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CAIXA DE PREVIDÊNCIA
CONTRIBUIÇÃO PARA A PREVIDÊNCIA
ADVOGADOS
EXECUÇÃO
COMPETÊNCIA MATERIAL
Sumário
I - A cobrança das dívidas à Caixa de Previdência de Advogados e Solicitadores por contribuições não pagas pelos beneficiários é da competência dos Tribunais Administrativos e Fiscais, sendo incompetentes para o efeito os Tribunais Comuns.
Texto Integral
Acordam na 6ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa:
RELATÓRIO. Caixa de Previdência dos Advogados e Solicitadores intentou contra J… acção executiva para pagamento da quantia certa de 21 555,28 euros, sendo 19 979,38 euros de contribuições em dívida pelo executado, na sua qualidade de advogado e 1 575,90 euros de juros vencidos, tendo sido apresentada, como título executivo, uma certidão da dívida de contribuições, por si emitida.
Foi proferido despacho que declarou a incompetência material do tribunal, entendendo serem competentes os tribunais administrativos e fiscais e indeferiu liminarmente o requerimento executivo.
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Inconformada, a exequente interpôs recurso e alegou, formulando conclusões com os seguintes argumentos:
- A CPAS é uma instituição de previdência autónoma, com personalidade jurídica, regime próprio e gestão privativa, não estando sujeita a poder de superintendência do Governo, mas sim apenas a um mero poder de tutela inspectiva, não fazendo parte da administração directa ou indirecta do Estado, não sendo financiada com dinheiros públicos, quer do orçamento do Estado, quer da segurança social, sendo o seu regime específico de natureza privativa.
- O litígio em apreço tem carácter privado, não tendo as contribuições para a CPAS natureza tributária, assentando na pessoalidade, na qualidade de advogado ou de solicitador do sujeito passivo, resultam da vontade do beneficiário, que opta pela escalão de contribuição a pagar, assentam numa relação sinalagmática e não se destinam a garantir a satisfação de um encargo público do Estado.
- O artigo 148º nº2 do CPPT exige que estejam expressamente previstos na lei os casos de dívidas que podem ser cobradas em execução fiscal e o artigo 179º do CPA estabelece que se segue o processo de execução fiscal na falta de pagamento voluntário de prestações pecuniárias a pessoa colectiva pública, não existindo no regulamento da CPAS norma expressa que determine que as dívidas a esta sejam cobradas através do processo de execução fiscal, inexistindo também norma que habilite a segurança social a instaurar processos de execução fiscal sobre esta matéria.
- A interpretação feita no despacho recorrido, de que são competentes os tribunais administrativos e fiscais ao abrigo do artigo 4º alínea o) do ETAF, viola os artigos 2º nº2 do CPC e o artigo 20º da CRP, pois leva a que a CPAS não tivesse norma legal que a habilitasse a cobrar judicialmente as dívidas por contribuições não pagas, nem nos tribunais administrativos e fiscais, nem por meio de execuções fiscais promovidas pela Autoridade Tributária e nem por meio e execuções fiscais promovidas pela Segurança Social.
- A decisão recorrida violou assim os artigos 2º nº2 do CPC, 179º nºs 1 e 2 do CPA, 148º nº2 do CPPT, 81º nº5 do Regulamento da CPAS, 4º nº1 o) do ETAF, bem como a norma constitucional do artigo 20º nº1 da CRP.
- Deve proceder o recurso e ser julgado materialmente competente o tribunal recorrido.
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Citado o executado, não foram oferecidas contra-alegações e a questão a decidir é a de saber se o tribunal recorrido é competente em razão da matéria para a tramitação dos autos, ou se são competentes para o efeito os tribunais administrativos e fiscais.
* FACTOS.
Os factos a atender são os que constam no relatório do presente acórdão.
* ENQUADRAMENTO JURÍDICO.
Nos termos dos artigos 64º do CPC e 40º nº1 da LOSJ, (Lei da Organização do Sistema Judiciário, Lei 62/2013 de 26/8), são da competência dos tribunais judiciais as causas não atribuídas a outra ordem jurisdicional e, por força do artigo 212º nº3 da CRP e do artigo 4º do ETAF (Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais, Lei 13/2002 de 19/2), são da competência dos tribunais administrativos e fiscais as acções que têm por objecto dirimir litígios resultantes de relações administrativas e fiscais, nomeadamente, da alínea o) do nº1 do referido artigo 4º, ou seja, a apreciação de litígios de natureza administrativa e fiscal, relativos a matérias não previstas nas alíneas anteriores.
