I - Deve ser qualificada como crime de tráfico de estupefacientes p. e p. pelo art. 21.º do DL 15/93, de 22-01 e não pelo art. 25.º, al. a), do mesmo diploma legal, a conduta do arguido que, pelo período de pouco mais de 1 ano, com a colaboração próxima da sua companheira e co-arguida, vendia liamba, placas de haxixe, "speed" (anfetamina) MD, ou MDMA e também cocaína, numa área que abrangia os concelhos de Penafiel, Paredes e Valongo, em lugares muito diversificados e bem determinados, a pelo menos 51 indivíduos, e que também fornecia produto estupefaciente aos co-arguidos F, S ou R, que por sua vez o forneciam sobretudo nas ausências do recorrente e companheira.
II - Apontando os dados disponíveis para o fornecimento, por parte do arguido, sobretudo de haxixe e liamba e ponderando que, apesar das necessidades de prevenção geral serem elevadas, as necessidades de prevenção especial se apresentam bem mais baixas, na medida em que o arguido ingressou no mundo do tráfico numa altura em que não possuía trabalho, não apresenta passado criminal e é bem visto no seu meio, sendo considerado trabalhador e educado, não apresentando dificuldades de integração, tendo apoio familiar e revelou alguma consciência do mal do seu comportamento, entende-se justa a pena de cinco anos de prisão pela prática do crime de tráfico de estupefacientes p. e p. pelo art. 21.º do DL 15/93, de 22-01.
III - Só se deve optar pela suspensão da pena quando existir um juízo de prognose favorável, centrado na pessoa do arguido e no seu comportamento futuro. A suspensão da pena tem um sentido pedagógico e reeducativo, sentido norteado, por sua vez, pelo desiderato de afastar, tendo em conta as concretas condições do caso, o delinquente da senda do crime.
IV - Não se colocando preocupações fortes ao nível da reinserção social do arguido, mas continuando a mostrar-se importante, fazer sentir ao agora condenado, os efeitos da condenação, sendo possível apostar na sua reinserção, sobretudo se abandonar os contactos com marginais do mundo da droga, não frequentar ambientes noturnos propícios ao tráfico, deixar ele mesmo de consumir, e sobretudo se trabalhar, é de suspender a execução da pena de prisão, por igual período de tempo, sujeitando tal suspensão a regime de prova, estruturado pelos serviços competentes de reinserção social, tendo em conta as especificidades do caso.
Inconformado recorreu para este STJ, pelo que cumpre conhecer.
A - FACTOS
Transcrevem-se os factos provados relacionados mais de perto com a conduta do recorrente (realces nossos):
"1. O arguido BB é vulgarmente conhecido por "...", a arguida CC por "Guida", o arguido AA, conhecido por "...", o arguido DD pela alcunha de "...", o arguido EE pela alcunha de "...", o arguido FF pela alcunha de "...", o arguido GG pela alcunha de "...".
2. Desde pelo menos Agosto de 2013 até 20 de Outubro de 2014, data em que foi detido, BB, segundo projecto que delineou, sempre manteve e pelo qual se orientou, tendo em vista obter proventos monetários, passou a adquirir por compra produtos estupefacientes, MDMA, Speed, liamba e haxixe para depois vender a terceiros que o procuravam para esse efeito, repartindo os produtos adquiridos em porções mais pequenas, tudo conforme as encomendas recebidas através de telemóvel ou contacto pessoal.
3. Para o desenvolvimento de tal actividade o arguido BB contou com a cooperação das arguidas HH, sua companheira, e CC, mãe de ..., na venda e distribuição dos sobreditos produtos estupefacientes, predominantemente realizadas tanto no interior da habitação comum sita na rua ..., como nas respectivas imediações (viaduto do ..., hospital de...).
4. O arguido BB era o principal fornecedor de produtos estupefacientes, nomeadamente, MD, Speed, liamba e haxixe, que vendia aos arguidos AA e companheira II para eles próprios procederem, por sua vez, à venda directa, nas zonas de ... e ..., aos consumidores que os contactavam, pessoalmente ou através de telemóvel, os quais contaram ainda com a colaboração, nas ausências de ambos da sua habitação, sita, a partir de 1 de Maio de 2013, na rua ..., dos arguidos JJ, LL e MM que também procederam â venda de tais substâncias aos consumidores interessados, indicando-lhes (aqueles a estes) previamente o preço pelo qual o deveriam fazer.
5. O arguido BB, também desenvolvia, como desenvolveu, a aludida actividade de venda de estupefacientes primeiramente num anterior apartamento que possuía na Ava ..., nas imediações e na discoteca "...", em ..., das bombas de combustível da Galp na saída da A4 e do Parque Radical, em ...o, dos Bombeiros Voluntários de ..., e do Mcdonald's, da Estrada da Circunvalação, no ..., bem como em eventos de música "tecno", designadamente no ..., fazendo-se transportar, para o efeito, no veículo "Fiat Linea", de cor preta, matrícula ...-HV-..., tendo utilizado também com tal propósito os seguintes números de telemóvel: ..., ..., ..., bem como os telemóveis com os IMEI: ... e ....
6. O arguido BB cobrava em média por cada placa de canabis (haxixe) cerca de 110€/120€; o grama de MDMA entre 20€ e 30€, de Speed entre 10€ e 20€; liamba cerca de 5€/6€ o grama.
7. Na execução da respectiva actividade o arguido BB vendeu aos arguidos AA e II, pelo menos entre Abril de 2014, até à data da respectiva detenção em 20 de Outubro de 2014, pelo menos, três placas de haxixe por semana, pelo valor de €100/110 cada, e ainda com frequência e em quantidade não concretamente apuradas, Speed, a €15 o grama, MDMA, a 25€/30€ o grama, erva a €10 o grama.
8. O arguido BB, em datas não concretamente apuradas, mas durante o ano de 2014, vendeu ainda (…)
9. Por sua vez, os arguidos AA e II vendiam, 1 placa de canabis (haxixe) por 130€, o grama de MD a cerca de 40€, Speed a cerca de 15€ cada grama, liamba entre 7,5€ e 10€, cada grama (valores médios);
10. E o arguido AA ainda cocaína, por número não concretamente apurado de vezes a €40 e €50, a pedra.
11. Na verdade estes arguidos AA e companheira II, desde, data não concretamente apurada, o primeiro desde -pelo menos - do Verão de 2013 e a segunda, pelo menos com início em 2014, até 20 de Outubro de 2014, data em que foram detidos, dedicaram-se à venda dos identificados produtos estupefacientes, a consumidores/traficantes interessados, primeiramente o arguido AA na residência de sua mãe, em ..., depois ambos na residência comum sita em ..., bem como nas imediações dos locais que a seguir se descriminarão, utilizando para o efeito a viatura de matrícula ...-PZ, VW Golf cinza, a saber: Do concelho de...; parque do ... e parque radical, em ...; biblioteca municipal, em ... campo de futebol, em ...; jardim próximo das bombas de combustível da BP, em ...; Rua ...; Igrejas de...;
12. Nos cafés: "...", em ...; "...", em ...; "...", em ..., ...; restaurante "...", em ...;
13. No concelho de ...; Pastelaria "...", em ...; café "...", em ...; café em ...; Banco ...;
14. No concelho de ....
15. Durante o apontado período e locais, na maioria das vezes mediante contacto prévio para os respectivos telemóveis, os arguidos AA e II, providenciando o primeiro pela maior parte dos contactos e entregas, venderam, designadamente, e pelo menos a:
i. NN, na semana anterior à detenção, por duas vezes, dois gramas de erva, pelo valor de 15 euros;
ii. OO, cerca de três meses antes da respectiva detenção, na residência de ..., em média €5/€10 por semana de haxixe e uma das vezes uma placa da mesma substância;
iii. PP, durante o ano que antecedeu a detenção, por número de vezes e quantidades não concretamente apuradas, em casa, ..., €5/€10 de haxixe e também MDMA e Speed;
iv. QQ, por número de vezes não concretamente apurados de vezes nos anos de 2013 e 2014, pelo menos uma vez por semana €10 de haxixe, sendo que ao namorado desta pelo menos por três vezes
v. RR, por número não determinado de vezes, entre 2013 e 2014, haxixe €10 a €20 por semana e uma das ervas erva, estupefaciente que entregava na habitação de ... e ainda junto à Igreja da mesma freguesia, altura em que se faziam transportar no identificado WV Golf;
vi. SS, por número não determinado de vezes, nos anos de 2013 e 2014, inicialmente só haxixe, entre €5 a €20 por semana, essencialmente na sua residência e também em menor número de vezes cocaína a €40, €50 a pedra;
vii. TT, por número não determinado de vezes haxixe, erva e speed (esta ao fim-de-semana), pelo menos duas vezes por semana, na casa de ... e algumas vezes noutros dos supra identificados locais do concelho de ..., altura em que se faziam transportar no referido WV;
viii. UU, pelo menos por quatro vezes €5/€10 de haxixe de cada vez, no período de dois meses do ano de 2014, na respectiva casa em Galegos;
ix. VV, em data não concretamente apurada, do indicado período, duas placas de haxixe, a €100 cada;
x- XX: durante dois anos, na respectiva habitação, pelo menos €5 de haxixe por semana, e por número não determinado de vezes €10 e €15 de speed;
xi. YY, cerca de 1 ano, por referência à detenção dos arguidos, pelo menos duas vezes por semana, €10 de haxixe, na casa de ...;
xii. ZZ, durante pelo menos um ano entre o último trimestre de 2013 e o ano de 2014, €5 a €10 de haxixe por semana, na casa de ...;
xiii. AAA, desde que passaram a habitar em ..., entre Dezembro de 2013 até pelo menos Setembro de 2014, pelo menos por 20 vezes, €5 de haxixe, e pelo menos por uma vez erva no valor de €10, o que ocorria na casa de ...;
xiv. BBB, desde o início de 2014, até um mês antes da detenção, por número não determinado de vezes €10 ou €20 de haxixe, e por uma vez Vs placa do mesmo produto, pela quantia de €75, junto da habitação sita em ..., na habitação e junto à igreja da mesma freguesia, no que se fizeram transportar no identificado veículo VW;
xv. CCC, pelo menos durante o ano de 2014, por número de vezes e em quantidades não concretamente apuradas, em casa, ..., haxixe, erva, speed e MDMA;
xvi. DDD, desde Outubro de 2013 até à respectiva detenção pelo menos €10 de haxixe por semana junto à respectiva casa e às bombas de combustível de ...
