JUSTIFICAÇÃO NOTARIAL
IMPUGNAÇÃO
REGISTO PREDIAL
DIREITO DE PROPRIEDADE
PRESUNÇÕES LEGAIS
ACÇÃO DE REIVINDICAÇÃO
AÇÃO DE REIVINDICAÇÃO
FALSIDADE
UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA
Sumário


I - Não se mostrando provados factos susceptíveis de ilidir a presunção do artigo 7º do Código de Registo Predial de que os autores beneficiavam, oriunda do facto de terem efectuado o registo do seu direito, com base na escritura de justificação notarial, a acção de reivindicação merece proceder.
II - Improcedendo a impugnação da escritura de justificação com base na qual foi lavrado o registo, vale contra o impugnante a referida presunção que a lei concede no pressuposto da existência do direito impugnado.

Texto Integral

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça




I - RELATÓRIO


AA e BB intentaram contra CC, DD, EE, FF, GG, HH, II, JJ e KK acção com processo comum, pedindo que:

a) se declare que os autores são donos do imóvel identificado no artigo 1° da petição inicial, o qual se encontra inscrito em seu nome na Conservatória do Registo Predial de … ;

b) se declare que desde 2004, os réus são possuidores de má-fé do prédio em apreço, o qual tem sido por estes possuído de forma abusiva e precária, bem sabendo que este não lhe pertence, seja a que título for;

c) sejam os réus condenados a reconhecer esse direito e tais factos, os quais são do seu perfeito conhecimento, e a entregá-lo, livre de pessoas e bens, aos autores, e em bom estado de conservação;

d) sejam os réus condenados no pagamento de uma indemnização pelos prejuízos causados aos autores desde 2004, data em que a posse por aqueles exercida passou a ser de má-fé, devendo o montante a pagar ser apurado em sede de execução e liquidação de sentença;


Em síntese, alegaram que são possuidores de um prédio misto situado na A… e L…., freguesia de …, concelho de …, inscrito na matriz sob os artigos rústico 5320 e urbano 394 e descrito na Conservatória do Registo Predial sob o nº 2880 daquela freguesia, onde se encontra inscrito a seu favor pelas inscrições AP. 1516 de 30.05.2013 e AP. 1561 de 30.05.2013.

Os réus sabem que aquele prédio não lhes pertence, sendo meros possuidores precários do mesmo e que estão a utilizá-lo por permissão dos verdadeiros proprietários.


Recusam-se a entregar o prédio aos autores, seus legítimos proprietários, apesar de os autores o terem solicitado, verbalmente, por carta registada com A/R e por notificação judicial avulsa. Os réus não têm legitimidade para cultivar o terreno nem para armazenar objectos velhos na parte urbana, já em ruínas.


Os réus contestaram e apresentaram reconvenção, alegando, em substância, que os autores não são proprietários nem nunca possuíram o prédio acima mencionado e referido no artigo 1º da petição inicial. São falsas as escrituras de justificação notarial que deram origem às inscrições registrais a favor dos autores.

Na contestação, requereram a intervenção principal provocada de LL, MM, NN, OO, PP e marido QQ, pretensão que, tendo inicialmente sido indeferida, foi posteriormente admitida na sequência de decisão tomada de 09.07.2015, em sede de recurso, por decisão singular Tribunal da Relação.


Terminam, pedindo que seja julgada improcedente a acção e procedente a reconvenção, ou seja, que sejam declaradas falsas as declarações constantes na escritura de justificação e compra e venda de 17.04.2013 exarada de fls 52 a 56 e na escritura de justificação de 17.04.2013, exarada de fls 57 a 58, ambas do Livro 53 e lavradas no Cartório Notarial Privativo de … e que as mesmas sejam declaradas ineficazes e inexistentes os direitos aí justificados e declarada nula a aludida venda.

Que seja ordenado à Conservatória do Registo Predial o cancelamento das inscrições efectuadas com base nos referidos títulos e que constam nas apresentações nº 1516 e 1561. Ambas de 30.05.2013, existentes no prédio descrito sob o nº 2880/20070321, da freguesia dos …, concelho de …, a favor dos autores ou de quem quer que seja.

Que seja admitida a requerida intervenção principal.


Os autores apresentaram réplica (fls 287 a 290), referindo que o prédio referido nos presentes autos e que fundamenta a petição inicial é a verba nº 2 e não a verba nº 4 do inventário obrigatório nº 51/67 (fls 29 e 30).

Pugnam pela improcedência da reconvenção e pela procedência do pedido inicial.


O incidente de intervenção principal foi admitido por decisão singular de 09.07.2015, proferida em recurso de apelação – fls 381 a 386.



