EXTINÇÃO DA EXECUÇÃO
INUTILIDADE SUPERVENIENTE DA LIDE
EMBARGOS DE EXECUTADO
Sumário


I) - Nas situações em que ocorre extinção da execução por inutilidade superveniente da lide, fundada na ausência de indicação de bens penhoráveis no prazo legalmente previsto, ao abrigo do disposto nos artºs 750º, nº. 2 e 849º, nº. 1, al. c) ambos do NCPC, não tendo sido penhorado quaisquer bens, nem o crédito exequendo sido reclamado noutra execução pendente, a instância de embargos de executado deverá ser declarada extinta por inutilidade superveniente da lide, sem prejuízo da sua eventual renovação, caso venha a renovar-se a execução extinta, nos termos do nº. 5, do artº. 850º, do mesmo Código.

II) - Encontrando-se a execução já extinta, nenhuma utilidade advém da prossecução dos embargos em sede de instância executiva. Renovando-se esta, recuperarão os embargos todas as suas virtualidades, impondo-se, então, o respectivo prosseguimento em paralelo com o processo de execução.

Texto Integral


Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães

I. RELATÓRIO

Por apenso à execução comum para pagamento de quantia certa, intentada por Banco C, S.A. contra a executada Maria, esta deduziu oposição à execução mediante embargos, pedindo que seja:

a) Declarada a nulidade da notificação do requerimento de Injunção, e consequentemente, a inexistência do título executivo em que se funda a execução, por não ter sido válida e regularmente constituído, ou se assim não se entender,
b) Julgada procedente, por provada, a invocada inexistência de título executivo, em virtude da falsidade da assinatura constante do Contrato de Crédito n.º (...) que se imputa à Executada, absolvendo-a da instância, ou caso assim não se entenda,
c) Julgada a presente Oposição à Execução procedente, por provada, absolvendo a Executada/Embargante do pedido;
d) Condenada a Exequente, em sede de litigância de má-fé, no pagamento de uma multa a definir pelo Tribunal, e de uma indemnização à Executada de montante nunca inferior a € 2.500,00 no pagamento dos honorários do Mandatário Judicial do Executado, por ora avaliados em € 1.500,00.

Após o agente de execução (doravante AE) ter procedido à notificação do exequente nos termos e para os efeitos do disposto no artº. 750º, nº. 1 do NCPC, este, em 13/10/2016, enviou ao AE uma comunicação na qual peticionou que procedesse nos termos dos nºs 1 e 2 do artº. 750º do NCPC, atenta a patente inexistência de bens da executada e com o propósito de pugnar pela extinção da instância executiva, por inutilidade superveniente da lide nos termos do artº. 849º, nº. 1, al. c) do NCPC, prescindindo o mesmo das eventuais diligências de pesquisa requeridas e ainda não efectuadas, bem como da faculdade de indicação de bens prevista no nº. 1 do citado artº. 750º, entregando-se-lhe as quantias que tivessem sido penhoradas e que ultrapassassem os valores devidos a título de honorários e despesas (cfr. refª. 4532616 no processo de execução disponível na plataforma Citius).

Em 17/10/2016 foi declarada extinta a execução, ao abrigo do disposto no artº. 750º, nº. 2 do NCPC (cfr. refª. Citius 4549490 no processo de execução electrónico), decisão esta que, nessa mesma data, foi notificada ao exequente e à executada (cfr. refª. Citius 4549484 e 4549488 no processo de execução electrónico).

Em 5/01/2017 a Mª Juíza “a quo” proferiu o seguinte despacho [transcrição]:

«Nos termos do artigo 277º, e), do Código de Processo Civil, a instância extingue-se com a impossibilidade e com a inutilidade superveniente da lide, ou seja, quando, em virtude de novos factos ocorridos na pendência do processo, sobrevenha obstáculo legal à manutenção da lide ou a decisão a proferir já não possa ter qualquer efeito útil, nomeadamente porque não é possível dar satisfação à pretensão que se pretende fazer valer no processo ou esta foi satisfeita por outra via.

Ora, atento o estado dos autos principais, a instância tornou-se, nos termos supra referidos, impossível e inútil.
Em conformidade, declaro extinta a instância por impossibilidade e inutilidade superveniente da lide, nos termos do artigo 277º, e), do Código de Processo Civil.
Condeno a embargante no pagamento das custas processuais, nos termos do artigo 536º, n.º 3, do Código de Processo Civil.
Registe e notifique.»