xvii. EEE, entre Janeiro e Julho de 2014, pelo menos por quinze vezes, €5/€10 de haxixe, junto da habitação de ...;
xviii. FFF, por número não determinado de vezes no ano de 2014 até à respectiva detenção, haxixe, erva, MDMA, speed, no valor global de €100, por mês;
xix. GGG, em datas não concretamente apuradas entre 2013 e 2014, pelo menos cinco vezes, em casa, ..., €10/€15 de haxixe.
xx. HHH, em datas não concretamente apuradas do ano de 2014, em casa, ..., haxixe em quantidade e valor também não apurados
xxi. III, de Maio a Setembro de 2014, duas vezes por semana, €5 de haxixe, junto da habitação de ...;
xxii. JJJ, no ano de 2014, por número não concretizado de vezes, €5 de haxixe por semana e por uma vez 1/2 placa do mesmo produto e uma vez por mês €10a€15de speed.
xxiii. LLL entre Outubro de 2013 e a data da detenção, €10 a €20 de haxixe e €10 de erva, por semana e por uma vez placa de haxixe pelo valor de €70, o que levou a efeito em casa e nos Cafés ... e ...;
xxiv. MMM, em datas não concretamente apuradas dos anos de 2013 e 2014, e por número indeterminado de vezes €5 e €10 de haxixe e erva;
xxv. NNN, poucos meses antes da detenção, junto ao Parque de ... uma pica de haxixe, pelo valor de €100;
xxvi. OOO, no período de um ano que antecedeu a detenção, pelo menos duas vezes por semana, €10 a €20 de haxixe, em casa e uma das vezes junto à Igreja de ..., altura em que se fizeram transportar no referido VW golf;
xxvii. PPP, por número não determinado de vezes entre o Verão de 2013 e o Verão de 2014, inicialmente €10 de haxixe de cada vez e posteriormente o mesmo estupefaciente em placas, em número não inferior a 3, o que foi levado a efeito junto à biblioteca de ..., no ..., onde se faziam transportar no identificado WV Golf e também na respectiva habitação:
xxviii. QQQ, pelo menos durante os quatro meses que precederam a detenção e quatro vezes por mês, €5 a €10 de haxixe, na respectiva residência.
xxix. RRR, em datas não concretamente apuradas entre o ano de 2013 e dois meses antes da detenção, pelo menos por três vezes, €10/€20/€30 de haxixe, duas vezes em casa e por uma vez no Café ..., para o que se fizeram transportar no aludido WV;
xxx. SSS, entre o Natal de 2013 e a detenção, pelo menos uma vez por semana €5 a €10 de haxixe e/ou erva, habitualmente na respectiva residência, por uma vez junto ã Igreja de ... e uma outra na ..., locais para os quais se fizeram transportar na mesma viatura;
xxxi. TTT, entre 2013 e 2014, ainda o arguido AA morava em ... e depois também em ..., pelo menos uma vez por mês, quantidade não concretamente apurada de haxixe e erva
xxxii. UUU, em 2014, por número não concretamente apurado de vezes, €10 de haxixe em casa e pelo menos uma vez junto ao Banco ..., local para onde se deslocavam no veículo VW supra identificado;
xxxiii. VVV, pelo menos em 2014, por número de vezes e quantidades não concretamente apuradas, haxixe, erva, MDMA e Speed, em casa, ... e no "...", na mesma localidade;
xxxiv. XXX, desde data não concretamente apurada de 2014, até à detenção, em casa ou junto desta, por número não concretamente apurado de vezes, mas pelo menos uma vez por mês, €5 a €10 de haxixe e com menos frequência, erva;
xxxv. YYY, desde 2014 até à detenção, pelo menos três vezes por mês €10 de haxixe na respectiva casa em ...,
xxxvi. ZZZ, entre 2013 e 2014, ainda o arguido AA morava em ... e depois também em ..., pelo menos €20 de haxixe, por mês;
xxxvii. AAAA entre pelo menos 2013 e Outubro de 2014, ainda o arguido AA morava em ... e depois também em ..., em número e quantidades não concretamente apuradas, haxixe, speed, e erva;
xxxviii. BBBB pelo menos no ano de 2014, em casa ..., por número de vezes e em quantidades não concretamente apuradas, entre €5 a €10 de haxixe.
xxxix. CCCC, entre 2013 e 2014, até período próximo da detenção, com início ainda o arguido AA morava em ... e depois também em ..., pelo menos €10 de haxixe, duas vezes por semana e MDMA e Speed, de dois em dois meses;
xl. DDDD, entre finais de 2013 até à detenção, em casa, ..., pelo menos uma vez por mês €10/€20 de haxixe.
xli. EEEE, em datas não concretamente apuradas do ano de 2014, em casa,..., e por número de vezes não determinado, mas não inferior a seis, entre €7,50 e €10 de haxixe
xlii. FFFF, desde data não apurada de 2013 até à detenção, em casa, pelo menos duas vezes por semana, €10/€15 de haxixe, uma das vezes VQ. placa do mesmo estupefaciente e por vezes 1 grama de erva a €10;
xliii. GGGG, desde o início de 2014 até à detenção, com uma frequência mínima de uma vez por semana, em casa, em ..., diversas quantidades de haxixe, entre €10 e €50 e por vezes Va e 1 placa e MD;
xliv. HHHH, com inicio pelo menos um ano antes da detenção, uma vez por semana €10 de haxixe, em casa, ... e por uma vez no Campo de Futebol de ..., local para o qual os arguidos se fizeram transportar no aludido VW.
xlv. IIII, desde início de 2014, até à respectiva detenção, em casa ..., pelo menos 4 vezes por semana, €10 de haxixe e Erva;
xlvi. JJJJ, desde pelo menos 2014 até duas semanas antes da detenção, em casa, em ..., pelo menos três vezes por semana, €10/€20 de haxixe, por uma vez uma placa pelo valor de €130 e esporadicamente 1 grama de erva a €10;
xlvii. LLLL, desde Abril de 2014, até à detenção, €10/€20 de haxixe por semana, em casa,...;
xlviii. MMMM, desde data não concretamente apurada de 2014, até à detenção, €5 de haxixe por semana, em casa, ...;
xlix. NNNN, no período de um ano que antecedeu a detenção, uma vez por semana, €10/€15 de erva e €10/€20 de haxixe, em casa, ....
l. OOOO em 9 de Outubro de 2014, junto ao ..., pelo menos €40 de haxixe, fazendo-se os arguidos transportar na viatura VW.
li. PPPP, em datas não concretamente apuradas do ano e 2014, mas pelo menos por cinco vezes, €5 de haxixe de cada vez.
16. O arguido AA era também fornecedor de produtos estupefacientes aos arguidos DD e FF.
17. Os arguidos GG e JJ, por seu turno tendo utilizado para o efeito, o veículo de matrícula ...-TO, Audi A3, colaboravam nas vendas de estupefacientes por parte de AA e II, desde Maio e Julho de 2014, respectivamente, sendo que o segundo levava também consumidores para que adquirissem estupefaciente que chegou a transportar na viatura ...-NV, Fiat Punto, cor preta, para a residência destes.
18. No âmbito da referida colaboração, em data não concretamente apurada do Verão de 2014 (Julho e Agosto), JJ, no interior da residência dos arguidos AA e II, entregou a RRRR haxixe a troco de €5 que recebeu;
19. O mesmo arguido JJ, no mesmo local e circunstâncias temporais, entregou por uma vez haxixe a QQQ. a troco de €5;
20. E da mesma forma entregou a TTT, haxixe a troco de €10;
21. Também no Verão (Agosto de 2014), e no sobredito circunstancialismo, quando os arguidos AA e II se encontravam de férias, o arguido JJ, que se encontrava na casa daqueles, entregou haxixe a IIII, a troco de € 10
22. O arguido GG por seu turno, em data não concretamente apurada do ano de 2014, e em idênticas circunstâncias entregou haxixe a DDDD, a troco de €10;
23. E em 2014, pelo menos intermediou por duas vezes a venda de 14 e 10 placas de haxixe, a €115, cada placa.
24. O arguido DD, desde data não concretamente apurada do ano de 2013 a meados de 2014 vendeu canabis em doses de 5€, 10€ e 20€, a toxicodependentes, designadamente, em Paredes e Penafiel.
25. Assim, e em datas não concretamente apuradas mas entre 2013 e 2014, por oito vezes, o arguido DD entregou haxixe pelo menos a SSSS, a troco de €5/€10 de cada vez.
26. E no Verão de 2014 cedeu duas placas de haxixe ao arguido AA, pelo valor de pelo menos €100/cada.
27. O arguido FF, por número não concretamente apurado de vezes, mas não inferiores às a seguir descritas, entre Outubro de 2011 e Outubro de 2014, vendeu (…)
28. Os arguidos LL e MM, residentes desde 1 de Setembro de 2014 na habitação situada por cima da residência de AA e II, colaboraram com estes na venda de produtos estupefacientes por número não concretizado de vezes (desde a referida data até 20 de Outubro de 2014), tendo pelo menos por uma ocasião entregue haxixe, a troco de €20, em ..., o que a arguida MM, após ter sido contactada para o efeito pelo companheiro, fez conduzindo o veículo Opel Corsa, matrícula ...-IV.
