CONDUÇÃO DE VEÍCULO EM ESTADO DE EMBRIAGUEZ
ALCOOLÍMETROS
VERIFICAÇÃO DO APARELHO
Sumário


I – Os alcoolímetros quantitativos estão sujeitos a uma verificação periódica anual, isto é, a realizar todos os anos civis, e cada verificação periódica é válida até ao dia 31 de Dezembro do ano seguinte ao da sua realização.

II - Tendo sido utilizado na realização da contraprova um alcoolímetro quantitativo que fora objeto de verificação pelo IPQ em 10/05/2016, tal verificação manteve-se válida até ao dia 31/12/2017, abrangendo, por isso, o exame toxicológico realizado ao arguido no dia 18/06/2017.

Texto Integral


Acordam, em conferência, na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora:

RELATÓRIO.

Decisão recorrida.

No processo comum nº73/17.7GDSRP, procedente do Juízo de Competência Genérica de Serpa do Tribunal Judicial da Comarca de Beja, o arguido LR, devidamente identificado nos autos, sob acusação do Ministério Público, foi pronunciado e posteriormente submetido a julgamento perante tribunal singular, vindo por sentença de 19-06-2018, a ser condenado pela prática de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, pp. pelas disposições conjugadas dos arts.292º nº1 e 69º nº1 al. a), do Código Penal, na pena de 60 dias de multa à taxa diária de seis euros (€ 6,00),sendo descontado 1 dia na multa por ter sido sujeito a detenção (art.80º, do C. Penal) e na pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor pelo período de quatro (4) meses.

Na sentença foi ainda julgada improcedente a questão invocada pelo arguido sobre a inadmissibilidade/proibição da prova sobre a medição da taxa de álcool no sangue obtida através do alcoolímetro DRAGER, 7110 MKIII P, ARAN-0030, utilizado aquando do teste realizado (18-06-2017) por já ter expirado o prazo de 1 ano (em 10-05-2017), contado da data da verificação do aparelho pelo IPQ, em 10-05-2016.

Recurso.

Inconformado com esta decisão o arguido interpôs o presente recurso, pugnando pela sua absolvição, extraindo da respectiva motivação as seguintes (transcritas) conclusões:

a) Por Sentença do Juízo de Competência Genérica de Serpa, o Recorrente foi condenado na pena de 59 dias de multa à taxa diária de € 6.00 (seis euros), bem como na pena acessória de proibição de veículos motorizados pelo período de quatro meses.

b) Não se pode o Recorrente conformar com esta sentença, pois a prova fundamental para esta condenação foi a leitura junta aos autos, feita pelo alcoolímetro marca Drager, modelo 7110 MKIIIP, número ARAN-030, aprovado pelo despacho n." 19684/2009, da ANSR, de 25 de junho, e pelo IPQ através do Despacho n. ° 211.06.07.3.06, de 24 de abril de 2007 e verificado também pelo IPQ em 10/05/2016.

c) O Tribunal a quo, ao acompanhar a tese recente da jurisprudência, condescendente com a falta de validade dos aparelhos e com a sua não conformidade, não cumpriu com a sua missão de fazer uma justiça equitativa e cumpridora da Constituição, ao dar todas as oportunidades de defesa ao Arguido.

d) Ao validar o controlo metrológico do alcoolímetro em crise, o Tribunal a quo fez uma má interpretação do legislado, pois a prova foi obtida pela leitura feita no alcoolímetro marca Drager, modelo 7110 MKIIIP, número ARAN-030, aprovado pelo despacho n.º 19684/2009, da ANSR, de 25 de junho, e pelo IPQ através do Despacho n.º 211.06.07.3.06, de 24 de abril de 2007 e verificado também pelo IPQ em 10/05/2016, tendo a sua validade expirada à data dos factos, 18/06/2017;

e) O Art.º 4.°, n.º 5 do D.L. n." 291/90, de 20 de setembro, prescreve que a verificação periódica é válida até 31 de dezembro do ano seguinte ao da sua realização, salvo regulamentação específica em contrário, que entendemos existir.

f) Já que Regulamento do Controlo Metrológico dos Alcoolímetros, Lei n.º 18/2007, de 17 de maio e a Portaria n.º 1556/2007, de 10 de dezembro, impôs verificações periódicas anuais a estes instrumentos de medição, conforme o Art.º 7°, n.º 2 daquela portaria.

g) Isto é, o regime geral do Decreto-Lei n.º 291/90 foi, no nosso entendimento, derrogado pelo regime especial da Portaria n.º 1556/2007, ao fixar um ano de validade para estes aparelhos, independentemente de qualquer tipo de verificação.

h) E só assim se pode compreender a intenção do legislador, pois os alcoolímetros devem ser fiáveis e merecedores de confiança total, já que constituem um elemento de prova fundamental em Tribunal.

i) Aliás na esteira do Acórdão da Relação de Évora de 13/11/2012, sendo Relator o Sr. Desembargador Martinho Cardoso, lido in www.dgsi.pt.

j) Caso assim não se entenda, suscita-se a se suscita a inconstitucionalidade do Art. ° 4.°, n.º 2, do Decreto-Lei nº 291/90, de 20 de setembro, quando dispensa de verificação periódica os instrumentos de medição, até 31 de dezembro do ano seguinte, por estar em contradição com a Lei especial da Portaria n.º 1556/2007, de 10 de dezembro, quando esta define a validade como anual.

k) O texto do referido n.º 2, do artigo acima indicado, deve ser revogado, ou substituído por outro, que defina ser um ano a validade dos aparelhos, mesmo após a sua primeira verificação.

