CONTRATO DE MEDIAÇÃO IMOBILIÁRIA
MEDIADOR
REMUNERAÇÃO
CONCLUSÃO DO CONTRATO
Sumário


I - No contrato de mediação imobiliária a regra é a de que a remuneração da empresa mediadora só é devida com a conclusão e perfeição do negócio visado pelo exercício da mediação, ou seja, que a comissão do mediador apenas é devida quando a sua atividade tenha contribuído, de forma determinante, para a celebração (e perfeição) do negócio, por via da aproximação do comitente com terceiros para o efeito.
II - Assim, mesmo que a mediadora se tenha empenhado na busca de interessados na conclusão do negócio, se este não se concretizar, não haverá lugar a remuneração, suportando, então, o mediador o risco da sua atividade comercial. E, é assim, mesmo que o contrato seja celebrado em regime de exclusividade, ressalvadas, porém, as exceções previstas no artigo 19º da Lei n.º 15/2013.

Texto Integral



Acórdão da 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora

I – Relatório
1. BB – Mediação Imobiliária Unipessoal, Lda., apresentou requerimento de injunção [que prosseguiu como acção especial para cumprimento de obrigações pecuniárias – cf. regime aprovado pelo Decreto-Lei n.º 269/98, de 1 de Setembro] contra CC, pedindo a condenação da requerida no pagamento da quantia de € 9.225,00, correspondente ao preço convencionado pelas partes para os serviços de mediação imobiliária realizados pela A. à R., com vista à venda do imóvel pertencente à R. e ao seu ex-marido, acrescido de juros moratórios, à taxa legal, vencidos e vincendos, até efectivo e integral pagamento, alegando, em síntese, a celebração do contrato de mediação e que na execução do mesmo angariou comprador nas condições acordadas com a R., mas que esta recusou a celebração do negócio de compra e venda.

2. Regularmente citada, nos termos do artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 269/98, de 1 de Setembro, a requerida deduziu oposição, alegando que a requerente não conseguiu comprador para a sua casa pelo preço convencionado pelas partes no contrato de mediação, que o contrato foi subscrito com uma cláusula de não exclusividade, e que rescindiu o contrato antes de proceder à venda da casa.

3. Realizou-se a audiência de julgamento, no decorre da qual a A. apresentou articulado superveniente, alegando ter, entretanto, tomado conhecimento de que a R. procedeu à venda da casa em 26/03/2018, o que foi admitido por despacho de fls.53.

4. Após veio a ser proferida sentença, na qual se decidiu julgar improcedente a acção e absolver a R. do pedido.

5. Inconformada interpôs a A. o presente recurso, que conclui pedindo a revogação da sentença e a condenação da R. no pedido, com os fundamentos seguintes [segue transcrição das conclusões do recurso]:
A) Em casos, como o dos autos, em que a comitida mediadora alcançou os resultados visados com a mediação, angariando comprador em condições que o comitente expressamente aceitou, mas em que o comitente-vendedor veio a denegar a realização desse contrato visado e expressamente por si aceite, o nº 2 do art. 19º da Lei 15/2013, de 8 de Fevereiro não obsta à exigibilidade da remuneração pelo facto de a mediação haver sido contratada sob o regime da não exclusividade.
B) O que tal número 2 pretende é deixar claro que, no regime de exclusividade, a remuneração é devida, independentemente dos resultados obtidos pela própria mediação, ou da rejeição do negócio angariado, ou da realização do negócio visado por via da acção ou intervenção de terceiros – dito de outro modo, o que decorre daquele nº 2 é uma vinculação do comitido para com o comitente, e vice-versa, e durante todo o tempo contratado, sob pena de exigibilidade da retribuição (que será em contrapartida da desvinculação ou da celebração do negócio contratado à margem ou à revelia da comitida.
C) Como já se disse em outro momento dos autos, o nº 1 do art. 19º apenas estabelece o momento da exigibilidade da obrigação, que não a sua constituição.
D) Outra interpretação da lei levaria à postergação dos princípios e exigências da boa-fé negocial, da conformação aos bons costumes e à moral pública – que têm tradução também nos valores dos pacta sunt servanda, por exemplo.
E) Deve, pelo exposto, ser a douta sentença substituída pela condenação da Ré nos termos peticionados, com todas as consequências legais.

