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CONTRATO DE ARRENDAMENTO
DIVÓRCIO
ATRIBUIÇÃO DA CASA DE MORADA DE FAMÍLIA
APLICAÇÃO DA LEI NO TEMPO
Sumário
I - Perante casamento celebrado no regime supletivo da comunhão de bens adquiridos, e contrato de arrendamento celebrado apenas por um dos membros do casal – in casu, a requerente do incidente de atribuição da casa de morada de família, na sequência de divórcio –, na constância do matrimónio mas anteriormente à previsão do artigo 1068.º do CC, perfilam-se duas soluções plausíveis da questão de direito decorrentes de diverso entendimento sobre a aplicação da lei no tempo decorrente dos artigos 12.º, n.º 2, do CC e 59.º, n.º 1, do NRAU. II - Assim, há quem considere que i) não operaria a comunicabilidade do arrendamento ao requerido e, consequentemente, o direito ao arrendamento da casa de morada de família, estaria apenas na titularidade da requerente; e quem entenda que ii) o arrendamento comunicou-se automaticamente ao requerido após a entrada em vigor do artigo 1068.º da Lei n.º 6/2006. III - Nesta perspectiva, o arrendamento transmutou-se de singular a plural, passando o requerido a ser co-arrendatário e, nessa qualidade, ficando a deter na sua esfera jurídica exactamente os mesmos direitos que inicialmente haviam sido constituídos na esfera jurídica da primitiva arrendatária, única outorgante no contrato. Significa o que vimos de referir, que as vicissitudes decorrentes da extinção do vínculo conjugal se reflectem na relação arrendatícia quando o arrendamento incida sobre a casa de morada de família, nos termos previstos no artigo 1105.º do CC. IV - De harmonia com o n.º 2 deste preceito, a existência de necessidade idêntica por parte dos ex-cônjuges não determina desde logo a improcedência da acção, já que a necessidade de cada um dos cônjuges e os interesses dos filhos, são circunstâncias meramente exemplificativas a ponderar pelo tribunal, a sopesar ainda em face da cláusula geral ínsita no n.º 2 do artigo 1105.º, pelo que, deveria também o tribunal ponderar a existência de “outros factores relevantes” para atribuição da casa de morada de família a um dos cônjuges. V - Sendo certo que com a entrada em vigor da Lei n.º 61/2008, de 31.10, a culpa pela violação dos deveres conjugais deixou de ser declarada no divórcio decretado sem o consentimento do outro cônjuge, tal não significa inexoravelmente que as circunstâncias que levaram à extinção do vínculo conjugal não possam ser atendidas na ponderação a efectuar pelo tribunal para atribuição da casa de morada de família. VI - Ponderando que a situação demonstrada no processo de divórcio, persistia há mais de 7 anos quando o incidente foi deduzido, vivendo requerente e requerido na mesma casa, a própria prevenção de situações de violência doméstica de maior gravidade, que infelizmente são amiúde notícia, não pode deixar de ser ponderada pelo julgador, tanto mais quando, por diversas vezes, o requerido ameaçou a requerente “que lhe iria dar um tiro”, chegando a agredi-la, pelo menos uma vez, com um murro. VII - Portanto, no caso em presença, não só a requerente demonstrou ter maior necessidade da casa do que o requerido, como os factos que se extraem do processo de divórcio evidenciam a sua maior fragilidade no confronto com a situação deste, sendo consequentemente a mesma quem deve beneficiar de maior protecção na atribuição da casa de morada de família. VIII - Assim, havendo comunicação do arrendamento nos contratos de pretérito celebrados por um dos elementos da comunhão conjugal, como é preconizado pelos defensores da aplicação imediata do preceituado no artigo 1068.º do CC, e verificados os factores relevantes que determinam a atribuição da casa de família a um dos ex-cônjuges, opera a concentração do direito ao arrendamento a favor desse, já que a transmissão do direito somente se verifica nas situações em que apenas um deles é arrendatário e houve convenção de separação de bens.
Texto Integral
Processo n.º 1965/18.1T8PTM-A.E1
Tribunal Judicial da Comarca de Faro[1]
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Acordam na 1.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora[2]:
I – RELATÓRIO 1. Por apenso ao processo de divórcio sem consentimento do outro cônjuge, em 31.01.2019, veio BB instaurar o presente processo especial de atribuição da casa de morada de família contra CC, pedindo que lhe seja atribuída a casa que foi de morada de família onde viveu com o requerido na constância do casamento.
Em fundamento da sua pretensão invocou, em suma, que foi casada com o requerido, tendo o casamento sido dissolvido por divórcio decretado por sentença de 9 de Janeiro de 2019; apesar do divórcio, continua a partilhar a casa com o requerido; a casa é propriedade da Câmara Municipal de Portimão que a deu de arrendamento à requerente por contrato de arrendamento celebrado a 3 de Fevereiro de 2000; actualmente, a renda é de € 100,10; a requerente é assistente operacional e aufere uma retribuição mensal de € 600; tem duas dívidas que está a pagar em prestações mensais de € 116,24, e € 50,92, respectivamente; o requerido é pintor de construção civil e aufere mensalmente entre € 700 e € 800; requerente e requerido não têm qualquer outro rendimento, e este não suporta outros encargos; a requerente vive ainda com a filha maior de idade; e não possui qualquer outra habitação.
2. Realizada tentativa de conciliação, sem que tivesse sido possível obter acordo, o requerido apresentou oposição, tendo alegado, em síntese, que no contrato de arrendamento ficou a constar a requerente por uma questão prática e de gestão diária do tempo do casal, olvidando esta o vertido no artigo 1105.º do Código Civil, e que foi o requerido quem sempre pagou a renda de casa; aufere um rendimento mensal de € 800; tem as despesas domésticas com água, eletricidade, e gás, e uma dívida de € 4000 que está a regularizar em prestações de € 123,57; paga um seguro automóvel semestralmente no valor de € 77,47; a mãe é idosa estando actualmente aos cuidados da irmã do requerido, pretendendo este, no futuro, assegurar esses cuidados, para o que precisa da casa; a requerente não se encontra a residir na casa, já tendo encontrado um lugar para morar juntamente com a filha. 3. Ouvidas as testemunhas arroladas, foi proferida sentença, julgando improcedente a acção e absolvendo o requerido do pedido. 4. Inconformada, a Requerente apelou, finalizando a respectiva minuta com as seguintes conclusões[3]: «4. A Recorrente celebrou contrato de arrendamento com a Câmara Municipal de Portimão em 03/02/2000, no estado de casada sob o regime de comunhão de bens adquiridos; 5. Nessa habitação o casal passou a residir, juntamente com a filha de ambos, passando a constituir a casa de morada de família. 6. Assim, a atribuição da casa de morada de família deveria operar mediante a Concentração do arrendamento unicamente a favor da Recorrente, 7. Considerando que, pese embora apenas figure o nome da Recorrente no contrato de arrendamento, nos termos do art.º 1068º do Código Civil, o direito do arrendatário comunica-se ao seu cônjuge, nos termos gerais e de acordo com o regime de bens vigente, 8. Assim, são ambos arrendatários de igual forma, e com iguais direitos. 9. No que concerne às necessidades de atribuição de casa de morada de família, não pode deixar de se verificar uma maior necessidade por parte da ora Recorrente, senão vejamos: 10. O Recorrido aufere pelo menos mais € 200,00 euros de remuneração base que a Recorrente; 11. Não possui encargos com empréstimos, ao contrário da Recorrente, que se encontra a liquidar mensalmente cerca de € 167,16; 12. Devia ainda ter sido considerado pelo Tribunal “a quo” que a Recorrente não possui quaisquer outros familiares próximos, à excepção da filha de ambos, que vive a sua vida com independência; 13. O Recorrido, por sua vez, tem a mãe, a irmã, e vários primos a residir na mesma cidade, alguns dos quais foram suas testemunhas na presente acção; 14. Por fim, terá em última instância que atender ao factor da distância, na medida em que a casa de morada de família está localizada em Portimão, a Recorrente trabalha no hospital da mesma cidade, e o Recorrido, por sua vez, trabalha na cidade de Lagoa, conforme resulta dos recibos de vencimento juntos aos autos pelo mesmo. 15. Por sua vez, o Tribunal “a quo” entendeu que nenhum dos dois, Recorrente e Recorrido, demonstrou estar mais especialmente carenciado do que o outro, “sendo certo que de casa para morar ambos precisam”, pelo que decidiu julgar a acção improcedente e absolver o Recorrido do pedido. 16. A nosso ver merece acolhimento a opinião doutrinária dos ilustres Profs. Pereira Coelho e Guilherme de Oliveira (in «Curso de Direito da Família», Vol I, 3ª edição, pág. 721 e segs.), segundos os quais, “O tribunal deve atribuir o direito de arrendamento da casa de morada de família ao cônjuge que mais precise dela, necessidade esta a inferir, por exemplo, da sua situação económica líquida, do interesse dos filhos, da idade e do estado de saúde dos cônjuges ou ex-cônjuges, da localização da casa em relação aos seus locais de trabalho, da possibilidade de disporem doutra casa para residência, e que só quando as necessidades de ambos os cônjuges ou ex-cônjuges forem iguais ou sensivelmente iguais haverá lugar para considerar a culpa que possa ser ou tenha sido efectivamente imputada a um ou a outro na sentença de divórcio ou separação judicial de pessoas e bens.” 17. Pelo que deve ser a decisão do Tribunal “a quo” revogada, substituída por outra que julgue a acção procedente, e em consequência decida atribuir a casa de morada de família à ora Recorrente».
