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ACÇÃO ESPECIAL PARA CUMPRIMENTO DE OBRIGAÇÕES PECUNIÁRIAS EMERGENTES DE CONTRATO
COMPENSAÇÃO
INADMISSIBILIDADE DA RECONVENÇÃO
Sumário
Sumário ( da relatora ):
I. Nos termos do artº 266º-nº2-al.c) do NCPC, pretendendo o Réu o “reconhecimento de um crédito”, com vista a obter quer a “Compensação”, ou o pagamento do valor em que o crédito invocado excede o do Autor, deverá realizar-se por via de “Reconvenção”, e não por defesa por excepção peremptória.
II. Sendo tal dedução legalmente inadmissível no Processo Especial (AECOP ) regulado pelo DL nº 269/98, de 1/9 (cfr. Cons. Salvador da Costa, in “A injunção e as Conexas Acção e Execução, Processo Geral Simplificado”, 6.ª Edição Actualizada e Ampliada, Almedina 2008, págs. 86 a 89, e, em sentido contrário Ac. STJ de 6/6/2017, P. 147667/15.5YIPRT.P1.S2, nomeadamente ).
Texto Integral
Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães
“X, Lda..”, Ré nos autos de acção especial para cumprimento de obrigações ao abrigo do D.L. 269/98, de 1/9, em curso, em que é Autora, “Y-Codificação, Marcação e Etiquetagem, Lda”, veio interpor recurso de apelação do despacho proferido nos autos em 9/7/2018, na parte em que se pronunciou sobre a excepção de Compensação deduzida pela Ré no articulado de oposição, julgando-a liminarmente improcedente, nos seguintes termos: “Atento o exposto, conclui-se que a compensação invocada pela Ré, na medida em que não foi formulado pedido reconvencional (pedido esse inadmissível atento o formalismo a que obedece apresente acção), é inoponível à Autora”.
O recurso foi recebido como recurso de apelação, com subida em separado e efeito meramente devolutivo.
Nas alegações de recurso que apresentou, a apelante formula as seguintes Conclusões:
1. Na sua oposição à injunção, a Recorrente invocou a compensação de créditos com base no facto de a Recorrida lhe ter vendido, pelo preço de € 12 300,00, um produto defeituoso e de nunca ter devidamente solucionado o problema, quer através de reparação ou substituição, apesar de a Recorrente lhe ter denunciado tais defeitos. 2. O Tribunal a quo pronunciou-se no despacho com a referência 159112756, concluindo “que a compensação invocada pela Ré, na medida em que não foi formulado pedido reconvencional (pedido esse inadmissível atento o formalismo a que obedece a presente ação) é inoponível à Autora.”, despacho este com o qual a Recorrente não se conforma. 3. Estatui a alínea c) do nº 2 do artigo 266º do Código de Processo Civil que: “A reconvenção é admissível (...) quando o réu pretende o reconhecimento de um crédito, seja para obter a compensação seja para obter o pagamento do valor em que o crédito invocado excede o do autor”, notando-se que esta norma, em rigor, apenas se refere aos casos em que a reconvenção é admissível, não versando sobre a possibilidade de utilização de diferente meio processual para obter a compensação, sendo certo que, a maior parte dos autores defende uma interpretação restritiva da norma, de modo a excluir da sua aplicação algumas situações que, no seu entender, têm de ser salvaguardadas sob pena de a defesa do réu ficar seriamente prejudicada. 4. José Lebre de Freitas, in “A Ação Declarativa Comum à Luz do Código de Processo Civil de 2013”, 4ª ed. GESLEGAL, Junho 2017, pp. 145-155, defende que a melhor interpretação a fazer do atual regime é de que nada mudou relativamente ao anterior, permanecendo a reconvenção fundada em compensação meramente facultativa. Isto porque, na opinião deste autor, a lei não diz que a compensação só pode ser feita valer em reconvenção, mas sim que é admissível como fundamento da reconvenção, e porque, ao réu, deverá sempre ser facultada a invocação da compensação por uma via ou por outra, sendo esta a tese que melhor se coaduna com o regime substantivo da compensação introduzido pelo Código Civil de 1966. 5. Já Adriano Vaz Serra salientava que, declarada judicial ou extrajudicialmente a compensação pela parte, não pode o tribunal decidir, sem mais, que o demandado deve pagar o crédito do demandante, já que o demandado tem o direito de não pagar, na medida em que a sua dívida se compense com uma dívida do demandante para com ele. Este autor alertava também que, nas formas de processo em que não seja admissível a reconvenção, não pode o demandado ficar provado do direito à compensação, sendo esta, então, invocada por exceção perentória. 