EMBARGOS DE EXECUTADO
MÚTUO
LIVRANÇA
AVAL
Sumário

– De acordo com a doutrina da autonomia da obrigação do avalista, bem como no preceituado no nº. 4, do artº. 217º, do CIRE, conclui-se que a aprovação de um plano de insolvência, com moratória para pagamento da dívida, de que beneficia o mutuário subscritor da livrança, não é susceptível de ser invocado pelo avalista contra quem é instaurada a execução para seu pagamento, pois as medidas aprovadas no plano de insolvência só se aplicam ao insolvente ;

– tal solução tem ainda a sua justificação no facto do credor, ao votar favoravelmente tal plano, considerar, apenas, a particular situação de fragilidade económica/financeira do devedor insolvente, nomeadamente a sua impossibilidade de cumprir as suas obrigações para com os credores ;

– pelo que, consequentemente, não está vedado ou cerceado ao credor instaurar acção executiva contra o avalista e reclamar o crédito por este avalizado nos autos de insolvência, não sendo permitido ao avalista opor a alteração do prazo de pagamento do crédito avalizado, pois, a circunstância da relação subjacente se modificar ou possuir contornos de renovação, não induz, ou faz seguir, que esses efeitos se repercutam ou obtenham efeitos jurídicos na relação cambiária ;

– in casu, homologado, por sentença, plano de pagamentos apresentado pelos mutuários, subscritores da livrança, prevendo o pagamento do crédito ora em equação numa modalidade temporal diferente da acordada no contrato de mútuo, não é oponível pela ora Embargante Avalista ao Embargado Banco, não podendo aquela socorrer-se do ali prescrito e homologado para, como excepção, se opor ao preenchimento da livrança nos termos operados ;

– entende-se, assim, que o regime previsto naquele nº. 4, do artº. 217º, do CIRE, mantém total pertinência de aplicabilidade também nas situações em que existe um plano de pagamentos aos credores devidamente homologado, ou seja, as razões de ser subjacentes àquela previsão legal, mantêm total validade neste instituto jurídico ;

– com efeito, diferenciada interpretação entraria em conflito com o interesse da generalidade dos credores e dos próprios devedores, pois, caso se afectasse, com a adesão ao plano de pagamentos, a existência ou o montante dos direitos dos credores relativamente aos terceiros garantes da obrigação, criar-se-ia um manifesto obstáculo ao apoio do credor aos propostos planos de pagamento, nas situações em que este beneficiasse daquelas garantias pessoais ;

– no caso concreto, tal significa, prima facie, que o beneficiário do aval (Banco credor) pode agir, mediante a competente acção cambiária, perante a avalista (Embargante Executada), de forma a obter a quantia correspondente ao crédito garantido ;

– de acordo com o disposto na 2ª parte, do nº. 1, do artº. 259º, do CIRE, enquadrado na secção referente ao plano de pagamentos aos credores, que remete para o prescrito na alínea a), do nº. 7, do artº. 39º, do mesmo diploma, um dos efeitos mitigados, que normalmente corresponde à declaração de insolvência, traduz-se, efectivamente, no enunciado no transcrito artº 91º, nº. 1, do CIRE, ou seja, a determinação do vencimento de todas as obrigações do insolvente ;

– a verificar-se tal efeito, o que não ocorre nas situações de apresentação e aprovação de plano de pagamentos aos credores, tal colidiria com os objectivos ínsitos ao plano de pagamentos legalmente equacionado nos artigos 251º a 263º, do CIRE, previsto especificamente para a insolvência das pessoas singulares, desvirtuando-o e impossibilitando a sua total operacionalidade ;

– o reconhecimento da natureza abstracta e de autonomia do título de crédito em equação – livrança – não se deve sobrepor à análise do acordado entre o Banco Exequente e a Embargada Avalista, ou seja, aferir se existiu ostensiva violação do pacto de preenchimento ;

– efectivamente, tendo sido o título de crédito apresentado à execução – livrança -, pelo próprio Banco mutuante (portador inicial), afigura-se-nos que a Avalista pode opor àquele o teor do acordado relativamente à convenção de preenchimento da livrança, pois, ademais, não se saiu do domínio das relações imediatas, ou seja, do âmbito da “relação causal” entre o Banco portador e a Avalista Executada.

Texto Integral

ACORDAM os JUÍZES DESEMBARGADORES da 2ª SECÇÃO da RELAÇÃO de LISBOA o seguinte [1]:

 
             
I–RELATÓRIO:



1– SM…, Executada, deduziu oposição à execução, mediante embargos, aduzindo, em súmula, o seguinte:
– O exequente intentou a presente acção executiva a 3 de Agosto de 2016, referindo ser dono e legítimo portador da livrança que constitui o título executivo, a qual apresenta como dia de vencimento 29 de Setembro de 2014 ;
– Mencionado, ainda, que tal livrança foi avalizada pela executada, aqui embargante, como garantia prestada a favor do contrato de crédito nº …-…, o que corresponde à verdade ;
– Todavia, o Exequente procedeu ao preenchimento abusivo de tal título de crédito, uma vez que, ao contrário da condição acordada para o seu preenchimento, não existia qualquer incumprimento do contrato de crédito nº …-… aquando do seu preenchimento, não estando em dívida em tal data qualquer quantia acordada no âmbito desse contrato ;
– Pelo que, ao arrepio do pacto de preenchimento, não poderia o exequente ter procedido ao preenchimento do título dado à execução em 29 de Setembro de 2014 ;

– No referenciado contrato de crédito não hipotecário ficou a constar, na parte respeitante ao avalista:
“Declara-se que aceito(amos) ser Avalista(s) do(s) Mutuário(s) deste empréstimo, por quem fui(omos) informado(s) do montante da dívida a contrair, bem como das cláusulas deste contrato e da cláusula de Acesso a informações, que aceito(amos), avalizando para o efeito a Livrança de Caução em branco (anexa ao contrato).
Declara-se que autorizo(amos) que o Banco BPI, SA, em caso de incumprimento do(s) Mutuário(s) de qualquer das obrigações decorrentes do presente contrato, designadamente da obrigação de pagamento ao Banco BPI, SA do capital e juros em caso de exercício do direito de livre revogação, a completar o preenchimento daquela Livrança, fixando-lhe o vencimento e indicando, como montante, tudo quanto constitua crédito do Banco, logo que deixe de ser cumprida qualquer obrigação caucionada.
Fica ainda o Banco BPI autorizado a proceder à cobrança dos montantes em dívida por débito da minha/nossa conta com o NIB …, e proceda à acção judicial respectiva caso se mantenha o incumprimento.” ;
– Traduz tal acordo o pacto de preenchimento da Livrança dada à execução, só podendo o Banco exequente proceder ao preenchimento da mesma “em caso de incumprimento do(s) Mutuário(s)” ;
– Ora, ainda no ano de 2013 e encontrando-se em vigor aquele contrato de crédito, no âmbito do processo nº …/…-A que corria termos no …º Juízo Cível do Tribunal de Família e Menores e de Comarca de Loures, os mutuários apresentaram aos seus credores (incluindo ao Banco exequente) um plano de pagamento de todas as suas dívidas ;
– No que concerne ao Banco exequente, para liquidação de todas as suas responsabilidades, o plano de pagamentos apresentado pelos mutuários consistia no pagamento de € 95,35 mensais durante 120 meses, tendo a Exequente aderido a tal plano ;
– O qual foi homologado por sentença já transitada em julgado, tendo o Banco exequente sido notificado da mesma por notificação expedida a 10/02/2014 ;
– Por notificação expedida a 21 de Fevereiro de 2014, foi o Banco BPI, SA expressamente notificado para indicar o modo de pagamento das prestações acordadas no plano de pagamentos, o que só veio a ser indicado pelo Banco exequente a 23 de Julho de 2014, considerando-se os mutuários notificados a 28 de Julho de 2014 ;
– Tendo os mutuários cumprido com as obrigações de pagamento acordadas ;
– Cumpriram, assim os mutuários a sua obrigação de pagamento até Setembro de 2014, pelo que não podia o Banco exequente ter preenchido abusivamente a Livrança dada à execução no final de Setembro de 2014, na medida em que inexistia incumprimento por parte dos mutuários e aquele só estava autorizado a proceder ao preenchimento no caso de incumprimento ;
– Pelo que não podia a Embargante ser executada com fundamento numa livrança entregue em branco apenas para garantia do cumprimento ;
– O que constitui, inclusive, um verdadeiro abuso de direito, proibido pelo artigo 334.º do Código Civil ;
– O que se requer seja declarado pelo Tribunal, levando à procedência dos embargos e extinção da execução.
Conclui, no sentido da procedência dos embargos deduzidos, devendo “em consequência ser declarada a execução extinta, nos termos do disposto no artigo 732.º, nº 4 do CPC.
Sem prescindir, deverão pelo menos proceder parcialmente os presentes embargos, deduzindo-se ao valor total peticionado as quantias já pagas pelos mutuários no âmbito do plano de pagamentos homologado por sentença”.

2– Admitidos liminarmente os embargos e notificada a Exequente/Embargada BANCO BPI, S.A., Sociedade Aberta, nos termos e para os efeitos do prescrito no nº. 2 do artº. 732º, do Cód. de Processo Civil, veio apresentar contestação – cf., fls. 28 a 32 -, aduzindo, em resumo, o seguinte:
– o título executivo (livrança) utilizado pela Exequente, foi a garantia prestada pelos mutuários subscritores CF… e JA… e pela Embargante avalista, para cumprimento do empréstimo …, celebrado a 06 de Março de 2012, por 72 meses e com uma taxa Nominal de 11,250% e T.A.E.G. de 16,849% ;
– efectivamente, aquando da celebração do contrato de empréstimo, entre o Exequente e a Embargante, foi assinada uma livrança em branco por CF… e JA…, enquanto mutuários subscritores, e pela Embargante, enquanto avalista ;
– tendo a Embargante prestado aval, sendo este um acto pelo qual um terceiro garante o pagamento de uma letra por parte dos seus subscritores, estipulando-se que o dador do aval é responsável da mesma maneira que a pessoa por si avalizada, os mutuários subscritores tornaram se pessoalmente responsáveis pela dívida por si garantida ;
– Entretanto, os mutuários subscritores CF… e JA… da Livrança foram alvo de um processo de Insolvência nº …/…, no âmbito do qual foi homologado um Plano de Insolvência ;
– Neste, foi aprovado um plano de pagamento da dívida, em que o Exequente se tornou um credor comum, e o seu pagamento no prazo de 120 prestações, de € 95,35 (noventa e cinco euros e trinta e cinco cêntimos) por mês, Encontrando-se os Insolventes a cumprir o plano até ao dia de hoje, tendo já pago, na presente data. 37 (trinta e sete) prestações de € 95,35 (noventa e cinco euros e trinta e cinco cêntimos), totalizando € 3.527,95 ;
– Deste modo, os credores votaram o plano que é aprovado, atendendo à particular situação dos mutuários subscritores que se encontram numa situação de económica difícil ou em situação de insolvência iminente, estando a Embargante/Avalista fora do âmbito do plano de insolvência ;
– o nº 1 do artº 519º do CC não impede que o credor reclame o seu crédito contra os mutuários subscritores e instaure execução contra Embargante/Avalista, pois verifica-se a existência de uma razão atendível para o efeito, que é a insolvência iminente dos mutuários subscritores ou a dificuldade de obter a prestação por dificuldades económicas que conduziram à instauração de um processo de insolvência ;
– Ora, nada pode garantir que o plano de insolvência aprovado vá ser cumprido e de modo integral, sem embargo de, e como é evidente, não poder o credor receber dos mutuários subscritores e da Embargante/Avalista a totalidade do crédito garantido por aval ;
– A livrança foi entregue pelos subscritores insolventes e pela Embargante avalista, subscrita em branco, como garantia do bom pagamento, tendo esta, autorizado expressamente o respectivo preenchimento, conforme declaração dos avalistas e cláusula 4ª que consta no contrato ;
– Acresce que antes da livrança em branco ter sido preenchida pela Exequente, esta enviou a devida carta de interpelação à Embargada, que foi recepcionada por CF…, mutuária subscritora do contrato de empréstimo aqui em discussão, no dia 26 de Setembro de 2014, informando que, caso nada seja dito, a livrança seria preenchida com a data de vencimento de 29/09/2014, pelo valor de 11.576,99 (onze mil quinhentos e setenta e seis euros e noventa e nove cêntimos) ;
– nesse momento, nada foi dito pela Embargante/Avalista, remetendo-se ao silêncio até à apresentação dos Embargos do Executado ;
– não houve, como se verifica, qualquer preenchimento abusivo ou não autorizado da livrança exequenda, pois a Exequente mais não fez do que preencher a livrança caução de acordo com o clausulado acordado com a aqui Embargada.
Conclui, requerendo que os presentes embargos sejam julgados totalmente improcedentes, por não provados, devendo a instância executiva prosseguir os seus ulteriores termos.

3– Conforme despachos de fls. 40, datados de 14/02/2018:
- fixou-se o valor processual da causa ;
- indeferiu-se o pedido de suspensão da execução, sem prestação de caução
- conheceu-se acerca dos requerimentos probatórios ;
- designou-se data para a realização da audiência final.

4– Procedeu-se á realização da audiência de julgamento, conforme acta de fls. 95 e 96, após o que, datada de 19/06/2018, foi proferida SENTENÇA, que terminou com o seguinte dispositivo:
“Pelo exposto, julga-se pela procedência parcial dos presentes embargos de executado e, em consequência, extingue-se a execução na parte em que se pede o pagamento de quantia superior a €1.019,52 (mil e dezanove euros e cinquenta e dois cêntimos), acrescida dos juros de mora contados sobre o valor de cada uma das prestações de €254,88 (duzentos e cinquenta e quatro euros e oitenta e oito cêntimos), desde o dia imediatamente seguinte ao vencimento de cada uma delas, ocorrido em 30 de outubro de 2013, 30 de novembro de 2013, 30 de dezembro de 2013 e 30 de janeiro de 2014.
Condena-se executada e exequente nas custas destes embargos, na vertente de custas de parte, na proporção do respetivo decaimento.
Registe-se, notifique-se e comunique-se”.

