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CONTRAORDENAÇÃO ESTRADAL
IDENTIFICAÇÃO DO CONDUTOR VEÍCULO INFRACTOR
NOTIFICAÇÃO DA LOCATÁRIA
NULIDADE PREVISTA NA AL. D) DO Nº 2 DO ARTº 120º DO CPP
Sumário
I) Tendo o titular do documento de identificação do veículo sido expressamente notificado nos termos do artº 171º, nº 5, do CE e não tendo identificado o condutor nem o locatário "no prazo de 15 dias úteis" que lhe foi fixado, já não poderá fazê-lo na fase de impugnação judicial da decisão administrativa de aplicação de coima e de sanção acessória.
II) É o que sucede no caso dos autos e, por isso, outra solução não se vislumbra que não seja a condenação da recorrente pela prática da contraordenação que lhe vem imputada.
III) A não ser assim decidido, criar-se-ia uma incoerência no regime jurídico que rege as infrações estradais pois permitiria ao proprietário vir indicar o condutor para além do prazo estabelecido na lei para o efeito, defraudando a intenção do legislador ao estabelecer na lei um prazo que ainda lhe permitiria agir contra o condutor.
Texto Integral
Acordam, em conferência, os Juízes na Secção Penal do Tribunal da Relação de Guimarães:
I. RELATÓRIO
- 1. ... – SUCURSAL EM PORTUGAL impugnou judicialmente a decisão administrativa da Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária, proferida a 14 de junho de 2016, que lhe aplicou a coima de € 74,82 (setenta e quatro euros e oitenta e dois cêntimos), pela prática de uma contraordenação prevista e sancionada nos termos do disposto no artº 60º, nº 1 do Regulamento de Sinalização do Trânsito, aprovado pelo Decreto-Regulamentar nº 22-A/98, de 01.10, bem como a sanção acessória de inibição de conduzir pelo período de 60 dias, substituída pela apreensão do veículo durante 60 dias, atendendo a que se trata de pessoa coletiva.
Por sentença datada, lida e depositada a 26 de novembro de 2018 (fls. 55, 56 e 57), nestes autos de recurso de contraordenação nº 293/18.7T8CMN, que corre termos no Tribunal Judicial da Comarca de Viana do Castelo, no Juízo de Competência Genérica de Caminha, foi decidido “não conceder provimento ao recurso e, em consequência, manter a coima de € 74,82 e a sanção acessória de inibição de conduzir pelo período de 60 dias, substituída pela apreensão do veículo durante 60 dias.” (fls. 55).
- 2. Inconformada ... – Sucursal em Portugal interpôs o presente recurso, tendo formulado as seguintes conclusões (transcrição):
“ – I. Veio a ora Recorrente notificada da sentença em foi decidido não conceder provimento ao recurso e, em consequência, manter a coima de € 74,82 e a sanção acessória de inibição de conduzir pelo período de 60 dias, substituída pela apreensão do veículo durante 60 dias.
- II. Relativamente à fundamentação, e para uma melhor compreensão, transcrevemos da sentença, a parte que para estes efeitos de recurso releva.
“No caso dos autos, a arguida, apesar de ter demonstrado que o veículo foi objeto de um contrato de Aluguer de Longa Duração celebrado com ... Internacional – Aluguer de Automóveis, SA.” (Sublinhado e negrito nossos).
- III. Ora, como é de conhecimento público a ... Internacional – Aluguer de Automóveis, SA, é uma empresa que se dedica diariamente ao aluguer diário de automóveis, com inúmeros seus clientes.
- IV. É por demais manifesto que estamos diante uma impossibilidade objetiva de identificação do condutor.
- V. Apesar da impossibilidade de identificação, a Recorrente requereu no âmbito da impugnação judicial como meio essencial de prova a notificação do titular do contrato de Aluguer de Longa Duração de forma a possibilitar a identificação concreta do condutor.
- VI. Mais, o tribunal ignorou a existência do artigo 171º número 7 do Código da Estrada que refere o seguinte: No caso de existir aluguer operacional do veículo, aluguer de longa duração ou locação financeira, quando for identificado o locatário, é este notificado para proceder à identificação do condutor, nos termos do número anterior, sob pena de o processo correr contra ele.