6. Neste sentido, o Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 16/01/2018, Proc. nº 12373/17.1YIPRT-A.C1, disponível in www.dgsi.pt, no qual se considera, precisamente, que a compensação pode ser feita valer por outro meio que a reconvenção, sendo certo que, em processo onde seja vedada a dedução de reconvenção, ao réu terá de ser facultada a possibilidade de invocar a compensação por via de exceção, sob pena de lhe ser coartado um importante meio de defesa. 7. Contudo, caso o Tribunal ad quem de outro modo entenda e considere que a compensação de créditos terá sempre de ser operada por via da reconvenção, com certeza concordará que esta posição, que veda no processo especial previsto no Decreto-Lei nº 269/98, de 01 de Setembro, a possibilidade de invocação da compensação de créditos, tem conduzido a resultados incómodos, tendo vindo, por isso, a ser objeto de apreciação crítica no plano doutrinal. 8. Miguel Teixeira de Sousa, na sua publicação de 26/04/2017 no blog do Instituto Português de Processo Civil, sob o título “AECOPs e compensação”, disponível in https://blogippc.blogspot.com/2017/04/aecops-e- compensacao.html, defende que, uma vez que as AECOPs são um processo especial, sendo, por isso, reguladas “pelas disposições que lhes são próprias e pelas disposições gerais e comuns” (artigo 549º, nº 1, do Código de Processo Civil), atendendo à admissibilidade da reconvenção regulada no artigo 266º do Código de Processo Civil e a sua inclusão nas disposições gerais e comuns deste diploma, “parece não se suscitar nenhumas dúvidas quanto à sua aplicação às AECOPs.” 9. Miguel Teixeira de Sousa acrescenta que o regime anexo ao Decreto-Lei nº 269/98, de 01 de Setembro, é insuficiente para regular as AECOPs, sendo “indiscutivelmente necessário aplicar, em tudo o que não esteja previsto nesse regime, o que consta do CPC”. Claro que se pode alegar que a tramitação simplificada e célere deste regime não é compatível com a dedução de um pedido reconvencional pelo demandado, contudo, “se não se admitir a possibilidade de o réu demandado numa AECOP invocar a compensação ope reconventionis, essa mesma compensação pode vir a ser posteriormente alegada pelo anterior demandado como fundamento da oposição à execução (cf. art. 729.°, al. h), CPC); ora, como é evidente, não tem sentido coarctar as possibilidades de defesa do demandado na AECOP e possibilitar, com isso, a instauração de uma execução que, de outra forma, poderia não ser admissível. A economia de custos na AECOP traduzir-se-ia afinal num desperdício de recursos, ao impor-se que aquilo que poderia ser apreciado numa única acção tivesse de ser decidido em duas acções.” 10. Concluindo-se que o demandado, numa AECOP, pode invocar a compensação por via de reconvenção, cabendo ao juiz fazer uso dos seus poderes de gestão processual e de adequação formal, nos termos dos artigos 6º e 547º do Código de Processo Civil, para ajustar a tramitação da AECOP à dedução do pedido reconvencional. 11. A argumentação expendida por Miguel Teixeira de Sousa, reproduzida no Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 13/06/2018, Proc. nº 26380/17.0YIPRT.P1, disponível in www.dgsi.pt, foi suficiente alterar a posição do relator deste acórdão, Rodrigues Pires, sobre a matéria expressa no Acórdão da Relação do Porto de 12/05/2015, entendendo agora “que deve ser dada a possibilidade ao demandado de no âmbito de uma ação especial para cumprimento de obrigações pecuniárias (AECOP) invocar a compensação de créditos por via de reconvenção, devendo o juiz fazer uso dos seus poderes de adequação formal e também de gestão processual (art. 6º do Cód. do Proc. Civil) de forma a ajustar a tramitação da AECOP à dedução do pedido reconvencional.” 12. Esta é principalmente uma questão de justiça material. Questiona-se o porquê de a reconvenção ser admitida quando o procedimento de injunção tem valor superior a metade da alçada do tribunal da relação, por força da sua transmutação em processo comum, e não quando o seu valor é inferior - inviabilizando esta forma de compensação de créditos -, uma vez que inexiste motivo de justiça material que justifique este tratamento desigual. Neste sentido, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 06/06/2017, Proc. nº 147667/15.5YIPRT.P1.S2, disponível in www.dgsi.pt. 13. Deste modo, suporta a jurisprudência mais atual que, quer pela via da exceção, quer através de reconvenção, deverá sempre ser admitida a compensação de créditos invocada pela aqui Recorrente, sendo esta oponível à Recorrida.
