Ups... Isto não correu muito bem. Por favor experimente outra vez.
ACÇÃO DE DEMARCAÇÃO
INEPTIDÃO DA PETIÇÃO INICIAL
RECONVENÇÃO
Sumário
I - A reforma do CPC de 1961 de 1995/96 eliminou o processo especial de demarcação. II - O antigo processo especial adjetivava os vários «passos» do direito substantivo, os vários critérios de demarcação estabelecidos no artigo 1354.º do Código Civil. III - Porém, com ou sem processo especial, o direito substantivo não mudou. IV - A todo o direito deve corresponder a ação adequada a fazê-lo reconhecer em juízo, a prevenir ou reparar a violação dele e a realizá-lo coercivamente. V - Na atual ação de demarcação sob a forma de processo comum deve continuar a seguir-se os vários «momentos» anteriormente autonomizados no processo especial: no primeiro «momento» dirime-se a questão do direito à demarcação, de acordo com a prova da existência de prédios confinantes, pertencentes a proprietários distintos, cujas estremas são incertas ou duvidosas; no segundo «momento» passa-se, então, ao estabelecimento da linha de demarcação. VI - A decisão recorrida sai da órbitra da ineptidão por ininteligibilidade, ao referir-se à inviabilidade dos pedidos. VII - Quando uma situação é analisada à luz de uma determinada norma jurídica, e, em face dela, não se pode concluir pelo efeito pretendido, a questão não é de ininteligibilidade, mas de improcedência da ação.
Texto Integral
Acordam na 2.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa,
I - Relatório
1. Os Autores AR… e MA… interpuseram recurso de apelação dodespacho que julgou procedente a exceção dilatória da ineptidão da petição inicial, com a consequente nulidade do processado e a absolvição do Réu GA… da instância.
O Réu/Reconvinte GA… interpôs recurso de apelação do despacho que julgou inepta a reconvenção, com a consequente nulidade do respetivo processado e a absolvição dos Autores/Reconvindos da instância.
2. AR… e MA… intentaram, no dia 11.1.2017, a presente ação declarativa, sob a forma de processo comum, contra GA…, tendo formulado o seguinte pedido:
Fixação judicial dos limites do prédio rústico denominado «M… – A…», sito nos limites de Almada – Mafra, composto por cultura arvense oliveiras e horta com a área de 6.750 m2, inscrito na matriz predial rústica sob o artigo … – Secção “O”, da dita freguesia de Mafra, e descrito na Conservatória do Registo Predial de Mafra sob o n.º …, aos Autores pertencente, condenando-se o Réu no cumprimento da sentença que venha a ser proferida.
3. Alegaram, em suma, que:
- São proprietários do prédio rústico denominado «M… – A…», sito nos limites de Almada – Mafra, composto por cultura arvense oliveiras e horta com a área de 6.750 m2, inscrito na matriz predial rústica sob o artigo … – Secção “O”, da dita freguesia de Mafra, e descrito na Conservatória do Registo Predial de Mafra sob o n.º …;
- O prédio rústico é composto, matricialmente, por 2 (duas) parcelasde terreno - a parcela 1, com a área de 6375m2 de CA (cultura arvense), e a parcela 2, com a área de 375m2 de H (horta) e tem, actualmente, as seguintes confrontações:
NORTE: Rio;
SUL: Estrada de Almada;
NASCENTE: GA…;
POENTE: Herdeiros de JJ…;
- O prédio foi adquirido pelos Autores no ano de 2004 a uma empresa da qual o Autor marido foi sócio;
- Mesmo passando pela posse titular da sociedade Batalha & Inácio - Construções, Lda., sempre pertenceu aos Autores e a sua família, estando na posse dos mesmos há mais de oitenta anos, tendo sido sempre cultivado, arado, amanhado e limpo pelos seus possuidores, que sempre suportaram os seus custos e despesas, colhendo os seus frutos, utilizando-o sempre de boa-fé, pacífica e publicamente, com posse titulada, trabalhando sempre no mesmo, sem a menor oposição de ninguém;
- Presentemente, o prédio confina a Norte com Rio, a Sul com estrada de Almada e como prédio inscrito sob o artigo 35 da Secção “O” da mesma matriz rútica, a Poente com o mesmo prédio inscrito sob o artigo 35 da Secção “O”, e a Nascente com o prédio misto composto pelo artigo rústico … da mesma Secção “O” e pelos artigos urbanos 4891, 4888, 4889 e 4890, todos da freguesia e concelho de Mafra;
- O prédio rústico inscrito na respectiva matriz sob o artigo 35 da Secção “O” da freguesia de Mafra, com o qual o prédio sub judice confronta a Sul e a Poente, pertence presentemente aos herdeiros de JJ…;
- O prédio misto com o qual o prédio sub judice confronta a Nascente, denominado «Terra Nova», descrito na Conservatória do Registo Predial de Mafra sob o n.º …, é, atualmente, composto pelo artigo rústico … da mesma Secção “O” e pelos artigos urbanos 4891, 4888, 4889 e 4890, todos da freguesia e concelho de Mafra, tendo as seguintes composição e confrontações: «Casa de R/C e 1.º andar, para habitação – 114 m2;- PAVILHÃO n.º 1 – 549 m2;- PAVILHÃO n.º 2 – 171 m2;- PAVILHÃO n.º 3 – 600 m2;- Cultura arvense e mato – 13 568 m2;- Norte: regueira;- Sul: Estrada Municipal;- Nascente: Cavi – Sociedade de Produtos Alimentares, Lda.;- Poente: TR…»;
- Pertencendo, atualmente, ao Réu, que o adquiriu por compra, tendo sido registada a propriedade a seu favor através da ap. 30, de 19 de maio de 2008;
- Acontece que as confrontações e os limites do prédio sub judice sempre foram respeitados e pacíficos entre a maioria dos confinantes, quer do lado Norte, quer do lado Sul, quer do lado Poente;
- O mesmo não se pode dizer no que diz respeito à confrontação do lado Nascente, com o prédio misto actualmente pertença de GA…;
- Sucede ainda que o prédio misto pertencente ao Réu, confrontante com o prédio dos Autores, encontra-se pendente de retificação cadastral desde, pelo menos, 23.2.1989;
- O referido prédio misto foi adquirido por Mafriobra – Construções e Urbanizações,Lda., em 1998, por compra, tendo o mesmo prédio sido transmitido, sucessivamente, no ano de 2002, para a Besleasing Imobiliária - Sociedade de Locação Financeira, S. A., transmissão essa registada a favor da mesma através da ap. 39 de 15.2.2000 e da ap. 74 de 5.6.2000;
- No ano de 2008, o prédio misto confinante com o dos Autores foi adquirido à empresa Besleasing e Factoring - Instituição Financeira de Crédito, S. A. por GA…, tendo sido registada a aquisição a seu favor através da ap. 30 de 2008.5.19;
- Apesar das diferentes entidades pessoas coletivas titulares do direito de propriedade e das reservas de propriedade, o certo é que, na realidade, quem sempre administrou, utilizou e ocupou o prédio composto pelo artigo rústico … da mesma Secção “O” e pelos artigos urbanos 4891, 4888, 4889 e 4890, e que sempre o considerou seu, foi ML… e o seu ex-marido, sócios das referidas sociedades Moreau & Cª, Lda. e Cavi - Sociedade de Produtos Alimentares, Lda. e o atual proprietário, também sócio, GM…, aqui Réu;
- Acontece que, do lado poente do referido prédio misto (lado nascente do prédio que épropriedade dos Autores), o proprietário, ou alguém a seu mando ou com o seu consentimento, vem alterando constantemente as redes e vedações que demarcam a estrema entre o prédio dos Autores e o prédio do Réu, alterações com as quais não concordam nem aceitam, e que violam o seu direito de propriedade;
- Há cerca de cinco anos, perante a existência de algumas dúvidas acerca das confrontações do lado Nascente do prédio dos aqui Autores com o lado Poente do prédio do Réu, os Autores, a mãe do ora Réu, e os representantes da Cavi - Sociedade de Produtos Alimentares, Lda. acordaram em colocar uma rede delimitadora de ambos os prédios;
- No verão de 2016, os Autores viram o seu terreno demarcado do lado Nascente com uma nova rede colocada ao lado da outra já existente, mas sensivelmente a um metro para dentro do seu terreno, situação com a qual não podem de modo algum concordar, havendo, da parte do Réu, a clara intenção de apropriação, para si, de uma parte do terreno pertencente aos Autores, sem qualquer legitimidade e sem a permissão dos mesmos;
- As estremas do lado nascente do prédio dos Autores têm vindo, assim, a ser discutidas com o proprietário do prédio confinante, o aqui Réu;
- Os Autores não podem mais permanecer na dúvida quanto às estremas do seu prédio, pelo que pretendem, assim, que sejam as partes convidadas a vir aos autos concorrer na demarcação das estremas dos prédios em questão e, assim, ver fixadas judicialmente as estremas do referido prédio, para que não haja qualquer dúvida e se evitem demandas e problemas de vizinhança, devendo ser.
4. Em sede de contestação, o Réu GA… alegou, em suma, que:
- O Réu é dono e legítimo proprietário do prédio n.º … - Mafra, da C.R. Predial de Mafra, inscrito na matriz cadastral sob parte do artigo … – secção “O”, com 15.002,00 m2;
- Tal prédio resultou da divisão, em duas partes, de um terreno-mãe que tinha 25.000,00 m2, artigo …º - “O”, conforme descrição 6040 do livro B-19, fls 73 da Conservatória do registo Predial de Mafra, onde consta;
- Com a ap. n.º 1 de 08/06/1977, foram desanexados 10.000,00 m2 que deram origem ao prédio 51056 fls 127 do Livro B-137, hoje prédio 7776 – Mafra;
- Com a ap. n.º 5 de 08/05/1980, o prédio 6040 ficou com a área de 15.000,00 m2 denominado “Terra Nova”, hoje prédio … Mafra;
- Esta divisão na Conservatória em 1977, não foi comunicada ao Cadastro (Finanças) tendo o artigo … – “O” continuado a ter 25.000,00 m2 com a configuração original;
- Após a criação em 23.02.89 dos artigos urbanos 4891, 4888, 4889, 4890, todos da freguesia de Mafra, foi feita a reclamação cadastral referida no artigo 20.º da p.i. para retirar da área rústica de 15 002,00 m2, a área das construções já inscritas nos artigos urbanos supra referidos, afim de evitar a dupla inscrição;
- Tal reclamação foi entregue nas Finanças em 23.2.89 e com o seu duplicado foi efetuado o averbamento das áreas cobertas e descoberta na descrição … – Mafra da Conservatória do Registo Predial de Mafra conforme ap. n.º 17 de 24.2.89 à descrição 6040, Livro B-19;
- Tal reclamação nas Finanças não altera a área total de 15.002,00 m2, apenas reclama que parte dessa área, 1.434,00 m2, passou a ser urbana e a restante área de 13.568,00 m2 ficou com àrea descoberta do prédio misto com a área total de 15.002,00 m2;
- O Réu fez um levantamento topográfico do artigo … – secção “O” que junta como doc. n.º 7, e onde assinalou:
a) área ocupada pelo prédio n.º 7776 – C.R.P. Mafra - 10.000,00 m2, desenhada a verde, obtida através de levantamento topográfico;
b) área ocupada pelo prédio n.º … (excluindo o terreno em litígio) – C.R.P. Mafra -14.603,00 m2, desenhada a vermelho, obtida através de levantamento topográfico;
c) área ocupada pelo prédio n.º … (excluindo o terreno em litígio) – C.R.P. Mafra -6.750,00 m2, desenhada a azul, obtida através do Google Maps;
d) área do terreno em litígio entre os prédios do Réu (n.º …) e dos Autores (n.º …), de866,00 m2, obtida pelo cruzamento do projeto de loteamento que junta como doc n-º 11, levantamento topográfico nos termos do artigo 1354.º do Código Civil;
- Conforme resulta da planta no doc. n.º 7 e do exposto no artigo anterior, a demarcação pretendida pelos Autores implica afetar a área titulada pelo Réu em 397 m2;
- Conforme resulta da planta no doc. n.º 7, existem cerca de 469 m2 de área real excedente à soma das áreas tituladas pelas partes, e os Autores, além de pretenderem que essa área lhes seja toda atribuida, ainda pretendem retirar mais 397 m2 à área titulada pelo Réu;
- A determinação das pretensões dos Autores quanto à demarcação da extrema, advinha‑se da conjugação do seu projecto de loteamento indeferido em 2000-2001, cuja planta junta como doc. n.º 11, das várias conversações que foram sendo realizadas desde 2001 e ainda das obras que os Autores realizaram contra a vontade do Réu, mediante coação física;
- O terreno em litígio põe em causa a área titulada do Réu, mas não põe em causa a área titulada dos Autores;
- Do levantamento topográfico do predio rústico mãe artigo … secção O – doc n.º 7 – resulta que o Réu ocupa sem litígio a área de 14.603,00 m2 (correspondendo a 24.603,00 m2 do prédio mãe) pelo que, falta ao Réu a área em litígio de 397,00 m2 (15.002,00 m2 – 14.603,00 m2 = 397,00 m2 ou 25.000,00 m2 – 24.603,00 m2 = 397,00 m2);
- Devem assim, tais 397,00 m2 ser considerados como parte integrante do prédio do Réu por constarem nos respetivos títulos (inscrição nas Finanças e descrição na Conservatória);
- Além desses 397,00 m2, que estão titulados no prédio do Réu, existem mais 469,00 m2 que não estão registados nem nos títulos dos Autores, nem nos títulos do Réu e como tal, deve ser tal acréscimo distribuído proporcionalmente pelos dois prédios nos termos do artigo 1345.º, n.º 3, do Código Civil, sendo atribuídos ao Réu um total de 631,50 m2 (397,00 m2 + (469,00/2)) e aos Autores 234,50 m2 (469,00/2);
- Caso se viesse a concluir, de forma que não se vislumbra possível, que a área total real dos prédios das partes fosse coincidente com a soma das áreas que titulam, sempre se manteria o litígio quanto a 397 m2, que os Autores entendem lhes pertencer, mas que estão além da área que titulam e que estão em défice na área titulada pelo Réu, nos termos do n.º 3 do artigo 1345.º do Código Civil;
- Caso ainda mais remotamente se viesse a concluir que a área total real dos prédios das partes fosse inferior à soma das áreas que titulam, sempre teria de ser repartida a área em défice de forma proporcional entre as partes, nos termos do n.º 3 do artigo 1345.º do Código Civil;
- Caso venha a ser impugnada a planta que junta como doc. n.º 7, sempre se requererá perícia colegial, com intervenção de um topógrafo do Tribunal, a fim de serem realizados novos levantamentos topográficos;
- Quanto à disposição das áreas tituladas supra expostas nos terrenos, cumpre referir a linha prevista no cadastro, da responsabildiade da Direção Geral do Território, que corresponde àquela a tracejado preto, na planta que junta como doc. n.º 7;
- No Troço C de tal planta, a linha do cadastro coincide com um muro de pedra solta centenário existente, conforme foto que junta como doc. n.º 12;
- O Réu aceita que o muro antigo de pedra solta centenário delimita a propriedade desde o talude a tardoz do segundo armazém, até ao rio – Troço C da planta doc. n.º 7;
- No entanto, mantém-se em conflito toda a extrema desde o talude a tardoz do segundo armazém, até à Estrada Nacional correspondente ao troço A e troço B do levantamento topográfico que junta como doc. n.º 7;
- Resulta da delimitação do Cadastro que o prédio do Réu tem uma área total de 14.960,00 m2, conforme planta que junta como doc. n.º 7.