- VII. Ora, tal como ficou devidamente provado nos autos, a Recorrente procedeu à identificação do locatário, pelo que não se compreende a sentença.
- VIII. Ora, é nosso entendimento que ao abrigo do Princípio da Descoberta da Verdade material e do Princípio da Cooperação que rege a tramitação processual deveria o Tribunal proceder à notificação da ... Internacional para efeitos de identificação do condutor, tendo em consideração a sua posição como locatária.
- IX. Assim, ao não notificar a ... Internacional, foi, desde logo, cometida, e, por isso, pelo Tribunal a quo a nulidade a que alude a alínea d) do número 2 do artigo 120º, do Código de Processo Penal, por omissão de diligência essencial à descoberta da verdade, aplicável ex vi artigo 41º do Regime Geral das Contraordenações.
- X. Ora resulta da al. d) do número 2 do artigo 120º do Código de Processo Penal aplicável ex vi artigo 41º do Regime Geral das Contraordenações, o seguinte:
“2 – Constituem nulidades dependentes de arguição, além das que forem cominadas noutras disposições legais: (…) d) A insuficiência do inquérito ou da instrução, por não terem sido praticados atos legalmente obrigatórios, e a omissão posterior de diligências que pudessem reputar-se essenciais para a descoberta da verdade.” (Sublinhado nosso).
- XI. A omissão de diligência probatória que podia/devia ser ordenada, oficiosamente e que foi devidamente requerida constitui uma nulidade na medida em que, se trata de uma diligência essencial e necessária à descoberta da verdade.
- XII. A Recorrente identificou a locatária ... Internacional, devendo por isso proceder liminarmente o presente recurso. A obrigação de identificação do condutor deixa assim de recair sobre o locador, aqui Recorrente, por impossibilidade objetiva nos termos acima expostos, cedendo e passando a ser do locatário por força do número 5 do artigo 171º do Código da Estrada.
- XIII. Ora, é ponto assente na sentença e na convicção do Tribunal que a Recorrente identificou o contrato de aluguer celebrado com a ... Internacional, pelo que procedeu devidamente consoante as possibilidades que dispunha na posição de proprietária.
- XIV. Nos termos do número 3 do artigo 135º do Código da Estrada, são responsáveis pelas contraordenações rodoviárias, além dos agentes que pratiquem os factos constitutivos das mesmas, o titular do documento de identificação do veículo relativamente às infrações que respeitam às condições de admissão do veículo ao trânsito nas vias públicas, bem como pelas infrações referidas na alínea anterior, quando não for possível identificar o condutor.
- XV. O Tribunal a quo ignorou contudo o artigo 171º do Código da Estrada.
- XVI. Não estamos perante um caso de não identificação do condutor. Ao invés, cabia notificar a locatária ... Internacional para identificar o condutor no âmbito do contrato de aluguer de veículo celebrado.
- XVII. A norma em causa e a considerar nestes autos é o artigo 171º/5 e não a do 135º, ambos do Código da Estrada.
- XVIII. Demonstrado que está nos autos o contrato de aluguer, cabe à locatária pessoa identificar o condutor do veículo e não o Recorrente.
- XIX. O Tribunal a quo esqueceu, contudo a existência do citado artigo 171º, essencial nestes autos.
Mais,
- XX. Ora, no caso em apreço, deveria a ... Internacional ser devidamente notificada para proceder à identificação do condutor, ou caso não o fizesse seria a mesma responsável pelas contraordenações rodoviárias, nos termos do número 3 do artigo 135º do Código da Estrada.
- XXI. Destarte, não existe fundamento legal nem factual para a manutenção da coima aplicada e das sanções acessórias pela entidade administrativa, pelo que se requer a revogação da decisão em conformidade com o acima referido.
Nestes termos e nos demais de Direito que V.Exa. doutamente suprirá, deve o presente Recurso ser deferido, por provado, revogando a decisão de manutenção da coima aplicada e a sanção de inibição de conduzir pelo período de 60 dias, substituída pela apreensão de veículo durante 60 dias absolvendo a Recorrente do pedido, ou, se não for esse entendimento, notificar devidamente a ... Internacional – Aluguer de Automóveis, S.A. para proceder à devida identificação do condutor.” (fls. 62 a 64).