Termos em que o douto despacho recorrido deve ser substituído por outro que admita a compensação de créditos invocada pela Recorrente.
Não foram proferidas contra – alegações.
O recurso veio a ser admitido neste tribunal da Relação na espécie e com os efeitos e regime de subida fixados no despacho de admissão do recurso na 1ª instância.
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
Delimitação do objecto do recurso: Questões a decidir.
O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações do recorrente, não podendo o tribunal conhecer de quaisquer outras questões “salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras “ ( artº 635º-nº3 e 608º-nº2 do Código de Processo Civil ) - Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 21/10/93, CJ. Supremo Tribunal de Justiça, Ano I, tomo 3, pg.84, e, de 12/1/95, in CJ. Supremo Tribunal de Justiça, Ano III, tomo I, pg. 19.
E, de entre estas questões, excepto no tocante aquelas que o tribunal conhece ex officio, o tribunal de 2ª instância apenas poderá tomar conhecimento das questões já trazidas aos autos pelas partes, nos termos do artº 5º do Código de Processo Civil , não podendo a parte nas alegações de recurso e respectivas conclusões vir suscitar e requerer a apreciação de questões ou excepções novas.
Atentas as conclusões da apelação deduzidas, e supra descritas, são as seguintes as questões a apreciar:
- pode o Réu na contestação excepcionar a compensação, quer pela via da excepção, quer através de reconvenção ? - no âmbito de uma acção especial para cumprimento de obrigações pecuniárias (AECOP) regulada pelo D.L. 269/98, de 1/9, pode o Réu invocar a compensação de créditos por via de reconvenção ?
FUNDAMENTAÇÃO ( de facto e de direito )
1. Nos presentes autos de acção especial para cumprimento de obrigações ao abrigo do D.L. 269/98, de 1/9, em curso, em que é Autora, “Y-Codificação, Marcação e Etiquetagem, Lda”, e Ré, “X, Lda..”, veio a Ré interpor recurso de apelação do despacho proferido nos autos em 9/7/2018, na parte em que se pronunciou sobre a excepção de Compensação deduzida pela Ré no articulado de oposição, julgando-a liminarmente improcedente, nos seguintes termos: “Atento o exposto, conclui-se que a compensação invocada pela Ré, na medida em que não foi formulado pedido reconvencional (pedido esse inadmissível atento o formalismo a que obedece apresente acção), é inoponível à Autora”. 2. Alega a recorrente que pode o Réu na contestação excepcionar a compensação, quer pela via da excepção, quer através de reconvenção, e, que, de acordo com a doutrina e jurisprudência mais recentes deve considerar-se que mesmo no âmbito de uma ação especial para cumprimento de obrigações pecuniárias (AECOP) pode o Réu invocar a compensação de créditos por via de reconvenção.
Com o devido respeito, tratando-se de questão controversa, em discussão na doutrina e jurisprudência, nomeadamente, nas obras e arestos jurisprudenciais indicados no despacho recorrido e pela recorrente em sede de alegações, afastamo-nos da posição preconizada pela recorrente, aliás, nos seguimento de anteriores Ac. deste colectivo, adoptando-se a posição já expressa na decisão recorrida, designadamente na fundamentação já aí expressa :
“ … A requerida deduziu contestação e compensação de créditos em virtude do cumprimento defeituoso do contrato que determina a resolução do mesmo.