1) Não se trata de qualquer nulidade ou irregularidade da prova, mas sim da total ausência de prova, de que, na data da alegada infracção, o Recorrente conduzisse sob a influência de álcool, por o alcoolímetro utilizado, face à falta da verificação anual imposta por lei, não merecer qualquer fiabilidade e não devendo servir como prova incriminatória.

m) Também merece censura, com todo o respeito, a sentença considerar ter o Recorrente agido com dolo directo fundamentando a sua decisão recorrendo às regras da normalidade e da experiência atento o facto que deu como provado de o arguido ter ingerido bebidas alcoólicas; saber que as ingerira e decidir conduzir na via pública o automóvel.

n) Ora, para se aferir do dolo e da negligência, nos termos e para os efeitos do Art.º 292º, n.º 1 do Código Penal, o elemento ao qual se deve atender é a consciência da embriaguez e não o facto de ingerir bebidas alcoólicas e isso não ficou provado neste processo.

o) Nem nas declarações do Recorrente, nem nos depoimentos dos dois guardas da GNR, ficou provado o Recorrente ter consciência que tinha ingerido bebidas alcoólicas em excesso ou ter uma condução perigosa, reveladora desse excesso.

p) Deste modo, a douta sentença recorrida enferma do vício previsto no Art.º 410.°, n.º 2, alínea a), do Código Processo Penal.

q) Destarte, falecem as provas apresentadas pelo Ministério Público pelo que será da mais elementar justiça apelar ao princípio in dúbio pro reo, pedindo a absolvição do Arguido/Recorrente em todas as acusações.

Nestes Termos e nos mais de Direito que doutamente serão supridos, deve ser a Sentença Recorrida revogada, determinando-se a revogação da sentença com a absolvição do Arguido/Recorrente, por falta de fundamento das provas.

Contra motivou o Ministério Público na 1ª Instância defendendo o acerto da decisão recorrida, concluindo nos seguintes termos:

1. No dia 18 de Junho de 2017, o ora recorrente foi submetido a exame no alcoolímetro de marca "Drager", modelo "7119 MKIII", número "ARAN-0030", tendo acusado taxa de álcool no sangue superior a 1, 20 g/1.

2. Este aparelho alcoolímetro foi sujeito a primeira verificação pelo I.P.Q. em 10 de Maio de 2016, sendo válido até 31 de Dezembro de 2017, nos termos do artigo 4.º n.º 2 e n.º 5 do Decreto-Lei n.º 291/90, de 20 de Setembro.

3. Da interpretação conjunta do artigo 4.º n.º 5 do Decreto-Lei n.º 291/90 e do artigo 7.º n.º 2 da Portaria 1556/2007 significa que os aparelhos têm de ser sujeitos a, pelo menos, uma verificação em cada ano civil, sendo esta válida até 31 de Dezembro do ano seguinte.

4. O alcoolímetro utilizado na fiscalização ao ora recorrente encontrava-se regularmente verificado, sendo o resultado do exame realizado admissível e válido.

5. Como se retira dos factos dados como provados, o ora recorrente ingeriu bebidas alcoólicas e sob o seu efeito, conduziu um veículo automóvel, inferindo-se que praticou esta conduta de forma dolosa.

6. O ora recorrente cometeu o crime de condução em estado de embriaguez previsto e punível no artigo 292.º n.º 1 do Código Penal, pelo qual foi pronunciado.

7. A douta sentença recorrida fez uma correcta e ponderada apreciação da prova produzida e a matéria de facto provada na sentença recorrida é suficiente para decisão de direito proferida.

8. O Tribunal a quo não violou qualquer disposição legal, nomeadamente as invocadas pelo recorrente.

Nesta Relação o Exmº Senhor Procurador-Geral Adjunto acompanha a argumentação expendida na resposta ao recurso, sendo também de parecer que o recurso dever julgado totalmente improcedente com a consequente manutenção da sentença recorrida.

Observado o disposto no nº2 do art.417º, do CPP não foi apresentada resposta.

Efectuado o exame preliminar e colhidos os vistos teve lugar a conferência.

Cumpre apreciar e decidir.

FUNDAMENTAÇÃO.

Poderes de cognição deste Tribunal. Objecto do recurso. Questões a examinar.

Sendo como é sobejamente sabido e constitui jurisprudência uniforme que o objecto dos recursos é delimitado pelas conclusões extraídas pelo recorrente da respectiva motivação (art.412º nº1, do CPP), fazendo a sua síntese as questões que delas emergem e que aqui reclamam solução, sem prejuízo de outras de conhecimento oficioso, consistem em saber:

1.º Se é válido ou inválido o meio de obtenção da prova relativa à medição da taxa de alcoolemia obtida através do alcoolímetro (quantitativo) utilizado e por conseguinte se a prova é ou admissível;

2.º Se ocorre o vício – insuficiência para a decisão da matéria de facto provada - previsto na al. a) do nº2 do art.410º do CPP; e

3. º Se o arguido deve beneficiar da aplicação do princípio “in dubio pro reo”.

O Tribunal recorrido deu como provado e não provado a seguinte factualidade:

Da acusação
1. No dia 18 de Junho de 2017, pelas 2 horas e 42 minutos, na Estrada Nacional 386, Brinches, concelho de Serpa, o arguido conduzia o veículo ligeiro de mercadorias de matrícula "-AM".

2. Em tais circunstâncias, o arguido ao conduzir na via pública, fê-lo após ter ingerido bebidas alcoólicas, as quais lhe determinaram uma taxa de alcoolemia de, pelo menos, 1,63 g/l (taxa a que se chegou após a dedução da margem erro máximo relativa aos 1,72 g/l do aparelho).

3. O arguido agiu livre, deliberada e conscientemente, com o propósito concretizado de conduzir o mencionado veículo na via pública, bem sabendo que havia ingerido bebidas alcoólicas em excesso e que, por isso, não podia conduzir veículos na via pública em tais condições, sendo que, não obstante esse conhecimento, quis adoptar tal comportamento.

4. O arguido sabia que a sua conduta era proibida e punida por lei penal.
5. O arguido não possui antecedentes criminais averbados no seu certificado de registo criminal.

Das condições pessoais e económicas do arguido
6. O arguido nasceu em 3 de Julho de 1987.
7. É solteiro.
8. Vive com uma companheira.
9. Tem uma filha com seis meses.
10. É trabalhador rural, auferindo o salário mínimo [€ 580,00].
11. A sua companheira é engenheira civil, auferindo pelo menos € 700,00.
12. Vive em casa arrendada, pagando renda no valor de € 400,00.
13. Despende em despesas gerais de água, luz e gás uma quantia mensal de € 100,00.
14. Como habilitações literárias o arguido possui o 6.º ano de escolaridade.

