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TRANSMISSÃO DO IMÓVEL
NOÇÃO DE PARTE INTEGRANTE E COMPONENTE
Sumário
Sumário (do relator):
1- Salvo convenção em contrário entre transmitente e adquirente, as árvores, arbustos e frutos naturais existentes no prédio objeto da transmissão e que se encontrem ligados materialmente ao respetivo solo, formam com o prédio uma única unidade, um único prédio, pelo que a transmissão do prédio para o adquirente implica a transmissão para o último daquelas árvores, arbustos e frutos.
2- A transferência do prédio para o adquirente, implica a transferência para o último de toda a água existente no prédio, designadamente, poços, furos e minas, cuja água não tenha sido objeto de anterior desintegração do prédio, por lei ou negócio.
3- A transferência do prédio implica a transmissão para o aquirente de todas as suas partes componentes. Salvo convenção em contrário, a transmissão do prédio para o adquirente implica a transmissão para o último de todas as partes integrantes do prédio.
4- São “partes componentes” do prédio as coisas que fazem parte da estrutura do próprio prédio, sem as quais este não se encontra completo ou é impróprio para o uso a que se destina (ex: portas, janelas, vigas, telhas, clarabóias, etc.).
5- São “partes integrantes” do prédio as coisas móveis que se encontrem ligadas materialmente (presas, fixadas) ao prédio, com carácter de permanência (perpetuidade), isto é, destinadas a satisfazer necessidades permanentes do prédio e em que a ligação não tenha limite temporal definido, a não ser os que resultem das leis da física, que não fazem parte da estrutura do prédio mas que aumentam a sua utilidade, servindo para tornar o prédio mais produtivo, mais seguro, mais cómodo ou mais belo (ex: azulejos, tijoleira, instalação de aquecimento central, painel solar, etc.).
6- São ainda “partes integrantes” do prédio as coias móveis que se encontrem fixadas/presas àquele e que se destinam a aumentar a sua utilidade, mas em que apesar de não existir o caráter de perpetuidade da ligação, têm de nele existir por imposição legal, por razões administrativas ou de sanidade pública.
7- Tendo o autor comprado um prédio urbano, sem que nada tivesse sido acordado entre vendedor e comprador a propósito de qualquer exclusão sobre aquela compra e venda, a transmissão da propriedade do prédio para o comprador (autor) engloba a transferência para último da propriedade do anexo existente no prédio, com todas as janelas e portas que nele existiam; a transferência do furo de captação de água existente no prédio; a transferência das árvores e sebes existentes no jardim e que se encontravam presas ao solo; a transferência de todas as loiças das casas de banho que existiam no prédio (suas partes componentes); a transferência da caldeira do aquecimento central, dos radiadores, do painel e das torneiras existentes no prédio (suas partes integrantes), mas não engloba a transferência dos móveis de cozinha e respetivos electrodomésticos, à exceção do lava loiça.
8- Os móveis de cozinha e respetivos eletrodomésticos, ainda que ligados materialmente (presos, fixados) às paredes da cozinha, não são partes integrantes do prédio, uma vez que essa ligação é meramente precária, tratando-se de elementos facilmente destacáveis e substituíveis.
Texto Integral
Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Guimarães.
I. RELATÓRIO.
Recorrentes: José e Maria. Recorrido: V. M..
V. M., residente na Rua … n,º …, Braga, instaurou ação declarativa, como processo comum, contra José e mulher, Maria, residentes na Rua … Braga, e Massa Insolvente de Construções X Unipessoal, Lda., representada pelo administrador judicial, F. J., com domicílio profissional na Rua … Barcelos, pedindo que:
a) se julgue como ilícito o comportamento dos 1ºs Réus e, em consequência, se condene estes a repor o imóvel no exato estado em que se encontrava à data da apreensão, vistoria e adjudicação deste, repondo naquele os bens/equipamentos por eles retirados, melhor identificados no item 38º da petição inicial;
b) na eventualidade da reposição do imóvel no estado em que se encontrava não ser possível, se condene os 1ºs Réus a devolver ao Autor o valor dos bens retirados, ou seja, a importância de 21.539,00 euros;
c) se condene ainda os 1ºs Réus no pagamento de uma indemnização civil a favor do Autor, como forma de o ressarcir dos danos de natureza patrimonial, os quais jamais poderão ser quantificados em quantia inferior a 1.500.00 euros;
Subsidiariamente, para o caso das pretensões deduzidas contra os 1ºs Réus não serem procedentes,
a) se julgue verificado o cumprimento defeituoso do contrato de compra e venda celebrado entre o Autor e a 2ª Ré e, em consequência, se condene esta a repor o imóvel no exato estado em que se encontrava à data da apreensão, vistoria e adjudicação, repondo naquela os bens/equipamentos melhor identificados no item 38º da petição inicial;
b) na eventualidade da reposição do imóvel no estado em que se encontrava não ser possível, se condene a 2ª Ré a devolver ao Autor o valor dos bens retirados, ou seja, a importância de 21.539,00 euros;
c) se condene ainda a 2ª Ré no pagamento de uma indemnização civil a favor do Autor, como forma de o ressarcir dos danos de natureza patrimonial, os quais jamais poderão ser quantificados em quantia inferior a 1.500,00 euros;
d) se classifique como dívidas da massa insolvente todas as quantias em dívida, nos termos do disposto nas alíneas c) e d) do art. 51º do CIRE.
Para tanto alega, em síntese, que a 2ª Ré foi declarada insolvente, por sentença de 10/03/2015, tendo sido nomeado administrador judicial F. J.;
No âmbito do processo de insolvência foi apreendido o prédio urbano, composto por casa de cave, rés-do-chão, andar e logradouro, sito em ..., Rua …, Braga, descrito na 1ª Conservatória do Registo Predial de Braga sob o n.º …/..., e inscrito na matriz predial urbana da União de Freguesias de ... e ... sob o art. …º;
Relativamente a esse prédio, os 1ºs Réus reclamaram nos autos de insolvência um direito de crédito decorrente do incumprimento de um contrato promessa de compra e venda, crédito esse que veio a ser graduado com natureza real, por força do exercício do direito de retenção que sobre o mesmo exerceram;
No âmbito das diligências do ativo da 2ª Ré, o administrador judicial promoveu a venda daquele imóvel, por negociação particular, mediante propostas em sobrescrito fechado, a serem abertas no dia 06/11/2015, e designou o dia 26/10/2015 para mostrar o imóvel aos potenciais interessados na sua aquisição;
Acontece que no dia designado para a mostra, o Autor deslocou-se ao prédio e na presença de um colaborador do administrador judicial vistoriou-o e veio a apresentar uma proposta de aquisição pelo valor de 166.020,00 euros, valor esse que veio a ser aceite pelo administrador judicial, que adjudicou o imóvel em causa ao Autor por esse valor;
Após essa adjudicação, o Autor solicitou ao administrador judicial que agendasse uma vistoria ao imóvel antes da celebração da escritura de compra e venda;
Essa vistoria veio a ser realizada no dia 15/01/2016, data em que o prédio apresentava o estado que se encontra descrito no art. 20º da petição inicial;
Acontece que celebrada a escritura e efetuada a entrega do imóvel pelos 1ºs Réus ao Autor em 29/01/2016, este verificou que o imóvel não se encontrava nas exatas condições em que se encontrava quando o vistoriou, posto que lhe faltavam os equipamentos que descrimina nos arts. 23º a 29º da petição inicial;
O Autor apresentou reclamação junto do administrador judicial, posto que oferecera aquele preço de 166.020,00 euros, no pressuposto que o prédio lhe seria entregue nos exatos termos em que se encontrava à data em que o mesmo lhe foi mostrado;
Aquando da realização da vistoria ao prédio, em 15/01/2016, a filha dos 1ºs Réus remeteu ao conhecimento do Autor uma listagem, onde constavam os equipamentos descritos no art. 18º da petição inicial, que, segundo esta, o Autor poderia adquirir mediante o pagamento dos valores referidos nesse art. 18º, o que não mereceu a concordância do Autor que logo disso deu conhecimento à filha dos 1ºs Réus, por correio eletrónico remetido à última e com conhecimento do administrador de insolvência, requerendo pronúncia urgente, pois que os 1ºs Réus se preparavam para remover aqueles bens do imóvel, o que não aconteceu até à presente data;
Foram os 1ºs Réus que, de forma unilateral, decidiram remover os identificados bens/equipamentos do prédio, sem antes reclamarem à 2ª Ré o reconhecimento de créditos decorrentes de eventuais benfeitorias realizadas no imóvel, mormente, decorrentes da instalação desse equipamento, cujo valor ascende a 21.539,00 euros;
Acresce que a atitude dos 1ºs Réus causou ao Autor sentimentos de injustiça, arrelias, transtornos e obrigou-o a recorrer à justiça para repor os seus direitos, danos esses que carecem de ser compensados em quantia nunca inferior a 1.500,00 euros.
A 2ª Ré massa insolvente contestou, impugnando parte da factualidade alegada pelo Autor.
Alegou que o imóvel foi apreendido no exato estado em que se encontrava à data da sua apreensão, ou seja, com uma caldeira de aquecimento e respetivos radiadores de aquecimento, WC, devidamente equipado com louças sanitárias e mobiliário, cozinha equipada, painel solar, entre outros;
Foi no pressuposto que esse imóvel se encontrava dotado desses bens e equipamentos que aquele foi avaliado e posto à venda;
Nunca os 1ºs Réus reclamaram e reivindicaram nos autos de insolvência a propriedade sobre os equipamentos que se encontravam no interior desse prédio e que a 2ª Ré identifica no art. 21º da contestação, apenas fazendo-o já após a adjudicação desse prédio ao Autor;
Foram os 1ºs Réus que retiraram esses bens e equipamentos do interior do prédio, sem que, em momento algum, tivessem comunicado ao administrador judicial que a titularidade desses bens, a serem desintegrados do prédio, eram sua propriedade e sem que tivessem reclamado quaisquer créditos em relação aos mesmos nos autos de insolvência, que sabiam serem indissociáveis e necessários do imóvel.
Conclui pedindo que a ação seja julgada improcedente quanto à 2ª Ré massa insolvente e se condene os 1ºs Rés como litigantes de má fé em multa.
Os 1ºs Réus contestaram impugnando parte da factualidade alegada pelo Autor.
Sustentaram que o Autor bem sabia que os bens que descreve na petição inicial, constituíam móveis, que não integravam o prédio objeto da compra e venda e que aquele nunca levantou qualquer objeção à titularidade dos contestantes sobre esses bens.
Concluem pela improcedência da ação, pedindo que sejam absolvidos do pedido e se condene o Autor como litigante de má fé, em multa e em indemnização a favor deles, 1ºs Réus, em valor nunca inferior a 2.500,00 euros, sustentando que aquele deduz pretensão cuja falta de fundamento não devia ignorar, mente, deturpa e inventa factos com vista à obtenção de um objetivo que bem sabe que não tem correspondência com a realidade e faz dos meios processuais um uso manifestamente reprovável.
Realizou-se audiência prévia em que se tentou a conciliação das partes, que se frustrou.
Proferiu-se despacho saneador, fixou-se o valor da causa em 25.539,00 euros, o objeto do litígio e os temas da prova, que não foram alvo de reclamação.
Conheceu-se dos requerimentos probatórios apresentados pelas partes e designou-se data para a realização da audiência final.
Realizada a audiência final proferiu-se sentença julgando a ação parcialmente procedente e improcedentes os pedidos de condenação como litigantes de má fé de Autores e 1ºs Réus, constando essa sentença da seguinte parte dispositiva:
“Pelo exposto, a) Condeno os 1ºs RR, José e Maria no pagamento ao A, V. M., do valor dos bens por si indevidamente retirados do imóvel em questão nos autos, no montante de € 21.539,00, a que acrescem juros de mora legais desde a data da presente sentença até ao seu cumprimento integral. b) Absolvo os RR José e Maria e Massa Insolvente de Construções X Unipessoal, Lda., do restante peticionado. c) Absolvo o A, V. M., do pedido de condenação em litigância de má fé.
Custas pelos 1ºs RR, José e Maria, que lhes deram causa - artigo 527º, nº1 e 2 CPC”.
Inconformados com o assim decidido, os 1ºs Réus, José e mulher, Maria, interpuseram o presente recurso de apelação, em que formulam as seguintes conclusões:
1ª) O Tribunal recorrido deveria ter dado como não provados os factos 21, 22, 40, 41 e 49.
2ª) Decorre claramente do depoimento do Administrador de Insolvência, bem como da prova documental oportunamente junta aos autos que a avaliação do prédio em questão foi feita sem que tivesse havido acesso ao interior do prédio, ou seja, com total desconhecimento do estado em que o mesmo se encontrava.
3ª) Assim sendo, o valor atribuído ao imóvel na avaliação nunca poderia ter tido em consideração as eventuais partes integrantes, pelo simples facto de se desconhecer se elas existiam.
4ª) Efetivamente, uma vez que não houve acesso ao interior do aludido prédio, não podendo obviamente presumir-se quais os bens existentes no seu interior, aavaliação oportunamente efetuada só diz respeito ao prédio propriamente dito, sem quaisquer outros componentes (designadamente bens móveis ainda que incorporados neste imóvel), sendo que apenas o prédio propriamente dito podia ser objeto da venda em discussão nos presentes autos.
5ª) Considerando tal circunstancialismo, a proposta de aquisição do imóvel inventariado sob a verba 7, no valor de 166.020,00€, não podia ter sido efetuada pelo Autor no pressuposto do imóvel lhe seria entregue nos exatos termos em que o mesmo se encontrava à data da apreensão, à data da mostra, à data da venda, ou seja, dotado do equipamento /bens que se consideram partes componentes do imóvel, isto porque tais partes componentes não foram atendidas na avaliação.
6ª) Assim, o Tribunal a quo deveria ter dado o facto 21 como não provado.
7ª) Do depoimento do AI, bem como da prova documental oportunamente junta aos autos decorre uma vez mais que a avaliação do prédio em questão (que, por sua vez, é determinante para a fixação do valor que é proposto para aquisição) foi feita sem que tivesse havido acesso ao interior do prédio, ou seja, com total desconhecimento dos bens que o dotavam.
8ª) Assim, o valor atribuído ao imóvel na avaliação nunca poderia ter tido em consideração as eventuais partes integrantes, pelo simples de se desconhecer se elas existiam.
9ª) Efetivamente, uma vez que não houve acesso ao interior do aludido prédio, não podendo obviamente presumir-se quais os bens existentes no seu interior, aavaliação oportunamente efetuada só diz respeito ao prédio propriamente dito, sem quaisquer outros componentes (designadamente bens móveis ainda que incorporados neste imóvel), sendo que apenas o prédio propriamente dito podia ser objeto da venda em discussão nos presentes autos.
10ª) Considerando tal circunstancialismo, quando se propôs adquirir o imóvel pela importância de € 166.020,00, o Autor nunca podia ter a convicção do mesmo estar dotado do mobiliário de casa de banho (louças sanitárias imprescindíveis ao fim de um Wc); a cozinha estar dotada de bancadas, mobiliário de cozinha, torneiras e eletrodomésticos imprescindíveis ao fim de uma cozinha), pré instalação de aquecimento, respetivos radiadores de aquecimento, com a respetiva caldeira de aquecimento e de um painel solar, o anexo se encontrar fechado com as respetivas janelas e portas, com o furo de água aberto, isto porque tais bens não foram atendidos na avaliação.
11ª) Assim, o Tribunal a quo deveria ter dado o facto 22 como não provado.
12ª) Novamente, do mesmo depoimento do AI, bem como da prova documental oportunamente junta aos autos, decorre uma vez mais que a apreensão/avaliação do prédio em questão foi feita sem que tivesse havido acesso ao interior do prédio, ou seja, com total desconhecimento dos bens e equipamentos que o dotavam.
13ª) Assim sendo, o auto de apreensão e o valor atribuído ao imóvel na avaliação nunca poderiam ter tido em consideração tais bens ou equipamentos, pelo simples facto de se desconhecer se eles existiam.
14ª) Efetivamente, uma vez que não houve acesso ao interior do aludido prédio, não podendo obviamente presumir-se quais os bens e equipamentos existentes no seu interior, a apreensão oportunamente efetuada só diz respeito ao prédio propriamentedito, sem quaisquer outros componentes (designadamente bens móveis ainda que incorporados neste imóvel), sendo que apenas o prédio propriamente dito podia ser objeto da venda em discussão nos presentes autos.
15ª) Atendendo a tal circunstancialismo, nunca poderia ter sido considerado que o imóvel foi apreendido no exato estado em que se encontrava, com os bens componentes e integrantes que já existiam à data da apreensão, a saber, com uma caldeira de aquecimento e respetivos radiadores de aquecimento, wcs devidamente equipados com louças sanitárias e mobiliário, cozinha equipada, painel solar, isto porque aquando da apreensão e da avaliação imóvel não houve qualquer acesso ao interior do mesmo.
16ª) Assim, o Tribunal a quo deveria ter dado o facto 39 como não provado.
17ª) Uma vez mais, do mesmo depoimento do AI, bem como da prova documental oportunamente junta aos autos, decorre novamente que a avaliação do prédio em questão foi feita sem que tivesse havido acesso ao interior do prédio, ou seja, com total desconhecimento dos bens e equipamentos que o dotavam.
18ª) Assim sendo, o valor atribuído ao imóvel na avaliação nunca poderia ter tido em consideração tais bens ou equipamentos, pelo simples de se desconhecer se eles existiam.
19ª) Efetivamente, uma vez que não houve acesso ao interior do aludido prédio, não podendo obviamente presumir-se quais os bens e equipamentos existentes no seu interior, a avaliação oportunamente efetuada só diz respeito ao prédio propriamentedito, sem quaisquer outros componentes (designadamente bens móveis ainda que incorporados neste imóvel), sendo que apenas o prédio propriamente dito podia ser objeto da venda em discussão nos presentes autos.
20ª) Considerando tal circunstancialismo, não podia existir o pressuposto de que o imóvel se encontrava dotado com os bens e equipamentos descritos em 39º para que ao mesmo fosse atribuído o valor de € 180.000,0 0, isto porque aquando da avaliação imóvel não houve qualquer acesso ao interior do mesmo.
21ª) Assim, o Tribunal a quo deveria ter dado o facto 40 como não provado.
22º) Dos depoimentos da Ré Maria e da testemunha P. C., bem como da prova documental oportunamente junta aos autos decorre claramente que já antes da venda do imóvel os 1ºs RR reivindicaram a propriedade sobre 11 radiadores grandes, 3 radiadores de wc (toalheiros), uma caldeira de aquecimento central, 4 casas de banho completas, uma cozinha com eletrodomésticos (placa, exaustor, forno e micro-ondas), 1 painel solar para água, 4 candeeiros exteriores, 5 candeeiros interiores (wc e lavandaria), 2 espelhos, furo de água com motor (5 saídas) com captação de água para o jardim e piscina, isto porque aquando da visita ocorrida em 15/Janeiro/2016, ou seja, antes da celebração da escritura de compra e venda, foi apresentada ao Autor uma proposta de aquisição de tais bens, formalizada (a pedido do próprio) por email datado de 17/Janeiro/2016.
23ª) Assim, o Tribunal a quo deveria ter dado o facto 41 como não provado.
24ª) Uma vez mais, do já referido depoimento do AI, bem como da prova documental oportunamente junta aos autos, decorre novamente que a apreensão do prédio em questão foi feita sem que tivesse havido acesso ao interior do prédio, ou seja, com total desconhecimento dos bens e equipamentos que o dotavam.
25ª) Assim sendo, ao apreender-se o referido imóvel, e tal como sucedeu na sua avaliação, nunca se poderia ter tido em consideração os bens ou equipamentos que eventualmente existissem no seu interior, pelo simples de se desconhecer se esses bens efetivamente existiam.
26ª) De facto, uma vez que não houve acesso ao interior do aludido prédio, não podendo obviamente presumir-se quais os bens e equipamentos existentes no seu interior, a apreensão oportunamente efetuada só diz respeito ao prédio propriamente dito, sem quaisquer outros componentes (designadamente bens móveis ainda que incorporados neste imóvel), sendo que apenas o prédio propriamente dito podia ser objeto da venda em discussão nos presentes autos.
27ª) Considerando tal circunstancialismo, não podia existir a convicção ou pressuposto de que o imóvel se encontrava dotado com os bens e equipamentos descritos em 39º para que ao mesmo fosse atribuído o valor de € 180.000,00, isto porque aquando da avaliação imóvel não houve qualquer acesso ao interior do mesmo.
28ª) Assim, o Tribunal a quo deveria ter dado o facto 49 como não provado.
29ª) Além do que foi dado como provados nos factos 23 e 24 dos factos provados, o Tribunal deveria ter acrescentado que na oportunidade o Autor não manifestou qualquer oposição à proposta que lhe foi formulada, nomeadamente alegando que os bens em questão já faziam parte integrante da moradia, estando incluídos no preço por ele proposto, o que nos permite concluir que (tal como sucede com os Réus) naquele momento considerou tais bens como sendo recheio da casa e, portanto, passíveis de serem retirados (e só apresentando uma reclamação depois da entrega do imóvel).
30ª) Dos depoimentos da Ré Maria e das testemunhas P. C. e J. S., bem como da prova documental oportunamente junta aos autos decorre claramente que o Autor não manifestou qualquer oposição à proposta que lhe foi formulada, nomeadamente alegando que os bens em questão faziam parte integrante da moradia, o que nos permite concluir que (tal como sucede com os Autores) considerou tais bens como sendo recheio da casa e, portanto, passíveis de serem retirados, o que deveria ter sido dado como provado pelo Tribunal a quo.
31ª) O Tribunal recorrido deveria também ter dado como provados os factos E, F, H e I.
32ª) Decorre do depoimento do AI, bem como da prova documental oportunamente junta aos autos que a avaliação do prédio em questão foi feita sem que tivesse havido acesso ao interior do prédio, ou seja, com total desconhecimento dos bens e equipamentos que o dotavam e dele faziam parte.
33ª) Assim sendo, o valor atribuído ao imóvel na avaliação nunca poderia ter tido em consideração tais bens ou equipamentos, pelo simples facto de se desconhecer se eles existiam.
34ª) Efetivamente, uma vez que não houve acesso ao interior do aludido prédio, não podendo obviamente presumir-se quais os bens e equipamentos existentes no seu interior, a avaliação oportunamente efetuada só diz respeito ao prédio propriamentedito, sem quaisquer outros componentes (designadamente bens móveis ainda que incorporados neste imóvel), sendo que apenas o prédio propriamente dito podia ser objeto da venda em discussão nos presentes autos.
35ª) Considerando tal circunstancialismo, só poderá concluir-se que os bens retirados pelos 1ºs RR do imóvel não fizeram parte da avaliação predial do imóvel, isto porque aquando da avaliação imóvel não houve qualquer acesso ao interior do mesmo.
36ª) Assim, o Tribunal a quo deveria ter dado o facto E como provado.
37ª) Decorre dos depoimentos das testemunhas J. S., J. M., M. A. e J. J., bem como da prova documental oportunamente junta aos autos que os referidosbens foram colocados pelos 1ºs RR no imóvel após lhes ter sido entregue o mesmo pelo legal representante da insolvente.
38ª) Assim, o Tribunal a quo deveria ter dado o facto F como provado.
39ª) Uma vez mais, resulta do depoimento do AI, bem como da prova documental oportunamente junta aos autos que a apreensão e avaliação do prédio em questão foram feitas sem que tivesse havido acesso ao interior do prédio, ou seja, com total desconhecimento dos bens e equipamentos que o dotavam e dele faziam parte.
40ª) Assim sendo, o auto de apreensão e o valor atribuído ao imóvel na avaliação nunca poderiam ter tido em consideração tais bens ou equipamentos, pelo simples facto de se desconhecer se eles existiam.
41ª) Efetivamente, uma vez que não houve acesso ao interior do aludido prédio, não podendo obviamente presumir-se quais os bens e equipamentos existentes no seu interior, a apreensão e a avaliação oportunamente efetuada só dizem respeito aoprédio propriamente dito, sem quaisquer outros componentes (designadamente bens móveis ainda que incorporados neste imóvel), sendo que apenas o prédio propriamente dito podia ser objeto da venda em discussão nos presentes autos.
42ª) Considerando tal circunstancialismo, só poderá concluir-se que a apreensão se efetuou sem qualquer deslocação ao interior do imóvel por parte do AI ou seus colaboradores.
43ª) Assim, o Tribunal a quo deveria ter dado o facto H como provado.
44ª) Novamente, resulta do depoimento do AI, bem como da prova documental oportunamente junta aos autos que a avaliação do prédio em questão foram feitas sem que tivesse havido acesso ao interior do prédio, ou seja, com total desconhecimento dos bens e equipamentos que o dotavam e dele faziam parte.
45ª) Assim sendo, o valor atribuído ao imóvel na avaliação nunca poderiam ter tido em consideração tais bens ou equipamentos, pelo simples facto de se desconhecer se eles existiam.
46ª) Efetivamente, uma vez que não houve acesso ao interior do aludido prédio, não podendo obviamente presumir-se quais os bens e equipamentos existentes no seu interior, a avaliação oportunamente efetuada só diz respeito ao prédio propriamentedito, sem quaisquer outros componentes (designadamente bens móveis ainda que incorporados neste imóvel), sendo que apenas o prédio propriamente dito podia ser objeto da venda em discussão nos presentes autos.
47ª) Considerando tal circunstancialismo, só poderá concluir-se que a avaliação do imóvel se processou sem o seu responsável ter acedido ao interior da moradia.
48ª) Assim, o Tribunal a quo deveria ter dado o facto H como provado.
49ª) No caso dos bens móveis em discussão nos presentes autos, apesar de se verificar uma ligação dos mesmos ao imóvel, a verdade é que isso não impede que os mesmos possam ser retirados, sem que o prédio sofra qualquer dano ou destruição.