Estes procedimentos especiais (injunção e acção declarativa especial) destinam-se exigir o cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contratos de valor não superior a € 15.000,00, nos termos do artigo 1.º de tal Decreto-Lei.
Este diploma legal, visando o descongestionamento dos Tribunais Judiciais, instituiu um regime processual especial, orientado pelos princípios da celeridade, da simplicidade e da eficácia processuais, criando as formas processuais especiais da acção declarativa especial para cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contratos e da injunção.
Ora, uma das consequências de tais princípios orientadores é precisamente a inadmissibilidade de reconvenção.
Na verdade, percorrendo o diploma legal em causa e o seu desiderato, e interpretando literal e teleologicamente as normas nele contidas, a doutrina e a jurisprudência têm sido unânimes ao rejeitar a possibilidade de dedução de reconvenção neste tipo de procedimentos.
Desde logo, porque tal lei apenas prevê para esta forma processual dois articulados, estabelecendo mesmo que a contestação só é notificada ao autor com a notificação do despacho que designa julgamento (artigo 1.º). E, nessa sequência, a resposta às excepções deduzidas na contestação só pode ocorrer, oralmente, no início da audiência.
Por outro lado, porque a admissão da reconvenção não seria compatível com a simplicidade de tramitação e a celeridade de resolução dos casos, objectivos decisivos do legislador com a instituição desta forma processual.
Finalmente, o afastamento da reconvenção não põe em causa nenhum dos direitos de defesa do réu.
Veja-se a propósito o ensinamento e os argumentos apresentados por Salvador da Costa in “A injunção e as Conexas Acção e Execução, Processo Geral Simplificado”, 6.ª Edição Actualizada e Ampliada, Almedina 2008, págs. 86 a 89, dos quais se destaca a seguinte conclusão: “Daí resulta a intencionalidade da lei no sentido de proibir a dedução de pedido reconvencional na espécie processual em causa, o que, aliás, está de acordo com a simplificação que a caracteriza, em função da reduzida importância dos interesses susceptíveis de a envolver ou da estrutura do litígio em causa. (…) Não se prevê que esta solução legal afecte o direito de defesa do réu, certo que este, se tiver para tal algum fundamento legal, pode fazer valer em acção própria a situação jurídica que eventualmente possa estar de algum modo conexionada com aquela que o autor faz valer na acção.(…)”.
Por outro lado, o artigo 266º, n.º 2, alínea c) do CPC consagrou a opção legislativa de obrigatoriedade de apresentação da compensação na reconvenção”.
3. Com efeito, e, no tocante á primeira questão em apreciação, no sentido de saber se “pode o Réu na contestação excepcionar a compensação, quer pela via da excepção, quer através de reconvenção”, vimos considerando que relativamente ao exercício do direito de Compensação em acção judicial em curso, estabelecendo, actualmente, o NCPC, nos termos do artº 266º-nº2-al.c) do CPC, que pretendendo o Réu o “reconhecimento de um crédito”, com vista, quer a obter a “Compensação”, por si só, ou para obter o pagamento do valor em que o crédito invocado excede o do Autor, a Compensação, relativa a créditos ainda não reconhecidos, terá, por expressa opção legislativa, de realizar-se por via de “Reconvenção”, e não por defesa por excepção peremptória, mais se considerando, deste modo, tal preceito ter posto fim a acesa discussão doutrinária e jurisprudencial, maxime nos casos em que o contra-crédito invocado pelo Réu não excedia o valor do crédito peticionado na acção e o Réu pretendia obter a extinção total ou parcial do seu crédito por via de compensação.
- No mesmo sentido v. Abilio Neto, in “Novo Código de Processo Civil, anotado, Janeiro 2104, p, 307, 308, Acórdão do TRL, 16/11/2016, P. 3942/15.5T8CSC-A.L1-4, TRC de 7/6/2016, P. in www.dgsi.pt ; Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luis Filipe Pires de Sousa, in Código de Processo Civil Anotado, Vol I, 2018, pg. 304 – “ Por agora o que podemos afirmar … e a manifesta vontade do legislador de alterar o paradigma anterior parecem induzir a conclusão de que, sempre que o réu pretenda invocar um contra-crédito com vista a obter a improcedência da ação ( por extinção do crédito do autor ) ou a obter a condenação do autor no pagamento do valor remanescente, deve agir através da dedução de reconvenção”.
