ARRENDAMENTO
RENDAS
DEVOLUÇÃO
Sumário

Não tendo o arrendatário logrado provar a existência de vício na coisa locada, qualquer fundamento de resolução do contrato de arrendamento consubstanciado em facto ilícito e culposo praticado pela Ré, ou de anulação do contrato por erro ou dolo, ou acordo do senhorio na revogação do contrato anteriormente a determinado momento, não lhe assiste o direito à devolução das rendas que pagou relativamente a período que decorre até esse momento.

Texto Parcial

Acordam na 1ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa.


I.RELATÓRIO.


A. instaurou a presente ação comum contra B., S.A., peticionando a condenação da Ré no pagamento da quantia de €5.800,00, acrescida de juros de mora desde a citação até integral pagamento.

Alegou, em resumo, que em 27.2.2017, as partes celebraram contrato de arrendamento habitacional, com efeitos a partir de 2017, com a renda mensal de €2.200,00, que pagou a quantia de €6.600,00, sendo a quantia de €2.200,00 a título de caução e €4.400,00, de renda dos meses de Março e Abril de 2017 e que recebidas as chaves e feitas as mudanças, apercebeu-se que a chama do esquentador não acendia sempre e, quando acendia, apagava-se sozinha, não se mantendo, alastrando-se no imóvel forte odor a gás, com fuga indiscutível.

Referiu que perdeu vários períodos de trabalho à espera de solução por parte da Ré e que por não suportar mais esta situação, fez chegar à mediadora do arrendamento uma minuta de revogação do contrato para formalizar a denúncia, que a ré não assinou, tendo, em 8.3.2017, por SMS, confirmado o recebimento da denúncia e da minuta de revogação.

Invocou o abuso de direito por parte da Ré, no alongar de dias desnecessários para não dar resposta final a fim de evitar a denúncia, alegou que saiu do imóvel e restituiu as chaves à Ré em 13.3.2017, por correio, concluindo que a Ré deve restituir ao Autor a caução, a renda de Abril e metade da renda de Março.
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Citada, a Ré contestou, alegando em suma que tendo o Autor reclamado que a chama piloto do esquentador se desligava frequentemente e, por causa dessa reclamação, o representante legal da ré dirigiu-se ao locado, que embora não tivesse conseguido constatar a anomalia, a Ré adquiriu um esquentador novo, que mandou instalar no dia 6.3.2017, em substituição do anterior, sendo que o instalador e o Autor verificaram o bom funcionamento do novo esquentador.
Mais alegou que nessa altura, os pertences do autor ainda se encontravam nas caixas em que haviam sido transportados, pelo que o Autor não se havia mudado para o locado, nomeadamente para pernoitar, tendo afirmado à Ré que já não queria a casa.
Acrescentou que não aceitou a denúncia do contrato por mútuo consentimento que o Autor pretendia que a Ré assinasse, que nos termos do contrato, a denúncia apenas operava quando comunicada com 90 dias de antecedência em relação à data da sua eficácia, que não tendo o Autor cumprido o pré-aviso contratualmente estabelecido para a formalização da denúncia, a Ré apenas está disponível para devolver a caução, no valor €2.200,00.
Pediu a condenação do Autor como litigante de má-fé por ter omitido factos importantes para o mérito da causa, nomeadamente, as comunicações da Ré propondo a devolução da caução.
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Foi proferido despacho saneador, fixado o objeto do litígio e enunciaram-se os temas de prova, sem reclamação.
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Realizou-se a audiência final, vindo a ser proferida sentença que julgando a acção parcialmente procedente condenou a Ré a pagar ao Autor a quantia de €2.200,00, correspondente à caução entregue, absolvendo-a do demais peticionado, e julgou improcedente o pedido de condenação como litigante de má-fé.
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Inconformado com esta decisão, dela apelou o Autor, formulando as seguintes conclusões:
(…)
*

A Ré contra-alegou, apresentando, por seu turno, as seguintes conclusões:
(…)
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II.–QUESTÕES A DECIDIR.

Sendo o objeto do recurso balizado pelas conclusões do recorrente, nos termos preceituados pelos artigos 635º, nº 4, e 639º, nº 1, do Código de Processo Civil, impõe-se conhecer das questões colocadas pelo Apelante e as que forem de conhecimento oficioso, sem prejuízo daquelas cuja decisão fique prejudicada pela solução dada a outras, sendo o julgador livre na apreciação e aplicação do direito, nos termos do disposto no artigo 5º, n.º 3 do Código de Processo Civil.