- No troço A existe um talude natural que nunca foi objecto de demarcação nem de intervenção humana e no troço B ocorreram várias tentativas de demarcação improcedentes e uma obra levada a cabo pelos Autores sem autorização e contra a vontade oportunamente comunicada do Réu;
- Desde pelo menos 1999, nunca teve lugar nenhuma exploração agrícola ou pecuária, nunca teve lugar nenhuma construção imobiliária, nem qualquer tipo de atividade humana, no prédio dos Autores;
- A partir de 25.3.2008, quando foi celebrado o contrato de compra e venda, a posse do Réu passou a ser a título de proprietário;
- No entanto, o Réu já era possuidor desde 1999, por ter autorização dos anteriores proprietários e por ser gerente das sociedades locatárias;
- É verdade que existem redes na confrontação em litígio, mas estas apenas servem para vedar a entrada de animais dos vizinhos do Réu a Norte, que galgavam o terreno abandonado dos Autores e entravam pelo terreno do Réu, e não têm, nem nunca tiveram função de demarcação;
- O Réu concorda e aceita que a demarcação implica a colocação de marcos com caráter de permanência, conforme artigo 41.º da p.i., não podendo as redes serem tidas como um marco, até por não estarem bem colocadas;
- Em 2002/2003, Autores e Réu tentaram obter a extrema entre os dois prédios, mas não foi alcançado acordo nem consenso:
- Em 2000/2003, depois da tentativa de acordo fracassada, os Autores realizaram obra no terreno em litígio de forma individual, com total oposição do Réu, sem licença de construção, através de coação física recorrendo à ação direta;
- Tal obra ocupou a parte do terreno em litígio com ferros e pedaços de betão armado;
- A falta de consentimento e a oposição do Réu foi comunicada por diversas vezes aos Autores através dos Advogados das partes, diretamente no local e ainda em cartas;
- Tal obra, além de consubstanciar uma ofensa ao direito de propriedade do Réu, afetou substancialmente a passagem livre e desimpedida na lateral dos seus edifícios, tendo mesmo o Réu deixado de conseguir utilizar certos instrumentos de cultivo de suas terras, ao que acresce o prejuízo para a imagem arquitectónica do prédio em questão;
- Os terrenos em litígio (troço B e troço A da planta doc. n.º 7), desde 2002, não são usados pelos Autores nem pelo Réu, tendo este último se abstido, de tomar qualquer acção direta perante o confronto existente;
- Desde pelo menos o ano de 2002 que tal terreno se encontra efetivamente abandonado.
5. O Réu deduziu reconvenção contra os Autores, a qual termina com os seguintes pedidos:
1 - Seja considerado demarcado o Troço C da planta junta como doc. n.º 7;
2 - Em pedido reconvencional requer:
a) Seja considerado por demarcar o Troço A e o Troço B da planta junta como doc. nº 7 e em consequência seja ordenada a sua demarcação com base nos títulos nos termos da primeira parte do n.º 1 do artigo 1354.º do Código Civil.
b) Caso se venha a entender que em alguma parte os títulos não são suficientes e se recorra às alternativas subsidiárias previstas no artigo 1354.º do Código Civil, sempre se requer sejam os títulos considerados suficientes quanto às suas áreas, conforme nº 2 do artigo 1354.º do Código Civil.
c) Seja a área excedente ou deficitária relativamente aos títulos, distribuída proporcionalmente pelas partes, conforme n.º 3 do artigo 1354.º do Código Civil.
Alega, para tal, que:
- Quanto à confrontação desde o fim desse muro até à estrada não existe demarcação;
- O Réu fez um levantamento topográfico do artigo … – secção “O” que junta como Doc nº 7 e onde assinalou:
a) área ocupada pelo prédio n.º 7776 – C.R.P. Mafra - 10.000,00 m2, desenhada a verde, obtida através de levantamento topográfico;
b) área ocupada pelo prédio n.º … (excluindo o terreno em litígio) – C.R.P. Mafra - 14.603,00 m2, desenhada a vermelho, obtida através de levantamento topográfico;
c) área ocupada pelo prédio n.º … (excluindo o terreno em litígio) – C.R.P. Mafra - 6.750,00 m2, desenhada a azul, obtida através do Google Maps;
d) área do terreno em litígio entre os prédios do Réu. (n.º …) e dos Autores (n.º …), de 866,00 m2, obtida pelo cruzamento do projeto de loteamento que junta como Doc. n.º 11, levantamento topográfico nos termos do artigo 1354.º do Código Civil.
Conforme planta dos Autores, os mesmos pretendem ocupar 7.616,00 m2, resultando uma área excedente que titulam em 866,00 m2 (7.616,00 m2 – 6.750,00 m2 = 866,00 m2) que se encontra assinalada a sombreado cinza na planta – Doc. n.º 7:
- Do levantamento topográfico do predio rústico mãe artigo … secção O – Doc. n.º 7 – resulta que o Réu ocupa sem litígio a área de 14.603,00 m2 (correspondendo a 24.603,00 m2 do prédio mãe) pelo que, falta ao Réu, a área em litígio de 397,00 m2 (15.002,00 m2 – 14.603,00 m2 = 397,00 m2 ou 25.000,00 m2 – 24.603,00 m2 = 397,00 m2);
- Devem assim, tais 397,00 m2 ser considerados como parte integrante do prédio do Réu por constarem nos respetivos títulos (inscrição nas Finanças e descrição na Conservatória);
- Além desses 397,00 m2 que estão titulados no prédio do Réu, existem mais 469,00 m2 que não estão registados nem nos títulos dos Autores, nem nos títulos do Réu e como tal, deve ser tal acréscimo distribuído proporcionalmente pelos dois prédios nos termos do artigo 1345º n.º 3 do Código Civil, sendo atribuídos ao Réu um total de 631,50 m2 (397,00 m2 + (469,00/2)) e aos Autores 234,50 m2 (469,00/2);
- Caso se viesse a concluir, de forma que não se vislumbra possível, que a área total real dos prédios das partes fosse coincidente com a soma das áreas que titulam, sempre se manteria o litígio quanto a 397 m2, que os Autores entendem lhes pertencer, mas que estão além da área que titulam e que estão em défice na área titulada pelo Réu, nos termos do n.º 3 do artigo 1345.º do Código Civil;
- Caso ainda mais remotamente se viesse a concluir que a área total real dos prédios das partes fosse inferior à soma das áreas que titulam, sempre teria de ser repartida a área em défice de forma proporcional entre as partes, nos termos do n.º 3 do artigo 1345.º do Código Civil;
- Os terrenos em litígio (troço B e troço A da planta doc. n.º 7), desde 2002, não são usados pelos Autores, nem pelo Réu, tendo este último se abstido, de tomar qualquer acção directa perante o confronto existente; desde então, a posse de tal terreno é disputada por Autores e Réu;
- Desde pelo menos que o ano de 2002, tal terreno se encontra efetivamente abandonado.
6. Os Autores apresentaram articulado de réplica, no qual impugnam a generalidade dos factos da reconvenção.
7. No dia 15.5.2017, foi proferido despacho relativo ao valor da causa, do qual consta o seguinte trecho final:
«Assim, antes de lançar mão dos poderes conferidos pelo artigo 308.º do Cód. Proc. Civil, convido os AA. a informarem, documentado se possível, as razões pelas quais atribuíram o valor em apreço à presente, indicando também a área alegadamente ocupada pelo R na sequência do arguido a 16.º da petição inicial.»
8. Após pronúncia dos Autores, no dia 30.10.2017 foi proferido o seguinte despacho:
«Na sequência do despacho de fls. 119, a A. atravessou o requerimento que antecede, não liquidando o valor do processo nos termos e para os efeitos já consignados. Ora, não constando dos autos elementos nos quais possa este Tribunal escorar a sua decisão relativa ao valor da causa, ao abrigo dos artigos 308.º e 309.º, ambos do Cód. Proc. Civil, determino a realização de arbitramento pelo qual aferir-se-á o valor da faixa de terreno melhor identificada a 31.º da petição inicial, a executar por um único perito, cuja identidade será indicada pela secção de processos. Desde já se nomeia a pessoa que vier a ser indicada, devendo a mesma prestar compromisso de cumprimento consciencioso a que alude o artigo 479.º do Cód. Proc. Civil mediante declaração escrita e por si assinada, podendo constar do relatório da avaliação a realizar – cfr. n.º 3 do preceito em referência. Concedo o prazo de 30 (trinta) dias para realização do arbitramento.»
9. No dia 11.4.2018, foi proferido o seguinte despacho [não se transcrevem as notas de rodapé]:
«Em face do relatório de arbitramento, constante de fls. 129 e seguintes, não se suscitam quaisquer dúvidas a este Tribunal relativamente aos valores alcançados ou à forma pelos quais estes foram obtidos, fixo no constante a fls. 134 o valor da faixa de terreno em questão nos autos. * Considerando o valor do bem acima fixado e tendo em conta o que se consignou a fls. 119 e 119 verso, nos termos e para os efeitos dos artigos 296.º, 1, n.º 1, 299.º, 302.º, n.º 1, 308.º e 309.º, todos do Cód. Proc. Civil, fixo em 6.840,00 € (seis mil e oitocentos e quarenta euros) o valor do pedido por via de acção deduzido. * Na presente acção declarativa de condenação com processo comum, vieram AR… e MA…, melhor identificados nos autos, demandar GA…, também melhor identificado nos autos, peticionando a demarcação de estremas entre prédios confinantes da propriedade das aqui partes. Regular e pessoalmente citado, o R. ofereceu contestação, na qual, entre o demais, deduz um pedido reconvencional, pelo qual peticiona que a demarcação das estremas em referência da forma por si concretizada. Pelo exposto, e antes do mais, cumpre apreciar a admissibilidade da reconvenção deduzida. * Impondo-se verificar se se encontram preenchidos os requisitos de que depende a admissão dos pedidos reconvencionais deduzidos, constata-se, em primeiro lugar e em face do disposto no artigo 93.º, n.º 1 do Cód. Proc. Civil, que o presente Tribunal é absolutamente competente para deles conhecer. Em segundo lugar, e porque a nenhum corresponde processo especial1, nos termos do n.º 3 do artigo 266.º do diploma legal em referência, nada obsta à admissibilidade da reconvenção. Por fim, há ainda que apreciar da verificação dos factores de conexão previstos no n.º 2 do artigo 266.º do Cód. Proc. Civil. Na verdade, e como escreve Miguel Teixeira de Sousa, Além dos pressupostos processuais gerais, a reconvenção exige ainda conexão e compatibilidade processual com o objecto definido pelo autor. Essa conexão respeita à relação entre o objecto apresentado pelo autor e o pedido reconvencional formulado pelo réu. Assim, Para que a reconvenção seja admissível, tem de verificar-se, desde logo, uma conexão objectiva ou material entre as duas acções cruzadas ou, por outras palavras, uma ligação ou nexo entre os objectos da causa inicial e da causa reconvencional. A nossa lei, …, não se fica por esta exigência genérica, prevendo, nas três alíneas do artigo 274.º, n.º 2 os casos em que tal nexo se verifica. Nas referidas alíneas enunciam-se os denominados requisitos objectivos, “pressupostos” ou “requisitos substantivos” da reconvenção. Facilmente se percebe tamanha prudência: pretende evitar-se que o pedido do réu conduza a um forte distúrbio ou uma situação de “caos” no processo, com grave prejuízo para a economia judicial. Descendo agora à situação sub judicio, quanto ao vertido nas alíneas b) a d) do preceito em referência, é evidente a sua não aplicação, pelo que resta apurar se os critérios da alínea a) se encontram preenchidos. O R. sustenta o que peticiona na contiguidade dos prédios dos autos das partes e indefinição da estrema entre os prédios, que pretende ver cessada por via da declaração dos respectivos limites, procedendo à indicação da exacta localização destes. Ora, a causa de pedir dos AA. assenta nessa mesma situação de contiguidade e indefinição da concreta confrontação. Neste conspecto, afigura-se claro encontrar-se preenchida a primeira parte da alínea a) do mesmo n.º 1, na medida em que a causa de pedir dos pedidos ora em apreciação se reconduz à mesma situação jurídica predial, havendo assim coincidência integral entre os factos jurídicos que servem de fundamento à acção e os nos quais se sustenta a demanda reconvencional. Pelo exposto, admito, ao abrigo dos artigos 93.º e 266.º do Cód. Proc. Civil, o pedido reconvencional melhor identificado a fls. 41 e seguintes.» * Nos termos dos artigos 296.º, n.º 1, 299.º, n.ºs 2 (a contrario) e n.º 3, e, finalmente, 297.º, n.º 1 todos do Cód. Proc. Civil, a presente acção passa a ter o valor correspondente à soma dos pedidos deduzidos e admitidos no seu âmbito, a saber 22.840,00 € (vinte e dois mil oitocentos e quarenta euros). * À presente acção foi fixado valor que supera metade da alçada do Tribunal da Relação, razão pela qual no seu âmbito dever-se-ia proceder à audiência prévia cujo regime consta do artigo 591.º do Cód. Proc. Civil – cfr. ainda artigos 592.º e 593.º, estas a contrario, e bem assim artigo 597.º, todos do diploma em referência. Não vislumbrando qualquer mais-valia na realização da diligência acima referida nestes concretos autos, e tendo presente que a agenda deste Juízo encontra-se preenchida até Junho de 2018, desde já proponho a seguinte adequação formal do processado, o que faço ao abrigo do artigo 6.º, n.º 1 do Cód. Proc. Civil, consubstanciada na eventual concessão de prazo às aqui partes para se pronunciarem sobre matéria de excepção e questões que se entendam do conhecimento oficioso, a identificar oportunamente, após o que se proferirá despacho saneador e despachos ao abrigo dos artigos 596.º e 593.º, n.º 2, alínea d), todos do Cód. Proc. Civil, sem prejuízo das faculdades previstas no n.º 3 do último dos preceitos referidos. Semelhante adequação do processado facultará um mais célere andamento processual, atendendo ao congestionamento da agenda deste Tribunal de que acima se dá nota, não implicando a postergação de qualquer direito das aqui partes. Neste conspecto, pronunciem-se então as partes sobre este projecto de adequação formal, sendo que no seu silêncio, assim decidirá este Tribunal.»