5– Inconformada com o decidido, a Exequente/Embargada interpôs recurso de apelação, em 31/08/2018, por referência à decisão prolatada.
Apresentou, em conformidade, a Recorrente as seguintes CONCLUSÕES:
“I.–O título executivo (livrança) utilizado pela Exequente, foi a garantia prestada pelos mutuários subscritores CF… e JA… e pela Executada avalista, para cumprimento do empréstimo nº …;
II.–O dador do aval é responsável da mesma maneira que a pessoa por si avalizada, os mutuários subscritores tornaram se pessoalmente responsáveis pela dívida por si garantida.
III.–Sendo o aval uma garantia bancária que, embora com natureza jurídica semelhante à da fiança, não pode confundir-se com esta.
IV.–Ao aval somente são aplicáveis os princípios da fiança que não contradigam o seu carácter cambiário.
V.–Pelo qual um terceiro ou um signatário da letra ou de uma livrança garante o seu pagamento por parte de um dos seus subscritores - art. 30 da LULL.
VI.–A função do aval é uma função de garantia, inserida ao lado da obrigação de um certo subscritor cambiário, a cobri-la e a caucioná-la.
VII.–Como é sabido, a obrigação do avalista é uma obrigação materialmente autónoma ainda que formalmente dependente da obrigação do avalizado.
VIII.–Na verdade a obrigação do avalista vive e subsiste independentemente da obrigação do avalizado, mantendo-se mesmo que seja nula a obrigação garantida, salvo se a nulidade desta provier de um vício de forma - art. 32 da LULL.
IX.–Atenta essa autonomia, o avalista não pode defender-se com as exceções do avalizado, salvo no que concerne ao pagamento.
X.–Com efeito, tendo em conta a natureza da obrigação de garantia da obrigação do avalista, destinada à satisfação do direito do credor, se o avalizado pagar ou satisfizer de outro modo a sua dívida ao portador da letra ou livrança, este não pode exigir do avalista um segundo pagamento.
XI.–O princípio da independência das obrigações cambiárias e da obrigação do avalista relativamente à do avalizado (arts 7 e 32, nº2 LULL) não impede que o avalista oponha ao portador a exceção do pagamento, por extinção da obrigação do avalizado, desde que o portador seja o mesmo em relação ao qual o avalizado extinguiu a sua obrigação.
XII.–Mas o avalista já não pode defender-se com as demais exceções do avalizado, por a obrigação daquele ser autónoma em relativamente à deste.
XIII.–Acontece que no contrato em apreço não foi totalmente cumprido pelos mutuários subscritores.
XIV.–Na vigência do contrato, os mutuários subscritores, bem como a Executada foram, por diversas vezes, interpelados para regularizar a situação, quer por contactos telefónicos, quer por cartas simples – carta a informar do incumprimento da prestação 19 e 20 (Outubro e Novembro de 2013).
XV.–Assim, das 72 prestações acordadas no contrato garantido pela livrança dada à execução, os mutuários subscritores pagaram apenas as primeiras 18 (vencida a 30 de Setembro de 2013).
XVI.–Iniciando-se o incumprimento a 30 de Outubro de 2013.
XVII.–Sendo a presente dívida liquidável em prestações, a falta de pagamento de uma delas importa o vencimento de todas, nos termos do disposto no artigo 781º do CC.
XVIII.–Posteriormente, os mutuários subscritores CF… e JA… da Livrança apresentaram-se à Insolvência – proc. nº …/….
XIX.–No âmbito da insolvência foi aprovado um incidente de plano de pagamentos, em que o Exequente se tornou um credor comum e o seu pagamento do valor reclamado (sem juros vincendos) no prazo de 10 anos em 120 prestações mensais, iguais e sucessivas, a distribuir rateadamente pelos credores na proporção dos seus créditos.
XX.–Tendo a sentença de homologação transitado em julgado a 26.02.2014.
XXI.–Encontrando-se os Insolventes a cumprir o plano até ao dia de hoje,
XXII.–A declaração de insolvência do mutuário subscritores, que veio a ocorrer a 18.03.2014, teria por efeito o vencimento das restantes prestações em dívida, e isto sem qualquer interpelação.
XXIII.–Com efeito, dispõe o artigo 91º do CIRE que “a declaração de insolvência determina o vencimento de todas as obrigações do insolvente não subordinadas a uma condição suspensiva”.
XXIV.–A declaração de insolvência sempre determinaria como efeito automático, e sem necessidade de qualquer interpelação, o vencimento das restantes prestações em dívida.
XXV.–O Exequente resolveu o contrato de crédito não hipotecário.
XXVI.–Enviando a devida carta de interpelação à Executada,
XXVII.–Tendo sido esta carta de interpelação enviada para a morada Rua …, Lote …, …º Dto., 2625- Povoa de Santa Iria, XXVIII. Morada que ainda se mantém, cfr. pesquisa à Segurança Social que consta nos autos principais e formulário dos dados da Embargante no apenso da Oposição.
XXIX.–A carta de interpelação foi rececionada por CF…, mutuária subscritora do contrato de empréstimo aqui em discussão, no dia 26 de Setembro de 2014.
XXX.–Informando que, caso nada seja dito, a livrança seria preenchida com a data de vencimento de 29/09/2014, pelo valor de 11.576,99 (onze mil quinhentos e setenta e seis euros e noventa e nove cêntimos).
XXXI.–E, nesse momento, nada foi dito pela Executada,
XXXII.–Remetendo-se ao silêncio até à apresentação dos Embargos do Executado.
XXXIII.–Acontece que, o Exequente mantém intactos os direitos de que dispunha contra condevedores e terceiros garantes, podendo exigir deles tudo aquilo por que respondem e no regime de responsabilidade originário, sendo que o exercício consentido aos credores pelo art.º 217º, n.º 4 do CIRE não extravasa o limiar de risco que os garantes assumiram.
XXXIV.–Assim, a Exequente instaurou a execução contra a Executada, demandada na qualidade de avalista de uma livrança no valor total de € 11.576,99, subscrita pelos mutuários subscritores CF… e JA… e avalizada pela Executada.
XXXV.–A função do aval é, assim, uma função de garantia, inserida ao lado da obrigação de um certo subscritor cambiário, a cobri-la e caucioná-la.
XXXVI.–O fim específico do aval é o de garantir o cumprimento pontual do direito de crédito cambiário.
XXXVII.–É uma garantia prestada à obrigação cartular do avalizado.
XXXVIII.–O avalista não é sujeito da relação jurídica existente entre o portador e o subscritor da livrança, mas apenas da relação subjacente à obrigação cambiária estabelecida entre ele e o seu avalizado.
XXXIX.–O art. 32 da LULL, determina que o dador de aval é responsável da mesma forma que a pessoa por ele afiançada.
XL.–A extensão e o conteúdo da obrigação do avalista aferem-se pela do avalizado (Ferrer Correia, Lições de Direito Comercial, 1975, III, pág. 207 a 215).
XLI.–A razão de ser do referido art. 32 da LULL é ser o aval um ato cambiário que desencadeia uma obrigação independente e autónoma.
XLII.–A obrigação do avalista é uma obrigação materialmente autónoma, ainda que formalmente dependente da do avalizado, pois o avalista responsabiliza-se pela pessoa que avaliza, assumindo a responsabilidade, abstrata e objetiva, pelo pagamento do título.
XLIII.–Com efeito, a obrigação do avalista vive e subsiste independentemente da obrigação do avalizado, mantendo-se mesmo que seja nula a obrigação garantida, salvo se a nulidade desta provier de um vício de forma – art. 32 da LULL.
XLIV.–Como se escreve no Acórdão Uniformizador de Jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça de 11-12-2012, proferido na revista nº 5903/09.4TVLSB.L1.S1,“tratando-se de uma obrigação autónoma, independente da relação subjacente, não poderá o avalista valer-se da renovação/prorrogação do contrato de abertura de crédito para se desobrigar de uma obrigação que, pela sua abstração e literalidade, se emancipou da relação subjacente para subsistir como obrigação independente e autónoma”.
XLV.–“O avalista não é responsável ou não se obriga ao cumprimento da obrigação constituída pelo avalizado, mas tão só ao pagamento da quantia titulada no título de crédito.”
XLVI.–“A obrigação firmada pelo avalista é perante a obrigação cartular e não perante a relação subjacente”.
XLVII.–“Do que ficou dito supra, o avalista não se obriga perante o avalizado, mas sim perante o titular da letra ou livrança, constituindo uma obrigação autónoma e independente e respondendo como obrigado cartular, pelo pagamento da quantia titulada na letra ou livrança”.
XLVIII.–“A circunstância de ocorrerem vicissitudes na relação subjacente não captam a virtualidade de se transmitirem à obrigação cambiária, pelo que esta se mantém inalterada e plenamente eficaz, podendo o beneficiário do aval agir, mediante ação cambiária, perante o avalista para obter a satisfação da quantia titulada na letra”.
XLIX.–“A circunstância da relação subjacente se modificar ou possuir contornos de renovação não induz ou faz seguir que esses efeitos se repercutam ou obtenham incidência jurídica na relação cambiária”.
L.–“A relação cambiária constituída permanece independente às mutações ou alterações que se processem na relação subjacente, não acompanhando as eventuais transformações temporais e/ou de qualidade da obrigação causal”.
LI.–Refere, ainda, o Tribunal da Relação de Coimbra de 3.06.2014, processo nº 1030/13.8TBTMR-B.C1: “(…) Por via dessa autonomia, o avalista não pode defender-se com as exceções que o seu avalizado pode opor ao portador do título, salvo a do pagamento (Vaz Serra, R.L.J, Ano 113, pág. 186, nota 2; Ac. S.T.J. de 23-1-86, Bol. 353, pág. 485; Ac. S.T.J. de 27-4-99, Col. Ac. S.T.J., VII, 2º, 68; Ac. S.T.J. de 19-6-2006, Col. Ac. S.T.J., XV, 2º, 118). Esta doutrina da autonomia da obrigação do avalista está conforme e harmoniza-se perfeitamente com o preceituado no art. 217, nº4, do CIRE, onde se estabelece que: “As providências previstas no plano de insolvência com incidência no passivo do devedor não afetam a existência nem o montante dos direitos dos credores da insolvência contra os codevedores ou os terceiros garantes da obrigação, mas estes sujeitos apenas poderão agir contra o devedor em via de regresso nos termos em que o credor da insolvência pudesse exercer contra ele os seus direitos”. É, pois, de concluir que a aprovação do plano de revitalização onde possa existir uma moratória para o cumprimento das obrigações da subscritora das livranças, quanto ao pagamento dos seus débitos, não é invocável pelos respetivos avalistas, ora recorrentes, contra o portador da mesma livrança que instaurou a presente execução para obter o seu pagamento. Na verdade, tal plano é constituído por um conjunto de medidas que só se aplicam à sociedade subscritora. Ao votar a favor de tal plano, o credor fá-lo apenas por se tratar de medidas aplicáveis a uma sociedade que está numa particular situação de dificuldade de cumprir as suas obrigações para com os credores. Não seria razoável que o credor ficasse inibido de acionar os respetivos avalistas, que não são contemplados por tal plano, nem se encontram impossibilitados de cumprir as obrigações que livremente assumiram, face à autonomia da obrigação do aval que prestaram. Os garantes estão fora do âmbito de tal plano de revitalização e do que nesta se delibera.”
LII.–Ora, o incidente de aprovação de plano de pagamentos dos mutuários subscritores não afeta nem pode afetar os direitos Exequente contra a avalista,
LIII.–Tão pouco proibirá o credor de acionar os demais obrigados cambiários durante a vigência de tal plano.
LIV.–Este plano vincula, apenas e só, o Exequente mas apenas no que se refere à exigibilidade do crédito quanto aos mutuários subscritores.
LV.–Não estando a Executada sob tutela deste plano de insolvência
LVI.–E, sendo devedora solidária pelo aval prestado enquanto garantia da dívida contraída pelos mutuários subscritores CF… e JA…,
LVII.–Não poderá a Executada invocar a inexigibilidade temporária do crédito por força do mesmo.
LVIII.–Perante o exposto, não existe qualquer disposição legal que impeça o aqui Exequente de reclamar créditos no processo de insolvência contra os mutuários subscritores e, simultaneamente, intentar execução contra a outra devedora, no caso, a avalista subscritora da livrança.
LIX.–Nada havendo qualquer impedimento para o Exequente em querer ser ressarcido do valor em divida rapidamente,
LX.–Uma vez que através do plano de pagamento, no âmbito da insolvência, demorará, pelo menos, mais seis anos a receber o que lhe é devido, sem receber qualquer tipo de juro vincendo.
LXI.–Receberá, apenas e só, o valor reclamado em 2013, em dez anos, em 120 prestações mensais e sucessivas.
LXII.–Quer o Exequente com isto dizer que, não pretende receber em duplicado (através do plano de pagamento da insolvência e das penhoras da ação executiva), mas sim o mais rápido possível, fazendo as devidas reduções ao valor em divida.
LXIII.–É, por isso, indiscutível e inequívoco que a Executada, enquanto avalista, responde solidariamente perante o Exequente, portador da Livrança, podendo ser demandada, individual ou conjuntamente.
LXIV.–Se assim não fosse estava retirada ao aval a sua natureza garantística.
LXV.–Assim o determina a LULL artºs 32, 47, 77 e 78 e assim o entendeu o STJ em Acórdão Uniformizador de Jurisprudência de 11.12.2012, de onde se retira que “O avalista não é responsável ou não se obriga ao cumprimento da obrigação constituída pelo avalizado, mas tão só ao pagamento da quantia titulada no título de crédito”.
LXVI.–O mesmo entendimento apoiaram a Relação de Guimarães em 05.12.2013, a Relação de Lisboa em 09.09.2013 e, mais uma vez, o STJ em 26.02.2013”.
Conclui, no sentido da procedência do recurso, devendo, em consequência, a sentença recorrida “ser anulada e, em sua substituição, deve ser proferido douto Acórdão que julgue os Embargos de Executado como improcedentes”.

