CRIME DE DESOBEDIÊNCIA
Sumário


I - Faltar à obediência devida não constitui, por si só, facto criminalmente ilícito. A dignidade penal da conduta exige que o dever de obediência que se incumpriu, se não tiver a sua fonte numa disposição legal que comine no caso, a sua punição, como desobediência radique na cominação da punição da desobediência, feita por autoridade ou funcionário competentes para ditar a ordem.

II - Não satisfaz o requisito legal, por isso, a mera cominação de incorrer em procedimento criminal; tal como se exige, na alínea a), do artigo 348.º do CP que uma disposição legal comine, no caso, a punição da desobediência, a alínea b) do mesmo preceito requer que a autoridade ou funcionário cominem, no caso, a punição da desobediência.

III – No caso de o condutor se recusar a submeter-se às provas estabelecidas para a detecção do estado de influenciado pelo álcool, essa advertência não constitui elemento constitutivo do crime de desobediência.

IV - Tanto comete o crime de desobediência quem se recusa a realizar o teste quantitativo como quem não realiza sequer o teste qualitativo (de despistagem).

V – Não constitui motivo justificado da recusa do condutor a circunstância de, alegadamente, ter ingerido a última bebida cerca de 10 minutos antes.

Texto Integral


Acordam, em conferência, na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora:

RELATÓRIO.

Decisão recorrida.

No processo sumário nº9/18.8GBODM, procedente do Juízo de Competência Genérica de Odemira (J2) do Tribunal judicial da Comarca de Beja, o arguido AA, com os sinais dos autos, sob acusação formulada pelo Ministério Público foi submetido a julgamento perante tribunal singular, vindo por sentença datada de 25-10-2018, proferida em cumprimento do acórdão deste Tribunal da Relação que declarou nula a que havia sido anteriormente prolatada, a ser condenado pela prática de um crime de desobediência, pp. pelo art.348º (e não 358º como por manifesto e evidente lapso consta da fundamentação e dispositivo da sentença recorrida), nº1, al. a) do Código Penal, por referência ao art.152º, nºs 1, al. a) e nº3 do Código da Estrada, na pena de doze (12) meses de prisão com execução suspensa por igual período de tempo, com regime de prova direcionado para o tratamento do alcoolismo, e na pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor pelo período de dezoito (18) meses (art.69º, nº1, al. c) [e não al. a) como por mero lapso consta do dispositivo da sentença] do C. Penal.

Recurso.

Inconformado com essa decisão dela recorreu o arguido pugnando pela sua absolvição ou quando assim se não entenda que a pena de prisão seja substituída por multa e a pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor reduzida a limites proporcionais à gravidade da culpa do arguido., rematando a motivação com as seguintes (transcritas) conclusões:

1.º O art.º 45.º do Cód. Penal não se basta com as razões pelas quais o julgador optou pela pena privativa da liberdade em vez da pena não privativa.

Na verdade,
2.º O que este comando legislativo reclama é que, depois daquela escolha feita, se consignem as razões pelas quais o julgador não procede à comutação da pena de prisão por uma pena substitutiva, não privativa da liberdade;

3.º A substituição da pena de prisão não superior a 1 ano por pena não privativa da liberdade impõe-se, por regra, e tal substituição só não ocorrerá se o julgador argumentar, fundadamente, que a execução da pena de prisão é a única forma prevenir o cometimento de futuros crimes por parte do arguido.

Ora,
4.º A Mm.ª Juiz a quo não logrou cumprir tal determinação legal na sentença ora recorrida, pelo que é o arguido levado a concluir que se mantém, tal e qual, a nulidade que levou os Mm.ºs Desembargadores a decretarem a nulidade da sentença de 08-02-2018, e que agora determina, pelas mesmas razões, a nulidade da sentença ora em recurso;

5.º O arguido não foi submetido ao teste qualitativo, facto que resulta provado, não apenas das declarações do arguido, mas diretamente das contradições entre os depoimentos dos guardas RC e FC.

Com efeito,
6.º O guarda RC diz que foi ele que fez o teste, o guarda FC diz que afinal foi ele que fez o teste, e, por fim, admite ainda que possa ter sido o colega L, que não chegou a prestar depoimento;

7.º Acresce que nada existe nos autos que documente a realização desse teste, nem que tenha sido a taxa referida no facto provado n.º 3 a alegadamente detetada no teste qualitativo;

8.º Termos em que o facto provado n.º 3 deve ser retirado do rol dos factos provados e inserido no rol dos factos não provados com interesse para a decisão da causa;

9.º A não se entender assim, no mínimo, deve ser retirada do facto provado n.º 3 a alusão à taxa de alcoolémia;

10.º Resulta ainda do depoimento do guarda RC que o mesmo não perguntou ao arguido há quanto tempo aquele tinha ingerido a última bebida alcoólica quando lhe pediu para fazer o teste qualitativo;

11.º Resulta das declarações do arguido que este tinha estado a beber há cerca de 10 minutos antes de lhe ser pedido que fizesse o teste de despiste;

12.º Em consequência, deve ser acrescentado um novo facto ao rol dos factos considerados provados, com a redação sugerida acima;

13.º A Organização Internacional de Metrologia Legal (OIML), na sua recomendação n.º 126, publicada em 1998, relativamente aos requisitos metrológicos, veio advertir que, para efeitos de minimizar os erros máximos admissíveis (EMA), no uso dos aparelhos quantitativos dever-se-á ter em consideração a influência do Etanol no trato respiratório superior, devendo as autoridades nacionais optar por aparelhos quantitativos cujo instrumento de aprovação estabeleça disposições relativas ao uso dos mesmos;

14.º A observância desta Recomendação é obrigatória, de acordo com o art.º 4.º do Regulamento de Controlo dos Alcoolímetros, aprovado e publicado em anexo à Portaria n.º 1556/2007, de 10 de Dezembro;

15.º Os alcoolímetros quantitativos estão sujeitos a controlo metrológico obrigatório, nos termos do art.º 7.º do Regulamento de Controlo dos Alcoolímetros, citado;

16.º Ainda assim, apresentam uma possibilidade de erro de cerca de 30% para um alcoolímetro com mais de 1 ano, para uma TAE superior a 2mg/L, de acordo com o Anexo ao Regulamento de Controlo dos Alcoolímetros;

17.º Os alcoolímetros qualitativos nem sequer à verificação anual estão sujeitos, apenas a uma calibragem esporádica, o que aumenta substancialmente a possibilidade de erros;

18.º Por tal motivo, a regra dos 20 minutos sobre a ingestão da última bebida alcoólica deve sempre ser empregue em todos os casos, mesmo no despiste qualitativo;

19.º Os guardas que prestaram depoimento sabiam disso, mas não a cumpriram, procurando obrigar o arguido a realizar a pesquisa pouco tempo depois da ingestão da última bebida.

Nestes termos,

20.º É de concluir que o arguido dispunha de motivo justificativo para a recusa à submissão ao teste qualitativo, devendo por isso ter sido absolvido da prática do crime de desobediência pelo qual vinha acusado;

21.º A fundamentação da sentença, quanto à aplicação da pena de prisão, é confusa e contraditória.

Com efeito,
22.º O Tribunal fundamenta a justeza da pena de prisão nos antecedentes crimes de condução de veículo em estado de embriaguez – quando é certo que o arguido vem acusado, nos presentes autos, da prática de um crime de desobediência – e, igualmente, no facto de o arguido já ter sido anteriormente punido pela prática de um crime de desobediência, em 2009, com pena de prisão, pelo que seria de manter a mesma escolha de pena.

Acresce que,

23.º Não dá cumprimento ao comando constante do n.º 1 do art.º 45.º do CP, na redação da Lei n.º 94/2017, de 23 de Agosto, quanto à obrigatoriedade de substituição da pena de prisão não superior a 1 ano por pena de multa ou outra pena não privativa de liberdade.

Por último,
24.º E considerando a postura processualmente colaborante do arguido,

25.º A confissão dos factos,

26.º O facto de demonstrar ter consciência da censurabilidade da sua conduta e ter sincero receio de ser condenado numa pena de prisão efetiva,

27.º Que já se encontra a frequentar consultas de alcoologia, e, ainda,

28.º Que está atualmente a trabalhar como agricultor, e encontra-se familiarmente inserido, sendo o sustento da casa dos seus pais,

29.º É de considerar a graduação da pena acessória de proibição de condução de veículos motorizados pelo período de 18 meses é claramente desproporcionada, pelo que deverá ser reduzida para seis meses, por tal duração se mostrar adequada aos fins de prevenção especial em evidência, ou, no máximo, para uma duração igual à do período de duração da suspensão da pena.

Pelo exposto,

30.º É de concluir que a douta sentença recorrida padece dos seguintes vícios:

a) Nulidade, pelo facto de a douta sentença se ter deixado de pronunciar sobre questões que devia apreciar, nos termos do disposto na al. c) do n.º 1 do art.º 379º do CPPenal;

b) Insuficiência para a decisão da matéria de facto provada e erro notório na apreciação da prova (art.º 410.º/2-a) e c) do CPP) – conclusões 1.º a 8.º;

c) Violação do disposto no art.º 152.º/3 do CE e do art.º 348.º/1-a) do CP, por não se verificarem os pressupostos dos quais depende a punibilidade pelo crime em evidência – conclusões 9.º 16.º;

d) Violação do disposto nos artigos 70.º e 71.º do CP, pela fundamentação da escolha da pena de prisão e respetiva medida da pena – conclusões 17.º e 18.º;

e) Violação do disposto nos artigos 40.º e 71.º do CP, pela desproporção da pena acessória aplicável, face à culpa apurada e a todas as circunstâncias que, em concreto, militam em favor do arguido – conclusões 19.º a 25.º.

Termos em que, e nos mais de Direito aplicáveis, e sempre com o douto suprimento de V. Exas., deve o presente recurso ser julgado procedente por provado e, por via dele, ser revogada a sentença recorrida e substituída por acórdão que determine a absolvição do arguido do crime de desobediência.

Caso assim se não entenda, seja a pena de prisão substituída por multa, e a pena acessória reduzida a limites proporcionais à gravidade da culpa do arguido.

Contra motivou o Ministério Público na 1ª Instância, pugnando pela improcedência do recurso com a consequente manutenção da sentença recorrida, concluindo nos seguintes termos:

A. Tanto comete o crime de desobediência quem se recusa a realizar o teste quantitativo como quem não realiza sequer o qualitativo (de despistagem) e o próprio arguido confessou ter-se recusado a realizar esse teste.

B. O arguido entende que dispunha de motivo justificativo para a recusa à submissão ao teste qualitativo (cfr. conclusão 16.º) sucede que na sua conclusão 22.º pretende que se considere «o facto de demonstrar ter consciência da censurabilidade da sua conduta» e, nessa medida, tais conclusões revelam-se incongruentes e incompatíveis entre si e, por isso, deve o recurso ser rejeitado por manifesta improcedência, nos termos do art. 420.º, n.º 1, a) do CPP.

C. O âmbito de aplicação da Recomendação n.º 126 da Organização Internacional de Metrologia Legal (OIML) circunscreve-se aos alcoolímetros que efectuam o teste quantitativo e nenhuma dúvida pode haver a esse respeito sendo que a redacção é, aliás, muito clara ao referir que «não se devem confundir estes aparelhos com os de despistagem» (nossa tradução).

D. Além disso, o art. 4.º do Regulamento, ao referir apenas que «Os alcoolímetros deverão cumprir os requisitos metrológicos e técnicos, definidos pela Recomendação OIML R 126», está a remeter para a «Part 1 - Metrological and technical requirements» e não para as restantes partes da Recomendação, sendo que a que diz respeito à presença de etanol no trato respiratório superior («Annex A - Examples of detection of alcohol in upper respiratory tracts (Informative) (…) A.3 - Delay before measurement») é de cariz meramente informativo e a redacção originária desta parte da Recomendação é, aliás, bastante clara a esse respeito.

E. Nenhuma regra impõe que os militares da GNR tivessem que esperar os 20 minutos pretendidos pelo arguido nem sequer os 15 minutos sugeridos pela dita Recomendação (a qual nem se aplica ao teste de despistagem), pelo que é por demais evidente que o arguido não tinha motivo justificativo nenhum para se recusar a efectuar o teste de pesquisa de álcool.

