JUNÇÃO DE DOCUMENTO
Sumário

I - Após apresentação das alegações de recurso, não é admissível a junção aos autos pelas partes de cópia de acórdão, pois um acórdão não pode ser considerado um parecer (cf. art. 426.º do CPC).
II - Tendo em conta a letra da lei e a sua ratio no art. 423.º, n.º 2, do CPC, a expressão “até 20 dias antes da data em que se realize a audiência final” significa “até à data em que efetivamente se inicie a audiência final”. Atenta a possibilidade de a data inicialmente designada para audiência final ser dada sem efeito ou de adiamento propriamente dito da audiência, releva apenas a data concreta em que a audiência final se venha a iniciar/realizar.
III - Mas uma vez iniciada, se tiver várias sessões, ainda que entre as mesmas decorram mais de 20 dias, não é admissível a junção documental ao abrigo do referido preceito.
IV - O Código de Processo Civil contém diversos preceitos legais que permitem “equilibrar” o regime consagrado no art. 423.º do CPC, em que assume preponderância a consagração do princípio do inquisitório, no art. 411.º do CPC, assim ficando assegurado o direito de acesso à justiça e à tutela jurisdicional efetiva e a um processo equitativo (artigos 20.º da CRP e 6.º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem).
V - Mas o referido princípio não pode servir para colmatar toda e qualquer “falta” das partes a respeito da apresentação dos meios de prova, pois se assim fosse estaria a fazer-se do mesmo uma interpretação normativa e aplicação prática em colisão com outros importantes princípios, do processo civil e até constitucionais, mormente o dispositivo, a igualdade das partes, a independência do tribunal e a imparcialidade do juiz (20.º e 62.º da CRP).

Texto Integral

Acordam, na 2.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa, os Juízes Desembargadores abaixo identificados

I - RELATÓRIO

DG… - Compra e Venda de Propriedades, Lda. interpôs o presente recurso de apelação do despacho que indeferiu a junção documental por si requerida em 19-10-2018, na ação declarativa de condenação que, sob a forma de processo comum, intentou contra T… - CS…, S.A., atual SU…, S.A..
Na Petição Inicial, apresentada em 14-08-2017, a Autora deduziu o pedido de condenação da Ré no pagamento da quantia de 35.481,40 €, acrescida de juros de mora à taxa legal em vigor, contados desde a citação até efetivo e integral pagamento.
Para tanto, alegou, em síntese, que:
- Em março de 2013, a Autora celebrou com a Ré um contrato de seguro multirriscos tendo por objeto, entre outras, as frações autónomas “M”, “N”, “O” e “P”, identificadas também pelos números 12, 13, 14 e 15 do prédio urbano descrito na Conservatória do Registo Civil, Predial, Comercial e Automóveis de Sesimbra sob o n.º … da freguesia de Sesimbra (Castelo), e o respetivo recheio das mesmas, no valor de 12.500 € para cada uma das frações;
- No dia 7 de maio de 2013, as referidas frações foram assaltadas por desconhecidos, tendo sido furtados 8 fornos da marca Míele, 4 máquinas de lavar e quarto máquinas de secar da mesma marca, 4 torneiras, 4 esquentadores, 4 placas elétricas, diversos móveis de cozinha, 3 torneiras misturadoras com duche, 4 torneiras de cozinha; os assaltantes também danificaram a vedação e partiram vidros, ascendendo os prejuízos da Autora, no total, a 35.088,41 €;
- A Autora participou tais factos à Ré, que declarou não aceitar o sinistro, recusando-se a indemnizá-la.
Juntou, com a Petição Inicial, os seguintes documentos:
- Documentos 1 a 5 - Certidão da Conservatória do Registo Predial, na qual consta, além do mais, que, mediante ap. n.º …, de 22-08-2013, foi efetuada a inscrição de aquisição, por compra, das referidas frações a favor de OS…, sendo a venda, efetuada pela Autora, a retro, ficando esta sociedade (vendedora) com a faculdade de resolver o contrato, no prazo de 24 meses a contar de 13 de fevereiro de 2013;
- Documentos 6 a 9 - Condições particulares da apólice e faturas/recibo de pagamento dos prémios (datadas de 5 de março de 2013);
- Documento 10 - Certidão (datada de 09-06-2013) da Guarda Nacional Republicana – Posto Territorial de Sesimbra relativa a denúncia de furto e dano apresentada pela Autora (da qual não consta a data em que foi efetuada a denúncia);
- Documento 11 - Proposta da Míele, datada de 24-06-2013, de fornecimento de mobiliário de cozinha e eletrodomésticos, bem como montagem, no valor total de 35.088,41 €;
- Documentos 12 a 15 – Participações dos 4 sinistros dirigidas à T… (das quais não consta indicação da data dos factos);
- Documento 16 – Email enviado à GNR relativo à emissão de certidão da denúncia;
- Documento 17 - Carta da Ré, comunicando, além do mais, o seguinte “Face ao exposto (participações fora do prazo, habitações com acabamentos por fazer, habitações devolutas e conclusões das peritagens quanto às divergências e incongruências das declarações prestadas) informamos que a nossa decisão é a de não aceitarmos os sinistros participados, e portanto, a de não procedermos ao pagamento de qualquer indemnização, encerrando-se assim o processo”.

A Ré apresentou Contestação, na qual se defendeu invocando a exceção dilatória de ilegitimidade processual da Autora (por não estar acompanhada da credora hipotecária), e por impugnação, concluindo pela sua absolvição do pedido. Alegou, designadamente, que:
- Tratarem-se, não de um, mas de 4 contratos de seguros, com n.ºs de apólice distintos, um para cada fração autónoma, tendo as participações sido remetidas à Ré apenas em 06-06-2013;
- Levanta igualmente sérias dúvidas, o facto de a Autora ter procedido à venda das moradias em data posterior ao do alegado furto e não proceder à junção das faturas de aquisição do equipamento furtado;
- Ao contrário do declarado pela Autora, nenhuma das moradias constituía, à data do início de vigência dos contratos de seguro, habitação, ainda que secundária, encontrando-se devolutas.
A Ré juntou 9 documentos:
Documento 1 - Apólice de seguro, incluindo condições especiais;
Documento 3 - Anexo ao NUIPC n.º …/…, com a menção de 07-05-2013 como data da ocorrência e a relação dos objetos subtraídos e o respetivo valor,
Documentos 4 - Seis fotografias (identificadas com os n.ºs 1 a 6, que a Ré diz terem sido recolhidas pelo averiguador que se deslocou ao local);
Documento 5 - Declaração do legal representante da Autora, de 19 de junho de 2013, descrevendo os factos participados:
Documento 7 - Quatro fotografias (identificadas com os n.ºs 17, 18, 19 e 20, que a Ré diz terem sido recolhidas pelo averiguador que se deslocou ao local);
Documento 8 - Onze fotografias (identificadas com os n.ºs 7 a 16, existindo duas com o n.º 11, a que a Ré diz terem-lhe sido apresentadas como tendo sido tiradas no dia do alegado furto);
Documento 9 - Auto de denúncia de anterior furto nas moradias (em 2011);
Documento 10 - Treze fotografias (identificadas com os n.ºs 21 a 34, que a Ré alega terem sido tiradas nas moradias e numa das quais diz ser visível o esquentador da moradia 12 que foi participado como tendo sido furtado).
A Ré protestou juntar o documento 2 (Condições particulares das apólices) e os documentos 12 a 14 (Propostas de seguro das apólices).