6– A Recorrida/Executada/Embargante apresentou contra-alegações, nas quais formulou as seguintes CONCLUSÕES:
“A)– A questão a decidir nos presentes é saber se o Banco exequente poderia em primeiro lugar preencher a livrança de fls_ e, mesmo assim, qual o valor que lhe era lícito ser aposto.
B)– O exequente intentou a acção executiva a 3 de Agosto de 2016, alegando que é dono e legítimo portador da livrança que constitui o título executivo, avalizada pela embargante, a qual apresenta como dia de vencimento 29 de Setembro de 2014 e que foi entregue como garantia prestada a favor do contrato de crédito nº …-….
C)– Sucede que nessa data (Setembro de 2014) não existia qualquer incumprimento por parte dos mutuários, pelo que não poderia ter sido preenchida sequer a livrança.
D)– Conforme resulta da factualidade provada (pontos 8 a 11 dos factos provados constantes da sentença) ainda no ano de 2013 e encontrando-se em vigor o contrato de crédito nº …- …, no âmbito do processo nº …/… que corria termos no …º Juízo Cível do Tribunal de Família e Menores e de Comarca de Loures, ao abrigo do CIRE, os mutuários apresentaram aos seus credores (incluindo ao Banco exequente, com pagamento de 100% do seu valor) um plano de pagamento de todas as suas dívidas – conforme igualmente documento já junto aos autos.
E)– Ora, o Banco exequente aderiu a tal plano de pagamentos, conforme se constata da douta sentença proferida a 6 de Fevereiro de 2014 no referido processo nº …/…, onde foi precisamente homologado tal plano de pagamentos, tendo o Banco exequente sido notificado da mesma por notificação expedida a 10/02/2014, conforme documento junto aos autos.
F)– Tendo sido cumprido o plano até ao dia de hoje, conforme muito bem lembra o Banco recorrente no artigo 27.º das suas alegações de recurso e consta igualmente do ponto 11 dos factos provados constantes da sentença.
G)– O Banco embargado esteve mais de dois anos a receber o montante acordado no plano de pagamentos tansitado em julgado, mas entendeu passado tal hiato temporal (em Agosto de 2016) tentar receber da aqui recorrida todo o montante de uma só vez e sem sequer descontar na execução apensa a estes todos os montantes que foi recebendo dos mutuários!!!

H)– Acresce que, nos termos do disposto na cláusula 8ª das condições gerais do contrato, o Banco exequente só poderia invocar a perda do benefício do prazo e considerar resolvido o contrato, quando cumulativamente:
a)- Houvesse falta de pagamento de duas prestações consecutivas que excedesse 10% do montante total do crédito; e
b)- Ter o Banco, sem sucesso, concedido por carta registada com aviso de recepção um prazo suplementar mínimo de 15 dias para pagamento dos valores em atraso.
I)– O que não sucedeu (mesmo que se considere a existência de uma alegada dívida de 4 prestações entre Outubro de 2013 e Fevereiro de 2014 durante a pendência do processo de plano de pagamentos, pois a verdade é que na data do preenchimento do título, o contrato estava a ser integralmente cumprido, aí se incluindo todas as prestações).
J)– Acresce que o Banco exequente nunca resolveu o contrato com os mutuários (nem podia, atenta a sentença de homologação do plano de pagamentos), limitando-se a enviar a missiva unicamente à avalista (a qual é naturalmente ilícita e ineficaz, pois não é naturalmente possível resolver o contrato com o garante, quando o contrato continua em vigor com os mutuários!!!)
L)– Não podia, pois, a embargante/recorrida ser executada com fundamento numa Livrança entregue em branco que servia apenas para garantia do cumprimento, havendo cumprimento!
M) Constitui, aliás, um verdadeiro abuso de direito, proibido pelo artigo 334.º do Código Civil, a conduta do Banco exequente ao:
a)- Aderir voluntariamente a um plano de pagamentos que modifica o contrato de crédito inicialmente celebrado entre as partes, prestar informação no final de Julho de 2014 em relação ao NIB para o qual deveriam ser realizados os pagamentos mensais, receber as respectivas prestações em Agosto e Setembro de 2014 e ao mesmo tempo preencher nesse mesmo mês de Setembro de 2014 a Livrança que servia unicamente como garantia de cumprimento do contrato que acabava de ser livremente modificado e homologado por sentença; e
b)- Apresentar um requerimento executivo a cobrar coercivamente o valor de € 11.576,99 acrescidos de juros de mora, num total de € 12.685,16 quando foi recebendo dos mutuários as quantias previstas no plano de pagamentos até à data da instauração da execução, não fazendo menção desses recebimentos e não descontando tais valores ao peticionado.
N)– Com o devido respeito, o Banco recorrente sustenta todo o seu recurso em três premissas, quanto a nós, completamente erradas e que inquinam qualquer possibilidade de sucesso da sua pretensão:
a)- Faz longo apelo à característica de autonomia dos títulos de créditos, mas sem conseguir contraditar o essencial e prévio, que consiste na ostensiva violação do próprio pacto de preenchimento, ou seja, preencheu o título, apondo-lhe um montante e data de vencimento que manifestamente não lhe era permitido;
b)- Ao arrepio do próprio CIRE, tenta sustentar que o seu crédito ficou todo ele vencido, o que não corresponde logicamente à verdade, não lhe sendo possível preencher o título pelos montantes dele constantes;
c)- Pretende que seja aplicável o artigo 217.º do CIRE, quando o mesmo diploma é claro ao considerar inaplicável aos planos de pagamento tal norma; e
d)- Confunde claramente a resolução contratual que alega ter ocorrido, sendo certo que nunca o Banco embargado podia ter resolvido o contrato em apreço (nem sequer nunca o fez).
O)– É verdade que o título de crédito goza de autonomia, mas antes dessa autonomia, terá de ser respeitado o pacto de preenchimento (o que não sucedeu, conforme já explanado).
P)– A sentença de insolvência que é proferida após o trânsito em julgado do incidente de plano de pagamentos não implica o vencimento de todas as dívidas (ao contrário no alegado no recurso), mas tem apenas os efeitos previstos no artigo 259.º do CIRE - “da sentença de declaração de insolvência constam apenas as menções referidas nas alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 36.º, sendo aplicável o disposto na alínea a) do n.º 7 do artigo 39.º”.
Q)– O artigo 217.º do CIRE a que a apelada faz referência no seu recurso é igualmente inaplicável, pois a norma especial do artigo 250.º do CIRE dispõe que aos processos de insolvência abrangidos pelo presente capítulo (onde se inserem os planos de pagamento) não são aplicáveis as disposições dos títulos IX (onde se encontra o artigo 217.º) e X.
R)– Como já se destacou, o Banco embargado nunca resolveu o contrato com os mutuários, sendo certo que a missiva enviada à recorrida (avalista) não tem logicamente como efeito resolver o contrato de mútuo, até porque foi enviada após o trânsito em julgado da decisão de homologação do plano de pagamentos a que o próprio Banco voluntariamente aderiu em momento que estava a ser integralmente cumprido (como aliás, ainda está – vide artigo 27.º alegações de recurso e ponto 11 dos factos provados constantes da sentença).
S)– Não existem assim, quaisquer dúvidas de que o Banco exequente/embargado procedeu ao preenchimento abusivo do título de crédito, uma vez que, ao contrário da condição acordada para o seu preenchimento, não existia qualquer incumprimento do contrato de crédito nº …-… aquando do seu preenchimento, não estando em dívida em tal data a quantia que foi aposta.
T)– O que se requer seja confirmado pelo Venerando Tribunal da Relação”.
7– O recurso foi admitido por despacho datado de 13/10/2018, como apelação, com subida nos próprios autos e efeito devolutivo.

8– Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar, valorar, ajuizar e decidir.
***

II–ÂMBITO DO RECURSO DE APELAÇÃO

Prescrevem os nºs. 1 e 2, do artº. 639º do Cód. de Processo Civil, estatuindo acerca do ónus de alegar e formular conclusões, que:
“1– o recorrente deve apresentar a sua alegação, na qual conclui, de forma sintética, pela indicação dos fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão.
2– Versando o recurso sobre matéria de direito, as conclusões devem indicar:
a)- As normas jurídicas violadas ;
b)- O sentido com que, no entender do recorrente, as normas que constituem fundamento jurídico da decisão deviam ter sido interpretadas e aplicadas ;
c)- Invocando-se erro na determinação da norma aplicável, a norma jurídica que, no entendimento do recorrente, devia ter sido aplicada”.
Por sua vez, na esteira do prescrito no nº. 4 do artº. 635º do mesmo diploma, o qual dispõe que “nas conclusões da alegação, pode o recorrente restringir, expressa ou tacitamente, o objecto inicial do recurso”, é pelas conclusões da alegação da Recorrente Apelante que se define o objecto e se delimita o âmbito do recurso, sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, apenas estando este tribunal adstrito à apreciação das questões suscitadas que sejam relevantes para conhecimento do objecto do recurso.
Pelo que, na ponderação do objecto do recurso interposto pela Recorrente  Embargada, delimitado pelo teor das conclusões expostas, a apreciação a efectuar na presente sede consubstancia-se, fundamentalmente, no seguinte:
a)- se o Banco Exequente, ora Embargado, podia preencher a livrança dada à execução e, na afirmativa, qual o valor que lhe era lícito apor na mesma ;
b)- e, por outro lado, se o mesmo Banco Exequente podia exigir à Executada/Avalista, ora Embargante, o pagamento imediato da livrança dada à execução, após a homologação de plano de pagamentos apresentado no âmbito do incidente de aprovação de plano de pagamentos, nos autos de insolvência dos subscritores da livrança, ou seja, se a avalista Embargante pode defender-se com a excepção do homologado plano de pagamentos, onde ficou estabelecido, quanto ao reembolso do crédito, “o pagamento de 100% (cem por cento) do seu valor, mediante 120 (cento e vinte) prestações mensais, iguais e sucessivas”.

O que implica, in casu, a análise das seguintes questões:
-Da natureza jurídica e função do aval ;
-Do alegado incumprimento do contrato de mútuo celebrado justificativo do preenchimento da livrança, em articulação com a alegada violação do pacto de preenchimento ;
-Dos efeitos da declaração de insolvência dos mutuários subscritores e da eventual aplicabilidade do nº. 1, do artº. 91º, do CIRE ;
-Da alegada resolução do contrato de crédito mediante interpelação efectuada à avalista ;
-Do exercício consentido aos credores pelo artº. 217º, nº. 4, do CIRE.
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III–FUNDAMENTAÇÃO

A–FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

Na sentença apelada foi CONSIDERADA PROVADA a seguinte matéria de facto:

1.– Banco BPI, S.A. instaurou, em 3 de agosto de 2016, execução contra SM…, para pagamento da quantia, liquidada no requerimento executivo, de €12.685,16 (doze mil seiscentos e oitenta e cinco euros e dezasseis cêntimos).
2.– A execução funda-se em livrança, subscrita por CF… e por JA…, avalizada, a favor destes, pela executada, constando do seu teor a data de emissão de 19 de setembro de 2014, o montante, por extenso e algarismos, de €11.576,99 (onze mil quinhentos e setenta e seis euros e noventa e nove cêntimos), e a menção a “caução do empréstimo n.º …”.
3.– Em 6 de março de 2012, os subscritores da livrança e o exequente celebraram, por escrito, com o n.º …, contrato por via do qual os primeiros se comprometeram a restituir ao segundo a quantia de €13.141,75 (treze mil cento e quarenta e um euros e setenta e cinco cêntimos), mediante 72 (setenta e duas) prestações mensais, iguais e sucessivas, de capital e juros, no valor de €254,88 (duzentos e cinquenta e quatro euros e oitenta e oito cêntimos), cada, a liquidar até ao dia 30 (trinta) de cada mês.
4.– A livrança foi assinada e entregue ao exequente, com a data de vencimento e o montante por preencher, em garantia das responsabilidades dos subscritores emergentes da celebração do referido contrato.
5.– A executada declarou, através do referido escrito, na qualidade ali designada de “avalista”, que aceita ser avalista dos mutuários do empréstimo, por quem foi informada do montante da dívida a contrair, bem como das cláusulas do contrato, que aceita, avalizando para o efeito a livrança de caução em branco anexa ao contrato.
6.– A executada declarou ainda, através do mesmo escrito, que autoriza que o Banco BPI, S.A., em caso de incumprimento dos mutuários de qualquer das obrigações decorrentes do contrato, designadamente da obrigação de pagamento ao Banco BPI do capital e juros em caso de exercício do direito de livre revogação, a completar o preenchimento daquela livrança, fixando-lhe o vencimento e indicando, como montante, tudo quanto constitua crédito do Banco, logo que deixe de ser cumprida qualquer obrigação caucionada. Fica ainda o BPI autorizado a proceder à cobrança dos montantes em dívida por débito na sua conta e a proceder à ação judicial respetiva caso se mantenha o incumprimento.

7.– Constam do referido escrito, entre outras, as seguintes “Condições Gerais do Contrato”:

Cláusula 4ª – Titulação e Convenção de Preenchimento

1.- O(s) Mutuário(s) entrega(m) nesta data ao Banco uma Livrança em branco, por si subscrita, a favor do Banco, com a cláusula “Não à Ordem”, a qual ficará em poder deste para caucionar o integral cumprimento de todas e quaisquer obrigações e responsabilidades, actuais e futuras, decorrentes do presente Contrato, designadamente, da obrigação de pagamento ao Banco do capital e juros em caso do exercício do direito de livre revogação.
2.- O(s) Avalista(s), identificado(s) nas Condições Particulares deverá(ão)apor a seu aval na Livrança acima referida.
3.- O Banco fica expressa e irrevogavelmente autorizado a completar o preenchimento da Livrança referida no número anterior, nomeadamente no que diz respeita à data de vencimento, valor e local de pagamento, quando o entender necessário para a boa cobrança dos seus créditos, encargos e despesas que tenha a suportar.
4.- O presente Contrato é título executivo bastante para efeitos de reclamação do crédito ou da acção executiva, qualquer que seja a natureza do processo e a espécie de tribunal em que ocorra.

Cláusula 8ª – Não cumprimento do contrato de crédito pelo mutuário´

1.– Em caso de incumprimento do contrato de crédito pelo mutuário, o Banco pode invocar a perda do benefício do prazo e/ou a resolução do contrato se, cumulativamente, ocorrerem as circunstâncias seguintes:
a)- a falta de pagamento de duas prestações sucessivas que exceda 10% do montante total do crédito.
b)- Ter o Banco, sem sucesso, concedido ao mutuário um prazo suplementar mínimo de 15 dias para proceder ao pagamento das prestações em atraso, acrescidas da eventual indemnização devida, com a expressa advertência dos efeitos da perda do benefício do prazo ou da resolução do contrato.
2.– Para efeitos do disposto na antecedente alínea a), os pagamentos efectuados servirão para liquidar as prestações que primeiro se tiverem vencido.
3.– As situações indicadas no número 1. antecedente serão comunicadas ao(s) Mutuário(s) por carta registada com aviso de recepção.
4.– A resolução do contrato de crédito pelo credor não obsta a que este possa exigir o pagamento de eventual sanção contratual ou a indemnização, nos termos gerais.