Em 03.06.2017 foi proferida sentença que julgou a acção procedente, tendo decidido nos seguintes termos:

a) Reconhecer o direito de propriedade dos autores sobre o prédio misto, situado na A… e L…, dita freguesia de …, concelho de …, com a área total de 730m2, sendo a área coberta de 30m2, a confinar pelo norte com Caminho, sul com DD, leste com RR e oeste com SS, inscrito na matriz sob os artigos rústicos 5.320 e urbano 394, descrito na Conservatória do Registo Predial da … sob o n° 2880 daquela freguesia, onde se encontra inscrito a seu favor pelas inscrições AP 1516 de 30.05.2013 e AP 1561 de 30.05.2013, e bem assim condenam-se os réus a absterem-se da prática de actos ofensivos do direito de propriedade dos autores sobre tal prédio;

b) A declarar-se que desde 2004, os réus são possuidores de má fé do prédio em apreço, o qual tem sido por estes possuído de forma abusiva e precária, bem sabendo que este não lhe pertence, seja a que título for;

c) A procederem ao pagamento de uma indemnização pelos prejuízos causados aos autores desde 2004, data em que a posse por aqueles exercida passou a ser de má fé, devendo o montante a pagar ser apurado em sede de execução e liquidação de sentença.

2) julgar improcedente o pedido reconvencional formulado pelos réus, absolvendo-se os autores do pedido formulado.


Por acórdão da Relação de 16.11.2018, foi julgado improcedente a apelação e confirmada a sentença da primeira instância, com um voto de vencido (fls 968 a 1008).


Não se conformando com aquele acórdão, dele recorreram os réus, tendo formulado as seguintes CONCLUSÕES:

A) Vem o presente recurso de revista do douto Acórdão da Relação de Lisboa de 13/11/2018 que, com dois votos a favor e um voto vencido, julgou improcedente a apelação e, em conformidade, confirmou a sentença proferida pelo Tribunal da 1ª instância.

B) Os autores/reconvindos AA e marido BB propuseram contra os réus/reconvintes CC e outros a presente acção declarativa com processo comum.

C) Os réus/reconvintes CC e outros, por seu lado, contestaram a acção e deduziram reconvenção, onde impugnaram as duas escrituras de justificação notarial lavradas no dia 17/04/2013, adiante identificadas, sendo uma de justificação e compra e venda e outra de justificação (constam de fls. 191 a fls. 195 e de fls. 242 a fls. 249 dos autos), incidindo cada escritura sobre metade do prédio reivindicado pelos autores/reconvindos.


D) Na sequência do decidido na 1ª seção do Tribunal da Relação de Lisboa, confirmado por despacho de fls. 389 dos autos, foi admitida a intervenção principal provocada relativamente aos justificantes e vendedores MM; LL; NN; OO; PP e marido QQ.

E) Uma vez pessoalmente citados, os referidos chamados, apesar do previsto no nº3 do artigo 319º do Código de Processo Civil, nada disseram, ou seja, não carrearam para os autos os actos materiais demonstrativos da efectiva posse e propriedade da metade que declararam na aludida escritura de justificação e compra e venda impugnada, suas características e duração, nem invocaram a usucapião a seu favor.

F) Nestas condições, competindo aos aludidos chamados a alegação e prova dos factos constitutivos do direito de propriedade que se arrogaram na escritura de justificação impugnada, não o fizeram, o que implica, salvo diferente e melhor opinião, só por si, que não provaram a existência do direito que lá declararam.

G) Os presentes autos tratam de uma acção de reivindicação e simultaneamente, em face da reconvenção, de uma acção de impugnação de duas justificações notariais, ambas outorgadas em 17/04/2013, acção esta que, conforme entendimento uniforme na jurisprudência, se assume como uma acção de simples apreciação negativa.

H) Tal significa que, no caso concreto, cabia aos autores/reconvindos e aos chamados, nas respectivas proporções declaradas (uma metade para cada), alegar e provar, como não provaram, os factos constitutivos da aquisição do direito de propriedade sobre o prédio em causa por usucapião, na sequência das alegadas aquisições verbais e dos efectivos actos materiais demonstrativos da posse que declararam, sem que beneficiem dos registos efectuados pelas apresentações nº 1516 e 1561, ambas de 30/05/2013 e existentes no prédio descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o nº 2880/20070321, freguesia dos … .

I) Encontra-se demonstrado nos autos que a aludida apresentação nº 1516 de 30/05/2013, assentou na escritura de justificação notarial de 17/04/2013, aludida no facto provado 30) em que foram justificantes os ora autores BB e esposa AA.

J) Mais se encontra demonstrado nos autos que a apresentação nº 1561 de 30/05/2013 assentou na escritura de justificação notarial e compra e venda de 17/04/2013, aludida no facto 29), em que foram justificantes e vendedores os chamados e compradores os autores BB e esposa AA.

K) Ora, salvo o devido respeito, o douto acórdão sob recurso, embora com um voto vencido, andou mal quando decidiu que “ (…) a prova da falsidade das declarações contidas nos supra aludidos documentos autênticos competia indiscutivelmente aos réus/reconvintes e, manifestamente, esses apelantes não conseguiram demonstrar nem sequer minimamente (logo, muito menos, para além de qualquer dúvida razoável) que as declarações contidas nesses documentos não são verdadeiras.” (veja-se 2º parágrafo da página 36 do douto acórdão “a quo”).

