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HABILITAÇÃO DE CESSIONÁRIO
SUCESSÃO INTER-VIVOS
Sumário
- Em contraponto à habilitação-acção e habilitação-legitimidade, existem dois tipos de habilitação-incidente, traduzida na habilitação por sucessão mortis causa e por sucessão inter-vivos ; - esta – sucessão inter-vivos - tem natureza facultativa e encontra-se plasmada no artº. 356º, do Cód. de Processo Civil, não gerando, ipso jure a suspensão da instância, em virtude do transmitente ou cedente continuar a deter legitimidade para a causa até à habilitação do adquirente ou cessionário (cf., art. 263º, nº. 1, do Cód. de Processo Civil) ; - no âmbito da habilitação de cessionário incide sob o requerente o ónus probatório dos factos demonstrativos da existência do contrato de cessão e que os créditos em execução fazem parte do objecto daquele ; - ainda que não seja deduzida contestação/oposição, não está o Tribunal dispensado de exercer sindicância, antes se lhe impondo a devida actividade jurisdicional no sentido de apreciar e aferir se a transmissão é válida, quer em relação ao objecto, quer em relação à qualidade das pessoas que nela intervieram.
Texto Integral
ACORDAM os JUÍZES DESEMBARGADORES da 2ª SECÇÃO da RELAÇÃO de LISBOA o seguinte [1]:
I – RELATÓRIO
1 – CABOT SECURITIZATION EUROPE LIMITED, por apenso ao processo de execução nº. 2454/12.3T2SNT, deduziu incidente de habilitação de cessionário, contra:
§ BANCO SANTANDER TOTTA, S.A. ;
§ Demais Intervenientes no processo,
pugnando pela procedência da habilitação, devendo ser julgada habilitada a intervir nos autos de execução, em substituição do Banco Santander Totta, S.A., com as respectivas consequências legais.
Alegou, em suma, o seguinte:
§ Por escritura pública, outorgada no dia 27/12/2017, a instituição bancária BANCO POPULAR PORTUGAL, S.A., Exequente no presente processo executivo, foi objeto de fusão por incorporação, com transmissão integral de património, na instituição bancária BANCO SANTANDER TOTTA, S.A., extinguindo-se a primeira das aludidas sociedades e transmitindo-se os seus direitos e obrigações para a sociedade incorporante ;
§ Nesse seguimento, e mediante contrato de cessão de créditos celebrado em 15/06/2018, o Banco Santander Totta, S.A., cedeu à Cabot Securitization Europe Limited um conjunto de créditos vencidos de que era titular ;
§ Constando dos créditos objecto de cessão os anteriormente detidos pelo Banco Popular Portugal SA. sobre os Executados nos presentes autos ;
§ O que faz com que, presentemente, a Requerente seja a actual titular dos créditos supra referidos ;
§ A mencionada cessão inclui a transmissão, relativamente a cada um dos créditos, de todos os direitos, garantias e direitos acessórios a eles inerentes, e foi devidamente comunicada aos Executados, ora Requeridos.
Juntou 2 documentos, tendo o presente incidente sido deduzido em 22/02/2019.
2 – Cumpridas as notificações previstas no artº. 356º, nº. 1, alín. a), do Cód. de Processo Civil, não foi apresentada qualquer contestação/oposição.
3 – Em 24/04/2019, foi proferida sentença, exarando-se, no DISPOSITIVO, o seguinte:
“Em conformidade com o exposto, julgo habilitada a sociedade comercial CABOT SECURITISATION EUROPE LIMITED, para no lugar de exequente prosseguir os autos principais.
Custas pela requerente, nos mínimos.
Registe e notifique”.
4 – Inconformada com o decidido, a Requerida Consulteam – Consultores de Gestão, S.A., interpôs recurso de apelação, em 29/05/2019, por referência à decisão prolatada.
