RECURSO PENAL
ABSOLVIÇÃO
SEQUESTRO
BURLA INFORMÁTICA E NAS COMUNICAÇÕES
ROUBO
CONCURSO DE INFRACÇÕES
CONCURSO DE INFRAÇÕES
CRIME ÚNICO
CRIME CONTINUADO
ATENUAÇÃO ESPECIAL DA PENA
REGIME PENAL ESPECIAL PARA JOVENS
PENA PARCELAR
PENA ÚNICA
MEDIDA CONCRETA DA PENA
Sumário


I - Atento o disposto no n.º 3 do art. 30.º do CP, o crime continuado fica restringido à violação plúrima de bens não eminentemente pessoais, independentemente de haver uma ou mais vítimas.
II - O crime de roubo é um crime complexo, pluriofensivo, em que os valores jurídicos tutelados são de ordem patrimonial (direito de propriedade e de detenção de coisas móveis) abrangendo bens jurídicos eminentemente pessoais, como a liberdade individual de decisão e acção, integridade física e até a própria vida alheia.
III - Para que funcione a unificação das condutas sob a forma de crime continuado há que estar-se perante vários actos entre os quais haja uma certa conexão temporal, sendo por esta que se evidenciará uma diminuição sensível da culpa, mercê de factores exógenos que facilitaram a recaída ou recaídas. A figura do crime continuado supõe actuações diversas, reiteração de condutas, situações que se repetem em função da verificação de determinados quadros factuais. Entre os comportamentos existe um fio sequencial, reiteração, repetição.
IV - Nada disto se verifica no assalto à residência do casal, já que todas a conduta se esgotou numa acção, consumando-se os roubos praticados em co-autoria. As agressões foram concomitantes, em simultâneo. Resulta da factualidade assente que o assalto foi infligido ao casal, tendo os ofendidos sido vítimas de constrangimento, coacção e intimidação exercida pelos arguidos, que apontaram as armas de que eram portadores, sofreram agressões que lhes causaram lesões físicas com sequelas.
V - Colocando a conduta criminosa em causa não apenas valores patrimoniais, mas também valores eminentemente pessoais, havendo pluralidade de ofendidos, haverá tantos crimes, quantos forem esses ofendidos, como tem decidido a jurisprudência do STJ de forma uniforme. Dirigindo-se as diferentes acções contra diversos titulares dos bens jurídicos pessoalíssimos da integridade física e da liberdade de acção e de decisão, como aconteceu neste caso, está excluído o crime único ou continuado por falta de identidade do bem jurídico afectado, não se podendo reconduzir à unidade as condutas provadas.
VI - No caso não existe qualquer facto que possa suportar a formulação de um juízo de prognose favorável à reinserção social do recorrente X, de modo a concluir, nos termos do art. 4.º, do DL 401/82, que se esteja face a fortes razões, “sérias razões”, que levem a crer que da aplicação da moldura atenuada e mais benevolente resultante da atenuação possa resultar vantagem para a reinserção; os factos colhidos não tornam viável a afirmação de tal conclusão, pois não ficaram provados factos demonstrativos da interiorização plena do desvalor da conduta, não sendo possível formular um juízo ou ter uma expectativa optimista sobre a personalidade do recorrente.
VII – Na determinação da medida concreta da pena deve o tribunal, em conformidade com o disposto no art. 71.º, n.º 2, do CP, atender a todas as circunstâncias que deponham a favor ou contra o agente, abstendo-se, no entanto, de considerar aquelas que já fazem parte do tipo de crime cometido.
VIII – Ponderando o modo de execução, a intensidade do dolo, directo, as necessidades de prevenção geral e especial, o passado criminal no caso do arguido Y e a idade do arguido X à data da prática dos factos (16 anos de idade), bem como o tempo decorrido desde então, contando-se em mais de 4 anos, afigura-se-nos justificar-se intervenção correctiva, fixando-se a pena de 6 anos e 6 meses de prisão por cada um dos 2 crimes de roubo agravado quanto ao arguido Y e a pena de 5 anos de prisão quanto ao arguido X, por cada um dos dois crimes, em vez das penas, respectivamente, de 8 anos e 6 meses e de 7 anos e 6 meses, por cada um dos crimes, aplicadas pela 1.ª instância.
IX - No que concerne à determinação da pena única, para além dos critérios gerais da medida da pena contidos no art. 71.º, do CP, em conjugação com os princípios constantes do art. 40.º, do CP, deve ter-se em consideração a existência de um critério especial na determinação concreta da pena do concurso, segundo o qual serão considerados, em conjunto, os factos e a personalidade do agente, o que obriga a que do teor da sentença conste uma especial fundamentação da medida da pena do concurso. Em suma, a pena unitária tem de responder à valoração, no seu conjunto e inter-conexão, dos factos e personalidade de cada um dos arguidos, afigurando-se-nos equilibrada e adequada a aplicação da pena única de 6 anos de prisão ao arguido X e de 9 anos de prisão ao arguido Y, em substituição das penas únicas aplicadas pela 1.ª instância, respectivamente, de 10 e de 13 anos de prisão.

Texto Integral





No âmbito do processo comum, com intervenção do Tribunal Colectivo, n.º 610/11.0GCPTM, da Comarca de Faro, Instância Central de Portimão - 2.ª Secção Criminal – J2, foram submetidos a julgamento os arguidos:

AA, natural da freguesia e concelho de Portimão, nascido a ... de ...de 1991, solteiro, residente no ......, bloco........º, em Porches, portador do C.C. n.º 0000000,

BB, natural da freguesia e concelho de Portimão, nascido a .... de .... de 1979, solteiro, residente no ............., bloco D, 2.º frente, em Porches, portador do C.C. n.º000000, actualmente preso no Estabelecimento Prisional de Pinheiro da Cruz, à ordem de outro processo,

CC, natural e nacional do Brasil, nascido a e Dezembro de 1994, solteiro, com última residência conhecida na Rua da ......., em Porches, actualmente preso no Estabelecimento Prisional de Pinheiro da Cruz, conforme fls. 765 e 817, vindo do EP de Silves, onde cumpriu até 1-06-2015, parte da pena à ordem do processo sumário n.º 352/11.7GDPTM, da Comarca de Faro, Portimão - Instância Local, Secção Criminal-J3, conforme fls. 689, 695, 832 e 833, 868 e 869 e verso, tendo sido desligado deste processo para ficar à ordem do presente processo, com efeitos a partir de 24-09-2015.

      O Ministério Público acusou estes arguidos e ainda DD, natural da freguesia e concelho de Esposende, nascido a ... de Janeiro de 1974, solteiro, com última residência conhecida no Bairro .............. Poço Partido, em Carvoeiro, portador do C.C. n.º 000000, imputando-lhes a prática, em co-autoria material, na forma consumada e em concurso real, a cada um deles, de:

- dois crimes de roubo agravado, p. e p. nos artigos 210.º n.ºs 1 e 2, alínea b), ex vi do artigo 204.º, n.º 2, alínea e), ambos do Código Penal;

- dois crimes de sequestro, p. e p. no artigo 158.º, n.º 1, do Código Penal;

- um crime de burla informática, p. e p. no artigo 221.º, n.º 1, do Código Penal,

                                                              ***

      Em sede de audiência de julgamento foi ordenada a separação de processos, ao abrigo do disposto no artigo 30.º, n.º 1, alínea d), do CPP, relativamente ao arguido DD, prosseguindo o julgamento relativamente aos demais.

                                                              ***

      No decurso do julgamento, conforme consta da acta de fls. 735 a 740, foi determinada a comunicação aos arguidos de uma alteração de factos descritos na acusação como FP 1.1 a FP 1.21, não importando alteração não substancial de factos nem da qualificação jurídica. Nada tendo sido oposto pelo M.º P.º e defesa, seguiu-se a leitura do acórdão.

                                                             ***

      Por acórdão do Colectivo da 2.ª Secção Criminal da Instância Central de Portimão do Tribunal Judicial da Comarca de Faro, de 19 de Maio de 2015, constante de fls. 713 a 734 do 3.º volume, depositado no dia seguinte, conforme fls. 742, foi deliberado:

   Julgar parcialmente improcedente a acusação, e, procedendo à alteração da qualificação jurídica:
1. - Absolver os arguidos AA, BB e CC da prática dos crimes de sequestro e de burla informática por que vinham acusados;

2.- Condenar:

2.1 - O arguido AA pela prática, como co-autor, de dois crimes de roubo, p. e p. pelos artigos 210.º, n.º 1 e 2, alínea b), com referência ao artigo 204.º, n.º 2, alínea f), do Código Penal, na pena de 6 (seis) anos e 6 (seis) meses de prisão, por cada um deles;
2.2.- O arguido BB pela prática, como co-autor, de dois crimes de roubo, p. e p. pelos artigos 210.º, n.º 1 e 2, alínea b), com referência ao artigo 204.º, n.º 2, alínea f), do Código Penal, na pena de 8 (oito) anos e 6 (seis) meses de prisão, por cada um deles;
2.3.- O arguido CC pela prática, como co-autor de dois crimes de roubo, p. e p. pelos artigos 210.º, n.º 1 e 2, alínea b), com referência ao artigo 204.º, n.º 2, alínea f), do Código Penal, na pena de 7 (sete) anos e 6 (seis) meses de prisão, por cada um deles;
3. Operando o cúmulo jurídico das penas parcelares em concurso aplicadas foram fixadas as seguintes penas únicas:
3.1- Ao arguido AA a pena única de 8 (oito) anos e 6 (seis) meses de prisão;
3. 2 - Ao arguido BB a pena única de 13 (treze) anos de prisão;
3.3. - Ao arguido CC a pena única de 10 (dez) anos de prisão.

                                                                  *
      O arguido CC interpôs recurso para o Tribunal da Relação de Évora, conforme fls. 744, dizendo versar matéria de facto e de direito.
      O arguido BB interpôs recurso para este Supremo Tribunal de Justiça como consta de fls. 756.

      O arguido CC apresentou a motivação de fls. 745 a 754, que rematou com as seguintes conclusões:

Iº - Perante uma moldura penal abstracta, cujo limite mínimo é de três (3) anos de prisão, nunca seria de aplicar a um delinquente de 16 anos de idade, à data dos factos, pena superior ao mínimo legal abstracto.

2º - Conhecendo-se os efeitos nefastos de prolongada reclusão, toda a pena de prisão superior a 4 (quatro) anos de prisão, necessariamente, irá comprometer a ressocialização do delinquente, e a sua ressocialização.

3º - Sendo os co-Arguidos do ora Recorrente, mais velhos, e mais experientes, registando antecedentes de relevo, é elevada a probabilidade de o ora Recorrente se ter deixado influenciar, o que se deverá manifestar em sede de escolha da medida da pena concreta, que sempre deverá ser atenuada.

4º - Nada resulta dos factos provados, o que configura insuficiência de matéria de facto, que os Arguidos soubessem que os Ofendidos se encontravam, ambos, na residência que haviam projectado assaltar, o que configura facto essencial para a apreciação e boa Decisão, como não resulta provado se admitiam que, ali, se encontrava, um, ou ambos os Ofendidos, ou, mesmo, mais pessoas, o que não determina o número de crimes praticados, pelo que só por um crime haveriam de ser condenados.

5º - O "projecto" delineado, era o assalto à casa. e que seria de furto, se os Ofendidos estivessem ausentes, para, dali, retirarem o que, ali, encontrassem, não devendo relevar se ali se encontrava uma, ou duas pessoas, facto improvado que os Arguidos conhecessem, e não previsto pelos Arguidos, pelo que o crime praticado, é um (1), de roubo, e não dois, por que vieram os Arguidos a ser condenados.

6º - Efectivamente, é um, e o mesmo, o bem jurídico atingido, praticado da mesma forma, no mesmo acto, no mesmo local, no quadro da mesma solicitação, pelo que não poderiam os Arguidos, e o ora Recorrente, ser condenado/s pela prática de dois (2) crimes de roubo, mas sim, de um único crime, o que se espera em recurso, que merece provimento.

7º - Face à juventude do Arguido, ora Recorrente, cujos antecedentes criminais não são de especial relevo, a não se justificar a aplicação do Dec-Lei 401/82, sempre a invocada ponderação da juventude do Arguido, na escolha da medida concreta da pena a aplicar, se deveria manifestar diferentemente, e para menos, mas substancialmente menos, na medida da pena concreta, que nunca deveria ultrapassar os três (3) ou quatro (4) anos de prisão, coincidente com o limite mínimo abstracto, ou algo acima deste, e pela prática de um único crime de roubo.

8º - Conhecendo-se os efeitos nefastos de uma prolongada pena de reclusão, particularmente quando o Arguido é um jovem com, à data dos factos, 16 anos de idade, a aplicação de pena, efectiva, superior ao mínimo legal abstracto contraria todos os princípios que devem nortear a escolha das penas a aplicar, por comprometer a reintegração do agente na sociedade – artº 40º-1 do Código Penal.

9º - Por outro lado, a factualidade apurada, configura a prática de um único crime, nos termos do disposto no artigo 30°-2 do Código Penal, pelo que não deveria o ora Recorrente ser condenado pela prática de mais do que um único crime de roubo, em pena atenuada, ou próxima do seu limite mínimo abstracto, atentos os vigentes critérios da escolha da pena concreta.

10° - Violou, pois, o douto Tribunal “a quo”, o disposto nos artigos 40º-1 e 30°-2 do Código Penal, ao condenar o muito jovem ora Recorrente, em pena superior ao mínimo legal abstracto, pela prática de 2, e não de 1, crime, assim se comprometendo a desejável reintegração do Arguido, pelo que, merecendo provimento o presente Recurso, se deverá revogar o douto Acórdão de Fls, a substituir por outro que condene o ora Recorrente em pena de prisão não superior a 4 (quatro) anos de prisão.

Nestes termos, a não haver reenvio do Processo, para repetição do Julgamento,

deverá o douto Acórdão ora recorrido ser revogado e substituído por outro que, considerando a juventude do Recorrente, a moldura abstracta, e o limite mínimo, para o crime praticado, condene o ora Recorrente em pena de prisão não superior a quatro (4) anos, assim merecendo provimento o presente Recurso.

 

       O arguido BB rematou a motivação de fls. 756 a 764, com as seguintes conclusões:

I- Vem o presente recurso interposto do douto acórdão de fls. ..., que Julgou a acusação procedente e, em consequência, além do mais, condenou o Arguido BB pela prática, como co-autor de dois crimes de roubo, p. e p. pelo art°. 210°., n°s. 1 e 2, al. b), com referência ao art°. 204°., n°. 2, al. f) do Cód. Penal, na pena de 7 (sete) anos e 6 (seis) meses de prisão, cada um deles; em cúmulo jurídico, na pena única de 13 (treze) anos de prisão.

Contudo,

II- já decorreu mais três anos desde a ocorrência dos factos pelos quais o Arguido vem condenado, tendo este mantido um bom comportamento adequado às normas vigentes na sua vivência em estabelecimento prisional.

III - O Arguido apresenta fragilidades de saúde associadas ao consumo de estupefacientes no passado.

IV - Actualmente, o Arguido encontra-se inserido em programa de metadona e a frequentar consultas na especialidade de infecciologia.

V- O Arguido tem demonstrado uma postura colaborante com a intervenção terapêutica.

 VI- Pugnava o Arguido, ora Recorrente, pela condenação em penas inferiores,

VII- designadamente com uma pena de prisão não superior a 5 (cinco) anos e 6 (seis) meses de prisão para cada um dos crimes de roubo,

VIII- operando o cúmulo jurídico destas penas, justificava-se que fosse imposta ao Recorrente a pena única não superior a 7 (sete) anos de prisão.

IX - Ao condenar o Recorrente em pena de prisão inferior ao aplicado, nos termos ora pugnados, dar-se-á grande contributo para a reintegração do agente na sociedade, cumprindo-se o disposto no art°. 40.° do Cód. Penal, assim, merecendo provimento o presente Recurso.

X- Pelo que consideramos, salvo o devido respeito por opinião diversa, que a pena, aplicada ao arguido, é desproporcional e desadequada, tendo o Tribunal a quo violado o disposto nos art°s. 40°. e 71°., ambos do Cód. Penal.

NESTES TERMOS, requer-se a V. Exªs. Senhores Conselheiros seja dado provimento ao presente recurso, considerando-o procedente e, em consequência, revogando parcialmente o douto acórdão recorrido e substituindo-o por outra decisão que condene na pena de 7 (sete) anos e 6 (seis) meses de prisão, por cada crime de roubo; em cúmulo jurídico, na pena única de 13 (treze) anos de prisão (SIC)

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      Estes recursos foram admitidos por despacho de fls. 768, para além do mais, especificando que são ambos para o Supremo Tribunal de Justiça.

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        O Ministério Público na Comarca apresentou a resposta de fls. 818 a 830 e em original de fls. 855 a 867, concluindo (realces do texto):

1- A argumentação dos arguidos, em especial as conclusões, são semelhantes na sua forma e essência, razão pela qual também a nossa resposta será a mesma para os dois, por se nos afigurar uma solução esquemática adequada ao caso concreto, salvo o respeito devido.

2- Não contém o Douto Acórdão impugnado qualquer erro de julgamento da matéria de facto, ou outro vício que o inquine.

3- As provas produzidas e analisadas em audiência de julgamento foram avaliadas pelo Tribunal "a quo" no seu todo e segundo o que preceituam os arts.124° a 127°, do Código de Processo Penal, entre outros preceitos legais.

4- “São as conclusões que o recorrente extrai da motivação, onde sintetiza as razões do pedido, que recortam o thema decidendum (cfr. artigos 412.°, n.° 1, e 417.°, n.° 3, do Cód. Proc. Penal e, entre outros, o acórdão do STJ de 27.05.2010, www.dgsi.pt/jstj)[1] e, portanto, delimitam o objecto do recurso, assim se fixando os limites do horizonte cognitivo do tribunal de recurso", in www.dgsi.pt, Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 21-1-2015, Processo 353/14.3PBMAI.P1.

 5- Foram respeitados pelo Tribunal “ a quo” os dispositivos contidos nos artigos 30°, 40°, 70° e 71°, do Código Penal.

6- Os arguidos/recorrentes têm antecedentes criminais, sendo que o arguido BB já foi condenado;

"- no proc. comum colectivo 1003/99.1 PAPTM do 1º juízo criminal do Tribunal de Portimão, em 5/6/2000, por decisão transitada em 20/6/2000, pela prática em 16/8/1999, de um crime de roubo, na pena de 3 anos de prisãc, suspensa por igual período;

- no proc. comum colectivo 1356/00.0PAPTM do 2º juízo criminal do Tribunal de Portimão, em 18/1/2000, por decisão transitada em 19/2/2002, pela prática em 22/10/2000, de dois crimes de furto qualificado na pena única de 3 anos de prisão, suspensa por quatro anos;

- no proc. comum singular 872/00.9GDPTM do 1º juízo criminal do Tribunal de Portimão, em 7/11/2002, por decisão transitada em 22/11/2002, pela prática em 19/12/2000, de um crime de furto, na pena de 8 meses de prisão, suspensa por dois anos, declarada extinta pelo cumprimento;

- no proc. sumaríssimo 1133/04.0TAPTM do 2º juízo criminal do Tribunal de Portimão, em 3/11/2006, por decisão transitada em 22/1/2007, pela prática em 1/2/2003, de um crime de falsidade de depoimento, na pena de 220 dias de multa à taxa diária de 3 euros, que foi convertida em prisão subsidiária, já declarada extinta pelo cumprimento;

- no proc. sumário 201/03.3PAPTM do 1º juizo criminal do Tribunal de Portimão, em 19/2/2003, por decisão transitada em 6/3/2003, pela prática em 28/1/2003, de um crime de condução sem habilitação legal, na pena de 80 dias de multa à taxa diária de 5 euros, que foi convertida em prisão subsidiária, já declarada extinta pelo cumprimento;

- no proc. comum colectivo 304/03.0GDPJM do 1º juízo criminal do Tribunal de Portimão, em 22/3/2004, por decisão transitada em 15/4/2004, pela prática em 9/6/2003, de um crime de falsidade de depoimento, na pena de 45 dias de multa à taxa diária de 2,50 euros;

- no proc. comum colectivo 366/03.0GDPTM do 2º juízo criminal do Tribunal de Portimão, em 18/10/2004, por decisão transitada em 2/11/2004, pela prática em 18/3/2003, de quatro crimes de furto, dos quais 2 na forma tentada, na pena única de 3 anos e 3 meses de prisão, efectiva;

- no proc. comum singular 522/11.8GDPTM do 2º juízo criminal do Tribunal de Portimão, em 10/1/2013, por decisão transitada em 11/2/2013, pela prática em 8/7/2011, de um crime de furto qualificado, na pena de 2 anos e 8 meses de prisão, suspensa por igual período, sob condição do pagamento de 625 euros e em regime de prova;

- no proc. comum colectivo 916/11.9GDP7M do 2º juízo criminal do Tribunal de Portimão, em 1/3/2013, por decisão transitada em 5/12/2013, pela prática em 19/12/2011, de dois crimes de furto qualificado, na pena de 4 anos e 6 meses de prisão, de prisão efectiva;

7-  Por sua vez o arguido CC foi condenado:

- no processo sumário 352/11.7GDPTM, do 2º juízo criminal do Tribunal de Portimão, em 11/5/2011, por decisão transitada em 8/6/2011, pela prática, em 11/5/2011, de um crime de furto qualificado na forma tentada, na pena de 6 meses de prisão, suspensa por um ano, com regime de prova.

8- Não deverá proceder a argumentação do recorrente CC quando argumenta que só cometeu um crime de Roubo. Pois foram “roubadas” duas pessoas e não uma, tendo sido cometidos dois crimes de Roubo, p. e p. nos artigos 210°, n°1 e n°2, alínea b), com referência ao artigo 204°, n°2, alínea f), ambos do Código Penal, havendo em tal matéria unanimidade na Jurisprudência e Doutrina.

9- Sopesados os passados criminais dos arguidos, parece-nos indubitável que não estão reunidas as condições para alterar o Douto Acórdão, diminuindo as penas parciais e únicas aplicadas.

10- Cabe ao Tribunal coordenar, avaliar e sopesar a prova de acordo com os legais imperativos e com bom senso, e depois condenar ou absolver o ou os arguidos.

11- Os arguidos questionam a medida das penas, e a esse propósito, diz o Prof. Germano Marques da Silva [Direito Penal Português, 3, pág. 130], que a pena será estabelecida com base na intensidade ou grau de culpabilidade (...). Mas para além da função repressiva medida pela culpabilidade, a pena deverá também cumprir finalidades preventivas de protecção do bem jurídico e de integração do agente na sociedade. Vale dizer que a pena deverá desencorajar ou intimidar aqueles que pretendem iniciar-se na prática delituosa e deverá ressocializar o delinquente.

12-O Tribunal “a quo” teve em consideração para a escolha e medida das penas parcelares e únicas aplicadas aos arguidos todos os critérios referidos nos artigos 30°, 40° 70° e 71°, do Código Penal, conjugados com os factos que se provaram em audiência de julgamento.

13- Considerando o binómio culpa/prevenção afiguram-se-nos adequadas, proporcionais e justas, as penas parcelares e únicas de 13 anos e 10 anos de prisão, pois estão em sintonia com a culpa dos arguidos, e não olvidaram as respectivas ressocializações.

Termina, pedindo a manutenção na íntegra do acórdão recorrido, negando-se provimento aos recursos.

                                                             ***

       O processo foi inadvertidamente e ao arrepio do despacho de fls. 768, remetido para o Tribunal da Relação de Évora, conforme fls. 942, possivelmente por confusão determinada por haver outro recurso dirigido a esse Tribunal a impugnar a decisão de imposição de prisão preventiva ao arguido CC.

       No Tribunal da Relação de Évora, a fls. 946/8, o Exmo. PGA emitiu parecer no sentido de o Tribunal ser incompetente para conhecer dos recursos interpostos.

       Por decisão sumária do Desembargador proposto a relator, constante de fls. 955/8, foi declarada a incompetência do Tribunal da Relação de Évora para conhecer dos recursos, ordenando a remessa dos autos ao STJ.

                                                                    *****

      A Exma. Procuradora-Geral Adjunta neste Supremo Tribunal, de fls. 966 a 972, emitiu douto parecer, defendendo verificar-se um único crime de roubo e a aplicação ao recorrente CC do regime especial dos jovens adultos, com pena suspensa, e a não ser assim, redução da pena aplicada, mais próxima dos cinco anos de prisão, o mesmo se aplicando neste aspecto para arguido BB, devendo a pena ser fixada mais próximo dos 7 anos de prisão.

                                                                    *****

       Cumprido o disposto no artigo 417.º, n.º 2, do CPP, os recorrentes silenciaram.

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       Não tendo sido requerida audiência de julgamento, o processo prossegue com julgamento em conferência, nos termos dos artigos 411.º, n.º 5 e 419.º, n.º 3, alínea c), do Código de Processo Penal.

                                                                    *****

      Colhidos os vistos, realizou-se a conferência, cumprindo apreciar e decidir.

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      Como é jurisprudência assente e pacífica, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso – detecção de vícios decisórios ao nível da matéria de facto emergentes da simples leitura do texto da decisão recorrida, por si só ou conjugada com as regras da experiência comum, previstos no artigo 410.º, n.º 2, do Código de Processo Penal (neste sentido, o acórdão do Plenário da Secção Criminal, de 19 de Outubro de 1995, proferido no processo n.º 46580, Acórdão n.º 7/95, publicado no Diário da República, I Série - A, n.º 298, de 28 de Dezembro de 1995, e BMJ n.º 450, pág. 72, que fixou jurisprudência, então obrigatória, no sentido de que “É oficioso, pelo tribunal de recurso, o conhecimento dos vícios indicados no artigo 410º, nº 2, do Código de Processo Penal, mesmo que o recurso se encontre limitado à matéria de direito”) e verificação de nulidades, que não devam considerar-se sanadas, nos termos dos artigos 379.º, n.º 2 e 410.º, n.º 3, do CPP – é pelo teor das conclusões que o recorrente extrai da motivação, onde sintetiza as razões de discordância com o decidido e resume o pedido (artigo 412.º, n.º 1, do Código de Processo Penal), que se delimita o objecto do recurso e se fixam os limites do horizonte cognitivo do Tribunal Superior.

      As conclusões deverão conter apenas a enunciação concisa e clara dos fundamentos de facto e de direito das teses perfilhadas na motivação (assim, acórdão deste Supremo Tribunal de 25 de Março de 1998, proferido no processo n.º 53/98 da 3.ª Secção, in BMJ n.º 475, pág. 502).

 

                                                                    ******

          

     Questões propostas a reapreciação e decisão

 

     O âmbito do recurso é delimitado pelas conclusões, onde o recorrente resume as razões de divergência com o deliberado no acórdão recorrido.

     As questões suscitadas são:

      Recurso do Arguido CC

  

      Questão I – Qualificação jurídica – Determinação do número de crimes de roubo – Concurso real – Unificação dos crimes de roubo na figura do crime único – Conclusões 4.ª, 5.ª, 6.ª, 9.ª e 10.ª;

      Questão II – Atenuação especial – Aplicação do regime especial dos jovens adultos, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 401/82, de 23 de Setembro – Conclusão 7.ª;

       Questão III – Medida das penas parcelares e única – Conclusões 1.ª, 2.ª, 3.ª e 8.ª

       Recurso do Arguido BB       

       Questão única – Medida das penas parcelares e única – Conclusões 1.ª a 10.ª.

Apreciando. Fundamentação de facto.

        Factos Provados

        Foi dada como provada a seguinte matéria de facto, que é de ter-se por imodificável e definitivamente assente, já que da leitura do texto da decisão, por si só considerado, ou em conjugação com as regras de experiência comum, não emerge a ocorrência de qualquer vício decisório ou nulidade de conhecimento oficioso, mostrando-se a peça expurgada de insuficiências, erros de apreciação ou contradições que se revelem ostensivos, sendo o acervo fáctico adquirido suficiente para a decisão, coerente, sem contradição, harmonioso, e devidamente fundamentado.

