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ARRESTO/PRESSUPOSTOS
PRELIMINAR /INCIDENTE
AÇÃO IMPUGNAÇÃO DA TRANSMISSÃO DE BENS
IMPUGNAÇÃO PAULIANA
DESCONSIDERAÇÃO DA PESSOA COLETIVA
NULIDADE DA SENTENÇA
CASO JULGADO
Sumário
I - O arresto pode ser decretado contra o adquirente dos bens do devedor, exigindo-se nesse caso a impugnação judicial da transmissão dos bens (art. 619º, n.º 2 do Código Civil e 392º, n.º 2 do CPC), seja através da impugnação pauliana ou da declaração de nulidade.
II – Nesse caso, o procedimento cautelar de arresto tanto pode ser instaurado como preliminar ou incidente de ação (declarativa) de impugnação da transmissão dos bens.
III - Se o arresto for deduzido na pendência e como incidente da ação de impugnação, o requerente do arresto tem apenas de alegar e provar a factualidade relativa à probabilidade da existência do crédito e ao justo receio de perda da garantia patrimonial, sendo que a prova dos pressupostos da impugnação pauliana e/ou da desconsideração da pessoa coletiva há-de fazer-se naquela ação principal.
Texto Integral
Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães
I. Relatório
Por apenso à ação principal, Maria, D. V., M. M., M. R., M. B., J. P., F. P., C. M., M. G., M. C., T. J., e M. F. instauraram, no Juízo Central Cível de Viana do Castelo – J1 – do Tribunal Judicial da Comarca de Viana do Castelo, procedimento cautelar de arresto contra (1º) M. A. e J. B., e (2ª) X, S.L., com os fundamentos expostos no requerimento inicial, pretendendo ver arrestado o dinheiro pertencente aos Requeridos e que se encontra já depositado à ordem destes autos (apenso A).
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Sem audiência prévia dos requeridos, o Tribunal julgou procedente o procedimento cautelar intentado e determinou o arresto do dinheiro (€ 97.572,83) pertencente aos Requeridos e que se encontra depositado à ordem do apenso A. (cfr. fls. 87 a 99).
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Notificados de tal decisão, os requeridos deduziram oposição, pedindo a revogação do arresto decretado e o consequente levantamento do bem arrestado (cfr. fls. 104 a 112).
No âmbito da referida oposição deram por reproduzida a oposição ao arresto que correu termos sob o apenso A, admitindo que existe uma dívida dos primeiros requeridos aos requerentes, que aceitam parcialmente, na parte respeitante ao valor em que foram condenados no processo relativo às Q..., sendo controversa a remanescente parte reclamada pelos requerentes.
Mais alegam que, a proceder a impugnação pauliana, apenas poderá responder pela mencionada dívida, seja qual for o seu montante, os bens imóveis transmitidos pelos primeiros requeridos à segunda requerida.
Os requisitos de que depende o decretamento do arresto não se encontram preenchidos quanto à segunda requerida, uma vez que esta não é devedora dos requerentes.
Concluíram pela não verificação dos pressupostos de que depende o decretamento do arresto, na medida em que o dinheiro da caução pertence à segunda requerida, que não é devedora dos requerentes, sendo que tal dinheiro não é nem nunca foi garantia patrimonial do crédito dos requerentes, inexistindo acto susceptível de ser impugnado subjacente ao dinheiro arrestado.
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Responderam os requerentes nos termos constantes do requerimento de fls. 131 vº e 132, cujo teor se dá aqui por reproduzido.
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Designada data para produção de prova, veio a mesma a ser dada sem efeito por, no entendimento da Mmª Juiz “a quo”, tal configurar a realização de acto inútil e dilatório para a decisão da presente causa.
De seguida, foi proferida decisão final, datada de 3/09/2018, nos termos da qual foi decidido julgar improcedente a oposição, mantendo a decisão que decretou o arresto nos seus precisos termos (cfr. fls. 173 a 185).
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Inconformados, os requeridos, M. A., J. B., e X, S.L., interpuseram recurso desta decisão (cfr. fls. 186 a 205) e formularam, a terminar as respectivas alegações, as seguintes conclusões (que se transcrevem1):
«1. CONCLUSÕES
DA NULIDADE DA SENTENÇA
A. A sentença recorrida deve ser declarada nula na parte em que não apreciou nem decidiu sobre a matéria carreada para os autos pelo Recorrentes através do requerimento de 31/08/2018 (ref.: 29966474), contendo 21 documentos demonstrativos do por si alegado na oposição – nulidade essa que aqui expressamente se argui para os devidos e legais efeitos. B. Acresce ao exposto que o tribunal não se pronunciou, em momento anterior à prolação da mencionada sentença, sobre o referido requerimento, de onde se conclui pela verificação do disposto no artigo 615.º, n.º 1, alínea d), do CPC. Sem prescindir
IMPUGNAÇÃO DA DECISÃO SOBRE A MATÉRIA DE FACTO
C. A sentença recorrida incorre em erro na qualificação jurídica dos factos, dando como provados factos que deveriam ser dados como não provados e vice-versa.
D. Concretamente, a sentença recorrida deveria:
1. Para assegurar a congruência do elenco dos factos dados como provados:
1.1. Alterar a redação dos seguintes factos, no sentido que seguidamente se indica:
• No facto 1.6, onde se lê “J. B. é o único sócio”, deverá ler-se “J. B. era o único sócio”; • No facto 1.45, onde se lê “(…) de que o 1º Requerido J. B. era, e é, único sócio”, deverá ler-se “(…) de que o 1º Requerido J. B. era único sócio”. • No facto 1.81, onde se lê “A sociedade requerida, representado pelo primeiro requerido, seu único sócio e administrador” deverá ler-se “A sociedade requerida, representado pelo primeiro requerido, seu administrador” 1.2. Dar como não provado o facto 1.89, na medida em referindo-se à data de 17/06/2016, indica que os Primeiros Requeridos eram titulares de quotas na sociedade Segunda Ré, com o valor nominal de € 10.000,00, o que é rotundamente falso, já que, à data, os Primeiros Recorrentes nem sequer eram sócios da Segunda Requerida. 2. Dar como não provados os seguintes facto/excertos, na medida em que sobre os mesmos não foi produzida qualquer prova atendível (sendo que o ónus da respetiva prova pertencia aos Recorridos), tendo sido especificamente impugnados pelos Recorrentes na sua oposição: 3. No facto 1.10, o excerto “de que M. A. era, por conseguinte, devedora à herança”; 4. O facto 1.22; 5. No facto 1.32, o excerto “, e por esse motivo foi indicado pelo Conservador do Registo Predial que o montante máximo assegurado para efeitos de registo era de € 29.780,43 (Capital acrescido de juros de três anos)”; 6. O facto 1.43; 7. No facto 1.50, o excerto “(por estarmos perante uma sentença ilíquida)”. 8. No facto 1.75, o excerto “e um deles continua a ser a morada oficial em Portugal dos 1os Requeridos, como resulta do teor do auto de penhora realizada no dia 18 de maio de 2017(…)”, realçando-se que um auto de penhora não pode consubstanciar meio comprovativo deste facto (morada oficial); 9. No facto 1.60, o excerto “resulta dos atos das vendas a impossibilidade, para os Requerentes, de obterem a satisfação integral do seu crédito, já que os 1os Requeridos – residentes em Espanha – não são proprietários de quaisquer outros bens imóveis em Portugal, para além dos penhorados…”, sublinhando-se que este facto – que é eminentemente conclusivo – não permite o juízo da impossibilidade de satisfação do crédito nele contido (pois que a inexistência de bens em Portugal não significa, nem pode significar, a impossibilidade de satisfação do crédito dos Recorridos) e, ainda, que o facto contém uma incorreção manifesta, já que os bens penhorados pertenciam, à data da penhora, à Segunda Recorrente, e não aos Primeiros Recorrentes (cfr., neste sentido, documentos 14 e 15 da PI dos autos principais) 10. O facto 1.66, pelos motivos já acima apontados, quer quanto ao valor do crédito, quer quanto à putativa inexistência de outros bens suscetíveis de penhora; 11. O facto 1.77 (“Apesar de formalmente administrador da 2ª requerida o certo é que o 1º Requerido nunca exerceu qualquer atividade através dessa sociedade dado que a sua profissão era bancário (estando atualmente reformado)”), que corresponde a um facto concretamente impugnado e sobre o qual não foi produzida prova demonstrativa da redação adotada. 12. Dar como não provados os factos 1.53 e 1.67 por serem conclusivos ou conterem somente opiniões pessoais dos Recorridos, que – sem prejuízo da sua irrelevância para o caso dos autos - foram especificamente impugnados pelos ora Recorrentes, não tendo sido produzida prova que confirmasse a sua veracidade 13. Dar como não provados os seguintes factos, que se resultam especificamente infirmados por prova documental constante dos autos:
• Facto 1.44, que refere que “foi feita a penhora dos dois únicos imóveis que os 1os requeridos tinham em Portugal “, quando os documentos 14 e 15 da PI dos autos principais demonstram que, à data da penhora, os bens imóveis pertenciam à ora Segunda Recorrente; e • Facto 1.79, onde se indica que “A sociedade não deposita os documentos da prestação de contas nem tem qualquer informação sobre os contactos” quando o contrário resulta demonstrado do requerimento dos ora Recorrentes apresentado nos autos principais a 04/07/2018 (ref.: 29626067), que os Recorrentes derem por integralmente reproduzido nos presentes autos de arresto (cfr. artigo 6.º da Oposição dos autos), em especial dos documentos 2, 3, 4 e 5 daquele requerimento: justamente as contas da sociedade apresentadas perante as competentes autoridades. 14. Aditar ao acervo de factos provados os seguintes factos, que correspondem ao alegado nos artigos 13.º, 14.º, 16.º, 22.º, 23.º, 24.º, 25.º, 26.º, 27.º, 28.º, 29.º, 31.º, 32.º, 33.º, 34.º, 35.º da oposição dos ora Recorrentes, porquanto demonstrados através dos documentos juntos aos autos com a oposição e com o requerimento dos Recorrentes de 31/08/2018:
• 1.93 O dinheiro da caução pertence à 2ª Requerida, • 1.94 Não aos Primeiros Requeridos • 1.95 A diligência pretendida pelos Requerentes opera-se sobre bens que pertencem exclusivamente à 2ª Requerida, que não é devedora do crédito reclamado pelos Requerentes • 1.96 O arresto, tal como requerido e decretado nos presentes autos, teve como objeto o valor de € 97.572,83, que pertence à 2ª Requerida, e que corresponde ao valor excedente de uma caução por esta prestada no âmbito de um processo judicial. • 1.97 Ou seja, o objeto da providência requerida corresponde a um bem que pertence única e exclusivamente à Segunda Requerida, que não é a devedora do crédito reclamado pelos Requerentes, • 1.98 Desta feita, para ser legalmente admissível o arresto, necessário seria que os requerentes houvessem procedido como preceituado no citado n.º 2 do artigo 392.º do CPC, • 1.99 O que, manifestamente, não ocorreu quanto pedido de arresto do valor de € 97.572,83 • 1.100 Aquele montante pertence e sempre pertenceu à 2ª Requerida, • 1.101 Que foi quem o pagou. • 1.102 Aquele montante não pertencia nem proveio dos 1os Requeridos • 1.103 Que não transferiram nem emprestaram por qualquer forma aquela quantia à 2ª Requerida. • 1.104 A 2ª Requerida, quando instada para proceder ao pagamento da caução, e confrontada com o facto de não ter a totalidade desse montante imediatamente disponível, pediu parte do dinheiro emprestado a terceiros. • 1.105 Mais tarde, a 10/10/2016, a 2ª Requerida conseguiu vender um imóvel em Espanha de que era proprietária (cfr. cópia de escritura que se junta como documento n.º 1, cuja cópia consta já dos autos principais, por ter sido junta pelos Requeridos em audiência de julgamento) • 1.106 Com o produto dessa venda pagou integralmente os referidos empréstimos. • 1.107 Assim, os Primeiros Requeridos não contribuíram nem emprestaram qualquer montante à 2ª Requerida para o pagamento daquela caução, • 1.108 Pelo que não se encontram preenchidos os requisitos de admissibilidade de decretamento do arresto, sendo o mesmo ilícito por violar frontalmente o preceituado no artigo 391.º do CPC. Sem prescindir
IMPUGNAÇÃO DA DECISÃO SOBRE A MATÉRIA DE FACTO
Do indevido decretamento do arresto: da apreensão de bens de terceiro sem fundamento legal atendível
E. O arresto determinado pela sentença de que se recorre, opera-se sobre bens que pertencem exclusivamente à 2ª Recorrente, que não é devedora do crédito reclamado pelos Recorridos. F. Apenas os 1.os Recorrentes são devedores dos Recorridos (pese embora não o sejam no valor que os Recorridos indicam), pelo que apenas os bens a estes pertencentes poderiam ser apreendidos nos autos, por apenas estes consubstanciarem garantia patrimonial do crédito dos Recorridos. G. O arresto, tal como requerido e decretado nos autos, teve como objeto o valor de € 97.572,83, exclusivamente pertencente à 2ª Recorrente, corresponde ao valor excedente de uma caução por esta prestada no âmbito de um processo judicial. H. Desta feita, para ser legalmente admissível o arresto, necessário seria que os Recorridos houvessem procedido como preceituado no citado n.º 2 do artigo 392.º do CPC, o que, manifestamente, não ocorreu! I. Na verdade, o valor de € 97.572,83, objeto do arresto dos autos, não foi alienado, nem, por qualquer forma, objeto de qualquer disposição onerosa ou gratuita dos Primeiros Recorrentes a favor da Segunda (cfr., neste sentido, os 21 documentos juntos ao requerimento dos Recorrentes de 31/08/2018 e o documento 1 junto à oposição). J. Ou seja, a Segunda Recorrente não é “adquirente dos bens do devedor” nos termos e para os efeitos do disposto no citado dispositivo, nem, por outro lado, existiu qualquer “aquisição” a que a norma legal se refere. K. Resulta daqui, desde logo, que a estatuição da referida norma não se verifica no caso dos autos, de onde se extrai que a Segunda Recorrente carece de legitimidade substantiva para ser demandada no arresto dos autos e, bem assim, que a decisão que decretou o arresto é ilícita, por violar as normas previstas nos artigos 391.º e 392.º, n.º 2 do CPC, L. Devendo, por conseguinte, a decisão do Tribunal a quo ser integralmente revogada. M. Sem prescindir, recorda-se que – conforme oportunamente alegado na contestação dos autos principais – não se encontram preenchidos os requisitos cumulativos de que depende a procedência da impugnação pauliana, a saber: (i) A realização de um ato, de natureza não pessoal, que envolva a diminuição da garantia patrimonial do crédito; (ii) A existência de um crédito anterior ou posterior à realização do ato, sendo, neste último caso, exigível que o ato haja sido praticado dolosamente com o intuito de impedir a satisfação do crédito; (iii) Resulte do ato a impossibilidade ou o agravamento da impossibilidade de satisfação do crédito; (iv) Má fé do devedor e do terceiro (in casu, na tese dos Recorridos, dos Primeiros Recorrentes e da Segunda Recorrente, respetivamente), entendida esta como a consciência do prejuízo que o ato causa ao credor. N. No caso dos autos não existe, sequer, um “ato” nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 610.º do CC, pelo que nenhum dos referidos requisitos se encontra verificado, pelo que é manifesto que a impugnação pauliana terá de improceder quanto a este ponto. O. O exposto acarreta como consequência que a providência dos autos não poderá ser decretada sob pena de a mesma ir mais longe do que aquilo que a própria decisão dos autos principais seria capaz – o que é uma aberração e constitui um efeito contrário à ordem jurídica estabelecida, na medida em que a presente providência tem caráter conservatório do direito que se pretende acautelar. P. Assim, atendendo a que não foram deduzidos factos que tornem provável a procedência da impugnação dos autos principais nem que permitam a emissão de um juízo de probabilidade sério de existência do correspondente direito dos Recorridos, a procedência do arresto – tal como decretado na sentença de que ora se recorre – é ilícita por violar o n.º 2 do artigo 392.º e o n.º 1 do artigo 368.º, todos do CPC, e deve, nessa medida, ser revogada. Ainda que assim não se entenda (o que não se concebe, e apenas se cogita por mero dever de patrocínio), mas sem prescindir do exposto, Do indevido decretamento do arresto: da inexistência de justo receio de perda da garantia patrimonial do crédito Q. Conforme referido supra, os bens (indevidamente) arrestados não consubstanciam, eles próprios, garantia patrimonial do crédito dos Recorridos, na medida em que não são bens do devedor, nem bens que – não obstante não pertençam ao devedor – sejam passíveis de serem arrestados nos termos da lei adjetiva. R. Tal circunstância é particularmente evidente quanto ao arresto dos presentes autos, que recaiu sobre o montante de € 97.572,83 (correspondente ao excedente de caução prestada), em relação ao qual a sentença de que ora se recorre não cumpriu o preceituado no artigo 392.º, n.º 2 do CPC, o que torna aquele arresto inadmissível e ilícito. S. Inexistindo justo receio de perda da garantia patrimonial, o arresto decretado pela sentença de que ora se recorre é ilícito por violar o disposto no artigo 391.º do CPC, de onde resulta que a referida decisão deverá ser integralmente revogada.
Do indevido decretamento do arresto: violação do princípio da proporcionalidade plasmado no n.º 2 do artigo 368.º do CPC
T. O decretamento do arresto acarreta para a 2.ª Recorrente um prejuízo considerável, na medida em que determina que a mesma fique privada de uma quantia pecuniária avultada (€ 97.572,83), perpetuando, a um nível potencialmente insustentável, uma situação de carência financeira, que poderá ter consequências drásticas. U. De notar que a quantia de € 97.572,83, para uma sociedade da dimensão da 2.ª Recorrente é uma quantia muito elevada (cfr., neste sentido, as contas anuais da 2.ª Recorrente que se juntaram aos autos principais como documento 2, 3, 4 e 5 do requerimento de 04/07/2018, e cujo teor se deu por reproduzido nos presentes autos (cf. artigo 6.º da oposição). V. Os danos que os Recorridos pretendem evitar ao requerer ao arresto não são, na verdade, evitáveis através das concretas providências que aqui foram requeridas. W. Na verdade, sendo os bens arrestados pertencentes a terceiro, que não o devedor do crédito, não se mitiga qualquer dano com esta providência. X. Pelo exposto, conclui-se que a providência decretada viola o princípio da proporcionalidade previsto no n.º 2 do artigo 368.º do CPC, motivo que deverá determinar a sua imediata revogação.
Quanto à tese da desconsideração da personalidade jurídica
Y. É falso tudo quanto os Recorridos referem acerca do comportamento e intenção subjacente das partes relativamente ao putativo “ato”. Z. São também falsas as insinuações de permeabilidade ou confundibilidade patrimonial entre Primeiros e Segunda Recorrentes. AA. Tanto assim é que não se provou factualidade que aponte claramente nesse sentido. BB. Se bem se compreende, o efeito prático que os Recorridos pretendem obter com o presente procedimento de arresto equivale ao que estes obteriam se – como desejavam - a hipoteca judicial registada sobre os imóveis valesse como garantia do pagamento de € 127.353,26 (quantia exequenda da ação executiva que correu termos no J5 do Juízo de Execução do Porto, Instância Central do Tribunal Judicial da Comarca do Porto, sob o n.º de processo 992/13.0YYPRT-D, a “Ação Executiva”, acrescida de despesas) e ainda do crédito que alegam deter sobre os Primeiros Recorrentes a título de tornas. CC. Como os Recorridos não conseguiram, pela via legal, obter esse efeito, vêm agora tentar obter o mesmo resultado por via travessa, invocando a “desconsideração da personalidade jurídica”. DD. Em abono da verdade, sempre se diga que, quer os imóveis fossem detidos pelos 1.os Recorrentes, quer o sejam exclusivamente pela 2.ª Recorrente, as hipotecas continuam a ter a mesma extensão: os € 29.780,43. EE. E isto porque as hipotecas foram assim registadas; porque o registo é constitutivo; e porque aqueles registos nunca foram alterados, retificados ou corrigidos pelos Recorridos, sendo que os Recorridos podiam tê-lo feito, a qualquer momento e que, se não o fizeram, foi por sua livre opção. FF. Em suma, a força e o âmbito das hipotecas judiciais seriam exatamente os mesmos no caso de os imóveis serem propriedade dos 1.os Recorrentes ou no caso de os imóveis serem (como são) pertença da 2.ª Recorrente. GG. Por outras palavras ainda: as hipotecas judiciais, entendidas na qualidade de garantias especiais da obrigação, têm a mesma validade e alcance independentemente da pessoa que, num dado momento, seja proprietária dos imóveis sobre os quais aquelas incidem. HH. Assim sendo, valendo as hipotecas judiciais com os mesmos limites (responsabilidade pelo pagamento de € 29.780,43) quer os imóveis pertençam à 2.ª Recorrente, quer aos 1.os Recorrentes, não tem qualquer validade substancial nem qualquer utilidade prática o que é alegado pelos Recorridos. II. E isto porque os Primeiros Recorrentes, com a transmissão dos imóveis para a Segunda Recorrente, não retiraram daí o benefício que os Recorridos insinuam. JJ. Nomeadamente, o benefício que os Primeiros Recorrentes tiveram naquela transmissão em nada se relacionou com a redução da responsabilidade destes Primeiros Recorrentes no pagamento da dívida. KK. E isto porque a responsabilidade destes não diminuiu em resultado daquela venda. LL. Da mesma forma, aquelas transmissões também não visaram nem, por outro lado, permitiram que os imóveis “fugissem” da mira da responsabilidade pelo pagamento da dívida garantida, na medida em que os imóveis estavam (e estão) onerados com os ónus reais das hipotecas, os quais, justamente por serem dotados dessa natureza (de ónus real), se mantêm independentemente do concreto sujeito que é titular do direito de propriedade sobre os bens. MM. Por outro lado, e conforme acima ficou explanado, as vendas dos imóveis dos 1.os Recorrentes à 2.ª Recorrente não provocaram aos Recorridos qualquer prejuízo, também porque estes podiam satisfazer o seu crédito de outra forma. NN. Enfim, não houve má-fé, não houve aproveitamento ilegítimo, não houve benefício (nem prejuízo), pelo que não houve abuso de direito. OO. Esclarecido este ponto, refira-se que nada, no direito positivo, impede, em abstrato, que os proprietários de bens sobre os quais incidam hipotecas (ou outras garantias) os alienem. PP. Da mesma forma, também os 1.os Recorrentes agiram licitamente e a cobro de todas as normas jurídicas, tendo a alienação produzido plenos efeitos. QQ. O exercício do direito de livre disposição do próprio património foi exercido pelos referidos 1.os Recorrentes dentro dos limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes e pelo fim social e económico desse direito. RR. Pelo que inexiste sequer fundamento para se falar em abuso de direito. SS. Ora, partindo dos pressupostos pacíficos na doutrina e jurisprudência de que: Em Portugal inexiste, em sentido próprio, o instituto jurídico da desconsideração da personalidade coletiva, entendido como instituto autonomizado e balizado; Que, nessa medida, não é possível, entre nós, de iure constituto, invocar, sem mais, esse “instituto”, nem dele extrair consequências juridicamente relevantes; Que, em decorrência desta constatação, os efeitos que se pretendiam alcançar com a invocação do “instituto” da desconsideração da personalidade jurídica coletiva, para poderem ser valorados e considerados pela nossa ordem jurídica, hão-de conseguir obter-se por via da invocação de institutos jurídicos propriamente ditos, como seja o do abuso de direito. TT. E que não existiu, no presente caso, qualquer abuso de direito ou qualquer violação de normas ou de princípios legais, sendo os atos de alienação dos bens imóveis impugnados nos autos principais integralmente válidos e eficazes UU. Então inexiste fundamento para se proceder ao chamado levantamento da personalidade coletiva e pôr a 2.ª Recorrente a responder pela pretensa dívida reclamada. VV. Andou mal o Tribunal a quo ao expender considerações contrárias ao acima exposto na sentença de que ora se recorre, a qual, também por esse motivo, deverá ser revogada. Ainda que assim não se entenda (o que não se concebe, e apenas se cogita por mero dever de patrocínio), mas sem prescindir do exposto, WW. A tese da desconsideração da personalidade coletiva, já foi invocada em outro contexto pelos ora Recorridos, peticionando os mesmos efeitos, contra as mesmas pessoas e tendo por base os mesmos factos invocados nos presentes autos. XX. Tal ocorreu no apenso de oposição à penhora, que correu termos no J5 do Juízo de Execução do Porto, Instância Central do Tribunal Judicial da Comarca do Porto, sob o n.º de processo 992/13.0YYPRT-D, concretamente nas alegações de recurso expendidas pelos próprios, cuja cópia foi junta à petição inicial dos autos principais como documento n.º 23, e cujo teor se dá por integralmente reproduzido. YY. Sobre tal alegação o Tribunal da Relação do Porto pronunciou-se, no seu acórdão de 07/07/2016, que transitou em julgado. ZZ. Existindo decisão transitada em julgado sobre causa onde foram deduzidas as mesmas pretensões, com os mesmos fundamentos e contra as mesmas partes, conclui-se verificar-se a exceção de caso julgado, AAA. Pelo que a sentença é nula na parte em que aprecia esta matéria, na medida em que viola o disposto nos artigos 576.º, n.º 2, 577.º alínea i) e 580.º e seguintes do CPC, devendo ser revogada.
Termos em que deverá proceder a presente apelação e, por via disso, ser revogada a sentença de 03/09/2018, com todas as necessárias e legais consequências.
Em preito à, JUSTIÇA».
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Contra-alegaram os recorridos (cfr. fls. 220 a 258), pugnando pela improcedência dos fundamentos invocados pelos Recorrentes quer para declaração de nulidade da sentença, quer para a alteração da decisão seja da matéria de facto, seja de direito, devendo manter-se a decisão recorrida que decretou o arresto da quantia em dinheiro;
Subsidiariamente, pugnam pela procedência da impugnação da matéria de facto vertida na decisão que julgou improcedente a oposição ao arresto e manteve o arresto decretado, aditando-se os factos alegados no requerimento inicial do arresto e provados por documentos, por via da ampliação do âmbito do recurso ao abrigo do disposto nos art. 636º, nº 2 e 640º do C.P.C., devendo manter-se, por esta via, o arresto decretado,
Fizeram constar no final as seguintes conclusões:
«1) A decisão proferida pelo Tribunal recorrido, aliás exemplar, baseou-se precisamente nos mesmos factos que este Tribunal da Relação julgou provados no anterior arresto requerido pelos Recorridos (apenas com a correcção resultante da impugnação, pelos Recorridos, da decisão proferida sobre dois concretos pontos da matéria de facto em sede de ampliação do recurso). 2) Nesse 1º arresto (apenso A), os Recorridos tinham requerido o arresto de dois imóveis e do dinheiro utilizado para prestar caução para obstar à sua venda judicial na acção executiva pendente em que os Recorridos são exequentes e os Recorrentes são executados, tendo o mesmo sido decretado e mantido apenas sobre os imóveis, por uma questão formal, por o Tribunal da Relação ter entendido que á data em que foi deduzida oposição a esse arresto, o pedido da acção principal ainda não incluía a impugnação dos actos relacionados com a transmissão e utilização do dinheiro, o que veio a suceder com a apresentação de um articulado superveniente e ampliação do pedido da acção de impugnação pauliana, admitidos por despacho transitado em julgado. 3) Essa questão deixou de se colocar pois à data da sentença que decretou e manteve, depois da oposição, o arresto nestes autos, o pedido da acção principal já abrangia, igualmente, a quantia monetária. 4) Uma vez que o Tribunal recorrido baseou a sua decisão nos factos já dados como provados nos autos e que os Recorridos entendem que foram alegados outros factos, que estão demonstrados por prova documental, que têm também interesse para prova do facto de que o dinheiro da caução pertencia de facto aos 1ºs Recorrentes e não à sua sociedade, por cautela, prevenindo a hipótese de procedência de alguma questão suscitada pelos Recorrentes neste recurso, os Recorridos impugnaram, nestas contra-alegações, a título subsidiário, a decisão proferida sobre esses concretos pontos da matéria de facto que entendem dever ser aditados aos factos provados, ao abrigo do disposto no artº 636, nº 2 do C.P.C., requerendo a ampliação do âmbito deste recurso. 5) Foi entretanto proferida, em 12 de Outubro de 2018, sentença na acção principal (a que o presente arresto está apensado), que julgou a acção totalmente procedente e, em consequência, decidiu: “a) Declarar a nulidade, por simulação, dos contratos de compra e venda outorgados pelos Réus e identificados em 1.54. e 1.57. dos factos provados, regressando os prédios vendidos à titularidade dos alienantes (1ºs Réus), ordenando-se o cancelamento de todos os actos de inscrição matricial e registo predial efectuadas sobre os referidos prédios a favor da 2ª Ré, quer subsequentes às referidas vendas, quer os registos provisórios de aquisição, de forma a que os Autores possam executar tais bens no património dos 1ºs Réus para pagamento do seu crédito; b) Declarar a nulidade, por simulação, do negócio de transmissão da quantia de € 97.572,83 outorgado pelos Réus (pelo qual se operou a transferência dessa quantia dos 1ºs Réus para a 2ª Ré), regressando o dinheiro à titularidade dos alienantes (1ºs Réus) e, em consequência a nulidade por simulação da prestação de caução pela 2ª Ré com dinheiro dos 1ºs Réus e o pedido de entrega à 2ª Ré da quantia depositada e prestada a esse título” e, bem assim, condenar os 1ºs Réus (aqui Recorrentes) M. A. e J. B. como litigantes de má-fé na multa de 4 (quatro) Uc’s.
DA RESPOSTA AO RECURSO:
QUANTO À ARGUIDA NULIDADE DA SENTENÇA:
6) Nos procedimentos cautelares, as provas são apresentadas com a petição e a oposição, não sendo admissível a junção posterior de documentos, como resulta do disposto no artº 365º, nº 3 do C.P.C. (“é subsidiariamente aplicável aos procedimentos cautelares o disposto nos artº 293º a 295”) e do artº 293º, o qual prevê, quanto à “indicação das provas e oposição”, no seu nº1, que “no requerimento em que se suscite o incidente e na oposição que lhe for deduzida, devem as partes oferecer o rol de testemunhas e requerer outros meios de prova.” 7) Esta regra é aplicável ao arresto, conforme previsto no artº 376º, nº1 do C.P.C., sendo que a secção relativa ao arresto não contém qualquer norma relativa à oposição. 8) Na situação sub judice o arresto foi decretado sem audiência dos requeridos e estes vieram deduzir oposição – na qual deviam ter apresentado todos os meios de prova, incluindo documentais. 9) Na oposição (apresentada por todos os requeridos), os requeridos, aqui Recorrentes (e designadamente a 2ª Requerida, representada pelo 1º Requerido) confessaram que a sociedade não tinha o dinheiro disponível para prestar a caução (cfr. artº 31º da Oposição) e alegaram, de forma genérica. alguns factos para prova dos quais não juntaram qualquer documento. 10) A junção extemporânea de documentos que estavam já na posse dos Recorrentes à data da apresentação da oposição (até porque parte deles até foram elaborados pelos próprios) e sem que tivesse sido alegada parte dos factos que com eles pretendiam demonstrar é que está ferida de nulidade, por se tratar de um acto processual que a lei não admite. 11) O tribunal a quo não considerou, e muito bem, o requerimento e os documentos juntos, mas apenas o que foi alegado na oposição e a prova que aí foi indicada, pois só essa pode influir na decisão do procedimento cautelar, pelo que não se verifica qualquer nulidade da sentença.
QUANTO AO RECURSO SOBRE A MATÉRIA DE FACTO:
12) Não existe qualquer contradição entre os factos provados; a redacção dos factos 1.83 e 1.84 resultou da decisão de alteração da matéria de facto proferida por este Tribunal da Relação (no anterior arresto – apenso A) no Acórdão de 03.05.2018, tendo sido justificada a alteração em virtude de ter sido arguida, pelos Recorridos, a simulação absoluta dos contratos que titulam a alegada transmissão das participações sociais (compra e venda e doação, ambas aos próprios filhos dos 1ºs Recorrentes); 13) Não obstante essa alteração, o próprio Tribunal da Relação manteve inalterada a redacção dos factos 1.6, 1.45, 1.81 e 1.89 que foram dados como provados nos termos alegados e já anteriormente assentes nos autos (pois o J. B. na realidade era, e é, além de administrador único, também sócio único da 2ª Recorrente e continuou sempre a gerir e controlar a sociedade). 14) O Recorrente J. B. só outorgou contratos de “transmissão de participações sociais” para, formalmente, deixar de figurar como sócio único da 2ª Recorrente (que efectivamente continua a ser) para tentar, por essa via, “fugir” à invocada desconsideração da personalidade colectiva, mas continuando a usar, dominar e controlar a sua sociedade como sempre fez (utilizando-a no seu interesse pessoal). 15) No que concerne aos factos ou excertos que os Recorrentes pretendem que sejam dados como não provados (1.10, 1.22, 1.32, 1.43, 1.50, 1.75, 1.60, 1.66, 1.77 e ainda 1.53, 1.67, 1.44 e 1.79), os Recorrentes não produziram qualquer meio de prova de onde resultassem infirmados quaisquer desses factos; pelo contrário, tais factos foram dados como assentes em resultado da prova (documental e testemunhal) que sobre eles foi produzida, como se explicou nestas contra-alegações (para cada um deles). 16) No que diz respeito aos factos que os Recorrentes pretendem ver aditados aos factos provados (alegados na sua oposição), trata-se de meras observações e conclusões subjectivas, salvo aquele que se reporta à venda do imóvel, a qual, porém não tem qualquer interesse para o que se discute nesta providência cautelar, atenta a prova em sentido contrário que foi feita nestes autos e a ausência de prova de qualquer relação entre a venda de um imóvel e a prestação de caução no processo executivo pela sociedade (ocorrida muito antes). 17) Sendo a fundamentação do recurso sobre a matéria de facto (aliás, muito escassa) totalmente inconsistente e mesmo incoerente, e não tendo os Recorrentes apresentado no processo meios de prova que impusessem decisão diversa, deve manter-se a decisão de julgar os factos provados e não provados nos precisos termos constantes da sentença recorrida.