L) Mais andou mal o douto acórdão sob recurso quando refere que “ (…) operando, a partir da agora identificada matéria de facto declarada provada na acção, os raciocínios de experiência comum e de bom senso conformes ou referenciáveis à normal diligência de um/a bom pai/boa mãe de família que essas presunções judiciais configuram e aos quais dão corpo e sustentação legal, torna-se possível concluir serem verdadeiros os factos declarados na escritura de justificação que, por sua vez, fundamentou o registo de aquisição em causa nos autos e que foi posto em causa pelos réus/reconvintes.” (veja-se o último parágrafo de fls.39 do douto acórdão “a quo”).

M) Analisando a prova que resultou demonstrada, constatam os réus/reconvintes CC e outros que os autores/reconvindos AA e BB, MM e outros, nada provaram, nomeadamente quanto às alegadas aquisições verbais, actos efectivos de posse, tempo, a intenção de agirem como donos e demais pressupostos necessários à aquisição do prédio em causa por usucapião a seu favor e nos termos em que declararam em ambas as escrituras de justificação notarial em que foram justificantes, nem os justificantes e vendedores demonstraram a necessária legitimidade para procederem à venda da metade justificada.

N) Significa isto que os autores e os chamados nada provaram que hajam exercido poderes de facto que os levassem a adquirir, nas proporções declaradas em ambas as escrituras de justificação, o imóvel em causa por usucapião, nos termos previstos nos artigos 1294º a 1296º, todos do Código Civil, pelo que não o podem vender, nem adquiri-lo por usucapião.

O) Está assente na nossa jurisprudência judicial que os autores e os aludidos chamados não podem beneficiar da presunção do registo decorrente do artigo 7º do Código do Registo Predial – por todos o Acórdão de Uniformização de Jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça de 04/12/2007, Proc. 07A2464, in www.dgsi.pt – pois o registo existente a seu favor foi efectuado com base nas escrituras de justificação e de justificação e compra e venda ora impugnadas.

P) Toda a fundamentação do acórdão recorrido e da sentença da 1ª instância encontra-se invertida uma vez que ambos partiram do princípio errado de que era aos réus/reconvintes quem competia fazer prova da falsidade das declarações invocadas nas aludidas escrituras de justificação notarial impugnadas, beneficiando os justificantes, por tal, dos aludidos registos a seu favor.

Q) Esta interpretação está errada e viola o estabelecido nos artigos 10º, nº2 e nº3, alínea a) do Código de Processo Civil; 343º, nº1 do Código Civil, e a jurisprudência do Acórdão de Uniformização de Jurisprudência do STJ de 04-12-2007, Proc.07A2464, in www.dgsi.pt, que estabelece o seguinte:

“ Na acção de impugnação de escritura de justificação notarial prevista nos arts 116º nº1 do Código do Registo Predial e 89º e 101º do Código do Notariado, tendo sido os réus que nela afirmaram a aquisição, por usucapião, do direito de propriedade sobre um imóvel, inscrito definitivamente no registo, a seu favor, com base nessa escritura, incumbe-lhes a prova dos factos constitutivos do seu direito, sem poderem beneficiar da presunção do registo decorrente do artigo 7º do Código do Registo Predial.”

R) Uma vez que não ocorreram alterações legislativas que hajam revogado a doutrina deste Acórdão de Uniformização de Jurisprudência, nem foi produzida jurisprudência que o neutralize, o mesmo encontra-se em vigor.

S) O corpus da posse e o animus sobre o imóvel justificado não constam demonstrados pelos autores/reconvindos AA e marido BB e pelos chamados MM, LL, NN, OO, PP e marido QQ.

T) Competia a estes autores/chamados/reconvindos o ónus da prova de todos os caracteres da efectiva posse, designadamente se foi de boa ou má-fé, pacífica ou violenta, pública ou oculta, titulada ou não e invocação e prova do respectivo prazo prescritivo, pelo que o acórdão “a quo” e a sentença da 1ª instância violaram o artigo 10º, nº2 e 3, alínea a) do Código de Processo Civil e artigos 343º, nº1; 1258º; 1259º; 1260º; 1261º; 1262º; 1287º e 1296º do Código Civil e a jurisprudência do supra aludido Acórdão Uniformizador de Jurisprudência, não podendo aqueles autores/chamados/reconvindos terem adquirido, por usucapião, o imóvel identificado nas escrituras de justificação e na justificação e compra e venda, ambas datadas de 17/04/2013.

U) Aliás, é este o entendimento que consta na declaração do Sr. Juiz Desembargador que votou vencido no douto acórdão “a quo”.