1.1       No decurso do mês de Novembro de 2011, conjuntamente com outro indivíduo, os arguidos AA, BB e CC, combinaram e decidiram entre si assaltar uma moradia, situada em zona despovoada, com vista a apoderarem-se de todos os objectos que encontrassem no interior da mesma, inclusivamente os cartões bancários e, bem ainda que, iriam precavidos com fita adesiva, para amarrar as vítimas, assim como de outros objectos necessários à intimidação destas.

1.2       Assim, em concretização do plano que haviam delineado, no dia 6 de Dezembro de 2011, cerca das 09h30, fazendo-se transportar na viatura automóvel marca e modelo «Renault Laguna», com a matrícula 00-00-00 conduzida pelo outro indivíduo, os arguidos dirigiram-se à moradia sita no Monte do ...., Vale de C...., Arão, na ......., habitada pelos seus proprietários, os ofendidos EE e FF, casal de nacionalidade holandesa.

1.3       Uma vez chegados a um caminho de terra batida, situado junto à estrada que dá acesso ao autódromo internacional do algarve, o outro indivíduo parou a viatura e combinou com os restantes arguidos que, enquanto ele ficaria ali a aguardar, os arguidos AA, BB e CC iriam entrar no interior da sobredita residência, munidos de um objecto semelhante a uma caçadeira de canos serrados, uma faca com várias lâminas, um taco de golfe, ocultando as faces com gorros e usando luvas nas mãos.

1.4   Chegados ao local, os arguidos AA, BB e CC, aperceberam-se de que, a ofendida EE se encontrava no interior da residência, enquanto, por seu turno, o ofendido EE se encontrava no exterior da mesma a tomar o pequeno-almoço.

1.5       Acto contínuo, o arguido CC, munido de uma faca, e o arguido BB, munido de um objecto semelhante a uma caçadeira, dirigiram-se ao ofendido EE apontando-lhe respectivamente aquela e esta, ao mesmo tempo que o arguido AA constatando que a ofendida se tinha apercebido da presença deles e se encontrava a pegar no telefone, usando um taco de golfe, de que se havia previamente munido, partiu o vidro da porta de correr da sala da residência para aceder ao interior da mesma, após o que retirou da posse da ofendida o aludido telefone.

1.6       De seguida, os arguidos BB e CC empurraram o ofendido EE para o interior da residência,

1.7       Quando os dois ofendidos já se encontravam no interior da residência, os arguidos CC e BB amarraram as pernas e mãos daqueles, com fita adesiva, tendo antes retirado ao ofendido EE a carteira que este tinha no bolso traseiro das calças que trajava e onde se encontravam os cartões bancários do mesmo.

1.8   Nesta sequência, os arguidos CC e BB obrigaram os ofendidos a manterem-se deitados com a cabeça virada para o chão, situação esta que perdurou cerca de sessenta minutos, ao mesmo tempo que lhes diziam “don´t look up or i´ll shot you” (vulgo, “não olhes para cima ou eu disparo sobre ti”).

1.9       Na posse dos cartões bancários, num total de três cartões (sendo um cartão de crédito «American Express Gold Card» e dois cartões de débito emitidos pelo «Millenium BCP») os arguidos exigiram ao ofendido EE que lhes fornecessem os respectivos códigos PIN,

1.10     Atendendo ao circunstancialismo em que se encontrava e amedrontado pelo que os arguidos lhe diziam, o ofendido forneceu àqueles os códigos PIN dos sobreditos cartões bancários.

1.11     Além dos referidos cartões, os arguidos retiraram do interior da residência, os seguintes objectos, que fizeram seus -

- uma câmara de filmar «Panasonic Lumix», com o valor estimado de €245,00;

- uma câmara de filmar «Sony», com o valor estimado de €210,00;

- uns binóculos, com o valor estimado de €210,00;

- um colar em ouro, com o valor estimado de €400,00;

- dois anéis em ouro;

- um relógio em ouro, com o valor estimado de €5.602,00;

- um anel solitário em ouro, com o valor estimado de €6.117,00;

- uma bracelete «Cartier», com o valor estimado de €4.900,00;

- um anel «Cartier»;

- uma tv «led Sony», com o valor estimado de €1.179,00;

- um smartphone «Palm Treo 680», com o valor estimado de €595,00;

- um smartphone «Ericsson P910i», com o valor estimado de €475,00;

- um telemóvel «Nokia 3310», com o valor estimado de €20,00;

- um telemóvel «Vodafone Sagem», com o valor estimado de €25,00;

- um saco em pele de cor preta;

- uma colecção de moedas;

- €150,00 em notas emitidas pelo Banco Central Europeu.

1.12     Na posse dos referidos objectos e dos cartões bancários, os arguidos puxaram os ofendidos (que se encontravam de mãos e pés atados) do chão, colocando-os em pé e começaram a desferir-lhes empurrões com vista a encaminhá-los na direcção do escritório da sobredita residência, sendo que, no percurso e em consequência de um empurrão mais forte, o ofendido EE caíu,  tendo embatido com a face no chão.

1.13     De seguida, os arguidos BB e CC levantaram o ofendido EE do chão e arrastaram o mesmo e a esposa, a ofendida EE, até ao interior da casa de banho do escritório da residência, aonde trancaram ambos, fechando à chave a porta da aludida casa de banho.

1.14     Os ofendidos só lograram sair do interior da aludida casa de banho cerca de uma hora depois, após, inicialmente, e sem sucesso, com vista a cortar a zona envolvente da fechadura da porta, terem usado uma armação de um candeeiro e, posteriormente, o suporte do papel higiénico, com o qual lograram abrir um buraco na porta, através do qual, saíram do interior daquela.

1.15     Como consequência directa e necessária das agressões descritas supra  sofreram os ofendidos as seguintes lesões:

- EE -

- na face: ausência dos dentes incisivos e caninos superiores; na metade esquerda da região mentoniana, tumefacção, apenas perceptível à apalpação, não dolorosa, medindo 1cm de diâmetro;

- no membro superior esquerdo: no terço superior da face póstero-externa do antebraço, cicatriz, nacarada, pouco aparente, medindo 2cm de comprimento,

lesões que foram determinantes de um período de doença de 20 dias, com afectação da capacidade de trabalho geral por igual período de tempo;

- FF-

- no crâneo: na região parietal, ligeiramente à esquerda da linha média, cicatriz, quase inaparente, medindo 2 cm de comprimento;

- no tórax: na linha média da região dorso-lombar duas cicatrizes, quase inaparentes, medindo a superior 1cm de diâmetro e a inferior 2cm de diâmetro;

- no membro superior direito: no terço médio da face posterior do antebraço, várias cicatrizes, quase inaparentes, medindo 1cm de comprimento cada;

- no membro superior esquerdo: na face posterior do terço médio do antebraço, cicatriz, quase inaparente, medindo 1cm de comprimento,

                lesões que foram determinantes de um período de doença de 20 dias, com afectação da capacidade de trabalho geral por igual período de tempo.

1.16     Na posse dos objectos e cartões bancários acima referidos, os arguidos AA, CC e BB, dirigiram-se para o local onde se encontrava o outro indivíduo e a viatura automóvel onde se haviam feito transportar, a qual voltaram a utilizar para abandonar aquele local.

1.17     De seguida, na posse dos cartões bancários referidos supra e, em execução do que haviam combinado entre si, fazendo uso dos códigos PIN que o ofendido lhes havia indicado, os arguidos e o outro individuo efectuaram três levantamentos bancários, no montante, cada um, de €200,00, numa caixa ATM instalada na agência do Montepio Geral, sita na Urbanização ......., n.º ..... loja ...., em Armação de Pêra, sendo que, só não efectuaram mais levantamentos em virtude dos cartões terem sido cancelados.

1.18     Os arguidos apoderaram-se e fizeram seus os sobreditos quantitativos monetários, no valor total de €600,00, o qual dividiram entre si, assim como se apoderaram e dividiram entre si os objectos indicados supra bem sabendo que os mesmos não lhes pertenciam e que actuavam contra a vontade e em prejuízo dos seus legítimos proprietários.

1.19     O outro indivíduo e os arguidos AA, BB e CC agiram de forma conjunta e concertada, em comunhão de esforços e intentos e, em concretização do plano que haviam previamente gizado entre eles.

1.20     E agiram de forma livre, deliberada e consciente com a intenção concretizada de entrarem sem autorização e através da quebra da porta de vidro da sala da residência dos ofendidos e de lhes retirarem, através do uso da força e violência física, e da exibição e ameaça de morte com uma faca e um objecto semelhante a uma caçadeira de canos serrados e, ainda, mediante a privação e manietação de movimentos dos ofendidos por largo período de tempo, os objectos que encontrassem no interior da habitação em causa e, bem assim, e ainda, os cartões bancários dos ofendidos, cujos respectivos códigos obrigaram o ofendido EE a fornecer-lhes, após o que lograram efectuar três levantamentos de dinheiro, através da introdução dos sobreditos cartões em máquina ATM e digitação do respectivo PIN.

1.21     Os arguidos agiram sempre bem sabendo que as suas condutas eram proibidas e punidas por lei.

1.22     O arguido AA já foi condenado:

- no proc. comum colectivo 332/13.8GDABF do 1º juízo do Tribunal de Albufeira, em 15/7/2014, por decisão transitada em 30/9/2014, pela prática, em 26/9/2013, de um crime de roubo qualificado, na pena de 4 anos e 6 meses, suspensa por igual período, em regime de prova,

1.23     O arguido BB já foi condenado:

- no proc. comum colectivo 1003/99.1PAPTM do 1º juízo criminal do Tribunal de Portimão, em 5/6/2000, por decisão transitada em 20/6/2000, pela prática em 16/8/1999, de um crime de roubo, na pena de 3 anos de prisão, suspensa por igual período;

 - no proc. comum colectivo 1356/00.0PAPTM do 2º juízo criminal do Tribunal de Portimão, em 18/1/2000, por decisão transitada em 19/2/2002, pela prática em 22/10/2000, de dois crimes de furto qualificado na pena única de 3 anos de prisão, suspensa por quatro anos;

- no proc. comum singular 872/00.9GDPTM do 1º juízo criminal do Tribunal de Portimão, em 7/11/2002, por decisão transitada em 22/11/2002, pela prática em 19/12/2000, de um crime de furto, na pena de 8 meses de prisão, suspensa por dois anos, declarada extinta pelo cumprimento;

- no proc. sumaríssimo 1133/04.0TAPTM do 2º juízo criminal do Tribunal de Portimão, em 3/11/2006, por decisão transitada em 22/1/2007, pela prática em 1/2/2003, de um crime de falsidade de depoimento, na pena de 220 dias de multa à taxa diária de 3 euros, que foi convertida em prisão subsidiária, já declarada extinta pelo cumprimento;

- no proc. sumário 201/03.3PAPTM do 1º juízo criminal do Tribunal de Portimão, em 19/2/2003, por decisão transitada em 6/3/2003, pela prática em 28/1/2003, de um crime de condução sem habilitação legal, na pena de 80 dias de multa à taxa diária de 5 euros, que foi convertida em prisão subsidiária, já declarada extinta pelo cumprimento;

- no proc. comum colectivo 304/03.0GDPTM do 1º juízo criminal do Tribunal de Portimão, em 22/3/2004, por decisão transitada em 15/4/2004, pela prática em 9/6/2003, de um crime de falsidade de depoimento, na pena de 45 dias de multa à taxa diária de 2,50 euros;

- no proc. comum colectivo  366/03.0GDPTM do 2º juízo criminal do Tribunal de Portimão, em 18/10/2004, por decisão transitada em 2/11/2004, pela prática em 18/3/2003, de quatro crimes de furto, dos quais 2 na forma tentada, na pena única de 3 anos e 3 meses de prisão, efectiva;

- no proc. comum singular  522/11.8GDPTM do 2º juízo criminal do Tribunal de Portimão, em 10/1/2013, por decisão transitada em 11/2/2013, pela prática em 8/7/2011, de um crime de furto qualificado, na pena de 2 anos e 8 meses de prisão, suspensa por igual período, sob condição do pagamento de 625 euros e em regime de prova;

- no proc. comum colectivo 916/11.9GDPTM do 2º juízo criminal do Tribunal de Portimão, em 1/3/2013, por decisão transitada em 5/12/2013, pela prática em 19/12/2011, de dois crimes de furto qualificado, na pena de 4 anos e 6 meses de prisão, de prisão efectiva;

1.24     O arguido CC já foi condenado:

- no proc. sumário 352/11.7GDPTM do 2º juízo criminal do Tribunal de Portimão, em 11/5/2011, por decisão transitada em 8/6/2011, pela prática, em 11/5/2011, de um crime de furto qualificado na forma tentada, na pena de 6 meses de prisão, suspensa por um ano, em regime de prova;

1.25     O AA tem 23 anos e à data dos factos encontrava-se em fase activa do uso de substâncias estupefacientes, sem trabalho, pernoitava na rua, vivia sozinho e convivia com pares com condutas delituosas. Nesta desorganização pessoal as suas preocupações visavam assegurar necessidades imediatistas com recurso a práticas pouco lícitos: é neste contexto que o arguido enquadra o seu envolvimento no actual processo penal. Único filho dos progenitores, o seu processo de desenvolvimento passou-se num sistema familiar pouco normativo, referenciado a problemas de violência doméstica do pai sobre a mãe. Com a separação dos pais, quando tinha 9 anos de idade, ficou com o pai ausentando-se a mãe para parte incerta. Mais tarde integrou o agregado familiar materno residindo na região metropolitano do Porto. Concluiu o 6º ano do ensino básico após retenções, reflectindo igualmente a inexistência de um modelo familiar estruturado e securizante no suporte à sua aprendizagem escolar. Quando viveu na zona do Porto frequentou um curso profissional de electricidade de alta e média – tensão que abandonou por desinteresse. As dificuldades de aprendizagem, os problemas de absentismo e a desmotivação facilitaram a sua proximidade a pares desocupados, encetando no estádio da adolescência o consumo regular de haxixe. No cumprimento do serviço militar, aos 18 anos de idade, desertou uma semana o que determinou uma sanção disciplinar e a posterior rescisão do contrato com as Forças Armadas Portuguesas. A experiência laboral é pouco expressiva e sem vinculação contratual, os seus conhecimentos situam-se na área da restauração, maioritariamente como empregado de mesa e balcão – em parte através de empresas de trabalho temporário. As suas vivências são marcadas pela instabilidade e conflito na relação com o pai, a que acresce uma situação económica deficitária e de incumprimento de regras. Ausentava-se frequentemente de casa recorrendo ao apoio de amigos e da tia materna com que se mantém actualmente. Em momentos de maior disfunção do arguido, no início da idade adulta, começou a registar contactos com o aparelho judicial pela prática de crimes contra o património associados à toxicodependência. No decurso de uma medida de coacção fiscalizada por vigilância electrónica, que decorreu sem problemas, no âmbito do Proc. Nº 332/13.8GDABF, do 1º Juízo de Albufeira, efectuou acompanhamento psicoterapêutico na Equipa Técnica Especializada de Tratamento (ETET) de Portimão, interrompendo as consultas em Maio/2014. Por sentença transitada em julgado em 30-09-2014, foi condenado numa pena de 4 (quatro) anos e 6 (seis) meses de prisão, suspensa na sua execução por igual período, com regime de prova, sendo acompanhada nesta Equipa da DGRSP de Algarve 2. Aos 23 anos AA é pai de uma menina com 1 ano de idade, nascida do seu relacionamento afectivo não mantido com ..., 20 anos. Sem autonomia económica, o arguido reside há pouco mais de um mês em casa da tia materna, elementos referencial no suporte ao jovem. Continua a ter uma relação instável com o pai: ainda viveu em casa deste para se manter próximo da ex-namorada e da filha, no entanto a vinculação afectiva ao progenitor é frágil. Actualmente o arguido está desempregado, vive em casa da tia e, ainda que esta disponha de uma situação económica modesta, mostra-se preocupada com o AA, disponibilizando-se a apoiá-lo nomeadamente na garantia da sua subsistência.

1.26     O arguido BB tem 36 anos, provém de um agregado familiar constituído pelos pais e mais quatro irmãos, de condição social modesta e pouco coesa, que se agravou com a emigração do pai para a Alemanha. Desde cedo revelou problemas comportamentais associados a dificuldades de integração de normas orientadoras, desinvestimento escolar e precoce consumo de estupefacientes associado a grupo de pares com condutas desviantes. Frequentou o ensino regular sem que tenha concluído o 2º ciclo, revelando paralelamente algumas capacidades de trabalho na área da construção civil, situação que se veio dissipando ao longo do seu percurso. Entre os 17 e os 20 anos de idade permaneceu na Alemanha junto do pai, situação que levou a um evoluir do consumo de estupefacientes para um quadro de toxicodependência; regressou a Portugal por conflitos com o pai e por se sentir alvo do sistema de justiça alemão, acabando por se envolver em vivências marginais e problemas judiciais, até que foi preso em abril de 2003, tendo cumprido três penas de prisão sucessivas, tendo sido libertado em situação de liberdade condicional, aos 5/6 da pena, em maio de 2011. Em situação de liberdade condicional, não mantinha ocupação laboral ou formativa estruturada, tendo efetuado algumas diligências junto do Centro de Emprego local e do Gabinete de Intervenção do Município. Vivenciava precariedade sócio-económica e dependência financeira relativamente à mãe. Apresenta fragilidades de saúde; em meio livre integrava programa de acompanhamento de metadona, frequentando consultas de infeciologia no Centro Hospitalar do Barlavento Algarvio; actualmente e no âmbito da execução da pena continua o tratamento em ambas as vertentes. No projecto que preconiza para a sua liberdade, perspectiva reintegrar o agregado familiar de origem, onde apenas se encontra a sua mãe; mantém ainda um relacionamento afectivo que perspectiva vir a fortalecer quando em liberdade. Em termos laborais não tem qualquer perspectiva. Preso em Fevereiro de 2014 para cumprimento de uma pena de 4 anos e 6 meses de prisão à ordem do Processo 916/11.9GDPTM; recentemente esta pena foi interrompida para que BB cumprisse primeiramente 1 ano, 7 meses e 6 dias de prisão, resultante de revogação de liberdade condicional em que se encontrava aquando da prisão, cujo termo ocorrerá em agosto de 2016. No E.P. de Pinheiro da Cruz, o arguido vinha revelando um comportamento adequado às normas vigentes, até que recentemente se envolveu em luta com o companheiro de cela, tendo sofrido sanção disciplinar. Encontra-se em situação de inactivo, tendo já solicitado trabalho ou formação; ocupa o seu tempo na prática de desporto, na leitura e visualização de TV. Tem vindo a ser sujeito a acompanhamento médico e psicológico, mantendo-se inserido em programa de metadona e a frequentar consultas de infeciologia. BB, embora assuma um discurso que revela, em abstracto, reconhecer o bem jurídico em causa, manifesta pouco sentido crítico em relação ao estilo de vida que mantinha anteriormente, assumindo uma postura de vitimização. O presente processo não denota ter tido especial impacto no seu modo de vida.

1.27     O arguido CC tem 20 anos, e à data dos factos do presente processo tinha ficado a viver sozinho em Porches, na casa em que antes vivera com a mãe e irmãs, tornando-se aquela um espaço de permanência de outros jovens problemáticos, entre os quais alguns dos co-arguidos no processo. Pouco depois juntou-se novamente ao agregado de origem, vivendo os dois anos seguintes em Portimão, com a mãe. O arguido é cidadão brasileiro, originário de Vitória – Espírito Santo. Veio para Portugal com a mãe, há 8 anos atrás, depois de 3 anos de imigração desta no nosso país, deixando os filhos a cargo da família alargada. O pai separou-se era CC ainda criança e perdeu-se o seu paradeiro, sendo descrito como um indivíduo alcoólico e maltratante, embora quando presente trabalhasse e contribuísse no sustento da família. Afigurou-se um contexto familiar multiproblemático e de carência económica, com um relacionamento interno confuso. O agregado do arguido vai apresentando composições diversas, de acordo com circunstancias várias, à volta do elemento central que é a mãe, GG, de 43 anos. Foi pai, há 4 meses atrás, fruto de uma relação de namoro com uma jovem de 17 anos. O único elemento que trabalha é a progenitora, empregada da restauração, ainda assim, instável. Ao CC nunca foi conhecida uma ocupação, pelo menos desde que veio para Portugal. Chegou a frequentar a escola, mas sempre desmotivado e com elevado absentismo. Não progrediu além do 5º ano. Foi assinalado nos serviços oficiais por fuga à escolaridade e foi encaminhado para o sistema alternativo de PIEC, mas não aderiu. Não se encontra legalizado no país, alegadamente por falta de um documento proveniente do Brasil. A falta de documentação acaba por ser também uma das justificações para nunca se ter enquadrado em trabalho. Os pares assinalados, a apetência por espaços de diversão nocturna, sendo habituais zaragatas com outros grupos e desacatos, associados a consumos de substâncias lícitas e ilícitas deram azo a vários problemas, incluindo a condenação em 1 ano de pena suspensa, no processo nº 352/11.7GDPTM, por factos de idêntica natureza aos do processo em apreço. Aparentemente, depois da mudança definitiva para Portimão, afastando-se daqueles pares, houve alguma acalmia comportamental, designadamente nas saídas e associação a pares. Contudo, não houve lugar a uma mudança em sentido de estruturação pessoal/ integração social positiva, continuando a existir um estilo de vida ocioso, hábitos aditivos e desinteresse generalizado. A família revelou-se há muito incapaz de funções de supervisão, orientação e controle do comportamento do sujeito, que se perspectiva como portador de uma história de vida infeliz. Além da pena suspensa assinalada, houve referencia a factos considerados pela lei como crime em idade anterior aos 16 anos, pelos quais cumpriu medidas de natureza tutelar educativa. Em qualquer das situações foi sempre incumpridor das obrigações, conduzindo designadamente à actual revogação e cumprimento de pena de prisão efectiva. Em meio prisional, mostra-se um elemento pouco participativo. Não encara como oportuno o cumprimento da pena, assim como do processo em apreço, de que se demarca. Atribui a sua nomeação nos factos como resultado de retaliações de terceiros. Considera que evoluiu desde então, alegando não haver mais registos policiais. Os seus projectos são de se manter em Portugal, onde fala de alguns projectos, como viver com a namorada e filho, embora sem noção das exigências da situação.

      Apreciando. Fundamentação de direito.

     

      Recurso do Arguido CC

  

      Questão I – Qualificação jurídica – Determinação do número de crimes de roubo – Concurso real – Unificação dos crimes de roubo na figura do crime único

       O recorrente nas conclusões 4.ª, 5.ª, 6.ª, 9.ª e 10.ª bate-se pela unificação jurídica das condutas dadas por provadas, pretendendo a sua integração na figura de crime único, defendendo estar-se perante um só crime de roubo e não dois, como foi decidido na decisão recorrida, muito embora convoque de forma errónea, a norma do artigo 30.º, n.º 2, do Código Penal, que prevê a figura da continuação criminosa.

       Alude o recorrente na conclusão 4.ª a insuficiência de matéria de facto e daí que tenha referido no início do requerimento de recurso, a fls. 744, que recorria de facto e de direito, terminando por aludir a reenvio do processo e repetição do julgamento, verdade sendo que percorrido todo o texto da motivação vez alguma se vislumbre sequer arremedo de substanciação de tal propósito, cingindo-se a sobredita afirmação num contexto em que alega a falta de previsão no quadro de operações da presença dos donos da casa, porque o que foi perspectivado foi apenas a prática de um furto…   

     Não resulta provado em seu entender que os arguidos soubessem que os ofendidos se encontravam, ambos, na residência, que haviam projectado assaltar, assim procurando fundamentar a pretensão de integração de um único crime.

       Face a tal argumentação não deixará de se dizer que os arguidos previram a presença de pessoas na casa a assaltar, de tal modo que por precaução levaram fita adesiva (num simples furto a fita adesiva não faz falta nenhuma), a qual veio a ser usada para amarrar as vítimas, levando ainda outros objectos necessários à intimidação, como uma faca com várias lâminas, um taco de golfe e um objecto semelhante a espingarda de canos serrados para intimidarem as vítimas, conforme FP 1.1, tendo ocultado as faces com gorros - FP 1.3.

       Como é evidente, não estamos perante o vício decisório previsto no artigo 410.º, n.º 2, alínea a), do CPP, mas antes perante uma questão de qualificação jurídica, estando em causa a determinação do número de crimes de roubo cometidos, a questão de saber se é possível unificar em um só crime condutas que atingiram direitos pessoalíssimos de duas pessoas, que foram agredidas, ofendidas na sua integridade física, constrangidas, ameaçadas e manietadas, vendo limitada a sua liberdade de locomoção e de acção.     

      A questão colocada reconduz-nos à problemática da verificação de concurso real ou efectivo de crimes, ou de crime único e não tanto crime continuado.

      Objecto de análise será a questão de saber se a matéria de facto dada por definitivamente assente comporta a integração das condutas provadas na figura do crime único, como efectivamente pretende o recorrente, ou antes na pluralidade de crimes, em concurso real/efectivo, como considerou o acórdão recorrido.

Como vimos, no parecer emitido a Exma. Procuradora-Geral Adjunta neste Supremo Tribunal defende a verificação de um único crime de roubo.

                                                                   ******

      Como referimos nos acórdãos de 13 de Julho de 2011, processo n.º 451/05.4JABRG.G1.S1, de 31 de Janeiro de 2012, processo n.º 2381/07.6PAPTM.E1.S1, de 12 de Setembro de 2012, processo n.º 2745/09.0TDLSB.L1.S1, de 30 de Setembro de 2015, processo n.º 2430/13.9JAPRT.P1.S1, de 25 de Novembro de 2015, processo n.º 27/14.5JAPTM.S1 e no voto de vencido aposto no acórdão de 13 de Julho de 2011, no processo n.º 1659/07.3GTABF.S1, relativo a acidente rodoviário com resultados múltiplos (morte e ofensas corporais), publicado in CJSTJ 2011, tomo 2, págs. 210 a 241, maxime, págs. 224 a 241 e ainda no despacho de pronúncia de 17 de Março de 2015, proferido no processo n.º 1/13.9YGLSB.S1:

      «A distinção entre unidade e pluralidade de crimes é decisiva na determinação das consequências jurídicas do facto, para efeito de punição do agente, sabido que no caso de concurso de crimes cabe a aplicação do critério especial de determinação da pena constante do artigo 77.º, extensível, nos termos do artigo 78.º, ao caso de superveniência de conhecimento da existência de relação concursal, cabendo ainda em caso de unificação do concurso, como crime continuado, tratado como uma situação ou caso de unidade de infracção, ou seja, como um só crime, um outro critério especial, este de privilegiamento punitivo, do artigo 79.º, sendo o crime punível com a pena aplicável à conduta mais grave que integra a continuação, podendo em certos casos, considerar-se ainda, num diverso plano, a existência de um único crime, a punir nos termos do critério geral do artigo 71.º, como os demais do Código Penal.

      Como se extrai do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 25 de Junho de 1986, proferido no processo n.º 38.292, publicado no BMJ n.º 358, pág. 267, a realização plúrima do mesmo tipo legal pode constituir:

      a) Um só crime, se ao longo de toda a realização tiver persistido o dolo ou resolução inicial;

      b) Um só crime, na forma continuada, se toda a actuação não obedecer ao mesmo dolo, mas estiver interligado por factores externos que arrastam o agente para reiteração das condutas;

     c) Um concurso de infracções, se não se verificar qualquer dos casos anteriores.

  

       A regra é a de que, sendo vários os preceitos violados, ou sendo o mesmo preceito objecto de plúrimas violações, como é o presente caso, com duas, haja uma pluralidade de crimes; esta pluralidade só fica afastada no caso de concurso aparente, ou nas formas de unificação de condutas, seja como crime continuado, ou ainda fora dos quadros do artigo 30.º, como único crime (acórdão de 02-04-2008, processo n.º 4197/07-3.ª, configurando em caso específico de tráfico de estupefacientes, actividade contemplada por caso julgado anterior), ou como crime de trato sucessivo, como é ponderado a nível de situações de tráfico de estupefacientes (v. g., acórdão de 17-12-2009, processo n.º 11/02.1PECTB-5.ª), ou de infracções fiscais ou contra a segurança social, que se protraem por períodos mais ou menos longos (neste tipo foi já considerada a figura denominada de “infracções contínuas sucessivas” no acórdão de 18-12-2008, processo n.º 20/07-5.ª), ou mesmo em caso de burla qualificada e falsificação de documento (acórdão de 21-02-2008, processo n.º 2035/07-5.ª), tendo sido assim qualificados alguns casos de abusos sexuais de crianças, solução que, segundo Paulo Pinto de Albuquerque, em Comentário do Código Penal, UCE, 2.ª edição, 2010, pág. 162, será de afastar, a partir da Lei n.º 40/2010, de 03-09, por estarem em causa bens eminentemente pessoais, afirmando que no caso da sucessão de vários crimes contra bens eminentemente pessoais, deve punir-se as condutas do agente em concurso efectivo.