Assim, no caso concreto, importa apreciar e decidir:
 -se procede a impugnação da matéria de facto; e consequentemente,
-se deve a Ré ser condenada a restituir ao Autor, para além do valor da caução entregue, o valor que o mesmo peticiona relativo a rendas;
-se deve o Autor ser condenado como litigante de má fé.
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III.–FUNDAMENTAÇÃO.

III.1.O Tribunal Recorrido considerou provados os seguintes factos:
1. Em 27.2.2017, as partes celebraram contrato de arrendamento habitacional, pela renda mensal de €2.200,00, cf. fls. 5V-8. O contrato de arrendamento prevê na sua Cláusula Segunda:
“1.-O prazo de duração do contrato de arrendamento, o qual é celebrado nos termos da Lei n.º 6/2006, de 27 de Fevereiro, na redação que lhe foi dada pela Lei n.º 31/2012, de 14 de Agosto, é de 1 (um) ano, com início a 1 de Março de dois mil e dezassete e términus a 28 de Fevereiro de dois mil e dezoito.
2.-Findo o prazo certo mencionado no número um, o arrendamento em causa renovar-se-á automaticamente por períodos sucessivos de um ano, desde que nenhuma das partes outorgantes se oponha à renovação do contrato, nos termos e com a antecedência mínima convencional, de cento e vinte dias por parte do primeiro outorgante e de noventa dias por parte do Segundo Outorgante.
2. O autor pagou à ré a quantia de €6.600,00, sendo a quantia de €2.200,00 a título de caução e €4.400,00, de renda dos meses de Março e Abril de 2017.
3. O autor reclamou que a chama piloto do esquentador da fração se desligava frequentemente.
4. Em 5.3.2017, o autor enviou o SMS de fls. 8V ao administrador da ré, referindo-se a problema com o esquentador e solicitando uma reunião no dia seguinte.
5. O autor fez chegar à mediadora do arrendamento uma minuta de revogação do contrato para formalizar a denúncia, que a ré não assinou, cf. fls. 9-V.
6. Em 8.3.2017, por SMS, de fls. 10, a ré confirmou o recebimento da denúncia e da minuta de revogação.
7. Em 8.3.2017, por SMS, de fls. 10V, o autor comunica à ré, na pessoa do Engenheiro JL, que:
“(…) Sr. Engenheiro, Lamento imensamente que todas as providências tomadas pelo senhor precisaram ser provocadas – isto é, não partiram de vossa iniciativa – quando o correto é o proprietário ter o dever de entregar seu imóvel “em plenas condições” (palavras minhas), ou “apto” para a sua ocupação (como disse seu sócio),e foi justamente por esta razão de eu desistir de ocupá-lo: ele não me foi entregue em condição satisfatória!”
8. Embora não tivesse conseguido constatar a anomalia, a ré adquiriu um esquentador novo, que mandou instalar no dia 6.3.2017, em substituição do anterior.
9. O autor saiu do imóvel e restituiu as chaves à ré em 13.3.2017, por correio.
10. Em 1.5.2017 o locado foi arrendado a terceiro.
11. Em 10.3.2017, o ilustre mandatário da ré enviou ao autor o email de fls. 24:
”Exmo. Senhor Dr.