5. O requerido contra-alegou, pugnando pela confirmação da decisão recorrida.
6. Observados os vistos, cumpre decidir.
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II. O objecto do recurso.
Com base nas disposições conjugadas dos artigos 608.º, n.º 2, 609.º, 635.º, n.º 4, 639.º, e 663.º, n.º 2, todos do Código de Processo Civil[4], é pacífico que o objecto do recurso se limita pelas conclusões das respectivas alegações, evidentemente sem prejuízo das questões cujo conhecimento oficioso se imponha, não estando o Tribunal obrigado a apreciar todos os argumentos produzidos nas conclusões do recurso, mas apenas as questões suscitadas, e não tendo que se pronunciar sobre as questões cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras.
Assim, no caso em apreço, a única questão que importa decidir é a de saber se deve ou não atribuir-se a casa de morada de família à Apelante.
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III – Fundamentos III.1. – De facto Na sentença recorrida foram considerados provadosos seguintes factos:
1. A requerente e o requerido casaram um com o outro a 18 de Novembro de 1990;
2. Esse casamento foi dissolvido por divórcio decretado por sentença de 9 de Janeiro de 2019, já transitada em julgado;
3. A 3 de Fevereiro de 2000 a requerente outorgou contrato com a Câmara Municipal de Portimão, pelo qual esta deu de arrendamento à requerente, para sua habitação, o ….º andar esquerdo, do bloco …A, sito em C… M…, Portimão, inscrito na matriz predial urbana da freguesia de Portimão sob o artigo …, mediante o pagamento da renda anual de 18.450$00;
4. Desde então a requerente e o requerido fixaram, nesse local, a sua residência;
5. A requerente e o requerido mantiveram-se a residir nessa casa até fevereiro de 2019, altura em que a requerente saiu de casa e passou a pernoitar noutro local;
6. Têm uma filha maior de idade que vive com autonomia;
7. A requerente trabalha como assistente operacional no Centro Hospitalar Universitário do Algarve e aufere uma retribuição base de € 600;
8. Tem como encargos mensais duas dívidas referentes ao uso de cartões de crédito, nos valores de € 4.815 e € 413,90, que está a amortizar em prestações mensais de € 116,24 e € 50,92;
9. O requerido trabalha como pintor da construção civil e aufere uma retribuição base mensal de € 800;
10. O requerido despende semestralmente com prémio do seguro automóvel o valor de € 77,47;
11. O requerido tem como familiares a mãe e a irmã, a residirem em Portimão;
12. A mãe do requerido reside com a irmã e, durante o dia frequenta o centro de dia para a terceira idade. E foram considerados não provados os seguintes factos:
1. Sempre tenha sido o requerido a pagar a renda de casa;
2. O requerido tenha uma dívida no valor de € 4000 que esteja a amortizar em prestações de € 123,57 mensais;
3. O requerido esteja a assegurar os cuidados à sua mãe. O pedido de divórcio[5] foi formulado pela ora Requerente, e o seu decretamento teve por fundamento a seguinte factualidade provada:
«1. O autor[6] e a ré casaram um com o outro, sem convenção antenupcial no dia 17 de Novembro de 1990.
2. A relação da autora e do réu deteriorou-se desde há 7 anos atrás, tendo o Réu, por diversas vezes, ameaçado a autora, nomeadamente "que lhe iria dar um tiro", e, agrediu-a fisicamente com um murro, pelo menos, uma vez.
3. Desde então, o autor e a ré, apesar de viverem na mesma casa, não partilham quarto, não partilham as refeições e fazem vidas completamente independentes um do outro.
4[7]. Não existe por parte da autora a intenção de retomar a vida em comum com o réu». Por acordo[8], de harmonia com os artigos 607.º, n.º 4, e 663.º, n.º 2, do CPC, encontra-se provado que:
- Actualmente a renda mensal do imóvel cifra-se em € 100,10 (cem euros e dez cêntimos).
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III.2. – O mérito do recurso
A decisão de improcedência do presente processo especial de atribuição da casa de morada de família à requerente assentou em duas ordens de razão expressas na fundamentação da sentença recorrida. A primeira, por ter sido considerado pelo tribunal a quo que “o pedido que a requerente pretende fazer valer já resulta da sua posição no contrato que celebrou com a Câmara de Portimão”. A segunda, por ter sido entendido que, “[n]enhum dos dois, Requerente e Requerido, demonstrou estar mais especialmente carenciado do que o outro. Sendo certo que de casa para morar ambos precisam”.
Insurge-se a Recorrente contra a decisão que julgou improcedente a sua pretensão de atribuição da casa de morada de família, pretendendo que deve existir a concentraçãodo direito ao arrendamento na sua pessoa; que é a Apelante quem tem mais necessidade da casa; e, finalmente, que em caso de dúvida quanto à necessidade, a mesma sempre haveria de resolver-se por via da consideração da culpa que possa ser ou tenha sido imputada a cada um dos ex-cônjuges.
Vejamos, pois, se a Apelante tem ou não razão.
Atento o disposto no artigo 1673.º do Código Civil[9], os cônjuges devem escolher de comum acordo a residência da família, procurando salvaguardar a unidade da vida familiar, e salvo motivos ponderosos em contrário, devem adoptar a residência da família, sendo que, para além deste preceito, todo o regime legal referente à casa de morada de família ínsito nos artigos 1682.º-A, n.º 2, 1682.º-B, 1775.º, n.ºs 2 e 3, 1778.º, 1793.º, 2103.º-A e 2103.º-B, todos do CC, corresponde ao desenvolvimento do princípio fundamental consagrado no n.º 1 do art.º 67.º da CRP, de acordo com o qual a família tem direito à protecção da sociedade e do Estado e à efectivação de todas as condições que permitam a realização pessoal dos seus membros.
