CRIME DE CONTRAFACÇÃO
FORMA TENTADA
NÃO SUSPENSÃO DA EXECUÇÃO DA PENA
ARTº271º
DO CP
Sumário


I) Constitui a prática do crime de contrafação de moeda na forma tentada e não a prática de meros atos preparatórios (na previsão do art, 271º do CP), a conduta do arguido que, além de se munir das "ferramentas" necessárias ao fabrico de notas e moedas falsas, ensaia a cunhagem de moedas (imprimindo as respetivas face e anverso), bem como grava em placas acrílicas (adequadas à transferência para moldes para posterior elaboração de chapas de impressão) diversos elementos de notas.

II) Os sucessivos atos de aperfeiçoamento da falsificação são de natureza a fazer esperar, segundo a experiência comum, a subsequente produção de notas e moedas falsas.

Texto Integral


Acordam, em conferência, os Juízes da Secção Penal do Tribunal da Relação de Guimarães:

I – Relatório

1. Em processo comum (tribunal colectivo) com o nº 305/14.3JAPRT, a correr termos no Tribunal Judicial da comarca de Braga – Juízo Central Criminal de Braga – Juiz 1, foi proferido acórdão e depositado em 02/05/2018, com a seguinte decisão (transcrição):

“4. Decisão
Pelo exposto, decide-se:
a) CONDENAR o arguido B. F. pela prática, em co-autoria material, do crime de contrafacção de moeda, na forma tentada, p. e p. pelos arts. 262.º n.º 1, 22º, n.ºs 1 e 2, 23.º, n.º 2 e 73.º, n.º 1, als. a) e b), todos do Código Penal, na pena de 1 (um) ano de 8 (oito) meses de prisão, substituída por 480 (quatrocentos e oitenta) horas de trabalho a favor da comunidade;
b) CONDENAR o arguido M. A. pela prática, em co-autoria material, do crime de contrafacção de moeda, na forma tentada, p. e p. pelos arts. 262.º n.º 1, 22º, n.ºs 1 e 2, 23.º, n.º 2 e 73.º, n.º 1, als. a) e b), todos do Código Penal, na pena de 2 (dois) anos de prisão, cuja execução se suspende por igual período de tempo;
c) CONDENAR o arguido P. F. pela prática, em co-autoria material, do crime de contrafacção de moeda, na forma tentada, p. e p. pelos arts. 262.º n.º 1, 22º, n.ºs 1 e 2, 23.º, n.º 2 e 73.º, n.º 1, als. a) e b), todos do Código Penal, na pena de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de prisão, cuja execução se suspende por igual período de tempo;
d) CONDENAR o arguido J. M. pela prática, em concurso efectivo:
i. do crime de contrafacção de moeda, na forma tentada e em co-autoria material, p. e p. pelos arts. 262.º n.º 1, 22º, n.ºs 1 e 2, 23.º, n.º 2 e 73.º, n.º 1, als. a) e b), todos do Código Penal, na pena de 3 (três) anos e 4 (quatro) meses de prisão;
ii. do crime de detenção de arma proibida, em autoria material singular, p. e p. pelas disposições conjugadas dos arts. 2.º, n.º 3, al. p) e 86.º, n.º 1 al. d), ambas do R.J.A.M., na pena de 1 (um) ano e 6 (seis) meses de prisão.
e) em cúmulo jurídico, vai o arguido J. M. condenado na pena única de 4 (quatro) anos de prisão efectiva.

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Dos objectos apreendidos:

Declarar perdidas a favor do Estado as munições apreendidas nos autos (art. 109.º do C.P.).
Cumpra o disposto no art. 78.º do R.J.A.M., após trânsito.
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Declarar perdidos a favor do Estado todos os restantes objectos apreendidos, nos termos do art. 109.º do C.P..
No que respeita ao seu destino e com excepção ainda dos bens que se seguem, determina-se a destruição dos bens apreendidos.

Assim:

- determina-se a afectação da máquina gravadora de marca Roland à colecção do LPC (alínea 01 de fls. 2212 do 8.º vol.), cfr. requerido pelo Ministério Público, bem como os materiais constantes das alíneas 13, 15, 16, 17, 18, 31.1, 35.2, 37, 39, 52, 53, 54, 56 e 58 de fls. 2212 do 8.º vol., cfr. requerido pelo LPC da PJ, local onde já se encontram todos esses bens;
- determina-se a avaliação dos telemóveis, do computador, da pendrive e da guilhotina, por forma a determinar-se o seu destino final (destruição, venda ou afectação aos serviços).
Após tal avaliação e no que se refere ao computador, à pendrive e à guilhotina, solicite à Sr.ª Secretária deste tribunal que informe se pretende a sua afectação aos serviços deste tribunal.

Em caso de:

a) resposta afirmativa, tal computador e pendrive, deverão ser previamente formatados pelos Srs. técnicos de informática deste tribunal;
b) resposta negativa, serão os mesmos destruídos.
Demais d.n., após trânsito, nomeadamente a comunicação da decisão de afectação daqueles bens ao LPC da PJ.
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Declarar perdida a favor do Estado a importância de € 800,00 apreendida (e depositada a fls. 2033, do 7.º vol.).
D.n., após trânsito.
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Os CD’s e DVD’s apreendidos ficarão nos autos por constituírem meios de prova.
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Custas pelos arguidos, com taxa de justiça individual de 3 UC’s (cfr. arts. 513.º e 514.º do C.P.P., e arts. 3.º n.º 1 e 8.º n.º 9 e Tabela III anexa, do Regulamento das Custas Judiciais).
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São devidos honorários à defensora nomeada, nos termos da lei.
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Após trânsito:

- remeta os boletins ao registo criminal;
- comunique à D.G.R.S.P. a presente decisão, informando da obrigação imposta ao arguido B. F. e solicitando a elaboração do plano de prestação de trabalho a favor da comunidade;
- remeta cópia certificada da presente decisão à D.G.R.S.P., cfr. solicitado.
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Determina-se a recolha de amostras biológicas ao arguido J. M. para inserção na base de perfis de ADN, nos termos dos arts. 8.º, n.º 2 e 18.º, n.º 3 da Lei n.º 5/2008, de 12.02., na redacção dada pela Lei n.º 90/2017, de 22.08., qual será efectuada após trânsito em julgado.
D.n., solicitando à entidade competente a sua realização, que será, no entanto, dispensada caso já existam tais perfis de ADN, o que aquela deverá dar conta aos presentes autos.
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Consigna-se, desde já, para efeitos do disposto no art. 80.º do Código Penal, que:

- os arguidos B. F. foi detido no dia 13.06.2016 (cfr. fls. 1683 do 6.º vol.), foi submetido a 1º Interrogatório judicial de arguido detido no dia 14.06.2016, tendo sido restituído à liberdade nesse dia (cfr. fls. 1743/1754, 1756/1757, do 6.º vol.);
- o arguido M. A. foi detido no dia 14.06.2016 (cfr. fls. 1698 do 6.º vol.), foi submetido a 1º Interrogatório judicial de arguido detido no dia 14.06.2016, tendo-lhe sido aplicada a medida de OPH com VE (cfr. fls. 1743/1754, 1756/1757 e 1758 do 6.º vol.), situação em que se manteve até 28.09.2016 (cfr. decisão do T.R.P. de 28.09.201 de fls. 2130/2150, do 7.º vol.);
- o arguido J. M. foi detido no dia 13.06.2016 (cfr. fls. 1682, do 26.º vol.), foi submetido a 1º Interrogatório judicial de arguido detido no dia 14.06.2016, tendo-lhe sido aplicada a medida de prisão preventiva (cfr. fls. 1743/1754, 1756/1757 e 1759 do 6.º vol.), situação em que se manteve até 28.09.2016 (cfr. decisão do T.R.P. de 28.09.201 de fls. 2130/2150, do 7.º vol.).
- o arguido P. F. foi detido no dia 30.09.2016 (cfr. fls. 2150 a) do 7.º vol.) e foi submetido a 1º Interrogatório judicial de arguido detido nesse mesmo dia, tendo sido restituído à liberdade nesse dia (cfr. fls. 2160/2165 e 2167, do 7.º vol.).
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Deposite e demais d.n..”
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2 – Não se conformando com a decisão, o arguido J. M. interpôs recurso, oferecendo as seguintes conclusões (transcrição):

