UNIÃO DE CONTRATOS
CUMPRIMENTO DEFEITUOSO
RESOLUÇÃO
Sumário

I – A união de contratos pressupõe um só negócio jurídico integrando elementos essenciais de tipos contratuais diversos, que se interligam através de um único nexo de funcionalidade comum, e que, na sua execução, dependem da realização de cada uma das prestações pertinentes a cada um dos tipos de contrato em presença.
II – É o que se verifica quando a Ré se obriga a instalar em favor da A. determinado sistema informático por si fornecido, com a disponibilização de acessos URL e users, e ainda a prestar serviços de suporte e de manutenção (contrato de prestação de serviço que avoca o regime do contrato de empreitada) mediante o pagamento de determinada contrapartida monetária global (fraccionada no tempo), destinado a servir determinado fim específico relacionado com a organização e rentabilidade da actividade empresarial da adquirente do produto, a que acresce a obrigação, nos termos contratuais firmados, de conceder uma licença de utilização à A., viabilizando-lhe um espaço para o alojamento de um software num sítio da internet, associando-lhe prestações relacionadas com a manutenção desse espaço virtual destinado ao fim que se assinalou supra, medianto retribuição (locação).
III - Temos, assim, diversos tipos contratuais que se congregam e complementam num único negócio global, intrinsecamente ligados entre si, mas que, de todo o modo, mantém a sua individualidade jurídica própria e distinta, perdendo apenas a sua autonomia em razão da dependência intrínseca que mantém e do nexo de funcionalidade comum que justificou a sua celebração conjunta e conjugada.
IV - Encontra-se claramente demonstrado nos autos que tal sistema informático fornecido e implementado pela Ré revelou um conjunto de deficiências e insuficiências que o tornaram objectivamente inapto a servir os interesses da sua beneficiária e que tal como foi disponibilizado pela Ré tal sistema não cumpriria os objectivos contratualmente firmados que justificaram a sua aquisição pela beneficiária e a avultada contrapartida monetária por ele suportada, sendo certo que a a Ré, devidamente interpelada para o efeito pela A., nunca logrou superar, eliminando e ultrapassando, tais vícios do sistema informático após o que, depois do proletar sucessivo de diligências com vista a tentar que o sistema funcionasse correctamente e em conformidade com o desiderato contratual acordado, a ora demandante, por perda do interesse no negócio, exerceu legitimamente o correspectivo direito de resolução, nos termos gerais dos artigo 432º, nº 1, e 808º, nº 1, do Código de Processo Civil.
V - Trata-se, de resto, de uma situação comum quando o objectivo contratual visado através da obrigação de resultado assumida pela prestadora do serviço (in casu, de natureza informática) não é manifestamente alcançado e esta se revela absolutamente incapaz de o superar em tempo minimamente razoável.

Texto Parcial

Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Lisboa (7ª Secção).
I – RELATÓRIO
Instaurou A., acção declarativa de condenação, na forma comum, contra B.
Alegou, essencialmente, que:
Entre a Autora e a Ré foi celebrado, além do mais, um contrato de implementação e software em 2 de Abril de 2015.
O projecto estipulado visava a implementação de um software com a finalidade de criação de uma base de dados de recrutamento e seleção que permitisse a recepção e gestão de candidaturas a ofertas de emprego, intervindo-se em todas as fases de um processo de recrutamento e seleção.
Ficou acordado que o mesmo estaria em condições de estar concluído em Agosto de 2015.
Todavia, a Autora não teve acesso aos módulos aplicacionais na data a que a Ré se obrigou a tal prestação, sendo que a solução de implementação contratada jamais foi concluída por esta empresa.
O software apresentava defeitos na fase da realização de testes, a Autora comunicou à Ré as necessidades e correções a realizar e nenhuma solução foi fornecida por esta empresa, nunca se tendo passado da fase de testes.
Foram, ainda, encetadas diligências com vista à normalização da relação contratual estabelecida, sem sucesso, levando à perda do interesse por parte da Autora.
Nesse circunspecto, esta sociedade tomou a iniciativa unilateral da resolução contratual, por incumprimento definitivo da Ré, face à perda de interesse na prestação contratualizada.
Conclui pedindo que o Tribunal:
a) Declare a legalidade do direito à resolução do contrato, com a consequência da destruição retroativa do contrato celebrado;
b) Declare a legalidade da exceção do não cumprimento quanto às faturas relativas a 450 licenças de utilização do software T. HCM em Saas, emitidas pela Ré a partir de outubro de 2015;
c) Declare não devidas as quantias referentes à utilização de 450 licenças do software T. HCM em Saas, constantes das faturas emitidas pela Ré a partir de outubro de 2015;
d) Declare a nulidade da cláusula contratual que limita a responsabilidade pelo incumprimento do contrato (cfr. cláusula décima quinta, número três);
e) Condene a Ré no pagamento da quantia de € 13 194,67 (treze mil, cento e noventa e quatro euros e sessenta e sete cêntimos), a título de indemnização pela resolução contratual fundada no interesse contratual negativo, acrescida de juros de mora comerciais, à taxa legal em vigor, desde a data da comunicação da resolução até efetivo e integral pagamento.
Pessoal e regularmente citada, a Ré contestou e deduziu reconvenção contra a Autora.
Essencialmente alegou:
O incumprimento na relação contratual deveu-se apenas à Autora, posto que a implementação do software não se completou no prazo previsto por responsabilidade exclusiva da mesma, tendo a Ré prestado todos os serviços a que se obrigara contratualmente.
Efetivamente, desde 12 de Junho de 2015 que a Autora teve acesso aos módulos em ambiente de qualidade, para início dos testes, mas esta solicitou alterações imprevistas.
A Autora, conhecedora dessa situação, veio alegar factos inverídicos nesta acção, apenas com a finalidade de vir a obter vantagem financeira à custa do património da Ré.
Conclui pela improcedência da acção, por não provada, e pela procedência do pedido reconvencional, com a consequente condenação da Autora no pagamento à Ré da quantia de € 56 125,71 (cinquenta e seis mil, cento e vinte e cinco euros e setenta e um cêntimos), acrescida de juros de mora vencidos e vincendos, calculados desde a data da interpelação para pagamento até efetivo e integral pagamento.
Mais reclamou indemnização de montante não inferior a € 2 000,00 (dois mil euros) por litigância de má fé, devendo, ainda, a Autora ser condenada na correspondente multa.
Replicou a Autora, com vista a ser desatendido o pedido reconvencional, tal como o pedido de condenação por litigância de má fé, mantendo a sua versão inicial dos factos.
Procedeu-se ao saneamento dos autos.
Realizou-se audiência final.
Foi proferida sentença que julgou declarou a legalidade do direito à resolução do contrato pela Autora, com a consequência da destruição retroativa do contrato celebrado; declarou não ser devido o pagamento pela Autora das faturas relativas a 450 licenças de utilização do software T. HCM em Saas, emitidas pela Ré a partir de outubro de 2015; declarou não devidas as quantias referentes à utilização de 450 licenças do software T. HCM em Saas, constantes das faturas emitidas pela Ré a partir de outubro de 2015; declarou a nulidade da cláusula contratual que limita a responsabilidade pelo incumprimento do contrato (por referência à cláusula geral transcrita no ponto 66 supra, por violação do disposto no artigo 18.º, alínea c), e nos termos do estatuído no artigo 12.º, ambos do Decreto-Lei n.º 446/85, de 25 de outubro, na versão atual); condenou a Ré no pagamento à Autora da quantia de € 13 194,67 (treze mil, cento e noventa e quatro euros e sessenta e sete cêntimos, sem IVA), a título de indemnização pela resolução contratual fundada no interesse contratual negativo, acrescida de juros de mora comerciais, às taxas legais em vigor, desde a data da comunicação da resolução (pela Autora) até efetivo e integral pagamento; absolveu a Autora/reconvinda do pedido reconvencional contra si formulado pela Ré/reconvinte, na sua totalidade; absolveu a Autora do pedido de condenação por litigância de má fé contra si deduzido pela Ré, na sua totalidade (cfr. fls.  296 a 339).
Apresentou a Ré recurso desta decisão, o qual foi admitido como de apelação (cfr. fls. 436).
Juntas as competentes alegações, a fls. 349 a 395, formulou o apelante as seguintes conclusões:
(...)
Contra-alegou o Autora pugnando pela improcedência do recurso e pela manutenção da decisão recorrida.
Apresentou as seguintes conclusões:
(...)
II – FACTOS PROVADOS.