6. Contra-alegou a R., pugnando pela confirmação da sentença.
O recurso foi admitido como de apelação, com subida nos próprios autos e efeito meramente devolutivo.
Colhidos dos vistos legais, cumpre apreciar e decidir.
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II – Objecto do recurso
O objecto do recurso, salvo questões de conhecimento oficioso, é delimitado pelas conclusões dos recorrentes, como resulta dos artigos 608º, nº 2, 635º, nº 4, e 639º, nº 1, do Código de Processo Civil.
Considerando o teor das conclusões apresentadas, a única questão a decidir consiste em saber se a A. tem direito a receber a remuneração pelos serviços prestados no âmbito do contrato de mediação celebrado com a R..
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III – Fundamentação
A) - Os Factos
Na 1ª instância foram dados como provados os seguintes factos:
1. A Requerente é uma empresa do ramo de actividade de mediação imobiliária, detentora da licença AMI n.º …, emitida pelo Instituto dos Mercados Públicos, do imobiliário e da Construção, I.P. (IMPLC, IP).
2. Em 7/09/2017, a requerente, como mediadora celebrou com a Requerida um contrato de mediação imobiliária, que reduziram a escrito, por via do qual aquela se obrigou a procurar destinatário para a realização de negócio jurídico de compra e venda, pelo preço de € 165.000,00 (cento e sessenta e cinco mil euros) de prédio de que a requerida e o seu ex-marido eram proprietários, prédio esse urbano, destinado a habitação constituído por 4 divisões assoalhadas sito na Rua …, n.º …, em Évora, União de Freguesias de Malagueira e Horta das Figueiras, do concelho de Évora, descrito na Conservatória do Registo Predial sob a ficha n.º … e inscrito na matriz predial urbana da dita união de freguesias sob o n.º ….
3. No âmbito do contrato referido em 2), foram convencionadas, entre outras, as seguintes cláusulas contratuais:
“- Cláusula 4.ª (regime de contratação)
1) O segundo contraente contrata a mediadora em regime de não exclusividade. (…)
3) No que respeita ao pagamento da remuneração, caso o negócio visado tenha sido celebrado em regime de exclusividade e não se concretize por causa imputável ao cliente proprietário ou ao arrendatário trespassante do bem imóvel, é devida à empresa a remuneração acordada.
- Cláusula 5.ª (remuneração)
1) A remuneração é devida se a Mediadora conseguir destinatário que celebra com o segundo contraente o negócio visado pelo presente contrato, nos termos e com as excepções previstas no n.º 1 e 2 do artigo 19.º da Lei n.º 15/2013 de 8 de Fevereiro.
2) O segundo contratante obriga-se a pagar à Mediadora a título de remuneração a quantia de 5% calculada sobre o preço pelo qual o negócio é efectivamente concretizado acrescido de IVA à taxa legal de 23%.
3) O pagamento da remuneração apenas será efectuado nas seguintes condições: 50% após a celebração do contrato-promessa e o remanescente de 50% na celebração da escritura, documento particular ou conclusão do negócio.
- Cláusula 8.ª (Prazo de duração do contrato)
O presente contrato tem a validade de 180 dias contados a partir da data da sua celebração, renovando-se automaticamente por iguais e sucessivos períodos de tempo. Os contraentes podem impedir a renovação automática do presente contrato através de carta registada com aviso de recepção ou outro meio equivalente, com a antecedência mínima de 10 dias em relação ao seu termo.”
4. Em finais de Outubro de 2017 a requerente angariou comprador para a casa da requerida, pelo valor de 150.000€, tendo esta comunicado à requerente aceitar tal valor.
5. A requerida veio, todavia, a recusar a celebração do negócio de compra e venda.
6. Em 18 de Novembro de 2017 a requerida endereçou à requerente uma comunicação em que solicitava “(…) a rescisão do contrato de mediação imobiliária assinado em 07/09/2017 (…)”.
7. Em 26 de Março de 2018, a requerida e o seu ex-marido, DD, procederam à venda do imóvel referido em 2), pelo preço de 155.000€ (cento e cinquenta e cinco mil euros), através de mediação imobiliária da empresa “EE Sociedade de Mediação Imobiliária, Unipessoal Lda.”
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B) – O Direito
1. Com a presente acção pretendia a A. receber a remuneração que entende ser-lhe devida pela R. na sequência do contrato de mediação imobiliária com esta celebrado em 07/09/2017, cujo regime legal é regulado pela Lei n.º 15/2013, de 8 de Fevereiro.
De acordo com o n.º 1 do artigo 2.º da Lei 15/2013, de 8 de Fevereiro,“[a] actividade de mediação imobiliária consiste na procura, por parte das empresas, em nome dos seus clientes, de destinatários para a realização de negócios que visem a constituição ou aquisição de direitos reais sobre bens imóveis, bem como a permuta, o trespasse ou o arrendamento dos mesmos ou a cessão de posições em contratos que tenham por objecto bens imóveis”, acrescentando-se no n.º 2, que esta actividade consubstancia-se também no desenvolvimento das seguintes acções: “a) Prospecção e recolha de informações que visem encontrar os bens imóveis pretendidos pelos clientes; b) Promoção dos bens imóveis sobre os quais os clientes pretendam realizar negócios jurídicos, designadamente através da sua divulgação ou publicitação, ou da realização de leilões.”