F. O arguido defende, em recurso, a tese de que não se teria recusado a efectuar o teste de pesquisa de álcool no sangue, teria tão só pretendido fazê-lo mais tarde, como se lhe assistisse um direito à escolha do momento da realização do teste.

G. Sucede que, como se decidiu no douto Acórdão do TRE de 08-03-2016, no proc. 587/13.8GTABF, em que foi Relator FERNANDO RIBEIRO CARDOSO, disponível em www.dgsi.pt, «o exame de pesquisa de álcool no sangue deve ser efetuado pelos condutores a quem as autoridades policiais o solicitem e quando estas o solicitem, e não quando os condutores entendam submeter-se a tal exame».

H. Pois, recuperando as palavras de CRISTINA LÍBANO MONTEIRO (in Comentário Conimbricense ao Código Penal, Tomo III, Coimbra Editora, 2001, página 350), o crime de desobediência integra a categoria dos crimes contra a autoridade pública, em que se pretende tutelar a autonomia institucional do Estado, em concreto, a não colocação de entraves à actividade administrativa por parte dos destinatários dos seus actos.

I. E como, a este respeito, se decidiu no douto Acórdão do TRE de 10-01-2017, no proc. 20/16.3PTFAR em que foi Relator SÉRGIO CORVACHO, disponível em www.dgsi.pt, «não se nos afigura que possam restar dúvidas que o dever de se submeter a exame para detecção de álcool no sangue, sob pena de incorrer em responsabilidade criminal por desobediência, se justifica pelo facto da condução em si» e «o que releva, para efeitos de obrigação de submissão ao teste de pesquisa de álcool no sangue, e de preenchimento do tipo do crime de desobediência (quanto à legitimidade da ordem de sujeição ao teste enquanto condutor), é a atualidade da condução, no sentido de ser efetuado o mais próximo possível ao momento em que o arguido conduzia, ou seja, em circunstâncias que permitam concluir que a eventual ingestão de álcool foi anterior ou contemporânea da condução e que a pessoa objeto de fiscalização conduziu efetivamente sob o efeito do álcool.»
J. Não há qualquer obrigatoriedade de substituição da pena de prisão por multa se – como dispõe o art. 45.º, n.º 1 do CP – «a execução da prisão for exigida pela necessidade de prevenir o cometimento de futuros crimes» e é por demais evidente que a pretendida substituição estava á partida arredada face ao que do CRC do arguido resultava.

K. Com efeito, do CRC do arguido e de todas as condenações anteriormente sofridas, outra não podia ser a conclusão senão a de que só a ameaça de cumprimento de tempo de prisão (senão mesmo o cumprimento efectivo…) é de molde a prevenir o cometimento de futuros crimes, da mesma forma que a graduação da pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados pelo período de 18 meses não é nada desproporcionada (quanto muito peca por defeito…).

L. O arguido já conta no seu registo criminal com 04 condenações anteriores – sendo esta a 5.ª –: 03 condenações pela prática do crime de condução de veículo em estado de embriaguez e 01 pela prática do crime de desobediência, sendo que pelo crime de desobediência fora condenado em pena de prisão suspensa e pelos crimes de condução em estado de embriaguez havia sido condenado em pena de multa e, posteriormente, em penas de prisão substituídas por multa e por trabalho a favor da comunidade.

M. É, pois, evidente, que uma 5.ª condenação já não se pode bastar com a substituição da pena de prisão, sendo que apenas a ameaça de cumprimento de tempo de prisão (senão mesmo o cumprimento efectivo…) é de molde a prevenir o cometimento de futuros crimes, resultando muito expressamente da Sentença que «(…), o Tribunal considera que as finalidades da punição não permitem que se substitua a pena de prisão agora determinada por uma pena de multa ou por outra pena não privativa da liberdade, nos termos do artigo 43.º, do Código Penal».

Termos em que deverá considerar-se que a Sentença recorrida não padece de nenhum vício que a afecte e, em consequência, deverá a mesma ser integralmente confirmada, com a improcedência do recurso, considerando-se ainda que as penas aplicadas (principal e acessória) não são nada exageradas nem excessivas.

Nesta Relação o Exmº Senhor Procurador-Geral Adjunto acompanha a argumentação expendida pelo Ministério Público na 1ª Instância, pelo que também é de parecer que deve ser negado provimento ao recurso e confirmada a sentença recorrida.

Cumprido o disposto no art.417º, nº2 do CPP, não foi apresentada resposta.
Efectuado o exame preliminar e colhidos os vistos teve lugar a conferência.
Cumpre apreciar e decidir.

FUNDAMENTAÇÃO.

Poderes de cognição deste Tribunal. Objecto do recurso. Questões a examinar.

Constata-se da peça recursiva que o recorrente com base nos mesmos fundamentos impugna a matéria de facto dada como provada na sentença recorrida, quer por meio da forma restrita através da invocação dos vícios elencados nas alíneas a) e c) do nº2 do art.410º, do CPP – insuficiência para a decisão da matéria de facto provada e erro notório na apreciação da matéria de facto, quer através da impugnação ampla prevista nos nº3 e 4 do art.412º, daquele código.

Como é sobejamente sabido trata-se de duas formas distintas de impugnar a matéria de facto que coexistem na nossa lei processual penal.

Enquanto naquela – impugnação restrita – os vícios enunciados no nº2 do art.410º, do CPP tem de resultar do texto da decisão recorrida por si só ou conjugadamente com as regras da experiência comum, sendo até de conhecimento oficioso, a impugnação ampla da matéria de facto, nos termos do art.412º, nºs 3 e 4, do CPP, não é de conhecimento oficioso, incidindo sobre o recorrente quando pretenda o reexame amplo da matéria de facto o ónus de especificar:

a) Os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados;
b) As concretas provas que impõem decisão diversa da recorrida,
c) As provas que devem ser renovadas.

Mostrando-se minimamente observadas estas especificações e tendo sido documentadas através de gravação áudio as declarações e depoimentos prestados oralmente na audiência de julgamento, este Tribunal, conhece de facto e de direito (arts.363º, 364º e 428º do CPP).

Sendo como é sobejamente sabido e constitui jurisprudência uniforme que o objecto dos recursos é delimitado pelas conclusões extraídas pelo recorrente da respectiva motivação (art.412º nº1, do CPP), as questões a examinar que delas emergem, alinhadas por ordem preclusiva, sem prejuízo de outras de conhecimento oficioso, podem sintetizar-se e consistem em saber:

1.º Se a sentença recorrida é nula, nos termos do disposto no art. 379º, nº1, al. c) do CPP por alegada omissão de pronúncia;

2.º Se o tribunal “a quo” avaliou incorrectamente a prova ocorrendo o erro de julgamento apontado pelo recorrente e se por isso deve ser modificada a matéria de facto descrita na sentença recorrida, nos termos por si preconizados;

3.º Se a sentença recorrida enferma dos vícios previstos no nº2, als.a) e c) do CPP – insuficiência para a decisão da matéria de facto provada e erro notório na apreciação da prova;

4.º Se não se verificam os pressupostos dos quais depende a punibilidade pelo crime de desobediência pelo qual o arguido/recorrente foi condenado;

5.º Se justifica a opção por pena de multa e na negativa se é excessiva e desproporcionada apena de prisão aplicada; e

6.ª Se é também excessiva e desproporcionada a pena acessória de proibição de conduzir aplicada e se consequentemente deve ser reduzida.

Na sentença recorrida foi dada como provada a seguinte materialidade:
«1. No dia 15.01.2018, cerca da 23.07 horas, na EN 390, em Vila Nova de Mil Fontes, o arguido conduzia veículo automóvel ligeiro de passageiros quando, por ter uma luz de presença traseira fundida e a chapa da matricula ilegível, lhe foi dada ordem de paragem;

2. Na altura o arguido foi fiscalizado tendo-se constatado que não era portador de documentos de identificação;

3. O arguido foi submetido ao teste de alcoolemia através do aparelho Dragger Alcotest 6810 qualitativo, tendo apresentado uma taxa de 2,86 g/l de álcool no sangue;

4. O arguido foi transportado para o Posto territorial de Vila Nova de Mil Fontes com o objectivo de aí efectuar novo teste de alcoolemia quantitativo;

5. O arguido recusou-se a realizar o teste de pesquisa de álcool no sangue;

6. O arguido foi advertido, pelo militar, que caso não procedesse ao teste de pesquisa de álcool no sangue incorria na prática de um crime de desobediência;

7. O arguido continuou a recusar-se submeter ao teste de pesquisa de álcool no sangue;

8. O arguido sabia que faltava à obediência devida à obrigação legal de submissão a teste de pesquisa de álcool por todos os condutores e a ordem da GNR., a qual lhe foi regularmente comunicada por militar da GNR, devidamente fardado e em exercício de funções;

9. O arguido tinha conhecimento dessa obrigação legal, bem como da ordem emanada pela GNR. e percebeu a advertência que lhe foi efectuada e que, por isso, caso se recusasse a submeter-se a teste de pesquisa de alcoolemia, incorreria em crime de desobediência;

10. Não obstante o arguido quis desobedecer àquela obrigação legal e à ordem emanada pela GNR., recusando-se a ser submetido a exame de álcool no sangue, o que efectivamente fez;

11. O arguido é agricultor, auferindo mensalmente cerca de 400,00€;

12. Vive em casa arrendada pela qual paga 500,00€ por ano;

13. Tem o 12.º ano de escolaridade;

14. Do certificado de registo criminal do arguido consta que:

• Foi condenado nos autos de processo abreviado n.º --/08.8SPLSB que correram os seus termos no 1.º Juízo- 3.ª secção do Tribunal de Pequena Instancia Criminal de Lisboa, por factos praticados 15.05.2008 e sentença transitada em julgado a 22.10.2008, pela prática de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, na pena de 80 dias de multa à razão diária de 5€ e na sanção acessória de inibição de conduzir pelo período de 4 meses;

• Foi condenado nos autos de processo sumário n.º --/09.9SILSB que correram os seus termos no 1.º Juízo- 2.ª secção do Tribunal de Pequena Instancia Criminal de Lisboa, por factos praticados 27.03.2009 e sentença transitada em julgado a 21.04.2009, pela prática de um crime de desobediência, na pena de 6 meses de prisão suspensa na sua execução pelo período de 1 ano;

• Foi condenado nos autos de processo sumário n.º --/13.8GDODM que correram os seus termos no Tribunal Judicial da Comarca de Beja – Juízo de Competência Genérica de Odemira, por factos praticados 18.11.2013 e sentença transitada em julgado a 11.07.2014, pela prática de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, na pena de 4 meses de prisão, substituída por 120 dias de multa à razão diária de 6€ e na sanção acessória de inibição de conduzir pelo período de 12 meses;

• Foi condenado nos autos de processo sumário n.º --/17.2GCODM que correram os seus termos no Tribunal Judicial da Comarca de Beja – Juízo de Competência Genérica de Odemira, por factos praticados 06.03.2017 e sentença transitada em julgado a 05.04.2017, pela prática de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, na pena de 6 meses de prisão, substituída por 180 horas de trabalho a favor da comunidade e na sanção acessória de inibição de conduzir pelo período de 5 meses.

Foi consignado não se terem provado quaisquer outros factos como relevância para a causa.

O tribunal recorrido fundamentou a formação da sua convicção do seguinte modo:
No apuramento da factualidade provada o Tribunal formou a sua convicção com base no conjunto da prova produzida, mais concretamente, nos depoimentos dos militares da GNR que abordaram o arguido na sequência de terem constatado que o mesmo vinha a conduzir sem luz traseira e com a chapa de matrícula ilegível, tendo referido que quando o arguido saiu do carro o fez cambaleando e exalando um forte cheiro a álcool, razão pela qual lhe solicitaram que se submetesse à realização de teste de pesquisa de álcool no sangue por ar expirado, qualitativo. Mais referiram que, no local, o arguido foi submetido ao teste de pesquisa de álcool tendo acusado uma taxa de 2,86 g/l de álcool no sangue. Mais esclareceram que o arguido não tinha consigo quaisquer documentos de identificação, pelo que o transportaram para o posto para proceder à sua identificação e para realizar teste de pesquisa de álcool no sangue, desta feita quantitativo. Referiram ainda os agentes que, já no posto, o arguido se recusou a efectuar o teste de pesquisa de álcool, apesar de ter sido advertido que a sua conduta o faria incorrer na prática de um crime de desobediência.