Assim, o artigo 1682.º-B do CC, que rege sobre a disposição do direito ao arrendamento, estabelece que relativamente à casa de morada de família, carecem do consentimento de ambos os cônjuges, a resolução, a oposição à renovação ou a denúncia do contrato de arrendamento pelo arrendatário; a revogação do arrendamento por mútuo consentimento; a cessão da posição de arrendatário; e o subarrendamento ou o empréstimo, total ou parcial; em suma, todas as formas de cessação do contrato de arrendamento que tenha por objecto a casa de morada de família.
E, concordantemente, do ponto de vista da legitimidade processual, esta especial protecção da casa de morada de família impõe que se considere tão relevante a posição do cônjuge arrendatário como a do não arrendatário, quando é a residência da família que está em causa[10]. Por isso, já do artigo 28.º-A do anterior CPC resultava, sem margem para dúvidas, que independentemente da data da celebração do contrato de arrendamento e do regime de bens do casamento, porque a final podem implicar a perda da casa de morada de família, que as acções relativas ao direito ao arrendamento da residência da família devem ser intentadas por ambos os cônjuges ou contra ambos os cônjuges, legitimidade passiva que actualmente decorre do artigo 34.º,n.º 1, do CPC, sob a epígrafe, “ações que têm de ser propostas por ambos ou contra ambos os cônjuges”, protecção que igualmente não foi esquecida pelo legislador na Lei n.º 6/2006, de 27 de Fevereiro, cujo artigo 12.º, com a epígrafe “casa de morada de família”, rege sobre as comunicações, mormente as respeitantes à constituição do título executivo para despejo ou actualização de renda, que devem ser dirigidas a ambos os cônjuges.
Pode, pois, concluir-se que o conceito de casa de morada de família enquanto objecto desta especial protecção legal, implica que a casa em questão constitua ou tenha constituído a residência principal do agregado familiar e que um dos cônjuges seja titular de um direito que lhe confira a utilização dela para aquele fim[11]. Pressuposto primeiro deste direito, é, portanto, que o imóvel arrendado seja a casa de morada de família, porquanto se o não for a lei já não concede esta protecção do direito ao arrendamento nos casos em que o mesmo não se tenha comunicado ao cônjuge do arrendatário, por força do regime matrimonial de bens.
Na situação em apreço, as partes não dissentem em que a casa cujo direito ao arrendamento se pretende efectivar por via da presente acção, constitui a casa de morada de família do extinto casal, daí o pedido para a sua atribuição por parte da requerente, e a invocação pelo requerido do disposto no artigo 1105.º do Código Civil.
Efectivamente, está demonstrado que em 3 de Fevereiro de 2000 a requerente outorgou contrato com a Câmara Municipal de Portimão, pelo qual esta lhe deu de arrendamento, para sua habitação, a casa identificada em 3., e que desde então a requerente e o requerido fixaram, nesse local, a sua residência, ali se mantendo ambos a residir até fevereiro de 2019, já após o divórcio do casal, afirmou-se na sentença recorrida que “[s]endo a casa arrendada, o objetivo desta ação seria para eventualmente efetuar uma transmissão do direito de arrendamento ao ex-cônjuge não arrendatário se este estiver mais necessitado de habitação que o outro. No caso em apreço, sendo arrendatária a requerente, o direito a permanecer na casa decorre do próprio contrato de arrendamento”.
Porém, como veremos, na situação em presença, não é (necessariamente[12]) assim.
Na realidade, está igualmente demonstrado que o arrendamento foi celebrado naquela data, apenas pela ora requerente, mas na constância do casamento com o requerido, celebrado sem convenção antenupcial no dia 17.11.1990[13], o mesmo é dizer, no regime supletivo da comunhão de adquiridos, atento o disposto no artigo 1717.º do CC, destinando-se tal habitação a ser a casa de morada da família.
Acontece que, quando o contrato de arrendamento foi celebrado, em 03.02.2000, encontrava-se em vigor o artigo 83.º do Regime de Arrendamento Urbano, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 321-B/90, de 15 de Outubro[14], que estava inserido na Secção do Capítulo II dedicado ao arrendamento para habitação, e expressamente estabelecia a incomunicabilidade do direito ao arrendamento habitacional, independentemente do regime de bens do casamento[15]. Assim, no domínio da sua vigência, ainda que com críticas de alguma autorizada doutrina, era predominante o entendimento de que a posição do arrendatário habitacional não se comunicava ao respectivo cônjuge, fosse qual fosse o regime de bens que o casal tivesse adoptado[16].
Não obstante, no decurso do contrato de arrendamento cujos efeitos ora se apreciam, entrou em vigor no dia 28 de Junho de 2006 o Novo Regime do Arrendamento Urbano[17], aprovado pela Lei n.º 6/2006, de 27 de Fevereiro[18], cujo artigo 3.º introduziu uma norma inovadora, o artigo 1068.º do CC, que sob a epígrafe “Comunicabilidade”, veio estatuir que “[o] direito do arrendatário comunica-se ao seu cônjuge, nos termos gerais e de acordo com o regime de bens vigente”.
Por seu turno, o artigo 1105.º do CC, com a epígrafe “comunicabilidade e transmissão em vida para o cônjuge”, estabelecendo que:
“1 - Incidindo o arrendamento sobre casa de morada de família, o seu destino é, em caso de divórcio ou de separação judicial de pessoas e bens, decidido por acordo dos cônjuges, podendo estes optar pela transmissão ou pela concentração a favor de um deles.
2 - Na falta de acordo, cabe ao tribunal decidir, tendo em conta a necessidade de cada um, os interesses dos filhos e outros factores relevantes.
3 - A transferência ou a concentração acordadas e homologadas pelo juiz ou pelo conservador do registo civil ou a decisão judicial a elas relativa são notificadas oficiosamente ao senhorio”.
Na comparação deste preceito com a matéria anteriormente prevista no artigo 84.º do RAU[19], verificamos que o legislador ampliou o seu conteúdo, harmonizando o seu teor com o regime regra da comunicabilidade do arrendamento que veio estabelecer no já referido artigo 1068.º do CC.
Consequentemente, prevendo-se agora no NRAU como regra geral, - aplicável, portanto, tanto aos arrendamentos habitacionais como aos não habitacionais celebrados após a sua entrada em vigor -, que a comunicabilidade é admitida segundo o regime de bens, nos contratos celebrados após a data da sua entrada em vigor, para aferir se o arrendamento se comunicou ou não ao cônjuge há que observar as regras respeitantes ao regime de bens adoptado pelo casal. Assim: “… – no regime da separação de bens, o direito do arrendatário não se comunica ao seu cônjuge, pois não há património comum do casal (cfr. art.º 1735.º do CC); – no regime da comunhão de adquiridos, o direito do arrendatário comunica-se ao seu cônjuge, ingressando no património comum, se o contrato for celebrado na constância do casamento [cfr. art.ºs 1724.º, al. b), 1725.º e 1730.º do CC]; – no regime da comunhão geral, o direito do arrendatário comunica-se ao seu cônjuge, integrando o património comum do casal, mesmo que o contrato de arrendamento seja anterior ao casamento (cfr. art.º 1732.º do CC)”[20].
Concordantemente, quando o contrato de arrendamento se destina à casa de morada de família, por via do preceituado no artigo 1105.º do CC, por acordo ou, na sua falta, por decisão judicial, pode haver ou concentração ou transmissão a favor de um dos ex-cônjuges, consoante tenha ou não havido comunicabilidade do arrendamento, por força do regime de bens do casamento.
