Ups... Isto não correu muito bem. Por favor experimente outra vez.
REGISTO PREDIAL
RECUSA
DEVERES
Sumário
1. Constitui fundamento de recusa de registo, nos termos da alínea b) do artigo 69.º do Código do Registo Predial, a não apresentação de documento que titula o ato a registar.
2. Decorre do artigo 73.º do mesmo Código que impende sobre a conservatória do registo predial um dever geral de acessoria dos interessados, seja através da realização de diligências oficiosas, seja através da notificação dos interessados para, nos prazos previstos na lei, serem juntos aos autos os documentos em falta de modo a suprir as deficiências do procedimento de registo.
Texto Integral
Acordam na 1.ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa
I – RELATÓRIO
A SA… S.A., ao abrigo dos artigos 140.º a 149.º do Código de Registo Predial[1] (doravante, CRPredial) impugnou judicialmente o despacho de qualificação proferido, em …/01/2018, pela ….a CONSERVATÓRIA DO REGISTO PREDIAL DE ALMADA, com referência à apresentação …/20180117, que recusou o registo de nomeação de terceiro.
Em 06/06/2018 (Ref.ª 377186034 – fls. 60-62), foi proferida sentença, que vem a ser a recorrida, que julgou a impugnação improcedente, mantendo o despacho de recusa do registo.
Inconformada, apelou a impugnante, apresentando as seguintes conclusões:
1. A sentença, que aqui e agora, se está a por em crise, baseou-se, exclusivamente, em o despacho da Senhora Conservadora da …a Conservatória do Registo Predial de Almada, que recusou o registo, requisitado pela requisição de registo, que deu origem à Ap. …, de … de janeiro de 2018, se ter fundamentado, designadamente na alínea c), do número 1, do artigo 69.°, do CRP, ou seja, no facto, através de tal apresentação submetido a registo já estar registado, ou não estar sujeito a registo, e esse fundamento de recusa não permitir a aplicação do artigo 73.°-2, do CRP.
2. Ora, na impugnação judicial, que, contra o despacho de qualificação de recusa em causa, foi, oportunamente, deduzida pela agora recorrente, esta alegou que não se verificava nenhum dos fundamentos, nem de facto, nem de direito, em que o despacho de qualificação de recusa impugnado, se havia fundamentado para recusar, como recusou, a efetivação do registo em causa.
3. Tendo a recorrente articulado, e limitando-nos agora ao artigo 69.º-1-c), do CRP, por ser aquele em que, como atrás se mencionou já, unicamente se funda a sentença sob recurso, para considerar, como considerou, improcedente a impugnação judicial da recorrente, pelo que só a tal norma legal nos interessa, pelo menos por ora, fazer referência, designadamente no número 18, a páginas 6, da impugnação judicial dela, que, apesar de na alínea c), do número 1, do artigo 69.°, do CRP, se prever efetivamente uma causa de recusa de registo, consistente em o facto já estar registado, ou não estar sujeito a registo, tal situação não ocorria no caso em análise, não se podendo pois, naturalmente, tal norma legal aplicar a esse caso, nem nela se ter baseado a não efetuação à agora recorrente, da notificação, a que alude o artigo 73.°-2, do CRP.
4. Na verdade, o facto que se pretendia registar, que era, e é, a nomeação de um terceiro, num contrato para pessoa a nomear, não só estava, e está, sujeito a registo (artigo 101.°-2-f), do CRP), como também não se encontrava então, e continua a não se encontrar agora, registado.
5. Tendo-se pois o despacho de qualificação de recusa impugnado fundamentado, designadamente, numa norma jurídica, rectius o artigo 69.° -l-c), do CRP, que não tinha aplicação ao caso vertente, por nele não se verificar, como nele não se verificava, nem se verifica, a hipótese prevista na mesma norma, ou seja, estar-se em presença de um facto não sujeito a registo, ou já registado.