Apresentou, em conformidade, a Recorrente as seguintes CONCLUSÕES:
“A. O entendimento da ora Recorrente, é o de que, em face do enquadramento jurídico aplicável à habilitação de cessionário, salvo o devido respeito, deveria ter sido diversa a decisão do tribunal a quo, pelo que vem pugnar pela revogação da douta sentença propugnada pela 1.ª instância. B. Nos termos do disposto no art. 356.º do CPC, cabe ao requerente o ónus da prova dos factos tendentes a demonstrar a existência do contrato de cessão e o seu objecto, constatando a ora Recorrente que não se encontram reunidos os requisitos de procedência da habilitação de cessionário, em virtude de a Recorrida não ter logrado provar que os créditos executados na presente acção lhe foram efectivamente cedidos. C. Ao invés do que alega a Recorrida, a Exequente é a ora Recorrente, Consulteam -Consultores de Gestão, S.A., sendo esta parte legítima na acção, por força de escritura de cessão de créditos realizada em 31.08.2010, celebrada entre esta e o Banco Popular Portugal, S.A., conforme contrato junto ao Requerimento Executivo junto como Doc. N.º 1. D. Nos termos estipulados no referido contrato de cessão de créditos, o Banco Popular cedeu à Consulteam um conjunto de créditos, concedidos a diversos mutuários,melhor identificados no respectivo documento complementar, no qual se encontraespecificado o crédito da ora Requerida, que faz parte integrante da referida escriturade cessão de créditos. E. Note-se que, aquando da fusão por incorporação, com transmissão integral do património, do Banco Popular Portugal, S.A. na instituição bancária do Banco Santander Totta, S.A., operação realizada em 27.12.2017, a que faz menção a Recorrida, já a ora Recorrente Consulteam - Consultores de Gestão, S.A. detinha os créditos objecto da cessão mencionada no artigo 6.º que correspondem aos peticionados na presente ação executiva. F. A Consulteam - Consultores de Gestão, S.A. é completamente alheia a qualquer contrato de cessão de créditos celebrado entre o Banco Santander Totta, S.A. e a Requerente Cabot Securitization Europe Limited, nem tão pouco teria que ter conhecimento da sua existência. G. A 15.06.2018, data em que terá sido realizada a cessão de créditos a que alude a Recorrida, nem o Banco Popular Portugal, S.A., nem o Banco Santander Totta, S.A. detinham já a titularidade dos créditos executados nos autos principais, pelo que os mesmos, a ter sido, não poderiam ter sido objecto de cessão. H. Tais incongruências ressaltam de forma evidente, efectuado o confronto entre a documentação junta aos autos bem como os factos alegados em sede de requerimento executivo pela ora Recorrente e a documentação e factos alegados pela Recorrida no incidente de habilitação de cessionário, o que a douta decisão do tribunal a quo, salvo melhor entendimento, não poderia ter deixado de aferir. I. Acresce que, no que concerne à prova dos factos tendentes a demonstrar a existência do contrato de cessão e o seu objecto, constata-se que, o documento junto como Doc. 2 na petição inicial, ao contrário do que a Recorrida alega, não procede àidentificação concreta dos créditos em causa, ou sequer indica o nome dodevedor executado nos autos, CA…, limitando-setão só a indicar o nome do mutuário, Carlos Domingos Car, Lda., o que nãopermite apurar se as alegadas responsabilidades/dívidas destes titularesefectivamente coincidem com aquelas que estão a ser executadas, carecendoassim tudo o que alega o Requerente de qualquer suporte documental. J. Os créditos executados nos autos encontram-se melhor identificados no respetivo documento complementar anexo à escritura, correspondente à Verba Dez, bem como da lista anexa à cessão de créditos à ora Recorrente, CONSULTEAM - CONSULTORES DE GESTÃO, LDA. (conforme Doc. 1 junto aos autos). K. Conforme consta do requerimento executivo, os títulos dados à execução são Letras, que como documento particular foram emitidas em 18/06/2008 e 26/06/2008 e com data de vencimento a 18/07/2008 e 26/07/2008, pelos valores de € 18.000,00 e € 21.000,00, com saque da Carlos Domingos Car, Lda. e aceite do Executado CA…. L. Da análise de ambos os documentos, é passível extrair-se que as datas de incumprimento das responsabilidades associadas ao sacado Carlos Domingos Car, Lda. que constam nas listas de créditos cedidos, não encontram qualquer correspondência entre si, o que apenas permitiria que se concluísse que os créditosexecutados nos presentes autos não se tratam dos mesmos créditos que alegadamenteterão sido objecto de cessão, ao invés da conclusão a que chegou a douta sentença dotribunal de 1.ª instância, de que ora se recorre. M. Os documentos juntos pela Recorrida não comprovam a invocada transmissão da titularidade dos créditos, sendo certo que, nos termos do disposto no art. 356.º do CPC, caberia ao requerente a prova dos factos tendentes a demonstrar a existência do contrato de cessão e o seu objecto, prova esta que não foi devidamente valorada pela douta sentença e que impunha decisão diversa. N. Refira-se, a este respeito, o que fundamenta o Acórdão da Relação de Lisboa datado de 09-02-2017, no Proc.º n.º 2359-15.6T8LRS-A.L1-6, disponível in www.dgsi.pt: (…) Não obstante não ser apresentada qualquer oposição - pela parte contrária , a qual, neste caso, é tão só aquela que na lide está em posição contrária ao cessionário - , o juiz não pode dispensar-se de apreciar se a transmissão é válida, quer em relação ao objecto, quer em relação à qualidade das pessoas que nela intervieram, ou seja, de exercer uma actividade jurisdicional .(…) Em suma, da redacção da alínea a), do nº1, do artº 356º, do CPC, licito não é inferir que o Juiz tem necessariamente de ordenar a notificação da parte contrária para deduzir oposição à habilitação, antes pode indeferir liminarmente o requerimento, ou convidar a parte/requerente a juntar aos autos documento idóneo que comprove a alegada cessão de crédito.” P. Por todo o exposto, considera a ora Recorrente que a douta sentença do tribunal a quo contém na sua fundamentação, erro na interpretação e aplicação do Direito, atento o disposto no art. 356.º do CPC, não podendo conformar-se com a referida decisão. Q. Nestes termos, deve a sentença proferida pelo tribunal a quo ser revogada, substituindo-se por outra que julgue improcedente o incidente de habilitação de cessionário intentado pela Recorrida, mantendo-se na posição processual de Exequente a ora Recorrente, parte que é legítima na acção”.