No presente caso, pretende a exequente, Caixa de Previdência de Advogados e Solicitadores, cobrar o valor de contribuições não pagas pelo executado, na sua qualidade de advogado.
Estabelece o artigo 63º da CRP que todos têm direito à Segurança Social, incumbindo ao Estado organizar, coordenar e subsidiar um sistema de segurança social e descentralizado, apoiando e fiscalizando, nos termos da lei, a actividade e o funcionamento das instituições particulares de solidariedade social.
A CPAS (Caixa de Previdência de Advogados e Solicitadores), criada pelo DL 36550 de 22/10/47, é uma instituição que preenche a incumbência do Estado de colaboração com as suas funções de previdência e foi-se mantendo sempre com um regime autónomo, com gestão privativa, mas com uma actividade que coexiste com as funções de previdência da Segurança Social, ao longo da vigência dos vários diplomas aplicáveis e da actual Lei 4/2007 de 16/1, lei bases da Segurança Social, a qual, no seu artigo 106º, estatui que se mantêm autónomas as instituições de previdência criadas antes da vigência do DL 549/77 de 31/12, “com os seus regimes jurídicos e formas de gestão privativas, ficando subsidiariamente sujeitas às disposições da presente lei e à legislação dela decorrente, com as necessárias adaptações”, prevendo também o regulamento da CPAS, anexo ao DL 119/2015 de 29/6, no seu artigo 1º nº2, que lhe é aplicável subsidiariamente as bases gerais da Segurança Social e a legislação dela decorrente.
Prevê ainda o regulamento da CPAS, no artigo 29º, que é obrigatória a inscrição de qualquer advogado e solicitador como beneficiários, no artigo 97º, que Caixa está sujeita à tutela dos membros do governo responsáveis pelas áreas da justiça e da segurança social, no artigo 98º, que a CPAS goza de regalias previstas na lei para entidades públicas, no artigo 81º nº5, que a certidão de dívida de contribuições emitida pela direcção constitui título executivo, devendo obedecer aos requisitos previstos no Código de Procedimento e de Processo Tributário (artigos 162º e 163º do CPPT), prevendo-se, no artigo 60º nº1 da Lei 4/2007, que a cobrança da quotas e contribuições não pagas se realiza coercivamente nos termos legais.
Face a todo este quadro legal, tem sido entendido pela jurisprudência, que se crê uniforme e que se acompanha, que as funções de previdência da CPAS se integram no sistema geral de Segurança Social tutelado pelo Estado, sendo-lhe atribuídos poderes de autoridade que caracterizam as relações administrativas e sendo a cobrança coerciva das respectivas contribuições da competência dos tribunais administrativos e fiscais ao abrigo do artigo 4º nº1 alínea o) do ETAF (cfr., entre outros, acórdãos do Tribunal de Conflitos de 1/02/2018, p. 044/17, da RL de 22/03/2018, p. 16976/17, de 2/11/2017, p. 9354/16, de 9/3/2017, p. 17398/15, da RP de 5/02/2018, p. 785/17, de 20/06/2016, p.6988/16, da RC de 18/09/2018, P. 2880/17, da RG de 7/12/2017, p. 2825/17, da RE de 22/03/2018, p. 694/17, todos em www.dgsi.pt)
A atribuição de competência aos Tribunais Administrativos e Fiscais para dirimir estes conflitos não viola o artigo 20º da CRP, como defende a apelante, porque, naturalmente, os seus direitos não deixarão de ter tutela jurisdicional nos tribunais competentes.
Conclui-se, portanto, que é materialmente incompetente o tribunal comum e competentes os tribunais administrativos e fiscais, improcedendo as conclusões de recurso.
* DECISÃO.
Pelo exposto, julga-se improcedente a apelação e confirma-se o despacho recorrido.
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Custas pela apelante.
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2019-03-28
Maria Teresa Pardal
Carlos Marinho
Anabela Calafate