APOIO JUDICIÁRIO
HONORÁRIOS AO AGENTE DE EXECUÇÃO
DESPESAS POR ELE EFETUADAS
Sumário


Sumário (da relatora):

1- Os honorários ao agente de execução e as despesas por ele efetuadas, pagos pelo exequente, pagamento, esse, que é condição de prosseguimento da execução, saem precípuos pelo produto dos bens penhorados e, caso não seja possível obter tal pagamento precípuo, o exequente pode reclamar o seu reembolso ao executado na execução (arts. 721º, n.º 1, e 541º, do C. P. Civil, e art. 45º, n.º 1, da Portaria n.º 282/2013, de 29.08).

2- De tal se excetua a situação de o executado beneficiar de apoio judiciário, na modalidade de “dispensa de pagamento de taxa de justiça e demais encargos”, caso em que o mesmo está dispensado do referido pagamento por força do estatuto de beneficiário de apoio judiciário na referida modalidade, o qual não lhe pode, por isso, ser imposto;

3- E ao Instituto de Gestão Financeira e Equipamentos da Justiça, IP não pode, também, ser imputada a responsabilidade do reembolso ao exequente dos supra referidos encargos, pois que nenhuma norma especialmente o prevê, não sendo admissível interpretação analógica do nº6, do art. 26º, do Regulamento das Custas Processuais, norma excecional (art. 11º, do Código Civil), nem deve ser efetuada interpretação extensiva da mesma, pois que nada nos permite concluir ser essa a intenção do legislador, sendo obrigação do intérprete atender à letra da lei e presumir que o legislador soube exprimir o seu pensamento em termos adequados (art. 9º, nºs 2 e 3 do C. Civil);

4- Do regime do apoio judiciário e da interpretação literal do referido preceito do RCP - no sentido de que beneficiando a parte vencida de apoio judiciário, na modalidade de dispensa prévia de pagamento de taxa de justiça e demais encargos com o processo, a parte vencedora apenas fica com o direito a ser reembolsada das taxas de justiça pelo Instituto de Gestão Financeira e Equipamentos da Justiça, IP -, nenhuma violação do direito fundamental de acesso ao direito e aos tribunais assim como à tutela jurisdicional efetiva, consagrados no artº 20º, da Constituição da República Portuguesa, pode resultar, por nenhuma interferência implicar no concreto e efetivo exercício do direito de recurso à via jurisdicional desta parte e este não se apresentar totalmente destituído de riscos e de custos, sendo o risco do exequente de não obtenção do reembolso dos montantes, por si pagos, de honorários e despesas de agente de execução, um normal e previsível risco em todas as ações.

Texto Integral


Acordam na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães (1)

Recorrente: Condomínio (…)
Recorridos: (..) e outros

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I. RELATÓRIO

Veio o (…) II, exequente nos autos de execução sumária que moveu contra Marco (…) e outros, recorrer do despacho que dispensou o Executado (..) de pagar os honorários e despesas com Agente de Execução, pelo facto de beneficiar de apoio judiciário na modalidade de dispensa de pagamento de taxa de justiça e demais encargos com o processo. Pugna por que o despacho recorrido seja totalmente revogado e substituído por outro que condene o Executado a pagar ao Exequente os montantes correspondentes às despesas e honorários com Agente de Execução ou, caso assim não se entenda, seja o IGFEJ condenado a reembolsar as referidas despesas ao Exequente.

Formula, para tanto, as seguintes

CONCLUSÕES:

“29. O Tribunal a quo decidiu no despacho recorrido dispensar o Executado Sérgio de pagar os honorários e despesas com Agente de Execução, pelo facto de beneficiar de apoio judiciário na modalidade de dispensa prévia de pagamento de taxa de justiça e demais encargos com o processo.
30. O Exequente intentou a execução para cobrar um montante de que era credor e o Executado devedor, desconhecendo se este beneficiaria ou não de apoio judiciário e muito menos em que modalidades.
31. O que o Exequente sabia quando intentou a execução é que, de acordo com o artigo 720.º n.º 1 do Código de Processo Civil, lhe competia designar Agente de Execução de entre os registados em lista.
32. Sabia também que, nos termos do artigo 35.º-A da Lei 34/2004, de 29 de Julho, quando se beneficia de apoio judiciário na modalidade de atribuição de agente de execução, o mesmo é sempre um oficial de justiça, designado segundo as regras da distribuição.
33. Ao contrário do que o Executado pretendeu no seu requerimento, o facto de gozar de apoio judiciário na modalidade de atribuição de Agente de Execução, não lhe confere a dispensa de pagamento das despesas e honorários com Agente de Execução.
34. Pois o pedido dessa modalidade de apoio judiciário está apenas conferida para quem assuma a posição de exequente.
35. Sendo que, nesse caso, é atribuído um oficial de justiça.
36. Em momento algum, foi conferida a possibilidade ao Exequente de a execução ser tramitada por oficial de justiça e assim conseguir que o executado ficasse responsável pelo pagamento das suas despesas e honorários.
37. Pelo contrário, já depois de finda a execução pela cobrança da totalidade da quantia exequenda, através de penhora de renda do executado, é que o exequente tomou conhecimento que afinal teria ele próprio de assumir essas custas.
38. Ou seja, para vigorar a tese do despacho recorrido, deveria ser conferida a faculdade ao Exequente de a execução ser tramitada por oficial de justiça, uma vez que, por toda a justiça, deveria ser o executado a assumir todos os encargos com o processo.
39. Assim sendo, a modalidade de apoio judiciário de atribuição de Agente de Execução não é aplicável a quem assume a posição de executado, sob pena de se estar a beneficiar quem incumpre as suas obrigações.
40. Segundo o despacho recorrido o Executado, só porque goza de apoio judiciário na modalidade de dispensa da taxa de justiça e demais encargos com o processo, fica desonerado de pagar as custas que o exequente suportou com o Agente de Execução.
41. Salvo o devido respeito, esta interpretação viola frontalmente o princípio constitucional da Tutela Jurisdicional Efectiva, previsto no artigo 20.º da CRP.
42. Quando o Exequente intenta a execução para cobrar um divida ele desconhece se o executado gozará de apoio judiciário e em que modalidades.
43. Pode suceder, por exemplo, caso de um exequente ser credor de uma quantia de duzentos e cinquenta euros e estar munido de um título executivo para a sua cobrança.
44. Se o Exequente for obrigado a pagar as despesas e honorários com Agente de Execução, pelo facto de o Executado gozar de apoio judiciário na modalidade de dispensa da taxa de justiça e demais encargos com o processo, então ao Exequente não compensará executar a divida.
45. Pois, no mínimo, ao Agente de Execução, terá de pagar duzentos e cinquenta e cinco euros mais IVA, de acordo com o disposto no D.L. n.º 282/2013 de 29 de Agosto.
46. Ficando impedido de exercer o direito de acesso aos Tribunais para garantir e exercer o seu direito de credor.
47. No caso em apareço, a manter-se a decisão recorrida, o montante que o Exequente terá de pagar ao Agente de Execução representa cerca de metade da divida que o Executado tinha para consigo.
48. Assim, o acesso ao presente processo executivo apenas confere ao Exequente a possibilidade de cobrar metade da quantia de que é credor.
49. Isto porque o executado beneficia de apoio judiciário nas modalidades de pagamento da taxa de justiça e demais encargos com o processo.
50. Sem prescindir do exposto, na nossa modesta opinião, o despacho recorrido faz uma interpretação errada da conjugação das normas aplicáveis.
51. É certo que foi concedido ao executado o benefício do apoio judiciário, nas modalidades de dispensa total de pagamento com as custas e encargos processuais e de honorários de com Agente de execução.
52. O artigo 532º do CPC estabelece que os encargos são da responsabilidade da parte que lhes deu origem, “salvo o disposto na lei que regula o acesso ao direito”.
53. O artigo 19º nº 1 do RCP estatui que, se a parte beneficiar de apoio judiciário, os encargos são adiantados pelo Instituto de Gestão Financeira e das Infra-Estruturas da Justiça, IP (IGFEJ).
54. Já o artigo 533º do CPC impõe que a parte vencida suporte as custas da parte vencedora, considerando, no nº 2 alínea c), compreendidas nas custas de parte as remunerações pagas ao agente de execução e as despesas por este efectuadas.
55. O artigo 4º nº 7 do RCP estabelece que a isenção de custas não abrange os reembolsos à parte vencedora a título de custas de parte, “com excepção dos casos de insuficiência económica, nos termos da lei de acesso ao direito e aos tribunais”.
56. Também o artigo 26º do RCP, no seu nº 3, al. d) considera custas de parte a pagar pela parte vencida à parte vencedora os valores pagos a título de honorários ao agente de execução e, no seu nº 6, prevê que, gozando a parte vencida de apoio judiciário, o reembolso das taxas de justiça pagas pelo vencedor é suportado pelo IGFEJ.
57. Finalmente, o artigo 29º do RCP, relativamente à oportunidade da conta de custas, dispõe, no seu nº 1, os casos em que a conta é dispensada, entre os quais o da alínea d) em que o responsável pelas custas beneficie de apoio judiciário na modalidade de dispensa do pagamento de taxa de justiça e demais encargos.
58. Da conjugação normas citadas, efectuado o pagamento da quantia exequenda, deve o reembolso ao Exequente das despesas e honorários com Agente de Execução ficar a cargo do IGFEJ”.
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O executado não apresentou contra-alegações.
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O Ministério Público respondeu, pugnando pela improcedência do recurso, formulando as seguintes CONCLUSÕES:

“1ª - Os honorários devidos ao A.E. e o reembolso das despesas por ele efectuadas, bem como os débitos a terceiros a que a venda executiva dê origem, são suportados pelo exequente, podendo este reclamar o seu reembolso ao executado (nesse mesmo sentido, cfr arts 45°, nº1 e 51º, nº1, da Portaria 282/2013, de 29.8);
2a - A responsabilidade do pagamento das quantias devidas ao AE recaem indubitavelmente sobre o exequente (sem prejuízo de, posteriormente, este imputar tais despesas ao executado, por via de reclamação de custas de parte);
3a - Beneficiando a parte vencida de apoio judiciário na modalidade de dispensa prévia de pagamento de taxa de justiça e demais encargos com o processo, a parte vencedora apenas fica com o direito a ser reembolsado das taxas de justiça pelo Instituto de Gestão Financeira e das Infra-Estruturas da Justiça (nos termos previstos pelo nº6 do artº 26° do Regulamento das Custas Processuais);
4a - O douto despacho recorrido fez correta interpretação e aplicação da lei, pelo que deve ser mantido nos seus precisos termos, não se vislumbrando que tenha sido violada qualquer norma ou princípio constitucional”.
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Após os vistos, cumpre apreciar e decidir o mérito do recurso interposto.
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II. FUNDAMENTAÇÃO

- OBJETO DO RECURSO

Apontemos as questões objeto do presente recurso, tendo presente que o mesmo é balizado pelas conclusões das alegações do recorrente, estando vedado ao tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que se imponha o seu conhecimento oficioso, acrescendo que os recursos não visam criar decisões sobre matéria nova, sendo o seu âmbito delimitado pelo conteúdo do ato recorrido – cfr. arts 635º, nº4, 637º, nº2 e 639º, nºs 1 e 2, do Código de Processo Civil.