Conclui, no sentido da procedência do recurso e, em consequência, “revogar-se a doutasentença ora recorrida, substituindo-se por outra quejulgue a habilitação de cessionário totalmenteimprocedente, por não provada, e consequentemente,determinando que se mantém na posição processual deExequente a ora Recorrente”.
4 – O recurso foi admitido por despacho datado de 06/09/2019, como apelação, com subida imediata, nos próprios autos e efeito devolutivo.
5 – Não consta terem sido apresentadas quaisquer contra-alegações pelos Recorridos.
6 – Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar, valorar, ajuizar e decidir.
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II – ÂMBITO DO RECURSO DE APELAÇÃO
Prescrevem os nºs. 1 e 2, do artº. 639º do Cód. de Processo Civil, estatuindo acerca do ónus de alegar e formular conclusões, que:
“1 – o recorrente deve apresentar a sua alegação, na qual conclui, de forma sintética, pela indicação dos fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão. 2 – Versando o recurso sobre matéria de direito, as conclusões devem indicar: a) As normas jurídicas violadas ; b) O sentido com que, no entender do recorrente, as normas que constituem fundamento jurídico da decisão deviam ter sido interpretadas e aplicadas ; c) Invocando-se erro na determinação da norma aplicável, a norma jurídica que, no entendimento do recorrente, devia ter sido aplicada”.
Por sua vez, na esteira do prescrito no nº. 4 do artº. 635º do mesmo diploma, o qual dispõe que “nas conclusões da alegação, pode o recorrente restringir, expressa ou tacitamente, o objecto inicial do recurso”, é pelas conclusões da alegação da Recorrente Apelante que se define o objecto e se delimita o âmbito do recurso, sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente,apenas estando este tribunal adstrito à apreciação das questões suscitadas que sejam relevantes para conhecimento do objecto do recurso.
Pelo que, na ponderação do objecto do recurso interposto pela Recorrente Apelante, delimitado pelo teor das conclusões expostas, a apreciação a efectuar na presente sede consubstancia-se em aferir:
- se a cessionária Requerente é titular do crédito exequendo, na sequência do contrato de cessão de créditos outorgado em 15/06/2018 com o Banco Santander Totta, S.A., justificativo da decretada habilitação como exequente ;
- ou se, ao invés, o crédito dado à execução não faz parte da carteira de créditos cedida, ou seja, do título de cessão, injustificando a decretada habilitação.
O que implica, in casu, a análise das seguintes questões:
1) Da apreciação do incidente de habilitação do adquirente ou cessionário ;
2) Dos requisitos do título de aquisição ou da cessão ;
3) Do ónus probatório a observar no presente incidente.