QUANTO AO RECURSO SOBRE A MATÉRIA DE DIREITO:
18) Tal como os imóveis, também o dinheiro arrestado constitui garantia patrimonial do crédito dos Recorridos, e pertence aos Recorrentes (devedores) que o transferiram (apenas) formalmente para um suposto “terceiro” (uma sociedade deles próprios, que eles dominam e controlam) exclusivamente para o usarem para prestar uma caução tendo em vista obstar á venda judicial dos (seus) imóveis, completando, dessa forma, o esquema engendrado para se furtarem ao pagamento da dívida para com os Recorridos (seus familiares directos). 19) O arresto foi requerido nos termos do artº 392º, nº2 do C.P.C., na pendência da acção de impugnação pauliana (portanto, depois de ter sido “judicialmente impugnada a aquisição”), pelo que os requerentes não tinham de deduzir os “factos que tornem provável a procedência da impugnação”, mas apenas alegar os factos que tornavam provável a existência do crédito (e, neste caso, estamos perante um crédito judicialmente reconhecido, por decisão definitiva) e justificar – como fizeram - o receio invocado. 20) Os factos atinentes à impugnação seriam, e foram, apreciados na acção principal, a qual foi já julgada procedente, pelo que a questão aqui suscitada pelos Recorrentes quanto ao (não) preenchimento dos requisitos da impugnação pauliana mostra-se prejudicada, uma vez que se trata de matéria que não é apreciada no arresto e o Tribunal até já decidiu, na acção principal, declarar a nulidade dos negócios de transmissão dos bens a favor da sociedade (quer dos imóveis quer do dinheiro). 21) Em todo o caso, sempre se dirá que o arresto foi decretado sobre os bens imóveis e, para o que aqui interessa, o dinheiro que, embora não pertençam formalmente aos 1ºs Recorrentes (por estes os terem transmitido, ficticiamente, à sua sociedade), continuam a servir de garantia ao crédito dos Recorridos. 22) O artº 818º do Código Civil preceitua que “o direito de execução pode incidir sobre bens de terceiros quando estejam vinculados à garantia do crédito ou quando sejam objecto de acto praticado em prejuízo do credor, que este haja procedentemente impugnado”, normativo este que concretiza o disposto no nº1 do artº 616º do mesmo Código, o qual prevê que “Julgada procedente a impugnação, o credor tem direito à restituição dos bens na medida do seu interesse, podendo executá-los no património do obrigado à restituição e praticar os actos de conservação da garantia patrimonial autorizados por lei.” 23) No caso em apreço, o Tribunal até já declarou na acção principal, como se disse, a nulidade, por simulação, do negócio de transmissão do dinheiro (da quantia de € € 97.572,83) “outorgado pelos Réus (pelo qual se operou a transferência dessa quantia dos 1ºs Réus para a 2ª Ré, regressando o dinheiro à titularidade dos alienantes (1ºs Réus) e, em consequência a nulidade por simulação da prestação de caução pela 2ª Ré com dinheiro dos 1ºs Réus e o pedido de entrega à 2ª Ré da quantia depositada e prestada a esse título”. 24) A “transmissão” simulada do dinheiro do sócio para a sua sociedade e o acto de depósito do dinheiro e o pedido do levantamento do depósito após a decisão de limitar a responsabilidade da adquirente dos imóveis ao montante máximo inscrito no registo predial foi a forma encontrada pelos Recorrentes de evitar a venda dos imóveis a cuja transmissão respeita também a impugnação pauliana e pedido de declaração de nulidade. 25) Inicialmente foram os 1ºs Recorrentes que ofereceram a prestação de caução (nos termos que constam da matéria que se requererá seja aditada aos factos provados) e só depois de esse pedido ter sido indeferido é que a sociedade (representada pelos mesmos mandatários dos devedores) veio a fazer o depósito da quantia que o Tribunal entendeu adequada a suspender a venda dos imóveis penhorados; 26) Essa caução, prestada (formalmente) pela “X, SL”, visou apenas que ficasse sem efeito a venda (judicial) dos imóveis, não se tratando de uma caução prestada para suspender a execução oferecida por embargante (ao abrigo da al. a) do nº1 do artº 733º do C.P.C.), dado que esta sociedade (habilitada nos autos como “adquirente” dos imóveis hipotecados judicialmente para garantia do crédito dos Recorridos) não deduziu embargos de executado (mas apenas oposição à penhora, defendendo que esta tinha de se limitar ao montante máximo garantido indicado no registo predial). 27) O valor depositado tendo em vista evitar a venda judicial dos imóveis está directamente relacionado com a impugnação das vendas e trata-se de dinheiro que não pertence à depositante (mas sim ao seu único sócio, rectius ao sócio único e ao seu cônjuge), e os actos praticados pelos devedores e por pretenso “terceiro” (a sociedade deles próprios) relacionados com o dinheiro são eles próprios actos que envolvem a diminuição da garantia patrimonial do crédito e, por conseguinte, impugnáveis; 28) O arresto pode incidir sobre bens do devedor e em poder deste, bens do devedor na posse de terceiros, bens alegadamente pertencentes ao devedor, mas que este, para os subtrair à acção do credor, transfere para a titularidade de terceiros ou inscreve-os em nome deste e ainda sobre bens de terceiro adquirente dos bens do devedor (artºs 619º, nº2 do Código Civil e 392º, nº2 do CPC.); 29) É totalmente improcedente a argumentação dos Recorrentes de que a sociedade não é “devedora” e os arresto não podia incidir sobre bens seus: não só os bens não são, na realidade, da sociedade, mas sim do J. B. e da M. A., como os actos de “transmissão” – simulada - desse bens para a sociedade foram impugnados pelos credores, como ainda o arresto pode incidir sobre bens do terceiro adquirente dos bens do devedor (ou bens que estejam apenas formalmente na titularidade do terceiro); 30) Apesar de não caber discutir nesta sede (e sim na acção principal) a verificação dos requisitos da impugnação pauliana, uma vez que a acção estava já pendente à data em que o arresto foi requerido (artº 392º, nº2 do C.P.C.), a realidade é que foram alegados e provados todos os factos que tornavam provável a procedência da impugnação, como resulta dos factos dados como provados nestes autos (quer na decisão que decretou o arresto, quer na que julgou improcedente a oposição) e foi até já proferida sentença que declarou a nulidade do acto de transmissão do dinheiro dos 1ºs para a 2ª Recorrente; 31) Tendo os Recorrentes transmitido à sua sociedade os únicos bens de que eram proprietários em Portugal e não dispondo, como não dispõem, de qualquer outro património, nem rendimentos, é manifesto o prejuízo que causou aos seus credores a transmissão simulada dos imóveis à sociedade e os actos subsequentes de prestar caução em nome dela para impedir a venda executiva dos imóveis hipotecados e penhorados e requerer, por via da sociedade, o seu levantamento. 32) É absurdo o argumento dos Recorrentes de que não houve diminuição da garantia patrimonial e do activo dos devedores por o pagamento do crédito continuar a ser garantido pelos imóveis pelo montante de € 29.780,43! – como se este valor fosse suficiente para pagamento de um crédito de mais de € 450.000,00!!! 33) Sem o esquema montado pelos Recorrentes, os prédios seriam vendidos na execução pelo seu valor de mercado (e seria satisfeito o crédito exequendo) e não teriam os mesmos conseguido obstar à sua venda, despendendo apenas € 29.780,43 (quando a penhora foi registada pelo valor de e 127.353,26)! 34) A conduta dos Recorrentes visou apenas contornar a lei e fazer com que a sociedade adquirente (que é deles próprios) viesse a beneficiar da aplicação de uma norma (artº 693º, nº2 do Código Civil) que poderia limitar a sua responsabilidade e, portanto, a responsabilidade dos devedores, executados; com a invocação do “limite máximo garantido” calculado nos termos dessa norma, conseguiram os 1ºs Recorrentes, através de uma sociedade que dominam exclusivamente (e que é, afinal, o próprio J. B.), uma limitação da sua própria responsabilidade. 35) A transmissão, pelos Recorrentes, dos imóveis que constituíam, à data, a única garantia do crédito dos Recorridos à sua sociedade configura, face à decisão proferida na oposição à penhora (confirmada em sede de recurso), um meio adequado a impedir a sua cobrança. 36) No que diz respeito ao “justo receio de perda da garantia patrimonial” pronunciou-se nomeadamente o S.T.J. no Acórdão de 11 de Dezembro de 1973, in B.M.J., 232, p.110 no sentido de que, para a sua verificação basta que exista acentuada desproporção entre o montante do crédito e o valor do património conhecido do devedor – como é manifestamente o caso e foi reconhecido na douta decisão recorrida. 37) No caso sub judice o valor da dívida dos Recorrentes para com os Recorridos ascende, por defeito (dado se desconhecer, neste momento, o valor final das despesas da execução) a € 453.379,16 crescida de juros de mora vincendos, até efectivo e integral pagamento (como resulta dos factos julgados provados); 38) Sendo o património dos 1ºs Recorrentes conhecido em Portugal constituído apenas pelos imóveis e pelo dinheiro da caução, o qual é facilmente ocultável e de fácil dissipação, é manifesto o receio dos Recorridos de que, quando conseguirem a diligência para penhora, os Recorrentes já não disponham de quaisquer bens no seu património; 39) Com o levantamento da penhora que incidia sobre os imóveis (como requereram na acção executiva), se não tivesse sido decretado o arresto, os Recorrentes podiam transmitir os prédios, agora livres do encargo da hipoteca judicial, utilizando formalmente a sociedade, situação que, atendendo ao histórico da actuação dos Recorrentes, iria seguramente ocorrer a curto prazo; 40) Com o levantamento do valor depositado como caução (para impedir a venda dos prédios), os Recorrentes, por via da sociedade, ocultariam e dissipariam, com facilidade, o dinheiro, colocando-se em posição de não poderem pagar as suas dívidas aos Recorridos (à semelhança do que já fizeram com os prédios). 41) A regra da proporcionalidade da providência prevista no nº2 do artº 368º do C.P.C., que os Recorrentes invocam ter sido violada, não é aplicável no âmbito dos procedimentos cautelares nominados ou especificados, como é o caso do arresto, como resulta expressamente do disposto no artº 376º, nº1 do C.P.C. 42) De qualquer forma, os argumentos invocados pelos Recorrentes, a este propósito, são meras conclusões e considerações, não suportados em quaisquer factos concretos e, além disso, como bem refere a decisão proferida pelo Tribunal de 1ª Instância no 1º arresto (que decretou o arresto dos imóveis e do dinheiro), “face ao elevado crédito dos requerentes sobre os primeiros requeridos e a data do seu vencimento, o arresto decretado é a providência adequada e proporcional!” 43) Em relação à desconsideração da personalidade jurídica, é verdade que com a transmissão dos imóveis para a sua sociedade, a responsabilidade dos 1ºs Recorrentes não diminuiu (por continuarem responsáveis pelo pagamento da quantia exequenda); todavia, o certo é que deixaram de ser proprietários de quaisquer bens penhoráveis que possam responder na execução! 44) No momento em que foi feita a penhora dos dois únicos bens conhecidos dos 1ºs Recorrentes em Portugal (os dois imóveis arrestados), já estes os tinham transmitido (por negócio fictício celebrado com o objectivo de impedir a satisfação do crédito dos Recorridos) à 2ª Recorrente, sociedade de que era sócio único e administrador único o 1º Recorrente. 45) Porém, não contavam os Recorrentes com o registo da hipoteca judicial que tinha sido promovido pelos Recorridos (em 20.09.2012), após a prolação do Acórdão do STJ, sobre os dois prédios pertencentes aos devedores, hipoteca essa que, segundo a menção registal, se destinava a “garantia de pagamento da quantia devida aos herdeiros que vier a ser liquidada em execução de sentença, acrescida das quantias de juros às sucessivas taxas legais até integral pagamento”. 46) Incidindo sobre os prédios essa inscrição registal – como incidia -, os Recorrentes, ao optarem por outorgar as escrituras de compra e venda, não tinham alternativa senão alienar os imóveis com o ónus da hipoteca judicial, tendo sido esta circunstância que determinou que o 1º Recorrente, por via da sua sociedade, tivesse formalizado (na mesma) a compra e venda (dos prédios hipotecados) e tivesse vindo, de seguida, invocar, em nome da sociedade, a limitação da responsabilidade desta ao montante máximo inscrito no registo predial. 47) Se não tivesse sido registada uma hipoteca judicial, a 2ª Recorrente nem teria de assumir o pagamento de qualquer quantia, dado que os Recorrentes conseguiram celebrar as escrituras de compra e venda antes da penhora na execução (que foi registada em 18.09.2013); 48) Sucede que, estando registada sobre os prédios a hipoteca judicial, os Recorrentes viram-se na necessidade de assumir, através da sociedade, o pagamento da quantia de € 29.780,43, que correspondia ao montante indicado no registo predial como sendo o montante máximo garantido pela hipoteca judicial. 49) Como a quantia que tinham de despender, com a alienação dos imóveis com o ónus de hipoteca judicial, era muito inferior à quantia exequenda, o negócio ainda compensava. 50) Assim, a sociedade, representada pelo próprio executado (o 1º Recorrente) veio invocar, como “terceiro adquirente”, que os imóveis que “adquirira” só respondiam pelo valor máximo inscrito no registo predial e teve de assumir a responsabilidade pelo pagamento desse montante (por não ter tido alternativa, face ao registo da hipoteca judicial). 51) Se os imóveis tivessem permanecido no património dos devedores à data da penhora, eles responderiam, obviamente, pela totalidade da dívida exequenda, não se colocando qualquer questão de limitação de responsabilidade. 52) A questão é que a alienação dos imóveis hipotecados visou justamente impedir a satisfação do crédito dos Recorridos (anterior aos actos impugnados) posto que em vez de responderem por € 127.353,26, passam a responder apenas por € 29.780,43 em virtude do esquema montado pelos 1ºs Recorrentes que utilizaram a sua sociedade para colocar em nome desta os imóveis e continuarem a usufruir deles, como verdadeiros proprietários que são, e nunca deixaram de ser e depois para prestarem uma caução formalmente em nome da sociedade e impedir, dessa forma, a venda dos imóveis na execução. 53) Os devedores (1ºs Recorrentes) aproveitaram-se da máscara da sociedade, que formalmente adquiriu os bens imóveis e prestou uma caução, para seu exclusivo benefício pessoal, ou seja, utilizaram a sociedade para prosseguir objectivos do sócio J. B. (e da mulher) e não o interesse social. 54) A transmissão da propriedade dos bens para a sociedade visou, unicamente, diminuir o património dos executados e dificultar e evitar a cobrança do crédito por parte dos exequentes, expediente formal que utilizaram de forma abusiva e fraudulenta pois bem sabiam que se tais bens permanecessem no seu património responderiam pela totalidade da dívida exequenda. 55) E essa “alienação” ocorreu após o trânsito em julgado da decisão condenatória: o Acórdão do STJ transitou em julgado a 5 de Novembro de 2012 e as escrituras de compra e venda foram outorgadas em 7 de Novembro de 2012 – no caso do prédio descrito sob o 1112 - e em 12 de Maio de 2013 - no caso do prédio descrito sob o nº 700. 56) Aproximando-se a data da venda (pois a oposição à penhora deduzida pela 2ª Recorrente não suspendeu a execução), os 1ºs Recorrentes ofereceram-se, formalmente em nome da 2ª Recorrente (que era a proprietária formal dos imóveis) para prestar caução, transferindo para esta a quantia necessária a esse fim, para depois poderem, em nome da sociedade, requerer o seu levantamento, mantendo-se, com este esquema, a disponibilidade sobre os imóveis (que continuaram a usar, como proprietários e possuidores) e sobre o dinheiro. 57) Esta forma de actuação dos Recorrentes afigura-se manifestamente abusiva e desconforme à boa fé, agindo os intervenientes naquele negócio – os 1ºs Recorrentes e a sociedade 2ª Recorrentes – com abuso de direito, figura prevista e regulada no artigo 334º do Código Civil e que é do conhecimento oficioso. 58) No caso em apreço, a personalidade colectiva foi usada de modo ilícito e abusivo para prejudicar terceiros (os Recorridos), existindo uma utilização contrária a normas ou princípios gerais, incluindo a ética dos negócios; se verificarmos o histórico dos factos e a estrutura societária da sociedade 2ª Recorrente, é claríssimo que se justifica plenamente a desconsideração da personalidade jurídica societária, fazendo imputar directamente a responsabilidade pela dívida (do sócio) à sociedade, na medida em que a alienação dos imóveis a favor desta e os actos relacionados com a prestação de caução em nome da sociedade configuram abuso de direito. 59) O 1º Recorrente tratou de ficticiamente transmitir (também) as participações sociais aos filhos, para tentar “fugir” ao instituto da desconsideração da personalidade jurídica invocado pelos Recorridos nos vários processos pendentes. 60) Todavia, é absolutamente irrelevante essa transmissão, que foi simulada, não só porque a mesma teve lugar após a prática dos actos impugnados, como ainda e sobretudo, porque o Recorrente continua a ser a única pessoa que gere e controla a sociedade. 61) Tais transmissões fictícias nunca foram levadas a registo ou ao conhecimento de terceiros, tendo o Recorrente J. B. actuado sempre e figurando em todos os documentos, como o único sócio e o único administrador da X, SL. 62) As invocadas transmissões das participações sociais aos filhos do Recorrente foram negócios simulados, celebrados por conluio entre declarante e declaratários (seus filhos) e que visaram apenas enganar terceiros, designadamente os Recorrentes, tendo em vista a pretensa demonstração de que não é o único sócio da sociedade utilizada por si como veículo para adquirir os imóveis em Portugal e prestar caução para impedir a sua venda. 63) Estas fictícias transmissões das participações sociais reforçam a necessidade de proceder ao levantamento da personalidade colectiva da sociedade, pois demonstram, com clareza, que o 1º Recorrente tratou de criar a aparência de uma multiplicidade de sócios, mas afinal os “novos” sócios são os seus próprios filhos, que se prestaram a esse papel para ajudar o pai a completar o esquema ardiloso que engendrou para se esquivar ao pagamento da dívida para com os familiares da sua mulher. 64) Em relação à invocada “nulidade” da sentença, por suposta violação do disposto nos artº 576º, nº2, 577º i) e 580º e segs. do CPC, ou seja, por alegado “caso julgado”, os Recorrentes também não têm qualquer razão. 65) A excepção de caso julgado pressupõe (tal como a litispendência) a repetição de uma causa e tem por fim evitar que o tribunal seja colocado na alternativa de contradizer ou de reproduzir uma decisão anterior (artº 580º do Código de Processo Civil). Repete-se uma causa quando se propõe uma acção idêntica quanto aos sujeitos, ao pedido e à causa de pedir. 66) Neste caso, não se verifica repetição de uma causa, não há identidade de sujeitos, não há identidade do pedido nem há identidade de causa de pedir. 67) Constituindo a sentença caso julgado nos precisos limites e termos do que julga (artº 621º do C.P.C.), não se verifica, nem podia verificar, caso julgado relativamente à decisão sobre a aplicação do instituto jurídico da desconsideração da personalidade jurídica que não foi sequer apreciada pelo Tribunal (seja pela 1ª Instância, seja pela Relação) no incidente de oposição à penhora.
DA AMPLIAÇÃO DO ÂMBITO DO RECURSO
68) Pese embora a decisão recorrida tenha feito correcta interpretação e aplicação das normas legais, há alguns concretos pontos da matéria de facto que foram alegados pelos Recorridos e que se encontram provados por documentos e que o Tribunal de 1ª Instância não elencou nos factos provados por se ter baseado (apenas) nos factos assentes no Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães (e que foram alegados no 1º arresto), como foi referido pela Mma. Juíza a quo. 69) Trata-se dos factos transcritos nestas contra-alegações (1 a 26) e que foram alegados no requerimento inicial desta providência tendo em vista a demonstração de que a caução foi prestada com dinheiro dos 1ºs Recorrentes que, uma vez mais, e à semelhança do que fizeram com os imóveis, utilizaram a sua sociedade X, SL para prestar caução (a fim de evitar a venda dos imóveis a eles pertencentes) e depois requerer o seu levantamento em nome da sociedade (dessa forma recuperando o dinheiro que utilizaram para prestar a garantia, como se o mesmo pertencesse à sociedade); 70) Assim, os Recorridos alegaram no requerimento inicial que isso resultava expressamente da actuação dos Recorrentes na acção executiva nº 992/13.0YYPRT e, designadamente, que quem ofereceu, num momento inicial, a caução foram os próprios 1ºs Recorrentes. 71) Esses factos têm interesse para reforço da prova da matéria atinente à transferência do dinheiro dos Recorrentes para a sua sociedade para prestarem, formalmente, em nome desta a caução e manterem, com o esquema montado, a disponibilidade sobre os imóveis (que dessa forma não seriam vendidos na execução) e sobre o dinheiro (que esperavam mais tarde recuperar, também por via da sociedade), e, bem assim, para prova de na acção executiva os 1ºs Recorrentes actuaram sempre indistintamente em seu próprio nome e da sua sociedade, de acordo com as suas conveniências pessoais e sem nunca ter em conta o interesse social (antes, utilizando a sociedade sempre no seu exclusivo interesse pessoal). 72) Já aí tinham usado a sua sociedade (a 2ª Recorrente) para constituir hipoteca para garantia da dívida dos 1ºs Recorrentes e assim evitar a venda dos seus imóveis, fazendo tábua rasa das normas que determinam que a uma sociedade comercial está vedado constituir garantias a dívidas dos seus sócios ou administradores (artºs 6º e 397º do Código das Sociedades Comerciais). 73) Os Recorridos vêm, pois, a título subsidiário, impugnar a decisão proferida sobre a matéria de facto, requerendo que sejam aditados aos factos provados aqueles que, a este propósito, alegaram no requerimento inicial do arresto e que indicaram nestas contra-alegações, prevenindo a hipótese de procedência de alguma questão suscitada pelos Recorrentes, ao abrigo do disposto no artº 636º, nº2 do C.P.C. 74) Estes factos que se pretende sejam aditados aos factos provados demonstram que os 1ºs Recorrentes, por si e em nome da sociedade 2ª Recorrente, que mais uma vez utilizaram nos seus próprios interesses pessoais, conseguiram protelar a decisão que indeferiu o incidente de prestação de caução (apenso C)) que requereram tendo em vista obter a suspensão da execução (Processo nº 992/13.0YYPRT). 75) Mais tarde, quando a 2ª Recorrente requer a prestação de caução (no apenso F) para impedir a venda dos imóveis registados a seu favor (cujo arresto foi decretado), são novamente os Executados, aqui 1ºs Recorrentes, que depositam o dinheiro formalmente em nome da sociedade, para depois requererem, através desta, o seu levantamento e dessa forma recuperarem o dinheiro que usaram para evitar a venda dos imóveis, como se o mesmo pertencesse à sociedade. 76) Utilizaram, assim, a sua sociedade apenas para prejudicar os Recorridos, com movimentação de dinheiro próprio como se fosse da sociedade, pois esta não tinha, nem tem, disponibilidade financeira para fazer esse pagamento, dado que não lhe é conhecida qualquer actividade que possa gerar lucros, como foi dado como provado (facto 1.76). 77) Tal como se referiu quanto aos actos de compra e venda impugnados na acção principal, também quanto à suposta prestação de caução em nome da 2ª Recorrente e à prévia transmissão do dinheiro ficticiamente para esta para poder prestar a caução, estamos perante uma actuação manifestamente abusiva e desconforme à boa fé, para além de proibida por lei, agindo os intervenientes nestes actos com abuso de direito, figura prevista e regulada no artº 334º do Código Civil e que é do conhecimento oficioso. 78) Os imóveis (arrestados nos autos e cujas vendas foram impugnadas por via da presente acção) e o dinheiro são os únicos bens conhecidos dos 1ºs Recorrentes em Portugal, sendo que o valor dos imóveis é insuficiente para satisfazer o crédito dos Recorridos. 79) Quer as compras e vendas simuladas (pelas quais os 1ºs Recorrentes “transmitiram” os prédios à 2ª Recorrente), quer a prestação de caução formal e ficticiamente em nome da 2ª Recorrente com dinheiro que a sociedade “recebeu” do 1º Recorrente apenas para este efeito, estão interligadas e ambas visaram apenas prejudicar os Recorridos que, desta forma, receberam uma quantia inferior a € 29.780,43 e ficaram sem a garantia patrimonial constituída pelos imóveis e pelo dinheiro – bens que pertencem efectivamente aos 1ºs Recorrentes. 80) Esta actuação dos 1ºs Recorrentes insere-se na linha do seu anterior comportamento, porquanto estes desde sempre recorreram a sucessivos estratagemas e expedientes para se furtarem às suas obrigações, como resulta desde logo do facto de terem vendido imóveis da herança e se terem apropriado do preço a que não tinham direito , dos repetidos protelamentos do cumprimento de todas as decisões judiciais condenatórias (mesmo que para tal utilizem argumentos que bem sabem carecer absolutamente de fundamento), da venda de imóveis com ónus da hipoteca judicial , do recurso a um fictício arrendamento (para justificar a continuação da sua ocupação do imóvel) , da invocação da falsa transmissão de quotas aos próprios filhos (apenas para fugir à alegada desconsideração da personalidade colectiva – mas que continuam apenas em nome do 1º Requerido no registo). 81) A decisão recorrida violou, assim, na parte a que respeita a ampliação do âmbito do recurso, designadamente o disposto no artº 607º, nº 3 do C.P.C.»
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O recurso foi admitido como de apelação, a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo
De seguida, foi proferida decisão em que a Mmª Juíza “a quo” se pronunciou pela não verificação da invocada nulidade da sentença (cfr. fls. 259).
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Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
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II. Questões a decidir.
Sendo o âmbito dos recursos delimitado pelas conclusões das alegações do recorrente – artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.ºs 1 e 2 do Código de Processo Civil (doravante, abreviadamente, designado por CPC), aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho –, ressalvadas as questões do conhecimento oficioso que ainda não tenham sido conhecidas com trânsito em julgado, as questões que se colocam à apreciação deste Tribunal, por ordem lógica da sua apreciação, consistem em saber:
1ª - Quanto ao recurso independente:
– Da nulidade da sentença com fundamento na al. d) do n.º 1 do art. 615º do CPC.
– Da impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto.
– Da (in)verificação dos pressupostos do decretamento da providência cautelar de arresto.
– Da indevida desconsideração da personalidade jurídica e da violação do caso julgado.
2.ª – Quanto à ampliação do objeto do recurso:
– Da impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto.
*
III. Fundamentos
IV. Fundamentação de Facto.
A decisão recorrida deu (indiciariamente) como provados os seguintes factos:
A) Do crédito dos Requerentes
1.1. A 1ª Requerente D. Maria foi casada com o Eng. D. V., falecido no dia 30 de Outubro de 1999. 1.2. Para partilha da herança aberta por óbito do referido Eng. D. V., foi instaurado processo de inventário, que correu termos na Comarca do Porto, Porto – Instância Local, Secção Cível – J2, sob o nº 152/04.0TVPRT, cuja sentença homologatória da partilha, proferida em 18 de Setembro de 2015, transitou entretanto em julgado, com a notificação às partes do Acórdão proferido pelo STJ de 14.06.2017 (doc. nº1). 1.3.Todos os Requerentes, os filhos da M. J., falecida no dia 16 de Setembro de 2016, conforme escritura de habilitação de herdeiros que está junta aos autos da acção principal, e os 1ºs requeridos são interessados nessa herança, como consta do auto de declarações de cabeça de casal, mapa informativo da partilha e mapa de partilha extraídos do processo de inventário (cfr. docs. juntos com a P.I. da acção principal sob os nºs 1,2,3 e 4: os Requerentes D. V. (2º), M. M. (3ª), M. R. (4ª), M. B. (5ª), J. P. (6º), F. P. (7º) e a 1ª Requerida mulher M. A. são todos filhos da 1ª Requerente e do inventariado; as Requerentes C. M. (8ª), M. G. (9ª), M. C. (10ª), T. J. (11ª) e M. F. (12ª), todas já maiores, são netas da 1ª Requerente e do inventariado, filhas da sua filha pré falecida (em 01.06.1998) M. G.. 1.4. Em relação à filha M. J. (entretanto falecida) estão a decorrer as citações, dado que foi deduzido, nos próprios autos da acção principal, o respectivo incidente de habilitação. 1.5. A 1ª Requerida é casada com o 1º Requerido, de nacionalidade espanhola, sob o regime da comunhão geral de bens, como consta das declarações de cabeça de casal (cfr. doc. nº1 junto com a acção principal). 1.6. Por sua vez, a 2ª Requerida é uma sociedade comercial de direito espanhol, de que o 1º Réu J. B. é o único sócio e também o único administrador à data em que foi constituída, como resulta do documento junto sob o nº5 da acção principal e doc n2 do apenso A., em resultado da consulta efectuada a 30.06.2017 (doc. nº2) 1.7. A 2ª Requerida tem por objecto a promoção de vendas de imóveis, assim como a construção ou intermediação na venda de todo o tipo de imóveis e o arrendamento; foi constituída pelo único sócio (o 1º Requerido) em 06.09.2005, com o capital social de € 10.000,00 (dez mil euros), e tem a sua sede na morada dos 1ºs Requeridos: Calle …, em Espanha, como resulta dos documentos referidos em 1.6. e ainda das certidões das escrituras de compra e venda nas quais o 1º Requerido interveio por si – como vendedor - e na qualidade de administrador e em representação da 2ª Requerida – compradora (docs. nºs 6 e 7 juntos com a P.I. da acção principal). 1.8. Além disso, como resulta das procurações juntas aos apensos A (habilitação da 2ª Requerida) e B (Embargos de Executado) da acção executiva pendente na Comarca do Porto, Porto – Instância Central, 1ª Secção de Execução – J5, sob o nº 992/13.0YYPRT, todos os Requeridos (1ºs Requeridos e 2ª Requerida) são representados pelos mesmos mandatários, Senhores Drs. Pedro, Joana e João (documentos juntos com a P.I. da acção principal sob o os nºs 8, 9 e 10). 1.9. Das procurações emitidas pelos Requeridos a favor dos seus mandatários consta a indicação das suas moradas (dos 1ºs Requeridos) e sede social (da 2ª Requerida) no mesmo local: Calle …, Valencia.
O crédito dos Requerentes reconhecido no processo de inventário
1.10. No âmbito do referido processo de inventário, foram relacionados dois créditos da herança sobre a 1ª Requerida M. A., que correspondem ao preço da venda de imóveis pertencentes à herança que foi pela mesma recebido e de que a M. A. era, por conseguinte, devedora à herança, pelo que foram, na partilha, imputados na sua quota hereditária, de harmonia com o disposto no nº2 do artº 2074º do Código Civil. 1.11. Trata-se das verbas nº 1 (no valor de € 265.700,00) e nº 220 (€ 128.008,53), indicadas no mapa informativo da partilha. 1.12. Quanto à verba nº1, trata-se de parte do preço dos imóveis que integravam a Quinta ..., em Caminha, e que pertenciam à herança aberta por óbito do Eng. D. V. que a 1ª Requerida recebeu por antecipação relativamente aos restantes herdeiros. 1.13. No que concerne à verba nº 220, esse valor refere-se ao preço da venda de outro prédio da herança (denominado “Q...”), também em Caminha, que pertencia igualmente à mesma herança e que a 1ª Requerida foi condenada a restituir à herança. 1.14. Uma vez que este 2º crédito estava já a ser reclamado no âmbito de uma execução de sentença, os Requerentes reservaram-se o direito a fazer prosseguir a acção executiva que corre termos no Juízo de Execução do Porto, sob o nº 992/13.0YYPRT. 1.15. Sem prejuízo dessa circunstância, os Requerentes reclamaram dos 1ºs Requeridos o pagamento das tornas que são devidas a cada um deles. 1.16. O crédito relativo à acção executiva nº 992/13.0YYPRT foi relacionado pelo valor de € 128.008,53, reportado a 17 de Outubro de 2013. 1.17. Assim, a 1ª Requerente (cônjuge sobrevivo) reclamou dos 1ºs Requeridos o pagamento das tornas que lhe são devidas, no valor de € 329.122,49, o qual poderá vir a ser proporcionalmente reduzido em função da quantia que possa vir a ser recebida na execução pendente sob o nº 992/13.0YYPRT. 1.18. Os Requerentes filhos do inventariado, D. V., M. M., M. R., M. J. (cujos herdeiros serão habilitados para a acção), M. B., J. P. e F. P., reclamaram, para cada um, também a título de tornas, a quantia de € 7.834,04 (num total de € 54.838,28). 1.19. As Requerentes, netas do inventariado, C. M., M. G., M. C., T. J. e M. F. reclamaram dos 1ºs Requeridos tornas de €1.566,81 para cada uma (num total de € 7.834,05). 1.20. Requerendo todos que os 1ºs Requeridos fossem notificados para procederem ao seu depósito no prazo que lhes viesse a ser fixado, tudo como consta do requerimento apresentado no processo de inventário em 08.03.2015 (cfr. documento junto com a P.I. da acção principal sob o nº 19). 1.21. Os 1ºs Requeridos não pagaram aos Requerentes, nem depositaram, qualquer quantia a título de tornas, como aceitam e confessam na contestação à acção de impugnação pauliana. 1.22. Os Autores são, assim, credores da quantia devida a título de tornas no processo de inventário, com dedução do valor que possam vir a receber no âmbito da acção executiva nº 992/13.0YYPRT (já que as tornas foram calculadas também com base no crédito emergente desta acção, aí relacionado). 1.23. Os ora Requeridos M. A. e J. B. interpuseram recurso de apelação da sentença homologatória da partilha proferida no processo de inventário, o qual foi julgado improcedente por douto Acórdão proferido em 25.01.2016 pelo Tribunal da Relação do Porto, que confirmou a sentença recorrida (doc. nº 3). 1.24. Desse Acórdão foi interposto pelos mesmos Requeridos recurso de revista, sobre o qual incidiu decisão singular (de 31.01.2017) que decidiu não tomar conhecimento do recurso. 1.25. Os Requeridos reclamaram para a Conferência, tendo sido proferido em 8 de Maio de 2017 Acórdão que confirmou a decisão singular de não tomar conhecimento do recurso, o qual foi notificado às partes em 12 de Junho de 2017 e transitou, entretanto, em julgado (cfr. doc. nº1).