10. No dia 13.5.2018, foi proferido o seguinte despacho [não se transcrevem as notas de rodapé]:
«Face ao silêncio das partes, adequo formalmente o processado nos termos propostos no despacho precedente. * Considerando a adequação formal acima determinada, notifique as partes para se pronunciarem, querendo, sobre a seguinte solução de Direito referente ao pedido deduzido por acção: “Determina o artigo 552.º, n.º 1, alínea e) do Cód. Proc. Civil que na petição inicial deve o autor formular o pedido. Isto por que, através da apresentação do articulado inicial, deve o autor afirmar uma situação jurídica subjectiva actual, solicitando uma providência processual para tutela do seu interesse. Semelhante afirmação é realizada não só por via da dedução de um pedido, mas também pela alegação dos factos constitutivos da situação jurídica que quer fazer valer, consequência da consagração da teoria da substanciação no nosso direito processual civil (cf., para além da disposição legal já mencionada, artigo 581.º, n.º 4 do Cód. Proc. Civil). Donde, como escreve Rodrigues Bastos, se faltar ou for ininteligível a indicação de tais factos – que constituem a causa de pedir - ou do pedido, só materialmente se poderá falar em petição inicial, porque substancialmente é evidente que não o é. Tal peça jurídica, com falta desses requisitos, não se mostrará apta a reproduzir, em juízo, o litígio..., dado que semelhante ausência conduz à inexistência do objecto do processo. Ora, a lei classifica de inepta a petição inicial da qual não conste pedido, por ausência ou por ininteligível, cominando semelhante ineptidão com a nulidade da peça processual em apreço e com a consequente absolvição do réu da instância [cfr. artigos 186.º, n.º 2, alínea a), 577.º, alínea b), 196.º, n.º 1, 578.º e 278.º, n.º 1, alínea b), todos do Cód. Proc. Civil]. Como expressivamente verteu Lebre de Freitas A ineptidão constitui assim um vício de conteúdo da petição inicial,... . Em posição paralela à do vício gerador de invalidade específica da sentença (art. 668), não constitui propriamente uma invalidade do acto enquanto elemento da sequência processual, mas uma invalidade do acto em si mesmo considerado, que, por via dele, não exerce a sua função conformadora do objecto do processo;... Mas quando é que se deve qualificar como inepta a peça processual através da qual se pretende introduzir um feito em juízo? A resposta a esta pergunta alcançar-se-á por via da resposta a uma outra, que deve ser colocada anteriormente; a saber, qual a função da petição inicial. A tal responde Mariana França Gouveia da seguinte forma: ...função é a de informar a contraparte sobre o que o autor pretende com aquela acção, bem como o próprio Tribunal. Ora, considerando o conteúdo da p.i., afigura-se que pela presente, pretendem os AA. exercer o direito de demarcação previsto no artigo 1353.º e seguintes do Cód. Civil. Resulta da previsão normativa do preceito acima identificado que o direito em causa assiste aos titulares dod direitos de propriedade sobre prédios confinantes, sendo incertas ou duvidosas as suas estremas. Por outro lado, actualmente o direito de demarcação é judicialmente exercido com recurso ao processo comum de declaração, que seguirá a forma comum de processo declarativo. Assim sendo, inexistindo já as acções especiais de arbitramento, no âmbito do qual se inseria a antiga acção de demarcação, prevista nos então vigentes artigo 1052.º e 1058.º do Cód. Proc. Civil, impõe-se que em sede de petição inicial, não só o demandante alegue a contiguidade dos prédios, mas também a razão pela qual a linha divisória entre estes se queda incerta ou duvidosa, e bem assim a exacta localização dessa mesma linha ou estrema, peticionando, a final, que reconheça o Tribunal que aquela linha passa em determinados pontos geográficos. Isto por que já não é possível, como era no passado, solicitar que o Tribunal aferisse, por arbitramento, a localização das estremas; antes se impõe, concretizar, por determinação destas, o pedido em causa, afirmando-se a sua concreta localização por forma a permitir a definição dos contornos do direito no caso concreto, quando tiver de ser proferida a sentença. Analisado o pedido realizado pelos AA. e acima sumariado, constato que o mesmo não possui a precisão e determinação que permitiriam não só ao R. exercer devidamente o contraditório, mas também a este Tribunal dizer o direito relativamente à concreta demarcação peticionada, já que em bom rigor nenhuma é concretamente solicitada. Carece, assim, o pedido deduzido das suficientes precisão e determinação que lhe confeririam validade formal e aptidão para introduzir plenamente o feito em juízo. É, pois, aquele ininteligível, porque vago, tal como alegado pelos RR.; razão pela qual se prefigura a nulidade de todo o processo prevista no artigo 186.º do Cód. Proc. Civil. Sucede, porém, que o R. deduziu contestação na qual, para além do pedido reconvencional, se limita a corroborar a veracidade do litígio quanto às estremas dos prédios confinantes. Ora, nos termos do n.º 3 do artigo 186.º do diploma em referência, sempre que o réu conteste a acção cuja a petição padeça do vício de falta ou ininteligibilidade do pedido, e desde que de tal contestação resulte ter-se cabalmente percebido o pretendido pelo demandante, a invalidade em causa considerar-se-á sanada, prosseguindo os autos a sua tramitação. Impõe-se, face à dedução de contestação, aferir se da mesma resulta ter o R. percebido qual a tutela jurisdicional concretamente solicitada a este Tribunal. Em face ao acima vertido, entende este Tribunal evidente que tal percepção não é patenteada na defesa oferecida nos autos. Na verdade, tal só ocorreria, caso o R. alegasse que a linha divisória não era constituída por concretos pontos do terreno e, ouvidos os impetrantes, estes confirmassem ser precisamente pelos pontos invocados que pretendiam ver demarcados os prédios confinantes. Ora, como é fácil de constatar, o R. em nenhum lugar da sua peça faz semelhante afirmação, limitando-se a afirmar a incerteza das estremas e o seu interesse em que a situação seja definitivamente resolvida, razão pela qual, de resto, deduz pedido reconvencional. Logo, e para os efeitos que agora interessam, a nulidade em apreço não se encontra sanada. Donde, não restará senão declarar inviável do pedido deduzido por acção – o que não bulirá com o pedido reconvencional, atenta o disposto no artigo 266.º, n.º 6 do Cód. Proc. Civil -, por nulidade adveniente da ineptidão da petição inicial, em consequência de ininteligibilidade de causa de pedir, o que nos termos dos artigos 186.º, n.º 2, alínea a), 577.º, alínea b), 196.º, n.º 1, 578.º e 278.º, n.º 1, alínea b), todos do Cód. Proc. Civil, determinará a absolvição do R. da presente instância e a sua consequente extinção.»
11. Os mandatários dos Autores e do Réu foram notificados do despacho referido no ponto 10, tendo os Autores apresentado requerimento de pronúncia sobre a ineptidão da petição inicial.
12. No dia 3.6.2019, foi proferido o seguinte despacho:
«Atendendo à adequação formal do processado previamente determinada, já tendo sido assegurado o exercício do contraditório, passo a proferir: * DESPACHO SANEADOR I – Valor da causa: Nos termos do artigo 306.º, n.ºs 1 e 2 do Cód. Proc. Civil, conjugado com o vertido nos artigos 296.º, 302.º, n.º 1 e 299.º, n.º 1, todos daquele diploma legal, o valor da causa foi fixado em 22.840,00 € (vinte e dois mil oitocentos e quarenta euros) por despacho de fls. 141. II - Saneamento: O Tribunal é competente em razão da nacionalidade, da hierarquia e da matéria. * Da Ineptidão dos pedidos deduzidos por acção e por reconvenção: Determina o artigo 552.º, n.º 1, alínea e) do Cód. Proc. Civil que na petição inicial deve o autor formular o pedido. Isto porque, através da apresentação do articulado inicial, deve o autor afirmar uma situação jurídica subjectiva actual, solicitando uma providência processual para tutela do seu interesse1. Semelhante afirmação é realizada não só por via da dedução de um pedido, mas também pela alegação dos factos constitutivos da situação jurídica que quer fazer valer 2, consequência da consagração da teoria da substanciação no nosso direito processual civil (cf., para além da disposição legal já mencionada, artigo 581.º, n.º 4 do Cód. Proc. Civil). Donde, como escreve Rodrigues Bastos, se faltar ou for ininteligível a indicação de tais factos – que constituem a causa de pedir - ou do pedido, só materialmente se poderá falar em petição inicial, porque substancialmente é evidente que não o é. Tal peça jurídica, com falta desses requisitos, não se mostrará apta a reproduzir, em juízo, o litígio..., dado que semelhante ausência conduz à inexistência do objecto do processo. Ora, a lei classifica de inepta a petição inicial da qual não conste pedido, por ausência ou por ininteligível, cominando semelhante ineptidão com a nulidade da peça processual em apreço e com a consequente absolvição do réu da instância [cfr. artigos 186.º, n.º 2, alínea a), 577.º, alínea b), 196.º, n.º 1, 578.º e 278.º, n.º 1, alínea b), todos do Cód. Proc. Civil]. Como expressivamente verteu Lebre de Freitas A ineptidão constitui assim um vício de conteúdo da petição inicial, ... Em posição paralela à do vício gerador de invalidade específica da entença (art. 668), não constitui propriamente uma invalidade do acto enquanto elemento da sequência processual, mas uma invalidade do acto em si mesmo considerado, que, por via dele, não exerce a sua função conformadora do objecto do processo;... Mas quando é que se deve qualificar como inepta a peça processual através da qual se pretende introduzir um feito em juízo? A resposta a esta pergunta alcançar-se-á por via da resposta a uma outra, que deve ser colocada anteriormente; a saber, qual a função da petição inicial. A tal responde Mariana França Gouveia da seguinte forma: ... função é a de informar a contraparte sobre o que o autor pretende com aquela acção, bem como o próprio Tribunal. Ora, considerando o conteúdo da petição inicial, afigura-se que pela presente, pretendem os AA. exercer o direito de demarcação previsto no artigo 1353.º e seguintes do Cód. Civil. Resulta da previsão normativa do preceito acima identificado que o direito em causa assiste aos titulares dos direitos de propriedade sobre prédios confinantes, sendo incertas ou duvidosas as suas estremas. Por outro lado, actualmente o direito de demarcação é judicialmente exercido com recurso ao processo comum de declaração, que seguirá a forma comum de processo declarativo. Assim sendo, inexistindo já as acções especiais de arbitramento, no âmbito do qual se inseria a antiga acção de demarcação, prevista nos então vigentes artigo 1052.º e 1058.º do Cód. Proc. Civil, impõe-se que em sede de petição inicial, não só o demandante alegue a contiguidade dos prédios, mas também a razão pela qual a linha divisória entre estes se queda incerta ou duvidosa, e bem assim a exacta localização dessa mesma linha ou estrema, peticionando, a final, que reconheça o Tribunal que aquela linha passa em determinados pontos geográficos. Isto dado já não é possível, como era no passado, solicitar que o Tribunal aferisse, por arbitramento, a localização das estremas; antes se impõe, concretizar, por determinação destas, o pedido em causa, afirmando-se a sua concreta localização por forma a permitir a definição dos contornos do direito no caso concreto, quando tiver de ser proferida a sentença. Analisado o pedido realizado pelos AA. e acima sumariado, constato que o mesmo não possui a precisão e determinação que permitiriam não só ao R. exercer devidamente o contraditório, mas também a este Tribunal dizer o direito relativamente à concreta demarcação peticionada, já que em bom rigor nenhuma é concretamente solicitada. Carece, assim, o pedido deduzido das suficientes precisão e determinação que lhe confeririam validade formal e aptidão para introduzir plenamente o feito em juízo. É, pois, aquele ininteligível, porque vago; razão pela qual se prefigura a nulidade de todo o processo prevista no artigo 186.º do Cód. Proc. Civil. Sucede, porém, que o R. deduziu contestação na qual, para além do pedido reconvencional, se limita a corroborar a veracidade do litígio quanto às estremas dos prédios confinantes. Ora, nos termos do n.º 3 do artigo 186.º do diploma em referência, sempre que o réu conteste a acção cuja petição padeça do vício de falta ou ininteligibilidade do pedido e desde que de tal contestação resulte ter-se cabalmente percebido o pretendido pelo demandante, a invalidade em causa considerar-se-á sanada, prosseguindo os autos a sua tramitação. Impõe-se, face à dedução de contestação, aferir se da mesma resulta ter o R. percebido qual a tutela jurisdicional concretamente solicitada a este Tribunal. Em face ao acima vertido, entende este Tribunal evidente que tal percepção não é patenteada na defesa oferecida nos autos. Na verdade, tal só ocorreria, caso o R. alegasse que a linha divisória não era constituída por concretos pontos do terreno e, ouvidos os impetrantes, estes confirmassem ter entendido quais precisamente pelos pontos invocados que pretendiam ver demarcados os prédios confinantes. Ora, como é fácil de constatar, o R. em nenhum lugar da sua peça faz semelhante afirmação, limitando-se a afirmar a incerteza das estremas e o seu interesse em que a situação seja definitivamente resolvida, razão pela qual, de resto, deduz pedido reconvencional. Logo, e para os efeitos que agora interessam, a nulidade em apreço não se encontra sanada. Donde, não resta senão declarar inviável do pedido deduzido por acção – o que não bulirá com o pedido reconvencional, atenta o disposto no artigo 266.º, n.º 6 do Cód. Proc. Civil -, por nulidade adveniente da ineptidão da petição inicial, em consequência de ininteligibilidade de causa de pedir, o que nos termos dos artigos 186.º, n.º 2, alínea a), 577.º, alínea b), 196.º, n.º 1, 578.º e 278.º, n.º 1, alínea b), todos do Cód. Proc. Civil, determina a absolvição do R. da instância por acção e a sua consequente extinção, o que desde já julgo. * Custas do pedido deduzido por acção da responsabilidade dos AA. – cfr. artigo 527.º, n.ºs 1 e 2 do Cód. Proc. Civil.