No seguimento de despacho que a convidou a pronunciar-se por escrito, a Autora veio responder à matéria de exceção, concluindo pela sua improcedência.
Foi proferido despacho saneador, que julgou improcedente a referida exceção, bem como despacho de identificação do objeto do litígio (considerou-se que se tratava de saber se a Ré era contratualmente responsável pelo pagamento do valor das coisas objeto do alegado furto, incluindo as questões jurídicas da verificação dos pressupostos da celebração entre as partes de contrato de seguro válido e eficaz, âmbito de cobertura e exclusões desses contrato) e enunciação dos temas da prova, que foram os seguintes:
“I - Concreto âmbito de cobertura do contrato de seguro celebrado entre a Autora e Ré e respectivas exclusões;
II - Verificação no dia 7 de Maio de 2013 nas moradias que correspondem às fracções M,N, O, e P indicadas na petição inicial de furto;
III - Data da participação do mesmo furto pela Autora à autoridade policial e à Ré;
IV - Objectos furtados das aludidas moradias na sequência do evento referido em II), e respectivos valores”.
Agendou-se, nesse despacho, a realização da audiência final de julgamento para o dia 7 de março de 2018.
Em 30-01-2018, foi proferido despacho dando sem efeito aquela data, atento o impedimento comunicado pelo mandatário da Autora, e designada nova data para realização da audiência de julgamento (21 de março de 2018).
Em 20-03-2018, foi proferido despacho que, em virtude do incumprimento de notificações (à Ageas Portugal e ao BBVA Leasing para junção de documentos) que haviam sido determinadas, deu sem efeito aquela data, designando para a realização da audiência o dia 30 de maio de 2018.
No dia 17-04-2018, atenta a comunicação de impedimento por parte do mandatário da Ré, foi, de novo, dada sem efeito a indicada data e designado o dia 14 de junho de 2018 para a realização da audiência final.
Em 11-06-2018, foi, mais uma vez, atendendo à falta de junção aos autos de documentos solicitados, dada sem efeito a data da audiência de julgamento e designado para o efeito o dia 17-09-2018.
Em 14-09-2018, foi proferido despacho indeferindo o adiamento da audiência requerido pela Ré.
Em 17-09-2018, teve início a audiência final, tendo designadamente sido tentada a conciliação das partes. Foi também proferido despacho determinando que se insistisse junto do BBVA pelo envio de documento. Foi ouvido JM…, legal representante da Autora, em declarações de parte. Mais foi requerida a junção aos autos de 4 fotografias do local, tendo sido proferido despacho a admitir essa junção. Foram ouvidas 3 testemunhas (LC…, arrolado pela Autora, JA… e MM…, arroladas pela Ré), designadamente. Por fim, foi proferido o seguinte despacho:
“Considerando que o documento 10 junto à Petição Inicial não corresponde ao auto de notícia ou denúncia do sinistro que está junto aos autos e que o Autor alega não o ter conseguido obter junto da autoridade policial, ao abrigo do artigo 6.º e 7.º, n.º 1 do Código de Processo Civil, o Tribunal oficiosamente determina que se oficie a GNR (Guarda Nacional Republicana) de Sesimbra solicitando o envio, no prazo de 10 dias, da cópia do auto de notícia ou de denúncia do sinistro ocorrido nos autos e bem assim, se o houver, certidão de despacho final que veio a ser proferido no processo de inquérito.
Também ao abrigo do artigo 7.º, n.º 1 do CPC, considerando os factos trazidos aos autos por via das declarações de parte do Legal Representante da Autora e porque os mesmos podem assumir relevância para a boa decisão da causa, o Tribunal concede à Autora o prazo de 10 dias para juntar aos autos as escrituras de compra e venda das moradias que estão em causa no processo”.
Seguidamente, ainda no decurso da audiência final, foi designado para continuação da mesma o dia 11 de outubro de 2018, data obtida em função das agendas dos ilustres mandatários presentes.

Em 19-09-2018, a Autora apresentou requerimento para junção aos autos das referidas escrituras (doc. 1) e ainda de outros 25 documentos, nos seguintes termos:
DG… – COMPRA E VENDA DE PROPRIEDADES LDA, Autora nos autos à margem, por seu advogado, vem, perante V. Ex.ª, em face do R. despacho e, nos termos do disposto no art.º 423 nº.1 a 3.º do CPC, expor e requerer o seguinte:
1.º A autora foi notificada para juntar o documento de venda das quatro moradias a que os autos se referem, o que faz através do documento 1.
2.º Por se afigurar que tem interesse para a decisão a proferir, em face designadamente do depoimento da testemunha da Ré que fez a peritagem do sinistro, a A. requer a junção dos seguintes documentos:
a) Documento 2, comprovativo de que ainda a esta data a Autora tem celebrado com a Ré, contrato de seguro das 11 moradias.
b) Documento 3 a 7, para demonstrar que, contrariamente à fotografia junta com o Nº. 16 a que a testemunha da Ré se referiu no depoimento, existem ligações de canalização e de eletricidade no móvel constante de tal fotografia.
c) Documento 8 a 18, comprovativo da aquisição das cozinhas completas aquando da conclusão da obra no condomínio.
d) Documento 19 a e 25 em complemento dos documentos juntos pela Ré como doc. 9, comprovativos da aquisição dos objetos furtados, aquando do furto ocorrido em 2011 e de que foi parcialmente recuperado conforme consta dos documentos nos autos.
e) O documento 26 comprova o valor unitário dos esquentadores objeto de sinistro, a esta data.
3.º Os documentos ora em causa para além do documento 1, justificam-se em face do depoimento produzido pela testemunha da Ré e que fez a vistoria ao local e que em tal depoimento tentou demonstrar que nem sequer havia ligação de água e de luz para as máquinas bem como para prova quer do objeto do litígio quer dos temas de prova.
Em face do exposto, requer a V. Exª.:
1) Que se digne admitir a junção aos autos dos documentos ora juntos.
2) Que, em face do exposto digne considerar justificada a sua junção, sem qualquer sanção de natureza pecuniária.
Juntou como documento 1 um contrato de compra e venda e respetivo “termo de autenticação”, ambos datados de 13 de fevereiro de 2013, este último elaborado por Advogada, do qual consta terem comparecido, nessa data, JM…, na qualidade de legal representante da Autora, e o referido OS…, e ter-lhe sido apresentado, para fins de autenticação, contrato de compra e venda das frações autónomas identificadas nos autos, ficando a sociedade vendedora com a faculdade de resolver o contrato nos termos do art. 927.º do CC.
Quanto aos demais documentos são (incluímos, em itálico, a descrição que deles foi feita pela Autora):
a) Documento 2, comprovativo de que ainda a esta data a Autora tem celebrado com a Ré, contrato de seguro das 11 moradias (são faturas/recibo de pagamento de prémios dos contratos de seguro datadas de fevereiro e março de 2018);
b) Documentos 3 a 7, para demonstrar que, contrariamente à fotografia junta com o n.º 16 a que a testemunha da Ré se referiu no depoimento, existem ligações de canalização e de eletricidade no móvel constante de tal fotografia (são 5 fotografias, duas do espaço debaixo de lava-louça de cozinha, outras duas com duas tomadas elétricas e tubos, e de uma bancada de cozinha onde são visíveis, ao lado do lava-louça, uma máquina de lavar roupa e outra de secar);
c) Documentos 8 a 18, comprovativo da aquisição das cozinhas completas aquando da conclusão da obra no condomínio (11 faturas datadas de 2007 e a última de 2009, relativas à aquisição à Míele de diverso equipamento de cozinha);
d) Documentos 19 a 25, em complemento dos documentos juntos pela Ré como doc. 9, comprovativos da aquisição dos objetos furtados, aquando do furto ocorrido em 2011 e de que foi parcialmente recuperado conforme consta dos documentos nos autos (2.ªs vias de faturas de 2011 e 2012 relativas à aquisição à Míele de diverso equipamento);
e) O documento 26, comprova o valor unitário dos esquentadores objeto de sinistro, a esta data (mensagem de email, enviada por Sesigás, em resposta a email de JP…, de 18-09-2019, com orçamento de esquentador).
Notificada a Ré, pronunciou-se nos seguintes termos:
SU… S.A., Ré nos autos à margem referenciados, em que é Autora DG… – Compra e Venda de Propriedades, Lda, na sequência dos requerimentos da A. de 19.09.2018 (ref.ª 30130592 e 30130621), vem expor e requerer o seguinte:
I. Do documento n.º 1
1. Do teor do doc. n.º 1 – contrato de compra e venda das 4 moradias em causa nestes autos – decorre que a transmissão da propriedade das mesmas pela A. a favor de OS… ocorreu em 13.02.2013.
2. Os seguros em causa nestes autos foram celebrados em Março de 2013, conforme basta documentação junta aos autos.
3. O registo predial da venda referida no n.º 1 foi efectuado por apresentação de 22.08.2013, ou seja, aquando da celebração do contrato de seguro não estava a R. em condições de saber que a A. não era a proprietária dos imóveis a segurar.
4. Não obstante ter sido efectuada uma venda a retro, a faculdade de resolução, pela vendedora, do negócio de compra e venda poderia ser exercida pelo período de 24 meses, ou seja, até 13.02.2015, o que não sucedeu, consolidando-se definitivamente a propriedade a favor do comprador.
5. Isto leva-nos a concluir que já aquando da celebração do contrato, a A. não detinha qualquer interesse sobre os bens em causa na medida em que os imóveis e o equipamento que os integram já haviam sido vendidos a terceiros, facto desconhecido da R. porque só registado posteriormente.
6. Mas mesmo que a transmissão da propriedade do bem seguro tivesse ocorrido após a entrada em vigor do contrato de seguro – o que não sucedeu, como demonstram os documentos -, sempre estaria a A. obrigada a notificar a R., notificação da qual ficaria dependente a obrigação da R. para com o novo proprietário.
7. Considerando que esta notificação nunca existiu, fica afastada toda e qualquer responsabilidade da R. para com o novo proprietário das fracções.
8. Mas acresce a esta situação outra ainda mais relevante: é que não sendo, desde 13.02.2013, a A. a proprietária dos bens em causa nestes autos, e seguros pela R., carece a mesma de legitimidade para reclamar a correspondente indemnização na medida em que não sofreu qualquer dano na sua esfera patrimonial.
9. Os danos reclamados pela A. não foram por si sofridos, sendo que inexiste qualquer obrigação da R. para com o actual proprietário dos mesmos.
10. Aliás: a procedência da pretensão da A. e a consequente indemnização pelo alegado furto de bens que não são da sua propriedade fá-la-ia incorrer numa situação ilegítima de enriquecimento sem causa.
11. Sem conceder, sempre se dirá que se revela cada vez mais evidente a má-fé com que a A. litiga nos presentes autos, não podendo desconhecer que carece de interesse substantivo na medida em que os bens alegadamente furtados não eram da sua propriedade, não podendo este Tribunal deixar de daí retirar as devidas consequências, o que desde já se requer.
II. Dos documentos n.ºs 2 a 26
1. Escudando-se no despacho que de que foi alvo, no sentido de juntar aos autos as escrituras de compra e venda que titulassem a transmissão de propriedade das fracções a favor de OS…, a A. vem proceder à junção de outros documentos, a qual não se poderá admitir pelos motivos que se passam a expor.
2. A junção dos documentos no presente momento processual viola flagrantemente o disposto no art.º 423.º do C.P.C. e é manifesto que nem sequer se encontra minimamente justificada pelos argumentos expendidos pela A.
3. Com efeito, alega a A. que a junção de tais documentos na presente data se mostrou relevante face ao depoimento da testemunha da R., BM…, tentando enquadrar tal junção no disposto no n.º 3 da citada norma legal.
4. Desde logo, no que se refere ao doc. 02, não se alcança de que forma o depoimento da testemunha da R. possa justificar a junção aos autos dos recibos dos prémios pagos em relação a cada um dos seguros para as 11 moradias ou a demonstração de que tais contratos ainda se encontram em vigor.
5. Acresce que a R. nunca colocou em causa a existência de tais seguros, questionando apenas o interesse da A. na celebração de contratos de seguro para as 4 moradias em causa nos autos já após ter procedido à sua venda.
6. No que respeita aos documentos 3 a 7 ainda é mais flagrante a falta de fundamento da A. ao alegar que os mesmos contrariam o que se vê na fotografia n.º 16, fotografia essa que já se encontra junta aos autos desde a apresentação da contestação, dispondo a A. de mais do que tempo para, querendo, ter junto aqueles documentos.
7. Aliás, a questão da inexistência de contratos de fornecimento de serviços para as moradias em causa foi alegada na contestação, na sequência da informação prestada, verbalmente e por escrito, pelo próprio representante legal da A. ao averiguador da R., motivo pelo qual também não se pode aceitar, porque manifestamente extemporânea, a junção dos documentos 03 a 07 neste momento.
8. Além do mais, sempre de dirá que o meio idóneo à prova da existência de contratos de fornecimento de serviços para as moradias em causa seria a junção dos próprios contratos e não meras fotografias que se desconhece onde e quando foram tiradas ou a que fracções dizem respeito.
9. Idêntica conclusão será aplicável aos documentos 08 a 18: além de as facturas em causa se referirem à data de 2009 – quando o questionado pela R. seria a reposição de determinados bens após o sinistro de 2011 -, das mesmas não decorre qualquer identificação da fracção e, de algumas delas, nem sequer consta a descrição do equipamento.
10. Sem conceder, sempre se dirá que também a questão da existência dos bens foi alegada na contestação, motivo pelo qual a junção dos documentos 08 a 18 neste momento se revela manifestamente extemporânea, tanto mais que, atenta a data dos mesmos, já a A. os poderia e deveria ter junto.
11. Quanto aos documentos 19 a 25, refere a A. que os junta em complemento ao doc. 09, documento esse que foi junto pela R. na contestação e que, como tal, não se aceita.
12. Acresce que tais documentos são datados de 2011 e 2012, pelo que já estariam na posse da A. aquando da apresentação da petição inicial e da contestação da R. onde tal questão foi alegada.
13. Mais: já estariam na posse da A. quando o averiguador da R. os solicitou, pedido que a A. nunca satisfez.
14. Sem conceder quanto à inadmissibilidade da sua junção, sempre se dirá que os referidos documentos não são aptos à prova da substituição dos equipamentos furtados aquando do sinistro de 2011, uma vez que dos mesmos não resultam as fracções a que se destinaram tais equipamentos.
15. Idêntica conclusão é de aplicar ao doc. 26, o qual traduz um mero orçamento solicitado pelo legal representante da A. dois dias após o início da sessão de discussão e julgamento.
16. Face a todo o exposto, crê-se ser manifestamente evidente a má-fé com que litiga a A. ao pretender que este Tribunal aceite, neste momento processual, documentos para a contra-prova de factos há muito alegados pela R., documentos esses que apenas por mera incúria da sua parte não foram oportunamente juntos aos autos.
17. Mais grave ainda é a A. pretender escudar a apresentação de tais documentos no depoimento do averiguador da R. o qual apenas se debruçou sobre factos alegados na contestação e, como tal, não inéditos.
18. Face a todo o exposto, a admissão de tais documentos representaria uma manifesta violação do disposto no art.º 423.º do C.P.C., em especial do seu n.º 3, dado que além de não ter ocorrido nenhuma circunstância inédita que motivasse a junção dos documentos nesta fase, a A. também não invocou qualquer facto que justificasse a omissão da sua junção em momento anterior, motivo pelo qual se requer que seja a mesma indeferida.