V) Pelo referido, requerem que seja julgada procedente a revista e, consequentemente, que o douto acórdão “a quo” e a sentença da 1ª instância sejam revogados e substituídos por acórdão que julgue a acção improcedente, por não provada e a reconvenção seja julgada procedente e, por consequência, que sejam declaradas ineficazes a escritura de justificação e compra e venda de 17/04/2013, exarada de fls.53 a fls.56 e a escritura de justificação de 17/04/2013, exarada de fls.57 a fls.58 verso, ambas do livro 53 e lavradas no Cartório Notarial Privativo de … e inexistentes os direitos aí justificados e declarada nula a aludida venda e que seja ordenado à Conservatória do Registo Predial o cancelamento das inscrições efectuadas com base nos referidos títulos e que constam nas apresentações nº1516 e 1561, ambas de 30/05/2013, existentes no prédio descrito sob o nº2880/20070321, da freguesia dos …, concelho de …, a favor dos Autores ou de quem quer que seja.


Terminam, pedindo que o acórdão recorrido e a sentença da 1ª instância sejam revogados e substituídos por acórdão que julgue a acção improcedente por não provada e a reconvenção julgada procedente e, por consequência, que sejam declaradas ineficazes a escritura de justificação e compra e venda de 17/04/2013, exarada de fls.53 a fls.56 e a escritura de justificação de 17/04/2013, exarada de fls.57 a fls.58 verso, ambas do livro 53 e lavradas no Cartório Notarial Privativo de … e inexistentes os direitos aí justificados e declarada nula a aludida venda e que seja ordenado à Conservatória do Registo Predial o cancelamento das inscrições efectuadas com base nos referidos títulos e que constam nas apresentações nº1516 e 1561, ambas de 30/05/2013, existentes no prédio descrito sob o nº2880/20070321, da freguesia dos …, concelho de …, a favor dos Autores ou de quem quer que seja.


Os autores contra-alegaram, pugnando pela confirmação do acórdão recorrido.

Colhidos os vistos, cumpre decidir.


II - FUNDAMENTAÇÃO


A) Fundamentação de facto


As instâncias deram como provados os seguintes factos:

"1) Descrito na Conservatória do Registo Predial da … sob o n° 2880 mostra-se inscrito a favor de BB casado com AA pelas inscrições AP. 1516 de 30/05/2013 e AP. 1561 de 30/05/2013 o prédio misto, situado na A… e L…, freguesia de …, concelho de …, com a área total de 730m2, com a área coberta de 30m2, a confinar pelo norte com Caminho, sul com DD, leste com RR e oeste com SS, inscrito na matriz sob os artigos rústicos 5320 e urbano 394.

2) O autor é filho de TT, também conhecida por UU, e marido VV, e é neto materno de XX e mulher ZZ;

3) A avó materna do autor foi casada em primeiras núpcias com AAA e em segundas núpcias com o referido XX;

4) Por óbito da avó ZZ, falecida em 1967, correu termos, no Tribunal Judicial da …, o processo de Inventário Obrigatório n° 51/67;

5) No referido inventário foram interessadas, entre outros, UU, mãe do autor e BBB tia deste, e filhas do segundo matrimónio da referida ZZ;

6) O prédio aqui em litígio, foi relacionado no referido Inventário como verba n° 2, "prédio rústico e urbano no sítio da A… e L…, freguesia dos …, confina a Norte com AAA, Sul CCC e outros, Leste DDD e outros, e Oeste EEE";

7) Que foi adjudicado, na proporção de metade para cada uma, a UU, mãe do autor, e BBB;

8) A ré CC, que naquela altura usava o nome de …, é filha do primeiro casamento da inventariada ZZ, pelo que também interveio como interessada no referido inventário, tendo herdado 1/10 nas verbas 8 e 10, correspondentes a prédios distintos;

9) Após a referida adjudicação no inventário as irmãs TT e BBB começaram a amanhar e cultivar a terra a batatas e hortaliças, conservando e mantendo a parte urbana e pagando as respectivas contribuições ao Estado; (não provado, conforme consta de fls 996 do acórdão).

10) As irmãs TT e BBB emigraram para a … e …, respectivamente, há mais de 20 anos;

11) Após essa partida autorizaram os réus CC e marido a fazê-lo, mas sempre numa situação de favor, o que era do conhecimento destes.

12) Para evitar o abandono do terreno e da casa e consequente deterioração (não provado, conforme consta de fls 996).

13) As referidas TT e BBB sempre liquidaram os impostos referentes àquele imóvel, então denominados "décima" e contribuição autárquica, sendo que quem efectuava o pagamento em seu nome era a FFF.

14) Nessa altura e ainda hoje, a maior parte dos prédios relacionados e então partilhados naquele Processo de Inventário, não forem objecto de reclamação à matriz para mudança de titularidade do inventariado para os interessados naquele processo judicial, tendo continuado inscritos na matriz em nome do inventariado GGG, incluindo o prédio misto ora em litígio. (não provado, conforme consta de fls 996).

15) Por tal motivo, e uma vez que a Ré CC cultivava alguns imóveis partilhados e adjudicados nas partilhas a vários herdeiros, era esta quem procedia ao pagamento directo dos impostos então ainda em nome do dito GGG. (não provado, conforme consta de fls 996).

16) Sendo que cada proprietário a quem foram adjudicados imóveis, entregava à requerida CC o valor na proporção dos prédios que haviam recebido, para esta fazer o pagamento dos impostos devidos pela totalidade dos bens que faziam parte daquela herança. (não provado, conforme consta de fls 996).