O tribunal teve ainda em consideração as declarações do arguido que, pese embora negando ter realizado sequer o primeiro teste de pesquisa de álcool no sangue no local onde foi fiscalizado, assume ter-se recusado a efectuar o teste, mesmo depois de advertido de que incorria num crime de desobediência caso mantivesse a recusa, demonstrando ter plena consciência de que, ao recusar obedecer à ordem que lhe era dada pelo militar da GNR, incorria na prática de um crime de desobediência.

Esclareceram ainda os agentes inquiridos que identificaram o arguido através das declarações prestadas pelo mesmo e dos elementos constantes do site do IMTT do qual consta a fotografia do arguido e através da qual confirmaram os seus dados pessoais.

Os agentes RC e FC depuseram de forma clara, espontânea e circunstanciada, merecendo credibilidade.

Os antecedentes criminais do arguido resultaram do certificado de registo criminal junto aos autos a fls. 23 a 32.

O tribunal “ a quo” procedeu à subsunção legal da factualidade apurada, à escolha da espécie e determinação da medida da pena da seguinte forma:

Ao arguido é imputada a prática de um crime de desobediência, p. e p. pelas disposições conjugadas dos artigos 152.º n.º 3 do Código da Estrada e 348.º n.º 1 al. a) do Código Penal.

O artigo 348.º n.º 1 al. a) dispõe que quem faltar à obediência devida a ordem ou a mandado legítimos, regularmente comunicados e emanados de autoridade ou funcionário competente, é punido com pena de prisão até um ano ou com pena de multa até 120 dias se uma disposição legal cominar, no caso, a punição da desobediência simples.

Por sua vez, o artigo 152.º, n.º 3 do Código da Estrada comina com o crime de desobediência, a recusa de submissão às provas estabelecidas para a detecção do estado de influência pelo álcool.

Efectivamente, estabelece o artigo 152.º do CE inserido no Capítulo relativo ao Procedimento para a fiscalização da condução sob influência de álcool ou de substâncias psicotrópicas que,

1. Devem submeter-se às provas estabelecidas para a detecção dos estados de influenciado pelo álcool ou por substâncias psicotrópicas:
a) Os condutores;
b) Os peões, sempre que sejam intervenientes em acidentes de trânsito;
c) As pessoas que se propuserem iniciar a condução.

2. Quem praticar actos susceptíveis de falsear os resultados dos exames a que seja sujeito não pode prevalecer-se daqueles para efeitos de prova.

3. As pessoas referidas nas alíneas a) e b) do n.º 1 que recusem submeter-se às provas estabelecidas para a detecção do estado de influenciado pelo álcool ou por substâncias psicotrópicas são punidas por crime de desobediência.

4. As pessoas referidas na alínea c) do n.º 1 que recusem submeter-se às provas estabelecidas para a detecção do estado de influenciado pelo álcool ou por substâncias psicotrópicas são impedidas de iniciar a condução.

5. O médico ou paramédico que, sem justa causa, se recusar a proceder às diligências previstas na lei para diagnosticar o estado de influenciado pelo álcool ou por substâncias psicotrópicas é punido por crime de desobediência.

Sendo que, nos termos preceituados no artigo 153.º do mesmo diploma,
1. O exame de pesquisa de álcool no ar expirado é realizado por autoridade ou agente de autoridade mediante a utilização de aparelho aprovado para o efeito.

2. Se o resultado do exame previsto no número anterior for positivo, a autoridade ou o agente de autoridade deve notificar o examinando, por escrito, ou, se tal não for possível, verbalmente, daquele resultado, das sanções legais dele decorrentes, de que pode, de imediato, requerer a realização de contraprova e de que deve suportar todas as despesas originadas por esta contraprova no caso de resultado positivo.

3. A contraprova referida no número anterior deve ser realizada por um dos seguintes meios, de acordo com a vontade do examinando:

a) Novo exame, a efectuar através de aparelho aprovado;
b) Análise de sangue.

4. No caso de opção pelo novo exame previsto na alínea a) do número anterior, o examinando deve ser, de imediato, a ele sujeito e, se necessário, conduzido a local onde o referido exame possa ser efectuado.

5. Se o examinando preferir a realização de uma análise de sangue, deve ser conduzido, o mais rapidamente possível, a estabelecimento oficial de saúde, a fim de ser colhida a quantidade de sangue necessária para o efeito.

6. O resultado da contraprova prevalece sobre o resultado do exame inicial.

7. Quando se suspeite da utilização de meios susceptíveis de alterar momentaneamente o resultado do exame, pode a autoridade ou o agente de autoridade mandar submeter o suspeito a exame médico.

8. Se não for possível a realização de prova por pesquisa de álcool no ar expirado, o examinando deve ser submetido a colheita de sangue para análise ou, se esta não for possível por razões médicas, deve ser realizado exame médico, em estabelecimento oficial de saúde, para diagnosticar o estado de influenciado pelo álcool.

Por seu turno, prevê o art. 1.º do Decreto Regulamentar n.º 24/98, de 30 de Outubro,

1. A presença de álcool no sangue pode ser indiciada por meio de teste no ar expirado, efectuado em analisador qualitativo.

2. A quantificação da taxa de álcool no sangue é feita por meio de teste no ar expirado, efectuado em analisador quantitativo.

3. Quando, por motivo de saúde ou acidente, o examinando não possa ser submetido ao teste referido no número anterior, aquele pode ser substituído por análise de sangue.

Provou-se que o arguido, sendo abordado por militares da GNR que lhe solicitaram que efectuasse o teste de pesquisa de álcool no sangue, através de ar expirado, este se recusou fazê-lo.

Mais se provou que tendo os militares da GNR advertido o arguido que tal recusa o faria incorrer em crime de desobediência, o arguido manteve-a.

O arguido sabia que tinha de se submeter às provas estabelecidas para detecção da influência de álcool, tendo sido advertido de que, se não o fizesse, incorria em crime de desobediência.

O arguido actuou livre, consciente e deliberadamente.

Face à previsão legal, quer objectiva, quer subjectiva e dos factos descritos, dúvidas não há quanto ao cometimento pelo arguido do crime por que vem acusado.

Mais se provou que o arguido sabia ser o comportamento proibido por lei, pelo que está verificada a consciência da ilicitude.

Não se verificam circunstâncias comuns ou especiais atenuantes ou agravantes que alterem a moldura penal abstracta.

DETERMINAÇÃO DA PENA
Subsumidos os factos ao direito, importa agora aquilatar da pena a aplicar ao arguido caso sub judice.

Dispõe o artigo 70.º do Código Penal que,
«Se forem aplicáveis, em alternativa, pena privativa e pena não privativa da liberdade, o tribunal dá preferência à segunda sempre que esta realizar de forma adequada e suficiente as finalidades da punição».

Temos, pois, que quando haja de se escolher entre uma pena privativa e uma pena não privativa da liberdade, estabelece o artigo 70.º que se dê prevalência à segunda, sempre que esta realize de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.

De acordo com o artigo 40.º n.º 1 do Código Penal essas finalidades consistirão na prevenção geral, ou seja a estabilização das expectativas comunitárias da validade da norma violada, e na prevenção especial, ou seja a necessidade de socialização que o arguido demonstra.

A pena mais do que um castigo para quem prevarica, deve servir de motivação a que o arguido não volte a prevaricar.

Ponderando, em conjunto, o tipo de ilícito cometido, a existência de antecedentes criminais pela prática do mesmo ilícito pelo qual foi condenado em pena de prisão suspensa na sua execução e pese embora tenha adoptado uma postura processualmente colaborante, demonstrando arrependimento, entende-se que não realiza de forma adequada e suficiente as necessidades da punição a aplicação de uma pena de multa, até porque o arguido tem antecedentes criminais também pela prática do crime de condução em estado de embriaguez, a última das quais no ano de 2017, demonstrando não ter interiorizado a gravidade do facto de conduzir veículos na via pública depois de ingerir bebidas alcoólicas, razão pela qual se opta por uma pena de prisão.

A determinação da medida da pena obedece ao critério geral que consta do artigo 71.º n.º 1 do Código Penal, onde se lê,

«A determinação da medida da pena, dentro dos limites definidos na lei, é feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção».

A aplicação de penas visa a protecção de bens jurídicos e a reintegração social do agente, sendo que em caso algum a pena pode ultrapassar a medida da culpa (artigo 40.º n.ºs 1 e 2 do Código Penal).

Segundo o princípio da culpa “não há pena sem culpa e a medida da pena não pode em caso algum ultrapassar a medida da culpa”, a verdadeira função da culpa no sistema punitivo reside numa incondicional proibição de excesso. A culpa não é fundamento da pena mas constitui o seu limite inultrapassável, limite inultrapassável de todas e quaisquer considerações ou exigências preventivas.

A função da culpa é a de estabelecer o máximo de pena ainda compatível com as exigências de preservação da dignidade da pessoa e de garantia do livre desenvolvimento da sua personalidade nos quadros próprios de um Estado de Direito Democrático.

A defesa da ordem jurídico-penal, tal como é interiorizada pela consciência colectiva (prevenção geral positiva ou de integração) é a finalidade primeira que se prossegue, no quadro da moldura penal abstracta, entre o mínimo, em concreto, imprescindível à estabilização das expectativas comunitárias na validade da norma violada e o máximo que a culpa do agente consente; entre esses limites, satisfazem-se quanto possível, as necessidades de prevenção especial positiva ou de socialização.

Como refere Figueiredo Dias, (IN «CONSEQUÊNCIAS JURÍDICAS DO CRIME», EDITORIAL NOTÍCIAS, PÁG. 215), «através do requisito de que sejam levadas em conta as exigências de prevenção, dá-se lugar à necessidade comunitária da punição do caso concreto e, consequentemente, à realização in casu das finalidades da pena. Através do requisito de que seja tomada em consideração a culpa do agente, dá-se tradução à exigência de que a vertente pessoal do crime – ligada ao mandamento incondicional de respeito pela eminente dignidade da pessoa do agente – limite de forma inultrapassável as exigências de prevenção».

Na determinação da medida concreta da pena ter-se-á ainda em conta o disposto no artigo 71.º n.º 2 do Código Penal, ou seja, o Tribunal deve atender a todas as circunstâncias que deponham a favor ou contra o agente, abstendo-se, no entanto, de considerar aquelas que já fazem parte do tipo de crime cometido (salvo nos casos em que a sua intensidade concreta supere aquela que foi considerada pelo legislador para determinação da moldura aplicável).

Temos, pois de apreciar, nomeadamente, o grau de ilicitude do facto, que se entende ser de grau elevado, atenta a censurabilidade do não acatamento de uma ordem emanada de uma autoridade.

A intensidade da culpa, na forma mais grave, dolo directo.

A conduta anterior ao crime, sendo que tem antecedentes criminais por crime de idêntica natureza, o qual remonta a 2009.

O arguido praticou em autoria material um crime desobediência p. e p. pelas disposições conjugadas dos artigos 152.º n.º 3 do Código da Estrada e artigo 348º [e não 358.ºcomo por manifesto lapso foi consignado] n.º 1, al. a) do Código Penal.

Este crime é punido com pena de prisão até 1 ano ou pena de multa até 120 dias.

Ou seja, a moldura penal abstracta é, para a pena de prisão, o mínimo de 1 mês e o máximo de 1 ano.

Tendo em consideração que já se optou por uma pena detentiva da liberdade, será dentro desta moldura penal que deverá fixar-se a pena a aplicar concretamente ao arguido.

Nesta conformidade e atento o que atrás foi exposto considera-se adequada a pena de 12 (DOZE) MESES DE PRISÃO.

Atento o facto de o arguido já ter antecedentes criminais, tendo praticado anteriormente outro crime da mesma natureza e três crimes de condução de veículo em estado de embriaguez (directamente relacionados com a prática do crime em causa, na medida em que o próprio arguido admitiu que se recusou a efectuar o teste de despiste de alcoolemia porque havia ingerido bebidas alcoólicas momentos antes), o Tribunal considera que as finalidades da punição não permitem que se substitua a pena de prisão agora determinada por uma pena de multa ou por outra pena não privativa da liberdade, nos termos do artigo 43.º, do Código Penal.