Foi dado como provado em 1ª instância:
1. A Autora é uma sociedade comercial por quotas que se dedica à atividade de implementação de soluções de rede de telecomunicações, manutenção, suporte e gestão de projetos e equipamentos no âmbito de outsourcing, bem como dos projetos dos seus clientes;
2. É uma empresa que desenvolve a sua atividade a nível nacional e, por isso, integra no seu quadro empresarial entre 400 a 450 trabalhadores, o que reclama, além de outras necessidades, uma elevada eficácia de gestão de recursos humanos, para fazer face a todas as necessidades que esta gestão implica;
3. Com o intuito de solucionar e facilitar esta gestão, a Autora celebrou um contrato de prestação de serviços com a Ré (sociedade cuja certidão permanente está documentada nos presentes autos, de fls. 163 a 166);
4. A Ré é uma sucursal, com personalidade judiciária e representante permanente em Portugal de empresa sediada em França, que se dedica à atividade de implementação, integração, formação e suporte de soluções de software, para melhor gestão dos negócios dos seus clientes, para serem utilizadas internamente ou como outsourcing, ou seja, com recurso a serviços de alojamento em Saas (Software as a Service) para o qual fazem a transição das soluções escolhidas pelo cliente e através das quais podem ser retiradas vantagens no acesso à informação inserida no software pelos clientes; o objeto social da Ré centra-se no “Desenvolvimento, criação, implementação, comercialização e manutenção de programas informáticos (software), bem como a prestação de serviços de consultadoria em matéria informática” (cfr. certidão permanente de fls. 163 a 166);
5. A Ré tem duas linhas principais de negócios, sendo, uma delas, os recursos humanos (processamento salarial, gestão de pessoas, recrutamento e seleção, etc.);
6. No dia 2 de abril de 2015, a Autora e a Ré celebraram dois contratos ligados;
7. Um deles, denominado “Condições Gerais de Prestação de Serviços – Software T. HCM” (contrato Ref.ª TLT.WDC.2015.007), teve como objeto a “prestação de serviços de implementação do software T. HCM” (cfr. documento de fls. 122 a 136);
8. (...) Especificamente, a prestação do serviço de implementação da solução T. HCM em Saas, nos módulos base, recrutamento e seleção e relatórios, na empresa Autora (a cliente), abrangente a 450 colaboradores + 450 utilizadores;
9. (...) Dividindo-se, cada um daqueles módulos, nas fases de análise, implementação, testes e entrada em produção;
10. Foi previsto, para a conclusão deste serviço, um prazo de três meses, que poderia, com a margem acordada, ir até ao final de Agosto de 2015, de acordo com o plano de projeto (cfr. pág. 12 do seu anexo I, a fls. 132);
11. Ficou acordado que, pela prestação deste serviço, seriam pagos os seguintes valores sem IVA incluído e da seguinte forma (cfr. pág. 19 do seu anexo I, a fls. 135 verso):
- Com a aprovação da análise do módulo base, € 2 379,00;
- Com a aprovação dos testes ao módulo base, € 3 172,00;
- Com a aprovação da análise do módulo recrutamento, € 2 379,00;
- Com a aprovação dos testes ao módulo recrutamento, € 3 965,00;
- Com a aprovação dos relatórios, € 3 379,00;
- Com a entrada em produção, € 1 586,00;
8. Foram pagas as quantias correspondentes à aprovação da análise do módulo base e à aprovação da análise do módulo recrutamento, perfazendo o valor de € 4 758,00 + IVA (cfr. documento de fls. 19);
9. Outro, denominado “Condições Gerais do Contrato de Licenciamento e Manutenção – Saas Software T. HCM” (contrato Ref.ª TLT.WDC.2015.006), teve como objeto a prestação que “facultará à Cliente o acesso aos Módulos Aplicacionais devidamente identificados nas Condições Particulares do presente Contrato e prestará serviços de suporte e manutenção diretamente relacionados com os Módulos Aplicacionais, assim como quaisquer outros serviços enumerados neste documento” (cfr. documento de fls. 19 verso a 40 e 137 verso a 160);
10. No atinente ao contrato das Condições Particulares de Contrato de Licenciamento e Manutenção – Saas Software T. HCM, teve como objeto a definição do número de acessos de utilização em Saas do Software T. HCM, que definia o preço a pagar, bem como definia limites de armazenamento e as configurações mínimas recomendadas nas máquinas de acesso por parte do cliente (hardware) – cfr. documento de fls. 40 verso a 42; 11. De acordo com o número dois da cláusula primeira das Condições Gerais do Contrato de Licenciamento e Manutenção – Saas Software T. HCM, ficou acordado que, a partir do dia 31 de Março de 2015, “(...) nos termos das cláusulas das presentes Condições Gerais, a T. Software prestará à Cliente, os serviços descritos nas Condições Particulares e no Anexo II, todos do presente Contrato” (cfr. documento de fls. 19 verso a 40 e 137 verso a 160);
12. De acordo com o referido anexo II, que define as características do serviço Saas, SLA’S e penalizações, modelo contratado para utilizar o software, é descrito:
- No ponto A1.1 que “Os serviços de alojamento do T. HCM permitirão o acesso da Cliente às Aplicações contratadas e devidamente identificadas no presente Contrato”;
- No ponto A2.1 que “A T. Software instalará nos seus servidores em Itália, Milão, o software T. HCM em Saas e respetivos módulos aplicacionais contratados pela Cliente ao abrigo do presente Contrato”;
- No ponto A2.3 que “Quaisquer serviços de personalização a desenvolver pela T. Software a pedido da Cliente implicarão custos para esta, em valores a negociar” (cfr. documento de fls. 19 verso a 40 e 137 verso a 160);
15. Também os números dois e três da cláusula segunda deste Contrato de Licenciamento e Manutenção – Saas, dispõe que “A T. Software emite a favor da Cliente um conjunto de acesso de utilização intransmissíveis sobre os Módulos Aplicacionais disponíveis no software T. HCM de acordo com o descrito nas Condições Particulares do presente Contrato” e “A licença de utilização em Saas concedida ao abrigo do presente Contrato apenas conferirá à Cliente o direito de utilização dos Módulos Aplicacionais, que constituem objecto das Condições Particulares, durante a vigência do presente Contrato (...)” (cfr. documento de fls. 19 verso a 40 e 137 verso a 160);
16. Na cláusula sexta das Condições Particulares de Contrato de Licenciamento e Manutenção – Saas Software T. HCM, é acordado que “O presente contrato tem início de vigência no dia 31 de Março de 2015” (cfr. documento de fls. 40 verso a 42);
17. Pelo serviço Software as a service (Saas), cujo objeto é a licença de utilização do Software T. HCM a ser disponibilizado num ambiente de acesso, que seria acedido via internet, de acordo com as condições gerais e particulares do contrato e seus anexos, seria devido o valor de € 1.166,67 por mês (valor sem IVA), cujo pagamento era efetuado trimestralmente, perfazendo a quantia trimestral de € 3 500,01;
20. De acordo com o número dois da cláusula sétima das Condições Gerais do Contrato de Licenciamento e Manutenção – Saas Software T. HCM, “a Cliente facturará os preços das tarifas devidas pela prestação dos Serviços nos termos que se seguem:
a) Em 31 de Março de 2015, será facturado o preço correspondente à 1ª tarifa de entrada.
b) No dia 30 de Abril facturar-se-á o correspondente ao mês de Abril, Maio e Junho, completando-se o 1º trimestre, e assim sucessivamente.
c) O preço pelos acessos em Saas será facturado trimestralmente, até ao último dia do mês que compõe o trimestre seguinte a facturar.” (cfr. documento de fls. 19 verso a 40 e 137 verso a 160);
21. Ao abrigo do referido contrato de licenciamento e manutenção, a Autora procedeu aos seguintes pagamentos (cfr. documento de fls. 19):
- A 30 de Abril de 2015, € 1.166,67 a título de primeira tarifa de entrada;
- A 30 de Abril de 2015, € 3.500,00 pelo trimestre de abril, maio e junho;
- A 30 de Julho de 2015, € 270,00 por encomenda de licenças adicionais (cfr. documento de fls. 42 verso e 43);
- A 30 de Julho de 2015, € 3.500,00 pelo trimestre de julho, agosto e setembro;
22. Na primeira quinzena de abril deu-se início à análise do módulo base para que fosse implementada a solução Standard do Software T. HCM, adaptada à realidade da Autora (cfr. documento de fls. 50 a 61 verso);
23. As adaptações passavam por alterar terminologias, a ordem dos campos, dar acesso de visibilidade consoante o utilizador fosse Manager, Colaborador ou HRPOF;
24. De acordo com o respetivo “Enquadramento”, “O presente documento tem como objetivo descrever as alterações a realizar no âmbito do projeto de implementação do T. HCM, proporcionando a adaptação do Módulo Base do T. HCM à realidade da Wondercom” (cfr. documento de fls. 50 a 61 verso);
25. Conforme os seus ”Pressupostos”, “Nesta fase estão incluídos apenas os Perfis Standard do T. HCM (Manager, HRPROF e SELFSRV – colaborador)” – cfr. documento de fls. 50 a 61 verso;
26. De seguida, apresenta-se a “Solução” para as modificações a adotar e respetivas respostas que se encontram no documento de fls. 43 verso e 44, cuja implementação se iniciaria a 23 de abril de 2015;
27.Após aprovação da análise do módulo base, antes de serem feitos os testes ao mesmo de acordo com o projeto (cfr. anexo I do documento de fls. 122 a 136), iniciou-se a análise ao módulo de recrutamento a 25 de maio de 2015 (cfr. documento de fls. 62 a 74);
28(...) Cuja resposta foi enviada a 29 de Maio de 2015 e foi providenciada uma reunião para realização dos testes ao módulo base, cuja data seria a 8 de Junho de 2015 (cfr. documento de fls. 77 verso a 83);
29.Foi realizada uma reunião a 8 de Julho de 2015 para apresentação em ambiente de qualidade, tendo sido nesta data que a Autora teve oportunidade de ver o software pelas mãos do gestor de projeto, PA., uma vez que, até então, apenas haviam sido exibidos prints screens;
30. No entanto, foi aprovada a análise do módulo de recrutamento, já que ainda não tinha existido interação direta pela Autora com o software em apreço;
31. Pela circunstância de a Ré ter estado grande parte do mês de agosto de férias, apenas a 18 de Setembro de 2015 foi cedido o URL para acesso ao ambiente de qualidade;
32. Nesta data já tinha sido ultrapassado o prazo de conclusão da implementação do software, na sua globalidade;
33. Foi a partir desta data que a Autora teve contacto com o aludido software, disponível a três utilizadores seus, podendo explorá-lo e testá-lo, cujo resultado foi insatisfatório por só nesse momento ter tido a possibilidade de constatar os diversos erros na sua implementação (cfr. documento de fls. 44 verso);
34. Erros que se caracterizaram como: partes de software não traduzido, indicações de alterações que foram pedidas e nunca implementadas, existência de partes do software que nunca antes tinham sido apresentadas; tendo sido enviada à Ré, por comunicação eletrónica, no dia 29 de Outubro de 2015, uma análise detalhada dos erros detectados, das alterações solicitadas e não implementadas (cfr. documento de fls. 90 verso a 99);
35. Ao longo do projeto, a Autora, por diversas vezes, fez menção ao facto de os prints screens não serem o método suficiente para se ter a percepção do funcionamento do software; no entanto, nunca antes havia sido cedido o URL para poder consultá-lo por via internet;
36. Apenas a 30 de Novembro de 2015 foi concluída, por parte da Ré, a análise ao documento de fls. 90 verso a 99, enviado a 29 de Outubro de 2015 (cfr. documento de fls. 45 e 45 verso);
37. Tendo sido, nesta última data, enviado um documento pela Ré para a Autora identificar os campos a corrigir e a serem esclarecidos, cuja resposta foi dada a 3 de Dezembro de 2015 e foi também pedido o plano para os “próximos passos” no aludido projeto (cfr. documento de fls. 45 e 45 verso);
38. A Ré informou a Autora, nos dias 14 e 30 de Dezembro de 2015, que ainda não tinha analisado a resposta desta, e cuja resposta só veio a ser remetida no dia 30 de Dezembro de 2015, na sequência de uma comunicação electrónica enviada pela Autora demonstrando o profundo desagrado pela forma como vinha a ser encaminhado o projeto e a sua falta de esperança na implementação do mesmo, solicitando uma reunião urgente (cfr. documento de fls. 83 verso e 84);
39. A resposta foi dada no dia 30 de Dezembro de 2015 pela Ré, no sentido de serem realizadas as correções para apresentar um novo calendário (cfr. documento de fls. 83 verso e 84);
40. Realizou-se uma reunião a 15 de Janeiro de 2016 (sem acta), com a funcionária da Ré, RR., tendo esta se comprometido a entregar sem erros a última versão para testes, disponível no final de Fevereiro de 2016, totalmente pronta para passar a ambiente de produção, na medida em que a Autora já havia indicado que seria a última oportunidade para não desistir e perder o interesse no negócio;
41. Nessa sequência, agendou-se uma reunião com vista à conclusão do projeto, para o dia 29 de Fevereiro de 2016;
42. No entanto, esta reunião foi desmarcada pela Ré, tendo sido reagendada para o dia 4 de Março de 2016 (cfr. documento de fls. 84 verso a 86);
43. Ainda no dia 29 de Fevereiro de 2016, uma vez que se iria realizar a reunião a 4 de março seguinte, a Autora alertou para o facto de ter realizado alguns testes e que continuavam a existir desconformidades, enviando, para o efeito, um documento com os devidos comentários ponto a ponto, com o intuito de estas desconformidades estarem colmatadas até ao dia da reunião (cfr. documentos de fls. 46 e 86 verso a 88);
44. Na data marcada para a reunião final, em 4 de Março de 2016, a Autora continuou a detectar desconformidades, de cuja acta resulta, em suma, que continuavam a existir e que a Ré iria propor uma solução com vista à exposição do software desde o pedido de recrutamento até à contratação, tendo a Autora ficado de dar uma resposta à sugestão da Ré (cfr. documento de fls. 99 verso a 101);
45. No dia 23 de Março de 2016, a Autora informou a Ré que, face à descrença na correta implementação do software, apenas poderia ponderar a continuação do mesmo caso houvesse compromisso da Ré em fazer a apresentação sugerida e, neste seguimento, apresentarem um plano concreto no atinente à implementação e estruturação da equipa de desenvolvimento de suporte (cfr. documento de fls. 101 verso e 102);
46. Ainda nesta comunicação eletrónica, a Autora alertou para a circunstância de terem sido emitidas faturas pela Ré, no respeitante aos serviços de hosting/cloud/licença, durante o período em que o processo esteve parado por parte da Ré, e que não deveria assumir a responsabilidade desse custo, dado que não houve qualquer proveito, situação que deveria ser avaliada pela Ré (cfr. documento de fls. 101 verso e 102);
47. Em 29 de Março de 2016, a Ré respondeu que iria ser agendada uma reunião com vista à apresentação do T. HCM, mostrando o processo de A a Z (desde um pedido de recrutamento até uma contratação); após esta reunião, a Ré iria propor um plano de ação, sendo que a questão do custo com as aludidas faturas pendentes seria analisada/apresentada com o plano de ação (cfr. documento de fls. 102 verso e 103);
48. Foi agendada reunião para dia 12 de Abril de 2016; no entanto, foi novamente desmarcada e proposta uma data para a realização da reunião (20 de Abril de 2016) – cfr. documento de fls. 102 verso e 103;
49. A reunião de 12 de Abril de 2016 era, para a Autora, a última oportunidade de se ultrapassar todos os inconvenientes e custos causados com a não implementação do software em causa;
50.  Mais uma vez, a Autora demonstrou o seu desagrado perante a falta de compromisso e rigor, ao que acrescentou que a data sugerida não era compatível com a sua agenda, propondo à Ré os dias 28 ou 29 de Abril de 2016;
51. Os motivos apresentados pela Ré para a desmarcação da reunião do dia 12 de Abril de 2016 foram os seguintes (cfr. documento de fls. 103 verso a 105 verso):
Boa tarde An.,
O nosso consultor funcional do módulo de recrutamento terá de se deslocar aos Açores na próxima semana. Por este motivo terei de reagendar a reunião para dia 20 de Abril.
