I - Extrapolando do disposto no art. 608.º, n.º 2, do NCPC (2013), o objeto do litígio pode coincidir com as questões que as partes submetem à apreciação do juiz, delimitadoras dos seus poderes de cognição, nomeadamente das questões consubstanciadas no pedido, causa de pedir e matéria de exceção.
II - A partir dos factos controvertidos que corporizam a causa de pedir e as exceções, procede-se à sua enumeração, como temas da prova, delimitando a matéria objeto da instrução, segundo as várias soluções plausíveis da questão de direito.
III - Tanto o despacho de identificação do objeto do litígio como o da enunciação dos temas da prova, podendo ser modificados posteriormente, não formam caso julgado formal.
I – RELATÓRIO
AA – Compra e Venda de Imóveis, Lda., instaurou, em 21 de outubro de 2011, no então 1.º Juízo de Competência Cível da Comarca de Loulé, contra BB, ação declarativa, pedindo que o Réu fosse condenado a abster-se de danificar ou destruir o prédio descrito, sob o n.º 41… (Almancil), na Conservatória do Registo Predial de Loulé, incluindo os seus muros ou vedações e quaisquer das suas benfeitoria, obras ou acessões; a abster-se de afirmar em público que o prédio lhe pertence; a pagar, a título de sanção pecuniária compulsória, a quantia de € 1 000,00, por cada incumprimento; e ainda a pagar-lhe a quantia de € 14 275,00.
Para tanto, alegou, em síntese, que o prédio se encontra registado a seu favor; o R. instaurou-lhe uma ação de reivindicação, indicando o prédio com diferente registo, ação que foi julgada improcedente; mesmo assim, o R. e outras pessoas, a seu mando, destruíram o muro da extremidade sul do prédio, colocando uma vedação de arame no local onde se encontrava o muro; a atuação do R. tem causado diversos danos.
Contestou o Réu, por exceção e impugnação, e, tendo deduzido reconvenção, pediu que a A. fosse condenada a pagar-lhe a quantia de € 15 766,88, a título de danos patrimoniais e não patrimoniais.
Replicou a A., impugnando a reconvenção e invocando a exceção de caso julgado, designadamente da ação n.º 2001/07.9TBLLE, alegação retirada na audiência prévia, por inexistência de coincidência de pedidos.
Foi proferido despacho saneador, julgando-se improcedentes as exceções, e despacho de identificação do objeto do litígio e da enunciação dos temas da prova, nos termos declarados a fls. 251, do qual não houve qualquer reclamação.
Realizada, depois, a audiência de discussão e julgamento, foi proferida, em 19 de março de 2014, a sentença, que condenou o R. a abster-se de, por qualquer forma, danificar ou destruir o prédio, incluindo muros ou vedações e quaisquer benfeitorias, obras ou acessões, assim como a abster-se de afirmar em público que o prédio lhe pertence, a pagar a sanção pecuniária compulsória, no valor de € 1 000,00, por cada ocasião em que infrinja tais deveres, e ainda a pagar à A. a quantia de € 11 775,00, para além de ter absolvido a A. da reconvenção.
Inconformado, o R. apelou para o Tribunal da Relação de Évora, que, por acórdão de 13 de dezembro de 2015, negou provimento ao recurso e manteve a decisão recorrida.
De novo inconformado, o Réu recorreu (em revista excecional) para o Supremo Tribunal de Justiça e, tendo alegado, formulou essencialmente as conclusões:
a) O acórdão recorrido decidiu alterar o objeto do litígio e os temas da prova.
b) O despacho não foi impugnado, constituindo caso julgado formal.
c) A apreciação é completamente contrária ao decidido na ação n.º 2001/07.9TBLLE, com clara violação dos princípios da cooperação e da descoberta da verdade material.
d) Nessa ação, o direito de propriedade da A. nunca foi reconhecido.
e) O acórdão recorrido, colocando em causa a segurança jurídica da audiência prévia, violou os arts. 578.º, 620.º e 625.º do CPC.
Com a revista, o Recorrente pretende a revogação ou declaração de nulidade do acórdão recorrido.
Não foram apresentadas contra-alegações.
O recurso, depois de apresentado à Formação a que se refere o art. 672.º, n.º 3, do Código de Processo Civil (CPC), foi distribuído como revista normal.
Corridos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.
Neste recurso, está essencialmente em discussão a ofensa ao caso julgado formal, nomeadamente do despacho de identificação do objeto do litígio e da enunciação dos temas da prova.