Dispõe o artigo 50.º n.º 1 do Código Penal que,
«O tribunal suspende a execução da pena de prisão aplicada em medida não superior a 3 anos se, atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste, concluir que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição

A suspensão da execução da pena de prisão tem como pressuposto formal a pena de prisão aplicada não ser superior a 5 anos.

A este pressuposto acresce ainda um pressuposto material que implica, nas palavras de Figueiredo Dias (IN «CONSEQUÊNCIAS JURÍDICAS DO CRIME», AEQUITAS, 1993, P. 242 E 243), que «…o tribunal, atendendo à personalidade do agente e às circunstâncias do facto, conclua por um prognóstico favorável relativamente ao comportamento do delinquente: que a simples censura do facto e a ameaça da pena (…) bastarão para afastar o delinquente da criminalidade. Para a formulação de tal juízo – ao qual não pode bastar nunca a consideração ou só a personalidade, ou só das circunstâncias de facto – o tribunal atenderá especialmente às condições de vida do agente e à sua conduta anterior e posterior ao facto

Nos presentes autos tendo em consideração que pese embora o arguido tenha antecedentes criminais por ilícito da mesma natureza, o que faz com que as necessidades de prevenção especial sejam mais elevadas, o mesmo já se encontra a frequentar consultas de alcoologia, e demonstrou ter sincero receio de ser condenado numa pena de prisão efectiva.

Acresce que o arguido adoptou uma postura processualmente colaborante, confessando os factos e demonstrando ter consciência da censurabilidade da sua conduta.

O arguido está actualmente a trabalhar como agricultor, e encontra-se familiarmente inserido.

Por tudo quanto fica dito, entende-se que a censura do facto com a ameaça da pena de prisão e a obrigação de efectuar um tratamento à dependência do álcool, acompanhado pelo desenvolvimento de um plano de reinserção social acautelam de forma suficiente e adequada as necessidades de prevenção.

Pelo que fica exposto, DECIDE-SE SUSPENDER A PENA DE PRISÃO APLICADA AO ARGUIDO, PELO PERÍODO DE 12 (DOZE) MESES, COM REGIME DE PROVA, DEVENDO A ELABORAÇÃO DO PLANO DE REINSERÇÃO SOCIAL COMPREENDER O COMPROMISSO DE SE SUBMETER AO TRATAMENTO AO ALCOOLISMO E, CONSEQUENTEMENTE, MANTER-SE ABSTINENTE.

DA PENA ACESSÓRIA DE PROIBIÇÃO DE CONDUÇÃO DE VEÍCULOS COM MOTOR
Cumpre, ainda, determinar se e, nos termos do artigo 69.º n.º 1, al. c) [e não al.a) como por manifesto lapso foi consignado) do Código Penal, é ou não de aplicar ao arguido a pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor.

Lê-se no artigo 69.º n.º 1 do Código Penal que «É condenado na proibição de conduzir veículos com motor por um período fixado entre três meses e três anos quem for punido:

c) Por crime de desobediência cometido mediante recusa de submissão às provas legalmente estabelecidas para detecção de condução de veículo sob o efeito do álcool, estupefacientes, substâncias psicotrópicas ou produtos de efeito análogo.».

Ora, sendo certo que o artigo 65.º do Código Penal, no seu n.º 1, estabelece que «Nenhuma pena envolve como efeito necessário a perda de direitos civis, profissionais ou políticos», foi fixada jurisprudência no sentido de que «o agente de crime de condução em estado de embriaguez, previsto e punido pelo art. 292.º do CP, deve ser sancionado, a título de pena acessória, com a proibição de conduzir prevista no art. 69.º n.º 1, al. a) do Código Penal».

Jurisprudência com a qual se concorda inteiramente e consequentemente se segue, atentas as especiais razões de prevenção geral que se colocam no crime em apreço, dada a elevada sinistralidade que vem assolando nossas estradas, à qual não será certamente estranho o facto de muitos condutores conduzirem com taxas de álcool no sangue superiores às permitidas por lei.

Ora, tendo em consideração que a aplicação da pena acessória aos crimes de desobediência em apreço visou obviar às situações em que os condutores se furtavam a fazer o teste por forma a não lhes ser aplicada a pena acessória de inibição de conduzir, entende-se que a jurisprudência citada é igualmente válida para ao caso sub júdice.

Há, pois, que determinar qual a medida concreta da pena acessória a aplicar ao arguido. Para tanto, temos de atender a que o arguido tem antecedentes criminais pela prática do mesmo tipo de ilícito criminal e adoptou uma postura processualmente colaborante.

Nesta conformidade e atendendo ao que atrás ficou dito, considera-se adequada e suficiente a aplicação ao arguido da pena acessória de 18 (DEZOITO) MESES DE PROIBIÇÃO DE CONDUZIR VEÍCULOS COM MOTOR».

Apreciando.

Examinemos as questões acima enunciadas pela ordem indicada.

1.ª Questão: Da alegada nulidade da sentença por omissão de pronúncia.
Alega o recorrente que nos termos prescritos no art.379º, nº1, al.c) do CPP a sentença ora recorrida à semelhança da anteriormente prolatada nestes autos, é nula por omissão de pronúncia, porquanto não foi cumprido cabalmente o determinado no acórdão deste tribunal de 12-07-2018, que declarou nula a sentença anteriormente proferida por se ter constatado haver falta absoluta de ponderação sobre substituição da pena de prisão não superior a 1 ano por pena não privativa da liberdade.

Na verdade como escrevemos, nesse acórdão de que fomos relator, (…) «estando aqui em causa um crime que é punível alternativamente com prisão ou multa, a primeira operação a realizar é, como decorre do artº 70º do Cod. Penal, optar por uma ou outra, levando-se naturalmente em conta o comando ínsito em tal dispositivo (dar preferência à pena não privativa de liberdade, sempre que a mesma realize de forma adequada e suficiente as finalidades da punição).

Ora, sem cuidarmos de saber neste momento se a opção feita pelo julgador merece ou não a nossa adesão, esta primeira operação na escolha da pena foi realizada.

De seguida, há que proceder à determinação do quantum da pena concretamente aplicada, em obediência aos critérios enunciados no artº 71º do Cod. Penal, o que aqui também se mostra verificado.

Por fim, tendo o julgador optado por pena de prisão e determinada a pena concreta e admitindo a mesma substituição por pena não privativa de liberdade, como aqui sucede, deve ponderar a possibilidade da sua substituição, o que no caso foi pura e absolutamente omitido.

Com efeito, estatui-se no artº 45º, nº 1 do Cod. Penal, na redacção introduzida pela Lei nº94/2017, de 23 de Agosto (à semelhança do que anteriormente constava do art.43º, nº1 do C. Penal) que “a pena de prisão aplicada em medida não superior a um ano é substituída por pena de multa ou por outra pena não privativa da liberdade aplicável, excepto se a execução da prisão for exigida pela necessidade de prevenir o cometimento de futuros crimes”.

Quer dizer: a opção feita por pena privativa de liberdade, no momento previsto no artº 70º do Cod. Penal, não dispensa o julgador de, determinada que esteja a pena concreta em medida não superior a um ano de prisão, ponderar a sua substituição por pena de multa (pena de substituição) ou por outra pena não privativa de liberdade aplicável como seja, por exemplo, a prestação de trabalho a favor da comunidade (art.58º do C. Penal).

Aliás, o artº 45º, nº 1 do Cod. Penal não só não dispensa, como exige, tal ponderação. Mais: tal substituição impõe-se, isto é, constitui a regra; e só pode ser afastada se a execução da prisão for exigida pela necessidade de prevenir a prática de novos crimes.

Ora, a Mª juíza feita a opção nos termos do art.70º do C. Penal por pena privativa da liberdade e fixado esta em 1 ano de prisão, pura e simplesmente omitiu qualquer ponderação sobre a substituição por pena de multa (pena de substituição) ou por outra pena não privativa de liberdade aplicável como seja, por exemplo, a prestação de trabalho a favor da comunidade (art.58º do C. Penal), violando, assim, o comando legal constante do nº1 do art.45º do C. Penal.

Essa ponderação não é um acto discricionário do julgador, dependente de uma vontade arbitrária e imotivada.

A substituição da pena de prisão não superior a 1 ano por pena não privativa da liberdade impõe-se, por regra, se o julgador, justificadamente, entender que essas formas de cumprimento realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição, só assim não sucedendo se a execução da prisão for exigida pela necessidade de prevenir o cometimento de futuros crimes».

Remetido o processo à 1ª Instância com vista à sanação da mencionada patologia, em 25-10-2018 foi proferida a sentença agora sob recurso, tendo a senhora juíza a quo com o propósito de colmatar aquela deficiência e sanar a apontada nulidade, face à alternativa da punição prevista no art.348º, nº1, al.a) do C. Penal, depois de optar pela punição com pena de prisão e fixada esta em 12 meses, ao que constava da anterior sentença, aditou o seguinte:

«Atento o facto de o arguido já ter antecedentes criminais, tendo praticado anteriormente outro crime da mesma natureza e três crimes de condução de veículo em estado de embriaguez (directamente relacionados com a prática do crime em causa, na medida em que o próprio arguido admitiu que se recusou a efectuar o teste de despiste de alcoolemia porque havia ingerido bebidas alcoólicas momentos antes), o Tribunal considera que as finalidades da punição não permitem que se substitua a pena de prisão agora determinada por uma pena de multa ou por outra pena não privativa da liberdade, nos termos do artigo 43.º, do Código Penal».

O recorrente considera que este aditamento é insuficiente por forma a sanar a nulidade decretada no mencionado aresto.

O que nesse aresto se constatou foi que a sentença anteriormente prolatada era pura e absolutamente omissa quanto a qualquer ponderação sobre a substituição daquela pena de prisão por pena de multa (pena de substituição) ou por outra pena não privativa de liberdade aplicável como seja, por exemplo, a prestação de trabalho a favor da comunidade.

Salvo o devido respeito por opinião diferente, independentemente se concorde ou não com o mérito da opção adoptada, com este aditamento o julgador, ainda que de uma forma concisa e abreviada faz a ponderação sobre se deve ou não o arguido beneficiar da pena substitutiva à pena de prisão e toma posição sobre o mérito dessa ponderação optando por uma resposta negativa, decidindo-se pela não aplicação de pena substitutiva.

Sendo que nada impede que essa fundamentação seja idêntica à utilizada no momento de se fazer a opção nos termos do art.70º do C. Penal, face à alternatividade da punição do crime com pena de prisão ou multa, assim, ao contrario do que sucedeu na anterior sentença, na nova sentença, que é agora objecto de recurso, o julgador fez aquela ponderação, justificando ainda que de uma forma talvez excessivamente lacónica, mas que apesar disso entendemos ser suficiente para se compreender a motivação que presidiu à solução adoptada, pelo que a sentença agora sob censura não enferma do vicio apontado pelo recorrente, não devendo ser fulminada com a impetrada nulidade.

Falece pois, neste aspecto, razão ao recorrente, pelo que improcede a invocada nulidade da sentença.

2.ª Questão: Do alegado erro de julgamento e se a matéria de facto descrita na sentença recorrida deve ser modificada nos termos preconizados pelo recorrente.

Invocando a contradição existente nos depoimentos prestados na audiência de julgamento pelos guardas da GNR RC e FC sobre quem teria realizado o teste de pesquisa de álcool no sangue através do ar expirado por meio do analisador qualitativo, aliado à circunstância do arguido ter negado ter sido submetido a esse teste (não obstante reconhecer que no posto da GNR se negou a ser submetido ao teste no analisador quantitativo), e ainda que nenhuma prova existe sobre a taxa de alcoolemia e ser esta absolutamente irrelevante para o crime de desobediência aqui em causa, sustenta o recorrente que o ponto 3 dos factos dados como provados na sentença recorrida dele deve ser eliminado e transitar para os não provados.

Vejamos.
Como afirmado pelo recorrente e sublinhado pelo Ministério Público e que merece a nossa adesão, é de todo irrelevante para a decisão de mérito o facto descrito no ponto 3 dos factos dados como provados na sentença recorrida.

Ora, como é acertadamente salientado no acórdão desta Relação de 18-06-2013, proferido no proc.nº9/10.6TDEVR.E1, de que foi relator o Senhor Desembargador António Latas, disponível em www.dgsi.pt a impugnação da decisão da matéria de facto pressupõe a relevância da mesma, apenas cabendo apreciar e decidir do mérito da impugnação se dela puder decorrer em concreto, alteração da sentença em matéria da culpabilidade ou determinação da sanção, o que não é manifestamente o caso.