…//… Como acima já se foi deixando consignado, por via reconvencional, o R. deduz também pedido de demarcação, que, ao abrigo do artigo 266.º, n,º 6 do Cód. Proc. Civil, deve ser conhecido no presente âmbito já que não se encontra realizado na dependência do por acção impetrado. Contudo, de vício idêntico ao acima apontado, padecem os pedidos reconvencionais, dado que se se atentar no petitório inserto a fls. 42 e seguintes da contestação/reconvenção oferecida nos autos, constata-se de imediato que na demanda do Reconvinte, este solicita que se declare incerta as estremas entre os prédios dos autos nos troços A e B melhor assinaladosa fls. 96, solicitando que o Tribunal com base nos títulos; ou seja, não indicando concretamente a sua concreta localização. Ao que acresce que na Réplica oferecida, os Reconvindos limitam-se a afirmar que nunca houve litígio quanto à delimitação naqueles troços, não revelando assim conhecer os pontos nos quais pretende o R. fixar as estremas respectivas. Assim, e mais uma vez, declaro inviável o pedido reconvencional, por nulidade adveniente da ineptidão da petição inicial, em consequência de ininteligibilidade de causa de pedir, o que nos termos dos artigos 186.º, n.º 2, alínea a), 577.º, alínea b), 196.º, n.º 1, 578.º e 278.º, n.º 1, alínea b), todos do Cód. Proc. Civil, determina a absolvição dos AA/Reconvindos da instância reconvencional e a sua consequente extinção, o que desde já julgo. * Custas do pedido reconvencional da responsabilidade do R. – cfr. artigo 527.º, n.ºs 1 e 2 do Cód. Proc. Civil.»
13. Inconformado com o assim decidido, o Réu/Reconvinte interpôs recurso, com as seguintes CONCLUSÕES:
«I – DA DEMILITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO 45.º A douta Sentença absolveu o Recorrente do pedido apresentado na petição inicial pelos Recorridos, por não ser compreensível qual a linha de demarcação peticionada por estes últimos, conforme excerto que passa a transcrever: “Donde, não resta senão declarar inviável do pedido deduzido por acção – o que não bulirá com o pedido reconvencional, atenta o disposto no artigo 266.º, n.º 6 do Cód. Proc. Civil -, por nulidade adveniente da ineptidão da petição inicial, em consequência de ininteligibilidade de causa de pedir, o que nos termos dos artigos 186.º, n.º 2, alínea a), 577.º, alínea b), 196.º, n.º 1, 578.º e 278.º, n.º 1, alínea b), todos do Cód. Proc. Civil, Determina a absolvição do R. da instância por acção e a sua consequente extinção, o que desde já julgo.” 46.º O Recorrente aceita tal decisão e não vem da mesma interpor recurso. 47.º No entanto, a douta Sentença determina que também quanto ao pedido reconvencional não foi possível compreender qual a linha de demarcação peticionada em reconvenção pelo Recorrente, conforme excerto que passa a transcrever: “Contudo, de vício idêntico ao acima apontado, padecem os pedidos reconvencionais, dado que se se atentar no petitório inserto a fls. 42 e seguintes da contestação/reconvenção oferecida nos autos, constata-se de imediato que na demanda do Reconvinte, este solicita que se declare incerta as estremas entre os prédios dos autos nos troços A e B melhor assinalados a fls. 96, solicitando que o Tribunal com base nos títulos; ou seja, não indicando concretamente a sua concreta localização. Ao que acresce que na Réplica oferecida, os Reconvindos limitam-se a afirmar que nunca houve litígio quanto à delimitação naqueles troços, não revelando assim conhecer os pontos nos quais pretende o R. fixar as estremas respectivas.”. 48.º O Recorrente não se conforma com a douta Sentença na parte referida no artigo anterior, consubstanciado esta o âmbito do presente recurso, de matéria de direito. II – DA VIOLAÇÃO DO PRINCÍPIO DA IGUALDADE 49.º Na perspetiva do Recorrente e salvo melhor entendimento, foram violados os artigos 4.º do CPC e artigo 13.º da Constituição da República Portuguesa. 50.º Nos termos do artigo 4.º do CPC “O tribunal deve assegurar, ao longo de todo o processo, um estatuto de igualdade substancial das partes, designadamente no exercício de faculdades, no uso de meios de defesa e na aplicação de cominações ou de sanções processuais.”. 51.º Nos termos do n.º 1 do artigo 13.º da Constituição da República Portuguesa, “Todos os cidadãos têm a mesma dignidade social e são iguais perante a lei.”. 52.º A 11-04-2018 foi proferido o seguinte despacho pelo Tribunal de 1.ª Instância: “Impondo-se verificar se se encontram preenchidos os requisitos de que depende a admissão dos pedidos reconvencionais deduzidos, constata-se, em primeiro lugar e em face do disposto no artigo 93.º, n.º 1 do Cód. Proc. Civil, que o presente Tribunal é absolutamente competente para deles conhecer. Em segundo lugar, e porque a nenhum corresponde processo especial1, nos termos do n.º 3 do artigo 266.º do diploma legal em referência, nada obsta à admissibilidade da reconvenção. (…) O R. sustenta o que peticiona na contiguidade dos prédios dos autos das partes e indefinição da estrema entre os prédios, que pretende ver cessada por via da declaração dos respectivos limites, procedendo à indicação da exacta localização destes. Ora, a causa de pedir dos AA. assenta nessa mesma situação de contiguidade e indefinição da concreta confrontação. (…) Pelo exposto, admito, ao abrigo dos artigos 93.º e 266.º do Cód. Proc. Civil, o pedido reconvencional melhor identificado a fls. 41 e seguintes.” (sublinhado nosso). 53º O Tribunal de 1.ª Instância proferiu o referido despacho no qual determina que o Recorrente indicou com exatidão a localização dos limites da demarcação, decidindo que o R. sustenta o que peticiona e concluindo pela admissão do pedido reconvencional. 54º Face a tal despacho, o Recorrido ficou legitimamente convencido que o seu pedido tinha sido compreendido e aceite pelo Tribunal. 55.º Pelo contrário, o Tribunal vinha a demonstrar que considerava o pedido dos Recorridos ininteligível, convicção esta que veio a ser definitivamente adotada no despacho transcrito no artigo seguinte. 56.º A 23-05-2018 foi proferido o seguinte despacho pelo Tribunal de 1.ª Instância: “Analisado o pedido realizado pelos AA. e acima sumariado, constato que o mesmo não possui a precisão e determinação que permitiriam não só ao R. exercer devidamente o contraditório, mas também a este Tribunal dizer o direito relativamente à concreta demarcação peticionada, já que em bom rigor nenhuma é concretamente solicitada. Carece, assim, o pedido deduzido das suficientes precisão e determinação que lhe confeririam validade formal e aptidão para introduzir plenamente o feito em juízo. É, pois, aquele ininteligível, porque vago, tal como alegado pelos RR.; razão pela qual se prefigura a nulidade de todo o processo prevista no artigo 186.º do Cód. Proc. Civil. (…) . Donde, não restará senão declarar inviável do pedido deduzido por acção – o que não bulirá com o pedido reconvencional, atenta o disposto no artigo 266.º, n.º 6 do Cód. Proc. Civil -, por nulidade adveniente da ineptidão da petição inicial, em consequência de ininteligibilidade de causa de pedir, o que nos termos dos artigos 186.º, n.º 2, alínea a), 577.º, alínea b), 196.º, n.º 1, 578.º e 278.º, n.º 1, alínea b), todos do Cód. Proc. Civil, determinará a absolvição do R. da presente instância e a sua consequente extinção.” (sublinhado nosso). 57.º Os Recorridos foram notificados quanto à intenção de absolvição do seu pedido, tendo tido a oportunidade de o completar ou esclarecer, oportunidade essa que não aproveitaram. 58.º Em violação do princípio da igualdade, o Recorrente nunca foi notificado da intenção de absolvição do seu pedido, não tendo tido qualquer oportunidade para se pronunciar quanto a este aspeto nem quanto aos seus fundamentos que já só vêm indicados em sentença. 59.º O Tribunal andou bem quando concedeu oportunidade aos Recorridos para melhor esclarecerem o seu pedido, e deveria ter feito o mesmo quanto ao Recorrido. III - DA DETERMINABILIDADE DA DEMARCAÇÃO PETICIONADA PELO RECORRENTE NO SEU PEDIDO RECONVENCIONAL 60.º A douta Sentença recorrida absolve os Recorridos quanto ao pedido reconvencional apresentado pelo Recorrente com base no n.º 1 do artigo 186.º do CPC, alínea b) do n.º 1 do artigo 278.º do CPC e alínea b) do artigo 577.º do CPC, normas estas que na perspetiva do Recorrido, com o devido respeito, não deveriam ter sido aplicadas, com os fundamentos que passa a expor. 61.º O n.º 1 do artigo 186.º do CPC dispõe que “É nulo todo o processo quando for inepta a petição inicial.” e a alínea a) do n.º 2 do referido artigo dispõe que “Diz-se inepta a petição quando falte ou seja ininteligível a indicação do pedido ou da causa de pedir;”. 62.º A alínea b) do n.º 1 do artigo 278.º do CPC dispõe que “O juiz deve abster-se de conhecer do pedido e absolver o réu da instância quando anule todo o processo;” 63.º A alínea b) do artigo 577.º do CPC dispõe que “São dilatórias, entre outras, as exceções seguintes: A nulidade de todo o processo;”. 64.º O Recorrente discorda que o seu pedido seja ininteligível, com o devido respeito, pelo que estas normas não deveriam ter sido aplicadas ao caso, sendo este pedido determinado, com os fundamentos que passa a expor. 65.º Na Constestação vem referido que o Recorrente é proprietário do prédio n.º …, da C.R. Predial de Mafra, com a área registada de 15.002,00 m2, que vem delimitada pelas linhas vermelhas tracejadas e preta contínua na planta junta à Constestação como doc. 7, conforme legenda, área esta destacada na referida planta do doc. 7 abaixo, na qual se apagaram as demais camadas para melhor compreensão. 66.º No entanto, o Recorrente só está na posse de 14.603,00 m2, que vêm identificados na trama vermelha no doc. 7 junto à Contestação, destacada na planta do referido doc. 7 abaixo, na qual se apagaram as demais camadas para melhor compreensão. 67.º Por outro lado, vem referido na Contestação que os Recorridos são proprietários do prédio n.º … da C.R. Predial de Mafra com área registada de 6.750,00 m2, área esta que vem identificada com trama azul no doc. 7 junto à Contestação, destacada na planta do referido doc. 7 abaixo, na qual se apagaram as demais camadas para melhor compreensão. 68.º Acresce que na contestação/reconvenção vem referido que a soma da área total real dos terrenos das partes é de 22.219,00 m2, valor este que é superior à soma da área titulada dos terrenos das partes de 21.752,00 m2, verificando-se assim uma área sobrante de 467 m2. 69.º Nos termos do n.º 3 do artigo 1354.º do Cód. Civil, “Se os títulos indicarem um espaço maior ou menor do que o abrangido pela totalidade do terreno, atribuir-se-á a falta ou o acréscimo proporcionalmente à parte de cada um.” 70.º Assim, além da área que titula, o Recorrente pediu em reconvenção que a demarcação seja feita dividindo a área sobrante a meio pelas partes, demarcação esta identificada com a linha vermelho contínua no doc. 7 junto à Contestação, destacada na planta do referido doc. 7 abaixo, na qual se apagaram as demais camadas para melhor compreensão. 71.º Na planta supra, a área titulada pelo Recorrente vai até à linha a preto e a área titulada pelos Recorridos corresponde à trama a azul. A área sobrante está entre as duas áreas tituladas pelas partes e vem dividida a meio pela linha vermelha que corresponde ao pedido reconvencional do Recorrente. 72.º O Recorrente apresentou o seguinte pedido reconvencional: d) Seja considerado por demarcar o Troço A e o Troço B da planta junta como doc. nº 7 e em consequência seja ordenada a sua demarcação com base nos títulos nos termos da primeira parte do nº 1 do artigo 1354º do C.C.. e) Caso se venha a entender que em alguma parte os títulos não são suficientes e se recorra às alternativas subsidiárias previstas no artigo 1354º do C.C., sempre se requer sejam os títulos considerados suficientes quanto às suas áreas, conforme nº 2 do artigo 1354º do C.C.. f) Seja a área excedente ou deficitária relativamente aos títulos, distribuída proporcionalmente pelas partes, conforme nº 3 do artigo 1354º do C.C.. 73.º O pedido principal consiste na demarcação dos troços A e B da planta junta à Constestação/Reconvenção como doc. 7 com base no artigo 1354.º do CC. 74.º Ora, a linha de tal demarcação do pedido principal vem inequivocamente ilustrada a vermelho na planta junta à Constestação como doc. 7, cuja respetiva legenda tem a seguinte redação: “Linha com base no artigo 1354.º do C.C.”. 75.º A linha de demarcação peticionada pelo aqui Recorrente vem identificada a traço vermelho contínuo na planta junta à Constestação como doc. 7. 76.º Ainda que o pedido fosse ininteligível, sempre deveria o Recorrido ter sido notificado para o esclarecer, em conformidade com o n.º 2 do artigo 590.º do CPC dispõe que “Findos os articulados, o juiz profere, sendo caso disso, despacho pré-saneador destinado a: a) Providenciar pelo suprimento de exceções dilatórias, nos termos do n.º 2 do artigo 6.º; b) Providenciar pelo aperfeiçoamento dos articulados, nos termos dos números seguintes;”. 77.º Pelo que, no entender do Recorrente, salvo melhor entendimento, deveria ter sido aplicado o n.º 2 do artigo 590.º do CPC, o que não foi. IV – DO APROVEITAMENTO DO PEDIDO RECONVENCIONAL: 78.º É do entender do Recorrente, com o devido respeito, que a douta sentença aplicou incorretamente o n.º 6 do artigo 266.º do CPC. 79.º O n.º 6 do artigo 266.º do CPC dispõe que: “A improcedência da ação e a absolvição do réu da instância não obstam à apreciação do pedido reconvencional regularmente deduzido, salvo quando este seja dependente do formulado pelo autor.”. 80.º O Recorrente especificou muito concretamente qual a área em litígio, identificada a trama cinza na planta que junta como doc. 7, área esta onde não existe nenhuma demarcação e indicou qual a linha de demarcação que deve ser fixada em concreto para esta área. 81.º Pelo que deveria ter sido aplicado o n.º 6 do artigo 266.º do CPC, concluindo-se pela admissão do pedido reconvencional.»