    A matéria de concurso de crimes não é tratada no artigo 30.º do Código Penal, de forma abrangente e esgotante, na medida em que as soluções indicadas no preceito se limitam a estabelecer um critério mínimo de distinção entre unidade e pluralidade de crimes, tratando-se de um ponto de partida estabelecido pelo legislador, a partir do qual à doutrina e à jurisprudência caberá em última análise, encontrar soluções adequadas, tendo em vista a multiplicidade de casos e situações que se prefiguram e que ocorrem na vida real (assim acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 04-01-2006, processo n.º 3671/03-3.ª, in CJSTJ 2006, tomo 1, pág. 159, que aborda a temática da distinção entre crime continuado e crime único, num caso de falsificação de três cheques para aquisição de produtos alimentares em hipermercado).

        Aliás, note-se que de acordo com a epígrafe do artigo 30.º, inserto no capítulo relativo a “Formas do crime” – cfr. Capítulo II do Título II – na perspectiva de unidade/pluralidade de infracções, só haveria lugar ao concurso de crimes e ao crime continuado, não albergando o preceito, por exemplo, as hipóteses de crime único, que o Código Penal de 1886 previa no § único do artigo 421.º para o crime de furto.

     Relembrando o preceito, após no corpo escalonar as penalidades de acordo com os valores da coisa furtada (mais tarde actualizados pela Lei n.º 27/81, de 22 de Agosto), dispunha no § único:

       “Considera-se como um só furto o total das diversas parcelas subtraídas pelo mesmo indivíduo à mesma pessoa, embora em épocas distintas”.

       Há outras figuras de lesividade múltipla ou repetida de bens jurídicos com tutela jurídico-criminal, que se não contêm na dicotomia prevista no artigo 30.º - “Concurso de crimes e crime continuado”.

        Isto é, para além do concurso de crimes, a punir nos termos dos artigos 77.º e 78.º, e do crime continuado, a punir de acordo com o artigo 79.º do Código Penal, há toda uma gama de situações da vida real a demandar uma específica regulamentação.

      Estabelecendo um critério, assumidamente distintivo, o artigo 30.º contém a indicação de um princípio geral de solução da problemática do concurso de crimes, sendo também uma base de trabalho, a partir da qual há que olhar outras dimensões de violações de bens jurídicos, que ficam de fora, não estando abrangidos outros casos e situações que ocorrem no dia a dia, apresentando dificuldades de integração por exemplo as hipóteses de crimes culposos emergentes de acidentes de viação, sabido que o critério vale fundamentalmente para os crimes dolosos e mesmo nestes o critério não esgota todas as formas, todos os modos de execução do tipo legal».

                                                                 *****

       O recorrente, nos dois últimos parágrafos da motivação, a fls. 752, e nas conclusões 9.º e 10.ª, refere o artigo 30.º, n.º 2, do Código Penal, que trata do crime continuado, mas querendo, obviamente, reportar-se à diversa figura de um único crime, até pela simultaneidade da prática das condutas.

      A situação concreta não cabe na figura do crime continuado, que pressupõe repetição de condutas, o que não é o caso, pois que os dois elementos do casal foram molestados em simultâneo, concomitantemente, não se estando perante um caso de sucessão de vários crimes.

     A figura do crime continuado supõe actuações diversas, reiteração de condutas, situações que se repetem em função da verificação de determinados quadros factuais, proximidade temporal das condutas parcelares.

       Mas mesmo que estivéssemos perante crime continuado sempre haveria que ter em conta o n.º 3 do artigo 30.º do Código Penal.

       Começando pela sua configuração. 

       Na versão originária do Código Penal de 1982 (intocada pela reforma de 1995), estabelecia o

                                                            Artigo 30.º

                                (Concurso de crimes e crime continuado) 

1 – O número de crimes determina-se pelo número de tipos de crime efectivamente cometidos, ou pelo número de vezes que o mesmo tipo for preenchido pela conduta do agente.

2 – Constitui um só crime continuado a realização plúrima do mesmo tipo de crime ou de vários tipos de crime que fundamentalmente protejam o mesmo bem jurídico, executada por forma essencialmente homogénea e no quadro da solicitação de uma mesma situação exterior que diminua consideravelmente a culpa do agente.

     Em anotação ao artigo 30.º, na redacção então em vigor, relatava Maia Gonçalves, Código Penal Português Anotado, 11.ª edição, 1997, pág. 152 (e mesmo lugar na 12.ª edição de 1998), que o preceito teve por fonte principal o artigo 33.º do Projecto de Parte Geral de Código Penal de 1963 e que na sua discussão foi aprovado um último período para o n.º 2, que seria o seguinte: “A continuação não se verifica, porém, quando são violados bens jurídicos inerentes à pessoa, salvo tratando-se da mesma pessoa”.

    Adiantava que a supressão/não aceitação do período “não significa que outra solução deva ser adoptada, mas tão só que o legislador considerou a afirmação desnecessária, por resultar da doutrina, e até inconveniente, por a lei não dever entrar demasiadamente no domínio que à doutrina deve ser reservado”.

       Com a 23.ª alteração do Código Penal, introduzida pela Lei n.º 59/2007, de 4 de Setembro (Diário da República, I Série, n.º 170, de 4-09, rectificado pela Declaração de Rectificação n.º 102/2007, de 25-10, publicada no Diário da República, 1.ª série – n.º 210, de 31 de Outubro), foi introduzido o n.º 3, que passou a estabelecer:

      3 - O disposto no número anterior não abrange os crimes praticados contra bens eminentemente pessoais, salvo tratando-se da mesma vítima.

       O que a versão de 2007 fez foi consagrar a solução preconizada pelo Projecto de 1963, recuperando o conteúdo da proposta feita exactamente por Maia Gonçalves, há mais de 43 anos, em 8 de Fevereiro de 1964.

       A este propósito, pode ver-se Maria do Carmo Silva Dias, Repercussões da Lei n.º 59/2007, de 04-09, nos crimes contra a liberdade sexual (Revista do Centro de Estudos Judiciários, 1.º trimestre de 2008, n.º 8 (especial), pág. 225), Maria da Conceição Valdágua, As Alterações ao Código Penal de 1995, relativas ao crime continuado, propostas no Anteprojecto de Revisão do Código Penal, em palestra proferida em Maio de 2006, no âmbito de Colóquio sobre a revisão do Código Penal de 1995 (Revista Portuguesa de Ciência Criminal, Ano 16, N.º 4, Outubro-Dezembro 2006, págs. 531-533) e Paulo Pinto de Albuquerque, Comentário do Código Penal, UCE, 2008, págs. 137/8.

       Com a Lei n.º 40/2010, de 3 de Setembro, que operou a 26.ª alteração ao Código Penal, entrada em vigor em 3 de Outubro de 2010, foi alterada a redacção do n.º 3 que passou a estabelecer:

   3 - O disposto no número anterior não abrange os crimes praticados contra bens eminentemente pessoais.

    Com a alteração foi suprimida a expressão final “salvo tratando-se da mesma vítima”, do que resultou o fim da figura do crime continuado que atinja bens essencialmente pessoais, mesmo quando a vítima dos diversos actos seja a mesma pessoa. O crime continuado fica assim restringido à violação plúrima de bens não eminentemente pessoais, independentemente de haver uma ou mais vítimas.

       O crime de roubo é um crime complexo, pluriofensivo, em que os valores jurídicos tutelados são de ordem patrimonial (direito de propriedade e de detenção de coisas móveis) abrangendo bens jurídicos eminentemente pessoais, como a liberdade individual de decisão e acção, integridade física e até a própria vida alheia.

       Para que funcione a unificação das condutas sob a forma de crime continuado há que estar-se perante vários actos entre os quais haja uma certa conexão temporal, sendo por esta que se evidenciará uma diminuição sensível da culpa, mercê de factores exógenos que facilitaram a recaída ou recaídas.

    A figura do crime continuado supõe actuações diversas, reiteração de condutas, situações que se repetem em função da verificação de determinados quadros factuais.

       Entre os comportamentos existe um fio sequencial, reiteração, repetição.

       Ora, nada disto se verifica no assalto à residência do casal, já que toda a conduta se esgotou na acção descrita nos pontos de facto 1.1.a 1.21 dos factos provados, consumando-se os roubos praticados em co-autoria pelos três arguidos que respondem neste processo e um outro, entretanto separado. As agressões foram concomitantes, em simultâneo.

       Resulta da facticidade assente que o assalto foi infligido ao casal, tendo os ofendidos sido vítimas do constrangimento, coacção e intimidação exercida pelos arguidos, que apontaram as armas de que eram portadores, agressões descritas nos FP 1.7 e 1.12 e causando as lesões físicas com sequelas, sendo as descritas no FP 1.15, no que toca ao ofendido e ofendida, em ambos os casos determinantes de um período de doença de 20 dias, com afectação da capacidade de trabalho geral por igual período de tempo.  

       Colocando a conduta criminosa em causa não apenas valores patrimoniais mas também valores eminentemente pessoais, havendo pluralidade de ofendidos, haverá tantos crimes, quantos forem esses ofendidos, como tem decidido a jurisprudência de forma uniforme – acórdãos do STJ, de 14-04-1983, BMJ n.º 326, pág. 422, de 30-11-1983, BMJ n.º 331, pág. 345, de 30-07-1986, BMJ n.º 359, pág. 411, de 15-11-1989, BMJ n.º 391, pág. 239, de 20-01-1994, processo 45265-3.ª, de 03-02-1994, processo n.º 45927-3.ª, de 26-10-1995, processo n.º 48237, de 01-02-1996, CJSTJ1996, T1, pág. 198, de 04-06-1996, CJSTJ1996, T2, pág. 188, de 24-07-1998, processo n.º 734/98, de 17-10-1998, processo n.º 131/98, de 01-03-2000, processo n.º 17/00-3., Sumários Assessores, 39, pág. 53, de 19-04-2006, CJSTJ2006, T2, pág. 168, de 02-05-2007, processo n.º 1027/07-3.ª e de 3-10-2007, por nós relatado no processo n.º 2576/07, CJSTJ 2007, tomo 3, pág.198.

       Dirigindo-se as diferentes acções contra diversos titulares dos bens jurídicos pessoalíssimos da liberdade de acção e de decisão, como aconteceu neste caso, está excluído o crime único ou continuado por falta de identidade do bem jurídico afectado, não se podendo reconduzir à unidade.

       Concluindo.

   Improcede esta pretensão do recorrente, mantendo-se a qualificação da primeira instância, ou seja, a verificação da prática de dois crimes de roubo qualificado.

                                                            ******

       Questão II – Atenuação especial – Aplicação do regime especial dos jovens adultos, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 401/82, de 23 de Setembro.

      Em causa a aplicabilidade do regime penal para jovens com idade compreendida entre os 16 e os 21 anos - Decreto-Lei n.º 401/82, de 23 de Setembro - questão que foi suscitada pelo recorrente.

       O Arguido CC coloca na conclusão 7.ª esta questão, embora de forma algo enviesada, pois afirma que a não se justificar a aplicação do Decreto-Lei n.º 401/82, sempre a invocada ponderação da sua juventude, na escolha da medida concreta da pena a aplicar, se deveria manifestar diferentemente, e para substancialmente menos, na medida da pena concreta.

       Pese embora esta formulação, verificar-se-á se no presente caso se justifica ou não a aplicação, sabido que a primeira instância de forma expressa a afastou.

       Há que ver se merece acolhimento a pretensão do recorrente neste aspecto, ou se pelo contrário, é de manter a decisão recorrida.

     A vingar a aplicabilidade do regime estar-se-ia perante um regime de punição mais atenuada, uma moldura abstracta mais benévola, dentro da qual, sequentemente, a proceder essa pretensão, teria de ajuizar-se a medida concreta da pena a aplicar aos crimes por que foi condenado, fazendo assim actuar os critérios do artigo 71.º do Código Penal, já dentro de uma outra moldura, com limites mais baixos/benévolos para o arguido, determinados exactamente, por essa atenuação.

      Daí que esta ponderação constitua um prius em relação à determinação da medida concreta da pena.

                                                                     *

    A presente questão consiste em saber se os autos fornecem elementos de facto suficientes para se concluir, ao contrário do que fez a decisão recorrida, pela aplicação ao ora recorrente do regime penal dos jovens adultos.

       Passemos então à análise da questão da atenuação especial em função da aplicação do regime estabelecido pelo Decreto-Lei n.º 401/82, de 23 de Setembro, seguindo-se de perto nessa abordagem o exposto nos acórdãos de 04-02-2009, de 29-04-2009, de 14-05-2009, de 31-03-2011, de 05-12-2012, de 17-04-2013 e de 04-07-2013, relatados pelo ora relator, nos recursos n.º 4135/08, 6/08.1PXLSB.S1, 96/09, 169/09.8SYLSB.S1, 250/10.1JALRA.E1.S1, 237/11.7JASTB.L1.S1 e 31/11.5PEFAR.S1, com as necessárias actualizações.
       
       O ora recorrente CC nasceu em 19 de Dezembro de 1994, pelo que, aquando dos crimes cometidos, ocorridos em 6 de Dezembro de 2011, tinha 16 anos de idade.

       De acordo com o artigo 9.º do Código Penal «Aos maiores de 16 anos e menores de 21 são aplicáveis normas fixadas em legislação especial».

       Estabelece o artigo 1.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 401/82, de 23 de Setembro, que «É considerado jovem para efeitos deste diploma o agente que, à data da prática do crime, tiver completado 16 anos sem ter ainda atingido os 21 anos».

       Dispõe, por seu turno, o artigo 4.º do mesmo diploma legal que, se for aplicável pena de prisão, deve o juiz atenuar especialmente a pena nos termos dos artigos 73.º e 74.º do Código Penal (artigos 72.º e 73.º, após a versão dada ao Código Penal pelo Decreto-Lei n.º 48/95, de 15 de Março, intocados na revisão operada pela Lei n.º 59/2007, de 4 de Setembro, e posteriores), quando tiver sérias razões para crer que da atenuação resultem vantagens para a reinserção social do jovem condenado.

      Refere-se no preâmbulo do citado Decreto-Lei – n.º 4 – que “trata-se, em suma, de instituir um direito mais reeducador do que sancionador, sem esquecer que a reinserção social, para ser conseguida, não poderá descurar os interesses fundamentais da comunidade, e de exigir, sempre que a pena prevista seja a de prisão, que esta possa ser especialmente atenuada, nos termos gerais, se para tanto concorrerem sérias razões no sentido de que, assim, se facilitará aquela reinserção”.

    Como se assinala no n.º 7 do mesmo exórdio: “As medidas propostas não afastam a aplicação - como ultima ratio - da pena de prisão aos imputáveis maiores de 16 anos, quando isso se torne necessário, para uma adequada e firme defesa da sociedade e prevenção da criminalidade, e esse será o caso de a pena aplicada ser a de prisão superior a dois anos”.
       O “Regime penal especial para jovens com idade compreendida entre os 16 e os 21 anos”, instituído pelo Decreto-Lei n.º 401/82, de 23 de Setembro, surge em regulação do imperativo decorrente do artigo 9.º do Código Penal, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 400/82, da mesma data, sendo, pois, um regime datado, entrando aquele diploma em vigor simultaneamente com o Código Penal, com o qual, aliás, foi articulado, consignando-se no 1.º segmento do ponto 4 do preâmbulo daquele Decreto-Lei que “O princípio geral imanente em todo o texto legal é o da maior flexibilidade na aplicação das medidas de correcção que vem permitir que a um jovem imputável até aos 21 anos possa ser aplicada tão só uma medida correctiva”.
       E no 2.º segmento, proclama-se «Trata-se, em suma, de instituir um direito mais reeducador que sancionador, sem esquecer que a reinserção social, para ser conseguida, não poderá descurar os interesses fundamentais da comunidade, e de exigir, sempre que a pena prevista seja a de prisão, que esta possa ser especialmente atenuada, nos termos gerais, se para tanto concorrerem sérias razões no sentido de que, assim, se facilitará aquela reinserção”.
       Nesta perspectiva foram estabelecidas as estatuições dos artigos 5.º e 6.º, prevendo medidas tutelares ou correctivas, desde que ao caso correspondesse pena de prisão até dois anos.
       Para os casos de a pena aplicada ser superior a esse limite, já não se afasta a possibilidade de aplicação, como ultima ratio, de pena de prisão – n.º 7 do preâmbulo.
  Esta diversidade de previsões legais quanto a forma de sancionamento poderá constituir uma achega para a clarificação das posições que vêm sendo assumidas a propósito da aplicação ou afastamento do regime atenuativo especial em causa, não sendo despiciendo para o efeito indagar da quantificação dos casos concretos em que aos jovens condenados, ao longo dos mais de 29 anos de vigência do diploma, foram aplicadas medidas de correcção e a legislação relativa a menores (o Decreto-Lei n.º 314/78, de 27-10, a antiga Organização Tutelar de Menores, até 31-12-2000, e a partir de 1-01-2001, com as alterações do direito de menores de 1999 – Lei n.º 166/99, de 14-09 – Lei Tutelar Educativa – publicada no Diário da República, Série I-A, n.º 215, de 14-09-1999, alterada e republicada pela Lei n.º 4/2015, de 15 de Janeiro, Diário da República, 1.ª série, n.º 10, de 15-01, e Decreto-Lei n.º 323-D/2000, publicado no Diário da República, Série I-A, n.º 292, de 20-12, 3.º Suplemento, diploma que aprovou o regulamento geral e disciplinar dos centros educativos e que concretizou a vigência daquela Lei e Decreto-Lei n.º 5-B/01, de 12-01, 2.º Suplemento).
       Tal regime “sucedeu” ao vigente no domínio do Código Penal de 1886, em que relativamente aos jovens com menos de 18 ou menores de 21 anos ao tempo da perpetração do crime, estava prevista redução das molduras penais com abaixamento de grau na escala de penas, de modo que aos primeiros, a penalidade mais elevada aplicável era a de 2 a 8 anos, e aos segundos, de 12 a 16 anos - artigos 107.º e 108.º.
 

       A aplicação do regime ora em causa suscita em alguns pontos controvérsia na jurisprudência.

       Desde logo, a caracterização do próprio regime como especial ou geral não é consensual ou pacífica, sendo disso exemplos, por um lado, os acórdãos de 27-10-2004, processo n.º 1409/04-3.ª, CJSTJ 2004, tomo 3, pág. 212 e de 28-06-2007, processo n.º 1906/07-5.ª, em que se refere que o regime penal aplicável a jovens adultos não constitui um regime especial, mas o regime penal geral relativo aos jovens delinquentes, sendo “o regime-regra de sancionamento penal aplicável a esta categoria etária” (ainda neste sentido os acórdãos de 07-05-2009, processo n.º 1213/08-5.ª, de 12-11-2009, processo n.º 979/08.4PCCBR.S1-5.ª e de 18-11-2009, processo n.º 1451/06.2GAVNF.S1-5.ª); diferentemente, os acórdãos de 07-11-2007, processo n.º 3214/07-3.ª e de 02-06-2010, processo n.º 27/04.3GBTMC.S2-3.ª, em que se afirma que o preceito do artigo 4.º estabelece não um regime especial, mas no rigor um regime específico de atenuação especial, restrito aos jovens condenados, e ainda diversamente, o acórdão de 06-09-2006, proferido no processo n.º 1916/06-3.ª, que aplicou o regime em caso de tráfico de menor gravidade, publicado na CJSTJ 2006, tomo 3, pág. 181, em que é considerado como regime especial que prevalece sobre o regime geral, subsidiariamente aplicável.

Como se extrai do acórdão de 21-10-2009, processo n.º 872/05.2PEGDM.S1-3.ª, o direito penal dos jovens surge como uma “categoria própria, envolvendo um ciclo de vida”, referente a um período de “lactência social”, de descompromisso com a relação escolar, familiar e profissional, com um “potencial de delinquência”, em moldes efémeros, sob o signo de capacidade de mutação e regressão na fase de mais avançada idade.

       O instituto previsto no regime penal especialmente destinado a jovens adultos corresponde a um dos “casos expressamente previstos na lei”, a que alude o n.º 1 do artigo 72.º do Código Penal e “a uma atenuação especialmente prevista na lei”, como se expressa o n.º 3 do mesmo preceito.

  Na expressão do acórdão de 13-07-2005, processo n.º 2122/05-3.ª, a norma do artigo 4.º do Decreto-Lei 401/82, configura um fundamento autónomo de atenuação especial da pena, directamente fundado na idade do agente e no juízo de prognose favorável quanto ao desempenho da personalidade, não remetendo para os pressupostos de atenuação especial do artigo 72.º do Código Penal.

       A autonomia deste tipo de atenuação especial é acentuada nos acórdãos de 10-04-2014, processo n.º 368/12.6PFLRS.L1.S1-3.ª, de 15-10-2014, processo n.º 107/13.4JACBR.C1.S1-3.ª, de 10-12-2014, processo n.º 75/13.2SULSB.S1-3.ª, todos com o mesmo relator.

       Todos estão, porém, de acordo em que a atenuação especial ao abrigo do regime visando os jovens adultos

- não é de aplicação necessária e obrigatória;

- nem opera de forma automática, sendo de apreciar casuisticamente;

- é de conhecimento oficioso;

- a consideração da sua aplicação não constitui uma mera faculdade do juiz,

- mas antes um poder-dever vinculado que o juiz deve (tem de) usar sempre que se verifiquem os respectivos pressupostos, sendo de concessão vinculada;

- de aplicar sempre que procedam sérias razões para crer que da atenuação resultam vantagens para a reinserção social do jovem condenado, sendo a aplicação em tais circunstâncias, obrigatória e oficiosa,

- havendo a obrigação, ou pelo menos, não se dispensando a equacionação da pertinência ou inconveniência da sua aplicação;

- justificando-se a opção ainda que se considere inaplicável o regime, isto é, devendo ser fundamentada a não aplicação.
A propósito destes pontos podem ver-se os acórdãos deste Supremo Tribunal de Justiça, de 01-03-1990, BMJ n.º 395, pág. 210 (o regime não é de aplicação automática em função da idade do agente, devendo ser averiguado casuisticamente); de 12-06-1997, processo n.º 209/97-3.ª, BMJ n.º 468, pág. 116 (a aplicação do disposto no artigo 4.º não opera automaticamente havendo a necessidade de fazer um prognóstico favorável acerca do carácter evolutivo e da capacidade de ressocialização); de 28-10-1998, no processo n.º 887/98-3.ª, in BMJ n.º 480, pág. 83 (repetindo argumentação do acórdão de 15-01-1997, proferido no processo n.º 1129/96-3.ª, in CJSTJ 1997, tomo 1, pág. 182 e do acórdão de 17-09-97, proferido no processo 504/97-3.ª, CJSTJ 1997, tomo 3, pág. 173, ambos do mesmo relator (encarando como obrigatório o dever de fundamentação relativamente à não aplicação do regime e explicitando que as exigências de prevenção geral positiva não podem ser sacrificadas em nome da predominância de razões de prevenção especial de socialização, pois estas, sendo neste domínio de particular e compreensível justificação, não são bastantes para prescindir do limite da pena necessária, à garantia da protecção de bens jurídicos e, por essa via, à da validade da norma que os prevê e tutela); de 18-06-1997, processo n.º 357/97-3.ª, CJSTJ 1997, tomo 2, pág. 242; de 15-10-1997, do mesmo relator do anterior, no processo n.º 383/97-3.ª, CJSTJ 1997, tomo 3, pág. 191; de 07-12-1999, processo n.º 1034/99-3.ª, CJSTJ 1999, tomo 3, pág. 234 e BMJ n.º 492, pág. 168; de 12-01-2000, processo n.º 829/99-3.ª, CJSTJ 2000, tomo 1, pág. 163; de 02-03-2000, processo n.º 1192/99 – 5.ª, SASTJ, n.º 39, pág. 63 e BMJ n.º 495, pág. 100; de 14-02-2002, processo n.º 4438/01-5.ª, CJSTJ 2002, tomo 1, pág. 213; de 11-06-2003, processo n.º 1657/03 – 3.ª; de 29-04-04, processo n.º 1679/04-5.ª, CJSTJ 2004, tomo 2, pág. 177 (defendendo que a aplicação do regime em causa não constitui uma faculdade do juiz, mas antes um poder dever vinculado que o juiz deve e tem de usar sempre que se verifiquem os respectivos pressupostos, entendendo que no juízo de prognose positiva imposto pelo regime do jovem delinquente deve considerar-se tanto a globalidade da actuação do jovem, como a sua situação pessoal e social, o que implica o conhecimento da sua personalidade, das suas condições pessoais, da sua conduta anterior e posterior ao crime, determinando, na sequência, o reenvio por insuficiência de matéria de facto, pondera que “a eventual aplicação aos jovens com idades entre os 16 e os 21 anos do regime especial previsto no artigo 4.º do DL n.º 401/82 depende do juízo sobre a existência de razões sérias para crer que de tal medida resultem vantagens para a reinserção social do jovem condenado e não apenas do juízo sobre a gravidade dos factos praticados e das fortes necessidades de prevenção geral que se fazem sentir em relação ao crime de roubo”); de 22-09-04, processo n.º 1795/04-3.ª, in CJSTJ 2004, tomo 3, pág. 159 (na base da aplicação do regime previsto no artigo 4.º do DL n.º 401/82, está, pelo tribunal da condenação, a hipótese de formulação de um juízo de prognose favorável ao arguido jovem, no sentido de que o abrandamento da pena irá concorrer decisivamente para a observância futura dos “padrões-standard”, quer dizer que o Tribunal, como na suspensão da execução da pena, há-de concluir que é vantajoso à reinserção social o regime atenuativo, capacitando-se de que esse regime de favor não é em vão, sendo aproveitado pelo jovem para se não confrontar com a lei; na formulação daquele juízo, há-de concluir-se que é vantajoso para o jovem delinquente a aplicação de um regime atenuativo, no sentido de que com a sua aplicação esse jovem não venha novamente a delinquir, atendendo-se, entre outras coisas, à imagem global dos factos praticados, designadamente ao seu processo executivo); de 21-10-2004, processo n.º 3442/04-5.ª, CJSTJ 2004, tomo 3, pág. 192 (a atenuação especial não opera automaticamente; a ressocialização, sendo sem dúvida um dos fins associados à aplicação de qualquer pena só funciona, “na medida do possível”, isto é, depois de assegurada a necessária protecção dos bens jurídicos, tal como emerge do artigo 40.º do Código Penal); de 27-10-04, processo n.º 1409/04-3.ª, CJSTJ 2004, tomo 3, pág. 212 (a aplicação do regime constitui um poder-dever vinculado); de 06-07-2005, processo n.º 2256/05-3.ª; de 20-10-2005, processo n.º 2966/05-5.ª; de 20-12-2006, processo n.º 3169/06 - 3ª; de 28-06-2007, processo n.º 1906/07 – 5.ª; de 28-06-2007, processo n.º 2284/07-5.ª, CJSTJ 2007, tomo 2, pág. 231; de 07-11-2007, processo n.º 3214/07 – 3.ª; de 18-02-2009, processo n.º 3775/08-5.ª; de 23-09-2009, processo n.º 27/04.3GBTMC.S1-3.ª; de 17-12-2009, processo n.º 187/08.4GISNT.L1.S1-5.ª; de 04-02-2010, processo n.º 145/07.6 SLSB.L1.S1-5.ª (Ao tribunal incumbe o poder-dever de averiguar se estão ou não verificados os pressupostos de facto de que depende a aplicação do DL 401/82); de 15-04-2010, processo n.º 1423/08.2JDLSB.L1.S1-3.ª; 30-05-2012, processo n.º 21/10.5GATVR.E1.S1-3.ª.