50ª) É precisamente o que sucede no caso sub judice, sendo que situação semelhante está relatada em vasta Jurisprudência, e donde se destaca, por exemplo, o douto Acórdão do STA de 8/10/1986, CTF, 337º -375 e RLJ 120º - 173.
51ª) Assim sendo, os bens móveis em questão nunca poderiam ter sido considerados como parte integrante do imóvel.
52ª) A apreensão e a avaliação do prédio em questão foram feitas pelo exterior, pelo que só dizem respeito ao prédio propriamente dito, sem quaisquer outros componentes (designadamente bens móveis ainda que incorporados neste imóvel), pelo que nenhuma lógica teria a reclamação de tais bens como benfeitorias.
53ª) Na visita efetuada em 15/Janeiro/2016, o Autor aceitou (e até insistiu) que lhe fosse apresentada uma proposta relativamente aos bens móveis que faziam parte do imóvel, sendo que tal proposta lhe foi remetida por email datado de 17/Maio/2016.
54ª) Isso permite-nos concluir que (tal como sucede com os Réus), o Autor considerou tais bens como sendo recheio da casa e, portanto, passíveis de serem retirados, o que deveria ter sido dado como provado pelo Tribunal a quo, como já se disse.
55ª) Assim sendo, e ainda que os bens móveis em questão pudessem ser considerados parte integrante do imóvel (o que não se concede), a verdade é que, no contexto supra descrito, os mesmos sempre poderiam ter sido objeto de negociação (como foram) entre Autor e Réus de acordo com os princípios da autonomia privada e da boa fé (sempre presente no espírito dos Réus, como ficou provado).
56ª) O Autor aceitou que lhe fosse apresentada uma proposta, nunca referindo que os bens já faziam parte do imóvel, omissão esta que terá de ser tido em conta de acordo com os critérios de experiência comum, de razoabilidade, de normalidade e da lógica do homem médio suposta pela ordem jurídica, já que nos permite concluir que também o Autor considerou que os bens móveis em questão estavam excluídos da aquisição que tinha efetuado.
57ª) O Autor ser condenado a pagar uma multa ao Tribunal, sendo que, na fixação da mesma, deve ter em consideração, designadamente a função pedagógica da condenação.
58ª) O Autor deve também ser condenado no pagamento de uma indemnização aos aqui Réus e Recorrentes por todos os prejuízos e despesas que o presente pleito necessariamente lhe acarretam, em quantia nunca inferior a € 2.500,00 (dois mil e quinhentos euros).
59ª) Assim, a douta sentença recorrida que ora se impugna violou, entre outros, o artigo 204º do Código Civil.
Nestes termos e nos mais de direito, na integral procedência do recurso, deve revogar-se a sentença recorrida, julgando-se a ação inteiramente improcedente.
O apelado V. M. contra-alegou, pugnando pela improcedência da presente apelação, concluindo as suas contra-alegações nos seguintes moldes:
I. Pretende o Recorrido e, com total provimento, que o comportamento dos 1.º RR/recorrentes seja julgado ilícito e estes condenados a repor o imóvel no estado em que se encontrava à data da apreensão, vistoria e adjudicação, repondo no imóvel os bens por eles retirados e identificados no item 38.º da PI e 19 dos factos provados.
II. Os 1.º RR/aqui recorrentes insurgem-se contra a sentença proferida alegando, em síntese, que os fatos 21, 22, 40, 41 e 49 dados como provados deveriam ter sido dados como não provados.
III. Porém, a verdade é que os recorrentes apenas e tão só se “agarram” ao douto entendimento de que os bens que o Autor/recorrido reivindica como sendo partes componentes e integrantes do imóvel são da propriedade daqueles e ao facto da avaliação da massa insolvente ter sido efetuada pelo exterior, donde não poderia contemplar tais bens e, como tal, o recorrido não pode ter a pretensão de adquirir bens que não foram avaliados.
IV. Uma vez produzida toda a prova documental e testemunhal, resultou claro que na data da entrega do imóvel (29-01-2016) nem todos os bens que tinham sido vistoriados pelo Autor/recorrido aquando da diligência de mostra estavam no imóvel já que, ao deixarem o imóvel, os recorrentes retiraram do mesmo os bens descritos no artigo 19.º dos factos provados por entenderem que lhes pertencem e não ao imóvel.
V. Aliás, não há qualquer dúvida que os bens reclamados pelo recorrido foram removidos do imóvel por autoria/iniciativa dos recorrentes, tal como, aliás, ficou confessado pelo depoimento de parte da 1.º Ré mulher.
VI. Porém, a verdade é que os 1.º RR/recorrentes, em sede e momento próprio, não demonstraram que adquiriram os bens em questão, nem tão pouco que os pagaram.
VII. Os recorrentes interpuseram uma verificação ulterior de créditos, tramitada por apenso ao processo de insolvência (“B”), na qual peticionaram da sociedade insolvente o reconhecimento de um crédito que ascendia à importância de 360.500,00€ (trezentos e sessenta mil e quinhentos euros), cujo fundamento legal estava na outorga do contrato promessa datado de 14-11-2007 e contrato de empreitada, com base nos quais, aqueles prometeram adquirir o imóvel que hoje pertence ao aqui recorrido.
VIII. Os recorrentes também, nunca e em momento algum, lograram reclamar no processo de insolvência a existência de benfeitorias / obras /melhorias no imóvel a seu cargos.
IX. Donde, não há qualquer factualidade que sustente a pretensão dos recorrentes em ver o facto F da matéria não provada como matéria assente “que os referidos bens foram colocados pelos 1.º RR no imóvel após lhes ter ido entregue o mesmo pelo legal representante da insolvente”.
X. Mais, a demais factualidade que os recorrentes pretendem ver julgada como matéria assente, concretamente, os factos: - E “Que os bens retirados pelos 1.ºs RR do imóvel não fizeram parte da avaliação predial do imóvel”; - H “Que a apreensão se efetuou sem qualquer deslocação ao interior do imóvel por parte do AI ou seus colaboradores”; - I” Que a avaliação do imóvel se processou sem o seu responsável ter acedido ao interior da moradia”, não lhe permite, caso venha a ter procedência na sua pretensão (o que jamais se aceita mas que apenas se equaciona para efeitos de tese) reverter a sentença proferida pelo Tribunal a quo.
XI. Independentemente da avaliação ao imóvel apreendido sob a verba 7 ter sido efetuada pelo exterior, em nada afeta a qualificação jurídica das coisas elencadas no ponto 19.º dos factos provados.
XII. Não restam, pois dúvidas que os bens elencados no item 19 dos factos provados fazem parte do imóvel onde está implantada uma casa de habitação.
XIII. Termos em que a douta sentença proferida pelo Tribunal a quo não enferma de erro/vício de interpretação e aplicação das regras do Direito à factualidade objeto de apreciação, devendo, por isso, a sentença ser mantida in tontum.
Nestes termos e nos melhores de Direito que V. Exa. doutamente suprirá deve o presente recurso ser declarado improcedente por não provado com as demais consequências legais.
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Corridos os vistos legais, cumpre decidir.
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II- FUNDAMENTOS
O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação dos apelantes, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso - cfr. artigos 635.º, nº 4 e 639.º, nºs 1 e 2, do CPC.
No seguimento desta orientação, as questões que se encontram submetidas à apreciação desta Relação resumem-se ao seguinte:
a- se o tribunal a quo incorreu em erro de julgamento quanto à matéria de facto que julgou como provada e não provada:
a.1- ao ter considerado como provados os factos vertidos nos pontos 21º, 22º, 39º, 40º, 41º e 49º e se, uma vez revisitada e reponderada a prova produzida, se impõe concluir pela não prova dessa factualidade;
a.2- ao ter considerado como provados os factos exarados nos pontos 23º e 24º em singelo e se, uma vez revisitada e reponderada a prova produzida, se impõe aditar a esses factos assim considerados como provados, ainda o seguinte: “na oportunidade, o Autor não manifestou qualquer oposição à proposta que lhe foi formulada, nomeadamente, alegando que os bens em questão já faziam parte integrante da moradia, estando incluídos no preço por ele proposto, considerando tais bens como sendo recheio da casa e passíveis de serem dela retirados”;
a.3- ao ter considerado como não provados os factos das alíneas E, F, H e I e se uma vez feita a enunciada revisitação e reponderação da prova produzida, se impõe concluir pela prova desta concreta materialidade fáctica;
b- se ao julgar procedente a ação quanto aos apelantes e ao absolver o apelado como litigante de má fé, a 1ª Instância incorreu em erro de direito quanto à decisão de mérito ao considerar que os bens e equipamentos descritos no ponto 19º dos factos provados na sentença recorrida, fazem parte integrante do prédio vendido ao apelado V. M., quando esses bens podem ser retirados sem que o prédio sofra qualquer dano ou destruição, constituindo simples recheio desse prédio; a apreensão e a avaliação do prédio foi feita pelo exterior deste, dizendo, portanto, apenas respeita ao prédio propriamente dito, sem quaisquer outros componentes, designadamente, bens móveis, ainda que incorporados nesse prédio; e quando na vistoria efetuada ao prédio pelo apelado, em 15/01/2016, este aceitou que lhe fosse apresentada uma proposta relativamente a esses bens e equipamentos, proposta essa que lhe foi remetida por mail de 17/05/2016, considerando, assim o apelado que tais bens e equipamentos são recheios da casa e passíveis de dela serem retirados, pelo que, contrariamente ao sustentado na sentença, nunca aqueles bens e equipamentos podiam ser considerados como fazendo parte integrante desse prédio, impondo-se concluir existir abuso de direito da parte do apelado e pela consequente improcedência da ação e pela condenação do apelado como litigante de má fé.
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A- FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
A 1ª Instância julgou como provados os seguintes factos:
1- A Construções X, Unipessoal, Lda. foi declarada insolvente, o que ocorreu por sentença datada de 10-03-2015, no processo de insolvência tramitado com o processo n.º 6196/14.7T8VNF, pendente no J2 – secção comércio – Tribunal Judicial de Vila Nova de Famalicão.
2- No âmbito daquele processo de insolvência e no exercício das suas funções, o Sr. Administrador Judicial logrou apreender à ordem da massa insolvente, sob a verba n.º 7 do auto de apreensão, o seguinte bem imóvel: Prédio urbano, composto por casa de cave, rés-do-chão, andar e logradouro, sito em ..., Rua Dr. ..., freguesia de ..., concelho e distrito de Braga, descrito na 1.º CRP de Braga, sob o n.º .. / ... e inscrito na matriz predial sob o artigo … da União de freguesias de ... e ..., com a área total de 814 m2 e área de implantação do edifício de 112,50 m2.
3- Relativamente ao mesmo imóvel, os 1.º RR reclamaram nos autos um direito de crédito, decorrente do incumprimento do contrato promessa de compra e venda, graduado com natureza real, por força do exercício de direito de retenção que sobre o mesmo exerceram, conforme aliás decorreu da ação de verificação ulterior de créditos tramitada sob o apenso “B”.
4- Sendo que a posse reivindicada pelos 1.º RR sobre aquele mesmo imóvel foi aceite pela massa insolvente, aqui 2.º Ré e respetivo credor hipotecário, Caixa ..., CRL, o que permitiu pôr termo à ação de verificação ulterior de crédito, por transação.
5- No âmbito das diligências de liquidação do ativo da 2.º Ré, o Sr. A.J. promoveu a venda do imóvel inventariado sob a verba n.º 7, o que fez através de venda por negociação particular, mediante a apresentação de propostas em sobrescrito fechado.
6- Foi agendado o dia 26-10-2015, no período compreendido entre as 11h30/12h00 para a mostra do referido imóvel.
7- A abertura dos sobrescritos fechados ocorreu no dia 06-11-2015, no domicílio profissional do Sr. A.J., conforme anúncio devidamente publicitado.
8- No dia e período compreendido para a mostra, o Autor vistoriou o imóvel, na presença de um colaborador do A.J.
9- Como o imóvel, estado de conservação e características iam de encontro às necessidades e interesses do Autor, este decidiu apresentar proposta de aquisição.
10- O Autor apresentou proposta para a compra do imóvel em causa, no valor de €166.020,00.
11- No dia de abertura dos sobrescritos fechados, o Sr A.J. decidiu adjudicar o imóvel ao proponente V. M., aqui Autor, por este ter apresentado a melhor oferta de aquisição.
12- Após a adjudicação, o Autor, por correio eletrónico datado de 07-01-2016, pediu ao Sr A.J. que agendasse uma vistoria ao imóvel antes de efetuar a escritura.
13- O Sr A.J., nesse mesmo dia e também por correio eletrónico, remetido ao mandatário dos 1.ºsRR, solicitou o agendamento de visita ao imóvel, a qual deveria ser realizada no dia anterior ao da escritura, agendada para o dia 15 de janeiro, ou no próprio dia da escritura, pelas 09h00.
14- Os 1.ºs RR, em resposta, através do seu mandatário, requereram o reagendamento da escritura decorridos que fossem mais 15 dias, por forma a ser possível a entrega do prédio completamente livre de pessoas e bens até ao último fim-de-semana do mês de janeiro.
15- O que foi aceite, sendo que ficou estipulado que a entrega do imóvel deveria decorrer até ao final do mês de janeiro de 2016.
16- A vistoria ao imóvel por parte do Autor ocorreu no dia 15-01-2016.
17- Nesse dia o imóvel encontrava-se no seguinte estado: a) Cozinha equipada com mobiliário imprescindível ao fim a que se destina; b) Cozinha equipada de eletrodomésticos, tais como: placa, exaustor, forno e micro-ondas; c) Os Wc equipados com as louças sanitárias imprescindíveis à sua utilização, com materiais e louças recentes; d) Os Wc encontravam-se dotados de radiadores de aquecimento e toalheiros de aquecimento; e) Radiadores de aquecimento em todos os compartimentos da casa, quartos, corredores, sala e wc; f) O anexo encontrava-se fechado com porta e janela; g) Havia um furo de água no exterior da casa, devidamente funcional. h) Jardim com árvores de fruto e vedado com sebe.
18- A entrega do imóvel ao Autor foi efetuada pelos 1.ºs RR, na presença de um colaborador do Sr A.J., no dia 29 de janeiro de 2016.
19- No dia da entrega do imóvel o Autor verificou que o imóvel relativamente ao qual logrou apresentar proposta de aquisição e que lhe fora adjudicado não se encontrava nas exatas condições em que se encontrava quando o vistoriou: as janelas e portas do anexo foram retiradas, ficando o compartimento completamente aberto; as louças sanitárias das casas de banho foram retiradas e/ou substituídas por louças sanitárias de fraca qualidade e mais antigas; a cozinha ficou completamente despida de mobiliário, designadamente a banca, armários, eletrodomésticos, torneiras de água; foram removidos do imóvel a caldeira de aquecimento central e o painel solar; o furo de água existente no logradouro foi tapado com pedras e terra; as árvores de fruto, assim como a sebe existente no jardim foram cortadas.
20-Descontente com esta situação, o Autor apresentou reclamação ao Sr. A.J., conforme documento de fls. 26 e 27, cujo teor aqui se dá por reproduzido para os devidos e legais efeitos.
21-A proposta que o Autor fez para adquirir o imóvel inventariado sob a verba 7, no valor de 166.020,00€, foi efetuada no pressuposto do imóvel lhe ser entregue nos exatos termos em que o mesmo se encontrava à data da apreensão, à data da mostra, à data da venda, ou seja, dotado do equipamento/bens que se consideram partes componentes do imóvel.
22- O Autor quando se propôs adquirir o imóvel pela importância de € 166.020,00 foi na convicção do mesmo estar dotado do mobiliário de casa de banho (louças sanitárias imprescindíveis ao fim de um Wc); a cozinha estar dotada de bancadas, mobiliário de cozinha, torneiras e eletrodomésticos imprescindíveis ao fim de uma cozinha), pré instalação de aquecimento, respetivos radiadores de aquecimento, com a respetiva caldeira de aquecimento e de um painel solar, o anexo se encontrar fechado com as respetivas janelas e portas, com o furo de água aberto, pois só assim se pode retirar dele as respetivas potencialidades, árvores de fruto e da sebe que lá existia e que foi completamente eliminada.
23- Aquando da vistoria ao imóvel, no passado dia 15 de janeiro de 2016, a filha dos1.ºs RR, P. C., remeteu ao conhecimento do aqui Autor uma listagem de bens, que segundo o entendimento desta, poderiam ser adquiridos pelo aqui Autor, apresentando o respetivo valor: 11 radiadoras grandes – € 2.500,00; 3 radiadores WC (toalheiros) – € 600,00; 1 caldeira de aquecimento central – € 800,00; 4 casas de banho completas – € 4.500,00; 1 cozinha com eletrodomésticos (placa, exaustor, forno e micro-ondas) – € 6500,00; 1 painel solar para a água – € 1.500,00; 4 Candeeiros exteriores – € 30,00; 5 candeeiros interiores (wc e lavandaria) – € 25,00; 2 espelhos – € 100,00; furo de água com motor (5 saídas) com captação de água para o jardim e piscina – € 4.000,00.
24- Bens esses que, na avaliação apresentada, totalizavam a importância de € 21.539,00 (vinte e um mil, quinhentos e trinta e nove euros).
25- A atitude dos 1.ºs RR obrigou/ causou no Autor sentimentos de injustiça, arrelias, transtornos, o que lhe obrigou também a recorrer à justiça para repor os seus direitos.
26- O Autor após tomar posse efetiva do imóvel constatou que este se encontra inapto para habitação, pelo menos, de forma imediata.
27- A cozinha não se encontra apta a realizar os fins a que se destina, porquanto não se encontra dotada de mobiliário, equipamentos e eletrodomésticos.
28- As louças do WC foram substituídas por outras de fraca qualidade e de design e material mais arcaico, que não aquele que existia à data da vistoria e adjudicação do imóvel.
29- O imóvel era dotado de aquecimento central, que incluía a pré-instalação, respetivos radiadores, caldeira de aquecimento e ficou privado dessa mais-valia.
30- A eliminação destas qualidades/características do imóvel foi da efetuada pelos 1.ºsRR, os quais, de forma arbitrária e unilateral, decidiram remover os bens/equipamentos melhor identificados no artigo 19º deixando o imóvel disfuncional.
31- Nunca os 1.ºs RR lograram reclamar à 2ª Ré o reconhecimento de créditos decorrentes de benfeitorias.
32- Nunca os 1ºs RR se arrogaram credores da insolvente a título de benfeitorias erguidas no imóvel, concretamente, os bens elencados no artigo 19º supra.
33- Entre o Autor e a 2.º Ré foi celebrado um contrato de compra e venda, no âmbito da liquidação do ativo do processo de insolvência desta.
34- Por força do contrato de compra e venda celebrado, o Autor assumiu o compromisso de pagar o preço, concretamente a importância de €166.020,00, e, em contrapartida, a 2.º Ré assumiu o compromisso de entregar àquele o imóvel nos exatos termos em que se encontrava à data da apreensão, da vistoria e da adjudicação.
35-A massa insolvente comprometeu-se a entregar ao Autor o imóvel melhor identificado na verba 7 do auto de apreensão devidamente dotado dos seguintes bens /elementos: a) 11 radiadoras grandes distribuídos por quartos, salas e corredores b) 3 radiadores WC (toalheiros) c) 1 caldeira de aquecimento central d) 4 casas de banho completas, isto é, equipadas com as respetivas louças sanitárias; e) 1 Cozinha com eletrodomésticos (placa, exaustor, forno e micro-ondas) e mobiliário; f) 1 painel solar para a água g) 4 Candeeiros exteriores h) 5 candeeiros interiores (wc e lavandaria) i) 2 espelhos j) Furo de água com motor (5 saídas) com captação de água para o jardim e piscina.
36-O valor atribuído ao imóvel após apreensão para a massa e avaliação foi de € 180.000,00.
37-Os 1ºos RR interpuseram ação de verificação ulterior de créditos pedindo o reconhecimento do crédito de € 300.000,00 decorrente de pagamento de sinal e pagamentos por conta de um contrato promessa de compra e venda.
38-Essa ação terminou por transação judicialmente homologada em que foi reconhecido aos 1ºs RR o direito de retenção sobre o imóvel. 39-O imóvel descrito na verba nº7 do auto de apreensão foi apreendido no exato estado em que se encontrava, com os bens componentes e integrantes que já existiam à data da apreensão, a saber, com uma caldeira de aquecimento e respetivos radiadores de aquecimento, wcs devidamente equipados com louças sanitárias e mobiliário, cozinha equipada, painel solar.
40-Foi no pressuposto de que o imóvel se encontrava dotado com os bens e equipamentos descritos em 39º que ao mesmo foi atribuído o valor de € 180.000,00.
41-Só após a venda do imóvel é que os 1ºs RR vieram reivindicar a propriedade sobre 11 radiadores grandes, 3 radiadores de wc (toalheiros), uma caldeira de aquecimento central, 4 casas de banho completas, uma cozinha com eletrodomésticos (placa, exaustor, forno e micro-ondas), 1 painel solar para água, 4 candeeiros exteriores, 5 candeeiros interiores (wc e lavandaria), 2 espelhos, furo de água com motor (5 saídas) com captação de água para o jardim e piscina.
42-O AI marcou a abertura dos sobrescritos fechados contendo proposta para a verba nº7 para o dia 6-11-2015.
43-Foi marcada visita ao imóvel para os potenciais interessados verificarem as suas condições, que ocorreu no dia 26-10-2015, com a presença de um colaborador do AI.
44-Na visita o imóvel estava equipado com todos os bens acima descritos.
45-Na abertura de propostas o imóvel foi adjudicado ao A. por € 166.020,00.
46-Foi marcada a escritura para 15-1-2016, mas os 1ºs RR pediram que a entrega fosse adiada para o final de janeiro para terem disponibilidade para entregar o imóvel livre de pessoas e coisas.
47-Em momento algum os 1ºs RR reclamaram qualquer crédito por benfeitorias efetuadas no imóvel.
48-Nem tão pouco alertaram o AI para tal facto.
49-A apreensão do imóvel pelo AI foi realizada com a convicção de que os referidos bens que se encontravam no imóvel faziam parte do mesmo.
50-Após receção da reclamação do A, o AI notificou o mandatário dos 1ºs RR para obter uma explicação plausível.
51-Ao que o mandatário dos 1ºs RR respondeu tratarem-se de bens dos 1ºs RR, e como tal foram retirados do imóvel.
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E considerou como não provados os factos que se seguem:
A- Que noutras casas de banho, as louças sanitárias foram simplesmente retiradas.
B- Que os 1ºs RR retiraram o número de polícia do imóvel.
C- Que o A. aquando da entrega do imóvel não reclamou a falta de qualquer bem.
D- Que com a retirada dos bens pelos 1ºs RR o imóvel não sofreu qualquer diminuição de valor ou estando limitada a sua utilização.
E- Que os bens retirados pelos 1ºs RR do imóvel não fizeram parte da avaliação predial do imóvel.
F- Que os referidos bens foram colocados pelos 1ºs RR no imóvel após lhes ter sido entregue o mesmo pelo legal representante da insolvente.
G- Que o imóvel não ficou impedido ou inapto de ser utilizado.
H- Que a apreensão se efetuou sem qualquer deslocação ao interior do imóvel por parte do AI ou seus colaboradores.
I- Que a avaliação do imóvel se processou sem o seu responsável ter acedido ao interior da moradia.
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B- FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA
B.1- Impugnação do julgamento da matéria de facto.
Os apelantes impugnam o julgamento da matéria de facto realizado pela 1ª Instância, sustentando que os factos considerados como provados sob os pontos 21º, 22º, 39º, 40º e 49º da sentença recorrida, em face da prova produzida, tinham de ser considerados como não provados e antes impunha que se tivesse considerado como provados os factos vertidos nas alíneas E, H e I dos factos julgados não provados, isto porque do depoimento do administrador judicial e da prova documental junta aos autos decorre que a avaliação do prédio vendido ao apelado foi efetuada sem que tivesse havido acesso ao interior desse prédio e, consequentemente, com total desconhecimentos dos bens que o dotavam.
Deste modo, concluem os apelantes, o valor atribuído ao imóvel e o preço oferecido pelo apelado pela aquisição desse prédio nunca poderia ter tido em consideração as eventuais partes integrantes daquele, pela simples razão que se desconhecia, à data da avaliação do prédio, se essas partes integrantes existiam, pelo que a avaliação realizada apenas diz respeito ao prédio propriamente dito, sem quaisquer outros componentes, designadamente, os bens móveis nele incorporados.
Por sua vez, os apelantes impugnam o julgamento da matéria de facto considerada como provada no ponto 41º, sustentando que esta materialidade fáctica tinha de ser julgada como não provada isto porque dos depoimentos da apelante Maria e da testemunha P. C. e da prova documental junta aos autos, decorre claramente que já antes da vendo do imóvel, os apelantes reivindicaram a propriedade sobre onze radiadores grandes, três radiadores de wc (toalheiros), uma caldeira de aquecimento central, quatro casas de banho completas, uma cozinha com eletrodomésticos (placa, exaustor, forno e micro-ondas), um painel solar para água, quatro candeeiros exteriores, cinco candeeiros interiores (wc e lavandaria), dois espelhos, furo de água com motor (cinco saídas), com captação de água para o jardim e piscina e que, aquando da vistoria realizada ao prédio pelo apelado em 15/01/2016, ainda antes da celebração da escritura de compra do prédio, foi-lhe apresentada uma proposta de aquisição desses bens, proposta esta que lhe foi formalizada, a pedido deste, por mail de 17/01/2016.