Em 11-10-2018, no início da 2.ª sessão da audiência final de julgamento, foi proferido o despacho recorrido, com o seguinte teor:
“Finda a produção da prova testemunhal em sede de audiência final, foi proferido despacho, concedendo à Autora o prazo de 10 dias para juntar aos autos as escrituras de compra e venda das moradias que estão em causa na presente acção.
Em cumprimento do despacho descrito, a Autora requereu a junção aos autos dos documentos identificados, que, por tempestiva e oportuna, se admite desde já.
Sem prejuízo do supra exposto, a Autora requereu ainda a junção de 25 documentos adicionais, por entender que os mesmos têm «interesse para a decisão a proferir, em face designadamente do depoimento da testemunha da Ré que fez a peritagem do sinistro».
Notificada do requerimento descrito, veio a Ré aos autos, concluindo pela inadmissibilidade da junção dos documentos em causa, entendendo não ter ocorrido nenhuma circunstância inédita que motivasse a junção dos mesmos nesta fase, não tendo igualmente a Autora invocado qualquer facto que justificasse a omissão da sua junção em momento anterior.
Cumpre apreciar e decidir.
Dispõe o art. 426.º, n.º 1 do CPC, que «os documentos destinados a fazer prova dos fundamentos da ação ou da defesa devem ser apresentados com o articulado em que se aleguem os factos correspondentes».
Acrescenta o n.º 2 do normativo citado, que, «se não forem juntos com o articulado respetivo, os documentos podem ser apresentados até 20 dias antes da data em que se realize a audiência final, mas a parte é condenada em multa, exceto se provar que os não pôde oferecer com o articulado».
Ora, resulta evidente, desde logo, não ter a Autora requerido a junção dos documentos descritos nos prazos e termos supra citados.
Por esse motivo, resulta, em consequência, aplicável o disposto no artigo 426.º, n.º 3, que determina que, «após o limite temporal previsto no número anterior, só são admitidos os documentos cuja apresentação não tenha sido possível até àquele momento, bem como aqueles cuja apresentação se tenha tornado necessária em virtude de ocorrência posterior».
Desde logo, não resulta demonstrado pela Autora não lhe ter sido possível a apresentação dos documentos descritos em momento anterior; o que deveria ter sido feito – sublinhe-se –, porquanto a maioria daqueles documentos tem data anterior à própria petição inicial apresentada.
Do mesmo modo, não resulta igualmente demonstrado pela Autora a existência de qualquer motivo ou ocorrência que tenha tornado necessária tal junção na presente fase processual.
Com efeito, não obstante a Autora alegar que os documentos em causa resultam com interesse para a decisão a proferir, «em face designadamente do depoimento da testemunha da Ré que fez a peritagem do sinistro», a verdade é que a testemunha depôs sobre os factos constantes da Contestação, factos esses há muito do conhecimento daquela, que, por isso mesmo, os podia ter já juntado previamente aos autos.
Além disso, caso a Autora entendesse existir alguma circunstância capaz de abalar a credibilidade do depoimento da testemunha, quer por afetar a razão da ciência invocada por aquela, quer por diminuir a fé que ela pudesse merecer, deveria ter deduzido tempestivamente o competente incidente de contradita, oferecendo os documentos que entendesse relevantes para o efeito, nos termos do disposto no artigo 522.º, n.ºs 1, 2 e 3 do CPC.
Assim não o tendo feito, não lhe é lícito requerer agora a junção de tais documentos, com tal fundamento, sendo que a mesma se afigura, conforme se disse já, inadmissível por intempestiva.
Por último, e não obstante todas considerações já expostas (que sempre seriam suficientes para o indeferimento do requerido pela Autora), sempre se dirá que não se vislumbra qualquer interesse para a boa decisão da causa dos documentos cuja junção a Autora requereu, quer porque respeitam a matéria não controvertida (no caso do doc. 02), quer porque não permitem a prova dos factos pretendidos pela Autora (no caso dos documentos 03 a 26), designadamente pelo facto de dos mesmos não resultarem quais as frações a que respeitam.
Em face do exposto e nos termos supra explanados, indefere-se a junção requerida pela Autora dos documentos constantes de fls. 216 verso a 241 verso, determinando-se o seu desentranhamento dos presentes autos.
Mais se condena a Autora em custas pelo incidente, que se fixam em 2 (duas) unidades de conta – art. 7.º, n.º 4 do Regulamento das Custas Processuais, por referência à tabela ii, que faz parte integrante do mesmo.
Notifique”.
No decurso dessa sessão foi ainda ouvida a testemunha OS… (comprador das moradias). Após, foi designada para continuação da audiência final o dia 24-10-2018 (data obtida em concertação com a agenda dos mandatários das partes presentes), tendo ainda sido determinado que se oficiasse, por forma expedita, à GNR de Sesimbra solicitando a junção aos autos do auto de notícia ou denúncia.
No dia 24-10-2018, foi realizada a última sessão da audiência final de julgamento, com as alegações orais por parte da mandatária da Ré, após o que foi encerrada a audiência final e determinado que os autos fossem conclusos a fim de ser proferida sentença.