17) E a FFF entregava à ré CC anualmente, em mão, o dinheiro devido pelos impostos dos prédios daquelas irmãs.

18) Os pais do réu marido procederam à doação verbal de metade do prédio misto, acima referido, em seu favor no ano de 1983 (facto P. do documento n.° 5 junto aos autos a fis. 41); (não provado, conforme consta de fls 996).

19) A outra metade do terreno pertencia a III, por doação verbal e não titulada efectuada em 1981 por BBB e JJJ, sendo que o III morreu em 2000, deixando viúva e quatro filhos; (Documento 6).

20) Os autores adquiriam a metade de terreno referida em 11) por compra verbal e não titulada aos herdeiros de III pelo preço de E 3.000, tendo apenas feito a escritura em 17.04.2013.

21) Durante a ausência do país das proprietárias TT e BBB, estas autorizaram que os RR CC e seu segundo marido DD cultivassem a parte rústica do imóvel e que vivessem na parte urbana (conforme alteração de fls 996 do acórdão).  

22) O referido III viveu na … até 1996, e antes de vir para cá residir, vinha anualmente à … passar férias com a mulher e os filhos, sendo que costumava visitar o prédio em questão para verificar se os RR continuavam a gerir devidamente o respectivo cultivo; (não provado, conforme consta de fls 996).

23) Os RR CC e marido já se mudaram para outra casa há vários anos, servindo a casa em apreço apenas para armazenamento de produtos hortícolas e ferramentas, encontrando-se num estado bastante degradado; (não provado, conforme consta de fls 996).

24) Quando voltaram para a ilha … para aí residirem definitivamente, os autores  procuraram os RR CC e DD para estes procederem à entrega, livre de pessoas e bens, do imóvel identificado em 1) e por eles ocupado. (conforme alteração de fls 996 do acórdão).  

25) Em 24 de Fevereiro de 2004 os AA notificaram os RR para proceder à desocupação e respectiva entrega, dando prazo até 31 de Agosto desse ano para o efeito;

26) A CC acordou verbalmente em entregar o prédio em Janeiro de 2005, uma vez que queria proceder à colheita dos produtos então plantados; (não provado, conforme consta de fls 996).

27) Os RR CC e DD têm-se recusado e continuam a recursar-se a proceder à entrega, livre de pessoas e bens, do imóvel identificado em 1) por eles ocupado; conforme alteração de fls 996 ao acórdão).  

28) Já foram notificados quer verbalmente, quer através de carta registada com a/r e, ainda, por notificação avulsa;

29) Da Escritura de Justificação Notarial e Compra e Venda celebrada em 17/04/2013, exarada de fls. 53 a fis.56 do Livro 53, do Cartório Notarial Privativo do Cartório Notarial de …, consta que os justificantes MM, LL, NN, OO e PP, casada sob o regime da comunhão de adquiridos com QQ, na qualidade de justificantes e primeiros outorgantes, declararam o seguinte: "(...) Que, por escritura de habilitação, de três de Março de dois mil e quatro, lavrada no então cartório notarial de … a folhas oitenta e seis a oitenta e seis verso do livro trezentos e quarenta e oito, foram habilitados como únicos herdeiros de III, conforme se vê da fotocópia certificada da dita escritura, que arquivo. Que do acervo da herança aberta por óbito daquele faz parte o seguinte imóvel: Metade dum prédio misto, sendo a parte urbana, composta por urna habitação térrea, com chão de terra batida, outrora coberta de colmo e destinada a habitação, e a parte rústica por terra de cultivo, localizado actualmente na Travessa … (antes da implementação da toponímia no concelho de …; A… e L…), freguesia dos …, concelho de …, com a área total de setecentos e trinta metros quadrados, sendo a superfície coberta de trinta metros quadrados, a confrontar no todo pelo Norte com Caminho, Sul com RR, Leste com KKK e Oeste com LLL, inscrito na matriz, em nome de GGG, a parte rústica sob o artigo 5320, com o valor patrimonial actual de €8,87 e a parte urbana sob o artigo 394 (...)"

Mais à frente consta "(...) Que o mesmo se encontra descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o número dois mil oitocentos e oitenta, daquela freguesia, onde se acha registada a inscrição a apresentação dois de vinte e um de Março de dois mil e sete que corresponde a uma acção judicial."

Mais declararam os referidos justificantes " (...) Que o prédio na referida proporção foi adquirido pelo autor da herança e sua mulher MM, no ano de mil novecentos e oitenta e um, por doação verbal e não titulada feita por seus pais e sogros, respectivamente, BBB e JJJ, residentes que foram na …".