Assim sendo, a questão que os autos convocam, é a respeitante à aplicação da lei no tempo, o mesmo é dizer, a de saber se quando os contratos de arrendamento foram celebrados até 27-06-2006, como é o caso dos presentes autos, o disposto no artigo 1068.º e no coerente segmento do artigo 1105.º do CC, se lhes aplica ou não.
Por isso, havia que ter sido ponderada na decisão recorrida a possibilidade de comunicação do contrato de arrendamento, em face do regime introduzido pelo artigo 1068.º do CC a respeito da comunicabilidade, já que este artigo aplica-se apenas quando o contrato de arrendamento tenha sido celebrado somente por um dos cônjuges na posição de arrendatário, como ocorreu na situação em presença, e, em caso afirmativo, na falta de acordo, cabendo ao tribunal decidir, pela transmissão ou pela concentração a favor de um deles, conforme decorre do artigo 1105.º, n.ºs 1 e 2, do CC.
De facto, pese embora, como acima referimos, o artigo 1068.º seja um preceito inovador, e mesmo tendo presente que tanto o contrato de arrendamento como o casamento foram celebrados no domínio do RAU, não é pacífico o entendimento de que, em situações como a dos autos, em que, à data da celebração do contrato de arrendamento regia a norma imperativa ínsita no art.º 83.º do RAU, que na esteira de longa tradição assente na natureza intuitu personae da locação estabelecia a incomunicabilidade do direito ao arrendamento para habitação, não seja também aplicável aos contratos de pretérito a regra da comunicabilidade que veio a ser consagrada no artigo 1068.º do CC, de acordo com o regime de bens do casamento[21].
Isto porque, atento o disposto nos artigos 59.º, n.º 1, da Lei n.º 6/2006, e 12.º, n.º 2, do CC, dispondo aqueles indicados preceitos directamente sobre o âmbito da relação jurídica arrendatícia, divergem os entendimentos quanto ao enquadramento da situação em presença na primeira parte deste normativo ou no seu segmento final, havendo quem considere que a lei nova se aplica às relações jurídicas já constituídas que subsistam à data da sua entrada em vigor, afastando o princípio geral contido no n.º 1 deste preceito, de acordo com o qual a lei só dispõe para o futuro, e quem entenda que tal preceito dispõe sobre as condições de validade substancial dos seus efeitos, pelo que, em caso de dúvida, só visa os factos novos.
Ora, ainda que nada a este respeito ali tenha sequer sido abordado, o entendimento vertido na sentença recorrida quanto a uma aparente inutilidade da declaração do que já resulta do contrato, ou seja, da qualidade de arrendatária da requerente do incidente, só será sufragável por quem considera que quando estejam em causa arrendamentos para habitação anteriores ao NRAU, nos quais, por força de norma imperativa (o art.º 83.º do RAU e, antes deste, o art.º 1110.º, n.º 1, do CC), a posição do arrendatário não se comunicou ao cônjuge, não se poderia agora aplicar o referido artigo 1068.º, já que isso implicaria atribuir-lhe eficácia retroactiva[22].
Esta ideia assenta, em traços gerais, no argumentário de que «a comunicabilidade dá-se por efeito da celebração do contrato de arrendamento e do casamento. Se ambos ocorreram no domínio de lei que estabelecia imperativamente a incomunicabilidade, o direito do arrendatário não se comunicou ao cônjuge e não se poderá comunicar, mais tarde, já que a comunicabilidade se dá, “nos termos gerais”, ou seja, por força dos factos previstos nas disposições legais aplicáveis e vigentes à data dos mesmos. É que o art.º 1724.º, al. a), relativo ao regime da comunhão de adquiridos, diz que fazem parte da comunhão “os bens adquiridos pelos cônjuges na constância do matrimónio, que não sejam exceptuados por lei”. E o art.º 1732.º, respeitante ao regime da comunhão geral, preceitua que “o património comum é constituído por todos os bens presentes e futuros dos cônjuges, que não sejam exceptuados por lei”. Se a lei – no caso o art.º 83.º do RAU, que vigorou até 27-06-2006 – exceptuava da integração na comunhão conjugal o direito ao arrendamento, este não se comunicou ao cônjuge do arrendatário.
Assim, se no domínio da lei antiga foi celebrado contrato de arrendamento para habitação e o arrendatário era casado no regime da comunhão de adquiridos ou no regime da comunhão geral, o seu direito não se comunicou ao cônjuge, pois quando aquele adquiriu o direito a lei exceptuava da integração no património comum do casal o direito ao arrendamento. Não tendo esse direito integrado o património comum do casal até 28-06-2006, não vemos que possa ingressar na comunhão conjugal após tal data.
Em conclusão, nos arrendamentos habitacionais de pretérito, independentemente do regime de bens, a posição do arrendatário casado não se comunica ao seu cônjuge».
Este entendimento a respeito da aplicação da lei no tempo[23], foi também sufragado na doutrina por MENEZES CORDEIRO, expressamente anotando que “[o] 1068.º aplica-se aos contratos de arrendamento celebrados após a entrada em vigor do NRAU de 2006”, considerando que “[e]stamos, claramente, no domínio dos efeitos do contrato, pelo que funciona o 12.º/2, 1.ª parte”, e na jurisprudência, designadamente nos acórdãos do Tribunal da Relação de Lisboa, de 18.10.2012[24], de 23.09.2014[25] e de 09.12.2014[26], nos quais se considerou que o artigo 1068.º do CC não se aplica aos contratos existentes à data da sua entrada em vigor, por se tratar de direito novo.
Assim, aplicando a tese que vimos de referir à situação em presença, perante casamento celebrado no regime supletivo da comunhão de bens adquiridos, e contrato de arrendamento celebrado apenas por um dos membros do casal – in casu, a requerente do incidente –, na constância do matrimónio mas anteriormente à previsão do artigo 1068.º, não operaria a comunicabilidade do arrendamento ao requerido e, consequentemente, o direito ao arrendamento da casa de morada de família, estaria apenas na sua titularidade, pelo que, como se referiu na decisão recorrida, o “pedido que a requerente pretende fazer valer já resulta da sua posição no contrato que celebrou com a Câmara de Portimão”.
Acontece que, no caso em apreço a decisão recorrida deixa exactamente como se encontrava o litígio decorrente da falta de acordo entre os ex-cônjuges que originou a necessidade de recurso a tribunal por banda da requerente, peticionando a tutela efectiva do seu invocado direito a residir na casa de morada de família, não acautelando a justacomposição do litígio, nem tendo presente o princípio da economia processual, antes impondo que a requerente instaure nova acção para o efeito[27], porquanto, como a matéria de facto evidencia (ponto 5.), pouco depois da propositura do presente incidente, ocorrida em 31.01.2019, logo em fevereiro, a requerente saiu de casa e passou a pernoitar noutro local.
Porém, pese embora na matéria de facto não tenha ficado a constar qualquer razão para que a requerente tenha saído de casa, sequer na fundamentação de facto, vendo a materialidade subjacente ao divórcio sem consentimento do outro cônjuge, nada autoriza pensar que a requerente tenha saído da casa arrendada definitivamente e por sua livre vontade, e muito menos poderá entender-se que tal equivale a desinteresse na definição judicial de qual dos ex-cônjuges tem direito a continuar a residir naquela que foi a casa de morada de família, tanto mais que a tentativa de conciliação data de 27.03.2019, e consta da acta da diligência não ter sido possível obter o acordo entre as partes a respeito da atribuição da residência, que ambos disputam, apesar de o requerido não ter formulado pedido para que a mesma lhe seja atribuída.