6. Aplicabilidade esta que a sentença sob recurso manteve, embora naturalmente mal, na modesta e humilde, mas que procura ser fundada e fundamentada, opinião da recorrente, e sem prejuízo de outra, certamente sempre possível, e até, talvez, ou, neste caso, e porque se trata da opinião do Senhor Juiz de 1.ª instância, seguramente mais bem dito até, certamente, melhor e mais autorizada, e do maior respeito e da maior consideração, por tal outra opinião, merecidos, devidos e tidos, respeito e consideração esses que são aliás, diga-se em abono da melhor verdade, muito elevados no caso vertente.
7. Referindo-se ainda, embora isso não possa ter relevância para este recurso, porque a sentença apelada a tal não se refere, que, também os outros motivos, de facto e de direito, em que se fundamentou o despacho de qualificação de recusa em causa e atrás referidos, não poderiam conduzir a essa qualificação de recusa.
8. Tendo pois, e muito embora data venia, a sentença sob recurso violado, como violou, diversas disposições legais, nomeadamente o artigo 73.°-2, do CRP.
9. Devendo por isso tal sentença, e sem que isso possa constituir, nem constitua, qualquer demérito, por pequeno, ou mínimo até, que seja, para com o Distinto Senhor Juiz de l.ª instância sob recurso, ser, por V. Exas., Exmos. Senhores Doutores Juízes Desembargadores do Tribunal da Relação de Lisboa, anulada - artigos 639.°-1 (in 18 fine), do CPC 2013 e 156.°, do CRP -, o que se peticiona.
10. Prolatando-se, em substituição de tal da douta sentença anulada, não menos douto acórdão, que anule também a qualificação de recusa sob impugnação judicial, e que determine que a …a Conservatória do Registo Predial de Almada, envie à recorrente a comunicação, a que se refere o artigo 73.°-2, do CRP., o que também se peticiona.
Não foi apresentada resposta ao recurso.
O recurso foi admitido pelo despacho de 13/11/2018 (fls. 95). II- FUNDAMENTAÇÃO A- Objeto do Recurso
Delimitado o objeto do recurso pelas conclusões apresentadas, sem prejuízo das questões que sejam de conhecimento oficioso e daquelas cuja decisão fique prejudicada pela solução dada a outras (artigos 635.º, n.ºs 3 e 4, 639.º, n.º 1 e 608.º, n.º 2, do CPC), não estando o tribunal obrigado a apreciar todos os argumentos apresentados pelas partes para sustentar os seus pontos de vista, sendo o julgador livre na interpretação e aplicação do direito (artigo 5.º, n.º 3, do CPC), está em causa aferir se, no caso, o registo não devia ter sido recusado e, ao invés, devia ter ter sido dado cumprimento ao artigo 73.º, n.º 2, do CRPredial. B- De Facto:
São relevantes para a apreciação do objeto do recurso, os seguintes factos:
1. SA…, S.A. através da Ap. … de 2018/01/17, requereu na ….ª Conservatória do Registo Predial de Almada, em relação ao prédio urbano descrito na ficha n.º …, da freguesia de Vila Real (S. Dinis), o registo de nomeação de terceiro (fls. 11 da certidão junta a fls. 31-44).
2. Em …/01/2018 foi proferido «Despacho de Qualificação» com o seguinte teor (cfr. certidão supra referida, a fls. 48):
«Recusado o registo de nomeação de terceiro, não apenas por já haver sido recusado e com base nos mesmos fundamentos (Ap. 564/20141201), mas também por se encontrar pendente impugnação judicial do despacho aí proferido e, dependendo da sorte de tal ação, o registo ora peticionado, se revelar inútil.
Notifique-se.
Fundamentação legal: Artigos: 68º, 69, nº 1 alínea c) e 71.º, 1 e 3, todos do Código o Registo Predial.»