Inconformada com o despacho de 11-10-2018, veio a Autora, em 19-10-2018, interpor o presente recurso de apelação, pugnando, na sua alegação de recurso, pela revogação do despacho recorrido e formulando as seguintes conclusões:
1.ª Considerando que:
a) Tal como acima se demonstra, os documentos juntos pela autora em 19.9.2018, são tempestivos posto que, a fase de julgamento só terminará em 24.10.2018.
b) O que, à luz do disposto no nº.2 do artigo 423º, do C.P.C e tal como considerado no aresto do “STJ” acima citado, são tempestivos.
c) Os documentos em causa referem-se quer ao objeto do processo quer aos temas de prova e consequentemente têm interesse para a decisão a proferir.
d) Sendo certo que, no caso, se trata de documentos particulares com força probatória vinculada tanto mais que a Ré não apresentou qualquer incidente de falsidade.
e) Mesmo que por hipótese de raciocínio se entenda que tal ónus de exceção de prova pertence à Ré, a autora tem o direito de produzir tal prova.
f) Tal como acima se referiu e consta do acórdão citado, este entendimento põe em causa o direito constitucionalmente consagrado quanto à tutela jurisdicional efetiva a que se refere o artigo 20º, da CRP bem como o R, despacho proferido, nos termos em que o foi, constitui um pré juízo do julgador quanto ao mérito da causa ao afastar documentos que são importantes para a decisão e no R, despacho diz-se exatamente o oposto.
g) Tratando-se de pedido legal e tempestivo, deveria a M.ª Juiz ter ordenado a junção dos documentos, embora sujeitos a tributação posto que não entendeu a justificação apresentada para o efeito.
2.ª Para instrução do recurso, requer a passagem e junção de certidão dos seguintes documentos:
i) Petição inicial.
ii) Contestação
iii) Resposta de 20.11.2017
iv) Requerimento de 19.9.2018 com os documentos.
v) Requerimento da Ré de 19.9.2018
vi) Despacho recorrido.
3.ª A R. decisão recorrida violou no entendimento da A., as seguintes normas:
a) Do CPC
- Artigo 413.-º,417º e 423 nº.2.º do CPC, Tal como considerado no R, acórdão acima parcialmente transcrito, poderá estar em causa ainda o direito à tutela jurisdicional efetiva a que se refere o artigo 20º, da C.R.P, de acordo com o entendimento daquele Vdº Tribunal superior.;
b) Da CRP:
Artigo 20º, quanto à violação do direito à tutela jurisdicional efetiva”.

Foi apresentada, em 02-11-2018, alegação de resposta pela Ré, defendendo que se mantenha a decisão recorrida e formulando as seguintes conclusões:
1. Insurge-se a Recorrente contra o despacho proferido na supra identificada sessão de julgamento (e não no despacho saneador como erradamente se refere no cabeçalho do requerimento da Recorrente), na parte em que indeferiu a junção aos autos de um conjunto de documentos, juntos pela Recorrente por requerimento de 19.09.2018.
2. Para sustentar a sua posição, a Recorrente apela a um conjunto de argumentos que, de tão frágeis, se encontram votados ao insucesso.
3. Desde logo, começa a Recorrente por apresentar uma “Questão Prévia”, ao abrigo da qual apresenta a cronologia dos “agendamentos” do julgamento, incorrendo num manifesto equívoco na medida em que, como resulta evidente das actas das sessões de julgamento, não houve qualquer “reagendamento”.
4. O que sucedeu foi que a audiência de julgamento se iniciou em 17.09.2018 e que, por contingências relativas à prova documental, foi necessário designar data para a sua continuação - 11.10.2018 (quando foi proferido o despacho ora em crise).
5. Mas os equívocos da Recorrente sucedem-se ao invocar que “e) Entre a data referida na alínea “C” antecedente e a junção dos documentos pela autora – 19.9.2018, mediou um prazo superior a 20 dias.”: sendo a data referida em “C” o dia 17.09.2018, data da primeira sessão de julgamento, desconhecemos qual o cálculo a que a Recorrente deitou mão para concluir que entre 17.09.2018 e 19.09.2018 mediou mais de 20 dias...
6. Mas a mais caricata conclusão que a Recorrente retira é a de que “o prazo que releva para o efeito do disposto no n.º 2 do art.º 423.º do . . a data do encerramento da audiência – após as alegações.”
7. Cremos que só mesmo um prodigioso raciocínio criativo poderia conduzir a tal afir-mação, mediante uma letra da lei absolutamente clara: os 20 dias a que se reporta o n.º 2 do art.º 423.º do C.P.C. são os 20 dias anteriores à data em que se realize a audiência final, e não a data da sua conclusão como, num fraco malabarismo jurídico, a Recorrente pretende fazer crer.
8. Aliás, tal conclusão, tem tanto de absurdo como de ilógico e apenas demonstra uma manifesta ignorância da intenção do legislador ao determinar tal prazo, bem como da regra que decorre do n.º 1 do mesmo artigo.
9. A intenção do legislador foi a de, 20 dias antes do início da audiência final, ter consolidada toda a prova documental carreada para os autos pelas partes.
10. Também de forma não menos curiosa e em abono da sua inventiva tese, a Recorrente convoca um Acórdão do STJ de 13.02.2007 - ou seja, anterior à reforma do C.P.C. de 2013 que levou à redacção do preceito em causa - e proferido ao abrigo da versão do C.P.C. de 1961 que, de facto, permitia a junção de documentos até ao encerramento da discussão em 1.ª instância (art.º 523.º, n.º 2 do C.P.C.), pelo que tal decisão superior não poderá servir de orientação na presente data.
11. Sob o ponto B) do requerimento de recurso, a Recorrente debruça-se sobre o objecto do litígio e os temas da prova, bem como sobre o teor dos documentos, quando o que está em causa é a possibilidade da sua junção, pelo que nada do que ali se expõe pode ser atendido.
12. Não obstante, não se pode deixar de fazer notar a  posição violadora dos mais elementares deveres de correcção e urbanidade para com o Tribunal e a própria Recorrida ao afirmar que esta última “fez uma interpretação truncada da lei” e que aquele aderiu “sem interpretar a norma do art.º 423.º, n.º2”, colocando em causa a imparcialidade deste Tribunal de forma absolutamente infundada.
13. Donde, não pode a Recorrida deixar de repudiar tal entendimento dado que, quer o Tribunal, quer a própria, se limitaram a interpretar correctamente a norma jurídica em causa.
14. Por fim, na página 10 das suas alegações, a Recorrente ainda consegue extrapolar o limite da criatividade já demonstrada ao invocar artigos do C.C. relativos a documentos autênticos e com fora probatória plena, o que, não sendo manifestamente o caso, não têm qualquer aplicação e mais não são do que mais uma tentativa falhada de a Recorrente fazer valer uma pretensão que não tem a mínima sustentação no direito adjectivo em vigor.