Inconformada com tal decisão, a executada/embargante dela interpôs recurso, extraindo das respectivas alegações as seguintes conclusões [transcrição]:

I. Vem o presente recurso interposto da sentença proferida em 05.01.2017 – ref. citius 151041141 – a qual decidiu pela extinção da instância por inutilidade superveniente da lide, nos termos do artigo 277º alínea e) do Código de Processo Civil e condenou a embargante/recorrente em custas.
II. No caso vertente, a Embargante/Recorrente deduziu embargos tempestivos, nos quais alegou defesa por excepção e impugnação, mormente a inexistência de título executivo, a nulidade da notificação do requerimento de injunção, pedindo ainda a condenação da Exequente como litigante de má-fé.
III. No âmbito dos autos de execução foram as partes notificadas nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 750°, n° 1 do CPC, ou seja, para indicaram bens à penhora, e não o tendo feito, ao abrigo do n° 2 do citado artigo a execução foi declarada extinta.
IV. O Tribunal a quo fez uma incorrecta interpretação do disposto no artigo 732°, n° 4 em conjugação com o disposto no artigo 277°, alínea e), ambos do CPC.
V. A única questão a decidir é se, no caso concreto, a extinção da instância na acção executiva de que estes autos são apenso, torna ou não inútil a respectiva apreciação.
VI. Nos termos dos n.ºs 4 e 5 do artigo 732.º do CPC, a oposição à execução mediante embargos é dependência do processo executivo, daí que a procedência dos embargos extinga a execução, no todo ou em parte, constituindo a decisão de mérito proferida nos embargos à execução, nos termos gerais, caso julgado quanto à existência, validade e exigibilidade da obrigação exequenda.
VII. No caso concreto, a instância de embargos foi julgada extinta por inutilidade e impossibilidade superveniente da lide, na sequência da extinção da execução pelo Agente de Execução nos termos do n.º 2 do artigo 750º do CPC.
VIII. Se a procedência dos embargos extingue a execução no todo ou parte (artigo 732.º, n.º 4, do CPC), tornando inútil o respectivo prosseguimento, já a extinção da execução só torna supervenientemente inútil a oposição por embargos que à mesma tenham sido deduzidos, quando tal extinção seja definitiva por ter ocorrido o pagamento da quantia exequenda, em qualquer uma das modalidades possíveis (artigos 795.º, n.º 1, e 846.º do CPC), ou seja, por ter sido conseguida a satisfação do credor, já que a finalidade primeira da acção executiva é a de conseguir alcançar coercivamente para o credor “a mesma prestação, o mesmo benefício que lhe traria o cumprimento voluntário da obrigação por parte do devedor.
IX. Em reforço do que se acaba de concluir, salienta-se que mesmo a situação relativa à desistência do exequente, outra causa de extinção da execução, se estiverem pendentes embargos de executado, depende da aceitação do embargante (artigo 848.º do CPC), ou seja, o legislador deixa na esfera deste a apreciação da manutenção ou não do respectivo interesse no prosseguimento dos embargos.
X. Pretendendo a Recorrente, através dos embargos tempestivamente deduzidos, colocar em causa o próprio título executivo, visando a improcedência total da execução, a inutilidade superveniente da sua pretensão só ocorreria se, por via de um comportamento decisivo, como fosse o pagamento voluntário da quantia exequenda, aceita o direito do credor talqualmente este se encontra representado no título executivo (artigo 849.º, n.º 1, alínea a) do CPC).