De seguida enviarei o reagendamento.
Melhores cumprimentos,
RR”; e
Boa Tarde An.,
De facto tentei contactar antes mas raramente a consigo contactar por telefone.
Como refere imprevistos acontecem, não só a minha filha estava doente a semana passada como também esta. Para desmarcar prefiro sempre invocar motivos profissionais em vez dos pessoais (...)”.
50. Até então, tinham sido denunciados os defeitos, motivo pelo qual não se aceitou o projeto de implementação do software, que até à última data não foram corrigidos/solucionados, descritos no documento de fls. 110 verso a 112 e aqui dados como integrados, cuja data remonta a 2 de Abril de 2015;
51. Desde 13 de Abril de 2015, não houve mais nenhuma tentativa de agendar uma reunião para solucionar os problemas descritos no dito documento de fls. 110 verso a 112 (cfr., ainda, documento de fls. 103 verso a 105 verso):
52. Desde o dia 31 de Março de 2015 que a licença de utilização dos módulos aplicacionais deveria ter sido concedida, através do URL, ao invés de a análise e implementação ser desenvolvida através de print screen e respetivas análises;
53. São impercetíveis as funcionalidades do software, ao nível da sua análise e correta implementação, sem ser concedido à Autora o acesso aos módulos aplicacionais (cfr. documento de fls. 19 verso a 40 e 137 verso a 160);
54. Desde 31 de Março de 2015 que a Autora pagou essa licença de utilização sem nunca dispor do referido acesso aos módulos aplicacionais, até 18 de Setembro de 2015, data em que o referido contrato de implementação já deveria estar em funcionamento (cfr. documento de fls. 19);
55. Segundo as Condições Particulares do Contrato de Licenciamento e Manutenção – Saas Software T. HCM, o pagamento da licença de utilização era definido consoante o número de acessos de utilização em Saas (450 colaboradores) – cfr. documento de fls. 40 verso a 42;
56. No decurso da execução do contrato para implementação da solução T., a Autora foi comunicando à Ré, por via eletrónica, os erros reiterados detetados ao longo da tentativa de implementação, impeditivos da sua aptidão para o uso previsto no contrato;
57. A partir de Abril de 2016, deixou de haver qualquer contacto pela Ré;
58. No dia 22 de Agosto de 2016, a Autora enviou à Ré uma interpelação para cumprimento do contrato de prestação de serviços de implementação, recepcionada em 23 de Agosto de 2016, em suma, nos termos seguintes (cfr. documento de fls. 106 e 107):
“Como sabem foi celebrado contrato de implementação e software com essa sociedade a 02/04/2015, sendo que ficou acordado que o mesmo estaria em condições de estar concluído em Agosto de 2015. O projeto visava a implementação de um software em que o objetivo seria a criação de uma base de dados de recrutamento e seleção que permitisse a receção e gestão de candidaturas a ofertas de emprego, intervindo em todas as fases de um processo de recrutamento e seleção. Não só não foi respeitada a data de conclusão, como até hoje nada está operacional. Chegados à fase de testes, ainda em fase de análise para o objetivo que motivou a celebração do contrato, indicámos as necessidades e as correções a efetuar, às quais não foi dada resposta, ou seja, não foi solucionado, uma vez que nunca desta fase se passou. (...).
Nestes termos, vimos notificar V. Exas. para, no prazo de cinco dias praticarem os atos necessários para que o programa adquirido a essa sociedade funcione sob pena de perdermos o interesse na manutenção do contrato e resolvermos o mesmo por justa causa”;
57. A Ré respondeu e negou qualquer responsabilidade, alegando diversos factos, tais como os seguintes (cfr. documento de fls. 112 verso a 113):
- “Celebrado o Contrato, que contemplava o software na sua versão standard, foi elaborado o Documento de Análise, o qual foi aprovado por V. Exas., e onde constava as alterações a efectuar à versão standard, sendo que esta ficou desde logo disponível para vossa utilização”;
- “Essa fase de testes, da responsabilidade de V. Exas., foi por vós adiado diversas vezes e só veio a verificar-se durante o mês de Outubro de 2015. Testes que foram também acompanhados pela T.. Assim, e unicamente por motivos imputáveis à Wondercom, nunca a implementação do software poderia estar concluída no final de Agosto de 2015”;
- “Depois da fase de testes, e de forma surpreendente, foram por V. Exas. solicitados novos desenvolvimentos ao software, que se traduziram em novas alterações, nunca antes contempladas”;
- “A T. aceitou proceder aos desenvolvimentos solicitados, tendo sido realizadas as alterações identificadas. Assim, aliás como foi expressamente transmitido a V. Exas., o software, personalizado a vosso pedido, está devidamente implementado, em ambiente de qualidade, desde 4 de Março de 2016. Para que o software passe a ambiente de produção, será apenas necessário que V. Exas. validem essa passagem, o que desde aquela data ainda não se verificou”;
- “Assim que V. Exas. dêem instruções à T. para passar o software a ambiente de produção, o mesmo será executado, ficando desde logo disponível para utilização. Certo é que, a versão standard do software esteve sempre disponível para utilização por V. Exas.”;
62. Nos últimos contactos havidos, a Autora abdicou de certas funcionalidades e alterações antes solicitadas, com vista à célere implementação do software em causa;
63. Sempre foram facultados à Autora, e apenas, prints screens;
64. No dia 5 de Outubro de 2016, e perante a aludida resposta da Ré, a Autora remeteu-lhe a comunicação escrita para resolução do contrato de prestação de serviços celebrado a 2 de Abril de 2015, invocando “justa causa”, missiva recebida no dia 6 seguinte e aqui dada como integrada (cfr. documento de fls. 113 verso a 116 verso);
65. Consta da cláusula nona das Condições Gerais de Prestação de Serviços – Software T. HCM – sob a epígrafe “Causa de Resolução Automática do Contrato” – que, “Caso a Cliente decida resolver o presente Contrato nos termos do número precedente, as Partes mais acordam que será resolvido automaticamente o Contrato de Licenciamento e Manutenção – SaaS (Software T. HCM) – Contrato Ref.ª TLT.WDC.2015.006” (cfr. documento de fls. 122 a 136, com enfoque para fls. 125);
66. Consta da cláusula décima quinta, número três, das Condições Gerais do Contrato de Licenciamento e Manutenção – Saas Software T. HCM – sob a epígrafe “Limitação de Responsabilidade” – que “A responsabilidade das Partes relativa aos incumprimentos do presente Contrato e aplicável aos danos patrimoniais e/ou danos não patrimoniais directamente decorrentes desses incumprimentos, está limitada, nos seguintes termos:
a) 1.° ano de Contrato – 30 % do valor das tarifas mensais devidas desde o início de vigência do Contrato até à data da verificação do incumprimento, ressalvando os valores que efetivamente estejam liquidados à data de verificação do incumprimento;
b) 2.° ano de Contrato – 15 % do valor das tarifas mensais devidas desde o início de vigência do Contrato até à data da verificação do incumprimento, ressalvando os valores que efetivamente estejam liquidados à data de verificação do incumprimento;
c) 3.° ano de Contrato – 5 % do valor das tarifas mensais devidas desde o início de vigência do Contrato até à data da verificação do incumprimento, ressalvando os valores que efetivamente estejam liquidados à data de verificação do incumprimento;
d) Anos subsequentes de renovação do Contrato – 50 % do valor das tarifas mensais devidas no ano de cada uma das renovações do Contrato a que o incumprimento disser respeito, ressalvando os valores que efetivamente estejam liquidados à data de verificação do incumprimento (cfr. documento de fls. 19 verso a 40 e 137 verso a 160, com enfoque para fls. 23 verso e 24).