Assim, a única questão a decidir é a seguinte:

- Se houve erro de direito na decisão recorrida ao considerar que, tendo sido concedido ao executado o benefício de apoio judiciário, na modalidade de dispensa do pagamento de taxa de justiça e demais encargos do processo, o mesmo está dispensado de pagar ao exequente os honorários e as despesas do agente de execução, ficando estes a cargo do exequente.
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II.A - FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

Os factos provados, com relevância para a decisão, constam já do relatório que antecede, acrescentando-se, ainda, os seguintes:

1. Foi deferido ao executado Sérgio o requerimento de proteção jurídica na modalidade de “dispensa de taxa de justiça e demais encargos com o processo” e de “atribuição de agente de execução” – doc. de fls 20, cujo teor se dá por reproduzido;
2. Na sequência do pagamento referido a fls 38, foi proferido despacho a ordenar que, oportunamente, os autos fossem remetidos à conta - v. fls 39;
3. Na sequência do requerimento do Executado Sérgio de fls 8 foi proferido o despacho recorrido, com o seguinte teor:
As custas processuais abrangem a taxa de justiça, os encargos e as custas de parte (artigos 529º, nº1, do Cód. De Processo. Civil, e 3º, nº1, do Regulamento das Custas Processuais), compreendendo estas o que cada parte haja despendido com o processo e tenha direito a ser compensada, designadamente as remunerações pagas ao agente de execução (artºs 533º do CPC e 25º, nºs 2/d e 3, do RCP), devendo apresentar a respectiva nota discriminativa cinco dias após a notificação de que foi obtida a totalidade do pagamento ou do produto da penhora, consoante os casos (artºs 25º, nº1, do RCP e 31º da Portaria nº. 419-A/2009, de 17 de Abril), mas apenas são consideradas as quantias até ao limite previsto na alínea c) do nº3 do artigo 26º do RCP.
Os valores pagos a título de honorários e despesas com o agente de execução são reclamados ao executado quando não tiverem obtido pagamento precípuo pelo produto dos bens penhorados (artigos 721º, nº1, e 541º, do CPC), excepto se os executados beneficiarem de apoio judiciário na modalidade de dispensa de pagamento de taxa de justiça e demais encargos, caso em que nem sequer há lugar à elaboração da conta (artigo 29º, nº1/d, do RCP), tendo o exequente de suportar esses encargos, ficando apenas com o direito a ser reembolsado das taxas de justiça pelo Instituto de Gestão Financeira e das Infra-Estruturas da Justiça nos termos previstos pelo nº6 do artº 26º do Regulamento das Custas Processuais.
O caso dos autos deve merecer esse tratamento, isto é, gozando o executado Sérgio de apoio judiciário na modalidade de dispensa de pagamento de taxa de justiça e demais encargos, os honorários e despesas com o agente de execução terão de ser suportados pelo exequente – prescindindo o Estado dos custos inerentes aos serviços prestados, através da devolução das taxas de justiça pagas pelo exequente -, e por maioria de razão não há fundamento legal para o prosseguimento da execução uma vez paga a totalidade da quantia exequenda e correspondentes juros.
Pelo exposto, uma vez que os executados são beneficiários de apoio na modalidade de dispensa prévia de pagamento de taxa de justiça e demais encargos com o processo estão dispensados de pagar ao exequente os honorários e despesas do agente de execução, em face do seu estatuto de beneficiários de apoio judiciário, o que se decide.
Notifique” – cfr. fls 19.
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II.B - FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

- Do reembolso ao exequente dos honorários e despesas do agente de execução, por ele suportados

Pretende o apelante a revogação da decisão que reconheceu aos executados a dispensa de pagarem ao exequente os honorários e despesas do agente de execução, por gozarem do beneficio do apoio, na modalidade de dispensa de pagamento de taxa de justiça e demais encargos com o processo, em face desse seu estatuto de beneficiários de apoio judiciário.

A questão aqui em análise e a decidir foi tratada em Acórdão desta mesma Secção em que a ora relatora foi adjunta (2), tendo-se aí sufragado o seguinte entendimento, com inteira pertinência para os presentes autos:

“O sistema de acesso ao direito e aos tribunais destina-se a assegurar que a ninguém seja dificultado ou impedido, em razão da sua condição social ou cultural, ou por insuficiência de meios económicos, o conhecimento, o exercício ou a defesa dos seus direitos (art. 1º, da Lei n.º 34/2004, de 29 de Julho (Lei do Apoio Judiciário ou LAJ).
De acordo com o disposto no art. 6º, n.º 1, da LAJ, “a proteção jurídica reveste as modalidades de consulta jurídica e de apoio judiciário.”
Uma das modalidades do apoio judiciário consiste na “dispensa de taxa de justiça e demais encargos com o processo” (art. 16º, n.º 1, al. a), da LAJ).
De igual modo, o apoio judiciário compreende a “atribuição de agente de execução” (art. 16º, n.º 1, al. g), da LAJ).
Por sua vez, as custas processuais, abrangem a taxa de justiça, os encargos e as custas de parte (art. 529º, n.º 1, do C. P. Civil, e art. 3º, n.º 1, do Regulamento das Custas Processuais ou RCP), compreendendo estas o que cada parte haja despendido com o processo e tenha direito a ser compensada, designadamente os honorários pagos ao agente de execução e as despesas por este efetuadas (art. 533º, n.º 2, al. c), do C. P. Civil; e arts. 25º, n.º 2, als. c) e d) e 26º, n.º 3, als. b) e d), do RCP).
Os honorários devidos ao agente de execução e o reembolso das despesas por ele efetuadas são suportados pelo exequente, podendo este reclamar o seu reembolso ao executado nos casos em que não seja possível obter o pagamento precípuo pelo produto dos bens penhorados (arts. 721º, n.º 1, e 541º, do C. P. Civil, e art. 45º, n.º 1, da Portaria n.º 282/2013, de 29.08), exceto, claro está, se os executados beneficiarem de apoio judiciário na modalidade de dispensa de pagamento de taxa de justiça e demais encargos, caso em que nem sequer há lugar à elaboração da conta (art. 29º, n.º 1, al. d), do RCP), tendo o exequente de suportar esses encargos, ficando apenas com o direito a ser reembolsado das taxas de justiça pelo Instituto de Gestão Financeira e Equipamentos da Justiça, IP (art. 26º, n.º 6, do RCP).
Por conseguinte, no caso em apreço, temos como demonstrado que os executados gozam do benefício de apoio judiciário na modalidade de dispensa de taxa de justiça e demais encargos com o processo, pelo que não terão estes que suportar os encargos resultantes de honorários devidos ao agente de execução e despesas por ele efetuadas no âmbito do presente processo executivo, sendo estes necessariamente suportados pelo exequente, nos termos sobreditos, tanto quanto é certo que se mostra inviável o pagamento precípuo de tais encargos por via do disposto no art. 541º, do C. P. Civil, em face do configurado benefício de apoio judiciário que os mesmos gozam.
Neste particular, Virgínio da Costa Ribeiro e Sérgio Rebelo (3) chamam a atenção que: “… caso o executado litigue com benefício do apoio judiciário que não inclua a modalidade de atribuição de agente de execução (o que será a situação mais frequente), os honorários e despesas do agente de execução têm de ser suportadas pelo exequente, face às regras das custas em sede executiva (…). O legislador quis, agora, que, em semelhantes situações, seja o exequente a suportar os riscos da lide executiva, ao invés de ser a comunidade a suportar esse mesmo risco.”
A idêntica conclusão chegou-se no Ac. RG de 17.11.2016 (4), onde se salienta que, “gozando os executados de apoio judiciário na modalidade de dispensa de pagamento de taxa de justiça e demais encargos, os honorários e despesas com o agente de execução terão de ser suportados pelo exequente – prescindindo o Estado dos custos inerentes aos serviços prestados, através da devolução das taxas de justiça pagas pelo exequente –, e por maioria de razão não há fundamento legal para o prosseguimento da execução uma vez paga a totalidade da quantia exequenda e correspondentes juros.
A propósito da apreciação duma suscitada inconstitucionalidade do n.º 6 do artigo 26º do RCP, o acórdão do Tribunal Constitucional 2/2015, de 07.07, diz na sua fundamentação que «se litigar é sempre uma atividade arriscada, sobretudo pelos custos que comporta e pela incerteza quanto ao resultado da lide, é também certo que essa escala de risco comporta diversas nivelações, havendo de reconhecer-se que ser-se parte vencedora num processo em que a parte vencida litiga com apoio judiciário acaba por revelar algumas especificidades diferenciadoras – algumas delas negativas, outras nem sempre prejudiciais para aquele que teve ganho de causa. Daí que não seja possível sustentar que a opção do legislador é intolerável ou inadmissível, procurando-se com a diferenciação de tratamento introduzida, atenta a diferença entre as situações, conciliar considerações associadas ao princípio da causalidade, por um lado, com imperativos de praticabilidade económica na administração da justiça e do sistema de apoio judiciário, por outro».”
Na sequência, neste mesmo Ac. do TC n.º 2/2015, de 07.07 (5) concluiu-se que “o artigo 26.º, n.º 6, do Regulamento de Custas Processuais, na redação conferida pela Lei 7/2012, de 13 de fevereiro, quando interpretado no sentido de que apenas é devido à parte vencedora, quando a parte vencida litiga com apoio judicial, o reembolso da taxa de justiça paga e não de outras importâncias devidas a título de custas de parte, não viola o princípio da igualdade, consagrado no artigo 13.º da Constituição.”
Conclui-se no referido Acórdão impor-se “a revogação do despacho recorrido, de modo a que se considere que os executados estão dispensados de pagar os honorários devidos ao agente de execução e reembolso das despesas por ele efetuadas, em face do benefício de apoio judiciário que os mesmos gozam, mormente na modalidade de dispensa de taxa de justiça e demais encargos com o processo”, sendo, também, a essa conclusão - de que os aqui executados estão dispensados de pagar os honorários devidos ao agente de execução e reembolso das despesas por ele efetuadas, em face do benefício de apoio judiciário que os mesmos gozam, na modalidade de dispensa de taxa de justiça e demais encargos com o processo - que aqui chegamos.

Vejamos.

O artigo 532º, do Código de Processo Civil, diploma a que pertencem todos os preceitos citados sem outra referência, estabelece que os encargos que se forem produzindo no processo são da responsabilidade da parte que lhes dá origem,salvo o disposto na lei que regula o acesso ao direito” e o artigo 533º, impõe que a parte vencida suporte as custas da parte vencedora, considerando a al. c), do nº2, compreendidas nas custas de parte as remunerações pagas ao agente de execução e as despesas por este efetuadas e o artigo 26º, do Regulamento das Custas Processuais, abreviadamente RCP, na al. d), do nº3, considera, também, custas de parte a pagar pela parte vencida à parte vencedora os valores pagos a título de honorários ao agente de execução. Prevê, ainda, o nº6, do referido artigo, que, gozando a parte vencida de apoio judiciário, o reembolso das taxas de justiça pagas pelo vencedor é suportado pelo Instituto de Gestão Financeira e Equipamentos da Justiça, IP, abreviadamente IGFEJ.