Em 13-01-2019, veio a Autora/Apelante apresentar requerimento, que, no formulário do Citius, classificou como “Articulado superveniente”, com o seguinte teor:
DG…, LDA, Apelante nos autos à margem, por seu advogado, vem, perante V. Ex.ªs, nos termos do disposto no art.º 425.º, 426.º e 651.º do CPC, expor e requerer o seguinte:
Dispõe o artigo 651.º do CPC:
Artigo 651.º - Junção de documentos e de pareceres
1 - As partes apenas podem juntar documentos às alegações nas situações excecionais a que se refere o artigo 425.º ou no caso de a junção se ter tornado necessária em virtude do julgamento proferido na 1.ª instância.
2 - As partes podem juntar pareceres de jurisconsultos até ao início do prazo para a elaboração do projeto de acórdão.
Ora, o apelante requer a junção aos autos de Um documento, equiparado, no caso a “Parecer” (Neste sentido acórdão do TRP de 6.1.2005: JTR0003/7553.dgsi.net citado por ABILIO NETO – Novo CPC – Anotado – Jan/2014 em anotação ao art.º 651.º - Pág. 803), sendo:
Acórdão proferido pelo V.do Tribunal da Relação do Porto com data de 15.11-2018, no processo 11465/17.1T8PRT-B.P1
O documento em causa, tal como se verifica do seu núcleo factual e jurídico, é exatamente o do Recurso em analise nos presentes autos, com diferente decisão jurídica.
4º. O documento cuja junção ora se requer, encontra-se abrangido pela norma excecional do artigo 425º, e 651.º, n.º 1 e 2 do CPC, equiparado, no caso, a parecer e que pode ser junto aos autos até ao início do prazo para a elaboração do projeto do acórdão e que se afigura importante e relevante para a decisão do mérito do recurso até em face do que dispõe o nº. 1 do artigo 662º, do C.P.C, tratando-se, no caso, de documento superveniente e inexistente à data do julgamento em primeira instância.
5º. Como também o citado documento é posterior à apresentação pelo apelante das suas alegações de recurso, conforme se verifica dos autos, apresentadas em 19.10.2018, a justificar assim a sua admissão, também à luz do disposto no artigo 425.º do CPC, posto que posterior quer à data do encerramento da discussão em primeira instância quer à data da apresentação das alegações de recurso e que se mostra necessário pela sua relevância na analise da prova e na aplicação do direito ao caso em concreto e que se tornou necessário em face da sua publicação e conhecimento em data posterior) à sentença recorrida e à apresentação do recurso de apelação.
Em face do exposto, perante a importância e relevância do citado documento requer a V. Exªs, que se dignem ordenar a junção aos autos do dois documento ora junto que decidiu a mesma questão do recurso nos autos no sentido em que o apelante sustenta no recurso apresentado.
Juntou cópia do referido acórdão recolhido, em 11-01-2019, da página www.dgsi.pt.
Em 25-01-2019, a Ré pronunciou-se a respeito deste requerimento, nos seguintes termos:
“1. Atento o formulário Citius, a A. define o seu requerimento como um articulado superveniente, pela processual cujos termos de admissibilidade são definidos nos artigos 588.º e 589.º do C.P.C.
2. Conforme decorre de tais preceitos legais, o articulado superveniente serve para alegar factos supervenientes, podendo ser deduzidos até ao encerramento da discussão.
3. Ora, por reporte ao caso em apreço, não só a A. não vem alegar quaisquer factos novos, como a discussão da causa se encontra encerrada, tendo a sentença sido proferida.
4. Donde, como articulado superveniente, jamais o requerimento da A. poderia ser admitido.
5. Porém, atentando ao corpo o requerimento, temos que a A., afinal já na qualidade de Apelante, vem, sim, proceder à junção de um Acórdão de 15.11.2018, o qual equipara a um parecer, escudando-se nos artigos 425.º, 426.º e 651.º do C.P.C.
6. Desde logo, só a prodigiosa imaginação da A., já manifestada anteriormente, poderá levá-la a afirmar que procede à junção de um “documento”.
7. Com o requerimento a que ora se responde, a A. pretende que seja admitida a junção de um Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 15.11.2018.
8. Note-se, desde já, que um Acórdão não pode servir para a prova de qualquer facto em discussão nestes autos, além de que proceder à sua junção equivale a subvalorizar a capacidade e o conhecimento dos Venerandos Desembargadores em relação à sua existência.
9. Por outro lado, tal Acórdão cuja junção se pretende versa sobre o tema do momento até ao qual é admitida a apresentação de documentos – ou seja, a matéria que motivou o recurso da A., sobre o despacho de não admissão dos documentos, interposto em 19.10.2018.
10. Alega a A. que o referido Acórdão apenas pôde ser agora junto atenta a data da sua prolação – 15.11.2018 -, mas a verdade é que veio a ser junto apenas em 13.01.2019.
11. Por fim, é manifesto que não se trata de “documento” necessário à aplicação do direito, dado que, como se disse, afirmá-lo equivale a menosprezar a capacidade de análise, pesquisa e conhecimento dos Venerandos Desembargadores.
12. Face ao exposto, requer-se a sua não admissão e respectivo desentranhamento”.

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

***

II - FUNDAMENTAÇÃO

Como é consabido, as conclusões da alegação do recorrente delimitam o objeto do recurso, ressalvadas as questões que sejam do conhecimento oficioso do tribunal (artigos 635.º, n.º 4, e 639.º, n.º 1, do CPC).
Face ao teor das conclusões da alegação de recurso, identificamos as seguintes questões a decidir:
1.ª) Questão prévia - Se deve ser admitida a junção de cópia de um acórdão requerida pela Apelante após a apresentação da sua alegação de recurso;
2.ª) Se devia ter sido admitida a junção documental (25 documentos) requerida pela Apelante em 19-09-2018.

Questão prévia
Após ter apresentado a sua alegação de recurso nos presentes autos (em 19-10-2018), a Apelante veio requerer, em 13-01-2019, a junção de cópia de um acórdão, proferido em 15-11-2018.
A Apelada opôs-se, aduzindo os argumentos acima reproduzidos.
Vejamos.
Em primeiro lugar, é óbvio que não se está perante articulado superveniente, nos termos dos artigos 588.º e 589.º do CPC, sendo irrelevante a classificação feita pela Apelante ao preencher o formulário do Citius.
A Apelante invoca, aliás, o disposto nos artigos 425.º, 426.º e 651.º do CPC, sendo à luz destes normativos que importa enquadrar o requerimento em questão.
Preceitua o art. 651.º do CPC que:
“1 - As partes apenas podem juntar documentos às alegações nas situações excecionais a que se refere o artigo 425.º ou no caso de a junção se ter tornado necessária em virtude do julgamento proferido na 1.ª instância.
2 - As partes podem juntar pareceres de jurisconsultos até ao início do prazo para a elaboração do projeto de acórdão”.
Por seu turno, o art. 425.º do CPC estabelece: “Depois do encerramento da discussão só são admitidos, no caso de recurso, os documentos cuja apresentação não tenha sido possível até àquele momento”.
Como é consabido, os documentos são, por definição, meios de prova de factos; destinam-se a fazer prova dos fundamentos (dos factos necessitados de prova) da ação ou da defesa (cf. artigos 410.º e 423.º, n.º 1, do CPC).
É, pois, evidente que, no presente processo, o referido acórdão não pode ser considerado um documento. A finalidade da junção requerida não é a de provar um qualquer facto (mormente, tendo em conta o objeto do recurso, fazer a prova a que se refere a parte final do n.º 2 do art. 423.º do CPC), mas apenas a de convencer da bondade da posição jurídica defendida na alegação de recurso.
Aliás, a Apelante reconhece isso mesmo, tanto assim que defende a equiparação do dito acórdão a um parecer, com vista a prevalecer-se do disposto no art. 426.º do CPC, nos termos do qual: “Os pareceres de advogados, professores ou técnicos podem ser juntos, nos tribunais de 1.ª instância, em qualquer estado do processo.”
Porém, um acórdão também não pode ser considerado um parecer.
É verdade que, na prática forense, nos deparamos frequentemente com a indicação, nas alegações de recurso, de acórdãos (ou outras decisões judiciais), de que são, por vezes, também juntas cópias, em alternativa à sua incorporação ou reprodução no corpo das alegações. Uma tal prática é aceitável, tendo a vantagem de permitir que a peça processual seja mais escorreita. No fundo, é uma questão de estilo, funcionando a junção de tais decisões judiciais como um anexo ou complemento da própria peça processual, mas, ainda assim, parte integrante da mesma.
Todavia, de forma alguma se poderá aceitar que, como pretende a Apelante, após a apresentação da alegação de recurso, a mesma seja complementada ou desenvolvida com ulterior requerimento dando conta de jurisprudência, ainda que “objetiva ou subjetivamente” superveniente.
Neste sentido, veja-se o acórdão do STJ de 02-02-2010, na Revista n.º 942/07.2TVPRT.S1 - 1.ª Secção, cujo sumário, disponível em www.stj.pt, citamos, pelo seu interesse: “Um acórdão da Relação não constitui nem cumpre a função específica de um verdadeiro documento, que é a de servir de meio de prova de determinados factos que possam constituir fundamento da acção ou da defesa – cf. art. 523.º, n.º 1, do CPC – e não pode ser considerado como parecer – cf. arts. 525.º e 706.º, n.º 2, do CPC –, razão pela qual deve ser indeferida a sua junção, como documento superveniente, após a apresentação das alegações da apelação”. 
Destarte, deverá ser desentranhado dos autos, por legalmente inadmissível, o acórdão/“documento” apresentado no requerimento de 13-01-2019 e a Apelante condenada em multa, afigurando-se ajustado o valor de 1 UC (artigos 443.º, n.º 1, CPC e 27.º, n.º 1, do RCP).

