DESPEDIMENTO SEM JUSTA CAUSA
EXTINÇÃO DO POSTO DE TRABALHO
Sumário

I - O despedimento por extinção do posto de trabalho deve fundamentar-se em razões objectivas, ligadas à empresa, apuradas num procedimento em que se observe um conjunto de requisitos e pressupostos, sob pena de ilicitude.
II - Tal como sucede com o despedimento disciplinar, também no despedimento por extinção do posto de trabalho vigoram as regras gerais de repartição do ónus da prova, cabendo ao empregador alegar e provar os pressupostos formais e substanciais do despedimento fundado em razões objectivas.
III - Não tendo a entidade patronal provado que elaborou o legal procedimento, com vista ao despedimento por extinção do posto de trabalho, mas apenas que remeteu ao trabalhador a declaração Mod. 346, tal despedimento tem de ser visto como um despedimento individual, sem justa causa, sem precedência de procedimento disciplinar e a que correspondem as legais consequências.

Texto Integral

Acordam no Tribunal da Relação do Porto:

B………. interpôs a presente acção emergente de contrato individual de trabalho, com processo comum, contra C……….., pedindo que se declare ilícito o despedimento efectuado e que se condene a R. a pagar à A. a quantia de € 17.034,58, sendo € 12.558,24 de indemnização de antiguidade e a restante relativa a diferenças salariais e retribuições vencidas, sem prejuízo das vincendas até à sentença final, acrescidas de juros de mora, até integral pagamento.
Alega a A., para tanto, que tendo sido admitida ao serviço da R. em 1989-01-01, aí se manteve até 2004-10-31 data em que, por carta cuja cópia juntou a fls. 6, esta comunicou àquela a rescisão unilateral do contrato individual de trabalho por “Extinção do posto de trabalho por dificuldades financeiras”, sem que tivesse cumprido os legais procedimentos, pelo que o despedimento é nulo. Juntou também cópia do modelo 346, exclusivo da Imprensa Nacional – Casa da Moeda, S.A..
Contestou a R., por impugnação e, por excepção, alegou que não tendo a A. mencionado na petição inicial quais os concretos procedimentos em falta, verifica-se a ineptidão da petição inicial e dada a falta de verificação dos pressupostos da nulidade do despedimento, deve a acção improceder.
Na designada audiência de julgamento os doutos Mandatários das partes prescindiram da inquirição de todas as testemunhas por si arroladas.
Proferida sentença, foi a R. absolvida do pedido.
Irresignada com o assim decidido, veio a A. interpor recurso de apelação, pedindo que se revogue a sentença, tendo formulado a final as seguintes conclusões:

1 - A Recorrente alegou como causa de pedir o não cumprimento dos procedimentos legais, por parte da Recorrida, para o seu despedimento por extinção do posto de trabalho.
2 - Procedimentos são uma sucessão ordenada de factos e formalidades tendentes à formação e manifestação de uma vontade.
3 - A Recorrida, que nem a comunicação inicial da sua intenção em fazer cessar o contrato de trabalho fez, não cumpriu os procedimentos que a lei exige.
4 - Torna-se perfeitamente perceptível a razão que levou a Recorrente a fazer o seu pedido.
5 - Ou seja, foi o facto da Recorrida não ter manifestado e respeitado as formalidades legais que expressassem a sua vontade em fazer cessar o contrato de trabalho, que motivou o pedido da declaração da ilicitude do despedimento.
6 - Violando a lei, mormente o art. 660° do CPC, a sentença ao dar como não provida a acção.
7 - Caso assim não entendesse devia o Meritíssimo Juiz, findos os articulados, ter mandado, explicitar os factos que lhe levantassem dúvidas na Audiência Preliminar, prevista nos arts. 508° do CPC e 62° do CPT.
8 - Não cumprindo o comando dos arts. 265° do CPC e 27° do CPT que determinam dever da busca da verdade dos factos,
9 - Violando a lei a decisão que, omitindo este princípio, vem dizer não haverem nem diz não existirem factos para decidir, quando antes entendeu existirem ao não os mandar esclarecer nos autos.
10 - Sendo de anular a decisão em apreço por violação da lei.