Verifica-se, assim, que os encargos (arts 16º e ss, do RCP) são inicialmente suportados pela parte que lhes deu origem, embora possam ser reembolsados pela parte contrária de acordo com a decisão que for proferida quanto à responsabilidade pelas custas (6).

Assim, os honorários “devidos” e as despesas “efetuadas” pelo agente de execução são, sempre, suportados pelo exequente, sob pena de não prosseguimento da execução, saindo, no final, precípuos do produto da venda dos bens penhorados e, se tal não for possível, pode o exequente vir a exigir o seu reembolso ao executado. O art. 533º, nº2, al. c) compreende nas custas de parte as “remunerações pagas” e as despesas efetuadas (7).

Deste modo, e como do art. 541º decorre, as custas da execução, incluindo os honorários e as despesas devidos ao agente de execução, saem precípuas do produto dos bens penhorados. E, efetivamente, sendo que os honorários devidos ao agente de execução e o reembolso das despesas por ele efetuadas são suportados pelo exequente, pode este reclamar o seu reembolso ao executado nos casos em que não seja possível obter o pagamento precípuo pelo produto dos bens penhorados (arts. 721º, n.º 1, e 541º, do C. P. Civil, e art. 45º, n.º 1, da Portaria n.º 282/2013, de 29.08).

Consagra a lei o entendimento de que “as despesas justificadas são reembolsáveis” (Ribeiro de Faria – Luísa Loureiro, Notas cit., I, anotação ao art. 541), como é vincado no art. 43º da Portaria 282/2013, de 29 de Agosto (“despesas que realize e comprove devidamente” (8), pelo executado.

É, pois, este o regime regra.

Tal não sucede, contudo, como acima se referiu, no caso de os executados beneficiarem de apoio judiciário, na modalidade de “dispensa de pagamento de taxa de justiça e demais encargos”, decorrendo tal desvio do regime regrada lei que regula o acesso ao direito” e do estatuto de beneficiário de apoio judiciário, de que os executados gozam.

Poderia entender-se, como faz parte da jurisprudência dos Tribunais Superiores, que não seria legítimo que o exequente, que suportou os honorários e as despesas devidos ao agente de execução, para poder ver o seu direito de acesso à justiça - constitucionalmente garantido - satisfeito, ficasse, definitivamente, sem as importâncias por si suportadas para impulsionar o processo, a que a parte que goza do benefício do apoio judiciário deu causa. E que, constituindo o acesso ao direito e aos Tribunais uma “responsabilidade do Estado” - v. artº 2, da LAJ -, garante este que, no seu exercício, “o sistema de acesso ao direito e aos tribunais funcionará por forma a que os serviços prestados aos seus utentes sejam qualificados e eficazes” e seja efetuada “uma adequada compensação aos profissionais forenses que participem no sistema de acesso ao direito e aos Tribunais”- v. nº1 e 2, do art. 3º, do referido diploma. E, na verdade, decorrendo da lei (v. referido art. 2º, da LAJ) que “O acesso ao direito e aos tribunais constitui uma responsabilidade do Estado”, não pode esta ser transferida para os particulares e impor-se a estes o assegurar de tal direito a quem se encontre em situação de insuficiência económica (v. artº 8º e 9º, da LAJ), endereçando-se-lhes um risco acrescido para a cobrança de créditos, este criado pelo Estado (que é quem tem o poder de conceder o apoio judiciário e, efetivamente, o concede).

Considera esta corrente jurisprudencial que, só tendo o pedido de apoio judiciário, na modalidade de “atribuição de pagamento ao agente de execução” (previsto na al. g), do nº1, do art. 16º, da Lei 34/2004 de 29/07) verdadeira aplicação aos casos em que o requerente do mesmo é o exequente (sendo, , um oficial de justiça a exercer as funções de agente de execução), estando-se perante a modalidade de “dispensa de taxa de justiça e demais encargos com o processo” (prevista na al. a) do referido preceito), que abrange, quanto nos “demais encargos”, o pagamento dos honorários e despesas ao agente de execução - sendo, quanto a estes, como vimos, a regra a da precipuídade (art. 541º) e, na falta de produto dos bens penhorados, a que resulta do nº1, do art. 45.º, da Portaria 282/2013 -, gozando o executado, responsável pelo pagamento, de apoio judiciário, nessa modalidade, está, necessária e automaticamente, dispensado de tal pagamento, não podendo, contudo, o exequente deixar de recuperar o que pagou de honorários e despesas, por via do reembolso junto do IGFEJ (artigo 26º, nº 6, do RCP) (9) (10).

Reforça-se no referido Acórdão que tal entendimento decorre da própria redação do artº 26º, do RCP, “quando dispõe (…) “3 - A parte vencida é condenada, nos termos previstos no Código de Processo Civil, ao pagamento dos seguintes valores, a título de custas de parte:

d)- Os valores pagos a título de honorários de agente de execução.

Daqui que considere que os valores pagos a título de honorários e despesas com o agente de execução é reclamado ao executado quando não tiverem obtido pagamento precípuo pelo produto dos bens penhorados (artigos 721º, nº1, e 541º), excepto se os executados beneficiarem de apoio judiciário na modalidade de dispensa de pagamento de taxa de justiça e demais encargos, caso em que nem sequer há lugar à elaboração da conta (artigo 29º, nº1/d, do RCP), tendo o exequente de suportar esses encargos, ficando com o direito a ser reembolsado das taxas de justiça pelo Instituto de Gestão Financeira e das Infra-Estruturas da Justiça nos termos previstos pelo nº6, do artº 26º, do Regulamento das Custas Processuais.