29. A arguida TTTT, no dia 20.10.14, cerca das 21h45m, acompanhada da arguida II, após se TER deslocado à habitação do arguido BB, sita na rua ..., trouxe consigo, no bolso, uma placa de haxixe com o peso bruto de 98,70grs de haxixe, destinava também à venda a terceiros.
30. No dia 30 de Maio de 2014, no desenrolar de uma operação de fiscalização efectuada pelo Posto da GNR de ..., o arguido AA, que se encontrava acompanhado do arguido JJ, aquele detinha canabis (sumidades), MDMA, canabis resina e cocaína; 7 (sete) notas de vinte euros do banco central europeu, perfazendo a quantia monetária de 140€ (cento e quarenta euros).
31. Os arguidos utilizaram, nos contactos entre si e com toxicodependentes, os seguintes telemóveis e cartões telefónicos: a arguida CC: ...;
32. O arguido AA;
64293040 cartão telefónico ...
64293050 telemóvel IMEI ...
64851040 cartão telefónico ...
64851050 telemóvel IMEI ...
65360040 cartão telefónico ...
65360050 telemóvel IMEI ...
65696040 cartão telefónico ...
65696050 telemóvel IMEI ...
66649040 cartão telefónico ...
66649050 telemóvel IMEI ...
67227040 cartão telefónico ...
67227050 telemóvel IMEI ...
67790040 cartão telefónico ...;
33. A arguida HH (…)
34. No dia 20 de Outubro de 2014, na habitação dos arguidos BB, HH e CC, sita na Rua ... encontravam-se (…)
35. Na mesma data, na habitação dos arguidos AA e II, sita ... no quarto: - Um canivete de cor azul, com a inscrição "Cervejaria o Leão", com resíduos de Pólen de Haxixe;-arrecadação com frigorífico: - Um recipiente de cor amarela, em plástico, onde já esteve acondicionado canabis; Um recipiente de cor branco, em plástico, onde já esteve acondicionado canabis; -cozinha da habitação: - Um saco de plástico de cor preto, o qual contém no seu interior um pedaço de plástico de cor verde, acondicionando Bicarbonato de Sódio, com peso bruto de 272.4 gramas; - Um telemóvel da marca Nokia, de cor preto, modelo X2, com o IMEI n.° ..., sem cartão de operadora e sem carregador; - Uma balança digital da marca MS-100 de lOOgxO.O1g, com vestígios de Cannabis; - Uma nota de 10€, (dez euros) do Banco Central Europeu; - Dois cartões verdes, com inscrição de "máquina de folha", com manuscritos de valores e nomes diversos; - Uma faca de cozinha, com cabo em plástico de cor azul e lâmina com cerca de 19.7 cm, com vestígios de canabis; - Um rolo de papel celofane; - Um frasco em vidro com tampa de plástico de cor cinzento e azul, contendo, 9,8 grs de canabis; - Um telemóvel da marca Alcatel de cor preto, modelo 1042X, com o IMEI n.° ..., com cartão da Vodafone com o número ..., com o PIN 2908, sem carregador; - Um almofariz contendo no seu interior resíduos de canabis.
36. Na habitação dos arguidos LL e MM, sita Rua ...; No quarto: (…)
37. Nos veículos dos arguidos LL e MM (…)
38. Ao arguido JJ, (…)
39. Na habitação do arguido FF, (…)
40. Na habitação do arguido GG (…)
41. Ao arguido DD foi-lhe aprendido: (…)
42. Nos períodos de tempo antes aludidos, os arguidos venderam os descritos produtos estupefacientes, por um número indeterminado de vezes a diversos consumidores de tais produtos que o destinaram ao gasto pessoal, sobretudo nas localidades de ... e ....
43. O produto estupefaciente efectivamente apreendido ao arguido GG (…)
44. O produto estupefaciente efectivamente apreendido aos arguidos AA e II na respectiva residência, determinada a substância activa e grau de pureza era Cannabis (Resina), que dava para 14 doses de cannabis (sumidades) que equivalia a 18 doses.
45. Os arguidos não possuíam qualquer permissão legal para levar a cabo condutas como as supra descritas e conheciam bem as características dos produtos estupefacientes que adquiriam, detinham e vendiam, sabendo que qualquer daquelas actividades era proibida, destinando, mesmo assim, tais substâncias à venda aos consumidores que os procurassem com essa finalidade.
46. Todos os arguidos se dedicaram a tal actividade com o único propósito de conseguirem lucros e de obterem proventos, conforme obtiveram, com a venda dos referidos produtos, pelo menos às identificadas pessoas.
47. Os arguidos agiram sempre com o único intuito concretizado de obter vantagens patrimoniais e desejando tal objectivo, conhecendo as características dos produtos que vendiam, bem assim como os efeitos nefastos que os mesmos provocam nos seus consumidores.
48. Todos os arguidos sabiam dos malefícios que as substâncias em causa provocam na saúde dos cidadãos que as adquiriam e destinavam a consumo próprio, mas apesar disso não se coibiram de actuar da forma descrita.
49. Actuaram sempre livre, voluntária e conscientemente, bem sabendo que o comércio, detenção ou cedência de tais substâncias são condutas proibidas e sancionadas por lei.
Das condições sociais e económicas dos arguidos.
50. O arguido BB (…)
87. CC (…)
99. HH (…)
112. 0 processo de desenvolvimento e socialização do arguido AA decorreu junto da família de origem, pais e 3 irmãos mais velhos.
113. 0 grupo familiar apresentava uma situação económica difícil, atentos os parcos rendimentos auferidos pelo pai, único elemento laboralmente activo, enquanto operário da construção civil.
114. A dinâmica da família foi fortemente marcada pelos hábitos alcoólicos do pai, figura agressiva e mal tratante para com todos os elementos da família.
115. Apesar desse ambiente familiar, o arguido evoca a existência de laços de afecto, sobretudo com a mãe, com quem passou a viver sozinho após o falecimento do pai, contava 13/14 anos de idade.
116. AA frequentou a escolaridade até ao 9º ano, que não concluiu. Até ao 8º ano conservou um percurso regular, situação que se inverteu no 9º ano, passando a assumir comportamentos desajustados para com colegas, em contexto de sala de aula, merecendo várias sanções disciplinares e elevado nível de absentismo.
117. Abandonou a escola por sua iniciativa, no início do 3º período.
118. Deu preferência pelo início de actividade laboral e pelos 15 anos de idade coadjuvou a mãe, no exercício de tarefas agrícolas, que a mesma executava como meio de subsistência.
119. Pelos 16 anos foi trabalhar para um talho, no Porto, onde permaneceu durante 8 meses. Conseguiu posteriormente trabalho num outro estabelecimento comercial do mesmo ramo de actividade, mas em Paredes, onde permaneceu por mais 1 ano.
120. Mais tarde, e na perspectiva de obter melhores condições remuneratórias foi trabalhar para outro talho, em ..., e onde trabalhou pelo período de 2/3 anos.
121. Do seu percurso laboral consta ainda uma curta experiência de trabalho, em regime de biscates, numa serralharia, e mais tarde numa empresa de infra-estruturas eléctricas, onde esteve cerca de 1 ano e da qual veio a abandonar devido às constantes deslocações dentro e fora e do pais.
122. Voltou a conseguir trabalho num talho, em ...onde trabalhou até Maio/2013.
123. AA iniciou consumos de haxixe pelos 17/18 anos de idade, inicialmente com carácter pontual e associados a momentos de diversão e lazer, junto de grupo de pares, numa fase posterior e mais recente de forma regular.
124. 0 arguido desvaloriza esta adição como problemática e/ou condicionante do seu bem-estar físico e psíquico.
125. 0 arguido, aos 21 anos, constitui uma relação de facto com II, co-arguida nos presentes autos e desta relação nasceram dois descendentes, actualmente com 5 anos e 4 anos de idade.
126. 0 grupo familiar conseguiu reunir condições económicas, por via do exercício laboral por parte de ambos os elementos do casal, o arguido a exercer funções como talhante e a companheira como operária têxtil, o que lhes permitiu garantir a sua autonomização, arrendando espaço habitacional em ....
127. Na sequência de conflitos entre o casal, em altura não concretamente apurada do ano de 2012, deu-se a ruptura da relação e o regresso de ambos aos respectivos agregados de origem, situação que se manteve até início de 2013.
128. AA e a companheira, coarguida no presente processo, retomaram a relação marital no início de 2013, passando então o casal e restante família constituída, a viver autonomizada, sita na Rua ..., num imóvel arrendado pelo casal.
129. Numa fase inicial, ainda foi possível honrar os compromissos financeiros, garantindo o pagamento da renda de casa, crédito bancário para aquisição de automóvel, e as despesas correntes da família, uma vez que o casal mantinha o exercício laboral regular.
130. Todavia, AA, em Maio de 2013, optou por enjeitar a manutenção do seu posto de trabalho no talho, em ..., por se opor à manutenção duma situação laboral sem vínculo contratual, precária, sem direito a férias e sem regularização na Segurança Social.
131. A companheira, pouco tempo depois, também ficou inactiva, pelo que as condições de vida da família alteraram-se significativamente, passando a apresentar dificuldades em assumir as suas obrigações financeiras.
132. AA constituiu, há cerca de 4 anos, círculo de sociabilidade do qual faziam parte os co-arguidos nos presentes autos. Juntos frequentavam locais de diversão e cafés na sua zona de residência e eram visita de sua casa.
133. No meio de residência, em ..., é do conhecimento público a sua actual situação jurídico-penal, bem como os factos que lhe estão subjacentes, não tendo passado despercebido a acção policial à data da sua detenção.
134. Não obstante a censura dos comportamentos de que vem acusado, não foram percepcionados sentimentos de animosidade em relação a ele, dada a relação cordial que estabelecia na interacção com os residentes.