O crédito reclamado na acção executiva nº 992/13.0YYPRT (relacionado no processo de inventário como verba nº 220)
1.26. Por douta sentença proferida nos autos de acção declarativa ordinária que correram termos na 1ª Secção da extinta 4ª Vara Cível do Porto, sob o nº 1684/04.6TVPRT, completada por douto Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 14 de Junho de 2012, e transitada em julgado em 5 de Novembro de 2012, foram os 1ºs Requeridos condenados a pagar à herança aberta por óbito de D. V., representada pelos herdeiros – os ora Requerentes - a quantia de € 26.589,67, acrescida de juros de mora, às sucessivas taxas legais, desde 12.07.1991, incidindo sobre:
- a quantia liquidada até integral pagamento;
- a quantia de € 33.266,07 até 06.08.2002, como resulta da certidão emitida em 15 de Fevereiro de 2013 (traslado junto à acção executiva nº 992/13, junta com a P.I. da acção principal como doc nº 11). 1.27. A quantia que os 1ºs Requeridos foram condenados a pagar aos Requerentes nesta acção diz respeito ao preço da venda, feita pelos mesmos, do prédio das “Q...” que, como supra referido e dado como provado, pertencia à herança aberta por óbito de D. V. e que foi recebido e embolsado pelos 1ºs Requeridos, sem prestarem contas aos demais herdeiros, deduzido das despesas da responsabilidade da herança que foram por eles pagas (quantia essa que veio a ser fixada na sequência da liquidação da sentença de condenação genérica inicialmente proferida, tendo ocorrido a renovação da instância precisamente para esse fim). 1.28. Os 1ºs Requeridos requereram a reforma do Acórdão do STJ de 14 de Junho de 2012 – que foi negada por Acórdão do mesmo Tribunal proferido em 27.09.2012 - e depois interpuseram recurso para uniformização de jurisprudência – que não foi admitido - e ainda reclamaram para a conferência, tendo o STJ confirmado o despacho reclamado, por Acórdão de 14.04.2013 (cfr. docs. nºs 12 e 13 juntos com a P.I. da acção principal). 1.29. Na pendência dessas iniciativas processuais, os Requerentes tinham já promovido, em 20 de Setembro de 2012, o registo de hipoteca judicial, de harmonia com o previsto no artº 710º do Código Civil, sobre dois prédios pertencentes aos 1ºs Requeridos:
- Prédio urbano composto por casa de R/C, 1º andar e rossio, sito na Rua do ..., nº .., freguesia de ..., concelho de Caminha, inscrito na matriz sob o art … e descrito na Conservatória do Registo Predial de Caminha sob o nº …;
- Prédio urbano composto por casa de R/C, 1º andar e logradouro, sito na Rua ..., nº 6, freguesia de ..., concelho de Caminha, inscrito na matriz sob o artº … e descrito na Conservatória do Registo Predial de Caminha sob o nº …. 1.30. Tal como consta das informações do registo predial, o registo da hipoteca judicial foi efectuado (sobre ambos os prédios) pela Ap. 3257 de 2012/09/20 (cfr. docs. juntos com a P.I. da acção principal sob os nºs 14 e 15) e destinou-se a “garantia de pagamento da quantia devida aos herdeiros que vier a ser liquidada em execução de sentença, acrescida das quantias de juros às sucessivas taxas legais até integral pagamento”, como consta da menção aposta no registo. 1.31. Este registo de hipoteca judicial foi feito com base na certidão do título de que resulta a garantia. 1.32. Na ocasião da prolação da decisão condenatória o montante do capital que os 1ºs Requeridos estavam obrigados a pagar aos Requerentes ascendia a € 26.589,67, quantia a que acresciam juros de mora a liquidar nos termos previstos no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça – resultando essa operação de simples cálculo aritmético, e por esse motivo foi indicado pelo Conservador do Registo Predial que o montante máximo assegurado para efeitos de registo era de € 29.780,43 (capital acrescido de juros de três anos. 1.33. Em 26 de Julho de 2012, o capital e os juros vencidos até essa data (incluídos na condenação) totalizavam € 110.742,52, tendo os Requerentes procedido à capitalização dos juros, por notificação judicial avulsa, nos termos do artº 560º do Código Civil (doc. junto com a P.I. da acção principal como doc. nº 16). 1.34. Devidamente notificados para procederem ao pagamento do capital e juros, sob pena de, na data indicada, ocorrer a capitalização dos juros (passando os juros supervenientes a vencer-se sobre o montante global apurado, até efectivo e integral pagamento), os 1ºs Requeridos não fizeram, porém, o pagamento de qualquer quantia (nem, por alguma forma, se manifestaram). 1.35. Em face da falta de pagamento da quantia em que os 1ºs Requeridos haviam sido condenados e tendo a sentença transitado em julgado (em 5 de Novembro de 2012), os Requerentes instauraram, em 19 de Fevereiro de 2013, a acção executiva (execução da sentença proferida no âmbito do referido Proc. nº 1684/04.6TVPRT), que se encontra actualmente pendente, no Tribunal Judicial da Comarca do Porto, Juízo de Execução do Porto – Juiz 5, sob o nº 992/13.0YYPRT, conforme requerimento executivo (cfr. doc. nº 17 junto com a P.I. da acção principal), tendo indicado à penhora os dois prédios sobre que incidia a hipoteca judicial. 1.36. À data da instauração da execução, o valor da dívida ascendia a € 121.288,82. 1.37. Tendo em conta os juros e sanção pecuniária vencidos e as despesas da execução desde a data em que foi apresentado o requerimento executivo (19.02.2013), o valor do crédito dos Requerentes sobre os Requeridos ascendia, em 23 de Maio de 2016, a € 178.408,56, como consta da nota de liquidação da responsabilidade dos executados elaborada pela Agente de Execução e junta a esses autos de execução (cfr doc. nº 18 junto com a P.I. da acção principal). 1.38. Tal nota não foi objecto de reclamação por parte dos Requeridos (aí executados) e corresponde ao crédito dos Requerentes sobre os Requeridos nessa data. 1.39. A essa quantia acrescem juros de mora vincendos calculados sobre a quantia capitalizada desde 23.05.2016 até efectivo e integral pagamento, bem como sanção pecuniária compulsória de 5% ao ano, conforme previsto no artº 829º-A, nº4 do Código Civil, e ainda honorários e despesas da agente de execução, a liquidar no momento do pagamento. 1.40. Desde 23 de Maio de 2016 até 2 de Julho de 2017 venceram-se juros de mora à taxa legal de 4% sobre os valores de € 110.742,52 (capital) e € 2.530,00 (custas de parte), de € 4.915,15 e € 112,29, respectivamente, sendo o valor global de juros de € 5.027,44. 48. 1.41. Venceu-se ainda a sanção pecuniária compulsória prevista no artº 829º-A, nº 4 do Código Civil, à taxa de 5% ao ano, sobre € 110.742,52, que ascende na mesma data (02.07.2017) a € 6.156,87. 1.42. O crédito dos Requerentes na acção executiva reportado a 02.07.2017 (e sem considerar o acréscimo de despesas da execução desde 23.05.2016) é de quantia não inferior a € 189.592,87. 1.43. Daí que o crédito global dos Requerentes sobre os Requeridos seja, em 27.06.2017 de € 453.379,16, que corresponde à soma das seguintes importâncias:
(i) 61.584,34 (€ 189.592,87 - € 128.008,53)
(ii) € 329.122,49 (tornas devidas à 1ª Requerente)
(iii) € 54.838,28 (tornas devidas aos filhos do inventariado e aos herdeiros da
filha M. J., entretanto falecida: € 7.834,04 x 7);
(iv) € 7.834,05 (tornas devidas às netas do inventariado, filhas da filha pré-falecida M. G.: € 1.566,81 x 5),
B) Da garantia patrimonial dos créditos dos Requerentes e do justificado receio da sua perda.
1.44. No âmbito da acção executiva acima identificada (instaurada para cobrança coerciva de parte dos créditos dos Requerentes sobre os Requeridos (Proc. nº 992/13.0YYPRT), foi feita a penhora dos dois únicos imóveis que os 1ºs Requeridos detinham em Portugal, que eram aqueles sobre que incidia a hipoteca judicial. 1.45. Sucede, porém, que à data em que a penhora foi registada (18.09.2013) os Requeridos já tinham operado a transmissão – alteração da titularidade – da propriedade desses dois imóveis para a 2ª Requerida, tendo registado a aquisição a favor desta sociedade que é uma sociedade de direito espanhol de que o 1º Requerido J. B. era, e é, o único sócio e administrador/gerente. 1.46. Como consequência, os 1ºs Requeridos deixaram de ser os titulares inscritos (cfr. documentos juntos com a P.I. da acção principal sob os nºs 14 e 15). 1.47. Os Requerentes requereram então a habilitação da 2ª Requerida X, S.L., como adquirente dos prédios hipotecados, para também contra ela prosseguir a execução, de modo a poderem (enquanto exequentes) valer-se da garantia, posto que as compras e vendas dos dois imóveis onerados com hipoteca judicial eram inoponíveis aos credores hipotecários e ineficazes quanto ao prosseguimento da acção executiva. 1.48. E por sentença proferida em 17 de Dezembro de 2013 e já transitada em julgado (dado que dela não foi interposto recurso) foi julgada habilitada a 2ª Requerida para contra ela prosseguir a execução (cfr. doc.nº 21 junto com a P.I. da acção principal). 1.49. A 2ª Requerida veio então deduzir oposição à penhora que incidia sobre os prédios agora registados em seu nome (descritos sob os nºs 1112 e 700 na Conservatória do Registo Predial de Caminha), invocando que, do valor da quantia exequenda, os dois prédios penhorados “apenas garantem o pagamento de € 29.780,43”, admitindo que adquiriu os prédios com ónus, “mais concretamente com registo de hipoteca judicial a garantir o pagamento da quantia devida aos herdeiros que viesse a ser liquidada em execução de sentença”, mas invocando que essa quantia “no respectivo averbamento da hipoteca judicial em ambos os aludidos prédios se limitou ao montante máximo de € 29.780,43.” 1.50. Os Requerentes contestaram o incidente defendendo não apenas que a oposição não se enquadrava nos fundamentos previstos no CPC para o executado deduzir à penhora e ser, por isso legalmente admissível, mas também que a 2ª Requerida, habilitada para também contra ela prosseguir a execução, respondia nos precisos termos dos primitivos executados (os 1ºs Requeridos) dado que os imóveis que ela voluntária e conscientemente adquiriu garantiam o pagamento de toda a dívida exequenda, porquanto o registo de hipoteca judicial efectuado sobre os prédios se destinou a “garantia do pagamento da quantia devida aos herdeiros que vier [viesse] a ser liquidada em execução de sentença, acrescida das quantias de juros às sucessivas taxas legais até integral pagamento”, como consta da própria inscrição/menção aposta no registo e abrangia o valor de toda a condenação (por estarmos perante uma sentença ilíquida). 1.51. O valor da condenação exequenda, que é o crédito garantido – era constituído pelas seguintes parcelas:
- a quantia de € 26.589,67;
- juros sobre € 26.589,67 desde 12.07.1991 até integral pagamento;
- juros sobre € 33.266,07 desde 12.07.1991 até 06.08.2002. 1.52. O Acórdão que constituiu o título válido para o registo da hipoteca judicial condenou logo os réus no pagamento de juros que já podiam ter sido quantificados à data do registo da hipoteca judicial (porém, a Conservatória fez o registo com base no título apenas pelo montante do capital, mas com a menção da iliquidez do montante garantido) 1.53. Alegaram ainda os Requerentes, no âmbito da oposição referida em 1.50. que no caso em apreço se estava perante uma hipoteca judicial, registada antes da celebração da “compra e venda”, pelo que a 2ª Requerida bem sabia que estava a “comprar” um bem hipotecado, que garantia a dívida (ainda por liquidar) em que os transmitentes haviam sido condenados por sentença judicial (todo o valor da condenação) – e sabia-o desde logo porque o transmitente marido (J. B.) era, ele próprio, o gerente ou administrador da sociedade adquirente (a X, SL); e se a 2ª Requerida adquiriu os prédios sem se preocupar em saber previamente qual o valor concreto da dívida garantida, foi precisamente por estar de má fé e ser, ela própria, representada pelo transmitente, o 1º Requerente J. B. – preferindo formalizar o acto de transmissão para dificultar a posição dos exequentes (aqui Requerentes). 1.54. Não obstante, veio a ser proferida decisão que julgou procedente a oposição à penhora pela mesma deduzida e determinou a redução da penhora ao montante de €29.780,43 por entender que as hipotecas judiciais registadas apenas garantem o pagamento do crédito exequendo até esse montante, conforme consta da sentença que junta como doc. 22 do processo principal. 1.55. Dessa sentença, os ora Autores interpuseram recurso de apelação, o qual foi admitido com efeito suspensivo (docs. juntos com a P.I. da acção principal sob os nºs 23 e 24). 1.56. Em 7 de Julho de 2016 foi proferido Acórdão pelo Tribunal da Relação do Porto, notificado aos Autores em 11 de Julho de 2016, que julgou a apelação improcedente (cfr. doc. nº 25 junto com a P.I. da acção principal). 1.57. A questão a decidir nesse recurso era a de saber se os (dois) imóveis hipotecados (judicialmente) e penhorados à ordem da execução, em face da transmissão da sua propriedade a favor da ora segunda requerida, deveriam responder pelo montante máximo inscrito no registo predial ou se, por se tratar de uma hipoteca judicial de uma sentença de condenação ilíquida, deveriam garantir a totalidade da quantia exequenda (também mencionada no registo). 1.58. Depois disso, os Requerentes ainda interpuseram recurso de revista, mas o STJ decidiu dele não conhecer (doc. que se junta sob o nº 4). 1.59. Uma vez que a decisão definitiva proferida na oposição à penhora foi no sentido de os imóveis adquiridos pela 2ª requerida só responderem parcialmente pela dívida, os Requerentes viram-se na necessidade de impugnar os actos de venda, por os mesmos envolverem diminuição da garantia patrimonial do seu crédito (anterior) e terem sido realizados dolosamente com o objectivo de impedir a satisfação integral do direito dos credores – tendo instaurado a acção de impugnação pauliana de que este arresto constitui incidente. 1.60. Tendo o Tribunal da Relação do Porto decidido que os prédios hipotecados e penhorados só respondem pelo valor de € 29.780,43 – o que foi confirmado pelo STJ -, resulta dos actos das vendas a impossibilidade, para os Requerentes, de obterem a satisfação integral do seu crédito, já que os 1ºs Requeridos – residentes em Espanha – não são proprietários de quaisquer outros bens imóveis em Portugal, para além dos penhorados, nem saldos bancários, nem rendimentos (seja de que natureza for), que possam garantir a satisfação do crédito dos Requerentes, como resulta das buscas levadas a cabo pelo agente de execução no âmbito da execução por custas de parte instaurada contra os Requeridos (docs. nºs 10, 11, 12 e 13). 1.61. Acresce que sobre o prédio descrito sob o nº 1112/... incide uma hipoteca voluntária a favor da Caixa ... para garantia de um crédito que ascendia a € 16.183,79 à data em que este banco apresentou a reclamação de créditos na ação executiva movida pelos Requerentes contra os Requeridos (crédito esse ao qual acrescem juros de mora), como resulta do documento nº5. 1.62. Além disso, nessa mesma acção executiva, foi fixado o seguinte valor base para venda dos bens imóveis penhorados: € 200,000,00 para o imóvel descrito sob o nº 700 e € 81.000,00 para o imóvel descrito sob o nº 1112, sendo aceites propostas acima de 85% desses valores, como resulta da notificação da Agente de Execução junta como doc. 6. 1.63. Para evitar a venda, a 2ª Requerida prestou caução por apenso à execução, tendo depositado à ordem desse processo a quantia de € 127.353,26 (doc. nº7). 1.64. Em face da decisão proferida no processo de oposição à penhora, a 2ª Requerida requereu que lhe seja restituída a quantia de € 97.572,83, correspondente à parte da caução que excede a sua responsabilidade liquidada nesse incidente, como resulta do requerimento apresentado no respectivo apenso em 29.06.2017 (doc. nº 8). 1.65. E apresentou na mesma data requerimento na acção executiva, a requerer que o valor de €29.780,43 “seja convertido em pagamento definitivo aos exequentes” e que seja ordenado o cancelamento das penhoras que incidem sobre os imóveis descritos na Conservatória de Caminha sob os nºs … e … da freguesia de ... que adquiriu pelas compras e vendas impugnadas por via da acção principal de que este arresto constitui incidente (doc. nº9). 1.66. Considerando o valor do crédito dos Requerentes, quer o reclamado nessa acção executiva, na qual irão receber apenas € 29.780,43 (sendo que não existem quaisquer outros bens susceptíveis de penhor), quer o devido a título de tornas e, bem assim, o valor do crédito do Caixa ... garantido por hipoteca voluntária (que goza de preferência), ainda que seja julgada procedente a impugnação pauliana, o valor dos imóveis “vendidos” será insuficiente para garantir a satisfação do crédito dos Requerentes. 1.67. Já depois de terem sido condenados a pagar aos Requerentes a quantia que viesse a ser liquidada em execução de sentença no âmbito de uma acção pendente desde 2004 (Proc. nº 1684/04), e de terem reconhecido um outro crédito da herança sobre eles correspondente ao preço da venda da Quinta ..., que receberam com antecipação relativamente aos demais herdeiros (os Requerentes), os 1ºs Requeridos venderam à 2ª Requerida os dois únicos prédios de que eram proprietários em Portugal, alienando os únicos bens imóveis de que eram proprietários em Portugal e que constituíam a garantia do crédito dos Requerentes. 1.68. Actos esse que foram impugnados na acção principal, tratando-se de acto titulado pela escritura pública outorgada no dia 7 de Novembro de 2012, no Cartório Notarial a cargo do Notário L. B., em Matosinhos, pelo qual os 1ºs Requeridos declararam vender à 2ª Requerida, nesse acto representada pelo 1º Requerido, que era o seu único administrador, e esta declarou comprar, o prédio urbano composto por casa de rés do-chão e andar, com rocio, situado na Rua do ..., nº .. da freguesia de ..., concelho de Caminha, descrito na Conservatória do Registo Predial de Caminha sob o nº ../... e inscrito na matriz predial urbana sob o artº …, com o valor patrimonial tributário de € 82.802,88 (cfr. doc. nº 6 junto com a P.I. da acção principal). 1.69. O preço declarado para a compra e venda foi de € 100.000,00, que os 1ºs Requeridos afirmaram ter já recebido. 1.70. Da escritura consta que sobre o prédio incide uma hipoteca voluntária a favor da “Caixa ...” “para garantia do empréstimo do valor de € 60.000,00” e uma hipoteca judicial “para garantia da quantia de € 26.589,67 acrescida de juros legais. 1.71. E, bem assim, do acto titulado pela escritura outorgada no dia 9 de Maio de 2013, no mesmo Cartório Notarial a cargo do Notário L. B., em Matosinhos, pelo qual os 1ºs Requeridos declararam vender à 2ª Requerida, nesse acto igualmente representada pelo 1º Requerido, seu único administrador, e esta declarou comprar, o prédio urbano composto por uma casa de rés-do-chão, primeiro andar e logradouro, situado na Rua …, lugar ou rua de ..., da freguesia de ..., concelho de Caminha, descrito na Conservatória do Registo Predial de Caminha sob o nº …/... e inscrito na matriz predial urbana sob o artº …, com o valor patrimonial tributário de € 147.678,63 (cfr. doc. nº 7 junto com a P.I. da acção principal). 1.72. O preço declarado para a compra e venda foi de € 83.500,00, que os 1ºs Requeridos declararam, igualmente, ter já recebido. 1.73. Da escritura consta que sobre este prédio incide também uma hipoteca voluntária a favor do “Banco ..., S.A.” para garantia do empréstimo do valor de € 75.000,00” e uma hipoteca judicial “para garantia da quantia de € 26.589,67 acrescida de juros legais.” 1.74.Nenhuma das escrituras menciona os “montantes máximos garantidos”. 1.75. Os prédios declarados vender à 2ª Requerida são os prédios onde os 1ºs Requeridos passavam, e continuaram a passar após a pretensa venda, férias em Portugal, juntamente com os seus filhos, e um deles continua a ser a morada oficial em Portugal dos 1ºs Requeridos, como resulta do teor do auto de penhora realizada no dia 18 de Maio de 2017 no âmbito de uma execução para pagamento de custas de parte instaurada por alguns dos aqui Requerentes contra os 1ºs Requeridos e da pesquisa feita nessa execução (docs. nº14 e 15). 1.76. A sociedade, 2ª Requerida, não tinha disponibilidade de tesouraria para fazer depositar uma caução de € 127.353,26. 1.77. Apesar de formalmente administrador da 2ª requerida, o certo é que o 1º Requerido nunca exerceu qualquer actividade através desta sociedade dado que a sua profissão era bancário (estando actualmente reformado). 1.78. Por sua vez, a 1ª Requerida sempre foi dona de casa, nunca tendo exercido qualquer actividade profissional. 1.79. A sociedade não deposita os documentos da prestação de contas, nem tem qualquer informação sobre os contactos – cf. documentos nºs 16 e 17). 1.80. A sociedade requerida não é proprietária de quaisquer outros imóveis em Portugal para além daqueles que lhe foram transmitidos pelo seu próprio sócio e administrador, como resulta dos documentos do IMI juntos com a Contestação da acção principal como doc. nº 11. 1.81. A sociedade requerida, representada pelo primeiro requerido, seu único sócio e administrador, celebrou o contrato de arrendamento junto como documento nº10 com a contestação, através do qual declarou dar de arrendamento um dos imóveis adquiridos aos primeiros requeridos ao filho destes últimos. 1.82. Os primeiros requeridos continuam a ser considerados pelos vizinhos como donos dos imóveis – cf. auto de penhora Maio de 2017. 1.83. Por contrato de compra e venda celebrado em 8/11/2013 em Espanha, o 1º Requerido declarou transmitir parte das participações sociais do capital social da X, SL aos seus filhos J. D., Maria, F. P. e M. I., 500 para cada um, continuando ele próprio sócio com 8000 participações sociais. 1.84. Por contrato de doação, com uma cláusula de reversão a favor do doador e de proibição de alienação ou oneração sem o consentimento do doador, celebrado em 22/6/2015, em Espanha, o 1º Requerido declarou doar as 8000 participações sociais aos seus referidos filhos, designadamente 1300 ao filho J. D., 3000 à filha Maria, 1800 ao filho F. P. e 1900 à filha M. I.. 1.85. Os actos impugnados pelos Requerentes nos autos principais correspondem a dois contratos de compra e venda de bens imóveis celebrados entre os Primeiros e a Segunda Requerida (documentos n.º 6 e 7):
a) Contrato de compra e venda celebrado a 07/11/2012, entre os Primeiros Requeridos e a Segunda Requerida, nas qualidades de vendedores e compradora (respectivamente), tendo por objecto o prédio urbano descrito na Conservatória do Registo Predial de Caminha sob o n.º …/... e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo …, pelo preço de € 100.000,00 (cem mil euros); e
b) Contrato de compra e venda celebrado a 09/05/2013, entre os Primeiros Requeridos e a Segunda R Requerida, nas qualidades de vendedores e compradora (respetivamente), tendo por objeto o prédio urbano descrito na Conservatória do Registo Predial de Caminha sob o n.º …/... e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo …, pelo preço de € 83.500,00 (oitenta e três mil e quinhentos euros). 1.86. Os bens objecto das referidas escrituras tinham, à data, os seguintes valores patrimoniais tributários e encargos registados:
a) Imóvel descrito na Conservatória do Registo Predial de Caminha sob o n.º …/... e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 149:
- Valor patrimonial tributário: € 82.802,88;
- Encargos registados: a) Hipoteca para garantia de empréstimo de € 60.000,00; e b) hipoteca para garantia de € 26.580,89;
b) Imóvel descrito na Conservatória do Registo Predial de Caminha sob o n.º …/... e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo …:
- Valor patrimonial tributário: € 147.678,63
- Encargos registados: a) Hipoteca para garantia de empréstimo de € 65.000,00; e b) hipoteca para garantia de € 26.580,89. 1.87. Um dos encargos registados sobre os dois mencionados imóveis, mais concretamente a “hipoteca para garantia de € 26.580,89”, a que corresponde o montante máximo assegurado de € 29.780,43, tem como beneficiários os aqui Requerentes. 1.88. A Segunda Requerida, na acção executiva a que se refere o artigo 23.º da petição inicial, depositou à ordem dos autos, a título de caução, a quantia de € 127.353,26 a qual foi aceite e considerada idónea sendo que a Segunda Requerida admitiu que, da quantia global depositada de € 127.353,26, € 29.780,43 se deveriam dar por definitivamente entregues, a título de pagamento aos aí exequentes. 1.89. À data, os Primeiros Requeridos eram titulares de quotas na sociedade Segunda Ré, com o valor nominal de € 10.000,00 (dez mil euros). 1.90. Os Primeiros Requeridos eram proprietários de dois bens imóveis, um sito na Calle …, Espanha e outro na Calle … Espanha, (cfr. documentos n.º 8 e 9 da contestação do processo principal - fls. 371 e ss). 1.91. A segunda requerida, na qualidade de senhoria, e representada pelo primeiro requerido outorgou contrato de arrendamento com J. D., versando sobre o imóvel descrito em 1.4. supra, al. b) – cf. fls. 376 e 377 do processo principal. 1.92. O 1º Requerido é actualmente administrador da 2ª Requerida.
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2. E deu como não provados quaisquer outros factos, designadamente da oposição.
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V. Fundamentação de Direito.
1. Nulidade da sentença recorrida com fundamento na al. d) do n.º 1 do art. 615º do CPC.
1.1. Como é sabido, é através da sentença, conhecendo das pretensões das partes – pedido e causa de pedir –, que o juiz diz o direito do caso concreto (arts. 152º, n.º 2 e 607º, ambos do CPC).
Pode, porém, a sentença estar viciada em termos que obstem à eficácia ou validade do pretendido dizer do direito.
Assim, por um lado, nos casos em que ocorra erro no julgamento dos factos e do direito, do que decorrerá como consequência a sua revogação, e, por outro, enquanto ato jurisdicional que é, se atentar contra as regras próprias da sua elaboração e estruturação, ou ainda contra o conteúdo e limites do poder à sombra da qual é decretada, caso este em que se torna, então sim, passível do vício da nulidade nos termos do artigo 615.º do CPC (2).
As nulidades de decisão são, pois, vícios intrínsecos (quanto à estrutura, limites e inteligibilidade) da peça processual que é a própria decisão (trata-se, pois, de um error in procedendo), nada tendo a ver com os erros de julgamento (error in iudicando), seja em matéria de facto, seja em matéria de direito (3).
As causas de nulidade da sentença ou de qualquer decisão (art. 613º, n.º 3 do CPC) são as que vêm taxativamente enumeradas no n.º 1 do art. 615º do CPC.
Nos termos do n.º 1 do art. 615º do CPC, a sentença é nula quando:
«d) O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento».
Como vício de limite, a nulidade de sentença/decisão enunciada na transcrita norma divide-se em dois segmentos, sendo o primeiro atinente à omissão de pronúncia (que é o que releva à situação dos autos) e o segundo relativo ao excesso de pronúncia ou de pronúncia indevida.
Como regra geral, o tribunal deve resolver todas e apenas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação (cfr. art. 608.º, n.º 2, do CPC).
Verifica-se a omissão de pronúncia quando o juiz deixe de conhecer, sem prejudicialidade, de todas as questões que devesse apreciar e cuja apreciação lhe foi colocada (4) (5).
Doutrinária (6) e jurisprudencialmente (7) tem sido entendido de que só há nulidade quando o juiz não se pronuncia sobre verdadeiras questões não prejudicadas invocadas pelas partes, e não perante a argumentação invocada pelas partes. Por questões não se devem considerar as razões ou argumentos apresentados pelas partes, mas sim as pretensões (pedidos), causa de pedir e exceções invocadas e todas as exceções de que oficiosamente lhe cabe conhecer. O que “não significa considerar todos os argumentos que, segundo as várias vias, à partida plausíveis, de solução do pleito, as partes tenham deduzido (…)” (8).
O juiz não tem, por isso, que esgotar a análise da argumentação das partes, mas apenas que apreciar todas as questões que devam ser conhecidas, ponderando os argumentos na medida do necessário e suficiente (9).
Defendem os recorrentes que a sentença recorrida deve ser declarada nula na parte em que não se pronunciou sobre o requerimento probatório apresentado a 31/08/2018 (ref. 29966474), contendo 21 documentos demonstrativos do por si alegado na oposição, sendo certo que o Tribunal, em momento anterior à prolação da mencionada sentença, não emitiu qualquer pronúncia sobre o referido requerimento.
Mais deve a sentença recorrida – nos termos propugnados pelos recorrentes – ser declarada nula na parte em que não apreciou nem decidiu sobre a matéria por si carreada para os autos através do aludido requerimento probatório de 31/08/2018.
Em contraponto, os recorridos pugnam pela não verificação da arguida nulidade da sentença, aduzindo para o efeito que os documentos foram juntos extemporaneamente, além de que o requerimento tardiamente apresentado não se limita à junção de documentos, mas configura um novo articulado (com alegação de vários factos que não foram alegados na oposição), o que é legalmente inadmissível.
Por sua vez, a Mmª Juíza a quo, aquando da prolação do despacho de admissão de recurso, exarou não se verificar a nulidade invocada, tendo decidido manter a decisão recorrida nos seus precisos termos.
A nossa ver, a nulidade da sentença (ou da decisão) é manifesta, uma vez que tendo os requeridos, posteriormente à dedução da oposição, apresentado a 31/08/2018 um requerimento probatório, contendo 21 documentos, a verdade é que o Tribunal recorrido omitiu qualquer pronúncia sobre a sua admissibilidade, nada dizendo se o(s) admitia ou se o(s) indeferia.
Em face da formulação daquele requerimento probatório impunha-se ao tribunal que sobre ele se tivesse pronunciado, quer admitindo-o, quer rejeitando-o (designadamente, por extemporaneidade ou por impertinência dos documentos apresentados). O que não podia era abster-se de sobre ele se pronunciar.
Diga-se, por outro lado, que os argumentos aduzidos pelos recorridos para a não verificação da apontada nulidade da sentença dizem já respeito à inviabilidade da junção de tais documentos, bem como quanto à impropriedade do meio utilizado para a alegação de novos factos, nada dizendo, porém, quanto à inexistência de pronúncia do Tribunal sobre o referido requerimento.
Nesta conformidade, e sem mais considerações por desnecessárias, reconhece-se, nessa parte, a nulidade da decisão recorrida, por omissão de pronúncia [art. 615º, n.º 1, al. d) do CPC], relativamente ao requerimento probatório formulado a 31/08/2018.
Procedendo a nulidade arguida pela ora recorrente, nada obsta a que este Tribunal de recurso, substituindo-se ao tribunal recorrido (art. 665º do CPC), se pronuncie sobre a (in)admissibilidade do requerimento probatório em causa, bem como sobre a (i)licitude da alegação fáctica aduzida naquele requerimento probatório, sendo certo que as partes já tiveram oportunidade de exercer o direito ao contraditório (uma vez que no âmbito das suas alegações já sobre tal questão, ambas, se pronunciaram), mostrando-se, pois, desnecessária qualquer ulterior notificação para esse efeito.
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2. Da admissibilidade do requerimento probatório apresentado a 31/08/2018 (ref. 29966474).
No caso dos autos, a providência cautelar de arresto [do dinheiro (€ 97.572,83) pertencente aos Requeridos e que se encontra depositado à ordem do apenso A] foi, em obediência ao estatuído no art. 393º, n.º 1, do CPC, decretada sem audiência dos requeridos, em 28/06/2018 (cfr. fls. 87 a 99).