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III - FUNDAMENTAÇÃO
A – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
A factualidade a considerar é a que resulta do iter constante do relatório supra, à qual se adita, nos termos do nº. 4, do artº. 607º, ex vi do nº. 2, do artº. 663º, ambos do Cód. de Processo Civil, tendo em atenção a prova documental junta aos presentes autos e aos autos principais executivos, a seguinte:
a) Nos autos principais de execução, dos quais os presentes são apenso, figura como Exequente Consulteam – Consultores de Gestão, S.A., figurando como Executado (único) CA… ;
b) Os títulos dados em execução traduzem-se em duas letras de câmbio, com o seguinte valor, data de emissão e data de vencimento:
VALOR DATA EMISSÃO DATA VENCIMENTO
18.000,00€ 26/06/2008 26/07/2008
(reforma aceite de 21.000,00 €)
21.000,00 € 18/06/2008 18/07/2008
(reforma aceite 24.000,00 €)
c) Figurando em tais títulos como sacador C. D. Car, Lda., e como sacado/aceitante CA… ;
d) Na mesma execução foi apresentado requerimento executivo do seguinte teor: “Comarca da Grande Lisboa-Noroeste - Secretaria-Geral dos Juízos de Sintra Pagamento de Quantia Certa - Dívida civil [Execuções] Documento Particular 702480020746016 A Exequente é parte legítima na presente execução, em nome próprio e em consequência da Escritura de Cessão de Créditos realizada em 31-08-2010 (doc. 1). A Exequente é dona e legítima possuidora de 2 Letras, que como documento particular foram emitidas em 26/06/2008 e 18/06/2008, vencidas em 26/07/2008 e 18/07/2008, pelos valores de € 18.000,00 e € 21.000,00. Saque da CD Car, Lda. e aceite do Executado CA…. A referida obrigação cartular constante das letras embora esteja prescrita, as mesmas são títulos executivos enquanto quirógrafos, ou seja, enquanto documento particular no qual consta o reconhecimento de uma obrigação pecuniária por parte da Executada. As letras dadas à Execução foram entregue à Exequente pelo sacador, no âmbito da sua actividade comercial, para reforma de duas letras de € 21.000,00 e € 24.000,00, das quais o sacado/aceitante assumiu o pagamento do valor constante das mesmas. Até à presente data e não obstante ter sido interpelado para tal, o Executado não procedeu ao seu pagamento. Ficando em dívida o montante de € 39.000,00, a título de capital vencido e não pago. Assim, à face do título tem a Exequente direito a haver do Executado o capital em dívida a que acrescem juros à taxa legal desde a data de vencimento até à presente data e respectivo imposto de selo, bem como os juros de mora vincendos até efectivo e integral pagamento. Aos valores das letras, foram somados o valor de juros, à taxa legal de 4% sobre o capital, desde as respectivas datas de vencimento até à presente data, no montante global de € 5.577,53, bem como o respectivo Imposto de Selo, à taxa de 4%, no montante de € 223,10, tudo perfazendo o montante de € 44.800,63”.
e) Conforme escritura pública de Cessão de Créditos, datada de 31/08/2010, em que figura como Cedente o Banco Popular Portugal, S.A., e como Cessionária Consulteam – Consultores de Gestão, S.A., consta a cedência dos “créditos identificados no documento complementar anexo à presente escritura, incluindo todas as garantias e acessórios dos mesmos, nos termos do disposto no artigo 582º do Código Civil, designadamente as hipotecas, fianças e avales, constituídas em garantia de cada um dos referidos créditos, sobre os imóveis, igualmente referidos no citado documento complementar, pelo preço total de VINTE MILHÕES OITENTA E NOVE MIL SEISCENTOS EUROS E OITO CÊNTIMOS (…)” – cf., doc. junto com o requerimento executivo, que aqui integralmente se reproduz ;
f) No âmbito do Contrato de Cessão de Carteira de Créditos não garantidos, outorgado em 15/06/2018, entre o Banco Santander Totta, S.A., enquanto Cedente, e Cabot Securitisation (Europe) Limited, enquanto Cessionária, consta, sob o ponto 2.1, que “nos termos do presente Contrato, o Cedente vende e transmite ao Cessionário, que por sua vez compra e adquire, a Carteira de Créditos, livre de todos os Ónus, como contrapartida pelo pagamento do Preço de Aquisição, adquirindo a titularidade plena dos Créditos que compõem a referida Carteira de Créditos na Data de Determinação da Carteira de Créditos, nos termos do presente Contrato, bem como os Valores Depositados em Tribunal, sem prejuízo do disposto na cláusula 2.3” ;
g) Acrescentando-se no ponto 6.1 do mesmo Contrato que “tendo em consideração o objecto do presente Contrato e o carácter incerto e duvidoso da cobrança dos Créditos, as Partes acordam que o Preço de Aquisição da Carteira de Créditos é de € 46.176.046,44” ;
h) Constando do Anexo 2, para além daquele “Preço de Aquisição”, como “número de créditos cedidos 24548” e o “montante total em dívida à data de determinação da carteira de créditos € 357.162.704,50” ;
i) Nos Considerandos (G) e (H) de tal Contrato consta, ainda, que:
“O volume da Carteira de Créditos, a heterogeneidade dos Créditos que a compõem e, em muitos casos, a sua antiguidade e/ou a sua proveniência de alguma das instituições de crédito integradas por fusão no Cedente, não permitem ao Cedente declarar ou garantir que a informação relativa aos Créditos é completa ou correcta em todos os casos. Pelo mesmo motivo, a documentação física detida pelo Cedente relativa aos Créditos não é necessariamente completa ou exaustiva” ;
“O Cessionário declara reconhecer e aceitar estas características dos créditos, dos Dados dos Créditos e da documentação física relativa aos Créditos” – cf., documento junto a fls. 7 a 38, que integralmente se reproduz ;
j) Consta do Anexo 4 de tal Contrato uma “lista de Créditos”, figurando a fls. 36 a 38, vários referentes ao cliente “CARLOS DOMINGOS CAR COMÉRCIO DE AUTOMÓVEIS SOC UNIP”, com indicação da respectiva “data de incumprimento”.