Alegaram, ainda, "Que, desde então, até à sua morte, o autor da herança e mulher o possuíram, e depois do falecimento do autor da herança, os seus herdeiros os demais justificantes, ou seja, há mais de vinte anos sem a menor oposição de quem quer que fosse, posse essa que sempre exerceram, sem interrupção e ostensivamente, com conhecimento de todas as pessoas, sendo por isso uma posse de boa fé, ou seja, na convicção de que não lesavam interesses de terceiros, pública, pacífica e contínua, sendo consenso que o imóvel lhes pertence, pois têm vindo a praticar todos os actos inerentes à qualidade de proprietários, antes da sua morte, após a qual se transmitiu aos seus herdeiros, que continuaram a possuí-lo até agora, com as mesmas características, como fazendo parte da herança."

(veja-se documento n.° 7 junto pelos Autores, mais propriamente em fls. 60 dos autos)].

Mais alegaram: "Que esta posse, pacífica, contínua e pública, conduziu à aquisição do imóvel por usucapião, que invocam, justificando o seu direito de propriedade para efeitos de registo, dado que essa aquisição não pode ser comprovada por qualquer outro título extrajudicial.".

Nessa escritura declararam, ainda, os primeiros outorgantes justificantes: "Que pelo preço de sete mil quatrocentos e oitenta euros, que já receberam e de que prestam quitação, vendem aos terceiros outorgantes, BB e mulher AA, livre de quaisquer ónus ou encargos, a metade que lhes pertence no referido imóvel, sendo que atribuem à parte rústica o valor de mil quatrocentos e oitenta euros e à parte urbana o valor de seis mil euros" tendo o outorgante QQ prestado o seu consentimento ao cônjuge para os presentes actos.

Declararam os ora Autores, BB e esposa AA na referida escritura "(..) Que compram o referido prédio na indicada proporção em apreço nos termos exarados e que a parte urbana do mesmo se destina a habitação."

30) Por Escritura de justificação notarial de 17/04/2013, exarada de fls. 57 a fls. 58 verso do Livro 53 do Cartório Notarial Privativo de …, os ora autores declararam-se "(...) com exclusão de outrem, donos e legítimos possuidores de metade dum prédio misto, sendo a parte urbana, composta por uma habitação térrea, com chão de terra batida, outrora coberta de colmo e destinada a habitação e a parte rústica por terra de cultivo, localizado actualmente na Travessa … (antes da implementação da toponímia no concelho de …; A… e L…), freguesia dos …, concelho de …, com a área total de setecentos e trinta metros quadrados, sendo a superfície coberta de trinta metros quadrados, a confrontar no todo pelo Norte com Caminho, Sul com RR, leste com KKK e Oeste com LLL, inscrito na matriz, em nome de GGG, a parte rústica sob o artigo 5320, com o valor patrimonial actual de €8,87 e a parte urbana sob o artigo 394 (...)".

Mais à frente consta: "(...) Que o mesmo se encontra descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o número dois oitocentos e oitenta, daquela freguesia, onde se acha registada a inscrição a apresentação dois de vinte e um de Março de dois mil e sete que corresponde a unta acção judicial."

Mais declararam os ora autores: "Que tal fracção veio à posse dos ora justificantes, por doação, não titulada, feita em Janeiro de mil novecentos e noventa e três, por seus pais e sogros, respectivamente, TT e VV, residentes que foram em …, os quais por sua vez o haviam adquirido por partilha amigável e não titulada a que procederam com os restantes herdeiros no ano de mil novecentos e sessenta e nove, por óbito da mãe daquela, ZZ, residente que foi ao sítio da A…. e L…, freguesia de …, concelho de … a qual foi casada em segundas núpcias com XX, que também usava o nome GGG, titular inscrito na matiz, com última residência no dito sítio da A… e L…, freguesia de …, concelho de … ."

Mais alegaram os autores: "Que, desde então, o referido prédio, na indicada proporção, se encontra na sua posse, ou seja, há mais de vinte anos, sem a menor oposição de quem quer que seja, posse essa que sempre exerceram, sem interrupção e ostensivamente, com conhecimento de todas as pessoas, sendo por isso uma posse de boa-fé, ou seja, na convicção de que não lesavam interesses de terceiros, pública, pacifica e contínua, sendo consenso que o imóvel lhes pertence, pois têm vindo a praticar todos os actos inerentes à qualidade de proprietários, exercendo os direitos de proprietários."

Alegaram, ainda, os autores: "Que esta posse, pacífica, contínua e pública conduziu à aquisição do imóvel por usucapião, que invocam, justificando o seu direito de propriedade para efeitos de registo, dado que essa aquisição não pode ser comprovada por qualquer outro título extrajudicial."

31) O autor marido, BB nasceu em …/02/1965 e a autora mulher AA nasceu em …/10/1971." (sic).


B) Fundamentação de direito


As questões colocadas e que este tribunal deve decidir, nos termos dos artigos 663º nº 2, 608º nº 2, 635º nº 4 e 639º nºs 1 e 2 do novo Código de Processo Civil, são as seguintes:

- Os autores são proprietários do prédio reivindicado?

- Houve violação do Acórdão de Uniformização de Jurisprudência de 04.12.2007?


Comecemos pela acção de reivindicação, já que esta foi a acção intentada pelos autores.