Quanto à matéria considerada provada nos pontos 23º e 24º, os apelantes não impugnam o julgamento de provado da identificada materialidade fáctica vertida mas entendem que face ao depoimento prestado pela apelante Maria e pela testemunha P. C. e à prova documental junta aos autos, impunha-se que se considerasse igualmente como provado a seguinte factualidade: “na oportunidade o Autor não manifestou qualquer oposição à proposta que lhe foi formulada, nomeadamente, alegando que aqueles bens já faziam parte integrante da moradia, estando incluídos no preço por ele proposto, considerando tais bens como sendo recheio da casa e possíveis de serem dela retirados”.
Finalmente, os apelantes impugnam o julgamento de não provado em relação aos factos vertidos na alínea F, sustentando que dos depoimentos prestados pelas testemunhas J. S., J. M., M. A. e Joaquim e da prova documental junta aos autos, resulta que os bens foram colocados pelos apelantes no imóvel, após este lhes ter sido entregue pelo legal representante da insolvente.
Antes de entrarmos na apreciação da impugnação do julgamento da matéria de facto operado pelos apelantes, impõe-se enunciar quais os concretos ónus que impendem sobre os mesmos em sede de impugnação do julgamento da matéria de facto realizado pela 1ª Instância, sem cujo cumprimento não é possível a esta Relação entrar nessa sindicância, verificar se aqueles cumpriram com esses ónus e, no caso positivo, enunciar quais os critérios em que é consentido a este tribunal alterar o julgamento da matéria de facto realizado pela 1ª Instância.
Assim procedendo, relembra-se que na sequência das alterações legislativas introduzidas ao CPC pelos Decretos-Leis n.ºs 39/95, de 15/02 e 329-A/95, de 12/12, o legislador introduziu o registo da audiência final, com a gravação integral da prova produzida, e conferiu às partes o duplo grau de jurisdição em sede de julgamento da matéria de facto, de modo que a alteração da matéria de facto, que no anterior regime processual era excecional, passou a ser uma função normal da Relação.
Nessa operação foi propósito do legislador que o tribunal de segunda instância realize um novo julgamento em relação à matéria impugnada, assegurando um efetivo duplo grau de jurisdição, sendo isto que resulta expressamente do estabelecido no art. 662º, n.º 1 do CPC, quando nele se expressa que a Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa (1).
Deste modo é que perante as regras positivas vigentes na atual lei processual civil, tendo o recurso por objeto a impugnação da matéria de facto, a Relação deve proceder a um novo julgamento, limitado à matéria de facto impugnada, procedendo à efetiva reapreciação da prova produzida, devendo, nessa tarefa, considerar os meios de prova indicados no recurso, assim como, ao abrigo do princípio do inquisitório, outros que entenda pertinentes, tudo da mesma forma como o faz o juiz da primeira instância, embora, nessa tarefa, esteja naturalmente limitada pelos princípios da imediação e da oralidade.
Nesse novo julgamento, como verdadeiro tribunal de substituição, a Relação aprecia livremente as provas produzidas segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto impugnado, exceto no que respeita a factos para cuja prova a lei exija formalidades especiais ou que só possam ser provados por documentos ou que estejam plenamente provados por documento, acordo ou confissão e que, consequentemente, se encontrem subtraídos ao princípio da livre convição (art. 607º, n.º 5 do Cód. Proc. Civil).
Nessa sua livre apreciação o Tribunal da Relação não está condicionado pela apreciação e fundamentação do tribunal recorrido, uma vez que o objeto da apreciação em 2ª instância é a prova produzida, tal como na 1ª instância, e não a apreciação que esta fez dessa mesma prova, podendo, na formação dessa sua convicção autónoma recorrer a presunções judiciais ou naturais nos mesmos termos em que o faz o juiz da primeira instância (2).
No entanto, apesar do que se acaba de referir, não foi propósito do legislador que o julgamento a realizar pela Relação em sede de matéria de facto se transformasse na repetição do julgamento realizado em 1ª Instância, sequer permitir recursos genéricos, e daí que tenha rodeado o recurso da impugnação da matéria de facto à imposição ao recorrente de determinados ónus que enuncia no art. 640º do CPC.
É assim que com vista a atingir esse desiderato, o legislador optou “por restringir a possibilidade de revisão de concretas questões de factos controvertidas relativamente às quais sejam manifestadas e concretizadas divergências por parte do recorrente”, pelo que se mantém o entendimento que, como tribunal de 2ª Instância que é, este deverá ter competência residual em sede de reponderação ou reapreciação da matéria de facto (3), estando subtraída ao seu campo de cognição a matéria de facto fixada pelo tribunal a quo que não seja alvo de impugnação.
Depois, tal como se impõe ao juiz a obrigação de fundamentar as suas decisões, também ao recorrente é imposto, como correlativo do princípio da auto responsabilidade e dos princípios estruturante da cooperação, da lealdade e da boa-fé processuais, a obrigação de fundamentar o seu recurso, demonstrando o desacerto em que incorreu o tribunal a quo em decidir a matéria de facto impugnada em determinado sentido, quando se impunha decisão diversa, devendo no cumprimento desses ónus, indicar não só a matéria de facto que impugna, como a concreta solução que, na sua perspetiva, reclama que tivesse sido proferida, os concretos meios de prova que ancoram essa solução diversa, com a respetiva análise crítica, isto é, com a indicação do porquê dessa prova impor decisão diversa daquela que foi julgada pelo tribunal a quo.
Deste modo é que o art. 640º, n.º 1 do CPC, estabelece que “quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição: a) os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados; b) os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida; c) a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
Depois, caso os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação da prova tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes (al. a), do n.º 2 do art. 662º).
Cumprindo a exigência de conclusões nas alegações a missão essencial de delimitação do objeto do recurso, fixando o âmbito de cognição do tribunal ad quem, é entendimento jurisprudencial pacífico que, nas conclusões, o recorrente tem de delimitar o objeto da impugnação de forma rigorosa, indicando os concretos pontos da matéria de facto que impugna e a concreta resposta que, na sua perspetiva, deve ser dada a essa matéria impugnada.
Já quanto aos demais ónus, os mesmos, porque não têm aquela função delimitadora do objeto do recurso, mas se destinam a fundamentar o último, não têm de constar das conclusões, mas sim das motivações.
Sintetizando, à luz deste regime, seguindo a lição de Abrantes Geraldes (4), sempre que o recurso de apelação envolva matéria de facto, terá o recorrente: a) em quaisquer circunstâncias indicar sempre os concretos factos que considere incorretamente julgados, com a enunciação na motivação do recurso e síntese nas conclusões; b) especificar, na motivação, os meios de prova constantes do processo ou que nele tenham sido registados que, no seu entender, determinam uma decisão diversa quanto a cada um dos factos; c) relativamente a pontos de facto cuja impugnação se funde, no todo ou em parte, em provas gravadas, para além da especificação obrigatória dos meios de prova em que o recorrente se baseia, cumpre-lhe indicar, com exatidão, na motivação, as passagens da gravação relevantes e proceder, se assim o entender, à transcrição dos excertos que considere oportunos; d)…; e) o recorrente deixará expressa, na motivação (segundo o STJ, nas conclusões), a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas, tendo em conta a apreciação crítica dos meios de prova produzidos, exigência que vem na linha do reforço do ónus da alegação, por forma a obviar à interposição de recurso de pendor genérico ou inconsequente.
O cumprimento dos referidos ónus, como adverte Abrantes Geraldes, tem a justificá-lo a enorme pressão, geradora da correspondente responsabilidade de quem, ao longo de décadas, pugnou pela modificação do regime da impugnação da decisão da matéria de facto e se ampliasse os poderes da Relação, a pretexto dos erros de julgamento que o sistema anterior não permitia corrigir; a consideração que a reapreciação da prova produzida em 1ª instância, enquanto garantia do duplo grau de jurisdição em sede de matéria de facto, nunca poderá envolver, pela própria natureza das coisas, a reapreciação sistemática e global de toda a prova produzida; a ponderação de que quem não se conforma com a decisão da matéria de facto realizada pelo tribunal de 1ª instância e se dirige a um tribunal superior, que nem sequer intermediou a produção da prova, reclamando a modificação do decidido, terá de fundamentar e justificar essa sua irresignação, sendo-lhe, consequentemente, imposto uma maior exigência na impugnação da matéria de facto, mediante a observância de regras muito precisas, sem possibilidade de paliativos, sob pena de rejeição da sua pretensão e, bem assim o princípio do contraditório, habilitando a parte contrária de todos os elementos para organizar a sua defesa, em sede de contra-alegações, uma vez que só na medida em que se conhece especificamente o que se encontra impugnado e qual a lógica de raciocínio expandido pelo recorrente na valoração e conjugação deste ou daquele meio de prova, é que se habilita o recorrido de todos os elementos que lhe permitam contrariar essa impugnação em sede de contra-alegações.
A apreciação do cumprimento das exigências legalmente prescritas em sede de impugnação do julgamento da matéria de facto realizado pela 1ª Instância deve ser feita à luz de um “critério de rigor” como decorrência dos referidos princípios de auto responsabilização, de cooperação, lealdade e boa-fé processuais e salvaguarda cabal do princípio do contraditório a que o recorrente se encontra adstrito, sob pena da impugnação da decisão da matéria de facto se transformar numa “mera manifestação de inconsequente inconformismo” (5).
Como consequência, impõe-se a rejeição total ou parcial do recurso respeitante à impugnação da decisão da matéria de facto quando ocorra: “a) falta de conclusões sobre a impugnação da matéria de facto (art. 635º, n.º 4 e 6411º, n.º 2, al. b) do CPC); b) falta de especificação, nas conclusões, dos concretos pontos de facto que o recorrente considera incorretamente julgados (art. 640º, n.º 1, al. a) do CPC); c) falta de especificação na motivação, dos concretos meios probatórios constantes do processo ou nele registados (v.g. documentos, relatórios periciais, registo escrito, etc.); d) falta de indicação exata, na motivação, das passagens da gravação em que o recorrente se funda; e e) falta de posição expressa, na motivação (segundo o STJ, nas conclusões), sobre o resultado pretendido a cada segmento da impugnação” (6).
Esta posição tem sido aquela que tem sido seguida, de forma praticamente uniforme, pela jurisprudência do STJ, que, como referido, tem sustentado que a decisão que, na perspetiva do apelante, deve ser proferida quanto à concreta matéria de facto que impugna, deve, também, constar das conclusões (7).
Acresce que essa instância superior tem operado uma distinção entre: a) ónus primário ou fundamental de delimitação do objeto do recurso em sede de impugnação da matéria de facto, onde os requisitos impostos à parte se encontram ligados com o mérito ou demérito do recurso; e b) ónus secundários, que se prendem com os requisitos formais.
Quanto aos requisitos primários ou fundamentais de delimitação do recurso, onde se inclui a obrigação do recorrente de formular conclusões e nestas especificar os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados e a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas e, bem assim, a falta de especificação, na motivação, dos concretos meios probatórios constantes do processo ou nele registados que, na sua perspetiva, sustentam esse julgamento diverso da matéria de facto que impugna, requisitos estes sobre que versa o n.º 1 do art. 640º do CPC, a jurisprudência, sem prejuízo do que infra se dirá, tem considerado que aquele critério de rigor se aplica de forma estrita, não admitindo quaisquer entorses, pelo que sempre que se verifique o incumprimento de qualquer um desses ónus, se impõe rejeitar o recurso da matéria de facto na parte em que se verifica a omissão.
Já no que respeita aos ónus da impugnação secundários, que são os enunciados no n.º 2 daquele art. 640º, em que se consagra a obrigação do recorrente, quando os meios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas que tenha sido gravada, indicar com exatidão as passagens da gravação em que funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes, considera-se que embora a observância desse ónus deva ser apreciado à luz do enunciado critério de rigor, não convém exponenciar esse rigor ao ponto de ser violado o princípio da proporcionalidade e seja denegada a reapreciação da decisão da matéria de facto com invocação de fundamentos que não encontram sustentação clara na letra ou no espírito do legislador” (8).
Argumenta-se que se está perante meros requisitos de forma, destinados a facilitar a localização dos depoimentos relevantes no suporte técnico que contém a gravação da audiência, pelo que o cumprimento desse ónus tem de ser “interpretado em termos funcionalmente adequados e em conformidade com o princípio da proporcionalidade, não se justificando a imediata e liminar rejeição do recurso quando, apesar da indicação do recorrente não for totalmente exata e precisa, não exista dificuldade relevante na localização pelo tribunal dos excertos da gravação em que a parte se haja fundado para demonstrar o invocado erro de julgamento” (9).
Precise-se que mesmo em relação aos ónus de impugnação primários tem-se assistido ultimamente, ao nível do STJ, a um aliviar do enunciado critério de rigor, admitindo-se a apreciação do recurso ainda que as conclusões sejam omissas quanto à referência expressa dos concretos pontos da matéria de facto que o apelante impugna, desde que os factos impugnados resultem claramente identificados nas antecedentes motivações (10).
Tendo presente estes critérios orientadores, descendo ao caso concreto, é indesmentível que os apelantes deram cumprimento aos ónus prescritos pelo art. 640º, n.ºs 1 e 2, al. a) do CPC em sede de impugnação do julgamento da matéria de facto, o que nem sequer é colocado em crise pelo apelado.
Com efeito, os apelantes indicam, nas conclusões, quais os concretos pontos da matéria de facto que impugnam (pontos 21º, 22º, 23º, 24º 39º, 40º, 41º e 49º dos factos considerados provados na sentença recorrida e alíneas E, F, H e I dos factos nela considerados como não provados), apontam, nas conclusões, qual a concreta decisão de facto que, no seu entender, deve recair sobre cada um desses pontos e alíneas que impugnam, além de que indicam, na motivação (e, inclusivamente, indevidamente, nas conclusões), os concretos meios probatórios que, na sua perspetiva, impõem esse julgamento diverso que sufragam e, bem assim, as concretas razões pelas quais, na sua perspetiva, deve prevalecer a leitura distinta que fazem da prova produzida em relação àquela que foi feita pela 1ª Instância, indicando, de forma suficiente, o porquê dessa prova que individualizam impor o julgamento diverso que propugnam.
Em relação à prova gravada, os apelantes indicam o início e o termo dos excertos dos depoimentos em que fundam o seu recurso e, inclusivamente, procedem à transcrição desses excertos.
Deste modo, em face dos fundamentos que se acabam de explanar, impõe-se concluir que nada impede, mas antes impõe, que se entre na reapreciação do julgamento da matéria de facto impugnada pelos apelantes.
No entanto, antes de avançarmos para essa reapreciação importa enunciar quais os concretos critérios em que é consentido ao Tribunal da Relação alterar o julgamento de facto realizado pela 1ª Instância.
Como se deixou dito, em relação à matéria de facto cujo julgamento vem impugnado pelos apelantes (sujeita ao princípio da livre apreciação da prova), cumpre ao Tribunal da Relação realizar um novo julgamento.
Nesse novo julgamento, o Tribunal da Relação goza dos mesmos poderes atribuídos ao tribunal a quo, sem exclusão dos que decorrem do princípio da livre apreciação da prova (11), embora esteja limitado pelos princípios da imediação e da oralidade.
Porém, realizado esse novo julgamento, para que seja possível ao Tribunal da Relação alterar o julgamento da matéria de facto realizado pela 1ª Instância, não basta que a prova indicada pelos apelantes, conectada com a restante prova constante dos autos, a que o tribunal ad quem, ao abrigo do princípio da oficiosidade, entenda dever socorrer-se, consinta esse julgamento diverso, mas antes que o imponha.
Na verdade, o art. 662º, n.º 1 do CPC é expresso em estabelecer que “a Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa”.
A enunciada exigência legal decorre da circunstância de se manterem em vigor no atual vigente CPC os princípios da imediação, da oralidade, da concentração e da livre apreciação da prova.
Destarte, nos casos em que os factos em julgamento vêm esse julgamento submetido ao princípio da livre apreciação da prova, tendo presente aqueles princípios e, bem assim, que o julgamento humano se guia por padrões de probabilidade e não de certeza absoluta, não se pode aniquilar, em absoluto, a livre apreciação da prova que assiste ao juiz da 1ª Instância, sequer desconsiderar, em absoluto, os princípios da imediação, da oralidade e da concentração da prova, que tornam percetíveis a esse julgador, que intermediou na produção da prova, determinadas realidades relevantes para a formação da convicção, que fogem à perceção do julgador do tribunal ad quem através da mera audição da gravação áudio dos depoimentos pessoais prestados em audiência final.
Por conseguinte, o uso pela Relação dos poderes de alteração da decisão da 1ª Instância sobre a matéria de facto só deve ser usado quando seja possível, com a necessária segurança, concluir pela existência de erro de apreciação relativamente a concretos pontos de facto impugnados, isto é, quando depois de proceder à audição efetiva da prova gravada e à análise da restante prova produzida que entenda pertinente, conclua, com a necessária segurança, no sentido de que os depoimentos prestados em audiência final, conjugados com a restante prova produzida, apontam em direção diversa e delimitam uma conclusão diferente daquela que vingou na 1ª Instância.
Daqui deriva que “em caso de dúvida, face a depoimentos contraditórios entre si e à fragilidade da prova produzida, deverá prevalecer a decisão proferida pela 1ª Instância em observância aos princípios da imediação, da oralidade e da livre apreciação da prova, com a consequente improcedência do recurso nesta parte” (12).
Assentes nestas premissas, urge entrar na sindicância que os apelantes operam em relação ao julgamento da matéria de facto realizado pela 1ª Instância.
Como referido, os apelantes impugnam o julgamento de provado dos factos vertidos nos pontos 21º, 22º, 39º, 40º e 49º e, bem assim, de não provado em relação aos enunciados nas alíneas E, H e I dos factos considerados não provados na sentença recorrida, alegando que do depoimento do administrador judicial e da prova documental junta aos autos decorre que a avaliação do prédio vendido ao apelado foi efetuada sem que tivesse havido acesso ao interior desse prédio e, por isso, com total desconhecimento dos bens que o dotavam, pelo que o valor atribuído ao imóvel e o preço oferecido pelo apelado pela aquisição desse prédio nunca poderia ter tido em consideração as eventuais partes integrantes daquele, pela simples razão que se desconhecia, à data da avaliação, se esses partes integrantes existiam, pelo que a avaliação realizada apenas diz respeito ao prédio propriamente dito, sem quaisquer outros componentes, designadamente, os bens móveis nele incorporados.
Salvo o devido respeito por entendimento contrário, prefigura-se-nos que ao assim alegar os apelantes não destrinçam, como se impunha que fizessem, os seguintes momentos: a) modo e condições em que foi efetuada a apreensão e a avaliação do prédio no âmbito do processo de insolvência, designadamente, se essa apreensão e/ou avaliação foram realizadas sem que, respetivamente, o administrador de insolvência e os avaliadores se tivessem deslocado ao prédio ou ao interior da moradia que nele se encontrava (e encontra) construída; b) composição desse prédio à data da apreensão deste para a massa insolvente, à data em que foi avaliado a mando do administrador de insolvência com vista à sua colocação à venda em sede de liquidação do ativo; à data em que foi anunciada a venda desse prédio; à data da abertura das propostos e à data da venda propriamente dita, isto é, da celebração da escritura de compra e venda entre o administrador de insolvência e o apelado, designadamente, se a composição desse prédio era a mesma nesses diversos momentos temporais, nomeadamente, se as janelas, portas, louças sanitárias, cozinha, torneiras, caldeira de aquecimento central, radiadores, painel solar, furo de água, árvores e sebes que se encontram elencados no ponto 19º dos factos provados na sentença se encontravam já nesse prédio nesses diversos momentos temporais; c) objeto da avaliação realizada a mando do administrador de insolvência no âmbito da liquidação do ativo, com vista a colocar à venda aquele prédio, designadamente, se essa avaliação teve ou não em consideração os concretos bens que se encontram discriminados no ponto 19º dos factos provados na sentença recorrida e/ou outros; e d) e convicção e pressuposto com que o apelado apresentou a proposta de aquisição desse prédio e com que agiu no momento da celebração da escritura pública de compra e venda tendo por objeto esse prédio.
Com efeito, trata-se de situações bem distintas, com repercussões distintas em sede de factos a considerar como provados e não provados, circunstância essa que não foi tida em devida conta ou que foi desconsiderada/desvalorizada pelos apelantes nas críticas que assacam à sentença recorrida.
Vejamos:
B.1.1- Modo como foi efetuada a apreensão e a avaliação do prédio no âmbito do processo de insolvência – alíneas H e I dos factos considerados não provados na sentença.
A 1ª Instância deu como não provado os factos vertidos nas alíneas H e I, isto é:
“H- Que a apreensão se efetuou sem qualquer deslocação ao interior do imóvel por parte do AI ou seus colaboradores. I- Que a avaliação do imóvel se processou sem o seu responsável ter acedido ao interior da moradia”.
No entanto, como bem salientam os apelantes, F. J., administrador de insolvência, em sede de depoimento de parte e declarações de parte que prestou em audiência final, foi perentório em afirmar que a avaliação do prédio foi efetuada do exterior, isto é, o avaliador que aquele contratou para proceder a essa avaliação em sede de liquidação do ativo, tendo em vista colocar o prédio à venda, não teve acesso ao interior da moradia que se encontrava (e encontra) erigida nesse prédio, tendo procedido à avaliação do mesmo a partir do exterior dessa moradia (que não do prédio, sabendo-se que este é constituído pelo terreno e, bem assim pela moradia que estava – e está – erigida em parte desse terreno). Ora, o avaliador, nas palavras de F. J., não teve acesso ao interior da moradia, o que não equivale a afirmar que não tivesse tido acesso ao terreno.
Note-se que o relatório de avaliação desse prédio encontra-se junto aos autos a fls. 65 a 71 e nele se lê que essa avaliação foi precedida de visita efetuada ao imóvel, a qual teve lugar no dia 05 de maio de 2015 (cfr. fls. 66 verso), mas que “não foi possível aceder ao interior da moradia, tendo-se considerado os elementos cadastrais. À data da avaliação, o imóvel encontrava-se ocupado por José e Maria” (cfr. fls. 68).
Por sua vez, o auto de apreensão desse prédio e de outros imóveis pelo senhor administrador de insolvência a favor da massa insolvente encontra-se junto aos autos a fls. 12, onde se vê que essa apreensão a favor da massa insolvente teve lugar em 18/04/2015, sem que desse auto conste que essa apreensão tivesse sido realizada mediante prévia ou contemporânea deslocação do administrador de insolvência aos prédios apreendidos e sem que à luz das regras da experiência comum seja credível que essa deslocação tivesse tido lugar.
Na verdade, a apreensão de bens à ordem da massa insolvente é um ato formal que, em regra, é realizado pelo administrador de insolvência, sem qualquer deslocação aos prédios a apreender.
Acresce que analisamos toda a prova documental junta aos presentes autos e procedemos à audição integral da prova produzida em sede de audiência final e verificamos que nunca, em nenhum momento, administrador de insolvência ou quem quer que fosse referiu que a apreensão do prédio objeto dos presentes autos tivesse sido realizada mediante a deslocação prévia ou contemporânea do administrador de insolvência ou colaboradores deste a esse prédio.
Antes pelo contrário, o que se extrai da prova pessoal produzida, designadamente, do depoimento de parte prestado pela apelante Maria, do depoimento de parte e das declarações de parte prestados pelo administrador de insolvência, F. J., e dos depoimentos prestados pelas testemunhas P. C., filha dos apelantes, que esteve presente em todas as deslocações que foram feitas ao prédio; por J. S., pessoa contratada pelo administrador de insolvência para no dia designado para a mostra do prédio aos potenciais interessados na sua aquisição, para se deslocar a esse prédio para este ser mostrado a esses potenciais interessados, o que fez, e que também foi contratado pelo mesmo administrador de insolvência para proceder à entrega do prédio ao apelado, o que fez em 29/01/2016; bem como por D. C., pai do apelado, que acompanhou o último no dia da mostra do prédio aos potenciais interessados – em 26/10/2015 – e quando este foi entregue, em 29/01/2016, ao último, é que os apelantes tudo fizeram para dificultar a venda desse prédio e para dissuadir os potenciais interessados na respetiva compra desse seu eventual intento, manifestando sempre, inclusivamente, no dia da abertura dos sobrescritos contendo as propostas de aquisição, que não sairiam desse prédio (cfr. autos de abertura de fls. 14 verso a 20), sendo bem elucidativo o episódio relatado por D. C., que foi perentório em afirmar que no dia da mostra do prédio aos potenciais interessados na compra, o mandatário dos apelantes advertiu os presentes e potenciais interessados na aquisição desse prédio que os seus constituintes não iriam sair do prédio e que aqueles, caso apresentassem propostas, iriam ficar com o dinheiro deles (o sinal) retido por longo período de tempo, dissuadindo-os do interesse que tinham na aquisição do prédio, levando, inclusivamente, que um senhora que lá se encontrava para ver o imóvel, ficasse dissuadida do seu interesse na aquisição do mesmo, mas não logrando obter igual êxito em relação ao aqui apelado.
Neste contexto, é indiscutível que a apreensão do prédio se processou sem que o administrador de insolvência ou seus colaboradores se tivessem deslocado ao mesmo e que a avaliação desse prédio se processou sem que o avaliador tivesse podido aceder ao interior da moradia que se encontrava (e encontra) construída em parte do terreno do prédio, até porque, como referido, esse facto é atestado pelo próprio teor do auto de avaliação e foi confirmado pelo próprio administrador de insolvência em audiência final.
Resulta do que se vem dizendo, proceder a impugnação do julgamento da matéria de facto operada pelos apelante em relação à matéria de facto das alíneas H e I dos factos julgados como não provados na sentença recorrida, impondo-se eliminar esses factos do elenco dos factos não provados e antes considerá-los como provados.