3. Em 22/10/2014, em relação à Ap. 564 de 2014/10/15, tinha sido proferido na 1.ª Conservatória do Registo Predial de Almada «Despacho de Qualificação», com o seguinte teor (cfr. certidão supra referida, a fls. 47):
«RECUSADA A NOMEAÇÃO DE TERCEIRO
A mesma não se encontra titulada nos documentos apresentados. Mantêm-se os fundamentos da anterior recusa – artigo 69.º n.º 1 c) CRP.»
4. Foi interposta impugnação judicial da recusa referida em 3. (certidão supra referida, a fls. 41).
5. Em 14/10/2014, em relação à Ap. 356 de 2014/10/12, tinha sido foi proferido na Conservatória dos Registos Civil, Predial, Comercial e Automóveis de Valongo «Despacho de Qualificação», com o seguinte teor (cfr. certidão supra referida, a fls. 46):
«Recusado o ato de registo pedido, por não ter sido junto título para o mesmo.
Artigos: 55º, 68º, 69º, nº 1, al. b) todos do Código do Registo Predial e art.º 453º do Código Civil.
Notifique».
6. Em 22/08/2014, em relação à Ap. 838 de 2014/08/11, tinha sido proferido na Conservatória do Registo Predial de Ourique «Despacho de Qualificação», com o seguinte teor (cfr. certidão supra referida, a fls. 45):
«Pela natureza do acto e, ainda, por verificar-se que o apresentante não comprovou a declaração de nomeação e ratificação da pessoa nomeada, nem procuração passada anteriormente ao contrato, ou seja, não foi apresentado título para o registo requisitado, é o mesmo de recusar pelos motivos indicados.
Artigos: 68º, 69.º, n.º1, alínea b) todos do Código de Registo predial e art. 453.º do Código Civil.
Notifique.»
7. Em 20/03/2018, foi proferido despacho de sustentação como consta de fls. 3-6.
B- De Direito
1. Consta da fundamentação da decisão recorrida, em ordem a manter o despacho de recusa, o seguinte:
«Como resulta dos autos, nomeadamente de fls. 19, o registo da ap. … de 17.01.2018 foi recusado nos termos dos arts 68°, 69° nº l alínea c) e 71° nºs 1 e 3, todos do CRP.
Também decorre do despacho de sustentação da Sr.ª Conservadora e da documentação junta, que já foram efectuadas quatro apresentações para nomeação de terceiro, sendo que em nenhuma delas foi junta documentação que permitisse a concretização do registo.
Tendo sido a apresentação … de 17 de Janeiro de 2018 recusada nos termos do art. 69° nºl alínea c), a mesma não permite a aplicação do art. 73° nº2 do CRP, como pretende o recorrente, já que este preceito exclui expressamente a possibilidade de suprimento de deficiências na situação em que o registo é recusado nos termos daquele preceito.»
Defende a apelante que ao caso não é aplicável o artigo 69.º, n.º 1, alínea c), do CRPredial, porquanto, por um lado, a nomeação de um terceiro num contrato para pessoa a nomear constituiu um facto sujeito a registo como decorre do artigo 101.º, n.º 2, alínea f), do mesmo CRPredial e, por outro lado, o facto não se encontra registado.
Por conseguinte, no entender da apelante, em vez do registo ser recusado deveria ter sido dado cumprimento ao disposto no artigo 73.º, n.º 2, do CRPredial notificando-se a apresentante como ali se encontra prescrito, pelo que pugna pela anulação da sentença e que seja proferido acórdão que ordene a referida notificação.
Vejamos, então, se assiste razão à apelante.
2. Como decorre do ponto 1 dos factos em apreciação, está em causa a recusa de um registo de nomeação de terceiro, requisitada pela ora apelante à ….ª Conservatória do Registo Predial de Almada através da Ap. … de 2018/01/17.
O contrato para pessoa a nomear encontra-se regulado nos artigos 452.º a 456.º do Código Civil.