 

   As consequências da falta de consideração de aplicação do regime, a sanção para a omissão de pronúncia sobre essa aplicação, conheceram diversos enquadramentos ao longo do tempo.

Para os acórdãos de 15-01-1997, processo n.º 1129/96-3.ª, CJSTJ 1997, tomo 1, pág. 182; de 17-09-1997, processo n.º 504/97-3.ª, CJSTJ 1997, tomo 3, pág. 173 e de 28-10-1998, processo n.º 887/98-3.ª, BMJ n.º 480, pág. 83, todos do mesmo relator, a falta de consideração de aplicação do regime era encarada como violação do dever de fundamentação; estar-se-ia perante uma falta de fundamentação ou de motivação, que a não ser arguida, estaria sanada.

       No acórdão de 12-06-1997, processo n.º 209/97-3.ª, BMJ n.º 468, pág. 116, considerou-se que a não aplicação do regime especial dos jovens não constituía nulidade, por não enquadrável nos casos referidos no artigo 379.º do CPP, podendo constituir, quando muito, erro de julgamento.

       Nos acórdãos de 18-06-97 e de 15-10-97, ambos com o mesmo relator, nos processos n.º 357/97 e n.º 383/97, CJSTJ1997, tomos 2 e 3, págs. 242 e 191; de 07-04-1999, processo n.º 24/99; de 02-03-2000, BMJ n.º 495, pág. 100 e de 22-09-2004, processo n.º 1795/04-3.ª, CJSTJ 2004, tomo 3, pág. 159, considera-se que a falta de apreciação de matéria de conhecimento oficioso não constitui qualquer omissão de pronúncia por isso não gerando qualquer nulidade da decisão, constituindo antes a omissão de tomada de posição um erro de julgamento, error in judicando e não um error in procedendo, seguindo-se nos dois primeiros acórdãos citados a posição de Miguel Teixeira de Sousa, em Estudos sobre o Novo Processo Civil, Junho 1996, pág. 181, sendo que no segundo acaba por anular o acórdão recorrido por não dispor dos factos necessários para aplicação do regime, gerando nulidade por violação do artigo 374.º, n.º 2, do CPP.

       No acórdão de 29-04-04, processo n.º 1679/04-5.ª, in CJSTJ 2004, tomo 2, pág. 177, foi considerado verificar-se o vício de insuficiência para a decisão de matéria de facto provada, determinando-se o reenvio.

       Posteriormente a 1 de Janeiro de 1999, com a entrada em vigor da reforma operada pela Lei n.º 59/98, de 25 de Agosto, com a introdução da alínea c) do n.º 1 e do n.º 2 do artigo 379.º, do CPP, deixou de haver dúvidas quanto à cognição oficiosa da nulidade emergente de omissão de pronúncia, considerando-se a partir de então que a não consideração da aplicabilidade do regime constitui nulidade por omissão de pronúncia sobre questão de conhecimento oficioso, sendo de conhecimento oficioso nos termos do artigo 379.º, n.º 1, alínea c) e n.º 2 do CPP. Caso se entenda estar em causa violação do dever de fundamentação, a falta de fundamentação constituirá violação da injunção constante do artigo 374.º, n.º 2, do CPP, sendo então a nulidade a prevista na alínea a) do n.º 1 do citado preceito.

Neste sentido, podem ver-se os acórdãos do STJ de 07-02-1999, processo n.º 1034/99, CJSTJ 1999, tomo 3, pág. 234 e BMJ n.º 492, pág. 168; de 14-02-2002, processo n.º 4438/01-5.ª, CJSTJ 2002, tomo1, pág. 213; de 10-01-2007, processo n.º 1045/06 – 3.ª; de 28-02-2007, processo n.º 4686/06 – 3.ª; de 16-05-2007, processo n.º 1492/07 – 3.ª; de 12-06-2008, processo n.º 3245/07 – 3.ª; de 25-09-2008, processo n.º 3858/07 – 5.ª; de 29-10-2008, processo n.º 2874/08 – 3.ª, CJSTJ 2008, tomo 3, pág. 207; de 12-11-2008, processo n.º 3059/08 – 3.ª; de 19-11-2008, processo n.º 3776/08 – 3.ª; de 15-07-2009, processo n.º 8/08.8PDLSB.S1-3.ª; de 23-09-2009, processo n.º 27/04.3GBTMC.S1-3.ª.

                                                                      *****

       Diferenças existem já quanto à consideração, ou não, na análise e ponderação a realizar, da natureza e gravidade do crime e seu modo de execução.

       A divergência assenta no conflito que emergirá da consideração da prevalência ou não das exigências de prevenção especial sobre as exigências de prevenção geral de integração dos valores plasmados na ordem jurídica penal.

      No sentido da possibilidade e legitimidade da consideração de prevalência da prevenção geral, tendo por base o que consta do ponto n.º 7 do preâmbulo do Decreto-Lei n.º 401/82, ou fazendo uma chamada de atenção para a imposição de um limite às considerações de reinserção social, invocando-se prementes razões de defesa da ordem jurídica, podem ver-se os acórdãos de 20-12-1989, in BMJ n.º 392, pág. 263; de 23-10-1991, processo n.º 41736, BMJ n.º 410, pág. 373; de 12-12-1991, processo n.º 42188, in BMJ n.º 412, pág. 368 (em caso de crime de receptação considerou-se não ser de fazer uso da faculdade de atenuação especial prevista no artigo 4.º do DL 401/82, quando é grande o grau de ilicitude dos factos praticados e é grave a sua culpa, na forma de dolo directo); de 23-01-1992, BMJ n.º 413, pág. 244; de 15-01-1997, processo n.º 1129/96-3.ª, CJSTJ 1997, tomo 1, pág. 182; de 17-09-97, processo n.º 504/97-3.ª, CJSTJ 1997, tomo 3, pág. 173 (após se afirmar que o DL 401/82 tem subjacente uma preocupação de instituição de um direito mais reeducador que sancionador com adopção preferencial de medidas correctivas desprovidas de efeitos estigmatizantes, prevendo-se a atenuação especial da pena de prisão e que tem como nota dominante a predominância de razões de prevenção especial de socialização, adverte que a predominância da consideração da prevenção especial não é bastante para se prescindir do limite da pena necessária à garantia e protecção de bens jurídicos, e por essa via, à da validade da norma que os prevê e tutela; a atenuação da pena não só não opera automaticamente como, mais do que isso, necessário se torna ainda que se tenha estabelecido positivamente que há sérias razões para crer que da atenuação especial resultam vantagens para a reinserção social do jovem); com idêntica argumentação o acórdão de 28-10-1998, do mesmo relator, no processo n.º 887/98-3.ª, BMJ n.º 480, pág. 83; de 14-04-1999, processo n.º 1409/98-3.ª, CJSTJ 1999, tomo 2, pág. 174; de 09-12-1999, processo n.º 933/99, BMJ n.º 492, pág. 193; de 02-03-2000, processo n.º 1192/99 – 5.ª, BMJ n.º 495, pág. 100; de 30-1-2000, processo n.º 2707/00 – 5.ª; de 01-03-2001, processo n.º 107/01 – 5.ª; de 9-05-2002, processo n.º 628/02-5.ª, CJSTJ 2002, tomo 2, pág. 193 e do mesmo relator de 12-02-2004, processo n.º 218/04-5.ª, CJSTJ 2004, tomo 1, pág. 202 (mesmo em caso de prognose favorável, trata-se de erigir, como última barreira, a defesa da ordem jurídica, que em caso algum, pode ser ultrapassada, um pouco à semelhança do que se passa com idêntico juízo de prognose a propósito da suspensão da pena); de 03-04-2003, processo n.º 865/03-5.ª, CJSTJ 2003, tomo 2, pág. 157 (a gravidade do crime cometido, patente na medida da pena aplicável, é, pois, indicada pelo legislador como critério a atender); de 27-11-03, processo n.º 3393/03 – 5.ª; de 21-10-2004, processo n.º 3442/04-5.ª, CJSTJ 2004, tomo 3, pág. 192 (em que se assinala que a ressocialização, sendo sem dúvida um dos fins associados à aplicação de qualquer pena só funciona, «se possível», isto é, depois de assegurada a necessária protecção dos bens jurídicos, tal como emerge do disposto no artigo 40º do Código Penal; há um limite que não pode ser ultrapassado - a defesa do ordenamento jurídico); de 13-07-2005, processo n.º 1682/05-3.ª; de 18-05-2006, da 5.ª Secção, mas sem indicação de número, in CJSTJ 2006, tomo 2, pág. 180; de 25-05-2006, processo n.º 1771/06 “com a atenuação especial da pena na delinquência jovem, atendendo às vantagens para a reinserção social do jovem condenado daí advindas, pretende-se evitar que uma reacção penal severa, na fase latente da formação da personalidade, possa comprometer definitivamente a socialização do jovem. Mas deve ter-se igualmente presente a gravidade do crime cometido, patente na medida da pena aplicável, indicada, aliás, pelo legislador como critério a atender também, sem se comprometer acriticamente aquele desiderato. Haverá que apreciar, em cada caso concreto, a personalidade do jovem, a sua conduta anterior e posterior ao crime, a natureza e modo de execução do crime e os seus motivos determinantes”; de 13-07-2006, processo n.º 1926/06-5.ª, in CJSTJ 2006, tomo 2, pág. 244 (afastando o regime em caso de duplo homicídio qualificado cometido por arguido com diagnóstico de personalidade “borderline” e de perigosidade social decorrente da afirmação de uma probabilidade superior a 50% de cometimento de crimes do mesmo género); de 28-02-2007, processo n.º 4680/06 – 3.ª; de 11-04-2007, processo n.º 521/07-3.ª; de 19-04-2007, processo n.º 620/07 – 5.ª; de 16-05-2007, processo n.º 1492/07 – 3.ª; de 20-06-2007, processo n.º 2083/07 – 5.ª; de 11-07-2007, processo n.º 2047/07 – 3.ª; de 31-10-2007, processo n.º 3484/07 – 3.ª; de 05-12-2007 processo n.º 3178/07-3.ª; de 06-12-2007, processo n.º 2813/07 – 5.ª; de 31-01-2008, processo n.º 4573/07 – 5.ª (o tribunal antes de proceder à atenuação especial da pena nos termos do artigo 4.º do DL 401/82, deve ponderar a gravidade do crime cometido, aferida pela medida da pena aplicável); de 02-04-2008, processo n.º 817/08 – 3.ª (a aplicação do regime não pode manter-se à margem da consideração das exigências de prevenção geral e de defesa do ordenamento jurídico); de 09-04-2008, processo n.º 698/08 – 3.ª; de 21-05-2008, processo n.º 998/08 – 3.ª; de 08-10-2008, processo n.º 589/08 – 5.ª; de 05-11-2008, processo n.º 2861/08 – 3.ª; de 12-11-2008, processos n.ºs 3059/08-3.ª e 3278/08-3.ª; de 14-01-2009, processo n.º 3777/08-3.ª; de 18-02-2009, processo n.º 100/09-3.ª; de 12-09-2012, processo n.º 605/09.4PBMTA.L1.S1-3.ª.

       Nesta corrente entende-se que razões atinentes às necessidades de reprovação e de prevenção do crime poderão precludir o uso e aplicação do regime, designadamente quando a ele se opuserem considerações de prevenção geral sob a forma de exigências mínimas e irrenunciáveis de defesa do ordenamento jurídico.

       Neste contexto, a jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça, de uma forma geral, afasta a aplicação do regime especial em casos de homicídio, enunciando-se alguns dos acórdãos mais recentes.

O acórdão de 10-04-2014, processo n.º 368/12.6PFLRS.L1.S1-3.ª, após ponderação global das circunstâncias do caso, afastou a aplicação a arguido com 18 anos, em caso de homicídio qualificado. A atitude do arguido não foi determinada nem influenciada por problemas de inserção social ou de formação da personalidade, pelo que não tem sentido aplicar um regime que procura incentivar a “reinserção social” ou “reeducação” do delinquente.

O acórdão de 15-10-2014, processo n.º 107/13.4JACBR.C1.S1-3.ª, com o mesmo relator do anterior, após ponderação global das circunstâncias do caso, afastou a aplicação a arguido com 19 anos, em caso de homicídio qualificado e roubo qualificado.

Segundo o acórdão de 08-01-2015, processo n.º 1623/12.0JAPRT.P1.S1 - 5.ª, sendo o arguido de 19 anos de idade condenado por homicídio simples, após afastamento da qualificação: A atenuação especial da pena prevista no art. 4.º do DL 401/82, de 23-09, não opera automaticamente; é necessário que se estabeleça positivamente que há sérias razões para crer que da atenuação especial resultam vantagens para a reinserção social do jovem condenado. Ora, na personalidade do recorrente manifestada na prática do crime e nos factos que, imediatamente, lhe sucederam nada se encontra que sustente um juízo positivo sobre as vantagens da atenuação especial da pena para a sua reinserção social, ao que acresce que o crime cometido e as circunstâncias em que o foi escapam a uma tradicional categorização da delinquência juvenil.

Nos crimes de homicídio, as exigências de prevenção geral positiva são sempre especialmente intensas porque a violação do bem jurídico fundamental ou primeiro – a vida – é, em geral, fortemente repudiada pela comunidade. (…) As exigências de prevenção especial de socialização não constituem, normalmente, nos casos de homicídio, um factor com relevo significativo na medida da pena porque, quando é posto em causa o bem jurídico vida sobreleva, decisivamente, a necessidade e a medida da sua tutela.   

Para o acórdão de 19-02-2015, processo n.º 617/11.8JABRG.G2.S1 - 5.ª Secção, O DL 401/82, de 23-09, institui o regime aplicável em matéria penal aos jovens com idade compreendida entre os 16 e 21 anos. A atenuação especial da pena prevista no art. 4.º deste diploma não opera automaticamente; é necessário que se estabeleça positivamente que há sérias razões para crer que da atenuação especial resultam vantagens para a reinserção do jovem condenado.

Na definição das exigências de prevenção especial de socialização, as características da personalidade do recorrente R, que muito impressivamente se projectaram no crime de homicídio, relativamente ao qual não demonstrou qualquer arrependimento, prejudicam a formulação de um juízo positivo sobre a verificação dos pressupostos de que depende a atenuação especial da pena prevista no art. 4.º do citado diploma.

Em caso de homicídio simples considerou o acórdão de 05-03-2015, processo n.º 416/11.7GFVFX.L1.S1 - 5.ª Secção - O regime penal especial para jovens maiores de 16 e menores de 21 anos previsto no DL 401/82, de 23-09, não sendo embora de aplicação automática, deve merecer obrigatoriamente a atenção do tribunal no sentido de equacionar a sua aplicação no caso concreto.

A condição indispensável da atenuação especial da pena a coberto do disposto no art. 4.º do DL 401/82 é a conclusão sobre a existência de razões sérias e sobre as suas vantagens para a reinserção social do jovem.

(…) O juízo sobre as virtualidades da atenuação especial da pena para a reinserção social do jovem há-de assentar num condicionalismo que, não se reduzindo à idade, atenda a todo o condicionalismo do cometimento do crime. Não é só por estar em causa um jovem com idade entre os 16 e os 21 anos que se tem de partir do princípio que quanto menor for a prisão mais fácil se torna a reinserção social do jovem.

Extrai-se do acórdão de 23-04-2015, processo n.º 86/14.0YFLSB - 5.ª em caso de homicídio “Dado que as razões de prevenção especial são particularmente fortes, face à existência de uma personalidade alheada dos padrões comuns e normais (daí a qualificação do crime), a reclamar um exigente esforço de ressocialização do agente, não são as mesmas coadunáveis com a atenuação especial da pena, nos termos do art. 4.º do DL 401/82, de 23-09”.

Segundo o acórdão de 23-04-2015, processo n.º 693/13.9JDLSB.L1.S1 - 5.ª Secção Nesse contexto  (crime de homicídio), a atenuação especial da pena ao abrigo do DL 401/82, de 23-09, ao invés de funcionar como estímulo a um repensar da sua vida no sentido de obediência aos valores, correria o risco de ser por ele mal compreendida, constituindo obstáculo à interiorização da gravidade do seu comportamento e da necessidade e vantagem de mudar de rumo. Acresce que, residindo o fundamento do regime penal especial para jovens na menor maturidade do agente, deve ser-se mais exigente na afirmação dos pressupostos materiais da sua aplicação à medida que a idade se aproxima do limite dos 21 anos, sendo que no caso esse limite estava a poucos meses de ser atingido.

       Pode ler-se no acórdão de 30-09-2015, proferido no processo n.º 861/13.3PFCSC.L1.S1, da 3.ª Secção: De acordo com o entendimento maioritário do STJ, a atenuação especial da pena fundada no art. 4.º, do DL 401/82, só pode ocorrer quando o tribunal tiver estabelecido positivamente que há razões sérias para crer que dessa atenuação especial resultam vantagens para a reinserção social do jovem delinquente e, simultaneamente, se considerar a atenuação compatível com as exigências de prevenção geral, sob forma de exigências mínimas e irrenunciáveis de defesa do ordenamento jurídico e garantia de protecção dos bens jurídicos.

       Ou seja, da leitura do referido preceito legal retira-se, antes do mais, que a atenuação especial ali prevista não é decorrente apenas da idade, mas pelo contrário exige-se ainda um conjunto de elementos objectivos que criem no julgador a convicção de que da sua aplicação resultarão vantagens para a reinserção do jovem. No caso em apreço, a aplicação de tal regime foi afastada, e bem, perante a gravidade da ilicitude e da culpa, conjugados com a falta de arrependimento e ausência de confissão, sendo que, para além disso, a tal obrigariam considerações de prevenção geral, atenta a gravidade do crime em causa (homicídio qualificado).

Em sentido oposto, considerando a aplicabilidade do regime especial, ponderou o acórdão de 10-12-2015, processo n.º 134/13.1GBASL.E1.S1- 5.ª Secção - Em caso de jovens delinquentes não é apenas por referência à gravidade da conduta do agente que o tribunal deve fundamentar a decisão de inaplicabilidade da atenuação especial  com base na idade do delinquente.

      Assim, embora no crime de homicídio se proteja o bem mais precioso, a vida humana, a gravidade do ilícito, por si só, não constitui justificação bastante para a formulação de um juízo negativo quanto à aplicação do regime especial para jovens, porquanto, tal benesse afere-se pela finalidade da prevenção especial, ou seja, pela carência de socialização que o agente revele. (Segue-se mais alargada fundamentação).      

       No mesmo sentido, do mesmo relator, em caso de homicídio qualificado, agravado pelo uso da arma, com voto de vencido, pronunciou-se o acórdão de 17-12-2014, proferido no processo n.º 8/13.6JAFAR.E1.S1-5.ª.

Em sentido diverso, enfatizando a perspectiva de ressocialização, pronunciaram-se os seguintes acórdãos deste Tribunal: de 10-07-1991, processo n.º 41950, BMJ n.º 409, pág. 387, tendo o acórdão recorrido decidido que a reiteração e gravidade dos factos praticados, bem como a especial intensidade da sua vontade criminosa justificavam a não aplicação do regime previsto no artigo 4º, decidiu o STJ que não é com base neste juízo que será de afastar o preceito, mas no da inexistência de razões sérias para crer que da atenuação não resultam vantagens para a ressocialização do jovem; de 06-09-2006, processo n.º 1916/06-3.ª, CJSTJ 2006, tomo 3, pág. 181, proclamando uma interpretação algo diferente do artigo 4.º, conclui que “A gravidade do crime praticado e o grau de ilicitude do facto (…) não podem aqui ser considerados senão para efeitos de medida concreta da pena, depois de achada a moldura aplicável ao caso”; de 15-02-2007, processo n.º 4681/06 – 5.ª (a atenuação prevista no artigo 4º funda-se em razões de prevenção especial; contra ela não poderá invocar-se a “gravidade do crime praticado e/ou a defesa da sociedade e/ou a prevenção da criminalidade”; apenas será de afastar se contra-indicada por uma manifesta ausência de sérias razões para crer que, dela, possam resultar vantagens para a reinserção); de 14-06-2007, processo n.º 1423/07-5.ª; de 28-06-2007, processo n.º 2284/07-5.ª, CJSTJ 2007, tomo 2, pág. 231, citando acórdãos de 14-11-2002, processo n.º 3117/02 – 5.ª e de 04-03-2004, processo n.º 3364/03-5.ª (quanto a jovens adultos a finalidade da pena (razões de prevenção especial-reintegração na sociedade) sobrepõe-se à protecção dos bens jurídicos e de defesa social); de 28-06-2007, processo n.º 1906/07 – 5.ª (Para negar a atenuação, não basta que se possam colocar reservas à capacidade de ressocialização do jovem. Aliás, «a atenuação especial da pena p. no art. 4.º do DL 401/82 não se funda nem exige “uma diminuição acentuada da ilicitude e da culpa do agente”, nem, contra ela, poderá invocar-se “a gravidade do crime praticado e/ou a defesa da sociedade e/ou a prevenção da criminalidade”. Pois que, por um lado, a lei não exige – para que possa operar – a «demonstração de» (mas a simples «crença em») «sérias razões» de que «da atenuação resultem vantagens para a [sua] reinserção social» (cf. Ac. do STJ de 27-02-03, Proc. n.º 149/03 - 5.ª). E já que, por outro, «a atenuação especial da pena a favor do jovem delinquente não pressupõe, em relação ao seu comportamento futuro, um “bom prognóstico”, mas, simplesmente, um “sério” prognóstico de que dela possam resultar “vantagens” para uma (melhor) reinserção social do jovem condenado» (ibidem). «O que o art. 9.º do CP trouxe de novo aos chamados jovens adultos foi, além do mais, a imperativa atenuação especial (“deve o juiz atenuar”), mesmo que o princípio da culpa o não exija, quando “haja razões sérias para crer que da atenuação resultem vantagens para a reinserção social do jovem condenado” (art. 4.º do DL 401/82)» (cf. Ac. do STJ de 29-01-04, Proc. n.º 3767/03 - 5.ª); de 24-10-2007, processo n.º 3263/07 – 3.ª (o artigo 4.º significa que, relativamente aos jovens condenados, a finalidade ressocializadora se sobrepõe aos demais fins das penas, não podendo, portanto, recusar-se a atenuação especial com fundamento na retribuição ou na prevenção geral, cujos interesse deverão ser secundarizados e mesmo postergados se for de concluir que a atenuação especial favorece a ressocialização do arguido); de 14-11-2007, processo n.º 3859/07 – 3.ª (em que se considera que não é admissível recusar a aplicação do regime com fundamento na prevenção especial ou na retribuição; o único fundamento legítimo para o fazer é a inexistência de vantagens para a reinserção social); de 23-04-2008, processo n.º 821/08 – 3.ª (o artigo 4.º faz prevalecer as razões de prevenção especial, na vertente de ressocialização, sobre as restantes finalidades das penas, nomeadamente a prevenção geral); de 17-09-2009, processo n.º 169/07.3GCBNV.S1-5.ª (o que está verdadeiramente em causa no regime penal especial para jovens são razões de prevenção especial, ligadas à reinserção social do menor, e não razões de culpa ou mesmo de ilicitude.

No acórdão de 07-11-2007, processo n.º 3214/07-3.ª, ponderou-se que “As reacções penais relativamente a jovens que praticam factos criminais devem, tanto quanto possível, aproximar-se das medidas de reeducação, e na máxima medida permitida pela concordância prática com exigências de prevenção, com a utilização da plasticidade dos modelos que o regime penal específico prevê, evitar as penas privativas de liberdade”.

Noutra linha jurisprudencial que será de solução de compromisso, com a ponderação adequada das duas finalidades da pena, entende-se que no juízo de prognose positiva imposto ao aplicar o artigo 4.º há que considerar a globalidade da actuação e da situação pessoal e social do jovem, o que implica o conhecimento da sua personalidade, das suas condições pessoais, da sua conduta anterior e posterior ao crime, não se podendo atender de forma exclusiva (ou desproporcionada) à gravidade da ilicitude ou da culpa do arguido – neste sentido se pronunciou o acórdão de 01-03-2000, processo n.º 17/00-3.ª, in SASTJ, n.º 39, pág. 53, CJSTJ 2000, tomo 1, pág. 212 e BMJ n.º 495, pág. 59 (citado nos acórdãos de 9-05-2002, processo n.º 628/02-5.ª, CJSTJ 2002, tomo 2, pág. 193; de 12-02-2004, processo n.º 218/04-5.ª, CJSTJ 2004, tomo 1, pág. 202; de 29-04-2004, processo n.º 1679/02-5.ª, CJSTJ 2004, tomo 2, pág. 177).

       No acórdão de 12-07-2000, processo n.º 1773/00, BMJ n.º 499, pág. 199, defende-se que “São considerações de prevenção especial de socialização que estão na base da situação de atenuação em causa e, por consequência, de reintegração na comunidade, o que é conexo à própria finalidade de protecção dos bens jurídicos, à defesa dos interesses fundamentais da comunidade”. Esclarece que não podem esquecer-se os bens jurídicos tutelados pela incriminação e cuja protecção se insere na finalidade de prevenção geral.

Na posição do acórdão de 21-10-2009, processo n.º 872/05.2PEGDM.S1-3.ª, do que se trata é, em derradeira análise, em puro juízo prudencial, lograr atingir uma solução conciliatória, como ponto óptimo, entre a exigência colectiva de perseguibilidade penal e de desenvolvimento sem marcas inultrapassáveis à vida futura do jovem delinquente.

       Como referiu o acórdão de 13-07-2011, proferido no processo n.º 1659/07.3GTABF.S1, em que estava em causa crime de homicídio negligente emergente de acidente estradal com resultados plúrimos, em que interviemos como adjunto (com voto de vencido quanto a outro ponto), e publicado na CJSTJ 2011, tomo 2, pág. 210, a gravidade das condutas, uma culpa acentuadíssima, uma ilicitude vincada e fortíssima, não são fundamentos adequados para decidir sobre a aplicação, ou a aplicabilidade, do regime penal de jovens; o fundamento não está no facto ou na culpa, mas no prognóstico favorável («sérias razões para crer») sobre a vantagem da atenuação para a reinserção social do jovem condenado, sendo o regime penal em causa comandado por exclusivas finalidades de prevenção especial.

       A ser deferida a atenuação especial prevista no artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 401/82 terá a medida premial de ser concretizada e quantificada de harmonia com o disposto nos artigos 72.º e 73.º do Código Penal, que constituem apoio subsidiário do regime ali previsto, estando-se perante uma situação de atenuação especial fora da cláusula geral do artigo 72.º - cfr.  acórdão de 12-07-2000, BMJ n.º 499, pág. 199.

       Estabelece o n.º 1 do artigo 72.º do Código Penal na redacção dada ao diploma pela 3.ª alteração – Decreto-Lei n.º 48/95, de 15 de Março – e mantido inalterado pela 23.ª alteração, introduzida pela Lei n.º 59/07, de 4 de Setembro, e seguintes, que o tribunal atenua especialmente a pena, para além dos casos expressamente previstos na lei, quando existirem circunstâncias anteriores ou posteriores ao crime, ou contemporâneas dele, que diminuam por forma acentuada a ilicitude do facto, a culpa do agente ou a necessidade da pena.

       O n.º 2 do referido preceito elenca algumas das circunstâncias, exemplos - padrão, que podem ser consideradas para o efeito consignado, a saber:

a) Ter o agente actuado sob influência de ameaça grave ou sob ascendente de pessoa de quem dependa ou a quem deva obediência;

b) Ter sido a conduta do agente determinada por motivo honroso, por forte solicitação ou tentação da própria vítima ou por provocação injusta ou ofensa imerecida;

c) Ter havido actos demonstrativos de arrependimento sincero do agente, nomeadamente a reparação, até onde lhe era possível, dos danos causados;

d) Ter decorrido muito tempo sobre a prática do crime, mantendo o agente boa conduta.

       Em anotação a este artigo Leal - Henriques e Simas Santos, Código Penal Anotado, Rei dos Livros, 3.ª edição, 2002, I volume, pág. 856 e 4.ª edição, 2015, II volume, pág. 116, consideram: “Seguiu-se neste art. 72º o caminho de proceder a uma enumeração exemplificativa das circunstâncias atenuantes de especial valor, para se darem ao juiz critérios mais precisos de avaliação do que aqueles que seriam dados através de uma cláusula geral de avaliação”.