Da admissibilidade da junção documental requerida em 19-09-2018
Recordemos que documentos são esses, nas palavras da Apelante:
a) Documento 2, comprovativo de que ainda a esta data a Autora tem celebrado com a Ré, contrato de seguro das 11 moradias (são faturas/recibo de pagamento de prémios de seguros datadas de fevereiro e março de 2018);
b) Documentos 3 a 7, para demonstrar que, contrariamente à fotografia junta com o n.º 16 a que a testemunha da Ré se referiu no depoimento, existem ligações de canalização e de eletricidade no móvel constante de tal fotografia (são 5 fotografias, duas do espaço debaixo de lava-louça de cozinha, outras duas com duas tomadas elétricas e tubos, e uma bancada de cozinha onde são visíveis, ao lado do lava-louça, uma máquina de lavar roupa e outra de secar);
c) Documentos 8 a 18, comprovativo da aquisição das cozinhas completas aquando da conclusão da obra no condomínio (11 faturas datadas de 2007 e a última de 2009, relativas à aquisição à Míele de diverso equipamento de cozinha);
d) Documentos 19 a 25, em complemento dos documentos juntos pela Ré como doc. 9, comprovativos da aquisição dos objetos furtados, aquando do furto ocorrido em 2011 e de que foi parcialmente recuperado conforme consta dos documentos nos autos (2.ªs vias de faturas de 2011 e 2012 relativas à aquisição à Míele de diverso equipamento);
e) O documento 26, comprova o valor unitário dos esquentadores objeto de sinistro, a esta data (mensagem de email, enviada por Sesigás, em resposta a email de JP…, de 18-09-2019, com orçamento de esquentador).
Sustenta a Apelante que a junção requerida foi tempestiva, porquanto a fase de julgamento só terminará em 24-10-2018, conforme disposto no n.º 2 do artigo 423.º do CPC e tal como considerado no aresto do STJ de 13-02-2007 em que foi Relator o Juiz Conselheiro Sebastião Póvoas. Portanto, na perspetiva da Apelante, a junção, efetuada em 19-09-2019, é tempestiva, uma vez que a audiência final ainda estava a decorrer (estava até agendada a continuação para a data em que foi proferido o despacho recorrido).
Invocou o referido acórdão do STJ, embora não tendo o cuidado de indicar a fonte, nem sequer o n.º do processo, mas, pela pesquisa efetuada, verificámos tratar-se do agravo n.º 4496/96, da 1.ª Secção, estando o acórdão disponível para consulta em www.dgsi.pt, e o respetivo sumário em www.stj.pt, de que de passamos a citar o trecho que importa:
(…) II - Se o documento não é oferecido com o articulado, poderá ser apresentado até ao encerramento da discussão em 1.ª instância ou, no recurso, até ao início da fase dos vistos.
III - Então, o apresentante tem de alegar, e demonstrar, a impossibilidade de junção tempestiva, que pode ser objectiva (inexistência do documento no momento anterior) ou subjectiva (ignorância sobre a existência do texto ou impossibilidade de a ele aceder, aqui, mau grado o disposto no art. 531.º do CPC.
IV - Se o documento é, face ao demonstrado, oferecido em momento oportuno, há que emitir um juízo sobre a sua necessidade ou pertinência.
V - A discussão da causa em 1.ª Instância encerra-se - em termos de relevar para os efeitos do n.º 2 do art. 523.º - após os debates a que se refere o n.º 5 do art. 652.º do CPC. 
Ora, esta jurisprudência não pode ser transposta para a atualidade, em que vigora o Código de Processo Civil, aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de junho, que pretendeu alterar o modelo até então vigente.
Importa ter presente o disposto no art. 423.º do CPC:
“1 - Os documentos destinados a fazer prova dos fundamentos da ação ou da defesa devem ser apresentados com o articulado em que se aleguem os factos correspondentes.
2 - Se não forem juntos com o articulado respetivo, os documentos podem ser apresentados até 20 dias antes da data em que se realize a audiência final, mas a parte é condenada em multa, exceto se provar que os não pôde oferecer com o articulado.
3 - Após o limite temporal previsto no número anterior, só são admitidos os documentos cuja apresentação não tenha sido possível até àquele momento, bem como aqueles cuja apresentação se tenha tornado necessária em virtude de ocorrência posterior”.
A propósito deste preceito legal, veja-se a Exposição de Motivos da Proposta de Lei n.º 113/XII (PL 521/2012, de 22-11-2012), que esteve na génese da referida Lei n.º 41/2013: “Em consonância com o princípio da inadiabilidade da audiência final, visando disciplinar a produção de prova documental, é estabelecido que os documentos podem ser apresentados até 20 dias antes da data em que se realize a audiência final, assim se assegurando o oportuno contraditório e obviando a intuitos exclusivamente dilatórios”.
Como afirmam Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, in “Código de Processo Civil Anotado”, Volume I, Almedina, pág. 499, o CPC de 2013 introduziu alterações relevantes em sede de apresentação de prova documental, visando contrariar uma certa tendência (…) traduzida em protelar a junção de documentos para o decurso da audiência final. Os efeitos negativos que isso determinava, com o arrastamento das audiências e a perturbação do decurso dos depoimentos, levou o legislador a adotar uma solução mais rígida, sem que daí resulte, todavia, prejuízo para a descoberta da verdade.
Assim, tendo em conta a letra da lei e a sua ratio, como emerge da passagem citada, o sentido da expressão “até 20 dias antes da data em que se realize a audiência final” é, em nosso entender, até à data em que efetivamente se inicie a audiência final. Ante a possibilidade de a data inicialmente designada para audiência final ser dada sem efeito (como sucedeu no presente processo) ou de adiamento propriamente dito da audiência (cf. art. 603.º do CPC), a data a considerar é a data concreta em que a audiência final se venha a iniciar/realizar.
A nosso ver, o sentido da norma não é o de permitir a “livre junção documental” (ainda que com eventual condenação em multa) até 20 dias antes da data em que se encerre a audiência final ou até 20 dias antes da data em que se conclua uma sessão da mesma.
Este entendimento, que nos parece ser maioritário, na doutrina e na jurisprudência, encontra, aliás, paralelismo com o que foi defendido na vigência do anterior Código de Processo Civil relativamente ao art. 512.º-A, que previa a possibilidade de aditamento ou alteração do rol de testemunhas até 20 dias antes da data em que se realizasse a audiência de julgamento.
Reconhecendo este paralelismo, Paulo Ramos de Faria e Ana Luísa Loureiro, referem a respeito do regime do n.º 2 do art. 423.º do CPC tratar-se de densificação de “uma regra de estabilização dos meios de instrução a partir do vigésimo dia que antecede a audiência final” - in “Primeiras Notas ao Novo Código de Processo Civil”, 2014, 2.ª edição, Almedina, pág. 370.
Em sentido em parte coincidente com o que defendemos pronunciam-se Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, obra citada, pág. 499 (sublinhado nosso): “A teleologia do preceito, que visa evitar a perturbação resultante da apresentação extemporânea de documentos, leva-nos a considerar que o limite para a sua apresentação (e também para a alteração do rol de testemunhas, ao abrigo do art. 598º, nº 2, com semelhante redação) tem como referência a data designada para a audiência final ou para a primeira sessão, independentemente de qualquer adiamento ou continuação (neste sentido, reportando-se à alteração do rol de testemunhas admitida pela norma do art. 598º, nº 2, cf. Paulo Pimenta, Processo Civil Declarativo", 2ª ed., p. 327, e RP 12-5-15, 7724/10).”
Discordamos destes autores apenas na desconsideração que fazem do adiamento da audiência final (embora irrelevante para o caso em apreço). E nesta discordância estamos acompanhados por Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, in “Código de Processo Civil Anotado”, Volume 2.º, 3.ª edição, Almedina, pág. 241:
“O cômputo do prazo do n.º 2, idêntico ao estabelecido para o aditamento ou alteração do rol de testemunhas (art. 598-2), está sujeito às regras gerais dos arts. 138 a 140, (…). A razão de ser do prazo estipulado (a preparação, nas melhores condições, da audiência final) conduz a esta interpretação.
Não se realizando a audiência na data designada, o prazo conta em função da nova data, pois o que importa é a data em que a audiência se realiza e não aquela em que era suposto realizar-se.”
E mais adiante, na pág. 675, em anotação ao art. 598.º: “O n.º 2 permite o adiamento ou a alteração (…) do rol de testemunhas até 20 dias antes da data em que efetivamente se realize a audiência final. A fixação duma primeira data, havendo depois adiamento da audiência, ainda que depois de aberta, nos termos do art. 151-4 ou do art. 603-1, ou a suspensão da instância, nos termos do art. 269, não releva para o efeito, uma vez verificado o adiamento ou a suspensão”.
Referem-se, pois, estes autores, se bem interpretamos a sua posição, apenas aos casos de adiamento, em que não chegou, pelas razões previstas nos citados normativos ou em virtude da suspensão da instância, a iniciar a prática de atos previstos no n.º 3 do art. 604.º do CPC.
Admitimos que possam também ser abrangidas pelo preceito (sendo, pois, de admitir a junção documental) certos casos de anulação da audiência final: se a audiência final tiver sido anulada, porque não foi adiada quando o devia ter sido; se houver uma anulação parcial do julgamento para ampliação da matéria de facto (tendo sido impugnado com êxito o despacho que inferiu uma reclamação apresentada relativamente ao despacho de enunciação dos temas da prova, com o aditamento de novo tema da prova – cf. art. 596.º, n.º 3, do CPC).
Não falta, é certo, quem defenda a possibilidade de junção documental até 20 dias antes do início de uma das sessões da audiência final. Neste sentido, veja-se o acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 15-11-2018, no processo n.º 11465/17.1T8PRT-B.P1, disponível em www.dgsi.pt, em cujo sumário se afirma: O prazo limite para a apresentação de documentos (bem como o da alteração do rol de testemunhas) tem por referência não a data inicialmente designada para a audiência final mas a data da efetiva realização da audiência, quer haja adiamento ou continuação da audiência).
Pensamos, todavia, tratar-se de posição minoritária, que não se coaduna com o espírito da norma, nem com o princípio da continuidade da audiência (cf. art. 606.º do CPC), potenciando o risco de manobras dilatórias para atrasar a conclusão da audiência final e até a necessidade de reinquirição das partes/testemunhas já ouvidas em anteriores sessões a fim de serem confrontadas com os novos documentos, sendo certo que, com o novo regime de junção documental consagrado no CPC de 2013 se pretendeu, precisamente, contrariar o risco de tal acontecer, limitando-se, pois, a possibilidade de apresentação de documentos no decurso da audiência final (até ao encerramento da discussão) às situações previstas no n.º 3 do art. 423.º do CPC, que adiante iremos analisar.
Transpondo a interpretação normativa que defendemos para o caso dos autos, concluímos que, pese embora a data inicialmente designada tenha sido o dia 7 de março de 2018, apenas releva, para contagem do referido limite temporal de 20 dias, o dia 17 de setembro de 2018.
A junção documental foi posterior, não sendo de admitir por via do n.º 2 do citado art. 423.º do CPC, conforme se entendeu no despacho recorrido.
 