8.– Os mutuários apresentaram-se à insolvência e instauraram incidente de aprovação de plano de pagamentos com o n.º …/… do extinto ….º Juízo Cível de Loures, no âmbito do qual foi proferida sentença em 6 de fevereiro de 2014, transitada em julgado em 26 de fevereiro de 2014, que homologou o plano de pagamentos apresentado por aqueles.
9.– Os mutuários foram declarados insolventes por decisão de 18 de março de 2014, proferida nos autos principais.
10.– O crédito do exequente, derivado da celebração do referido contrato, consta daquele plano de pagamentos, nos termos do qual se prevê o pagamento de 100% (cem por cento) do seu valor, mediante 120 (cento e vinte) prestações mensais, iguais e sucessivas.
11.– As referidas prestações encontram-se a ser liquidadas até ao momento.
12.– O exequente enviou carta datada de 18 de setembro de 2014, dirigida à executada e endereçada para morada desta, do teor da qual consta o seguinte: “Serve a presente para informar que, em virtude da atual situação de incumprimento, consideramos definitivamente resolvido o contrato (…) em que V. Exa. intervém como Avalista. Consequentemente, torna-se imediatamente exigível todo o valor em dívida que compreende: prestações vencidas e não pagas, capital vincendo, juros de mora e despesas, tudo num total de €11.576,99. Comunicamos-lhe ainda que de acordo com a cláusula 4.ª do contrato, preenchemos e procederemos à execução da livrança que V. Exa. avalizou e que nos foi entregue no momento da celebração do contrato para garantia do seu bom cumprimento, nos seguintes termos: Data de Vencimento: 29.09.2014, Valor da Livrança: €11.576,99, A que acresce o respetivo imposto de selo no valor de €57,88. Assim, sob pena de recurso à ação judicial, interpelamos V. Exa. para proceder à liquidação dos montantes acima referidos, no prazo máximo de 10 (dez) dias, junto de qualquer balcão do Banco BPI, S.A.”.
13.– As prestações mensais fixadas no referido contrato deixaram de ser liquidadas a partir da que se venceu em 30 de Outubro de 2013.
***

B–FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO
                       
Da natureza jurídica e função do aval e da obrigação do avalista


Na oposição apresentada, alega a Embargante, ora Recorrida, ter prestado aval numa livrança em branco, para garantia de cumprimento de contrato de crédito celebrado entre o Banco Exequente, ora Recorrente, e os mutuários CF… e JA….
Considera que o preenchimento efectuado pelo Banco Exequente foi abusivo, pois, contrariamente à condição então acordada no contrato de crédito, inexistia qualquer incumprimento à data de tal preenchimento, ou seja, em 29/09/2014, ocorrendo, assim, violação do pacto de preenchimento.
Acrescenta que no ano de 2013, e no âmbito de processo de insolvência, os mutuários apresentaram aos seus credores (entre os quais se incluía o Banco Exequente) um plano de pagamento de todas as suas dívidas, ao qual o Banco Exequente aderiu, sem necessidade de suprir a sua eventual falta de adesão.  
Tal plano foi homologado por sentença de 06/02/2014 e, nos termos acordados e conforme as notificações e informações prestadas, a obrigação de pagamento encontrava-se cumprida em Setembro de 2014. Donde, inexistia qualquer incumprimento dos mutuários, pelo que o preenchimento da livrança dada á execução foi abusivo.
Por outro lado, o Banco Exequente só podia invocar a perda do benefício do prazo e considerar resolvido o contrato de mútuo, verificadas, cumulativamente, as circunstâncias enunciadas no nº. 1, da Cláusula 8ª das Condições Gerais do Contrato, o que não se verificou, tendo os mutuários continuado a pagar as prestações acordadas no plano de pagamentos, mesmo depois do preenchimento da livrança e sua execução.
Donde, ao preencher a livrança, o Banco Exequente agiu com abuso de direito.
Na decorrência do exposto, surge, então, no âmbito do petitório, o pedido de extinção da execução, através da procedência dos embargos deduzidos e, sem prescindir, deverá esta procedência ser, pelo menos, parcial, deduzindo-se ao valor total peticionado as quantias já pagas pelos mutuários, no âmbito do plano de pagamentos homologado, no competente incidente dos autos de insolvência.

Na contestação aos embargos, o Banco Exequente, invoca o artº. 32º da Lei Uniforme Relativa a Letras e Livranças, realçando a autonomia da obrigação do avalista, independente da relação subjacente entre o portador e o subscritor, pelo que aquele não pode opor excepções fundadas nesta relação subjacente, com excepção do pagamento.
Cita, ainda, o prescrito no nº. 4, do artº. 217º, do CIRE, mencionando que a Embargante/Avalista está fora do âmbito do plano de pagamentos, defendendo, ainda, ter inexistido qualquer preenchimento abusivo ou não autorizado da livrança exequenda.

A sentença apelada raciocinou, em súmula, mediante a seguinte argumentação:
- provou-se que as prestações mensais fixadas no contrato de mútuo deixaram de ser liquidadas a partir da que se venceu em 30/10/2013 – cf., facto 13. ;
- a Embargante/Executada responde perante o Banco Exequente, única e exclusivamente, na qualidade de avalista, ou seja, a sua obrigação é apenas a obrigação cambiária, decorrente do aval em branco, e não a obrigação causal, própria dos mutuários ;
- Exequente e Executada foram partes num acordo de preenchimento da livrança, em função do qual definiram a responsabilidade cambiária da Executada Avalista, tendo esta sido parametrizada, essencialmente, pelo incumprimento, por parte dos mutuários, subscritores de tal livrança, do contrato de crédito garantido ;
- efectivamente, o crédito causal do Banco Exequente, com base no qual a livrança poderia ser preenchida, é o que deriva da situação de incumprimento contratual dos mutuários ;
- todavia, tendo sido parte no acordo de preenchimento (pacto de preenchimento), a Embargante, Avalista em branco, devedora cambiária, pode opor ao Exequente/Embargado, credor cambiário, a inexistência de qualquer situação de incumprimento contratual dos mutuários à data em que a livrança foi preenchida ;
- por outro lado, o plano de pagamentos acordado no âmbito do incidente de aprovação de plano de pagamentos, por apenso aos autos de insolvência dos mutuários, não se estende a terceiro que tenha prestado garantia pessoal a favor do crédito, in casu à Avalista, tendo em conta a natureza e o regime especial do aval, o qual se mantém mesmo no caso de a obrigação que garante ser nula por qualquer razão que não seja um vício de forma – cf., o artº. 32º, 2º §, da L.U.L.L  ;
- todavia, a partir da homologação de tal plano de pagamentos, que abrangeu o crédito derivado do contrato celebrado entre o Banco Exequente e os mutuários (subscritores da livrança), deixa de poder falar-se em incumprimento contratual por partes destes, pelo que tal incumprimento, enquanto pressuposto do preenchimento da livrança, só existe no período compreendido entre 30/10/2013 a 30/01/2014, ou seja, 4 prestações, no montante total de 1.019,52 € ;
- acresce que a situação de insolvência dos devedores mutuários não pode considerar-se coberta pelo pacto de preenchimento, ou seja, nada se convencionou expressamente nesse sentido e, interpretando o convencionado de acordo com as regras interpretativas dos negócios jurídicos, não se extrai a vontade de autorizar o Banco mutuante a preencher a livrança com ao valor da totalidade das prestações vincendas, caso os mutuários fossem declarados insolventes ;
- pois, o que se retira do acordo firmado é a possibilidade de preenchimento da livrança em caso de incumprimento dos mutuários de qualquer das obrigações decorrentes do contrato, sendo este o único objecto que define a responsabilidade cambiária da Avalista/Executada ;
- No que concerne às condições exigidas para a perda do benefício do prazo e/ou resolução do contrato, enunciadas no nº. 1, da cláusula 8ª, das Condições Gerais do Contrato, nada foi estabelecido, em sentido diverso, em relação à Avalista ;
- donde, na ponderação da falta de pagamento, pelos mutuários, das prestações vencidas, no indicado período – 30/10/2013 a 30/01/2014 -, não se verifica a previsão da alínea a), do nº. 1, da cláusula 8ª, pelo que não pode considerar-se ter ocorrido o vencimento imediato da totalidade das prestações fixadas ;
- pelo que deve negar-se a produção de tal efeito jurídico à comunicação feita pelo Exequente à Executada/Embargante, por ser desconforme com o que foi convencionado ;
- assim, o Banco Exequente, à data do preenchimento da livrança, só podia exigir dos mutuários o pagamento daquelas 4 prestações mensais, vencidas e não pagas, pelo que, sendo este o crédito causal, ao preencher a livrança com montante superior, o Exequente desrespeitou o pacto de preenchimento, importando assim reduzir tal montante aos limites do crédito causal.

O Banco Apelante discorda da decisão sob apelo, invocando, num esforço de sintetização, o seguinte:
- o aval é uma garantia bancária, sendo-lhe aplicável os princípios da fiança que não contradigam o seu carácter cambiário – cf., artº. 30º, da Lei Uniforme Relativa a Letras e Livranças ;
- a obrigação do avalista caracteriza-se, assim, como uma obrigação materialmente autónoma, ainda que formalmente dependente da obrigação do avalizado, pois vive e subsiste independentemente da obrigação do avalizado, mantendo-se mesmo que seja nula a obrigação garantida, salvo se a nulidade provier de vício de forma – cf., artº. 32º, da L.U.L.L. ;
- deste modo, o avalista não pode defender-se com as excepções do avalizado, salvo no que concerne ao pagamento, e desde que o portador seja o mesmo em relação ao qual o avalizado extinguiu a sua obrigação ;
- o contrato de crédito/mútuo não foi totalmente cumprido pelos mutuários subscritores, tendo-se iniciado o incumprimento em 30/10/2013, pelo que sendo a dívida liquidável em prestações, a falta de pagamento de uma delas importa o vencimento de todas – cf., artº. 781º, do Cód. Civil ;
- por outro lado, a declaração de insolvência dos mutuários subscritores, datada de 18/03/2014, teve por efeito o vencimento das restantes prestações em dívida, sem necessidade de qualquer interpelação, conforme decorre do artº. 91º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas ;
- o Exequente resolveu o contrato de crédito, enviando a devida carta de interpelação à Executada/Avalista, pois manteve os direitos de que dispunha contra condevedores e terceiros garantes, podendo exigir destes tudo aquilo por que respondem, e no regime de responsabilidade originário, nos termos previstos no nº. 4, do artº. 217º, do CIRE (inexiste qualquer extravasar do limite de risco que os garantes assumiram) ;
- com efeito, o deliberado no incidente de aprovação do plano de pagamentos dos mutuários subscritores não afecta os direitos do Exequente contra a Avalista, nem proíbe o Banco credor de accionar os demais obrigados cambiários durante a vigência de tal plano ;
- pois, este plano de pagamentos, e o aí deliberado, apenas vincula o Banco Exequente no que se reporta à exigibilidade do crédito quanto aos mutuários subscritores, não estando a Executada/Avalista sob a tutela deste plano de insolvência, pelo que não pode invocar a inexigibilidade temporária do crédito prevista naquele plano.

Do exposto, resultam, num excessivo esforço de síntese, três diferenciadas posições:

I)– A da Executada/Embargante para quem, inexistindo qualquer situação de incumprimento, o preenchimento da livrança entregue em branco ao mutuante Banco é abusivo, devendo, consequentemente, ser declarada extinta a execução instaurada ;
II)– A do Exequente/Embargado, entendendo ter ocorrido efectivo incumprimento por parte dos mutuários, legitimando o preenchimento da livrança entregue em branco pelo valor então em dívida, mediante prévia resolução do contrato e interpelação da Avalista, pois o acordado em sede de incidente de aprovação do plano de pagamentos dos mutuários subscritores, por apenso aos autos de insolvência, não afecta os direitos do Exequente contra a Avalista ;
III)– A do Tribunal a quo, que, apesar de reconhecer que a Embargante, enquanto avalista, responde apenas perante o Banco Exequente nessa qualidade, entende que, tendo sido ambos parte no acordo de preenchimento da livrança, a responsabilidade cambiária da Executada/Avalista é parametrizada, no essencial, pelo incumprimento dos mutuários subscritores da livrança, sendo que este apenas ocorreu relativamente a 4 prestações, no valor total de 1.019,52 €, pelo que só este valor poderia ter sido aposto no título preenchido.
   
Vejamos.

Prevendo acerca da garantia do pagamento pelo aval, prescreve o artº. 30º, da LULL que “o pagamento de uma letra pode ser no todo ou em parte garantido por aval. Esta garantia é dada por um terceiro ou mesmo por um signatário da letra”.
Acrescenta o artº. 32º, no âmbito da responsabilidade do avalista, que “o dador de aval é responsável da mesma maneira que a pessoa por ele afiançada.
A sua obrigação mantém-se, mesmo no caso de a obrigação que ele garantiu ser nula por qualquer razão que não seja um vício de forma.
Se o dador de aval paga a letra, fica sub-rogado nos direitos emergentes da letra contra a pessoa a favor de quem foi dado o aval e contra os obrigados para com esta em virtude da letra”.

Por sua vez, o artº. 47º, do mesmo diploma, ao determinar a responsabilidade solidária dos intervenientes na letra, aduz que “os sacadores, aceitantes, endossantes ou avalistas de uma letra são todos solidariamente responsáveis para com o portador.
O portador tem o direito de accionar todas estas pessoas, individualmente ou colectivamente, sem estar adstrito a observar a ordem por que elas se obrigaram.
O mesmo direito possui qualquer dos signatários de uma letra quando a tenha pago.
A acção intentada contra um dos co-obrigados não impede de accionar os outros, mesmo os posteriores àquele que foi accionado em primeiro lugar”.

Referencie-se, ainda, o estatuído no artº. 10º, do mesmo diploma, ajuizando acerca da violação do acordo na emissão da letra, que “se uma letra incompleta no momento de ser passada tiver sido completada contrariamente aos acordos realizados, não pode a inobservância desses acordos ser motivo de oposição ao portador, salvo se este tiver adquirido a letra de má fé ou, adquirindo-a, tenha cometido uma falta grave”.

Todos estes normativos, previstos para as letras, “são aplicáveis às livranças, na parte em que não sejam contrárias à natureza deste escrito”, conforme prescrito no artº. 77º, do mesmo diploma, enunciando o artº. 75º acerca dos requisitos da livrança.

Definindo-se o título de crédito como o “documento necessário para exercitar o direito literal e autónomo nele mencionado” ou incorporado, é certo que o “direito cartular pressupõe uma relação jurídica anterior – a relação subjacente ou fundamental -, de forma que sem esta relação não se explica a criação do título”.