A R. apresentou a sua alegação de resposta que concluiu pela confirmação da sentença.
A Exm.ª Sr.ª Procuradora-Geral Adjunta, nesta Relação, emitiu douto parecer no sentido de que o recurso merece provimento parcial.
Nenhuma das partes tomou posição acerca de tal parecer.
Recebido o recurso, foram colhidos os vistos legais.

Cumpre decidir.

São os seguintes os factos dados como provados pelo Tribunal a quo:

1º) - Autora e ré celebraram entre si um contrato de trabalho, sem limitação temporal, com início em 01.01.1989, mediante o qual a autora passou a prestar, sob as ordens, instruções e fiscalização da ré, as funções inerentes à categoria profissional de Educadora de Infância.
2º) - Em contrapartida do trabalho, a ré remunerava a autora com 584,89 euros ilíquidos e mensais.
3º) - Em 31.10.2004, a ré emitiu em nome da autora a declaração de situação de desemprego, mod.346, nela declarando que motivou a cessação do contrato a "extinção do posto de trabalho por dificuldade financeira".
4º) - Desde essa data – 31.10.2004 –, a autora deixou de prestar trabalho à ré.
5º) - Nessa data – 31.10.2004 –, a ré pagou à autora os proporcionais de férias e subsídios de férias e de Natal, com base na remuneração mensal de 584,89 euros.

Fundamentação
Sendo pelas conclusões que se delimita o objecto do recurso[1], como decorre das disposições conjugadas dos Art.ºs 684.º, n.º 3 e 690.º, n.º 1, ambos do Cód. Proc. Civil, ex vi do disposto no Art.º 87.º, n.º 1 do Cód. Proc. do Trabalho, a única questão a decidir nesta apelação consiste em saber se ocorreu um despedimento ilícito.

Matéria de facto
Previamente, convirá atentar na decisão da matéria de facto, pois o facto assente sob o n.º 4 parece não corresponder, pelo menos integralmente, ao alegado no artigo 6.º da petição inicial, aceite pela R. no artigo 1.º da contestação, embora com a seguinte restrição: apenas e na exacta medida que decorre do teor do documento n.º 1 junto com a inicial.
Assim, atento o disposto nos Art.ºs 490.º, n.º 2 e 712.º, n.º 4, ambos do Cód. Proc. Civil, nada obsta, antes se impõe, que se dê como provado o facto alegado no artigo 6.º da petição inicial, bem como o teor dos documentos n.ºs 1 e 2, juntos com tal articulado.
Nestes termos, adita-se à respectiva lista, os seguintes factos:
6 – Com efeitos a 31 de Outubro de 2004, a R. comunicou à A. a rescisão unilateral do contrato individual de trabalho por “Extinção do posto de trabalho por dificuldades financeiras – cfr. doc. 1, a fls. 6.
7 – Datada de 31 de Outubro de 2004, a R. enviou à A. uma carta, cuja cópia se encontra junta a fls. 6, como doc. 1, do seguinte teor:
C………., com sede na Rua .........., ..., contribuinte n.º ........., vem, nos termos e para os efeitos do artigo 30 do decreto-lei 64-A/89, de 27 de Fevereiro, comunicar a sua decisão de proceder à cessação do contrato de trabalho celebrado em 01 de Janeiro de 1989 com V. Ex.ª, com os seguintes fundamentos:
- A cessação do contrato é motivada pelo número reduzido de utentes que frequentam o Infantário, originando enormes dificuldades financeiras, pelo que não tenho outra alternativa senão rescindir o mesmo por falta de serviço.
8 – Na declaração de situação de desemprego, Modelo n.º 346, junta a fls. 7, como doc. 2, a R. indicou como situação que motivou a cessação do contrato: Extinção do posto de trabalho por dificuldade financeira.