Foi consignado não existirem outros factos por provar.

O tribunal recorrido fundamentou a formação da sua convicção do seguinte modo:

A convicção do Tribunal assentou na análise crítica da prova produzida em audiência de julgamento, bem como do teor dos documentos constantes dos autos, prova esta concatenada entre si e apreciada ao abrigo do princípio da livre apreciação da prova, previsto no art.º 127 do C. P. P.

Assim, resultaram fundamentais para a formação da convicção, no que respeita à factualidade provada, as declarações prestadas pelo arguido em sede de inquérito, a fls. 35, o depoimento das testemunhas, bem como o teor do auto de notícia de fls. 3, exame toxicológico, de fls. 5, certificado do alcoolímetro, de fls. 6 e 7, e certificado de registo criminal.

Destarte, e em particular, o Tribunal considerou:

Factos provados de 1 a 4.
O Tribunal atendeu desde logo ao teor do exame toxicológico de fls. 5 [contraprova] e às próprias declarações do arguido prestadas em sede de inquérito, perante Magistrado do Ministério Público e após advertência prevista no art.º 141, n.º 4, al. b) do C.P.P., que confirmou o teor do auto de notícia e admitiu ter ingerido bebidas alcoólicas.

Foram ainda inquiridos os agentes da PSP FR e TS, que tiveram intervenção nos factos, e descreveram a fiscalização ao arguido que culminou com o levantamento do auto de notícia.

FR, agente autuante, acompanhou posteriormente o arguido ao Posto de Beja para realização da contraprova.

Foram declarações credíveis, prestadas por quem teve conhecimento directo dos factos e ademais em exercício de funções. Pelo que foram positivamente valoradas pelo Tribunal.

Tendo tais questões sido suscitadas pelo arguido, cumpre ainda notar que, além de ter o arguido sido visto a conduzir de forma que suscitou aos militares a necessidade de fiscalização ao mesmo, ainda que assim não fosse, nos termos do art.º 152, n.º 1, al. a) do Código da Estrada, todos os condutores devem submeter-se às provas estabelecidas para a detecção de estado influenciado pelo álcool.

Por outro lado, quanto a (não) ter sido o arguido informado de que poderia realizar teste de contraprova através de novo exame por a1coolímetro ou por análise de sangue, consta dos autos, a fls. 8, tal notificação, nos termos do art.º 152, n.º 2, al. c) e 3 do Código da Estrada.

No que respeita à validade do resultado de contraprova obtido através do alcoolímetro DRAGER, modelo 7110 MKIII P, número ARAN-0030, já foi tal questão supra apreciada, dando-se aqui por reproduzido o entendimento aí expresso.

Facto provado 5
Do certificado de registo criminal do arguido não constam averbados antecedentes criminais.

Factos provados 6 a 14
O Tribunal atendeu às declarações prestadas pelo arguido e considerou que as mesmas se afiguraram credíveis, no que às condições pessoais, familiares e profissionais respeita.

Examinemos as questões atrás de enunciadas pela ordem indicada.

1.ª Da validade ou invalidade do meio de obtenção da prova obtida através do alcoolímetro (quantitativo) utilizado e da admissibilidade ou inadmissibilidade desta.

Não sofre qualquer contestação que a medição da taxa de álcool no sangue a que foi submetido o arguido/recorrente no dia 18-06-2017 foi realizada através alcoolímetro DRAGER, modelo 7110 MKIII P, número ARAN-0030, aprovado pelo despacho n.º 19684/2009, da ANSR, de 25 de junho, e pelo IPQ através do Despacho n.º 211.06.07.3.06, de 24 de Abril de 2007 e verificado também pelo IPQ em 10/05/2016, pelo que entende o recorrente que a sua validade já tinha expirada à data dos factos, 18/06/2017, não sendo valida a prova obtida através desse aparelho.

Por sua vez o Tribunal Recorrido e o Ministério Público sustentam que tendo esse alcoolímetro sido sujeito a primeira verificação pelo I.P.Q. em 10 de Maio de 2016, é válido até 31 de Dezembro de 2017, pelo que o resultado do exame quantitativo de álcool no sangue com ele realizado ao arguido é plenamente válido.

O tribunal a quo fundamentou o juízo que firmou do seguinte modo:
«Entende o arguido que são inválidas todas as leituras que possam ter sido efectuadas após o dia 10 de Maio de 2017 através do a1coolímetro de marca DRAGER, modelo 7110 MKIII P, número ARAN-0030, pela razão de estar, após essa data, expirado o prazo de validade de um ano desde a verificação do aparelho pelo IPQ realizada em 10/05/2016.

Independentemente do desvalor jurídico assacado pelo arguido a tal prova, nulidade por ser proibida [art.º 125º e 126º do C.P.P.], sempre se dirá que não lhe assiste razão.

Conforme consta do certificado de verificação emitido pelo Instituto Português da Qualidade [fls. 7], relativamente ao aparelho em causa, utilizado para contraprova, foi o mesmo sujeito a primeira verificação em 10/05/2016.

Assim, e desde logo, tendo ocorrido primeira verificação do a1coolímetro em 10/05/2016, estava o mesmo dispensado de verificação periódica até 31/12/2017. E, naturalmente, verificada a sua qualidade metrológica até essa data, o resultado da sua utilização em 18/06/2017 afigura-se válido, se o critério para tanto aferir for o do seu correcto controlo metrológico.

Ainda se adiante que a mesma conclusão se teria de extrair fosse a verificação realizada em 10/05/2016 já periódica, ou seja, ulterior à primeira verificação, posto que nos termos do número 5 do citado artigo, a verificação periódica é válida até 31 de Dezembro do ano seguinte ao da sua realização, inexistindo, com rigor, diferença de tratamento, neste ponto, ou seja, do prazo da sua validade, entre a primeira verificação e a verificação periódica.

Tal postulado, em nada sai prejudicado com o disposto na Portaria n.º 1556/2007, de 10 de Dezembro, designadamente no seu art.º 7, n.ºs 1 e 2, na medida em que também esta regulação (específica aos a1coolímetros) remete para o hiato temporal anual, o que, cremos, em nada se incompatibiliza com o regime geral (aplicável ao todos os aparelhos metrológicos) previsto no citado Decreto-Lei n.º 291/90, de 20 de Setembro.