Na sentença concluiu-se que, em função da factualidade provada, foi celebrado entre as partes, em 07/09/2017, um contrato de mediação imobiliária, vigorando pelo período de 180 dias, isto é, até 07/03/2018, e que, «face ao teor das cláusulas convencionadas e, bem assim, o regime legal aplicável ao caso, não estavam reunidas as condições factuais para que, em termos jurídicos, a requerida pudesse cessar o contrato celebrado, de forma unilateral, em 18/11/2017, através da “comunicação da rescisão do contrato”, pelo que tal comunicação não teve o condão de fazer cessar os efeitos contratuais em curso, sendo, por conseguinte, ineficaz.»
Porém, não obstante a ineficácia da comunicação de rescisão do contrato, entendeu-se não ter a mediadora direito à remuneração, fundamentando-se a decisão no seguinte:
«No que à remuneração diz respeito, dispõe a cláusula 5.ª do contrato celebrado pelas partes o seguinte: “1) A remuneração é devida se a Mediadora conseguir destinatário que celebra com o segundo contraente o negócio visado pelo presente contrato, nos termos e com as excepções previstas no n.º 1 e 2 do artigo 19.º da Lei n.º 15/2013, de 8 de Fevereiro. (…)”. Por sua vez, a cláusula 4.ª da mesma fonte contratual dispõe “3) No que respeita ao pagamento da remuneração, caso o negócio visado tenha sido celebrado em regime de exclusividade e não se concretize por causa imputável ao cliente proprietário ou ao arrendatário trespassante do bem imóvel, é devida à empresa a remuneração acordada.”
Já o art. 19.º da Lei 15/2013, de 8 de Fevereiro – para qual remete a cláusula 5.ª do contrato celebrado – refere: “1 - A remuneração da empresa é devida com a conclusão e perfeição do negócio visado pelo exercício da mediação ou, se tiver sido celebrado contrato -promessa e no contrato de mediação imobiliária estiver prevista uma remuneração à empresa nessa fase, é a mesma devida logo que tal celebração ocorra. 2 — É igualmente devida à empresa a remuneração acordada nos casos em que o negócio visado no contrato de mediação tenha sido celebrado em regime de exclusividade e não se concretize por causa imputável ao cliente proprietário ou arrendatário trespassante do bem imóvel.”
Dos preceitos legais supra citados, e da cláusula contratual transcrita, verifica-se que a requerente, enquanto mediadora, comprometeu-se, perante a sua cliente (a requerida) a desenvolver uma série de acções com vista à venda do seu imóvel, em troca de uma remuneração que, de acordo com a cláusula 5.ª do contrato (e de acordo com o disposto no art. 19.º da Lei 15/2013, de 8 de Fevereiro) só seria devida com a conclusão e perfeição do negócio visado pelo exercício da mediação. No dizer do acórdão do STJ de 28.04.2009, cuja doutrina se acompanha, “O comitente só fica constituído na obrigação de remunerar o mediador se o negócio tido em vista pelo incumbente for concretizado em virtude da actividade do mediador, ou seja, a obrigação de meios que lhe incumbe há-de desembocar no resultado pretendido – a celebração do negócio para que foi mandatado o mediador – sob pena de se considerar que o contrato não almejou a perfeição e, não surtindo efeito útil a actividade do mediador – o risco, a álea negocial – não há lugar à remuneração (comissão), nem ao pagamento de despesas se o contrato for celebrado pelo incumbente com terceiro, que não se interessou pelo negócio por causa da actuação do mediador.”
Note-se que a conclusão e perfeição do negócio não seria pressuposto necessário ao recebimento da remuneração pela requerente, caso o contrato tivesse sido celebrado em regime de exclusividade. Aqui, a não concretização do negócio por causa imputável ao cliente seria suficiente para gerar na esfera jurídica da requerente, o direito à remuneração (conforme art. 19.º/2 da Lei 15/2013, de 8 de Fevereiro). Contudo, no caso em apreço, tal circunstância não é suficiente para gerar na Autora o direito à contraprestação pelos serviços de mediação prestados à requerida, na medida em que o negócio visado pela mediação não se concluiu (aliás, a Ré e o seu ex-marido acabaram por vender a casa a outras pessoas, que não lhes foram apresentadas pela Autora, e por um preço diferente do negócio que a Autora visava mediar, pelo que o contrato de compra e venda efectivamente realizado não teve qualquer conexão com os serviços de mediação levados a cabo pela Autora), e irreleva a quem deva ser imputado tal desiderato, na medida em que o contrato foi celebrado em regime de não exclusividade.
Claro está que a circunstância de a Autora não ter direito à remuneração pelos serviços de mediação prestados à Ré – nos termos supra expostos – não invalida o seu direito a poder vir ser ressarcida pelos danos que haja sofrido com a conduta da Ré durante a vigência do contrato. Contudo, a Autora não fundamentou a sua causa de pedir no instituto da responsabilidade civil (nem peticionou uma indemnização), antes alicerçou o seu pedido no contrato celebrado e no direito à contraprestação (remuneração convencionada) pelos serviços que prestou à ré. Estando o objecto da acção (pela causa de pedir e do pedido) circunscrito ao dever de prestar, não pode ser apreciado o eventual dever de indemnizar que pudesse estar em causa.
Em face do exposto, assente que está a não exclusividade do contrato de mediação celebrado entre as partes e a circunstância do negócio proposto não se ter realizado com o interessado conseguido por intermédio da autora, não tem esta direito a receber a remuneração convencionada, sendo totalmente improcedente o seu pedido.»