O Direito
Vejamos, agora, a única questão a decidir nesta apelação, que consiste em saber se ocorreu um despedimento ilícito.
Como se vê dos factos ora assentes sob os n.ºs 6 e 7, com efeitos reportados a 31 de Outubro de 2004, a R. comunicou à A. a rescisão unilateral do contrato individual de trabalho por “Extinção do posto de trabalho por dificuldades financeiras, nos termos e para os efeitos do artigo 30 do decreto-lei 64-A/89, de 27 de Fevereiro – sic.
No entanto, tendo o Cód. do Trabalho entrado em vigor[2] em 2003-12-01, é este o diploma aplicável in casu, que adrede dispõe:

Artigo 402º[3]
Noção
A extinção do posto de trabalho determina o despedimento justificado por motivos económicos, tanto de mercado como estruturais ou tecnológicos, relativos à empresa, nos termos previstos para o despedimento colectivo.
Artigo 403º[4]
Requisitos
1 — O despedimento por extinção do posto de trabalho só pode ter lugar desde que, cumulativamente, se verifiquem os seguintes requisitos:
a) Os motivos indicados não sejam devidos a uma actuação culposa do empregador ou do trabalhador;
b) Seja praticamente impossível a subsistência da relação de trabalho;
c) Não se verifique a existência de contratos a termo para as tarefas correspondentes às do posto de trabalho extinto;
d) Não se aplique o regime previsto para o despedimento colectivo;
e) Seja posta à disposição do trabalhador a compensação devida.
2 — Havendo na secção ou estrutura equivalente uma pluralidade de postos de trabalho de conteúdo funcional idêntico, o empregador, na concretização de postos de trabalho a extinguir, deve observar, por referência aos respectivos titulares, os critérios a seguir indicados, pela ordem estabelecida:
1º Menor antiguidade no posto de trabalho;
2º Menor antiguidade na categoria profissional;
3º Categoria profissional de classe inferior;
4º Menor antiguidade na empresa.
3 — A subsistência da relação de trabalho torna-se praticamente impossível desde que, extinto o posto de trabalho, o empregador não disponha de outro que seja compatível com a categoria do trabalhador.
4 — O trabalhador que, nos três meses anteriores à data do início do procedimento para extinção do posto de trabalho, tenha sido transferido para determinado posto de trabalho que vier a ser extinto, tem direito a reocupar o posto de trabalho anterior, com garantia da mesma retribuição base, salvo se este também tiver sido extinto.
Artigo 404º[5]
Direitos dos trabalhadores
Ao trabalhador cujo contrato de trabalho cesse nos termos da presente divisão aplica-se o disposto nos artigos 398º a 401º[6].
Artigo 423º[7]
Comunicações
1 — No caso de despedimento por extinção de posto de trabalho, o empregador comunica, por escrito, à comissão de trabalhadores ou, na sua falta, à comissão intersindical ou comissão sindical respectiva a necessidade de extinguir o posto de trabalho e o consequente despedimento do trabalhador que o ocupe.
2 — A comunicação a que se refere o número anterior é igualmente feita a cada um dos trabalhadores envolvidos e enviada ao sindicato representativo dos mesmos, quando sejam representantes sindicais.
3 — A comunicação a que se referem os números anteriores é acompanhada de:
a) Indicação dos motivos invocados para a extinção do posto de trabalho, com identificação da secção ou unidade equivalente a que respeitam;
b) Indicação das categorias profissionais e dos trabalhadores abrangidos.
Artigo 424º[8]
Consultas
1 — Nos 10 dias posteriores à data da comunicação prevista no artigo anterior, a estrutura representativa dos trabalhadores, em caso de oposição ao despedimento, emite parecer fundamentado do qual constam as respectivas razões, nomeadamente quanto aos motivos invocados, quanto à não verificação dos requisitos previstos nas alíneas a) a d) do nº 1 do artigo 403º ou quanto à violação das prioridades a que se refere o nº 2 do mesmo artigo, bem como as alternativas que permitam atenuar os seus efeitos.
2 — Dentro do mesmo prazo os trabalhadores abrangidos podem pronunciar-se nos termos do número anterior.
3 — A estrutura representativa dos trabalhadores e cada um dos trabalhadores abrangidos podem, nos três dias úteis posteriores à comunicação referida nos nºs 1 e 2 do artigo anterior, solicitar a intervenção dos serviços competentes do ministério responsável pela área laboral para fiscalizar a verificação dos requisitos previstos nas alíneas c) e d) do nº 1 e no nº 2 do artigo 403º.
4 — Os serviços competentes do ministério responsável pela área laboral, no prazo de sete dias contados da data de recepção do requerimento referido no número anterior, devem elaborar relatório sobre a matéria sujeita à sua fiscalização, o qual é enviado ao requerente e ao empregador.
Artigo 425º[9]
Decisão
1 — Decorridos cinco dias sobre o termo do prazo previsto nos nºs 1 e 2 do artigo anterior, em caso de cessação do contrato de trabalho, o empregador profere, por escrito, decisão fundamentada de que conste:
a) Motivo da extinção do posto de trabalho;
b) Confirmação dos requisitos previstos nas alíneas a) a d) do nº 1 do artigo 403º, com justificação de inexistência de alternativas à cessação do contrato do ocupante do posto de trabalho extinto ou menção da recusa de aceitação das alternativas propostas;
c) Prova do critério de prioridades, caso se tenha verificado oposição quanto a este;
d) Montante da compensação, assim como a forma e o lugar do seu pagamento;
e) Data da cessação do contrato.
2 — A decisão é comunicada, por cópia ou transcrição, à entidade referida no nº 1 do artigo 423º e, sendo o caso, à mencionada no nº 2 do mesmo artigo e, bem assim, aos serviços competentes do ministério responsável pela área laboral.
Artigo 432º[10]
Despedimento por extinção de posto de trabalho
O despedimento por extinção de posto de trabalho é ainda ilícito sempre que o empregador:
a) Não tiver respeitado os requisitos do nº 1 do artigo 403º;
b) Tiver violado o critério de determinação de postos de trabalho a extinguir, enunciado no nº 2 do artigo 403º;
c) Não tiver feito as comunicações previstas no artigo 423º;
d) Não tiver colocado à disposição do trabalhador despedido, até ao termo do prazo de aviso prévio, a compensação a que se refere o artigo 401º e, bem assim, os créditos vencidos ou exigíveis em virtude da cessação do contrato de trabalho.
Artigo 435º[11]
Impugnação do despedimento
1 — A ilicitude do despedimento só pode ser declarada por tribunal judicial em acção intentada pelo trabalhador.
2 — A acção de impugnação tem de ser intentada no prazo de um ano a contar da data do despedimento, excepto no caso de despedimento colectivo em que a acção de impugnação tem de ser intentada no prazo de seis meses contados da data da cessação do contrato.
3 — Na acção de impugnação do despedimento, o empregador apenas pode invocar factos e fundamentos constantes da decisão de despedimento comunicada ao trabalhador.