I. O presente recurso, incide pela falta de prova legal ou tarifada, de forma a atingir uma dada convicção, à qual acresce a preterição do princípio "in dúbio pro reo" .
II. Igualmente a apreciação critica do crime, pelo qual vem o recorrente acusado, na qual inexiste qualquer tentativa de contrafacção de moeda falsa.
III. Da mesma forma a responsabilização da uso e porta de armas, quando estava em causa material de caça obsoleto, sendo que nunca o recorrente agiu com dolo, seja directo, necessário ou eventual, mas sim um erro sobre a ilicitude ou negligência.
IV. Diz-nos a lei, que à tentativa quando o agente praticar actos de execução de um crime que decidiu cometer, sem que este chegue a consumar-se.
V. A definição legal da tentativa encontra-se no art. 22.ºCP, enquanto o n.º 1 do art.º 23.º CP estatui quando e o n.º 2 como a tentativa é punível.
VI. O art. 22.º CP diz que há tentativa quando o agente praticar actos de execução de um crime que “decidiu cometer”, sem que este chegue a consumar-se.
VII. Não basta dizer, pura e simplesmente, o crime é possível objectivamente, sendo que o que interessa é saber se a impossibilidade do meio, se a inexistência do objecto, são evidentes ou aparentes para a generalidade das pessoas.
VIII. Na fase de inquérito, foram recolhidos os mais diversos objectos, sendo que no seu conjunto são incapazes de produzir a contrafacção de moeda,
IX. Não ficou demonstrado, que sem impressora ou offset, tinta, papel próprio, hologramas, fotocélulas, conseguisse o recorrente, praticar o crime de contrafacção de moeda.
X. Da mesma forma, não ficou demonstrado, que o arguido tivesse praticado qualquer facto, que pudesse indicar a compra de material para a contrafacção de que vem acusado,
XI. Todas as testemunhas, em nada alteraram a prova material ou vieram dizer ao tribunal, que o recorrente tinha intenção em praticar a contrafacção de moeda.
XII. Pelo que, nunca existiu tentativa de contrafacção de moeda, nem um acto de execução.
XIII. Existiu sim, uma violação do in dúbio pro reu, que deve ser tratada como erro na apreciação da prova, na qual optou-se contra o arguido, no mesmo sentido STJ de 15 Abril de 1988 – BMJ, 476,82 ).
XIV. A presente investigação levada a cabo desde 2014 até 2016, não apresentou em toda a fase de julgamento uma única prova da existência de um acto de execução, basta para o efeito, ouvir todos os depoimentos das testemunhas em julgamento.
XV. O presente colectivo, ao aplicar ao recorrente uma pena de prisão efectiva, onde em cumulo foi aplicado 4 anos, que no entender do mesmo, deve-se única e exclusivamente a duas situações,
XVI. A primeira relacionada com o registo criminal do recorrente, em concreto os
crimes cometidos há 16 anos atrás, numa espécie de dupla condenação,
XVII. Basta verificar, que nos quatro arguidos, foi o único a ser condenado em prisão efectiva, mas sem nunca fazer-se prova que teria uma maior participação em qualquer acto,
XVIII. O segundo aspecto, pelos elementos encontrados, na qual estabeleceram um nexo causal entre os mesmos, e aquilo que se estaria a preparar, embora com demonstração que todos os elementos juntos não conseguem produzir qualquer acto executório,
XIX. Ficou demonstrado a impossibilidade do meio, e a inexistência do objecto.
XX. No entanto, caso de duvida, mais uma vez reitera-se deveria ser tido em conta o principio in dúbio pro reo,
XXI. Pelo que nunca poderia ser considerado uma tentativa de contrafacção de moeda e subsequentemente ser o recorrente condenado efectivamente,
XXII. Incorrendo desta forma uma violação do artigo 13º e 32º da Constituição e uma errada interpretação do artigo 22º, 23º e 271º Código Penal.
XXIII. Toda a prova documental e testemunhal, RDE e material apreendido, demonstram a inexistência de qualquer acto execução,
XXIV. Ao invés demostraram sim um volume de material, que verdadeiramente não se complementa
XXV. A investigação no presente processo, decorreu durante dois anos, sendo que qualquer homem médio, tem percepção que sendo o objectivo do recorrente a contrafacção moeda, seguramente não implicaria tal espaço temporal,
XXVI. Até porque o recorrente, sempre foi conectado como pessoa experiente e já condenado pelo mesmo facto.
XXVII. Dos objectos apreendidos, basta verificar que as placas encontradas com o desenho de uma nota de 500€ eram acrílicas, e não em chapa, que pela sua falta de rigidez, não podiam ser usadas em maquina alguma.
XXVIII. O papel era A4 e não especifico para contrafacção de moeda,
XXIX. Não existia hologramas, notas e moedas falsas, tinta para nota, entre outros elementos que seriam essenciais para a contrafacção.
XXX. O próprio inspector demonstrou na suas declarações que placas acrílicas não eram susceptíveis de ser usadas e nunca tinha visto falsificação, sem ser com placas de chapa,
XXXI. Posto isto, toda a prova trazida pelo Ministerio Publico, em nada mostravam ou faziam demonstrar a existência de tentativa ou contrafacção de moeda,
XXXII. Pelo que, pelos elementos encontrados, podem unicamente ir de encontro para os actos preparatórios descritos nos termos do artigo 271º do código penal.
XXXIII. Neste caso concreto, existiam determinados objectos, que conjugados com outros, que não existiam poderiam dar origem à pratica do crime, ou a algum acto executório.
XXXIV. Nem mesmo se pode esperar que a simples existência de alguns deles possa dar origem a que o bem jurídico protegido, ou seja a integridade ou intangibilidade do sistema monetário oficial, e a consumação possa ocorrer,
XXXV. Pelo que nunca não está em causa a responsabilização, de acordo com os arts. 21.º e 22.º CP.
XXXVI. Não existiu sequer, a prova de tentativa de fabrico ilícito da moeda suposta e que essa moeda pudesse imitir ou reproduzir a moeda verdadeira, por forma a poder com ela confundir-se na circulação normal,
XXXVII. Por fim, é ainda o recorrente, condenado a cumprir pena de prisão de 1 ano e seis meses de prisão, por detenção de arma proibida.
XXXVIII. O recorrente em tempos foi caçador e dedicava-se dentros dos períodos de caça permitida a praticar tal modalidade,
XXXIX. Tinha licença e porte de armas, sendo que após ter sido detido em 2002 nunca mais teve interesse e renovou a licença.
XL. E nesse contexto, foi encontrado 162 cartuchos de caça de calibre 12 Gauge, aquando da apreensão e busca na sua moradia.
XLI. Sendo que os mesmos encontravam-se em local visível numa pasta, e não em lugar escondido ou reservado.
XLII. Poderá dizer-se que existiu um erro sobre a ilicitude ou negligencia,
XLIII. Mas nunca uma atitude dolosa, seja directa, necessária ou eventual, e que possa justificar 1 ano e 6 meses de prisão efectiva,
XLIV. Pelo que, não concorda o recorrente pela pena aplicada, até porque nunca na própria acusação, foi tomada em consideração alguma conduta que visasse a prática de qualquer crime,
XLV. Eram cartuchos sem uso, obsoletos e sem qualquer utilidade,
XLVI. Pelo que, qualquer pena efectiva, só poderá ser compreendida, como uma restrição à sua liberdade, quando nunca se relacionou qualquer nexo, com algum resultado levado a cabo pelo recorrente, pelo uso e porte de armas,

TERMOS EM QUE,
---A DOUTO ACORDÃO RECORRIDO DEVE SER REVOGADO.
---DEVENDO PROCEDER-SE AO REENVIO DO PROCESSO PARA NOVO JULGAMENTO, CASO ASSIM SE ENTENDA.
- SER CONSIDERADO A MERA EXISTENCIA DE ACTOS PREPARATÓRIOS E NUNCA TENTATIVA DE CONTRAFACÇÃO DE MOEDA.
- DEVE A PRISÃO EFECTIVA SER SUBSTITUIDA POR PENA SUSPENSA ATENDENDO A TODOS OS FACTOS EXPOSTOS, INCLUSIVE SE O ÚNICO ARGUIDO CONDENADO EM PENA EFECTIVA.

NESTES TERMOS, DANDO PROVIMENTO AO RECURSO FARÃO V.EXCIAS COMO
SEMPRE A HABITUAL JUSTIÇA!

3 – A Exma. Procuradora da República na primeira instância respondeu ao recurso, pugnando pela improcedência do mesmo e pela manutenção da decisão recorrida nos seus precisos termos.
4 – Nesta instância, a Exma. Procuradora-Geral Adjunta sufragou a posição expendida pela Exma. Procuradora e emitiu parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso.
5 – No âmbito do disposto no artigo 417º, nº 2, do Código de Processo Penal, não houve qualquer resposta.
6 – Colhidos os vistos, o processo foi presente à conferência, por o recurso dever ser aí julgado de harmonia com o preceituado no artigo 419º, nº 3, do Código de Processo Penal.
* * *
II – Fundamentação

1 - O objeto do recurso define-se pelas conclusões que o recorrente extraiu da respetiva motivação - artº 412º, n1, do Código de Processo Penal e jurisprudência fixada pelo acórdão do Plenário da Secção Criminal do STJ nº 7/95, de 19/10, publicado no DR de 28/12/1995, série I-A -, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso, como sejam as cominadas com a nulidade de sentença, com vícios da decisão e com nulidades não sanadas - artigos 379º e 410º, nºs 2 e 3, do Código de Processo Penal (cfr. Acórdãos do STJ de 25/06/98, in BMJ nº 478, pág. 242; de 03/02/99, in BMJ nº 484, pág. 271; Germano J. M. da Silva, “Curso de Processo Penal”, vol. III, págs. 320 e ss; Simas Santos/Leal Henriques, “Recursos em Processo Penal”, Rei dos Livros, 3ª edição, pág. 48).

2 - As questões invocadas pelo recorrente são as seguintes:

- Erro na apreciação da prova (inexistência de tentativa, por se tratar de meros atos preparatórios quanto à contrafacção de moeda e erro sobre a ilicitude ou negligência na detenção dos cartuchos de caça obsoletos);
- Violação do princípio “in dubio pro reo”;
- Suspensão da execução da pena de prisão aplicada .