E, o direito cartular “tem normalmente o mesmo conteúdo económico de um dos direitos que decorrem dessa relação jurídica” prévia, pelo que “o título de crédito em confronto com a relação fundamental apresenta-se com uma feição unilateral: refere-se exclusivamente aos direitos de uma só das partes”.

Assim, e para além da ideia da incorporação, tradutora da conexão existente entre o documento e o direito, os títulos de crédito possuem, ainda, as características da literalidade e autonomia.

A primeira, traduz que o “direito incorporado no título é um direito literal, no sentido de que a letra do título é decisiva para a determinação do conteúdo, limites e modalidades do direito”, enquanto que, no que concerne à autonomia, afirma-se que “o direito é autónomo, dado que o possuidor do título, o que o recebeu segundo a sua lei de circulação, adquire o direito nele referido de um modo originário, isto é, independentemente da titularidade do seu antecessor e dos possíveis vícios dessa titularidade”.

Tais características, e a disciplina jurídica que lhes subjaz, “aparece toda ele enformada pela preocupação de defesa dos interesses de terceiros de boa fé”, no sentido de que “todo aquele que tiver adquirido, pelo modo legal de transmissão, um título de crédito, deve poder confiar no seu conteúdo literal e estar defendido contra a alegação de quaisquer irregularidades que tiverem porventura ocorrido numa fase precedente da circulação do mesmo título” [2].

Especificamente no que concerne ao aval, é este definido como “o acto pelo qual um terceiro ou um signatário da letra garante o pagamento dela por parte de um dos seus subscritores” [3], sendo assim a natureza jurídica da sua obrigação a de garantia da obrigação do avalizado.

Ou, por outras palavras, traduz-se no “negócio cambiário unilateral e abstracto que tem por conteúdo uma promessa de pagar a letra e por função a garantia desse pagamento” [4].

Tal característica de garantia é extensível em termos económicos, pois o “fim próprio, a função específica do aval é garantir ou caucionar a obrigação de certo subscritor cambiário, que se designa na letra de maneira expressa ou tácita”. Isto é, a garantia do avalista “vem inserir-se ao lado da obrigação de um determinado subscritor, cobrindo-a, caucionando-a”.

Ou seja, no que concerne à natureza e medida da responsabilidade do avalista, a sua extensão e conteúdo da obrigação “aferem-se pela do avalizado”, pelo que “qualquer limitação de responsabilidade expressa por este no título aproveita àquele”.

Todavia, “a responsabilidade do avalista não é subsidiária da do avalizado. Trata-se de uma responsabilidade solidária. O avalista não goza do benefício da excussão prévia, mas responde pelo pagamento da letra solidariamente com os demais subscritores (art. 47º, I). Além de não ser subsidiária, a obrigação do avalista não é, senão imperfeitamente, uma obrigação acessória relativamente à do avalizado. Trata-se de uma obrigação materialmente autónoma, embora dependente da última quanto ao aspecto formal” [5].

Nas palavras de Pedro Pais de Vasconcelos [6], que nega igualmente tal subsidariedade, a responsabilidade do avalista é “solidária e cumulativa”, sendo, neste aspecto, “acessória da do avalizado”.

Realça, ainda, a posição de autonomia do avalista, ao referenciar a subsistência do aval, “mesmo que o acto do avalizado seja nulo por qualquer razão que não o vício de forma (artº 32º/2 LULL)”. Assim, “a autonomia do aval traduz-se num regime segundo o qual o avalista é responsável pelo pagamento da obrigação cambiária própria como avalista, que se define pela do avalizado, mas que vive e subsiste independentemente desta”.

Deste modo, a partir da característica de autonomia do aval, este “evoluiu no sentido de a obrigação do avalista se tornar independente e, portanto, o aval passou a ter natureza diferente da fiança”, adoptando a Lei Uniforme “a tese do aval-fiança objectiva”.

Donde, resulta do § 2º, do artº. 32º de tal diploma, que “se a nulidade da obrigação avalizada não destrói a obrigação do avalista, (é porque)…a obrigação do avalista é uma responsabilidade que garante….o pagamento da letra e não constitui uma mera responsabilidade pelo pagamento da letra por parte de uma certa pessoa: o avalizado. Responde-se objectivamente pelo pagamento da letra, não se responde subjectivamente, ou seja, pelo pagamento dela por parte da pessoa avalizada” [7]

Acresce que, tal como os demais actos cambiários, e nos termos supra expostos, o aval possui uma relação subjacente ou fundamental, que “é constituída pela relação jurídica que funda a prestação do aval e que pode ser invocada nas relações entre o avalista e o avalizado” [8].

Aqui chegados, recentremos a controvérsia em equação:

Podia o Banco Exequente/Embargado, ora Apelante, preencher a livrança dada à execução ?

E, na afirmativa, qual o valor que licitamente poderia apor na mesma ?
Podia o mesmo Banco Exequente exigir à Avalista/Executada, ora Embargante Apelada, o pagamento imediato da livrança dada à execução, pela totalidade da quantia alegadamente em dívida, mesmo após ter sido decidida, nos competentes autos de insolvência, a homologação do plano de pagamentos (ao qual o Exequente, inclusive, aderiu), apresentado pelos mutuários devedores, subscritores da livrança,no âmbito do incidente de aprovação de plano de pagamentos ?
Ou poderia, antes, a Avalista/Executada/Embargante, ora Apelada, defender-se, por excepção, através da invocação daquele homologado plano de pagamentos, onde ficou estabelecido, quanto ao reembolso do crédito, “o pagamento de 100% (cem por cento) do seu valor, mediante 120 (cento e vinte) prestações mensais, iguais e sucessivas” ?

Do alegado incumprimento do contrato de mútuo celebrado justificativo do preenchimento da livrança, em articulação com a alegada violação do pacto de preenchimento

Relativamente ao pacto de preenchimento, e de acordo com o prescrito no transcrito artº. 10º da L.U.L.L, que é igualmente aplicável às livranças, “é possível e é frequente que ao tempo do saque e do aceite não esteja ainda definitivamente determinado o valor do crédito subjacente, seja ainda ilíquido. Neste caso a letra é passada com o valor em branco”.

Quando tal suceda, “a letra pode ser preenchida posteriormente e deve sê-lo antes de apresentada a pagamento”, sendo que tal preenchimento “deve ser feito de acordo com o convencionado”.

Deste modo, “sempre que é emitida uma letra em branco tem que ter havido prévia ou simultaneamente à emissão um acordo quanto ao critério do preenchimento. Este acordo é uma convenção extracartular e designa-se por pacto de preenchimento”.

Este pacto, por outro lado, configura-se como “uma convenção obrigacional e informal. Tem como conteúdo a obrigação de preencher a letra de acordo com o critério estipulado e só é oponível entre as partes”.

A violação de tal pacto ou acordo de preenchimento “designa-se por preenchimento abusivo” e não é oponível ao portador, devendo, todavia, “entender-se que o portador referido no artº 10º LULL a que o preenchimento abusivo se não pode opor é um portador que não seja interveniente no pacto de preenchimento. A doutrina do artº 10º é a mesma do artº 17º LULL: as convenções extracartulares só podem ser opostas entre os respectivos intervenientes” [9] [10]

Todavia, sendo uma letra (ou livrança) emitida em branco, “a obrigação que incorpora só poderá efectivar-se desde que no momento do vencimento o título se encontre preenchido. Se o preenchimento se não fizer antes do vencimento, então o escrito não produzirá efeito como letra, de harmonia com os arts. 1º e 2º”.

Pelo que, no que concerne à obrigação cambiária, ou seja, a obrigação de pagar a quantia inscrita no título, “ela só se constituiria através do preenchimento”, pois o que “existe antes do preenchimento para o emitente do título não é a obrigação cambiária, é apenas o estar ele sujeito ao exercício do direito (potestativo) do portador de preencher a letra, sendo o preenchimento que marca o nascimento da obrigação cambiária” [11].


Do entendimento jurisprudencial

As várias questões em controvérsia equacionadas mereceram devido tratamento jurisprudencial, que ora procuraremos sintetizar.
Refere o douto Acórdão Uniformizador de Jurisprudência do STJ de 11/12/2012 – Relator: Gabriel Catarino, Processo nº. 5903/09.4TVLSB.L1.L1.S1, in www.dgsi.pt -, após catalogar a garantia oferecida pelo aval como acessória e autónoma, com natureza independente relativamente à obrigação avalizada, ainda que formalmente dependente desta, que o aval surge como “um acto pelo qual uma pessoa que não está obrigada por qualquer razão a pagar uma letra (ou outro título de crédito) aceita fazê-lo para garantir a responsabilidade de um dos obrigados, sacador, subscritor ou endossante”.

Seguidamente, após enunciar os traços distintivos do aval relativamente à fiança, aduz que “o aval, qual garantia objectiva não se vincula com a pessoa nem com a obrigação avalizada, mas tão só porque, singelamente, é uma garantia de pagamento de uma obrigação que emerge do título”.

Deste modo, acrescenta, “tratando-se de uma obrigação autónoma, independente da relação subjacente, não poderá, em nosso juízo, o avalista valer-se da renovação/prorrogação do contrato de abertura de crédito para se desobrigar de uma obrigação que, pela sua abstracção e literalidade, se emancipou da relação subjacente para subsistir como obrigação independente e autónoma. O avalista não é responsável ou não se obriga ao cumprimento da obrigação constituída pelo avalizado mas tão só ao pagamento da quantia titulada no título de crédito. A obrigação firmada pelo avalista é perante a obrigação cartular e não perante a relação subjacente. [ Cfr. Ac. do STJ de 19-06-2007, in www.stj.pt de que deixa extractada a parte interessante. “Poderia dizer-se tão-somente que, inexistindo vício de forma, se mantêm a obrigação dos avalistas, “ex vi” da segunda parte do artigo 32º da LULL.

Dir-se-á, contudo, que a razão de ser desta norma, é ser o aval um acto cambiário que desencadeia uma obrigação independente, autónoma. (cfr. o Prof. Ferrer Correia, ob. cit. 197 ss, o fazer notar que a responsabilidade do avalista não é subsidiária da do avalizado, mas solidária, pelo que o avalista não goza do beneficio da excussão prévia; e ainda para o facto da nulidade intrínseca da obrigação avalizada não se comunicar à do avalista, tendo este direito de regresso contra os signatários anteriores ao avalizado; cf. ainda, v.g, os Acórdãos do STJ de 27 de Maio de 2004 - 04 A1518 - e de 24 de Outubro de 2002 - 02 A2976).
O avalista não é sujeito da relação jurídica existente entre o portador e o subscritor da livrança mas apenas da relação subjacente à obrigação cambiária estabelecida entre ele e o seu avalizado.
É uma garantia de natureza pessoal que gera uma obrigação autónoma pois o avalista responsabiliza-se pela pessoa que avaliza, assumindo a responsabilidade, abstracta e objectiva, pelo pagamento do título.
Assim sendo, o avalista é responsável, nos mesmos termos em que o é a pessoa por ele garantida por qualquer acordo de preenchimento concluído entre o subscritor e o portador, não podendo invocar a excepção do preenchimento abusivo (cf. v.g, os Acórdãos do STJ de 6 de Março de 2007 - 07 A205 - e de 11 de Dezembro de 2003 - 03 A3529), sabido que o ónus da prova do preenchimento abusivo sempre caberia ao obrigado cambiário demandado, nos termos do artigo 342º nº 2 do Código Civil por integrar um facto impeditivo, modificativo ou extintivo do direito emergente do titulo de crédito. (cf. ainda, o Acórdão desta conferência de 14 de Dezembro de 2006 - 06 A2589)” (sublinhado nosso).

E, na prossecução da citação do aresto do STJ de 19/06/2007, aduz, em jeito conclusivo, que “também não pode o avalista apor quaisquer outras excepções do seu avalizado ao portador, salvo qualquer causa extintiva da obrigação decorrente das relações entre ambos.]
Do que ficou dito supra, o avalista não se obriga perante o avalizado mas sim perante o titular da letra ou da livrança, constituindo uma obrigação autónoma e independente e respondendo, como obrigado cartular, pelo pagamento da quantia titulada na letra ou livrança. A circunstância de ocorrerem vicissitudes na relação subjacente não captam a virtualidade de se transmitirem à obrigação cambiária pelo que esta se mantém inalterada e plenamente eficaz, podendo o beneficiário do aval agir, mediante acção cambiária, perante o avalista para obter a satisfação da quantia titulada na letra. A circunstância de a relação subjacente se modificar ou possuir contornos de renovação não induz ou faz seguir que esses efeitos se repercutam ou obtenham incidência jurídica na relação cambiária. A relação cambiária constituída permanece independente às mutações ou alterações que se processem na relação subjacente, não acompanhando as eventuais transformações temporais e/ou de qualidade da obrigação causal. Os efeitos da obrigação cartular assumida pelo avalista destacam-se da obrigação subjacente segregando um feixe de obrigações e deveres (…)” (sublinhado nosso).

Por sua vez, o douto aresto da RG de 05/12/2013 – Relatora: Helena Melo, Processo nº. 2088/12.2TBFAF-B.G1, in www.dgsi.pt -, enuncia que “o avalista não é sujeito da relação jurídica existente entre o portador imediato e o subscritor da livrança, mas apenas da relação subjacente à obrigação cambiária estabelecida entre ele e o seu avalizado”, pois, tal como as demais obrigações cambiárias, o aval está “subordinado aos princípios de incorporação, literalidade, autonomia e abstracção, revestindo as obrigações dos avalistas um carácter totalmente autónomo relativo à obrigação subjacente estabelecida entre o credor e o devedor por força de determinado negócio jurídico” (sublinhado nosso).

Acrescenta, então, que “embora a extensão e o conteúdo da obrigação do avalista se afira pela do avalizado, esta obrigação vive e subsiste independentemente da obrigação do avalizado, mantendo-se, mesmo que seja nula a obrigação garantida, salvo se a nulidade desta provier de um vício de forma (art. 32º da LULL).

A obrigação do avalista é pois uma obrigação autónoma, independente da relação subjacente entre o portador e o subscritor e, como tal, os avalistas não podem ôpor excepções fundadas nessa relação, com excepção do pagamento”.

Apela, ainda, ao decidido no Acórdão do STJ de 26/02/2013 (de que trataremos infra), e á citação neste contida do aresto do mesmo Alto Tribunal de 11/12/2012 (já supra referenciado), aplicando ao processo de revitalização o então já decidido relativamente à dilação do prazo de pagamento resultante de aprovação de um plano de insolvência, no sentido de que, apesar do processo de revitalização não consagrar norma idêntica ao nº. 4, do artº. 217º, do CIRE, tal não significa “que o legislador tenha pretendido consagrar solução diferente da que adoptou para o processo de insolvência, pois não o disse, não desconhecendo o disposto no nº 4. Aliás, apenas esta solução é possível, atento o princípio de autonomia da obrigação cambiária (…)”.