Com interesse para a presente decisão, o Tribunal também considera provados os factos seguintes, todos oriundos da contestação/reconvenção:
67. No âmbito da atividade comercial da Ré, esta estabeleceu contactos com a Autora para apresentação da Solução T. HCM, cujo produto visava fazer a gestão dos recursos humanos dos seus clientes, mormente no que diz respeito ao processamento salarial, gestão de colaboradores, recrutamento, seleção e avaliação de desempenho;
68. Após o contacto estabelecido com a Autora, foi agendada uma reunião entre esta empresa e a Ré, nas instalações da primeira, na qual foi feita uma apresentação do produto para que a Autora pudesse avaliar se o mesmo poderia corresponder às suas necessidades de gestão de recursos humanos;
69. Como subsistiam algumas dúvidas quanto às funcionalidades e características do produto, foi agendada uma nova reunião na qual se esclareceram as dúvidas e se fez novamente uma apresentação do produto;
70. Depois de diversos contactos, reuniões e esclarecimentos, a Ré apresentou uma proposta comercial, datada de 19 de Janeiro de 2015, a qual veio a ser aceite pela Autora (cfr. documento de fls. 190 a 199);
71. Em 28 de Fevereiro de 2015 foi assinada por ambas a adjudicação da proposta comercial, para que fosse possível dar início à prestação do serviço por parte da Ré, sendo que a sua faturação teria início no mês de Março de 2015, quanto ao valor de € 1 166,67, relativo à abertura do software T. HCM (cfr. documento de fls. 199 verso a 200);
72.Em virtude do processo de negociação entre as partes, e em consequência da assinatura da adjudicação da proposta, foram celebrados os contratos acima identificados, ambos com a data de 2 de Abril de 2015 (cfr. documentos de fls. 19 verso a 40, 40 verso a 42, 122 a 136 e 137 verso a 160);
73. Os documentos de análise funcional foram aprovados, respetivamente, em 23 de Abril de 2015 e em 15 de Junho de 2015 (cfr. documentos de fls. 201 verso e 202);
74 . Em 29 de Maio de 2015, a Ré, através do seu colaborador PA., enviou uma comunicação eletrónica à Autora a solicitar o ponto da situação quanto à aprovação do documento de análise funcional ao módulo de recrutamento e seleção, uma vez que, com base no planeamento, a implementação teria início no dia 1 de Junho de 2015 (cfr. documento de fls. 203 e 203 verso);
75. Por iniciativa da Ré foi solicitada uma reunião para o dia 4 de Junho de 2015, em 3 de Junho de 2015, para apresentação do ambiente de qualidade, mas não se realizou por impossibilidade da Autora nesse dia 4 (cfr. documento de fls. 204 e 204 verso);
76. Em Outubro de 2015, a Ré lançou uma atualização da Solução T. HCM, com novas funcionalidades; em virtude dessa atualização, foram enviados à Autora, em 23 de Outubro de 2015, novos links de acesso ao ambiente de qualidade, mantendo-se os user e passwords (cfr. documento de fls. 210 e 211);
77. Em 31 de Outubro de 2016, a Ré remeteu uma carta à Autora reclamando o pagamento das faturas números P2015137, P2015138, P2016008, P2016050 e P2016081, emitidas em 30 de outubro de 2015, 30 de outubro de 2015, 30 de janeiro de 2016, 30 de abril de 2016 e 29 de julho de 2016, sob pena de “resolução” dos contratos invocando o disposto no número quatro da cláusula oitava do Contrato Ref.ª TLT.WDC.2015.007 e na alínea b) do número um da cláusula décima sétima do Contrato Ref.ª TLT.WUC.2015.006, por alegado incumprimento da Autora (cfr. documento 227 verso a 228 verso);
78. Decorrido o prazo de 20 dias concedido na missiva identificada no ponto anterior,e perante a falta de pagamento das cinco faturas em apreço, a Ré enviou nova missiva à Autora, em 22 de Dezembro de 2016, comunicando a “resolução” dos contratos celebrados em 2 de Abril de 2015 e solicitando o pagamento das 15 faturas identificadas a fls. 229, então remetidas e infra elencadas (cfr. documento de fls. 229 verso a 230 verso);
79. A Ré emitiu e enviou à Autora as faturas seguintes, que esta não pagou até hoje (cfr. documentos de fls. 231, 231 verso, 234 a 236, 238 a 239 verso e 242 a 243 verso):
- Fatura n.º P2015137, de 30/10/2015, no valor de € 4 305,01 (com IVA);
- Fatura n.º P2015138, de 30/10/2015, no valor de € 332,10 (com IVA);
- Fatura n.º P2016008, de 30/01/2016, no valor de € 4 305,01 (com IVA);
- Fatura n.º P2016050, de 30/04/2016, no valor de € 4 305,01 (com IVA);
- Fatura n.º P2016081, de 29/07/2016, no valor de € 4 305,01 (com IVA);
- Fatura n.º P2016155, de 20/12/2016, no valor de € 4 305,01 (com IVA);
- Fatura n.º P2016156, de 20/12/2016, no valor de € 4 305,01 (com IVA);
- Fatura n.º P2016157, de 20/12/2016, no valor de € 4 305,01 (com IVA);
- Fatura n.º P2016158, de 20/12/2016, no valor de € 4 305,01 (com IVA);
- Fatura n.º P2016159, de 20/12/2016, no valor de € 4 305,01 (com IVA);
- Fatura n.º P2016160, de 20/12/2016, no valor de € 4 305,01 (com IVA);
- Fatura n.º P2016161, de 20/12/2016, no valor de € 3 901,56 (com IVA);
- Fatura n.º P2016162, de 20/12/2016, no valor de € 4 876,95 (com IVA);
- Fatura n.º P2016163, de 20/12/2016, no valor de € 2 926,17 (com IVA);
- Fatura n.º P2016164, de 20/12/2016, no valor de € 1 950,78 (com IVA);
78. A Ré emitiu tais faturas pelos valores que considerou serem os correspondentes ao pagamento do montante integral dos dois contratos celebrados com a Autora (cfr. documentos de fls. 231, 231 verso, 234 a 236, 238 a 239 verso e 242 a 243 verso).

III – QUESTÕES JURÍDICAS ESSENCIAIS.
São as seguintes as questões jurídicas qu  e importa dilucidar:
 1 – Impugnação da matéria de facto. Incumprimento da exigência legal prevista no artigo 640º, nº 2, alínea a), do Código de Processo Civil. 
2 – Contrato de prestação de serviço celebrado entre as partes. Incumprimento por parte da prestadora de serviço. Exercício do direito de resolução do negócio.
Passemos à sua análise:
1 – Impugnação da matéria de facto. Incumprimento da exigência legal prevista no artigo 640º, nº 2, alínea a), do Código de Processo Civil. 
Invoca a apelada, a este respeito:
“b) Da inadmissibilidade do recurso no que tange à matéria de facto por não cumprimento do ónus que lhe incumbe.
Tal ónus na impugnação da matéria de facto, é ainda mais específico nomeadamente com as regras constantes do artigo 640.° n.° 1 alínea b) e n.° 2 alíneas a) e b) do CPC
Assim, no que tange à prova testemunhal nos autos, a Apelante não indica com exatidão as passagens da gravação, em que funda o seu recurso, nem os excertos que considera relevantes, na verdade não indica rigorosamente nada, retirando ainda da prova testemunhal conclusões que nem da sentença constam referências;
Veja-se no sentido ora exposto, E) Dos Fundamentos do Recurso”  artigos 17.°, 18.°, 19.°, 20.°, 25.°, 28.°, 32.°, 34.°, 42.°, 52.°;
Incumbia à Apelante, ao invocar erro na apreciação da prova e estando a mesma gravada, como é o caso, indicar com exatidão as passagens da gravação em que baseia a sua impugnação, identificando a testemunha, a que parte da gravação proferiu esta ou aquela afirmação ou negação que fundamente a sua tese;
Situação que, não é exigível ao juiz que profere a decisão no Tribunal a quo, mas que é à recorrente
Conclui-se assim que o recurso deverá ser rejeitado, ex vi n.° 1 artigo 640.° do CPC”.
Apreciando:
Analisando as alegações/conclusões do presente recurso de apelação apresentado pela Ré, cumpre naturalmente concluir que assiste inteira e indiscutível razão à apelada neste particular, sendo perfeitamente objectivo e inegável o incumprimento processual em que a recorrente incorreu.
Vejamos:
O artigo 640º, nº 2, alínea a), do Código de Processo Civil, obriga expressamente o recorrente que impugna a matéria de facto com base em depoimentos gravados a que “indique com exactidão as passagens da gravação em que funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevante”.
Em conformidade com o mesmo preceito legal, a sanção para o incumprimento desta obrigação processual é precisamente a “imediata rejeição do recurso”.
Ora, a apelante, nas suas alegações/conclusões de recurso, não procedeu a nenhuma indicação da passagem dos depoimentos testemunhais a que mera alusão.
Ao contrário do que a lei determina, e sem cumprir minimamente o exigido pela norma, limitou-se a aludir muito vaga e genericamente aos depoimentos das testemunhas PA. e RR. (cfr. fls. 378, 379, 381, 382 a 383 ), e a (pretensamente) procurar contrariar o depoimento das testemunhas An. e VV. (cfr. fls. 379, 384).
Não existe a menor referência (nem exacta, nem inexacta) à indicação das passagens da gravação a que respeitam os depoimentos avocados, não tendo sido igualmente apresentada qualquer transcrição destes (sendo esta última circunstância reveste carácter meramente facultativo não conduzindo à rejeição do recurso).
A apelante optou por apresentar uma espécie de conexão esparsa entre a versão dos acontecimentos que entende ter efectivamente demonstrado e as ditas testemunhas (que identifica), imputando-lhes - em bloco e avulso – a simples confirmação probatória desses factos, sem pormenorizar o que efectivamente disseram e em que momento concreto da audiência de julgamento.
Ou seja, tal postura assumida na instância recursiva constitui o exemplo clássico, perfeito e acabado, daquilo que o legislador entende ser manifestamente insuficiente para que a parte possa submeter à reapreciação e sindicância no Tribunal superior o juízo de facto emanado do juiz a quo.
Generalizando:
O recurso em matéria de facto encontra-se regulado processualmente no artigo 640º, do Código de Processo Civil, cuja estrita observância é de uma importância absolutamente vital para a respectiva apreciação e procedência.
Refere a norma em análise:
“ Quando seja impugnada a decisão proferida sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a)Os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados;
b)Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre questões de facto impugnadas“.
Acrescenta o nº 2, alínea a), deste mesmo preceito:
“Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respectiva parte, indicar com exactidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevante “.
A tarefa, a este propósito, exigida pelo legislador não é complexa.
Resume-se ao seguinte:
 1º - O apelante deverá indicar, com clareza e autonomia, quais os pontos de facto concretos que considera incorrectamente valorados em 1ª instância;
2º - Seguidamente, terá que indicar, relativamente a cada um dos pontos de facto:
- quais os concretos meios de prova que justificariam, pela positiva, resposta diversa da que foi proferida;
- quais os meios de prova que, em contraponto, deveriam ter sido desvalorizados e não foram;
 Trata-se, naturalmente, de uma crítica global ao conjunto da prova produzida, o que não prejudica a obrigação de referência clara e inequívoca aos meios de prova que, num sentido ou noutro, foram incorrectamente valorados pela 1ª instância, justificando a sua modificação pelo Tribunal da Relação.
3º - Finalmente, o recorrente tem a obrigação de concluir pelas respostas (alternativas às que foram dadas) que, no seu entender, deveriam ter sido proferidas a cada um dos pontos de facto em apreço.
Cumprindo este itinerário processual a impugnação da decisão de facto encontra-se em condições de ser conhecida e decidida pelo tribunal de recurso.
Sobre esta matéria, recomenda-se vivamente a leitura dos seguintes acórdãos:
Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 28 de Abril de 2016 (relator Abrantes Geraldes), publicado in www.dgsi.pt :
“Deve considerar-se satisfeito o ónus de alegação previsto no artigo 640º, do CPC se o recorrente, além de indicar o segmento da decisão de facto, impugnado, enunciar a decisão alternativa sustentada em depoimento testemunhal que identificou e localizou”.
Na verificação do cumprimento do ónus de alegação previsto no artigo 640º do CPC, os aspectos de ordem formal devem ser modelados em função dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade”.
Este aresto contém uma exaustiva referência ao critério jurisprudencial do STJ neste domínio.
Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 19 de Fevereiro de 2015 (relator Tomé Gomes), publicado in www.dgsi.pt.
Pode ler-se in “Código de Processo Civil Anotado”, Volume I, “Parte Geral e Processo de Declaração. Artigos 1º a 702º”, páginas 770 a 771: “Sendo evidente que a previsão destes ónus tem razão de ser, quer para garantia do contraditório, quer para efeito de rigorosa delimitação do objecto do recurso até porque o sistema consagrado não admite recursos genéricos contra a decisão da matéria de facto, não é compreensível que a verificação do cumprimento de tais ónus se transforme num exercício burocrático tal que deixe transparecer a ideia – que por vezes perpassa em diversos arestos das Relações – de que a elevação do nível de exigência além dos parâmetros que a lei inequivocamente determina constitui, na realidade, um pretexto para recusar a apreciação da matéria de facto”.