Nesta conformidade, na procedência deste fundamento de recurso, determina-se a eliminação das alíneas H e I dos factos julgados não provados na sentença e julga-se provada a seguinte matéria fáctica:
52- A apreensão do prédio identificado em 2) à ordem da massa insolvente efetuou-se sem qualquer deslocação ao interior desse prédio por parte do administrador de insolvência ou seus colaboradores. 53- A avaliação do prédio que o administrador de insolvência ordenou fosse feita ao mesmo em sede de liquidação do ativo, com vista a colocá-lo à venda, processou-se sem que o perito avaliador tivesse acedido ao interior da moradia que se encontra construída nesse prédio. B.1.2- Objeto da avaliação realizada ao prédio a mando do administrador de insolvência em sede de liquidação do ativo, com vista a colocar à venda esse prédio – ponto 40º dos factos considerados como provados na sentença e alínea E dos factos nela considerados como não provados.
Em relação ao objeto da avaliação que o administrador de insolvência determinou que fosse realizada ao prédio em sede de liquidação do ativo, com vista a colocá-lo à venda, referem-se o ponto 40º dos factos considerados como provados na sentença e a alínea E dos factos nela considerados como não provados.
A 1ª Instância considerou como provados os seguintes factos:
“40- Foi no pressuposto de que o imóvel se encontrava dotado com os bens e equipamentos descritos em 39º que ao mesmo foi atribuído o valor de 180.000,00 euros”.
E considerou como não provados os seguintes factos:
“E- Que os bens retirados pelos 1ºs Réus do imóvel não fizeram parte da avaliação predial do imóvel”.
É indiscutível que a avaliação que o administrador judicial determinou que fosse efetuada ao prédio no âmbito do processo de insolvência, em sede de liquidação do ativo, com vista a determinar o valor desse prédio para o colocar à venda, foi realizada sem que o perito avaliador tivesse tido possibilidade de aceder ao interior da moradia que se encontrava (e encontra) erigida nesse prédio.
Deste modo, é apodítico que como bem salientam os apelantes, o perito avaliador desconhecia, à data em que realizou essa avaliação, quais os concretos bens que se encontravam no interior dessa moradia, designadamente, que no interior daquela se encontrava a concreta caldeira de aquecimento e respetivos radiadores de aquecimento, as concretas louças sanitárias e a concreta cozinha e respetivos eletrodomésticos e torneiras a que se alude nos pontos 19º e 27º a 29º dos factos considerados provados na sentença, pelo que é indiscutível que no valor de 180.000,00 euros por que foi avaliado aquele prédio (cfr. fls. 65 verso a 71) não foi considerado o valor desses concretos bens.
Já quanto ao painel solar, apesar de no relatório de avaliação de fls. 65 verso a 71, nenhuma referência expressa se fazer a esse painel, trata-se de elemento que é colocado no exterior da moradia, em regra, sobre o respetivo telhado, ou seja, em lugar bem visível do respetivo exterior, pelo que nada, mas absolutamente nada nos autos permite concluir que o perito avaliador não tivesse visto esse painel e considerado o mesmo na avaliação que realizou, antes pelo contrário, tendo o mesmo realizado essa avaliação precedida de visita ao prédio, que realizou em 05 de maio de 2015, onde necessariamente inspecionou esse prédio com atenção, ainda que do exterior da moradia nele erigida, onde aquele painel não pôde passar-lhe despercebido, reafirma-se, nada mas absolutamente nada permite concluir que o mesmo não tivesse considerado o valor desse painel no valor de 180.000,00 euros pelo qual avaliou o prédio.
Quanto às janelas e portas do anexo, que foram retiradas pelos apelantes aquando da entrega do prédio ao apelado, o furo de água existente no logradouro, que foi tapado com pedras e terra aquando dessa entrega, as árvores de fruto e sebes que existiam no jardim, que foram por eles cortadas aquando da entrega do prédio (ponto 19º dos factos considerados provados na sentença, e que não foi impugnado, encontrando-se, por isso, esta matéria, em definitivo, assente), apesar de naquele relatório de avaliação não se fazer menção expressa a estes concretos bens, sendo estes bem visíveis ao senhor perito avaliador quando vistoriou aquele prédio com vista a proceder à respetiva avaliação, igualmente, nada, mas absolutamente nada nos autos permite concluir que o respetivo valor não tivesse sido considerado no valor que atribui ao prédio.
Acresce referir que quanto aos concretos bens que se encontravam no interior da moradia, se é certo que o perito avaliador, porque não teve ao acesso ao interior dessa moradia, desconhecia que no respetivo interior se encontrava a concreta caldeira de aquecimento e respetivos radiadores de aquecimento, as concretas louças sanitárias e a concreta cozinha, eletrodomésticos e torneiras a que se alude no ponto 19º dos factos considerados provados, pelo que é indiscutível que no valor de 180.000,00 euros por que avaliou esse prédio, não considerou (não pôde considerar) o valor desses concretos bens, também não menos certo é que, contrariamente ao pretendido pelos apelantes, daqui não deriva que essa avaliação só diga “respeito ao prédio propriamente dito, sem quaisquer outros componentes (designadamente bens móveis, ainda que incorporados neste imóvel), sendo que apenas o prédio propriamente dito podia ser objeto da venda em discussão nos presentes autos”.
Na verdade, conforme resulta do depoimento de parte e das declarações de parte do administrador de insolvência e é, de resto, de lei, na avaliação de um prédio considera-se o terreno, as construções nele erigidas e tudo o que é parte integrante e componente desse terreno e respetivas construções.
Acresce que como resulta do depoimento de parte prestado pela apelante Maria, do depoimento de parte e declarações de parte prestado pelo administrador de insolvência, F. J., e dos depoimentos prestados pelas testemunhas P. C., J. M. e M. A., à data da avaliação deste concreto prédio, nele encontrava-se (e encontra-se), construída uma moradia, que na altura se encontrava totalmente pronta, dotada, inclusivamente, de jardim, onde residiam os apelantes e a família.
A testemunha P. C. referiu, inclusivamente, que os pais, a própria e os irmãos, foram residir para aquela moradia em 2010, e que quando foram para ela residir a cozinha, os eletrodomésticos, a loiça dos sanitários, os radiadores e a caldeira, já estavam instalados.
De resto, dos depoimentos prestados por J. M. e M. A. extrai-se precisamente que quando os apelantes e familiares foram residir para aquela vivenda, a cozinha, os eletrodomésticos, a loiça dos sanitários, os radiadores e a caldeira já se encontravam instalados, uma vez que J. M. afirma que a cozinha e os eletrodomésticos foram-lhe encomendados pelos apelantes, que os instalou, tendo-lhe os apelantes pago os móveis de cozinha e dos eletrodomésticos em 10/12/2009 (data da fatura que apresentou em audiência final e que não se encontra junta aos autos) e, consequentemente, antes dos apelantes terem ido residir para esse prédio.
Por sua vez, a testemunha M. A. referiu ter sido o mesmo que instalou a loiça dos sanitários, a caldeira e os radiadores, relatando que o preço da caldeira e dos radiadores lhe foram pagos pelos apelantes, mas que o custo dessa instalação e da instalação da loiça sanitária lhe foi pago pela insolvente “X”, embora, na altura, fosse do seu conhecimento, que a insolvente já se debatia com graves dificuldades económicas e que os fornecedores já não lhe forneciam os materiais para os obras sem ser a pronto pagamento, pelo que os adquirentes das moradias, sob pena das obras pararem por falta de materiais para instalação, chegaram a pagar esses materiais aos respetivos fornecedores e que foi isso que, na altura, ouvia dizer ter acontecido em relação à concreta obra objeto dos autos, em que os apelantes lhe pagaram a caldeira e os radiadores e em que sempre ouviu dizer terem sido estes que pagaram as loiças sanitárias que o mesmo instalou na moradia, deixando bem claro, no entanto, desconhecer os concretos negócios que, nessa sequência, vieram a ser celebrados entre os apelantes e a insolvente “X”, designadamente, se tendo os apelantes pago a cozinha, os eletrodomésticos, as loiças sanitárias, os radiadores e a caldeira, se o preço desses bens e equipamentos foram ou não deduzidos no preço de aquisição do prédio pelos apelantes à insolvente (tese esta defendida pela apelante Maria e pela testemunha P. C., filha dos apelantes, que pretenderam que o preço de aquisição da moradia acordado entre apelante e a insolvente era de 300.000,00 euros, já descontado o preço da cozinha, eletrodomésticos, loiças sanitárias, radiadores e caldeira, não obstante no processo de insolvência tivessem celebrado transação por 92.000,00 euros – cfr. fls. 77 verso e 78 – e nele não tivessem reclamado qualquer valor a título de benfeitorias realizadas no prédio).
Já a testemunha J. J. referiu ter aberto o furo e instalado a bomba em 2009, tendo sido os apelantes que lhe pagaram o respetivo preço. Logo, de acordo com este depoimento, também o furo e a respetiva bomba foram, respetivamente, aberto e instalada ainda antes dos apelantes e do seu agregado familiar terem ido residir para o prédio.
Retira-se, assim, do depoimento de parte prestado pela apelante mulher e dos depoimentos prestados pelas testemunhas acabadas de identificar que à data da avaliação do prédio determinada pelo administrador de insolvência, no âmbito da insolvência e em sede de liquidação do ativo, com vista a determinar o valor desse prédio para o colocar à venda, que nesse prédio residiam os apelantes e familiares desde 2010, e que, na altura em que aqueles foram residir para o mesmo, aquela moradia já tinha a cozinha, com os respetivos, eletrodomésticos, instalados, a loiça sanitária, os radiadores e a caldeira que vieram a retirar desse prédio aquando da sua entrega ao apelado, igualmente instalados, o mesmo acontecendo com o furo, que já se encontrava aberto.
Ora, conforme se vê do auto de avaliação de fls. 65 verso a 71, embora o avaliador desconhecesse naturalmente desde quando os apelantes residiam nesse prédio e desconhecesse, inclusivamente, quais os concretos bens que se encontravam no interior dessa moradia, por não ter podido aceder ao respetivo interior, o mesmo tinha conhecimento que à data da avaliação, os apelantes e respetivo agregado familiar, residiam nessa moradia, facto esse que, inclusivamente, fez consignar no auto de avaliação, onde escreve: “À data da avaliação o imóvel encontrava-se ocupado por José e Maria” e que, consequentemente, essa vivenda tinha de dispor de todas as condições de habitabilidade que permitissem a um agregador familiar residir na mesma, designadamente, que essa moradia tinha de ter cozinha instalada, equipada com os respetivos electrodomésticos e torneiras, tinha de ter as casas de banho devidamente equipadas, água, eletricidade, e que, inclusivamente, tratando-se de uma moradia nova e moderna, situada em Braga, que é uma zona fria, com invernos rigorosos, estava dotada de equipamento de aquecimento que permitisse aos respetivos residentes nela habitarem em condições de conforto, próprias da vida moderna e de uma moradia recém construída, com as características da da objeto dos presentes autos.
Mais. Nesse relatório pericial, lê-se a fls. 67 verso, que ao perito avaliador foram fornecidas “informação sobre elementos cadastrais, registo e licenças fornecidas pelo cliente (o administrador de insolvência), que consideramos válidas” e que foi com base nesses elementos que aquele procedeu à determinação dos elementos característicos do prédio a avaliar.
Nesse relatório escreve-se, inclusivamente, que “na obtenção dos valores do imóvel, tiveram-se em atenção os principais fatores, determinantes como sendo a localização, acessos, dimensões, estado de conservação e outros fatores considerados relevantes para a formação do valor do imóvel objeto de avaliação e o estado do mercado imobiliário na zona” (cfr. fls. 69); a fls. 69 verso que “o método do custo tem por base a “obra nova” (construída recorrendo a tecnologias e materiais modernos) idêntica à do bem patrimonial em avaliação, acrescido de todos os encargos indiretos tidos com o desenvolvimento do projeto de investimento….”, e continua-se, a fls. 70, escrevendo-se que “o imóvel foi avaliado considerado livre de ónus e encargos e no pressuposto de poder a vir a possuir todas as licenças necessárias à sua utilização, tal como se encontra (….). A avaliação foi efetuada considerando não existirem problemas ambientais nem materiais perigosos e/ou proibidos para o uso a que se destinam” (sublinhado nosso).
Ora, conforme se vê dos documentos enviados pela Câmara Municipal de .., junto aos autos a fls. 129 a 138, a moradia objeto dos presentes autos dispõe de licença de utilização desde 15/12/2010 (cfr. fls. 129).
Na “ficha técnica da habitação” dessa moradia, junta a fls. 137 dos autos, que se encontra assinada pelo legal representante da insolvente “Construções X”, lê-se que essa moradia é dotada, na cozinha, de “ventiladores de hotes”, no arrumo, de “caldeira de aquecimento” e na sala, quartos, casa de banho e hall, de “radiadores de águas”.
Logo, caso o avaliador tivesse tido acesso a estes elementos juntos pela Câmara Municipal de …, os mesmos permitiam-lhe concluir que se tratava de uma moradia com cozinha e eletrodomésticos, modernos, instalados, com caldeira de aquecimento e com radiadores de água instalados, pelo que apesar daquele não ter conhecimento que a cozinha, os eletrodomésticos, a loiça sanitária, a caldeira e os radiadores que se encontravam no interior dessa moradia eram os concretos bens que os apelantes dela retiraram quando a entregaram ao apelado, aquele tinha perfeito conhecimento que essa moradia tinha instalada cozinha, com eletrodomésticos, modernos instalados, tinha os wcs, com loiça completa e moderna instalada, tinha caldeira e radiadores instalados, tudo conforme resulta do seu relatório pericial onde, reafirma-se, refere que na avaliação que fez teve em consideração o custo de construção para uma moradia de características semelhantes à em avaliação, “recorrendo a tecnologias e materiais modernos”, sem “existiram problemas ambientais, nem materiais perigosos e/ou proibidos para o uso que se destinam” e partindo do pressuposto que essa moradia, tal como se encontra, poderá vir a possuir todas as licenças necessárias à sua utilização”.
Mas admitindo-se que o avaliador não teve acesso, à data em que realizou essa avaliação, à licença de utilização e à identificada “ficha técnica de habitação” de fls. 129 a 138. Nesse caso, a ilação a extrair da prova produzida é precisamente a mesma, dado que o avaliador, apesar de não ter tido a possibilidade de aceder ao interior daquela moradia, o mesmo tinha perfeito conhecimento, que nessa data, nela residiam os apelantes e respetivo agregado familiar, que se tratava de uma moradia de construção recente, moderna, com uma área de construção considerável, em que a construção estava completa, tendo, inclusivamente, construído jardim, com um furo, e que, por isso, tinha de ter cozinha e eletrodomésticos e torneiras instalados, tudo moderno, bem como áreas sanitárias totalmente equipadas e modernas e com todas as condições de conforto próprias de uma moradia daquela natureza, incluindo, caldeira e radiadores, na qual foram utilizadas “tecnologias e materiais modernos”, posto que é esta a única ilação que se pode extrair em face de tudo o quanto se foi relatando e à luz das regras da experiência comum.
Neste contexto, se é certo que não se pode manter a resposta de provado à matéria do ponto 40º, sequer se pode manter a resposta de não provado à matéria da alínea E), também não menos certo é que, contrariamente ao pretendido pelos apelantes, não se pode simplesmente concluir pela não prova da matéria vertida naquele ponto 40º e considerar provada a matéria da alínea E).
É que quanto à matéria do ponto 40º, é indiscutível que foi no pressuposto que o painel solar, as janelas e portas do anexo, o furo de água, as árvores de fruto e sebes que existiam no jardim, identificadas no ponto 19º dos factos provados na sentença, que os apelantes retiraram do prédio quando o entregaram ao apelado, faziam parte do prédio, que o perito atribui a esse prédio o valor de 180.000,00 euros, já que todos esses bens existiam no prédio aquando da realização dessa vistoria, foram visíveis ao avaliador e são indiscutivelmente elementos relevantes na avaliação do prédio realizada.
Por outro lado, se é certo que o perito desconhecia, à data da avaliação, que a cozinha, os eletrodomésticos, a loiça sanitária, radiadores e a caldeira que se encontravam instalados no interior dessa moradia eram a concreta cozinha, eletrodomésticos, loiça sanitária, radiadores e caldeira que os apelantes retiraram aquando da entrega do prédio ao apelado, aquele tinha perfeito conhecimento que essa vivenda se encontrava dotada de cozinha, com eletrodomésticos e torneiras instalados, wc completos, radiadores e caldeira instalados, tudo moderno, até porque se tratava de moradia que estava a ser habitada pelos apelantes e pelo seu agregado familiar, trata-se de bens que, por norma, já se encontram instalados nas moradias e frações autónomas quando estas são comercializadas, pelo que nada lhe tendo sido referido em contrário, designadamente pelo administrador de insolvência (vide teor do mail de fls. 95 que o administrador de insolvência enviou aos apelantes, em que perante a comunicação que lhe foi feita pelo apelado queixando-se do estado em que lhe foi entregue o prédio, ameaça os apelantes de os responsabilizar, o que é bem demonstrativo que também era sua convicção que o prédio foi apreendido e avaliado com todos os bens em falta, incluindo, móveis de cozinha, respetivos electrodomésticos e torneiras), foi, necessariamente, nesse pressuposto que aquele avaliou o prédio em 180.000,00 euros.
Nesta conformidade, na procedência parcial do recurso nesta parte, elimina-se a alínea E dos factos considerados não provados na sentença e altera-se a matéria julgada como provada no ponto 40º, nos seguintes termos: 40 - Foi no pressuposto que o painel solar, as janelas e portas do anexo, o furo de água, as árvores de fruto e sebes que existiam no jardim, bens estes identificados em 19º, faziam parte do prédio identificado em 2º, e que a moradia construída nesse prédio se encontrava dotada de cozinha completa, com electrodomésticos e torneiras instalados, casas de banho completas, radiadores e caldeira instalados, tudo moderno, que a esse prédio foi atribuído pelo perito que o avaliou, a mando do administrador de insolvência, no âmbito da insolvência, para o colocar à venda em sede de liquidação do ativo, lhe atribuiu o valor de 180.000,00 euros.
Adita-se à matéria de facto, a seguinte matéria, que se julga como provada:
54- Os concretos móveis de cozinha, os eletrodomésticos, torneiras, loiças sanitárias, caldeira de aquecimento central e radiadores que os 1ºs Réus retiraram do interior da vivenda que se encontra construída no prédio identificado em 2º quando entregaram esse prédio ao Autor, não fizeram parte da avaliação desse prédio, tendo o senhor perito, nessa avaliação, considerado bens idênticos, nos moldes referidos em 40º.
B.1.3- Composição do prédio à data da apreensão deste para a massa insolvente, à data em que foi avaliado a mando do administrador de insolvência com vista à sua colocação à venda em sede de liquidação do ativo; à data em que foi anunciada a venda desse prédio, à data da abertura das propostas e à data da celebração da escritura de compra e venda e convicção e pressuposto com que o apelado apresentou a proposta de aquisição desse prédio e com que agiu no momento da celebração da escritura pública de compra e venda – Pontos 21º, 22º, 39º e 49º
A 1ª Instância considerou como factos provados os seguintes factos:
21- A proposta que o Autor fez para adquirir o imóvel inventariado sob a verba 7, no valor de 166.020,00 euros, foi efetuada no pressuposto do imóvel lhe ser entregue nos exatos termos que o mesmo se encontrava à data da apreensão, à data da mostra, à data da venda, ou seja, dotado do equipamento/bens que se consideram como partes componentes do imóvel. 22- O Autor quando se propôs adquirir o imóvel pela importância de 166.020,00 euros, foi na convicção do mesmo estar dotado do mobiliário de casa de banho (louças sanitárias imprescindíveis ao fim de um WC); a cozinha estar dotada de bancadas, mobiliário de cozinha, torneiras e eletrodomésticos imprescindíveis ao fim de uma cozinha), pré instalação de aquecimento, respetivos radiadores de aquecimento, com a respetiva caldeira de aquecimento e de um painel solar, o anexo se encontrar fechado com as respetivas janelas e portas, com o furo de água aberto, pois só assim se pode retirar dele as respetivas potencialidades, árvores de fruto e da sebe que lá existia e que foi completamente eliminada. 39- O imóvel descrito na verba n.º 7 do auto de apreensão foi apreendido no exato estado em que se encontrava, com os bens componentes e integrantes que já existiam à data da apreensão, a saber, com uma caldeira de aquecimento e respetivos radiadores de aquecimento, WCs devidamente equipados com louças sanitárias e mobiliário, cozinha equipada, painel solar. 49- A apreensão do imóvel pelo AI foi realizada com a convicção de que os referidos bens que se encontravam no imóvel faziam parte do mesmo.
Insurgem-se os apelantes contra a matéria assim considerada como provada, pretendendo que a circunstância da avaliação do prédio ter sido efetuada sem que o perito avaliador tivesse tido acesso ao interior da moradia que se encontra erigida no prédio, força a que se conclua pela não prova desta concreta matéria, mas sem manifesta razão.
Como já referido e demonstrado, o painel solar, as janelas e portas do anexo, o furo de água, as árvores de fruto e sebes que os apelantes, respetivamente, retiraram e cortaram do prédio quando, em 29/01/2016, procederam à sua entrega ao apelado, já existiam à data em que se procedeu à avaliação desse prédio, a mando do administrador de insolvência, em sede de liquidação do ativo, para se proceder à venda desse prédio.
Trata-se de bens que se encontravam no exterior da vivenda que se encontra erigida nesse prédio, pelo que a perceção desses bens por parte do perito avaliador não estava naturalmente dependente da circunstância daquele ter sido impossibilitado de entrar no interior dessa vivenda.
Como também já demonstrado, nada nos autos permite concluir que esses concretos bens não tivessem sido considerados pelo avaliador na avaliação que fez desse prédio, antes pelo contrário, a prova produzida aponta no sentido de que os mesmos foram considerados nessa avaliação.
Apesar da testemunha P. C., filha dos apelantes, ter referido que o painel solar, as janelas e portas do anexo, o furo de água e as árvores de fruto e sebes (o jardim em geral) foram instalados pelos seus pais após aqueles e filhos terem ido viver para o prédio em 2010, indo o depoimento de parte da apelante Maria em igual sentido, resulta do depoimento da testemunha J. J. que o furo foi aberto e a respetiva bomba foi instalada antes dos apelantes terem ido residir, em 2010, para o prédio.
Aliás, independentemente do referido, do depoimento de P. C. e da apelante Maria e, bem assim de toda a prova produzida resulta linear que todos esses bens, incluindo o jardim, já se encontravam instalados/construídos no prédio há vários anos aquando da respetiva avaliação e que, consequentemente, à data da apreensão do prédio para a massa insolvente, os mesmos já se encontravam aí instalados/abertos/construídos.
O prédio foi apreendido pelo administrador de insolvência a favor da massa insolvente em 18/04/2015 (cfr. auto de fls. 12) e esse prédio foi objeto da visita pelo senhor avaliador menos de um mês depois, mais concretamente, em 05/05/2015 (cfr. fls. 66 verso), pelo que é indiscutível que o painel solar, as janelas e portas do anexo, o furo de água, as árvores de fruto e sebes que os apelantes retiram desse prédio quando o entregaram ao apelado e que nele existiam à data da sua avaliação já nele existiam quando esse prédio foi apreendido, menos de um mês antes, a favor da massa insolvente.
Quanto à cozinha, eletrodomésticos, torneiras, loiça sanitária, radiadores e caldeira, como referido, na altura da avaliação, o perito não pôde aceder ao interior da vivenda quando realizou a avaliação, mas como supra já demonstrado, esses bens já se encontravam instalados nessa vivenda quando os apelantes para ela foram residir em 2010, sendo indiscutível que todos já existiam, no interior da vivenda, quando o prédio foi apreendido em 18/04/2015 a favor da massa insolvente e quando veio a ser avaliado.
Todos esses bens, isto é, painel solar, janelas e portas do anexo, furo de água, árvores de fruto e sebes que existiam no jardim, assim como a cozinha, respetivos eletrodomésticos, torneiras, loiça sanitária, radiadores e caldeira, que existiam no interior da vivenda que se encontra erigida no prédio, eram não só já existentes à data em que esse prédio foi apreendido à ordem da massa insolvente, em 18/04/2015; como eram existentes à data em que o mesmo foi visitado em 05/05/2015 pelo avaliador, a mando do administrador de insolvência, em sede de liquidação do ativo, com vista a realizar a venda desse prédio; como eram existentes à data em que em 13/10/2015, foi anunciada a venda e designado o dia 26/10/2015, para mostra do imóvel e foi designado o dia 06/11/2016 para abertura de propostas em sobrescrito fechado (cfr. anúncio de fls. 12 verso); como também eram existentes quando o apelado visitou esse prédio em 26/10/2015; bem como quando apresentou a proposta de aquisição desse prédio e viu este a ser-lhe adjudicado, em 06/11/2016, pelo valor da proposta de 166.020,00 euros que oferecera (cfr. fls. 14 verso a 20); assim como eram existentes quando em 15/01/2016 o apelado visitou esse mesmo prédio (pela segunda vez), acompanhado agora por perito avaliador do Banco ..., junto de quem pretendia contrair financiamento tendo em vista a compra desse prédio, altura em que foram tiradas as fotografias de fls. 27 verso a 29.
Na verdade, relembra-se, dos depoimentos prestados pelas testemunhas P. C., filha dos apelantes, J. M., M. A. e J. J., resulta que a cozinha e respetivos eletrodomésticos, torneiras, loiças sanitárias dos WCs, radiadores a caldeira do aquecimento central e o furo já se encontravam, respetivamente, instalados e aberto quando os apelantes e filhos foram residir para essa vivenda em 2010.
Apesar do perito avaliador desconhecer que os bens instalados no interior da vivenda eram os concretos bens que dela os apelantes retiraram quando entregaram o prédio ao apelado, na avaliação que fez ao prédio, como já demonstrado, não deixou de considerar bens idênticos/semelhantes aos retirados.