Notificados dessa decisão, os requeridos, em 31/07/2018, deduziram tempestivamente oposição, pedindo a revogação do arresto decretado e o consequente levantamento do bem arrestado, sendo que, a título de requerimento probatório, juntaram um documento e arrolaram prova testemunhal (cfr. fls. 104 a 112).
De seguida foi designada data para audiência final, que, inicialmente agendada para 17/08/2018, foi remarcada para o dia 5/09/2018.
Em 31/08/2018, os requeridos apresentaram o supra referido requerimento probatório, tendo explicitado que:
- Aquando da apresentação da oposição, não dispunham de determinados documentos demonstrativos do aí alegado, os quais estavam na posse de entidades bancárias, concretamente do Banco … e do Banco ….
- Tendo solicitado às aludidas entidades a disponibilização daqueles documentos, apenas a 27/08/2018 as entidades bancárias deram resposta completa aos pedidos de informação veiculados pelos Requeridos.
- Os elementos em causa consistem em documentos bancários que demonstram o alegado nos artigos 31.º, 32.º, 33.º e 34.º da oposição e, por consequência, a demais matéria factual alegada naquela peça processual.
- Assim, juntam ao presente articulado 21 documentos, ao abrigo do disposto na última parte do n.º 2 e na primeira parte do n.º 3 do artigo 423.º do CPC, reiterando que a junção aos autos dos referidos documentos não foi possível em momento anterior.
A admissibilidade do referido requerimento probatório pressupõe que entremos em linha de consideração com duas questões distintas, quais sejam:
i) - A tempestividade e/ou pertinência dos meios probatórios apresentados;
ii) - A admissibilidade da alegação da matéria de facto incorporada no referido requerimento, que os requeridos, ao longo do seu arrazoado alegatório, dizem tratar-se de um articulado (cfr. art. 21º do requerimento de fls. 137 e ss).
Iniciaremos a nossa análise pela primeira questão enunciada.
O direito à prova, como tem sido sublinhado, surge como corolário do direito de ação e defesa, consagrado no art. 20.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa (CRP), que garante a todos «o acesso ao direito e aos tribunais para defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos (…)» (10).
O direito de ação ou direito de agir em juízo terá de efetivar-se através de um processo equitativo, que, entre outras manifestações, se traduz na possibilidade de cada uma das partes invocar as razões de facto e de direito, oferecer as suasprovas, controlar as provas da outra parte, pronunciar-se sobre o valor e resultado dessas provas (11).
E se o direito de acesso à justiça comporta, indiscutivelmente, o direito à produção de prova (12), tal não significa, porém, que o direito subjetivo à prova implique a admissão de todos os meios de prova permitidos em direito, em qualquer tipo de processo e relativamente a qualquer objeto do litígio (13), muito embora a recusa de qualquer meio de prova deva ser, devidamente, fundamentada, na lei ou em princípio jurídico, não podendo o Tribunal fazê-lo de modo discricionário.
Ao juiz, enquanto “gestor” ou responsável pela direção do processo incumbe autorizar a realização das diligências que se afigurem necessárias e adequadas e indeferir as que afigurem inúteis ou meramente dilatórias (14).
Ora, situando-nos no âmbito dos procedimentos cautelares, importa não perder de vista que estes visam “acautelar o efeito útil da ação” (art. 2º, n.º 2 do CPC), da qual, exceto se for decretada a inversão do contencioso, são dependentes (art. 364º, n.º 1 do CPC).
É sabido que as providências cautelares têm a sua justificação naquele princípio do nosso sistema processual civil segundo o qual a demora de um processo não deve prejudicar a parte que tem razão (15) ou naquela consideração de que o processo deve dar ao Autor, quando vencedor, a tutela que ele receberia se a decisão fosse proferida no preciso momento da instauração da lide.
As providências cautelares são, assim, o tipo de medidas que são requeridas e decretadas, tendo em vista acautelar o efeito útil da ação (declarativa ou executiva), mediante a composição provisória dos interesses conflituantes, mantendo ou restaurando a situação de facto necessária à eventual realização efetiva do direito.
O procedimento cautelar representa uma luta contra o tempo exigido pela ação principal.
Visto que o processo cautelar se propõe remover o periculum in mora, a sua tramitação há-de ser forçosamente simples e rápida, sob pena de a estrutura estar em flagrante desarmonia com a função(16).
Como notas principais importa (ainda) ter presente que os «procedimentos cautelares revestem sempre caráter urgente, precedendo os respetivos atos qualquer outro serviço judicial não urgente» (art. 363º, n.º 1 do CPC). Daí que os actos que integram estes procedimentos podem ser praticados em férias judiciais, não se suspendendo nesses período os prazo processuais (art. 138º, n.º 1 do CPC).
O caráter urgente do procedimento cautelar impõe uma rápida tramitação, estabelecendo a lei prazos muito curtos para a decisão em 1ª instância (art. 363º, n.º 2 do CPC).
Além de imporem celeridade (e, portanto uma summaria cognitio), os procedimentos cautelares revestem-se de uma estrutura simplificada, não permitindo, em regra, mais do que dois articulados, a que se seguem imediatamente a produção da prova e a decisão.
Atendo-nos ao regime probatório dos procedimentos cautelares, prescreve o art. 365.º, n.º 1 do CPC que, “[c]om a petição, o requerente oferece prova sumária do direito ameaçado e justifica o receio da lesão”.
E o art. 367.º, n.º 1, do CPC prescreve que: “Findo o prazo da oposição, quando o requerido haja sido ouvido, procede-se, quando necessário, à produção das provas requeridas ou oficiosamente determinadas pelo juiz”.
É aplicável ao arresto, por força dos arts. 365º, n.º 3 e 376º, n.º 1 do CPC, o disposto nos arts. 293º a 295º do CPC.
Segundo o n.º 1 do art. 293º do CPC, “[n]o requerimento em que se suscite o incidente e na oposição que lhe for deduzida, devem as partes oferecer o rol de testemunhas e requerer os outros meios de prova”.
Mercê da apontada remissão feita para os arts. 293º a 295º do CPC, torna-se claro que nos procedimentos cautelares todos os meios de prova devem ser oferecidos com a apresentação do requerimento inicial ou de oposição (17).
Assim, a natureza urgente do processo e o objetivo de celeridade prosseguido pelo legislador impõem que esses meios de prova sejam logo oferecidos naquele momento.
O ponto não é, porém, unânime no que respeita à prova documental(18).
Como é sabido, os documentos, como meio de prova que são, devem, igualmente, ser juntos logo com o requerimento inicial ou a oposição, o que se mostra em harmonia com a regra do n.º 1 do art. 423º do CPC [“os documentos destinados a fazer prova dos fundamentos da ação ou da defesa devem ser apresentados com o articulado em que se aleguem os factos correspondentes”].
A jurisprudência maioritária tem, porém, considerado que, embora o momento processual próprio deva ser com o respectivo articulado, nada obsta a que a parte, depois de apresentar o seu articulado, junte aos autos documentos que se considerem necessários para o apuramento dos factos em discussão e a fim de habilitar o juiz a proferir uma decisão conscienciosa, justa e acertada. A parte pode, aliás, estar impossibilitada de juntar o documento em devido tempo. Basta, para tanto, que o documento ainda não exista, o que acontece quando se forma posteriormente ao oferecimento do articulado, ou, então, que a parte não disponha dele quando apresentou o articulado.
Além de que sendo possível nos próprios recursos, quer na Relação, quer no Supremo Tribunal de Justiça, verificado o condicionalismo previsto nos arts. 651º, n.º 1 e 680º, n.º 1, todos do CPC, produzir prova documental, não se compreende que ela não possa ser produzida na primeira instância depois de apresentado o respectivo articulado no procedimento cautelar (19).
Incidindo a nossa atenção sobre a “prova por documentos”, importa ter presente o regime específico do “momento da apresentação” previsto no art. 423º do CPC, que dispõe:
“1 - Os documentos destinados a fazer prova dos fundamentos da acção ou da defesa devem ser apresentados com o articulado em que se aleguem os factos correspondentes.
2- Se não forem juntos com o articulado respectivo, os documentos podem ser apresentados até 20 dias antes da data em que se realize a audiência final, mas a parte é condenada em multa, excepto se provar que os não pôde oferecer com o articulado.
3- Após o limite temporal previsto no número anterior, só são admitidos os documentos cuja apresentação não tenha sido possível até àquele momento, bem como aqueles cuja apresentação se tenha tornado necessária em virtude de ocorrência posterior“.
Resulta do citado normativo que, desde que destinados a fazer prova dos fundamentos da acção ou da defesa, e se não apresentados com o articulado em que se aleguem os factos correspondentes (n.º 1), os documentos podem ainda ser apresentados até 20 dias antes da data em que se realize a audiência final, mas neste caso a parte é condenada em multa, exceto se alegar e provar que não os pôde oferecer com o articulado (n.º 2); por último, podem ser ainda apresentados mesmo para além do limite temporal fixado n.º 2 do artigo 423.º, e até ao encerramento discussão em 1ª instância (art. 425º do CPC), caso a sua apresentação não tenha sido possível até aquele momento, bem comose a referida apresentação se tenha tornado necessária em virtude de ocorrência posterior (n.º 3).
A parte que, neste último caso, pretende a junção de documentos fora dos casos previstos nos nºs 1 e 2 do art. 423º do C.P.C. deve alegar e demonstrar a impossibilidade da sua junção ou que a mesma só naquele momento se tornou necessária em virtude de ocorrência posterior (20). Como explana Elisabeth Fernandez (21), “se faltarem menos de 20 dias para a data em que está designada a audiência de julgamento, a junção é extemporânea e não poderá ser admitida, a não ser que fiquem demonstrados os motivos que objetivamente podem justificar a junção após aquele momento, e que passam pela necessidade da sua junção e pela impossibilidade de junção no momento oportuno”.
Ora, no caso em apreço, não obstante a justificação alegatória apresentada para a apresentação tardia dos referidos documentos, a verdade é que os recorrentes não lograram demonstrar da razão por que não apresentaram os documentos com a apresentação do articulado da oposição, designadamente que só a 27/08/2018 lograram obtê-los das entidades bancárias. Aliás, pretendendo os documentos juntos fazer a demonstração de factos já anteriormente alegados nos autos (designadamente nos artigos 31.º, 32.º, 33.º e 34.º da oposição (22), cuja facticidade se reporta ao ano de 2016), ficamos sem saber em que data os recorridos cuidaram de providenciar pela obtenção de tais documentos junto das entidades bancárias, sendo certo que no articulado da oposição não invocaram qualquer dificuldade ou atraso na obtenção de tais documentos probatórios (o que poderia ter relevo para efeitos da previsão do n.º 4 do art. 7º do CPC), tão pouco tendo naquele articulado protestado juntar os referidos documentos com vista à demonstração da facticidade erigida como fundamentadora da oposição deduzida.
Significa isto que os recorrentes não lograram provar que a não junção dos documentos não foi possível até ao momento temporal a que alude o n.º 2 do art.º 423º do CPC.
Por outro lado, não se vislumbra dos autos qualquer “ocorrência posterior”, suficientemente consistente e atendível, que tornou necessária a apresentação dos mesmos documentos.
Pelo exposto, não se mostrando comprovado o condicionalismo previsto no n.º 3 do art.º 423º do CPC, é de concluir pela extemporaneidade dos documentos cuja junção foi requerida com o requerimento probatório apresentado a 31/08/2018 (ref. 29966474), o que nos reconduz à não admissibilidade dos mesmos.
Passando de imediato à apreciação da segunda questão supra suscitada - admissibilidade da alegação, no requerimento probatório, de (nova) matéria de facto -, dir-se-á que tendo a instrução por objecto os temas da prova enunciados ou, quando não tenha lugar a esta enunciação, os factos necessitados de prova, a (eventual) admissão dos referidos documentos destinar-se-ia tão só a servir de meio probatório tendente à demonstração da matéria fáctica incluída na oposição, e não com vista à demonstração das considerações extemporâneas expendidas pelos requeridos no seu requerimento de fls. 181, datado de 31/08/2018.
Com efeito, no aludido requerimento probatório os requeridos aproveitaram para alegar matéria fáctica nova.
Face a este comportamento processual dir-se-á que tal postura é proibida, porquanto os fundamentos da acção e da defesa devem ser deduzidos nos respectivos articulados, estando vedado às partes socorrer-se dos requerimentos probatórios para alegar factualidade nova. De facto, é legalmente inadmissível à parte aproveitar o requerimento probatório para alegar matéria fáctica que corporiza um aperfeiçoamento ou correcção da matéria factual já alegada na oposição. Sendo esse o objectivo da parte deverá deduzir o competente articulado superveniente, sujeitando-se à apreciação que venha a ser feita pelo tribunal quanto à verificação, ou não, dos respetivos pressupostos legais (23).
Nesta conformidade, na parte em que comporta a alegação de matéria fáctica, sempre seria de considerar não escrita a (nova) matéria fáctica alegada no requerimento probatório em apreço, dada sua ilegalidade.
Assim, quanto ao segundo fundamento de nulidade da sentença – na parte em que a sentença não apreciou, nem decidiu sobre a matéria fáctica carreada para os autos através do requerimento de 31/08/2018 –, inexiste a apontada nulidade, visto aquela matéria fáctica estar excluída da apreciação do tribunal recorrido (24).
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3. Da impugnação da matéria de facto.
3.1. Em sede de recurso, os apelantes impugnaram a decisão sobre a matéria de facto proferida pelo tribunal de 1.ª instância.
Para que o conhecimento da matéria de facto se consuma, deve previamente o recorrente, que impugne a decisão relativa à matéria de facto, cumprir o (triplo) ónus de impugnação a seu cargo, previsto no artigo 640º do CPC, o qual dispõe que:
“1- Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados; b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida; c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
2- No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte:
a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respectiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes; b) Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes. 3 - O disposto nos n.ºs 1 e 2 é aplicável ao caso de o recorrido pretender alargar o âmbito do recurso, nos termos do n.º 2 do artigo 636.º.».
Aplicando tais critérios ao caso, constata-se que os recorrentes indicam quais os factos que pretendem que sejam decididos de modo diverso, inferindo-se por contraponto a redação que deve ser dada (da modificação dos factos provados para não provados, dos não provados para provados, bem como da resposta restritiva a alguns dos factos provados), como ainda o(s) meio(s) probatório(s) que na sua ótica o impõe(m), pelo que podemos concluir que cumpriram suficientemente o ónus estabelecido no citado artigo 640.º.
Assim, no caso sub júdice, o presente Tribunal pode proceder à reapreciação da matéria de facto impugnada, uma vez que, baseando-se a impugnação deduzida unicamente na prova documental carreada aos autos, dispõe dos elementos de prova que serviram de base à decisão sobre os factos em causa.
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3.2. Sob a epígrafe “Modificabilidade da decisão de facto”, preceitua o artigo 662.º, n.º 1 do CPC, que «a Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa».
Os recursos da matéria de facto podem envolver objetivos diversificados:
- Alteração da decisão da matéria de facto, considerando provados factos que o tribunal a quo considerou não provados, e vice-versa, a partir da reapreciação dos meios de prova ou quando os elementos constantes do processo impuserem decisão diversa (no caso de ter sido apresentado documento autêntico, com força probatória plena, para prova de determinado facto ou confissão relevante) ou em resultado da apreciação de documento novo superveniente (art. 662º, n.º 1 do CPC);
- Apreciação de patologias que a decisão da matéria de facto enferma, que, não correspondendo verdadeiramente a erros de apreciação ou de julgamento, se traduzam em segmentos total ou parcialmente deficientes, obscuros ou contraditórios (art. 662º, n.º 2, al. c) do CPC);
- Ampliação da matéria de facto, por ter sido omitida dos temas da prova matéria de facto alegada pelas partes que se revele essencial para a resolução do litígio (art. 662º, n.º 2, al. c) do CPC);
O âmbito da apreciação do Tribunal da Relação, em sede de impugnação da matéria de facto, estabelece-se, resumidamente, de acordo com os seguintes parâmetros (25):
- só tem que se pronunciar sobre a matéria de facto impugnada pelo recorrente;
- sobre essa matéria de facto impugnada, tem que realizar um novo julgamento; e,
- nesse novo julgamento forma a sua convicção de uma forma autónoma, de acordo com o princípio da livre apreciação das provas, mediante a reapreciação de todos os elementos probatórios que se mostrem acessíveis (e não apenas os indicados pelas partes).
- a reapreciação da matéria de facto por parte da Relação tem que ter a mesma amplitude que o julgamento de primeira instância.
- a intervenção da Relação não se pode limitar à correção de erros manifestos de reapreciação da matéria de facto, sendo também insuficiente a menção a eventuais dificuldades decorrentes dos princípios da imediação, da oralidade e da livre apreciação das provas.
- ao reapreciar a prova, valorando-a de acordo com o princípio da livre convicção, a que está também sujeita, se conseguir formar, relativamente aos concretos pontos impugnados, uma convicção segura acerca da existência de erro de julgamento da matéria de facto, deve proceder à modificação da decisão.
- se a decisão factual do tribunal da 1ª instância se basear numa livre convicção objetivada numa fundamentação compreensível onde se optou por uma das soluções permitidas pela razão e pelas regras de experiência comum, a fonte de tal convicção - obtida com benefício da imediação e oralidade - apenas poderá ser afastada se ficar demonstrado ser inadmissível a sua utilização pelas mesmas regras da lógica e da experiência comum.
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3.3. Por referência às suas conclusões, extrai-se que os recorrentes pretendem:
i) - A alteração de redação dos seguintes factos: 1.6 [onde se lê “J. B. é o único sócio”, deverá ler-se “J. B. era o único sócio”]; facto 1.45 [onde se lê “(…) de que o 1º Requerido J. B. era, e é, único sócio”, deverá ler-se “(…) de que o 1º Requerido J. B. era único sócio”], facto 1.81 [onde se lê “A sociedade requerida, representado pelo primeiro requerido, seu único sócio e administrador” deverá ler-se “A sociedade requerida, representado pelo primeiro requerido, seu administrador”].
ii) - A alteração da resposta positiva para negativa dos seguintes pontos de facto: 1.89, 1.53 e 1.67.
iii) - A alteração da resposta positiva para negativa dos seguintes factos/excertos: - no facto 1.10 [o excerto “de que M. A. era, por conseguinte, devedora à herança”]; o facto 1.22; no facto 1.32 [o excerto “e por esse motivo foi indicado pelo Conservador do Registo Predial que o montante máximo assegurado para efeitos de registo era de € 29.780,43 (Capital acrescido de juros de três anos)”]; o facto 1.43; no facto 1.50 [o excerto “(por estarmos perante uma sentença ilíquida)”]; no facto 1.75 [o excerto “e um deles continua a ser a morada oficial em Portugal dos 1ºs Requeridos, como resulta do teor do auto de penhora realizada no dia 18 de maio de 2017 (…)”]; no facto 1.60 [o excerto “resulta dos atos das vendas a impossibilidade, para os Requerentes, de obterem a satisfação integral do seu crédito, já que os 1ºs Requeridos – residentes em Espanha – não são proprietários de quaisquer outros bens imóveis em Portugal, para além dos penhorados…”]; o facto 1.66 [quer quanto ao valor do crédito, quer quanto à putativa inexistência de outros bens suscetíveis de penhora”]; o facto 1.77 [“Apesar de formalmente administrador da 2ª requerida o certo é que o 1º Requerido nunca exerceu qualquer atividade através dessa sociedade dado que a sua profissão era bancário (estando atualmente reformado)”].
iv) - A alteração da resposta positiva para negativa dos seguintes facto/excertos: 1.44 [que refere que “foi feita a penhora dos dois únicos imóveis que os 1ºs requeridos tinham em Portugal”]; facto 1.79 [onde se indica que “A sociedade não deposita os documentos da prestação de contas nem tem qualquer informação sobre os contactos”].
v) - O aditamento ao acervo de factos provados dos factos que correspondem ao alegado nos arts. 13.º, 14.º, 16.º, 22.º, 23.º, 24.º, 25.º, 26.º, 27.º, 28.º, 29.º, 31.º, 32.º, 33.º, 34.º, 35.º da oposição (26).
Cumpre, assim, analisar das razões de discordância invocadas pelos apelantes e se as mesmas se apresentam de molde a alterar a facticidade impugnada, nos termos por si invocados.
i) – Da eliminação dos factos provados contraditórios entre si.
A propósito deste segmento da impugnação defendem os recorrentes que o rol dos factos provados na sentença recorrida inclui factos que reciprocamente se contradizem, porquanto do conjunto de factos composto pelos factos 1.6, 1.45, 1.81 e 1.89 resulta que o Tribunal “a quo” deu como provado que o 1.º Recorrente marido era e é único sócio e administrador da 2.ª Recorrente, ao passo que no segundo bloco de factos constituído pelos factos 1.83 e 1.84 considera-se assente que, por atos de 08/11/2013 e 22/06/2015, o 1.º Recorrente alienou a totalidade das suas participações sociais na 2.ª Recorrente, perdendo, portanto, a qualidade de sócio.
Contra-argumentam os recorridos, dizendo inexistir qualquer contradição, até porque foi por ter sido “arguida a simulação absoluta“ dos contratos que titulam “transmissões de participações sociais” (uma compra e venda e uma doação aos próprios filhos dos 1ºs requeridos) é que foi alterada, pelo Tribunal desta Relação, no acórdão de 3/05/2018, que julgou procedente o recurso interposto no apenso A, a redacção dos pontos 1.83 e 1.84 – que refere tão somente as declarações prestadas pelo 1º requeridos nos aludidos contratos –, mais referindo que o “Recorrente J. B. só outorgou estes contratos para, formalmente, deixar de figurar como sócio único da Requerida (que efectivamente continua a ser) para tentar, por essa via, “fugir” à invocada desconsideração da personalidade colectiva, mas continuando a usar, dominar e controlar a sua sociedade como sempre fez (utilizando-a no seu interesse pessoal)”.
Com o devido respeito por opinião contrária, estes argumentos não convencem, sendo certo que a impugnação agora deduzida – quanto aos factos 1.6, 1.45, 1.81 e 1.89 – não foi objecto de decisão expressa no citado acórdão proferido no recurso interposto no apenso A.
Assim, independentemente do que venha a ser (ou já) decidido na acção principal quanto à invocada simulação dos contratos de “transmissões de participações sociais”, certo é que no âmbito deste procedimento cautelar e em face da factualidade dada como demonstrada nos pontos 1.83 e 1.84, sob pena de direta contradição, impõe-se que os factos 1.6, 1.45, 1.81 e 1.89 a ela se ajustem, pois que daquela facticidade resultam comprovados os negócios que titulam as “transmissões de participações sociais”, isto independentemente de eles serem válidos ou não (o que aqui, em sede de decisão da matéria de facto, não cabe averiguar).
Pelo exposto, a fim de obviar à contradição ou ambiguidade entre os aludidos factos provados, é de deferir, nesta parte, a impugnação da matéria de facto, passando os referidos pontos de facto impugnados a valer com a seguinte redacção:
1.6. A 2ª Requerida é uma sociedade comercial de direito espanhol, de que o 1º Réu J. B. era o único sócio e também o único administrador à data em que foi constituída.
1.45. À data em que a penhora foi registada (18.09.2013), os 1ºs Requeridos já tinham operado a transmissão – alteração da titularidade – da propriedade desses dois imóveis para a 2ª Requerida, tendo registado a aquisição a favor desta sociedade que é uma sociedade de direito espanhol, de que o 1º Requerido J. B. era o único sócio e administrador/gerente.
1.81. A sociedade requerida, representada pelo primeiro requerido, seu administrador, celebrou o contrato de arrendamento junto como documento nº 10 com a contestação, através do qual declarou dar de arrendamento um dos imóveis adquiridos aos primeiros requeridos ao filho destes últimos.
Consequentemente, o facto 1.89 deverá ser dado como não provado, na medida em que, por referência à data da efectivação do depósito (17/06/2016), a título de caução, da quantia de € 127.353,26, na acção executiva a que se refere o artigo 23.º da petição inicial, o 1º requerido já havia outorgado nos contratos de transmissão de participações sociais aduzidos nos pontos 1.83 e 1.84 dos factos provados.
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ii) – Dos factos indevidamente qualificados como provados
Quanto a este segmento da impugnação os recorrentes erigem para tanto três fundamentos distintos:
a) - Foram indevidamente incluídos no elenco de factos provados factos sobre os quais não foi produzida qualquer prova atendível (pertencendo o ónus da respetiva prova aos ora Recorridos) e que foram especificamente impugnados pelos Recorrentes na sua oposição (factos 1.10, 1.22, 1.32, 1.43, 1.50, 1.75, 1.60, 1.66 e 1.77). b) - Os factos 1.53 e 1.67 são conclusivos ou contêm somente opiniões pessoais dos Recorridos, que foram especificamente impugnados pelos ora Recorrentes, não tendo sido produzida prova que confirmasse a sua veracidade. c) - Foram dados como provados factos que se resultam especificamente infirmados por prova documental constante dos autos (factos 1.44 e 1.79).
Antes de iniciarmos a análise circunstanciada de cada um dos factos impugnados afigura-se-nos relevante ter presente em que termos se processa o contraditório subsequente ao decretamento da providência.
Assim, segundo o art. 372º do CPC:
«1 - Quando o requerido não tiver sido ouvido antes do decretamento da providência, é-lhe lícito, em alternativa, na sequência da notificação prevista no n.º 6 do artigo 366.º: a) Recorrer, nos termos gerais, do despacho que a decretou, quando entenda que, face aos elementos apurados, ela não devia ter sido deferida; b) Deduzir oposição, quando pretenda alegar factos ou produzir meios de prova não tidos em conta pelo tribunal e que possam afastar os fundamentos da providência ou determinem a sua redução, aplicando-se, com as adaptações necessárias, o disposto nos artigos 367.º e 368.º. (…)».
Conforme resulta do citado normativo, sendo o contraditório exercitado subsequentemente ao decretamento da providência – o que sucederá quando o requerido não tiver sido ouvido com anterioridade relativamente ao decretamento da providência, como é o caso dos autos– é lícito ao recorrido, em alternativa, após a notificação da decisão que haja ordenado a providência prevista no art. 366º, n.º 6 do CPC: a) recorrer, nos termos gerais, dessa decisão, quando, face aos elementos apurados, entenda que ela não devia ter sido deferida; b) deduzir oposição, quando pretenda alegar os factos e/ou apresentar meios de prova que visem colidir com os fundamentos utilizados pelo Tribunal para o decretamento da providência, com vista a conseguir a remoção ou a modificação/redução da decisão cautelar.
Pela via da oposição à providencia cautelar, o requerido procurará alterar a decisão anteriormente proferida pelo julgador, carreando para os autos novos elementos factuais (impeditivos, modificativos ou extintivos do direito sumariamente invocado pelo requerente) e/ou outros meios probatórios que eram desconhecidos do tribunal aquando do acolhimento da providência (27).
Sem prejuízo de uma valoração global dos meios de prova produzidos na primeira fase (antes do decretamento da providência) e no âmbito da oposição, o objectivo fundamental deste meio de defesa não é o de proceder à reponderação dos primeiros, actividade que mais se ajusta ao recurso da decisão em cujo âmbito se inscreva a reapreciação do julgamento sobre a matéria de facto.
Se, porventura, a prova produzida e registada nos autos e os demais elementos probatórios que constavam dos autos no momento em que o tribunal proferiu a decisão permitiam uma conclusão diversa daquela, quer no que respeita aos factos dados como provados, quer quanto às respectivas consequências jurídicas, o meio de defesa adequado, em qualquer dessas situações, não será a dedução de oposição, mas sim a interposição de recurso, abarcando a discussão da matéria de facto e/ou de matéria de direito. Isto porque, como se disse, a oposição pressupõe sempre a alegação de novos factos ou de novos meios de prova não considerados pelo tribunal no primeiro momento que decretou a providência e que tenham a virtualidade de, uma vez provados, determinarem o afastamento ou a redução daquela providência (28).
Feitas estas (breves) considerações quanto aos limites e fundamentos da oposição, afigura-se-nos desde logo que o primeiro fundamento de impugnação da matéria de facto não se ajusta aos fundamentos da oposição, visto não se conexionar com a apresentação de novos meios de prova, nem com a alegação de novos factos não incluídos na versão unilateral do requerente, posto que o meio adequado para reagir a tal suposto erro de julgamento seria a dedução do competente recurso. De facto, estando em causa factos que foram dados como provados logo no primeiro momento do decretamento da providência, não se ajusta à dedução da oposição a alegação de que tais factos deveriam ter sido dado como não provados por falta de prova atendível – tendo os recorrentes optado por enveredar pela dedução de oposição como meio de reagirem ao arresto decretado, tinham mais era de aduzir outros meios de prova que infirmassem aqueles factos –, além de que a mera impugnação daqueles factos feita em sede de oposição não deixa de redundar num ato inócuo, uma vez que competia aos requeridos alegar factos novos que, uma vez provados, permitissem afastar os factos alegados pelos requerentes.
Sem embargo do que antecede sempre se dirá que:
- facto 1.10 – resulta documentalmente provado pelos mapas informativos da partilha e mapa de partilha do processo de inventário, juntos com a PI da acção principal como docs. n.ºs 2 e 3 (ref.ª 23210960), sendo que a partilha foi homologada por sentença transitada em julgado [(doc. nº 4 junto com a PI da acção principal e documento nº 1 junto com o articulado superveniente apresentado na acção principal em 25/10/2017 - (ref.ª 27145122)], e, ainda, pela certidão do processo de inventário junta aos autos da acção principal em 11.07.2018 (ref.ª 29687119).
Facto 1.22 – resulta provado pelos mesmos documentos referidos no item impugnado antecedente, sendo que a dedução do valor que viesse a ser recebido na acção executiva pendente sob o nº 992/13.0YYPRT é uma decorrência que se impõe, porquanto as tornas foram calculadas também com base no crédito reclamado nessa acção executiva.
Facto 1.32 – está documentalmente provado, mais concretamente tendo por referência as informações do registo predial (docs. nºs 14 e 15 com a PI da acção principal - ref.ª 23252910) e o teor do acórdão de 7/07/2016 proferido pelo Tribunal da Relação do Porto, no apenso de oposição à penhora deduzido pela 2ª Requerida, junto com a PI da acção principal como doc. nº 25 - ref.ª 23253801.
Facto 1.43 – secundando o referido pelos recorridos, o valor do crédito dos Recorridos sobre os Recorrentes está provado por documentos, designadamente do mapa informativo de partilha, do mapa de partilha, da relação de bens, da sentença homologatória da partilha e da informação sobre o seu trânsito em julgado e da nota de liquidação da agente de execução elaborada na execução nº 992/13.0YYPRT (documentos juntos com a PI da acção principal, sob os nºs 2, 3, 4, 18, 19, 20 e docs. nºs 1 e 2 juntos com o articulado superveniente na acção principal).
Tendo, porém, presente o alegado no requerimento inicial do procedimento cautelar (arts. 104º a 107º), em que foi já imputada a entrega por conta, na execução, do valor de 23.603,50€, impõe-se introduzir uma correcção ao referido ponto fáctico, sendo que a decisão recorrida limitou-se a dar por integralmente reproduzida a facticidade consolidada no acórdão desta Relação de 3/05/2018, proferido no apenso A, sem (sequer) atender àquela nova alegação fáctica.
Assim, altera-se o referido ponto fáctico, que passará a valer com a seguinte formulação:
1.43. O crédito global dos Requerentes sobre os Requeridos, em 27.06.2017, era de € 429.637,58, que corresponde à soma das seguintes importâncias:
(i) 37.842,76 (€ 189.592,87 - € 128.008,53 - 23.603,50€,)
(ii) € 329.122,49 (tornas devidas à 1ª Requerente)
(iii) € 54.838,28 (tornas devidas aos filhos do inventariado e aos herdeiros da filha M. J., entretanto falecida: € 7.834,04 x 7);
(iv) € 7.834,05 (tornas devidas às netas do inventariado, filhas da filha pré-falecida M. G.: € 1.566,81 x 5),
Facto nº 1.50 – perfilhando mais uma vez o explicitado pelos recorridos, entendemos ser de manter a resposta conferida pelo tribunal recorrido, pois que «a sentença era ilíquida porquanto condenou os Réus (aqui Recorrentes) a pagarem a quantia devida aos herdeiros (aqui Recorridos) “que viesse a ser liquidada em execução de sentença, acrescida das quantias de juros às sucessivas taxas legais até integral pagamento”».
É, por isso de manter inalterado o excerto impugnado (“por estarmos perante uma sentença ilíquida”).
- Facto 1.75 – resulta documentalmente provado, tendo por base o teor do auto de penhora realizado no dia 18 de Maio de 2017, no âmbito de uma execução para pagamento de custas de parte instaurada por alguns dos aqui Requerentes contra os 1ºs Requeridos [junto como documento nº 10 do Arresto que constitui o apenso A) – ref. ª: 26252996], no qual o agente de execução atestou: “Consigna-se contudo que antes de avançar com o arrombamento foi possível falar pessoalmente com a vizinha, de nome Dra. M. S., residente no n.º 4 da mesma Rua, cuja casa confina diretamente com a dos executados, tendo esta confirmado tratar-se da casa onde os executados J. B. e mulher M. A. habitualmente residem quando se encontram em Portugal”.
E, como se refere na decisão recorrida, tal factualidade resulta igualmente comprovada da pesquisa feita naquela execução (docs. nº14 e 15).
- Facto 1.60 – Relativamente a parte do excerto impugnado – “resulta dos actos das vendas a impossibilidade, para os Requerentes, de obterem a satisfação integral do seu crédito” –, temos de admitir que o mesmo comporta matéria manifestamente conclusiva.