A este propósito leia-se o acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, datado de 26 de Setembro de 2012 [relator Jorge Dias; processo n. º 135/11.4GCPMS.C1; disponível em www.dgsi.pt]: entendendo-se que tem de haver uma verificação periódica em cada ano civil e, por isso, se refere que a verificação periódica seguinte teria de ser efetuada até 31 de dezembro de 2011. Até esta data estava o aparelho verificado, independentemente da data em que tivesse sido verificado no ano de 2010 (o recorrente suscita a hipótese de ser o aparelho verificado em Junho de um ano e se valesse até ao fim do ano seguinte a validade não era anual mas de ano e meio, a isto diremos que em vez de Junho de um ano a verificação pode ocorrer em Janeiro de um ano e essa verificação é válida até ao fim do ano seguinte, sem deixar de haver verificação anual. A verificação anual é uma verificação em cada ano civil. Assim, estava a vigorar a verificação periódica.

Tal interpretação sobre a validade quer da primeira verificação quer da verificação periódica e sobre a conjugação entre o Decreto-Lei n.º 291/90, de 20 de Setembro e a Portaria nº1556/2007, de 10 de Dezembro encontra-se consolidada nos tribunais superiores e também nós a sufragamos.

Além do citado aresto, sendo inúmera a jurisprudência vertida sobre a questão, veja-se por todos o acórdão do Tribunal da Relação de Évora, datado de 20 de Janeiro de 2015 [relator Sérgio Corvacho; processo n.º 314/13.0GFLLE.E1; disponível em www.dgsi.pt]: (...) os nºs 2 e 5 do art. 4º do DL nº 291/90 de 20/9 estatuem que tanto a primeira verificação como a verificação periódica são válidas até ao dia 31/12 do ano seguinte ao da respectiva realização, salvo regulamentação específica em contrário. Na tese interpretativa defendida pelo recorrente, o adjectivo «anual», referenciado à verificação periódica, no texto do nº 2 do art. 7º da Portaria nº 1556/07 de 19112, deve ser entendido como impondo que essa verificação tenha lugar nos 365 dias (eventualmente 366, se estivermos em ano bissexto) posteriores à data da verificação imediatamente anterior, sob pena de caducidade desta. Diferentemente, a generalidade da jurisprudência vem entendendo que o emprego do referido adjectivo no contexto da norma interpretanda não significa outra coisa senão aquilo que já resulta do disposto nos nºs 2 e 5 do art. 4º do DL nº 291/90 de 20/9, ou seja, que tem de haver uma verificação em cada ano civil. ( ... ) Trata-se de uma orientação jurisprudencial perfeitamente consolidada, pois não temos conhecimento de alguma decisão de um Tribunal Superior em sentido contrário, nem o recorrente a indica. Em apoio da sua tese, o recorrente invoca a necessidade de assegurar a precisão e a credibilidade dos resultados dos exames feitos pelos alcoolímetros, que, em sua opinião, seriam postas em causa pelo facto de, em resultado da interpretação dominantes, os aparelhos poderem permanecer, hipoteticamente, quase dois anos completos (no máximo desde o dia 1/1 de um ano até ao dia 31/12 do ano seguinte), sem serem sujeitos a fiscalização. Contudo, tal imperativo é válido para todo e qualquer instrumento de medição e não apenas os alcoolímetros. Nesta ordem de ideias, não vislumbramos razão válida para nos afastarmos da jurisprudência pacífica que se gerou a respeito da questão que agora nos ocupa. Assim sendo, teremos de assentar em que a verificação a que foi sujeito, em 22/2/12, o alcoolímetro utilizado no exame ao ar expirado feito ao arguido no presente processo se manteve válida até 31/12/13, pelo que estava em vigor à data da realização do exame.

Assim sendo e revertendo este entendimento ao caso dos autos, verificamos que tendo sido o aparelho alcoolímetro (quantitativo) utilizado objecto de verificação pelo IPQ em 10/05/2016, tal verificação manteve-se válida até ao dia 31/12/2017, abrangendo, pois o exame toxicológico realizado ao arguido no dia 18/06/2017.

Por último, de notar-se que a jurisprudência citada pelo arguido [acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, datado de 16 de Maio de 2012; relator Vasques Osório; processo n.º 191/11.5PAPBL.Cl; disponível em www.dgsi.pt] versou sobre situação substancialmente distinta da questão suscitada nos autos: em tal aresto decidiu-se pela necessidade de constar dos autos a certificação da última verificação do a1coolímetro atendendo a que, caso contrário e enquanto prova tarifada, não se pode aferir se a sua data de validade se encontra ou não ultrapassada à data do exame toxicológico.

Nesta conformidade, deve considerar-se que o aparelho a1coolímetro se encontra validamente verificado no que respeita ao seu controlo metrológico, devendo por isso ser o resultado obtido pela utilização do mesmo, na supra referida data, valorado pelo Tribunal, enquanto elemento probatório válido e eficaz.

Pelo exposto e de acordo com a fundamentação supra aduzida, julgo não verificada a nulidade da prova disponibilizada pelo a1coolímetro, por proibição de prova».

Sobre esta questão, é certo que não existe unanimidade na jurisprudência.

Porém, julgamos ser maioritária a que defende a posição adoptada na sentença recorrida, que é também por nós perfilhada, no sentido de que os alcoolímetros quantitativos estão sujeitos a uma verificação periódica anual, isto é, a realizar todos os anos civis, (art.7º, nº2 da Port. nº 1556/2007, de 10-12) (art.4º, nº5 do DL nº291/90, de 20-09 e cada verificação periódica é válida até ao dia 31 de Dezembro do ano seguinte ao da sua realização (cfr. os acórdãos citados na resposta ao recurso do Ministério Público, desta Relação de 20-01-2015, proc. nº314/13.0GFLLE.E1 e da Relação de Coimbra, de 03-07-2012, proc. nº396/10.6GAPMS.C1).