Trata-se da figura designada na LCCT por cessação do contrato de trabalho[12], por extinção de postos de trabalho, prevista nos seus Art.ºs 26.º e segs. e designada no Cód. do Trabalho por despedimento por extinção de posto de trabalho. Reporta-se, contrariamente ao despedimento disciplinar, ao despedimento, também individual, mas fundado em razões objectivas, ligadas à empresa e não imputáveis subjectivamente ao comportamento, quer do trabalhador, quer do empresário.
No entanto, a aplicação da figura, exige a elaboração de um procedimento, em que se observe um conjunto de requisitos e de pressupostos, sob pena de o despedimento ser ilícito, tal como dispõem as normas acima transcritas, o que já acontecia no domínio de aplicação da LCCT[13].
Ora, tal como sucede com o despedimento disiciplinar, também nesta figura do despedimento individual por extinção do posto de trabalho, as regras da distribuição do ónus da prova vão no sentido de que ao A. cumpre alegar e provar o despedimento e ao R. cumpre alegar e provar os pressupostos formais e susbstanciais do despedimento fundado em razões objectivas, atento o disposto nas regras gerais decorrentes do Art.º 342.º, n.ºs 1 e 2 do Cód. Civil e da regra especial prevista no n.º 3 do transcrito Art.º 435.º do Cód. do Trabalho[14].
Sucede que in casu o despedimento está provado, mas a R. não alegou nem provou que elaborou o legal procedimento, nem que se encontram verificados os pressupostos substanciais do despedimento por extinção do posto de trabalho, não constituindo a carta que remeteu à A. e a declaração Mod. 346, qualquer dos legais requisitos.
Aliás, é gratuita – o que se afirma por dever de ofício – a declaração de cessação do contrato de trabalho por extinção do posto de trabalho, pois nenhuma prova se encontra feita nesse sentido, pelo que o despedimento da A. tem de ser visto como um despedimento individual, sem justa causa, sem precedência de processo disciplinar e a que correspondem as legais consequências.
In casu, visto o pedido e as conclusões do recurso, a A. tem direito a indemnização de antiguidade correspondente ao despedimento disciplinar[15] e aos salários de tramitação.
Vejamos, em primeiro lugar, a indemnização.
São pertinentes as seguintes normas do Cód. do Trabalho:
Artigo 439º
Indemnização em substituição da reintegração
1 — Em substituição da reintegração pode o trabalhador optar por uma indemnização, cabendo ao tribunal fixar o montante, entre 15 e 45 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo ou fracção de antiguidade, atendendo ao valor da retribuição e ao grau de ilicitude decorrente do disposto no artigo 429º.
2 — Para efeitos do número anterior, o tribunal deve atender a todo o tempo decorrido desde a data do despedimento até ao trânsito em julgado da decisão judicial.
3 — A indemnização prevista no nº 1 não pode ser inferior a três meses de retribuição base e diuturnidades.
Artigo 429º
Princípio geral
Sem prejuízo do disposto nos artigos seguintes e em legislação especial, qualquer tipo de despedimento é ilícito:
a) Se não tiver sido precedido do respectivo procedimento;
b) Se se fundar em motivos políticos, ideológicos, étnicos ou religiosos, ainda que com invocação de motivo diverso;
c) Se forem declarados improcedentes os motivos justificativos invocados para o despedimento.