Sobre esta temática, vide, entre outros, o importante acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 28 de Abril de 2016 (relator Abrantes Geraldes), publicado in www.dgsi.pt, onde se enfatiza que “Deve considerar-se satisfeito o ónus de alegação previsto no artigo 640º, do CPC se o recorrente, além de indicar o segmento da decisão de facto, impugnado, enunciar a decisão alternativa sustentada em depoimento testemunhal que identificou e localizou”.
Na verificação do cumprimento do ónus de alegação previsto no artigo 640º do CPC, os aspectos de ordem formal devem ser modelados em função dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade”.
Este aresto contém uma exaustiva referência ao critério jurisprudencial do STJ neste domínio.
Já no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 19 de Fevereiro de 2015 (relator Tomé Gomes), publicado in www.dgsi.pt, aludiu-se a que: “a especificação dos concretos meios probatórios convocados e a indicação exacta das passagens da gravação dos depoimentos que se pretendem ver analisados, além de constituírem uma condição essencial para o exercício esclarecido do contraditório, servem sobretudo de parâmetro da amplitude com que o tribunal de recurso deve apreciar a prova, sem prejuízo do seu poder inquisitório sobre toda a prova produzida que se afigure relevante para tal reapreciação, como decorre do preceituado no nº 1 do artigo 662º do Código de Processo Civil”.
Outrossim no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 15 de Fevereiro de 2018 (relator Tomé Gomes), publicado in www.dgsi.pt, salientou-se que: “a jurisprudência deste Supremo Tribunal de Justiça tem vindo a flexibilizar a rigidez literal com que, por vezes, o referido normativo vem sendo interpretado”, para esclarecer que seguida que: “a razão de ser do ónus impugnativo estatuído na indicada alínea a) do nº 2 do artigo 640º do Código de Processo Civil tem em vista o delineamento, por parte do recorrente, do campo de análise probatória sobre o teor dos depoimentos convocados de modo a propiciar, em primeira linha, o exercício esclarecido do contraditório, por banda do recorrido, e a servir de base ao empreendimento analítico do tribunal de recurso, sem prejuízo da indagação oficiosa que a este tribunal é legalmente conferida, em conformidade com o disposto nos artigos 5º, nº 2, alínea a), 640º, nº 2, alínea b), 1ª parte, e 662º, nº 1, do referido Código. Complementarmente, tal exigência constitui um factor de concentração da argumentação probatória do recorrente, numa base substancial, sobre a caracterização do erro de facto invocado, refreando, por outro lado, eventuais tendências para meras considerações de natureza generalizante e especulativa”.
Concretizando:
Ainda que se concorde que a verificação dos requisitos legais expressos na alínea a), do nº 2, do artigo 640º, do Código de Processo Civil, demande uma “ponderação do critério legal nas circunstâncias e modo como os depoimentos foram prestados e colhidos, bem como em face do grau de dificuldade que a indicação das passagens da gravação efectuada acarrete para o exercício do contraditório e para a própria análise crítica por parte do tribunal de recurso”, conforme se consignou no citado acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 15 de Fevereiro de 2018 (relator Tomé Gomes), constitui inequívoca desconsideração pelo cumprimento da lei aceitar que a obrigação de “indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso” se encontra satisfeita com a apresentação ao tribunal de recurso - e à parte contrária – da mera referência às declarações das diversas testemunhas, ligando-as directamente aos factos que o recorrente entende terem resultado provados, sem o menor arremedo de especificação e selecção valorativa, omitindo o momento em que na audiência de julgamento foram produzidas os depoimentos tidos por relevantes ou decisivos para a modificação da decisão de facto.
Em rigor e com directa aplicação à situação sub judice, “indicar com exactidão” (como a disposição legal exige) não pode nunca equivaler a contar o que se entende que deveriam ter sido os factos provados e não provados, avocando acriticamente o simples nome de algumas testemunhas como factor meramente abonatório das suas próprias conclusões acerca da análise da prova.
A lei processual define claramente este critério de exigência.
Não cumpre ao jurista sobrepor-lhe um outro, digamos benévolo, que com ele conflitue e seja susceptível de contender com o exercício do direito ao contraditório que assiste à parte contrária.
A exigência do escrupuloso cumprimento do artigo 640º, nº 1 e 2, do CPC, não tem só a ver com a facilitação da tarefa a cumprir pelo Julgador de 2ª instância, como principalmente com o exercício do contraditório por parte da apelada neste tocante.
Sobre esta matéria, vide dois acórdãos recentes do STJ que se pronunciaram pela rejeição (ainda que parcial, no segundo caso) da impugnação de facto.
O acórdão do STJ de 21 de Março de 2019 (relator Oliveira Abreu), no qual um dos motivos da rejeição foi o facto de “as curtas transcrições efectuadas apenas se destinarem a tentar demonstrar que as testemunhas em causa não eram credíveis e não que os depoimentos por si prestados impusessem decisão diversa sobre qualquer ponto de facto”; e de “no corpo das alegações, os recorrentes além de não terem indicado com exactidão as passagens da gravação em que fundam o recurso, não terem efectuado qualquer transcrição das declarações de parte do Réu e das testemunhas mencionadas nas conclusões, limitando-se a descrever as várias sessões de julgamento e as pessoas que foram inquiridas, referindo o início e o fim da gravação tal como consta da respectiva acta de julgamento”.
O acórdão do STJ de 7 de Março de 2019 (relatora Rosa Ribeiro Coelho) onde um dos motivos da rejeição parcial foi: “ o incumprimento do texto legal (artigo 640º, nº 2, do CPC) que não exige a indicação que conste na acta de julgamento, mas diversamente a indicação de elementos que podem ser facilmente obtidos a partir da consulta do suporte digital da gravação da audiência, nomeadamente a indicação – com hora, minuto e segundo – dos locais onde começam e acabam as passagens do depoimento tidas como relevantes, o que é bem diferente da indicação dos locais onde começa e acaba a gravação desses mesmos depoimentos”.
 Fez-se notar neste último aresto que:
- A reforma processual de 1995/1996 abriu as portas à possibilidade de recurso contra a decisão proferida sobre factos, mas rejeitou os recursos genéricos contra a errada decisão de facto.
- A Lei nº 41/2013, de 26 de Junho, vincou o rigor e exigência a colocar na impugnação da decisão de facto.
- Há que fazer funcionar, em qualquer caso um princípio geral de proporcionalidade.
- Pode falar-se de um ónus primário e de um ónus secundário.
Ónus primário: delimitação do objeco de fundamentação concludente.
Ónus secundário: Facilitação de acesso aos meios de prova gravados relevantes.
- Especial rigor no cumprimento do ónus secundário no caso de depoimentos particularmente extensos, abarcando matéria bastante diversificada (grande parte não impugnada).
- Como pano de fundo está sempre a possibilidade de exercício do contraditório pela parte contrária e a certeza do que está em causa pelo julgador de 1ª instância.
Na situação sub judice, o incumprimento da exigência processual prevista no artigo 640º, nº 2, alínea a), do Código de Processo Civil, é de tal forma patente e gritante que se impõe  a incortornável de que o recurso em matéria de facto terá necessariamente que ser rejeitado de imediato.
O que se decide, permanecendo imodificável a decisão de facto proferida em 1ª instância.
2 – Contrato celebrado entre as partes. Incumprimento por parte da prestadora de serviço. Exercício do direito de resolução do negócio. 
Em 1ª instância, procedeu-se ao seguinte enquadramento jurídico da matéria assente como provada:
“Na situação em apreço, deparamo-nos perante uma união de contratos, por haver unidade contratual, um só negócio jurídico, cujos elementos essenciais respeitam a tipos contratuais distintos, apenas vigorando, porém, o contrato de licenciamento se o contrato de prestação de serviços de implementação de software fosse executado, por só assim o primeiro se revestir de utilidade para a empresa demandante.
É consabido que, no figurino da união de contratos, existem dois ou mais contratos ligados entre si por um nexo de funcionalidade, de tal modo que aparentam e constituem uma unicidade económica, um depende do outro, pese embora cada um mantenha a sua individualidade própria. No entanto, atenta a estreita dependência recíproca de ambos os contratos, as vicissitudes de um repercutem-se, inelutavelmente, na vida do outro.
No que se refere às Condições Gerais do Contrato de Licenciamento e Manutenção – Saas Software T. HCM, trata-se de um contrato que, em primeiro plano, obriga uma prestação de facere e non facere. Ou seja, obrigou a que a Ré disponibilizasse os acessos (URL e users) e, bem assim, que não interferisse no acesso ao conteúdo cuja licença de utilização atribuiu, mediante retribuição. Vinculou a Ré, de igual sorte, a prestar serviços de suporte e manutenção diretamente relacionados com os módulos aplicacionais disponibilizados à Autora, como prestação acessória da principal.
E sendo uma prestação periódica (pagamento pelos serviços), estamos perante uma licença de utilização que não se enquadra no regime da compra e venda, por inexistir neste campo uma transferência de propriedade, mas sim da locação, por consistir numa concessão de licença de utilização de um espaço para “alojamento” de um bem (software) num sítio da internet, com prestações acessórias de manutenção desse espaço virtual para o fim a que se destinava, mediante retribuição (cfr. artigo 1022.º do Código Civil).
No que se refere às Condições Gerais de Prestação de Serviços – Software T. HCM, a prestação típica é a prestação de serviços de implementação do software T. HCM com alteração à versão standard, isto é, adaptada à realidade empresarial da Autora.
Consubstancia um contrato de prestação de serviços atípico, cujo regime se assemelha, no que for passível de integração, ao regime geral da empreitada.
Com efeito, existe um consenso praticamente generalizado na qualificação da encomenda de obra intelectual como contrato de empreitada, o mesmo valendo para os casos em que o utilizador encomenda a adaptação de um programa informático já existente, que se traduza na criação de um novo programa de software.
Tendo o contrato versado sobre uma solução informática, a instalação correta do programa e a respetiva parametrização de acordo com as necessidades e interesses da Autora, o mesmo traduziu-se numa verdadeira obrigação de resultado (e não de meios).
A obrigação do empreiteiro é uma obrigação de resultado, em que este assume a obrigação de realização de uma determinada obra, de acordo com o convencionado e sem vícios que excluam ou reduzam o seu valor, ou a sua aptidão para o uso ordinário ou previsto no contrato (cfr. artigo 1208.º do Código Civil).(...)
Ora, no concernente às Condições Gerais do Contrato de Licenciamento e Manutenção – Saas Software T. HCM, o espaço de alojamento não foi cedido à Autora, na medida em que só em 18 de setembro de 2015 é que foram disponibilizados os acessos. Apesar de a Autora ter suportado e pago a retribuição pela cedência de 450 licenças de utilização, a Ré não cumpriu com a prestação a que estava obrigada (cfr. artigo 1031.º do Código Civil).