Vale isto por dizer que, persistindo um litígio e a necessidade de o dirimir judicialmente, e tendo presente que o entendimento acima referido a respeito da aplicação da lei no tempo não é pacífico, existindo outras soluções plausíveis para a questão de direito, cumpre enfrentá-las, tanto mais que o requerido expressamente invocou o preceituado no artigo 1105.º do CC, para justificar continuar a residir na casa de morada de família.
Cumpre, pois, prosseguir, desta feita na análise do caso em presença, no pressuposto da aplicação ao mesmo do entendimento que tem vindo a ser igualmente acolhido, tanto na doutrina como na jurisprudência, de acordo com o qual o arrendamento em apreço, se comunicou ao cônjuge que não outorgou o contrato de arrendamento, no caso, o requerido.
Na realidade, ainda antes do NRAU, já alguns autores defendiam a solução da comunicabilidade do direito ao arrendamento, independentemente do regime de bens, quando o locado constituísse casa de morada da família, argumentando que, para constituir uma protecção eficaz da casa de morada da família, o arrendamento relativo à mesma devia ser considerado comunicável, inclusivamente no regime da separação, não se justificando que fossem efectuadas distinções em função do regime de bens adoptado[28].
Após a entrada em vigor do NRAU, o problema da eventual entrada do direito ao arrendamento habitacional no património comum do casal, por via da comunicabilidade que veio a ser consagrada no citado artigo 1068.º do CC, bem como a conexa questão da sua “concentração” ou transmissão, na sequência da extinção do casamento, por via de separação de bens, divórcio ou morte, ganharam novos contornos, que determinaram a harmonização dos artigos 1105.º e 1106.º do CC, com o novo paradigma.
Efectivamente, o legislador do NRAU, de forma deliberada, não se limitou a reger sobre o regime dos contratos de arrendamento celebrados após a sua entrada em vigor, antes pretendendo ser de “mais simples apreensão e aplicação um sistema em que não coexistam, por tempo indeterminado, duas regulações sobre temas materialmente idênticos, sendo possível, com a devida cautela e tendencialmente, sujeitar todos os contratos à mesma lei”[29].
Com tal finalidade, adoptou normas próprias mas consentâneas com o já disposto no artigo 12.º do Código Civil, relativamente aos princípios gerais que regem sobre a aplicação da lei no tempo, isto porque um novo regime do arrendamento urbano - que regula não só a formação do contrato de arrendamento mas também as vicissitudes da sua vigência e cessação -, sempre contenderia, pela própria natureza do contrato que visa regular, com relações jurídicas já constituídas, abstraindo dos factos que lhes deram origem.
Em decorrência deste princípio geral e regendo expressamente quanto à aplicação da lei no tempo, o artigo 59.º, n.º 1, da Lei n.º 6/2006, veio afirmar que “[o] NRAU aplica-se aos contratos celebrados após a sua entrada em vigor, bem como às relações contratuais constituídas que subsistam nessa data, sem prejuízo do previsto nas normas transitórias”. Portanto, a regra é que o NRAU se aplica imediatamente a todos os contratos, mesmo aos celebrados anteriormente à sua vigência, com duas excepções, de diferente natureza: a constante da parte final do referido preceito, relativa às normas transitórias constantes dos artigos 26.º a 58.º; e a consagrada no n.º 3 do mesmo artigo quanto às normas supletivas contidas no NRAU que “só se aplicam aos contratos celebrados antes da entrada em vigor da presente lei quando não sejam em sentido oposto ao de norma supletiva vigente aquando da celebração, caso em que é essa a norma aplicável”.
Deste modo, alguma doutrina vem defendendo que, não constando a situação em apreço em nenhuma das indicadas excepções à aplicação imediata do NRAU a todos os contratos de arrendamento anteriormente celebrados que ainda se encontravam vigentes à data da entrada em vigor do novo regime, concretamente o artigo 1068.º por este introduzido, que alterou imperativamente as regras sobre a situação contratual do cônjuge do arrendatário casado em regime de comunhão, aplica-se-lhes, comunicando-se ou não o contrato de arrendamento habitacional, de acordo com o regime de bens do casal.
Assim, RITA LOBO XAVIER[30], analisando o problema da eventual entrada do direito ao arrendamento habitacional no património comum do casal (comunicabilidade) e da sua “concentração” ou transmissão designadamente por causa de divórcio, à luz da reforma do regime do arrendamento urbano, considera que «[no que diz respeito à “comunicabilidade” do direito ao arrendamento segundo o regime de bens, o regime transitório previsto nos artigos 26.º e seguintes da Lei n.º 6/2006 não excepciona a aplicação do artigo 1068.º aos contratos já existentes à data da entrada em vigor do RNAU. (…) [A] nova lei apenas altera a qualificação do direito ao arrendamento habitacional: a disciplina anterior atribuía-lhe uma natureza estritamente pessoal e, por isso, tal direito constituía sempre um bem próprio mesmo nos regimes comunitários. A lei nova não modifica os regimes de bens nem as suas regras, apenas atenua a natureza intuitu personae do direito ao arrendamento, o que, envolvendo certamente consequências quanto à sua qualificação como bem próprio ou bem comum, não impede a aplicação imediata do artigo 1068.º do CC».
Também MARIA OLINDA GARCIA[31] afirma que «o art. 59.º concretiza, de modo explícito, a regra interpretativa que sempre resultaria do art. 12.º, n.º 2, segunda parte, do código Civil, sobre aplicação das leis no tempo”. Por isso, entende que “a regra consagrada no artigo 1068.º do Código Civil passou a ter aplicação imediata a todos os arrendamentos para habitação, incluindo, portanto, os que já se encontravam em fase de execução. Deste modo, os anteriores arrendamentos com arrendatário casado em comunhão geral, bem como os que haviam sido outorgados por arrendatário casado em comunhão de adquiridos[32], passaram automaticamente de arrendamentos singulares a arrendamentos plurais, ou seja, a arrendamentos que têm ambos os cônjuges como coarrendatários. (…)
Parece-nos, assim, mais pertinente afirmar que o regime de bens é um pressuposto do qual o legislador faz depender a comunicabilidade do direito ao arrendamento, em vez de dizer que esta comunicabilidade é um efeito do regime de bens no qual o arrendatário é casado. Na realidade, em caso de divórcio, o direito que se comunicou ao cônjuge do primeiro arrendatário não se extingue automaticamente, em consequência da extinção do casamento, apesar de se tratar de um direito pessoal de gozo.
Em tal hipótese, as vicissitudes da relação de arrendamento são disciplinadas nos termos do artigo 1105.º do CC».
Mais recentemente, o Supremo Tribunal de Justiça veio a pronunciar-se a este respeito no mesmo sentido[33], sumariando o seu entendimento, na parte que aqui releva considerar, nos seguintes termos:
«I - Um contrato de arrendamento para habitação celebrado nos anos 60 está sujeito às normas transitórias que integram o regime estabelecido no Título II, Capítulo II, da Lei n.º 6/2006, de 27-02, com as alterações introduzidas pela Lei n.º 31/2012, de 14-08 (nomeadamente as constantes da Secção I - "Disposições gerais", arts. 27.º a 29.º -, da Secção II - "Arrendamento para habitação", arts. 30.º a 49.º - e da Secção IV - "Transmissão" - arts. 57.º e 58.º-, comum a arrendamentos habitacionais e não habitacionais) e está igualmente sujeito ao NRAU na parte não abrangida por aquelas.
II - Nenhuma, de entre este conjunto de normas, rege especificamente a questão da comunicabilidade do direito ao arrendamento ou exclui a aplicação do art. 1068.º do CC, pelo que se impõe, em princípio, concluir pela aplicabilidade desta norma aos contratos coevos do aqui contemplado.