3Fundamentação constante da sentença recorrida
*
2. Fundamentação de facto

2.1. Factos provados

Com interesse para a decisão da causa, mostram-se provados os seguintes factos:

1. Desde data não concretamente apurada do ano de 2014, os arguidos J. M. e M. A. decidiram adquirir o material necessário ao fabrico de moedas metálicas de valor facial de € 2 do BCE falsas, como se fossem legítimas, actuando conjuntamente, de forma combinada e articulada e com tarefas divididas entre si, com vista a colocá-las em circulação e assim obterem proveitos.
2. Por seu turno, desde data não concretamente apurada do ano de 2015, os arguidos J. M., M. A., P. F. e B. F. decidiram adquirir o material necessário ao fabrico de notas de valor facial de € 500 do BCE falsas, como se fossem legítimas, actuando conjuntamente, de forma combinada e articulada e com tarefas divididas entre si, com vista a colocá-las em circulação e assim obterem proveitos.
3. Assim, em concretização dos planos delineados e depois da aquisição do material necessário para o efeito, nomeadamente material informático e maquinaria de estampagem e gravação, já no ano de 2016, os arguidos foram efectuando alguns ensaios para o fabrico de notas e moedas falsas.
4. Assim, no dia 13.06.2016, pelas 17h00m, no anexo/arrecadação sito no ..º andar da habitação sita Rua …, Braga, arrendado a E. B., companheira do arguido P. F., os arguidos tinham já gravado uma placa em acrílico com cerca de 8 mm de espessura e dimensões de cerca de 20 cm de comprimento por 10,5cm de largura com os elementos de uma nota de € 500 do BCE.
5. Para o efeito, usaram um computador e uma máquina de gravação de marca Roland E6X350HF, a qual tem capacidade para fazer cunhos para fabrico de moedas, timbres para estampagem dos hologramas das notas e moldes.
6. No dia 13.06.2016, pelas 17h00m no interior do anexo/arrecadação mencionado no ponto 4, os arguidos tinham, ainda e para além da placa referida em 4., na sua posse os seguintes objectos:
- a placa em acrílico referida no ponto 4 gravada com os elementos de uma nota de 500 € do BCE (eliminar, se for aceite a proposta supra);
- o computador portátil, da marca Dell, modelo Inspiron 15 3000 series com n.º de série 3…;
- o computador portátil, referido no ponto 4, da marca Dell, modelo Inspiron 15 3000 series com n.º de série …;
- uma pen drive acoplada ao portátil, de marca Kingston, modelo “ Data Travel”;
- uma nota de 100 USD (cem dólares) como o número KE … A E5 e uma nota de 200 € do BCE (duzentos euros) com o número … acondicionadas entre as páginas de um livro;
- uma caixa de plástico de cor azul, a qual continha onze placas em acrílico de idênticas dimensões, todas elas já com elementos de notas gravados;
- três placas em acrílico de menores dimensões, nas quais estavam gravados diferentes elementos relativos a notas do BCE;
- diferentes componentes: uma mesa metálica, um cabo eléctrico um tubo de pressão de ar com torneira numa das extremidades, uma pequena caixa com doze ponteiros de gravação e uma tampa de plástico;
- uma pequena lupa de precisão devidamente acondicionada na sua respectiva caixa.
7. Nessas mesmas circunstâncias de tempo e lugar, o arguido J. M. tinha na sua posse os seguintes objectos:
- um telemóvel da marca SAMSUNG, modelo GT-S7560, com o IMEI n.º …, de cor azul, contendo no interior um cartão Sim da Vodafone com o n.º …, no qual tinha guardadas fotografias com registo de um conjunto de moedas de dois euros, umas peças metálicas destinadas ao fabrico de moeda metálica e da máquina de gravação de marca ROLAND EGX–350
- um telemóvel da marca SAMSUNG, modelo GT-E1200, com o IMEI n.º …, contendo no interior um cartão Sim USO, ref ….
8. Nessas mesmas circunstâncias de tempo e lugar, o arguido B. F. tinha na sua posse:
- um telemóvel da marca APPLE, Mod. IPHONE A1457, IMEI …
9. No mesmo dia 13.06.2016, pelas 19h30m, na residência do arguido J. M., este detinha:
A. nos arrumos, situados por cima da zona habitacional e utilizado como oficina e arrecadação:
- uma guilhotina da marca "STAPLES";
- uma resma de papel tipo esquiço com 173 folhas e com as dimensões aproximadas de 20x08 cm;
- duas placas de acrílico contendo gravado em relevo a face e o verso de uma nota de € 500;
- uma placa de acrílico contendo gravadas estrelas utilizadas no mesmo tipo de notas;
- um bloco rígido de cor azul contendo embutido uma imitação de um lingote de ouro;
- um disco metálico contendo cunhada a face de uma moeda de € 2 (dois euros);
- dois discos metálicos de dimensões semelhantes e sem gravação/cunhagem visível;
- um bloco metálico contendo cunhado o verso de uma moeda de € 2 (dois euros);
- uma peça de metal com o recorte de dimensões de uma moeda de € 2 (dois euros);
- três peças metálicas para uso como cunhos;
- um cunho metálico contendo gravada a face de uma moeda de € 2 (dois euros), acondicionada em caixa própria de cor cinzenta;
- um cunho metálico contendo gravado o verso de uma moeda de € 2 (dois euros), acondicionada em caixa própria de cor cinzenta;
- um disco metálico de cor amarelo, contendo gravado frente e verso de uma moeda de € 2 (dois euros);
- quatro anilhas metálicas;
- setenta e seis discos metálicos de diversos tamanhos;
- oito rolos de película de cor prateada, de diversas dimensões;
- duas placas de metal para uso no processo de cunhagem;
- uma prensa artesanal, composta por uma estrutura em madeira, motor hidráulico e duas peças metálicas não acopladas;
- uma pasta de arquivo de cor azul contendo o manual de usuário do equipamento de marca "ROLAND", modelo "EGC 350".

B. na garagem fechada da habitação:

- uma prensa de marca "MEGA", modelo "KMG - 30 A";
- uma resma de papel com as dimensões aproximadas de 38 x 50 centímetros;
- cinco resmas de papel com as dimensões aproximadas de 10x75 centímetros;
- um maço de papel com as dimensões aproximadas de 14x07 centímetro;

C. nos arrumos:

- uma pasta/mala de cor preta, contendo 162 cartuchos de caça de calibre 12 Gauge, de várias marcas e diversos modelos.
10. No dia 14.06.2016, pelas 09h45m, o arguido M. A. detinha:
A. no interior da sua habitação sita na Rua …, os seguintes objectos:
- duas moedas metálicas de € 2 (dois euros), cunhadas apenas numa das faces, correspondendo à frente e verso de moeda autêntica de € 2, sendo uma moeda bimetálica de € 2 com a face nacional francesa do ano de 2001 com verso e o bordo maquinado (sem relevo) e outra moeda bimetálica de € 2 com a face comum do Euro, com o verso e o bordo maquinado (sem relevo);
- seis núcleos metálicos;
- quatro anilhas/aros metálicos de cor amarelada;
- dez anilhas/aros metálicos de cor prateada;
- seis discos/núcleos metálicos de cor amarelada;
B. no interior da viatura de matrícula ... e por si utilizada:
- uma peça metálica circular com sistema de cunhagem do bordo de moedas metálicas.
11. Os arguidos preparavam-se para reproduzir notas com valor facial falso de € 500 e moeda com valor facial falso de € 2, como se fossem legítimas, com a intenção de serem colocadas em circulação, com inerente perigo de, entrando em circulação como pretendiam, serem confundidas com moeda legítima e atingir e afectar a credibilidade, integridade e intangibilidade do sistema monetário e a sua credibilidade como meio de pagamento, o que quiseram e representaram.
12. Os arguidos só não lograram alcançar a plenitude do seu projecto e produzir moeda em papel e metálica susceptível de entrar em circulação como legitima por razões alheias à sua vontade.
13. Ao agirem do modo descrito, os arguidos J. M. e M. A. fizeram-no de comum acordo e vontades, com o propósito de produzir moedas com valor facial de € 2, como se fossem verdadeiras, com a intenção de as colocar em circulação como se de moeda legítima se tratasse, o que quiseram e representaram.
14. Ao agirem do modo descrito, os arguidos J. M., M. A., P. F. e B. F. fizeram-no de comum acordo e vontades, com o propósito de produzir notas com valor facial de € 500, como se fossem verdadeiras, com a intenção de as colocar em circulação como se de moeda legítima se tratasse, o que quiseram e representaram.
15. O arguido J. M. previu e quis ter consigo as aludidas munições, ciente das suas características e sabendo que não era titular de documento que o habilitasse ao uso, porte e detenção de tais munições.
16. Os arguidos actuaram de forma livre, deliberada e consciente, em conjugação de esforços e vontades, bem sabendo que as suas condutas eram proibidas e punidas por lei.

Mais se provou que:

17. O arguido B. F. cresceu integrado num agregado composto pelos progenitores e uma irmã mais nova, sendo o pai a única fonte de rendimento do agregado.
Possui como habilitações literárias o 9.º ano de escolaridade. Frequentou o 10.º ano, integrado num curso profissional de informática, mas que não concluiu.
Sem dar início a uma actividade profissional, o B. F. auxiliava o pai, o co-arguido P. F., no armazém de compra e venda de mobiliário e electrodomésticos usados e na venda de outros produtos. Mais tarde, entre 2014 e 2016, trabalhou na empresa “...” como ajudante no escritório, para além de outras tarefas, onde auferia o SMN, até ao encerramento da empresa.
Actualmente, voltou a auxiliar o pai no conserto/restauro de electrodomésticos e mobiliário usado e, ainda, na venda online de suplementos alimentares em pareceria com um amigo, com o que recebe € 200,00 (do pai) e cerca de € 500,00 (pela venda online).
Beneficia do apoio consistente da família e da namorada.
Não há qualquer rejeição na comunidade onde se insere.
18. Não lhe são conhecidos antecedentes criminais.
19. O arguido M. A. viveu integrado num agregado familiar constituído pelos seus progenitores e nove irmãos, sendo a economia assegurada pelos rendimentos auferidos pelos primeiros.
Possui como habilitações literárias o 6.º ano de escolaridade.
Iniciou o percurso laboral aos catorze anos, como diversas actividades profissionais que desempenhou inclusivamente no estrangeiro.
Regressado a Portugal, trabalhou numa empresa de construção civil durante dois anos, após o que se dedicou à comercialização durante alguns anos de artigos têxteis que vendia em Portugal e Espanha.
À data dos factos, partilhava o agregado com a sua mulher e convivia frequentemente com os filhos. A economia do lar era assegurada apenas pelo vencimento auferido pela mulher no valor de € 900,00.
Actualmente, o arguido auxilia o irmão numa olaria, retirando por cada dia de trabalho € 45,00, e comercializa móveis usados e antiguidades, retirando rendimentos de valor não concretamente apurados, contribuindo dessa forma para a economia do seu lar.
Beneficia do apoio consistente da mulher e dos filhos
Não existe qualquer rejeição na comunidade onde se insere.
20. Não lhe são conhecidos antecedentes criminais.
21. O arguido P. F. cresceu num contexto sócio-económico equilibrado.
Possui como habilitações literárias o 11.º ano de escolaridade.
Iniciou a actividade profissional com 19 anos, tendo desempenhado as funções de empregado de escritório ao longo de 5 anos consecutivos, após o que se estabeleceu por sua conta própria, envolvendo-se em vários projectos.
Esteve emigrado cerca de dois anos em Espanha por razões económicas onde auferia cerca de € 3.000 mensais. Em razão da sua reclusão, a família regressou definitivamente a Portugal.
Actualmente, o arguido vive com a sua mulher e filhos e dedica-se à compra de electrodomésticos e mobiliário usado que, após recuperação/conserto comercializa e, ainda, à venda de vinho. Simultaneamente, ainda que de forma pontual, efectua reparações e assistência técnica de máquinas de café. De tais actividades, retira entre € 1.000 e € 1.200 por mês.
Beneficia do apoio consistente da família.
Não há qualquer rejeição na comunidade onde se insere.
22. Consta do C.R.C. do arguido P. F. a seguinte condenação:
- por acórdão de 04.12.2008, transitado em julgado em 22.12.2008, no processo comum colectivo n.º123/06.2JELSB, do extinto 2.º Juízo do T.J. de Esposende, foi condenado pela prática, em 07.04.2006, de um crime de tráfico de estupefacientes, na pena de 6 anos de prisão, tendo beneficiado de liberdade condicional e definitiva.
23. O arguido J. M. viveu integrado num agregado familiar de modestas condições sócio-económicas e culturais, constituído pelos seus progenitores e seis descendentes, sendo o arguido o mais novo dessa fratria.
O pai faleceu quando o arguido tinha 4 anos de idade, ficando a responsabilidade da educação dos filhos e sustento económico do agregado exclusivamente a cargo da mãe, costureira.
Possui como habilitações literárias o 4.º ano de escolaridade.
Depois de contraiu matrimónio e na tentativa de melhores condições de vida para o seu agregado, emigrou para a Suiça, país onde laborou como trabalhador indiferenciado, essencialmente desempenhando funções de canalizador e no ramo da construção civil, o que veio a fazer noutros países.
Entretanto regressou a Portugal para dar continuidade a um projecto de mecânica e estabeleceu-se por conta própria, na venda de artigos diversos, para além do tal projecto, que acabaram por colocar a família numa situação de significativas carências económicas.
À data dos factos, o arguido vivia em união de facto com a companheira (depois de se ter divorciado), relação que manteve até inícios de 2017. Ambos subsistiam do RSI por parte da companheira e dos montantes auferidos pelo arguido através da venda de artesanato produzido pelo próprio.
Actualmente, o arguido vive sozinho. Paga pela renda € 350,00, tendo-lhe sido cortado o abastecimento do fornecimento de água em razão do incumprimento.
Trabalha, desde Março de 2018, numa empresa de comércio de peças automóveis, desempenhando as funções de vendedor, auferindo o SMN.
24. Constam do C.R.C. do arguido J. M. as seguintes condenações:
- por acórdão de 06.07.1995, transitado em julgado, no processo comum colectivo n.º 328/94.7TBBCL (anterior 1297/94), do extinto 2.º Juízo Criminal de Barcelos, foi condenado pela prática, em 02.04.1994, de 3 crimes de coacção, 1 crime de contrafacção de moeda, 1 crime de detenção de arama proibida e 1 crime de tráfico de estupefacientes, na pena única de 10 anos e 6 meses de prisão, tendo-lhe sido perdoado um ano; por decisão do T.E.P. do Porto de 23.03.2000, foi-lhe concedida liberdade condicional, a qual veio entretanto a ser revogada por decisão de 23.05.2005;
- por acórdão de 29.07.2004, transitado em julgado, no processo comum colectivo n.º 827/02.9PABCL, do extinto 2.º Juízo Criminal de Barcelos, foi condenado pela prática, em 22.11.2002, de um crime de contrafacção de moeda, um crime de actos preparatórios para a contrafacção de moeda e um crime de detenção ilegal de arma, na pena única de 6 anos, 1 mês e 15 dias de prisão; por decisão do T.E.P. beneficiou de liberdade condicional e definitiva à ordem desses autos.
*
2.2. Factos não provados
Não os há.
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Anote-se que os demais factos alegados na acusação pública não foram tidos como provados ou não provados por se reportarem a meios de prova ou por serem meras conclusões e/ou repetições.
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2.3. Convicção do tribunal

O tribunal formou a sua convicção a partir de toda a prova produzida em sede de audiência de julgamento, depois de criticamente analisada, à luz das regras da experiência comum e da verosimilhança, naquela se incluindo:

A) As declarações dos arguidos M. A., P. F. e J. M.;
B) Os depoimentos das testemunhas J. P., A. C., F. A., A. F., J. T., J. A., E. B., M. N. e D. A..

C) Os documentos, nomeadamente:

- os relatórios de vigilância externa: RDE de fls. 88/119, 1.º vol.; RDE de fls. 512/522, do 2.º vol.; RDE de fls. 523/542, do 2.º vol.; RDE de fls. 880/889, do 3.º vol.; RDE, de fls. 990/1015, do 4.º vol.; RDE de fls. 1124/1131, do 4.º vol.; RDE de fls. 1142/1150, do 4.º vol.; RDE de fls. 1151/1156, do 4.º vol.; RDE de fls. 1157/1179, do 4.º vol.; RDE de fls. 1589/1597, do 6.º vol.; RDE de fls.1598/1614, do 6.º vol.; RDE de fls. 1615/1616, do 6.º vol.; RDE de fls. 1617/1618, do 6.º vol.; e, RDE de fls. 1636 do 6.º vol..
- os autos de busca e apreensão com reportagem fotográfica: de fls. 1636/1657, do 6.º vol. (na arrecadação em Braga); fls. 1660/1668, 6.º vol. (residência do arguido J. M.); fls. 1687/1688, do 6.º vol. (residência e veículo do arguido M. A.); e auto de apreensão fls. 1691/1692, do 6.º vol. (a A. F.);
- o relatório preliminar com dados informáticos de fls. 1699/1703, do 6.º vol.;
- a cópia do contrato de renting e da factura da máquina Roland EGX350HF: de fls. 1803 a 1809 do 6.º vol.;
- as certidão de Registo Comercial das sociedades “…, S.A.” e “...-Têxteis, S.A.” de fls. 1779/1781, do 6.º vol. e de fls. 2056/2063, do 7.º vol., respectivamente;
- as fotografias do telemóvel do arguido J. M. de fls. 2224/2243, do 8.º vol..
D) O relatório de análise forense ao computador portátil da marca “DELL” de fls. 1444/1445, do 7.º vol..
E) O exame pericial de fls. 2202/2215, do 8.º vol..
F) O auto de exame de munições de fls. 1684, do 6.º vol. e a informação policial do SIGAE de fls. 1765 do 6.º vol..
G) As intercepções telefónicas: sessões dos alvos 66354040, 68391040 e 66354040, cujas transcrições constam de apenso I.
H) Os certificados do registo criminal de fls. 2407 (B. F.), 2408 (M. A.), 2409/2410 (P. F.) e 2423/2425 (J. M.), todos do 8.º vol..
I) Os relatórios sociais de fls. 2494/2495 (B. F.), 2496/2498 (P. F.), 2499/2502 (J. M.) e 2508/2512 (M. A.), todos do 9.º vol..

No que respeita às declarações do arguido, bem como aos depoimentos das testemunhas dispensamo-nos, aqui, de os reproduzir, uma vez que a audiência foi objecto de gravação.

Dir-se-á, apenas, em síntese, que:

A) das declarações dos arguidos:

- M. A.: começou por dizer que o Inácio J. P., de quem é amigo há muito anos, emprestou dinheiro ao “J. M,.” (J. M.) há 4 ou 5 anos, que por este desaparecido o J. P. começou a pressioná-lo para resolver o problema. Assim, como sabia que o “J. M.” tinha cunhos e de modo a resolver o problema, pediu-lhe que lhe emprestasse os cunhos para moedas de € 2, o que este aceitou, e mostrou-os ao amigo J. P., propondo-lhe que fizessem alguma coisa com os cunhos. Mas disse que tal proposta se destinou apenas ganhar tempo, pois que não pretendia fazer nada. Mais disse que a peça do “J. M.” estava partida e não dava para fazer nada. Conhecia o J. M. com quem teve um negócio e ambos envolveram-se com espanhóis: ele próprio porque lhes vendia peúgas e o “J. M.” lhes vendia máquinas. Mais disse que os espanhóis “AB e o ML” queriam que o “J. M.” fizesse notas”, mas que este declinou. Mais disse que esteve com o P. F. duas ou três vezes, porque estes acompanhavam o J. M., mas não os conhecia. Relativamente às conversas com o “Ferreira” disse que foi ele que consertou a peça partida.
- P. F.: Só teve conhecimento do que se passava no dia em que a PJ actuou, não sabia. Disse que só tinha uma máquina normal de fazer gravações, uma fresadora e nada mais do que isso. Esclareceu que só falou com o “…” por causa da compra de um carro (o J. M. é que o apresentou) e nada mais do que isso. Relativamente ao J. M., disse que arranjava as máquinas do cunhado C. L. e por isso convivia com ele (que conheceu na cadeia). Mais explicou que quando a empresa fechou decidiu guardar algumas coisas, em particular máquinas e secretárias, dessa empresa. Negou ser o “dono” da empresa, afirmando que ele e o filho eram empregados da mesma. Relativamente à arrecadação afirmou que esta pertencia à sua amiga E. B., sendo certo que “ao princípio tinha as chaves dela”. Relativamente à manutenção da máquina não soube dizer a razão por que foi feita, já que, segundo disse, não estava a ser utilizada. Mais esclareceu que o B. F. assinava tudo da “...”, mas era apenas “testa de ferro” do C. L., já que ele era só funcionário da empresa. Finalmente, disse que o filho B. F. tem apena o 9.º ano de escolaridade, não sendo técnico de informática;
- J. M.: o qual afirmou que cunhos encontrados lhe pertenciam desde o ano de 2002, mas danificou-os para não poderem ser usados. Disse, ainda, nem os acrílicos encontrados davam para fazer noas (“não dão para fazer nada”), nem a peça dava para fazer moedas. Mais disse que não tinha intenção de fazer notas nem moedas. Afirmou ainda que a máquina tinha lupa e fresas, mas como não havia qualquer nota de € 500, não era possível analisar a fidedignidade e qualidade da impressão. Relativamente aos encontros com os espanhóis, afirmou que foram eles que que vieram procurá-lo para que fizesse notas, o que declinou. Confirmou, ainda, ser devedor do Inácio J. P.. Quanto às munições, afirmou que as mesmas têm mais de 20 anos por nessa altura ter sido caçador.
Das declarações que prestou perante JIC no 1.º interrogatório judicial disse que
- B. F. [declarações prestada perante JIC em sede de 1.º interrogatório judicial de arguido detido - advertido nos termos do art. 141.º, n.º 4, als. b) e e) do C.P.P.]: disse que foi “apanhado de surpresa” pois só estava a acompanhar o “Sr. J. M.” (que lhe foi apresentado pelo pai na fábrica “...”, onde trabalhava e onde o “Sr. J. M.” reparava máquinas. Na altura da busca, estava lá a acompanhá-lo porque ele queria falar com ele, ia pedir-lhe um favor e que lhe “daria uma prenda por isso”, mas que não chegou a concretizar-se porque a judiciária entrou entretanto. Mais disse que o “Sr. J. M.” estava a trabalhar com a máquina, mas não viu. Foi o “J. M.” quem lhe pediu para levar o seu computador e era ele quem estava trabalhar nele. Mais confirmou que ele estava com um programa da máquina aberto e a fazer uma impressão “numa coisa plástica”.

B) Nos depoimentos das testemunhas:

- J. P.: conhece os arguidos M. A. e J. M. por serem seus amigos. Disse que emprestou € 20.000,00 ao “J. M.” por este estar com dificuldades, não sabendo a que se destinava. E como o dinheiro não lhe foi devolvido pressionou o M. A. para que o J. M. lhe devolvesse o dinheiro, pois que já tinham passado 2 ou 3 anos. Perguntou então ao M. A. se arranjava maneira para lhe pagar o dinheiro. Em face da pressão, o M. A. mostrou-lhe umas peças, uns anilhos e uns cunhos dizendo-lhe que dava para fazer umas moedas falsas, o que este recusou. Confrontado com o RDE de fls. 526/442, confirmou as fotografias onde estão retratados os mencionados cunhos. Mais disse que se lembra de um telefonema de um terceiro para o M. A. referente a umas anilhas.
- A. C.: começou por dizer que o arguido J. M. que tinha um contacto em Espanha para ir trabalhar, mas nada relacionado com o fabrico de moedas. Entretanto foi detido pelo inspector D. A. que lhe pediu “para atrair o J. M. para o apanhar”. Confrontado com o depoimento que prestou em sede de inquérito de fls. 1885/1887, linhas 11 a 42 e 51 a 58 do 6.º vol. (cuja leitura foi permitida) e apesar de aí constar o contrário, reafirmou em audiência que nunca falou com o J. M. de contrafacção de notas falsas, nomeadamente de dólares em Espanha.
- F. A.: explicou que tinha uma máquina de impressão Offset antiga para vender e colocou-a na internet (OLX). Foi contactado pelo J. M. que foi vê-la e depois a comprou. Foi a única máquina que vendeu ao J. M. e foi um colega dele que a levou e entregou ao J. M..
- A. F.: afirmou que conhece o M. A. há 20/25 anos, por razões profissionais, pois reparou muitas vezes as peças das máquinas da empresa de peúgas que aquele tinha. Nuna ocasião, o M. A. pediu-lhe meia dúzia de anilhas e respectivos discos, mas não sabe a que se destinavam, pois faz imensas todos os dias. Confirma as conversas telefónicas, cujo conteúdo confirma explicando que se reporta a uma grande encomenda que o M. A. pretendia fazer. Mais disse que o M. A. lha trouxe um dia uma peça partida nas beiras e que a tentou reparar. Confirma que as fotografias de fls. 1688 a) e c), do 6.º vol. retratam a peça que reparou (“esta peça dava para fundir, para moldar. Estava inutilizada e eu reparei-a. Para moeda não dava”) e as anilhas. Confrontado com o depoimento que prestou em sede de inquérito de fls. 1931/1934, do 7.º vol. (cuja leitura foi permitida), confirmou o seu teor, em particular no que se refere à sua desconfiança quanto ao destino das anilhas que lhe tinha feito.
- J. T.: disse que conhece o “J. M.” por este ter comprado, como intermediário, uma máquina fresadeira, que foi entregue em Braga à empresa “...” directamente ao “Sr. P. F.” (que o J. M. apresentou como sendo o responsável da empresa) e ao “J. M.”. Mais disse que só explicou o funcionamento da máquina ao B. F., e que deu formação quando entregou a máquina e depois numa segunda ocasião (segunda formação) para poderem manusear melhor o equipamento. Essa segunda formação teve lugar numa garagem dum prédio onde estiveram presentes o B. F., o J. M. e o P. F., mas reafirmou que só deu formação ao primeiro. Verificou que a máquina tinha resíduos, razão pela qual percebeu que a mesma estava ser utilizada. Mais disse que, nesse local, só estava aquela máquina numa bancada. Disse, ainda, que o J. M. foi ter com ele várias vezes para afiar as fresas. Explicou, ainda, a forma como feito o renting e com quem. Relativamente à função das máquinas fresadoras, explicou que estas têm por objectivo fresar materiais e podem, nomeadamente, fazer hologramas e cunhos, com o programa informático. Confrontado com as fotografias de fls. 1664, do 6.º vol. afirmou que os mesmos “podem ter sido feitos pela máquina que vendeu”.
- J. A.: afirmou que foi administrador da “…” até 2017 e lá trabalhava o P. F., sendo que o J. M. lá ia fazer reparações de máquinas. Mais disse que a empresa “...” era do C. L. e era este quem “mandava”, embora o administrador fosse o B. F. inscrito. Desconhece o destino da maquinaria. Mais disse que o P. F. trabalhava na parte da manutenção nas duas empresas.
- E. B.: disse ser companheira do P. F. e confirmou que os arrumos lhe pertenciam. Mais disse que deu uma cópia das chaves ao P. F. ao filho, mas que aquele lhe entregou logo depois de fazer a mudança. Mais disse que o P. F. não lhe deu qualquer explicação acerca da presença do filho nos arrumos aquando da busca e apreensão. Confrontada com o depoimento que prestou em sede de inquérito de fls. 1890/1892, linhas 16 a 23 e 28 a 48, do 6.º vol. (cuja leitura foi permitida), acabou por não desmentir o que aí consta e que difere do que havia dito primeiro no tocante às chaves.
- M. N.: afirmou que arrendou o apartamento, a garagem e os arrumos à E. B., através de uma imobiliária que se encarregou de lhe entregar as chaves. Confrontado com o depoimento que prestou em sede de inquérito de fls. 1894, do 6.º vol. (cuja leitura foi permitida) confirma o seu teor, esclarecendo que o contrato de arrendamento foi feito com uma imobiliária e foi ela quem entregou as chaves. Mais disse que tanto a E. B. como o P. F. lhe pagavam a renda.
- D. A., inspecto da PJ, o qual teve a seu cargo a investigação. Assim, explicou que recolheu uma informação em 2014 de que o arguido J. M. iria comprar papel para impressão, informação essa interligada a um outro processo de Lisboa em que estavam ligados os arguido J. M. e M. A., juntamente com uns indivíduos de nacionalidade espanhola (AB e ML). Por essa razão, ele (e a sua equipa) começou a realizar vigilâncias – os RDE supra mencionados e que a testemunha confirma integralmente – onde estão retratados os vários encontros com os espanhóis e entre os próprios arguidos. Mais disse que nos seguimentos que foram efectuados viram que os arguidos J. M. e B. F. ficavam juntos no local “às oito horas seguidas”.