Não obstante e para dissipar qualquer dúvida sempre diremos, que existe a apontada discrepância e hesitação nos depoimentos das mencionadas testemunhas, pelo que é razoável a dúvida sobre se o teste de pesquisa de álcool no sangue através do analisador qualitativo foi ou não realizado e dessa dúvida deve beneficiar o arguido por aplicação do princípio “in dubio pro reo”.

Por outro lado, como salienta o recorrente a taxa de álcool alegadamente detectada por esse analisador qualitativo é absolutamente irrelevante para o crime de desobediência que é o que aqui está em apreciação.

Como é sabido, a detecção da presença de álcool no sangue pode ser feita por meio de analisador qualitativo ou quantitativo de ar expirado, mas a determinação ou quantificação da taxa de álcool no sangue só pode ver validamente efectuada por analisador quantitativo de ar expirado ou por métodos biológicos. Uma coisa é detecção da presença de álcool no sangue e outra é determinação ou quantificação da taxa de álcool no sangue.

Ora, os aparelhos de pesquisa de álcool no ar expirado são classificados em dois grupos: os analisadores qualitativos, de despiste ou de triagem e os analisadores quantitativos, evidenciais ou formais. Os primeiros são cientificamente considerados como incapazes ou insuficientes para revelarem a verdadeira e exacta taxa de alcoolemia com a fidedignidade exigida pelo direito punitivo penal ou contra-ordenacional, pelo que para esse efeito só são validamente admitidos os resultados obtidos através destes segundos ou pelo método biológico de análise do sangue (cfr. “Direito Penal Rodoviário – Os crimes dos Condutores”, pp.149/150, de Francisco Marques Vieira).

Mas como diz o recorrente e é também sublinhado pelo Ministério Público, é completamente inócuo para o crime de desobediência o facto descrito no ponto 3 dos factos provados, pois tanto comete esse crime o condutor que injustificadamente se recusa a realizar o teste qualitativo como o quantitativo.

Pelo exposto, é suprimido dos factos dados como provados na sentença recorrida o ponto 3, que transitará para os factos não provados.

Em consequência disso, é eliminada a expressão “novo” constante do ponto 4 dos factos provados, que passará a ter a seguinte redacção “O arguido foi transportado para o Posto territorial de Vila Nova de Mil Fontes com o objectivo de aí efectuar o teste de alcoolemia quantitativo”.

Ainda nesta sede de impugnação da matéria de facto, pugna o recorrente para que seja aditado à factualidade dada como provada que “(…) O arguido não foi perguntado há quanto tempo tinha ingerido a última bebida, previamente a ser-lhe solicitado que realizasse o teste de despiste de alcoolemia”, facto este que alega resultar da discussão da causa, nomeadamente do depoimento da testemunha RC.

Liminarmente diremos que por se tratar de factos que não constam da enumeração dos factos provados e não provados da sentença recorrida, constitui matéria que não podemos sindicar no âmbito da impugnação ampla da matéria de facto.

Na verdade, no que tange a esse facto que o recorrente alega que também ficou provado e que, segundo a sua valoração, terá resultado da discussão da causa, designadamente do depoimento da mencionada testemunha produzido na audiência de discussão e julgamento realizada na 1ª Instância, cabe dizer que não é admissível a impugnação da matéria de facto, nos termos do art.412º, nº3 do CPP relativamente a factos que o recorrente entende terem resultado provados da discussão da causa, mas que não constam da enumeração dos factos provados e não provados da sentença recorrida, como é o caso, pelo que trata-se de matéria que não podemos sindicar neste âmbito.

Com efeito como é salientado a este propósito no acórdão desta Relação de 22-11-2011, de que foi relator o Exmº Senhor Desembargador Fernando Ribeiro Cardoso, acessível em www.dgsi.pt «a função do recurso no quadro institucional que nos rege não visa a realização de um novo julgamento, mas apenas sindicar aquele que foi efectuado, despistando e sanando os eventuais erros procedimentais ou decisórios cometidos e que tenham sido devidamente suscitados em recurso.

Por outro lado, o recurso sobre a matéria de facto não pressupõe uma reapreciação pelo tribunal de recurso de todos os elementos de prova que foram produzidos e que serviram de fundamento à sentença recorrida, mas apenas e tão-só a reapreciação da razoabilidade da convicção formada pelo tribunal “a quo”, a incidir sobre os pontos de factos impugnados e com base nas provas indicadas pelo recorrente.

Quando impugne a decisão proferida ao nível da matéria de facto, tal impugnação faz-se por referência à matéria de facto que o tribunal recorrido deu efectivamente como provada ou não provada, quer seja proveniente da acusação, defesa (neste caso na contestação limitou-se a oferecer o merecimento dos autos) o ou resultante da discussão da causa, ou seja, é restrita à decisão realmente proferida e não àqueloutra que o recorrente, na sua perspectiva, entende que deveria fazer parte do elenco factual que foi objecto do julgamento pelo tribunal recorrido.

Se a sentença não enumera factos, que, na perspectiva do recorrente, resultaram da discussão da causa e tinham relevância para a decisão, essa omissão não pode ser suprida por uma reapreciação da prova pelo tribunal de recurso. Não foi essa a solução processual querida pelo legislador. A motivação do recurso não é o meio adequado para introduzir factos novos no objecto da acção penal».

Seja como for, de qualquer modo, o facto que o recorrente pretende ver aditado à matéria de facto provada, como à frente veremos de forma mais pormenorizada também não assume qualquer relevância, nomeadamente a que o recorrente lhe atribui, não tendo aptidão para alterar a decisão de mérito proferida na 1ª Instância e, assim, impor a sua absolvição pela prática do crime de desobediência pelo qual foi condenado.

3.ª Questão: Da existência dos vícios previstos no nº2, als.a) e c) do CPP – insuficiência para a decisão da matéria de facto provada e erro notório na apreciação da prova.

Conforme resulta do estatuído no nº2 do art.410º, do CPP, os vício previstos nas alíneas a), b) e c), têm de resultar do texto da decisão recorrida, por si só ou conjugada com as regras da experiência, sem recurso a quaisquer elementos que lhe sejam externos.

Como já anteriormente referimos, trata-se de vícios intrínsecos da decisão, não sendo lícito afirmar-se a sua existência recorrendo a elementos que lhe sejam exteriores, designadamente de depoimentos e declarações prestados, quer durante o inquérito, instrução, quer até na audiência de julgamento.

O erro notório na apreciação da prova, como vício relevante em processo penal, é segundo a doutrina e jurisprudência mais generalizadas, o que é evidente para qualquer indivíduo de médio discernimento e deve resultar do texto da sentença conjugado com as regras da experiência comum.

Para além disso, a sua essência, consiste em que para existir como tal, terá de se retirar de um facto dado como provado uma conclusão logicamente inaceitável.

O vício de erro notório na apreciação da prova, só pode verificar-se relativamente aos factos tidos como provados e não provados e não às interpretações ou conclusões de direito com base nesses factos.

O erro tem assim de aferir-se do texto da decisão recorrida, por si só ou conjugadamente com as regras da experiência comum (sem recurso, por exemplo, a declarações ou depoimentos prestados durante o inquérito, instrução ou julgamento), tendo ainda que resultar desse texto de forma tão patente que não escape à observação do homem de formação média.

«Erro notório na apreciação da prova é aquele de tal modo evidente que não passa despercebido ao comum dos observadores, ou seja, quando o homem médio facilmente dele se dá conta.» (Ac. STJ, de 9.12.98, BMJ 482 - 68).

É que o erro na apreciação da prova só pode resultar de se ter dado como provado algo que notoriamente está errado «que não pode ter acontecido, ou quando, usando um processo racional e lógico, se retira de um facto dado como provado uma conclusão ilógica, arbitrária e contraditória, ou notoriamente violadora das regras de experiência comum, sendo o erro de interpretação detectável por qualquer pessoa» (Ac. de 12.11.98, no BMJ 481-325), o que no caso concreto não se verifica.

Mas se bem interpretamos a peça recursiva, a invocação destes vícios radica nos mesmos fundamentos em que se alicerçou o erro de julgamento apontado relativo ao ponto 3 dos factos provados, isto é, na valoração da prova feita pelo tribunal recorrido e na valoração oposta que dela faz o recorrente, relativamente a esse facto, alegação essa que nada tem a ver com estes vícios, na medida em que faz apelo a elementos alheios ao texto do acórdão recorrido, como são as declarações e depoimentos prestadas em julgamento.

Como é sobejamente sabido, o erro de julgamento e o erro notório na apreciação da matéria de facto são institutos distintos e como tal não devem ser confundidas, como parece acontecer com o recorrente.

Trata-se de duas formas distintas de “atacar” a matéria de facto, estando por isso sujeitas a regimes processuais diferentes.

Assim, enquanto o erro notório na apreciação da prova, constitui um vício intrínseco da sentença, e por isso, tem de resultar por si só ou conjugadamente com as regras da experiência comum do respectivo texto (art.410º, nº2, do CPP), o erro de julgamento não se confina a esse domínio, tratando-se de uma forma ampla de impugnação da matéria de facto, que todavia, deve ser exercida com observância do disposto no art.412º, nºs 3 e 4 do CPP.

O erro notório na apreciação da prova não reside na desconformidade entre a decisão de facto do julgador e aquela que teria sido a do recorrente.

A este respeito, como é salientado pelo STJ «Se existe mera discordância do recorrente entre aquilo que o colectivo teve como provado e aquilo que o recorrente entende não ter resultado da prova produzida, ou o contrário, não se verifica qualquer dos vícios indicados no art. 410º- 2 a) e c), do CPP.» (Ac. de 19.3.98, no BMJ 475-261).

Em bom rigor, o que o recorrente com esta alegação pretende por em causa é a apreciação que o Tribunal “a quo” fez de alguns meios de prova, que na sua perspectiva não avaliou devidamente, o que acima foi objecto de apreciação por este tribunal em sede de impugnação ampla da matéria de facto.

Improcede, pois, a invocação do erro notório na apreciação da prova.

Prosseguindo.
Da alegada insuficiência para a decisão da matéria de facto provada.
Incorre no vício de insuficiência para a decisão da matéria de facto, quando o tribunal recorrido podendo fazê-lo, deixou de investigar toda a matéria de facto relevante, de tal forma que essa matéria de facto não permite, por insuficiência, a aplicação do direito ao caso submetido à apreciação do Tribunal.

Este vício trata consabidamente de uma insuficiência da matéria de facto para a decisão de direito.

Como refere o Prof. Germano Marques da Silva, no “ Curso de Processo Penal”, vol.III, pag.339/340 «é necessário que a matéria de facto dada como provada não permita uma decisão de direito, necessitando de ser completada. Antes de mais, é necessário que a insuficiência exista internamente, dentro da própria sentença ou acórdão. Para se verificar este fundamento, é necessário que a matéria de facto se apresente como insuficiente para a decisão que deveria ter sido proferida por se verificar lacuna no apuramento da matéria de facto necessária para uma decisão de direito. A insuficiência para a decisão da matéria de facto provada não tem nada a ver com a eventual insuficiência da prova para a decisão de facto proferida.

A insuficiência para a decisão da matéria de facto ocorre quando da factualidade vertida na sentença se colher faltarem elementos que podendo e devendo ser indagados, são necessários para se poder formular um juízo seguro de condenação ou de absolvição (Ac. STJ de 15/171998, proc.1075/97, acessível em www.dgsi.pt).

Tal insuficiência determina a formulação incorrecta de um juízo porque a conclusão ultrapassa as premissas, ou seja, quando os factos provados forem insuficientes para fundamentar a solução de direito encontrada.

A referida insuficiência resulta do tribunal não ter esgotado os seus poderes de indagação relativamente ao apuramento da matéria de facto essencial; no cumprimento do dever da descoberta da verdade material, o tribunal podia e devia ter ido mais longe, não o tendo feito, ficaram por investigar factos essenciais, cujo apuramento permitiria alcançar a solução legal e justa (cfr.Ac.STJ de 2/6/1999, proc.288/99, acessível em www.dgsi.pt).

Assim, um tal vício só pode ter-se como evidente quando os factos provados forem insuficientes para justificar a decisão assumida.

Ora atenta a materialidade apurada, acima transcrita, é manifesta a inexistência deste vício.