II – FUNDAMENTAÇÃO
2.1. Na ação, foram dados como provados os seguintes factos:
1. O prédio rústico situado em …, composto de terra de cultura e pastagem com figueiras e pinheiros, com a área de 5433 m2, que confronta a nascente e poente com caminho e a norte e sul com a Junta de Freguesia encontra-se descrito na Conservatória do Registo Predial de Loulé sob o n.º 41… (Almancil).
2. Desde 6 de janeiro de 2005, encontra-se registada a aquisição a favor da A., por compra a CC – Compra e Venda de Propriedades, Lda., desse prédio.
3. No dia 20 de julho de 2007, o R. instaurou no Tribunal Judicial de Loulé, juntamente com a sua mãe e a neta desta, ação de reivindicação contra a A.
4. Nessa ação, os AA. invocavam o direito de propriedade incidente sobre um prédio situado em …, freguesia de Almancil, e pediam o reconhecimento do direito de propriedade e a restituição da posse do imóvel, que reconheciam estar então na posse da R. AA – Compra e Venda de Imóveis, Lda.
5. A mesma ação correu termos no 2.º Juízo Cível do Tribunal Judicial de Loulé, sob o n.º 2001/07.9TBLLE.
6. Na mencionada ação, os AA. identificavam o prédio como estando descrito na Conservatória do Registo Predial, sob o n.º 93….
7. Na sentença proferida, em primeira instância, consignou-se que: “percorrendo os factos provados, no entanto, não se vislumbra que o prédio descrito sob o n.º 93… tenha qualquer ponto de ligação com o prédio em causa nos autos (e que se pretende reivindicar)”.
8. Na mesma ação, o Tribunal reconheceu que o prédio que aí se encontrava em causa está descrito sob o n.º 41…, encontrando-se então na posse da A.
9. Mediante sentença proferida a 15 de junho de 2009, no âmbito da mesma ação, foi julgada improcedente a pretensão formulada pelos AA., tendo a R. sido absolvida dos pedidos formulados.
10. Essa sentença foi confirmada pelos acórdãos proferidos pelo Tribunal da Relação de Évora a 14 de abril de 2010 e pelo Supremo Tribunal de Justiça a 18 de novembro de 2010, tendo este transitado já em julgado.
11. No dia 24 de junho de 2011, a A. teve conhecimento de que o muro de pedra existente na parte sul do prédio identificado em 1. tinha sido destruído.
12. No lugar onde se encontrava esse muro foi colocada uma vedação de arame, com postes de cor verde e sem qualquer portão ou entrada (artigo 12º da petição inicial).
13. As pedras que antes compunham o muro foram desviadas e colocadas em fila, no sentido nascente-poente.
14. Foi o R., juntamente com outras pessoas a seu mando, que destruiu o muro referido e colocou no seu lugar a vedação de arame mencionada.
15. A A. mandou, de imediato, proceder à recolocação do muro de pedra no seu estado original e à remoção da vedação de arame.
16. No dia 27 de junho de 2011, cerca das 9:30 horas, o construtor encarregado pela A. de realizar esta obra foi abordado, no local, pelo R., que dizia ser o proprietário do prédio, pretendendo impedir a execução da obra.
17. Foi chamada a GNR, tendo sido exibida aos militares da GNR que se deslocaram ao local a sentença a que se alude em 9.
18. Os militares da GNR confrontaram o R. com a referida sentença, tendo o mesmo dito que tinha documentos que mostravam que a propriedade lhe pertencia, pelo que não aceitava a decisão proferida.
19. O R. acabou por aceitar retirar-se do local, a pedido da GNR.
20. No dia 29 de junho de 2011, o R. dirigiu-se novamente ao local, onde tentou impedir a continuação da obra, tendo gritado e proferido impropérios contra as pessoas que aí se encontravam.
21. No dia 1 de julho de 2011, cerca das 9:00 horas, quando os trabalhadores contratados pela A. iniciavam o seu trabalho de reconstrução do muro, o R. apareceu novamente no local, ameaçando que atiraria pedras às pessoas presentes se estas continuassem a trabalhar.
22. As obras só puderam recomeçar depois de o R. se ausentar do local.
23. A vedação que o R. destruiu era de pedra e tinha sido construída em 2006, com um custo total de € 16 510,44, pela DD, Lda.
24. Depois da destruição causada pelo R., a A. mandou recolocar a vedação no estado em que se encontrava, encontrando-se esse trabalho concluído.