De acordo com o n.º 1 do artigo 452.º o contrato para pessoa a nomear é um contrato em que uma das partes se reserva a faculdade de designar uma outra pessoa que assuma a sua posição na relação contratual, como se o contrato tivesse sido celebrado com esta última. Ressalvadas as exceções previstas no n.º 2 do mesmo normativo, todos os contratos, podem ser contratos para pessoa a nomear, desde que lhes seja aposta a respetiva cláusula.
A nomeação é feita pelo estipulante; a aceitação, pelo nomeado (n.º 1 do artigo 453.º do Código Civil).
A declaração de nomeação deve ser acompanhada, sob pena de ineficácia, do instrumento de ratificação do contrato ou de procuração anterior à celebração do contrato (n.º 2 do artigo 454.º do Código Civil).
A lei exige documento escrito para a declaração de nomeação e para a ratificação (artigos 453.º e 454.º do Código Civil), mesmo que o contrato tenha sido verbal[2].
Se o contrato estiver sujeito a registo, pode ser feito em nome do contraente originário, com indicação da cláusula para a pessoa a nomear, fazendo-se posteriormente os necessários averbamentos (n.º 1 do artigo 456.º do Código Civil).
Estando em causa bens imóveis, o registo da cláusula para pessoa a nomear ou o registo do contrato para pessoa a nomear, com a menção da respetiva cláusula, bem como as posteriores alterações, encontram-se sujeitas a registo como decorre, v.g, dos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), 55.º, 94.º, alínea b), 95.º, n.º 1, alínea aa) e 101.º, n.º 2, alínea f), todos do CRPredial.
O registo depende, assim, da apresentação dos documentos referenciados no artigo 55.º, n.º 1 do CRPredial conjugado com o que vem estipulado nos artigos 453.º e 454.º do Código Civil[3], sem prejuízo das exigências de natureza fiscal, que não colhe referenciar na economia do objeto deste recurso.
Como decorre do n.º 1 do artigo 43.º do CRPredial só podem ser registados factos constantes de documentos que legalmente os comprovem. Efetivamente, vigora no nosso registo predial o princípio da legalidade, estipulando o artigo 68.º do CRPredial que compete ao conservador apreciar da viabilidade do pedido de registo, em face das disposições legais aplicáveis, especialmente a identidade do prédio, a legitimidade dos interessados, a regularidade normal dos títulos e validade dos atos dispositivos nele contidos, designando-se esta tarefa por qualificação.
A recusa do registo encontra-se prevista no artigo 69.º do CRPredial.
No que releva para o objeto do recurso, importa levar em conta que o registo pode ser recusado «Quando for manifesto que o facto não está titulado nos documentos apresentados» (alínea b) do artigo 69.º) e «Quando se verifique que o facto constante do documento já está registado ou não está sujeito a registo» (alínea c) do artigo 69.º).
Porém, o artigo 73.º do CRPredial regula a matéria do suprimento das deficiências do procedimento de registo, impondo quer uma atividade oficiosa, quer um atividade a cargo do apresentante, consoante as circunstâncias.
Antes do Decreto-Lei n.º 116/2008, de 04/07, a lei registal determinava que deveria ser prontamente recusado o registo cujo pedido não fosse instruído com título que legalmente comprovasse o facto a registar, abrangendo as situações em que o procedimento registal era instruído com documento que não titulava o facto a registar, bem como aquelas em que não era apresentado qualquer documento.[4]
Porém, as alterações legislativas introduzidas em 2008, mantidas posteriormente, que tiveram como escopo simplificar e modernizar a atividade registal, consagrando uma série de medidas que visam fomentar o ingresso dos factos no registo com caráter definitivo, com alargamento de situações de oficiosidade e incremento de um sistema de suprimento de deficiências, permite a apresentação a posteriori do documento.