Na verdade, sobre esta questão recentemente subscrevemos como adjunto o acórdão desta Relação proferido em 18-10-2018 [proc.nº234/17.9GACTX.E1 Rel. Des. Fernando Pina], que nesta matéria secundou integralmente o acórdão também desta Relação de 22-11-2011 [proc.º 1182/11.1GAABF.E1, Rel. Des. Fernando Ribeiro Cardoso] e não surgindo desde então qualquer argumento novo que nos leve a abandonar a fundamentação que serve de suporte à tese nele explanada e à interpretação das disposições legais nele invocadas sobre o assunto, continuamos a entender que os alcoolímetros quantitativos estão sujeitos a uma verificação periódica anual, isto é, a realizar todos os anos civis, e cada verificação periódica é válida até ao dia 31 de Dezembro do ano seguinte ao da sua realização.

Com efeito, a utilização dos alcoolímetros (quantitativos) para a realização do teste de alcoolémia exige a sua aprovação prévia, seja pelo IPQ - que atesta a sua conformidade com as especificações técnicas aplicáveis à sua categoria - seja pela ANSR (art.º 14 n.ºs 1 e 2 da Lei 18/2007, de 17 de Maio - Regulamento de Fiscalização da Condução sob a influência do álcool ou de substâncias psicotrópicas) e que esta aprovação - técnica - de modelo “… é o ato que atesta a conformidade de um instrumento de medição ou de um dispositivo complementar, com as especificações aplicáveis à sua categoria, devendo ser requerida pelo respectivo fabricante ou importador”, e “… será válida por um período de 10 anos, findo o qual carece de renovação” (art.º 2 n.ºs 1 e 2 do Regime Geral de Controlo Metrológico previsto no DL 291/90, de 20.09). Prazo de validade que veio a ser consagrado, também, posteriormente, na Portaria 748/94, de 13.08, e na Portaria 1556/2007 - Regulamento do Controlo Metrológico dos Alcoolímetros - que revogou aquela.

Todavia, estão sujeitos a uma verificação periódica anual destinada a constatar se os instrumentos de medição mantêm a qualidade metrológica dentro das tolerâncias admissíveis relativamente ao modelo respectivo, a realizar todos os anos civis, e cada verificação periódica é válida até ao dia 31 de Dezembro do ano seguinte ao da sua realização.

Com efeito como é explanado naquele acórdão, onde é feito uma análise exaustiva e que aqui seguiremos de perto, diz-se a este propósito o seguinte:

«A Portaria n.º1556/2007, de 10 de Dezembro, como resulta do seu artigo 1.º, regulamenta o controlo metrológico dos alcoolímetros, aplicável aos alcoolímetros quantitativos ou analisadores quantitativos.

Estes aparelhos estão sujeitos a quatro verificações, como resulta do art. 5.º, que são a verificação para aprovação de modelo, a primeira verificação, a verificação periódica e a verificação extraordinária.

A aprovação de modelo é o acto que atesta a conformidade de um instrumento de medição com as especificações aplicáveis à sua categoria; a primeira verificação é o exame e o conjunto de operações destinados a constatar a conformidade da qualidade metrológica dos instrumentos de medição, novos ou reparados, com a dos respectivos modelos aprovados e com as disposições regulamentares aplicáveis; a verificação periódica é o conjunto de operações destinadas a constatar se os instrumentos de medição mantêm a qualidade metrológica dentro das tolerâncias admissíveis relativamente ao modelo respectivo; finalmente, a verificação extraordinária ocorre apenas em casos de dúvidas ou de reclamações específicas.

O art. 7.º dispõe sobre as verificações metrológicas dos aparelhos e determina, no seu nº 2, que «a verificação periódica é anual, salvo indicação em contrário no despacho de aprovação de modelo», no caso o despacho n.º19684/2009, proferido pelo Presidente da ANSR em 25 de Junho de 2009, o qual não contem qualquer indicação em contrário.

Este Regulamento do Controlo Metrológico dos Alcoolímetros, como consta expressamente do mesmo, foi aprovado pelo Governo, “Ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 1.º e no artigo 15.º do Decreto-Lei n.º 291/90, de 20 de Setembro, conjugado com o disposto no n.º 1.2 do Regulamento Geral do Controlo Metrológico anexo à Portaria n.º 962/90, de 9 de Outubro”.

Na Portaria 1556/2007 o momento temporal das verificações metrológicas ordinárias, que comporta a primeira e as verificações periódicas encontra-se regulado no seu artigo 7.º, distinguindo-se esses dois momentos, pois enquanto no seu n.º 1 se reporta à inicial, no n.º 2 alude-se às subsequentes [n.º 2] – o n.º 3 refere-se às operações de verificação extraordinária.

No que respeita às verificações ordinárias subsequentes à primeira verificação estipula-se naquele artigo 7.º, n.º 2 que “A verificação periódica é anual, salvo indicação em contrário no despacho de aprovação do modelo”. Este segmento normativo não tem nada de inovador, pois limita-se a transcrever o que já constava, nos mesmíssimos e precisos termos, nas portarias antecedentes, ou seja a Portaria n.º 110/91, de 06 de Fevereiro (n.º 11) e na Portaria n.º 748/94, de 13 de Agosto (n.º 11).

A expressão “anual” tinha e continua a ter o significado comum daquilo que se faz, celebra, acontece ou realiza em cada ano ou num período de cada ano, ou, ainda, todos os anos.

Assim e como se pode verificar do citado artigo 7.º, n.º 2 o mesmo não regula a validade do uso dos alcoolímetros mas apenas e tão só o momento temporal em que se devem realizar as verificações metrológicas periódicas. A única referência que é feita à validade da verificação dos alcoolímetros diz apenas e tão só respeito à verificação extraordinária, no referido artigo 7.º, n.º 3 e nos seguintes termos: “A verificação extraordinária compreende os ensaios da verificação periódica e tem a mesma validade”.

Isto significa que o disposto no artigo 7.º, n.º 2 é de todo estranho ao período de validade da verificação dos exames metrológicos dos alcoolímetros, pelo que enxertar neste segmento normativo qualquer interpretação neste sentido é sair do seu comando regulamentador.

