA, Direito Processual Civil, volume II, 2ª edição, p. 503.
[2] O recorrente deve apresentar a sua alegação, na qual conclui, de forma sintética, pela indicação dos fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão. Versando o recurso sobre matéria de direito, as conclusões devem indicar, as normas jurídicas violadas; o sentido com que, no entender do recorrente, as normas que constituem fundamento jurídico da decisão deviam ter sido interpretadas e aplicadas, e invocando-se erro na determinação da norma aplicável, a norma jurídica que, no entendimento do recorrente, devia ter sido aplicada – art. 639º, nºs 1 e 2, do CPCivil.
[3] Na sessão anterior ao julgamento do recurso, o processo, acompanhado com o projeto de acórdão, vai com vista simultânea, por meios eletrónicos, aos dois juízes-adjuntos, pelo prazo de cinco dias, ou, quando tal não for tecnicamente possível, o relator ordena a extração de cópias do projeto de acórdão e das peças processuais relevantes para a apreciação do objeto da apelação – art. 657º, n.º 2, do CPCivil.
[4] Todas as questões de mérito que tenham sido objeto de julgamento na sentença recorrida e que não sejam abordadas nas conclusões do recorrente, mostrando-se objetiva e materialmente excluídas dessas conclusões, têm de se considerar decididas, não podendo delas conhecer o tribunal de recurso.
   Vem sendo entendido que o vocábulo “questões” não abrange os argumentos, motivos ou razões jurídicas invocadas pelas partes, antes se reportando às pretensões deduzidas ou aos elementos integradores do pedido e da causa de pedir, ou seja, entendendo-se por “questões” as concretas controvérsias centrais a dirimir.
[5] LOPES CARDOSO, Manual da Ação Executiva, p. 300.
[6] AMÂNCIO FERREIRA, Curso de Processo de Execução, 11ª ed., p. 186.
[7] AMÂNCIO FERREIRA, Curso de Processo de Execução, 11ª ed., p. 186.
[8] AMÂNCIO FERREIRA, Curso de Processo de Execução, 11ª ed., p. 188.
[9] Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 2010-11-11, Relator: SERRA BATISTA, www.dgsi.pt./stj.
[10] Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 2017-04-20, Relator: PEDRO CUNHA, www.dgsi.pt./jtrg.
[11] Acórdãos do Tribunal da Relação do Porto de 1/7/2008, CJ, Ano XXXIII, Tomo III, p. 191; e Acórdãos do Tribunal da Relação de Lisboa de 22/1/08, Relator: RUI VOUGA e de 16/11/2006, Relator: TIBÉRIO SILVA, ambos em www.dgsi.pt/jtrl.
[12] Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 2017-04-20, Relator: PEDRO CUNHA, www.dgsi.pt./jtrg.
[13] Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 2017-04-20, Relator: PEDRO CUNHA, www.dgsi.pt./jtrg.
[14] Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 2017-04-20, Relator: PEDRO CUNHA, www.dgsi.pt./jtrg.