Como se lê no Parecer do IRN, proc. 154/2009, ponto 11.[5]«..o suprimento de deficiências foi introduzido no Código de Registo Predial de 1984, numa perspectiva de simplificação e modernização da actividade resgistral, que, salvaguardando aspectos substantivos, como a prioridade do registo, procurou facilitar o acesso ao registo mediante a previsão de um procedimento de suprimento de deficiências, a cargo dos serviços (suprimento oficioso) ou dos interessados (apresentação complementar) que permitisse a repetição do pedido.»
Assim, a atual redação do artigo 73.º do CRPredial elenca as medidas tendentes ao suprimento das deficiências, do seguinte modo: «1 - Sempre que possível, as deficiências do procedimento de registo devem ser supridas oficiosamente com base nos documentos apresentados ou já existentes no serviço de registo competente ou por acesso direto à informação constante de bases de dados das entidades ou serviços da Administração Pública.»
Acrescentando o n.º 2: «2 - Não sendo possível o suprimento das deficiências nos termos previstos no número anterior e tratando-se de deficiência que não envolva novo pedido de registo nem constitua motivo de recusa nos termos das alíneas c) a e) do n.º 1 do artigo 69.º, o serviço de registo comunica este facto ao interessado por escrito, por correio eletrónico ou sob registo postal, para que, no prazo de cinco dias, proceda a tal suprimento, sob pena de o registo ser lavrado como provisório ou recusado.»
No caso de existir deficiência que não seja colmatável pela ação do requerente nos termos deste n.º 2, ainda assim, o registo não deve ser lavrado provisoriamente nem recusado, pois como estipula o n.º 3 do normativo «3- O registo não é lavrado provisoriamente ou recusado se as deficiências em causa respeitarem à omissão de documentos a emitir pelas entidades referidas no n.º 1 e a informação deles constante não puder ser obtida nos termos aí previstos, desde que o interessado tenha expressamente solicitado ao serviço de registo, pessoalmente ou por escrito, através de correio eletrónico ou sob registo postal, e no prazo referido no número anterior, que diligencie pela sua obtenção diretamente junto das entidades ou dos serviços da Administração Pública.»
Acresce, ainda, como é referido no preâmbulo do Decreto-Lei n.º 116/2008, que o regime de suprimento de deficiências também visou evitar a «recusa de atos de registo quando o título não tenha sido, por lapso, apresentado, mas o facto sujeito a registo seja anterior à data da apresentação», concretizando esse regime nos n.ºs 6 e 7 do artigo 73.º, cuja redação atual (Decreto-Lei n.º 125/2013, de 30/08), é a seguinte: «6 - Caso os documentos pedidos nos termos do n.º 3 não sejam recebidos pelo serviço de registo até ao termo do prazo legalmente estabelecido para a emissão do documento pedido com o prazo mais longo de emissão, acrescido de três dias, o registo é lavrado como provisório ou recusado. 7 - A falta de apresentação de título que constitua motivo de recusa, nos termos da alínea b) do n.º 1 do artigo 69.º, pode ser suprida, com observância dos números anteriores, desde que o facto sujeito a registo seja anterior à data da apresentação, ou à hora desta se, sendo da mesma data, o título contiver a menção da hora em que foi assinado ou concluído.»
Por conseguinte, se for requerido um registo sem a junção que legalmente comprove o facto a registar, compete, agora, ao serviço de registo o início de um procedimento vinculativo tendente ao suprimento da falta de apresentação de título, que corresponde a um «dever geral de acessória dos interessados»[6]. Primeiro, confirmando se o documento não consta dos documentos apresentados no próprio serviço de registo, nas bases de dados das entidades ou serviços da Administração Pública (n.º 1 do artigo 73.º). Não sendo suprível a falta de título nestes termos, notifica-se, o interessado para que este, no prazo 5 dias proceda à entrega do título (n.ºs 2 do artigo 73.º).
Este procedimento não é seguido nos casos ressalvados no n.º 2 do artigo 73.º, ou seja, se não for possível suprir as deficiências nos termos do n.º 1, o interessado não é notificado nos casos em que a deficiência envolva novo pedido de registo ou quando o motivo de recusa se enquadre nas alíneas c) a e) do n.º 1 do artigo 69.º.