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B - FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO
A sentença apelada raciocinou nos seguintes termos:
A Requerente veio suscitar a sua habilitação para prosseguir a causa no lugar da Exequente ;
Decorre dos documentos juntos aos autos que, por escritura pública, foram cedidos, entre outros, o crédito que deu origem à execução, bem como todos os seus acessórios e garantias ;
Pelo que, considerou procedente o incidente deduzido, julgando habilitada a sociedade requerente Cabot Securitisation Europe Limited para, no lugar de exequente, prosseguir os autos principais.
Por sua vez, a Apelante/Recorrente aduz, em súmula, que:
- Contrariamente ao feito constar no requerimento inicial do incidente, a Exequente não é o Banco Popular Portugal, S.A., mas antes a apelante Consulteam – Consultores de Gestão, S.A. ;
- A qual figura como Exequente por força da escritura de cessão de créditos outorgada em 31/08/2010 com o Banco Popular Portugal, S.A., em que figurou como cessionária e o banco como cedente ;
- Sendo que o crédito dado à execução faz parte do elenco dos créditos objecto de cessão ;
- Assim, na data da aludida cessão de créditos invocada pela ora Requerente Cabot Limited – 15/06/2018 -, nem o Banco Popular Portugal, S.A., nem o Banco Santander Totta, S.A., que o incorporou, detinham já a titularidade dos créditos dados em execução, pelo que estes, logicamente, não podiam ter sido objecto da concretizada cessão. ;
- Por sua vez, o documento nº. 2, junto com o requerimento inicial do presente incidente, não procede à identificação concreta dos créditos em causa, pois nem sequer indica o nome do devedor executado – CA… -, limitando-se, tão-só, a indicar o nome do mutuário – Carlos Domingos Car Comércio de Automóveis Soc. Unip ;
- Não permitindo, assim, apurar se as alegadas dívidas/responsabilidades destes titulares coincidem com as executadas ;
- Constando antes tais créditos na lista anexa á escritura de cessão de créditos efectuada à ora Recorrente ;
- Ou seja, da análise da listagem dos créditos cedidos, junta pela Requerente/Recorrida, em contraposição com as datas de vencimento dos títulos dados à execução (letras de câmbio), constata-se inexistir qualquer correspondência entre as datas de incumprimento das responsabilidades associadas ao sacador Carlos Domingos Car, Lda. ;
- Resultando, assim, que os créditos executados não correspondem aos créditos objecto de cessão ;
- Isto é, os documentos juntos pela Requerente/Recorrida Cabot Limited não comprovam a invocada transmissão da titularidade dos créditos ;
- Sendo certo que incumbia à Requerente o ónus probatório dos factos demonstrativos da existência do contrato de cessão e que os créditos em execução fazem parte do objecto do contrato de cessão ;
- Não cumprindo tal ónus, não se encontram reunidos os requisitos de procedência da habilitação de cessionário, pois a Recorrida/Requerente não logrou provar que os créditos executados foram-lhe efectivamente cedidos.
Analisemos.
- do incidente de habilitação do adquirente ou cessionário
Prevendo acerca do princípio da estabilidade da instância, aduz o artº. 260º que “citado o réu, a instância deve manter-se a mesma quanto às pessoas, ao pedido e à causa de pedir, salvas as possibilidades de modificação consignadas na lei”, acrescentando a alínea a), do artº. 262º, relativa às modificações subjectivas, que “a instância pode modificar-se quanto às pessoas: em consequência da substituição de alguma das partes, quer por sucessão, quer por ato entre vivos, na relação substantiva em litígio”.
Estipula o normativo seguinte – 263º -, nos seus nºs. 1 e 2, no que concerne à legitimidade do transmitente – substituição deste pelo adquirente, que:
“1 – no caso de transmissão, por ato entre vivos, da coisa ou direito litigioso, o transmitente continua a ter legitimidade para a causa enquanto o adquirente não for, por meio de habilitação, admitido a substituí-lo. 2 – A substituição é admitida quando a parte contrária esteja de acordo e, na falta de acordo, só deve recusar-se a substituição quando se entenda que a transmissão foi efectuada para tornar mais difícil, no processo, a posição da parte contrária”.