III - A tradição jurídica portuguesa era no sentido de que o direito ao arrendamento se não comunicava ao cônjuge do arrendatário e caducava por morte deste.
IV - Com a publicação da Lei n.º 6/2006, que aditou ao Código Civil o art. 1068.º, instituiu-se a regra da comunicabilidade para todos os arrendamentos de prédios urbanos.
V - Do art. 59.º do NRAU resulta a aplicação do art. 1068.º a contratos anteriores, que subsistam, e não apenas aos constituídos após a sua entrada em vigor.
VI - Não se trata de uma aplicação retroativa, antes sendo uma aplicação imediata da lei nos termos previstos no art. 12.º, n.ºs 1 e 2, 2.ª parte, do CC, pressupondo a vigência da relação jurídica em causa».
Ora, da possibilidade de aplicação deste entendimento ao caso em presença – por se tratar de uma das soluções plausíveis da questão de direito –, decorre que o arrendamento, celebrado em 2000, pela requerente, no estado de casada com o requerido, no regime da comunhão de adquiridos, comunicou-se-lhe automaticamente após a entrada em vigor do artigo 1068.º da Lei n.º 6/2006. Assim, o arrendamento transmutou-se de singular a plural, passando o requerido a ser co-arrendatário e, nessa qualidade, ficando a deter na sua esfera jurídica exactamente os mesmos direitos que inicialmente haviam sido constituídos na esfera jurídica da primitiva arrendatária, única outorgante no contrato. Significa o que vimos de referir, que as vicissitudes decorrentes da extinção do vínculo conjugal se reflectem na relação arrendatícia quando o arrendamento incida sobre a casa de morada de família, nos termos previstos no artigo 1105.º do CC.
Assim, havendo comunicação do arrendamento nos contratos de pretérito celebrados por um dos elementos da comunhão conjugal, como é preconizado pelos defensores da aplicação imediata do preceituado no artigo 1068.º do CC, opera a concentração do direito ao arrendamento a favor de um dos cônjuges, já que a transmissão do direito somente se verifica nas situações em que apenas um deles é arrendatário e houve convenção de separação de bens. Em qualquer caso, tanto a concentração como a transmissão não dependem do consentimento ou reconhecimento do senhorio (artigo 1059.º, n.º 2, in fine, do CC).
Como decorre das conclusões das suas alegações de recurso, a Apelante preconiza a concentração do arrendamento a seu favor, invocando ter maior necessidade da casa do que o seu ex-marido.
Considerou-se na decisão recorrida que “[n]enhum dos dois, Requerente e Requerido, demonstrou estar mais especialmente carenciado do que o outro. Sendo certo que de casa para morar ambos precisam”.
Concordando que ambos necessitam de casa para morar, não sufragamos a perspectiva de que nenhum deles demonstrou estar mais especialmente carenciado do que o outro.
Na realidade, a requerente provou que trabalha como assistente operacional no Centro Hospitalar Universitário do Algarve e aufere uma retribuição base de € 600, tendo como encargos mensais duas dívidas referentes ao uso de cartões de crédito, nos valores de € 4.815 e € 413,90, que está a amortizar em prestações mensais de € 116,24 e € 50,92.
Por seu turno, o requerido trabalha como pintor da construção civil e aufere uma retribuição base mensal de € 800, e despende semestralmente com prémio do seguro automóvel o valor de € 77,47; não tendo provado que tenha uma dívida no valor de € 4000 que esteja a amortizar em prestações de € 123,57 mensais, nem que esteja a assegurar os cuidados à sua mãe, isto porque se demonstrou que o requerido tem como familiares a mãe e a irmã, a residirem em Portimão, sendo que a mãe do requerido reside com a irmã e, durante o dia frequenta o centro de dia para a terceira idade.
Quanto a quem suporta a renda da casa em litígio temos apenas que não se provou ser o requerido quem sempre pagou a renda da casa, e relativamente às despesas inerentes ao seu normal funcionamento, como sejam a electricidade, água e saneamento, nada consta na matéria de facto, apesar de na fundamentação constar a seguinte justificação da julgadora a respeito da alegação da requerente: “Não tendo ficado demonstrado que tenha despesas com água e eletricidade, pois os documentos que juntou respeitam à casa de morada de família e, neste momento, a requerente não reside nesse local, respeitando as faturas ao ano de 2018”.
Ora, “o critério da «necessidade de um dos cônjuges» só poderá ser densificado se aferido em função dos concretos rendimentos e encargos de ambos os cônjuges, de modo a ajuizar qual deles se encontra numa situação mais desfavorável, isto é, qual deles tem maior premência da necessidade da casa”[34].
Portanto, mesmo com a escassez da materialidade recolhida, e desvalorizando as comprovadas despesas com o pagamento pela requerente das dívidas existentes em cartões de crédito, não deixa de relevar neste patamar de rendimentos uma diferença de cerca de € 200, correspondente ao vencimento que o requerido recebe a mais do que a requerente, mormente porque tal diferença é, por exemplo, o suficiente para suportar o pagamento da renda desta concreta casa, e naturalmente, ainda algumas das suas despesas.
Nestes termos, entendemos que a requerente demonstrou ter uma necessidade de ver-lhe atribuída a casa de morada de família, que é superior à do requerido.
Mas, ainda que assim não se considerasse, e se concordasse com a avaliação efectuada em primeira instância, mesmo a existência de necessidade idêntica por parte dos ex-cônjuges não determinava desde logo a improcedência da acção, como se entendeu.
Na realidade, a necessidade de cada um dos cônjuges e os interesses dos filhos, são circunstâncias meramente exemplificativas a ponderar pelo tribunal, a sopesar ainda em face da cláusula geral ínsita no n.º 2 do artigo 1105.º, pelo que, haveria também que ponderar a existência de “outros factores relevantes”, já que, relativamente aos interesses dos filhos, no caso em apreço está provado que a filha de ambos é maior de idade e vive com autonomia.
Assim, pese embora na comparação daquele preceito com o n.º 2 do artigo 84.º do RAU, se verifique o desaparecimento de várias das razões atendíveis que neste se encontravam elencadas, tal não significa que tais elementos indicativos, não devam ser objecto de ponderação, bem como todas aquelas circunstâncias que se apresentem com relevância que justifique serem sopesadas pelo julgador.
Deste modo, apreciando o circunstancialismo que envolve o caso em apreço, cumpre desde logo afirmar que o facto de ter sido a requerente mulher a sair da casa de morada de família afigura-se como irrelevante dado que não se encontram apuradas as motivações de tal atitude, sendo que a mesma não se prefigura sequer como estando estabilizada em termos de ser considerada impeditiva da sua pretensão ao uso da casa, porquanto apesar de o requerido ter permanecido na residência, tudo ocorreu pouco após ter sido decretado o divórcio e pouco tempo depois de ter sido instaurado pela requerente o presente apenso de atribuição da casa de morada de família[35].
Acresce que, sendo certo que com a entrada em vigor da Lei n.º 61/2008, de 31.10, a culpa pela violação dos deveres conjugais deixou de ser declarada no divórcio decretado sem o consentimento do outro cônjuge, tal não significa inexoravelmente que as circunstâncias que levaram à extinção do vínculo conjugal não possam ser atendidas na ponderação a efectuar pelo tribunal para atribuição da casa de morada de família.