Por seu turno o Decreto-Lei n.º 291/90, de 20 de Setembro, procedeu à harmonização do regime nacional com o direito comunitário sobre o controlo metrológico dos aparelhos de medição.

Nos termos do seu art. 1.º, n.º 1, «o controlo metrológico dos métodos e instrumentos de medição envolvidos em operações comerciais, fiscais ou salariais, ou utilizados nos domínios da segurança, da saúde ou da economia de energia, bem como das quantidades dos produtos pré-embalados e, ainda, dos bancos de ensaio e demais meios de medição abrangidos pelo artigo 6º é exercido nos termos do presente diploma e dos respectivos diplomas regulamentares».

Tal como para a portaria, também para este diploma as operações a realizar no âmbito do controlo metrológico são a aprovação de modelo, a primeira verificação, a verificação periódica e a verificação extraordinária (art. 1.º, n.º 3).

A verificação periódica está tratada no art. 4.º, nos seguintes termos:
«1 - Verificação periódica é o conjunto de operações destinadas a constatar se os instrumentos de medição mantêm a qualidade metrológica dentro das tolerâncias admissíveis relativamente ao modelo respectivo, devendo ser requerida pelo utilizador do instrumento de medição.

2 - Os instrumentos de medição são dispensados de verificação periódica até 31 de Dezembro do ano seguinte ao da sua primeira verificação, salvo regulamentação específica em contrário.

3 - Nos instrumentos de medição cuja qualidade metrológica esteja dentro das tolerâncias admissíveis, relativamente ao respectivo modelo, será aposta, no acto da operação, a marca de verificação periódica.

4 - A marca referida no número anterior será aposta por forma a garantir a inviolabilidade do instrumento de medição.

5 - A verificação periódica é válida até 31 de Dezembro do ano seguinte ao da sua realização, salvo regulamentação específica em contrário».

Fora deste regime jurídico base de controlo metrológico, surgiu um regime específico, com o Decreto-Lei n.º 192/2006, de 26 de Setembro, que transpondo para o direito interno a Directiva n.º 2004/22/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 31 de Março, veio regular o controlo metrológico dos 11 instrumentos de medição elencados no seu artigo 2.º, inaplicável aos alcoolímetros. No que a estes diz respeito e na sequência da Lei n.º 18/2007, de 17 de Maio, que aprovou o Regulamento de Fiscalização da Condução sob a Influência do Álcool ou de Substâncias Psicotrópicas, enunciou-se, no seu artigo 14.º, que a aprovação dos analisadores cabe, por despacho, ao presidente da Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária [n.º 1 e 3], muito embora sujeitos a prévia homologação do Instituto de Português de Qualidade (IPQ), nos termos do Regulamento do Controlo Metrológicos dos Alcoolímetros [n.º2].

Face aos diplomas que regulamentam a matéria discutida no presente recurso é seguro, no que respeita à verificação periódica dos aparelhos de medição, que ela é anual e que a sua validade se estende até ao dia 31 de Dezembro do ano seguinte ao da sua realização (sublinhado nosso). Em sentido semelhante vejam-se os Acórdãos da Relação do Porto de 6 de Abril de 2011, 25 de Maio de 2011 e 8 de Junho de 2011, relatados, respectivamente, pelas Des. Olga Maurício, Airisa Caldino e pelo Des. Artur Oliveira, acessíveis em www.dgsi.pt.

Parece-nos que a clareza da lei não permite dúvidas sobre esta concreta questão».

E é também nesse sentido que foi entendido no acórdão desta Relação de 13-11-2012 [proc. nº39/10.8GBLSG.E1, Rel. Des. Martinho Cardoso], também disponível em www.dgsi.pt pelo que se nos afigura incompreensível a sua invocação pelo recorrente.

Para além destes e dos já anteriormente citados e no mesmo sentido, isto é, de que os alcoolímetros quantitativos estão sujeitos a uma verificação periódica anual, a realizar todos os anos civis, e cada verificação periódica é válida até ao dia 31 de Dezembro do ano seguinte ao da sua realização, podem ainda ver-se entre muitos outros, os acórdãos desta Relação de 06-12-2016 [proc. nº972/13.5GBLLE.E1, Rel. Des. Clemente Lima], e de 11-09-2018, proc. nº301/17.9GDPTM.E1, Rel. Des. Alberto Borges].

Como neste é afirmado «A utilização dos alcoolímetros para a realização do teste de alcoolémia exige a sua aprovação prévia, seja pelo IPQ - que atesta a sua conformidade com as especificações técnicas aplicáveis à sua categoria - seja pela ANSR (art.º 14 n.ºs 1 e 2 da Lei 18/2007, de 17 de maio - Regulamento de Fiscalização da Condução sob a influência do álcool ou de substância psicotrópicas).

Essa aprovação técnica é válida por um período de 10 anos, findo o qual carece de renovação.

Porém, de acordo com o Regime Geral de Controlo Metrológico dos Alcoolímetros (n.º 7 do art.º 2 do DL 291/90, de 20.09), não obstante a caducidade do prazo de validade da aprovação de modelo, nada obsta à sua utilização desde que satisfaça as operações de verificação aplicáveis (Portaria n.º 1556/2007, de 10.12)».

Assim, em conformidade, em 18.06.2017, quando o exame de pesquisa de álcool no sangue foi efetuado ao arguido com a utilização do alcoolímetro da marca Drager, modelo 7110 MKIII-P, Nº de série ARAN 0030, aprovado pelo IPQ através do Despacho de Aprovação de Modelo n.º 211.06.07.3.06, de 24 de Abril de 2007 publicado na 2.ª Série do Diário da República de 6.06.2007, verificado - primeira verificação - em 12.09.2016 e aprovado pelo Despacho da ANSR n.º 19684/2009, de 25-06, DR 166, II Série, de 27.08.2009, o prazo de validade do aparelho já havia caducado em 06-06-2017 (10 anos após o despacho da última aprovação, que fora publicado em de 6.06.2007): contudo, tendo aquele aparelho sido aprovado na verificação a que foi submetido em 12.09.2016 e, portanto, encontrando-se em condições de ser utilizado, ex vi art.º 2 n.º 7 do DL 291/90, de 20.09, e art.ºs 10º a 11º da Portaria 1556/07, de 10.12, nada impedia que permanecesse em utilização, e daí que se considere válido o teste efetuado.