25. O custo desse trabalho foi de € 9 225,00.
26. A A. suportou ainda o pagamento dos encargos com a colaboração do arquiteto que lhe dá apoio em trabalhos de construção civil, para supervisionar o andamento dos trabalhos e contactar o empreiteiro.
27. Os honorários pagos a esse arquiteto ascenderam ao montante de € 2 550,00.
28. Por força da situação criada pelo R., o gerente da A. teve que ocupar o seu tempo com a resolução do problema, chamando um arquiteto para organizar a reconstrução, aprovando a contratação do empreiteiro e disponibilizando os fundos necessários para que a obra se realizasse.
29. O gerente da A. teve que contactar advogados para se aconselhar sobre a forma como deveria reagir relativamente à atuação do R., pois estava convencido de que o litígio estava definitivamente resolvido com a sentença proferida na ação mencionada em 3.
30. O gerente da A. teve ainda que aprovar a instauração de um procedimento cautelar para resolver o problema imediatamente e permitir a reposição do muro de vedação, afastando o R. no local.
31. A atuação do R. causou na gerência da A. e nos restantes colaboradores um sentimento de descrença nas instituições da justiça.
32. A atuação do R. causou na gerência da A. e nos restantes colaboradores uma sensação de impotência e desproteção perante os atos pelo mesmo praticados.
33. A A. tem em curso um processo de aprovação de um projeto para o conjunto de prédios onde se integra o prédio identificado em 1. e receia que o comportamento do R. possa colocar em risco, ou atrasar, o respetivo licenciamento e viabilização.
34. A A. tem por objeto a compra e venda de imóveis, construção, arrendamento, administração e gestão de imóveis, condomínios e centros comerciais.
35. O prédio rústico situado em …, composto de terra arenosa com pinheiros, com a área de 4985 m2, que confronta a nascente com EE, a norte com FF, a poente com GG e a sul com HH, encontra-se descrito na Conservatória do Registo Predial de Loulé, sob o n.º 93… (Almancil).
36. Pela apresentação n.º 376, de 31 de agosto de 2011, encontra-se registada a aquisição desse prédio, sem determinação de parte ou direito, a favor de II e BB, por sucessão hereditária de JJ e KK.
37. Esse mesmo prédio encontrava-se omisso, mas inscrito na matriz antiga sob o artigo 3719.º.
38. A certidão matricial do prédio inscrito, sob o antigo artigo 3720.º, a favor de FF, até 1974, continha a indicação de que o mesmo confrontava a sul com LL e a nascente com EE.
39. LL vendeu o prédio identificado em 35. à mãe do R.
40. A certidão matricial do prédio inscrito, sob o antigo artigo 3718.º, a favor de HH, até 1967, continha a indicação de que o mesmo confrontava a norte com LL e a nascente com EE.
41. A certidão matricial do prédio inscrito, sob o antigo artigo 3717.º, a favor de GG, até 1965, continha a indicação de que o mesmo confrontava a nascente com LL.
42. O prédio inscrito sob o antigo artigo 3718.º está descrito na Conservatória do Registo Predial, sob o n.º 35..., sendo composto de courela de terra de areia com pinheiros, no sítio dos …, e confinando a nascente com MM, Lda, a norte com LL, a poente com caminho e a sul com NN.
43. Pela apresentação n.º 2, de 9 de maio de 1985, encontra-se registada a menção de que esse prédio está atualmente inscrito na matriz sob o artigo 3033.º.
44. Pela apresentação n.º 30, de 5 de junho de 1985, encontra-se registada a menção de que o mesmo prédio é composto de terra de cultura e pastagem com figueiras e pinheiros, com a área de 4100 m2, confrontando a nascente com caminho e a norte com Junta de Freguesia.
45. O prédio inscrito sob o antigo artigo 3720.º está descrito na Conservatória do Registo Predial sob o n.º 11015, sendo composto de terra de areia com pinheiros, com a área de 5033 m2, no sítio …, e confrontando a nascente com caminho, a sul com GG, a norte com herdeiros de NN e a poente com EE.
46. Esse prédio encontra-se atualmente inscrito na matriz sob o artigo 3023.º.
47. Pela apresentação n.º 35, de 21 de dezembro de 2004, foi registada a aquisição, por compra, a favor da A., desse prédio.
48. A certidão matricial do prédio inscrito sob o antigo artigo 3717.º continha a indicação de que foi adquirido por GG, em 1965, e por OO, em 1977.