Na sequência da nossa conversa telefónica, serve a presente, em representação da B, SA, para informar que, de acordo com os dados que me referiu e que, aliás, já me haviam sido comunicados pela minha cliente, não existe qualquer fundamento para a revogação/cessação do contrato de arrendamento celebrado entre vós em 27 de Fevereiro de 2017.
Na realidade, conforme sabe, a minha cliente, na sequência do dito contrato de arrendamento, dotou a fração de vários eletrodomésticos e equipamentos novos, tendo, inclusive, retirado o imóvel do mercado de arrendamento, convicta nos termos do acordo assinado.
Reitero o que a minha cliente já lhe havia transmitido, ou seja, que está e sempre estará disponível para resolver qualquer reclamação justa da sua parte, cuja responsabilidade lhe caiba, de modo a assegurar-lhe o gozo condigno do imóvel.
Referiu no seu telefonema que estava a ter problemas com a campainha da porta de entrada do prédio, a qual, a minha cliente desconhece, mas desde já se prontifica a ir ao local para confirmar a situação e, em caso disso, resolver qualquer problema daí eventualmente emergente.
De qualquer modo, uma vez que já manifestou a sua vontade de não permanecer no imóvel arrendado, no limite, a minha cliente está na disposição de não exigir a observância o pré-aviso de denuncia necessário para o arrendatário fazer cessar o arrendamento, e V. Exa. poderá, se assim o entender, durante o decurso da próxima semana, de 13 a 17 de Março, comunicar por carta que pretende denunciar o contrato de arrendamento, contudo a eficácia dessa denuncia só operará no 1º de Maio de 2017, pelo que as rendas de Março e Abril de 2017 serão devidas, podendo V. Exa., como é evidente, usufruir do locado até essa data.
O valor adiantado a título de caução será devolvido, com a entrega do imóvel à senhoria nas condições em que o mesmo foi entregue ao arrendatário. (…)”
12. Em 9.5.2017, o ilustre mandatário da ré enviou ao autor o email de fls. 23V:
“Exmo. Senhor Dr.
Serve a presente para informar V. Exa. que está ao seu dispor a quantia de 2.200,00€ (dois mil e duzentos euros) a título de devolução do valor entregue a como caução no âmbito do contrato de arrendamento celebrado em 27 de Fevereiro de 2017 entre a minha cliente B. SA e V. Exa.
Tendo V. Exa. manifestado a sua vontade de não permanecer no imóvel arrendado, a minha cliente está na disposição de não exigir a observância do pré-aviso de denúncia necessário para o arrendatário fazer cessar o arrendamento, e considera que denunciou o contrato de arrendamento, contudo a eficácia dessa denuncia, tal como lhe referi por telefone e email, só operará no 1º de Maio de 2017, pelo que as rendas de Março e Abril de 2017 foram devidas.
Assim sendo, solicito que agende comigo uma data e hora para lhe ser entregue a quantia de 2.200,00€, contra a assinatura da declaração que ora lhe envio. (…)
* * *