A habilitação do adquirente ou cessionário encontra-se, por sua vez, prevista formalmente através de incidente próprio, regulado no artº. 356º, o qual dispõe que: “1 - A habilitação do adquirente ou cessionário da coisa ou direito em litígio, para com ele seguir a causa, faz-se nos termos seguintes: a) Lavrado no processo o termo da cessão ou junto ao requerimento de habilitação, que é autuado por apenso, o título da aquisição ou da cessão, é notificada a parte contrária para contestar; na contestação pode o notificado impugnar a validade do ato ou alegar que a transmissão foi feita para tornar mais difícil a sua posição no processo; b) Se houver contestação, o requerente pode responder-lhe e em seguida, produzidas as provas necessárias, é proferida decisão; na falta de contestação, verifica-se se o documento prova a aquisição ou a cessão e, no caso afirmativo, declara-se habilitado o adquirente ou cessionário. 2 - A habilitação pode ser promovida pelo transmitente ou cedente, pelo adquirente ou cessionário, ou pela parte contrária; neste caso, aplica-se o disposto no número anterior, com as adaptações necessárias”.
Substantivamente, a cessão de créditos é legalmente prevista no artº. 577º, do Cód. Civil, ao prescrever que: “1. O credor pode ceder a terceiro uma parte ou a totalidade do crédito, independentemente do consentimento do devedor, contanto que a cessão não seja interdita por determinação da lei ou convenção das partes e o crédito não esteja, pela própria natureza da prestação, ligado à pessoa do credor. 2. A convenção pela qual se proíba ou restrinja a possibilidade da cessão não é oponível ao cessionário, salvo se este a conhecia no momento da cessão”.
Acrescenta o nº. 1 do artº. 582º, relativamente à transmissão de garantias e outros acessórios, que “na falta de convenção em contrário, a cessão do crédito importa a transmissão, para o cessionário, das garantias e outros acessórios do direito transmitido, que não sejam inseparáveis da pessoa do cedente”, sendo que, no que concerne aos efeitos em relação ao devedor, aduz o normativo seguinte – 583º - que: “1. A cessão produz efeitos em relação ao devedor desde que lhe seja notificada, ainda que extrajudicialmente, ou desde que ele a aceite. 2. Se, porém, antes da notificação ou aceitação, o devedor pagar ao cedente ou celebrar com ele algum negócio jurídico relativo ao crédito, nem o pagamento nem o negócio é oponível ao cessionário, se este provar que o devedor tinha conhecimento da cessão”.
Como excepção ao enunciado princípio da estabilidade da instância, o incidente de habilitação destina-se, fundamentalmente, “a comprovar a aquisição, por sucessão ou transmissão, da titularidade de um direito ou de um complexo de direitos ou de situações jurídicas, pode ser feita por via notarial ou por via judicial, isto é, através de escritura pública (habilitação notarial) ou no âmbito de um processo judicial (habilitação judicial)”.
Sendo dois os tipos da habilitação-incidente (em contraposição à habilitação-acção e habilitação-legitimidade), traduzida na habilitação por sucessão mortis causa e por sucessão inter-vivos, esta tem natureza facultativa [2] e encontra-se plasmada no transcrito artº. 356º, “não gerando ipso jure a suspensão da instância, uma vez que o transmitente ou cedente continua a deter legitimidade para a causa até à habilitação do adquirente ou cessionário (art. 263º, nº. 1)” [3][4].
No caso sub júdice, figura como Exequente nos autos principais a entidade Consulteam – Consultores de Gestão, S.A., provindo o crédito exequendo de escritura pública de cessão de créditos outorgada entre aquela entidade e o Banco Popular Portugal, S.A., datada de 31/08/2010.
Tal crédito consubstancia-se em duas letras de câmbio, com saque de Carlos Domingos Car, Lda. (sacador) e aceite de CA… (aceitante), com os valores, data de emissão e data de vencimento, respectivamente, de 18.000,00 e 21.000,00 €, 26/06/2008 e 18/06/2008, e 26/07/2008 e 18/07/2008.
Entretanto, na pendência da execução, uma outra entidade, ora Requerente – Cabot Securitization Europe Limited -, veio deduzir o presente incidente de habilitação de cessionário, alegando que o crédito em execução foi-lhe cedido, mediante contrato de cessão de créditos outorgado em 15/06/2018, pelo Banco Santander Totta, S.A.. Banco que, por sua vez, havia incorporado, por fusão, o Banco Popular Portugal S.A., que havia figurado como cedente na cessão de créditos efectuada á Consulteam – Consultores de Gestão, S.A., em 31/08/2010.
Pendente a execução, e prosseguindo a mesma os seus normais termos, a questão a dirimir é então a de apurar se o crédito em execução foi efectivamente objecto de cedência/transmissão operada pelo contrato de cessão de créditos celebrado em 15/06/2008, tendo como outorgantes a ora Requerente (apelada) Cabot Securitization Limited (cessionária) e o Banco Santander Totta (cedente).
Ora, não deixa de ser estranho que a sentença apelada não tenha sequer constatado que a transmissão do crédito ora invocada não tenha sido celebrada com a Exequente, ou seja, com a sociedade Consulteam – Consultores de Gestão, S.A..