Na verdade, examinada e revista, à luz de tais ditames e ensinamentos, o texto da sentença recorrida, não se vê, de todo em todo, que o tribunal “a quo” haja incorrido em tal vício.

Com efeito, como veremos detalhadamente mais à frente, basta atentar nos factos elencados como provados na sentença recorrida, donde decorre a perfectibilização subsuntiva dos elementos de facto pertinentes à responsabilidade criminal - elementos objectivos e subjectivos - do crime que a sentença recorrida atribui ao arguido/recorrente, pelo qual foi condenada na 1ª Instância.

Mas se bem interpretamos a motivação do recurso e subsequentes conclusões, o recorrente invoca este vício pretendendo estribar-se na insuficiência da prova para ter sido dado como provado o ponto 3 dos factos elencados como provados na sentença recorrida, que foi apreciado aquando do conhecimento da impugnação ampla da matéria de facto que pretendia, que nesse partícula obteve êxito, transitando esse facto para os factos não provados.

Ora, são coisas distintas e como tal não podem ser confundidas, a insuficiência de prova e a insuficiência da matéria de facto para a decisão.

Acresce que relativamente ao aditamento à matéria de facto preconizado pelo recorrente, também essa questão foi conhecida anteriormente.

De salientar que, ao fim e ao cabo, no essencial, a questão suscitada sob a invocação deste vício é, no essencial, a mesma que emerge da impugnação ampla da matéria de facto, efectuada ao abrigo do art.412º, nº 3 e 4 do CPP e por nós anteriormente conhecida, apreciada e resolvidas nessa sede.

É, pois, manifesto que a decisão recorrida também não enferma deste vício.

Não vem invocada nem nós vislumbramos a existência de contradição insanável da fundamentação ou entre esta e a decisão [vício previsto na al.b) do nº2 art,410º do CPP].

Não padecendo a sentença recorrida de algum dos vícios enunciados nas alíneas a), b, e c) no nº2 do art.410º do CPP, nem estando alicerçada em prova proibida, temos por definitivamente sedimentada a decisão sobre a matéria de facto, com as alterações introduzidas nesta Instância proferida.

4.ª Questão: Da alegada inexistência dos pressupostos dos quais depende a punibilidade pelo crime de desobediência pelo qual o arguido/recorrente foi condenado na 1ª Instância.

Sedimentada a factualidade apurada nos termos atrás expostos, vejamos se em face dela se encontram preenchidos os elementos objectivos e subjectivos do crime de crime desobediência, pp. pelo arts.348º, nº1, al.a) do Código de Penal, por referência ao art.152º, nº3 do Código da Estrada.

Pratica o crime de desobediência, nos termos do artigo 348º n.º1, do Código Penal: “quem faltar à obediência devida a ordem ou a mandado legítimos, regularmente comunicados e emanados de autoridade ou funcionário competente, é punido com pena de prisão até 1 ano ou de multa até 120 dias se:

a) Uma disposição legal cominar, no caso, a punição da desobediência simples;

b) Na ausência de disposição legal, a autoridade ou o funcionário fizerem a correspondente cominação”.

Neste tipo legal de crime, tal como nos demais crimes contra a autoridade pública, protege-se a autonomia intencional do Estado, de uma forma particular, a não colocação de entraves à actividade administrativa por parte dos destinatários dos seus actos. Desobedecer é não cumprir, não respeitar “a ordem ou mandado legítimo, regularmente comunicados e emanados de autoridade ou funcionário competente”.

Temos assim a considerar vários elementos que compõem o tipo objectivo: a ordem ou mandado; a legalidade substancial e formal da ordem ou mandado; a competência da autoridade ou funcionário para a sua emissão; a regularidade da sua transmissão ao destinatário; a violação dessa ordem ou mandado.

De acordo com este preceito legal, o legislador apenas confere relevância criminal à desobediência que tenha desrespeitado uma cominação prévia: legal ou expressa pelo emitente da ordem ou mandado.

Faltar à obediência devida não constitui por si só facto criminalmente ilícito. A dignidade penal da conduta exige que o dever de obediência que se incumpriu tenha uma de duas fontes: ou uma disposição legal que comine, no caso, a sua punição (cominação legal); ou, na ausência desta, a correspondente cominação feita pela autoridade ou funcionário competente para ditar a ordem ou mandado (cominação funcional). - Cristina Líbano Monteiro, Comentário Conimbricense do Código Penal, Tomo III, Coimbra, 2001, p. 351;

No caso de cominação legal, a imposição da norma de conduta é feita por norma geral e abstracta anterior à prática do facto. Daí que o crime de desobediência pareça destinado a servir de norma auxiliar (uma vez que fixa as condições básicas do ilícito e da pena) a alguns preceitos de direito penal extravagante que incriminam um determinado comportamento desobediente, sem contudo fixarem uma moldura penal própria Cristina Líbano Monteiro, ob. Cit. p. 353;

No caso de cominação funcional, a relevância penal da conduta resulta da vontade da autoridade ou funcionário, contemporânea da actuação do agente, o que determina que o tipo legal de crime seja entendido como uma norma penal em branco, cuja última determinação caberá ao julgador, no estrito respeito e cumprimento do principio da legalidade, constitucional e legalmente consagrado, e nunca à vontade a determinar em cada caso concreto, por um agente da administração.

O crime previsto na alínea b) do art.º 348º existe apenas para os casos em que nenhuma norma jurídica prevê o comportamento desobediente, o que determina que nas alíneas do nº 1 do art.º 348º se prevêem dois tipos incriminadores distintos.

Do que consta das Actas e Projecto da Comissão de Revisão, Rei dos Livros, págs. 407-408, ressalta, com clareza que a actual redacção do preceito expressa a vontade do legislador de apenas conferir relevância criminal às desobediências que tenham desrespeitado uma comunicação prévia: legal ou expressa pelo emitente.

Do que não se pode é prescindir da cominação da punição por desobediência. Faltar à obediência devida não constitui, por si só, facto criminalmente ilícito. A dignidade penal da conduta exige que o dever de obediência que se incumpriu, se não tiver a sua fonte numa disposição legal que comine no caso, a sua punição, como desobediência radique na cominação da punição da desobediência, feita por autoridade ou funcionário competentes para ditar a ordem. Não satisfaz o requisito legal, por isso, a mera cominação de incorrer em procedimento criminal; tal como se exige, na alínea a), que uma disposição legal comine, no caso, a punição da desobediência, a alínea b) requer que a autoridade ou funcionário cominem, no caso, a punição da desobediência.

No caso de que aqui nos ocupamos estamos perante um caso de cominação legal, a imposição da norma de conduta é feita por norma geral e abstracta anterior à prática do facto, resultando do disposto no nº3 do art.152º, do Código da Estrada, segundo o qual os condutores (…) que se recusem submeter às provas estabelecidas para a detecção do estado de influenciado pelo álcool (…) são punidos por crime de desobediência, pelo que é irrelevante e até dispensável para o preenchimento do crime em causa que o órgão de polícia criminal que procedeu à fiscalização tivesse advertido o arguido de que incorria no crime de desobediência caso não se submetesse ao teste de alcoolemia.

Neste caso, essa advertência não constitui elemento constitutivo do crime de desobediência.

Com efeito, como é salientado por Cristina Líbano Monteiro, em anotação ao referido preceito, no Comentário Conimbricense do Código Penal, Parte Especial, Tomo III, pag.351, a desobediência tem duas fontes: ou uma disposição legal que comine, no caso, a sua punição; ou na ausência desta, a correspondente cominação feita pela autoridade ou pelo funcionário competentes para ditar a ordem ou o mandado.

A advertência seria relevante mas se estivéssemos perante um caso de cominação funcional, da al.b) do nº1 do art.348º, do C. Penal, o que aqui não sucede, pois esta incriminação existe tão-só para os casos em que nenhuma norma jurídica, seja qual for a sua natureza, prevê um comportamento desobediente. São unicamente as desobediências não tipificadas, a ficarem dependentes, para a sua relevância penal, de uma simples cominação funcional.

Mas para o preenchimento do crime é ainda necessário que o agente actue dolosamente, pois estamos perante um crime doloso (art.13º - 1ª parte do C. Penal), sendo que o dolo do tipo consiste no conhecimento e vontade de realização da acção típica, distinguindo-se o elemento volitivo (vontade) do elemento intelectual do dolo (conhecimento).

No caso da desobediência o dolo preenche-se sempre que alguém incumpre, consciente e voluntariamente uma ordem ou mandado legítimos regularmente comunicados e emanados de autoridade ou funcionário competente.

Ora, da factualidade definitivamente consolidada que atrás transcrevemos vertida nos pontos 1 a 10 dos factos provados, mesmo com as modificações acima operadas no que concerne à exclusão dos factos provados do ponto 3 e à alteração da redacção dada ao ponto 4, resulta de forma irrefutável todos os elementos objectivos e subjectivos do crime de desobediência, previsto e punido pelo art.348º, nº1, al.a) do C. Penal por referência ao art.152º, nº3 do C. Estrada, pelo que improcede a pedida absolvição do arguido.

Mas a absolvição do arguido/recorrente da prática desse crime pelo qual foi condenado na 1ª Instância, vem ancorada na modificação da matéria de facto nos termos por si preconizados, considerando o recorrente estar justificada a sua recusa a submeter-se ao teste de álcool no sangue através do ar expirado, porquanto diz o recorrente, que se recusou a realizar o teste no alcoolímetro qualitativo, porque havia ingerido a ultima bebida alcoólica há cerca de 10 minutos antes e que deve ser sempre observado o intervalo de 20 minutos entre a ingestão da ultima bebida alcoólica e a realização do teste de pesquisa de álcool através do ar expirado, mesmo no despiste realizado através do alcoolímetro qualitativo.

Não só esta alegação carece de prova, como também pelas razões anteriormente expostas não foi aditado aos factos provados o facto pretendido pelo recorrente de que não lhe perguntado há quanto tempo tinha ingerido a última bebida, previamente a ser-lhe solicitado que realizasse o teste de despiste de alcoolemia, sendo que tal circunstância a verificar-se sempre se revelaria absolutamente irrelevante, não tendo o efeito pretendido pelo recorrente de justificar a recusa a ser submetido ao teste qualitativo, sendo que nem sequer está em causa que ele recusou a realização no posto da GNR do teste no alcoolímetro quantitativo e como já dissemos é completamente inócuo para o preenchimento do crime de desobediência aqui em causa, pois tanto comete esse crime o condutor que se recusa a realizar o teste qualitativo como o quantitativo, sendo que não existe qualquer norma legal a determinar ou impor aquele intervalo de tempo entre a ingestão da última bebida alcoólica e a realização do teste de pesquisa de álcool através do ar expirado, quer seja realizado no alcoolímetro qualitativo, quer seja no alcoolímetro quantitativo, pelo que esse fundamento não pode constituir motivo justificado da recusa do condutor.

Acresce, como muito bem sublinha o Ministério Publico na sua contra motivação, a recomendação invocada pelo recorrente nº126 da Organização Internacional de Metrologia Legal (OIML), cuja observância é obrigatória nos termos do art.4.º do Regulamento de Controlo Metrológico dos Alcoolímetros (anexo á Portaria n.º 1556/2007, de 10-DEZ), mas tal recomendação circunscreve-se aos alcoolímetros que efectuam o teste quantitativo.

Na verdade, resulta da redacção originária da dita recomendação, o seguinte:

«1 Scope
This Recommendation applies to quantitative breath alcohol analyzers that render a measurement result of alcohol concentration in exhaled human breath for the purpose of establishing compliance with national policy for fighting against alcohol abuse.

These types of quantitative breath alcohol analyzers are referred to by some national authorities as “evidential” breath alcohol analyzers and serve to provide the principal means by which a definitive alcohol measurement is obtained.

These devices are not to be confused with those that provide a preliminary result, or do not quantitatively indicate a measurement result (i.e. pass/fail devices), or which do not provide a sufficiently accurate result to definitively establish a breath alcohol concentration (often referred to as breath alcohol “screening” devices).

The purpose of this Recommendation is to enumerate the minimum metrological specifications and tests applicable to type approval of quantitative breath alcohol analyzers.»

Donde, na verdade resulta que com toda a clareza que ela se aplica apenas aos aparelhos quantitativos. «These devices are not to be confused with those that provide a preliminary result, or do not quantitatively indicate a measurement result». Como diz o Mº Pº «em simples português: “não se devendo confundir estes aparelhos com os de despistagem”».