In casu, tendo a A. sido admitida ao serviço da R. em 1989-01-01, iremos considerar uma indemnização calculada com base em 18 anuidades, sem prejuízo de oportuna liquidação. Fica, assim, para decidir a graduação do número de dias de retribuição a atender por cada ano, uma vez que a moldura legal se encontra fixada entre 15 e 45 dias, atendendo ao valor da retribuição e ao grau de ilicitude decorrente do disposto no artigo 429º, ora transcrito.
Quanto ao critério da retribuição, entendem uns que ele não constitui verdadeiramente nenhuma indicação, sendo irrelevante enquanto tal, enquanto outros opinam no sentido de que ela deve ser tomada na razão inversa da sua grandeza, isto é, quanto menor for a retribuição auferida pelo trabalhador, maior deve ser o número de dias a atender no cálculo da indemnização e quanto maior for a retribuição auferida, menor deverá ser o número de dias a graduar entre os 15 e 45, de modo que um trabalhador que aufira uma retribuição próxima do nível do salário mínimo deverá ser contemplado com uma indemnização calculada com base num número de dias perto do máximo. Cremos que esta segunda interpretação, a de dar relevo ao montante da retribuição auferida, deverá ser a seguida, pois algum sentido há-de ter o critério, sendo certo que na interpretação das normas sempre teremos de atender à presunção constante do Art.º 9.º do Cód. Civil.
Quanto ao critério da ilicitude teremos de convir que a situação não melhora significativamente. Na verdade, dizer-se que a indemnização se fixa de acordo com o grau da ilicitude do despedimento e remeter-nos para as 3 hipóteses em que ele se pode compaginar – ausência de procedimento disciplinar, invocação de motivos políticos, ideológicos, étnicos ou religiosos e improcedência da justa causa – representando algo mais que o critério da retribuição, não é completamente esclarecedor. De qualquer modo, embora haja quem refira que tais hipóteses são mais causas da ilicitude do que elementos para determinar o respectivo grau, tem-se entendido que será mais grave um despedimento fundado em motivos políticos, ideológicos, étnicos ou religiosos do que outro por falta ou vício do procedimento disciplinar, que a um despedimento declarado ilícito por inexistência ou improcedência da justa causa deverá corresponder uma indemnização graduada a meio da moldura legal ou que deve ser graduada pelo máximo do número de dias a indemnização correspondente a um despedimento em que o empregador, consciente disso mesmo, invocou motivos falsos para sustentar a sua decisão rescisória[16].
Aliás, entendem – de lege ferenda – outros autores que, apesar dos referidos critérios da retribuição e do grau de ilicitude, a outros se poderia atender, como sejam a idade, as habilitações e a experiência e o currículo profissionais[17].
Seja como for, certo é que na determinação do montante da indemnização de antiguidade há que atender ao critério da retribuição auferida pelo trabalhador e ao grau de ilicitude do despedimento, como se referiu.
Analisando os factos provados, verificamos que a A. auferia a retribuição base de € 584,89 [a A. calculou a indemnização no montante global de € 12.558,24, tendo por critério a retribuição de € 784,89 por 16 meses] e que foi despedida sem precedência de processo disciplinar ou de qualquer outro procedimento.
Considerando o critério da retribuição, uma vez que a retribuição base auferida é de montante relativamente próximo do salário mínimo nacional, deverá a indemnização ser fixada atendendo a um número de dias próximo do limite máximo da moldura legal – 45. Já considerando o critério da ilicitude do despedimento, resultando ela da ausência de procedimento disciplinar ou outro, temos que nos afastar daquele limite máximo, pois ele está reservado para as situações mais gravosas, como sejam os despedimentos com invocação de motivos políticos, ideológicos, étnicos ou religiosos ou com invocação de factos, não provados, que integrem crimes, por exemplo.
Ora, ponderando os factos atendíveis de acordo com os referidos critérios legais vigentes, entendemos fixar a indemnização de antiguidade atendendo a 35 dias, o que perfaz o montante global de € 12.282,69, sem prejuízo de oportuna liquidação.