Para além dos RDE, confirmou também os autos de busca e apreensão. Mais explicou que o colchão encontrado nos arrumos destinava-se a impedir ou diminuir a propagação do som que a máquina produzia. Disse ainda que tal máquina estava fazer numa peça de acrílico de uma nota de € 500. Tal molde seria depois passado para chapas para ulterior impressão das notas. Quanto ao papel do M. A. disse que o mesmo era o angariador. A peça é fundamental à contrafacção. E a máquina foi apreendida nos anexos do J. M.. Relativamente às moedas disse que só faltavam os cunhos, pois existiam as anilhas, a máquina do rendilhado, só faltava “dar a dureza do aço” e tinha de arranjar alguém de confiança para dar essa dureza. Disse finalmente que o arguido J. M. tinha o know how todo, sendo que era “o melhor contrafactor do país”. Explicou as fotografias, nomeadamente a de fls. 1664 do 6.º vol. (a máquina artesanal, a moeda, outros cunhos ainda não acabados, o que levou a concluir que se reportavam às experiências/ensaios que tinha feito); fls. 1888 a)do 6.º vol. (a máquina rendilhada que se encontrava no carro do M. A.). Relativamente à questão da ferrugem, explicou que tal situação poderá ter ocorrido do facto de terem sido colocados num local húmido e, não de serem velhos.
Enunciados os meios de prova, passemos à análise crítica, descrevendo os pilares que estão na base da construção da convicção do tribunal.
Antes do mais diremos que as declarações dos arguidos são absolutamente destituídas de sentido e contraditórias entre si. Na verdade, os arguidos procuraram apenas confundir o tribunal com explicações objectivamente absurdas (basta ouvi-las com atenção para se chegar a esta conclusão) e desprovidas de qualquer lógica, em particular quanto aos objectos apreendidos e a sua finalidade e quanto aos encontros que mantiveram entre si e com terceiros.
Ademais, não encontram nos demais meios de prova qualquer sustentabilidade, resultando antes o contrário do que procuraram fazer crer.
Por estas razões, as suas declarações não forma atendidas pelo tribunal.
Restam-nos, assim, os depoimentos das testemunhas, das quais se destacam em particular o depoimento do inspector da PJ, D. A. e os restantes elementos de prova, nomeadamente as imagens recolhidas nas vigilâncias (e que retratam, para além do mais, os vários encontros), bem como os autos de busca e apreensão e o que deles resultou e foi apreendido, para além dos exames de perícia forense que incidiu sobre os materiais/objectos apreendidos.
No que toca aos depoimentos prestado e com excepção das testemunhas J. P., A. C. e E. B.– a primeira, quando afirmou que recusou a proposta, quando resulta um grande interesse da sua parte em que se concretizasse a contrafacção de moedas, cfr. sessões telefónicas n.ºs 717, 730 e 738 do alvo 66354040 e 39 do alvo 68391040; a segunda, porque procurou descredibilizar o inspector da PJ, apesar de ter dito algo bem diferente quando foi ouvido em inquérito e que se mostra sustentado pela restante prova; a terceira, porque foi evasiva e não quis visivelmente prejudicar o companheiro e o filho deste -, diremos que os seus depoimentos se nos afiguraram isentos e credíveis, pela forma como foram prestados, apesar de forte conforto a que as testemunhas foram sujeitas, não vacilando nem apresentando quaisquer sinais de inverdade.
Ademais, mostram-se devidamente sustentados nos demais elementos de prova, nomeadamente nas sessões telefónicas, nos RDE e respectivas imagens, fotografias, factura e cópia de contrato de renting, e, sobretudo, nos autos de busca e apreensão.
E, especificadamente quanto ao depoimento do inspector da PJ, diremos que apesar das tentativas em descredibilizar o seu depoimento, também pelo arguido J. M., o certo é que as afirmações que efectuou encontram total sustentabilidade no relatório pericial efectuado pelo LPC da PJ e constante de fls. 2203/2215 do 8.º vol..
Assim, atendeu-se ao mencionado relatório pericial o qual concluiu, nomeadamente, que “todo o material metálico recebido para exame apresenta características e dimensões de moedas autênticas. Todo o material sugere serem restes de testes e experiências de forma a atingir os valores das moedas autênticas tanto a nível do seu aspecto exterior/design) como na sua caracterização elementar (magnetismo e condutividade). Relativamente às placas acrílicas, as mesmas foram analisadas através de luz transmitida tendo por base uma nota autêntica de € 500 com o objectivo de identificar a presença de uma sobreposição/match dimensiona, entre o exame e espécimen sendo que se concluiu que todas as placas com gravações apresentam características de gravação idênticas, ou seja, com profundidade para realizar a transferência para moldes para posterior elaboração de chapas de impressão. Nenhuma apresentava a gravação de nota de € 500 completa, mas todas as placas continham os elementos de segurança tácteis.”.
No que toca aos factos constantes dos pontos 11, 13, 14, 15 e 16: para além de ter resultado das próprias declarações dos arguidos e dos depoimentos das testemunhas referidas no que respeita à forma como aqueles actuaram, que são imputáveis e têm consciência dos actos que praticam, em presunção judicial decorrente das circunstâncias que envolveram a actuação destes e das regras da normalidade e experiência comuns já referidas, consideradas no âmbito do princípio da livre apreciação da prova consagrado no art. 127.º do C.P.P..
Por fim, diremos para a formação de uma convicção sem margem para qualquer dúvida razoável quanto à natureza de cada um dos actos em causa, relativamente a todos os arguidos, não é necessário uma prova directa sobre aquilo que foi observado.
Na verdade, se um indício isolado não permite concluir de forma minimamente segura pela verificação de um facto, a articulação de vários indícios consentâneos entre si e não contrariados (de forma cabal) por qualquer outro meio de prova (directa ou indirecta) pode legitimamente (e deve) conduzir a julgar provada a factualidade pelos mesmos indiciada.
O mesmo é dizer, no caso da contrafacção de moeda, que, não sendo bastante a prova da existência de uma nota ou moeda ainda incompleta, mas falsa, para daí concluir que se trata de contrafacção, já o será a articulação, à luz das regras da experiência, dessa prova com a apreensão, ao mesmo agente de tais “peças” e a articulação com o que resulta da apreensão de outros objectos todos relacionados com a contrafacção (máquinas, impressoras, papel, metal, etc…), tudo conjugado ainda com a circunstância com as dificuldades económicas dos arguidos à data da ocorrência.
Assim, conjugados todos estes elementos e com base nas regras da experiência comum, e ao abrigo do princípio da livre apreciação da prova, chegou o tribunal à convicção da ocorrência dos factos constantes da matéria de facto e nos termos em que aí constam.
Quanto às condições pessoais dos arguidos: no teor dos relatórios sociais e nos C.R.C.’s supra mencionados.”
*
III - Apreciação do recurso

Preceitua o artigo 410º, nº 2, do Código de Processo Penal, que: “Mesmo nos casos em que a lei restrinja a cognição do tribunal de recurso a matéria de direito, o recurso pode ter como fundamentos, desde que o vício resulte do texto da decisão recorrida, por si ou conjugada com as regras da experiência comum:

a) A insuficiência para a decisão da matéria de facto provada;
b) A contradição insanável da fundamentação ou entre a fundamentação e a decisão;
c) Erro notório na apreciação da prova.”

A insuficiência para a decisão da matéria de facto provada ocorrerá - como referem Simas Santos e Leal Henriques em “Recursos em Processo Penal”, citados por Maia Gonçalves em “Código de Processo Penal Anotado”, Almedina, 16ª edição, pág. 871 – quando exista uma lacuna no apuramento da matéria de facto indispensável para a decisão de direito, isto é, quando se chega à conclusão de que com os factos dados como provados não era possível atingir-se a decisão de direito a que se chegou, havendo assim um hiato nessa matéria que é preciso preencher.

Porventura, melhor dizendo, só se poderá falar em tal vício quando a matéria de facto provada é insuficiente para fundamentar a solução de direito e quando o tribunal deixou de investigar toda a matéria de facto com interesse para a decisão final.

Ora, como vem considerando o Supremo Tribunal de Justiça, só existe tal insuficiência quando se faz a “formulação incorrecta de um juízo” em que “a conclusão extravasa as premissas” ou quando há “omissão de pronúncia pelo tribunal sobre factos alegados ou resultantes da discussão da causa que sejam relevantes para a decisão, ou seja, a que decorre da circunstância de o tribunal não ter dado como provados ou como não provados todos os factos que, sendo relevantes para a decisão, tenham sido alegados pela acusação e pela defesa ou resultado da discussão.”

Quanto à contradição insanável da fundamentação ou entre a fundamentação e a decisão consiste, basicamente, na incompatibilidade, insusceptível de ser ultrapassada através da própria decisão recorrida, entre os factos provados, entre estes e os não provados ou entre a fundamentação e a decisão.

Assim, há oposição na matéria de facto provada quando, por exemplo: se dão como provados dois ou mais factos que estão entre si em oposição (que sejam logicamente incompatíveis); há oposição entre a matéria de facto provada e a matéria de facto não provada quando se dá como provado e não provado o mesmo facto; há uma incoerência da fundamentação probatória da matéria de facto quando se dá como provado certo facto e da motivação da convicção resulta que seria outra a decisão de facto correta; e há oposição entre a fundamentação e a decisão quando a fundamentação de facto e de direito apontam para uma determinada decisão final e no dispositivo da sentença consta decisão em sentido diverso.

O erro notório na apreciação da prova constitui uma “falha grosseira e ostensiva na análise da prova, perceptível pelo cidadão comum, denunciadora de que se deram como provados factos inconciliáveis entre si, que o que se teve como provado ou não provado está em desconformidade com o que realmente se provou ou não provou, que as conclusões são ilógicas ou inaceitáveis ou que se retirou de um facto provado uma conclusão logicamente inaceitável.

Dito de outro modo, há tal erro quando um homem médio, perante o que consta do texto da decisão recorrida, por si só ou conjugada com o senso comum, facilmente se dá conta de que o tribunal violou as regras da experiência ou se baseou em juízos ilógicos, arbitrários ou mesmo contraditórios ou se desrespeitaram regras sobre o valor da prova vinculada ou das leges artis – cfr. Simas Santos e Leal Henriques, obra citada.

Descritos, ainda que sumariamente, os apontados vícios, incontroverso é que eles têm de resultar da decisão recorrida (melhor, do texto da decisão), por si só ou conjugada com as regras da experiência comum.