E, conclui, enunciando que não estava “vedado à exequente instaurar a execução contra os avalistas e reclamar o crédito por estes avalizado no processo de revitalização (nº 2 do artº 17º D do CIRE), não sendo permitido aos avalistas opôr a alteração do prazo de pagamento do crédito avalizado. Adaptando ao processo de revitalização, o que é referido no Ac. do STJ de 26.02.2013, há que referir o seguinte:
O plano de recuperação contém um conjunto de medidas que se aplicam à sociedade a revitalizar. Esse plano vincula-a e vincula os credores, mesmo os que não hajam participado nas negociações (nº 6 do artº 17º F), mas só vincula os credores relativamente à sociedade requerente e não relativamente aos terceiros, como são os ora executados.
Os credores votam o plano que é aprovado, atendendo à particular situação da sociedade que se encontra numa situação de económica difícil ou em situação de insolvência iminente (nº 1 do artº 17º-A do CIRE), estando os garantes fora do âmbito da revitalização e do que nesta se delibera.
O nº 1 do artº 519º do CC não impede que o credor reclame o seu crédito contra a sociedade subscritora e instaure execução contra os avalistas, pois verifica-se a existência de uma razão atendível para o efeito, que é a insolvência iminente da sociedade subscritora ou a dificuldade de obter a prestação por dificuldades económicas que conduziram à instauração de um processo de revitalização. Defendem os apelantes que aprovado o plano de revitalização, a subscritora deixa de se encontrar em dificuldades económicas. Ora, nada pode garantir que o plano de revitalização aprovado vá ser cumprido e de modo integral, sem embargo de, e como é evidente, não poder o credor receber da subscritora e do ou dos avalistas a totalidade do crédito garantido por aval” (sublinhado nosso).

O douto Acórdão do STJ de 26/02/2013 – Relator: Azevedo Ramos, Processo nº. 597/11.0TBSSB-A.L1.S1, in www.dgsi.pt -, perfilhando idêntico entendimento, referencia que o aval configura-se como “uma garantia prestada à obrigação cartular do avalizado”, não podendo o avalista “defender-se com as excepções que o seu avalizado pode opor ao portador do título, salvo a do pagamento”, o que decorre do facto do aval ser uma acto cambiário que desencadeia uma obrigação independente e autónoma.

Pelo que, fundando-se na doutrina da autonomia da obrigação do avalista, bem como no preceituado no nº. 4, do artº. 217º, do CIRE, conclui que “a aprovação de um plano de insolvência, com moratória para pagamento da dívida, de que beneficia a sociedade subscritora da livrança, não é invocável pelos avalistas contra quem é instaurada a execução para seu pagamento”, pois as medidas aprovadas no plano de insolvência só se aplicam à sociedade insolvente.

Tal solução justifica-se, ainda, na consideração de que “ao votar a favor de tal plano, o credor fá-lo apenas por se tratar de medidas aplicáveis a uma sociedade que está numa particular situação de impossibilidade de cumprir as suas obrigações para com os credores.
Não seria razoável que o credor ficasse inibido de accionar os respectivos avalistas, que não são insolventes, nem se encontram impossibilitados de cumprir as obrigações que livremente assumiram, face à autonomia da obrigação do aval que prestaram.
Com efeito, o credor do insolvente, ao votar favoravelmente um plano de insolvência, fá-lo apenas em relação ao insolvente.
Os garantes estão fora do âmbito da insolvência e do que nesta se delibera”.

Por fim, enuncie-se, ainda, o decidido no douto Acórdão da RC de 03/06/2014 – Relatora: Anabela Luna de Carvalho, Processo nº. 1030/13.8TBTMR-B.C1, in www.dgsi.pt -, que segue de perto o entendimento adoptado no já citado aresto do STJ de 26/02/2013.
Ajuizando relativamente a situação em que existiu a aprovação de um plano de revitalização, com moratória para pagamento da dívida, reafirma que “a obrigação firmada pelo avalista é perante a obrigação cartular e não perante a relação subjacente”, sendo que as vicissitudes ocorrida nesta não se transmitem à relação cambiária.
Assim, a circunstância da relação subjacente se modificar ou possuir contornos de renovação, não induz, ou faz seguir, que esses efeitos se repercutam ou obtenham efeitos jurídicos na relação cambiária [12].

Da aplicação ao caso sub judice

Em primeiro lugar, urge concluir que a aprovação do plano de pagamentos identificado nos factos 8. e 10. provados, no âmbito do respectivo incidente, e os efeitos daí decorrentes, não se estendem à Avalista/Embargante.
Com efeito, a relação cambiária constituída permanece independente às mutações ou alterações que se processem no âmbito da relação subjacente, não acompanhando as eventuais transformações temporais e ou de quantidade da obrigação subjacente ou causal [13]. Ou seja, e in casu, o homologado, por sentença, plano de pagamentos apresentado pelos mutuários, subscritores da livrança, prevendo o pagamento do crédito ora em equação numa modalidade temporal diferente da acordada no contrato de mútuo (facto 3.), não é oponível pela ora Embargante Avalista ao Embargado Banco, não podendo aquela socorrer-se do ali prescrito e homologado para, como excepção, se opor ao preenchimento da livrança nos termos operados.

O que parece plenamente justificar-se pelo apelo à natureza e regime especial do aval, assim se impondo o princípio da autonomia da obrigação cambiária, e encontra-se, ainda, em plena consonância com o prescrito no nº. 4, do artº. 217º, do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, no qual se refere que “as providências previstas no plano de insolvência com incidência no passivo do devedor não afetam a existência nem o montante dos direitos dos credores da insolvência contra os codevedores ou os terceiros garantes da obrigação, mas estes sujeitos apenas podem agir contra o devedor em via de regresso nos termos em que o credor da insolvência pudesse exercer contra ele os seus direitos”.

Decorre deste normativo que “seja qual for a posição assumida no processo, o credor mantém incólumes os direitos de que dispunha contra condevedores e terceiros garantes, podendo exigir deles tudo aquilo por que respondem e no regime de responsabilidade originário”, podendo, ainda, agir imediatamente contra garantes quando tenha votado favoravelmente um plano de insolvência que contemple uma moratória de pagamento.

Justificando tal solução, aduz-se não se descortinarem “razões determinantes para concluir diferentemente, conforme se esteja perante uma extinção - total ou parcial – de dívida ou, simplesmente, o seu reescalonamento, protegendo melhor o credor na primeira situação.
Potenciar-se-iam, aliás, resultados perversos, contrários aos interesses da generalidade dos credores e do próprio devedor, que o plano de insolvência intenta promover: por um lado, criar-se-ia um obstáculo ao apoio do credor e planos de reescalonamento de dívidas quando beneficie de garantias pessoais ; além disso, os credores seriam induzidos a preferir o perdão face à recalendarização, o que, aliás, redundaria em prejuízo dos próprios garantes” [14].

Nas contra-alegações apresentadas, invoca a Apelada Embargante que este normativo não é aplicável aos planos de pagamento, conforme decorre do artº. 250º do CIRE, ou seja, no incidente de plano de pagamentos aos credores não seria aplicável o regime que permite a cobrança dos terceiros garantes, pois tal apenas seria possível nos planos de insolvência.

Prescreve o artº. 250º do CIRE, prevendo acerca da inadmissibilidade de plano de insolvência e da administração pelo devedor, que “aos processos de insolvência abrangidos pelo presente capítulo não são aplicáveis as disposições dos títulos IX e X”, ou seja, nas situações em que estejam em causa a insolvência de não empresários e titulares de pequenas empresas, não são aplicáveis as disposições relativas ao plano de insolvência e da administração pelo devedor. Disposições entre as quais figura o citado artº. 217º, o qual prevê acerca dos efeitos gerais da execução do plano de insolvência.

Referem Luís Carvalho Fernandes e João Labareda [15] que “quanto ao Título IX, que rege sob o plano de insolvência, a razão de ser da exclusão reside no facto de, para os devedores aqui em causa, a lai prever uma figura sucedânea: o plano de pagamentos, a que, precisamente, eles podem, querendo, recorrer.
Não são, porém, obrigados a fazê-lo. E se, realmente, o não fizerem, recorrendo, por iniciativa própria, ao modelo comum do processo de insolvência ou não usando da faculdade de que dispõem quando a ação tenha sido instaurada por outro legitimado nos termos do artº. 20º, então nada obsta a que, nesse processo sob a forma comum, haja lugar a um plano de insolvência, exactamente porque não estaremos já perante processo abrangido neste Capítulo”.

Verifica-se, assim, por um lado, que a exclusão de aplicabilidade prevista no transcrito artº. 250º, do CIRE, reporta-se, no que ora interessa, a todo um Título (IX) previsto para o plano de insolvência, incluindo a sua aprovação, homologação, execução e efeitos, não sendo propriamente direccionada para o normativo em equação.

O que bem se compreende, pois, ao prever a figura do plano de pagamentos aos credores no âmbito da insolvência de pessoas singulares não empresários, ou titulares de pequenas empresas, afastada se mostra a aplicabilidade da figura jurídica do plano de insolvência.

Todavia, o regime previsto naquele nº. 4, do artº. 217º, do CIRE, mantém total pertinência de aplicabilidade também nas situações em que existe uma plano de pagamentos aos credores devidamente homologado, ou seja, as razões de ser subjacentes àquela previsão legal, mantêm total validade neste instituto jurídico.

Com efeito, diferenciada interpretação entraria em conflito com o interesse da generalidade dos credores e dos próprios devedores, pois, caso se afectasse, com a adesão ao plano de pagamentos, a existência ou o montante dos direitos dos credores relativamente aos terceiros garantes da obrigação, criar-se-ia um manifesto obstáculo ao apoio do credor aos propostos planos de pagamento, nas situações em que este beneficiasse daquelas garantias pessoais.

Donde decorre que, também nestas situações o entendimento resultante daquele normativo mantém a sua plena validade, devendo assim concluir-se pela sua aplicabilidade mesmo nas situações dos devedores singulares que apresentem, e vejam homologado, plano de pagamento aos credores.

Aliás, o presente entendimento mimetiza o exposto no citado Acórdão da RG de 05/12/2013 relativamente ao processo de revitalização, que não prevê norma idêntica ao citado nº. 4, do artº. 217º e, apesar disso, entendeu-se, o que ora se sufraga, no sentido do legislador não ter querido consagrar solução diferenciada daquela que adoptou para o plano de insolvência.

Por fim, ainda que assim não se entendesse, a solução enunciada não poderia ser diferenciada, pois ela decorre, ademais e desde logo, do já apreciado princípio da autonomia da obrigação cambiária. Efectivamente, e in casu, a não afectação da posição do credor Banco perante a Avalista Executada, pelo facto daquele ter aderido ao plano de pagamento apresentado pelos mutuários insolventes decorre, desde logo, da autonomia material da vinculação da Avalista e do facto do decidido naquela plano de pagamentos não poder ser invocado pela mesma Avalista. 

O que traduz que a circunstância de ocorrerem alterações ou vicissitudes na relação subjacente, não implica que tal se transmita à obrigação cambiária ou cartular, antes se mantendo esta inalterada e plenamente eficaz, sem ser inquinada ou maculada por aquelas ocorrências. E, in casu, tal significa que o beneficiário do aval (Banco credor) pode agir, mediante a competente acção cambiária, perante a avalista (Embargante Executada), de forma a obter a quantia correspondente ao crédito garantido.

Todavia, aqui chegados, urge referenciar não se afigurar que a natureza abstracta e de autonomia do título de crédito em equação se deva sobrepor à análise do acordado entre o Banco Exequente e a Embargada Avalista, ou seja, aferir se existiu ostensiva violação do pacto de preenchimento.

Efectivamente, tendo sido o título de crédito apresentado à execução – livrança -, pelo próprio Banco mutuante (portador inicial), afigura-se-nos que a Avalista pode opor àquele o teor do acordado relativamente à convenção de preenchimento da livrança, pois, ademais, não se saiu do domínio das relações imediatas, ou seja, do âmbito da “relação causal” entre o Banco portador e a Avalista Executada.

Ora, conforme resulta da factualidade provada sob os nºs. 5 e 6, a Embargante/Executada/Avalista declarou no contrato de empréstimo outorgado, nomeadamente na parte referente à Declaração do(s) Avalista(s), e nessa qualidade, “que aceita ser avalista dos mutuários do empréstimo, por quem foi informada do montante da dívida a contrair, bem como das cláusulas do contrato, que aceita, avalizando para o efeito a livrança de caução em branco anexa ao contrato”, bem como autorizar que  “o Banco BPI, S.A., em caso de incumprimento dos mutuários de qualquer das obrigações decorrentes do contrato, designadamente da obrigação de pagamento ao Banco BPI do capital e juros em caso de exercício do direito de livre revogação, a completar o preenchimento daquela livrança, fixando-lhe o vencimento e indicando, como montante, tudo quanto constitua crédito do Banco, logo que deixe de ser cumprida qualquer obrigação caucionada. Fica ainda o BPI autorizado a proceder à cobrança dos montantes em dívida por débito na sua conta e a proceder à ação judicial respetiva caso se mantenha o incumprimento” (sublinhado nosso).

Pelo que, na devida ponderação do convencionado, urge definir se, à data do preenchimento – 19/09/2014 (cf., facto 2.) -, existia, ou não, uma situação de incumprimento por parte dos mutuários subscritores. Neste desiderato, não se trata já de discutir acerca de um pretenso alargamento dos efeitos dos prazos de pagamento acordados, no plano de pagamentos, à posição da Avalista Embargante, mas antes permitir a esta, que também foi parte ou teve directa intervenção no contrato de crédito subscrito, discutir acerca da efectiva (não) ocorrência de incumprimento.

Invoca a Embargada Apelante que a declaração de insolvência dos mutuários subscritores, datada de 18/03/2014 – cf., facto 9. -, teve por efeito o vencimento das demais prestações em dívida, sem necessidade de qualquer interpelação, conforme decorre do artº. 91º do CIRE.

Inserido nos efeitos da declaração de insolvência sobre os créditos, e especificamente prevendo acerca do vencimento imediato de dívidas, prescreve o nº. 1 deste normativo que “a declaração de insolvência determina o vencimento de todas as obrigações do insolvente não subordinadas a uma condição suspensiva”.