       A verificação dos índices previstos exemplificativamente no n.º 2 poderão ancorar a formulação de um juízo de prognose favorável, de modo a concluir-se pela existência das sérias razões a que alude o artigo 4.º. 

Pressuposto material da atenuação da pena, autónomo ou integrado pela intervenção valorativa das situações exemplificativamente enunciadas, é a acentuada diminuição da culpa ou das exigências de prevenção.

A atenuação especial resultante da acentuada diminuição da culpa ou das exigências da prevenção corresponde a uma válvula de segurança do sistema, que só pode ter lugar em casos extraordinários ou excepcionais, em que a imagem global do facto resultante da actuação da (s) atenuante (s) se apresenta com uma gravidade tão diminuída que possa razoavelmente supor-se que o legislador não pensou em hipóteses tais quando estatuiu os limites normais da moldura cabida ao tipo de facto respectivo.

       As diferenças de campo de aplicação nas duas previsões, na vertente faculdade/obrigatoriedade de aplicação do benefício, esbateram-se a partir de 01-10-1995, pois que dantes, enquanto à faculdade ou possibilidade de atenuação à luz do artigo 73.º do Código Penal de 1982 - “o tribunal pode atenuar” - correspondia uma injunção nos termos do artigo 4.º do DL 401/82 - “deve o juiz atenuar especialmente a pena” -, actualmente, nos termos do artigo 72.º do Código Penal, “o tribunal atenua especialmente a pena ”.

A diferença substancial entre os dois regimes será marcada pelo facto de, como resulta do artigo 4.º, fundando-se o regime penal destinado aos jovens em razões de prevenção especial, a finalidade ressocializadora se sobrepõe aos demais fins das penas, enquanto na medida prevista no Código Penal, a aplicação de moldura mais benevolente assenta na existência de circunstâncias que tenham por efeito a diminuição por forma acentuada da ilicitude do facto, da culpa do agente ou da necessidade da pena.  

      A este propósito, mas situando-se no segundo vector, cfr. o acórdão de 02-06-2010, processo n.º 27/04.3GBTMC.S2-3.ª, em que se afirma que o requisito material “haver razões para crer que da atenuação resultem vantagens para a reinserção social do condenado” é de natureza diferente, e mais flexível, do que o previsto no art. 72.º, n.º 1, do CP, que impõe, como condição da atenuação especial, uma diminuição acentuada da ilicitude, ou da culpa, ou da necessidade da pena.

Ou seja, para a aplicação da atenuação especial da pena ao abrigo do artigo 4.º do DL 401/82, basta que se apure que essa atenuação favorece a ressocialização do agente, haja ou não diminuição de ilicitude ou de culpa. Este preceito estabelece, pois, um regime específico de atenuação especial, restrito aos jovens condenados, segundo o qual, as razões de a ressocialização prevalecem sobre as razões dos demais fins das penas. Por isso, sempre que se prove a vantagem da atenuação especial da pena para a ressocialização do jovem condenado, aquela atenuação não pode ser denegada com base em considerações de prevenção geral ou de retribuição.

       Por último, há que ter em conta que esta forma de atenuação especial, como a prevista na cláusula geral do artigo 72.º do Código Penal, só funciona em relação a penas parcelares e não a penas únicas e em sede de recurso, apenas quando assegurada a respectiva recorribilidade.

       Como exemplos do primeiro impedimento, podem ver-se os seguintes   

Como se extrai dos acórdãos de 15-11-2012, proferido no processo n.º 5/04.2TASJP.P1.S1-3.ª e de 5-12-2012, processo n.º 1213/09.5PBOER.S1-3.ª: “O instituto da atenuação especial da pena apenas tem campo de aplicação no domínio das penas parcelares, que não na pena conjunta, pois é no momento da determinação da medida concreta das penas parcelares que se afere dos pressupostos constantes do artigo 72.º do Código Penal”.

       Como refere o acórdão de 21-03-2013 proferido no processo n.º 153/10.0PBVCT.S1 - 3.ª Secção: A questão da aplicação do regime para jovens adultos foi apreciada no momento da determinação das respectivas penas. No momento de formular a pena ou as penas únicas com sentenças já transitadas em julgado, não se coloca, a questão da aplicação do regime decorrente do DL 401/82, de 23-09, já ultrapassada nos processos respectivos.

       Como diz o acórdão de 4-07-2013, proferido no processo n.º 144/10.0JBLSB.L1.S2-5.ª “a atenuação especial da pena não é uma operação que tem de ser efectuada no cúmulo jurídico das penas, mas em relação a cada uma das penas fixadas em concreto. Na decisão que procede ao cúmulo jurídico, aplicando uma pena única, já o tribunal tem de partir das penas concretamente aplicadas que foram objecto de cognição autónoma, incluindo nesta a atenuação especial, se acaso se verificarem os respectivos pressupostos”.

       Segundo o acórdão de 06-03-2014, proferido no processo n.º 352/10.4PEOER.S1 - 3.ª Secção, No caso de concurso de crimes, as circunstâncias susceptíveis de justificarem a atenuação especial da pena ─ portanto, também a aplicação do art. 4.º do Regime penal especial para jovens, aprovado pelo DL 401/82, 23-09 ─ actuam no momento da determinação da medida concreta de cada uma das penas singulares e não (ou também não) no momento da determinação da pena conjunta.

       Para o acórdão de 07-05-2014 proferido no processo n.º 9/10.6PCLRS.L1.S1 - 5.ª Secção, A questão da aplicação do regime penal especial para jovens, com atenuação especial da pena, por efeito do disposto no art. 4.º do DL 401/82, remetendo para o art. 73.º do CP, está ultrapassada, uma vez que no âmbito dos poderes de cognição do STJ, o conhecimento das questões relativas a cada um dos crimes, incluindo a medida concreta das penas parcelares, já não se põe, sendo certo que a atenuação especial da pena não é uma operação que tenha que ser efectuada no cúmulo jurídico, mas em relação a cada uma das penas concretas.

Extrai-se do acórdão de 27-05-2015, processo n.º 173/08.4PFSNT.CS1 - 3.ª Secção “Em caso de cúmulo jurídico por conhecimento superveniente as penas parcelares que o integram, encontram-se já transitadas em julgado, ficando precludida a possibilidade de apreciação da aplicação do instituto de atenuação especial da pena nos termos gerais do art. 72.° do CP e do regime especial para jovens (possibilidade que apenas se colocaria em relação à determinação da medida concreta das penas parcelares), pelo que, o acórdão cumulatório recorrido não tinha que se pronunciar sobre tal hipótese, e assim sendo, não houve qualquer omissão de pronúncia”.

Como refere o acórdão de 30-09-2015, processo n.º 425/07.0PBBRR.L2.S1 - 3.ª Secção - O STJ vem entendendo pacificamente que, no caso de concurso de crimes, as circunstâncias susceptíveis de justificarem a atenuação especial da pena – portanto também a aplicação do art. 4.º, do DL 401/82, de 23-09, que consagra o regime penal especial para jovens adultos – actuam no momento da determinação da medida concreta de cada uma das penas parcelares. No momento de formular a pena ou as penas únicas com sentenças já transitadas em julgado, não se coloca a questão da aplicação do aludido regime legal, já ultrapassada nos processos respectivos.

      

       Versando o segundo exemplo (dupla conforme).

Como referimos no acórdão de 17-12-2014, processo n.º 512/13.6PGLRS.L1.S1-3.ª Secção “Por força da dupla conforme, está igualmente arredada a possibilidade de reapreciação da questão relativa à atenuação especial resultante de aplicação do regime especial dos jovens adultos, previsto no Decreto-Lei n.º 401/82, de 23 de Setembro, pretensão proposta pelo recorrente nas conclusões 22.ª e 23.ª, pois que a medida premial coloca-se em relação à determinação da medida concreta das penas parcelares, as quais se mostram fixadas em termos definitivos.

     Estando definitivamente fixadas as penas parcelares, precludida fica a possibilidade de apreciação da aplicação do instituto.

       Assim, igualmente, no acórdão de 15-04-2015, processo n.º 1474/12.2PJPRT.P1.S1 - 5.ª Secção, onde se pode ler: No que respeita à aplicação do regime especial para jovens, previsto no DL 401/82, de 23-09, decorrente do disposto no art. 9.º do CP, nomeadamente, do poder-dever do juiz para atenuar especialmente a pena (nos termos dos arts. 73.º e 74.º do CP), “quando tiver razões sérias para crer que da atenuação resultem vantagens para a reinserção social do jovem condenado”, temos que começar por salientar que, como qualquer regime de atenuação especial da moldura abstrata do crime, é aplicável às molduras dos crimes “parcelares” em que os arguidos sejam condenados. Como vimos anteriormente, no caso dos autos, apenas é recorrível a parte do acórdão referente à determinação da pena do concurso de crimes, pelo que também aqui não cabe a este tribunal apreciar.

Segundo o acórdão de 11-06-2015, processo n.º 401/13.4JAPRT.P1.S1 - 5.ª Secção

“No que respeita à aplicação do regime especial para jovens, previsto no DL 401/82, de 23-09, decorrente do disposto no art. 9.º do CP, nomeadamente do poder-dever do juiz para atenuar especialmente a pena (nos termos dos arts. 73.º e 74.º do CP), “quando tiver razões sérias para crer que da atenuação resultem vantagens para a reinserção social do jovem condenado”, temos que começar por salientar que, como qualquer regime de atenuação especial da moldura abstrata do crime, é aplicável às molduras dos crimes “parcelares” em que os arguidos sejam condenados. Isto é, aquela atenuação, quando seja de aplicar por se ter concluído que irá trazer vantagens à reinserção social do jovem, é uma atenuação da moldura abstrata da pena do crime, individualmente considerado, em que o arguido venha condenado.

         O recorrente foi condenado por diversos crimes em penas todas elas inferiores a 8 anos de prisão. De acordo com o estipulado no art. 400.º, n.º 1, al. f), do CPP, são irrecorríveis os acórdãos proferidos pela Relação que apliquem pena inferior a 8 anos de prisão.

      Estando este tribunal limitado ao conhecimento da pena única (e verificação dos seus pressupostos), toda a matéria relativa aos crimes parcelares está transitada em julgado - um caso julgado parcial sob condição resolutiva. Assim sendo, não se integra nos poderes de cognição deste tribunal uma análise das penas parcelares atribuídas, o que consequentemente inviabiliza qualquer possibilidade de aplicação (ou não) daquele regime especial, pelo que improcede nesta parte o recurso interposto pelo arguido”.

De acordo com o acórdão de 29-10-2015, processo n.º 137/12.3JBLSB.L1.S1 – 5.ª Secção - Sendo a matéria do âmbito das penas parcelares cuja recorribilidade para este STJ já vimos ser inadmissível por não se integrar nos seus poderes de cognição, está inviabilizada qualquer possibilidade de análise e/ou de aplicação (ou não) pelo STJ do regime especial para jovens, previsto no DL 401/82, de 23-09, decorrente do disposto no art. 9.º, do CP.

No acórdão de 7-05-2014, proferido no processo n.º 9/10.6PCLRS.L1.S1-5.ª, “cumularam-se” os dois impedimentos, como segue:

         “O Tribunal da Relação manteve as penas que foram fixadas na 1.ª instância, respectivamente de 4 anos e 9 meses de prisão (para 3 crimes de violação) e de 4 anos e 6 meses de prisão (para outros 4 crimes de violação). Desta forma, verifica-se a chamada dupla conforme, segundo o regime estatuído no art. 400.º, n.º 1, al. f), do CPP.

Consequentemente, o recurso terá de ser restringido ao conhecimento da pena única (10 anos de prisão), rejeitando-se o mesmo relativamente a todas as questões colocadas a respeito de cada um dos crimes em concurso (arts. 400.º, n.º 1, al. f), 414.º, n.ºs 2 e 3, e 420.º, n.º 1, al. b), todos do CPP).

       A questão da aplicação do regime penal especial para jovens, com atenuação especial da pena, por efeito do disposto no art. 4.º do DL 401/82, remetendo para o art. 73.º do CP, está ultrapassada, uma vez que no âmbito dos poderes de cognição do STJ, o conhecimento das questões relativas a cada um dos crimes, incluindo a medida concreta das penas parcelares, já não se põe, sendo certo que a atenuação especial da pena não é uma operação que tenha que ser efectuada no cúmulo jurídico, mas em relação a cada uma das penas concretas”.

      Revertendo ao caso concreto.

   

       Definidos os princípios, cabe ponderar se, em concreto, estão reunidos os pressupostos de aplicação ao recorrente CC do referido regime penal para jovens, sabido que à data da prática dos crimes, tinha 16 anos de idade.

      No acórdão recorrido a possibilidade de atenuação especial, foi focada, não tendo sido aplicado o regime especial ao recorrente.

       Após versar sobre a medida das penas, o acórdão recorrido, a fls. 731, sobre este aspecto disse o seguinte:

       “ Por último, 

importa ainda considerar o Regime Penal Especial dos Jovens Adultos, previsto no DL 401/82 de 2/9, relativamente ao arguido CC, que à data do crime - 6/12/2011 – tinha apenas 16 anos, pelo que, segundo o disposto no art. 4º do referido diploma, sendo-lhe aplicável pena de prisão, como é o caso da pena abstracta prevista para o crime de roubo no caso dos autos, deve o juiz atenuar especialmente a pena nos termos dos artigos 73º e 74º  do Código Penal - a que actualmente correspondem os arts.  72º e 73º - quando tiver sérias razões para crer que da atenuação resultem vantagens para a reinserção social do jovem condenado.

       Sendo certo que se entende decorrer desta disposição legal que tratando-se de jovens adultos as razões de ressocialização devem prevalecer, em detrimento das questões da culpa e da ilicitude - vd. Ac do STJ de 21/9/2006, relatado pelo Sr. Cº Rodrigues da Costa, disponível em www.dgsi.pt - todavia, no caso do arguido CC é convicção deste Tribunal face à factualidade respeitante à sua situação pessoal que ficou apurada, que a atenuação especial da pena em nada contribuirá para a sua reinserção social, conclusão que se retira do não investimento do arguido no sentido da mudança de estruturação pessoal/ integração social positiva, apesar das experiências já vivenciadas de natureza tutelar educativa, continuando a existir um estilo de vida ocioso, hábitos aditivos e desinteresse generalizado, em que a sua atitude foi sempre de incumpridor das obrigações, o que já conduziu  à revogação e cumprimento de pena de prisão efectiva.

        Deste modo, não se procederá à atenuação especial da pena, sem prejuízo da ponderação da juventude do arguido na medida concreta da pena a aplicar, diminuindo-a”.

       Como se viu, sendo obrigatória a ponderação da aplicação do regime em causa, já não o será a sua efectiva aplicação, desde logo porque não é automática, não sendo um mero resultado do factor idade.

       Há convergência na afirmação de que o prognóstico favorável à ressocialização radica na valoração, em cada caso concreto, da globalidade da actuação, do circunstancialismo factual da prática do crime e da situação do jovem, da sua personalidade, das suas condições pessoais e da sua conduta anterior e posterior ao crime, colocando-se as divergências no plano da consideração ou não da natureza e gravidade do crime.

    Como se refere nos acórdãos de 17-10-2007, processo n.º 3495/07-3.ª, de 16-01-2008, processo n.º 4837/08-3.ª, de 20-02-2008, processo n.º 211/08-3.ª e de 05-11-2008, processo n.º 2861/08-3.ª, a avaliação das vantagens da atenuação especial para a reinserção especial do jovem tem de ser equacionada perante as circunstâncias concretas do caso e do percurso de vida e não perante considerações vagas e abstractas desligadas da realidade.

       A atenuação tem de emergir de um julgamento do caso concreto que incuta na convicção do juiz a crença em sérias razões de que para o arguido resultam vantagens para a sua reinserção.

     Como dizia José António Barreiros, A ressocialização e o processo penal, in “Cidadão delinquente: reinserção social?”, edição do IRS, 1983, págs. 104 e sgs., a propósito do Decreto-Lei n.º 401/82, o diploma na sua concretização pressupõe necessariamente o detalhado conhecimento da individualidade comportamental do agente.

      Na expressão do acórdão do STJ de 21-03-1984, BMJ n.º 335, pág. 236, para ajuizar das vantagens que da atenuação podem resultar para a reinserção social, torna-se, fundamentalmente, preciso reconstituir a personalidade e a ambiência ou «milieu» do agente criminal.

       A ressocialização do arguido parte da sua vontade de querer nortear-se pelo respeito dos valores ético-jurídico comunitários e de respeitar os bens jurídicos, postura que tem de manifestar-se em atitudes comportamentais, que objectivamente, elucidem que está realmente interessado no caminho da ressocialização.

       Como referido foi no acórdão de 31-01-2008, CJSTJ 2008, tomo 1, pág. 215, a aplicação do regime especial para jovens não depende de se terem provado circunstâncias susceptíveis de demonstrar que da sua aplicação resultam vantagens para a reinserção social do condenado, mas de o tribunal ter sérias razões para crer que da atenuação especial resultam vantagens para a reinserção do condenado.

Nesta análise há que considerar o quadro de vida do arguido, a sua vivência pessoal e familiar, neste plano relevando os traços constantes dos factos provados n.º 1.27.

Como consta dos factos provados e se extrai do relatório social de fls. 707 a 709, elaborado em 18-05-2015 a partir de entrevista feita ao arguido no Estabelecimento Prisional de Silves onde se encontrava a cumprir 6 meses de prisão, o arguido veio para Portugal quando tinha 12 anos, tendo chegado a frequentar a escola, mas sempre desmotivado e com elevado absentismo não indo além do 5.º ano.

       Cometeu os factos ora em causa com 16 anos de idade e foi pai no início de 2015.     

 Não se encontra legalizado no país, alegadamente por falta de um documento proveniente do Brasil. A falta de documentação acaba por ser também uma das justificações para nunca se ter enquadrado em trabalho.

    

A aplicação do regime especial encontrará dificuldades insuperáveis nos casos em que não haja assunção pela prática dos factos, o que é evidenciado face ao que ficou assente no ponto de facto provado n.º 1.27, onde consta que o arguido “Atribui a sua nomeação nos factos como resultado de retaliações de terceiros” e ainda ao que consta da motivação a fls. 724, dizendo o arguido CC “não ter participado em nada disto” e a fls. 726, quando refere terem sido as declarações do arguidos BB e CC simplesmente negatórias.

       Atente-se que as declarações duraram apenas três minutos, como se alcança da acta de fls. 696, tendo tido início pelas 11 horas e 27 minutos e termo pelas 11 horas e 30 minutos.

      Há que atender ao elevado grau da ilicitude e da culpa, ao modo de execução, à violência usada sobre o casal com idades para serem avós do recorrente.

      Na perspectiva da vida pregressa do arguido, de anotar que o mesmo pela prática de factos considerados pela lei como crime em idade anterior aos 16 anos, cumpriu medidas de natureza tutelar educativa, sendo incumpridor de obrigações impostas.
       No que toca a perspectivas de futuro, ao apuramento de razões sérias para crer que da atenuação resultem vantagens para a reinserção social do recorrente, sobreleva o acontecido com a condenação anterior e que se constitui como sério obstáculo a que se possa produzir um juízo de prognose favorável, porque demonstra que o recorrente não soube aproveitar uma oportunidade.        
       Na verdade, a conduta do recorrente posterior à prática dos crimes de roubo ora em equação, veio a demonstrar não ser o recorrente merecedor da confiança que nele depositou o julgador no processo sumário que o condenou em pena suspensa.

    Como consta do FP 1.24, o arguido CC foi condenado no processo sumário 352/11.7GDPTM do 2.º Juízo Criminal do Tribunal de Portimão, em 11 de Maio de 2011, por decisão transitada em 8 de Junho seguinte, pela prática, naquele dia 11 de Maio de 2011, de um crime de furto qualificado na forma tentada, na pena de 6 meses de prisão, suspensa por um ano, em regime de prova.

Aquando do julgamento em 21-04-2015, o arguido encontrava-se preso, conforme a acta de fls. 693/4, e igualmente aquando da entrevista para elaboração de relatório social em Maio de 2015, tendo estado inicialmente no EP de Silves até 1 de Junho e depois sendo transferido para o EP de Pinheiro da Cruz.

       Como resulta de fls. 689, 695, 832 e 833, 868 e 869 e verso, o arguido cumpriu a pena de seis meses de prisão, inicialmente substituída por pena suspensa, de tal modo que foi desligado do processo sumário para ficar em prisão preventiva à ordem deste processo com efeitos a partir de 24 de Setembro de 2015.

 

     Do quadro global da situação concreta do arguido resulta que este não é merecedor de tratamento penal especializado.
   Sendo certo que após Dezembro de 2011, o arguido não cometeu crimes, tal não significa que tenha mantido boa conduta, o que é demonstrado pelo comportamento que fez renascer a primitiva natureza de pena privativa de liberdade aplicada no processo sumário.    
      O caso concreto não abona qualquer facto que possa suportar a formulação de um juízo de prognose favorável à reinserção social do jovem recorrente, de modo a concluir que se esteja face a fortes razões, “sérias razões”, que levem a crer que da aplicação da moldura atenuada e mais benevolente resultante da atenuação possa resultar vantagem para a reinserção; os factos colhidos não tornam viável a afirmação de tal conclusão, pois não ficaram provados factos demonstrativos da interiorização plena do desvalor da conduta, não sendo possível formular um juízo ou ter uma expectativa optimista sobre a personalidade do recorrente.
        No quadro presente afigura-se-nos, pois, ser de afirmar a sobreposição do direito sancionador ao direito reeducador.
       A idade será de considerar na determinação da pena como atenuante geral.

Concluindo: no caso não se postulam sérias razões para acreditar que da atenuação especial das penas resultem vantagens para a reinserção social do recorrente.

Nestes termos, entende-se não ser caso de atenuar especialmente as penas, nos termos do artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 401/82, improcedendo esta pretensão do recorrente.
     Do quadro global da situação concreta do arguido resulta que este não é merecedor de tratamento penal especializado.
     O caso concreto não abona qualquer facto, mínimo que seja, que possa suportar a formulação de um juízo de prognose favorável à reinserção social do jovem recorrente, de modo a concluir que se esteja face a fortes razões, “sérias razões”, que levem a crer que da aplicação da moldura atenuada e mais benevolente resultante da atenuação possa resultar vantagem para a reinserção; os factos colhidos não tornam viável a afirmação de tal conclusão, pois não ficaram provados factos demonstrativos da interiorização plena do desvalor da conduta, não sendo possível formular um juízo ou ter uma expectativa optimista sobre a personalidade do recorrente.
No quadro presente afigura-se-nos, pois, ser de afirmar a sobreposição do direito sancionador ao direito reeducador.
acórdão de 10-04-2014, processo n.º 368/12.6PFLRS.L1.S1-3.ª,
viver sozinho em Porches mudança definitiva para Portimão houve acalmia comportamental      
  Concluindo: no caso não se postulam sérias razões para acreditar que da atenuação especial das penas resultem vantagens para a reinserção social do recorrente.

Nestes termos, entende-se não ser caso de atenuar especialmente as penas, nos termos do artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 401/82, improcedendo esta pretensão do recorrente.

                                                             *******

      Questão II – Medida das penas aplicadas pelos crimes de roubo

       O recorrente CC impugna a medida das penas nas conclusões 1.ª, 2.ª, 3.ª e 8.ª, pugnando pela aplicação, tendo em conta um único crime, de pena de prisão não superior a 4 anos de prisão. 

        O recorrente BB igualmente impugna a decisão recorrida neste segmento, único de que discorda, ao longo das conclusões I a X, terminando por pedir a fixação da pena exactamente nos termos da decisão recorrida, o que se deverá a lapso e falta de revisão do texto, pois que como resulta das conclusões VII e VIII, pretende a fixação em prisão não superior a 5 anos e 6 meses para cada um dos crimes de roubo e pena única não superior a 7 anos de prisão.

       Assim, abordar-se-á a questão em bloco, tendo em conta as suas especificidades.

    

       Analisando.

      A moldura abstracta penal cabível ao crime de roubo agravado é a de prisão de 3 a 15 anos. 

      Dentro desta moldura funcionam todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, deponham a favor ou contra o agente, designadamente:

- O grau de ilicitude do facto, o modo de execução deste e a gravidade das suas consequências, bem como o grau de violação dos deveres impostos ao agente;

- A intensidade do dolo ou da negligência;

- Os sentimentos manifestados no cometimento do crime e os fins ou motivos que o determinaram;

- As condições pessoais do agente e a sua situação económica;

- A conduta anterior ao facto e a posterior a este, especialmente quando esta seja destinada a reparar as consequências do crime;

- A falta de preparação para manter uma conduta lícita, manifestada no facto, quando essa falta deva ser censurada através da aplicação da pena.


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      No domínio da versão originária do Código Penal de 1982, alguma jurisprudência, dizendo basear-se em posição do Professor Eduardo Correia (Actas das Sessões, pág. 20), segundo a qual o procedimento normal e correcto dos juízes na determinação da pena concreta, em face do novo Código, seria o de utilizar, como ponto de partida, a média entre os limites mínimo e máximo da pena correspondente, em abstracto, ao crime, adoptou tal orientação, considerando-se em seguida as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, depusessem a favor do agente ou contra ele, sendo exemplos de tal posição os acórdãos de 13-07-1983, BMJ n.º 329, pág. 396; de 15-02-1984, BMJ n.º 334, pág. 274; de 26-04-1984, BMJ n.º 336, pág. 331; de 19-12-1984, BMJ n.º 342, pág. 233; de 11-11-1987, BMJ n.º 371, pág. 226; de 19-12-1994, BMJ n.º 342, pág. 233; de 10-01-1987, processo n.º 38627- 3.ª, Tribuna da Justiça, n.º 26; de 11-11-1987, BMJ n.º 371, pág. 226; de 11-05-1988, processo n.º 39401-3.ª, Tribuna da Justiça, n.ºs 41/42.

     Manifestou-se contra esta interpretação Figueiredo Dias em Direito Penal Português, As Consequências Jurídicas do Crime, Aequitas, Editorial Notícias, 1993, § 277, págs. 210/211.

     A refutação de tal critério foi feita por Carmona da Mota, in Tribuna da Justiça, n.º 6, Junho 1985, págs. 8/9 e Alfredo Gaspar, em anotação ao acórdão de 2 de Maio de 1985, in Tribuna da Justiça, n.º 7, págs. 11 e 13, dando-se conta, em ambos os casos, de que o primeiro aresto em que se verificou uma inflexão na jurisprudência foi o acórdão da Relação de Coimbra de 09-11-1983, in Colectânea de Jurisprudência 1983, tomo 5, pág. 73.

     Posteriormente, e ainda antes de 1995, partindo da ideia de que a culpa é a medida que a pena não pode ultrapassar nem mesmo lançando apelo às necessidades de prevenção, mesmo que acentuadas, começou a considerar-se não ser correcto partir-se dum ponto médio dos limites da moldura penal para a agravação ou atenuação consoante o peso relativo das respectivas circunstâncias, como vinha sendo entendido, salientando-se que a determinação da medida da pena não depende de critérios aritméticos. Neste sentido, podem ver-se os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 16-12-1986, BMJ n.º 362, pág. 359; de 25-11-1987, BMJ n.º 371, pág. 255; de 22-02-1989, BMJ n.º 384, pág. 552; de 09-06-1993, BMJ n.º 428, pág. 284; de 22-06-1994, processo n.º 46701, CJSTJ 1994, tomo 2, pág. 255. E no acórdão de 27-02-1991, in A. J., n.º 15/16, pág. 9 (citado no acórdão de 15-02-1995, CJSTJ 1995, tomo 1, pág. 216), decidiu-se que na fixação concreta da pena não deve partir-se da média entre os limites mínimo e máximo da pena abstracta. A determinação concreta há-de resultar de a adaptar a cada caso concreto, liberdade que o julgador deve usar com prudência e equilíbrio, dentro dos cânones jurisprudenciais e da experiência, no exercício do que verdadeiramente é a arte de julgar.