XI. Não tendo sido assim, e tendo a execução sido extinta por uma outra qualquer razão que a lei consagra, em especial por não ser possível encontrar bens (artigo 750.º n.º 2 do CPC), podendo a instância executiva ser posteriormente renovada caso venham a ser encontrados e indicados bens penhoráveis que possam satisfazer integral ou parcialmente o referido desiderato (artigos 850.º, n.º 5 e 849.º, n.º 1, alíneas c), d) e e), do CPC), é patente que não está preenchido o pressuposto da inutilidade superveniente da lide quanto aos embargos deduzidos pretendem, precisamente, definir se o direito representado no título existe.
XII. A impossibilidade ou inutilidade superveniente da lide dá-se quando, por facto ocorrido na pendência da instância, a pretensão do autor não se pode manter, por virtude do desaparecimento dos sujeitos ou do objecto do processo, ou encontra satisfação fora do esquema da providência pretendida. Num e noutro caso, a solução do litígio deixa de interessar – além, por impossibilidade de atingir o resultado visado; aqui, por ele já ter sido atingido por outro meio.
XIII. Tendo a executada/recorrente deduzido tempestivamente oposição à execução, não pode considerar-se que a mesma ficou supervenientemente inútil com a extinção condicional da execução, a qual se pode renovar nos termos legais.
XIV. A extinção da execução, ao abrigo das alíneas c), d) e e) do artigo 849° do CPC, embora seja assim denominada, não se trata de uma "verdadeira" extinção da execução, mais não sendo do que uma mera suspensão ou extinção condicional da instância executiva, pois não colocam um fim definitivo à lide, podendo esta a todo o momento ser renovada e continuar a sua tramitação processual.
XV. A procedência dos embargos de Executado, esses sim, e nos termos em que foram deduzidos, visa a extinção - parcial ou total - dos autos de execução, mas, esta extinção já será, nos termos do artigo 732º n° 4 do CPC, definitiva.
XVI. Com a eventual procedência dos embargos de Executado, a lide executiva não mais pode ser “ressuscitada pelo Exequente”, ficando assim definitivamente julgada a sua extinção, desde logo, porque a decisão aí proferida forma caso julgado formal, tendo assim força obrigatória dentro do processo, nos termos do disposto no artigo 620° do CPC.
XVII. A presente lide não perdeu a sua razão de ser por força da extinção da execução nos termos do artigo 750.º n.º 2 do CPC, devendo os embargos prosseguir para decisão de mérito, nem ocorreu qualquer inutilidade superveniente, pois mantém-se quer o objecto do processo quer os sujeitos processuais.
XVIII. O despacho/sentença recorrida, ao julgar a instância extinta por inutilidade e/ou impossibilidade superveniente da lide, viola os direitos fundamentais da Recorrente, designadamente o direito de defesa previsto no art° 20° da CRP.
XIX. A Recorrente, em face da decisão proferida, pode-se futuramente deparar com a instância executiva renovada a pedido da Exequente, nos termos do disposto no art° 850, n° 5 do CPC, e ver os bens que futuramente venha a adquirir penhorados e vendidos, o que pretende ver desde já ser definitivamente resolvido, e apenas o poderá ser através do prosseguimento dos embargos.
XX. O entendimento aqui defendido foi o acolhido no douto Acórdão do Tribunal da Relação de Évora proferido em 22.09.2016 no processo n.º 71/13.0TBETZ-A.E1, disponível em www.dgsi.pt e em que foi relator a Exma. Sra. Desembargadora Albertina Pedroso.
XXI. A decisão recorrida viola o disposto nos artigos 277° alínea e), 731°, 732° n° 4, 750° n° 2, 849°, e 850° n° 5, todos do Código de Processo Civil, e o artigo 20° da Constituição da República Portuguesa.
XXII. Deve revogar-se a sentença recorrida, e em consequência, ordenar-se o prosseguimento dos autos de embargos de Executado a fim de ser proferida decisão de mérito.