No caso em apreço, como atrás dissemos, tal aparelho foi verificado em 12.09.2016, conforme certificado a fls. 6, com validade até 31.12.2017, tendo o resultado sido, como dessa certificação consta “Aprovado, em conformidade com o Regulamento em vigor”, donde se conclui que - não obstante a caducidade do prazo de aprovação de modelo pelo IPQ (que caducara em 6.06.2017) - aquele aparelho foi aprovado na verificação a que foi submetido em 12.09.2016 e, portanto, estava em condições de ser utilizado, ex vi art.º 2 n.º 7 do DL 291/90, de 20.09 (“os instrumentos de medição em aprovação cuja aprovação de modelo não seja renovada ou tenha sido revogada podem permanecer em utilização desde que satisfaçam as operações de verificação aplicáveis”), e art.ºs 10 a 11 da Portaria 1556/07, de 10.12.

Assim, impõe-se concluir que a validade da verificação do alcoolímetro quantitativo utilizado, comprovada pelo certificado de fls.6, realizada em 12-09-2016 “Aprovado, em conformidade com o Regulamento em vigor” estende-se até ao dia 31 de Dezembro de 2017, pelo que nada obsta a que se considere válido o teste efetuado e, consequentemente, que se considere como provado tal facto, sendo que nenhuma disposição legal estabelece que a utilização daquele aparelho nessas circunstâncias constitua um meio de prova proibido (art.º 125 do CPP) e muito menos de ausência ou inexistência de prova, como alega o recorrente.

O recorrente alega ainda ser inconstitucional o Art. ° 4.°, n.º 2, do Decreto-Lei nº 291/90, de 20 de setembro, quando dispensa de verificação periódica os instrumentos de medição, até 31 de dezembro do ano seguinte, por estar em contradição com a Lei especial da Portaria n.º 1556/2007, de 10 de dezembro, quando esta define a validade como anual.

Para além da decisão sob recurso não apontar qualquer contradição entre esses dois preceitos, o certo é que não o diz o recorrente e nós também não descortinamos qual a norma da nossa Lei Fundamental ou princípio constitucional violado, postergado ou derrogado, pelo que carece de fundamento a invocada inconstitucionalidade.

Com o devido respeito, falece, razão ao recorrente.

Prosseguindo.

2.ª Da insuficiência para a decisão da matéria de facto provada - a al. a) do nº2 do art.410º do CPP.

Alega o recorrente que a sentença recorrida enferma desse vício, porquanto nem das suas declarações nem dos depoimentos dos dois guardas da GNR, resulta que ele tivesse consciência de que tinha ingerido bebidas alcoólicas em excesso ou ter uma condução perigosa reveladora desse excesso.

Vejamos.
Conforme resulta do estatuído no nº2 do art.410º, do CPP, os vício previstos nas alíneas a), b) e c), têm de resultar do texto da decisão recorrida, por si só ou conjugada com as regras da experiência, sem recurso a quaisquer elementos que lhe sejam externos.

Trata-se de vícios intrínsecos da decisão, não sendo lícito afirmar-se a sua existência recorrendo a elementos que lhe sejam exteriores, designadamente de depoimentos e declarações prestados, quer durante o inquérito, instrução, quer até na audiência de julgamento.

Incorre no vício de insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, quando o tribunal recorrido podendo fazê-lo, deixou de investigar toda a matéria de facto relevante, de tal forma que essa matéria de facto não permite, por insuficiência, a aplicação do direito ao caso submetido à apreciação do Tribunal.

Este vício trata consabidamente de uma insuficiência da matéria de facto para a decisão de direito.

Como refere o Prof. Germano Marques da Silva, no “ Curso de Processo Penal”, vol.III, pag.339/340 «é necessário que a matéria de facto dada como provada não permita uma decisão de direito, necessitando de ser completada. Antes de mais, é necessário que a insuficiência exista internamente, dentro da própria sentença ou acórdão. Para se verificar este fundamento, é necessário que a matéria de facto se apresente como insuficiente para a decisão que deveria ter sido proferida por se verificar lacuna no apuramento da matéria de facto necessária para uma decisão de direito. A insuficiência para a decisão da matéria de facto provada não tem nada a ver com a eventual insuficiência da prova para a decisão de facto proferida.

A insuficiência para a decisão da matéria de facto ocorre quando da factualidade vertida na sentença se colher faltarem elementos que podendo e devendo ser indagados, são necessários para se poder formular um juízo seguro de condenação ou de absolvição (Ac. STJ de 15/171998, proc.1075/97, acessível em www.dgsi.pt).

Tal insuficiência determina a formulação incorrecta de um juízo porque a conclusão ultrapassa as premissas, ou seja, quando os factos provados forem insuficientes para fundamentar a solução de direito encontrada.

A referida insuficiência resulta do tribunal não ter esgotado os seus poderes de indagação relativamente ao apuramento da matéria de facto essencial; no cumprimento do dever da descoberta da verdade material, o tribunal podia e devia ter ido mais longe, não o tendo feito, ficaram por investigar factos essenciais, cujo apuramento permitiria alcançar a solução legal e justa (cfr.Ac.STJ de 2/6/1999, proc.288/99, acessível em www.dgsi.pt).

Assim, um tal vício só pode ter-se como evidente quando os factos provados forem insuficientes para justificar a decisão assumida.

Ora atenta a materialidade apurada, acima transcrita, é manifesta a inexistência deste vício.

Na verdade, examinada e revista, à luz de tais ditames e ensinamentos, o texto da sentença recorrida, não se vê, de todo em todo, que o tribunal “a quo” haja incorrido em tal vício.

Com efeito, basta atentar nos factos elencados como provados, donde decorre a perfectibilização subsuntiva dos elementos de facto pertinentes à responsabilidade criminal - elementos objectivos e subjectivos - do crime que a sentença recorrida atribui ao arguido/recorrente, pelo qual foi condenado na 1ª Instância.