Termina pedindo que seja anulada a decisão recorrida e seja determinado o prosseguimento dos autos exclusivamente quanto ao peticionado pelo Recorrente em sede de pedido reconvencional.
14. Os Autores apresentaram alegações de respostas, nas quais arguem que a matéria alegada pelo Apelante é matéria de facto, pelo que a mesma não poderá ser objeto de apreciação em sede deste recurso interposto pelo Réu.
Quanto às demais alegações do Réu/Recorrente, entendem os Autores que não poderá proceder a sua pretensão, isto é, o prosseguimento dos autos exclusivamente quanto ao peticionado pelo mesmo Réu em sede de pedido reconvencional, sem que proceda também o peticionado pelos Autores, pois o pedido reconvencional encontra-se numa relação de dependência e de identidade em relação ao pedido dos Autores.
Contrariamente ao alegado pelo Réu, o pedido dos Autores não é, de forma alguma ininteligível, tanto que o Réu entendeu o peticionado e respondeu ao mesmo e, em sede de contraditório, deduziu pedido reconvencional sob o mesmo objeto de litígio e peticionado igualmente a demarcação dos prédio.
Concluem que não poderão os autos proceder exclusivamente quanto ao pedido reconvencional, sem que procedam igualmente quanto ao peticionado pelos Autores.
15. Inconformados com o decidido, os Autores interpuseram recurso, apresentando as seguintes CONCLUSÕES:
«A) Os AA. recorrem da decisão que considerou Inepta petição inicial, em consequência da ininteligibilidade da causa de pedir e da absolvição do R. da Instância. B) Ora, com o devido respeito, os AA. Ora recorrentes, consideram que andou mal o Tribunal ao Decidir como decidiu quanto à Petição inicial, atendendo a todo o Petitório, às informações, documentação, peritagem de avaliação efectuada nos autos, por indicação do tribunal, e prova testemunhal que apesar de carreada para os autos não foi sequer ainda analisada pelo tribunal, nesta fase, e mesmo até pela resposta em Contestação/ Reconvenção levada a efeito pelo R., o Tribunal, no entender dos AA. Deveria ter levado a ação a julgamento, ou no mínimo convocar as partes para audiência prévia, que não se verificou. C) Porém no entender dos AA. mal andou o tribunal ao proferir a decisão considerando a petição inepta e considerando que a nulidade não se encontra sanada; D) Considerou ainda o Tribunal a nulidade adveniente da petição inicial, em consequência da inintelegibilidade da causa de pedir, absolvendo o aqui recorrente do pedido reconvencional; E) Ora nesta parte, andou bem o tribunal, por consequência, e se for considerada inepta a petição inicial, deverá ser, tal como foi, proferida a decisão de absolvição dos AA/ Reconvindos da instância reconvencional com a sua consequente extinção. F) Ora, o tribunal no entender dos AA., teria de ter tomado decisão diferente, no sentido de continuidade do processo. G) A acção entrou em Juízo em 11 de janeiro de 2017; H) O tribunal mandou citar o R. o reu contestou e apresentou Reconvenção e fez também ele pedido de demarcação. I) O Tribunal ao gerir o processo apercebeu-se do que efectivamente se encontrava em Litígio e das pretensões das partes, a demarcação de uma confrontação do terreno dos AA. e do Réu, na estrema nascente do terreno do A. e na estrema poente do terreno do Réu; J) Tudo o demais não se encontrava em discussão; K) Tanto assim é que ordenou a avaliação da faixa de terreno em discussão e solicitou o pagamento dos encargos aos AA., que pagaram; e foi a mesma avaliação efectuada por perito nomeado pelo tribunal; L) Depois veio considerar que não haverá necessidade de audiência prévia; e que para além disso não havia disponibilidade de agenda, e que se encontrava muito preenchida, tendo proposto a adequação formal do caso às partes, M) E somente em Junho de 2018 vem considerar inviável o pedido deduzido por acção absolvendo o R. da instância por acção e a sua consequente extinção; N) Admitiu a reconvenção e quanto ao pedido Reconvencional absolveu também os AA. O) Considerou ainda o tribunal que os AA. peticionaram a demarcação e que O tribunal é absolutamente competente para conhecer dos pedidos das estremas entre prédios confinantes da propriedade das aqui partes;
(…) Y) Ora, com o devido respeito, os AA. Ora recorrentes, consideram que andou mal o Tribunal ao Decidir como decidiu quanto à Petição inicial, atendendo a todo o Petitório, às informações, documentação, peritagem de avaliação efectuada nos autos, por indicação do tribunal, e prova testemunhal que apesar de carreada para os autos não foi sequer ainda analisada pelo tribunal, nesta fase, e mesmo até pela resposta em Contestação/ Reconvenção levada a efeito pelo R., o Tribunal, no entender dos AA. Deveria ter levado a ação a julgamento, ou no mínimo convocar as partes para audiência prévia, que não se verificou. Z) Os AA. na sua petição inicial descreveram o seu prédio os prédios, as suas confrontações os seus actuais proprietários e possuidores, os seus anteriores possuidores, as estremas dos prédios confinantes, AA) Descreveu as áreas e confrontações do prédio, indicando os proprietários, BB) Referiram que as demais confrontações do prédio a Norte a Sul e a Poente, sempre têm sido respeitadas e que sobre as mesmas não se verificam discussões, mas porém a confrontação nascente com o prédio do R. não é pacifica nem respeitada; CC) E que a mesma se encontra pendente de rectificação cadastral desde, pelo menos 23 de fevereiro de 1989; DD) Reportaram os AA. ainda ao tribunal no artigo 28º e seguintes da petição inicial que o Réu, ou alguém a seu mando vem alterando constantemente as redes e as vedações que demarcam a estrema entre o prédio dos AA. E o prédio do R., alterações essas que demonstraram com fotografias e prova, plantas e outra documentação, para alem de terem indicado Rol de Testemunhas a ser ouvido em sede de audiência de julgamento que viesse a ter lugar, o que não veio a acontecer, EE) Quanto á delimitação da confrontação em discussão, informaram os AA. o seu artigo 30° que há cerca de cinco anos, foi por acordo entre os proprietários AA e R., colocada uma rede delimitadora entre ambos os prédios, do lado nascente, do prédio dos AA. e do lado poente do prédio do R., e que, no Verão de 2016 essa rede delimitadora, foi alterada pelo R. , colocando-a sensivelmente cerca de um metro mais para dentro do terreno dos autores, juntou fotografias e prova, e requereram a audição de prova testemunhal. FF) Referiram os AA. que a estrema com o prédio do Réu, é duvidosa que tem vindo a ser discutida com o R., pretende que a mesma seja fixada judicialmente para que não haja qualquer duvida e se evitem demandas e problemas de vizinhança; CG) Informaram os AA. na sua petição inicial e demonstraram documentalmente que existem reclamações cadastrais pendentes nos prédios, reportou a situação actual dos prédios e solicitou ao tribunal uma providencia processual na tutela da defesa do seu interesse, fixando judicialmente as estremas para evitar demandas e problemas de vizinhança; HH) Os AA. Alegaram os factos e Direito, consideraram reunidos os requisitos para a demarcação e convidaram as partes a vir aos autos concorrer para a demarcação, concluindo com o pedido ao Tribunal para que sejam fixadas judicialmente as estremas com a consequente condenação do Réu no cumprimento da sentença. II) Os AA. requereram perícia a efectuar pelos Srs. Peritos do Instituto Geografico Português. JJ) Entendem os AA. que a sua petição é clara e inteligível, e que foi entendida tanto pelo R. como pelo Tribunal, KK) E que se encontram reunidos todos os requisitos para que o Tribunal possa dizer o direito, e julgar; LL) Pelo que a Decisão proferida terá de ser anulada e ser proferida outra com a continuação do autos e julgamento. MM) Até porque, NN) Foi o Réu citado e contestou e reconveio, OO) Percebeu completamente o peticionado; PP)Concordou na sua contestação com a titularidade dos prédios de A. e Réu, QQ) Concordou com as suas confrontações, concordou que os prédios são confinantes em toda a extensão da confrontação oeste, do prédio descrito sob o … com a confrontações a Este do prédio com a descrição … da Conservatória do Registo Predial de Mafra, RR) O Réu Informou na sua Contestação/ reconvenção que numa parte dessa extensão e terreno, existe um muro de pedra solta centenário, que no entender do R. constitui demarcação de parte da estrema, e entendeu no artigo 6º da sua reconvenção, que quando à confrontação desde o fim desse muro até à estrada não existe demarcação. SS) Alegou também em consonância com o alegado pelo A. na sua petição inicial que existiram divisões do prédio, e no artigo 10º da sua contestação informou que a divisão na Conservatória em 1977 não foi comunicada ao cadastro (finanças) tendo o artigo … - "o" continuado a ter 25.000m2 com a configuração original, pelo que os prédios permanecem pendentes de reclamação; TT) Também o R. juntou plantas e documentos, e entendeu que existe uma parte de terreno em litígio, quando à mesma estrema, coincidente com o alegado e peticionado pelo Réu, sua posição, tendo também o R. efectuado o seu pedido reconvencional de demarcação dos terrenos.
(…) CCC) Os AA .na sequência do Pedido Reconvencional do R. responderam em Réplica e no seu artigo 2º da peça processual responderam que o prédio sempre esteve perfeitamente delimitado em relação ao prédio do Réu, com um muro de pedra, numa parte e com um combro de terra e pedras soltas, algumas de grande volume, desde esse muro até à estrada, delimitação essa que até é visível, em fotografia área que juntaram; DDD) Referiram que esse combro de terra e pedras soltas, ruiu em 2005. Em consequência de desaterro levado a cabo pelo R., sem consentimento dos AA., tendo com isso o R. ocupado uma área de terreno pertencente aos AA., impugnaram alguma documentação junta pelo R., tendo os AA. juntado ao processo mais documentação de prova das estremas do prédio e outra documentação referente a um loteamento levado a efeito na Camara Municipal de Mafra, no prédio dos AA., EEE) No entender dos AA. também o Tribunal percebeu e interpretou a petição inicial, ao ponto de por conclusão de 30/10/2017 o Tribunal ter Despacho a determinar a realização de arbitramento do valor da faixa de terreno identificada no artigo 31º da Petição inicial; FFF) Tendo os AA. sido notificados para efectuar o pagamento antecipado de encargos no valor de 700,00€, o que fizeram; GGG) Foi assim e nessa sequência por perito nomeado pelo Tribunal avaliação da faixa de terreno tendo sido considerado um valor de 6840,00€; HHH) Em 11/04/2018, foi proferido despacho pelo tribunal tendo sido admitida a reconvenção; III) Ora nesse despacho suporta o tribunal que não se suscitaram dúvidas sobre os valores alcançados e fixou o valor à faixa de terreno em questão nos autos, de 6840,00€ sendo esse o valor do pedido por via de acção deduzido; JJJ) Considerou ainda o tribunal que os AA. peticionaram a demarcação é absolutamente competente para conhecer dos pedidos das estremas entre prédios confinantes da propriedade das aqui partes; KKK) Foi considerado pelo Tribunal que "o R. sustenta o que peticiona na contiguidade dos prédios, dos autos, das partes e na indefinição das estremas entre prédios, que pretende ver cessada por via de declaração dos repectivos limites, procedendo à indicação da exacta localização destes. Ora, a causa de pedir dos AA. assenta nessa mesma situação de contiguidade e indefinição da concreta confrontação". LLL) Foi admitida a Reconvenção e atribuído a acção o valor de 22.840,00€. MMM) Considerou o tribunal que tendo sido atribuído à presente acção valor que supera metade da alçada do tribunal, pelo qual dever-se-ía proceder à audiencia Prévia, nos termos do artigo 591° do Código processo Civil, considerou o tribunal "Não vislumbro qualquer mais valia na realização da diligência acima referida nestes concretos autos, e tendo presente que a agenda deste juízo encontra-se preenchida até junho de 2018, proponho a seguinte adequação formal...., após o que se proferirá despacho saneador". NNN) Ambas as partes não se pronunciaram; OOO) E em 25/05/2018 foi proferida conclusão do tribunal tendo as partes sido notificadas sobre a solução de direito referente ao pedido deduzido por acção: PPP) O Tribunal efectuou a adequação formal do processado e mandou notificar as partes sobre a solução de Direito proposta: "... Ora considerando o conteúdo da p.i., afigura-se que pela presente, pretendem ao AA. exercer o direito de demarcação previsto no artigo 1353° e seguintes do Código Civil. QQQ) Resulta da previsão normativa do preceito acima identificado que o direito em causa assiste aos titulares de propriedade sobre prédios confinantes sendo certas ou duvidosas as suas estremas. RRR) Por outro lado, actualmente o direito de demarcação é judicialmente exercido com recurso ao processo comum de declaração, que se seguirá a forma comum do processo declarativo. SSS) Assim inexistindo já as acções especiais de arbitramento no âmbito do qual se inseria a acção especial de demarcação, prevista então nos vigentes artigo 1052º e 1058. Do Código proc. Civil, impõe-se que em sede de petição inicial, não só o demandante alegue a contiguidade dos prédios, mas também a razão pela qual a linha divisória entre estes se queda incerta ou duvidosa, e bem assim a exacta localização dessa mesma linha ou estrema, peticionando, afinal que reconheça o tribunal que aquela linha passa em determinados pontos geográficos. Isto por que já não é possível, como era no passado, solicitar que o tribunal aferisse, por arbitramento, a localização das estremas, antes se impõe, concretizar, por determinação destas, o pedido em causa, afirmando-se a sua concreta localização por forma a permitir a definição dos contornos do direito no caso concreto, quando tiver de ser proferida a sentença. TTT) Analisando o pedido realizado pelos AA., e acima sumariado, constato que o mesmo não possui a precisão e determinação que permitiriam não só ao R. exercer devidamente o contraditório, mas também a este Tribunal dizer o direito relativamente à concreta demarcação peticionada, já que em bom rigor nenhuma é concretamente solicitada. UUU) Carece assim, o pedido deduzido das suficientes precisão e determinação que lhe confeririam validade formal e aptidão para introduzir plenamente o feito em Juízo. É pois, aquele ininteligível, porque vago, tal como alegado pelos RR., razão pela qual se prefigura a nulidade de todo o processo prevista no artigo 186° do Cód. Proc. Civil. VVV) Sucede porém que o R. deduziu contestação na qual, para além do pedido reconvencional, se limita a corroborar a veracidade do litígio quanto ás estremas dos prédios confinantes. WWW) Ora nos termos do n° 3 do artigo 186° do diploma em referência, sempre que o réu conteste acção cuja petição padeça de vício de falta de inintelegibilidade do pedido, e desde que de tal contestação resulte ter-se cabalmente percebido o pretendido pelo demandante, a invalidade em causa considerar-se-á sanada, prosseguindo os autos a sua tramitação. XXX) Impõe-se face á dedução de contestação, aferir se da mesma resulta ter o R. percebido qual a tutela jurisdicional concretamente solicitada a este tribunal. YYY) Em face do acima vertido entende este tribunal evidente que tal percepção não é patenteada na defesa oferecida nos autos. Na verdade tal só ocorreria caso o R. alegasse que a linha divisória não era constituída por concretos pontos de terreno e, ouvidos os impetrantes estes conformassem ser precisamente pelos pontos invocados que pretendiam ver demarcados os prédios confinantes. ZZZ) Ora, como é fácil de constatar, o R. em nenhum lugar da sua peça faz semelhante afirmação, limitando-se a afirmar a incerteza das estremas e o seu interesse em que a situação seja definitivamente resolvida, razão pelo qual, de resto deduz pedido reconvencional. AAAA) Logo e para os efeitos que agora interessam, a nulidade não se encotra sanada. BBBB) Donde, não restará senão declarar inviável do pedido deduzido por acção- o que não bulirá com o pedido reconvencional, atenta o disposto no artigp 266° do Cód. Proc. Civil- por nulidade adveniente da ineptidão da petição inicial, em consequência da inintelegibilidade de causa de pedir, o que nos termos dos artigos 186°. N° 2 alínea a), 577. Alínea b) 196.n° 1 578° e 278.