Termina entendendo que deve ser concedido provimento ao recurso e revogada a sentença recorrida.

Não foram apresentadas contra-alegações.

O recurso foi admitido por despacho de fls. 22.
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

II. FUNDAMENTAÇÃO

O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso, tendo por base as disposições conjugadas dos artºs 608º, nº. 2, 635º, nº. 4 e 639º, nº. 1 todos do Novo Código de Processo Civil [doravante NCPC], aprovado pela Lei nº. 41/2013 de 26/6.

Nos presentes autos, o objecto do recurso interposto pela executada/embargante, delimitado pelo teor das suas conclusões, circunscreve-se à questão de saber se os presentes embargos de executado deviam ou não ter sido extintos por impossibilidade e inutilidade superveniente da lide, na sequência da extinção da execução pelo AE nos termos do artº. 750º, nº. 2 do NCPC.

Com relevância para a apreciação e decisão da questão suscitada no presente recurso, importa ter em consideração a dinâmica processual supra referida, em sede de relatório, e ainda a seguinte factualidade que resulta dos elementos constantes do processo de execução disponível na plataforma Citius:

1. O título executivo que serve de base à presente execução é um requerimento de injunção, entregue no Balcão Nacional de Injunções em 24/08/2009, no qual foi aposta fórmula executória em 23/10/2009 (cfr. requerimento executivo refª. Citius 1355830 no processo de execução electrónico).
2. Em 18/07/2016 o AE procedeu à notificação do exequente nos termos e para os efeitos do disposto no artº. 750º, nº. 1 do NCPC, por não ter sido possível determinar a existência de bens penhoráveis, o qual não indicou bens à penhora, tendo enviado ao AE a comunicação de 13/10/2016 acima referida (cfr. refª. Citius 4148165 no processo de execução electrónico).
3. Em 29/07/2016, o AE expediu carta registada com aviso de recepção, para citação da executada nos termos e para os efeitos do disposto no artº. 750º do NCPC, a qual foi recebida em 6/08/2016, não tendo a executada indicado bens à penhora (cfr. refª. Citius 4205043 e 4249231 no processo de execução electrónico).

*
Apreciando e decidindo.

Entende a recorrente que não se verifica a inutilidade superveniente dos presentes embargos de executado por força da extinção da execução pelo AE, pretendendo o prosseguimento dos mesmos para decisão de mérito, alegando, em síntese, que:

- a extinção da execução só torna supervenientemente inútil a oposição por embargos, quando tal extinção seja definitiva por ter ocorrido o pagamento da quantia exequenda, em qualquer uma das modalidades possíveis, ou seja, por ter sido conseguida a satisfação do credor;
- tendo a execução sido extinta por não ser possível encontrar bens penhoráveis, nos termos do artº. 750º, n.º 2 do NCPC, e podendo a instância executiva ser posteriormente renovada e continuar a sua tramitação processual, caso venham a ser encontrados e indicados bens penhoráveis que possam satisfazer integral ou parcialmente o direito do credor (não se tratando de uma "verdadeira" extinção da execução, mais não sendo do que uma mera suspensão ou extinção condicional da instância executiva, pois não coloca um fim definitivo à lide), não se mostra preenchido o pressuposto da inutilidade superveniente da lide quanto aos embargos deduzidos, que pretendem, precisamente, definir se o direito representado no título executivo existe;
- com a eventual procedência dos embargos de executado, a lide executiva não mais pode ser “ressuscitada” pelo exequente, ficando assim definitivamente julgada a sua extinção, uma vez que a decisão aí proferida forma caso julgado formal, tendo assim força obrigatória dentro do processo, nos termos do disposto no artº. 620° do NCPC;
- a sentença recorrida viola os direitos fundamentais da recorrente, designadamente o direito de defesa previsto no art°. 20° da CRP;
- a recorrente, em face da decisão proferida, pode-se futuramente deparar com a instância executiva renovada a pedido do exequente, e ver os bens que futuramente venha a adquirir penhorados e vendidos, o que pretende ver desde já ser definitivamente resolvido, podendo apenas fazê-lo através do prosseguimento dos embargos.

Vejamos se lhe assiste razão.

Como é sabido a finalidade da acção executiva é a de exigir e obter coercivamente o cumprimento de uma obrigação, que se pressupõe incumprida. A execução tem necessariamente de basear-se num documento, o título executivo, que determina o seu fim e os limites, nos termos do artº. 10º, nºs 5 e 6 do NCPC, sendo por ele que se conhece, com precisão, o conteúdo da obrigação do devedor.

Refere o Prof. José Lebre de Freitas (in A Acção Executiva à luz do Código de Processo Civil de 2013, 6ª ed., Coimbra Editora, pág. 193, 212 e 213) que a oposição do executado “visa a extinção da execução, mediante o reconhecimento da actual inexistência do direito exequendo ou da falta dum pressuposto, específico ou geral, da acção executiva”, assumindo “o carácter duma contra-acção tendente a obstar à produção dos efeitos do título executivo e (ou) da acção que nele se baseia. Quando veicula uma oposição de mérito à execução, visa um acertamento negativo da situação substantiva (obrigação exequenda), de sentido contrário ao acertamento positivo consubstanciado no título executivo (judicial ou não), cujo escopo é obstar ao prosseguimento da acção executiva mediante a eliminação, por via indirecta, da eficácia do título executivo enquanto tal”.

A oposição à execução mediante embargos é dependência do processo executivo, daí que a procedência dos embargos extinga a execução, no todo ou em parte, constituindo a decisão de mérito proferida nos embargos à execução, nos termos gerais, caso julgado quanto à existência, validade e exigibilidade da obrigação exequenda (cfr. artº. 732º, nºs 4 e 5 do NCPC).