Efectivamente como bem sublinha o MºPº naquela peça processual «o referido art. 4.º do Regulamento, sob a epígrafe «Requisitos dos alcoolímetros» dispõe apenas (e tão somente) que «Os alcoolímetros deverão cumprir os requisitos metrológicos e técnicos, definidos pela Recomendação OIML R 126”, isto é, o art. 4.º do Regulamento quer apenas ver aplicada a «Part 1 - Metrological and technical requirements», e nada mais do que isso».

Acresce que na dita recomendação donde consta que «Annex A

Examples of detection of alcohol in upper respiratory tracts (Informative)
(…)
A.3 - Delay before measurement
Good measurement practice, regardless of technical solutions (A.1, A.2), involves allowing for an observation period prior to subject tests of at least 15 min to ensure that the alcohol has disappeared from the upper respiratory tract», para além de se referir a 15 minutos e não a 20 minutos, como invoca o recorrente, não deixa qualquer dúvida do seu carácter meramente informativo.

Improcede, pois, a invocada justificação e consequentemente absolvição do arguido pela prática do mencionado crime.

5.ª Questão: Da opção por pena de multa e na negativa se é excessiva e desproporcionada apena de prisão aplicada.

O crime de desobediência cometido pelo arguido/recorrente, previsto e punido pelo art.348º, nº1, al.c), 69º,nº11, al.c) do C. Penal por referência ao art.152º, nº3 do C. Estrada, é punível com uma pena (principal), de prisão de 1 mês até 1 ano ou (pena alternativa) com multa de 10 a 120 dias e com pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor por um período fixado entre três meses e três anos.

Em vista da moldura legal abstracta supra indicada, importa considerar, antes de tudo, o critério geral orientador da selecção da pena concreta estabelecido no art. 70º do C. Penal.

Nos termos deste preceito e na alternativa, como é o caso, de ao crime ser aplicável pena privativa ou não privativa da liberdade, o tribunal deve dar preferência à segunda sempre que esta realizar de forma adequada e suficiente as finalidades da punição, isto é, «a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade» (art. 40º nº 1, do CP).

No dizer da Prof. Fernanda Palma, «A protecção de bens jurídicos implica a utilização da pena para dissuadir a prática de crimes pelos cidadãos (prevenção geral negativa), incentivar a convicção de que as normas penais são válidas e eficazes e aprofundar a consciência dos valores jurídicos por parte dos cidadãos (prevenção geral positiva). A protecção de bens jurídicos significa ainda prevenção especial como dissuasão do próprio delinquente potencial. Por outro lado, a reintegração do agente significa a prevenção especial na escolha da pena ou na execução da pena. E, finalmente, a retribuição não é exigida necessariamente pela protecção de bens jurídicos. A pena como censura da vontade ou da decisão contrária ao direito pode ser desnecessária, segundo critérios preventivos especiais, ou ineficaz para a realização da prevenção geral.» (As alterações Reformadoras da Parte Geral do Código Penal na Revisão de 1995: Desmantelamento, Reforço e Paralisia da Sociedade Punitiva», in Jornadas sobre a Revisão do Código Penal» (1998), AAFDL, pp. 25-51, e in «Casos e Materiais de Direito Penal» (2000), Almedina, pp. 31-51 (32/33).

Diga-se que o art. 70º do Código Penal não vincula o julgador a uma automática preferência pela pena não privativa da liberdade, uma vez que, logo por si e em si, comporta uma condicionante limitativa dessa preferência, traduzida na necessidade de verificação, para que tal opção se imponha e justifique, de que a escolha da pena não privativa da liberdade realize “de forma adequada e suficiente as finalidades da punição”: se entender que as finalidades da punição não se atingem com esta pena, não tem o tribunal que optar, forçosamente, por ela.

A escolha da pena, nos termos do art. 70º do Código Penal, entre a pena privativa de liberdade e a pena não privativa da liberdade depende unicamente de considerações de prevenção geral e especial. Já a determinação do “quantum” ou medida da pena depende fundamentalmente da culpa. A escolha entre a pena privativa e não privativa da liberdade alternativa tem de resultar de uma avaliação casuística feita pelo julgador e a opção por esta tem de ser feita sempre que através dela se possam realizar as finalidades da punição.

E isto mesmo nos diz, com expressiva lucidez, Robalo Cordeiro, ao esclarecer que “determinar se as medidas não institucionais são suficientes para promover a recuperação social do delinquente e dar satisfação às exigências da reprovação e da prevenção do crime não é uma operação abstracta ou atitude puramente intelectual mas fruto de uma avaliação das circunstâncias de cada situação concreta. Só caso a caso, processo a processo, mediante uma apreciação dos elementos de prova disponíveis, se legitimará uma escolha entre as penas detentivas ou não detentivas. Pelo que competirá, em última instância, aos tribunais a selecção rigorosa dos delinquentes que hão-de ser sujeitos a umas e outras. Selecção rigorosa e – repete-se – sempre fundamentada, não obstante o art. 71º (actual art. 70º) parecer sugerir esta fundamentação apenas nos casos em que a preferência do legislador se dirigir a penas não detentivas” – (cf. «Escolha e medida da pena», Jornadas de Direito Criminal, publicação do CEJ, pag. 237 e ss).

Ainda que a lei penal procure fixar os parâmetros em que o aplicador se deve mover na escolha e determinação da pena, é bem claro que ao juiz continua a pertencer uma margem de liberdade/responsabilidade nessa tarefa.

Naturalmente que as dificuldades são bem visíveis, quer pelo lado da determinação da culpa, vista nos sinais da actuação de cada um, das representações feitas à vontade manifestada; pelo desconhecimento que o Tribunal em regra possui sobre a personalidade do arguido, já que as perícias de especialidade ou as informações sociais são ainda a excepção; quer pelo prisma do apelo às expectativas comunitárias na validade das normas, pois constitui um campo impreciso sendo muitas vezes difícil de concretizar o que se pensa ser o sentimento comunitário em dado momento - nem sempre captável pelos mais atentos.

A ponderação do binómio culpa/prevenção impõe que, na fixação da pena, se tenha em conta que a culpa, enquanto censura dirigida ao agente em virtude da atitude desvaliosa traduzida num certo facto individualizado, estabelece o máximo da pena concreta, limitação que é consequência do princípio da culpa, subjacente a todo o Código Penal e segundo o qual não há pena sem culpa, nem a medida da pena pode ultrapassar a medida da culpa.

Além do exposto supra, e porque a medida da pena é dada pela necessidade de tutela dos bens jurídicos concretos, o limite inferior da medida concreta da pena decorrerá de considerações ligadas à prevenção geral, entendida esta como prevenção geral positiva ou de reintegração, contraposta à prevenção geral negativa, de intimidação do delinquente.

A pena deve neutralizar o efeito negativo do crime na comunidade e fortalecer o seu sentimento de justiça e de confiança na validade das normas violadas, além de constituir um elemento dissuasor.

A justificação assenta na ideia de sociedade considerada como um macro sujeito activo que sente e padece o conflito e que viu violado o seu sentimento de segurança com a violação da norma, tendo, portanto, direito a participar e ser levada em conta na solução de conflito.

Recordados estes parâmetros, temos que, “in casu”, a senhora juíza, perante as quatro condenações anteriores do arguido, por crime relacionados com a circulação rodoviária (3 por condução em estado de embriaguez e 1 por desobediência), uma delas por crime da mesma natureza do que aqui agora está em causa, em pena de prisão com execução suspensa, entendeu e bem, que a pena de multa não realiza de forma adequada e suficiente as finalidades da punição, pois que para além dessa condenação sofreu outras três condenações anteriores por condução em estado de embriaguez, em que foi condenado, respectivamente em pena de multa, em prisão substituída por multa e em pena de prisão substituída em trabalho a favor da comunidade, o que demonstra que essas penas não foram adequadas a fazê-lo interiorizar a reprovabilidade da sua conduta e a observar os valores e regras dominantes na sociedade.

Por outro lado, há que convir que os antecedentes criminais do arguido estão longe de contribuírem para um juízo optimista sobre o seu comportamento futuro, designadamente quanto a actos da mesma índole dos que ora ocorreram.

Finalmente do acervo factual apurado não emerge um quadro atenuativo que, face à protecção do bem jurídico envolvido e às necessidades de ressocialização do arguido (que já desmereceu das advertências em que se traduziram as quatro precedentes condenações), justificasse a opção por uma pena não privativa da liberdade em relação ao crime em presença.

Assim não nos merece reparo a opção feita pelo julgador pela pena privativa da liberdade – pena de prisão.

Pena esta que foi fixada em 12 meses de prisão. Limite máximo da pena prevista para o crime.

Vejamos se é excessiva e desproporcionada essa pena.

Como é sobejamente sabido, em sede de dosimetria da pena relevam os arts. 40º e 71º, do C. Penal.

Culpa e prevenção são assim os dois termos do binómio com auxílio do qual há-de ser construído o modelo da medida da pena (ou de determinação concreta da pena). – Figueiredo Dias, “As consequências jurídicas do crime”, pag.274.

As finalidades da aplicação de uma pena residem primordialmente na tutela dos bens jurídicos e, na medida do possível, na reinserção do agente na comunidade.

Se é certo que a pena não pode ultrapassar, em caso algum, a medida da culpa (art.40º nº2, do C. Penal), “ a medida da pena há-de primordialmente ser dada pela medida da necessidade da tutela dos bens jurídicos face ao caso concreto. Aqui a protecção dos bens jurídicos assume um significado prospectivo, que se traduz na tutela das expectativas da comunidade na manutenção ou mesmo reforço da vigência da norma infringida. Até ao máximo conseguido pela culpa, é a medida exigida pela tutela dos bens jurídicos que deve determinar a medida da pena –F. Dias, Ob. Cit.pag. 227.

Estão aqui em causa exigências de prevenção geral positiva ou de integração, isto é, de reforço da consciência jurídica comunitária e do seu sentimento de segurança face à violação da norma ocorrida. Estas exigências não permitem que a pena baixe do quantum indispensável para que se não ponha irremediavelmente em causa a crença da comunidade na validade da norma violada e, por essa via, o sentimento de confiança e segurança dos cidadãos nas instituições jurídico-penais. Ob.cit.pag.242 e ss.

Revertendo ao caso em apreciação, o grau de ilicitude do facto é acentuado.

Em sede de culpa, a conduta do arguido justifica uma censura ético-jurídica, já que podiam e devia ter agido de outro modo, assumindo a natureza de dolo directo e, por isso, intenso.

É acentuada a exigência reclamada pela prevenção especial em face dos antecedentes criminais do arguido, quatro condenações anteriores, sendo uma delas pela prática de um crime desta mesma natureza.

É também acentuada a exigência reclamada pela prevenção geral, pois, como é sabido, é acentuado o custo social desta espécie de crimes que urge combater com firmeza, dada a erosão dos valores que provoca sendo, por isso, acentuada a necessidade de prevenir e reprovar a prática de crimes desta natureza, sendo também acentuada a necessidade de acautelar as finalidades de prevenção geral na determinação das penas como garantia da validade das normas e de confiança da comunidade.

Porém, não podem ser descuradas as finalidades de reinserção dentro do modelo de prevenção especial.

A finalidade de reintegração do agente na sociedade há-de ser, em cada caso, prosseguida pela imposição de uma pena cuja espécie e medida, determinada por critérios derivados das exigências de prevenção especial, se mostre adequada e seja exigida pelas necessidades de ressocialização do agente, ou pela intensidade da advertência que se revele suficiente para realizar tais finalidades.

Importa que a sanção também contribua para reflexão do arguido sobre os seus actos de modo a alterar no futuro o seu comportamento, de modo a encontrar os caminhos certos da vida.

Nos limites da prevenção geral de integração e da prevenção especial de socialização há-de ser encontrado o modelo adequado e a medida concreta da pena, sempre de acordo com o princípio da culpa como seu limite inultrapassável.

As finalidades das penas (de prevenção geral positiva e de prevenção especial de integração) conjugam-se na prossecução do objectivo comum de, por meio da prevenção de comportamentos danosos, proteger bens jurídicos comunitariamente valiosos cuja violação constitui crime.