Dispõe a esse respeito o art 607.º, n.º 4, do CPC que, na fundamentação da sentença, o juiz tomará «em consideração os factos admitidos por acordo, provados por documentos ou por confissão reduzida a escrito, compatibilizando toda a matéria de facto adquirida e extraindo dos factos apurados as presunções impostas pela lei ou por regras de experiência».
No âmbito do anterior regime do Código de Processo Civil, o art. 646.º, n.º 4, previa, ainda, que têm-se «por não escritas as respostas do tribunal colectivo sobre questões de direito e bem assim as dadas sobre factos que só possam ser provados por documentos ou que estejam plenamente provados, quer por documento, quer por acordo ou confissão das partes».
Muito embora esta norma tenha deixado de figurar expressamente na lei processual vigente, na medida em que, por imperativo do disposto no art. 607.º, n.º 4, do CPC, devem constar da fundamentação (de facto) da sentença os factos julgados provados e não provados, deve expurgar-se da matéria de facto a matéria susceptível de ser qualificada como questão de direito, conceito que, como vem sendo pacificamente aceite, engloba, por analogia, os juízos de valor ou conclusivos (29).
Com efeito, conforme é entendimento pacífico da jurisprudência dos tribunais superiores, mormente do Supremo Tribunal de Justiça, os juízos conclusivos ou de valor não retratam ocorrências da vida real, quer internas, quer externas, mas sim o efeito e consequência dessas mesmas ocorrências, conclusões essas que cabe ao julgador extrair na prolação da sentença, dos factos dados como provados. Trata-se de matéria que não se cinge ao elencar do facto, mas tem em si, explicita ou implicitamente, considerações valorativas sobre esse facto, ou seja, apreciações que ultrapassam a objetividade do facto e trazem consigo a subjetividade da análise valorativa de uma determinada ocorrência da vida real. Dito de outro modo, só os factos materiais são susceptíveis de prova e, como tal, podem considerar-se provados. As conclusões, envolvam elas juízos valorativos ou um juízo jurídico, devem decorrer dos factos provados, não podendo elas mesmas serem objecto de prova (30).
O que significa que, quando tal não tenha sido observado pelo tribunal “a quo” e este se tenha pronunciado sobre afirmações conclusivas, considerando-as provadas ou não provadas, deve tal pronúncia ter-se por não escrita (31).
Feitas estes considerandos torna-se evidente que parte do excerto impugnado encerra inequivocamente matéria de índole conclusiva e/ou subjetiva, pelo que o mesmo nunca poderia ter sido dado como provado. Com efeito, estando em discussão nos autos saber a situação económica dos requeridos e da eventual prática de actos corporizadores do propósito de dissipação ou ocultação de bens, de modo a eximirem o seu património à ação dos credores, a referida alegação não poderia ser dada como provada, na medida em que encerra em si a resolução dum concreto requisito legal ou normativo, que é objecto da providência cautelar requerida. Essa alegação comporta um juízo de valor de natureza conclusivo e é portadora de valoração jurídica que permita reportá-la ao thema decidendum, contendo a resolução da questão controvertida, pelo que se conclui pela inviabilidade da inserção desse ponto na matéria de facto provada. Saber se dos actos das vendas dos dois imóveis a favor da ora 2ª requerida resulta “a impossibilidade, para os Requerentes, de obterem a satisfação integral do seu crédito”será (quando muito) conclusão a extrair na sentença dos factos materiais, concretos e precisos alegados e provados. Esse juízo conclusivo apenas poderia ser formulado na sentença a jusante, aquando da apreciação crítica da matéria de facto provada, pelo que o mesmo sempre seria de excluir do elenco factual a considerar.
Acresce que, mercê das transmissões da propriedade dos dois imóveis para a 2ª Requerida, em data anterior à do registo da penhora (18.09.2013) – cfr. ponto 1.45 dos factos provados –, ainda que tais transmissões tenham sido impugnadas no âmbito da ação principal, o certo é que não poderá dar-se como adquirido que tais bens ainda pertençam aos 1ºs requeridos.
Pelo exposto, altera-se o referido ponto fáctico, passando a valer com a seguinte formulação:
1.60. O Tribunal da Relação do Porto decidiu que os prédios hipotecados e penhorados só respondem pelo valor de € 29.780,43 – o que foi confirmado pelo STJ –, sendo que os 1ºs Requeridos – residentes em Espanha – não são proprietários de quaisquer outros bens imóveis em Portugal, nem saldos bancários, nem rendimentos (seja de que natureza for).
- Facto 1.66 – A referida materialidade resulta provada tendo em conta os mesmos meios probatórios que serviram de base à demonstração dos pontos fácticos 1.10 a 1.22, 1.26, 1.32, 1.33, 1,36, 1.37, 1.39 a 1.43, 1.44, 1.45, 1.46, 1.60, 1.61, 1.62, com os quais estão conexionados.
Impõe-se, unicamente, nos termos do art. 249º do Cód. Civil, uma retificação do lapso de escrita cometido, pois onde consta penhor deverá ler-se penhora – o que resulta do próprio contexto da declaração –, passando a valer com a seguinte redacção:
1.66. Considerando o valor do crédito dos Requerentes, quer o reclamado nessa acção executiva, na qual irão receber apenas € 29.780,43 (sendo que não existem quaisquer outros bens susceptíveis de penhora), quer o devido a título de tornas e, bem assim, o valor do crédito do Caixa ... garantido por hipoteca voluntária (que goza de preferência), ainda que seja julgada procedente a impugnação pauliana, o valor dos imóveis “vendidos” será insuficiente para garantir a satisfação do crédito dos Requerentes.
- Facto 1.77 – tratando-se de facto provado na decisão proferida em 28/06/2018 que decretou a providência cautelar de arresto (e que já havia sido provado no âmbito do procedimento cautelar de arresto decretado no apenso A), contrariamente ao propugnado pelos recorrentes, entendemos que não tinha o Tribunal, em sede de oposição, de produzir novamente prova demonstrativa da redacção adotada. Competia, sim, aos recorrentes produzir outros meios de prova que infirmassem ou contrariassem aquela alegação fáctica, sendo certo que estes não demonstraram ter cumprido esse ónus probatório.
Improcede, por isso, a impugnação em apreço.
- Facto 1.53 – a referida facticidade limita-se unicamente a reproduzir o que foi alegado pelos recorridos na contestação da oposição à penhora deduzida pela X no âmbito da acção executiva n.º 992/13.0YYPRT, inexistindo razões para a sua exclusão do acervo dos factos provados (sem embargo, reconhece-se, da reprodução daquela alegação ser inócua para a decisão da causa).
- Facto 1.67 – A referida materialidade resulta provada tendo em conta os mesmos meios probatórios que serviram de base à demonstração dos pontos fácticos 1.10 a 1.28, 1.32, 1.33, 1.35 a 1.37, 1.39 a 1.46, 1.60 e 1.62, com os quais estão conexionados, acrescentando-se que os recorrentes não carrearam aos autos qualquer novo meio de prova que impusesse diferente decisão sobre estes concretos pontos da matéria de facto.
- Facto 1.44 – conforme resulta incontroversamente dos pontos fácticos 1.26 a 1.31, 1.33, 1.35 a 1.37 e 1.45 a 1.48 (documentalmente provados), os Recorridos registaram hipoteca judicial sobre os dois únicos imóveis de que os Recorrentes M. A. e J. B. eram, então, titulares em Portugal (após ser proferido acórdão condenatório pelo STJ) e, posteriormente, requereram a sua penhora na execução de sentença (proc. nº 992/13.0YYPRT), tendo esses bens sido penhorados à ordem da execução; considerando, todavia, que entre a data da decisão de condenação na acção declarativa e a data em que foi realizada a penhora na execução da sentença os devedores declararam “vender” esses dois imóveis (onerados com a hipoteca judicial), feita a penhora verificou-se que os dois prédios estavam já registados a favor da adquirente – X, SL –, pelo que os recorridos promoveram a habilitação desta, como adquirente dos prédios hipotecados, para contra ela prosseguir a execução, de modo a poderem (enquanto exequentes) valer-se da garantia, dado que as compras e vendas dos dois imóveis onerados com hipoteca judicial eram inoponíveis aos credores hipotecários e ineficazes quanto ao prosseguimento da acção executiva.
Assim, tendo tais imóveis sido transmitidos pelos 1ºs requeridos à 2ª requerida, que procedeu à sua inscrição no registo, e não obstante a impugnação de tais transmissões ser objeto de discussão no âmbito da ação principal, ao nível deste procedimento cautelar impõe-se a alteração do ponto fáctico em apreço, pois que não pode dar-se como seguro ou assente que à data da efectivação da penhora os referidos imóveis ainda faziam parte da esfera patrimonial dos 1ºs requeridos.
Nesta conformidade, altera-se o referido ponto fáctico, nos termos seguintes:
1.44. No âmbito da acção executiva acima identificada (instaurada para cobrança coerciva de parte dos créditos dos Requerentes sobre os Requeridos (Proc. nº 992/13.0YYPRT), foi feita a penhora dos dois imóveis que os 1ºs Requeridos haviam declarado vender à 2º requerida e sobre os quais incidia a hipoteca judicial.
- Facto 1.79 – a manutenção da referida materialidade fáctica foi objecto de expressa confirmação por esta Relação, no acórdão de 3/05/2018, prolatado no recurso de apelação interposto no apenso A.
Acontece, porém, que os recorrentes aludem aos documentos que acompanharam o requerimento por si apresentado nos autos principais a 04/07/2018 (ref. 29626067), em especial dos documentos 2, 3, 4 e 5.
Embora a junção de tais documentos nos autos principais tenha aí sido considerada extemporânea, dessa decisão foi interposto o competente recurso (ainda pendente).
Certo é que, para efeitos dos presentes autos de procedimento cautelar, estando apenas em causa a tempestividade da apresentação de tais documentos, nada obstava à sua atendibilidade, visto terem sido juntos aos autos antes mesmo da dedução da oposição.
Os supra mencionados documentos (n.ºs 2, 3, 4 e 5) consubstanciam quatro Modelos 200 da Segunda Ré, referentes aos exercícios de 2013, 2014, 2015 e 2016, bem como a informação da respectiva apresentação de tais declarações, para efeitos de impostos sobre as sociedades, junto da autoridade (“agências”) Tributária.
Tais documentos, todavia, apenas comprovam que, relativamente aos indicados anos, a 2ª Ré apresentou as declarações fiscais junto da Autoridade Tributária; deles não se infere, porém, que a referida sociedade tenha registado as suas contas, nem que tenha informação sobre os contactos. Ou seja, aqueles documentos não são por si só suficientes para abalar as informações fundadas nos documentos juntos sob os nºs 16 e 17 com o requerimento inicial do arresto objecto do apenso A (ref.ª 26252996), que correspondem a informações prestadas pela Info…., sendo que no documento nº 16 é indicado que as contas anuais da sociedade Recorrente (X, SL) não foram depositadas no “Registro Mercantil” (leia-se registo comercial) e no documento nº 17 refere, a propósito dos números de telefone e direcções/endereços, que a referida sociedade não tem informação de telefones disponíveis.
Donde se concluiu que os novos meios de prova invocados pelos recorrentes não possuem a virtualidade probatória para fundar a alteração do ponto fáctico impugnado.
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iii) – Dos factos a aditar ao elenco dos factos provados.
Analisado o (extenso) elenco dos factos cujo aditamento/ampliação é pretendida desde logo se dirá serem de excluir os indicados sob os n.ºs 1.98, 1.99 e 1.108, visto os mesmos corresponderem exclusivamente a juízos de valor conclusivos ou de direito, estando excluída a sua inclusão no rol dos fundamentos de facto nos termos já anteriormente explicitados.
Quanto aos demais, importará ter presente que os recorrentes fundavam a demonstração de tais factos nos documentos juntos com o requerimento probatório apresentado em 31/08/2018, o qual foi julgado extemporâneo, por não ter sido feita prova de que os apresentantes só lograram obter tais documentos após o decurso do limite temporal previsto no n.º 2 do art. 423º do CPC.
Restam, por conseguinte, os documentos juntos com a oposição, designadamente a cópia de escritura pública (cfr. fls. 112 v.º a 127), que titula a venda, pela 2ª requerida, em 10/10/2016, de um imóvel, sito em …, Espanha, pelo preço global de € 175.000,00€, aí se mencionando que recebeu desse preço a quantia de 146.200,05€, através de dois cheques bancários, titulando um deles o valor de 42.520,79€ e outro de 103.679,26€.
Esse documento é manifestamente insuficiente à demonstração da matéria fáctica que os recorrentes pretendem ver aditada à matéria de facto provada.
Mas mesmo que atendêssemos ao teor dos documentos apresentados com o requerimento probatório apresentado em 31/08/2018 – o que se concebe para efeitos meramente argumentativos, dado a pretendida junção não ter sido admitida –, sempre se diria que o fluxo ou movimento de dinheiro que deles se extrai não permitiria concluir, por um lado, que o dinheiro da caução depositado no proc. nº 992/13.0YYPRT pertence à 2ª Requerida, e não aos 1ºs Requeridos, nem, por outro lado, que os 1ºs requeridos intervieram como meros intermediários, disponibilizando a sua conta para a realização de tais transferências sob a justificação de daí não advir qualquer custo, ao contrário do que sucederia se as transferências tivessem sido feitas diretamente da conta da 2ª requerida em Espanha para a conta da 2ª requerida em Portugal, nem tão pouco que a 2ª requerida obteve empréstimos, de mutuários (que não dos 1ºs requeridos), no valor global de 97.000,00€.
Ou seja, afora a demonstração da venda de um imóvel da 2ª requerida, realizada em data posterior à da prestação da caução em nome da sociedade, e do reconhecimento feito pelos recorrentes de que a própria sociedade (representada pelo co-requerido J. B.) não tinha disponibilidade imediata de tesouraria para pagar a totalidade caução (cfr. arts. 31º da oposição), a verdade é que os elementos probatórios carreados aos autos não permitem concluir pela prova de alegados empréstimos a terceiros a que a sociedade diz ter recorrido a fim de lograr obter o montante necessário à prestação da caução.
Assim, à míngua de outros elementos probatórios, que não foram sequer invocados, resta concluir pela improcedência da impugnação deduzida relativamente ao supra enunciado item em apreço, sem prejuízo de se dever dar como provado que:
1.93 A 10/10/2016, a 2ª Requerida vendeu um imóvel em Espanha, de que era proprietária.
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3.4. Ampliação do recurso sobre a matéria de facto (art. 636º, n.º 2 do CPC).
Os recorridos, a título subsidiário, impugnaram a decisão proferida sobre a matéria de facto, requerendo que sejam aditados aos factos provados os que alegaram no requerimento inicial da providência de arresto e que indicaram nas contra-alegações (1 a 26), prevenindo a hipótese de procedência de alguma questão suscitada pelos Recorrentes, ao abrigo do disposto no art. 636º, nº 2 do C.P.C.
Constata-se, efetivamente, que, não obstante os recorridos terem alegado, neste 2º procedimento cautelar (que tem por objecto apenas o arresto da quantia em dinheiro), outros pontos fácticos diversos dos alegados no 1º procedimento cautelar, que deu origem ao apenso A, a verdade é que a Mmª Juíza “a quo”, optando por dar como reproduzidos (apenas) os factos considerados provados em função da sua fixação por esta Relação no Acórdão proferido no âmbito do apenso A, omitiu total pronúncia quanto a estes factos novos, que não haviam sido alegados – nem considerados – naquele 1º procedimento cautelar.
Vejamos, especificadamente, cada um dos factos cujo aditamento é reclamado pelos recorridos.
Ponto 1) – a referida materialidade extrai-se da procuração junta ao incidente de prestação de caução [doc. nº 4 junto com o articulado superveniente na acção principal em 25/10/2017 - (ref.ª 27145122)], pelo que se adita o seguinte ponto:
- No incidente de prestação de caução (apenso F à execução nº 992/13.0YYPRT), a 2ª Requerida foi (igualmente) representada pelos mesmos mandatários dos 1ºs Requeridos (Drs. Pedro, Joana e João).
Ponto 2) – resulta provado por referência ao requerimento apresentado e que veio a dar origem ao apenso “C” à execução [documento junto com o articulado superveniente na acção principal como doc. nº 10 - (ref.ª 27145122)], pelo que dá-se como provado que:
- Numa fase inicial do processo executivo (Proc nº 992/13), foram os próprios 1ºs Requeridos que ofereceram a prestação de caução a fim de obter a suspensão da execução.
Ponto 3) – resulta provado tendo por base o mesmo documento mencionado no ponto antecedente [documento junto com o articulado superveniente na acção principal como doc. nº 10 - (ref.ª 27145122)], dando-se, assim, como provado que:
- Essa caução tinha como pressuposto a dedução de embargos de executado (que tinham sido apresentados pelos aqui 1ºs Requeridos – e autuados no apenso “B”) e foi oferecida mediante garantia bancária a emitir por um banco espanhol, pelo valor da quantia exequenda.
Ponto 4) – A primeira e a última parte do ponto em apreço são conclusivos ou representam meras conjecturas, pelo que é de excluir a sua inclusão nos factos provados.
Assim, tendo como suporte os documentos nºs 11 e 12 juntos com o articulado superveniente apresentado na acção principal em 25/10/2017 (ref.ª 27145122), deverá dar-se apenas como provado que:
- Os embargos à execução deduzidos pelos executados (aqui 1ºs Requeridos) foram julgados improcedentes por decisão transitada em julgado.
Ponto 5) – Excluindo a conotação subjectiva utilizada (“laconicamente”), a referida facticidade resulta provada por se mostrar estribada no documento nº 10 junto com o articulado superveniente na acção principal [ref.ª 27145122], impondo-se que se dê como provado que;
- No requerimento inicial (do apenso C à execução nº 992/13) ofereceram a caução, referindo que pretendiam caucionar a quantia exequenda, mas requerendo que fosse fixado “o valor a caucionar” e afirmando que a mesma seria prestada através de garantia bancária a emitir por banco espanhol que não identificaram.
Ponto 6) – resulta provado por força do documento nº 13 junto com o articulado superveniente apresentado na acção principal (ref.ª 27145122), dando-se, assim, como provado que:
- Foi então proferido despacho que determinou que viessem indicar o valor (certo) da caução que pretendiam prestar e identificar, em concreto, o banco prestador da garantia.
Ponto 7) – Excluindo as considerações puramente subjectivas ou opinativas (“insólito”), resulta provado tendo por base o requerimento junto com o articulado superveniente apresentado na acção principal como doc. nº 14 (ref.ª 27145122), pelo que dá-se como provado que:
- Notificados desse despacho, os 1ºs Requeridos vieram dizer que a garantia bancária a prestar era muito onerosa e ofereceram, em sua substituição, a constituição de hipoteca sobre um dos prédios penhorados à ordem da execução.
Ponto 8) – Resulta provado da conjugação do documento nº 14 junto com o articulado superveniente apresentado na acção principal (ref.ª 27145122) com os documentosnºs 14 e 15 juntos com a p.i. da acção principal (ref.ª 23252910), e que se mostra espelhado no ponto fáctico 1.45.
Dá-se assim como provado que:
- Este requerimento foi apresentado no dia 23 de Julho de 2014, numa data em que os imóveis penhorados já estavam registados em nome da sociedade 2ª Requerida.
Ponto 9) – Resulta provado por se mostrar estribado no documento nº 14 junto com o articulado superveniente apresentado na acção principal (ref.ª 27145122), ficando provado que:
- Os 1ºs Requeridos ofereceram como caução uma hipoteca sobre o prédio urbano que constitui a verba nº 1 dos autos de penhora dos autos de execução principais, referindo que seria a sociedade 2ª requerida a constituir a hipoteca.
Ponto 10) – A mera reprodução do requerimento no qual foi oferecida como caução a hipoteca afigura-se-nos irrelevante para a sorte do procedimento cautelar, segundo as várias soluções plausíveis da questão de direito, motivo por que se indefere o aditamento do referido ponto fáctico.
Ponto 11) – está provado, porquanto se alicerça no doc. nº 15 junto com o articulado superveniente na acção principal (ref.ª 27145122), razão por que se adita a seguinte factualidade:
- Em face do requerimento de alteração ao pedido de prestação de caução (que já não seria prestada por garantia bancária, mas por hipoteca sobre bem imóvel), o Tribunal notificou os Requerentes (aqui 1ºs Requeridos) para juntarem aos autos certidão do registo provisório de hipoteca.
Ponto 12) – mostra-se provado em conformidade com o doc. nº 16 junto com o articulado superveniente na acção principal (ref.ª 27145122), pelo que se dá como provado que:
- Por requerimento expedido a juízo a 23.09.2014, os 1ºs Réus juntaram certidão do registo predial, mas sem o registo provisório de hipoteca.
Ponto 13) – resulta provado em função do doc. nº 17 junto com o articulado superveniente na acção principal (ref.ª 27145122), dando-se como provado que:
- Foi proferido novo despacho a determinar que se aguardasse que os mesmos (aqui 1ºs Requeridos) cumprissem o anterior despacho e juntassem aos autos o registo provisório de hipoteca.
Ponto 14) – está provado com base no doc. n.º 18 junto com o articulado superveniente na acção principal (ref.ª 27145122), aditando-se, assim, à matéria de facto o seguinte ponto:
- Os 1ºs Requeridos vieram então requerer a prorrogação do prazo, invocando que o registo teria de ser requerido pela X, SL, sediada em Espanha e que era necessário conferir poderes ao mandatário dos 1ºs Requeridos para “proceder a esse registo em nome e representação” dessa sociedade.
Ponto 15) – resulta provado por força do doc. nº 19 junto com o articulado superveniente na acção principal (ref.ª 27145122), pelo que se dá como provado que:
- Os Requerentes opuseram-se à prorrogação desse prazo para juntar o registo provisório de hipoteca, invocando que esse pedido era “uma manobra manifestamente dilatória”, por não ser “necessária procuração para apresentar o pedido de registo”.
Ponto 16) – está provado por recurso ao doc. nº 20 junto com o articulado superveniente na acção principal (ref.ª 27145122), dando-se como provado que:
- O Tribunal decidiu, por despacho de 23.10.2014, deferir a requerida prorrogação de prazo até 31.10.2014.
Pontos 17) a 21) – a materialidade em causa mostra-se provada com base no doc. nº 21 junto com o articulado superveniente na acção principal (ref.ª 27145122), dando-se como provado que:
- No último dia do prazo concedido pelo Tribunal (em 31.10.2014), os 1ºs Requeridos apresentaram nos autos um requerimento, no qual afirmam que:
“Apesar da prorrogação pedida e concedida, não podem cumprir a junção da certidão de onde consta o registo provisório (…).
Com efeito, não existindo consulado português em Valência, Espanha, a saúde e indisponibilidade por outros afazeres não lhes permitem a deslocação onde exista esse consulado para efeitos de outorga da procuração a conceder os respectivos poderes, designadamente, a mandatário judicial.” Assim, tal registo apenas se poderá realizar no aludido prazo caso seja transformado o da penhora da apresentação 1703 de 2013/09/18 em registo provisório e definitivo de hipoteca. Para o efeito, obtiveram da titular inscrita a autorização para converter esse registo de penhora em registo de hipoteca caso venha a ser considerada idónea a prestação da caução por esse meio. Autorização essa que consta de requerimento a apresentar pela citada titular inscrita”
Requereram que o Tribunal determinasse “que o citado registo de penhora” fosse “convertido em hipoteca, a produzir efeitos quando e se esta vier a ser julgada idónea, para efeitos de prestação da caução dos autos”.
Ponto 22) – resulta provado tendo por base o doc. nº 22 junto com o articulado superveniente na acção principal (ref.ª 27145122), dando-se como provado que:
- Na mesma data em que foi apresentado este requerimento dos 1ºs Requeridos, subscrito pelo Dr. Pedro, o Dr. João apresentou, em nome da 2ª Requerida, X, SL, um requerimento nesses autos de incidente de prestação de caução, a declarar o seguinte: “Caso venha a ser considerada idónea a caução através de hipoteca do prédio inscrito sob o nº 700 na Conservatória do Registo Predial de Caminha, declara que autoriza que a penhora registada sob a apresentação … de 2013/09/18 seja convertida em registo definitivo de hipoteca”.
Ponto 23) – está provado, por estar suportado no doc. nº 23 junto com o articulado superveniente na acção principal (ref.ª 27145122), dando-se como provado que:
- Os Requerentes pronunciaram-se sobre este pedido por requerimento de 06.11.2014, no qual requereram o indeferimento do requerido e a improcedência do incidente de prestação de caução.
Ponto 24) – Segundo as várias soluções plausíveis da questão de direito, é irrelevante a alegação explicitada no referido requerimento de 06.11.2014.
Pontos 25) e 26) – estão documentalmente provados, tendo por referência os docs. nºs 24 e 25 junto com o articulado superveniente na acção principal (ref.ª 27145122), dando-se como provado que:
- Por sentença proferida em 07.11.2014, foi indeferido o incidente de prestação de caução, decisão essa que transitou em julgado.
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Procede, assim, parcialmente a impugnação da matéria de facto deduzida pelos recorridos.
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3.5. Face às alterações introduzidas na decisão relativa à matéria de facto, é a seguinte a factualidade (provada e não provada) a atender para efeito da decisão a proferir (32):
- Factos provados.
1.1. A 1ª Requerente D. Maria foi casada com o Eng. D. V., falecido no dia 30 de Outubro de 1999.
1.2. Para partilha da herança aberta por óbito do referido Eng. D. V., foi instaurado processo de inventário, que correu termos na Comarca do Porto, Porto – Instância Local, Secção Cível – J2, sob o nº 152/04.0TVPRT, cuja sentença homologatória da partilha, proferida em 18 de Setembro de 2015, transitou entretanto em julgado, com a notificação às partes do Acórdão proferido pelo STJ de 14.06.2017 (doc. nº1).
1.3.Todos os Requerentes, os filhos da M. J., falecida no dia 16 de Setembro de 2016, conforme escritura de habilitação de herdeiros que está junta aos autos da acção principal, e os 1ºs requeridos são interessados nessa herança, como consta do auto de declarações de cabeça de casal, mapa informativo da partilha e mapa de partilha extraídos do processo de inventário (cfr. docs. juntos com a P.I. da acção principal sob os nºs 1,2,3 e 4: os Requerentes D. V. (2º), M. M. (3ª), M. R. (4ª), M. B. (5ª), J. P. (6º), F. P. (7º) e a 1ª Requerida mulher M. A. são todos filhos da 1ª Requerente e do inventariado; as Requerentes C. M. (8ª), M. G. (9ª), M. C. (10ª), T. J. (11ª) e M. F. (12ª), todas já maiores, são netas da 1ª Requerente e do inventariado, filhas da sua filha pré falecida (em 01.06.1998) M. G..
1.4. Em relação à filha M. J. (entretanto falecida) estão a decorrer as citações, dado que foi deduzido, nos próprios autos da acção principal, o respectivo incidente de habilitação.
1.5. A 1ª Requerida é casada com o 1º Requerido, de nacionalidade espanhola, sob o regime da comunhão geral de bens, como consta das declarações de cabeça de casal (cfr. doc. nº1 junto com a acção principal).
1.6. A 2ª Requerida é uma sociedade comercial de direito espanhol, de que o 1º Réu J. B. era o único sócio e também o único administrador à data em que foi constituída.
1.7. A 2ª Requerida tem por objecto a promoção de vendas de imóveis, assim como a construção ou intermediação na venda de todo o tipo de imóveis e o arrendamento; foi constituída pelo único sócio (o 1º Requerido) em 06.09.2005, com o capital social de € 10.000,00 (dez mil euros), e tem a sua sede na morada dos 1ºs Requeridos: Calle …, em Espanha, como resulta dos documentos referidos em 1.6. e ainda das certidões das escrituras de compra e venda nas quais o 1º Requerido interveio por si – como vendedor - e na qualidade de administrador e em representação da 2ª Requerida – compradora (docs. nºs 6 e 7 juntos com a P.I. da acção principal).
1.8. Além disso, como resulta das procurações juntas aos apensos A (habilitação da 2ª Requerida) e B (Embargos de Executado) da acção executiva pendente na Comarca do Porto, Porto – Instância Central, 1ª Secção de Execução – J5, sob o nº 992/13.0YYPRT, todos os Requeridos (1ºs Requeridos e 2ª Requerida) são representados pelos mesmos mandatários, Senhores Drs. Pedro, Joana e João (documentos juntos com a P.I. da acção principal sob o os nºs 8, 9 e 10).
1.9. Das procurações emitidas pelos Requeridos a favor dos seus mandatários consta a indicação das suas moradas (dos 1ºs Requeridos) e sede social (da 2ª Requerida) no mesmo local: Calle …, Valencia.
O crédito dos Requerentes reconhecido no processo de inventário
1.10. No âmbito do referido processo de inventário, foram relacionados dois créditos da herança sobre a 1ª Requerida M. A., que correspondem ao preço da venda de imóveis pertencentes à herança que foi pela mesma recebido e de que a M. A. era, por conseguinte, devedora à herança, pelo que foram, na partilha, imputados na sua quota hereditária, de harmonia com o disposto no nº2 do artº 2074º do Código Civil.
1.11. Trata-se das verbas nº 1 (no valor de € 265.700,00) e nº 220 (€ 128.008,53), indicadas no mapa informativo da partilha.
1.12. Quanto à verba nº1, trata-se de parte do preço dos imóveis que integravam a Quinta ..., em Caminha, e que pertenciam à herança aberta por óbito do Eng. D. V. que a 1ª Requerida recebeu por antecipação relativamente aos restantes herdeiros.
1.13. No que concerne à verba nº 220, esse valor refere-se ao preço da venda de outro prédio da herança (denominado “Q...”), também em Caminha, que pertencia igualmente à mesma herança e que a 1ª Requerida foi condenada a restituir à herança.
1.14. Uma vez que este 2º crédito estava já a ser reclamado no âmbito de uma execução de sentença, os Requerentes reservaram-se o direito a fazer prosseguir a acção executiva que corre termos no Juízo de Execução do Porto, sob o nº 992/13.0YYPRT.
1.15. Sem prejuízo dessa circunstância, os Requerentes reclamaram dos 1ºs Requeridos o pagamento das tornas que são devidas a cada um deles.
1.16. O crédito relativo à acção executiva nº 992/13.0YYPRT foi relacionado pelo valor de € 128.008,53, reportado a 17 de Outubro de 2013.
1.17. Assim, a 1ª Requerente (cônjuge sobrevivo) reclamou dos 1ºs Requeridos o pagamento das tornas que lhe são devidas, no valor de € 329.122,49, o qual poderá vir a ser proporcionalmente reduzido em função da quantia que possa vir a ser recebida na execução pendente sob o nº 992/13.0YYPRT.
1.18. Os Requerentes filhos do inventariado, D. V., M. M., M. R., M. J. (cujos herdeiros serão habilitados para a acção), M. B., J. P. e F. P., reclamaram, para cada um, também a título de tornas, a quantia de € 7.834,04 (num total de € 54.838,28).
1.19. As Requerentes, netas do inventariado, C. M., M. G., M. C., T. J. e M. F. reclamaram dos 1ºs Requeridos tornas de €1.566,81 para cada uma (num total de € 7.834,05).
1.20. Requerendo todos que os 1ºs Requeridos fossem notificados para procederem ao seu depósito no prazo que lhes viesse a ser fixado, tudo como consta do requerimento apresentado no processo de inventário em 08.03.2015 (cfr. documento junto com a P.I. da acção principal sob o nº 19).
1.21. Os 1ºs Requeridos não pagaram aos Requerentes, nem depositaram, qualquer quantia a título de tornas, como aceitam e confessam na contestação à acção de impugnação pauliana.
1.22. Os Autores são, assim, credores da quantia devida a título de tornas no processo de inventário, com dedução do valor que possam vir a receber no âmbito da acção executiva nº 992/13.0YYPRT (já que as tornas foram calculadas também com base no crédito emergente desta acção, aí relacionado).
1.23. Os ora Requeridos M. A. e J. B. interpuseram recurso de apelação da sentença homologatória da partilha proferida no processo de inventário, o qual foi julgado improcedente por douto Acórdão proferido em 25.01.2016 pelo Tribunal da Relação do Porto, que confirmou a sentença recorrida (doc. nº 3).
1.24. Desse Acórdão foi interposto pelos mesmos Requeridos recurso de revista, sobre o qual incidiu decisão singular (de 31.01.2017) que decidiu não tomar conhecimento do recurso.
1.25. Os Requeridos reclamaram para a Conferência, tendo sido proferido em 8 de Maio de 2017 Acórdão que confirmou a decisão singular de não tomar conhecimento do recurso, o qual foi notificado às partes em 12 de Junho de 2017 e transitou, entretanto, em julgado (cfr. doc. nº1).
O crédito reclamado na acção executiva nº 992/13.0YYPRT (relacionado no processo de inventário como verba nº 220)
1.26. Por douta sentença proferida nos autos de acção declarativa ordinária que correram termos na 1ª Secção da extinta 4ª Vara Cível do Porto, sob o nº 1684/04.6TVPRT, completada por douto Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 14 de Junho de 2012, e transitada em julgado em 5 de Novembro de 2012, foram os 1ºs Requeridos condenados a pagar à herança aberta por óbito de D. V., representada pelos herdeiros – os ora Requerentes - a quantia de € 26.589,67, acrescida de juros de mora, às sucessivas taxas legais, desde 12.07.1991, incidindo sobre:
- a quantia liquidada até integral pagamento;
- a quantia de € 33.266,07 até 06.08.2002, como resulta da certidão emitida em 15 de Fevereiro de 2013 (traslado junto à acção executiva nº 992/13, junta com a P.I. da acção principal como doc nº 11).