Conforme se alcança dos autos, a execução, da qual os presentes embargos de executado são apenso, encontra-se extinta nos termos do nº. 2 do artº. 750º do NCPC, decorrendo da decisão recorrida que, encontrando-se extinta a execução, foi declarada extinta esta instância de embargos, por impossibilidade e inutilidade superveniente da lide, convocando o disposto na al. e) do artº. 277º do NCPC.

Dispõe o artº. 750º do NCPC o seguinte:

1 - Se não forem encontrados bens penhoráveis no prazo de três meses a contar da notificação prevista no n.º 1 do artigo 748.º, o agente de execução notifica o exequente para especificar quais os bens que pretende ver penhorados na execução; simultaneamente, é notificado o executado para indicar bens à penhora, com a cominação de que a omissão ou falsa declaração importa a sua sujeição a sanção pecuniária compulsória, no montante de 5% da dívida ao mês, com o limite mínimo global de 10 UC, se ocorrer ulterior renovação da instância executiva e aí se apurar a existência de bens penhoráveis.
2 - Se nem o exequente nem o executado indicarem bens penhoráveis no prazo de 10 dias, extingue-se sem mais a execução (sublinhado nosso).

Estatui o artº. 849º do NCPC, no que concerne à extinção da execução, que:

1 - A execução extingue-se nas seguintes situações:
a) Logo que se efetue o depósito da quantia liquidada, nos termos do artigo 847.º;
b) Depois de efetuada a liquidação e os pagamentos, pelo agente de execução, nos termos do Regulamento das Custas Processuais, tanto no caso do artigo anterior como quando se mostre satisfeita pelo pagamento coercivo a obrigação exequenda;
c) Nos casos referidos no n.º 3 do artigo 748.º, no n.º 2 do artigo 750.º, no n.º 6 do artigo 799.º e no n.º 4 do artigo 855.º, por inutilidade superveniente da lide;
d) No caso referido na alínea b) do n.º 4 do artigo 779.º;
e) No caso referido no n.º 4 do artigo 794.º;
f) Quando ocorra outra causa de extinção da execução.
2 - A extinção é notificada ao exequente, ao executado, apenas nos casos em que este já tenha sido pessoalmente citado, e aos credores reclamantes.
3 - A extinção da execução é comunicada, por via eletrónica, ao tribunal, sendo assegurado pelo sistema informático o arquivo automático e eletrónico do processo, sem necessidade de intervenção judicial ou da secretaria (sublinhado nosso).

Por sua vez, ajuizando acerca da renovação da execução extinta, prescreve o artº. 850º do mesmo Código, nos seus nºs 1 e 5, que:

1 - A extinção da execução, quando o título tenha trato sucessivo, não obsta a que a ação executiva se renove no mesmo processo para pagamento de prestações que se vençam posteriormente.
(…)
5 - O exequente pode ainda requerer a renovação da execução extinta nos termos das alíneas c), d) e e) do n.º 1 do artigo anterior, quando indique os concretos bens a penhorar, aplicando-se, com as necessárias adaptações, o disposto no número anterior (sublinhado nosso).

Verifica-se, assim, que para além da extinção da execução por consequência da revogação da sentença exequenda (proferida em instância de recurso), da procedência dos embargos de executado e do pagamento da quantia liquidada (entre outras), existem demais causas de extinção, entre as quais se pode enunciar a que decorre do facto de não serem encontrados nem indicados bens penhoráveis, o que se extrai, nomeadamente, do prescrito nos artºs 748º, nº. 3, 750º, nº. 2 (acima transcrito) e 855º, nº. 4 do NCPC.

E nestas situações, enunciadas na transcrita al. c) do nº. 1 do artº. 849º do NCPC, estamos perante casos “de inviabilidade da execução, por desconhecimento de bens penhoráveis ao executado” (cfr. Paulo Ramos de Faria e Ana Luísa Loureiro, Primeiras Notas ao Novo Código de Processo Civil, Vol. II, 2014, Almedina, pág. 377).

No caso que ora nos interessa, a extinção da instância executiva prevista no citado artº. 849º, nº. 1, al. c) conjugado com o artº. 750º, nº. 2 ambos do NCPC não se confunde com a impossibilidade ou inutilidade superveniente da lide prevista na al. e) do artº. 277º do mesmo Código.