    Anteriormente, não manifestando preocupações de adesão à pena média, pronunciaram-se, v. g.,  os acórdãos de 21-06-1989, BMJ n.º 388, pág. 245 e de  17-10-1991, BMJ n.º 410, pág. 360.

     Hans Heinrich Jescheck, in Tratado de Derecho Penal, Parte General, II, pág. 1194, diz: “o ponto de partida da determinação judicial das penas é a determinação dos seus fins, pois, só partindo dos fins das penas, claramente definidos, se pode julgar que factos são importantes e como se devem valorar no caso concreto para a fixação da pena”.

     Definindo o papel que cabe à culpa na determinação concreta da pena, nos termos da teoria da margem de liberdade (Claus Roxin, Culpabilidade y Prevención en Derecho Penal, págs. 94 -113) é ele o seguinte: a pena concreta é fixada entre um limite mínimo (já adequado à culpa) e um limite máximo (ainda adequado à culpa), limites esses que são determinados em função da culpa do agente e aí intervindo dentro desses limites os outros fins das penas (as exigências da prevenção geral e da prevenção especial).

 

      A partir de 1 de Outubro de 1995 foram alterados os dados do problema, passando a pena a servir finalidades exclusivas de prevenção, geral e especial, assumindo a culpa um papel meramente limitador da pena.

      A terceira alteração ao Código Penal operada pelo Decreto-Lei n.º 48/95, de 15 de Março, entrado em vigor em 1 de Outubro seguinte, proclamou a necessidade, proporcionalidade e adequação como princípios orientadores que devem presidir à determinação da pena aplicável à violação de um bem jurídico fundamental, introduzindo a inovação, com feição pragmática e utilitária, constante do artigo 40.º, ao consagrar que a finalidade a prosseguir com as penas e medidas de segurança é «a protecção dos bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade», ou seja, a reinserção social do agente do crime, o seu retorno ao tecido social lesado.

     Com esta reformulação do Código Penal, como se explica no preâmbulo do diploma, não prescindiu o legislador de oferecer aos tribunais critérios seguros e objectivos de individualização da pena, quer na escolha, quer na dosimetria, sempre no pressuposto irrenunciável, de matriz constitucional, de que em caso algum a pena pode ultrapassar a culpa, dispondo o n.º 2 que «Em caso algum a pena pode ultrapassar a medida da culpa».

     Em consonância com estes princípios dispõe o artigo 71.º, n.º 1, que “a determinação da medida da pena, dentro dos limites definidos na lei, é feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção”; o n.º 2 elenca, a título exemplificativo, algumas das circunstâncias, agravantes e atenuantes, a atender na determinação concreta da pena, dispondo o n.º 3, que na sentença são expressamente referidos os fundamentos da medida da pena, injunção com concretização adjectiva no artigo 375.º, n.º 1 do CPP, ao prescrever que a sentença condenatória especifica os fundamentos que presidiram à escolha e à medida da sanção aplicada. (Em sede de processo decisório, a regulamentação respeitante à determinação da pena tem tratamento autónomo relativamente à questão da determinação da culpabilidade, sendo esta tratada no artigo 368.º, e aquela prevista no artigo 369.º, com eventual apelo aos artigos 370.º e 371.º do CPP).

 

     Figueiredo Dias, em Temas Básicos da Doutrina Penal, Coimbra Editora, 2001, no tema Fundamento, Sentido e Finalidades da Pena Criminal, págs. 65 a 111, diz que o legislador de 1995 assumiu, precipitando no artigo 40.º do Código Penal, os princípios ínsitos no artigo 18.º, n.º 2, da CRP, (princípios da necessidade da pena e da proporcionalidade ou da proibição do excesso) e o percurso doutrinário, resumindo assim a teoria penal defendida:

1) Toda a pena serve finalidades exclusivas de prevenção, geral e especial.

2) A pena concreta é limitada, no seu máximo inultrapassável, pela medida da culpa.

3) Dentro deste limite máximo ela é determinada no interior de uma moldura de prevenção geral de integração, cujo limite superior é oferecido pelo ponto óptimo de tutela dos bens jurídicos e cujo limite inferior é constituído pelas exigências mínimas de defesa do ordenamento jurídico.

4) Dentro desta moldura de prevenção geral de integração a medida da pena é encontrada em função de exigências de prevenção especial, em regra positiva ou de socialização, excepcionalmente negativa ou de intimidação ou segurança individuais.

     No dizer de Fernanda Palma, inAs Alterações Reformadoras da Parte Geral do Código Penal na Revisão de 1995: Desmantelamento, Reforço e Paralisia da Sociedade Punitiva”, nas “Jornadas sobre a Revisão do Código Penal”, edição 1998, AAFDL, pág. 25, «a protecção de bens jurídicos implica a utilização da pena para dissuadir a prática de crimes pelos cidadãos (prevenção geral negativa), incentivar a convicção de que as normas penais são válidas e eficazes e aprofundar a consciência dos valores jurídicos por parte dos cidadãos (prevenção geral positiva). A protecção de bens jurídicos significa ainda prevenção especial como dissuasão do próprio delinquente potencial».

     Américo Taipa de Carvalho, em Prevenção, Culpa e Pena, in Liber Discipulorum para Jorge Figueiredo Dias, Coimbra Editora, 2003, pág. 322, afirma resultar do actual artigo 40.º que o fundamento legitimador da aplicação de uma pena é a prevenção, geral e especial, e que a culpa do infractor apenas desempenha o (importante) papel de pressuposto (conditio sine qua non) e de limite máximo da pena a aplicar por maiores que sejam as exigências sociais de prevenção.

     Está subjacente ao artigo 40.º uma concepção preventivo-ética da pena. Preventiva, na medida em que o fim legitimador da pena é a prevenção; ética, uma vez que tal fim preventivo está condicionado e limitado pela exigência da culpa.

     Para o efeito de determinação da medida concreta ou fixação do quantum da pena que vai constar da decisão o juiz serve-se do critério global contido no referido artigo 71.º do Código Penal (preceito que a alteração introduzida pela Lei n.º 59/2007, de 4 de Setembro, deixou intocado, como de resto aconteceu com o citado artigo 40.º), estando vinculado aos módulos - critérios de escolha da pena constantes do preceito.

    Como se refere no acórdão de 28-09-2005, CJSTJ 2005, tomo 3, pág. 173, na dimensão das finalidades da punição e da determinação em concreto da pena, as circunstâncias e os critérios do artigo 71.º do Código Penal têm a função de fornecer ao juiz módulos de vinculação na escolha da medida da pena; tais elementos e critérios devem contribuir tanto para co-determinar a medida adequada à finalidade de prevenção geral (a natureza e o grau de ilicitude do facto impõe maior ou menor conteúdo de prevenção geral, conforme tenham provocado maior ou menor sentimento comunitário de afectação dos valores), como para definir o nível e a premência das exigências de prevenção especial (circunstâncias pessoais do agente; a idade, a confissão; o arrependimento) ao mesmo tempo que também transmitem indicações externas e objectivas para apreciar e avaliar a culpa do agente.

     Observados estes critérios de dosimetria concreta da pena, há uma margem de actuação do julgador dificilmente sindicável, se não mesmo impossível de sindicar.

O referido dever jurídico-substantivo e processual de fundamentação visa justamente tornar possível o controlo - total no caso dos tribunais de relação, limitado às «questões de direito» no caso do STJ, ou mesmo das relações quando se tenha renunciado ao recurso em matéria de facto – da decisão sobre a determinação da pena.

     Estando a cognoscibilidade em recurso de revista limitada a matéria de direito, coloca-se a questão da controlabilidade da determinação da pena nesta sede.

     Paulo Pinto de Albuquerque, no Comentário do Código de Processo Penal, Universidade Católica Editora, 2007, pág. 218 (e pág. 224 na 4.ª edição actualizada de Abril de 2011), defende que a questão da determinação da espécie e da medida da sanção criminal redunda numa verdadeira questão de direito.

    

      Segundo Maria João Antunes, em Consequências Jurídicas do Crime, Lições 2007-2008, págs. 19 e 20, no procedimento de determinação da pena trata-se de autêntica aplicação do direito – na sentença são expressamente referidos os fundamentos da medida da pena, por imposição do artigo 71.º, n.º 3, do CP. Consequentemente, há uma autonomização do processo de determinação da pena em sede processual penal (artigos 369.º, 370.º e 371.º do CPP) e a possibilidade de controlo da decisão sobre a determinação da pena em sede de recurso, ainda que este seja apenas de revista.

Figueiredo Dias, em Direito Penal Português, As Consequências Jurídicas do Crime, edição de 1993, a págs. 196/7, § 255, após dar conta de que se revela uma tendência para alargar os limites em que a questão da determinação da pena é susceptível de revista, afirma estarem todos de acordo em que é susceptível de revista a correcção do procedimento ou das operações de determinação, o desconhecimento pelo tribunal ou a errónea aplicação dos princípios gerais de determinação, a falta de indicação de factores relevantes para aquela, ou, pelo contrário, a indicação de factores que devam considerar-se irrelevantes ou inadmissíveis. Defende ainda estar plenamente sujeita a revista a questão do limite ou da moldura da culpa, assim como a forma de actuação dos fins das penas no quadro da prevenção, e relativamente à determinação, dentro daqueles parâmetros, do quantum exacto de pena, esta será controlável no caso de violação das regras da experiência ou se a quantificação se revelar de todo desproporcionada.

     Ainda de acordo com o mesmo Professor, na mesma obra de 1993, § 280, pág. 214 e repetido nas Lições ao 5.º ano da Faculdade de Direito de Coimbra, 1998, págs. 279 e seguintes: «Culpa e prevenção são os dois termos do binómio com auxílio do qual há-de ser construído o modelo da medida da pena (em sentido estrito, ou de «determinação concreta da pena»).

     As finalidades da aplicação de uma pena residem primordialmente na tutela de bens jurídicos e, na medida do possível, na reinserção do agente na comunidade. A pena, por outro lado, não pode ultrapassar em caso algum a medida da culpa.

     Assim, pois, primordial e essencialmente, a medida da pena há-de ser dada pela medida da necessidade de tutela dos bens jurídicos face ao caso concreto e referida ao momento da sua aplicação, protecção que assume um significado prospectivo que se traduz na tutela das expectativas da comunidade na manutenção (ou mesmo no reforço) da validade da norma infringida. Um significado, deste modo, que por inteiro se cobre com a ideia da prevenção geral positiva ou de integração que vimos decorrer precipuamente do princípio político-criminal básico da necessidade da pena».

     Anabela Miranda Rodrigues em “O Modelo de Prevenção na Determinação da Medida Concreta da Pena”, in Revista Portuguesa de Ciência Criminal, ano 12, n.º 2, Abril/Junho de 2002, págs. 147 e ss., como proposta de solução defende que a medida da pena há-de ser encontrada dentro de uma moldura de prevenção geral positiva e que será definida e concretamente estabelecida em função de exigências de prevenção especial, nomeadamente de prevenção especial positiva ou de socialização; a pena, por outro lado, não pode ultrapassar em caso algum a medida da culpa.

     Adianta que “é o próprio conceito de prevenção geral de que se parte – protecção de bens jurídicos alcançada mediante a tutela das expectativas comunitárias na manutenção (e no reforço) da validade da norma jurídica violada - que justifica que se fale  de uma moldura de prevenção. Proporcional à gravidade do facto ilícito, a prevenção não pode ser alcançada numa medida exacta, uma vez que a gravidade do facto ilícito é aferida em função do abalo daquelas expectativas sentido pela comunidade. A satisfação das exigências de prevenção terá certamente um limite definido pela medida da pena que a comunidade entende necessária à tutela das suas expectativas na validade das normas jurídicas: o limite máximo da pena. Que constituirá, do mesmo passo, o ponto óptimo de realização das necessidades preventivas da comunidade, que não pode ser excedido em nome de considerações de qualquer tipo, ainda quando se situe abaixo do limite máximo consentido pela culpa. Mas, abaixo daquela medida (óptima) de pena (da prevenção), outras haverá que a comunidade entende que são ainda suficientes para proteger as suas expectativas na validade das normas - até ao que  considere que é o limite do necessário para assegurar a protecção dessas expectativas. Aqui residirá o limite mínimo da pena que visa assegurar a finalidade de prevenção geral”.

     Apresenta três proposições em jeito de conclusões e da seguinte forma sintética:

    “Em primeiro lugar, a medida da pena é fornecida pela medida de necessidade de tutela de bens jurídicos, isto é, pelas exigências de prevenção geral positiva (moldura de prevenção). Depois, no âmbito desta moldura, a medida concreta da pena é encontrada em função das necessidades de prevenção especial de socialização do agente ou, sendo estas inexistentes, das necessidades de intimidação e de segurança individuais.

     Finalmente, a culpa não fornece a medida da pena, mas indica o limite máximo da pena que em caso algum pode ser ultrapassado em nome de exigências preventivas”.

     E finaliza, afirmando: “É este o único entendimento consentâneo com as finalidades da aplicação da pena: tutela de bens jurídicos e, na medida do possível, a reinserção do agente na comunidade, e não compensar ou retribuir a culpa. Esta é, todavia, pressuposto e limite daquela aplicação, directamente imposta pelo respeito devido à eminente dignidade da pessoa do delinquente”.

     Uma síntese destas posições sobre os fins das penas foi feita no acórdão de 10 de Abril de 1996, proferido no processo n.º 12/96, in CJSTJ 1996, tomo 2, pág. 168, nos seguintes termos: “O modelo de determinação da medida da pena no sistema jurídico-penal português comete à culpa (juízo de apreciação, de valoração, que enuncia o que as coisas valem aos olhos da consciência e o que deve ser do ponto de vista da validade lógica e da moral ou do direito) a função de determinar o limite máximo e inultrapassável da pena, mas disso já cuidou, em primeira mão, o legislador, quando estabeleceu a moldura punitiva.

   Acontece, porém, que outras exigências concorrem naquele modelo: a prevenção geral (dita de integração) que tem por função fornecer uma moldura de prevenção, cujo limite é dado, no máximo, pela medida óptima de tutela dos bens jurídicos - dentro do que é consentido pela culpa - e, no mínimo, fornecido pelas exigências irrenunciáveis de defesa do ordenamento jurídico. Cabe à prevenção especial a função de encontrar o quantum exacto da pena, dentro dessa função, rectius, moldura de prevenção que melhor sirva as exigências de socialização (ou, em casos particulares) de advertência ou de segurança”.

     Ainda do mesmo relator, e a propósito de um caso de tráfico de estupefacientes, diz-se no acórdão de 08-10-1997, proferido no processo n.º 356/97-3.ª, in Sumários de Acórdãos, Gabinete de Assessoria do STJ, n.º 14, volume II, págs. 133/4: «As “exigências de prevenção” variam em função do tipo de criminalidade de que se trata. Na criminalidade relacionada com o tráfico de estupefacientes, com todo o seu cortejo de lesão de bens jurídicos muito relevantes, a carecerem de adequada protecção pelo direito penal - além do efeito propulsor de outras formas de criminalidade, nomeadamente contra as pessoas e contra o património, a que, a justo título, se tem chamado de “flagelo social” - são de considerar as particulares exigências de prevenção, tanto geral como especial».

   Uma outra formulação, em síntese, na esteira da posição de Figueiredo Dias, em As consequências jurídicas do crime, 1993, § 301 e ss., é a que consta dos acórdãos do STJ de 17-09-1997, processo n.º 624/97; de 01-10-1997, processo n.º 673/97; de 08-10-1997, processo n.º 874/97; de 15-10-1997, processo n.º 589/97, sendo os três últimos publicados in Sumários de Acórdãos do Gabinete de Assessoria do STJ, n.º 14, Outubro de 1997, II volume, págs. 125, 134 e 145, e de 20-05-1998, processo n.º 370/98, este publicado na CJSTJ 1998, tomo 2, pág. 205 e no BMJ n.º 477, pág. 124, todos da 3.ª Secção e do mesmo relator, nos seguintes termos: “A defesa da ordem jurídico-penal, tal como é interiorizada pela consciência colectiva (prevenção geral positiva ou de integração), é a finalidade primeira, que se prossegue, no quadro da moldura penal abstracta, entre o mínimo, em concreto, imprescindível à estabilização das expectativas comunitárias na validade da norma violada e o máximo que a culpa do agente consente; entre esses limites, satisfazem-se, quanto possível, as necessidades da prevenção especial positiva ou de socialização.

     Ou seja, devendo ter um sentido eminentemente pedagógico e ressocializador, as penas são aplicadas com a finalidade primordial de restabelecer a confiança colectiva na validade da norma violada, abalada pela prática do crime, e, em última análise, na eficácia do próprio sistema jurídico-penal”.

      No sentido deste último segmento, ver do mesmo relator, os acórdãos de 08-10-1997, processo n.º 976/97 e de 17-12-1997, processo n.º 1186/97, in Sumários de Acórdãos, n.º 14, pág. 132 e n.º s 15/16, Novembro/Dezembro 1997, pág. 214.   

     A intervenção do Supremo Tribunal de Justiça em sede de concretização da medida da pena, ou melhor, do controle da adequação e proporcionalidade no respeitante à fixação concreta da pena, tem de ser necessariamente parcimoniosa, porque não ilimitada, sendo entendido, de forma uniforme e reiterada, que “no recurso de revista pode sindicar-se a decisão de determinação da medida da pena, quer quanto à correcção das operações de determinação ou do procedimento, à indicação dos factores que devam considerar-se irrelevantes ou inadmissíveis, à falta de indicação de factores relevantes, ao desconhecimento pelo tribunal ou à errada aplicação dos princípios gerais de determinação, quer quanto à questão do limite da moldura da culpa, bem como a forma de actuação dos fins das penas no quadro da prevenção, mas já não a determinação, dentro daqueles parâmetros, do quantum exacto da pena, salvo perante a violação das regras da experiência, ou a desproporção da quantificação efectuada” - cfr. neste sentido, acórdãos de  09-11-2000, processo n.º 2693/00-5.ª; de 23-11-2000, processo n.º 2766/00 – 5.ª; de 30-11-2000, processo n.º 2808/00-5.ª; de 28-06-2001, processos n.ºs 1674/01-5.ª, 1169/01-5.ª e 1552/01-5.ª; de 30-08-2001, processo n.º 2806/01-5.ª; de 15-11-2001, processo n.º 2622/01 – 5.ª; de 06-12-2001, processo n.º 3340/01-5.ª; de 17-01-2002, processo 2132/01-5.ª; de 09-05-2002, processo n.º 628/02-5.ª, CJSTJ 2002, tomo 2, pág. 193; de 16-05-2002, processo n.º 585/02 – 5.ª; de 23-05-2002, processo n.º 1205/02 – 5.ª; de 26-09-2002, processo n.º 2360/02 – 5.ª; de 14-11-2002, processo n.º 3316/02 – 5.ª; de 30-10-2003, CJSTJ 2003, tomo 3, pág. 208; de 11-12-2003, processo n.º 3399/03 – 5.ª; de 04-03-2004, processo n.º 456/04 – 5.ª, in CJSTJ 2004, tomo 1, pág. 220; de 11-11-2004, processo n.º 3182/04 – 5.ª; de 23-06-2005, processo n.º 2047/05 - 5.ª; de 12-07-2005, processo n.º 2521/05 – 5.ª; de 03-11-2005, processo n.º 2993/05 - 5ª; de 07-12-2005 e de 15-12-2005, CJSTJ 2005, tomo 3, págs. 229 e 235; de 29-03-2006, CJSTJ 2006, tomo 1, pág. 225; de 15-11-2006, processo n.º 2555/06 – 3.ª; de 14-02-2007, processo n.º 249/07 – 3.ª; de 08-03-2007, processo n.º 4590/06 – 5.ª; de 12-04-2007, processo n.º 1228/07 – 5.ª; de 19-04-2007, processo n.º 445/07 – 5.ª; de 10-05-2007, processo n.º 1500/07 – 5.ª; de 14-06-2007, processo n.º 1580/07-5.ª, CJSTJ 2007, tomo 2, pág. 220; de 04-07-2007, processo n.º 1775/07 – 3.ª; de 05-07-2007, processo n.º 1766/07-5.ª, CJSTJ 2007, tomo 2, pág. 242; de 17-10-2007, processo n.º 3321/07 – 3.ª; de 10-01-2008, processo n.º 907/07 – 5.ª; de 16-01-2008, processo n.º 4571/07 – 3.ª; de 20-02-2008, processos n.ºs 4639/07 – 3.ª e 4832/07-3.ª; de 05-03-2008, processo n.º 437/08 – 3.ª; de 02-04-2008, processo n.º 4730/07 – 3.ª; de 03-04-2008, processo n.º 3228/07 – 5.ª; de 09-04-2008, processo n.º 1491/07 – 5.ª e processo n.º 999/08-3.ª; de 17-04-2008, processos n.ºs 677/08 e 1013/08, ambos desta secção; de 30-04-2008, processo n.º 4723/07 – 3.ª; de 21-05-2008, processos n.ºs 414/08 e 1224/08, da 5.ª secção; de 29-05-2008, processo n.º 1001/08 – 5.ª; de 03-09-2008, no processo n.º 3982/07-3.ª; de 10-09-2008, processo n.º 2506/08 – 3.ª; de 08-10-2008, nos processos n.ºs 2878/08, 3068/08 e 3174/08, todos da 3.ª secção; de 15-10-2008, processo n.º 1964/08 – 3.ª; de 29-10-2008, processo n.º 1309/08-3.ª; de 21-01-2009, processo n.º 2387/08-3.ª; de 27-05-2009, processo n.º 484/09-3.ª; de 18-06-2009, processo n.º 8523/06.1TDLSB-3.ª; de 1-10-2009, processo n.º 185/06.2SULSB.L1.S1-3.ª; de 25-11-2009, processo n.º 220/02.3GCSJM.P1.S1-3.ª; de 03-12-2009, processo n.º 136/08.0TBBGC.P1.S1-3.ª; de 28-04-2010, processo n.º 126/07.0PCPRT.S1-3.ª; de 14-07-2010, processo n.º 149/07.9JELSB.E1.S1; de 10-11-2010, processo n.º 145/10.9JAPRT.P1.S1-3.ª; de 29-06-2011, processo n.º 21/10.5GACUB.E1.S1-3.ª; de 15-12-2011, processo n.º 17/09.0TELSB.L1.S1; de 12-09-2012, processo n.º 1221/11.6JAPRT.S1; de 05-12-2012, processo n.º 250/10.1JALRA.E1.S1; de 29-05-2013, processo n.º 454/09.0GAPTB.G1.S1; de 5-06-2013, processo n.º 7/11.2GAADV.E1.S1-3.ª, CJSTJ 2013, tomo 2, pág. 213; de 11-06-2014, processo n.º 14/07.0TRLSB.S1-3.ª; de 24-09-2014, processo n.º 994/12.3PBAMD.L1.S1; de 15-10-2014, processo n.º 353/13.0JAFAR.S1; de 12-11-2014, processo n.º 56/11.0SVLSB.E1.S1; de 25-02-2015, processo n.º 1514/12.5JAPRT.P1.S1; de 25-11-2015, processo n.º 24/14.0PCSRQ.S1.

     Na determinação da medida concreta da pena deve o Tribunal, em conformidade com o disposto no artigo 71.º, n.º 2, do Código Penal, atender a todas as circunstâncias que deponham a favor ou contra o agente, abstendo-se, no entanto, de considerar aquelas que já fazem parte do tipo de crime cometido.

     O limite mínimo da pena a aplicar é determinado pelas razões de prevenção geral que no caso se façam sentir; o limite máximo pela culpa do agente revelada no facto; e servindo as razões de prevenção especial para encontrar, dentro daqueles limites, o quantum de pena a aplicar – cfr. Jorge de Figueiredo Dias, in Direito Penal Português, As Consequências Jurídicas do Crime, 1993, Editorial Notícias, págs. 227 e seguintes.

     Na graduação da pena deve olhar-se para as funções de prevenção geral e especial das penas, mas sem perder de vista a culpa do agente, ou, como diz o acórdão de 22-09-2004, proferido no processo n.º 1636/04-3.ª, in ASTJ, n.º 83: “a pena, no mínimo, deve corresponder às exigências e necessidades de prevenção geral, de modo a que a sociedade continue a acreditar na validade da norma punitiva; no máximo, não deve exceder a medida da culpa, sob pena de degradar a condição e dignidade humana do agente; e, em concreto, situando-se entre aquele mínimo e este máximo, deve ser individualizada no quantum necessário e suficiente para assegurar a reintegração do agente na sociedade, com respeito pelo mínimo ético a todos exigível”.

     Ou, como expressivamente se diz no acórdão deste STJ de 16-01-2008, processo n.º 4565/07 - 3.ª: «A norma do art. 40.º do CP condensa em três proposições fundamentais o programa político-criminal sobre a função e os fins das penas: a) protecção de bens jurídicos; b) a socialização do agente do crime; c) constituir a culpa o limite da pena mas não o seu fundamento.

    O modelo do C P é de prevenção: a pena é determinada pela necessidade de protecção de bens jurídicos e não de retribuição da culpa e do facto. A fórmula impositiva do art. 40.º determina, por isso, que os critérios do art. 71.º e os diversos elementos de construção da medida da pena que prevê sejam interpretados e aplicados em correspondência com o programa assumido na disposição sobre as finalidades da punição.

    O modelo de prevenção acolhido – porque de protecção de bens jurídicos – estabelece que a pena deve ser encontrada numa moldura de prevenção geral positiva, e concretamente estabelecida também em função das exigências de prevenção especial ou de socialização, não podendo, porém, na feição utilitarista preventiva, ultrapassar em caso algum a medida da culpa.

Dentro desta medida de prevenção (protecção óptima e protecção mínima – limite superior e limite inferior da moldura penal), o juiz, face à ponderação do caso concreto e em função das necessidades que se lhe apresentem, fixará o quantum concretamente adequado de protecção, conjugando-o a partir daí com as exigências de prevenção especial em relação ao agente (prevenção da reincidência), sem poder ultrapassar a medida da culpa.

    Nesta dimensão das finalidades da punição e da determinação em concreto da pena, as circunstâncias e critérios do art. 71.º do CP devem contribuir tanto para co-determinar a medida adequada à finalidade de prevenção geral (a natureza e o grau de ilicitude do facto impõe maior ou menor conteúdo de prevenção geral, conforme tenham provocado maior ou menor sentimento comunitário de afectação dos valores), como para definir o nível e a premência das exigências de prevenção especial (as circunstâncias pessoais do agente, a idade, a confissão, o arrependimento), ao mesmo tempo que também transmitem indicações externas e objectivas para apreciar e avaliar a culpa do agente».

     Revertendo ao caso concreto.

  Neste particular, ter-se-ão em conta as concretizações dos critérios legais estabelecidas pela decisão recorrida, que recolheu, em directo, em registo de imediação, os elementos necessários/bastantes e suficientes para o efeito, e teve em vista, de forma explanada, os parâmetros legais a observar, bem como o contexto de actuação dos arguidos no concreto caso.

     Sobre a questão da determinação da medida concreta das penas aplicadas pelos crimes em causa, discorreu o acórdão recorrido, de fls. 730 a 732, nos termos que seguem, anotando-se que de permeio abordou a questão da aplicação do regime especial dos jovens adultos no que toca ao recorrente CC, a qual constitui um prius, por definidora de moldura penal, premial, se aplicada, e não de determinação concreta da medida das penas, que supõe aquela definição prévia:

     “5. Determinação das Penas

(…)

Assim,

no presente caso, há a ponderar,

- a necessidade premente de prevenção geral dos crimes de roubo, cada vez mais, nos dias de hoje, numa escalada de violência, 

- a ilicitude -  que é muito elevada, revelada no modo de actuação conjunta que ficou descrito nos factos provados, acrescida pelos factos respeitantes à privação da liberdade dos ofendidos, com fitas adesivas e o encerramento na casa de banho, e pela exigência dos códigos dos cartões de crédito e respectivos levantamentos, mostra-se particularmente elevada relativamente aos arguidos BB e CC, pelo maior relevo dos respectivos contributos para a execução do projecto comum, cuja actuação se pauta por maior intervenção e agressividade, como ressalta da descrição das suas condutas vertida nos factos provados,

- a intensidade do dolo - na forma directa, relativamente a todos os arguidos,

- a gravidade das consequências – considerados o montante dos prejuízos e as lesões físicas e morais dos ofendidos,   

- a conduta anterior e posterior dos arguidos –  relevando a favor do arguido AA as declarações que prestou, em sede de inquérito e de audiência de julgamento, contribuindo de forma decisiva para a descoberta da verdade, e, nelas se vendo manifestação de um arrependimento real que atenua as exigências de prevenção especial,

e, ao contrário,  aumentando tais exigências os antecedentes criminais do arguido BB que praticou os factos cerca de 7 meses depois de ter terminado o período de liberdade condicional a que se encontrava sujeito, o que constituiria até fundamento de reincidência, a que apenas não se pôde atender por não ter sido considerada na acusação.