A apelante Maria e as testemunhas J. S., P. C. e D. C. foram concordantes entre si em confirmar que no dia 26/10/2015, em que se encontrava designada data para a mostra do prédio, o apelado e pelo menos uma outra interessada na aquisição desse prédio, deslocaram-se ao mesmo, a fim de o vistoriarem e verificarem se tinham ou não interesse na respetiva aquisição e qual o preço que se propunham oferecer pelo mesmo.
Por sua vez, a apelante Maria e, bem assim a testemunha P. C. foram igualmente concordantes em afirmar que no dia 15/01/2016, o apelado deslocou-se novamente a esse prédio, agora acompanhado por um perito avaliador do Banco..., junto de quem o apelado pretendia adquirir financiamento tendo em vista a aquisição do prédio (não obstante já antes, ter apresentado proposta pela respetiva aquisição e ter visto, em 06/11/2015, essa sua proposta aceite e aquele prédio ser-lhe adjudicado pelo valor oferecido de 166.020,00 euros, mas na altura dessa segunda deslocação, ainda não se encontrava celebrada a escritura de compra e venda – vide depoimento e declaração da parte do administrador de insolvência, F. J., nesse sentido), altura em que foram tiradas as fotografias de fls. 27 verso a 29, o que tudo se mostra concordante com o teor dos documentos juntos aos autos a fls. 21 a 23 e 168 a 175, constando justamente de fls. 179, como data da realização da visita pelo avaliador do Banco... o dia 15/01/2016, pelo que é indiscutível que no dia 15/01/2016, o apelado deslocou-se, pela segunda vez ao prédio, a fim de o vistoriar, acompanhado pelo perito avaliador daquela instituição financeira, junto de quem pretendia adquirir financiamento tendo em vista a aquisição deste prédio e antes da celebração, nesse mesmo dia 15/01/2016, da escritura de compra e venda, altura em que foram tiradas as fotografias de fls. 27 verso a 29 do interior dessa moradia.
Note-se que a testemunha P. C., não só confirmou esta segunda deslocação do apelado ao prédio, juntamente com aquele perito avaliador do Banco..., como confirmou que nesse dia 15/01/2016, o apelado e esse perito avaliador tiveram oportunidade de vistoriar todo o prédio, incluindo o interior da moradia, altura em que tiraram as identificadas fotografias de fls. 27 verso a 29, dizendo, inclusivamente, que na altura, o interior dessa moradia já se encontrava mais vago de recheio do que aconteceu na primeira visita, que teve lugar no dia 26/10/2015, atenta a proximidade da data em que os apelantes teriam de entregar o prédio ao apelado, o que se mostra consentâneo com as regras da experiência comum, resultando por aqui também, mais uma vez corroborado, não só que o painel solar, janelas e portas do anexo, furo de água, árvores de fruto e sebes que existiam no jardim, assim como a cozinha e respetivos eletrodomésticos, torneiras, loiças das casas de banho, radiadores e caldeira, que existiam no interior da vivenda que se encontra erigida no prédio existiam, à data em que o prédio foi apreendido à ordem da massa insolvente, em 18/04/2015; à data em que esse prédio foi visitado em 05/05/2015 pelo avaliador, a mando do administrador de insolvência, em sede de liquidação do ativo, com vista a realizar a venda desse prédio; em 13/10/2015, quando foi anunciada a venda desse prédio; em 26/10/2015, quando o apelado se deslocou ao mesmo para o vistoriar; em 06/11/2016, quando viu esse prédio a ser-lhe adjudicado pelo valor da proposta de 166.020,00 euros que oferecera pela respetiva aquisição (cfr. fls. 14 verso a 20), assim como quando em 15/01/2016 visitou esse mesmo prédio, acompanhado por perito avaliador do Banco ..., antes da celebração da escritura pública de compra e venda e em que o viu e vistoriou pela segunda vez.
Note-se que apesar da testemunha D. C., pai do apelado, ter pretendido que no dia 26/10/2015, data designada para a mostra do prédio e quando o apelado se deslocou ao mesmo pela primeira vez, para o vistoriar, a fim de aquilatar do seu interesse na aquisição do mesmo e do preço que se propunha oferecer, o apelado mal teve oportunidade de o vistoriar, na medida em que a filha dos apelantes e o mandatário destes, praticamente apenas os terão deixado entrar no hall de entrada da vivenda, esse facto acabou por ser contrariado pelo próprio D. C., que apesar daquela sua versão dos factos, a dado passo referiu que “antes de fazer a proposta, o filho foi ver a casa porque não ia comprar a casa sem a ver”.
Ora se o filho de D. C. “não ia comprar a casa sem a ver”, isto é, sem a vistoriar devidamente e sem que pudesse recolher todos os elementos que lhe permitiam aquilatar do respetivo interesse na aquisição e sobre o preço a oferecer – o que é, aliás, uma regra da experiência comum -, é indiscutível que quando o apelado, no dia 26/10/2015, se deslocou, pela primeira vez, ao prédio, apesar de todas as ameaças e medo que lhe foi incutido (e à outra interessada) no sentido de os dissuadir de qualquer interesse que pudessem ter na aquisição desse prédio, forçoso é concluir que, contrariamente ao afirmado pela testemunha D. C., o apelado teve oportunidade de vistoriar todo o prédio devidamente, inclusivamente, todo o seu interior e exterior, sequer o contrário resiste minimamente às regras da experiência comum. É que caso o apelado tivesse sido impedido de realizar essa vistoria, nomeadamente, ao interior da vivenda, o mesmo não deixaria de se queixar desse impedimento junto do administrador de insolvência ou junto da testemunha M. C., pessoa contratada pelo administrador de insolvência para acompanhar os potenciais interessados na aquisição do prédio, o que não fez.
Note-se que a apelante Maria e a testemunha P. C. foram perentórias em confirmar que, nesse dia 26/10/2015, o apelado e as demais pessoas que se deslocaram ao prédio, potenciais interessados na respetiva aquisição, tiveram oportunidade de vistoriar todo o prédio e viram todo o interior da vivenda, o que é igualmente confirmado pelo próprio apelado nos pontos 8º a 11º da petição inicial e essa matéria encontra-se dada como provada no ponto 8º dos factos considerados provados na sentença, sem que a mesma tivesse sido colocada em crise pelos apelantes no presente recurso, de modo que se encontra, em definitivo, assente nos autos.
Aqui chegados, sendo indiscutível que tendo vistoriado esse prédio nesse dia 26/10/2015, nessa vistoria, o apelado não deixou de constatar que a vivenda tinha painel solar instalado; que o anexo tinha janelas e portas instaladas; que o prédio tinha um furo de água; tinha jardim, onde havia árvores de fruto e sebes; que a cozinha encontrava-se totalmente mobilada e dotada de todos os eletrodomésticos e torneiras; que todas as casas de banho se encontravam equipadas com a loiça sanitária e torneiras e que essa vivenda era dotada de radiadores e caldeira.
Independentemente dos conhecimentos jurídicos que o apelado pudesse ter na altura em que se deslocou a esse prédio, é indiscutível que resultando das regras da experiência comum que, em regra, as vivendas e apartamentos são comercializados com mobília de cozinha, eletrodomésticos e torneiras instalados; com loiças sanitárias e torneiras instaladas nas respetivas casas de banho; que quando providos de painel solar para aquecimento de água, com esses painéis instalados e, bem assim, que quando providos de instalação de aquecimento central, que os mesmos são comercializados com a caldeira e os radiadores que neles se encontram instalados, mas ainda, que essas construções e respetivos anexos são comercializados com todas as portas e janelas que neles se encontram instaladas e, bem assim que quando comercializados com jardim, são vendidos com esse jardim que neles se encontre construído, é inegável que perante o que foi dado ver ao apelado no dia 26/10/2015, que nada constando em contrário no anúncio de venda do prédio, sequer nada lhe tendo sido referido em contrário pelo administrador de insolvência ou por quem quer que fosse, designadamente, pelos apelantes, pela filha destes e/ou pelo mandatário dos apelantes que acompanhou a visita de 26/10, que a única convicção que o apelado podia legitimamente ter adquirido é que o prédio lhe seria vendido com todos esses bens e que no valor que ofereceu para a respetiva aquisição não deixou de ter presente esse facto.
Precise-se que a apelante Maria, referiu que no dia 26/10/2015, quando o apelado e pelo menos uma outra interessada na aquisição desse prédio se deslocaram ao mesmo, para o vistoriarem e aquilatarem do respetivo interesse na aquisição desse prédio e do valor que se propunham oferecer, nunca disseram aos presentes, onde se contava o apelado, que a cozinha, as janelas, os radiadores, o painel solar, etc., que nele se encontravam instalados e que os apelantes vieram a retirar quando entregaram o prédio a apelado, “não faziam parte da casa”, em síntese, não fizeram qualquer ressalva junto dos presentes que aqueles bens não faziam parte do prédio.
Igualmente, a testemunha P. C. pronunciou-se em igual sentido, sendo perentória em afirmar que, nesse dia 26/10/2015, as pessoas que se deslocaram à casa “viram toda a casa”, “todas as divisões”, tendo sido ela e o advogado (dos apelantes) que acompanharam essas pessoas; na altura, “nada tinha sido retirado da casa”; “a casa estava no exato estado em que se encontrava”, referindo que “as pessoas não lhe fizeram perguntas sobre se era tudo para ficar ou se era para sair alguma coisa, limitavam-se a ver” e ela também nada lhes disse.
Logo, como referido, reafirma-se, quando o apelado apresentou a proposta de aquisição do prédio, a única ilação que aquele poderia legitimamente extrair, e que não deixou de extrair, é que ao oferecer o preço de 166.020,00 euros, pela aquisição do prédio, estava a adquirir o terreno, a vivenda e o anexo construídos nesse prédio, mas com o painel solar que se encontrava instalado nessa vivenda, no dia 26/10/2015; o anexo com todas as janelas e portas que nele se encontravam então instaladas; com o furo de água que se encontrava aberto nesse prédio; com o jardim que nele se encontrava instalado, com todas as árvores de fruto e sebes que existiam nesse jardim no apontado dia 26/10; com o mobiliário de cozinha, eletrodomésticos e torneiras que nessa cozinha se encontravam instalados nesse dia 26/10; com a loiça sanitária e torneiras que se encontravam instaladas nas casas de banho e com os radiadores e caldeira do aquecimento central que nela se encontravam instalados, uma vez que foi isso que lhe foi dado ver quando visitou esse prédio no dia 26/10/2015 e nada lhe foi dito em contrário por quem quer que fosse, nomeadamente, quando o mesmo fez essa visita e nenhuma menção em contrário se encontrava no anúncio publicitando a venda do prédio e essa é a regra do normal acontecer.
Conforme acusam os apelantes acontecer nas suas alegações de recurso, a identificada P. C., sustentou que quando o apelado se deslocou, em 15/01/2016, pela segunda vez ao prédio, agora acompanhado pelo perito do Banco ..., a fim de vistoriar a casa, a fim de contrair financiamento bancário junto desta instituição bancária, esta perguntou ao apelado “se ele estava interessado em alguma das coisas que estavam lá na casa, porque iam vender algumas coisas?”, ao que o apelado lhe respondeu que “ia pensar”, dizendo-lhe logo que “não estava interessada nos candeeiros”. Falaram dos espelhos e P. C. perguntou ao apelado se não estaria interessado na aquisição dos radiadores, na caldeira, nas loiças das casas de banho, no painel solar, nos móveis e eletrodomésticos da cozinha, ao que o apelado lhe respondeu que tudo dependia do preço, facultando-lhe então o seu endereço eletrónico, para que a mesma lhe fizesse chegar o preço da venda desses bens, tendo sido nesse contexto que aquela fez chegar ao apelado o mail de fls. 30 e 31, mail este que se encontra datado de 17/01/2016, relatando que, posteriormente, o apelado lhe telefonou, dizendo-lhe que não estava interessado na aquisição desses bens.
Note-se que esta versão dos factos da testemunha P. C. é corroborada, em parte, pelo teor do relatório de avaliação feito pelo avaliador do Banco..., que naquele dia 15/01/2016, se deslocou com o apelado ao prédio, a fim de proceder à vistoria deste por via do financiamento que o mesmo pretendia contrair junto dessa instituição bancária, relatório esse junto a fls. 168 a 175 dos autos, onde, a fls. 174, se escreve o seguinte: “De acordo com as informações da atual proprietária, aquando da venda do imóvel, esta vai retirar os seguintes elementos: caldeira de aquecimento a gás, painel solar, radiadores da parede, móveis e equipamentos de cozinha e espelhos dos quartos. O cliente se pretender pode adquirir estes elementos à parte”.
Neste relatório, confirma-se, pois, que a testemunha P. C. teve efetivamente aquela conversa com o apelado, no dia 15/01/2016, propondo-lhe que comprasse aos apelantes, seus pais, a caldeira, os radiadores, o painel solar, os móveis e eletrodomésticos da cozinha e os espelhos dos quartos.
Sobre os espelhos dos quartos não cuidam os presentes autos.
Nesse relatório, sequer no mail de fls. 30 e 31, não se confirma, sequer P. C. o refere no depoimento que prestou em sede de audiência final, ter proposto ao apelado que comprasse aos apelantes também as árvores e sebes do jardim, que estes cortaram quando entregaram ao apelado prédio, sequer semelhante é credível.
Também não confirma ter proposto ao apelado a aquisição das janelas e das portas do anexo, que aqueles apelantes também retiraram aquando da entrega do imóvel ao apelado.
Neste contexto é indiscutível que a propósito desse jardim, respetivas árvores e sebes e, bem assim, a propósito das janelas e portas do anexo, nenhuma conversa ocorreu no dia 15/01/2016 entre o apelado e a filha dos apelantes.
No entanto, P. C. refere ter proposto ao apelado a aquisição das loiças sanitárias e respetivas torneiras que se encontravam instaladas nas casas de banho da moradia e no mail de fls. 30 e 31, aquela propõe efetivamente ao apelado a compra das casas de banho completas, em número de quatro, pelo preço global de 4.500,00 euros.
Trata-se de um dado relevante para efeitos da vistoria que o perito do Banco … realizou ao prédio nesse dia 15/01, pelo que sem dúvida alguma, caso P. C. tivesse tido aquela conversa para com o apelado quanto às loiças das casas de banho e respetivas torneiras, era esperável que o perito avaliador do Banco … também tivesse feito referência a esse dado no seu relatório, perante as menções que nele teve o cuidado de fazer a fls. 174, dado tratar-se indiscutivelmente de elemento relevante para efeitos desta avaliação.
Acontece que lido e relido esse relatório de avaliação de fls. 168 a 174, verificamos que no mesmo nenhuma menção é feita a propósito das loiças e torneiras das casas de banho que se encontravam instaladas na moradia no dia 15/01/2016 e que, como referido, aí já se encontravam instaladas desde que os apelantes e família foram residir para essa moradia em 2010.
A ausência de menção desse dado no apontado relatório de fls. 168 a 174 e o facto de para além do depoimento de P. C. e do mail de fls. 30 e 31, nenhuma outra prova ter sido produzida em como aquela tivesse proposto ao apelado também a compra das louças e torneiras das casas de banho (veja-se que a apelante Maria, no depoimento de parte que prestou em audiência final, pretendeu, inclusivamente, que a sua filha P. C., nesse dia 15/01/2016, apenas falou ao apelante, na compra do recheio da casa, não lhe falando do furo, dos radiadores, das loiças da casa de banho ou da cozinha), a prova produzida não impõe que se conclua que P. C. tivesse efetivamente, nesse dia 15/01/2016, proposto ao apelado a aquisição das loiças sanitárias e torneiras da casa de banho, mas antes faz gerar a fundada dúvida sobre se essa proposta feita por P. C. também incidiu sobre essas loiças sanitárias e torneiras, fazendo-o apenas, no mail que lhe enviou em 17/01/2016.
Quanto ao furo, apesar de no mail de fls. 30 e 31, a testemunha P. C. propor ao apelado que este pague 4.000,00 euros pelo “furo de água com motor (5 saídas) – com captação de água para o jardim e piscina”, a mesma, no depoimento que prestou em audiência final, não confirmou que na conversa que manteve com o apelado naquele dia 15/01, tivesse falado ao apelado do furo, pelo que na ausência de outra prova nesse sentido e a ausência de qualquer menção no relatório de avaliação do Banco …, concluímos que nenhuma conversa entre aqueles ocorreu no apontado dia 15/01 a propósito desse furo e que foi a testemunha P. C. que decidiu, de modo unilateral e pela primeira vez, incluir na proposta de fls. 30 e 31, o furo.
Resulta do exposto que, em função da prova produzida, a única conversa que a testemunha P. C. comprovadamente teve com o apelado no dia 15/01/2016, respeitou à caldeira, aos radiadores, ao painel solar e aos móveis de cozinha e respetivos eletrodomésticos (e aos espelhos dos quartos de que não cuidam os presentes autos) que se encontravam instalados na moradia, propondo ao apelado que comprasse esses bens, sob pena de os retirar, obtendo dele por resposta que tudo dependeria do preço de venda que lhe fosse apresentado pelos apelantes, assim se compreendendo que P. C., tivesse em 17/01/2016, enviado ao apelado o mail de fls. 30 e 31.
Apesar de nesse mail se fazer menção a outros bens, designadamente ao furo e à loiça sanitária e torneiras da casa de banho, a prova produzida não impõe que a conversa tida por P. C. com o apelado tivesse incidido igualmente sobre os mesmos, mas antes são fundadas e justificadas as dúvidas a este respeito.
Prosseguindo. Não obstante P. C. ter comprovadamente proposto ao apelado naquela deslocação de 15/01, que comprasse aos apelantes a caldeira, os radiadores, o painel solar e os móveis de cozinha e respetivos eletrodomésticos que se encontravam instalados na moradia, sob pena destes os retirarem do interior do prédio aquando da sua entrega ao apelado e deste último não ter logo argumentado que esses bens eram seus e que já estavam incluídos na proposta de preço que oferecera pela aquisição do prédio, mas antes, pelo contrário, respondendo-lhe que tudo dependeria do preço de venda que lhe viesse a ser proposto, da prova produzida não resulta confirmada a versão dos factos apresentada por P. C. quando refere que, na sequência do mail de fls. 30 e 31, o apelante lhe telefonou, dizendo-lhe que não estava interessado na aquisição desses bens.
Com efeito, para além do depoimento P. C., nenhuma outra prova foi produzida a propósito deste pretenso telefonema.
A testemunha J. S., que foi contratada pelo administrador de insolvência, para acompanhar o apelado no dia 29/01/2016, para os apelantes lhe entregarem o prédio e, bem assim, D. C., pai do apelado, que o acompanhou aquando dessa entrega, foram concordantes entre si em afirmar que quando o prédio lhe foi entregue, o apelado ficou indignadíssimo, queixando-se que as árvores e as sebes do jardim tinham sido cortadas rentes ao pé, o furo tinha sido atolado, os móveis e os eletrodomésticos da cozinha tinham sido retirados, encontrando-se esta totalmente vazia, as loiças das casas de banho e torneiras, umas tinham sido retiradas e outras tinham sido substituídas por outras de mais fraca qualidade e mais antiquadas, vendo-se o silicone da instalação dos anteriores lavabos; os radiadores e a caldeira do aquecimento central tinham sido retirados, o mesmo acontecendo com o painel solar, argumentando o apelado que não tinha sido isto que o mesmo comprara, posição essa que este reafirma nos presentes autos e que igualmente assumiu perante o administrador de insolvência no mail de fls. 26 e 27 dos autos.
Todos estes factos, designadamente, a atitude que o apelado teve na altura em que o prédio lhe foi entregue, não pode deixar de gerar a fundada dúvida sobre a ocorrência desse pretenso telefonema a que alude a testemunha P. C., em que o apelado pretensamente lhe terá comunicado não estar interessado na aquisição dos bens que aquela lhe propusera que comprasse aos apelantes aquando da deslocação que o mesmo fez ao prédio no dia 15/01/2016 e aos demais bens discriminados no mail de fls. 30 e 31.
Relembra-se aos apelantes que, em função do disposto no art. 662º, n.º 1 do CPC, para que a Relação possa alterar a decisão proferida pela 1ª Instância em relação à matéria de facto impugnada, não basta que a prova produzida consinta o julgamento diverso que propugnam, mas antes que o imponha, o que não é manifestamente o caso em relação a este pretenso telefonema.
Acresce que do facto de comprovadamente a testemunha P. C. ter proposto ao apelado, na deslocação que este fez ao prédio no dia 15/01/2016, que comprasse aos apelantes a caldeira, os radiadores, o painel solar e os móveis de cozinha e respetivos eletrodomésticos, sob pena destes os retirarem do interior do prédio aquando da entrega deste ao último e deste não ter logo argumentado que esses bens eram dele, estando incluídos na proposta que apresentara para aquisição desse prédio, mas antes, pelo contrário, respondendo que tudo dependeria do preço de venda que lhe viesse a ser proposto pelos apelantes, daqui não deriva que quando o apelado apresentou a proposta de aquisição do prédio pelo valor de 166.020,00 euros, este não tivesse agido na convicção de nesse valor estava incluído o terreno, a vivenda e o anexo construídos nesse prédio, mas com o painel solar que se encontrava instalado nessa vivenda, o anexo com todas as janelas e portas que nele se encontravam instaladas, com o furo de água que se encontrava aberto nesse prédio, o jardim que nele se encontrava instalado, com todas as árvores de fruto e sebes que existiam nesse jardim, com o mobiliário de cozinha, eletrodomésticos e torneiras que existiam nessa cozinha, com a loiça sanitária e torneiras que se encontravam instaladas nas casa de banho e com os radiadores e caldeira do aquecimento central que nela se encontravam instalados.
Na verdade, como já referido e demonstrado, esta era a única ilação que o apelante podia ter legitimamente retirado aquando da apresentação dessa proposta, uma vez que nada em contrário constava do anúncio que publicitou a venda do prédio, nada em contrário lhe foi comunicado pelo administrador de insolvência ou respetivos representantes e, bem assim, nada em contrário lhe foi comunicado, por quem quer que fosse, nomeadamente, pelos apelantes, ou pela filha destes ou respetivo mandatário, quando o mesmo se deslocou em 26/10/2015, pela primeira vez, ao prédio para o vistoriar, como vistoriou, e onde constatou a existência daqueles bens e equipamentos, sequer no dia da abertura de propostas.
Acresce que quando a testemunha P. C., no dia 15/01/2016, já depois da apresentação da proposta pelo apelado e da adjudicação àquele do prédio pelo valor de 166.020,00 euros, que o mesmo propôs pela respetiva aquisição, teve a supra descrita conversa com o último, propondo-lhe que comprasse aos apelantes a caldeira, os radiadores, o painel solar e os móveis de cozinha e respetivos eletrodomésticos que se encontravam instalados na moradia, obtendo dele a resposta também acima já referida, manifestando-lhe disponibilidade para vir adquirir aos apelantes a caldeira, os radiadores, o painel solar e os móveis de cozinha e respetivos eletrodomésticos, tudo dependendo do preço de venda que estes lhe apresentassem, daqui não deriva que o apelado tivesse deixado de ter aquela sua convicção que tinha aquando da apresentação da proposta de aquisição do prédio, mas apenas que ou o apelado não se quis chatear com P. C. e o advogado dos apelantes (até por via do comportamento anteriores que estes já tinham tido perante os potenciais interessados na aquisição do prédio, sendo certo que a escritura de compra e venda do prédio encontrava-se designada para esse mesmo dia 15/01/2016 e caso o apelado a ela faltasse, perdia o valor do sinal já oferecido, não valendo, consequentemente, a pena mais discussões) ou, quando muito, que o mesmo, perante essa conversa de P. C., ficou numa situação de dúvida sobre se aquela sua convicção com que apresentou a proposta (já aceite) era correta e se na compra do prédio estavam ou não efetivamente incluídos a caldeira, os radiadores, o painel solar e os móveis de cozinha e respetivos eletrodomésticos, conforme fora sua convicção acontecer quando apresentou a proposta, situação de dúvida essa que o mesmo cuidou em entretanto esclarecer junto de técnico de direito, nomeadamente, advogado, assim se entendendo a indignação que o mesmo manifestou quando o prédio lhe foi entregue despido daqueles bens (e não só) e a reação que teve junto do administrador de insolvência, enviando-lhe o mail de fls. 26 a 27, que não contestou a posição do apelado, mas antes pediu explicações aos apelantes, ameaçando de os responsabilizar (cfr. fls. 95).
Resulta do que se vem dizendo, que contrariamente ao pretendido pelos apelantes, a prova produzida não impõe que se conclua pela não prova dos factos considerados provados pela 1ª Instância nos pontos 21º, 22º, 39º e 49º, mas antes que a prova desses factos tem pleno cabimento na prova produzida.
Termos em que na improcedência dos enunciados fundamentos de recurso aduzidos pelos apelantes, mantém-se inalteradas as respostas de provado dos factos vertidos nos pontos 21º, 22º, 39º e 49º da sentença recorrida. B.1.4- Impugnação da matéria de facto do ponto 41º dos factos provados na sentença.
A 1ª Instância considerou como provado os seguintes factos:
“41- Só após a venda do imóvel é que os 1ºs RR vieram reivindicar a propriedade sobre 11 radiadores grandes, 3 radiadores de wc (toalheiros), uma caldeira de aquecimento central, 4 casas de banho completas, uma cozinha com eletrodomésticos (placa, exaustor, forno e micro-ondas), 1 painel solar para água, 4 candeeiros exteriores, 5 candeeiros interiores (wc e lavandaria), 2 espelhos, furo de água com motor (5 saídas) com captação de água para o jardim e piscina”.