49. A certidão matricial do prédio inscrito sob o antigo artigo 3023.º, inicialmente a favor de PP, continha a indicação de que confrontava a sul com JJ.
50. A certidão matricial do prédio inscrito sob o antigo artigo 2067.º, a favor de FF, continha a indicação de que confrontava a norte com QQ, a nascente e a sul com caminho e a poente com RR.
51. A certidão matricial do prédio inscrito sob o antigo artigo 2066.º, a favor de RR, continha a indicação de que confrontava a nascente com QQ.
52. O prédio rústico situado em Figueiral, composto de terra de cultura com amendoeiras e figueiras, com a área de 3850 m2, retificada depois para 7565 m2, inscrito na matriz sob o artigo 2684.º, que confronta a nascente com SS, a norte com TT, a poente com UU e a sul com caminho, encontra-se descrito na Conservatória do Registo Predial de Loulé, sob o n.º 3858 (Almancil).
2.2. Delimitada a matéria de facto, expurgada de redundâncias, importa então conhecer do objeto do recurso, definido pelas suas conclusões, nomeadamente da questão da ofensa ao caso julgado do despacho de identificação do objeto do litígio e da enunciação dos temas da prova.
A admissibilidade do recurso justifica-se, com efeito, pela alegada ofensa ao caso julgado, fundamento constante da alínea a) do n.º 2 do art. 629.º do Código de Processo Civil (CPC).
Tendo o acórdão recorrido confirmado a sentença recorrida, estamos confrontados com uma inequívoca situação de dupla conforme, nos termos do disposto no art. 671.º, n.º 3, do CPC, restringindo-se o objeto do recurso, portanto, à questão da ofensa de caso julgado formal.
Na concreta identificação do objeto do litígio, consignou-se “discute-se na ação se o direito de propriedade da A. se encontra a ser violado pelo R. e se, em consequência, este deve ser condenado a respeitar tal direito e a pagar uma indemnização pelos danos causados e sanção pecuniária compulsória se persistir na sua conduta. Discute-se, ainda, se o direito de propriedade do R. se encontra a ser violado pela A. e se, em consequência, esta deve ser condenada a pagar uma indemnização pelos danos causados” (fls. 251).
Na concreta enunciação dos temas da prova, o despacho enumerou oito temas, correspondentes a factos que consubstanciam a violação do direito de propriedade da A. e os danos causados pelo R., assim como a violação do direito de propriedade deste e os danos causados pela A. (fls. 251).
A alegação de ofensa ao caso julgado, por alteração do objeto do litígio e dos temas da prova, decorre, se bem se compreende, da parte do acórdão recorrido em que se aprecia a arguida nulidade da sentença, por omissão e excesso de pronúncia, nos termos do disposto no art. 615.º, n.º 1, alínea d), do CPC.
A questão suscitada conduz-nos, diretamente, à problemática da identificação do objeto do litígio e da enumeração dos temas da prova, regulada no art. 596.º do CPC.
Trata-se de matéria inovadora introduzida pelo Código de Processo Civil, aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de junho, em vigor desde 1 de setembro de 2013.
A prolação, após debate, do despacho previsto no n.º 1 do artigo 596.º e a decisão das reclamações das partes constituem uma das finalidades da audiência prévia – alínea f) do n.º 1 do art. 591.º do CPC.
A identificação do objeto do litígio, que neste âmbito constitui a principal inovação, é tida pela doutrina, como sendo a “enunciação dos pedidos deduzidos (objeto do processo) sobre os quais haja controvérsia” (J. LEBRE DE FREITAS, A Ação Declarativa Comum, 3.ª edição, 2013, pág. 198).
Esta identificação do objeto do litígio afigura-se insuficiente, porquanto deixa de fora a causa de pedir e, eventualmente, a matéria de exceção.
Na verdade, extrapolando do disposto no art. 608.º, n.º 2, do CPC, o objeto do litígio coincide com as questões que as partes submetem à apreciação do juiz, delimitadoras dos seus poderes de cognição (sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso), nomeadamente das questões consubstanciadas no pedido, causa de pedir e matéria de exceção.
A identificação do objeto do litígio, tendo em conta os pressupostos em que assenta, tem como finalidade esclarecer as partes, depois dos articulados e antes da instrução, dos termos precisos da controvérsia da ação, de modo a potenciar uma melhor e mais esclarecedora discussão dos termos da causa.