Importa então analisar se estamos perante a situação do n.º 3 do art. 423.º, nos termos do qual só são admitidos os documentos:
- Cuja apresentação não tenha sido possível até àquele momento;
- Ou aqueles cuja apresentação se tenha tornado necessária em virtude de ocorrência posterior.
A Autora/Apelante justificou a junção, alegando que “os documentos ora em causa para além do documento 1, justificam-se em face do depoimento produzido pela testemunha da Ré e que fez a vistoria ao local e que em tal depoimento tentou demonstrar que nem sequer havia ligação de água e de luz para as máquinas bem como para prova quer do objeto do litígio quer dos temas de prova”.
Quanto ao sentido da expressão legal “documentos cuja apresentação não tenha sido possível até àquele momento”, explicam Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, que, ultrapassado o limite temporal do n.º 2 do art. 423.º, “apenas são admitidos documentos não tenha sido possível, atenta a verificação de um impedimento que não pôde ser ultrapassado em devido tempo, ou quando se trate de documentos objetiva ou subjetivamente supervenientes, isto é, que apenas foram produzidos ou vieram ao conhecimento da parte depois daquele momento.” - Obra citada, pág. 499.
Paulo Ramos de Faria e Ana Luísa Loureiro precisam que “atualmente, na norma de dilação prevista no nº 3, esse impedimento (que se prolongou para além do prazo previsto no nº 2) apenas legitima a apresentação imediata, logo que cesse a impossibilidade de apresentação, não podendo a parte aguardar pelo derradeiro momento pressuposto pela norma de dilação – o encerramento da discussão em primeira instância (art. 425.º).” – Obra citada, pág. 370 (sublinhado nosso).
Ora, a Autora, nem no requerimento em apreço, nem na sua alegação de recurso, alegou fosse o que fosse no sentido de justificar a impossibilidade de apresentação dos documentos em momento anterior (isto é, até 20 dias antes do dia 17 de setembro de 2018), nem isso se pode retirar dos documentos em questão, conforme se referiu no despacho recorrido (apenas o último tem data posterior, mas nada permite considerar que não podia ter sido obtido e apresentado antes), pelo que fica afastada a primeira situação.
Passamos, pois, a apreciar se, no caso em apreço, a apresentação dos documentos se tornou necessária em virtude de ocorrência posterior, como parece ser a posição da Autora/Apelante.
Será que o depoimento de testemunha pode configurar ocorrência posterior? Parece-nos que se perante um depoimento testemunhal, que incidisse sobre a matéria de facto dos temas da prova, pudessem, sem mais, ser apresentados documentos com o propósito de contrariar a credibilidade do mesmo, então estaríamos, passe a expressão, “a deixar entrar pela janela o que não se quis deixar entrar pela porta”. E isto até de forma mais vantajosa para a parte, que assim nem teria de pagar qualquer multa. Note-se que a razão de ser da não previsão de pagamento da multa no n.º 3 do artigo 423.º do CPC é precisamente a de que não se justifica sancionar a parte por algo que a ultrapassa: trata-se de apresentar um documento que não tinha podido obter até àquele momento ou um documento cuja junção não era necessária, mas passou a ser.
Portanto, em nosso entender, a “ocorrência posterior” não se pode bastar com uma mera intenção de contrariar a força probatória de documentos juntos aos autos com os articulados ou de descredibilização do depoimento de testemunha (aliás, para isto também existe a contradita, conforme se referiu no despacho recorrido).
Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa apontam, exemplificando, para a necessidade de uma averiguação casuística da natureza da “ocorrência posterior”. Mas acrescentam que “não respeitará, por certo, a factos que constituam fundamento da ação ou da defesa (factos essenciais, na letra do art. 5.º), pois tais factos já hão-de ter sido alegados nos articulados oportunamente apresentados ou, pelo menos, por ocasião da dedução de articulado de aperfeiçoamento (art. 590º, n.º 4). Tão pouco respeita a factos supervenientes, pois a alegação desses factos deve ser acompanhada dos respetivos documentos, sendo esse o meio da sua entrada nos autos (art. 588º, n.º 5). Portanto, no plano dos factos, a ocorrência posterior dirá somente respeito a factos instrumentais ou a facto relativo a pressupostos processuais (…)
Por outro lado não deve confundir-se esta figura com regimes específicos de junção de documentos, nomeadamente para instruir a impugnação de testemunhas (art. 515º) ou a contradita (art. 522º), bem assim a impugnação da genuinidade de documento (art. 445º, nºs 1 e 2) ou a ilisão da autenticidade ou da força probatória de documento. O sentido destas e doutras disposições é o de evitar que, por meios artificiosos, sejam introduzidos no processo documentos para além do momento fixado pelo legislador ou segundo critérios diversos dos definidos para tal.
Ou seja, não podem criar-se artificialmente eventos ou incidentes cujo objetivo substancial seja tão só o de inserir nos autos documentos que poderiam e deveriam ser apresentados em momento anterior, sob pena de frustração do objetivo disciplinador fixado pelo legislador e, assim, da persistência de uma prática que se quis assumidamente abolir.” – Obra citada, pág. 499.
Paulo Ramos de Faria e Ana Luísa Loureiro referem, a respeito da junção documental que se “tenha tornado necessária em virtude de ocorrência posterior”, destinar-se nomeadamente à prova ou contraprova de factos ocorridos após o termo do prazo previsto no número anterior. Acrescentando que a “apresentação não se torna necessária em virtude de ocorrência posterior quando uma testemunha alude a um facto, ainda que em sentido contrário ao pretendido pelo apresentante, se se tratar de um facto essencial já alegado – ou de um facto puramente probatório”- obra citada, pág. 370.
A jurisprudência a este respeito é, parece-nos, mais pacífica. Veja-se, a título exemplificativo, o acórdão da Relação de Lisboa de 06-12-2017, proferido no processo n.º 3410-12.7TCLRS-A.L1-6 , disponível em www.dgsi.pt, cujo sumário citamos, pelo seu interesse:
– O incidente da contradita visa questionar a credibilidade da própria testemunha, pondo em causa a sua isenção e a fé que possa merecer, ou seja a fonte do seu conhecimento e não directamente a veracidade do seu depoimento.
– A pretensão do A. de junção de documentos, finda uma sessão de audiência de julgamento, alegando, como fundamento dessa junção, a “contra prova do invocado” na sequência do depoimento de testemunha que depusera nessa sessão, não se integra no incidente de contradita, ainda que este fosse temporalmente admissível.
– A junção de documentos é admissível nos prazos previstos no artº 423 do C.P.C., que permite a junção em três momentos distintos: a) com o articulado respectivo, sem cominação de qualquer sanção; b) até 20 dias antes da data em que se realize a audiência final, mas com cominação de multa, excepto se a parte alegar e provar que os não pode oferecer antes; c) até ao encerramento da discussão em 1ª instância, mas apenas daqueles documentos cuja apresentação não tenha sido possível até aquele momento ou se tornem necessários por virtude de ocorrência posterior.
– Cabe à parte que pretende a junção de documento alegar e demonstrar que a sua apresentação não foi possível até àquele momento, ou que a sua apresentação só se tornou possível em virtude de ocorrência posterior.
– Os meios de prova, qualquer que seja a sua natureza, destinam-se à instrução da causa, a qual “tem por objeto os temas da prova enunciados ou, quando não tenha de haver lugar a esta enunciação, os factos necessitados de prova.”
– O depoimento de testemunhas arroladas nos autos não constitui ocorrência posterior para efeitos de apresentação de documentos não juntos aos autos, com fundamento na parte final do nº3 do artº 423 do C.P.C.
No acórdão da Relação de Lisboa de 25-09-2018, proferido no processo n.º 744/11.1TBFUN-D.L1-1, disponível em www.dgsi.pt, avançou-se com a ideia de relacionar a “ocorrência posterior” com a dinâmica do desenvolvimento do próprio processo, designadamente tendo em vista a dialética que se desenvolve durante o processo de produção de prova no julgamento da causa, afirmando-se que “consistirá, na generalidade dos casos, na revelação de factos instrumentais, complementares ou concretizadores”. Concordamos que a ideia-chave a reter é a de revelação, no sentido de que deverá existir um elemento de novidade, mormente por se prefigurar, em resultado da instrução, nova factualidade instrumental idónea a suportar presunções judiciais, complementar ou concretizadora de factos essenciais (integrantes da causa de pedir ou de exceções oportunamente deduzidas).
Ora, referindo a Autora que os documentos em causa se destinam a fazer prova do objeto do litígio e dos temas da prova, nada de novo existe, sendo inócua essa afirmação. Na verdade, o objeto do litígio, por definição (isto é, o pedido, incluindo a reconvenção, se a houver, respetiva causa de pedir e exceções juridicamente enquadradas), não é passível de prova. Sendo certo que os documentos servem, por definição, para prova (ou contraprova) da matéria dos temas da prova. Sendo impertinentes ou desnecessários, justificar-se-á o seu desentranhamento – cfr. art. 443.º do CPC.
Ora, volvendo ao caso sub judice, é seguro afirmar relativamente ao documento 2 que o mesmo não tem nenhuma relação com o depoimento testemunhal, não tendo sido alegada pela Autora nenhuma razão para que a sua junção se tivesse tornado necessária em virtude de ocorrência posterior. Sublinhamos que não se discute nos presentes autos o pagamento, muito menos, com referência ao ano 2018, dos prémios dos contratos de seguros. Portanto, era impertinente e desnecessária a junção desse documento.
Quanto aos demais documentos, alegando a Autora/Apelante que servem para prova da matéria dos temas da prova, então, nessa perspetiva, a respetiva junção já seria necessária, pelo menos logo após a Contestação da Ré, considerando o teor da mesma, bem como os documentos que foram juntos. Tratam-se de fotografias (documentos 3 a 7) e outros documentos (faturas atinentes à aquisição do equipamento alegadamente furtado e um orçamento com o valor de um esquentador) que, segundo a própria Autora, apenas serviriam para prova dos factos controvertidos alegados na Petição Inicial. Logo, não foi sequer alegado pela Autora que com esses documentos pretendia fazer prova (ou contraprova) de novos e relevantes factos (instrumentais, complementares ou concretizadores) que apenas tivessem resultado da instrução da causa.
Aliás, a Autora, aquando da propositura da ação, já conhecia a posição da Ré, da qual lhe tinha sido dado conhecimento na carta junta com a Petição Inicial, nada permitindo considerar que a apresentação dos documentos em apreço apenas se tornou necessária em virtude do depoimento da testemunha BM…, uma vez que este incidiu (nem a Autora diz o contrário) sobre a matéria de facto controvertida a que se referem os temas da prova.
Não é por essa testemunha ter declarado que efetuou uma vistoria ao local após a data do alegado furto e ter feito a descrição que fez do mesmo, com referência às fotografias juntas aos autos, que podemos considerar que se tornou necessária a apresentação de documentos efetuada pela Autora, para além do limite temporal que resulta do disposto no n.º 2 do art. 423.º do CPC.
Tanto basta para que tenhamos de afastar a aplicação ao caso do n.º 3 deste artigo.