Assim, não podemos deixar de ter presente, que na fundamentação de facto subjacente ao decretamento do divórcio, consta no seu ponto 2. que «a relação da autora e do réu deteriorou-se desde há 7 anos atrás, tendo o Réu, por diversas vezes, ameaçado a autora, nomeadamente "que lhe iria dar um tiro", e, agrediu-a fisicamente com um murro, pelo menos, uma vez».
Ponderando que a indicada situação persistia há mais de 7 anos quando o incidente foi deduzido, vivendo requerente e requerido na mesma casa, a própria prevenção de situações de violência doméstica de maior gravidade, que infelizmente são amiúde notícia, não pode deixar de ser ponderada pelo julgador, tanto mais quando, por diversas vezes, o requerido ameaçou a requerente “que lhe iria dar um tiro”, chegando a agredi-la, pelo menos uma vez, com um murro.
Ora, tendo presente o reforço a que vimos assistindo na prevenção das situações de violência doméstica, visando a redução das suas nefastas consequências nas vítimas, e nomeadamente aumentando a rede de protecção às mesmas, desde logo com a possibilidade de aplicação ao arguido de medidas de coacção urgentes, previstas no artigo 31.º, n.º 1, da Lei n.º 112/2009, de 16 de Setembro, que estabelece o regime jurídico aplicável à prevenção da violência doméstica, à protecção e à assistência das suas vítimas, de entre as quais avulta a vertida na alínea c), de o agressor não permanecer na residência onde o crime tenha sido cometido ou onde habite a vítima, ressalvando o n.º 2 do preceito que o ali disposto mantém a sua relevância mesmo nos casos em que a vítima tenha abandonado a residência em razão da prática ou de ameaça séria do cometimento do crime de violência doméstica, pese embora, não se trate aqui de um processo de natureza criminal, na aplicação da lei há que ter em conta a harmonia do sistema, vertida em lugares paralelos, que no caso merecem inclusivamente a última ratio de protecção da tutela penal.
Portanto, não podemos deixar de concluir que não só a requerente demonstrou ter maior necessidade da casa do que o requerido, como os factos que se extraem do processo de divórcio evidenciam a sua maior fragilidade no confronto com a situação deste, sendo consequentemente a mesma quem deve beneficiar de maior protecção na atribuição da casa de morada de família.
Concluindo, quer se entenda que o arrendamento não se transmitiu ao requerido, sendo a requerente a sua única titular, quer se considere que o mesmo se comunicou e, por via da sua maior necessidade deve concentrar-se na requerente, quer, finalmente, porque se verificam os factores relevantes agora indicados a respeito da sua maior fragilidade e necessidade de protecção, deve a atribuição daquela que foi a casa de família, ser-lhe deferida.
Pelo exposto, a apelação procede.
Vencido, o Apelado suportaria as custas devidas em primeira instância e na Relação, aqui na vertente de custas de parte, atento o princípio da causalidade e o disposto nos artigos 527.º, n.ºs 1 e 2, 529.º, n.ºs 1 e 4, e 533.º, todos do CPC, as quais não lhe são tributadas por beneficiar de apoio judiciário.
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III.3. Síntese conclusiva
I - Perante casamento celebrado no regime supletivo da comunhão de bens adquiridos, e contrato de arrendamento celebrado apenas por um dos membros do casal – in casu, a requerente do incidente de atribuição da casa de morada de família, na sequência de divórcio –, na constância do matrimónio mas anteriormente à previsão do artigo 1068.º do CC, perfilam-se duas soluções plausíveis da questão de direito decorrentes de diverso entendimento sobre a aplicação da lei no tempo decorrente dos artigos 12.º, n.º 2, do CC e 59.º, n.º 1, do NRAU.
II - Assim, há quem considere que i) não operaria a comunicabilidade do arrendamento ao requerido e, consequentemente, o direito ao arrendamento da casa de morada de família, estaria apenas na titularidade da requerente; e quem entenda que ii) o arrendamento comunicou-se automaticamente ao requerido após a entrada em vigor do artigo 1068.º da Lei n.º 6/2006.
III - Nesta perspectiva, o arrendamento transmutou-se de singular a plural, passando o requerido a ser co-arrendatário e, nessa qualidade, ficando a deter na sua esfera jurídica exactamente os mesmos direitos que inicialmente haviam sido constituídos na esfera jurídica da primitiva arrendatária, única outorgante no contrato. Significa o que vimos de referir, que as vicissitudes decorrentes da extinção do vínculo conjugal se reflectem na relação arrendatícia quando o arrendamento incida sobre a casa de morada de família, nos termos previstos no artigo 1105.º do CC.
IV - De harmonia com o n.º 2 deste preceito, a existência de necessidade idêntica por parte dos ex-cônjuges não determina desde logo a improcedência da acção, já que a necessidade de cada um dos cônjuges e os interesses dos filhos, são circunstâncias meramente exemplificativas a ponderar pelo tribunal, a sopesar ainda em face da cláusula geral ínsita no n.º 2 do artigo 1105.º, pelo que, deveria também o tribunal ponderar a existência de “outros factores relevantes” para atribuição da casa de morada de família a um dos cônjuges.
V - Sendo certo que com a entrada em vigor da Lei n.º 61/2008, de 31.10, a culpa pela violação dos deveres conjugais deixou de ser declarada no divórcio decretado sem o consentimento do outro cônjuge, tal não significa inexoravelmente que as circunstâncias que levaram à extinção do vínculo conjugal não possam ser atendidas na ponderação a efectuar pelo tribunal para atribuição da casa de morada de família.
VI - Ponderando que a situação demonstrada no processo de divórcio, persistia há mais de 7 anos quando o incidente foi deduzido, vivendo requerente e requerido na mesma casa, a própria prevenção de situações de violência doméstica de maior gravidade, que infelizmente são amiúde notícia, não pode deixar de ser ponderada pelo julgador, tanto mais quando, por diversas vezes, o requerido ameaçou a requerente “que lhe iria dar um tiro”, chegando a agredi-la, pelo menos uma vez, com um murro.
VII - Portanto, no caso em presença, não só a requerente demonstrou ter maior necessidade da casa do que o requerido, como os factos que se extraem do processo de divórcio evidenciam a sua maior fragilidade no confronto com a situação deste, sendo consequentemente a mesma quem deve beneficiar de maior protecção na atribuição da casa de morada de família.
VIII - Assim, havendo comunicação do arrendamento nos contratos de pretérito celebrados por um dos elementos da comunhão conjugal, como é preconizado pelos defensores da aplicação imediata do preceituado no artigo 1068.º do CC, e verificados os factores relevantes que determinam a atribuição da casa de família a um dos ex-cônjuges, opera a concentração do direito ao arrendamento a favor desse, já que a transmissão do direito somente se verifica nas situações em que apenas um deles é arrendatário e houve convenção de separação de bens.
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IV - Decisão
Pelo exposto, na procedência da apelação, acorda-se em revogar a decisão recorrida, atribuindo à requerente a casa que foi a morada de família.
Sem tributação, atento o benefício de apoio judiciário concedido ao requerido.
Cumpra-se o disposto no n.º 3 do artigo 1105.º do CC, comunicando à Câmara Municipal de Portimão, a decisão de concentração do direito ao arrendamento, na arrendatária Maria Cristina Mateus Santana Geada.
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Évora, 19 de Dezembro de 2019
Albertina Pedroso [36]
Tomé Ramião
Francisco Xavier
_________________________________________________
[1] Juízo de Família e Menores de Portimão - Juiz 1.
[2] Relatora: Albertina Pedroso; 1.º Adjunto: Tomé Ramião; 2.º Adjunto: Francisco Xavier.
[3] Que se restringem às necessárias para a compreensão do objecto do recurso.
[4] Doravante abreviadamente designado CPC.