O que consideramos verificar-se, indubitavelmente em relação a créditos não reconhecidos (v. dúvidas suscitadas in CPC Abrantes Geraldes, obra e pg. citada ).
Com efeito, sob a epígrafe “ Admissibilidade da Reconvenção“, dispõe o art.º 266º do Código de Processo Civil:
“ 1. O Réu pode, em reconvenção, deduzir pedidos contra o autor. 2. A reconvenção é admissível nos seguintes casos:
a) Quando o pedido do réu emerge do facto jurídico, que serve de fundamento à acção ou à defesa;
b) Quando o réu se propõe obter a compensação ou tornar efectivo o direito a benfeitorias ou despesas relativas à coisa cuja entrega lhe é pedida;
c) Quando o Réu pretende o reconhecimento de um crédito,seja para obter a compensação, seja para obter o pagamento do valor em que o crédito invocado excede o do autor”.
d) Quando o pedido do réu tende a conseguir, em seu benefício, o mesmo efeito jurídico que o autor se propõe obter
Concluindo-se que a compensação deve ser invocada em acção judicial, pelo Autor por via de acção, ou pelo Réu, actualmente, por via de Reconvenção nos casos previstos no artº 266º-nº2-al.c) do NCPC, quando o direito do Réu ainda não esteja reconhecido, com vista a obter a extinção do crédito do Autor.
Nos termos do disposto no art.º 847º-n.º1 do Código Civil, “Quando duas pessoas sejam reciprocamente credor e devedor, qualquer delas pode livrar-se da sua obrigação por meio de compensação com a obrigação do seu credor, verificados os seguintes requisitos: a) Ser o seu crédito exigível judicialmente e não proceder contra ele excepção, peremptória ou dilatória, de direito material; b) Terem as duas obrigações por objecto coisas fungíveis da mesma espécie e qualidade.
Mais estabelecendo o n.º2 do citado artigo que “ Se as duas dividas não forem de igual montante, pode dar-se a compensação na parte correspondente.”
“ A compensação é uma forma de extinção das obrigações em que, no lugar do cumprimento, como sub-rogado dele, o devedor opõe o crédito que tem sobre o credor. Ao mesmo tempo que se exonera da sua divida, o compensante realiza o seu crédito por uma espécie de acção directa.” (P.Lima e A. Varela, in C.Civil anotado, volume II, pg. 117 ).
Distinta da exigibilidade judicial do crédito, imposta pelo art. 847º- nº1, é o reconhecimento judicial do mesmo, não obstante só possa operar-se a compensação caso ambos os créditos venham a ser reconhecidos na acção judicial em que se discutem.
“ (…) um dos requisitos da compensação é o crédito do compensante ser judicialmente exigível, mas esse requisito nada tem a ver com um prévio reconhecimento judicial ou extrajudicial do crédito. A exigibilidade em questão significa outra coisa: diz respeito à possibilidade de o compensante poder impor à outra parte a realização coactiva do seu crédito” – Ac. Supremo Tribunal de Justiça, de 6/7/06, P. 06S1067 e de 2/7/2015, P. 91832/12.3YIPRT-A.C1.S1, in www.dgsi.pt.
No mesmo sentido, aponta o actual artº 266º-nº2-al.c) do CPC, o qual se refere ao exercício do direito de Compensação por via de “reconhecimento do crédito” do compensante, em sede de Reconvenção (v. artº em referência - 2. A reconvenção é admissível nos seguintes casos: (...) c) Quando o Réu pretende o reconhecimento de um crédito, seja para obter a compensação, seja para obter o pagamento do valor em que o crédito invocado excede o do autor”.
Concluindo-se, nos termos expostos, e, desde logo, pela liminar improcedência da excepção de Compensação deduzida pela Ré na contestação, como decidido na sentença recorrida, só podendo tal excepção ser deduzida por via de Reconvenção nos termos do artº 266º-nº2-al.c) do NCPC, pois que o direito de crédito invocado e a compensar não se encontrava ainda reconhecido, nesta parte, consequentemente, improcedendo os fundamentos da apelação.