° n° 1 alinea b) todos do Cód. Proc. Civil, determinará a absolvição do R. da presente instância e a sua consequente extinção." CCCC) Os AA. notificados que foram do despacho do tribunal vieram aos autos em 05/06/2018 apresentar resposta dizendo que apresentaram acção declarativa de condenação sob a forma de processo comum, pretendendo a demarcação atendendo a que são incertas e duvidosas as estremas do prédio confinante pertença do R., DDDD) Alegaram que existe de facto uma linha longitudinal que passa em determinados pontos geográficos do prédio, que tal como o R. reconhece, se trata de um muro de pedra ao longo da propriedade, existe uma zona do prédio em que q linha é dubi, não estando claramente definida entre os prédios dos AA. e do R., tendo-se mantido o conflito, pelo que se requereu ao tribunal que fossem fixados os limites do prédio rustico denominado "A…". EEEE) E Que o Réu citado tinha apresentado contestação e reconvenção, tendo apresentado prova e rol de testemunhas, FFFF) Ora, as acções de demarcação são complexas e apresentam causa de pedir também ela complexa; GGGG) No caso concreto não está em discussão a titularidade dos prédios, nem a sua contiguidade, mas sim a incerteza e a duvida da exacta localização da linha ou estrema que divide os prédios confinantes, não podendo os AA. indicar, na sua totalidade a exacta localização e que aquela linha passa em determinados pontos geográficos, como pretendia o tribunal; HHHH) Entenderam os AA. que sem analise da documentação junta, carreada para os autos e da prova testemunhal apresentada não poderiam indicar com rigor os concretos e exactos pontos, da linha longitudinal divisória do prédio; para além dos indicados na petição inicial, IIII) Entendem assim, que se a linha divisória entre os prédios não está marcada, ou sinalizada no terreno está assim aberta a porta para a actuação do direito de demarcação. JJJJ) Se a divisão da área conflituante não puder ser resolvida pelos títulos de cada um, será sucessivamente resolvida pela posse, ou outros meios de prova, no limite, não podendo ser resolvida por nenhum desses meios, será equitativamente dividia pelos proprietários confinantes, veja o ac. Proferido pelo Tribunal da Relação de Coimbra Proc. 3779/10.8TBVIS.C1. KKKK) Referiu ainda que no entender dos AA., não se verifica a ininteligibilidade do pedido, não havendo assim razão pela qual o mesmo devesse ser considerado nulo. LLLL) Entende o A. que o R. compreendeu cabalmente o peticionado e o pretendido pelo demandante, devendo a acção continuar , seguindo-se os ulteriores termos legais até final, não padecendo de qualquer nulidade, muito menos insanável. MMMM) Entenderam ainda os AA., que no entanto, se o tribunal considerasse na sua apreciação que os articulados necessitam de algum aperfeiçoamento, sempre poderá providenciar pelo aperfeiçoamento do articulado convidando as partes a suprir irregularidades fixando prazo para o suprimento ou correção do vício, nos termos do disposto no artigo 590° do Código de Processo Civil, convidando as partes a suprir, respeitando as regras do contraditório. NNNN) Entendem ainda os AA. que a petição inicial é suficientemente explicita para permitir a qualquer declaratário compreender os contornos da relação material controvertida, mesmo no caso de esses contornos não se encontrarem claramente definidos o juiz do processo está no seu dever de convidar os AA. a aperfeiçoar o seu pedido. OOOO) Na verdade, sendo a função constitucional dos Juízes administrar a justiça em nome do Povo, n° 1 do artigo 202º da Constituição da República Portuguesa, têm os Juizes que dentro dos limites da Lei e obedecendo ás regras previstas no artigo 9° do Código Civil, mas dando particular ênfase ao n° 3 que faz apelo "às soluções mais acertadas" tudo fazer para dirimir ou eliminar os conflitos que são submetidos ao seu julgamento, nomeadamente interpretando os normativos que consagram os direitos das partes e a validade dos seus actos, sempre no sentido do alargamento desses direitos e nunca da sua restrição, seguindo sempre o principio do aproveitamento dos actos processuais das partes. PPPP) Tendo sido violados esses preceitos pelo Tribunal " a quo" QQQQ) Sendo também esse princípio o estipulado n° 4 do artigo 20° da Constituição da República Portuguesa, do qual resulta que o acesso dos cidadãos e demais entidades que interagem no comércio jurídico ao Direito deve ser sempre facilitado e não dificultado ou restringido, conforme Ac. Proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa em 17/11/2009 no âmbito do processo n° 3417/08.9TVLSB.L1-1 disponivel para consulta em www.dgsi.pt RRRR) Ora, O tribunal proferiu despacho saneador concluindo pela Ineptidão dos pedidos deduzidos por acção e por reconvenção. SSSS) Porém no entender dos AA. mal andou o tribunal ao proferir a decisão considerando a petição inepta e considerando que a nulidade não se encontra sanada; TTTT) Conforme é entendimento da jurisprudência nestas matérias do direito da demarcação a ausência da indicação da linha divisória não inquina a petição inicial, aplica-se os critérios sucessivos dos artigos 1354° do CC, veja-se neste sentido Ac. Trib. Relação de Coimbra 11/11.3TBSPS.CA; UUUU) Para além disso, os AA. na sua petição inicial descreveram os prédios, os seus confinantes, a sua linha divisória, informaram que por acordo foi estabelecida uma linha divisória ao longo do terreno na confrontação este do terreno dos AA. com a confrontação Este do Terreno do R., que veio a ser alterada, pelo R., VVVV) Juntaram fotografias, incluindo fotografia aérea, levantamentos, caderneta prediais, mapas e licenciamentos de loteamento, declarações cadastrais, declaração de pendencia de retificação e prova testemunhal, WWWW) Por sua vez o R., interpretou e entendeu perfeitamente o pedido dos AA, tendo concordado que a linha delimitadora entre os prédios tem vindo a ser alterada, numa parte, e que a mesma se encontra em litígio, concordou em parte com uma linha divisória e, claro, na outra parte que é a que se considera permanentemente em litigio, não concordou tendo apresentado a sua reconvenção solicitando a demarcação conforme pretende e lhe seja conveniente. XXXX) Até porque o R. levou a efeito umas construções no prédio junto da estrema e agora pretende obter passagem suficiente para carro, condição que omite no processo. YYYY) Como se pode verificar, no entender dos AA. tanto o Réu como o Tribunal entenderam perfeitamente o que é pretendido pelos AA., ZZZZ) O Tribunal mandou avaliar a faixa em litígio, e entendeu perfeitamente qual o objecto do litígio e como dizer o direito; AAAAA) E se alguma dificuldade ocorresse na apreciação da causa, No entender do AA. poderia e deveria o tribunal ter marcado audiência prévia a fim de realizar tentativa de conciliação entre as partes, nos termos do disposto no artigo 591° n° 1 alinea a) do C.P.C., que como ficou bem patente nas posições de ambas as partes levadas ao processo, o litigio queda-se apenas em aferir uma parte da delimitação da propriedade, BBBBB) A audiência prévia, serviria também para discutir as posições das partes com vista a delimitação dos termos do litigio e suprir as insuficiências ou imprecisões na exposição da matéria de facto que ainda subsistam ou se tornem patentes na sequência do debate, nos termos do disposto no artigo 591° n° 1 b) e c); CCCCC) E só depois após debate programar a adequação formal; a simplificação ou a agilização processual nos termos do disposto nos artigos 591° n° 1 e) e 547° n° 1 e 6° do Código Processo Civil, DDDD) O Tribunal aquando da gestão inicial do processo não indeferiu a petição inicial, não providenciou pelo suprimentos de excepções que considerasse dilatórias, não considerou que o pedido era manifestamente improcedente, não providenciou se fosse o caso disso pelo aperfeiçoamento dos articulados, não convidou as partes a suprir quaisquer insuficiência ou exposição da matéria de facto, conforme lhe é permitido pelo artigo 590° do Código de processo Civil. EEEEE) Violou assim o preceituado no artigos 590° e 591° do Código de processo Civil, e 547° n° 1 e 6° do Código Processo Civil, FFFFF) Para além disso, a garantia de que todas as decisões judiciais devem ser fundamentadas tem, entre nós, assento constitucional (artigo 205.°, n.° 1 CRP), está configurada nos artigos 154.° e 615.°, n.° 1, alínea b), do CPC (anteriores artigos 158.° e 668.°, n.° 1, alínea b)) e consta do artigo 6.° da Declaração Europeia dos Direitos do Homem, como uma componente essencial da garantia de um processo equitativo (artigo 20.°, n.° 4.° mil. GGGGG) O art° 1353° do Código Civil consagra o direito potestativo do dono de um prédio obter o concurso dos donos dos prédios vizinhos para a demarcação das estremas entre o seu prédio e o deles. HHHHH) Visando efectivar esse direito, as acções de demarcação apresentam uma causa de pedir complexa, traduzindo-se na invocação da titularidade de prédios distintos, da continência e, por último, da controvérsia quanto aos limites, sendo certo que se trata da acção adequada ainda naquelas situações em que a linha limite é conhecida e indiscutida, destinando-se a acção a obter o concurso do dono do prédio vizinho para a mera aposição dos marcos. IIIII) O direito a demarcar prédios, nos termos do art° 1354° n° 2 do Código Civil depende, não tanto da invocação de uma linha de demarcação, mas antes da própria inexistência de demarcação em si, seno que tudo o mais deve ser conhecido pelo próprio Tribunal, aplicando, para efeitos da fixação de uma linha de demarcação, os critérios principal e supletivo previstos no citado preceito. JJJJJ) O direito de demarcação pode ser invocado desde que se verifique a continência de prédios pertencentes a proprietários diferentes e inexista linha divisória entre eles (seja porque, indiscutida entre os proprietários confinantes, não está marcada, sinalizada no terreno, seja porque a sua localização é objecto de controvérsia entre eles, seja porque eles pura e simplesmente desconhecem a sua localização. KKKKK) Se a divisão da área conflituante não puder ser resolvida pelos títulos de cada um, será sucessivamente resolvida pela posse ou outros meios de prova. No limite, não podendo ser resolvida por nenhum desses meios, será equitativamente dividida pelos proprietários confinantes. LLLLL) Ora, o tribunal no entender dos AA., teria de ter tomado decisão diferente, no sentido de continuidade do processo.»
16. Os recursos de apelação interpostos foram admitidos por despacho de 22.10.2019, com subida nos próprios autos e efeito devolutivo.
Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.
*
II - Âmbito do recurso de apelação
Sendo o objeto do recurso balizado pelas conclusões dos Recorrentes (artigos 635.º, n.º 4, 639.º, n.º 1, do CPC), ressalvadas as questões que sejam do conhecimento oficioso do tribunal (artigo 608.º, n.º 3, ex vi do artigo 663.º, n.º 2, do mesmo diploma), a solução a alcançar pressupõe a análise das seguintes questões:
- Da violação do princípio da igualdade de armas relativamente ao Réu, no precedente despacho de pronúncia sobre tal nulidade;
- Da ineptidão da petição inicial e da reconvenção por inviabilidade dos respetivos pedidos e ininteligibilidade das respetivas causas de pedir.
*
III - Fundamentação Fundamentação de facto
Com relevância para a decisão a proferir, importa ter em consideração o iter processual descrito no relatório.
* Apreciação do recurso
Da violação do princípio da igualdade de armas relativamente ao Réu, no precedente despacho de pronúncia sobre tal nulidade
Na perspetiva do Réu/Recorrente, foram violados os artigos 4.º do CPC e artigo 13.º da Constituição da República Portuguesa.
Com efeito, no dia 11.4.2018 foi proferido despacho a convidar os Autores a pronunciarem-se sobre a ineptidão da petição inicial, o mesmo não sucedendo relativamente ao Réu, relativamente ao qual, no mesmo despacho, admitidos liminarmente os pedidos reconvencionais.
Assim, considera o Réu/Recorrente que, contrariamente aos Autores/Recorridos, que foram notificados quanto à intenção de absolvição da instância, não teve a oportunidade de se pronunciar ao abrigo do disposto no artigo 3.º, n.º 3, do CPC.
Analisando o caso em apreço, constatamos que o Tribunal recorrido, com a finalidade de conhecer da exceção dilatória da nulidade decorrente da ineptidão da petição inicial, proferiu um despacho prévio a convidar os Autores a pronunciarem-se sobre tal nulidade, o mesmo não sucedendo quanto ao Réu, o que se traduz na violação dos princípios do contraditório e da igualdade de armas, expressos nos artigos 3.º e 4.º do CPC.
A omissão do contraditório implica uma nulidade processual, susceptível de influir no exame da causa – artigo 195.º do CPC.
O meio próprio para reagir contra as nulidades processuais cobertas por uma decisão judicial (despacho) que ordenou, autorizou ou sancionou (ainda que só de modo implícito) um ato ou omissão é o recurso desse despacho (na lição de Manuel de Andrade, explicando que se trata da «doutrina tradicional, condensada na máxima: dos despachos recorre-se; contra as nulidades reclama-se», in Noções elementares de Processo Civil, Reimpressão, Coimbra Editora, p. 183).