Não é, pois, admissível o recurso a elementos estranhos à sentença, como, por exemplo, quaisquer outros dados existentes nos autos, mesmo que provenientes do julgamento, tratando-se, portanto, de vícios intrínsecos da sentença que, quanto a eles, terá que ser suficiente.

No caso em apreço inexiste qualquer nulidade e não se vislumbra qualquer dos vícios supra elencados – o invocado erro notório na apreciação da prova, por violação do princípio “in dubio pro reo”, que o recorrente veio invocar, será analisado em seguida.
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O recorrente afirma (ponto 1 da motivação de recurso) que “o Tribunal Colectivo a quo, não realizou de forma plenamente satisfatória as exigências de objectividade, lógica e motivação que o princípio da livre apreciação da prova postula, pelo que, não existindo prova legal ou tarifada, o concreto uso do material meramente indiciário posto à sua disposição, de forma a atingir uma dada convicção, é susceptível de censura, à qual acresce a preterição do princípio “in dubio pro reo” porquanto ressalta que a mera utilização de uma fresadora e um computador sem qualquer impressora ou offset, e outros elementos juntos e apreendidos, por si são insuficientes para a formação de uma convicção plena, …”.
Mais adiante (pontos 14 a 20 da motivação), o recorrente vem concretizar a alegação, esclarecendo que não ficou provado que tivesse sido praticado qualquer ato de execução indispensável à consumação do crime de contrafacção de moeda.
Ora, percorrido o acórdão em causa, não se vislumbra (do seu teor), que o tribunal haja violado as regras da experiência ou que se tenha baseado em juízos ilógicos, arbitrários ou mesmo contraditórios, aos olhos do cidadão comum. Ao invés, apresenta uma fundamentação completa, lógica e congruente da posição assumida.
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No que concerne à violação do princípio “in dubio pro reo”.

Como é sabido, a prova não pode ser analisada de forma segmentada, atomizada. “O julgador tem de apreciar e valorar a prova na sua globalidade, estabelecendo conexões, conjugando os diferentes meios de prova e não desprezando as presunções simples, naturais ou hominis, que são meios lógicos de apreciação das provas e de formação da convicção.”
A convicção formada mostra-se explicitada em termos perfeitamente perceptíveis, não se vislumbrando qualquer dúvida em que tenha incorrido o tribunal que possa dar lugar à aplicação do invocado princípio.
O princípio “in dubio pro reo” traduz-se numa imposição dirigida ao juiz no sentido de este se pronunciar de forma favorável ao arguido quando não tiver a certeza sobre os factos decisivos para a solução da causa, pelo que a sua violação exige que o juiz tenha ficado na dúvida sobre factos essenciais e, nesse estado de dúvida, tenha decidido contra o arguido.

É insofismável que perante uma dúvida sobre os factos desfavoráveis ao arguido, que seja insanável, razoável e objectivável, o tribunal deve decidir “pro reo”.

Como ensina o Prof. Figueiredo Dias ““à luz do princípio da investigação bem se compreende, efectivamente, que todos os factos relevantes para a decisão (quer respeitem ao facto criminoso, quer à pena) que, apesar de toda a prova recolhida, não possam ser subtraídos à “dúvida razoável” do tribunal, também não possam considerar-se como provados. E se, por outro lado, aquele mesmo princípio obriga em último termo o tribunal a reunir as provas necessárias à decisão, logo se compreende que a falta delas não possa, de modo algum, desfavorecer a posição do arguido: um non liquet na questão da prova – não permitindo nunca ao juiz, como se sabe, que omita a decisão (…) – tem de ser sempre valorado a favor do arguido. É com este sentido e conteúdo que se afirma o princípio in dubio pro reo.””

Em momento algum resulta do acórdão recorrido que, relativamente à factualidade provada e não provada apreciada nos autos, tenha o tribunal a quo ficado com dúvidas, a mais pequena que fosse, na formação da sua convicção. E, obviamente, muito menos que, tendo-a, haja decidido em desfavor do(s) arguido(s).

Também não se verifica que a matéria de facto assente não esteja suficientemente suportada na prova produzida, de molde a deixar dúvidas inultrapassáveis no espírito do tribunal e que, apesar disso, haja decidido “contra” o(s) arguido(s).

Nestes termos, e, porque nenhuma censura pode merecer o juízo valorativo plasmado na sentença, sendo que ao decidir como decidiu o tribunal a quo não incorreu na violação do princípio “in dubio pro reo”, improcede, neste segmento, o recurso.
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A verdade, porém, é que da motivação e das conclusões do recurso apresentado o que se conclui é que, apesar da invocação do referido vício e da violação do citado princípio basilar, o recorrente não pretende pôr em causa a matéria de facto apurada, mas apenas questionar a conclusão de ter praticado um crime de contrafacção de moeda, sob a forma tentada - por entender que só ocorreram atos preparatórios e nenhum ato de execução – bem como a condenação pelo crime de detenção de arma proibida – porque as munições “estariam obsoletas” e detinha-as pelo menos desde 2002, quando iniciou o cumprimento de pena de prisão, não havendo dolo na detenção, mas sim erro sobre a ilicitude ou negligência.
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O crime de contrafacção de moeda na forma tentada (atos preparatórios/atos de execução).

Preceitua o art. 262º do Código Penal, sob a epígrafe “Contrafacção de moeda”, que: “1 – Quem praticar contrafacção de moeda, com intenção de a pôr em circulação como legítima, é punido com pena de prisão de três a doze anos.”.

O art. 22º do mesmo diploma (“Tentativa”), estabelece: “1 – Há tentativa quando o agente praticar actos de execução de um crime que decidiu cometer, sem que este chegue a consumar-se. 2 – São actos de execução: a) Os que preencherem um elemento constitutivo de um tipo de crime; b] Os que forem idóneos a produzir o resultado típico; ou c) Os que, segundo a experiência comum e salvo circunstâncias imprevisíveis, forem de natureza a fazer esperar que se lhes sigam actos das espécies indicadas nas alíneas anteriores.”.
Por sua vez, o art. 21º do Cód. Penal (“Actos preparatórios”), dispõe que: “Os actos preparatórios não são puníveis, salvo disposição em contrário.”.
E tal disposição existe. É o art. 271º do mesmo diploma legal, que estatui: “1 - Quem preparar a execução dos actos referidos nos artigos 256º, 262º, 263°, no nº 1 do artigo 268º, no nº 1 do artigo 269º, ou no artigo 270º, fabricando, importando, adquirindo para si ou para outra pessoa, fornecendo, expondo à venda ou retendo: a) Formas, cunhos, clichés, prensas de cunhar, punções, negativos, fotografias ou outros instrumentos que, pela sua natureza, são utilizáveis para realizar crimes; ou b) Papel, holograma ou outro elemento igual ou susceptível de se confundir com os que são particularmente fabricados para evitar imitações ou utilizados no fabrico de documento autêntico ou de igual valor, moeda, título de crédito ou valor selado; é punido com pena de prisão até um ano ou com pena de multa até 120 dias.”.
Feita esta introdução, importa dilucidar se a conduta do recorrente se traduziu na prática de atos de execução do crime decidido, havendo tentativa, ou se se limitou a preparar a execução, constituindo então somente atos preparatórios.
Da transcrição supra efectuada (art. 271º) não restam dúvidas que o recorrente praticou (pelo menos) tais atos preparatórios, já que adquiriu e/ou fabricou e detinha, entre outros, cunhos e peças metálicas para uso como cunhos, prensas, maquinaria de estampagem e gravação, placas acrílicas gravadas com elementos de notas, ponteiros de gravação, fotografias, papel, guilhotina e diversas outras peças metálicas, além de equipamento informático, adequados à preparação e fabrico de notas e moedas metálicas.

Como refere Helena Moniz (anotação ao art. 271º, Comentário Conimbricense, pág. 859), ““as condutas punidas no âmbito do art. 271º constituiriam uma punição da “tentativa da tentativa” …,””.

Ora, como já supra se referiu, a questão está em saber se o recorrente se limitou a preparar a execução dos atos, simplesmente adquirindo ou fabricando os instrumentos necessários para o efeito, ou se, ao invés, foi mais longe, levando a cabo atos de execução do crime que decidiu cometer.

Como se refere no sumário do Acórdão do TRP de 11/04/2018 (proc. 216/16.8GBFLG.P1, disponível em dgsi.pt): “A tentativa começa onde os atos preparatórios acabam: o diferenciador é a existência ou não de uma execução em marcha.”.

Ora, no caso em apreço, o recorrente, além da mera aquisição ou fabrico dos instrumentos necessários e adequados á concretização do crime de contrafacção de moeda, foi mais além, ensaiando o fabrico de moedas bimetálicas de € 2,00. Para este efeito, procedeu à impressão, numa delas, da face nacional francesa do ano de 2001 e, na outra, o anverso exibindo a face comum do Euro.
E o mesmo se diga da gravação em placas acrílicas de elementos das notas de € 500,00. Relativamente a estas placas acrílicas, o recorrente invoca a insusceptibilidade das mesmas para a produção das notas. Mas, como ressalta das conclusões do exame pericial de fls. 2202 a 2215 (vol. 8º): “Todas as placas recebidas para exame com gravações apresentam características de gravação idênticas, ou seja, com profundidade suficiente para realizar a transferência para moldes para posterior elaboração de chapas de impressão.”
Pelo exposto, bem andou o Tribunal a quo ao considerar que, havendo resolução criminosa, “os sucessivos actos de aperfeiçoamento da falsificação de moeda, destinados à obtenção de uma cópia original tão perfeita quanto possível, traduzem actos de execução da contrafacção enquadráveis no conceito de tentativa” – citando o sumário do Ac. do STJ de 12.11.1996, publicado na Internet in www.dgsi.pt/jstj.