-3. A Exmª Magistrada do Ministério Público junto da primeira instância respondeu entendendo que “não se deverá dar provimento ao recurso interposto pela recorrente, assim se fazendo JUSTIÇA.” (fls. 66vº).
- 4. Nesta instância, o Exmº Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer (fls. 82 a 83vº) referindo em conclusão que: “a sentença posta sob apreciação porque respeitadora do disposto nos artigos 135º, nº 3, alíneas a) e b) e 171º, nºs 2 e 5 do Código da Estrada, deverá ser confirmada, julgando-se, do mesmo passo, improcedente o recurso da arguida.”
- 5. Cumprido o preceituado no artº 417º, nº 2, do Código de Processo Penal, a arguida apresentou resposta, concluindo, nos termos da jurisprudência que refere, “em que é clarividente que em situações em que o condutor do veículo não era o arguido, estando provado que o condutor era pessoa diferente do titular do documento de identificação do veículo, nenhuma responsabilidade poderá recair sobre este (no caso Recorrente). Acrescentando, ainda, que não existe nenhum normativo que obste a que seja feita na impugnação judicial a prova de que o condutor foi pessoa distinta do proprietário.”
- 6. Efetuado o exame preliminar e colhidos os necessários vistos, teve lugar a conferência, cumprindo decidir.
II – FUNDAMENTAÇÃO
-1. Como é jurisprudência assente, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso, é pelas conclusões que o recorrente extrai da motivação apresentada, em que sintetiza as razões do pedido (artº 412º, nº 1 do Código de Processo Penal), que se delimita o objeto do recurso e os poderes de cognição do Tribunal Superior.
Em processo de contraordenação, o Tribunal da Relação conhece exclusivamente de direito (artº 75º, nº 1 do DL nº 433/82 de 27/10), sem prejuízo do acima aludido conhecimento oficioso no que tange aos vícios previstos no artº 410º, nºs 2 e 3, do Código de Processo Penal).
Com o presente recurso a arguida ... – Sucursal em Portugal, invoca uma nulidade cometida pelo Tribunal a quo - nulidade prevista na alínea d) do nº 2 do artº 120º do Código de Processo Penal, por omissão de diligência essencial à descoberta da verdade, aplicável ex vi artº 41º do Regime Geral das Contraordenações.
Entende a arguida que “ao abrigo do princípio da descoberta da verdade material e do princípio da cooperação que rege a tramitação processual deveria o Tribunal proceder à notificação da ... Internacional para efeitos de identificação do condutor, tendo em consideração a sua posição como locatária.”
Por outro lado, acrescenta que “identificou a locatária ... Internacional, devendo por isso proceder liminarmente o presente recurso.”
- 2. Na sentença recorrida, consta (transcrição):
“ A)- Factos provados
Da discussão da causa, e com relevância para a sua decisão, resultaram provados os seguintes factos:
1. No dia 02/02/2016, pelas 15,00 horas, na EN 13, Km 87, TOLEDO. CAMINHA, o condutor do referido veículo automóvel ligeiro de passageiros com matrícula ... transpôs a linha longitudinal contínua (Marca M1) separadora de sentidos de trânsito, existente no local; 2. Não foi possível identificar na altura o condutor daquele veículo; 3. A arguida é titular do documento de identificação do referido veículo; 4. No dia 05/04/2016, a arguida foi notificada para identificar o condutor do veículo referido no dia, hora e local referidos em 1), o identificar; 5. A arguida não identificou o condutor daquele veículo; 6. Com a conduta descrita, o condutor do referido veículo revelou desatenção e irreflectida inobservância das normas de direito rodoviário, actuando com manifesta falta de cuidado e prudência que o trânsito de veículos aconselha e no momento se lhe impunham, agindo de forma livre e consciente, bem sabendo que a conduta descrita nos autos é proibida e sancionada pela lei contra-ordenacional; 7. A viatura com a matrícula BB é um veículo de marca VOLKSWAGEN, modelo POLO, objecto de um contrato de Aluguer de Longa Duração celebrado com ... Internacional - Aluguer de Automóveis, SA, com morada em Edifício … Lisboa; 8. O referido contrato teve início em 05/07/2015, terminando em 05/10/2016.