Nem esta solução prejudica o exequente, porque a situação que se quis salvaguardar, do pagamento dos honorários e despesas ao AE - que recai em primeira linha sobre o mesmo (art. 721º) embora com o direito de pedir o reembolso ao executado se não conseguir obter o pagamento nos termos do art. 541º (e do art. 45º/1 da Portaria 282/2013, de 29/08) -, fica garantida, pois que é o IGFEJ terá de pagar tais valores no lugar do executado que beneficia de apoio judiciário (art. 19/1 do RCP)” (11).

Nesta conformidade, poderia considerar-se que, apesar de o Acórdão do Tribunal Constitucional nº2/2015, publicado na II Série do Diário da República nº130, de 7-07-2015, “não julgar inconstitucional a norma do artigo 26.º, n.º 6, do Regulamento de Custas Processuais, na redação conferida pela Lei n.º 7/2012, de 13 de fevereiro, quando interpretada no sentido de que apenas é devido á parte vencedora, quando a parte vencida litiga com apoio judiciário, o reembolso da taxa de justiça paga e não de outras importâncias devidas a título de custas de parte” (12) (13), uma interpretação meramente literal e restrita do referido preceito, por forma a excluir o reembolso dos honorários e despesas do agente de execução, quando existam, violaria, o direito de acesso à justiça e aos tribunais na medida em que da referida norma resulte responsabilidade para o próprio exequente, por condicionar, desde logo, o referido direito dos exequentes. Na verdade, poderia entender-se que a lei consagra, expressamente, o direito do exequente a ser reembolsado das taxas de justiça pelo Instituto de Gestão Financeira e Equipamentos da Justiça, IP (art. 26º, n.º 6, do RCP) e nenhuma razão existir para excluir do direito ao reembolso os honorários devidos ao agente de execução e as despesas por ele efetuadas, suportados pelo exequente para poder fazer prosseguir a execução, no exercício do seu direito legal e constitucionalmente garantido. E, reconhecendo a lei o direito do exequente a ser reembolsado das taxas de justiça pelo Instituto de Gestão Financeira e Equipamentos da Justiça, IP (art. 26º, n.º 6, do RCP), nenhum sentido, faria não lhe ser assegurado, também, o reembolso dos, por si suportados, honorários e das despesas ao agente de execução, pelo que justo e equitativo nunca se mostraria fazer o exequente, particularmente, suportar um encargo que é de toda uma comunidade.

Efetivamente, poderia considerar-se, como o faz parte da jurisprudência, que as quantias de honorários e despesas ao agente de execução, não podendo ficar a cargo do executado, por beneficiar de apoio judiciário, não podem deixar de ser, numa equitativa interpretação atualista, e desde logo à luz do disposto no nº1, do art. 19º, do RCP - que estatui que, se a parte beneficiar de apoio judiciário, os encargos são adiantados pelo Instituto de Gestão Financeira e das Infra-Estruturas da Justiça, IP - reembolsadas ao exequente, impondo-se, por isso, fazer uma interpretação extensiva do referido preceito. E que se ao executado, que está em situação de insuficiência económica, tem de ser assegurado o direito de defesa, não o pode, contudo, ser à custa de violação de direitos do exequente e que nunca seria justo nem equitativo nuns processos o exequente poder ver satisfeito o seu direito ao reembolso e noutros, só porque ao executado foi concedido apoio judiciário, nunca o ver materializado, não podendo ser transferida, em termos definitivos, para o exequente, uma obrigação que não é exclusivamente sua, mas sim e, efetivamente, de toda a comunidade, tendo o respetivo reembolso ao exequente de ficar, tal como as taxas de justiça, por isso e porque se trata de despesas essenciais e necessárias ao prosseguimento da execução, também, a cargo do IGFEJ (14). E, ainda, que, na verdade, como conclui o apelante, quando o Exequente intenta a execução para cobrar uma dívida fá-lo no desconhecimento de benefício de apoio judiciário ao executado e impondo-se àquele a obrigação de pagar, suportando definitivamente, as despesas e honorários com Agente de Execução, pelo facto de o Executado gozar de apoio judiciário na modalidade de dispensa da taxa de justiça e demais encargos com o processo, estão a criar-se acrescidos riscos para o exercício do direito do exequente, que pode, até, vir a ser surpreendido com o não compensar da execução.

Porém, na verdade, estes são os riscos normais que o exercício da atividade de litigar comporta.

Como refere o Tribunal Constitucional no mencionado acórdão entre esses riscos estão custos de vária ordem e, mesmo, a incerteza quanto ao resultado da lide e, por isso, está, sempre presente, em cada uma, a incógnita de o recurso à ação vir trazer benefício ou, até, somente comportar prejuízo, por nada se vir a conseguir encontrar no património do devedor.

E sendo concedido ao Executado o benefício do apoio judiciário, efetivamente, porque goza de apoio judiciário, na modalidade de “dispensa da taxa de justiça e demais encargos” com o processo, fica dispensado de pagar os honorários e as despesas que o exequente suportou com o Agente de Execução, e que o teve de fazer para poder exercer o seu direito à cobrança do seu crédito, sendo que, contudo, esclareça-se, tal dispensa nada tem a ver com situações legalmente consagradas de isenção de custas (cfr. art. 4º, do RCP).

Esta interpretação, que é a que decorre do regime do apoio judiciário, em nada viola o princípio constitucional da Tutela Jurisdicional Efetiva, previsto no artigo 20.º da CRP, pois que, a final, o não reembolso de importâncias suportadas em nada afeta o exercício do direito.