III.2 Na mesma decisão considerou-se que não se provaram os seguintes factos com interesse para a boa decisão da causa:
Recebidas as chaves e feitas as mudanças, o autor apercebeu-se que a chama do esquentador não acendia sempre e, quando acendia, apagava-se sozinha, não se mantendo, alastrando-se no imóvel forte odor a gás, com fuga indiscutível.
O autor perdeu vários períodos de trabalho à espera de solução por parte da ré.
No SMS de fls. 8V para o administrador da ré, o autor referiu que ia sair do imóvel, entregar as chaves à ré, com restituição dos valores pagos.
O instalador e o autor verificaram o bom funcionamento do novo esquentador.
Nessa altura, os pertences do autor ainda se encontravam nas caixas em que haviam sido transportados, pelo que o autor não se havia mudado para o locado, nomeadamente para pernoitar.
O autor afirmou à ré que já não queria a casa.
*

III.3. Da impugnação do julgamento da matéria de facto.
(…)
Improcede, pois, nesta parte, a apelação.
*

III.4.Os factos e o direito.

Mantendo-se inalterado o julgamento da matéria de facto, necessariamente tem de manter-se o enquadramento jurídico feito pelo Tribunal recorrido, que se sufraga.
Na verdade, dependia o pedido de devolução dos montantes pagos a título de rendas – no valor total de €3.600,00 (três mil e seiscentos euros) - no que à interpretação e aplicação do Direito respeita, do prévio sucesso da impugnação da decisão sobre a matéria de facto.
Efetivamente, tendo as partes celebrado um contrato de arrendamento para fins habitacionais - através do qual em contrapartida de a Ré proporcionar ao Autor o gozo do imóvel, este se obrigou a pagar a retribuição acordada (artigos 1022º, 1023º e 1038º, al. a) do Código Civil) - no âmbito do qual a citada quantia foi entregue, dúvidas não se colocam de que o gozo do imóvel foi cedido ao Autor, e que este entregou as quantias relativamente às quais o direito à devolução não lhe foi reconhecido na sentença recorrida, a título de renda.
Para obter a devolução da quantia que assim entregou, sobre o Autor recaía, nos termos do disposto no artigo 342º, n.º 1 do Código Civil, o ónus de provar factos que fundamentassem tal obrigação de devolução a cargo da Ré.
Vejamos.
O contrato de arrendamento cessa por acordo das partes, resolução, caducidade ou outras causas definidas na lei, conforme dispõe o artigo 1079º do Código Civil.
Como se referiu já, não logrou o Autor provar a alegada avaria ou a fuga de gás, tendo-se ainda demonstrado que a Ré diligenciou, apesar disso, pela substituição do esquentador escassos dias após o início do contrato e a reclamação do Autor.
Mostra-se, pois, afastada a possibilidade de se considerar a existência de vício na coisa locada (artigo 1032º do Código Civil), qualquer fundamento de resolução do contrato de arrendamento, designadamente facto ilícito e culposo praticado pela Ré (artigos 1083º e 1050º do Código Civil), ou de anulação por erro ou dolo (artigo 1035º do Código Civil), como, de resto, se entendeu na decisão sob censura.
De recordar que são coincidentes os pressupostos em que assenta a responsabilidade civil contratual com os fundadores da responsabilidade civil extracontratual, elencados quanto à primeira no artigo 798.º do Código Civil, de acordo com cuja estatuição «[o] devedor que falta culposamente ao cumprimento da obrigação torna-se responsável pelo prejuízo que causa ao credor», e quanto a esta no artigo 483.º do Código Civil, preceito que consagra os respectivos princípios gerais, dispondo que «[a]quele que, com dolo ou mera culpa, violar ilicitamente o direito de outrem ou disposição legal destinada a proteger interesses alheios fica obrigado a indemnizar o lesado pelos danos resultantes da violação».
Em qualquer caso, em face do disposto no artigo 342.º do CC, atento o pedido formulado e a causa de pedir na presente acção, ao Autor incumbia, como se referiu, a prova dos factos consubstanciadores do direito invocado, enquanto fundamentadores dos pressupostos da responsabilidade civil por facto ilícito, que tradicionalmente se consideram num elenco de cinco, a saber: a) o facto; b) a ilicitude; c) a imputação do facto ao lesante; d) o dano; e) um nexo de causalidade entre o facto e o dano.
Por outro lado, e no que respeita à oposição à renovação ou denúncia pelo arrendatário, o artigo 1098.º, n.º 6 do Código Civil, na redação introduzida pela Lei 31/2012, de 14 de Agosto, estabelece que desrespeito da antecedência prevista no citado artigo, designadamente no seu n.º 3 – que no caso, claramente não foi respeitada - não impede a cessação do contrato mas obriga o arrendatário ao pagamento do valor das rendas correspondentes ao período de pré-aviso em falta.
Finalmente, a revogação do contrato pressuporia o acordo da Ré, nos termos do disposto no artigo 1082º do Código Civil, que, conforme se demonstrou, apenas a aceitou com efeitos a partir de 1 de Maio de 2017, sendo que apenas a partir de tal data o local voltou a ser arrendado a terceiro.
Nenhuma censura merece, pois, a decisão recorrida, ao decidir que não é devida a devolução das rendas relativas aos meses de Março e Abril.
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Resta apreciar o pedido de condenação do Autor/Recorrente como litigante de má fé.
Dispõe actualmente o artigo 542º, n.º 1 do Código de Processo Civil, que tendo litigado de má fé, a parte será condenada em multa e numa indemnização à parte contrária se esta a pedir.

O artigo 542º do CPC, no seu nº 2, estatui:

“Diz-se litigante de má fé quem, com dolo ou negligência grave:
A)- tiver deduzido pretensão ou oposição cuja falta de fundamento não devia ignorar;
B)- tiver alterado a verdade dos factos ou omitido factos relevantes para a decisão da causa;
C)- tiver praticado omissão grave do dever de cooperação;
D)- tiver feito do processo ou dos meios processuais um uso manifestamente reprovável, com o fim de conseguir um objectivo ilegal, impedir a descoberta da verdade, entorpecer a acção da justiça ou protelar, sem fundamento sério, o trânsito em julgado da decisão.”
A sanção para tal conduta está, como se referiu,  prevista no nº 1 – multa e indemnização à parte contrária (a determinar de acordo com o disposto no artigo 457º do mesmo Código), se esta a pedir.
A má fé processual não exige que a parte actue com dolo, basta que actue com negligência grave ou grosseira. O regime actual ampliou substancialmente o dever de boa fé das partes no processo, ao alargar o tipo de comportamentos que podem ser objecto daquela censura. A sanção por má fé pode ser imposta à parte que actue dolosamente como aquela que se comporta com negligência grave ou grosseira, desrespeitando, desse modo os seus deveres processuais de verdade, lealdade e cooperação.
Na sua actuação no processo estão as partes vinculadas aos deveres de probidade e cooperação, a agir de boa fé e cooperar para se obter, com brevidade e eficácia a justa composição do litígio (artigos 7º, 8º, 417º do Código de Processo Civil).
Actua com má fé (material) a parte que, com dolo ou negligência grave, para convencer o tribunal de um facto ou pretensão que sabe ilegítima, distorce ou deturpa a realidade de si conhecida ou omite factos relevantes, também por si conhecidos, para a decisão (violando conscientemente o dever de verdade) bem como a que deduz oposição cuja falta de fundamento não pode ignorar ou fizer do processo uso reprovável (má fé instrumental), entorpecendo a acção da justiça.
Exigindo a sanção por litigância de má-fé que a parte que tal conduta adopta actue com dolo ou negligência grave, tal não sucederá com a lide simplesmente temerária ou ousada ou assente em erro, mesmo que grosseiro, com a dedução de pretensão ou oposição que vieram a decair por mera fragilidade da prova e de não se convencer o tribunal da realidade trazida a julgamento ou resultar da discordância na interpretação e aplicação da lei aos factos.
A simples proposição de uma acção ou contestação, embora sem fundamento, pode não constituir uma actuação dolosa ou mesmo gravemente negligente da parte. A incerteza da lei, a dificuldade em apurar os factos e os interpretar, podem levar as consciências honestas a afirmar um direito que não possuem e a impugnar uma obrigação que devem cumprir.
Não basta, pois, que a parte não veja acolhida a sua pretensão ou a sua versão dos factos. Pode defender convicta, séria e lealmente uma posição sem dela convencer o tribunal.

A Ré funda o seu pedido de condenação do Autor como litigante de má fé nas seguintes circunstâncias:
1. No facto de ter ocultado que a ora Ré se disponibilizou para lhe devolver a quantia de €2.200,00 que foi entregue a título de caução;
2. No facto de não ter junto as comunicações que recebeu da Recorrida;
3. Na circunstância de narrado a posição assumida pela recorrida em relação aos factos, pedindo a condenação da mesma numa quantia que está disposta a devolver;
4. No facto de como suporte do seu recurso ter escolhido cirurgicamente excertos de depoimentos, omitindo toda a restante prova em sentido contrário.
Ora, quanto aos três primeiros pontos, importa referir que respeitam à fase anterior à prolação da sentença recorrida, sendo que tendo o pedido de condenação do Autor como litigante de má fé sido julgado  improcedente na sentença recorrida e não tendo esta sido impugnada nesta parte, não cabe a este Tribunal voltar a pronunciar-se sobre essa matéria.
No que respeita à conduta processual do Autor materializada no requerimento de interposição de recurso, não pode, pela simples razão de o mesmo ter feito referência apenas aos meios de prova que sustentam a sua posição, concluir-se pela existência de má-fé. Note-se que o artigo 640º, n.º 1, al. c) do Código de Processo Civil impõe ao impugnante da matéria de facto, que indique os concretos meios probatórios que, no seu entender, impunham decisão diversa da recorrida.
Assim, no caso dos autos, não é possível considerar verificada uma situação dolosa ou gravemente negligente que permita concluir pela litigância de má fé por parte do Autor.
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Conclui-se desta forma que a decisão recorrida é de manter e o pedido de condenação do Apelante como litigante de má-fé, de julgar improcedente.
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IV.Decisão.
Em face do exposto, acordam em julgar a apelação improcedente por não provada e, em consequência, em manter a sentença recorrida e em julgar improcedente o pedido de condenação do Apelante como litigante de má fé.
Custas da apelação pelo Recorrente e quanto ao incidente de condenação do Autor como litigante de má-fé, pela Recorrida, fixando-se em 0,5 UC a taxa de justiça relativa a tal incidente – artigo 527º do Código de Processo Civil.
Registe e notifique.
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Lisboa,2019-10-15                                                                                                               

(Ana Isabel Mascarenhas Pessoa)
(Vera Antunes)
(Amélia Rebelo)