Vejamos agora os salários de tramitação.
A A. tem também direito às retribuições vencidas desde o trigésimo dia anterior à data da propositura da acção – 2005-07-10, uma vez que a acção foi proposta em 2005-08-09, como se vê no rosto da petição inicial – até ao trânsito em julgado decisão, atento o disposto no Art.º 437.º do Cód. do Trabalho que, por simplicidade de cálculo, se liquidam até 2007-05-10, no montante de € 14.037,36.

Procedem, destarte, as conclusões da apelação, pelo que a sentença deve ser revogada.

Decisão.
Termos em que se acorda em conceder provimento à apelação, assim revogando a sentença, que se substitui pelo presente acórdão, em que se declara ilícito o despedimento e se condena a R. a pagar à A. a indemnização de antiguidade calculada com base em 18 anuidades, à razão de 35 dias cada uma, o que perfaz o montante global de € 12.282,69, bem como as retribuições vencidas desde 2005-07-10 até 2007-05-10, no montante global de € 14.037,36, sem prejuízo de oportuna liquidação, em ambos os casos, até ao trânsito em julgado da decisão.
Custas pela R.

Porto, 4 de Junho de 2007
Manuel Joaquim Ferreira da Costa
Domingos José de Morais
António José Fernandes Isidoro

_________________________________
[1] Cfr. Abílio Neto, in Código de Processo Civil Anotado, 2003, pág. 972 e o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 1986-07-25, in Boletim do Ministério da Justiça, n.º 359, págs. 522 a 531.
[2] Como dispõe o Art.º 3.º, n.º 1 da Lei n.º 99/2003, de 27 de Agosto, que aprovou o Cód. do Trabalho.
[3] Corresponde ao Art.º 26.º n.º 1 do regime jurídico aprovado pelo Decreto-Lei n.º 64-A/89, de 27 de Fevereiro, de ora em diante designado apenas por LCCT.
[4] Corresponde ao Art.º 27.º da LCCT.
[5] Corresponde ao Art.º 31.º da LCCT.
[6] Que dispõem:
Artigo 398º
Aviso prévio
1 — A decisão de despedimento, com menção expressa do motivo, deve ser comunicada, por escrito, a cada trabalhador com uma antecedência não inferior a 60 dias relativamente à data prevista para a cessação do contrato.
2 — A inobservância do aviso prévio a que se refere o número anterior não determina a imediata cessação do vínculo e implica para o empregador o pagamento da retribuição correspondente ao período de antecedência em falta.
Artigo 399º
Crédito de horas
1 — Durante o prazo de aviso prévio o trabalhador tem direito a utilizar um crédito de horas correspondente a dois dias de trabalho por semana, sem prejuízo da retribuição.
2 — O crédito de horas pode ser dividido por alguns ou por todos os dias da semana, por iniciativa do trabalhador.
3 — O trabalhador deve comunicar ao empregador o modo de utilização do crédito de horas com três dias de antecedência, salvo motivo atendível.
Artigo 400º
Denúncia
Durante o prazo de aviso prévio, o trabalhador pode, mediante declaração com a antecedência mínima de três dias úteis, denunciar o contrato, sem prejuízo do direito à compensação.
Artigo 401º
Compensação
1 — O trabalhador cujo contrato cesse em virtude de despedimento colectivo tem direito a uma compensação correspondente a um mês de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo de antiguidade.