É inquestionável que estamos perante uma acção de reivindicação prevista no artigo 1311° do Código Civil, segundo o qual:

1. " o proprietário pode exigir judicialmente de qualquer possuidor ou detentor da coisa o reconhecimento do seu direito de propriedade e a consequente restituição do que lhe pertence".

2. “ Havendo reconhecimento do direito de propriedade, a restituição só pode ser recusada nos casos previstos na lei”.


Estando demonstrada a propriedade dos autores e a detenção pelos réus do prédio misto em litígio e, sabendo-se que o proprietário “ goza de modo pleno e exclusivo dos direitos de uso, fruição e disposição das coisas que lhe pertencem, dentro dos limites da lei e com observância das restrições por ela impostas” (artigo 1305º do Código Civil), os autores têm direito à restituição do mencionado prédio, salvo se existir caso previsto na lei que justifique a recusa de tal restituição (artigo 1311º nº 2 do Código Civil).


Entre os casos em que é lícito negar-se ao proprietário a restituição da coisa podem apontar-se o direito de retenção, o penhor, o usufruto, a locação, o comodato e qualquer outra relação obrigacional que confira a posse ou a detenção da coisa por parte do não proprietário.


Assim, provada a propriedade da coisa, a entrega desta só será recusada, se o demandado (o possuidor ou detentor) invocar (e provar) que lhe assiste a posse ou a detenção da coisa em virtude de uma relação obrigacional ou real que impeça o exercício pleno da propriedade, facto que, a ser alegado, constituirá excepção peremptória ao direito invocado pelo autor.


A causa de pedir na acção de reivindicação, como em qualquer acção real, é “ o facto jurídico de que deriva o direito real” – artigo 581º nº 4 do Código de Processo Civil -, preceito que consagra a teoria da substanciação, segundo a qual o objecto da acção é o pedido, definido através de certa causa de pedir, que se reconduz aos factos de onde emerge o direito do autor[1].


A acção de reivindicação, que é a proposta pelo proprietário não possuidor da coisa contra o detentor ou possuidor não proprietário, tem a sua procedência condicionada a que seja feita a prova da aquisição do direito de propriedade em termos que não deixem dúvidas sobre a sua existência, o que implica a necessidade de se provar ter havido uma aquisição originária, do direito de propriedade ou de se provar ter havido uma ou várias aquisições derivadas que acabem por formar uma cadeia ininterrupta a terminar numa aquisição originária do mesmo direito - ressalvada a existência de presunções actuantes no caso e não ilididas.


Conforme melhor consta do nº 1 dos factos provados, o prédio misto, situado na A… e L…, freguesia de …, concelho de …, descrito na Conservatória do Registo Predial da … sob o n° 2880 com a área total de 730m2, com a área coberta de 30m2, mostra-se inscrito a favor dos autores BB casado com AA pelas inscrições AP. 1516 de 30/05/2013 e AP. 1561 de 30/05/2013, apresentando como título de aquisição, a primeira por doação e a segunda por compra.


Estando o prédio reivindicado inscrito no registo predial a favor dos autores, estes gozam da presunção da titularidade do direito de propriedade estabelecida no artigo 7º do Código do registo Predial, segundo o qual “ o registo definitivo constitui presunção de que o direito existe e pertence ao titular inscrito, nos precisos termos em que o registo o define”.


A articulação entre aquela exigência de prova de uma aquisição originária a fundamentar a existência do direito de propriedade invocado, por um lado, e a força da presunção resultante da inscrição registral de aquisição, por outro, se fez no sentido de que, porque uma presunção legal, embora ilidível, dispensa quem dela beneficia de provar o facto a que ela conduz – artigo 350º do Código Civil – a dita inscrição registral dispensa o seu titular de provar a aquisição originária bem como a eventual cadeia de aquisições derivadas anteriores à aquisição que conseguiu fazer inscrever.

 

Já se disse que os autores têm a aquisição do prédio inscrita a seu favor, o que, prima facie, faz presumir que são seus proprietários.

Porém, essa presunção é ilidível, cabendo então aos réus fazer a prova de que a inscrição feita a favor dos autores não corresponde à realidade jurídica.


Como tentaram os réus ilidir aquela presunção?

Argumentaram que os autores não são proprietários nem nunca possuíram o prédio referido no artigo 1º da petição inicial e ainda que são falsas as escrituras de justificação notarial que deram origem às inscrições registrais a favor dos autores.


Os autores provaram a quase totalidade dos factos alegados na petição inicial e os réus não ilidiram a presunção derivada do registo que favorece os autores.


A questão que se coloca consiste em saber se os autores são donos do prédio em causa nos presentes autos e ainda se se mostra provado, tal como foi pedido na reconvenção, a falsidade das declarações constantes na escritura de justificação e compra e venda de 17.04.2013 exarada de fls 52 a 56 e na escritura de justificação de 17.04.2013, exarada de fls 57 a 58, ambas do Libro 53 e lavradas no Cartório Notarial Privativo de … .