1.27. A quantia que os 1ºs Requeridos foram condenados a pagar aos Requerentes nesta acção diz respeito ao preço da venda, feita pelos mesmos, do prédio das “Q...” que, como supra referido e dado como provado, pertencia à herança aberta por óbito de D. V. e que foi recebido e embolsado pelos 1ºs Requeridos, sem prestarem contas aos demais herdeiros, deduzido das despesas da responsabilidade da herança que foram por eles pagas (quantia essa que veio a ser fixada na sequência da liquidação da sentença de condenação genérica inicialmente proferida, tendo ocorrido a renovação da instância precisamente para esse fim).
1.28. Os 1ºs Requeridos requereram a reforma do Acórdão do STJ de 14 de Junho de 2012 – que foi negada por Acórdão do mesmo Tribunal proferido em 27.09.2012 - e depois interpuseram recurso para uniformização de jurisprudência – que não foi admitido - e ainda reclamaram para a conferência, tendo o STJ confirmado o despacho reclamado, por Acórdão de 14.04.2013 (cfr. docs. nºs 12 e 13 juntos com a P.I. da acção principal).
1.29. Na pendência dessas iniciativas processuais, os Requerentes tinham já promovido, em 20 de Setembro de 2012, o registo de hipoteca judicial, de harmonia com o previsto no artº 710º do Código Civil, sobre dois prédios pertencentes aos 1ºs Requeridos:
- Prédio urbano composto por casa de R/C, 1º andar e rossio, sito na Rua do ..., nº 59, freguesia de ..., concelho de Caminha, inscrito na matriz sob o art … e descrito na Conservatória do Registo Predial de Caminha sob o nº …;
- Prédio urbano composto por casa de R/C, 1º andar e logradouro, sito na Rua ..., nº 6, freguesia de ..., concelho de Caminha, inscrito na matriz sob o artº … e descrito na Conservatória do Registo Predial de Caminha sob o nº 700.
1.30. Tal como consta das informações do registo predial, o registo da hipoteca judicial foi efectuado (sobre ambos os prédios) pela Ap. 3257 de 2012/09/20 (cfr. docs. juntos com a P.I. da acção principal sob os nºs 14 e 15) e destinou-se a “garantia de pagamento da quantia devida aos herdeiros que vier a ser liquidada em execução de sentença, acrescida das quantias de juros às sucessivas taxas legais até integral pagamento”, como consta da menção aposta no registo.
1.31. Este registo de hipoteca judicial foi feito com base na certidão do título de que resulta a garantia.
1.32. Na ocasião da prolação da decisão condenatória o montante do capital que os 1ºs Requeridos estavam obrigados a pagar aos Requerentes ascendia a € 26.589,67, quantia a que acresciam juros de mora a liquidar nos termos previstos no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça – resultando essa operação de simples cálculo aritmético, e por esse motivo foi indicado pelo Conservador do Registo Predial que o montante máximo assegurado para efeitos de registo era de € 29.780,43 (capital acrescido de juros de três anos.
1.33. Em 26 de Julho de 2012, o capital e os juros vencidos até essa data (incluídos na condenação) totalizavam € 110.742,52, tendo os Requerentes procedido à capitalização dos juros, por notificação judicial avulsa, nos termos do artº 560º do Código Civil (doc. junto com a P.I. da acção principal como doc. nº 16).
1.34. Devidamente notificados para procederem ao pagamento do capital e juros, sob pena de, na data indicada, ocorrer a capitalização dos juros (passando os juros supervenientes a vencer-se sobre o montante global apurado, até efectivo e integral pagamento), os 1ºs Requeridos não fizeram, porém, o pagamento de qualquer quantia (nem, por alguma forma, se manifestaram).
1.35. Em face da falta de pagamento da quantia em que os 1ºs Requeridos haviam sido condenados e tendo a sentença transitado em julgado (em 5 de Novembro de 2012), os Requerentes instauraram, em 19 de Fevereiro de 2013, a acção executiva (execução da sentença proferida no âmbito do referido Proc. nº 1684/04.6TVPRT), que se encontra actualmente pendente, no Tribunal Judicial da Comarca do Porto, Juízo de Execução do Porto – Juiz 5, sob o nº 992/13.0YYPRT, conforme requerimento executivo (cfr. doc. nº 17 junto com a P.I. da acção principal), tendo indicado à penhora os dois prédios sobre que incidia a hipoteca judicial.
1.36. À data da instauração da execução, o valor da dívida ascendia a € 121.288,82.
1.37. Tendo em conta os juros e sanção pecuniária vencidos e as despesas da execução desde a data em que foi apresentado o requerimento executivo (19.02.2013), o valor do crédito dos Requerentes sobre os Requeridos ascendia, em 23 de Maio de 2016, a € 178.408,56, como consta da nota de liquidação da responsabilidade dos executados elaborada pela Agente de Execução e junta a esses autos de execução (cfr doc. nº 18 junto com a P.I. da acção principal).
1.38. Tal nota não foi objecto de reclamação por parte dos Requeridos (aí executados) e corresponde ao crédito dos Requerentes sobre os Requeridos nessa data.
1.39. A essa quantia acrescem juros de mora vincendos calculados sobre a quantia capitalizada desde 23.05.2016 até efectivo e integral pagamento, bem como sanção pecuniária compulsória de 5% ao ano, conforme previsto no artº 829º-A, nº4 do Código Civil, e ainda honorários e despesas da agente de execução, a liquidar no momento do pagamento.
1.40. Desde 23 de Maio de 2016 até 2 de Julho de 2017 venceram-se juros de mora à taxa legal de 4% sobre os valores de € 110.742,52 (capital) e € 2.530,00 (custas de parte), de € 4.915,15 e € 112,29, respectivamente, sendo o valor global de juros de € 5.027,44. 48.
1.41. Venceu-se ainda a sanção pecuniária compulsória prevista no artº 829º-A, nº 4 do Código Civil, à taxa de 5% ao ano, sobre € 110.742,52, que ascende na mesma data (02.07.2017) a € 6.156,87.
1.42. O crédito dos Requerentes na acção executiva reportado a 02.07.2017 (e sem considerar o acréscimo de despesas da execução desde 23.05.2016) é de quantia não inferior a € 189.592,87.
1.43. O crédito global dos Requerentes sobre os Requeridos, em 27.06.2017, era de € 429.637,58, que corresponde à soma das seguintes importâncias:
(i) 37.842,76 (€ 189.592,87 - € 128.008,53 - 23.603,50€,)
(ii) € 329.122,49 (tornas devidas à 1ª Requerente)
(iii) € 54.838,28 (tornas devidas aos filhos do inventariado e aos herdeiros da filha M. J., entretanto falecida: € 7.834,04 x 7);
(iv) € 7.834,05 (tornas devidas às netas do inventariado, filhas da filha pré-falecida M. G.: € 1.566,81 x 5),
B) Da garantia patrimonial dos créditos dos Requerentes e do justificado receio da sua perda.
1.44. No âmbito da acção executiva acima identificada (instaurada para cobrança coerciva de parte dos créditos dos Requerentes sobre os Requeridos (Proc. nº 992/13.0YYPRT), foi feita a penhora dos dois imóveis que os 1ºs Requeridos haviam declarado vender à 2º requerida e sobre os quais incidia a hipoteca judicial.
1.45. À data em que a penhora foi registada (18.09.2013), os 1ºs Requeridos já tinham operado a transmissão – alteração da titularidade – da propriedade desses dois imóveis para a 2ª Requerida, tendo registado a aquisição a favor desta sociedade que é uma sociedade de direito espanhol, de que o 1º Requerido J. B. era o único sócio e administrador/gerente.
1.46. Como consequência, os 1ºs Requeridos deixaram de ser os titulares inscritos (cfr. documentos juntos com a P.I. da acção principal sob os nºs 14 e 15).
1.47. Os Requerentes requereram então a habilitação da 2ª Requerida X, S.L., como adquirente dos prédios hipotecados, para também contra ela prosseguir a execução, de modo a poderem (enquanto exequentes) valer-se da garantia, posto que as compras e vendas dos dois imóveis onerados com hipoteca judicial eram inoponíveis aos credores hipotecários e ineficazes quanto ao prosseguimento da acção executiva.
1.48. E por sentença proferida em 17 de Dezembro de 2013 e já transitada em julgado (dado que dela não foi interposto recurso) foi julgada habilitada a 2ª Requerida para contra ela prosseguir a execução (cfr. doc.nº 21 junto com a P.I. da acção principal).
1.49. A 2ª Requerida veio então deduzir oposição à penhora que incidia sobre os prédios agora registados em seu nome (descritos sob os nºs 1112 e 700 na Conservatória do Registo Predial de Caminha), invocando que, do valor da quantia exequenda, os dois prédios penhorados “apenas garantem o pagamento de € 29.780,43”, admitindo que adquiriu os prédios com ónus, “mais concretamente com registo de hipoteca judicial a garantir o pagamento da quantia devida aos herdeiros que viesse a ser liquidada em execução de sentença”, mas invocando que essa quantia “no respectivo averbamento da hipoteca judicial em ambos os aludidos prédios se limitou ao montante máximo de € 29.780,43.”
1.50. Os Requerentes contestaram o incidente defendendo não apenas que a oposição não se enquadrava nos fundamentos previstos no CPC para o executado deduzir à penhora e ser, por isso legalmente admissível, mas também que a 2ª Requerida, habilitada para também contra ela prosseguir a execução, respondia nos precisos termos dos primitivos executados (os 1ºs Requeridos) dado que os imóveis que ela voluntária e conscientemente adquiriu garantiam o pagamento de toda a dívida exequenda, porquanto o registo de hipoteca judicial efectuado sobre os prédios se destinou a “garantia do pagamento da quantia devida aos herdeiros que vier [viesse] a ser liquidada em execução de sentença, acrescida das quantias de juros às sucessivas taxas legais até integral pagamento”, como consta da própria inscrição/menção aposta no registo e abrangia o valor de toda a condenação (por estarmos perante uma sentença ilíquida).
1.51. O valor da condenação exequenda, que é o crédito garantido – era constituído pelas seguintes parcelas:
- a quantia de € 26.589,67;
- juros sobre € 26.589,67 desde 12.07.1991 até integral pagamento;
- juros sobre € 33.266,07 desde 12.07.1991 até 06.08.2002.
1.52. O Acórdão que constituiu o título válido para o registo da hipoteca judicial condenou logo os réus no pagamento de juros que já podiam ter sido quantificados à data do registo da hipoteca judicial (porém, a Conservatória fez o registo com base no título apenas pelo montante do capital, mas com a menção da iliquidez do montante garantido)
1.53. Alegaram ainda os Requerentes, no âmbito da oposição referida em
1.50. que no caso em apreço se estava perante uma hipoteca judicial, registada antes da celebração da “compra e venda”, pelo que a 2ª Requerida bem sabia que estava a “comprar” um bem hipotecado, que garantia a dívida (ainda por liquidar) em que os transmitentes haviam sido condenados por sentença judicial (todo o valor da condenação) – e sabia-o desde logo porque o transmitente marido (J. B.) era, ele próprio, o gerente ou administrador da sociedade adquirente (a X, SL); e se a 2ª Requerida adquiriu os prédios sem se preocupar em saber previamente qual o valor concreto da dívida garantida, foi precisamente por estar de má fé e ser, ela própria, representada pelo transmitente, o 1º Requerente J. B. – preferindo formalizar o acto de transmissão para dificultar a posição dos exequentes (aqui Requerentes).
1.54. Não obstante, veio a ser proferida decisão que julgou procedente a oposição à penhora pela mesma deduzida e determinou a redução da penhora ao montante de €29.780,43 por entender que as hipotecas judiciais registadas apenas garantem o pagamento do crédito exequendo até esse montante, conforme consta da sentença que junta como doc. 22 do processo principal.
1.55. Dessa sentença, os ora Autores interpuseram recurso de apelação, o qual foi admitido com efeito suspensivo (docs. juntos com a P.I. da acção principal sob os nºs 23 e 24).
1.56. Em 7 de Julho de 2016 foi proferido Acórdão pelo Tribunal da Relação do Porto, notificado aos Autores em 11 de Julho de 2016, que julgou a apelação improcedente (cfr. doc. nº 25 junto com a P.I. da acção principal).
1.57. A questão a decidir nesse recurso era a de saber se os (dois) imóveis hipotecados (judicialmente) e penhorados à ordem da execução, em face da transmissão da sua propriedade a favor da ora segunda requerida, deveriam responder pelo montante máximo inscrito no registo predial ou se, por se tratar de uma hipoteca judicial de uma sentença de condenação ilíquida, deveriam garantir a totalidade da quantia exequenda (também mencionada no registo).
1.58. Depois disso, os Requerentes ainda interpuseram recurso de revista, mas o STJ decidiu dele não conhecer (doc. que se junta sob o nº 4).
1.59. Uma vez que a decisão definitiva proferida na oposição à penhora foi no sentido de os imóveis adquiridos pela 2ª requerida só responderem parcialmente pela dívida, os Requerentes viram-se na necessidade de impugnar os actos de venda, por os mesmos envolverem diminuição da garantia patrimonial do seu crédito (anterior) e terem sido realizados dolosamente com o objectivo de impedir a satisfação integral do direito dos credores – tendo instaurado a acção de impugnação pauliana de que este arresto constitui incidente.
1.60. O Tribunal da Relação do Porto decidiu que os prédios hipotecados e penhorados só respondem pelo valor de € 29.780,43 – o que foi confirmado pelo STJ –, sendo que os 1ºs Requeridos – residentes em Espanha – não são proprietários de quaisquer outros bens imóveis em Portugal, nem saldos bancários, nem rendimentos (seja de que natureza for).
1.61. Acresce que sobre o prédio descrito sob o nº 1112/... incide uma hipoteca voluntária a favor da Caixa ... para garantia de um crédito que ascendia a € 16.183,79 à data em que este banco apresentou a reclamação de créditos na ação executiva movida pelos Requerentes contra os Requeridos (crédito esse ao qual acrescem juros de mora), como resulta do documento nº5.
1.62. Além disso, nessa mesma acção executiva, foi fixado o seguinte valor base para venda dos bens imóveis penhorados: € 200,000,00 para o imóvel descrito sob o nº 700 e € 81.000,00 para o imóvel descrito sob o nº 1112, sendo aceites propostas acima de 85% desses valores, como resulta da notificação da Agente de Execução junta como doc. 6.
1.63. Para evitar a venda, a 2ª Requerida prestou caução por apenso à execução, tendo depositado à ordem desse processo a quantia de € 127.353,26 (doc. nº7).
1.64. Em face da decisão proferida no processo de oposição à penhora, a 2ª Requerida requereu que lhe seja restituída a quantia de € 97.572,83, correspondente à parte da caução que excede a sua responsabilidade liquidada nesse incidente, como resulta do requerimento apresentado no respectivo apenso em 29.06.2017 (doc. nº 8).
1.65. E apresentou na mesma data requerimento na acção executiva, a requerer que o valor de €29.780,43 “seja convertido em pagamento definitivo aos exequentes” e que seja ordenado o cancelamento das penhoras que incidem sobre os imóveis descritos na Conservatória de Caminha sob os nºs … e … da freguesia de ... que adquiriu pelas compras e vendas impugnadas por via da acção principal de que este arresto constitui incidente (doc. nº9).
1.66. Considerando o valor do crédito dos Requerentes, quer o reclamado nessa acção executiva, na qual irão receber apenas € 29.780,43 (sendo que não existem quaisquer outros bens susceptíveis de penhora), quer o devido a título de tornas e, bem assim, o valor do crédito do Caixa ... garantido por hipoteca voluntária (que goza de preferência), ainda que seja julgada procedente a impugnação pauliana, o valor dos imóveis “vendidos” será insuficiente para garantir a satisfação do crédito dos Requerentes.
1.67. Já depois de terem sido condenados a pagar aos Requerentes a quantia que viesse a ser liquidada em execução de sentença no âmbito de uma acção pendente desde 2004 (Proc. nº 1684/04), e de terem reconhecido um outro crédito da herança sobre eles correspondente ao preço da venda da Quinta ..., que receberam com antecipação relativamente aos demais herdeiros (os Requerentes), os 1ºs Requeridos venderam à 2ª Requerida os dois únicos prédios de que eram proprietários em Portugal, alienando os únicos bens imóveis de que eram proprietários em Portugal e que constituíam a garantia do crédito dos Requerentes.
1.68. Actos esse que foram impugnados na acção principal, tratando-se de acto titulado pela escritura pública outorgada no dia 7 de Novembro de 2012, no Cartório Notarial a cargo do Notário L. B., em Matosinhos, pelo qual os 1ºs Requeridos declararam vender à 2ª Requerida, nesse acto representada pelo 1º Requerido, que era o seu único administrador, e esta declarou comprar, o prédio urbano composto por casa de rés do-chão e andar, com rocio, situado na Rua do ..., nº59 da freguesia de ..., concelho de Caminha, descrito na Conservatória do Registo Predial de Caminha sob o nº …/... e inscrito na matriz predial urbana sob o artº 149, com o valor patrimonial tributário de € 82.802,88 (cfr. doc. nº 6 junto com a P.I. da acção principal).
1.69. O preço declarado para a compra e venda foi de € 100.000,00, que os 1ºs Requeridos afirmaram ter já recebido.
1.70. Da escritura consta que sobre o prédio incide uma hipoteca voluntária a favor da “Caixa ...” “para garantia do empréstimo do valor de € 60.000,00” e uma hipoteca judicial “para garantia da quantia de € 26.589,67 acrescida de juros legais.
1.71. E, bem assim, do acto titulado pela escritura outorgada no dia 9 de Maio de 2013, no mesmo Cartório Notarial a cargo do Notário L. B., em Matosinhos, pelo qual os 1ºs Requeridos declararam vender à 2ª Requerida, nesse acto igualmente representada pelo 1º Requerido, seu único administrador, e esta declarou comprar, o prédio urbano composto por uma casa de rés-do-chão, primeiro andar e logradouro, situado na Rua …, nº 6, lugar ou rua de ..., da freguesia de ..., concelho de Caminha, descrito na Conservatória do Registo Predial de Caminha sob o nº …/... e inscrito na matriz predial urbana sob o artº …, com o valor patrimonial tributário de € 147.678,63 (cfr. doc. nº 7 junto com a P.I. da acção principal).
1.72. O preço declarado para a compra e venda foi de € 83.500,00, que os 1ºs Requeridos declararam, igualmente, ter já recebido.
1.73. Da escritura consta que sobre este prédio incide também uma hipoteca voluntária a favor do “Banco ..., S.A.” para garantia do empréstimo do valor de € 75.000,00” e uma hipoteca judicial “para garantia da quantia de € 26.589,67 acrescida de juros legais.”
1.74.Nenhuma das escrituras menciona os “montantes máximos garantidos”.
1.75. Os prédios declarados vender à 2ª Requerida são os prédios onde os 1ºs Requeridos passavam, e continuaram a passar após a pretensa venda, férias em Portugal, juntamente com os seus filhos, e um deles continua a ser a morada oficial em Portugal dos 1ºs Requeridos, como resulta do teor do auto de penhora realizada no dia 18 de Maio de 2017 no âmbito de uma execução para pagamento de custas de parte instaurada por alguns dos aqui Requerentes contra os 1ºs Requeridos e da pesquisa feita nessa execução (docs. nº14 e 15).
1.76. A sociedade, 2ª Requerida, não tinha disponibilidade de tesouraria para fazer depositar uma caução de € 127.353,26.
1.77. Apesar de formalmente administrador da 2ª requerida, o certo é que o 1º Requerido nunca exerceu qualquer actividade através desta sociedade dado que a sua profissão era bancário (estando actualmente reformado).
1.78. Por sua vez, a 1ª Requerida sempre foi dona de casa, nunca tendo exercido qualquer actividade profissional.
1.79. A sociedade não deposita os documentos da prestação de contas, nem tem qualquer informação sobre os contactos – cf. documentos nºs 16 e 17).
1.80. A sociedade requerida não é proprietária de quaisquer outros imóveis em Portugal para além daqueles que lhe foram transmitidos pelo seu próprio sócio e administrador, como resulta dos documentos do IMI juntos com a Contestação da acção principal como doc. nº 11.
1.81. A sociedade requerida, representada pelo primeiro requerido, seu administrador, celebrou o contrato de arrendamento junto como documento nº 10 com a contestação, através do qual declarou dar de arrendamento um dos imóveis adquiridos aos primeiros requeridos ao filho destes últimos.
1.82. Os primeiros requeridos continuam a ser considerados pelos vizinhos como donos dos imóveis – cf. auto de penhora Maio de 2017.
1.83. Por contrato de compra e venda celebrado em 8/11/2013 em Espanha, o 1º Requerido declarou transmitir parte das participações sociais do capital social da X, SL aos seus filhos J. D., Maria, F. P. e M. I., 500 para cada um, continuando ele próprio sócio com 8000 participações sociais.
1.84. Por contrato de doação, com uma cláusula de reversão a favor do doador e de proibição de alienação ou oneração sem o consentimento do doador, celebrado em 22/6/2015, em Espanha, o 1º Requerido declarou doar as 8000 participações sociais aos seus referidos filhos, designadamente 1300 ao filho J. D., 3000 à filha Maria, 1800 ao filho F. P. e 1900 à filha M. I..
1.85. Os actos impugnados pelos Requerentes nos autos principais correspondem a dois contratos de compra e venda de bens imóveis celebrados entre os Primeiros e a Segunda Requerida (documentos n.º 6 e 7):
a) Contrato de compra e venda celebrado a 07/11/2012, entre os Primeiros Requeridos e a Segunda Requerida, nas qualidades de vendedores e compradora (respectivamente), tendo por objecto o prédio urbano descrito na Conservatória do Registo Predial de Caminha sob o n.º …/... e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 149, pelo preço de € 100.000,00 (cem mil euros); e
b) Contrato de compra e venda celebrado a 09/05/2013, entre os Primeiros Requeridos e a Segunda R Requerida, nas qualidades de vendedores e compradora (respetivamente), tendo por objeto o prédio urbano descrito na Conservatória do Registo Predial de Caminha sob o n.º …/... e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 547, pelo preço de € 83.500,00 (oitenta e três mil e quinhentos euros).
86. Os bens objecto das referidas escrituras tinham, à data, os seguintes valores patrimoniais tributários e encargos registados:
a) Imóvel descrito na Conservatória do Registo Predial de Caminha sob o n.º …/... e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 149:
- Valor patrimonial tributário: € 82.802,88;
- Encargos registados: a) Hipoteca para garantia de empréstimo de € 60.000,00; e b) hipoteca para garantia de € 26.580,89;
b) Imóvel descrito na Conservatória do Registo Predial de Caminha sob o n.º …/... e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo …:
- Valor patrimonial tributário: € 147.678,63
- Encargos registados: a) Hipoteca para garantia de empréstimo de € 65.000,00; e b) hipoteca para garantia de € 26.580,89.
1.87. Um dos encargos registados sobre os dois mencionados imóveis, mais concretamente a “hipoteca para garantia de € 26.580,89”, a que corresponde o montante máximo assegurado de € 29.780,43, tem como beneficiários os aqui Requerentes.
1.88. A Segunda Requerida, na acção executiva a que se refere o artigo 23.º da petição inicial, depositou à ordem dos autos, a título de caução, a quantia de € 127.353,26 a qual foi aceite e considerada idónea sendo que a Segunda Requerida admitiu que, da quantia global depositada de € 127.353,26, € 29.780,43 se deveriam dar por definitivamente entregues, a título de pagamento aos aí exequentes.
1.90. Os Primeiros Requeridos eram proprietários de dois bens imóveis, um sito na Calle …, Espanha e outro na Calle … Espanha, (cfr. documentos n.º 8 e 9 da contestação do processo principal - fls. 371 e ss).
1.91. A segunda requerida, na qualidade de senhoria, e representada pelo primeiro requerido outorgou contrato de arrendamento com J. D., versando sobre o imóvel descrito em 1.4. supra, al. b) – cf. fls. 376 e 377 do processo principal.
1.92. O 1º Requerido é actualmente administrador da 2ª Requerida.
1.93. A 10/10/2016, a 2ª Requerida vendeu um imóvel em Espanha, de que era proprietária.
1.94. - No incidente de prestação de caução (apenso F à execução nº 992/13.0YYPRT), a 2ª Requerida foi (igualmente) representada pelos mesmos mandatários dos 1ºs Requeridos (Drs. Pedro, Joana e João).
1.95. - Numa fase inicial do processo executivo (Proc nº 992/13), foram os próprios 1ºs Requeridos que ofereceram a prestação de caução a fim de obter a suspensão da execução.
1.96. - Essa caução tinha como pressuposto a dedução de embargos de executado (que tinham sido apresentados pelos aqui 1ºs Requeridos – e autuados no apenso “B”) e foi oferecida mediante garantia bancária a emitir por um banco espanhol, pelo valor da quantia exequenda.
1.97. - Os embargos à execução deduzidos pelos executados (aqui 1ºs Requeridos) foram julgados improcedentes por decisão transitada em julgado.
1.98. - No requerimento inicial (do apenso C à execução nº 992/13) ofereceram a caução, referindo que pretendiam caucionar a quantia exequenda, mas requerendo que fosse fixado “o valor a caucionar” e afirmando que a mesma seria prestada através de garantia bancária a emitir por banco espanhol que não identificaram.
1.99. - Foi então proferido despacho que determinou que viessem indicar o valor (certo) da caução que pretendiam prestar e identificar, em concreto, o banco prestador da garantia.
1.100. - Notificados desse despacho, os 1ºs Requeridos vieram dizer que a garantia bancária a prestar era muito onerosa e ofereceram, em sua substituição, a constituição de hipoteca sobre um dos prédios penhorados à ordem da execução.
1.101. - Este requerimento foi apresentado no dia 23 de Julho de 2014, numa data em que os imóveis penhorados já estavam registados em nome da sociedade 2ª Requerida.
1.102. - Os 1ºs Requeridos ofereceram como caução uma hipoteca sobre o prédio urbano que constitui a verba nº 1 dos autos de penhora dos autos de execução principais, referindo que seria a sociedade 2ª requerida a constituir a hipoteca.
1.103. - Em face do requerimento de alteração ao pedido de prestação de caução (que já não seria prestada por garantia bancária, mas por hipoteca sobre bem imóvel), o Tribunal notificou os Requerentes (aqui 1ºs Requeridos) para juntarem aos autos certidão do registo provisório de hipoteca.
1.104. - Por requerimento expedido a juízo a 23.09.2014, os 1ºs Réus juntaram certidão do registo predial, mas sem o registo provisório de hipoteca.
1.105. - Foi proferido novo despacho a determinar que se aguardasse que os mesmos (aqui 1ºs Requeridos) cumprissem o anterior despacho e juntassem aos autos o registo provisório de hipoteca.
1.106. - Os 1ºs Requeridos vieram então requerer a prorrogação do prazo, invocando que o registo teria de ser requerido pela X, SL, sediada em Espanha e que era necessário conferir poderes ao mandatário dos 1ºs Requeridos para “proceder a esse registo em nome e representação” dessa sociedade.
1.107. - Os Requerentes opuseram-se à prorrogação desse prazo para juntar o registo provisório de hipoteca, invocando que esse pedido era “uma manobra manifestamente dilatória”, por não ser “necessária procuração para apresentar o pedido de registo”.
1.108. - O Tribunal decidiu, por despacho de 23.10.2014, deferir a requerida prorrogação de prazo até 31.10.2014.
1.109. - No último dia do prazo concedido pelo Tribunal (em 31.10.2014), os 1ºs Requeridos apresentaram nos autos um requerimento, no qual afirmam que:
“Apesar da prorrogação pedida e concedida, não podem cumprir a junção da certidão de onde consta o registo provisório (…). Com efeito, não existindo consulado português em Valência, Espanha, a saúde e indisponibilidade por outros afazeres não lhes permitem a deslocação onde exista esse consulado para efeitos de outorga da procuração a conceder os respectivos poderes, designadamente, a mandatário judicial.” Assim, tal registo apenas se poderá realizar no aludido prazo caso seja transformado o da penhora da apresentação 1703 de 2013/09/18 em registo provisório e definitivo de hipoteca. Para o efeito, obtiveram da titular inscrita a autorização para converter esse registo de penhora em registo de hipoteca caso venha a ser considerada idónea a prestação da caução por esse meio. Autorização essa que consta de requerimento a apresentar pela citada titular inscrita”
Requereram que o Tribunal determinasse “que o citado registo de penhora” fosse “convertido em hipoteca, a produzir efeitos quando e se esta vier a ser julgada idónea, para efeitos de prestação da caução dos autos”.
1.110. - Na mesma data em que foi apresentado este requerimento dos 1ºs Requeridos, subscrito pelo Dr. Pedro, o Dr. João apresentou, em nome da 2ª Requerida, X, SL, um requerimento nesses autos de incidente de prestação de caução, a declarar o seguinte: “Caso venha a ser considerada idónea a caução através de hipoteca do prédio inscrito sob o nº … na Conservatória do Registo Predial de Caminha, declara que autoriza que a penhora registada sob a apresentação … de 2013/09/18 seja convertida em registo definitivo de hipoteca”.
1.111. - Os Requerentes pronunciaram-se sobre este pedido por requerimento de 06.11.2014, no qual requereram o indeferimento do requerido e a improcedência do incidente de prestação de caução.
1.112. - Por sentença proferida em 07.11.2014, foi indeferido o incidente de prestação de caução, decisão essa que transitou em julgado.
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Factos não provados (os demais factos alegados, designadamente):
- À data, os Primeiros Requeridos eram titulares de quotas na sociedade Segunda Ré, com o valor nominal de € 10.000,00 (dez mil euros).
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4. – Enquadramento jurídico.
4.1. Como já vimos, decretado o arresto sem audiência prévia dos requeridos, podem estes defender-se contra tal providência, por duas vias, em alternativa (art. 372° do CPC):
- recurso do despacho que tiver decretado a providência, quando entendam que, face aos elementos apurados, não devia ter sido decretada;
- oposição, quando pretendam alegar factos e/ou produzir meios de prova susceptíveis de afastar os fundamentos do arresto ou reduzir o seu âmbito e que o tribunal não levou em conta ao decretar o arresto.
Pela via da oposição à providência cautelar, o requerido procurar alterar a decisão anteriormente proferida pelo julgador, carreando para os autos elementos factuais e/ou probatórios que eram desconhecidos do tribunal aquando do acolhimento da providência (33).
No caso em apreço, os requeridos deduziram oposição alegando factos e provas tendentes a demonstrar não estar suficientemente demonstrada a probabilidade séria da existência do crédito dos requerentes sobre si, bem como a verificação do justo receio de perda da garantia patrimonial, tendo após produção da respectiva prova sido julgada improcedente a oposição apresentada, com a consequente manutenção da providência (de arresto) decretada.
Como refere Abrantes Geraldes (34), "não se trata de facultar ao mesmo tribunal a reapreciação da decisão, a partir dos mesmos elementos, mas de conferir a possibilidade de revisão da convicção anteriormente formada, através de novos meios de prova ou de novos factos com que o tribunal não pôde contar".
Por isso se diz que os indícios trazidos pelo requerente do procedimento cautelar podem ser afastados por indícios de sinal contrário carreados pelo requerido (35). E é a ponderação do conjunto da prova indiciária que permite ao julgador manter a providência decretada, afastar os seus fundamentos ou determinar a sua redução, constituindo esta nova decisão complemento e parte integrante da inicialmente proferida, como vem estabelecido no artigo 372°, n.° 3 do CPC.
Significa isto que vai ajustar-se à decisão anterior, reforçando-a, anulando-a ou introduzindo-lhe modificações.
i) Reforçará a decisão anterior se os factos novos ou as provas oferecidas forem insuficientes para afastar os motivos em que se baseou a decisão anterior, caso em que o arresto se manterá.
ii) Modificará a decisão se, mantendo-se embora a convicção sobre a existência do crédito e sobre o receio motivado de perda da respectiva garantia patrimonial, aquele for inferior ao inicialmente invocado e este perder alguma da razão que o justificava, designadamente, pela demonstrada existência de bens no património do requerido; neste caso, o arresto será reduzido aos limites necessários e suficientes para afastar o periculum in mora.
iii) Anulará a decisão se os novos elementos de facto ou as provas oferecidas produzirem uma convicção oposta à que presidiu ao decretamento do arresto (inexistência do crédito e/ou de justificado receio de perda da garantia patrimonial) ou se a convicção se consolidar na ponderação diferencial do maior prejuízo causado pelo arresto relativamente ao dano que ele visava acautelar.
No caso, o tribunal “a quo” enveredou pela primeira hipótese, ao concluir pela inalteração da verificação dos fundamentos do decretamento da providência de arresto (a existência do crédito de que os requerentes se arrogam titulares e o justificado receio de perda da garantia patrimonial) e pela improcedência da oposição, com a consequente manutenção do arresto decretado nos autos.
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4.2. O arresto, além de ser um dos meios de conservação da garantia patrimonial, constitui um procedimento cautelar nominado.
Encontra a sua disciplina legal nos arts. 619º a 622 do Código Civil [abreviadamente CC)] e nos arts. 391º a 399º do CPC.