Sendo que a apresentação do título em falta que constitua motivo de recusa nos termos da alínea b) do artigo 69.º só é suprível nos termos previstos no preceito se o facto sujeito a registo for anterior à data da apresentação do pedido de registo.
3. Delineado em traços largos o regime legal, cumpre, agora, reverter à situação em apreciação nestes autos e levar em conta o concreto teor da sentença recorrida.
Para referir, em primeiro lugar, que o ato - nomeação de terceiro - cujo registo foi pedido através da Ap. … de 2018/01/…, é um ato sujeito a registo como decorre, entre outros, da conjugação dos artigos 453.º, 454.º do Código Civil, 2.º, n.º 1, alínea a), 55.º, 94.º, alínea b), 95.º, n.º 1, alínea aa) e 101.º, n.º 2, alínea f), todos do CRPredial.
Não tendo a requerente apresentado qualquer documento a titular o ato – como reconhece no articulado da impugnação judicial (cfr. artigos 9 ) e é confirmado no despacho de sustentação da Sr.ª Conservadora (cfr. fls. 36) onde é referido que a impugnante requereu o registo recusado «sem qualquer documento a instruir o pedido» - e encontrando-se o conservador adstrito a proferir despacho de qualificação do pedido de registo com observância do princípio da legalidade inserto no artigo 68.º do CRPredial, encontravam-se preenchidos os pressupostos da recusa de registo ao abrigo do artigo 69.º, alínea b), do CRPredial, por ser manifesto que o ato não está titulado (em face do modo como foi instruído o pedido de registo), por outra não poder ser a conclusão a retirar da falta absoluta de junção de documentos, a saber, a declaração de nomeação do terceiro e a ratificação do contrato ou de procuração anterior à celebração do contrato.
Sucede, porém, que o registo não foi recusado com base nesta alínea b) do artigo 69.º do CRPredial, mas com base em fundamentos jurídicos que ao caso não se aplicam, como bem defende a apelante.
Efetivamente a menção à alínea c) do artigo 69.º do CRPredial é inaplicável ao caso em apreço, porquanto não existe qualquer registo do ato (bem, pelo contrário, o mesmo foi anteriormente recusado, inclusive pela Ap. 564 de 2015/10/15, referida no despacho de recusa) e o ato encontra-se, como já dito, sujeito a registo. Sendo que, a recusa anterior do ato a registar (independentemente das vezes que o foi) não constitui motivo para a recusa do registo, ainda que se verifique uma situação de repetição, que o sistema de registo não impede[7].
Acresce, ainda, que a pendência de impugnação judicial referente a recusa do mesmo tipo de registo, também não determina a recusa do registo. O que estará aí em causa, não é uma situação, de possível inutilidade, mas de prevalência do princípio da prioridade (artigo 6.º do CRPredial).
Como se refere no acórdão da Relação de Coimbra de 02/03/2010[8]: «O princípio da prioridade do registo, prior tempore, significa apenas que o direito inscrito em primeiro lugar prevalece sobre os que se lhe seguirem relativamente aos mesmos bens, por ordem da data dos registos, e, dentro da mesma data, pela ordem temporal das apresentações correspondentes. Ora, quer do registo provisório quer do convite ao suprimento das deficiências resulta apenas que o registo se reporta à data da apresentação. Na recusa, o registo só conserva a prioridade correspondente à apresentação se o recurso, hierárquico ou contencioso, vier a ser procedente (artigo 6º). Princípio que em nada é postergado com a determinação do convite ao suprimento das deficiências – a opção do legislador do registo predial foi de conferir ao registo a data da apresentação, solução concatenada com o princípio da instância. Tomada a iniciativa de pedir o registo, haja ou não intervenção do conservador, a data da sua efectivação reporta-se sempre à da apresentação. E mesmo a recusa dá lugar à abertura da descrição e anotação na ficha do acto recusado após o número, data e hora da respectiva apresentação (artigos 80º, 2, e 69º, 3).