2 — No caso de fracção de ano, o valor de referência previsto no número anterior é calculado proporcionalmente.
3 — A compensação a que se refere o nº 1 não pode ser inferior a três meses de retribuição base e diuturnidades.
4 — Presume-se que o trabalhador aceita o despedimento quando recebe a compensação prevista neste artigo.
[7] Corresponde ao Art.º 28.º da LCCT.
[8] Corresponde ao Art.º 29.º da LCCT.
[9] Corresponde ao Art.º 30.º da LCCT.
[10] Corresponde ao Art.º 32.º, n.º 1, alíneas b) a e) da LCCT.
[11] O n.º 1 corresponde, in casu, ao Art.º 32.º, n.º 2 da LCCT.
[12] O legislador de 1989 não quis designar a figura por despedimento, como o veio a fazer o do Cód. do Trabalho. Trata-se, no entanto, de verdadeiros “…despedimentos por motivos objectivos [sublinhado nosso], não imputáveis nem ao empregador nem ao trabalhador, designadamente por motivos económicos (de mercado, estruturais e tecnológicos), tais como a redução da actividade da empresa (justificando despedimentos colectivos), extinção do posto de trabalho, inadaptação ao posto de trabalho…”, como referem J. J. Gomes Canotilho e Vital Moreira, in Constituição da República Portuguesa Anotada, volume I, 4.ª edição revista, 2007, pág. 709.
[13] Cfr. Pedro Furtado Martins, in Cessação do Contrato de Trabalho, Principia, 1999, págs. 113 e segs. e Despedimento Ilícito, Reintegração da Empresa e Dever de Ocupação Efectiva, “Direito e Justiça”, Revista da Faculdade de Direito da Universidade Católica Portuguesa – Suplemento, 1992, págs. 19 a 21.
[14] Cfr. Maria do Rosário Palma Ramalho, in Direito do Trabalho, Parte II – Situações Laborais Individuais, 2006, págs. 887 e o Acórdão da Relação de Lisboa de 1998-01-14, in Colectânea de Jurisprudência, Ano XXIII-1998, Tomo I, págs. 159 a 161.
[15] Indemnização essa correspondente a um montante a fixar entre 15 e 45 dias, prevista no Art.º 439.º, n.º 1 do Cód. do Trabalho e não a uma compensação correspondente a um mês, como seria se se tratasse de despedimento por extinção de posto de trabalho, atento o disposto no Art.º 401.º, ex vi do Art.º 404.º, ambos do Cód. do Trabalho.
[16] Cfr. Pedro Romano Martinez, in Direito do Trabalho, 2.ª edição, pág. 984, António Monteiro Fernandes, in Direito do Trabalho, 12.ª edição, pág. 562 a 565, Albino Mendes Baptista, in Estudos sobre o Código do Trabalho, 2004, págs. 135 a 138, João Leal Amado, in Algumas Notas sobre o Regime do Despedimento Contra Legem no Código do Trabalho, VII Congresso Nacional de Direito do Trabalho, 2004, págs. 292 e 293, Maria do Rosário Palma Ramalho, in Direito do Trabalho, Parte II – Situações Laborais Individuais, 2006, págs. 853 a 859 e o Acórdão da Relação de Lisboa de 2005-03-16, in Colectânea de Jurisprudência, Ano XXX-2005, Tomo II, págs. 146 a 148.
[17] Cfr. Pedro Furtado Martins, in Consequências do Despedimento Ilícito: Indemnização/Reintegração, Código do Trabalho, Alguns Aspectos Cruciais, Principia, 2003, págs. 49 e segs., nomeadamente, pág. 59 e Albino Mendes Baptista, in Estudos sobre o Código do Trabalho, 2004, págs. 138 e 139.