Inserido no capítulo dos procedimentos cautelares especificados, dispõe o n.º 1 do art. 391º do CPC que “o credor que tenha justificado receio de perder a garantia patrimonial do seu crédito pode requerer o arresto de bens do devedor” (ver também o n.º 1 do art. 619º do CC), ou de bens adquiridos por terceiros ao devedor, se tiver sido judicialmente impugnada a transmissão (art. 392º, n.º 2 do CPC e art. 619º, n.º 2 do CC), consistindo esta providência numa apreensão judicial de bens cujo valor seja suficiente para assegurar a satisfação patrimonial do crédito invocado (art. 619º do CC), à qual são aplicáveis, na parte aplicável, as disposições relativas à penhora (art. 622º, n.º 2 do CC e art. 391º, n.º 2 do CPC).
A finalidade última do arresto é a manutenção da garantia patrimonial que os bens a arrestar representam para o requerente (36).
São, por isso, elementos constitutivos do fundamento para que seja decretado o arresto (arts. 619º e 817º do Cód. Civil e 392º, n.º 1 do CPC):
a) A provável existência do direito invocado;
b) O justo receio de perda da garantia patrimonial.
Ambos os requisitos são cumulativos, pelo que basta não se verificar a ocorrência de um deles para que a providência requerida não possa ser decretada.
Deverá, pois, o requerente alegar – e provar - factos que levem o Tribunal a concluir pela provável existência do direito invocado, competindo-lhe mostrar que é credor e provar em princípio a existência do crédito. Porém, a prova da existência do crédito há-de fazer-se na acção principal, contentando-se a lei no procedimento cautelar com a mera probabilidade da existência deste à data do pedido, o que se reconduz à ideia da «aparência do direito de crédito». Mas a titularidade do crédito terá de ser inequívoca, no sentido de ser o requerente o credor efectivo dos requeridos (37).
Embora circunscrito a direito de crédito, este pode fundar-se em qualquer fonte das obrigações [pode provir de relações contratuais, fundar-se na responsabilidade por factos ilícitos ou pelo risco, radicar no instituto do enriquecimento sem causa ou na nulidade ou anulação de um determinado negócio, ou ter por fonte directa a própria lei] (38) e não é necessário que o crédito seja exigível e líquido à data da instauração ou do deferimento da providência, conquanto deva ser apresentada uma estimativa aproximada do seu montante(39).
E, bem assim, deverá o requerente invocar – e provar – o justo receio de perda da garantia patrimonial.
Fundamentalmente, “o fundado receio de perder a garantia patrimonial só será justificado, fundado ou justo quando está criado um perigo de insatisfação do crédito, por o seu titular se deparar com a ameaça de estar a ser lesado aquilo que lho garantia: o património do devedor” (40).
O citado requisito poderá resultar, além do mais, da prova sumária de que o requerido corre o risco de ficar em situação de insolvência por dissipação ou oneração do património; de que tenha praticado factos ou assumido atitudes que, razoavelmente interpretadas, conduzam à suspeita de que está a preparar-se para subtrair os seus bens à acção do devedor; a prática de actos do requerido de oneração dos bens que poderiam servir de garantia; a ausência do requerido para parte incerta; a insuficiência do património conhecido do devedor, aliada ao facto de este ter abandonado a actividade profissional que constituía a sua única fonte rendimento; a frustração de contactos com o devedor por facto que lhe seja imputável, associada ao risco de dissipação do seu património.
O justo receio tem de ser analisado em termos objectivos e não em termos subjectivos ou em simples conjecturas da perspectiva do credor ou do próprio juiz, ou seja, deve consubstanciar-se em factos ou circunstâncias que, de acordo com as regras da experiência, aconselhem uma decisão cautelar imediata como factor de potencialidade da eficácia da ação declarativa ou executiva (41). Dito de outro modo, para que se prove o justo receio (o mesmo é dizer o receio justificado e não apenas o receio) da perda da garantia patrimonial, não basta a alegação de meras convicções, desconfianças, suspeições de carácter subjectivo por parte do requerente. É preciso que haja razões objectivas, convincentes, capazes de explicar a pretensão drástica do requerente, que vai subtrair os bens ao poder de livre disposição do seu titular (42). Para a formação do juízo valorativo do justo receio de perda da garantia patrimonial exige-se, pois, a verificação efetiva de factos positivos, concretos e objectivos, reveladores da disposição, por parte do devedor, de frustrar a garantia patrimonial dos credores.
O tribunal há-de orientar-se por critérios que, ultrapassando a mera apreciação pessoal do requerente, o façam crer que qualquer credor, medianamente cauteloso e prudente, perante a situação concreta do devedor, teria sério receio de não receber o seu crédito (43).
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4.3. Do indevido decretamento do arresto [do dinheiro (€ 97.572,83)], por traduzir a apreensão de bens de terceiro sem fundamento legal atendível.
No dizer dos recorrentes, o arresto determinado pela sentença recorrida opera-se sobre bens que pertencem exclusivamente à 2ª Recorrente, que não é devedora do crédito reclamado pelos recorridos, pelo que sendo unicamente os 1.ºs recorrentes devedores dos recorridos apenas os bens a estes pertencentes poderiam ser apreendidos nos autos, por só estes consubstanciarem garantia patrimonial do crédito dos recorridos, sendo certo que estes não procederam como preceituado no n.º 2 do art. 392.º do CPC.
Mais alegam que, por não terem sido deduzidos factos que tornem provável a procedência da impugnação pauliana dos autos principais, nem que permitam a emissão de um juízo de probabilidade sério de existência do correspondente direito dos Recorridos, a procedência do arresto viola o disposto no n.º 2 do art. 392.º e o n.º 1 do art. 368.º, todos do CPC.
Vejamos se lhes assiste razão.
Tratando-se – como se disse – de um meio da conservação da garantia patrimonial dos credores e constituindo uma espécie típica de procedimento cautelar, a determinação dos requisitos do arresto e dos seus efeitos está prevista na lei civil, ao passo que no Código de Processo Civil apenas está regulada a sua parte adjetiva (quanto aos termos em que se requer e o modo como se realiza o arresto e as suas vicissitudes) (44).
Estipula o art. 619º do CC que:
“1. O credor que tenha justo receio de perder a garantia patrimonial do seu crédito pode requerer o arresto de bens do devedor, nos termos da lei de processo. 2. O credor tem o direito de requerer o arresto contra o adquirente dos bens do devedor, se tiver sido judicialmente impugnada a transmissão”.
Como decorre expressamente do n.º 1 do art. 391º do CPC, o arresto há-de incidir, sobre bens que integrem o património do devedor – em sintonia com o princípio geral consignado no n.º 1 do art. 601º do CC segundo o qual “pelo cumprimento das obrigações respondem todos os bens do devedor susceptíveis de penhora (…)” – cabendo ao requerente, de harmonia com os critérios de repartição do ónus probatório, a prova dessa titularidade (45).
Todavia, assim como excecionalmente podem ser executados bens de terceiros (art. 818º do CC e art. 735º, n.º 2 do CPC), também estes bens podem, excecionalmente, ser arrestados (46).
Prescreve para o efeito o n.º 2 do art. 392º do CPC que, «[s]endo o arresto requerido contra o adquirente de bens do devedor, o requerente, se não mostrar ter sido judicialmente impugnada a aquisição, deduz ainda os factos que tornem provável a procedência da impugnação».
O n.º 2 do art. 392º do CPC, à semelhança do que sucede com o citado n.º 2 do art. 619º do CC, confere ao credor o direito de requerer arresto contra o adquirente dos bens do devedor, aplicando-se este preceito tão só à transmissão inter vivos.
Importa, porém, ter presente que caso o arresto seja requerido contra o terceiro adquirente de bens do devedor, o requerente terá que demonstrar ter sido judicialmente impugnada a aquisição ou, a ter sido o arresto deduzido como preliminar da ação declarativa, os fundamentos que tornam provável a procedência da impugnação.
O regime do n.º 2 do art. 392º do CPC, na medida em que admite a possibilidade de, nos casos de arresto requerido contra o adquirente dos bens do devedor, a providência ser requerida previamente à ação de impugnação judicial da aquisição, visando assim reforçar a eficácia do arresto já que se salvaguarda o secretismo do seu procedimento até à sua efetivação (art. 393º, n.º 1 do CPC) (47), impõe uma interpretação corretiva do n.º 2 do art. 619º do CC, já que este exigia a prévia propositura da impugnação judicial da transmissão (o que poderia fazer perigar a função da providência de arresto, designadamente no caso de os bens arrestados não estarem sujeitos a registo).
Nas palavras de José Lebre de Freitas e Isabel Alexandre (48), a “impugnação em causa tanto pode dirigir-se contra a validade do negócio, nos termos do art. 286 CC ou do art. 287 CC (ação de declaração de nulidade; ação de anulação), como consistir na sua impugnação pauliana, nos termos do art. 610º (ação pauliana). (…)
[O] requerente passou a ter tão-só o ónus de alegar na petição de arresto e de provar sumariamente os factos que fundam a impugnação, no caso de não ter já proposto a respetiva ação. Embora a lei não o diga, deve entender-se que a não propositura da ação, no prazo do art. 373-a, faz caducar a providência decretada. Efetivamente, o arresto não depende apenas, neste caso, da ação de dívida, mas também da ação de impugnação. (…) O art. 619-2 CC tem hoje de ser interpretado no sentido de impor a impugnação judicial da transmissão a terceiro do bem arrestado, como ação de que o arresto depende, juntamente com a ação de dívida, tendo deixado de condicionar o decretamento do arresto a uma impugnação prévia. Quando a ação de impugnação já tenha sido proposta à data da instauração do arresto, basta ao fumus boni júris (art. 36º, n.º 1, CPC) a prova sumária da existência do direito de crédito, regime a que não é alheia a anormal dificuldade da prova, reservada para a ação principal, dos requisitos de procedência da impugnação”.
Ainda sobre o específico tema em apreço António Santos Abrantes Geraldes (49) pronunciou-se nos termos seguintes:
“O arresto pode incidir sobre bens de terceiro quando seja requerido na dependência funcional da acção de impugnação pauliana como meio de defesa da garantia patrimonial.
“O disposto no art.407º [atual 392º], n.º 2 do CPC mais não é do que adjetivação do direito conferido ao credor de perseguir os bens do devedor para efectivo exercício de um direito de crédito, quando se verifique a prática de actos de que resulte a diminuição da garantia patrimoniais (art. 619º, n.º 2, do CC) (…).
Na verdade, a concessão ao credor da possibilidade de obter a declaração de ineficácia de tais actos poderia revelar-se insuficiente, se fosse desacompanhada do direito de obter a sua prévia apreensão, designadamente quando se esteja perante bens móveis relativamente aos quais nem o registo consiga tornar eficaz a sentença constitutiva.
Perante tais circunstâncias os requisitos a preencher no arresto dependem do facto de se encontrar ou não pendente a ação de impugnação pauliana:
a) Se a ação já tiver sido instaurada, bastará a alegação e prova dos factos relativos à probabilidade do crédito e ao justo receio de perda da garantia, destinando-se o arresto dos bens a dar eficácia à decisão que eventualmente venha a ser proferida; b) Se a ação ainda não tiver sido instaurada, exige-se complementarmente a alegação e prova sumária dos pressupostos da impugnação [pauliana], como factor de credibilidade e de seriedade da pretensão, tanto mais que vai interferir na esfera jurídica de terceiros, porventura alheios à relação creditícia de onde emerge o direito” (50) (51).
O arresto contra o adquirente dos bens do devedor (52), no fundo, vem dar cobertura àquelas situações em que o devedor transmite os seus bens para, dolosamente, impedir a satisfação do direito do credor. Tais transmissões, uma vez verificados determinados requisitos, podem ser declaradas ineficazes, mediante o recurso à impugnação pauliana – consistente no direito conferido ao credor de perseguir os bens do devedor quando se verifique a prática de atos de que resulte a diminuição da garantia patrimonial (arts. 610º e 619º, n.º 2, ambos do CC (53) – ou à declaração de nulidade (54) (55). Se o ato translativo for declarado ineficaz em relação aos credores, o arresto torna-se possível em consequência da própria ineficácia; tudo se passa como se os bens continuassem no património do devedor (56). Com efeito, uma vez julgada procedente aquela impugnação, não pode o terceiro adquirente obstar a que o credor execute no seu património o bem objeto do ato impugnado (cfr. arts. 616º e 818º do CC).
Revertendo ao caso dos autos, os recorridos requereram o arresto do dinheiro (alegadamente) pertença dos 1ºs requeridos e que se encontra depositado à ordem destes autos (apenso A).
Na ação pauliana [ou de impugnação pauliana] de que este procedimento cautelar é dependência e incidente [posto que tal ação foi proposta antes deste], os AA. peticionam (contra todos os aqui recorrentes) – entre o mais – a declaração de ineficácia do ato de transmissão dos 1ºs réus para a 2ª requerida da referida quantia de 97.572,83€ depositada à ordem dos autos de ação executiva n.º 992/13.0YYPRT, e o direito dos autores à restituição desse valor aos alienantes (1ºs Réus), na medida dos seus interesses, a executá-los no património da 2ª Ré, para pagamento do seu crédito; subsidiariamente, pedem a declaração de nulidade, por simulação, do negócio de transmissão da quantia de € 97.572,83, com o consequente regresso do dinheiro à titularidade dos alienantes (1ºs Réus).
Ora, para o deferimento do presente procedimento cautelar, os requerentes tinham apenas que alegar e sumariamente provar factualidade integradora da probabilidade da existência do seu crédito sobre os 1ºs requeridos [alegados transmitentes do dinheiro em causa] e do justo receio de perda da garantia patrimonial relativamente aos mesmos; quanto à 2ª requerida nada tinham que alegar e provar, nem tão-pouco os pressupostos de procedência da ação de impugnação pauliana, uma vez que esta já se encontrava instaurada à data da dedução do arresto. O mesmo é dizer que, de acordo com o disposto nos arts. 619º, n.º 2 do CC e 392º, n.º 2, do CPC, os credores têm o direito de requerer o arresto contra o terceiro que (alegadamente) tenha adquirido bens do devedor, sendo que, por a ação de impugnação dessa aquisição estar já proposta, os requerentes do arresto têm apenas de alegar e provar a factualidade relativa à probabilidade do crédito e ao justo receio de perda da garantia, não tendo que deduzir ainda “os factos que tornem provável a procedência da impugnação”.
Os dois enunciados pressupostos da procedência do arresto só têm que ser aferidos relativamente ao devedor e não já também quanto ao terceiro adquirente (57). Na verdade, o justo receio de perda da garantia patrimonial, que se traduziria na insolvabilidade do património do devedor, é conferido apenas perante este, que não perante o adquirente, o qual apenas é demandado na lide cautelar para que conserve intacto o bem adquirido e o entregue quando lhe for pedido, para eventual execução (58). Só no caso de estarmos perante um arresto (contra o adquirente de bens do devedor) como preliminar da ação pauliana (o que não é o caso) é que o requerente teria ainda que deduzir e sumariamente comprovar “os factos que tornem provável a procedência da impugnação”.
E, no caso em apreço, a prova daqueles dois requisitos específicos do arresto mostra-se feita. Com efeito, mais do que a probabilidade da existência do crédito, os requerentes fizeram prova da existência do crédito sobre os 1ºs requeridos, como se afere do que consta dos pontos fácticos provado sob os n.ºs 1.10 a 1.43. E também se mostra demonstrado o justo receio dos requerentes perderem a garantia patrimonial do seu crédito ante o que está exarado nos pontos fácticos n.ºs 1.44, 1.60, 1.66, 1.67, 1.77 e 1.78.
Alegam, ainda, os requerentes que o dinheiro arrestado, entregue a título de caução e depositado à ordem dos autos de ação executiva n.º 992/13.0YYPRT, constitui garantia patrimonial do seu crédito, já que, na realidade, pertence aos 1ºs requeridos, que utilizaram a sociedade 2ª requerida para prestar caução e depois requerer o seu levantamento em nome da sociedade. E que essa prestação de caução visou prejudicar os requerentes, que ficaram sem a garantia patrimonial constituída pelo dinheiro, sendo que este pertencia efetivamente aos 1ºs requeridos.
Pois bem, mostrando-se judicialmente impugnada a transmissão desse dinheiro, quer pela ação pauliana, quer (subsidariamente) por via de declaração de nulidade daquele negócio, tanto basta para a verificação da previsão do regime estabelecido nos art. 392º, n.º 2 do CPC.
E, como se disse, para o decretamento da providência de arresto aos requerentes bastava alegar e sumariamente provar factualidade integradora da probabilidade da existência do seu crédito sobre os 1ºs requeridos e do justo receio de perda da garantia patrimonial relativamente aos mesmos, sendo que quanto à 2ª requerida nada tinham que alegar e provar, nem tão-pouco os pressupostos de procedência da ação de impugnação pauliana, uma vez que esta já se encontrava instaurada à data da dedução do arresto.
Saliente-se ainda que, diversamente do propugnado pelos recorrentes, não ficou provado (ainda que indiciária ou sumariamente) que o valor de € 97.572,83, objeto do arresto dos autos, não foi alienado, nem, por qualquer forma, objeto de qualquer disposição onerosa ou gratuita dos 1ºs Recorrentes a favor da 2.ª Recorrente
Neste caso, por força do disposto nos arts. 619º, n.º 2 do CC e 392º, n.º 2, do CPC, o arresto pode, pois, incidir sobre bens do terceiro adquiridos ao devedor, inexistindo qualquer ilegitimidade substantiva.
É, por isso, de sufragar a sentença recorrida quando concluiu que “sendo a acção principal de impugnação pauliana (cf. artigo 610º C. Civil), pretendendo-se atacar a eficácia dos actos de disposição dos primeiros requeridos para a segunda requerida sociedade, obviamente que o arresto pode incidir sobre bens de terceiro, não devedor dos requerentes, desde que provados os pressupostos do artigo 392º, nº2 CPC., com o que improcede igualmente o fundamento de oposição alegado sob o título de “Do indevido decretamento do arresto: da apreensão de bens de terceiro sem fundamento legal atendível”.
Improcede, assim, a argumentação de que o arresto não podia incidir sobre bens (aparentemente pertença) da sociedade 2ª requerida.
Resta por fim dizer que, por ser o objeto da ação principal previamente instaurada, não cabia (nem cabe) neste procedimento cautelar analisar os requisitos de que depende a procedência da impugnação pauliana, sendo naquela ação que tal questão terá de ser apreciada e decidida. Sendo o arresto deduzido como incidente da ação pauliana, e não como preliminar, não tinham os requerentes de demonstrar os factos que tornassem provável a procedência desta, ou seja, os requisitos da impugnação, Será, de facto, na ação principal que os requerentes/autores deverão fazer prova efetiva dos requisitos de que depende a impugnação, para que possam executar os bens transmitidos como se eles não tivessem saído do património dos devedores (1ºs requeridos) e sem a concorrência dos demais credores, quer dos devedores, quer da adquirente, bem como praticar os atos necessários à conservação dessa garantia. A procedência da ação de impugnação opera, na verdade, como condição necessária da validade do arresto contra o adquirente dos bens do devedor, pois a anular-se o ato da transmissão fará regressar os bens ao património do devedor; já se a ação pauliana vier a ser julgada improcedente, o arresto realizado caducará, por incidir sobre coisa alheia.
Improcedem, assim, as conclusões E a P da apelação.
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4.4. Do indevido decretamento do arresto por inexistência de justo receio de perda da garantia patrimonial do crédito.
A posição dos recorrentes alicerça-se – reproduzindo argumentação anterior – na alegação de que o bem arrestado não consubstancia garantia patrimonial do crédito dos Recorridos, na medida em que não é um bem do devedor, nem é um bem que – não obstante não pertença ao devedor – seja passível de ser arrestado nos termos da lei adjetiva.
A questão colocada foi já respondida no ponto antecedente, no qual se referiu que, não obstante o princípio de que o arresto só pode recair sobre bens do devedor, podem excecionalmente ser arrestados bens de terceiro, conforme o previsto no n.º 2 do art. 619º do CC, contanto que a alienação/transmissão de tais bens seja objeto de ação de impugnação, seja através da impugnação pauliana, seja da declaração de nulidade, uma vez que nesta invocação por igual modo se impugna a transmissão.
Também a questão da (in)existência de justo receio de perda da garantia patrimonial do crédito foi já abordada no aludido ponto, tanto mais que para o preenchimento desse requisito “basta a alegação e a prova do risco decorrente para o credor da constituição, na esfera jurídica de terceiro, do direito real sobre um bem cuja falta no património do devedor afete a solvabilidade deste. Aliás, a alienação ou oneração feita pelo devedor, nestas condições, implica, por si só, ao menos na generalidade dos casos, a justificação do receio da subsequente perda, por alienação ou outro modo de sonegação, do bem alienado ou onerado”, se bem que a “alegação e a prova do justo receio da prática, pelo adquirente, de atos de alienação e/ou oneração dos bens objeto do ato de transmissão impugnado pode reforçar a alegação e a prova deste ato” (59).
No caso, não poderá de modo algum concluir-se que o acto impugnado não provocou qualquer diminuição da garantia patrimonial dos recorridos, tanto mais que os 1ºs requeridos – residentes em Espanha – não são proprietários de quaisquer bens imóveis em Portugal, nem saldos bancários, nem rendimentos (seja de que natureza for) (ponto 1.60 dos factos provados).
Aliás, considerando o valor do crédito dos requerentes (que, em 27.06.2017, ascendia a, pelo menos, € 429.637,58), e inexistindo quaisquer outros bens susceptíveis de penhora, ainda que seja julgada procedente a impugnação pauliana, o valor dos imóveis “vendidos” será insuficiente para garantir a satisfação daquele crédito dos Requerentes (pontos de facto 1.43 e 1.66 dos factos provados).
Por outro lado, já depois de terem sido condenados a pagar aos Requerentes a quantia que viesse a ser liquidada em execução de sentença no âmbito do proc. n.º 1684/04.6TVPRT e de terem reconhecido um outro crédito da herança sobre eles correspondente ao preço da venda da Quinta ..., que receberam com antecipação relativamente aos demais herdeiros (os Requerentes), os 1ºs Requeridos venderam à 2ª Requerida os dois únicos bens imóveis de que eram proprietários em Portugal, sendo certo que, não obstante a formalizada venda à 2ª Requerida, os 1ºs Requeridos continuam neles a passar férias em Portugal, juntamente com os seus filhos, e um deles continua a ser a morada oficial em Portugal (pontos 1.67 e 1.75 dos factos provados)
Ademais, a 2ª Requerida não tinha disponibilidade de tesouraria para fazer depositar uma caução de € 127.353,26; o 1º Requerido, apesar de formalmente administrador da 2ª requerida, nunca exerceu qualquer actividade através desta sociedade dado que a sua profissão era bancário (estando actualmente reformado); a 1ª Requerida sempre foi dona de casa, nunca tendo exercido qualquer actividade profissional; a sociedade requerida não deposita os documentos da prestação de contas, nem tem qualquer informação sobre os contactos, nem é proprietária de quaisquer outros imóveis em Portugal para além daqueles que lhe foram transmitidos pelo seu próprio sócio e administrador (cfr. pontos 1.76 a 1.60 dos factos provados).
Ora, como bem referem os recorridos, a ser levantado o arresto que incide sobre o dinheiro da caução depositado, os recorrentes, por via da sociedade, formalmente titular da referida quantia, facilmente lograriam ocultar e dissipar a referida quantia monetária, impedindo que o objetivo da satisfação dos créditos dos requerentes pudesse ser alcançado através da restituição dos bens prevista no art. 616º do CC. O facto de os requerentes não terem sido ressarcidos do seu crédito e, bem assim, de os 1ºs requeridos terem transmitido bens à 2ª requerida (quer seja os dois únicos imóveis de que eram titulares em Portugal, quer seja alegadamente o dinheiro em apreço), que serviriam como garantia daquele crédito, manifesta inequivocamente o legítimo e fundado receio de existir perigo de se tornar difícil ou impossível a cobrança do crédito por parte dos requerentes. Como lembrou a Mm.ª Juíza “a quo”, “perante todo o historial litigioso, o largo período de tempo por que o mesmo se arrastou e arrasta, conjugado com o elevado montante do crédito dos requerentes, que assumidamente os requeridos não pretendem cumprir ou pagar, é expetável que os mesmos, logo que obtenham o levantamento do montante depositado a titulo de caução, tratem de o dissipar ou ocultar, como forma de dificultar ainda mais, ou mesmo impedir a cobrança dos créditos dos aqui requerentes.
Assim, o valor depositado à ordem da acção executiva n.º 992/13.0YYPRT pela 2º requerida constitui também garantia patrimonial do crédito do requerentes, mas de fácil dissipação e ocultação, pela sua própria natureza, pois logo que seja restituída à 2ª requerida (sociedade controlada pelo [1º requerido J. B.]) a quantia depositada nos autos, ela rapidamente fará desparecer esse dinheiro”.
Assinale-se, ainda, que o 1º requerido J. B., malgrado tenha declarado transmitir as participações sociais na sociedade 2ª requerida aos seus filhos, continua a ser o administrador da mesma, existindo, por conseguinte, uma relação familiar entre aquele administrador e os putativos sócios da sociedade requerida, circunstancialismo este que, por propiciar ou facilitar a concretização daquele intento, fornece maior consistência ou justificação ao apontado receio de lesão do direito dos requerentes.
Nesta conformidade, os factos concretos indiciados permitem estribar, pelo menos em termos de probabilidade, um juízo de justificado receio da lesão ou do dano apreciável (e da correspondente gravidade), inerente à mora própria da ação definitiva. Tais factos, em si mesmos, permitem concluir que qualquer credor avisado colocado na situação dos requerentes manifestaria o mesmo objectivado ou compreensível receio de perda de garantia patrimonial, pelo que verificado se mostra o referido requisito.
Deste modo, improcedem as conclusões Q a S da apelação.
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4.5. Do indevido decretamento do arresto por violação do princípio da proporcionalidade previsto no n.º 2 do artigo 368.º do CPC.
Sustentam os recorrentes que “o decretamento do arresto acarreta para a 2.ª Recorrente um prejuízo considerável, na medida em que determina que a mesma fique privada de uma quantia pecuniária avultada (€ 97.572,83), perpetuando, a um nível potencialmente insustentável, uma situação de carência financeira, que poderá ter consequências drásticas”, pelo que a providência decretada viola o princípio da proporcionalidade previsto no n.º 2 do art. 368.º do CPC.
Inserido no capítulo do procedimento cautelar comum, o indicado normativo prevê que:
“A providência pode, não obstante, ser recusada pelo tribunal quando o prejuízo dela resultante para o requerido exceda consideravelmente o dano que com ela o requerente pretende evitar”.
A citada disposição legal contém a consagração do princípio da proporcionalidade, visando-se desta forma pôr cobro a decisões formalmente adequadas, mas materialmente injustas (60).
Todavia, por força do estatuído no art. 376º, n.º 1 do CPC, mostra-se excluída a aplicação (subsidiária) aos procedimentos cautelares especificados ou nominados do regime de recusa da providência com fundamento num juízo de proporcionalidade (61).
Como referem José Lebre de Freitas e Isabel Alexandre (62), “não faria, efetivamente, sentido recusar, com esse fundamento, o arresto (não obstante art. 393-3) (…)”.
Ao nível da providência de arresto, o princípio da proporcionalidade tem sido, sim, invocado para salientar que o arresto deve limitar-se aos bens cujo valor se revele suficiente e adequado para garantir a satisfação do crédito a acautelar e que sejam suscetíveis de penhora (art. 751º, n.º 3 do CPC “ex vi” do art. 622º, n.º 2 do CC).
Não sendo, porém, este o específico fundamento da apelação invocado e tendo-se já concluído pela exclusão da aplicação do regime do n.º 2 do art. 368º do CPC à providência cautelar de arresto, resta-nos concluir pela improcedência das conclusões T a X da apelação.
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4.6. Da desconsideração da personalidade jurídica coletiva (relativamente à 2ª requerida) e da nulidade da sentença.
Nas palavras de Menezes Cordeiro (63), «o levantamento da personalidade colectiva trata-se de um instituto surgido para sistematizar e explicar diversas soluções concretas, estabelecidas para resolver problemas reais postos pela personalidade colectiva e que se manifestam na confusão de esferas jurídicas, na subcapitalização e no atentado a terceiros e abuso da personalidade».
Segundo este mesmo autor, «o atentado a terceiros verifica-se sempre que a personalidade colectiva seja usada, de modo ilícito ou abusivo, para os prejudicar. Como resulta da própria fórmula encontrada, não basta uma ocorrência de prejuízo, causada a terceiros através da pessoa colectiva: para haver levantamento será antes necessário que se assista a uma utilização contrária a normas ou princípios gerais, incluindo a ética dos negócios».
Como se explicitou no Ac. do STJ de 7/11/2017 (relator Alexandre Reis), in www.dgsi.pt., «não existe no nosso ordenamento jurídico positivo um preceito que tutele de modo genérico a desconsideração da personalidade jurídica ([…]), embora a figura não deixe de encontrar arrimo em princípios gerais positivamente consagrados, como são os da boa-fé e do abuso de direito, e também possam ser vistos como seus afloramentos concretos alguns casos tipificados de responsabilidade dos sócios, como são os previstos, p. ex., nos arts. 58º nº 1 a), 58º nº 3 e 84º do CSC ou, até, no art. 378º do CT. Embora a lei não contenha, como se disse, referência expressa à figura da desconsideração, a justificação da sua actuação, pelo menos em grande parte dos casos, emerge da exigência do princípio da boa fé ([…]), cuja dimensão é aflorada, no essencial do que aqui importa, pelo art. 762º, nº 2, concatenado com o art. 334º, ambos do CC».
Revertendo ao caso dos autos, conquanto na decisão que (sem prévia audição do contraditório) decretou o arresto a Mmª Juíza “a quo” tenha concluído pela verificação dos pressupostos da desconsideração da personalidade jurídica coletiva (relativamente à 2ª requerida),certo é que na decisão posteriormente prolatada que incidiu sobre a oposição deduzida pelos requeridos, louvando-se já para o efeito no decidido no Acórdão desta Relação de 3/05/2018, proferido no apenso A, a Mmª julgadora aduziu, então, a seguinte fundamentação:
“Ora, como o arresto foi instaurado na pendência da acção de impugnação, é lapidar que os requerentes apenas tinham de deduzir os factos que tornam provável a existência do crédito e justificavam o receio de perder a garantia patrimonial (artigos 391º, nº1 e 392º, nº1). Deste modo, torna-se irrelevante a ponderação no âmbito do procedimento cautelar da verificação ou não dos pressupostos da impugnação das transmissões, designadamente da verificação da desconsideração da pessoa colectiva e do abuso do direito”.
Subscreve-se sem qualquer reserva tal fundamentação.
De facto, sendo o presente arresto deduzido como incidente da acção pauliana já previamente instaurada, no âmbito do procedimento cautelar os requerentes têm apenas de alegar e provar (sumariamente) os dois requisitos próprios do arresto, e não também os requisitos da impugnação e/ou da desconsideração da pessoa colectiva. A demonstração dos requisitos corporizadores destes institutos jurídicos, como já se disse, há-de fazer-se na ação principal.
Por último, defendem os recorrentes que a “tese da desconsideração da personalidade coletiva, já foi invocada [n]outro contexto pelos ora Recorridos, peticionando os mesmos efeitos, contra as mesmas pessoas e tendo por base os mesmos factos invocados nestes autos”, mais concretamente nas alegações de recurso apresentadas no apenso de oposição à penhora, que correu termos no J5 do Juízo de Execução do Porto, Instância Central do Tribunal Judicial da Comarca do Porto, sob o n.º 992/13.0YYPRT-D, que foi julgada improcedente por decisão transitada em julgado.
Concluem, assim, pela verificação do caso julgado, dizendo que “a sentença é nula na parte em que aprecia esta matéria, na medida em que viola o disposto nos artigos 576.º, n.º 2, 577.º alínea i) e 580.º e seguintes do CPC”.
Pois bem, tendo presente que a verificação dos pressupostos da desconsideração da pessoa colectiva acabou, na decisão da oposição, por ser relegada para a ação final, dir-se-ia estar prejudicada a objeção colocada pelos recorrentes.
Por outro lado, tendo aquele instituto sido considerado na decisão inicial que, sem prévio contraditório do requerido, decretou o arresto, é inegável que o meio próprio para reagir a esse fundamento da decisão seria a interposição do recurso e não a dedução de oposição (na qual, em bom rigor, aquela questão não foi suscitada, sendo-o apenas no recurso interposto da decisão que julgou improcedente a oposição).
Contudo, tendo presente que na oposição o requerido não se limitou a invocar fundamentos próprios do recurso, mas também fundamentos próprios daquele meio de defesa (oposição) e porque a decisão sobre a oposição constitui complemento e parte integrante da inicialmente proferida, tudo se deve passar como se ambas consistissem numa decisão final unitária, perante a qual se abre a via do recurso susceptível de abarcar também as questões que a decisão inicial suscite (64).
Obviando, assim, a uma eventual arguição de nulidade do presente acórdão, por omissão de pronúncia (art. 615º, n.º 1, al. d) “ex vi” do art. 666º, n.º 1, ambos do CPC), não deixaremos de apreciar a invocada questão.
Como adiante melhor se explicitará, nos termos do art. 581º do CPC a excepção de caso julgado supõe a repetição de numa causa.
Nessa eventualidade, é vedado ao tribunal conhecer do pedido, pelo que absolverá da instância (art. 576º, n.º 2 do CPC).