2. A A./Recorrente discorda deste entendimento, porquanto considera que, tendo a mediadora alcançado os resultados visados com a mediação, angariando comprador em condições que o comitente-vendedor expressamente aceitou, mas que não se concretizou por culpa deste, tem direito à remuneração, a isso não obstando a norma do n.º 2 do artigo 19º da Lei n.º 15/2013, a qual visa apenas deixar claro que, no regime de exclusividade, a remuneração é devida, independentemente dos resultados obtidos.
Porém, não se nos afigura que a razão esteja do lado da recorrente, em face do regime legal aplicável.
Senão vejamos:

3. No que se reporta ao pagamento da remuneração pela actividade da mediadora, estabeleceu-se na cláusula 5ª do contrato:
«1) A remuneração é devida se a Mediadora conseguir destinatário que celebra com o segundo contraente o negócio visado pelo presente contrato, nos termos e com as excepções previstas no n.º 1 e 2 do artigo 19.º da Lei n.º 15/2013 de 8 de Fevereiro.
2) O segundo contratante obriga-se a pagar à Mediadora a título de remuneração a quantia de 5% calculada sobre o preço pelo qual o negócio é efectivamente concretizado acrescido de IVA à taxa legal de 23%.
3) O pagamento da remuneração apenas será efectuado nas seguintes condições: 50% após a celebração do contrato-promessa e o remanescente de 50% na celebração da escritura, documento particular ou conclusão do negócio.»