Insurgem-se os apelantes contra este julgamento, sustentando que esta materialidade fáctica tinha de ser julgada como não provada isto porque dos depoimentos da apelante Maria e da testemunha P. C. e da prova documental junta aos autos, decorre claramente que já antes da venda do imóvel, os apelantes reivindicaram a propriedade sobre os bens identificados nesta resposta, mas apenas com parcial razão.
Na verdade, conforme resulta dos fundamentos probatórios atrás enunciados e analisados, apenas na visita que teve lugar no dia 15/01/2016, os apelantes, através da filha P. C., reivindicaram junto do apelado comprovadamente a propriedade sobre a caldeira, os radiadores, o painel solar e os móveis de cozinha e respetivos eletrodomésticos, pretendo que o apelado lhos comprasse.
Apenas em 17/01/2016, através do mail de fls. 30 e 31, que P. C. enviou ao apelado, é que os apelantes, para além de manterem aquela anterior reivindicação, reivindicaram do apelado acrescidamente a propriedade dos demais bens que se encontram discriminados nesse mail.
Logo, tendo a venda do prédio sido realizada ao apelado no dia 15/01/2016 – vide depoimento de parte e declarações de parte do administrador de insolvência, F. J., nesse sentido, facto esse, confirmado pelo teor dos mails de fls. 21 a 25, onde se vê que a escritura de compra e venda do prédio estava designada para o dia 15/01/2016, pelas 10h00 -, daqui deriva que só após a apresentação da proposta pelo Autor, em 15/01/2016, dia em que foi efetuada a venda do prédio ao Autor, mas antes da celebração da escritura pública de compra e venda, é que os 1ºs Réus vieram reivindicar a propriedade sobre 11 radiadores grandes, 3 radiadores de wc (toalheiros), uma caldeira de aquecimento central, uma cozinha com eletrodomésticos (placa, exaustor, forno e micro-ondas) e dois espelhos, e só após a venda do prédio ao Autor é que os 1ºs Réus vieram reivindicar ainda a propriedade sobre quatro casas de banho completas, um painel solar para água, quatro candeeiros exteriores, cinco candeeiros interiores (wc e lavandaria) e furo de água com motor (cinco saídas), com captação de água para o jardim e piscina.
Nesta conformidade, na procedência parcial deste fundamento de recurso, altera-se a resposta dada ao ponto 41º, que passa a constar dos seguintes factos que se julgam como provados:
41- Só após a apresentação da proposta pelo Autor, em 15/01/2016, dia em que foi efetuada a venda do prédio ao Autor, mas antes da celebração dessa escritura pública de compra, os 1ºs Réus vieram reivindicar junto do Autor a propriedade sobre onze radiadores grandes, três radiadores de wc (toalheiros), uma caldeira de aquecimento central, uma cozinha com eletrodomésticos (placa, exaustor, forno e micro-ondas) e dois espelhos, e só após a venda do prédio ao Autor é que os 1ºs Réus vieram reivindicar junto daquele ainda a propriedade sobre quatro casas de banho completas, um painel solar para água, quatro candeeiros exteriores, cinco candeeiros interiores (wc e lavandaria) e furo de água com motor (cinco saídas), com captação de água para o jardim e piscina.
B.1.5- Impugnação da matéria dos pontos 23º e 24º
Nos pontos 23º e 24º, a 1ª Instância considerou como provados os seguintes factos:
23- Aquando da vistoria ao imóvel, no passado dia 15 de Janeiro de 2016, a filha dos1.ºs RR, P. C., remeteu ao conhecimento do aqui Autor uma listagem de bens, que segundo o entendimento desta, poderiam ser adquiridos pelo aqui Autor, apresentando o respetivo valor: 11 radiadoras grandes – € 2.500,00; 3 radiadores WC (toalheiros) – € 600,00; 1 caldeira de aquecimento central – € 800,00; 4 casas de banho completas – € 4.500,00; 1 cozinha com eletrodomésticos (placa, exaustor, forno e micro-ondas) – € 6500,00; 1 painel solar para a água – € 1.500,00; 4 Candeeiros exteriores – € 30,00; 5 candeeiros interiores (wc e lavandaria) – € 25,00; 2 espelhos – € 100,00; furo de água com motor (5 saídas) com captação de água para o jardim e piscina – € 4.000,00. 24- Bens esses que, na avaliação apresentada, totalizavam a importância de € 21.539,00 (vinte e um mil, quinhentos e trinta e nove euros).
Os apelantes não impugnam os factos assim julgados como provados pela 1ª Instância, mas pretendem que se adite a esses factos ainda o seguinte: que “na oportunidade o Autor não manifestou qualquer oposição ou reação à proposta que lhe foi formulada, nomeadamente alegando que os bens em questão já faziam parte da moradia, estando incluídos no preço por ele proposto”.
Na esteira dos fundamentos probatórios que se vem explanando, incumbe referir que na visita que o apelado fez ao prédio no dia 15/01/2016, os apelantes, através da sua filha, P. C., apenas falou ao apelado dos onze radiadores grandes, três radiadores de wc (toalheiros), uma caldeira de aquecimento central, uma cozinha com eletrodomésticos (placa, exaustor, forno e micro-ondas) e dois espelhos, propondo-lhe que o apelado comprasse aos apelantes esses radiadores, a caldeira de aquecimento central e a cozinha com os eletrodomésticos que nela se encontravam instalados, altura em que o apelado não manifestou efetivamente a P. C. qualquer oposição ou reação à proposta que esta lhe formulou, nomeadamente, alegando que esses bens já faziam parte integrante da moradia, estando incluídos no preço por ele proposto.
Quanto aos restantes bens, da prova produzida, não resulta que P. C. tivesse falado ao apelado dos mesmos, fazendo-o apenas no mail de fls. 30 e 31.
Deste modo, a prova produzida apenas consente que se conclua pela parcial procedência deste fundamento de recurso.
Nesta conformidade, na procedência parcial do enunciado fundamento de recurso, determina-se que seja aditada à matéria de facto julgada como provada o seguinte ponto, cujos factos se julgam como provados:
55- Na oportunidade referida em 23º e 24º, quando P. C. falou ao Autor, em 15/01/2016, antes da celebração da escritura de compra e venda do prédio, nos termos relatados em 41º, dos onze radiadores grandes, três radiadores de wc (toalheiros), uma caldeira de aquecimento central, uma cozinha com eletrodomésticos (placa, exaustor, forno e micro-ondas) e dois espelhos, propondo-lhe que comprasse aos 1ºs Réus esses radiadores, a caldeira de aquecimento central e a cozinha com os eletrodomésticos, o Autor não manifestou a P. C. qualquer oposição ou reação à proposta que esta lhe formulou, nomeadamente, alegando que esses bens já faziam parte integrante da moradia, estando incluídos no preço por ele proposto.
B.1.6- Impugnação da matéria da alínea F dos factos julgados não provados na sentença.
A 1ª Instância deu como não provado que “os referidos bens foram colocados pelos 1ºs Rés no imóvel após lhes ter sido entregue o mesmo pelo legal representante da insolvente”.
Os apelantes imputam erro de julgamento à 1ª Instância, alegando que os depoimentos das testemunhas J. S., J. M., M. A. e J. J. resulta que os bens foram colocados e integralmente pagos pelos apelantes no prédio, após lhes ter sido entregue pelo legal representante da insolvente.
Refira-se que é certo que a testemunha J. S. confirmou que perante as queixas do apelado, quando o prédio lhe foi entregue em 29/01/2016, destituído dos bens e equipamentos que se encontram discriminados no ponto 19º dos factos julgados provados na sentença, a filha dos apelantes, a testemunha P. C., e o advogado dos últimos, afirmaram que esses bens tinham sido instalados no prédio apelantes, que também os tinham pago e que, por isso, aqueles os tinham retirado em virtude de serem seus proprietários.
Esta versão dos factos, como já referido, é reafirmada pelos apelantes na sua contestação e foi apresentada pela apelante Maria, no depoimento de parte que prestou em sede de audiência final e, bem assim, pela filha dos apelantes, a testemunha P. C..
Também é um facto que a testemunha J. M. confirmou que a cozinha e os respetivos eletrodomésticos lhe foram encomendados e pagos pelos apelantes.
Igualmente a testemunha M. A. referiu terem sido os apelantes que lhe pagaram a caldeira e os radiadores, mas que o preço da instalação destes, assim como o preço de instalação das loiças das casas de banho lhe foram pagas pela insolvente X, apesar de sempre ter ouvido terem sido igualmente os apelantes que pagaram ao respetivo fornecedor as loiças sanitárias instalada nas casas de banho.
Finalmente, a testemunha J. J. relatou que o furo e respetiva bomba lhe foram pagos pelos apelantes.
No entanto, os identificados J. J., M. A. e J. M. foram concordantes entre si em afirmar que a abertura do furo, a instalação dos radiadores e da caldeira e, bem assim das instalações sanitárias das casas de banho, bem como a instalação dos móveis de cozinha e respetivos eletrodomésticos, tiveram lugar em 2009, isto é, antes dos apelantes terem ido residir para aquela residência, indo o depoimento da testemunha P. C. em igual sentido, dado que esta afirma que os apelantes e os filhos foram residir para o prédio em 2010.
Acresce que conforme se vê dos documentos remetidos pela Câmara Municipal de … de fls. 129 a 138, a moradia que foi erigida no prédio apenas obteve licença de utilização em 15/12/2010, e todo o processo de licenciamento, incluindo a ficha técnica de fls. 133 verso a 138 foi apresentada em nome da insolvente “Construções X”.
Deste modo, a prova produzida não impõe que se conclua que aquele furo, os radiadores, a caldeira, as loiças sanitárias instaladas nas casas de banho da moradia e a mobília de cozinha e respetivos eletrodomésticos, tivessem sido nela instalados após o prédio ter sido entregue aos apelantes pelo legal representante da insolvente “X”, até porque, reafirma-se, os apelantes e família foram residir para esse prédio em 2010, quando, em função da prova produzida, aquele furo já se encontrava aberto e quando os radiadores, caldeira, loiças sanitárias, mobília de cozinha e respetivos eletrodomésticos, já se encontram instalados e essa moradia apenas veio a obter licença de utilização em 15/12/2010, quando o processo de licenciamento foi apresentado em nome da insolvente, que foi quem em 05/11/2010, requereu a emissão dessa licença.
Acresce precisar que apesar de terem sido os apelantes que pagaram a abertura do furo e a instalação da respetiva bomba à testemunha J. J. e terem sido os mesmos que pagaram os móveis de cozinha e respetivos electrodomésticos à testemunha J. M. e, bem assim, pagaram a caldeira e os radiadores à testemunha M. A. e desta testemunha sempre ter ouvido falar que foram aqueles que, igualmente, pagaram as loiças instaladas na casa de banho ao respetivo fornecedor, verifica-se que já a instalação dessa caldeira, radiadores, loiças de casa de banho foram pagas pela insolvente “X” a M. A..
Apesar desses pagamentos feitos pelos apelantes àquelas testemunhas, é manifesto que estas desconhecem que concretos negócios intercederam entre os apelantes e a insolvente “X” e que eventualmente estão na base desses pagamentos que lhes foram feitos pelos apelantes.
Acresce que apesar da apelante Maria e da testemunha P. C. pretenderem que os apelantes pagaram à insolvente 300.000,00 euros como preço de aquisição da moradia, verifica-se que estes vieram a celebrar transação no âmbito do processo de insolvência, em que reduziram o pretenso crédito de 300.000,00 euros, que reclamaram, para 92.000,00 euros (cfr. fls. 77 verso e 78) e não reclamaram, nesse processo de insolvência, quaisquer créditos por eventuais benfeitorias que tivessem realizado nesse prédio, como certamente não o deixariam de fazer caso, uma vez feitos aqueles pagamentos, tivessem suportado efetivamente, isto é, do seu bolso, aquelas despesas.
Neste contexto, é indiscutível que a prova produzida não impõe que se conclua pela prova da materialidade vertida na alínea F dos factos considerados não provados na sentença recorrida, mas antes essa não prova tem pleno cabimento na prova produzida, onde sobram fundadas e manifestas dúvidas sobre as relações que intercederam entre apelantes e a insolvente e o que aqueles efetivamente pagaram à última e/ou por conta do prédio.
Termos em que na improcedência dos enunciados fundamentos de recurso, mantém-se inalterada a resposta de não provada em relação à matéria vertida na alínea F dos factos considerados não provados na sentença recorrida.
Introduzidas as alterações supra identificadas à matéria de facto considerada provada e não provada na sentença recorrida, resta verificar se a mesma padece dos erros de direito quanto à decisão de mérito nela proferida que lhe são assacados pelos apelantes.
B.2. Do mérito.
Tendo adquirido a propriedade sobre o prédio urbano melhor identificado no ponto 2º dos factos apurados na sentença recorrida, no âmbito do processo de insolvência da sociedade “Construções X, Unipessoal, Lda.”, por negociação particular, mediante propostas em sobrescrito fechado, abertas em 06/11/2011, onde a sua proposta foi aceite e o prédio lhe foi adjudicado nesse dia, pelo valor que propôs de 166.020,00 euros, após ter, em 26/10/2015, visitado e vistoriado esse prédio, a fim de aquilatar do seu interesse na aquisição do mesmo e do preço que se propunha oferecer pela respetiva aquisição, e tendo esse prédio sido entregue ao apelado em 29/01/2016, após em 15/01/2016 ter sido celebrada a escritura de compra e venda entre aquele e o administrador de insolvência, sem os bens que se encontram identificados nos pontos 19º e 27º a 29º dos factos provados na sentença, que os apelantes, retentores desse prédio retiraram deste quando o entregaram, pretende o apelado, a título principal, obter a condenação judicial dos apelantes a repor o prédio no estado em que se encontrava à data da apreensão, vistoria e adjudicação, repondo naquele os bens que dele retiraram ou, subsidiariamente, caso essa reposição não seja possível, lhes pague o valor desses bens.
Na sentença recorrida condenou-se os apelantes a pagar ao apelado o valor dos bens que retiraram do prédio, reconhecendo-se, assim, que a reposição in natura dos bens retirados não era possível, o que não é colocado em crise pelos apelantes na presente apelação e daí que esta concreta questão, porque não suscitada, se encontre ultrapassada.
O que os apelantes contestam no presente recurso é a natureza desses bens, sustentando que, diversamente do propugnado na sentença recorrida, não se está perante partes integrantes ou componentes do prédio vendido pela massa insolvente ao apelado, mas perante simples recheio do mesmo e daí que sendo os mesmos proprietários desse recheio, podiam retirá-lo, como fizeram, não colhendo a tese segundo a qual lhes assistia o direito de reclamarem o respetivo valor, a título de benfeitorias, no âmbito do processo de insolvência.
Mais contestam que esse pretenso recheio tivesse sido considerado à data da apreensão, vistoria e adjudicação do prédio ao apelado e tivesse sido considerado pelo último no valor de aquisição que propôs pela aquisição da propriedade desse prédio, argumentando que o administrador de insolvência procedeu à apreensão do mesmo sem que se tivesse, ou os seus colaboradores, deslocado ao mesmo, pelo que naturalmente não pôde considerar aquele recheio, cuja existência, inclusivamente, desconhecia, e que o perito avaliador por ele contratado para proceder à sua avaliação em sede de liquidação do ativo, com vista a efetuar-se a venda deste, não teve igualmente oportunidade de entrar no interior da moradia que se encontrava erigida no prédio, pelo que também desconhecia qual o respetivo recheio e, consequentemente, não considerou, sequer podia considerar, na avaliação que fez do prédio os bens identificados nos enunciados pontos 19º e 27º a 29º dos factos apurados.
Quanto ao apelado, sustentam que conforme resulta dos factos atrás descritos e da circunstância deste ter aceitado a proposta de aquisição que lhe foi apresentada pelos apelantes, através da filha destes, P. C., antes de se concretizar a compra e venda do prédio, para que comprasse aos últimos aqueles bens, sem que tal proposta lhe tivesse merecido qualquer oposição, aquele não só aceitou que se está perante simples recheio do prédio que comprou, como estão excluídos dessa aquisição, como demonstrou que sempre teve perfeito conhecimento que esses bens eram recheio do prédio, não tinham sido apreendidos, aquando da apreensão do prédio a favor da massa insolvente, sequer foram considerados na avaliação feita ao prédio, sequer ainda foram considerados pelo próprio apelado no valor que propôs para aquisição desse prédio, concluindo que, ao instaurar a presente ação, o apelado atua em abuso de direito, na modalidade de venire contra factum proprium, e litiga de má fé.
Como consequência, os apelantes imputam erro de direito à decisão de mérito proferida na sentença recorrida ao condená-los a pagar ao apelado o valor desse pretenso recheio e quando absolveu o último do pedido de condenação como litigante de má fé.
Sendo estes os traços do inconformismo dos apelantes quanto à decisão de mérito proferida na sentença e ao qual esta Relação vê cingido o seu campo de cognição e de decisão, verifiquemos se assiste razão aos apelantes nas críticas que assacam à decisão de mérito proferida na sentença.
Compulsados os factos apurados sob os pontos 2º, 3º, 4º, 52º e 39º, provou-se que no âmbito do processo de insolvência que correu termos em relação à sociedade “Construção X, Unipessoal, Lda.”, e onde esta foi declarada insolvente por sentença de 10/03/2015, o administrador de insolvência, no exercício das suas funções, procedeu à apreensão à ordem da massa insolvente do prédio urbano, composto por casa de cave, rés-do-chão, andar e logradouro, sito em ..., Rua Dr. ..., em relação ao qual foi reconhecido direito de retenção a favor dos apelantes, tendo essa apreensão ocorrido sem que tivesse sido efetuada qualquer deslocação ao prédio por parte do administrador de insolvência ou seus colaboradores, tendo o mesmo sido apreendidos no exato estado em que se encontrava, com os bens componentes e integrantes que já existiam à data da apreensão.
Mais se apurou que no âmbito das diligências de liquidação do ativo, o administrador de insolvência promoveu a venda desse prédio, tendo para o efeito contratado um perito avaliador para que procedesse à avaliação daquele, o qual efetuou essa avaliação sem que tivesse acedido ao interior da moradia que se encontra construída no mesmo e sem que tivesse, por isso, considerado os concretos móveis de cozinha, os eletrodomésticas, torneiras, loiças sanitárias, caldeira de aquecimento e radiadores que se encontravam no interior dessa moradia, mas considerando bens idênticos, posto que foi no pressuposto que o painel solar, as janelas e portas do anexo, o furo de água, as árvores de frutos e sebes que existiam no jardim do prédio à data da sua apreensão e avaliação e que a moradia construída nesse prédio se encontrava dotada de cozinha completa, com eletrodomésticos e torneiras instaladas, casa de banho completas, radiadores a caldeiras instalados, e que tudo fazia parte do prédio a avaliar, que o perito o avaliou em 180.000,00 euros (pontos 19º, 39º, 40º, 49º, 53º e 54º dos factos apurados).
Também se apurou que feita essa avaliação, o administrador de insolvência determinou que a venda se processasse por negociação particular, mediante a apresentação de propostas em sobrescrito fechado, anunciando como valor base de venda o valor de 180.000,00 euros, e como valor mínimo de venda o valor de 153.000,00 euros, agendando o dia 26/11/2015 para mostra do prédio e o dia 06/11/2015, para abertura dos sobrescritos (cfr. anúncio de fls. 12 verso dos autos e pontos 5º a 7º da matéria apurada).
Apurou-se que nesse dia 26/11/2015, o apelado visitou e vistoriou o prédio, altura em que este apresentava cozinha equipada com mobiliário e eletrodomésticos, casas de banho equipadas com materiais e louças recentes, radiadores de aquecimento e toalheiros de aquecimentos, radiadores de aquecimento em todos os compartimentos, caldeira e painel solar, anexo fechado com porta e janela, furo de água e jardim com árvores de fruto e vedado com sebes, bens estes que ainda se encontravam nesse prédio em 15/01/2016, quando o apelado vistoriou, pela segunda vez o prédio, já após este lhe ter sido adjudicado, mas que os apelantes dele retiraram quando lho entregaram (cfr. pontos 8º e 12º a 19º dos factos apurados).
Ainda se apurou que porque o prédio apresentasse o estado de conservação e as características que iam ao encontro das necessidades e interesses do apelado, este apresentou proposta de aquisição do prédio, no valor de 166.020,00 euros, tendo sido no pressuposto que o prédio lhe seria entregue nos exatos termos em que se encontrava à data da apreensão, à data da mostra e à data da compra e venda, esta celebrada em 15/01/2016, isto é, dotado das louças sanitárias das casas de banho, de bancas, mobiliário de cozinha, torneiras e eletrodomésticos, pré instalação de aquecimento, respetivos radiadores de aquecimento, com a respetiva caldeira de aquecimento e de um painel solar, o anexo estar fechado com portas e janelas, com o furo de água aberto e com as árvores e da sebe que existiam no jardim, que aquele fez a proposta de 166.020,00 euros, a qual foi aceite, tendo-lhe o prédio sido adjudicado pelo identificado valor de 166.020,00 euros em 06/11/2015 (cfr. pontos 9º a 11º, 21º, 22º e 41º dos factos apurados).
Também se apurou que, aquando da segunda vistoria que o apelado realizou ao prédio, em 15/01/2016, a filha dos apelantes, P. C., propôs ao apelado, antes da celebração da escritura de compra e venda do prédio (escritura essa celebrada em 15/01/2016), que este comprasse aos apelantes os radiadores, a caldeira de aquecimento central e a cozinha com os eletrodomésticos que se encontravam instalados na vivenda, ao que o apelante não manifestou qualquer oposição ou reação, nomeadamente, não alegou que esses bens já faziam parte integrante da moradia, estando incluídos no preço por ele proposto, vindo P. C. a remeter-lhe uma listagem de bens, que segundo o entendimento desta, poderiam ser adquiridos pelo apelado, apresentando o respetivo preço (11 radiadores grandes – 2.500,00 euros; 3 radiadores WC (toalheiros) – 600,00 euros; 1 cadeira de aquecimento central – 800,00 euros; 4 casas de banho completas – 4.500,00 euros; 1 cozinha com eletrodomésticos (placa, exaustor, forno e micro-ondas) – 6.500,00euros; 1 painel solar para a água – 1.500,00 euros; 4 candeeiros exteriores – 30,00 euros; 5 candeeiros interiores (wc e lavandaria) – 25,00 euros; 2 espelhos – 100,00 euros; furo de água com motor (5 saídas) com captação de água para o jardim e piscina – 4.000,00 euros).
Apurou-se que apenas após o apelado ter apresentado a sua proposta de aquisição do prédio e deste lhe ter sido adjudicado por essa proposta, mas antes da celebração da escritura pública de compra e venda, mais concretamente, em 15/01/2016, é que os apelantes vieram a reivindicar junto do apelado a propriedade sobre os onze radiadores grandes, três radiadores de wc (toalheiros), uma caldeira de aquecimento central, uma cozinha com eletrodomésticos (placa, exaustor, forno e micro-ondas) e dois espelhos que se encontravam instalados na vivenda construída no prédio, e que, inclusivamente, apenas após a celebração da escritura de compra e venda do prédio, os apelantes vieram reivindicar daquele a propriedade sobre a loiça sanitária das casas de banho, sobre o painel de água, quatro candeeiros exteriores, cinco candeeiros interiores (wc e lavandaria) e furo de água com motor (cfr. pontos 23º, 41º, 55º, 10º e 11º dos factos provados).
Finalmente, apurou-se que tendo os apelantes entregue o prédio ao apelado em 29/01/2016, os mesmos, com o argumento de que se tratavam bens de sua propriedade, retiraram as janelas e portas do anexo, deixando-o totalmente aberto; retiraram as louças sanitárias das casas de banho e substituíram outras por louças de fraca qualidade e mais antigas; retiraram a cozinha, que ficou completamente despida de mobiliário, designadamente a banca, armários, eletrodomésticos e torneiras de água; removeram a caldeira do aquecimento central, os radiadores e o painel solar; taparam com pedras e terra o furo de água existente no prédio e cortaram as árvores de fruto e as sebes do jardim, entregando ao apelado o prédio comprado sem estes bens e equipamentos (cfr. pontos 18º, 19º, 27º a 29º e 51º dos factos apurados).
Ante as questões que se encontram submetidas pelos apelantes à apreciação desta Relação, tendo estes retirado do prédio comprado pelo apelado:
- as janelas e portas do anexo;
- as loiças sanitárias;
-os móveis de cozinha, com os respetivos eletrodomésticos e torneiras,
- a caldeira do aquecimento central, radiadores e o painel solar;
- tapado o furo e
- cortado as árvores e sebes do jardim,
tudo bens que existiam no prédio quando este foi apreendido à ordem da massa insolvente, quando este foi avaliado, quando foi anunciada a respetiva venda no âmbito do processo de insolvência, quando o prédio foi mostrado ao apelado e aos demais potenciais interessados na respetiva compra e quando o apelado apresentou a sua proposta de aquisição e viu-lhe este adjudicado pelo valor que propôs, com o argumento de que esses bens eram sua propriedade e que constituíam recheio, está em causa nos autos a qualificação jurídica desses bens, no sentido de se saber se, tal como se entendeu na sentença recorrida, os mesmos são partes integrantes ou componentes do prédio vendido ou se antes se trata de recheio.
Depois, independentemente da resposta que possa merecer a questão anterior, está em causa saber-se se o prédio foi apreendido à ordem do processo de insolvência com a convicção de que aqueles bens integravam esse prédio; se o valor desses bens foi ou não considerado na avaliação do prédio e por cujo valor aquele foi colocado à venda no âmbito do processo de insolvência; se esses bens foram ou não considerados pelo apelado na proposta que apresentou no âmbito do processo de insolvência e, finalmente, quais os reflexos jurídicos decorrentes para os presentes autos caso essa convicção seja errónea.