Isto para dizer que, conquanto os recorrentes não explicitem o preceito legal em que alicerçam a invocada nulidade da sentença, é de admitir que a mesma possa ser enquadrada em qualquer um dos dois segmentos previstos na al d) do n.º 1 do art. 615º do CPC.
No tocante à omissão de pronúncia já anteriormente explicitámos os pressupostos que subjazem a esse segmento normativo (para os quais se remete).
Relativamente ao segundo segmento, entende-se que o excesso de pronúncia gerador da nulidade «só tem lugar quando o juiz conhece de pedidos, causas de pedir ou exceções de que não podia tomar conhecimento» (65).
Como reiteradamente é referido, o efeito mais importante a que a sentença pode conduzir é o caso julgado.
Diz-se que a sentença forma caso julgado quando a decisão nela contida se torna imodificável ou imutável. A imodificabilidade da sentença é, assim, o núcleo essencial do caso julgado.
Neste sentido, refere Miguel Teixeira de Sousa (66) que «o caso julgado traduz-se na inadmissibilidade da substituição ou modificação por qualquer tribunal (incluindo aquele que a proferiu) em consequência da insusceptibilidade da sua impugnação por reclamação ou recurso ordinário. O caso julgado torna indiscutível o resultado da aplicação do direito ao caso concreto que é realizada pelo tribunal, ou seja, o conteúdo da decisão deste órgão».
E a decisão considera-se transitada em julgado,nos termos doart. 628º do CPC, «logo que não seja suscetível de recurso ordinário ou de reclamação» (67).
Tanto podem transitar em julgado as sentenças ou despachos recorríveis, relativos a questões de carácter processual, como a decisão referente ao mérito da causa, isto é, respeitante à concreta relação material controvertida.
No primeiro caso, forma-se o caso julgado formal (art. 620º do CPC); no segundo caso, forma-se o caso julgado material ou substancial (sendo apenas este o que interessa aqui analisar).
Pressupondo ambos a preclusão dos recursos ordinários ou da reclamação, o caso julgado material tem força obrigatória dentro do processo (eficácia intraprocessual) e fora dele, impedindo que o mesmo ou outro tribunal, ou qualquer outra autoridade, possa definir em termos diferentes o direito concreto aplicável à relação material litigada (68). - cfr. art. 619º, n.º 1 do CPC.
O fundamento do caso julgado material fundamenta-se em razões de prestígio dos tribunais, que «seria comprometido no mais alto grau se a mesma situação concreta, uma vez definida por eles em dado sentido, pudesse ser validamente definida em sentido diferente» (69), mas também em razões de certeza ou segurança jurídicas, pois que, «desde que uma sentença, transitada em julgado, reconhece a alguém certo benefício, certo direito, certos bens, é absolutamente indispensável, para que haja confiança e segurança nas relações sociais, que esse benefício, esse direito, esses bens constituam aquisições definitivas, isto é, que não possam ser tirados por uma sentença posterior» (70). A significar que o “caso julgado é uma exigência da boa administração da justiça, da funcionalidade dos tribunais e da salvaguarda da paz social, pois evita que uma mesma acção seja instaurada várias vezes, obsta a que sobre a mesma situação recaiam soluções contraditórias e garante a resolução definitiva dos litígios que os tribunais são chamados a dirimir. Ele é, por isso, a expressão dos valores da certeza e da segurança que são imanentes a qualquer ordem jurídica” (71).
O caso julgado tem uma função negativa e uma função positiva.
A função negativa (única que releva à situação dos autos) encontra-se na finalidade de impedir que a questão que foi objeto da decisão proferida e inimpugnável possa voltar a ser, ela própria, na sua essencial identidade, recolocada à apreciação do tribunal: se tal ocorrer, por força da figura da exceção dilatória de caso julgado, que visa evitar que o tribunal seja colocado na alternativa de contradizer ou de reproduzir uma decisão anterior (art. 580º, n.º 2 do CPC), deve o juiz abster-se de voltar a apreciar a matéria ou questão que se mostra já jurisdicionalmente decidida, em termos definitivos, como objeto de uma anterior ação (art. 576º, n.º 2 do CPC).
O tribunal fica sujeito tanto a uma “proibição de contradição da decisão transitada”, como a “uma proibição de repetição daquela decisão” (72).
Considerando a função negativa do caso julgado, o legislador configura-a como exceção dilatória nominada, constante da al. i) do art. 577º do CPC, que pode ser suscitada pelo demandado e conhecida oficiosamente (art. 578º do CPC).
Atenta a exceção (do caso julgado), o juiz fica impedido de apreciar o mérito da causa e dá lugar à absolvição da instância (arts. 576º, n.ºs 1 e 2 e 577º, al. i) do CPC).
Os limites dentro dos quais opera a força do caso julgado material são traçados pelos elementos identificativos da ação: - as partes, o pedido e a causa de pedir (art. 581º, n.º 1 do CPC).
A esse propósito, segundo o estatuído no n.º 1 do art. 581º do CPC, “repete-se a causa quando se propõe uma ação idêntica a outra quanto aos sujeitos, ao pedido e à causa de pedir”.
“Há identidade de sujeitos quando as partes são as mesmas sob o ponto de vista da sua qualidade jurídica” - n.º 2 do mesmo preceito normativo -, ocorrendo “identidade do pedido quando numa e noutra causa se pretende obter o mesmo efeito jurídico - n.º 3 do citado preceito legal -, sendo que “há identidade de causa de pedir quando a pretensão deduzida nas duas acções procede do mesmo facto jurídico” - n.º 4.
Segundo o critério propugnado por Antunes Varela, Miguel Bezerra e Sampaio Nora (73), “para sabermos se há ou não repetição da acção, deve atender-se não só ao critério formal (assente na tríplice identidade dos elementos que definem a acção) fixado e desenvolvido no artigo 498º, mas também à directriz substancial traçada no n.º 2 do artigo 497º, onde se afirma que a excepção da litispendência (tal como a do caso julgado) tem por fim evitar que o tribunal seja colocado na alternativa de contradizer ou de reproduzir uma decisão anterior”.
Questão que tem sido debatida na doutrina e jurisprudência – e sem soluções unívocas – é a de saber se o caso julgado respeita apenas à parte decisória ou se também abrange os seus fundamentos.
A esse respeito do alcance do caso julgado o art. 621º do CPC clarifica que a sentença constitui caso julgado nos precisos limites e termos em que julga, ou seja, em princípio, o caso julgado só se forma sobre a decisão contida na sentença.
E quanto a esse concreto ponto é doutrina dominante que a economia processual, o prestígio das instituições judiciárias, reportado à coerência das decisões que proferem, e o prosseguido fim da estabilidade e certeza das relações jurídicas, são melhor servidos por aquele critério eclético, que sem tornar extensiva e eficácia do caso julgado a todos os motivos objetivos da sentença, reconhece, todavia, essa autoridade à decisão daquelas questões preliminares que forem antecedente lógico indispensável à emissão da parte dispositiva do julgado (74). Ou seja, quando a decisão da questão preliminar for tal que seja também de considerar como solicitada pela parte, a autoridade do caso julgado tem de abranger essa decisão.
Nas palavras de Alberto dos Reis (75), o “que adquire força e autoridade de caso julgado é a posição tomada pelo juiz quanto aos bens ou direitos (materiais) litigados pelas partes e à concessão ou denegação da tutela jurisdicional para esses bens ou direitos. Não a motivação da sentença: as razões que determinaram o juiz, as soluções por ele dadas aos vários problemas que teve de resolver para chegar àquela conclusão final (pontos ou questões prejudiciais)”. Asserção que não exclui o recurso à parte motivatória da sentença para interpretar, reconstruir, o verdadeiro conteúdo da decisão, embora a essência do caso julgado se contenha, não na definição de uma questão, mas no reconhecimento ou negação de um bem (76).
Reportando-nos, agora, ao caso concreto – e aderindo na íntegra aos fundamentos aduzidos pelos recorridos nas contra-alegações – dir-se-á que:
- Não se verifica a repetição de uma causa, dado que a oposição à penhora é um incidente de uma acção executiva e o presente arresto é uma providência cautelar requerida pelo credor destinado a obter uma decisão judicial imprescindível à apreensão de bens ou direitos necessários à satisfação do seu direito (assegura que os bens apreendidos se manterão na esfera jurídica do devedor até que no processo executivo seja realizada a penhora, antecedente do pagamento do crédito).
- Não há identidade de sujeitos, dado que a oposição à penhora foi deduzida apenas pela sociedade requerida e o arresto foi requerido contra essa sociedade e ainda contra a M. A. e o J. B. (réus na acção de impugnação pauliana).
- Não há identidade do pedido, dado que não se pretende obter o mesmo efeito jurídico: a oposição à penhora visa o levantamento da penhora (artº 785º, nº6 do CPC) e o arresto visa a apreensão de um bem (para posteriormente ser convertido em penhora).
- Não há identidade de causa de pedir, dado que a pretensão deduzida nas duas “acções” não procede do mesmo facto jurídico.
- A factualidade carreada para a oposição à penhora é distinta daquela que deu origem ao presente arresto, desde logo porque os processos visam fins diferentes.
- Não foi deduzida sequer a mesma pretensão e, muito menos, com os mesmos fundamentos.
- Não se verifica caso julgado relativamente à decisão sobre a (não) aplicação do instituto jurídico da desconsideração da personalidade jurídica que não foi sequer apreciada pelo Tribunal (seja pela 1ª Instância, seja pela Relação) no incidente de oposição à penhora.
- Como refere a decisão recorrida, a própria decisão do Tribunal Superior “expressamente refere não ter sido alegada realidade que traduza actuação abusiva”, ou seja, o tribunal não apreciou essa questão por considerar que o processo não continha matéria de facto para esse efeito.
Conclui-se, por conseguinte, pela inverificação da exceção de caso julgado relativamente à questão da desconsideração da pessoa colectiva e, consequentemente, pelo indeferimento da invocada nulidade da sentença.
Consequentemente, improcedem as conclusões Y a AAA.
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A sentença recorrida merece, assim, plena confirmação, improcedendo as conclusões dos apelantes.
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Sumário (ao abrigo do disposto no art. 663º, n.º 7 do CPC):
I - O arresto pode ser decretado contra o adquirente dos bens do devedor, exigindo-se nesse caso a impugnação judicial da transmissão dos bens (art. 619º, n.º 2 do Código Civil e 392º, n.º 2 do CPC), seja através da impugnação pauliana ou da declaração de nulidade.
II – Nesse caso, o procedimento cautelar de arresto tanto pode ser instaurado como preliminar ou incidente de ação (declarativa) de impugnação da transmissão dos bens.
III - Se o arresto for deduzido na pendência e como incidente da ação de impugnação, o requerente do arresto tem apenas de alegar e provar a factualidade relativa à probabilidade da existência do crédito e ao justo receio de perda da garantia patrimonial, sendo que a prova dos pressupostos da impugnação pauliana e/ou da desconsideração da pessoa coletiva há-de fazer-se naquela ação principal.
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VI – DECISÃO
Perante o exposto acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar improcedente o recurso de apelação interposto pelos apelantes, confirmando a sentença recorrida.
Custas da apelação a cargo dos apelantes (art. 527º do CPC).
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Guimarães, 9 de abril de 2019
Alcides Rodrigues (relator)
Joaquim Boavida (1º adjunto)
Paulo Reis (2º adjunto)
1. Todas as transcrições efetuadas respeitam o respetivo original, salvo gralhas evidentes e a ortografia utilizada. 2. Cfr. Ac. da RP de 24/01/2018 (relator Nélson Fernandes), in www.dgsi.pt. e Paulo Ramos Faria e Ana Luísa Loureiro, in Primeiras Notas ao Novo Código de Processo Civil, vol. I, 2ª ed., 2014, Almedina, pp. 598/601. 3. Cfr. Ac. do STJ de 17/10/2017 (relator Alexandre Reis), Acs. da RG de 4/10/2018 (relatora Eugénia Cunha) e de 5/04/2018 (relatora Eugénia Cunha), todos disponíveis in www.dgsi.pt. e Ac. do STJ de 1/4/2014 (relator Alves Velho), Processo 360/09, Sumários, Abril/2014, p. 215, https://www.stj.pt/wp-content/uploads/2018/01/sumarios-civel-2014.pdf. 4. Cfr. Ac. do STJ de 28/02/2013 (relator João Bernardo), in www.dgsi.pt. 5. Como escreve Teixeira de Sousa, este «corolário do princípio da disponibilidade objectiva (artºs 264º, nº 1 e 664º, 2ª parte) significa que o tribunal deve examinar toda a matéria de facto alegada pelas partes e analisar todos os pedidos formulados por elas, com excepção apenas das matérias ou pedidos que forem juridicamente irrelevantes ou cuja apreciação se tornar inútil pelo enquadramento jurídico escolhido ou pela resposta fornecida a outras questões» - cfr. Estudos Sobre o Novo Processo Civil, Lex, 1997, p. 220. Acrescenta o citado autor que também “a falta de apreciação de matéria de conhecimento oficioso constitui omissão de pronúncia (se, por exemplo, o tribunal condena o réu a restituir a quantia mutuada e não considera a nulidade do respetivo contrato pro inobservância da forma legal (artºs. 1143º e 220º CC), o não conhecimento dessa nulidade (que é de apreciação oficiosa, artº. 286 CC) origina uma omissão de pronúncia e, por isso, gera a nulidade da decisão”. E não existe uma omissão de pronúncia, mas sim “um erro in iudicando, se o tribunal não aprecia um determinado pedido com o argumento de que ele não foi formulado: aquela omissão pressupõe uma abstenção não fundamentada de julgamento e não uma fundamentação errada para não conhecer de certa questão”. 6. Cfr., entre outros, F. P. Lucas Ferreira de Almeida, Direito Processual Civil, Vol. II, 2015, Almedina, p. 371 e António Júlio Cunha, Direito Processual Civil Declarativo, 2ª ed., Quid Juris, p. 364. 7. Cfr. Ac. do STJ de 8/11/2016 (relator Nuno Cameira), in www.dgsi.pt. 8. Cfr. José Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, Código de Processo Civil Anotado, vol. 2º, 3ª ed., Almedina, p. 713. 9. Cfr. Ac. do STJ de 30/04/2014 (relator Mário Belo Morgado), in www.dgsi.pt. e Cardona Ferreira, Guia de Recursos em Processo Civil, 6.ª edição, Coimbra Editora, pp. 69/70. 10. Cfr. Sara Rodrigues Campos, (In)admissibilidade de Provas Ilícitas (Dissemelhança na Produção de Prova no Direito Processual?), Almedina, p. 29. 11. Cfr., Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, vol. I, 4ª ed. revista, Coimbra Editora, p. 415, Manuel A. Domingues de Andrade, Noções Elementares de Processo Civil, reimpressão, Coimbra Editora, 1993, p. 379 e Ac. do TC n.º 86/88, de 13/04/1988 (relator Messias Bento), in www.dgsi.pt. 12. Cfr., Miguel Teixeira de Sousa, As Partes, o Objecto e a Prova na Acção Declarativa, Lisboa, 1995, p. 228 e ss.. 13. Cfr. Acórdão do TC n.º 209/95, proc. n.º 133/93, 1.ª secção, DR, II Série, n.º 295, de 23.12.1995, p. 15380. 14. Cfr. Ac. da RC de 21/04/2015 (relatora Maria João Areias), in www.dgsi.pt.. 15. Cfr. Anselmo de Castro, in Direito Processual Civil Declaratório, vol. 1, Almedina, p. 130 e segs. 16. Cfr. Alberto dos Reis, A figura do processo cautelar, BMJ, n.º 3, p. 45. 17. Cfr.António Santos Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Pires de Sousa, Código de Processo Civil Anotado, Vol. I - Parte Geral e Processo de Declaração, Almedina, p. 424. 18. Cfr. António Abrantes Geraldes, Temas da Reforma do Processo Civil, Procedimento Cautelar Comum, Vol. III, Almedina, p. 109 e a doutrina e jurisprudência aí citadas; Paulo Sousa Pinheiro, o Procedimento Cautelar Comum no Direito Processual do Trabalho, 2ª ed., Almedina, pp. 82/83. 19. Cfr. Ac. do STJ de 9/02/1995, BMJ, n.º 444, pp. 542/547 e Joel Timóteo Ramos Pereira, in Prontuário de Formulários e Trâmites, Vol. II, Procedimentos e Medidas Cautelares (com incidentes Conexos), Quid Juris, 2002, pp. 200/201 e 336. 20. Cfr. Ac. do STJ de 23/06/2016 (relator Manuel Tomé Soares Gomes), Ac. da RL de 6/12/2017 (relatora Cristina Neves), Ac. da RP de 15/02/2016 (relator Domingos Morais), Ac. da RC de 24/03/2015 (relator Fonte Ramos), Ac. RP de 17/12/2014 (relatora Maria José Costa Pinto) e Ac. da RL de 22.10.2014 (relatora Celina Nóbrega), todos disponíveis in www.dgsi.pt. 21. Cfr. Um Novo Código de Processo Civil ?, Em busca das Diferenças, Vida Económica, 2014, p. 62. 22. “31. A 2ª Requerida, quando instada para proceder ao pagamento da caução, e confrontada com o facto de não ter a totalidade desse montante imediatamente disponível, pediu parte do dinheiro emprestado a terceiros. 32. Mais tarde, a 10/10/2016, a 2ª Requerida conseguiu vender um imóvel em Espanha de que era proprietária (cfr. cópia de escritura que se junta como documento n.º 1, cuja cópia consta já dos autos principais, por ter sido junta pelos Requeridos em audiência de julgamento) 33. Com o produto dessa venda pagou integralmente os referidos empréstimos. 34. Assim, os Primeiros Requeridos não contribuíram nem emprestaram qualquer montante à 2ª Requerida para o pagamento daquela caução”. 23. Como nos dá conta Abrantes Geraldes (Temas (…), Vol. III, p. 109), é entendimento generalizado a inadmissibilidade de articulados supervenientes no âmbito dos procedimentos cautelares; em sentido similar, Miguel Teixeira de Sousa, Estudos (…), p. 230 e Joel Timóteo Ramos Pereira, obra citada, p. 322/323. 24. Na parte final das suas conclusões [WW a AAA] os recorrentes invocam uma outra nulidade da sentença, atinente à verificação da exceção do caso julgado impeditiva do conhecimento da desconsideração da personalidade coletiva. Porque a cabal apreensão dessa nulidade pressupõe a prévia apreciação do mérito da causa, relega-se o seu conhecimento para momento ulterior. 25. Cfr., na doutrina, Abrantes Geraldes Recursos no Novo Código de Processo Civil, 2017 – 4ª ed., Almedina, pp. 271/300, Luís Filipe Pires de Sousa, Prova testemunhal, Almedina, 2017 – reimpressão, p. 384 a 396, Miguel Teixeira de Sousa, em anotação ao Ac. do STJ de 24/09/2013, in Cadernos de Direito Privado, n.º 44, Outubro/dezembro 2013, p. 33 e F. P. Lucas Ferreira de Almeida, obra citada, pp. 462 a 469; na jurisprudência, Acs. do STJ de 7/09/2017 (relator Tomé Gomes), de 24-9-2013 (relator Azevedo Ramos), de 03.11.2009 (relator Moreira Alves) e de 01.07.2010 (relator Bettencourt de Faria); Acs. da RG de 11/07/2017 (relatora Maria João Matos), de 14/06/2017 (relator Pedro Damião e Cunha) e de 02/11/2017 (relator António Barroca Penha), todos consultáveis em www.dgsi.pt. 26. Cujo teor é o seguinte: 1.93 O dinheiro da caução pertence à 2ª Requerida. 1.94 Não aos Primeiros Requeridos. 1.95 A diligência pretendida pelos Requerentes opera-se sobre bens que pertencem exclusivamente à 2ª Requerida, que não é devedora do crédito reclamado pelos Requerentes. 1.96 O arresto, tal como requerido e decretado nos presentes autos, teve como objeto o valor de € 97.572,83, que pertence à 2ª Requerida, e que corresponde ao valor excedente de uma caução por esta prestada no âmbito de um processo judicial. 1.97 Ou seja, o objeto da providência requerida corresponde a um bem que pertence única e exclusivamente à Segunda Requerida, que não é a devedora do crédito reclamado pelos Requerentes. 1.98 Desta feita, para ser legalmente admissível o arresto, necessário seria que os requerentes houvessem procedido como preceituado no citado n.º 2 do artigo 392.º do CPC. 1.99 O que, manifestamente, não ocorreu quanto pedido de arresto do valor de € 97.572,83. 1.100 Aquele montante pertence e sempre pertenceu à 2ª Requerida. 1.101 Que foi quem o pagou. 1.102 Aquele montante não pertencia nem proveio dos 1os Requeridos. 1.103 Que não transferiram nem emprestaram por qualquer forma aquela quantia à 2ª Requerida. 1.104 A 2ª Requerida, quando instada para proceder ao pagamento da caução, e confrontada com o facto de não ter a totalidade desse montante imediatamente disponível, pediu parte do dinheiro emprestado a terceiros. 1.105 Mais tarde, a 10/10/2016, a 2ª Requerida conseguiu vender um imóvel em Espanha de que era proprietária (cfr. cópia de escritura que se junta como documento n.º 1, cuja cópia consta já dos autos principais, por ter sido junta pelos Requeridos em audiência de julgamento). 1.106 Com o produto dessa venda pagou integralmente os referidos empréstimos. 1.107 Assim, os Primeiros Requeridos não contribuíram nem emprestaram qualquer montante à 2ª Requerida para o pagamento daquela caução. 1.108 Pelo que não se encontram preenchidos os requisitos de admissibilidade de decretamento do arresto, sendo o mesmo ilícito por violar frontalmente o preceituado no artigo 391.º do CPC. 27. Cfr. Marco Filipe Carvalho Gonçalves, Providências Cautelares, 2017 - 3ª ed., Almedina, pp. 359 e 379. 28. Cfr. Abrantes Geraldes, Temas (…), vol. III, p. 232. 29. Cfr., neste sentido, Acs. do STJ de 28/09/2017, proc. n.º 659/12.6TVLSB.L1.S1 (relatora Fernanda Isabel Pereira) e proc. n.º 809/10.7TBLMG.C1.S1 (relatora Fernanda Isabel Pereira), Acs. da RP 24/10/2016 (relator Oliveira Abreu) e de 18/09/2017 (relator Manuel Domingos Fernandes) e Ac. da RE de 3/11/2016 (relatora M. G. Araújo), todos acessíveis inwww.dgsi.pt.; no sentido de que às conclusões de direito são assimiladas, por analogia, as conclusões de facto, ou seja, “os juízos de valor, em si não jurídicos, emitidos a partir dos factos provados”, José Lebre de Freitas, A. Montalvão Machado e Rui Pinto, Código de Processo Civil-Anotado, Vol. II, 2008, Coimbra Editora, pp. 637 e 638. 30. Cfr., Acs. do STJ de 28/09/2017 (relatora Fernanda Isabel Pereira), de 29/04/2015 (relator Fernandes da Silva), de 14/01/2015 (relator Fernandes da Silva), de 14/01/2015 (relator Pinto Hespanhol); na doutrina, Tiago Caiado Milheiro, In Nulidades da Decisão Da Matéria de Facto, www.julgar.pt., e Antunes Varela, “Juízos de valor da lei substantiva, o apuramento dos factos na ação e o recurso de revista”, CJ, Ano XX, tomo IV, pp. 7 a 14. 31. Cfr., Ac. RP de 23/04/2018 (relator Jerónimo Freitas), in www.dgsi.pt.. 32. Manteve-se a ordem/sequência adotada na sentença recorrida. 33. Cfr. Marco Filipe Carvalho Gonçalves, obra citada, p. 359. 34. Cfr. Temas (…), vol. III, p. 256. 35. Cfr. Ac. da RE de 19/12/2006 (relator Almeida Simões), in www.dgsi.pt. 36. Cfr., António Júlio Cunha, obra citada, p. 108.
37. Cfr. Ac. da RP de 25/09/2012 (relator Manuel Pinto dos Santos), in www.dgsi.pt. 38. Cfr., neste sentido, António Santos Abrantes Geraldes, Temas da Reforma do Processo Civil, Vol. IV, 6. Procedimentos Cautelares Especificados, Almedina, 2001, p. 169, e Joel Timóteo Ramos Pereira, obra citada, pp. 631/632. 39. Cfr., António Santos Abrantes Geraldes, Temas …, Vol. IV, pp. 172-174. 40. Cfr. Ac. da RE de 4/05/2006 (relatora Maria Alexandra Santos), in www.dgsi.pt. 41. Cfr., neste sentido, António Santos Abrantes Geraldes, Temas …, Vol. IV, p. 176, Joel Timóteo Ramos Pereira, obra citada, p. 633 e o Ac. do STJ de 3.03.98, CJSTJ, T. I, p. 116. 42. Cfr., Acs. da RP de 16/06/2009 (relatora Anabela Dias da Silva) e de 07/10/2008 (relator Carlos Moreira), Ac. da RL de 28/11/2013 (relatora Fernanda Isabel Pereira), ambos in www.dgsi.pt.; Alberto dos Reis, Código de Processo Civil Anotado, vol. II, 3ª ed., Coimbra Editora, p. 18/26, e Jacinto Rodrigues Bastos, Notas ao Código de Processo Civil, vol. II, 3ª ed., p. 191, Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, Vol. II, 4ª ed., p. 453 e José Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, obra citada, p. 144. 43. Cfr. Rita Barbosa da Cruz, O Arresto, in Revista O Direito, Ano 132º, 2000, I-II, Janeiro-Junho, p. 124. 44. Cfr. Antunes Varela, Das Obrigações (…), vol. II, p. 452. 45. Identicamente, nos termos do princípio geral estabelecido no art. 817º do CC, “[n]ão sendo a obrigação voluntariamente cumprida, tem o credor o direito de exigir judicialmente o seu cumprimento e de executar o património do devedor (…)” (sublinhado nosso). 46. Cfr. Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, Vol. I, 4ª ed., Coimbra Editora, p. 637. 47. Evitando que os requeridos, alertados pela propositura e citação na ação de impugnação, possam facilmente ocultar ou dissipar os bens. 48. Cfr. obra citada, vol. 2º, p. 151;no mesmo sentido, José Lebre de Freitas, Código Civil Anotado (Ana Prata Coord.), volume I, Almedina, 2017, p. 801/802. 49. Cfr., Temas (…)Vol. IV, 6. pp. 194/195. 50. Cfr., no mesmo sentido, António Santos Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Pires de Sousa, , obra citada, p. 466 e João Cura Mariano, Impugnação Pauliana, Almedina, pp. 285/287. 51. Sobre essa matéria os nossos Tribunais Superiores têm-se pronunciado nos termos seguintes: - No Ac. da RC de 13/10/2015 (relator Alexandre Reis), in www.dgsi.pt, foi decidido que: “II - Tratando-se de arresto requerido como preliminar da ação pauliana contra o adquirente de bens do devedor, o requerente deve deduzir, além dos requisitos em geral exigidos, os factos que tornem provável a procedência de tal impugnação, podendo pedir-se, com esse pressuposto, o arresto de bens alienados pelo devedor, mas não quaisquer outros que pertençam ao adquirente, terceiro perante a relação obrigacional. Daí que se justifique a prova indiciária do justo receio da prática por aquele terceiro de actos de alienação e/ou oneração dos bens objecto do acto de transmissão a impugnar”. - No ac. da RP de 17/09/2013 (relator Manuel Pinto dos Santos), in www.dgsi.pt, foi considerado que: “I - O arresto pode ser deduzido como preliminar ou como incidente de acção de impugnação pauliana; em tais casos, o credor tem o direito de requerer o arresto contra o adquirente dos bens do devedor (arts. 619º nº 2 do CCiv. e 407º do CPC). II - Se aquela acção já estiver proposta, o requerente do arresto tem apenas que alegar e provar a factualidade relativa à probabilidade do crédito e ao justo receio de perda da garantia; se a mesma não tiver sido ainda instaurada, caberá àquele alegar e provar (sumariamente), além destes requisitos (próprios do arresto), também os pressupostos da impugnação pauliana. III - O arresto, nestes casos, pode ter por objecto (bem a arrestar) o bem cujo acto/contrato é posto em causa na acção de impugnação; excepcionalmente, em situações enquadráveis na previsão dos nºs 2 e 3 do art. 616º do CCiv., pode incidir sobre bens pertencentes ao terceiro adquirente. IV - No primeiro caso referido no parágrafo anterior, os dois pressupostos da procedência do arresto só têm que ser aferidos relativamente ao requerido devedor; no segundo, o deferimento da providência cautelar depende da alegação e prova, por parte do requerente, do justo receio de perda da solvabilidade do terceiro adquirente. (…)”. - No Ac. da RL de 23/11/2006 (relatora Fátima Galante), in www.dgsi.pt, foi entendido que: “(…) II. A lei concede ao credor o direito de requerer o arresto contra o adquirente dos bens do devedor (nº. 2 do art. 619º do CCivil). Neste caso, o requerente do arresto, se não mostrar ter sido judicialmente impugnada a aquisição, deduzirá ainda os factos que tornem provável a procedência da impugnação (art. 407º n. 2 do CPC). III. Assim, mesmo que ainda não tenha sido judicialmente impugnada a aquisição, o arresto pode ser requerido contra o adquirente de bens do devedor desde que o requerente deduza os factos que tornem provável a procedência da impugnação”. - No Ac. da RC de 20/03/2007 (relator Nunes Ribeiro), in www.dgsi.pt., foi decidido que: “A lei admite que, excepcionalmente, possam ser executados bens de terceiro, do mesmo modo que admite, excepcionalmente, também, o seu arresto. É o que sucede por força do estatuído no nº2 do art.619º do C.Civil e nº 2 do art.º 407º do C.P.Civil, relativamente a terceiros que hajam adquirido bens do devedor, desde que a respectiva transmissão tenha sido objecto de impugnação judicial ou, quando ainda não impugnada, se demonstre a probabilidade da procedência da impugnação”. 52. O que não é confundível com o arresto de bens do devedor que se encontrem na posse de terceiro (art. 747º do CPC), posto que nessa situação os bens do executado devem ser apreendidos ainda que, por qualquer título, se encontrem em poder de terceiro (n.º 1). 53. Terá o requerente de provar, nomeadamente, que o crédito é anterior ao acto que envolveu diminuição da garantia patrimonial do crédito ou, sendo posterior, ter sido o acto realizado dolosamente com o fim de impedir a satisfação do direito do futuro credor, bem como que do acto tenha resultado a impossibilidade, para o credor, de obter a satisfação integral do seu crédito ou agravamento dessa impossibilidade (art. 610º do CC). Se o ato for oneroso, tem ainda de provar que o devedor e o terceiro adquirente agiram de má fé, ou seja, com consciência do prejuízo que o acto causa ao credor (art. 612º do CC). 54. Cfr. Rita Barbosa da Cruz, estudo e obra citada, p. 161. 55. No sentido de que a ineficácia pode ser obtida através da ação pauliana ou da declaração de nulidade, Antunes Varela, obra citada, pp. 453/454. 56. Cfr. Pires de Lima e Antunes Varela, obra citada, p. 637. 57. Cfr. Ac. da RP de 17/09/2013 (relator Manuel Pinto dos Santos), in www.dgsi.pt. 58. Cfr. Ac. do STJ de 29/05/2007 (relator Sebastião Póvoas), in www.dgsi.pt. 59. Cfr. José Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, obra citada, pp. 151/152. 60. Cfr., António Abrantes Geraldes, Temas (…), Vol. III, p. 210. 61. Sem embargo do que especificamente se mostra estabelecido para o embargo de obra nova (art. 401º do CPC) e para a suspensão de deliberações sociais (art. 381º, n.º 2 do CPC). 62. Cfr., obra citada, p. 83. 63. Cfr. Tratado de Direito Civil Português, I, Tomo III, 2004, Almedina, pp. 627-649. 64. Cfr., Lopes do Rego, Comentários ao Código de Processo Civil, Vol. I, 2.ª ed., 2004, Almedina, p. 357 e Ac. da RC de 13/10/2015 (relator Alexandre Reis), in www.dgsi.pt.. 65. Cfr. Ac. do STJ de 6/12/2012 (relator João Bernardo), in www.dgsi.pt. 66. Cfr., Estudos (…), p. 567. 67. Nos termos do art. 627º, n.º 2 do CPC, os “recursos são ordinários ou extraordinários, sendo ordinários os recursos de apelação e de revista e extraordinários o recurso para uniformização de jurisprudência e a revisão”. 68. Cfr. Antunes Varela, J. Miguel Bezerra e Sampaio Nora, Manual de Processo Civil, 2ª ed., Coimbra Editora, pp. 703-704. 69. Cfr. Manuel de Andrade, obra citada, pp. 304, 306. 70. Cfr. Alberto dos Reis, Código de Processo Civil Anotado, vol. III, 4ª ed., 1985, Coimbra Editora, p. 94. 71. Cfr. Miguel Teixeira de Sousa, Estudos (…), p. 568. 72. Cfr. Miguel Teixeira de Sousa, Estudos (…), p. 574. 73. Cfr. Antunes Varela, Miguel Bezerra e Sampaio Nora, obra citada, p. 302. 74. Cfr. J. Rodrigues Bastos, in Notas ao Código de Processo Civil, Vol. III, 3ª ed. p. 201. 75. Cfr. Código (…), vol. III, p. 139. 76. Cfr. Manuel de Andrade, obra citada, p. 318 e Antunes Varela, J. Miguel Bezerra e Sampaio Nora, obra citada, p. 715.