4. O acordado pelas partes mostra-se em consonância com o regime estabelecido nos n.ºs 1 e 2 do artigo 19º da Lei n.º 15/2013, de 8 de Fevereiro, para o qual o contrato remete, onde se estabelece que:
«1 - A remuneração da empresa é devida com a conclusão e perfeição do negócio visado pelo exercício da mediação ou, se tiver sido celebrado contrato-promessa e no contrato de mediação imobiliária estiver prevista uma remuneração à empresa nessa fase, é a mesma devida logo que tal celebração ocorra.
2 - É igualmente devida à empresa a remuneração acordada nos casos em que o negócio visado no contrato de mediação tenha sido celebrado em regime de exclusividade e não se concretize por causa imputável ao cliente proprietário ou arrendatário trespassante do bem imóvel.
(…)»

5. Ora, afigura-se-nos que constitui entendimento pacífico, na doutrina e na jurisprudência, que no contrato de mediação imobiliária a regra é a de que a remuneração da empresa mediadora só é devida com a conclusão e perfeição do negócio visado pelo exercício da mediação, ou seja, que a comissão do mediador apenas é devida quando a sua actividade tenha contribuído, de forma determinante, para a celebração (e perfeição) do negócio, por via da aproximação do comitente com terceiros para o efeito. [Veja-se a título exemplificativo, os acórdãos da Relação de Lisboa, de 11/11/2004 (proc. n.º 5439/2004-8), da Relação do Porto, de 13/04/2010 (proc. n.º5408/06.5TBVFR.P1), da relação de Coimbra, de 17/12/2014 (proc. n.º 242/11.3TBNZR.C1), da Relação de Évora, de 10/10/2019 (proc. n.º 562/17.3T8PTM.E1) e do Supremo Tribunal de Justiça, de 27/05/2010 (proc. n.º 9934/03.0TVLSB.L1.S1).]
Assim, mesmo que a mediadora se tenha empenhado na busca de interessados na conclusão do negócio, se o negócio não se concretizar, não haverá lugar a remuneração, suportando, então, o mediador o risco da sua actividade comercial. E, é assim, mesmo que o contrato seja celebrado em regime de exclusividade, ressalvadas, porém, as excepções previstas no artigo 19º da Lei n.º 15/2013.
De facto, no regime de exclusividade exige-se também a conclusão e perfeição do negócio, a não ser que o mesmo se “não se concretize por causa imputável ao cliente proprietário ou arrendatário trespassante do bem imóvel” (cf. n.º 2 do artigo 19º da Lei n.º 15/2013).
Trata-se, portanto de uma excepção ao regime regra, que como tal não é extensível aos contractos celebrados em regime de não exclusividade.
Na verdade, como se decidiu no acórdão desta Relação de Évora, de 22/03/2018 (proc. n.º 7439/16.8T8STB.E1), em que é relatora a aqui 1ª Adjunta: «I- Constitui pressuposto do direito à remuneração do mediador à luz do disposto no nº 2 do art.º 19º do RJAMI (Lei nº 15/2013, de 8 de Fevereiro) que tenha sido estabelecida de forma válida e eficaz uma cláusula de exclusividade;
II- A atribuição de tal remuneração pressupõe, outrossim, que o contrato visado esteja em vias de se concretizar, i.e. que a mediadora tenha cumprido a sua obrigação de encontrar um destinatário para o negócio i.e. uma pessoa que se disponha a satisfazer as condições que o seu cliente tenha estabelecido para a sua concretização (v.g. preço, (in) existência de contrato promessa, montante do sinal, momento da celebração do contrato visado). (…)»