De acordo com a cláusula segunda, número dois, do referido contrato, “A T. Software emite a favor da Cliente um conjunto de acessos de utilização intransmissíveis sobre os Módulos Aplicacionais disponíveis no software T. HCM de acordo com o descrito nas Condições Particulares do presente Contrato”; acrescentando o número três que “A licença de utilização em SaaS concedida ao abrigo do presente Contrato apenas conferirá à Cliente o direito de utilização dos Módulos Aplicacionais, que constituem objecto das Condições Particulares, durante a vigência do presente Contrato, pelo que a Cliente não poderá utilizar o software T. HCM contratado para qualquer outra finalidade que não a prevista no Contrato ou depois da cessação do mesmo e/ou de qualquer documento que faça parte integrante daquele, seja por que motivo for”.
Nesse contexto, a Ré deveria ter facultado os acessos, uma vez que a Autora tinha o direito de utilizar os módulos aplicacionais na sua versão standard desde o início do contrato, nos seus precisos termos, por ter procedido ao pagamento do preço estipulado.
A Autora pagou e não pôde utilizar, porque não foram cedidos aqueles elementos necessários para essa utilização, com inobservância das cláusulas décima, número um, e décima segunda; na realidade, nem sequer houve implementação prática do software que sustente a obrigação de pagamento do serviço de licenciamento inerente a este contrato.
No que tange às Condições Gerais de Prestação de Serviços – Software T. HCM, não foi implementado o software contratado e nunca as partes passaram da fase de testes, porquanto existiam erros reiterados na solução planeada que não foram corrigidos.
São considerados defeitos os vícios que excluam ou reduzam o valor da obra e as desconformidades com o que foi convencionada; desconformidades entre a obra realizada e a projetada; desconformidades com o contratado, independentemente de se tratar de anomalias objetivas (vícios) ou desvios ao projeto de obra convencionado.
Os erros denunciados pela ora demandante, provados no âmago da materialidade assente, jamais foram colmatados pela Ré, consubstanciando os mesmos uma situação de incumprimento contratual culposa (cfr. artigo 799.º, n.º 1, do Código Civil), respeitante à concreta obrigação sinalagmática que impendia sobre a Ré, uma vez que esta não logrou realizar a prestação a que se obrigou: proceder à implementação da solução informática contratada, sem erros impeditivos de um seu normal aproveitamento.
A Ré, enquanto entidade tecnicamente idónea para o efeito, vinculou-se perante a Autora, no âmbito do contrato global firmado entre as partes, a instalar e a parametrizar esta solução informática, tornando-a operativa – o que, como é bom de ver, não aconteceu.
Não tendo sido possível chegar a um acordo, por força dos diversos adiamentos das reuniões para a eliminação dos defeitos/vícios e passagem imediata a ambiente de produção, assiste à Autora o direito à resolução do contrato, na medida em que os defeitos/vícios/erros tornaram a solução inapropriada à finalidade a que se destinava (cfr. artigo 1222.º, n.º 1, do Código Civil); assistindo à Autora o direito a ser indemnizada nos termos gerais aplicáveis, pelos prejuízos causados (cfr. artigo 1223.º do Código Civil).
Isto posto, ficou provado nos autos que, no dia 5 de outubro de 2016, a Autora resolveu o contrato por incumprimento contratual da Ré, tendo interpelado a mesma para indemnizá-la pelos prejuízos causados, por força do incumprimento contratual definitivo (cfr. documento de fls. 113 verso a 116 verso).
Como se viu, foi concedida à Ré a possibilidade de proceder à correção dos vícios, não tendo esta ocorrido. Nunca houve qualquer acordo no sentido da redução do preço. Como tal, a Autora pagou o preço acordado para ambos os contratos e os mesmos foram incumpridos, não dispondo ela de acesso aos módulos aplicacionais na data a que a Ré se obrigara a tal prestação. A solução de implementação contratada nunca foi concluída.
(...) De acordo com a finalidade do negócio, a interligação entre os vários passos na implementação está funcionalmente conexionada com a causa resolutiva, o que legitima uma resolução plena (cfr. artigo 434.º, n.º 2, segunda parte, do Código Civil). A resolução plena justifica-se pela indivisibilidade do objeto prestacional para o fim a que se destina, não sendo possível o aproveitamento de qualquer parte.
Acresce que consta da cláusula nona das Condições Gerais de Prestação de Serviços – Software T. HCM – sob a epígrafe “Causa de Resolução Automática do Contrato” – que, “Caso a Cliente decida resolver o presente Contrato nos termos do número precedente, as Partes mais acordam que será resolvido automaticamente o Contrato de Licenciamento e Manutenção – SaaS (Software T. HCM) – Contrato Ref.ª TLT.WDC.2015.006” (cfr. documento de fls. 122 a 136, com enfoque para fls. 125); numa linha de dependência funcional entre ambos.
Destarte, ao abrigo do disposto nos artigos 798.º, 808.º, 432.º, 434.º e 436.º, todos do Código Civil, a resolução do contrato tem efeito retroativo. E a indemnização fundada no não cumprimento definitivo, que se cumula com a resolução, reporta-se ao denominado interesse contratual negativo, visando colocar o credor na situação em que estaria se não tivesse sido celebrado o contrato.
Perante o quadro factual e jurídico descrito, resta concluir que a resolução do contrato por parte da Autora foi feita com justa causa e devidamente fundamentada, pois resultaram verificados factos que consubstanciam, com suficiência, um comportamento grave por parte da Ré e que colocaram em crise a continuidade do programa negocial.
Tudo visto e ponderado, assiste à Autora o direito a ser ressarcida de todos os prejuízos causados.
De acordo com a matéria assente inserta nos pontos 12 e 21, a Autora pagou à Ré, na sua globalidade, uma quantia pecuniária (com IVA) equivalente a € 16 229,46; sendo legítima e fundada a resolução unilateral do contrato, por banda da Autora, esta deverá ser ressarcida da importância de € 13 194,67 (sem IVA), valor acrescido de juros de mora.
Em conclusão, pronunciamo-nos pela verificação do direito da Autora à resolução do contrato de prestação de serviços subjacente aos presentes autos (extensível ao outro contrato), com a consequência da sua destruição retroativa; bem como pelo seu direito a ser ressarcida da quantia de € 13 194,67, a título de indemnização pela resolução fundada no interesse contratual negativo, acrescida de juros de mora comerciais, às taxas sucessivas em vigor, desde a data da comunicação da resolução até integral pagamento. (...)
(...) sempre se realçará que se encontra demonstrada, in casu, a culpa grave no incumprimento da prestação por parte da Ré, conforme acima abundantemente se explicitou. Presumindo-se a natureza culposa do incumprimento (cfr. artigo 799.º, n.º 1, do Código Civil), assistia, de qualquer forma, à devedora a faculdade de, expondo factos, elidir essa presunção, através da subsequente prova, cujo ónus lhe incumbia. Em face da não realização da prestação devida, competia à Ré justificar esta ocorrência através da demonstração dos motivos impeditivos do pontual cumprimento e reveladores da sua diligência na satisfação do interesse contratual positivo da contraparte.
Sucedeu que a Ré nada logrou elidir, como emerge da facticidade não provada.
(... ) Tem a Autora o direito a invocar a exceção de não cumprimento do contrato quanto às faturas relativas a 450 licenças de utilização do software T. HCM em Saas, emitidas pela Ré a partir de outubro de 2015, não sendo devidas as quantias referentes à utilização de 450 licenças do software T. HCM em Saas, constantes dessas faturas?
A esse propósito, afirmou a demandante que, face ao incumprimento contratual e na tentativa frustrada de Autora e Ré chegarem a acordo na redução do preço, perante o total incumprimento da cedência dos acessos (URL) ao software, quando já tinham sido pagas duas faturas correspondentes a dois trimestres (até outubro de 2015), preço que abrangia a licença a 450 utilizadores, a Autora, por não haver mais desenvolvimentos, não pagou as faturas relativas ao alojamento do software.
Ademais, a circunstância de a Ré cobrar um serviço sem o cumprimento da prestação a que estava obrigada leva à legítima exceção do não cumprimento do contrato.
Assim, concluiu, tendo a Autora denunciado os defeitos da implementação do software e requerido, por diversas vezes, o acesso ao software através do URL que deveria ter sido disponibilizado desde o início do contrato pela Ré, e tendo sido protelado o cumprimento da obrigação a que esta estava vinculada, a Autora tem legitimidade para excecionar o cumprimento do contínuo pagamento dos serviços de alojamento/cloud.
Acresce que a implementação do software deveria ter sido terminada em finais de agosto de 2015 e, chegados a outubro de 2015, ainda os erros denunciados pela Autora estavam sob apreciação e análise.
A Ré retorquiu que, uma vez que não houve qualquer incumprimento contratual da sua parte, inexistia fundamento algum que pudesse justificar a invocação da aludida exceção, e que desse à Autora legitimidade para não liquidar as faturas que foram sendo emitidas, as quais, necessariamente, tinham de ser pagas aquando do seu vencimento. Se a implementação do software não estava concluída no prazo previsto, tal deveu-se, em exclusivo, à responsabilidade da Autora.
Dissentimos, nesta parte, do enquadramento jurídico aqui delineado pela Autora, embora, ao nível das consequências práticas, tudo redunde em idêntico desenlace.
Com efeito, tal exceção dilatória de direito material (provisória), a que alude o artigo 428.º, n.º 1, do Código Civil, apenas opera os seus efeitos jurídicos numa relação contratual não finda – não sendo essa a situação dos autos, em que o vínculo veio a cessar.
(...)  A exceção de não cumprimento do contrato, a que alude o artigo 428.0, n.0 1, do Código Civil, pode ter lugar nos contratos com prestações correspetivas ou correlativas, isto é, interdependentes, sendo uma o motivo determinante da outra; mesmo estando o cumprimento das prestações sujeito a prazos diferentes, a exceptio poderá ser sempre invocada pelo contraente cuja prestação deva ser realizada depois da do outro, apenas não podendo ser oposta pelo contraente que deveria cumprir primeiro; não funciona como uma sanção, mas somente como um processo lógico de assegurar, mediante o cumprimento simultâneo, o equilíbrio em que repousa o esquema do contrato bilateral ou sinalagmático; por isso, ela vigora, não só quando a outra parte não efetua a sua prestação porque não quer, mas também quando ela a não realiza ou a não oferece porque não pode, valendo tanto para o caso de falta integral do cumprimento, como para o caso de cumprimento parcial ou defeituoso, desde que a sua invocação não contrarie o princípio geral da boa fé consagrado nos artigos 227.0, n.0 1, e 762.0, n.0 2, ambos do Código Civil.
(...) Tal exceção não legitima o incumprimento definitivo do contrato pelo “contraente fiel”; ela legitima apenas o cumprimento dilatório daquele como forma de coagir o contraente faltoso a cumprir também aquilo que deve cumprir. Da sua própria natureza emerge que aquela exceção é aplicável tão só aos contratos bilaterais com obrigações reciprocamente interligadas por um sinalagma genético-funcional; em boa verdade, só aí o “contraente fiel” pode sustar o cumprimento da sua prestação como meio idóneo de coagir a contraparte a cumprir também a sua prestação sinalagmática.
O que verdadeiramente importa no caso em apreço é, tendo havido uma resolução fundamentada em justa causa, por parte da Autora, e que se comprovou haver sido legal, tal acarreta uma destruição retroativa da relação contratual visada nos autos, no seu todo, à luz do preceituado no artigo 434.º, n.º 2, segunda parte, do Código Civil.