No entanto, o despacho de identificação do objeto do litígio, servindo apenas para delimitação da controvérsia da ação, não atribui nem retira direitos às partes, sendo certo ainda que a omissão ou o excesso de pronúncia provoca a nulidade da decisão nos termos do art. 615.º, n.º 1, alínea d), do CPC.
Por outro lado, a enunciação dos temas da prova, que substituiu a anterior base instrutória, que, por sua vez, já tinha substituído o questionário, corresponde genericamente à enumeração das questões de facto fundamentais controvertidas (J. LEBRE DE FREITAS, Ibidem, pág. 197).
A partir dos factos controvertidos que corporizam a causa de pedir e as exceções, procede-se à sua enumeração, delimitando a matéria objeto da instrução, segundo as várias soluções plausíveis da questão de direito.
Apesar de certa desvalorização e também alguma indefinição, a enunciação dos temas da prova constitui um ato processual relevante, nomeadamente pela definição do objeto da instrução e por poder facilitar a disciplina da audiência, bem como o julgamento da matéria de facto, o qual, naturalmente, requer um cuidado extremo, de modo a obter-se a justa composição do litígio e, assim, legitimar e prestigiar a administração da justiça, pilar fundamental do Estado de Direito.
A identificação do objeto do litígio, por sua vez, sendo meramente enunciativa, não atribui nem retira direitos às partes e, como tal, não decide qualquer relação processual, sendo certo ainda que as questões a resolver na ação resultam da alegação deduzida nos seus articulados.
Por isso, o despacho de identificação do objeto do litígio, correspondente ao alegado nos articulados, designadamente na petição inicial, não chega a constituir caso julgado, podendo a sentença, quanto ao objeto da ação, ir além daquele despacho, se o conteúdo dos articulados o permitir, na medida em que são os mesmos que delimitam os poderes de cognição do tribunal, independentemente da identificação do litígio que tenha sido declarada, embora esta, observando a disciplina processual, deva corresponder inteiramente à alegação dos articulados.
Por outro lado, relativamente à enunciação dos temas da prova também esta não forma caso julgado, pois pode ser modificada posteriormente.
Aliás, nem mesmo a especificação, existente até 1996, formava caso julgado, por poder ser modificada até à decisão final, conforme se decidiu no assento (equivalente ao atual acórdão uniformizador de jurisprudência) do Supremo Tribunal de Justiça de 26 de maio de 1994 (BMJ n.º 437, pág. 35).
Nestas circunstâncias, podemos concluir que tanto o despacho de identificação do objeto do litígio como o da enunciação dos temas da prova, podendo ser modificados posteriormente, não formam caso julgado formal.
Neste contexto, não era, pois, possível ocorrer qualquer ofensa ao caso julgado formal, improcedendo a argumentação desenvolvida pelo Recorrente.
De resto, o acórdão recorrido, na parte impugnada, limitou-se a julgar improcedentes as arguidas nulidades da sentença, quer por omissão quer por excesso de pronúncia, sempre dentro dos limites dos poderes de cognição do Tribunal.
Tal pronúncia, aliás, enquadra-se no âmbito do objeto do litígio identificado no despacho de fls. 251.
Consequentemente, nos autos, não se surpreende a qualquer ofensa ao caso julgado formal, estando devidamente salvaguardada a segurança jurídica.
Nestes termos, nega-se totalmente a revista.
2.3. Em conclusão, pode extrair-se de mais relevante:
I. Extrapolando do disposto no art. 608.º, n.º 2, do Código de Processo Civil, o objeto do litígio pode coincidir com as questões que as partes submetem à apreciação do juiz, delimitadoras dos seus poderes de cognição, nomeadamente das questões consubstanciadas no pedido, causa de pedir e matéria de exceção.
II. A partir dos factos controvertidos que corporizam a causa de pedir e as exceções, procede-se à sua enumeração, como temas da prova, delimitando a matéria objeto da instrução, segundo as várias soluções plausíveis da questão de direito.
III. Tanto o despacho de identificação do objeto do litígio como o da enunciação dos temas da prova, podendo ser modificados posteriormente, não formam caso julgado formal.
2.4. O Recorrente, ao ficar vencido por decaimento, é responsável pelo pagamento das custas, em conformidade com a regra da causalidade consagrada no art. 527.º, n.º s 1 e 2, do CPC.
III – DECISÃO
Pelo exposto, decide-se:
1) Negar a revista.
2) Condenar o Recorrente no pagamento das custas.
Lisboa, 16 de junho de 2016
Olindo Geraldes (Relator)
Pires da Rosa
Maria dos Prazeres Beleza