Efetivamente, da factualidade apurada em audiência, não podem restar dúvidas que, atento o adiantado estado de desenvolvimento da actividade, os atos praticados são de natureza a esperar, segundo a experiência comum, a subsequente produção de moedas e notas falsas. Produção que só não se veio a concretizar devido à intervenção policial e à apreensão do acervo dedicado a tal desiderato.

Ainda segundo o citado Acórdão do TRP: “o critério legal para a distinção entre actos preparatórios e actos de execução é um critério objectivo: Os actos de execução hão-de conter, em si mesmos, um momento de ilicitude, pois que ainda que não produzam a lesão do bem jurídico tutelado pela norma incriminadora do crime consumado produzem já uma situação de perigo para esse bem. E, é este perigo objectivo – embora aparente – causador de alarme e intranquilidade social que possui aptidão bastante para fundamentar a punição do agente, …” – cfr. também os Acórdãos do TRE de 17/03/2015 (proc. 144/08.0JAFAR.E1) e do TRG de 03/04/2017 (proc. 49/14.6T9BRG.G1)

Nestes termos, conclui-se que a conduta prosseguida pelo recorrente não se subsume a atos preparatórios, mas sim a atos de execução, tal como fez o acórdão recorrido, pelo que o recurso improcede, nesta parte.
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Crime de detenção de arma (munições) proibida.

O recorrente limita-se a invocar que as munições “estariam obsoletas” e que as detinha pelo menos desde 2002, quando iniciou o cumprimento de pena de prisão e abandonou a prática da caça, pelo que não havia dolo na detenção, mas sim erro sobre a ilicitude ou negligência.
Cumpre recordar que ao recorrente foram apreendidos 162 cartuchos de caça de calibre 12 Gauge, de várias marcas e modelos diversos, que detinha numa mala/pasta nuns arrumos.
Quanto à alegada obsolescência das munições, impõe-se assinalar que a mesma não ficou provada e também não resulta do auto de exame de fls. 1684 que, ao invés, concluiu que elas se apresentam “em aparente bom estado de conservação, com aspecto de conterem todos os componentes e de ainda estarem em condições de serem imediatamente disparadas”.
No que concerne aos alternativamente propugnados erro sobre a ilicitude ou negligência na detenção - que o recorrente não concretiza em que se traduzem um e outra, salvo o facto de ter cumprido pena de prisão (extensa) – nada se demonstrou que permitisse obter tal conclusão.
Neste aspeto, cumpre somente dizer que, como é facto notoriamente conhecido, a publicação em 2006 do Regime Jurídico das Armas e Munições foi objecto de ampla difusão noticiosa, pelo que se afigura algo caricato vir arguir a falta de consciência sobre a ilicitude, decorridos 10 anos (à data da apreensão) sobre a vigência de tal regime jurídico. A proibição era plenamente conhecida de toda a gente, tendo sido comentada não só nos órgãos de comunicação social, mas também em todas as tertúlias.
Já quanto à detenção negligente, também nada se apurou que permita obter tal conclusão. Pelo contrário, o tribunal a quo, usufruindo da imediação e da oralidade da prova, concluiu pela detenção dolosa das referidas munições, nada havendo que imponha solução diversa.
Mas não pode deixar de se assinalar que, tendo cessado a actividade venatória por alturas de 2002, o recorrente ainda detivesse tais munições ao fim de 14 anos, quando foram apreendidas, mesmo tendo permanecido por um longo período na cadeia. Temos de convir que seria uma grande negligência ou, pelo menos, muito persistente no tempo, o que é inadmissível. Em suma, o arguido detinha as citadas munições, porque assim o queria.
Pelo exposto e sem necessidade de mais considerações, também neste segmento o recurso improcede.
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Suspensão da pena de prisão.

O recorrente foi condenado, em cúmulo jurídico - das penas parcelares de 3 anos e 4 meses pelo crime tentado de contrafacção de moeda e de 1 ano e 6 meses pela detenção de arma proibida – na pena única de 4 anos de prisão efectiva.
Insurge-se contra a pena aplicada - por ter sido a única condenação em prisão efectiva, apesar de não se ter provado uma maior participação sua em qualquer ato – entendendo que a mesma está “relacionada com o registo criminal do recorrente, em concreto os crimes cometidos há 16 anos atrás, numa espécie de dupla condenação” (conclusão XVI), pugnando pela suspensão da execução da mesma.
O recorrente “espanta-se” por ser o único (dos 4 arguidos) condenado a uma pena de prisão efectiva (dos demais, dois foram condenados em pena de prisão suspensa na execução e outro em pena de prisão substituída por prestação de trabalho a favor da comunidade). Mas certamente não atentou em que é o único condenado pela prática de dois crimes!
O Tribunal recorrido fundamentou amplamente as medidas concretas das penas – cfr. fls. 2592 a 2604 dos autos – tendo em conta os fins visados pelas penas (art. 40º do CP), bem como a culpa dos agentes e as exigências de prevenção, inclusive as circunstâncias previstas no art. 71º do CP.
No que respeita ao recorrente, o tribunal salientou as suas condições pessoais, concluindo ter ele “uma personalidade que está muito longe de ser modelar, com uma intensa e reiterada vontade criminosa, sendo pois muito exigentes as necessidades ao nível da prevenção geral e especial.”

Ponderou a eventual suspensão da pena de prisão, concluindo que o arguido “não é propriamente um ingénuo e inexperiente contrafactor de moeda falsa, mas a de alguém que propondo viver à custa do alheio, não hesita em iniciar contactos em Espanha e em Portugal, pondo em prática um plano urdido para enganar terceiros e obter bens ou valores conseguidos pelo uso de moeda falsa à custa alheia, o que, no caso, configura mesmo tendência para o crime, tanto mais que já cumpriu penas de prisão efectiva por este tipo de ilícito, não deixando de ser reveladora de uma personalidade malformada, pelos sentimentos revelados, por isso que carece de educação para o direito.”

Considera ainda o Tribunal a quo que a personalidade do recorrente “exige punição que lhe sirva de emenda, que o leve a arrepiar caminho onde é bem evidente arrojo e audácia reiterados, e que a sua débil condição económica não justifica, deixando a pairar até a ligação a uma rede montada de falsários, tudo exacerbando a punição, por razões da prevenção especial, que representa a finalidade particular da pena, como ainda por razões de prevenção geral que também demanda uma intervenção vigorosa do direito penal, para dissuasão de potenciais delinquentes e de afirmação da validade e eficácia da lei, necessária à confiança dos cidadãos nos seus órgãos aplicadores, à luz do ideário da prevenção geral positiva ou de integração, onde predomina a ideia de que é imperioso cumprir a lei para bem da comunidade e da segurança social que traz.”

Importa aqui recordar os diversos antecedentes criminais do arguido:

- por acórdão de 06/07/1995, uma condenação na pena única de 10 anos e 6 meses de prisão, pela prática, em 02/04/1994, de 3 crimes de coacção, de 1 crime de contrafacção de moeda, de 1 crime de detenção de arma proibida e de 1 crime de tráfico de estupefacientes, Beneficiou do perdão de um ano. Veio a ser-lhe revogada a liberdade condicional concedida;
- por acórdão de 29/07/2004, foi condenado pela prática, em 22/11/2002, de um crime de contrafacção de moeda, de um crime de actos preparatórios para a contrafacção de moeda e de um crime de detenção ilegal de arma, na pena única de 6 anos, 1 mês e 15 dias de prisão.

Acaba por concluir o Tribunal recorrido que “não haverá lugar à suspensão da execução da pena de prisão, uma vez que tal se não afigura adequado e suficiente a assegurar as finalidades da punição, nomeadamente as atinentes à prevenção do cometimento de futuros crimes, tendo em conta antecedentes criminais do arguido, em particular as anteriores condenações pela prática de crimes de idêntica natureza e em penas de prisão efectiva, sem que isso tenha servido de suficiente advertência para que o arguido inflectisse o seu estilo de vida e para que evitasse a prática de novos factos criminosos (sendo que numa dessas condenações, o arguido beneficiou de liberdade condicional, a qual, contudo veio a ser revogada na sequência da prática de novo ilícito criminal de idêntica natureza), não impedindo que o mesmo praticasse os factos aqui em discussão, bem como a situação de reiteração da conduta do arguido que se pode concluir das condenações já sofridas, e considerando que as exigências de prevenção especial (tendo em conta a pessoa do agente que se quer que ganhe consciência do dever ser da vida em sociedade e do valor dos bens jurídicos pessoais) são ainda elevadas.”

Não podemos estar mais de acordo com a decisão tomada (e com os respectivos pressupostos) de não suspender a execução da pena de prisão aplicada ao arguido/recorrente.

Na verdade, suspender a execução da pena no caso em preço só poderia contribuir para o descrédito nas instituições encarregadas da aplicação da lei.

Também nesta parte, improcede o recurso.
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IV – DISPOSITIVO

Nos termos e pelos fundamentos expostos, acordam os Juízes da Secção Penal do Tribunal da Relação de Guimarães em julgar totalmente improcedente o recurso interposto pelo arguido J. M. e, consequentemente, manter na íntegra o acórdão recorrido.
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Custas a cargo do arguido/recorrente, fixando-se a taxa de justiça na quantia correspondente a 3 UC (três unidades de conta) – artigo 513º, nº 1, do CPP, artigo 8º, nº 9, do RCP e tabela anexa a este diploma legal.
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(Texto elaborado pelo relator e revisto por ambos os signatários – artigo 94º, nº 2, do Código de Processo Penal).
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Guimarães, 13 de Maio de 2019

(Mário Silva)
(Maria Teresa Coimbra)