135. Em contexto prisional tem tido o apoio da mãe através de visitas pontuais, esta familiar verbaliza total disponibilidade em acolhê-lo em meio livre e a garantir lhe os meios de subsistência, no entanto é muito precária a sua situação económica, sendo seu único rendimento a pensão de sobrevivência que aufere, de 175€.
136. A mãe reside na ..., numa casa térrea em mau estado de conservação, inserida num meio tipicamente rural.
137. AA entende como oportuno aceitar o acolhimento e apoio da mãe, pelo tempo necessário à conquista de meios de autonomização, que lhe permitam reunir novamente a família constituída, já que, apesar de haver por parte do casal vontade em recuperar a união de facto, neste momento o arguido não reúne a aprovação para integrar o núcleo familiar de origem da companheira, onde esta e filhos do casal estão acolhidos, nem a companheira aceita a sua mudança para casa da mãe do arguido.
138. Do contacto com CCCC proprietário da empresa de fibra óptica e telecomunicações "...", com sede na Freguesia de ..., resultou a informação que AA tem assegurado colocação profissional quando restituído à liberdade.
139. No meio social de residência da mãe, não foram auscultados sentimentos de rejeição à sua presença, apesar de ser do conhecimento de alguns moradores a actual situação jurídico-penal e factos que lhe estão subjacentes.
140. Sinalizam o arguido como um individuo trabalhador, educado e socialmente bem integrado.
141. Quanto à natureza dos factos pelos quais vem acusado nos presentes autos, AA diz perceber a ilicitude dos mesmos, embora, tenda a minimizar a gravidade e o impacto que este tipo de comportamento causa na sociedade em geral, apontando como principais responsáveis pelo fenómeno do narcotráfico os consumidores.
142. 0 arguido verbaliza preocupação face a uma eventual condenação.
143. 0 arguido sente com especial penosidade o impacto negativo que a actual situação jurídico-penal e prisional causou a si próprio, ao nível emocional pelo afastamento dos filhos e companheira, e em termos mais abrangentes, por não ter conseguido recuperar o seu estatuto social e económico, como era sua vontade.
144. No E.P. Porto, AA tem sabido adequar o seu comportamento às regras instituídas e tem encetado acções com vista ao desenvolvimento de competências pessoais e sociais, aproveitando os recursos e oportunidades existentes em contexto prisional.
145. Frequentou no ano transacto curso de teatro, de pastelaria e padaria, formações de curta duração pelas quais manifestou interesse.
146. No corrente ano lectivo frequenta curso EFA B3 "Curso de Formação de Adultos" com equivalência ao 9º ano de escolaridade.
147. Da trajectória de vida de AA há a ressaltar a sua baixa motivação pela prossecução dum projecto escolar em idade própria, todavia, ao nível profissional assumiu uma atitude pró-activa, atitude que continua a revelar em contexto prisional, valorizando a sua formação escolar/profissional como forma de melhorar os recursos pessoais.
148. Apesar de nunca se ter envolvido ou integrado actividades de lazer estruturadas e pró-sociais, que lhe promovessem o sentido de responsabilidade social, assumiu ao longo da sua vida uma adequada interacção social.
149. Nos últimos anos envolveu-se no consumo regular de haxixe, facto que lhe facilitou o contacto com contextos sociais marginais e especialmente associados ao narcotráfico.
150. Em meio livre dispõe de suporte familiar junto da mãe, pelo período necessário à sua autonomização, altura em que pretende agregar a sua família constituída.
151. Beneficia também de enquadramento laboral, factor de protecção no seu processo de reinserção social, no sentido da conquista de meios próprios de subsistência, invertendo assim, a condição que conservava á data dos factos pelos quais está acusado.
152. Pelo exposto e em caso de condenação, consideram estes serviços, que o processo de reinserção social de AA deverá incidir particularmente na devida interiorização do desvalor da sua conduta, no seu afastamento de contextos sociais marginais e especialmente associados ao narcotráfico, bem como no investimento de um projecto laboral consistente e regular que lhe permita garantir as condições necessárias à sua autonomização responsável.
153. A arguida II nasceu em ..., no seio de um agregado familiar de modesta condição económica, composto pelos pais e três irmãos, sendo a mais velha.
154. 0 pai, único elemento activo, a trabalhar numa empresa de construção de redes de distribuição de electricidade e de telecomunicações, onde se mantém, sendo a mãe doméstica,
155. A dinâmica familiar é caracterizada pelos níveis de coesão e afectividade entre os elementos.
156. 0 percurso escolar de II iniciou-se em idade normal, tendo concluído o 7º ano de escolaridade, com cerca de 15/16 anos, altura em que abandonou o sistema de ensino, pela falta de motivação pelos conteúdos escolares.
157. Aos 16 anos iniciou-se profissionalmente no sector têxtil, com funções de costureira, actividade que exerceu de forma regular até 2010, altura em que se confrontou com situação de desemprego.
158. Beneficiou do respectivo subsídio de desemprego durante dois anos.
159. Neste período, frequentou um curso de formação profissional de assistente administrativa, com equivalência ao 9º ano.
160. Posteriormente, em 2012, retomou actividade laboral no sector têxtil, actividade que exerceu até meados de 2013, altura em que ocorreu o fecho da empresa, mantendo-se desde então inactiva.
161. II reporta o início do consumo de haxixe aos 16 anos, ainda que de forma esporádica.
162. Em meio prisional a arguida integrou o programa antidrogas, durante três meses, assumindo-se desde então, abstinente.
163. Em 2010 II estabeleceu relacionamento afectivo com o actual companheiro, seu co-arguido, actualmente preso do Estabelecimento Prisional do ..., com quem passou a viver em união de facto, existindo deste relacionamento dois filhos de 5 e 4 anos,
164. Numa fase inicial, o casal passou a residir numa habitação arrendada, em ..., a que se seguiram outras residências em diferentes lugares.
165. A dinâmica conjugal foi descrita como instável, tendo o casal permanecido separado durante cerca de 1 ano, ocorrendo posteriormente a reconciliação.
166. No período a que se referem os factos, II coabitava com o companheiro e os dois filhos menores.
167. Residiam numa habitação arrendada, dispondo de condições mínimas de habitabilidade, situada na freguesia de ...
168. A nível laboral, encontrava-se sem qualquer atividade estruturada desde 2013. O seu quotidiano era passado em função dos deveres parentais e das actividades domésticas, privilegiando no seu tempo livre o convívio com o companheiro e com o grupo de pares, alguns deles com condutas anti-sociais e associados a actividades ilícitas.
169. A sustentabilidade do agregado era assegurada pela prestação social de crianças e jovens, relativa aos menores, no valor de 71€ e pelo do auxílio prestado pelos pais, designadamente através da atribuição de géneros alimentares.
170. As despesas fixas mais significativas do agregado eram as relativas ao pagamento da renda da habitação, no valor de 125€ mensais, bem como as despesas de manutenção, designadamente energia eléctrica, no valor de 100€/mês.
171. A arguida assume, nesta altura, o consumo de haxixe, ainda que de forma ocasional e apenas em contexto de convívio com grupo de pares com os mesmos hábitos.
172. Actualmente, a subsistência da arguida e dos filhos é assegurada pelos pais desta, nomeadamente pelos rendimentos auferidos pelo seu pai e pela prestação familiar de crianças e jovens, num valor total aproximado de 1 025 €.
173. Os pais mostram-se solidários e disponíveis para colaborar no processo de ressocialização da arguida.
174. Relativamente aos seus projectos de vida, II apresenta a perspectiva de trabalhar na Associação para o Desenvolvimento de ....
175. Em contacto telefónico estabelecido com o responsável da referida instituição, este manifestou receptividade em colaborar no processo de reinserção profissional da arguida.
176. Na eventualidade de condenação, a arguida manifesta adesão a uma medida de execução na comunidade.
177. II vivencia o presente processo com angústia e preocupação, principalmente pelas eventuais consequências que dele possam advir e que possam condicionar o acompanhamento dos descendentes.
178. Quanto aos factos pelos quais está acusada, a arguida formula, em abstracto, juízo crítico de censura, considerando-os de carácter gravoso e reconhecendo a sua ilicitude, bem como eventuais danos nas vítimas.
179. 0 presente processo teve implicações na sua vida pessoal, decorrente da aplicação da medida de coacção de prisão preventiva e, posteriormente, obrigação de permanência na habitação, com vigilância electrónica.
180. No período de execução já decorrido, II manteve uma conduta globalmente consentânea com os deveres que sobre si recaem, para a qual contribuiu o apoio de que beneficia por parte do agregado de origem.
181. No processo de desenvolvimento de II destaca-se a integração em agregado familiar aparentemente normativo e de humilde condição socioeconómica, enquadramento que contribuiu para uma aquisição regular de competências pessoais e profissionais, até à data em que se confrontou com a situação de desemprego.
182. 0 apoio familiar de que beneficia tem-se constituído como um suporte estruturante do seu quotidiano e poder-se-á apresentar como um factor de suporte para o seu processo de ressocialização.
183. 0 processo de socialização de QQQQ (…).”
Não se regista qualquer condenação pretérita do recorrente.
B - RECURSO
O arguido concluiu assim a motivação do seu recurso:
"1. O Recorrente foi condenado a uma pena de prisão de 5 (cinco) anos e 6 (seis) meses de prisão pela prática de um crime de tráfico, p. p. pelo artigo 21.º , n, 1, do Decreto-Lei n.° 15/93, de 22 de Janeiro.
2. Porém, os factos carreados aos autos apontam para a prática, pelo Recorrente, de 1 (um) crime de tráfico de menor gravidade, p. e p. pelo art. 25.º, alínea a), do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro.