Antes, porém, rememoremos que os autores provaram, nuclearmente, que:

4) Por óbito da avó ZZ, falecida em 1967, correu termos, no Tribunal Judicial da …, o processo de Inventário Obrigatório n° 51/67;

5) No referido inventário foram interessadas, entre outros, UU, mãe do autor e BBB tia deste, e filhas do segundo matrimónio da referida ZZ;

6) O prédio aqui em litígio, foi relacionado no referido Inventário como verba n° 2, "prédio rústico e urbano no sítio da A… e L…, freguesia dos …, confina a Norte com AAA, Sul CCC e outros, Leste DDD e outros, e Oeste EEE";

7) Que foi adjudicado, na proporção de metade para cada uma, a UU, mãe do autor, e BBB;

8) A ré CC, que naquela altura usava o nome de …, é filha do primeiro casamento da inventariada ZZ, pelo que também interveio como interessada no referido inventário, tendo herdado 1/10 nas verbas 8 e 10, correspondentes a prédios distintos;

10) As irmãs TT e BBB emigraram para a … e …, respectivamente, há mais de 20 anos;

11) Após essa partida autorizaram os réus CC e marido a fazê-lo, mas sempre numa situação de favor, o que era do conhecimento destes.

13) As referidas TT e BBB sempre liquidaram os impostos referentes àquele imóvel, então denominados "décima" e contribuição autárquica, sendo que quem efectuava o pagamento em seu nome era a FFF.

20) Os autores adquiriam a metade do terreno referido em 1º por compra verbal e não titulada aos herdeiros de III pelo preço de € 3.000, tendo apenas feito a escritura em 17.04.2013 - Vide certidão do registo predial de fls 17 e escritura de justificação e compra de 17-04-2013 de fls 57 a 63.

21) Durante a ausência do país das proprietárias TT e BBB, estas autorizaram que os RR CC e seu segundo marido DD cultivassem a parte rústica do imóvel e que vivessem na parte urbana.

24) Quando voltaram para a ilha … para aí residirem definitivamente, os autores  procuraram os RR CC e DD para estes procederem à entrega, livre de pessoas e bens, do imóvel identificado em 1) e por eles ocupado.

27) Os RR CC e DD têm-se recusado e continuam a recursar-se a proceder à entrega, livre de pessoas e bens, do imóvel identificado em 1) por eles ocupado.


Da conjugação de todos estes factos é possível concluir que são verdadeiros os factos declarados na escritura de justificação que deu origem ao registo de aquisição em causa – Cfr certidão da Conservatória do Registo Predial de fls 16.


Além disso, os factos provados sob os nºs 29 e 30 mostram que os autores provaram o ali consignado e que afastaram a falsidade das declarações constantes das supra mencionadas escrituras e que foi invocada pelas rés na contestação.


Por isso, os autores provaram o seu direito, sem ter havido violação da doutrina definida no Acórdão de Uniformização de Jurisprudência nº 1/2008, de 04 de Dezembro de 2007, publicado no DR 1ª Série nº 63 de 31 de Março de 2008, que decidiu do seguinte modo:

“ Na acção de impugnação de escritura de justificação notarial prevista nos artigos 116º, nº1, do Código do Registo Predial e 89º e 101º do Código do Notariado, tendo sido os réus que nela afirmaram a aquisição, por usucapião, do direito de propriedade sobre um imóvel, inscrito definitivamente no registo, a seu favor, com base nessa escritura, incumbe -lhes a prova dos factos constitutivos do seu direito, sem poderem beneficiar da presunção do registo decorrente do artigo 7º do Código do Registo Predial”.


Deste modo, os réus não conseguiram pôr em causa a fidedignidade da escritura de fls 56 a 63 e que consta do nº 29 da Fundamentação de facto, assim como a escritura de fls 192 a 195 constante do nº 30 dos factos provados.


Aos réus reconvintes competia provar os factos alegados no respectivo articulado no que respeita à falsidade das declarações contidas nas supra mencionadas escrituras, não tendo conseguido demonstrar que as declarações contidas nesses documentos não são verdadeiras.


No caso concreto, após a publicação das escrituras de justificação acima referidas, estas não foram impugnadas, pelo que a inscrição do prédio a favor dos autores passou a constituir a presunção da titularidade do direito em causa, nos termos do artigo 7º do Código do Registo Predial.


A matéria de facto provada revela, pois, que os réus não têm título que legitima a ocupação do prédio referido em 1º e a sua recusa em restitui-lo aos autores.

Por conseguinte, encontra-se provada a propriedade dos autores sobre aquele prédio por beneficiarem da presunção registral que não foi ilidida pelos réus.



III - DECISÃO


Atento o exposto, nega-se provimento à revista, confirmando-se o acórdão recorrido.

Custas pelos recorrentes.


Lisboa, 11 de Abril de 2019


Ilídio Sacarrão Martins

Nuno Manuel Pinto Oliveira

Paula Sá Fernandes 

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[1] Lebre de Freitas, “Acção Declarativa Comum, à Luz do Código de Processo Civil de 2013”, pág. 41-46.