E, com efeito, do regime do apoio judiciário, conjugado com o regime das custas processuais, e da interpretação literal do nº6, do artigo 26º, do RCP, nenhuma responsabilidade decorre para o próprio exequente, nenhuma violação do direito fundamental de acesso ao direito e aos tribunais, assim como à tutela jurisdicional efetiva, consagrados no artº 20º da CRP, resulta existir, não transparecendo que o exercício do direito à via jurisdicional se mostre afetado, ficando é aberta a possibilidade de materialização de riscos para o exequente, com que o mesmo, de antemão, podia contar (desde logo por a todos ser concedida, por lei, a possibilidade de requerer o apoio judiciário e ser de configurar a hipótese de o mesmo vir a ser concedido).

Acresce que, na verdade, olhando ao sistema e ao espírito do mesmo, verifica-se, até, que outras situações existem, mesmo mais gravosas, em que o Exequente, com vista à cobrança do seu crédito, tem de assumir despesas, correndo riscos de nunca, alcançar o fim visado, sequer ser reembolsado dos custos que teve de suportar. É, designadamente, o caso de falta ou insuficiência de bens do executado, fora de situação de benefício de apoio judiciário, sendo que no âmbito deste o exequente obtém, ao menos, o reembolso das taxas de justiça, suportado pelo Instituto de Gestão Financeira e das Infraestruturas da Justiça, IP.

Assim, o direito de acesso à justiça, atividade arriscada, é um direito não totalmente gratuito, podendo aquele que o pretende exercer ter de suportar despesas e nunca delas ser ressarcido, mesmo que parte vencedora.

Cabe, ainda, acrescentar que, sendo obrigação do intérprete atender à letra da lei e presumir que o legislador soube exprimir o seu pensamento em termos adequados (art. 9º, nºs 2 e 3, do Código Civil), entendemos que, não se podendo fazer interpretação analógica, sequer interpretação extensiva, pois que a lei é perentória a falar apenas de “taxas de justiça”, deixando de fora os “demais encargos” (de cuja dispensa o executado, que beneficia de apoio judiciário na referida modalidade, goza), não podem aos mesmos, face aos termos da lei especial, ser dado o mesmo tratamento que às taxas de justiça e impor-se ao IGFEJ uma responsabilidade não prevista (a de ser ele a reembolsar o exequente de “encargos”).

Assim, beneficiando os executados de apoio judiciário, na modalidade de dispensa de pagamento de taxa de justiça e demais encargos com o processo, estando dispensados de pagar os honorários e as despesas do agente de execução e não sendo de impor ao IGFEJ o reembolso ao exequente dos honorários e despesas ao agente de execução, vê o exequente concretizado o risco que ficar definitivamente para si (por impossibilidade de exigir a outrem o reembolso) aquilo que não pôde deixar de assumir se queria instaurar e impulsionar a execução, tendo, pois, de improcedem as conclusões da apelação.

Destarte, é de manter a orientação seguida por este Tribunal no processo acima referido – a de que “Os honorários devidos ao agente de execução e o reembolso das despesas por ele efetuadas são suportados pelo exequente, podendo este reclamar o seu reembolso ao executado nos casos em que não seja possível obter o pagamento precípuo pelo produto dos bens penhorados (arts. 721º, n.º 1, e 541º, do C. P. Civil, e art. 45º, n.º 1, da Portaria n.º 282/2013, de 29.08), exceto se os executados beneficiarem de apoio judiciário na modalidade de dispensa de pagamento de taxa de justiça e demais encargos, caso em que nem sequer há lugar à elaboração da conta (art. 29º, n.º 1, al. d), do RCP), tendo o exequente de suportar esses encargos, ficando apenas com o direito a ser reembolsado das taxas de justiça pelo Instituto de Gestão Financeira e Equipamentos da Justiça, IP (art. 26º, n.º 6, do RCP)” (15).

Em suma: Estando o executado dispensado do pagamento de taxas de justiça e outros encargos, não lhe podendo, por isso, ser imposta a obrigação de os pagar, por beneficiar de apoio judiciário, na referida modalidade, ao Instituto de Gestão Financeira e Equipamentos da Justiça, IP não pode, contudo, ser imposto, ao abrigo do nº6, do art. 26º, do Regulamento das Custas Processuais, o reembolso ao exequente (para além das taxas de justiça nele previstas) dos supra referidos encargos, nenhuma interpretação analógica desta norma, excecional (art. 11º, do Código Civil), sequer interpretação extensiva, pode ser feita, sendo obrigação do intérprete atender à letra da lei e presumir que o legislador soube exprimir o seu pensamento em termos adequados (art. 9º, nºs 2 e 3, do Código Civil).

Da concessão do apoio judiciário, na modalidade de dispensa prévia de pagamento de taxa de justiça e demais encargos, e da interpretação literal do referido preceito - no sentido de que beneficiando a parte vencida de apoio judiciário, na modalidade de dispensa prévia de pagamento de taxa de justiça e demais encargos com o processo, a parte vencedora apenas fica com o direito a ser reembolsada das taxas de justiça pelo Instituto de Gestão Financeira e Equipamentos da Justiça, IP, com exclusão, de direito desta parte a reembolso de honorários e despesas de agente de execução -, nenhuma violação do direito fundamental de acesso ao direito e aos tribunais assim como à tutela jurisdicional efetiva, consagrados no artº 20º da Constituição da República Portuguesa, pode resultar, por ela mesma nenhuma interferência ter no exercício do direito à via jurisdicional desta parte, sendo que o mesmo não é totalmente destituído de riscos e de custos.
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Assim, uma vez que os executados são beneficiários de apoio, na modalidade de dispensa prévia de pagamento de taxa de justiça e demais encargos com o processo, estão dispensados de pagar ao exequente os honorários e despesas do agente de execução, em face do seu estatuto de beneficiários de apoio judiciário, e não podendo o reembolso dos montantes dos referidos honorários e despesas ser imposto ao Instituto de Gestão Financeira e Equipamentos da Justiça, IP, por a sua responsabilidade por estes lhe não estar legalmente consagrada, tem o recurso de improceder.
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III. DECISÃO