Finalmente, está em causa a apreciação do comportamento tido pelo apelado no dia 15 de janeiro de 2016, que, aquando da segunda visita que fez a esse prédio, perante a proposta que lhe foi apresentada pela filha dos apelantes no sentido de que comprasse aos últimos os radiadores, a caldeira de aquecimento central, o mobiliário de cozinha, com os respetivos eletrodomésticos e dois espelhos, não manifestou àquela qualquer oposição ou reação, nomeadamente, não alegando junto desta que esses bens faziam parte integrante da moradia, estando incluídos no preço por ele proposto, designadamente, se perante esse comportamento, ao intentar a presente ação, o apelado atua em abuso de direito na modalidade de venire contra factum proprium, e se litiga de má fé.
Como é sabido, o art. 874º do CC, define compra e venda como o contrato pelo qual se transmite a propriedade de uma coisa, ou outro direito, mediante um preço.
Trata-se de um contrato bilateral, oneroso e sinalagmático, que tem como efeitos essenciais a obrigação do vendedor de transmissão da propriedade da coisa ou da titularidade do direito alienado; a obrigação do vendedor de entregar a coisa ao comprador e a obrigação deste de pagar ao vendedor o preço (art. 879º do CC), intercedendo entre obrigações de vendedor e de comprador um nexo sinalagmático, posto que as obrigações que impendem sobre uma das partes têm como correspetivo as obrigações que impendem sobre a outra.
A coisa que foi vendido ao apelado foi o prédio urbano, composto por casa de cave, rés-do-chão, andar e logradouro, melhor identificado no ponto 2º dos factos apurados.
Nos termos do n.º 2 do art. 882º do CPC, na compra e venda, a obrigação de entrega da coisa vendida, salvo estipulação em contrário, abrange as partes integrantes, os frutos pendentes e os documentos relativos à coisa ou direito.
Por sua vez, a noção de “coisa” consta do n.º 1 do art. 202º do CC, onde se dispõe que coisa é tudo aquilo que pode ser objeto de relações jurídicas.
Para além de outras classificações possíveis, as coisas podem ser categorizadas em móveis ou imóveis (art. 203º do CC).
Note-se que o CC não dá uma definição de “coisa móvel” ou “imóvel”, mas limita-se a enunciar, no art. 204º do CC, quais as coisas que categoriza, de modo taxativo, de “coisa imóvel”, de onde resulta que são móveis todas as coisas que não se integram no elenco do art. 204º (art. 205º, n.º 1 do CC).
Esta opção legislativa assenta no reconhecimento pelo legislador que muito embora a esta categorização presida a ideia fundamental que aquelas devem ser qualificadas como móveis ou imóveis, conforme possam, respetivamente, ser ou não transportadas de um lugar para o outro, que essa “conceção física de coisa” é insuficiente para a noção jurídica, posto que deixa de fora as coisas imateriais, não corpóreas, como a energia elétrica, e não explica o fenómeno jurídico que leva que, determinadas coisas, ainda que do ponto de vista natural, quando consideradas em si mesmas, devam ser qualificadas como “coisas móveis”, uma vez incorporadas em determinada “coisa imóvel”, percam essa sua individualidade e autonomia e adquiram a natureza do imóvel em que se incorporam (13).
Nos termos do n.º 1 do art. 204º do CC, são coisas imóveis: a) os prédios rústicos e urbanos; b) as águas; c) as árvores, os arbustos e os frutos, enquanto estiverem ligadas ao solo; d) os direitos inerentes aos mencionados nas alíneas anteriores; e e) as partes integrantes dos prédios rústicos e urbanos.
Por sua vez, a definição de prédio rústico e de prédio urbano, consta do n.º 2 daquele preceito, em que se estipula entender-se por “prédio rústico” uma parte delimitada do solo e as construções nele existentes que não tenham autonomia económica, e por “prédio urbano” qualquer edifício incorporado no solo, com os terrenos que lhe sirvam de logradouro.
A noção de “parte integrante” de prédio rústico e urbano consta do n.º 3, onde se estatui que é parte integrante toda a coisa móvel ligada materialmente ao prédio com caráter de permanência.
Tendo a compra e venda objeto dos presentes autos incidido sobre um prédio urbano, importa retermo-nos na noção de prédio urbano.
A noção de prédio urbano, tal como resulta do n.º 2 do art. 204º, pressupõe um edifício, que esse edifício esteja incorporado no solo.
Note-se, no entanto, que para a noção de prédio urbano, não basta ou é suficiente que sobre determinado terreno se encontre construído um “edifício”, posto que os prédios rústicos incidem sobre terreno/solo, onde também podem constar edificadas construções, incorporadas em parte do solo do prédio, sem que daqui resulte a perda da natureza rústica do prédio, contanto que essas construções não tenham autonomia económica em relação ao terreno, como será o caso, de construções erigidas sobre um determinado terreno agrícola, para nelas serem acondicionadas as máquinas agrícolas, gado, etc..
Como realça Manuel Andrade, embora à noção de prédio urbano seja imprescindível a construção de um “edifício”, para estes efeitos, “não constitui edifício toda e qualquer construção – como seja um muro, uma cerca, uma coluna ou série de colunas – mas tão-só a que se possa denominar-se casa, quaisquer que sejam os materiais de que é feita, ou a sua forma, proporções e destino. Por casa entender-se-á a construção que limite o solo por todos os lados, incluindo o espaço aéreo correspondente, por meio de telhado ou qualquer outra cobertura”. Depois, para que um edifício possa ser categorizado como prédio urbano “importa ainda que esteja «incorporado no solo», o que significa que aquele tem de se encontrar “unido ou ligado ao solo, fixado nele direta ou indiretamente, pelos alicerces ou por colunas, estacas ou qualquer outro meio” não bastando que esteja pousado no terreno, como acontece com as casas de madeira desmontáveis (14).
Precise-se, porém, que ao dizer-se que para efeitos de categorização de uma porção de terreno como prédio urbano, nela tem de estar incorporado um “edifício” a que possa denominar-se “casa”, não se quer significar que apenas os edifícios que se destinam a servir de habitação, e que, por conseguinte, em termos de linguagem comum são correntemente designadas de “casas”, integram a noção de “edifício”.
Por “edifício” e por “casa”, para efeitos de qualificação jurídica do prédio como urbano, deve entender-se uma construção que pode servir para fins diversos da habitação, como sejam atividades comerciais ou industriais, arrecadações de produtos, etc., mas que tem de ser necessariamente constituída por paredes que delimitam o solo e o espaço por todos os lados, por uma cobertura superior (telhado ou terraço), normalmente por paredes divisórias e podendo ter um ou vários pisos (15).
Diremos que a distinção entre prédio rústico e urbano passa pela determinação do elemento preponderante.
Se o prédio é constituído preponderantemente por terreno (solo), isto é, se o que releva economicamente é o terreno, ou seja, o solo, e neste existem construções, ainda que construídas/incorporadas no solo (em parte), mas sem autonomia económica em relação ao terreno/solo, mas antes estando afetos ao fim económico a que se destina esse terreno (ex: edifícios para guardar o gado ou as alfaias agrícolas), então esse terreno e as construções que nele se encontram erigidas constituem civilisticamente um prédio rústico.
Essas construções são meras partes componentes do prédio rústico porque não têm autonomia económica em relação ao terreno/solo.
Ao invés, se o elemento preponderante, do ponto de vista económico, é o edificado, estando o restante terreno adjacente funcionalizado em relação ao edificado/casa, servindo-lhe de jardim, quintal ou pátio, então o prédio deve civilisticamente ser categorizado como prédio urbano.
Note-se que o prédio, quer seja rústico, quer seja urbano, não abrange apenas o solo e as construções nele incorporadas conforme se poderia pensar a partir do enunciado art. 204º, mas também abrange o espaço aéreo correspondente à superfície, bem como o subsolo, com tudo o que nele se contém e não esteja desintegrado do domínio por lei ou negócio (art. 1344º, n.º 1 do CC).
Acresce precisar que embora a água que brote no prédio (rústico ou urbano) ou que exista no respetivo subsolo seja qualificada como coisas imóvel (al. b), do n.º 1 do art. 204º do CC), decorre daquele art. 1344º, n.º 1 do CC e é pacífico o entendimento que a água enquanto não for desintegrada da propriedade superficiária, são partes componentes do respetivo prédio, tal como a terra, as pedras, etc., fazendo parte do respetivo subsolo, onde se encontra o respetivo lençol freático. Apenas quando desintegradas, as águas adquirem autonomia e são consideradas, de per si, imóveis (16).
O que se acaba de dizer em relação à água é igualmente válido em relação às árvores, aos arbustos e aos frutos naturais, embora estes, quando desintegrados do solo, sejam móveis.
As árvores, arbustos e frutos naturais apesar de serem categorizados pela al. c), do n.º 1 do art. 204º, como coisas imóveis enquanto estiverem ligados ao solo, adquirem a natureza de coisa móvel quando deles desintegrados ou quando sejam objeto de contrato para no futuro serem dele separados, tendo-se em conta, portanto, não o seu estado atual, mas o seu estado futuro, como é o caso de compra e venda de árvores para serem cortadas, ou a compra e venda da fruta existente nas árvores de determinado pomar, em que a perda da natureza de bem imóvel apenas é perdida e essas árvores, arbustos e/ou frutos passam a ser considerados coisa móvel, quando cortadas e, portanto, desintegradas do prédio.
Por conseguinte, a transferência da respetiva propriedade para o madeireiro que comprou as árvores de determinada floresta ou para o terceiro que adquiriu a fruta de determinado pomar apenas se dá no momento da separação daquelas coisas do prédio ao qual se encontram ligadas (art. 408º, n.º 2 do CC).
Até ao momento da separação, o terceiro apenas tem um direito de crédito sobre o alienante das árvores e da fruta e se este último vender o prédio, sem convencionar com o comprador do prédio que essa venda não engloba as árvores, arbustos e/ou os frutos antes vendidas ao terceiro, a propriedade destes transfere-se para o comprador do prédio, juntamente com a propriedade deste, restando ao terceiro que antes comprara as árvores da floresta ou os frutos do pomar, reclamar uma indemnização ao vendedor, por incumprimento contratual, ao não ter cuidado em excluir da posterior venda do prédio que realizou e em que se situava essa floresta ou pomar aquelas árvores e fruta que antes lhe tinha vendido.
Assim, ao categorizar as árvores, arbustos e os frutos naturais autonomamente como coisas imóveis, enquanto não separados do solo, foi propósito do legislador estabelecer uma “conexão material” desses produtos em relação ao prédio ao qual se encontram ligados, subordinando juridicamente esses produtos a esse prédio, de modo que salvo acordo das partes em contrário, a transmissão do prédio, determina que essa transmissão implique igualmente a transferência da propriedade sobre as árvores, arbustos e frutos naturais nele existentes e a cujo solo se encontrem ligados para o adquirente (art. 880º e 882º, n.º 2 do CC).
Destarte, salvo convenção de vendedor e comprador do prédio em contrário, árvores, arbustos e frutos naturais existentes neste e que se encontrem ligados ao respetivo solo, formam com o prédio a que se encontrem, física e materialmente, ligados, uma única unidade, um único prédio, ficando, por consequência abrangidos pelas relações jurídicas que incidam sobre esse prédio (17).
Acresce precisar que quer o prédio rústico, quer o urbano, abrange as suas partes componentes e, bem assim, as suas partes integrantes.
As “partes componentes” são aquelas coisas que fazem parte da estrutura do próprio prédio e sem as quais este não está completo ou é impróprio para o uso a que se destina, como é o caso das portas, janelas, vigamentos, telhas e clarabóias.
Já são “partes integrantes aquelas que não chegam a ser elementos da própria estrutura do prédio, que sem elas não deixaria de existir completo e prestável para o uso a que se destina. Só que aumentam a utilidade do mesmo, enquanto servem para o tornar mais produtivo, ou para a sua maior segurança, comodidade ou embelezamento. Estão postas ao serviço do prédio. Desempenham relativamente a ele uma função auxiliar ou instrumental. Mas sucede que ao mesmo tempo é assim, convertidas em partes integrantes dum imóvel, que estas coisas, móveis de sua natureza, conseguem realizar – ou realizam melhor – a sua própria finalidade económica” (18) É o caso dos esteios e ferros de uma ramada, os motores elétricos, a instalação de água e de luz, o aquecimento central (19).
Note-se, porém, que para que determinada coisa móvel ligada materialmente ao prédio e que não faça parte da sua estrutura seja considerada “parte integrante” deste, não basta que essa coisa aumente a utilidade do prédio, mas é ainda necessário que esta esteja ligada àquele “com carácter de permanência”, isto é, de perpetuidade.
Desta feita, para ser considerada parte integrante do prédio, para além dessa coisa ter de ser por natureza móvel; exige-se que esteja ligada materialmente ao prédio, isto é, tem de estar fixada, presa ou unida ao mesmo e não apenas em contacto físico com o prédio; reclama-se que essa ligação entre a coisa e prédio tenha carácter permanente, não bastando uma destinação transitória ou ocasional, mas é imprescindível que a ligação revista uma certa estabilidade, que tenha caráter duradoiro.
Esta permanência, significa que a coisa tem de adquirir o carácter de pertença ao prédio, estando adstrita à satisfação de necessidades permanentes deste, exteriorizando-se essa permanência na situação de facto criada entre ambos e, por outro lado, exige-se que essa ligação tenha carácter de perpetuidade, isto é, que não tenha um limite temporal a não ser aquele que derive das próprias leis físicas (20).
Não obstante isto, impõe-se ter presente que casos existem em que determinadas coisas móveis ligadas materialmente ao prédio e que estão adstritas ao serviço deste, aumentando-lhe a utilidade, mas em que falta o requisito da permanência dessa ligação, ainda assim têm de ser consideradas como constituindo partes integrantes do prédio por razões de ordem administrativa ou de sanidade pública.
Porque essas coisas móveis não podem nos termos da lei deixar de existir nos prédios urbanos, as mesmas, não obstante a ausência dessa ligação permanente entre coisa e prédio, têm de ser impreterivelmente de ser consideradas partes integrantes do prédio urbano ao qual se encontram ligadas, fazendo parte do prédio urbano (21).
Uma última precisão, construções ou edificações existem que em si reúnem características que permitiriam, em abstrato, classificá-las autonomamente como prédios, mas em que essa classificação autónoma deve ser excluída por se verificar que as mesmas não têm autonomia económica em relação ao solo em parte do qual se encontram incorporadas, devendo, por isso, o solo e todas as construções construídas em parte daquele, mas sem independência económica em relação àquele, dada essa dependência, serem classificadas como um único prédio rústico.
Do mesmo modo, o edifício/casa incorporado no solo e as demais construções nele incorporadas, mas sem autonomia económica em relação ao primeiro, como é o caso dos anexos, bem como a parcela de terreno, também funcionalizado ao edifício/casa, servindo-lhe de jardim, quintal ou pátio, devem ser considerados um único prédio urbano.
Trata-se de situações em que se está perante uma única unidade principal, uma única unidade estrutural e, consequentemente, um único prédio (22).
Feitas as enunciadas precisões teóricas, revertendo ao caso em análise, nele apurou-se que os apelantes retiraram do prédio comprado pelo apeladoas janelas e as portas do anexo.
Um anexo está economicamente funcionalizado (tal como acontece com o solo que serve de jardim, quintal ou pátio) ao edifício incorporado no solo do prédio urbano comprado pelo apelado, isto é, à vivenda.
Vivenda, anexo e jardim constituem uma única unidade predial, isto é, o prédio urbano que o apelado comprou (23).
As janelas e as portas do anexo fazem parte da própria estrutura desse anexo, sem o qual este não pode ser considerado completo, por ser inapto à realização da sua função típica.
Logo, as janelas e as portas que os apelantes retiraram do anexo, são suas partes componentes e, por conseguinte, são partes que formam o prédio comprado.
Ao retirar essas janelas e portas do anexo, os apelantes lesaram o direito de propriedade do apelado sobre o prédio que comprou (art. 1305º do CC), pelo que lhes incumbe, tal como decidido na sentença, nos termos do disposto no art. 483º, n.º 1 do CC, indemnizar o apelado pelos prejuízos sofridos em consequência da retirada dessas partes componentes do prédio.
Sendo a reposição in natura dessas janelas e portas inviável, tal como decidido, impõe-se a condenação dos apelantes no pagamento ao apelado do respetivo valor.
Os apelantes retiraram as loiças sanitárias das casas de banho que existiam no prédio comprado pelo apelado e substituíram-nas por outras.
As loiças sanitárias são do ponto de vista natural coisas móveis, mas foram aplicadas nas casas de banho da vivenda que se encontra construída no prédio urbano comprado pelo apelado.
Diversamente do que acontece com a tijoleira, os azulejos, o parquet ou o soalho que sejam pousados/aplicados sob a laje que serve de piso da casa e que, por isso, não servem de sustento/lage, em que estes elementos não fazem parte da estrutura da vivenda, mas apenas servem para o embelezar e acrescentar comodidade e valor, sendo, por isso, partes integrantes do prédio, as loiças sanitárias, na nossa perspetiva, fazem parte da própria estrutura da vivenda construída no prédio, uma vez que sem estas, não se pode considerar que aquela esteja completa e própria para o uso a que se destina.
Logo, as loiças sanitárias são partes componentes do prédio urbano comprado pelo apelado, pelo que nenhuma crítica nos merece a sentença recorrida, quando nela se condena os apelantes a pagarem ao apelado o valor da loiça sanitária retirada e substituída.
Os apelantes retiraram a caldeira do aquecimento central, os radiadores e o painel solar existentes no prédio urbano comprado pelo apelado.
A caldeira de aquecimento central serve para aquecer a água que vai ser fornecida aos radiadores, os quais, por sua vez, servem para aquecer o ar das divisões da vivenda.
O painel solar serve para aquecer a água fornecida à cozinha e casas de banho da vivenda.
Trata-se de elementos que não fazem parte da própria estrutura do prédio, mas que aumentam a sua utilidade e comodidade.
Estes elementos, apesar de serem por natureza, coisas móveis, encontravam-se incorporados, isto é, presos ao próprio prédio e destinam-se naturalmente a satisfazer necessidades permanentes dos nele residentes.
Esta ligação tem caráter permanente, posto que enquanto pelas leis da física não se tornarem inaptos ao desempenho da função a que se destinam, essa ligação ao prédio perdurará no tempo.
Por conseguinte, trata-se de partes integrantes do prédio comprado pelo apelado e, como tal, nenhuma censura nos merece a sentença recorrida quando condenou os apelantes a pagar ao apelado o respetivo valor.
Os apelantes taparam o furo que existia no prédio urbano comprado pelo apelado, atolando-o de pedras e terra.
O furo serve para aceder à água que se situa no subsolo do terreno que integra o prédio.
A água, enquanto não for desintegrada da propriedade superficiária, como é o caso, como anteriormente referido, é parte componente do respetivo prédio, tal como a terra ou as pedras que o compõem.
Logo, ao taparem o furo que existia no prédio comprado pelo apelado, privando-o da água que dele brotava e, assim, de uma sua parte componente, nenhuma censura nos merece a sentença recorrida quando condenou os apelantes a pagar ao apelado o valor do furo destruído.
Os apelantes cortaram as árvores e sebes do jardim do prédio comprado pelo apelado.
Estas, enquanto não forem separadas do solo, como acontecia no caso, integram o prédio urbano a cujo solo se encontravam fisicamente ligadas e, por isso, acompanham a sorte desse prédio.
Logo, tendo o prédio urbano sido vendido ao apelado, bem andou a 1ª Instância em condenar os apelantes a pagar àquele o valor das árvores e sebes que cortaram.
Os apelantes retiraram os móveis de cozinha, com os respetivos eletrodomésticos e torneiras da vivenda incorporada no prédio urbano comprado pelo apelado.
Os móveis de cozinha, respetivos eletrodomésticos e torneiras, ainda que ligados materialmente às paredes da cozinha e, portanto, ao prédio, não integram a sua estrutura, mas apenas servem para aumentar a utilidade do prédio, exponenciando a respetiva comodidade, tratando-se, por isso, eventualmente de partes integrantes.
No entanto, ainda que os móveis de cozinha e respetivos eletrodomésticos estejam presos às paredes da casa, falta-lhes o carácter de perpetuidade dessa ligação, na medida em que, conforme resulta das regras da experiência da vida e da própria expressão “móveis de cozinha” e “eletrodomésticos”, essa ligação ao prédio é meramente precária, tratando-se de elementos facilmente destacáveis e substituíveis.
A natureza de parte integrante do prédio em relação a esses móveis e eletrodomésticos, apenas lhes poderia advir da circunstância de existir imposição legal que tornasse a comercialização do prédio dependente da instalação naquele de móveis de cozinha e de eletrodomésticos.
Ora, essa imposição legal não existe, à exceção do lava loiça.
Na verdade, o art. 84º, n.º 2 do Regulamento Geral de Edificações Urbanas (RGEU), aprovado pelo DL n.º 38.882, de 07 de agosto de 1951, apenas torna obrigatória à emissão de licença de habitabilidade e, consequentemente, à comercialização de prédios urbanos (art. 1º, n.º 1 do DL n.º 281/99, de 26/07), que a cozinha tenha obrigatoriamente instalada um lava loiça e uma saída de esgoto.
Deste modo, os móveis de cozinha e respetivos eletrodomésticos, com exceção do lava loiça, não são partes integrantes do prédio comprado pelo apelado, mas apenas recheio desse prédio, pelo que ao levantá-los, os apelantes não violaram o direito de propriedade deste sobre o prédio comprado.
Decorre do exposto que, diversamente do decidido pela 1ª Instância, não existe fundamento legal para condenar os apelantes a pagar ao apelado o valor dos móveis de cozinha e respetivos electrodomésticos que dela retiraram, com exceção do valor do lava-loiça (24).
Não assim quanto às torneiras da cozinha que os apelantes igualmente retiraram antes de entregarem o prédio comprado pelo apelado ao último.
As torneiras, uma vez instaladas, passam a ficar materialmente ligadas à própria rede de fornecimento de água do prédio e essa ligação é permanente, perdurando no tempo até que, em princípio, deixem de exercer a função a que se destinam, tratando-se, por isso, de partes integrantes do prédio comprado pelo apelado.
Como tal, quanto à cozinha, com exceção do valor do lava-loiça e das torneiras que os apelantes retiraram e cujo valor têm de repor ao apelado, não assiste efetivamente ao último o direito de ver aqueles condenados a pagar-lhe o valor dos restantes móveis de cozinha e dos eletrodomésticos que levantaram.
A esta conclusão jurídica não obsta a circunstância de, diversamente do pretendido pelos apelantes, se ter apurado que a apreensão do prédio pelo administrador de insolvência a favor da massa insolvente foi realizada com a convicção de que os referidos móveis de cozinha e eletrodomésticos faziam parte do prédio apreendido; que o avaliador a que se socorreu o administrador, avaliou-o no pressuposto que estes móveis e eletrodomésticos faziam parte do prédio, atribuindo-lhe o valor de 180.000,00 euros, que foi o valor anunciado para a venda, nesse pressuposto; se ter apurado que do anúncio não constava qualquer menção que do prédio a vender estavam excluídos aqueles móveis de cozinha e eletrodomésticos, sequer o facto de se ter apurado que o apelado apresentou a proposta de 166.020,00 euros, no pressuposto que aqueles elementos integravam o prédio que comprou (cfr. pontos 49º, 40º, 21º e 22º dos factos apurados e teor do anúncio de fls. 12 verso dos autos), uma vez que essas convicções e factos não podem colocar em crise e derrogar o comando legal do n.º 3 do art. 204º do CC.
O apelado deduziu pedido subsidiário para o caso das pretensões que formulou, a título principal, não procederem.
O sentido e o alcance deste pedido subsidiário, ao que tudo indica, seria para o caso das pretensões que formulou, a título principal, improcederem in totum, sendo para esse caso que aquele pede, subsidiariamente, que seja julgado verificado o cumprimento defeituoso do contrato de compra e venda celebrado com a massa insolvente e esta ser condenada a repor o imóvel no exato estado em que se encontrava à data da apreensão, vistoria e adjudicação ou a pagar-lhe o valor desses bens caso aquela reposição não fosse possível.
No entanto, sempre se dirá, que ainda que assim não seja, que aqueles pedidos subordinados sempre teriam de improceder.
Na verdade, não é pela circunstância de no preço de venda constante do anúncio publicitando a venda do prédio constar como valor base do prédio a vender o valor de 180.000,00 euros e de para determinação desse valor o avaliador ter considerado o valor dos móveis de cozinha e dos eletrodomésticos existentes na vivenda construída no prédio a vender, que se pode concluir ter ocorrido cumprimento defeituoso do contrato de compra e venda do prédio, quando se verifica que o apelado foi totalmente estranho a essa avaliação; que no anúncio nada se diz sobre se aqueles móveis de cozinha e eletrodomésticos integravam ou não o prédio a vender; o apelado é totalmente alheio à convicção com que o senhor administrador de insolvência procedeu à apreensão do prédio, assim como este último é totalmente alheio à convicção com que o próprio apelado apresentou a sua proposta de aquisição desse prédio; e, finalmente, quando o apelado viu e vistoriou o prédio, pelo que comprou aquilo que viu uma vez sujeito ao regime legal do art. 204º do CC, de cujo n.º 3 decorre que aqueles móveis de cozinha e eletrodomésticos, à exceção do lava-loiça e torneiras, não integram o prédio que comprou.
Este regime legal imperativo não pode naturalmente ser afastado pela convicção (aliás, meramente interna) de vendedor e comprador.
Avançando.