[5] Cuja cópia da decisão, extraída do sistema Citius foi junta aos presentes autos, com o requerimento inicial, e que se considera ao abrigo do disposto nos artigos 607.º, n.º 4, e 663.º, n.º 2, ambos do CPC.
[6] Trata-se de lapso material, repetido também no n.º 3, que se evidencia logo pelo início do relatório, devendo estar escrito “autora” e “réu”, como ocorre com os factos n.ºs 2 e o ora renumerado 4.
[7] Por lapso, constam dois factos identificados com o n.º 3.
[8] Facto alegado pela requerente no artigo 6.º da petição inicial, e expressamente aceite pelo requerido no artigo 1.º da oposição.
[9] Doravante abreviadamente designado CC.
[10] Cfr. neste sentido, Ac. STJ, de 27-04-2004, proferido no Agravo n.º 992/04 – 6.ª, disponível em www.stj.pt, Sumários de Acórdãos.
[11] Cfr, neste sentido, NUNO DE SALTER CID, in A Protecção da Casa de Morada de Família no Direito Português, Coimbra, págs. 53 e 54.
[12] Abaixo veremos melhor a razão deste parêntesis.
[13] Factos que, por serem relevantes, se extraíram da acção de divórcio, e acima se indicaram.
[14] Doravante abreviadamente designado RAU.
[15] Sob a epígrafe “Incomunicabilidade do arrendamento”, o artigo 83.º do RAU estatuía que “Seja qual for o regime matrimonial, a posição do arrendatário não se comunica ao cônjuge e caduca por morte, sem prejuízo do disposto nos dois artigos seguintes”.
[16] PEREIRA COELHO e GUILHERME DE OLIVEIRA, in Curso de Direito da Família, 2.ª edição, Vol. I, pág. 539 e segs. criticavam a posição assumida pelo legislador do RAU (e, antes deste, no art.º 1110.º, n.º 1, do CC), afirmando que “a solução da incomunicabilidade do direito ao arrendamento para habitação merece as maiores reservas”. Diferentemente, quanto aos arrendamentos para comércio ou indústria, face ao carácter patrimonial de que o direito ao arrendamento aí se revestia e até por argumento a contrario sensu, decorrente do facto de existir esta norma especial a prever a incomunicabilidade apenas no arrendamento para habitação, a doutrina e a jurisprudência preconizavam que nos demais arrendamentos o princípio geral seria o da comunicabilidade, segundo o regime de bens. Cfr. neste sentido, ARAGÃO SEIA, in Arrendamento Urbano Anotado e Comentado, 7.ª edição, Almedina, pág. 567, e BALTAZAR COELHO, in A incomunicabilidade na posição do arrendatário, SCIENTIA IVRIDICA, n.º 299, págs. 304 e 305, bem como os Acs. STJ de 03-06-2003 (revista 1462/03-6.ª), 08-07-2003 (revista 436/03-1.ª) e 24-04-2004 (agravo 992/04-6.ª), todos disponíveis em www.stj.pt, Sumários de Acórdãos.
[17] Doravante abreviadamente designado NRAU.
[18] Rectificada pela Declaração de Rectificação n.º 24/2006, de 17 de Abril.
[19] O artigo 84.º do RAU, tinha a epígrafe “Transmissão por divórcio”, e estabelecia que:
“1 - Obtido o divórcio ou a separação judicial de pessoas e bens, podem os cônjuges acordar em que a posição de arrendatário fique pertencendo a qualquer deles.
2 - Na falta de acordo, cabe ao tribunal decidir, tendo em conta a situação patrimonial dos cônjuges, as circunstâncias de facto relativas à ocupação da casa, o interesse dos filhos, a culpa imputada ao arrendatário na separação ou divórcio, o facto de ser o arrendamento anterior ou posterior ao casamento e quaisquer outras razões atendíveis.
3 - Estando o processo pendente no tribunal de família, cabe a este a decisão.
4 - A transferência do direito ao arrendamento para o cônjuge do arrendatário, por efeito de acordo homologado pelo juiz ou pelo conservador do registo civil, consoante os casos, ou por decisão judicial, deve ser notificada oficiosamente ao senhorio”.
[20] Cfr. anotação ao artigo 1068.º do CC, in Arrendamento Urbano – Novo Regime Anotado e Legislação Complementar, 3.ª Edição Revista, Actualizada e Aumentada, Quid Juris, 2009, em co-autoria da ora Relatora, ALBERTINA PEDROSO, com LAURINDA GEMAS e JOÃO CALDEIRA JORGE, págs. 300 a 303 de onde se extraíram igualmente as notas anteriores.
[21] Cfr. obra citada, págs. 300 e 301, quanto às várias questões que podem suscitar-se no âmbito da aplicação da lei no tempo, da qual se retiram as citações que seguem sem outra menção.
[22] Para uma noção mais aprofundada da evolução legislativa a respeito do estabelecimento da regra da incomunicabilidade, pode ver-se PEREIRA COELHO, em anotação do Acórdão do STJ de 2 de Abril de 1987, na RLJ n.º 3782, págs. 135, 136 e 139 a 143; e ANTÓNIO MENEZES CORDEIRO, na obra com a sua coordenação, Leis do Arrendamento Urbano Anotadas, Almedina, 2014, págs. 152 a 154.
[23] Para maior desenvolvimento, cfr. J. BAPTISTA MACHADO, Sobre a aplicação no tempo do novo Código Civil, Almedina, 1968, páginas 352 e ss: “Sistemática do art. 12.º. O esquema disjuntivo do seu n.º 2.”.
[24] Proferido no processo n.º 4994/08.0TBAMD-A.L1-2, disponível, como os seguintes, em www.dgsi.pt.
[25] Proferido no processo n.º 738/11.7YXLSB.L1-1.
[26] Proferido no processo n.º 414/12.3TVLSB.L1.
[27] Mormente a defesa da posse mediante providência não especificada, prevista no artigo 379.º do CPC.
[28] Assim, RITA LOBO XAVIER, in O Regime dos Novos Arrendamentos Urbanos e a perspectiva do Direito da Família, publicado na revista O Direito, ano 136.º, 2004, II-III, págs. 323 a 325 e 328; cfr. também autores citados por esta, com destaque para PEREIRA COELHO, RLJ ano 122.º, págs. 138 e ss..
[29] Cfr. Explicação sobre a Reforma do Arrendamento Urbano disponível para consulta no Portal do Governo, in www.portugal.gov.pt.
[30] No artigo intitulado “CONCENTRAÇÃO” OU TRANSMISSÃO DO DIREITO AO ARRENDAMENTO HABITACIONAL EM CASO DE DIVÓRCIO OU MORTE, in ESTUDOS EM HONRA DO PROFESSOR DOUTOR JOSÉ DE OLIVEIRA ASCENSÃO, Vol. II, Almedina, 2008, pág. 1028.
[31] In “O arrendatário invisível – A comunicabilidade do direito ao cônjuge do arrendatário no arrendamento para habitação”, SCIENTIA IVRIDICA, Tomo LXV, 2016, n.º 342, págs. 416 a 418.
[32] Como acontece no caso em apreço.
[33] Acórdão proferido em 01.03.2018, Revista n.º 4685/ 14.2T8FNC.L1.S1 - 2.ª Secção, disponível em www.dgsi.pt.
[34] Cfr. Ac. TRL de 31.01.2013, proferido no processo n.º 2557/10.9TBVFX.L1-6.
[35] Cfr. neste sentido, Ac. TRL de 19.03.2013, proferido no processo n.º 8866/09.2TBCSC-B.L1-1.
[36] Texto elaborado e revisto pela Relatora.