Efectivamente, e contrariamente ao aduzido em sede de requerimento inicial, nos autos principais executivos não figura como exequente o Banco Popular Portugal, S.A., mas antes a sociedade Consulteam – Consultores de Gestão, S.A., pelo que, invocada a transmissão/cedência de créditos efectuada pelo incorporante Banco Santander Totta, S.A., que nada tem a ver com a Exequente, seria facilmente constatável que alguma distonia ou incongruência existia. Pois, de outro modo, estaríamos perante um problema de legitimação substantiva por parte da Exequente Consulteam – Consultores de Gestão, S.A..
Ora, conforme resulta da factualidade supra aduzida como provada, a análise da prova documental junta pela Requerente Cabot Limited, nomeadamente, e de forma mais incisiva, no que concerne ao documento nº. 2 junto com o requerimento inicial, não permite minimamente concluir que os créditos objecto de execução figurem na listagem da carteira de créditos objecto da cessão outorgada entre a ora Requerente e o Banco Santander Totta, S.A..
Efectivamente, tal documento traduz, segundo a própria Requerente, a folha identificativa dos créditos em causa nos presentes autos, fazendo parte do anexo IV do contrato de cessão de carteira de créditos não garantidos celebrado entre aquela Requerente e o Banco Santander Totta, S.A...
Analisada a mesma, e com atinência aos créditos em execução, temos apenas a identificação do cliente Carlos Domingos Car Comércio de Automóveis Soc Unip, com determinados código-conta, tipo crédito, data original (nem sempre disponível) e data de incumprimento.
Confrontando tais elementos identificativos com o teor dos títulos executivos, constata-se o seguinte:
- inexiste coincidência entre a identificação do cliente e do sacador dos títulos - Carlos Domingos Car Comércio de Automóveis Soc Unip e C. D. Car, Lda., ainda que se reconheça alguma similitude identificativa entre ambas ;
- não consta da mesma documentação qualquer referência ao executado e aceitante CA…, capaz de suscitar qualquer processo identificativo entre os créditos em execução e a invocada cedência de créditos ;
- os demais elementos não permitem efectuar qualquer correspondência entre os créditos exequendos ou títulos dados em execução e os alegados créditos objecto de cessão, tendo por outorgantes a cessionária Cabot Limited e o cedente Banco Santander Totta, S.A. ;
- o que surge com especial ênfase no que concerne à data de incumprimento, pois nenhuma destas datas (e são 43 as datas de incumprimento indicadas), corresponde às datas de vencimento dos títulos dados em execução, sendo que a quase totalidade (com excepção de uma) estão mesmo a juzante das datas de vencimento destes títulos.
Deste modo, não é minimamente compreensível como pode a sentença apelada referenciar que “como decorre dos documentos juntos aos autos, por escritura pública foram cedidos, entre outros, o crédito que deu origem à execução, bem como todos os seus acessórios e garantias”.
Efectivamente, não só não foi por escritura pública, como a documentação junta não demonstra, minimamente, a cedência do crédito subjacente á execução.
Existe, deste modo, claramente, alguma confusão identificativa da Requerente na dedução do presente incidente, à qual não será certamente alheia a dificuldade já realçada e reconhecida no próprio contrato de cessão de créditos, donde consta, nos Considerandos (G) e (H), que:
“O volume da Carteira de Créditos, a heterogeneidade dos Créditos que a compõem e, em muitos casos, a sua antiguidade e/ou a sua proveniência de alguma das instituições de crédito integradas por fusão no Cedente, não permitem ao Cedente declarar ou garantir que a informação relativa aos Créditos é completa ou correcta em todos os casos. Pelo mesmo motivo, a documentação física detida pelo Cedente relativa aos Créditos não é necessariamente completa ou exaustiva” ;
“O Cessionário declara reconhecer e aceitar estas características dos créditos, dos Dados dos Créditos e da documentação física relativa aos Créditos” – cf., facto i) provado.
Por fim, sempre se dirá, ainda, decorrer das regras probatórias, tal como bem refere a Apelante, que incumbia à Requerente o ónus probatório dos factos demonstrativos da existência do contrato de cessão e que os créditos em execução fazem parte do objecto daquele.
Ónus que, nos termos expostos, não se mostra observado ou cumprido.
Ademais, o facto de não ter existido qualquer contestação da parte contrária notificada também não permite concluir no sentido de que ao Tribunal não era exigível qualquer sindicância.
Com efeito, nas palavras de Alberto dos Reis [5], “suponhamos que o adversário do transmitente não faz oposição, isto é, que não diz coisa alguma ou se mostra favorável à habilitação.