6. O entendimento da recorrente no sentido de que no regime de não exclusividade também é devida a remuneração caso a mediadora angarie interessado para a celebração do negócio por preço que seja aceite pelo vendedor, ainda que o negócio não se concretize, por facto a este imputável, não tem apoio legal, doutrinário ou jurisprudencial que o sustente.
Aliás, se assim fosse, não teria o legislador necessidade de consignar a excepção prevista no citado n.º 2 do artigo 19º.
Em suma, como se disse no acórdão da Relação de Lisboa, de 17/02/2011 (proc. n.º 3452/07.4TVLSB.L1-8): «I -…, não basta angariar um qualquer candidato a negociar com o cliente dono do imóvel; isto porque, o contrato de mediação é, essencialmente, um contrato para a obtenção de um negócio: a empresa de mediação cumpre a sua obrigação contratual quando encontra um terceiro com quem o contrato visado com a mediação venha a ser efectivamente celebrado; pelo que o mediador só pode reclamar a remuneração no momento em que, entre o comitente e a entidade angariada, for concluído o negócio visado pelo exercício da mediação. II - Isto é assim a ponto de, não obstante todo o empenho na actividade de angariação de interessado e o êxito dessa diligência, o negócio não vier a concluir-se, não há lugar a remuneração. III - Como se refere no Ac. do STJ de 03/04/2008 (Santos Bernardino) – in www.dgsi.pt – “… Esta é uma fatalidade com que as empresas de mediação, que são comerciantes, que exercem uma actividade comercial numa economia de mercado têm de viver e é nesse pressuposto que a desempenham, sendo que as percentagens cobradas sobre o valor das vendas que ajudam a concretizar têm já em conta o risco normal, a álea que é inerente a essa actividade…”.»
Ora, no caso dos autos, embora seja certo que a mediadora exerceu actividade conducente à celebração do negócio por preço que, apesar de inferior ao pretendido pela vendedora, foi aceite por esta, porém o negócio não veio a concretizar-se com o interessado angariado pela mediadora, mas sim com um terceiro, e por preço diferente ao anteriormente aceite.
Assim, e não tendo sido estabelecida cláusula de exclusividade, não sendo aplicável a norma do n.º 2 do artigo 19º da Lei n.º 15/2013, a mediadora não tem direito à remuneração, como bem se decidiu na sentença.

7. Apela agora a recorrente aos princípios da boa-fé negocial, da conformação aos bons costumes e à moral pública, em prol da interpretação que advoga do regime legal.
Mas como se viu tal interpretação não tem apoio legal, sendo certo que a mediadora, ao aceitar a celebração do contrato em regime de não exclusividade, sabe que corre o risco de não vir a receber a remuneração pelo seu trabalho, caso o negócio não se concretize com o interessado que angariou, que foi o que sucedeu nos autos.
Acresce que, como se diz na sentença, a circunstância de a A. não ter direito à remuneração pelos serviços de mediação prestados à R. não invalida o seu direito a poder vir ser ressarcida pelos danos que haja sofrido com a conduta da R. durante a vigência do contrato. Contudo, a A. não fundamentou a sua causa de pedir no instituto da responsabilidade civil (nem peticionou uma indemnização), antes alicerçou o seu pedido no contrato celebrado e no direito à contraprestação (remuneração convencionada) pelos serviços que prestou à R.. Assim, estando o objecto da acção (pela causa de pedir e do pedido) circunscrito ao dever de prestar, não pode ser apreciado o eventual dever de indemnizar que pudesse estar em causa.

8. Deste modo, improcede a apelação, com a consequente confirmação da sentença recorrida.
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IV – Decisão
Nestes termos e com tais fundamentos, acordam os juízes deste Tribunal da Relação em julgar improcedente a apelação e, em consequência, confirmar a sentença recorrida.
Custas a cargo da apelante.
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Évora, 19 de Dezembro de 2019

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(Francisco Xavier)

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(Maria João Sousa e Faro)

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(Florbela Moreira Lança)