3. O artigo 25.º do aludido diploma legal refere-se ao tráfico de menor gravidade, fundamentado na diminuição considerável da ilicitude do facto revelada pela valoração em conjunto dos diversos factores, alguns deles enumerados na norma, a título exemplificativo (meios utilizados, modalidade e circunstâncias da acção, qualidade e quantidade das plantas, substâncias ou preparados).
4. A diminuição da ilicitude que o tráfico de menor gravidade pressupõe resulta, assim, de uma avaliação global da situação de facto, atenta a qualidade ou a quantidade do produto, os meios utilizados, a modalidade ou as circunstâncias da acção.
5. No caso sub judice, o Recorrente vendia produtos estupefacientes directamente ao consumidor final.
6 Actuando sempre de forma básica e elementar, sem auxílio de quaisquer meios sofisticados e sem preocupação com o facto da vizinhança saber de tal facto.
7. E pese embora o número elevado de consumidores finais, a verdade é que a forma de venda, (a rua, e a casa do Arguido/Recorrente) e os meios utilizados denunciam um traficante menor e sem qualquer esquema de dissimulação da sua actividade.
8. Da quantidade de produtos estupefacientes apreendidos nos autos, bem como a falta de sofisticação dos meios utilizados pelo Recorrente na venda de pequenas doses de produtos estupefacientes aos consumidores finais, arriscando a ser detectado pelos agentes policiais, conforme veio a acorrer, é notório que estamos perante um pequeno traficante de rua.
9. O grau de ilicitude é, no caso concreto, pequeno, pois, no quadro de um tráfico comum, a quantidade que detinha de produto não era elevada, os proventos também não o eram (nesse quadro), os meios usados eram rudimentares e o Recorrente fazia a venda "a retalho", sem usar intermediários.
10. A forma de actuação do Recorrente aliada à sua toxicodependência e à quantidade de produto estupefaciente apreendido, permite-nos concluir que estamos perante uma situação de pequeno tráfico completamente distinta da do grande tráfico, razão pela qual a actuação do Recorrente deveria ter sido enquadrada no previsto no artigo 25.a, alínea a), do Decreto-Lei n." 15/93, de 22 de Janeiro.
11. De facto, resulta dos autos, designadamente do Acórdão nos pontos 133 e 134, (resultante do relatório social), que apesar da actividade do aqui Arguido/Recorrente o mesmo é visto pela comunidade onde reside como um indivíduo trabalhador e cordial "(...) 133. No meio de residência, em ..., é do conhecimento público a sua actual situação jurídico-penal, bem como os factos que lhe estão subjacentes, não tendo passado despercebido a acção policial à data da sua detenção. 134. Não obstante a censura dos comportamentos de que vem acusado, não foram percepcionados sentimentos de animosidade em relação a ele, dada a relação cordial que estabelecia na interacção com os residentes."
12. Ao decidir diferentemente o Tribunal a quo violou o disposto no artigo 25.º, alínea a), do Decreto-Lei n." 15/93, de 22 de Janeiro.
13. Os factos provados devem ser qualificados no crime de tráfico de menor gravidade, p. e p. pelo artigo 25.°, alínea a), do Decreto-Lei n.° 15/93, de 22 de Janeiro, e não no crime porque foi o Recorrente condenado.
14. Consequentemente, a pena a aplicar ao Recorrente não deverá ultrapassar os 5 (cinco) anos de prisão, atento o limite máximo da pena aplicável previsto no artigo 25.°, alínea a), do Decreto-Lei n.° 15/93, de 22 de Janeiro, e deverá ser suspensa nos termos do previsto no artigo 50.º do Código Penal (CP).
15. Este preceito consagra agora um poder-dever, ou seja um poder vinculado do julgador, que terá que decretar a suspensão da execução da pena, na modalidade que se afigurar mais conveniente para a realização daquelas finalidades, sempre que se verifiquem os necessários pressupostos.
16. O juízo de prognose favorável ao comportamento futuro do arguido pode assentar numa expectativa razoável de que a simples ameaça da pena de prisão será suficiente para realizar as finalidades da punição e consequentemente a ressocialização (em liberdade) do arguido.
17. A suspensão da execução da pena deverá ter na sua base uma prognose social favorável ao arguido, a esperança de que este sentirá a sua condenação como uma advertência e que não cometerá no futuro nenhum crime.
18. No presente caso é, na actual fase da vida do Recorrente, possível a formulação de um juízo de prognose favorável no sentido de que a simples censura dos factos e a ameaça de regressar à prisão realizariam de forma adequada as finalidades da punição.
19. O Recorrente, em julgamento, confessou de forma livre, voluntária, integral e sem reservas os factos pelos quais vinha acusado, fez uma autocrítica da sua conduta e demonstrou arrependimento.
20. Declarou de forma sincera e credível ter-se envolvido nesta situação por se encontrar desempregado, sem qualquer apoio familiar e social e desesperado economicamente, (cf. Relatório Social do Recorrente a fls. dos autos).
21. Como se nota na fundamentação do Acórdão, o Recorrente tem uma história pessoal difícil, marcada por precariedade económica, insucesso escolar, irregularidade laboral, desemprego, consumo de estupefacientes e instabilidade emocional e afectiva (pontos 112 a 152 do Acórdão).
22. O Recorrente é uma pessoa jovem.
23. Está absolutamente arrependido.
24. Nunca esteve privado da sua liberdade, a não ser por conta do processo dos autos, encontrando-se detido desde Outubro de 2014.
25. É hoje uma pessoa mais madura e segura dos seus actos.
26. Perspectiva retomar o projecto de vida, com a reintegração no agregado familiar, com a sua companheira e os filhos menores de idade, e o exercício laboral regular.
27. A manutenção do Recorrente num estabelecimento prisional por longos anos poderá inviabilizar a sua reinserção social, além de contribuir para a sua exclusão social, dado que irá ter problemas acrescidos em integrar-se no mundo laboral, devido à sua baixa escolaridade embora mantenha a promessa de um posto de trabalho numa empresa de fibra óptica, (cfr. os pontos 138 a 145 do acórdão ora em crise).
28. A jovem idade do Recorrente, o facto de ter-se mostrado arrependido, ter apoio familiar, ter projectos de trabalho na empresa "..." e de ter deixado de consumir produtos estupefacientes, permite-nos concluir que é possível estabelecer um juízo de prognose no sentido de que com a simples ameaça da prisão o Recorrente irá manter a sua conduta de acordo com as normas sociais.
29. Sem prescindir do seu livre arbítrio, o Recorrente é um conjunto de idiossincrasias, das quais a sociedade é também responsável.
30. Porém sempre será de referir que o Recorrente, sempre teve um comportamento correcto ao longo da sua vida, sem antecedentes criminais, tendo a sua vida desmoronado nestes últimos anos, fruto da sua adição a estupefacientes, e sem querer eximir o Recorrente das suas responsabilidades, mas o culminar da sua vida nos actos de que vem acusado, terá também que ver com a falta de resposta da sociedade, do ensino regulamentar para situações como a dos autos
31. O Com o devido respeito que é muito, e no caso concreto devido e merecido, o Tribunal a quo não ponderou, nos presentes autos que o Recorrente, já se encontra a cumprir pena de prisão desde 2014, carecendo assim de uma oportunidade, pois o tempo que já permaneceu detido, em muito já o fizerem reflectir e reponderar os seus actos e comportamentos na vida em liberdade.
32. O Recorrente ainda pode considerar-se um adulto com tempo de vida, teve o passado que teve, do qual demonstrou arrependimento, carece de ter um futuro e a possibilidade de recomeçar uma nova vida junto da família, dos filhos pequenos, e companheira, que ainda pretende criar.
33. Em reclusão, em cumprimento de pena tão elevada, para além de ver cortado um futuro e um caminho de rectidão e honestidade que tem pela frente, tomará contacto com a realidade das prisões que poderá vir a ter uma influência perniciosa e contrária aos interesses de reinserção social que o nosso ordenamento institui.
34. A determinação da medida da pena, dentro dos limites definidos na lei, é feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção conforme dispõe o art.° 71.º, n.° 1 do Código Penal. Na determinação concreta da pena devem ponderar-se todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo legal, depuserem a favor ou contra o agente, nomeadamente as referidas no n.° 2 da mesma disposição legal.
35. Porém, salvo o devido respeito e melhor opinião, o Tribunal a quo considerou apenas as circunstâncias que depunham contra o Arguido/Recorrente, não tendo valorado suficientemente as circunstâncias que depunham a favor deste, nomeadamente o facto de o mesmo, a "pedido" do aqui tribunal recorrido, ter prestado declarações, no sentido de auxiliar o mesmo tribunal e pese embora de forma nervosa, respondeu a todas as perguntas que lhe foram colocadas, e sobretudo a circunstância de o Arguido estar convenientemente inserido socialmente, ter modo de vida e não ser portador de antecedentes criminais.
36. O Recorrente tem um passado do qual, até dada altura da sua vida se orgulha, teve exatamente até essa parte da sua vida (concretamente ao ano de 2014), um comportamento conforme ao direito, sem cometer qualquer crime, reconhecendo os actos ilícitos e o crime por si praticado.
37. Ora, sem prescindir a crítica e respectiva impugnação de parte da matéria de facto dada como provada, mormente a forma como relatada na douta sentença do Tribunal "a quo", e conforme supra referimos, o Tribunal ad quem deve assim, salvo melhor entendimento, ter em conta as condições pessoais e sócioeconómicas do Arguido/recorrente.
38. A suspensão da execução da pena de prisão permite manter as condições de sociabilidade próprias à condução da vida, no respeito pelos valores de direito como factores de inclusão, evitando os riscos de fractura social, familiar, laboral e comportamental como factores de exclusão.
39. Assim, a pena a aplicar ao Recorrente deverá ser suspensa na sua execução nos termos do previsto no artigo 50.° do CP.