Nas contra-alegações apresentadas, defende a Apelada Embargante que a sentença de insolvência, proferida após o trânsito em julgado do incidente de aprovação do plano de pagamentos, não implica o vencimento de todas as dívidas, mas tem apenas os efeitos previstos no artº. 259º do CIRE. Tendo, fundamentalmente, em atenção o prescrito no nº. 1, parte final, que remete para a alínea a), do nº. 7, do artº. 39º, do mesmo diploma.

Estatui o nº. 1, do artº. 259º, enquadrado na secção referente ao plano de pagamentos aos credores, que “o juiz homologa o plano de pagamentos aprovado nos termos dos artigos anteriores por meio de sentença, e, após o seu trânsito em julgado, declara igualmente a insolvência do devedor no processo principal ; da sentença de declaração de insolvência constam apenas as menções referidas nas alíneas a) e b) do nº. 1 do artigo 36º, sendo aplicável o disposto na alínea a) do nº. 7 do artigo 39º”. 

As menções referenciadas nas alíneas a) e b) do artº. 36º reportam-se ao momento da prolação da sentença de declaração de insolvência e a outra à identificação do insolvente, sua sede ou residência.

Por sua vez, prescreve a alínea a), do nº. 7, do artº. 39º, que “não sendo requerido o complemento da sentença:
a)- o devedor não fica privado dos poderes de administração e disposição do seu património, nem se produzem quaisquer dos efeitos que normalmente correspondem à declaração de insolvência, ao abrigo das normas deste Código”.

Resulta do exposto que “não sendo requerido o complemento da sentença, a declaração de insolvência não desencadeia a generalidade dos efeitos que normalmente lhe estão ligados, ao abrigo das normas do Código, mantendo-se o devedor também na administração e disposição do património – que exista”.

O que determina que, existindo homologação do plano de pagamentos apresentado, através da competente sentença transitada em julgado, com posterior prolação de sentença declarativa da insolvência do devedor, esta possui uma eficácia “significativamente mitigada. Desde logo, pelo conteúdo da sentença, mas também pelos seus efeitos” [16].

Ora, cremos que um dos efeitos mitigados, que normalmente corresponde à declaração de insolvência, traduz-se, efectivamente, no enunciado no transcrito artº 91º, nº. 1, do CIRE, ou seja, a determinação do vencimento de todas as obrigações do insolvente. Efeito que, a verificar-se, colidiria com os objectivos ínsitos ao plano de pagamentos legalmente equacionado nos artigos 251º a 263º, do CIRE, previsto especificamente para a insolvência das pessoas singulares, desvirtuando-o e impossibilitando a sua total operacionalidade.

Donde, se conclui pela não operacionalidade, nesta sede, dos feitos previstos naquela nº. 1, do artº. 91º, do CIRE, não implicando a declaração de insolvência dos mutuários, datada de 18/03/2014, posterior á homologação do plano de pagamentos apresentado, por sentença transitada em julgado em 26/02/2014, o vencimento, qua tale, de todas as obrigações dos insolventes. E, acrescente-se, muito menos se compreenderia que tal ocorresse com as obrigações (créditos) expressamente incluídos no plano de pagamentos apresentado.

Deste modo, não se podendo concluir, sem mais, pelo incumprimento dos mutuários por força de tal estatuição legal, urge apreciar se, tal como igualmente invoca a Apelante, não tendo sido totalmente cumprido pelos mutuários subscritores, mas antes se iniciando o incumprimento em 30/10/2013, e sendo a dívida liquidável em prestações, a falta de pagamento de uma delas imporá o necessário vencimento de todas, nos termos do artº. 781º, do Cód. Civil.

Vejamos.

Estatuindo acerca da perda do benefício do prazo no cumprimento da obrigação, dispõe o artº. 780º, do Cód. Civil, que:

“1.- Estabelecido o prazo a favor do devedor, pode o credor, não obstante, exigir o cumprimento imediato da obrigação, se o devedor se tornar insolvente, ainda que a insolvência não tenha sido judicialmente declarada, ou se, por causa imputável ao devedor, diminuírem as garantias do crédito ou não forem prestadas as garantias prometidas.
2.- O credor tem o direito de exigir do devedor, em lugar do cumprimento imediato da obrigação, a substituição ou reforço das garantias, se estas sofreram diminuição”.

O normativo seguinte – 781º -, prevendo a respeito da dívida liquidável em prestações, aduz que “se a obrigação puder ser liquidada em duas ou mais prestações, a falta de realização de uma delas importa o vencimento de todas”.

Por sua vez, o artº. 782º, dispondo acerca da perda do benefício do prazo em relação aos co-obrigados e terceiros, prescreve que “a perda do benefício do prazo não se estende aos co-obrigados do devedor, nem a terceiro que a favor do crédito tenha constituído qualquer garantia”.

Antunes Varela [17] refere prever o artº. 781º, do Cód. Civil, acerca “de obrigações cujo objecto, apesar de globalmente fixado, se reparte em várias fracções, escalonadas ao longo do tempo”, ou seja, “o objecto está fixado desde a constituição da dívida, e só o seu pagamento (cumprimento, ou liquidação como lhe chama o art. 781º), em regra para facilidade do devedor, é repartido por fracções”.

De acordo com a legal previsão, “o credor fica, por conseguinte, com o direito de exigir a realização, não apenas da prestação a que o devedor faltou, mas de todas as prestações restantes, cujo prazo ainda não se tenha vencido.
Assim se deve interpretar o texto do artigo 781º, e não no sentido de que, vencendo-se imediatamente, ex vi legis, as prestações restantes, o devedor comece desde esse momento a responder pelos danos moratórios.
O vencimento imediato das prestações cujo prazo ainda se não vencera constitui um benefício que a lei concede – mas não impõe – ao credor, não prescindindo consequentemente da interpelação do devedor”.
Pelo que “a interpelação do devedor para que cumpra imediatamente toda a obrigação (realizando todas as prestações restantes) constitui a manifestação da vontade do credor em aproveitar o benefício que a lei lhe atribui” [18](sublinhado nosso).
Ora, a aplicação da sanção prevista neste artigo 781º “supõe a mora do devedor”, ou seja, é necessário “que o não cumprimento de uma das prestações lhe seja imputável (art. 804º, nº. 2)” [19].

Todavia, a maioria da doutrina inclina-se para que a redacção do normativo “não queira, só por si, significar que se está perante um vencimento automático, mas, no quadro desta subsecção, perante mais uma circunstância que se reflecte no prazo, mais exactamente na perda do benefício dele pelo devedor. O que tem como consequência que, faltando o devedor ao cumprimento de uma das prestações, possa o credor exigir-lhe (interpelá-lo, de acordo com o nº. 1 do art. 805º) o cumprimento da totalidade da obrigação”, sendo ainda reconhecido pela generalidade da doutrina “o carácter supletivo da norma” [20] (sublinhado nosso).

Jurisprudencialmente, enuncia o douto aresto do STJ de 12/07/2018 [21] que “neste contexto, quadra inteira pertinência e validade a explanação constante do acórdão recorrido quando – louvando-se no ensinamento do Prof. Antunes Varela– diz que “[…] não se pode olvidar o entendimento doutrinário pacífico neste particular no sentido de que estando em causa no art. 781º do C.Civil um benefício concedido ao credor – que este poderá exercer ou não – não poderá ser dispensada a interpelação do devedor para cumprir, sendo que só com a interpelação – por via da qual o credor exerce o direito ou benefício que a lei lhe concede – poderá ocorrer a mora do devedor relativamente à totalidade da prestação.

Donde, nas dívidas liquidáveis em prestações, de acordo com o regime consagrado no art. 781º, do C. Civil, o não pagamento de uma delas não importa a exigibilidade imediata de todas, cabendo ao credor interpelar o devedor para proceder ao pagamento da totalidade da dívida.

Assim, se o imediato vencimento de todas as prestações e a constituição em mora relativamente às mesmas, pressupõe a prévia interpelação do devedor para cumprir a prestação nesses termos (na sua totalidade) […]” (sublinhado nosso).

Em idêntico sentido, começando por efectuar abundantes referências quer doutrinárias, quer jurisprudenciais, aduz o douto aresto do mesmo Alto Tribunal de 18/01/2018 [22] que “a exigibilidade antecipada de dívida liquidável em prestações caracteriza-se por:

i)- não ser um regime de vencimento automático;
ii)- ser um regime supletivo;
iii)- ser um regime que, não tendo sido afastado pelas partes, no âmbito da sua autonomia privada, implicar que o credor interpele o devedor no sentido de a exigibilidade se tornar actuante passando a poder indicar-se que foi “exigida a totalidade da dívida antes dos prazos acordados para cada uma das prestações.

Neste quadro normativo a interpelação do devedor é necessária – pois só dessa forma este pode saber que o credor exerceu a faculdade que lhe é conferida de escolher exigir a totalidade da dívida. Assim:
Sobre a matéria da necessidade de interpelação para o vencimento antecipado, também já se decidiu no Ac. do STJ de 14/11/2006, proc. 06B2911 (BETTENCOURT DE FARIA), entre outros acima citados:
“I- Na liquidação da obrigação em prestações, a que alude o artº 781º do C. Civil, o vencimento imediato das restantes prestações, quando uma delas não é satisfeita, não exclui a necessidade de interpelação, dado tratar-se de uma faculdade do credor que a exercerá se assim o entender.
II- Significando, pois, a imediata exigibilidade dessas prestações e não que a data do seu vencimento passe a ser a da prestação faltosa.” (sublinhado nosso).

Nesta Relação, pode referenciar-se, entre outros, o recente douto Acórdão de 07/06/2018 [23], ao mencionar “que tem sido discutido na doutrina e jurisprudência o sentido da expressão legal “vencimento de todas” e assim se o vencimento é imediato e automático, dispensando a interpelação do devedor, ou se o vencimento significa apenas exigibilidade imediata de todas as prestações, sendo necessária a interpelação do devedor.
Galvão Teles (“Direito das Obrigações, Coimbra, 7ª edição, pág. 271) defende, de acordo com o referido artigo e relativamente às dívidas a prestações, que a omissão de uma delas implica o imediato vencimento das restantes prestações independentemente de interpelação. Um dos argumentos dos defensores desta posição assenta na confrontação entre a redação da lei (resultante da 2ª Revisão Ministerial) e o que se encontrava consagrado no art. 742º do antigo Código Civil e bem assim com o que constava do Anteprojeto e na 1ª Revisão Ministerial onde se estabelecia de forma expressa a mera exigibilidade imediata: “a falta de pagamento de uma delas confere ao credor o direito de exigir o imediato pagamento de todas”.

Pronuncia-se em sentido contrário, entre outros, Almeida e Costa (“Direito das Obrigações”, Almedina, 9ª edição, pág. 950-951) que defende que o referido preceito estabelece a mera exigibilidade antecipada e não o vencimento automático, impondo-se ao credor a interpretação do devedor para exigir antecipadamente as prestações vincendas. Também Antunes Varela ensina que o que resulta do art. 781º do Código Civil é tão somente a perda do benefício do prazo quanto a todas as prestações devidas para o futuro, ficando o credor, por conseguinte, com o direito de exigir a realização, não apenas da prestação a que o devedor faltou, mas de todas as prestações restantes, cujo prazo ainda não se tenha vencido, não resultando qualquer vencimento imediato ex vi legis, começando desde esse momento o devedor a responder pelos danos moratórios. Por outras palavras, o vencimento imediato das prestações cujo prazo ainda não se vencera constitui um benefício que a lei concede, mas não impõe ao credor, não prescindindo consequentemente da interpelação do devedor para que cumpra imediatamente toda a obrigação, interpelação que corresponde à manifestação da vontade do credor em aproveitar o benefício que a lei lhe atribui.

Posicionamo-nos ao lado desta última posição (na senda, entre outros do Ac. do Tribunal da Relação de Lisboa de 15/5/2012, proc. 7169/10.4TBALM-A.L1-7, relatora Graça Amaral, que acompanhamos de perto, e ainda Ac. do mesmo Tribunal de 17/11/2011, proc. 1156709.2TBCLD-D.L1.2, relator Ezaguy Martins) de que a expressão legal significa apenas “exigibilidade imediata”, não no sentido de que o prazo de pagamento de todas as prestações seja o da primeira prestação, mas enquanto perda do benefício do prazo ou antecipação de exigibilidades, isto é, o prazo das prestações antecipadas deixou de existir como facto indicativo do vencimento, tornando-se a obrigação pura, dependendo pois o seu vencimento de interpelação.

Porquanto, como frisa Vasco Xavier (RDES, Ano XXI, n.ºs 1, 21, 3 e 4, pág. 201), a interpretação que defende o vencimento automático não só representa uma injustificada violência para o devedor, como se não concilia com o que dispõe o art. 805º do C. Civil, nos termos do qual aquele fica constituído em mora após ter sido interpelado para cumprir, exceto se a obrigação tiver prazo certo. Como salienta ainda este autor, a harmonização dos dois preceitos apenas seria possível se se considerasse que o prazo das prestações após o incumprimento passaria a ser o prazo da prestação não paga.

Assim, uma vez que em face do não cumprimento de uma das prestações, o prazo para cumprimento das restantes deixou de existir como prazo indicativo de vencimento, cabia ao credor/exequente interpelar o devedor para exigir antecipadamente as restantes prestações (neste sentido ainda Acs. do STJ de 15/3/2005, 17/1/2006, 6/2/2007 e 19/11/2009, estes último versando concretamente sobre Réus constituídos fiadores e principais pagadores, todos in www.dgsi.pt)”.

Perfilhando idêntico entendimento, refere-se no douto aresto de 12/09/2017 [24] que o artº. 781º, “na medida em que determina a perda do benefício do prazo, não é de carácter automático mas apenas atribui ao credor uma faculdade, que ele usará ou não se e quando for do seu interesse.
Essa mesma norma tem, no entanto, natureza supletiva, pelo que é lícito às partes (art.º 405º do CCiv) estabelecer a automaticidade da perda do benefício do prazo”.

Donde resulta que “querendo o credor accionar a perda do benefício do prazo em face do não pagamento de uma prestação terá de fazer chegar ao conhecimento do devedor essa sua vontade. “A ausência de automatismo no vencimento antecipado arrasta uma consequência: só pode levar-se a cabo tal exigência (…) depois de interpelação ao devedor para cumprir a obrigação de pagamento que então ganhou novos contornos”.