Na situação sub judice, o Réu/Recorrente recorreu com fundamento nesta nulidade.
E termina as suas alegações, pedindo que seja «anulada a decisão recorrida e seja ordenado o prosseguimento dos autos exclusivamente quanto ao peticionado pelo Réu/Reconvinte em sede de pedido reconvencional».
Ora, não obstante estarmos perante uma nulidade que, nos termos do artigo 195.º, n.º 2, do CPC, implica a anulação de todos os atos posteriores à sua verificação, determinando também a anulação da decisão final, quanto à reconvenção, certo é que a decisão quanto à questão seguinte a apreciar - exceção dilatória da nulidade de todo o processado, por ineptidão, que conduziu à absolvição da instância reconvencional - poderá prejudicar tal anulação.
Da ineptidão da petição inicial e da reconvenção por inviabilidade dos respetivos pedidos e ininteligibilidade das respetivas causas de pedir
a) Os Autores e o Réu interpuseram recursos independentes da decisão que decretou a ineptidão da petição inicial e da reconvenção, com a consequente nulidade do processado e a absolvição das partes das respetivas instâncias.
Uma vez que a questão jurídica a decidir em ambos os recursos é a mesma, será apreciada num só bloco.
No que concerne à ação, lê-se na decisão recorrida, sob o tema Da Ineptidão dos pedidos deduzidos por acção e por reconvenção, o seguinte:
«Ora, considerando o conteúdo da petição inicial, afigura-se que pela presente, pretendem os AA. exercer o direito de demarcação previsto no artigo 1353.º e seguintes do Cód. Civil. Resulta da previsão normativa do preceito acima identificado que o direito em causa assiste aos titulares dos direitos de propriedade sobre prédios confinantes, sendo incertas ou duvidosas as suas estremas. Por outro lado, actualmente o direito de demarcação é judicialmente exercido com recurso ao processo comum de declaração, que seguirá a forma comum de processo declarativo. Assim sendo, inexistindo já as acções especiais de arbitramento, no âmbito do qual se inseria a antiga acção de demarcação, prevista nos então vigentes artigo 1052.º e 1058.º do Cód. Proc. Civil, impõe-se que em sede de petição inicial, não só o demandante alegue a contiguidade dos prédios, mas também a razão pela qual a linha divisória entre estes se queda incerta ou duvidosa, e bem assim a exacta localização dessa mesma linha ou estrema, peticionando, a final, que reconheça o Tribunal que aquela linha passa em determinados pontos geográficos. Isto dado já não é possível, como era no passado, solicitar que o Tribunal aferisse, por arbitramento, a localização das estremas; antes se impõe, concretizar, por determinação destas, o pedido em causa, afirmando-se a sua concreta localização por forma a permitir a definição dos contornos do direito no caso concreto, quando tiver de ser proferida a sentença. Analisado o pedido realizado pelos AA. e acima sumariado, constato que o mesmo não possui a precisão e determinação que permitiriam não só ao R. exercer devidamente o contraditório, mas também a este Tribunal dizer o direito relativamente à concreta demarcação peticionada, já que em bom rigor nenhuma é concretamente solicitada. Carece, assim, o pedido deduzido das suficientes precisão e determinação que lhe confeririam validade formal e aptidão para introduzir plenamente o feito em juízo. É, pois, aquele ininteligível, porque vago; razão pela qual se prefigura a nulidade de todo o processo prevista no artigo 186.º do Cód. Proc. Civil.»
E, mais à frente, consta o seguinte:
«Donde, não resta senão declarar inviável do pedido deduzido por acção – o que não bulirá com o pedido reconvencional, atenta o disposto no artigo 266.º, n.º 6 do Cód. Proc. Civil -, por nulidade adveniente da ineptidão da petição inicial, em consequência de ininteligibilidade de causa de pedir, o que nos termos dos artigos 186.º, n.º 2, alínea a), 577.º, alínea b), 196.º, n.º 1, 578.º e 278.º, n.º 1, alínea b), todos do Cód. Proc. Civil, determina a absolvição do R. da instância por acção e a sua consequente extinção, o que desde já julgo.»
No que concerne à reconvenção, lê-se de igual modo na decisão recorrida que:
«Como acima já se foi deixando consignado, por via reconvencional, o R. deduz também pedido de demarcação, que, ao abrigo do artigo 266.º, n,º 6 do Cód. Proc. Civil, deve ser conhecido no presente âmbito já que não se encontra realizado na dependência do por acção impetrado. Contudo, de vício idêntico ao acima apontado, padecem os pedidos reconvencionais, dado que se se atentar no petitório inserto a fls. 42 e seguintes da contestação/reconvenção oferecida nos autos, constata-se de imediato que na demanda do Reconvinte, este solicita que se declare incerta as estremas entre os prédios dos autos nos troços A e B melhor assinaladosa fls. 96, solicitando que o Tribunal com base nos títulos; ou seja, não indicando concretamente a sua concreta localização. Ao que acresce que na Réplica oferecida, os Reconvindos limitam-se a afirmar que nunca houve litígio quanto à delimitação naqueles troços, não revelando assim conhecer os pontos nos quais pretende o R. fixar as estremas respectivas.
«Assim, e mais uma vez, declaro inviável o pedido reconvencional, por nulidade adveniente da ineptidão da petição inicial, em consequência de ininteligibilidade de causa de pedir, o que nos termos dos artigos 186.º, n.º 2, alínea a), 577.º, alínea b), 196.º, n.º 1, 578.º e 278.º, n.º 1, alínea b), todos do Cód. Proc. Civil, determina a absolvição dos AA/Reconvindos da instância reconvencional e a sua consequente extinção, o que desde já julgo.»
A decisão recorrida aponta para a inviabilidade dos pedidos, mas não deixa de se reportar à ininteligibilidade da causa de pedir, pelo que cumpre dilucidar os termos utilizados para melhor compreender o decidido.
b) A ineptidão da petição inicial constitui um vício de tal modo grave que, implicando a nulidade de todo o processo, origina a exceção dilatória prevista no artigo 577.º, alínea b), do CPC e conduz à absolvição da instância (artigo 278.º, n.º 1, alínea b), do mesmo diploma).
Segundo o artigo 186.º, n.º 1, do CPC, a ineptidão da petição inicial pode consistir na falta ou ininteligibilidade na indicação do pedido ou da causa de pedir [alínea a)], na contradição entre o pedido e a causa de pedir [alínea b)], ou na cumulação de causas de pedir ou de pedidos substancialmente incompatíveis [alínea c)].
Atentemos primeiramente na denominada inviabilidade do pedido.
São requisitos do pedido, a referência expressa na petição inicial (existência), a apresentação de forma clara e inteligível (inteligibilidade), o conteúdo determinado ou determinável em face da liquidação da sentença (determinação) e a coerência relativamente à causa de pedir ou pedidos cumulados (compatibilidade) – cf. Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Sousa, in Código de Processo Civil Anotado, Vol. I, Coimbra: Almedina, 2018, p. 218, nota 3.
Ao determinar que o autor formule o pedido de forma expressa (cf. artigo 552.º do CPC), a lei não só assegura à contraparte o exercício do direito de defesa, como coloca o próprio autor a coberto de decisões judiciais com um alcance diferente do pretendido.
Como decorre do artigo 186.º, n.º 3, do CPC, o pedido deve ter uma formulação que possa ser compreendida pelo réu e pelo juiz, dado que só assim é passível de sustentar uma ação em que se pretende uma decisão judicial definidora de um conflito de interesses, não incumbindo àqueles o jogo da «adivinhação» da vontade real do autor.
Com efeito, como referem os Autores citados, «Quanto ao réu, só pode exercer efetivamente o contraditório quando for confrontado com uma pretensão cujos contornos e alcance resultem em termos imediatos da petição inicial, sem necessidade de conjeturar acerca do verdadeiro objetivo do autor; no que ao juiz concerne, a clareza e a inteligibilidade da tutela que lhe é solicitada visam evitar, em todas as fases processuais, mas fundamentalmente na sentença final, incertezas quanto ao objeto da ação no que respeita à forma da tutela pretendida.» (obra citada, p. 219, nota 7).
O pedido ininteligível é aquele que se apresente «confuso, incompreensível, indecifrável, obscuro» (palavras do acórdão do STJ de 9.5.1995, CJ, t. II, p. 68)
Serão os pedidos formulados pelos Autores e pelo Réu/Reconvinte obscuros ou ininteligíveis?
O pedido dos Autores é o de fixação judicial dos limites do prédio rústico denominado «M… – A…», sito nos limites de Almada – Mafra, composto por cultura arvense oliveiras e horta com a área de 6.750 m2, inscrito na matriz predial rústica sob o artigo … – Secção “O”, da dita freguesia de Mafra, e descrito na Conservatória do Registo Predial de Mafra sob o n.º …, aos Autores pertencente, condenando-se o Réu no cumprimento da sentença que venha a ser proferida.
Os pedidos reconvencionais do Réu são:
a) Seja considerado por demarcar o Troço A e o Troço B da planta junta como doc. nº 7 e em consequência seja ordenada a sua demarcação com base nos títulos nos termos da primeira parte do n.º 1 do artigo 1354.º do Código Civil.
b) Caso se venha a entender que em alguma parte os títulos não são suficientes e se recorra às alternativas subsidiárias previstas no artigo 1354.º do Código Civil, sempre se requer sejam os títulos considerados suficientes quanto às suas áreas, conforme nº 2 do artigo 1354.º do Código Civil.
c) Seja a área excedente ou deficitária relativamente aos títulos, distribuida proporcionalmente pelas partes, conforme n.º 3 do artigo 1354.º do Código Civil.
O Tribunal a quo compreendeu perfeitamente os pedidos dos Autores e do Réu, pela forma como os enquadrou na ação de demarcação.
O Réu entendeu perfeitamente o pedido e, com base nele e nos factos alegados pelos Autores, pôde sustentar a sua defesa e equacionar os seus pedidos em sede de reconvenção.
Em nosso entender, a decisão recorrida sai da órbitra da ineptidão, ao referir-se à inviabilidade dos pedidos.
Na verdade, quando uma situação é analisada à luz de uma determinada norma jurídica, e, em face dela, não se pode concluir pelo efeito pretendido, a questão não é de ininteligibilidade, mas de improcedência da ação.
É o que aqui está em causa.
O Tribunal recorrido entende que, tendo «desaparecido» o processo especial de demarcação, tal como estava previsto no CPC de 1961, na versão anterior à reforma de 1995/96, os pedidos formulados não têm apoio legal.
É o que ressalta da seguinte passagem da decisão recorrida:
«Assim sendo, inexistindo já as acções especiais de arbitramento, no âmbito do qual se inseria a antiga acção de demarcação, prevista nos então vigentes artigo 1052.º e 1058.º do Cód. Proc. Civil, impõe-se que em sede de petição inicial, não só o demandante alegue a contiguidade dos prédios, mas também a razão pela qual a linha divisória entre estes se queda incerta ou duvidosa, e bem assim a exacta localização dessa mesma linha ou estrema, peticionando, a final, que reconheça o Tribunal que aquela linha passa em determinados pontos geográficos. Isto dado já não é possível, como era no passado, solicitar que o Tribunal aferisse, por arbitramento, a localização das estremas; antes se impõe, concretizar, por determinação destas, o pedido em causa, afirmando-se a sua concreta localização por forma a permitir a definição dos contornos do direito no caso concreto, quando tiver de ser proferida a sentença.»
Dir-se-á que, como nenhum dos pedidos formulados pelas partes afirma a concreta localização das estremas dos prédios confinantes, num «passe de mágica» passaram à situação de obscuridade.
Ora, antes de mais, havia que confrontar os pedidos formulados com o fim abstrato designado pela lei.
O processo civil não pode ser interpretado e aplicado como um fim em si mesmo.
No caso, estamos perante uma ação declarativa sob a forma de processo comum que se traduz numa verdadeira ação de demarcação.
A propósito da opção legislativa que consistiu nas alterações/revogações nos artigos 1052.º a 1068.º do CPC de 1961, pondo termo à previsão da ação de demarcação como um processo especial, escreveu-se no preâmbulo do Decreto-Lei n.º 329-A/95, de 12.12, que:
«Procedeu-se, de igual modo, à eliminação, como categoria processual autónoma, das acções de arbitramento - espécie que, no Código vigente, abarca situações heterogéneas, amontoadas no artigo 1052º e tendo como único elemento aglutinador comum a realização de um arbitramento, precedendo a decisão judicial, em muitos casos meramente homologatória do laudo dos árbitros. Entende-se que a prova pericial – objecto, como se referiu, de profunda reformulação e flexibilização – se revelará perfeitamente idónea para dar resposta, no quadro do processo comum de declaração, às necessidades e interesses tutelados com a instituição da figura do "arbitramento", com a vantagem de outorgar ao juiz o poder-dever de valorar livremente os resultados da perícia a que seja necessário proceder.»
O antigo processo especial adjetivava, devida e rigorosamente, os vários «passos» do direito substantivo, os vários critérios de demarcação estabelecidos no artigo 1354.º do Código Civil.
Porém, há que colocar o foco no que é verdadeiramente essencial:
«Com ou sem processo especial, o direito substantivo não mudou» - cf. acórdão do TRC de 7.2.2012, p. 497/08.2TBTNV.C1, in www.dgsi.pt; negrito e subl. nossos.
Sempre que haja dois prédios contíguos, pertencentes a proprietários diferentes e se a linha divisória entre eles for incerta e duvidosa, qualquer dos proprietários tem o direito de recorrer ao tribunal, a fim de que se fixem as estremas ou se trace a linha divisória dos dois prédios; nisto se traduz o direito de demarcação consagrado no artigo 1353.º do Código Civil.
Demarcação que, também resulta do artigo 1354.º do Código Civil, devendo ser feita com base nos seguintes critérios:
1.º - Em conformidade com os títulos respetivos;
2.º - Na falta ou insuficiência de títulos, segundo a posse em que estiverem os confinantes ou de acordo com o que resultar de outras provas que for possível coligir;
3.º - Quando não haja provas que habilitem a determinar a linha divisória, distribui-se o terreno, objeto da contenda, em partes iguais.
Como se escreveu no citado acórdão do TRC de 7.2.2012, «Eram justamente estas especificidadesda lei substantiva que o antigo processo especial conhecia e tinha presente; e que, passo a passo, conforme o processo ia avançando, impunha, exigindo respostas, sem prescindir, como é evidente, da realização duma perícia. Perícia, prova pericial, que deve continuar agora a realizar-se.»
A decisão recorrida incorre, pois, em erro de julgamento quando não atenta no conteúdo substantivo da ação de demarcação, considerando que, eliminado o processo especial, desaparece também o correspondente direito substantivo.