Mas se bem interpretamos a fundamentação do recurso e subsequentes conclusões, o recorrente invoca este vício pretendendo estribar-se na insuficiência da prova para ter sido dado como provada a actuação dolosa que lhe é atribuída na sentença recorrida.

Ora, são coisas distintas e como tal não podem ser confundidas, a insuficiência de prova e a insuficiência da matéria de facto para a decisão.

É, pois, manifestamente patente que a decisão recorrida não enferma deste vício.

De qualquer modo sempre se dirá, que sendo a intenção e a consciência da ilicitude, do foro interior de cada um, se não forem admitidos pelos próprios, como é o caso, só uma avaliação alicerçada em presunções judiciais, não proibidas por lei, com base nos demais factos apurados e nas circunstâncias e contexto global em que se verificam e em dados da personalidade do agente, avaliação essa permitida se feita com respeito pelas regras da experiência comum, permite retirar tais conclusões.

No caso vertente, a convicção alcançada pelo tribunal “ a quo” relativamente ao dolo e à consciência da ilicitude, uma vez que o arguido se remeteu ao silêncio, só por meio de prova indirecta apreciada livremente pelo julgador e através de deduções lógicas era possível a sua demonstração, como aqui sucede.

Na verdade, a factualidade objectiva dada como provada em conjugação com as regras da experiência comum levam necessariamente à conclusão/dedução, de que quem apresenta uma taxa de alcoolemia como aquela de que era portador o arguido (1,63 g/l) muitíssimo superior a que é permitida para se poder legalmente conduzir (inferior a 0,5 g/l) e até muito superior à que a lei pune como crime (= ou superior a 1,2 g/l) tal necessariamente significa que que foi ingerida uma quantidade elevada de álcool e/ou uma quantidade de álcool com acentuado teor alcoólico.

Por outro lado, se é do conhecimento geral que é proibido conduzir no estado de influenciado pelo álcool ou em estado de embriaguez, por maioria de razão não pode ignorar isso qualquer condutor encartado, como é o caso do arguido/recorrente.

Assim, o arguido não podia deixar de saber e prever que naquelas circunstâncias, acusaria uma taxa de álcool superior ao limite legal e que a condução automóvel na via pública nesse estado era proibida e punida por lei.

Assim, não merece reparo a convicção alcançada pelo tribunal relativamente à conduta dolosa descrita na sentença recorrida atribuída ao arguido.

3. ª Da aplicação do princípio in dubio pro reo.
Alega ainda o recorrente que devia ou deve beneficiar do princípio ”in dubio pro reo”.

Trata-se de um princípio com aplicação na avaliação da prova e não na subsunção dos factos ao direito.

Como é sabido, o princípio do “in dubio pro reo” é um corolário da presunção de inocência, consagrada constitucionalmente no art.32º nº2 da CRP. Integra uma norma directamente vinculante e constitui um dos direitos fundamentais dos cidadãos. (cfr.arts.18º nº1, da CRP; 11º, da Declaração Universal dos Direitos do Homem; 6º nº2, da Convenção Europeia para a Protecção dos Direitos e Liberdades Fundamentais e 14º nº2, do Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos).

Tem o seu campo de aplicação no domínio natural e lógico da valoração e apreciação da prova, ou seja, no âmbito do apuramento da matéria de facto.

Ora, examinada a fundamentação da sentença recorrida, não vislumbramos que o Tribunal “a quo” tenha subsistido em dúvida sobre algum os factos que deu como provados e que tenha optado por solucioná-la em desfavor dos arguidos/recorrentes. Dúvida que este Tribunal de recurso, relativamente a essa matéria, relativamente à qual nem sequer tem acesso à oralidade e a imediação com as provas, em toda a sua plenitude, também não nos assalta, pois que só se a fundamentação revelasse que aquele Tribunal, face a algum ou alguns factos, tivesse ficado em dúvida “patentemente insuprível”, como se referiu no Ac. do STJ de 15/06/2000, publicado na Col. Jur. Ano VII, Tomo 2º, pag.228, e a tivesse decidido em desfavor do arguido, é que se podia afirmar que havia sido postergado o princípio “ in dubio pro reo” que, como dissemos, é um corolário da presunção de inocência consagrado constitucionalmente.

Como bem se salienta no Ac. STJ de 14/4/2011 (rel. Cons. Souto de Moura), disponível em www.dgsi.pt “a situação de dúvida tem que se revelar de algum modo, e designadamente através da sentença. A dúvida é a dúvida que o tribunal teve, não a dúvida que o recorrente acha que, se o tribunal não teve, deveria ter tido”.

Não emergindo da fundamentação da sentença recorrida que o julgador se tenha deparado com uma qualquer dúvida insanável sobre a verificação dos factos que deu como provados, não se evidenciando essa dúvida nada há para resolver, pro ou contra quem quer que seja.

Também neste conspecto falece razão ao recorrente.

Não padecendo a sentença recorrida de algum dos vícios enunciados nas alíneas a), b, e c) no nº2 do art.410º do CPP, nem assentando em prova proibida, tem-se por definitivamente sedimentada a decisão sobre a matéria de facto proferida na 1ª Instância, sendo irrefutável que esses factos preenchem indubitavelmente os elementos objectivos e subjectivo do crime de condução de veículo em estado de embriaguez, pp. nos termos do disposto nos art. 292º n.º 1 e 69º nº 1 a), do C. Penal pelo qual o arguido foi condenado na sentença recorrida, pelo que improcede a sua impetrada absolvição.

Nesta conformidade e sem mais desenvolvidas considerações por supérfluas, o recurso deve improceder, mantendo-se na íntegra a sentença recorrida, que não afronta nem posterga nenhum dos princípios e preceitos legais invocados pelo recorrente.

DECISÃO.
Nestes termos e com tais fundamentos negamos provimento ao recurso, mantendo integralmente a sentença recorrida.

Custas pelo arguido/recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 4 UC’s [arts.513º, nºs 1 e 3 e 514º, nºs 1 e 2 do CPP e art. 8º nº9 e tabela III anexa, do Código das Custas Processuais].

Évora, 20 de Dezembro de 2018.

(Elaborado e integralmente revisto pelo relator).

Gilberto Cunha

João Martinho de Sousa Cardoso