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B)- Factos não provados
Não resultaram provados outros factos com relevo para a boa decisão da causa, designadamente que a arguida não tem conhecimento da recepção por parte dos seus serviços administrativos de qualquer comunicação prévia da entidade autuante para identificação do condutor do veículo, nem tão pouco logrou encontrar nos seus registos internos a recepção da referida notificação.
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C)- Motivação
O Tribunal alicerçou a sua convicção, quanto à factualidade que resultou provada, no auto de notícia de fls. 5, que faz fé em juízo até prova em contrário (cfr. art.º 170, n.º 3, do CE), sendo certo que o militar autuante, M. F., e o militar F. F., que com o mesmo se encontrava, confirmaram os factos dele constantes e que presenciaram.
O militar autuante esclareceu ainda que, depois de averiguar que a arguida é titular do documento de identificação do veículo referido em 1), notificou-a para identificar o condutor do veículo e também do auto de notícia, exibindo cópia (que foi junta aos autos) da carta que inicialmente enviada e do aviso de recepção junto a fls. 6, que nos mostra que a carta de notificação do auto de notícia foi recebida em 05/04/2016 por uma pessoa chamada A. M..
Quanto aos demais factos provados [factos vertidos em 7) e 8)], o tribunal considerou os documentos juntos pela arguida com a sua impugnação (fls. 11 a 14), que confirmam que o referido veículo foi objecto de um contrato de Aluguer de Longa Duração celebrado com ... Internacional - Aluguer de Automóveis, SA, com início em 05/07/2015 e fim em 05/10/2016, e o depoimento da testemunha N. S., funcionário da arguida, que confirmou que o referido contrato foi celebrado, facto de que teve e tem conhecimento em virtude do exercício das suas funções.
O facto não provado assim foi julgado por não se ter feito prova da sua verificação.
Com efeito, a testemunha N. S., no que concerne à recepção da notificação do auto de contra-ordenação, afirmou que a pessoa que assinou o respectivo aviso deve ser funcionário da empresa que recebe e trata da correspondência da arguida, acrescentando depois que, se aquela notificação foi recebida, deve ter tido uma resposta da arguida.
Contudo, não confirmou que a arguida não tem conhecimento da recepção por parte dos seus serviços administrativos de qualquer comunicação prévia da entidade autuante para identificação do condutor do veículo, nem que não encontrou nos seus registos internos a recepção da referida notificação, razão pela qual, na falta de outra prova, o tribunal julgou tais factos não provados.” (fls. 53 e 54).
- 3. APRECIAÇÃO DO RECURSO
Dispõe o artº 171º, nº 2 do Código da Estrada que “Quando se trate de contraordenação praticada no exercício da condução e o agente de autoridade não puder identificar o autor da infração, deve ser levantado o auto de contraordenação ao titular do documento de identificação do veículo, correndo contra ele o correspondente processo.”
E o nº 5 do mesmo preceito estipula que “Quando o agente da autoridade não puder identificar o autor da contraordenação e verificar que o titular do documento de identificação é pessoa coletiva, deve esta ser notificada para, no prazo de 15 dias úteis, proceder à identificação do condutor, ou no caso de existir aluguer operacional do veículo, aluguer de longa duração ou locação financeira, do locatário, com todos os elementos constantes do nº 1 sob pena de o processo correr contra ela, nos termos do nº 2.”
O auto de contraordenação dos presentes autos foi levantado contra a arguida, ... – Sucursal Portugal, por ser ela a “titular do documento de identificação do veículo”, por estar em causa uma contraordenação “praticada no exercício da condução”, e, em virtude de o agente autuante “não puder identificar o autor da infração.”
No caso concreto, não tendo o agente autuante logrado identificar o autor da contraordenação, levantou o competente auto de contraordenação contra o titular do documento de identificação do veículo, a ora arguida, que, por ser pessoa coletiva, foi notificada para identificar o condutor, tudo em conformidade com o preceituado no transcrito nº 5 do citado artº 171º.