40. Mantendo-se qualificação dos factos praticados pelo Recorrente no crime de tráfico, p. e p. pelo artigo 21.°, n.° 1, do Decreto-Lei n.° 15/93, de 22 de Janeiro, parece-nos que a pena aplicada ao Recorrente — 5 (cinco) anos e 6 (seis) meses — é deveras exagerada, desproporcional, injusta e ilegal tendo em consideração os factores sociais e pessoais do mesmo e o seu arrependimento.
41. No nosso entendimento, salvo o devido respeito por melhor opinião, na determinação da medida concreta da pena, respeitante ao crime de tráfico de estupefacientes, o Tribunal a quo não fez como devia uma equitativa ponderação.
42. A determinação da medida da pena, dentro dos limites definidos na lei, é feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção.
43. Na determinação da pena, o tribunal atenderá a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, depuserem a favor do agente ou contra ele, considerando nomeadamente o grau de ilicitude do facto, o modo de execução deste e a gravidade das suas consequências, bem como o grau de violação dos deveres impostos ao agente, a intensidade do dolo ou da negligência, os sentimentos manifestados no cometimento do crime e os fins ou motivos que o determinaram, as condições pessoais do agente e a sua situação económica, a conduta anterior ao facto e a posterior a este, especialmente quando esta seja destinada a reparar as consequências do crime, a falta de preparação para manter urna conduta lícita, manifestada no facto, quando essa falta deva ser censurada através da aplicação da pena.
44. Pelas razões supra expostas — a idade do Recorrente, o seu arrependimento sincero, o facto de ter apoio familiar, projectos de trabalho e ter deixado de consumir produtos estupefacientes — deveria ter sido aplicada a atenuação especial da pena prevista no artigo 72.°, n.° 1, e n.° 2, alínea c), do CP.
45. No entanto, o Tribunal a quo, não teve totalmente em consideração tais factos na determinação da medida da pena a aplicar ao arguido, nem os valorou em benefício deste.
46. A pena aplicada pelo douto Tribunal é excessiva, injusta e manifestamente ilegal, violando o disposto no artigo 72.°, n.° 1, e n.° 2, alínea c), e 73.° do CP.
47. Porquanto, foram violados as supra referidas disposições legais e as demais que V. Exas suprirão e os artigos 70.° e 71.° do Código Penal, todos do Código Penal e artigos 205.° e 32.° da Constituição da República Portuguesa.
48. Entende o Recorrente que, mantendo-se a qualificação dos factos provados no crime de tráfico, p. e p. pelo artigo 21.°, n.° 1, alínea a), do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro, deverá ser aplicada ao Recorrente uma pena de prisão que não deverá ser superior a 5 (cinco) anos, a qual, pelas motivos já aduzidos nestas Motivações de Recurso, deverá ser suspensa na sua execução, nos termos do artigo 50.° do CP.
49. A suspensão da execução da pena de prisão permite manter as condições de sociabilidade próprias à condução da vida no respeito pelos valores de direito como factores de inclusão, evitando os riscos de fractura social, familiar, laboral e comportamental como factores de exclusão.
50. Assim, a pena a aplicar ao Recorrente deverá ser suspensa na sua execução nos termos do previsto no artigo 50.° do CP.
51. No nosso entendimento, salvo o devido respeito por melhor opinião, na determinação da medida concreta da pena, respeitante ao crime de tráfico de, o Tribuna! a quo não fez como devia uma equitativa ponderação.
52. O crime de tráfico em que o Recorrente foi condenado é punível com prisão de 4 (quatro) a 12 (doze) anos, cf. artigo 21.°, n.s 1, do Decreto-Lei n.° 15/93, de 22 de Janeiro.
53. A 1.ª instância fixou a pena em 5 (anos) anos e 6 (seis) meses de prisão
54. A determinação da medida da pena, dentro dos limites definidos na lei, é feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção.
55. Na determinação da pena, o tribunal atenderá a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, depuserem a favor do agente ou contra ele, considerando nomeadamente o grau de ilicitude do facto, o modo de execução deste e a gravidade das suas consequências, bem como o grau de violação dos deveres impostos ao agente, a intensidade do dolo ou da negligência, os sentimentos manifestados no cometimento do crime e os fins ou motivos que o determinaram, as condições pessoais do agente e a sua situação económica, a conduta anterior ao facto e a posterior a este, especialmente quando esta seja destinada a reparar as consequências do crime, a falta de preparação para manter uma conduta lícita, manifestada no facto, quando essa falta deva ser censurada através da aplicação da pena.
56. Pelas razões supra expostas — a idade a do Recorrente, ausência de registo criminal, o seu arrependimento sincero, o facto de ter apoio familiar, projectos de trabalho e ter deixado de consumir produtos estupefacientes — deveria ter sido aplicada a atenuação especial da pena prevista no artigo 72.º, n.° 1, e n.° 2, alínea c), do CP.
57. No entanto, o Tribunal a quo, não teve em consideração tais factos na determinação da medida da pena a aplicar ao arguido, nem os valorou em benefício deste.
58. A pena aplicada pelo douto Tribunal é excessiva, injusta e manifestamente ilegal, violando o disposto no artigo 72.°, n.° 1, e n.° 2, alínea c), e 73.° do CP.
59. Entende o Recorrente que, mantendo-se a qualificação dos factos provados no crime de tráfico, p. e p. pelo artigo 21.°, n.° 1, alínea a), do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro, deverá ser aplicada ao Recorrente uma pena de prisão que não deverá ser superior a 5 (cinco) anos, a qual, pelas motivos já aduzidos nestas Motivações de Recurso, deverá ser suspensa na sua execução, nos termos do artigo 50.° do CP.
NESTES TERMOS, e nos melhores de direito, que V/ Exas. Doutamente suprirão, deve o presente recurso ter provimento e, em consequência:
a) Ser revogado o douto Acórdão recorrido, pelo qual foi aplicada ao Recorrente a pena de 5 (cinco) anos e 6 (seis) meses de prisão, pela prática de 1 (um) crime de tráfico, p. e p. pelo artigo 21.°, n.° 1, do Decreto-Lei n.° 15/93, de 22 de Janeiro;
b) Ordenar a sua substituição por outro que condene o Recorrente pela prática de 1 (um) crime de tráfico de menor gravidade, p. e p. pelo artigo 25.°, alínea a), do Decreto-Lei n.° 15/93, de 22 de Janeiro, em pena não superior a 5 (cinco) anos de prisão, a qual deve ser suspensa na sua execução, nos termos do disposto nos artigos 72.°, n.° 1, e n.° 2, alínea c), 73.° e 50.° do CP; ou
c) Caso assim não se entenda, condenar o Recorrente pela prática de 1 (um) crime de trafico, p.e p. pelo artigo 21.º, n.º 1 de Decreto-Lei, n.º 15/93, de 22 de Janeiro, em pena não superior a 5 (cinco) anos de prisão, a qual deve ser suspensa na sua execução, nos termos do disposto nos artigos 72.°, n.º 1,e n.° 2, alínea c), 73.° e 50.° do CP."
O Mº Pº respondeu, concluindo:
"1 - Perante a factualidade dada como provada, em face da prova produzida em sede de audiência de discussão e julgamento, a conduta do recorrente integra a prática de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p., pelo art.° 21, n.° 1 do Dec. Lei n.° 15/93 de 22/01 e não da prática do crime previsto no art.° 25 do Dec. Lei n.° 15/93 de 22/01.
2- Apresenta-se adequada e justa a pena de cinco (5) anos e seis (6) anos de prisão aplicada ao recorrente pela prática do crime em causa, uma vez que, não excedendo a medida da culpa, satisfaz plenamente as exigências preventivas, gerais e especiais.
3 - Os M.°s Juízes "a quo", apreciaram de forma correcta e de acordo com as regras da experiência comum toda a prova produzida em sede de audiência de discussão e julgamento, pelo que no final outra conclusão não pode ser extraída que não seja a da justeza da condenação do recorrente pelo crime de tráfico de estupefacientes na pena em concreto em que o foi, relativamente à qual em face da sua moldura concreta não pode ser suspensa na sua execução.
Nestes termos e nos demais de direito, que os Colendos Conselheiros se dignarão suprir, negando provimento ao recurso e, em consequência mantendo o Douto Acórdão, far-se-á a já costumada justiça.
Já neste STJ, o Mº Pº emitiu parecer douto, em que afastou a convolação pretendida pelo recorrente, do crime do art. 21º para o do artº 25º, al. a) do CP, por não ocorrer uma considerável diminuição da ilicitude da conduta do arguido, em face da factualidade que lhe é imputada. Também considerou correta a pena aplicada, pelo que a seu ver o recurso não merece qualquer provimento.
Colhidos os vistos os autos foram levados à conferência.
C - APRECIAÇÃO
As duas questões colocadas pelo recorrente são a da qualificação da sua conduta e a da medida da pena aplicada que, independentemente da dita qualificação, deveria ser sempre uma pena prisão suspensa na sua execução. Vejamos então.
1. Qualificação da conduta
O arguido pretende que a sua conduta seja enquadrada no art. 25º e al. b), do DL 15/93, de 22 de Janeiro. Ora, para se saber se o crime cometido foi o do art. 21º, ou o do art. 25º daquele diploma, deverá ter-se em conta, como é sabido, que o preceito faz depender a sua aplicação de ocorrer uma ilicitude do facto “consideravelmente diminuída”. E aponta a título exemplificativo, como índices dessa diminuição “nomeadamente os meios utilizados, a modalidade ou as circunstâncias da ação, a qualidade ou a quantidade das plantas, substâncias ou preparações”.
A questão da qualificação em foco começa por se debater com a dificuldade de se estabelecerem as previsões do D.L. 15/93, constantes dos seus arts. 24º, 21º, e 25º, numa escala decrescente de gravidade.