Sendo certo que, como se referiu na conclusão III do Parecer do IRN lavrado no proc. RP 256/2010 STJ-CT, já citado, ainda que no âmbito de um recurso hierárquico, mas perfeitamente transponível para a impugnação judicial, «Não pode ser efetuado como definitivo o registo que tenha sido anteriormente recusado, se estiver pendente impugnação contra a recusa, pelo que se não houver deficiências que sejam motivo de nova recusa, cabe qualifica-lo (também) como provisório por natureza (92.º/1/d) do Código do Registo Predial)».
Resulta, assim, que independentemente da sorte da impugnação judicial da anterior recusa de registo, o pedido de registo correspondente à Ap. … de 2018/01/… não podia ser recusado com esse fundamento.
E sendo assim, chegamos, agora, ao cerne da questão.
Considerando a requalificação que se fez da concreta situação fático-jurídica, admissível atento o disposto no artigo 5.º, n.º 3, do CPC aplicável ex vi do artigo 156.º do CRPredial, é evidente que o argumento utilizado na sentença reconduzindo a situação ao segmento normativo do n.º 2 do artigo 73.º do CRPredial que se refere à alínea c) do artigo 69.º, não tem fundamento legal. Isto é, não estando em causa um facto já registado, nem um facto não sujeito a registo, não está vedada a possibilidade do apresentante suprir as deficiências referentes à falta de apresentação de titulação do facto a registar, através do mecanismo previsto na parte final do n.º 2 do referido 73.º, ou seja, podendo no prazo de 5 dias, após a notificação que lhe for dirigida pela conservatória, apresentar os documentos que titulam o facto a registar.
Sendo que o n.º 6 do artigo 73.º igualmente aponta a mesma via, ou seja, mesmo que a deficiência corresponda à previsão da alínea b) do artigo 69.º do CRPredial, como se nos afigura ser o caso, impende igualmente, sobre a conservatória o dever de notificar o apresentante para, no referido prazo, apresentar o título, sem prejuízo do registo poder vir a ser recusado ou lavrado como provisório como decorre da parte final do n.º 2 e n.º 6 do artigo 73.º (cfr., ainda, artigo 70.º).
Sendo de frisar, mais uma vez, que no caso em apreço, importa sempre levar em conta a situação tabular anterior, i.e., a existência de impugnação judicial pendente em relação a recusa anterior (se ainda for essa a situação no momento em que é suprida a deficiência) e o disposto no artigo 92.º, n.º 1, alínea d), do CRPredial, como já supra referido, na aferição da viabilidade do pedido de registo, como impõe o artigo 68.º do mesmo Código.
Em face do exposto, impõe-se a revogação da sentença recorrida e a procedência da apelação. Donde decorre, nos termos do artigo 148.º CRPredial, a insubsistência da qualificação que determinou a recusa do ato, ordenando-se, outrossim, que a 2.ª Conservatória do Registo Predial de Almada dê cumprimento ao disposto no n.º 2 do artigo 73.º do CRPredial nos termos sobreditos.
III- DECISÃO
Nos termos e pelas razões expostas, acordam em julgar procedente a apelação, revogam a sentença recorrida e declaram insubsistente ao despacho de qualificação proferido em relação à Ap. … de 2018/01/…, ordenando que a 2.ª Conservatória do Registo Predial de Almada dê cumprimento ao disposto no n.º 2 do artigo 73.º do CRPredial.
Sem custas.
Cumpra-se o disposto no artigo 147.º do CRPredial.
Lisboa, 19 de março de 2019
Maria Adelaide Domingos - Relatora
Ana Isabel Mascarenhas Pessoa – 1.ª Adjunta
Eurico José Marques dos Reis - 2.º Adjunto