A ação de demarcação, embora siga a forma de processo comum, não perdeu a natureza material de arbitramento.
O que significa que o tribunal deve ter neste tipo de ações que envolvem um arbitramento uma função diversa da que desenvolve na generalidade das ações de processo comum, devendo determinar oficiosamente (ou promover junto das partes) a realização das iniciativas processuais necessárias a alcançar o desiderato de concretizar o arbitramento.
E tem o instrumento ao serviço dessa finalidade: a adequação formal que saiu realçada e reforçada nos artigos 6.º e 547.º do CPC de 2013.
O citado acórdão do TC de 7.2.2012, que seguimos de perto, explicita os dois momentos relevantes do processo:
«Na atual ação comum de demarcação, têm pois que, em abstração, continuar a considerar-se os vários momentos que antes existiam, autonomamente, no processo especial revogado; um primeiro momento, correspondente à alegação dos factos respeitantes ao direito à demarcação (a existência de prédios confinantes, pertencentes a proprietários distintos, cujas estremas são incertas ou duvidosas); e um segundo “momento”, estabelecido o direito à demarcação – estabelecido que a linha divisória entre eles é incerta e duvidosa – respeitante à efetivação delimitação dos prédios a efetuar de acordo com os critérios de demarcação supra indicados (critérios que funcionam de forma sequencial, na insuficiência do critério de demarcação anterior). Sendo que, no primeiro momento abstrato, quanto ao estabelecimento do direito à demarcação, tratando-se da caracterização da causa de pedir da ação de demarcação, vale, em matéria de ónus da prova, o artigo 342.º, n.º 1, do Código Civil, com a consequente necessidade de o autor provar os factos constitutivos do direito que alega; enquanto, no segundo momento abstrato, correspondente já à concretização da demarcação através dos critérios de decisão plasmados no artigo 1354.º do Código Civil, deixa de valer (enquanto critério de decisão) o sucesso ou insucesso da atividade probatória da parte que, propondo a ação, fornece ao tribunal uma determinada linha divisória, uma vez que, perante o insucesso de tal atividade probatória, a solução não pode passar pelo perpetuar da incerteza quanto aos limites dos dois prédios, mas antes pela distribuição salomónica do terreno em litígio (cf.artigo 1354.º, n.º 2, parte final do Código Civil).» (negrito nosso).
Neste sentido, podem consultar-se, entre outros, o acórdão do TRE de 14.10.2004 (CJ, n.º 177, T. IV, 2004), o acórdão do TRL de 29.10.2013 (p. 2642/04.6 TBBRR.L1-1, www.dgsi.pt) e o acórdão do TRG de 18.12.2017 (p. 1955/15.6T8BR.G1, in www.dgsi.pt).
Registe-se que esta problemática não é algo sem paralelo pois, como é sabido, também o processo especial de reforma de documentos foi suprimido com a entrada em vigor do CPC de 2013 (apenas se transpôs o procedimento no que concerne a reforma de autos, caindo a reforma de documentos e de livros notariais).
Assim, encontrava-se expressamente prevista em lei - artigos 1069.º a 1073.º do CPC de 1961 - a possibilidade de se recorrer à reforma judicial de documentos, procedimento que permitia a reconstituição de documento pré-existente mas que, por qualquer razão não imputável ao requerente, se tinha perdido, sendo admissível a sua reconstituição com recurso à prova testemunhal.
Ora, atendendo à importância que a reforma de documento continua a ter, poderá ser realizada em sede de processo comum, com as devidas adaptações, recorrendo-se ao princípio da adequação formal e à interpretação histórica e teleológica, quiçá até «repristinando» alguns passos perdidos do processo especial eliminado.
Reduzindo toda a argumentação ao seu reduto mais elementar e nem por isso menos relevante, temos que a todo o direito deve corresponder a ação adequada a fazê-lo reconhecer em juízo, a prevenir ou reparar a violação dele e a realizá-lo coercivamente (princípio da tutela jurisdicional efetiva, consagrado no artigo 2.º, n.º 2, do CPC (e no artigo 20.º da CRP).
Assim, é manifesto que importa in casu acautelar o efeito útil da ação de demarcação, nos termos em que se configura atualmente.
Procedem, pois, as alegações de ambas as partes no sentido de não se verificar a inviabilidade dos pedidos.
c) A decisão recorrida parece aflorar o vício da ininteligibilidade da causa de pedir.
Assim, escreveu-se «Donde, não resta senão declarar inviável do pedido deduzido por acção (…), por nulidade adveniente da ineptidão da petição inicial, em consequência de ininteligibilidade de causa de pedir, o que nos termos dos artigos 186.º, n.º 2, alínea a), 577.º, alínea b), 196.º, n.º 1, 578.º e 278.º, n.º 1, alínea b), todos do Cód. Proc. Civil, determina a absolvição do R. da instância por acção e a sua consequente extinção, o que desde já julgo.»
E refere, a propósito da reconvenção:
«Contudo, de vício idêntico ao acima apontado, padecem os pedidos reconvencionais, dado que se se atentar no petitório inserto a fls. 42 e seguintes da contestação/reconvenção oferecida nos autos, constata-se de imediato que na demanda do Reconvinte, este solicita que se declare incerta as estremas entre os prédios dos autos nos troços A e B melhor assinalados a fls. 96, solicitando que o Tribunal com base nos títulos; ou seja, não indicando concretamente a sua concreta localização.
(…) Assim, e mais uma vez, declaro inviável o pedido reconvencional, por nulidade adveniente da ineptidão da petição inicial, em consequência de ininteligibilidade de causa de pedir, o que nos termos dos artigos 186.º, n.º 2, alínea a), 577.º, alínea b), 196.º, n.º 1, 578.º e 278.º, n.º 1, alínea b), todos do Cód. Proc. Civil, determina a absolvição dos AA/Reconvindos da instância reconvencional e a sua consequente extinção, o que desde já julgo.»
A ininteligibilidade da causa de pedir ocorre quando, embora se aleguem factos concretos, a sua narração se mostre, de forma insuperável, equívoca, ambígua, prolixa ou difusa que se torna impossível compreender os contornos essenciais da situação em apreço.
Face ao preceituado no artigo 498.º, n.º 4, do CPC, que afirma no nosso direito adjetivo a teoria da substanciação, pode definir-se causa de pedir como sendo o ato ou facto jurídico, simples ou complexo, de que deriva o direito que se invoca ou no qual assenta o direito invocado pelo autor e que este se propõe fazer valer.
Tem-se em vista não o facto jurídico abstrato, tal como a lei o configura, mas um certo facto jurídico concreto, conciso e preciso, cujos contornos se enquadram na definição legal.
A causa de pedir é, pois, o facto material apontado pelo autor e produtor de efeitos jurídicos e não a qualificação jurídica que este lhe emprestou ou a valoração que o mesmo entendeu dar-lhe.
A ideia geral e primordial, desde logo na perspetiva do julgador, no que concerne à figura da ineptidão da petição inicial, é a de impedir o prosseguimento duma ação viciada por falta ou contradição interna da matéria ou objeto do processo, que mostre desde logo não ser possível coerente e unitário ato de julgamento – cf. Castro Mendes, Direito Processual Civil, ed. AAFDL, 1978, 3.º, p. 47.
Na lição de Alberto dos Reis, há que ter presente que «Se o autor exprimiu o seu pensamento em termos inadequados, serviu-se de linguagem tecnicamente defeituosa, mas deu a conhecer suficientemente qual o efeito jurídico que pretendia obter, a petição será uma peça desajeitada e infeliz, mas não pode qualificar-se de inepta».» - Comentário ao Código de Processo Civil, vol. 2.º, pp. 364 e 371.
Com efeito, petição prolixa não é o mesmo que petição inepta e causa de pedir obscura ou imprecisa não é o mesmo que causa de pedir ininteligível.
A ineptidão da petição inicial por ininteligibilidade da causa petendi apenas sobrevém quando os factos sejam enunciados de modo tal, que seja impossível, ou, pelo menos, razoavelmente inexigível, determinar, qual o núcleo e sentido essencial da causa de pedir.
Se, não obstante a confusão, obscuridade imperfeição, equivocidade, incorreção ou deficiência, na exposição factual, tal determinação - vg. pela própria posição assumida pelo réu - for possível, não deve o juiz declarar a ineptidão, mas antes convidar o autor a suprir e corrigir os vícios e as imperfeições detetadas, nos termos do artigo 590.º, n.º 2, alínea b), e 4, do CPC.
Como vimos, a ação de demarcação é uma ação declarativa cujo objetivo é marcar a linha divisória entre prédios pertencentes a donos diferentes.
O seu fim é fazer reconhecer o direito concedido ao proprietário pelo artigo 1353.º do Código Civil, de obrigar os donos de prédios confinantes a concorrerem para a demarcação de estremas.
Nas palavras do citado acórdão do TRG de 18.12.2017, «Considerando estes pressupostos, encontra-se há muito assente, que se saiba sem oposição, que a causa de pedir nas ações de demarcação é complexa, e exige a alegação: - da titularidade por Autor e Réu de prédios distintos; - da confinância desses prédios; - da controvérsia quanto aos limites e/ou da inexistência de linha divisória sinalizada no terreno.»
Também o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 5.10.2012 (p. 725/04.1TBSSB.L1.S1, www.dgsi.pt) refere que «A demarcação, portanto, tanto almeja a definição e fixação das estremas dos prédios cujos limites não são conhecidos, ou pelo menos, são discutíveis (a actio finium regundorum do Direito Romano) como simplesmente a aposição de marcos (supondo-se neste caso, portanto, que os limites entre os prédios são indisputados e apenas se pretende torná-los mais visíveis) (cfr. Gonzalez, José Alberto, Código Civil Anotado, vol. IV, 2011, p. 213-214)».
O acórdão do TRP de 5.10.2011 (p. 666/04.2TBLMG.P1, www.dgsi.pt) pronunciou-se no sentido de que «O direito a demarcar prédios depende, não tanto da invocação de uma linha de demarcação, mas antes da própria inexistência de demarcação em si - tudo o mais deve ser conhecido pelo próprio tribunal, aplicando, para efeitos da fixação de uma linha de demarcação, os critérios principal e supletivo previstos no citado artº 1354º.».
Também se sumariou no acórdão do STJ de 10.5.2012 (725/04.1TBSSB.L1.S1, www.dgsi.pt) o seguinte:
«I - Os proprietários de prédios confinantes e contíguos estão reciprocamente obrigados a concorrer para a demarcação dos respectivos prédios – o que bem se compreende pois a determinação dos limites de um prédio tem implicações sobre os dos prédios vizinhos que com ele confinam – quer a linha divisória seja pacífica e indiscutida ou controvertida. II - A demarcação tanto almeja a definição e fixação das estremas cujos limites não são conhecidos – ou pelos menos são discutíveis – como, simplesmente, a aposição de marcos, quando os limites não são disputados e apenas se pretende torná-los mais visíveis. III - Assim, desde que se verifique a confinância de prédios pertencentes a diferentes proprietários e inexista linha divisória entre eles (seja porque ela, embora indiscutida, não está marcada, seja porque é objecto de controvérsia ou até porque desconhecem a sua localização) está aberta a porta para a actuação do direito de demarcação. IV - Nos termos em que se encontra regulada a demarcação no art. 1354.º do CC – e uma vez verificados os pressupostos do exercício do respectivo direito – não há lugar à improcedência da acção, no sentido de desatender a pretensão de definir os limites dos prédios, devendo a mesma ser resolvida (i) pelos títulos de cada um dos proprietários; (ii) na sua impossibilidade, pela posse destes ou outros meios de prova; (iii) ou ainda dividindo a área em litígio por cada um em partes iguais. V - Logo, o autor só tem que alegar e provar os factos constitutivos do direito à demarcação, a saber: a confinância dos prédios, a titularidade do respectivo direito de propriedade na pessoa do autor e do demandado e a inexistência, incerteza, controvérsia ou tão só desconhecimento sobre a localização da respectiva linha divisória. (…)»
Ora, a ação e a reconvenção em apreço contêm a articulação dos factos relativos à causa de pedir supra explicitada.
Nelas é invocada a confinância dos prédios, a titularidade do direito de propriedade na pessoa do autor e do demandado e a incerteza ou controvérsia acerca da localização da linha dividória.
Não vislumbramos, nem a decisão recorrida explica, quais os factos integrantes do núcleo da causa de pedir omitidos e que conduzem a um vício que fere todo o processo de nulidade.
Assim, dúvidas não restam de que também aqui assiste razão aos Recorrentes, na parte em que defendem os argumentos favoráveis à procedência das respetivas apelações.
d) Em face das considerações expendidas, urge concluir pela procedência de ambos os recursos, devendo ser revogada a decisão recorrida nos segmentos dirigidos quer à ação quer à reconvenção, devendo os autos prosseguir os seus termos com a identificação do objeto do litígio e a enunciação dos temas da prova, de preferência em audiência prévia, se necessário precedidas de outros atos que se considere imprescindíveis.
A questão da nulidade processual suscitada pelo Réu/Recorrente, com fundamento na omissão de convite a pronunciar-se sobre a ineptidão da reconvenção, fica prejudicada, em face do ora decidido.
Uma vez que ambas as partes ficaram vencidas nos recursos interpostos pela outra parte, são responsáveis pelo pagamento das custas do recurso, ao abrigo dos artigos 527.º, 529.º, 533.º e 607.º, n.º 6, do CPC, nos seguintes termos:
- O Réu paga as custas do recurso interposto pelos Autores;
- Os Autores/Reconvindos pagam as custas do recurso interposto pelo Réu/Reconvinte.
*
IV - Decisão
Nestes termos, acordam os Juízes desta 2.ª Secção deste Tribunal da Relação de Lisboa em:
a) julgar procedente a apelação dos Autores AR… e MA… e, em consequência, revogar a decisão recorrida quanto à ineptidão da petição inicial;
b) julgar procedente a apelação do Réu GA… e, em consequência, revogar a decisão recorrida quanto à ineptidão da reconvenção;
c) substituir ambas as decisões por outras que determinem o prosseguimento da ação e da reconvenção com a prolação do despacho de identificação do objeto do litígio e de enunciação dos temas da prova, de preferência com a convocação de audiência prévia, se necessário precedidos de outros atos que se considere imprescindíveis.
Mais se decide condenar o Réu no pagamento das custas do recurso interposto pelos Autores e os Autores/Reconvindos no pagamento das custas do recurso interposto pelo Réu/Reconvinte.
*
Lisboa, 19 de dezembro de 2019
Gabriela Cunha Rodrigues
Arlindo Crua
António Moreira