(…)

Assim, tudo ponderado,

entende-se adequadas às exigências de prevenção assinaladas e à culpa de cada um dos arguidos, que é muito elevada relativamente a todos, mas, ainda maior, no caso do arguido BB, por merecedora de maior censura, pela idade e pelo passado criminal anterior, as seguintes penas:

- 6 anos e 6 meses de prisão por cada um dos crimes de roubo de que foram vítimas os ofendidos EE e FF, para o arguido AA,

- 8 anos e 6 meses de prisão por cada um dos crimes de roubo de que foram vítimas os ofendidos EE e FF, para o arguido BB, 

- 7 anos e 6 meses de prisão por cada um dos crimes de roubo de que foram vítimas os ofendidos EE e FF, para o arguido CC”.


****

       Vejamos se no caso em reapreciação são de reduzir as penas aplicadas pelos crimes de roubo agravado.

      Sendo uma das finalidades das penas a tutela dos bens jurídicos – artigo 40.º, n.º 1, do Código Penal – definindo a necessidade desta protecção os limites daquelas, há que ter em atenção o bem jurídico tutelado no tipo legal em causa.
      Na sistematização do Código Penal, o crime de roubo, p. e p. pelo artigo 210.º, enquadra-se na categoria dos crimes contra o património (Título II, do Livro II - Parte especial), e mais especificamente, dos crimes contra a propriedade (Capítulo II – artigos 203.º a 216.º).
       Em função do fim do agente, o roubo é um crime contra a propriedade, assumindo, no entanto, outros contornos para além desta vertente; estando em causa valores patrimoniais, está também em jogo na fattispecie a liberdade e segurança das pessoas, assumindo o elemento pessoal particular relevo, com a violação de direitos de personalidade.
       Na doutrina clássica, o roubo denominava-se rapina, que Bohmer definia nos seguintes termos: ”Est enim delictum publicum, quod res mobilis, per vim personae illatam, animo lucrifaciendi intervertitur”.
       Na antiga doutrina jurídica portuguesa, Pereira e Sousa, Classes dos Crimes, 2.ª edição, Lisboa, 1816, pág. 333, relativamente ao crime de roubo, escrevia: «Roubo é a tirada da coisa móvel para o fim do lucro com violência feita à pessoa», acrescentando ainda […] Não é preciso, porém, que a violência seja levada ao último grau, mas bastam as ameaças, e os gestos, quando obrigado por elas o dono da coisa a entrega».
       Segundo Miguel Caeiro, in BMJ n.º 18, pág. 15, versando sobre o tipo base/definição do artigo 432.º do Código Penal de 1886 «… O roubo, por ser um crime complexo, não deixa de reproduzir integralmente os tipos legais que o formam. Nem da unificação deste resulta para o tipo complexo outra autonomia que não seja a respeitante à punição. Portanto, no artigo 432.º, encontra-se reproduzido o tipo legal do artigo 421.º, exceptuando o modo de execução».
      E acrescentava: «Seja pessoal ou patrimonial o elemento predominante do roubo, não se vê razão para a menor diversidade de conceitos sobre a situação jurídica do agente perante a coisa subtraída, embora esta seja por violências ou ameaças contra as pessoas…».   
      Então o artigo 421.º reportava-se ao crime de furto e o modo de execução do roubo, segundo a descrição legal, consistia em a subtracção de coisa alheia se cometer com violência ou ameaça contra as pessoas.
      Para José António Barreiros, Crimes contra o património, Universidade Lusíada, 1996, pág. 85, o roubo constitui categoria típica autónoma, a comungar de características de furto e de extorsão, sendo sui generis o tipo face a eventualidade do duplo modo alternativo de comissão.
      Como refere Conceição Cunha, no Comentário Conimbricense do Código Penal, Parte Especial, Tomo II, Coimbra Editora, 1999, pág. 160, a ofensa aos bens pessoais surge como meio de lesão dos bens patrimoniais, sendo o furto o crime - fim do roubo.
      Nesta análise importará reter que o crime de roubo é um crime complexo (porque, segundo Luís Osório de Oliveira Batista, contém um crime contra a liberdade e um crime contra o património), de natureza mista, pluriofensivo (na expressão de Antolesi «um típico crime pluri-ofensivo»), em que os valores jurídicos em apreço e tutelados são de ordem patrimonial – direito de propriedade e de detenção de coisas móveis alheias – e abrangendo sobretudo bens jurídicos de ordem eminentemente pessoal – os quais merecem tutela a nível constitucional – artigos 24.º, 25.º, 27.º e 64.º da Constituição da República – e da lei civil, no reconhecimento dos direitos de personalidade – artigo 70.º do Código Civil –, como o direito à liberdade individual de decisão e acção, à própria liberdade de movimentos, à segurança (com as componentes do direito à tranquilidade e ao sossego), o direito à saúde, à integridade física e mesmo a própria vida alheia.
      No plano da jurisprudência, há que ter em consideração os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça, versando sobre os tipos legais do artigo 306.º do Código Penal de 1982 e artigo 210.º do Código Penal de 1995, ou seja, i. a., os acórdãos de 30-11-1983, BMJ, n.º 331, pág. 345; de 15-11-1989, BMJ, n.º 391, pág. 239; de 04-04-1991, BMJ, n.º 406, pág. 335; de 04-02-1993, BMJ, n.º 424, pág. 369; de 22-04-1993, BMJ n.º 426, pág. 250, de 15-02-1995 (dois), CJSTJ1995, Tomo 1, págs. 205 e 216; de 18-05-2006, processo n.º 1411/06-3.ª, in CJSTJ 2006, Tomo 2, pág. 185, que após assinalar o carácter complexivo e pluriofensivo do roubo, afirma: “Trata-se de um crime de processo típico, na medida em que o iter criminis, está expressis et appertis verbis, definido na descrição dos processos de subtracção: violência contra a pessoa, ameaça com perigo iminente para a vida ou integridade física ou colocação da vítima na impossibilidade de resistir”; de 24-05-2006, processo n.º 1049/06 – 3.ª; de 25-10-2006, processo n.º 3042/06-3.ª; de 24-01-2007, processo n.º 4066/06-3.ª; de 2-05-2007, processo n.º 1024/07-3.ª; de 12-09-2007, processo n.º 2702/07-3.ª; de 03-10-2007, processo n.º 2576/07-3.ª, in CJSTJ 2007, Tomo 3, pág. 198; de 13-12-2007, processo n.º 3210/07-3.ª; de 17-04-2008, processo n.º 1013/08 – 3.ª; de 21-05-2008, processo n.º 1221/08-3.ª; de 16-10-2008, processo 221/08-5.ª; de 26-11-2008, processo n.º 3548/08-3.ª, em que se define o roubo como crime complexo e estruturalmente um furto qualificado, como infracção complexa em que coexistem afectados bens pessoais, como meio de execução, e patrimoniais, como realização da finalidade do agente; de 27-01-2009, processo n.º 3853/08-3.ª; de 19-03-2009, processo n.º 381/09-3.ª; de 29-04-2009, processo n.º 939/07.2PYLSB.S1-3.ª; de 04-02-2010, processo n.º 1244/06.7PBVIS.C1.S1-3.ª; de 07-04-2010, processo n.º 113/04.0GFLLE.E1.S1-3.ª; de 12-05-2010, processo n.º 51/08.7JBLSB.S1-5.ª; de 27-05-2010, processo n.º 474/09.4PSLSB.L1.S1-3.ª (O crime de roubo constitui um crime de resultado, que pressupõe a produção de um resultado como consequência da actividade do agente: a subtracção de coisa alheia com constrangimento para bens jurídicos pessoais); de 09-06-2010, processo n.º 493/07.5PRLSB.L1.S1-3.ª; de 30-06-2010, processo n.º 99/09.4GGSNT:S1-3.ª; de 20-10-2010, processo n.º 845/09.6JDLSB-3.ª, de 10-11-2010, processo n.º 145/10.9JAPRT.P1.S1-3.ª; de 23-02-2011, processo n.º 250/10.1PDAMD.S1-3.ª; de 13-04-2011, processo n.º 918/09.5JAPRT.P1.S1-3.ª; de 21-09-2011, processo n.º 137/06.2JAGRD.C1.S1-3.ª, em que interviemos como adjunto; de 31-03-2011, processo n.º 169/09.9SYLSB.S1-3.ª; de 21-12-2011, processo n.º 595/10.0GFLLE.E1.S1-3.ª; de 11-01-2012, processo n.º 131/09.1JBLSB.L1.-A.S1 (processo originário da Lourinhã, relativo a assaltos a bancos, reapreciado no TRL, apresentado, e distribuído no Supremo Tribunal, como “recurso independente e em separado”); de 31-01-2012, processo n.º 2381/07.6PAPTM.E1.S1-3.ª; de 4-07-2013, processo n.º 31/11.5PEFAR.S1-3.ª; de 26-11-2014, processo n.º 65/10.7PFALM.L1.S1-3.ª; de 10-12-2014, processo n.º 659/12.6JDLSB.L1.S1-3.ª; de 17-12-2014, processo n.º 512/13.6PGLRS.L1.S1-3.ª; de 8-01-2015, processo n.º 23/13.0SVLSB.L1.S1-3.ª; de 11-02-2015, processo n.º 591/12.3GBTMR.E1.S1-3.ª; de 17-06-2015, processo n.º 161/12.6PBFAR.S1-3.ª; de 24-02-2016, processo n.º 60/13.4PBVLG.P1.S1 e de 02-03-2016, processo n.º 8/08.8GALNH.L1.S1-3.ª.
      Da caracterização específica do crime de roubo deriva que há que ter em conta, em cada caso concreto, a extensão da lesão, o grau de lesividade, das duas componentes presentes no preenchimento do tipo legal.
     No que respeita às consequências do roubo, como crime de resultado que é, há que distinguir as duas vertentes que o integram.
      O valor patrimonial da coisa móvel alheia apropriada em sede de crime de roubo, não pode deixar, obviamente, de ser tomado em atenção. (A este respeito cfr. acórdãos por nós relatados, de 23-02-2011, processo n.º 250/10.1PDAMD.S1, de 31-03-2011, processo n.º 169/09.9SYLSB, de 13-04-2011, processo n.º 918/09.5JAPRT.S1, de 11-05-2011, processo n.º 1040/06.1PSLSB.S1 e de 31-01-2012, processo n.º 2381/07.6PAPTM.E1.S1).
       Sob esta perspectiva da componente patrimonial, em termos puramente objectivos, são de considerar os valores apropriados pelos arguidos, tendo em vista descortinar na densificação da ilicitude, o grau de lesividade do património atingido, a medida do prejuízo causado.
       Atendendo à natureza dos bens subtraídos no caso presente, descritos no FP 1.11, foram apropriadas quantias em dinheiro - € 150,00 em notas - e através de levantamentos em caixa multibanco, para tanto usando os arguidos cartões do ofendido a quem exigiram fornecesse os respectivos códigos PIN, no montante de 600,00 €, e outros objectos, alguns muito valiosos, como duas câmaras de filmar, cinco anéis, sendo três em ouro, um colar em ouro, uma TV, dois smartphone, dois telemóveis, tudo no valor de 19.978,00, que adicionados ao dinheiro atinge o valor global de 20.728,00 €, sem contar com dois anéis em ouro, um anel «Cartier» e uma colecção de moedas a que não foi atribuído valor.
       Os valores apropriados aos ofendidos integram o conceito de valor consideravelmente elevado, conforme o artigo 202.º, alínea b), do Código Penal.
       Conclui-se assim que na vertente da lesão patrimonial, atentos os valores apropriados, assumiu a conduta dos ora recorrentes uma dimensão económica com relevo, para só considerar este aspecto, salientando-se que nada foi recuperado. 
      Vejamos agora a vertente ofensa de bens pessoais.
      O que distingue, essencialmente, o furto do roubo, é a violência.
     Como se extrai do acórdão deste Supremo Tribunal de 11-03-1998, processo n.º 20/98-3.ª, BMJ n.º 475, pág. 217, versando roubo por esticão, no crime de roubo, a violência ou ameaça não tem que ter especial intensidade, basta que seja idónea para por o ofendido num estado de coacção absoluta, sem poder resistir.
      E de acordo com o acórdão de 28-5-1998, processo n.º 320/98- 3.ª, BMJ n.º 477, pág. 136, a violência tem um sentido muito amplo, incluindo qualquer violência, mesmo a moral ou psicológica.
      Neste particular da vertente da colisão do vector pessoal com violação de direitos de personalidade, como o direito à saúde e integridade física da vítima, há que ter em atenção o modo como o elemento violência se concretizou.               
      A este nível há a considerar o modo de actuação dos recorrentes, actuando com empurrões, ameaças com armas, atando os ofendidos de pés e mãos e deixando-os trancados na casa de banho do escritório da residência, onde permaneceram durante uma hora até que pelos próprios meios conseguiram libertar-se.  

     Com as agressões descritas nos FP 1.7 e 1.12, causaram as lesões físicas com sequelas, sendo as descritas no FP 1.15, no que toca ao ofendido, neste caso sobrelevando a perda de dentes incisivos e caninos superiores, em consequência de ter embatido com a face no chão na sequência de empurrão mais forte,  e ofendida, em ambos os casos determinantes de um período de doença de 20 dias, com afectação da capacidade de trabalho geral por igual período de tempo.  

Ponderando o modo de execução, a intensidade do dolo, directo, as necessidades de prevenção geral e especial, o passado criminal no caso do arguido BB e a idade do arguido CC à data da prática dos factos, bem como o tempo decorrido desde então, contando-se em mais de quatro anos, afigura-se-nos justificar-se intervenção correctiva, fixando –se a pena de 6 anos de prisão por cada um dos crimes de roubo agravado quanto ao arguido BB e a pena de 4 anos e 6 meses de prisão quanto ao arguido CC, por cada um dos crimes.     

 Medida da pena única

      O acórdão recorrido pronunciou-se nestes termos a fls.732/3 quanto aos recorrentes: 

 “ 7.  Do cúmulo jurídico de penas respeitante ao arguido BB

Verificando-se uma situação de concurso real de crimes importa proceder nos termos do art. 77º/1e /2 do CP ao cúmulo jurídico das penas parcelares.

Assim,

considerada a moldura abstracta do concurso, de 8 anos e 6 meses de prisão (a pena mais elevada sendo que são iguais as penas aplicadas) a 17 anos de prisão (a soma das penas parcelares),

considerados o conjunto dos factos e a sua gravidade global e a personalidade do arguido neles revelada, como preceitua o art. 77º/1 do CP,  acreditando-se em face do passado criminal do arguido estar em causa uma tendência da sua personalidade, aplicar-se-à ao arguido a pena única de 13 anos de prisão.

8.  Do cúmulo jurídico de penas respeitante ao arguido CC  

Verificando-se uma situação de concurso real de crimes importa proceder nos termos do art. 77º/1 e /2 do CP ao cúmulo jurídico das penas parcelares.

Assim,

considerada a moldura abstracta do concurso, de 7 anos e 6 meses de prisão (a pena mais elevada sendo que são iguais as penas aplicadas) a 15 anos de prisão (a soma das penas parcelares),

considerados o conjunto dos factos e a sua gravidade global e a personalidade do arguido neles revelada, como preceitua o art. 77º/1 do CP,  acreditando-se, por ora, que não estará em causa uma tendência criminosa, aplicar-se-à ao arguido a pena única de 10 anos de prisão”.

      Estabelece, quanto a regras de punição do concurso de crimes, o artigo 77.º, n.º 1, do Código Penal, na redacção introduzida pelo Decreto-Lei n.º 48/95, de 15 de Março, que operou a terceira alteração ao Código Penal, em vigor desde 1 de Outubro de 1995 (e inalterado pelas subsequentes trinta e duas modificações legislativas, operadas, nomeadamente, e mais recentemente, pelas Leis n.º 59/2007, de 4 de Setembro, n.º 61/2008, de 31 de Outubro, n.º 32/2010, de 2 de Setembro, n.º 40/2010, de 3 de Setembro, n.º 4/2011, de 16 de Fevereiro, n.º 19/2013, de 21 de Fevereiro, n.º 60/2013, de 23 de Agosto, n.º 2/2014, de 6 de Agosto, n.º 59/2014, de 26 de Agosto, n.º 69/2014, de 29 de Agosto, n.º 82/2014, de 30 de Dezembro, n.º 30/2015, de 12 de Abril, n.º 81/2015, de 3 de Agosto, n.º 83/2015, de 5 de Agosto, n.º 103/2015, de 24 de Agosto e n.º 130/2015, de 4 de Setembro), que:

     “Quando alguém tiver praticado vários crimes antes de transitar em julgado a condenação por qualquer deles é condenado numa pena única. Na medida da pena são considerados, em conjunto, os factos e a personalidade do agente”.

    E nos termos do n.º 2, a pena aplicável tem como limite máximo a soma das penas concretamente aplicadas aos vários crimes, não podendo ultrapassar 25 anos, tratando-se de pena de prisão e 900 dias, tratando-se de pena de multa; e como limite mínimo, a mais elevada das penas concretamente aplicadas aos vários crimes.

    O que significa que no caso presente, a moldura penal do concurso se situa entre 6 anos de prisão a 12 anos de prisão, no caso do recorrente BB e entre 4 anos e 6 meses a 9 anos de prisão no caso do recorrente CC.   

    A medida da pena unitária a atribuir em sede de cúmulo jurídico reveste-se de uma especificidade própria.

    Por um lado, está-se perante uma nova moldura penal, mais ampla, abrangente, com maior latitude da atribuída a cada um dos crimes.

    Por outro, tem lugar, porque se trata de uma nova pena, final, de síntese, correspondente a um novo ilícito e a uma nova culpa (agora culpa pelos factos em relação), uma específica fundamentação, que acresce à decorrente do artigo 71.º do Código Penal.

    Constitui posição sedimentada e segura neste Supremo Tribunal de Justiça a de nestes casos estarmos perante uma especial necessidade de fundamentação, na decorrência do que dispõem o artigo 71.º, n.º 3, do Código Penal, e os artigos 97.º, n.º 5 e 375.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, em aplicação do comando constitucional ínsito no artigo 205.º, n.º 1, da CRP, onde se proclama que “As decisões dos tribunais que não sejam de mero expediente são fundamentadas na forma prevista na lei”.

    Como estabelece o artigo 71.º, n.º 3, do Código Penal, “Na sentença são expressamente referidos os fundamentos da medida da pena”, decorrendo, por seu turno, do artigo 97.º, n.º 5, do Código de Processo Penal, que os actos decisórios são sempre fundamentados, devendo ser especificados os motivos de facto e de direito da decisão, e do disposto no artigo 375.º, n.º 1, do mesmo Código, que a sentença condenatória deve especificar os fundamentos que presidiram à escolha e à medida da sanção aplicada.

    Maia Gonçalves, in Código Penal Português Anotado e Comentado, 15.ª edição, pág. 277 (e a págs. 275 da 16.ª edição, de 2004 e pág. 295 da 18.ª edição, de 2007), a propósito do artigo 77.º, salientava que “na fixação da pena correspondente ao concurso entra como factor a personalidade do agente, a qual deve ser objecto de especial fundamentação na sentença. Ela é mesmo o aglutinador da pena aplicável aos vários crimes e tem, por força das coisas, carácter unitário”.

    A punição do concurso efectivo de crimes funda as suas raízes na concepção da culpa como pressuposto da punição – não como reflexo do livre arbítrio ou decisão consciente da vontade pelo ilícito. Mas antes como censura ao agente pela não adequação da sua personalidade ao dever - ser jurídico penal.

    Como acentua Figueiredo Dias em Liberdade, Culpa e Direito Penal, Coimbra Editora, 2.ª edição, 1983, págs. 183 a 185, “ (…) o substracto da culpa (…) não reside apenas nas qualidades do carácter do agente, ético-juridicamente relevantes, que se exprimem no facto, na sua totalidade todavia cindível (…). Reside sim na totalidade da personalidade do agente, ético-juridicamente relevante, que fundamenta o facto, e portanto também na liberdade pessoal e no uso que dela se fez, exteriorizadas naquilo a que chamamos a “atitude” da pessoa perante as exigências do dever ser. Daí que o juiz, ao emitir o juízo de culpa ou ao medir a pena, não possa furtar-se a uma compreensão da personalidade do delinquente, a fim de determinar o seu desvalor ético-jurídico e a sua desconformação em face da personalidade suposta pela ordem jurídico-penal. A medida desta desconformação constituirá a medida da censura pessoal que ao delinquente deve ser feita, e, assim, o critério essencial da medida da pena”.


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    No que concerne à determinação da pena única, deve ter-se em consideração a existência de um critério especial na determinação concreta da pena do concurso, segundo o qual serão considerados, em conjunto, os factos e a personalidade do agente, o que obriga a que do teor da sentença conste uma especial fundamentação da medida da pena do concurso.

    Como se lê em Figueiredo Dias, Direito Penal Português - As Consequências Jurídicas do Crime, Aequitas, Editorial Notícias, 1993, § 420, págs. 290/1, estabelecida a moldura penal do concurso, a pena conjunta do concurso será encontrada em função das exigências gerais de culpa e de prevenção, fornecendo a lei, para além dos critérios gerais de medida da pena contidos no art. 72.º-1 (actual 71.º-1), um critério especial: o do artigo 78.º (actual 77.º), n.º 1, 2.ª parte, segundo o qual na determinação concreta da pena do concurso serão considerados, em conjunto, os factos e a personalidade do agente, o que obriga logo a que do teor da sentença conste uma especial fundamentação da medida da pena do concurso.

    E no § 421, págs. 291/2, acentua o mesmo Autor que na busca da pena do concurso, “Tudo deve passar-se como se o conjunto dos factos fornecesse a gravidade do ilícito global perpetrado, sendo decisiva para a sua avaliação a conexão e o tipo de conexão que entre os factos concorrentes se verifique. Na avaliação da personalidade – unitária – do agente relevará, sobretudo, a questão de saber se o conjunto dos factos é reconduzível a uma tendência (ou eventualmente mesmo a uma «carreira») criminosa, ou tão só a uma pluriocasionalidade que não radica na personalidade: só no primeiro caso, já não no segundo, será cabido atribuir à pluralidade de crimes um efeito agravante dentro da moldura penal conjunta”.

    Acrescenta ainda: “De grande relevo será também a análise do efeito previsível da pena sobre o comportamento futuro do agente (exigências de prevenção especial de socialização)”.

    Como se extrai do acórdão deste Supremo Tribunal de 6 de Maio de 2004, in CJSTJ 2004, tomo 2, pág. 191, a propósito dos critérios a atender na fundamentação da pena única, nesta operação o que releva e interessa considerar é, sobretudo, a globalidade dos factos em interligação com a personalidade do agente, de forma a aquilatar-se, fundamentalmente, se o conjunto dos factos traduz uma personalidade propensa ao crime, a dar indícios de projecto de uma carreira, ou é antes, a expressão de uma pluriocasionalidade que não encontra a sua razão de ser na personalidade do arguido, mas antes numa conjunção de factores ocasionais, sem repercussão no futuro – cfr. na esteira da posição do citado Autor, os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 08-07-1998, in CJSTJ 1998, tomo 2, pág. 246; de 24-02-1999, processo n.º 23/99-3.ª; de 12-05-1999, processo n.º 406/99-3.ª; de 27-10-2004, processo n.º 1409/04-3.ª; de 20-01-2005, processo n.º 4322/04-5.ª, in CJSTJ 2005, tomo I, pág. 178; de 17-03-2005, no processo n.º 754/05-5.ª; de 16-11-2005, in CJSTJ 2005, tomo 3, pág. 210; de 12-01-2006, no processo n.º 3202/05-5.ª; de 08-02-2006, no processo n.º 3794/05-3.ª; de 15-02-2006, no processo n.º 116/06-3.ª; de 22-02-2006, no processo n.º 112/06-3.ª; de 22-03-2006, no processo n.º 364/06-3.ª; de 04-10-2006, no processo n.º 2157/06-3.ª; de 21-11-2006, in CJSTJ 2006, tomo 3, pág. 228; de 24-01-2007, no processo n.º 3508/06-3.ª; de 25-01-2007, nos processos n.ºs 4338/06-5.ª e 4807/06-5.ª; de 28-02-2007, no processo n.º 3382/06-3.ª; de 01-03-2007, no processo n.º 11/07-5.ª; de 07-03-2007, no processo n.º 1928/07-3.ª; de 14-03-2007, no processo n.º 343/07-3.ª; de 28-03-2007, no processo n.º 333/07-3.ª; de 09-05-2007, nos processos n.ºs 1121/07-3.ª e 899/07-3.ª; de 24-05-2007, no processo n.º 1897/07-5.ª; de 29-05-2007, no processo n.º 1582/07-3.ª; de 12-09-2007, no processo n.º 2583/07-3.ª; de 03-10-2007, no processo n.º 2576/07-3.ª; de 24-10-2007, no processo nº 3238/07-3.ª; de 31-10-2007, no processo n.º 3280/07-3.ª; de 09-01-2008, processo n.º 3177/07-3.ª, in CJSTJ 2008, tomo 1, pág. 181 (Na valoração da personalidade deve atender-se a se os factos são a expressão de uma inclinação, tendência ou mesmo carreira criminosa, ou delitos ocasionais, sem relação entre si. A autoria em série é factor de agravação dentro da moldura penal conjunta, enquanto a pluriocasionalidade, que não radica na personalidade, não tem esse efeito agravante); de 09-04-2008, no processo n.º 686/08-3.ª (o acórdão ao efectuar o cúmulo jurídico das penas parcelares não elucida, porque não descreve, o raciocínio dos julgadores que orientou e decidiu a determinação da medida da pena do cúmulo); de 25-06-2008, no processo n.º 1774/08-3.ª; de 02-04-2009, processo n.º 581/09-3.ª, por nós relatado, in CJSTJ 2009, tomo 2, pág. 187; de 21-05-2009, processo n.º 2218/05.0GBABF.S1-3.ª; de 29-10-2009, no processo n.º 18/06.0PELRA.C1.S1-5.ª, in CJSTJ 2009, tomo 3, pág. 224 (227); de 04-03-2010, no processo n.º 1757/08.6JDLSB.S1-5.ª; de 10-11-2010, no processo n.º 23/08.1GAPTM-3.ª.

    Na expressão dos acórdãos deste Supremo Tribunal de Justiça, de 20-02-2008, proferido no processo n.º 4733/07 e de 8-10-2008, no processo n.º 2858/08, desta 3.ª Secção, na formulação do cúmulo jurídico, o conjunto dos factos fornece a imagem global do facto, o grau de contrariedade à lei, a grandeza da sua ilicitude; já a personalidade revela-nos se o facto global exprime uma tendência, ou mesmo uma “carreira”, criminosa ou uma simples pluriocasionalidade.