Conforme escreve o Prof. José Lebre de Freitas (in Código do Processo Civil Anotado, vol. 1º, pág. 512, com a colaboração de João Redinha e Rui Pinto), “a impossibilidade ou inutilidade superveniente da lide dá-se quando, por facto ocorrido na pendência da instância, a pretensão do autor não se pode manter, por virtude do desaparecimento dos sujeitos ou do objecto do processo, ou encontra satisfação fora do esquema da providência pretendida. Num e noutro caso, a solução do litígio deixa de interessar – além, por impossibilidade de atingir o resultado visado; aqui, por ele já ter sido atingido por outro meio”.

A impossibilidade ou inutilidade superveniente é uma causa de extinção da instância que se traduz, assim, numa impossibilidade ou inutilidade jurídica da lide, cuja determinação tem por referência o estatuído na lei.

Explica o Prof. José Alberto dos Reis (in Comentário ao CPC, Vol. III, Coimbra Editora, pág. 369) que a lide pode tornar-se impossível pela extinção do sujeito, pela extinção do objecto ou pela extinção da causa, isto é, dum dos interesses em conflito; quando tal acontece "e por isso se extingue (a lide), é evidente que o processo não pode continuar. Costuma então dizer-se que o processo cessa, porque cessou a matéria da contenda".

Nesta situação, todavia, mesmo depois de extinta, pode a instância executiva renovar-se no mesmo processo, nomeadamente “mediante indicação superveniente de bens penhoráveis” por parte do exequente, não podendo tal indicação ser vaga ou genérica, antes se exigindo uma especificação individual, pois “a execução só se renova se, em consequência da efetiva descoberta da existência de concretos bens, o exequente os indicar, para poderem ser penhorados, prosseguindo a execução sobre eles” (cfr. Paulo Ramos de Faria e Ana Luísa Loureiro, ob. cit., pág. 379), sendo certo que, com a reforma operada em 2013 no Código de Processo Civil, “casos que davam lugar apenas à suspensão da execução passaram a constituir causa da sua extinção” (cfr. Prof. José Lebre de Freitas, A Acção Executiva à luz do Código de Processo Civil de 2013, 6ª ed., Coimbra Editora, pág. 415, nota 4-A e 420).

No caso em apreço, tratando-se de execução cuja extinção foi determinada ao abrigo do disposto no artº. 750º, nº. 2 do NCPC, é patente que não ocorreu, quer a extinção de qualquer dos sujeitos, quer a extinção do seu objecto, permanecendo o interesse que está na origem da instância executiva. A extinção da execução aí estatuída é apenas temporária, não obstando à renovação da instância executiva extinta a requerimento do exequente, nos termos do disposto no supra citado artº. 850º, nº. 5 do NCPC. Não ocorre, pois, qualquer impossibilidade ou inutilidade superveniente da execução.

Questão diversa é o que acontece à oposição que corre por apenso ao processo executivo extinto nos termos do artº. 750º, nº. 2 do NCPC.

Conforme resulta das alegações de recurso, a ora recorrente sustentou a sua posição no entendimento plasmado no acórdão do Tribunal da Relação de Évora proferido em 22/09/2016, no processo nº. 71/13.0TBETZ-A (acessível em www.dgsi.pt), que incidiu sobre semelhante situação, em que a instância dos embargos foi julgada extinta por inutilidade superveniente da lide, na sequência de extinção da execução operada pela Agente de Execução.

Na situação apreciada neste aresto, o património do executado já havia sido atingido ou afectado por diligência de penhora, já se havia concretizado desapossamento que se iria prolongar, sendo, por isso, lógica e consequente a necessidade de conhecimento da pertinência da oposição à execução apresentada, inexistindo lugar a qualquer juízo de inutilidade superveniente da lide de embargos de executado, que não ocorria nem era sustentável.

Em sentido idêntico pronunciou-se o aresto da Relação do Porto de 14/12/2017 (proc. nº. 24370/15.7T8PRT-A, acessível em www.dgsi.pt), no qual existiam penhoradas contas bancárias de um co-executado embargante, tendo-se operado inclusive pagamentos ao exequente, apesar da pendência de embargos, em violação do prescrito no nº. 4 do artº. 733º do NCPC. Considerou-se então que “estando pendentes embargos de executado e não obstante ter sido penhorado, contra a vontade do co-executado/embargante, saldos de contas bancárias suas, apesar da ocorrência de erro técnico da AE ao proceder aos pagamentos, em violação do disposto no nº. 4 do artº. 733º do C.P.Civil, e ao declarar extinta a execução, não se verifica qualquer inutilidade superveniente da lide dos embargos de executado”.