Mesmo neste caso o juiz não pode dispensar-se de apreciar se a transmissão é válida, quer em relação ao objecto, quer em relação à qualidade das pessoas que nela intervieram. Tem de exercer uma actividade jurisdicional perfeitamente idêntica à que lhe impõe o artigo 305º, a propósito do julgamento da confissão, desistência ou transacção”.
Em idêntico sentido, referem António Santos Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa [6] caber “ao requerente o ónus da prova dos factos tendentes a demonstrar a existência do contrato de cessão e o seu objecto relevante. A prova do contrato de cessão é documental (…) não tendo de expressar o exacto montante da obrigação ao tempo da transmissão, mas devendo identificar o crédito de molde a permitir saber qual o objecto da cessão”.
Acresce que, “mesmo que o requerido não conteste, compete ao juiz verificar se a transmissão ou cessão é válida, apreciando se foi feita a prova legalmente exigida do ato fundante da cessão (al. b) do nº. 1)”.
Tal entendimento é sufragado pelo douto aresto desta Relação de 09/02/2017 [7], ao referenciar que “não obstante não ser apresentada qualquer oposição - pela parte contrária , a qual, neste caso, é tão só aquela que na lide está em posição contrária ao cessionário - , o juiz não pode dispensar-se de apreciar se a transmissão é válida, quer em relação ao objecto, quer em relação à qualidade das pessoas que nela intervieram, ou seja, tem de exercer uma actividade jurisdicional”.
O que implica, necessariamente, concluir-se no sentido de não se encontrarem reunidos os requisitos de procedência da habilitação de cessionário, pois a Recorrida/Requerente não logrou provar que os créditos executados foram-lhe efectivamente cedidos.
Por outro lado, não cabe no âmbito do incidente deduzido, nem faz parte do presente objecto recursório a aferição da legitimidade substantiva do apelante/exequente relativamente aos créditos em execução, pelo que nada se acrescentará relativamente a tal questão.
Determinando, consequentemente, juízo de procedência da presente apelação, impondo-se:
Ø a revogação da sentença recorrida/apelada ;
Ø a suasubstituição por sentença que julga o deduzido incidente de habilitação de cessionário totalmente improcedente, por não provado.
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Nos quadros do artº. 527º, nºs. 1 e 2, do Cód. de Processo Civil, a tributação processual opera-se nos seguintes termos:
- quanto à acção/incidente: custas a cargo da Requerente Cabot Securitisation Limited ;
- quanto à apelação: tendo a Apelante obtido vencimento e não tendo os Apelados apresentado contra-alegações, não são devidas custas.
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IV. DECISÃO
Destarte e por todo o exposto, acordam os Juízes desta 2ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa em:
a) Julgar procedente o recurso de apelação interposto pela Apelante/Recorrente CONSULTEAM – CONSULTORES de GESTÃO, S.A. ;
b) Em consequência, revoga-se a sentença recorrida/apelada, a qual se substitui por sentença que julga o deduzido incidente de habilitação de cessionário totalmente improcedente, por não provado.
Nos quadros do artº. 527º, nºs. 1 e 2, do Cód. de Processo Civil, a tributação processual opera-se nos seguintes termos:
- quanto à acção/incidente: custas a cargo da Requerente Cabot Securitisation Limited ;
- quanto à apelação: tendo a Apelante obtido vencimento e não tendo os Apelados apresentado contra-alegações, não são devidas custas.
Lisboa, 11 de Dezembro de 2019
Arlindo Crua
António Moreira
Carlos Gabriel Castelo Branco
_______________________________________________________ [1] A presente decisão é elaborada conforme a grafia anterior ao Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa de 1990, salvaguardando-se, nas transcrições efectuadas, a grafia do texto original. [2] Nas palavras do Juiz Santos Silveira – Questões Subsequentes em Processo Civil, pág. 359 -, citado por Ary Elias da Costa e outros – Código de Processo Civil Anotado e Comentado, 4ª Volume, Almedina, 1974, pág. 291 -, “a habilitação, ao invés do que sucedia no caso de transmissão mortis causa, apresenta-se-nos, aqui, com carácter facultativo, no sentido de que não é condição sine qua non do prosseguimento da demanda”. [3] Francisco Manuel Lucas Ferreira de Almeida, Direito Processual Civil, Volume I, 2ª Edição, Almedina, pág. 599 e 600. [4] Cf., ainda, Lebre de Freitas, João Redinha e Rui Pinto, Código de Processo Civil Anotado, Volume 1º, Coimbra Editora, pág. 645. [5]Comentário ao Código de Processo Civil, Vol. 3º, Coimbra Editora, 1946, pág. 78. [6]Código de Processo Civil Anotado, Vol. I, Almedina, 2019, Reimpressão, pág. 413. [7] Relator: António Santos, Processo nº. 2359/15.6T8LRS-A.L1-6, in www.dgsi.pt, citado nas alegações recursórias.