Sopesando em tudo isto e ainda no facto do arguido ter tido uma postura processual relevante, na sua inserção social e nas suas condições pessoais apuradas, salvo o merecido respeito, afigura-se excessiva e desproporcionada a pena de 1 ano de prisão (limite máximo da pena prevista para o crime) fixada na sentença recorrida, pelo que deve ser reduzida, afigurando-se-nos mais ajustada e proporcionada à culpa do arguido, ora recorrente e às exigências de prevenção, a pena de 8 meses de prisão.

Posto isto, é altura de examinarmos se é caso para a substituição desta pena em multa substitutiva.

Vejamos.
Nos termos do art.45º, do C. Penal «a pena de prisão aplicada em medida não superior a um ano, é substituída por pena de multa (…), excepto se a execução da prisão for exigida pela necessidade de prevenir o cometimento de futuros crimes».

Decorre do art.40º, nº1 do C. Penal que a aplicação da pena visa a protecção dos bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade.

Como temos afirmado bastas vezes noutras ocasiões, a reintegração do agente na sociedade não é senão um dos meios de realizar o fim do direito penal que é a protecção dos bens jurídicos (ao contribuir esta reintegração ou reinserção social para evitar a reincidência – prevenção especial positiva. A finalidade da aplicação de uma pena reside primordialmente na tutela dos bens jurídicos e, na medida do possível, na reinserção do agente na comunidade.

Como é sabido, o Código Penal não fornece um critério ou cláusula geral de escolha das penas de substituição - tanto assim que, como referem Leal-Henriques e Simas Santos (in Código Penal Anotado, P: 405), a propósito desta questão, "a Comissão de Revisão (...) não chegou a definir um critério de preferência entre as penas de substituição: ficariam em situação de igualdade, menos, como foi ressalvado em Comissão, a prisão por dias livres e o regime de semidetenção, cabendo depois ao juiz optar por aquela que melhor se adeque aos objectivos de prevenção especial".

Porém parece ser pacífico, que as penas de substituição devem ser agrupadas em penas de substituição de carácter não institucional ou não detentivo, por serem cumpridas em liberdade (as penas de suspensão de execução da prisão, de multa de substituição, de prestação de trabalho a favor da comunidade) e penas de substituição de carácter institucional ou detentivo, por serem cumpridas intramuros (permanência na habitação, já que as outras - a prisão por dias livres e os regimes de semidetenção – foram entretanto abolidas), devendo ser dada preferência às primeiras sobre a segunda, por esta implicar a privação/restrição da liberdade do arguido.

Face à ausência de critério estabelecido na lei, na ponderação e fixação de uma pena de substituição, o tribunal deve aplicar a pena de substituição que melhor realiza as finalidades da punição (cfr. artigo 40º nº 1, do Código Penal), dando preferência a uma pena substitutiva não privativa da liberdade, considerando nomeadamente as circunstâncias da prevenção especial de ressocialização – neste sentido Figueiredo Dias, in As Consequências Jurídicas do Crime, pp. 364 e 365, e Odete Maria de Oliveira, in Jornadas de Direito Criminal, Revisão do Código Penal, p. 73, edição do CEJ, ambos defendendo não existir, em abstracto, uma hierarquia legal de penas de substituição, devendo antes o Tribunal apurar, em concreto, entre as penas de substituição, a que melhor realiza as das exigências de prevenção especial de socialização que na hipótese se façam sentir e da forma mais adequada.

Na sentença recorrida, o tribunal a quo entendeu não ser adequada e suficiente para as finalidades da punição beneficiar o arguido com a pena de multa de substituição, optando por julgar adequada e suficiente para satisfazer as finalidades da punição a suspensão da execução da pena de prisão, excluindo todas as outras.

Flui do que anteriormente dissemos que a escolha da pena terá assim de ser perspectivada em função da adequação, proporção e potencialidade para atingir os objectivos estipulados no referido art. 40º, do C. Penal.

As exigências de prevenção geral e especial são os factores determinantes na escolha da pena, embora devendo prevalecer a ponderação da prevenção especial de socialização, porque o tribunal só deve negar a aplicação de uma pena alternativa ou de uma pena de substituição quando a execução da prisão se revele do ponto de vista da prevenção especial de socialização, necessária ou, em todo o caso, provavelmente mais conveniente do que aquelas penas.

A prevenção geral surge aqui sob a forma do conteúdo mínimo de prevenção de integração indispensável à defesa do ordenamento jurídico, como limite à actuação das exigências de prevenção especial de socialização. Ou seja desde que impostas ou aconselhadas à luz de exigências de socialização, a pena alternativa ou a pena de substituição só não serão aplicadas se a execução da pena de prisão se mostrar indispensável para que não sejam postas irremediavelmente em causa a necessária tutela dos bens jurídicos e a estabilização contrafáctica das expectativas comunitárias.

Emerge do anteriormente exposto que as quatro condenações anteriores, três delas em penas não privativas da liberdade, sendo que pelo crime desta natureza foi condenado em pena de prisão com execução suspensa, não foram suficiente para o dissuadir de voltar a delinquir, denotando a insensibilidade e indiferença do arguido perante a censura nelas ínsitas, insistindo o arguido em manter um comportamento desconforme ao direito e aos valores tutelados pelas normas incriminatórias.

Assim, não obstante o arguido se mostrar socialmente inserido, é manifesto que agora a pena de multa não se revela minimamente adequada e suficiente para satisfazer as finalidades da punição.

Com efeito, ante a comprovada persistência do arguido em delinquir, insistir em bafejá-lo com a pena de multa substitutiva, por si reclamada, mais não seria que encorajá-lo a reincidir e gorar-se-iam inapelavelmente as mencionadas finalidades da punição.

Por outro lado, neste caso, a pena de multa substitutiva à pena de prisão, também não se mostra minimamente adequada nem suficiente para o restabelecimento da paz jurídica comunitária abalada pelo crime e da confiança dos cidadãos no sistema de justiça.

Deste modo, não nos merece reparo a exclusão da aplicação de pena de multa substitutiva, revelando-se, isso sim, adequada, proporcional e suficiente para realizar as finalidades da punição a opção feita na sentença recorrida pela suspensão da execução da pena de prisão.

6.ª Questão: Da alegada excessividade e desproporcionalidade da pena acessória de proibição de conduzir aplicada e da sua eventual redução.

Entende o arguido que a pena acessória de proibição de conduzir pelo período de 18 meses fixada na sentença, é excessiva e desproporcionada, preconizando a sua redução.

Com é sabido e constitui jurisprudência unânime, a determinação da medida da referida pena acessória opera-se mediante o recurso aos critérios gerais constantes do art. 71º, do C. Penal.

Como já dissemos e repetimos, culpa e prevenção são assim os dois termos do binómio com auxílio do qual há-de ser construído o modelo da medida da pena (ou de determinação concreta da pena). – Figueiredo Dias, “As consequências jurídicas do crime”, pag.274.

Dando aqui por reproduzidas as considerações já expendidas anteriormente sobre as finalidades da aplicação das penas, também aplicáveis à pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor resultante da prática do mencionado crime de desobediência por recusa em ser submetido ao teste de alcoolemia, na determinação da correspondente medida deverá, em princípio, atender-se aos mesmos critérios que regem para a pena principal, sendo, no entanto, mais sensível a certos valores, nomeadamente de prevenção geral que a pena principal não prosseguirá tão eficazmente. (Cfr. Acórdãos desta Relação, de 14/5/96, C.J.Ano XXI, tmo 3º, pp.286 e segs. E de 29/5/2001, C.J., Ano XXVI, tomo 3º, pp.285).

A duração da pena acessória pode ser proporcionalmente diferente da concretamente encontrada para a pena principal por via, desde logo, da diversidade dos objectivos de política criminal ligados à aplicação de cada uma delas (cfr. Ac. Rel. Porto, de 20/9/95, C.J., Ano XX, Tomo 4º, pp229 231).

É consabida a eficácia preventiva da pena acessória em causa.

Como assinalava, já em 1993, o Prof. Figueiredo Dias, “Direito Penal Português – Consequências Jurídicas do Crime”, Editorial Notícias, pp. 164/165, enfatizando a necessidade e a urgência de que o sistema sancionatório português passasse a dispor de uma verdadeira pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados, em termos de direito penal geral e não somente de direito penal da circulação rodoviária, «…à proibição de conduzir deve também assinalar-se (e pedir-se) um efeito de prevenção geral de intimidação, que não terá em si nada de ilegítimo porque só pode funcionar dentro do limite da culpa. Por fim, mas não por último, deve esperar-se desta pena acessória que contribua, em medida significativa, para a emenda cívica do condutor imprudente ou leviano».

Trata-se de um censura adicional pelo facto cometido pelo agente, censura essa que visa prevenir a perigosidade deste, embora lhe seja assinalado também um efeito de prevenção geral, de intimidação.

Postas estas considerações e revertendo ao caso em apreciação, cumpre desde logo sublinhar, que estando definitivamente sedimentada a factualidade dada como provada na 1ª Instância, com as modificações que lhe introduzimos, só a esta nos podemos cingir, sendo despiciendas e absolutamente irrelevantes a invocação de circunstâncias que nela não se contenham.

Em todo o caso sempre se dirá, que é absolutamente irrelevante a circunstância do arguido necessitar da carta de condução, bem como as consequências (incómodos e transtornos) que eventualmente lhe possam advir da proibição de conduzir.

Os eventuais transtornos que a pena acessória possa causar ao recorrente, nos quais devia ter pensado antes de adoptar o comportamento delituoso em causa, não têm aptidão para a influenciar, nem legitimam ou autorizam, nos termos do direito vigente, a redução da pena.

Como já anteriormente dissemos, o grau de ilicitude do facto – afigura-se acentuado – bem como a intensidade do dolo – que é directo – , havendo que ponderar ainda nos sentimentos manifestados no cometimento do crime, os motivos que determinaram o arguido – furtar-se a ser fiscalizado – bem assim nas consequências do crime – que se saldou no desvalor imanente à violação da norma e na frustração da sua efectiva fiscalização.

Como também já sublinhámos, é premente e acentuada a necessidade de por cobro a comportamentos do tipo assumido pelo arguido (prevenção geral). Estão aqui em causa exigências de prevenção geral positiva ou de integração, isto é, de reforço da consciência jurídica comunitária e do seu sentimento de segurança face à violação da norma em causa.

Relativamente à prevenção geral - defesa da ordem jurídica, necessidade da pena - há que ter em conta a frequência destes crimes e a gravidade dos seus efeitos, por via do sentimento que se gera na sociedade de um generalizado sentimento de impunidade e desvanecer da autoridade pública, o que desabona em desfavor do arguido.

Como também já deixámos consignado são também acentuadas as exigências reclamadas pela prevenção especial.

Se é certo que é da mais elementar justiça não premiar ou branquear condutas que, com o fito de evitar a detecção do estado de influenciado pelo álcool, põem em causa a autoridade do Estado, entendemos ser algo excessiva e desproporcionada a pena de 18 meses de proibição de conduzir imposta na sentença recorrida, justificando-se a sua redução.

Sopesando em todas estas circunstâncias mencionadas e tendo presente os limites definidos na lei, temos por ajustado e equilibrado reduzir para treze (13) meses a pena acessória de proibição de conduzir, que não excede a medida da culpa e consideramos adequada e proporcional às exigências de prevenção.

Nesta conformidade, e sem mais desenvolvidas considerações por desnecessárias, haverá de conceder-se provimento parcial ao recurso nos termos supra mencionados.

DECISÃO.

Nestes termos e com tais fundamentos, concedemos provimento parcial ao recurso e em consequência decidimos:

1. Modificar nos termos supra expostos a matéria de facto dada como provada na sentença recorrida;

2. Reduzir para oito (8) meses de prisão a pena aplicada ao arguido/recorrente mantendo, no entanto, a sua suspensão da sua execução pelo período de 1 ano, com regime de prova nos termos estabelecidos na sentença recorrida;

3. Reduzir para treze (13) meses a pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor de qualquer categoria aplicada na sentença recorrida;

4. Quanto ao mais mantém-se a sentença recorrida.

Sem custas (art.513º, nº1 in fine a contrario sensu do CPP na redacção dada pelo DL nº34/2008, de 26-2).

Évora, 7 de Maio de 2019.

(Elaborado e integralmente revisto pelo relator).

GILBERTO CUNHA

MARTINHO CARDOSO