Tal entendimento veio a ser perfilhado também no acórdão da Relação de Évora de 23/03/2017 (proc. nº. 159/10.9TBPST-A, acessível em www.dgsi.pt), em que estava em causa uma situação de extinção de execução, não com base na alínea c) do nº. 1 do artº. 849º, em concatenação com o nº. 2 do artº. 750º ambos do NCPC, ou seja, por inexistência ou desconhecimento de bens penhoráveis, mas antes com base na alínea e) do mesmo normativo, isto é, causada por integral sustação da execução decorrente de penhora antecedente sobre os mesmos bens, o que determinou a reclamação do crédito no processo onde se concretizou a penhora mais antiga - situação prevista no artº. 794º, nºs 1 e 4, determinante, após reforma operada no Código de Processo Civil, de extinção da execução, quando no regime anterior era apenas causa de suspensão da execução (cfr. o antecedente artº. 871º do anterior CPC).

Ou seja, nesta situação, a execução havia sido extinta, por força do prescrito na alínea e) do nº. 1 do artº. 849º, em articulação com o nº. 4 do artº. 794º ambos do NCPC, sendo que o crédito que a sustentava iria ser reclamado nos autos executivos onde se havia operado a penhora mais antiga sobre o bem ou bens igualmente objecto de penhora na execução ora julgada extinta - pelo que, tendo sido nesta apresentada oposição à execução, mediante embargos, onde se alegaram factos modificativos e extintivos da obrigação exequenda, entende-se e justifica-se a sua subsistência, a manutenção da necessidade do conhecimento da oposição apresentada, inexistindo qualquer situação de inutilidade superveniente dos embargos.

Todavia, a situação subjacente ao caso em apreciação nestes autos reveste-se de diferentes contornos relativamente aos casos decididos nos arestos acima mencionados. A extinção da instância executiva, por impossibilidade e inutilidade superveniente da lide, ocorreu por falta de indicação de bens penhoráveis no prazo legalmente previsto, ao abrigo do disposto nos artºs 750º, nº. 2 e 849º, nº. 1, al. c) do NCPC, não tendo consequentemente sido penhorados quaisquer bens.

Não ocorreu, assim, ainda qualquer afectação do património da embargante/executada, que não se viu desapossada de quaisquer bens ou activo patrimonial.

E, por outro lado, ocorrendo a extinção da instância executiva pelo indicado fundamento, não a sustentou igualmente a necessidade de ir reclamar o crédito noutro processo executivo, onde tivesse sido concretizada penhora, com precedência, sobre os mesmos bens ora penhorados.

Nesta conformidade, coloca-se a questão de saber se os argumentos expostos naqueles arestos mantêm total validade na situação em apreço, ou seja, se se deverá concluir pela necessidade de manutenção da instância de embargos de executado, de forma a conhecer-se acerca da pertinência substantiva desta, ou se, em contraponto, será antes de manter o juízo de extinção da instância dos presentes embargos, por inutilidade superveniente da lide (e não por impossibilidade, conforme consta da decisão recorrida) - instância que sempre seria objecto de eventual renovação, caso viesse a ocorrer renovação da instância executiva, nos termos do nº. 5 do artº. 850º, ou seja, quando viessem a ser indicados, de forma concreta e especificada, bens a penhorar à ora embargante/recorrente.

Ora, foi esta a solução adoptada no acórdão da RP de 24/02/2015 (proc. nº. 33364/03.4TJPRT-A, acessível em www.dgsi.pt), que se debruçou sobre um caso idêntico ao dos presentes autos, no qual se refere que “o efeito principal dos embargos consiste, pois, na extinção da execução, no todo ou em parte. E tal efeito só é alcançável enquanto a execução puder prosseguir. Não assim quando a execução já tenha sido extinta nos termos do n.º 2 do art.º 750º do CPC, enquanto se não verificar a condição suspensiva estabelecida pelo art.º 850º, n.º 5 do CPC – não é possível extinguir aquilo que já foi extinto”.

Acrescenta, ainda, que “é certo que da decisão de mérito proferida nos embargos à execução resulta ainda um efeito de caso julgado quanto à existência, validade e exigibilidade da obrigação exequenda, que pode, em caso de procedência dos embargos, assumir interesse relevante para o executado. Trata-se, aqui, porém, de um efeito reflexo ou subordinado daquele efeito principal de extinção da execução. Encontrando-se a execução já extinta, nenhuma utilidade advém da prossecução dos embargos em sede de instância executiva. Renovando-se esta, recuperarão os embargos todas as suas virtualidades, impondo-se, então, o respectivo prosseguimento em paralelo com o processo de execução”.