Consta dos pontos 4 e 5 da matéria de facto provada que “No dia 05/04/2016, a arguida foi notificada para identificar o condutor do veículo referido no dia, hora e local referidos em 1), o identificar” e “A arguida não identificou o condutor daquele veículo”.
A arguida apesar de notificada “nos termos e para os efeitos do nº 5 e do nº 6 do artº 171º do Código da Estrada”, para identificar o condutor do veículo, não o fez nem indicou a existência do locatário, que também não identificou.
Apenas no decurso da impugnação judicial é que a arguida indicou que a viatura com a matrícula BB, de marca Volkswagen e modelo Polo, “é objeto de um contrato de Aluguer de Longa Duração celebrado com a ... Internacional – Aluguer de Automóveis, S.A., com morada no Edifício …, em Lisboa”, juntou o dito contrato e realçou que o mesmo “teve início em 05-07-2015, terminando em 05-10-2016.”
Ora, tendo o titular do documento da identificação do veículo sido expressamente notificado nos termos e para os efeitos do disposto no artº 171º, nº 5 do Código da Estrada e não tendo identificado o condutor, nem o locatário, “no prazo de 15 dias úteis” que lhe foi fixado, já não poderá fazê-lo na fase de impugnação judicial da decisão administrativa de aplicação de coima e de sanção acessória.
Esgotado esse prazo, já não é admissível o afastamento da presunção legal. Tal não tem sustentação legal, e, como se diz no Ac. do TRL de 18.04.2017, proferido no âmbito do processo nº 3719/16.0T8OER.L1-5, acessível em www.dgsi.pt, “seria mesmo contra legem e consubstanciaria um esvaziamento das normas consagradas no artº 135º, do Código da Estrada neste sentido, entre outros, Ac. da Relação de Lisboa de 02/02/2016, Proc. nº 3017/15.7T8BRRR.L1-5; Ac. da Relação de Coimbra de 06/03/2002, Coletânea de Jurisprudência, 2002, tomo II, pág. 37; Ac. da Relação de Coimbra de 12/12/2017, Proc. nº 213/06.1TBMMV.C1; Ac. da Relação de Guimarães, de 03/10/2005, Proc. nº 1388/05-2, todos consultáveis em www.dgsi.pt, à exceção do na C.J. referenciado.”
A posição que vem referida nos acórdãos indicados na resposta ao Parecer formulada pela recorrente (designadamente os Acs. da Relação de Coimbra, de 5/07/2006, Procº nº 1511/06 e de 20/09/2006, Procº nº 1302/06 e Ac. desta Relação (com voto de vencido), de 25/02/2008, Procº nº 1983/07-1, todos disponíveis em www.dgsi.pt), admite que a aludida presunção seja ilidida na fase de impugnação judicial da decisão da autoridade administrativa.
Cremos que esta posição só seria defensável havendo motivo para não aplicar o prazo de 15 dias referido no artº 171º nº 5 do Código da Estrada. Não havendo qualquer motivo, como não há (a norma não é inconstitucional na medida em que ao arguido/a é facultado um prazo razoável para afastar a sua responsabilidade, identificando o verdadeiro responsável pela infração) e não tendo a arguida/recorrente cumprido o dever de identificar, dentro do prazo legal fixado, o condutor ou o locatário do veículo, outra solução se não vislumbra que não seja a condenação da recorrente pela prática da contraordenação.
Como se salienta no Ac. do Tribunal da Relação de Lisboa, de 18/04/2017, já acima citado, “a arguição em sede judicial que o condutor não era o proprietário e sim um terceiro cria uma incoerência no regime jurídico que rege as infrações estradais pois permitiria ao proprietário vir indicar o condutor para além do prazo estabelecido na lei para o efeito, defraudando a intenção do legislador ao estabelecer na lei um prazo que ainda lhe permite agir contra o condutor.”
A recorrente destaca a afirmação de que “nenhuma norma existe que obste a que seja feita na impugnação judicial a prova de que o condutor foi pessoa distinta do proprietário”, olvidando, contudo, o disposto nos artºs 171º, nº 5 e 135º, nº 3, als. a) e b), do Código da Estrada.