Como acima se avançou, resulta inclusive da cláusula nona das Condições Gerais de Prestação de Serviços – Software T. HCM – sob a epígrafe “Causa de Resolução Automática do Contrato” – que, “Caso a Cliente decida resolver o presente Contrato nos termos do número precedente, as Partes mais acordam que será resolvido automaticamente o Contrato de Licenciamento e Manutenção – SaaS (Software T. HCM) – Contrato Ref.ª TLT.WDC.2015.006”; sempre sob o prisma da dependência funcional que os interligava.
Será com base nessa destruição de efeitos – não através daquela exceção dilatória de direito material – que se legitima o não pagamento por parte da Autora de tais faturas.
(...)Em sede reconvencional, a Ré/reconvinte tem direito a ser paga da quantia global de € 56 125,71, acrescida de juros de mora vencidos e vincendos, calculados desde a data de interpelação para pagamento e até efetivo e integral pagamento, no que concerne às faturas emitidas em nome da Autora/reconvinda, pendentes de pagamento?
Em síntese, alegou a Ré que a Autora incumpriu o contrato, que aquela prestou os serviços estipulados e que estes não foram pagos pela demandante, aqui Reconvinda.
Naturalmente que a resposta à aludida questão será negativa, considerando o que, mutatis mutandis, se argumentou nos pontos anteriores, mormente no precedente ponto III, bem como a operatividade da resolução efetivada pela Autora.
Por outro lado, acrescentamos que a missiva que a Ré remeteu à Autora, no dia 22 de dezembro de 2016, comunicando a “resolução” dos contratos celebrados em 2 de abril de 2015 e solicitando o pagamento das 15 faturas melhor identificadas a fls. 229 (elencadas no ponto 79), não teve a virtualidade de produzir efeitos jurídicos. E a razão é simples: não pode rescindir-se uma relação contratual já cessada no ordenamento jurídico, por válida e anterior resolução unilateral do outro contraente. Um contrato que deixou de integrar a ordem jurídica – por exemplo, por resolução de uma das partes – não pode ser alvo de uma “ulterior resolução” pelo outro contraente. Não se finda algo que já não existe.
No mais, urge reiterar que a Ré/reconvinte não fez a prova, como lhe incumbia, dos factos constitutivos do seu direito alegado, por via reconvencional, nos termos e para os efeitos previstos no n.º 1 do artigo 342.º do Código Civil.
Não se demonstrou que o incumprimento na relação contratual se devesse apenas à Reconvinda, que a implementação do software não se terminou no prazo previsto por responsabilidade exclusiva da mesma e que a Reconvinte houvesse prestado todos os serviços a que se obrigou.
Não se comprovou que, desde 12 de junho de 2015, a Reconvinda tivesse acesso aos módulos em ambiente de qualidade, para início dos testes, mas esta veio solicitar alterações contratualmente não contempladas, ou seja, modificações imprevistas.
Não pode a Reconvinte pretender que a contraparte proceda ao pagamento de serviços que nunca foram prestados, sendo que as faturas em si não constituem fonte de obrigação. Como precedentemente se aferiu, por força da contratação celebrada entre ambas as partes, a Reconvinte vinculou-se a instalar e a parametrizar a referida solução informática, tornando-a operativa, o que acabou por nunca acontecer em concreto.
Destarte, e sem necessidade de considerandos acrescidos, por serem despiciendos, o Tribunal pronuncia-se pela improcedência do pedido reconvencional formulado.“.
Apreciando
Perante os factos que foram dados como provados (e que não podem ser objecto de qualquer modificação no âmbito do presente recurso, desde logo por virtude do incumprimento pela recorrente da exigência legal estabelecida no artigo 640º, nº 2, alínea a), do Código de Processo Civil), cumpre basicamente concordar com o enquadramento jurídico a que o juiz a quo procedeu, em termos certeiros, rigorosos e particularmente desenvolvidos, pouco havendo, no fundo, a acrescentar.
Dir-se-á, todavia:
Existe, de facto, uma situação de união de contratos, ou seja, um só negócio jurídico integrando elementos essenciais de tipos contratuais diversos, que se interligam através de um único nexo de funcionalidade comum, e que, na sua execução, dependem da realização de cada uma das prestações pertinentes a cada um dos tipos de contrato em presença.
Neste contexto, obrigou-se a Ré a instalar em favor da A. determinado sistema informático por si fornecido, com a disponibilização de acessos URL e users, e ainda a prestar serviços de suporte e de manutenção (contrato de prestação de serviço que avoca o regime do contrato de empreitada) mediante o pagamento de determinada contrapartida monetária global (fraccionada no tempo), destinado a servir determinado fim específico relacionado com a organização e rentabilidade da actividade empresarial da adquirente do produto.
Tal como se sublinhou em 1ª instância, a Ré obrigou-se igualmente nos termos contratuais firmados a conceder uma licença de utilização à A., viabilizando-lhe um espaço para o alojamento de um software num sítio da internet, associando-lhe prestações relacionadas com a manutenção desse espaço virtual destinado ao fim que se assinalou supra, medianto retribuição (locação).
Temos, por conseguinte, diversos tipos contratuais que se congregam e complementam num único negócio global, intrinsecamente ligados entre si, mas que, de todo o modo, mantém a sua individualidade jurídica própria e distinta, perdendo apenas a sua autonomia em razão da dependência intrínseca que mantém e do nexo de funcionalidade comum que justificou a sua celebração conjunta e conjugada.
Tal como refere Inocêncio Galvão Telles, in “Direito das Obrigações”, 6ª edição, Coimbra Editora, 1989, a página 71: “União com dependência. Neste caso a ligação dos contratos é mais estreita porque se estabelece entre eles um laço de dependência. Os contratos são também distintos mas não já autónomos. As partes querem-nos como um conjunto económico, que envolve um nexo funcional. A dependência pode aliás ser bilateral ou unilateral, consoante é recíproca ou não. O vínculo de dependência significa que a validade e vigência de um contrato, ou de cada um dos contratos, depende da validade e vigência do outro. Um contrato só será válido se o restante o for; e, desaparecido este, aquele desaparecerá também. Mas em tudo o mais aplicam-se a cada contrato as suas regras próprias”.
(versando sobre uma situação de contrato de natureza mista, assente na venda de equipamento informático e instalações das respectivas aplicações informáticas – o que não sucede in casu -, vide acórdão do Tribunal do Porto de 25 de Janeiro de 2005 (relator Henrique Araújo), publicitado in www.dgsi.pt).
Relativamente à legalidade do exercício do direito de resolução por parte da A.:
Encontra-se claramente demonstrado nos autos que tal sistema informático, fornecido e implementado pela Ré, revelou um conjunto de deficiências e insuficiências que o tornaram objectivamente inapto a servir os interesses da sua beneficiária.
Ou seja, tal como foi disponibilizado pela Ré tal sistema não cumpriria os objectivos contratualmente firmados que justificaram a sua aquisição pela beneficiária e a avultada contrapartida monetária por ela suportada.
Nunca a Ré, devidamente interpelada para o efeito pela A., logrou superar, eliminando e ultrapassando, tais vícios do sistema informático após o que, depois do proletar sucessivo de diligências com vista a tentar que o sistema funcionasse correctamente e em conformidade com o desiderato contratual acordado, a ora demandante perdeu o interesse no negócio e exerceu o competente direito de resolução, nos termos gerais dos artigo 432º, nº 1, e 808º, nº 1, do Código de Processo Civil.
Trata-se, de resto, de uma situação comum quando o objectivo contratual visado através da obrigação de resultado assumida pela prestadora do serviço (in casu, de natureza informática) não é manifestamente alcançado e esta se revela absolutamente incapaz de o superar em tempo minimamente razoável.
Não se existe assim qualquer dúvida – perante a factualidade dada como assente em 1ª instância, insista-se – quanto à legalidade do exercício do direito de resolução pela A., à atribuição do correspondente direito de indemnizatório que visa cobrir os danos relacionados com o interesse contratual negativo, e, na mesma linha, com o pleno cabimento do recurso à excepção de não cumprimento, prevista no artigo 428º, nº 1, do Código Civil, quanto às prestações que deveriam, neste entretanto, ser realizadas pela A. (excepcionante) em favor da Ré (prestadora de serviços).
Correspectivamente, não se provaram os factos alegados pela Ré que possibilitariam concluir que a razão para o não funcionamento correcto do sistema seriam afinal imputáveis à A., mormente por via da sua inépcia ou má utilização do produto fornecido.
Também não se provou que a A. houvesse, durante o decorrer do relacionamento contratual mantido, solicitado novos pedidos ou exigências que tivessem tornado impráticável o respeito pelo cumprimento dos prazos antecipadamente estabelecidos entre as partes.
De notar outrossim que os termos com base nos quais a apelante decidiu estruturar as suas alegações/conclusões de recurso não lhe permitiriam verdadeiramente colocar em crise, eficazmente, a aplicação do direito a que o juiz a quo judiciosamente procedeu.
Com efeito, toda a sua narrativa assenta indissociavelmente na premissa de que o conjunto da matéria de facto fixada em 1ª instância seria alterado por este Tribunal superior (assentando toda a sua discordância jurídica nesse pressuposto essencial que afinal não se verificou).
Ou seja, a recorrente não coloca em crise a natureza jurídica do contrato celebrado entre as partes; a nulidade da cláusula contratual de limitação em caso de responsabilidade por incumprimento; o quadro de incumprimento contratual e a atribuição indemnizatória que, nesse mesmo pressuposto, teve lugar, tudo à luz dos factos que foram dados como provados e não provados pelo juiz a quo.
Ao invés, a sua impugnação no plano da discussão jurídica avoca, sempre e necessariamente, os factos que, no seu entender, deveriam ter sido dados como provados e não foram, bem como aqueles que foram dados como não provados e que, segundo a sua óptica, deveriam ter sido dados como provados.
O que significa que, perdendo a possibilidade técnico-jurídica de impugnação da decisão de facto por força do inequívoco incumprimento o ónus imposto pela alínea a), do nº 2, do artigo 640º, do Código de Processo Civil, firmando-se em função disso a decisão de facto da 1ª instância enquanto realidade inabalável, deixa de fazer qualquer tipo de sentido lógico todo o seu argumentário jurídico, construído sobre um conjunto de factos que não podem ser tomados em consideração e relevados neste processo.
O direito que a apelante quer ver aplicado é tão somente o que seria avocado se a materialidade da tomar em consideração fosse outra – coincidente com a sua versão dos acontecimentos – e não aquela (e única) que importa relevar.
Veja-se em particular:
No que respeita ao recurso em matéria de direito (misturado intrinsecamente com a sua própria impugnação de facto que naufragou), a apelante invocou essencialmente:
1 – Muito antes do prazo previsto para o fim da implementação do software, ou seja, em Agosto de 2015, a apelante estava a cumprir escrupulosamente o acordado (conclusão 12ª).
2 – O envio do URL de acesso ao ambiente de qualidade verificou-se no dia 12 de Junho de 2015 (conclusão 19ª).
3 - A partir de 12 de Junho de 2015 pode a apelada ter contacto directo com o software, podendo explorá-lo e testá-lo, ou seja, muito antes do prazo previsto para o fim da implementação do software (conclusão 27ª).
4 - Desde 12 de Junho e até 29 de Outubro de 2015, em momento algum a ora apelada referiu a existência de quaisquer erros, fosse de que natureza fosse, de onde resulta que o Contrato de Empreitada não apresentava vícios, pelo menos que pusessem em causa a utilização do software (conclusão 29ª).