Por fim, mencionemos, ainda, o aduzido no douto Acórdão de 28/05/2015 [25], no qual se defende a necessidade de “efectuar uma interpretação correctiva, posto que no artigo 781º do CPC se confundem os conceitos de exigibilidade e de vencimento, sendo que o credor deve dispor da faculdade de exigir o pagamento imediato de todas as prestações em falta, interpelando o devedor, e da faculdade de não exigir.

Em idêntico sentido propugnam MENEZES CORDEIRO, Direito das Obrigações, AAFDL, 1986, 2º vol., 193, nota 55 e MÁRIO JÚLIO DE ALMEIDA COSTA, Direito das Obrigações”, 8ª ed., 941., por justamente se considerar que o vencimento de tais prestações é um benefício concedido por lei ao credor que, querendo aproveitar-se dele, deverá manifestar a sua vontade nesse sentido, interpelando o devedor para cumprir imediatamente a totalidade da obrigação.

Este tem sido, de resto, o entendimento jurisprudencial maioritário, tendo em consideração a jurisprudência recentemente publicada, e com o qual se concorda, ou seja, do imediato vencimento das prestações futuras, previsto no artigo 781.º do CC, não decorre automaticamente a entrada em mora do devedor relativamente a tais prestações, revelando-se necessária a sua prévia interpelação – v. neste sentido Ac. R.L. de 04.06.2013 (Pº 5366/09.4T2AGD-A.C1) e ampla jurisprudência aí citada” (sublinhado nosso).

Revertendo o supra exposto ao caso concreto, vejamos.

No contrato de mútuo outorgado em 06/03/2012, intervieram como mutuários CF… e JA…, e como avalista SM…, ora Embargante Executada.

Em tal contrato, a ora Executada Embargante, nos termos já apreciados, declarou, nessa qualidade de avalista, aceitar “ser avalista dos mutuários do empréstimo, por quem foi informada do montante da dívida a contrair, bem como das cláusulas do contrato, que aceita, avalizando para o efeito a livrança de caução em branco anexa ao contrato”, bem como autorizar “que o Banco BPI, S.A., em caso de incumprimento dos mutuários de qualquer das obrigações decorrentes do contrato, designadamente da obrigação de pagamento ao Banco BPI do capital e juros em caso de exercício do direito de livre revogação, a completar o preenchimento daquela livrança, fixando-lhe o vencimento e indicando, como montante, tudo quanto constitua crédito do Banco, logo que deixe de ser cumprida qualquer obrigação caucionada. Fica ainda o BPI autorizado a proceder à cobrança dos montantes em dívida por débito na sua conta e a proceder à ação judicial respetiva caso se mantenha o incumprimento” – factos 5. e 6. provados.

Todavia, na cláusula 8ª das Condições Gerais do Contrato, previu-se, ainda, acerca do não cumprimento do contrato de crédito pelo mutuário, que:
“1.– Em caso de incumprimento do contrato de crédito pelo mutuário, o Banco pode invocar a perda do benefício do prazo e/ou a resolução do contrato se, cumulativamente, ocorrerem as circunstâncias seguintes:
a)- a falta de pagamento de duas prestações sucessivas que exceda 10% do montante total do crédito.
b)- Ter o Banco, sem sucesso, concedido ao mutuário um prazo suplementar mínimo de 15 dias para proceder ao pagamento das prestações em atraso, acrescidas da eventual indemnização devida, com a expressa advertência dos efeitos da perda do benefício do prazo ou da resolução do contrato.
2.– Para efeitos do disposto na antecedente alínea a), os pagamentos efectuados servirão para liquidar as prestações que primeiro se tiverem vencido.
3.– As situações indicadas no número 1. antecedente serão comunicadas ao(s) Mutuário(s) por carta registada com aviso de recepção.
4.– A resolução do contrato de crédito pelo credor não obsta a que este possa exigir o pagamento de eventual sanção contratual ou a indemnização, nos termos gerais” – cf., facto provado 7..
Resultou igualmente provado, conforme facto 13., que “as prestações mensais fixadas no referido contrato deixaram de ser liquidadas a partir da que se venceu em 30 de Outubro de 2013”.
Constata-se, deste modo, que para que pudesse ser operatória a perda do benefício do prazo e/ou a resolução do contrato de mútuo, tal dependia, para além da situação de incumprimento por parte dos mutuários, da ocorrência das duas demais condições/circunstâncias expressamente consagradas. O que constitui, mediante fonte convencional, um acréscimo às exigências legalmente enunciadas no citado artº. 781º, do Cód. Civil.
Todavia, nada nos autos se aduz relativamente ao cumprimento de tais pressupostos ou circunstâncias relativamente aos mutuários, nomeadamente em cumprimento do nº. 3 de tal cláusula 8ª.
O que facilmente se entende e compreende, atenta a adesão por parte do Banco Credor ao plano de pagamentos aos credores apresentado pelos mesmos mutuários no âmbito da sua insolvência.
E, a interpelação à Avalista, ora Executada, exposta no facto provado 12. - o exequente enviou carta datada de 18 de setembro de 2014, dirigida à executada e endereçada para morada desta, do teor da qual consta o seguinte: “Serve a presente para informar que, em virtude da atual situação de incumprimento, consideramos definitivamente resolvido o contrato (…) em que V. Exa. intervém como Avalista. Consequentemente, torna-se imediatamente exigível todo o valor em dívida que compreende: prestações vencidas e não pagas, capital vincendo, juros de mora e despesas, tudo num total de €11.576,99. Comunicamos-lhe ainda que de acordo com a cláusula 4.ª do contrato, preenchemos e procederemos à execução da livrança que V. Exa. avalizou e que nos foi entregue no momento da celebração do contrato para garantia do seu bom cumprimento, nos seguintes termos: Data de Vencimento: 29.09.2014, Valor da Livrança: €11.576,99, A que acresce o respetivo imposto de selo no valor de €57,88. Assim, sob pena de recurso à ação judicial, interpelamos V. Exa. para proceder à liquidação dos montantes acima referidos, no prazo máximo de 10 (dez) dias, junto de qualquer balcão do Banco BPI, S.A.” -, a declarar a resolução do contrato e, consequentemente, a considerar a imediata exigibilidade da totalidade da dívida, para além de estranha, por ser dirigida à terceira garante avalista, e não propriamente a um dos mutuários, também não observa, minimamente, aqueles pressupostos enunciadas na clausula 8º acordada.
O que implica que tal declaração não possa, consequentemente, produzir os efeitos ali declarados, pois, para além do exposto, e conforme claramente se constata, nem sequer respeita o alegado prazo de interpelação ao pagamento de 10 dias, prévio à data de preenchimento da livrança. Efectivamente, tal comunicação, datada de 18/09/2014, apenas foi recepcionada em 26/09/2014, conforme decorre de fls. 36 vº e é expressamente declarado pelo Embargado/Exequente no artº. 32º da sua contestação. 
Deste modo, não se podendo considerar a perda do benefício do prazo relativamente aos mutuários, por não se mostrar cumprido o convencionalmente outorgado na citada cláusula 8ª das Condições Gerais do Contrato, também não se logra preencher a condição de autorização de preenchimento exposta no facto 6. provado, com a amplitude de “tudo quanto constitua crédito do Banco”. Ou seja, a autorização conferida pela Avalista, para o preenchimento da livrança, dependia do “incumprimento dos mutuários de qualquer das obrigações decorrentes do contracto, designadamente da obrigação de pagamento ao Banco BPI do capital e juros em caso de exercício do direito de livre revogação”, e logo que deixasse de ser cumprida qualquer obrigação caucionada.

Por outro lado, conforme decorre do já transcrito artº. 782º, tal perda do benefício do prazo, decorrente do incumprimento, não se estende, prima facie, aos “co-obrigados do devedor, nem a terceiro que a favor do crédito tenha constituído qualquer garantia”, ou seja, e no que ora importa, não abrangeria a posição da Embargante Avalista.

Efectivamente, nas palavras de Pires de Lima e Antunes Varela, [26] “[a] perda do benefício do prazo não afecta terceiros que tenham garantido pessoalmente o cumprimento da obrigação. A lei não distingue entre garantias pessoais e reais. É aplicável a disposição, portanto, não só ao fiador, como a terceiros que tenham constituído uma hipoteca, um penhor, ou uma consignação de rendimentos.
Qualquer destas garantias só pode ser posta a funcionar depois de atingido o momento em que a obrigação normalmente se venceria” [27].

Porém, a aludida não extensão da perda do benefício do prazo aos garantes, quer pessoais quer reais, tem carácter ou natureza supletiva, podendo aqueles renunciar validamente ao benefício legalmente concedido.

E, in casu, tal parece resultar, ainda que de forma não expressa, da forma como a Avalista se vinculou, ao autorizar o preenchimento da livrança no caso de incumprimento por parte dos mutuários de qualquer das obrigações decorrentes do contrato de mútuo, e logo que deixasse de ser cumprida qualquer obrigação caucionada. Isto é, afigura-se que, atenta a dependência da obrigação da Avalista relativamente à dos mutuários, caso ocorresse perda do benefício do prazo relativamente a estes, necessariamente que tal efeito se estenderia à posição da Avalista.

Todavia, não sucedendo tal relativamente aos mutuários, não se pode concluir pela extensibilidade de tais feitos à posição da Avalista Embargante.
Resta-nos, assim, uma situação de incumprimento limitada, ou seja, a que decorre do facto 13. provado, no sentido de que as prestações mensais fixadas deixaram de ser liquidadas a partir da que se venceu em 30 de Outubro de 2013.
Todavia, tal situação de incumprimento não implicou, por falta de preenchimento dos respectivos pressupostos ou circunstâncias, nem a perda do benefício do prazo, nem a resolução do contrato de mútuo outorgado.
O que determina, consequentemente, juízo de improcedência da pretensão recursória da Embargada Exequente, no sentido de ser reconhecido o vencimento imediato da totalidade das prestações fixadas, acrescido dos respectivos juros moratórios, desde a data de vencimento de cada uma delas, e até efectivo pagamento, com a consequente confirmação da sentença apelada.
*

Nos quadros do artº. 527º, nºs. 1 e 2, do Cód. de Processo Civil, decaindo a Apelante Embargada no presente recurso, é responsável pelo pagamento das custas da presente apelação.
***

IV.DECISÃO

Destarte e por todo o exposto, acordam os Juízes desta 2ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa em:
a)- Julgar totalmente improcedente o recurso de apelação interposto pela Apelante/Exequente/Embargada BANCO BPI, S.A., em que surge como Apelada/Embargante/Executada SM… ;
b)- Em consequência, confirma-se a sentença apelada ;
c)- Custas da presente apelação a cargo da Embargada/Apelante – cf., artº. 527º, nºs. 1 e 2, do Cód. de Processo Civil.

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Lisboa, 24 de Outubro de 2019



Arlindo Crua – Relator   
António Moreira – 1º Adjunto
Carlos Gabriel Castelo Branco – 2ª Adjunto



[1]A presente decisão é elaborada conforme a grafia anterior ao Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa de 1990, salvaguardando-se, nas transcrições efectuadas, a grafia do texto original.
[2]Ferrer Correia, Lições de Direito Comercial, Vol. III, Letra de Câmbio, Universidade de Coimbra, 1975, pág. 1, 2 e 7 a 12.
[3]Idem, pág. 206.
[4]Pedro Pais de Vasconcelos, Direito Comercial, Títulos de Crédito, AAFDL, 1990, pág. 125.
[5]Ferrer Correia, ob. cit., pág. 206, 207 e 216.
[6]Ob. cit., pág. 126 a 128,
[7]Paulo Sendin e Evaristo Mendes, A Natureza do Aval e a Questão da Necessidade ou Não do Protesto Para accionar o Avalista do Aceitante, Almedina, 1991, pág. 39, citando Paulo Cunha, Da Garantia nas Obrigações.
[8]Pedro Pais de Vasconcelos, ob. cit., pág. 128.
[9]Pedro Pais de Vasconcelos, ob. cit., pág. 105 e 106.
[10]De forma liminar, Ferrer Correia - , ob. cit., pág. 139 -, refere expressamente que “a excepção de preenchimento abusivo só não pode ser oposta àquele portador a cujas mãos a letra chega completamente preenchida, salvo, é claro, a hipótese de má fé. Havendo má fé, a excepção, obviamente, é sempre oponível”.
[11]Ferrer Correia, ob. cit., pág. 134 e 135.
[12]Em sentido divergente, cf., o douto aresto da RG de 24/04/2012 – Relator: José Manuel Araújo de Barros, Processo nº. 1248/10.5TBBCL-A.G2, in www.dgsi.pt -, no qual se considerou que sendo alterado o prazo de cumprimento da obrigação através da aprovação do plano de insolvência, tal repercute-se, necessariamente, na relação processual estabelecida entre o credor exequente e o avalista.
[13]Cf., ainda, neste sentido, o douto Acórdão da RG de 30/05/2013, Relator: Manuel Bargado, Processo nº. 3308/08.3TBGMR-A.G1, in www.dgsi.pt .
[14]Luís A. Carvalho Fernandes e João Labareda, Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas Anotado, 3ª Edição, Quid Juris, 2015, pág. 792 a 794.
[15]Ob. cit., pág. 879.
[16]Idem, pág. 276 e 899.
[17]Das Obrigações em Geral, Vol. II, 4ª Edição, 1990, Almedina, pág. 51.
[18]Idem, pág. 52 e 53.
[19]Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, Vol. II, 3ª Edição Revista e Actualizada, Coimbra Editora, pág. 32.
[20]Ana Prata, Código Civil Anotado, Vol. I, Almedida, 2017, pág. 979 e 980.
[21]Relator: Hélder Almeida, Processo nº. 10180/15.5T8CBRT-A.C1.S1, in www.dgsi.pt .
[22]Relatora: Fátima Gomes, Processo nº. 2351/12.2TBTVD-A, in www.dgsi.pt .
[23]Relatora: Cristina Neves, Processo nº. 22574/13.6T2SNT, in www.dgsi.pt .
[24]Relator: Rijo Ferreira, Processo nº. 6691/11.0TBVFX-A.L1-1, in www.dgsi.pt.
[25]Relatora: Ondina Carmo Alves, Processo nº. 1859/11.1TBVFX-A.L1-2, in www.dgsi.pt .
[26]Ob. cit., pág. 33.
[27]No mesmo sentido, referiu-se em douto aresto do STJ de 10/05/2007, citado no douto Acórdão supra mencionado de 12/07/2018, que “[a] perda do benefício do prazo de pagamento de obrigações a prestações emergente do não pagamento de uma delas não vale quanto ao fiador”.