Não significa isto que estejamos já em condições de concluir pela improcedência das conclusões da alegação de recurso, considerando que a Apelante invoca também o direito à prova, à luz do disposto no art. 20.º da CRP.
Na verdade, o Código de Processo Civil contém diversos preceitos legais que permitem “equilibrar” o regime consagrado no art. 423.º do CPC (e outros limites temporais/preclusões relativos a diversos meios de prova; veja-se, por exemplo, no caso da prova testemunhal, o disposto no art. 508.º do CPC), em que assume preponderância a consagração do princípio do inquisitório, no art. 411.º do CPC: “Incumbe ao juiz realizar ou ordenar, mesmo oficiosamente, todas as diligências necessárias ao apuramento da verdade e à justa composição do litígio, quanto aos factos de que lhe é lício conhecer.”
Assim, o Tribunal pode oficiosamente realizar ou ordenar uma qualquer diligência probatória (incluindo no tocante à prova documental), ao abrigo dos princípios do inquisitório e da cooperação, desde que a considere necessária ao apuramento da verdade e à justa composição do litígio (artigos 7.º, 411.º e 417.º do CPC).
Desta forma, quando se justifique, é possível, convocando estes normativos, obviar a eventuais iniquidades decorrentes dos mecanismos de preclusão, assim ficando assegurado o direito de acesso à justiça e à tutela jurisdicional efetiva e a um processo equitativo (artigos 20.º da CRP e 6.º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem).
Reconhecendo este equilíbrio, veja-se Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, afirmando que, apesar da rigidez para que o art. 423.º do CPC parece apontar, “em parte associada ao princípio da autoresponsabilidade das partes, o mesmo não pode deixar de ser compatibilizado com outros preceitos ou com outros princípios que justificam a iniciativa oficiosa do tribunal na determinação da junção ou requisição de documentos que, estando embora fora daquelas condições, sejam tidos como relevantes para a justa composição do litígio, à luz, pois, de um critério de justiça material, cabendo realçar em especial o princípio do inquisitório consagrado no art. 411º e concretizado ainda no art. 436º” – obra citada, pág. 501.
Mas, naturalmente, não poderá o referido princípio ser usado para colmatar toda e qualquer “falta” das partes a respeito da apresentação dos meios de prova, pois se assim fosse estaria a fazer-se do mesmo uma interpretação normativa e aplicação prática em colisão com outros importantes princípios, do processo civil e até constitucionais, mormente o dispositivo, a igualdade das partes, a independência do tribunal e a imparcialidade do juiz (20.º e 62.º da CRP).
Neste sentido, veja-se o acórdão da Relação de Lisboa de 04-10-2018, proferido no processo n.º 4046/16.9T8OER-D.L1, e o acórdão da Relação de Lisboa de 25-09-2018, proferido no processo n.º 744/11.1TBFUN-D.L1-1 (ambos disponíveis em www.dgsi.pt), citando-se o sumário deste último:
“I. O art.º 423º do CPC regula tão só e apenas o direito que assiste às partes de fazerem juntar ao processo documentos, independentemente da sua pertinência, da sua relevância e da apreciação do seu valor probatório;
II. Ele não invalida que a junção dos mesmos documentos possa ser ordenada pelo juiz ao abrigo dos poderes inquisitoriais previsto no art.º 411º do CPC;
III. É, aliás, essa possibilidade que afasta eventuais objecções de inconstitucionalidade, por violação da garantia do processo equitativo (fair trial), da norma do nº 3 do art.º 423º do CPC;
IV. As circunstâncias que tornam admissível a apresentação de documentos depois dos 20 dias que antecedem a audiência final têm de ser alegadas e provadas pela parte que pretende a junção do documento;
V. A impossibilidade da prévia apresentação haverá de ser apreciada segundo critérios objectivos e de acordo com padrões de normal diligência;
VI. A necessidade de apresentação deve surgir de uma circunstância posterior, ou seja, de uma circunstância que ocorra depois do vigésimo dia anterior à audiência final”.
O Tribunal recorrido teve em atenção esta última via para analisar da admissibilidade legal da junção requerida e pronunciou-se, lembramos, nos seguintes termos:
“Por último, e não obstante todas considerações já expostas (que sempre seriam suficientes para o indeferimento do requerido pela Autora), sempre se dirá que não se vislumbra qualquer interesse para a boa decisão da causa dos documentos cuja junção a Autora requereu, quer porque respeitam a matéria não controvertida (no caso do doc. 02), quer porque não permitem a prova dos factos pretendidos pela Autora (no caso dos documentos 03 a 26), designadamente pelo facto de dos mesmos não resultarem quais as frações a que respeitam”.
Ora, face ao que foi alegado pela Autora, nas conclusões da sua alegação de recurso, não vemos motivo para divergir deste entendimento.
Quanto ao documento 2, repetimos, não visa fazer prova de factos controvertidos relevantes para a decisão da causa.
O documento 26 não é necessário, considerando a data em que foi produzido e os documentos já juntos aos autos, designadamente o 11 junto com a P.I. e 3 junto com a Contestação.
Os documentos 3 a 7 são fotografias que não se sabe quando, nem onde, foram tiradas e os demais documentos são faturas que não permitem relacioná-las com as frações autónomas em apreço, não se podendo olvidar que a Autora é uma sociedade comercial que se dedica, ao que tudo indica, à atividade de construção, compra e venda de imóveis, não estando este Tribunal, tal como não estava o Tribunal recorrido, em condições de afirmar que tais documentos são necessários ao apuramento da verdade e à justa composição do litígio.
Aliás, as fotografias, para terem qualquer interesse, já deveriam ter sido tiradas à data dos factos, não se compreendendo que a Autora as não tivesse apresentado em data anterior, mormente tendo em conta a fotografia 16 junto com a Contestação. As faturas também já existiam à data da propositura da ação. Assim, não deixa de ser estranho que a Autora, invocando o direito a produzir prova, atribua agora aos documentos em apreço uma relevância que, ela própria, não viu em momento anterior, quando teria sido oportuno apresentá-los com vista à demonstração da matéria a que se referem os temas da prova.
Em face de tudo o exposto, também esta Relação não vislumbra que esses documentos se mostrem necessários para o apuramento da verdade, pelo que não merece censura a decisão recorrida.
Assim, improcedem as conclusões da alegação de recurso.

Vencida a Apelante, é responsável pelo pagamento das custas do presente recurso (artigos 527.º e 529.º, ambos do CPC).

***

III - DECISÃO
Pelo exposto, decide-se:
a) Não admitir a junção de “documento” requerida pela Apelante após a sua alegação de recurso, o qual deve ser-lhe restituído, mais se condenando a Apelante no pagamento de multa, no valor de 1 UC;
b) Negar provimento ao presente recurso e, em consequência, manter o despacho recorrido, condenando a Apelante no pagamento das custas do recurso.

D.N.

Lisboa, 06-06-2019
Laurinda Gemas
Gabriela Cunha Rodrigues
Arlindo Crua