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    Na consideração dos factos (do conjunto dos factos que integram os crimes em concurso) está ínsita uma avaliação da gravidade da ilicitude global, como se o conjunto de crimes em concurso se ficcionasse como um todo único, unificado, globalizado, que deve ter em conta a existência ou não de ligações ou conexões e o tipo de ligação ou conexão que se verifique entre os factos em concurso - cfr., neste sentido, inter altera, os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça, de 17-03-2004, proferido no processo n.º 4431/03; de 20-01-2005, in CJSTJ 2005, tomo 1, pág. 178; de 08-06-2006, processo n.º 1613/06 – 5.ª; de 07-12-2006, processo n.º 3191/06 – 5.ª; de 20-12-2006, processo n.º 3379/06-3.ª; de 18-04-2007, processo n.º 1032/07 – 3.ª; de 03-10-2007, processo n.º 2576/07-3.ª, in CJSTJ 2007, tomo 3, pág. 198; de 09-01-2008, processo n.º 3177/07-3.ª, in CJSTJ 2008, tomo 1, pág. 181 (Na formação da pena conjunta é fundamental uma visão e valoração completa da pessoa do autor e das diversas penas parcelares de modo a que a pena global reflicta a personalidade do autor e os factos individuais); de 06-02-2008, processo n.º 129/08-3.ª e da mesma data no processo n.º 3991/07-3.ª, este in CJSTJ 2008, tomo I, pág. 221; de 06-03-2008, processo n.º 2428/07 – 5.ª; de 13-03-2008, processo n.º 1016/07 – 5.ª; de 02-04-2008, processos n.º s 302/08-3.ª e 427/08-3.ª; de 09-04-2008, processo n.º 1011/08 – 5.ª; de 07-05-2008, processo n.º 294/08 – 3.ª; de 21-05-2008, processo n.º 414/08 – 5.ª; de 04-06-2008, processo n.º 1305/08 – 3.ª; de 25-09-2008, processo n.º 2891/08 – 3.ª; de 29-10-2008, processo n.º 1309/08 – 3.ª; de 27-01-2009, processo n.º 4032/08 – 3.ª; de 29-04-2009, processo n.º 391/09 – 3.ª; de 14-05-2009, processo n.º 170/04.9PBVCT.S1 – 3.ª; de 27-05-2009, processo n.º 50/06.3GAVFR.C1.S1 – 3.ª; de 18-06-2009, processo n.º 577/06.7PCMTS.S1 – 3.ª; de 18-06-2009, processo n.º 8253/06.1TDLSB-3.ª; de 25-06-2009, processo n.º 274/07-3.ª, in CJSTJ 2009, tomo 2, pág. 251 (a decisão que efectiva o cúmulo jurídico das penas parcelares necessariamente que terá de demonstrar fundamentando que foram avaliados o conjunto dos factos e a interacção destes com a personalidade); de 21-10-2009, processo n.º 360/08.5GEPTM.S1-3.ª; de 04-11-2009, processo n.º 296/08.0SYLSB.S1-3.ª; de 18-11-2009, processo n.º 702/08.3GDGDM.P1.S1-3.ª; de 25-11-2009, processo n.º 490/07.0TAVVD-3.ª; de 10-12-2009, processo n.º 496/08.2GTABF.E1.S1-3.ª (citado no acórdão de 23-06-2010, processo n.º 862/04.2PBMAI.S1-5.ª), ali se referindo: “Na determinação da pena única do concurso, o conjunto dos factos indica a gravidade do ilícito global, sendo decisiva a avaliação e conexão e o tipo de conexão que se verifique entre os factos concorrentes. Na avaliação da personalidade – unitária – do agente importa, sobretudo, verificar se o conjunto dos factos é recondutível a uma tendência (ou eventualmente mesmo a uma «carreira» criminosa), ou tão-só a uma pluriocasionalidade que não radica na personalidade: só no primeiro caso, já não no segundo, será cabido atribuir à pluralidade de crimes um efeito agravante dentro da moldura penal conjunta”; de 04-03-2010, no processo n.º 1757/08.6JDLSB.L1.S1-5.ª; de 10-03-2010, no processo n.º 492/07.7PBBJA.E1.S1-3.ª; de 18-03-2010, no processo n.º 160/06. 7GBBCL.G2.S1-5.ª; de 15-04-2010, no processo n.º 134/05.5PBVLG.S1-3.ª; de 28-04-2010, no processo n.º 260/07.6GEGMR.S1-3.ª; de 05-05-2010, no processo n.º 386/06.3SLSB.S1-3.ª; de 12-05-2010, no processo n.º 4/05.7TDACDV.S1-5.ª; de 27-05-2010, no processo n.º 708/05.4PCOER.L1.S1-5.ª; de 09-06-2010, processo n.º 493/07.5PRLSB-3.ª; de 23-06-2010, no processo n.º 666/06.8TABGC-K.S1-3.ª; de 20-10-2010, processo n.º 400/08.8SZLB.L1-3.ª; de 03-11-2010, no processo n.º 60/09.9JAAVR.C1.S1-3.ª; de 16-12-2010, processo n.º 893/05.5GASXL.L1.S1-3.ª; de 19-01-2011, processo n.º 6034/08.0TDPRT.P1.S1-3.ª; de 02-02-2011, processo n.º 217/08.0JELSB.S1-3.ª; de 31-01-2012, processo n.º 2381/07.6PAPTM.E1.S1-3.ª; de 12-09-2012, processos n.º 223/07.1GCVIS.C1.S1-3.ª e 2745/09.0TDLSB.L1.S1-3.ª; de 06-02-2013, processo n.º 639/10.6PBVIS.S1-3.ª; de 14-03-2013, processo n.º 224/09.5PAOLH.S1 e n.º 13/12.0SOLSB.S1, ambos desta Secção e do mesmo relator; de 10-07-2013, processo n.º 413/06.4JAFAR.E2.S1-3.ª; de 12-09-2013, processo n.º 1445/09.6JAPRT.P1.S1-3.ª; de 04-06-2014, processo n.º 186/13.4GBETR.P1.S1-3.ª; de 17-12-2014, processo n.º 512/13.3PGLRS.L1.s1-3.ª.

     Como refere Cristina Líbano Monteiro, A Pena «Unitária» do Concurso de Crimes, Revista Portuguesa de Ciência Criminal, ano 16, n.º 1, págs. 151 a 166, o Código rejeita uma visão atomística da pluralidade de crimes e obriga a olhar para o conjunto – para a possível conexão dos factos entre si e para a necessária relação de todo esse bocado de vida criminosa com a personalidade do seu agente, estando em causa a avaliação de uma «unidade relacional de ilícito», portadora de um significado global próprio, a censurar de uma vez só a um mesmo agente.

     A pena conjunta tenderá a ser uma pena voltada para ajustar a sanção – dentro da moldura formada a partir de concretas penas singulares – à unidade relacional de ilícito e de culpa, fundada na conexão auctoris causa própria do concurso de crimes.


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    Como referimos nos acórdãos de 20 de Janeiro de 2010, de 24 de Fevereiro de 2010, de 9 de Junho de 2010, de 10 de Novembro de 2010, de 2 de Fevereiro de 2011, de 18 de Janeiro de 2012, de 5 de Julho de 2012, de 12 de Setembro de 2012 (dois), de 22 de Maio de 2013, de 1 de Outubro de 2014 e de 17 de Dezembro de 2014, proferidos no processo n.º 392/02.7PFLRS.L1.S1, in CJSTJ 2010, tomo 1, pág. 191, processo n.º 655/02.1JAPRT.S1, processo n.º 493/07.5PRLSB-3.ª, processo n.º 23/08.1GAPTM.S1, processo n.º 994/10.8TBLGS.S1-3.ª, processo n.º 34/05.9PAVNG.S1, CJSTJ 2012, tomo 1, pág. 209, processo n.º 246/11.6SAGRD, processos n.º 223/07.1GCVIS.C1.S1 e n.º 2745/09.0TDLSB.L1.S1, processo n.º 344/11.6PCBRG.G1.S1, processo n.º 11/11.0GCVVC.S1 e processo n.º 512/13.6PGLRS.L1.S1:

     “Perante concurso de crimes e de penas, há que atender ao conjunto de todos os factos cometidos pelo arguido, de modo a surpreenderem-se, ou não, conexões entre os diversos comportamentos ajuizados, através duma visão ou imagem global do facto, encarado na sua dimensão e expressão global, tendo em conta o que ressalta do contexto factual narrado e atender ao fio condutor presente na repetição criminosa, procurando estabelecer uma relação desses factos com a personalidade do agente, tendo-se em conta a caracterização desta, com sua projecção nos crimes praticados; enfim, há que proceder a uma ponderação da personalidade do agente e correlação desta com os concretos factos ajuizados, a uma análise da função e da interdependência entre os dois elementos do binómio, não sendo despicienda a consideração da natureza dos crimes em causa, da verificação ou não de identidade dos bens jurídicos violados, até porque o modelo acolhido é o de prevenção, de protecção de bens jurídicos.

     Todo este trabalho de análise global se justifica tendo em vista descortinar e aferir se o conjunto de factos praticados pelo(a) condenado(a) é a expressão de uma tendência criminosa, isto é, se significará já a expressão de algum pendor para uma “carreira”, ou se, diversamente, a feridente repetição comportamental dos valores estabelecidos emergirá antes e apenas de factores meramente ocasionais”.

 


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     Por outro lado, na confecção da pena conjunta, há que ter presentes os princípios da proporcionalidade, da adequação e proibição do excesso.

     Cremos que nesta abordagem, há que ter em conta os critérios gerais da medida da pena contidos no artigo 71.º do Código Penal – exigências gerais de culpa e prevenção – em conjugação, a partir de 1 de Outubro de 1995, com a proclamação de princípios ínsita no artigo 40.º, atenta a necessidade de tutela dos bens jurídicos ofendidos e das finalidades das penas, incluída a conjunta, aqui acrescendo o critério especial fornecido pelo artigo 77.º, n.º 1, do Código Penal - o que significa que este específico dever de fundamentação de uma pena conjunta, não pode estar dissociado da questão da adequação da pena à culpa concreta global, tendo em consideração por outra via, pontos de vista preventivos, sendo que, in casu, a ordem de grandeza de lesão dos bens jurídicos tutelados e sua extensão não fica demonstrada pela simples enunciação, sem mais, do tipo legal violado, o que passa pela sindicância do efectivo respeito pelo princípio da proporcionalidade e da proibição do excesso, que deve presidir à fixação da pena conjunta, tornando-se fundamental a necessidade de ponderação entre a gravidade do facto global e a gravidade da pena conjunta.

     Neste sentido, podem ver-se aplicações concretas nos acórdãos de 21-11-2006, processo n.º 3126/06-3.ª, CJSTJ 2006, tomo 3, pág. 228 (a decisão que efectue o cúmulo jurídico não pode resumir-se à invocação de fórmulas genéricas; tem de demonstrar a relação de proporcionalidade entre a pena conjunta a aplicar e a avaliação dos factos e a personalidade do arguido); de 14-05-2009, no processo n.º 170/04.9PBVCT.S1-3.ª; de 10-09-2009, no processo n.º 26/05.8SOLSB-A.S1-5.ª, seguido de perto pelo acórdão de 09-06-2010, no processo n.º 493/07.5PRLSB.S1-3.ª, ali se referindo que “Importa também referir que a preocupação de proporcionalidade a que importa atender, resulta ainda do limite intransponível absoluto, dos 25 anos de prisão, estabelecido no n.º 2 do art. 77.º do CP. É aqui que deve continuar a aflorar uma abordagem diferente da pequena e média criminalidade, para efeitos de determinação da pena conjunta, e que se traduzirá, na prática, no acrescentamento à parcelar mais grave de uma fracção menor das outras”; de 18-03-2010, no processo n.º 160/06. 7GBBCL.G2.S1- 5.ª, onde se afirma, para além da necessidade de uma especial fundamentação, que “no sistema de pena conjunta, a fundamentação deve passar pela avaliação da conexão e do tipo de conexão que entre os factos concorrentes se verifica e pela avaliação da personalidade unitária do agente. Particularizando este segundo juízo - e apara além dos aspectos habitualmente sublinhados, como a detecção de uma eventual tendência criminosa do agente ou de uma mera pluriocasionalidade que não radica  em qualidades desvaliosas da personalidade - o tribunal deve atender a considerações de exigibilidade  relativa e à análise da concreta necessidade de pena resultante da inter-relação dos vários ilícitos típicos”; de 15-04-2010, no processo n.º 134/05.5PBVLG.S1-3.ª; de 21-04-2010, no processo n.º 223/09.7TCLSB.L1.S1-3.ª; e do mesmo relator, de 28-04-2010, no processo n.º 4/06.0GACCH.E1.S1-3.ª.

     Com interesse para o caso, veja-se o acórdão de 28-04-2010, proferido no processo n.º 260/07.6GEGMR.S1-3.ª, relativamente a onze crimes de roubo simples a agências bancárias.

     Como se refere no acórdão de 10-09-2009, processo n.º 26/05.8SOLSB-A.S1, da 5.ª Secção “a pena conjunta situar-se-á até onde a empurrar o efeito “expansivo” sobre a parcelar mais grave, das outras penas, e um efeito “repulsivo” que se faz sentir a partir do limite da soma aritmética de todas as penas. Ora, esse efeito “repulsivo” prende-se necessariamente com uma preocupação de proporcionalidade, que surge como variante com alguma autonomia, em relação aos critérios da “imagem global do ilícito” e da personalidade do arguido. Proporcionalidade entre o peso relativo de cada parcelar, em relação ao conjunto de todas elas.

     Se a pena parcelar é uma entre muitas outras semelhantes, o peso relativo do crime que traduz é diminuto em relação ao ilícito global, e portanto, só uma fracção menor dessa pena parcelar deverá contar para a pena conjunta. (Asserção repetida no acórdão do mesmo relator, de 23-09-09, no processo n.º 210/05.4GEPNF.S2 -5.ª).

     A preocupação de proporcionalidade a que importa atender resulta do limite intransponível absoluto dos 25 anos de prisão estabelecido no n.º 2 do artigo 77.º do Código Penal.

     É aqui que deve continuar a aflorar uma abordagem diferente da pequena e média criminalidade, face à grande criminalidade, para efeitos de determinação da pena conjunta, e que se traduzirá, na prática, no acrescentamento à parcelar mais grave de uma fracção menor das outras.

    Como referimos nos acórdãos de 23-11-2010, processo n.º 93/10.2TCPRT.S1, de 2-02-2011, processo n.º 994/10.8TBLGS.S1, de 24-03-2011, processo n.º 322/08.2TARGR.L1.S1, de 12-09-2012, processos n.º 223/07.1GCVIS.C1.S1 e n.º 2745/09.0TDLSB.L1.S1, de 10-07-2013, processo n.º 413/06.4JAFAR.E2.S1, de 12-09-2013, processo n.º 1445/09.6JAPRT.P1.S1 e de 1-10-2014, processo n.º 344/11.6PCBRG.G1.S2 “A determinação da pena do concurso exige um exame crítico de ponderação conjunta sobre a conexão e interligação entre todos os factos praticados e a personalidade do seu autor, de forma a alcançar-se a valoração do ilícito global e entender-se a personalidade neles manifestada, de modo a concluir-se pela motivação que lhe subjaz, se emergente de uma tendência para delinquir, ou se se trata de mera ocasionalidade ou pluriocasionalidade não fundamentada na personalidade, tudo em ordem a demonstrar a adequação, justeza, e sobretudo, a proporcionalidade, entre a avaliação conjunta daqueles dois factores e a pena conjunta a aplicar e tendo em conta os princípios da necessidade da pena e da proibição de excesso.

    Importará indagar se a repetição operou num quadro de execução homogéneo ou diferenciado, quais os modos de actuação, de modo a concluir se estamos face a indícios desvaliosos de tendência criminosa, ou se estamos no domínio de uma mera ocasionalidade ou pluriocasionalidade, tendo em vista configurar uma pena que seja proporcional à dimensão do crime global, pois ao novo ilícito global, a que corresponde uma nova culpa, caberá uma nova, outra, pena.

    Com a fixação da pena conjunta não se visa re-sancionar o agente pelos factos de per si considerados, isoladamente, mas antes procurar uma “sanção de síntese”, na perspectiva da avaliação da conduta total, na sua dimensão, gravidade e sentido global, da sua inserção no pleno da conformação das circunstâncias reais, concretas, vivenciadas e específicas de determinado ciclo de vida do(a) arguido(a) em que foram cometidos vários crimes ”.

    Como se extrai dos acórdãos de 12-05-2010, processo n.º 4/05.7TACDV.S1-5.ª e de 16-12-2010, no processo n.º 893/05.5GASXL.L1.S1-3.ª, a pena única deve reflectir a razão de proporcionalidade entre as penas parcelares e a dimensão global do ilícito, na ponderação e valoração comparativas com outras situações objecto de apreciação, em que a dimensão global do ilícito se apresenta mais intensa.

    Reportam ainda a ideia de proporcionalidade os acórdãos de 11-01-2012, processo n.º 131/09.1JBLSB.L1.-A.S1-3.ª; de 18-01-2012, processo n.º 34/05.9PAVNG.S1-3.ª; de 31-01-2012, processo n.º 2381/07.6PAPTM.E1.S1-3.ª; de 05-07-2012, processo n.º 246/11.6SAGRD.S1-3.ª e os supra referidos de 12-09-2012, processos n.º 223/07.1GCVIS.C1.S1-3.ª e n.º 2745/09.0TDLSB.L1.S1-3.ª; de 22-01-2013, processo n.º 651/04.4GAFLTG.S1-3.ª; de 27-02-2013, processo n.º 455/08.5GDPTM.S1-3.ª; de 22-05-2013, processo n.º 344/11.6PCBRG.G1.S1-3.ª; de 19-06-2013, processo n.º 515/06.7GBLLE.S1-3.ª; de 10-07-2013, processo n.º 413/06.4JAFAR.E2.S1-3.ª; de 12-09-2013, processo n.º 1445/09.6JAPRT.P1.S1-3.ª; de 26-09-2013, processo n.º 138/10.6GDPTM.S2-5.ª e de 3-10-2013, processo n.º 522/01.6TACBR.C3.S1-5.ª, onde pode ler-se: «O equilíbrio entre os efeitos “expansivo” e “repulsivo” prende-se necessariamente com uma preocupação de proporcionalidade, que surge como variante com alguma autonomia, em relação aos critérios da “imagem global do ilícito” e da “personalidade do arguido”»; de 24-09-2014, processo n.º 994/12.3PBAMD.L1.S1-3.ª; de 1-10-2014, processo n.º 344/11.6PCBRG.G1.S2-3.ª.

    Como se refere no acórdão de 2 de Maio de 2012, processo n.º 218/03.4JASTB.S1-3.ª, a formação da pena conjunta é uma solução para o problema de proporção resultante da integração das penas singulares numa única punição e o «restabelecimento do equilíbrio» entre crime isolado e pena singular, pelo que deve procurar-se que nas sucessivas operações de realização de cúmulo jurídico superveniente exista um critério uniforme de avaliação de tal proporcionalidade”.

    Como se pode ler no acórdão de 21 de Junho de 2012, processo n.º 38/08.0GASLV.S1, “numa situação de concurso entre uma pena de grande gravidade e diversas penas de média e curta duração, este conjunto de penas tem de ser objecto de uma especial compressão para evitar uma pena excessiva e garantir uma proporcionalidade entre penas que correspondem a crimes de gravidade muito díspar; doutro modo, corre-se o risco de facilmente se poder atingir a pena máxima, a qual deverá ser reservada para as situações de concurso de várias penas muito graves”.

     Focando a proporcionalidade na perspectiva das finalidades da pena, pode ver-se o acórdão de 27 de Junho de 2012, processo n.º 70/07.0JBLSB-D.S1-3.ª, onde consta: “A medida da pena única, respondendo num segundo momento também a exigências de prevenção geral, não pode deixar de ser perspectivada nos efeitos que possa ter no comportamento futuro do agente: a razão de proporcionalidade entre finalidades deve estar presente para não eliminar, pela duração, as possibilidades de ressocialização (embora de difícil prognóstico pelos antecedentes)”. (Sublinhados nossos).

     Sobre os princípios da proporcionalidade, da proibição de excesso e da legalidade na elaboração de pena única pode ver-se o acórdão de 10-09-2014, processo n.º 455/08-3.ª, por nós citado no acórdão de 24-09-2014, proferido no processo n.º 994/12.3PBAMD.L1.S1-3.ª.

    Revertendo ao caso concreto.

     A pena conjunta visa corresponder ao sancionamento de um determinado trecho de vida do arguido condenado por pluralidade de infracções.

     Há que valorar o ilícito global perpetrado, ponderando em conjunto a gravidade dos factos e a sua relacionação com a personalidade dos ora recorrentes, em todas as suas facetas.                            

   Na elaboração da pena conjunta impõe-se fazer uma nova reflexão sobre os factos em conjunto com a personalidade do arguido, em ordem a adequar a medida da pena à personalidade que nos factos se revelou.

  Importa ter em conta a natureza e diversidade ou igualdade/similitude dos bens jurídicos tutelados, ou seja, a dimensão de lesividade da actuação global dos arguidos.

     Como se extrai dos acórdãos de 9-01-2008, processo n.º 3177/07, CJSTJ 2008, tomo 1, pág. 181, de 25-09-2008, processo n.º 2288/08 (a proporcionalidade da pena única, em função do ponto de vista preventivo geral e especial, é avaliada em função do bem jurídico protegido e violado; as penas têm de ser proporcionadas à transcendência social – mais que ao dano social – que assume a violação do bem jurídico cuja tutela interessa prever. O critério principal para valorar a proporção da intervenção penal é o da importância do bem jurídico protegido, porquanto a sua garantia é o principal fundamento daquela intervenção), de 22-01-2013, processo n.º 650/04.6GISNT.L1.S1, de 26-06-2013, processo n.º 267/06.0GAFZZ.S1 (e de novo acórdão de 10-09-2014 proferido no mesmo processo) e de 1-10-2014, processo n.º 471/11.0GAVNF.P1.S1, todos da 3.ª Secção, um dos critérios fundamentais em sede do sentido de culpa em relação ao conjunto dos factos, numa perspectiva global dos factos, é o da determinação da intensidade da ofensa e dimensão do bem jurídico ofendido, assumindo significado profundamente diferente a violação repetida de bens jurídicos ligados à dimensão pessoal em relação a bens patrimoniais.

    E como referiu o supra citado acórdão de 27 de Junho de 2012, processo n.º 70/07.0JBLSB-D.S1-3.ª, a pena única não pode deixar de ser perspectivado o efeito da pena sobre o comportamento futuro do agente em função da sua maior ou menor duração.

    No mesmo sentido podem ver-se os acórdãos de 22 de Janeiro de 2013, processo n.º 651/04.4GAFLG.S1-3.ª, de 4 de Julho de 2013, processo n.º 39/10.8JBLSB.L1.S1-3.ª sobre o ponto e, citando neste particular os acórdãos do mesmo relator, de 9 de Fevereiro de 2011, processo n.º 19/05.5GAVNG.S1-3.ª e de 23 de Fevereiro de 2011, processo n.º 429/03. 2PALGS.S1-3.ª Secção.

    No mesmo sentido ainda, o acórdão de 2 de Fevereiro de 2011, processo n.º 217/08.0JELSB.S1, igualmente da 3.ª Secção, citando expressamente Figueiredo Dias no passo assinalado supra (Consequências…, § 421, págs. 291/2).

    E mais recentemente, os acórdãos de 08-01-2014, processo n.º 154/12.3GASSB.L1.S1, de 29-01-2014, processo n.º 629/12.4JACBR.C1.S1 e de 26-03-2014, processo n.º 316/09.0PGOER.S1, todos da 3.ª Secção.

   

     Concretizando.

    Sendo uma das finalidades das penas, incluindo a unitária, segundo o artigo 40.º, n.º 1, do Código Penal, na versão da terceira alteração, introduzida pelo Decreto-Lei n.º 48/95, de 15 de Março, a tutela dos bens jurídicos, definindo a necessidade desta protecção os limites daquelas, há que, necessariamente, ter em atenção o bem jurídico tutelado nos tipos legais em causa.

      No caso em apreciação, concretamente, temos dois crimes de roubo agravado cometidos em co-autoria e em simultâneo, sendo ofendidos um casal de nacionalidade holandesa, com 70 e 62 anos de idade, a viver numa moradia em zona despovoada.

     Procurando estabelecer conexão entre os crimes cometidos, a mesma está presente no modo de actuação dos arguidos, que molestaram ambos os ofendidos com o objectivo de obterem dinheiro e bens convertíveis facilmente no mercado.

     O arguido CC e arguido BB tinham à data dos factos, respectivamente, 16 e 32 anos de idade, e actualmente, 21 e 36 anos de idade, sendo de atender às condições pessoais narradas nos factos provados supra referidos.

     No que respeita a antecedentes criminais, há a registar os do BB..

  Concatenados todos estes elementos, há que indagar se a facticidade dada por provada no presente processo permite formular um juízo específico sobre a personalidade de ambos os recorrentes que ultrapasse a avaliação que se manifesta pela própria natureza dos factos praticados, evidenciando-se alguma tendência radicada na personalidade, ou seja, que o ilícito global, seja produto de tendência criminosa, ou antes correspondendo no singular contexto ora apreciado, a um conjunto de factos praticados no mesmo momento, em acto seguido, restando a expressão de uma mera ocasionalidade procurada pelos arguidos.
     A facticidade provada não permite, no presente caso, formular um juízo específico sobre a personalidade do recorrente CC que ultrapasse a avaliação que se manifesta pela própria natureza dos factos praticados, atenta a natureza e grau de gravidade das infracções por que responde, não se mostrando provada personalidade por tendência, ou seja, que o ilícito global seja produto de tendência criminosa deste arguido, restando a expressão de um facto episódico, isolado, na sua vida.
      De forma diferente e como considerou e bem a decisão recorrida , notando tendência no caso do arguido BB

      Haverá que ter em consideração que a actuação delitual em apreciação desenvolveu-se em apenas uma manhã, em 6 de Dezembro de 2011, não havendo notícia de outros factos cometidos pelos recorrentes depois.

     Em suma: A pena unitária tem de responder à valoração, no seu conjunto e inter conexão, dos factos e personalidade de cada um dos arguidos, afigurando-se-nos equilibrada e adequada a aplicação da pena conjunta de 5 anos e 6 meses de prisão ao arguido CC e de 8 anos de prisão ao arguido BB, as quais não afrontam os princípios da necessidade, proibição do excesso ou proporcionalidade das penas – artigo 18.º, n.º 2, da CRP –, nem as regras da experiência, antes são adequadas e proporcionais à defesa do ordenamento jurídico, e não ultrapassam a medida da culpa dos recorrentes.


          Decisão

        Pelo exposto, acordam nesta 3.ª Secção do Supremo Tribunal de Justiça em
     I. - Julgar parcialmente procedentes os recursos interpostos pelos arguidos CC e BB, e em consequência:
       II. – Reduzir a pena aplicada por cada um dos dois crimes de roubo agravado, fixando a pena de 4 anos e 6 meses de prisão no que toca ao arguido CC e a pena de 6 anos de prisão ao arguido BB;
       III. – Fixar a pena única aplicada ao recorrente CC em 5 anos e 6 meses de prisão e ao arguido BB, a pena única de 8 anos de prisão.
     Sem custas, nos termos dos artigos 374.º, n.º 3, 513.º, n.º s 1, 2 e 3 e 514.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, na redacção anterior à que lhes foi dada pelo Decreto-Lei n.º 34/2008, de 26 de Fevereiro (rectificado pela Declaração de Rectificação n.º 22/2008, de 24 de Abril, e com as alterações introduzidas pela Lei n.º 43/2008, de 27 de Agosto, pelo Decreto-Lei n.º 181/2008, de 28 de Agosto, pelo artigo 156.º da Lei n.º 64-A/2008, de 31 de Dezembro (Suplemento n.º 252), pelo artigo 163.º da Lei n.º 3-B/2010, de 28 de Abril, pelo Decreto-Lei n.º 52/2011, de 13 de Abril, pela Lei n.º 7/2012, de 13 de Fevereiro, rectificada com a Rectificação n.º 16/2012, de 26 de Março, pela Lei n.º 66-B/2012, de 31de Dezembro, pelo Decreto-Lei n.º 126/2013, de 30 de Agosto, e pela Lei n.º 72/2014, de 2 de Setembro), o qual aprovou – artigo 18.º – o Regulamento das Custas Processuais, publicado no anexo III do mesmo diploma legal, entrado em vigor em 20 de Abril de 2009, tendo o presente processo tido início em 9 de Janeiro de 2008.
      Consigna-se que foi observado o disposto no artigo 94.º, n.º 2, do Código de Processo Penal.

Lisboa, 25 de Maio de 2016

Raul Borges (Relator)
Manuel Augusto de Matos