O processo correu contra a arguida, como bem salienta o Exmº Procurador-Geral Adjunto, como direta consequência da sua omissão, de, no tempo fixado de 15 dias uteis após a sua notificação, não ter indicado a existência da locatária que fruía do veículo de que era titular. A cominação do disposto no artº 171º, nº 5 do Código da Estrada realizou-se, então, na arguida, ora recorrente, “sob pena de o processo correr contra ela, nos termos do nº 2.”
Nos termos do disposto no artº 135º, nº 3, als. a) e b), do Código da Estrada “A responsabilidade pelas infrações previstas no código e legislação complementar recai no: a) Condutor do veículo, relativamente às infrações que respeitem ao exercício da condução; b) Titular do documento de identificação do veículo relativamente às infrações que respeitem às condições de admissão do veículo ao trânsito nas vias públicas, bem como pelas infrações referidas na alínea anterior quando não for possível identificar o condutor”.
O recurso deve, neste segmento, ser julgado improcedente.
Sustenta a recorrente, logo no início do seu recurso, que tendo identificado a locatária do veículo (no âmbito da impugnação judicial) “deveria o Tribunal proceder à notificação da ... Internacional para efeitos de identificação do condutor”, “ao abrigo do Princípio da Descoberta da Verdade material e do Princípio da Cooperação”. “A omissão de diligência probatória que podia/devia ser ordenada, oficiosamente e que foi devidamente requerida constitui uma nulidade na medida em que, se trata de uma diligência essencial e necessária à descoberta da verdade:”
Invoca, assim, a nulidade prevista na al. d) do nº 2 do artº 120º do Código de Processo Penal.
De acordo com o estabelecido no artº 340º, nº 1 do Código de Processo Penal (aplicável ao processo de contraordenação por força do artº 41º, nº 1 do Regime Geral das Contraordenações) “O tribunal ordena oficiosamente ou a requerimento, a produção de todos os meios de prova cujo conhecimento se lhe afigure necessário à descoberta da verdade e boa decisão da causa.”
Constitui nulidade dependente de arguição segundo a al. d) do nº 2 do artº 120º do Código de Processo Penal: “(…)a omissão posterior de diligências que pudessem reputar-se essenciais para a descoberta da verdade.”
Como se refere no Ac. do STJ de 04/11/2009, Procº nº 680/07.6GCBRG.G1.S1, também citado no Ac. do TRL de 18/04/2017 a que já acima fizemos referência, a invalidade resultante da omissão de diligência de prova essencial para a descoberta da verdade, ao constituir uma nulidade da audiência e não da sentença – uma vez que as nulidades da sentença estão taxativamente elencadas nas alíneas a) a c) do nº 1 do artº 379º do Código de Processo Penal, onde não se inclui a ora em causa – cumpre que seja arguida até ao encerramento da audiência, conforme preceitua o artº 120º, nº 2 al. d) e nº 3, al. a), do mesmo diploma legal. A recorrente não a arguiu atempadamente.
Assim, mesmo concedendo hipotética e academicamente a existência da nulidade, não tendo ela sido oportuna e tempestivamente invocada, deverá a mesma considerar-se sanada, pelo que também neste segmento o recurso improcede.
De harmonia com o expendido, não resta senão confirmar a sentença recorrida e julgar improcedente, na totalidade, o recurso interposto pela arguida.
III - DISPOSITIVO
Nos termos e pelos fundamentos expostos, acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Guimarães em negar provimento ao recurso interposto pela arguida ... – Sucursal em Portugal, assim se mantendo a decisão recorrida.
Custas a cargo da arguida/recorrente, fixando-se a taxa de justiça em quantia correspondente a três unidades de conta (artºs 92º, 93º nº 3, do DL nº 433/82 e artº 8º, nº 9, do Regulamento das Custas Processuais, e Tabela III anexa a este último diploma).
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(Texto elaborado pela relatora e revisto por ambos os signatários – artº 94º, nº 2, do Código de Processo Penal).
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Guimarães, 13 de maio de 2019