Sustentam os apelantes que o facto do apelado ter aceitado a proposta de aquisição que lhe foi apresentada pelos apelantes, através da filha destes, antes de se concretizar a compra e venda do prédio, para que comprasse aos últimos os bens que retiraram do prédio quando o entregaram àquele, sem que essa proposta tivesse merecido qualquer oposição ou reação da parte do apelado, é demonstrativo que este aceitou que se está perante simples recheio do prédio, excluídos do prédio que comprou, como é demonstrativo que o mesmo sempre teve perfeito conhecimento que esse recheio não foi apreendido, sequer foi considerado na avaliação do prédio, sequer no valor que propôs para a aquisição deste, pelo que ao intentar a presente ação, o apelado atua em abuso de direito e litiga de má fé, mas sem razão.
O instituto do abuso de direito visa “obtemperar a situações em que a concreta aplicação de um preceito legal que, na normalidade das situações seria ajustada, numa específica situação da relação jurídica, se revela injusta e fere o sentido de justiça dominante” (25).
Trata-se de uma válvula de segurança, uma das cláusulas gerais a que o legislador recorreu para dar remédio à injustiça chocante e reprovável para o sentimento jurídico prevalecente na comunidade social, à injustiça de proporções intoleráveis para o sentimento jurídico imperante, em que redundaria o exercício de um direito por lei conferido (26).
No abuso de direito “não se trata da violação de um direito de outrem, ou da ofensa a uma norma tuteladora de um interesse alheio, mas do exercício anormal do direito próprio. O exercício do direito em termos reprovados pela lei, ou seja, respeitando a estrutura formal do direito, mas violando a sua afetação substancial, funcional ou teleológica, é considerado ilegítimo” (27).
É assim que o art. 334º do CC estatui que “é ilegítimo o exercício de um direito quando o titular exceda manifestamente os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico desse direito”.
Este normativo é expresso no sentido que os titulares do direito se encontram condicionados, no respetivo exercício, aos limites decorrentes da boa fé, dos bons costumes e do fim social e económico desse direito, de modo que quando esses limites sejam ultrapassados, esse exercício, ainda que formal e aparentemente legítimo, não o é materialmente, porque contrário aos valores estruturantes do sistema jurídico, devendo ser neutralizada a conduta do agente, declarando-a ilícita, com as consequências de todo o ato ilegítimo, maxime, em sede indemnizatória.
A boa fé é fundamentalmente a consideração razoável e equilibrada dos interesses dos outros, a honestidade e a lealdade dos comportamentos e, designadamente, na celebração e execução dos negócios jurídicos.
Trata-se de uma cláusula geral de direito privado que cabe às partes observar tanto na conclusão de um contrato, como nos seus preliminares, na formação dele (art. 227º do CC), no cumprimento das respetivas obrigações e no exercício dos direitos correspondentes (art.762º do CC).
A boa fé configura, assim, um conceito indeterminado que cabe ao intérprete preencher casuisticamente, de acordo com as circunstâncias específicas do caso e as convicções historicamente dominantes em cada momento histórico na sociedade (28).
Em síntese, agir de boa fé significa atuar “com diligência, zelo e lealdade correspondente aos legítimos interesses da contraparte; é ter uma conduta honesta e conscienciosa, uma linha de correção e probidade, a fim de não prejudicar os legítimos interesses da contraparte, e não proceder de modo a alcançar resultados opostos aos que uma consciência razoável poderia tolerar” (29).
Os bons costumes são as regras morais e de conduta social, generalizadamente reconhecidas, em dado momento, numa sociedade (30).
Trata-se do conjunto de regras de comportamento sexual, familiar e deontológico, que não estando codificadas, provocam consenso em concreto, pelo menos nos casos limite, numa determinada sociedade e momento histórico e que, por isso, são acolhidas pelo direito (31).
O fim social ou económico do direito tem a ver com a configuração real do direito, a apurar através de interpretação.
Existem direitos acentuadamente subordinados à prossecução de determinado fim, como acontece quanto aos respeitantes ao exercício das responsabilidades parentais. Já noutros, reconhece-se uma maior liberdade de atuação ou decisão ao titular desse direito (direitos potestativos, direito de propriedade, etc.).
Logo se um direito é atribuído com um determinado perfil/fim, já não existirá direito quando o titular desrespeita a norma constitutiva do mesmo (32).
Precise-se, no entanto, que tratando-se do exercício de um direito que assiste efetivamente a quem o exerce, ao menos do ponto de vista formal, conforme acima já enunciado e decorre do art. 344º do CC, a neutralização desse exercício com fundamento na cláusula geral do abuso de direito apenas será legitimada quando o excesso cometido pelo titular do direito no respetivo exercício seja “manifesto” ou, dito por outras palavras, que aquele exerça o direito que lhe assiste em termos clamorosamente ofensivos da justiça ou do sentimento jurídico socialmente dominante.
Acresce que para haver abuso de direito não é necessária a consciência por parte do titular do direito de que está a exceder tais limites porque a conceção adotada pelo legislador de abuso de direito é a objetiva, não obstante tal não signifique que se deva prescindir de fatores subjetivos, como, por exemplo, a intenção com que o titular tenha agido.
Na concretização do abuso de direito impõe-se atender, como resulta do que já se vem dizendo, de modo especial, às conceções ético-jurídicas dominantes na coletividade à data do exercício do direito, o que exige o apelo a considerações políticas, sociológicas, históricas e culturais vigentes naquela determinada comunidade e naquele momento concreto.
Na tipologia do abuso de direito sobressai o venire contra factum proprium, que “se traduz, de um modo geral, na pretensão de alguém extinguir certa relação subjetiva, recorrendo ao direito de anular, resolver, revogar ou denunciar o negócio que lhe serviu de fonte, depois de fazer ver à parte contrária (…) que não exerceria tal direito” (33) – cfr. Antunes Varela, “ Centros Comerciais “, pág. 90.
O venire contra factum proprium traduz, assim, por parte do titular do direito, numa traição à confiança depositada por aquele contra quem o direito é exercido, decorrente de uma conduta anterior do titular do direito, geradora da confiança legítima em como esse direito jamais seria exercido.
Segundo Batista Machado, são pressupostos do venire contra factum proprium: a- a verificação de uma situação objetiva de confiança: a conduta de alguém que possa ser entendida como vinculante em relação a uma situação futura; b- o investimento na confiança e irreversibilidade desse investimento: a outra parte, com base na situação criada, organiza planos de vida de que surgirão danos se a sua confiança legítima lhe vier a ser frustrada; e a c- boa fé da contraparte que confiou: nos casos de divergência entre a intenção aparente do responsável pela confiança e a sua intenção real, a contraparte só é merecedora de proteção jurídica se estiver de boa fé (por desconhecer aquela divergência) e tenha agido com cuidado e precaução usuais ao tráfico jurídico” (34).
No caso presente, contrariamente ao que é sustentado pelos apelantes, o administrador de insolvência apreendeu o prédio a favor da massa insolvente na convicção de que todos os bens retirados do prédio pelos primeiros, incluindo, os móveis de cozinha e respetivos eletrodomésticos, faziam parte do prédio apreendido, o mesmo acontecendo com o avaliador desse prédio, que considerou esse valor no montante de 180.000,00 euros, pelo qual foi anunciada a venda, tendo o apelado apresentado a sua proposta de aquisição do prédio com igual convicção, pelo que improcede toda a argumentação em contrário apresentada pelos apelantes.
É certo que em 15/01/2016, aquando da segunda visita ao prédio, a filha dos apelantes propôs ao apelado que comprasse os radiadores, a caldeira, os móveis de cozinha e respetivos eletrodomésticos, sem que que essa proposta merecesse qualquer oposição ou reacção deste.
Fê-lo apenas comprovadamente quanto a estes concretos bens, sem que os apelantes tivessem logrado fazer prova, como era seu ónus fazer (art. 342º, n.º 2 do CC), que essa proposta tivesse também incidido sobre os restantes bens que os mesmos retiraram do prédio quando o entregaram ao apelado.
Quanto a esses outros bens, a proposta feita pela filha dos apelantes a que se alude no ponto 23º dos factos apurados, é totalmente irrelevante em sede de abuso de direito e de litigância de má fé, dado que esta proposta foi apresentada ao apelado quando a compra e venda já tinha sido celebrada (cfr. ponto 41º dos factos apurados).
Em relação aos móveis de cozinha e respetivos eletrodomésticos, com exceção do lava-loiça e torneiras, a questão do abuso de direito não se coloca, dado que ao apelado não assiste efetivamente o direito a ver repostos esses móveis e eletrodomésticos.
Resta verificar se a circunstância da filha dos apelantes ter feito essa proposta de aquisição do lava-loiça, torneiras de cozinha, radiadores e caldeira de aquecimento central ao apelado e dessa proposta não ter merecido qualquer reação ou oposição da parte deste, significa que aquele ao reclamar a reposição destes bens dos apelantes atua em abuso de direito.
Essa resposta tem de ser claramente negativa quando se verifica que essa era a convicção do apelado quando apresentou a sua proposta de aquisição do prédio e quando este já lhe tinha sido adjudicado pelo valor que propusera, a que acresce o facto da filha dos apelantes ter feito a enunciada proposta àquele no próprio dia em que se encontrava designada data para a celebração do contrato de compra e venda, pelo que caso este a ele não comparecesse perderia o valor do sinal já entregue.
Acresce que essa falta de reação e de oposição do apelado não significa que aquele tivesse abandonado aquela que fora a sua convicção inicial quando apresentara a sua proposta de aquisição do prédio, mas apenas que ou não se quis incomodar com a proponente ou que perante a proposta desta ficou numa situação de dúvida sobre se os radiadores, a caldeira de aquecimento central, a cozinha, com eletrodomésticos que a filha dos apelantes lhe propôs que comprasse integravam ou não o prédio.
Quanto aos apelantes, aqueles não desconheciam, sequer podiam desconhecer, que a escritura de compra e venda do prédio estava designada para o próprio dia em que a filha dos mesmos apresentou aquela proposta ao apelado e que caso este faltasse a essa escritura perderia o sinal que já entregara pela compra do prédio e que nunca antes tinham reivindicado a propriedade junto daquele dos radiadores, caldeira de aquecimento central, lava loiça e torneiras da cozinha, sequer sobre o que quer que fosse (cfr. ponto 41º dos factos apurados).
Neste contexto, prefigura-se a esta Relação que a ausência de reação e de oposição da parte do apelante à proposta que lhe foi apresentada pela filha dos apelantes, reafirma-se, no próprio dia em que se encontrava designada a escritura de compra e venda do prédio, não consubstancia qualquer comportamento suscetível de gerar qualquer confiança nos apelantes de que aqueles radiadores, caldeira de aquecimento central, lava-loiça e torneiras da cozinha, na perspetiva do apelado, eram deles e a justificadamente acreditarem e investirem nessa confiança de que o mesmo jamais lhes iria reclamar que recolocassem no prédio que comprou esses bens, pelo que improcede este fundamento de recurso.
O que se acaba de referir, impõe que se conclua que o apelado não litiga de má fé em nenhuma das modalidades enunciadas no art. 542º, n.º 2 do CPC.
Não é pela circunstância do apelado ter instaurado a presente ação em que pede a reposição dos móveis de cozinha e dos respetivos eletrodomésticos (únicas pretensões em relação às quais se pode suscitar a questão da litigância de má fé, já que quanto às restantes, o apelado limita-se a exercer os direitos que, efetivamente, lhe assistem), que se pode concluir litigar aquele de má fé, quando se veio a apurar que o administrador de insolvência procedeu à apreensão do prédio na convicção de que esses móveis de cozinha e respetivos eletrodomésticos integravam realmente o prédio apreendido, atuando o avaliador desse prédio com igual convicção e, sobretudo, quando se apurou ter sido, também, essa a convicção do próprio apelado quando apresentou a proposta de aquisição do prédio.
Acresce que a interpretação do art. 204º do CC, nomeadamente, do seu n.º 3, é questão técnico-jurídica que assume uma certa complexidade, sem que exista jurisprudência significativa debruçando-se sobre as concretas questões que se colocam nos presentes autos, isto é, se os móveis de cozinha e respetivos electrodomésticos são ou não partes integrantes do prédio urbano onde se encontra construída a casa.
Relembra-se aos apelantes que para a condenação como litigante de má fé, exige-se que o procedimento do litigante evidencie indícios suficientes de uma conduta dolosa ou gravemente negligente, mas que essa apreciação requer “grande cautela para evitar condenações injustas” e de se violar a dignidade da pessoa humana proclamada com pedra angular do ordenamento jurídico nacional pela Lei Fundamental (art. 1º da CRP), “pois que ninguém porá em causa o caráter gravoso de uma condenação injusta como litigante de má fé" (35).
Aqui chegados, bem andou a 1ª Instância em absolver o apelado do pedido de condenação como litigante de má fé.
Resulta do que se vem dizendo, que tal como decidido pela 1ª Instância, impõe-se condenar os apelantes a pagar ao apelado o valor das janelas e portas do anexo, das loiças sanitárias, da caldeira de aquecimento central, dos radiadores, do painel solar que retiraram do prédio quando o entregaram, bem como do furo que atolaram e das árvores e sebes do jardim, que cortaram.
Quanto aos móveis de cozinha, eletrodomésticos e torneiras que igualmente retiraram, apenas se impõe que os apelantes paguem ao apelado o valor do lava-loiça e das torneiras.
A 1ª Instância fixou esse valor em 21.539,00 euros, valendo-se dos factos apurados nos pontos 23º e 24º, mas, salvo o devido respeito, erroneamente.
É que na sequência do supra decidido, para além de a essa quantia sempre se impor subtrair o valor dos móveis de cozinha e dos eletrodomésticos retirados pelos apelados quando entregaram o prédio (com exclusão, naturalmente do valor do lava-loiça e das torneiras), verifica-se que nessa quantia de 21.539,00 euros considerada pela 1ª Instância, está incluído o valor de quatro candeeiros exteriores, cinco candeeiros interiores (wc e lavandaria), dois espelhos e que a quantia de 4.000,00 euros, mencionada no ponto 23º, não se refere exclusivamente ao valor do furo destruído pelos apelantes, mas também ao motor para extração de água.
Acontece que os candeeiros, os espelhos e o motor, ainda que se encontrassem no prédio vendido ao apelado, não fazem parte da estrutura do mesmo, sequer são suas partes integrantes, na medida em que a ligação material destes ao prédio é meramente precária, sendo facilmente removíveis e substituíveis.
Logo, ao apelado não assiste o direito a receber dos apelantes o valor desses candeeiros, espelho e motor.
Ao apelado apenas assiste o direito a receber dos apelantes o valor das janelas e portas do anexo, dele retiradas pelos apelantes, das loiças sanitárias, da caldeira de aquecimento central, dos radiadores, do painel solar, do furo, das árvores e sebes do jardim, do lava loiça e das torneiras removidas da cozinha.
O valor das loiças sanitárias ascende a 4.500,00 euros; da caldeira de aquecimento central a 800,00 euros; dos radiadores a 3.100,00 euros e do painel solar a 1.500,00 euros (cfr. ponto 23º dos factos apurados), o que perfaz a quantia global de 9.900,00 euros.
Quanto ao valor das janelas e portas retiradas do anexo, do furo atolado, das árvores e sebes do jardim cortadas e do lava loiça e torneiras de cozinha retiradas, os autos não contém elementos que permitam o seu apuramento, pelo que, nos termos do disposto no art. 609º, n.º 2 do CPC, relega-se o respetivo apuramento para incidente de liquidação.
Resulta do que se vem dizendo, proceder parcialmente a presente apelação, impondo-se revogar a alínea a) da parte dispositiva da sentença e substitui-la pela condenação dos apelantes a pagar ao apelado, o valor dos bens por si indevidamente retirados do imóvel em questão nos autos e supra identificados, no montante global de 9.900,00 euros, bem como o valor que vier a ser apurado em sede de incidente de liquidação em relação às janelas e portas retiradas do anexo, do furo que atolaram, das árvores e sebes do jardim que cortaram e do lava loiça e torneiras de cozinha que retiraram do prédio, cujo valor a liquidar, uma vez deduzido do montante de 9.900,00 euros já liquidado, não pode exceder o valor do pedido (23.039,00 euros), ou seja, a quantia de 13.192,00 euros (23.039,00 euros – 9.900,00 euros).
No mais, impõe-se confirmar a sentença recorrida.
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Decisão:
Nestes termos, os Juízes desta Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães acordam em julgar parcialmente procedente a apelação e, em consequência:
a- alteram os factos julgados como provados e não provados na sentença nos termos acima identificados;
b- revogam a al. a) da parte dispositiva da sentença e substituem-na pela seguinte condenação:
“Condenam os 1ºs Réus, José e Maria no pagamento ao A., V. M., no valor dos bens por si indevidamente retirados do imóvel em questão nos autos e supra identificados:
a.1- no montante de 9.900,00 (nove mil e novecentos) euros, a que acrescem juros de mora legais, desde a data da prolação da sentença recorrida (23/04/2019) até integral pagamento;
a.2- o montante que vier a ser apurado em sede de incidente de liquidação em relação às janelas e portas retiradas do anexo, do furo que atolaram, das árvores e sebes do jardim que cortaram e do lava loiça e torneiras de cozinha que retiraram do prédio, cujo valor a liquidar não poderá exceder a quantia de 13.192,00 euros (treze mil cento e noventa e dois euros).
b- no mais, confirmam a sentença recorrida.
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Custas em ambas as instâncias por apelantes e apelado na proporção do respetivo decaimento, que se fixa provisoriamente em partes iguais para ambas as partes, fazendo-se o rateio a final, em função do valor que se vier a apurar em sede de incidente de liquidação (art. 527º, n.ºs 1 e 2 do CPC).
Notifique.
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Guimarães, 07 de novembro de 2019
Assinado eletronicamente pelos Juízes Desembargadores:
Dr. José Alberto Moreira Dias (relator)
Dr. António José Saúde Barroca Penha (1º Adjunto)
Dr. J. M. Alves Flores (2º Adjunto)
1. Ac. STJ. de 14/02/2012, Proc. 6823/09.3TBRG.G1.S1, in base de dados da DGSI. 2. Ac. RG. de 01/06/2017, Proc. 1227/15.6T8BGC.C1, in base de dados da DGSI. 3. António Abrantes Geraldes, in “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, Almedina, 2017, 4ª ed., pág. 153. 4. Abrantes Geraldes, ob. cit., pág. 155. 5. Abrantes Geraldes, in ob. cit., pág. 159. No mesmo sentido vide Acs. S.T.J. de 18/11/2008, Proc. 08A3406; 15/09/2011, Proc. 1079/07.0TVPRT.P.S1; 04/03/2015, Proc. 2180/09.0TTLSB.L1.S2; 01/10/2015, Proc. 824/11.3TTLSB. L1. S1; 26/11/2015, Proc. 291/12.4TTLRA.C1; 03/03/2016, Proc. 861/13.3TTVIS.C1.S1; 11/02/2016; Proc. 157/12.8TUGMR.G1.S1, todos in base de dados da DGSI. 6. Abrantes Geraldes, ob. cit., págs. 158 e 159. 7. Acs. do STJ de 26/09/2018, Proc. 141/17.5T8PTM.E1-S1; 05/09/2018, Proc. 15787/15.8T8PRT.P1-S2; 01/03/2018, Proc. 85/14.2TTMAI.P1.S1; de 06/06/2018, Proc. 4691/16.2T8LSB.L1.S1; 06/06/2018, Proc. 1474/16.38CLD.C1.S1; 06/06/2018, Proc. 552/13.5TTVIS.C1.S1; e de 16/05/2018, Proc. 2833/16.7T8VFX.L1.S1, todos in base de dados da DGSI. 8. Abrantes Geraldes, in ob. cit., págs. 160 e segs. 9. Ac. STJ. 29/10/2015, Proc. n.º 233/09.4TBVNG.G1.S1, in base de dados da DGSI. 10. Neste sentido, Acs. do STJ, de 08/02/2018, Processo nº 765/13.0TBESP.L1.S1; de 08/02/2018, Processo nº 8440/14.1T8PRT.P1.S1; de 06/06/2018, Processo nº 552/13.5TTVIS.C1.S1, e de 13/11/2018, Processo nº 3396/14, este último ainda inédito e os restantes in base de dados da DGSI. 11. Abrantes Geraldes, ob. cit., pág. 290. 12. Ana Luísa Geraldes, “Impugnação e Reapreciação Sobre a Matéria de Facto”, in “Estudos em Homenagem ao Prof. Dr. Lebre de Freitas, vol. IV, pág. 609. 13. Pires de Lima e Antunes Varela, “Código Civil Anotado”, vol. I, 4ª ed., Coimbra Editora, págs. 194 e 195. 14. Manuel Andrade, “Teoria Geral da Relação Jurídica”, vol. I, Coimbra, 1983, pág. 233. 15. Pires de Lima e Antunes Varela, ob. cit., pág. 195. 16. Pires de Lima e Antunes Varela, ob. cit., pág. 196. 17. Pires de Lima e Antunes Varela, ob. cit., págs. 196 e 197. Em igual sentido, Manuel de Andrade, ob. cit., págs. 236 e 237. 18. Manuel de Andrade, ob. cit., pág. 237 e 238. No mesmo sentido, Pires de Lima e Antunes Varela, ob. cit., págs. 195 e 196; Luís Castro Fernandes, “Teoria Geral do Direito Civil”, I, 2ª ed., Lex Lisboa, 1995, pág. 562; Castro Mendes, “Direito Civil, Teoria Geral”, vol. II, 1979, AAFDL, pág. 295; e Ac. RG. de 17/12/2014, Proc. 1633/12.8TBVVD.G1, in base de dados da DGSI, onde se lê que que o pavimento, quando aplicado numa construção urbana, é parte integrante do prédio urbano, escrevendo-se: “O pavimento, quando adquirido, o foi como coisa móvel. Porém, aplicado, integra-se no imóvel, assim se lhe comunicando a natureza de coisa imóvel que a este cabia. Com efeito, o que é fundamental para aferir é a ligação da coisa ao prédio com carácter de permanência. Ora, a incorporação de um pavimento num prédio urbano, aumentou a respetiva utilidade e está indiscutivelmente ligado a este. Mostra-se unido ao mesmo, sem limite temporal, aumentando o seu conforto e estética. Não se pode dizer de um pavimento que o mesmo é deslocável ou que pode ser desincorporado facilmente. Na verdade, nada obsta a que o seja. Porém, a coisa não ficaria com a mesma aparência e funcionalidade. Daí que seja uma coisa imóvel, considerada legalmente, como imóvel”. 19. Pires de Lima e Antunes Varela, ob. cit., pág. 198. 20. Manuel de Andrade, ob. cit., págs. 238 e 239, notas 1. 21. Luís A. Carvalho Fernandes, “Teoria Geral do Direito Civil”, 2º, pág. 135, nota 132. 22. Pires de Lima e Antunes Varela, ob. cit., pág. 195. 23. Neste sentido, mais uma vez Pires de Lima e Antunes Varela, ob. cit., pág. 195, onde ponderam: “Se a uma casa principal estão anexas construções de carácter secundário (casa do porteiro, garagem, dependência para arrecadações, galinheiros, etc.), deve entender-se que estamos perante um único prédio urbano, não obstante a pluralidade de construções que o integram” 24. Neste sentido Ac. RE de 10/05/2018, Proc. 11232/16.0T8VR.E1, in base de dados da DGSI, onde se pondera que os electrodomésticos de cozinha não podem ser considerados parte integrante do prédio urbano onde se encontram, quer porque não existe qualquer exigência legal da sua presença naquele compartimento, quer porque a sua ligação material ao imóvel é precária, sendo facilmente destacáveis e substituíveis”. 25. Ac. STJ. de 15/03/2013, Proc. 600/06.5TCGMR.G1.S1, in base de dados da DGSI. 26. Manuel de Andrade, “Teoria Geral das Obrigações”, 1958, pág. 63. 27. Antunes Varela, “Das Obrigações em Geral”, vol. I, 9ª ed., Almedina, pág. 563. 28. Ana Prata, “Dicionário Jurídico”, vol. I, 5ª ed., Almedina, pág. 214. 29. Ac. STJ. de 10/12/1991, BMJ, n.º 412, pág. 60. 30. Ana Prata, ob. cit., pág. 215; Ac. STJ. de 10/12/1991, BMJ, n.º 412, pág. 460. 31. Menezes Cordeiro, “Tratado de Direito Civil Português, I – Parte Geral”, tomo I, pág. 193. 32. Pires de Lima e Antunes Varela, “Código Civil Anotado”, vol. I, 4ª ed., Coimbra Editora, pág. 299; Menezes Cordeiro, ob. cit., pág. 283. 33. Antunes Varela, in “Centros Comerciais”, pág. 90. 34. Batista Machado, “Obra Dispersa”, vol. I, págs. 416 e segs. Na mesma linha, Menezes Cordeiro, in “Revista da Ordem dos Advogados”, ano 58, julho de 1998, pág. 964, onde escreve que são quatro os pressupostos da proteção da confiança ao abrigo da figura do “venire contra factum proprium”: 1º- uma situação de confiança, traduzida na boa-fé própria da pessoa que acredite numa conduta alheia (no factum proprium); 2º- uma justificação para essa confiança, ou seja, que essa confiança na estabilidade do factum proprium seja plausível e, portanto, sem desacerto dos deveres de indagação razoáveis; 3º- um investimento de confiança, traduzido no facto de ter havido por parte do confiante o desenvolvimento de uma atividade na base do, factum proprium, de tal modo que a destruição dessa atividade (pelo venire) e o regresso à situação anterior se traduzam num injustiça clara; 4º- uma imputação da confiança à pessoa atingida pela proteção dada ao confiante, ou seja, que essa confiança (no factum proprium) lhe seja de algum modo recondutível”. 35. Ac. STJ. de 28/05/2009, Proc. 09B681, in base de dados da DGSI.