4. E, também relativamente á segunda questão suscitada, no sentido de saber se no âmbito de uma acção especial para cumprimento de obrigações pecuniárias (AECOP) pode o Réu invocar a compensação de créditos por via de reconvenção, julgamos improcedentes os fundamentos da apelação, considerando-se, a par, nomeadamente, dos ensinamentos de Salvador da Costa in obra citada, e jurisprudência até ora maioritária, que no âmbito do processo especial previsto no DL n.º 269/98, de 01.9, não é admissível reconvenção, por via de expressa opção legislativa “… resulta a intencionalidade da lei no sentido de proibir a dedução de pedido reconvencional na espécie processual em causa, o que, aliás, está de acordo com a simplificação que a caracteriza…”,intencionalidade esta, cremos, que impede qualquer actuação ou intervenção judicial em sentido contrário no âmbito de concreta acção judicial.
V. no sentido acima indicado- Ac. TRLisboa de 7/6/2016, P. 139381/13.2YIPRT.C1, “1. Face à redacção do art.º 266º, n.º 2, alínea c), do CPC de 2013 é de concluir que foi intenção do legislador estabelecer que a compensação de créditos terá sempre de ser operada por via da reconvenção, independentemente do valor dos créditos compensáveis,quando o direito do réu ainda não esteja reconhecido. 2. No âmbito do processo especial previsto no DL n.º 269/98, de 01.9, no qual não é admissível reconvenção, não é possível operar a compensação de créditos por via de excepção, excepto se o direito do réu já estiver reconhecido judicialmente ou pelo próprio devedor. 3. Tal interpretação não é inconstitucional, porquanto não viola os princípios do acesso ao direito e da tutela jurisdicional efectiva (art.º 20º da CRP).”; Ac. TRPorto de 30/11/2015, P. 869/14.1TBMAI.P1 – “I - Perante o disposto no artigo 266.º, n.º 2, alínea c), do Código de Processo Civil, sempre que o réu pretenda o reconhecimento de um crédito, seja para obter a compensação seja para obter o pagamento do valor em que o crédito invocado excede o do autor, deverá exercer o seu direito por via reconvencional, não se limitando a invocar exceção ou a confirmar a sua verificação. II - A prévia declaração extrajudicial (unilateral) de compensação de crédito não permite subtrair o consequente pedido de compensação ao regime previsto no artigo 266.º, n.º 2, alínea c), do Código de Processo Civil, mantendo-se a necessidade de formulação de reconvenção”, todos in www.dgsi.pt.
5. Não se vislumbrando a violação de quaisquer preceitos constitucionais decorrentes da interpretação da norma em referência do artº 266º-nº1 e 2 –al. c) do CPC, ou da sua aplicação ou teor, mesmo nos casos em que a reconvenção não é admitida no processo especial previsto no DL n.º 269/98, de 1-9, não ficando o Réu inibido de propor acção própria com vista á efectivação do direito, faculdade que se mantém e se não esgota na acção especial em referência”.
E, no mesmo sentido, neste TRG – P. 69039/16.0YIPRT.G1, de 22/6/2017, relatora Des. Ana Cristina Duarte, P. 10412/16.2YIPRT.G1, de 27/4/2017, relator Des. Beça Pereira, todos in www.dgsi.pt
Aliás, salienta-se, não é apenas a dedução de Compensação que fica impedida pela não admissibilidade legal de reconvenção nas indicadas acções de processo especial (AECOP) previsto no DL n.º 269/98, de 01.9, mas o exercício de qualquer dos direitos legalmente previstos no artº 266º-nº e 2- als. do CPC e a operar por via de pedido reconvencional, afigurando-se que a posição defendida pela apelante tenderá á total inversão ou esvaziamento da norma, tratando-se de norma legal de teor expresso.
Concluindo-se, nos termos expostos, pela improcedência do recurso de apelação.
DECISÃO
Pelo exposto, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar improcedente o recurso de apelação, confirmando a decisão recorrida.
Guimarães, 17 de Dezembro de 2018
Maria Luísa Ramos
António Júlio da Costa Sobrinho
Jorge Teixeira