Reitera-se, aqui, que é de toda a conveniência o estabelecimento de uma corrente jurisprudencial que sirva como indicador para aplicação de cada um destes normativos, em nome da estabilidade e da segurança do direito, o que em nada prejudica a indispensabilidade de apreciação autónoma de cada caso, o qual deverá ser encarado como um episódio com especificidades próprias, inconfundível com os demais.
Dir-se-á, por um lado, que sempre existe entre aqueles assinalados preceitos uma escalada de danosidade social centrada no grau de ilicitude, mas acrescentar-se-á também que, por outro, se revela uma estrutura altamente abrangente, a do tipo base do art. 21º, ao compreender comportamentos tão diversos como a mera detenção, a importação, compra, exportação ou venda, o que só reforça a necessidade de análise do caso concreto. E tem-se criado a tendência para se concentrar exageradamente, nesta previsão, a esmagadora maioria das qualificações.
Importa notar que o tráfico que se costuma apelidar de pequena gravidade, vive, por regra, da atividade do “dealer” de rua, sem que, porém, mesmo num conceito generoso de “dealer” de rua, ele tenha que ver a sua responsabilidade enquadrada, sempre, no art. 25º acima referido. Acresce que se sabe como, em sede de ilicitude, e portanto em sede de malefício causado à sociedade, o papel do pequeno e médio traficante é essencial a todo o sistema de tráfico. O abastecimento normal, do consumidor normal, faz-se através deles, e, sem eles, os chamados barões da droga poucos lucros aufeririam.
Esta realidade acentua a necessidade de uma interpretação da lei com especial atenção ao elemento sistemático, que nos forneça a linha condutora de eleição das situações, que se hão de encaixar em cada um dos tipos legais do art. 21º, 24º, e 25º do D.L. 15/93, de 22 de Janeiro. Tendo em conta que o art. 26º do diploma se reporta a um condicionalismo muito específico, a saber, de um tráfico que serve em exclusivo as necessidades de consumo do próprio traficante.
No acórdão deste STJ de 17/11/2011 (Pº 127/09.3PEFUN.S1, 5ª Secção), procurou-se chegar a um conjunto de orientações que podem servir de instrumento ao julgador, e que já foram tidas em conta nos acórdãos com o presente relator, de 5/1/2012, (Pº 3399/10.7TASXL.L1.S1, 5ª Secção) ou de 17/2/2016 (Pº 26/14.7PEBRG.S1, 5ª Secção), para se saber se o caso concreto cabe ou não na previsão do art. 25º relativo ao tráfico privilegiado.
Assim se logrou o equilíbrio possível entre uma preocupação de segurança na aplicação do direito, que se não satisfaz só, com os critérios amplos e meramente exemplificativos de aplicação do preceito em questão, e as exigências de justiça do caso concreto, que reclamam sempre alguma margem de discricionariedade do julgador.
Então, assegurando-se sempre o respeito pelo quadro legislativo existente, enunciaram-se indicadores, que só podem ter uma natureza jurisprudencial, e se cifrariam no seguinte:
O agente do crime de tráfico de menor gravidade do art. 25.º do DL 15/93, de 22 de Janeiro, deverá beneficiar, como já se viu, de uma ilicitude consideravelmente diminuída, atenta a qualidade ou a quantidade do produto, os meios utilizados, a modalidade ou as circunstâncias da ação. Mas poderão contar-se, como sinais daquela diminuição acentuada da ilicitude, as circunstâncias seguidamente enunciadas:
a) A atividade ser exercida por contacto direto com quem recebe do arguido, e a qualquer título, o produto (compra, venda, cedência, etc.). Isto é, sem recurso a intermediários ou a indivíduos contratados, e usando os meios normais que as pessoas utilizam para se relacionarem (deslocação de rua, venda em casa, telefonema, internet);
b) Não importa adicionar todas as quantidades de estupefaciente que se provou que o agente disponibilizou, mas há que atentar nas quantidades que esse vendedor transmitia individualmente a cada um dos consumidores, designadamente se são adequadas ao consumo individual dos mesmos, e verificar ainda se a quantidade que ele detinha na sua pessoa ou num certo local, a determinado momento, é compatível com uma venda limitada e num período de tempo razoavelmente curto;
c) O agente disponibilizar a outrem apenas derivados da “cannabis”.
d) O período de duração da atividade não ser tão prolongado que se possa considerar o agente como o abastecedor a quem os consumidores recorriam sistematicamente em certa área, há mais de um ano.
e) As operações de cultivo ou de corte e embalagem do produto não terem demasiada sofisticação.
f) Os meios de transporte serem os que o agente usa na sua vida diária para fins lícitos;
g) Os proventos obtidos não serem maiores dos que os necessários para a subsistência própria do agente, e eventualmente de familiares dependentes, com um nível de vida modesto considerado o meio em que vivem, ou então os necessários para serem utilizados, essencialmente, no consumo próprio de produtos estupefacientes;
h) A atividade em causa ser exercida em área geográfica restrita;
i) Ainda que se verifiquem as circunstâncias mencionadas anteriormente, não ocorrer qualquer das outras mencionadas no art. 24.º do DL 15/93.
1. 2. Se nos debruçarmos sobre o caso concreto, verificamos que os elementos de facto disponíveis permitem reconstituir a conduta do arguido, de modo a determinar que a sua atividade no tráfico se desenvolveu pelo menos a partir do verão de 2013 cessando com a prisão em 22/10/2014. Portanto, por pouco mais de um ano. Contou com a colaboração próxima da sua companheira e coarguida Andreia de Fátima a partir de data não apurada mas já em 2014, e o recorrente vendia liamba, placas de haxixe, "speed" (anfetamina) MD, ou MDMA (de que deriva o "ecxtasy") e também cocaína. Vendia o produto numa área que abrangia os concelhos de Penafiel, Paredes e Valongo, em lugares muito diversificados e bem determinados (factos 11 a 14).
Foram identificados 51 indivíduos a quem o arguido vendeu droga, em certos casos com regularidade, certo que só 5 lhe compraram "speed" ou MA. Nenhum desses compradores identificados lhe terá comprado cocaína (facto 15).
O recorrente não se limitou a vender ele, diretamente, aos consumidores, o produto, porque também o fornecia aos coarguidos DD, FF ou JJ, que forneciam a droga sobretudo nas ausências do recorrente e companheira (facto 16 e 17). Também os coarguidos LL e MM, que moravam por cima do arguido, colaboravam com este nas vendas (facto 28). Os meios usados no tráfico não eram especialmente sofisticados certo que o recorrente usava inúmeros telemóveis e cartões nos seus contactos.
A área abrangida pelo fornecimento de droga, o tempo em que a atividade do arguido se desenrolou, o grupo que com ele colaborava, as dezenas de adquirentes de droga, só quanto aos identificados, ou os tipos de estupefacientes transacionados, não permitem que se considere estar perante um caso de tráfico de menor gravidade. Muito embora, nos parâmetros do art. 21º, do DL 15/93, de 22 de Janeiro, a conduta do recorrente não assuma uma ilicitude alta, sobretudo porque a droga que surge, de longe, como mais vendida, nos factos provados, é haxixe ou simplesmente liamba.
Improcede o recurso quanto à qualificação da conduta pretendida, mantendo-se a imputação do crime do art. 21º, do DL 15/93, de 22 de Janeiro.
2. A medida da pena
2.1. Assinalaremos, mais uma vez, que o ponto de partida e enquadramento geral da tarefa a realizar, na escolha da medida da pena a aplicar, não pode deixar de se prender com o disposto no artº 40º do CP, nos termos do qual toda a pena tem como finalidade “a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade”. Em matéria de culpabilidade, diz-nos o nº 2 do preceito que “Em caso algum a pena pode ultrapassar a medida da culpa”.
Com este preceito, fica-nos a indicação de que a pena assume agora, e entre nós, um cariz utilitário, no sentido de eminentemente preventivo, não lhe cabendo, como finalidade, a retribuição “qua tale” da culpa.
Quanto aos fins utilitários da pena, importa referir que, contraposta no artº 40º do C.P. a defesa dos bens jurídicos à reintegração do agente na sociedade, não podemos deixar de ver nesta uma finalidade especial preventiva, e, na dita defesa de bens jurídicos, um fim último que se há de socorrer fundamentalmente, do instrumento da prevenção geral.
Quando, pois, o art. 71º do CP nos vem dizer, no seu nº 1, que “A determinação da medida da pena, dentro dos limites definidos na lei, é feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção”, não o dissociamos daquele art. 40º. Daí que a doutrina venha a defender, sobretudo pela mão de Figueiredo Dias, (Cf. “Direito Penal Português - As Consequências Jurídicas do Crime”, Coimbra Editora, 2005, págs. 227 e segs.) que, se as finalidades da aplicação de uma pena residem primordialmente na tutela dos bens jurídicos, e, na medida do possível, na reinserção do agente na comunidade, então, o processo de determinação da pena concreta a aplicar refletirá, de um modo geral, a seguinte lógica:
A partir da moldura penal abstrata procurar-se-á encontrar uma “sub-moldura” para o caso concreto, que terá como limite superior a medida ótima de tutela dos bens jurídicos com atenção às expectativas comunitárias, e, como limite inferior, o “quantum” abaixo do qual “já não é comunitariamente suportável a fixação da pena sem pôr irremediavelmente em causa a sua função tutelar.” (Cfr. Idem pág. 229).
Ora, será dentro dos limites consentidos pela prevenção geral positiva que deverão atuar os pontos de vista da reinserção social. Quanto à culpa, para além de suporte axiológico- normativo de toda e qualquer repressão penal, compete-lhe, como se viu já, estabelecer o limite inultrapassável da medida da pena a aplicar. A prevenção geral negativa ou intimidatória surgirá como consequência de todo este procedimento.
A jurisprudência deste Supremo Tribunal tem-se orientado quase unanimemente num sentido igual ao que acaba de se referir.