Assim, revertendo o entendimento ali sufragado para o caso em apreço, extinta que foi a execução por inutilidade superveniente da lide, fundada na ausência de indicação de bens penhoráveis, sendo certo que nenhuns existem afectados nem o crédito foi reclamado noutra execução pendente, ir-se conhecer acerca do âmbito da oposição apresentada nos embargos de executado configurar-se-ia como um acto, pelo menos por ora, inútil, cuja prática está legalmente proibida (artº. 130º do NCPC).

Efectivamente, caso nunca se venha a operar a renovação da instância executiva declarada extinta, aquele conhecimento acerca da existência, validade e exigibilidade da obrigação exequenda é totalmente inútil, sendo que os Tribunais devem resolver questões concretas que lhes são colocadas, de forma a dirimirem litígios existentes e não satisfazer eventuais necessidades futuras ou acudir à resolução de questões latentes, mas sem tradução concreta em determinada data da sua ocorrência.

Pelo que, caso no futuro se venha a operar tal renovação da instância executiva declarada extinta, impor-se-á igual renovação da intentada instância da oposição à execução, mediante embargos, e conhecer-se-á acerca dos fundamentos de oposição, os quais, “in casu”, se traduzem, essencialmente, na nulidade da notificação do requerimento de injunção e consequente inexistência do título executivo em que se funda a execução, por não ter sido válida e regularmente constituído e, subsidiariamente, na inexistência de título executivo em virtude da falsidade da assinatura constante do contrato de crédito que é imputada à executada.

E, nem se afirme que, deste modo, se viola os direitos fundamentais da embargante/recorrente, designadamente o direito de defesa ou o direito a uma tutela jurisdicional efectiva, pois esta é totalmente salvaguardada, ficando apenas em latência, dependente de um juízo de necessidade de tutela, que ora não se verifica, pois a instância executiva encontra-se extinta, em nada afectando o reclamado direito da embargante à sua defesa por referência ao acto de agressão em que se consubstancia o intentado processo de execução.

Este entendimento, que aqui sufragamos, foi também acolhido no acórdão da RL de 7/06/2018, proferido no processo nº. 5362/15.2T8OER-A (acessível em www.dgsi.pt), no qual se apreciou um caso idêntico ao dos presentes autos.

Por tudo o que se deixou exposto, tendo ainda em atenção o princípio da economia processual, entendemos ser de manter a decisão recorrida que declarou extinta a presente instância de oposição à execução, mediante embargos, esclarecendo-se e concretizando-se que tal ocorre por inutilidade superveniente da lide (e não por impossibilidade), sem prejuízo da sua eventual renovação, caso venha a renovar-se a execução extinta, nos termos do nº. 5 do artº. 850º do NCPC.

Nestes termos, improcede o recurso interposto pela executada/embargante.
*
SUMÁRIO:

I) - Nas situações em que ocorre extinção da execução por inutilidade superveniente da lide, fundada na ausência de indicação de bens penhoráveis no prazo legalmente previsto, ao abrigo do disposto nos artºs 750º, nº. 2 e 849º, nº. 1, al. c) ambos do NCPC, não tendo sido penhorado quaisquer bens, nem o crédito exequendo sido reclamado noutra execução pendente, a instância de embargos de executado deverá ser declarada extinta por inutilidade superveniente da lide, sem prejuízo da sua eventual renovação, caso venha a renovar-se a execução extinta, nos termos do nº. 5, do artº. 850º, do mesmo Código.
II) - Encontrando-se a execução já extinta, nenhuma utilidade advém da prossecução dos embargos em sede de instância executiva. Renovando-se esta, recuperarão os embargos todas as suas virtualidades, impondo-se, então, o respectivo prosseguimento em paralelo com o processo de execução.

III. DECISÃO

Em face do exposto e concluindo, acordam os Juízes da Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães em julgar improcedente o recurso de apelação interposto pela executada/embargante Maria e, em consequência, confirmar a decisão recorrida.

Custas a cargo da recorrente.
Notifique.
Guimarães, 25 de Outubro de 2018
(processado em computador e revisto, antes de assinado, pela relatora)

(Maria Cristina Cerdeira)
(Raquel Baptista Tavares)
(Margarida Almeida Fernandes)