5 - Em sede de reconvenção, a Ré reconvinte apresentou a factura relativa ao não pagamento da quantia de € 270,00, por encomenda de licenças adicionais, sendo que ao abrigo da inversão do ónus de prova a apelada não provou o pagamento da mesma (conclusão 31ª).
6 - A apelada solicitou alterações às costumizações inicialmente previstas no documento em análise e aprovadas, o que não se compadeceu, nem mesmo tal seria exigível à ora apelante, com o prazo previsto de implementação do software (conclusão 33ª).
7 - Os serviços de personalização que a apelada solicitou teriam que ser negociados entre as partes e não poderiam nunca ter sido considerados como incumprimento contratual por parte a apelante (conclusão 35ª).
8 - Em 28 de Julho havia atraso no pagamento de três facturas, com data de vencimento em 30 de Junho de 2015, sendo a apelada que estava a incumprir o contrato (conclusão 37ª).
9 - Um ano após reportarem a eventual existência de defeitos, que antes nunca tinham sido mencionados e dois meses após receberem a missiva da apelante solicitando a autorização para a passagem do software para ambiente de produção, resolveu a apelante resolver, ilegitimamente, o contrato outorgado (conclusão 48ª).
10 - A apelante não incumpriu o contrato outorgado e a apelada deve ser responsável pelo pagamento das facturas até Outubro de 2016, devido ao serviço prestado, até porque se o não fez antes, apenas e só à sua inércia pode pedir responsabilidades e não à apelante (conclusão 51ª).
Apreciando:
1 - Muito antes do prazo previsto para o fim da implementação do software, ou seja, em Agosto de 2015, a apelante estava a cumprir escrupulosamente o acordado (conclusão 12ª).
Foi dado como provado relativamente a esta matéria que:
“31. Pela circunstância de a Ré ter estado grande parte do mês de agosto de férias, apenas a 18 de Setembro de 2015 foi cedido o URL para acesso ao ambiente de qualidade;
32. Nesta data já tinha sido ultrapassado o prazo de conclusão da implementação do software, na sua globalidade;
33. Foi a partir desta data que a Autora teve contacto com o aludido software, disponível a três utilizadores seus, podendo explorá-lo e testá-lo, cujo resultado foi insatisfatório por só nesse momento ter tido a possibilidade de constatar os diversos erros na sua implementação (cfr. documento de fls. 44 verso);
34. Erros que se caracterizaram como: partes de software não traduzido, indicações de alterações que foram pedidas e nunca implementadas, existência de partes do software que nunca antes tinham sido apresentadas; tendo sido enviada à Ré, por comunicação eletrónica, no dia 29 de Outubro de 2015, uma análise detalhada dos erros detectados, das alterações solicitadas e não implementadas (cfr. documento de fls. 90 verso a 99);
35. Ao longo do projeto, a Autora, por diversas vezes, fez menção ao facto de os prints screens não serem o método suficiente para se ter a percepção do funcionamento do software; no entanto, nunca antes havia sido cedido o URL para poder consultá-lo por via internet”;
Ou seja, e como se pode facilmente constatar através deste conjunto inequívoco de factos, foram vários e significativos os erros detectados e as insuficiências verificadas no produto colocado à disposição da A..
Logo, não faz o menor sentido o argumentário da apelante de que: “Muito antes do prazo previsto para o fim da implementação do software, ou seja, em Agosto de 2015, a apelante estava a cumprir escrupulosamente o acordado”.
Tal correcto cumprimento da prestação contratual a cargo da Ré não aconteceu obviamente, não se traduzindo, por inépcia sua, na esperada satisfação do interesse do credor, nos termos gerais do artigo 762º, nº 1, do Código Civil.
Não existe assim qualquer tipo de “cumprimento escrupuloso do acordado” que ponha em causa a legalidade do exercício do direito de resolução por parte da A.
2 - O envio do URL de acesso ao ambiente de qualidade verificou-se no dia 12 de Junho de 2015 (conclusão 19ª).
Foi dado como provado precisamente o contrário:
“Apenas a 18 de Setembro de 2015 foi cedido o URL para acesso ao ambiente de qualidade, encontrando-se, nesta data, ultrapassado o prazo de conclusão da implementação do software, na sua globalidade”.
Assim sendo, a conclusão jurídica que a Ré, ora apelante, pretende retirar do facto por si alegado não tem o menor sustentáculo real e efectivo.
3- A partir de 12 de Junho de 2015 pode a apelada ter contacto directo com o software, podendo explorá-lo e testá-lo, ou seja, muito antes do prazo previsto para o fim da implementação do software (conclusão 27ª).
Em conformidade com o referido supra, tal afirmação carece, em absoluto, de correspondência no plano dos factos, o que impede a Ré de refutar o claro incumprimento contratual em que nitidamente ocorreu.
Não há nenhum facto provado que corrobore minimamente esta conclusão da recorrente.
Ou seja, e basicamente, trata-se apenas e só da versão dos acontecimentos trazida pela Ré a juízo e que não logrou a imprescindível confirmação no veredicto emitido pelo Tribunal neste tocante.
4 - Desde 12 de Junho e até 29 de Outubro de 2015, em momento algum a ora apelada referiu a existência de quaisquer erros, fosse de que natureza fosse, de onde resulta que o Contrato de Empreitada não apresentava vícios, pelo menos que pusessem em causa a utilização do software (conclusão 29ª).
Ora, constitui um facto dado como provado que a comunicação electrónica através da qual a A. comunicou à Ré a listagem dos citados erros data de 29 de Outubro de 2015, conform documento de fls. 90/verso a 99 (cfr. facto provado nº 34).
Note-se que, segundo o facto que foi dado como provado em 31, só a 18 de Setembro de 2015 aconteceu a cedência do URL que permitiu o acesso da A. ao ambiente de qualidade.
A dilação temporal ultrapassa portanto apenas uma mês, o que não é evidentemente significativo ou relevante.
Mesmo a eventual dilação temporal na comunicação desses erros do sistema não justifica a existência das anomalias referidas nem, muito menos, significa que os erros afinal, por esse motivo, não existissem.
Uma coisa não implica a outra.
Pelo que não assiste razão à Ré na questão que aqui suscita.
5- Em sede de reconvenção, a Ré reconvinte apresentou a factura relativa ao não pagamento da quantia de € 270,00, por encomenda de licenças adicionais, sendo que ao abrigo da inversão do ónus de prova a apelada não provou o pagamento da mesma (conclusão 31ª).
O raciocínio da Ré padece de um evidente vício lógico.
Não é pelo facto de uma entidade passar determinada factura em nome de outra que esta se presume devedor da primeira.
A emissão de factura, só por si, não acarreta qualquer tipo de inversão do ónus da prova.
Em abstracto é perfeitamente possível uma entidade emitir determinada factura e enviá-la à destinatária sem que, só por isso, esta se presuma devedora daquela.
Na situação sub judice, tal pagamento foi dado como provado pelo juiz a quo no ponto 31.
Não havendo lugar à modificação da decisão de facto, cumpre dar como correcta a fixação dessa factualidade.
6 - A apelada solicitou alterações às costumizações inicialmente previstas no documento em análise e aprovadas, o que não se compadeceu, nem mesmo tal seria exigível à ora apelante, com o prazo previsto de implementação do software (conclusão 33ª).
A matéria em causa não foi dada como provada pelo que não pode servir de fundamento a uma alteração do enquadramento jurídico realizado na decisão recorrida.
Não foram dados como provados factos que suportassem tal conclusão quanto à impossibilidade de cumprimento dos prazos acordados imputável a qualquer conduta da A., beneficiária dos serviços prestados.
Sobre esta matéria, basta verificar os pontos I, II, XI, XII, XIV, dos factos considerados como não provados.
Os mesmos encerram, precisamente, a factualidade (não provada) com base na qual a Ré visa, através do presente recurso, alterar o enquadramento jurídico elaborado na decisão de 1ª instância.
Não faz, naturalmente e como se compreende, qualquer sentido.
7 - Os serviços de personalização que a apelada solicitou teriam que ser negociados entre as partes e não poderiam nunca ter sido considerados como incumprimento contratual por parte a apelante (conclusão 35ª).
Esta conclusão jurídica da apelante não pode, obviamente, merecer acolhimento.
Provando-se que o sistema fornecido pela Ré não era idóneo a prosseguir os objectivos contratuais firmando entre os celebrantes, não faz sentido alegar a necessidade de negociação de serviços personalizados.
Tal afirmação, mais uma vez, carece de base factual necessária e justificadora.
Nem se entende de que forma se fechou a presente contratação entre as partes, assente na obtenção de determinado benefício concreto para a A. que suportou o custo da implementação do sistema informático, para depois se invocar que a personalização dos serviços (ou seja, a vantagem concreta que a beneficiária retiraria do produto para a sua actividade empresarial) dependeria de negociação entre as partes.
8 - Em 28 de Julho havia atraso no pagamento de três facturas, com data de vencimento em 30 de Junho de 2015, sendo a apelada que estava a incumprir o contrato (conclusão 37ª).
A excepção do não cumprimento prevista, em geral, no artigo 428º, nº 1, do Código Civil, assenta precisamente na possibilidade de incumprimento da prestação de pagamento a que a A. se encontraria obrigada em função do não cumprimento correspectivo das prestações a cargo da Ré.
Logo, tal argumentário não é suficiente para abalar a construção jurídica em que assenta a conclusão final extraída pelo Tribunal de 1ª instância.
De resto, nas alegações/conclusões de recurso a apelante não coloca em crise o regime da excepção do não cumprimento do contrato, previsto no artigo 428º, nº 1, do Código Civil, na sua aplicação pelo juiz a quo ao caso concreto, em função dos factos que foram dados como provados.
Basicamente, em termos implícitos, considera-o prejudicado na óptica dos factos que, no seu entender, deveriam ter sido dados como provados e não provados.
9 - Um ano após reportarem a eventual existência de defeitos, que antes nunca tinham sido mencionados e dois meses após receberem a missiva da apelante solicitando a autorização para a passagem do software para ambiente de produção, resolveu a apelante resolver, ilegitimamente, o contrato outorgado (conclusão 48ª).
Face ao evidente incumprimento pela Ré da prestação contratualizada e à concessão dos prazos razoáveis para a sanação dos vícios do sistema informático, afigura-se-nos plenamente fundado o exercício do direito de resolução do negócio por parte da A., conforme já se salientou supra.
Logo, foi plenamente justificado o referido exercício do direito de resolução do negócio.
10 - A apelante não incumpriu o contrato outorgado e a apelada deve ser responsável pelo pagamento das facturas até Outubro de 2016, devido ao serviço prestado, até porque se o não fez antes, apenas e só à sua inércia pode pedir responsabilidades e não à apelante (conclusão 51ª).
Na sequência do já referenciado supra, o incumprimento do contrato pela Ré fundamenta claramente a resolução do negócio e a atribuição à demandante do direito indemnizatório correspondente.
Soçobram, assim, todas as razões elencadas no plano jurídico no presente recurso de apelação.
Cumpre portanto confirmar a sentença recorrida, improcedendo o recurso interposto pela apelante.

IV - DECISÃO: 
Pelo exposto, acordam os Juízes desta Relação em julgar improcedente a apelação, confirmando-se a decisão recorrida.
Custas apelante.

Lisboa, 2 de Julho de 2019.
Luís Espírito Santo
Conceição Saavedra
Cristina Coelho