Pelos fundamentos expostos, os Juízes desta Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães acordam em julgar a apelação improcedente e, em consequência, confirmam a decisão recorrida.
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Custas pelo apelante, pois que ficou vencido – art. 527º, nº1 e 2, do CPC.
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Guimarães, 10 de julho de 2019
(Assinado eletronicamente pelos Senhores Juízes Desembargadores)

Eugénia Cunha
José Flores
Sandra Melo


1. Relatora: Eugénia Cunha; 1º Adjunto: José Flores; 2ª Adjunta: Sandra Melo
2. Ac. da Relação de Guimarães de 6/6/2019, processo APELAÇÃO N.º 704/09.2TBGMR.G1, in dgsi.net
3. In A Ação Executiva Anotada e Comentada, Almedina, 2015, pág. 124 (em comentário ao art. 541º, do CPC)
4. Proc. n.º 1033/14.5TBBCL.G1, relator Heitor Gonçalves, acessível em www.dgsi.pt.
5. Publicado no DR, n.º 130/2015, Série II, de 2015-07-07.
6. António Santos Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, O Código de Processo Civil Anotado, vol. I, Almedina, pág. 585
7. José Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, Código de Processo Civil Anotado, volume 2º, 3ª Edição, Almedina, pág. 454
8. Ibidem, pág 454
9. Ac. da RL de 7/2/2019, processo 2702.13.2.YYLSB-B.L1-8 (Isoleta Almeida Costa), in dgsi.net
10. Em sentido contrário, isto é, que ficam excluídos do reembolso v. José António Coelho Carreira, Regulamento das custas processuais anotado, 2ª edição, 2018, pág. 354 e seg.
11. Cfr., no mesmo sentido, entre outros Ac. da Rel. de Lisboa de 18/2/2016, processo 2052-09.9TBPDL-C.L1-6, (Maria Teresa Pardal) in dgsi.net, onde se decidiu “Numa execução em que é efectuado o pagamento voluntário da quantia exequenda pela executada a quem foi concedido o benefício do apoio judiciário na modalidade de dispensa do pagamento de taxa de justiça e dos encargos do processo, bem como dos honorários com patrono e solicitador de execução, não devem ser liquidadas as quantias devidas com honorários e despesas ao agente de execução, a seu cargo, sendo o respectivo reembolso à exequente a cargo do IGFEJ”.
12. Aí se refere «se litigar é sempre uma actividade arriscada, sobretudo pelos custos que comporta e pela incerteza quanto ao resultado da lide, é também certo que essa escala de risco comporta diversas nivelações, havendo de reconhecer-se que ser-se parte vencedora num processo em que a parte vencida litiga com apoio judiciário acaba por revelar algumas especificidades diferenciadoras – algumas delas negativas, outras nem sempre prejudiciais para aquele que teve ganho de causa. Daí que não seja possível sustentar que a opção do legislador é intolerável ou inadmissível, procurando-se com a diferenciação de tratamento introduzida, atenta a diferença entre as situações, conciliar considerações associadas ao princípio da causalidade, por um lado, com imperativos de praticabilidade económica na administração da justiça e do sistema de apoio judiciário, por outro».
13. Cfr. ainda Ac. da Relação de Guimarães de 17/11/2016, 1033/14.5TBBCL.G1(Heitor Gonçalves), in dgsi.net, onde se decidiu “Gozando os executados de apoio judiciário na modalidade de dispensa de pagamento de taxa de justiça e demais encargos, os honorários e despesas com o agente de execução terão de ser suportados pelo exequente, não podendo este inclui-los na nota de custas de parte” e Ac. da Rel de Coimbra de 23/10/2018 (Carlos Moreira), in dgsi.net, onde se decidiu que “1 – A interpretação do teor nº6 do artº 26º do RCP, até porque norma especial perante o 533°, n° 2, al. c) do NCPC, não é condicionada por este preceito. 2 – Aquele segmento normativo deve ser interpretado como vinculando o IGFIEJ, quando o vencido goze do benefício do apoio judiciário, apenas ao pagamento ao vencedor da taxa de justiça por este suportada, com exclusão dos demais encargos previstos no nº3 de tal preceito”, por “o âmbito da regulamentação de uma situação excepcional, ou até especial, a letra da lei ganha especial relevo, pois que, naquela, a analogia é proibida e, inclusive, a interpretação extensiva tem de ser adotada cautelosamente – artº 11º do CC. Pelo que aqui ganha maior relevo o disposto no artº 9º nº2 do CC: «não pode… ser considerado pelo interprete o pensamento legislativo que não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso». No caso vertente assim é: nada na letra da lei permite a conclusão de que o legislador quis vincular o Instituto para além do pagamento da taxa de justiça. Acresce que o próprio elemento sistemático assim o inculca. Efetivamente, no nº3 o legislador definiu o âmbito/amplitude da parte vencida a título de custas de parte no qual se incluem, para além do mais, Os valores pagos a título de honorários de agente de execução. Mas no nº6, e sendo-lhe muito fácil remeter para o nº3, e, assim, abarcando tudo o que nele se prevê, apenas se cingiu à taxa de justiça. Destarte se conclui que este preceito deve ser interpretado nos seus precisos termos”.
14. Cfr. Ac. da RE de 18/2/2016, Processo 2052-09.9TBPDL-C.L1-6.dgsi.Net, citado in Abílio Neto, Novo Código de Processo Civil Anotado, 4ª Edição Revista e Ampliada, Março/2017, Ediforum, pág 1223
15. Ac da RG de 6/6/2019, processo n.º 704/09.2TBGMR.G1, acima citado