O nº 2 do artº 71º do C. P. manda atender, na determinação concreta da pena, “a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, depuserem a favor do agente ou contra ele”. Enumera a seguir, a título exemplificativo, circunstâncias referentes à ilicitude do facto, à culpa do agente, à sua personalidade, ao meio em que se insere, ao comportamento anterior e posterior ao crime.
2. 2. Regressando ao caso concreto, vemos que o comportamento pelo qual o recorrente foi condenado, o fornecimento ao mercado de drogas, algumas duras, cada vez mais disseminado, tem consequências pessoais, familiares e comunitárias perversas, que é escusado sublinhar mais porque sobejamente conhecidas.
Ora, a partir do momento em que os malefícios da droga (desde logo para a saúde pública, mas ainda como fator de deterioração das relações interpessoais a nível privado, e de degradação do próprio consumidor), foram atendidos pelo legislador, criminalizando o tráfico com penas de prisão muito significativas, criou-se na comunidade a expectativa da punição do agente desse crime, em termos que respondam às necessidades de prevenção geral elevadas que de facto se colocam. Se depois da criminalização do tráfico nos termos que existe, redundar na prática, em nada, a repressão das condutas, é todo o sistema penal que perde credibilidade e a confiança da sociedade. As necessidades de prevenção geral são de sublinhar.
Isto dito, não se esquecerá que os dados disponíveis apontam para o fornecimento, por parte do arguido, sobretudo de haxixe e liamba.
Os dados fornecidos pelos autos apontam para necessidades de prevenção especial bem mais baixas. O recorrente viveu a infância num ambiente marcado pelo alcoolismo e agressividade do pai, operário da construção civil, que morreu tinha ele 13/14 anos. Era um de 4 irmãos e não chegou a terminar o 9º ano de escolaridade porque optou por ajudar a mãe em trabalhos agrícolas. Pelos 16 anos passou a trabalhar em talhos e ainda, em regime de biscates, numa serralharia, ou mais tarde numa empresa de infraestruturas elétricas. Quando estava a trabalhar de novo, num talho de ..., face às condições de trabalho que considerou injustas, porque precárias, despediu-se. A sua companheira também ficou sem trabalho e foi por isso que, segundo o arguido, ingressou no mundo do tráfico. Já consumia haxixe desde os 17/18 anos. Não apresenta passado criminal.
O arguido é bem visto no seu meio, é considerado trabalhador e educado, não apresentando dificuldades de integração. No seu contacto com o meio prisional não criou problemas. Tem apoio familiar, revelou alguma consciência do mal do seu comportamento, e sobretudo parece ter trabalho assegurado junto de XXX, proprietário da empresa de fibra ótica e telecomunicações "...", com sede na Freguesia de ...
Numa moldura penal de 4 a 12 anos de prisão a pena a aplicar deve situar-se claramente na metade inferior. Consideramos justa a pena de cinco anos de prisão.
2.3. O art. 70º do CP refere que, “Se ao crime forem aplicáveis, em alternativa, pena privativa e pena não privativa de liberdade, o tribunal dá preferência à segunda sempre que esta realizar de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.”
O nº 1 do art. 50º do CP (redação da Lei nº 59/2007 de 4 de Setembro) estipula, a seu turno, que “O tribunal suspende a execução da pena de prisão aplicada em medida não superior a 5 anos se, atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste, concluir que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.”
Segundo o nº 2 do preceito,
“O tribunal, se o julgar conveniente e adequado à realização das finalidades da punição, subordina a suspensão da execução da pena de prisão, nos termos dos artigos seguintes, ao cumprimento de deveres ou à observância de regras de conduta, ou determina que a suspensão seja acompanhada do regime de prova.”
E de acordo com o nº 3 do art. 53º do CP, “O regime de prova é ordenado (…) quando a pena de prisão cuja execução foi suspensa tiver sido aplicada em medida superior a três anos”.
É sabido que só se deve optar pela suspensão da pena quando existir um juízo de prognose favorável, centrado na pessoa do arguido e no seu comportamento futuro. A suspensão da pena tem um sentido pedagógico e reeducativo, sentido norteado, por sua vez, pelo desiderato de afastar, tendo em conta as concretas condições do caso, o delinquente da senda do crime.
Também importa acrescentar que esse juízo de prognose não corresponde a uma certeza, antes a uma esperança fundada de que a socialização em liberdade se consiga realizar. Trata-se pois de uma convicção subjetiva do julgador que não pode deixar de envolver um risco, derivado, para além do mais, dos elementos de facto mais ou menos limitados a que se tem acesso (Cf. Figueiredo Dias, in “Direito Penal Português – As Consequências Jurídicas do Crime”, pág. 344).
De um lado, cumpre assegurar que a suspensão da execução da pena de prisão não colida com as finalidades da punição. Numa perspetiva de prevenção especial, deverá mesmo favorecer a reinserção social do condenado.
Por outro lado, tendo em conta as necessidades de prevenção geral, importa que a comunidade não encare, no caso, a suspensão, como sinal de impunidade, retirando toda a sua confiança ao sistema repressivo penal.
Acresce que a aposta que a opção pela suspensão, sempre pressupõe, há-de fundar-se num conjunto de indicadores que a própria lei adianta. Personalidade do agente, condições da sua vida, conduta anterior e posterior ao crime e circunstâncias deste.
4. 2. No caso em apreciação, como resulta do que já referimos, e tanto quanto os autos revelam, não se colocam preocupações fortes ao nível da reinserção social do arguido. Se continua a mostrar-se importante, fazer sentir ao agora condenado, os efeitos da condenação, o certo é que o mesmo já está preso há mais de dois anos, sendo possível apostar na sua reinserção. Sobretudo se abandonar os contactos com marginais do mundo da droga, não frequentar ambientes noturnos propícios ao tráfico, deixar, evidentemente, ele mesmo de consumir, e sobretudo se trabalhar. É de crer que a suspensão da pena, neste caso, não seja vista como como “mais um perdão judicial”, de que decorresse perda da confiança no sistema repressivo penal, tendo em conta a notícia de que o recorrente é bem visto na comunidade de origem.
Daí que se entenda estarem reunidas as condições da reclamada suspensão, da execução da pena de prisão aplicada ao recorrente.
D - DECISÃO
Tudo visto, delibera-se neste Supremo Tribunal e na conferência da 5ª Secção, conceder provimento parcial ao recurso, e assim condenar o arguido AA, pela prática do crime de tráfico de estupefacientes do art. 21° do DL nº 15/93, de 22 de Janeiro, na pena de cinco anos de prisão, suspensa na sua execução por igual período de tempo, e sujeito a regime de prova, estruturado pelos serviços competentes de reinserção social, tendo em conta as especificidades do caso.
Sem custas, face ao provimento parcial do recurso.
Lisboa, 14 de dezembro de 2016
Souto de Moura (Relator)
Isabel Pais Martins (Vencida quanto à suspensão da execução da pena conforme declaração que junto) *
Santos Carvalho (com voto de desempate)
Segundo o n.º 1 do artigo 50.º do CP, o tribunal suspende a execução da pena de prisão se, atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste, concluir que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.
As finalidades da punição, quer dizer, as finalidades das penas são, como paradigmaticamente declara o artigo 40.º, n.º 1, do CP, a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade.
Com a finalidade da prevenção geral positiva ou de integração do que se trata é de alcançar a tutela necessária dos bens jurídico-penais no caso concreto. No sentido da tutela da confiança das expectativas de todos os cidadãos na validade das normas jurídicas e no restabelecimento da paz jurídica comunitária abalada pelo crime.
A medida da necessidade de tutela dos bens jurídicos é um «acto de valoração in concreto, de conformação social da valoração legislativa, a levar a cabo pelo aplicador à luz das circunstâncias do caso. Factores, por isso, da mais diversa natureza e procedência – e, na verdade, não só factores do “ambiente”, mas também factores directamente atinentes ao facto e ao agente concreto – podem fazer variar a medida da tutela dos bens jurídicos» Figueiredo Dias, As Consequências jurídicas do Crime, Aequitas, Editorial Notícias, 1993, p. 228.. Do que se trata – e uma tal tarefa só pode competir ao juiz – «é de determinar as referidas exigências que ressaltam do caso sub iudice, no complexo da sua forma concreta de execução, da sua específica motivação, das consequências que dele resultaram, da situação da vítima, da conduta do agente antes e depois do facto, etc.» Ibidem, p. 241..
Se são factores atinentes ao facto que relevarão as mais das vezes para a determinação da medida necessária para satisfazer as exigências de prevenção geral, nas condutas subsumíveis a um mesmo tipo legal podem encontrar-se muitas variáveis, sem se sair do âmbito do desvalor típico, capazes de influir, para mais ou para menos, na medida necessária à tutela do bem jurídico.
Nos crimes de tráfico de estupefacientes as finalidades de prevenção geral impõem-se com particular acuidade, pela forte ressonância negativa, na consciência social, das actividades que os consubstanciam.
No caso, e como o acórdão realça, o arguido desenvolveu uma actividade de tráfico de uma multiplicidade de drogas (incluindo “drogas duras”), por mais de um ano, numa área geográfica alargada, que abrangia os concelhos de ..., ... e ..., contando com número considerável de clientes (foram identificados 51) e desenvolvendo a actividade, por si mesmo ou por intermédio de pessoas que com ele colaboravam, tudo como melhor se descreve no ponto 1.2. do acórdão.
Neste quadro, embora não se suscitem especiais preocupações ao nível da reinserção social do arguido – como o acórdão assinala –, considero que a suspensão da execução da pena não será compreensível para o sentimento jurídico da comunidade e para a manutenção da sua confiança no direito e na administração da justiça.
Com a suspensão da execução da pena não ficará acautelada a defesa do ordenamento jurídico.
Por isso, só a pena efectiva de prisão poderá assegurar o efeito essencial de prevenção geral.
Isabel Pais Martins